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Sexta-feira, 31 de Outubro de 1997 Número 10

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE OUTUBRO DE 1997

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex.mos Srs.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 40 minutos.
Prosseguiu a discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os 146/VII - Grandes Opções do Plano para 1998 e 147/VII - Orçamento do Estado para 1998. Intervieram, a diverso título, além dos Srs. Ministros das Finanças (Sousa Franco), do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (João Cravinho) e da Educação (Marçal Grilo) e dos Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Fiscais (António Carlos dos Santos) e dos Assuntos Parlamentares (António Costa), os Srs. Deputados Manuela Ferreira Leite (PSD), Henrique Neto (PS), Manuel Monteiro (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), António Galvão Lucas (CDS-PP), Manuel Varges (PS), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Rui Rio (PSD), Joel Hasse Ferreira e Carlos Zorrinho (PS), Nuno Abecasis (CDS-PP), Carlos Luís (PS), António Filipe (PCP), Afonso Candal e Martim Gracias (PS), Jorge Ferreira (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Augusto Boucinha (CDS-PP), Álvaro Amaro (PSD), Luís Queiró (CDS-PP), Artur Torres Pereira (PSD), José Junqueiro, Paulo Neves e Francisco de Assis (PS), Joaquim Matias (PCP), Carlos Coelho (PSD), Luísa Mesquita (PCP), Fernando de Sousa (PS), Castro de Almeida (PSD), Vieira de Castro (PSD), Nelson Baltazar, José Niza e Manuel dos Santos (PS), Correia de Jesus (PSD), João Carlos da Silva (PS) e Ferreira Ramos (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.

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Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custódio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Fernando José de Moura e Silva.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Kruz Abecasis.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos prosseguir a discussão, na generalidade, das propostas de lei n.os 146/VII - Grandes Opções do Plano para 1998 e 147/VII Orçamento do Estado para 1998.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças (Sousa Franco): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A apresentação dos objectivos e das linhas fundamentais do Orçamento do Estado para 1988, feita ontem pelo Sr. Primeiro-Ministro, o debate que sobre ela incidiu, bem como as primeiras intervenções dos partidos, facilitaram muito a minha intervenção de justificação do conteúdo do Orçamento.
De facto, a articulação deste Orçamento - o terceiro do Partido Socialista e da nova maioria - com os Orçamentos anteriores e com o Programa do Governo revela uma linha de coerência e uma série de pontos firmes e claros de que o povo português não duvida e que me parece não foram questionados nesta Câmara.
Penso eu que não foram questionados o rigor, a fundamentação e a seriedade das previsões que apresentámos, que, esperamo-lo, tal como no passado, prudentes e moderadas, possam também ser ultrapassadas por uma melhor execução. Acabaram, felizmente, as profecias de desgraça; hoje a visão da economia portuguesa corresponde àquilo que ainda ontem o Financial Times escrevia acerca de Portugal: «getting better all the time» - melhorando constantemente. É assim que está a economia portuguesa e é assim que vai continuar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ninguém questiona hoje, penso, que a economia portuguesa se encontra em expansão, que o crescimento e o emprego, que conseguimos em 1996 e 1997, bem acima da média europeia, nos aproximam, de novo, dos níveis de riqueza dos outros países da União Europeia. Tem aumentado o rendimento disponível das famílias e os salários reais dos portugueses, conseguiu-se uma evolução positiva da situação do emprego, em boa parte à custa do esforço de investimento público e do investimento privado que se seguiu.
Assim, não se questionará a perspectiva de uma aceleração real da economia para 3,8%, em 1998, garantindo a continuação da recuperação dos nossos atrasos e que continuemos a melhorar em crescimento e em emprego. Este é, como os dois anteriores, um Orçamento dominado pelo crescimento, pelo emprego, pelo desenvolvimento e pela recuperação dos atrasos económico sociais, ou seja, é um Orçamento de absoluta prioridade para a concorrência real com a União Europeia, para sermos mais ricos e mais justos.
Também ninguém questionará, penso eu, que, após 1997, ano teste para o acesso à moeda única e para a verificação dos critérios de convergência nominal, este é um Orçamento de preparação do País para o euro. A prática certeza e a elevadíssima probabilidade de Portugal cumprir os critérios de acesso resulta de o fazermos sem nenhum favor e sem que esse cumprimento resulte de uma qualquer modificação na política da União Europeia. Portugal acede ao euro por direito próprio!
E as vantagens desse acesso representam a abertura de uma porta para o progresso de Portugal na Europa e no mundo, em cujos mercados financeiros e monetários já se não distingue Portugal e o seu escudo das outras moedas que vão constituir o núcleo originário do euro.
Além disso, a política de consolidação financeira, a estabilidade cambial, a desinflação consolidada, a redução do défice orçamental e da dívida pública, com equilíbrio sustentável, são condições para qualquer economia hoje no mundo poder crescer, competir e conquistar novos mercados.
Respeitamos a convergência nominal mas, também, como instrumento para que Portugal integre o núcleo

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originário do euro e assim esteja no centro da Europa e seja, cada vez mais, uma economia competitiva no mundo. Sem essas condições, não o seria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Penso que também ninguém questionará que o crescimento do País se deve, em boa parte, à positiva reacção dos mercados e dos agentes privados, em particular dos mercados financeiros e depois dos empresários, e que daí resultou uma colocação das nossas taxas de juro numa trajectória de profunda descida.
Os portugueses sentem isso na sua vida, tendo melhor acesso ao bem-estar, das casas de habitação aos automóveis, dos salários aos seguros e aos empréstimos, e as empresas também, porque a sua melhor situação financeira permite-lhes produzir mais, investir mais e ganhar eficiência, conquistando novos mercados. A baixa das taxas de juro representou a melhoria da situação financeira e a melhoria da situação da economia real: mais investimento, mais crescimento e mais bem-estar para as famílias.
Penso que estes são dados adquiridos deste Orçamento, que não vi ninguém contestar validamente até agora.
Também ninguém contestará que o cumprimento do Programa de Convergência Estabilidade e Crescimento, de 12 de Maio de 1997, é assegurado por este Orçamento, reduzindo o défice do Sector Público Administrativo para 2,5% do PIB, a inflação para 2% - praticamente um nível que corresponde à não existência de inflação, pela primeira vez desde há dezenas de anos -, a dívida pública para valores muito próximos dos 60%, muito abaixo da média da União Europeia, mantendo o escudo estável e as taxas de juro de longo prazo com possibilidade de novas baixas neste e no próximo ano.
Penso que é difícil, se não impossível, contestar que esta política é sustentável, isto é, tem condições de continuar para o futuro.
O controlo da despesa corrente é evidente: cresceu 7,4%, em 1996, 5,3%, em 1997, e crescerá apenas 4,7% em 1998. Ao mesmo tempo, o saldo primário do subsector Estado em contabilidade nacional vem também aumentando, revelando a sustentabilidade da situação financeira consolidada: de 85,4 milhões de contos, em 1996, para 122,6 milhões de contos, em 1997, e para 128.5 milhões de contos, em 1998.
É também evidente que as receitas das privatizações, além de serem o resultado de uma profunda reforma estrutural e de terem representado mais receita e maior redução da dívida só nestes dois anos do que nos anteriores sete anos, apenas contribuem para diminuir extraordinariamente a dívida pública, que vinha crescendo até 1995, e, assim, aliviar as gerações futuras.
Recordo que a sustentabilidade é também assegurada pela existência de reformas, das quais este Orçamento é um instrumento, e pela confiança dos agentes económicos numa política macroeconómica que já deu as suas provas e que hoje pode ser objecto de discordâncias mas tem uma coerência e uma eficácia que ninguém contesta validamente.
A partir desta base, todos aceitamos a boa situação da economia portuguesa. todos aceitamos o êxito desta política e todos aceitamos que ela não é dominada pela convergência nominal mas, sim, pela convergência real, pelo desenvolvimento, pelo crescimento e pelo emprego.
Também não me parece que a coerência interna deste Orçamento seja contestada: ele é um orçamento de crescimento, tal como os anteriores, pois aposta na continuidade do esforço de investimento público mas com forte indução da formação bruta de capital fixo público e privado, que crescerá 9,5%, com o crescimento das exportações e com um crescimento real do consumo privado de 2,8%.
É um Orçamento coerente com as prioridades políticas do Governo. Sabemo-lo já! As funções sociais representavam apenas 45,6% da despesa orçamental em 1995; três anos depois, em 1998, representarão 54,6% da despesa total, ou seja, cresceram mais de 9 pontos em três anos.
Entre as despesas sociais, a prioridade das prioridades é a educação, que representará já 5,8% do PIB, em 1998, que tem crescido a um nível compatível com o compromisso de crescimento para a legislatura assumido pelo PS e pela nova maioria.
Este é, pois, um Orçamento virado para a solidariedade, para a saúde, para a educação, para a ciência e tecnologia, para o ambiente, mas é também um Orçamento de coesão nacional, no cumprimento da Lei das Finanças Locais e no cumprimento, por antecipação, da Lei das Finanças das Regionais, e um Orçamento com uma visão estratégica de reforço da segurança social pública, através do cumprimento, pelo terceiro ano consecutivo, e pela terceira vez, desde que foi aprovada em 1984, da Lei de Bases da Segurança Social. Quem ousará falar, visto isto, de um amplo programa de reformas de longo prazo, que vão sendo feitas passo a passo e que neste Orçamento têm expressão clara e inequívoca? Quem ousaria negar a existência deste programa?
Este é, por outro lado, o terceiro Orçamento em que não há aumento dos impostos: pelo contrário, em 1996, relativamente a 1995, vimos que a pressão fiscal diminuiu (0,4% do PIB) e que o IRC tem crescido bem mais do que o IRS e isso significa o resultado de uma política de concessão de benefícios fiscais às famílias, em especial aos trabalhadores, de actualização de escalões e da dedução específica do rendimento do trabalho, em suma, numa política consistente com o objectivo de fazer pagar mais àqueles que não vivem do seu trabalho e fazer pagar menos aos que vivem dele. Não conseguimos ainda tudo, mas até ao final da legislatura há passos a dar. Em todo o caso, os resultados estão já à vista.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador - Este é, pois, um Orçamento em que, pela terceira vez, se reduz o peso da despesa do Estado no PIB, neste caso de 28,7%, em 1997, para 28,1%, em 1998.
Tem coerência interna o Orçamento? Tem! Penso que pode caracterizar-se, claramente, como um Orçamento de crescimento e emprego, um Orçamento de solidariedade social e de coesão nacional, um Orçamento de transição para a moeda única, tendo por adquirido o acesso ao núcleo fundador do euro.
Onde existem, então, dúvidas e divergências? Certamente nas opções políticas de fundo e em muitos aspectos que no pluralismo democrático o conteúdo do Orçamento, admito, sejam questionados por quem com ele não concorda. Mas num ponto essencial eu sintetizaria a mais importante das linhas de clivagem: quem está contra a opção europeia de Portugal deverá estar naturalmente contra este Orçamento, que é uma peça decisiva para a concretizar, quem está a favor da opção europeia deverá estar a favor deste Orçamento.

Aplausos do PS.

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Portugal, ainda antes deste Orçamento, estava numa posição de claro preenchimento dos critérios de convergência, mas é evidente que sem ele não se prepararia em condições para competir no espaço mais aberto, que será a União Europeia da moeda única, para avançar na construção da Europa, como queremos.
Este Orçamento é, pois, essencial para o caminho que queremos neste momento decisivo da Europa: tornar Portugal cada vez mais forte numa Europa forte, capazes ambos de pesarem no mundo onde as fronteiras se enfraquecem e dominam as grandes regiões económicas e políticas. É este o sentido deste Orçamento. Há, por certo, outras divergências, todas legítimas, mas nenhuma com o alcance e o significado estratégico desta.
Do conteúdo do Orçamento do Estado para 1999 limitar-me-ei a destacar a principal matéria discutida: a matéria fiscal. Deu, enfim, frutos o esforço teimoso deste Governo para lançar um debate nacional sobre a reforma dos impostos e a problemática fiscal, que ainda há bem pouco tempo era esquecida e caía no silêncio na maior parte dos debates orçamentais ou outros, pois os mais desfavorecidos não têm voz para falar da injustiça fiscal e os que beneficiam da injustiça têm força bastante para silenciar a discussão destes temas.
A problemática fiscal tornou-se central no debate orçamental. Ainda bem! Entendemos que isso significa um avanço na discussão política em Portugal e que a reforma fiscal é uma tarefa inadiável de modernização do País e constitui condição básica da justiça, da cidadania, do Estado de Direito e da democracia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Consideramos um triunfo do Governo que se discuta a reforma fiscal e que mesmo quem mais resistência opôs a tudo aquilo que significava correcção das injustiças agora se coloque na primeira linha: bem-vindos sejam os convertidos!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em sede de fiscalidade, este Orçamento do Estado não se limita a prosseguir orientações anteriores, mas leva à prática alguns princípios novos.
O primeiro é o de separar claramente Orçamento e sistema fiscal. Não pretendemos introduzir uma reforma fiscal em cada orçamento: pretendemos realizar uma reforma fiscal em articulação com o Orçamento, mas à margem dele, para que seja permanente e estável. Este Orçamento é uma peça da reforma fiscal, mas esta tem-se feito e continuar-se-á a fazer à margem e acima de cada orçamento anual.
Por outro lado, noto que, pela terceira vez consecutiva, há consolidação orçamental sem aumento de impostos. O crescimento das receitas fiscais que prevemos, 7,3%, quando a previsão para 1997 era de 8,9%, é um crescimento moderado.
Apenas 2,1% das receitas fiscais (contra 2,9% no ano passado) são imputados ao aumento de eficiência fiscal. Prevê-se, a exemplo dos Orçamentos do Estado anteriores, que os aumentos de receita derivados de acréscimos de eficiência sejam redistribuídos em despesa fiscal. O não aumento de impostos num tempo de consolidação orçamental é o principal benefício fiscal do Orçamento do Estado.
Escuso de recordar a política fiscal em matéria de benefícios, pois, de forma geral, actualizaram-se os benefícios sociais e os dos rendimentos do trabalho e não se actualizaram de forma comparável os benefícios financeiros, o que é uma consequência da política de continuar na reforma fiscal a aliviar o peso sobre os rendimentos do trabalho e a distribuí-lo lentamente pelo outros.
No domínio fiscal, sublinhe-se, pretendemos evitar reformas fiscais que pairem nas nuvens da mera legislação, volátil e rapidamente substituída e que não tenham reflexos, quer na vida da administração fiscal, quer na relação desta com os cidadãos.
Temos vivido, infelizmente, assim há muitos anos, mas a nossa prioridade é outra: é mudar os impostos na vida dos portugueses e torná-los mais justos em concreto e não na letra das leis!
A questão central da reforma é a da descentralização e da informatização e é também, por essa via, a de lutar contra a evasão e a fraude por via de uma fiscalização eficaz - aliás, notamos, com prazer, que o principal partido da oposição adere hoje a esta nossa proposta.
Mudámos a filosofia da acção de fiscalização, dando outra força à fiscalização, aumentado o número de acções de fiscalização, e só no domínio dos impostos, relativamente ao primeiro semestre de 1997, conseguimos aumentos da matéria colectável resultantes da fiscalização de 41,2% e acréscimos de impostos em falta de 59,4%, o que é um grande aumento apenas com o mesmo número de funcionários.
Aprovámos a criação da Unidade de Luta Contra a Evasão e Fraude Fiscal e Aduaneira e, recordo, previmos no PIDDAC de 1997 uma verba idêntica à de 1996 para a melhoria do equipamento informático e dos sistemas de informação - 4,5 milhões de contos - a qual no corrente ano já foi utilizada em 92%, ao contrário do que aqui foi dito ontem.
Por outro lado, no final de 1995, apenas 30 repartições de finanças estavam informatizadas. A Rede Informática dos Impostos, Tesourarias e Alfândegas, em que integrámos uma acção que antigamente não estava articulada, abrangerá, no final de 1997, 204 repartições de finanças e as Direcções Distritais de Finanças de Lisboa e do Porto, ou seja, de 30 para 204 em dois anos. É esta a medida da nossa eficácia.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Julgo importante que no Parlamento, agora e mais tarde, decorra um debate sério. As declarações do Sr. Primeiro-Ministro de ontem foram certamente uma contribuição para isso.
É necessário introduzir mecanismos que reforcem a fiscalização, e nisso nos empenhamos, que ponham cobro a situações de evasão em massa. Todo o potencial fiscal do País demostra que há larguíssimas situações em que a cobrança da receita que seria devida não é possível por desconhecimento ou falta de meios da Administração.
Propomos a todos os portugueses um debate sério sobre esta matéria. O Governo está disposto a não avançar com medidas que não recolham suficiente consenso social e político. Foi nesse sentido que o Sr. Primeiro-Ministro anunciou ontem a revogação do regime forfetário do IVA, porque é necessária uma investigação mais aprofundada de alternativas, como é também necessária uma fiscalização mais intensa relativamente a eventuais situações de evasão ou fraude.

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Pela mesma razão, relativamente aos pagamentos por conta do IRC e reconhecendo as dificuldades da sua aplicação prática, apostaremos num programa mais intenso de fiscalização de sectores profissionais e económicos, embora continuando a estudar medidas legislativas genéricas, que ponham cobro às situações de fraude. Mas consideramos que para a injustiça fiscal, a fraude e as distorções da concorrência existem medidas imediatas no domínio do IRC, porque será dada execução à autorização legislativa que permite criar um regime e um mecanismo generalizado de pagamentos por conta, permitindo o seu reembolso, quando justificado, no prazo máximo de dois anos.
Esclareço, como sempre fiz, que nenhuma destas situações constitui, tecnicamente, uma colecta mínima. Não existem colectas mínimas em Portugal, apesar disso estar previsto no Acordo de Concertação Estratégica.
Esse fantasma foi apenas um exemplo de discussão confusa em matéria fiscal, mas, neste domínio como nos demais, sabemos que a maioria relativa impõe um incessante esforço de diálogo, como impõe consensos sociais e políticos alargados e realismo na acção. Não será por nós que tal prática democrática enfraquecerá. Dialogaremos sempre, mas com clareza.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, concluo dizendo que, naturalmente, em minha opinião, este é um bom Orçamento, adequado a uma boa política. É por isso também um orçamento ao serviço das reformas profundas que estão sendo feitas e que garantem, no futuro, a sustentabilidade, o rigor financeiro e uma cada vez maior disponibilidade de meios para a solidariedade social, para o investimento produtivo, para o desenvolvimento sustentado. Certamente por isso, ao menos em nome da governabilidade e da transição necessária para a moeda única, ou, com mais forte razão, pelos méritos da política que ele concretiza e para a coerência interna e eficácia com que prometemos executá-lo, julgamos que merece a vossa aprovação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro das Finanças, os Srs. Deputados Manuela Ferreira Leite, Henrique Neto, Manuel Monteiro, Octávio Teixeira, António Galvão Lucas e Manuel Varges.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, a questão que vou colocar-lhe está mais relacionada com o debate geral do Orçamento do Estado do que propriamente com a intervenção que o Sr. Ministro acabou de fazer.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, portanto um dos membros da sua equipa, em declarações feitas esta manhã a uma rádio - e faço-lhe esta pergunta porque com certeza o Sr. Ministro tutela tais declarações dado serem de natureza política -, afirmou que haveria um acordo entre o PSD e o Governo para a viabilização do Orçamento do Estado.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Ouviu mal!

A Oradora: - Devo dizer-lhe que gostaria de saber os termos desse acordo, a data em que foi feito, as pessoas que estiveram envolvidas, mas especialmente os seus termos, porque, já agora, gostaríamos de aproveitar desse negócio e de saber o que havíamos de propor.

O Sr. João Amaral (PCP): - Tem de perguntar ao Marcelo!

A Oradora: - Portanto, Sr. Ministro, gostaria de saber os fundamentos das afirmações do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Quero acrescentar, Sr. Ministro, que fico à espera que me informem qual é a sanção política aplicada a um membro do Governo que se lembra de fazer afirmações que, julgo eu, têm apenas como fundamento dar cobertura à situação de desespero em que se encontra o Partido Popular.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite: O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais teve já a possibilidade de esclarecer que não fez essas declarações. Do que ele falou foi de «compromisso», e um compromisso não é um acordo já que pode ser unilateral. Além disso, todos estamos habituados à extrapolação de algumas declarações que se fazem. V. Ex.ª ainda ontem me atribuiu declarações que eu não fiz. Aliás, disse o contrário daquilo que eu tinha afirmado.

Aplausos do PS.

Temos, portanto, de compreender o essencial, e o que posso dizer-lhe, em nome do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, é que ele não afirmou que existia qualquer acordo e, como é evidente, todos nós sabemos que não há nenhum acordo. O Governo, mesmo usando a expressão «compromisso», que é a manifestação de um sério comprometimento perante os portugueses e perante o Parlamento - e essa, sim, foi a expressão usada -, apenas afirmou a posição que irá tomar e que é aquela que o Sr. Primeiro-Ministro disse ontem e que eu expliquei hoje no aspecto técnico. Mas essa é uma posição unilateral do Governo, que não compromete mais ninguém.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças: Vou tentar colocar algumas questões relacionadas com Orçamento do Estado, até porque o maior partido da oposição não tem, aparentemente, questões para colocar. Está convencido dos méritos do Orçamento e já não tem dúvidas.

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Sr. Ministro, penso ser inquestionável que o Governo se apresenta aqui com uma credibilidade acrescida relativamente à que tinha - o que era normal - há dois anos atrás, na medida que, então, entrava em funcionamento um novo Governo relativamente ao qual os portugueses, nomeadamente os empresários, poderiam ter dúvidas. Como penso que dois anos depois essas dúvidas já não têm razão de ser. limitar-me-ei a chamar a atenção para uma questão particular: o facto de, nos últimos dois anos, ter-se reduzido a inflação e melhorado a situação do desemprego, e isso é algo que, de algum modo, poderemos designar como uma maneira de fazer teoria económica.
Uma outra área da credibilidade deste Orçamento do Estado resulta, penso eu, das execuções orçamentais anteriores, ou seja, as de 1996 e de 1997.
Portanto, Sr. Ministro das Finanças, a minha primeira pergunta é no sentido de saber se está convicto de que em 1998 poderá esperar-se uma execução da mesma ordem e do mesmo rigor da que experimentámos em 1996 e em 1997.
Uma segunda questão, Sr. Ministro, tem a ver com a afirmação, que fez hoje mas que já tinha feito em outras ocasiões, de que o Orçamento do Estado não é o local indicado para fazer reformas fiscais. Penso que, de um modo geral, os portugueses compreendem isso, que os empresários, se bem que ainda com alguma expectativa, também o compreendem, mas não podemos ignorar que a opinião pública sabe que existe uma profunda injustiça fiscal em Portugal e que há, por um lado, uma sede de justiça fiscal e, por outro, alguma curiosidade, se quiser até alguma expectativa, relativamente a esta matéria, por parte dos empresários, que estão habituados a um certo tratamento.
Portanto, gostaria de saber, Sr. Ministro, - e espero que possa explicar-nos - o que é que os empresários e os portugueses em geral podem esperar, em 1998, em termos de reforma fiscal.
A minha terceira pergunta tem a ver, Sr. Ministro, com a questão do investimento público e do investimento privado. O Sr. Ministro não ignora que há algumas preocupações na sociedade portuguesa, nomeadamente em algumas empresas, relativamente à continuação do investimento público. Existem grandes obras que estão a terminar e, portanto, há em relação a isto alguma expectativa.
Por outro lado, o Sr. Ministro também sabe que as oposições levantaram recentemente algumas dificuldades acrescidas a grandes obras públicas, nomeadamente à participação da actividade privada nesse grande esforço de investimento em infra-estruturas, sobretudo complicando, dificultando ou até inviabilizando - quem sabe! - as concessões que estão em curso e que deviam dar origem não só a novas obras, a novas vias de comunicação e a novos meios de melhorar a competitividade portuguesa, mas que iam dar também azo a novos investimentos.
Por fim, quero dizer que, pessoalmente, estou convicto de que não haverá problemas quanto ao investimento privado, de que, no clima de estabilidade política e económica que tem existido, o investimento privado vai crescer - é isso que eu sinto da parte dos empresários -, mas, de qualquer maneira, gostaria de não deixar de levantar um problema de conjuntura perguntando ao Sr. Ministro se pode e quer comentar o recente acontecimento nas bolsas internacionais, na medida em que, naturalmente, têm a ver, naturalmente, com a estabilidade que conduz ao investimento.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Henrique Neto, penso que a inserção deste Orçamento numa política continuada e que já deu frutos,
torna muito claro que existe uma articulação entre os objectivos chamados de convergência nominal e os objectivos chamados de convergência real e, mais, que a nossa prioridade é o desenvolvimento, o crescimento e o emprego e, portanto, a convergência real, apostando em que esse desenvolvimento, esse crescimento e esse emprego não podem fazer-se fora do contexto do acompanhamento do movimento da União Europeia e da moeda única e apostando também em que a internacionalização da nossa economia só dá vantagens às empresas, que serão os seus principais agentes no investimento, no comércio, na prestação de serviços, na medida em que se lhes cria um enquadramento macroeconómico são.
Ora, esse enquadramento macroeconómico são para as empresas exige redução da inflação, consolidação financeira, estabilidade do escudo e baixa da taxa de juro. Enfim, exige tudo aquilo que é feito em nome da convergência nominal mas que representa muito mais: é um serviço que o Estado presta às empresas para que elas possam competir em pé de igualdade com as dos outros países que já têm estas situações estabilizadas.
Também o investimento que cria emprego tem exactamente o mesmo enquadramento macroeconómico. O principal que o Estado pode dar hoje à economia - à economia, não a sociedade, porque à sociedade pode dar boas políticas noutros domínios, tais como os sociais e políticos e com isso, como se sabe, estamos profundamente preocupados e comprometidos - é um enquadramento estável, para que os agentes económicos sejam capazes de competir em pé de igualdade com os dos outros países, tanto na Europa como por esse mundo fora, porque condições de desigualdade já a globalização introduziu muitas, favorecendo o dumping ecológico, o dumping social e até o dumping da falta de sanidade financeira, que hoje está, em boa parte, na origem da crise da Ásia Oriental. Condições de desigualdade já há muitas e estão fora da nossa mão, excepto quando lutamos por uma ordem internacional mais justa.
No entanto, esforçamo-nos, às vezes com alguma compreensão, por aquelas que estão na nossa mão: as políticas macro-económicas sãs, para as empresas portuguesas poderem competir em boas condições no mundo e poderem criar emprego para os portugueses. Fazêmo-lo, às vezes, com alguma incompreensão, mas acho que cada vez mais os portugueses vão compreendendo que é este o caminho certo.
Por outro lado, quanto à reforma fiscal, não se esqueça que a opinião pública tem, de facto, expectativas, às vezes desvirtuadas por esse conceito mítico de reforma fiscal como uma acção feita nas nuvens, que substitui umas leis por outras leis, todas pouco ou mal cumpridas. Ora, nós queremos uma reforma fiscal na vida, uma reforma fiscal que tome a administração fiscal mais eficiente para lutar contra o mal mas mais disponível para apoiar os cidadãos no cumprimento de um seu dever cívico fundamental. Por isso mesmo, penso que o conteúdo da resolução do Conselho de Ministros, no que se refere à reforma fiscal, é um compromisso que estamos a cumprir.

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Falei da reforma da administração fiscal, principal ponto do qual depende a informatização, a descentralização e reforço dos meios de fiscalização e a luta contra a fraude e a evasão. Mas quero dizer que a lei geral tributária será objecto de uma proposta de autorização legislativa, que virá a esta Câmara a muito breve trecho, porventura no início do próximo mês, que a revisão da legislação do imposto de selo está praticamente pronta e uma autorização legislativa também aqui virá, que vários dos impostos especiais de consumo estão a ser objecto de revisão e o Sr. Primeiro-Ministro já anunciou ontem que vamos dar utilização, até ao final do ano, à autorização legislativa relativa à redução, até dois pontos percentuais, da taxa máxima do imposto de rendimento sobre as pessoas colectivas, bem como ao regime, previsto no Orçamento do Estado para 1997 em autorização legislativa, das pequenas e médias empresas, estabelecendo um regime fiscal mais simplificado e mais adequando à situação desse sector fundamental da economia portuguesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, agradeço que termine.

O Orador: - Estas são algumas das medidas imediatas, ou seja, a serem implementadas até ao final do ano. E, evidentemente, 1998 vai ser um ano muito intenso em matéria de reforma, com a adopção de muitas outras medidas que estão programadas.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Ministro.

O Orador: - O que é que as empresas e os portugueses podem esperar de 1998? Em boa parte, no domínio fiscal, já o disse, mas importa não esquecer também o programa de redução do selo das operação financeiras, em 1998, que, tal como a extinção do selo dos recibos dos salários, resultará do Código do Imposto de Selo, cuja autorização legislativa pensamos apresentar no mês de Novembro a esta Assembleia. Devo dizer que estamos em condições de utilizar, visto que os trabalhos...

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Ministro.

O Orador: - ... que decorrem no Ministério das Finanças estão numa fase de ultimação de um projecto já muito avançado.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, tem de terminar, se faz favor!

O Orador: - Sr. Presidente, peço desculpa, responderei muito rapidamente.
Quanto ao investimento público, penso que é claro que uma das razões da sustentabilidade deste Orçamento é que temos uma visão de longo prazo quanto aos programas de investimentos públicos. O Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território várias vezes o tem expresso, não me cabe a mim substituí-lo. Mas recordo que esse anseio «e depois de 1998 e depois de 1999» é um anseio sem fundamento. Podia mencionar o programa do metro do Porto ou do novo aeroporto do centro do País, mas há muitos outros que são investimentos públicos importantes e que assegurarão o papel motor do investimento público.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, muito rapidamente para, de uma vez por todas, pedir a V. Ex.ª que esclareça algumas questões, que creio, e crê esta bancada, necessitam ser esclarecidas.
Em nome da verdade, da verdade técnica e da verdade política, e não em nome de algumas «trocas-tintices» que às vezes aparecem surgir, com a complacência e o silêncio cúmplice de alguns membros do Governo, inclusive alguns dos mais responsáveis.
Quero, de uma vez por todas, pedir ao Sr. Ministro das Finanças que explique a esta Câmara, e através da imprensa ao País, como Ministro e como Professor, o que é para si colecta mínima e o que é o pagamento por conta.

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso já explicou ontem!

O Orador: - Desculpe, mas não explicou. Sabe porquê?

Protestos do PS.

Sr. Presidente, espero que este tempo me seja descontado.
Eu vou explicar o que não explicaram: ontem, o Primeiro-Ministro de Portugal disse aqui uma coisa e, à noite, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, na TSF, disse outra completamente diferente.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não disse! Ouviu mal!

O Orador: - Eu ouvi!

O Sr. José Magalhães (PS): - Eu também ouvi os dois!

O Orador: - Lembro-me de o Sr. Secretário de Estado ter dito - e a TSF está presente, pode apresentar a gravação...

O Sr. José Magalhães (PS)- Outra cassette!

O Orador: -...- de que, de facto, o Governo tinha deixado cair a colecta mínima por acordo com o PSD para a viabilização do Orçamento do Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Não!

O Orador: - Sr. Secretário de Estado, tenha calma! Só quero pedir ao Sr. Ministro das Finanças que esclareça o que é colecta mínima e o que é o pagamento por conta. Não posso aceitar que, perante o País, se diga uma coisa, aliás repetidamente (ainda hoje de manhã foi dito através da imprensa) e depois aqui dentro se digam coisas completamente distintas.
Segunda questão: esta bancada, Sr. Ministro, é completamente favorável aos pagamentos por conta - e fica aqui estabelecida a nossa diferença, entre outros aspectos, com a bancada do lado.

Risos do PSD.

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Somos favoráveis aos pagamentos por conta em nome de um princípio de justiça fiscal, que foi introduzido no Orçamento do Estado para 1997. Isto porque temos memória e estamos recordados que o Governo veio aqui dizer que era uma questão de justiça fiscal a introdução dos pagamentos por conta, uma vez que continuávamos a ter no País um sistema fiscal que sobrecarregava exclusivamente os trabalhadores por conta de outrém.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Ora, não posso aceitar que, ontem, o Primeiro Ministro de Portugal tenha vindo dizer aos portugueses que não aplicava a autorização legislativa dos pagamentos por conta em relação ao IRS tão-só porque as receitas entretanto recebidas lhe permitiam ter essa folga, embora já as aplicasse ao IRC.
Devo dizer, Sr. Ministro das Finanças, que é um recuo grave do Governo...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - ... suspender ou não aplicar essa autorização legislativa. Peço ao Sr. Ministro das Finanças que leia tudo quanto disse a esse propósito, que leia tudo quanto o seu Governo escreveu a esse propósito, que os Deputados do Partido Socialista tenham memória e também leiam tudo quanto disseram a esse propósito, porque a questão da justiça fiscal que nos levou a defender, hoje como ontem, os pagamentos por conta, em relação a certos titulares de rendimentos em sede de IRS, continua a ser uma questão de justiça, que parece que o Governo meteu na gaveta...

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Esqueceu!

O Orador: - ... exclusivamente, não para defender qualquer princípio de justiça, mas para salvar a liderança de um partido político. Trocou-se a justiça fiscal em Portugal pela liderança de um partido político.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, são duas questões muito simples em relação às quais espero respostas muito concretas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Monteiro, a proposta da colecta mínima que o Governo, entre muitas outras alternativas de métodos indirectos de fixação de matéria colectável apresentou, e relativamente à qual há uma cláusula no Acordo de Concertação Social Estratégica, é uma proposta que não está concretizada em nenhum momento e em nenhuma regra da ordem jurídica portuguesa.
Uma colecta mínima é não um novo imposto mas uma forma de determinação de matéria colectável dos impostos existentes. E consiste em quê? Consiste em estabelecer-se, para determinados contribuintes, uma prestação mínima obrigatória anual, relativamente aos quais não haveria, em princípio, qualquer possibilidade de demonstrar que o respectivo rendimento não foi auferido. Colecta mínima é isto! Nós apresentámo-la, como uma de várias propostas possíveis, na discussão do Orçamento do Estado para 1997, em consequência de uma negociação parlamentar aberta, numa iniciativa de transformação da colecta mínima ou a sua substituição por pagamentos por conta, nos quais se fariam pagamentos a acertar no futuro, num prazo máximo, com possibilidade de demonstração de que os rendimentos que serviam de base à fixação do pagamento tinham ou não sido auferidos. Essa é a proposta que está concretizada em duas autorizações legislativas do Orçamento de 1997. Não tem nada a ver com a colecta mínima.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Portanto, é diferente! Não tem nada a ver!

O Orador: - Sempre o dissemos. Os pagamentos por conta do IRS e do IRC, por sua vez, também não têm nada a ver...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Era importante saber isso!

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Então, os cartazes estão errados!

O Orador: - Sr. Presidente, também peço que este tempo de interrupções me seja descontado!
Os pagamentos por conta, por sua vez, também nada têm a ver com outras formas...

Vozes do PSD: - Vocês é que se enganaram!

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - O Governo tem estado calado quanto a isso!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que deixem ouvir o Sr. Ministro das Finanças.
Faça favor, Sr. Ministro.

O Orador: - Os pagamentos por conta também nada têm a ver com outras formas de determinação indirecta da matéria colectável, das quais menciono em parte o regime forfetário do IVA, que é outra coisa, ou métodos indiciários, que são também outra coisa. Não ganhamos nada em confundir isto tudo, só baralhamos a nossa cabeça e as dos portugueses.
Sr. Deputado Manuel Monteiro, creio que já respondi à sua pergunta. Colecta mínima é só isto. Não há nenhuma colecta mínima em Portugal.
Pagamentos por conta do IRS e do IRC é outra figura, que não é colecta mínima. O que o Sr. Primeiro-Ministro disse foi o seguinte: «Está também o Governo disposto a não utilizar a autorização legislativa, prevista no Orçamento de 1997, sobre os pagamentos por conta do IRS, adoptando em sua substituição um programa intenso de controlo e de fiscalização dos sectores profissionais, onde se sabe existirem maiores e mais significativos volumes de fraudes e fuga ao imposto».
Foi apenas isto que o Sr. Primeiro-Ministro disse. Nada mais.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Isso é vago!

O Orador: - O que é que isto quer dizer? Quer dizer que se me permito desenvolver pela minha parte os

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fundamentos relativamente ao IRS, o estudo e a discussão social revelou que há dúvidas sobre a possibilidade de fazer aplicar o sistema, com a base de informação de que dispomos, em condições justas a alguns profissionais. Por isso, por agora, o Governo, até ao final do ano, não vai legislar à pressa, assumirá durante o próximo ano o critério de uma fiscalização mais intensa e continuará a estudar o problema. Pessoalmente, penso que quanto ao IRS, em certas situações, não todas, é perfeitamente justificável uma medida deste tipo, mas não estamos em condições de a aplicar até ao final do ano, à pressa, e com resultados que seriam maus.
Quanto ao IRC, estamos em condições - e isso faremos. Foi o que o Sr. Primeiro-Ministro disse. Isto não está associado minimamente à necessidade de receitas e sublinho-o -, porque é outra das coisas que se tem dito. Estas são medidas de justiça, que vão eventualmente provocar acréscimo de sacrifício de alguns contribuintes mas com redistribuição da carga fiscal e reposição da justiça. Não são medidas para aumentar as receitas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Manuel Monteiro pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço-lhe desculpa pela figura regimental utilizada, mas gostaria de, através da Mesa, perguntar ao Sr. Ministro das Finanças se acha que há justiça fiscal quando sobrecarrega
as empresas e não as liberta, de acordo com o seu critério, desse pagamento por conta e só as liberta em relação a determinado tipo de profissionais neste país. Isso é que é uma nova forma de injustiça fiscal!
É, pois, de lamentar que alguns senhores, que andam neste país a dizer que querem menos impostos, como é também o caso do Governo, sobrecarreguem as empresas que têm a seu cargo milhares e milhares de trabalhadores por conta de outrem.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro das Finanças, tem a palavra para prestar o esclarecimento que lhe foi solicitado.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, apenas para esclarecer que, na verdade, a medida tomada em relação ao IRC não representa sobrecarregar as empresas, visto que a redução da taxa máxima do IRC e o novo regime das pequenas e médias empresas, evidentemente mais favorável do que o actual, vai regenerar as empresas muito mais do que o facto de algumas delas passarem a estar sujeitas a métodos indirectos, ao abrigo da autorização legislativa aprovada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, V. Ex.ª começou por dizer que est ano tinha a sua tarefa facilitada devido ao que se passou ontem. De facto, acho que tem toda a razão para fazer essa afirmação e para estar satisfeito com essa situação.
No ano passado, o Sr. Ministro das Finanças e o Governo ainda tiveram de negociar a viabilização do Orçamento durante a sua discussão; este ano, logo à
partida, tem assegurada a viabilização do Orçamento por parte do PSD, sem necessidade de a negociar durante o próprio debate orçamental. A sua tarefa, Sr. Ministro das Finanças, está, de facto, muito facilitada.
Aquilo a que assistimos aqui ontem foi à formalização pública do bloco central para a execução da política, não apenas para as orientações de política mas para a execução de política! Aliás, ainda ontem um membro do Governo pediu, publicamente, ao PSD que lhe explicasse como é que iam fazer a fiscalização e o combate à fraude e à evasão fiscal.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Finalmente, reconheceu a verdade!

O Orador: - É evidente que é exagerado que, em termos públicos, o PSD também possa dar a resposta sobre como vai ensinar a fazer. Já disse o que deve fazer, estão de acordo, combinaram, houve acordo...

Vozes do PSD: - Não houve acordo!

O Orador: - Não houve acordo...?! Houve compromisso!
Admito e quero crer que esse acordo, ou esse compromisso - utilizem a expressão que quiserem - não fosse do conhecimento de todos, quer na bancada do PSD quer na do Governo. Pelos vistos, o jantar, tal como se passou há dois anos atrás, foi apenas entre dois, e só esses dois é que conhecem tudo o que foi acordado ou tudo aquilo a que se comprometeram.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, em termos de tempo para um pedido de esclarecimento não se pode fazer uma análise muito profunda mas, já que falou em convergência real, recordar-lhe-ia, Sr. Ministro, que, há dois dias atrás, publicou no Diário de Notícias um artigo seu (e já não vou falar na coesão social, etc.) em que os números que apresenta para a convergência real são os seguintes: diferença entre a evolução do PIB em Portugal e na União Europeia - em 1996, um diferencial de 1,6%; em 1997, 1,1%; em 1998, 1%; em 1999, 0,4%; em 2000, 0,3%. São estas as previsões do Ministério das Finanças! Sr. Ministro, que convergência real é esta? Há aqui alguma convergência real? Não!  Orçamento do Estado e a política do Governo têm em vista, exclusivamente, a convergência nominal, e esse é um facto.
A terceira questão, Sr. Ministro das Finanças, tem a ver com o problema da reforma fiscal: no seu terceiro Orçamento, o Governo entendeu que, afinal, a reforma fiscal não se pode fazer no Orçamento do Estado, deve ser feita em lei autónoma. Vai de deslizamento em deslizamento, até ao momento final, que não se sabe quando chegará ou se alguma vez chegará...
Gostaria de lhe perguntar: tudo o que existe de mau neste momento e de injusto no sistema Fiscal implica uma reforma fiscal global? Por exemplo, a erosão da base tributável do sistema bancário, que é de 78%, exige uma reforma fiscal global?! Não deveria já ter sido o Governo

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a tornar medidas para reduzir fortemente essa erosão tributária? Isto, para além da questão dos benefícios fiscais, que, aliás, me suscita uma outra questão.
Na sua intervenção de há pouco - e julgo que isto é exemplificativo das orientações do Governo em matéria fiscal, de não combate à injustiça fiscal - o Sr. Ministro disse: «prevê-se, a exemplo dos Orçamentos do Estado anteriores, que os aumentos de receita derivados de acréscimos de eficiência sejam redistribuídos em despesa fiscal». Isto é, o Governo não pretende utilizar o aumento de receitas decorrente da receita fiscal para reduzir a carga fiscal em sede de IRS; pretende utilizar esses aumentos de receitas para aumentar a despesa fiscal, para aumentar os benefícios fiscais, que são fundamentalmente para as operações financeiras e para as instituições financeiras. Este é, de facto, o quadro das orientações políticas deste Governo, que são as orientações políticas dos governos anteriores do PSD. Agora, não são apenas as orientações que são comuns, é o Orçamento que é comum, e a concretização das medidas será comum e será feita por um novo bloco central.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, as declarações do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais feitas à rádio sobre o tema do acordo ou do compromisso deverão, eventualmente, ser objecto de um esclarecimento dele próprio, visto que eu não as ouvi, e ninguém melhor do que o próprio para esclarecer o sentido que têm. Em todo o caso, é evidente que aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro aqui disse, e que foi a palavra usada pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira - «acordo» igual a «compromisso» - não suporta esta conclusão. O Sr. Primeiro-Ministro falou de compromisso nosso - há compromissos unilaterais que se tomam perante o Parlamento e perante o povo português, e suponho que foi nesse sentido que usou a palavra. Aliás, em português, «compromisso» é uma palavra com muitos significados, mas é raro significar acordo formal.
Portanto, não há nenhum acordo, há compromissos. E, na sua intervenção, o Sr. Primeiro-Ministro disse que havia abertura para o diálogo, nomeadamente em termos de especialidade. Essa vontade firme de estabilidade e compromisso só tem sentido num quadro de inteira previsibilidade na votação da especialidade, o que implica uma regra de consenso mútuo entre os grupos parlamentares que viabilizem o Orçamento do Estado na aceitação de quaisquer outras emendas.
Sr Deputado, este é um Orçamento que privilegia as funções sociais! Este é um Orçamento virado para uma reforma fiscal de combate à injustiça! Pergunto-lhe: o PCP está em condições de o viabilizar? Se está, penso que a ideia de compromisso também se aplica a todos os que estão nesta Câmara.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro! Ninguém é excluído!

O Orador: - Quanto à convergência real, apontei claramente os respectivos ganhos: até 1995, e desde 1991, crescemos menos do que a União Europeia, em 1996, 3,3% em Portugal e 1,8% na União Europeia; em 1997, 3,75% em Portugal e 2,6% na União Europeia; em 1998, 3,8% em Portugal e 3% na União Europeia; em 1999, 3,7% em Portugal e 3,1% na União Europeia. Continua, pois, a haver um diferencial confortável. Não pode ser sempre tão esmagador como em 1996, mas continuamos a ter uma vantagem muito significativa, fruto das nossas políticas internas e não de uma boleia da Europa. Trata-se de uma convergência real muito significativa. Todos nós quereríamos mais, mas é muito melhor do que o que se alcançou antes.
Quanto à reforma fiscal, Sr. Deputado Octávio Teixeira, fizemos - e pela primeira vez desde há dezenas de anos - uma fiscalização a um bom número de entidades do sistema bancário. Este ano não actualizámos as isenções financeiras como uma maneira de repor a justiça nesse domínio, mas, francamente, Sr. Deputado, entendemos que o sistema bancário e o sistema financeiro, todo ele, têm de se preparar para suportar duros custos de transição para o euro. Por isso mesmo, esta não é a altura para descapitalizar um sector que vai ser fundamental na adaptação da economia portuguesa ao euro.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Ah! É o fisco que vai pagar o euro!?

