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Quinta-feira, 16 de Outubro de 1997 89 I SÉRIE - NÚMERO 3

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

VII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 15 DE OUTUBRO DE 1997

Presidente: Exmo. Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou «aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 420/VII, das propostas de resolução n.º 72 e 73/VII, de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP) falou sobre os principais temas abordados nas jornadas parlamentares do seu partido, realizadas durante o semana, após n que respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Luís Marques Guedes (PSD).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira (PS) congratulou-se com a aprovação, em Conselho de Ministros, da anteproposta de lei de Finanças das Regiões Autónomas dando depois resposta a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Lalanda Gonçalves (PSD) e Arlindo Oliveira (PS).
O Sr. Deputado António Dias (PS) trouxe à colação alguns dos problemas mais prementes dos concelhos do distrito de Viana do Castelo. No fim respondeu a pedidas de esclarecimento do Sr. Deputado Augusta Boucinha (CDS-PP).

Ordem do dia. - Procedeu-se à discussão na generalidade, do projecto de lei n.º 292/VII (CDS-PP) - Revê o Regime Jurídico de Segredo de Justiça, tendo intervindo, a diverso título, os Srs. Deputados Luís Queiró (CDS-PP), Odete Santos (PCP), Joaquim Sarmento, (PS) e Calvão da Silva (PSD).
Foram discutidas, igualmente na generalidade, as propostas de lei n.os 95/VII - Estabelece n regime de negociação colectiva e a participação dos trabalhadores da Administração pública em regime de direito público e 106/VII - Altera n Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho (Princípios gerais em matéria de emprego público, remunerações e gestão de pessoal da Administração Pública). Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro Adjunto (Jorge Coelho), os Srs. Deputados Moreira da Silva (PSD), Rodeia Machado (PCP), Marta José Nogueira Pinto (CDS-PP) e Barbosa de Oliveira e Osório Gomes (PS).
A Câmara «provou ainda um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à retoma de mandato do Sr. Deputado do PS Daniel Bessa, seguida do pedido de renúncia do mesmo e da sua correspondente substituição.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas.

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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel António dos Santos.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rocinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro. António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.

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Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projecto de lei n.º 420/VII - Referendo sobre a regionalização (PSD), que baixa à 1.ª Comissão; propostas de resolução n.os 72/VII - Aprova, para Ratificação, o Acordo de Cooperação no domínio da Defesa entre a República Portuguesa e a República de Angola, assinado em Luanda, em 3 de Outubro de 1996 -, que baixa às 2.ª e 3.ª Comissões e 73/VII - Aprova, para Ratificação, o Acordo Europeu que Cria uma Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados membros, agindo no âmbito da União Europeia, por um lado, e a República da Eslovénia, por outro, e respectivos Anexos e Protocolos, bem como a Acta Final com as Declarações, que baixa às 2.ª e 9.ª Comissões.
Entretanto, relativamente à ratificação n.º 34/VII (PSD), informa-se que todas as propostas de alteração foram rejeitadas com votos contra do PS e do PCP e a abstenção do CDS-PP, pelo que esta iniciativa caducou.
Foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos:
Na reunião plenária de 2 de Outubro: ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral; ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado António José Dias; aos Ministérios das Finanças e da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Jovita Manas; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Antão Ramos; à Secretaria de Estado da Administração Educativa, formulado pela Sr.ª Deputada Paula Cristina Duarte; ao Ministério da Solidariedade e Segurança Social, formulados pela Sr.ª Deputada Filomena Bordalo; aos Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Teresa Patrício Gouveia e Rui Rio; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Lino Carvalho.

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Na reunião plenária de 3 de Outubro: ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Lacão; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe.
No dia 7 de Outubro: às Secretarias de Estado da Administração Interna, da Administração Local e Ordenamento do Território, formulado pelo Sr. Deputado Barbosa de Oliveira; a diversos Ministérios e ao Instituto Nacional de Estatística, formulados pelos Srs. Deputados Maria Celeste Correia e Lemos Damião; aos Ministérios da Educação e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Jorge Roque Cunha; e ao Ministério da Economia, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Arlindo Oliveira e Bernardino Soares.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, vamos dar início ao período das declarações políticas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Decididamente o Governo e certas forças políticas parecem querer transformar o País numa realidade formal e virtual.
Dois factos recentes aí estão a demonstrar isto mesmo: as propostas de perguntas para o referendo europeu e a propaganda do Governo em torno do Orçamento do Estado e dos indicadores macro-económicos.
Durante anos, PS e PSD opuseram-se à ideia de ouvir o povo sobre o processo de integração europeia. Receosos da resposta, com os exemplos da Dinamarca e da França, PS e PSD foram recusando o referendo particularmente num período em que tal era absolutamente necessário, quando da ratificação do Tratado de Maastricht, impedindo assim um verdadeiro debate nacional.
Era então que se colocava em discussão o núcleo essencial que determinava o caminho «federalista» da União Europeia: moeda única, critérios de convergência, perdas decisivas de soberania.
Pressionados pela vontade da opinião pública e pelos mais variados sectores da vida nacional, PS e PSD lá foram obrigados, timidamente, a entreabrir a porta, na última revisão, à possibilidade constitucional do referendo. Mas tudo fizeram para negar aos portugueses a possibilidade real de se pronunciarem sobre o que de verdadeiramente essencial está em debate.
As perguntas propostas pelo Governo e pelo PSD vêm nessa linha: são vazias de conteúdo e constituem, por si só, a demonstração cabal de que o «bloco central» quer transformar o referendo europeu numa monumental farsa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Perguntar aos eleitores, como propõe o Governo, se «Portugal deve continuar a participar na construção da União Europeia que resulta do Tratado de Amsterdão», é perguntar o que não está posto em causa, já que nenhuma força política coloca a questão de Portugal não participar na construção europeia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É, pois, uma pergunta manipuladora e de resposta assegurada.
Igualmente, as restantes perguntas propostas pelo PSD, são perguntas que não colocam aos portugueses qualquer questão sobre as quais haja pontos de vista divergentes e para apuramento dos quais se justifique consultar o País.
Perguntar aos portugueses se querem que a União Europeia combata o desemprego ou a criminalidade é, obviamente, uma fraude e uma fantochada; é fazer uma pergunta de resposta óbvia, com o objectivo de, a partir dos resultados encontrados, procurar extrapolar conclusões abusivamente com vista a uma «legitimação» de todas as políticas e orientações de Maastricht.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Por que é que não ensaiavam a pergunta inversa? Como perguntarem, por exemplo, se os portugueses estão de acordo com políticas que provocam mais desemprego, mais precaridade e mais desigualdades.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Governo e PSD não querem, assim, fazer um verdadeiro referendo europeu. Querem, sim, manipular o instituto do referendo e a vontade de debate e de intervenção dos portugueses.
O PCP considera que a pergunta a ser colocada deve conter, sempre no respeito pelos limites constitucionais, questões verdadeiramente essenciais, sobre as quais haja opiniões divergentes entre as forças políticas e no País e que por isso exijam um apuramento da vontade dos portugueses. Uma pergunta que não pode deixar de ter em conta o quadro histórico concreto e o núcleo de problemas fundamentais associados ao Tratado de Amsterdão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Foi esta uma das questões que debatemos nas Jornadas Parlamentares do PCP, realizadas este fim-de-semana, em Faro.
O que o Tratado de Amsterdão levanta como questão central é a evolução da integração europeia no sentido de haver cada vez maiores transferências de soberania e na qual se insere o abandono do escudo como moeda nacional e o Pacto de Estabilidade com pesada multa aos países que não cumprirem os critérios de Maastricht. É isto que está em causa. É sobre isto que se divide a opinião das forças políticas e dos portugueses. É sobre esta questão essencial que aos portugueses deve ser dada oportunidade de se pronunciarem.

O Sr. José Calçada (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Com este objectivo vamos apresentar hoje um projecto de resolução com a seguinte pergunta a considerar para o referendo: «Concorda que a evolução da integração europeia implique maiores transferências de soberania, desde a supressão do escudo e a imposição de multas aos países que não cumpram os critérios de Maastricht até as novas transferências previstas no Tratado

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de Amsterdão?» É esta a pergunta que se deve fazer aos portugueses.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Não se importa de repetir, Sr. Deputado?

O Orador: - Se o PS e o PSD querem, de tacto, um referendo com sentido útil; se não têm medo de apurar a vontade dos portugueses, explicitando e não escondendo as questões essenciais que estão inscritas no Tratado de Amsterdão, então têm aqui, Srs. Deputados, uma pergunta com sentido que fará do referendo não um acto formal e manipulador mas um momento importante de auscultação da vontade soberana dos portugueses sobre o futuro dê Portugal.

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um outro facto, sobre o qual também se debruçaram as Jornadas Parlamentares do PCP, tem a ver com o Orçamento do Estado e as alegadas boas performances da economia portuguesa.
O primeiro comentário, Srs. Deputados, é que o Governo e a União Europeia parecem sofrer de autismo político, confundindo os seus desejos e os seus abstractos indicadores macro-económicos com a realidade económica e social que os cerca.
Numa Europa onde o desemprego cresce inexoravelmente: num País, como Portugal, onde se mantém o desemprego estrutural e em que a sua redução estatística é conseguida à custa de limpeza de ficheiros e de inexplicáveis aumentos de mais de 60 000 activos na agricultura; num País onde 88% das pensões de velhice e 86% das pensões de invalidez não ultrapassam os 30 000$; num País onde, praticamente, só pagam impostos os trabalhadores por conta de outrem; num País onde uma parte significativa da actividade económica e da estrutura produtiva estão extremamente fragilizados, vulneráveis e nem sequer estão a beneficiar dos resultados conjunturais provocados pelas grandes obras públicas; num País assim, como Portugal, falar de boas performances na economia é ignorar a realidade e confundir as médias dos indicadores macro-económicos com as dificuldades dos trabalhadores, dos reformados, dos jovens, de milhares de pequenas empresas, de muitos sectores de actividade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas já agora - e este é o segundo comentário -, se a economia vai tão bem, desafiamo-vos, Srs. Deputados, a traduzirem esses bons resultados em medidas que melhorem a vida de quem trabalha e dos mais desprotegidos. Se a economia vai tão como a pregoam, desafiamo-vos a aceitarem que os aumentos salariais tenham em conta não só a prevista taxa oficial de inflação mas também os ganhos de produtividade e a necessária aproximação ao nível médio dos salários europeus. Desafiamo-vos a aceitarem um aumento extraordinário das pensões de reforma de 3000$ para todas as pensões inferiores ao salário mínimo nacional (matéria que, aliás, pelas últimas notícias, o PSD já deixou cair). Desafiamo-vos a aceitarem uma redução da carga fiscal sobre os rendimentos de trabalho e a reduzirem os benefícios fiscais não produtivos sobre o capital. Desafiamo-vos a que façam cumprir efectivamente a redução do horário de trabalho para 40 horas, sem subterfúgios.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Se não aceitam estas propostas, é porque de duas uma: ou os alegados «bons indicadores macro-económicos» não existem de facto ou, então, esses apregoados bons resultados da economia traduzem-se unicamente em aumento dos lucros para o capital, em aumento das receitas do Estado com vista à moeda única e este ano em aumento vultoso, diga-se (mais 27%), das transferência para as regiões autónomas, eventualmente tendo em vista assegurar o voto favorável para o Orçamento de alguns Srs. Deputados do PSD.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Pode, pois, o Sr. Primeiro-Ministro estar descansado: já tem o Orçamento aprovado e até o PSD pode ensaiar alguma táctica de aparente distanciamento, nem precisa de mandar calar os ministros, para evitar a repetição das incómodas (mas verdadeiras) declarações do Ministro Sousa Franco, como a de que o «chumbo do Orçamento» não teria consequências graves para a economia portuguesa.
Está, assim, tudo na paz dos deuses! A economia vai virtualmente bem; o Orçamento vai passar; os lucros do capital continuarão a aumentar; os desempregados vão continuar a existir; os reformados vão continuar com pensões de miséria; as desigualdades sociais e regionais vão manter-se, o PSD e o PP continuarão, no essencial, a estar de acordo com as políticas do Governo.
Bem haja!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, ouvi com atenção a sua intervenção e vou referir-me à primeira parte, que tem a ver com o referendo europeu, uma vez que aí até citou, directamente o PSD.
Sr. Deputado, com toda a franqueza, devo dizer-lhe que, em matéria de perguntas capciosas, que eventualmente indiquem, de uma forma mais ou menos clara, o tipo de resposta a ser dada pelo eleitorado, pelos vistos, temos muito a aprender convosco. Àquela pergunta que ouvi o Sr. Deputado fazer estou convencido de que até Jacques Delors votaria contra.

Risos do PS.

O Sr. João Amaral (PCP): - Ai é...!

O Orador: - Não tenho grandes dúvidas. Portanto, Sr. Deputado, temos de nos conduzir às realidades das coisas.

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As perguntas propostas pelo PSD, para serem discutidas por esta Câmara, têm a ver com uma questão muito simples: não somos nós que temos a culpa de o Tratado de Amsterdão ter tido um conteúdo fraco e pouco substantivo como teve. Agora, uma vez que o que estará em causa são as questões determinantes ou matérias relevantes do Tratado de Amsterdão, não podemos deixar de perguntar sobre aquilo que se decidiu em Amsterdão. Não podemos fazer de outra maneira, Sr. Deputado, e o seu partido e o Sr. Deputado, que, com coerência, sempre têm vindo a defender e a pugnar pela defesa e pelo respeito da Constituição da República, convirão comigo que não se poderá fazer de outra maneira.
A Constituição da República, quer os senhores gostem ou não, diz claramente que o que se tem ou se pode perguntar em referendo sobre esta matéria são as questões relevantes que decorrem do Tratado. E o PSD propõe, de facto, que se façam perguntas sobre o que se passou em Amsterdão. É evidente, Sr. Deputado, que também não iludimos a questão mais geral, de não frustrar os portugueses, relativamente à prossecução da nossa integração na construção europeia. Para isso colocamos lá a pergunta de ordem genérica, a pergunta mais ampla.
Relativamente a isto, gostaria de saber se o Sr. Deputado não entende de facto que a pergunta de âmbito geral proposta pelo PSD é passível de um debate político sério na campanha do referendo junto do país, junto dos portugueses, no sentido de se esclarecer todos os eleitores, todos os cidadãos nacionais, das vantagens e inconvenientes e eventualmente das alternativas, porque é também muito importante que se esclareça os portugueses disso, à prossecução do nosso, empenhamento na construção europeia.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Gostaria que o Sr. Deputado me esclarecesse sobre se, do seu ponto de vista, estarão ou não reunidas condições, com uma pergunta daquele tipo, para um debate e um esclarecimento político adequado do eleitorado por forma a que ele possa pronunciar-se conscientemente sobre o caminho que há 10 ou 12 anos vimos trilhando na construção europeia e que, pela parte do PSD, inequivocamente queremos continuar.
Uma última questão, Sr. Deputado Lino de Carvalho, e muito rapidamente: aparentemente, o PCP só gosta de referendos e só pugna por eles quando está contra, porque nunca vi qualquer entusiasmo da sua bancada em referendar a regionalização deste país. Assim, gostaria de saber por que é que à Europa diz «sim» e à regionalização diz «não»?

Aplausos do PSD.

O Sr. João Amaral (PCP): - Somos a favor da soberania nacional!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, antes de começar a responder ao Sr. Deputado Luís Marques

Guedes, gostaria de saber se algum Sr. Deputado do PS se inscreveu para me pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Não, Sr. Deputado.

O Orador: - É sinal que estão de acordo com as questões que levantei.
Sr. Deputado Luís Marques Guedes, em primeiro lugar, quero sublinhar a sua significativa confissão ao declarar que, se a pergunta no referendo fosse a que o meu partido vai apresentar hoje em projecto de resolução, toda a gente, até o Jacques Delors, votaria contra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Então, o Sr. Deputado está de acordo em que, se a pergunta abranger aquilo que é o núcleo essencial da discussão, as transferências de soberania e tudo o que lhe está associado, porque é esta a questão central em discussão, mesmo no Tratado de Amsterdão, o povo português votaria contra por se opor a esse processo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não é isso que está em causa. É uma pergunta capciosa!

O Orador: - É uma confissão significativa, Sr. Deputado, e que explica melhor do que outra, que é o resto da sua pergunta, as razões por que tanto os senhores como o PS procuraram encontrar uma pergunta que fosse vazia de conteúdo, que não explicitasse as questões centrais inerentes ao Tratado de Amsterdão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Porque, como o Sr. Deputado sabe e referiu, há no Tratado de Amsterdão, apesar das alterações relativamente limitadas, questões importantíssimas e essenciais de transferência de soberania, por exemplo, ao nível do 3.º Pilar, que os senhores ignoram completamente na vossa pergunta, como, aliás, o PS também ignora. E o Sr. Deputado também não pode pôr de parte que o Tratado de Amsterdão e as novas transferências de soberania que resultam dele estão inscritas num contexto histórico, que é preciso discutir e clarificar com os portugueses, porque são essas as questões subjacentes àquilo que foi depois a prossecução do Tratado de Maastricht com o Tratado de Amsterdão e as novas transferências de soberania. Estão subjacentes as outras questões que explicitamos na pergunta que propusemos. Isto é, o núcleo essencial da pergunta, como o Sr. Deputado refere, é: se os portugueses concordam ou não com as novas transferências de soberania previstas no Tratado de Amsterdão, enquadradas obviamente nas questões históricas concretas que estão subjacentes a todo o processo de transferência de soberania. E é isso, Sr. Deputado, que os senhores procuram não explicitar nas vossas perguntas.
Se há perguntas capciosas, Sr. Deputado, se há perguntas de resposta assegurada, se há perguntas que não colocam os portugueses perante o núcleo essencial dos problemas que o Tratado de Amsterdão traz para o futuro de Portugal, obviamente são as perguntas do PS e do PSD.

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Se formos para um referendo nos termos em que os senhores propõem ao PS, não iremos discutir algo de essencial, não iremos discutir algo que separe os portugueses em matéria de opiniões ou de forças políticas, que torne possível apurar uma resposta; iremos discutir questões de resposta assegurada, passando ao lado daquilo que são as questões essenciais. É a isso que nos opomos e é por isso que apresentamos um projecto de resolução com uma pergunta alternativa à vossa e à do PS.

Aplausos do PCP.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, pareceu-me ouvir uma preocupação do Sr. Deputado Lino Carvalho ao perguntar se o PS não se inscrevia.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Foi uma constatação, Sr. Deputado!

O Orador: - Ficámos sensibilizados! Conhecemos a atenção com que ele nos ouve sempre! Estávamos atentamente a ouvir uma parte das conclusões das Jornadas Parlamentares do PCP, que ouvimos com todo o respeito, o que não quer dizer que tenham trazido grandes novidades.
Quanto ao Orçamento do Estado, temos um longo mês para discuti-lo e o Sr. Deputado Lino de Carvalho verá que, certamente, algumas das questões que levantou terão a resposta adequada durante esse debate.
Quanto ao Tratado de Amsterdão, certamente que o Sr. Deputado Lino de Carvalho, quando ler a proposta do PS, verá que ela é abrangente e global e não se trata, efectivamente, daquela pergunta que formulou aqui e que já se sabe qual é a resposta.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, quer precisar qual é a sua interpelação à Mesa, para que lhe possa responder?

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa era para confirmar que o Sr. Presidente disse que o Grupo Parlamentar do PS, efectivamente, não se inscreveu.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Então, era um esclarecimento à Mesa. Nessa conformidade, a Mesa sente-se dispensada de dar-lhe resposta.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Também é para interpelar a Mesa?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É no mesmo sentido que o Sr. Presidente já interpelou o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, que é o de saber se, de facto, através da interpelação, o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira e o Partido Socialista não estavam a querer intervir no debate, não colocando directamente ao orador - neste caso a mim próprio - as questões que deveriam ter colocado no momento próprio.
Seguramente, Sr. Presidente, foi porque o PS não queria ser confrontado com a nossa argumentação, não queria ser confrontado com as declarações do Ministro Sousa Franco em Bruxelas e com a chamada à ordem do Primeiro-Ministro António Guterres ontem no Conselho de Ministros para que ninguém mais fale sobre as consequências do chumbo do Orçamento.

