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Quinta-feira, 3 de Julho de 1997 I Série - Número 88
DIÁRIO da Assembleia da República
VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 2 DE JULHO DE 1997
Presidente: Ex.mo. Sr. António de Almeida Santos
Secretários: Ex.mos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 40 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação da proposto de lei n.º l27/VII, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos. Liberdades e Garantias relativo às retomas de mandato de um Deputado do PS e noutro do PSD e à substituição de um Deputado do PS.
O Sr Deputado João Corregedor da Fonseca (PCP) deu conta da preocupação da população de Linda-a-Velha pela construção desenfreada de prédios em detrimento da existência de espaços verdes naquela zona e respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Elisa Damião (PS) e Jorge Ferreira (CDS-PP).
D Sr Deputado Manuel Moreira (PSD) enalteceu o trabalho dos bombeiros portugueses e chamou a atenção para alguns problemas com que os mesmos se confrontam, tendo respondido, depois, aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Moura e Silva (CDS-PP) e Rodeia Machado (PCP).
Ao obrigo da artigo 81.º n.º 2, do Regimento, o Sr. Deputado Manuel Frexes criticou a gestão socialista na área da cultura e respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputadas José Magalhães (PS), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP) e António Martinho (PS).
O voto n.º 73/VII - De saudação ao movimento cooperativo (PS), foi aprovado, tendo produzido intervenções os Srs. Deputados Rui Namorado (PS), Antonino Antunes (PSD), Lino de Carvalho (PCP) e Nuno Abecasis (CDS-PP).
Ordem do dia. - Procedeu-se à discussão conjunta, no generalidade, das propostas de lei n.º 111/VII - Estabelece n quadro de transferência de atribuições e competências fora as autarquias locais - e 115/VII - Regime financeiro das autarquias locais - e dos projectos de lei n.º 333/VII - Atribuições das associações de municípios de direito público e competências do seus órgãos (PSD) - e 387/VII- Alterações ao Decreto-Lei n.º100/84, de 29 de Março (Atribuição e competências das autarquias) (CDS-PP). Intervieram no debate, a diverso título, além do Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João
Cravinho), os Srs. Deputados Manuela Ferreira Leite (PSD), Luís Sá (PCP),Ferreira Ramos (CDS-PP), Teresa Patrício Gouveia (PSD), Lino de Carvalho (PCP), Luís Marques Mendes (PSD), Pedro Feist (CDS-PP), Mário de Albuquerque (PSD), Manuel Monteiro e Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP), Artur Torres Pereira (PSD), José Junqueira (PS),Álvaro Amaro (PSD), Luís Sá (PCP), Júlio Faria e Francisco de Assis (PS) e Macário Correia (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 55 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 40 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António Rui Esteves Solheiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelino Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sônia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Partido Social Democrata (PSD):
Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugênio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugênio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
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Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Pedro José Del Negro Feist.
Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do diploma, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitida, a proposta de lei n.º 127/VII - Dá nova redacção ao artigo 4.º da Lei n.º 40/96, de 31 de Agosto (Regula a audição dos órgãos de Governo próprio das regiões autónomas) (ALRM), que baixou à 1.ª Comissão.
Nas últimas reuniões plenárias foram apresentados à Mesa vários requerimentos. Na reunião plenária de 18/06/97: às Secretarias de Estado das Pescas e da Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Beja; ao Ministério da Solidariedade e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado Costa Pereira; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Hermínio Loureiro e Filomena Bordalo; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e à Secretaria de Estado do Desporto, formulados pelo Sr. Deputado Mendes Bota; aos Ministérios da Justiça e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado António Filipe; a diversos Ministérios, formulados pelos Srs. Deputados Bernardino Soares e
Lino de Carvalho; à Secretaria de Estado da Administração Pública, formulado pelo Sr. Deputado Luís Sá; ao Ministério da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; aos Ministérios da Economia, do Ambiente e à Câmara Municipal de Loulé, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; à Câmara Municipal de Oeiras, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira.
Na reunião plenária de 19/06/97: ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Costa Pereira; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados Filomena Bordalo e Soares Gomes; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Roque Cunha; ao Ministério das Finanças, formulados pelos Srs. Deputados Pedro Baptista e José Calçada; aos Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Ministério da Solidariedade
e Segurança Social, formulados pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira.
Na reunião plenária de 20/06/97: ao Governo, formulado pelo Sr. Vice-Presidente Mota Amaral; ao Ministério dá Educação, formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; ao Ministério das Finanças, formulado pela Sr.ª Deputada Odete Santos; às Câmaras Municipais
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de Oeiras e Sintra, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira.
No dia 24/06/97 e na reunião plenária de 25/06/97: aos Ministérios da Saúde e da Economia, formulados pelo Sr. Deputado José Cabeças: ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Luís Sá: ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Costa Pereira; à Câmara Municipal do Porto, formulado pelo Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados, no dia 24/06/97: José Reis, na sessão de 6 de Novembro e no dia 23 de Maio; Miguel Ginestal, no dia 19 de Novembro; Isabel Castro, na sessão de 10 de Janeiro; Guilherme Silva, na sessão de 15 de Janeiro; Nuno Abecasis, no dia 25 de Fevereiro; Jorge Roque Cunha, na sessão de 27 de Fevereiro; Lino de Carvalho, na sessão de 6 de Março; Elisa Damião, no dia 8 de Abril; Manuel Alegre, na sessão de 23 de Abril; Artur Penedos, no dia 17 de Junho.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias sobre retomas de mandatos e substituição de Deputados.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer é do seguinte teor:
1 - Em reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, realizada no dia 2 de Julho de 1997, pelas 10 horas, foram observadas as seguintes retomas de mandato e substituição de Deputado:
a) Retomas de mandato nos termos do artigo 6.º, n.ºs 1 e 2, do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7/93, de 1 de Março).
Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS):
António Rui Esteves Solheiro (Círculo Eleitoral de Viana do Castelo), em 1 de Julho corrente, inclusive, cessando António José Guimarães Fernandes Dias;
Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata (PSD):
Fernando Santos Pereira (Círculo Eleitoral de Braga), em 3 de Julho corrente, inclusive, cessando Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva; .
b) Substituição nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea h), do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7/93, de 1 de Março)
Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS):
José Domingos da Ascensão Cabeças (Círculo Eleitoral de Coimbra) por Rui Manuel dos Santos Namorado, com início em 30 de Junho passado, inclusive.
2 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
3 - Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
4 - Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As retomas de mandato e a substituição em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, não havendo inscrições para proferir declarações políticas. passamos ao tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Subo hoje a esta tribuna para intervir sobre uma matéria de grande interesse para uma população vizinha de Lisboa: Linda-a-Velha.
Esta população anda bastante preocupada com o facto de naquela vila não existirem espaços verdes que contribuam para a humanização do ambiente, já que tem sido dada prioridade à construção desenfreada de prédios, que a têm transformado em mais um dormitório cie Lisboa, sem que, em simultâneo, se valorize a necessidade de se garantirem condições adequadas a uma boa qualidade de veda, a que todos tem indubitável direito.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - No centro de Linda-a-Velha situa-se uma quinta que bem poderá considerar-se como
o verdadeiro «pulmão» da zona. mas, ao longo dos anos, tem sofrido de um total abandono provocado pela ânsia de ali se autorizar a construção de edifícios, de elevada volumetria, de apartamentos, de escritórios, um centro comercial e parques de automóveis. Dispõe de uma área de 21 520 metros quadrados, onde está implantado um palácio remodelado há cerca de 40 anos pelo arquitecto Raul Lino. Reúne, sem dúvida, as condições ideais para ali se criar um local susceptível de uso livre dos moradores.
Porém, assim não sucede. Adquirida por um construtor civil, logo surgiu a proposta de loteamento, que indignou a população, receosa de que a última área verde ali existente viesse dar lugar a mais uma série de blocos de cimento, destruindo irremediavelmente as suas características. Aluís, uma associação cívica e cultural, a Liga dos Amigos de Linda-a-Velha tem, ao longo dos anos, desempenhado um papel essencial na defesa do poder local, apoiada pela população, que, por diversas formas. tem manifestado a sua intenção de impedir a destruição total daquela quinta.
A questão de fundo radica no facto de a Câmara Municipal de Oeiras, nomeadamente o seu Presidente, não ter, até agora, correspondido aos legítimos anseios da população.
Os antecedentes do processo remontam a 1977. Em 1991, o município aprovou liminarmente o loteamento apresentado pelo proprietário - o qual nunca, até hoje, foi publicitado no local, nos termos da lei -, mas a sua aprovação definitiva ficou condicionada ao parecer da Comissão Coordenadora Regional de Lisboa e Vale do Tejo que, em Janeiro de 1992, exarou um despacho
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desfavorável, por inconformidade com o projecto do Plano Director Municipal de Oeiras.
Por outro lado, a decisão camarária afronta também o Plano de Salvaguarda do Património Construído e Ambiental do Concelho de Oeiras, previsto no capítulo V do PDM, que define as orientações a respeitar para a zona.
Outro aspecto curioso é o facto de a Quinta dos Aciprestes ter sido classificada pela própria Câmara Municipal de Oeiras como «imóvel de interesse concelhio». Nem assim se demoveu a vontade de autorizar as referidas construções, mesmo contra novo parecer contrário da CCR, de fins de Maio de 1993, em resposta a novo requerimento dos proprietários.
O presidente da Câmara insiste cm que o loteamento não é ilegal, porque o Plano de Urbanização da Costa do Sol (PUCS) sofreu nova alteração de pormenor, a solicitação camarária.
Esse pedido foi objecto de três informações negativas de técnicos de Direcção-Geral do Ordenamento do Território, até que o respectivo Director propôs a alteração do PUCS em 21 de Janeiro de 1994, embora sem fundamentar as razões do seu desacordo com as três informações negativas a que nos referimos. Um mês depois, o então Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território autorizava a alteração de pormenor do PUCS.
No entanto, em nossa opinião, este despacho chegou atrasado, uma vez que em Janeiro de 1994 o Conselho de Ministros já ratificara o PDM. A publicação no Diário der República desta ratificação levou à revogação simultânea do Plano de Urbanização da Costa do Sol, pelo que, como é evidente, se extinguiram os efeitos do despacho do Secretário de Estado.
O loteamento que entretanto sofreu modificações, acabou por ser definitivamente aprovado, com os votos contra da CDU, em Setembro de 1995, ou seja um ano e meio depois da entrada em vigor do PDM.
Mas o complicado processo não fica por aqui. Com a aproximação da época eleitoral, o Presidente da Câmara Municipal de Oeiras sentiu necessidade de minorar os efeitos negativos desta operação e anunciou que pretendia a abertura de negociações com vista à aquisição de parte da quinta e que nunca quisera encarar. Os vereadores da CDU da Câmara Municipal de Oeiras aprovam esta medida por, apesar de se tratar de uma iniciativa tardia, incompleta e de duvidosa eficácia, representar um primeiro passo para atenuar as consequências mais negativas do loteamento de um dos testemunhos históricos e culturais do concelho.
Ao mesmo tempo, circulam notícias que divulgam o facto de a Quinta dos Aciprestes ir ser objecto de venda executiva, devido a vultosas dívidas dos seus proprietários. Contudo, esta venda teria sido impedida pelo Tribunal de Aveiro, que suspendeu a operação por «suspeita de conluio entre a empresa exequente e a executada». Segundo a imprensa, trata-se de «uma história que pode render mais de nove milhões de contos e que se desenrola entre Gibraltar e as Bahamas», o que, a ser verdade, lança novos e obscuros contornos a um processo que urge clarificar.
Perante a situação, a Liga dos Amigos de Linda-a-Velha interpôs, no Tribunal Administrativo, recurso contencioso, alegando nulidades da deliberação camarária de 1995.
Foi ainda solicitado pela Assembleia Municipal de Oeiras, em Março de 1996, à Inspecção-Geral de Administração do Território (IGAT) um inquérito, com carácter de urgência, a toda esta situação. Já passaram mais de 15 meses sem que a IGAT dê por concluídos os seus trabalhos sem que tenha elaborado qualquer relatório sobre a inspecção que diz respeito a uma matéria que obrigaria os serviços a serem mais diligentes.
É possível que a IGAT não esteja a inquirir apenas em Oeiras sobre este caso. Mesmo assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não é aceitável que um assunto desta natureza, apesar das vicissitudes por que passou, seja tão difícil de esclarecer. A população de Linda-a-Velha e a opinião pública em geral têm o direito de exigir à IGAT mais celeridade na conclusão do inquérito.
Esperemos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que se encontre finalmente uma solução justa e adequada, que respeite a vontade das populações e a legalidade democrática.
(O Orador reviu.)
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.
A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, ouvi atentamente o relato pertinente que nos trouxe e comungo de algumas das preocupações, ainda que declare que, evidentemente, acredito nas instituições.
Estou convicta de que a IGAT vai investigar até ao fundo da questão um problema que nos suscita as maiores dúvidas, sem pretendermos, na Assembleia da República, substituirmo-nos a esse processo. Por isso, entendo que a obscuridade das decisões em torno deste processo levem o seu tempo a investigar, portanto, admito que
15 meses não seja muito tempo, uma vez que o que sucede, em termos de loteamento deste importante património municipal, é, de facto, sui generis. Este assunto tem motivado os socialistas e, é bom que se refira, na Assembleia Municipal de Oeiras, o PS e a CDU tornaram este inquérito possível e esta investigação uma obrigatoriedade.
Em todo o caso, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, o que mais me preocupa em todo este processo é uma alteração introduzida no regulamento do PDM, cuja origem nos é desconhecida. E isso dá-nos um quadro jurídico novo, que torna bastante mais difícil a resolução deste problema.
Em minha opinião, tem de haver mais vigilância, e não com qualquer intuito persecutório, à acção dos autarcas, na leviandade e na forma como as autarquias tratam a política de solos, o desenvolvimento dos seus concelhos e, sobretudo, o património. Na realidade, há intuitos especulativos que superam por vezes a vontade dos próprios autarcas e são frequentemente condicionados por modelos de desenvolvimento que não se ajustam ao interesse público.
Assim, pergunto-lhe: esta subtil alteração ao regulamento do PDM, que passou despercebida à maioria dos membros da Assembleia Municipal de Oeiras, não
o preocupa, Sr. Deputado?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, havendo mais um orador inscrito para lhe pedir esclarecimentos, pergunto se pretende responder já ou depois.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): Respondo já, Sr. Presidente.
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O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Elisa Damião, agradeço o seu comentário e pedido de esclarecimento. Classifica este processo de obscuro. Estamos de acordo consigo, pois também o classificámos desse modo na intervenção que proferi.
A Sr.ª Deputada falou nas instituições democráticas. Como é evidente, o nosso grupo parlamentar que lutou pela sua implantação e que nelas acredita é exigente quanto à sua eficácia. A verdade é que nos parece que 15 meses para apreciar este problema, que se rodeia de múltiplas
nuances, é mais do que suficiente para que a 1GAT possa elaborar um relatório e um parecer. Aliás, o tribunal administrativo também está a aguardar o parecer da IGAT para tomar uma decisão sobre o recurso entretanto apresentado.
Em relação à alteração ao regulamento do PDM. essa questão é preocupante. Fala-se nesse aspecto que relatou, Sr.ª Deputada, e diz-se inclusive que desapareceu um papel do processo. A Liga dos Amigos de Linda-a-Velha e as populações sabem que há algo que paira, que necessita de ser esclarecido. Por isso, foi apresentada uma petição sobre este problema. Esperemos que da sua análise se vá um pouco mais longe e se consiga descortinar alguns dos aspectos menos claros que em torno desta Quinta dos Aciprestes têm ocorrido.
(O Orador reviu.)
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.
O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, tenho de começar por dizer-lhe que partilho inteiramente das considerações que acabou de fazer em relação a este caso da Quinta dos Aciprestes, que é, de facto, um problema com contornos políticos, jurídicos, autárquicos e, em minha opinião, até nacionais que começa a ser urgente esclarecer cabalmente.
Estranhamente, em tudo o que diz respeito à Quinta dos Aciprestes parece haver um muro de silêncio das instituições. A Câmara Municipal de Oeiras, sistematicamente, não responde a vários requerimentos, que eu próprio tenho apresentado, no sentido de esclarecer muitos dos obscuros aspectos que envolve a sua actuação neste processo.
De facto, já fiz vários requerimentos e, até agora, a Câmara Municipal de Oeiras não respondeu a nenhum; já perguntei ao Sr. Ministro João Cravinho se tem alguma ideia ou palpite sobre qual o ano civil em que virá a ser concluída a inspecção da IGAT sobre todo este complexo problema e, até agora, o Sr. Ministro também. ainda não deu qualquer resposta acerca desta matéria, o que é preocupante, porque, como já foi referido, esta inspecção está a correr há vários meses e todos, menos a Inspecção-Geral da Administração do Território, parecem saber tudo. Não se compreende, pois, a demora na tomada de posições relativamente a esta matéria.
Ora, o que quero perguntar-lhe, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, é o seguinte: tendo em conta este condenável muro de silêncio das instituições, seja da Câmara Municipal de Oeiras seja do Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, apoia ou não a iniciativa do Grupo Parlamentar do CDS-PP, no sentido de chamar o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Oeiras à Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente para, nessa sede, dar finalmente resposta àquilo que, por escrito, parece não ser capaz de dar?
Quero, portanto, anunciar que vamos tomar a iniciativa de chamar a essa Comissão o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Oeiras para esclarecer este nebuloso caso e a participação nele da Câmara e, por outro lado, aproveito para lhe perguntar se podemos contar com o seu apoio no pedido que ainda hoje vamos formalizar nesse sentido.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Ferreira, é claro que este «muro de silêncio» de que falou é desagradável. Apoiaremos a vinda à Comissão do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Oeiras. Mas não apenas a do Sr. Presidente da Câmara, já que, pela nossa parte, também pretendemos chamar outras entidades, nomeadamente a Liga dos Amigos de Linda-a-Velha, pois os seus membros, mais do que ninguém, têm acompanhado este gravíssimo problema que afecta aquela zona.
Em relação ao atraso da IGAT, já dissemos o que tínhamos a dizer. Quanto às respostas ministeriais chegarem ou não, nós vamos apresentar um outro tipo de requerimento, ao qual, dada a forma como o vamos fazer, o Governo terá de dar uma resposta o mais depressa possível.
(O Orador reviu.)
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que se encontram a assistir à sessão plenária um grupo de 35 cidadãos luso-alemães, entre os quais alguns jovens e outros não tanto. Para eles, peço a vossa habitual saudação.
Aplausos gerais, de pé.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os bombeiros de Portugal são uma instituição das mais nobres e prestigiadas do País, que lhe têm prestado relevantíssimos serviços ao longo dos 600 anos da sua existência.
Os bombeiros portugueses têm uma génese essencialmente popular e uma característica social eminentemente humanitária e são considerados muito legitimamente os «soldados da paz», que têm como missão primordial a segurança dos cidadãos, dos seus bens e do património público
e cujo lema é «Vida por Vida».
O associativismo e o voluntariado são princípios e valores que constituem a matriz da história e da vida dos bombeiros portugueses, que importa defender e preservar convictamente.
Defender a tradição secular do associativismo e do voluntariado dos bombeiros portugueses não deve impedir a sua modernidade para servir cada vez melhor, de uma forma altruísta, a comunidade.
O sucesso do futuro dos bombeiros de Portugal está em fazer a síntese entre a tradição e a modernidade.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Face ao prenúncio de profundas alterações estruturais no domínio da actividade organizativa e operacional dos bombeiros de Portugal por parte do Governo socialista, entendeu a Liga dos Bombeiros Portugueses reunir, em Maio passado, os seus órgãos sociais para proceder a uma ampla reflexão sobre esta situação, tendo concluído, depois de um amplo debate, o seguinte:
Primeiro, perante o conjunto de medidas, de natureza legislativa e política, recentemente adoptadas relativamente ao funcionamento, organização e actividade dos corpos de bombeiros, existem, neste momento, sintomas de uma indesejável estatização dos bombeiros de Portugal, em contradição com o modelo perseguido em toda a Europa da Comunidade e que aponta para a crescente valorização da intervenção da sociedade livremente organizada e para a promoção da sua criatividade e iniciativa, em contraponto da redução do poder interventivo e providencial do Estado.
Segundo, partindo da constatação de que 90% dos corpos de bombeiros portugueses são de raiz e de responsabilidade associativa c voluntária e de que, em Portugal, o Estado não é detentor de corpos de bombeiros, não é admissível que qualquer reforma a introduzir no sector, mesmo que subordinada a uma alegada mais-valia de eficácia, seja perspectivada e executada numa postura imperativa e não negociada, impondo uma lógica inspirada pelo princípio de que o Estado manda c a sociedade civil obedece.
Terceiro, o modelo de reforma que tem vindo a ser incrementado configura que se está a partir do princípio de que os valores do associativismo e do voluntariado, que, desde sempre, constituíram a matriz inspiradora da história c da vida dos bombeiros portugueses, estariam cm crise ou, até mesmo, esgotados.
Para além da realidade viva e quotidiana das 424 associações de bombeiros voluntários existentes no País o desmentir, este pressuposto transporta consigo um perigoso manancial de perversão da identidade da nossa instituição, que importa refutar e combater.
Quarto, os órgãos sociais da Liga dos Bombeiros Portugueses, face ao confortante quadro de potencial humano das nossas instituições, ilustrado nos elevados índices de novas adesões e ingressos das camadas jovens nos corpos de bombeiros do País, concluem que não só não está esgotada a prestação de serviço voluntário nos bombeiros de Portugal como continua a revelar-se promissora.
Entretanto, reconhece-se como necessário reflectir sobre a identidade da instituição e as missões que, hoje, lhe deverão ser atribuídas, no quadro da prestação do serviço à comunidade, bem como a correspondente afectação de recursos para o seu eficaz desempenho.
Mas esta reflexão não pode ser orientada de modo a viciar os seus dados conclusivos, apontando para soluções não suficientemente avaliadas e dialogadas com o universo dos bombeiros e as suas estruturas representativas.
Quinto, relativamente ao Serviço Nacional de Bombeiros, considera-se que, enquanto interlocutor da Liga dos Bombeiros Portugueses, por parte do Estado, importa proceder a uma profunda reanálise quanto à sua natureza c funções, no quadro das sucessivas alterações legislativas introduzidas à sua Lei Orgânica (Decreto-Lei n.º 418/80,de 29 de Setembro).
É tempo de questionarmos o Serviço Nacional de Bombeiros que temos e concluirmos se ele serve os rins e os objectivos pelos quais os bombeiros portugueses se
empenharam activamente na sua criação, nos finais da década de 70.
Esta análise deve ser feita numa perspectiva positiva, ou seja, sem preconceitos, nem reservas ou constrangimentos. Tal tarefa deverá ser assumida e dinamizada pelos órgãos sociais da Liga dos Bombeiros Portugueses em continuadas reuniões conjuntas, como aconteceu nesta oportunidade.
Sexto, numa apreciação global ao quadro legislativo regulador da actividade dos bombeiros, conclui-se pela sua dispersão e insuficiência.
Por outro lado, tão importantes instrumentos legais como o Regulamento Geral dos Corpos de Bombeiros, a Tipificação dos Corpos de Bombeiros e a Regulamentação do Estatuto Social do Bombeiro continuam todos sem aprovação, em clara contradição com as expectativas criadas no seio da opinião pública, em geral, e das estruturas dos bombeiros, em particular, que, para tanto, avançaram em diferentes oportunidades, e até em congressos, com contributos c propostas, que, até hoje, não tiveram qualquer seguimento prático.
Sétimo, é inegável que os factos anteriormente descritos vêm-se revelando como geradores de legítimos descontentamento e descrenças.
Contrariamente à celeridade com que se aprovaram alterações legislativas relativas à estrutura operacional do Serviço Nacional de Bombeiros e à correspondente dotação de meios humanos, verifica-se uma incompreensível e inaceitável morosidade na produção de legislação, que, ao ser aplicada, pode contribuir para uma reforma gradual, consensualizada e participada da actividade e funcionamento dos corpos de bombeiros, sem perversões ou imposições historicamente ilegítimas e, por isso, condenadas ao insucesso.
Oitavo, os fogos florestais têm mobilizado, nos últimos anos, de forma crescente, avultados recursos financeiros.
Assim e em consequência disto, ano após ano, é cada vez maior a percentagem do orçamento do Serviço Nacional de Bombeiros comprometida com o combate a este flagelo.
A intervenção operacional dos bombeiros, durante três a quatro meses, é suportada por custos de estrutura relativos à manutenção de meios humanos em permanência, durante todo o ano.
Tem sido a pressão que os fogos florestais exercem sobre os governantes que tem inspirado o quadro de medidas até agora implantadas para o sector.
O carácter mediático deste tipo de ocorrência e a consequente influência que a sua divulgação exerce sobre a imagem de quem detém responsabilidades governativas implica que se mobilizem quase exclusivamente para o estorço do combate as principais preocupações das entidades de tutela.
Este facto tem influenciado fortemente o conjunto de medidas de carácter estrutural que vêm sendo adoptadas, bem como o quadro de investimentos do Estado no sector.
Não se questiona a importância económica e ambiental da preservação da floresta portuguesa, mas é indispensável clarificar, de forma duradoura e sustentada, o papel que cabe aos bombeiros e demais entidades intervenientes na concretização deste desígnio. É igualmente importante concluir que h5 ainda muito que fazer no domínio da prevenção e vigilância, assumidas como tarefas de 365 dias e não apenas dos dois meses que antecedem a época de Verão.
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Finalmente, os órgãos sociais da Liga dos Bombeiros Portugueses concluem pela necessidade de se prosseguir o aprofundamento e análise destas matérias, visando a definição de uma estratégia de actuação da confederação face ao Estado, em defesa da identidade, independência e projecto de intervenção das associações/corpos de bombeiros de todo o País, pelo que irão desenvolver as actividades e iniciativas que se revelem mais consentâneas com estes objectivos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria ainda de referir, a propósito das associações de bombeiros voluntários, que nelas existem bombeiros assalariados, que efectuam cerca de 36 a 40 horas de trabalho seguidas, sem receber qualquer compensação por isso e sem usufruir do descanso a que tem direito, não estando também garantida a situação de aposentação dos que trabalham há mais de 20 anos. Impõe-se que estas situações sejam revistas com toda a urgência.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria agora de vos falar brevemente dos bombeiros profissionais, constituídos por bombeiros sapadores e bombeiros municipais, ambos na dependência administrativa de uma câmara municipal.
No entanto, quer os bombeiros profissionais quer os bombeiros voluntários dependera operacionalmente do Serviço Nacional de Bombeiros
e devemos reconhecer que não tem sido fácil fazer passar à prática a necessária articulação entre os diversos bombeiros intervenientes no teatro das operações, dadas as diferentes formas de organização, o que tem levado a alguma confusão e, por vezes, ineficácia.
Os bombeiros profissionais defendem que, no campo operacional, devem possuir uma dependência directa do Inspector Superior de Bombeiros e defendem ainda a sua representação no Conselho Nacional de Bombeiros.
A Associação Nacional de Bombeiros Profissionais tem procurado sensibilizar os diferentes governos
e câmaras municipais para a defesa dos direitos e prerrogativas dos seus associados.
Esta Associação elegeu como primeira reivindicação mais e melhor formação para os bombeiros profissionais sem esquecer a prevenção.
Os bombeiros profissionais estão conscientes dos desafios do futuro e de que isso implica forçosamente a reestruturação de métodos de acção, o repensar da actual legislação e a criação de nova legislação própria para melhor servir a operacionalidade e a eficácia destes «soldados da paz» na sua nobre missão, para o que a sua Associação representativa está disponível e interessada em participar como parceiro activo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os bombeiros portugueses necessitam de incrementar a sua operacionalidade, com a
qualificação dos seus elementos, o apetrechamento dos seus meios técnicos e do equipamento de combate e protecção individual, bem como a construção e remodelação dos seus quartéis-sedes.
O Estado, as autarquias locais e as suas forças vivas devem, num movimento solidário com os bombeiros portugueses, dar-lhes lodo o apoio para a sua modernização.
Como apologista e entusiasta, desde há muito, da nobre causa dos bombeiros de Portugal, quis hoje levantar a minha voz nesta Assembleia da República em sua defesa. Espero que o futuro próximo demonstre que valeu a pena.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Moura e Silva e Rodeia Machado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, com certeza, todos estaremos de acordo em reconhecer que as associações humanitárias, vulgarmente designadas por bombeiros voluntários, prestam um serviço muito nobre, humanitário, de uma forma desinteressada de proveitos patrimoniais ou remuneratórios.
Sr. Deputado, estou de acordo com muitas das questões aqui colocadas. Curioso, infelizmente, é que, já no passado, assistíamos, nesta altura do ano, a um conjunto de preocupações de natureza política, no sentido de dotar as associações humanitárias de melhores meios técnicos e de proporcionar aos profissionais que desempenham essa tarefa melhores condições humanas. Infelizmente, fez-se essa política no passado e, curiosamente, quando se esperava que ela tosse invertida, constatamos que se mantém.
Por outro lado, sentimos existir alguma contestação, ao nível dos sapadores, com a passagem de batalhões a regimentos - instituições paramilitares -, em que os seus comandantes são, de uma forma geral - ou, presumo, são mesmo -, militares, com carreira militar. Ora, fazia todo o sentido que criássemos as condições para que fosse um civil profissional a exercer o cargo. Está ou não de acordo comigo?
Pergunto-lhe também, Sr. Deputado, como devemos certificar profissionalmente os bombeiros voluntários, que desempenham a sua actividade profissional de uma forma desinteressada, mas, no fundo, em regime de full time, nestas associações humanitárias. Ou seja, de que forma devíamos certificar profissionalmente aqueles que não têm um estatuto profissional, mas que trabalham a tempo inteiro, dedicando-se, única e exclusivamente, a servir as associações humanitárias designadas por bombeiros voluntários? Que estatuto profissional e remuneratório devíamos encontrar para esses homens que trabalham nessas condições?
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel Moreira, há mais um orador inscrito para pedir esclarecimentos. Deseja responder já ou no fim?
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - No fim. Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.
O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, o Sr. Deputado trouxe-nos aqui um conjunto de situações sobre os bombeiros voluntários e profissionais com que estamos de acordo. Quanto ao diploma sobre a Tipificação dos Corpos de Bombeiros e outros, que se encontram no Ministério da Administração Interna para publicação, creio ser importante dizer que, de facto, eles deveriam, há muito, ter visto a luz do dia, para que os bombeiros soubessem quais são, no sentido de conhecerem as verbas que lhes são atribuídas, porque muito do que se diz em relação a essas verbas não corresponde à realidade.
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Julguei que V. Ex.ª viesse aqui hoje falar sobre uma preocupação sentida neste momento pelos bombeiros e relacionada com uma reportagem transmitida na televisão, no dia 25 de Junho, que trouxe problemas aos bombeiros voluntários, ao procurar denegrir a sua imagem perante a população portuguesa,
e que os indignou. Uma das coisas aí referidas foi que os bombeiros voluntários gastariam demasiado dinheiro ao País e seriam pouco eficientes.
Como o Sr. Deputado já há pouco mencionou, são 424 as associações de bombeiros voluntários, mas são 40 000 os
voluntários, homens e mulheres, que prestam serviço a este país e que tão acarinhados são pela população.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Gostaria ainda de dizer-lhe, relativamente a essa reportagem, que há duas situações cm concreto. Foi aí dito que os bombeiros gastam muito dinheiro. Ora, os bombeiros, neste momento, estão dotados de 10,5 milhões de contos no Orçamento do Estado, mas essa verba distribui-se pelo Serviço Nacional de Bombeiros, pelos meios aéreos, pelos combates aos fogos florestais, enfim, por toda uma plêiade, que não vai directamente para as mãos dos bombeiros. E estas afirmações não são só nossas. De facto, os bombeiros voluntários, em Portugal, custam esse dinheiro, mas, se tossem profissionalizados, custariam mais de 100 milhões de contos. E é este património efectivo que temos de preservar.