O Orador: - A justiça fiscal, nós impómo-la, e estamos a fazê-lo passo a passo. Mas incidir exclusivamente sobre o sistema financeiro seria ineficiente para a economia portuguesa em termos de futuro. Justiça, sim, mas também eficiência.
Finalmente, quanto a benefícios fiscais, Sr. Deputado Octávio Teixeira, entendemos que o princípio da afectação de ganhos de eficiência fiscal não incide só sobre os rendimentos do trabalho subordinado. Muitos dos rendimentos recuperados pela fiscalização de que falei há pouco são de IRC, e há também empresários individuais no IRS que estão a ser, privilegiadamente, sujeitos a fiscalizações.
Sublinho, por outro lado, que as deduções do IRS, só no Orçamento deste ano, correspondem a uma despesa fiscal de 20 milhões de contos - 20 milhões de contos, esses sim, com toda a justiça, atribuídos ao trabalho subordinado. Pensamos que a reforma do IRS de 1999 irá mais longe mas, em cada Orçamento, têm sido de dezenas de milhões de contos as exonerações muito significativas em benefícios (e tem sido ainda mais significativo o crescimento relativo do IRS em relação ao IRC), que cumprem o compromisso de partilhar melhor o sacrifício fiscal entre os trabalhadores e todos os outros. Passo a passo se fazem grandes reformas, e é este o caso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para defesa da consideração da sua bancada, relativamente à intervenção do Sr. Deputado Octávio Teixeira, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, efectivamente, uso da palavra em defesa da honra da minha bancada dado afirmações feitas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira.
Gostaria de, de uma vez por todas, deixar bem clara a posição do PSD para ver se evitamos cenários virtuais que,

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neste momento, estão tão próprios na política portuguesa. Nós não pusemos condições, não queremos pagamentos, não fizemos negócios relativamente à viabilização do Orçamento!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Ontem, eu disse que o Orçamento, quando entrou nesta Assembleia, estava viabilizado porque, do ponto de vista político, nós tínhamos assumido, como interesse de Estado, como interesse nacional, que este Orçamento fosse viabilizado.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, existe uma diferença grande entre o Partido Social Democrata, o seu partido e o partido ali do lado...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - O partido do lado tem nome!

A Oradora: - Tem nome tanto quanto o senhor, há pouco, me deu! Exactamente o mesmo que o senhor, há pouco, me deu!

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Foi para retribuir a vossa gentileza de há pouco!

A Oradora: - Trata-se da retribuição de uma gentileza, Sr. Deputado Luís Queiró!

Risos.

Nós somos oposição, não somos muleta do Governo. E como oposição, a despeito de o Orçamento estar viabilizado, continuaremos a lutar por todos aqueles aspectos que consideramos injustos. Lutámos durante um ano por aquilo que considerávamos ser uma injustiça a ser introduzida no sistema fiscal. E caso o Sr. Primeiro Ministro, ontem, tivesse feito afirmações inversas àquelas que tinha feito, o seu Orçamento manter-se-ia viabilizado e nós manter-nos-íamos na nossa luta. Portanto, não abdicaríamos dessa luta porque somos oposição, mas somos a oposição alternativa a este Governo e, como tal, temos um sentido de Estado e defendemos os interesses nacionais de uma forma que nem todos os partidos conseguem entender.
Espero, Sr. Deputado Octávio Teixeira, que este ponto fique absolutamente claro e, mais do que isso, que se perceba definitivamente onde está o estilo de oposição feita ao Governo e o estilo de muleta feita por outros partidos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, não vou pôr em causa aquilo que afirmou, no sentido de que o PSD não fez exigências ao Governo. Conversou, chegou a acordo (ou a compromisso), não sei se fez exigências... A Sr.ª Deputada Manuela Ferreira lei diz que não fez exigências mas eu, com toda a sinceridade, não posso dizer nem sim nem não; não estive lá, não conheço os termos.
Mas gostaria de lhe dizer o seguinte, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite: é que há acordos ou compromissos que são escritos e formalizados. Por exemplo, o acordo de revisão constitucional foi escrito, assinado, rubricado, etc., etc. - umas dezenas ou centenas de páginas, com as propostazinhas todas ali, até à vírgula, acordadas. Por outro lado, há acordos que não precisam de ser escritos, principalmente quando as pessoas se conhecem há longos anos, como é o caso do Sr. Primeiro-Ministro e do Sr. Presidente do PSD!
Agora, repare, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite: os tais compromissos até conduziram o Governo a declarar aqui hoje, ou, melhor, para não ser muito chocante, levaram o Governo, pela voz do Sr. Ministro das Finanças, a pôr em causa a sua própria credibilidade - «sua própria» do Ministério das Finanças e do Governo - em termos de rigor e de competência.
Quando o Sr. Ministro das Finanças vem aqui dizer «vamos revogar o regime forfetário do IVA porque precisamos de o estudar melhor, precisamos de aprofundar os estudos ... », põe em causa a sua própria capacidade de rigor e a sua competência, porque legislou duas vezes sobre a mesma matéria e só depois do compromisso com o PSD é que chegou à conclusão de que era incompetente para tal!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais pediu a palavra para dar um esclarecimento.
A Mesa tem a possibilidade de lha conceder para esse efeito, pelo que tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (António Carlos dos Santos): - Sr. Presidente, como diz Eduardo Prado Coelho, «as palavras servem para as pessoas se entenderem, e, às vezes, para se desentenderem». Ou, como diria Herman José, «o português é uma língua muito traiçoeira»...
Aquilo que eu disse em relação à questão do compromisso foi esclarecido pelo Sr. Ministro das Finanças. Não utilizei a expressão noutro sentido que não fosse aquele que o Sr. Primeiro-Ministro ontem, por duas vezes, empregou no seu discurso e que, no fundo, é o seguinte: no final das Jornadas Parlamentares do PSD, foi apresentado, para apreciação na especialidade, um conjunto de propostas; pois bem, o Governo fez contrapropostas em relação a tal, e é isto que está em cima da mesa para discussão, mais nada. Se o PSD aceita as contrapropostas que são feitas, ou não...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Então conversaram!

O Orador: - Toda a gente sabe isso, porque isso veio nos jornais. As Jornadas foram públicas, pelo que não é uma questão privada, é uma questão pública! São declarações públicas do PSD.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Quanto mais falam, mais se enterram!

O Orador: - São oito pontos, que foram analisados, sobre os quais o Sr. Primeiro-Ministro se pronunciou ontem. É esta a questão!

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O segundo ponto que penso dever ser sublinhado é o seguinte: todas as medidas de natureza fiscal que sejam medidas de fundo estão remetidas para a reforma fiscal. Foram claramente separadas as águas do que é Orçamento e do que é reforma fiscal!
Por exemplo, a reforma mais profunda, mais global do IRS é matéria de reforma fiscal porque chegámos à conclusão de que o IRS precisa de mais medidas de fundo, de uma revisão mais profunda do que aquela que, inicialmente, estava pensada. Isso não acontece com o IRC, e essa é uma das boas razões pelas quais é possível que o regime dos pagamentos generalizados por conta seja aceite, desde já, em IRC e não o seja, desde já, em IRS.
De resto, é bom lembrar o seguinte: nós sempre dissemos que o problema dos pagamentos por conta é uma medida de combate à evasão fiscal - não é a medida, ou a única medida, há muitas outras alternativas. Sempre há! O que é preciso é ser firme no objectivo, ser firme nas estratégias, mas ser flexível nos meios a atingir. E é disso de que estamos a dar provas, isto é, de que somos flexíveis nos meios.
Estas medidas, nomeadamente as do regime forfetário do IVA, não têm nada a ver com colecta mínima. Trata-se de um regime simplificado de tributação, que substitui o regime dos pequenos retalhistas, alargando-o aos prestadores de serviços. É, pois, uma coisa completamente diferente. Ora bem, não sendo esse o regime ideal, procuraremos, em sede de reforma fiscal, outro regime. Foi isto o que foi dito, e é isto que volto a testemunhar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, o meu pedido de esclarecimento será muito rápido. Aliás, utilizo esta figura regimental mais para agradecer a franqueza e a clareza daquilo que acabou de afirmar.
Afinal, não houve acordo, nem compromisso... O que houve foi o seguinte: nas Jornadas Parlamentares do PSD, este partido, através do seu presidente, fez propostas..., e o Governo fez-lhe contrapropostas. Isto não é acordo ...!?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: Não é acordo!

O Orador: - Depois, chegaram a acordo! Depois, houve uma convergência! Mas não é acordo, não é compromisso ... !? Ó, Sr. Secretário de Estado, a língua portuguesa pode ser, às vezes, complicada, mas as palavras têm um significado próprio!
O Sr. Secretário de Estado confirmou aqui, claramente, o que houve até este momento. Veremos o que haverá até ao final da discussão do Orçamento do Estado!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Para explicar as palavras.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, percebo que haja alguns Srs. Deputados que se sintam desconfortáveis por não haver uma enorme excitação na Sala e que, portanto, queiram desviar a discussão dos problemas reais e efectivos que se colocam com o Orçamento do Estado para incidentes puramente laterais...

O Sr. João Amaral (PCP): - Quem pediu a palavra foi o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais!

O Orador: - ... que, obviamente - e permita-me a dureza das palavras, Sr. Deputado Octávio Teixeira -, são pura chicana política.
Quero, pois, que tenham a certeza de que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e o Governo não vão entrar nesse debate. Estamos aqui para discutir o Orçamento do Estado, é o que faremos e não vamos entrar em tricas sobre matérias relativamente às quais a posição do Governo é insusceptível de qualquer dúvida porque o Sr. Primeiro-Ministro fez ontem, em nome do Governo, um discurso que está escrito, e que, estando escrito, pode ser lido por todos os Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, agradeço que termine pois não está a fazer uma interpelação à Mesa.

O Orador: - Sr. Presidente, solicito, pois, à Mesa que reconduza o debate aos seus termos normais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira para defender a honra ou consideração da sua bancada.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputados: É, de facto, a defesa da consideração da bancada que faço quando o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares nos vem aqui acusar de estarmos a fazer chicana política. Se houve chicana política não foi certamente feita por esta bancada mas, provavelmente, pela bancada onde se senta o Sr. Secretário de Estado.
Mas, mais do que isso, além de não admitirmos sequer a hipótese de alguém nos dizer o que devemos discutir agora ou noutro qualquer momento neste Plenário,...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ... estamos a discutir problemas de fundo do Orçamento do Estado para 1998 e em que condições ele vai ser viabilizado. E o que ficou aqui provado e demonstrado é que houve, de facto, uma negociata política em que o Governo foi parte, e parte principal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares para a hipótese de querer dar explicações. Trata-se de um privilégio.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, sendo meu dever dar explicações, darei, mas só para dizer o seguinte: Sr. Deputado Octávio Teixeira, o seu tom excessivamente emotivo, que, aliás, não lhe fica bem,...

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O Sr. João Amaral (PCP): - Ora essa! Não ouviu a sua intervenção!

O Orador: - ... é um truque que nós sabemos que utiliza quando não tem razão.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Faz o mal e a caramunha!

O Orador: - Sr. Deputado, não percamos mais tempo. Vamos discutir o que importa discutir, que é o fundo das questões, que são os problemas reais, que é o Orçamento do Estado, e não essas tricas políticas.
Além do mais, muito me surpreende o empenho do PCP nessa matéria, dado que costuma - aliás, é uma sua característica positiva - rejeitar a política-espectáculo. Portanto, concentremo-nos nos problemas reais do País e não na fricção política. Não vos fica bem, não fica bem ao Parlamento, não fica bem ao Governo, não fica bem a ninguém.

O Sr. João Amaral (PCP): - O que lhe ficava bem era pedir desculpa!

O Orador: - Peço desculpa quando houver motivo para isso, e não houve nenhum!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento ao Sr. Ministro das Finanças, o Sr. Deputado António Galvão Lucas.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Sr. Presidente, inscrevi-me, de facto, para um pedido de esclarecimento ao Sr. Ministro das Finanças, mas não posso deixar de salientar que ficou perfeitamente claro, após a intervenção do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, aquilo que para nós já não era uma surpresa, isto é, que houve de facto um acordo, como, aliás, houve em anos anteriores com o nosso partido, só que não foi feito da mesma forma como este porque foi assumido. E era bom que, duma vez por todas, este assunto fosse dado por encerrado. Houve acordo, fizemos acordos, assumiram-se na altura esses acordos. Agora o acordo não está a ser assumido, mas é facto que foi feito.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - É grave!

O Orador: - Mas não levanto a questão porque, de facto, também estou de acordo que em toda esta discussão, que é importantíssima, porque estamos a discutir um dos pressupostos básicos para a aprovação deste Orçamento do Estado, não se estão discutir outros aspectos que seria importante discutir e que têm a ver com o Orçamento do Estado.
E um dos aspectos que queria levantar ao Sr. Ministro das Finanças tem a ver com a evasão fiscal, que é, antes de mais, uma obrigação de qualquer Governo combater. E não vejo, sinceramente, qualquer forma mais expedita de virmos a conseguir alguma sustentabilidade e algum equilíbrio para as contas públicas após o 1.º de Janeiro de 1999 que não passe por um combate eficaz à evasão fiscal.
Foi publicado que neste País, em 1996, terão fugido ao fisco mil milhões de contos. O Governo enviou, em meados de Maio, à Assembleia da República um projecto de resolução de reforma fiscal prometendo para Setembro um conjunto de autorizações legislativas. Onde é que estão essas autorizações legislativas?
O Sr. Primeiro-Ministro informou ontem esta Câmara que se iria dar início a um recrudescimento da fiscalização - aliás, o Sr. Ministro acabou de o confirmar. Portanto, Sr. Ministro das Finanças, quando é que chegam as tais autorizações legislativas para que haja mais justiça fiscal, que é, ao fim e ao cabo, aquilo por que todos lutamos? Quando vemos deixar cair os pagamentos por conta para o IRS e não vemos avançar minimamente nesse sentido, perguntamo-nos quando é que chegam as autorizações legislativas para que haja mais justiça fiscal e mais eficácia nas cobranças e quais são as medidas concretas de que ontem o Sr. Primeiro-Ministro falou para aumentar de imediato a fiscalização.
Finalmente, Sr. Ministro, tem alguma estimativa de qual vai ser a evasão fiscal para 1997?
São três questões que se justificam porque esta bancada está plenamente convencida de que quando chegarmos ao final de 1998, em termos da nossa economia, se não houver um combate eficaz, eficiente, à evasão fiscal. só haverá sustentabilidade, só nos manteremos com a taxa de inflação e os défices que temos e com os ratios que hoje atingimos através do aumento de impostos e esse aumento só poderá ser feito, de acordo com a máquina que neste momento existe, à custa de quem já paga impostos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Galvão Lucas, relativamente à questão das autorizações legislativas para pagamentos por conta em IRS e IRC, parece-me claro que o acordo que existiu foi no sentido de se aprovarem duas autorizações legislativas, cujas condições de aplicação iriam ser estudadas. E é em consequência deste estudo, se quisermos simplificar - e o Sr. Primeiro-Ministro anunciou-o ontem em nome do Governo -, que vamos dar aplicação à do IRC porque temos condições para isso em articulação com a redistribuição dos encargos do IRC resultante da descida de taxas e da aprovação do regime das PME.
Todavia, não temos condições para dar, com segurança, aplicação à autorização legislativa de pagamentos por conta do IRS, mas continuaremos a estudá-la no âmbito de uma reforma do IRS que está programada para ser discutida ao longo de 1998 e para entrar em vigor em 1999 porque é mais seguro. Não somos um Governo que se tenha por infalível e quando não há condições para fazer algo que devíamos fazer não consideramos que seja incompetência dizer que precisamos de estudar. Aliás, como não consideramos que seja incompetência dizer, a propósito do regime forfetário do IVA, que não há ainda condições sociais para o aplicar assim porque, embora sendo uma boa ideia, precisa de ser melhorada. Pelo contrário, achamos que incompetência seria teimar no erro quando, eventualmente, há possibilidade de o corrigir.
Julgo, Sr Deputado, que isto também se aplica à matéria relativa à luta contra a fraude e evasão fiscal. As estimativas que existem variam muito. Só no domínio do IRS há dois cálculos recentes que foram apresentados em Outubro. O Dr. Medina Carreira estima que a matéria colectável declarada para o IRS poderá andar na ordem de grandeza de um terço relativamente à matéria colectável total que seria tributável. Usando métodos mais restritos, o Dr. Albano dos Santos calcula que a base tributável

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efectiva de IRS é objecto de evasão, para 1995, num valor que ele estima em 21,5% e que nos anos anteriores poderá andar nos 25%. Entre estas duas enormes variações certamente o que podemos dizer é que a evasão fiscal é muito grande. Isso todos os portugueses sabem, e a administração fiscal também.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa determinação, sobretudo através da reforma da administração fiscal, da informatização, da descentralização, eliminando os erros da concentração de 1993 e da afectação de meios à fiscalização, com programas mais rigorosos, já está a dar resultados. E esses são, como disse, os nossos programas fundamentais.
Sr. Deputado, quanto a autorizações legislativas, não queria deixar de lhe dizer duas coisas. Quando foi apresentado e aprovado o Orçamento do Estado para 1997 o Governo disse que, em virtude do carácter crucial do Orçamento do Estado de 1997 para o acesso à moeda única, as autorizações legislativas em matéria fiscal seriam utilizadas ou apresentadas, consoante os casos, muito perto do final do ano para não perturbar a execução orçamental. É assim que estamos a trabalhar, e das 36 previstas no Orçamento do Estado para 1997 estão em aprovação em Conselho de Ministros 17, estão aprovadas duas, concretizar-se-ão até ao final do ano oito e haverá mais três relatórios que serão apresentados até ao final do ano, visto que o prazo de apresentação é 31 de Dezembro, e temos dúvidas sobre a execução de oito, uma delas, esta que está a ser discutida e mais sete autorizações legislativas que pensamos que possam transitar para o Orçamento do Estado do próximo ano como o projecto de articulado aqui apresentado o demonstra.
É este o balanço da execução. Elas serão utilizadas ou apresentadas, consoante os casos, em prazo, até ao final de 1997, de acordo com aquilo que tínhamos dito. A execução de 97 não pode ser perturbada, mas a entrada em vigor em 98, como sucede com a maior parte dessas autorizações ou utilizações, e a apresentação dos relatórios será garantida até 31 de Dezembro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Manuel Varges.

O Sr. Manuel Varges (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por saudar este Orçamento do Estado pela vantagem acrescida de estarmos já com dois anos de execução orçamental decorridos e pelo facto de o Governo sempre ter cumprido, e até excedido, os objectivos que assumiu nos Orçamentos do Estado anteriores por muito que isso custe aos incrédulos e aos profetas da desgraça.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Só isto, Sr. Ministro das Finanças, dá suficiente crédito ao Governo, a V. Ex.ª, à sua equipa e a este Orçamento do Estado e, por isso, o PSD rendeu-se hoje à necessidade de viabilizar este Orçamento do Estado, e louvamos o sentido de responsabilidade e de seriedade com que o fizeram.
Como já foi dito e redito, Sr. Ministro, o significado deste Orçamento do Estado para 1998 para a economia portuguesa tem a ver, fundamentalmente, com o facto de ele vir confirmar e consolidar cinco objectivos fundamentais: a redução do desemprego, o aumento real dos salários, a diminuição da inflação directamente pela desinflação monetária e como consequência da consolidação financeira, um menor défice e uma menor dívida pública e, finalmente, a expansão da nossa economia a um ritmo que continua a ser significativamente superior ao da média da União Europeia.
Mas, Sr. Ministro, já ouvimos alguém argumentar que o Governo está a aproveitar a boa conjuntura. Claro que todos temos de entender que Portugal não pode ter uma conjuntura feita só por si ou só para si numa economia europeia cada vez mais mundializada, mas é bom recordar que essa conjuntura se insere num bom contexto de uma expansão mundial muito boa, mas que, apesar de tudo, na Europa não tem tido unia execução tão boa. E quero recordar, para que todos nos lembremos, que em Portugal temos tido uma execução melhor do que na maioria dos países da Europa.
Sr. Ministro, não estamos numa lotaria nem andamos à boleia de nada ou de quem quer que seja. O que pretendo de V. Ex.ª é que, para que não restem dúvidas, nos dê argumentos que claramente convençam quem não está convencido de que este Governo tem tido medidas e atitudes da nossa economia interna pró-activa que, de facto, fazem com que esta situação não seja devida à conjuntura mas, sim, a uma atitude interna e pró-activa deste Governo e da política que tem seguido.
Há ainda outra questão que não quero deixar de colocar-lhe Sr. Ministro. Este Governo, desde 1994, cumpriu pela primeira vez a Lei de Bases da Segurança Social.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Desde 1994! Disse bem!

O Orador: - A partir de 1996 e 1997, Sr. Deputado!

O Sr Vieira de Castro (PSD): - Não, não! Disse bem!

O Orador: - Em 1995, como todos sabemos, o orçamento para a segurança social rondava cerca de 1,1% do PIB. Em 1996, as transferências já rondavam 2% do PIB. Todos sabemos, Sr. Ministro, que o financiamento da segurança social era conseguido com base em certos artifícios, ou, se quisermos, em certos truques. Gostaríamos que V. Ex.ª explicasse como é que, de uma forma evidente e transparente, este Governo apresenta pela primeira vez o Orçamento em que o financiamento da segurança social é feito com clareza, com transparência e com muita evidência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Varges, agradeço as suas palavras.
Na primeira parte das suas considerações atrevo-me a encontrar um desafio quanto à ideia de que a recuperação da economia portuguesa, processando-se em economia aberta e, em particular, em íntima articulação com a economia da União Europeia, é mérito dos portugueses e foi conseguida em resultado da política económica desempenhada por este Governo. Foi em meados de 1996 que, claramente, essa recuperação se começou a desenhar. Ora, se constatarmos que a convergência real não se

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verificou, que houve divergência real em 1993, 1994 e 1995 em relação à Europa, e que houve convergência real depois, teremos nisso uma boa indicação.
Outra boa indicação resulta do que o Sr. Primeiro Ministro, na intervenção de ontem, também já disse: em 1995, Portugal tinha a taxa de crescimento mais baixa da União Europeia, a seguir à mais baixa de todas, que era a da Alemanha. Quer dizer, estávamos numa situação praticamente recessiva ou próximo disso. Em 1996 e em 1997, de acordo com as previsões da Comissão Europeia para 1998, a taxa de crescimento da produção, em Portugal, é uma das quatro maiores da União Europeia. Somos um dos quatro países que crescem mais. Não admira, portanto, que o Financial Times intitule o suplemento de ontem sobre Portugal com «grandes melhorias constantemente». É essa a situação da economia portuguesa, hoje. Continuar assim é importante para recuperarmos o atraso.
Quanto à segurança social, desde a Lei de Bases de 1984, só estes três Orçamentos, de 1996, de 1997 e para 1998, é que a cumpriram, viabilizando o sistema público através da componente tributária de financiamento da segurança social. Tentativas de empréstimos entre Orçamentos do Estado e da segurança social, transferências de créditos em condições pouco claras, como é evidente, não por razões de honestidade ou de legalidade mas por falta de transparência financeira, foram feitas antes, mas nada disso é cumprir a lei. Nós entendemos que a solidariedade dos portugueses com a segurança social começa pela transferência do Orçamento do Estado para o orçamento da segurança social, como está na lei. E isso é uma aposta decisiva para viabilizar o sistema público de segurança social. Aqui, como no resto, a prioridade do longo prazo e da solidariedade é que está na origem da nossa decisão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, no seu discurso, perguntou: «quem ousará negar a existência de um programa de reformas?». Um programa de reformas ninguém ousa negar. É o Programa do Governo. O Programa do Governo, como o Sr. Ministro bem se recorda, é altamente reformista. Portanto, esse programa de reformas ninguém ousa negar. O que nós ousamos negar é a existência de reformas em curso.
Gostaria de perguntar-lhe se, quando anuncia um aumento de despesa considerável nos sectores sociais - certamente, conhecendo, melhor do que eu, a construção e a arquitectura dessas reformas que estão no Programa do Governo, o Sr. Ministro das Finanças sabe perfeitamente que não estão a ser feitas -, esse crescimento da despesa sem essas reformas poderá ou não levar àquilo a que eu chamaria um aumento de despesa totalmente improdutivo, sobretudo do ponto de vista social. Isto é, se esse aumento de despesa permitirá, tão-só, fazer o mesmo, o que significa, com o andar do tempo, fazer menos, ou até, em algumas áreas, como é o caso da saúde, uma degradação tecnológica, logo, fazer pior?
Recordo-me que, quando discutimos aqui o Orçamento Suplementar para a saúde e lhe coloquei esta questão, o Sr. Ministro das Finanças me respondeu que concordava, dizendo: «De facto, se as coisas continuassem assim, seria um grave prejuízo para os portugueses, como contribuintes e como utentes e beneficiários». Isto é, a não existência destas reformas estruturais significa uma degradação da qualidade dos serviços, um constante aumento improdutivo da despesa, e vai significar, aliás, segundo contas que tenho, um aumento também da carga fiscal.
Pergunto-lhe, como Ministro das Finanças, se pensa fazer acompanhar a receita, não sei por que forma nem por que via, para este aumento improdutivo da despesa (tenho aqui, por exemplo, um aumento de 5%, mas ela tem sido superior a isto) com um crescimento económico de 3%, o que nos levaria a ter, em 2005, um nível de fiscalidade de 41,7. Os números valem o que valem, mas penso que, se fizer estas contas, ficará próximo disto. Ora, um nível de fiscalidade de 41,7 significa aquilo que todos nós sabemos.
Portanto, não sei até que ponto é prudente que o Sr. Ministro faça o discurso de empolar a bondade do crescimento da despesa, que pode ser feito de uma forma mais perdoável pelos seus colegas que não são ministros das finanças, quando se sabe que muitas vezes ela é improdutiva, destina-se apenas a manter sistemas que não funcionam, porque as reformas que tinham de pôr os sistemas a funcionar - que são instrumentais em relação às tais pessoas com as quais o Sr. Ministro das Finanças diz preocupar-se o Sr. Primeiro-Ministro - não estão feitas nem estão a ser feitas.
Para terminar, dir-lhe-ia que olhando para este Orçamento e estando atenta à governação, como me compete, sendo de um partido da oposição, o que ressalta não é o ainda não feito mas, sim, o não começado, e o não começado a dois anos de legislatura significa o não feito daqui a quatro anos.
Portanto, pergunto-lhe: diz-me o mesmo que me disse há um ano atrás, ou seja, reconhece que, no essencial, nestes sistemas, não foram introduzidos mecanismos que permitam que a despesa seja produtiva e que, por isso, o seu crescimento signifique, de facto, uma melhoria da qualidade dos serviços, uma melhoria do atendimento e até um aumento dos benefícios?

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, em primeiro lugar, o ponto de partida da questão que coloca merece o meu inteiro acordo, não, naturalmente, na ideia de que as reformas não estão a ser feitas, mas na ideia de que não basta falar no aumento de recursos afectos às funções sociais, ele tem de se traduzir numa maior qualidade na satisfação das necessidades sociais dos portugueses.
A prioridade é inegável e significa que conseguimos conter, em gastos de funcionamento, a despesa corrente ou improdutiva, ou menos produtiva, e que conseguimos sacrificar, no conjunto da despesa corrente de não funcionamento, recursos afectos a funções que não as sociais. Mas é necessário dizer algo mais para além deste indicador muito impressivo: quase 10 pontos percentuais na afectação dos recursos às despesas sociais, à custa da compressão das prioridades puramente políticas, económicas ou outras.

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Quero também dizer-lhe - a Sr.ª Deputada antecipou uma parte da resposta - que, como é óbvio, pelos diversos sectores sociais, são os meus colegas responsáveis por eles que devem falar e falarão, mas sublinho que está em discussão, numa versão preliminar, o livro de reforma da segurança social e, além disso, sei que o Governo não está à espera do Livro Branco ou do Livro Verde, seja qual for a cor, para fazer efectivamente reformas passo a passo. Desde o rendimento mínimo garantido à forma das prestações familiares, muita coisa se tem feito no domínio da segurança social. No domínio da saúde, o documento orientador da reforma do sistema de saúde será aprovado a muito breve trecho pelo Governo.
Sublinho que as reformas estruturais mencionadas no Programa de Estabilidade e Convergência são, além das reformas da segurança social e da saúde, a reforma do sistema orçamental, que está praticamente conseguida com a consolidação e será consagrada pela apresentação, até ao primeiro semestre do próximo ano, de uma nova lei de enquadramento do Orçamento do Estado; a reforma fiscal, acerca da qual já temos falado e que está a ser concretizada com grande determinação; a reforma da Administração Pública, cujas características ainda hoje, Dia da Desburocratização, serão certamente lembradas e ilustradas, e que é uma reforma prática que está a ser prosseguida, negociada com os trabalhadores da Administração Pública e feita no terreno, também com grande eficácia.
Estas reformas estruturais, que se reflectem no Orçamento do Estado, são uma peça fundamental para dizer que também nesse aspecto o Orçamento é compatível com elas e é sustentável. Sem reformas estruturais, não o seria, mas, como elas existem, é e sê-lo-á.

Vozes do PS: - Muito bem!

 Sr Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

 Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Primeiro Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de Orçamento do Estado para 1998 que hoje aqui se debate é apresentada num cenário macroeconómico bastante confortável para o Governo. Usufruindo de uma conjuntura internacional favorável e de uma herança francamente positiva, o Executivo socialista resolveu não pôr em causa as principais opções de política económica que vinham sendo seguidas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

 Orador: - Muito criticou o PS a política macroeconómica do PSD, mas, afinal, quando chegou ao poder, resolveu dar-lhe o devido seguimento. Ainda bem! Ainda bem, porque é preferível ser-se criticado pela incoerência do que por um mau desempenho da nossa economia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

 Orador: - Na verdade, com um crescimento económico em torno dos 4%, com as recentes receitas de privatizações a um nível muito elevado e com as taxas de juro a cair, o Orçamento para 1998 é elaborado com uma margem de manobra substancialmente alargada.
É tendo em conta este aspecto que esta proposta de lei se apresenta desadequada às necessidades da nossa economia. As opções orçamentais de um país devem ser traçadas em função da sua situação conjuntural e das suas limitações estruturais. Infelizmente, não é isso que o Governo propõe à Assembleia da República.
 que nos é proposto é um Orçamento que aproveita o presente e despreza o futuro. Aumentam as despesas improdutivas, aumenta a receita fiscal e agrava-se o défice público.
Neste Orçamento está bem reflectido o custo de ainda não se ter feito qualquer reforma estrutural nas nossas finanças públicas.

 Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

 Orador: - As despesas correntes do Estado continuam a disparar para infinito, porque o Executivo socialista não fez, nem tem coragem para fazer, reformas na Administração Pública, na justiça, na saúde, no sistema fiscal ou mesmo no modelo de financiamento da segurança social.
As despesas correntes sem juros passaram de 5747 milhões de contos, em 1995, para 7095, em 1998. Nestes três anos, crescerão 23,5%, a taxas anuais sempre superiores à da produção nacional.
Por isso, o seu peso no PIB aumenta todos os anos. Por isso, subtraem-se todos os anos cada vez mais recursos à nossa economia para pagar as ineficiências do Estado. É, seguramente, um contributo muito negativo para a competitividade das empresas portuguesas, pois, como não podia deixar de ser, para pagar o despesismo, as receitas de impostos passaram de 3393 milhões de contos, em 1995, para 4270, em 1998. Mais 894 milhões de contos, correspondentes a um aumento de 26,5%, com taxas anuais de crescimento sempre em torno dos 8%.
Estes números, por mais incrível que pareça, ainda não são suficientes para este Governo admitir que tem seguido uma estratégia de aumento de impostos.
Mas, Sr. Presidente, se a ausência de medidas estruturais nos mais diversos sectores tem prejudicado fortemente as nossas finanças públicas e a nossa economia, há, no entanto, um sector que, de ano para ano, se tem agravado de forma inadmissível o da saúde.
A Sra. Ministra distribui sorrisos à esquerda e à direita. Revela-se uma governante simpática e com espírito dialogante. Mas, o desempenho do Ministério é, face aos números que todos os anos o Governo se vê obrigado a apresentar-nos, um verdadeiro descalabro.
As verbas despendidas crescem anualmente a taxas muito elevadas e o Governo tenta contornar o problema, dizendo que está a apostar na saúde.  facto de as verbas nunca chegarem e ser sempre preciso mais e mais não significa que se está a apostar na saúde. Significa que se está a gastar mal gasto, ou seja, a desperdiçar.
Se o que é gasto nesta área governamental fosse gasto em mais e melhores coisas, seguramente, os portugueses notariam. Mas a verdade é que os portugueses nada de melhor notam. Há mais despesa, muito mais despesa, mas não há melhor serviço. Está praticamente tudo na mesma, menos os milhões que os contribuintes pagam para este Ministério gastar.
Como sempre, os socialistas gastam: gastam muito, sem que, apesar disso, os portugueses consigam notar qualquer melhoria considerável na sua qualidade de vida.
Em cada ano que passa, a situação torna-se mais preocupante. A Sr.ª Ministra tem de compreender que não basta ser-se simpática. Ser-se simpática, por si só, nada

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resolve, pois poucas coisas na vida melhoram apenas com sorrisos. É preciso agir e fazer as reformas que o descalabro orçamental impõe que sejam feitas. Os portugueses aceitam afectar mais impostos à saúde, se esses impostos servirem para melhorar o serviço que lhes é prestado. Para pagar as ineficácias do sistema, apenas porque não há coragem política para o reformar, ninguém, seguramente, concorda em dar mais um tostão que seja.
E, se na actual conjuntura económica de confortável crescimento do PIB, as deficiências estruturais conseguem ser razoavelmente disfarçadas, no futuro não será, seguramente, assim. Por isso, impõe-se que o Governo responda à seguinte pergunta: com a entrada na moeda única e face ao pacto de estabilidade que Portugal vai ter de cumprir, que pensa o Executivo fazer quando a nossa produção crescer a taxas mais baixas, facto que, pelas leis da economia, necessariamente, ocorrerá? Nessa altura, até os menos atentos perceberão que a realidade jamais conseguirá ser mudada apenas com recurso à simpatia e ao diálogo. Ficará claro que ela só se alterará com medidas profundas, que eliminem as deficiências estruturais que todos sentimos no nosso quotidiano.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se não aproveitarmos as conjunturas, favoráveis para preparar melhor o futuro, quando tivermos de enfrentar uma recessão, por mais ténue que ela seja, os seus efeitos negativos far-se-ão sentir muito mais. É o velho princípio da história A cigarra e a formiga.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Apesar do crescimento do produto constante do cenário macroeconómico para 1998, do forte aumento da receita fiscal e da poupança em juros da dívida pública face à estimativa de execução de 1997, a presente proposta de Orçamento, por mais incrível que pareça, ainda agrava o saldo primário e o próprio défice global do sector público administrativo.
Os 53 milhões de contos de poupança em juros, os 293 milhões de contos correspondentes ao aumento da receita de impostos e ainda mais os 58 milhões de agravamento do défice público não são suficientes para fazer face a um aumento de despesas correntes que se prepara para atingir os 459 milhões de contos no próximo ano.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - São números que atestam uma evolução que a todos nos deve assustar e que, seguramente, não permite augurar um futuro tranquilo, perante qualquer pequena «constipação» que a economia europeia, a qualquer momento, possa sofrer. Será que tantos milhões se traduzem em melhor qualidade de vida para os portugueses? A esta pergunta o Partido Social Democrata responde inequivocamente «não»! Não, gasta-se muito mais, mas não se nota qualquer melhoria especial na vida do País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma das formas saudáveis de aproveitar a conjuntura económica favorável que estamos a atravessar seria a de aumentar o investimento público de forma substancial. Não é, infelizmente, o caso no presente Orçamento. As verbas nacionais disponíveis para o PIDDAC são exactamente coincidentes com a estimativa de execução de 1997. Descontados os 6% que o Governo nos propõe que fiquem desde já congelados, o ridículo aumento cifra-se em apenas 742 000 contos. Significa que mal dá para pagar as simples obras no quarto de banho de um qualquer ministro que, repentinamente, se veja a braços com a incontrolável vontade de caprichar um pouco mais em matéria sanitária.

Aplausos do PSD.

O Governo gasta e, assim sendo, pouco lhe sobra para investir. É por isso que não consegue afectar maiores valores ao investimento e se vê na necessidade de inventar esquemas esdrúxulos, como o das «portagens virtuais». Uma maneira de construir estradas com o dinheiro que ainda não existe, ou seja, com o dinheiro dos impostos das gerações futuras.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Só se agarra a soluções deste género quem dá pouca importância ao dia de amanhã e não se imporia de oferecer lucros extraordinários às empresas privadas. A implementação das denominadas «portagens virtuais», seria uma medida muito polémica se tomada por um governo de direita. Implementada por uma governação que se auto-proclama de esquerda, é, seguramente, mais um caso para os Srs. Deputados do PS, ideologicamente mais sólidos, continuarem a não conseguir dormir descansados. Neste caso, já nem o argumento de o socialismo ter sido metido na gaveta consegue explicar tal opção. É já preciso ter lá metido muito mais coisas, tantas, aliás, que, qualquer dia, a famosa gaveta já nem consegue fechar.
Mas as fraquezas do investimento público não são só visíveis na estagnação das verbas do PIDDAC. Se olharmos para os dados disponíveis referentes à utilização dos fundos que o II Quadro Comunitário da Apoio põe à nossa disposição, chegamos rapidamente à conclusão que a sua taxa de utilização está muito abaixo daquilo que seria desejável.
Decorridos quatro anos, dos seis em que Portugal deve utilizar os 3484 milhões de contos a que tem direito, apenas estavam utilizados 1552, em 1 de Julho do presente ano. Quer isto dizer que decorrido praticamente 60% do tempo apenas utilizamos cerca de 45% das verbas disponíveis.
Mas o mais dramático é que, segundo as previsões dos próprios serviços governamentais competentes, em fins de 1998 estarão ainda por utilizar perto de 1000 milhões de contos. Se assim vier a ser, o panorama é efectivamente muito mau, pois ninguém, seguramente, acredita, que, em 1999, se conseguirá, num só ano, emendar satisfatoriamente todos os males do passado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não houve, até agora, capacidade para se conseguir uma boa gestão das verbas que, em 1993, conseguimos negociar com a União Europeia.
O assunto de que estamos a falar é, Srs. Deputados, da maior importância...

Vozes do PSD: - Muito bem!

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O Orador: - ... não apenas porque o país se moderniza menos quando investe menos mas, principalmente, porque uma baixa taxa de utilização é a melhor forma de Portugal perder peso negocial nas difíceis conversações que vão decidir as novas opções comunitárias, no que concerne aos apoios estruturais.
Direi mesmo que, face ao alargamento a Leste, esta é das piores coisas que nos poderá acontecer nesta matéria. Esperemos que o Governo se consciencialize da extrema importância do que estamos a falar e se esforce por tentar ultrapassar as modestas previsões para 1998. Apesar de poder haver transferência de saldos para o ano 2000, é fundamental apresentar, em Bruxelas, uma boa taxa de utilização no último ano de vigência do actual Quadro Comunitário de Apoio, ou, melhor dito, termos aprovado projectos mais que suficientes para assegurar a absorção integral das verbas à nossa disposição.
Porque é o futuro de Portugal que está em jogo, esperamos sinceramente que o Governo consiga melhorar decisivamente a sua actual performance nesta matéria. Não é, seguramente, com agrado que o Partido Social Democrata se sente na obrigação de, na sua qualidade de principal partido da oposição, alertar o Parlamento para os perigos da presente situação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Entrar no primeiro pelotão da União Económica e Monetária é, para nós, uma meta fundamental para o desenvolvimento do País. Este Orçamento do Estado, ao cumprir os critérios de convergência nominal, dá continuidade a uma estratégia há muito iniciada e permite, assim, que Portugal se junte aos melhores.
Por isso, seria um contra-senso desperdiçar esta oportunidade, chumbando a proposta que nos é submetida a apreciação. Só que o mundo não acaba em 1 de Janeiro de 1999. Esta data significa apenas que as nossas perspectivas de desenvolvimento aumentaram e que nesse dia conquistamos um instrumento fundamental para a nossa permanente batalha contra o atraso económico, que, face à maioria dos nossos parceiros europeus, ainda continuamos a ter.
É, assim, à luz desta convicção que criticamos o documento que nos é apresentado. Ele permite a entrada na moeda única, mas não nos prepara para a moeda única. Tira partido do presente, mas esquece o futuro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Neste Orçamento gasta-se mais, cobra-se mais impostos, aumenta-se o défice público, degrada-se o saldo primário, minoriza-se o investimento, não se cumprem promessas feitas e, acima de tudo, não se anuncia qualquer reforma importante.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este não seria, pois, o nosso Orçamento do Estado, em circunstância alguma. É um documento em que o Governo, deslumbrado com o presente, ignora o futuro. Por isso, Sr. Presidente, gostaríamos que o País pudesse seguir outro caminho. Um caminho, em que o presente fosse, acima de tudo, aproveitado para preparar o futuro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Informo a Câmara que se encontram inscritos, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira e Henrique Neto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, a imprensa anunciou que V. Ex.ª vinha defender o cavaquismo, o Professor Cavaco Silva. Como parece que já ninguém o defende, também nesse domínio V. Ex.ª foi uma desilusão. De qualquer modo, está a proceder à reciclagem, com qualidade e habilidade, do discurso feito no ano passado. Mas vamos a factos.
Contrariamente ao que V. Ex.ª diz, aumenta-se a eficácia fiscal, reduz-se o défice público, aumenta-se o investimento público, de forma a potenciar o investimento privado. É isto que se passa e não o que V. Ex.ª diz.
Quanto ao Quadro Comunitário de Apoio, remeto-o para as declarações da Comissária Monika Wulf-Mathies, que ainda ontem referiu que Portugal era o país que melhor o estava a executar, pelo que V. Ex.ª está desinformado. Assim, agradeço que leia os textos, porque, certamente, agora eles não lhe chegam da direcção da sua bancada com a mesma facilidade, não tem o mesmo acesso. No entanto, os dados são os dados e não vale a pena distorcê-los, Sr. Deputado Rui Rio.
No que toca à saúde, V. Ex.ª, quando ataca a questão dos sorrisos, quererá, certamente, ser recebido no hospital com, digamos, algum bulldog e não com sorrisos... V. Ex.ª esquece-se de que as reformas profundas estão pendentes de estudos e relatórios, esquece-se de que há uma táctica de contratualização de orçamentos com hospitais e a saúde, que VV. Ex.as nunca fizeram. Aliás, tendo em conta a vergonha que foi a gestão da saúde, o PSD devia impedir V. Ex.ª de falar no assunto. Foi uma vergonha tal que nem quero voltar a referir isso aqui.

Aplausos do PS.

VV. Ex.as pagavam os défices nos hospitais, nós procuramos fazer com que essas despesas correspondam a investimentos e a reorganização, só que o descalabro a que VV. Ex.as conduziram durante 10 anos não pode ser reformado em dois.
A maneira como o Sr. Deputado trata a questão dos cuidados primários na saúde é de facto um atentado grave e primário aos profissionais da saúde. Há mais, Sr. Deputado, mas o tempo não permite que diga tudo.
O Sr. Deputado falou em «portagens virtuais». Ouvi anteontem a sua crónica radiofónica, que V. Ex.ª reciclou agora. E, devo dizer-lhe, não faz qualquer sentido, porque o que se pretende exactamente é que haja também algum compromisso em relação ao futuro, o que até é uma maneira equilibrada e inteligente de distribuir custos relativamente ao futuro. V. Ex.ª não deve ter entendido bem o mecanismo das «portagens virtuais», ou, então, também faz parte daquele grupo de fanáticos do Bombarral.
No que diz respeito ao PIDDAC, que está perto dos 1000 milhões de contos, a maneira como V. Ex.ª trata esta questão é, pura e simplesmente, uma deturpação completa - e eu nem queria acreditar quando agora a estive a ler.
O Sr. Deputado Rui Rio falou na conjuntura e, a este respeito, não pode escapar ao que vou dizer: tendo em conta que temos os dados, como V. Ex.ª também os tem, a outro desculparia, mas a V. Ex.ª não...! O que acontece é que nos últimos anos do cavaquismo, como V. Ex.ª sabe,

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o produto não só cresceu menos em termos europeus como cresceu menos do que o previsto no Orçamento do Estado. É ou não verdade que, em 1992, previram um crescimento de 3% e foi só até 1,9%? Que, em 1993, previram 3% e decresceu? Que, em 1995, previram um crescimento entre 2,5% e 3,5% e cresceu 2,3%? É ou não verdade que com o PS se previu um crescimento entre 2,5% e 3%, em 1996, que V. Ex.ª dizia ser difícil e a Dr.ª Manuela Ferreira Leite impossível, e cresceu 3,2? Em 1997, previu-se um crescimento entre 2,75% e 3,25% e cresceu mais do que 3,5%. É ou não verdade que só não cresceu mais do que a média europeia como mais do que as próprias previsões? E o seu antigo amado Cavaco Silva, nos últimos anos, fez sempre com que crescesse menos do que a média europeia e as previsões. Esta é a verdade, Sr. Deputado Rui Rio, não queira de facto trazer-nos aqui qualquer mistificação. O senhor não é um político que não conheça o que se passa em termos económicos, por isso compreendemos e louvamos a sua habilidade. V. Ex.ª faz um discurso hábil, mas nada tem a ver com a verdade. Nada tem a ver com a verdade!
Posso ter a maior consideração por si, mas tenho muito mais pela verdade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, nem sei por onde começar...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Desista!

