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Quinta-feira, 20 de Março de 1997 I Série - Número 53
DIÁRIO da Assembleia da República
VII LEGISLATURA
2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 19 DE MARÇO DE 1997
Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos
Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei n.ºs 73 a 77VVII, das propostas de resolução n.ºs 47 e 48/VII, do projecto de deliberação n.º 37/VII e do projecto de resolução n.º 45/VII.
Foi aprovado um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à substituição de um Deputado do PSD.
O Sr. Presidente informou a Câmara de uma mensagem do Sr. Presidente da República dando conhecimento da sua deslocação a Paris, sem carácter oficial, entre os dias 26 e 28 do corrente mês.
Procedeu-se ao debate da interpelação n.º 7/VII - Sobre política geral centrada na natureza e consequências económicas e sociais da moeda única (PCP), tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Deputado Carlos Carvalhas (PCP) e do Sr. Ministro das Finanças (Sousa Franco), que proferiram intervenções na fase de abertura, e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa), os Srs. Deputados Carlos Zorrinho (PS), Lalanda Gonçalves (PSD), Joel Hasse Ferreira (PS), Luís Sá (PCP), António Galvão Lucas (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), Lino de Carvalho (PCP), Manuela Ferreira Leite e Francisco Torres (PSD), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Manuel dos Santos (PS), Octávio Teixeira (PCP), Manuel Monteiro (CDS-PP), Acácio Barreiros (PS), João Poças Santos (PSD), João Carlos da Silva e José Saraiva (PS) e José Calçada (PCP).
No encerramento do debate, intervieram o Sr. Deputado Octávio Teixeira (PCP) e o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 40 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Maninho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Lameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Victor Brito de Moura.
Partido Social Democrata (PSD):
Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Calvão da Silva.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
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José Bernardo Veloso Falcão e Cunha,
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Kruz Abecasis.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Baião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.
Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: propostas de lei n.ºs 73/VII Altera o Estatuto da Associação Profissional dos Médicos Dentistas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 110/91, de 29 de Agosto, garantindo o enquadramento ético e deontológico dos cirurgiões dentistas e odontologistas legalmente habilitados a exercer a sua actividade em Portugal, que baixou à 7.ª Comissão; 74/VII - Revoga a alínea a) do n.º 3 do artigo 40.º da Lei n.º 52-C/96, de 27 de Dezembro, e estabelece uma nova estrutura da taxa do imposto incidente sobre os cigarros; que baixou à 5.ª Comissão; 75/VII - Autoriza o Governo a transferir para os municípios competências relativas à actividade de transportes de aluguer em veículos ligeiros de passageiros e a criar regras específicas sobre o acesso à profissão de motorista de táxis (revoga o Decreto-Lei n.º 319/95, de 28 de Novembro), que baixou à 1.ª Comissão; 76/VII - Antecipação da idade de acesso à pensão de velhice para a bordadeira de casa e para trabalhadores de fábricas do sector do bordado (ALRM), que baixou à 8.8 Comissão, e 77/VII - Altera o artigo 24 º da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho (Estatuto dos Eleitos Locais), que baixou à 1.ª Comissão; propostas de resolução n.ºs 47/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção Europeia para a Protecção do Património Arqueológico (revista), aberta à assinatura em La Valetta-Malta, em 16 de Janeiro de 1992, e assinada por Portugal nessa data, que baixou às 2.ª e 6.ªs Comissões, e 48/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção entre a República Portuguesa e a República da Venezuela para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão Fiscal em matéria de Impostos sobre o Rendimento e respectivo Protocolo, assinada em Lisboa em 23 de Abril de 1996, que baixou às 2.ª e 5.ºs Comissões; projecto de deliberação n .º 37/VII - Concessão de prazo adicional à Comissão Parlamentar de Inquérito para averiguar os pedidos pendentes no Ministério da Educação ou objecto de decisão nos últimos 12 meses para reconhecimento ou autorização de funcionamento de instituições ou cursos do ensino superior particular ou cooperativo (PAR) e o projecto de resolução n.º 45/VII - Salvaguarda dos interesses das populações de Alcochete e Montijo face às alterações no ambiente, desenvolvimento e qualidade de vida, que decorrem da construção da nova ponte sobre o Tejo, ponte Vasco da Gama (PSD), que baixou à 4.ª Comissão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre substituição de Deputados.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição do Sr. Deputado Gilberto Parca Madaíl, do PSD, por um período não inferior a 45 dias, a partir do dia 19 de Março corrente inclusive, pelo Sr. Deputado José Júlio de Carvalho Ribeiro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou proceder à leitura da seguinte mensagem, que não implica a realização de qualquer votação, dirigida à Assembleia pelo Sr. Presidente da República:
«Tencionando deslocar-me a Paris, entre os próximos dias 26 e 28 do corrente mês de Março, em viagem sem carácter oficial. venho dela dar prévio conhecimento à Assembleia da República, nos termos do artigo 132.º, n.º 2, da Constituição da República.»
Pausa.
Vamos iniciar o debate relativo à interpelação n.º 7/ VII - Sobre política geral, centrada na natureza e consequências económicas e sociais da moeda única (PCP).
Para introduzir o debate, em representação do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Esta interpelação do PCP ao Governo, centrada na moeda única, realiza-se num momento em que grandes movimentações de trabalhadores se intensificam na generalidade dos países da União Europeia, com o apoio e a compreensão das populações, confirmando que a política de austeridade levada a cabo em toda a Europa comunitária, em nome da moeda única, se confronta com uma crescente oposição social, o que se verifica não só na Alemanha, França, Bélgica, Grécia, em Espanha ou em Itália, como também em Portugal.
O que fundamenta a oportunidade desta interpelação é que acontece num momento em que a opinião pública menos crê, mais questiona e duvida das alegadas virtudes de uma moeda única fundada nos critérios e orientações de Maastricht, e em que o Governo português mais quer acelerar a marcha silenciosa e forçada, na prática habitual dos factos consumados, de modo a submeter o País às decisões monetaristas e neoliberais e a aprisioná-lo no quadro da «gangrena» da moeda única, a partir de 1 de Janeiro de 1999.
Por isso, acusamos o Primeiro-Ministro e o Governo de, em nome dos critérios de Maastricht e da participação no núcleo duro da moeda única, prosseguirem e aprofundarem uma política que trava e funciona contra o crescimento económico, o investimento e o emprego no nosso país.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Acusamos o Primeiro-Ministro e o Governo de conduzirem uma política económica subjugada à prioridade absoluta da moeda única, que se traduz numa política de regressão social, de aumento do desemprego e na eliminação de direitos duramente conquistados pelos trabalhadores ao longo de muitas dezenas de anos.
Acusamos o Primeiro-Ministro e o Governo de, com a sua fé cega nos dogmas de Maastricht e da participação na moeda única, espoliarem o País do poder soberano de utilizar os instrumentos monetário e orçamental para enfrentar situações de crise, impondo assim que todos os custos recaiam inevitavelmente sobre os trabalhadores, através do aumento do desemprego e do congelamento ou reduções salariais, sobre os reformados e sobre muitos e muitos pequenos e médios empresários.
O Sr. Francisco Torres (PSD): - Porquê?!
O Orador: - Acusamos o Primeiro-Ministro e o Governo de, através da moeda única, pretenderem amarrar Portugal a uma evolução federalista da União Europeia, sem que para tal tenham mandato dos portugueses.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - E acusamos o Primeiro-Ministro e o Governo de, pela recusa de um referendo sobre a moeda única e o Tratado da União Europeia, se concertarem com a direcção do PSD para deliberadamente manterem os cidadãos à margem de uma decisão que, indisfarçavelmente, afectará profundamente o futuro dos portugueses e do País.
Aliás, não constando sequer do Tratado da União Europeia, o Governo aceitou há poucos meses o chamado pacto de estabilidade que prevê sanções que poderão ser muito lesivas para o nosso País, que tem uma economia frágil, sem qualquer debate prévio e sem qualquer mandato do povo português,...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... um pacto imposto pela Alemanha que, subserviente e levianamente, o Governo assinou em nome dos portugueses e de Portugal.
Quando se questiona o Governo sobre as consequências para o nosso aparelho produtivo, para as pequenas e médias empresas não exportadoras, ou sobre quem vai pagar os custos operativos da introdução do euro a cada banco ou mesmo no pequeno comércio, a resposta é inevitavelmente a mesma: não há outro caminho, não há outra solução.
Depois, quando o desemprego explodir - e ele já é bem superior ao que as manobras estatísticas revelam então, lá teremos as desculpas dos constrangimentos externos...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Estas acusações, Srs. Deputados, consubstanciam os motivos fulcrais desta interpelação do PCP ao Governo do Engenheiro António Guterres e do Partido Socialista.
Importa, e exige-se, que durante este debate o Primeiro-Ministro e o Governo, interpelados, respondam às nossas acusações e às nossas interrogações e propostas com a mesma seriedade e sentido de responsabilidade com que as formulamos.
Aplausos do PCP.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: A perspectiva de passagem à moeda única não é nem pode ser uma questão exclusivamente para especialistas, como pretende o Governo português. Pelo seu significado e implicações, ela tem de ser colocada à apreciação e submetida ao juízo da opinião pública - esta é uma questão democraticamente incontornável.
O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!
O Orador: - A política para a moeda única tornou-se uma fonte de interrogações, de inquietações, para um nú-
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mero crescente de portugueses, que, cada vez mais, e bem, estabelecem uma relação directa entre tal opção com a sua vida quotidiana e reivindicam o direito democrático de serem consultados e informados em debate contraditório.
Relevando do estrito respeito da democracia, não é possível fazer desaparecer a moeda nacional com todas as suas consequências políticas, económicas e sociais, sem que sobre isso previamente seja consultado o povo português.
Aplausos do PCP.
Continuando a recusar a possibilidade de um referendo sobre a questão central da União Europeia, sobre a moeda única, a posição do Governo, do PS e do PSD, abrindo as portas à possibilidade de um referendo sobre matérias vagas e laterais decorrentes da revisão do Tratado, não passa de uma desajeitada manobra de diversão e de um autêntico «referendo-ficção».
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A verdade é que o Governo do Engenheiro Guterres e o PS, irmanados com o PSD, decidiram desde o princípio que o País tem de querer a moeda única e o Tratado de Maastricht e é a esse querer unilateral e autoritário que 'o Engenheiro Guterres e o Governo apelidam de desígnio nacional. O que está justamente por apurar é a existência e a dimensão de um consenso dos portugueses sobre esse dito desígnio.
Porque se há alguma coisa evidente nesta matéria é que a moeda única e o Tratado da União Europeia não são consensuais na sociedade portuguesa e é crescente a angústia, a indignação e a preocupação dos que têm um vínculo precário, dos desempregados, dos trabalhadores e de muitos empresários que querem ser cabalmente esclarecidos e pretendem pronunciar-se sobre a matéria.
Porque é um facto que, para além daqueles que, como o PCP, se opõem clara e frontalmente aos critérios de Maastricht, à moeda única e a esta União Europeia, há igualmente muitos portugueses que colocam justificadas reservas ao voluntarismo e ao artificial impulso federalista que mora em Maastricht e assenta as suas bases na moeda única.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - O referendo é uma condição do esclarecimento popular e de ponderação nacional sobre o significado e as consequências de tal escolha. Só a campanha do referendo poderá proporcionar o debate contraditório, generalizado e esclarecedor, que é indispensável. E o interesse em participar na decisão levará a generalidade dos cidadãos a interessar-se pelo assunto e a decidir em consciência sobre uma opção tão decisiva para o futuro de Portugal.
As grandes decisões que, como esta, afectam profundamente o curso histórico do nosso país carecem indubitavelmente de uma legitimação democrática qualificada.
Aplausos do PCP.
Mas, para matéria tão decisiva, o tão celebrado «diálogo» já não faz parte dos atributos do Governo. Temos, sim, o diktat do «pensamento único» e dos compromissos do Governo PS. É caso para perguntar: de que tem medo o Partido Socialista? Que razões existem para tão grande falta de autoconfiança nas virtudes desse paraíso anunciado que vos leva a proibir, nos termos constitucionais, que o povo português seja chamado, por referendo - como o PCP propõe -, a pronunciar-se sobre a moeda única? Se só temos vantagens com o euro, se tudo é cor-de-rosa, se tudo é um oásis, porquê ter medo de que seja o povo a decidir?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Argumenta o Sr. Primeiro-Ministro com os mercados que fustigariam o escudo. Bela desculpa! Os mercados, Sr. Primeiro-Ministro, não são entidades abstractas, têm rosto - são os bancos, o capital financeiro - mas não têm certidão de eleitor. Ou será que o Governo PS entende que os mercados devem decidir pelo povo português? Pela nossa parte, rejeitamos a teologia economicista que confia aos mercados o governo de Portugal.
Nenhum governo tem legitimidade ou está mandatado para suprimir a moeda nacional e substituí-la por uma moeda única da União Europeia imposta pelos interesses do eixo franco-alemão.
Aplausos do PCP.
O Governo e o PS não querem o referendo porque não querem o debate, e não querem o debate porque têm receio de que a sua propaganda seja contestada; porque sabem que aquilo que apregoam a favor do euro é uma mistificação; porque o seu diálogo é de sentido único, só para falarem mas não para ouvirem, e muito menos para considerarem aquilo que ouvem.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Porque o PS sabe que o caminho seguido pela moeda única põe em causa e subalterniza o princípio da coesão económica e social, tem pés de barro e que os ditos critérios carecem de fundamento económico ou científico. É um caminho para mais desemprego e subemprego, que fragiliza e põe em causa o aparelho produtivo nacional e o futuro soberano e democrático de Portugal.
Aplausos do PCP.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: A moeda única fragiliza de facto e põe em causa o aparelho produtivo nacional.
É ou não verdade que a moeda única, um euro feito, como é inevitável, à imagem e semelhança do marco, supervalorizado em relação ao curso normal do escudo, vai tornar mais difícil a competitividade dos produtos portugueses nos mercados europeu e mundial, quando confrontados com os nossos principais concorrentes, os países fora da zona do euro, os países asiáticos, os países do continente americano, com as suas moedas e taxas de câmbio próprias?
No mercado comunitário, incluindo o mercado nacional, face à menor eficiência da nossa economia, os produtos portugueses aparecerão mais caros, e as empresas terão dificuldades acrescidas na venda, ou terão preços semelhantes aos de outros países comunitários e as em-
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presas portuguesas venderão com margens cada vez menores ou optarão, mais certamente, pela redução relativa dos salários.
A moeda única é um instrumento de aprofundamento do mercado único e de desregulamentação das fronteiras. Muitas e muitas empresas bem como muitos e muitos agricultores portugueses, que vendem para o mercado nacional, vão confrontar-se também com a aceleração das importações feitas com mais baixos custos cambiais e, portanto, com uma ainda maior substituição da produção nacional pela produção estrangeira. O encerramento de empresas e a crise em muitos sectores serão a consequência lógica de tal processo.
O Sr. Francisco Torres (PSD): - Isso aconteceria se ficássemos fora da moeda única!
O Orador: - Seria por isso de grande interesse que o Governo nos dissesse aqui como é que a economia portuguesa vai aguentar o duplo choque a que vai estar submetida: o da moeda única e o da crescente abertura ditada pela Organização Mundial do Comércio, isto é, pelos Acordos do GATT.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A moeda única e os critérios de Maastricht são um factor de aumento do desemprego. A livre circulação de capitais, facilitada e dinamizada pela moeda única, em condições de relativa aproximação média das taxas de juro, vai impulsionar a deslocalização do dinheiro, dos investimentos, das empresas para as regiões da Comunidade Europeia com maior produtividade e dinamismo económico.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Orador: - A vantagem comparativa que o Governo PS se prepara para oferecer é uma força de trabalho mais barata e com menos garantias sociais.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Aí virão os apelos e as chantagens sobre os trabalhadores para políticas ditas de moderação salarial, de aumento da desregulamentação das relações de trabalho, de mais precaridade, de maior facilidade de despedimento, de mobilidade dos trabalhadores, de menor protecção social. E isto num país onde os lucros das grandes empresas estão em alta e o investimento em baixa, onde cerca de 50% da mão-de-obra tem vínculos precários e onde se mantêm as artimanhas sucessivamente repetidas para que as 40 horas não sejam cumpridas!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Os casos Renault multiplicar-se-ão debaixo das lágrimas de crocodilo do Sr. Engenheiro Guterres e do Sr. Santer, escondendo que as Renault são uma consequência inevitável e inerente à política de austeridade da moeda única.
Como afirma o relatório final pedido pelo Parlamento Europeu a várias universidades europeias sobre as consequências sociais da União Económica e Monetária, as «piores consequências da convergência para a UEM far-se-ão sentir nas regiões menos favorecidas da União Europeia. A probabilidade de, da UEM, resultarem consequências sociais nefastas é maior na Grécia, Itália, Espanha e Portugal».
É uma evidência que, com a liquidação de empresas e sectores, o aumento do desemprego será uma realidade. Não fomos nós que afirmámos que empresas vão fechar e existe o risco de um aumento de desemprego.
A moeda única, Sr. Primeiro-Ministro, também não vai dar mais voz a Portugal. Bem pelo contrário, a moeda única vai entregar a condução da política monetária e cambial, da política fiscal e da política económica ao Banco Central Europeu, omnipotente e intocável, em cujas decisões executivas dominadas pelo eixo franco-alemão Portugal não participa.
Por isso, estarmos no pelotão da frente, como diz o PSD, ou no centro das decisões, como diz o PS - grandes diferenças semânticas! -, não passa de milongas e de frases propagandísticas sem conteúdo concreto.
Como afirma recentemente um relatório do Conselho da Europa, o «défice democrático que existe no seio da União Europeia agravar-se-á de maneira intolerável».
Portugal perde um elemento constitutivo da sua soberania nacional e, como parente pobre e subalterno, a voz' do País não terá qualquer peso ou relevo significativo e andará a reboque dos interesses das grandes potências.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - É sabido também que os níveis económicos e monetários tendem a aumentar o fosso entre as zonas mais desenvolvidas e as de menor desenvolvimento. A história mostra-nos que, para compensar tal tendência, os governos foram obrigados a reforçar, através dos respectivos orçamentos, as compensações às diversas regiões. Mas no caso da União Europeia, como é sabido, os países ricos recusam-se a reforçar o orçamento comunitário e, com o alargamento, as pressões negativas ainda vão ser maiores. Chegou a falar-se de um fundo para o efeito, mas tal foi abandonado.
É conhecida também a blague de que em qualquer deserto os critérios de Maastricht são rigorosamente cumpridos, pela simples razão de que aí não há pessoas...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O PS sabe bem que tais critérios, assim como a decisão de entrada no euro, são escolhas políticas que vão ser tomadas por maioria, que é com quem diz pelos «grandes».
Veja-se a contabilidade criativa do Eurostat sobre a dívida pública e a não inclusão dos juros para se abrirem as portas do «Clube do Euro» a certos países em dificuldades.
Por isso, não se pode deixar de ouvir com um sorriso a declaração enfática, ontem proferida pelo Sr. Primeiro-Ministro, de que Portugal deixaria entrar a Alemanha no euro mesmo que este país não viesse a cumprir os ditos critérios e desde que tal não fosse estrutural... Consta que o Chanceler Kohl, que já não dormia há três dias por não saber qual seria a decisão do Engenheiro Guterres, teve ontem à noite um sono descansado e repousado!
Aplausos do PCP.
Ficámos a saber que Portugal deixa a Alemanha entrar no euro e não quer qualquer adiamento! O ridículo
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tem limites! Ou será que algum membro deste ditoso Governo está convencido que haveria moeda única se o Sr. Kohl mudasse de opinião?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Para o PS do Engenheiro Guterres, ao contrário de outros partidos socialistas, não há reservas, nem em relação ao «nó duro» do euro, nem a uma «zona alargada» do marco, nem há preocupações com o pacto de estabilidade, nem com a submissão a um banco central feito à medida do Bundesbank.
Ao contrário do que se quer fazer crer, há outros caminhos, Sr. Engenheiro Guterres e Sr. Ministro das Finanças.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - É possível uma outra construção europeia, de paz e cooperação, de co-desenvolvimento, que faça do princípio da coesão económica e social o seu primeiro objectivo, que ponha em primeiro lugar o emprego e a convergência real das economias e não a convergência nominal; uma Europa plural que ataque um dos seus mais graves problemas, o desemprego, o que passa por uma verdadeira cooperação monetária, pelo reforço do orçamento comunitário, pelo financiamento de projectos comuns, pelo aproveitamento dos recursos de cada país e pela solidariedade recíproca.; uma Europa social, harmonizando por cima em vez de nivelar por baixo, ou pelo nível dos países do Terceiro Mundo, as suas conquistas sociais.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A moeda única não é um projecto de cooperação europeia, não é um projecto para o desenvolvimento das economias mais periféricas e da economia portuguesa em particular. A moeda única não é um projecto para mais e melhor emprego.
A moeda única é um projecto ao serviço de um directório de grandes potências e de consolidação do poder de grandes transnacionais, na guerra com as transnacionais e as economias americanas e asiáticas, por uma nova divisão internacional do trabalho e pela partilha dos mercados mundiais.
A moeda única é um projecto político que conduzirá a choques e a pressões a favor da construção de uma Europa federal, ao congelamento de salários, à liquidação de direitos, ao desmantelamento da segurança social e à desresponsabilização crescente das funções sociais do Estado.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro vai procurando enfeitar o seu febril fundamentalismo pela moeda única, pela Europa política, económica e monetária, com a referência vaga a uma dita Europa social.
Mas a Europa social que os trabalhadores e o povo português reclamam não pode resumir-se a meras frases vazias de conteúdo nem à concepção de uma Europa social «complementar» e de disfarce da Europa comandada pelo capital financeiro em, que o «social» apenas visa favorecer uma certa resignação dos trabalhadores à pretensa inevitabilidade da baixa dos custos do trabalho.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Essa concepção instrumental, subordinada e propagandística do «social» na Europa da moeda única é, aliás, perfeitamente comprovada com o facto de a menção do emprego como princípio de valor equivalente à estabilidade monetária ter sido rejeitado pelos governos dos quinze na Conferência Intergovernamental. Ou como, mais cruamente, a pôs a nu o presidente do Bundesbank ao afirmar que «com a moeda única, o airbag social será suprimido».
A coesão económica e social deve ser o objectivo central de qualquer integração europeia e não uma vulgar opção que se junte em último lugar para tornar o todo publicamente apresentável. De nada representaria amanhã uma gota de «social» no oceano do desemprego, da pobreza, da desregulamentação, da flexibilidade, da liquidação de direitos e do tudo à «economia de casino», que é o que representa a Europa da moeda única.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - É a própria lógica da actual construção europeia que está em questão.
Esperamos que neste debate o bom senso, a reflexão e a ponderação triunfem sobre a propaganda, os dogmas do neoliberalismo e a arrogância do pensamento único.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Esperamos que a arrogância e a política dos factos consumados venham a ceder perante a exigência popular da realização de um referendo sobre a moeda única. Portugal precisa de uma mudança de rumo na sua política económica e social. Precisa Portugal, precisam os portugueses, precisam os trabalhadores. É neste sentido que continuaremos a nossa luta e a nossa intervenção.
Aplausos do PCP, de pé, e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: - De acordo com a direcção da sua bancada, o tempo que o Sr. Deputado Carlos Carvalhas gastou a mais será descontado no tempo do seu grupo parlamentar.
Para pedir esclarecimentos, inscreveu-se o Srs. Deputado Carlos Zorrinho. No entanto, apenas lhe darei a palavra para o efeito após o período de abertura do debate, tal Como é habitual.
Assim, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças, para uma intervenção, em representação do Governo.
O Sr. Ministro das Finanças (Sousa Franco): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A interpelação do Partido Comunista Português, mais do que ocasião para que o Governo reafirme e fundamente uma política que, sendo nacional, tem sido bastantes vezes afirmada, argumentada, debatida e provada pelos factos, é uma ocasião para pôr à prova a atitude do Partido Comunista Português perante este claro desígnio nacional.
Estes dois aspectos - porquê o desígnio da moeda única como parcela instrumental, embora importante, neste momento histórico da nossa afirmação na Europa e porquê esta posição negativa do Partido Comunista Português e com que consequências para Portugal e para os
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portugueses - são as duas coisas que importa clarificar neste debate.
