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Sexta-feira, 14 de Março de 1997

I Série - Número 51

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 13 DE MARÇO DE 1997

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr Deputado Álvaro Amaro (PSD) criticou o Governo pela falta de medidas para o desenvolvimento do interior do país, nomeadamente do distrito da Guarda, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Carlos Alberto Santos e Victor Moura (PS).
O Sr. Deputado António Filipe (PCP) trouxe à colação as últimas declarações do Presidente do CDS-PP sobre a recuperação dos toxicodepentes, após o que deu explicações à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP) - que defendeu a honra da bancada - e respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Nuno Correia da Silva (CDS-PP) e a um protesto do Sr. Deputado Jorge Ferreira (CDS-PP)
O Sr. Deputado Luís Queiró (CDS-PP) falou sobre o acordo de revisão constitucional recentemente celebrado entre o PS e o PSD, tendo, no final, respondido a pedidos de esclarecimento do Sr Deputado João Carlos da Silva (PS).
A Câmara aprovou o voto n.º 65/VII - De pesar pela morte de Liseta Rosa Sousa Moreira, na sequência de aborto clandestino, apresentado pelas Sr.as Deputadas Helena Roseta e Odete Santos. Produziram intervenções os Srs. Deputados Helena Roseta (PS). Maria do Céu Ramos (PSD), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), José Magalhães (PS) e Odete Santos (PCP).
Foram aprovados os n.os 34 a 41 do Diário.
Ordem do dia. - Foram discutidos, na generalidade, em conjunto, os projectos de n.os 252/VII - Cria a Fundação Democracia e Liberdade (PSD) e 289/VII - Participação da Assembleia da República na cooperação com os países africanos de língua portuguesa (PS) Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Maria Eduarda Azevedo (PSD), Maria Carrilho (PS), João Corregedor da Fonseca (PCP), Maria Celeste Correia e Laurentino Dias (PS), Luís Marques Guedes(PSD). Isabel Castro (Os Verdes), Nuno Abecasis (CDS-PP), Azevedo Soares (PSD), Carlos Encarnação (PSD) e Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP).
Entretanto a Câmara deu assentimento à viagem de carácter oficial do Sr Presidente da República à República de Angola, que ocorrerá entre 18 e 26 de Março, não devendo exceder três dias, e aprovou sete pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias no sentido de autorizar vários Srs. Deputados do PCP, do PSD e do PS a deporem como testemunhas em tribunal.
Foram aprovadas, na generalidade, as propostas de lei n.os 57/VII Autoriza o Governo a legislar em matéria de Direitos de Autor e Direitos Conexos, 64/VII - Regula o disposto no artigo 82.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos e 68/VII - Estabelece o regime jurídico comum das associações de municípios de direito público.
Igualmente em votação na generalidade, o projecto de lei n.º 112/VII - Organização e quadros de pessoal das associações de municípios (PCP) foi aprovado o projecto de lei n.º 286/VII - Alterações ao Decreto-Lei n.º 412/89, de 29 de Novembro (Estabelece o Regime jurídico das Associações de Municípios) (CDS-PP) foi rejeitado e os projectos de lei n.os 249/VII - Criação do Museu do Douro (PCP) e 287/VII - Criação do Museu da Região do Douro (PS) foram aprovados. baixando à Comissão de Educação. Ciência e Cultura
Em votação final global, foi aprovado o texto, apresentado pela Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas. relativo ao projecto de lei n.º 165/VII - Cria o Observatório dos Mercados Agrícolas e das Importações Agro-Alimentares (PCP), assim conto a proposta de lei n.º 69/VII - Revisão da 2.ª Lei de Programação Militar (Lei n.º 67/93, de 31 de Agosto).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sônia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.

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Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madail.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Povoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Mário de Lemos Damião.
Luc1ia Maria Samoreno Ferra.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Luísa Lourenço Ferreira. .
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira..
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do expediente que deu entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (José Reis): - Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos:
Na reunião plenária de 6 de Março de 1997: aos Ministérios da Saúde, da Defesa Nacional e da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Francisco José Martins, Jorge Roque Cunha e Costa Pereira; a diversos ministérios e às Câmaras Municipais de Albufeira, Lisboa e Loures, formulados pelos Srs. Deputados Mendes Bota, José Luís Moreira da Silva e António Rodrigues; ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Lemos Damião; à Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional, formulado pelo Sr. Deputado Carvalho Martins; ao Ministério da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados Manuel Frexes e Octávio Teixeira; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; a diversos ministérios, formulados pelos Srs. Deputados Lino de Carvalho, António Filipe e Jorge Ferreira;
Na reunião plenária de 7 de Março de 1997: ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral;
No dia 11 de Março de 1997: ao Ministério da Educação e à Secretaria de Estado do Ensino Superior, formulados pelo Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan; aos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e Administração do Território e do Ambiente, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados, no dia 10 de Março de 1997: Azevedo Soares, Fernando Pedro Moutinho, Sílvio Rui Cervan, Lino de Carvalho, Isabel Castro, Mota Amaral, Carlos Santos, Macário Correia, Miguel Miranda Relvas, Carlos Marta, Carlos Pinto, Manuela Aguiar, Jorge

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Ferreira, Costa Pereira, Bernardino Soares, Soares Gomes, Guilherme Silva, Manuel Moreira, Maria José Nogueira Pinto, Carlos Coelho e Maria Carrilho.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Amaro.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há quase ano e meio no poder, os portugueses sentem hoje que, em relação ao Governo, caiu a máscara e começou a ver-se, a verdadeira face.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Caiu a máscara, em primeiro lugar, de um poder para quem tudo eram facilidades e que, em relação a tudo, tinha soluções rápidas e eficazes; a máscara de um poder para quem o diálogo tudo resolvia e a todos contentava; a máscara de um poder para quem, antes, tudo estava mal e errado e tudo, a seguir e depressa, ficaria bem e com vantagens inequívocas para todos.
Caindo a máscara, os portugueses começam hoje a ver a verdadeira face do Governo socialista. Afinal, quase ano e meio volvido, a realidade é muito diferente das ilusões prometidas e a verdade da governação é radicalmente distinta das expectativas criadas nos portugueses. Antes, o Governo tinha soluções para tudo, agora, afinal, já não tem soluções e muito menos resultados em quase nada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Prometeu este Governo combater o que chamou a desertificação do interior. Hoje, quase um ano e meio depois, não há uma medida, uma decisão, uma iniciativa que valorize o interior e o ajude a aproximar-se dos níveis de desenvolvimento do litoral.
Mais, e mais grave ainda, criticava no actual Primeiro-Ministro, quando líder da oposição, a política do betão, a fobia da construção de vias de comunicação, aquilo que considerava ser a aposta do cimento em vez da aposta nas pessoas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo anterior fazia estradas no terreno, este Governo faz estradas no papel. As pessoas ganham com isso? Não. Basta hoje percorrer o País em particular o País do interior - para ver que as pessoas estão desiludidas, frustradas, angustiadas e revoltadas. As acessibilidades são essenciais para fomentar o desenvolvimento, para melhorar a vida das pessoas, para concretizar a solidariedade entre regiões.
O Governo desferiu um rude golpe no esforço que estava a ser feito, com aplauso geral e benefício colectivo.
A gravidade da situação é ainda maior se pensarmos no que é hoje a acção do Governo em matéria de aplicação de fundos comunitários.
Os portugueses recordam bem o tempo em que o actual Primeiro-Ministro, outrora líder da oposição, dizia, angustiado e preocupado, que não percebia por que é que, recebendo então o Governo 1,5 milhões de contos/dia da União Europeia, o País não se modernizava e o desemprego aumentava. Hoje, quase um ano e meio depois, Portugal já não recebe 1,5 milhões de contos/dia, recebe mas, sim, mais de 2 milhões de contos. No entanto, a modernização está adiada, os investimentos estão parados e o desemprego, em vez de estabilizar, em vez de diminuir, aumenta e agrava-se em cada mês que passa.

Aplausos do PSD.

Vozes do PS: - É falso!

O Orador: - É consequência, ainda, de um Governo que teve, em 1996, uma má aplicação dos fundos comunitários, desperdiçou a utilização de mais de 200 milhões de contos de fundos da União Europeia, quando, ao mesmo tempo, Portugal precisa de mais estradas e tem menos estradas, de mais desenvolvimento regional e tem menos desenvolvimento regional, de maior solidariedade regional e tem maior afastamento e mais assimetrias entre as regiões.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É a governação virtual! Fala-se, mas não se faz; dialoga-se, mas não se realiza; debate-se, mas nada se concretiza; estuda-se, mas não se vê obra; fazem-se muitos diagnósticos, mas aplicam-se poucas terapêuticas.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi esta a realidade que o Grupo Parlamentar do PSD pôde constatar na visita que acabou de fazer ao distrito da Guarda.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Ah!...

O Orador: - Quisemos ver e ouvir; quisemos trabalhar com autarquias e instituições, tendo sempre em conta que as gentes do interior sabem hoje avaliar melhor entre a humildade de quem quer fazer e a vaidade de quem apenas promete.
A realidade do distrito conhecê-mo-la bem, finas tornava-se imperioso demonstrar que o actual Primeiro-Ministro e o PS têm memória curta e um total desrespeito pelos compromissos que assumem. Frequentaram bastante o distrito na pré-campanha e na campanha eleitoral, munidos de uma floresta densa de promessas que se traduziu num deserto de concretizações. Se o rápido esquecimento das promessas revela um despudorado desrespeito pela palavra dada e uma fraude política perante os cidadãos (que nos slogans eleitorais não eram números), denuncia igualmente um estilo e uma forma de fazer política em que a pedra de toque é a gestão das expectativas e a criação de patamares sucessivos de promessas. Esse não é o nosso estilo: à propaganda, preferimos a obra; à estabilidade da inércia, preferimos o risco da acção; à preocupação pelos índices das sondagens, preferimos o bem e o interesse nacionais.
Mas, ao menos, seria importante que se respeitasse a preocupação dos outros. A cada proposta por nós apresentada na preparação do Orçamento, o PS e o Governo respondiam com a recusa; a cada problema que reclamasse solução, o PS e o Governo faziam orelhas moucas; a cada listagem de prioridades para o distrito, o PS e o Governo escondiam-se na demagogia do tempo passado, alibi aparentemente eterno para os sinais de incompetência e de perturbação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O novo hospital de Seia, obra do Governo anterior e importantíssimo para a região, continua a não funcionar; entretanto, o melhor acesso dos cidadãos à saúde vai sendo adiado.

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O parque industrial da Guarda, lançado há largos anos, continua a não ser rentabilizado com vias de acesso e infra-estruturas inqualificáveis e com equipamentos em estado adiantado de degradação. Infelizmente, o parque ressalta, na opinião pública, por circunstâncias infelizes, como as que caracterizam o matadouro regional. A incapacidade da Câmara Municipal socialista de mobilizar os empresários e os investimentos é confrangedora.
O Grupo Parlamentar do PSD pôde verificar, e aqui damos disso testemunho, a recusa do Governo socialista nos trabalhos de arranjo paisagístico e melhoria de acessos e estacionamento na fronteira de Vilar Formoso. Pudemos igualmente constatar a paralisia das iniciativas na zona de Pinhel, que se vem transformando numa autarquia de atraso permanente e sem valorização das suas potencialidades.
Estas atitudes do poder local socialista contrastam com a exploração das potencialidades em alguns concelhos e em outros pontos do distrito, que, de forma notável, aproveitam as oportunidades resultantes do Programa de Recuperação de Aldeias Históricas lançado pelo Governo anterior.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a conclusão é simples: o que estava feito, feito está; o que faltava fazer, adiado está!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Primeiro-Ministro muito se deslocou ao distrito da Guarda na pré-campanha e na campanha eleitoral. Em ano e meio de Governo, nem nas redondezas foi visto. Conquistados os votos, rapidamente lhe passaram o fervor e a paixão pelo desenvolvimento do interior, facilmente se acomodou à exuberância palaciana e aos rituais da política externa. Os cidadãos portugueses, as pessoas concretas não perturbam a consciência política do Governo e do PS.
O PSD/Guarda pede, solicita e desafia até o Sr. Primeiro-Ministro a reponderar a construção da A14, que ligará o litoral à Europa, cada vez mais flagrantemente necessária como elemento central do desenvolvimento e da circulação, bem como o conjunto de prioridades nas vias de comunicação que atempadamente enunciámos, invertendo a lógica da sua acção política.
Os cidadãos da Guarda certamente querem compromissos do Chefe do Governo para a concretização do centro de estágios em altitude, aproveitando as condições excepcionais da nossa região. E, por favor, não esqueçam que estamos numa zona do interior, às portas da Europa, pelo que seria importante a instalação de um centro de produção regional de televisão.
E não nos cansaremos de reivindicar a instalação de uma Universidade. na Guarda por forma a enquadrar a inteligência regional (e de todos os jovens que nos procurem) adequada aos domínios prioritários do nosso projecto de desenvolvimento.
Não queremos mais promessas sem sentido! Queremos a concretização de projectos já identificados e uma afirmação reivindicativa dos poderes locais em relação aos governos. Câmaras municipais acomodadas não servem a sua missão; câmaras municipais submissas às orientações partidárias e às opções centralistas do Governo traem as expectativas dos cidadãos.
Estou certo de que a única forma útil de termos o Sr. Primeiro-Ministro na Guarda é com a vinculação a medidas aprovadas. Não queremos mais promessas! Também o poderemos ver em inaugurações - é certo! -, mas não será certo inaugurar obras do seu Governo...! Nesta matéria de inaugurações, a herança do passado, por vezes, dá muito jeito.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Alberto Santos.

O Sr. Carlos Alberto Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Amaro, mais uma vez fomos brindados com aquilo que eu diria ser um espanto solene. E isto porquê? O Sr. Deputado Álvaro Amaro tem naturalmente todo o direito - e felicito-o, inclusivamente - em preocupar-se com os interesses vitais da Guarda.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Lamento que na altura a Guarda não tenha visto o então Sr. Secretário de Estado da Agricultura, o então membro do Governo, preocupado com os interesses da região...

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - ... pois ninguém o viu nem ouviu,...

Aplausos do PS.

... quando à Guarda foram retirados «palcos de poder» que tinha.
Ainda quanto à rodovia, Sr. Deputado Álvaro Amaro, estamos de acordo em que a rodovia, na Guarda, não está boa. Mas, Sr. Deputado Álvaro Amaro, o senhor é membro de um partido político que ocupou o poder durante mais de uma década, por isso pergunto-lhe: o que é que foi feito na Guarda?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Onde está o IP2 feito pelo Governo do PSD?

Aplausos do PS.

Onde está o vosso Plano Rodoviário Nacional, que desclassificou a maioria das estradas de ligação inter-concelhos e à capital do distrito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, aconselho-o a olhar para o novo Plano Rodoviário Nacional e verificará o mal que na altura fizeram e o bem que este Governo está a fazer ao distrito da Guarda.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mais, ainda, Sr. Deputado Álvaro Amaro: falou nas câmaras municipais socialistas, mas, ó Sr. Deputado, quem dera ao vosso partido que as câmaras municipais do PSD tivessem os seus concelhos no ponto em que as câmaras municipais socialistas estão. Ou não é verdade que os concelhos mais desenvolvidos do distrito da Guarda são de presidência de câmara socialista?!...

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Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - É verdade, Sr. Deputado! E dou-lhe apenas um dado: há câmaras municipais presididas por elementos do seu partido que só numa década, de 1981 a 1993, perderam mais de 20% da população. Porquê? Acerca deste assunto, penso que este dado lhe basta: não havia condições para ficar e deu-se a emigração para os municípios PS.
Relativamente à Universidade, estamos de acordo quanto ao querermos uma Universidade na Guarda, mas eu quero-a pública. E, para tal, em devido tempo, fiz ao Governo um requerimento a solicitar a instalação de uma Universidade na Guarda. O Sr. Deputado Álvaro Amaro sabe bem disso, mas talvez a sua ideia não seja essa. A Guarda tem direito a ter uma Universidade pública c não a uma qualquer Universidade privada, com todo o respeito que tenho por essas instituições.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Deve ser no ano 3000!

O Orador: - Sr. Deputado Álvaro Amaro, como é que consegue acusar este Governo de não ter carinho pelo interior, de não ter uma visão estratégica diferente da do vosso Governo para o interior deste país?!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Santos, peço-lhe que abrevie, pois já ultrapassou o tempo regimental.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Para terminar, pergunto: é ou não verdade que o gás natural vai até à Guarda? Tenho aqui, na minha mão, Sr. Deputado Álvaro Amaro, a resposta ao requerimento que fiz - porque me preocupo - sobre o gás natural para o interior. Tenho-a aqui, Sr. Deputado, e dela consta que brevemente o interior irá ter gás natural, e que irá terminar na Guarda.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que termine.

O Orador: - Sr. Presidente, peço-lhe só mais um segundo.
Por último, Sr. Deputado Álvaro Amaro, se entende que as câmaras municipais presididas por elementos do PS não fazem um trabalho como o senhor pensa que deviam fazer, desafio-o, neste momento, a candidatar-se à Câmara Municipal da Guarda, à Câmara Municipal da capital do distrito.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Amaro.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Santos, obrigado pelas solicitações, e registei o seu espanto solene.
Se na altura o senhor não me viu na Guarda, como membro do Governo, foi porque andava muito distraído...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... e, além de distraído na época, hoje, ao fim de ano e meio como Deputado socialista, já está tão autista que nada consegue ver à sua frente.

Risos do PSD.

Vale a pena, Sr. Deputado, se não é possível pelos seus próprios meios, e como nós ainda não conseguimos visitar todos os concelhos do distrito, vir connosco na nossa próxima visita-a um dos concelhos, e é desde já nosso convidado. Acompanhe-nos!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Isso é para uma caçada!?

O Orador: - Também pode ser.
E aquilo que o senhor vir de bom e que por baixo se possa escrever PS eu também assino, assim como também assinarei e farei a festa consigo quando o gás natural chegar à Guarda, mas recorde-se, como o seu Primeiro-Ministro fez, que esse projecto foi do Governo anterior.

Vozes do PS: - Isso não é verdade!

O Orador: - Quando o gás natural tiver chegado à Guarda, serei o primeiro a aplaudir. E, mais: quando houver uma Universidade pública na Guarda - e tenho pena que não haja -,também assinarei por baixo o seu requerimento. Mas vamos ver, pois faltam poucas semanas, se o Sr. Ministro da Educação tem coragem para abrir uma Universidade pública na Guarda. Dar-lhe-ei um abraço a si e ao Sr. Ministro da Educação!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Faço-o porque é a bem do distrito.
Ó Sr. Deputado, eu não quero acusar o Governo do PS...

Vozes do PS: - Ah!... Então, está bem!