O Orador: - É tanta coisa! Não esteve mal de todo, mas ainda não deve dar para a renovação ministerial de Janeiro.
Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, comecemos pelas portagens virtuais trata-se de um esquema em que o Governo entrega obras a uma empresa privada, que constrói a estrada, onde o Governo nada paga. Não aparece no Orçamento, não figura na dívida pública, mas depois fica-se a pagar um esquema chamado «portagens virtuais» durante não sei quantos anos.
A minha pergunta é muito simples: primeiro, por que é que isto não é colocado no Orçamento e, sendo tal o envolvimento das gerações futuras, em vez de se fazer desta forma não se faz via normal, via défice público? Quando aparece no défice público é um aumento de dívida pública, e, portanto, está aí uma herança das gerações futuras negativa, mas perfeitamente controlada.
Em segundo lugar, por que é que também não se vai ao mercado buscar os fundos e se permite que as empresas privadas fiquem com um duplo lucro: primeiro, o lucro da construção da obra e, depois, o lucro da intermediação financeira?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É isto que não se entende e que gostaríamos de ver explicado.
Relativamente ao QCA, o Sr. Deputado fala em notícias de jornais. Eu tenho mais notícias de jornais, Sr. Deputado, tenho aquela de que falou e outras. Tenho, por exemplo, uma, também de ontem, onde o Sr. Ministro João Cravinho diz que admite chegar ao fim, a 1999, sem usar 300 milhões de contos do QCA. É uma coisa espantosa sabermos, ainda a dois anos de distância, que vamos ser ineficientes. Mais ainda, na mesma notícia - também deve ter lido esta -, o Sr. Ministro João Cravinho diz que vai haver atrasos na negociação do III QCA. Ou seja, a dois anos e tal de distância já admite não vir a conseguir aquilo que nós conseguimos quer no QCA I quer no QCA II.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - O Sr. Deputado referiu a notícia onde a Comissão elogia o sucesso português. É uma coisa fantástica! A Comissão tem 365 dias para elogiar o Governo português, mas logo havia de o elogiar no dia em que se inicia aqui o debate orçamental.

Vozes do PS: - Dói, não dói!? É masoquista!

O Orador: - Há coincidências do diabo!...

Risos do PSD e do PCP.

Deixe-me dizer-lhe mais uma coisa, Sr. Deputado. Diz a notícia uma coisa fantástica: que Portugal ultrapassa, com frequência, as previsões iniciais sobre a execução dos dinheiros. Quer dizer, nem sequer está coincidente com o que o Governo diz, porque a própria execução do Governo está longe de estar em paralelo com aquilo que é programado. É mais papista do que o Papa! São argumentos do diabo!...
Agora uma outra coisa, Sr. Deputado. Diz-se também aqui que, em vez de se estar a criar 17 000 postos de trabalho por ano, está-se a criar 35 000. Não sei se é ou não verdade, mas, se for, muito obrigado! Porque quem fez o modelo, quem fez o QCA fomos nós.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Mas vocês não sabiam usá-lo!

O Orador: - A ser assim, é este modelo que está a gerar mais emprego que o previsto. Portanto, também aqui agradeço!
E, para não abusar do tempo, quero dizer, em relação ao QCA, que os senhores podem atacar, e estão no seu papel, o PSD em tudo e mais alguma coisa... Mas atacar o PSD no que toca à execução anterior do QCA, quando os senhores durante anos e anos nos criticaram por isso?! Quando os senhores nos criticaram de só olharmos para as obras públicas, de só olharmos para o betão?! Então, agora, querem criticar, numa atitude de completa incoerência relativamente àquilo que fizeram no passado, também isto?! É um argumento do diabo, Sr. Deputado!...

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, com toda a franqueza, apesar de ter confiança própria, fico sempre preocupado, quando ouço intervenções como esta, pelo que possa acontecer a pessoas inteligentes e experientes profissionalmente quando têm a tentação de esquecer tudo aquilo que aprenderam na vida

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real e enveredam pela vida política, mal entendida e mal digerida, porque há limites.
Sr. Deputado, no, que toca à conjuntura favorável, se bem me recordo, o seu anterior líder dizia ser uma coisa que não existia. Conjunturas favoráveis foi coisa que os senhores sempre negaram existir.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Privatizações, ó da guarda! Porque este Governo teve sucesso e receitas elevadas nas privatizações. O Sr. Deputado esqueceu que as privatizações eram, enfim, o vosso grande objectivo e que não o conseguiram realizar, realizaram-no mal, realizaram-no curto e com todos aqueles problemas que, aparentemente, o Sr. Deputado esqueceu, como o do Banco Totta & Açores, o do BPA, o das questões na Bolsa, todas aquelas negociatas,...

O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Negociatas! Isso dá um inquérito!

O Orador: - ... porque era isso que, na altura, se lia nos jornais, e que hoje desapareceu da vida económica portuguesa. Será que isso não tem valor, Sr. Deputado? Será que isso não vale nada?
Depois, Sr. Deputado, quanto à sua insistência nas reformas de fundo, às vezes fico sem perceber se sabem o que são reformas de fundo - se não sabem, é ignorância - ou se é, mais uma vez, uma mera atitude política, se é que podemos chamar a isto política. Porque é evidente que os senhores têm obrigação de saber que as reformas de fundo fazem-se, muitas vezes, todos os dias. Têm obrigação de saber, até porque anunciaram «montes» de reformas de fundo que não concretizaram.
E, para não usar as minhas próprias palavras, limito-me a ler o que vem no Diário de Notícias de hoje, escrito por um comentador que, enfim, não é da nossa área política, que diz: «a inauguração do Centro de Formalidades das Empresas e a criação de Lojas do Cidadão são, inequivocamente, duas medidas governamentais que merecem um claro elogio».

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mais uma coincidência!

O Orador: - E termina dizendo: «Tenho para mim que um Governo que execute muitas destas medidas funcionais, práticas e eficazes recolhe mais simpatias e elogios da opinião pública do que aqueles que vivem com a preocupação exclusiva das grandes transformações que nunca chegam a realizar».

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem dito!

O Orador: - Suspeito que este comentador estava a pensar nalgum governo em particular e nalgum partido político em concreto!

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem dito! Muito bem!

O Orador: - Ainda por cima, Sr. Deputado, vem falar do Quadro Comunitário de Apoio dizendo que o Governo e o Sr. Ministro teriam dito que se estava a perder a ineficiência! Para já não é verdade! Aquilo que o Sr. Ministro disse foi que, no caso de o Quadro Comunitário de Apoio seguinte se atrasar, teria meios para criar essa continuidade. Foi isto que ele disse!
Mas o Sr. Deputado sabe que o atraso que existe foi legado por VV. Ex.as. Foram 280 milhões - estou a falar de cor - de atraso do Quadro Comunitário de Apoio que este Governo herdou de VV. Ex.as.
Finalmente, a questão da saúde, Sr. Deputado, já agora, quanto a esta questão, pego-lhe na palavra, porque eu próprio, no relatório que fiz das Grandes Opções do Plano - esta é uma matéria que me preocupa pessoalmente - escrevi o seguinte: «No campo da saúde, a formulação de um conjunto de propostas legislativas que promovem no sector da saúde uma evolução de uma Administração Pública tradicional subsidiada para uma organização enquadrada e contratualizada, criando as condições necessárias para o ensaio de novos modelos de administração pública em saúde, porque, pela sua importância, poderá não ser menos do que uma revolução, sendo desejável que as forças conservadoras e os diversos corporativismos de interesses existentes não se sobreponham ao interesse nacional». Foi isto que eu disse no meu relatório das Grandes Opções do Plano.
Perante isto, desafio-o a dizer-nos se V. Ex.ª e o seu partido estão dispostos a viabilizar esta grande revolução do sector da saúde, que é, no fundo, tornar o sector da saúde eficiente, uma das grandes reformas de fundo que VV. Ex.as tanto pedem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, este Deputado está mais interventor do que o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira. É preciso olhar para ele com atenção em Janeiro!

Risos.

Sr. Deputado Henrique Neto, falou em negociatas. Não percebo bem a que se está a referir, mas as negociatas mais recentes de que me lembro foram o «totonegócio» e o «cinenegócio». Estas são as mais recentes de que me lembro, mas julgo que não se estava a referir a elas.

Vozes do PSD: - E a Autodril!

O Orador: - E a Autodril, é verdade! A memória atraiçoou-me agora.
Sr. Deputado Henrique Neto, disse tanta coisa que não sei por onde começar!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Desista!

O Orador: - Quanto à questão da conjuntura económica, aproveito para falar na «herança» da forma como o Sr. Primeiro-Ministro ontem aqui a trouxe. A questão da inflação é pacífica, uma vez que o Sr. Primeiro-Ministro assumiu que não se faz descer a inflação em apenas dois anos, como é pacífica a estabilidade cambial e parece-me que também a entrada para o Sistema Monetário Europeu.
Porém, já não é pacífica a questão da dívida pública, mas a dívida pública, Sr. Primeiro-Ministro, também tem uma questão, é que...

Vozes do PS: - Os gráficos!

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O Orador: - OS gráficos do Sr. Deputado Henrique Neto ajudam àquilo que vou dizer!
Sabe o Sr. Deputado Henrique Neto que, quando a dívida está a subir, ela não decresce no ano em que baixamos o défice. Ou seja, o défice, pelos motivos que todos sabemos, aumentou - e bem! - em 1993... Se não tivéssemos reduzido o défice em 1993, a situação social do País era muito melhor... É para isso mesmo que existem os orçamentos nessas situações. É evidente que a dívida cresce nos anos imediatamente a seguir, por força desse aumento de défice, e só começa a reduzir-se anos depois de se ter reduzido o défice. Por isso, este Governo está a usufruir da redução do défice de 1994 e 1995, relativamente à dívida pública.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Guterres): - Não houve!

O Orador: - Houve redução do défice em 1994 e em 1995, como é óbvio, tal como em 1997, e este ano há aumento do défice público, que é uma coisa espantosa que esta Câmara parece que ainda não absorveu. O défice público este ano é maior do que o do ano transacto em 58 milhões de contos.
Portanto, há redução do défice, há redução da dívida motivada pela herança que vem de trás.
E mais uma coisa, relativamente às taxas de juro: então, é possível dizer que o mérito da inflação é nosso e o das taxas de juro não? É exactamente a mesma coisa! Na exacta medida em que a inflação vai descendo, vão descendo também as taxas de juro, que são rigorosamente a mesma coisa.

O Sr. Primeiro-Ministro: - As taxas de juro reais!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado Henrique Neto, quero fazer uma pequena correcção àquilo que disse no início do meu discurso, e que V. Ex.ª aproveitou, que tem a ver com o quadro macro-económico confortável que este Governo tem. Este quadro macro-económico é isso, é confortável, não nada de extraordinário.
Os senhores acham que este quadro macro-económico é uma coisa muito doce e estão, desde ontem, a lamber os dedos de contentes, mas não é assim tão doce. Sr. Deputado olhe, se se lembrar do crescimento em 1986, 1987, 1998, 1989, 1990, que teve taxas - tenho aqui anotado - de 4,1%, 5.1%, 4%, 5,5%, 4,2%, verá que ele está muito para cima daquilo que os senhores conhecem.
Agora, entendemos o vosso contentamento da mesma forma que entendemos o contentamento de um clube que sobe da 3.ª à 2.ª Divisão nacional.

Aplausos do PSD

O Sr. Primeiro-Ministro: - Estávamos na 3.ª Divisão! É uma boa síntese! Terceira divisão! Tudo numa palavra!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Uns aplaudem, outros lamentam, mas todos concordam que discutimos aqui, hoje, um Orçamento que coloca Portugal em definitivo no centro da construção europeia e na 3.ª fase da União Económica e Monetária.
É também um Orçamento de crescimento controlado e socialmente sustentado. Nele se consagra uma prática global, inteligente e eficaz que, com coragem e competência, o Governo do Partido Socialista pôs em prática desde o início das suas funções.
É hoje evidente que, a um estilo de maior transparência e diálogo, correspondeu uma progressiva mobilização dos agentes económicos e sociais para os desafios da mudança e que, com o envolvimento colectivo, essa mudança emerge pujante sob a forma de um desenvolvimento equilibrado e sólido, uma solidez alicerçada em confiança. Confiança nas instituições; confiança nas políticas; confiança nas previsões macro-económicas; confiança no controlo dos níveis de emprego; confiança na eficácia dos sistemas de protecção social; confiança nos objectivos de justiça fiscal; confiança, em síntese, numa estratégia de Governo, que combina, com arte e saber, rigor económico, sensibilidade social e capacidade de aproveitamento das potencialidades do povo português.
Combinar responsabilidade na gestão da economia com justiça no combate à exclusão e arrojo no apelo à criatividade dos portugueses, é a chave do êxito, diria mesmo, o triângulo do sucesso, do ciclo de Governo protagonizado pelo Engenheiro António Guterres e pela sua equipa.
O rigor económico permitiu-nos, contrariamente às lancinantes previsões catastrofistas das pitonisas da oposição, qualificar Portugal, com naturalidade, para a mais importante reforma instrumental no contexto europeu, ou seja, para a adopção do euro e para a fruição do potencial de afirmação económica e política que ele permitirá.
Mas, esse rigor não foi, como no passado aconteceu e muitos desejariam, um rigor socialmente cego Pelo contrário, foi um rigor explicado, partilhado pela sociedade e compensado por mecanismos de amortecimento, designadamente pelo rendimento mínimo garantido e pelo crescimento controlado do rendimento disponível das famílias.
Mas, além dessa cuidadosa gestão conjuntural de prevenção no que diz respeito aos fenómenos de exclusão e de marginalização, o Governo lançou, convicta e determinadamente, as bases das reformas essenciais de que o País necessita.
Reformas que não se anunciam com pompa e circunstância, como outros fizeram, e por aí se esgotaram, mas reformas que se implantam com lucidez, com gradualismo e com envolvimento.
Foi assim com a solidificação da segurança social; foi assim com a dinâmica de colaboração e envolvimento na melhoria do sistema educativo, foi assim com a nova perspectiva integrada na aplicação dos fundos de coesão, foi assim com a paulatina alteração das práticas bloqueadoras no sistema de saúde e foi assim com o lançamento dos alicerces da reforma administrativa e da reforma fiscal.
E esta prática de afirmação no espaço europeu e de envolvimento de todos os agentes económicos, sociais e culturais no traçar do nosso futuro colectivo teve um impacto enorme numa variável decisiva, embora dificilmente mensurável. Refiro-me à auto-estima dos portugueses, ao seu orgulho de serem cidadãos de um País que surpreende pela capacidade de se adaptar aos novos desafios da transição do milénio.
Um País fiel à sua tradição universalista e que, ancorado no centro da construção europeia, reforça o seu posicionamento charneira, cruzando uma secular tradição

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atlântica com um relacionamento privilegiado com os países do Mediterrâneo, com África e com o espaço do Mercosul.
Com o mérito de todos e de cada um dos portugueses, apoiados e incentivados por um Governo inovador e capaz, é hoje um Portugal diferente e melhor aquele que se reflecte e projecta no Orçamento para 1998.
Um Portugal que as oposições, cegas e enredadas pela retórica do seu discurso e submersas pela busca obsessiva de bolsas de descontentamento, demoram em compreender. Não se estranhe, por isso, que os portugueses retribuam essa incompreensão na formulação das suas opções políticas ou na expressão das suas intenções de voto.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Nada justifica que as Grandes Opções do Plano e o Orçamento que aqui analisamos não sejam merecedores de um grande consenso nacional para a sua aprovação e concretização. A bancada do PS contribuirá entusiasticamente para esse objectivo.
Temos consciência de que, ao fazê-lo, estamos, por um lado, a salvaguardar os interesses imediatos dos cidadãos portugueses, mas simultaneamente estamos a apoiar com vigor uma nova atitude de participação e intervenção de Portugal quer na construção europeia quer na geopolítica mundial do século XXI.
Estando no centro da União Económica e Monetária, aumentámos a nossa capacidade de pugnar por uma visão solidária da União Europeia. Uma Europa dos valores, economicamente forte e centrada no reforço da sua dimensão social. Uma Europa dos cidadãos, fundada na segurança e na defesa dos direitos e liberdades individuais. Uma Europa das regiões, estruturada na diversidade e no partenariado. Uma Europa das Nações, empenhada na coesão e no desenvolvimento sustentado e equilibrado. Uma Europa do emprego, capaz de inovar e reforçar qualitativamente a rede de competências dos seus trabalhadores.
Sr. Presidente, Sr Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Portugal necessita da União Europeia na exacta medida em que a União Europeia necessita de Portugal. Com a política prosseguida pelo actual Governo, de que este Orçamento é uma peça fundamental, Portugal responde favoravelmente ao desafio europeu e, simultaneamente, reforça o seu tecido económico, melhora os níveis de protecção social e prepara-se melhor para a competição global, a que não nos poderemos furtar.
Estamos, por isso, também em condições de exigir da União Europeia uma atitude favorável aos nossos interesses na negociação crucial, que agora se inicia, da Agenda 2000, sobre o futuro da Europa.
A credibilidade resultante do conteúdo deste Orçamento e - estou certo - da sua clara aprovação por esta Câmara será um forte contributo para que Portugal prossiga no rumo seguro, na aura do novo milénio.
Juntos faremos Portugal.

Aplausos do P.S.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs Deputados: O Governo não se tem cansado de acentuar o especial significado que assume para o futuro de todos nós o Orçamento do Estado e as Grandes Opções do Plano que o enquadram e informam. Para o bem ou para o mal, tem razão o Governo, até pela especial circunstância de este ser o Orçamento que - diz-se - antecederá a nossa participação na 3.ª fase da União Económica e Monetária.
Dir-se-ia, por isso, que este Orçamento do Estado deveria acentuar particularidades que nos caracterizam e, simultaneamente, valorizam e reforçam a nossa posição no contexto da Europa comunitária.
Referimo-nos, como é óbvio, ao desenvolvimento das nossas relações económicas com o Brasil, e através dele com o Mercosul, e com os países africanos de língua portuguesa, e através deles com a África Austral, na linha, aliás, do que ultimamente tem vindo a ser repelido insistentemente, tanto ao nível da Presidência da República como ao nível do Governo, e justificou mesmo a realização de visitas de Estado de significativas delegações, compostas por numerosos membros do Governo e altos dirigentes dos sectores económicos nacionais, que acompanharam o Presidente da República e o Primeiro-Ministro nas suas recentes deslocações a um e outro dos referidos destinos.
Fizemos, então, fé nas afirmações feitas de que estas vertentes, não só da nossa política externa mas também e principalmente da nossa política económica, seriam condicionantes para o êxito e para a individualização da nossa adesão à Europa e procurámos descortinar os seus traços, quer na enumeração dos sete desafios à sociedade e à economia portuguesas, quer na enumeração e análise das cinco grandes opções que enformam o plano e nas decorrentes linhas de acção governativa.
Nem uma palavra e nem uma intenção caracterizam este plano e este Orçamento como o de um País integrante e fundador da CPLP que procura, no revigoramento das suas relações económicas com os seus parceiros em outros continentes, o reforço de que carece para manter a sua individualidade e para acrescentar o seu valimento na Europa que se consolida. Fazê-lo, aliás, não seria mais do que consubstanciar o pensamento expresso do Sr. Primeiro-Ministro, que ainda há pouco condicionava a perenidade das ligações históricas e afectivas no seio da CPLP à consolidação e ao desenvolvimento dos laços económicos entre os seus componentes.
Este plano e este Orçamento poderiam ser os de qualquer outro país da Europa que nunca tivesse tido uma presença fora do seu continente nem tivesse metade da sua população dispersa pelo mundo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Aliás, também a este propósito, cabe aqui fazer uma reflexão. Propõe-se o Governo - e bem! - criar um programa especial para apoiar a internacionalização da economia portuguesa e dota-o de um significativo orçamento de cerca de 20 milhões de contos.
Quem conhece as comunidades portuguesas no mundo e sabe com quantas centenas ou mesmo milhares de professores, investigadores e docentes elas contam nas mais prestigiadas universidades do mundo: quem conhece o valor do know how, tantas vezes de ponta, detido por empresas por elas criadas e geridas; quem se apercebeu da diversidade e da dimensão de empresas dominantes em diversos sectores de actividade que os portugueses possuem nos países mais desenvolvidos; quem conhece tudo isto não pode compreender que não esteja ainda feito e disponibilizado o inventário de tão grande potencialidade humana e económica.

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A dura verdade, porém, é que este inventário, que nunca foi feito, permanecerá ainda ignorado no ano de 1998 e nem sequer se vislumbra quando será iniciado. A dura verdade também é que a internacionalização da economia portuguesa, que urge fazer e que o novo programa irá apoiar, ignorará, mais uma vez, as potencialidades existentes e disponíveis nessa massa não negligenciável de cerca de cinco milhões de portugueses dispersos pelo mundo e para quem tarda o dia de serem chamados à participação cidadã na tarefa do desenvolvimento, que deveria ser de todos nós.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Lastimamos que, sobre estes aspectos, mais esta oportunidade esteja perdida. De nada serve afirmar os grandes princípios quando os documentos de trabalho que produzimos não os integram nem traduzem, como sucede com o Orçamento que o Governo agora nos apresentou.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo que se encontra a assistir aos nossos trabalhos um grupo de alunos do Instituto para o Desenvolvimento Social de Lisboa, que, apesar de não muito numeroso, é muito fiel, porque está, desde a primeira hora, a assistir aos nossos trabalhos.
Para eles, peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Abecasis, V. Ex.ª focou uma área que é extremamente sensível a este Governo.
Desde logo, foi com este Governo que se institucionalizou a Comunidade dos Povos de Língua Portuguesa (CPLP). Também a primeira visita oficial do Sr. Primeiro-Ministro foi a um país do espaço lusófono, o Brasil, afirmando aí um diálogo, que, no passado, foi de surdos. E, ultimamente, o Sr. Primeiro-Ministro fez uma segunda visita ao Brasil, reforçando os laços não só a nível bilateral mas também com as comunidades portuguesas que aí trabalham e residem, com quem manteve um amplo diálogo.
Foi também com este Governo, Sr. Deputado Nuno Abecasis, depois de 77 anos de um mesmo Regulamento Consular, caduco e obsoleto, que veio à luz do dia um novo Regulamento Consular, que permite, pela primeira vez, quer na área cultural quer na área económica e social, responsabilizar os funcionários consulares e os nossos funcionários diplomáticos, dando-lhes meios para eles fazerem a inventariação dos agentes económicos e potenciando assim também a actividade dos agentes económicos que trabalham e residem no estrangeiro.
No que diz respeito à reestruturação e afirmação consular, o governo anterior também nunca olhou responsavelmente para esta matéria. Actualmente, com a reestruturação consular, temos as nossas missões diplomáticas e os nossos consulados apetrechados para darem resposta às exigências dos dias de hoje.
Assim, Sr. Deputado Nuno Abecasis, gostaria de fazer-lhe a seguinte pergunta: não entende V. Ex.ª que, em dois anos de Governo, muito já foi feito nesta matéria, quer na área económica externa quer na reestruturação consular e diplomática, para dar resposta cabal às exigências e às solicitações das nossas comunidades?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Luís, não fiz uma crítica específica a este Governo. Aliás, quem me conhece sabe há quantos anos ando a falar nisto e não só a este mas também a outros governos!

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Aquilo que quis dizer é que me entristece ser cidadão de um País perdulário. Entristece-me que um País que quer conquistar o futuro esqueça cinco milhões de cidadãos, que querem participar e o demonstram diariamente através de remessas para este País das suas verbas disponíveis, das suas economias. Repare no seu montante e, a partir daí, calcule o volume da economia da diáspora portuguesa! E aqui socorro-me das palavras do Sr. Primeiro-Ministro, que, ainda há muito pouco tempo, disse, e com razão, acerca do Brasil: «Deixemos os sentimentalismos, porque, quando eles não se apoiam na economia, não vamos a sítio algum».
Aquilo que referi, e repito, é que este Orçamento e estas Grandes Opções do Plano podiam ser as de qualquer país, que nada tivesse a ver com o mundo como Portugal tem. Aquilo que eu disse, e continuo a dizer - mesmo pregando no deserto -, é que ai de nós se esquecermos que o nosso valimento no mundo e, particularmente, na Europa está na nossa capacidade de interlocução. Ora, isso não está neste Orçamento nem nestas Grandes Opções do Plano! Leia os «sete desafios» ou as «cinco opções» e veja se isso lá está traduzido.
É isto que continuarei a dizer, não para criticar governos mas para despertar o meu país e o meu povo para aspectos que podem condicionar o nosso futuro.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, vamos interromper, agora, os nossos trabalhos. Retomá-los-emos, depois do almoço, pelas 15 horas.
Está interrompida a sessão.

Eram 13 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Grande parte da atenção que muitos cidadãos dedicam ao Orçamento do Estado recai sobre o PIDDAC. Em cada ano, logo que se torna conhecida a proposta de lei do Orçamento, são milhares os cidadãos interessados na resolução de muitos problemas sociais que procuram encontrar no PIDDAC a resposta a muitas reivindicações, a concretização de muitas aspirações, o cumprimento de muitas promessas.

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Bombeiros, que justamente aspiram a apoios para a construção de novos quartéis, que lhes permitam ampliar ou substituir instalações, em muitos casos, exíguas;
dirigentes associativos, que procuram o apoio, tantas vezes prometido, à construção de instalações culturais ou desportivas para servir as populações; autarcas que anseiam pelo progresso das suas terras; populações que lutam pela construção de hospitais ou centros de saúde, de melhores acessibilidades, de mais e melhores instalações para forças de segurança. Todos procuram encontrar no PIDDAC a perspectiva de melhores condições para a satisfação de necessidades sociais fundamentais.
Acontece que, para muitos milhares destes cidadãos, o conhecimento da proposta do PIDDAC para 1998 traduz-se numa enorme frustração, pela falta de inscrição de obras fundamentais, pelo seu constante adiamento, pelo incumprimento de promessas mil vezes repetidas em vésperas de eleições, mas também pela instrumentalização eleitoralista desta proposta, revelando uma completa falta de respeito para com os cidadãos e contribuindo lamentavelmente para o descrédito da proposta orçamental.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - No que respeita às funções sociais que mais preocupam os cidadãos, designadamente ao nível dos equipamentos de saúde, das instalações para forças de segurança ou de tribunais, o plano de investimentos da administração central, proposto para 1998, revela três aspectos deploráveis.
Traduz-se, o primeiro, no arrastamento e protelamento de um conjunto muito significativo de projectos, com o sucessivo adiamento dos prazos de conclusão previstos; o segundo, na inexplicável redução de muitas dotações que, no PIDDAC para 1997, se encontravam previstas para 1998, e consiste, o terceiro, no número imenso de projectos, que são dotados de verbas irrisórias, revelando, por um lado, a falta de vontade política em realizar tais projectos no próximo ano e, por outro, a óbvia vontade de utilizar o PIDDAC para servir objectivos eleitoralistas, reiterando promessas que, por enquanto, não passarão disso mesmo.
Mas não há como passar aos factos para comprovar tudo o que acabo de afirmar.
O Serviço Nacional de Protecção Civil dispõe, em PIDDAC, de uma dotação destinada à aquisição de recursos para apoio a 5000 desalojados - monta tal dotação a 4000$ por desalojado.

O Sr Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O PIDDAC do Ministério da Administração Interna conta com a inscrição de 92 projectos, relativos a instalações para forças de segurança (esquadras da PSP e quartéis da GNR), com verbas não superiores a 5000 contos. A dotação média destes 92 projectos é de 3380 contos. E não se diga que se trata de obras em fase de conclusão, pois apenas seis se encontram nessas condições.
Retirando os 28 novos projectos, cuja conclusão se encontra prevista para as calendas gregas, verificamos que 64 projectos já vêm de 1997. Nestes, foram inscritos 948 322 contos para 1997 e foram executados 697 315 contos. Aliás, deu-se mesmo a coincidência incrível de 39 projectos terem conhecido uma execução de 200 contos.
No PIDDAC para 1997, previa-se que esses 64 projectos viessem a afectar, em 1998, uma verba de 2 798 345 contos. Ora, a verba efectivamente inscrita é de 211400 contos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - 10% não é mau!...

O Orador: - Assim, para os comandos das divisões da PSP na Guarda, em Portalegre e em Vila Real estava previsto um investimento de 150000 contos em cada. Porém, a realidade é um tanto diferente: estão inscritos 5000 contos para Portalegre, outro tanto para Vila Real e 2000 contos para a Guarda.
Para os quartéis da GNR em Aljezur, no Porto Santo, em S. Vicente, em Ponte de Lima, em Portimão e em Vila do Bispo estavam previstos 70 000 contos para cada um. Mas também aqui a realidade é um pouco diferente: estão inscritos 5000 contos para os de Ponte de Lima, de Portimão e de Vila do Bispo e 3000 contos para os de Aljezur, do Porto Santo e de S. Vicente.
Ainda assim, um tanto melhor que as esquadras da Brandoa, da Damaia e de Alfragide, que se encontram dotadas com 1000 contos para cada uma. Até já estou a ver os candidatos do PS a essas juntas de freguesia a invocar o grande empenhamento do Governo na garantia da segurança e tranquilidade das respectivas populações.

Risos do PCP

Presumo que omitirão o valor das verbas inscritas, mas isso não passará de um pormenor de somenos nas respectivas campanhas.
No PIDDAC do Ministério da Justiça, também há números que impressionam. O caso do tribunal de Vila Franca do Campo, que, dos 156 300 contos previstos, só tem 840; ou o caso do tribunal da Amadora, que, apesar de ter lugar cativo em todos os PIDDAC dos anos 90, ainda não viu sequer a primeira pedra e, mais uma vez, se mantém fiel à tradição: dos 251 963 contos previstos, só tem 9300. Ou ainda o caso da directoria de Coimbra da Polícia Judiciária, que, dos 160 000 contos previstos, só tem 5000, verba que, no entanto, é superior à que está inscrita para as inspecções da Polícia Judiciária na Guarda, em Aveiro, em Chaves, em Portimão e em Setúbal.
Outro caso sintomático é o PIDDAC do Ministério da Saúde. Neste, estão inscritos 105 projectos de sedes ou extensões de centros de saúde, com verbas até 5000 contos. E, de entre estes, 53 têm inscrições de 2500 contos.
De entre os centros de saúde que estão inscritos em PIDDAC com 5000 contos, importa referir que as previsões para 1998 eram, no caso do Centro de Saúde de Condeixa-a-Nova, de 110 000 contos; no de Eiras, em Coimbra, a previsão era de 190 000 contos; no de Esgueira, de 100 000 contos; no de Lamego, 145 000 contos; no de Pampilhosa da Serra, 80 000 contos; no de Penela, 110 000 contos; no de Pinhel, 192 000 contos; no de Resende, 115 000 contos; e, no de S. João da Madeira, 120 000 contos. E falta ainda referir o de Alcabideche, que, tendo como previsão 120 000 contos, integra o numeroso «clube» dos 2500.
A esta lógica do protelamento e da derrapagem financeira não escapam os hospitais distritais, nem os centrais. Senão, vejamos: o Hospital Distrital de Braga tinha, para 1997, uma inscrição de 110 000 contos - a

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execução foi zero. Tem, agora, 150 000 contos - espera-se que com melhor destino. O Hospital Distrital de Cascais/Sintra tinha uma previsão de 200 000 contos e tem uma inscrição de 25 000. O Hospital Distrital de Lamego tinha uma previsão de 500 000 contos e tem uma inscrição de 50 000. O Hospital Distrital de Santiago do Cacém tinha uma previsão de 4 185 339 contos e tem uma inscrição de 450 000 contos. O Hospital Central de Todos os Santos tinha 500 000 contos inscritos para 1997, teve uma execução de zero, e, para uma previsão de 1 300 000 contos, tem uma inscrição de 25 000 contos - que todos os Santos lhe valham!

Risos do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Os dados que acabei de referir revelam claramente que, a par do PIDDAC Apoios e do PIDDAC Tradicional, existe também o PIDDAC eleitoral.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Perante justas reivindicações das populações, que exigem melhores condições de acesso aos cuidados de saúde e mais segurança e tranquilidade e que reivindicam equipamentos que possam satisfazer necessidades sociais básicas, o Governo não dá resposta, mas inscreve no PIDDAC. Não se trata, no caso destes 105 centros de saúde ou destes 92 quartéis da GNR ou esquadras da PSP, com inscrições não superiores a 5000 contos, de faseamento normal de obras. Trata-se, sim, de verbas de tal modo irrisórias que não passam evidentemente de meras simulações.
Não faltarão candidatos do PS às próximas eleições autárquicas a pregar as boas-novas. Alegrem-se os cidadãos de Vila do Conde, que têm 9000 contos no PIDDAC para um centro de saúde e um quartel da GNR! Alegrem-se as gentes da Guarda, que têm 4000 contos para o comando da divisão da PSP e para a inspecção da Polícia Judiciária! Alegre-se o povo da Amadora, que os 12 300 contos que estão no PIDDAC hão-de dar para um palácio da justiça e três esquadras da PSP.

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Chama-se a isto usar o Orçamento do Estado para defraudar as populações. Tanto o Orçamento do Estado como o povo português mereciam melhor respeito da parte do Governo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, a minha preocupação foi tentar entender que intervenção foi esta.

Risos do PS.

Ainda pensei que o PCP tivesse, de alguma forma, sistematizado as intervenções, uma sobre cada mapa que acompanha o Orçamento, mas, depois, vi que só tinham 18 minutos e que o Sr. Deputado gastou quase 10 a falar só sobre um mapa, pelo que não podia ser.
Mas, finalmente, penso que entendi e era isto que gostaria de ver esclarecido: tenho a impressão de que esta intervenção teve apenas o objectivo de abrir caminho a 600 propostas de alteração, a apresentar, na especialidade, pelo PCP.

Aplausos do PS.

Penso que terá sido este o objectivo... Não consegui ver mais nenhum.
Agora, sinceramente, espero que estas 600 propostas de alteração, na especialidade, sejam mais cuidadas do que as 400 do ano passado, nomeadamente aquelas que falavam de bibliotecas municipais mas não diziam em que concelho ou de centros para idosos acamados, com certeza itinerantes porque também não diziam onde é que se situavam.
Portanto, a fazerem as habituais 500 propostas, ao menos, tenham mais cuidado na indicação da localização das mesmas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Afonso Candal, não sei se serão 600 propostas,...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Mais?!

O Orador: - ... mas o que posso dizer-lhe é que vale a pena, para resolver problemas das populações, apresentar propostas que não se traduzam em meras simulações de propostas, como estas aqui presentes no PIDDAC.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É que o que consta deste mapa tem a ver com algo que diz muito respeito às populações. Podemos facilmente imaginar - alguns casos conhecemos directamente, outros podemos facilmente imaginar - que estas inscrições correspondem a necessidades inequivocamente sentidas pelas populações, a lutas por vezes de muitos anos e a inegáveis reivindicações populares, que mereciam melhor respeito.
De facto, consideramos uma grande falta de respeito por parte do Governo inscrever esses projectos com dotações absolutamente simbólicas. Aliás, quem as propõe sabe que não têm qualquer significado, do ponto de vista orçamental, que a única coisa que podem garantir é que as obras não se fazem, pelo menos, no próximo ano, e, com esta inscrição, visam, no fundo, defraudar as expectativas das populações. Isto para poderem dizer que, afinal, o Governo está de tal modo receptivo a essas reivindicações que até as inscreveu, quando, no fundo, essas inscrições são puramente fictícias.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ora, como referi na minha intervenção, entendemos que os portugueses merecem melhor respeito da parte do Governo.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Informo a Câmara de que se encontra a assistir aos nossos trabalhos um grupo de alunos do Instituto de Educação Técnica de Lisboa.
Para eles, peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Neto.

O Sr. Henrique Neto (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs Deputados: O Governo apresentou-se na Assembleia da República para a discussão do Orçamento do Estado para 1998, numa posição muito distinta daquela com que aqui chegou para a discussão dos dois Orçamentos anteriores.
Nessa altura, o PS tinha apenas a credibilidade de ter sido oposição responsável, o Primeiro-Ministro a simpatia dos portugueses e o Governo a legitimidade que advinha de o PS ter ganho as eleições, sem margem para qualquer dúvida.
Mas os portugueses e, nomeadamente, os agentes económicos estavam ainda para ver do que o Governo do PS seria capaz, em presença de dificuldades então conhecidas: crescimento económico muito abaixo da média europeia; desemprego crescente; queda da produção industrial; taxas de juro que teimavam em não descer; muitas empresas em situação de não pagar salários e muitos milhares mais sem cumprir as suas obrigações fiscais e legais para com o Estado, num desrespeito claro pelas regras da concorrência sã e leal.
Nessa altura, os partidos da oposição também não ajudaram muito, fazendo todo o tipo de profecias catastrofistas, primeiro, para o caso do PS ser Governo e, depois, sendo-o, imaginando todo o tipo de desgraças: desde o despedimento de funcionários públicos ao aumento dos impostos; do crescimento do desemprego ao regabofe que seria o rendimento mínimo garantido, para apenas citar algumas dessas «visões».
Passaram dois anos e muita água passou sob as pontes da casa portuguesa. O Governo apresenta-se agora nesta Câmara e perante o País para discutir o Orçamento do Estado para 1998 com uma legitimidade e uma credibilidade acrescidas, porque os portugueses sabem e, nomeadamente, os empresários conhecem que o Governo não apenas cumpriu o que prometeu, mas que o fez em diálogo permanente com os agentes económicos.
As associações empresariais, tal como os sindicatos, conhecem bem o esforço feito por este Governo em sede de concertação estratégica para eliminar o estilo de confrontação permanente do anterior governo e para criar um novo ambiente capaz de privilegiar o estudo rigoroso das questões, por oposição às tomadas de posição públicas baseadas em mal-entendidos e na desconfiança mútua.
Mas hoje, felizmente, os agentes económicos sabem mais do que isso, sabem também que o Governo não aumentou os impostos, como tinha afirmado. Mais: não se deixam iludir com os gritos da oposição sobre um inverificável aumento de impostos, porque sabem que o aumento da receita fiscal não é a mesma coisa e porque conhecem que essa é a via segura - a da eficiência fiscal - para a redução futura dos impostos.
Os agentes económicos sabem hoje que as taxas de juro descem e que o sistema financeiro é mais competitivo, aproximando as suas condições de acesso ao crédito, de forma semelhante às da União Europeia, facilitando e dinamizando o investimento e a criação de novos postos de trabalho.
Os empresários sabem, também, que Portugal cumpre hoje todos os critérios para entrar na primeira leva da 3.ª fase da União Económica e Monetária, com todas as vantagens que isso implica de estabilidade económica e cambial e de credibilidade acrescida para o nosso país. Com o resultado, entre outros, de facilitar o investimento e a realização de acordos e associações com empresas da Europa e do Mundo e o acesso a formas mais diversificadas de financiamento, seja crédito financeiro seja empresarial. Como sabem que a participação, desde a primeira hora, na moeda única aumenta a credibilidade das empresas portuguesas para a colocação dos seus produtos e serviços no exterior, com menor custo do que no passado, quando fomos penalizados pelo facto, apenas, de serem produtos ou serviços portugueses.
Os agentes económicos sabem que, hoje, é mais fácil criar uma empresa do que no passado e que existem estímulos e incentivos próprios para a modernização das empresas, através dos novos factores dinâmicos da competitividade, como sejam, a investigação, a inovação e o desenvolvimento de novos produtos, tecnologias ou serviços, nomeadamente através de novos e mais criativos incentivos fiscais. Como conhecem a actual dinâmica de internacionalização das empresas portuguesas, não apenas pela existência de apoios específicos com essa finalidade mas também por força de um novo clima de confiança e de optimismo, bem visível no valor dos investimentos no estrangeiro realizados por empresas portuguesas, sem qualquer paralelo com o passado.
Os empresários portugueses sabem que terminou, com o Governo do PS, a concorrência desleal que era feita por empresas com custos reduzidos, pelo facto de não cumprirem as suas obrigações para com o fisco e com a segurança social. Como sabem, da mesma forma, os trabalhadores que hoje existe não apenas um quadro legal claro mas também instrumentos de negociação e de resolução dos muitos casos de empresas em dificuldade, sem recurso às polícias, tornando muitas dessas empresas novamente viáveis e defendendo os postos de trabalho ameaçados.
Os agentes económicos sabem que a confiança e a estabilidade existentes, em consonância com o aumento dos salários reais, está a melhorar o consumo privado, com reflexos na produção industrial e nas vendas das empresas.
Os empresários portugueses, nomeadamente dos sectores da construção e das obras públicas, sabem que o Governo do PS reforçou o ritmo de crescimento das grandes obras, como as auto-estradas, o caminho de ferro ou outras obras desejadas pelas populações, que morriam no esquecimento das gavetas do Estado, como é o caso do Alqueva. Como sabem que esse aumento do investimento se deve não apenas ao recurso às formas tradicionais de financiamento herdadas do passado mas, através de uma nova dinâmica e de uma criatividade acrescida, abrindo à actividade privada o financiamento e a gestão dos consórcios criados.
E, a propósito desta nova dinâmica, os empresários portugueses também sabem e têm dificuldade em compreender, que sejam partidos políticos, como o PSD e o CDS-PP, que procuram atrasar, dificultar ou até mesmo inviabilizar estes consórcios, atrasando a construção e a entrada em funcionamento das novas vias desejadas pelos cidadãos e pelas empresas, vias que constituem reforços importantes da competitividade, como ainda recentemente

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foi afirmado em comunicado, por várias associações empresariais da região do Oeste.
Ainda sobre este tema, devo confessar o meu espanto pela intervenção, esta manhã, do Sr. Deputado Rui Rio que, neste Plenário, disse uma coisa que é particularmente interessante e que, aparentemente, o choca, ou seja, que empresas privadas possam ter lucros por, em primeiro lugar, construírem obra pública e, em segundo lugar, por nesta investirem o seu dinheiro e fazerem a sua gestão. Vindas de um partido como o PSD, que reivindica a participação das actividades privadas e a defesa destas. estas afirmações são um pouco espantosas.
Para maior espanto só me resta aguardar que o PSD, em aliança com o PCP, possa vir aqui propor algumas nacionalizações, para evitar os inconvenientes de a actividade privada participar no investimento público... E se o Sr. Deputado quiser fazer o que muitas vezes já foi feito nesta Câmara, que é acusar o Partido Socialista de ter defendido as nacionalizações, apenas posso responder-lhe desde já que, mesmo que tal tivesse sido verdade, nós aprendemos e evoluímos enquanto, aparentemente, o PSD não aprendeu e retrocedeu.
Sr. Presidente. Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estou certo de que os empresários portugueses, como os cidadãos em geral. sabem que o Orçamento do Estado para 1998 corresponde às necessidades do País e aos desafios que se colocam às empresas e à sociedade portuguesa. Como conhecem o valor da estabilidade política e da estabilidade económica, nomeadamente importante neste momento em que enfrentamos o momento histórico de participar, não apenas na moeda única mas, principalmente, no centro das decisões que vão modelar a Europa do futuro.
Por tudo isso, estou certo de que os empresários portugueses e os cidadãos portugueses em geral penalizarão aqueles que não compreenderem os desafios que hoje se colocam às empresas e à economia portuguesa, opondo-se a este Orçamento do Estado.
O PSD tem nisto particulares responsabilidades. Aliás, o PSD já afirmou nesta Câmara, e fora dela, não pretender inviabilizar o Orçamento. Ainda bem para Portugal e, estou certo, ainda bem para o PSD, nomeadamente, porque o povo português já demonstrou, abundantemente, não querer que o poder seja assumido por quem não demonstre o suficiente sentido de Estado e das suas responsabilidades enquanto oposição.
Mas, se assim é, o PSD terá também de estar certo que os portugueses compreendem o que quer dizer conceder com uma mão e tirar com a outra, isto é, viabilizar o Orçamento na votação na generalidade apenas para o inviabilizar através da apresentação de centenas de propostas de alteração, como fez o ano passado, propostas essas motivadas pelos interesses particulares à custa do interesse geral. Se isso acontecesse, seria mau para Portugal mas seria péssimo - estou certo - para o PSD, porque demonstraria. sem margem para dúvida, que o líder do PSD teria cedido à chantagem política e não tinha conseguido manter o seu partido como um partido credível e responsável.
Vamos todos, nesta Câmara e no País aguardar, com serenidade, para ver.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção. tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: Sr. Presidente. Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: O Orçamento e as Grandes Opções do Plano submetidas à Assembleia da República são a confirmação da boa governação de que o País necessita nesta nova fase do seu desenvolvimento. Comecemos por situar brevemente esta nova fase.
Entre os anos médios das décadas de 70 e 50, deu-se a ruptura com a ditadura e a consolidação do Estado democrático de direito. Seguiu-se depois o Estado de quantidade, o Estado de quantidade monopartidária que o PSD instaurou por obra e graça dos fundos estruturais. entre os anos médios das décadas de 80 e 90. Finalmente. as eleições de 1995 levaram ao poder um Governo que está a substituir o Estado de quantidade dos governos do PSD por um Estado de qualidade plural, nos planos social, económico e político.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Essa substituição 6 a condição necessária à aceleração da modernização da sociedade portuguesa. em cada uma das suas partes e no seu iodo, bem como à consolidação da participação de Portugal, de pleno direito, no centro director da União Europeia.
O cerne da modernização bem sucedida do País é a substituição do antigo Estado de quantidade do PSD, alimentado indefinidamente pelo maná dos fundos estruturais, pelo Estado de qualidade que estamos agora a construir na base da criatividade e energia dos portugueses.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Era bom, era!