Quais as críticas feitas? A primeira delas é a de que a moeda única travaria o desenvolvimento, o crescimento e o emprego. É evidentemente falso, não apenas porque toda a fundamentação desta política resulta de pretendermos, nós e os outros países europeus, prosseguir a caminhada para um nível mais elevado de satisfação das necessidades económicas, de partilha social justa e de combate à exclusão, mas porque os factos aí estão a mostrar que, tal nós a executámos em 1996 e 1997, esta política foi o caminho para que Portugal recuperasse níveis de crescimento e de emprego e entrasse numa trajectória de saúde económica que não conhecia desde 1990.
Crescemos mais do que a média europeia no ano passado, 1,5%; o produto cresceu 3% em termos reais, valores s6 atingidos há sete anos, em 1990; o emprego aumentou 0,6%; a inflação diminuiu, tal como diminuíram as taxas de juro. Quer isto dizer que a economia está numa situação de crescimento e saúde como desde 1990 não conhecia. E continua, no início deste ano!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Os indicadores relativos a Janeiro e Fevereiro demonstram claramente que a expansão da economia se mantém e que tudo leva a crer que teremos um ano de 1997 melhor do que o de 1996.
O investimento em material de transporte subiu mais de 30%. No trimestre que acaba em Fevereiro, a procura de cimento, indicando investimento na construção, subiu mais de 26%. Pela primeira vez, os indicadores coincidentes da produção industrial, do comércio, cresceram a níveis equiparáveis aos de 1990. Como se sabe, a inflação, em termos mensais, desceu mais do que se esperava. O desemprego registado diminuiu 0,2% em Janeiro e 0,7% em Fevereiro. Quer dizer: contivemos o desemprego no ano passado c estamos a fazê-lo recuar este ano.
Se isto não é crescimento e emprego, pergunto: o que é crescimento e emprego, Sr. Deputado Carlos Carvalhas?
Aplausos do PS.
Contra factos não há argumentos! A política de convergência nominal e convergência real que temos prosseguido, com concertação social, com grande atenção às necessidades da economia, com grande sensibilidade ao aumento moderado dos salários reais, com grande sensibilidade à sustentabilidade económica, política e social deste desafio fundamental da economia portuguesa é uma política que tem produzido bons resultados. Mas se isto é assim na vida concreta dos portugueses refiro-me a 1996 e 1997 e é isso que importa sobretudo -, também é assim no futuro.
Como já sabemos, esta opção nacional implica, simultaneamente, colocar Portugal no centro de decisão de uma Europa que está a reorganizar-se e em que temos de ser comparticipantes das respectivas decisões estratégicas e criar condições para, no seu âmbito, respondermos ao desafio da internacionalização e conseguirmos afirmar a nossa vocação universalista, sendo cada vez mais ricos, mais justos, mais desenvolvidos e sermos capazes de dar às empresas portuguesas condições financeiras e económicas para competirem no mercado mundial.
Este é um projecto de desenvolvimento, este é o único projecto de desenvolvimento, porque ficou confirmado aqui que o Partido Comunista não tem projecto alternativo. Ficou confirmado aqui que não há projecto alternativo neste momento se não para termos mais e melhor Portugal, termos mais e melhor Europa. É esta a nossa aposta.
Aplausos do PS.
E se é claro, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, para nós, esta aposta não é monetarista ou sequer economicista mas é uma aposta decisiva em colocar bem Portugal na Europa e em colocar bem a Europa no mundo, para vencer os desafios do século XXI, é também claro que esta é uma aposta social.
Este tem sido um Governo que procura combinar estabilidade e crescimento económico com consciência e justiça social. Parece-me mais do que evidente que a contenção de todas as despesas nos Orçamentos do Estado para 1996 e 1997 mas com o aumento do gasto social, a prioridade do gasto com a educação, a efectivação do rendimento mínimo garantido, os programas da reforma que está em curso no domínio da segurança social, da saúde e das outras necessidades sociais, tudo isso representa uma absoluta prioridade social.
Domesticamente, na nossa casa, este tem sido o Governo das causas sociais.
Aplausos do PS.
Mas tem sido também o Governo da alta, moderada embora, dos salários reais. E a alta dos salários reais significa que, ao reduzir a inflação, criamos condições para melhores salários, mais rendimento disponível das famílias, melhor consumo e bem-estar da generalidade dos trabalhadores.
E é também claro que, ao apostar em salários moderados, quando, nos outros países da Europa se prevêem descidas de salários reais, apostámos em que, para termos aumento dos salários, era preferível ter um pouco menos de crescimento. O nosso crescimento é também moderado - não é só o crescimento dos salários -, no equilíbrio justo entre aumento dos salários e o máximo crescimento possível para as empresas e unidades produtivas. Esta é uma política social como antes não tinha havido, Srs. Deputados!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas, ao mesmo tempo, na Europa, afirmamos as mesmas prioridades. Somos pela Europa social, que é rejeitada dentro da União Europeia pelo principal adversário da moeda única, a Inglaterra. Mais: o nosso Primeiro-Ministro, logo após a entrada em funções, relançou sozinho, no Conselho Europeu de Madrid, o tema do emprego como prioridade fundamental de política europeia. E foi dessa sua posição no Conselho Europeu de Madrid que resultou um movimento que, hoje, está a colocar as políticas de emprego, que não podem ser resolvidas exclusivamente a nível nacional, como preocupação central dos governos da União Europeia.
Aplausos do PS.
Também isto fax parte da nossa opção, que é a de combinar crescimento, desenvolvimento e emprego, na Europa mas para Portugal, com Europa social e emprego na Europa, para todos e também para Portugal.
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Sr. Deputado Carlos Carvalhas, o PCP não tem alternativa a esta política. Em que é que aposta? Na desvalorização? E que adviria da desvalorização, neste contexto da economia europeia e internacional? A inflação!. E o que adviria da inflação? A diminuição dos salários reais, a pior situação dos trabalhadores, e o aumento do desemprego, com novas desvalorizações. Neste contexto internacional, Portugal, se apostasse nisso, teria garantido mais desemprego e piores salários.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!
O Orador: - Mas se Portugal apostasse também numa política sem solidez financeira, como, por exemplo, a do México, o que aconteceria se tentasse desenvolver o seu sistema monetário, financeiro e cambial à margem do sólido sistema europeu? Aconteceria uma desvalorização brusca e brutal, como ocorreu no México, no final de 1994 e princípios de 1995, com consequências dramáticas para a nossa economia nacional.
Só poderemos defender a nossa situação no âmbito do espaço europeu. É por isso, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, que esta é uma política que aponta para a verdadeira coesão económica e social. Coesão económica e social que significa, hoje, na Europa, que quem manda tudo no domínio monetário é, evidentemente, a Alemanha, porque o poder económico real está no marco alemão. O que pretendemos é que o poder económico real passe para a mão de todos os povos europeus e também para a mão do nosso país.
Hoje, basta um pequeno discurso de um responsável político-financeiro alemão e os mercados cambiais tremem automaticamente! No futuro, com a moeda única, queremos que não seja assim; queremos que todos os europeus tenham poder de co-decisão sobre uma moeda verdadeiramente europeia.
Aplausos do PS.
Mais, Sr. Deputado Carlos Carvalhas: a coesão económico-social vive também da capacidade dos Estados europeus solidários manterem os instrumentos de redistribuição de riqueza que permitam aos países mais pobres recuperar os atrasos.
É verdade que, desde que entrámos para as Comunidades Europeias, hoje União Europeia, Portugal tem-se aproximado significativamente do rendimento médio per capita da União Europeia; também é verdade que o ano passado foi particularmente forte nesse sentido, depois de uma interrupção de três anos, em que não tivemos convergência real mas apenas nominal.
Todavia, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, é evidente que o esforço de coesão económica e social, a capacidade de transferir para Portugal recursos que, através de fundos comunitários, permitem atingir montantes de investimento - no ano passado foram da ordem dos 3,8% do PIB -. só serão mantidos se Portugal participar de uma maneira forte e bem sucedida na política de caminhada para o euro. Se Portugal se afastasse dela, a nossa posição no acesso aos fundos estruturais seria gravemente comprometida.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Essa agora!
O Orador: - Esta política é também uma parte significativa da política de coesão económico-social dentro da Europa,...
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Fantástico!
O Orador: - ... da partilha do poder económico dentro da Europa e, portanto, em simultâneo, do nosso progresso e da nossa participação no poder da União Europeia.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado Carlos Carvalhas, é evidente que uma política deste tipo implica renúncias, quando for concretizada, à autonomia cambial e à autonomia monetária. As políticas monetárias e cambiais serão, nos países que tiverem a moeda única, exercidas em conjunto, através dos seus órgãos comunitários.
Essa é uma opção que faz parte da lógica da integração europeia e o Partido Comunista não a aceita porque nunca aceitou a integração europeia! O Partido Comunista foi contra a adesão de Portugal às Comunidades Europeias!
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Bem lembrado!
O Orador: - Hoje já não diz isso, mas foi! O Partido Comunista foi contra todos os avanços da integração europeia e também é contra este.
A lógica da integração Europeia implica, necessariamente, que partilhemos e ponhamos em comum poderes com outros Estados. Mas pergunto-lhe, Sr. Deputado Carlos Carvalhas: quem ganha mais? Nós, em sermos co-gestores do marco, ou a Alemanha, em deixar de ser a única detentora dessa moeda para a pôr em comum, reforçada, com os outros países europeus?
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O pressuposto é falso!
O Orador: - Neste aspecto, penso que não é por acaso que o projecto da moeda única não é originariamente alemão; é um projecto defendido por vários socialistas europeus - Jacques Delors, François Miterrand -, que os pequenos países europeus, com governos socialistas e sociais democratas, conseguiram propor de maneira forte à Alemanha, fazendo-o adoptar.
Este é um projecto que, na Europa, não representa o auge do monetarismo mas, sim, um valor que, se quer que lhe diga, é profundamente de esquerda: a partilha de poder por todos e não o seu monopólio por alguns.
Aplausos do PS.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Se o PSD ouve isso, foge!
Risos do PCP.
O Orador: - Sr. Deputado Carlos Carvalhas, de algum modo, também há aqui uma adesão, se me permite, com o seu «quê» de oportunista, do PCP à ideia do referendo. Evidentemente, é importante a ideia do referendo, para consultar o povo, no quadro definido no artigo 118.º da Constituição da República Portuguesa. Mas, neste caso, permita-me que lhe diga, o referendo pretendido vem, como proposta, mal e fora de horas.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
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O Orador: - Permita-me recordar aquilo que dois comentadores importantes da nossa Constituição dizem sobre o referendo, a propósito do artigo 118.º: «o referendo não pode ser chamado a confirmar ou infirmar as deliberações já tomadas pelos órgãos representativos. É sempre anterior à decisão legislativa ou à aprovação da convenção internacional respeitante à questão submetida a referendo».
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Então e a regionalização?!
O Orador: - «Não pode haver referendo post factum, referendo ratificativo de leis ou convenções já aprovadas». E o que é que isto quer dizer? Uma coisa muito importante, Sr. Deputado Carlos Carvalhas: esta política foi decidida legitimamente aqui, no Parlamento, por maioria superior a 2/3 dos Deputados, quando foi ratificado o Tratado de Maastricht.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!
O Orador: - Esta é uma maioria que está legitimada em termos de democracia representativa e, portanto, o argumento decisivo para agora dizer não ao referendo não é de oportunidade, em termos de mercados, mas de respeito pela democracia representativa.
Sr. Deputado Carlos Carvalhas, do que se trata é de o povo português, repetidamente, através de eleições e de votações nesta Câmara, ter afirmado que quer a moeda única e não é na parte final da execução de uma política que se vai submeter a referendo essa decisão, com uma única consequência segura: a incerteza lançada sobre os mercados iria prejudicar, necessariamente, a execução dessa política. O argumento é este e não outro!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado Carlos Carvalhas e Srs. Deputados do PCP, respeitar a democracia representativa e a instituição parlamentar é, para nós, mais importante do que não perturbar os mercados e são estas duas razões, mas sobretudo a primeira, que nos levam a dizer que seria um desrespeito profundo pela democracia representativa entrar agora no caminho do referendo por uma decisão repetidas vezes tomada nesta Câmara por maioria superior a 2/3. Isso nós não queremos!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - A França, a Dinamarca, etc., todas violaram a democracia representativa!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Finalmente, encaminho-me para o último dos argumentos que me parece importante.
E evidente que há em Portugal, tal como houve quando entrámos para a União Europeia, sectores que têm de fazer uma reprogramação da sua actividade; é evidente que, de cada vez que uma economia fica mais aberta e menos protegida, isso significa oportunidade para os mais fortes mas, também, risco acrescido para os mais fracos.
Sabemos que se Portugal se colocasse à margem da economia europeia e da economia mundial, a médio e longo prazo, apenas estaria sujeito a uma sucessão de desvalorizações, de crises cambiais e de situações de incerteza que impossibilitariam o nosso crescimento, mas também sabemos que podem existir efeitos negativos que resultem de uma insuficiente preparação das empresas ou do Estado para a competitividade acrescida que resultará da moeda única.
A este respeito, o Governo tem procurado ser prudente, o que significa que não podemos desencadear campanhas de informação enquanto toda a informação necessária não estiver clarificada. Ora, neste momento, como os Srs. Deputados sabem, embora tenham sido tomadas decisões de princípio no Conselho Europeu de Dublin, muitas das regras fundamentais sobre o funcionamento da moeda única estão a ser preparadas e não sabemos se serão aprovadas na presidência holandesa, ou seja, neste semestre, ou na presidência luxemburguesa, ou seja, no próximo semestre.
Seria induzir em erro os portugueses lançar campanhas maciças de esclarecimento quando ainda não conhecemos quais as regras que, afinal, virão a ser fixadas.
Neste momento, no Ministério das Finanças e também, quanto ao sector produtivo não financeiro, no Ministério da Economia, temos preparadas comissões euro que agregarão o esforço do Governo e da Administração ao dos agentes produtivos. E logo que as regras do curo estiverem definidas a nível europeu - neste momento ainda não estão -, certamente uma tarefa importante vai ser esclarecer os portugueses sobre este processo, que é viável e necessário mas que precisa de ser objecto de intenso esclarecimento.
Por outro lado, como é do conhecimento desta Assembleia, o Governo resolveu encarregar a Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa de um estudo exaustivo das consequências da introdução do euro para a economia portuguesa.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - A um ano!
O Orador: - O facto de, fiéis ao princípio da subsidariedade, termos estimulado o crescimento nos sectores económicos, na banca, nos seguros e nos sectores financeiros, daquilo que para eles vai representar o desafio do euro, significa que assumimos as nossas responsabilidades e esperamos que a sociedade civil assuma as suas.
Só a perspectiva do acesso de Portugal à moeda única já produziu uma significativa afirmação da nossa economia no domínio internacional. Dou apenas um exemplo mais, além dos que já referi: após o ano de 1996, pela combinação do programa de privatizações com a confiança dos operadores no acesso de Portugal ao curo, foi possível ler, há pouco, no Financial Times, que a bolsa portuguesa tinha alcançado a idade adulta e, este ano, é possível saber que as bolsas portuguesas vão deixar de ser incluídas entre as bolsas dos países emergentes, isto é, da Ásia ou da América Latina, e vão passar a ser incluídas entre as bolsas dos países desenvolvidos.
Eis mais um exemplo de como a nossa economia, ao caminhar para o euro, não como fim em si, mas como caminho para valores mais altos, se torna, do mesmo passo, mais forte e mais desenvolvida. .
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta é uma aposta que fazemos pelas razões contrárias àquelas de que somos acusados pelo PCP, precisamente para conseguir mais desenvolvimento, mais coesão económica e social, uma Europa social e políticas coordenadas de emprego, bem como o respeito pela vontade popular repetidamente manifestada nesta Câmara.
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O euro representa, para nós, um meio, mas um meio que é, precisamente, o culminar da nossa aposta europeia. Mais Europa para termos mais e melhor Portugal, é essa a nossa aposta.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - O tempo que o Sr. Ministro das Finanças gastou a mais na sua intervenção será igualmente descontado no tempo global que cabe ao Governo.
Antes de dar a palavra aos oradores inscritos para pedirem esclarecimentos, informo o Governo e os Srs. Deputados que hoje temos a companhia de 572 alunos das nossas escolas. Continua a ser agradável termos a companhia da nossa juventude, como manifestação de interesse e, até, de curiosidade pela instituição parlamentar.
Assim, encontram-se a assistir à sessão 32 alunos da Escola Secundária Alberto Sampaio de Braga, 36 alunos da Escola Secundária de Padrão da Légua, 60 alunos da Escola E.B.2.3. de Tortosendo, 85 alunos da Escola C+S de Cruz de Pau, 20 alunos da Escola Secundária de Caldas de Vizela, 100 alunos da Escola Secundária Afonso Lopes Vieira, de Leiria, 52 alunos do Colégio da Imaculada Conceição, de Coimbra, 105 alunos da Escola Secundária de Ponte de Sôr, 35 alunos da Escola Secundária Padre Alberto Neto, de Queluz e 22 alunos do Liceu Francês, para os quais peço a vossa habitual saudação.
Aplausos gerais, de pé.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, podemos concluir da sua intervenção - com alguma dificuldade, confesso, dado o «chorrilho» de contradições que continha - que para o Partido Comunista as consequências económicas e sociais da adesão de Portugal à moeda única serão negativas para Portugal e para os portugueses. Daí podemos inferir, a contrario sensu, que, na vossa opinião, as consequências económicas e sociais de uma não adesão, essas, sim, serão positivas para Portugal e para os portugueses.
Analisemos, então, Sr. Deputado Carlos Carvalhas, que consequências são essas, verificando qual o impacto da flexibilidade macro-económica que os senhores agora reivindicam.
Primeiro impacto: desde logo, se não aderirmos à moeda única, poderemos, eventualmente, de forma muito limitada, dadas as condições aceites pelo sistema monetário europeu, fazer algumas desvalorizações competitivas. E o que é que isso significa, em termos de consequências económicas e sociais? Eventualmente, um ligeiro aumento não sustentado de exportações de produtos tradicionais. Mas à custa de quê? À custa da redução do valor do trabalho incorporado.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Ou seja, na linguagem de que os senhores gostam, haveria um pequeno crescimento pontual, à custa dos trabalhadores e do valor do trabalho dos trabalhadores. .
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O PCP, agora, quer mesmo isto ou será que está equivocado, Sr. Deputado?!...
Mas a não adesão permitirá outras coisas, como, por exemplo, ainda de acordo com os limites do sistema monetário, aumentar os défices públicos, insuflando á procura. Se não mudarmos o tecido produtivo, quais serão as consequências económicas e sociais de se insuflar a procura? Aumento das importações, descalabro da balança de pagamentos, estrangulamento da economia por muitos e muitos anos. É isso que os senhores agora defendem, Sr. Deputado, ou será que está equivocado?!...
Mas há mais consequências da não adesão à moeda única, como, por exemplo, a taxa de inflação. Certamente, reconhecerá que a taxa de inflação tenderá a subir. E quais as consequências económicas e sociais da subida da taxa de inflação? Ganhos especulativos para muitas pessoas, erosão das rendas e erosão das pensões. O PCP, agora, defende isso, Sr. Deputado, ou será que está equivocado?!...
Mas há ainda uma quarta consequência da não adesão à moeda única: a subida da taxa de juro. E a subida da taxa de juro também tem consequências económicas e sociais. Por exemplo: levará a que haja menos investimento produtivo, maior dificuldade das famílias em fazerem compras com base em crédito, compras de bens essenciais, como a habitação, o automóvel e outros. O PCP, agora, pretende mesmo isto ou equivocou-se?!...
Reflicta bem, Sr. Deputado, porque penso que as consequências económicas e sociais da não adesão são bem mais gravosas do que as consequências da adesão.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Zorrinho, ouvi com toda a atenção o «chorrilho» de virtudes das suas palavras, mas, pondo isto de lado, até porque o Sr. Primeiro-Ministro não ouviu, permita-me que lhe diga o seguinte: tenha cuidado! Não seja tão seguidista, porque o Sr. Primeiro-Ministro já mostrou que, por vezes, «tira o tapete»! E o senhor é tão seguidista que os seus argumentos são de uma pobreza franciscana!
Vozes do PCP: - Muito bem!
Protestos do PS.
O Orador: - Só lhe faltou falar na prestação do frigorífico! Mas essa tem direitos de autor!... Parecia o terramoto de 1755!...
Sr. Deputado Carlos Zorrinho, empresas vão fechar e existe o risco de um aumento do desemprego. Será que quem afirmou isto também está equivocado?! É o seu companheiro de partido Vítor Constâncio que o afirma! Quer que lhe cite dezenas e dezenas de economistas e dezenas e dezenas de socialistas que suscitam as mesmas dúvidas e as mesmas interrogações que nós suscitamos?! Estamos conversados, Sr. Deputado!
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro das Finanças, tem a palavra o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves.
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O Sr. Lalanda Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, este debate não tem novidade. O Partido Comunista, ao suscitá-lo nesta altura, não introduz nenhuma novidade. Aliás, nem no discurso do Sr. Ministro vimos alguma novidade relativamente ao seu discurso anterior.
Partilhamos do objectivo da moeda única, mas divergimos relativamente a determinadas reformas que consideramos necessário implementar para que a moeda única seja um objectivo não só alcançável mas sustentável no quadro europeu.
De qualquer modo, Sr. Ministro, gostaria de introduzir aqui uma questão: relativamente a referendar o passado e a trajectória para a moeda única, V. Ex.ª sabe que o Partido Social Democrata se posiciona contra; relativamente ao futuro, ou seja, ao processo de integração europeia, à revisão do Tratado, que está, neste momento, em curso, é um compromisso do Partido Social Democrata que o referendo sobre essas alterações se faça.
Assim, o que gostaria de perguntar ao Sr. Ministro, nesta oportunidade, é o seguinte: qual o momento em que considera que este referendo se deve efectuar? É que, no nosso entendimento, esse momento será o primeiro semestre do próximo ano, tendo em conta o processo de revisão do Tratado que está em curso e o tipo de problemas que se podem suscitar relativamente a esta revisão.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lalanda Gonçalves, penso que, de facto, num debate destes, ainda por cima com a frequência com que os debates sobre o tema da moeda única têm ocorrido, as novidades que podem surgir, da parte de todos nós, não são muitas e, por conseguinte, resta-nos a reafirmação, que talvez não seja má, de pontos de princípio e a actualização do argumentário, na medida em que tal seja possível.
Penso que a trajectória para a moeda única é uma trajectória cuja sustentabilidade se demonstra tanto em termos de perspectiva histórica como em termos de perspectiva futura. E nós, Governo português, temos defendido que a sustentabilidade também não é um mero critério económico. Como os problemas económicos mais importantes, trata-se de um critério político e de um critério social. A sustentabilidade política deve resultar da evidência de um apoio maioritário das forças políticas do Portugal político, tal como democraticamente existe, e a sustentabilidade social deve resultar da evidência, que o acordo de concertação estratégica tornou mais forte, de um consenso social quanto à adaptabilidade das políticas às necessidades da sociedade.
Nessa perspectiva, diria que me parece que a sustentabilidade política e social vai continuar a existir e deve ser medida, em 1997, como em 1998, do mesmo modo que até aqui, o que significa que, na minha opinião, até à decisão sobre quais os países que vão entrar no euro e à preparação do efectivo funcionamento da moeda única em 1 de Janeiro de 1999, os problemas de manifestação da vontade política e de acordo social com este objectivo vão continuar a ser sensivelmente os mesmos e, como tal, as respostas dadas para 1997 valerão para 1998.
O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro das Finanças, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, a primeira pergunta que quero formular tem a ver com o seguinte: é, para nós, muito importante a questão da coesão económica e social europeia. Sem esse objectivo, a expansão do mercado único e a própria adopção da moeda única poderiam contribuir para o crescimento das economias mas contribuiriam, certamente, para o alargamento das desigualdades.
Tem-se espalhado em algumas zonas do País alguma confusão, algum equívoco sobre o que se passará em termos de atribuição dos fundos, a partir do momento em que Portugal, conforme pensamos, possa participar no espaço da moeda única.