O Sr. João Carlos Silva (PS): - O debate do Orçamento é para a semana!

O Orador: - Foi a este debate que o PS se furtou e procurou fazê-lo através da interpretação abusiva da interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, as conclusões que tira da interpelação do Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira são da sua exclusiva responsabilidade.
Para fazer uma comunicação à Assembleia, tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram aceites, as propostas de lei n.os 146/VII - Grandes Opções do Plano para 1998 - e 147/VII - Orçamento do Estado para 1998 -, que baixaram à Sua Comissão.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho muito gosto em fazer esta declaração política com V. Ex.ª a presidir aos trabalhos, na medida em que ela diz respeito fundamentalmente à aprovação em Conselho de Ministros da proposta do Governo sobre a lei de finanças das regiões autónomas a apresentar a esta Assembleia da República.
O Governo presidido por António Guterres aprovou ontem, 14 de Outubro, a proposta de lei de finanças das regiões autónomas a apresentar a esta Assembleia da República, escassos dias após a entrada em vigor da lei de revisão constitucional.
Raras vezes a expressão «acontecimento histórico» foi tão apropriada para caracterizar um evento. De facto, a aprovação da futura lei de finanças das regiões autónomas é tão importante como o Decreto de 2 de Março de 1895, que criou os distritos autónomos nos Arquipélagos dos Açores e da Madeira, e equipara-se à consagração constitucional das autonomias insulares, em 1976, no regime democrático.
O objectivo do Partido Socialista de dotar as autonomias insulares com uma lei de finanças que permitisse, às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira a consolidação e o aprofundamento da autonomia financeira é agora alcançado com o envio desta proposta do Governo
à Assembleia da República.

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Trata-se de um objectivo que vinha de legislaturas anteriores, quando o Partido Socialista era minoritário, mas que só agora teve valimento, graças ao esforço conjugado dos Deputados na revisão constitucional e do Governo da República, após consultas aos governos regionais.
Na lei de revisão constitucional foi introduzido um novo n.º 3 no actual artigo 229.º da Constituição da República Portuguesa, que prevê que as relações financeiras entre a República e as regiões autónomas sejam reguladas através de lei de finanças própria, com a forma de lei orgânica, pela conjugação com o artigo 166.º, n.º 2, da Constituição.
Esta consagração constitucional da lei de finanças das regiões autónomas deu, pois, resultados imediatos e tenho muita honra em ter sido o autor da proposta na primeira leitura da Comissão Eventual de Revisão Constitucional, em Novembro de 1996, proposta depois adoptada como proposta comum do PS e PSD na segunda leitura, em Julho de 1997.
A aprovação tão rápida da proposta em Conselho de Ministros não teria sido possível sem a clarividente iniciativa do Ministro das Finanças Sousa Franco em constituir um grupo de trabalho para elaborar uma anteproposta de lei sobre esta matéria, grupo de trabalho esse coordenado pelo Professor Paz Ferreira e que apresentou esse anteprojecto a tempo de ele ser discutido com os representantes dos Governos Regionais dos Açores e da Madeira, no caso dos Açores com particular relevo para o Presidente do Governo Regional Carlos César e para o Secretário Regional das Finanças Roberto Amaral, já tendo em conta os novos critérios constitucionais.
A aprovação tão rápida desse anteprojecto deve-se, obviamente, à particular sensibilidade do Primeiro-Ministro António Guterres para as questões autonómicas e insulares. Basta dizer que António Guterres é o Primeiro-Ministro que mais vezes visitou os Açores na História de Portugal para se ilustrar esse interesse e cuidado.
Uma palavra sobre o contexto histórico da aprovação desta medida. É necessário acentuar, aqui e agora, que as medidas financeiras adoptadas pelo Governo, como a regularização e a normalização do endividamento público regional, se destinam a ajudar a resolver problemas vindos do passado e de gestões passadas. Este é um acto de solidariedade nacional e não um acto de apoio partidário.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Uns criam os problemas, como foi o caso dos governos do PSD, e o PS, no Governo e na Assembleia, quer resolvê-los e consegue resolvê-los.

Aplausos do PS.

Mas é também necessário dizer que as regiões autónomas assumiram, desde há 20 anos, quase todos os encargos de despesas correntes, que anteriormente pertenciam ao Estado centralista e aos seus Planos de Fomento no que diz respeito ao investimento público. E é da mais elementar justiça que as populações insulares tenham pleno acesso às políticas sociais nacionais definidas pelos órgãos da República, que aumentam substancialmente as despesas anuais nas regiões.
Não querer entender o alto serviço prestado pelas autonomias regionais ao Estado como um todo é uma das mais graves miopias políticas de que alguns espíritos dão manifestas provas. E aproveito aqui para repudiar uma espécie de campanha de opinião pública em relação às regiões autónomas, tendente, de certa maneira, a cavar um abismo na solidariedade recíproca devida entre as populações do continente e as populações, insulares, que se tem vindo a desenvolver ultimamente e que teria, certamente, por causa tentar impedir este acto político, corajoso, lúcido e com grande futuro, que foi a aprovação da anteproposta de lei por parte do Governo de António Guterres.
E aqui, mais uma vez, quero saudar o Governo pela coragem que teve em ir contra essa tentativa de campanha de opinião pública que ocorreu nos últimos meses.
Nem seria concebível que ao alargamento da autonomia política e legislativa acordada na revisão constitucional não correspondesse a atribuição de condições para o exercício da autonomia financeira nos Arquipélagos dos Açores e da Madeira. Maiores poderes políticos e administrativos e menores capacidades financeiras seriam uma perfídia para as populações insulares.
Com a futura lei de finanças tal não acontecerá. De facto, a proposta de lei introduz alguns mecanismos inovadores que marcam esta nova fase de uma autonomia cooperativa entre as regiões e a República.
Em primeiro lugar, o Fundo de Coesão para as Regiões Ultraperiféricas é uma inovação que decorre naturalmente do que ficou consagrado no artigo 227.º, n.º 2, do Tratado da União Europeia e no artigo também com o n.º 227, n.º 1, alíneas i) e j), da Constituição da República Portuguesa.
Assim, no actual n.º 1 do artigo 227.º da Constituição, as alíneas i) e j) são muito claras quanto aos poderes tributários próprios das regiões autónomas e quanto à sua capacidade de disporem, nos termos dos Estatutos e da lei de finanças, das receitas fiscais nelas cobradas ou geradas, bem como de uma participação nas receitas tributárias do Estado: estabelecida de acordo com um princípio que assegure a efectiva solidariedade nacional, e de outras receitas que lhes sejam atribuídas e afectá-las às suas despesas.
Numa entrevista que dei ao Açoreano Oriental, publicada a 16 de Julho de 1995, eu, como cabeça de lista pelo Partido Socialista nos Açores, propunha que se estabelecesse um fundo de coesão nacional, pois não podemos falar da solidariedade e da coesão. vindas da Comunidade Europeia sem falarmos também da necessidade de coesão vinda do próprio Estado português.
O Fundo de Coesão para as Regiões Ultraperiféricas é, pois, um meritório esforço da República no seu todo, mas não faria sentido que o Estado, nesta matéria, se aplicasse menos do que a Comissão Europeia na sua Agenda 2000, em que reconhece os Açores e a Madeira como regiões de objectivo um, para efeitos de distribuição dos fundos estruturais.
Outra inovação a ter em conta é a da previsão de «Projectos de interesse comum entre a República e as regiões», nomeadamente no domínio das infra-estruturas portuárias, dos transportes e da energia, aferidos esses projectos pelas suas consequências, em termos de balança

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de pagamentos, de criação de postos de trabalho e de diminuição dos custos de insularidade.
Também merece referência especial o título sobre a «Adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades regionais».
Não é este, porém, o melhor momento para apreciar em detalhe a proposta de lei sobre a lei de finanças das regiões autónomas, que será debatida e aprovada por esta Assembleia.
O que me tez subir hoje a esta tribuna foi o desejo de saudar a comunidade política portuguesa pelo exemplo de solidariedade e alto sentido de Estado dado pelo Governo presidido por António Guterres.
Com a revisão constitucional, com a consagração das regiões ultraperiféricas no Tratado da União Europeia e com a futura aprovação da lei de finanças das regiões autónomas é, de facto, uma nova autonomia que está em marcha e que honra o Estado português e a nova maioria que governa o País, há menos de dois anos.

Aplausos do PS.

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Presidente António de Almeida Santos.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Lalanda Gonçalves e Arlindo Oliveira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves.

O Sr. Lalanda Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, gostaria de me associar à congratulação do Sr. Deputado Medeiros Ferreira pela aprovação, em Conselho de Ministros, de uma proposta de lei sobre a lei de finanças para as regiões autónomas. Porém, quero também dizer ao Sr. Deputado Medeiros Ferreira que esse diploma deverá ser proposto a esta Assembleia e elaborado por ela e, sobretudo, terá de resultar numa lei que contemple e resolva, de facto, o problema das finanças regionais.
Não é o simples facto de existir uma lei que resolve todos os problemas, mas o facto de essa lei corresponder ao resultado do diálogo, da troca democrática de posições entre as diferentes bancadas desta Assembleia, a que se associarão as Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira, que, neste processo, também deverão ser envolvidas de forma eficaz e coerente.
Coloco esta questão, Sr. Deputado, pela seguinte razão: ao longo dos últimos 20 anos de autonomia democrática, todos nós participámos num processo empolgante de desenvolvimento regional, de afirmação da identidade regional dos Açores e da Madeira, não havendo apropriação partidária deste processo.
A nova autonomia democrática está para ser testada, Sr. Deputado! O que conheço é a afirmação clara dos princípios da autonomia política, administrativa e financeira, pela qual, ao longo dos últimos 20 anos, todos nós, repito-o, combatemos diariamente.
Aliás, quando o Sr. Deputado se refere a campanhas relativamente às regiões autónomas, devo dizer-lhe que o líder do meu grupo parlamentar teve a oportunidade de, no dia 3 de Setembro, suscitar aqui esta questão, dizendo que apresentassem rapidamente a lei de finanças regionais e que a aprovassem, porque senão o PSD iria apresentar, como sempre o tem feito pelo menos ao longo dos últimos dois anos, propostas concretas de alteração ao Orçamento do Estado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por essa razão, Sr. Deputado, tenhamos o sentido da História: alegremo-nos, porque, de facto, foi dado um passo, mas tenhamos consciência de que ainda temos um longo caminho a percorrer.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Medeiros Ferreira, há mais um orador inscrito para pedir esclarecimentos. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Já Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lalanda Gonçalves, é com muito gosto que faço um comentário às suas palavras, na medida em que, de certo modo, não me colocou qualquer pergunta, pelo que não tenho qualquer resposta a dar-lhe. Quero, porém, acentuar alguns aspectos.
Em primeiro lugar, as dificuldades financeiras das regiões autónomas datam, pelo menos, do fim da década de 80. Durante as legislaturas anteriores, em que a maioria nesta Assembleia era do PSD, não foi possível às regiões autónomas ir mais além do que alguns protocolos financeiros, acordados entre o Professor Cavaco Silva e o Presidente do Governo Regional da Madeira, Dr. Alberto João Jardim - e reparei que a Região Autónoma dos Açores não se quis associar a esse caminho empirista, seguido nas relações mútuas entre o Professor Cavaco Silva e o seu apoiante Dr. Alberto João Jardim.
Esses protocolos financeiros estão longe de fazer ciência, foram sempre considerados como expedientes casuísticos de dois governos casuísticos, pelo que, só agora, com a nova maioria e depois da revisão constitucional - e acentuei este aspecto, Sr. Deputado Lalanda Gonçalves, mas podia não tê-lo feito -, depois, portanto, da colaboração entre os Deputados do PS e do PSD, em certos pontos que também tiveram o apoio dos Deputados de outras bancadas - e recordo que esse novo n.º 3 do artigo 229.º, que torna obrigatória a existência de uma lei de finanças das regiões autónomas, foi aprovado por unanimidade pelos Srs. Deputados da Assembleia da República, embora a proposta inicial, tenho muita honra em recordá-lo, tenha sido minha -, foi possível ir mais além.
Portanto, Sr. Deputado Lalanda Gonçalves, o facto de ter tornado obrigatória a existência de uma lei de finanças das regiões autónomas é algo que não se pode tirar a esta legislatura. Assim como não se pode tirar ao Governo de António Guterres o mérito de ter preparado atempadamente a elaboração do anteprojecto, através de um grupo de trabalho, presidido, aliás, por um professor universitário

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micaelense - e, veja só, também da família de um dos primeiros autonomistas, embora do lado de cá, porque era Presidente do Conselho, Hintze Ribeiro -, o Professor Paz Ferreira, que coordenou esse grupo de trabalho e apresentou esse anteprojecto com a devida antecedência, o qual, após consulta aos órgãos de governo próprio, portanto, aos executivos regionais, quer dos Açores quer da Madeira, foi agora aprovado em Conselho de Ministros, como proposta de lei a ser enviada à Assembleia da República.
Estou de acordo consigo, Sr. Deputado, em que caberá a esta Assembleia aprovar a lei. Há alguns melhoramentos a fazer e eu próprio já tenho aqui algumas notas, que, penso, poderão depois contribuir para o efeito...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O quê? Então, já a conhece?!...

Risos do PCP e do PSD.

O Orador: - Conheço aquilo que vem nos jornais.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça o favor de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Em relação ao Orçamento, estou de acordo com o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves em que grande parte do que está previsto na lei de finanças das regiões autónomas deve já fazer parte do próximo Orçamento do Estado. Mas também gostava de dizer-lhe, Sr. Deputado, que nem o senhor nem ninguém nesta Sala jamais acreditou que a proposta de lei sobre alei de finanças das regiões autónomas fosse aprovada já. Este é um grande mérito do Conselho de Ministros, que, ontem, aprovou esta proposta de lei.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Arlindo Oliveira.

O Sr. Arlindo Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Medeiros Ferreira, de certa forma, com esta resposta ao Sr. Deputado Lalanda Gonçalves, o Sr. Deputado respondeu a uma das minhas perguntas. No entanto, gostaria de fazer um comentário, por forma a que pudesse também responder-me.
O Dr. Medeiros Ferreira é um ilustre ilhéu, conhece a realidade insular e sabe que as autonomias políticas só eram possíveis se houvesse autonomia financeira. As regiões viram-se numa situação tal que tiveram de recorrer a um endividamento e não encontraram apoio na República relativamente à necessidade urgente de criar infra-estruturas nas regiões, por forma a superar o atraso a que foram votadas durante séculos.
É verdade que foram os governos do PSD nas regiões, que, durante 20 anos, se endividaram, ultrapassando a sua capacidade de endividamento, sempre na mira de «quem vier que feche a porta» ou «quem vier que pague», porque os governos da República não foram sensíveis à situação das autonomias. E aqui os governos do PSD, que na República governaram desde 1980 - ou na AD ou sozinhos com maioria absoluta -, não conseguiram, em 20 anos, fazer aprovar nesta Câmara uma lei, que agora o PS, no poder, vai conseguir aprovar - espero que por unanimidade. Dizia eu que durante os últimos anos em que a maioria absoluta era do governo do PSD, este não tez aprovar uma lei que era imprescindível, por forma a aprofundar-se a autonomia, a que o relacionamento entre as regiões autónomas e o Estado não se baseasse na chantagem nem na suspeição constante, como se verificou especialmente na Região Autónoma da Madeira, e se pudesse responder aos anseios dos povos ilhéus.
Gostaria que o camarada Medeiros Ferreira comentasse estas minhas palavras.
Quero ainda fazer uma outra pergunta. Sou um leitor assíduo de V. Ex.ª e ainda hoje li na imprensa um dos seus escritos, tendo constatado que o amigo Medeiros Ferreira valoriza os critérios da cidadania e das liberdades relativamente aos critérios de ordem financeira, económica ou monetária. Sabendo V. Ex.ª que na Região Autónoma da Madeira a democracia é mitigada - e ainda ontem ou anteontem o Dr. Mário Soares talava do défice democrático existente naquela região -, entende V. Ex.ª que a aprovação da lei de finanças regionais e o acordo recentemente celebrado entre o Primeiro-Ministro e os presidentes das regiões autónomas, além de resolverem o défice financeiro, também ajudarão a resolver o défice democrático que, há alguns anos, nos atormenta nas regiões autónomas, ou, pelo contrário, que esse acordo cimentará ainda mais o poder autocrático do presidente do governo regional da Madeira?
Mais: gostaria de perguntar-lhe se esse endividamento, que ultrapassou a capacidade de endividamento da região, é sinónimo de heroísmo ou de irresponsabilidade.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Arlindo Oliveira coloca-me numa situação delicada. É que, tendo ele feito suas palavras minhas, sou tentado a fazer minhas palavras dele,...

Risos do PS.

... que, em princípio, já foram minhas. Portanto, estamos aqui nume situação extremamente delicada, desse ponto de vista.
Estou de acordo em que os critérios da cidadania devem primar sobre tudo o resto. Penso que a liberdade é o critério primeiro por onde há-de afirmar-se e aferir-se a evolução das sociedades, critério esse que é garantido pela República Portuguesa.
O Sr. Deputado citou um ex-Presidente da República e tenho a certeza de que, durante os respectivos 10 anos de mandato, ele terá feito uma apreciação sobre o grau de gravidade desse deficit democrático. Ora, se este último se acentuou depois da saída do citado Presidente, há, de facto, ocasião para perplexidade.
Por outro lado, tenho assistido a uma «ronda», que tem feito o Sr. Presidente do Governo Regional da Madeira, de «despedida» - penso que é este o termo que vem nos

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jornais - às comunidades emigrantes. Pois se é de despedida, ele que se despeça! Pode ser uma ocasião óptima para o PSD vir a recuperar a colaboração do actual Presidente do Governo Regional da Madeira, sabe-se lá se não pela sua inscrição na lista de candidatos a Deputados do Parlamento Europeu! Aliás, já tenho visto tanta gente democratizar-se após integrar o Parlamento Europeu que o considero uma óptima escola para todos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à fase de tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António José Dias.