A pergunta concreta que lhe faço, Sr. Deputado, é se está ou não solidário, tal como nós, com os bombeiros voluntários em Portugal
e se o protesto cívico que vão levar a efeito no próximo sábado, dia 5 de Julho, merece ou não o apoio de V. Ex.ª
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.
O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, quero, antes de mais, agradecer aos Srs. Deputados Moura e Silva e Rodeia Machado as perguntas que me colocaram.
Sr. Deputado Moura e Silva, a minha preocupação foi, acima de tudo, levantar hoje aqui a minha voz, em nome dos bombeiros portugueses, os voluntários e os profissionais, no sentido de sensibilizar o poder público instituído e, em particular, o Governo actuai para que se possa, em diálogo directo com as associações representativas dos bombeiros portugueses, tentar dar resposta às suas diferentes aspirações e aos problemas concretos que sentem no seu dia-a-dia.
Para quê? Para que, com respeito por aquilo que julgo fundamental, que é o associativismo e o voluntariado dos bombeiros, a sua tradição e a sua imagem de marca de seis séculos, se possa, efectivamente, caminhar no sentido da sua própria modernização, fazendo com que eles não sejam menorizados, antes pelo contrário devem ser devidamente reconhecidos e apoiados pela sociedade, pelos poderes públicos instituídos, pelo Estado e pelas autarquias locais.
Como referi, os assalariados dos bombeiros voluntários não estão a ser devidamente compensados pelo conjunto de horas seguidas que fazem, que é excessivo e que, de algum modo, parece de autêntica escravatura, e, por outro lado, não estão a ser garantidas as suas próprias reformas ao fim de muitos anos de serviço, como é o caso de muitos deles.
Penso, por isso, que estas são questões muito prementes, para as quais é preciso ter uma resposta objectiva e rápida por parte do actual Governo. Espero que isso aconteça.
Penso também que é necessário facultar-lhes todo um conjunto de meios técnicos de apetrechamento e de equipamento capazes, para lhes dar maior operacionalidade, bem como remodelar e construir novos quartéis, para que eles possam ter condições de actuar com eficácia ao serviço da comunidade, porque têm sido realmente uma das instituições das mais vitais ao serviço do nosso país.
No que se refere ao Sr. Deputado Rodeia Machado, quero dizer o seguinte: não foquei esse aspecto na minha intervenção, porque - quero dizer-lhe com toda a sinceridade - não tive oportunidade de ver o programa, vi apenas a reacção dos bombeiros, mas, cm face disso, estou solidário naturalmente com a sua profunda indignação, que as suas associações representativas manifestaram, pelo programa que realmente não prestigiou, cm primeiro lugar, os bombeiros
e, em segundo lugar, o órgão de comunicação social que o produziu.
Estou totalmente solidário e julgo que devemos repudiar esse tipo de programas, porque, de facto, os bombeiros portugueses merecem o máximo de consideração, de respeito e de admiração da parte da comunidade portuguesa. Julgo até que eles não têm sido suficientemente apoiados, quer no plano financeiro, quer no plano logístico, para cumprirem esta nobre missão, que é defender os bens públicos e privados e a segurança das pessoas.
Por isso, devemos ser solidários com essa atitude de indignação por parte dos bombeiros portugueses.
(O Orador reviu.)
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, ao abrigo do n.º 2 do artigo 81.º do Regimento, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Frexes.
O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Queixa-se o realizador José Fonseca e Costa de um processo de perseguição pessoal - ou política? - movido pelas autoridades culturais socialistas, a culminar com o seu afastamento da presidência do Conselho de Administração da Tóbis.
Queixam-se os arqueólogos de não serem ouvidos na feitura da recente lei do IPA, e isto, supostamente, num Governo que a única coisa com que enche a boca é o diálogo, mas, pelos vistos, não o pratica.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Queixa-se o autarca de Boticas de ter sido discriminado politicamente no recente caso da inauguração da biblioteca da terra, que não chegou a acontecer, nem pelo estímulo da presença no local do Sr. Presidente da República. Outro caso patológico e, por sinal, bem mais grave, protagonizado por um ministro exorbitante, que já nem a figura do Presidente da República reconhece e respeita.
Queixa-se o encenador Filipe La Féria de discriminação e perseguição político-cultural no também recente caso do Politeama, estando agora a contas com a ordem de despejo
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de que tomou conhecimento em primeiro lugar pelos jornais.
Estes são alguns casos exemplares da gestão socialista na cultura.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Tomemos o caso do Politeama. Quer se queira ou não, quer se goste ou não, Filipe La Féria é um dos mais talentosos e originais encenadores da sua geração, uma das personalidades criativas mais marcantes do espectáculo português da actualidade.
A crédito da actividade de La Féria, há que lançar, sem hesitações, esse fenómeno que assinalou, entre outras das suas produções de grande sucesso, a história do espectáculo em Portugal e que foi o celebérrimo Passa Por Mim no Rossio.
E com essa peça Passa Por Mim no Rossio, Filipe La Féria deu ao manifesto o seu estilo de produção imediata e comunicante. E por isso ficou marcado e lhe chamaram o encenador do cavaquismo, o encenador do regime. Não se exprimia em termos esotéricos, apenas fazia coisas de que o público gostava. Arriscava-se a ter êxito. E havia quem não pudesse suportar o êxito de Filipe La Féria.
Mais tarde ou mais cedo, após a ascensão ao poder dos novos e iluminados senhores da cultura, La Féria iria pagar com juros a ousadia de ter sido talentoso e acessível; iria pagar com juros a inaudita malfeitoria de ter levado público ao teatro, um público que há muito virara costas a esse teatro e que, com a peça Passa Por Mim no Rossio, formara filas que quase davam a volta ao edifício à espera da abertura das bilheteiras.
Por tudo isto, La Féria estava marcado; por tudo isto - ou só por isto -, La Féria tinha de ser prejudicado; por tudo isto La Féria haveria de ser saneado. E foi. Ou não tivesse ele, por infelicidade, que trabalhar com um Ministério do qual o titular tão afanosamente se reivindica dos valores da esquerda!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Como António Ferro!
O Orador: - Infelizmente da esquerda sectária e saneadora, pois então!
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Desculpe lá, mas não fale da esquerda toda!
O Orador: - Sr.ª Deputada, eu disse da esquerda sectária e saneadora! Se estiver atenta, perceberá as minhas palavras!
Este processo é exemplar da tibieza do Secretário de Estado da Cultura e da arrogância do seu chefe, o filósofo Ministro. Aquele, em entrevista a um órgão de comunicação social, começou por afirmar que a entrega do Politeama ao encenador «é um caso de absoluto privilégio no rocio teatral português, que não pode continuar» e que «exigir que ele tenha com o Estado uma relação contratual semelhante ü dos outros criadores teatrais é a única decisão política tomada».
Só por ignorância ou má fé se pode aduzir tal argumento. Com certeza que o Sr. Secretário de Estado da Cultura não ignorava, nem ignora, que muitos dos encenadores teatrais do nosso país ocupam recintos teatrais, cuja propriedade nu arrendamento é suportado por organismos do Estado. Começo por dar o exemplo mais
paradigmático: o Teatro da Cornucópia, cujo encenador é Luís Miguel Cintra, que é a companhia de Teatro que, actualmente, maior subsídio anual recebe do Ministério da Cultura. Nada mais nada menos do que 80 000 contos por ano!
E o Teatro Aberto do Novo Grupo? E o Teatro Luísa Tódi, em Setúbal? E os Teatros Sá da Bandeira e Carlos Alberto, ambos no Porto, da Seiva Trupe e do TEP? E o Teatro Mirita Casimiro, em Cascais? E o Teatro Gil Vicente, em Coimbra? E o Cinearte, aqui mesmo junto à Assembleia da República? O rol é interminável. São todos teatros de entidades públicas.
Também, para justificar o despejo de La Féria, se perguntava com que moral poderia o Estado continuar a alimentar uma companhia que «nunca se sujeitou. como as outras, aos concursos de atribuição de subsídios». Mais um argumento falso. Em primeiro lugar, porque La Féria, comparativamente com outros, recebeu subsídios diminutos para a produção teatral, enquanto tal, e, em segundo lugar, gostaria de saber a que concursos concorreram as 10 companhias teatrais que recebem actualmente a maior parte dos subsídios atribuídos pelo Ministério da Cultura à produção teatral. A concurso nenhum, Srs. Deputados, pois, para estas companhias, os subsídios são atribuídos automaticamente, sem concurso.
Como tal não convencesse, jogou-se, então, o argumento dos argumentos, qual seja o da falta de condições de segurança do Teatro Politeama. Mas não tardou muito que o estado de desorientação geral deste Ministério viesse ao de cima - aliás, a exemplo do que se passa no Governo em geral!... -, com o Ministro a desautorizar o Secretário de Estado, afirmando que a falta de condições de segurança não passava de um «exagero» que umas poucas obras, que o próprio Ministério se encarregará de suportar, não resolva, não passando tudo de uma «tempestade num copo de água».
Leda e triste encenação esta! Leda, porque o filósofo Ministro, alegre e prazenteiramente, vai dando o seu espectáculo de irresponsabilidade de dar o dito por não dito; triste, porque caem as máscaras da política da cultura socialista, que é persecutório, quando nos foi apresentada como tolerante, ecuménica e imaculada nos seus mais sãos princípios éticos: triste, porque um dos encenadores mais criativos da realidade teatral portuguesa está sem teatro, perseguido e desamparado, há cerca de 40 profissionais à beira do desemprego
e um dos mais bonitos teatros da capital, objecto de vultuosos investimentos, está encerrado.
O caso do Politeama é o último paradigma da política cultural do Governo socialista. De uma política cultural que o imodesto Ministro - filósofo da contingência - disse já ter cumprido 70% do seu programa. Fraco programa foi este! No primeiro ano, construiu o seu Ministério e, no segundo, atamancou algumas leis orgânicas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Numa coisa este Ministro ousou a mudança: Foi no capítulo dos saneamentos de tipo político-cultural.
Temo que, no horizonte, se esteja a desenhar um outro saneamento de um outro encenador. Refiro-me a Carlos Avilez, considerado no meio teatral português como
o «Papa» dos encenadores de Portugal.
Parece que é ao Ministro da Cultura que mais facilmente se toleram, no vasto seio do Governo, os
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dislates políticos e a quem se permitem todas as deselegâncias e défices de ética.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Um Ministro da Cultura pródigo em palavras e parco em obras e realizações, desdobrando-se em discursos
e entrevistas para conseguir, para a sua política de hesitacionismo, para o seu vácuo de ideias e para a sua escassa capacidade governativa, uma visibilidade falsa, assente mais no caudal das suas diatribes e dos seus ataques trauliteiros do que em qualquer circunstância positiva.
Triste contingência a sua! Triste destino o da cultura!
Aplausos do PSD e de público presente nas galerias.
O Sr. Presidente: - Os cidadãos que se encontram a assistir à sessão nas galerias não podem manifestar-se. Agradeço, por isso, que o não façam.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Frexes, triste figura, triste intervenção!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não apoiado!
O Orador: - Tendo V. Ex.ª desempenhado o fúnebre papel que desempenhou na triste política cultural do cavaquismo,...
Vozes do PSD: - Oh!...
O Orador: - ... esperava-se de si um período de nojo, um período de vergonha, um período de reflexão, um período de ponderação do que fez e do que não fez. Contudo, V. Ex.ª apresenta-se como se fosse uma «virgem» impoluta, carregada de razão, de dedo esticado, acusador, tremendo contra o «Adamastor». Que «Adamaston»? Um Ministro a quem V. Ex.ª censura o facto de ser ministro. V. Ex.ª foi Secretário de Estado, mas não é razão para ser complexado! V. Ex.ª era o ajudante de Cavaco, mas não é razão para viver vergado o resto do tempo!
Risos do PS.
Ele é Ministro, e ainda bem! Há um Ministro da Cultura em Portugal, felizmente! É uma virtude da nova maioria, ruas, pelos vistos, isto infunde a V. Ex.ª uma espécie de horror! Queria um Ministro calado! Queria um Ministro «capado»!
Risos do PS.
Este Ministro fala e exprime-se e isso para V. Ex.ª é uma coisa inusual no mundo dos eunucos culturais do cavaquismo! É normal. É normal que haja ministros que sejam ministros da cultura de cabo a rabo, que se assumam como personagens políticas e intervenham sobretudo na vida política! E se são filósofos, Sr. Deputado, ainda bem!
Agora, o que é que V. Ex.ª traz de relevante a esta Câmara? O que é que aconteceu de terrível? Bem, aconteceu que este Governo rompeu com a vossa política, tomou a iniciativa de proteger os bens de património
histórico inigualável, que VV. Ex.as condenavam à destruição.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - E tomou essa decisão logo, tomou essa decisão talhantemente e com êxito saudado universalmente. V. Ex.ª deve ter visto, pelo menos, espero eu, com pudor, a visita do Sr. Presidente da República e do Rei de Espanha às gravuras de Foz Côa. Devia saudar isso e dizer «eu errei, eu enganei-me». Enganou-se V. Ex.ª, Sr. Deputado Manuel Frexes, quando mandava.
Agora, o que é que V. Ex.ª critica? Tanto quanto percebi, critica aquilo a que chama «uma política persecutória». Mas qual política persecutória, Sr. Deputado?! É V. Ex.ª, agora, o defensor de quem, no passado, incomodava, no mínimo?! É V. Ex.ª, agora, o advogado oficioso - com que credibilidade? - de pessoas que discutem com o Governo dossiers que têm de ser discutidos e nos quais pode haver polémica? É essa polémica perseguição? Sr. Deputado, não estamos na era do cavaquismo! V. Ex.ª está mal habituado!
Por último, V. Ex.ª diz que q caso Politeama é o último paradigma da política cultural do Governo do Partido Socialista. Sr. Deputado, pode tentar transformar um rato numa montanha, mas um rato é um rato e uma montanha é uma montanha. Não transforme uma questão, que pode ser apurada face às regras do Direito Administrativo ou seja, se o edifício obedece ou não obedece a condições de segurança adequadas, se estão a ser feitas as obras que têm de ser feitas, se serão feitas nos prazos adequados numa obra sancionatória, que não existe. Desafio V. Ex.ª a provar, perante esta Câmara e agora, se possível, os dados que confirmem a grave acusação que fez, que não tem qualquer fundamento, porque a situação está resolvida. Queixa-se V. Ex.ª e uiva por dor alheia, que não existe e que não vem da parte daqueles que, como V. Ex.ª disse, são visados.
E, então, Sr. Deputado, desaparecido no ar, esfumado, este último paradigma da «terrível» política da nova maioria, o que é que lhe resta nos braços? A vergonha de não ter feito o que devia ter feito na altura própria, e por isso V. Ex.ª teria feito melhor cru estar franca e honestamente calado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Frexes.
O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Magalhães normalmente serve para bombeiro nestas ocasiões. Quando o PS não tem argumentos, aparece o Sr. Deputado José Magalhães.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Aplausos do Deputado do PSD Guilherme Silva.
O Orador: - Sr. Deputado, como o senhor nada mais tem a dizer, fala das gravuras de Foz Côa. Relativamente a esta matéria,...
O Sr. José Magalhães (PS): - Parece-lhe pouco importante?!
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O Orador: - Sr. Deputado, ouviu-o atentamente e espero que faça o mesmo, que tenha, pelo menos, esse sinal de boa educação.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É difícil!
O Orador: - Como dizia, relativamente a esta matéria, se o Sr. Deputado quiser ficar bem esclarecido, tem na sua bancada um Deputado que lhe pode explicar tudo sobre isso, o Deputado Júlio Meirinhos, que, pelos vistos, também foi saneado do programa PROCOA!
O Sr. José Magalhães (PS): - É falso!
O Orador: - Portanto, faça favor de perguntar...
O Sr. José Magalhães (PS): - É totalmente falso!
O Orador: - Tem aí um belo exemplo da sua política!
Aplausos do PSD.
O Sr. José Magalhães (PS): - O que é que isto tem a ver com o Foz Côa?!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não fique desesperado, Sr. Deputado José Magalhães!
O Orador: - Quanto à «triste figura», devo dizer que quem a faz é o Sr. Deputado José Magalhães.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E vou dizer-lhe porquê. Porque devia explicar aos 42 trabalhadores, que se encontram nas galerias a assistir aos trabalhos, a razão por que estão no desemprego. Isto
é que é uma triste figura. E aquela que se faz para tentar justificar esta política. Era isto que o Sr. Deputado deveria ter em conta e não mandar as pessoas para o desemprego, nem fechar teatros, porque isso nunca aconteceu.
Aliás, devo dizer-lhe mais: no tempo do Salazar poderia haver censura, mas ele não mandava encerrar os teatros ....
O Sr. José Magalhães (PS): - Não elogie o Salazar!
O Orador: - ... nem despedia os encenadores, como está a acontecer neste momento.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PS.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): Nem sequer o António Ferro!
O Orador: - Nem o António Ferro, exactamente!
Vou dizer-lhe mais, Sr. Deputado José Magalhães, para ver o que está a passar-se na política cultural. O senhor disse que eu fui Secretário de Estado. Fui com muita honra e muito gosto, fui-o ao serviço deste país. O Sr. Deputado chamou-me ajudante do Professor Cavaco Silva ou ajudante do ajudante, não interessa as palavras que foram ditas exactamente, com as quais está habituado a tratar os outros. Respondo-lhe apenas com uma coisa: é preferível ser ajudante do Professor Cavaco Silva
e ter feito pela cultura a obra que nós fizemos...
O Sr. José Magalhães (PS): - Onde é que está a obra?!
O Orador: - ... do que ser ministro e nada fazer, que é o que acontece com o actual Governo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Frexes, começo por cumprimentá-lo por ter trazido a esta Câmara duas questões paradigmáticas da actual gestão da cultura portuguesa, a primeira das quais prende-se com este instinto persecutório. Acho isto interessante porque. ao fim e ao cabo, já vou vendo muitas coisas. Queria deixar aqui bem claro aquilo que, julgo, representa o sentimento das pessoas. As pessoas não foram, de tacto - e eu até escrevi urna expressão muito usada pela bancada do Partido Socialista -, «lacaios do cavaquismo». Às pessoas foram criadas condições para trabalhar, o que é uma questão completamente diferente. Aliás, as condições que há hoje são as que havia ontem e as que havia ontem são as que há hoje. Não há ninguém que me possam apontar que esteja neste momento a fazer alguma coisa que não tivesse tido, de uma maneira mais ou menos próxima, uma relação com a Secretaria de Estado da Cultura. Alguns escondem-no, fazem muito mal, ruas fazem isso na base da nossa educação, de não termos a paciência de lembrar-lhes esse facto. Portanto, não há ninguém que hoje esteta que não tenha estado. Ninguém! Gostava que me dissessem um nome. Estavam era mais satisfeitos, porque realmente foram-lhes dadas condições de trabalho, coisa que agora não acontece.
A segunda questão muito importante é a do encerramento de um teatro, a do encerramento de um palco.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Quero lembrar que o grosso do encerramento de toda a rede de palcos em Portugal, incluindo a grande rede de cinemas que havia, se deu durante a gestão socialista, a anterior à gestão do PSD.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Isto é um facto. Os senhores conseguiram fechar o grosso da rede de, exibição e de espectáculos existente em Portugal. E só quem lá está ou quem lá esteve percebe quanto é doloroso ver fechar um palco.
O Sr. José Magalhães (PS): - Fizémo-lo por maldade!
A Oradora: - Não, não, os senhores nunca fazem isso por maldade, os senhores fazem-no por ineficácia.
Para terminar, pergunto ao Sr. Deputado Manuel Frexes se não concorda comigo em relação a esta enorme contradição, que é a de o Ministério da Cultura, particularmente o Sr. Secretário cie Estado, não ter
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percebido uma coisa essencial: enquanto não houver procura, a oferta não serve para nada, pelo que ele não pode promover a oferta. que também tem de promover,
se não criar espaços. Pensa ou não que ele entrou numa contradição ao promover, mal, a oferta, dando subsídios, em vez de continuar a fazer aquilo que estava a ser feito, e bem, que era «dar uma cana para pescar»? É que as pessoas só pedem condições, não pedem mais nada e, no estado em que está o mercado das artes, é natural que o Estado intervenha para lhes criar essas condições. Portanto, não estão a ser dadas às pessoas condições para uma oferta estável e sustentada e não há nada para fomentar o público.
Considerando que foi La Féria - pelo menos, este mérito inegável ele teve - quem fez a grande reconciliação com o público, porque o que tornou a trazer o público ao teatro foi, de facto, La Féria; considerando que vivemos num país que encheu os seus teatros com todas as camadas sociais, teatros que ficaram reduzidos a
teatros experimentais, que, durante 30 anos, experimentaram, experimentaram, experimentaram até ficarem vazios e só com moscas, reconciliação que, repito,
foi feita por La Féria, gostava que o Sr. Deputado Manuel Frexes me respondesse, mas o Sr. Deputado José Magalhães também pode responder, se realmente esta contradição, nos próprios termos, não irá ser um passo atrás na actividade teatral portuguesa.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Frexes.
O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, começo por agradecer o facto de me ter feito esta pergunta.
Sabe, Sr.ª Deputada, o Sr. Deputado José Magalhães nunca lhe poderia responder a essa sua pergunta por uma razão muito simples: é que ele nada tem a dizer, porque a política cultural deste Governo nesta matéria tem sido zero.
Vozes do PSD: - Exactamente!
O Orador: - Por exemplo, posso testemunhar que relativamente à política de aquisição, recuperação e valorização de recintos culturais nos últimos 10 anos,
aquela que alguns chamam «política do cavaquismo», recuperámos mais de 100 cine-teatros em todo o País.
Reabrimo-los e novas companhias foram instaladas. Fizemos a descentralização, há companhias em todos os distritos do País.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - E agora fecha-se!
O Orador: - E agora qual é a política do Governo socialista? Fechar os teatros, mandar os trabalhadores para o desemprego e pôr os encenadores na rua.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É esta a política teatral do Governo socialista.
Vozes do PSD: - Exactamente!
O Sr. José Magalhães (PS): - Demagogia!
O Orador: - Além disso, o problema deste Ministro é que quer funcionalizar toda a cultura. Ele não gosta de encenadores que tenham um espírito empresarial. ele não gosta de encenadores que possam conjugar a captação de público com o mecenato, ele não gosta de encenadores que possam agir livremente fora da sua alçada.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É uma ofensa à cultura!
O Orador: - Esse é que é o grande problema da cultura socialista.
Protestos do PS.
Têm muita dificuldade em lidar com aqueles que não são funcionários da cultura, nem funcionários socialistas. Daí que a única política que temos visto seguida pelo Partido Socialista - e veja-se o caso do Politeama e outras coisas se farão sem dúvida, a não ser que venha novamente a desautorização do Ministro ao Secretário de Estado,...
Vozes do PSD: - O que começa a ser corrente!
O Orador: - ... o que também pode ocorrer, porque já é normal -...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Neste Governo é normal!
O Orador: - ... seja a de ignorar e esquecer os valores essenciais e as infra-estruturas culturais portuguesas.
Aplausos do PSD e da Deputada do CDS-PP Maria José Nogueira Pinto.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Maninho.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Manuel Frexes disse que, enquanto membro do Governo, teve muito orgulho da política cultural de então.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Como é natural!
O Orador: - Olhe, a sua intervenção retrata a sua política cultural: falou durante 1 minuto do caso de Boticas e durante 8 minutos do caso do Politeama, o mesmo é dizer falou durante 8 minutos de Lisboa. Era esta a vossa política cultural. Ou seja, os grandes problemas são os de Lisboa e os pequenos problemas, que são os do resto do País, têm uns pozinhos. E assim fez!
Sr. Deputado, lembra-se, por exemplo, do que acontecia com as companhias de teatro? Lembra-se quais eram os apoios que davam às companhias de teatro, por exemplo, do interior?
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Oh!...
O Orador: - Lembra-se do descontentamento das companhias de teatro?
Vozes do PS: - Diga lá!
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O Orador: - Das exigências que eles fizeram nessa altura? Lembra-se, Sr. Deputado, do descontentamento de companhias de bailado, de profissionais de bailado, de arqueólogos, de homens da música? Lembra-se do que aconteceu com as orquestras sinfónicas durante o vosso mandato? Lembra-se, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PS): - Lembra-se mal!
O Orador: - Lembra-se também - e já aqui foi recordado - do atentado, pela política que seguiam, ao património arqueológico. vide Foz Côa, e da arrogância com que os senhores falavam neste Hemiciclo relativamente a esse problema? E agora, Sr. Deputado, trazem a este Hemiciclo o exemplo de Boticas e essa, sim, triste figura de um autarca do seu partido, que fez um ataque trauliteiro ao Ministro da Cultura que - pasme-se! - se negou a ir inaugurar uma biblioteca que ainda não está terminada!?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O corpo físico ainda não está terminado, ainda não tem livros. A biblioteca do Sr. Deputado é um edifício ou são os livros e a sua utilização pelas populações?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - As duas coisas!
O Orador: - Sr. Deputado, como explica esta ligação e o facto de trazer a este Hemiciclo essa afirmação infeliz do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Boticas?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Frexes.
O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Sr. Presidente. Sr. Deputado António Maninho, já estava habituado a que o senhor cometesse muitos lapsos e, de facto, comete-os permanentemente. Ainda há dias, cometeu um,...
O Sr. António Martinho (PS): - Qual?!
O Orador: relativamente à criação do museu do Douro.
O Sr. António Martinho (PS): - Ah!... Isso é um lapso!?
O Orador: - Mas, enfim, deixemos isso.
Protestos do PS.
Agora, é a minha vez de falar para lhe perguntar o seguinte: então, o senhor fala na anterior política cultural em relação ao teatro?! Fala de descentralização cultural?! Mus quem é que criou as companhias de teatro no interior?!
O Sr. António Martinho (PS): Não foi no vosso tempo. Foi em 1985!
O Orador: - Inclusive, uma na sua região, a Filandorra, quem é que a apoiou?! E a companhia de teatro das Beiras?!
Protestos do PS.
O Sr. José Junqueiro (PS): - O Sr. Deputado Manuel Frexes tem ar de quem não vai ao teatro.
O Orador: - Ó Sr, Deputado,...
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço que não entrem em diálogo directo. Os Srs. Deputados só se deixam interromper se assim o entenderem...
Façam favor de fazer silêncio.
O Orador: - Santa ignorância, Sr. Deputado! «Teatro» faz o senhor aqui ao fazer essas afirmações.
Vozes do PSD: - Exactamente!
O Orador: - Porque a Filandorra foi apoiada no meu tempo, fui eu quem assinou o despacho de apoio. Portanto, sei do que estou a falar. Fomos nós que criámos a descentralização cultural.
Risos do PS.
Fomos nós que criámos o programa de uma companhia de teatro residente em cada distrito, porque não éramos a favor da mera itinerância, de levar ao interior aquilo que se fazia na capital. Também defendemos isso, ruas queremos que cada distrito tenha a sua companhia de teatro.
O Sr. José Magalhães (PS): - Filósofo!
O Orador: - Digo-lhe mais: penso que só por lapso é que o Sr. Deputado veio aqui defender um Ministro independente. Deve ter tido essa incumbência. É um problema da sua bancada, o senhor resolvê-lo-á!
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, façam silêncio.
O Orador: - Mais: o Sr. Deputado disse que eu gastei 1 minuto a falar do caso de Boticas. Penso que também neste caso o Sr. Deputado foi infeliz. Sabe porquê? Porque se a biblioteca não tem livros é por culpa do Ministério da Cultura.
Vozes do PSD: - Exactamente!
Protestos do PS.
O Sr. José Magalhães (PS): - Se não chove, também é culpa do Ministério da Agricultura!...
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que deixem falar quem está no uso da palavra.
O Orador: - É que se o Sr. Deputado conhecesse o programa da Rede Nacional de Leitura Pública, que, felizmente, este Ministro ainda não teve a ousadia de dar por terminado, verificaria que metade da comparticipação
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para a aquisição de livros compete ao Ministério da Cultura e ao Instituto Português do Livro
e da Leitura. É isto que o Sr. Deputado ignora.
Sabe por que falei sobre o caso de Boticas durante 1 minuto e do caso do Politeama durante 8 minutos? É porque o Sr. Deputado não queria ouvir falar num escândalo nacional! Queda que eu tivesse falado de Boticas durante 8 minutos e apenas 1 minuto sobre o caso do Politeama. Mas não estou aqui para isso! O que é preciso é falar do caso do Politeama e questionar por que razão está este teatro encerrado e há 40 trabalhadores no desemprego. É isto que é preciso discutir aqui!
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, como consideramos que a nossa cultura não é feita de casos históricos, como aqui foi dito, mas de coisas bem mais simples e importantes, interpelo a Mesa para saber se é possível a Assembleia tomar alguma atitude no sentido de o Convento de Mafra não ser pintado de amarelo «pombalino» como está a ser. É que isso é que é, de facto, um grande atentado à cultura. Tirem o amarelo do Convento de Mafra!
Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, também não gosto do amarelo, mas a verdade é que existe algo chamado separação dos poderes. A Assembleia não pode interferir nessas coisas!
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. José Magalhães (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é para anunciar que, no âmbito da Subcomissão de Cultura, esta bancada tomará iniciativas, com a participação das outras bancadas, a que apelamos, no sentido de que a Subcomissão acompanhe directamente a situação do teatro Politeama. É um caso que está cm resolução ....
Vozes do PSD: - Ah!
O Orador: - ... pelo que entendemos que, nessa matéria, se justifica que a Câmara acompanhe...
Aplausos do PSD.
Srs. Deputados do PSD, sei que isto seria impossível no tempo do cavaquismo, mas é normalíssimo hoje em dia!
Aplausos do PS.
Como dizia, Sr. Presidente, tomaremos iniciativas no sentido de que a Subcomissão de Cultura acompanhe este caso, se inteire e forneça ao Plenário uma informação objectiva e circunstanciada, designadamente quanto ao futuro dos trabalhadores e ao recomeço das actividades.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Fica anunciado, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Sr. Presidente, é para dizer que me congratulo com esta posição do Sr. Deputado José Magalhães. Afinal, foi uma viragem de 180º! Ainda bem para a cultura portuguesa!
O Sr. José Magalhães (PS): - Uma viragem de 180º? Foi de 0º!
O Orador: - Quero informar que faço parte da Subcomissão de Cultura e que esta tem vindo a acompanhar este caso com muita preocupação...
Vozes do PS: - Ora, ainda bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não está a fazer uma interpelação à Mesa.
O Orador: - A única coisa que quero dizer ao Sr. Presidente é que faça um apelo à bancada socialista no sentido de esta, por sua vez, apelar ao bom senso do Ministro da Cultura e do seu Secretário de Estado para que seja reposta a situação do Politeama tal como existia até agora. É isto que é necessário e obrigatório.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a sede própria para isso será a Subcomissão de Cultura.
Srs. Deputados, há consenso para passarmos de imediato à discussão e posterior votação do voto n.º 73/VII - De saudação ao movimento cooperativo, apresentado pelo PS e cujo primeiro subscritor é o Sr. Deputado Rui Namorado.
