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Sexta-feira, 9 de Janeiro de 1998 I Série - Número 25

VII LEGISLATURA 3.A SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 8 DE JANEIRO DE 1998

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da respostas a alguns requerimentos.
Sob a forma de interpelação, o Sr. Deputado José Magalhães (PS) solicitou à Mesa que requeres-se informação completa e circunstanciada no Sr. Ministro da Justiça sobre situações semelhantes, ocorridas em anos anteriores, nos dois casos anómalos registados no processo de indultos do acro de 1997, lendo também intervindo os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Jorge Ferreira (CDS-PP) e Carlos Encarnado (PSD).
Procedeu-se ao debate de urgência, requerida pelo grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre o regime disciplinar para o ensino básico e secundário. Usaram da palavra, a diverso titulo, além do Sr. Ministro da Educação (Marçal Grilo), os Srs. Deputados Morria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Pedro Baptista e Manuel Alegre (PS), Castro de Almeida (PSD), Luísa Mesquita (PC P), Rui Namorado (PS) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).

Ordem do dia. - Foram apreciados, em conjunto, na generalidade, os projectos de lei n.os 379/VII - Lei das associações de deficientes (PCP), 436/VII - 436/VII - Associações de pessoas portadoras de deficiência (PSD), -437/VII - Observatório para a integração das pessoas portadoras de deficiência (PSD) e 43&Nll - Incentivos ao emprego domiciliário de trabalhadores portadores de deficiência (PSD), que foram aprovados. Usaram da palavra. a diverso título. os Srs. Deputados Bemardino Soares (PCP), Mirro Correia da Silva (CDS-PP), Maria Eduarda Azevedo (PSD), Elisa Damião (PS), Isabel Castro (Os Verdes) e Nuno Abecasis (CDS-PP).
Os projectas de deliberação n.os 15/VII - Debate parlamentar sobre o ambiente (Os Verdes) e 47/VII - Prorrogação do período de funcionamento da Comissão Eventual de Inquérito ao Aval do Estado à UGT (PAR) foram aprovados.
Foram também aprovadas, rui generalidade, das propostas de lei n.os 87/VII - Define o estatuto das organizações não governamentais de ambiente (revoga a Lei n.º 10/87, de 4 de Abril) e 114/VII - Aprova a estatuto das organizações não governamentais de cooperação para o desenvolvimento.
Finalmente, a Câmara aprovou ainda um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando um Deputado do PSD a depor em tribunal como testemunha.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto Berrardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Santos Mendonça Mendes.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
António Manuel Carmo Saleiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedo.
Augusto Carlos dos Santos Leite.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Pedro da Silva Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelino Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocla Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.

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António Soares Gomes.
Arménio dos Santos.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
José Mendes Bota.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular- (CDS-PP):

Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Comes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel .José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Galão Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Porrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viva de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista OS Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Deputado Independente:

José Mário de Lemos Damião.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, renovo os meus votos de um bom ano para todos, que ele vos traga só satisfações e alegrias.
O Sr. Secretário da Mesa vai dar conta das respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa, após o que passaremos ao debate de urgência previsto para hoje.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados o Governo respondeu aos requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados. No dia 6 de Janeiro de 1998: Ricardo Castanheira, na sessão de 15 de Julho: Bernardino Soares, na sessão de 24 de Setembro e 29 de Outubro: Mota Amaral, na sessão de 2 de Outubro; Cruz Oliveira, na sessão de 23 de Outubro.
No dia 7 de Janeiro de 1998: Heloísa Apolónia, na sessão de 3 de Setembro e no dia 28 de Outubro; Isabel Casino, Filomena Bordalo e Luísa Mesquita, no dia 30 de Setembro e nas sessões de 9 de Outubro e 27 de Novembro: Lemos Damião, no dia 7 de Outubro; José Calçada, na sessão de 15 de Outubro; José Cesário, na sessão de 22 de Outubro: Jorge Roque Cunha, no dia 27 de Outubro: Roleira Marinho e Manuel Moreira, na sessão de 30 de Outubro: António Rodrigues, na sessão de 20 de Novembro.