O Sr. António José Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Subo a esta tribuna para chamava atenção da Câmara e, através dela, do Governo e do País para alguns dos problemas que afligem todo o Alto Minho, com especial relevância para um dos 10 concelhos integrantes do distrito de Viana do Castelo. Este concelho, carenciado como todos os restantes, necessita, no entanto, de uma atenção particular já que tem sido sucessivamente marginalizado ao longo dos tempos.
Ponte da Barca é um pequeno concelho situado no interior do Alto Minho, que padece de grandes estrangulamentos e carências que o preocupam e desertificam. Dando voz a Ponte da Barca, pretendo também chamar a atenção, para todas as zonas periféricas, pequenas e desprotegidas, que tanta dificuldade têm em fazer-se ouvir, em clamar pela resolução das suas dificuldades. Estou a falar de uma terra do interior com grandes carências, mas com enormes potencialidades.
No Alto Lindoso, está construída a maior barragem, o maior centro electroprodutor do País e, seguramente, um dos maiores de toda a Europa. Esta barragem, produz diariamente um potencial energético incalculável. No entanto, este concelho, tal como o concelho vizinho de Arcos de Valdevez, pouco ou nada recebem como benefício ou como contrapartida deste empreendimento de interesse nacional.
A construção de uma barragem com esta envergadura teve e tem um enorme impacte ambiental, com graves alterações paisagísticas e climatéricas que devem ser contabilizadas e, por via das quais, as populações dos concelhos envolvidos merecem ser ressarcidas e devidamente compensadas. Produz-se nesta região tanta energia eléctrica e, afinal, não temos qualquer benefício visível.
Penso que, através de benefícios fiscais, através da redução do preço das tarifas ou de um aumento substancial das rendas dos centros electroprodutores, esta situação seria devidamente ponderada e corrigida.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Decorre neste momento o processo de inquérito público para a eventual construção de mais três pequenas barragens (mini-hídricas) no curso do rio Lima.
Daqui faço um apelo ao Governo e à Sr.ª Ministra do Ambiente para que esta possibilidade de construção de mais três barragens, não venha a obter viabilidade, pois as populações não as desejam e os prejuízos delas decorrentes seriam sempre superiores aos seus benefícios.
É que, no Alto Minho, não temos o Centro Cultural de Belém, não estamos no Terreiro do Paço nem mesmo na Avenida dos Aliados. Mas temos outras coisas: temos um rio, que é o Lima, que, para além da produção de energia, tem vida e dá vida e que pretendemos preservar e defender; ternos, também, um potencial paisagístico, que, pelas suas características invulgares, rivaliza com qualquer outra zona turística do nosso país; claro que não temos o sol do Algarve nem as praias da Linha de Cascais, mas temos uma atmosfera natural e despoluída que se pode respirar e fruir; temos, também, a pureza dos inúmeros rios e ribeiros que atravessam todo o Vale do Lima e que, juntamente com a paisagem, constituem um argumento de atracção turística que, no futuro, deve funcionar como uma verdadeira alavanca para o desenvolvimento regional.
É certo que há pouco teatro, cinema ou outras formas de irradiação cultural, ruas há gente; temos pessoas que, com o seu trabalho, com a sua genuinidade e pela sua generosidade, constituem um património valioso, merecedor da atenção e do respeito de todos os portugueses.
Três concelhos do Alto Minho (Ponte da Barca, Arcos de Valdevez e Melgaço) Fazem parte integrante do único parque nacional existente: o Parque Nacional Peneda-Gerês. Esta área protegida tem um conjunto de valores naturais e culturais de extrema importância. Pelas suas características, este foi o primeiro parque a incluir aldeamentos habitados. Esta situação não é mais do que o reconhecimento do que os seus habitantes contribuíram ao longo dos tempos para a existência de uma paisagem de conteúdo natural e cultural verdadeiramente notável.
No interior do parque nacional existem 114 pequenos aglomerados populacionais, com um total de 15 000 habitantes. Acontece que estas populações rapidamente sentiram que as restrições e proibições chegam depressa, mas as compensações para a sua melhoria sócio-económica tardam em chegar.
A melhor prova de que o parque nacional não tem desenvolvido uma política acertada em benefício das populações residentes está, seguramente, expressa na resistência que essas mesmas populações oferecem, questionando por vezes a legitimidade da existência dessa área protegida.
Mas o único parque nacional existente no País e as populações que nele vivem não se compadecem com mais atrasos nos pagamentos das indemnizações e não aceitam mais restrições sem sentirem o lado compensatório, que lhes proporcione a qualidade de vida a que têm direito e que merecem.
A assinatura de um protocolo recente entre este Governo e as autarquias do parque nacional (Programa de Intervenção na Peneda-Gerês), no valor de cerca de 2,5 milhões de contos, tendo em vista a execução do abastecimento de água, saneamento e novos acessos para as populações residentes, é um passo importante fruto de novas e melhores políticas, também nesta área.
É legítimo, por isso, continuar a exigir solidariedade nacional para as populações que residem na área do Parque Nacional Peneda-Gerês.
Noutro âmbito, é importante assinalar que a nova rede de acessibilidades evolui a bom ritmo, o que revela, da

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parte do actual Governo, um esforço e uma atenção completamente diferentes para com o distrito de Viana do Castelo.
Assim, a auto-estrada Braga-Valença (A3) está em execução, com a abertura do próximo lanço até Ponte de Lima já marcada para o início próximo mês de Novembro. Também o IC1, entre o Porto e Viana, está a decorrer em bom ritmo, estando prevista a sua conclusão para meados do próximo ano.
Porém, há uma via que é absolutamente fundamental para todo o distrito, já que se trata de um eixo transversal que ligará Viana do Castelo a Ponte da Barca e à fronteira do Lindoso, que deverá ter, no futuro próximo, um papel essencial no desenvolvimento de todo o vale do Lima. Refiro-me ao IP9/IC28, via de ligação à Galiza, cujos primeiros quilómetros já estão adjudicados à Brisa, com início previsto ainda para este ano e que esteve completamente encalhado algures no Ministério do Ambiente do anterior governo. Acreditamos que também o IC28 será uma realidade a curto prazo para servir as pessoas e toda esta região do vale do Lima.
A ligação dos concelhos do interior à cidade de Braga é igualmente importante, pelo que se torna necessário beneficiar e corrigir o traçado da EN101 entre Monção e Braga. Este eixo Norte-Sul apresenta o maior índice de tráfego médio diário anual em todo o território do Alto Minho (4000 a 5000 veículos/dia), o que justifica completamente a necessidade da sua correcção e beneficiação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso distrito de Viana do Castelo e a sua população têm sentido na pele o chamado custo da interioridade. Temos de ter capacidade para, em conjunto, autarquias locais e Governo, inverter uma situação que continua a asfixiar o centro e a paralisar as extremidades.
Uma grande linha de fronteira liga-nos à Galiza, que caracterizamos como o «Minho mais acima». Temos nestes vizinhos o exemplo claro de como esta região, com as mesmas características, tem, efectivamente, outro ritmo de desenvolvimento.
É também por conhecermos este exemplo que nos fica tão próximo que, com profunda convicção, ansiamos pela criação das regiões administrativas, com a grande esperança de que é por aí que passa o nosso futuro, o futuro de um país descentralizado, que possibilite mais atenção e disponibilize mais recursos para as zonas pequenas e periféricas.
Corre-se frequentemente o risco de subestimar as possibilidades culturais e humanas das regiões deserdadas, que os homens pouco a pouco têm tendência a abandonar. O nosso desafio e a nossa grande determinação vão no sentido de alterar este princípio.
A nossa terra, o Alto Minho, o distrito de Viana do Castelo, ainda fazem parte do Portugal esquecido que, felizmente, agora começa a ser lembrado.
É esse Portugal esquecido que exige mais meios para resolver as suas enormes carências, para os seus estrangulamentos e insuficiências, mas, acima de tudo, mais atenção e recursos para o que lá temos de mais valioso: a nossa gente, a nossa população, todos aqueles que lá nasceram, que lá vivem e que lá pretendem continuar a viver.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha, para pedir esclarecimentos.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António José Dias, ouvi atentamente o que disse sobre os problemas do Alto Minho, considerações essas que também partilho.
Houve uma questão que me tocou particularmente e que é a relativa à construção das três barragens, contra as quais não sei se sabe que o Partido Popular sempre se manifestou. Na verdade, o Partido Popular sempre teve a preocupação de estar ao lado das populações que se insurgem contra aquelas construções.
Ora, neste momento, o Sr. Deputado vem pedir ao Governo que não construa aquelas barragens, mas, se houver necessidade de tomar alguma posição de força, de fazermos alguma pressão nesse sentido, gostaria de saber se está disposto a colocar-se à meu lado e ao das populações para pedirmos ao Governo que não construa aquelas três barragens.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António José Dias.

O Sr. António José Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Augusto Boucinha, agradeço a pergunta que me fez.
Devo dizer-lhe que, antes de proferir a minha intervenção, tive oportunidade de, através de um requerimento que dirigi ao Ministério do Ambiente, expressar a minha posição frontalmente contra a construção das três mini-hídricas. Igualmente na Câmara Municipal de Ponte da Barca, os vereadores do Partido Socialista tomaram idêntica posição, logo que o assunto começou a ser discutido. Assim, aceito o seu repto.
Repito que estou contra a construção daquelas três barragens e certamente que o Governo vai ter o bom senso de não as aprovar porque, como referi, no Alto Lindoso já temos a maior barragem do País que é das maiores da Europa, pelo que a construção de mais três seria mau pois Ponte da Barca, Arcos de Valdevez e toda a zona do vale do Lima passariam a ser quase a «capital do nevoeiro» deste país, o que não pretendemos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 35 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 292/VII - Revê o regime jurídico do segredo de justiça (CDS-PP).
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tal como havíamos prometido no debate

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de urgência realizado no final do ano passado, o Partido Popular apresenta hoje um projecto de lei destinado a rever o regime legal do segredo de justiça.
Do debate parlamentar recordamo-nos da unanimidade existente nesta Câmara quanto à necessidade de rever este regime. Todas as bancadas levantaram questões com interesse, que só vieram confirmar aquilo que pensávamos sobre a oportunidade do tema.
Eram, pois, sobejas as razões para pensar que o Governo, pelo seu lado, iria também abreviar a apresentação de uma iniciativa legislativa neste domínio, compreendida ou não no âmbito da reforma mais vasta do Código de Processo Penal, fazendo finalmente jus à anunciada capacidade de concretização («gente que faz») que, para já, continua a não demonstrar a não ser no domínio da retórica política e eleitoral.
Foi também por este motivo que passámos das palavras aos actos e apresentámos a presente iniciativa legislativa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Reconhecemos que, no âmbito de uma concepção democrática do processo penal, a publicidade surge como a melhor forma de dissipar quaisquer desconfianças que se possam suscitar sobre a independência e a imparcialidade com que é exercida a justiça penal.
Com efeito, a publicidade do processo constitui uma garantia para todos e reforça o sentimento de fidelidade dos membros da sociedade para com o Direito. Apesar de isto ser uma evidência, não se pode esquecer, por outro lado, que os interesses da comunidade e do arguido podem conflituar, determinando e justificando as limitações ao princípio da publicidade.
Esse conflito resulta dos dois interesses que o segredo de justiça visa salvaguardar: por um lado, o êxito da investigação, por outro, a defesa do bom nome do arguido presumivelmente inocente.
Ora, o que está hoje demonstrado é que a lei não é suficientemente correcta na defesa destes interesses que se pretendem salvaguardar com o segredo de justiça. A solução estará na mútua compressão dos interesses em conflito, por forma a aproveitar, de cada um deles, o máximo potencial e o máximo conteúdo possível.
Sendo os fins já apontados aqueles que visa realizar, não se pode cair no absurdo de defender o segredo de justiça quando a sua funcionalidade o não justifica. É, manifestamente, o caso a partir do momento em que há uma acusação, isto é, a partir do momento em que a investigação de um crime já não justifica que se proteja o sigilo. Então, serão os interesses do arguido a aconselhar a transparência que a publicidade traz consigo.
A nosso ver, falar em segredo de justiça parece uma contradição: da justiça não se faz segredo, faz-se promoção.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Restringir a excepção à publicidade à fase de inquérito não significa desconsiderar o interesse jurídico da protecção do bom nome e reputação dos, investigados perante a necessária valorização do interesse jurídico da eficiência e qualidade da investigação criminal. E a confirmá-lo está o facto de as modificações, que propomos, ao artigo 86.º do Código de Processo Penal deverem, também, necessariamente ser acompanhadas de alterações legislativas tendentes a reforçar garantias dos particulares investigados ou chamados a colaborar com o processo penal.
E, assim, aqui se incluem igualmente propostas de alteração, quer às disposições legais que indicam o elenco dos deveres cujo acatamento condiciona e delimita a actividade do Ministério Público, quer à parte do Código de Processo Penal que omite o direito que, genericamente, deve assistir a qualquer testemunha de se fazer acompanhar por um advogado, direito, aliás, que tem hoje ampla consagração constitucional.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - São alterações motivadas por preocupações de garantia dos particulares, razão pela qual, por um lado, se faz depender da manifestação do interesse da defesa o cumprimento do novo dever especial do Ministério Público (para que a própria reposição da verdade se não constitua em amplificação de uma prévia divulgação ilegítima) e, por outro lado, como abaixo explicitaremos, se facilita ao advogado o exercício da defesa do bom nome e reputação do seu constituinte.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na altura do debate parlamentar, vários dos Srs. Deputados me formularam uma outra questão, que recordo, mais ou menos, nestes termos: qual é o papel que, neste contexto, deve desempenhar o advogado do arguido directamente lesado pela violação do segredo de justiça?
Todos sabemos que o advogado está sujeito à obrigação de sigilo profissional, cuja cessação, em qualquer caso, está sempre condicionada a prévia autorização da Ordem dos Advogados.
Ora, aquilo que nós propomos é arredar a necessidade dessa autorização prévia nos casos de resposta negativa ou insuficiente ao requerimento de promoção de diligências necessárias à reintegração do bom nome e reputação das pessoas investigadas.
Muito embora não esqueçamos que é ao Ministério Público que compete a direcção da fase processual do inquérito, temos de reconhecer que, em última análise, ninguém melhor do que o próprio sabe de si, ou seja, a cada arguido caberá avaliar em que medida o seu direito ao bom nome e à reputação se mostram lesados perante determinada violação do segredo de justiça e, num segundo momento, se tais direitos foram satisfatoriamente reintegrados pelas diligências promovidas pelo Ministério Público.
Ao advogado do arguido caberá, portanto, um papel fundamental em todo este processo, quer no aconselhamento das medidas reintegratórias a promover, quer no posterior controlo da eficácia dessas medidas e na promoção das mesmas em caso de recusa do Ministério Público.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sabemos que está em curso uma revisão do Código de Processo Penal, cujo anteprojecto até já se encontrará praticamente elaborado, se não me engano, mas que nos parece que só poderá ser aqui apreciado lá para Maio do próximo ano, pois, entretanto, ocorreu a revisão constitucional, o Parlamento interrompeu os seus trabalhos durante as férias, o

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Orçamento do Estado está à porta, as eleições autárquicas também e as questões prementes associadas ao referendo de Abril de 1998 prometem ocupar-nos durante a maior parte do primeiro trimestre do próximo ano, para já não falar no «cabaz» de propostas de lei que o Governo aqui nos trouxe, antes de férias, pela mão do Sr. Ministro António Vitorino.
Isto se, por essa altura, não estivermos novamente em campanha eleitoral...
Pelo caminho ficou a expectativa da bancada do Partido Socialista, expressa pelo Sr. Deputado Osvaldo Castro, no debate que aqui teve lugar o ano passado, da realização, nos primeiros meses deste ano, de um «verdadeiro e magno debate» a propósito da reforma do Código de Processo Penal. Repito que a previsão do Sr. Deputado Osvaldo Castro era «nos primeiros meses deste ano de 1997».
Ora, como já dissemos, há matérias que não podem esperar pêlos calendários do Governo, razão pela qual avançámos nós.
Temos até ouvido dizer que o anteprojecto de revisão do Código de Processo Penal contém soluções que se aproximam, em parte, das propostas no nosso projecto de lei. Refiro-me, em particular, à possibilidade de o juiz, durante a instrução, ou o Ministério Público, durante o inquérito, poderem divulgar comunicados ou peças do processo que julguem úteis para restabelecer a verdade e compatíveis com o desenvolvimento do processo, a pedido das pessoas publicamente postas em causa.
Estamos assim em crer, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a nossa iniciativa legislativa e a do Governo poderão vir a encontrar-se na especialidade, sendo certo que aí será necessário resolver, pelo menos, estas duas questões.
O segredo de justiça deve terminar com o despacho que declara encerrado o inquérito, como entende o Partido Popular, ou deve manter-se, em todo e qualquer caso, durante a fase de instrução, como julgam o Governo e o Partido Socialista? Primeira questão.
A segunda questão prende-se com o papel do advogado do lesado pela violação do segredo de justiça: deverá ser ele um mero espectador, como quer o Governo e o Partido Socialista, ou, pelo contrário, poderá e deverá controlar a eficácia das diligências de reposição da verdade, como é nossa firme convicção?
É que. para o Partido Popular, as situações de semi-segredo são as mais perigosas e perversas.
Pelo que tenho vindo a expor, ficou conhecida a nossa resposta a estas questões, mas estamos abertos ao debate e à procura da solução que, nesta matéria, melhor defenda os interesses da administração da justiça e, ao mesmo tempo, melhor os concilie com a defesa dos direitos fundamentais e das garantias dos particulares perante aquela.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente. Sr. Deputado Luís Queiró, o projecto de lei apresentado pelo Partido Popular contém algumas das linhas a seguir na necessária alteração do regime jurídico do segredo de justiça: não absolutiza o segredo de justiça nem inviabiliza o direito à informação.
Porém, parece-me que se pode ir um pouco mais longe porque há processos em que o segredo de justiça, mesmo na fase de investigação, é um mero pró-forma, um ritual — é o caso, por exemplo, dos acidentes de viação, entre outros crimes. Ora, pergunto a V. Ex.a como é que encara a solução ou a possibilidade de, mesmo durante a fase investigatória, o magistrado titular do processo poder decidir o que está ou não em segredo de justiça nesse processo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, havendo mais um orador inscrito para pedir de esclarecimentos, V. Ex.ª deseja responder já ou no fim?

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): — No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Então, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, tenho a dizer a V. Ex.ª o seguinte: discordamos não só da metodologia utilizada por V. Ex.ª e pelo partido que representa como também do teor do projecto de lei em apreço.
Em termos metodológicos, discordamos porque está em curso uma revisão profunda, já prometida e anunciada publicamente pelo Governo. Este projecto de lei está, portanto, perfeitamente desenraizado desse projecto global de reforma da justiça portuguesa, não só no âmbito do Código de Processo Penal como também da Lei Orgânica do Ministério Público e da Lei do Registo Criminal.
Em relação ao conteúdo do vosso projecto de lei, Sr. Deputado Luís Queiró, também discordamos frontal-mente. Como dizia no relatório que elaborei, efectivamente, nos últimos anos das sociedades democráticas, assiste-se a um combate entre os mecanismos de legitimidade comunicacional e os mecanismos da liberdade individual, entre a liberdade de informação e a defesa dos direitos dos cidadãos. Ou seja, há aqui dois pratos da balança em equação e uma relação entre a justiça e a comunicação social cuja harmonização nem sempre é pacífica.
Ora, VV. Ex.ªs não abrem uma «janela» com este projecto de lei, antes escancaram as «portas», escancaram todas as «janelas» a uma das componentes essenciais deste debate: a publicidade!
A este propósito, coloco-lhe a questão em termos muito práticos, em termos forenses: um arguido é acusado, requer a instrução no uso legítimo dos seus direitos que estão consagrados na lei. E se a instrução não vem suportar a acusação e, inclusivamente contraria essa mesma acusação? Quid juris, Sr. Deputado Luís Queiró? Podemos estar a violar, a estigmatizar a «bolsa» de privacidade do arguido que foi acusado, mas acusado sem fundamentação, porque a instrução vem, efectivamente, corrigir possíveis distorções que ocorreram e se desenvolveram ao longo da investigação criminal.
Por outro lado, entendo que este projecto de lei representa uma ruptura na ordem jurídica portuguesa, e deixe-me que lhe diga que este é um século de extremismos: a

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sua primeira metade é um exemplo paradigmático de extremismo da própria História, História atravessada por ditaduras sanguinolentas, por ditaduras repressivas. E durante esse período histórico todos os democratas pugnavam por uma liberdade de informação, mas hoje, Sr. Deputado, parafraseando um escritor da modernidade europeia, Milan Kundera, há que apelar à «paz nos cemitérios», segundo um dos principais protagonistas desse romancista.
O que pretendo dizer com esta citação é que muito mais importante do que a defesa da liberdade de informação é a defesa das «bolsas» de privacidade dos cidadãos, dos seus legítimos direitos, da sua «respiração» individual, da sua liberdade. De facto, parece-me que com este projecto de lei esses valores não ficam salvaguardados.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odeie Santos, estranhei um pouco a sua pergunta porque se ler atentamente a redacção proposta no nosso projecto de lei para o n.º 7 do artigo 86.º do Código de Processo Penal verifica que aí se prevê a possibilidade de o Ministério Público autorizar «a passagem de certidão em que seja dado conhecimento do acto ou do documento em segredo de justiça, sempre que o processo respeite a acidente causado por veículo de circulação terrestre». Calculo que V. Ex.ª se reteria a esta situação quando falou dos acidentes de viação.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não foi isso que eu perguntei!