O Orador: - É diferente! O que eu fiz foi constatar uma realidade. Não quero acusar ninguém! Como já disse inúmeras vezes peço-lhe, e a quem o possa fazer, que ajude o distrito não apenas a cumprir as promessas porque já não é essa a luta que travamos...
No ano e meio que passou, viu o Primeiro-Ministro nas redondezas do distrito? Eu não o vi porque ele não esteve lá. Mas tenho visto Secretários de Estado e Ministros num autêntico desfile de mais promessas... É natural, já estamos habituados a isso!

Risos do PS.

Até percebo que isto custe a outros Srs. Deputados porque o que se passa há ano e meio na Guarda, infelizmente para o país, passa-se nos outros distritos. Sabemos disso e é por essa razão que vos custa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar, pois esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Termino de seguida, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, peço-lhe que, em nome da Guarda, até às eleições autárquicas seja concretizada uma das realizações que elenquei, ou outra, pois consta do vosso progra-

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ma eleitoral, e eu serei o primeiro a, nesta Assembleia, prestar homenagem ao Governo socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Moura.

O Sr. Victor Moura (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Amaro, ouvi-o com atenção, mas confesso que fiquei com algumas dúvidas sobre se tinha mudado de nome. É tala amargura do seu discurso que julguei chamar-se «Álvaro Amargo».
Devo dar-lhe conta de uma realização nossa que não só ficou patente na comunicação social como pôde ser comprovada durante a campanha eleitoral. Refiro-me a uma empresa fabril, à FISEL, em Seia, com centenas de postos de trabalho, que estava totalmente paralisada e que agora, felizmente, está a laborar e mantém os salários em dia. Esta foi uma das empresas visitadas pelo Sr. Primeiro-Ministro enquanto candidato que estava paralisada e que hoje está a laborar, a produzir, e em que os trabalhadores recebem o seu salário e estão felizes.

Aplausos do PS.

Trata-se de uma acção deste Governo com a qual muito nos congratulamos porque bem falta fazia ao nosso distrito.
V. Ex.ª também falou do hospital de Seia, que é bem a prova do que foi o vosso governo. VV. Ex.as preocuparam-se sobretudo com o cimento e o betão armado. Se o Sr. Deputado quiser negá-lo diga-me, então, quantos médicos tinha o hospital de Seia no seu quadro quando deixaram de ser governo. Quantos? Um hospital destina-se a prestar cuidados diferenciados, deve ser um organismo vivo e ter médicos, designadamente, a trabalhar nele mas VV. Ex.ª nunca se preocuparam com isso. Quiseram nomear três gestores, um dos quais vendia vinhos na vida civil, e que hoje é administrador.

Aplausos do PS.

Porquê? Forque eram militantes do PSD. Criaram «tachos» e não se preocuparam em prestar cuidados às populações.
Sr. Deputado, diga-me, então, quantos médicos tinha o hospital de Seia quando VV. Ex.as deixaram o governo, porque é apenas isso o que quero saber.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, concedendo-lhe a Mesa mais dois minutos, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Amaro.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Victor Moura, chamo-me Álvaro Amaro. Uns chamam-me, às vezes, por lapso, «Amado», que também o sou, graças a Deus;...

Risos do PSD.

... outros, nunca me chamaram «Amargo» mas, se calhar, também o sou às vezes. Contudo, se de amargura pode falar-se é da que têm o país e o distrito da Guarda.

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PS Victor Moura.

Sr. Deputado, como não o interrompi, não permitirei que o faça e vai ouvir aquilo que eu não pensava dizer-lhe, a si, em particular, porque não tem desculpa. É Deputado, c respeito-o, pelo meu distrito, mais concretamente, por Seia.
Quando a FISEL estiver a laborar a 100%, com os salários em dia e não houver despedimentos, também aqui, nesta Câmara, presto justiça ao Governo socialista porque não é isso que acontece!
Por outro lado, o senhor, homem de Seia, jurista, não tem vergonha do que o Governo socialista está a fazer no hospital de Seia?
O senhor entretém-se, com o Presidente da Câmara de Seia, que é do Partido Socialista, a discutir nomes, em jogadas palacianas, enquanto que o edifício feito pelo governo anterior, o tal betão, lá está para servir as pessoas e os senhores nem um tostão em equipamento têm para pô-lo a funcionar. É uma vergonha!

Aplausos do PSD.

Mais uma vez, a berra das minhas terras e das gentes do interior, faço um apelo à futura direcção da bancada socialista para que vá a Seia e ajude o Deputado Victor Moura a lutar pela sua terra e a equipar aquele hospital, honrando não apenas os senenses mas toda a população da Guarda e do país. É este o apelo que faço! Assim, aos olhos dos seus conterrâneos, talvez o Deputado Victor Moura não faça esta Figura na Assembleia, que é uma vergonha.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para o tratamento de assunto de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, na passada segunda-feira, discursando no centro paroquial de Cabanelas, o Dr. Manuel Monteiro revelou ao país a sua receita para acabar com a droga em Portugal: prender os consumidores e sujeitá-los a tratamento.
Afirmações como esta não mereceriam qualquer referência se tivessem sido feitas por um qualquer irresponsável, mas, como o Dr. Manuel Monteiro é Deputado e é presidente de um partido com representação parlamentar, não pode ser tratado como tal.
A afirmação de que o problema da droga em Portugal se resolve prendendo os consumidores só pode revelar uma de duas coisas: uma absoluta e lamentável ignorância acerca das causas da toxicodependência...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ... e da complexidade do tratamento de toxicodependentes ou uma absoluta e lamentável demagogia na abordagem de questões que, pela sua gravidade, merecem um tratamento mais sério e responsável.

Aplausos do PCP.

Importa por isso lembrar a este respeito algumas coisas muito simples que o Dr. Manuel Monteiro ignora ou
finge ignorar.

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Desde logo, sendo a toxicodependência urna doença, as doenças não se curam prendendo os que delas sofrem. Submeter os toxicodependentes a situações de detenção não resolve o problema da toxicodependência dos próprios nem o problema social que a toxicodependência representa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O tratamento de toxicodependentes passa necessariamente por um acompanhamento médico e psicológico prolongado e é um processo difícil, que exige uma enorme determinação e força de vontade dos próprios.
O tratamento de toxicodependentes não se limita a um mero internamento em «clínicas especializadas». Embora possa passar por períodos de internamento voluntariamente assumidos, implica forçosamente um complexo trabalho de reinserção social.
Está hoje mais do que demonstrado e assumido que o meio prisional não tem virtudes terapêuticas e que não só não afasta ninguém da droga como, muito pelo contrário, agrava os problemas da toxicodependência.
A repressão em matéria de droga deve ser exercida sobre os traficantes e, especialmente, sobre os grandes traficantes, não devendo os toxicodependentes, principais vítimas deste flagelo social, ser tratados como se fossem eles os seus principais causadores. É um acto de pura hipocrisia fazer dos toxicodependentes os bodes expiatórios dos problemas sociais causados pela droga e da impotência das autoridades perante os traficantes.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, para os toxicodependentes não há solução que não passe pela criação de condições que permitam o seu atendimento, tratamento e reinserção social. É preciso criar mais centros de atendimento, mais unidades de desabituação, mais comunidades terapêuticas e combater pseudoclínicas que se aproveitam do desespero de milhares de toxicodependentes e das suas famílias. Prendê-los nada resolveria!
Sr. Presidente e Srs. Deputados, resta-me ainda uma dúvida: a de saber se o Dr. Manuel Monteiro faz ideia do número de pessoas cuja detenção preconiza. É que as estimativas mais optimistas reconhecem que a população toxicodependente não andará longe de corresponder a 1 % da população portuguesa. Não sei onde arranjaria o Dr. Manuel Monteiro clínicas ou penitenciárias para isolar tanta gente...
Este facto, embora lateral, permite tornar mais evidente a inconsistência e a demagogia das pseudopropostas do PP nesta matéria. Quando o PCP aqui propôs que fosse alargada a rede de serviços públicos para o tratamento e a reinserção de toxicodependentes, o PP votou contra; agora, quer prendê-los. É uma forma de estar na vida e na política que não é a nossa e que manifestamente repudiamos!

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da honra da bancada, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado António Filipe fez, daquela tribuna, uma intervenção inútil por assentar num pressuposto errado: o Dr. Manuel Monteiro não falou em prisão (claro que é mais fácil para si, serve mais o seu discurso político chegar ali e, de uma forma bastante primária desculpe-me que lhe diga -, reduzir as suas palavras) mas em detenção para tratamento, matéria sobre a qual teríamos muito que conversar e o senhor sabe-o muito bem.
Quero dizer-lhe que se o nosso discurso não lhe serve, só nos podemos congratular com isso mas a sua intervenção deixou-me bastante preocupada porque acho que a ninguém serve. O Sr. Deputado referiu, o que me pareceu extraordinário, que o facto de os toxicodependentes poderem ser 1 % da população portuguesa o leva a pensar que não vale a pena tratá-los porque não se arranjam centros para tratamento nem camas na rede pública ou privada e, assim, é preferível não falarmos nisso. Ora, temos uma perspectiva completamente diferente: a de que os meios têm de existir em função dos objectivos que queremos prosseguir. Na sua lógica, como os objectivos são inalcançáveis, sobre os meios nada mais temos a dizer do que falar da rede pública.
Por conseguinte, gostava de dizer-lhe que é fácil e demagógico, mas obviamente errado, também do ponto de vista político, chegar aqui e falar em prisão. Talvez valesse a pena discutir neste Plenário o tema da detenção para tratamento da mesma forma que valeria a pena conversar sobre onde vão morrer os toxicodependentes em último grau, porque não me consta que o Partido Comunista esteja preocupado com o facto de continuarem a morrer ou não nas ruas do Casal Ventoso. É que, sobre droga, também estamos, infelizmente, bastante informados. Isso não é exclusivo do Partido Comunista.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, eu é que estou surpreendido por ter usado da palavra para exercer o direito regimental de defesa da honra da bancada e, ainda por cima, fazendo algumas acusações muito primárias ao PCP, que contrariam aquilo que seguramente nos ouviu aqui defender.
Efectivamente, sempre tivemos a preocupação de afirmar que não só vale a pena como é indispensável tratar os toxicodependentes e criar-lhes meios para se tratarem, que, lamentavelmente, não existem em quantidade suficiente para poder chegar-se a todas as pessoas hoje afectadas pelas toxicodependências. Contudo, aquilo que nada resolve, rigorosamente, é prendê-los e foi isso o que propôs o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A Sr.ª Deputada referiu que, infelizmente, a população toxicodependente é em número muito elevado e perguntou-me se haveria meios para tratá-la, mas eu é que devo questioná-la sobre se há meios para prendê-la e se isso resolveria alguma coisa.
O Sr. Deputado Manuel Monteiro, ao falar em «detenção para tratamento», está a ignorar uma realidade evidente e que se mete pelos olhos dentro: é que, pelas características exigidas pelo tratamento de toxicodependentes, é indispensável o empenhamento dos próprios sem o qual não há tratamento algum. Apontou demagogicamente uma solução que nada soluciona e praticou a mais baixa demagogia sobre este problema.

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O que o Sr. Deputado Manuel Monteiro fez na segunda-feira foi dar mostras de uma verdadeira ou falsa ignorância sobre toda a matéria relativa ao tratamento de toxicodependentes praticando a mais baixa demagogia ao fazer dos toxicodependentes, que são as primeiras vítimas deste terrível flagelo social, os seus bodes expiatórios.

Aplausos do PCP.

Sr.ª Deputada, ao contrário do PP, sempre defendemos manifestamente o tratamento de toxicodependentes e a criação de serviços públicos para que seja possível esse tratamento. O que não defendemos nem nunca defenderemos é que a solução para os toxicodependentes seja prendê-los, porque isso nada resolve.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, faço uma pausa refrescante na discussão para anunciar-vos que a vaga de interesse pelo Parlamento entre a nossa juventude continua a alastrar. Prova disso é o facto de termos connosco um grupo de 37 alunos da Escola Secundária n.º 1 do Laranjeiro: um grupo de 50 alunos da Escola Secundária de Vila das Aves, de Santo Tirso; um grupo de 50 alunos da Escola Secundária de Coruche; um grupo de 150 alunos da Escola Secundária D. Duarte, de Coimbra; um grupo de 50 alunos da Escola E. B. 2.3 D. Dinis, de Leiria; um grupo de 50 alunos da Escola E. B. 2.3, de Vilar Formoso; um grupo de 60 alunos da Escola Secundária João Silva Correia; um grupo de 60 alunos da Escola Secundária de Eça de Queirós, da Póvoa do Varzim; um grupo de 32 alunos da Escola Secundária da Póvoa do Lanhoso; e um grupo de 70 alunos da Escola C+S de Lanheses, de Viana do Castelo.
A democracia não morre. Saudêmo-los.

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, gostava que esclarecesse a Câmara e o País sobre qual é a proposta do Partido Comunista Português.
Nunca pensei ver nesta Câmara um Deputado, criticar outro apenas porque este último pede que seja cumprida a lei. E a lei pune o consumo de drogas pesadas. Portanto, Sr. Deputado, sou eu que não compreendo a intervenção que acabou de fazer, porque ela só pode decorrer de uma de duas razões: ou é por ignorância da lei ou, então, o Sr. Deputado está a apelar a que os próprios agentes de segurança, aqueles que têm obrigação de fazer cumprir a lei, e nós próprios, que temos de dar o exemplo, não cumpramos a lei.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado quis confundir duas realidades completamente distintas: uma coisa é o tratamento, a reabilitação dos toxicodependentes, que todos desejamos; outra coisa é a defesa, que devemos promover, que temos obrigação de promover, daqueles que são vítimas dos toxicodependentes.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É porque quando o presidente do meu partido e Deputado a esta Câmara, Dr. Manuel Monteiro, se referiu à detenção dos toxicodependentes estava a falar daqueles que, na praça pública, no meio das ruas, nas escolas abandonam seringas nos parques onde estão crianças a brincar. O senhor sabe quais são as consequências, sabe qual vai ser a utilização dada a essas seringas? Sabe qual é o perigo público que está a ser criado?

O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Isso não sabe!

O Orador: - Sr. Deputado, por favor explique-me em que país vive!...
porque mesmo aqui, na cidade de Lisboa, há pessoas que têm medo de entrar nos seus prédios porque no átrio, nas escadarias, estão toxicodependentes a injectar-se. Eu próprio, tantas e tantas vezes, recebi telefonemas de irmãs minhas, dizendo que não podem entrar em casa porque nos acessos há toxicodependentes a injectarem-se. Assim, pergunto: estes cidadãos devem recorrer a quem? Não têm o direito de chamar a polícia e pedir que lhes libertem o caminho para as suas próprias casas?
Sr. Deputado, não vamos transformar em vítimas aqueles que, neste momento, estão a sofrer mas que, seguramente, acarretam consequências muito graves para a sociedade. Não vamos inverter a lógica das coisas!
Gostava de saber quais são os mecanismos de defesa que o Sr. Deputado propõe para aqueles que vivem em ambientes onde, todos os dias, vêem seringas abandonadas, vêem as crianças a passear por ruas com seringas espalhadas, vêem um perigo de contágio, não só com a toxicodependência como também com todas as doenças que, como deve saber, decorrem do consumo de droga.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, considero lamentável o seu pedido de esclarecimentos, tão lamentável como a intervenção que foi feita pelo Sr. Deputado Manuel Monteiro com a qual, pelos vistos, o Sr. Deputado está de acordo, o que de facto, é duplamente lamentável.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Lamentável foi a sua intervenção!

O Orador: - O Sr. Deputado parece ter a obsessão de meter as pessoas na cadeia. Há uns tempos atrás, tinha a obsessão de meter na cadeia as mulheres que praticassem interrupção voluntária da gravidez e, agora, tem a obsessão de meter na cadeia os toxicodependentes!

O Sr. João Amaral (PCP): - Exactamente!

O Orado: - Portanto, os senhores resolvem todos os problemas, metendo na cadeia as principais vítimas de graves flagelos sociais! É esta a solução que o PP propõe,...

Aplausos do PCP.

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O Orador: - ... o que é, de facto, a mais baixa demagogia porque não resolve qualquer problema e procura apenas dar uma falsa satisfação a pessoas que sentem as consequências graves dos flagelos sociais.
Não acredito que os senhores pensem que o combate ao tráfico de droga deva ser feito prendendo os consumidores.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Detendo para tratamento!

O Orador: - Não acredito que pensem que seja essa a solução, até porque, seguramente, os senhores reconhecem, embora não queiram admiti-lo, que não é por se prender um toxicodependente que ele deixa de sê-lo ou que encontra soluções para se tratar.
É facto que o Sr. Deputado Manuel Monteiro e, agora, também o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva defendem que a solução para os toxicodependentes é detê-los, o que é manifestamente lamentável.

O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - É tratá-los!

O Orador: - Não fui eu que falei em detenção, foi o Sr. Deputado Manuel Monteiro que falou em deter os toxicodependentes para tratá-los compulsivamente.
Ainda por cima, o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva nem sequer conhece a lei que temos porque diz que, perante um toxicodependente a injectar-se, chama-se a polícia para que o prenda foi assim que disse. O Sr. Deputado nem sequer conhece a legislação que temos.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Não foi isso que eu disse!

O Orador: - Efectivamente, embora, em nossa opinião, a legislação portuguesa seja insuficiente nessa matéria - e dissemo-lo no momento certo -, ainda assim, o Sr. Deputado se não sabe deveria saber que a legislação actualmente existente aponta precisamente para o tratamento de toxicodependentes e só considera a situação de prisão como última ratio, mas para os senhores é a primeira ratio porque o que o Sr. Deputado Manuel Monteiro propõe em primeiro lugar é, precisamente: aprendam-se os toxicodependentes».

Protestos do CDS-PP.

É isso que, manifestamente, consideramos inaceitável e que não resolve qualquer problema.

Aplausos do PCP.

Protestos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira, para formular um protesto.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, gostaria de lavrar um protesto porque há duas formas de fazer política: uma coisa é discordarmos das ideias uns dos outros - aliás, é por isso que representamos diversos eleitores, pois uns votam nuns partidos e outros noutros, e isso é normal, é saudável, é democrático e é assim que se faz nas sociedades desenvolvidas - outra coisa é quando tentamos mistificar.
Quero protestar porque penso que não é lícito à dignidade dos debates políticos desta Assembleia fazer discussões sobre declarações inexistentes.
Tenho estado a ouvir o Sr. Deputado do Partido Comunista, a quem longe de mim dar lições sobre «regimes de detenção e de tratamento»...

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em todo o caso, o Sr. Deputado tem estado a fazer intervenções políticas sobre declarações do presidente do meu partido que este não fez.

O Sr. João Amaral (PCP): - O quê?

O Orador: - Volto a lembrar - e tenho muito orgulho nisso - que as declarações que foram feitas decorrem da lei que já existe. O Sr. Deputado está a revoltar-se contra a lei que existe e que não é cumprida!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É falso!