O Orador: - Com efeito, tornou-se evidente no início dos anos 90 que o Estado de quantidade dos governos do PSD se esgotou num processo de fidelização de clientelas que constituem. ainda hoje, o principal obstáculo à modernização da sociedade portuguesa.
Hoje em dia, a grande tarefa política que o País enfrenta é o varrimento dos corporativismos instalados à sombra desse Estado de quantidade, para dar lugar à libertação da iniciativa e de criatividade dos portugueses, sem discriminação de estrato ou território, apoiados pelo poder mobilizador de um Estado de qualidade igualmente atento aos deveres inalienáveis de solidariedade e coesão entre gerações e entre populações espalhadas por todo o País.
Por isso, as propostas apresentadas à Assembleia da República são a confirmação segura da prioridade, em primeiro lugar, ao reforço orçamental das funções sociais do Estado no campo da educação, da saúde, da solidariedade social, da habitação. Por isso, essas mesmas propostas confeririam também o reforço do investimento como elemento essencial da infra-estruturação do País, da criação de novas capacidades produtivas, para vencer os decisivos combates ao desemprego e à desigualdade de oportunidades, agora e, sobretudo, no futuro.
Finalmente, as propostas submetidas pelo Governo à Assembleia são propostas de confirmação da segura confiança na crescente descentralização de competências e capacidades apoiadas em transferências orçamentais a favor das autarquias e das mais diversas parcerias de reconhecido interesse público que se podem forjar no seio de uma sociedade civil aberta à cooperação para o desenvolvimento e à solidariedade nacional.
O reforço simultâneo das funções sociais do Estado. do investimento e da participação descentralizada são, assim,

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marcas essenciais do Estado de qualidade produtor de coesão nacional, tendo em vista a construção de um País mais justo, mais próspero e mais solidário.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - E todas essas marcas só estão a ser atingidas porque os Orçamentos e as Opções propostas pelo Governo. desde 1995, confirmam a boa gestão das finanças públicas num quadro de maior justiça fiscal, o que as populações reconhecem. e de inflexível rigor na obtenção de objectivos merecedores da plena confiança dos mercados nacionais e internacionais.
Como o Primeiro-Ministro ontem sublinhou, o Governo tem bem presente que existem inúmeras carências. que são intoleráveis. Sabe bem que a extensão e os níveis de pobreza existentes em Portugal têm de ser combatidos radicalmente, que há desemprego imerecido, que há famílias cujos magros recursos nos põem a todos na posição de responder também pelo dever de solidariedade para com elas. Temos tudo isso bem presente e essa é a razão da nossa determinação em prosseguir sem desfalecimento o Programa do Governo. E. nesse caminho, é inegável que a situação económica e social do País nos últimos dois anos melhorou significativamente em relação ao período de 1992 a 1995.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Neste quadro, as oposições sentem-se incapazes de credibilizar propostas alternativas. E, assim, fazem o discurso da oposição a tudo, opondo-se frequentemente não ao Governo mas, sim, à realidade, por mais óbvia que ela seja. caindo em inúmeras e graves contradições. E, portanto, ficam-se pelo «bota abaixo».

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas as oposições não podem deixar de reconhecer que muitos dos grandes temas de disputa do tempo dos governos do PSD, hoje, não oferecem base lógica para o catastrofismo cego em que se têm obcecado neste debate.
Alguns exemplos, em áreas a que estou directamente ligado.
Lamentam-se as oposições que, em Portugal, a economia cresce pouco. No plano europeu, o crescimento português é forte: 3,8% nas previsões prudentes do Governo para 1998. E mais forte poderá ser se as oposições não se coligarem só para impedir o Governo de fazer o investimento pro gramado e as transformações estruturais que ele tão decisivamente impulsiona, tanto no sector público como no sector privado.

Aplausos do PS.

De qualquer modo, ficará sempre evidente que, do marasmo de 1993/1995, se passou para uma saudável dinâmica de desenvolvimento sustentada na confiança dos mercados quanto à política conduzido pelo Ministério das Finanças, no reforço do investimento e no aumento do consumo privado.
Queixam-se as oposições do investimento. Mas não sofre dúvida que o forte crescimento do investimento num período de redução do défice público continua a baralhar aqueles que, com défices duas vezes mais elevados. Não conseguiram sequer vencer a prolongada agonia da formação bruta de capital fixo ao longo dos três últimos anos da sua governação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em 1998, a despesa pública em PIDDAC crescerá 10,8%, atingindo cerca de mil milhões de contos. Entre 1995 e 1998, o crescimento do PIDDAC será responsável pela criação de 66000 novos postos de trabalho.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - No próximo ano, o PIDDAC dará emprego a 5% do emprego total, sendo próxima de 30% a sua contribuição para o emprego de um sector tão vital como é o da construção. O boom da construção, devido ao investimento público e à habitação, não tem precedentes nos últimos 10 anos.
É. assim, evidente que o PIDDAC tem sido um instrumento extremamente eficaz para combater o desemprego na actual conjuntura, tal como será decisivo para aumentar o emprego no futuro, através da criação de infra-estruturas e capacidades produtiva, aptas a assegurar a competitividade da economia portuguesa.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Queixam-se as oposições que o investimento público reprime as oportunidades do Norte para reforçar Lisboa. ou desenvolve o Litoral à custa do Interior.
O que sucede é bem diferente e a vários títulos. Não se muda de uni dia para o outro o nível do investimento público contra os padrões de concentração do produto ou da população estabelecidos ao longo de quase um século. Em Portugal. as assimetrias regionais são, partida, muito fortes no plano do produto e da demografia. Mas há que discutir este problema com seriedade e sem demagogia.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - A política do Governo inclina-se, inequivocamente, para combater as assimetrias originadas em potenciais de produção não aproveitados, em desigualdades de acesso ao rendimento e em diferenças de oportunidade face aos indicadores de bem-estar. Ora, as comparações relevantes não se centram no plano do PIB per capita a nível regional mas, sim, no plano das assimetrias regionais de rendimentos e níveis de bem-estar. E nesses dois planos o Governo está a contribuir poderosamente para reduzir desigualdades entre as regiões portuguesas através do Quadro Comunitário de Apoio, do PIDDAC e do investimento privado, suscitado ou apoiado pelo Governo.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Nunca as oposições souberam distinguir ou quiseram sequer distinguir as assimetrias regionais do produto das assimetrias do rendimento ou do bem estar. Ora, o que sucede é que estas duas últimas estão a diminuir e não a aumentar, como julgam erradamente as oposições.

Aplausos do PS.

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Quanto ao investimento, mesmo nos empreendimentos inscritos no PIDDAC para 1998, há claro sinal de viragem.
Assim, por exemplo, comparando os distritos de Lisboa e Porto, resulta claro, para quem sabe ler, que Lisboa está a perder peso e o Porto está a ganhar relevo.
De facto, relativamente ao passado e considerando como base a totalidade dos empreendimentos, os investimentos para além de 1997 perderão cerca de dois pontos percentuais em Lisboa, ao passo que os do Porto subirão seis pontos percentuais. A diferença introduzida por este Governo, contrariando o governo anterior, é já bem visível.
No que mais directamente releva da possibilidade de intervenção a médio prazo do Governo, é evidente que o Governo está a fazer um grande esforço para acelerar a infra-estruturação do Interior e do Norte, ao contrário do que fizeram os governos do PSD.
Veja-se o caso das acessibilidades a lançar em 1998, quer pela JAE directamente quer através de concessões várias. A quase totalidade desse investimento será feita fora de Lisboa, no Centro, no Norte e no Interior do País. Nos próximos quatro anos, mais de mil milhões de contos serão lançados nesse combate de inversão das tendências dos governos anteriores, que favoreceram a concentração do investimento público em Lisboa.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Muito bem!

O Orador: - É espantoso, é triste, diria mesmo que é lamentável que aqueles que pugnam pelo desenvolvimento do Interior venham combater a construção de auto-estradas para o Interior.

Aplausos do PS.

É vergonhoso, é lamentável que queiram confundir os portugueses com pseudo-cálculos tecnicamente fundamentados que, de facto, são extremamente fáceis de desmontar, ficando perfeitamente claro que a conclusão sobre a rendibilidade dos investimentos em causa é, precisamente, a contrária em todo o sentido daquela que tem sido propagandeada. Tenho as provas comigo: espero que algum dos Srs. Deputados queira trocar as minhas provas contra as suas. Se não as tiver, mesmo assim, darei as minhas de graça.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Queixam-se as oposições de que este Governo não faz reformas. Por mim, modestamente mas com indesmentível verdade, posso dizer que em todos os departamentos que tutelo estão em curso reformas estruturais que os governos do PSD atrasaram, na maior parte dos casos, pelo menos, de cinco a 10 anos.
É o que se passa no ordenamento do território. Pela primeira vez em duas décadas de democracia, foi presente ao Parlamento uma proposta de lei de bases de ordenamento do território. Essa proposta aqui jaz, nesta Assembleia, e quando dela sair, seis meses depois, estará regulamentada. Mas é preciso que ela saia urgentemente da Assembleia, Srs. Deputados do PSD, para que as reformas do Governo dêem fruto.
É também o que se passa no plano de reforço do poder local, onde não nos conformamos com a falta da nova lei de finanças locais e de atribuições de competências, também aguardando que a Assembleia faça o seu trabalho e acolha a colaboração do Governo.
Aliás, todos se recordam dos épicos trabalhos parlamentares sobre a aplicação da Lei das Finanças Locais e demais transferências para as autarquias nos Orçamentos dos governos do PSD.
Pois bem, apesar de estarmos a escassas semanas das eleições autárquicas, não há possibilidade de levar a sério contestações, à proposta deste Orçamento do Estado para 1998 nessas matérias. Noto, aliás, que não têm sido feitas. Que haja, ao menos, um momento de lucidez!
De facto, as transferências do Orçamento do Estado para as autarquias locais aumentaram, entre 1995 e 1998, 31%, ou seja, 70 milhões de contos. Subiram 11% em 1996, 8% em 1997 e subirão 9% em 1998, sempre muito acima do que seria estrita obrigação. No caso das freguesias, o aumento entre 1995 e 1998 chega a 94%, sendo 26% em 1998.
No plano do desenvolvimento regional, executa-se, e bem, o actual Quadro Comunitário de Apoio...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... e prepara-se já o novo plano de desenvolvimento regional para além de 1999, em moldes inteiramente novos, base imprescindível de um III Quadro Comunitário de Apoio bem diferente do actual.
Há também grandes reformas na política de acessibilidades, com a reforma dos caminhos de ferro, da aviação civil, da ANA, a recuperação da TAP, a reforma da JAE, o novo Plano Rodoviário Nacional, a nova política marítimo-portuária e o acento decisivo na intermodalidade. Há reformas em curso nas telecomunicações e na habitação. Não faltam reformas em todos estes domínios. Em todos estes casos, o que se valoriza é o serviço aos utilizadores e não o uso e o abuso dos dinheiros dos contribuintes em obras públicas lançadas de qualquer modo, para fazer vista em data de eleições.
Dirão as oposições que estas não são as grandes reformas estruturais. Mas é por demais evidente que sem todas estas reformas não haverá transformações que possam fazer de Portugal um país competitivo.
Dirão as oposições que todas estas reformas não são suficientes, só por si. Concordo! Mas acrescento que todas elas são absolutamente necessárias há muitos anos e que o governo do PSD nunca sequer tentou fazê-las a sério. E por isso as estamos fazendo com todo o empenho e cuidado. Porque este é um Governo que faz e o País começa a inteirar-se bem disso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O grande problema do momento não está no Governo, está nas oposições, perdidas na oposição pela oposição, para mascarar querelas internas e falta de projecto alternativo, ou perdidas nos escombros do passado.
Um Estado de qualidade precisa de oposições de qualidade e não apenas de oposições de número ou quantidade. As oposições de qualidade ajudam a bem governar o País; as coligações de pura quantidade, as coligações negativas, visam o oposto, pois apenas se fixam nos expedientes mais oportunos para impedir o Governo de governar.
Quererá o PSD reduzir-se, por muitos anos, a uma simples fracção de apoio a sucessivas coligações negativas ou de quantidade? Este é o problema político das votações desta Casa, começando pela votação deste Orçamento. E

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este não é um problema do Governo, Srs. Deputados, é da situação e determinar medidas de emergência um problema do PSD, porque o eleitorado não lhe apropriadas. Eu próprio presidirei a esse grupo de trabalho. perdoará.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Martim Gracias, Jorge Ferreira, Lino de Carvalho, 15abel Castro, Manuela Ferreira Leite, Paulo Neves, Augusto Boucinha, Joaquim Matias, Álvaro Amaro, Luís Queiró, Manuel Varges e Octávio Teixeira.
Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Martim Gracias.

O Sr. Martim Gracias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, peço desculpa pelo facto de a minha intervenção não se enquadrar perfeitamente na discussão do Orçamento do Estado, mas está bem na memória de todos nós a tragédia que caiu sobre o barlavento do Algarve, mais especialmente sobre a serra de Monchique e os concelhos de Portimão, Silves e Lagos.
Tratou-se, efectivamente, de uma tromba de água de grande dimensão e duração que provocou destruição, não só no município de Silves, mas também nos municípios de Portimão e Lagos, colocando populações sem acessos, com os seus haveres completamente destruídos, à míngua e à espera de um apoio, apoio esse que esperamos que venha do Governo. Aliás, o Governo nunca negou apoio às populações em casos de desastre deste tipo.
Pergunto ao Sr. Ministro João Cravinho se já foi tomada alguma posição política para acudir às populações e ao património destruído e quais os meios financeiros que serão postos à disposição das populações e das autarquias que viram destruídos estradas, pontões, redes de água e esgotos, muitos deles recentemente concluídos.
A população espera, da parte do Governo, uma posição firme perante o desastre que caiu sobre as populações.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Martim Gracias, o Governo tomou, de imediato, medidas de emergência, mobilizando verbas da protecção civil. Vários membros do Governo. entre os quais o Sr. Ministro da Administração Interna, a Sr.ª Ministra do Ambiente e secretários de Estado, visitaram imediatamente Monchique e as zonas atingidas, que não se circunscrevem a Monchique, para se inteirarem dos estragos.
Hoje mesmo o Conselho de Ministros constituiu um grupo de trabalho de emergência, formado por representantes dos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, da Administração Interna, do Ambiente, da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas e da Economia, ou seja, com elementos dos ministérios relevantes, que deverão estudar a situação com os autarcas. Aliás, desde já nos disponibilizamos para trabalhar com todos os Srs. Deputados do Algarve, todos!, bem como com os representantes das associações empresariais e dos sindicatos, para podermos estabelecer rapidamente o quadro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Ferreira.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro João Cravinho, fiquei espantado com a sua «tirada», de resto habitual, de acusar as pessoas e os partidos que defendem que no troço da estrada entre Torres Vedras e o Bombarral não deve haver portagens de não quererem a construção de mais estradas no País! Pela mesma razão, muitas vezes ouvi o Sr. Primeiro-Ministro, como líder do PS. acusar o anterior Primeiro-Ministro de demagogia.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Bem lembrado!

O Orador: - É um mau exemplo que V. Ex.ª dá, em termos de transformação de uma oposição de qualidade num governo de qualidade. Parece que, de facto, nesta matéria, não há correspondência.
Gostava de dizer ao Sr. Ministro João Cravinho que o problema dos 17 milhões de contos que, alegadamente. poderá custar a não instalação das portagens nessa estrada já está resolvido pelo seu colega Ministro das Finanças, que ontem anunciou ao Parlamento que o Governo prescindirá dos pagamentos por conta do IRS à custa de uma eficácia redobrada da administração fiscal na cobrança dos impostos. Portanto, V. Ex.ª poderá encontrar não apenas esses 17 milhões, através de cobranças adicionais e do combate à evasão fiscal, como ainda mais!
Posto isto, o seu problema financeiro quanto às portagens está resolvido, e bem, queremos acreditar, pelo Sr. Ministro das Finanças. Agora, de facto, da demagogia V. Ex.ª não se escapa, mas essa será uma matéria que teremos ocasião de discutir para a semana.
Aliás, gostaria de aproveitar esta oportunidade para focar o seguinte aspecto: diz-se por aí que haverá um acordo entre o PSD e o Governo no sentido de requerer a baixa à comissão competente, sem votação, do projecto de lei sobre as portagens do Oeste. Ora, gostaria de desafiar o PSD a deixar claro que, pelo menos, este acordo não existe.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Este é igual ao outro!...

O Orador: - Uma vez que já sabemos que, pelo menos, o outro existe, apelo para que deixem claro que este acordo não existe e que o PSD não cederá nem negociou com o Governo uma posição relativamente às portagens do Oeste por causa da viabilização deste Orçamento do Estado.
Espero, sinceramente, que a única forma de voltarmos a ter, no conceito do Sr. Ministro João Cravinho, oposição de qualidade não venha a ser o termos de devolver o PS à oposição.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

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O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente. Sr. Deputado Jorge Ferreira, eu não falei das portagens do Oeste

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Mas falei eu!

O Orador: - Falou o senhor .... muito bem! Então, está respondido e até para a próxima semana.

Risos e aplausos do PS.

O Sr Manuel Monteiro (CDS-PP)- - É a arrogância... Quem o viu e quem o vê!...

O Sr Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr Presidente, o Sr. Ministro João Cravinho procurou introduzir um novo conceito na análise da distribuição regional do investimento com o fito, obviamente, de fugir ao debate sobre se as políticas do Governo estão ou não a aprofundar as assimetrias regionais. Refiro-me ao conceito de padrões de rendimento e de bem-estar como alternativa ou complemento ao de padrões de concentração do produto.
Sr. Ministro, considerando esse conceito que aqui trouxe ao debate, permita-me que lhe pergunte o seguinte: se em matéria de padrões de rendimento e de bem-estar das populações há uma tão grande alteração do quadro herdado pelo Governo. como é que o Sr. Ministro justifica. de acordo com os próprios dados demográficos oficiais, que continue a verificar-se êxodo e desertificação das zonas do interior para as zonas de concentração do produto, no litoral?
De qualquer modo, Sr. Ministro. voltemos ao conceito de padrões de concentração do produto. Estou tentado a estar de acordo com o Sr. Ministro quando afirma que estes padrões não se alteram de um momento para o outro. mas peço que o Sr. Ministro também esteja de acordo comigo quando digo que, pelo menos, devem começar a fazer-se esforços no sentido de alterar essa herança antiga que faz corri que o investimento, a riqueza e a concentração demográfica ocorra nas zonas do litoral, com problemas de qualidade de vida para quem lá vive.
Ora bem, gostava que o Sr. Ministro reflectisse comigo sobre alguns dados que resultam do próprio PIDDAC Regionalizado. que o Sr. Ministro só entregou ontem, ao fim da tarde - talvez se perceba porquê...-, em relação ao qual o próprio Sr. Ministro afirma ter feito um esforço para encontrar uma melhor distribuição regionalizada do investimento previsto para os anos anteriores.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Bem lembrado!

O Orador: - Feita unia rápida leitura, no pouco tempo que tivemos disponível, verificámos que para os nove distritos do interior do país. se exceptuarmos Santarém por causa da sua ligação à Área Metropolitana de Lisboa. estavam previstos no Orçamento do Estado para 1997, em relação ao PIDDAC Regionalizado. um conjunto de investimentos do plano da ordem dos 7,3% do valor global dos investimentos do plano, enquanto que no Orçamento para 1998 esse valor atinge 17,3%, o que corresponde, de acordo com os mesmos critérios, a um valor global relativo de investimento de 14,6%.
Isto é, agravam-se as assimetrias regionais em relação aos distritos do interior do país com base em critérios de maior desenvolvimento da despesa regionalizada em relação ao ano anterior. Esta é que é a política que, pelo menos, abre caminho para combater os desequilíbrios regionais, Sr. Ministro? Esta é que é uma política de coesão?

O Sr. Presidente: - Queira terminar. Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Mais, Sr. Ministro: se fizermos um leve exercício para saber quais as taxas de execução dos programas do PIDDAC. nacionais e comunitários, verificamos que também é nas zonas do interior que elas são mais baixas.
A este propósito. lembrámo-nos das exigências feitas ao Governo pelos candidatos às câmaras municipais do Porto e de Gaia e, por curiosidade, fomos fazer a leitura comparada dos investimentos previstos para os concelhos do Porto e de Vila Nova de Gaia, entre 1997 e 1998. Foi fácil chegar à conclusão de que, no Porto, esses investimentos aumentam três vezes, de 15 milhões para quase 60 milhões. e no concelho de Vila Nova de Gaia esse aumento é dez vezes superior, Sr. Ministro! Se calhar, foi por essa razão que o Governo tardou em entregar o PIDDAC Regionalizado à Assembleia.
Em suma, pergunto se este é, de facto. um Orçamento que dá resposta a políticas que combatam as assimetrias regionais ou se é um Orçamento que responde. sobretudo. a exigências de ordem eleitoral do próprio Partido Socialista.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder. tem a palavra o Sr. Ministro tio Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento. do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, é obvio que os conceitos de assimetria quanto ao rendimento, ao bem-estar e ao produto são completamente distintos. Também é elementar que o conceito mais relevante é o de bem-estar, seguido do de rendimento e. por último, do de produto. Portanto, há enormes diferenças entre eles.
O produto tem constrangimentos, quanto mais não seja, geográficos, geofísicos; o rendimento tem menos constrangimentos e o bem-estar ainda menos. porque este reflecte. no fundo, a coesão nacional, a solidariedade nacional.
A este propósito, podia dar-lhe números, mas reservo isso para uma outra ocasião. Aliás, o Sr. Deputado ficará extremamente surpreendido com eles, tal como muitos dos seus colegas, comentadores e analistas, porque a realidade é muito diferente daquilo que pensam.
De vez em quando, aparecem nos jornais pequenos afloramentos: quem paga impostos, quem não paga impostos,...

Vozes do PSD e do PCP: - Exactamente!

O Orador: - .. onde é que há investimento público. com base nos impostos de outras regiões...
Dentro de algum tempo, dar-lhe-ei números interessantes, e até já estou a ver o Sr. Deputado a transformar-

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se, na segunda, quarta e sexta-feira, num adepto profundo das minhas teorias e, na terça, sábado e talvez domingo, num contraditor pleno delas. Veremos! Em todo o caso, vai usar os números que lhe vou fornecer com grande deleite. quando lhe convierem. E espero que lhe convenham muitas vezes!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Utilizei-os agora, Sr. Ministro!

O Orador: - Agora, quanto ao PIDDAC, aproveito para informar a Câmara de que no dia 9 de Outubro, portanto, na altura em que estávamos quase a entregar o Orçamento, a regionalização do PIDDAC era de apenas 58%, como nos outros anos. Todavia, a que têm em mãos é de 70%. com mais 100 milhões de contos regionalizados, porque se fez um grande esforço para saber a verdade, sem se saber, de antemão, em que sentido ela ia jogar! Mas a verdade é a verdade neste Parlamento e é a ela que devemos obediência.
Portanto, para habilitar os Srs. Deputados a terem informações mais fiáveis, fez-se um esforço, durante 20 dias, e quero louvar aqui, expressamente, os serviços públicos que fizeram esse esforço. dia e noite, para se poder passar uma cobertura de regionalização de 58% para 70%. Essa é a razão da entrega tardia e não outra!
Mas, dito isto, se o Sr. Deputado quiser ver os números, vai ver que não tem razão. E não tem razão porque o Estado não intervém apenas pelo PIDDAC!
Em primeiro lugar, o Sr. Deputado sabe que, por exemplo, no distrito de Beja se está a fazer o Alqueva, velha aspiração. decisiva para a transformação estrutural daquela região. E foi este Governo que o fez, foi este Governo que, de facto, o confirmou!

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - Ora. nascerão do Alqueva centenas de milhões de contos de actividade produtiva que não estão. sequer. aqui contabilizados. O Sr. Deputado sabe isso muito bem! Então, com que direito me vem dizer que, por exemplo, no distrito de Beja não há nada ou há pouco?!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não falei nisso!

O Orador: - Falou! Falou por indução de todos os outros! Então. e nos outros? Nós estamos a querer realizar 500 milhões de contos...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Em 1998?

O Orador: - Em 1998! Estamos a querer realizar 500 milhões de contos de investimento, sob impulso público, que não estão contabilizados no PIDDAC e que serão todos feitos fora de Lisboa. Contra a sua vontade!... São as concessões do Oeste e do Norte e as chamadas SCUT! Contra a sua vontade, pois o senhor não quer! Quando nós queremos pôr 500 milhões de contos no mercado de investimento, que representam muito mais do que está aqui no PIDDAC. para todos esses distritos em causa, o senhor recusa! Está a ver como é diferente a vida da realidade!... É fácil fazer protestos. é muito difícil fazer obra, mas falaremos.

Aplausos do PS.

Finalmente. Sr. Deputado....

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, tem de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr Presidente.
Estas questões das assimetrias, do futuro, do padrão de especialização da economia portuguesa no campo da actividade económica, são coisas muito sérias e muito difíceis e que, podemos dizê-lo, nunca foram atacadas com profundidade, merecendo, por isso um debate muito mais sério do que este que às vezes se trava, sob a demagogia do PIDDAC per capita. Tem de me perdoar, mas de facto essa demagogia não tem explicação!

Aplausos do PS.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr Presidente. permite-me uma interpelação à Mesa?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado. desculpe mas não posso permitir o uso da palavra sob a forma de interpelação à Mesa. porque senão vai haver uma epidemia de interpelações e não saímos disto.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, quero apenas lembrar ao Sr. Ministro que, de facto, a contrapartida dos investimentos no Alqueva em 1998 está no PIDDAC, no distrito de Beja, ao contrário do que o Sr. Ministro acaba de referir.
Por outro lado, coloquei o Si. Ministro perante números concretos dos documentos que nos entregou e o Sr. Ministro não os contestou. Essa é que é a verdade, o resto é conversa!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não fez uma interpelação à Mesa.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente. Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território. V. Ex.ª alega que as oposições não são suficientemente sérias na abordagem destas matérias, e disse-o algumas vezes, o que me parece de mau gosto e uni sinal de arrogância que registo com desagrado. Parece-me, aliás. complicado caracterizar a oposição como tendo quantidade e não tendo qualidade. Não é um registo de boa memória nesta Câmara...
Em relação à questão que suscitou, dos números e da dificuldade de leitura dos Srs. Deputados, começo por fazer unia sugestão, que não é apenas nossa mas também da própria Associação Nacional de Municípios: que seja publicada com o Orçamento do Estado e as Grandes Opções do Plano a listagem dos contratos-programa. Não se trata de uma reivindicação nova mas é, seguramente, uni dado que permite unia maior transparência na leitura. Aquilo que o Sr. Ministro entende como a nossa dificuldade de leitura talvez se possa, desse modo, ultrapassar.
E a primeira pergunta que lhe faço vai exactamente no sentido de saber se esses dados. que deveriam ser dados acessíveis e transparentes para todos os Deputados, para toda a Câmara e para qualquer cidadão que a eles quisesse recorrer, vão ou não ser tornados acessíveis pelo Governo.

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A segunda questão relativamente à qual gostaria de obter uma resposta do Sr. Ministro Cravinho tem a ver com a afirmação de que «Lisboa perdeu peso». «Lisboa perdeu peso» poderia ser uma afirmação positiva se se quisesse dizer com isto que, a nível nacional, há uma repartição mais justa dos investimentos, mas, de acordo com a sua intervenção, não foi claramente esse o sentido da afirmação feita.
Por isso mesmo, a minha pergunta é a seguinte: a expressão «Lisboa perdeu peso» é o argumento de alguém que é anti-regionalista ou é a derrota, por antecipação, em relação à Agenda 2000, ao alargamento e à possibilidade de Lisboa e Vale do Tejo vir a perder, efectivamente, 30% daquilo que são importantes fundos comunitários?
A última questão que gostava de ver esclarecida tem a ver com o desenvolvimento da Área Metropolitana de Lisboa, com novos equipamentos que se projectam para esta área, designadamente um novo aeroporto, com uma mudança que não vejo, porque não percebo como é que se projectam novos equipamentos sem que haja um plano regional de ordenamento do território, uma vez que tudo o que havia está parado. E há um aspecto que não compreendo e que é a segunda vez que ouço o Sr. Ministro criticar, que é o facto de haver uma lei de bases de ordenamento do território - que é apresentada pela primeira vez. ao fim de todos estes anos, o que é positivo - que, segundo o Sr. Ministro, jaz no Parlamento. Ora, se jaz no Parlamento, de duas, uma: ou jaz porque o Governo quer ou porque é incompetente para, em conferência de líderes, através do seu representante, colocar a questão da urgência da sua discussão e agendamento, como tem feito com outras matérias.
Portanto, a pergunta que lhe faço vai no sentido de saber se essa lei de bases jaz aqui deliberadamente e se isso é uma forma de facilitar algumas tomadas de decisão sem uma perspectiva global e integrada de desenvolvimento para esta região ou se é um problema de comunicação dentro do Governo ou uma incapacidade de um membro do Governo, concretamente do Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, para colocar as questões e para ser claro em relação àquilo que quer prioritário.
Por último, Sr. Ministro, uma questão relativamente à qual não me pareceu que tenha sido suficientemente alongado e que me parece importante, a da Expo 98.
A Expo 98 tem impactes sociais e ambientais extremamente importantes na região de Lisboa e Vale do Tejo, a zona da Expo 98 é hoje, na realidade, uma grande concentração de pessoas e de trabalhadores e o PER, de algum modo, tenta equacionar essa questão mas, do meu ponto de vista, não a equaciona suficientemente. Assim, a pergunta que lhe faço é a seguinte: tendo em conta que as pessoas não vão ser expulsas dessa zona - não haja ilusões sobre isto! - como é que o problema é efectivamente ponderado: uma vez que ele existe?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, colocou questões realmente importantes e pertinentes.
Quanto a contratos-programa, quero dizer-lhe que está pronta uma resenha, no que diz respeito ao meu Ministério, para ser entregue à Sr.ª Presidente da Comissão e, como verá por essa resenha, os resultados não são, certamente, correspondentes, mas é a vida, os números estão aqui e provam abundantemente que este Governo foi imparcial e apenas se limitou a corrigir a extrema parcialidade do governo anterior.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quanto aos novos equipamentos, em 1998/1999, porventura até ao ano 2000, termina um ciclo de grandes obras públicas em Lisboa. O Governo está atento às consequências desse problema e tem a resolução em marcha - não o estudo para mas a resolução!
Assim, sendo certo que a partir do segundo semestre de 1998 ou. se quiserem. do final de 1998, poderia haver uma quebra da actividade económica, o Governo tomou disposições para injectar recursos extra no valor de 700 milhões de contos, de modo a sustentar a procura interna até ao ano 2001, para além daquilo que já havia por todo o País, e a partir do ano de 2001 haverá 400 milhões de contos adicionais no novo aeroporto. Portanto. está perfeitamente garantida a continuidade de um ritmo de investimento forte, capaz de sustentar a procura interna e a criação de emprego.
Relativamente à questão de como é possível falar de novos equipamentos sem ter o plano, Sr.ª Deputada, se me permite o plebeísmo, é, um pouco, o problema da «galinha e do ovo». Como é possível fazer um plano sem saber onde fica o novo equipamento, como sucede, por exemplo, com o novo aeroporto?! Faz um mundo de diferença e será a primeira a dizer o contrário! Como será possível pôr em marcha um plano que o governo do PSD fez, o qual ignora a ponte Vasco da Gama?! Ora bem, Sr.ª Deputada, perdoe-me a expressão mas é bom evitar esses disparates e será bom não ficarmos parados porque não temos plano ou fazermos um plano só para mostrar um documento.
Finalmente, quanto à lei de bases de ordenamento do território, suponho que não será matéria que a Sr.ª Deputada queira, porventura, discutir até ao dia 13 de Dezembro, mas, se o quiser, estamos prontos e, se houver disponibilidade da Assembleia para esse efeito, tenciono solicitar a possibilidade de vir aqui fazer um relatório do ordenamento do território, a fim de demonstrar como é urgente promulgar a tal lei de bases de ordenamento do território.
No que diz respeito à Expo 98, há mais desenvolvimentos que lhe poderão ser dados por quem tem a tutela directa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para formular o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro. V. Ex.ª não tem dúvidas acerca do tema sobre que lhe vou falar porque ele surge em resposta à sugestão que me fez da tribuna.
Em primeiro lugar e antes de mais, quero apenas pedir ao Sr. Ministro que considere que este é um problema sério e importante para o País e, nesse sentido, peço-lhe, desde já, que não me responda com um excesso de papéis e com o fornecimento de informação, mesmo de graça, porque não é isso que pretendo.

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O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Está a pedir para responder ou para não responder?!

A Oradora: - Como o Sr. Ministro bem imagina, perante os números que o Sr. Ministro me deu e que forneceu à Comissão, fiz cálculos, uns cálculos rudimentares e, com esse rudimento...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Se calhar, foi por isso!

A Oradora: - Parece-me que os Srs. Deputados não deviam brincar com uma coisa que é verdadeiramente séria...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É mais prudente ouvirem!...

A Oradora: - ... e que pode ser boa como política de momento mas que considero má para o País. Mais: parece-me que não é um assunto para ser discutido nos jornais mas aqui na Assembleia! Mas se os Srs. Deputados entendem que não, então, vamos discutir para os jornais! Considero, sinceramente, que não é essa a posição do Sr. Ministro!...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Calcular coisas sérias de forma rudimentar é grave!...

A Oradora: - Sr. Ministro, fiz contas elementares e, de acordo com elas, cheguei à seguinte conclusão: de acordo com os valores que o Sr. Ministro nos deu, por um investimento de 280 milhões de contos acabaremos por pagar 680 milhões de contos. Ora, o cálculo elementar que fiz traduz-se no seguinte: se estes 280 milhões de contos fossem financiados, por exemplo, por um empréstimo à Caixa Geral de Depósitos,...

Risos dos Deputados do PS João Carlos da Silva e Afonso Candal.

... com as actuais condições de juro que a Caixa faz ao sector público - aliás, Sr. Ministro, não considerei nenhuma quebra na taxa de juro. em termos de evolução futura -, o encargo para o País seria de 510 milhões de contos, ou seja, 170 milhões de contos a menos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Sr. João Carlos da Silva (PS): Sr.ª Deputada?!

E a manutenção,

A Oradora: - Só um momento, Sr. Deputado.
Sr. Ministro, como sabe, melhor do que eu. com certeza, este regime de concessão é um regime que tem funcionado. por exemplo, em Inglaterra e que é aconselhável numa perspectiva de crescimento de taxa de juro. Ora, a nossa perspectiva é a da redução de taxa de juro, tanto mais que estamos a aderir ao euro e só se pode esperar que a taxa de juro decresça.
Nesse sentido, Sr. Ministro. não posso deixar de considerar que, havendo uma diferença tão grande no montante de investimento, razoavelmente susceptível de ser absorvida pelo investimento público até sem necessidade de concessão de empréstimo. porque 280 milhões de contos é algo que é susceptível de ser absorvido pelo orçamento tanto da JAE como da Brisa. em três ou quatro
anos - não muito mais do que isso -, pergunto por que razão se faz esta opção, sabendo que pode ser, realmente, uma boa opção do ponto de vista político mas que considero ser uma má opção para o País.
Mais, Sr. Ministro: tanto pelo meu presente como pelo meu passado, ninguém me pode acusar de não ser a favor do investimento privado. Considero. no entanto, também pelo meu presente e pelo meu passado, que acima de alguns interesses deverá estar, fundamentalmente, o interesse público.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite. quero, em primeiro lugar, agradecer as suas palavras e o modo como colocou o problema, que foi com seriedade.
Esta questão é de magna importância, tem de ser debatida a fundo nesta Assembleia da República e se não tiver tempo agora. em Plenário, fá-lo-emos em Comissão, para voltarmos, porventura, a Plenário tantas vezes quantas forem precisas, porque, de facto, é um problema fundamental.
Reconheço que a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite fez as observações que fez, certamente, segura de que defendia assim o interesse público. Não tenho a maior dúvida disso!
Assim, devo dizer-lhe que, pelo facto de querer dar o relevo que deu ao problema. sobretudo agora, prestou já um serviço ao próprio Governo e, seguramente, ao País, o que agradeço pessoalmente.
Gostaria, pois, de explicar sucintamente, mas com precisão. quais os fundamentos da nossa proposta.
Em primeiro lugar, há uma discrepância de base entre os pressupostos do seu cálculo e as realidades do País: é que, de facto, estando o País sob o constrangimento de um défice muito limitado - constrangimento esse que V. Ex.ª, segundo bem entendi das suas declarações de ontem, apoia totalmente, aceita e não questiona -, a primeira questão que se coloca é a de que não se pode aumentar o défice, que. para fazer o programa que o Governo quer fazer em termos das chamadas SCUT. representaria cerca de 100 milhões de contos de investimento lano nos próximos anos.
Ora. não se pode fazer isso à custa do orçamento da JAE que aumenta em termos reais 4 a 5 milhões de contos/ano, o que para 100 milhões de contos não dá!
Em segundo lugar, o orçamento da JAE está comprometido na ordem dos 40 milhões de contos para a manutenção das estradas - e é pouco -, na ordem dos 70 milhões de contos para a construção sob contrato de estradas já existentes é em cerca de 15 a 20 milhões de contos para expropriações.
Portanto estamos a falar de cerca de 130 milhões de contos, ficando apenas 20 milhões de contos para fazer projectos novos em 1998, em todo o País. Ora, como eu preciso de 100 milhões de contos, não dá de maneira alguma! Era preciso afectar 213 do orçamento da JAE a esses projectos, sobretudo para o interior, parando as construções todas, não fazendo manutenção e não fazendo expropriações. o que não era possível.

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Daqui resulta que só há duas vias para fazer isto: a primeira via é aumentando o défice. Ora, eu tenho a certeza que a Sr.ª Deputada rejeita essa via - aliás, já o seu partido o fez pela sua boca; a segunda via é através do aumento dos impostos, para não haver aumento do défice, mas também tenho a certeza de que a Sr.ª Deputada a rejeita.
São estas as duas únicas vias possíveis para fazer isto no quadro da empreitada habitual. Portanto, primeira conclusão: não se pode fazer as SCUT no quadro da empreitada habitual.
Por outro lado, também não se podem fazer sob concessão habitual, porque se se desse à Brisa - a hipótese que ouvi levantar aqui ou noutro local -, ou seja, se se desse a concessão a uma empresa pública que se fosse endividar fora do Orçamento para fazer isto, essa empresa pública teria de pagar os empréstimos, teria de ter receitas, logo teria de ter portagens e ninguém quer ver portagens no IP2, no IP3, em Vila Real, Chaves, Vila Pouca de Aguiar, etc. De facto, ninguém quer ver portagens!...
Portanto, também não se pode fazer por esta via, a não ser que V. Ex.as queiram fazer portagens por todo o País menos nas Caldas da Rainha e no Bombarral...

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Estava a falar a sério; agora já está a brincar!...

O Orador: - Portanto, por aqui ficamos! Tabu, tabu, tabu. Também tenho direito ao meu tabu e rompê-lo como os outros o rompem... Tabu rompido, tabu reposto!

Uma voz do CDS-PP: - O que é o interior?

O Orador: - O que é o interior? É o IP3, por Viseu, Reconcos, Régua, Vila Real, Chaves; é o IP2, por Castelo Branco, Guarda, Bragança e por aí fora...
Portanto, isto não se pode fazer pelos métodos clássicos e é uma opção não o fazer!

O Sr. António Martinho (PS): - Eles não querem que se faça!

O Orador: - Mas não é isso que defendemos.
Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, peço a sua atenção para o seguinte: a opção real para o País é fazer agora as SCUT ou fazer daqui a nove anos as ditas auto-estradas.
Tenho aqui para lhe entregar, a si e a todas as bancadas, um cálculo com as respectivas bases de cálculo explicadas. Este cálculo foi feito tomando como norma o IP2 e IP6 e partindo de uma realidade concreta, modelada pelo conhecimento que hoje se tem destas vias, que foram investimentos necessários ao longo de 25 anos, com estimativa de tráfegos ao longo de 25 anos - pois, como sabe, é assim que se fazem estes cálculos...

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - E os meus também!

O Orador: - Mas são diferentes, como vai ver! Eu tenho obrigação de apresentar cálculos que não sejam rudimentares e cumpro esta obrigação, porque o Parlamento tem o direito de me exigir isso.

Vozes do PS: - Convém!

O Orador: - Portanto, o que quero explicar-lhe é o seguinte: se eu fizer um investimento que pode ser feito sob empreitada por 100 milhões de contos neste regime, vou na realidade pagar mais, mas não são os números que a Sr.ª Deputada tem, porque o cálculo é diferente: são 213 milhões de contos, a valor actualizado. Em vez de ser 100 são 213 milhões de contos, mas a empreitada normal só a faço daqui a nove anos e de agora até aos próximos nove anos há lucros cessantes, digamos assim, como é óbvio.
Assim, os ganhos que se perderiam somam 145 milhões de contos, isto é, temos um custo acrescido de 113 milhões de contos para pagar, pelo menos, pelo que ganhamos 32 milhões de contos com este investimento, logo temos uma taxa de rentabilidade de 32%, que é um grande negócio, convenhamos!
Deste modo, é possível que no ano 2001 se alarguem para duas faixas em qualquer sentido 620 Km de estrada, o que, de outro modo, só seria possível dentro de 10 ou 15 anos.
É precisamente o facto de diferir 10 anos que lhe faz perder, só em termos de benefício directo do utilizador, 145 milhões de contos, que mais do que compensam os 113 milhões de contos que vai pagar a mais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E dizer que custa 600 milhões de contos quando são 280... Lembro-lhe isto: se for hoje comprar uma casa de 20 000 contos vai gastar por esse método 60 000 contos, porque soma as coisas; simplesmente, todos nós compramos a casa, porque queremos ter uma casa agora em vez de ter, digamos assim, o pé de meia a acumular para daqui a 20 anos a comprarmos..
Portanto, as coisas não são assim e temos aqui os cálculos.
Por outro lado, todos os cálculos foram feitos com hipóteses que subavaliam o ganho, que chega facilmente, em vez de ser a 30%, a 40 ou 50%. A este propósito, quero acrescentar aos dados que irei fornecer uma carta de um ministro inglês responsável por este tema em que explica por que razão o investimento feito por este processo, no caso inglês, é 15% mais barato do que o feito por empreitada normal. Em Portugal, será mais do que 15%, e nem sequer entrei com isso na minha conta.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito. Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr Presidente, como se trata de um assunto importante, gostaria que V. Ex.ª me cedesse um minuto para poder pedir um esclarecimento adicional.

O Sr. Presidente: - Excepcionalmente, posso dar-lhe a palavra para comentários durante três minutos.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Muito obrigada, Sr. Presidente, pela sua atenção.
Sr. Ministro, agradeço as suas explicações e começo por lhe dizer que, por alguma modéstia, utilizei a palavra «rudimentares» referindo-me aos cálculos que fiz, apesar

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de essa não ser, talvez, a palavra mais adequada. Em todo o caso. devo dizer-lhe que fiz os cálculos com toda a consciência e seriedade.
Das suas explicações, que lhe agradeço, há uma conclusão que tiro: é que realmente fica mais caro esta forma de realização de despesa do que fazer de outra forma.
Não tenho dúvidas e sou solidária com a questão dos constrangimentos da despesa e do défice, mas não sou solidária com o facto de - e já há muito tempo que andamos a dizer isto - esse constrangimento atingir a despesa de investimento e não atingir a despesa corrente.
Portanto, nessa situação, Sr. Ministro, poderíamos talvez analisar o montante de despesas que está aqui em opção e se havia necessidade de um constrangimento de 280 milhões de contos em vez de um constrangimento uni pouco menor.
Por outro lado, Sr. Ministro, a verdade é que nos cálculos que fiz - e foi por isso que disse que eles eram elementares - não tomei em consideração a redução da taxa de juro. É, pois, nesse sentido que considero que os cálculos são elementares, porque considerei a taxa de hoje.
Sr. Ministro, o que eu acho que devia ser discutido. claramente, neste Parlamento era a filosofia que está subjacente a esta opção que o Governo tomou. que, aliás me espanta de alguma forma, porque há realmente aqui uma confissão de necessidade de, para não sacrificar o investimento, ir para outras soluções.
Por outro lado penso que a grande acusação que sempre foi feita ao PSD da «política do betão» dava a sensação de que tudo já estava feito e, então, não era necessário fazer já este ano, isto é, poder-se-ia, de alguma forma dilatar os prazos e fazer isto ao longo de dois ou três anos. Mas, pelos vistos, assim não é, sendo necessário fazer de repente nos próximos um ou dois anos, mesmo que isso seja à custa de sacrificar recursos adicionais que poderão ser muito importantes para um País que, realmente, ainda precisa de muitas mais infra-estruturas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar esclarecimento, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, ao qual a Mesa cede actualmente três minutos.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr.ª Deputada , em primeiro lugar, quero dizer-lhe que o PSD construiu a ponte Vasco da Gania por uma técnica do ponto de vista da montagem financeira semelhante, que é, de facto, uni benefício para o País e que nós acolhemos bem.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é a excepção!