O Orador: - E como restringiu a sua pergunta a este ponto - apesar de tudo, de pormenor -, julgo que ficou esclarecida.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Permite-me que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Deputado, dei-lhe o exemplo dos acidentes de viação porque entendo que há processos em que não há qualquer razão para haver segredo de justiça e o magistrado deve poder decidir nesse sentido - e não estou a falar da passagem de certidões para o processo cível! Ou seja, o magistrado deve poder elaborar um despacho, determinando que naquele processo nada está em segredo de justiça ou, então, que está isto, aquilo ou aqueloutro em segredo de justiça.

O Orador: - Sr.ª Deputada, de todo o modo, creio que já respondi à sua questão, não sem querer acrescentar que, em relação ao que, agora disse, estamos inteiramente disponíveis para discutir essa como outras matérias em sede de Comissão.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Joaquim Sarmento a resposta já terá de ser um pouco mais extensa, até para podermos discutir as duas vertentes de que V. Ex.ª falou: a da metodologia e a do conteúdo.
Quanto à questão da metodologia, devo dizer que quem me parece estar completamente desenraizado das promessas feitas pelo Governo e pelo Partido Socialista é o Sr. Deputado Joaquim Sarmento! De facto, tive o cuidado de juntar alguma documentação sobre esta matéria e encontrei o despacho do Sr. Ministro da Justiça, datado de Março de 1996, que cria a Comissão de Revisão do Código de Processo Penal e fixa um prazo de 4 meses para a entrega dos trabalhos, ou seja, esse prazo terminaria em Julho de 1996 e não em Julho de 1997, Sr. Deputado, considerando que Julho é um mês de praia, esse. prazo até poderia ser alargado para Outubro...
Em Dezembro realizou-se nesta Assembleia um debate de urgência, requerido pelo CDS-PP, sobre o regime jurídico do segredo de justiça, tendo o Sr. Deputado Osvaldo Castro prometido que nos primeiros meses do ano de 1997 se travaria aqui o magno debate da reforma do Código de Processo Penal. Mas a verdade é que estamos a chegar ao Natal e a entrar em 1998 sem que se tenha realizado esse debate sobre a reforma do Código de Processo Penal.
Perante estes factos, devo dizer que quem está «desenraizado» - que foi o que me chamou, mas que eu agora lhe devolvo - das promessas eleitorais, dos propósitos e das intenções do Governo é o Sr. Deputado Joaquim Sarmento, que ainda por cima é Deputado da bancada que suporta o Governo!
A este propósito, até me apetece dizer que o Sr. Ministro da Justiça, que devia, aliás, dar o exemplo da celeridade processual ou da celeridade governativa,...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - ... porque se queixa que o principal problema dos tribunais é o seu estrangulamento e a morosidade, acaba por ser mais lento que os processos que tramitam e «jazem» nos tribunais, por este país fora.

Aplausos do CDS-PP.

Quanto ao conteúdo do nosso projecto de lei, a verdade é que temos concepções diferentes - o que é que hei-de fazer!? V. Ex.ª vem da esquerda e, tal como os senhores que estão sentados mais à vossa esquerda, considera-se a alavanca do progresso e da modernidade,...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Olhe que as posições são diferentes!

Risos do CDS-PP.

O Orador: - ... mas, neste momento, parece-me um «velho do Restelo», com medo da sociedade de informação.
Além do mais, Sr. Deputado, quando falo da informação não a confundo com a comunicação social. De facto, o que digo é que não há qualquer razão para restringir a publicidade dos processos numa fase que não seja a mera fase da investigação policial, porque aí, sim, ainda não há administração da justiça e trabalha-se com base em meros

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indícios, o que justifica a confidencial idade, com certeza! É preciso, por um lado, preservar a eficácia da investigação e, por outro lado, obviamente, proteger o bom nome da pessoas que são meramente indiciadas.
Quando entramos na fase da instrução não tenho notado, na minha vida forense, que os arguidos se importem com o facto de os processos se tornarem públicos a partir desse momento, mesmo que do resultado do debate instrutório venha a surgir uma decisão contraditória com aquela que resultou...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Alguns importam-se!

O Orador: - Alguns importam-se, Sr.ª Deputada, mas tenho de dizer-lhe o seguinte: é a partir da ponderação destes interesses que devemos apurar aquele que deve prevalecer, e aquele que deve prevalecer é, de facto, a meu ver, o princípio da publicidade, porque também é o que mais depressa conforma a sociedade e a faz aderir aos princípios e à prática do Direito.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apresente discussão em torno do projecto de lei n.º 292/VII, emanado do Grupo Parlamentar do CDS-PP e que pretende rever o regime jurídico do segredo de justiça, antecipa a discussão e debate que proximamente faremos a propósito da reforma do Código de Processo Penal,
Vivemos numa sociedade profundamente mediatizada, mediatização suportada no sensacionalismo, na linearidade e no kitsch que esmaga o quotidiano de cada um de nós e estreita, cada vez mais, o nosso espaço de reflexão humanista. O crepúsculo das ideologias reflecte, de alguma forma, um «desemprego histórico» e os valores por que se batem todos os humanistas, independentemente da matriz ideológica que os ilumina, foram, de certo modo, neutralizados no dizer de um pensador português, Eduardo Prado Coelho, por uma «diluição consensual de valores».
Sobra, com tudo isso, uma vertigem informativa que narcotiza e, às vezes, flagela e devassa a respiração individual dos cidadãos, os seus direitos e a sua liberdade.
Efectivamente, os últimos anos das sociedades democráticas caracterizam-se por um combate, nem sempre equilibrado, entre os mecanismos de legitimidade comunicacional e os mecanismos de liberdade individual, entre a liberdade de informação e a defesa dos direitos dos cidadãos, sendo difícil e complexa a harmonização entre a justiça e a comunicação social.
A salvaguarda da investigação criminal e o segredo de justiça que a acompanha entra com frequência em colisão com a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa, tornando-se complexa a conciliação desses direitos, sem deixar de ter presente que a regra é o direito à informação e a excepção residual o segredo de justiça.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Na procura desse equilíbrio, pretende o projecto de lei do CDS-PP alterar alguns artigos do Código vigente, sendo a alteração mais relevante a do artigo 86.º
Com essa alteração pretende-se antecipar o momento em que termina o segredo de justiça. Este terminaria com a acusação e não com a decisão instrutória, como acontece actualmente. O segredo de justiça passaria a vigorar apenas durante o inquérito, terminando de imediato com a acusação, independentemente do pedido de abertura de instrução, sustentada no artigo 287.º do Código de Processo Penal.
Aquando do debate de urgência requerido pelo CDS-PP sobre o conceito, finalidade e regime jurídico do segredo de justiça em Portugal, travado nesta Assembleia em 10 de Dezembro de 1996, o meu camarada Dr. Osvaldo Castro, reproduzindo declarações do Sr. Ministro da Justiça, expressou sobre tal matéria uma intenção ponderadamente reformadora.
Pouco tempo antes, o Sr. Ministro da Justiça, Dr. Vera Jardim, afirmara: «Será necessário encararmos ó que tenho chamado de janela aberta sobre o processo na fase de inquérito e instrução». Tal «janela aberta» passava e passa pela alteração do artigo 86.º do Código de Processo Penal, de forma a que a fase de instrução seja pública, desde que esta tenha sido requerida apenas pelo arguido e este no requerimento nada diga ou diga que não se opõe à publicidade.
A publicidade, porém, não poderá abranger os dados. relativos à reserva da vida privada que não constituam meios de prova, podendo e devendo ainda a autoridade judiciária especificar, por despacho, oficiosamente ou a requerimento, os elementos relativamente aos quais se mantém o segredo de justiça.
Porém, o projecto de lei em apreço não abre uma «janela». escancara todas as «portas» e todas as «janelas», ao preconizar que com a acusação termine o segredo de justiça.
Ora, todos os que têm experiência forense sabem que a acusação nem sempre é sustentada no despacho de decisão instrutória. E não sendo, ao publicitar-se o teor da acusação está a prejudicar-se seriamente o princípio da presunção da inocência do arguido, quiçá, o bom nome e a reputação das pessoas objecto de investigação.

Vozes do PS: - Muito bem.

O Orador: - A vingar tal tese de revisão, o segredo de justiça não beneficiaria a investigação criminal nem articularia eficazmente direitos fundamentais constitucionalmente consagrados, acima aludidos.
Tal não acontecerá se abrirmos a tal «janela» e se conferirmos publicidade à instrução quando e a partir do momento em que esta for requerida pelo arguido, salvo se este declarar que se opõe à publicidade, no requerimento de abertura de instrução, e sempre com a ressalva de a publicidade não poder abranger factos relativos à reserva da vida privada que não constitua meios de prova.
Na nossa intenção mora o desejo saudável de se encontrar o equilíbrio entre a liberdade de expressão e informação e o respeito pelos direitos dos cidadãos.
Contrariamente a tal, o presente projecto de lei em apreço, a ser aprovado, feriria o equilíbrio dos dois pratos

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da balança e daria origem a uma hierarquização perigosa entre aqueles direitos, relevando-se exageradamente a liberdade de informação, com a consequente mediatização social em detrimento das «bolsas» de privacidade.
Em termos de Direito Comparado, tal posição entra também em oposição com um número significativo de ordens jurídicas do espaço da União Europeia, nas quais, em princípio, o processo é secreto durante a fase do inquérito preliminar e instrução.
Aliás, a inovação positiva reclamada neste projecto de lei e constante da alínea c) do artigo 53.º poderá perfeitamente ser carreada ou adaptada para a fase de instrução e para o artigo 86.º, de forma a que o segredo de justiça não prejudique a prestação de esclarecimentos públicos, a pedido de pessoas postas em causa relativamente a processos pendentes, quando necessários ao estabelecimento da verdade, ou oficiosamente, em termos excepcionais, quando e na medida do estritamente necessário para a reposição da verdade sobre factos publicamente divulgados para garantir a segurança das pessoas e bens e para evitar a perturbação da tranquilidade pública, nomeadamente em casos de grande repercussão pública, sendo oportuno referir, aqui, posições públicas assumidas pelo Sr. Procurador-Geral da República no sentido de que «a lógica da comunicação poderá impor em muitos casos que quer as magistraturas quer os órgãos de polícia criminal divulguem informação relativa a processos que se encontrem em segredo de justiça»
Também dentro dessa «janela» convirá alargar a possibilidade de reprodução de peças processuais ou de documentos incorporados no processo, a partir da sentença da 1.ª instância, ou restringir a transmissão ou registo de imagens e tomada de som relativamente à pessoa que a tal se opuser, salvaguardando-se dessa forma o direito à própria imagem.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Isso não é nenhuma inovação!

O Orador: - Nenhuma destas inovações que aqui referi subjazem ao presente projecto de lei, que, de forma superficial e ao arrepio de preocupações de consenso sobre tal matéria, não contribui para solidificar a harmonização entre as diversas componentes que fundamentam o segredo de justiça e a necessidade saudável de informar e comunicar.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - O presente projecto de lei não contribui para moderar os inevitáveis excessos de competitividade noticiosa, que atravessam a imprensa escrita e falada, ávida de vastas audiências.
Tal projecto de lei representa uma ruptura na ordem jurídica portuguesa, e sabemos como as rupturas nem sempre são geradoras da justiça e da sua transparência.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A liberdade de imprensa pressupõe o acesso às informações e o direito de ser informado. Não

é, no entanto, este direito absoluto! O dever de informar deve respeitar o princípio da não discriminação e o respeito por regras relativas aos deveres de reserva e segredo profissional, sendo indispensável a independência e a transparência nos tribunais, única forma de se aproximarem os cidadãos à justiça.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - A justiça deve sujeitar-se à crítica pública dos «media» e esse controle público reforça mesmo a imparcialidade e o sentimento da responsabilização do juiz, mas aos jornalistas também se exige uma formação capaz de compreender o funcionamento e a administração da justiça, devendo, dentro do possível, melhorar a sua formação em matéria de Direito Penal e de Direito de Processo-Penal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não pretendemos que os intervenientes processuais, as testemunhas e os magistrados sejam condicionados por julgamentos apriorísticos da comunicação social e opinião pública.
O presente projecto de lei não é, pois, uma resposta consistente às perplexidades e interrogações que a realização de princípios com a mesma dignidade e hierarquia constitucional exigem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Joaquim Sarmento, os Srs. Deputados Odete Santos e Luís Queiró.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joaquim Sarmento, dentro do quadro jurídico que o Sr. Deputado mais ou menos gizou, gostaria que me respondesse ao seguinte: se um jornalista tem acesso a uma acusação, porque, por exemplo, conhece uma testemunha que, não lhe dando a acusação, lhe dá todos os dados, e divulga essa acusação no jornal, comete algum crime ou pode informar aquilo que investigou por sua iniciativa junto de uma fonte directa? Gostava que explicitasse esta questão para saber até que ponto é que a sua teoria vai contra o direito de informar.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, agradeço a questão que me colocou e devo dizer-lhe que respeitamos como um direito sagrado e inalienável que os Srs. Jornalistas não sejam obrigados a revelar as suas fontes.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não foi isso que lhe perguntei!

O Orador: - Está bem, mas está ligado com uma fonte que V. Ex.ª referenciou na questão que colocou.

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Portanto, respeitamos absolutamente o direito de o jornalista divulgar, de acordo com a investigação que fez, os dados que exprimiu no jornal ou em outro meio de comunicação escrita ou falada. Portanto, esse problema não contende absolutamente nada com a reforma que moderadamente preconizamos para a alteração ao segredo de justiça.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Se não fosse a cábula ao lado, escorregava!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joaquim Sarmento, V. Ex.ª subiu à tribuna para reproduzir e ampliar o teor da pergunta ou pedido de esclarecimentos que me fez.
Assim, o que lhe quero dizer é o seguinte: julgo que ambos concordamos que o segredo de justiça tem urna dupla função. E era disso que estava aqui a tratar, muito mais do que da imprensa ávida de escândalos, de que V. Ex.ª falou, tão preocupado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Fez bem! É o mundo real!

O Orador: - Falei da dupla função do segredo de justiça, que é, por um lado, claramente, a de proteger a investigação contra, digamos, os arguidos hipoteticamente culpados e que a podem prejudicar, se tiverem acesso a elementos do processo que isso permitam, e, por outro, também, obviamente, a de proteger os arguidos ou os investigados hipoteticamente inocentes contra a investigação, Julgo que é no balancear destes dois interesses que temos de encontrar o regime mais adequado à defesa do que devem ser os interesses da administração da justiça e também dos direitos fundamentais dos cidadãos.
V. Ex.ª deslocou esta questão para o mundo complicado da sociedade de informação, da comunicação ávida de escândalos e perguntou-me o seguinte: «E se, no seguimento do debate instrutório, surge uma decisão instrutória que desminta a acusação feita na fase da investigação?». Então, pergunto-lhe, Sr. Deputado: e se o réu vier a ser absolvido no julgamento?

O Sr. José Magalhães (PS): - Por esse critério havia o silêncio total desde o primeiro momento!

O Orador: - V. Ex.ª também defende que as audiências de julgamento devem ser reservadas e sigilosas? Levando o seu raciocínio até um certo ponto, se um réu, no terno do seu processo, no seu julgamento, for declarado inocente e não culpado, então, o processo não poderá ser público em qualquer fase. Pareceu-me ser isto que V. Ex.ª quis dizer!
Mas V. Ex.ª também referiu outro aspecto interessante: V. Ex.ª disse que os tribunais não podem ser condicionados por um ambiente de especulação, disto e daquilo.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente! E fez muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª pode dizer que os tribunais são condicionados pela opinião pública na prolação das suas sentenças e das suas decisões? V. Ex.ª pode dizer que há uma tendência nesse sentido? Os tribunais são compostos por Homens, sujeitos, obviamente, a talharem, como quaisquer outros, mas pode dizer que existe esse receio, no conjunto da administração da justiça portuguesa?
Convinha que V. Ex.ª esclarecesse a Câmara sobre estes aspectos.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, se formos elásticos no nosso raciocínio, sobretudo no seu, então, acabamos com o segredo de justiça. Não há segredo de justiça nenhum, em qualquer fase do processo!

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro! Até porque o réu pode vir a ser absolvido!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente!

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Não, Sr. Deputado! Pelo contrário!

O Orador: - E isto até porque, por hipótese, o arguido pode sempre vir a ser absolvido, mesmo tendo sido acusado, mesmo que a acusação tenha sido acompanhada na fase instrutória, e pode ser condenado em primeira instância e ser absolvido no Supremo.

O Sr. José Junqueiro 1(PS): - Exactamente!

O Orador: - Sr. Deputado, têm de haver aqui regras de equilíbrio! E equilíbrio é aquilo que não existe no vosso projecto!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - É que nós não nos fechamos, não bloqueamos, não nos colocamos numa situação de absolutismo, em termos de revisão legal, em relação ao actual Código de Processo Penal. Nós entendemos que deve haver uma revisão dessa figura importante que se chama segredo de justiça, mas o segredo de justiça existe para se fazer luz sobre o conhecimento das coisas. Aliás, se me permite, e sem querer ser académico, tenho aqui um apontamento no seguinte sentido: o termo «segredo» vem da palavra latina secretum, que significa «coisa que deve conservar o culto àquele que a sabe». Em processo penal o segredo não tem por finalidade ficar oculto, pelo contrário, tem por finalidade trazer à luz aquilo que se desconhece.

O Sr. José Calçada (PCP): - Ele sabe!...

O Orador: - Efectivamente, pretendemos que se faça luz sobre a verdade material dos factos. E com a vossa

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revisão processual escancaram-se as portas de tal forma à publicidade que o elo mais frágil do processo, que é quase sempre o arguido, embora nem sempre o seja, fica, no caso de uma acusação infundamentada, estigmatizado em termos de opinião pública e das pessoas que ficam a conhecer o processo. Aliás, a instrução, no actual Código de Processo Penal, já é um instrumento suportado no contraditório...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - ... e, portanto, apenas abrimos uma janela importante, ou seja, o arguido poderá declarar ou não se opor, entendendo-se isso como uma declaração afirmativa de que não se opõe à publicidade.
Portanto, nesse caso, está salvaguardada a tal bolsa de privacidade que, efectivamente, tanto escandaliza os Deputados do Partido Comunista, como sucedeu aqui, há pouco, quando citei Milan Kundera, porque certas verdades doem. Mas, Srs. Deputados, vivemos numa era em que a privacidade tem de ser respeitada e salvaguardada.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É a «insustentável leveza do ser»!

Risos do PCP, do PSD e da Deputada do CDS-PP Maria José Nogueira Pinto.

O Orador: - É a «insustentável leveza do ser»! E, por vezes, a Sr.ª Deputada Odete Santos também é uma figura insustentável!

Protestos do PCP.

Vozes do PSD: - Não apoiado!

O Orador: - Parece-me, Sr. Deputado Luís Queiró, que nós é que vivemos no mundo real e não V. Ex.ª. V. Ex.ª, possivelmente, vive no mundo dos lobbies da publicidade e da informação.

Risos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da honra da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joaquim Sarmento, este debate estava a correr tão bem e V. Ex.ª agora, no fim, estragou tudo. Para que é que V. Ex.ª disse que eu não vivia no mundo real mas, sim, num lobby...

Vozes do PS: - Quiçá!...

O Orador: - ... quiçá, num lobby das agências de publicidade ou lá o que V. Ex.ª disse?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Não é preciso ajuda do José Magalhães!