Para proceder à leitura deste voto, tem a palavra o Sr. Secretário.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Presidente, Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:
A Assembleia da República associa-se, uma vez mais, à comemoração do Dia Internacional das Cooperativas que, este ano, é a 5 de Julho.
Saúda, assim, o movimento cooperativo português, homenageando através dele as cooperativas de todo o mundo e as centenas de milhões de cooperadores que as integram. Relembra, nestas circunstâncias, o relevo dos valores e princípios cooperativos numa conjuntura mundial onde se multiplicam problemas que parecem obscurecer os horizontes da esperança.
A consciência aguda dos bloqueamentos que comprometem o futuro da humanidade alarga-se a um
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número crescente de pessoas, embora ainda sem a devida correspondência numa acção concertada dos poderes instituídos. É importante, por isso, valorizar o protagonismo, modesto mas determinado, das cooperativas, esses focos de uma liberdade vivida como procura da justiça no quadro de um desenvolvimento sustentável.
Por tudo isto, este voto de saudação e homenagem ao movimento cooperativo pela celebração do 75.º Dia Internacional das Cooperativas deve também ser entendido como um meio de salientar a importância que esta Assembleia atribui às cooperativas portuguesas.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão e cada grupo parlamentar disporá de 3 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Namorado.
O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Umas breves palavras para justificar este voto cujo conteúdo integra desde já uma parte substancial da justificação.
Como, de entre os dias que mais se aproximam de sábado, 5 de Julho, este era o dia em que era possível apresentar este voto, é por isso que é apresentado hoje.
Esta proposta de um voto de saudação dirige-se ao movimento de 700 milhões de cooperadores cuja organização festejou, em 1995, o seu primeiro centenário. É, por isso, um movimento sedimentado, um movimento que documenta a ideia de que a globalização é uma realidade complexa, com as suas faces sombrias, predatórias, opressoras mas também com as suas faces de solidariedade, libertadoras, emancipadoras, como é o caso do movimento cooperativo.
À luz da nossa Constituição, a cooperatividade vale por si mas, ao apresentarmos este voto, não podemos esquecer o facto de que o movimento cooperativo internacional tem vindo, crescentemente, a preocupar-se, a assumir a preocupação com os problemas da comunidade. Nessa medida, em 1995, foi integrado, entre os princípios, o princípio do envolvimento e da preocupação com os problemas da comunidade, assumindo-se uma prática que, especialmente no campo da defesa do ambiente e da promoção do desenvolvimento humano sustentável, era já de há algum tempo.
É, aliás, um sintoma positivo no mesmo sentido o facto de a declaração comemorativa do dia que hoje estamos a celebrar se ocupar da segurança alimentar mundial, o que significa que a afiança cooperativa internacional, os cooperadores de todo o mundo estão solidários connosco e com todos aqueles que querem lutar por um mundo melhor.
Assim, é com regozijo que saudamos as cooperativas, essas escolas de liberdade e de justiça que devem ter cada vez melhores condições para o serem cada vez melhor.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Antonino Antunes.
O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD associa-se a este voto de saudação ao Movimento Cooperativo, por altura da celebração do 75.º Dia Internacional das Cooperativas.
Assim o faz com agrado, porque os valores cooperativos da ajuda e responsabilidade próprias, da democracia, da igualdade, da equidade e da solidariedade sempre lhe foram extremamente caros.
Na tradição dos fundadores do movimento cooperativo, o PSD acredita nos valores éticos da honestidade, da transparência, da responsabilidade social e da preocupação pelos outros que caracterizam o movimento cooperativo.
Foi assim que, em 1995, apresentou neste Parlamento uma proposta de lei do Código Cooperativo que, aprovada nesta Câmara, viu depois o seu processo legislativo interrompido.
Foi assim que, ainda em 1995, pôde constatar com agrado e orgulho que essa proposta antevia e consagrava já, na sua generalidade, aquilo que viriam a ser as conclusões tomadas depois, em Manchester, no âmbito da Aliança Cooperativa Internacional.
Foi assim que o PSD deu, com orgulho, o seu contributo válido para a discussão e aprovação, em 1966, do Código Cooperativo que se traduziu no aperfeiçoamento da lei então vigente e na sua melhor identificação com o espírito cooperativo.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Estão, desde há um ano, definitivamente criadas as condições para melhorar a legislação complementar dos diversos ramos e proceder a uma reforma global dos quadros jurídicos da fiscalidade das cooperativas. Por isso, queremos que este voto de saudação se transforme também na oportunidade de um desafio ao Governo para que queira e saiba desenvolver uma política coerente de fomento cooperativo, capaz de estimular os cooperadores e de resolver os problemas com que ainda se debatem.
(O Orador reviu.)
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP associa-se a este voto de saudação ao movimento cooperativo, da iniciativa do Sr. Deputado Rui Namorado.
Através da associação a este voto, associamo-nos também a uma saudação e à manifestação da nossa solidariedade para com o movimento cooperativo em Portugal, precisamente no dia em que se comemora o 75.º Dia Internacional das Cooperativas.
Não é demais saudar e chamar a atenção desta Assembleia da República para a importância e o interesse do movimento cooperativo. Mas não basta saudar, Sr. Presidente. Mais do que saudar, é preciso tomar as medidas concretas que permitam apoiar, estimular o movimento cooperativo e ajudá-lo a ter um papel efectivo nas funções que lhe são cometidas pela Constituição e pelos princípios cooperativos. Infelizmente, tal não tem acontecido.
O novo Código Cooperativo, aprovado por esta Assembleia da República, prevê e determina que o Governo tomará as iniciativas adequadas para a implantação de medidas de apoio financeiro e fiscal ao sector cooperativo, no quadro do que é previsto na Constituição da República Portuguesa. Até hoje, tal não aconteceu, apesar dos compromissos públicos assumidos pelo Governo e pelo Partido Socialista.
Queremos, pois, crer que este voto de saudação, que, hoje, estamos a discutir e, seguramente, a aprovar, seja também um contributo para lembrar ao Governo os
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compromissos assumidos em matéria de apoio ao movimento cooperativo, designadamente no que se refere à definição de um conjunto de instrumentos financeiros e fiscais que decorrem da Constituição, definição essa a que
o Governo está obrigado pela própria Lei do Código Cooperativo recentemente aprovada nesta sede.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.
O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu partido também quer associar-se a este voto de saudação ao movimento cooperativo. Mas
queremos acentuar que não o fazemos no sentido de saudar uma «flor» da democracia portuguesa que mais significado não têm do que o de uma flor.
Nós acreditamos profundamente no valor económico e não só no valor moral do movimento cooperativo. Sabemos que o movimento cooperativo, em determinadas
circunstâncias e em determinadas regiões, é a melhor forma de dar corpo a um espírito empresarial entre populações que se preparam para o desenvolvimento.
Exactamente por essas razões é que quero acentuar a obrigação moral que Portugal tem de usar o seu movimento cooperativo como uma arma insubstituível e única para a cooperação no desenvolvimento dos países de língua portuguesa.
Estou a referir que não faz sentido que o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas se dirija a Moçambique, ou, um dia destes, a qualquer outro dos PALOP, para, individualmente, abrir caminho à implantação de agricultores, ignorando que, no nosso país, há cooperativas de agricultores e que o que podemos e devemos fazer é formar também cooperativas por intermédio das nossas próprias cooperativas. Com essa medida e com a utilização desse instrumento, podemos dar dimensão à capacidade produtiva que aqueles países
necessitam criar o mais rapidamente possível. Isso está previsto no nosso próprio movimento cooperativo, não só na área dos agro-alimentares mas também na da construção de edifícios de habitação e, igualmente, na área da construção de cidades. Ora, Portugal não pode continuar a votar, nesta sede, de uma forma muito poética, votos em favor do movimento cooperativo, enquanto continua a
ignorar que este constitui uma arma preciosa para nós mas, mais ainda, para aqueles que esperam de nós uma ajuda ao seu próprio desenvolvimento.
É nesse sentido que o meu partido se associa a este voto, chamando a atenção dos partidos de maior dimensão e também do Governo para a urgência de olhar a sério
para esta arma que é só nossa, que ninguém mais pode usar no desenvolvimento dos PALOP.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há consenso dos grupos parlamentares para que se vote, de imediato, o voto n.º 73/VII - De saudação ao movimento cooperativo (PS).
É o que faremos.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.
Eram 17 horas e 10 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.º 111/VII - Estabelece o quadro de transferência de atribuições e competências para as autarquias locais - e 115/VII - Regime financeiro das autarquias locais - e dos projectos de lei n.º 333/VII - Atribuições das associações de municípios de direito público e competências dos seus órgãos (PSD) - e 387/VII Alterações ao Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março (Atribuições e competências das autarquias) (CDS-PP).
Para introduzir o debate, relativamente às propostas de lei n.º111/VII e 115/VII, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As propostas de lei que são hoje objecto dos nossos trabalhos representam o compromisso do PS com os portugueses no sentido de reforçar o poder local na base de urna nova partilha das responsabilidades entre o Estado e as autarquias.
O programa eleitoral do PS estabeleceu como prioridade política uru ousado processo de reforma, marcado por um reforço do poder local e por uma nova partilha de responsabilidades. Diz-se, nesse programa: «Mais competências e mais responsabilidades implicam novos critérios de redistribuição financeira e, como tal, uma exigente revisão do regime de finanças locais.
Uma reforma estrutural das finanças locais tem, naturalmente, que acompanhar o processo de descentralização da transferência de competências. É a solução apresentada pelo PS e a lei-quadro de atribuições e competências é articulada com uma nova lei de finanças locais, por forma a permitir que novas responsabilidades sejam acompanhadas de novas dotações.
As soluções propostas de redistribuição de competências serão estabelecidas de forma realista e na base de soluções de articulação entre o Estado, as regiões, os municípios e as freguesias, por forma a garantir, em consequência dessa transferência de competências e sem agravamento da despesa pública, num ciclo de quatro/cinco anos, a duplicação em termos reais da percentagem dos recursos financeiros transferidos do Orçamento do Estado para as autarquias locais».
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - As duas propostas de lei hoje em discussão consubstanciam um núcleo essencial da estratégia descentralizadora do Governo que, com realismo e em diálogo com os sectores interessados, visa reforçar a autonomia do poder local no quadro de um profundo processo de descentralização e de reforma do Estado.
O Governo, em 12 de Setembro de 1996, isto é, muito antes da súbita conversão do PSD ao municipalismo, criou uma comissão interministerial com a missão de preparar o quadro jurídico do processo de transferência de competências; foi igualmente criado, em Agosto de 1996,
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um grupo de trabalho com a participação da Associação Nacional de Municípios para prepara uma nova lei de finanças locais.
O reforço do municipalismo. a anteceder o processo de criação das regiões administrativas, é uma prioridade que visa aprofundar a descentralização, assegurando a concretização do princípio da subsidiaredade.
A proposta de lei de transferencia de competências para as autarquias locais transforma os municípios em verdadeiros governos locais com intervenção em 17 novos domínios diversificados, determinantes para a qualidade de vida das populações, dando início a um processo ousado de descentralização, a concretizar ao longo do mandato autárquico de 1998-2001, envolvendo a transferência de cerca de 300 milhões de contos para os municípios no ano 2001, sem aumento da despesa pública.
Preconiza-se, assim, a transferência para o nível municipal de competências relativas a domínios quer de natureza exclusivamente municipal quer integrados em programas de acção regional e nacional, sendo que a execução destes últimos será norteada.
respectivamente, pelas prioridades definidas pelas regiões administrativas e pela Assembleia da República, sob proposta do Governo, sem prejuízo da possibilidade de previsão do seu exercício por associações de municípios ou pelas áreas metropolitanas.
Prevê-se ainda a possibilidade de realização de investimentos pelas freguesias, através de delegação, pelo município, da respectiva competência, acompanhada dos necessários financiamentos e apoios técnicos.
Procede-se também à identificação, relativamente a cada um dos domínios de atribuição municipal, das respectivas competências. estabelece-se a ,forma de concretização progressiva, nos quatro anos subsequentes à entrada em vigor da lei, através de diplomas próprios que estabelecerão disposições adequadas à gestão do processo.
Esta transferência de competências, desejavelmente a iniciar já no próximo ano, é acompanhada de um sistema de transferência de receitas financeiras, de forma a dotar as autarquias dos meios necessários para a prossecução efectiva das novas atribuições - os recursos necessários para o efeito estão estimados em 300 milhões de contos.
O pessoal afecto aos serviços ou funções transferidas passam igualmente a depender das autarquias, mantendo, porém, a plenitude dos direitos antes adquiridos. Prevê-se ainda a regulamentação da intervenção das autarquias locais no exercício de competências em regime de cooperação, através de diploma próprio, do qual constará o regime contratual a estabelecer com os departamentos da administração central.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Num contexto marcado pela incapacidade doa partidos da oposição em adoptar uma estratégia coerente de descentralização administrativa, com a inerente redefinição das competências municipais, é de saudar a apresentação pelo Partido Popular de um projecto de lei sobre atribuições e
competências das autarquias locais.
O CDS-PP apresenta uma estratégia relativamente à qual manifestamos reserva, serra prejuízo de afirmarmos, desde já, que nele se propõe também um vasto elenco de novas competências que merecem a nossa concordância genérica. Apesar dessa evidente afinidade, distancia-nos o tacto de o projecto do PP não dar a necessária atenção à transparência e homogeneidade do processo de transferência de competências.
Essa divergência poderá ser resolvida na especialidade. O Governo afirma ao Grupo Parlamentar do PP a sua disponibilidade nesse sentido.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - É uma «união de facto»!
O Orador: - O projecto do PP introduz ainda alterações no modo de designação e funcionamento das juntas de freguesia, bem como no relacionamento entre as câmaras e as assembleias municipais que, manifestamente, extravasam a matéria da descentralização e delimitação de competências entre as administrações central e local. Aí estamos em desacordo.
Quanto aos outros projectos, retira-se que o PCP não propõe qualquer nova transferencia de competências e ás novas competências que o PSD prevê transferir para os municípios não têm significado prático relevante, quanto muito acrescera marginalmente às receitas.
O PSD é, nesta matéria, o partido da hipocrisia, sem memória e sem história. Fiel a si próprio, é o partido do oportunismo político puro.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Quando foi Governo, o PSD violou sistematicamente a Lei das Finanças Locais e não concretizou a transferência para os municípios dás competências previstas no Decreto-Lei n.º 77/84.
Vozes do PS: - Bem lembrado!
O Orador: - Agora que é oposição - e por muitos anos, segundo parece! -, é o partido da generosidade financeira sem precedentes, propondo a transferência, logo em 1998, de 150 milhões, sem novas competências.
O irrealismo despesista do PSD é tal que ameaça dividir o próprio partido, como declarações recentes demonstram.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só se for, o PS!
O Orador: - Não é necessário, não havia necessidade, porque o partido já está mais do que partido, já está mais do que dividido.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Está a falar do Partido Socialista, não é?
O Orador: - Os trabalhos preparatórios da proposta do Governo da Lei das Finanças Locais tiveram a participação da Associação Nacional de Municípios Portugueses. A proposta prevê um aumento, entre 1997 e 2001, de cerca de 50% nas transferências para os municípios, isto é, cerca de 120 milhões de contos, em quatro anos, e um aumento de 47% nas transferências para as freguesias, em igual período.
São aumentos muito significativos, da ordem dos 10% ao ano, sendo certo que serão o dobro do crescimento nominal do produto nacional - o que não são é crescimentos loucos, como querem as oposições por razões de pura irresponsabilidade eleitoralista!
A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!
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O Orador: - O Governo reafirma que nunca aceitará o aumento de impostos em cerca de 150 milhões de contos, o que resultaria da aplicação do projecto de lei do PSD. Tal seria totalmente impensável pela irresponsabilidade que representa: esse projecto de lei só poderia ter vencimento num momento de total confusão e de total irresponsabilidade despesista.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O Governo entende que é necessário reformular as finanças locais e, para isso, tem princípios claros.
Um deles é o princípio da estabilidade e transparência na evolução do FEF. O FEF será iguala 24% do IRS cobrado dois anos antes, isto é, os municípios passam 4 saber antes da elaboração do Orçamento do Estado qual o valor global do FEF, em vez de depender da previsão, por vezes aleatória e manipulada, como aconteceu com o PSD, de variações do IVA - lembre-se, cada um de nós, do que foram essas manipulações, chegando ao ponto de se traduzirem, nalguns casos, em pura subtracção descarada das verbas devidas às autarquias!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - O FEF deve ser redistributivo e simplificado. O actual FEF, pela multiplicação de critérios - presentemente oito, alguns deles pouco objectivos e de reduzida fiabilidade -, é um falso instrumento de compensação de assimetrias entre municípios.
Na proposta do Governo, o FEF passa a ter como primeira finalidade assegurar a todos os municípios receitas correspondentes às receitas fiscais per capita. Neste ponto, o FEF compensatório que o Governo propõe é idêntico, na finalidade e na forma, ao FEF proposto pelo PCP.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - O autor é o mesmo!
O Orador: - O resto do FEF deve ser distribuído segundo um número reais restrito de critérios simples
e objectivos, com a intenção expressa de apoiamos municípios mais necessitados.
O Governo prevê ainda a participação directa dos municípios no IRS, o que constitui a realização de um princípio constitucional que não pode mais ser adiado e, além disso, será uma importante fonte de receita para os municípios urbanos das zonas com maior capacidade económica, nos quais o FEF tem pouca importância relativa.
Esta matéria interessa não só aos municípios urbanos, onde as contribuições de IRS são mais significativas, como também aos municípios do interior, àqueles que mais dependem do FEF, porque deste modo os municípios urbanos libertam verbas, não recorrem ao FEF, ficando essas verbas disponíveis em maior quantidade para socorrer os municípios que delas necessitam.
Procede-se à clarificação do regime de crédito dos municípios. O acesso dos municípios ao crédito passa a depender das receitas totais da autarquia e não só do FEF. Além disso, têm tratamento especial, não contando com os limites de endividamento, os empréstimos para apoio à habitação social e para projectos com financiamento comunitário.
Prevê-se o reforço da autonomia das freguesias, de tal modo que o FEF das freguesias será autónomo do dos municípios.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - De acordo com a nossa proposta, as freguesias passarão de 18 milhões de contos, em 1997, para 22 milhões de contos, em 1998.
Pela primeira vez, prevê-se a possibilidade de recurso ao crédito pelas freguesias. A esta estratégia global e coerente de descentralizarão administrativa contrapõem os projectos da oposição transferências irrealistas
e irresponsáveis, por pura razão eleitoral, para os municípios, cm 1998, que oscilariam entre os 53.2%, no projecto do PCP (127,1 milhões de contos) e os 66.5%, no projecto do PSD (158.8 milhões de contos), em ambos os casos sem novas competências.
Ora, isto significa que o PSD na oposição é 50% mais generoso do que o melhor PSD de sempre no Governo!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Que generosidade, Srs. Deputados, para quem, durante anos a fio, só se ficou pela contribuição devida aos municípios através do não cumprimento da Lei das Finanças Locais!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Em 1995, no último ano do Governo do PSD, por essa via, foram subtraídos 60 milhões de contos às autarquias. E, num arrependimento súbito e cruel, o PSD, agora na oposição, oferece 150 milhões de contos sem qualquer contrapartida, pagos, afinal. pelos contribuintes! É que o PSD subscreve o objectivo de não aumentar o défice, portanto só lhe resta preconizar o aumento dos impostos. Não o disse explicitamente, mas afirmou-o quando votou, nesta Assembleia, um projecto que preconiza a observação dos critérios de convergência, com um défice, portanto, abaixo dos 3%. Ao fazê-lo, assinou aqui a confissão clara de que o PSD quer resolver o problema pela via dos impostos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é conversa fiada!
O Orador: - Mas o PSD tem medo de ouvir falar do assunto. A verdade é que assinou e isso é mais importante do que falar: está escrito!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Nestas condições, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o PSD quer um aumento da despesa pública absolutamente incomportável face à política macro-económica que deve ser seguida.
Em matéria europeia e económica o que é o PSD neste momento? Ninguém sabe, porque deve haver quase tantos PSD quantos os seus líderes distritais!
Protestos do PSD.
Neste momento, os dirigentes do PSD dedicam a maior parte do seu tempo a oporem-se entre si, a digladiarem-se, «sem paciência» para ponderarem sequer os riscos das
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suas falsas saídas demagógicas. Mas, nesta Assembleia, não serão os Deputados do PSD que quererão ver votado o seu próprio projecto de lei.
Hoje, os Deputados do PSD já perceberam que o País sabe, com toda a clareza, que o aumento da despesa pública em 150 milhões de contos, em 1998, implicaria tremendos custos para todos os portugueses, sem excepção. S6 haveria três saídas possíveis: ou o aumento em cerca de 14% do IRS; ou o aumento em cerca de
1% do défice público; ou corte de 150 milhões de contos no PIDDAC, isto é, aproximadamente um terço, quando é certo que os Deputados do PSD, para sua clientela de eleitores ver, são aqueles que mais se afadigam em propor alterações ao PIDDAC, sempre no sentido da despesa crescente.
O Sr. José Magalhães (PS): - Bem lembrado!
O Orador: - Hoje pedem um corte de 150 milhões de contos porque, dizem, não querem o aumento do défice, mas assinaram-no aqui. Não confessam que querem aumento de impostos - não se atrevem -, mas querem um corte no PIDDAC de 150 milhões de contos.
No essencial, voltando-me para o PCP, devo dizer que o Governo reconhece, com grande regozijo, que o seu projecto de Finanças locais tem afinidades estruturais com as propostas do Governo, afastando-se delas em matéria de aprofundamento do quadro de atribuições e competências, visto que sobre isso nada diz, além de que, no início, precisamente para corrigir a deficiência do Governo do PSD, propõe um aumento de cerca de 100 milhões de contos no FEF inicial de 1998.
Pela nossa parte, não temos possibilidade de acomodar este aspecto da proposta do PCP. Se o fizéssemos. teríamos de fazê-lo também para outras situações, que são da responsabilidade do Governo anterior, como as da segurança social. E, nesse caso, não estaríamos a falar de 100 milhões de contos, estaríamos a talar, core certeza, de muitas centenas de milhões de contos,...
Vozes do PS: - Claro!
O Orador: - ... porque não pode haver justiça para aquilo que o PCP quer com injustiça para todos aqueles que dependem da segurança social.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - Seriam necessárias centenas de milhões de contos só para estes dois itens, para reparar o desnorte e a falta de cumprimento da lei, por parte do PSD.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Muito bem!
O Orador: - Aceitamos o princípio, mas temos de ter realismo perante a possibilidade de corrigir 10 anos de Governo do PSD, mediante um golpe numérico orçamental.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se as propostas do Governo forem aceites, como esperamos, com os contributos de todas as bancadas, para os quais estamos abertos, se as propostas do Governo servirem de base à nova legislação, estamos certos de que se dará o maior reforço de competências e recursos dos municípios dos 20 anos de poder democrático que acabam de comemorar.
Por isso, temos uma proposta de lei-quadro de transferências de atribuições e competências para as autarquias locais que levará a um acréscimo de 300 milhões de contos nas transferências do Orçamento para as autarquias e temos uma proposta de lei de finanças locais que levará, ainda no ano de 2001, a 358 milhões de contos. Tudo somado, 300 milhões mais 358 milhões, isto é, 658 milhões de contos, cumpre-se, muito folgadamente, a proposta eleitoral do PS.
O destino está nas vossas mãos, mas, se houver dificuldades, por força de uma maioria numérica, puramente numérica, sem substracto político, ficará claro que o Partido Socialista e o seu Governo tudo fizeram para cumprir a sua proposta, o seu programa eleitoral, e que uma pura coligação negativa de quem não terra uma alternativa de Governo a oferecer ao País, de quem não tem nenhum projecto aceitável para o País, se opôs a esse cumprimento.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Isso que o senhor está a fazer é muito grave, isso é chantagem!
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - É falar claro!
O Orador: - As eleitorais consequências seguir-se-ão e lamento que nesta Casa se ponha a possibilidade de evidenciar as consequências políticas de um acto, que compete ao eleitor julgar, como uma chantagem. É triste que se chame ao eleitor, ao simples eleitor que cada um de nós é - e lá fora há milhões -, um agente de execução de uma chantagem, pelo simples exercício do direito de voto.
O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não é nada exacto!
O Orador: - Democracia estranha, Sr. Deputado!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Nestas condições, Sr. Presidente, pensamos que o Parlamento, soberano em matéria fiscal e orçamental, na especialidade, terá ocasião de aperfeiçoar as nossas propostas. Estamos abertos a esses aperfeiçoamentos, queremos estudar, com detalhe e com pormenor, todas as sugestões de todas as bancadas, queremos que esse processo seja acompanhado pela Associação Nacional de Municípios, queremos que esse processo seja feito com seriedade, com rigor, com o tempo necessário, mas de modo a que não se inviabilize a sua entrada em vigor no mais breve lapso de tempo.
O Governo está à disposição de todos os grupos parlamentares e não será por falta de cooperação, de espírito de diálogo, de abertura, de vontade de consenso que estas propostas não terão vencimento. Será por bloqueio sistemático e apriorístico, se o houver, mas não creio que seja esse o caso.
Estamos nas vossas mãos, como, de facto, nos compete, e confiadamente o fazemos.
Aplausos do PS.
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Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se diversos Srs. Deputados para pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro. Dar-lhes-ei a palavra pela ordem de inscrição, mas ordenarei a lista em função da regra regimental segundo a qual deve ser alternada a participação dos diversos partidos políticos.
O Sr. Ministro irá responder por grupos de quatro pedidos, dispondo de cinco minutos para cada grupo, e cada um dos Srs. Deputados disporá de três minutos para fazer as suas perguntas.
Em primeiro lugar, para formular o seu pedido de esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, ouvi a sua intervenção com atenção, como me compete, e fiquei com a impressão de que o Sr. Ministro não pertence a este Governo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - É que o Sr. Ministro falou de uma forma escandalizada sobre o aumento de despesa que, hipoteticamente, o projecto do PSD poderia conter, quanto às finanças locais, como se este Governo fosse contrário ao aumento da despesa, como se não fosse este Governo aquele que mais despesa pública tem aumentado nos últimos anos.
Depois, o Sr. Ministro falou também de uma forma algo preocupada com a potencial hipótese de o projecto do PSD aumentar impostos, como se não fosse este Governo que estivesse a aumentar os impostos. Parece que os senhores são contra o aumento de impostos!...
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PS.
A Oradora: - Por último, Sr. Ministro, o ponto mais importante: o Sr. Ministro sugeriu que o nosso projecto poderia conter a necessidade de corte no PIDDAC. Ó Sr. Ministro, o senhor é o responsável pela aplicação dos fundos estruturais e o País está perante o escândalo de uma execução tão baixa que o senhor não só põe em causa a execução do investimento nestes anos como, pior do que isso, põe em causa o futuro do desenvolvimento do País, porque está sem condições para negociar o próximo quadro comunitário de apoio.
Aplausos do PSD.
Sr. Ministro, o senhor está muito preocupado com o PIDDAC, mas está a desperdiçar aquilo que um país com o nosso nível de recursos nunca poderia desperdiçar!
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Portanto, Sr. Ministro, não compreendo as suas preocupações. Provavelmente, o Sr. Ministro pertence a um outro Governo.
O Sr. Ministro tentou insistir na ideia de que o projecto do PSD implica aumento de impostos e de despesa pública.
O Sr. José Magalhães (PS): - Não! Que ideia!...
A Oradora: - Mas o Sr. Ministro sabe que não é verdade, porque se soubesse que era, com certeza, não se importaria de o demonstrar publicamente, em debates públicos para os quais foi solicitado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PS.
A Oradora: - No entanto, Sr. Ministro, não era preciso a sua recusa para debates públicos, para que o Sr. Ministro fosse desmentido, porque o maior desmentido às suas afirmações foi feito pelo Presidente da Associação Nacional de Municípios - que eu saiba, insuspeito socialista -, que disse publicamente que do projecto do PSD não se pode inferir um aumento de impostos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Talvez fosse bom que o Sr. Ministro dissesse ao Dr. Mário de Almeida como é que o Sr. Ministro infere coisas que ele não infere quando ele, de alguma forma, é conhecedor dessas matérias.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Protestos do PS.
A Oradora: - Não quero alargar-me muito na questão política, porque, do ponto de vista político, a questão já foi demasiado elevada, aliás, até já se arranjaram eleições antecipadas por causa desta matéria, pelo que vou abandonar o aspecto político e vou colocar-lhe uma questão muito concreta, muito simples e muito pragmática.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ª Deputada, peço-lhe o favor de concretizar a sua pergunta, porque esgotou o seu tempo.
A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, tive dúvidas acerca do benefício efectivo da proposta de lei do Governo e tive dúvidas sobre se era melhor esta proposta de lei ou a lei que está neste momento em vigor. Nessa medida, mandei fazer contas e, mantendo-se as mesmas transferências de competências, não se mexendo nas competências nem noutro tipo de receitas que as autarquias vão ter, isto é, tendo apenas em conta o FEF, cheguei às seguintes conclusões: em 1995, foram transferidos para as autarquias 219,6 milhões de contos, mas se a lei que o Governo neste momento propõe fosse aplicada seriam transferidos 210,7 milhões de contos, ou seja, menos 9 milhões de contos; em 1996, foram transferidos 241,5 milhões de contos, mas, de acordo com a lei proposta, teriam sido transferidos 219,8 milhões de contos; em 1997, foram transferidos 253,4 milhões de contos, mas com a actual proposta de lei teriam sido transferidos 234,8 milhões de contos; para 1998, pressupondo, como é evidente, algumas taxas de crescimento, diria que serão transferidos 269,4 milhões de contos, mas com a lei proposta serão transferidos apenas 257,0 milhões de contos, isto é, menos 12 milhões de contos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
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A Oradora: - A questão muito concreta que lhe coloco. Sr. Ministro, é a seguinte: ou o Sr. Ministro me diz que as rainhas contas estão erradas e o valor não é este,...
O Sr. Acácio Barreiros (PS): - É habitual!
A Oradora: - ... mas tem de me dizer qual é o seu valor e como chega a esses cálculos, ou direi que estamos perante a maior vergonha na discussão desta lei, o maior imbróglio da manifestação desta lei que é o de que, atinai, a proposta de lei do Governo pretende diminuir as transferências para as autarquias
e não aumentá-las.
Para finalizar, Sr. Presidente, quero pedir-lhe que me permita que distribua pelas restantes bancadas os cálculos a que procedi.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, passo em claro o namoro ao PP a que aqui assistimos, em termos que não considero particularmente telizes,...
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Também foi feito ao PCP, e não foi só hoje!
O Orador: - ... e as contradições do PSD.
Mas quero dizer que convém que, quando o Sr. Ministro intervém, leia com mais atenção os projectos que critica, porque, por exemplo, o artigo 3.º do projecto de lei do PCP contém uma norma sobre novas atribuições e competências, onde estão claramente definidos critérios que procuram acautelar ura aspecto que muito preocupa os municípios deste país, que é o de verem a sua capacidade financeira muito mais empobrecida do que agora, devido à imposição de encargos.
Mas o problema fundamental que aqui se suscita é o seguinte: quando o PS, ao longo dos governos do PSD, criticou o incumprimento da Lei das Finanças Locais, a Lei n.º 1/87, criticava o incumprimento com o actual nível de encargos e nunca disse «nós queremos mais dinheiro, mas com novos encargos». Portanto, temos de discutir o problema do regime das finanças locais com o nível de encargos que está actualmente estabelecido e, depois, temos de discutir a questão das atribuições e competências e de quanto custa cada uma delas, como uma questão metodologicamente separada.