Assim, a pergunta concreta que faço é a seguinte: o que nos pode dizer hoje, aqui, no Parlamento, o Sr. Ministro das Finanças sobre a questão da manutenção ou da reafectação de fundos que permitam continuar a ultrapassar as disparidades que nos separam da média das economias europeias? Trata-se de uma questão que
me parece importante esclarecer.
O segundo ponto que quero suscitar tem a ver, por um lado, coma questão das consequências e do estudo que o Ministério encomendou, ouvindo os grupos parlamentares, nomeadamente o nosso, sobre as consequências da participação na moeda única, e, por outro, com os problemas que podem surgir em algumas empresas e a adaptação necessária de alguns sectores.
Na sua perspectiva, Sr. Ministro, e no tempo limitado que um debate parlamentar permite, até que ponto julga que, quer a comissão do curo, quer esse estudo, poderão ajudar a clarificar, para muitas empresas é para vários sectores, os espaços novos que se abrem ao desenvolvimento económico e, para alguns sectores, a expansão empresarial e o desenvolvimento da competitividade?
Estas são as duas questões que lhe queria formular e parece-me que são questões reais que interessam aos portugueses.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Questões difíceis!
O Orador: - A terminar, quero congratular-me com a determinação de V. Ex.ª e do Sr. Primeiro-Ministro na forma como têm defendido, interna e externamente, o dossier da participação de Portugal na moeda única. Nesta questão, as palavras têm um valor, como têm um valor também na área económica e financeira. Aqui, não podemos dizer que «palavras leva-as o vento», aqui, as palavras, nomeadamente as do Ministro das Finanças e as do Primeiro-Ministro, têm valor e, por isso, congratulamo-nos com a forma como têm actuado.
E porque, para nós - reafirmo-o -, é fundamental, nesta caminhada, compatibilizar o desenvolvimento económico com a solidariedade social e compatibilizar o processo de integração europeia com o projecto político que o Governo, que V. Ex.ª integra e que é o nosso, tem efectivamente em mente, formulo-lhe estas perguntas e congratulo-me com a vossa forma de actuar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
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O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, em primeiro lugar, agradeço as suas palavras. Também faz parte da democracia que o Governo tenha, no Hemiciclo, uma bancada, que é a sua, pelo que as palavras que vêm da bancada que nos apoia, como expressão do mandato dos portugueses, têm, para nós, um valor afectivo e político muito particulares.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Podia guardar isso para o jantar!
Risos.
O Orador: - É a democracia, Sr. Deputado!
Quanto às perguntas que formulou, a coesão económica e social é, efectivamente, um aspecto importante e por vezes o predomínio do neoliberalismo e do liberalismo conservador em vários governos, e dos mais importantes dos países da União Europeia, tem-no deixado na sombra, durante alguns destes anos de política.
Como bem sabem, não é essa a nossa posição e, tal como em relação à coordenação de políticas para o emprego, tal como em relação à Europa social, tal como em relação à necessidade de a Europa proteger o seu modelo social perante a concorrência selvagem resultante da globalização de mercados a nível mundial, a posição deste Governo tem sido sempre coerente e defensora da liberdade mas oposta ao liberalismo conservador e ao neoliberalismo.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Vê-se!
O Orador: - O mesmo se tem passado quanto à coesão económica e social, que, para nós, é importante, a dois títulos. Como expressão de solidariedade dentro da União Europeia, entre os 15 países que a integram, e também - temos de dizê-lo mesmo que isso, a curto prazo, possa custar à nossa bolsa nacional - com os países do alargamento, cuja entrada, em devida altura e nos devidos termos, só reforçará o projecto europeu, mas também como aspecto de interesse nacional muito relevante.
O facto de o nosso produto per capita andar por cerca de metade da média comunitária quando entrámos e estar hoje perto de 70% significa não apenas que as empresas e economia portuguesa souberam encontrar, nesse alargamento de mercado, ocasião de crescimento e de melhoria qualitativa mas também que os mecanismos de coesão, pela transferência de fundos dos mais ricos para os mais pobres, funcionaram em proveito do nosso país, das regiões e das camadas sociais mais desfavorecidas e até excluídas.
Portanto, a coesão é, para nós, importante como expressão de uma Europa que vive a solidariedade interna e é-o, como disse, a dois títulos: um, estritamente europeu e, outro, nacional. Somos beneficiários da coesão, devemos dizê-lo claramente, porque isso faz parte da construção da Europa em Portugal.
Penso que as perspectivas das políticas de coesão que estão a ser negociadas e que só agora começam a ser estudadas com mais precisão, a nível de Comissão e a nível do Conselho da União Europeia, ainda são incertas, mas da parte do Governo português é legítimo dizer que, desde já, não vemos razão para a vaga de pessimismo que por vezes se tenta criar.
A coesão económico-social está inscrita no Tratado, é uma opção que todos os governos partilham e não tenho dúvida de que haverá força no âmbito dos órgãos comunitários para que ela seja implementada,...
O Sr. Presidente: - Agradeço que condense o seu pensamento, Sr. Ministro.
O Orador: - ... beneficiando Portugal.
Resumindo, creio que temos alguns sinais inequívocos de que a negociação da coesão económico-social, que vai ser prolongada e vai ser difícil, onde temos aliados e adversários, como em tudo na vida, chegará a bom porto.
A primeira das indicações é bem recente. De facto, várias manifestações concretas de coesão económico-social, como, por exemplo, o desbloqueamento das verbas comunitárias para o Alqueva, significam que ela funciona, e quem pensou que tinha deixado de funcionar enganou-se.
O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Ministro.
O Orador: - A nossa atitude de firmeza e, ao mesmo tempo, de inteira exigência quanto à regularidade, transparência e racionalidade à aplicação de fundo, deu frutos e vai continuar a dá-los.
O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, terá de fazer o favor de terminar, já gastou mais 2 minutos.
O Orador: - Peço desculpa, Sr. Presidente. Vou concluir de imediato.
A segunda razão é muito simples: a coesão económico-social está cada vez mais ligada à capacidade de rigor na gestão financeira dos países da coesão.
Quanto à terceira razão, ainda anteontem o Presidente do Tribunal de Contas Europeu, quando apresentou o relatório perante o ECOFIN, demonstrou que, pelo facto de haver países que integrem a zona do euro, isso significa que esses países renunciam à política cambial e à política monetária. É um facto! Por isso, se estiverem no grupo da coesão, sofrem uma penalização, sendo, pois, justo que sejam compensados através de transferências de coesão.
Isto é, há muitas razões para dizer que a política de moeda única vai favorecer a nossa posição social em termos de coesão e não a vai desfavorecer.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves.
O Sr. Lalanda Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa é no sentido de lembrar o Sr. Ministro de que, há pouco, não respondeu à única pergunta que, objectivamente, fiz, e que é a seguinte: para quando o referendo às alterações ao Tratado da União Europeia?
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Isso não faz parte do papel que assinaram?
O Orador: - Era uma pergunta simples, para a qual esperava ter uma resposta. De facto, não gostaria que a omissão fosse interpretada como sendo uma desistência da parte do Governo de levar por diante o compromisso de referendar as alterações ao Tratado da União Europeia.
O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro tomará a interpelação em conta, uma vez que lhe é dirigida, no momento que considerar oportuno e se for esse o caso.
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Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, estava habituado ao seu rigor jurídico e, por isso mesmo, há-de compreender que tenha ficado chocado com o que disse sobre' o referendo.
Na verdade, os dois comentadores que referiu não podiam deixar de comentar o artigo
118.º. O Sr. Ministro sabe bem que quem propôs um referendo propôs também a alteração do artigo 118.º, o que significaria, naturalmente, que se os dois comentadores analisassem o artigo 118.º depois de revisto, escreveriam uma coisa diferente daquela que o Sr. Ministro aqui citou.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É óbvio!
O Orador: - Mas mais, o Sr. Ministro sabe também que, nesta matéria, o PS e o PSD acordaram alterações aos artigos 118.º e 256.º, em matéria de regiões administrativas, para referendar não a questão de haver ou não regiões administrativas mas a questão de ser ou não implementada uma lei de regiões, já aprovada na Assembleia da República. O que significa, contrariando princípios, implementar decisões já tomadas.
No entanto, neste caso, nem se trata, obrigatoriamente, de uma decisão já tomada, porque uma coisa é o Tratado da União Europeia e outra coisa diferente é Portugal decidir adoptar as políticas de convergência nominal para o euro, questão que é uma decisão soberana do Estado português e não, propriamente, voltar a colocar a referendo o Tratado da União Europeia no seu conjunto.
Gostaria, de resto, que o Sr. Ministro perguntasse a si próprio e, se possível nos desse o resultado da resposta, que sentido tem referendar a revisão do Tratado da União Europeia, seguramente importante mas que tem a importância que tem, e, ao mesmo tempo, defender que não seja referendada a moeda única.
Creio que isto é totalmente incoerente! Aliás, qualquer exame de consciência dirá, com certeza, que é de uma total incoerência política.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Por outro lado, o Sr. Ministro referiu aqui as políticas económicas e financeiras do actual Governo, referiu desempenhos económicos nesta matéria, referiu, inclusive, que a situação, a partir de 1995 e 1996, está melhor. Gostaria de perguntar por que razão é que o PS, tendo em conta a resolução aqui aprovada, em conjunto com o PSD, sobre a moeda única, elogiou as políticas macro-económicas da última meia dúzia de anos e em que é que, de substancial - e apresente-me três diferenças, por exemplo -, as políticas actuais diferem das políticas que o próprio PS elogiou como sendo as políticas do PSD.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Uma pergunta difícil, Sr. Ministro!
O Orador: - Ainda outra questão, Sr. Ministro. Já ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro dizer que, em Bruxelas, o euro era um filho e o emprego era o enteado. De acordo com o discurso do Sr. Ministro das Finanças, parece que em vez de uma relação de filho e enteado passou a haver uma relação diferente, isto é, o emprego passou a ser um filho natural do euro, o euro vai conduzir a todas as maravilhas, inclusive a essa maravilha. Parece que deixou de haver uma relação de conflito, como é apontada por toda a Europa e por muitos especialistas, para haver uma relação de paternidade automática.
Quanto a projectos alternativos, Sr. Ministro, todos nós temos desígnios nacionais, simplesmente para o Sr. Ministro o desígnio nacional é o euro e é um banco em Frankfurt determinar o fundamental da política económica em Portugal. Para nós, pelo contrário, o desígnio nacional é estar no pelotão da frente, mas no pelotão da frente dos salários, das reformas dos idosos, do futuro da juventude, do investimento público, para garantir, efectivamente, uma convergência real e não a convergência nominal.
Esta é a grande diferença, é este o pelotão da frente em que queremos estar, é este o projecto em que apostamos. Temos projectos, só não é projecto o pensamento único de se entender e afirmar que só há uma política possível para Portugal, a política que o Governo entende, que é, aliás, nesta matéria, igual à política que o PSD defendeu e que foi derrotada em 1 de Outubro de 1995.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para responder - e agradeço que se circunscreva, na medida do possível, aos 3 minutos regimentais -, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, muito brevemente, quanto à primeira questão, é evidente que não vou agora falar aqui de revisão constitucional. Esse é um debate que tem a sua sede própria, que não é esta.
Quanto á versão actual do texto da Constituição, o que sublinhei, e não vou repetir mas apenas remeter, é que há uma lógica de democracia representativa e uma lógica de democracia directa referendária. Sempre que as pomos em conflito a democracia perde.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, não é verdade que se possa dizer que, depois do Tratado da União Europeia, os Estados ficaram livres de querer ou não a adesão à moeda única. Só dois Estados ficaram livres: o Reino Unido e a Dinamarca. São os únicos que gozam de cláusula optativa ou de cláusula de escolha, de opting out. Os outros Estados ficaram obrigados a desenvolver este tipo de políticas. A moeda única é uma política comum que obriga os outros Estados. É evidente que o grau de execução depende da liberdade dos órgãos de cada um desses Estados, mas recordo que exigem, já hoje, sanções, por exemplo, quanto ao acesso ao Fundo de Coesão no âmbito do exercício do défice excessivo. Embora Portugal, como outros países, não aceite a perfeita regularidade dessas sanções, há uma maioria de 12 Estados da União Europeia que entende que elas não só estão legisladas no âmbito do Direito Comunitário europeu como são válidas e regulares.
Em relação à terceira questão, a situação está melhor do que nos anos anteriores. Não vou agora entrar nesta polémica, mas sublinho, pura e simplesmente, que, no essencial, há alguma continuidade de políticas mas há também diferenças. Em quê? Nos resultados! Desde 1990 que.
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não se crescia tanto como em 1996. Isto quer dizer que temos uma política de crescimento. Em segundo lugar, nas prioridades de despesa social (educação e despesa social). Aqui tem duas diferenças e, se quisesse, apontar-lhe-ia mais, se tivesse tempo.
Sr. Deputado, não são as mesmas políticas, embora tenham, evidentemente, aspectos de continuidade, como tudo na vida.
Quanto à relação entre fim e meio, vamos ver se tiramos isto de uma certa sofística. É óbvio que o euro em si é um desígnio nacional entre outros, mas não é o último dos desígnios nacionais. O euro é desejado para colocar Portugal no centro de decisão europeia, para propiciar à Europa e a Portugal crescimento económico e também emprego. É evidente que as razões por que desejamos o euro são as razões por que estas políticas estão com prioridade neste momento. O curo não é um «bezerro de ouro», o que importa são os homens e as mulheres da Europa, a sua riqueza e o seu crescimento. Este é um caminho que consideramos adequado para isso.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!
O Orador: - Quanto a projectos alternativos, Sr. Deputado Luís Sá, continuo a dizer que não vejo o PCP ter algum projecto alternativo nesta matéria.
Em boa verdade, está mais do que demonstrado que um país que faz parte da União Europeia, se se colocasse à margem da opção do euro, ficaria, ainda por cima não tendo a economia que tem a Inglaterra e a Dinamarca, na posição em que estes países estão já, neste momento, e virão a estar cada vez mais à medida que o projecto for entrando em execução. Uma posição que, no nosso caso, seria de moeda extremamente fraca, sujeita à mais pequena especulação de carácter cambial. E aquilo que acontece hoje, por um pequeno discurso ou uma pequena frase, em relação a moedas de países fortes da Europa, como a Itália, passaria a acontecer muito mais facilmente em relação a moedas de países fracos e secundarizados em relação à zona do euro. De facto, não é um projecto alternativo estar na União Europeia e estar fora do euro. Compreendo que pode ser um projecto alternativo estar fora disso tudo, mas suponho que esse projecto já foi julgado pelo povo português.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Também para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Galvão Lucas.
O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Sr. Secretário de Estado: V. Ex.ª, Sr. Ministro das Finanças, apresentou-nos aqui um quadro optimista no que se refere à situação actual da economia portuguesa e à sua evolução a curto e a médio prazo. Aliás, no que se refere à evolução da economia portuguesa até ao ano 2000, o plano de convergência estabelecido, de estabilidade e crescimento, de que tomámos conhecimento recentemente, prevê igualmente uma evolução que nos suscita alguns comentários, mas disso trataremos no debate de urgência que, oportunamente, aqui será agendado - tanto quanto tomámos conhecimento, é intenção do Governo vir aqui debater connosco esse documento.
De qualquer forma, o documento, sendo conhecido, não pode ser por nós ignorado e, da sua intervenção e da análise que fizemos desse documento, resulta a necessidade de colocar duas questões, muito concretas e muito simples, mas que para nós são muito relevantes e importantes, porque são situações que têm de ser clarificadas para que possamos prosseguir neste caminho de uma forma mais consciente e mais responsável.
Pedia ao Sr. Ministro que atentasse no seguinte: o crescimento do PIB é equacionado pelo Governo, para os próximos anos, em níveis da ordem dos 3,3% ou 3,5% quando, nos últimos seis anos, se situou, em média, à volta dos 2%, período em que houve transferências anuais de fundos da Comunidade na ordem das centenas de milhões de contos - concretamente, no ano passado, 3%, como referiu, 700 milhões de contos de transferências. A discussão levada a cabo nesta Câmara dos Orçamentos do Estado, quer para 1996 quer para 1997, deixou muito claro que, do lado da receita, pouco mais haverá a esperar acabando as privatizações, e ainda há algumas importantes privatizações a concretizar. E porque tem sido insistentemente garantido pelo Governo que a carga fiscal dos portugueses não aumentará, só se conseguirá reduzir significativamente o
déficit reduzindo despesa.
O Governo defende que o desemprego não aumentará. Ora, o quadro actual, no que se refere ao emprego, independentemente das referências que o Sr. Ministro fez, é o seguinte: houve, de facto, em 1996, em relação a 1995, no que diz respeito ao emprego total, um aumento de 0,5%. No entanto, se analisarmos o caso dos trabalhadores por conta de outrem, houve uma redução de emprego; quanto aos trabalhadores por conta própria, com pessoal ao seu serviço, houve uma redução de 5,4%; e só houve aumento nos trabalhadores por conta própria sem pessoal ao seu serviço, de 5,9%. Portanto, este aumento do emprego em 1996 é conseguido por um aumento de 5,9% dos trabalhadores por conta própria sem pessoal ao seu serviço, o que já atinge 875.900 trabalhadores em Portugal e é, como o Sr. Ministro sabe, a situação mais precária e mais conjuntural que existe em termos de emprego.
A situação nalguns sectores mais significativos da nossa economia é a que passo a referir - e vou dar-lhe exemplos de algum trabalho recente, complicado de fazer mas que foi feito: em sectores que representam 4% a 5% do PIB, como sejam têxteis, vestuários e couro, química e petróleo, o volume de vendas baixou em 1995, estabilizou em 1996 e 1997, as margens baixaram no caso dos têxteis, vestuário e couro, e estão estáveis no sector da química e
do petróleo - o emprego baixou nos dois sectores; na alimentação, bebidas e tabaco, bens de consumo, o volume cresceu mas as margens estão estáveis e o emprego também baixou; na construção e obras públicas, cuja percentagem no PIB não conhecemos (julgo que ninguém conhece, neste país, exactamente), o volume de vendas cresceu - todos sabem porquê - e as margens têm-se mantido crescentes e, aí, o emprego tem crescido.
Entretanto, assumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, ultrapassou o seu tempo. Agradeço que conclua.
O Orador: - A situação de alguns sectores é aquela que referi e, face a este quadro, que é, necessariamente, resumido, mas é real e não virtual, coloco-lhe duas ques-
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tões: como é que V. Ex.ª compatibiliza os objectivos e a análise que faz com a promessa do Governo de passar ao quadro todos os trabalhadores da Função Pública em situação de contratados a prazo e a recibo verde? Ou cumpre, e o desemprego não aumenta mas a despesa também não se reduz, ou não cumpre, o que seria lamentável, e o desemprego aumenta significativamente.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, peço desculpa, mas tem de terminar.
O Orador: - A segunda questão decorre dos números que já referi sobre o emprego e que caracterizam uma situação de crescente precaridade do mesmo. Pergunto: qual é o conhecimento que o Governo tem da dimensão e características deste problema, que é o emprego precário e o emprego clandestino, e quais as medidas que tem preparadas para o combater?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, vou responder às duas perguntas finais brevemente. Parece-me que, na perspectiva da política da UEM, a questão da taxa de crescimento do PIB, essa, é que é central, a taxa de crescimento que consta do programa de convergência e que sintetiza e justifica a política que o Governo apresentou.
Quanto ao problema dos contratos precários na Função Pública, recordo que fez logo parte do programa de concertação de curto prazo a regularização dessas situações, o que é, aliás, mais uma expressão. daquilo que tanto se diz que não existe mas existe a cada passo, que é o carácter social do Programa do Governo e da sua política. Se não houvesse preocupações sociais, ninguém se preocuparia com a regularização dos contratos precários da Função Pública - porque há, é que este problema existe.
Feita esta observação, diria que chegámos agora, no seguimento do primeiro acordo de concertação de curto prazo, de Janeiro de 1996 e não do de Dezembro de 1996, que é de médio prazo, a uma solução negociada com os sindicatos e para mais tarde ficará a regularização de situações precárias idênticas no sector privado. Essa situação, em termos de Função Pública, não significa um aumento dos trabalhadores do Estado, pelo que não é, de maneira nenhuma, incompatível com a programação feita de despesa do Estado, visto que se trata de trabalhadores que já eram trabalhadores do Estado, que serão integrados em contratos de carácter permanente, por concursos e em função das vagas que venham a abrir-se. Em termos de despesa, a única coisa que o Estado gastará a mais, mas isso é gasto social, e certamente será positivo que o faça, será o pagamento das contribuições patronais ou o equivalente, correspondente a trabalhadores que tinham vínculo precário e que, antes, não eram objecto de desconto para a segurança social. Com excepção disso, esses são trabalhadores que já eram do Estado com vínculo precário, que passam para o Estado com vínculo sólido, não há aumento da Função Pública nem aumento significativo dos encargos públicos, apenas há aumento das garantias dos trabalhadores, e isso, para nós, é muito importante.
Quanto à situação do emprego precário, foram apontados dados que não conheço em pormenor relativamente a emprego precário em Portugal. Penso que, no âmbito da concertação social, e precisamente a propósito da regularização de situações deste tipo, não apenas no Estado como em entidades produtivas do sector privado, o Governo vai continuar a efectuar essa análise a partir de duas perspectivas distintas: é necessário encarar a situação com realismo e ver que, em alguns casos, situações deste tipo constituem, para certos sectores e perante os nossos constrangimentos legislativos, a única forma de criar mais emprego. Mas é necessário também ter conta que é uma forma relativamente pouco desejável.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Ministro, ultrapassou o seu tempo. Agradeço que termine.
O Orador: - Concluo este ponto e, se o Sr. Presidente me permite, diria, quanto à taxa de crescimento do PIB, que a taxa de crescimento incorporada no programa de convergência, estabilidade e crescimento é uma taxa histórica. A taxa média, nos últimos dez anos, é de 3,3%. Não estamos a exagerar nada, estamos apenas a partir do princípio de que a economia vai começar a recuperar depois de 1996 e que as condições existentes na Europa e em Portugal permitem sustentar essa recuperação de modo que 3,5% em 1998 e 'uma média de 3,4% consiga melhorar ligeiramente aquilo que, numa tendência de médio prazo, é já uma taxa histórica. Não é uma fantasia, é, pois, algo de perfeitamente realista, pressupondo que a economia europeia continuará a dar sinais de recuperação.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado António Galvão Lucas.
O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, eu não disse ao Sr. Ministro que a despesa aumentava. É óbvio que os trabalhadores já são remunerados! O que eu disse é que se não forem integrados e se passarem ao desemprego, este aumenta. Referi uma média dos últimos seis anos e o Sr. Ministro respondeu com uma média dos últimos dez no que diz respeito ao PIB. Portanto, subverteu, com todo o respeito que tenho por si, de uma forma hábil, a questão que lhe coloquei.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, peço desculpa, mas não está a fazer uma interpelação.
O Orador: - De qualquer maneira, já ficou dito.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, afirmou há pouco, na sua intervenção, que sobre as questões da moeda única há pouco a dizer porque se tem falado excessivamente sobre ela. Não é esse o nosso entendimento. Aliás, como presumo que calcula, aquilo que, julgo, preocupa os portugueses em relação ao euro não é a moeda, não são os trocos, mas são as questões de fundo, das quais o Governo, o Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro, em concreto, continuam a fugir.
Penso que o que sobre se interrogam os portugueses e o que anseiam saber não é tanto o dia em que vão gozar da liberdade de viajar sem trocar dinheiro mas gostariam
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que o Governo explicasse que garantias lhes vão ser dadas de que os seus empregos não serão mais postos em causa do que aquilo que já são, de que a sua insegurança em relação ao futuro não aumentará, de que a sua dependência alimentar em relação ao exterior não irá acentuar-se. Essas eram as respostas e, para essas respostas, para as quais o Sr. Ministro diz que há tantas certezas, no fundo, são muito poucas as bases que usa para sustentar a sua opinião.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!
A Oradora: - A pergunta que lhe faço, em concreto, tem a ver com o famoso estudo que o Sr. Ministro das Finanças alega que vai ser feito, tendo em conta e indo ao encontro daquilo que vários partidos políticos e grupos parlamentares, nesta Assembleia, têm reclamado. Nós vivemos num país onde não são raros, infelizmente, os exemplos das grandes opções, das grandes obras e dos estudos feitos a posteriori para encaixar numa breve decisão, ou seja, estamos habituados aos estudos de impacte ambiental feitos para encaixar naquilo que previamente está determinado, estudos que- não passam de meras formalidades protocolares. Assim, pergunto-lhe: que garantias de independência dá esta equipa de que o estudo não vai contrariar uma opção que, em nosso entendimento, deveria ser tomada, isso sim, depois de pesadas as vantagens e desvantagens de uma decisão que, por antecipação, foi tomada?