O Orador: - Na verdade, Sr. Deputado, é inacreditável que V. Ex.ª tenha dito isso! Ninguém o ofendeu e V. Ex.ª não tinha necessidade de ofender ninguém nem de fazer qualquer imputação relativamente às intenções ou a quem eu sirvo ou deixo de servir. Eu, tal como V. Ex.ª, defendo aqui apenas o povo português que me elegeu. E mais não digo!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, tenho a dizer-lhe que nutro por si uma grande estima e aquilo que disse não foi uma crítica pessoal, foi uma crítica pública e política. E esta Câmara é uma câmara política!
Em síntese, aquilo que quis dizer e que volto a repetir agora é que o vosso projecto de lei escancara as portas e as janelas a uma informação que, se não for controlada, põe em causa os direitos dos cidadãos. Era só isto, rigorosamente isto e nada mais do que isto!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Isso não faz diferença nenhuma!

O Sr. Presidente: - Para uma nova intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.

O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Espero que a minha voz não continue a trair-me, mas permitam-me que não puxe demasiado por ela.
Em primeiro lugar, este projecto de lei do CDS-PP é uma tentativa séria para resolver um problema dos mais complexos na vida moderna em que nos encontramos. Saber se é o melhor caminho ou não, eis aquilo que nos une na tentativa de o encontrar, na certeza de que só caminhando faremos o caminho.
Em segundo lugar, quero dizer que hoje de manhã, na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o Partido Social Democrata não pôde, como desejaria, votar favoravelmente o relatório, cingindo o seu voto favorável ao parecer de admissibilidade deste projecto de lei. E porquê? Porque, no seu relatório, o relator, do Partido Socialista; tem uma valoração que não corresponde à do PSD. São dois conceitos de segredo de justiça totalmente distintos que já na revisão constitucional estiveram presentes e, na actual Constituição, finalmente consagrado o segredo de justiça, se não por exigência pelo menos por Finca-pé do Partido Social Democrata, acabou por se conseguir inscrever aquela que nos parece ser a melhor visualização do problema. Por isso, quando hoje, no artigo 20.º da Constituição, se estabelece que a lei define e assegura a adequada protecção do segredo de justiça trata-se da consagração de uma perspectiva jurídico-filosófica, a do PSD, completamente distinta daquela que enformava a visão do Partido Socialista. Expliquemos porquê.
Refere o Sr. Relator, no relatório, servindo-se de um argumento de autoridade do Sr. Provedor de Justiça, que o segredo de justiça «(...) nasceu não para defender a honorabilidade das pessoas mas para não prejudicar a

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investigação criminal (...)». Mais adiante, escreve ainda que «(...) o grande desafio que se coloca é conciliar esses direitos e não hierarquizá-los (...)» - refere-se ao segredo de justiça e à liberdade de informação - «(...) tendo presente que a regra é o direito à informação e a excepção residual, o segredo de justiça.».
Estas são afirmações valorativas que nós, Partido Social Democrata, não subscrevemos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Confunde-se, nesta invocação da opinião do Sr. Provedor de Justiça, segredo de justiça com segredo de Estado, mas são dois conceitos totalmente distintos que não podem ser confundidos. E a ideia de segredo de Estado, que não se confunde com segredo de justiça, essa sim, é que está muito ligada à ideia de arcana imperii, que deve estar subjacente a todo o poder. Ora, não é isso o que está em causa no segredo de justiça.
É certo que hoje, no mundo mediático em que nos encontramos, o grande problema acaba por ser de conflito forte, porventura insolúvel neste estádio, entre o segredo de justiça e a liberdade de expressão e o direito à informação. É certo - e convém que o PSD o diga de modo muito claro - que a liberdade de expressão é, seguramente, um dos direitos mais preciosos do homem, reconhecido à imprensa, esse «cão-de-guarda» da democracia (numa frase célebre do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem) e um dos fundamentos da essência democrática. Dizemo-lo para que não restem dúvidas, completando, todavia, que essa liberdade supõe deveres e responsabilidades, e pode, por isso mesmo, sofrer restrições legais necessárias em sociedade democrática à protecção de outros direitos, também eles fundamentais, do homem e da pessoa humana.
Uma dessas restrições legais, um desses limites à liberdade de expressão reconhecida à imprensa, é justamente a presunção de inocência de toda e qualquer pessoa até ao trânsito em julgado de sua condenação. É um direito fundamental, proclamado desde sempre, a começar na Revolução Francesa, continuando na Declaração Universal dós Direitos do Homem, na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, etc., e também na Constituição da República Portuguesa. Trata-se de uma consequência da protecção da liberdade individual e, por isso, no âmago da questão da dignidade humana. Se quiséssemos até hierarquizar, este seria mesmo um princípio superior à própria-liberdade de expressão, à qual se impõe e, por isso mesmo, tende a limitar.
Sendo este o pano de fundo, então, a questão não está no segredo de justiça, com várias finalidades, entre as quais também a da salvaguarda desse grande princípio da presunção da inocência. A grande questão não estará, por isso, no segredo de justiça mas na violação do segredo de justiça.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como, então, proteger melhor, na sociedade comunicacional em que nos encontramos, esse outro grande valor, a presunção da inocência? Eis a questão que importa colocar, porque só colocando bem uma questão se poderão encontrar boas soluções: como proteger melhor, numa sociedade de comunicação, a presunção de inocência?
Acrescentemos ainda que o segredo de justiça tem outras finalidades nobres, uma delas, seguramente, servir a verdade. Assim, na fase do inquérito, na fase da investigação, fase preliminar de recolha de indícios de prova, a protecção da sociedade contra o crime - possível, eventual crime - leva a que, para nós, seguramente o segredo de justiça seja intocável, absoluto. É que convém não desarmar o Estado para procurar descobrir a verdade e combater o crime. Em segundo lugar, o segredo de justiça tem, seguramente, de servir a presunção da inocência, já aqui focada, tanto na fase preliminar do inquérito como nas fases subsequentes, onde o princípio da presunção da inocência continua a vigorar - e esse é sempre até à fase final de trânsito em julgado. Teoricamente, portanto, o modelo do actual Código de Processo Civil e de muitos outros, com o segredo de justiça ainda na fase da instrução, tem muita razão de ser pelo valor da presunção da inocência, seguramente, mas ainda até pela parte de servir a verdade e de recolher a prova suficiente da acusação, uma vez que, depois, a fase da instrução, como todos sabem, é ainda uma fase preliminar que visa a comprovação judicial da decisão de deduzir a acusação.
É nessa parte que, para nós, PSD, podem abrir-se, de facto, outras excepções, a juntar-se àquelas já previstas no actual Código de Processo Penal. Designadamente, se a instrução é facultativa e requerida pela parte interessada o acusado -, pode perfeitamente deixar-se nas mãos do acusado a liberdade, a faculdade de requerer o levantamento do segredo de justiça, na medida em que entenda que, face ao julgamento na praça pública de que está a ser objecto, melhor pode defender a sua imagem, o seu bom nome e a sua reputação. Por isso, é perfeitamente plausível que, na fase da instrução, onde, por princípio, se continua a justificar o segredo de justiça, todavia se possa acrescentar «salvo se o acusado requerer o seu levantamento». E, mesmo assim, o juiz, em nome do outro grande valor - o valor da verdade - e de outros valores, ponderará se deve levantar o segredo de justiça e ir para a publicidade, pelo menos nas mesmas circunstâncias em que o pode fazer actualmente na fase do julgamento que tem por princípio a publicidade mas, excepcionalmente, pode justificar-se a audiência não pública.
Ora, tudo isto porque são muitas as circunstâncias, dados os tempos diferentes da justiça e da comunicação social, em que a honorabilidade das pessoas e a presunção, longe de ser a presunção da inocência, acaba por ser a presunção de culpado. A gestão dos tempos na comunicação social e na justiça é totalmente diferente: a justiça exige reflexão, ponderação, tempo para sopesar - por isso o seu símbolo é a balança -, exige muito bom-senso, muito equilíbrio no sopesar de todas as circunstâncias, e também a audiência da outra parte, audi alteram partem. A comunicação tem o seu tempo totalmente diferente: é o tempo da celeridade, da rapidez, é o tempo do sensacionalismo, é o tempo onde o importante é ver quem chega primeiro à notícia e a divulga. Mas, com isto, sofre graves riscos o cidadão, que, longe de ver garantida a presunção da inocência, é posto na praça pública como culpado, mais do que um simples presumido culpado até. Por isso, o

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segredo de justiça, se levado à outrance da sua origem, acaba por ser um segredo da presunção de culpado e não da presunção de inocência. Sendo assim, permita-se que, a requerimento do acusado, possa levantar-se esse véu, para que não sirva de capa a uma verdade não demonstrada, não provada.
E não nos esqueçamos de que cabe a quem acusa provar os factos, provar aquilo em que fundamenta a acusação, e não à vítima inocente demonstrar que não são verdadeiros.
Estes problemas são, de facto, complexos, delicados e, por isso, a nossa contribuição, hoje mais de ordem doutrinária e valorativa, ou jurídico-valorativa, amanhã com outro status. Nós próprios, PSD, apresentaremos as nossas alternativas nesta matéria, como esperamos que o Governo traga também à Assembleia a sua solução para o problema, hoje um problema no coração da própria sociedade democrática, na certeza de que, em conjunto, poderemos assim encontrar a solução e na certeza também de que uma das principais, se não mesmo a principal, missões de soberania do Estado é assegurar uma justiça aequa, rápida e pronta, mas sempre uma justiça justa.
(O orador reviu.)

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero dizer que há pouco fiquei surpreendida quando o Sr. Deputado Luís Queiró, a propósito desta matéria, associou a esquerda ao partido do Kundera, ao Partido Socialista.
Sr. Deputado, penso que não ouviu bem o que eu disse no meu pedido de esclarecimento: disse que o projecto de lei do PP continha linhas que nos pareciam correctas em relação ao segredo de justiça e que não absolutizava o segredo de justiça nem impedia nem restringia o direito à informação. Devo dizer-lhe até que, em aparte, comentei, em relação às duas intervenções, que tinham mudado de bancada porque me surpreendeu o facto de o PP apresentar este projecto de lei e que fiquei muito surpreendida com a intervenção do PS, que é muito diferente de outras intervenções feitas em alturas passadas, sobre esta questão do direito à informação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, acho que se impõe, dadas as circunstâncias que enquadraram a apresentação do presente projecto de lei, que se comece por precisar um facto que consideramos indesmentível: - na alteração do regime actual do segredo de justiça, confluem interesses de todos - dos cidadãos, da magistratura e da comunicação social. Os cidadãos vítimas de crimes pretendem que o segredo de justiça se limite ao estritamente necessário à investigação dos crimes de que foram vítimas; os arguidos beneficiarão de que o segredo de justiça se limite ao que é estritamente necessário à defesa do seu bom nome e reputação, assegurando tal direito, por exemplo, a revelação pelo tribunal, em resultado de acto de investigação, de que, afinal, o crime participado (que até pode estar já na comunicação social) não foi de tal gravidade, embora possam prosseguir investigações no sentido de um crime menos grave - isto é em benefício do arguido. A magistratura beneficiará porque se tornará mais transparente, nomeadamente se puder ela própria ajuizar sobre se determinados actos investigatórios ainda devem estar sujeitos ao segredo de justiça, e porque, desta forma, se cimentará a sua independência. Os jornalistas verão reforçado o seu direito de acesso às fontes de informação, direito fundamental consagrado na Constituição da República; o próprio sensacionalismo de alguma comunicação social, que é ditado pelos que mandam nessa comunicação e ordenam aos profissionais que ajam de determinada maneira, perde assim margem de manobra.
Este é o quadro que impõe a alteração das normas de processo penal relativas ao segredo de justiça, sem esquecer a necessidade de alteração de algumas outras, em nome de direitos constitucionais, como acontece com as relativas à proibição de testemunhar sobre aquilo que o Governo considere segredo de Estado, porque isso representa uma submissão da justiça ao poder executivo, uma manifesta violação do princípio da separação de poderes. Esperamos para ver se no próximo Código de Processo Penal este artigo estará alterado!
Isto sem esquecer algumas normas do Código de Processo Penal que têm tido a leitura inconstitucional que permite a coacção sobre o jornalismo de investigação para revelação das fontes de informação e sem esquecer também a proibição de apresentação de declarações de voto dos juízes discordantes de sentenças penais, apenas nos tribunais de primeira instância.
É, pois, vasto o campo em que terá de haver uma alteração do secretismo, tanto do secretismo de Estado como do secretismo da justiça.
Os magistrados do Ministério Público e os magistrados em geral há muito - ruas há muito mesmo! - que vêm chamando a atenção para a necessidade de alterar o segredo de justiça, que, visando proteger a investigação e, simultaneamente, o bom nome e reputação dos cidadãos, asseguraria também a independência da magistratura contra lobbies de pressão.
Recentes exemplos evidenciaram que a extensão do segredo de justiça, para além da investigação, foi origem de violentos ataques à Magistratura.
De facto, embora o segredo de justiça não esteja configurado no Código em termos absolutos, a verdade é que a forma desproporcionada de protecção do mesmo, que tem passado despercebida sempre, que são estratos sociais anónimos a confrontarem-se com a violação do seu bom nome - parece que o não têm, já que ninguém se importou -, desvaloriza o segredo de justiça, apaga-o da consciência social, por forma a que o mesmo é violado quase quotidianamente, sem a consciência, no público em geral, de que se está a cometer um crime, contribui para a imprensa sensacionalista, ofendendo o jornalismo sério de investigação. Este quadro forma uma cena mediática forte avessa ao jornalismo sério, retira transparência e enfraquece as instituições democráticas.
Será no equilíbrio de todos os interesses em confronto, os quais podem e devem ser harmonizados, que deve ser reformulada a legislação processual penal em tudo o que o que contenha um secretismo que não se coadune com os critérios de adequação, proporcionalidade e necessidade na restrição a direitos constantes do artigo 18.º da Constituição da República; que deverá ser reformulada a

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lei processual penal em tudo o que contenda com direitos e liberdades fundamentais, como a liberdade de imprensa, e naquilo que se confronte com a independência dos magistrados, com a transparência da justiça em relação ao segredo de Estado, impedindo a investigação de crimes.
A rolha que se coloca aos magistrados vencidos nas decisões, impedindo-os de divulgar, em declaração de voto, a sua posição, envergonha o regime democrático que assenta, afinal, no exercício do direito de crítica.
O projecto de lei que discutimos, já o disse, contém algumas linhas que, penso, são de acolher para a reformulação desta questão do segredo de justiça, embora, como também já disse, se possa, nesta matéria, dar passos mais importantes.
Somos, pois - e estou a terminar - pela adequação do segredo de justiça à democracia, pela alteração de regimes previstos num Código apresentado e aprovado pelo PSD, que fez o mal e a caramunha, Código esse que não considerou o arguido, neste aspecto, um sujeito de direitos.
Mas bom é que se saiba que a administração da justiça não está acima do direito de informar, mesmo quando aquela recobre direitos e garantias fundamentais, porque, em matéria de direitos, liberdades e garantias. não se pode estabelecer uma hierarquia entre os bens jurídicos e as respectivas normas.
O direito de informar não existe apenas para satisfazer curiosidades, porque, então, não seria direito de informar. O direito de informar cumpre uma função social. O jornalismo de investigação pode lançar mão de fontes que tenham conhecimento directo dos factos relacionados com um crime, mesmo que esteja pendente um processo, sem que esteja a cometer um crime de violação de segredo de justiça, e não pode ser coagido á revelar as suas fontes de informação, porque os jornalistas não são polícias nem seus ajudantes.
Como dissemos, a conformação do segredo de justiça com a matriz democrática da lei processual penal contribuirá para o reforço dos direitos dos cidadãos, dos direitos dos magistrados, dos direitos dos profissionais de informação.
É nesse quadro que propugnamos a extirpação de secretismos e violências constantes do actual Código de Processo Penal que não se coadunam com a democracia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os 95/VIII - Estabelece o regime de negociação colectiva e a participação dos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público e 106/VII - Altera o Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho (Princípios gerais em matéria de emprego público, remunerações e gestão de pessoal da Administração Pública).
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr. Ministro Adjunto (Jorge Coelho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O regime de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores da Administração Pública, constante do Decreto-Lei n.º 45-A/84, de 3 de Fevereiro, mostra-se desajustado da realidade actual e incapaz de dar enquadramento legal aos procedimentos de intensa participação e negociação que o Governo vem desenvolvendo com as associações sindicais.
Por isso, o Governo inscreveu no seu Programa a revisão da legislação sobre o direito à negociação e concertação social na Administração Pública, garantindo a audição das associações sindicais. Da mesma forma, o acordo salarial para 1996 e os compromissos de médio e longo prazo que o Governo subscreveu com as associações sindicais previram a constituição de uma mesa negocial sobre negociação colectiva, cujo objectivo era o de proceder à revisão do regime legal em vigor, ampliando-o.
A proposta de lei que o Governo hoje apresenta à Assembleia da República constitui, assim, simultaneamente, uma medida de cumprimento do Programa do Governo e do acordo salarial para 1996.
Os aspectos mais importantes da proposta de lei que hoje apresento a VV. Ex.as e cujo conteúdo normativo espelha o largo consenso obtido durante o processo negocia) são os seguintes:
A vinculação do Governo à adopção das medidas legislativas ou administrativas adequadas ao cumprimento dos acordos obtidos em sede de negociação.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Isto é, a assunção, sem ambiguidades, de que o acordo obtido deixa de constituir mera recomendação mas sim, um compromisso, vinculando directamente o Governo, como órgão, a adoptar as medidas legislativas ou administrativas adequadas ao seu exacto e integral cumprimento no prazo máximo de 180 dias, o que representa algo de novo face à prática negocial pretérita.
Acaba-se, assim, com a indefinição da capacidade negocial das «entidades competentes da Administração», bem como se garante a execução formal e tempestiva dos resultados acordados, já desligados de critérios de oportunidade e conveniência políticas.
Outro ponto significativo e inovador respeita à ampliação das matérias que são objecto de negociação colectiva, nas quais se incluem umas com incidência orçamental e outras ligadas ao regime jurídico da função pública.
Com efeito, a legislação que agora se pretende rever restringia o objecto da negociação colectiva às prestações de carácter remuneratório, às pensões e às regalias de acção social.
Na presente proposta, alarga-se aquele objecto às matérias mais significativas do regime jurídico estatutário da função pública, designadamente as relativas à constituição, modificação e extinção da relação de emprego, ao regime das carreiras, das férias, das faltas e das licenças, da duração de trabalho, do recrutamento e selecção de pessoal, do estatuto disciplinar, da formação e aperfeiçoamento profissional.
Reconhece-se, assim, uma verdadeira negociação do quadro estatutário dos trabalhadores da Administração Pública.
Aspecto igualmente novo respeita à caracterização do procedimento negocial anual, em articulação com a votação da proposta do Orçamento, sem prejuízo de as matérias sem incidência orçamental poderem ser objecto de negociação a todo o tempo.