O Orador: - Portanto, reafirmo que as declarações que foram feitas foram-no exclusivamente para cumprimento das normas que já hoje existem em Portugal sobre tratamento de toxicodependentes, as quais não são cumpridas pelo Estado. De igual modo, Sr. Deputado - e nunca o vi revoltar-se contra isto -, infelizmente, também não são cumpridas normas pelas forças policiais relativamente à perseguição e à prisão dos traficantes de droga. Por que é que o senhor não se revolta contra isso? Desafio-o a fazer aqui uma declaração a protestar contra o tacto de, muitas vezes, as forças policiais saberem onde está o tráfico de droga, não irem a esses locais e não prenderem os traficantes. Faça-o, Sr. Deputado, se tiver essa coragem!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, quanto ao protesto feito pelo Sr. Deputado do PP, agora é que é a incoerência total.
Primeiro vem dizer que, afinal de contas, o Presidente do PP não defendeu a detenção, mas, depois, vem dizer que a lei deveria ser cumprida, detendo-se as pessoas. Portanto, é a incoerência total.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do CDS-PP.

O Orador: - Srs. Deputados, agora é que não me entendo quanto ao que os senhores pensam relativamente a esta matéria!
O que nós ouvimos e lemos na imprensa foi, de facto, o Sr. Deputado Manuel Monteiro dizer que era preciso deter as pessoas para tratá-las compulsivamente - a expressão foi dele não minha.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - O senhor não leu! Eu mando-lhe um recorte!

O Orador: - Portanto, o Sr. Deputado não venha agora procurar dizer que, afinal, essa declaração não exis-

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tiu nem venha «escondê-la no bolso» porque ela existiu e todos nós pudemos ouvi-la. Sr. Deputado, não venha agora procurar «dar o dito por não dito».

Protestos do CDS-PP.

Aliás, a confissão clara de que, afinal, o que os senhores querem é meter os toxicodependentes na cadeia foi o que o Sr. Deputado acabou de fazer, lamentando que a lei não seja cumprida.

O Sr. João Amaral (PCP): - Claro!

O Orador: - Digo-lhe que o Sr. Deputado é que manifesta um profundo desconhecimento da lei, o que também é lamentável pois deveria conhecê-la melhor. O que os Srs. Deputados defendem é que a legislação seja agravada e que os toxicodependentes sejam presos...

Protestos do CDS-PP.

Mas toda a gente reconhece - os senhores são os únicos que não o reconhecem - que, de facto, isso não iria resolver problema algum. Os Srs. Deputados utilizam a reivindicação da detenção dos toxicodependentes como uma arma da mais baixa e lamentável demagogia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró, para uma intervenção.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sexta-feira passada, o País e os seus representantes nesta Assembleia tiveram oportunidade de assistir à celebração de um acordo entre o PS e o PSD sobre a revisão constitucional.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Ainda?

O Orador: - Para todos, o sentido político deste acordo ficou desde logo muito claro: o que as cúpulas dos dois partidos procuraram fazer de relevante foi transformar o sistema político num «duopólio» de facto.
Não é que este acordo não contenha algumas boas ideias - ou, melhor, afloramentos de boas ideias muitas das quais o Partido Popular sempre defendeu, se não mesmo propôs. É o caso do voto dos imigrantes para a eleição do Presidente da República, da possibilidade do alargamento dos referendos a áreas até aqui constitucionalmente excluídas, de algumas propostas no que toca aos direitos fundamentais, de reformas em matéria de Justiça e de Administração Pública, do reforço da intervenção do Parlamento na construção europeia.
Em algumas destas matérias o acordo é, até, razoavelmente explícito em relação aos objectivos a alcançar e às soluções preconizadas.
Já no que se refere à reforma do sistema eleitoral para a Assembleia da República, este acordo é de uma vacuidade total e, mais pelas omissões que revela do que pelos objectivos que enuncia, parece-nos conter sérias ameaças à pedra basilar do sistema político português, que é o princípio da representatividade.
Sempre defendemos uma verdadeira democracia de eleitores que aproxime eleitos e votantes, dignifique a função política, as instituições democráticas e, em particular, o Parlamento.
Foi até o Grupo Parlamentar do Partido Popular que tomou a iniciativa de abrir o processo de revisão constitucional e apresentar um modelo concreto de sistema eleitoral. Mas temos a certeza de que uma revisão constitucional nesta matéria tem de obedecer a um modelo claro.
Os termos do acordo PS/PSD, ao chegar à revisão do sistema eleitoral, permitem tudo e o seu contrário. Faz-se alusão a círculos uninominais, a círculos plurinominais, a um círculo nacional e à possibilidade de redução acentuada do número de Deputados. Mas nada se concretiza.
Espantosamente, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando, por exemplo, até se prevê regular na Constituição a composição da Alta Autoridade Para a Comunicação Social, não se escreve uma linha sobre o tipo, a delimitação e a composição dos círculos eleitorais ou a sua articulação com o número de Deputados, remetendo-se para lei ordinária a configuração concreta do sistema eleitoral.
Como resulta evidente, esta lei eleitoral, a aprovar por maioria de dois terços, vai ser o resultado de uma negociação exclusiva entre os dois únicos partidos que, em conjunto, podem formar essa mesma maioria de dois terços: o PS e o PSD.
Talvez valha a pena fazer notar que são estes mesmos partidos, no mesmo acordo político, que se propõem ampliar o elenco das leis, agora já apenas aprovadas por maioria absoluta, em matérias tão relevantes como a legislação relativa à cidadania, às eleições dos órgãos das regiões autónomas e do poder local ou, ainda, à criação das regiões administrativas.
É, portanto, somente em relação à lei eleitoral para as eleições legislativas e também relativamente ao referendo que se verifica o sistema de aprovação por dois terços, o que significa que os dois partidos se irão tornar mutuamente reféns dos interesses de cada um deles e transformarão o sistema no sentido que a ambos convenha.
Se viesse a concretizar-se este pacto partidário estaríamos perante um verdadeiro golpe de Estado constitucional.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A troco deste pacto, o PSD - o partido que foi de Sá Carneiro - e o Partido Socialista pretendem fechar o sistema à realidade da vida nacional, estreitando as opções à escolha entre a social-democracia e o socialismo.
Neste bloco central, encontram-se os partidários incondicionais do «eurocratismo» político-monetário, da ideia de que as ideias não são necessárias para a política, do princípio, subliminar, é certo, de que nem as pessoas nem as instituições nacionais precisam de ser ouvidas porque, em Bruxelas, cuidarão melhor de nós.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A troco deste pacto, o PS e o PSD desistem das reformas de fundo nas matérias em que o País devia preparar-se para os problemas e desafios substanciais ligados às consequências da globalização dos mercados, do sistema e objectivos da construção europeia, aos da carga fiscal e da quebra do emprego, às grandes reformas sempre retoricamente proclamadas e sempre adiadas.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - O que é grave é que, na mira de um benefício de garantia do seu score eleitoral, à custa da

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reformulação do sistema, estes dois partidos não entendam que o que está em risco são a viabilidade e a representatividade do próprio modelo político - ou, então, entendem até bem demais...
O Partido Popular, em nome dos eleitores que lhe confiaram o seu voto, não consentirá nesta desvirtuação do sistema.
Não está aqui em causa a questão da governabilidade do País, pois sempre que os portugueses foram confrontados com opções e desafios políticos claros souberam dar condições de governabilidade aos seus eleitos.
Um sistema bipartidário como aquele que se prefigura no acordo de revisão constitucional, celebrado entre o PS e o PSD, não nos traz a vantagem da alternância de ideias e métodos no governo; traz-nos antes o rotativismo de dois partidos - um de centro e outro de centro esquerda -, cuias ideias não são fáceis de distinguir à vista desarmada: são o «Dupond e Dupont» da política portuguesa, a fechar o sistema, monopolizando-o em seu proveito.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Curiosamente, não somos os únicos a compreender isto. No Grupo Parlamentar do Partido Socialista, muitos Deputados houve que não aceitaram pacificamente este negócio particular celebrado entre os directórios do PS e do PSD, com as consequências que conhecemos: o Presidente da Comissão Eventual de Revisão Constitucional afastou-se e demitiu-se com o inquestionável argumento da dignidade e assistimos à cena, pelo menos insólita, de o Presidente do Grupo Parlamentar do PS ler, na cerimónia de assinatura do acordo, não o discurso da exaltação do mesmo mas o seu próprio epitáfio político.
O PSD, embora esfregue as mãos de contente, alardeando aos quatro ventos uma vitória política sem par, sentiu a necessidade de, ontem mesmo, subir a esta tribuna e tentar um truque de ilusionismo político de oposição ao Governo PS.
Simplesmente não é politicamente sério vestir a pele do partido responsável naquilo que o bloco central considera como grandes desígnios nacionais, como a passagem à terceira fase da moeda única, para, depois, vir criticar as políticas concretas deste Governo que decorrem, necessária e inevitavelmente, das opções que ambos livremente partilharam.
Seria bom que o Partido Social-Democrata se começasse a co-responsabilizar por estas políticas, em nome da unicidade bipartidária que deseja, em vez de vir aqui fazer o exercício de acalmia do eleitorado de centro-direita e direita, o qual já percebeu perfeitamente que não está representado neste acordo de revisão constitucional do PS c do PSD.

Vozes de CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para o Partido Popular, a revisão constitucional deve ser um espaço de consenso e tranquilidade entre os portugueses.
A Constituição da República não pode ser uma bandeira ideológica. As opções ideológicas concretas são escolhidas pelo povo nas eleições. A Constituição tem de estar acima dos partidos e deve exprimir um consenso nacional e democrático entre todas as correntes de opinião da sociedade portuguesa.
Ao tomar a iniciativa de abrir o processo, apresentámos um modelo claro de revisão constitucional.
Em primeiro lugar, defendemos que deve ser efectivamente rompido o «colete de forças» que na Constituição tem amarrado o recurso ao referendo, porque entendemos que se trata de um procedimento democrático por excelência.
Em segundo lugar, propugnamos por um sistema político que aproxime os eleitos dos eleitores, como forma de revivificar a democracia representativa, porque acreditamos que é essencial credibilizar o sistema político democrático em geral e a instituição parlamentar em especial.
Em terceiro lugar, propomos que todos, mas todos, os emigrantes portugueses possam votar na eleição do Presidente da República, porque o Chefe do Estado é, por natureza e vocação, Presidente de todos os portugueses e não pode, pois, ser eleito apenas por uma parte deles.
Em quarto lugar, pretendemos ver consagrado o reforço dos poderes da Assembleia da República, no sentido de lhe outorgar uma competência nova: a de se pronunciar previamente sobre actos comunitários de natureza normativa que versem matérias das suas próprias competências, obstando à crescente usurpação de poderes de soberania pela burocracia europeia e pugnando pelo respeito do princípio da subsidiariedade.
Em quinto lugar, queremos chamar os cidadãos à vida pública do País em vez de os afastar e, por isso, defendemos um sistema aberto, sem medo da concorrência, em que, ao lado dos partidos, possam concorrer listas de cidadãos independentes à Assembleia da República, às assembleias municipais e às câmaras municipais.
Destas e de outras ideias que apresentámos no nosso projecto de revisão constitucional, vemos - já o dissemos - alguns afloramentos no acordo de revisão constitucional entre o PS e o PSD, mas são apenas afloramentos e o seu conteúdo é vago e impreciso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Popular irá bater-se, nesta Assembleia e no seio da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, para que seja dado corpo e expressão adequada aos princípios que defende e para que esta revisão constitucional não institua o «duopólio» dos partidos que integram o bloco central e venha, afinal, a ser a «Magna Carta» em que todos os portugueses se possam rever e na qual se sintam representados.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Queiró beneficiou de 4 minutos que lhe foram concedidos pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Como o Sr. Deputado João Carlos da Silva se inscreveu para formular um pedido de esclarecimentos ao Sr. Deputado Luís Queiró, pergunto se o Grupo Parlamentar do Partido Socialista lhe dá mais um suplemento de tempo para a resposta.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Daremos mais 2 minutos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, a generosidade do Partido Socialista em tempo demonstra que, de facto, não é nosso objectivo calar nenhuma voz neste Hemiciclo.
V. Ex.ª, no seu discurso contra o acordo celebrado para a revisão constitucional, referiu-se a um oligopólio dos

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partidos do centro do espectro político português e disse que se tratava de um acordo interpartidário, no sentido de criar alguma base de estabilidade para decisões importantes desta Assembleia. Ora, se V. Ex.ª ataca a existência de negociações e conversações entre partidos para criar uma base de estabilidade para decisões importantes desta Assembleia, pergunto-lhe qual é o seu critério e se há acordos bons e acordos maus. É que o Partido Popular, em nome da estabilidade, também já foi protagonista de atitudes de negociação...

Aplausos da Deputada do PSD Manuela Ferreira Leite .

... e de colocação de opiniões em confronto para conseguir decisões eficazes desta Assembleia.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Recordo a V. Ex.ª momentos importantes, como os do Orçamento do Estado para 1996 e para 1997.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Fora da Assembleia!

O Orador: - Mas gostava de dizer a V. Ex.ª, e V. Ex.ª referiu-o, que, de facto, no acordo, há afloramentos de propostas apresentadas pelo próprio Partido Popular e também pelo Partido Comunista. Aliás, o acordo prevê que o contributo das outras forças políticas será importantíssimo, em sede de Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, para aperfeiçoar as soluções que ali se preconizam e para incluir outras matérias que, eventualmente, não tenham sido abordadas entre os dois partidos.
Mas recordo ainda a V. Ex.ª, e também ao Sr. Deputado João Amaral, que o Partido Socialista convidou todas as forças partidárias para conversações bilaterais relativamente à questão da revisão constitucional.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Isso é hipocrisia!

O Orador: - Portanto, não há legitimidade para dizer que houve uma tentativa de formar um oligopólio ou um bloco central, com exclusão das outras forças partidárias, por duas razões: em primeiro lugar, porque sempre estivemos disponíveis para dialogar e conversar com todos; em segundo lugar, porque o local onde todas as questões serão decididas será a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional,...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Nós sabemos!

O Orador: - ... assente, de facto, num mínimo de estabilidade necessária para que as grandes decisões se possam tomar, a partir de uma base de trabalho que se aperfeiçoará com o contributo de todos, se o quiserem dar.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, agradeço-lhe, em primeiro lugar, por me dar a palavra e ao Partido Socialista por me ter dado tempo suplementar para responder ao Sr. Deputado João Carlos da Silva. Aproveito, no entanto, para dizer à Assembleia que não fizemos qualquer acordo por baixo da Mesa para que o Partido Socialista me desse este tempo, não vá a Assembleia ficar convencida disso mesmo.

Vozes do PS e do PSD: - Ah!

O Orador: - Quero dizer, em primeiro lugar, que, na minha intervenção, não falei em oligopólio mas em «duopólio», que é uma coisa diferente, e, como é evidente, não quis criticar as discussões que há entre os partidos dentro da Assembleia da República.
É evidente que os senhores, que são uns arautos do diálogo, sabem bem que é através do diálogo com os diversos grupos parlamentares que se conseguem os consensos necessários, quando é necessário gerar consensos nesta Assembleia da República. O que critiquei não foi isso, foi, basicamente, o facto de este acordo de revisão constitucional conter em si mesmo - como lhe hei-de chamar?!... a possibilidade de haver entendimentos futuros e não controlados entre o PS e o PSD, sobretudo em termos de revisão do sistema político e do sistema eleitoral, que conduzam à perpetuação desses dois partidos no poder,...

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - ... com evidente desrespeito por fatias de eleitorado muito relevantes - no meu caso, falo de meio milhão de pessoas - que devem estar igualmente representadas no fórum de debate e nos governos, se assim o merecerem, pelo voto dos eleitores.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado João Carlos da Silva perguntou-me ainda se há acordos bons e acordos maus. Sr. Deputado, faça essa pergunta dentro da sua própria bancada! É que, na sequência deste acordo, o que vi foi os senhores perderem o presidente do vosso grupo parlamentar, o que vi foi o presidente da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional ir-se embora dizendo que não continuava a presidir à Comissão por questões de dignidade e por ter sabido do acordo pelos jornais.
Portanto, Sr. Deputado, os acordos, de facto, são bons ou são maus, mas, relativamente a este caso, pergunte à sua bancada se foi bom ou se foi mau!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Esperávamos mais!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, é chegado o momento de apreciarmos e votarmos o voto n.º 65/VII De pesar pela morte de Liseta Rosa Sousa Moreira, na sequência de um aborto clandestino, subscrito pelas Sr.as Deputadas Helena Roseta e Odete Santos.
O voto é do seguinte teor:

O dia 8 de Março, Dia Internacional da Mulher ficou tristemente assinalado este ano pela morte, no Hospital de São João, no Porto, de uma mulher, Liseta Rosa Sousa Moreira, de 36 anos, na sequência de um aborto clandestino. A Assembleia da República regista o nefasto acontecimento e manifesta o seu pesar.

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Srs. Deputados, está em apreciação.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Roseta.

A Sr.ª Helena Roseta (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Não é habitual esta Assembleia da República pronunciar-se sobre tragédias que se abatem sobre uma família anónima e pobre, mas a morte desta mulher, nas circunstâncias em que ocorreu, e os três filhos que deixa condenam-nos, a todos nós, por não termos conseguido evitá-la, por adiarmos respostas aos problemas com que se defrontam as mais pobres, as menos informadas e as mais excluídas das mulheres portuguesas, por termos tantas outras prioridades na nossa agenda política enquanto mortes como esta, desnecessária e violenta, continuam a acontecer.
Não trago aqui, nem a Deputada Odete Santos, um voto contra ninguém. Trago a minha mágoa, trago um luto que não ensombrou apenas uma família, ensombrou-nos a todas no Dia Internacional da Mulher.
Sei muito bem que não é com um simples voto de pesar que podemos realizar as reformas que faltam, mas lembrar o sucedido, neste preciso bairro degradado, com esta precisa mulher, mãe de três filhos, é um dever que se me impõe, pelo significado trágico e, para mim, escandaloso de uma morte como esta.
Como diz Sofia de Melo Breyner, «vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar». Que sobre esta morte, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não se abata o nosso silêncio.

Aplausos do PS, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, dispondo, para o efeito, de 3 minutos concedidos pela Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Céu Ramos.