Por isso mesmo, entendo que o facto de o Governo forçar aqui, fora de tempo, uma discussão conjunta destes diplomas, não facilita o debate, a não ser o da proposta do Governo que creio ter, claramente, o objectivo de poupar dinheiro à custa do poder local, legitimando o incumprimento da Lei das Finanças Locais no passado e procurando uma maior penúria financeira dos municípios, levando o descontentamento da porta dos ministérios para a porta das câmaras municipais
e impondo encargos em matérias onde o Governo não tem investido ou não tem investido o suficiente.
Nesta matéria, dou alguns exemplos que são significativos daquilo que pretendo dizer.
Relativamente as polícias municipais, o Governo criticou e critica, reconhece que há polícias a menos e propõe-se criar polícias municipais, uma vez que tapam 3000 polícias, por exemplo, na Área Metropolitana de Lisboa. Pergunto: quanto é que isto custa? Vai ou não transferir muito mais dinheiro do que o próprio Governo tem gasto até agora, por exemplo, para transferir as polícias municipais?
Quanto aos fogos florestais, o Secretário-Geral do PS, quando estava na oposição, criticou repetidas vezes, perante o País, e justamente, o facto de não haver um investimento suficiente em matéria de fogos florestais, a qual está agora, aqui, como atribuição municipal. Pergunto: propõe-se o Governo, acaso, transferir para os municípios os milhões e milhões de contos que deveria gastar a mais no combate aos fogos florestais e que não foram transferidos ou, pelo contrário, pretende apenas transferir a responsabilidade nesta matéria'?
Sr. Ministro, creio que esta proposta suscita uma questão óbvia: o que o PS propõe, acima de tudo, através desta lei de atribuições
e competências, é algo de extremamente vago. Desta lei, em concreto, nada vai decorrer praticamente, quase tudo é remetido para diplomas ulteriores, para a lei de Orçamento do Estado e para outras leis. Os verbos que são aqui utilizados com reais frequência são «apoiar», «colaborar», «participar», enfim, tudo coisas extremamente vagas, chegando-se, por exemplo, ao ponto de propor a competência municipal de «assegurar o apoio adequado ao exercício das competências da respectiva zona agrária». Acaso o Governo sabe exactamente o que escreveu aqui? Sabe o que isto representa? Sabe quanto custa?
Esta proposta de lei provocou um sentimento de profunda inquietação na generalidade dos municípios, acerca daquilo que o Governo pretende. Esta é que é a verdade e cicio que é incontornável! Os municípios estão com medo desta proposta de lei!
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para formular o seu pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira Ramos.
O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, a pergunta que lhe quero fazer prende-se com a proposta de lei n.º111/VII e sublinho a apresentação que foi feita, nomeadamente aquilo que o Sr. Ministro considerou ser a transformação dos municípios em verdadeiros governos locais e a identificação das 17 áreas novas de transferência de competências.
A referência ao papel das associações de municípios é também, para nós, importante, e o Sr. Ministro verificou a similitude nas traves-mestras ao nosso projecto de lei n.º 387/VII.
Por outro lado, Sr. Ministro, tomámos a devida nota da abertura demonstrada para a tentativa de encontrar propostas válidas e comuns. Aliás, o Sr. Ministro convirá que a nossa conversão ao municipalismo é de sempre. Portanto, a similitude entre a postura do Partido Popular
e a do Governo termina exactamente nessa avaliação objectiva, porque não entendemos estas transferências nem este reforço de verbas como o descartar de responsabilidades por parte do poder central, não entendemos, não poderemos entender, nunca, como um «presente envenenado» - e subscrevemos aqui, nesta parte
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concreta, a intervenção do Deputado Luís Sá. Entendemos mesmo que estas duas situações, a transferência de competências e o reforço de verbas, têm de ser sempre vistas cm comum; é, antes, o consolidar do edifício autárquico existente.
Portanto, não seria de estranhar, como o Sr. Ministro o fez, a nossa referência ao papel das assembleias municipais e das juntas de freguesia, porque, para nós, o edifício autárquico, tal como existe hoje, é suficiente, é aquele que é adequado ao nosso país e que interessa sedimentar e enformar com novas competências. Com essas novas competências e com os meios para exercer essas competências, esses edifício está pronto.
Assim, Sr. Ministro, aproximando-me da questão, pergunto-lhe o seguinte: com verdadeiros «governos locais», como o Sr. Ministro qualificou as autarquias, com estes novos poderes e competências, com o desenvolvimento das associações intermunicipais, que passam a ter, na verdade, um novo campo de actuação, para quê e que espaço terão as regiões administrativas? É porque, em nossa opinião, tal como ficou vincado na interpelação sobre interioridade, que recentemente fizemos, o poder central tem de ter competências próprias, tem de exercer determinadas competências e tem de ser responsabilizado por essa eficácia e eficiência, ou seja, depois de conseguirmos esta vitória no sentido do reforço do poder local com mais transferência de competências e mais meios, a criação de regiões administrativas, do nosso ponto de vista, não passará do descartar , de responsabilidades por parte do Governo, do alijar de funções e do criar bodes expiatórios para a ineficácia e ineficiência do poder central.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia.
A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, congratulo-me que o Governo tenha vindo, finalmente, num tom um pouco mais sereno, apresentar uma proposta sobre a questão das finanças locais e da transferência de competências para os municípios.
Sabemos que este não era o seu calendário, e mesmo para quem não soubesse bastava ler o preâmbulo da proposta de lei sobre as finanças locais para ver o que aí diz e para perceber que Governo gostaria de apresentar esta proposta de lei depois da regionalização, depois de outras reformas estruturais, como sejam: a reforma fiscal, a reforma do sistema de saúde, a reforma da educação, a reforma da segurança social. Só que, então, pergunta-se: quando? Para
bom entendedor, meia palavra basta... É a maior confissão de que o Governo não tencionava coisíssima alguma trazer esta proposta neste calendário; fê-lo porque os demais partidos da oposição, a começar pelo PSD, o obrigaram a fazer.
Além disso, o Governo cria, neste preâmbulo, um conceito - a propósito, bastante peculiar - que é o de «provisoriedade». Peço-lhe, Sr. Ministro, sinceramente, que nos explique o que é que significa uma proposta de lei com carácter de «provisoriedade». E uma curiosidade que nos ficou da leitura deste preâmbulo.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Na realidade, em relação a estas reformas, é evidente que o Governo não tenciona transferir todo o rol de competências que estão elencadas na sua proposta de lei, porque se elas fossem efectivamente concretizadas, se todos os municípios as reivindicassem, isso significava não só que o Governo não cumpria os critérios de convergência mas que o Estado português ia à falência.
Por isso, é evidente que esta proposta de lei não é para cumprir, é uma «proposta de lei virtual» - e aqui aproximamo-nos, então, urra pouco mais da noção e da explicação do conceito «provisoriedade».
Mas voltando às reformas, Sr. Ministro, os portugueses não têm sentido estas reformas no seu dia-a-dia, com excepção de uma, que é a reforma fiscal. Essa, os portugueses já começaram a sentir. Os portugueses, por aquilo que nos foi anunciado pelo Sr. Ministro das Finanças, sabem que a suspensão do IVA não vai ser aplicada tão cedo, ruas, em contrapartida, as colectas mínimas e os métodos indiciários, esses sim, são para aplicar agora.
Portanto, também aqui há uma metodologia, que nós antecipámos, que é a metodologia que vai ser usada na aplicação desta lei. Recursos para os municípios, lá mais para diante! Tudo o que sejam conflitos sociais para a porta dos municípios, esses provavelmente serão para já! O que dirá o Governo quando a população lhe perguntar pela gestão dos professores? O Governo dirá que isso é com as câmaras municipais. O que será que o Governo passará a dizer - aliás, já passou - quanto à localização das incineradoras ou dos aterros de resíduos industriais? Dirá: as câmaras que tratem disso e que se entendam com os privados! É, aliás, esta a resposta que ouvimos agora do Governo.
O que dizer quanto à questão da tranquilidade e da segurança públicas? Então, aí, ouviremos o Governo dizer: as câmaras municipais que se entendam com os polícias! É que o Sr. Ministro da Administração Interna já demostrou que não é capaz de fazê-lo.
Sr. Ministro, trata-se efectivamente de uma transferencia dos problemas e das questões conflituais para os municípios, mesmo na questão da tranquilidade e da segurança é à custa da alienação e do desmembramento de um dos pilares essenciais da soberania do Estado que é a segurança.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Atendendo à extensão das intervenções feitas, a Mesa irá prolongar o tempo regimental mente fixado. Veste caso, o Sr. Ministro
do Equipamento, do Planeamento e da Administração do disporá de sete minutos para responder aos primeiros quatro pedidos de esclarecimento, conforme foi
acordado.
Tem, dois, a palavra. Sr. Ministro.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto às questões postas pela Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, começo por aquilo que me parece mais surpreendente. A proposta do Governo prevê que, em 1998, expressa e taxativamente, 25,5% do IRS seja transferido a favor dos municípios. O IRS calculado na base do «n-2» de 1996, para que não haja precisamente essas imputações. Esse IRS soma 1022 milhões de contos
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vezes 25,5%, que é igual a 260.7 milhões de contos. Salvo erro, a Sr.ª Deputada falava em 210 milhões de contos. É um erro
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Não, não, são 257!
O Orador: - São 260,7 milhões de contos, como é capaz de se comprovar. Portanto, estando o FEF de 1997 em 238 milhões de contos, a que acrescem seis milhões de contos de IVA turístico...
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, é preciso fazer silêncio para que o Sr. Ministro possa responder às perguntas que lhe foram feitas e a que
responde contorne entender.
Queira continuar, Sr. Ministro.
O Orador: - Então, encurtando tabuadas, 1022 milhões de contos de IRS de 1996 vezes 25,5% de IRS é igual a 260.7 milhões de contos, a que acrescem 22
milhões de contos para as freguesias, perfazendo um total de 282 milhões de contos.
Diz também a Sr.ª Deputada que o Sr. Presidente da Associação Nacional de Municípios afirmou que a proposta do PSD não aumenta os impostos. A proposta do PSD aumenta em 150 milhões de contos, de jacto e subitamente, de uma forma que eu diria até cruel para os municípios, as suas receitas. H5 três possibilidades, mas se inventar a quarta, fico-lhe grato. Enquanto isso, admita que há três
possibilidades: a primeira, aumentam os impostos; a segunda, aumenta o défice: e a terceira, corta a despesa pública, que está naturalmente na calha para entrar.
Quanto ao corte na despesa pública, não corta nos ordenados, pelo menos, não o confessa; não corta nas transferências - não o dirá; não pode cortar nos duros da dívida pública; cortará no PIDDAC. Se não for aí, cortará noutro campo. Estou à espera das suas propostas de Orçamento.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Quanto ao debate público, suponho que este debate é público no órgão mais nobre e mais qualificado para o fazer. A Sr.ª Deputada privatiza a
Assembleia da República, eu não a privatizo, de certeza.
Logo, este debate é público!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Quanto a convites que tenha recebido, recebi um convite, via genérica, do Sr. Deputado Luís Marques Mendes.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Meu?
O Orador: - Fez o convite, mas esqueceu-se de dizer que ele não era o sujeito que iria ser posto à prova. Fazia um convite, um sacrifício no altar, em benefício de terceiros ou em punição de terceiros. Eu aceitei o convite, estava desejoso de ver o Sr. Deputado Luís Marques Mendes à minha frente, mas o Sr. Deputado ofereceu por si uma mulher, no caso, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite
Risos.
Eu aceitaria de bom grado, mas quando ouvi dizer que o Sr. Deputado, sabendo que eu lhe aceitava o repto, estava em Torres Vedras, a uma distância «incalculável»... - e já há auto-estrada, bem sei que pagaria portagem... -, e que não podia vir de Torres Vedras a Lisboa porque não tinha a menor possibilidade de fazer um jantar em Torres Vedras, fazer uma charla às 21 horas ou às 21 horas e 30 minutos, e estar às 23 horas em Lisboa, concluí que, de facto, haveria um outro motivo e resolvi, nessa altura, retirar-me dessa peleja. Porém, estou à sua disposição, assim como da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, se houver alguma televisão que nos queira receber.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado Luís Sá, quanto a novas atribuições e competências, analisadas, ponderadas, à margem da Lei de Finanças Locais, nova lei de finanças locais que diz respeito às competências actuais, completamente de acordo. E o Governo foi tão correcto nessa metodologia que fez duas propostas diferentes.
O Sr. Deputado Luís Sá tem de reconhecer que seguimos à risca aquilo que preconiza. Vem dizer agora, em contradição consigo próprio - e perdoe-me a expressão -, que, afinal de contas, misturou no seu projecto de lei de finanças as competências. Incorreu num erro que denunciou. Poderá julgar da natureza do seu erro pelo rigor da sua própria denúncia. E o que põe no artigo 5.º ou 3.º, salvo erro, do seu projecto, num único artigo, não regula uma matéria que é complexíssima, que precisa de muitos artigos e de projectos de diplomas regulamentares. Precisa de uma lei-quadro, precisa de projectos de lei regulamentares.
Em primeiro lugar, não confundimos. Sc alguém confundiu foi o próprio PCP que tez a amálgama dos dois casos e, ainda por cima, de uma maneira tão sintética que cumpriu o calendário.
Quanto ao problema de exemplos de transferências, o Sr. Deputado disse que faltam 3000 polícias em Lisboa. Sr. Deputado, é para funções de polícia. O que vai transferir-se para as autarquias não são todas as funções de polícia, nem sequer a grande maioria das funções de polícia que são exercidas. são funções de polícia de carácter administrativo, que se encontram alistadas. E aquelas que forem de segurança pública, por razões óbvias, serão diminutas. Portanto, se faltam 3000 polícias em Lisboa, não se está numa relação de pura substituição quando se criam polícias municipais. Continuarão a faltar muitos polícias em Lisboa.
Mas, agora, vamos ao cerne de uma outra questão, que é preciso elucidar de uma vez por todas, porque, senão. era como se houvesse dois países. O Portugal de todos nós, que tem expressão no Orçamento do Estado, com a limitação de recursos que existe - e todos sabemos que são precisas murtas mais escolas, muitos mais hospitais, muitos mais polícias, muitas mais estradas, muito mais de tudo, muito mais do que quiserem, o Orçamento é que não dá para tudo, nem pode dar. Daí que as competências sejam exercidas, nacionalmente, segundo prioridades e de acordo com as limitações orçamentais que existem. Quando se transferem competências para as autarquias, então, transferem-se em condições como se vivêssemos num outro país e as autarquias só aceitariam - o que não é o caso dos autarcas, porque nenhum deles me disse isso, mas é a
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sua interpretação - Se, logo de início, lhes dessem as condições que teriam num país extremamente rico, que era outro. Isto é, era a mesma coisa que eu, incumbido de uma responsabilidade de ministro, dizer que: só serei ministro se tiver os mesmos recursos que tem o meu colega na Holanda, porque senão não me ponha a exercer funções.
Estamos todos no mesmo barco, somos do mesmo país. As mesmas limitações gerais e o mesmo sentido cívico e a mesma vontade de servir que existe no Governo tem de existir nas autarquias, e o que existir nas autarquias tem de existir no Governo. Não pode haver condições excepcionais e condições debilitadas nas autarquias, porque os portugueses, em geral, não têm recursos - todos nós sabemos - e não podem pagar mais impostos. Porque, então, quando se transferissem competências para as autarquias transferiam-se competências com recursos de luxo e no Governo ficaria, por hipótese, a debilidade ainda mais acentuada, exactamente porque se fazia esse movimento. Isso não tem qualquer sentido! Não há autarca algum que me tenha dito isso. O que os autarcas me dizem - e espero que fique claro! - é uma outra coisa: «queremos mais recursos porque hoje gastamos melhor».
Eu, aí, estou com eles. Na medidas cm que os gastem melhor, devem ter mais recursos. Não é ter mais recursos, mais recursos, mais recursos, como se não pertencessem à mesma condição de limitação que tem todo e qualquer português.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Ministro, o seu tempo esgotou-se. Lamento, mas tenho de dar a palavra ao orador seguinte.
O Orador: - Sr. Presidente, deixe-me só dar a resposta aos restantes Srs. Deputados - serei muito breve.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O senhor já excedeu claramente o seu tempo. Seja mais sintético, o senhor dispersa-se um pouco - desculpe o reparo.
O Orador: - Muito obrigado pelo seu cuidado, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, o problema da regionalização não está hoje aqui em causa na sua essência.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Está, está!
O Orador: - Permita-me que não vá contraditá-lo estou em desacordo profundo consigo, mas não posso contraditar hoje, aqui, por razões óbvias.
Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia, faça-nos o castigo de aprovar a nossa proposta, que não está no nosso calendário.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não o merecem!
O Orador: - Rogo-lhe que nos castigue dando o seu voto a uma proposta que nós, no fundo, não quereríamos apresentar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, tem a palavra para defender a honra e a consideração da sua bancada. Peço-lhe o favor de se conter rigorosamente dentro do tempo regimental.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, pedi a defesa da honra da bancada porque a resposta do Sr. Ministro, Eng. João Cravinho, não correspondeu, na sua profundidade, à seriedade que eu pus na questão que coloquei. Sr. Ministro, largamos as considerações políticas - eu coloquei-lhe uma questão perante uma máquina de calcular; portanto, Sr. Ministro, ou a sua máquina de calcular é diferente da minha, ou o Sr. Ministro diz onde é que eu errei para nós percebermos que a afirmação que fiz está incorrecta. O Sr. Ministro teve dois cuidados especiais: em primeiro lugar, responder com 1998, quando, como bem sabe, eu só poderia ter feito cálculos para 1998 - e o Sr. Ministro também com base em previsões de crescimento, pelo que nunca poderíamos acertar. Portanto. Sr. Ministro, vamos a 1996 e 1997, que são factos concretos: não há previsões, não há estimativas, são factos reais. Em segundo lugar, Sr. Ministro (porque o Sr. Ministro tem consciência de que isto assim e), nos meus cálculos para o FEF, é evidente que não meti o IVA turístico - portanto, o Sr. Ministro não pode pôr o IVA turístico para a sua lei e não o pôr na actual lei; não pus IVA turístico, não pus pescados, não pus nada disso, só o FEF.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Comparar o que é comparável!
A Oradora: - Sr. Ministro, só podemos comparar aquilo que é comparável. Julgo que as nossas máquinas de calcular são as mesmas, dão os mesmos valores - os valores são diferentes e menores com a actual lei, com a lei que está em vigor. Portanto, Sr. Ministro, pedia-lhe que. mesmo que não tenha aí os cálculos, mos possa fornecer depois, dizendo-me onde é que eu estava errada.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Ministro, tem a palavra para dar explicações à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
O Sr. Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, só poderemos divergir num ponto, um único, eventualmente, que é o do montante do IRS de 1996, porque é com base nesse montante que se calcula o FEF de 1998, segundo a nossa proposta.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Faça de 1996 e de 1997!
O Orador: - De 1996; é: «n-2», ou seja, 1998 menos dois é 1996. A indicação que colhi, é de que o IRS de 1996 foi de 1022 milhões de contos; de tudo o resto, nada mais posso dizer.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Também para defesa da honra da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho. Peço-lhe também o favor de se conter dentro dos limites regimentais.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente, Sr. Presidente, tal como o fez o PSD.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, lamento dizer que o Sr. Ministro, nos últimos tempos, se tem especializado nalgum discurso com contornos - peço desculpa da expressão - demagógicos, e digo contornos demagógicos porque o Sr. Ministro sabe, tão bem como nós, que ninguém nesta bancada defendeu a entrega de competências e «meios de luxo» (para usar a expressão do Sr. Ministro) às autarquias locais. A única coisa que defendemos foi que, à transferência de novas competências sejam igualmente transferidos os meios adequados - é isso! Ponto final. Nada mais. E que essa transferência de competências se traduza na lei que nos é apresentada em formulações concretas para que todos percebam, a começar pelas autarquias, o que é que se lhes dá em termos de responsabilidades, e o que é que se dá, no concreto, em termos de meios financeiros.
Vou dar dois ou três exemplos concretos. Sr. Ministro, aos quais não respondeu manifestamente por falta de tempo! O meu camarada Luís Sá referiu uma das muitas transferências genéricas que aqui vêm: esta diz respeito ao apoio ao desenvolvimento regional e local, é até uma matéria que me toca particularmente no sector em que intervenho mais aqui, na Assembleia, e tem a ver com «assegurar o apoio adequado ao exercício das competências da respectiva zona agrária». Em que é que isto se traduz, Sr. Ministro? Ainda hoje, de manhã, por acaso, estivemos num reunião com o Sr. Ministro da Agricultura em que esta questão for largamente debatida e ele nunca disse que esta questão, esta nova implementação da orgânica do Ministério se iria traduzir numa transferência para as autarquias, mas falou em mil funcionários que estas zonas agrárias vão ter; são os mil funcionários que vão ser transferidos para as autarquias? São os edifícios para as zonas agrárias? É o suporte informático? O que é isto? Em que é que se traduz? Em meios?
Por outro lado, fala-se em transferência de custos do ensino básico: Sr. Ministro, é o pessoal do ensino básico? São os milhões de contos que se consomem aí? É isto que se vai transferir? Com que meios, Sr. Ministro? E a habitação social: com que meios? Depois, os senhores propõem-se transferir para as autarquias aquilo que são as zonas porventura mais degradadas, com mais complicações - mas a questão até nem é essa no essencial; a questão
é saber quais são, de facto, as competências e, para essas competências, quais são os meios concretos. E isto que falta nesta definição genérica e vaga de transferência de novas responsabilidades e de um grande desconhecimento de que meios é que correspondem a estas novas responsabilidades.
Esta é a questão concreta - não são meios de luxo, Sr. Ministro! Ninguém falou nisso. Falámos numa discussão séria sobre o que é que se quer que as autarquias façam; e, mais, sobre o que é que se quer que as autarquias façam no quadro do ordenamento administrativo do País, porque depois é preciso compatibilizar isto com a criação das regiões e com a definição das competências e meios das regiões, que não está feita. Por isso, outra questão que a destempo está a ser discutida.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Lino de Carvalho, julgo que a sua intervenção tem todo
o cabimento, mas dificilmente posso enquadrá-la numa defesa da honra, aliás, o mesmo vale para a intervenção da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite. Nestas condições, entendo que será razoável descontar o tempo que utilizaram no tempo que correspondia aos respectivos partidos. Isto para mantermos um principio de equidade no tratamento deste debate. De outra forma, o debate prolongar-se-á indefinidamente dado que as defesas da honra irão ser utilizadas como um elemento para novas intervenções, sem desconto de tempo. Não me parece curial.
Sr. Deputado pede a palavra para que efeito?
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra. Sr. Deputado.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, naturalmente que, enquanto Presidente em exercício na sessão, tem todo o direito para interpretar aquilo que são os pedidos de defesa da honra e para tomar a decisão que aponta, cie descontar no nosso tempo e, seguramente, também no tempo do PSD as respectivas defesas da honra. Mas, Sr. Presidente, foi de facto uma defesa da honra porque o Sr. Ministro acusou-nos de querermos demagogicamente transferir para as autarquias competências e meios de luxo relacionadas com um país que não existe, como se nós estivéssemos a querer aqui explorar recursos que não existem no País. Não é verdade! Aquilo que eu disse ao Sr. Ministro foi que, não sendo isso verdade, o que é verdade são as questões concretas que colocámos e que não obtiveram resposta. Foi neste quadro e neste contexto que interviemos, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, talvez devesse então tê-lo feito de uma forma mais enfática porque a defesa da honra exige que os oradores se indignem um pouco. Senão, não se nota...
Sr. Ministro, tem a palavra para dar explicações.
O Sr. Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território: - Sr. Presidente, para pôr um bálsamo na honra do Sr. Deputado Lino de Carvalho, só dando-lhe um pequeno esclarecimento.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Marques Mendes, pediu a palavra para interpelar a Mesa? Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, como o Sr. Ministro referiu à instante, não vale a pena nem protestos nem defesas da honra - também não ma atingiu, evidentemente.
Sobre a questão do debate público na televisão, quero dizer o seguinte: mais do as contas que a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite referiu ou, pelo menos, tanto, o convite que eu fiz ao Governo - ao Governo! - para um debate público na televisão foi por escrito, numa carta. E gostaria de deixar claro aqui (porque, às vezes, há algumas desonestidades intelectuais que vale a pena referir) que, no dia 26 de Maio, eu, na minha qualidade de Presidente do Grupo Parlamentar do PSD, escrevi ao Governo, na pessoa do Ministro António Vitorino, Ministro da Presidência, uma carta que concluo da seguinte maneira (já agora, vale a pena ler para que não haja dúvidas): «em função de tudo isto» - que eram as consideração políticas sobre a pertinência da matéria - «venho, através de V. Ex.ª, na sua qualidade de Ministro dos Assuntos
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Parlamentares, convidar o Governo para um debate público com o PSD, num canal de televisão à escolha, sobre esta matéria», etc., etc., etc. Quero dizer o seguinte: o Governo, naturalmente, como é legítimo, designa quem quer para o representar num debate; o PSD designa quem quer para o representar num debate. Nem eu tenho a veleidade de mandar no Governo - o que não quero, de resto - nem o Governo, alguma vez, comigo aqui, terá a veleidade de mandar no grupo parlamentar do PSD.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo e último lugar, não acredito que o jornalista da SIC que me contactou, que é um jornalista seriíssimo, alguma fez tivesse dito ao Sr. Ministro a mentira que o Sr. Ministro aqui disse agora. De facto, eu estava em Torres Vedras (a visitar uma obra, de que o Sr. Ministro devia ter vergonha, um IC que não ia ter portagem e vai ter portagem..., não interessa agora ao caso) quando fui contactado; e disse ao jornalista da SIC - que é um jornalista, repito, seriíssimo e acima de toda a suspeita - que o PSD estaria imediatamente disponível, que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite, que estava comigo, me acompanhava e a própria Dr.ª Manuela Ferreira Leite regressou imediatamente à Assembleia da República, no instante seguinte. Só duas horas depois o Sr. Ministro recusou o convite! Não acredito que o jornalista da SIC tivesse dito ao Sr. Ministro aquilo que o Sr. Ministro aqui disse, porque o conheço e é acima de toda a suspeita.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.
O Orador: - Sr. Presidente, aproveito ainda para dizer o seguinte: o Sr. Ministro tem, apesar de tudo, uma forma de se redimir que é, a partir deste momento, aceitar esse confronto, esse debate. Julgo que todos ganharíamos alguma coisa.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Então, e este? E este, aqui?
O Orador: - O Sr. Ministro poderia aí tentar provar como é que o seu projecto aumenta as receitas autárquicas quando a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite aqui provou, rigorosamente, o contrário.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Luís Marques Mendes, a Mesa regista as suas declarações. Nada tem a comentar sobre elas. No entanto, devido ao teor delas, estará na disposição de dar a palavra ao Sr. Ministro se ele pretender, em interpelação à Mesa, comentar as afirmações que foram feitas.
Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Mas então, este debate é entre o PSD e o Governo?
O Sr. Ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território: - Sr. Presidente, espero que o Sr. Deputado Luís Marques Mendes não substitua o Parlamento pela SIC ou por qualquer outra televisão. Estou aqui à inteira disposição, a todo e qualquer momento estarei à disposição para ir à Comissão e acho que deveria ir a mais do que uma comissão - já agora, se me permitem a sugestão, devia vir à do Poder Local e à Comissão de Economia, o que é absolutamente fundamental por razões óbvias. Se a prova que faz é aquela que aqui produziu, a dos tais 1022 milhões de contos do TRS, não vale a pena comentar. De qualquer maneira, estou à sua disposição e do seu partido, nas sedes próprias, incluindo a televisão.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, não fui demagógico - temos exactamente a mesma opinião. Espero que não venha dizer que sou demagógico por isso - não sou por termos, neste caso, a mesma opinião que é a de que as transferências para as autarquias devem ser acompanhadas dos recursos disponíveis no orçamento para o efeito. E, se forem mil funcionários ou o equivalente, serão. E se forem 200, serão. Aliás, o que nós dizemos, desde já, é que, segundo os nossos cálculos, serão 300 milhões de contos, o que significa que não é pouca coisa. E se alguém amanhã nos demonstrar que são 310, 320 ou 330 os que estão no Orçamento do Estado e que devam ser transferidos, certamente que terá o nosso acordo.
Portanto, não há de maneira alguma divergências, pois comungamos das mesmas ideias que no caso não serão demagógicas. No entanto, é fundamental perceber-se que se trata de uma lei-quadro que estabelece orientações gerais e não a resolução de cada problema disperso. Estamos num debate na generalidade, não é sequer um debate na especialidade, e o Sr. Deputado verá que no nosso projecto está dito que cada transferencia ano a ano será acompanhada dos diplomas específicos que regulem todos os pormenores e sob absoluto controlo da Assembleia da República. Nessas condições, será nessa ocasião que o Sr. Deputado terá perante si, podendo esclarecer-se como entender, todos os elementos. Por isso, não venha pedir que num debate na generalidade sobre uma lei-quadro, lhe dê os detalhes de 300 milhões de contos de transferência como requer. Sr. Deputado, isso não é sério. Sei que não é isso que decorre da sua afirmação, e espero ter ocasião de o esclarecer no detalhe que entender.
Finalmente,...
O Sr. Presidente (Mota Amaral) - Sr. Ministro, o seu tempo esgotou-se, agora não pode prolongar o seu discurso.
O Orador: - Sr. Presidente, concluo rapidamente.
Finalmente, uma questão de carácter geral que me é suscitada por estas interrogações: tudo quanto fazemos em matéria orçamental e legislativa de competência reservada da Assembleia da República é sob autorização exclusiva desta, onde, aliás, não temos maioria. Portanto, não nos venham agora assacar a vontade de subverter as competências da própria Assembleia da República ou de a iludir.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral) - Tem a palavra, para interpelar a Mesa, o Sr. Deputado Nuno Abecasis.
O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, é verdade que na próxima sexta-feira, dia 11, está acendido o processo de revisão do Código da Estrada? É porque o Sr. Presidente esta a dirigir este debate de tal forma que tudo está a passar pelas bermas e nós pensávamos que isto
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era um debate sério, tão sério que causou uma crise política.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Aliás, basta olhar as bancadas e a bancada da imprensa, para ver que o país está à espera de um debate sério sobre esta matéria. Todavia, estamos a assistir a ultrapassagens pela esquerda e pela direita, passagens pelas bermas! Sr. Presidente, permita-me que reserve para o próximo dia 11 o discurso sobre o Código da Estrada.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral) - Sr. Deputado Nuno Abecasis, é de facto para o dia 11 que está prevista a discussão do Código da Estrada.
Quanto ao teor das intervenções dos Srs. Deputados, como bem conhece, a Mesa deve garantir a liberdade de expressão de pensamento dos Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Feist, para um pedido de esclarecimento ao Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento
e da Administração do Território.
O Sr. Pedro Feist (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, esta questão que hoje debatemos, da transferência das competências e a inerente transferência dos meios financeiros através de uma alteração à Lei da Finanças Locais ou vice-versa, se quisermos, obviamente e como dizia o meu colega de bancada Nuno Abecasis, é um debate por demais sério e por demais importante que não careça da maior atenção e do maior cuidado na sua decisão.
Tenho um conjunto pequeno de notas que gostava de colocar-lhe e que têm que ver, em primeiro lugar, com um par de questões mais de fundo que passo a referir.