Aplausos de Os Verdes.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, primeiro, a pergunta sobre o estudo e, depois, a pergunta sobre as preocupações dos portugueses.
Devo dizer que, vindo da sua bancada, me surpreende que se entenda que há um estudo técnico que pode, por si, substituir ou contrariar uma opção política.
Vozes do PS: - Claro! Muito bem!
O Orador: - Parece-me completamente absurdo que quando o Dr. Mário Soares propôs ao Governo e o seu Governo propôs à Assembleia aderir às Comunidades Europeias estivesse à espera de estudos de economistas que, na maior parte dos casos, eram contrários a isso para tomar essa decisão e apresentá-la no Parlamento. É evidente que essa foi uma decisão que não foi estudada, foi uma decisão política!
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!
O Orador: - Logo, Sr.ª Deputada, a decisão de encaminhar a Europa para a moeda única é uma decisão política que tem em conta todos os elementos de informação existentes ao tempo mas que não pode ser substituída por uma decisão técnica, tecnocrática ou académica. É uma decisão política. O estudo não tem nada a ver com o fundamento dessa decisão.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!
O Orador: - Segundo: é evidente também que essa decisão política não podia ser condicionada a um estudo técnico prévio desta envergadura. Em nenhum país se fez isso, em Portugal também não, porque seria de uma manifesta falta de senso dar à «academia» o poder de decidir aquilo que devem ser os representantes do povo e o próprio povo a decidir. Mas também seria errado que se pensasse que o estudo de uma instituição académica credenciada possa agora vir a pôr em causa radicalmente essa decisão política porque, por definição, não pode!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ah!
O Orador: - Não é «ah!»
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Isso é para acalmar o PP!
O Orador: - Não é «ah»! Não é «a», nem «b»! São dois planos inteiramente diferentes. A confusão entre a «academia» e a política é verdadeiramente abominável e não esperava isso dessa bancada, podia esperar de outras.
Uma universidade estuda as consequências de uma determinada opção política e apresenta-as. Nós podemos minimizar as consequências más e tirar proveito das consequências boas, mas nenhum estudo de nenhuma universidade ou de nenhum sábio será capaz de substituir ou pôr em causa uma decisão política tomada pelos representantes do povo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Quanto ao que preocupa os portugueses, Sr.ª Deputada, far-nos-á a justiça de todos nós, mesmo aqueles que estão no Governo, procurarmos saber o que pensam os portugueses que elegeram os Deputados e que, através deles, nos manifestam a confiança que, conjuntamente com a confiança do Sr. Presidente da República, nos permite estar aqui.
Creio ser evidente que os portugueses pensam que Portugal tem toda a vantagem em estar na União Europeia; que Portugal na União Europeia deixou de ser um país de emigrantes e passou a receber imigrantes; que está cada vez um país menos pobre; que passou a ter acesso ao espaço económico com o qual se passam 80% das suas transações e que, em vez de ser um país dependente e dominado, é um país que codecide com os outros na medida da sua força política, que é a de um médio país, os assuntos que são de interesse comum na Europa. Penso que os portugueses acham que estão bem na União Europeia e que os portugueses têm também o bom senso para perceber que uma moeda europeia comum, que é também deles, que é também portuguesa,...
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Ministro, já ultrapassou o seu tempo em quase 1 minuto.
O Orador: - Concluo de imediato, Sr. Presidente.
... é muito mais capaz de ser uma boa maneira de porem as suas aplicações e as suas poupanças do que uma moeda europeia que fosse fraca, que fosse constantemente atacada nos mercados cambiais. Os portugueses conhecem o mundo, os portugueses emigraram há séculos, os portugueses sabem bem que esta pode ser uma boa opção para Portugal.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra para defesa da honra da bancada, a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Ministro das Finanças, quem tem uma visão tecnocrática é o senhor e o seu Governo porque é o senhor e o seu Governo que falam das pessoas como se fossem números e estatísticas.
Vozes do PCP e de Os Verdes: - Muito bem!
A Oradora: - É o senhor, e o seu Governo, que não fez outra coisa ao longo deste debate.
Vozes do PCP e de Os Verdes: - Muito bem!
A Oradora: - É o senhor, e o seu Governo, que não percebeu que as decisões políticas cabem ao políticos mas devem ser sustentadas pelo conhecimento técnico. Os técnicos não substituem os políticos, mas têm a obrigação de lhes darem os elementos para que, quando os políticos decidam, saibam o que isso significa na vida das pessoas, o que isso significa no seu futuro, o que isso significa para os jovens e para os direitos que eles têm. E a ignorância desses dados, Sr. Ministro das Finanças, essa sim, é que me parece grave. Essa é uma visão tecnocrática, essa é uma visão que Os Verdes não partilham.
E, quanto ao povo, Sr. Ministro das Finanças, se está tão preocupado, dê-lhe a palavra, dê-lhe a escolha nesta matéria.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr.ª Deputada, penso que o povo português está representado por todos os Deputados que aqui estão e não apenas por V. Ex.ª. E o que o povo português pensa em democracia representativa é expresso por todos os Deputados que aqui estão e não só por V. Ex.ª. E tem sido repetidas vezes expresso que, na verdade, quando nós estamos a trabalhar para dar ao povo português o futuro que ele pretende estamos a trabalhar para tirar o melhor proveito possível da integração europeia porque é isso que o povo português quer.. O contrário, Sr.ª Deputada, seria elitista, aristocrático e, em última instância, tecnocrático, embora no mau sentido.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Finalmente, para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças, a tese do Governo é simples: a moeda única é um desígnio sem alternativa, ficar fora do euro é ficar fora de tudo, é a instabilidade, é a desvalorização competitiva é o não acesso aos fundos estruturais.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!
O Orador: - E a minha primeira pergunta é a seguinte, Sr. Ministro: se isto é assim, se é um terramoto ficar fora do euro, por que é que o Sr. Ministro, logo após ter tomado posse como Ministro das Finanças, veio aqui dizer que se ficássemos fora do euro em 1999 não era problema nenhum para o país?
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Já se esqueceu!
O Orador: - O que é que mudou? Mudou que o senhor aderiu à propaganda política em detrimento do rigor económico.
Segunda questão: porque é que ficar de fora do euro, se ele se vier a criar, porque não é certo, se dá esse terramoto? Porque é que termos um instrumento que é uma política monetária, cambial e económica própria que permite, em certas condições e dentro de certos limites, manusear instrumentos fundamentais para a economia e adequá-los às condições concretas da nossa economia, não é melhor, sobretudo para economias que não têm hoje o nível produtivo, o nível de produtividade que têm as outras economias com que temos de competir no quadro do euro? Por que é que esta alternativa não é também uma alternativa e um caminho a prosseguir, como, aliás, ainda recentemente foi aprovado num relatório do Conselho da Europa?
Sr. Ministro, demonstre-o! Isto são axiomas! E é um axioma igual àquele que, quando foi aprovado o Tratado de Maastricht, os senhores defenderam e defendem sobre os critérios de convergência. Eram aqueles e não são outros e têm que ser aqueles para cumprir. Aliás, o PS também o defendia, com excepção do Sr. Deputado Manuel dos Santos, que neste momento não está aqui, e que tinha algumas dúvidas - diga-se em abono da verdade.
Vozes do PS: - Mas vai estar!
O Orador: - Mas agora os critérios de convergência não são esse. «Deus ex machina», já são flexíveis porque a Alemanha, enfim, tem que ter flexibilidade para os cumprir!
É o mesmo axioma, são as mesmas certezas que hoje têm porque, de facto, não há fundamentos económicos não havia para o tipo de critérios que foram definidos não há fundamentos sólidos para esta defesa acérrima de termos de entrar
na moeda única ou então não há alternativa e, por isso, descobrem, criam, inventam axiomas os quais não demonstram e para os quais não querem um debate a sério.
O verdadeiro terramoto criam-no VV. Ex.as quando apresentam essa visão catastrofista.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Visão catastrofista
O Orador: - Se, por hipótese, como é previsível, Portugal não ficar no euro, então é que os mercados vão reagir à visão de terramoto que os senhores hoje lançam para o mercado nessa previsão de Portugal não ficar no euro.
A outra questão tem a ver com o estudo. Agora percebi a resposta que o Sr. Ministro me deu quando fomos ao seu Gabinete falar do estudo e quando lhe perguntei porque o entregou à Universidade Nova e não o entregou, por exemplo, ao ISEG. Lembra-se, Sr. Ministro? O senhor, então, sorriu. É que, antes de mais, a ano e meio da moeda única, isso prova que o Governo não tem estudo nenhum, sobre consequências nenhumas, isto é, é um acto de fé.
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Mas, mais. O Sr. Ministro, primeiro - era um pressuposto -, veio dizer: «a moeda única é boa»...
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, ultrapassou o seu tempo. Agradeço que conclua.
O Orador: - Agora vem dizer: «pedimos um estudo à Universidade Nova ...» - ainda corremos o risco de ser o Sr. Deputado Francisco Torres ou o Dr. Braga de Macedo a fazer o estudo -...
Risos.
«... para provar que a moeda única é boa.» É uma ajuda ao PP para o ajudar a sair da contradição e para que possa dizer «como isto é bom, vamos à moeda única»? Sr. Ministro, isto não é sério! Isto verdadeiramente não é sério!
Por último - Sr. Presidente, vou terminar -, em relação ao emprego e ao desemprego, façamos um debate sério, sem esta ideia velha e relha da política portuguesa de que quem não é por nós é contra nós. Sr. Ministro, não somos só nos a dizê-lo, temos aqui na frente um relatório do Conselho da Europa, subscrito por companheiros seus da área socialista e social-democrata, que afirmam que, com a moeda única, as regiões periféricas do território da União Europeia verão o seu desemprego aumentado, sobretudo se os desempregados recusarem a mobilidade para outras zonas de forte crescimento para onde irão, em princípio, os investimentos. É isto que o Sr. Ministro quer?
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, já ultrapassou o seu tempo em 1 minuto e meio. Tem de terminar.
O Orador: - É a precaridade, é a mobilidade, é essa a coesão social para a Europa que o Governo vem defender!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, ultrapassou todos os limites, pelo que vou ter de lhe retirar a palavra.
O Orador: - Sr. Presidente, vou só terminar o meu pensamento.
Se o Sr. Ministro e a União Europeia têm tanta certeza, por que é que aprovam um programa de propaganda do euro em que uma das cláusulas que impõem aos propagandistas é que eles vão falar no euro com a condição de nunca dizerem mal dele. Que grande confiança, Sr. Ministro!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, agradeço que esta situação não se volte a repetir porque, nesse caso, serei obrigado a carregar no botão e a retirar a palavra a algum Deputado, o que é desagradável.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho ultrapassou em 2 minutos e tal o seu tempo!
Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, vou ter de ser telegráfico. Não tenho nada a ver com esse contrato da Comissão. Esse é um problema de administração da Comissão.
Por outro lado, também creio não ser oportuno neste momento estarmos a discutir quais os critérios de escolha da entidade a quem se pediu o estudo, cuja reputação e capacidade científica e académica estão inteiramente fora de causa. Aliás, há uma abundante produção teórica que pode ser aplicada ao caso português sobre processo de integração e processo de união monetária.
E sabemos que é possível, dependendo das políticas, que a competição, nesses processos, com economias mais produtivas possa funcionar como um factor de melhoria qualitativa das unidades produtivas portuguesas desde que funcionem mecanismos de coesão e que haja políticas de melhoria da produtividade. Este Programa de Governo tem claramente a aposta na produtividade e na competitividade e a coesão económica e social vai continuar, não tenha dúvidas a esse respeito.
Quanto ao cumprimento dos critérios por parte da Alemanha, acho que vamos assistir em todo este ano de 1997 a uma série de discussões que não são fundamentais. O que tenho dito sempre a propósito dos critérios de Maastricht é que têm suficiente flexibilidade incorporada, e não vale a pena estarmos a discutir a hipótese de cada dia e na semana seguinte a hipótese que surge. Os critérios admitem vária capacidade de interpretação desde que exprimam no essencial estabilidade e desenvolvimento sustentável.
Penso, por outro lado, que é evidente que nunca disse, nem aqui nem noutro sítio, que estar fora da moeda única não é mal nenhum. O que disse foi outra coisa. Apareceu na imprensa uma frase truncada quando estava a explicar o que eram as propostas de SME II, depois do Ecofin informal de Verona, dizendo que com estas regras um Estado que não consiga entrar desde o primeiro momento na moeda única tem a sua moeda protegida e tem a possibilidade de entrar mais tarde. Antes, estar fora da moeda única era correr um risco grande, depois, é correr um risco menor. Mas isto não significa que não ser capaz de entrar desde o início seja um bem, porque essa ideia de que quanto mais tarde entrarmos melhor significa que estamos a suportar os custos de estabilidade da entrada e não teremos os benefícios. Custos sem benefícios é uma má opção e essa é a razão principal porque entendemos que é importante estar desde o primeiro momento na moeda única. Todavia, como é evidente, um país que o não esteja e que queira continuar a estar terá de reavaliar a sua política.
Também tem sido dito muito claramente, porque a nossa política não é determinada essencialmente pela moeda única,...
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Ministro, já ultrapassou o seu tempo. Faça favor de concluir.
O Orador: - ...mas integra objectivos de desenvolvimento, crescimento e emprego, que se isso acontecesse prosseguiríamos a mesma política porque ela resulta do Programa de Governo e do sufrágio popular e não resulta só do programa da moeda única.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - A Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite pede a palavra para que efeito?
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, permita-me
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rapidamente apenas referenciar que a minha bancada fez uma pergunta concreta e directa ao Sr. Ministro das Finanças e à qual não obtivemos resposta.
Portanto, aquilo que quero deixar aqui expresso é que este debate parecia que não trazia nenhuma novidade, mas se o Sr. Ministro das Finanças, realmente, não puder responder à nossa pergunta, então este debate teve uma enorme novidade política: a de que o Governo deixou cair o referendo europeu.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Qual referendo?
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, gostaria de solicitar à Mesa que esclarecesse a Câmara, particularmente a bancada do Grupo Parlamentar do PSD, sobre o que é que está definido em matéria de calendário da revisão constitucional, visto que a pergunta que, insistentemente, o Grupo Parlamentar do PSD dirige ao Governo pressupõe uma resposta sobre o calendário da revisão constitucional e a conclusão de um processo de revisão constitucional.
Já agora, agradecia que a Mesa pudesse esclarecer o Grupo Parlamentar do PSD que, nos termos da Constituição que está em vigor e que regula o processo de revisão constitucional, o Governo é um órgão de soberania que não tem qualquer tipo de intervenção no processo de revisão constitucional, não podendo, portanto, antecipar-se a um processo que cabe, exclusivamente, à Assembleia da República.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Além de que a Deputada Manuela Ferreira tem o dever de conhecer o acordo secreto!...
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O Sr. Secretário de Estado sabe que a Mesa não tem possibilidade de dar essa resposta, uma vez que a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional ainda não decidiu.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.
O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O programa de convergência, estabilidade e crescimento, enviado à Assembleia da República, que iremos muito brevemente discutir, reconhece explicitamente na sua introdução, tal como já tinha sido reconhecido na resolução conjunta aqui aprovada a 13 de Fevereiro, a continuidade do processo de convergência iniciado pelo Governo anterior.
O actual Governo e o PS convergiram com o PSD na adopção desse objectivo ao longo de 1996. Hoje o consenso quanto aos objectivos é muito claro no País e no estrangeiro, como ficou expresso na referida resolução.
Todos sabemos que são necessárias reformas políticas, económicas e sociais para o País. Na nossa perspectiva, o Governo tem andado muito devagar .em alguns casos e pouco ou nada tem feito noutros. Mas, com outras reformas feitas ou por fazer, a moeda única é sempre uma reforma crucial para o nosso país, tal como a entrada do escudo para o SME - na altura criticada por alguns com a maior das ligeirezas - foi, talvez, a mais importante de todas as reformas dos Governos do PSD.
A moeda única é, ela própria, uma reforma para facilitar outras reformas e para permitir o sucesso das nossas empresas no mercado único e no mercado mundial. Não interessa, por isso, ficarmos a discutir os eventuais modos de lá chegar, sobretudo quando a discussão não é mais do que a repetição de chavões que nada têm que ver com a moeda única. Interessa é chegar lá!
Também não se pode, por isso, dizer que Portugal estará em desvantagem em relação a outros parceiros na moeda única só porque está mais atrasado na implementação de outras reformas, como afirmaram recentemente o presidente em exercício do Conselho Ecofin ou o Secretário de Estado do Tesouro alemão - o que, aliás, se compreende se atendermos às preocupações e às pressões dos banqueiros internacionais para evitar que os países do sul da Europa entrem para o clube da UEM e como afirmam todos os dias em Portugal aqueles que, consciente ou inconscientemente, colaboram nessa estratégia de desclassificação do nosso país; aqueles que, não sendo uma alternativa de Governo e não estando interessados em fazer uma oposição construtiva, apenas sobrevivem politicamente em situações de instabilidade política e económica; aqueles que querem ficar agarrados a chavões e a capitalizar demagogicamente contra o sistema e contra a Europa.
O que se pode dizer é que sem a moeda única estaremos em desvantagem em relação aos nossos parceiros da Europa e do resto do mundo. Porém, como é óbvio, a moeda única por si só não resolve nada, mas tornará mais transparentes e visíveis as distorções e carências do nosso sistema económico e social que é necessário corrigir.
A moeda única fará com que se deixe de falar apenas na moeda única - aliás, este é mais um debate sobre a moeda única num espaço tão curto de tempo -, como pretendem aqueles que nada de construtivo têm a dizer nessa e noutras matérias. A moeda única fará com que se passem a discutir coisas mais relevantes como, por exemplo, o emprego, a educação, a qualidade de vida, que são os verdadeiros problemas que afligem os portugueses.
O Sr. João Poças Santos (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Mas os argumentos nacionalistas contra a UEM deixaram de surtir efeito, porque ficou claro que não são os outros países que nos querem na moeda única: a decisão e o interesse são nossos. Ora, começa a ser muito difícil para o PCP e para o PP justificar um alinhamento de posições com os banqueiros internacionais contra a participação de Portugal na moeda única. Começa a ser mesmo embaraçante! O PCP e o PP estão, no fundo, com o Ministro das Finanças holandês, que pôs em causa a capacidade e o interesse de Portugal em poder vir a substituir o escudo pelo euro. Deviam ficar satisfeitos, essa é também a sua posição.
A uma certa direita, a uma certa esquerda e ao eterno grupo de «independentes» que converge com esses dois sectores não interessa um pacto de regime sobre a moeda única. Concretizada a moeda única, a luta entre maioria e oposição faz-se em questões mais importantes, aproximando os políticos dos cidadãos, o que não interessa nem aos extremos, nem à esquerda e direita balofas, esvaziadas pela
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queda do Muro de Berlim, nem aos que sobrevivem politicamente fora do sistema político, quer pelos cargos para que foram nomeados quer pelo acesso privilegiado que têm aos órgãos de comunicação social.
Por isso, esses sectores criticam o «fundamentalismo» da convergência nominal, «temem» pela convergência real, apresentam-se desiludidos com o «economicismo» dos critérios de convergência e apregoam uma série de outros chavões sem se deterem sobre as razões do que está verdadeiramente em causa com a realização da UEM. Limitam-se a citar nomes e mais nomes e a lançar o alarmismo sempre que tem lugar uma qualquer greve de camionistas em França ou uma qualquer subida de taxas de juro nos EUA; garantem que tal projecto levará à guerra na Europa, que nunca se concretizará, que nunca contará com a participação portuguesa, destruirá a economia real e o emprego, ou então, porque cada vez é mais fácil perceber que tais profecias são disparatadas, antecipam a turbulência financeira e a exclusão dos idosos e desempregados como uma consequência inevitável da mesma, como se um escudo fraco defendesse melhor do que uma moeda europeia estável o poder de compra dos trabalhadores, em geral, e dos idosos e desempregados, em particular.
Por outro lado, há quem afirme, mesmo os que defendem que politicamente é necessário integrar o chamado pelotão da frente, que é hoje claro que a moeda única implicará uma série de custos sociais e económicos. Isso é um absurdo: o único impacto financeiro da moeda única que é susceptível de ser avaliado é o impacto no próprio sector financeiro, que é, de qualquer modo, ao que parece, inferior ao impacto da simples mudança de datas que implica o novo milénio.
Para além disso, esses custos trazem também benefícios significativos para o consumidor, tal como a liberalização dos famigerados controlos de capitais em 1992 inverteu uma situação de taxas de juro absurdamente elevadas que transferiram recursos do sector real e dos contribuintes para o sector financeiro.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Estão o PCP e o PP preocupados com uma eventual diminuição dos lucros dos banqueiros?
O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Estamos, estamos!
O Orador: - Esqueceram-se da convergência real? Preferem taxas de juro elevadas, verdadeiros abusos em termos dos prémios cambiais cobrados, lucros chorudos de arbitragem e especulação cambial a mais baixos custos para o investimento produtivo e a criação de emprego, menores custos para os consumidores e maior certeza nas trocas e manutenção do poder de compra dos trabalhadores portugueses? Estão preocupados com a diminuição dos lucros provenientes da especulação cambial e da remuneração excessiva da dívida pública paga pelos contribuintes portugueses? De que lado estão os senhores?
A moeda única pode, de facto, acabar de uma vez por todas com as discussões fúteis sobre a conjuntura. Não se trata, por isso, de um objectivo economicista; pelo contrário, trata-se de acabar com o que é supérfluo (as oscilações monetárias e cambiais) e de voltar a nossa atenção para as empresas, o emprego, a qualidade de vida, as pessoas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - A maioria das intervenções anti-moeda única, sem quaisquer fundamentos teóricos- ou empíricos, são apenas baseadas no que se ouve dizer aqui e acolá, não contribuindo em nada para um debate saudável sobre as vantagens e inconvenientes da sua adopção.
Mas não se diga que esta questão não tem sido discutida - e não é preciso um referendo para que esta matéria seja discutida. Aliás, um dos argumentos que mais se ouve a favor da realização de um referendo é completamente absurdo, pois diz-se que, como os portugueses têm pouca informação sobre o que é a moeda única, é necessário um referendo para sobre ela decidirem.
Srs. Deputados, os referendos devem ser usados em questões claras, onde as alternativas em confronto sejam também elas muito claras. Como todos sabem, pugnamos por um referendo sobre a revisão do Tratado da União, o mesmo é dizer sobre o aprofundamento ou não da integração europeia.
Para além disso, sabemos que a Constituição da República Portuguesa não permite referendar tratados internacionais. De facto, não podemos desrespeitar os nossos compromissos internacionais, .tanto mais que eles foram sufragados diversas vezes por uma clara maioria de eleitores, uma vez que o objectivo da moeda única aparece nos programas eleitorais das eleições legislativas de 1991. Também o Parlamento ratificou o Tratado por uma clara maioria que não pode ser posta em causa. Depois disso, a moeda única foi tema central das eleições europeias de 1994, das eleições legislativas de 1995 e até um dos temas centrais das presidenciais de 1996.
Para além do mais, trata-se de uma escolha que, independentemente da sua concretização, vem ao encontro dos programas económicos da maioria dos partidos políticos. Tal como na altura da nossa entrada para a Comunidade Económica Europeia, o PCP bate-se contra esse objectivo, mas mais tarde dirá que não quer sair do euro, reivindicando um outro referendo qualquer...
O estudo agora encomendado à Universidade Nova de Lisboa pelo Governo será apenas mais uma contribuição, entre tantas outras não encomendadas pelo Governo, para a discussão destas questões.
Como sabemos, não é possível avaliar o impacto da moeda única no sector real da economia como se avalia o impacto de uma desvalorização ou de um direito aduaneiro. Não há nenhum estudo sério que ponha a questão nestes termos, e muitos estudos de autores incontestados têm sido publicados nos últimos anos.