A Sr.ª Maria do Céu Ramos (PSD): - Sr. Presidente, agradeço a sua condescendência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que a natureza das circunstâncias que motivam este voto exige-nos - a mim, pelo menos, exige-me - uma intervenção marcada pela autenticidade e pela parcimónia.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Julgo que as primeiras manifestações sinceras que devo fazer são as de pesar pela morte de Liseta Moreira e de solidariedade para com a sua família, perante esta perda, esta dor e este sofrimento.
A defesa da vida e o respeito pela dor dos outros não é um património de ninguém, é um património de todos e um princípio que a todos deve unir. A defesa da vida não é monopólio da esquerda nem da direita e o PSD, também pela defesa da vida, apresenta o seu pesar, porque se perderam duas vidas, a de Liseta Moreira e a de seu filho.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Mas apresento também aqui, com sinceridade e parcimónia, o meu lamento pela instrumentalização política da dor dos outros.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A dor e o sofrimento, como disse, podem ser objecto de partilha e de solidariedade, mas, acima de tudo e contra tudo, têm de ser objecto de respeito.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - E é pena que, perante duas perdas, haja a intenção de instrumentalizar politicamente a morte como uma arma de arremesso político, mesmo para marcar posições que podem ser legítimas, porque este é, e continuará a ser, um país livre.
Consideramos, portanto, que não podemos apoiar expressamente este voto de pesar. Manifestamos, com sinceridade, o nosso lamento pela perda, mas temos de denunciar a crueldade e a hipocrisia que motivam politicamente o voto aqui apresentado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS, do PCP e de Os Verdes, batendo com as mãos nas brincadas.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, em representação do Grupo Parlamentar do CDS-PP, dispondo igualmente de 3 minutos concedidos pela Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A minha bancada não se associa a este voto.
Este voto não é de pesar, é um acto político de pesadas consequências, traduzindo a instrumentalização do sofrimento e da morte alheios como arma política e demagógica.

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): - Não é demagogia, são factos!

A Oradora: - A minha bancada está aqui em nome das pessoas c para as pessoas...

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Nota-se!

A Oradora: - ... e não pode, por isso, admitir que elas sejam usadas desta forma, abrindo um terrível precedente na Assembleia da República.
Já sabíamos que, sendo todos os homens iguais, há sempre uns mais iguais do que outros. Julgávamos que, ao menos, perante a morte, por mero decoro, por mero pudor, todos fossem iguais, desde logo a mãe e o filho, mas também os que continuam a morrer todos os dias, em Portugal - homens, mulheres e crianças -, por falta de cuidados básicos, de mortes evitáveis. Quando é que, em relação a todos e cada um destes, ouvimos aqui um voto de pesar?! Que me lembre, nunca ouvi um voto de pesar em relação a algum e a cada um deles!

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Muito

A Oradora: - Também não poderia deixar, aqui c agora, de protestar, como mulher e como Deputada, que, a propósito do Dia Internacional da Mulher e em nome das mulheres, duas Deputadas tenham violado, sem proveito, o direito de intimidade c de privacidade na morte de outra mulher.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Fico também esclarecida quanto ao sentido que aqui é dado à solidariedade feminina.
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, este acto político não é apenas, do nosso ponto de vista, grosseiro e revoltante na forma, é também nas causas que, presumivelmente, o motivaram: primeiro, exercer uma coacção violenta sobre os Deputados que, no passado dia 20, manifestaram, com a liberdade que o seu mandato lhes confere, o direito e o dever de expressão e voto.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Segundo, provocar remorsos retardados ou tentativas de autocrítica no interior de qualquer bancada.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Assim sendo, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas signatárias, quero dizer que, por estas razões, votaremos contra, que esta arma política de arremesso não atingiu esta bancada e ficará certamente com quem a lançou.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Penso que aquilo que está em causa não é profanar a morte, o que pode estar em causa é o alívio de consciência para alguns, que preferem ignorá-la e silenciá-la para fingir que ela não existe.

Aplausos de Os Verdes, do PS e do PCP.

Gostem ou não, Sr.as e Srs. Deputados, há mulheres que morrem por esta razão neste País e não é por a senhora o ignorar que essas mortes são evitadas.
Aquilo que hoje está em causa, a única discussão que importa fazer, em nome desta mulher e de muitas outras, anónimas, aquilo que hoje a Assembleia vota, que tem de confrontar e que tem de lamentar é a sua própria hipocrisia e a sua indiferença perante o sofrimento.

Protestos do CDS-PP.

Aquilo que a Assembleia tem de confrontar é a manutenção de tabus, indo descansar para casa, porque prefere silenciar e ignorar estas situações.

Aplausos de Os Verdes, do PS e do PCP.

É este o exacto sentido daquilo que as nossas colegas fizeram, ao apresentarem este voto, e muito bem, digo-o em nome de Os Verdes. É este respeito que a morte desta mulher exige, porque ela deve fazer reflectir e confrontar a Assembleia com a sua própria responsabilidade, deve permitir que os Deputados se deixem de hipocrisias, de exercícios vãos de moralismos, que não têm nem ninguém pode dar nesta matéria.
Srs. Deputados, encarem o problema de frente e solucionem-no, para que não haja mais mulheres a morrer, pois é disso que se trata. É, pois, em nome da vida, de que ninguém tem o exclusivo, que este voto deve ser votado por nós.

Aplausos de Os Verdes, do PS e do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A antiga teia do aborto clandestino fez no sábado mais uma vítima. Morreu sozinha, não disse a ninguém. Creio que nos merece a todos, na morte, o respeito a que não teve direito na vida.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, o Grupo Parlamentar do PS respeitará estritamente a vontade publicamente expressa pelos familiares da vítima e não transformará, a título algum, este acontecimento numa bandeira política. Abominamos sinceramente a instrumentalização da morte, mas abominamos igualmente o silêncio perante uma realidade cruel..

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É assim que nos posicionamos perante este voto.
Apresento, em nome da bancada, os pêsames à família enlutada. Pensamos especialmente nas três crianças, que têm direito a especial protecção da sociedade e do Estado, nos termos da Constituição e da lei.
Daremos a nossa aprovação a este voto, apresentado pelas Sr.as Deputadas Helena Roseta e Odete Santos, neste entendimento, ou seja, no entendimento de que não se trata de um voto contra ninguém, trata-se talvez de um voto contra o silêncio e de expressão de uma preocupação que, seguramente, não deixa ninguém indiferente, dentro ou fora desta Câmara.
Por último, Sr. Presidente e Srs. Deputados, permitam-me que invoque algo que aconteceu há muitos, muitos anos. Há muitos, muitos anos, quando em Portugal se sofria, e muito, um poeta resistente, que nos dá a honra de pertencer a esta bancada, disse: «é possível falar sem o nó na garganta; é possível andar sem olhar para o chão; é possível viver de outro modo».
É por isso que gostaria de não terminar a evocação destas palavras de Manuel Alegre sem vos dizer que é de esperança que também devemos falar hoje, de tristeza e de esperança. A esperança de que sejamos capazes, todos, de construir as condições necessárias para que, em Portugal, se viva de outro modo e, sobretudo, não se morra deste modo.

Aplausos do PS, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Rejeito as acusações de instrumentalização e o que tenho de concluir é que as Sr.as Deputadas, que anunciaram que iriam votar contra, quando as mortes de que falávamos eram meros números nas estatísticas, nessa altura não se incomodavam nada porque se tratava de

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números. Porém, quando os números se transformam em nomes, aí, de facto, começa a incomodar, Sr.as Deputadas. E incomoda as mulheres, porque é às mulheres que causa maior sofrimento e maior crueldade, e as Sr.as Deputadas causam essa crueldade, por serem mulheres e não lamentarem uma morte,

Protestos do PSD e do CDS-PP.

... não a nível individual, em razão da causa, em razão da causa dessa morte. Isso é que é a suprema crueldade!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Antes de se tornar mais um número, em estatística, que envergonha, a sua morte saiu do anonimato onde se encobre o sofrimento clandestino e deixou de ser assunto privado para se tornar em nova vergonha do sistema penal.
Morreu uma mulher, não importa o nome, importa as condições em que viveu, importa o motivo porque morreu. Como tantas outras, da vida guardara tão-só a amargura de ter vivido, excluída entre os excluídos, de ter vivido como tantas outras um quotidiano - e sabem o que é um quotidiano femininamente violento, Sr.as Deputadas? -, um dia-a-dia marcado, hora a hora, pelo horizonte estreito de um bairro degradado. Como tantas outras, ouviu que uns senhores talavam de um crime e sofreu calada e sentiu o tal nó na garganta de que falou o Sr. Deputado José Magalhães. Como muitas outras esteve entre aquelas que ouviram falar num direito à vida e quiseram, mas não puderam, reclamar o seu direito de viver!
Morreu uma mulher e não importa o nome de quem era. O trágico acontecimento, como todas as tragédias do sexo feminino, resultantes da denegação de direitos e liberdades fundamentais, torna-se causa colectiva das mulheres em luta pela dignidade inseparável do direito de não sofrerem as penas do aborto clandestino, penas resultantes de tratamentos cruéis, desumanos, bárbaros e degradantes.
Morreu mais uma mulher, vítima de violência, no verdadeiro holocausto feito de «boas consciências» onde se imola a mulher.

Aplausos do PCP, do PS e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se concordassem, proceder-se-ia desde já, como é habitual, à votação do voto n.º 65/VII - De pesar pela morte de Liseta Rosa Sousa Moreira na sequência de um aborto clandestino, subscrito pelas Sr.as Deputadas Helena Roseta e Odete Santos, que foi lido e discutido.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Como sabem, é tradicional que a seguir a um voto de pesar se siga um minuto de silêncio. Porém, o minuto de silêncio não tem registo regimental, só se concede e é possível em termos de consenso. Neste caso, não havendo consenso, não proporei um minuto de silêncio.
Srs. Deputados, vamos passar à aprovação dos Diários da Assembleia da República, I Série, n.os 34 a 41, respeitantes às reuniões plenárias de 31 de Janeiro, 5, 6, 7, 12, 13, 14 e 19 de Fevereiro, p.p., respectivamente.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 55 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão conjunta dos projectos de lei n.os 252/VII - Cria a Fundação Democracia e Liberdade, da iniciativa do PSD, e 289/VII - Participação da Assembleia da República na cooperação com os países africanos de língua portuguesa, apresentado pelo PS.
Para introduzir o debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Após quase meio século de regime autoritário, Portugal conseguiu criar e consolidar uma democracia pluralista, associando a estabilidade política e o normal funcionamento das instituições democráticas ao desenvolvimento económico, social e cultural.
Portugal é hoje, justamente, reconhecido como um País pioneiro da terceira vaga da liberdade e da democratização política, movimento que nas últimas duas décadas percorreu a história da humanidade e teve o seu apogeu com o desmoronamento do bloco soviético e o colapso do comunismo.
Portugal é hoje, também, membro da União Europeia, que constituída por um conjunto de 15 países terra, na democracia, na liberdade e no respeito dos direitos humanos, os seus alicerces políticos decisivos e fundamentais.
Compreende-se, pois, o vivo interesse de outros países em relação à experiência democrática portuguesa, tacto que não só nos confere legitimidade para protagonizar o envolvimento directo nos processos de democratização que vêm desenvolvendo à escala mundial como também acentua e enfatiza a nossa responsabilidade crescente quando assumimos o compromisso de contribuir, por todos os meios ao nosso alcance, para a efectiva promoção da democracia, da liberdade e dos direitos humanos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Assim, pode afirmar-se, com verdade e justiça, que Portugal tem querido e tem sabido pôr a sua experiência ao serviço dos países que aspiram, como nós aspirámos, à implantação de regimes democráticos, sendo natural encontrar nos países de língua oficial portuguesa um natural e privilegiado espaço geográfico, histórico, de identidade e de afecto para concitar e congregar o empenhamento português.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Desta forma, o relacionamento dos países africanos de língua oficial portuguesa tem correspondido a uma das prioridades da acção externa de Portugal traduzindo um dado incontornável da diplomacia portuguesa.
Foi assim nos 10 últimos anos com os governos do PSD e espera-se, vivamente, do actual Governo que persista em trilhar activamente esta mesma senda, com a convicção c a determinação indispensáveis quer à afirmação dos interesses dos países visados quer à posição de

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Portugal. No entanto, diga-se que a expectativa começa a esmorecer tanto em Portugal como nos países africanos, visto que a política de cooperação do actual Governo teima em primar pela modéstia, senão mesmo por uma timidez claramente inibitória de acções concretas e significativas.
Há, pois, que dar corpo a uma política de cooperação dinâmica e interventiva, a bem da democracia e do desenvolvimento dos Estados e das nações. É que, a par da construção europeia, impõe-se igualmente impulsionar e robustecer as relações a todos os níveis com os países de língua oficial portuguesa, para realizar a aproximação dos países com uma mesma língua e uma história comum.
Esta mesma consciência esteve precisamente presente nesta Assembleia quando, em Junho do ano passado, foi realizada, em Lisboa, a primeira Conferência Interparlamentar dos Países de Língua Portuguesa, na sequência da qual o PSD propôs perante este Plenário a constituição de uma fundação portuguesa vocacionada para o apoio à consolidação da democracia parlamentar e à afirmação dos alicerces do Estado de direito naqueles países.
Tratava-se de um projecto sério e coerente que o PSD anunciava então, na sequência da análise e do conhecimento das virtualidades da cooperação e .do modo como se impõe realizá-la, de forma credível e sustentada, e na antevisão do inquestionável valor que a mesma também iria revestir para a afirmação de Portugal na cena mundial.
Daí que o projecto da Fundação para a Democracia e Liberdade surgisse como consequência natural - diria mesmo, como emanação - das nossas profundas convicções de solidariedade política e humanista e da consciência do interesse de, rapidamente, dispor de uma estrutura ágil e operativa para atingir os desideratos propostos. Reafirmámo-lo antes, reafirmamo-lo hoje.
Trata-se de um projecto que, tendo recolhido o aplauso do actual Governo, continua a merecer a adesão e o apoio do Governo socialista, como exprimiu, aliás, o Secretário de Estado da Cooperação, mas trata-se também de um projecto que recebeu o beneplácito dos partidos políticos com assento parlamentar, acolhimento esse que foi evidente e insuspeito aquando da aprovação do Orçamento do Estado para 1997.
De facto, no Orçamento de 1997 ficou consagrada a transferência de verba do orçamento da Assembleia da República para financiar a constituição de fundações porque não esta, a Fundação Democracia e Liberdade? gerando assim o necessário apoio financeiro para garantir as referidas iniciativas orientadas para a consolidação e o desenvolvimento da democracia nos países africanos de língua oficial portuguesa.
Feito este importante e complexo percurso até aqui e confrontados com o capital político de que Portugal goza, chegou o momento de dar o passo seguinte e, com coerência e sentido de Estado, aprovar a criação da Fundação Democracia e Liberdade que, de baptismo, poderia receber uma designação diferente, ainda mais consentânea com os propósitos que a animam na mente do partido proponente: Fundação Democracia, Liberdade e Desenvolvimento - aliás, é esta nova denominação que deixo agora à consideração desta Câmara.
Sr.as e Srs. Deputados: Num mundo marcado pelo fenómeno da crescente interdependência entre países, sociedades e economias há que apostar convictamente no aprofundamento dos laços efectivos de co-evolução política e económica, no sentido de salvaguardar a paz, a segurança, a estabilidade e a prosperidade dos povos.
A transição para a democracia não é um caminho isento de sobressaltos, dificuldades e contradições. A construção de uma sociedade democrática envolve uma multiplicidade de factores, desde o conceito de cidadania, o sistema de valores da sociedade e as formas de governação, através de instituições democráticas, em termos de legitimidade política representativa da generalidade dos cidadãos.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A consolidação de uma democracia requer uma adequada performance económica e social, ou seja, o funcionamento eficaz de uma economia baseada na interacção dos mercados e capaz de assegurar um crescimento económico e social sustentado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Daí que, relevante, relevante mesmo, seja que as diversas forças políticas portuguesas compreendam, interiorizem e assumam que o apoio à instauração e consolidação das democracias que emergem constitui um dos pontos mais decisivos da agenda política internacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, sendo assim, importa que Portugal seja consequente e ambicioso e não desperdice uma oportunidade ímpar para estar presente como agente e não como mero observador na cena mundial.
Sr.as e Srs. Deputados: O PSD pensa que não podemos responsavelmente alhear-nos de criar mecanismos de apoio aos agentes sociais que nos países africanos de língua oficial portuguesa se propõem pugnar pela consolidação dos recentes regimes democráticos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pensamos mesmo que é uma condição essencial da nossa afirmação como País na Europa e no mundo.
A decisão está nas nossas mãos, importa estar à altura do desafio. Este Parlamento tem, pois. a responsabilidade de agir.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Maria Carrilho, João Corregedor da Fonseca e Maria Celeste Correia.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Carrilho.

A Sr.ª Maria Carrilho (PSD): - Sr.ª Deputada, reconhecemos a validade das preocupações do PSD no sentido de reforçar a cooperação com os países africanos de língua oficial portuguesa e também o interesse dos esforços concretos empreendidos pelo PSD nesse domínio e nessa direcção.
Contudo, o projecto de criação de uma fundação, Fundação Democracia e Liberdade, parece-nos não corresponder, da forma mais adequada, ao reforço da política de cooperação portuguesa. Desde logo, porquê uma fundação? Mais uma instituição, com toda a carga burocrática que implica, quando é prioritário conseguir dar conteúdo a estruturas e a instituições já existentes? Não será que uma

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instituição sem meios próprios, por via do seu funcionamento, irá absorver do erário público as verbas que poderiam ser destinadas já a acções concretas?
Receamos que, embora com intenções louváveis, a criação de tal fundação venha a tornar mais formal e mais rígido o sistema de cooperação, em vez de torná-lo mais ágil e adaptável às circunstâncias típicas das sociedades em processo de transição é consolidação para a democracia.
Um outro aspecto que nos merece reparo e que coloca algumas interrogações tem a ver com a própria designação, Fundação Democracia e Liberdade, e com o objectivo da sua criação, e passo a citar: «apoiar as iniciativas viradas para a consolidação o desenvolvimento da democracia nos países africanos de língua oficial portuguesa». Será que isso não encerra uma certa ideologia paternalista em relação a esses países?
E porquê, se a designação da Fundação é esta, só com os países africanos de língua oficial portuguesa? Porque não também com outros países também em processo de transição e consolidação da democracia?
Não será, Srs. Deputados, que a consolidação da democracia é fruto, principalmente, do reforço e da acção da sociedade civil em cada país interessado?

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Não será que a previsibilidade, que, segundo os teóricos da consolidação da democracia, constitui a característica fundamental desse processo, se consegue principalmente através do reforço da sociedade civil?

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - A designação dos candidatos aos órgãos da fundação, nomeadamente para os conselho directivo, executivo c consultivo, assim como a respectiva eleição, não poderão vir a causar atritos? Não haverá o risco de, em caso de dificuldade no processo de candidatura e de eleição, se dar azo a leituras políticas que em nada irão beneficiar a cooperação?