Em primeiro lugar, sabe-se que as autarquias, as câmaras e, mais, as próprias juntas de freguesia não dispõem, na sua generalidade, de quadros muito brilhantes do ponto de vista técnico. Ora bem, a transferência financeira, acompanhada de um transferência de competências, deve ter em conta a, qualidade dos receptadores das competências de forma a que, no andamento dos programas
e no andamento dessas competências, não se perca a eficácia da decisão de fundo ou, pelo menos, do conteúdo da própria competência.
Por outro lado, há uma questão de fundo que nós sempre defendemos: o princípio genérico de menos Estado e melhor Estado não se pode transformar numa lógica de menos Estado mais poder local, mais poder local com a contrapartida de ser o Estado que, aos poucos e de uma forma eventualmente algo hipócrita, engorda o poder local de competências e eventualmente de finanças que as acompanham, não havendo possibilidade nem capacidade para utilizá-las convenientemente e no interesse das populações.
Por último, e ainda neste quadro de reflexão global, há um aspecto que me parece não estar contemplado na questão de fundo: ao transferirem-se competências, designadamente aquelas que têm que ver com áreas de empresas públicas -
e estou-me a lembrar, por exemplo, dos transportes -, não encontro no diploma e não creio que tivesse sido discutido na sus apresentação a questão da transferência dos passivos através do Orçamento do Estado. Portanto, as empresas transferem-se com passivo?
E de que forma é que vão ser absorvidos esses passivos? E de que forma vão ser contemplados os passivos contínuos quando se trate de empresas ou de actividades que sejam em si próprias não lucrativas, mas socialmente úteis?
O Sr. Presidente (Mota Amaral) - Sr. Deputado, queira sintetizar as suas observações porque o seu tempo está esgotado.
O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar rapidamente.
A questão tem que ver sob que forma se elabora o Orçamento do Estado: se sob a forma de soma dos orçamentos dos municípios ou por outra qualquer.
Em segundo lugar, uma questão relacionada com a referência no artigo 5.º, n.º 2, do programa do Governo em que se determina que «até à instituição das regiões administrativas». Ou seja: o Sr. Ministro dizia há pouco que não se talava na regionalização, mas com a aprovação deste documento já se está a consagrar a própria existência da regiões administrativas, pelo que, do nosso ponto de vista, será um parágrafo a emendar visto não existirem projectos cm realização nesta matéria.
Termino chamando-lhe a atenção para uma das competências transferidas: a da defesa do consumidor. Ora bem, a defesa do consumidor tem que ver com uma área murro complexa e muito complicada que é a das contrafacções, que são algo que preocupa muito não só o Governo como os agentes económicos porque é hoje uma actividade paralela que é mais forte do que a própria actividade contrafaccionada. Como pensa o Sr. Ministro tratar este problema da transferência destas competências?
O Sr. Presidente (Mota Amaral) - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Mário Albuquerque.
O Sr. Mário Albuquerque (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, ao analisarmos a proposta do Governo sobre o novo quadro de transferências de atribuições e competências para as autarquias é com bastante preocupação que constatamos que, de facto, as propostas apresentadas não traduzem minimamente as expectativas e até a vontade expressa pela generalidade dos autarcas.
Tem sido afirmado, inclusivamente pelo Sr. Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, que os municípios já têm competências que cheguem. Sr. Ministro, o que precisais é de mais meios para exercerem com credibilidade e dignidade as vastas competências que já exercem. Efectivamente, n que neste momento se pretende transferir não são mais do que perigosas «batatas quentes» capazes de transportar para a porta das câmaras e para o domínio dos autarcas, sempre mais expostos do que qualquer membro do Governo, um desestabilizador rol de conflitos extremamente difícil de gerir com tudo o que odioso contêm.
Assim, Sr. Ministro, pergunto-lhe se entende que faz sentido, pelos motivos atrais expostos, transferir para os municípios de entre outras as matérias que passo a especificar: segurança
e tranquilidade públicas, com todo o rol de conflitos que lhe estão subjacentes muitos dos quais determinados por decisões governamentais; participação na gestão de pessoal docente dos ensinos pré-
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escolar e básico, com toda a complexidade que se adivinha, nomeadamente, no campo das reivindicações salariais, de estatuto, de segurança profissional, etc.; intervenção no campo da habitação que, por ser um direito constitucionalmente consagrado, deve ter um tratamento supramunicipal como facilmente se compreende; equipamentos de despoluição, como as incineradoras; passagens desniveladas, substituindo-se à actual administração da CP, que ao longo dos últimos anos, não obstante a pronta colaboração prestada pelas autarquias, ainda não conseguiu concretizar um plano nacional de supressão de passagens de nível com manifesto prejuízo das populações que, algumas delas, já se manifestaram com levantamentos e ocupação de vias férreas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral) - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, permita-me que lhe faça perguntas de carácter essencialmente político e vou explicar-lhe porquê.
V. Ex.ª foi a primeira pessoa, em Portugal, que, a propósito desta matéria, falou de eleições antecipadas. Quando a Assembleia da República, há umas semanas atrás, discutiu, votou e aprovou, três projectos de lei, do Partido Comunista Português, do Partido Social-Democrata e do Partido Popular, de transferências de verbas para as autarquias, V. Ex.ª veio dizer ao País, antes mesmo de aqui chegar, que se por qualquer motivo os projectos de lei em discussão fossem aprovados poderíamos eventualmente estar perante um cenário de eleições antecipadas. Foi V. Ex.ª que o disse! Foi o primeiro membro do Governo a usar essa expressão e eu, em função disso - não o posso esquecer -, gostaria de perguntar-lhe muito claramente o seguinte: V. Ex.ª veio aqui pedir consenso, mas como pode um Governo pedir consenso quando a bancada que suporta politicamente esse Governo não dá consenso aos outros projectos? Ou seja: como pode o Governo estar à espera que o Partido Popular eventualmente viabilize - coisa que não acontecerá - a proposta de lei de finanças locais quando foi o próprio Partido Socialista que votou contra o projecto lei de finanças locais do Partido Popular?
Sr. Ministro, o consenso significa respeito mútuo e tentativa mútua de encontrar as coisas positivas dos projectos que são trazidos a esta mesma Câmara, finas o partido que suporta o Governo a que V. Ex.ª pertence rejeitou claramente a possibilidade de o projecto lei do Partido Popular poder ser aproveitado em sede de comissão especializada! E se o projecto de lei do Partido Popular está na comissão especializada não é graças ao Partido Socialista!
Mas há mais: é que apesar de a Assembleia da República, dentro da sua legitimidade democrática, ter dito aquilo que entendeu dever dizer ao aprovar os três projectos de lei na generalidade, o Governo, posteriormente, veio fazer uma chantagem de que V. Ex.ª hoje aqui veio fazer eco. V. Ex.ª começou a pedir consenso, mas terminou a sua intervenção ameaçando politicamente os Deputados e a Assembleia da República e vem dizer a esta Câmara que se existir aqui uma «convergência numérica» ou uma «coligação negativa» numérica que não tem representatividade no País, então - leia-se, no caso de a proposta de lei do Governo não ser aprovada -, a oposição em Portugal que assuma as suas responsabilidades.
Não está aí o Primeiro-Ministro, mas está aí V. Ex.ª que hoje o representa e eu quero dizer-lhe que o Partido Popular não confunde esta matéria com revisões constitucionais, nem com votações futuras de regionalização, porque o PP não entra numa lógica de negociata, que parece ser timbre de outros partidos políticos, no sentido do «toma lá dá cá», ou seja, de viabilizarmos uma proposta de lei se, em contrapartida, o Governo nos garantir a antecipação de uma determinada lei sobre a regionalização... Não é essa a postura do PP!
E, já agora, quero dizer-lhe que o meu partido assume todas as suas responsabilidades - e não estamos a falar da lei das competências mas, sim, da lei das finanças locais - em relação a esta matéria e ao seu voto.
Na verdade, em democracia, o Governo tem a liberdade e a legitimidade para defender os seus pontos de vista, mas era só o que faltava que, também cm democracia, o Governo não aceitasse, no que respeita ao PP, que este partido tivesse a liberdade
e a responsabilidade para defender pontos de vista diferentes.
Concluo, Sr. Presidente, fazendo mais uma pergunta: Sr. Ministro, explique, de uma vez por todas a esta Câmara e ao País, como é que o Governo cai, porque ainda ninguém entendeu isso - e esta questão tem de ficar clara.
V. Ex.ª veio aqui falar de eleições antecipadas. de «coligação negativa», veio dizer que, provavelmente, se a proposta de lei não fosse para a frente existiria o caos político... Então, vamos esclarecer isto de uma vez por todas! Vamos acabar com a especulação, Sr. Ministro!
Se a proposta de lei não for aprovada, o que é que o Governo faz? Demite-se? Não apresenta proposta de lei de Orçamento do Estado para 1998? Apresenta uma moção de confiança?
Sr. Ministro, vamos esclarecer isto, de uma vez por todas, porque o País e a classe política, nomeadamente os Deputados, não podem discutir o que quer que seja com a ideia de que existe uma pressão ou uma indefinição política sobre a sua capacidade de decisão.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou. Queira terminar imediatamente.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Espero, pois, que o Sr. Ministro, de uma vez por todas, esclareça o País sobre o que é que o Governo fará se a sua proposta de lei não for aprovada como, eventualmente, poderá acontecer nesta Assembleia.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Quais são os critérios da Mesa?
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Lino de Carvalho, a Mesa advertiu o Sr. Deputado Manuel Monteiro, tal como tem feito com outros Srs. Deputados.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Ministro a minha companheira de bancada Manuela Ferreira Leite já há pouco deu conta das preocupações que nos assaltam
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quanto ao facto de resultarem da proposta de lei de finanças locais, bem como de projecções já feitas, menos meios financeiros para as autarquias do que aqueles que elas têm à disposição até ao momento.
Esperamos, sinceramente, que o Sr. Ministro - seja nesta Assembleia, aos Deputados, seja aos portugueses, através da aceitação do repto que lhe foi dirigido pelo Grupo Parlamentar do PSD -, em breve e de uma vez por todas, esclareça quer os Deputados quer os portugueses.
Mas, se em matéria de recursos financeiros para as autarquias isto é grave, o que se passa em matéria de fundos estruturais não é menos grave. Por isso, quero dirigir ao Sr. Ministro oito perguntas muito concretas em relação à execução dos fundos estruturais que estão cometidos a Portugal à responsabilidade do Governo de que o Sr. Ministro faz parte.
Primeira pergunta: como explicar que, em Dezembro passado, no âmbito da preparação do Orçamento do Estado para este ano, tenha sido dito que tinham entrado em Portugal em fundos estruturais no ano de 1996 cerca de 690 milhões de contos e que, contas feitas, contas bem feitas!, afinal se constate que apenas entraram 490 milhões de contos, isto é menos 200 milhões de contos em relação ao anunciado, significando isto que ficaram por fazer, em Portugal, investimentos de cerca de 300 milhões de contos?
Segunda pergunta: até ao final do actual Quadro Comunitário de Apoio, o Governo terá de executar cerca de 60% do total das verbas negociadas com Portugal relativamente aos fundos comunitários, isto é, no triénio 1997-1999 o Governo terá de realizar investimentos de cerca de 1000 milhões de contos/por ano. Estão o Sr. Ministro e o Governo, de que faz parte, em condições para desmentir as afirmações que dão conta de que a taxa de execução dos fundos estruturais é, actualmente, apenas de cerca de
15%, o que se traduz pelo facto de terem sido realizados apenas cerca de 150 milhões de contos de despesa pública até ao momento em relação aos 1000 milhões que era suposto serem realizados este ano?
Terceira pergunta: será possível que programas do Quadro Comunitário de Apoio, essenciais em ternos económicos mas, sobretudo, em termos sociais estejam praticamente inactivos por falta de execução?
Quarta pergunta: serão aceitáveis, Sr. Ministro os baixíssimos apoios até agora canalizados para o sector têxtil, para o comércio e para as pequenas e médias empresas?
Quinta pergunta: como aceitar que, ao contrário das declarações feitas desde há um ano a esta parte nenhuma reprogramação ou renegociação das verbas ou dos programas do Quadro Comunitário de Apoio tenha sido concretizada?
Sexta: como explicar, face à sofreguidão deste Governo na nomeação de milhares de boys para a Administração, que quem esteja em malta por nomear, desde Maio de 1996, seja exactamente o supervisor financeiro do Quadro Comunitário de Apoio?
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, queria concluir o seu pedido de esclarecimento, porque o seu tempo esgotou.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Sétima pergunta, Sr. Ministro: como compreender que tenha misteriosamente desaparecido
o observatório de peritos independentes a quem competia fazer o acompanhamento e avaliação crítica do Quadro Comunitário de Apoio?
Oitava e última pergunta: por que é que há mais de seis meses que o Governo não dá resposta aos requerimentos que lhe são dirigidos pelo Grupo Parlamentar do PSD sobre a execução do Quadro Comunitário de Apoio e dos fundos estruturais?
Sr. Ministro, já que o senhor não quis, até ao momento, responder à Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite e ao desafio que lhe foi lançado, ao menos que esclareça a Assembleia da República e os portugueses da razão que leva o Governo português a deitar fora as verbas que a Comunidade Europeia põe ao serviço do desenvolvimento do povo português.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Ministro, o Governo aparece hoje, tardiamente, com uma proposta de lei das finanças locais quando, de facto, deveria tê-la apresentado na altura em que todos os partidos se dispuseram a discutir esta matéria. Mas, já que é hoje, que o seja!
Em todo o caso, o certo é que o Governo tem surgido nos últimos dias com a alegação de que vai dar aos municípios umas centenas ele milhões de contos, embora essas verbas não sejam certas, havendo contradições no Governo sobre quantas centenas é que o Executivo vai, efectivamente dar aos municípios.
O que é certo, e isso está na proposta de lei preto no branco, é que o Governo, em muitos casos, tira com uma mão o que dá com a outra! E isto porque começa logo por alargar a retenção das verbas do FEF por dívidas ao sector público de IS para 25%. Que Governo é este que não aceita que os particulares se compensem por créditos seus perante o Estado, mas que impõe às autarquias que se deixem compensar pelas suas dívidas ao sector público? São dois pesos e duas medidas que o Governo e o Sr. Ministro aqui determinam e que revelam a ambivalência dos seus métodos.
Em segundo lugar, o Governo resolve aumentar os custos dos serviços de presta, aumentando de 3 para 4% os encargos com a cobrança dos impostos e, pior do que isso, ainda, alarga o prazo de entrega dessas verbas às autarquias locais, muitas das vezes verbas essas que não pertencem ao Estado mas, sim, à administração local, alargando agora o Estado o prazo para a sua entrega.
Mas, pior ainda do que isso é que quando o Estado se atrasa nesses pagamentos nem sequer admite a possibilidade de pagar às autarquias juros de mora por esses atrasos ou seja, também aqui o Estado tem dois pesos e duas medidas porque exige dos particulares o pagamento de juros de mora, quando estes se atrasam no pagamento dos impostos, mas não admite essa possibilidade quando o Estado se atrasa no pagamento às autarquias das verbas que a estas são devidas.
Em terceiro lugar, a proposta de lei ao prever as transferências de IRS para as autarquias, cai no erro de agravar as assimetrias ao tomar como base o imposto liquidado na área de cada município. De facto, não há dúvida de que esta é a pior forma de corrigir as assimetrias. sendo, isso sim, a melhor forma de
agravá-
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Ias, tendo, contudo, o Governo tido a possibilidade de evitar que isto aconteça.
Por último, Sr. Ministro, e mais uma vez retirando com urna mão o que dá com a outra, o Governo vem exigir que as autarquias sejam solidárias com os tratados que o Governo aprova sem que elas tenham sido ouvidas para o efeito.
Na verdade, aquilo que vem referido no artigo 39.º da proposta de lei já devia vir devidamente esclarecido, pois não se admite que o Governo deixe para depois a adopção de critérios de solidariedade que decorrem da assinatura do Tratado de Maastricht e dos critérios cie convergência que aí estão previstos, impondo às autarquias locais, que não foram ouvidas para a sua assinatura, uma solidariedade que, de todo em todo, elas não devem.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Queira concluir a sua intervenção, pois o seu tempo também terminou.
O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Por último, o Sr. Ministro, no final da sua intervenção confundiu com gravidade duas matérias: por um lado, a matéria que aqui se está a discutir e, por outro, como disse o Deputado Manuel Monteiro, questões de fundo que têm a ver com o mandato do Governo.
A alternativa que aqui se coloca, Sr. Ministro, entre a oposição e o Governo, é uma solução alternativa em matéria de leis das finanças locais e de leis para atribuições e competências das autarquias e não uma alternativa entre uma solução de governo de qualquer dos partidos da oposição e uma do PS.
De tacto, o Partido Socialista tem de perceber que governa sem maioria absoluta e, como tal, tem de conformar-se com esse facto, pelo que não pode, de forma alguma, a todo o momento, estar a ameaçar as oposições com soluções que não cabem ao caso.
Por último, permita-me...
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, mais uma vez chamo-lhe a atenção: o seu tempo esgotou-se!
O Orador: - Terminarei já, Sr. Presidente.
Por último, gostaria de perguntar ao Sr. Ministro se uma das hipóteses previstas no artigo 6.º da proposta de lei, para transferir, de forma extraordinária, verbas para as autarquias locais, terra a ver com a necessidade de o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa obter mais financiamentos para recuperar os Paços do Concelho, porque, de facto, não é admissível que, por esta via, se vá financiar um dos candidatos em ano de campanha eleitoral para prosseguir uma das suas obras.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - O Sr. Deputado Pedro Feist colocou duas ou três questões importantes e permita-me que exemplifique com uma delas: a questão da contrafacção.
De facto, trata-se de um problema de grande amplitude económica em certas actividades e, tratando-se de um delito económico ligado a problemas de propriedade industrial e intelectual, e uma matéria que está hoje no
centro das discussões da Organização Mundial do Comércio, como sabe.
O Sr. Pedro Feist (CDS-PP): - Por isso é que devia estar aqui na proposta de lei!
O Orador: - Portanto, tenhamos a noção das proporções... Seria transferível para as autarquias tudo aquilo que pode ser objecto de verificação administrativa, ou policial de ordem sumária.
Mas esta é uma matéria com tal complexidade que muitas questões não cabem nela, como, por exemplo, a questão da subsidariedade, que deve ser incluída em local próprio. E, como sabe, esta questão da contrafacção vai muito longe.
Por outro lado, quanto à questão das «batatas quentes», colocada pelo Sr. Deputado Mário Albuquerque, deixe-me que lhe diga que tenho destas coisas uma noção um pouco singular: não gosto de políticos que temem as «batatas quentes», que fogem de batatas quentes», que querem fazer política com «batatas frias»... Aliás, considero isso uma autoconfissão não de espírito de serviço público mas, sim, de espírito de serviço próprio, digamos assim...
O Sr. Mário Albuquerque (PSD): - Quem está do outro lado é que sofre!
O Orador: - Imagine o que era, quando convidam um de VV. Ex.as para Deputado, vocês dizerem: «Não! Porque vou para uma batata quente...»! Imagine o que seria quando convidam alguém para ministro, seja lá do que for, essa pessoa dizer: «Não, porque são só batatas quentes...»! Sr. Deputados, na vida política há tanta «batata quente»...! E mesmo um batata - perdoem-me a expressão! -, e eu não entro nessa conversa.
O Sr. Mário Albuquerque (PSD): - Não é essa a questão!
O Orador: - O Sr. Deputado Manuel Monteiro colocou duas questões fundamentais. Referiu o que eu disse e as consequências do que eu disse, por um lado, acompanhado por todo o debate político suscitado, com pleno apoio do Sr. Primeiro-Ministro, que foi perfeitamente concreto, autoritário,...
Risos do PSD.
... no sentido etimológico do termo, no sentido de ater autoridade para colocar...», porque ele tem uma autoridade própria para colocar esta questão, sendo o homem de diálogo que é.
Diz o Sr. Deputado que afirmei: apodemos eventualmente estar perante eleições». Afirmação mais cautelosa, mais sedativa,
mais propiciativa ao diálogo não poderia haver. Há, pois, um reconhecimento, da sua parte, do carácter suave da minha intervenção. E por que razão, hoje, nem eu nem qualquer um de nós fala aqui em eleições antecipadas? Por duas razões fundamentais: somos o partido e o Governo da estabilidade, não queremos eleições antecipadas;...
Vozes do PSD: - Ah!
O Orador: - ... somos a estabilidade, não tememos eleições antecipadas, se os senhores as provocarem.
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Finalmente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, o senhor ou outros Srs. Deputados sentem-se coagidos pelo facto de alguns dos seus companheiros nesta Assembleia, no jogo político, terem uma opinião diferente da sua? Sente-se coagido pelo facto de, eventualmente, alguém poder evocar eleições antecipadas, por hipótese? Acha que isso é uma coacção, no jogo político?
Deixe-me contar-lhe uma história, a propósito do General Humberto Delgado.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Mas responda à pergunta!
O Orador: - Conto-lhe a história rapidamente, para mostrar bem como são as coisas.
O General Humberto Delgado foi quem foi, deve saber... Depois da campanha eleitoral do General Humberto Delgado alguém foi chamado por estar a fazer afirmações que não caíram bem a quem detinha o poder na ocasião. A afirmação era: «Viva a liberdade». Dizia-se que era preciso haver liberdade. Na altura, isso foi interpretado como uma coacção, ou seja, não só como uma ofensa mas como uma ameaça aos poderes e às legitimidades constituídas. E perguntaram: «Por que e que o senhor diz isso? Justifica-se? Admite-se que o senhor possa dizer isso? Acha que não há liberdade?». E ele respondeu: «Não, não há.». Ao que disseram: «Então, prove». E ele disse: «Se houvesse, os senhores não estariam a chamar-me aqui nem sequer a pôr o problema».
Mutatis nuuandis, se houvesse conhecimento exacto do que é a democracia vivida, o jogo político normal, ninguém perguntaria aqui se eu estaria a coagir fosse quem fosse, ao dizer que poderia, eventualmente, haver lugar a eleições. Portanto, essa questão é ridícula e não se põe.
Vozes do PSD: - Está muito baralhado!
O Orador: - Agora, digo-lhe uma coisa, Sr. Deputado: não necessito de falar de eleições antecipadas, porque somos a partido da estabilidade e porque não há necessidade.
Vozes do PS: - Muito bem!
Risos do PSD.
O Orador: - O Sr. Deputado Artur Torres Pereira colocou duas questões distintas.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não há necessidade?! Posso interrompe-lo, Sr. Ministro?
O Orador: - Não é «não há necessidade». Não havia necessidade e, por maioria de razão, hoje ainda menos.
Sr. Deputado Artur Torres Pereira, em relação aos meios, e para que não haja mais confusões, dir-lhe-ei que o Governo se comprometeu publicamente, por escrito, e está a comprometer-se de novo, a prever, no Orçamento do Estado para 1998, 282 milhões de contos de transferência para as autarquias, o que é muito superior ao que foi previsto para 1997 e é de tal maneira superior ao que constava no último Orçamento do Estado apresentado pelo Governo do PSD,...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E os fundos?!
O Orador: - ... que eram 219 milhões de contos, pelo que entre 1995 e 1998 haverá um crescimento de 29% em termos nominais, o que corresponde a um crescimento, em termos reais, pelo menos - Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, conceda nisso -, ..
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Não!
O Orador: de 15 ou 16%. Por isso, não tenha receio.
Mesmo que as máquinas de calcular falhem e se se quiser falar de IVA ou de IRS que não se sabe bem quanto são, digo-lhe que são mais de 282 milhões de contos. Agora não venham dizer que as vossas máquinas descontam de tal maneira que 282 milhões de contos, para vocês, não são o mesmo que para os outros portugueses.
Quanto à questão sobre os fundos estruturais, essa é matéria da maior importância, mas permita que lhe diga - e peço o especial apoio do Sr: Presidente - que me convenci, na minha ingenuidade, de que não fazia parte da ordem de trabalhos de hoje nem tinha rigorosamente nada a ver com ela e que as seis perguntas feitas pelo Sr. Deputado Artur Torres Pereira não estavam na ordem do dia, referiam-se a fundos estruturais, sem qualquer relação com os temas em debate. Quero perguntar ao Sr. Presidente se estou enganado. Se estiver enganado, tomarei isso em consideração, como é evidente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Ministro, uma vez que faz a pergunta à Mesa, respondo-lhe.
Nesta Casa, os Deputados têm plena liberdade na formulação das suas perguntas. Se quer a minha opinião, as perguntas formuladas pelo Sr. Deputado Artur Torres Pereira, apesar de se referirem a fundos estruturais, afectam as matérias ligadas às autarquias locais, pelo que não deixam também de estar dentro da ordem dos nossos trabalhos.
O Orador: - Sr. Presidente, peço desculpa, enganei-me e julguei que estava em vigor o princípio da estabilidade da ordem do dia. Vejo que não está e há interpretações subjectivas,...
Protestos do PSD.
... pelo que vou continuar a resposta ao Sr. Deputado Artur Torres Pereira.
Sr. Deputado, as questões sobre fundos estruturais que colocou são importantes. Mas o Sr. Deputado veio colocá-las para a imprensa as reproduzir, na certeza de que eu não iria responder-lhe, porque não tenho tempo. E, diga-se o que se disser, nem era essa a ordem do dia. Nada do que o Sr. Deputado disse se relacionava directamente com a ordem do dia, com o devido respeito por todos, em especial pelo Sr. Presidente. Estou completamente à disposição da Assembleia, e do Sr. Deputado, por maioria de razão, para, em sede de comissão ou em Plenário, discutirmos esse assunto.
Para terminar, Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, fez várias afirmações, mas creio que as suas interpretações não são correctas.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Não são interpretações, são números!
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O Orador: - No entanto, podemos discutir o significado das coisas na especialidade, porque é de coisas de especialidade que se trata, ou seja, se a cobrança é maior ou menor que as despesas, se se dá com uma mão e depois se tira com a outra.
Perguntou-me, depois, especificamente, se a possibilidade da cooperação técnico-financeira se destinava a cobrir, por exemplo, as reparações recentes na Câmara Municipal de Lisboa. Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que não espero um segundo incêndio, mas essa cooperação destinar-se-á a cobrir casos como o da Câmara de Ponte de Lima, onde tive muita honra em estar há poucos dias, a convite do seu Presidente, para cumprir um contrato programa de restauração dos paços do concelho. Creio que questões como essa podem resolver-se de várias maneiras e não implicam, de modo algum - longe de mim tal ideia -, qualquer relação menos lícita entre a minha pessoa, o Governo e o Sr. Presidente da Câmara de Ponte de Lima, a quem respeito profundamente.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, creio haver aqui um dado politicamente relevante. Esta é uma Câmara política, pelo que não pode passar despercebido.
V. Ex.ª sabe, eu sei, sabe o País, que durante vários dias consecutivos não se falou de outra coisa em Portugal que não do cenário de eleições antecipadas, a propósito da lei das finanças locais. Esse assunto abriu telejornais e noticiários de rádio, foi primeiras páginas nos jornais. Não se falou de outra coisa, o País parou em determinado momento, porque, cada vez que um membro do Governo falava, falava-se apenas de eleições antecipadas.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, em representação do Governo da República, não respondeu a nada do que lhe foi perguntado nesta Câmara. No entanto, penso que da sua «não resposta», pelo menos - a não ser que outra seja a interpretação da Mesa - é ilegítimo retirar a ilação, para que amanhã, ao fazer-mos a votação, acabe de uma vez por todas este cenário de eleições antecipadas, de que o Sr. Ministro comunicou hoje à Câmara e ao País que o Governo não se demitirá se a proposta de lei do Governo sobre finanças locais não for aprovada e que, se outra for a interpretação de S. Ex.ª o Sr. Primeiro-Ministro, no mínimo quem se demitirá será o Sr. Ministro João Cravinho.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Manuel Monteiro, a Câmara regista a ilação que o Sr. Deputado pretende retirar destas intervenções e do debate que houve nesta Assembleia e não tem qualquer comentário a fazer.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Para um protesto.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, preferia dar-lhe a palavra para uma interpelação à Mesa, porque não estou bem seguro...
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Posso fazer uma interpelação à Mesa. O efeito é o mesmo.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - ... de que possa fazer agora um protesto. Mas vou já esclarecer a questão.
Pausa.
Vozes do PS: - Agora não pode! Faça o protesto no fim do debate!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Deputado tem razão. E possível dar-lhe a palavra para formular um protesto, nos termos do artigo 93.º do Regimento. Dispõe, para o efeito, de 3 minutos.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Obrigado, Sr. Presidente.
Quero apenas protestar pela intervenção do Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, por ditas razões. Em primeiro lugar, disse que eu tinha feito a intervenção que fiz para a imprensa.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Com certeza!
O Orador: - Quero dizer-lhe que não a fiz para a imprensa.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Mas parecia!
O Orador: - Fiz urna intervenção dirigida ao Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, a um Ministro do Governo da República portuguesa.
Em segundo lugar, protesto porque não tive resposta. E é a segunda vez que não tenho resposta, Sr. Ministro! A primeira vez que fiz esta pergunta ao Governo de que V. Ex.ª faz parte, há menos de 15 dias, o seu colega que estava sentado nesse lugar não me respondeu rigorosamente a nada!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É bem verdade!
O Orador: - O Sr. Ministro diz que não me responde porque não tem tempo, pois perdeu 2 ou 3 minutos a perguntar ao Sr. Presidente da Assembleia em exercício se a questão era ou não da ordem do dia. Ó Sr. Ministro, peça ao seu grupo parlamentar, que, por razões desconhecidas, ainda não saiu em sua defesa neste debate, que lhe ceda um minuto para poder responder, já não a mim, porque o não quer fazer, mas aos portugueses que nos estão a ouvir, e dizer a razão pela qual o Governo atribui tão pouca importância aos fundos estruturais em Portugal, que tem uma taxa de realização desses mesmos fundos tão baixa como a que ouvimos dizer.
Os portugueses querem saber isto, Sr. Ministro, é para isso que os Deputados também aqui estão. Os autarcas querem saber quanto dinheiro vão ter dos fundos comunitários e como podem gerir os programas operacionais.
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Sr. Ministro, peça ao grupo parlamentar que em teoria o apoia para lhe dar alguns segundos, de modo a que o senhor, de uma vez por todas, responda a essas questões.
É por tudo isto, Sr. Presidente, que não posso deixar de protestar, porque, ao contrário do que o Sr. Ministro disse, as questões que lhe coloquei são concretas, sobre temas que interessam aos portugueses em geral e aos autarcas em particular, e é a segunda vez que neste Hemiciclo faço estas perguntas e um membro do Governo utiliza subterfúgios para não me responder directamente.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território para contraprotestar, já que o contraprotesto, nos termos do n.º 4 do artigo 93.º do Regimento, tem lugar imediatamente a seguir ao protesto e não pode exceder 2 minutos.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, se me permite, para além do contraprotesto, desejaria fazer um protesto em relação às afirmações do Sr. Deputado Manuel Monteiro. Poderei fazê-lo em momento distinto, no fim da sessão. Estou inteiramente sob a disciplina de V. Ex.ª.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra para formular um contraprotesto quanto à intervenção do Sr. Deputado Artur Torres Pereira e um protesto relativamente à intervenção do Sr. Deputado Manuel Monteiro.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Torres Pereira, salvo o devido respeito, o seu protesto não tem razão de ser. Eu disse aqui, e todos terão ouvido, que estou integralmente à disposição da Assembleia para, em comissão ou em Plenário, e, por maioria de razão, à disposição de V. Ex.ª, responder a todas essas questões, que não estão previstas na ordem do dia de hoje - repito-o -, explicitamente, e não têm relação, na sua formulação, com qualquer dos temas em debate.