A moeda única é uma reforma institucional (é bom não confundir moeda única com mercado único), cujos efeitos de longo prazo podem ser discutidos, e têm-no sido. Os melhores exemplos são, aliás, os exemplos históricos: como estaria a Alemanha sem a reforma monetária de 1948? Como estariam as duas Alemanhas sem a unificação monetária de 1990? Como estaria o Arkansas com uma moeda própria? Onde é que está a autonomia monetária do Chile ou da Argentina? Quais são os exemplos de desenvolvimento sustentado sem uma moeda forte?
É apenas possível elencar uma lista de eventuais custos no caso da ocorrência de choques externos assimétricos, cada vez mais improváveis, e para os quais não existam alternativas à distribuição dos seus custos por toda a população - porque é apenas disso que se trata - através da manipulação da taxa de câmbio. Aliás, para uma eco-
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nomia como a portuguesa o importante é identificar as alternativas possíveis à moeda única, coisa que nem o PCP nem o PP têm sido capazes de fazer.
Mas o que é preciso é ler alguma coisa dos muitos estudos já publicados e não pedir novos estudos encomendados pelo Governo só para empatar, sobretudo se as suas conclusões são depois ignoradas.
De qualquer modo, e tal como gostaríamos de ouvir em audição parlamentar na Subcomissão de Acompanhamento da
UEM a Comissão Euro do Ministério das Finanças, convidaremos os responsáveis por esse estudo da Universidade Nova de Lisboa para uma audição sobre os moldes em que ele será desenvolvido. Devo dizer, para já, que recolhi o consenso de todos os partidos presentes nessa Subcomissão a que presido. Nesta, como noutras questões, somos favoráveis a um maior envolvimento da Assembleia da República.
Está garantido que não haverá qualquer discriminação relativamente a nenhum Estado da União, como se poderia, por exemplo, intuir das considerações do Ministro das Finanças holandês sobre a participação dos países do Sul da Europa na
UEM já em 1999, apesar de, naturalmente, ter lugar uma interpretação política do cumprimento dos critérios de convergência pelo Conselho de Chefes de Estado e de Governo como parece ter descoberto agora o PP.
Para além disso, terá de ser respeitada uma base comum que permita o regular funcionamento das instituições já existentes. No caso da
UEM, por exemplo, é necessário garantir o funcionamento do mercado interno e de mecanismos de coordenação monetária, o que terá lugar sob a forma de um SME B, mas também permitir uma maior cooperação entre os países que desde o início adoptem o curo, o que terá lugar sob a forma de um pacto de estabilidade - conceito a que o Governo e a Assembleia da República já aderiram.
Defendo há muito que a ideia de um SME II poderia ser substituída pela adopção unilateral do euro, nomeadamente pela adopção dos chamados currency boards, isto é, para o caso português, o Banco de Portugal só emitiria escudos totalmente cobertos por euros. Isto equivaleria à participação do Banco de Portugal na terceira fase da UEM sem poder de voto no que se refere à formulação da política monetária comum.
Estas ideias têm sido, aliás, discutidas na Assembleia da República e estão contidas num livro que ofereci no ano passado a todos os grupos parlamentares. O programa de convergência, estabilidade e crescimento, discutido em breve na Assembleia da República, respeita já o pacto de estabilidade, como o próprio nome o indica, embora, a nosso ver, continue a assentar, quase exclusivamente, na queda dos juros, pelo que seria apenas necessário anunciar a fixação irrevogável da taxa de câmbio entre o escudo e o euro.
Cumpridos todos os critérios - o que se espera ocorra, de qualquer modo, antes da introdução do euro no ano 2002 -, passaríamos, então, a tomar parte nas decisões do Banco Central Europeu.
No fundo, existem apenas duas alternativas duráveis para o regime cambial pós-moeda única: flutuação livre ou adopção do euro. Para países que poderão vir a não participar na UEM por escolha política, como é o caso da Inglaterra e da Dinamarca, a alternativa mais consistente com os seus objectivos seria a adopção de metas para a inflação, independentemente da evolução da taxa de câmbio face ao euro.
É possível, no entanto, que até o Reino Unido e a Dinamarca venham a optar por aderir à moeda única aliás, um SME II reduz-se, no fundo, a acções unilaterais dos Estados membros (com todos os custos e sem nenhum dos benefícios de estar na moeda única), porque o Banco Central Europeu não intervirá nunca em defesa das moedas fracas, uma vez que quer construir uma reputação solidamente anti-inflacionista.
A melhor opção para Portugal continua a ser aderir, por decisão comum, já em 1999. Mas se Portugal fosse obrigado a esperar mais um ou dois anos para entrar, por ter falhado, por exemplo, o critério da inflação, a melhor opção passaria a ser a fixação unilateral do escudo ao euro com a garantia de conversão pelo Banco de Portugal de todas as suas responsabilidades em euros. Ou seja, participar na UEM sem poder de voto, a situação em que, de qualquer forma, estaríamos se não entrássemos em 1999. Assim, se evitariam ataques especulativos contra o escudo e o risco de divergência da possa economia.
Decorre daqui que se o Governo falhar o objectivo da moeda única em 1999 deve continuar a trabalhar para o alcançar quanto antes. A resolução conjunta sobre a moeda única, aprovada na Assembleia da República exactamente há um mês, teve, aliás, o mérito de afastar definitivamente a ideia da elaboração de uma estratégia macro-económica alternativa caso o Governo falhasse a data de 1999.
Ainda nos faltam várias alterações legislativas para cumprirmos todos os critérios de convergência para podermos participar na moeda única desde o início. Desde logo, substituir a actual redacção do artigo 105.º da Constituição pela redacção actualizada do artigo 3.º da nova Lei Orgânica do Banco de Portugal, como defendemos na altura da sua ratificação pela Assembleia da República e de acordo com o espírito da revisão constitucional de 1992.
A nova redacção do artigo 105.º da Constituição' da República Portuguesa, que propus ao presidente da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, estaria também conforme com o artigo 105.º do Tratado da União Europeia que estabelece que «objectivo primordial do Sistema Europeu de Bancos Centrais é a manutenção da estabilidade dos preços.»
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - E a lei-quadro das privatizações?
O Orador: - Seria desejável que o espírito da última revisão constitucional fosse traduzido na letra da presente revisão. Em primeiro lugar, porque a letra deve corresponder ao espirito da lei, e, em segundo lugar, para evitar que uma eventual inconsistência da letra da Constituição com o Tratado da União pudesse servir como argumento formal para a exclusão de Portugal da terceira fase da União Económica e Monetária. Seria, de facto, muito mau que, depois de assegurado o cumprimento de todos os critérios económicos estabelecidos no tratado o que resulta em grande parte, do esforço desenvolvido pelos governos anteriores -, Portugal ficasse de fora da terceira fase da UEM em 1 de Janeiro de 1999, tal como outros Estados que o não conseguissem, apenas pelo incumprimento de uma formalidade legal. Este é um risco que correríamos sem qualquer necessidade.
Por isso, tenho insistido na necessidade de alteração da redacção do artigo 105.º da Constituição. Seria absurdo chumbar no exame para a moeda única por um mero esquecimento do legislador. Seria um desprestígio para a
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Assembleia da República fazer uma nova revisão constitucional em 1998 para corrigir a redacção de um só artigo da Constituição. Não seria bom para a democracia deixar aos Deputados o mero papel de eco de propostas de, alterações legislativas vindas de fora do Parlamento, mesmo do estrangeiro, quando se fala de défice democrático nestas matérias.
É por isso que tenciono apresentar em breve, depois de ouvido o Governador do Banco de Portugal sobre os trabalhos do grupo legal do Instituto Monetário Europeu e do Banco de Portugal na Subcomissão de Acompanhamento da UEM a que gentilmente já se deslocou anteriormente, um projecto de lei sobre a alteração da Lei Orgânica do Banco de Portugal.
O PCP deveria olhar com atenção para os países do ex-COMECOM. Em matéria de reformas institucionais não vale a pena dar conselhos a estes países, pois eles sabem bem o que querem: querem acabar com a inflação e com tudo o que é supérfluo, como, uma moeda própria. Eles sabem bem como o anterior regime cultivava o apego nacionalista por uma moeda que não comprava nada.
Por outro lado, embora tendo vivido directamente a experiência da guerra, estes países não estão obcecados com o fantasma alemão; pelo contrário, eles querem construir com a Alemanha, com a França e com os outros países da União, uma Europa mais segura contra as tentações totalitárias que conhecem bem melhor do que nós.
É tempo de virarmos uma página da História e de nos debruçarmos em conjunto sobre os verdadeiros problemas deste fim de século.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Deputado Francisco Torres, pensei em pedir a palavra para defender a honra da bancada, mas depois, continuando a ouvi-lo, achei que não valia a pena, pois a bancada não se sente ofendida.
Creio que, num debate sem surpresas nem novidades, V. Ex.ª quis introduzir algumas e eu queria dizer-lhe o seguinte: uma parte do seu discurso foi para os eleitos e outra parte, a primeira, foi para os não eleitos.
E quanto a isto queria dizer-lhe que muitas vezes na História é muito bom não estar ao lado dos eleitos... O tempo vai passar e, certamente, estaremos todos vivos para falar um dia sobre este aspecto.
O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Muito bem!
O Orador: - Não temos qualquer relutância em não estar, neste momento e neste preciso tema, junto com os eleitos. A questão dos banqueiros internacionais não é nenhum conluio que a bancada do PCP e o PP tenham feito, os senhores é que defendem um desígnio nacional que tem de ser sancionado pelos banqueiros internacionais. Essa é que é a questão!
Portanto, nós não fizemos nenhum conluio - aliás, nem poderíamos nem quereríamos -, mas, de facto, esse desígnio está nas mãos dos banqueiros internacionais, e a isto o senhor não consegue responder. Portanto, essa sua primeira afirmação é totalmente absurda.
Por outro lado, o senhor também não nos pode acusar de não querermos aproximar os cidadãos dos políticos. Os senhores é que não querem! A nossa aflição nesta matéria é exactamente a de que os cidadãos não são tidos nem achados.
Porém, o Sr. Deputado disse uma coisa extraordinária: que os referendos são aconselháveis para questões claras, nunca para questões obscuras, e nós estamos, de facto, perante uma questão profundamente obscura, e nesta matéria estamos de acordo.
O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Muito bem!
O Orador: - Finalmente, queria dizer-lhe que as alternativas foram, desde sempre, actos de inteligência. Portanto, à partida, repudiar as alternativas, parece-me - e é injusto eu dizer que é um acto de estupidez, porque o senhor não é estúpido... Mas, de facto, seria conveniente que o senhor ponderasse sobre essas alternativas.
Por outro lado, muitas vezes as alternativas não são só um acto de inteligência, são um acto de sobrevivência, e também nessa matéria era bom que ponderasse.
Não tenho qualquer pergunta para lhe fazer, queria apenas dizer-lhe isto.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Está quase uma europeia!... Mais três debates...!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.
O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr.ª Deputada, sei que a senhora tem vindo a convergir com uma posição mais, moderada por parte da sua bancada relativamente à questão da moeda única...
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Moderada, mas não tanto!
O Orador: - ... Aliás, tive ocasião de o constatar em vários debates que efectuámos.
Sr.ª Deputada, não percebi a distinção que fez entre eleitos e não eleitos, pois ninguém está excluído. Não há aqui eleitos no sentido de constituir um grupo...
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Mas são os senhores que abrem a porta!
O Orador: - Não! Nem se trata de abrir portas! Como sabe, a decisão da UEM e o seu objectivo são prioritária ou unicamente políticos, têm é consequências económicas e têm alguma sanção por parte dos banqueiros porque, de facto, os banqueiros são executantes dessa própria estratégia, mas é preocupação do nosso partido, exactamente por isso, uma maior responsabilização desses mesmos banqueiros centrais que não existe na actualidade. Os próprios bancos centrais nacionais não são hoje responsáveis, como deveriam ser perante, por exemplo, o Parlamento, e é sempre mais difícil ainda num sistema sui generis e complexo como é o da União Europeia.
Portanto, defendemos mais poderes para o Parlamento Europeu para controlo a posteriori dos objectivos do Banco Central Europeu sem pôr em causa a sua independência.
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Não há aqui nenhum conluio com os banqueiros: Pelo contrário, trata-se de um objectivo político a que o PSD aderiu desde a primeira hora, portanto estamos à vontade, porque fomos a várias eleições com programas muito claros com esse objectivo no programa e esses objectivos foram sufragados com os votos dos eleitores.
Queremos aproximarmo-nos dos cidadãos, porque, resolvida esta questão supérflua da conjuntura monetária, podemos atacar os problemas que são verdadeiramente essenciais e que dizem alguma coisa ao cidadão.
Só aqueles que querem fazer bandeiras de questões que não são essenciais, mas são chamativas em termos de. opinião pública, como é o caso do PP e do PCP, embora me pareça que já estejam a desistir dessa bandeira, é que fazem finca-pé nessas mesmas questões para não se passar à discussão daquilo que é essencial e daquilo que aproxima os eleitores dos eleitos.
Não digo, Sr.ª Deputada, que não há alternativas, o que digo é que elas têm de ser postas de maneira muito clara e sem subterfúgios, ou seja, quem não aderir ao euro tem uma alternativa muito clara: é a flutuação livre! Não é mais nada!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Essa agora! Isso é falso!
O Orador: - Então, diga-me lá, Sr. Deputado!...
Bom, não vou entrar em diálogo, porque o Sr. Presidente não permite, mas não há qualquer outra alternativa: ou é a fixação da taxa de câmbio ou é a flutuação livre. Como sabe, todas as outras experiências - e há pouco o Sr. Ministro das Finanças falava na experiência do México - têm mostrado que não há soluções intermédias e, portanto, Portugal, como economia pequena e aberta que é, tem de decidir-se por uma das duas alternativas. Não pomos em causa que o CDS-PP possa escolher a outra, tem é de dizê-lo claramente. O que não há é alternativas intermédias, e gostaria que isso ficasse muito claro. Nós decidimo-nos, politicamente, pela alternativa de aderir à moeda única porque entendemos que, em termos económicos, ela trará grandes benefícios para Portugal, mas não só. Politicamente, ela é desejável para Portugal, como uma reforma institucional fundamental, para que possamos voltar aos anos em que fomos grandes e deixemos de fora o supérfluo.
E por isso que este objectivo não é economicista. Foi exactamente para acabarem com as discussões economicistas que os economistas envenenaram os últimos 20 anos da nossa democracia.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Nomeadamente, os professores catedráticos!
O Orador: - Costumo dizer que só apareci, com a preponderância que tive, na campanha eleitoral do PSD nas últimas eleições legislativas porque ainda não tínhamos um sistema suficientemente maduro, pois estávamos, de certa forma, ainda subdesenvolvidos em relação a outros países. As questões fundamentais a discutir em eleições não são estas questões económicas mas, sim, as escolhas políticas. Ora, só podemos voltar ao primado da política quando tivermos resolvido os problemas de lana-caprina que são estes problemas conjunturais. E isso faz-se através de uma forma monetária, como a introdução da moeda única.
Aplausos do PSD.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Almeida Santos.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
Enquanto o Sr. Deputado não usa da palavra, saudemos os alunos da Escola Secundária Emídio Navarro de Viseu, que só agora chegaram.
Aplausos gerais, de pé.
Tem a palavra, Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Deputados: A oposição à integração europeia é uma batalha recorrente do PCP.
Vozes do PCP: - É verdade!
O Orador: - Digamos que, à falta de outras bandeiras que foram sendo sucessivamente anuladas pela evolução da história, o PCP se fixou nesta oposição, fazendo dela a sua principal razão de ser.
Os prenúncios do PCP têm sido, neste domínio, sistematicamente desmentidos pela evolução da realidade.
O PCP esteve contra a adesão de Portugal às Comunidades; argumentou no plano político, social e económico, mas a evolução da economia portuguesa nos últimos 10 anos derrotou-o.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O PCP protestou contra o salto qualitativo que constituiu, na construção europeia, o Acto Único Europeu, mas a realidade desmentiu os seus presságios.
Vozes do PS: - Apoiado!
O Orador: - O PCP barafustou contra o Tratado da União Europeia, mas a aceleração dele decorrente, no domínio institucional e das políticas económicas, e os tempos mais recentes aí estão para o fazer mudar de opinião.
O PCP continuará a protestar e a opor-se à moeda única, ao alargamento da Comunidade, às políticas económicas harmonizadas, ao lançamento de bases de uma política europeia de emprego, à Europa social, etc., etc., etc. Mas a história prosseguirá interminavelmente o seu curso e a ideia de uma Europa unida e a uma s6 voz consolidar-se-á sem recuos.
Contudo, não é despicienda a tentativa regular de colocar este assunto na ordem do dia. Existe mesmo nessa atitude algo de positivo e louvável. É que a transformação da Europa e a construção da União Europeia é uma tarefa que não pode fazer-se com o alheamento dos cidadãos, em geral, e da opinião pública mais esclarecida, e todos os debates sobre esta matéria realizados no Parlamento, sobretudo se forem assistidos por jovens, serão contributos inestimáveis para esse objectivo. Até porque permitem perceber a sem-razão do PCP.
Vozes do PS: - Bem lembrado!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vivemos hoje, na Europa e em Portugal, tempos de profunda transformação mas também de acentuada esperança.
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A ideia de assentar a construção europeia num pilar de integração económica e monetária, sem excluir as preocupações do desenvolvimento, sendo uma ideia de futuro e progresso, é também, em certa medida, uma ideia de sobrevivência.
O embate de blocos económicos, políticos e sociais é a regra de ouro dos nossos tempos. Nele se funda e fundamenta o processo de globalização, a que assistimos à escala planetária. Ninguém sobreviverá sozinho. A globalização não é um fenómeno de exclusiva natureza económica. São profundas as suas implicações políticas, científicas, tecnológicas, sociais e culturais. E não se diga que estamos perante um fenómeno actualizado da mundialização das economias, que surgiu na sequência da expansão europeia no fim do século passado, porque efectivamente assim não é. Viver no mundo actual é partilhar as incertezas e lutar ferozmente por todas as oportunidades.
Neste contexto, as hipóteses de êxito variam na razão geométrica dos níveis de integração em espaços políticos mais alargados e economias mais poderosas.
A autarcia e o isolamento, que tantas vezes parecem ser reclamados pelos segmentos minoritários na sociedade portuguesa que se opõem à integração, teriam como resultado inevitável o definhamento da economia e as piores consequências.
A marginalização de Portugal em relação aos centros de decisão estratégica para o futuro, que decorreria já não tanto do abandono da ideia de integração mas da aceitação de um ritmo mais lento, produziria, a prazo, efeitos semelhantes.
É, assim, justa e correcta a política do Governo português, no sentido de se manter na frente do processo de construção europeia.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E não apenas por razões defensivas.
Nos últimos 10 anos, muito mudou na economia e na sociedade portuguesas.
Contra as previsões alarmistas do PCP, Portugal foi beneficiário líquido, durante o primeiro decénio de integração, de cerca de 2300 milhões de contos.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Essa é que é essa!
O Orador: - Repito: 2300 milhões de contos!
Sem convulsões excessivas e preços demasiado elevados, procedeu-se durante esse período a uma lenta transformação das estruturas produtivas portuguesas, à sua progressiva integração e adaptação a um mercado mais amplo e mais exigente e à criação e generalização de infra-estruturas de transporte e comunicações.
Em paralelo, reforçou-se um sentimento de cidadania e pertença europeias que, sendo mais imaterial, nem por isso deixa de ser um factor cultural importante e essencial para o desenvolvimento do nosso património económico.
As regras que voluntariamente aceitamos, de disciplina das finanças públicas e de moderação dos preços, são, em si mesmo, imprescindíveis, embora não suficientes para a viabilização de um modelo de desenvolvimento económico são e sustentado.
A política do actual Governo é, a esse título, exemplar. Aceite o princípio da restritividade das políticas que, de algum modo, aquelas regras incorporam, procedeu-se à indispensável correcção através da reafectação dos recursos e da redefinição das prioridades.
É, no fundo, a política «de rigor financeiro e consciência social» que o actual Governo introduziu.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Ora aí está!
O Orador: - Nisso se distingue profundamente do modelo assumido pelo Governo anterior, exclusivamente preocupado com a convergência nominal e o cumprimento dos seus principais indicadores.
Os resultados (melhores resultados) são, de resto, já perfeitamente visíveis: depois de um ciclo de divergência real, isto é, de crescimento português inferior à média comunitária, estamos de novo a crescer acima dessa média e, consequentemente, a convergir.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Só não vê quem não quer!
O Orador: - Esta evolução indispensável e, em si mesma, fundamental para justificar o esforço de integração foi compatível com uma razoável evolução do peso das políticas sociais, com o reforço significativo do investimento público e, sobretudo, com a paralisação da tendência crescente do desemprego.
É, de resto, nesta combinação de políticas potencialmente restritivas, como são as resultantes da disciplina orçamental e da moderação dos preços, com políticas selectivas de expansão, tais como o crescimento criterioso do investimento público, a reafectação de recursos para a educação, a formação e a saúde, o apoio às regiões deprimidas e a intervenção activa no mercado de emprego, que assenta no presente e fundamentará no futuro imediato o processo de desenvolvimento da economia portuguesa.
Este modelo está incorporado no plano de convergência até ao fim do século, que o Governo já apresentou e submeterá à Comissão Europeia a curto prazo.
Não pretendo, contudo, iludir as dificuldades. Todos os processos novos e de transformação estrutural profunda geram fenómenos de perversidade. É preciso combatê-los e erradicá-los, desde logo, reforçando os factores de competitividade da economia portuguesa, que passa, no essencial, pelo reforço da competitividade da própria sociedade.
No entanto, não devemos confundir o necessário esforço de competitividade com os mitos e limites de uma certa cultura de competição.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - São importantes todas as políticas de recuperação do tecido empresarial e de internacionalização da economia e são ainda mais fundamentais as políticas que incorporarão a indispensável reforma da Administração Pública e dos procedimentos administrativos.
É necessário o reforço das políticas de coesão, centrado na luta à exclusão social e às assimetrias regionais, e o combate reiterado ao desemprego.
Este combate é, de resto, o grande desafio que se coloca à Europa e aos europeus. A manutenção de uma taxa elevada de desemprego é um factor perturbador do reforço da integração, mas, por outro lado, só será ultrapassada com uma integração mais exigente e consolidada, assente na harmonização de políticas e no lançamento de acções europeias comuns.
A solução para este problema não passa, como o referem os Srs. Deputados interpelantes, pela moderação de
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ritmo na construção europeia, antes exige que se caminhe, sem hesitações nem alterações de rumo, para o Mercado Único.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Do ponto de vista político e social, vivemos no ponto de não retorno.
Vozes do PS: - Bem lembrado!
O Orador: - As responsabilidades que temos com os jovens cidadãos «que dizem chamar-se amanhã» devem sobrepor-se às exigências de um melhor bem-estar no curto prazo.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente. Srs. Deputados: A participação de Portugal, com todos os direitos e desde a primeira hora, nesta nova fase da construção europeia é um projecto do Governo mas é sobretudo um desígnio nacional.
Não podem subsistir dúvidas acerca disso. Reforcem-se (reforcemos todos) os mecanismos de discussão plural e democrática acerca da moeda única e das suas vantagens, sem iludir as dificuldades que há a vencer e a superar.
Não invoquemos, permanentemente e no total olvido das opções eleitorais recentes, legitimidades que, sendo respeitáveis, seriam no actual contexto perturbadoras e potencialmente bloqueadoras.
Aderir à moeda única, a partir de 1999, é um projecto consistente e convergente com as opções macro-económicas do actual Governo. Opções que valem por si mesmas, independentemente do projecto europeu, e que são essenciais para colocar Portugal no centro nuclear de tomada de decisões estratégicas que influenciarão irreversivelmente o nosso futuro.
Neste contexto, estar de fora, estando alguns dentro, seria preocupante e potencialmente muito prejudicial.
Srs. Deputados, aceitemos por uma vez que o destino dos portugueses não é necessariamente o de ficarem na margem dos grandes projectos, antes pode ser (terá de ser) o de construírem activamente o futuro de todos .os europeus, que é, afinal, o nosso próprio futuro.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Galvão Lucas e Octávio Teixeira.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Galvão Lucas.