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Efectivamente, o procedimento de negociação ora proposto disciplina o período da negociação geral, que se assume expressamente como anual, iniciando-se a partir de 1 de Setembro com a apresentação, por uma das partes, de proposta fundamentada e calendarizando-se as negociações de forma a terminarem antes da votação final global da proposta do Orçamento.
Quanto às matérias sem incidência orçamental, elas podem ser objecto de negociações a qualquer momento, desde que as partes o acordem e não tenham sido discutidas na negociação geral anual.
Prevê-se, ainda, a possibilidade de abertura de negociações sectoriais, em qualquer altura do ano, com a duração que for acordada entre as partes, coordenadas pelo ministro responsável pelo sector de actividade em causa.
Alteração de relevo assinalável é a que respeita à forma de superação de conflitos, em que a negociação suplementar é credibilizada pela sua obrigatoriedade, pela participação dos membros do Governo e ainda pelo facto de não poder ser encerrado qualquer procedimento negocial em curso sobre as mesmas matérias com qualquer outra entidade, enquanto decorrer a negociação complementar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Na verdade, o sistema proposto de negociação suplementar, ao invés do que acontecia antes, afirma-se pela sua obrigatoriedade, desde que requerido nos termos e nos prazos previstos na lei, por a parte governamental ser constituída por membro ou membros do Governo e por, durante a sua vigência propõe-se que seja de 15 dias - não poder ser encerrado qualquer procedimento negocial em curso sobre as mesmas matérias com qualquer outra associação sindical.
Outro ponto significativo é o que respeita ao alargamento das matérias sujeitas à participação e à constituição de comissões técnicas especializadas.
De facto, se, por um lado, a participação na elaboração relativa ao regime geral ou especial da função pública passou, na sua maioria, a ser objecto de negociação, por outro, fizeram-se acrescer ao elenco objecto do direito de participação matérias tão significativas como a elaboração dos programas de emprego, a fiscalização e implementação das medidas relativas às condições de higiene, saúde e segurança no trabalho, as alterações ao Estatuto da Aposentação, a definição da política de formação e aperfeiçoamento profissional da Administração Pública, as auditorias de gestão efectuadas aos serviços públicos, a definição do regime dos acidentes em serviço e doenças profissionais.
Finalmente, uma última palavra sobre um aspecto que, embora já aflorado, tem sido, ao longo dos últimos anos, objecto de controvérsia pela sua insuficiente previsão normativa - a clarificação dos interlocutores no procedimento negocial, em especial no que respeita à parte governamental.
É que a responsabilidade pelo processo negocial pela parte governamental diluía-se sempre por participantes de carácter técnico, sem capacidade negocial activa, o que muitas vezes turvou a transparência e a credibilidade dos resultados obtidos.
Assim, assume-se, aqui e agora, que o interlocutor pela Administração, nos procedimentos de negociação colectiva e de participação que revistam quer carácter geral quer carácter sectorial, é o Governo, no primeiro caso através daquele dos seus membros que tiver a seu cargo a função pública, que coordena, e do ministro das Finanças e, no segundo caso, através do ministro responsável pelo sector, que é agora o coordenador, do ministro das Finanças e do membro do Governo que tiver a seu cargo a Administração Pública.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É também discutida hoje a proposta de lei que visa alterar o Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, alteração parcelar que pretende aclarar, em termos definitivos, o regime do contrato de prestação de serviços na Administração Pública.
Verificou o Governo que vinha existindo um recurso generalizado à celebração de contratos de prestação de serviços, com a subversão dos fins a que estes contratos se destinam. Assim se geraram milhares de situações iníquas de precariedade que, ao abrigo de legislação aprovada nesta Assembleia, estão, hoje, umas resolvidas e outras em vias de resolução.

O Sr. José Magalhães (PS): Muito bem!

O Orador: - A alteração do Decreto-Lei n.º 184/89, que aqui apresentamos. visa essencialmente: aclarar o conceito de trabalho não subordinado, que fica agora vertido no texto legal, não permitindo; por isso, dúvidas conceptuais que possam permitir o recurso a esta figura indevidamente; um esforço de transparência da Administração e de controlo desta quer pelos funcionários quer pelas suas organizações, já que os serviços passam a ser obrigados a afixar listas dos contratos de prestação de serviço celebrados; que os contratos de prestação de serviços celebrados para o exercício de actividades subordinadas - logo, em contravenção à lei sejam nulos por força de lei, sem que essa nulidade se repercuta na esfera jurídica do trabalhador durante o tempo em que prestou serviço; responsabilizar ainda expressamente os dirigentes que recorram a contratos de prestação de prestação de serviços para tarefas de carácter subordinado. Desta forma, se julga poder evitar a proliferação de situações de precariedade e se reconduza a figura aos seus precisos termos.
Também com este diploma se procura, de uma vez por todas, resolver a contratação de pessoal que assegura a limpeza dos serviços. De facto, no processo de regularização de situações precárias, verificámos que 42% das situações, ou seja, cerca de 14 000 pessoas se reportavam a este tipo de pessoal. Porque entendemos não ser admissível que as pessoas que trabalham em tempo parcial vivam em completa insegurança, optámos pela sua contratação em regime de contrato individual de trabalho, com todas as consequências daí decorrentes, nomeadamente em matéria de segurança social.
Também nesta matéria, em consenso alargado com as organizações representativas dos trabalhadores, estamos a caminhar no sentido de uma Administração mais transparente e mais séria, sobretudo na relação com aqueles que a servem.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Moreira da Silva e Rodeia Machado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, gostava de formular-lhe alguns pedidos de esclarecimento relativamente à proposta de lei n.º 95/VII, deixando para mais tarde uma intervenção, que será, necessariamente, mais longa, sobre a proposta de lei n.º 106/VII.
Os esclarecimentos que, desde já, solicito a V. Ex.ª prendem-se com algumas das novidades que o Governo entende estarem presentes nesta proposta de lei, a saber: a vinculação; a ampliação das matérias acordadas em sede de negociação; o alargamento de matérias alvo de negociação colectiva; o procedimento; e, finalmente, a resolução de conflitos.
Sobre a primeira questão, a da vinculação, o Sr. Ministro entende que é uma grande novidade, há muito desejada pelas associações sindicais e pelos trabalhadores da função pública, que se passe de uma fase de mera participação para uma fase de verdadeira negociação colectiva, implicando isso a vinculação do órgão Governo à produção da matéria legislativa ou administrativa que se torne necessária, fruto do acordo a que se chegue em sede de negociação. No entanto, o que vejo nesta proposta de lei é que esta vinculação está totalmente nas mãos do Governo, isto é, por um lado, vincula-se às matérias acordadas, o que significa que se o Governo não der o seu acordo não haverá vinculação, e, por outro - e, se calhar, na maior parte dos casos -, as matérias a acordar, como se lê do elenco de matérias susceptíveis de negociação, têm de ser trazidas a esta Assembleia da República pelo Governo, porque se enquadram na reserva relativa de competência desta Assembleia. Se assim for, a única vinculação que há é a da apresentação, por parte do Governo, a esta Assembleia de uma proposta de lei ou de uma proposta de autorização legislativa. Ou seja, o Governo não se vincula ao resultado que daqui saia, vincula-se apenas a esse meio de apresentação. Por isso, Sr. Ministro, pergunto: existirá vinculação neste caso, quando está nas mão do Governo haver ou não vinculação? É uma questão que, claramente, necessita ser esclarecida.
A segunda questão prende-se com o que há pouco referi, ou seja, relativamente às matérias, ao procedimento e à resolução de conflitos. Sr. Ministro, o Governo tem noção de que, nesta matéria de negociação colectiva, a Administração Pública não é igual a uma empresa privada. O regime em Portugal não é igual ao regime dos Estados Unidos da América ou ao da Grã-Bretanha. O regime de Administração Pública em Portugal faz depender dos princípios da legalidade, da proporcionalidade, da imparcialidade, faz depender de variados princípios, com regime constitucional preciso, a actividade da Administração Pública. Esta vinculação que o Governo presumivelmente pretende com esta proposta de lei, poderá, nalguns casos, ferir este regime constitucional da Administração Pública.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Se com esta proposta, o Governo quer dar um sinal de que a esta legislação da função pública se aproxima do regime do direito laboral, não estará o Governo a esquecer que a Administração Pública não é igual às empresas privadas e que, por isso, o direito laboral privado nunca pode ser transposto tal qual para o direito da função pública, que está sujeito, como toda a actividade da função pública, a um regime específico, que impedirá, na maior parte dos casos, a mera transposição do direito de contratação colectiva que está previsto para as empresas privadas?
Em resumo, esta proposta de lei pode ter muitas intenções, mas, por um lado, está contra, se for até ao fim, o regime constitucional e, por outro, é uma vinculação que, se calhar, não existe.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - O Sr. Ministro vai ter dificuldade em responder!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Moreira da Silva, é evidente que não tenho a ousadia de vir dizer que esta iniciativa legislativa é uma grande novidade; no entanto, já digo que é uma novidade, é uma coisa nova, positiva, porque foi resultado da negociação e da discussão com as organizações representativas dos trabalhadores, o que é positivo, e essa, sim, é a nova forma, que tem havido, de legislar na Administração Pública. Garanto-lhe que dá muito mais trabalho, mas também dá mais resultados.
Nos últimos dois anos, na Administração Pública, já conseguimos chegar a acordo em 30 áreas diferentes, sempre em concertação com os sindicatos e em vinculação com aquilo que temos acordado. Ora, isso é positivo, é novo, porque no passado isso nunca aconteceu. É pena, porque teria havido melhores resultados do que os que, infelizmente, houve!
Quanto à questão da vinculação à matéria acordada em termos de negociação, é evidente que para haver acordo tem de haver aceitação da parte do Governo, o que só pode verificar-se em matérias em que o Governo esteja de acordo, porque senão não teria sentido, nem no direito da Administração Pública nem no sector privado. Isto é assim, sempre foi assim e é a base de uma negociação.
Perguntou-me também como é que são as disposição constitucionais e como é que tudo isto funciona. Bem, o problema é que Portugal vive num Estado de direito e num Estado de direito é assim.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Isso não é problema!

O Orador: - O que acho curioso na intervenção do Sr. Deputado é que levantou algumas questões, mas não emitiu opinião sobre elas.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Fiz-lhe um pedido de esclarecimento!

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O Orador: - Sim, fez um pedido de esclarecimento em que levantou algumas questões e acabou por não dizer como é que resolveria os problemas. Como, no passado, em relação a esta matéria, o partido de V. Ex.ª fez «zero», agora podiam ter apresentado alguma coisa de novo! Um Estado de direito é assim!
É evidente que a legislação da Administração Pública é diferente da das empresas privadas, mas é por isso que esta lei tem disposições diferentes das disposições sobre o direito do trabalho relativamente às empresas privadas.
Esta é a nossa proposta, é a novidade que é, resultado de uma negociação profunda com as organizações sindicais, mas é evidente que admitimos sempre que possa haver outras alternativas. Estas são as que apresentamos, porque nos parecem ser as mais correctas e que vão ao encontro de milhares e de milhares de pessoas que; em relação a muitas destas áreas, estavam à espera de soluções alternativas, uma vez que, durante anos, infelizmente, muitas matérias eram acordadas e depois nunca passavam nem à letra de lei, nem à sua concretização. A nossa proposta é precisamente para evitar que essas coisas aconteçam.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro Adjunto, gostaria de saber se V. Ex.ª está ou não de acordo que o sistema imposto no artigo 7.º da proposta de lei n.º 95/VII, que diz respeito à negociação colectiva e à sua calendarização, sistema esse imperativo da negociação, pode passar de imperativo a uma situação mais suave. Ou seja, o que se pretende é que, efectivamente, não seja um calendário apertado para que não condicione as partes a essa negociação. Em nosso entender, ela deve ser uma boa negociação, as partes devem estar disponíveis para isso, mas não deve ser criado na lei um sistema que seja um espartilho e uma condicionante a esse próprio calendário negociai.
Como V. Ex.ª sabe, desde há anos a esta parte que nas negociações da função pública há matérias muito sensíveis que necessitam de tempo mais dilatado para discussão. Dizer que a negociação inicia-se a partir de 1 de Setembro e termina obrigatoriamente até ao debate do Orçamento do Estado parece-nos excessivo. Daí que perguntemos: está V. Ex.ª em condições de dizer-nos se, em sede de especialidade, há ou não possibilidade de discutirmos esta matéria e de acrescentarmos o que acabámos de propor?
Por outro lado, em relação à precariedade de emprego na função pública, nós estamos de acordo que a mesma termine de vez, mas o que temos visto nos últimos tempos é que isso não foi conseguido.
Assim, a minha pergunta, Sr. Ministro, é no sentido de saber se, após a aprovação da autorização legislativa que deu lugar ao Decreto-Lei n.º 195/97, acabou a precariedade de emprego na função pública, porque, tanto quanto sabemos, houve contratações a prazo para as escolas, e não foram poucas! Gostaria que o Sr. Ministro nos dissesse qual o número de contratos a prazo que são, efectivamente, precários, em nosso entender. Por que não o descongelamento dás vagas e contratos de provimento, que seria o acertado para esta matéria?
Por último, em relação à proposta de lei n.º 106/VII, gostaria que me dissesse se, quanto à nulidade do contrato de trabalho que é feito por culpa do dirigente da função pública e não por culpa do trabalhador que é contratado, não entende que se deveria aplicar a lei geral do trabalho, de forma a que o trabalhador: não seja prejudicado por culpa do dirigente que contrata esse mesmo trabalhador, trabalhador esse que, repito, não tem qualquer culpa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodeia Machado, em relação à primeira questão, é evidente que ela pode ser discutida em termos de especialidade, mas digo-lhe, com sinceridade, que sempre estive convencido de que esta era uma questão fundamental para os sindicatos. Estou disponível para discutir este assunto em sede de especialidade, mas eu, se fosse dirigente sindical, queria ter alguma limitação para poder obrigar quem está a negociar comigo a resolver a questão antes da aprovação do Orçamento do Estado. Porém, repito, é uma questão que podemos colocar em sede de especialidade, pois há abertura para a discutirmos.
Contudo, se o objectivo é o de facilitar mais a vida às pessoas que representam os trabalhadores, acho que o que consta deste diploma defende mais do que a opinião contrária. No entanto, podemos discutir o assunto sem qualquer tipo de problema.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - 1 de Setembro, sim! 15 de Outubro, não!

O Orador: - O Sr. Deputado é sempre muito desconfiado sobre o que está nos diplomas do Governo. Tem de passar a confiar alguma coisa..., mas vai no bom caminho!
Relativamente à segunda questão, devo dizer-lhe que se há coisa que eu não costumo fazer é «pôr a cabeça debaixo da areia» e não reconhecer questões que nem sempre correm a 100%, como eu próprio gostaria. É o caso do trabalho precário. Estamos a ter algumas dificuldades, mas estamos a ter também muita determinação em resolver este problema e ninguém vai ficar prejudicado. Agora, é evidente que estamos um pouco atrasados. Os concursos já deviam ter sido abertos no mês de Setembro - aliás, já foi feita uma circular pela Direcção-Geral da Administração Pública no sentido de que os mesmos sejam abertos -, mas há uma razão para que isso aconteça: é que os serviços querem abrir os concursos só quando estiverem identificadas todas as situações em cada serviço, e faltam muito poucos para se chegar ao fim.
Reconheço, e assumo, a responsabilidade de que este problema já devia estar resolvido. Estamos com algum atraso, mas o problema vai ser resolvido sem prejudicar ninguém. É evidente que isto também acontece porque apareceram mais situações do que aquelas que existiam e nós não queremos prejudicar ninguém. Todas as situações

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estão a ser analisadas convenientemente para que ninguém possa ter, nesta matéria, razão de queixa justa relativamente a este processo.
Quanto à última questão, eu não acredito - e se ler bem o diploma, verificará isso, aliás, leu-o bem com certeza, porque sei que lê bem todas estas coisas - que, com as penalidades que estão previstas no diploma para um dirigente de um serviço, que são, por exemplo, a de ele próprio repor o vencimento que esteve a ser pago indevidamente a uma pessoa e isso ser motivo suficiente para poder cessar a sua comissão de serviço, haja algum dirigente, depois deste diploma aprovado, que ouse fazer aquilo que tem sido norma até há bem pouco tempo fazer na Administração Pública.
Portanto, esta é uma forma de, em conjunto, tomar as medidas legislativas para fazer face a este problema. Penso que vamos conseguir fazê-lo depois de aprovada por esta Assembleia esta proposta de lei.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 95/VII, na sua essência, confere o quê? Confere aos trabalhadores da Administração Pública um verdadeiro direito de negociação colectiva, direito esse que eles não tinham, como o Sr. Ministro bem sabe, ao dar a esta e aos acordos através dela alcançados um carácter vinculante. Ora, isto pode parecer uma situação positiva. Aliás, porque estou a substituir um colega, só hoje peguei na proposta de lei.
O Sr. Ministro falou em facilitar a vida aos trabalhadores, mas esse não é o seu objectivo, apesar de o propósito desta proposta de lei parecer ser só isso. O que acontece é que o Estado não é um patrão como os outros patrões e, por conseguinte, ao tornar vinculante para o Estado os acordos alcançados através da negociação colectiva e transformando-os em decretos-leis, em decretos regulamentares, etc., o Governo está a enxertar num corpo que tinha alguma lógica - devia, pelo menos, ter alguma lógica e alguma filosofia subjacente - um conjunto solto e sazonal de decisões que resultam de forças negociais.
Na actividade empresarial privada, é lógico que isso aconteça; só que o senhor não é patrão, o senhor é um ministro circunstancial. O que lhe dá a si o jus imperii que o senhor tem e eu não tenho - é o facto de o senhor estar a defender o interesse público, que nem sempre é o interesse dos trabalhadores.
Por isso é que eu, com todo o respeito pelos trabalhadores, desde já os afastei desta discussão, porque o resultado da aprovação desta proposta de lei é, de forma definitiva, atirar para o Estado a obrigação de assumir aquilo que não é mais do que o produto, a cada momento, da relação de forças.
Ora, não ouvi nada, por exemplo, sobre despedimentos, sobre reconversões profissionais, sobre assiduidade, ou seja, não ouvi nada sobre um conjunto de deveres que teriam de ser reordenados face a um direito que é muitíssimo importante e que é o de, através da negociação colectiva, poder fazer lei.
Acho que isto depende de algo fundamental: da concepção que se tenha do Estado. Se o Estado não serve para nada, então, sim senhor; se o Estado serve para alguma coisa, então pergunta-se: serve para quê? Aliás, eu sempre achei que o Estado serve para muita coisa e que ao Estado competia, cabia e caberá, com certeza, a defesa de interesses essenciais. Portanto, se assim é, isto não é mais do que uma cedência a uma ambição antiga, que todos nós conhecemos, só que com consequências, penso eu, altamente gravosas.
De facto, não consigo compreender como é que isto vai funcionar, ou seja, como é que se vai compatibilizar o que vier a ser recebido por força desta contratação colectiva com o corpo normativo que existe e que é característico da função pública.
É que quando falamos da função pública como algo diferente, por exemplo, do conjunto dos trabalhadores da Lisnave é precisamente porque a função pública tem uma função diferente, como diria Monsieur de La Palice e todos nós! Ou seja, não têm a mesma função e daí que tudo seja específico e o Direito tenha procurado dar corpo a essa especificidade.
Direi, pois, que se está a dar um passo no escuro, um passo gravíssimo. Aparentemente é algo simpático, agradável para os trabalhadores, mas nós, nesta sede concreta e neste momento concreto, estamos preocupados com outras coisas.
Não sei como vai compatibilizar no sentido de que o jus imperii tem como contrapartida a defesa do interesse público, a recepção permanente de consequências de forças negociais.
Em relação à proposta de lei n.º 106/VII, devo dizer que ela é uma cópia daquilo que já várias vezes foi aprovado e publicado no Diário da República, não tem particular novidade.
Diz o Sr. Ministro que a comissão de serviço pode ser dada de imediato como finda. Bom, toda a gente sabe que um director-geral está também subordinado a um estatuto disciplinar, portanto se desobedece, nomeadamente, de disposições legais, a sua comissão de serviço pode ser dada por finda, pelo que isso não tem nada de novo - aliás, nem devia estar numa lei, porque é uma vergonha, pois quem não obedece e quem não cumpre o que está prescrito deve ir embora.
Este diploma tem um conjunto de retaliações sobre o director-geral desobediente como ao longo de décadas sempre se criaram, ou seja, a reposição, etc. - aliás, o Sr. Ministro já aqui tinha trazido essa matéria num outro debate. Isto para lhe dizer o quê? O problema dos tarefeiros, dos contratados e dos clandestinos - que tem tido vários nomes, mas a situação é sempre a mesma -, do meu ponto de vista, radica em duas questões: primeira, os quadros são mal feitos, porque os serviços que têm competência para estabelecer uma dotação correcta para aquilo que fazem e que lhes é pedido depois vêem os seus quadros escortinhados pelos organismos centrais, quer do Ministério a que pertencem ou que os tutela, quer do Ministério das Finanças; segunda, a enorme dificuldade em preencher esses quadros pela forma normal, que são as quotas de descongelamento. Ou seja, os quadros já nascem

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tortos, não são preenchidos porque não há quotas de descongelamento, os trabalhos têm de ser feitas e, por conseguinte, contrata-se desta forma.
O Sr. Ministro pode assustar à vontade os directores-gerais que, se esta legislação for aprovada, daqui a 7 ou a 10 anos, vai ter os tarefeiros a fazer as mais variadas coisas, com os mais variados nomes.
Assim, o que quero perguntar-lhe é o seguinte: nem ao menos se explicita quando é que um serviço público pode recorrer a este tipo de contratos? Quero eu dizer: o senhor encontrou muitos tarefeiros que varriam e limpavam, sabendo nós que hoje em dia há recurso frequente ao out sourcing nessa área, portanto é uma atitude premeditada chamar tarefeiros para limpar, porque não se quer contratar uma empresa de limpeza. Pergunto: com esta proposta de lei, o que é que o Sr. Ministro avança? Absolutamente nada! Diz que se recorrerá excepcionalmente - já o sabemos -, mas não diz concretamente em que circunstâncias. Recorre-se porque, de repente, não há quem mexa no computador, porque é preciso abrir uma porta, porque é preciso varrer, porque há trabalho altamente qualificado e não há técnicos superiores habilitados? Quando é que se recorre?
Creio que, ao menos, era mais eficaz traçar-se um quadro em que esse recurso era possível do que, eventualmente, assustar os directores-gerais, porque da minha experiência, que é alguma, posso garantir-lhe que eles são «inassustáveis» nesta matéria.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto; ouvi-a com atenção e pareceu-me que existe no seu espírito uma razoável confusão entre o que é, de facto, bom e aquilo que parece bom. É que as questões que colocou, nomeadamente a da negociação colectiva, não são questões que parecem, são questões que são, de facto, boas!
Julgo que a Sr.ª Deputada sabe que até agora as relações dos sindicatos da Administração Pública com o Governo, em matéria de contratação colectiva, não eram verdadeiras relações de contratação colectiva mas, sim, relações de «faz de conta».