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Outras questões derivariam da leitura do projecto de lei do PSD mas fico-me, por enquanto, por aqui.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, V.Ex.ª deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD):- Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Carrilho, permita-me que lhe diga, sem qualquer sombra de crítica, que fiquei bastante espantada, desagradavelmente espantada, com o cartesiano estrutural da sua intervenção.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - V. Ex.ª coloca imensas dúvidas, que são pertinentes, certamente, para o seu espírito, mas só quem ler todo este projecto de lei com esse mesmo espírito cartesiano é que não pode deixar de ter dúvidas que não são essenciais nem fundamentais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Diria que são dúvidas por dúvidas!...
Ora bem, tentando esclarecer, se é que um cartesiano fundamentalista pode ser esclarecido, procuraria explicitar que a iniciativa tem um grande objectivo: sublinhar a independência da instituição a criar e desencadear uma efectiva participação de todos os partidos com assento parlamentar, o que, obviamente, não é de somenos importância, antes pelo contrário, pois não se confunde, de maneira alguma, com as competências do Governo nesta matéria - que, obviamente, também é o órgão de soberania que tem competências próprias para desenvolver essa mesma matéria -, algo que VV. Ex.ª no vosso projecto de lei esqueceram completamente, como mais adiante se verá.
Assim, aquilo que se pretende, com esta associação da Assembleia da República, é mostrar a mais-valia efectiva que essa colaboração associada, se quiser, essa parceria, pode trazer a este processo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - V. Ex.ª perguntou, porquê os PALOP. Bom, penso que ficou claro e inequívoco que nós temos, relativamente aos PALOP, um afecto, uma cultura, uma tradição e uma história que os tornam, antes do mais, um objectivo prioritário, mas não único. Por isso é que tive oportunidade de dizer que Portugal é, claramente, um país envolvido na terceira vaga da democratização e é um país apostado na consolidação da democracia, tal e qual como apostou na consolidação da sua própria democracia interna.
Portanto, Sr.ª Deputada, penso que os receios relativamente à exclusividade quanto ao objecto, quando à eventual carga burocrática e quanto aquilo que apontou como insuficiência de meios próprios, podem ser perfeitamente dirimidos pela performance desta fundação. A fundação será, na prática, aquilo que todos nós quisermos e como todos os partidos vão estar envolvidos na sua gestão e na sua actuação ela será um êxito, se nós quisermos, ou ela será um insucesso, se nós quisermos.
Fique, no entanto, presente que qualquer actuação menos própria ficará registada para a história, para a história de Portugal e para a história do nosso relacionamento com as novas democracias emergentes. O povo português não nos perdoará e o povo desses países também não.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, ficámos a saber que o vosso projecto de lei foi objecto de apreciação antecipada por membros do Governo e do Partido Socialista, que já lhe deram, segundo disse, total apoio.
Bom, lá estão a funcionar os acordos entre o PS e o PSD... Começou na revisão constitucional, no horário de trabalho das 40 horas, nas privatizações, e já chegámos a este tipo de iniciativas legislativas que bom seria não estivéssemos a debater!...

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Sr.ª Deputada, este projecto cria uma fundação sem património, partidarizada até na sua gestão, como V. Ex.ª acabou de dizer, partidarizada nos eleições dos conselhos directivo, consultivo e executivo, e financiada através do Orçamento do Estado. Pergunto-lhe: que tipo de Financiamento entende que deve ser canalizado através do Orçamento do Estado para uma fundação desta natureza? Com que objecto? Será um orçamento vago? Elevado ou reduzido? Pretendemos ser esclarecidos sobre o tipo de critério que deve ser adoptado.
Mas o que mais nos preocupa é o seguinte: V. Ex.ª falou na cooperação político-parlamentar. A propósito pergunto se se tem consciência ou sabe que está em curso um amplo programa de cooperação interparlamentar entre a Assembleia da República e os parlamentos dos países africanos de língua portuguesa? Sabe V. Ex.ª que, ainda na semana passada, o Sr. Presidente da Assembleia da República, chefiando uma delegação que integrava um representante do seu grupo parlamentar, assinou um aditamento ao acordo de cooperação, tendo sido tomadas imediatamente decisões bem importantes, que serão, com certeza, tornadas públicas e que já estão em curso?
Não acha V. Ex.ª que essa cooperação parlamentar, existente também no âmbito da CPLP, que prevê a criação de fóruns parlamentares, será suficiente, em vez de envolvermos a Assembleia da República em iniciativas como a vossa, que são preocupantes?
Finalmente, tem conhecimento da declaração constitutiva da CPLP, onde tudo o que diz respeito à cooperação, a todos os níveis, está perfeitamente apontado e regulado? Não seria cumprindo esse tipo de determinações da Declaração Constitutiva da CPLP que deveríamos orientar a cooperação portuguesa com esses países, de forma desinteressada e não tutelar, e não ensinar aqueles partidos, como se diz no seu projecto de lei, ao desenvolvimento da democracia, pois em alguns aspectos somos capazes de receber lições de democracia desses mesmos países.

(O Orador reviu.)

Vozes do PCP e de Os Verdes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, havendo mais um orador inscrito para pedir esclarecimentos, V.Ex.ª deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, permita-me uma observação de carácter pessoal: V. Ex.ª sofre de défice auditivo ou, então, ouve aquilo que quer ouvir...
E digo-lhe isto por uma razão muito simples: eu não disse, de forma alguma, que este projecto de lei tinha sido discutido com o Governo, da mesma forma que não disse que tinha sido discutido com os outros grupos parlamentares, o que eu disse foi que foram sondados o Governo e os grupos parlamentares, que atempadamente mostraram o seu apoio. Se mudaram de posição, permito-me dizer que tomo boa nota disso, tenho pena e lamento-o profundamente!
Como V. Ex.ª equacionou várias questões, começarei, desde logo, por levantar uma, que tomo como ponto de partida e que é fundamental para perceber a estrutura e a mecânica da fundação que propomos.
V. Ex.ª terá presente a existência da FLAD (Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento) - espero que ao défice auditivo não exista também um défice de conhecimento da realidade nacional -, criada pelo Decreto-Lei n.º 168/85, de 20 de Maio de 1985, e se cotejar os estatutos de uma e outra fundação observará uma similitude plena: Porquê? Bom, porque a motivação que esteve por detrás desta nossa iniciativa foi a intenção de não gerar...

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Posso interrompê-la, Sr.ª Deputada?

A Oradora: - Não, Sr. Deputado.
Como estava a dizer, foi a intenção de não gerar polémicas e de ser consensual, porque pretendemos desencadear um processo de partilha com todos os partidos e não partidarizar a fundação.
Por outro lado, temos de reconhecer - e espero que o Sr. Deputado faça essa justiça - que basta ler os estatutos, concretamente os artigos 1.º e 3.º, para ver, em primeiro lugar, que as formas de cooperação que propomos não esgotam a cooperação e, em segundo lugar, que não chocam, não colidem nem anulam a cooperação do Governo e da própria Assembleia da República. Sr. Deputado, entenda isto: seríamos os últimos a passar por cima de um órgão que queremos prestigiado e com intervenção, activo e operativo nesta matéria.
Portanto, V. Ex.ª vai-me desculpar mas, efectivamente, penso que invocou esses argumentos por dever de ofício e se tivesse feito uma análise profunda da matéria não teria invocado estas causas.
A cooperação político-partidária é importante, a cooperação governamental é importante e aquela que esta fundação vai desenvolver sê-lo-á também.
Além do mais, em regra, levamos à prática os nossos projectos; talvez VV. Ex.ª não estejam habituados mas nós prometemos e fazemos. De tal maneira que na Lei do Orçamento para 1997, por nossa iniciativa, foi introduzido um artigo onde se diz, de uma forma clara e inequívoca, que «no orçamento da Assembleia da República será inscrita uma dotação específica para programas de cooperação interparlamentar e de aperfeiçoamento das instituições democráticas nos países africanos de expressão oficial portuguesa promovidos por associações e fundações portuguesas, existentes ou a criar». V. Ex.ª quer maior acordo desta Câmara do que o que conduziu a um artigo que não foi posto em causa por ninguém? Quer um maior acordo relativamente à proposta que agora apresentamos do que o consenso à volta deste artigo?
Sr. Deputado, sem me querer parafrasear relativamente a uma intervenção de outro dia, devo dizer que V. Ex.ª aos costumes disse nada.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - A palavra à Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia, para um pedido de esclarecimento.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, o direito de associação e, logo, de constituição de associa-

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ções e fundações de direito privado, é constitucional e legalmente reconhecido aos cidadãos. Que as associações e fundações possam obter o estatuto de utilidade pública é igualmente compreensível, tal como é aceitável que possam beneficiar de apoios públicos de acordo com as finalidades que prosseguem.
Parece-me que há algumas ambiguidades na vossa proposta e por isso lhe coloco duas questões.
Em primeiro lugar, como é que a constituição de uma fundação de direito privado pode ser instituída por decisão de um órgão de soberania c não por uma normal assembleia de cidadãos?
Segunda questão: como c que nesse modelo de fundação que propõe não se prevê um órgão colegial com competência de fiscalização, pois não me parece que um órgão desse tipo possa ser substituído por um executivo?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Celeste Correia, V. Ex.ª colocou a sua dúvida porque, eventualmente, não ouviu o exemplo que dei de uma fundação na mesma situação, a FLAD. Mas, se não ouviu, dou-lhe outro: o da Gulbenkian. Portanto, a sua dúvida, face aos casos que estou a equacionar, está dirimida, pela sua natureza, à nascença.
Relativamente a este projecto de lei, devo dizer-lhe que, embora jurista, não acredito que a lei possa tudo, mas quando os objectivos são válidos, são altos, são significativos - e estes são-no - e quando nós somos o órgão legislativo e os objectivos querem ser atingidos, há que não ser hipócrita, há que avançar com os meios, com a forma adequada. Por isso mesmo está nas nossas mãos, temos que agir. O registo histórico assim o exige, o respeito pelos outros povos o exige, e como podemos fazê-lo, façâ-mo-lo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de lei n.º 289/VII, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.
Enquanto o Sr. Deputado Laurentino Dias se dirige à tribuna, lembro aos Srs. Deputados que, segundo os técnicos de som, não basta não usar os telemóveis dentro do Hemiciclo, é preciso não os ter ligados para receber o sinal pois causam interrupções frequentes e há o risco de desarticulação do sistema sonoro. Peço-lhes, por isso, que não se limitem a não os usar no Plenário mas que também não os tenham ligados no bolso.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresentam-se hoje para discussão em Plenário desta Assembleia dois projectos de lei que, atentas as respectivas exposições de motivos, visam objectivos similares ou ao menos próximos no âmbito da cooperação com os países africanos de língua portuguesa. Em abono da sua importância e da atenção que a esta Câmara deverá merecer a política de cooperação, recordam-se desde já as conclusões manifestadas na Conferência Interparlamentar que há menos de um ano aqui, nesta Assembleia, reuniu delegações dos países africanos de expressão portuguesa e do Parlamento português.
Então, nessa Conferência, que antecedeu a Cimeira de Chefes de Estado e do Governo, para além do total apoio à criação da CPLP, foi acentuado o papel dos respectivos parlamentos nacionais e mesmo decidida a realização anual de uma Conferência Interparlamentar dos Países de Língua Portuguesa. Houve, então, como hoje se mantém, segundo creio, plena unanimidade na tomada de posições sobre questões comuns, um sentimento geral de solidariedade e respeito pelos Direitos do Homem, pela consolidação da paz e o do desenvolvimento dos povos em liberdade e democracia.
É ao Governo - e todos o sabemos - que, nos termos da nossa Constituição, cumpre a obrigação da condução da política externa do Estado português o que envolve necessariamente as responsabilidades na área da cooperação, designadamente com os países africanos. Definir as linhas gerais de orientação política e assegurar a sua condução e cumprimento não significa nunca que possa ou deva caber ao Governo, e só a ele, a iniciativa concreta das relações ou acções no âmbito da cooperação. Mal andaríamos nós se na cooperação não se envolvessem, como aliás se verifica, instituições e organizações não governamentais de diversa natureza e expressão com diferentes níveis e âmbitos de intervenção, e com assinalável e positivo resultado.
Muito há ainda, no entanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para fazer em sede de cooperação.
É comum a toda esta Câmara - não temos qualquer dúvida - a vontade de contribuição para a consolidação dos regimes parlamentares democráticos e pluripartidários nos países de língua oficial portuguesa. E sendo claro que a valorização dos Parlamentos é factor indispensável para a realização do Estado de Direito e dos regimes democráticos que todos defendemos, concluir-se-à necessariamente que há um esforço positivo e estimulante de cooperação interparlamentar que importa concretizar e desenvolver.
Alguns passos já foram dados no sentido de acções concretas de cooperação, e cito como exemplo, por ser de fresca data, a assinatura na passada semana de um Protocolo entre a Assembleia da República de Cabo Verde e esta Assembleia, na pessoa do nosso Presidente, no reconhecimento comum das recíprocas vantagens na institucionalização de mecanismos de cooperação activa no domínio parlamentar. A Assembleia da República - esta Casa - pode e deve assumir a sua participação na promoção e execução de uma política de cooperação interparlamentar na consciência e respeito pelos limites constitucionais e pelo âmbito próprio das suas competências.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Aqui chegados, cumpre apreciar as soluções apresentadas nos projectos de lei n.os 252 e 289/VII que os Grupos Parlamentares do PS e do PSD subscreveram e estão hoje presentes para discussão.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!

O Orador: - Já se disse que exprimem ambos uma vontade comum e um propósito meritório, qual seja o de usar condições institucionais que envolvam as principais torças políticas portuguesas, para a institucionalização de soluções concretas de cooperação no âmbito da Assembleia. Registe-se agora que as soluções apontadas apresentam-se como substancialmente divergentes e materialmente incompatíveis.
O projecto de lei n.º 252/VII visa a criação de uma fundação que denomina de Fundação Democracia e Liberdade, entidade de direito privado e utilidade pública, tendo como objectivo o apoio a iniciativas viradas para a

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consolidação e o desenvolvimento da democracia nos países africanos de língua oficial portuguesa (como decorre do seu artigo 2.º). No âmbito financeiro e patrimonial a fundação gozaria, nos termos do projecto, de autonomia técnica e financeira e seria dotada de um fundo inicial a disponibilizar pelo Orçamento do Estado.
Ora, conhecemos todos o regime jurídico das fundações que se encontra previsto no Código Civil, que regula o modo de sua constituição nos artigos 164.º e 194.º e bem assim no Código Administrativo ou nos Decretos-Leis n.º 460/77 e 215/87 que disciplinam a conformidade legal dos seus estatutos e a declaração de utilidade pública.
A fundação proposta no projecto de lei n.º 252/VII aponta, ao nível do seu regime patrimonial e financeiro, uma solução de manifesta incompatibilidade com o ordenamento jurídico português atrás citado, quando dispõe que o seu fundo social será disponibilizado, à partida, pelo Orçamento do Estado. É que tal solução significa que, sem prejuízo de futuras contribuições, subsídios ou doações de pessoas singulares ou colectivas, de natureza pública ou privada, os bens de que, desde logo, e à partida, disporá ou poderá vir a dispor são, neste momento, inexistentes e indeterminados.
A base patrimonial, ponto de partida obrigatório na doutrina e nos normativos jurídicos que regem a instituição de fundações, não passa aqui de uma realização de bens futuros ou promessa da sua disponibilização.
O artigo 186.º do Código Civil impõe que, no acto de instituição, sejam indicados os fins e especificados os bens destinados a qualquer fundação. A natureza dos bens, a ser património desta fundação, prejudicará ou inviabilizará o reconhecimento da instituição, enquanto tal, nos termos do artigo 188.º do Código Civil.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - A par da questão da indeterminação dos seus bens e património, resulta da proposta a não inclusão estatutária de um verdadeiro e próprio órgão colegial com competência de fiscalização. Isto porque se propõe no texto apresentado que o conselho executivo se constitua na obrigação de promover a fiscalização anual do inventário do património da instituição e balanço das receitas e despesas por uma empresa independente de auditoria de reputação internacional.
Se acrescentarmos a estas questões as dúvidas quanto à extensão das actividades e iniciativas da proposta fundação, das entidades com que cooperará, do estatuto dos seus órgãos e dirigentes, e mesmo até a duvidosa admissibilidade da sua denominação social, havemos de concluir que este projecto apresenta, porventura, dificuldades insanáveis à sua eventual aprovação.
O Grupo Parlamentar do PS apresentou, entretanto, o projecto de lei n.º 289/VII que não propondo a criação de nenhuma instituição, fundação ou instituto, visa, como dele consta, a participação da Assembleia da República ria cooperação com os países africanos de língua portuguesa. Ao contrário do que se mostra proposto no projecto de lei do PSD, é no âmbito próprio e circunscrito da Assembleia da República que a proposta socialista pretende institucionalizar objectivos e procurar meios permanentes no quadro da cooperação para a paz, o desenvolvimento e a democracia com os países africanos de língua oficial portuguesa.
Neste projecto sugere-se expressamente - no seu artigo 1.º, n.º 2 - que os objectivos da cooperação são anualmente ajustados de acordo com as orientações da política do Estado português em sede de cooperação, ou seja, no respeito pela competência do Governo quanto a estas matérias.

A Sr.ª Maria Carrilho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Causará algum embaraço a definição alargada dos seus objectivos e das competências para apreciação c aprovação de programas de acção e cooperação.
Entenda-se que, enquadrado o projecto de lei subscrito pelo PS no âmbito das actuais estruturas da Assembleia da República sempre estará, como está já hoje, na total disponibilidade da vontade política da Câmara o resguardo dos limites de intervenção no respeito pelos parâmetros constitucionais dos diferentes órgãos de soberania.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mais do que disponibilidade é vontade do PS que à apreciação em generalidade que hoje se faz deste projecto, bem como do anterior, se suceda um cuidadoso e participado trabalho de especialidade que, no maior consenso possível e porventura unanimidade, assente nos objectivos a prosseguir, defina os seus meios e assuma com clareza a vertente parlamentar da cooperação.

