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21 DE FEVEREIRO DE 1997 1527

Nesta sociedade é bem diferente a condição de ser homem ou de ser mulher.
Para o homem, segundo certos moralistas, a expressão da sua sexualidade é vista como uma salutar manifestação da sua vitalidade e, na verdade, é apenas condicionada pelos perigos das doenças ou pelos riscos daquilo que eles mesmos chamam, condescendentemente, de «casamentos forçados».
Mas a mulher sabe, desde muito nova, que a sua sexualidade está condicionada não pelas opções que livremente queira assumir, mas por essa feroz repressão social que teima em reduzir a sexualidade à maternidade e por leis iníquas que criminalizam as eventuais consequências dessa sexualidade.
E sabem mesmo mais: desde muito jovens, as mulheres sabem que, mesmo entre elas, existem condições muito diferentes. Há aquelas que, por terem famílias mais compreensivas, por terem mais informação ou simplesmente mais dinheiro, podem optar livremente se querem ou não prosseguir uma gravidez indesejada.
Afinal, Badajoz não fica assim tão longe!
Mas para a maioria das mulheres fica a sexualidade reprimida pelo medo de que «alguma coisa não corra bem», pelo pavor de ficar diante de uma gravidez indesejada, com as consequências que nenhum de nós tem o direito de ignorar.
Para essa mulher, a opção estará ou em prosseguir essa gravidez em condições sociais, económicas e psicológicas, muitas vezes degradantes, ou em entrar no calvário do aborto clandestino, onde, como todos sabemos, há muito pior que o horror das parteiras de vão de escada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os projectos lei do Partido Comunista e da JS têm sido demagogicamente acusados de serem a favor do aborto, quando apenas pretendem - e já não é pouco - acabar com a legislação iníqua existente, que retira à mulher, de forma humilhante, o poder de tomar livremente as opções que só a ela dizem respeito.

Aplausos do PCP, de Os Verdes e de alguns Deputados do PS.

Nenhum de nós é a favor do aborto, a começar pelos milhares e milhares de mulheres que alguma vez tiveram de interromper a sua gravidez. Nós somos é a favor da afirmação da plena igualdade e dignidade da mulher. E é no quadro dessa dignidade e igualdade que defendemos os valores essenciais ao direito à vida, à liberdade religiosa e a uma sã educação sexual.
Direito à vida, sim, como expressão de uma maternidade desejada e em condições sociais, económicas e psicológicas dignas.
Liberdade religiosa, sim, mas assente numa verdadeira liberdade de opção e não num conjunto de leis, tratando como criminosos os que pensam de maneira diferente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, por indicação da direcção do seu grupo parlamentar, terminou o seu tempo.

O Orador: - Termino rapidamente, Sr. Presidente, fazendo um apelo para votarem nestes projectos de lei, mas também, com a mesma franqueza, para, se, por acaso, a decisão desta Assembleia for contrária aos projectos em causa, que ao menos evitemos às mulheres deste país os discursos compreensivos sobre os dramas do aborto clandestino. Ou, pior que tudo, evitemos os discursos piedosos sobre o drama da mulher que pecou ou da mulher que caiu.
Esperemos que esta Assembleia não desiluda as mulheres deste país e afirme com independência e total sentido da suas responsabilidades os valores de uma sociedade democrática e livre, assente na igualdade plena entre homens e mulheres.

Aplausos do PCP, de Os Verdes e de alguns Deputados do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: O debate que hoje aqui decorreu é extremamente importante e pôs a nu um gravíssimo problema da nossa sociedade, que constitui ameaça de morte para muitas mulheres e que é de saúde pública.
Trata-se de um problema que não é resolvido por quem teima a ignorá-lo, e este, lamentavelmente, é ainda o posicionamento hipócrita de alguns que aqui se manifestaram.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

A Oradora: - Porque a discussão que hoje aqui se está a fazer não é em tomo de valores morais ou de avaliação e juízos de valor que aqui não cabem, é, sim, em termos de considerar que há uma lei que deveria ter reduzido o aborto, e o não conseguiu; uma lei que deveria ter posto fim à ilegalidade, e que não o conseguiu; uma lei que deveria ter defendido a vida, e não o conseguiu. É essa lei profundamente penalizadora que importa alterar.
Essa alteração não significa que alguém seja a favor do aborto, não tem o significado que alguns lhe querem atribuir, ou seja, como uma forma de planeamento familiar, mas é, sim, uma solução e uma mudança que não implica que aquelas que o não queiram tenham de recorrer a ele, embora legitimamente o possam fazer, mas que também não deve obrigar aquelas que tenham de recorrer à interrupção da gravidez a fazê-lo em condições de clandestinidade, em condições humilhantes e em condições de risco para a vida.
É disso que se trata, não são outras considerações que estão em causa. O valor da vida que defendemos e a alegria que esse valor tem não podem ser dissociados desta discussão:

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

A Oradora: - Não estamos a falar da vida como resultado do acaso, estamos a falar da vida como livre escolha...

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - ... e como resultado de uma maternidade e paternidade livremente assumidas, como liberdade sexual das mulheres e como uma decisão conscientemente tomada. Afinal, uma vida que, para nós, não é um mero acto biológico, é, sim, mais do que o direito à vida, o direito a ser desejado, a ser amado e a ser feliz.

Aplausos de Os Verdes, do PCP e de alguns Deputados do PS.

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