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Agora também continuam a ser!

O Orador: - Não! Não continuam a ser, porque se o Sr. Deputado não leu, eu recomendo-lhe a leitura atenta do n.º 3 do artigo 5.º que responde às suas dúvidas,...

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Não diga isso!

O Orador: - ... porque aquilo que é uma dúvida para si - e o Sr. Deputado não leu com atenção ou, então, não percebeu bem o que leu, mas admito que não tenha lido com atenção -...

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Pois, é um problema de interpretação!...

O Orador: - ... - não constitui dúvida para a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, pois para ela é uma certeza.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Estou seguríssima!

O Orador: - Ou seja, o que é dúvida para si para ela é uma coisa má!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É a má consciência!

O Orador: - Creio que a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto percebeu exactamente que o que aqui está é a vinculação do Governo, é o acabar do «fazer de conta». Nisso estamos de acordo! Agora, onde não estamos de acordo, de modo algum, é na continuidade do «fazer de conta», porque os trabalhadores da Administração Pública têm a mesma dignidade dos restantes trabalhadores do País e ao menos o interlocutor, que, neste caso concreto, é o Governo, tem obrigação de se vincular, porque um dos princípios da negociação colectiva é o da boa fé das partes e não pode uma das partes, que é constituída pelos sindicatos, estar a negociar com a outra parte, que é o Governo, através de um «faz de conta», de um qualquer 4.º secretário, com o devido respeito pelos directores ou por um outro qualquer funcionário superior.
O Governo tem de estar representado, como agora tem estado e bem, na mesa de negociações e ao menos ele tem de estar submetido ao principio da boa fé e vincular-se. Depois, obviamente que naquilo que é da sua competência traduz essa vinculação em decretos-leis; no que não é da sua competência, submete à Assembleia da República, que assumirá as suas responsabilidades perante os documentos que lhe são postos à discussão, aprovando-os ou não.
Por isso é que eu não percebo que a Sr.ª Deputada diga que aquilo que parece um bem, afinal de contas, é um mal. Não é! Continua a ser um bem e é, sobretudo, o respeito pela dignidade dos trabalhadores da Administração Pública. A dignificação da tarefa da função pública leva a que as relações na Administração Pública com os cidadãos venham a tornar-se relações de natureza mais clara e, sobretudo, mais incentivadora em que os trabalhadores acabam por sentir-se respeitados. Foi isso que o Governo fez, e muito bem.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, o Sr. Ministro trouxe aqui uma proposta sindical e o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira defendeu-a sindicalmente!

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Ó Sr.ª Deputada!...

A Oradora: - Mas eu não desrespeito este facto. Só que eu coloquei-me, desde o início deste debate, fora dessa situação. Acho incorrecto e mau para o País que o Ministro, investido de jus imperii, traga aqui uma proposta sindical - tenho de dizê-lo, é um direito que tenho -,

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em vez de trazer a grande preocupação da adaptação do Estatuto da Função Pública àquilo que hoje o Estado precisa de ter - o Estado posto no seu sítio e com as suas novas funções. Já compreendo perfeitamente a sua situação: o senhor é Deputado, penso que é sindicalista e deu a resposta que qualquer sindicalista daria.
Mas eu, como não sou sindicalista, vou, então, explicar-lhe o que é que me preocupa. Vou ler-lhe uma parte do discurso que tinha preparado, mas que não li. Diz o seguinte: «Ainda que o produto do acordado não tenha per si força jurídica como acontece no direito colectivo privado, o acordo é vinculante e a sua integração em diploma legal ou regulamentar de origem pública é obrigatória».
Ora, quais são as consequências disto? É que o Estado perde o controlo do modelo do funcionalismo público. O Governo é livre de chegar aqui e dizer «o funcionalismo público tem esta moldura. A que temos está obsoleta, não motiva. Vamos dar-lhe outra moldura». Mas não foi isso que o Sr. Ministro veio aqui fazer!
Por outro lado, o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira veio dizer que era um «faz de conta». Mas era um «faz de conta» bom ou era um «faz de conta» mau?

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Mau! Todos os «faz de conta» são maus!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Por isso é que este Governo é mau!

A Oradora: - De facto, um «faz de conta» é sempre mau, mas aquilo que o «faz de conta» trazia de prejudicial numa visão sindicalista podia ser a falta de coragem do poder político para dizer que a nível da função pública não faz sentido uma negociação colectiva nestes termos.
Pergunto-lhe: as reformas não são diferentes? O regime de segurança social não é diferente?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - A exigência da produtividade não é diferente? Ou seja, os funcionários públicos, que conheço bem e prezo muito, têm um estatuto todo ele diferente e, portanto, aquilo que está a passar-se - e chamo a atenção da Câmara e do Sr. Ministro - é que bocadinho a bocadinho, neste facilitismo em que vivemos, vai-se dando uma achega aqui e outra acolá, desvirtuando o modelo.
Admito que possa não ser este o modelo - um modelo que eu goste ou que não goste -, mas isto significa que nunca mais haverá coerência alguma dentro do ordenamento jurídico da função pública. Nenhuma! Haverá um ordenamento jurídico da função pública completamente enviesado, sazonalmente, por relações de força que o Governo vai perder, porque penso que os governos são sempre fracos, sobretudo num quadro normativo deste tipo.
Como considero que a diferença entre o regime da função pública e o regime do contrato individual de trabalho radica, sobretudo, no facto de o trabalhador estar integrado na coisa pública ou na coisa privada que têm objectivos completamente diferentes, não tenho relutância em dizer que considero que o estatuto do funcionário público deve ser diferente, no bom e no mau, e não se deve aproximar do outro naquilo que convém e muito menos de uma forma desordenada.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Foram precisos muitos e muitos anos de luta dos trabalhadores da função pública para que matérias como as que hoje aqui apreciamos tivessem lugar nesta Assembleia da República no sentido de discutir os direitos desse importante sector dos trabalhadores portugueses, que são os trabalhadores da Administração Pública.
Governos sucessivos, desde os governos do PS passando pelos governos do PSD, sempre negaram esse elementar direito da negociação colectiva e fizeram do trabalho precário urna forma de recrutamento fácil. Foram esses governos responsáveis pelas políticas de desestabilização do sector laboral da função pública que tantos prejuízos causaram ao País em geral e aos trabalhadores da função pública em particular.
Quando hoje discutimos propostas que são a expressão dessa luta não podemos nem devemos deixar de o referir, em nome dessa luta e dos direitos dos trabalhadores da Administração Pública.
Estas matérias que englobam, por um lado, o regime de negociação colectiva na Administração Pública e, por outro, os Princípios Gerais em Matéria de Emprego Público, Remuneração e Gestão de Pessoal carecem, em nosso entender, de ser melhorados em sede de especialidade por considerarmos que as propostas de lei em causa ficam aquém daquilo que era possível e desejável fazer.
Sem prejuízo das propostas que, em sede de especialidade, poderemos apresentar, queremos desde já afirmar que o Grupo Parlamentar do PCP entende que o prazo taxativo apresentado na proposta de lei n.º 95/VII quanto ao calendário das negociações é inadequado. O mesmo deve prever o prazo do início das negociações a 1 de Setembro, como indicativo, e o terminus das negociações não deverá ser imperativo, ou seja, até à aprovação do Orçamento do Estado. Sabe-se, por experiências anteriores, que há matérias que podem ser discutidas, ou manter-se em discussão, para além da aprovação do Orçamento.
O prazo deverá, assim, manter-se como tendencialmente a terminar até a aprovação do Orçamento do Estado, mas não com carácter imperativo. Tal dispositivo poderia ser condicionante da aprovação de matérias que precisem de uma maior reflexão e análise. É preferível fazer uma negociação assente na disponibilização das partes e não uma negociação «a mata-cavalos» em que o factor tempo funcione como forma de pressão sobre a parte mais frágil.
Por outro lado, as regras não são iguais. Existe um claro desequilíbrio que favorece o Governo, em detrimento dos sindicatos, E colocar essa questão como imperativa é claramente favorecer uma das partes, neste caso o Governo. Daí que, em nosso entender, o prazo deverá ser apenas indicativo, tendo em conta todas as condicionantes atrás enumeradas.

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Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Outra das matérias que entendemos que deve ser objecto de melhoria diz respeito ao Estatuto da Aposentação, Acidentes em Serviço e Doenças Profissionais. Não faz sentido que estas matérias, importantes como são para os trabalhadores da Administração Pública, fiquem fora da negociação. E o que é mais grave é que, no tocante ao Estatuto da Aposentação, o Governo a considere apenas matéria para consulta aos sindicatos.
Quer isto dizer que os trabalhadores da Administração Pública não têm o direito de discutir e negociar uma matéria tão importante como é o seu Estatuto de Aposentação e para onde contribuem durante toda uma vida de trabalho. Ou seja, a carreira contributiva de qualquer trabalhador, nomeadamente o da função pública, comporta direitos fundamentais, que devem ser respeitados, e que qualquer modificação ou alteração no seu Estatuto deve ser objecto de negociação com as estruturas representativas dos trabalhadores. Em nosso entender, esta posição do Governo é insustentável e deverá ser objecto de alteração em sede de especialidade.
Quanto à proposta de lei n.º 106/VII, podemos, desde logo, afirmar que a mesma incide - e o Sr. Ministro já o disse - apenas sobre um aspecto parcelar do regime de prestação de trabalho na Administração Pública, o que, em nosso entender, é manifestamente insuficiente. O Governo faz, nesta matéria, a reafirmação que fez quanto aos recibos verdes, a de eliminar possíveis fraudes e acabar de vez com o trabalho precário na função pública. Boas intenções, mas que na prática se traduziram em pouco.
Já depois de aprovarmos aqui a autorização legislativa que deu base ao Decreto-Lei n.º 195/97 foram contratados a prazo cerca de 5000 trabalhadores só para as escolas, quando o processo normal seria o descongelamento de vagas e a admissão de pessoal através de contrato ele provimento. Esse seria o caminho normal e correcto e não o que conduziu novamente a situações de trabalho preçário.
Por outro lado, o Governo não cumpriu os prazos que a si mesmo impôs para aberturas de concursos no âmbito do Decreto-Lei n.º 195/97 - aliás, o Sr. Ministro disse que havia atrasos para a abertura dos concursos - e sabe-se já que o Tribunal de Contas não vai conceder vistos aos concursos que foram abertos fora do prazo que o diploma impôs. Significa isto que o Governo vai pedir nova autorização legislativa para alterar os prazos que não cumpriu? É a pergunta que faço ao Governo.
Por último, quero deixar aqui bem vincado que a nulidade do contrato, constante da proposta de lei n.º 106/VII, é um ,princípio que consideramos desadequado, já que o trabalhador contratado não pode, nem deve, ser penalizado por um acto cuja responsabilidade cabe ao dirigente da função pública, contrariando, aliás, um princípio exarado na lei geral. Será que o Estado pretende, através do Governo do Partido Socialista, ser excepção no sentido negativo? Em nosso entender, o trabalhador não deve ser prejudicado pelo facto de o dirigente não cumprir a lei.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, terminamos como começámos: estas matérias hoje aqui em debate são fruto de anos e anos de luta dos trabalhadores da função pública e das suas estruturas representativas, pelo que merecem a nossa aprovação na generalidade. Esperamos que o Governo e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista se disponibilizem para que, em sede de especialidade, possamos melhorar o texto, ou os textos, já que da nossa parte a disponibilidade é total.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, foi com satisfação que há bocado ouvi a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto pôr-me o rótulo de sindicalista. E digo que foi com satisfação porque estas matérias do direito do trabalho - e o Sr. Deputado Rodeia Machado sabe isso são matérias normalmente áridas na Assembleia da República e eu tenho uma especial apetência para o tratamento dessas questões e gosto, de facto, delas.
Sr. Deputado Rodeia Machado, gostaria que reflectisse sobre a sua preocupação quanto às negociações com incidência orçamental - a referência é às negociações que têm incidência orçamental -, portanto com carácter salarial, remuneratório. Em minha opinião, nessas negociações os sindicatos têm todo o interesse, repito, têm todo o interesse que terminem antes da votação final global do Orçamento do Estado, porque senão ficam - e perdoe-me a expressão que é popularuncha - «a berrar» um ano inteiro à espera do Orçamento do Estado seguinte. Todavia, se ler o n.º 2 do artigo 7.º, verificará que «As matérias sem incidência orçamental constantes do artigo anterior podem ser objecto de negociação a qualquer momento...», o mesmo é dizer que não têm necessariamente de terminar antes da votação final global da proposta do Orçamento do Estado. Mas, repito, em relação às matérias que têm incidência orçamental, os sindicatos, os trabalhadores, têm todo o interesse em que terminem antes da aprovação do Orçamento do Estado. Bom, na realidade, aqui tenho aquela costela que a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto referiu e vou pugnar para que se mantenha esta disposição, no interesse dos trabalhadores da Administração Pública.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado, para responder.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Barbosa de Oliveira, agradeço a questão que me colocou mas remeto-lha, pois gostaria que reflectisse também sobre as propostas que aqui fizemos, para além dessa, porque não respondeu a nenhuma. Espero que o seu grupo parlamentar esteja disposto, em sede de especialidade, a reflectir sobre elas de modo a conseguirmos que os textos finais sejam bem melhorados.
Sobre a questão das negociações, quero dizer-lhe que elas se podem prolongar por várias matérias, incluindo a da massa salarial, e naturalmente, como sabe, o Governo tem a dotação provisional onde pode ir buscar o dinheiro para tratar dessa situação. No entanto, não quero entrar nessa questão, porque o que é importante é que a negociação, tendencialmente (foi a nossa proposta) e não como imperativo, termine até à aprovação do Orçamento

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do Estado, mas se não conseguirem não vem mal nenhum ao mundo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Foi isso que propusemos.

Vozes do PCP: - Bem lembrado!

O Sr. Presidente: - Apalavra à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, para um pedido de esclarecimento.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodeia Machado, o senhor é um Deputado do Partido Comunista Português, presumo que bom comunista, presumo que empenhado na situação de todos os trabalhadores portugueses...

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Não presuma, tenha a certeza!

A Oradora: - ... e daí a minha pergunta. Relativamente ao regime das reformas dos funcionários a que há pouco se referiu - e esta proposta de lei pode ter aí alguma influência -, acha correcto que, como já se está a passar agora e decerto se agravará no futuro, os outros trabalhadores acabem, por via dos impostos, por ter de pagar as reformas dos funcionários públicos, que são substancialmente melhores? Esta é a situação: é o esforço dos outros trabalhadores, através dos seus impostos, que sustenta as reformas e a ADSE dos funcionários. Acha que isso é justo?

O Sr. Presidente: = Para responder, a palavra ao Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, não presuma, pode ter a certeza que aquilo que acabou de dizer é certo. Sou efectivamente indefectível na defesa dos trabalhadores portugueses, essa é a minha missão como comunista. Portanto, pode ter a certeza disso, não presuma só.
Em relação à pergunta que me formulou, quero dizer-lhe que os trabalhadores da função pública produzem, logo, também pagam impostos, e o fundo de pensões não tem só as contribuições dos impostos dos outros trabalhadores mas também as daqueles que são funcionários públicos, e eu, como sou funcionário público, sinto-me atingido nessa situação.
Porém, o que é mais grave não é isso mas, sim, as suas afirmações de há pouco que não tive oportunidade de contraditar, o que faço agora. A Sr.ª Deputada disse que a proposta de lei n.º 106/VII e as outras são retalhos. Embora concordando com essa sua afirmação, pergunto-lhe: como é que concilia essa afirmação com o projecto que o vosso partido apresenta em relação à proposta de lei n.º 103/VII a qual, essa sim, divide o regime jurídico do pessoal da segurança social e abre uma brecha ao contrato individual de trabalho -, cujo relatório foi hoje aprovado na Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social com o vosso voto favorável e até com uma proposta em concreto, o que o até o Governo não tinha feito?

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Bem lembrado!

O Sr. Presidente: - A palavra à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, para dar o esclarecimento solicitado.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodeia Machado, não respondeu à minha pergunta e é grave que não o tenha feito, pois falei em todos os trabalhadores e perguntei por que é que uns pagam para as reformas dos outros. Não respondeu, não foi capaz, porque as contas estão feitas e se quiser mando-lhas.
Todavia, o que lhe quero dizer é que não confunda as situações, pois o que disse ao Sr. Ministro é o que lhe digo a si, ou seja, ao menos, quando se está aqui a falar no contrato de tarefa, que se circunscrevesse. Nós admitimos as excepções - só se fôssemos burros é que não as admitiríamos -, que, aliás, existem em todas os aspectos da nossa vida mas desde que devidamente tipificadas, recortadas, limitadas. Ora, tanto quanto sei, até porque fui eu que a redigi, a proposta que apresentámos circunscreve essa questão claramente a situações muito bem determinadas. Esta proposta é que não, isto é um more magnum, é uma sombra, é uma nuvem, é uma poeirada e é nisso que vivemos, numa poeirada.

O Sr. Presidente: - Para uma nova intervenção, a palavra ao Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Deputados: Não resisto a responder ao repto que o Sr. Ministro Adjunto lançou ao Partido Social Democrata. Falou do passado do PSD sobre esta matéria mas, Sr. Ministro, é com grande orgulho que posso aqui citar o passado do Partido Social Democrata nesta matéria e compará-lo com o presente do Partido Socialista. E comparar o passado do Partido Social Democrata citando aqui um diploma de 1980, com a assinatura de Francisco Sá Carneiro, ...

O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - É preciso ir bem longe!

O Sr. Ministro Adjunto: - Onde é que o senhor tem de ir! ...Quase tinha de ir à I República!...