Desculpar-me-á por lhe responder deste modo, mas estou integralmente à sua disposição, como já lhe disse, por isso não venha exigir-me agora uma resposta em um minuto, quando lhe ofereço o tempo que a Assembleia quiser para discutir isso. Não diga que estou a fugir à questão, porque não estou e anteriormente tornei isso totalmente claro: quando a Assembleia quiser, quando a comissão especializada quiser e, eventualmente, quando V. Ex.ª quiser, se tiver o poder para determinar uma decisão nesse sentido, estou à vossa disposição.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Ministro tinha também pedido a palavra para fazer um protesto relativamente à intervenção do Sr. Deputado Manuel Monteiro. Faça favor de o formular.
O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Deputado Manuel Monteiro, vou fazer um protesto de forma rápida e breve:
protesto contra a ilação que o Sr. Deputado tira das minhas palavras. E como não quero que alguém, começando pelo Sr. Deputado Manuel Monteiro, pense que «quem cala consente», devo dizer que, em minha opinião, essa sua ilação é ilegítima e, desde já, manifesto a minha total discordância quanto a ela.
O que entendo e reafirmo aqui - isso é um outro problema, que corresponde à forma inicial em que a questão foi colocada e discutida - é que, se houver uma coligação negativa que force o Governo a aumentar os impostos em 150 milhões de contos, ou semelhante, ou a aumentar o défice, descontrolando as finanças públicas, essa coligação negativa terá de assumir a plena responsabilidade pelo enorme sarilho em que entra.
Aplausos do PS.
Nada disse sobre eleições ou aprovações de leis, nem eu, nem o Sr. Primeiro-Ministro, nem ninguém no Governo! O que temos dito é que não podemos aceitar um aumento de impostos de 150 milhões de contos ou qualquer outro, isto é, não podemos aceitar o descontrolo das Finanças públicas sob a forma de défices acrescidos. Dissemo-lo e mantemo-lo. Não havia necessidade, Sr. Deputado...
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para um contraprotesto, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, gostaria que ficasse claro, em relação a este protesto do Sr. Ministro João Cravinho, algo muito simples: o Partido Popular, quando apresentou o seu projecto de lei sobre finanças locais, fê-lo, em primeiro lugar, no pleno uso dos seus direitos e competências e, em segundo lugar, ciente das consequências políticas inerentes à sua aprovação.
O Partido Popular não é o «partido da moeda única». Sr. Ministro, o Partido Popular não tem as preocupações de política macro-económica do seu Governo e de outros partidos. O Partido Popular, quando apresentou o projecto de lei que apresentou, fê-lo na definição integral de objectivos políticos que não são os do Governo do Partido Socialista, pelo que votarmos a favor da proposta de lei do Governo seria estarmos a votar contra o projecto de lei que o PP, em devido tempo, aqui apresentou e que obteve a maioria dos votos desta mesma Câmara.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - É evidente!
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, interpelo a Mesa por três motivos e para dar informações que são fundamentais neste debate.
Em primeiro lugar, ontem, na Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente foi aprovada uma audição ao Sr. Ministro sobre os fundos estruturais. Essa proposta foi feita
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pelo PSD e aprovada na Comissão, com uma nota do PS dizendo que essa audição deveria ser feita ainda na presente sessão legislativa.
Em segundo lugar, os Deputados que aqui estão a intervir têm formulado questões ao Sr. Ministro sobre esse tema e não é possível, neste contexto e neste debate, usar da palavra sobre essa matéria senão no momento em que isso for consentido regimentalmente.
Em terceiro lugar, fica claro nesta interpelação que o Sr. Deputado Artur Torres Pereira está, por isso, a descentrar o tema do debate, porque ele não lhe convém - até o compreendo, pois foi um homem «de cabeça baixa», durante muitos e muitos anos, e nunca defendeu os autarcas -, e vem aqui fazer este disparate.
Aplausos do PS.
Protestos de alguns Deputados do PSD, batendo com as mãos nas bancadas.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado José Junqueiro, a Mesa, neste caso concreto, limita-se a tomar conhecimento das observações que formulou.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto relativamente a esta intervenção.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, a Mesa tem dúvidas sobre se é possível ou não, neste caso, fazer um protesto. Mas, em contrapartida, se o Sr. Deputado se sente agravado pelas observações formuladas pelo Sr. Deputado José Junqueiro, a Mesa poderá conceder-lhe a palavra ao abrigo do artigo 92.º do Regimento. Só que, nesse caso, anotará o seu pedido e conceder-lhe-á a palavra no final do debate.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, esta intervenção - e o Sr. Presidente ouviu-a, como todos nós - não pode deixar de merecer o meu protesto neste mesmo momento.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Então, peço a paciência da Câmara porque não quero decidir esse assunto sem consultar o Regimento.
Pausa.
Srs. Deputados, lendo melhor o que diz o Regimento, entendo que o artigo 93.º, ao referir-se à intervenção, refere-se às intervenções feitas por cada um dos participantes nos debates. Ora, relativamente à intervenção feita agora pelo Sr. Deputado José Junqueiro, cabe com certeza, da parte do Grupo Parlamentar do PSD, um protesto, ao abrigo desse artigo.
Assim, dou a palavra, por 3 minutos, ao Sr. Deputado Artur Torres Pereira para fazer um protesto.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, protesto contra esta intervenção do Sr. Deputado José Junqueiro, por dois motivos. Primeiro, por uma questão formal, relacionada com o seguinte: já, há pouco, a bancada do PSD deixou passar em claro uma deselegantíssima referência, feita pelo Sr. Ministro João Cravinho ao líder da nossa bancada parlamentar, referência essa de um mau gosto a toda a prova e indigna de um membro do Governo português.
Protestos do PS.
E, desta vez, V. Ex.ª, Sr. Deputado José Junqueiro, usou uma expressão que qualifico como indigna de um Deputado de qualquer parlamento livre em qualquer parte do mundo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Quero dizer-lhe que nunca «andei de cabeça baixa» perante ninguém e muito menos andarei perante V. Ex.ª! Fique bem ciente disto!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Se há pouco aqui intervim em matéria de fundos estruturais é porque a proposta de lei sobre o regime financeiro das autarquias locais, aqui presente pelo Governo, refere expressamente - queira V. Ex.ª fazer o favor de recorrer ao seu exemplar -, na alínea f) do artigo 10.º, a propósito de «receitas municipais», as «verbas provenientes de financiamentos comunitários». Ora, se, neste momento, assistimos a uma baixíssima taxa de execução dos fundos comunitários em Portugal, como é que o Sr. Deputado justifica que alguém não queira, não possa ou não deva suscitar esta questão?!
Sr. Deputado José Junqueiro, nós podemos ter divergências políticas ou processuais, mas o facto de as termos não justifica, em caso algum, o emprego e a utilização - e este comentário também é válido para o Sr. Ministro - de expressões de uma infelicidade manifesta e que não acrescentam rigorosamente nada em relação à razão que cada um de nós julga ou entende ter sobre os argumentos que emprega em defesa das suas causas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para um contraprotesto, tem a palavra, por 2 minutos, o Sr. Deputado José Junqueiro.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, gostaríamos de tornar clara esta matéria. Em primeiro lugar, se houve aqui uma deselegância nesta Sala, ela foi produzida, ainda há bem pouco tempo, pelo Sr. Deputado Marques Mendes, quando se referiu ao Sr. Ministro João Cravinho.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, quero dizer que, em matéria de dignidade, nem eu nem ninguém na nossa bancada recebe lições do PSD e, especialmente, do Sr. Deputado Artur Torres Pereira.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É que dignidade é resistir à adversidade; indignidade é acostumar-se e submeter-se à adversidade. E quando Cavaco Silva os proibiu, a si e aos autarcas do PSD, de participarem na direcção da Associação Nacional de Municípios Portugueses, os senhores claudicaram e
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caíram na indignidade de não assumir aquilo que era vosso dever como autarcas.
Aplausos do PS.
Em terceiro lugar, dispenso que o Sr. Deputado venha aqui, com um ar sério, falar das coisas de uma forma menos séria. Os senhores apresentaram à Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente um pedido de audição ao Sr. Ministro sobre esta matéria, que foi decidido e votado por unanimidade. Não pode, portanto, descentrar este debate. E se ele não lhe convém, tem de ter paciência e ouvir. Os senhores cometeram os erros que cometeram e nós, neste momento, reparamo-los.
Por outro lado, queremos intervir neste debate até para desmistificar afirmações inacreditáveis aqui produzidas, nomeadamente pela Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite. É que, tratando-se de contas, elas estão aqui bem feitas e provam que, em matéria de argumentação política, também é preciso ter dignidade, pelo que não podemos falar em não cumprimento ou num menor FEF, com base em contas e cálculos que aqui não estão explicados.
É em nome dessa dignidade que faremos uma intervenção imediatamente a seguir, não recebendo, portanto, de nenhum dos senhores qualquer lição nesta matéria.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ªs e Srs. Deputados, sinto-me na obrigação de apelar à serenidade. Não ganhamos nada, nem nós nem o Parlamento, com o azedar deste debate, porque o tema é da maior importância e devemos concluí-lo dentro dos tempos regimentais.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Faça favor.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro João Cravinho é pródigo em afirmar a sua disponibilidade para vir aqui à Assembleia participar em audições parlamentares sobre tudo e mais alguma coisa nas matérias que tutela.
O certo é que a prática vem desmentindo essa prodigalidade.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Prove isso!
O Orador: - Já provo, Sr. Deputado! Não perde pela demora!
Quero, através da Mesa, Sr. Presidente, informar este Plenário que o Partido Popular, ontem, na Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente deu o seu assentimento ao pedido de audição ao Sr. Ministro João Cravinho em matéria de fundos estruturais, desde que fosse respeitada a ordem das audições que estão por fazer ao Sr. Ministro João Cravinho. E recordo que o Partido Popular apresentou dois pedidos de audição ao Sr. Ministro João Cravinho, mas ele ainda não encontrou disponibilidade para estar presente. Um deles tem a ver com o escândalo do abaixamento das tarifas da TAP, nas vésperas das eleições regionais, para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira...
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Foi um escândalo!
O Orador: - ... e o outro com a escandalosa proposta do PS para que se suspendessem as acções da IGAT, seis meses antes da eleições autárquicas. Para ser aqui ouvido sobre estas duas questões, o Sr. Ministro João Cravinho ainda não encontrou disponibilidade. Portanto, a sua prodigalidade tem sido desmentida na prática.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - É esta a prova?!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, não tendo a Mesa conhecimento dos requerimentos feitos pelo CDS-PP na comissão competente, nada pode acrescentar às suas observações.
Para apresentar o projecto de lei n.º 333/VII Atribuições das associações de municípios de direito público e competências dos seus órgãos (PSD), tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Amaro.
O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Portugal vai ter, este ano, uma nova Lei de Finanças Locais. E bom para o país e para o poder local. Mas, se tal vai ser uma realidade a curto prazo, o mérito não é do Governo. Pelo contrário, o Governo tudo fez para que nada sucedesse. Passou ano e meio de governação sem nada fazer pelo reforço da capacidade financeira dos municípios.
Vozes do PS: - Não é verdade!
O Orador: - Fez aprovar dois Orçamentos do Estado sem cumprir a sua promessa eleitoral de duplicar as verbas das autarquias locais.
Vozes do PS: - É falso!
O Orador: - E, quando os partidos da oposição tomaram as suas próprias iniciativas e confrontaram- o Governo com as suas promessas e as suas responsabilidades, o resultado foi o que se viu:...
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É verdade!
O Orador: - ... um Ministro em desespero e um Primeiro-Ministro desnorteado a tentarem fazer chantagem com a oposição, a exibirem as suas fragilidades e a quererem lançar o país na irresponsabilidade de uma crise política e em eleições antecipadas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
Vozes do PS: - Não apoiado!
O Orador: - Este é um dos exemplos mais típicos de como este Governo actua. Não faz nem quer que os outros façam; não cumpre o que promete e, quando é chamado à responsabilidade dos compromissos que assinou, irrita-se, perde o verniz e ensaia a fuga em frente; proclama o diálogo e a concertação, mas, quando a iniciativa não lhe pertence ou é apanhado em contrapé, não hesita em enveredar pelos caminhos da arrogância e, da chantagem.
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É o Governo da falsa humildade. Humilde quando lhe convém, por interesse, que não por convicção; intolerante e arrogante quando falha nas aparências e quando é confrontado com o peso das suas vulnerabilidades e contradições.
Foi assim este Governo na questão das finanças locais. Foi assim, e mal; foi assim, e perdeu. Teve entradas de leão e saídas de sendeiro.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Isso é ofensivo!
O Orador: - A firmeza de quem não cede ao jogo da chantagem teve um duplo mérito inquestionável. Primeiro, o mérito de mostrar ao Governo que escusa de ameaçar com crises políticas e com eleições antecipadas, porque nunca as convicções cedem perante o medo da ameaça. A consolação que fica é que nem a ameaçar este Governo cumpre aquilo que diz.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Segundo, o mérito de mostrar ao pais, ao poder local e aos autarcas portugueses que a nova Lei das Finanças Locais há-de ser, no essencial, obra de quem tomou a iniciativa, apesar de não ser Governo, porque quem é Governo e devia tornar a iniciativa não a tomou a tempo e horas e quando a tomou foi tarde, a más horas, de forma tímida e à revelia das expectativas e das promessas que havia contraído perante a sociedade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Governo agiu a reboque dos acontecimentos. Mas mais do que isso, ou mais grave do que isso, a proposta de lei sobre finanças locais que hoje o Governo nos submete é um mau documento e um mau contributo para o reforço e a afirmação do poder local.
Esta proposta de lei enferma de três vícios essenciais. O primeiro, é que não cumpre, nem de longe nem de perto, a promessa eleitoral do PS e do actual Primeiro-Ministro em matéria de financiamento autárquico. Também aqui o compromisso político de ontem cedeu lugar à publicidade enganosa de hoje.
O segundo, é que não contribui para atenuar os actuais desequilíbrios entre municípios mais ricos e mais pobres, entre concelhos reais desenvolvidos e menos desenvolvidos, pelo contrário, agrava as assimetrias actualmente existentes.
O terceiro, é que não contempla soluções que permitam inverter as actuais tendências de desertificação do interior. Longe vão os tempos em que mais promessa de justiça regional enfeitava os discursos do PS! Uma vez chegados ao poder, a máscara caiu e passou a ver-se a verdadeira face, a face de quem muito fala, mas pouco faz; a face de quem muito promete e pouco cumpre: a face de quem muito reclama para o interior e pouco ou nada faz pelo seu desenvolvimento.
Aplausos do PSD.
Esta é a proposta de lei da desilusão! Não admira, por isso, que não haja um único autarca, mesmo do PS, que seja capaz de dirigir um aplauso e uma palavra de apoio a esta iniciativa do Governo. Mais, o Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses ainda teve uma palavra de apreço e apoio pelo projecto de lei do PSD, mas não ousou transmitir um simples aceno que fosse de simpatia pela decisão do Governo.
E aqui está a verdadeira razão porque o Governo quis dramatizar, foi para desviar as atenções do essencial, ocultar o vazio da sua proposta, tornear a falta de apoio à sua iniciativa e para disfarçar a incomodidade que a sua omissão, primeiro, e a sua falta de ambição, depois, geraram nos autarcas dos municípios e das freguesias.
Mas a verdade acaba sempre por vir ao de cima. A verdade é que, à falta de melhor e à míngua de argumentos, a dramatização não aguentou muito tempo, porque ninguém aguenta muito tempo o que é artificial, fictício e virtual.
A verdade é que, passado o ruído inicial e a propaganda do primeiro momento, o que fica para a história é o vago e a ausência de apoio para a iniciativa governamental.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - A verdade é que, apesar do alarido demagógico do Governo, até o insuspeito Presidente da ANMP veio publicamente desmentir o Sr. Ministro João Cravinho e o Primeiro-Ministro António Guterres quando afirmou, preto no branco, que o projecto de lei do PSD não implicava qualquer aumento de impostos.
Aplausos do PSD.
A verdade é que longe vai o tempo em que o Primeiro- Ministro doutrinava que um tostão gasto pela administração local era melhor aplicado que pela administração central, mas, uma vez subido ao poder, o seu frenesim descentralizador rapidamente cedeu lugar à chamada evolução na continuidade.
A verdade é que, mesmo contra a vontade do Governo, à revelia das suas grosseiras provocações e sem sentido, o país vai ter uma nova Lei de Finanças Locais, ousada como deve ser, séria e responsável como não pode deixar de ser.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O municipalismo não é monopólio de ninguém, porque faz parte da cultura nacional e da mais genuína tradição portuguesa. É um objectivo nacional, alicerçado em raízes sólidas que o passado sedimentou e que os últimos anos ajudaram a valorizar sobremaneira, e é, cada vez mais, uma aposta de futuro e com futuro.
Pelos municípios, individualmente considerados, e pelas associações e federações de municípios passa, cada vez mais, o desenvolvimento do País, harmonioso, participado pelas populações, sentido e vivido pela sociedade local e nacional.
Daí o empenho que colocamos neste desiderato. Daí o nosso projecto de lei sobre finanças locais, com mais recursos Financeiros para as autarquias locais, distribuídos com maior equidade e equilíbrio, e com mais atribuições e competências para os municípios e freguesias, como forma de retirar ao gigantismo do poder central fracções para as quais este não tem vocação nem apetência e que melhor exercidas podem ser por quem está mais próximo das populações e já provou saber fazer e fazer com maior eficácia. Trata-se de, também no plano interno e nacional, afirmar a pertinência do princípio da subsidiariedade.
Mas é preciso ir mais longe e apostar também nas associações e federações de municípios, nas sinergias da
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cooperação intermunicipal e nas virtualidades do associativismo.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Daí a necessidade de dotar as associações e federações de municípios de competências próprias: daí o projecto de lei que apresentamos e que aqui hoje se encontra também em discussão.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Em boa hora!
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - É curto!
O Orador: - Este é um projecto de atribuições, não um projecto de intenções. No essencial, ele apresenta uma visão integradora, garantindo, no entanto, a especificidade das situações concretas e das soluções que cada agente político autárquico melhor considera para os seus concidadãos.
Ao mesmo tempo, procura-se garantir uma participação mais activa e maiores níveis de responsabilidade nas opções estratégicas em domínios sensíveis e que envolvam áreas geográficas mais vastas do que um simples município.
Cremos que, neste domínio de reforço das competências e atribuições das autarquias, uma coisa nos distingue claramente das propostas de lei do Governo. O nosso projecto de lei não é de intenções, como disse, é de atribuições; o nosso projecto de lei não quer despejar nas autarquias o que não dá mais valia política ao Governo; o nosso projecto de lei não quer transferir o que de mais penalizante atinge o poder central. Nós, ao contrário de outros, não aligeiramos responsabilidades institucionais do Estado, não desculpabilizamos o não cumprimento da administração central e não procuramos alibis para as ineficiências.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E em matéria de finanças locais? Mas que diferenças! O PSD quer reforçar a capacidade financeira das autarquias. não para engordar os recursos
dirigidos à gestão corrente e burocrática mas, sim, para garantir uma maior capacidade de investimento em projectos, obras e realizações.
O reforço da capacidade financeira deve ser entendido como uma vitória das populações e dos cidadãos e não uma vitória da voragem burocrática das máquinas
administrativas, das tentações populistas de quem quer que seja ou de instrumentos de influência política, claramente ilegítimos.
Vozes do PSD: - Muito berra!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O debate parlamentar sobre finanças locais começou há pouco mais de um mês, de forma enviesada, por culpa e responsabilidade do Governo.
Vozes do PSD: - É verdade!
O Orador: - Era o tempo em que o Governo ameaçava demitir-se por lhe ser pedido que cumprisse o que ele próprio havia prometido.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Era o tempo em que o Governo se assumia como factor de instabilidade e a oposição como referencial de estabilidade e serenidade.
Hoje o debate começa a estar mais sereno. O Governo recuou...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Em toda a linha!
O Orador: - ... e tente esquecer tudo quanto disse e fazer de conta que nada sucedeu. Fica para a história política que este Governo substituiu o desespero e a ameaça de ontem pelo recuo e pela fraqueza de hoje.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Ainda não disse nada!
O Orador: - Por nós, mantemos a coerência e a fidelidade ao que então afirmámos: o poder local deve ser fortalecido; as autarquias devera ver os seus recursos
aumentados; o Estado deve gastar menos e os municípios
investirem mais; a repartição dos mesmos recursos financeiros do Estado deve ser alterada, mantendo a despesa pública global inalterada; e o próximo Orçamento de Estado deve reflectir já a nova orientação que cometa a desenhar-se.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Não alterámos uma vírgula no discurso que antes fizemos, nem descortinamos razões para o fazer; não andámos aos ziguezagues nem brincámos às crises políticas; não precisámos de falar alto para mostrar que tínhamos mais razão. Numa palavra, fomos coerentes. E com a mesma coerência e firmeza de convicções conduzimos o processo até final, sem qualquer tipo de hesitação.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Qual coerência?!
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Nem cumpriu a lei!
O Orador: - A mesma firmeza que evidenciámos no debate na generalidade, em 28 de Maio passado, norteará a nossa conduta até final, abertos à discussão e à concertação, mas fechados a dar o dito por não dito, e com a consciência do serviço prestado à democracia, porque apostar no poder local é fortalecer a democracia.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Luís Sá, Gonçalo Ribeiro da Costa e Júlio Faria.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Amaro, é sabido que o PSD, quando esteve no Governo, não cumpriu repetidamente - este facto e reconhecido, creio eu, pelo próprio PSD - a Lei de Finanças Locais (Lei n.º 1/87, de 2 de Janeiro), aprovada aqui por unanimidade.
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O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - É público e notório!
O Orador: - A pergunta que lhe coloco muito concretamente - e não quero agora estar a repisar o passado -, para ter algum sentido elaborar uma Lei de Finanças Locais, que um Governo, qualquer que seja, não desrespeite, Orçamento do Estado após Orçamento do Estado, é se o PSD está disponível para aprovar, no quadro da revisão da Constituição, um estatuto para a Lei de Finanças Locais que seja exactamente o de garantir expressamente que é uma lei de valor reforçado, isto é,
uma lei que tem de ser respeitada pela lei do Orçamento do Estado.
É sabido que o comportamento do PSD foi questionado no Tribunal Constitucional e que uru Acórdão do então Conselheiro António Vitorino disse - a meu ver, erradamente - que ela não tinha esse estatuto de lei de valor reforçado, o que significa que a actual revisão da Constituição devia expressamente reconhecer-lhe tal estatuto.
A propósito, é insuficientemente conhecido o facto de o estatuto de lei orgânica, que permitiria resolver este problema ter, ter sido conferido à Lei das Finanças Regionais e não ter sido conferido, apesar da proposta do PCP devido ao acordo do PS e do PSD, à Lei de Finanças Locais.
Pergunto, por isso, qual é a posição do PSD nesta matéria, até porque esta questão vai ser debatida nas próximas horas na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
A segunda questão que quero colocar-lhe é a seguinte: o Sr. Deputado veio aqui referir que, na opinião do PSD, mais meios financeiros significa também mais encargos, o que tem um profundo significado político, porque vem, no fim de contas, clarificar que o conflito entre o Governo e o PS e o PSD nesta matéria é um conflito meramente virtual, como, aliás, sempre dissemos. O PSD propunha mais meios financeiros, mas propunha também transferencia de mais encargos.
Ora, este problema da transferência de mais encargos e de dar reais verbas, com mais encargos, resolve-se muito facilmente. O Governo, por exemplo, resolve-o, transferindo os professores e o pessoal não docente do ensino básico, com o Sr. Ministro da Educação a proclamar que dar esta competência não significa que as autarquias tenham qualquer autoridade em relação aos professores. portanto é uma mera pagadoria burocrática.
Mas, independentemente dessa questão, há aqui um problema: o PSD aposta em acompanhar a transferência de mais meios de atribuições e competências e, portanto, o problema de mais impostos ou de mais défice que tanto preocupa aqueles que só
vêem a moeda única como grande desígnio nacional está resolvido e sempre esteve resolvido. É assim ou não, Sr. Deputado?
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Luís Sá, peço-lhe que termine, porque esgotou o seu tempo.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
A última questão que lhe quero colocar, para concluir, é a seguinte: o PSD apresenta um projecto de lei de atribuições das associações de municípios claramente para fazer crer que elas são a alternativa às regiões administrativas e também já apresentou, na revisão constitucional, um projecto no mesmo sentido, que não vai, ao que julgo, ser aprovado, o que significa que dar atribuições e competências às associações de municípios, que não sejam os próprios municípios, é inconstitucional. Pergunto-lhe, por isso, a que vem este projecto de lei.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Álvaro Amaro, deseja responder já ou no Final?
O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - No fim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Amaro, ouvi com atenção a sua intervenção, aliás, longa, mas não consegui perceber como é que o PSD vai votar a proposta de lei que «estabelece o Quadro de Transparência de atribuições e competências para as Autarquias Locais» e, sobretudo, a proposta de lei do «Regime financeiro das Autarquias Locais». Era essa resposta que esperava que anunciasse ao Plenário, quando subiu à tribuna, mas, afinal, não conseguiu transmitir-nos isso.
Deixe-nos aqui «preto no branco» a vossa posição, esclareça a Assembleia qual vai ser a posição do PSD sobre essa matéria.
O Sr. Deputado foi ali à tribuna falar sobre as associações intermunicipais e conseguiu usar da sua maior capacidade de síntese ao apresentar este projecto de lei, porque, de facto, ele é minimalista e deve ter sido preparado à última hora, para permitir ao PSD ter mais algum espaço no debate de hoje.
Vozes do PS: - Adivinhou!
O Orador: - Isto que os senhores hoje aqui apresentam à discussão é um exemplo do nada, porque nada dispõe quanto ao financiamento das associações intermunicipais e ao regime do pessoal que lhe deva estar afecto, e, inclusive, é redutor relativamente àquilo que o PP, em tempo oportuno, já aqui apresentou cru matéria de gestão dos programas operacionais. Aliás, aí os senhores são coerentes, porque, na altura, votaram contra a nossa proposta de atribuir às associações de municípios a gestão dos programas operacionais e aqui apenas lhes permitem participar nessa gestão, o que é, de facto, uma opção minimalista.
Já agora, Sr. Deputado, porque é que o PSD ainda não promoveu a reunião do grupo de trabalho que coordena, para se debater na especialidade os projectos de lei sobre associações municipais, que foram aqui aprovados em 12 de Março deste ano? Porque é que o PSD tem sido tão pouco célere em promover os trabalhos desse grupo de trabalho?
Sr. Deputado, que pensa o PSD sobre as competências das associações intermunicipais em matéria de turismo, de
infra-estruturas viárias, de transportes e de formação profissional?
Aquilo que os senhores aqui apresentaram foi, de facto um projecto de ler minimalista, onde usaram da vossa maior capacidade de síntese.
Sr. Deputado, tente responder às perguntas que lhe coloquei, sobretudo à primeira, ou seja, deixe aqui dito «preto no branco», de forma clara, qual vai ser a posição
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do PSD sobre as matérias de fundo que hoje aqui estamos a discutir.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): Tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Faria.
O Sr. Júlio Faria (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Amaro, subiu V. Ex.ª à tribuna para, supostamente. apresentar n projecto de lei n.º 333/VII, do PSD, que, lamentavelmente, chega a este Plenário sem que tenha sido objecto de discussão, de apreciação e de votação na 4.ª Comissão, como deveria, ter acontecido. Será uma questão que, em momento posterior, no seio da Comissão esclareceremos.
Gostaria apenas de referir alguns adjectivos desqualificativos que o Sr. Deputado Álvaro Amaro utilizou na sua intervenção, como sejam: chantagem, arrogância, sendeiro, grosseiro. Enfim, e tudo isto pasme-se! - perante o silêncio do Grupo Parlamentar do PSD e do Sr. Deputado Artur Torres Pereira que ainda bem recentemente aqui protestou, quando nenhum destes adjectivos tinha sido utilizado.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas o Sr. Deputado Álvaro Amaro dizia, na sua intervenção, a propósito da apresentação do seu projecto de lei, que o PS e o seu Governo até hoje, em matéria de poder local, nada tinham feito. Ó Sr. Deputado Álvaro Amaro, então quem é que, pela primeira vez e desde há anos, cumpre a Lei de Finanças Locais que os senhores, olhando para a primeira fila da vossa bancada, onde estão tantos ex-governantes, nunca cumpriram?
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Deputado Álvaro Amaro, quem aumentou em 20% as transferências para as autarquias em ano e meio de governação? Quem aumentou em 52% o orçamento para as juntas de freguesia? Quem transferiu para as câmaras municipais aquilo que os senhores não cumpriam a propósito dos transportes escolares?
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Isto dói! Isto dói!
O Orador: - Sr. Deputado Álvaro Amaro, quem é que fez aprovar nesta Assembleia uma nova lei da tutela? Quem é que apresentou nesta Assembleia novos diplomas em termos de associações representativas dos municípios das freguesias, do regime jurídico comum das associações de municípios de direito público, da lei de criação de empresas municipais e intermunicipais?
Sr. Deputado Álvaro Amaro, aquilo que efectivamente preocupa o PSD, o que é compreensível, é o tacto de este Governo, em ano e meio de governação, ter cumprido a Lei de Finanças Locais, ter cumprido aquilo a que se propôs em relação aos autarcas portugueses, ter apresentado um projecto de lei de atribuições e competências, onde se propõe, no espaço de quatro, cinco anos, duplicar as verbas a transferir para o poder local, ao contrário daquilo que os senhores...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É só conversa!
O Orador: - O que o PS sempre disse, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, no seu manifesto eleitoral -...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O Sr. Deputado acredita nisso?!
O Orador: - Sr. Deputado, ouça se faz favor! O que o PS sempre disse é que faria transferir novas atribuições e competências com novos recursos. E aquilo que os senhores fizeram recentemente, ao apresentarem aqui um projecto de lei sobre finanças locais, foi apenas aumentar a despesa pública ou aumentar o défice, sem contrapartidas, serra que isso significasse...
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Júlio Faria, peço-lhe que termine, pois já esgotou o tempo regimental.
O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
O que os senhores pretendem fazer é, efectivamente, levar ao incumprimento dos critérios de convergência, a que este Governo se propôs e que os senhores prometeram ajudar a cumprir e estão agora a querer arrepiar. E quando se diz que nenhum autarca...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é isso que a Associação Nacional de Municípios Portugueses diz!
O Orador: - A Associação Nacional de Municípios Portugueses não está de acordo, não está receptiva?!
Ó Sr. Deputado Álvaro Amaro, ouvi, às 13 horas, no telejornal, o Sr. Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, que o senhor conhece, dizer isto: «estamos, como sempre estivemos, receptivos à transferência de novas competências, de novos recursos, desde que eles signifiquem colocar mais próximo ido cidadão o poder de decidir, e de decidir bem».
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Será sobre essa matéria que os senhores terão de pronunciar-se,...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... e estamos disponíveis para, em sede de Comissão, na especialidade, podermos verificar da vossa boa vontade em colocar ao serviço do poder local aquilo que, enquanto foram Governo, sempre lhe negaram, e fizeram-no de tal forma, permutam-me que lhes diga, que até obrigaram à retirada dos vossos autarcas do concelho directivo da Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder aos pedidos de esclarecimento que lhe foram formulados, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Amaro. Dispõe, para o efeito, de 5 minutos.
O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, como praticamente respondeu à pergunta que me fez em matéria de revisão da Constituição, porque diz que este assunto vai ser lá discutido, não o vamos discutir aqui.