O Orador: - Sim, é a excepção!
Em segundo lugar, esta solução não é a mais cara, porque temos três soluções: uma, é fazer a solução impossível, que, portanto, por definição, nem sequer pode entrar em consideração, das outras duas, que estão em comparação, uma é fazer daqui a nove anos e a outra é fazer já ....

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas porquê daqui a nove anos?

O Orador: - ... sendo a mais cara fazer daqui a nove anos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas porquê daqui a nove anos?

O Orador: - É exactamente pelo contrário daquilo que o senhor pensa.
Por outro lado, quando a despesa pública para investimento cresce a 10%, o que talvez seja mais unias cinco vezes do que crescia no tempo do PSD de 1993 a 1995, é difícil argumentar como a Sr.ª Deputada argumentou.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Varges.

O Sr. Manuel Varges (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, tem sido dito que 1998 será um ano especial de obras públicas, que elas vão terminar, em grande parte. nesse ano e que estaremos a arriscar muito ao assentar o crescimento económico essencialmente no investimento público, porque depois é que vão ser elas!... Esta, Sr. Ministro, é a primeira questão que gostaria de ver esclarecida.
O Governo entende - e bem - que o investimento público deve continuar a sustentar, em áreas estratégicas, o crescimento da actividade económica e o emprego. Mas, Sr. Ministro, quando se aposta na concessão da Brisa, do Norte e do Oeste, a privados, quando se aposta na concessão de centenas de quilómetros de auto-estradas sem custo para o utilizador, vulgo portagens virtuais, quando se aposta na concessão do caminho-de-ferro da Ponte 25 de Abril a privados, quando se apostou na concessão da ponte Vasco da Gama a privados, não estamos a dar uni reforço progressivo ao investimento da iniciativa privada?
Sr. Ministro. irias então, depois de 1998, não teremos a continuação do projecto da extensão da rede do Metropolitano de Lisboa ao Cais do Sodré, a Santa Apolónia, ao Chiado e até a Odivelas - esta no ano de 2001? Não estamos a prosseguir o fecho da CRIL e do eixo Norte/Sul? Não estamos a apostar nos metropolitanos do Porto e da margem sul do Tejo, na quadruplicação da via ferroviária do norte? Sr. Ministro, concluir, até ao ano 2004, o plano de realojamento e a construção de habitação social, no valor de cerca de 200 milhões de contos, não é investimento público? Quanto custará à Junta Autónoma de Estradas concluir, até ao ano 2000, todos os itinerários principais e 50% dos itinerários complementares? Isto não é investimento público? Sr. Ministro, quanto vai investir se, após 1998, em toda a zona envolvente da Expo 98, através da iniciativa privada, em habitação, em serviços e em equipamento? Isto não é investimento?
Sr. Ministro, não se vão investir 90 milhões de contos em ETAR's. não vão investir-se, até ao 1000, 200 milhões de contos para encerrar todas as lixeiras deste país?
Quanto irá investir-se, Sr. Ministro, no projecto do Alqueva? Isto não é investimento público?
Quanto irá investir-se tia rede de hospitais que estará concluída nos próximos anos? Isto não é investimento público?
Ó Sr. Ministro, acha que, de facto, devemos preocupar-nos com que, nos próximos anos, o investimento público

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não promova e não sustente o emprego e o crescimento económico?
Segunda questão: temos hoje uma perversidade indesejada no funcionamento global tanto nos transportes terrestres como nos transportes rodoviário e ferroviário. Como sabe, o modo rodoviário transporta hoje 90% de passageiros e 70% de mercadorias. V. Ex.ª falou, Sr. Ministro, nas reformas iniciadas no modo ferroviário e disse que os investimentos irão concentrar-se essencialmente na quadruplicação da via e faz-se a acusação de que isso irá, sobretudo. privilegiar o litoral, as áreas suburbanas, os passageiros e as ligações entre as grandes cidades.
Ora bem, dado que anunciou igualmente que vão ser investidas fortes medidas para dinamizar o papel dos portos no crescimento económico deste país, como é que o Sr. Ministro encara que o caminho-de-ferro ganhe a vocação que também tem de ganhar, tanto nas ligações ao interior como ao estrangeiro, no transporte das mercadorias.
Esta é uma questão que gostaria também, Sr. Ministro, de ver esclarecida.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Informando que o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território responderá a grupos de perguntas, para pedir esclarecimentos tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, já no ano passado abordei este tema e volto agora a fazê-lo, porque foi corri surpresa que, ao analisar a distribuição das verbas do Orçamento do Estado verifiquei que a macrocefalia de Lisboa continua a imperar. Ora, como Deputado eleito pelo círculo eleitoral do Porto não posso aceitar esta situação e nem sei como justificar que a Lisboa tenha sido atribuído mais do dobro da verba prevista para o Porto. Será que as gentes do Porto não merecem também investimentos do Estado?
Segundo ponto: analisando também a distribuição regional dos investimentos, verifiquei que, relativamente à orla costeira e tal e qual como no ano passado - e isto faz-me parecer que anteontem, ontem e hoje é tudo a mesma coisa, é a macrocefalia a funcionar... -, há uma tentativa para aumentar a diferença entre o litoral e o interior, para um desnível cada vez maior entre ambos.
Na verdade, Sr. Ministro, se analisarmos a distribuição das verbas, verificamos que os distritos do interior têm menos verba do que o do Porto, tudo somado. Será isto uma maneira de descentralizarmos? Ou será isto um ensaio da regionalização que tanto anseia?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território. gostaria de voltar à questão das SCUT, isto é, das portagens virtuais ou das portagens sem cobrança aos utentes. Não fiz contas e utilizo apenas - e é esta a questão central que gostaria de colocar - o documento que o Sr. Ministro entregou à Comissão sobre as novas concessões SCUT No documento que rios entregou, o Sr. Ministro diz que, segundo as contas feitas pela Junta Autónoma de Estradas, a concessão vai dar aos adjudicatários privados unia taxa interna de rentabilidade de 13%. Ora, uma taxa interna de rentabilidade de 13% neste sector praticamente sem risco - não existe, praticamente, qualquer risco de investimento -, com receita assegurada. etc... é, de facto, uma taxa interna de rentabilidade extremamente favorável. É fabulosa! Para este tipo de investimento é fabulosa!... Poucos serão os investimentos nesta área que, em Portugal, têm, neste momento, uma taxa interna de rentabilidade tão elevada.
Sr. Ministro, as portagens são virtuais, mas o negócio, para quem ficar com elas, é real, muito substantivo e muito substancial. O Sr. Ministro, numa resposta que há pouco deu sobre esta matéria, disse por que é que isto não pode fazer-se pela Junta Autónoma de Estradas e falou dos défices e na dívida pública portuguesa. Então, a primeira questão que lhe coloco - para além da questão do negócio que é central - é esta: se não pode fazer-se pela Junta Autónoma de Estradas porque a moeda única e o pacto de estabilidade não o permitem. então declare-o pública e expressamente, porque a questão do défice e da dívida pública é isso que quer dizer.
O Sr. Ministro disse também que «a hipótese de uma empresa pública não pode ser», porque caso a atribui, não fosse feita a uma empresa pública, ela tinha de cobrar as portagens, Sr. Ministro, explique-me lá isto: se for entregue a uma empresa privada, esta não tem de cobrar portagens ao utente - são portagens virtuais -, mas, se, por acaso, for entregue a uma empresa pública já terá de haver portagem cobrada aos utentes, Porquê?
Para terminar, Sr. Ministro, quero dizer-lhe que não há soluções impossíveis; há apenas soluções que o Governo não quer seguir, pois quer apenas que a entrega seja feita aos privados, porque, de facto, a taxa interna de rentabilidade é muito e muito gorda.

Aplausos do PCP

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos neste primeiro lote de perguntas a que o Sr. Ministro vai responder em conjunto, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Amaro.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD) - Muito obrigado. Sr. Presidente.
Sr. Ministro, sem tecer qualquer tipo de consideração, quero colocar-lhe esta questão: o Sr. Ministro afirmou no seu discurso que «no PIDDAC para 1998 Lisboa perde peso e o Porto ganha relevo».
Ó Sr. Ministro, esta afirmação seria absolutamente inócua, não haveria qualquer problema. não fosse o caso de todos nós estarmos recordados de, há algumas semanas atrás, o Presidente da Câmara Municipal do Porto, antes de anunciar a sua candidatura, ter dito, «só anunciarei a minha candidatura se o Governo se atravessar de cruz». Esta afirmação não foi desmentida: antes foi, de algum modo, corroborada quando. na terça-feira passada, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista votou, na comissão Parlamentar de Administração do Território, Poder Local. Equipamento Social e Ambiente, contra, a requerimento do PSD. a vinda do Dr. Fernando Gomes à Comissão. Estava, sinceramente, longe de imaginar que hoje, aqui, o Sr. Ministro daria essa resposta, ou seja, eu não sei o que é que isso causa à candidatura à Câmara Municipal de

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Lisboa ou a quaisquer outras candidaturas, nem a alegria que isso causa no Porto, mas, Sr. Ministro, na sua qualidade de político e de especialista em matéria de desenvolvimento regional, tem de compreender que politicamente me choca - a mim e certamente a muitos outros Srs. Deputados, mesmo da sua bancada. acredito - que, como Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, que se ocupa do desenvolvimento regional - ou que devia ocupar-se -, reduza o conceito de explicar o PIDDAC, na Assembleia da República, para justificar politicamente essa exigência de um camarada seu, candidato à Câmara Municipal do Porto, e dizer aos Deputados, que, em matéria de PIDDAC, Lisboa perde peso e o Porto ganha relevo. E eu pergunto-lhe: e o centro do País? E a Guarda. E Castelo Branco? E o interior? O que é que eles ganham com o seu PIDDAC, Sr. Ministro?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. - Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Varges, as suas perguntas reflectem alguma preocupação que circula em meios que me parecem não ponderar bem o próprio efeito, já demonstrado, da política do Governo no aspecto fundamental de que o investimento público em Portugal. nos últimos dois anos e no futuro cada vez mais arrastou investimento privado nos mais diversos campos.
Assim, só para dar-lhe um exemplo, dos 300 000 postos de trabalho/ano que o PIDDAC representa em 1998, uma parte muito considerável é criada em actividades que não nada têm a ver com o PIDDAC, já que são fornecedores.
Por outro lado, toda a gente sabe que, ao fazer uni grande esforço de investimento de infra-estruturação, estamos a criar condições para que os futuros investimentos sejam mais competitivos, para que haja mais investimento em Portugal, tanto nas actuais empresas como nas empresas futuras, e para criar mais postos de trabalho.
Finalmente, estamos a fazer isso em condições tais que podemos assegurar que, se a nossa programação não for impedida, teremos à nossa frente, pelo menos, cinco a seis anos - ou mais - de grande investimento. Falei dos 700 milhões de contos que serão lançados no mercado em reforço. até ao ano 2001, ternos mais 400 milhões no novo aeroporto - isto para não falar de outros, como o Alqueva e os investimentos no norte.
O Sr. Deputado Augusto Boucinha falou de Lisboa e do Porto. Sr. Deputado, o que eu estou a querer dizer é que - e isto também serve para o Sr. Deputado Álvaro Amaro -, se formos ver os projectos que estão a ser feitos actualmente no PIDDAC e o que é que eles representam para o futuro - porque não terminam todos em 1998, muito pelo contrário -, verificamos que o Porto, que, em 1998, tem, de facto, uma desproporção muito grande em relação a Lisboa (2,5 mais a favor de Lisboa) -, no futuro, ficará apenas abaixo de uni, ficará apenas 60% abaixo da capital, ou seja, é a diferença entre a proporção de 34, 12%, e de 32, que desce Lisboa, e os 18 ou 19 que terá o Porto no futuro. Portanto, isto é uma enorme correcção, a que outras, em 1998 e 1999, se seguirão. É que aqui não estão contados cerca de 150 milhões de contos, pelo menos, que interessam ao Grande Porto, à área polarizada pelo Porto Se acrescentássemos isso, porventura o desequilíbrio começava a fazer-se contra Lisboa. Portanto, os número, são o que são, estão à disposição de todos e são fáceis de dar.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, devo dizer-lhe que achei a sua intervenção interessante porque é típica de uma certa escola de pensamento. Portanto, há aqui duas coisas a considerar: um desacordo quanto à escola de pensamento em si e a comparação de coisas que são incomparáveis.
Quanto ao primeiro aspecto, o Sr. Deputado acha que até era uma benesse - caía do céu - ,e o défice fosse agora para 4 ou 5%, e Maastricht ao ar. O que é que o País beneficiava com isso? É o seu juízo? E esse juízo é uma questão muito antiga, está mais que vista - não vale a pena talarmos disso. O Sr. Deputado acha que, em toda e qualquer circunstância, o Estado é sempre melhor do que a empresa privada. É o seu juízo, já sabemos isso.
Em relação às questões que pôs sobre as portagens, gostaria de dizer-lhe que a taxa interna de rentabilidade, é dos capitais próprios da empresa. E. Sr. Deputado, há, em Portugal, muitas empresas que,...

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Muitas empresas em crise!

O Orador: - ... declarando-o ou não ao risco, ganham muito mais do que isso. O Sr. Deputado está muito mal informado.

Vozes do CDS-PP: - Não está, não!

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - E neste tipo de actividade?

O Orador: - Neste tipo de actividade, a Brisa tem, salvo erro, 16%.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Você não está a utilizar os números certos!

O Orador: - Neste tipo de actividade, a Brisa, que é a única, tem para aí 15%, isto são números, da realidade.

O Sr. João Amaral PCP): - É extraordinário!...

O Orador: - Não é nada extraordinário. O Sr. Deputado é que não está a ponderar bem nos «males» do capitalismo... São muito maiores do que o, senhor julga. nesse ponto de vista. Deixe-me que lhe diga que abaixo de 13% são peanuts para muitas empresas deste tipo.
Isto tem riscos e há uma coisa muito importante aqui o conceito é novo e admito que o Sr. Deputado não se tenha familiarizado com ele, mas se pensar um pouco concorda: estes 13% são, pura e simplesmente, a título de ilustração, porque na realidade serão mais baixos, Porquê? Porque é uni processo de concorrência. O concurso vai por quatro a cinco consórcios em luta uns com os outros e o Estado não se vai interessar pelo investimento senão na parte em que ele garante a norma de qualidade. É isso que o Estado põe a concurso, uma qualidade de serviços. O que o Estado pretende é que todos os serviços rodoviário, futuros sejam pagos o mais barato possível Portanto, vai comprimir a taxa de lucro.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP).- Se 13% é tão baixo por que é que vai baixar mais?

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O Orador: - Por uma razão, Sr. Deputado: é que mais baixo do que 13% é perder um concurso.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Então, ninguém quer!

O Orador: - É evidente, é mais baixo ainda! Portanto. é uma questão de sabermos organizar a concorrência.
O Sr. Deputado pergunta-me: «por que razão não se faz pela JAE ou por uma empresa pública, por uma Brisa?».
Tecnicamente, seria possível, não tem qualquer dificuldade: bastaria que, em vez de se pagar ao concessionário a, se pagasse ao concessionário b, que seria a Brisa. Mas o concessionário b (Brisa), no fundo, é igual ao concessionário a se não for ligeiramente pior se ficar inteiramente nas mãos do Estado. Isso garanto-lhe eu!

O Sr Octávio Teixeira (PCP): - Os dividendos da Brisa não entram no Orçamento?

O Sr. Presidente: - Sem diálogo. Já terminou o seu tempo, Sr. Ministro.

O Orador: - Sr. Presidente, permita-me só uma questão muito simples.

O Sr. Presidente: - O mais possível condensado!

O Orador: - É um condensado muito simples.
Sr. Deputado, eu não negociei, eu não cedi, eu não fiz qualquer promessa a nenhum autarca que não fosse a promessa que este Governo fez em 1996 de que pagava integralmente o metro do Porto, e paga, que não fosse os contratos-programa que assinei em Julho na presença do Sr. Deputado Manuel Moreira, em Gaia, muito tempo antes de toda essa história de promessas e não promessas. Se alguém fez promessas não fui eu! Isso pouco tem a ver corri a nossa conversa aqui; a única coisa que tem que ver é o dar essa garantia política.
Finalmente, quanto aos investimentos no centro, vamos duplicar o IP3 se não inviabilizarem as SCUT. E, quanto aos investimentos no interior, vamos fazer o IP2 e o IP6. num total de 83 milhões de contos, e 42 milhões de contos na duplicação do IP5, só para lhe dar os seus concelhos. No Sabugal não sei quando farei, mas lá chegarei um dia com a conta.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, por paradoxal que pareça, quero começar por cumprimentá-lo, porque V. Ex.ª fez aqui uma intervenção centrada na defesa de que é possível adoptar uma estratégia de desenvolvimento contra as assimetrias que não passe pelo processo de regionalização.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Bem visto! Prestou um grande serviço ao País!

O Orador: - Portanto, tenho de cumprimentá-lo por isso e dizer-lhe que fez mais pelos adeptos da manutenção do Estado/Nação como actualmente existe do que muitos de nós que vamos entrar nessa luta.

O Sr. António Galvão Lucas (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Mas também quero cumprimentá-lo porque V. Ex.ª é, de facto, um político sui generis que faz um pouco de escola nestes 20 anos que levamos de democracia. V. Ex.ª foi uni agente importante no início do cicio do processo das nacionalizações e vai ser agora um agente importante no termo do ciclo das privatizações isso é de registar e é uma marca que V. Ex.ª deixa aqui, uma marca, porventura, única.
A ideia que tenho é a de que V. Ex.ª evoluiu, como, aliás, o Sr. Deputado Henrique Neto, que tem um percurso também atribulado nessa matéria.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Idêntico!

O Orador: - V. Ex.ª evoluiu - aliás, todos evoluímos pela vida fora - mas evoluiu neste caso no sentido da qualidade. E esta ideia da qualidade reconduz-me à pergunta que gostaria de fazer. porque V. Ex.ª introduziu no seu discurso uma imagem muito engraçada e interessante, que foi a análise dicotómica que introduziu entre o Estado/quantidade e o Estado/qual idade. O Estado/quantidade, monopartidário - chegou a chamar assim alimentado pelo maná dos fundos estruturais, que foi o Estado do PSD -, e o Estado/qualidade plural, que é Estado que V. Ex.ª representa e representou neste discurso, que é o Estado do Governo cor-de-rosa, não de um país cor-de-rosa, mas apenas do Governo cor-de-rosa.
No entanto, Sr. Ministro, devo lembrar que V. Ex.ª é o Ministro do Equipamento Social e. em certo sentido, é o ministro da quantidade: é o ministro dos equipamentos, das infra-estruturas, das auto-estradas. Portanto, talvez a qualidade seja mais com outros ministros, com a reforma com a saúde, com a educação, com a investigação científica, com tantas coisas importantes para a qualidade de vida de todos os portugueses e para melhores níveis de bem-estar.
Ora, a minha pergunta tem a ver com a baixa taxa de utilização dos fundos comunitários nos investimentos públicos. Sr. Ministro, quero perguntar-lhe se esta baixa taxa de concretização dos investimentos públicos, que é reconhecida por toda a gente, tem a ver com esta opção radical que V. Ex.ª fez pela qualidade em vez da quantidade ou se tem a ver com o facto simples de que os projectos de investimento público financiados pelos fundos estruturais e pelos fundos comunitários são projectos co-financiados, isto participação nacional.
Pergunto se não é aí mesmo que está o problema. isto é, se não é para suster o défice nas baias dos critérios de Maastricht (os 3%) que V. Ex.ª é obrigado a atrasar a taxa de execução, porque a máquina do Estado não sustenta a participação nacional nesses investimentos.
Era a questão que queria colocar-lhe, sem todavia deixar de perguntar se V. Ex.ª não considera que a manutenção dos critérios nominais não são em si mesmos perversos no que respeita a uma política de expansão do investimento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território: - Sr. Presidente, em

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relação às últimas afirmações do Sr. Deputado Luís Queiró sobre o mau uso dos fundos estruturais, gostaria de evocar aqui o testemunho da minha amiga Monika Wulf-Mathies. Passo a entregar ao Sr. Presidente cinco exemplares,

O Sr Lino de Carvalho (PCP) - Recorte, de imprensa!

O Orador: - .. para serem distribuídos por todas as bancadas. sobre a sua recente declaração, cujo título é o seguinte. «Portugal faz bom uso dos fundos estruturais comunitários.
É evidente que o critério de Bruxelas que diz que Portugal é um dos melhores, executantes - e não diz que é o melhor porque a delicadeza não o permite - é um critério que o Sr. Deputado Luís Queiró não reconhece, como aqui afirmou. Mas isso é um problema de competências e de conhecimento directo das situações entre o Sr. Deputado Luís Queiró e a minha amiga Monika Wulf-Mathies, que deixo para ser dirimido noutro foro.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Amiga recente! Amiga da véspera do Orçamento!

O Orador: - De hoje! De ontem!
Sr. Deputado Luís Queiró, relativamente a outras questões de fundo, orgulho-me de ter feito as nacionalizações.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Orgulha-se

O Orador: - Orgulho-me de ter feito a, nacionalizações. E, nesta Assembleia e em todo o lado, sempre disse que se voltasse atrás - e veja a enormidade do que vou dizer-lhe contra aquilo que senhor julga que é o meu interesse político - voltaria a fazê-las porque estava em causa a democracia portuguesa. Desse modo, orgulho-me de ter assumido frontalmente a minha quota parte de responsabilidade na consolidação da democracia portuguesa e na consolidação do emprego do PSD e do CDS, do meu, não, porque nunca trabalhei em qualquer sector nacionalizado. Mas veja como as, coisas são a «maldade, que eu fiz foi tal que levou 20 anos ao PSD, agarrado àquela «maldade» que não a quis ,largar, porque tinha lá empregos que eu nunca tive.
Portanto, nestas, condições, posso garantir-lhe apenas uma coisa: consolidada perfeitamente a democracia, estando nós a entrar no Estado de qualidade, combinando mercado, iniciativa pública, poder de Estado - poder de Estado em nome dos, interesses colectivos, sobrepondo-se ao interesse privado, quando for caso disso -, eu não preciso de nacionalizar mais, porque daqui a 20 anos talvez, alguém possa privatizar de novo Exactamente por isso é que privatizo agora, com a mesma consciência tranquila de estar de novo a defender o interesse do Estado e dos portugueses, retirando imensas riquezas que estavam sendo desperdiçadas, sobre uma gestão perfeitamente antinacional.
Nestas condições, faço a privatização com a mesma consciência, com o mesmo sentido de Estado que fiz as nacionalizações.
Finalmente, Sr. Deputado, sou Ministro do Equipamento Social, como lembrou, sou ministro da quantidade, como disse, mas sou também o ministro da qualidade dos equipamentos. Quero explicar-lhe que, precisamente nesta altura, o Plano Rodoviário Nacional está a ,er acrescentado com dois grandes capítulos novos que são o combate à sinistralidade e o apoio a informação dos utilizadores e uni plano de variantes que retiram o tráfego de pesados dos centros urbanos. São dois grandes capítulos que nunca se fizeram em Portugal e que acentuam o problema da qualidade da estrada em relação aos utilizadores e as populações que são muito mais numerosas, as que vivem à beira da estrada.
Portanto, Sr Deputado, isso não tem que ver com a quantidade, tem que ver exactamente com a substituição do Estado da quantidade pelo Estado da qualidade, que é outra coisa diferente.
Sobre os critérios de Maastricht, estamos conversados, porque sabemos todos as opiniões, uns dos outros. Lá vamos direitos a Maastricht e à convergência nominal com grande êxito da economia portuguesa.

O Sr Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira

O Sr Artur Torres Pereira (PSD) - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Existe hoje em Portugal uma nítida acentuação do processo de desertificação no interior do País, assim como uma crescente e preocupante tendência para agravar a sua litoralização. As assimetrias regionais, longe de se atenuarem, cada dia que passa cada vez mais se acentuam e agravam. Os atrasos no desenvolvimento do interior, longe de serem recuperados, cada vez progridem e aumentam mais.
Estas situações são tão mais preocupantes quanto é visível que a boa situação económica que o País atravessa, fruto da conjuntura internacional e da boa situação económico-financeira por este Governo herdada. não está a ser aproveitada para invertê-las ou, sequer, para travá-las;.
Sendo certo que a litoralização do País não é de agora, ela acentuou-se nas últimas, décadas, com particular relevo um período após o 25 de Abril. Foi a consciência de que esta situação, para ser combatida, exigia atenção permanente e intervenção constante que levou o, governos do PSD a não regatearem esforços, desde 1985, na sua abordagem.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD) - Muito bem!

O Orador: - Um gigantesco esforço sem precedentes, foi levado a cabo no lançamento de novas acessibilidades em todo o País: foram lançados sistemas de incentivos à criação de riqueza e de empregos, tendentes à fixação de pessoas e de empresas no interior: foi posta um enorme ênfase na criação de novos pólos universitários e de institutos politécnicos, por todo o País, sobretudo no interior.
Em 1994, na sequência da proposta do Governo português que, na Cimeira de Corfu a Comissão Europeia fez sua, entrou em vigor o Programa de Iniciativas, de Desenvolvimento Local, complementando o Programa Operacional de Promoção do Potencial de Desenvolvimento Regional (PPDR) e outros programas aprovados ao abrigo do Quadro Comunitário de Apoio.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Enquanto isto, o PS, então na oposição, considerava depreciativamente como «betão» as novas vias de comunicação que, derrubando as, muralhas da solidão.

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iam aproximando o interior do litoral e anunciava que, um dia Poder, de entre um infindável rol de promessas cor-de-rosa. alteraria por completo o Plano de Desenvolvimento Regional e estabeleceria novas prioridades de crescimento e de desenvolvimento.
O PS ganhou as eleições legislativas de 1995: a montanha pariu um rato.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Desde então, o interior esqueceu: nunca mais se ouviu falar de alterações ao Plano de Desenvolvimento Regional; não consta que tenham sido criados novos serviços de base local e de proximidade; desconhecem-se quaisquer novas iniciativas locais de emprego, projectos de investimento produtivo ou acções de valorização das produções tradicionais; acções de desenvolvimento rural, como as «aldeias históricas» e os «centros rurais», definharam; esfumaram-se os apoios à criação de micro e pequenas empresas em áreas complementares de actividade industrial e artesanal, bem como novos incentivos à fixação de jovens em busca do primeiro emprego.
No domínio das acessibilidades, poucas obras novas foram lançadas, travando-se, isso sim, o lançamento de inúmeras outras, já previstas. frustrando as expectativas e indignando as populações. As taxas de execução do QCA passaram a registar níveis preocupantemente baixos e a serem inclusivamente objecto da maior confusão, dadas as informações contraditórias a tal respeito sucessivamente feitas por diferentes membros do Governo.
Programas de desenvolvimento regional, anunciados como soluções miríficas para os problemas do interior, como o PROCOA, vêem os seus sucessivos responsáveis, aliás altos dirigentes do PS, debandarem em pânico, depois de constatarem a amarga diferença entre as promessas do Governo e a crua realidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Só agora, dois anos volvidos sobre a chegada ao poder do PS, e depois de muita controvérsia, é concretizada finalmente pela Comissão Europeia a primeira reprogramação do QCA, na qual aquela, bem como a Comissária Wulf-Mathies, não deixa de apelar ao Governo para que este faça «maiores esforços no domínio da redução das disparidades de níveis de desenvolvimento entre as regiões do litoral e as do interior do País». 

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como se tudo isto não bastasse, o Governo do PS acaba de apresentar uma proposta de lei de Orçamento de Estado em que, pelo terceiro ano consecutivo, se acentua o investimento público no distrito de Lisboa em detrimento do resto do País que. também pelo terceiro ano consecutivo, vê baixar o respectivo nível de investimento público, desta vez chegando ao ponto de naquele concentrar cerca de uni terço das verbas totais do PIDDAC regionalizado.
Com tudo isto não admira, pois, que, dois anos volvidos sobre a chegada do PS ao poder, os atrasos se acentuem, o êxodo rural aumente, a desertificação do interior se acentue e a litoralização se intensifique,

Aplausos do PSD.

Para inverter esta situação. era vital, desde logo, apostar nos municípios e nas associações de municípios. Em vez disso, o PS e o seu Governo propõem-nos, e ao País, a regionalização. Quais prestidigitadores que, para desviar as atenções dos espectadores do essencial, as atraem para o acessório, o PS e o seu Governo, cada vez que se confrontam com um problema real, inventam uma solução virtual e para ela tentam arrastar os portugueses!...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Existe uma preocupante problema de evasão e de fraude fiscal. Combatem-se as suas causas, detectam-se e punem-se os infractores e reforma-se o sistema? Não! Para alegadamente resolvê-lo - na realidade, para sacar mais dinheiro aos contribuintes - inventam-se colectas mínimas e métodos indiciários. Os portugueses desesperam quando têm de recorrer aos hospitais ou aos centros de saúde. Melhora-se o sistema de saúde? Não! Sobrevoa-se o País de helicóptero, com sorrisos e promessas em cada aterragem. anunciando-se milhões até para lá deste século em equipamentos hospitalares, alguns deles já concretizados, programados na sua esmagadora maioria pelos anteriores governos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Tudo no País aponta para o reforço substancial dos meios humanos, técnicos e sobretudo financeiros dos municípios e das associações de municípios. cujas potencialidades ao serviço das populações estão longe de estar exploradas? O PS anuncia aos portugueses as regiões.
Em meados de 1997, ano e meio depois de o PS chegar ao poder, o seu Governo apresentou uma proposta de lei das finanças locais, que acabou, de resto, no meio de muita polémica, por não ser aprovada na Assembleia da República devido à inesperada ausência de alguns dos seus Deputados, a qual. se estivesse hoje em vigor. atribuiria aos municípios em 1998 apenas mais 0,17 % que o atribuído pela actual Lei das Finanças Locais. Foi para este resultado que, de uma forma patética, o PS e o seu Governo acenaram com uma crise política. ameaçaram com a demissão e desestabilizaram o País e os portugueses?
Ao apostar na regionalização e rejeitando o aprofundamento das potencialidades do municipalismo, o PS colocou os seus interesses partidários acima dos interesses do País, privilegiando a lógica das suas clientelas em detrimento dos interesses dos portugueses, particularmente dos que vivem no interior; contribuiu para a fatalidade - bem demonstrada, de resto, pelo exemplo italiano - de tornar mais pobres as zonas hoje pobres e mais ricas as zonas hoje ricas, fatalidade que seria uma inevitabilidade não fora a possibilidade de o povo português a isso se poder opor no referendo que a muito custo o PSD e os portugueses arrancaram ao PS, que este depois fez sua prioridade para 25 de Abril de 1998, e que agora. depois de piruetas e subterfúgios inaceitáveis, se preparava aparentemente para abandonar, uma vez mais pela simples razão de que os seus interesses e calendários partidários já não são compatíveis com aquela data.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O País não precisa de aventuras. O País

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precisa, isso sim, de apostar sem subterfúgios no poder local e de adoptar uma política regional clara e bem orientada, que aproveite a boa situação económica que se vive, para que ela possa ser, também, uma política em favor do desenvolvimento - e em particular para o desenvolvimento do interior - que diminua as injustiças entre os portugueses e as assimetrias entre as diversas zonas do País.
Pena foi que, nas matérias ora em causa como noutras, tivessem sido necessários dois anos para que o PS e o seu Governo fossem obrigados a reconhecer o mérito dos nossos princípios e a justeza das nossas convicções. É porque com estes atrasos perdeu, entretanto, Portugal.
E porque, como sempre dissemos, este Governo, infelizmente, não age, só reage, continuaremos no caminho que traçámos, sempre e só fiéis aos interesses dos portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Torres Pereira, gostaria de recordar-lhe uma afirmação que acabou de fazer: a de que a regionalização acontece porque se colocam os interesses partidários acima dos interesses do País. Foi V. Ex.ª, até há fresca data, um defensor da regionalização...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas não da vossa!

O Orador: - Gostaria de perguntar-lhe se, no tempo do PSD, V. Ex.ª era defensor porque colocava os interesses partidários acima dos interesses do País e se agora, na oposição, mudou de opinião porque continua a colocar os interesses partidários acima dos interesses do País.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Isso não é verdade!

O Orador: - Depois, fala-me V. Ex.ª de convicções: o senhor não é uni homem de convicções - o senhor é um homem de conjunturas. como o prova cabalmente este
caso da regionalização; mas também é um homem de conjunturas, como o prova o próprio caso do financiamento das autarquias locais, porque o senhor, em determinado momento, calou-se, consentiu, vergou e não contestou, e agora está a dizer que não se cumpre, mas esquece-se de referir que, pela primeira vez, se está a cumprir a Lei das Finanças Locais.
Mas é fundamental dizer-lhe que o senhor só fala daquilo que se faz e que o PSD não fez - o senhor não falou aqui da Lisnave nem criticou a solução da Lisnave,
porquê? Mas, se criticasse, criticava porque tinha sido tomada uma decisão. 0 senhor não veio aqui criticar a decisão a respeito da Autodril ou a decisão acerca dos horários do comércio, mas podia criticar, porque essas decisões foram aqui assumidas. O senhor pode aqui criticar o PROCOA porque ele existe e com os senhores ele nunca existiria, nem nunca existiria uma decisão neste âmbito.
Falou de um conjunto de programas operacionais, falou em muitas questões, mas esqueceu-se do essencial: é que V. Ex.ª nunca se preocupou, durante o seu governo, em levantar a voz para defender, por exemplo, o cumprimento da Lei de Bases da Segurança Social; durante o seu governo, nunca levantou a voz para lutar contra a crise e o desemprego reinantes em Portugal. Por isso é que eu digo que, quando fala em convicções, é uma fraqueza da sua parte fazer essas afirmações porque o seu passado e o seu curriculum demonstram que, politicamente, V. Ex.ª é uma pessoa sem convicções. E, se o fosse, em matéria das própria finanças locais, em matéria daquilo que é conhecido no País, em matéria de um aumento médio de 30%, de mais de 94% para as freguesias, em matéria de legislação agora elaborada, como é que V. Ex.ª responde com o seu silêncio do passado às realidades do presente? É V. Ex.ª um homem de convicções?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, realmente, ao ouvi-lo, confesso que não posso deixar de pensar que, com muita probabilidade e muita plausibilidade, aquilo que o senhor acaba de dizer, tê-lo-á decorado ontem à noite não sabendo quem, pelo PSD, vinha fazer a intervenção de hoje. Aquilo que o senhor acaba de dizer. sendo questionado a qualquer um dos Deputados do PSD, acabou por me calhar a mim.

Risos do PSD.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O senhor tentou decorar isso ontem à noite - não decorou mal, confesso-o, mas enganou-se no destinatário! Se há pessoa, Sr. Deputado José Junqueiro, que tem legitimidade e autoridade moral e democrática para falar destas matérias, sabe V. Ex.ª muito bem quem é.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - É o José Junqueiro!

O Orador: - E sabe V. Ex.ª muito bem que eu já fui, em tempos, defensor da regionalização.

Vozes do PS: - Disse bem: foi!

O Orador: - E sabe por que é que hoje não sou defensor da regionalização?

O Sr. José Junqueiro (PS): - Porque é um vira-casacas! Pôs os interesses partidários acima dos da população!

O Orador: - Eu vou explicar: é que uma coisa de que os senhores não se deram conta nos últimos 10 anos, aconteceu: o País onde vivemos mudou!

O País que nós conhecíamos em 1980, nessa década, mudou muito, Sr. Deputado! O tempo que o senhor demorava para chegar de Lisboa até Viseu no início da década de 80, diminuiu radicalmente; o tempo que alguém demora para ir de Vila Real de Santo António a Viana do Castelo diminuiu radicalmente. De facto, as assimetrias regionais diminuíram nos tempos do Governo do PSD. Foram criadas condições para que os jovens portugueses

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pudessem fixar-se nas suas terras. Há um Portugal diferente que o senhor não vê ou não quer ver.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E o Portugal que Francisco Sá Carneiro conheceu e para o qual pugnou pela regionalização é um Portugal que, graças ao trabalho dos Governos do PSD, mudou substancialmente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E aquilo que levava a que fosse, talvez, necessária a regionalização em 1974, infelizmente no caso de Sá Carneiro até 1980, é isso que hoje, depois do trabalho dos Governos do PSD, faz com que não seja já necessário - a meu ver e respeitando todas as posições em contrário - fazer a regionalização em Portugal. É por isso que, Sr. Deputado José Junqueiro, com a legitimidade de quem, no terreno, se submeteu a cinco eleições democráticas - cinco! - e sabe o que é trabalhar pelo progresso das populações, sentindo efectivamente as suas alegrias e as suas tristezas, sem ter de andar permanentemente preocupado em aparecer nos jornais, é com essa legitimidade que lhe digo que me mantenho hoje, tal como em 1974, quando (com muito orgulho o digo hoje) me inscrevi no PSD: o mesmo homem de convicções que era em 1974.

Aplausos do PSD.

Para terminar, Sr. Presidente e Sr. Deputado José Junqueiro, cito-lhe, a propósito da regionalização, uma quadra de António Aleixo: «o rato mete o focinho/sem pensar que faz asneira/depois, ou larga o toucinho/ou fica na ratoeira».

Risos e aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.

O Sr Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Torres Pereira, eu não me engano, nem quanto ao destinatário da minha pergunta, nem quanto ao meu colega José Junqueiro. Verdadeiramente, Sr. Deputado, fiquei atónito: então quem, cinco vezes sucessivas, se candidatou a vários mandatos numa câmara no interior disse aquilo que o senhor acabou de proferir! Diga-me, Sr. Deputado, foi com que governo que, durante o QCA I, até 1994, se intensificou aquilo a que o Sr. Deputado chamou, e bem, os níveis de disparidade entre o litoral e o interior? A sua região, Sr. Deputado, até 1994, ganhou ou perdeu qualidade de vida em relação média comunitária? Os grandes centros urbanos, Lisboa e Porto, ganharam ou perderam? Sr. Deputado, não devia ser o senhor, de facto, a fazer aquela intervenção sobre esta matéria: o Alentejo perdeu, ficou mais longe da média comunitária durante toda a execução do QCA I pelo seu governo, até 1994.
Sr. Deputado, diga-me em que governo é que foi aprovado o projecto do gás natural para Portugal com o apoio da Comunidade Europeia? Foi com o seu governo Qual foi o projecto do seu governo? Afirmar as assimetrias regionais, sempre junto ao litoral. Qual foi o governo que alterou o projecto do gás natural para Portugal? Foi o Governo do PS que, claramente com apoio do investimento público, vai levar o gás natural ao interior do País para dar possibilidades de desenvolvimento, para criar oportunidades, para fixar populações, para criar empresas, para criar, afinal, desenvolvimento em todo o território nacional e não só no interior, como continuadamente o seu Governo fez também neste projecto.
Sr. Deputado, em matéria de acessibilidades, mencionou alguns exemplos e muito bem, mas esqueceu-se de algumas coisas fundamentais. É que o seu governo fez as auto-estradas mais fáceis, fez as auto-estradas em que há maior volume de tráfego e que se pagam a elas próprias, mas deixou para o Governo do PS o esforço de solidariedade nacional. Há 11 anos que existe uma placa em Chaves em relação ao IP3, mas este não está lá e, sim, a placa. Nós vamos fazê-lo, assim como o IP2, o IP8 e as outras estradas que faltam fazer, até ao final deste século.
Sr. Deputado, não lhe fica bem a intervenção que fez. Em relação à fixação de jovens no interior, ao regime de incentivos à criação de micro-empresas no interior e ao sistema de incentivos regionais, foi este Governo que flexibilizou o quadro de apoio à criação de micro-empresas e lançou o sistema de apoios aos jovens empresários. No anterior Governo houve o SIBR mas infelizmente não teve o sucesso que todos nós esperávamos dele. No entanto, em relação ao RIME e ao SIR, 40 000 novos postos de trabalho foram criados com as candidaturas lançadas no terreno. Sr. Deputado, há de facto trabalho feito.
Relativamente à habitação só dois números. O seu Governo conseguiu fazer o prodígio de baixar de 10000 fogos/ano financiados, em 1990, para 2000 fogos/ano financiados, em 1995. Sr. Deputado, para melhorar as condições de vida dos portugueses este Governo, de 1995 a 1997, aumentou de 2000 para 7000 fogos/ano. De facto, é obra que se vê.
Em relação ao PER, um programa lançado com grandes parangonas pelo então Ministro Ferreira do Amaral para Lisboa e Porto, de 1993 a 1995, executaram apenas 3,5%. Se continuássemos com este ritmo precisaríamos de mais 20 anos para acabar com as barracas! Foi de facto agora, com mais 4000 fogos/ano no PER, que este Governo arrancou claramente com esse apoio social, fundamental, para Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado Artur Torres Pereira, para responder.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, confesso que perante tantos Deputados do PS «cheios de gás»...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sim, porque vocês já perderam a força!

O Orador: - ... e perante a circunstância de que este gás ocorre na presença do Governo, naturalmente que é legítimo que nos interroguemos e que tornemos como boa a conclusão que já hoje aqui foi tirada. Pela minha parte, serei o primeiro a recomendar o Sr. Deputado Paulo Neves para, depois de Janeiro, se sentar naquela bancada, ou seja na bancada governamental.
Em relação ao que di-se, não lhe vou responder com números porque, para quem dizia que o importante eram

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as pessoas, não deixa de ser significativo que os senhores, nessa bancada, e aqueles senhores, da bancada do Governo, praticamente hoje só falem em números.

Vozes do PSD: - É verdade!

O Orador: - A maior parte do vosso tempo e do tempo daqueles senhores, da bancada do Governo, é gasto em utilizar números, mas não vou fazer o mesmo e vou responder-lhe com a realidade. Efectivamente não sei o que o Sr. Deputado Ferreira do Amaral fez no quotidiano do Ministério pelo qual foi responsável,...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito disparate!

O Orador: - ... mas sei que enquanto ele era responsável por esse ministério o País, no qual na altura tinha algumas responsabilidades políticas, como há pouco tive ocasião de dizer ao Sr. Deputado José Junqueiro, mudou. E mudou de tal maneira que, até 1995, gerou expectativas que, de resto, os senhores, como a fada Sininho, na campanha eleitoral e depois de serem poder em 1995, tanto alimentaram. Mas se forem a uma zona do interior do País - e presumo que, pelo menos em teoria irão -, certamente vão ouvir as pessoas que lá vivem falar da acção desse governo. Aliás, não põem em causa, como eu não fiz da tribuna, a boa situação económica que se vive porque essa, sabemo-lo todos, é fruto da conjuntura internacional e da situação que herdaram.

Protestos do PS.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Ninguém põe isso em causa, Sr. Deputado, mas no resto, naquelas coisas de que o senhor falou e a propósito das quais invocou os números, olhe, vá à Assembleia Distrital de Bragança, ao respectivo secretário da mesa, peça-lhe para ler a acta de uma das últimas reuniões e veja o que disseram...

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Armando Vara) - Pode ir lá amanhã, comigo!

O Orador: - ...de uma visita do Sr. Primeiro Ministro, a propósito de um «Governo em diálogo» que ele foi lá fazer há uns meses atrás. Verá que nessa acta - e estou a falar de Bragança, não falo, por motivos óbvios do Alentejo e o senhor compreenderá porquê -, que certamente terá muito interesse em ler e vai achar muito interessante, os autarcas de todos os partidos, incluindo o seu, são muito claros quando se referem às promessas feitas pelo seu Governo, ou melhor, ainda não é o seu mas o que o senhor apoia, e a forma como eles entendem, dois anos depois, que essas promessas e essas expectativas foram integralmente frustradas.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - E, Sr. Deputado, se o senhor for não a Bragança mas se percorrer o interior desde o vosso «Norte Atlântico» até ao que ainda presumimos chamar-se Algarve,...

Risos do PSD.