O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, a exposição que nos trouxe e a forma convicta como defendeu o novo desígnio que nos conduzirá à moeda única não me leva, no entanto, a crer que não é necessário pensar um pouco mais além dos desígnios e das missões sem que haja fundamentos e análises que nos conduzam de uma forma mais pragmática, mais directa, a esses objectivos. Talvez seja a minha deformação profissional, mas é assim que sei raciocinar.
Quero apenas dar-lhe um exemplo e pedir-lhe que me esclareça, tanto quanto possível, claramente, porque, se não o conseguir fazer no que respeita a esta matéria, julgo que toda a convicção que pôs na tribuna não fará muito sentido.
O exemplo que temos da Alemanha é típico daquilo que é um sistema do tipo monetário a funcionar, com uma Alemanha rica e uma Alemanha pobre fazendo hoje parte de um país único. O Sr. Deputado sabe tão bem quanto eu que anualmente é transferido da ex-Alemanha Ocidental para a ex-Alemanha Oriental cerca de 17% do PIB alemão, o que equivale a 3% do PIB nacional. Ora, como é possível que todas as previsões que nós fazemos, que o Governo faz e que o partido de V. Ex.ª, que apoia o Governo, faz sejam exequíveis se não houver uma garantia de que algo está negociado e conseguido em termos de transferências adicionais ou de mecanismos de compensação, para que as assimetrias entre os países mais ricos e os menos ricos não se agravem ou, se possível, se atenuem? Até porque os países mais ricos, como é sabido, não querem aumentar as suas contribuições. Ora, a abertura do mercado está aí à porta e de duas uma: ou o nosso Governo, o Governo que VV. Ex.as apoiam, já conseguiu transferências adicionais que nos vão permitir atingir os tais objectivos de crescimento, de redução do défice, de manutenção de uma qualidade de vida adequada e os mecanismos consequentes de compensação, ou, então, não entendo a convicção que o Sr. Deputado põe e não posso aceitar que enveredemos todos por este projecto, tendo exclusivamente na base um desígnio ou um imperativo que não seja baseado em dados mais concretos.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos, deseja responder já ou no fim?
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Respondo já, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Galvão Lucas, penso que a sua questão é de fácil resposta.
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado coloca a situação da Europa e, particularmente, da Alemanha como se não tivesse havido a unificação. Seguramente, se as duas Alemanhas se mantivessem separadas, o senhor reconheceria que, neste momento, a disparidade dos níveis de desenvolvimento seria ainda maior. Ora, é esse esforço de integração que propomos e aceitamos que seja feito também na Europa.
É evidente que a questão da coesão económica e social, aliás, um dos princípios do Tratado da União Europeia, um princípio fundamental introduzido em Maastricht, não será anulada com a criação da moeda única. A moeda única, uma moeda única a circular em todo o espaço europeu, é ela própria um factor de coesão económica e social. É evidente que o problema se coloca igualmente quanto à reafectação de recursos no interior da própria Comunidade e entre as regiões diversas da mesma
Comunidade.
Neste momento, temos um quadro financeiro perfeitamente estabilizado. O II Quadro Comunitário de Apoio, que está concretizado, é conhecido e está a ser implementado, transporta-nos até 1999. Parece-me que ainda é muito cedo - sobretudo não sabendo qual vai ser a evolução da Europa e a nossa própria evolução, pelo que não podemos ainda perceber inteiramente que tipo de
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problemas de coesão se colocarão na altura - e manifestamente exagerado que V. Ex.ª esteja já a exigir-nos uma nova programação financeira, uma vez que a Europa, em 1999, terá características muito diferentes das que tem em 1997, havendo uma nova programação financeira a partir de 1999.
O que é importante, e aqui está boa parte da minha convicção, é que com o Tratado da União Económica Europeia incorporou-se um princípio de coesão, de solidariedade, de ajudar com políticas de discriminação positiva, se for esse o caso, com readaptação ou alocação diferente dos recursos a regiões mais deprimidas, que podem ser um país ou apenas regiões. Esse é que é o princípio fundamental, o princípio soberano e o que nos dá as garantias de que, efectivamente, as coisas correrão bem.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, já vai sendo norma, quando discutimos matérias relacionadas com a União Europeia, que, tanto da parte do Governo, como do PS, como do PSD, pretendam fazer, em relação ao PCP, processos de intenções.
O Sr. José Saraiva (PS): - Nada disso!
O Orador: - Ora, creio que não é por essa via que devemos ir. Devemos discutir as matérias, as questões, as propostas, as opiniões de cada um e tentar rebater aquilo que consideramos errado.
Faço estas considerações, fundamentalmente, para lhe dizer o seguinte, Sr. Deputado Manuel dos Santos: quando põe a questão de que o PCP quer a autarcia, quer que Portugal fique sozinho e está contra a Europa, isto é totalmente falso.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Muito bem!
O Orador: - O problema é que nós estamos contra a Europa da moeda única porque a Europa da moeda única é contra a Europa dos homens e das mulheres, dos trabalhadores europeus!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Orador: - É essa a grande questão. É preciso construir outra Europa! Não é por este processo! Por este caminho não vamos lá, e estaremos sempre, de facto, a agravar a situação dos europeus e, no caso concreto, dos portugueses, designadamente dos seus trabalhadores.
A segunda questão, Sr. Deputado Manuel dos Santos, tem a ver com a frequente tendência do Governo para dizer que a moeda única é uma opção económica, uma mera questão económica, e é exclusivamente por aí que se deve analisar as questões. Só que o problema não está aí mas, sim, nos dois objectivos que a moeda única visa, desde o início, alcançar. O primeiro é um objectivo político: a concretização da moeda única será, para os seus defensores, o passo irreversível para a união política,...
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Orador: - ... uma união política no sentido de uma tendência federalista.
O Sr. José Saraiva (PS): - E isso é mau?
O Orador: - É péssimo! Mas já lá irei, Sr. Deputado José Saraiva... Quando colocar a terceira questão; abordarei essa pergunta que agora me colocou.
O segundo grande objectivo da moeda única é um objectivo financeiro, expresso desde o início. Pretende-se uma moeda única, uma moeda europeia, para quê? Para combater o dólar fundamentalmente, o dólar -, no domínio dos mercados financeiros. E é essa guerra económica, que subjaz ao mercado único, que implica consequências económicas e sociais do mais nefasto possível. É que nessa guerra para dominar os mercados financeiros, em combate com o dólar e o iene, vão ser utilizadas e sacrificadas armas, que têm a ver com os trabalhadores, com o nível de vida das populações e com os países mais fracos e mais frágeis, que não poderão desenvolver-se.
A terceira questão é a do desígnio nacional. Como é que o Sr. Deputado Manuel dos Santos pode fazer a afirmação de que a opção pelo euro é um desígnio nacional e, simultaneamente, recusar, desde 1992 até agora - e continuar a fazê-lo -, que o povo português possa ser ouvido em relação a uma opção que, independentemente da opinião que cada um de nós tenha sobre a moeda única, todos temos consciência e dizemos que terá consequências profundas para o nosso país?! Como é que se pretende dar este passo, que os defensores da moeda única consideram irreversível, sem consultar a opinião pública, sem consultar os portugueses? É esta a questão fundamental, a que o PS, neste momento, tem de responder.
O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
É que, em 1992, diziam «não fazemos agora um referendo sobre o Tratado de Maastricht, mas fá-lo-emos aquando da revisão do Tratado, porque, nessa altura, teremos o quadro todo definido». E, agora, recusam-se fazer o referendo, com o pretexto de que já está aprovada a moeda única e que, por conseguinte, já não se pode voltar atrás.
Isto é enganar os portugueses!
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, há algumas questões que vou abordar superficialmente, não por falta de consideração por V. Ex.ª ou porque não lhe pudesse responder, mas porque, conhecendo as duas intervenções que os meus colegas de bancada, Srs. Deputados João Carlos da Silva e José Saraiva, vão proferir de seguida, sei que algumas das questões que colocou acabarão por ter resposta nessas intervenções.
Reconheço que, às vezes, tenho alguma dificuldade em «acertar» no PCP, mas, por acaso, nem me referia ao PCP, ao dizer que «a autarcia e o isolamento, que tantas vezes
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parecem ser reclamados pelos segmentos minoritários na sociedade portuguesa que se opõem a integração, (...)».
Não falei, pois, no PCP, mas em segmentos minoritários
No entanto, reconheço que V. Ex.ª se considera integrado
nesse segmento minoritário.
Protestos do PCP.
Contudo, em relação à problemática europeia - e, agora, falando a sério e pedindo desculpa por lho dizer, mas fazendo-o com toda a franqueza e consideração -, tenho alguma dificuldade em «acertar-lhes», porque os
senhores efectivamente não estão quietos. É que os senhores têm vindo de derrota em derrota...
Risos do PCP.
Lembro-me perfeitamente de um debate que tive com a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo, em que ela afirmou peremptoriamente que Portugal iria ser um contribuinte líquido das Comunidades - e o senhor não pode desmenti-lo, porque isso foi dito aqui, na Assembleia da República, e está registado. Ora, a verdade é que, ao longo de 10 anos, recebemos 2,3 milhões de contos de contribuintes líquidos da Comunidade. Mas os senhores recuam sistematicamente na questão europeia. Agora, estão fixados na questão da moeda única e «inventaram» a recolha de assinaturas - aliás, muito mediática para o Sr. Deputado Carlos Carvalhas -, para o referendo. Os senhores têm de ter sempre uma bandeira - foi isso o que eu disse no meu discurso.
Os senhores não estão contra a Europa? É evidente que estão! Ou melhor, estão contra a ideia da integração europeia, da construção da União Económica e Monetária - é evidente que estão! Mas isso não é novidade. E é bom que isto seja discutido em todos os fora e em todas as circunstâncias. Multipliquem as interpelações! Aliás, referi que a vossa interpelação era bem-vinda, porque ela
vai permitir que os presentes e os ausentes através dos meios de comunicação social sejam informados. E se os senhores tiverem razão, seguramente ganharão as próximas eleições... Ou teriam ganho as eleições passadas...
Mas basta olhar para a vossa bancada para ver que o número de Deputados tem vindo sistematicamente a diminuir...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Vamos fazer o referendo!
O Orador: - Já lá vamos!
Quanto à questão do federalismo, não vou dar-lhe a minha opinião pessoal. Se quiser, fá-lo-ei lá fora, no corredor.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Diga aqui!
O Orador: - Não. Tenho direito a ter as minhas opiniões pessoais.
Quanto ao federalismo, o Sr. Deputado Octávio Teixeira colocou duas questões, mas há três: o federalismo, o mero associativismo e o confederalismo, uma forma mitigada de federalismo. Esqueceu-se, pois, desta última. Ora, como sou ousado, e até porque estou a ser estimulado pelo Sr. Deputado José Saraiva, devo dizer-lhe que não tenho medo, absolutamente nenhum, do federalismo e é perfeitamente possível, no quadro do federalismo, defender a identidade, a cultura, os valores, a história e o património nacionais. Não tenhamos sobre isso quaisquer dúvidas.
É evidente que a opção pela moeda única é um desígnio nacional. Então, se é um desígnio nacional, pergunta-me o Sr. Deputado, por que é que não fazemos o referendo? O Sr. Ministro das Finanças já respondeu a essa pergunta. A questão da moeda única está resolvida.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não está nada!
O Orador: - Desculpe, Sr. Deputado, mas nós assinámos um tratado, onde a moeda única surge como consequência inevitável dos compromissos que assumimos. O que pode ser referendado - e sê-lo-á, seguramente são as alterações que se verificarão na arquitectura europeia, na sequência da revisão do Tratado. A questão da moeda única é algo que está assumido, adquirido - é um acquis, como se costuma dizer na Comunidade Europeia -, no que diz respeito à nossa integração em termos de política económica.
O Sr. Presidente: - Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente
No entanto, também procurei dizer que, independentemente desse desígnio, os valores, consagrados no Tratado, da disciplina financeira e da moderação dos preços e espero que tenha estado atento, pois não fiquei por aí -, são condições essenciais para uma economia sã, desde que acompanhadas por outras - e é o que tem sido feito, designadamente a nível dos problemas do investimento público, de novas prioridades em relação aos sectores sociais, da formação, da educação, da luta contra a desertificação do interior. Se for feito tudo isso, independentemente da moeda única, não sei muito bem qual é o modelo alternativo que os senhores queriam.
A não ser que efectivamente o Sr. Deputado Carlos Zorrinho tenha razão quando diz que os senhores querem uma economia à década de 60, para fazermos as desvalorizações competitivas, ou pretensamente competitivas, dessa época, para aumentar o desemprego, para diminuir o rendimento total das pessoas, para aumentar a inflação, etc. Não acredito que queira isso, Sr. Deputado.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - É, de facto, uma pobreza enorme!
O Sr. Presidente: -- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Quero fazer uma curta intervenção, para dizer a VV. Ex.as e aos Srs. Deputados que é cada vez mais minha a convicção de que estes debates são um pouco os debates do «faz de conta». É que, enquanto estamos aqui a discutir as consequências e as implicações, todos nós já sabemos o que pensam o PS, o PSD, o PCP e o Partido Popular. Mas aquilo que talvez importe dizer, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, é que, enquanto estamos aqui a discutir, convictos de que vamos decidir o que quer que seja, na Alemanha, hoje, discute-se a sério se existirá ou
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não moeda única em 1999. E o que é grave para mim e para o Partido Popular é que o nosso Governo e o nosso país estejam a adoptar estratégias, políticas e medidas, em função não de uma vontade própria ou de uma política autónoma mas, fundamentalmente, daquilo que lá fora se fará ou não.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Significa isto, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, que não há hoje a garantia de que a moeda única ocorra em 1999.
E significa, ainda mais, Sr. Presidente e Srs. Membros do Governo, o seguinte: há dias, foi feito aqui um debate sobre a moeda única - nessa altura, a propósito de uma interpelação ou de um debate de urgência, pedido pelo Partido Popular -, em que o PS e o PSD se uniram, no sentido de que nenhum país ousasse pôr em causa a participação de Portugal na terceira fase, se fossem cumpridos os critérios de convergência nominal. Ora, a minha bancada teve, nessa altura, oportunidade de dizer que essa seria uma decisão política e não económica. Fomos contestados, contraditados, e curiosamente, pese embora o facto de um representante do Ministério das Finanças tenuamente ter vindo dar uma explicação sobre um parecer do Comité Económico e Social, há um parecer desse mesmo Comité, pedido e já discutido na Comissão Europeia, que vem dizer
claramente que a decisão de passagem à terceira fase será uma decisão política e não apenas económica.
Seria, aliás, interessante, Sr. Presidente, que V. Ex.ª fizesse distribuir este documento por todas as bancadas,...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Mas isso não é um tratado!
O Orador: - ... para que os Srs. Deputados, antes de falar, tivessem conhecimento não apenas do pensamento mas também daquilo que tem sido escrito por essa Europa fora.
Curiosamente, estas reflexões, que têm vindo a ser feitas ao nível europeu, dizem o seguinte: «É bom que haja em conta que, caso se dê uma união monetária de economias nacionais de níveis de desenvolvimento desiguais, o desaparecimento de câmbios maleáveis pode igualmente ter repercussões negativas. Os países que não satisfaçam os critérios reais de convergência correm o risco, como mais adiante se verá, de não poderem ir atrás dos demais e, durante um certo tempo, perderem quotas de mercado à exportação para regiões economicamente mais fortes».
O que significa, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, que o País discute a convergência nominal e a convergência real com base em previsões, que virão a ser discutidas nesta Câmara, apresentadas pelo Governo, de um Programa de Convergência, Estabilidade e Crescimento para o Ano 2000. Só que estas são previsões, Srs. Deputados do PS e do PSD, com base não no aumento das exportações - como, aliás, aqui se reconhece, ao dizer-se que as exportações não terão um peso significativo no aumento do PIB - mas na rubrica da procura interna e, dentro da procura interna, na rubrica do aumento do consumo privado. E aquilo que não se diz é que a esmagadora maioria das famílias portuguesas consome, hoje, com cheques pré-datados e com recurso aos cartões de crédito, na esperança de, daí a dois, três ou quatro meses, poderem vir a ter dinheiro nas suas contas para pagar aquilo que compram hoje. É essa a realidade e seria bom que auscultassem e consultassem o Ministério da Justiça para saberem quantos são os processos, que deram entrada desde Janeiro, em relação ao consumo feito no último Natal, em Dezembro, mesmo aqui, na cidade de Lisboa. E seria bom, Srs. Membros do Governo, reflectir sobre o problema da esmagadora maioria das famílias portuguesas que estão endividadas e não têm capacidade para suportar as contingências que lhes estão pela frente. Esta é uma realidade em relação à qual, na maior parte das vezes, o Governo diz nada.
Sr. Presidente e Srs. Membros do Governo, embora não esteja cá o Sr. Primeiro-Ministro, gostaria de dizer ao Sr. Ministro das Finanças, que seguramente transmitirá ao Sr. Primeiro-Ministro, algo simples mas também muito sério: apesar de todos os ataques, normais em política e nos partidos, o Partido Popular procurou, desde o início da presente legislatura, ter com os senhores uma postura séria e franca de debate, de diálogo e de trabalho. Assim, o Partido Popular propôs ao Governo que, antes de estarmos a discutir as questões de lana-caprina, como disse aqui um Sr. Deputado do PSD, avançássemos a sério nas reformas do regime e nos pactos de regime, de que o País carece, na educação, na justiça, na saúde, na segurança social e na Administração Pública.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - VV. Ex.as não quiseram, não aceitaram assim prosseguir. VV. Ex.as fizeram, de facto, dois grandes pactos nesta legislatura com o PSD: um, para a revisão constitucional e, outro, para a moeda única, em 1999. O PSD está comprometido com o Governo no agravamento da economia, se, por acaso, o desemprego aumentar e o seu nível «explodir», daqui para a frente. O PSD deixou de ter qualquer margem de recuo, porque deu toda a cobertura ao Governo do Partido Socialista para fazer aquilo que entendeu.
Quero ainda dizer-lhe, Sr. Ministro, que o Governo não contará mais com ó Partido Popular para debates ou pactos de regime sobre questões fundamentais, porque o partido do Governo e o próprio Governo entenderam estabelecer com o Partido Social Democrata pactos de pequeno grau e de conjuntura, em vez de discutirem primeiro as questões fundamentais e de estrutura do País. O Governo, infelizmente, discute a conjuntura mas não a estrutura.
O Governo não tem a coragem de mexer na Administração Pública, a não ser para dizer ao País: «vamos ter de mexer na Administração Pública e de despedir pessoas, não porque o queiramos mas porque a Europa nos obriga e porque a moeda única nos impõe». Não há governo algum, seja ele de que partido for, que não tenha rumo, que não tenha coragem para assumir as suas consequências e que deite as desculpas para a Europa e para a União Europeia, que acredite verdadeiramente nessa mesma a Europa e nessa mesma União Europeia! Porque, à semelhança do que aconteceu, infelizmente, com o passado, os senhores são os piores inimigos da Europa, são os que mais querem revoltar as populações contra à Europa e contra a União Europeia.
Há, de facto, nesta Câmara, um partido verdadeiramente europeísta. Esse partido é o Partido Popular, porque é um partido que acredita numa Europa, sem esconder aos cidadãos, sem esconder às pessoas os malefícios e as desvantagens que também tem entrar para um determinado clube. Os senhores não o fazem!
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Os senhores vão despedir pessoas da Administração Pública e mexer em muitos lobbies e em muitas «quintas», que, infelizmente, já deveriam ter sido desmanteladas, não porque tenham a coragem de o fazer mas apenas com o alibi de que é a moeda única e o Banco Central Europeu que vos obriga a fazê-lo.
Não é ,sério fazer política assim! Um político, um partido ou um governo devem assumir as suas responsabilidades e ter coragem, mesmo que essas responsabilidades impliquem perda de votos e que as pessoas se voltem contra eles, num determinado momento ou num determinado mês.
O que é grave para mim e para esta bancada é que os senhores querem deitar as culpas para a Europa daquilo que, inevitavelmente, vai acontecer ao nível do tecido produtivo, das pessoas e da sua vida.
O Sr. Deputado Galvão Lucas - e com isto concluo - fez aqui perguntas que, com todo o respeito, não foram respondidas.
O Sr. Ministro dizia há pouco que os funcionários que têm recibo verde não vão aumentar as despesas, porque já fazem parte do Estado.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que termine.
O Orador: - Ó Sr. Ministro, com todo respeito, não quero acreditar que um funcionário ou um trabalhador a recibo verde tenha os mesmos encargos que um trabalhador que tem contrato definitivo.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Então, mantém-se o recibo verde!?
O Orador: - Sinceramente, ninguém entende isso! E se não se mantém o recibo verde,
como diz o Governo, então, obviamente, vão aumentar as despesas da Administração Pública, vão aumentar as despesas do sector público administrativo.
E, depois, há uma outra questão, Sr. Presidente, que também não foi respondida ao Sr. Deputado Galvão Lucas. Os senhores fazem previsões sem ter garantido que os fundos de coesão ou que as transferências de dinheiro da Comunidade para os países do Sul vão aumentar efectivamente ou se vão manter. E aquilo que temo, Sr. Presidente, é que estejamos a analisar a conjuntura e não a estrutura e que estejamos contentes, felizes e tranquilos quando aumenta todos os dias o número de trabalhadores com trabalho clandestino, sem segurança para si e para as suas famílias.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe, mais uma vez, que termine.
O Orador: - Essa responsabilidade é do PS e do PSD.
É por isso, Sr. Presidente, que, quando o Sr. Deputado Francisco Torres diz que não estamos nos eleitos, eu digo: «ainda bem que não estamos nesses eleitos, porque não queremos fazer parte daqueles que vão ser criticados pela história - e pela história mais recente do que aquilo que se possa pensar - e que não ouviram, a tempo e horas, os que acreditavam verdadeiramente no desenvolvimento da economia».
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Acácio Barreiros; no entanto, como pode verificar, o Sr. Deputado Manuel Monteiro não tem tempo para responder.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, o PS cede dois minutos do seu tempo para o Sr. Deputado Manuel Monteiro poder responder.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra, Sr. Deputado Acácio Barreiros.
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, bem-vindo ao grupo dos defensores da União Europeia e do euro!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Contudo, devo dizer-lhe que não fica muito bem chegar agora e dizer que é o maior defensor da União Europeia e dar lições aos outros!
Risos do PS.
E outra coisa, Sr. Deputado: não me diga que só agora descobriu que a adesão à moeda única é uma decisão política! É claro! Isso está lá no Tratado! Trata-se de uma decisão política que vai ser tomada numa cimeira na Primavera do próximo ano. Portanto, é essa batalha política que estamos a travar.
Mas é muito bem-vindo a esta «barricada», digamos assim, e isso deixa, naturalmente, o Partido Comunista numa situação mais complicada.
Risos do PS.
O Sr. José Calçada (PCP): - Terrível! Verdadeiramente terrível!
O Orador: - Verdadeiramente terrível, diz o Sr. Deputado José Calçada.
Sr. Deputado Manuel Monteiro, o que era importante debater aqui é se o PP considera que as medidas de política económica de fundo que estão a ser tomadas pelo Governo - e a isso o Sr. Deputado não se referiu - têm mérito em si. mesmas, isto é, são medidas necessárias, independentemente do objectivo da nossa integração na moeda única. O Sr. Deputado não falou sobre o controle do défice, sobre a questão da inflação, etc., e era sobre isto que gostávamos de ouvir a sua opinião.
Depois, falou também num conjunto de problemas. Mas isso são preocupações que todos nós temos e para as. quais procuramos soluções. Ora, nós entendemos - e o Sr. Deputado nada disse em contrário - que o avanço para a moeda única é o passo essencial para resolver muitos dos problemas que colocou. Não é por se atirarem sobre a moeda única culpas de coisas que existem antes dela ser criada que entendemos que a sua criação é uma resposta política a isso!
Como o Sr. Deputado sobre isso nada disse, depreendo que está de acordo ou, pelo menos, já não contesta a criação da moeda única. Nesse aspecto, é muito bem-vindo, Sr. Deputado!
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Acácio Barreiros, V. Ex.ª tem um sentido de humor conhecido e, portanto, não vale a pena entrarmos por aí.
No dia em que eu aderir à sua moeda única já em 1999, faço-lho saber e não preciso que ninguém o diga por mim! O Sr. Deputado e todos os outros Srs. Deputados sabem que não sou favorável à adesão de Portugal à moeda única já em 1999 e muito menos - e sabe isso há imenso tempo - sem que eu e o senhor possamos decidir pelo voto, em referendo, se o País quer ou não.