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Vozes do PS: - Ah!...
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Ficamos esclarecidos!
O Orador: - Ainda assim lhe direi, como certamente estará de acordo comigo, que uma lei nunca é boa ou má por ser de valor reforçado. Ou é, ou não é! Mas, de qualquer maneira, esta é uma matéria que será discutida em Comissão.
A segunda questão que colocou tem a ver com mais encargos e mais meios contemplados no nosso projecto de lei - as palavras foram do Sr. Deputado Luís Sá, se as ouvi bem e se delas tomei boa nota.
O problema do aumento de impostos e de mais défice sempre esteve resolvido.
Risos do PS.
É verdade! No nosso projecto de lei esse problema sempre esteve resolvido, nunca houve aumento de impostos nem de défice.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!
O Orador: - Só não esteve resolvido na cabeça do Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território,...
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - ... porque, através dele, quis criar e pôr o país naquela situação que todos conhecemos.
Quanto à questão das associações e federações de municípios, sempre dissemos que defendíamos o associativismo com competências próprias e as federações, que não têm de estar em causa, com um eventual novo patamar de organização administrativa, que é o da criação das regiões.
O Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa considera o projecto de lei do PSD relativo às associações e federações minimalista. Porém, o Sr. Deputado tem, porventura, um bom caminho a seguir: ajudar a torná-lo maximalista.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Aprove-o e apresente as suas sugestões, para fazermos dele um projecto de lei ainda melhor.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Apresentámos em Março!
O Orador: - Se for assim, estaremos naturalmente todos satisfeitos, inclusive os defensores do associativismo.
Sr. Deputado Júlio Faria, o senhor é um homem tão calmo e hoje está tão enervado, tão preocupado! Mas nós percebemos!
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É que ele foi autarca no tempo do cavaquismo!
Vozes do PS: - É compreensível!
O Orador: - Nós compreendemos! Mas, depois, o Sr. Deputado Júlio Faria quis aqui atribuir-nos o ar da hipersensibilidade, porventura do Governo, quando aqui, nesta Casa e não nos jornais, dizemos que o Governo quis fazer chantagem política, quis lançar o país na instabilidade.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - De modo que o senhor não tem de ficar chocado com o facto de dizermos aqui, na Assembleia, e não nos jornais aquilo que o Governo queria fazer.
Vozes do PS e do CDS-PP: - Como é que vota?!
O Orador: - Sr. Deputado Júlio Faria, não há hipersensibilidade!
Vozes do PS e do CDS-PP: - Diga como é que vota?!
O Orador: - Amanhã eu direi.
Risos do PS e do CDS-PP.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Amanhã não, diga já hoje!
O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Júlio Faria, quanto à questão do passado... Pedimo-lhes que os senhores digam um dia em que esta bancada possa falar ao país. Nós fizemos asneiras no passado, não fizemos?
Vozes do PS: - Fizeram, fizeram!
O Orador: - Fizemos.
Vozes do PS: - Fizeram muitas asneira!
O Orador: - Fizemos algumas asneiras.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Algumas?!
O Orador: - Fomos penalizados por isso! Mas o Deputado Júlio Faria, com a inteligência que todos lhe reconhecemos, percebeu tão bem isso que depois passou à margem disto e o que quis fazer foi desculpar já o vosso passado de quase dois anos!
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Não diga isso!
O Orador: - E quis fazer o balanço do que o Governo fez, do que o Governo não fez, de que se esforçou por isto, de que esforçou-se por...
Protestos do PS.
Será que lhes dói...!?
Protestos do PS.
Sr. Presidente, agradecia que me deixassem falar!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, peço que criem condições para que o Sr. Deputado Álvaro Amaro possa prosseguir.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.
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O Orador: - Sr. Presidente. para terminar, quero dizer que, apesar desse esforço de defesa do vosso passado de expulsos!
já quase dois anos...
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Um passado negro! Muito negro!
O Orador: - Sr. Deputado Júlio Faria, indique-me uma palavra em defesa do vosso projecto de Lei de Finanças Locais dita pelo Dr. Mário de Almeida.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Digam uma!
O Orador: - Diga uma palavra! Mas, se não quiser, indique uma palavra de um presidente de câmara em exercício. Cite-me um, socialista... Diga um!
Sr. Deputado Júlio Faria, nós já dissemos aqui, por várias vezes, que o que o país agora precisa é de ouvir o julgamento da vossa acção governativa.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Mas qual julgamento?!
O Orador: - Apresentámos-lhe aqui um exemplo muito simples, que será mais uma questão de contas, de aritmética, que é assim: sabe quanto é que o vosso Governo deve aos municípios se cumprisse o que prometeu, que está escrito e que tanto defende? Devem 76 milhões de contos, dos dois Orçamentos, de 1996 e 1997...
Protestos do PS.
Está aqui, está aqui! Demora três anos e meio a cumprir a vossa promessa, Sr. Deputado!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Gosta.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, antes queria fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Faça favor.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, através da Mesa, gostaria de pedir ao Sr. Deputado Álvaro Amaro que respondesse às questões que coloquei...
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Ele não sabe!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, este não é o método mais curial.
O Orador: - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Júlio Faria lembrou agora um aspecto que me parece importante: o PSD, juntamente com o PS, está obrigado ao cumprimento dos critérios de Maastricht. Porventura, o PSD estará a aguardar o regresso do seu líder de Bruxelas, onde foi buscar instruções ao PPE...
Risos do PS.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Vocês foram
O Orador: - Talvez seja por isso que o PSD não está hoje em condições de dar a resposta que o PP lhe pediu.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - A Mesa regista as suas observações, apesar de esta não ser a maneira mais curial de pedir esclarecimentos.
O Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa tem a palavra para, em nome do CDS-PP, apresentar o projecto de lei n.º 387MI - Alterações ao Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março (Atribuições e competências das autarquias).
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados:...
O Sr. José Junqueiro (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, peço desculpa, por estar, a interrompê-lo, mas parece que. há um
problema.
O Sr. Deputado José Junqueiro pede a palavra para que efeito?
O Sr. José Junqueiro (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente. E serei muito rápido.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, mas peço-lhe que seja realmente rápido porque o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa foi interrompido na sua intervenção.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, quero apenas informar a Câmara de que vou fazer entrega na Mesa, para o Sr. Presidente mandar distribuir por todas as bancadas, da carta da Associação Nacional de Municípios Portugueses, que é importante para este debate e que diz, além de outras coisas, o seguinte: «Embora a ANMP não se identifique em absoluto com qualquer dos quatro projectos em análise, reconhece haver neles, sem excepção, elementos indispensáveis à obtenção final de uma boa Lei de Finanças Locais para Portugal».
Aplausos do PSD.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Ah! Agora o PSD bate palmas?!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Muito bem, Sr. Deputado. Faça o favor de a entregar na Mesa para ser distribuída.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Peço a palavra também para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Faça favor, mas peço-lhe também que seja brevíssimo.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Com certeza, Sr. Presidente.
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Interpelo a Mesa exactamente sobre a mesma questão, ou seja, no sentido de convidar o Partido Socialista, e o Sr. Deputado José Junqueiro em particular, a fazer distribuir também a resolução do congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses que refere a necessidade de cumprir a Lei de Finanças Locais em vigor e o nível de financiamento nela previsto e simultaneamente a ideia de uma negociação de transferência de novas responsabilidades e o seu acompanhamento com níveis de financiamento suficiente. São dois princípios fundamentais que também convém distribuir.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Se o Sr. Deputado Luís Sá tem esses documentos em seu poder, peço-lhe que os faça chegar à Mesa a tini de também serem distribuídos.
O Sr. Pedro Feist (CDS-PP): - Peço a palavra para formular um protesto, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Deputado deseja fazer um protesto relativamente a que intervenção?
O Sr. Pedro Feist (CDS-PP): - Se o Sr. Presidente quiser, pode chamar interpelação...
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, eu não posso chamar qualquer coisa aos pedidos de palavra dos Srs. Deputados.
O Sr. Pedro Feist (CDS-PP): - Quero fazer, em nome da minha bancada, um protesto à Mesa, que é feito directamente a si, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sendo assim, é rigorosamente uma interpelação.
Tem a palavra.
O Sr. Pedro Feist (CDS-PP): - O Sr. Presidente deu a palavra, para uma intervenção, ao meu colega de bancada Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa. O meu colega começou a intervenção, mas, logo a seguir, deu-se novamente aqui uma discussão entre dois partidos sobre a matéria que estava a ser objecto de intervenção do meu colega de bancada a quem tinha sido dada a palavra. Protesto, pois, por isto porque o meu colega abandonou a tribuna e só voltará quando lhe voltar a ser dada a palavra e quando forem restabelecidas as condições para poder fazer a sua intervenção.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Talvez o Sr. Deputado Pedro Feist tenha razão, mas era minha intenção, ao dar novamente a palavra ao Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, pedir-lhe desculpa pelo embaraço que lhe causei, porque, rigorosamente, talvez eu pudesse ter dado a palavra a quem a pediu para interpelar a Mesa depois da sua intervenção, uma vez que já a tinha iniciado.
Sanado o incidente, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa para proferir a sua intervenção.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Partido Popular apresenta hoje o seu projecto de lei para reforço das atribuições e das competências dos municípios e das freguesias, mediante uma alteração ao Decreto-Lei n.º 100/84, de 29 de Março.
Esta matéria foi objecto de um primeiro diploma, datado de 1977, substituído em 1984, e tem merecido sucessivas intervenções avulsas sem uma linha orientadora.
Ainda em 1984, a Administração Central aceitou conceder aos municípios uma delimitação nas actuações de ambos os níveis mas ficou-se por aí e nunca os diversos governos dos diversos partidos curaram de concretizar essa delimitação, regulamentando o Decreto-Lei n.º 77/84.
Pelo contrário, desde 1984, a tónica tem sido a de se descarregar sobre os municípios diversas competências, que mais não são do que tarefas, que a Administração Central reconhece ser incapaz de executar ou que pretende deixar de executar.
As mais das vezes, essas competências, ou tarefas, não são acompanhadas dos meios humanos, técnicos e financeiros necessários à sua execução, o que tem transformado as câmaras municipais em meras repartições da Administração Central.
O projecto de lei que o Partido Popular agora apresenta obedece aos princípios da sistematização, da descentralização, da desconcentração e da fiscalização.
Em primeiro lugar, a sistematização, num único diploma, da matéria que está contida no Decreto-Lei n.º 77/84 e que deixa de carecer de regulamentação, dando-se, assim, corpo às pretensões da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Ainda a este respeito, integrámos, em obediência ao mesmo princípio, as competências atribuídas às freguesias pela recentíssima Lei n.º 23/97.
Tivemos, aliás, oportunidade de dizer, por mais de uma vez, que esta tendência do PS de legislar «às pinguinhas» apenas para cumprir calendário, porventura satisfazer algumas clientelas e sem uma visão integrada, em nada beneficiava os destinatários, neste caso, as freguesias.
Em segundo lugar, descentralizam-se para os municípios todas as competências sobre matérias que, indubitavelmente, respeitam aos interesses directos das populações e cuja permanência na esfera da Administração Central carece de sentido e gera ineficácias. É, aliás, neste domínio que se mede a vontade descentralizadora de cada um dos proponentes dos projectos de lei hoje em discussão.
Dou apenas um exemplo.
O Partido Popular entende que deve caber em exclusivo aos municípios o licenciamento das grandes superfícies comerciais e que qualquer outra solução mais não será do que a tentativa do Governo em reter para si uma alavanca no comando do processo.
Um outro exemplo ainda: o parque habitacional social, hoje na posse do IGAPHE e do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, deve ser transferido para o património dos municípios com a concomitante transferência dos meios necessários à sua gestão e manutenção. Qualquer outra solução apenas indiciará a falta de vontade do Governo em abrir mão desse património e do orçamento que lhe está associado.
Como disse, o PP descentraliza para os municípios competências que respeitam aos interesses directos das populações mas recusa-se a alinhar na desresponsabilização da Administração Central em áreas que apenas a esta respeitam, como é o caso de competências da esfera do Ministério da Justiça.
Em terceiro lugar, permite-se que os municípios desconcentrem as suas competências em terceiras entidades, por eles participadas ou não, mobilizando e
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optimizando os recursos disponíveis nos sectores privado e cooperativo.
O interesse público e a agilidade da gestão empresarial são, na perspectiva do Partido Popular, desejavelmente associáveis. Em alternativa, permite-se a concessão a privados em áreas que são da competência dos municípios.
Em quarto lugar, introduzem-se instrumentos de fiscalização por parte da assembleia municipal e de cada um dos seus membros.
Referimo-nos à possibilidade de o órgão deliberativo chamar para ratificação os actos não constitutivos de direitos, praticados pela câmara municipal, pelo seu presidente e pelos vereadores e à obrigação da câmara em responder a pedidos de informação formulados pela assembleia municipal ou por cada um dos seus membros.
Por último, o Partido Popular introduz alterações na forma de constituição das juntas de freguesias e na definição do número de vereadores a tempo inteiro e a meio tempo, que visam conferir funcionalidade às juntas e às câmaras, responsabilizando os seus presidentes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Popular tem convicções firmes e conhecidas nesta matéria.
Estamos certos que a desejável aproximação ente os eleitos e os eleitores e entre o decisor e os destinatários das decisões só se consegue pela via do reforço dos municípios e das freguesias. E não nos restam dúvidas, que, ao contrário do apregoado, a regionalização será feita à custa dos municípios.
Por este motivo, urge deixar claro que aquilo que, hoje, aqui propomos pertence, por direito próprio e em resultado da experiência adquirida e do sucesso alcançado, aos municípios, não sendo urna mera concessão da Administração Central.
Com o regime agora proposto, devolve-se o poder a quem melhor o exerce e acaba-se com a gestão, por vezes eleitoral, dos fundos públicos, nomeadamente do PIDDAC.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Muito bem!
O Orador: - A opinião dos portugueses começa a definir-se e a ser conhecida e não consta que agrade aos regionalizadores. A sabedoria do povo é inegável e, neste caso, prefere aquilo que conhece àquilo que não lhe é dado a conhecer.
Estamos, por isso, convencidos que a razão nos assiste e que interpretamos a vontade majoritária dos portugueses.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.
O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O início da apreciação e discussão, em sede parlamentar, das iniciativas legislativas promovidas pelo Governo em matéria atinente à redefinição do quadro de atribuições e competências cometidas às autarquias locais e respectivos mecanismos institucionais de financiamento constitui o momento mais adequado para investir numa reflexão objectiva sobre a importância e a premência da descentralização político-administrativa e da subsequente modificação da arquitectura do Estado e da Administração Pública portugueses.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Antes de encetar tal esforço cabe-nos, contudo, saudar a acção que o Governo tem vindo a desenvolver neste domínio, consubstanciada já em múltiplas iniciativas da mais diversa índole que têm concorrido para a dignificação institucional do poder local democrático e o reforço da eficácia da sua actuação concreta. Na verdade, e tal merece ser distinguido, contrariando uma tendência anterior que os historiadores não deixarão de salientar como um dos traços políticos mais marcantes da década em que o PSD assegurou solitariamente a governação do País, o actual Executivo, em conformidade com os propósitos constantes do seu programa, tem revelado um notável empenhamento no prosseguimento de realizações conducentes à valorização das autonomias locais e ao correcto tratamento daqueles que, por vontade popular, asseguram a titularidade empírica dos órgãos autárquicos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Para além de evidenciar uma elevada lucidez na interpretação das expectativas e das necessidades do País, o Governo demonstra, desta forma, possuir a competência necessária para assegurar o pleno cumprimento de importantes objectivos políticos que o PS fora capaz de conceptualizar e propor no tempo em que estava incumbido da tarefa de desempenhar a função de principal partido da oposição na vida política portuguesa. Ainda bem que assim é.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Como é do conhecimento de todos, o nosso país, por diversas razões de ordem histórica que, na presente circunstância, me escuso a elencar, atingiu este final do século XX dotado de um modelo de organização estatal altamente centralizado, caracterizado por uma grande opacidade face à opinião pública, com inevitáveis prejuízos no que concerne à sua transparência, funcionalidade e democraticidade. Entre outros nefastos efeitos, tal modelo de organização favorece a perpetuação de uma espessa burocracia que atemoriza o cidadão, refreia a iniciativa e inibe a participação dos indivíduos na vida pública.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Ora, um sistema com estas características apresenta-se em total contradição com as possibilidades e as exigências do nosso tempo. Nada, desde o plano tecnológico até à dimensão cultural, justifica a manutenção de um modelo que se revela gerador de ineficiências e desperdícios e desincentivador de uma maior afirmação da sociedade civil.
Foi por ter compreendido tal coisa que o PS tez do objectivo da descentralização uma das suas mais emblemáticas bandeiras no período que antecedeu as últimas eleições legislativas. Para alcançar tal desiderato sempre afirmámos que era necessário seguir por duas vias, que não só não se revelavam antagónicas como até; se anteviam complementares: a via da criação das regiões administrativas e a via do aprofundamento e reforço do poder local.
Aplausos do PS.
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Partindo da ideia do primado do princípio da subsidiariedade aplicado à organização do Estado e da Administração, foi para nós sempre claro, como, de resto, para a esmagadora maioria dos autarcas portugueses, que tais reformas, a regional e a local, deveriam andar a par, vitalizando-se mutuamente.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Sem regiões administrativas, promotoras da discussão e responsáveis pela decisão a um nível territorial intermédio, o poder municipal permaneceria sempre demasiado vulnerável face às hipotéticas intromissões abusivas de uma gigantesca administração central; mas sem um poder local forte, dinâmico e prestigiado o novel poder regional correria o risco de (ficar desprovido de sustentação, condenado a uma suspensão acrobática que, a prazo, o liquidaria.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Foi este o nosso diagnóstico na oposição, esse é o nosso propósito, agora que detemos responsabilidades de outra natureza. Como é, aliás, reconfortante observar que, no decorrer do percurso que o levou da oposição para o poder, o PS não perdeu as referências, não renegou as convicções, não esqueceu os compromissos.
O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Muito bem!
O Orador: - A prova concludente disso mesmo encontra-se bem visível na natureza e no conteúdo dos diplomas agora em discussão, que almejam proporcionar um efectivo reforço da descentralização através da ampliação do poder municipal.
Numa época em que assistimos a tantas e tão súbitas inflexões programáticas e em que tantas opções se diluem perante o primeiro, sopro que as aborda, parece-nos justo salientar o carácter firme desta vontade que mais não traduz do que a ambição de cumprir importantes promessas eleitorais.
Aplausos do PS.
Como os portugueses recordam e nenhum de nós ignora, o PS manifestou reiteradamente a intenção de, uma vez alcançado o poder político, proceder, num ciclo de quatro a cinco anos, à duplicação do montante dos recursos financeiros a canalizar para as autarquias locais no âmbito de um processo de ampliação das atribuições e competências que lhes ficariam cometidas. No programa eleitoral, em vários manifestos públicos e no Programa de Governo esta intenção foi explicitamente assumida, sem margem para a ocorrência de qualquer dúvida.
Tão clara opção estribava-se no reconhecimento das potencialidades ainda não plenamente actualizadas da esfera autárquica e radicava na convicção de que muitos dos assuntos e matérias que vinham a ser geridos pela Administração Central poderiam ser tratados com um acréscimo de eficiência se passassem para a esfera da administração local. Nesse sentido, o PS apresentou em anteriores legislaturas várias propostas que visavam alcançar tão justo escopo.
Foi precisamente para dar satisfação a tal ambição que o Governo decidiu, em Setembro do ano passado, constituir uma comissão interministerial incumbida de preparar o quadro jurídico do processo de transferência de competências para as autarquias locais, na sequência da criação, em Agosto do mesmo ano, de um grupo de trabalho destinado a preparar a elaboração de uma nova lei das finanças locais.
Desse esforço que não impediu a aprovação, entretanto, da nova lei da tutela administrativa, que revogou o anterior diploma repressivo e centralista, bem como de propostas de lei sobre as associações de municípios, as empresas municipais e o novo regime de contabilidade autárquica, resultaram as propostas que tonos agora o ensejo de discutir.
Apraz-nos, desde logo, registar que o Governo se preocupou em apresentar iniciativas que não ludibriam as expectativas criadas e vão integralmente de encontro às necessidades pressentidas.
Na verdade, o Executivo propõe-se levar a cabo, de forma gradativa, durante um período de quatro anos, a transferência de atribuições para as autarquias em áreas que vão desde o equipamento rural e urbano, a educação, a saúde, a habitação, o ambiente ou o ordenamento do território até à polícia municipal, os equipamentos de justiça ou a cooperação externa, abrangendo 18 domínios de inegável importância.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Desta forma garante-se a extensão das responsabilidades municipais, activa-se e concretiza-se o princípio da subsidiariedade, amplia-se a transparência da administração, aproximam-se os decisores dos destinatários das decisões, incrementa-se a participação dos cidadãos na vida pública.
Aplausos do PS.
Estamos também certos de que se alcançarão ainda resultados satisfatórios no que compete à racionalidade do investimento público e à sua maior rentabilização.
Ao mesmo tempo que assim procede, ampliando atribuições e competências autárquicas, o Governo empenha-se em assegurar a transferência, para esse nível da administração, dos recursos financeiros, técnicos e humanos correspondentes, estabelecendo uma correcta conformação entre novas responsabilidades e novos recursos disponibilizados.
A proposta de lei das finanças locais agora apresentada pelo Executivo visa, sem prejuízo do equilíbrio geral das finanças públicas e repudiando o recurso ao agravamento da carga fiscal incidente sobre os portugueses, dotar os municípios e as freguesias dos recursos financeiros imprescindíveis para o correcto desempenho das funções que lhe passarão a estar atribuídas. Sem contrariar as opções de política orçamental que têm vindo a ser prosseguidas e, por isso mesmo, não apontando para o aumento da despesa pública, é possível transferir novos recursos para as autarquias locais, reforçando o seu peso e aumentando a sua importância no sistema político e no sistema administrativo nacionais.
Para além disto, a proposta em apreço contém significativas alterações face à legislação actualmente vigente, de modo a permitir uma maior estabilidade e acrescida transparência na evolução do FEF que passará a ter como referência a cobrança do IRS e não já do IVA e
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que passará a exercer de forma mais acentuada uma função redistributiva.
Afigura-se-nos também como muito positivo o propósito de modificar os critérios de distribuição do FEF que adquirem maior objectividade e concorrerão para favorecer os municípios mais carenciados.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - As alterações propostas no sentido da clarificação do regime de crédito dos municípios e no domínio do retorço da autonomia das freguesias suscitamos também uma apreciação francamente concordante.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um ano e alguns meses depois de ter assumido a responsabilidade da condução dos negócios públicos do País, o Governo apresenta ao Parlamento propostas sérias, qualificadas e ousadas no âmbito do sector autárquico, que, a par do processo de criação das regiões administrativas, contribuirão para a reconfiguração do Estado e da administração pública em ordem à consumação de uma verdadeira descentralização.
O PS, no Governo, não renega o património político elaborado pelo PS na oposição. Aliás, na oposição ou no poder, a permanência das convicções constitui a incontornável garantia da coerência do discurso e prenuncia, no domínio da acção, a plena concretização das intenções anunciadas.
É esta, também, uma peculiaridade do método de governação do PS - não se iludem os compromissos, não se elidem as promessas, não se suspendem as convicções.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - É verdade que neste hiato de tempo, decorrido desde as últimas eleições legislativas, o país assistiu ao nascimento de novas vocações municipalistas e pôde até observar, certamente com algum espanto, a impetuosidade de algumas conversões no mesmo sentido. Louvando-se de antiquíssimas tradições nacionais e confessando-se prisioneiros de uma súbita paixão pela dimensão autárquica local, os neomunicipalistas entregaram-se mesmo, com escasso pudor, ao exercício público do enaltecimento dos méritos daquela que têm proclamado como a única descentralização possível.
Aplausos do PS.
O fervor que têm vindo a manifestar em tais proclamações só tem paralelo, aliás, na fúria com que atacam a regionalização. Fazem a apologia da descentralização para mais eficazmente a contrariarem, enaltecem as autarquias locais com o intuito de impedir a criação das autarquias regionais. Sem vergonha e sem recato, proclamam-se agora os méritos daquilo que pouco antes se fustigara, ofendera e vilipendiara.
Aplausos do PS.
Mas tudo isto ainda seria minimamente aceitável se estivéssemos perante uma verdadeira conversão. No fim de contas, a História está cheia de exemplos de excessos cometidos por apóstatas e neoconvertidos. Se assim fosse ainda haveria alguma compreensão - há, de resto, sempre uma parte mais cândida em cada um de nós que tende a ver em cada convertido um viandante de uma qualquer estrada de Damasco.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É verdade!
O Orador: - Desiludam-se, porém, tais nobres expectativas.
No caso do PSD, por exemplo, a ilusão da estrada de Damasco não resiste à leitura do seu projecto de lei das finanças locais; a iluminação, a haver alguma, será apenas a proporcionada pelo oportunismo demagógico e a conversão não passa de uma vulgar falácia. Bem observadas as coisas, o ímpeto descentralizador resume-se a quase nada. Atinge-se o paradoxo de exaltar o municipalismo e desconfiar das autarquias, de se enaltecer a descentralização e não se assegurar a transferência de atribuições e competências, de se proclamar a autonomia sem diminuir a dependência.
O projecto de lei do PSD não aponta no sentido do alargamento da participação das autarquias na vida política nacional, não prevê a extensão das suas responsabilidades, não lhes concede novos poderes. Em suma, não altera substancialmente o actual modelo de organização do Estado, não combate o centralismo, não aponta no caminho da descentralização.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É verdade!
O Orador: - Na verdade, tudo isto demonstra uma coisa absolutamente evidente: o PSD, neste caso, não mudou na essência, na doutrina, nas convicções mais fundas, apenas mudou de posição na geografia político-eleitoral, passou do poder para a oposição.
Aplausos do PS.
Continua a não desejar autarquias mais fortes, apenas quer exigir aos outros que transfiram por excesso o que ele não transferiu por defeito. E apresentou mesmo um projecto tão extravagante que subsiste a dúvida sobre saber se se destina preferencialmente a reforçar as finanças locais ou, antes, a debilitar as finanças públicas nacionais.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao terminar esta intervenção, quero exprimir a expectativa prevalecente no Grupo Parlamentar do PS quanto à possibilidade de se alcançar um consenso maioritário em torno das propostas de lei apresentadas pelo Governo.
Em nome da descentralização do Estado e da Administração Pública e da valorização do papel institucionalmente conferido às autarquias locais, abdicando de exageros irresponsáveis que poriam em causa o equilíbrio das finanças públicas e originariam situações conflituantes com as orientações programáticas do actual Executivo, exortamos os vários grupos parlamentares com assento neste Hemiciclo a que realizem o esforço indispensável à obtenção do consenso desejável. Pela nossa parte, garantimos um sério empenhamento nessa tarefa.
Todos temos absoluta consciência da importância do que está em causa e não compreendemos, como decerto ninguém compreenderá, que motivos fúteis ou considerações marginais possam obstruir à manifestação da disponibilidade política necessária para a consumação de entendimentos possíveis.
Pela seriedade, rigor e competência com que apresentou as suas propostas, como, hoje, aqui está a ficar bem patenteado, o Governo está a corresponder às expectativas
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neste domínio criadas e a cumprir exemplarmente o seu papel. Saibam, de igual modo, os grupos parlamentares cumprir o seu.
Aplausos do PS, de pé.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Macário Correia, Luís Sá e Gonçalo Ribeiro da Costa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Macário Correia, que dispõe de 3 minutos.
O Sr. Macário Correia (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, estávamos à espera que subisse à tribuna para falar das virtudes da proposta de lei do Governo.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não tem virtudes!
O Orador: - No entanto, não sucedeu assim, seguramente porque houve dificuldade em encontrar algum mérito nessa proposta. Aliás, o pouco entusiasmo com que os Deputados da sua bancada seguiram, quer a sua intervenção quer as anteriores, leva-nos a concluir que não há qualquer virtude a apontar a essa proposta de lei.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!
Protestos do PS.
O Orador: - Na sua intervenção, notei mais preocupações em relação a um debate que aqui teve lugar há urnas semanas do que propriamente em relação ao que é matéria da ordem de trabalhos para hoje.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Exactamente!
O Orador: - Por outro lado, até ao momento, também ficou demonstrado que, nem por parte do Governo nem da bancada do Partido Socialista, ainda ninguém explicou a razão de ser da apresentação desta proposta de lei. Se a proposta não é boa para os autarcas. se não aumenta as verbas para as autarquias, estamos aqui a fazer o quê?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Estamos a «fazer de conta»!
O Orador: - Fica ainda uma outra dúvida relevante que é relativa ao facto de existir um artigo 39.º com uma clara inovação, pela qual o Governo quer que fique consagrado que pode «dar com uma mão e tirar com a outra». Ou seja, alegando uma razão de estabilidade financeira do que tem a ver com a União Económica e Monetária, o Governo quer que fique consignado em lei que o Ministro das Finanças pode retirar dinheiro às autarquias em qualquer momento. Trata-se de uma inovação legislativa que, claramente, deve ser objecto da nossa viva repulsa.
Depois, estava à espera que V. Ex.ª demonstrasse que, com esta proposta, as autarquias do interior e as das zonas desfavorecidas iam ganhar alguma coisa. Ora, até ao momento, como nada disse sobre isto, fica a clara dúvida de não haver argumentos para demonstrar a existência dessa virtude ou, então, seguramente, fica a ideia de que não há virtude de ordem global nem de ordem relativa em relação à proposta apresentada, na medida em que o fosso de dificuldades que hoje separa os municípios do litoral e das grandes zonas urbanas dos situados no interior vai manter-se ou agravar-se, porque nem uma só palavra foi pronunciada pelo Governo ou pelo Partido Socialista sobre esta matéria!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Por último, esperava que o Sr. Deputado Francisco de Assis subisse à tribuna para fazer eco das graves preocupações que várias estruturas do PS e autarcas socialistas de diferentes zonas do País tem manifestado em relação ao Governo. Não é por acaso que veio ontem a público um comunicado da Federação Distrital do PS no Algarve contra o Governo por este adiar sucessivamente as promessas em relação ao calendário do prolongamento da Via do Infante. Aliás, vários autarcas têm referido que o Governo já adiou por quatro vezes sucessivas, em menos de dois anos, a conclusão da Via do Infante e, também, a auto-estrada para o Algarve.
Protestos do Deputado do PS Nuno Baltazar Mendes.
Também em relação aos autarcas da zona do Oeste, que têm manifestado iguais preocupações quanto ao IP6 e à questão das portagens, deveria ter havido uma palavra, porque essas expectativas estão defraudadas.
O facto de começarem a levantar-se vozes de autarcas socialistas contra este Governo é grave e deve merecer aqui uma resposta clara.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis, dispondo de 3 minutos para o efeito.
O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, estará ao meu alcance realizar algumas coisas, mas não está, notoriamente, ao meu alcance fazer com que o Deputado Macário Correia faça uma correcta interpretação das palavras que acabei de proferir da tribuna! Se, porventura o Sr. Deputado tivesse feito uma correcta interpretação, certamente ter-se-ia apercebido de que, ao longo dessa mesma intervenção, tive oportunidade de salientar dois ou três méritos fundamentais que julgo estarem associados às propostas do Governo.
Desde logo, há um mérito que considero essencial: o Governo não trouxe aqui apenas uma nova lei das finanças locais, porque aumentar os recursos financeiros disponibilizados para os municípios portugueses pode, momentaneamente, contribuir para que eles respondam de modo mais eficaz a alguns dos problemas que os afligem e possam desempenhar as suas funções de uma forma mais adequada. Isso é indiscutível.