A Sr.ª Maria Carrilho(PS): - Muito Bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O papel importante dos parlamentos na consolidação e reforço da ordem democrática em cada um dos países, postula a todos nós o interesse comum e as vantagens recíprocas na institucionalização de mecanismos de cooperação parlamentar. Cremos mesmo ser no quadro parlamentar que, por força da presença e empenhamento das diversas forças partidárias e famílias políticas, se mostra possível - sempre sem sobreposição ou intromissão nas competências do Governo ou nas actividades da CPLP assegurar uma participação pluripartidária própria dos regimes democráticos que todos defendemos.
É neste quadro de empenhamento nos princípios e de procura de soluções eficazes e viáveis no quadro da cooperação interparlamentar, que o Partido Socialista assegura a Câmara, como atrás disse, não apenas a sua disponibilidade mas a vontade política séria de contribuir para a melhor solução institucional em sede de cooperação com os países africanos de língua oficial portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Laurentino Dias, o vosso projecto suscita-me algumas dúvidas. No artigo 2.º diz-se que um dos objectivos é a formação política e cívica e, noutra alínea, que visa a formação política, cultural e associativa.
Sr. Deputado, é o PS que apresenta este projecto de lei, não é um outro partido, não é um partido de direita! Como é que o PS pensa educar «política e civicamente» países independentes, com os quais temos boas relações?
VV. Ex.as alargam competências à Assembleia da República, alargam-nas ao Conselho de Administração, para

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seleccionar, para aceitar candidaturas, programas ou projectos de acção. Sr. Deputado, o Conselho de Administração da Assembleia da República é constituído por Deputados e por um representante dos trabalhadores! Ora, este projecto, além de alargar competências ilegítimas à Assembleia da República, que não as deve ter, alarga-as ainda ao Conselho de Administração.
O vosso projecto de lei refere também que grupos parlamentares, com mais de dez Deputados, podem credenciar potenciais candidatos a programas e projectos de cooperação. Creio que isto é muito grave. Vamos credenciar quem? Empresas? Grupos negociais? Organizações não governamentais? Estas já têm a sua própria Plataforma. Deputados estarão integrados nessa cooperação, bem como a própria Assembleia da República, mas esta já tem os seus projectos de cooperação interparlamentar em marcha! Sr. Deputado, como é que V. Ex.ª aceita a partidarização da cooperação? Como é que podemos aceitar uma situação destas, de grupos parlamentares a apreciarem candidaturas, projectos de cooperação, projectos de carácter económico, técnico, científico, etc., etc., quando sabemos que esse tipo de cooperação já existe, que estão em vigor múltiplos acordos de cooperação governamentais, que está constituída a CPLP com propostas concretas? Fundações podem existir, Sr. Deputado, podem ser criadas. Até há uma fundação luso-africana para a cultura, e outras que tais! Mas envolver a Assembleia da República numa iniciativa destas, do PS, alargando competências inaceitáveis à Assembleia da República, creio que se pode considerar um equívoco, Sr. Deputado!

(O Orador reviu.)

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, as questões que me colocou, que agradeço, creio terem a ver sobretudo com dois tipos de problemas que focalizou no projecto de lei que o PS apresentou.
O primeiro releva dos objectivos contidos no próprio projecto de lei. Na leitura que fez, a título exemplificativo, refere a alínea b) do artigo 2.º «A formação política e cívica de acordo com os princípios ordenadores do Estado de Direito;». Sobre isto, na minha intervenção, creio ter ficado clara a expressão que usei, e sublinho: «causará algum embaraço a definição alargada dos objectivos e competências contidos no projecto». E disse-o para reafirmar, em nome do PS, a esta Câmara, que creio todos termos consciência de uma coisa quando discutimos projectos desta natureza: é que não é fácil - e todos temos de fazer um esforço nesse sentido - procurar e encontrar as boas fronteiras daquilo que deve ser a cooperação decidida e assumida aqui, na vertente parlamentar, a cooperação interparlamentar, e outras cooperações no âmbito da própria política do Governo ou de outro tipo de instituições. Sei que não é fácil, ou, melhor, é uma tarefa para a qual todos devemos seriamente contribuir com vista a estabelecer esse tipo de fronteiras.
Julgo ter deixado claro na minha intervenção que, da parte do PS, no seu próprio projecto e na forma como o defendeu perante a Câmara - dito e afirmado com vontade política séria -, há aqui uma disponibilidade grande para, ao nível dos objectivos e dos contornos a definir na intervenção na área da cooperação interparlamentar, encontrar uma solução que faça com que a intervenção da Assembleia da República e este tipo de cooperação se contenha nos seus respectivos e próprios limites. Aliás, se o Sr. Deputado quiser chamar a esta questão ou a este enunciado um defeito, ele também decorre do outro projecto: se ambos têm esse defeito, temos de ponderar sobre ele ou sobre a extensão dos objectivos que, num e noutro, nos é proposta, no sentido de encontrar e definir os seus rigorosos limites.
Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, quanto à segunda questão que me colocou direi o seguinte: no projecto do PS é proposto um modelo de funcionamento no sistema parlamentar deste quadro de cooperação. Trata-se apenas de um modelo, e se me perguntar se aqui e ali é sujeito a alteração, eu dir-lhe-ei com clareza que é, obviamente, sujeito a alteração. Poderão, com muito à-vontade e com muita disponibilidade, ser feitas alterações a algumas das propostas contidas no modelo que o PS apresenta. Não há, sobre isso, nenhuma questão. O que há, de essencial, no objectivo e no espírito da proposta do PS, é que seja possível encontrar um espaço de cooperação interparlamentar onde as forças partidárias se coloquem em igualdade de circunstâncias porque é essa a forma como melhor contribuiremos para demonstrar aos nossos países irmãos de língua oficial portuguesa que estamos disponíveis para com eles trabalhar em termos de países livres, em termos de países democráticos, onde o pluripartidarismo é um valor e um bem essencial a defender.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Laurentino Dias, não posso deixar de estranhar, em qualquer circunstância, aquilo que ouvi o Sr. Deputado dizer do alto daquela tribuna quando leu o seu discurso. Posso até admitir que o discurso estivesse feito já há alguns dias, mas o que é certo é que foi clarificado durante o dia de ontem - durante o dia de hoje, de resto, a comunicação social fez eco disso - e o Sr. Deputado, seguramente, não está desatento a estas questões.
O Sr. Deputado recordar-se-á, quando da discussão do Orçamento do Estado nesta Casa, de uma proposta do PSD para inclusão de um artigo expresso a prever a orçamentação na Assembleia da República de um fundo para a cooperação com os países africanos de língua oficial portuguesa. E aconteceu que o PSD, por entender que esta matéria é suprapartidária, diligenciou junto das bancadas de todos os partidos e do Governo, que também participa, como sabe, no debate do Orçamento do Estado, no sentido de encontrar uma solução em que todos nos pudéssemos rever. Essa solução acabou por surgir, consta do Orçamento do Estado - é o artigo 78.º , que foi votado nesta Câmara por unanimidade, e onde claramente se diz que se inscreve no orçamento da Assembleia da República uma dotação específica para cooperação com países de língua oficial portuguesa, promovida por associações e fundações portuguesas, existentes ou a criar. Já nessa altura o entendimento entre todos os partidos foi de que não poderia ser a Assembleia da República, directamente, a diligenciar acções de cooperação, pelos problemas constitucionais que isto envolve, mas uma entidade estranha à Assembleia, uma entidade juridicamente diferente. Foi nesse espírito que foi aprovado o artigo 78.º, que está em vigor, e foi nesse espírito que o Partido Social Democra-

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ta, na sequência da aprovação do Orçamento do Estado, formulou o actual projecto de lei que está hoje aqui em discussão.
Aliás, o nosso projecto, que o Sr. Deputado, do alto daquela tribuna, se esforçou por juridicamente pôr em causa, não é nada mais e nada menos do que tirado «a papel químico» da Fundação Luso-Americana, que é uma instituição que existe há doze anos na ordem jurídica portuguesa, sem polémica nem controvérsia de ninguém, nem nunca suscitada por ninguém, de resto aprovada por um governo presidido pelo Dr. Mário Soares e cujo Ministro dos Negócios Estrangeiros era o Dr. Jaime Gama, também actualmente Ministro dos Negócios Estrangeiros. Portanto, seguramente que o Sr. Deputado, do alto daquela tribuna, não estava a pôr em causa a jurisdicidade e a conformação à ordem jurídica da Fundação Luso-Americana que tem, exactamente, palavra por palavra, o mesmo regime jurídico que tem a fundação agora proposta pelo PSD.
Ultima questão: não sei se o Sr. Deputado esteve pessoalmente envolvido, pela parte da sua bancada, nas negociações que houve entre todas as bancadas para se aprovar o artigo 78.º do Orçamento do Estado. Inicialmente, o PSD tinha proposto a definição exacta de uma verba, de um montante, e foi por solicitação do Governo e por entendimento de todos que não se colocou uma verba exacta no Orçamento do Estado, ficando, depois de se criar a fundação, de ser esta Assembleia a decidir qual seria o montante a atribuir para o funcionamento e o património.
Sr. Deputado, o Partido Social Democrata cumpriu escrupulosamente aquilo a que se comprometeu com os, outros partidos. Se a sua bancada, neste momento, tem dúvidas relativamente àquilo que acordou, ao acordo a que chegou com as outras bancadas, nomeadamente connosco, se tem dúvidas quanto ao objectivo a que se tinha vinculado connosco e com todas as bancadas desta Câmara, diga-o expressamente, não arranje artifícios jurídicos que não têm qualquer fundamento e que põem em causa coisas que estão em vigência e com bastante sucesso na sociedade portuguesa, pelo menos há doze anos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, na sequência do que acabou de dizer, quase que me apetecia fazer-lhe uma pergunta para iniciar a minha tentativa de esclarecimento.
Já que isso foi assim, pode dizer-me quem é que suscitou ao PSD o encargo de preparar, de estudar, de trabalhar, de marcar a conferência de imprensa e de apresentar o projecto da Fundação Democracia e Liberdade?

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Bem perguntado!

O Orador: - Já que isso foi assim, Sr. Deputado Luís Marques Guedes...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A iniciativa é nossa desde o princípio, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Deputado, não vamos aqui fazer o relato ou a crónica do que se passou nessa matéria em sede de Orçamento do Estado. E não vamos fazê-lo porque a informação que tenho não coincide, rigorosamente, com a que me deu e, como sabe, nestas matérias pequenas diferenças traduzem-se, no fim, em diferentes resultados.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - E o texto do Orçamento?

O Orador: - O texto não existe, foi retirado, Sr. Deputado. O texto das propostas que o PSD apresentou foi depois retirado.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Está no artigo 78.º

O Orador: - Muito bem, vamos ao artigo 78.º.
Sr. Deputado, a questão não está na existência, no Orçamento do Estado, de verbas para a cooperação. A questão está - e ouviram-me há pouco dizê-lo, com alguma clareza - num modelo - e já nem digo na forma, já nem digo no estilo, já nem digo nos termos - que o PSD apresentou como solução para incluir na actividade parlamentar, ou fazer introduzir institucionalmente no âmbito interparlamentar, actividades como a da cooperação. Foi isso o que eu disse da tribuna.
Se o que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes diz é verdade, se este projecto de estatutos é igual ao da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, que seja. Agora, se calhar, os objectivos da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento em sede de cooperação, por exemplo, terão de ser necessariamente muito diferentes daqueles que serão os objectivos em sede de cooperação interparlamentar a levar a cabo por nós todos. Com certeza que serão, não tenho sobre isso qualquer dúvida, e o senhor também não terá.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O senhor falou foi do modelo jurídico.

O Orador: - Para terminar, quero só dizer-lhe o seguinte: não estão aqui em causa artifícios jurídicos...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Foi o que eu ouvi!

O Orador: - ...para inviabilizar a proposta do PSD, o que está em causa é responder. como deve responder-se, em sede parlamentar, a uma proposta que, no nosso entender, não serve. E eu registei e li, com certeza, as anotações que o Sr. Presidente da Assembleia fez no despacho de admissão em relação tanto à vossa como à nossa proposta e, obviamente, o Grupo Parlamentar do PS tomou em conta essas preocupações e, se reparou, elas foram retratadas na própria intervenção que aqui fiz.
Agora, deixemo-nos de artifícios jurídicos...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ah! Sempre são artifícios!

O Orador: - ... e passemos para uma questão concreta: penso que o projecto de lei do PS, em contraponto com o vosso, tem uma grande virtualidade que é a de situar esta questão e esta solução em sede parlamentar e permitir que a todos nós seja lícito - e que seja também uma obrigação - procurar uma solução que se adeque à discussão dos objectivos de cooperação.

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.

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O Orador: - Ora, penso que isso é traduzível no projecto de lei do PS, como penso que isso é defensável por via do nosso projecto.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Laurentino Dias, em relação à questão dos projectos - preferiria não tratar a questão enquanto pedido de esclarecimento -, constatei que o Sr. Deputado centrou toda a sua intervenção na defesa do projecto do Partido Socialista em torno do interesse da cooperação interparlamentar e dos benefícios que dela advêm. Estou de acordo em que há benefícios nessa cooperação, aliás interrogo-o se, no seu entendimento, não há, neste momento, e de há muito, uma cooperação interparlamentar já em curso, que deu frutos sem ter de recorrer a esta solução. Mas a pergunta que lhe faço é muito concreta. O Sr. Deputado falou da importância da cooperação, do convívio das diferentes famílias políticas, da igualdade de circunstâncias dos diferentes partidos perante ela e o vosso projecto de lei, ele próprio, curiosamente, no artigo 3.º, relativo à credenciação, define qual é o vosso conceito de convívio. É que, independentemente daquilo que é hoje o Regimento da Assembleia da República, o que os senhores propõem no artigo 3.º, n.º 3, é, desde já, uma selecção, uma filtragem e uma arrumação entre partidos de primeira e partidos de segunda, pelo que só poderiam permitir-se credenciar projectos aqueles cujo número mínimo de Deputados fosse de 10, ficando os outros excluídos. Portanto, Sr. Deputado, que sentido têm as suas palavras perante este artigo?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, as minhas palavras e a defesa que fiz do projecto de lei do PS mantêm, obviamente, o seu sentido se eu lhe disser que o número do artigo que a Sr.ª Deputada referiu - e com razão - é meramente instrumental, e se lhe disser, com grande à vontade, que, necessariamente, essa é uma das áreas do nosso projecto de lei que deverá suscitar entre nós uma discussão clara e a assunção de alterações com alguma profundidade.
Como tive oportunidade de dizer na resposta ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, uma das grandes virtualidades do projecto, ou destas acções ao nível interparlamentar, é justamente o facto de, no âmbito da cooperação interparlamentar, tal como nós a entendemos, o pluripartidarismo que esta Assembleia significa poder estar presente, na sua essência, no âmbito da cooperação, e permitir com isso que todos, em pé de igualdade, possamos estar nessa cooperação interparlamentar com os países nossos amigos de língua oficial portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Encarnação pede a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - É só para me inscrever, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero exprimir uma ideia fortemente positiva por ver todos os grupos parlamentares desta Assembleia da República preocupados com a intensificação da cooperação. Isso, em si, é um valor positivo para esta Assembleia da República, que nos permite tentar encontrar, como é nossa obrigação, a melhor maneira de concretizar essas ideias.
Srs. Deputados, gostava de chamar a vossa atenção para o facto de a Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação ter recebido, há dias, a Comissão Internacional de Apreciação da Cooperação. Nesse encontro estiveram representados todos os grupos parlamentares e certamente todos os Srs. Deputados terão conhecimento das observações que foram feitas.
De um modo geral, diria que a Portugal não falta mais cooperação a nível oficial - estamos entre os países com maior número percentual de cooperação oficial -, mas o nosso país está num défice escandaloso e grave de cooperação a nível das organizações não governamentais.

A Sr.ª Maria Carrilho (PS): - Tem razão.

O Orador: - Portanto, Srs. Deputados, corremos um risco, que é bom não esquecermos, quando tratamos desta questão: o de separarmos a sociedade civil da organização do Estado no que diz respeito à cooperação. E convém não esquecermos que a cooperação é um acto fundamentalmente da sociedade civil e não um acto do Estado. A este compete orientar, enquadrar e incentivar a cooperação pelo lado da sociedade civil, mas são as empresas, são os agentes criadores de riqueza que podem cooperar verdadeiramente com o desenvolvimento e com o estabelecimento de condições de vida cada dia melhores nos países nossos irmãos da CPLP.
Se é assim, diria que seria bom que esta Assembleia se debruçasse sobre todas as formas possíveis de intensificar a cooperação da sociedade civil e que tenha uma preocupação fundamental: falamos muito do direito à dignidade de cada um dos países da CPLP, mas convém não esquecer que esse direito à dignidade tem de se consubstanciar através de uma clareza meridiana dos instrumentos de cooperação. É preciso que saibamos bem que cooperação não é compra, não é influência política desajustada e ilegítima, mas sim um acto de solidariedade, de identidade e de desejo de desenvolvimento.
Daí que eu veja no projecto de lei do Partido Social Democrata, com todo o respeito que ele me merece, defeitos que me parecem incontornáveis. Por exemplo, o próprio nome dado à fundação... Há direitos adquiridos por registo neste país. Democracia e liberdade são direitos adquiridos por uma instituição que deve merecer o respeito de todos nós, e certamente merece. Daí que o nome nunca poderia ser esse. Mas essa é uma questão de somenos, não é esse o problema importante.
Importante para mim é não se entender bem se esta fundação «é ainda Assembleia ou já não é Assembleia», é saber qual é a estabilidade desta fundação com os vários cenários possíveis numa democracia multipartidária como é a nossa.
Chamo a atenção dos Srs. Deputados para o facto de, dos três órgãos constitutivos da fundação proposta, só no conselho consultivo estar representada a totalidade dos

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partidos com assento na Assembleia da República. Eles não estão, nem poderão estar, no conselho executivo; não estão, e nada indica que devam estar, no conselho directivo.
O que acontecerá com esta cooperação, aos nossos olhos e aos dos países com os quais queremos cooperar, numa situação de maioria absoluta nesta Assembleia, que pode existir a favor de qualquer partido? Qual é o risco que virá, em termos de falta de transparência, de uma cooperação que pode, no limite, ser recusada, em nome do direito à dignidade dos países com os quais queremos cooperar?
Srs. Deputados, creio que estas não são reflexões de somenos mas, sim, preocupações que devemos ter.
Não é minha atribuição intervir na apreciação do projecto de lei apresentado pelo PS, mas muitas das observações que aqui faço são igualmente válidas para essa iniciativa legislativa. Só que - e quero assinalar isto - o PS declarou aqui total abertura para que em comissão possamos encontrar os instrumentos adequados a colmatar o que nos é proposto. Recordo-vos que nos foi proposta, há poucos dias, a ausência quase total de cooperação das ONG, e, porque estou envolvido profunda e diariamente em problemas de cooperação, quero que os Srs. Deputados percebam o que estou a dizer: a ausência de capacidade financeira das ONG significa que, todos os anos, milhares de estudantes universitários que queiram oferecer as suas férias em trabalho voluntário e gratuito para o desenvolvimento dos países africanos não o poderão fazer porque Portugal não encontrou os caminhos para cativar os Financiamentos internacionais nem para ter financiamentos próprios à sua disposição.
Este é o problema que condiciona o futuro. É por ele que somos responsáveis e é para ele que teremos de encontrar uma solução.
Srs. Deputados, tendo a consciência viva do que nos é pedido e das complicações ou confusões que podemos gerar, a minha bancada não poderá dar apreciação positiva ao projecto de lei apresentado pelo PSD. E isto nada tem a ver com a consideração que nos merece o facto de o PSD ter sido o primeiro a apresentar um projecto de lei para intensificar a cooperação.
Antes de terminar, gostaria de dizer que nada me leva a pensar, como vi há pouco nos meios de informação, que esta Fundação Democracia e Liberdade esteja relacionada com Timor. Li e reli os seus estatutos e nada lá se refere a Timor. Portanto, não penso que ela apareça como resposta ao problema, que nos foi colocado aquando da discussão do Orçamento do Estado, sobre a forma de apoiar ou não acções de cooperação com Timor.
A segunda observação que gostaria de fazer é a seguinte: creio que qualquer fundação deste tipo, ou qualquer instituição de cooperação com os países africanos de língua portuguesa, não tem semelhanças de qualquer natureza com a Fundação Luso-Americana.