O Orador: - ... que aprovou, para ratificação, a Convenção n.º 151 da OIT, ao abrigo da qual está a ser emitida esta regulamentação legal e a anterior, que agora é revogada. Por isso, o passado do PSD fala por si próprio, e foi o passado do PSD que permitiu, com a ratificação citada, fazer o que estamos a fazer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quanto ao presente do Partido Socialista, penso que este diploma fala por si. O Partido Socialista e o Governo do Partido Socialista, pelos vistos, desceram tão baixo na credibilidade dos parceiros sociais que já não basta a sua palavra, é preciso um diploma a dizer que se vincula ao resultado das negociações!

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não chega o Governo, com a sua boa fé negocial, vincular-se aos resultado das negociações, é preciso emitir um diploma para suprir essa sua falta de credibilidade junto dos parceiros sociais! Isto demonstra, à evidência, a comparação entre o passado do PSD, que aprova convenções da OIT sobre esta matéria, e o presente do PS, que precisa de leis para fazer com que os outros acreditem na sua boa fé negocial.
Por que razão, junto com esta proposta de lei, o Governo não apresenta também, para ratificação, a Convenção n.º 154, da OIT. que dá mais um passo a nível de negociação colectiva, incluindo a função pública? Por que é que ainda não fez isso? Por que razão não traz também aqui essa convenção, como nós, PSD, trouxemos à Assembleia a Convenção n.º 151? É esta a diferença entre o passado do PSD, do qual temos grande orgulho, e o presente do PS, onde há diálogo, mais uma vez, sem decisão, diálogo sem concretização.
Sr. Ministro Adjunto. Srs. Deputados: Muito sinteticamente, gostaria de dizer algumas palavras sobre a proposta de lei n.º 106/VII, que está também em discussão.
Esta proposta é, no nosso entender - e poderia ser abafada por uma discussão conjunta com a proposta de lei n.º 95/VII, que cremos ser menos polémica -, de uma gravidade enorme. Neste mesmo ano de 1997, o Sr. Ministro, nesta Assembleia, anunciou medidas tomadas por si em termos de instrumentos dê gestão de recursos humanos da Administração Pública. Estão bem recordados de ter anunciado o fim previsível dos contratos a termo certo na função pública, o fim dos recibos verdes na função pública e o fim dos excedentes na função pública.
Mas, ao mesmo tempo que o Sr. Ministro Adjunto anunciou na Assembleia da República este tipo de medidas para a função pública, trouxe-nos também medidas avulsas, cada vez mais avulsas, de introdução do contrato individual de trabalho e do contrato de prestação de serviços. Estamos todos bem recordados da proposta de lei n.º 103/VII, que foi presente a esta Assembleia e está neste momento em fase de discussão na especialidade. Temos também presente esta proposta de lei n.º 106/VII, o aditamento do artigo 11.º-A ao decreto-lei que aqui está também em causa e vários têm sido os excertos casuísticos de introdução do contrato individual de trabalho e do contrato de prestação de serviços no regime geral da função pública.
Sr. Ministro, com isto, é óbvio, acabam os excedentes. É possível despedir os trabalhadores e, por isso, acabaram os excedentes com estas políticas. A questão fundamental, a que o Sr. Ministro não consegue, mais uma vez, responder - não o fez na sua intervenção inicial e não se demonstra desta proposta de lei n.º 106/VII -, é a de saber qual é a política de gestão de recursos humanos que este Governo tem: é trazer o contrato individual de trabalho e o contrato de prestação de serviços como forma casuística, de política casuística, de gestão dos recursos humanos, ou afirmar de uma vez por todas que a intenção é estabelecer esse procedimento como regra e não como excepção casuística no regime de gestão dos recursos humanos da função pública? É uma resposta que ainda não foi capaz de dar a esta Assembleia e ao País.
Por isso, ficamos, continuamos a ficar, na dúvida, que é gravíssima para a gestão dos recursos humanos, sem saber se vão aplicar-se à Administração Pública as regras de direito laboral relativas ao recrutamento ou aos vencimentos na função pública. Vamos ter situações em que, para trabalho igual, para funções iguais, na função pública, vai haver salário diferente, através do regime geral da função pública e dos contratos de prestação de serviço, tal como já se verifica hoje, e inúmeros casos podem ser aqui presentes? Vai remunerar-se trabalho igual com salário diferente? Vai atribuir-se a possibilidade de fuga à regra claramente fixada no artigo 47.º da Constituição, relativa à igualdade de acesso ao funcionalismo público, permitindo, sem concurso, trazer à função pública pessoal contratado através de contrato individual de trabalho e de contrato de prestação de serviços, fugindo-se, assim, à regra geral da igualdade de acesso, do concurso e da oferta pública para o exercício de cargos na função pública?
São estas regras que estão a ser postas em causa por estas atitudes casuísticas do actual Governo, que, mais uma vez, não consegue demonstrar uma política global e coerente para a gestão dos recursos humanos.
Em síntese, Sr. Ministro e Srs. Deputados, diria que a proposta de lei n.º 106/VII, que está em discussão, não traz qualquer novidade. O Sr. Ministro falou no regime das nulidades e no da responsabilidade civil e financeira dos dirigentes. Mas não são só os directores gerais os abrangidos, são também os ministros, porque vão ser eles e não os directores gerais a assinar estes contratos, não tenhamos dúvidas.
No entanto, esse regime da nulidade decorre da lei geral, esse regime da responsabilidade civil decorre da lei geral, esse regime financeiro decorre da lei geral. Ainda recentemente aprovámos aqui um diploma relativo ao Tribunal de Contas, onde claramente está fixado o regime de responsabilidade financeira dos dirigentes da função pública.
Mais do que tudo, esta proposta de lei n.º 106/VII mantém, se não agrava, as situações precárias na função pública. É o fim dos contratos a termo certo, dos recibos verdes e dos excedentes, mas é o início dos contratos individuais de trabalho, dos contratos de prestação de serviços, sem regras gerais, sem regras de recrutamento a concurso público e sem regras quanto a vencimentos.
É, por isso, o fim de uma política global e coerente de gestão dos recursos humanos, sem qualquer outra política global e coerente de gestão dos recursos humanos na função pública capaz de a substituir.
A estas dúvidas, até hoje, o Governo ainda não soube dar resposta e vejo que cada vez menos tem capacidade de o fazer. Assim, esta proposta de lei demonstra mais uma vez, com uma gravidade inusitada, que o Governo gere a função pública sem qualquer política coerente e de forma casuística.
Face a isto. Sr. Ministro, ou nos dá explicações muito cabais e coerentes sobre o que pretende para a gestão dos recursos humanos na função pública ou nós, PSD, não poderemos estar de acordo com esta proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Osório Gomes.

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O Sr. Osório Gomes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A revisão da legislação aplicável à negociação colectiva na Administração Pública encontra-se prevista no Programa do Governo, constituindo, também, um compromisso inscrito no acordo salarial para 1996, pelo que esta proposta de lei corresponde ao cumprimento dos compromissos assumidos.
A Constituição da República consagra, no artigo 56.º, n.º 3, que «compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei».
A este respeito referem os constitucionalistas Gomes Canotilho e Vital Moreira que «o direito à contratação colectiva assiste a todos os trabalhadores. Não estabelecendo o preceito qualquer discriminação, não pode aquele direito deixar de ser reconhecido a todos os que gozam em geral dos direitos dos trabalhadores, incluindo, portanto, também os trabalhadores da função pública.»

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - «A este propósito há que sublinhar que o direito de contratação colectiva não se satisfaz com um simples direito de negociação, pois aquele implica uma convenção entre duas partes, assumindo as suas cláusulas eficácia normativa (...)».

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, a Convenção n.º 151 da OIT estabelece, no seu artigo 7.º, que devem ser tomadas as medidas adequadas por forma a permitir a negociação das condições de trabalho entre as autoridades públicas e as organizações de trabalhadores da função pública.
A proposta de lei hoje em discussão no Parlamento altera radicalmente as normas do Decreto-Lei n.º 45-A/84, de modo a que o Governo fica obrigado, num prazo máximo de 180 dias, a adoptar as medidas legislativas ou administrativas adequadas ao integral cumprimento dos acordos estabelecidos em sede de negociação colectiva, no respeito absoluto pelos preceitos constitucionais, as convenções internacionais, o Programa do Governo e o compromisso assumido com os parceiros sociais em 1996.
São, aliás, bem conhecidas as sucessivas reivindicações dos sindicatos representantes dos trabalhadores da Administração Pública para que fosse efectuada esta substancial alteração, a que os governos do PSD, durante 10 anos, não tiveram vontade nem coragem política para lhes dar resposta positiva.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Outra alteração proposta, e de significativa importância, refere-se ao objecto de negociação colectiva.
Nos termos do artigo 6.º do Decreto-Lei N.º 45-A/84, constituem matérias objecto da negociação colectiva as relativas à alteração ou fixação dos vencimentos e demais prestações de carácter remuneratório, às pensões de aposentação ou reforma e ainda às regalias da acção social e da acção social complementar.

Esta proposta de lei alarga o âmbito da negociação colectiva rios seguintes domínios: constituição, modificação e extinção da relação de trabalho; duração e horário de trabalho; regime das férias, faltas e licenças; condições de higiene, saúde e segurança no trabalho; formação e aperfeiçoamento profissional; estatuto disciplinar; regime de mobilidade; regime de recrutamento e selecção; e regime de classificação de serviço.
Os trâmites do processo de negociação colectiva encontram-se devidamente especificados no artigo 7.º, referindo-se o artigo 9.º da proposta de lei à resolução de conflitos através de negociação suplementar.
O Decreto-Lei n.º 45-A/84 reconhece aos trabalhadores, exercida através das suas associações sindicais, a participação (direito de consulta e de serem informados) ao nível da elaboração da legislação relativa ao regime geral e especial da Administração Pública, na gestão das instituições de segurança social e de outras organizações que visem satisfazer os interesses dos trabalhadores e no controlo de execução dos planos económico-sociais.
Outro aspecto de relevante significado político desta proposta de lei é ainda o alargamento do direito de participação às seguintes matérias: a elaboração de programas de emprego; a fiscalização e implementação das medidas relativas às condições de higiene, saúde e segurança no trabalho; as alterações ao Estatuto de Aposentação; a definição da política de formação e aperfeiçoamento profissional; a melhoria da qualidade dos serviços públicos; as auditorias de gestão efectuadas aos serviços públicos; a elaboração dos pedidos de autorização legislativa sobre matéria sujeita à negociação ou participação; a elaboração da regulamentação interna relativa às condições específicas de trabalho de cada serviço; e a definição do regime de acidentes de serviço e doenças profissionais.
Esta proposta de lei n.º 95/VII, que estabelece o regime de negociação colectiva e a participação dos trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público, é altamente meritória e significativamente positiva.
Com efeito, através desta iniciativa legislativa, o Governo do Partido Socialista contribui decisivamente para um reforço dos direitos sindicais dos trabalhadores da Administração Pública, porquanto consagra um efectivo direito à contratação colectiva e uma maior participação dos trabalhadores em matérias deste sector.
A revisão do regime de negociação colectiva, consubstanciada na proposta de lei em apreço, vem dar resposta a uma justa e legítima aspiração dos milhares de trabalhadores da Administração Pública, pelo que as suas organizações sindicais têm manifestado um grande desejo de a verem aprovada e, consequentemente, a sua rápida entrada em vigor como lei.
A promoção dos direitos dos trabalhadores, em geral, e dos direitos dos trabalhadores da Administração Pública, em particular, constou sempre do rol de prioridades do Partido Socialista.
Por, esta razão, o Partido Socialista apresentou-se ao eleitorado com a promessa de nova política para a Administração Pública, que passa pela valorização dos recursos humanos e pelo respeito e reforço dos direitos dos trabalhadores.
Trata-se de uma política baseada sobretudo numa «Administração Pública onde sejam atribuídos mais po-

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deres e mais responsabilidades aos funcionários directamente intervenientes, estimulando, assim, a criatividade e criando condições para melhorar significativamente a qualidade de serviços. Melhor Administração passa por mais motivação dos agentes da Administração», situação que só é possível atingir através de um reconhecimento dós direitos dos trabalhadores.
O facto de esta proposta de lei chegar ao Parlamento com o apoio das respectivas associações sindicais atribui-lhe um valor acrescido, sendo nossa profunda convicção de que se trata da melhor solução adoptada e que tem em linha de conta os interesses dos trabalhadores.
Trata-se, sem dúvida, de uma proposta de lei que, respeitando o Programa do Governo, satisfaz o compromisso assumido com os parceiros sociais e resolve as situações que durante anos se mantiveram manifestamente desajustadas da realidade, sem que o PSD, nos 10 anos de governo (e 8 com maioria absoluta nesta Assembleia), as tenha querido resolver.
O PS prometeu e está a cumprir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Naturalmente por isso, as sondagens vão-nos revelando que a população portuguesa mantém a sua confiança no Partido Socialista.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No que respeita à proposta de lei n.º 106/VII, ela é, do ponto de vista dos objectivos que visa atingir, bastante positiva, porque se insere no quadro geral de combate à precarização do emprego na Administração Pública, combate delineado e iniciado pelo Governo da nova maioria.
Com efeito, após ter-se iniciado o processo de regularização das situações precárias da Administração Pública, que contou com o apoio expresso dos parceiros sociais e veio beneficiar mais de 30 000 trabalhadores, os quais durante muitos anos foram fortemente penalizados, impunha-se clarificar e controlar o recurso à celebração de contratos de prestação de serviços no âmbito da Administração Pública.
O recurso excessivo e inadequado à celebração de contratos de prestação de serviços, a que se assistiu durante muitos anos como forma de responder a necessidades permanentes dos serviços da Administração Pública, configurou situações de total ilegalidade e penalizou milhares de trabalhadores, que, por necessidade e em troca de salário, se viam obrigados a aceitar um posto de trabalho inquinado pela precariedade e insegurança.
O Governo da nova maioria assumiu desde o primeiro momento a resolução deste flagelo social. Todavia, não chega regularizar as situações precárias dos trabalhadores da Administração Pública. É absolutamente necessário garantir que, de futuro, a contratação e a gestão dos recursos humanos da Administração Pública sejam feitas de forma rigorosa e sobretudo sem voltar a «bulir» com os direitos dos trabalhadores.
A proposta de lei em discussão visa precisamente garantir um correcto e adequado recurso à celebração de contratos de prestação de serviços e limitá-la, única e exclusivamente, às situações que configurem a execução de trabalhos de carácter não subordinado.
A iniciativa em debate deve ser entendida como uma medida legislativa complementar de todo um trabalho meritório levado a cabo pelo Governo no âmbito do saneamento das situações irregulares da Administração Pública.
Por todas estas razões, o Grupo Parlamentar do PS sustenta estas iniciativas do Governo, na convicção de que as mesmas correspondem às justas aspirações dos trabalhadores e suas organizações sindicais e contribuirão para uma Administração Pública mais moderna e com uma gestão de recursos humanos baseada no rigor e na transparência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro Adjunto.

O Sr. Ministro Adjunto: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas deixar duas ou três notas.
Em primeiro lugar, quero agradecer as posições expressas pelo Sr. Deputado Osório Comes, em nome do Partido Socialista, e que vão ao encontro da perspectiva que o Governo tem e do trabalho que tem vindo a realizar durante estes dois anos.
Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, com o respeito que tenho por V. Ex.ª, como sabe, temos conceito de Estado diferentes,...

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Ah! Temos, sim!

O Orador: - Temos, temos! Felizmente para os portugueses, o conceito de Estado que nós temos não é o conceito que a Sr.ª Deputada tem. E se eu tinha alguma razão para ser do PS e não ser do PP, hoje encontrei-a aqui de forma magnífica. Com efeito, não poderia ser do PP, quando têm conceitos da participação e do funcionamento do Estado dessa natureza.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Só hoje?!

O Orador: - Mas respeito-os e esse é um debate interessante. Penso que o Sr. Deputado estará preocupado com essa matéria, mas já falaremos dela.
Sr.ª Deputada, um dia, quando for possível fazer um debate sobre essa matéria, terei o maior gosto em participar nele. Temos perspectivas completamente diferentes sobre esta matéria mas são essas as perspectivas com que nos comprometemos com os eleitores, com os portugueses, e são essas as perspectivas que pretendemos cumprir durante os quatro anos de legislatura que queremos levar até ao fim.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Vai sempre a tempo de as rever!

O Orador: - O Sr. Deputado do PSD tem muito orgulho no passado do PSD. Mas tem tanto orgulho que teve de ir buscar um diploma que já tem 17 anos.

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122 I SÉRIE - NÚMERO 3

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - É aí que tudo começa!

O Orador: - Foi a única coisa que o orgulhou, pois não conseguiu encontrar nada dos últimos 10 anos em que o Professor Cavaco Silva foi Primeiro-Ministro, o que é lamentável. Também prevejo que os fantasmas, mesmo numa bancada onde estão apenas três Deputados, devem estar aí, noutros sítios, para nada poder referir em relação a essas matérias. Mas não vale a pena entrarmos por aí...
O Sr. Deputado pode dizer que se trata de «diálogo sem decisão, diálogo sem concretização», mas nós estamos a concretizar, estamos a apresentar coisas, e os senhores é que estão a fazer aquilo que ultimamente têm feito sempre, ou seja, tentar impedir que o Governo concretize aquilo que vai fazendo.
Sr. Deputado, vou só dar-lhe dois exemplos, muito simples: o passado de que o senhor se pode orgulhar é o de 35 000 trabalhadores precários na Administração Pública e 4000 funcionários no quadro de excedentes, que era o que havia no início das funções deste Governo. É disto que o senhor se pode orgulhar.
Porém, neste momento, já só há cerca de 200 trabalhadores no quadro de excedentes, e vão acabar; porque já não há sequer esse quadro, e isto sem despedimentos na Administração Pública, como sabe.
Portanto, não se orgulhe muito de coisas de que não pode ter orgulho; por aí nunca mais consegue recuperar aquilo que perdeu nestes últimos anos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por terminada a discussão conjunta das propostas de lei n.os 95/VII e 106/VII.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre retoma de mandato de Deputados.

O Sr. Secretário (João Corregedor da Fonseca): Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à retoma de mandato, nos termos do artigo 6.º, n.º 1 e 2, do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7193, de 1 de Março), do Sr. Deputado Daniel Bessa (PS), em 6 de Outubro corrente, inclusive, cessando o Sr. Deputado Sérgio Silva, e à substituição, nos termos do artigo 7.º (renúncia ao mandato), do Estatuto dos Deputados (Lei n.º 7/93 de 1 de Março), do Sr. Deputado Daniel Bessa (PS), com efeitos a 6 de Outubro corrente, inclusive, pelo Sr. Deputado Sérgio Silva.
Na mesma data, em consequência da renúncia ao mandato do Deputado Daniel Bessa, assume o mandato em regime de efectividade, a Deputada Paula Cristina Duarte, que já exercia funções em regime de substituição, conforme Relatório n.º 2 da Comissão Eventual de Verificação de Poderes, de 30 de Outubro de 1995.
Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio pelo aludido partido no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer: a retoma de mandato e a substituição em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a nossa próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 15 horas, e dela constará, no período de antes da ordem do dia, o debate de urgência, requerido pelo CDS-PP, sobre o problema da transformação da IC1 em A8 e a criação e instalação de portagens e, no período da ordem do dia, a discussão dos projectos de lei n.os 223/VII (PSD) e 55/VII (PCP) e das propostas de lei n.os 122/VII e 128/VII.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):

Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
José Augusto Gama.
Luís Carlos David Nobre.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Eduardo Ribeiro Pereira.
José Alberto Cardoso Marques.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Pinto Simões.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.

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Partido Social Democrata (PSD):

Antonino da Silva Antunes.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Manuel Taveira da Silva.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Domingos Dias Gomes.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
João Álvaro Poças Santos.
José Mendes Bota.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Pedro Augusto Silva Pinto.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Fernando José de Moura e Silva.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Deputado Independente:
José Mário de Lemos Damião.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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124 I SÉRIE - NÚMERO 3

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

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