... verá que todas as populações do interior pensam, em relação às expectativas e às promessas que os senhores fizeram em 1995, que estão a ser profundamente defraudados e burlados

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não me leve a mal, mas parece-me que a palavra «burlados» é um pouco excessiva.
Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal, para formular o seu pedido de esclarecimento.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Artur Torres Pereira, é óbvio que qualquer Deputado desta bancada pode ter a expectativa de, a breve trecho, enfim, a anos, ocupar algum lugar na bancada do Governo. Aliás, fica-lhe bem reconhecer isso porque só demonstra como reconhece a qualidade da bancada a que pertenço e que o Governo socialista está para ficar. Talvez o contrário já não seja verdadeiro, ou seja, um dia - e haverá sempre esse dia - o PSD pode voltar a pensar em ocupar a bancada governamental e talvez o Sr. Deputado nem nessa altura possa ter a expectativa de ter ali um «lugarzinho» marcado.

Risos do PS.

Mas vamos ao que interessa. Gosto sempre das tarefas difíceis, portanto estou sinceramente empenhado em compreendê-lo e principalmente a essa questão da coerência, que diz Ter, do regionalista primeiro e do não regionalista depois. Bem, uma primeira explicação possível foi aquilo que disse, que quando tinha responsabilidades políticas e presumo que essa altura coincide com a altura em que era regionalista; agora, que o PSD, todo o PSD, entrou numa onda de absoluta irresponsabilidade política, salvo em algumas situações em que essa responsabilidade felizmente volta ao de cima, o Sr. Deputado, nessa onda de irresponsabilidade, passou a ser contra.
Sinceramente, não me parece que seja esta a explicação... Mas, vamos aos dados: o Sr. Deputado já assumiu que era regionalista, o programa eleitoral do PSD, em 1991, tinha como um dos objectivos definidos criar as regiões no País e, sendo um programa de governo para a legislatura, pode presumir-se que esse objectivo continua até 1995... Mas não quero estar aqui a definir o timing de alteração da sua posição. No entanto, é facto que hoje, 1997, o Sr. Deputado é contra, ou seja, há aqui um momento em que muda de opinião.
Assim, sendo certo que também já nos disse que está preocupado com o desenvolvimento equilibrado do País, será porque considera que esse desenvolvimento equilibrado do País começou a ser feito algures entre estas datas?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ora bem, duas explicações são possíveis: uma, por aquilo que é o seguimento deste debate em que toda a gente critica a política do actual Governo, que provoca um desenvolvimento desequilibrado do País, o Sr. Deputado devia imediatamente assumir-se, novamente, como defensor da regionalização. Porém, não o faz, certamente porque considera que o desenvolvimento do País está a ser equilibrado e, portanto, mantém a sua

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posição de não regionalista. E diria mais: durante os 10 anos de governação do PSD e do cavaquismo, o Sr. Deputado era regionalista, presumo que no seu íntimo continua a ser, mas, dado o bom desempenho deste Governo nessa matéria, agora até se pode dar ao luxo de não defender as regiões.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira, para responder.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, permita-me que lhe diga que confesso não ter ouvido há pouco o seu comentário após a minha resposta ao Sr. Deputado Paulo Neves. E, não tendo ouvido, pareceu-me ter V. Ex.ª chamado a minha atenção para algum termo menos próprio que terei utilizado. Quero dizer a V. Ex.ª que não dei conta disso e, aliás, não é meu hábito fazê-lo...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não está em causa a intenção, não se preocupe.

O Orador: - ... e quero dizer que, se empreguei algum termo menos próprio, naturalmente, quero, desde já e sem saber a quem o enderecei, pedir desculpa pelo facto, que foi totalmente involuntário.

O Sr. Presidente: - Certamente, não está em causa a intenção. Queira prosseguir.

O Orador: - Sr. Deputado Afonso Candal, tive há dias ocasião de travar com o senhor seu pai, que não conhecia, numa estação de televisão, um debate,

O Sr. Afonso Candal (PS): - Não vi, estava em casa com a «senhora minha mãe».

Risos do PS.

O Orador: - Nem falando do senhor seu pai?! Nem quando se fala do senhor seu pai?!

Risos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, agradeço que façam silêncio para o Sr. Deputado poder usar da palavra.

O Orador: - Ia eu a dizer, Sr. Deputado, que tive o prazer de conhecer pessoalmente o senhor seu pai num debate televisivo há uns tempos atrás...

Risos do PS.

Devo referir que não sei qual a razão desta minha afirmação suscitar a hilaridade da sua bancada, mas seguramente que a não é relacionada com a expressão que utilizei. VV. Ex.as lá saberão a razão porque a minha expressão suscitou a vossa hilaridade.
Feito este comentário, quero dizer a V. Ex.ª que não vou entrar pelo debate, de resto com o seu pai bem mais interessante do que o que estou travar consigo, de quem é irresponsável por ser regionalista ou quem é responsável por não ser regionalista. A esse pretexto e a esse respeito, de resto, Sr. Deputado, fará o favor de olhar para dentro da sua bancada, para a bancada do Governo, ou para lá da bancada do Governo. Devolvo a V. Ex.ª ou a quem entender essas acusações ou esses comentários, mas desse lado.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Só estou a tentar compreendê-lo, mais nada!

O Orador: - Sr. Deputado, chega de subterfúgios e de sofismas!
Em relação à regionalização, a questão política do passado está ganha, os portugueses vão ter direito ao referendo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A questão política do presente é que o senhor e a sua bancada vão ter de responder aos portugueses e dizer-lhes se é verdade que os querem enganar, se é verdade que, afinal, querem deixar cair o referendo pelo facto de as sondagens revelarem que a pergunta que escolheram para o referendo dar uma opinião dos portugueses diferente daquela que resultava de outra pergunta. Sr. Deputado, responda aos portugueses, não os leve ao embuste, desminta perante o País que não querem deixar cair o referendo...

O Sr. Afonso Candal (PS): - Responda-me, a mim! Eu não falei em referendo.

O Orador: - ... e que o Sr. Deputado Francisco de Assis não vai ser desautorizado, como foi em relação à colecta mínima, na opinião que ele tem de fazer o referendo no primeiro semestre de 1998.

Aplausos do PSD.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defender a honra da bancada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente e Sr. Deputados, em relação à questão agora colocada pelo Sr. Deputado Artur Torres Pereira no que concerne à questão do referendo, quero dizer, de forma muito clara, que o PS quer que o referendo se faça em condições de seriedade absoluta. Essa é uma diferença em relação à bancada do PSD,...

Vozes do PSD: - Oh!

O Orador: - ... que quer fazer o referendo mas não quer garantir a sua realização em condições de seriedade absoluta!

Aplausos do PS.

Esta é também uma diferença marcante. A resposta é clara: queremos o referendo e contribuímos para que se apressasse o processo de revisão constitucional, numa altura em que o PSD colocava entraves artificiais com o único intuito de alongar tal processo, para evitar a realização do referendo nesta legislatura; queremos que o referendo se faça, mas também queremos que se proceda à actualização dos cadernos eleitorais, de modo a não

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subsistir qualquer dúvida sobre a validade dos resultados a alcançar no âmbito desse mesmo referendo.
Portanto, o que nos separa da bancada do PSD, em matéria de referendos, como em muitas outras, é apenas uma questão de seriedade política e de respeito pela opinião dos por1ugueses!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em relação à questão da colecta mínima e de uma eventual desautorização, quero apenas informar o Sr. Deputado, e alguns membros da bancada do PSD que já ontem aludiram a isso, de que nós podemos mudar de arma, mas não renunciamos ao combate.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O combate é contra a fuga e a evasão fiscais. É esse o combate essencial e, no âmbito desse combate, há várias armas a que se pode recorrer.
Termino com as palavras do Sr. Ministro das Finanças, esta manhã: bem-vindos, Srs. Deputados, a este combate; tragam também o contributo de algumas armas para este combate, porque a questão essencial, de facto, é a de que é preciso vencer a iniquidade fiscal que prevalece ainda no nosso país e que teve uma acentuação dramática durante o período em que VV. Ex.as assumiram responsabilidades governativas em Portugal!

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - É verdade!

O Orador: - Este combate tem de ser travado, mas também temos consciência de que deve ser travado alicerçado no mais amplo consenso social e político possível.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Esse combate deveria começar pela Câmara de Cascais!

O Orador: - E, se bem interpretei as palavras aqui proferidas ontem pelo Sr. Primeiro-Ministro - e não tenho dúvidas disso -, foi justamente em nome do alargamento dessa base de consenso social e político que o Governo decidiu evoluir no sentido de admitir a utilização de outras armas para travar este combate. No entanto, não nos afastamos do objectivo fundamental: combater a fraude e a evasão fiscal é, de facto, hoje, um desafio essencial em Portugal. Promover a reforma fiscal é hoje um desafio essencial. Combater a iniquidade fiscal é hoje um desafio da democracia portuguesa, porque é uma questão essencial, relacionada com o contrato de natureza cívica que cada um de nós estabelece com o Estado e a sociedade em que estamos inseridos.
Por isso, Sr. Deputado Artur Torres Pereira, com a maior clareza e frontalidade lhe respondi. Gostaria apenas que V. Ex.ª e a bancada de que faz parte tivessem, em relação a estas matérias, a mesma clareza, a mesma frontalidade, a mesma segurança e a mesma determinação que têm caracterizado a acção do Governo e da bancada parlamentar do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, reclamou V. Ex.ª de mim clareza. Vou ser muito claro.
Referiu o combate à evasão e à iniquidade fiscais. Lembro-lhe as afirmações do líder do meu partido, no encerramento das jornadas parlamentares:...

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Seja bem-vindo a esse combate!

O Orador: - ... se um candidato a uma câmara municipal pelo PSD demonstrasse que havia fugido às suas obrigações fiscais, fosse por que razão fosse, durante dois anos consecutivos, retirar-lhe-ia a confiança política e não seria candidato pelo partido.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Passemos à questão da colecta mínima. O Sr. Deputado Francisco de Assis, há um mês, defendia, para a comunicação social, a colecta mínima como arma essencial no combate à evasão e à fraude fiscal ....

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Não foi o que eu disse!

O Orador: - ... aliás, magnificamente acompanhado por alguns colegas da sua bancada. Um mês depois, o Sr. Primeiro-Ministro, na intervenção que ontem fez,...

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Não deturpe o que eu disse!

O Orador: - ... ao apresentar a proposta de lei do Orçamento do Estado para 1998, desautorizou, pública e inequivocamente,...

Vozes do PS: - É falso!

O Orador: - ... V. Ex.ª e os seus companheiros, que defendiam essa arma para esse combate.

Aplausos do PSD.

Terceira questão: a da regionalização e do referendo. Recordar-se-á V. Ex.ª bem, seguramente, apesar de na altura ainda não ser o líder da sua bancada, que o PSD, para acelerar o processo da regionalização e do referendo, propôs, para que não houvesse problemas em relação à revisão constitucional, que se fizesse uma dupla revisão constitucional,...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E os senhores não quiseram!

O Orador: - ... isto é, que em primeiro lugar se fizesse uma revisão constitucional extraordinária e depois, deixando de lado o referendo, se fizesse a revisão constitucional ordinária. A isto, os senhores disseram não!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - São os senhores os primeiros responsáveis pelo atraso que sofreu o processo da regionalização,...

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Não, não!

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O Orador: - ... que os senhores tanto disseram querer e tanto consideraram ser vossa prioridade! Mais, foram os senhores quem, ao contrário do que sempre foi dito, definiu e exigiu a data de 25 de Abril de 1998 para a realização do referendo sobre a regionalização.
Recordo-me - e o Sr. Primeiro-Ministro está presente e não me deixa mentir - que foi até um ministro deste Governo que disse publicamente que, se o referendo sobre a regionalização não tivesse lugar em 25 de Abril de 1998, pediria a demissão do lugar que ocupava no Governo!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Cá estaremos, Sr. Primeiro-Ministro, para ver se um dos ministros do seu Governo. perante as notícias que ouvimos, tomará a iniciativa correspondente às promessas que fez.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Termino, crendo não poder ter sido mais claro nas respostas, Sr. Deputado Francisco de Assis, tal e qual como há pouco comecei, dizendo que, para além da intervenção e dos comentários que o senhor fez, gostaria de tê-lo ouvido dizer aos portugueses que não haverá mais subterfúgios, não haverá mais alibis para, de uma vez por todas e com celeridade, dar a palavra aos portugueses, em referendo, de modo a que eles possam, inequivocamente, pronunciar-se sobre a regionalização.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Foi com especial ênfase que o Governo realçou o ritmo de crescimento apreciável, só do seu ponto de vista, do Programa de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central. Sendo certo que 37% dos fundos de financiamento do PIDDAC são fundos comunitários e dado que a previsão de execução financeira do Quadro Comunitário de Apoio para 1998 é superior a um milhar de milhão de contos, seria de esperar que, de idêntica forma, fosse realçado o cumprimento, ou não do II Quadro Comunitário de Apoio.
No entanto, tal não aconteceu.
A dois anos do fim deste II Quadro Comunitário de Apoio, quando já se negoceia o próximo, são justas e legítimas as preocupações que os mais variados quadrantes da opinião pública têm manifestado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe interrompê-lo, mas há um ruído na Sala. devido a reuniões de grupos de dois ou três Deputados. Srs. Deputados, de duas, uma: ou ouvem o orador ou, se não querem ouvi-lo, podem sair da Sala, é um direito que vos assiste.
Sr. Deputado Joaquim Matias, faça favor de continuar.

O Orador: - Obrigado, Sr. Presidente.
É certo que, em sede de comissão, o Sr. Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território apresentou uma previsão optimista aos Deputados presentes. No entanto, pouco tempo antes, o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional afirmava ao Diário Económico a sua preocupação pela baixa taxa de execução e queixava-se da falta das alterações necessárias à legislação. baseando-se justamente nos mesmos indicadores que justificavam o optimismo do Sr. Ministro.
Por outro lado. há pouco mais de duas semanas, o Sr. Primeiro-Ministro, na conferência de imprensa conjunta com Jacques Santer, sublinhava as dúvidas portuguesas relativas ao quadro financeiro da União Europeia para o período de 2000 a 2006.
Também as Grandes Opções do Plano não dão informações suficientes sobre a utilização dos fundos comunitários: nem sobre a avaliação feita ao Quadro Comunitário de Apoio pelo Governo. nem sobre a sua reprogramação.
O próprio Conselho Económico e Social manifesta, no seu parecer, preocupação pelo fraco nível de utilização global de fundos comunitários e estranha a falta de informação nas Grandes Opções do Plano sobre esta matéria.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: De facto, os fundos comunitários têm utilização diversa.
Os programas operacionais regionais, cuja execução é predominantemente das autarquias locais, registam elevados índices de execução em contraste com os programas nacionais e sectoriais. Em particular, o programa do ambiente vem registando atrasos que ficaram a dever-se, essencialmente, à indefinição inicial do Governo sobre as fontes de financiamento para atacar os múltiplos e gravosos problemas, sobretudo nos domínios do abastecimento de água e recolha e tratamento de águas residuais.
O Fundo de Coesão, segundo a Sr.ª Ministra do Ambiente, tem o seu valor praticamente comprometido: 243 milhões de contos em 290 milhões; tem ainda candidaturas a aguardar aprovação cujo valor fará ultrapassar o seu montante em cerca de 90 milhões de contos: e muitas outras candidaturas aguardam que o Governo as aceite. Este Fundo necessita obviamente de um reforço. No entanto, há legítimas dúvidas sobre a viabilidade de execução no período de vigência do Quadro Comunitário de Apoio de algumas das candidaturas já aceites e/ou aprovadas, pois dos 176 milhões de contos previstos para execução em 1997 apenas 76 milhões estão realizados.
Os municípios e as suas associações têm imensas propostas de projectos e obras nas áreas das acessibilidades, abastecimento de água, tratamento de águas e de águas residuais, tratamentos de resíduos sólidos urbanos, recuperação de zonas ribeirinhas e frente atlântica, recuperação de centros históricos, dinamização da economia local e apoio ao movimento associativo, os quais podem ser enquadrados nos objectivos e até nas meta: acordadas entre o Governo português e a União Europeia, mas o Governo não aceita estas candidaturas.
A principal questão que se coloca é a de alterar o modelo de gestão dos fundos comunitários.
Membros do actual Governo, mesmo já depois das eleições de 1995, fizeram várias críticas à gestão dos fundos comunitários e até à filosofia que lhes está associada. No entanto, dizendo-se regionalistas e adeptos da descentralização, mantêm em vigor regulamentos que impedem as autarquias e as associações de municípios de serem proponentes de projectos aos programas sectoriais.

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mesmo em áreas que, inclusive em alguns casos, são da sua competência.
Para quando a alteração regulamentar no sentido de descentralizar a gestão dos fundos, reforçar a participação das autarquias na execução e controlo dos programas regionais e sectoriais e permitir a transferência de verbas dos programas sectoriais já sem possibilidades de execução durante a vigência do Quadro Comunitário de Apoio para os programas operacionais regionais?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A título de exemplo pergunta-se: como se podem atingir índices de 90% no tratamento de águas residuais referidas nas Grandes Opções do Plano se do Plano Integrado da Península de Setúbal, apresentado ainda ao Governo anterior, apenas foram aceites pelo Governo duas candidaturas para ETAR que estão a aguardar aprovação e que cobrem apenas partes dos concelhos de Almada e Setúbal, isto é, pouco mais de l0%?
Como se pode, nas mesmas Grandes Opções do Plano, afirmar que se dá prioridade à execução de grandes sistemas de abastecimento de água, quando no que toca ao terceiro maior aglomerado urbano do país (a península de Setúbal), o protocolo assinado entre a Associação Nacional de Municípios Portugueses, a EPAL e o Governo, através da CCR, para construção e gestão da adutora regional de abastecimento, não é agora aceite pelo Governo?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: São justas e justificadas as nossas críticas à forma centralizada como o Governo, que se diz regionalista e descentralizador, continua a gerir as verbas do Quadro Comunitário de Apoio, com graves repercussões na melhoria da qualidade de vida das populações, correndo sérios riscos de não cumprir os objectivos e metas negociados em Bruxelas, prejudicando assim as futuras negociações da Agenda 2000.
No entanto, o Governo não prescinde de utilizar as mesmas verbas de forma discricionária e interferir na campanha para as eleições autárquicas com profundo desrespeito pelas mais elementares regras da democracia.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação (Marçal Grilo): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na apresentação do orçamento da educação para o ano de 1998. importa referir que o reforço das áreas sociais constitui um elemento essencial para a compreensão da política portuguesa no momento actual. Trata-se de uma opção que surge confirmada pelo terceiro ano consecutivo, demostrando que a «convergência» que temos praticado em relação aos restantes países da União Europeia não se limita a ser nominal, antes se situa numa preocupação estratégica de desenvolvimento social e cultural sustentável, baseado claramente numa complementaridade entre justiça social e conhecimento como factores de coesão nacional e de convergência real.
Com efeito, no mundo contemporâneo. o desenvolvimento e a convergência real entre economias exigem uma aposta muito determinada na qualificação das pessoas, no incentivo e apoio ao conhecimento. na livre circulação das ideias, na compreensão dos efeitos da imobilidade, na salvaguarda de uma identidade aberta e tolerante, na compreensão dos valores universais e na salvaguarda das diferenças e do pluralismo.
A democracia exige, pois, uma aposta clara na educação e na formação, de modo a combatermos a exclusão que resulta da ignorância e a garantir, a um tempo o rigor, a exigência e a igualdade de oportunidades, numa política de educação para todos, baseada em critérios e patamares de qualidade que nos coloquem gradualmente a par dos nossos parceiros europeus. Neste ponto, as responsabilidades do Estado democrático têm de ser assumidas numa lógica de descentralização, desde o investimento na valorização e formação dos professores e educadores até ao reforço da rede escolar e das escolas, passando pela melhoria das práticas pedagógicas, pelas avaliações de desempenho, pelo reforço dos apoios, pela acção social escolar e pelo planeamento do futuro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - As escolas estão, para nós, no centro da política educativa. Não basta, porém, afirmá-lo.

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - É absolutamente indispensável criar as condições no terreno para que tal seja uma realidade. Da educação pré-escolar ao ensino superior, esse objectivo tem de ser realizado. É uma cultura de qualidade e autonomia que tem de ser, e está a ser, posta em prática.
Nesse sentido, quando realçamos o facto de termos atingido já um peso das despesas da educação, no Produto Interno Bruto, de 5,8%, contra os 5,l% no início da presente legislatura, quando destacamos que a educação representa 20% das despesas públicas, em inclusão de passivos financeiros, dotação provisional e conta, de ordem, ou quando damos ênfase a um crescimento global de 9%, entre l997 e l998, significativamente superior ao ano anterior, mas representando uma continuidade em três anos consecutivos de incremento claro dos investimentos neste sector, estamos a pôr a tónica no desenvolvimento sustentável da educação e da formação, ou seja, antes de tudo, na valorização das pessoas e na aposta na primeira das matérias-primas com que o País pode contar: o factor humano.
Sabemos bem que não basta aumentar os orçamentos e fazer despesa para obter resultados positivos. Por isso, concebemos uma política de educação para todos que se desenvolve e aplica com gradualismo e selectividade.
Primeiro, trata-se de dar especial atenção aos fundamentos, isto é, à educação física, em especial ao 1.º cicio e à educação pré-escolar. A qualidade consegue-se quando a estrutura assenta em bases sólidas. Daí a nossa especial atenção às competências fundamentais nos domínios da leitura, da escrita e do cálculo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Daí a atenção à formação inicial e à formação contínua de professores. Daí Li aposta nas «escolas do novo século», com melhor qualidade de vida, com bibliotecas, com mediatecas equipadas com novas tecnologias de informação e comunicação e com espaços cobertos para a prática da educação física e do desporto.
Na educação pré-escolar, o Programa de Expansão e Desenvolvimento para os próximos três anos pretende dar

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resposta às necessidades sócio-educativas das crianças e das famílias, o que só é possível numa lógica integrada da rede, a partir da cooperação estreita entre os Ministérios da Educação e da Solidariedade e Segurança Social e da concertação com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, com as Uniões das Instituições Particulares de Solidariedade Social, Misericórdias e Mutualidades ou com a iniciativa do subsistema particular e cooperativo. O Estado, neste contexto de diversificação institucional, tem de assumir, no entanto, todas as suas responsabilidades exercendo e garantido uma tutela pedagógica única que substitui os dois subsistemas que existiam separadamente e que se desconhecem entre si. Assim se compreende o forte investimento previsto para l998, para fazermos cumprir a Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar por nós proposta a esta Câmara, com um crescimento orçamental global de mais de 50% relativamente ao ano anterior.
Na escolaridade obrigatória propomo-nos, na mesma linha. reforçar a qualidade. a igualdade de oportunidades e o combate à exclusão, através do alargamento dos territórios educativos de intervenção prioritária, dos currículos alternativos, do reforço da educação especial e da resposta às necessidades educativas especiais, do aperfeiçoamento da segurança das escolas, com o Programa Escola Segura, feito em parceria com o Ministério da Administração Interna, do reordenamento da rede ou da qualificação profissional certificada de nível II, em coordenação com o Ministério para a Qualificação e o Emprego.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O ano de l998 será o ano do lançamento de um audacioso projecto de autonomia das escolas, de incentivo ao agrupamento ou à associação e de uma nova filosofia na direcção, cestão e administração.
Pelos contratos de autonomia e pela adopção de um sistema flexível, mas claramente responsabilizador, pretendemos criar condições práticas para que as escolas possam garantir uma ligação efectiva entre os instrumentos disponíveis e o projecto educativo, entre a democraticidade, a participação, a eficiência, a descentralização e a dimensão local das políticas educativas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No ensino secundário prosseguiremos no reforço na sua identidade própria, como termo de estudos e via de acesso ao ensino superior, valorizando as vias tecnológicas e os cursos profissionalizantes. Pela primeira vez, desde l995. no esforço que temos prosseguido de estabilização da rede de escolas profissionais, definimos um quadro jurídico-financeiro que permite assegurar o financiamento do subsistema em parte significativa pelo Fundo Social Europeu, como foi inicialmente previsto, mas que se tornou impossível de aplicar por manifesta desadequação entre o regime previsto no II Quadro Comunitário de Apoio e a dimensão real da rede de escolas profissionais. Só clarificando compromissos e regras poderemos assegurar a continuidade das escolas profissionais, com todos os benefícios que lhes reconhecemos no tocante à qualidade e à relevância de formações nos campos técnico, tecnológico e artístico. Por outro lado, o lançamento da experiência de um ano pós-escolaridade obrigatória, em cooperação estreita com o Ministério para a Qualificação e o Emprego, constitui um factor da maior importância não apenas no sentido de se reforçar a ligação entre educação e formação profissional mas, sobretudo, na preparação da resposta adequada aos novos desafios colocados no mundo do trabalho e do emprego.
Permitam-me ainda que saliente a importância do desporto escolar, bem patente na acção levada a efeito junto das escolas e nas iniciativas locais, regionais e nacionais, que terão significativo incremento em 1998. Se é certo que construímos as novas escolas com instalações cobertas para a prática da educação física e do desporto, a verdade é que prosseguimos o plano de construção de pavilhões em escolas que os não tinham do mesmo modo que reforçámos a qualidade pedagógica nestes domínios, como factor de valorização pessoal e de equilíbrio humano e que reequacionámos o esquema de financiamento do Programa de Desporto Escolar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ninguém de boa fé que visite as nossas escolas poderá dizer que tudo está na mesma. Recordem-se o desalento e a desesperança de há alguns anos e invoquem-se os impasses a que se chegou, contrastantes com o actual pulsar de inovação e de mudança que se vive nas nossas escolas. De facto, para l998, propomos um aumento de 25% nas despesas com projectos de inovação e qualidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Aí estará o Programa Boa Esperança a valorizar as boas práticas a articular experiências e a incentivar transformações positivas. Aí estarão os Programas Nónio-Século XXI e o programa das bibliotecas e das mediatecas escolares.
Trata-se de dar vida e alma à qualidade, através da motivação e da mobilização das comunidades educativas, em nome da exigência, do rigor e da capacidade de organização. Com efeito, necessitamos em Portugal de um esforço redobrado na qualificação das pessoas, desde a educação básica à educação de adultos. Só assim poderemos estar à altura das competitividades europeia e mundial e aproveitaremos adequadamente as energias humanas disponíveis, num perspectiva da educação ao longo da vida.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - De facto, não basta investir; é fundamental que o esforço excepcional que está a ser feito na construção de escolas ou na sua substituição, ampliação e reparação, com l54 empreendimentos nos últimos dois anos, tenha correspondência em autonomia, responsabilidade e exigência acrescida nos objectivos e nas práticas. Mais e melhor educação para Portugal é um desígnio que ninguém poderá pôr em causa.
Mas a educação tem de ser um factor de projecção da cultura portuguesa no mundo, pelo que a concretização em curso das escolas do Maputo e o lançamento dos projectos de escolas portuguesas em Luanda e em Macau merecem aqui uma referência e um destaque especiais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No tocante ao ensino superior, apenas poderei reforçar o que têm sido os compromissos do Governo. O Estado assume as suas responsabilidades no sentido de garantir ensino superior para o maior número

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nas melhores condições: daí o crescimento do ensino público e o reforço de garantias de qualidade em todo o ensino, universitário, politécnico, estatal e não estatal. Daí o reforço do Orçamento do Estado nas despesas para o ensino superior a ritmo mais intenso do que o registado no ensino não superior, o que demonstra bem a preocupação do Governo em cumprir aquilo a que se comprometeu aquando do debate da lei de financiamento do ensino superior. A regra é a de que o Orçamento do Estado deve financiar o fundamental do crescimento do sistema, mobilizando-se a parte mais importante do produto das propinas para a melhoria de qualidade do ensino
Por outro lado, a acção social escolar visa prosseguir um objectivo de igualdade de oportunidades, de acordo com o que resulta da aplicação da lei ou do que entendemos ser a sua execução equitativa. E devo dizer, com toda a clareza, perante esta Câmara, que cumpriremos escrupulosamente aquilo a que nos comprometemos e que resulta da lei. nos termos que se revelarem adequados. Os sinais já dados pelo Governo através do regulamento recentemente publicado e o alargamento gradual da acção social escolar ao subsistema do ensino particular e cooperativo são significativos e mostram a vontade política que temos para levar à prática todas as medidas e instrumentos previstos na lei do financiamento aprovada por esta Câmara.
Estamos empenhados numa luta pacífica pela autonomia, pela responsabilidade, pela exigência e pelo rigor. Por isso, reforçamos a lei da autonomia universitária e adoptámos um regime financeiro que põe termo a entraves burocráticos indesejáveis. Abrimos, assim, caminho à qualidade e a eficiência, indispensáveis no confronto com instituições prestigiadas de outros países e na mobilização de energias próprias.
Mais e melhor educação e formação em Portugal, eis do que necessitamos e o que legitimamente continuamos a exigir. O Orçamento do Estado para 1998 consagra essa preocupação e esse empenhamento. Lancemos mãos à obra para executá-lo positivamente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Informo a Câmara que se encontram inscritos para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Carlos Coelho, Luísa Mesquita. Fernando de Sousa, Isabel Castro. Castro de Almeida e Maria José Nogueira Pinto.

Tem a palavra o Sr Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD). - Sr Presidente. Sr. Ministro da Educação, quero colocar-lhe três questões, a primeira das quais tem a ver com dinheiro, a segunda com boa fé e a última com o cumprimento da lei.

Como disse, a primeira questão tem a ver com dinheiro, com verbas orçamentais. Era indisfarçável, do alio da tribuna, o seu ar de satisfação, Sr. Ministro, pelo orçamento que apresenta à Câmara. O orçamento que ultrapassa a barreira dos 1000 milhões de contos para a educação. Tive ocasião de recordar, na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, que essa e uma evolução que todos nós, que analisamos as questões da educação há muito tempo, vimos registando há muitos anos, e recordei ate o orçamento de há 10 anos, de 1988. quando todos apelávamos ao Governo de então para ultrapassar a barreira mítica dos 300 milhões de contos. Desde há 10 anos, com 300 milhões de contos, e em 1995. quando saímos do Governo, o orçamento já era de 820 milhões de contos. Nos 1000 milhões de contos que o Sr. Ministro vem hoje apresentar há de facto uma evolução progressiva de reforço na educação. Se tivermos em atenção os dias de actividade escolar, o Sr. Ministro da Educação vai ter qualquer coisa como aproximadamente 6 milhões de contos/dia para investir na educação dos portugueses.

O Sr. Ministro sabe que o orçamento é um instrumento e tem, portanto, uma grande responsabilidade no exercício deste orçamento e na utilização deste instrumento. Tem 6 milhões de contos/dia. Sr. Ministro, para melhorai a educação dos portugueses, Portugal, a sociedade portuguesa, os líderes da opinião, os agentes educativos estão com os olhos postos em si, para ver esta execução orçamental, ou seja. como vai utilizar as verbas que tem à sua disposição e as melhorias significativas que vai introduzir no sistema educativo E sobre este ponto de vista faz todo o sentido o apelo que o líder do meu partido fez no encerramento das nossas jornadas parlamentares: na área social, para lá de o Governo se comprazer com o aumento das verbas para o sector social neste Orçamento, há uma questão de fundo - a da eficácia. Temos de saber como é que as verbas vão sei utilizadas e como se vão traduzir em melhoria real na qualidade do ensino, na formação dos portugueses.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Esteja descansado!

O Orador: - A segunda questão, Sr. Ministro, tem a ver com a boa fé. Antes das férias de Verão, o Governo veio pedir à Assembleia da República celeridade na aprovação da lei de financiamento do ensino superior, e pediu-a de tal forma que convidámos o Governo a explicar, na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, o porquê da pressa. A esta pergunta o Governo explicou que a pressa na aprovação da lei para antes das férias do Verão se devia ao facto de querer que as propinas do ensino superior entrassem em vigor neste ano lectivo. Entretanto, geraram-se várias polémicas e criou-se a suspeita de que o Governo estaria atrasado na elaboração de alguma regulamentação, tendo mesmo alguns reitores vindo a público dizer que n atraso dessa regulamentação comprometeria a entrada em vigor das propinas para este ano em lectivo.
Sr. Ministro da Educação, pela nossa parte, temos a consciência tranquila de que o Parlamento esteve de boa fé. O Governo, através do seu Secretário de Estado do Ensino Superior, veio à Assembleia pedir celeridade e explicou porquê. Estamos todos naturalmente à espera de que a boa fé de que a Assembleia deu provas tenha consequência eficaz nos actos legislativos de regulamentação do Governo e na entrada em vigor da lei.
Não foi por responsabilidade da Assembleia que houve qualquer atraso na aprovação da lei, quero crer que o Sr. Ministro não quererá que seja por responsabilidade do Governo que ela se não vá cumprir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Na área do ensino superior, convinha também que V. Ex.ª explicitasse se os reitores têm ou não razão na crítica que têm feito ao Governo, mas a verdade e que foi o Governo que pediu à Assembleia, aquando a discussão e aprovação da lei de financiamento do ensino superior, que inscrevesse um normativo de princípios, como o da responsabilização financeira do Estado ou o da complementaridade, que faziam pressupor que as propinas

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se adicionavam às receitas atribuídas pelo orçamento às Universidades e não que as substituam. Os reitores têm dito que assim não é, pelo que, a meu ver, seria importante um esclarecimento à Câmara por parte do Sr. Ministro sobre esta matéria.
Para concluir, Sr. Presidente, seria também bom que o Sr. Ministro desse garantias formais e claras à Assembleia de que a verba prevista para a acção social escolar do ensino superior é a necessária para fazer cumprir a lei que a Assembleia aprovou há poucos meses atrás.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro da Educação, havendo ainda outros pedidos de esclarecimento, deseja responder já ou no fim?

O Sr. Ministro da Educação: - Se fosse possível, gostaria de responder já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, penso que o Sr. Deputado Carlos Coelho levantou aqui três questões relevantes e pertinentes.
Em relação à primeira, considero que os l000 milhões de contos são apenas um número mágico, mítico, sem qualquer significado especial a não ser o facto de o crescimento deste ano nos ter atirado para cima dos 1000 milhões de contos. O que é mais relevante é o facto de termos atingido 5,8% do PIB, l6% do Orçamento global e termos tido uni crescimento de 9% em relação ao ano de 1977. Isto é que é significativo.
No entanto, estou de acordo consigo quando diz que, quando o país comete ao Ministério da Educação uma verba de mais de l000 milhões de contos, temos uma enorme responsabilidade em gastar bem este dinheiro, pois a questão da eficácia e sobretudo do combate ao desperdício constitui uma preocupação deste Governo e do Ministério da Educação.
Assim, o que quero dar aqui como garantia, a si e à Câmara, é a grande preocupação que esta equipa, este Governo, este Ministério da Educação e este Ministro têm em justificar ao País todo o dinheiro colocado à sua disposição para fazer funcionar melhor o sistema educativo e, sobretudo, às escolas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A segunda questão tem a ver com a boa fé, no que toca à lei do financiamento do ensino superior. Como sabe, sempre entendemos - e penso que a Câmara o entendeu - que a lei de financiamento não é uma lei de propinas mas aquela que, pela primeira vez, regula e estabelece um quadro de referência para a relação Estado-instituições, Estado-família e estudante-família, estudante-instituição. O que posso dizer-lhe, em relação quer à aplicação da lei quer à regulamentação da lei, nos seus vários aspectos, é o seguinte: em primeiro lugar, a questão magna das propinas é matéria que cabe inteiramente, no âmbito da regulamentação, às Universidades e institutos politécnicos. Como sabe, a nossa preocupação era a de fazer incluir, como fizemos, o valor e o montante das propinas no Orçamento para l998, como hoje faz parte integrante do próprio Orçamento.
Em relação à regulamentação que nos cabe, há vários aspectos na lei, pelo que vou apenas dar-lhe um exemplo de cinco aspectos que neste momento ou estão prontos ou estão em fase de preparação muito avançada: primeiro, o regulamento de bolsas para o ensino público; segundo, o alargamento da acção social escolar aos estudantes que estão no ensino privado; terceiro, a elaboração da legislação sobre contratos-programa e contratos de desenvolvimento - e aqui, o que temos praticamente pronto para apresentar é sobre os contratos-programa.
Gostaria ainda de dizer-lhe que temos um outro em fase avançada de preparação e que poderá vir ainda a ser aplicado em l997/1998; tem ele a ver com as chamadas bolsas de mérito, que, como sabe, também fazem parte da lei do financiamento do ensino superior público.
Portanto, a nossa «boa fé» está em que, para além de todos estes aspectos que estão neste momento em fase avançada de regulamentação, há um outro muito importante, como sabe, que é estruturante, que é o da nomeação da Comissão Instaladora do Fundo de Apoio ao Estudante, que é uma das estruturas que nascem da lei do financiamento do ensino superior público.
Quando viemos à Câmara dizer, pela minha voz e pela voz do Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior, que pretendíamos que a Câmara aprovasse esta lei antes do Verão, ou seja, em Julho passado, fizemo-lo de boa fé, porque entendemos que para estruturar o ensino superior, e não apenas no que respeita ao aspecto das propinas, que, como sabe, sempre considerámos um aspecto marginal em relação à lei, era importante que esta lei estivesse pronta até Julho, para que, até final deste ano e dentro dos prazos a que a lei nos obriga, pudéssemos vir a ter uma melhor estruturação e um melhor enquadramento do sistema de financiamento.
Em relação à responsabilização, ou seja, à sua última questão, devo dizer que sou sensível a esta matéria, porque sobre ela muito tem sido dito e escrito relativamente à forma como este Orçamento foi construído.
Como sabe, o orçamento das Universidades e dos institutos politécnicos públicos é, hoje, construído através de um algoritmo.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peço-lhe que termine, porque já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Estava eu a dizer que o orçamento das Universidades e dos institutos politécnicos públicos é construído através de um algoritmo que estabelece um valor-padrão de referência. Este valor-padrão de referência é construído todos os anos. Todos os anos o algoritmo é revisto e este ano foi revisto sobretudo na área da investigação científica. Ele introduz-nos um padrão de referência sobre o qual actuamos no sentido de fazer uma distribuição equitativa dos meios financeiros que são postos à nossa disposição para poder financiar as instituições.
Em relação a este plafond de referência, introduzimos, no ano de l997. um corte de cerca de 4% e este ano um corte de cerca de l,7% e sobre este orçamento, que resultou da aplicação do algoritmo, colocámos inteiramente o valor da propina.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, já gastou seis minutos, o dobro do tempo de que dispunha!

O Orador: - Sr. Presidente, só uma afirmação: o orçamento seria rigorosamente o mesmo que resulta da

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aplicação da fórmula se não houvesse valor de propinas por cima. ou seja. as propinas são, de facto, um valor que se acrescenta globalmente à verba dos impostos dos portugueses que seria aplicada no ensino superior público em Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente. Sr. Ministro da Educação, ficou claro, depois da sua intervenção hoje, nesta Câmara - e para nós já eram bastantes os indícios aquando da sua vinda à Comissão de Educação. Ciência e Cultura para discutir na generalidade o orçamento -, que dinheiro não significa boa política. Dissemo-lo na reunião com o Sr. Ministro, mas hoje é ele que o diz no seu discurso: «Sabemos bem que não basta aumentar os orçamentos e fazer despesa para obter resultados positivos». É verdade! Está de acordo connosco! E, de facto, é isso que acontece!
Daí resulta um discurso, que o Sr. Ministro hoje deixou aqui de uma forma muito clara e explícita, que não tem tradução orçamental. Mas o Sr. Ministro explica porquê e também é muito claro. Penso mesmo que está de parabéns, Sr Ministro, porque nunca uma intervenção foi tão clara. É que o discurso do Sr. Ministro é para as «escolas do novo século», e nós ainda estamos em 1997.
De facto, o seu orçamento é para 1998. Só que entre as «escolas do novo século», o orçamento que o Sr. Ministro aqui nos apresenta para 1998 e a realidade cio País há alguns conflitos. Daí que as traduções orçamentais estejam perfeitamente interrogadas.
Como o Sr. Ministro sabe - é dito pela comunidade estrangeira, é dito pela UNESCO, é dito pela ONU - Portugal é um dos países mais pobres da União Europeia. O Sr Ministro sabe que a pobreza tem, nem mais nem menos, como resultante mais directa - é a causa - e coincidência em termos de insucesso e de abandono escolar. As assimetrias culturais e as desigualdades reflectem-se e o insucesso e o abandono propagam-se.
E, nesta matéria, era naturalíssimo que essas fossem as duas vertentes de maior empenhamento orçamental do seu Ministério. Eu chamaria apenas a atenção, porque o tempo que temos é muito pouco, para dois ou três aspectos: acção social escolar, educação pré-escolar e ensino básico, fundamentalmente l.º ciclo. Estas são as três vertentes em que o Sr. Ministro diz que o seu Ministério aposta. E aposta de que maneira? Verbas para a educação pré-escolar, fundamentalmente para a rede privada, porque quanto à rede pública esquece-a. Não entende o Sr Ministro que a rede pública é, de facto, a verdadeira aposta para o combate ao insucesso e ao abandono precoces?

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Vamos à acção social escolar: temos um país repleto de residências, de refeitórios e de cantinas e. então, o Sr. Ministro não aposta na acção social escolar porque também considera que não é importante, quer no ensino superior quer no ensino não superior. Daí a diminuição das verbas.
Perfeitamente escandalosa a diminuição de verbas no ensino superior público e perfeitamente insuficiente o acréscimo no ensino não superior!
Terceiro elemento, educação especial - apoios educativos. Diz o Sr. Ministro, e com toda a razão, que. «face às assimetrias culturais, face às desigualdades, os apoios educativos são fundamentais». Então porquê o decréscimo também na área da educação especial, fundamentalmente na área do ensino básico e no l.º ciclo? Porquê, Sr. Ministro, esta conflitualidade tão grande entre as «escolas do novo século», o orçamento para 1998 e o seu discurso?

Aplausos do PCP

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr Presidente. Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, já, há alguns dias, tive ocasião de dizer-lhe, depois da sua intervenção na Comissão de Educação. Ciência e Cultura, que estou particularmente sensibilizado com as palavras que proferiu. Por uma razão simples: ç que não iniciou a sua intervenção com aquelas palavras tremendistas e apocalípticas, com que, o ano passado, fazia todas as suas intervenções.

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - É sinal de que, quando faz as suas visitas às escolas, verifica que, de facto,...

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - É melhor variar o discurso, porque esse já está gasto!

O Orador: - Ó Sr.ª Deputada, V. Ex.ª disse tantas vezes isso que agora vai ter de ouvir isto outras tantas vezes!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Já é a quarta vez!

O Orador: - A Sr.ª Deputada coloca aqui uma questão a que sou muito sensível, que é a da pobreza e o papel da escola. Vou responder-lhe com uma grande seriedade, como, aliás, é meu timbre A pobreza é uma questão de grande preocupação para este Ministério e sentimos que a escola tem um papel essencial, não como componente única mas como componente determinante para o combate à pobreza em determinadas regiões, sobretudo naquelas que têm níveis sócio-económicos e sócio-educativos mais desfavorecidos.
O nosso investimento, quer na concentração da acção social escolar nos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária, que, este ano, como sabe. aumentaram em cerca de 25%, em que cobrimos hoje mais de 200 escolas consideradas de zonas desprotegidas, de zonas de populações desfavorecidas, em que os apoios foram concentrados, quer nos Programas Entre Culturas. Educação para Todos. Educação para a Saúde, cobre hoje uma população muito mais alargada do que cobria há três anos atrás. E este é um dado absolutamente indiscutível.
O segundo aspecto que gostava de referir-lhe é este: estamos a construir aquilo a que chamamos «escolas do novo século» e chamamos-lhe assim porque são escolas que vão ter uma duração mínima de 20 anos, são escolas que normalmente se fazem para 20 ou 30 anos, ao contrário das pré-fabricadas que duram 10 anos. As escolas que estamos hoje a construir, estas 154 escolas em que mexemos nos últimos dois anos, vão estar no terreno até

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depois do ano 2020. Por isso, estas são as escolas que temos de preparar para o próximo século.
São escolas que têm todas as infra-estruturas necessárias, que estão apetrechadas com cantina, com equipamento informático, com biblioteca e com mediateca.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Lá equipadas estão, só que não funcionam!

Risos do PCP.

O Orador: - Importa-se de repetir, porque não percebi a graça?

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Ministro, dá-me licença? Não é graça, efectivamente, é uma grande tristeza.
Lá equipadas estão, Sr. Ministro, só que não funcionam! Porque o Sr. Ministro sabe que não há auxiliares de acção educativa suficientes para que as bibliotecas funcionem, para que os refeitórios estejam abertos, para que as cantinas funcionem, etc. Nem a segurança, Sr. Ministro...

O Orador: - Era uma graça!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Ó Sr. Ministro, não é graça!
Há encarregados de educação que receberam este ano...

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, desculpe, está a consumir o tempo do Sr. Ministro.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - ... cartas em casa solicitando a sua presença nas escolas para acompanhar os filhos, porque os conselhos directivos não tinham condições para garantir a segurança dos seus filhos.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, está a consumir o tempo do Sr. Ministro...

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Portanto, isto não é nenhuma graça!

O Sr. Presidente: -... não é lícito que use tanto tempo para uma interrupção!