A Sr.ª Maria Carrilho (PS): - Exactamente!

O Orador: - Desde logo, porque a Fundação Luso-Americana é financiada de uma maneira preponderante e determinante pelos próprios Estados Unidos da América. Depois, porque não me parece que esteja em risco, a não ser para nós, qualquer vício de cooperação com os Estados Unidos da América. Certamente, não constituiremos ameaça, por qualquer desvio nosso, em relação aos Estados Unidos da América. Não direi que o inverso não possa ocorrer, mas o que referi, certamente, não ocorre.
Por isso, não pode verificar-se na Fundação Luso-Americana o que poderá verificar-se aqui. Uma fundação criada pela Assembleia da República, com o seu financiamento inicial feito pelo Orçamento do Estado e por contribuições da Assembleia da República, não é, de maneira alguma, um convite para que instituições privadas vão aí juntar o seu dinheiro. Diria mesmo o contrário: é um convite para não o fazerem: Pela experiência que tenho, não duvido de que não o farão.
São estas as razões pelas quais não podemos dar aprovação a este projecto de lei.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Azevedo Soares.

O Sr. Azevedo Soares (PSD): - Sr. Presidente. Sr. Deputado Nuno Abecasis, estamos há largos minutos a discutir dois projectos: um deles tem cabeça, tronco e membros, e propõe a criação de uma fundação com contornos bem definidos; o outro é um projecto apressado, com cinco artigos, ostensivamente inconstitucional, apresentado pelo PS, sobre a mesma matéria.
O Sr. Deputado Nuno Abecasis acabou de anunciar que não podia apreciar positivamente o projecto apresentado pelo PSD. Não esclareceu qual seria a posição do seu partido em relação ao projecto do PS, embora eu tenha deduzido das suas palavras que lhe agrada mais a versão do PS do que a do PSD.
No fundo, a minha dúvida é a de perceber em concreto, sob o ponto de vista político e não através de dúvidas sobre futuras consequências perigosas que possa ter o facto de haver ou não maioria absoluta nesta Câmara ou de outras dúvidas de natureza jurídica, qual é a razão de fundo que leva o seu partido a dizer «não», ou pelo menos a abster-se, em relação a uma fundação com objectivos bem definidos e, aparentemente, a dizer «sim» a um projecto que mais não é do que uma tentativa de envolver esta Câmara em responsabilidades que, efectivamente, não lhe competem.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis. Informo-o de que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista lhe concedeu 3 minutos, ficando, portanto, com 4 minutos. No entanto, na resposta, apenas pode utilizar 3 minutos.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Azevedo Soares, a minha colega Maria José Nogueira Pinto irá fazer uma intervenção., por isso deixo-lhe o cuidado de responder à questão que me colocou.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos interromper o debate destes projectos de lei para procedermos às votações agendadas para hoje.
No entanto, antes de as iniciarmos, informo que o Sr. Presidente da República dirigiu a esta Assembleia a seguinte mensagem:
«Como é do conhecimento de V. Ex.ª, fui convidado pelo Presidente José Eduardo dos Santos para estar presente no acto da cerimónia de posse do Governo de Unidade e Reconciliação Nacional daquele país.
Como é igualmente do conhecimento de V. Ex.ª, a data daquela cerimónia ainda não se encontra definitivamente

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fixada, tudo indicando, contudo, que venha a ter lugar no período entre os dias 20 a 24 do corrente mês.
Face ao que precede, venho requerer, nos termos dos artigos 132.º, n.º 1, e 166.º, alínea b), da Constituição da República, o necessário assentimento da Assembleia da República para uma deslocação à República de Angola, que deverá ocorrer no período compreendido entre os dias 18 e 26 do corrente mês de Março, deslocação essa que não deverá exceder três dias.»
Srs. Deputados, em virtude desta mensagem, a 2.ª Comissão, competente para se pronunciar sobre o assunto, emitiu o seguinte parecer: «A Assembleia da República, de acordo com as disposições constitucionais aplicáveis, dá o
assentimento nos precisos termos em que é requerido».
Vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Agora, sim, vamos proceder às votações previstas para hoje.
Começamos pela votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 57/VII - Autoriza o Governo a legislar em matéria de direitos de autor e direitos conexos.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PSD.

Esta proposta de lei baixa à 1.ª Comissão.
Passamos agora à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 64/VII - Regula o disposto no artigo 82.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PSD.

Esta proposta de lei baixa também à 1.ª Comissão.
Vamos proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 68/VII - Estabelece o regime jurídico comum das associações de municípios de direito público.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes e votos contra do CDS-PP.

Também esta proposta de lei baixa à 1.º Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 112/VII - Organização e quadros de pessoal das associações de municípios (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes e votos contra do CDS-PP.

Solicito aos Srs. Deputados que, de futuro, quando forem chamados para procedermos às votações, se apressem a vir ao Plenário e não entrem durante as votações, sob pena de ter de interditar a entrada no Hemiciclo no momento em que se está a proceder a uma votação. Neste caso não tem relevo, porque não está em causa o resultado da votação, mas, normalmente, é bom que se respeite essa regra fundamental.
O projecto de lei que acabámos de votar baixa à 4.ªComissão.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, esta interpelação é motivada pela baixa à comissão destes diplomas para efeitos de discussão na especialidade.
Parece haver toda a vantagem em que os diplomas sobre esta matéria baixem à mesma comissão, ou a 1.ª ou a 4.ª Como há mais iniciativas relativas ao regime jurídico das associações de municípios, admitimos que o consenso da Câmara aponte para a baixa à 1ª Comissão, mas, então, faria sentido que todas as iniciativas sobre a mesma matéria baixassem à 1.ª Comissão, até porque podem resultar - não digo que necessariamente, mas isso pode acontecer - num texto legislativo comum.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não serei a favor nem contra essa proposta, pois quem manda são os Srs. Deputados, simplesmente, faço-lhe notar que estas iniciativas legislativas vêm da 4.ª Comissão e, assim sendo, o natural é que voltem à comissão que fez o relatório, onde já foram apreciadas, sob pena de se inutilizar essa primeira fase dos trabalhos. Parece-me que tem mais lógica que vão para a comissão de onde vieram.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, concordo com o que acabou de dizer, só que, neste caso concreto, inicialmente este projecto de lei do PCP baixou apenas à 4.ª Comissão enquanto que a proposta de lei que votámos anteriormente baixou às 1.ª e 4.ª Comissões.
Deste modo, creio que o melhor seria regermo-nos pelo denominador comum. É esta a proposta que faço.

O Sr. Presidente: - Propõe então que baixem todos à 4.ª Comissão?

O Orador: - Sim, que baixem todos à 4.ª Comissão, eventualmente. Um para cada lado é que não faz sentido.

O Sr. Presidente: - Se houver consenso nesse sentido, não tenho qualquer objecção. Todos estão de acordo em que os projectos e propostas de lei sobre esta matéria baixem à 4.ª Comissão?

Pausa.

Então, assim se fará, e fica registado.

Vamos agora votar, também na generalidade, o projecto de lei n.º 286/VII - Alterações ao Decreto-Lei n.º 412/89, de 29 de Novembro (Estabelece o regime jurídico das associações de municípios) (CDS-PP).

Submetido à votarão, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP e de Os Verdes e votos a favor do PSD e do CDS-PP.
Srs. Deputados, passamos à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 249/VII - Criação do Museu do Douro (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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Vamos agora votar, também na generalidade, o projecto de lei n.º 287/VII - Criação do Museu da Região do Douro (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, estes dois diplomas baixam à 6.ª Comissão.
Passamos agora à votação final global do texto, apresentado pela Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, relativo ao projecto de lei n.º165/VII - Cria o Observatório dos Mercados Agrícolas e das Importações Agro-Alimentares (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor PS, do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

Vamos proceder à votação final global da proposta de lei n.º 69/VII - Revisão da 2.ª Lei de Programação Militar (Lei n.º 67/93, de 31 de Agosto).

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do CDS-PP, votos contra de Os Verdes e abstenções do PSD e do PCP.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai agora dar conta de vários pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que serão votados após a respectiva leitura.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal de Círculo e de Comarca de Vila Real, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP) a prestar depoimento, por escrito, na qualidade de testemunha, no processo n.º 2/96, que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Benavente, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Francisco José Martins (PSD) a prestar depoimento, por escrito, na qualidade de testemunha, no processo n.º 538/91, que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca do Cartaxo, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Francisco José

Martins (PSD) a prestar depoimento, por escrito, na qualidade de testemunha, no processo n.º 201/96, que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Criminal da Comarca de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Miguel Macedo (PSD) a prestar depoimento (por escrito, querendo), na qualidade de testemunha, no processo n.º 5558/95.1 TD, que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real de Santo António, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado António Vairinhos (PSD) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, em audiência marcada para o dia 14 de Abril de 1997, respeitante ao processo n.º 70/95-AO, que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Álvaro Amaro (PSD) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, no processo n.º 8024/94.3TDLSB - 1.º Juízo Criminal, que se encontra pendente naquele tribunal (junta-se a declaração escrita, que deve ser enviada pela Assembleia da República ao tribunal em causa).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Junqueiro (PS) a prestar depoimento, na qualidade de testemunha, cm audiência marcada para o dia 14 de Maio de 1997, respeitante ao processo n.º 639/96-CS - 1.º Juízo Criminal, que se encontra pendente naquele tribunal.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos retomar o debate sobre os projectos de lei n.os 252/VII (PSD) e 289/VII (PS), atrás identificados.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs, e Srs. Deputados: Relativamente aos dois projectos de lei em discussão, um e outro apresentados a pretexto de enraizar aquilo que é hoje a cooperação com os países de língua portuguesa, gostaríamos de fazer uma primeira observação. É para nós inquestionável o interesse e a necessidade de enraizar a cooperação com os países de língua portuguesa. Porém, é preciso fazê-lo em domínios que, ao longo destes anos, têm estado ausentes da cooperação. Ou seja, é nosso entendimento que por demais se enfatizaram aspectos ligados à defesa, ao apoio em termos que tinham a ver, provavelmente e também, com os acontecimentos que se viviam em alguns desses países de língua portuguesa, mas parece-nos de todo o interesse, necessidade e urgência enraizar a cooperação em novas áreas e domínios, como os do saneamento básico, do ambiente, da construção civil, do ensino, da saúde e da defesa e promoção da língua.
Mas se esta é para nós uma questão pacífica, não oferecendo qualquer dúvida, já nos parece profundamente duvidoso que as vias propostas permitam enraizar essa cooperação.
De facto, o PSD propõe, através de uma fundação, uma bizarra forma de cooperação, em relação à qual nem tão-pouco são avançados os meios de a fazer - portanto, uma cooperação através de uma fundação sem património, pelo que estaríamos esvaziados de conteúdo e perante uma cooperação que não passaria de uma carta de intenções - e o próprio PS parece-nos que sustenta incorrectamente aquilo que é a via de aprofundar o que já hoje se começa a fazer em termos de cooperação interparlamentar.
Assim, numa perspectiva de não desperdício e de enfatizar aquilo que para nós não pode ser circunscrito a maiorias conjunturais ou a dados de circunstância, mas deve constituir uma prioridade do Estado português, complementada com um papel e um apoio cada vez maior às organizações não governamentais e aos movimentos sociais, entendemos que nem um nem outro destes projectos caminha neste sentido.
Para nós, aquilo que faz sentido é: utilizar as estruturas existentes c dotá-las de meios humanos, técnicos e financeiros, que permitam dar conteúdo e alargar a outras áreas a cooperação com os países de língua portuguesa; dar conteúdo à, recentemente criada e hoje manifestamente parada e congelada, Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e questionar o que é que o próprio Instituto da Cooperação Portuguesa tem feito e que outros meios devem ser criados para dar sentido e conteúdo às razões que lhe estiveram na origem.
Nada disto tendo sido feito, parece-nos que ambos os projectos de lei são dispensáveis, pelo que o Partido Ecologista Os Verdes não os irá votar favoravelmente.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As relações entre Portugal e os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa atravessam um momento de certo dinamismo motivado pela criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), cudos objectivos gerais se referem à concertação político-diplomática entre os seus membros nas relações internacionais, nomeadamente para o reforço da sua presença nos fora internacionais, a cooperação, particularmente nos domínios económico, social, cultural, jurídico e técnico-científico, e a materialização de projectos de promoção e difusão da língua portuguesa.
A declaração constitutiva da CPLP enumera, como um dos objectivos a prosseguir pela Comunidade, o estímulo ao desenvolvimento de acções de cooperação interparlamentar, tendo sido encarada, em reunião dos ministros de Negócios Estrangeiros e de Relações Exteriores, a eventual criação do Parlamento dos Países de Língua Portuguesa ou, consideradas as dificuldades para a criação de um Parlamento desse tipo, foi sugerida que, numa fase inicial, se enveredasse por uma cooperação entre comissões parlamentares dos sete países.
Nesse contexto, o actual Presidente da Assembleia da República, Almeida Santos, propôs a realização de uma Conferência Interparlamentar entre delegações desses países, que, efectivamente, se viria a concretizar em Junho do ano passado. Nas suas conclusões, a Conferência sublinhou a especial vocação dos Parlamentos nacionais para acompanharem a actividade dos respectivos governos, no que diz respeito à concretização dos objectivos da CPLP, apelou à intensificação da cooperação interparlamentar, quer a nível multilateral quer bilateral, com vista à troca de experiências e ao intercâmbio legislativo e de publicações, de forma a que seja possível uma eficaz cooperação técnica entre os diferentes Parlamentos e deliberou, ainda, promover jornadas parlamentares de periodicidade regular.
A verdade c que algumas destas intenções têm sido postas em prática pela Assembleia da República, como se pode comprovar pela recente estadia entre nós de uma ampla delegação guineense que, durante vários dias, tudo viu e acompanhou, e pela deslocação à Guiné de uma qualificada funcionária parlamentar portuguesa. E, na semana passada, o Sr. Presidente Almeida Santos chefiou uma delegação a Cabo Verde, onde assinou um aditamento ao acordo de cooperação existente entre os dois Parlamentos, tendo sido tomadas imediatamente decisões, no sentido de se ampliar a cooperação mútua com actos concretos. Outros acordos similares vão ser subscritos com os restantes Parlamentos e é intenção propor-se a realização do primeiro Fórum Parlamentar, em data próxima e num país a determinar. Estamos, por isso, num caminho adequado à cooperação parlamentar que se deseja eficaz.
Ora, é neste quadro que somos confrontados com a apresentação de um projecto de lei do PSD, que tem por finalidade promover a cooperação científica, técnica, educativa e cultural - objectivos estes que, como já vimos, constam da Declaração Constitutiva da CPLP e que será obrigação dos respectivos governos implementarem - e também iniciativas de intercâmbio e de cooperação político-parlamentar, que estão em curso, não necessitando - e mal seria se assim acontecesse - de uma qual-

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quer fundação para provocar iniciativas que só à Assembleia da República e aos respectivos Parlamentos competem.
Seria, se fosse aprovada, uma fundação sem património próprio, partidarizada, instituída pela Assembleia da República e que iria colidir claramente com actuações da esfera governamental e parlamentar. Recorde-se que existe, ainda, o Instituto da Cooperação Portuguesa que actua neste domínio.
É evidente que quem quiser, respeitando as normas legais existentes, pode criar as fundações que entender. Contudo, envolver directamente o Parlamento Português e os partidos políticos, obrigar à inscrição de verbas no Orçamento de Estado para uma fundação criada sem qualquer património só pode ser considerada como um equívoco, com intenções ainda por aclarar convenientemente.
A propósito de Orçamento do Estado, ao contrário do que foi afirmado pelo PSD, nomeadamente pelo Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, não é verdade que a Assembleia da República tenha aprovado uma cláusula que vise apoiar uma fundação deste tipo. Foi apresentada uma proposta, que veio a ser posteriormente retirada. O que se aprovou, por unanimidade, foi uma proposta que visa a cooperação parlamentar.
Surpreendente também não deixa de ser o projecto socialista, que prevê dotar a Assembleia da República de novas competências, como a de promotora de acções de cooperação extraparlamentar. Ora, um dos objectivos constantes do projecto que mais apreensão nos causa é o da formação política e cívica, cultural e associativa, de acordo, como se diz, com os princípios do Estado de Direito! Então, a Assembleia da República vai formar politicamente quem? Os países independentes e livres com os quais temos relações? Os seus dirigentes? Os seus partidos ou associações? E formar civicamente o quê, quem e como, Srs. Deputados socialistas?
Há limites que não podem, em circunstância alguma, ser ultrapassados. A Assembleia da República não deve ser comprometida com tais objectivos que, em última análise, apesar das intenções, podem ser considerados, por países com quem temos boas relações, desagradáveis ou mesmo de intromissão nos seus assuntos internos.
A iniciativa dos socialistas, se alguma vez fosse aprovada, transformaria ainda a Assembleia da República num verdadeiro escritório de acolhimento de candidaturas, de projectos ou programas de cooperação diversa, dotando o Conselho de Administração, que é constituído por Deputados e por um representante dos trabalhadores, de competências para apreciar e aprovar essas candidaturas, os diversos programas, projectos de acção e dossiers de execução e apreciação dos comprovativos das despesas! Há um exagero evidente nesta proposta.
Um outro aspecto no projecto de lei do Grupo Parlamentar do Partido Socialista que podemos considerar como, pelo menos, curioso refere-se à possibilidade de cada partido político que. detenha um grupo parlamentar poder credenciar, por cada 10 Deputados, uma entidade para apresentação de candidaturas à tal cooperação! Este é um problema para que chamamos particularmente a atenção dos Srs. Deputados.
Mas há mais: também se propõe que a dotação financeira global tem de ser inscrita anualmente no orçamento da Assembleia da República, sendo pelo seu Conselho de Administração, graduada proporcionalmente à representação parlamentar. E grave e não aceitável tal proposta. As competências seriam atribuídas, não só à Assembleia da República, mas também aos grupos parlamentares...
Tal financiamento pode incluir a previsão das despesas, como a monitoragem, a consultadoria, o suporte à realização concreta das acções, incluindo deslocações, alimentação, alojamento dos participantes e, ainda, as despesas com equipamentos e material de apoio técnico e logístico, a título permanente ou perecível! Creio, Srs. Deputados, que se trata de uma regulamentação que a Assembleia da República não pode, nem deve, de forma alguma, sustentar.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Boa tarefa aguardaria o Presidente do Conselho de Administração e os seus colegas Deputados de todas as bancadas!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Somos defensores de uma eficaz cooperação a todos os níveis com os países africanos de língua oficial portuguesa. Cooperação que sequer pujante, mas livre de tutelas e de tentativas de intromissão na vida interna de países independentes; cooperação parlamentar, na senda da que está a ser promovida pelo Presidente da Assembleia da República com o apoio unânime dos grupos parlamentares.
Somos defensores de uma cooperação cultural, técnica, científica, económica ou de outro tipo, respeitando sempre os acordos bilaterais já existentes e os multilaterais que venham a ser celebrados no âmbito da CPLP.
O que importa, Sr. Presidente, Srs. Deputados, é criar condições para que os objectivos e finalidades da CPLP ultrapassem alguns obstáculos, que sabemos existirem, para a sua concretização e não inventar processos políticos que podem vir a originar problemas à Assembleia da República, condições essas que possibilitem um regular relacionamento entre Estados, que todos devemos desejar que se processe de forma salutar e desinteressada, sem a criação de Fundações ou outras formas de cooperação partidarizadas, pouco credíveis, como a que são propostas e que não merecem, de forma alguma, o nosso apoio.