Portanto, não vale a pena repisar, permanentemente, essas questões, porque elas estão mais do que analisadas, mais do que debatidas. Toda a gente sabe! E, depois, os Srs. Jornalistas dizem: «uma vez mais, dois partidos a favor do referendo e dois partidos contra o referendo».
Sr. Deputado Acácio Barreiros, vou dizer-lhe o seguinte: nos últimos tempos, o Governo fez uma opção política, aqui e fora daqui - tome nota do que lhe estou a dizer - correcta, do seu ponto de vista. Fez uma opção política, que não tem a ver com adesão de Portugal à moeda única em 1999, aqui com os nossos amigos do PSD, e eles participaram nela, como, aliás, diz o Sr. Deputado Francisco Torres abanando com a cabeça. O Governo escolheu o seu caminho, escolheu a sua opção.
O PP é favorável à diminuição da inflação e do défice e a todos os critérios que estão no Tratado, mas o que está em causa para mim - e foi isso que pretendi dizer, e V. Ex.ª, depois, analisará quando os serviços da Assembleia da República publicarem a minha intervenção - é que de nada serve diminuir a inflação e o défice, e ter uma dívida pública mais baixa só por si.
O que é grave é que o Governo, em relação às medidas estruturais necessárias ao desenvolvimento do País, tem feito zero. O PP perguntou ao Governo: «há sacrifícios, há custos eleitorais? Pois, vamos a isso, em nome do País!». Mas o Governo não o quis fazer. Pensou e continua a pensar nos votos e juntou-se a um partido que poderia agarrar para esse desígnio e para esse objectivo eleitoral. Está agarrado! Estão os dois agarrados! Fez uma opção política! Ela está feita e o Governo não recuará, porque, mesmo que recue, bem pode olhar para a direita, porque pode acontecer que ela já lá não esteja.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O caso Renault fez aparecer muitas vozes, aparentemente indignadas, contra o comportamento desta transnacional europeia: Mas permitam-me que lhes diga que esta «indignação», expressa, desde logo, ao mais alto nível pelo Sr. Santer, tem um nome - hipocrisia, porque tanto a Comissão Europeia como os governos europeus sabem que o processo de deslocalização das empresas e de encerramento e despedimento súbito dos trabalhadores é uma consequência inerente ao modelo de economia em construção na Europa e no mundo; é uma consequência da chamada liberdade de circulação de capitais; e é uma consequência do mercado único, que se irá acentuar, acelerar e multiplicar com a moeda única.
É, pois, mentira a afirmação, como fez o PS no folheto de propaganda do euro, que a moeda única vai criar postos de trabalho. A moeda única vai, pelo contrário, criar mais desemprego e ser factor de pressão e chantagem sobre os trabalhadores para um emprego de menor qualidade e mais precário.
É um dado adquirido que uma integração económica mais profunda, no quadro de uma moeda única, com políticas monetárias e cambiais comuns, vai estimular a deslocalização das grandes empresas e das transnacionais para os países e regiões da Europa mais prósperas e com maiores produtividades.
Como diz o Argumentário Euro, «as posições concorrenciais das empresas reflectirão, fundamentalmente, as diferenças de produtividade e de inovação». Sabido que não são as empresas portuguesas as mais destacadas neste domínio - nem o irão ser nos próximos anos -, aí estará o Governo a oferecer como alternativa e como vantagem comparativa uma força de trabalho mais barata e com menos garantias sociais.
E não venha o Sr. Primeiro-Ministro falar em «consciência social» do Governo do Partido Socialista, porque essa consciência social está bem expressa na afirmação produzida, há poucos dias, pelo Secretário de Estado da tutela, quando, ao referir-se ao «programa para a internacionalização da economia portuguesa», apelava às empresas portuguesas, se considerassem estar a perder competitividade devido aos salários, a deslocalizarem-se para regiões e países onde os salários fossem mais baixos que os dos portugueses.
O Sr. José Calçada (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Consciência social, como está expressa no comentário do Engenheiro António Guterres, à recente investigação de sociólogos do Ministério para a Qualificação e o Emprego, que estimam já em mais de 2 milhões de empregos (46% dos trabalhadores) o volume do trabalho precário em Portugal. Face a dados que confirmam uma situação socialmente intolerável, esperar-se-ia de um Primeiro-Ministro de um Governo do PS, no mínimo, a preocupação e adopção de medidas de combate à crescente precarização e desregulamentação das relações de trabalho.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Mas não! Numa reacção que faria inveja à Sr.ª Thatcher (ou ao Sr. Chirac, já que se encontrava em Paris), o Engenheiro António Guterres veio dizer que a precariedade de emprego em Portugal é um fenómeno natural e assegurou ao patronato francês que assim iria continuar a ser. De uma penada o Primeiro-Ministro de um Governo dito socialista deita por terra a legítima ideia de que os avanços civilizacionais e tecnológicos devem ser colocados ao serviço da Humanidade, proporcionando uma melhor qualidade de vida, nela se integrando a criação de - e cito o programa eleitoral do PS - «mais e melhor emprego» e, citando ainda, o «combate ao abuso do trabalho precário e temporário».
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - No fundo, o que o Engenheiro António Guterres lamenta é que a situação laboral em Portugal não seja já como a do Reino Unido, da Sr.ª Thatcher e do Sr.
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Major, onde não há restrições aos contratos a prazo, onde o número de contratos a prazo sucessivos, concluídos com o mesmo trabalhador, podem ser ilimitados, onde não há limitação legal à duração semanal de trabalho nem obrigação de um mínimo de férias anuais, onde os períodos experimentais podem ir até dois anos, onde os despedimentos são feitos sem pré-aviso, levando a que hoje se esteja já a verificar deslocalizações de sentido contrário, transnacionais, que vêm de países do Médio Oriente, porque no Reino Unido encontram condições de precaridade laborai e de baixos custos de mão-de-obra, em melhores condições do que nos países asiáticos. É a isto que o Governo do PS e do Engenheiro António Guterres aspiram quando assumem como boa a interpretação do patronato sobre a lei das 40 horas ou quando fazem apelo permanente às políticas de .moderação salarial e de desregulamentação das relações de trabalho.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Tudo em nome da «competitividade» e da «globalização da economia»; tudo em nome da «moeda única»! É o sucesso contra o emprego, contra os salários, contra as despesas sociais. É a chantagem sobre os trabalhadores: ou te precarizas e aceitas salários moderados ou me deslocalizo; ou aceitas a mobilidade e vais atrás das empresas ou te desempregas. É o «sucesso» da economia sempre à custa de quem trabalha, que faria as delícias de qualquer ideólogo do fundamentalismo neo-liberal.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Como afirma o relatório recente do Conselho da Europa já hoje aqui citado, e cito, «as Regiões periféricas do território da União Europeia, menos preparadas e já pobres, arriscam-se a ver o seu desemprego aumentar, sobretudo se os desempregados recusam a mobilidade (...)» - cá está, isto é a transferência - «(...) para zonas de forte crescimento». É o apelo a uma nova vaga da emigração, Srs. Deputados. É esta Europa que querem construir?!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não venham com a cassette da visão catastrofista do PCP, respondam-nos com argumentos, se os têm. Mas respondam não só a nós, façam-no também às várias Universidades Europeias, que fizeram para o Parlamento Europeu o estudo sobre as «consequências sociais da UEM»; respondam às resoluções do Conselho da Europa; respondam aos múltiplos analistas que, em Portugal e por essa Europa fora, têm as mesmas preocupações que o PCP.
Se estão tão certos que o PCP não tem razão, não tenham medo da discussão e aceitem a realização de um amplo debate nacional, aceitem a realização de um referendo.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - A Europa está a ser construída contra os trabalhadores e contra o emprego, expresso nos mais de 18 milhões de desempregados e de 55 milhões de pobres. A moeda única está a ser preparada com o sacrifício do bem-estar, da estabilidade e das garantias de quem trabalha. Não foi isto, não é isto, o que foi e é prometido aos povos. Por isso cuidem-se! Em Portugal, em França, na Alemanha, o descontentamento, as lutas e os movimentos sociais alastram e continuarão a crescer à medida que os trabalhadores, que os povos, perceberem que Mercado único e moeda única são cada vez mais sinónimo de deslocalização, mobilidade, trabalho precário e desemprego.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Poças Santos.
O Sr. João Poças Santos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este debate que, aparentemente, não trazia novidades, fica desde já marcado pelo silêncio, relativamente eloquente, do Governo quanto à marcação do referendo europeu.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Efectivamente, perguntado por diversas vezes pelo PSD, o Governo nada disse, o que nos permite supor o pior quanto a esta matéria, sendo certo que o PS se mostrou tão pressuroso em marcar o referendo sobre a regionalização já para uma data fixa, a 25 de Abril de 1998. Esperemos que o PS e o Governo dêem resposta a esta matéria e que durante o primeiro semestre de 1998 seja possível realizar o referendo sobre as alterações ao Tratado da União Europeia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Somos hoje chamados novamente a reflectir sobre o processo de criação de uma União Económica e Monetária na Europa, nomeadamente no que diz respeito à fase final desta com a correspondente moeda única. Pretende o Partido interpelante que nos debrucemos, de modo particular, sobre as consequências económicas e sociais para o nosso País de uma participação plena na UEM a partir de l de Janeiro de 1999.
Seria interessante que algum dia se fizesse também um outro debate, o debate da alternativa, isto é, onde se equacionasse as consequências para os trabalhadores, para as empresas e para a nossa soberania nacional, se, naquela data, Portugal não estiver em condições de integrar o núcleo de países europeus que adoptarão o curo. Penso, aliás, que o famoso relatório que o Governo encomendou - depois de acolhida, com a habitual simpatia, a sugestão aqui feita nesse sentido pelo PP - estará, à partida, incompleto se não estudar tanto as consequências para Portugal da moeda única como os efeitos de uma eventual (espero que definitivamente afastada) não participação.
Todos sabem qual é a posição do Partido Social Democrata sobre esta matéria: a UEM não é, em si mesma, considerada a fonte de resolução de todos os problemas mas, sim, um importantíssimo instrumento de base para a própria afirmação europeia, face à globalização crescente da economia.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Com uma política externa e de segurança comum, pouco mais do que incipiente; a Europa precisa, de modo dramático c vital, de assegurar a existência de uma sólida política económica e monetária comum, sob pena de se remeter definitivamente à qualidade de mero pólo regional, deixando aos Estados Unidos, ao Japão e até a outros países ou blocos emergentes o papel de potências de nível mundial.
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Para Portugal não há outro caminho, menos perigoso ou mais largo, do que o que passa pela moeda única. Esta afirmação que convictamente fazemos tem o carácter definitivo que resulta da inexistência de propostas alternativas exequíveis, mesmo por parte dos seus detractores. É certo que, como ensinou Raymond Aron, «em política, não se pode demonstrar a verdade, mas pode tentar-se, a partir do que se sabe, tomar decisões razoáveis».
Para mim, a opção que, em devido tempo, os Governos do PSD e do Professor Cavaco Silva tomaram e que o actual Governo reafirmou é a «decisão razoável» que se exige aos que da política tenham uma ideia de longo prazo e não meramente imediatista. No entanto, o PSD - e aqui não podemos deixar de criticar a maioria socialista - entende que, sendo extraordinariamente importante, não basta assegurar a estabilidade macro-económica que viabilize o cumprimento dos critérios de convergência estabelecidos no Tratado da União Europeia. É necessário, em simultâneo e com o ritmo adequado, promover a modernização das nossas infra-estruturas e do tecido produtivo nacional e o prosseguimento de reformas estruturais, nomeadamente no que diz respeito à reforma da Administração Pública.
Neste ponto, e por incapacidade de optar, de tomar decisões difíceis - em suma, de governar -, o Governo socialista tem tornado menos sólida a sustentabibilidade do pós 1999, sem recurso a terapias mais ou menos «fortes» no decurso da nossa presença na UEM. Efectivamente, as políticas de médio e longo prazo, não tendo uma rendibilidade eleitoral imediata (a que o Partido Socialista dá sempre a primazia), tornam mais evidentes as vantagens que a moeda única não deixará de trazer para as empresas portuguesas, em termos de uma aceleração da convergência económica.
Há quem entenda que são despiciendos alguns dos benefícios da moeda única, tais como a eliminação dos custos das transacções cambiais, o desaparecimento da incerteza quanto aos riscos de câmbio ou o estatuto de primeira grandeza que a moeda europeia terá na cena financeira internacional. Mas, mesmo esses críticos não negarão certamente o seu apoio, se o trilho a percorrer para a integração monetária for acompanhado - como devia ser - por medidas de fundo que promovam uma acrescida competitividade das empresas e respeitem as legítimas expectativas de estabilidade social e de bem-estar dos cidadãos e das famílias portuguesas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A UEM deve ser um projecto articulado com as grandes linhas de força do processo de construção europeia, onde avulta a necessidade de assegurar, em permanência, a coesão económica e social, nomeadamente, de medidas activas e de políticas comunitárias de tipo regional e estrutural. Cabe aqui também ao Governo um papel decisivo na capacidade
negocial, que terá de demonstrar, para, num quadro de eventual concorrência com as necessidades decorrentes de futuros alargamentos, conseguir a manutenção, em termos qualitativos e quantitativos, de um grau elevado de esforço de coesão em relação a Portugal, como tem acontecido nos últimos anos. A UEM ficaria desprovida de muito do seu sentido útil e do espírito que presidiu ao seu incremento se não se contrariarem as naturais tendências para a deslocação de actividades económicas mais relevantes das regiões geográfica e economicamente periféricas para as regiões mais desenvolvidas.
Cabe aqui chamar a atenção para o perigo, do ponto de vista dos nossos interesses, se, por efeito de uma coincidência cronológica indesejada e indesejável, vir a existir uma proximidade na negociação final, da revisão do Tratado com a decisão sobre a 3.ª fase.
De facto, estando atrasada a conclusão da Conferência Intergovernamental, seria de todo negativo que alguns procurassem «maleabilizar» a posição portuguesa na fixação das disposições, nomeadamente institucionais, do Tratado como contrapartida mais ou menos indirecta da nossa presença em 1999 na moeda única. Ambos os dossiers devem seguir o seu curso autonomamente e em relação aos dois se exige a defesa intransigente do interesse nacional. O esforço a efectuar é decisivo para que a opinião pública portuguesa, que desde sempre tem dado maioritariamente um apoio fundamental para a nossa integração, não seja tentada pelo discurso facilitista e aparentemente fácil das correntes neonacionalistas com expressão dentro e fora desta Câmara. Quanto a estes, é óbvio que, como afirma Eduardo Lourenço, chá algo, ao mesmo tempo de profundo e patético, nestes espasmos de um nacionalismo mórbido», «neste obscurantismo antieuropeu», mas também é certo que vivemos tempos de incerteza, e a exploração grosseira do medo da mudança e da angústia face ao futuro pode bloquear perigosamente a serena compreensão e a lucidez da análise de sectores mais ou menos largos da população.
Cabe aos que entendem ser positivo o balanço da UEM em curso esclarecer os cidadãos, dando-lhes toda a informação, para que possam, livremente, fazer o seu juízo em futuras eleições.
Em 1995, nas eleições legislativas, o PSD e o PS comprometeram-se a procurar conseguir estar no primeiro grupo de países que integrariam a moeda única. Por isso, não temos de pedir desculpa á ninguém por defendermos a nossa posição, que foi sufragada por mais de dois terços dos eleitores. Temos, todavia, de explicar que o esforço que Portugal e os portugueses vêm fazendo desde há vários anos é útil, mesmo num quadro absurdo sem moeda única: estabilidade dos preços, solidez nas finanças públicas e, no quadro monetário, a sustentabilidade da nossa balança de pagamentos.
No essencial, quanto aos famosos critérios de convergência, foi já adquirido o princípio da estabilidade (fortalecida, aliás, pela alternância partidária entretanto verificada) e, no fundo, seria sempre do mais 'elementar bom senso a moderação no endividamento do Estado, a previsibilidade dos preços de bens e serviços, a estabilidade cambial. A não ter sido assim, seriam, em qualquer caso, inevitáveis o desequilíbrio da balança de pagamentos e a promoção de políticas de curto prazo que apenas na aparência salvariam empresas ou postos de trabalho.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aqueles que hoje se insurgem contra a participação portuguesa na moeda única são geralmente os mesmos que já estiveram contra o Acto único Europeu,; como: já tinham sido opositores da nossa adesão à Comunidade Europeia. Há que respeitá-los, como parte dessa «Europa insuficiente» de que falava Borges de Macedo, mas que isso não faça abrandar o passo, na certeza de que o Mercado único, que se construiu dificilmente, subsistirá sem moeda única. Não haverá o devido aproveitamento pelas empresas e outros agentes económicos europeus, em termos das suas opções de investimento e de comércio no quadro de um mercado de mais de três centenas e meia de milhões de consumidores, se não existir uma união monetária, como também não há espaço económico unificado que resista à instabilidade cambial. Para além disso, para um País como o nosso,
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sempre dependente das decisões de política monetária dos países de moeda mais forte, a passagem à moeda única pode apresentar-se como uma perda de soberania, mas é, na realidade, a forma mais certa e segura de defender alguma soberania monetária, através da participação portuguesa nos mecanismos e instituições previstas no Tratado.
Mesmo a questão já referida, da necessidade de continuação de políticas regionais suficientemente fortes para conseguir efeitos estabilizadores da nossa economia poderá ser gerada pela própria dinâmica da UEM ao criar uma situação que, pela irreversibilidade da interdependência das economias europeias, conduza inevitavelmente a uma solidariedade renovada.
Cabe aos responsáveis governamentais portugueses, conseguir que uma maior identidade europeia potenciada pelo curo e uma unidade externa acrescida sejam factores de aprofundamento dos mecanismos de coesão a par e sem prejuízo de novas adesões. A recusa de embarcarmos em qualquer «carruagem de segunda» e a vontade de participarmos activamente neste momento marcante e de algum modo refundador da União será mais importante do que toda a lamúria antieuropeia que se vai ouvindo. A menos de dois anos desse marco fundamental na nossa vida colectiva portuguesa e europeia, o pior que poderia fazer-se era adoptar comportamentos nervosos ou alarmistas, que nada trariam de positivo, mesmo considerando que o curo, como qualquer moeda, terá sempre duas faces.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.
O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Antes de mais, uma pequena precisão relativamente à intervenção que acabámos de ouvir.
Consideramos verdadeiramente um absurdo que neste debate se tente lançar a confusão, dizendo que as posições do PS, em matéria de referendo, não são claras. Nada mais absurdo do que isto! As posições do PS em matéria de referendo são extremamente claras: somos a favor do referendo para certas matérias que digam respeito à revisão do Tratado da União Europeia, após conhecermos as conclusões da CIG.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas o Sr. Deputado João Poças Santos, quando ainda há pouco usou da palavra, referiu que a questão da moeda única foi sufragada por dois terços dos eleitores, quando foi aprovada por mais de dois terços dos Deputados desta Câmara. Portanto, entendemos que não faz sentido defender-se o referendo relativamente a uma matéria que já está decidida e adquirida em termos de decisão política de Portugal.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando se debatem questões como a que hoje aqui nos reúne está-se a debater o futuro.
Em Portugal, assiste-se, com alguma frequência, a pessoas e entidades responsáveis a assumirem uma atitude derrotista em relação ao futuro de Portugal e dos portugueses.
Protestos do PCP.
É essa atitude derrotista que temos de combater. Com realismo, temos de assumir uma postura de confiança em nós próprios, uma postura de crença e optimismo naquilo que os portugueses são capazes de fazer. Não há lugar para o pessimismo em relação ao futuro, Sr. Presidente e Srs. Deputados.
Um povo que foi capaz de dar novos mundos ao Mundo, que foi capaz de avançar corajosamente e com espírito empreendedor para o desconhecido, conhecendo novos povos, novas culturas, novas rotas mercantis, não pode deixar de se considerar à altura...
Protestos do PCP.
Os Srs. Deputados do PCP renegam a coragem dos portugueses!
Protestos do PCP.
Os Srs. Deputados do PCP estão a desconfiar da coragem dos portugueses!
Vozes do PS: - Muito bem!
Protestos do PCP.
O Orador: - Um povo que fez o que fez não pode deixar de se considerar à altura dos desafios que tem pela frente.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - No desafio do curo, Portugal não tem de se sentir diminuído ou ameaçado na capacidade que terá para se adaptar...
Protestos da Deputada do PCP Odete Santos.
A Sr.ª Deputada Odete Santos está muito nervosa. Ouça que lhe faz bem!
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não estou nervosa, estou divertida com isso!
O Orador: - Muito bem, então faça favor de continuar o seu divertimento.
Portugal tem capacidade, pelo que pode e deve surgir na nova Europa de cabeça orgulhosamente levantada, em igualdade de circunstâncias com os seus parceiros europeus de dimensão comparável, como a Holanda, a Irlanda, ou a Bélgica. A moeda única traduz-se numa oportunidade e não numa ameaça. Devemos aproveitá-la, potenciando os nossos pontos fortes.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Estamos certos de que os portugueses, os cidadãos, as empresas e os entes públicos saberão adaptar-se às novas circunstâncias, suplantando os esforços até aqui desenvolvidos, numa nova capacidade de reestruturação a todos os níveis e com vontade de dar o salto para uma vida melhor.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O Partido Socialista apela ao Governo e exorta a oposição a que se transmita ao País uma dinâmica de optimismo responsável, incentivando os empre-
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endedores a tomarem as medidas que lhes concedam a preparação indispensável para que, no dia em que o curo chegar, estejamos já posicionados da melhor forma para ganhar a competição que se seguirá.
Temos de ter consciência das nossas dificuldades para as podermos minorar, mas não podemos deixar-nos enredar pelo círculo vicioso do pessimismo e do derrotismo que conduziriam à lassidão e à derrota.
É indispensável a criação de um bom clima que dê confiança aos empresários e às pessoas, que lhes evidencie as potencialidades da moeda única, que lhes indique claramente os caminhos das oportunidades e os alerte para os obstáculos das nossas dificuldades.
Essa é uma tarefa de todos: do Governo, do Partido Socialista e da oposição.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a moeda única não é um ponto de chegada mas de partida para um futuro que, estamos certos, será melhor para os portugueses. É também um ponto de importantíssima viragem nas relações económicas europeias e mundiais.
Como é de todos bem consabido, as grandes alterações estruturais criam grandes oportunidades para aqueles que não estão instalados como privilegiados pelo status quo. Quem poderá ter a perder com a moeda única serão aqueles países que hoje dominam o comércio e as trocas mundiais e europeias. Esses, sim, poderão sentir-se ameaçados.
Aqueles que se encontrarem sensibilizados e preparados para a mudança nada terão a perder e poderão capitalizar as oportunidades a seu favor através da capacidade de inovação, de desenvolvimento e da inteligência aplicada.
Muito se tem falado na moeda única, mas, face àqueles que têm algumas dúvidas, temos bastantes certezas: estamos confiantes de que a entrada no curo poderá ser extremamente positiva para as empresas portuguesas permitir-lhes-á reduzir os seus custos, diminuir os seus riscos, eliminar o seu estatuto de menoridade nas trocas mundiais; as empresas poderão contar com a consolidação estrutural das baixas taxas de juro europeias, poderão eliminar os seus custos de compra e venda de moeda estrangeira nas trocas europeias, desaparecerão os seus riscos cambiais e os associados custos com swaps, forwards, hedgings e outras técnicas de cobertura de riscos cambiais.
A partir da entrada no curo, os empresários sabem que, se venderem hoje, aquilo que receberão passados 90 ou 120 dias será precisamente o mesmo valor nacional do momento da facturação; sabem que, se encomendarem hoje, o preço que irão pagar daí a uns meses será precisamente o mesmo do dia da encomenda.
Os riscos reduzem-se, as empresas podem adoptar técnicas de custeio mais rigorosas e próximas da sua margem técnica. Quantas empresas em Portugal não apresentam resultados de exploração positivos que vêem depois completamente degradados com custos financeiros excessivos e perdas cambiais ruinosas? Esta situação irá desaparecer ou, pelo menos, reduzir-se significativamente.
A inserção da nossa economia num espaço financeiro sólido e evoluído, com uma moeda mundialmente forte e competitiva, irá solidificar os nossos mercados monetário e de capitais.