A verdade é que só reforçamos a importância das autarquias locais nos sistema político e no sistema administrativo portugueses se ampliarmos as suas competências e atribuições ....
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - ... se expandirmos as suas responsabilidades e se aumentarmos a sua influência na vida nacional.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Esse parece-me ser, de facto, o grande mérito das propostas do Governo e também, seguramente, o grande demérito do projecto de lei do PSD.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não é verdade!
O Orador: - E é esse demérito que demonstra que o PSD não deu o salto que anuncia ter dado e, afinal de contas, não se converteu verdadeiramente às teses descentralizadoras, porque, se assim fosse, teria aproveitado uma proposta no sentido de reforçar o peso e a importância das autarquias locais na vida nacional.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mais: se o PSD ou alguns sectores do PSD quisessem, por essa via, demonstrar que se poderia atingir um objectivo, o de tornar as regiões administrativas inúteis ou meramente supletivas, a verdade é que perderam uma oportunidade histórica de fazer essa demonstração. E isso aconteceu por uma razão muito simples: essencialmente - e essa é que é a questão fundamental -, o PSD não confia, nas autarquias nem na capacidade dos autarcas portugueses; o PSD não confia na capacidade de resolução por parte dos autarcas de uma série de problemas que hoje são da responsabilidade da administração central.
Aplausos do PS.
Aliás, há pouco, um Deputado da sua bancada fez uma intervenção verdadeiramente paradigmática nesse plano e indiciadora daquela que é a vossa posição mais profunda: uma posição de temor e de receio face à eventualidade de as autarquias passarem a ter mais competências e a assumir maiores responsabilidades no conjunto da vida nacional.
Aplausos do PS.
Essa é que é verdadeiramente a grande diferença que importa salientar e enfatizar neste debate.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Todos já perceberam que os senhores, estão a fazer tudo com o intuito de descentrar o debate, porque desistiram de participar nele e querem agora importar para o território deste confronto parlamentar outras polémicas, outras questões que não deixam de ser pertinentes, mas devem ser discutidas na altura própria e em momento mais adequado.
Em relação à questão de fundo que aqui estamos a discutir, a grande diferença entre as propostas apresentadas pelo Governo e o projecto de lei do PSD é que enquanto as primeiras visam, objectivamente, alterar o modelo de organização do Estado e da Administração Pública no sentido do reforço da descentralização política, o projecto de lei do PSD visa apenas, momentaneamente e por razões que suspeitamos que sejam de um oportunismo mais rasteiro, transferir mais recursos financeiros para as autarquias locais portuguesas,...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... sem cuidar de criar condições objectivas para que elas possam, no futuro, suportar legítimas reivindicações nesse domínio.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, peço o favor de concluir.
O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
No limite, poderíamos até pensar que os senhores o fazem porque ainda têm uma vaga esperança de regressar ao poder nos próximos anos e, como as autarquias, neste entretanto, não teriam visto reforçadas substancialmente as suas competências, os senhores facilmente justificariam a anulação da legislação em vigor, tal como fizeram no passado!
Aplausos do PS.
Também já percebemos que o PSD tem uma visão do que deve ser o relacionamento financeiro da administração central com as autarquias quando está no poder e outra, diferente, quando está na oposição. Ora, também aí há uma diferença, e uma diferença de que, francamente, nos orgulhamos!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco, de Assis, a minha questão prende-se com o seguinte: a Associação Nacional de Municípios Portugueses coloca como primeiro objectivo de uma lei das finanças locais a recuperação da capacidade financeira do poder local, afectada anteriormente pela suspensão da aplicação da Lei das Finanças Locais.
Ora, julgo que é evidente para o Sr. Deputado Francisco de Assis, uma vez que, na qualidade de presidente de câmara, até protestou muitas vezes contra o incumprimento da Lei das Finanças Locais, que esta recuperação da capacidade financeira se deveria fazer efectivamente, mas não através de medidas deste tipo, como seja a de transferir os professores ou o pessoal auxiliar do ensino básico, dizendo que as autarquias pagam mas não têm qualquer poder, como já foi afirmado pelo actual Governo. Pergunto se o Sr. Deputado entende que este objectivo, objectivo este pelo qual lutou quando era oposição e que o PS prometeu, está concretizado pelas medidas aqui propostas pelo Governo.
Em segundo lugar, e para que não tenhamos de voltar, ano após ano, a protestar contra o incumprimento da Lei das Finanças Locais, era fundamental que esta passasse a ter ou o estatuto de lei orgânica, como referi, ou de lei de valor reforçado. Como o acordo do PSD não contempla esta matéria, gostava que o Sr. Deputado comentasse este aspecto, porque parece que o poder local foi esquecido.
A este propósito, de o poder local ter sido esquecido ou, melhor, mal lembrado, queria colocar uma outra questão ao Sr. Deputado Francisco de Assis. Olhando para o elenco de atribuições e competências que o Governo se
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propõe transferir para o poder local, parece-me evidente que o Governo esqueceu as regiões administrativas. Há uma série de matérias que faria sentido transferir, sim, mas para as regiões administrativas, dada a dimensão das questões que estão colocadas.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Poderia dar-lhe alguns exemplos - mas agora não tenho tempo e por isso fá-lo-ei noutra altura em que a mínima sensatez apontaria nessa direcção.
E no sentido exacto do esquecimento das regiões administrativas que vai, também, a medida aprovada pelo grupo de trabalho para as regiões administrativas, que esteve reunido esta manhã. Esse grupo de trabalho, criado pela Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, permitiu-se desrespeitar uma resolução da Comissão, aprovada, aliás, por proposta do PS. Ou seja, onde se fixava que o prazo para apresentar uma lei das áreas das regiões ia até IS de Julho, passou a constar que o mesmo ia até ao fim do mês; onde se estabelecia que a tarefa do grupo era preparar uma lei com a definição das áreas, agora diz-se que a questão das áreas será remetida para Plenário, sempre que não haja acordo e sem que se faça qualquer esforço de consenso neste contexto; por fim, onde se fixava que a base de trabalho era a opinião dos municípios, agora refere-se, pura e simplesmente, de forma implícita, que tal depende da opinião de um qualquer «barão» do PS, fazendo tábua rasa daquilo que as assembleias municipais disseram.
Creio que esta não é a atitude própria de um municipalista e de um regionalista que o Sr. Deputado gostaria de ser e que, neste momento, eventualmente contrariado, parece estar a deixar de ser.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis, tendo em conta que o seu interpelante se conteve nos 3 minutos regimentais.
O Sr. Francisco de Assis (PS): - Certamente, Sr. Presidente. Até penso que não necessitarei de tanto tempo.
Sr. Deputado Luís Sá, se bem me recordo, as reivindicações feitas pela Associação Nacional de Municípios Portugueses, ao longo dos últimos anos, foram claramente no sentido de verem ampliadas, por um lado, as atribuições e competências atribuídas à esfera autárquica e, por outro lado, os recursos financeiros que são disponibilizados para esse nível da administração. E isso está absolutamente contemplado nas propostas apresentadas, pelo Governo. .
O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente!
O Orador: - Com efeito, há uma proposta de lei quadro de alteração do regime de atribuições e competências que amplia substancialmente as áreas que passam a estar sob jurisdição municipal e, por essa via, corresponde-se a um objectivo, a uma expectativa publicamente manifestada, desde há muitos anos, pelos responsáveis da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Ao mesmo tempo, é apresentada uma nova proposta de lei das finanças locais que procura assegurar uma correcta conformação entre-as novas responsabilidades entretanto transferidas e os novos recursos entretanto disponibilizados.
Por essa razão, julgo que não há qualquer motivo para introduzir aqui um factor anómalo e até desnecessário de contestação às iniciativas legislativas promovidas pelo Governo. Elas respondem, de uma forma cabal, que até me atrevo a reputar de exemplar, a essas expectativas e reivindicações que, muita justamente e com toda a legitimidade, ao longo dos últimos anos, tem vindo a ser tornadas públicas pela Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Todavia, existe aqui um outro elemento que se deve colocar. Refiro-me aos efeitos vantajosos que podem resultar da economia de escala. Os autarcas portugueses, ao longo dos últimos anos, também têm afirmado, de forma reiterada e com sustentação objectiva e inatacável, que em muitas áreas o investimento autárquico tem uma taxa de reprodução superior ao investimento estatal. Havia até aquela velha fórmula que consistia em afirmar que um escudo gasto pelas autarquias tinha um efeito reprodutivo muito maior do que um escudo gasto pela administração central.
Havendo agora uma transferência global dei competências, de atribuições e de recursos financeiros para as autarquias, admitindo que elas vão introduzir alguma poupança, por via de uma gestão mais correcta, que decorre até de uma maior proximidade em relação aos problemas a tratar, teremos de admitir que esta situação de conformidade vai evoluir no sentido de atribuir vantagens, do ponto de vista financeiro, às autarquias locais. E essa é uma matéria que não pode ser aqui diminuída e que não pode ser esquecida. Aliás, convém que citemos os dirigentes da Associação Nacional de Municípios Portugueses em toda a extensão das suas declarações públicas e que não os citemos selectivamente, em função do maior ou menor agrado que suscitam essas mesmas declarações.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É evidente que o Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses tem de manifestar permanentemente agrado quando constata que, no Parlamento, as mais diversas organizações políticas, os mais diversos grupos parlamentares apresentam propostas que reforçam as autarquias, seja estritamente no plano financeiro, como é o caso de algumas delas, seja no plano; financeiro e no plano político mais global, como sucede com o Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Estou mesmo em crer que o Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, quando manifesta alguma, satisfação pelo facto de o PSD apresentar agora esta iniciativa, está sobretudo a manifestar um profunda surpresa pelo facto de verificar que as novas circunstâncias políticas conduziram a uma alteração substancial da posição e da postura do PSD. Mas estou certo de que se ele for interrogado sobre se as autarquias querem ter só mais recursos financeiros ou se querem reais recursos financeiros e mais competências e atribuições, a resposta que dará será no sentido de favorecer esta segunda solução, porque só esta e que prestigia verdadeiramente o universo autárquico, reforça as autonomias e garante avanços significativos no sentido da descentralização.
Mas, de resto, esta até é uma matéria em que nós, pelo menos nós dois, Sr. Deputado, temos grandes consensos e
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seria mau que pequenas querelas nos fizessem esquecer esses grandes consensos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Assis, na nossa ordem de trabalhos foram agendadas matérias relacionadas com os municípios e a sua intervenção foi gasta, na maior parte do tempo, para fazer a apologia das regiões. Ficámos com a suspeita, se não mesmo convencidos, de que teve a necessidade de utilizar esse tempo de antena, por um lado, para convencer alguns anti-regionalistas do seu partido das vantagens da regionalização e, por outro, para dar certezas ao Partido Comunista sobre quais as convicções da direcção da bancada do Partido Socialista ou da bancada do Partido Socialista, já não digo do Partido Socialista propriamente dito, sobre essa mesma matéria.
Quanto ao Partido Popular e às nossas convicções anti-regionalistas. o Sr. Deputado tem inteira razão. De facto, fazemos uma enorme apologia das autarquias locais, nomeadamente dos municípios, porque estamos convencidos de que descentralização, aproximar eleitos cios eleitores, aproximar os decisores dos destinatários da decisão, tudo aquilo que o Sr. Deputado disse da tribuna, só se consegue reduzindo os patamares e não aumentando-os, só se consegue reduzindo as despesas e não aumentando-as, só se consegue reduzindo o universo sobre o qual se tem de decidir e não aumentando esse universo.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Querem criar mais municípios?!
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Exactamente?
O Orador: - Exactamente! Tem toda a razão! E somos coerentes! Exercemos aí a nossa coerência!
Mas o Sr. Deputado referiu aqui a existência de não sei quantos grupos de trabalho em comissões para produzir trabalho legislativo e enunciou inúmeros produtos legislativos saídos desses grupos de trabalho. Explique-me uma coisa, Sr. Deputado: será que algum desses grupos de trabalho ou alguma dessas comissões já produziu uma lei das finanças regionais? Será que o PS e o Governo têm ideias sobre quanto vai custar a regionalização? Por que é que ainda não trouxeram aqui, afinal, no meio de tanta produção legislativa, essa lei?
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - E quantos são os municípios que vão cortar ao meio?!
O Orador: - É que, afinal, trouxeram uma lei de atribuições e competências às autarquias locais, incluindo as regiões, e não trouxeram, porque não foram capazes de o fazer ou tiveram vergonha ou não tiveram coragem, uma lei das finanças regionais. No mínimo, poderiam incluir nesta proposta de lei das finanças locais os custos da regionalização, os custos de funcionamento das regiões.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.
O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, não sou tão céptico ao ponto de pensar que tenho de fortalecer as convicções regionalistas da minha bancada, e, portanto, não me dirigi a ela, mas também não sou tão optimista ao ponto de acreditar que tinha capacidade para o convencer a si...
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Pode estar certo!
O Orador: - ... e, por isso, também não me dirigi à sua bancada. Fiz apenas o elogio de uma convicção profunda do Partido Socialista.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Uma convicção que não é de hoje, urna convicção que remonta aos tempos em que estávamos na oposição e que afirmamos de forma muito evidente, que contratualizamos, de alguma forma, com o País, porque era uma das bandeiras mais emblemáticas dos nossos projectos eleitorais e suscitou uma adesão maioritária por parte do povo português, uma convicção que não esmoreceu pela circunstância de transitarmos da oposição para o poder. E esta é que é verdadeiramente a novidade na história mais recente do nosso país! Antes de chegarem ao poder, quase todos os partidos com dimensão governativa...
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - A vossa convicção já foi maior!
O Orador: - ... assumiam uma paixão regionalista e assumiam publicamente a vontade de avançar no sentido da criação das regiões administrativas, mas esta é a primeira vez, na história política mais recente do nosso país,...
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - É verdade! Ouça bem!
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Vamos
O Orador: - ... que um partido político, uma vez alcançado o poder, não renega as suas posições e não põe em suspensão as suas convicções mais profundas em matéria de regionalização.
Aplausos do PS.
Isto é uma demonstração acrescida de seriedade, mas também é uma manifestação suplementar da força das nossas convicções.
Meu caro Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa, não sei, em rigor absoluto, aliás, ninguém sabe em rigor absoluto. o que vai custar a regionalização.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Ora aí está!
O Orador: - Mas sei, porque fui presidente de uma câmara municipal antes de ser Deputado nesta Assembleia da República, o que custa a inexistência das regiões administrativas.
Vozes do PS: - Muito bem!
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O Orador: - Sei o que custa no plano político, no plano económico, no plano social e no plano cultural.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!
O Orador: - E devo dizer-lhe que a circunstância de ter tido a possibilidade de desenvolver uma experiência dessa natureza foi essencial, do meu ponto de vista pessoal, para que me tornasse um convicto defensor da necessidade das regiões administrativas.
O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Fala a voz da experiência!
O Orador: - Estou certo de que alguns dos Srs. Deputados que manifestam agora a pretensão de virem a desenvolver funções autárquicas a partir de Dezembro próximo, se conseguirem fazê-lo, nem que seja como vereadores da oposição, terão encontrado circunstâncias históricas favoráveis que proporcionarão a alteração das suas posições nessas matérias.
Mas, na minha intervenção, o que eu quis fazer, essencialmente, foi o seguinte: demonstrar que este Governo e esta maioria parlamentar que o sustenta têm uma visão coerente, integrada e muito séria do processo de redefinição do modelo de organização do Estado e da Administração Pública portuguesas.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): Tirando os custos!
O Orador: - Temos a noção exacta de que o nosso modelo de organização é um modelo altamente centralizado, com todas as consequências negativas que daí decorrem, quer no plano da desincentivação da participação dos cidadãos na vida pública, quer no plano do incremento da irracionalidade na gestão dos investimentos públicos, quer no plano da resolução de alguns dos principais problemas sociais e até no plano cultural. E justamente porque temos esta convicção pensamos que é preciso avançar, de uma forma arrojada e determinada, no sentido da promoção de uma efectiva descentralização do Estado e da Administração Pública portugueses. E essa descentralização, na nossa perspectiva, tem dois níveis e manifesta-se em dois patamares diferentes: um patamar regional e um patamar local. Do patamar regional, já falámos no passado e falaremos dentro em breve, aqui, de novo, nesta Assembleia da República, do patamar local, estamos hoje afalar. E o que conseguimos demonstrar é que só nós valorizamos de uma forma autêntica e efectiva esse patamar local.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Não é verdade!
O Orador: - O que se pode concluir deste debate é que já se sabia que só nós, e, nesta matéria, o Partido Comunista, éramos convictamente regionalistas. Mas também se pode concluir que só nós somos verdadeiramente municipalistas.
Aplausos do PS.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não se embriague com as palavras, porque depois perde o sentido!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Permitam-me, antes de mais, que diga que mal estaria o País se apenas o Partido Socialista fosse adepto do municipalismo. O «orgulhosamente sós», nesta matéria, era muito mau e creio que este tipo de intervenção fica muito mal ao Sr. Deputado Francisco Assis, que, de resto, não acredita, com certeza absoluta, naquilo que diz.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este é um debate num tempo errado e com um objecto errado.
É corado no tempo, porque o Governo não apresentou a sua proposta de lei das finanças locais na altura própria. Obriga, com intervalo de pouco tempo, a repetir aqui um debate há poucas semanas travado e na sequência do qual foram aprovados três projectos de lei, como, eventualmente, a proposta de lei do Governo poderia ter tido o destino que viesse a ser decidido.
É errado no objecto, porque o Governo, com a proposta de lei das finanças locais, procura legitimar os cortes de verbas e o incumprimento da Lei das Finanças Locais em anos sucessivos, mas tenta disfarçar esse facto, misturando as finanças locais com os novos encargos, para fazer acreditar que qualquer aumento de receitas das autarquias teria de estar ligado a uma imposição de novos encargos.
Ora, o nível de financiamento deve ser debatido e definido para o actual nível de encargos. Novas atribuições deverão ter um financiamento próprio, a estabelecer caso a caso.
A actual proposta de lei-quadro de atribuições e competências dos municípios traduz uma clara linha de desresponsabilização do Estado em áreas de intervenção e investimento público fundamentais para garantir os direitos sociais e a qualidade de vida das populações.
Estamos perante um processo que, inevitavelmente, se tornaria numa transferência de encargos realizada na base da insuficiência de meios que hoje estão destinados aos municípios e que contribuiria para aumentar esta insuficiência.
A preocupação fundamental, reiteradamente sublinhada nas declarações governamentais, de que estas transferências não poderão representar um aumento da despesa pública, significa que as autarquias não disporão de meios suficientes para elevar os baixos níveis de atendimento e satisfação de necessidades públicas, não poderão concretizar os investimentos reclamados pela população, herdando, assim, o descontentamento político que, por esta forma, seria transferido para o poder local.
Tomemos alguns exemplos.
O Governo não investiu no combate aos fogos florestais, como o PS e o seu Primeiro-Ministro tantas vezes prometeram, não investiu na habitação social, o que as declarações feitas permitiriam supor; não colocou na rua nem uma parte dos polícias que afirmou fazerem falta. E, neste plano, aquilo que está adiantado na proposta de lei não são meras competências administrativas na área do urbanismo ou do trânsito, são competências na área da segurança e tranquilidade públicas. Além disso, falta também pessoal nos escolas do ensino básico. Agora, as autarquias passariam a ser responsáveis por tudo ou quase tudo isto. O descontentamento seria transferido da porta dos ministérios para a porta das câmaras, enquanto o
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Governo se gabaria de descentralizar e de aumentar os recursos do poder local.
O Sr. Reagan ou a Sr.ª Thatcher preconizavam o fim ou a diminuição drástica das responsabilidades públicas. O PS e o Governo, na esteira do PSD, dizem que as responsabilidades devem ser públicas, simplesmente boa parte delas deve passar a ser das autarquias.
A prioridade, neste quadro, é o euro e o corte das despesas, os lesados são o poder local e as populações.
A verdade é que, no elenco de atribuições e competências a transferir, predominam a indefinição, meras funções
burocráticas, de «pagadoria», desligadas de uma participação efectiva na gestão e direcção dos processos. Além do mais, são áreas onde, devido ao acumular de carências decorrentes de um insuficiente investimento público nos últimos anos, a insatisfação popular é acentuada.
O Sr. Ministro da Educação, por exemplo, já se encarregou, aliás, de dizer que as autarquias passarão a pagar aos professores do ensino básico, mas não terão qualquer papel efectivo nesta matéria, a não ser o de receber dinheiro e pagar.
Noutros casos, predomina a perplexidade completa, tal como em alguns exemplos já aqui referidos. Fica a impressão de que o que o Governo, verdadeiramente, quer é livrar-se de obrigações dizendo que a culpa dos problemas é dos municípios.
A lei-quadro adianta, aliás, propostas em áreas que tornam legítimas as suspeitas sobre as verdadeiras intenções do «autor» quanto ao empenho no processo da regionalização. É dificilmente explicável a apresentação de uma lei-quadro sobre transferência de competências com a extensão que esta apresenta sem incluir o nível regional na delimitação que agora se propõe. Há pouco, o PS não respondeu à questão que lhe foi colocada a respeito de o grupo de trabalho criado por uma comissão parlamentar não respeitar essas decisões, atrasar os prazos e os critérios de definição das áreas regionais.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Esta proposta decorre de uma concepção orientada numa lógica de reforço da figura da contratualização na relação entre níveis de Administração Pública. Este princípio, em abstracto, é vantajoso se for usado de acordo com critérios objectivos e de transparência e com regras bem definidas, porque pode dotar a Administração de uma flexibilidade que de outra forma pode não existir. Com a prática conhecida, entretanto, ela pode ser contrária à autonomia e prestar-se a acções discriminatórias, como muitas vezes tem acontecido basta lembrar o que aconteceu com os, tristemente, célebres contratos-programa ou com a gestão de outras verbas, particularmente alguns fundos comunitários. Infelizmente, em Portugal, muitas vezes «contratualização» é um eufemismo que designa manipulação, discriminação, favores e desfavores pessoais e partidários.
É paradigmático que o Governo tenha decidido aprovar uma lei-quadro sobre esta matéria à margem da Associação Nacional de Municípios e dos municípios. Com efeito, estava constituído um grupo de trabalho entre o Governo e a ANMP com o fim de se debruçar sobre esta questão, mas a maioria das atribuições e competências que agora o Governo adianta para transferência nunca tinham sido objecto de qualquer alusão. ou consideração, estando outras consagradas em termos que já foram rejeitados pela ANMP.
A proposta de lei de finanças locais, por seu lado, estabelece um montante de transferências para as autarquias, que mantém sem alteração significativa a verba à disposição dos municípios, contrastando com as promessas do PS e com a sua actuação na oposição, em que tantas vezes denunciou o incumprimento da actual Lei de Finanças Locais.
O que importa, nesta matéria, entretanto, é que o grupo de trabalho para as finanças locais, já constituído, inicie rapidamente a ponderação das propostas existentes para, em estreita conjugação com a ANMP, chegar à elaboração de um texto consensual.
O que pretendemos é um novo regime financeiro, que assente num Fundo de Equilíbrio Financeiro mais redistributivo e numa participação reforçada na partilha dos impostos nacionais - e refiro-me, em particular, ao IRS. Propomos estabelecer uma base que afecte aos municípios um montante inicial que vise repor a verdade na aplicação da actual lei. Queremos adoptar um novo critério de variação do FEF, garantindo mais equidade no participação das receitas públicas e melhor defesa face à alteração das conjunturas económicas.
Propomos melhorar a redistribuição do FEF através da opção por critérios mais simplificados, justos e transparentes. Apostamos no reforço da capacidade financeira das freguesias, tornando-as autónoma e directamente ligadas ao Orçamento do Estado. Queremos consagrar disposições que impeçam a transferencia forçada e sem meios de novos encargos e a redução de receitas por via das isenções em impostos, cujas receitas revertem para os municípios.
A proposta de lei, aqui, em debate é negativa e não corresponde aos objectivos fundamentais que deveria visar.
Procuraremos enfrentar a questão das finanças locais com seriedade e rigor e não como arma de arremesso. Não temos paciência para conflitos virtuais entre partidos que os encenam e depois se entendem, em tudo ou quase tudo o que é fundamental, com destaque para a revisão constitucional, as prioridades da política comunitária e tantas outras questões.
O voto contra a proposta de atribuições e competências significa rejeitar o conteúdo da lei e o seu espírito, em particular a afirmação de que novos meros para as autarquias terão de significar novos e pesados encargos, com recursos financeiros insuficientes. Rejeitamos também a forma de procedimento, em particular a ruptura do trabalho com a ANMP e o carácter vago e indeterminado de muitas propostas.
Se a proposta de lei de finanças locais vier, eventualmente, a baixar à comissão especializada, apenas significa que ela se deve juntar às outras para que o grupo de trabalho elabore uma lei de finanças locais. E a lei a aprovar terá de ser muito diferente desta proposta para merecer o mínimo de aceitação da nossa parte, da parte da ANMP e das autarquias.
Aplausos elo PCP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Deputado José Junqueiro inscreveu-se para pedir esclarecimentos, porém, o Sr. Deputado Luís Sá não tem tempo para responder, a não ser que o Sr. Deputado José Junqueiro utilize um minuto no seu pedido de esclarecimento e ceda o outro minuto do seu partido ao Sr. Deputado Luís Sá.
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3 DE JULHO DE 1997 3139
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, com o devido respeito, o PS tem algum tempo para formular esta pergunta, mas creio que a generosidade da Mesa poderá colaborar num tempo para a devida resposta.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Bom, Sr. Deputado, convém não abusar da generosidade da Mesa, que hoje, de facto, esteve muito generosa.
No entanto, dada a matéria de fundo que hoje é aqui tratada, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro, solicitando-lhe
que seja breve.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, a verdade é que na proposta de transferência de atribuições e competências para as autarquias locais, que o Governo apresentou, há uma inovação substancial que a distingue de tudo quanto foi apresentado aqui em matéria de lei de finanças locais.
Os senhores, como a restante oposição, mantiveram da Lei n.º 1/87, o artigo 3.º, prevendo a transferência de atribuições e competências no futuro. Mas devo dizer que nenhum dos partidos políticos da oposição teve a preocupação de descentralizar e tirar poderes ao poder central e dar mais poderes ao poder local. E aquilo que o Governo faz é deixar de gastar pelo poder central e passar a gastar mais pelo poder local.
Esta vontade descentralizadora também nos caracteriza, mas é para nós objecto de alguma admiração que, para quem
defende a regionalização e a descentralização, ela não seja acompanhada no vosso projecto ou então num voto afirmativo no sentido de discutir e melhorar aquilo que for possível melhorar nesta mesma proposta de lei.
Segunda questão: a lei das finanças locais que o Governo apresenta aumenta efectivamente a transferência de verbas para as autarquias e, contrariamente àquilo que foi dito aqui, hoje, pela
Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, aquilo que corresponderia, em 1998, ao Orçamento e à fórmula de cálculo era um aumento substancial para 260 milhões de contos e, em 1999, para 293 milhões de contos. É que a Sr.ª Deputada - e pergunto-lhe se confirma ou não - baseou-se numa fórmula imaginária e, de facto, não foi capaz de apresentar aqui a base de cálculo com que tentou iludir toda a bancada.
Terceira e última questão: consideramos decisivo para o poder local o retorço das suas competências. Gostaria de saber, concreta mente, Sr. Deputado, se o PCP está ou não disposto a colaborar neste estorço de descentralização, de reforço do poder local já nesta fase, para podermos passar a uma fase seguinte de reforço ainda maior do poder local, que é a constituição em concreto das regiões administrativas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - A Mesa cede dois minutos ao Sr. Deputado Luís Sá, para responder.
O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, agradeço a generosidade da Mesa.
Sr. Deputado José Junqueiro, quero apenas referir que aquilo que está actualmente previsto na Lei n.º 1/87, em matéria de encargos, é um conjunto de regras muito definidas, isto é, durante dois anos, a verba para cada nova competência que é transferida é discriminada município a município no Orçamento do Estado. E isto tem uma razão de ser muito clara: é que os municípios, que elaboraram em conjunto com os partidos a Lei n.º 1/87, tinham experiências extremamente negativas. Falemos, por exemplo, na experiência da transferência dos transportes escolares, em que as verbas foram claramente insuficientes.
Se o Sr. Deputado leu o projecto de lei do PCP verificou que, por exemplo, é adiantada uma proposta no sentido de passar de dois para quatro anos a discriminação da respectiva verba. E isto com um objectivo: é que somos a favor da transferencia de competências, mas acompanhada das devidas verbas, com toda a clareza, e não apenas para a Administração Central reduzir o investimento que deveria fazer e não faz. É este o problema fundamental que está colocado.
De resto, se esta proposta de lei de atribuições e competências não for aprovada, vão acontecer duas coisas: primeira, as propostas de descentralização que aqui estão já constam de outros diplomas, como, por exemplo, a lei da gestão hoteleira, a lei de turismo. E, em matéria de fixação de contingentes de transportes de automóveis de aluguer, já está igualmente estabelecido noutro diploma. Portanto, o que aqui está é inútil!
Segunda, há outras coisas que estão por regulamentar. Fala, por exemplo, em apoiar as zonas agrárias. O que é apoiar as zonas agrárias? E fazer os edifícios? É pagar ao pessoal, tal como aos professores? Isto é, há aqui n exemplos em que há uma perfeita indefinição.
Portanto, eu diria que, nas coisas que são concretas, elas podem ser feitas por outros diplomas, até já está a ser feito; nas outras coisas que são vagas..., inclusive as declarações que são feitas, por exemplo, pelo Sr. Ministro da Educação são altamente inquietantes. Ou seja, as autarquias têm uma função de pagadoria, uma função burocrática - e isto não significa poder real.
Quanto a isto, Sr. Deputado, como há-de compreender no seu íntimo, se calhar, o Sr. Deputado não está de acordo, ... .
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Mas ele é independente!
O Orador: - ... tal como de certeza que, acreditando eu que quer mesmo regionalizar, não está de acordo com a proposta que subscreveu esta manhã, que ó tudo menos favorável à regionalização.
O Sr. Deputado, no seu íntimo, anda muito contrariado, anda a sofrer muito, e só desejo que se empenhe mais na luta do seu partido para que este deslizar numa determinada direcção não vá tão longe e que, finalmente. haja aqui, em matéria de regiões, de municípios, de poder local, algum cumprimento daquilo que o PS prometeu aos portugueses e com o qual obteve a vitória em
1 de Outubro de 1995.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrado o debate.
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, pelas 15 horas, com um período da ordem do dia, do qual consta a interpelação ao Governo n.º 10/VII, sobre política geral de ambiente centrada nas questões do ordenamento do território e dos resíduos, da iniciativa de Os Verdes.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 55 minutos.
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3140 I SÉRIE - NÚMERO 88
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Domingos Fernandes Cordeiro.
Joaquim Moreira Raposo.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Partido Social Democrata (PSD):
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Carlos Alberto Pinto. José Augusto Gama.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Henrique José de Sousa Neto.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Ernesto Figueira dos Reis.
Júlio Meirinhos Santanas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Mário Manuel Videira Lopes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Raimundo Pedro Narciso.
Raúl d' Assunção Pimenta Rêgo.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Victor Brito de Moura.
Partido Social Democrata (PSD):
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Roleira Marinho.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
José Mário de Lemos Damião.
José Mendes Bota.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP):
João António Gonçalves do Amaral.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
DIÁRIO da Assembleia da República
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