(O Orador reviu.)

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É por uma razão de consciência que, neste momento, faço uma intervenção, que quero breve, em relação a esta matéria, para tentar traçar um pouco da história do que esteve na base deste nosso projecto de lei e acabar, se possível, com algumas das controvérsias em que nos enredámos aqui, porque penso que o pior sinal e o pior espectáculo que podemos dar nesta Assembleia é digladiarmo-nos em relação a uma questão que deve unir todos os portugueses, todos os partidos e todas ás instituições portuguesas.
Portanto, não é com qualquer espírito de controvérsia nem de acrimónia em relação a quem quer que seja que ergo a minha voz nesta Sala e que falo deste assunto.
Gostaria de recordar que, depois da Conferência Interparlamentar realizada neste Parlamento, o Sr. Deputado Durão Barroso fez uma intervenção no Plenário que motivou o aplauso e o consenso de todas as bancadas. E o que é que dizia o Sr. Deputado Durão Barroso nessa altura? Dizia que entendia que devíamos apresentar um projecto de uma fundação que garantisse as condições para

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que fosse feita a cooperação entre os partidos com assento parlamentar com garantias de igualdade.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não foi outra coisa que, então, disse o Sr. Deputado Durão Barroso! Não foi outra coisa que nós, entretanto, plasmámos numa iniciativa legislativa! Não foi outra coisa que motivou, na altura, o aplauso de todas as bancadas deste hemiciclo.
Fizemos nós este projecto de lei sem cuidados? Não! Fizemos este projecto de lei com muito cuidado em relação às competências da Assembleia. Por isso, neste projecto de lei dissemos que ele se iria ocupar de outras matérias que não aquelas que acrescentassem qualquer coisa ou que melindrassem, de alguma forma, as competências da Assembleia.
Inovámos nós negativamente em relação ao modelo jurídico proposto para esta fundação? Não! Pois o que fomos buscar foi justamente o modelo jurídico de uma fundação, que - pasme-se! - é a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento. Diz-se no n.º 2 do artigo 4.º que «O património da Fundação será acrescido com futuras contribuições do Governo Português...», o que significa que, além das contribuições obtidas pela Fundação na cooperação com o Governo norte-americano, pode haver outras, que são absorvidas pelos dois interessados na criação desta Fundação para este objectivo. É evidente que a lei pode fazer isto e fê-lo e é natural que, para clareza do modelo que empregámos, tivéssemos sugerido um modelo absolutamente idêntico ao da Fundação Luso-Americana. No entanto, são verbas públicas e não verbas privadas que estiveram na sua origem.
É apenas com dinheiro público? Não! Poderiam vir contribuições da Assembleia da República, dos partidos ou dos privados que quisessem e pudessem financiar acções de cooperação, dentro deste domínio.
É isto concentração num partido, em vários ou no Governo? Não! Isto é justamente colocar todos os partidos em pé de igualdade numa fundação por eles gerida, com garantias de total independência e isenção, dando aos nossos parceiros em África o exemplo do que é vários partidos conjugados a fazerem acções de cooperação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É este o modelo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que queríamos «exportar». É ele um modelo condenável? Não! É um modelo salutar. É um modelo de convivência democrática. É um modelo que, em breves termos, realizaria aquilo que penso ser um desígnio nacional, um objectivo nacional, que não pode pertencer a um governo nem se pode esgotar num partido...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... e que tem de ser feito com garantias de igualdade, com garantias de liberdade e com garantias de independência.
Tem um nome, porventura, já registado, Sr. Deputado Nuno Abecasis? Não sei melhor maneira de celebrar um grande Deputado desta Casa, como foi Amaro da Costa! Mas se o problema é o nome, mude-se o nome, mas conserve-se aquilo que este nome tem e que nos une a todos: Democracia e Liberdade. Liberdade e Democracia são talvez das coisas, se não das únicas coisas, mais fundas que nos unem a todos, partidos e pessoas, nesta Casa. Por isso, sugerimos que estes dois termos estivessem no seu nome.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pode entender-se desta iniciativa que ela é feita contra alguém, contra a política do Governo? Mas como é que isso é possível? Será que os Srs. Secretários de Estado José Lamego e Pina Moura estão a jogar contra o Governo?! Será que estão eles a jogar contra si próprios quando, ao apoiarem a nossa iniciativa, dizem que ela é boa, deve ser saudada, deve ser apoiada?!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Bom, não compreendo, Srs. Deputados.
Disseram VV. Ex.as que esta iniciativa não foi cuidada, que aparece aqui sem sombra de origem de financiamento, que é uma iniciativa de uma fundação sem património. Então, não está escrito, no artigo 78.º da Lei do Orçamento do Estado: «... promovidos por associações e fundações portuguesas, existentes ou a criar»?! Então, isto não significa que houve um especial cuidado na redacção deste artigo, que a todos uniu, que por todos foi unanimemente votado e, portanto, por todos unanimemente reconhecido como necessário? Então, houve alguma hesitação da nossa parte, inconsideração, porventura? Não, Srs. Deputados! É um percurso claro aquele que seguimos em relação a esta iniciativa.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, custa-me muito ver aqui posições de princípio declaradas como posições contrárias a este texto. Que os Srs. Deputados digam que este texto pode ser corrigido, pode ser melhorado, pode ser trabalhado em comissão de modo a que possamos «fazer um grande «edifício» à volta desta nossa pequena iniciativa, com toda a certeza. Mas que o recusem, que digam que ele é quase ilícito, que ele é quase subversivo em relação ao que o Governo quererá da cooperação, acho que é um manifesto exagero e não tem sentido nesta Assembleia, não tem sentido nos dias de hoje.
A cooperação, Sr. Presidente e Srs. Deputados - e nós ainda há pouco tivemos disso um exemplo - ou e feita com um espírito de grande unidade nacional correspondente ao desejo dos países africanos de língua portuguesa ou, então, terá muito menos sentido.
É preciso que todos os portugueses se unam, que todos os partidos se unam, que a cooperação seja o nosso objectivo comum.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como os tempos estão praticamente esgotados, a Mesa vai conceder dois minutos ao Sr. Deputado Laurentino Dias e dois minutos ao Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca para pedirem esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Encarnação, que por sua vez vai dispor de quatro minutos para responder aos dois pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, pedi a palavra apenas para corresponder ao apelo de consciência e ao reavivar da história que o Sr. Deputado aqui nos quis trazer, nomeadamente, chamando à discussão uma intervenção do en-

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tão Deputado Durão Barroso no passado ano, a propósito da Conferência que aqui ocorreu e que, obviamente, tem a ver também com este projecto. Como fez o apelo à consciência e à história e como falou do percurso claro do PSD quanto a esta proposta, dir-lhe-ei que também li a intervenção do então Deputado Durão Barroso - se é que não o ouvi na altura, mas suponho que sim - que fez a defesa de uma fundação. Ou seja, disse que entendia que deveria apresentar-se ou propor-se a criação de uma fundação...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É isso mesmo!

O Orador: - ... e, instado depois pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, por sinal a esclarecer como é que essa proposta teria alguma tradução , respondeu (e permitam-me que o releia, por apego à consciência e à história): «... quanto à proposta que fiz, Sr. Deputado, ela obviamente foi muito genérica, porque a minha ideia e, portanto, a do PSD, pois também estou a falar em nome do PSD, não é a de vos servir qualquer modelo pré-concebido mas, pelo contrário, a de que surja uma proposta de consenso dos diferentes grupos parlamentares».
Alguém arrepiou caminho porque não foi seguida esta vontade que o então Sr. Deputado Durão Barroso aqui exprimiu no passado ano, quando dizia que gostaria - e nós também - que uma proposta desta natureza, antes de ser apresentada, antes de ser discutida, fosse objecto de aturadas conversações entre nós e de um consenso generalizado dos grupos parlamentares. O que é que mudou, Sr. Deputado Carlos Encarnação?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Laurentino Dias, fez bem este apelo à consciência porque realmente foi buscar um texto que consta dos arquivos desta Assembleia, em que se não diz mais do que aquilo que nós fizemos.
O que nós fizemos, Sr. Deputado Laurentino Dias, foi isto: elaborámos um projecto, enviámo-lo ao presidente de cada grupo parlamentar e suscitámos a concordância de cada um deles. Não fizemos nenhum anúncio público deste projecto sem, da parte dos presidentes dos grupos parlamentares, nos vir algum apoio, alguma concordância a esta ideia.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não percebi isso da parte dos grupos parlamentares!

O Orador: - Foi assim que fizemos e não de outra maneira! Tivemos depois uma palavra para com o Governo, explicando aquilo que quereríamos fazer e, do ponto de vista do Governo, tive oportunidade de, num debate na Rádio Renascença, com o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro, Pina Moura, trocar argumentos em relação a esta matéria e ele teve oportunidade de dar também, claramente, o apoio do Governo a esta iniciativa. Não quereria V. Ex.ª com certeza, que esta iniciativa ficasse em - banho-maria eternamente!... Avançámos com um texto!... Mas não é esta a forma de aprovar as leis nesta Assembleia?

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - Não temos nós a iniciativa de apresentar textos? Não têm VV. Ex.as iniciativa de trabalhar esses textos, alterá-los, arranjarmos um texto conjunto, de consenso? Não é esse o trabalho da Assembleia, Sr. Deputado? V. Ex.ª quer que um texto nasça do consenso antes de os Deputados trabalharem sobre ele? É esta a proposta que aqui deixamos, Sr. Deputado. Não é outra.
Se V. Ex.ª quiser juntar-se a todos nós e elaborar um bom texto de consenso, somos os primeiros a apoiá-lo.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Encarnação, vamos ver se nos entendemos.
Como é patente os dois projectos são maus e não nos custa reconhecer que o menos mau é o vosso, pois bem pior é o do Partido Socialista. Nenhum deles pode obter, de forma alguma, o nosso apoio.
Em relação ao que disse o Sr. Deputado Durão Barroso, a propósito da Conferência Interparlamentar, e como tive, há pouco, a oportunidade de desmentir o que foi afirmado pela Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo sobre a tal proposta aprovada no Orçamento do Estado, esclareço também esta questão a que o Sr. Deputado Laurentino Dias já se referiu. O Sr. Deputado Durão Barroso, na altura presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, referiu-se aqui, circunstancialmente, ao êxito da Conferência Interparlamentar. Todos os grupos parlamentares - eu próprio usei da palavra - se congratularam com isso, mas, a propósito dessa proposta de criar uma fundação, eu, vendo os seus perigos, interpelei-o claramente e as respostas foram dadas da forma que ouviu.
Em relação à FLAD, na Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação V. Ex.ª também argumentou com a FLAD e a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo também falou duas ou três vezes na Fundação Luso-Americana.
Tenho aqui, Sr. Deputado, um livrito - aliás tenho dois e, se quiser, terei gosto em ofereço-lhe um volume - sobre Fundações, nomeadamente sobre a Luso-Americana para o Desenvolvimento. Esta fundação foi criada pelo Estado português para o hipotético desenvolvimento de Portugal, Sr. Deputado, de colaboração com os Estados Unidos. Não foi criada por uma entidade portuguesa, visando a cooperação com outros países ou uma fundação partidarizada, atribuindo novas competências à Assembleia da República ou, neste caso, ao Governo. Não é isso, Sr. Deputado.
A Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento não é um bom exemplo, porque é um caso completamente diferente do projecto de lei que os senhores apresentam. Acentuo, uma vez mais, para terminar, que a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento não é partidarizada e não alarga competências a qualquer órgão de soberania. Ora, o vosso projecto de lei propõe-nas no que toca à Assembleia da República, nomeadamente através dos financiamentos que pretendem ver contemplados.

(O Orador reviu.)

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, francamente, não sei que mais lhe posso dizer em relação à Fundação

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Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD)... V. Ex.ª tem dois livros, mas tenho a impressão de que não os leu bem. Tenho aqui o diploma que foi publicado - e, quando quiser, terei todo o prazer em entregar-lho - e posso explicar-lhe o seguinte: o que estávamos a discutir era o modelo jurídico e esse, não há dúvida, tanto pode ser seguido pela FLAD como pode e deve ser seguido por uma fundação com estas características. A questão não está em saber em que território se aplica, onde se vai buscar o dinheiro, se aos Estados Unidos, a Portugal, a Angola, a Moçambique ou ao Brasil; tem a ver com o Financiamento feito por capitais públicos, por uma fundação criada de acordo com um figurino institucional, que é repetível, tal como aqui se encontra e se propõe no nosso projecto de lei.
A segunda questão que o Sr. Deputado coloca é que é muito mais bizarra, pois, querendo nós com isto estabelecer a igualdade entre todos os partidos políticos nas acções de cooperação e na gestão de uma fundação que seria de todos eles, V. Ex.ª vem dizer que esta fundação era partidarizada...

Risos do PSD.

É partidarizada por todos os partidos!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - É igualdade!

O Orador: - Mas o problema, Sr. Deputado, é que esta FLAD, então, é muito mais partidarizada. Sabe porquê? Porque todos os órgãos são nomeados pelos governos e, sendo os partidos que estão no poder os membros desses governos, nessa altura e nesse sentido, V. Ex.ª então, tem o contrário do que há pouco aqui queria explicar. Esta, sim, é uma fundação partidarizada, no sentido de que só o partido que está no Governo é que nomeia.
Aqui, era exactamente o contrário, Sr. Deputado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Fraca argumentação!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, vou limitar-me a comentar o projecto de lei apresentado pelo Partido Socialista, uma vez que o Sr. Deputado Nuno Abecasis já falou do projecto de lei apresentado pelo Partido Social Democrata.
De qualquer maneira, quero dizer que estamos aqui perante dois maus projectos de lei que, do nosso ponto de vista, interpretam muito mal o artigo 78.º da Lei do Orçamento do Estado. Enquanto que o conceito de «cooperação interparlamentar» ainda pode ser apreensível, no de «aperfeiçoamento das instituições democráticas» já começa a haver alguma confusão. Portanto, o conteúdo desta cooperação era um dado fundamental a ter sido definido, antes de nos preocuparmos com as questões puramente formais.
Julgo que isto é um salto de uma cooperação governamentalizada para uma cooperação partidarizada, o que significa juntar uru retrocesso á outro.
Do nosso ponto de vista, ambos os projectos de lei são maus. No entanto, como existe este artigo 78.º - e quero dizer ao Sr. Deputado Carlos Encarnação que não tenho informação de o Sr. Deputado Jorge Ferreira, que me antecedeu na liderança desta bancada, ter dado qualquer concordância formal (pelo menos, foi isso que ele me disse) -, estou à vontade para dizer que o menos mau será o do Partido Socialista, que dá alguma abertura para, em sede de comissão - e é preciso que tomem aqui esse compromisso, para sabermos o nosso sentido de voto - se poder «talhar esta fatiota» de uma fornia, penso eu, substancialmente diferente.
Penso que nos devemos preocupar aqui com o conceito de cooperação. Estamos todos preocupados com a forma, mas julgo que o conceito de cooperação era bem mais importante. É preciso dar um salto em frente.
Temos feito uma cooperação que, julgo, peca sobretudo pela incapacidade de articulação entre cooperação de Governo, cooperação de autarquias, cooperação de fundações e cooperação de organizações não governamentais. Ora, é esta falta de articulação que, do nosso ponto de vista, tem dificultado a cooperação, e é isso também que nos tem sido dito nos contactos que temos tido.
Portanto, digamos que o refazer deste projecto de lei passaria, no nosso ponto de vista, por alguma ponderação do contributo que a Assembleia da República poderia dar a uma maior dinâmica, nomeadamente, de fundações e de entidades que já existem, porque passamos a vida a criar coisas novas para fazer coisa nenhuma, Sr. Deputado Carlos Encarnação! Essa é a minha convicção, infelizmente.
Penso que há no terreno uma quantidade razoável de iniciativas, muitas delas aproveitáveis, quer públicas quer privadas, quer na área do Governo quer na área das organizações não governamentais, mas o que é certo é que as coisas não se desenvolvem, às vezes por questões muitíssimo simples.
Ainda, há tempos atrás, o embaixador de Moçambique me perguntava qual era a burocracia que impedia, por exemplo, a ida para Moçambique, como emigrantes, de quadros portugueses, uma vez que eles querem ir e não conseguem.
Por alguma razão a cooperação entre autarquias funciona muito melhor do que a cooperação entre governos.
Se não falam português é porque não pomos lá os professores e se não lêem português é porque não pomos lá os livros! Estas coisas parecem simples e não são feitas. Serão feitas com uma fundação? Não acredito!
Portanto, a nossa proposta visa dar seguimento a um artigo que foi aprovado por todos, que é o artigo 78.º do Orçamento do Estado para 1997, e tentar interpretar o que possa ser esta cooperação a partir da Assembleia da República, sem criar aqui dentro uma estrutura paralela a outras, com o compromisso da bancada do Partido Socialista de que essa ponderação passa por cortar muitas das coisas que aqui estão, que, como disse o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca e eu subscrevo inteiramente, não têm cabimento, nomeadamente este papel que se dá ao Conselho de Administração, entre outros, que também já aqui foram referidos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos os trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, pelas 10 horas, com a discussão conjunta das propostas de resolução n.os 9 e 37/VII e a discussão da proposta de resolução n.º 35/VII.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 55 minutos.

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Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Fernandes da Silva Braga.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Maria Amélia Macedo Antunes.

Partido Social Democrata (PSD):

António Joaquim Correia Vairinhos.
Arménio dos Santos.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
Luís Carlos David Nobre.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular(CDS-PP):

Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

José Fernando Araújo Calçada.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.

Faltara à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Bento da Silva Galamba.
Carlos Manuel Luís.
Nelson Madeira Baltazar.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.

Partido Social Democrata (PSD):

Carlos Alberto Pinto.
José Mendes Bota.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social (CDS-PP):

Manuel Fernando da Silva Monteiro.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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1814 I Série - Número 51

DIÁRIO da Assembleia da República:

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