O Orador: - Gostava de dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que, quando faz a leitura do Orçamento e vai à verba correspondente ao investimento em acção social escolar no ensino superior, verifica que esta verba teve um decréscimo. Nós assumimo-lo. E assumimo-lo por uma razão simples: é que este decréscimo é apenas de 300 000 contos, quando o crescimento em acção social escolar no ensino superior ultrapassa os cinco milhões de contos. Ou seja: a Sr.ª Deputada está a comparar percentagens, mas o que tem de comparar são valores globais.
O crescimento das verbas de acção social escolar no ensino superior atingem 23,8% em relação ao Orçamento de l997. Acho que este é um dado absolutamente significativo quanto à importância que atribuímos à acção social escolar no ensino superior.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, foi aqui referido o ar de satisfação do Sr. Primeiro-Ministro relativamente a este Orçamento. De facto, há mais do que razões para o Sr. Ministro da Educação exprimir essa satisfação. Satisfação que é nossa, que é do PS, que é do País e que nós pensamos que é da própria oposição. O Sr. Deputado Carlos Coelho e o PSD sabem-no e disseram-no, comentando sobretudo aspectos de política educativa e não orçamental.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - O importante é saber como é que se vai gastar o dinheiro! Isso é que relevante!

O Sr. Primeiro-Ministro: - Bem... Não é como no seu tempo!

O Orador: - A Sr.ª Deputada Luísa Mesquita não o disse, mas também o sabe. E congratulamo-nos por, em certo momento do seu discurso, ter dado aos parabéns ao Sr. Ministro da Educação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - De facto, ele está de parabéns com o orçamento que apresenta.
Trata-se de um bom orçamento, de um orçamento que cresce continuamente nos últimos dois anos. Para o próximo ano tem um incremento de cerca de 90 milhões de contos, sem considerar os aumentos salariais, portanto é, de facto, um bom crescimento, um crescimento que tem em consideração, a nível da acção social escolar, um esforço adicional de cinco milhões de contos, que nos leva a podermos afirmar tranquilamente que nenhum aluno do ensino superior ficará fora do subsistema por razões de natureza económica.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Disso estamos certos e seguros, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Uma outra questão que quero colocar ao Sr. Ministro da Educação é a seguinte: um dos aspectos originais da política educativa do seu Ministério tem passado pela colaboração activa entre o Ministério da Educação e diversas instituições, autarquias locais e, sobretudo, outros ministérios, como o Ministério da Solidariedade e Segurança Social, o Ministério para a Qualificação e o Emprego, o Ministério da Ciência e Tecnologia, etc., demonstrando, creio que pela primeira vez, que a política educativa é vista de uma maneira horizontal, transversal, isto é, não tem unicamente a ver com o Ministério da Educação, tem também a ver com outros ministérios.
Essa colaboração tem passado por uma coordenação eficaz, por uma coordenação de rigor, que muito nos apraz aqui registar.
Nesse sentido, gostaria de perguntar a V. Ex.ª se não se importava de explicar um pouco mais as acções e os projectos que estão em curso e os principais resultados até agora obtidos.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Sr Presidente: - Para responder. tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando de Sousa, como V. Ex.ª pode imaginar, não tenho aqui todos os dados relativos a todos os acordos que o Ministério da Educação tem com os restantes ministérios, mas poderei trazê-los à Comissão quando o Sr. Deputado quiser, porque é uma área de grande importância. Posso, todavia, dizer-lhe, num levantamento muito simples, que temos acordos com os Ministérios da Ciência e Tecnologia, do Ambiente, para a Qualificação e o Emprego, da Solidariedade e Segurança Social, da Saúde, da Cultura e, obviamente, das Finanças, porque nada disto se faz semi haver um entendimento perfeito entre os Ministérios da Educação e das Finanças, sob a égide do Sr. Primeiro-Ministro.
Há três campos para os quais gostaria de pedir a sua atenção, pela importância de que se podem revestir e revestem já hoje: o primeiro tem a ver com o acordo estabelecido com o Ministério da Solidariedade e Segurança Social. Foi através do acordo entre o Ministério da Educação e o Ministério da Solidariedade e Segurança Social que foi possível construir a estrutura que hoje rege a expansão e o desenvolvimento da educação pré-escolar. Só foi possível fazer este acordo por força de um grande entendimento entre os dois ministérios, do ponto de vista político e do ponto de vista técnico. A questão que se coloca é esta: havia dois subsistemas completamente separados e, hoje, há um sistema único, com uma tutela única, que nos permite fazer uma grande racionalização dos meios postos à disposição da educação pré-escolar. Não há duplicações de financiamento das instituições, nem das públicas nem das privadas.
Em relação ainda a esta matéria - e aproveitando para responder ao que há pouco disse a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita -, conseguimos fazer, mercê deste acordo com o Ministério da Solidariedade e Segurança Social, uma extensão altamente significativa na educação pré-escolar, nos jardins de infância públicos, de apoio às famílias, estendendo o horário de funcionamento e introduzindo a refeição dentro dos jardins de infância públicos. Foi um salto qualitativo enorme. Desde o início, perseguíamos este objectivo e conseguimos este ano que ele estivesse presente em todos os jardins de infância que assim o entendam.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O segundo tem a ver com acordo estabelecido com o Ministério da Ciência e Tecnologia. Foi o primeiro protocolo que assinámos com este Ministério. O Programa Ciência Viva tem vindo a ser conduzido pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, seguramente com o nosso apoio, e, já hoje, se pode ver, ao entrarmos, por exemplo, nas escolas do 1.º ciclo, que o ensino experimental se pratica em muitas delas.
Finalmente, o acordo estabelecido com o Ministério para a Qualificação e o Emprego, que é de grande importância, diz respeito à formação de todos os jovens que, tendo terminam o 9.º ano de escolaridade, não prosseguem estudos e pretendem entrar na vida activa. Nesse sentido, o Ministério para a Qualificação e o Emprego e o Ministério da Educação desenvolveram um programa para, este ano, dar um ano de formação a estes jovens, de modo a que eles entrem na vida activa com uma formação adquirida. Temos, neste momento, em preparação um programa para um outro grupo, de grande risco, que é o dos jovens, que, entre os l6 e os 25 anos de idade, estão na vida activa e não têm o 9.º ano completo. Esta é uma iniciativa que pertence aos dois ministérios e que vamos pôr em prática, ainda durante o ano de 1998.
Finalmente, Sr. Deputado Fernando de Sousa, gostava de chamar a sua atenção para a enorme importância desta colaboração entre os ministérios. A chave para muitos destes problemas reside num bom entendimento entre os ministérios, para que, horizontalmente, a educação não seja apenas uma questão do Ministério da Educação mas uma função do Governo no seu conjunto.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, ouvi a sua intervenção e julgo não ser nos grandes princípios genéricos que ela coloca que existem as divergências. Porém, há questões, que, tendo em conta aquilo que para nós a escola deve ser, me parece, de todo em todo, continuarem a ser ignoradas.
Uma delas, já aqui abordada, e em relação à qual o Sr. Ministro não deu resposta, é a do ensino especial. Essa questão, que foi sempre ignorada pelo PSD, atinge um número muito significativo de crianças no nosso país e é uma preocupação para estas famílias. É uma questão à qual, quase em exclusivo, os sectores cooperativo e privado têm dado resposta. Ou seja, o Estado tem ignorado a sua responsabilidade perante estas crianças e o seu papel integrador. Aquilo que se conhece do Governo, nesta matéria, é, ao nosso ponto de vista, extremamente preocupante. Há os projectos, já aqui denunciados noutra altura, de integrar as crianças portadoras de deficiência no ensino dito normal, sem ter em conta que há um conjunto de aspectos, designadamente das características da preparação técnica daqueles que irão receber essas crianças e problemas que têm a ver com os transportes e com o regime de permanência, que não foram equacionados. E seguramente. Sr. Ministro, não vemos tal reflectido no Orçamento do Estado, nem nas Grandes Opções do Plano, aprofundando esta questão, e muito menos na expressão orçamental para este problema.
Uma segunda questão parece-me continuar a ser ignorada, em termos orçamentais e em termos daquilo que são as grandes opções da escola, particularmente no ensino básico. Como bem sabe, a escola ou reproduz desigualdades - e, do nosso ponto de vista, tem reproduzido - ou reproduz exclusão e a prazo, isto significa que vai favorecer a marginalidade e a delinquência juvenil, pela falta de resposta do sistema a estes jovens e aos seus sonhos. Nas áreas metropolitanas, particularmente na Área Metropolitana de Lisboa, como sabe, o número de crianças filhas de imigrantes e de minorias étnicas é muito significativo. A escola não dá uma resposta adequada, com os programas que tem, para equacionar este problema: não tem um pessoal técnico capaz, do ponto de vista pedagógico, de lidar com estas crianças, algumas das quais dominam mal o português, não está preparada para valorizar culturalmente as diferenças de que estas crianças são portadoras; em suma, a escola elimina e marginaliza estas crianças.
Sr. Ministro, este é um problema que não vejo minimamente reflectido no Orçamento, pelo que gostaria

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que fosse claro acerca dele. Estas crianças estão no nosso país e têm o direito de ser integradas. A escola, se se pretende de futuro e não perpetuadora de diferenças e de exclusão, tem de responder e, do nosso ponto de vista, claramente não o faz.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr Presidente: - O Grupo Parlamentar do PS transferiu 5 minutos do seu tempo para a bancada do Governo, pelo que, para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, as duas questões que colocou são relevantes e pertinentes. Porém, ao contrário do que disse, estamos a dar uma resposta. E vou dar-lhe dois exemplos, nomeadamente em relação ao ensino especial.
É verdade que está cometido às instituições privadas um esforço significativo no domínio do ensino especial. Mas está-o com um apoio significativo da parte do Estado e com uma alteração também muito significativa em relação ao que ocorreu no passado recente. No passado recente, havia muitas destas organizações que tinham apoios do Estado, apenas autorizando a requisição de educadoras que eram pagas pelas próprias instituições. Ora. nós alterámos esta regra e passámos a pagar a estas educadoras, que estão hoje nas instituições privadas. Visitei, há três semanas, a APPCDM de Vila Nova de Poiares, onde o Ministério da Educação tem pago por nós, pelos contribuintes, pelos impostos, 10 educadoras que asseguram o funcionamento de uma instituição, onde estão cerca de 63 crianças com deficiências profundas.
O segundo aspecto em que poderá não haver uma tradução directa no Orçamento, mas que revela a importância que atribuímos a esta matéria, é o seguinte: todas as escolas em construção estão equipadas para poder lidar com crianças com deficiências - todos os edifícios estão equipados com rampas, com elevadores e casas-de-banho próprias, para que as crianças possam ser integradas.
Uma outra questão que colocou e que também é importante é a da integração. Como sabe, em termos pedagógicos, há vários modos de entender a forma como se lida com as crianças com deficiências. Estamos a acompanhar, muito cuidadosamente, o que está a ser feito no País, em termos de integração nas escolas regulares de crianças com deficiências, algumas mesmo com deficiências profundas.
Nesta mesma visita que fiz há muito pouco tempo pelo centro do País, tive ocasião de visitar algumas escolas que têm experiências muito avançadas na integração das crianças e, se a Sr.ª Deputada tiver interesse, terei muito gosto em que veja o trabalho, que está neste momento a ser feito em escolas públicas, de integração das crianças. É evidente que estas escolas requerem determinados apoios especiais, em lermos quer financeiros quer de equipamentos, e nós estamos a promovê-los.
A última questão tem a ver com a interculturalidade e a dificuldade em absorver, assumir e assimilar, nas nossas escolas, crianças de origens étnicas diferentes.
Como sabe, temos, há alguns anos, a funcionar o programa Entreculturas. que. neste momento, está articulado com o Instituto de Inovação Educacional. Ora, estou seguro de que se houver uma grande convergência de esforços entre o Entreculturas, o programa Educação para Todos e os Territórios Educativos de Intervenção
Prioritária - e, se verificar, os Territórios Educativos, todos eles. estão colocados em zonas onde há questões étnicas e raciais -, poderemos melhorar o seu grau de inserção e de absorção
Não estou a dizer-lhe que tenho uma varinha de condão para resolver este problema; estou a dizer-lhe que esta é uma preocupação nossa, que temos vindo a apoiar e a investir nestes projectos e, sobretudo, e ter um contacto directo com as escolas onde estes programas estão a ser aplicados.
Há uma questão fundamental, que é a da relação com as próprias comunidades...

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, permita-me que o advirta de que há ainda dois oradores inscritos para pedir esclarecimentos e já gastou quase todo o seu tempo.

O Orador: - Vou terminar já, Sr. Presidente.

Em algumas escolas. Sr.ª Deputada, estamos a obter resultados particularmente sensíveis e significativos em relação à integração. Dou-lhe o exemplo da Escola n.º 3, de Algés. em que temos um programa especial para integração de crianças cabo-verdianas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente. Sr. Ministro da Educação, dado o adiantado da hora. quase me esqueci da pergunta que ia fazer-lhe, mas tinha mais ou menos a haver com isto. o seu ministério dispõe de 1000 milhões de contos. Ora, a pergunta que quero fazer-lhe é se V. Ex.ª chegou junto do Sr. Ministro das Finanças, ou do Conselho de Ministros, e disse que o seu sistema custava 1000 milhões de contos ou disse que ele gastava 1000 milhões de contos Depois, quero perguntar-lhe se quem tem um sistema que custa ou gasta 1000 milhões de contos deve ou não ter também algum critério de avaliação de resultados e, se assim é, quando é que poderemos vê-los, ainda no âmbito desta legislatura.

Certamente, o Sr. Ministro deve ter feito um estudo comparado - não sei quanto é que lhe custa um bom aluno, quanto é que custa na Alemanha, no Japão, na América... Na área da saúde, não sei se sabe. mas não são os países que mais gastam em saúde que têm melhores indicadores. Portanto, fico sem saber se o Sr Ministro foi pedir 1000 milhões de contos, porque o seu sistema custa 1000 milhões de contos ou porque gasta 1000 milhões de contos. E, «até que a voz me doa» e por mais que ninguém me ouça. vou fazer esta distinção. E que costumo direi que a despesa improdutiva, do ponto de vista social, é outra iniquidade. Também há uma ética na despesa e julgo que aqui, por mais que não tenha grande eco, tenho de defendê-la.
Já a defendi noutros locais, e faço-o aqui também com muito gosto.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Grupo Parlamentar do Partido Socialista transferiu mais 3 minutos para a bancada do Governo. Tomo a liberdade de sugerir ao Sr. Ministro que deixe o último orador inscrito formular o seu pedido de esclarecimento e responda em conjunto aos dois.

Concorda. Sr. Ministro?

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O Sr. Ministro da Educação: - Concordo, sim. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, o Sr. Ministro, sempre que pode, põe em destaque a alta prioridade que atribui à educação pré-escolar. E. hoje mesmo, no seu discurso de apresentação, referenciou alguns números e algumas percentagens, pretendendo significar a grande prioridade da educação pré-escolar para o seu Governo.
Sr. Ministro, como já foi aqui dito várias vezes, o orçamento do Ministério da Educação é, hoje, superior a 1000 milhões de contos e, quem conhecer este número, fica a pensar que a educação pré-escolar está dotada com 5% do orçamento - e já não digo 10%...
Quero aqui recordar ao Sr. Ministro e pedir-lhe uma justificação para o facto de o investimento - refiro-me às despesas de investimento - previsto para a educação pré-escolar representar 2,6 milhões de contos. Ou seja, esta altíssima prioridade, que é a educação pré-escolar, vai gastar o equivalente a 2 horas e 30 minutos de funcionamento do sistema educativo. Sr. Ministro, como é que este valor se compatibiliza com a alta prioridade que diz atribuir à educação pré-escolar?
Mas há mais e pior. Os 2,6 milhões de contos nem seriam maus, o problema é que, em 1997. o Sr. Ministro já previa gastar 1.8 milhões de contos e a estimativa de execução do Ministério para este mesmo ano é de 370 000 contos. É o próprio Ministério da Educação que diz que, no ano de 1997, a despesa de investimento no ensino pré-escolar vai ser de 370 000 contos, contra uma dotação orçamental de 1,179 milhões de contos.
Portanto. Sr. Ministro, penso que para avaliarmos as contas do seu Ministério temos de olhar para a conta e não para o orçamento. Não podemos fazer a avaliação financeira do Ministério através das suas intenções, que nem são muito más, mas se olharmos para os resultados, para a execução concreta, aí é que o Sr. Ministro não se porta tão bem.
Isto é tanto mais estranho se lhe recordar que o próprio Sr. Primeiro-Ministro, juntamente com o Ministro da Presidência e o Ministro da Educação, fizeram notar que a Assembleia estava a atrasar um instrumento importante para o desenvolvimento do ensino pré-escolar, que era a lei-quadro da educação pré-escolar. Disseram-no nesta Assembleia. Ora, recordo que aprovámos aquela lei-quadro em Dezembro de 1996, quase há um ano, e, passado todo este tempo, o Sr. Ministro não foi capaz de gastar mais do que 375 000 contos, que é o que diz que vai gastar. Ou seja, Sr. Ministro, em matéria de educação pré-escolar, é «muita parra e pouca uva».
Quero pegar numa outra questão que já aqui foi suscitada pela bancada do Partido Comunista, a relativa ao investimento em matéria de acção social escolar.
Sr. Ministro, a dotação para investimento em acção social escolar diminui outra vez este ano. Já diminuiu de 1995 para 1996, diminui no confronto de 1997 com 1996 e volta a diminuir no confronto de 1998 com 1997. Tem vindo a diminuir permanentemente.
Recordo que, no orçamento do Ministério para 1995, a dotação era de 5 milhões de contos e, para 1998, estamos reduzidos a 2.7 milhões de contos. Cada vez se investe menos na acção social escolar.
Ora, há tantos estudantes a quererem residências nas universidades e o Sr. Ministro investe cada vez menos em residências e cantinas universitárias?! Como é que quer ter mais alunos no ensino superior e investir cada vez menos na acção social escolar?
Tenho ainda uma terceira questão para colocar-lhe, com a permissão do Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Já esgotou o seu tempo. Sr. Deputado. Tem de ser muito breve.

O Orador: - Serei brevíssimo, Sr. Presidente.
Continuando, o Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa disse, no ano passado, que avaliava que o sistema educativo desperdiçava por ano cerca de 50 milhões de contos - tomara muitos ministérios terem este valor como seu orçamento! -, o que é muito dinheiro. Assim, queria saber em que rubricas é que, este ano, o Ministério vai começar a evitar desperdício, sendo certo que todas as rubricas crescem com excepção da do investimento na acção social escolar do ensino superior, que é a única que diminui. Ora, se havia 50 milhões de desperdício e se todas as rubricas crescem, onde é que vai haver combate ao desperdício no orçamento do seu Ministério?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento formulados pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto e pelo Sr. Deputado Castro de Almeida, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, começo por responder-lhe.
Devo dizer que é pertinente a pergunta que coloca relativamente ao custar e ao gastar.
Pessoalmente, estou convencido de que estamos a aproximar gradualmente os custos dos gastos. E o nosso esforço será sempre no sentido de aproximar o que é real e que se traduz por uma melhoria do serviço do que são os encargos em termos orçamentais
Uma das formas de melhorar é avaliar. Avaliar no sentido de ser mais exigente, mas entendendo que esta exigência tem patamares que podemos ir subindo gradualmente. Os sistemas educativos não sobem por escalões, sobem gradualmente.

ctualmente, temos quatro áreas de avaliação montadas: uma primeira, que não foi fácil de negociar e de acertar, que é a da avaliação de desempenho dos professores: uma segunda, que é a da avaliação do ensino superior no seu conjunto, cujo alargamento foi estendido este ano a todo o sistema: uma terceira, que é a da própria avaliação dos estudantes, em que os exames nacionais do final do 12.º ano são um indicador precioso. Temos, depois, um outro sistema que é o da avaliação de conhecimentos adquiridos em várias fases e em várias etapas do sistema educativo para o qual, regularmente, temos vindo a produzir material, a divulgá-lo e, sobretudo, a utilizá-lo para nossa própria reflexão interna.
Há uma outra área que vamos lançar em 1998, que se iniciou em Setembro de 1997, que é a da avaliação, a nível do ensino secundário, do nível de desempenho das próprias escolas. É por aqui que iremos melhorando gradualmente o sistema e fazendo a tal aproximação entre o que é custo e o que é gasto.

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A este propósito, aproveito para responder desde já à última questão colocada pelo Deputado Castro de Almeida, relativa ao desperdício.
O Sr. Secretário de Estado, Dr. Guilherme d'Oliveira Martins, disse nesta sede, no ano passado, que estimávamos em valor elevado o desperdício no sistema. Então, este ano, eu próprio encomendei um levantamento de áreas de desperdício no âmbito do Ministério da Educação. Esta é uma matéria a que somos particularmente sensíveis e, no seguimento do clima de responsabilização que o Deputado Carlos Coelho referiu há pouco, certamente teremos ocasião de. em sede de especialidade, discutir quais são as áreas em que é possível introduzir ganhos significativos na gestão do Ministério.
Passo a uma das últimas questões, relativa ao ensino pré-escolar.
Peço muita desculpa ao Sr. Deputado Castro de Almeida, mas devo dizer-lhe que tem pouca autoridade para falar nesta matéria. A questão que coloca é importante e cabe nesta discussão orçamental, mas tem de reconhecer que, pela primeira vez, temos o edifício jurídico certo e adequado para podermos ter uma educação pré-escolar que cubra as crianças dos três aos cinco anos de idade.
A lei-quadro que aqui apresentámos e que este Parlamento aprovou por unanimidade, o decreto-lei que produzimos a seguir, todos os acordos que fizemos com os parceiros relevantes - a Associação Nacional dos Municípios, as Misericórdias, as mutualidades e as instituições particulares de solidariedade social -, o acordo que estamos a terminar com a Associação dos Estabelecimentos de Ensino Particular (AEEP) e, ainda, todo o enquadramento resultante do acordo feito entre o Ministério da Educação e o Ministério da Solidariedade e Segurança Social criaram, pela primeira vez, o único instrumento que alguma  vez foi criado em Portugal para poder haver uma educação pré-escolar a sério.
O crescimento de 1997 para l998, Sr. Deputado, não o esconda! É, em termos financeiros, l22% em relação a 1997. Resulta de um acordo entre o Ministério da Solidariedade e Segurança Social e o Ministério da Educação e vai dar resposta ao que são os nossos dois grandes objectivos e compromissos: por um lado, expandir a rede, mas de uma forma gradual e em acordo com os parceiros que estão no terreno e, por outro, consolidar o que existe. Isto só pode ser feito através de um esquema articulado, em que o Ministério da Educação assume a tutela pedagógica destes estabelecimentos e em que o Ministério da Solidariedade e Segurança Social assume a tutela social destas instituições. Este é um esquema a que o Sr. Deputado não ligou. Ora, peço-lhe que reconheça publicamente que é a primeira vez que existe em Portugal um esquema jurídico completo e os mecanismos para podermos ter educação pré-escolar para as nossas crianças.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, tem de terminar, pois já ultrapassou em muito o seu tempo disponível.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
A última questão tem a ver com a acção social escolar, particularmente no ensino superior.
Já há pouco respondi à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, tendo dito que, no investimento na acção social escolar relativamente ao ensino superior, há um decréscimo de cerca de 300 000 contos. A vontade política do Governo não pode ser posta em causa quando no que diz respeito às verbas para a acção social e escolar no ensino superior, temos um crescimento superior a 5 milhões de contos em relação a l997. Não poderemos comparar um crescimento de 5 milhões de contos em acções de funcionamento com o decréscimo de 300 000 contos.
Mesmo assim, quero dizer que, no programa de residências universitárias que o Sr. Deputado referiu, nós assumimos o compromisso de até final de l999, instalar 5500 novas camas, das quais, neste momento, estão em construção 4800. Ou seja, o ritmo de crescimento é na casa dos 63% em relação ao número de camas que hoje existe nas universidades e nos institutos politécnicos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro. Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A discussão do orçamento do Ministério da Saúde está à partida, prejudicada pela incerteza quanto à apresentação pelo Governo de um Orçamento rectificativo, visando, entre outros um reforço da dotação do Orçamento do Estado para 1997 para o Serviço Nacional de Saúde.
Não se conhece, pois, com rigor a execução do orçamento para l997. Não se sabe a quanto ascendeu a derrapagem da despesa nem se conhece o montante das dívidas a fornecedores.
Esperamos que a não apresentação do Orçamento rectificativo, antes da discussão na generalidade do Orçamento do Estado para l997, não signifique alguma inibição do Governo em apresentar já à Assembleia da República o agravamento do descontrole financeiro do Ministério da Saúde.
Temos fundadas razões para o nosso raciocínio, ou não fosse o actual Ministério da Saúde um ministério de muito más contas.

Protestos do PS.

O plano de investimentos, anunciado pelo Sr. Primeiro-Ministro é um exemplo paradigmático. Nele tudo coube.
Há custos totais de hospitais já concluídos ou em vias de conclusão, como são os casos dos hospitais de Matosinhos e Viseu.
Há investimentos que o Governo, há pouco tempo, não considerava prioritários e que agora, aparecem incluídos naquele plano, como é o caso do Hospital de Todos-os-Santos, em Lisboa.
Há investimentos previstos para hospitais, relativamente aos quais ou não há programas, ou não há projectos, ou não há terrenos disponíveis, como são os casos dos hospitais de Braga, de Santiago do Cacém e da Maternidade Magalhães Coutinho.
Há investimentos cujo anúncio parece ter tido em vista as próximas eleições autárquicas, como são o caso dos Hospitais Cascais/Sintra, Póvoa do Varzim/Vila do Conde, Loures e Vila Franca de Xira.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Esquecidas as promessas que não vai cumprir no seu mandato o Governo iniciou o rol de promessas para o século XXI.

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O Sr. Carlos Coelho (PSD): - São promessas para cumprir como as outras!?

O Orador: - Como pode acreditar-se no esforço de investimento que foi anunciado se, em l997, a programação do PIDDAC previa que, em l998, fossem investidos 57,6 milhões de contos e o PIDDAC de 1998 só refere investimentos de 48 milhões de contos? Ainda o PIDDAC para 1998 não começou a ser executado e já sofreu o primeiro corte de 9,6 milhões de contos!
Com este Governo, gasta-se mais dinheiro com a saúde, mas degrada-se a qualidade dos cuidados prestados aos utentes.
Em l998, nada de bom é de esperar do Ministério da Saúde porque o Governo não tem coragem para reformar o sistema de saúde.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - É falso!

O Orador: - Em vez de reincidir na promessa fácil, o Governo deveria ter controlado a despesa com os medicamentos e deveria ter reduzido as listas de espera. O Governo não devia ter perdido dois anos.
É preciso que o Governo governe a saúde para que ela mude para melhor.
Assim, no debate na especialidade, o Grupo Parlamentar do PSD vai apresentar uma proposta que comprometa o Governo a não adiar, sine die, a urgente reforma da saúde.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Decorridos dois anos, a paixão do Sr. Primeiro-Ministro pela educação esfumou-se.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Não, não!

O Orador: - Por isso, nada de bom se espera do Ministério da Educação, em l998.
Vai gastar-se mais dinheiro com a educação, mas vai degradar-se a qualidade do ensino. É que, para vencer o desafio da educação, não basta comprazermo-nos com os grandes números. O importante neste sector. como noutros, é que a aplicação dos recursos se traduza em melhorias concretas e valha pela sua eficácia e justiça relativa.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Vocês dão «uma no cravo e outra na ferradura»!

O Orador: - Temos fundadas reservas quanto ao orçamento do Ministério da Educação.
A lei do ensino pré-escolar teve uma baixíssima taxa de execução em l997, de acordo, aliás, com a previsão do próprio Ministério.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É verdade!

O Orador: - As dotações para o ensino superior estão já a gerar polémica com reitores e dirigentes estudantis.
A dotação para a acção social escolar do ensino superior, e designadamente para bolsas, é insuficiente para dar cumprimento ao que ficou legalmente estabelecido.
O esforço financeiro para o ensino técnico e profissional tem uma redução muito significativa. O Governo não cuida da preparação do futuro dos portugueses, contenta-se com a macroeconomia de importação. E na ausência de uma política para a educação, o Governo cede às «políticas» dos grupos de pressão.
O diálogo do Sr. Ministro da Educação atinge plenamente o seu objectivo, permitindo-lhe adiar a tomada de decisões; o diálogo vai servindo, também, para iludir pais, alunos e professores.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - Os jovens portugueses, esses vão perdendo o seu futuro.
O Governo noa quer, porque lhe falta a coragem, melhorar a qualidade do ensino, reforçar a formação dos professores e avaliar professores e alunos. Entre o que é mais difícil e o que é mais fácil, o Governo opta pelo mais fácil.
Para impedir que o Governo desperdice mais tempo, o Grupo Parlamentar do PSD vai apresentar uma proposta que comprometa o Governo a não adiar, por mais tempo, a reforma da educação.

Risos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Repetidas vezes temos alertado o Governo para a necessidade de se fazer um eficaz combate à droga. Passados dois anos, as estatísticas revelam que o consumo da droga alastra de forma alarmante e os dados mais recentes dizem que, em cada dia que passa, há mais 27 novos toxicodependentes.
Parte significativa do aumento do sentimento de insegurança dos cidadãos decorre de crimes relacionados com o tráfico e o consumo da droga.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Que «droga» de intervenção!...

O Orador: - Os números negros provam que o Governo está a descurar o combate à droga...
Ó Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, o senhor não teve graça, porque estou a falar daquele que, porventura, é o maior flagelo da nossa sociedade.

Aplausos do PSD.

Há descoordenação entre os ministérios e os organismos implicados no combate; há atrasos na aprovação de projectos; há listas de espera para o tratamento; há sentimentos de ansiedade e frustração naqueles que dedicadamente travam o combate contra a droga. Os centros de informação, acolhimento e atendimento ou não funcionam ou funcionam mal.
Quanto à prevenção primária, l997 foi um ano perdido. Durante l0 meses não foi gasto um só escudo dos 600 000 contos destinados à prevenção primária - os primeiros projectos de prevenção primária foram aprovados na segunda-feira passada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É grave!

O Orador: - Dependendo o combate à droga, em grande parte, do que for feito ao nível da prevenção primária, facilmente se conclui que o Governo não agiu como devia. A continuar-se assim, pode perder-se o combate.
Mais uma vez, apelamos ao Governo para a gravidade desta situação que se não compadece apenas com a

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realização de mais «dias D». Os «dias D» que não tenham como consequência a adopção de medidas adequadas e a consequente tomada de decisões firmes iludem o problema e só contribuem para o seu agravamento.
Para superar a fraqueza que o Governo vem revelando, o Grupo Parlamentar do PSD apresentará, em sede de discussão na especialidade, propostas que comprometam o Governo a fazer, em 1998, o que lamentavelmente não fez em dois anos perdidos - os anos de 1996 e l997.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Os dois primeiros anos do mandato do Governo foram dois anos perdidos. Não fora a boa herança económica e financeira que o PSD deixou e a boa conjuntura económica mundial, o país estaria hoje, certamente, mergulhado numa crise grave.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Era o chamado caos!...

O Orador: - A inacção do Governo não pode continuar por mais tempo, porque a conjuntura favorável não vai durar sempre. O Governo tem de aproveitar as condições excepcionais de que está a beneficiar para preparar o futuro de Portugal.
Em nome do interesse dos portugueses, o PSD não desistirá de incitar o Governo a não perder mais tempo. O PSD não desistirá de incitar o Governo a governar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Nelson Baltazar, Fernando de Sousa e José Niza.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Baltazar.

O Sr. Nelson Baltazar (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vieira de Castro, gostaria de fazer-lhe algumas perguntas relativas à estratégia que deve ser seguida em matéria de saúde, para conhecermos melhor quem somos, o que somos, quem servimos e o que temos ao nível do Serviço Nacional de Saúde.
Desde logo, gostaria de saber se concorda ou não comigo que é necessário racionalizar o sistema e, nesse sentido, há muito tempo que defendemos a necessidade de um cartão de utente. Esta é, aliás, uma medida que está a ser implementada pelo Governo no terreno e terá a sua cobertura nacional até finais de l998. Esta é, pois, uma forma de racionalizar o sistema.
Por outro lado, este Governo está a incrementar a informatização dos sistemas de saúde e a dar passos no avanço das técnicas de informação, concretamente de informação médica à distância, como é o caso da telemedicina. Isto era algo que todos queríamos e está a ser concretizado pelo Governo.
Também no final deste mês, a carta de equipamentos de saúde vai permitir-nos conhecer tudo o que temos, em termos de instalações de saúde, para podermos racionalizar. Esta é, pois, uma das palavras-chave: racionalizar.
O Sr. Deputado falou ainda em coragem. Ora, este Governo tem tido a coragem de valorizar as administrações regionais de saúde, implementando valores e verbas específicas, abrindo caminho à descentralização e tendo em conta uma perspectiva fundamental, que é a função de agência das administrações regionais de saúde. Para o fazer, é preciso coragem: não se fez antes, faz-se agora!
É preciso coragem para incorporar os grupos de diagnóstico homogéneo como uma parte da previsão orçamental das unidades de saúde, de forma a premiar actividades ajustadas, desde que elas sejam positivas e os GDH assim o demonstrem, é preciso coragem para financiar projectos específicos das unidades de saúde, permitindo e incentivando a contratualização dos respectivos orçamentos destas unidades de saúde.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E, para além de coragem, ainda é preciso apostar. Apostar não tanto no risco mas, sim, em soluções políticas válidas, como é o caso, por exemplo, da aposta na qualidade. É isso que se tem feito e o que vai fazer-se: através do funcionamento dos institutos da qualidade podemos fomentar e medir a qualidade do Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Há que apostar, igualmente, na diversificação dos horários de funcionamento dos centros de saúde e dos hospitais, de forma a aproximar o Serviço Nacional de Saúde dos utentes e dos cidadãos. Isto significa acessibilidade.
Deve ainda fazer-se uma aposta na prevenção, através da expansão da rede de assistência a toxicodependentes, de mais e melhores condições de atendimento a grávidas toxicodependentes. do reforço da prevenção e vigilância da transmissão do HIV e da melhoria dos cuidados de assistência médica e social aos infectados.
Coragem, apostas e racionalização do Sistema Nacional de Saúde é aquilo que este Governo tem feito. Concorda ou não comigo nesta apreciação, Sr. Deputado Vieira de Castro?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.

O Sr. Fernando de Sousa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vieira de Castro, começaria por dizer-lhe que uma coisa é falar bem e pausadamente, outra coisa é falar certo. V. Ex.ª falou bem e pausadamente, mas não falou certo: disse generalidades, e destas rapidamente passou ao erro, para não dizer às banalidades.
V. Ex.ª referiu que estamos a governar mal na área da educação e que este, que é reconhecidamente o melhor orçamento que algum dia a educação teve em Portugal, é um mau orçamento. Ora, gostaria que V. Ex.ª nos dissesse, tendo em conta os últimos l0 anos, qual foi o ministro que governou melhor do que o actual Ministro da Educação...

Vozes do PS: - E bem verdade!

O Orador: -... e qual foi o melhor orçamento que tivemos no período de l0 anos em que o PSD esteve no Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!

Orador: - O Sr. Deputado referiu-se a dois ou três aspectos concretos, em relação aos quais gostava de

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esclarecer o seguinte: em primeiro lugar, o ensino pré-escolar tem sido uma aposta deste Governo e, tal como o Sr. Ministro da Educação disse, vai crescer mais de 100% no próximo ano. Como sabe, esta é uma prioridade deste Governo e, pela primeira vez, em ordem a aproximarmo-nos dos indicadores europeus, está a ser feito um grande esforço para que as crianças entre os três e os cinco anos tenham, efectivamente, acesso ao ensino pré-escolar.
Ora, pergunto ao Sr. Deputado Vieira de Castro o que foi feito, a nível do ensino pré-escolar, durante os l0 anos de Governo do PSD.

Vozes do PS: - Nada!

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Os primeiros 50%!

O Orador: - Não, Sr. Deputado, se tivermos presente as verbas gastas pelo Governo do PSD no ensino pré-escolar, podemos dizer que elas aumentaram mais de l300%! Aliás, os senhores nem sequer quiseram reconhecer o ensino pré-escolar como prioritário e importante a nível da educação.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado Vieira de Castro fala em polémica no ensino superior. Ainda bem que existe alguma polémica no ensino superior e não uma «guerra», Sr. Deputado! É que os senhores, durante 10 anos, viveram em «guerra» com as associações e o ensino superior.

Vozes do PS: - Claro!

O Orador: - Nós teremos, eventualmente, que travar algum diálogo para fazer face à polémica, mas de certeza que não temos as academias e as associações de estudantes, todas elas, contra este Governo, ao contrário do que se passou com o Governo do PSD nos últimos anos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, o Sr. Deputado referiu-se à acção social escolar, argumentando que esta cresce pouco. De facto, a acção social escolar cresce pouco, mas o suficiente para evitar que qualquer aluno que não tenha possibilidades económicas não possa, efectivamente, frequentar o ensino superior.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Vamos ver!...

O Orador: - Estamos certos e seguros de que, por razões de natureza económica, ninguém ficará excluído do ensino superior.

O Sr. José Calçada (PCP): - Essa é boa!...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Nós escrevemos isso na lei!

O Orador: - E cresce pouco!
Aliás, pela primeira vez, desde há dois anos, a acção social escolar não só cobre os alunos do ensino superior público como os do ensino superior privado, só que os senhores esqueceram esse aspecto...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sabe quanto é que cresce em 1998? 50000 contos!

O Orador:- Ou seja, permitiram que dezenas de escolas do ensino superior privado abrissem as suas portas por todo o país, mas esqueceram sempre os alunos. Porque será, Sr. Deputado Vieira de Castro?!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Niza.

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente. Sr. Deputado Vieira de Castro, estava na expectativa de que a sua intervenção tratasse a matéria da segurança social, porque foi essa a sua experiência anterior e, realmente, em relação às matérias de que falou - saúde, educação e droga - revelou um razoável desconhecimento, senão mais qualquer coisa...
Acresce que sempre que o PSD fala de droga produz-se o efeito de boomerang: os senhores querem servir-se de uma arma de arremesso contra o Governo. mas ela volta a cair-lhes em cima! E vou explicar-lhe porquê.
De facto, foi pena que o Sr. Deputado Vieira de Castro não estivesse presente nas duas reuniões que ocorreram, há dias, nesta Assembleia, com a presença do Ministro da tutela, Dr. Jorge Coelho, e do Presidente do SPTT, porque os Deputados do PSD que assistiram a essas reuniões e tiveram oportunidade de participar, durante várias horas, nessa discussão reagiram de maneira perfeitamente compreensível e completamente diferente da sua, já que perceberam, a partir das informações prestadas, como é que tudo se estava a processar e nada tiveram a dizer contra. O mesmo se passou com os Deputados do PCP e do PP.
Portanto, o Sr. Deputado Vieira de Castro veio aqui falar com bastante desconhecimento de causa e foi pena que não se tivesse informado junto dos seus colegas de bancada.
Passando a questões mais concretas, e já que estamos aqui para discutir o Orçamento, gostava de dizer que o Orçamento não são números apenas: são números que têm a ver com a vida das pessoas.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em matéria de toxicodependência, queria dizer-lhe o seguinte: o vosso último Governo, em l995, atribuiu uma verba de 7 milhões de contos para o combate à droga, em 1996 essa verba atingiu os 9 milhões e em 1997 os l2 milhões. Agora estão previstos l5 milhões para l998, isto é, duplicámos a verba que os senhores previram para 1995.
É evidente que esta verba foi gasta para enfrentar o tal flagelo de que o Sr. Deputado falou, mas que só agora descobriram, porque tenho a impressão de que andaram distraídos durante l0 anos... E falo com conhecimento de causa, porque foi nessa área que trabalhei!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - De facto, os senhores andavam distraídos, muito distraídos, e agora aparecem aqui a fazer discursos perfeitamente incompreensíveis e surrealistas! Mais valia estarem calados. porque teriam mais razão.
Sr. Deputado, aproveito para explicar-lhe que esses milhões de contos que foram orçamentados para os últimos anos e para l998 contribuíram, designadamente, para a criação de uma rede nacional de centros de atendimento aos toxicodependentes. É que os senhores esqueceram-se do interior, tal como se estão a esquecer agora em matéria

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de regionalização, nomeadamente de Bragança, Vila Real, Castelo Branco. Portalegre, Beja, Évora e Algarve.
Hoje, é aquela senhora, a Ministra da Saúde, aqui presente, a responsável pelo tratamento dos toxicodependentes que os senhores deixaram pelo país, porque os toxicodependentes - esta é uma informação técnica que lhe forneço - não nasceram no dia l de Outubro de 1995! É que, infelizmente, as coisas são o que são e a ciência é o que é: um toxicodependente que começa a consumir e se torna dependente só aparece nas consultas - estes são estudos do Ministério da Saúde - alguns anos depois.
Portanto, estes toxicodependentes que agora estão a aparecer já o eram, na sua maioria - e não falo em períodos de Governos nem de mandatos -, no final dos anos 80 e nos primeiros anos de 90, porque os toxicodependentes mais recentes ainda não começaram a aparecer nas consultas.
Por outro lado, a comunicação social agitou-se muito quando foram divulgados os números relativos à droga, uma vez que havia um aumento significativo de primeiras consultas. E evidente que assim é, porque na altura que este Governo começou a criar CAT em locais onde estes não existiam, como é o caso de Vila Real, Bragança, Portalegre, Beja, etc. zonas onde os senhores diziam que não valia a pena! as pessoas começaram a aparecer nas consultas.
Da mesma maneira, desapareceriam os doentes de Portugal se a Sr.ª Ministra da Saúde mandasse fechar os hospitais, ou seja, estatisticamente, os dentes desapareciam! Portanto, os senhores que falam tanto dos números, vejam se aprendem qualquer coisa com estas questões. De facto, quando se abre um serviço em Portalegre - os senhores nunca contribuíram para que esses toxicodependentes alentejanos fossem tratados -, é óbvio que eles aparecem, porque já existiam!
Podia estar aqui toda a noite a explicar ao Sr. Deputado Vieira de Castro aquilo que o Sr. Ministro já explicou em Comissão... Ao menos que os seus colegas de bancada lhe expliquem o que se passa neste domínio!
Por último, queria dizer à Sr.ª Ministra da Saúde que tem feito um excelente trabalho, em conjunto com os outros ministérios,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... mas esse trabalho está a ser desenvolvido a partir da tal «herança» - e eu não gosto de usar esta expressão...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que termine, porque, apesar de no painel dos tempos não estar a ser descontado o tempo que falou, a verdade é que já ultrapassou em muito os 3 minutos de que dispunha.

O Orador: - Mas penso que não os gastei mal. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Gastou, sim! Quer dizer, não gastou mal, mas o problema não é esse.

Risos.

Nenhum dos Srs. Deputados gasta mal o tempo, o Regimento é que não faz distinções dessa ordem.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, vou terminar, mas penso que a Assembleia da República também tem um papel pedagógico nestas matérias, até porque há pessoas que estão em casa a assistir a este debate pela Televisão e convém que elas saibam como as coisas são!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, normalmente as regras não se contornam com princípios de pedagogia.

O Orador:- Sr. Presidente, agradeço a sua condescendência.
Como dizia, e para terminar, a Sr.ª Ministra da Saúde tem neste momento, e desde há dois anos - seguramente, vai continuar a tê-la por mais tempo -, a responsabilidade de tratar toxicodependentes «herdados» de uma situação anterior.
Esperemos que, daqui a l0 anos, não haja um Deputado de um outro partido qualquer a dizer o mesmo que eu estou aqui a dizer. E nesse sentido que o Governo tem estado a trabalhar, e a fazer um excelente trabalho. Se quiserem informar-se melhor sobre esse trabalho, eu próprio prestarei os elementos oficiais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder aos três pedidos de esclarecimento, dispondo de 5 minutos para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Vieira de Castro.

O Sr. Vieira de Castro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nelson Baltazar, bem gostava de concordar com o Sr. Deputado. mas não posso.
O Partido Socialista está no Governo há dois anos...

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Felizmente!

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Há mais!

O Orador: -.. e é evidente que eu nunca diria que algumas medidas não foram tomadas. o meu problema é o resultado dessas medidas.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Isso é demagogia!

O Orador: - Se o Sr. Deputado Nelson Baltazar viesse aqui dizer que as urgências estão diferentes e a que as listas de espera estão mais curtas, diria que estava de acordo consigo, só que as urgências estão piores e as listas de espera estão mais compridas.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Isso é falso!

O Orador: - O Sr. Deputado João Carlos da Silva está a falar assim, porque não vai vê-las, eu falo assim, porque lá vou! Exactamente!
Sr. Deputado Fernando de Sousa, V. Ex.ª disse que para l998 vamos ter um maior orçamento. O problema não é o de ele ser o maior, o problema não é o de haver muito dinheiro, o problema é o de como se gasta esse dinheiro.

Vozes do PS: - Gasta-se bem!

O Orador: - Parece-me que no passado se gastava melhor, mas o Sr. Deputado, porventura, não está de acordo comigo o Sr. Deputado dir-me-á que não. Parece-me que agora há mais desperdícios...