A segurança nos investimentos criará novas facilidades de financiamento através da bolsa e do sistema bancário, o acesso aos mercados mais evoluídos da Europa será uma realidade.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, os particulares, os cidadãos individualmente considerados, os homens, as mulheres e os jovens também sentirão as vantagens da moeda única.
Com o curo como moeda forte, com os mercados financeiros sólidos, as pessoas saberão que as suas poupanças estão protegidas; saberão que, com a baixa inflação que a macroestrutura económica proporcionará, o seu dinheiro aforrado não estará a desvalorizar-se nem sofrerá depreciação com o tempo.
As poupanças terão acesso a sofisticados e rentáveis fundos internacionais com toda a segurança.
Também os trabalhadores, aqueles que vivem e comem do seu salário, saberão que o seu ordenado em curo não será ainda mais diminuído em termos europeus com desvalorizações cambiais e diferenciais de inflação que encarecem os produtos indispensáveis ao seu sustento. Os trabalhadores saberão que o seu rendimento, a partir daí, dependerá quase exclusivamente da sua produtividade.
Mesmo a comparabilidade dos rendimentos e dos preços portugueses com os europeus, possibilitada com a introdução do curo, criará condições para que as políticas de solidariedade se mantenham e se intensifiquem até que se atinja uma efectiva convergência real.
Estes casos são concretos. É a moeda única no terreno. Recomendamos a certos sectores que se deixem de lamúrias. Contra o derrotismo, contra o pessimismo, vamos preparar Portugal para enfrentar o novo mundo com a coragem e o espírito de iniciativa que sempre soubemos demonstrar.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a moeda única é, isso sim, uma oportunidade única.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Saraiva.
O Sr. José Saraiva (PS): - Permitam-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que releve o essencial deste debate e que se resume ao que todos já sabiam: o PCP, ideologicamente, está contra a União Europeia.
Não é sacrilégio político mas também não constitui qualquer novidade. Daí a discussão ser estafante.
Apesar disso, porém, não deixa de ser curioso registar que, embora não o declare enfaticamente, o PCP ande constantemente a sublinhar os perigos, as catástrofes, as hecatombes com que a Europa «arrasará» os portugueses numa dessas manhãs que aí vêm e que já não cantam...
Com o pretexto de «dar a palavra aos cidadãos», o PCP lançou-se na rua à procura de apoios para vir a conseguir a realização de um referendo sobre a moeda única. Trata-se somente de um acto de agitação e de propaganda e este debate aqui na Assembleia da República, no tempo em que decorreu - ou seja, poucas semanas após um incontornável momento político que culminou com a aprovação pelo PSD e pelo PS de uma resolução do mais alto significado -, é apenas uma peça do novo espantalho lusitano construído pelo PCP.
Que fique claro: consideramos dispensável qualquer referendo sobre a moeda única. Ao subscrever o Tratado da União .Europeia, Portugal assumiu implicitamente o percurso para a União Económica e Monetária de que a moeda única é um instrumento. Mas ainda que considerássemos indispensável o referendo, o PS não teria então qualquer receio nem o temeria.
É imparável a marcha para o curo sobre o qual, como vincou no Conselho de Madrid o Primeiro-Ministro
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António Guterres, se construirá a Europa do século XXI. É-o por determinação do Governo e é-o pelo consistente apoio político dos portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o PCP adoptou agora como palavra de ordem «trabalhar para um novo rumo para Portugal». Não diz qual é esse rumo, mas é o mesmo de sempre, que está velho e nele, felizmente, já são poucos os que acreditam.
Senão vejamos: em 28 de Março de 1977, o então Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal depositou em Bruxelas os instrumentos que configuravam o pedido de adesão à CEE. Que fez o PCP? Reclamou outro rumo! Porque clamava então que essa era a Europa das multinacionais... Viviam-se ainda os anos da grande ilusão (ou do grande embuste) deste século. Mas, naquele dia, há quase 20 anos, José Medeiros Ferreira - hoje nosso muito apreciado colega e meu estimado camarada -, num simples gesto, estava, ele sim, a protagonizar uma opção histórica e a ajudar a definir um rumo para Portugal.
Desde então, fazendo das fraquezas forças, o PCP não desfaleceu e mesmo depois de, no esplendor dos Jerónimos, Mário Soares ter assinado o momento histórico, os comunistas prosseguiram as campanhas, as conferências, os comícios... O PCP nunca desarmou e nisso é insuportavelmente coerente. É obra!
Risos do PCP.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, sabe-se que o PCP não oferece alternativa alguma - como aliás ficou amplamente demonstrado aqui hoje e noutras ocasiões - e limita-se simplesmente à reclamação e a estabelecer sofismas apoiados na incredulidade dos incautos.
A Europa - avisou Robert Schuman em 1950 - não se constrói por um golpe mas realizar-se-á por actos concretos. definidores, antes de tudo, de uma solidariedade, o que é hoje patente. Os portugueses não o ignoram, mas, estranhamente, o PCP quer um novo rumo! Qual? Porventura, o rumo de sempre a que foram submetidos povos que hoje vemos terem estampado no rosto as indeléveis marcas do sofrimento e da angústia.
A Europa alcançou a paz há 50 anos «com sangue, suor e lágrimas»; a União Europeia edificar-se-á com avanços e recuos, com tenacidades e sacrifícios, com «ideias e com entusiasmos», como profetizava Jean Monnet.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Agora percebe-se o artigo que o senhor escreveu sobre o Raúl Rêgo...!
O Orador: - O PCP pode resistir. só lhe resta, convenhamos, a resistência contra o inexorável caminhar da história. Mas o PCP não se contenta com isso e organiza em Lisboa um comício dos seus clones europeus. Será a grande festa da clonagem comunista.
Aí se falará dos custos sociais e do desemprego que grassa na União Europeia - mas ignorar-se-á, esquecer-se-ão, as imagens cruéis que nos chegam todos os dias de homens e de mulheres que vagueiam pelas ruas de Moscovo, de Kiev ou de Minsk...
A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Ah! Ah! Ah!
O Orador: - ... ou até mesmo de Tirana, que foi para alguns o farol do socialismo na Europa, andrajosos ou vestidos com roupas de feira, absortos, estendendo mão à caridade. É essa a vossa alternativa? É esse o rumo?
O PCP tem um discurso obsoleto, a nada disse! antieuropeu e antimoderno, e, se me permitem, com todo o respeito, é um discurso que se confunde com a verborreia do Sr. Le Pen ou do Sr. Bruno Megret. E será que isso nem sequer os incomoda?
Risos do PCP.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, este debate é um equívoco; quando trazido pelo PCP torna-se uma maçadoria.
Como disse, o referendo não é indispensável. Não temos medo algum de ouvir o povo português. Nós, socialistas, nunca tivemos medo de ouvir o povo português! Mas, é certo, que sendo esse o rumo que o PCP quer, teremos de dizer sem tibiezas que um referendo seria uma irresponsabilidade política com graves consequências económicas.
Bem ponderado o que aqui se disse hoje, ficamos. todos com a certeza de que o PCP há muito perdeu, há muito deixou de compreender qual era o «rumo à vitória».
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.
O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Saraiva, sinceramente, tenho grandes dificuldades em dizer o que quer que seja que possa ser razoavelmente dignificante, tendo em conta comparações como as que foram feitas, aliás, também pelo orador que o antecedeu.
Desde alusões ao caminho marítimo para a índia até ao tema do euro, de duas uma: ou alguém está a ler mal a História ou foi o euro que, de todo em todo, deu a volta à cabeça das pessoas, mesmo das que tinham obrigação de ser particularmente lúcidas.
Disse o Sr. Deputado que «o PCP é insuportavelmente coerente». Gostaria de poder dizer já não que o PS é insuportavelmente socialista mas, ao menos, suportavelmente socialista. Gostaria bem de poder dizê-lo! Todos sabemos que, hoje, há grandes dificuldades em poder fazer uma afirmação dessas, desde logo, a partir dessa bancada.
Começa a perceber-se agora com alguma clareza, se é que ainda não tinha ficado clarificado, como é que o Sr. Deputado José Saraiva escreveu o que escreveu, e o modo como o fez, sobre a posição que, com grande dignidade, o seu camarada de bancada Raúl Rêgo - julgo que seja seu camarada - assumiu nesta Câmara ainda há bem poucos dias.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Permito-me ficar por aqui. Não creio que possa «gastar-se boa cera com ruim defunto».
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Saraiva.
O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calçada, V. Ex.ª não fez qualquer observação ou pergunta, limitou-se a um arrazoado...
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Porque o senhor
O Orador: - Sendo que nada disse, VV. Ex.as há muito que nada dizem, sobretudo aos portugueses.
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Todavia, o Sr. Deputado quis introduzir dados aos quais vou dispensar-me de responder porque o defeito não é meu, é seu, que não soube ler o que estava escrito.
Independentemente disso, classifiquei o PCP como «insuportavelmente coerente» porque o PCP parou no tempo. Parou há muito, não compreende a dinâmica da História e insiste na ideia de catalogar os outros, de lançar anátemas sobre os socialistas, insultando-nos sempre que pode. Aliás, ainda hoje, essa «elegância» foi aqui amplamente demonstrada por intervenções provenientes da vossa bancada.
Entretanto, eu próprio limito-me a dizer que VV. Ex.as são homens e mulheres «parados no Inverno», são pessoas que não mudaram a vossa visão do mundo, que não viajaram, não viram, não estudam...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O quê?... Você nunca estudou!
O Orador: - ... e limitam-se a fazer aqui discussões perfeitamente bizantinas, discutindo «o sexo dos anjos»...
O Sr. José Calçada (PCP): - Deve ser isso, com certeza!
O. Orador: - Eu sei que, desde há muito tempo, acham que a ideologia dominante é a que VV. Ex.as determinam. Quero dizer-vos que não tenho receio algum do que VV. Ex.as ou outros dirão do que eu disse. Não retiro uma vírgula e, se pudesse, agravaria os adjectivos com que ouso classificar a posição do PCP.
Aplausos do PS.
O Sr. José Calçada (PCP): - Pode agravar! Faça favor!
O Sr. Presidente: - Não há mais inscrições, pelo que vamos entrar na fase de encerramento do debate.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira, para encerrar o debate em nome do PCP.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro. Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Mais uma vez, durante esta interpelação, o Sr. Primeiro-Ministro optou por manter-se silencioso perante as acusações que o PCP lhe fez e ao seu Governo.
Mais uma vez o Sr. Primeiro-Ministro fez prova de que ama o diálogo, mas apenas e na medida em que esse diálogo não comporte o contraditório, desde que o Sr. Primeiro-Ministro não seja obrigado a ser directamente confrontado com opiniões e razões que contestam as suas.
E, mais uma vez, o Sr. Primeiro-Ministro, com a sua postura de silêncio c com a sua substituição pelo Sr. Ministro das Finanças, pretendeu dar a entender, quiçá aos seus próprios Deputados mas certamente à opinião pública, que a opção pela moeda única é «apenas» uma opção económica.
A verdade, porém - e como ficou bem patente nas intervenções do PCP nesta interpelação -, é que a moeda única é desde o início um projecto essencialmente político, com enormes e insofismáveis consequências nos domínios económico e social.
Porque é inequívoco, como o Sr. Primeiro-Ministro bem o sabe e defende, que a motivação fundamental do avanço para a moeda única reside no pacto franco-alemão assente numa perspectiva federalista. Porque é evidente e inevitável que uma união monetária exige e implica que não apenas a política macro-económica e as políticas monetária e cambial mas também as políticas orçamentais e fiscais (como o comprova o pacto dito de estabilidade) sejam definidas e reguladas a nível supranacional, eliminando rapidamente os poderes e soberanias nacionais.
E é para escamotear esta questão central que o Governo e os defensores da união política europeia persistem, como hoje o voltaram a fazer o Governo, o PS e o PSD, em embalar a moeda única com meia dúzia de slogans indemonstráveis e de sofismas que não resistem à prova dos factos.
Mais uma vez, ouvimos o argumento de que é essencial Portugal estar presente no núcleo duro da decisão europeia, mas são incapazes de demonstrar que o simples facto de Portugal vir a integrar uma moeda forte com uma economia fraca lhe vai dar um lugar decisivo na definição dos destinos da Europa.
Pela enésima vez, o Governo veio dizer-nos que não integrar a moeda única significaria amarrar-nos para todo o sempre à «periferia» da União Europeia, mas não são capazes de explicar por que é que, pelo facto de eventualmente não integrarem o núcleo duro, a Dinamarca, o Reino Unido, a Espanha ou a Itália passam ser qualificados como países periféricos. Mais importante: escondem que a nossa periferia decorre da fraqueza e do atraso da nossa economia e que com a moeda única esse atraso se acentuará e, por isso, se agravará a periferização de Portugal. Porque a verdade, como o Governo sabe e o Ministro das Finanças alemão já fez saber publicamente, é que «a moeda única não se destina a ajudar os países da União Europeia a recuperarem os seus atrasos». Esses países nada mais têm a fazer do que adaptarem-se e submeterem-se à moeda única e às suas consequências.
De novo, o argumento da estabilidade dos mercados cambiais e da descida das taxas de juro. Mas a moeda única não poderá ser um factor de estabilidade monetária nem porá fim à especulação cambial, antes imporá elevadas taxas de câmbio e de juros e tornará mais dura a especulação, já que um seu objectivo confesso é o da guerra pelo domínio dos mercados financeiros e pela atracção de capitais, em confronto com o dólar e com o iene.
Do mesmo modo, a moeda única não eliminará os défices comerciais que Portugal tem com todos os países comunitários; o que implicará é a perda de instrumentos para que Portugal possa reagir contra o agravamento desses défices.
Identicamente, foi renovada a promessa de fé do Governo numa Europa social, mas, mais uma vez, foi escamoteado que, nessa guerra financeira a nível mundial de que a moeda única será um factor de agravamento, serão inevitavelmente utilizadas como armas a sacrificar, como já está a suceder, o actual sistema de segurança social, a precaridade e a instabilidade do emprego, os níveis salariais, a flexibilidade dos horários de trabalho, a polivalência forçada dos trabalhadores e a compressão das despesas sociais e, consequentemente, novas e mais numerosas exclusões sociais.
E, como sempre, voltámos a ouvir a recusa do Governo, do PS e do PSD à realização de um referendo nacional sobre a moeda única. Mas, como hoje aqui afirmou o Secretário-Geral do PCP, esta é uma questão essencial e incontornável, porque o desaparecimento do escudo e a passagem à moeda única que o Governo do PS, com a conivência activa do PSD, quer impor aos portugueses constituiria uma decisão de consequências incalculáveis.
Com a moeda única e a transferência da total competência monetária para um banco central europeu, completamente à margem do sufrágio universal, são a própria soberania popular e os fundamentos da democracia que são postos em causa.
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O referendo que o PCP exige é uma exigência de cidadania dos portugueses,...
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - ... exigência que corresponde à necessidade de debate e à vontade dos portugueses de terem a palavra para exprimirem as suas escolhas e fazerem valer as suas aspirações.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Por essa exigência o PCP continuará a pugnar, nas instituições e fora delas.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para encerrar o debate em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo: Este debate pode não ter trazido muitas novidades, mas, como sempre, é útil que na Assembleia da República se clarifiquem posições sobre questões centrais da política e do destino do nosso país. Esta é uma delas.
Penso que ficou clara, desde logo, a posição do partido interpelante: em matéria europeia, o PCP tem estado sempre contra a integração e tem sido, sucessivamente, advogado de múltiplas causas perdidas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Esteve contra a adesão às Comunidades, contra o Tratado da União Europeia e, agora, está contra a política que nos coloca à porta da 3.ª fase da UEM, ou seja, da moeda única. Mas, ao estar contra a integração europeia, está contra um factor de mobilização da economia portuguesa para o desenvolvimento económico e social e também contra a vontade da maioria do povo português.
O Sr. João Carlos Silva (PS): - Muito bem!
O Orador: - O PCP não pode, por isso, arrogar-se de qualquer dom divino que lhe atribua a representação dos trabalhadores, mais do que daqueles que nele votam. Também os trabalhadores portugueses querem a integração europeia.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Então vamos ouvi-los!
O Orador: - Esta coerência - e eu repetiria o qualificativo insuportável - é, infelizmente, a coerência no erro, na posição negativa, na recusa do principal factor de progresso e de abertura das políticas económico-sociais dos últimos anos, porque o PCP não tem alternativas. Verdadeiramente, propõe-nos: ou o adiamento ou o continuarmos um pouco à deriva, sem estratégia na Europa e no mundo.
O adiamento significaria que pagaríamos o preço de uma política que, desde 1992, tem vindo a ser desenrolada e renunciaríamos às suas vantagens. Penso que ninguém quereria isso, estando nós, como estamos, numa posição excelente para ter acesso ao primeiro grupo fundador do euro.
A alternativa de abandonar, contra os nossos compromissos de 1992, contra aquilo que tem sido a expressão claríssima da vontade do povo português, nesta Assembleia e em sucessivas eleições, contra aquilo que sabemos ser, através de muitos indicadores de opinião, a posição da maioria dos portugueses, significaria, pura e simplesmente, a opção por um terramoto ou, pelo menos, por uma desgraça económica: uma moeda fraca e sujeita a toda a especulação, uma economia de desvalorização, inflação e baixa de salários reais. Em suma, uma opção que esquece a ideia de que quem ganha mais do que tem mostra que siso não tem.
Hoje é necessário ter muito siso para, que a economia portuguesa possa continuar a progredir a afirmar-se no mundo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas se não há aqui uma alternativa económica, também não há alternativa política A opção do curo é, manifestamente e antes de mais, como o Sr. Primeiro-Ministro tem dito várias vezes, uma opção estratégica para Portugal. Só seremos fiéis à nossa vocação universalista, só nos colocaremos no mundo com a força correspondente às aspirações, à história, aos interesses do nosso povo na relação com outros povos, em particular os de expressão portuguesa, se tomarmos a posição a que temos direito no núcleo central da Europa que está em profunda reconstrução. Isso faz-se por esta via e não por outra!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - A proposta do PCP ou, diria mais, a não proposta do PCP, visto que é apenas a recusa teimosa do espírito que só sabe dizer não, seria a falta de uma opção estratégica para Portugal na Europa e no mundo; seria o isolamento, o andar à deriva e um «empequenecimento» cada vez maior do nosso país, que não desejamos e contra o qual queremos lutar.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - Esta opção, a da não proposta, vem acompanhada de terríveis profecias de desgraça. Pensamos que é negativo, em particular neste momento, repetir essas profecias de desgraça. É evidente que em qualquer opção tão complexa como esta, política, económica e social, há sempre custos e benefícios, incertezas e riscos, há sempre quem ganhe e quem perca e explorar isso não nos parece ser o caminho mais favorável para reforçar a coesão nacional à volta de um objectivo que constitui a expressão da nossa opção europeia, da nossa coerência com o Programa do Governo...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não nos quer impor a censura, pois não?!...
O Orador: - ... por um modelo de desenvolvimento, crescimento e emprego, mas também a expressão de um desígnio.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O melhor é escamotear os problemas!
O Orador: - Com isto, queria sublinhar que é evidente que este é um desígnio nacional não é o desígnio dos desígnios;...
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O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Mas não é o nosso!
O Orador: - ... não é o único desígnio nacional, mas é um desígnio nacional, claramente partilhado por uma esmagadora maioria dos portugueses representados nesta Assembleia.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Vamos a referendo!
O Orador: - O PCP converteu-se tarde à ideia do referendo e agora defende-a com vigor contra a democracia representativa, porque também aí o seu entusiasmo por valorizar a democracia representativa nem sempre tem sido muito grande. Neste caso, o referendo sobre um tema que foi, legítima e claramente, objecto de deliberação aqui, neste Parlamento, seria uma desvalorização da democracia representativa.
Estou, todavia, autorizado pelo Sr. Primeiro-Ministro a dizer que, neste momento, o Governo pode anunciar que tomará a iniciativa de...
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Fazer o referendo!
Risos do PCP.
O Orador: - ... promover um referendo sobre matéria europeia, desde que constitucional, desde que plenamente conforme com a legitimação dos órgãos democráticos e no momento adequado.
Aplausos do PS.
Penso que isto é importante e representa, verdadeiramente, a auscultação da vontade do povo português, não para a virar - que não se viraria - contra uma política que está a ser executada legitimamente e por opção desse mesmo povo, mas para saber, realmente, se todas as dúvidas que por aí se suscitam em matéria europeia têm ou não alguma razão de ser, correspondem ou não à opção profunda do nosso povo. Nós queremos ouvi-lo, mas queremos ouvi-lo a favor dos seus interesses e não contra eles!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - E não sobre a moeda única!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me que diga, claramente, que deste debate resulta que a opção em que o Governo está empenhado, executando as escolhas desta Assembleia, é uma opção válida c de futuro e, sem prejuízo da legitimidade de todas as críticas e de todos os argumentos, não deve ser permanentemente atacada, obscurecida e obnubilada por profecias de desgraça muito pouco fundamentadas.
Alimentar a confiança do povo, sem deixarmos de ter consciência dos riscos das escolhas que fazemos, é importante para que as políticas democraticamente legitimadas não sejam contrariadas por campanhas minoritárias e pouco responsáveis.
O Sr. João Carlos Silva (PS): - Muito bem!
O Sr. José Calçada (PCP): - Vá lá, vá lá, são responsáveis!...
O Orador: - É importante que o povo português participe no debate, mas é importante também que não se desenvolvam campanhas que servem apenas o interesse dos nossos adversários. Temos assistido, de fora de Portugal, a muitas diligências no sentido de tornar difícil o acesso de Portugal, ou de blocos de países onde estamos integrados, ao primeiro grupo do curo. Continuamos fiéis à ideia de que, sendo a Comunidade uma comunidade de Direito, a escolha terá de ser feita de acordo com as regras constantes do Tratado, ou seja, analisando cada país e vendo se ele cumpre ou não os critérios que estão definidos no próprio Tratado. Nenhum outro critério é atendível!
O Sr. José Calçada (PCP): - Coitada da Alemanha!
O Orador: - Mas quando misturamos na discussão elementos ou argumentos que se baseiam na posição dos nossos adversários, sejam eles especuladores financeiros, sejam eles grupos políticos que pretendem enfraquecer a Europa, sejam eles entidades ou grupos que pretendem enfraquecer Portugal, penso que não ajudamos à realização do interesse nacional.
Este é um momento em que deve afirmar-se, com clareza, que a maioria das forças políticas e a maioria dos portugueses apoiam esta opção, que o Governo está firme na sua defesa e na sua execução e que fará tudo quanto é necessário para estimular, no respeito pelo princípio da subsidiariedade, a preparação e a adaptação da economia portuguesa a uma aposta que é arriscada, mas que é importante para termos acesso a desenvolvimento, crescimento e emprego, porque a opção do curo não é a opção da Europa da moeda contra a Europa dos trabalhadores; é a opção da continuidade do mercado único, é a opção da criação de condições para que a Europa de todos, muito em especial dos trabalhadores, consiga resolver o problema do emprego.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para nós, o que conta é realizar Portugal na Europa, através de uma moeda que nem por passar a ser partilhada com os outros povos europeus passará a ser menos portuguesa...
O Sr. José Calçada (PCP): - É como o cozido!
O Orador: - ... e, sobretudo, através de uma estratégia política e económica que realize, para nós e para a Europa, o emprego, a política social, a defesa do modelo social europeu, os valores de justiça e solidariedade por que nos batemos e sem os quais não haveria desenvolvimento nem para nós nem para a União Europeia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos.
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã, pelas 15 horas, e compreende um período de antes da ordem do dia e um período da ordem do dia destinado à apreciação dos projectos de lei
n.ºs 278/VII e 70/VII e a votações.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 40 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
António Alves Martinho.
Carlos Manuel Amândio.
Fernando Garcia dos Santos.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
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Jorge Manuel Fernandes Valente.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Partido Social Democrata (PSD):
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Antonino da Silva Antunes.
Arménio dos Santos.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Carlos Pires Póvoas.
Manuel Acácio Martins Roque.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rui Fernando da Silva Rio.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Nelson Madeira Baltazar.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Raimundo Pedro Narciso.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Carlos Barreiras Duarte.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José de Almeida Cesário.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Partido Comunista Português (PCP):
João António Gonçalves do Amaral.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
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