O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

7 DE MARÇO DE 1997 1717

bem assim, de todos e quaisquer suportes materiais das fixações e reproduções que por qualquer desses meios possam obter-se, incluir-se-á uma quantia destinada a beneficiar os autores, os artistas, intérpretes ou executantes, os editores e os produtores fonográficos e videográficos».
A mencionada norma legal tem em vista a regulamentação da designada «cópia privada», estipulando a criação de um mecanismo compensatório, à semelhança do existente em vários países europeus, a favor dos titulares de direitos sobre obras protegidas pelo prejuízo que lhes advém do fenómeno generalizado da reprodução massiva das obras, mediante o uso de meios e processos tecnológicos de eficácia comprovada, de crescente implantação na sociedade contemporânea e, em grade medida, incontrolável.
É fácil a qualquer observador atento do actual panorama cultural reconhecer que a habitual reprodução das obras protegidas pelo direito se, por um lado, facilita o acesso das pessoas à informação, ao saber e à fruição cultural, traduz-se no entanto por um grave prejuízo da normal exploração económica da obra numa inaceitável violação dos legítimos, interesses e expectativas dos autores.
Ora, verificando-se aqui uma colisão de direitos, ao menos potencial - de um lado, o direito ao saber e à informação constituído a favor do cidadão, do outro, o direito exclusivo do autor sobre a sua obra -, é obrigação do legislador definir e criar o mecanismo que permita dar satisfação ao interesse que, no caso concreto, mereça melhor e mais adequada protecção.
Neste ponto, ninguém pode, com fundamento, duvidar, de que o equilíbrio dos interesses e das expectativas entrou em ruptura e que isso aconteceu em claro prejuízo dos autores, intérpretes e outros titulares de direitos, aspecto que se tem acentuado ao longo das duas últimas décadas.
Há, pois, que procurar proceder à justa composição dos diversos interesses em presença. O Governo, dando cumprimento a um dos pontos do seu Programa, formaliza nesta Assembleia a apresentação de uma proposta que permite, finalmente, dar corpo a uma previsão legal há muito estabelecida e que carecia da necessária regulamentação. Fá-lo na convicção de que, deste modo, para além de se restabelecer uma situação de maior justiça na relação entre os autores, os consumidores e as obras, se propicia também um ambiente mais incentivador da criação cultural e do conhecimento em geral.
Este aspecto tem para nós uma importância decisiva, tanto mais quanto estamos inseridos numa sociedade que depende cada vez mais da capacidade de criação e do desenvolvimento do conhecimento por parte do conjunto da população, factores que são hoje decisivos no plano da afirmação do país no contexto mundial. Um país que não protege os direitos dos seus criadores artísticos, intelectuais ou científicos caminha para o colapso da sua identidade.
Num mundo competitivo, organizado de um modo complexo e com crescentes especializações profissionais, a produção do saber e da informação não escapam às leis do funcionamento das demais actividades, sendo normal a expectativa de recolher a justa retribuição de uma acção criadora que requer, da parte dos titulares dos direitos, o dispêndio de energias, organização, tempo, trabalho e o risco inerente a um funcionamento marcado pelas contingências do mercado.
Deste modo, a proposta de lei prevê que no preço de venda ao público dos aparelhos que permitem a fixação e reprodução de obras e prestações seja incluída uma remuneração correspondente a 3% do preço de venda estabelecido pelos fabricantes e importadores. É igualmente estipulada uma verba a aplicar sobre os suportes materiais que viabilizam as referidas reproduções das obras e prestações variável em função do tipo e da duração do registo.
À fixação destes montantes pecuniários previstos no Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos não deve ser aplicada a qualificação de imposto, o que tem sido veiculado em especial por alguns dos críticos da medida preconizada na proposta de lei. Basta lembrar que a noção habitual de imposto é caracterizada por ser uma prestação patrimonial, unilateral, fixada por lei, a favor de entidade que exerça funções públicas e para satisfação de fins públicos.
Ora, parece-nos claramente excessivo enquadrar a medida proposta no domínio dos impostos. A própria epígrafe do artigo 82.º do Código afirma, e cito, que se trata de uma «compensação devida pela reprodução ou gravação de obras», ou seja, associa-se a referida remuneração à ideia de uma contrapartida - o pagamento, ainda que mínimo, do benefício obtido pela pessoa ao fruir a obra objecto de reprodução. No imposto não existe uma obrigação sinalagmática nem há qualquer ideia de contrapartida. No caso presente, estamos diante de uma evidente contrapartida que, podendo não ser sempre individualizada e concreta, é certamente no comum dos casos de natureza genérica.
A impossibilidade prática de se conseguir estabelecer um acordo concreto entre; o autor e o beneficiário fruidor da obra protegida não deve fazer esquecer o nexo profundo que liga a existência desta remuneração à ideia, possível e genérica, de uma relação não menos importante que se estabelece entre as duas partes envolvidas - o autor e o consumidor da obra.
Por outro lado, também à semelhança do que ocorre na generalidade dos países que adoptaram a medida e na linha de orientações sugeridas no âmbito da União Europeia, a proposta de lei prevê a criação de uma pessoa colectiva privada composta pelas entidades legalmente existentes que representam os diversos titulares de direitos, principais destinatários da proposta, e que terá por fim a cobrança, gestão e repartição das quantias previstas na futura legislação.
Não faz hoje qualquer sentido pensar em atribuir ao Estado ou a pessoas colectivas de natureza jurídica pública, no âmbito aqui considerado, os poderes de gestão das remunerações em causa. Por todo o mundo desenvolvido, estas funções são cometidas a entidades privadas que procedem à «gestão colectiva dos direitos de autor» e que são representativas dos próprios titulares dos direitos.
Infelizmente, em Portugal, ainda não foi possível dar concretização à previsão contida no artigo 218.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, no sentido de o regime das entidades de gestão colectiva ser regulamentado por lei.
A inexistência desse regime jurídico acarreta, sem dúvida, algumas dificuldades para a melhor compreensão e para a resolução do problema cuja solução é apontada na presente proposta de lei.
De resto, foi essa mesma lacuna legislativa um dos aspectos que esteve na base da motivação que determinou o Governo a enviar à Assembleia da República a proposta de lei em análise, por se tratar de matéria da competência do Parlamento.
Sublinhe-se, porém, que não se vê uma dificuldade intransponível no domínio constitucional em fazer aprovar a solução contida na proposta.

Páginas Relacionadas
Página 1722:
1722 I SÉRIE - NÚMERO 48 Sr. Deputado José Magalhães, aceito que V. Ex.ª queira defender a
Pág.Página 1722