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Ó Sr. Deputado, sobre o pré-escolar e sobre aquilo que fizemos ou não, mesmo que tivéssemos feito pouco, receio que os senhores ainda venham a fazer menos, a avaliar por o que foi a execução em l997.
Acerca da comparação dos nossos orçamentos com os orçamentos do Governo do partido de V. Ex.ª sempre lhe direi que os nossos se outro mérito não tiveram, tiveram, pelo menos, o de aumentar a escolaridade obrigatória para nove anos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - E a segurança social?...

O Orador: - Sr. Deputado José Niza. creia que não tenho muito jeito para aquilo a que o senhor chamou de «armas de arremesso» e seria incapaz de usar a droga como arma de arremesso. Queria ter concordado com o Sr. Deputado José Niza, se o Sr. Deputado dissesse que há sinais inequívocos da eficácia do combate à droga que vem sendo desenvolvido desde l996.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - E há! Há um grande progresso!

O Orador: - Mas, sabe, Sr. Deputado José Niza, para dor de todos nós, infelizmente, não é isso que está a acontecer, e o Sr. Deputado sabe-o bem V. Ex.ª referiu o reforço de meios, mas, infelizmente, aí, tenho de fazer um triste paralelo. Sabe com quê? Com o sentimento de insegurança dos cidadãos. Queiramos ou não, Sr. Deputado José Niza, há mais agentes das forças de segurança e há mais esquadras, mas há mais insegurança: há mais meios para combater a droga, mas a droga continua a aumentar. Gostaria de dizer consigo que esses meios estão a ser eficazes, mas, infelizmente, os números não consentem que o diga.

Aplausos do PSD.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não falou da segurança social!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro afirmou ontem, aqui, que este Orçamento merece a aprovação da Assembleia da República. E justificou a sua afirmação não apenas pelo enunciado das principais características da proposta orçamental - de todos conhecidas e por uma esmagadora maioria acolhidas -, mas também pela sua percepção de que a maioria esmagadora dos portugueses deseja que a estabilidade política prossiga serenamente.
Com efeito. é também sob este ângulo que deve ser feita esta discussão na Assembleia da República.
O País vive, inequivocamente, uma situação de estabilidade política, pelo menos naquilo que depende da acção governativa. Essa estabilidade tem de ser a regra até ao fim da legislatura, pois, para lá de um bem em si mesmo, é uma condição indispensável para sanear as finanças públicas, reforçar a coesão interna, aproximar os níveis de bem-estar dos portugueses da média europeia e modernizar a economia do País. E é claro que só um clima de estabilidade política, temperada pela existência de um Governo assente numa imensa minoria sujeito, contudo, ao controlo democrático e eficaz do Parlamento, da oposição e da opinião pública, é possível lançar, sustentadamente, as reformas estruturais indispensáveis à transposição do limiar do próximo milénio.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!

O Orador: - A aprovação do Orçamento é, portanto, na sua origem e também na sua essência, fundamentalmente, uma gestão de estabilidade política, e esta é a única situação que pode justificar a exigência de reformas estruturais consolidadas.

Vozes do PS: - Muito bem

O Orador: - Mas também é evidente que. pela sua própria natureza, a discussão da política orçamental no Parlamento depende da capacidade do Governo para perceber os limites das suas propostas e da oposição para aceitar uma certa co-responsabilização nessa política.
O Governo já aqui fez a sua parte, de forma exemplar: em primeiro lugar, apresentando uma boa, uma excelente proposta orçamental, em segundo lugar, anunciando, pela voz do Sr. Primeiro-Ministro, um espirito construtivo e de diálogo que, sen pôr em causa os, princípios essenciais, é susceptível de acomodar algumas das principais preocupações dos partidos da oposição.
Estão, pois, definidas regras claras e pontos de diálogo susceptíveis e necessários para que o Parlamento, aprovando o Orçamento do Estado para 1998, dê ao País um inequívoco sinal verde no sentido da necessária estabilidade política.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados. Este é um excelente Orçamento do Estado.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Verdadeiramente, ninguém foi capaz de, durante este debate, afirmar o contrário ou de pelo menos, rebater este juízo. E é um excelente Orçamento do Estado, porque constitui uma base sólida para o lançamento de uma política económica susceptível de conduzir o País aos níveis de bem-estar e de progresso que merece.
Não estamos, apenas e exclusivamente, perante uma proposta de política com o objectivo único de cumprir os critérios de convergência nacional, assegurando, assim, as condições mínimas de entrada na terceira fase da união económica e monetária.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!

O Orador: - É, pois, restritivo e limitador afirmar que este é exclusivamente um orçamento para o euro. E, realmente, um orçamento para o progresso, para o crescimento económico, para a equidade fiscal e para o desenvolvimento, que incorpora, sem sacrifícios para os portugueses, os princípios da moderação dos preços e da disciplina orçamental, que são a base constitutiva da união económica e monetária.
A política orçamental proposta pelo Governo português não se limita a juntar-se, a somar-se ás políticas similares da Europa, bem pelo contrário, integra-se e, em alguns casos, conduz, pelo exemplo, essas mesmas políticas. É, pois, uma política orçamental credível e um excelente

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suporte para uma política económica e social que responde aos compromissos assumidos, quer com os agentes económicos nacionais, quer com os agentes económicos internacionais, quer com as instituições internacionais e, em particular, a Comissão europeia.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!

O Orador: - Com efeito, cumpre-se o programa de convergência nominal, mas acentuam-se os factores de atractividade do investimento estrangeiro, prosseguindo a redução da inflação, o saneamento das contas públicas e o aumento dos salários reais, e, sobretudo, caminha-se com segurança para a convergência real e para os níveis de bem-estar social prevalecentes na Europa comunitária.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo tem afirmado, praticamente desde o primeiro dia, na sequência, aliás, do que fora o programa eleitoral do Partido Socialista, que os impostos não aumentarão durante a legislatura e que a prioridade da reorientação da despesa pública deverá ser feita no sentido da intervenção social e, nomeadamente, no sentido da criação para o futuro de uma melhor competitividade da sociedade portuguesa.
Não me parece que a discussão deste ano seja susceptível de suportar a ideia recorrente da oposição de que o Governo aumentou os impostos. Tal, com efeito, não ocorreu, como, aliás, já não ocorrera nos pretéritos anos de 1997 e de l996. Estamos, assim, perante um período contínuo de três anos, durante o qual não se pediu nem se pede esse sacrifício aos portugueses. Curiosamente, o mesmo período e os mesmos três anos durante os quais se verificou um crescimento real da economia portuguesa superior à média de crescimento europeu.
Podemos ter a coragem, ou não a ter, de convalidar estas afirmações, mas não nos assiste, seguramente, o direito de mistificar estas realidades.
É claro que a receita fiscal tem aumentado, mas isso resulta, desde logo, do crescimento real da economia e da luta, progressivamente bem sucedida, contra a evasão e a fraude fiscais.
Exige-se uma reforma fiscal! Eu diria que, mais do que os partidos ou os governos, a exigem os cidadãos contribuintes, e exigem-na pelo menos há 20 anos. Mas o que é, afinal, uma reforma fiscal? É um conjunto de normas inscritas num orçamento, sob a forma de autorizações legislativas? Ou é, sobretudo, uma ideia motora de transformação da fiscalidade, no sentido de uma maior justiça e equidade, ela própria tributária, com certeza, do modelo conceptual de base, mas, de igual modo, de pequenas modificações do dia-a-dia na administração fiscal e no comportamento dos agentes?
Não haverá uma reforma fiscal eficaz sem um reforço da cidadania e uma acentuada credibilização do Estado, quer na forma e no equilíbrio com que capta as receitas, quer na opção que define e concretiza para a aplicação das despesas. Estas são condições que o actual Governo tem vindo a construir e a consolidar e, ao fazê-lo, está naturalmente a fazer a reforma fiscal que os cidadãos reclamam. Só não vê isto quem não quer ver e, como diz o povo, o pior cego é aquele que, efectivamente, não quer ver.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Orçamento foi apresentado como sendo um orçamento de crescimento, de emprego e de solidariedade. E são exactamente estes traços que permitem caracterizá-lo, muito sinteticamente, como um orçamento de consciência social.
Conforme tem sido aqui abundantemente referido, mais de 50% da despesa total do Estado - concretamente 54,6% em l998 - é afectada às chamadas funções sociais. Este indicador é tanto mais significativo, no contexto da percentagem da despesa pública e, portanto, na sua eficiência económica e social, quanto, em 1995, não ultrapassou os 48,7%.
E é, sobretudo, notável e merecedor de reconhecimento político, que já foi. aliás, aqui exprimido, em várias ocasiões, o facto de a despesa global com o sector da educação ter ultrapassado. finalmente, a barreira mítica dos 1000 milhões de contos. colocando o Ministério da Educação no topo da aplicação de recursos, excluindo, naturalmente, o Ministério das Finanças, valor que representa já mais de 5,5% do PIB nacional.
E, assim, cumprida, de forma inquestionável, uma das promessas do Governo. até porque a dotação atribuída ao sector pré-escolar, que constitui a base de todo o sistema, cresce, no próximo ano, mais de 50%.
Note-se que este esforço, prioridade ou opção, como se quiser, é obtido na sequência da aprovação do novo sistema de financiamento do ensino superior, esta, também, uma reforma estrutural prometida e cumprida.
A evolução no que diz respeito ao sector da saúde, bem como da segurança social, é de sentido semelhante e poderia suscitar comentários similares.
E por isso, sobretudo por isso, que pode afirmar-se, sem risco de desmentido, que esta proposta orçamental prepara o futuro sem comprometer o presente
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Parlamento já aceitou e a opinião pública já compreendeu a delicada situação em que se colocaram os Srs. Deputados do principal partido da oposição. Com efeito, nos últimos tempos nada tem corrido bem aos Srs. Deputados do PSD. Desejo-lhes, sinceramente, rápidas melhoras e, sobretudo, peço-lhes, como diria o outro, que não nos atrapalhem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Compreendemos a posição dos Srs. Deputados do PP e somos tolerantes com algumas das afirmações dos Srs. Deputados do PCP. Só que o mundo mudou e a economia portuguesa também. Não adianta protestar contra a perda de soberania, num mundo de dependências progressivamente mais estreitas, onde a autonomia própria cada vez mais se mede pelo compromisso com as soberanias alheias.
Não é possível manter uma sociedade competitiva com um peso excessivo e injustificado do Estado, limitando, dessa forma, a agilização da intervenção pública num sistema onde os mecanismos de regulação, de disciplina e de coesão são fundamentais e decisivos.
Não é possível governar sem um guia e uma matriz, um programa e uma acção, um compromisso e uma visão de futuro.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Também sob esta óptica, o Orçamento do Estado para l998 é exemplar, na medida em que dá seguimento e consolida, inequivocamente, o compromisso que o Governo da nova maioria assumiu com o eleitorado.
Se há lição que se pode retirar destas propostas é a de que, finalmente, os negócios públicos são olhados com seriedade, credibilidade e visão de futuro.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Uma visão de futuro que não esquece as preocupações com o crescimento, o ambiente, a coesão social e, sobretudo, o emprego, afirmando também, definitivamente, o nosso País no centro estratégico das decisões europeias, sem submissões nem sacrifícios escusados.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Correia de Jesus.

O Sr. Correia de Jesus (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Na memória justificativa da proposta de lei do Governo relativa à defesa nacional e às forças armadas, que veio a converter-se na Lei n.º 29/82, de 11 de Dezembro, reconhecia-se que é nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores que se situam importantes infra-estruturas de defesa, que nelas vigoram relevantes convenções internacionais de carácter militar, que é nas regiões autónomas que, em caso de guerra, se verificarão fortes incidências geo-estratégicas.
A propósito da importância geo-estratégica dos arquipélagos dos Açores e da Madeira, acrescentei, então, no respectivo debate, que a própria definição do papel da Nação portuguesa no mundo não pode fazer-se sem entrar em linha de conta com os Arquipélagos dos Açores e da Madeira, que o chamado «triângulo estratégico» Continente-Madeira-Açores surge como factor de identificação do nosso país, no contexto da defesa colectiva do Ocidente, sobretudo em face do ingresso da Espanha na OTAN,...

O Sr. Pedro Holstein Campilho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Isso está démodé!

O Orador: - ... e, ainda, que as posições estratégicas propiciadas pelas regiões autónomas conferem ao Estado português uma acrescida força negocial no plano internacional.
Por seu lado, no conceito estratégico de defesa nacional, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 9/94, de 4 de Fevereiro, refere-se expressamente que o quadro político da situação na região sul da bacia do Mediterrâneo continua marcado pela marginalização desta em relação ao sistema de relações económicas e internacionais. Potenciados pelo crescimento demográfico, detectam-se no Norte de África movimentos radicais, étnicos, religiosos e ideológicos, de cariz anti-ocidental e geradores de tensões sociais e políticas. Os reflexos desta situação podem estender-se ao continente europeu e, para oeste, até à área do Atlântico, especialmente à zona de aproximação do estreito de Gibraltar.

O Sr. Pedro Holstein Campilho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sobre o carácter e objectivos da defesa nacional, o conceito estratégico é lapidar ao afirmar que «a política de defesa nacional tem carácter permanente ( ... ); abrange todo o território nacional, nele compreendido o continente e os arquipélagos dos Açores e da Madeira; tem em conta todo o espaço estratégico de interesse nacional, em particular o espaço interterritorial; e visa garantir a salvaguarda dos interesses nacionais».
Sobre as orientações para as estratégias gerais, o referido conceito preconiza que o Estado constitua um sistema de forças que, de acordo com os recursos financeiros disponíveis e os objectivos estabelecidos, assegure as capacidades necessárias para realizar operações conjuntas de vigilância, controlo e defesa do território nacional, bem como de vigilância e controlo do espaço interterritorial e, ainda, para realizar missões de interesse público e colaborar na preservação e reposição das condições ambientais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas o conceito estratégico de defesa nacional vai mais longe na sua densificação, estabelecendo que cabe ao Estado assegurar que, na concretização do sistema de forças, se tenha em conta a necessidade de melhorar o valor e a mobilidade operacional dos meios existentes, por forma a satisfazer as necessidades impostas pela dispersão do território nacional e pela caracterização do espaço interterritorial, designadamente no âmbito do reforço e de intervenção rápida em qualquer área.
Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O quadro institucional e legal em que o Estado deve exercer a sua acção em matéria de defesa nacional nas regiões autónomas não poderia ser mais claro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E a desconformidade entre o que lá existe e aquilo que deveria existir também não poderia ser mais gritante.

O Sr. Pedro Holstein Campilho (PSD): - É uma miséria!

O Orador: - Em Julho passado, a Comissão Parlamentar de Defesa Nacional visitou oficialmente a Região Autónoma da Madeira. Ao longo dessa visita, os Deputados da Comissão de Defesa Nacional puderam constatar, com enorme agrado, o relacionamento exemplar que existe entre os órgãos de governo próprio e a instituição militar; o patriotismo, o aprumo e a competência com que os militares cumprem as suas missões e os seus deveres; e, sobretudo, a intensa e profícua cooperação que, nos vários domínios, se desenvolve entre as forças armadas e a sociedade em geral.

O Sr. Pedro Holstein Campilho (PSD): - É isso mesmo!

O Orador: - Verificámos que o Comando Operacional da Madeira realiza, de forma sustentada, um vasto conjunto de operações de cariz sócio-cultural em todos os sectores da vida colectiva da região.
No âmbito daquela visita, pela primeira vez, uma delegação da Assembleia da República se deslocou às Ilhas Selvagens - a parte mais meridional do nosso território. E aí nos deslumbrámos com a sua riqueza ornitológica, com a flora de espécies raríssimas, no que poderíamos considerar um verdadeiro regresso ao status natura..
Comprovámos, com os nossos próprios olhos, o que, décadas antes, escrevera o historiador madeirense Eduardo Pereira: «As Ilhas Selvagens são de uma riqueza espantosa

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em alguns ramos da História Natural, contendo exemplares próprios, que em mais parte alguma do globo foram ainda encontrados».
Sr.as e Srs. Deputados: Vimos tudo isso, mas pudemos observar também a face negativa da realidade.
Antes de mais, é evidente uma chocante desproporção na distribuição de pessoal e meios entre o continente e as regiões autónomas, que se traduz numa quase impossibilidade prática para o Estado português aí exercer a soberania, vigiar a sua imensa zona económica exclusiva e levar a cabo as acções de busca e salvamento que são da sua responsabilidade.
O Presidente da Comissão Parlamentar de Defesa Nacional, Sr. Deputado Eduardo Pereira, falando aos órgãos de comunicação social, após termos visitado as Ilhas Selvagens, resumiu a situação de forma eloquente: «Há um nítido défice de vigilância por parte das autoridades portuguesas competentes. Trata-se de um problema que deve ser resolvido com muita urgência pelo Governo da República». E acrescentou: «É inconcebível e inadmissível que o Arquipélago da Madeira disponha. apenas, de um único meio naval para vigiar quatro conjuntos de ilhas e uma tremenda área oceânica».
Ao fazer estas declarações, o Sr. Presidente da Comissão Parlamentar de Defesa Nacional, interpretou o sentimento unânime de todos os Deputados que visitaram a Região Autónoma da Madeira, oriundos, aliás, de todos os grupos parlamentares.
À falta de meios marítimos junta-se, inevitavelmente, a falta de meios aéreos, tão essenciais como aqueles.
Também é manifesta a falta de recursos financeiros com que se debatem as estruturas militares na região. O mais importante aquartelamento existente na Madeira, o Regimento de Guarnição n.º 3, que, além das suas missões específicas, constitui o principal suporte da acção sócio-cultural das forças armadas na região, recebe anualmente, da exígua dotação do orçamento de defesa destinada à Zona Militar da Madeira, uma verba que, pasme-se!, anda à volta dos 40 000 contos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O assunto que trago à vossa consideração, em sede de debate na generalidade das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1998, é muito sério. Tem a ver com questões essenciais da nossa identidade geográfica, cultural, estratégica e económica.
Neste contexto, e tendo também em conta as dúvidas que ainda subsistem no plano das relações bilaterais entre Portugal e Espanha acerca da delimitação das respectivas zonas económicas exclusivas na estreita nesga de mar que separa as Ilhas Selvagens das Ilhas Canárias; tendo em conta que a bolha das canárias, com 62 milhas marítimas de extensão, abrange as Ilhas Selvagens, colocando-as e ao mar circundante, no quadro da OTAN, sob o comando sub-regional de Madrid; tendo em conta que, por negociação bilateral, as operações de busca e salvamento no mar das Selvagens podem ser levadas a cabo por unidades da força aérea e naval espanhola -, tendo em conta que a instalação do SICCAP - Sistema Integrado de Comando e Controlo Aéreo de Portugal - ainda não está concretizada nas regiões autónomas; tendo, sobretudo, em conta que o Governo, no capítulo das Grandes Opções do Plano para l998, dedicado à defesa nacional, não se faz eco de nenhuma destas preocupações; tendo em conta tudo isto, é legítimo e necessário dizer ao Sr. Primeiro-Ministro, aos Srs. Membros do Governo e aos Srs. Deputados que Portugal não pode reduzir a sua presença militar nas regiões autónomas, como lamentavelmente tem acontecido nos últimos dois anos, antes terá de reforçar essa presença, assumindo, de vez, as suas responsabilidades históricas e actuais no Atlântico.

Aplausos do PSD.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Essa intervenção era para este debate?!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro. Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Permitam-me fazer uma breve referência introdutória, em comentário, a uma parte da intervenção de ontem da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite naquilo que se refere à questão do combate à fraude fiscal e alargamento da base tributável.
E poderei começar este comentário fazendo um pouco de história: o Governo do PSD do início dos anos 90, de que a Sr.ª Deputada fez parte com responsabilidades específicas nesta área, foi o responsável pela colocação da administração fiscal em perfeito estado de impotência no que respeita à fiscalização tributária.
É verdade que o investimento em informática, em acções inspectivas e em formação profissional foi completamente abandonado e paralisado por ordem do PSD.
Em l990, a DGCI tinha organizado 1161 acções de formação com mais de 20 000 participantes, mas em l993 a atrofia era tal que só se realizaram 81 acções de formação a que apenas tiveram acesso cerca de l000 formandos.
As acções de inspecção foram reduzidas entre 1992 e l 994 para cerca de metade (de 320 000 para l 80 000). O investimento em informática tributária, que, em 1993, era da ridícula quantia de 922 000 contos (atendendo à dimensão das necessidades), foi ainda mais reduzido em 1994 e l995 para cerca de 213 daquele valor, ou seja, cerca de 600 000 contos.
Isto foi tão grave que a Comissão para o Desenvolvimento da Reforma Fiscal, em relatório solicitado pelo Governo do PSD e coordenada pelo Professor Silva Lopes, escreveu: «É a falta de meios materiais com que assim se lutou, aliada à insuficiência de recursos humanos que tem explicado a insuficiente cobertura informática das necessidades básicas da DGCI. A política de investimentos na informática tributária, além de dever ser mais ambiciosa do que até l995, deve também ser mais clara e mais estável».
Foi isto que esta prestigiada Comissão concluiu na apreciação que fez ao trabalho de VV. Ex.as, Srs. Deputados do PSD.
E vem agora, com grande descaramento político, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite proclamar, candidamente, que o combate à fraude e o alargamento da base tributária se fazem, sobretudo, através do investimento em informática, na formação profissional dos técnicos e na realização de acções de inspecção.
É caso para lembrar o ditado «Bem prega Frei Tomás! Faz o que ele diz, não faças o que ele faz».

A Sr.ª Rosa Albernaz (PS): - Muito bem!

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O Orador: - Ou, então, com ainda maior sabedoria popular, poder-se-ia criar outro dito popular: «Ouve a Manuela, mas não olhes para a obra dela!».

Aplausos e risos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Governo não seguiu o exemplo da obra do Governo anterior.
Tem-se preocupado com a eficácia da administração fiscal, com o estabelecimento de uma luta sem tréguas contra a evasão fiscal e tem tomado medidas adequadas, nomeadamente: com o reforço das acções de formação e da motivação aos quadros da administração tributária: com o reforço do investimento e racionalização da informática tributária, com a criação de uma Direcção-Geral de Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros, com a criação de uma Unidade de Coordenação da Luta Contra a Fraude Fiscal e Aduaneira.
Isto sim, Srs. Deputados, são medidas eficazes, de boa gestão, de aposta na criação de bases sólidas para funcionamento futuro eficiente da administração fiscal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este Governo deparou com uma situação caótica. Os serviços estavam numa situação caótica! A máquina fiscal estava «ligada à máquina» - agonizante.

Risos do PS.

Em dois Orçamentos do Estado, apresentados por este Governo, os ganhos de eficácia da máquina tributária permitiram resultados bem acima dos 200 milhões de contos, que foram canalizados para a melhoria do rendimento disponível das famílias e para medidas com efeitos positivos no crescimento económico.
Hoje a vitalidade que a máquina fiscal começa a evidenciar-se e as boas medidas tomadas pelo Governo do PS permitiram ao Sr. Primeiro-Ministro vir anunciar ao Parlamento o reforço das medidas inspectivas e do fiscalização em sede de IVA e de IRS, o que permite dinamizar operações credíveis de combate à fraude e abandonar as opções do regime forfetário do IVA e dos pagamentos por conta do IRS (na linguagem vulgar e demagógica dos senhores do PSD - as colectas mínimas do IVA e do IRS), mantendo a intenção de instituir os pagamentos por conta do IRC compensados com uma redução da taxa deste imposto.
Espera-se agora que o PSD, que foi o responsável pela paralisação da máquina fiscal, que nada tem feito para apoiar as medidas de moralização, de justiça e de reforma fiscal que este Governo firmemente pretende concretizar, venha apresentar as suas propostas e as suas alternativas. Que venha de boa fé, que abandone a sua postura destrutiva, de dizer «não» a tudo, sem apresentar quaisquer alternativas, e sobretudo, abandone a demagogia que revelou até hoje e passe a colaborar activamente na construção de uma reforma fiscal, que exige ponderação, técnica aplicada, mas sobretudo, uma forte legitimação política e social. Condição sine qua non: a consensualização das medidas considerando-se que isto é uma questão de Estado e de interesse nacional.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Estamos perante questões de Estado, Srs. Deputados, e nesta matéria, à boa fé do Governo só poderá corresponder a boa fé e o espírito construtivo da oposição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É também por isto que este Orçamento do Estado é assumidamente parco em medidas de carácter fiscal, pois a proposta de lei cinge-se ao estritamente necessário para a execução do Orçamento e para a introdução de apenas alguns ajustamentos de correcção pontual de escalões e alguns sinais no sentido do desagravamento fiscal das famílias de mais baixos rendimentos, alguns incentivos sectoriais e parcelares, a par de algumas medidas que podem, desde já ser indiciadas para a prossecução de trabalhos mais urgentes em consonância com as orientações programáticas da resolução sobre a reforma fiscal, tomada pelo Governo e que está também ela em análise e discussão pública, nomeadamente nesta Câmara.
Cabe, então, aqui um apelo à cooperação da oposição com o Governo neste desígnio de interesse nacional, que é o da realização de uma reforma fiscal, de modo consolidado e política e socialmente legitimado.
As linhas programáticas dessa reforma foram já definidas pelo Governo na resolução do Conselho de Ministros do Julho deste ano, no sentido de promover uma maior justiça social, através de medidas destinadas às famílias, aos consumidores, aos trabalhadores e aos pensionistas, à dinamização da economia, prosseguindo uma política de alargamento das bases de tributação e reforçando a luta contra a evasão e a fraude.
Algumas medidas já foram tomadas ou encontram-se em curso: a criação de um carburante colorido para a actividade agrícola, com a penalização do seu uso indevido, o início do controlo dos entrepostos fiscais; a já citada recente criação da Unidade de Coordenação da Luta contra a Fraude Fiscal e Aduaneira.
Outras medidas estão em adiantado estado de preparação, no sentido da protecção aos contribuintes: a lei geral tributária: a nomeação para breve, do defensor do contribuinte.
O debate sobre a reforma fiscal e sobre o levantamento do estado fiscal da nação levaram, para além do reforço da participação do CES em matéria fiscal, à criação do Conselho Nacional de Fiscalidade, a quem competirá elaborar, entre outras coisas, um relatório anual sobre a situação fiscal e parafiscal em Portugal, nomeadamente dando a conhecer a estrutura e evolução do nível de fiscalidade, a distribuição da carga tributária e as suas implicações económicas e o funcionamento da administração e da justiça fiscais.
Quanta diferença, Srs. Deputados, se verifica entre os métodos, as atitudes e o empenhamento deste Governo em comparação com aquilo a que mal nos habituámos ao longo de muitos anos!..

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ao laxismo, à falta de rigor, substitui-se a consensualidade, a discussão, a vontade, a capacidade técnica e a credibilidade para implementar as medidas que são necessárias.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os anos de 1998 e 1999 serão decisivos para a concretização da

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reestruturação do sistema fiscal nas suas vertentes legislativa. para o que esta Câmara será activamente chamada, informática e administrativa.
Os seus objectivos serão: mais justiça, garantindo o cumprimento dos deveres fiscais por todos os cidadãos para que todos possam pagar menos, pondo a administração fiscal ao serviço dos contribuintes, garantindo os seus direitos e comodidades - coisa que nunca tinha sido pensada em matéria fiscal - e observando o interesse público, garantindo simplicidade e eficiência nas cobranças e na luta contra a evasão e fraude e promovendo o desenvolvimento económico.
Para isso teremos, em breve. que estudar, consensualizar e debater um código do imposto automóvel, um código do imposto sobre o álcool e bebidas alcoólicas e uma lei geral tributária.
Também teremos que debater e aprovar um novo Código do Imposto do Selo, que substitua o velhíssimo Regulamento e Tabela, de modo a que se transforme num imposto moderno, que tribute sem atrapalhar os modernos actos económicos e novas expressões de riqueza que escapam às arcaicas formas de tributação.
E também imperioso reformar o Estatuto dos Benefícios Fiscais, com grande esforço disciplinador, redefinindo os objectivos económicos e sociais dos benefícios, garantindo a sua transparência, equidade, proporcional idade, adequação aos fins e, por definição a sua temporalidade.
Ponto extremamente importante e fonte das maiores desigualdades que actualmente grassam no nosso sistema fiscal é o estado da actual forma de tributação do património e do rendimento derivado do património imobiliário.
A revisão dos impostos nesta área, sem perder de vista os objectivos da extinção da Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações (fontes de injustiça fiscal diária), devem,! também contemplar uma revisão global e reformulação da Contribuição Autárquica, também ela tendo acabado por se revelar factor de ineficiência e de injustiça.
Indispensável à prossecução de todos estes objectivos e a acompanhar a sua concretização deverá estar a reforma de dois dos pilares da credibilidade e da eficiência do sistema fiscal: a reforma da justiça processual fiscal e dos tribunais fiscais e aduaneiros e a reforma da administração tributária.
A primeira, enquanto factor indispensável à garantia de um subsistema fiscal subordinado às regras de um Estado de direito democrático, onde os tribunais funcionem e julguem com celeridade e credibilidade, é um factor indispensável para a protecção dos cidadãos nos seus conflitos com a administração fiscal, como último garante do respeito pelo princípio constitucional da legalidade dos impostos e da não arbitrariedade da Administração Pública perante o cidadão.
A segunda, a reforma da administração tributária, devendo ser alvo de esforços extraordinários no sentido da sua modernização. Um computador ou um fax têm que deixar de ser olhados nas repartições como verdadeiros bichos raros e nunca vistos... A informatização, a alteração dos métodos de gestão, a reformulação e recuperação da celeridade das execuções fiscais - coisa que tinha sido abandonada -, o reforço e inovação na fiscalização e na auditoria interna, com rejuvenescimento dos quadros e a formação profissional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: São estes os grandes desígnios da reforma que o PSD não fez! Tudo isto ficou esquecido durante mais de uma década. Porquê, Srs. Deputados? Porque era difícil! Era difícil obter consensos, era difícil descer do escadote da arrogância e da torre de marfim em que estavam instalados.

Aplausos do PS.

Agora, sim, é possível fazer isto com diálogo e com legitimação política e social. Esperemos que aqueles que não fizeram não queiram agora impedir aquilo que se impõe e que, pelo contrário, eles e todos os outros colaborem e embarquem no comboio da renovação que já estando em marcha, não vai parar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Carlos da Silva, acho que o senhor teve imensa piada, mas acho também que não tem a mínima razão. Mas piada teve!

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Os factos são os factos!

A Oradora: - Pois é, Sr. Deputado, pelos factos eu penso que o senhor teve graça, a despeito de estar em depressão. E eu acho que está em depressão, porque nos últimos tempos, especialmente nestes debates orçamentais, o Sr. Deputado foi realmente um dos grandes defensores do combate à evasão e à fraude fiscal e a única coisa que o vi sempre defender como uma grande arma para as combater foi a colecta mínima.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Não é assim que se designa!

A Oradora: - Mas foi assim que foi baptizada. Tecnicamente, é possível que não seja bem assim, mas nós não estamos em nenhuma aula de Finanças!

O Sr. Primeiro-Ministro: - Grandes progressos!

A Oradora: - Sr. Deputado João Carlos da Silva, lembro-me que no ano passado, aquando da discussão do Orçamento do Estado, a propósito da colecta mínima. me perguntou. «Mas a Sr.ª Deputada vai pagar mais impostos?». E isto porque eu dizia que aquela introdução era um aumento de impostos e o senhor dizia que não, que era um instrumento de combate à evasão e à fraude fiscal. Imagine o senhor que, ontem, o Sr. Primeiro Ministro me deu razão. Portanto, evidentemente, que eu não deixo de estar...

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Deu?!...

O Sr. Primeiro-Ministro: - Não dei nada!

A Oradora: - Ó Sr. Primeiro-Ministro, evidentemente que considero que não me deu razão, até porque não tinha nada que dar...

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Vozes do PS: - Ah!..

A Oradora: - É uma força de expressão. Mas o que o Sr. Primeiro-Ministro disse veio ao encontro de uma realidade, porque eu não acredito, de forma alguma, que o Sr. Primeiro-Ministro tivesse tomado a decisão correcta que ontem tomou se estivesse tão convencido quanto o Sr. Deputado João Carlos da Silva de que estávamos perante um instrumento tão importante de combate à evasão e à fraude fiscal!...

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, o senhor só tomou essa medida - e bem! - porque estava convencido de que isso era um novo imposto, muito impróprio em altura de eleições. Eu, se estivesse no seu lugar, era isso que fazia!

Risos do PSD.

O Sr. Deputado disse que nós não fizemos nada que não tínhamos instrumentos para nada, que era um caos. O próprio Sr. Ministro das Finanças tem dito várias vezes que a administração fiscal está «ferida de morte», que a administração fiscal é um caos...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - E têm ambos razão!

Mas, Sr. Deputado João Carlos da Silva, estava a esquecer-me de lhe dizer que, talvez, as uniões de facto sejam um bom elemento a introduzir no vosso diploma!

Risos do PCP.

É que nas uniões de facto servem são só as mulheres legais mas também as outras!

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - As mulheres e as «outras»!?

A Oradora: - É um bom elemento a introduzir no vosso diploma!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr.ª Deputada, tem de concluir.

A Oradora: - Concluo já, Sr. Presidente, dizendo apenas ao Sr. Deputado João Carlos da Silva que, para além desta nossa colaboração de denúncia e de apoio a estas medidas, há uma coisa que eu nunca serei: assessora económica deste Governo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos da Silva.

A Oradora: - É exactamente por causa disso que não é possível aplicarem-se instrumentos, tais como a colecta mínima ou os pagamentos por antecipação. É exactamente por causa disso!
Um outro ponto, Sr. Deputado, é este: de pouco vale haver meios financeiros para o combate à fraude e à evasão fiscal se eles não forem utilizados. E aquilo que eu ontem disse foi que, em l996 e em l997, as orçamentações com vista a esse objectivo não tinham sido utilizadas. Eu não utilizei, mas agora estão lá instrumentos e não são utilizados. Portanto, a diferença não é muita! Direi que o meu orçamento era mais transparente, porque não gastava e não estava lá. Mas estar lá para não gastar não vale a pena, Sr. Deputado João Carlos da Silva.
Disse ainda o Sr. Deputado que esperava a nossa colaboração para o combate à evasão e à fraude fiscal. Ó Sr. Deputado, nós já demos um bom contributo para o combate à evasão e fraude fiscal quando denunciámos, por exemplo, a questão da fuga aos impostos pelo Sr. Presidente da Câmara Municipal de Cascais.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Outra vez?!

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - As vezes que forem necessárias!

A Oradora: - Considero que esse é um bom exemplo de que estamos a colaborar, e os bons exemplos devem ser seguidos. Mas daí eu retiro uma boa lição, Sr. Deputado João Carlos da Silva: a de que, para o senhor e para as pessoas que silenciam este problema, só não podem fugir aos impostos os solteiros e os viúvos. Esses é que ficam sem qualquer espécie de defesa, porque não têm mulher para os defender!

Risos do PCP.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, já tive, por parte dos meus colegas, a sugestão de passarmos a reunir a Comissão de Economia, Finanças e Plano a esta hora, porque a esta hora V. Ex.ª tem muito mais graça.
De facto, não sei se foi por causa do ditado popular que referi ou se foi por qualquer outra coisa, mas V. Ex.ª está mesmo bem disposta.
Mas, Sr.ª Deputada, quem não estavam bem dispostos eram os contribuintes e os trabalhadores da administração fiscal no tempo em que V. Ex.ª encarou estes serviços como um centro de custos e não como um centro de produção de receitas, dentro da justiça, ao serviço do Estado.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Bem observado!

O Orador: - Aliás, não queria entrar neste tipo de considerações pessoais, mas é conhecido que naquela altura até as ajudas de custo para a deslocação de técnicos de inspecção, tais como os passes de autocarros, foram retiradas aos funcionários.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Os passes de autocarros?!...

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Iam de táxi!

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Ou de bicicleta!

O Orador: - Sr. Deputada, os funcionários da fiscalização não podiam sair dos serviços para fiscalizarem os contribuintes. Isso é verdade, Sr.ª Deputada, e o ditado popular aplica-se perfeitamente.

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Mas, quanto à evasão fiscal, a Sr.ª Deputada tem boa memória e recordar-se-á, com certeza, que eu defendo a colecta mínima na sua terminologia errada. Defendo esse método quando temos uma administração fiscal que não funciona, quando temos uma legislação fiscal que está, inclusivamente, desajustada do perfil psicológico do nosso contribuinte, um sistema fiscal que se baseia no princípio da declaração e em que cada qual paga o que quer, uma administração fiscal que está constrangida pelo sigilo bancário, que está constrangida pelo ónus da prova, que está constrangida por um conjunto de dificuldades legais que resultam da protecção devida ao contribuinte e que fica sem quaisquer meios se não tiver eficácia, se não tiver formação profissional, informática. Sr.ª Deputada, ter uma administração fiscal sem meios informáticos e sem formação é a mesma coisa que querer ir disputar o Rally de Portugal num carro sem motor, porque o motor da administração fiscal é o sistema de informação.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - V. Ex.ª acusou-nos de não termos gasto o dinheiro. Sr. Deputada, o dinheiro foi gasto. Só no projecto da rede informática tributária, 92% da verba orçamentada para este ano já está executada. As repartições de finanças, que VV. Ex.ªs transformaram em meras caixas de correio, voltaram a ter poder, conhecem melhor os contribuintes, conseguem fazer uma gestão rigorosa da carteira fiscal do contribuinte e onde VV. Ex.ªs deixaram 30 repartições com computadores temos hoje mais de 200 repartições informatizadas e ligadas a sistemas centrais.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ainda bem!

O Orador: - Acha bem, não acha, Sr. Deputado?
Portanto, o ditado popular está correcto.
Sr.ª Deputada, o caos existia de facto. Quando o Sr. Ministro das Finanças disse que a máquina fiscal «estava ligada a máquina» disse muito bem e o esforço deste Governo foi indispensável para que, hoje, a colecta mínima do IVA e do IRS - para a senhora compreender o que estou a dizer - pudesse ser substituída por um reforço de inspecção no IVA e no IRS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É o menor esforço!

O Orador: - Mas, para além da colecta mínima, ainda há outros meios. Os métodos indiciários também são um meio de combate à fraude. É a mesma coisa com armas diferentes, como disse aqui o Sr. Deputado Francisco de Assis.
Portanto, Srs. Deputados, não estejam tristes com a evolução dos acontecimentos. VV. Ex.ªs entrem para dentro do «barco» que serão muito bem-vindos, porque, ao fim e ao cabo, até conseguem ter umas ideias.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira Ramos.

O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Dá-se como adquirido que este Orçamento do Estado e estas Grandes Opções do Plano são o prenúncio do euro já, a qualquer preço, em 1999. Por ser assim, aqueles que erigiram tal como um «desígnio nacional» o viabilizarão, aqueles que, como nós, entendem tal opção como precipitada, pouco avisada, com consequências ainda não totalmente esclarecidas, votarão contra.
A votação deste Orçamento não traduz uma posição a favor ou contra a participação de Portugal na União Europeia, representa, isso sim, uma posição acerca da forma de construção europeia.
Dito de outra forma, o Partido Popular defende a participação de Portugal na União Europeia e é contra a forma da construção que federaliza hoje economicamente, para federalizar amanhã politicamente. Não estamos - mas não nos preocuparia se estivéssemos - sós nessa ponderação. Governos e partidos políticos de Estados da União Europeia têm vindo a demonstrar reservas e posições semelhantes às nossas.
A nós sempre preocupou a consequência do cumprimento rígido de critérios impostos externamente no que se refere aos sectores produtivos nacionais e ao emprego, à primazia da convergência nominal perante a convergência real.
Sintoma de que as nossas reservas tinham razão de ser é uma mudança da linguagem do Governo e dos partidos do «Bloco Central», que falam como nunca em convergência real, em coesão social, com a hipocrisia de quem sabe que a degradação social nesta Europa assim construída irá agravar-se.
Na verdade, na altura em que estamos a discutir o orçamento da moeda única, assiste-se à abertura de duas discussões relevantes acerca do emprego: o Conselho Europeu Especial Sobre o Emprego e a Agenda 2000.
Dir-se-á que se trata mais de uma reabertura. Os federalistas sempre que dão um salto tentam sossegar os cidadãos, que se mantêm alheados desta Europa, com megaprogramas e com miríficas promessas de desenvolvimento do mercado de trabalho.
Em 1993, o Livro Branco de Delors almofadou previamente Maastricht e, hoje, o Conselho Europeu Especial e a Agenda 2000 tentam reduzir o impacto da terceira fase do SME.
A inovação entre estes dois documentos é nula e esperamos que nos resultados se consiga mais do que o nada que o Livro Branco trouxe na prática.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, consideramos fundamental para o reforço do coesão nacional e para acautelarmos internamente o nosso futuro, a 4.ª opção do Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, ou seja, «valorizar o território no contexto europeu por forma a superar os dualismo cidade/campo e centro/periferia». O desenvolvimento desta opção é, do nosso ponto de vista, determinante para criar um desenvolvimento sustentado, um correcto aproveitamento dos recursos humanos e a sua fixação em todo o território, assegurando um emprego qualificado. Por isso, como se recordarão, na sessão legislativa passada interpelámos o Governo sobre esta matéria com um agendamento potestativo.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É uma desilusão a diferença entre as palavras, as ideias, os projectos, com os quais estamos, na sua maioria, de acordo, com a prática, com as propostas concretas que o Governo nos apresenta aqui, hoje.
A publicação do Livro Branco sobre política portuária e a revolução anunciada no transporte ferroviário fez-nos esperar pelo surgir e concretizar de uma nova mentalidade

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e política nacional que se reflectisse na produção e na movimentação interna e externa dos vários modos de transporte, com a criação de interfaces e plataformas multimodais. Seriam espaços de actuação logística, de grupagem e encaminhamento. Serviriam como pólos envolventes de serviços e promoveriam o desenvolvimento sustentado, através da cumplicidade entre a indústria e os transportes. Permitiria a Portugal assumir-se como uma porta para a Europa. lutando pela posição que Espanha soube conquistar através dos portos de Cadiz e de Vigo.
Para tal era necessário tomarem-se opções claras, como a identificação de dois «portos secos», um no distrito de Aveiro, que servisse os portos de Aveiro, de Figueira da Foz, do Douro e de Leixões, e o outro a sul, que servisse
os portos de Setúbal, de Sines e de Lisboa.
Paralelamente, desejávamos ver traduzida, nos documentos em discussão. uma aposta clara no transporte ferroviário, na ligação de alta velocidade transeuropeia entre Lisboa e Madrid, ...

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, Peço-lhe que abrevie.

O Orador: - Termino de imediato, Sr. Presidente.
... ou, em alternativa, através da realização de um anel ferroviário Sevilha/Lisboa/Porto/Vigo.
Tal contribuiria para diminuir a nossa circunstância periférica, tal permitiria dar pistas de desenvolvimento a zonas mais desfavorecidas, tal permitiria retirar parte considerável das mercadorias das nossas estradas.
Ao vermos a programação financeira para os transportes ferroviários verificamos que só menos de um terço é destinado à rede ferroviária nacional geral.
Tememos que estes vários pólos de desenvolvimento, em vez de assumirem um papel de complementaridade nacional, articulada, continuem a envolver-se em estratégias de suicida competitividade.
Toda esta articulação, tendo em atenção o desenvolvimento integrado e o aproveitar de todas as sinergias, permitiria a Portugal recuperar a sua tradição de plataforma intercontinental. Tal só será conseguido se soubermos lutar e conseguir ligações transeuropeias dignas, que não se compadecem, por exemplo, com a sobrecarga do IP5, que tão recentemente tem sido alvo de atenção pelos piores motivos.
Ponto importante nesta estrutura de transportes é o novo aeroporto, cuja localização terá de ser encontrada. tendo em atenção os objectivos nacionais e o nosso posicionamento na Europa. Também acerca deste assunto nada de relevante foi dito.
Confessamos que, com a publicação do Livro Branco com o apontar de alterações na política ferroviária, acreditámos que tinha chegado uma era de modernidade no enfoque destas questões, na ligação entre a economia e os transportes, no encontrar de formas de ultrapassar o facto de sermos um país periférico no reforço da coesão nacional, na superação dos dualismo cidade/centro e centro/periferia.
Também, neste aspecto, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, este Orçamento do Estado para l998 foi para nós uma desilusão e uma oportunidade perdida.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, como não há mais inscrições, resta-me informar que a sessão de amanhã, com início às 10 horas, terá como ordem do dia a conclusão do debate conjunto, na generalidade, das propostas de lei n.º 146/VII Opções do Plano para l998 e l47/VII - Orçamento do Estado para 1998.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 55 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Albino Gonçalves da Costa.
António José Gavino Paixão.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Elisa Maria Ramos Damião.
Joaquim Moreira Raposo.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.

Partido Social Democrata (PSD):

Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Manuel Taveira da Silva.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto.
Fernando Santos Pereira.
Francisco Antunes da Silva.
João Álvaro Poças Santos.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José de Almeida Cesário.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Augusto Torres Boucinha.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.

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Partido Comunista Português (PCP):

Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Fernandes da Silva Braga.
Artur Clemente Gomes de Soma Lopes.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Fernando Garcia dos Santos.
João Rui Gaspar de Almeida.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.

Partido Social Democrata (PSD):

Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
Luís Filipe Menezes Lopes.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Armelim Santos Amaral.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

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