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O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente. a minha interpelação é no sentido de pedir à Mesa que proceda a urna diligência junto do Sr. Ministro da Justiça.
Como o Sr. Presidente saberá, ontem mesmo, no plenário da 1.ª Comissão, houve partidos da oposição que, a propósito dos dois casos anómalos registados no processo de indultos do ano de 1997, além de rasgarem as vestes, clamaram que era caso nunca visto e imputaram, aliás, de maneira desproporcionada e inadequada, ao Sr. Ministro da Justiça responsabilidades que não lhe podem ser assacadas. Seguramente, uma que, com grande destemor e falta de responsabilidade, a bancada do PSD, em especial, aqui sublinhou: a ideia de que era caso nunca isto. Não é assim! Acaba de ser divulgado por alguns órgãos de comunicação social, e agora mesmo confirmado pelo Gabinete do Sr. Ministro Justiça, que, pelo menos num caso, o caso do recluso Arcelino Pinto Ramos da Silva, cidadão estrangeiro condenado por tráfico de droga em penas de seis e três meses de prisão e expulsão de território nacional, houve um indulto em que também se verificou uma saída precária não contemplada com regresso e em que, tendo sido proposta a revogação do indulto, tal não aconteceu, apesar de proposto às entidades competentes.
Gostaria, pois, de solicitar a V. Ex.ª- e, por sua vez, à Mesa - que requeres-se informação completa e circunstanciada ao Sr. Ministro da Justiça sobre situações deste jaez ocorridas noutros momentos, porque a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias deve fazer o seu trabalho nesta matéria com todos os elementos da Mesa e sem que ninguém adopte, nesta matéria, uma atitude arrogante de atirar a primeira pedra.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não queremos isso! Queremos trabalho sério e responsável!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Embora o Sr. Deputado tivesse o direito de poder requerer pessoalmente a informação de que precisa, a Mesa vai encarregar-se de faze-lo.

O Sr. António Filipe (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado

O Sr. António Filipe(PCP): - Sr. Presidente, na sequência da interpelação feita pelo Sr. Deputado José Magalhães, quero não só dizer que consideramos importante que seja dada uma informação detalhada sobre o caso que agora é referido, mas também que o facto de lerem existido precedentes mais aconselharia que, neste ano, tivessem sido tomadas as medidas necessárias para que factos como esse não se repetissem.

Vozes do PCP e de alguns Deputados do PSD: Muito bem!

O Sr. ,Jorge Ferreira (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. .Jorge Ferreira (CDS-PP): - Sr. Presidente, ao abrigo da mesma figura regimental. se me permite, gostaria de dizer que, do ponto de vista da bancada do PP, parece de muito mau gosto tentar analisar este caso, que ontem foi amplamente debatido, seja no Plenário, seja na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantia, no pinguepongue dos casos passados e dos casos presentes.

O Sr. José Magalhães (PS): - É uma questão de verdade!

O Orador: - Pensamos que o importante é evitar casos fulcros.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Detestaríamos que esta polémica se transformasse em mais um ajuste de contas tão ao gosto do PS e do PSD, relativamente ao sistema, relativamente ao passado, relativamente às responsabilidades de ambos no mesmo tipo de conduta, na mesma irresponsabilidade política e na forma ligeira como tratam estas matérias.
Por isso, gostaríamos, Sr. Presidente - aliás, confiamos que isso será feito - que a Mesa irão se deixasse instrumentalizar no sentido de adulterar o verdadeiro debate e os valores que urge defender a propósito do caso que aqui, ontem, discutimos.
Mais: se o Partido Socialista achasse que era tão importante a averiguação dos casos passados, teria tido, ontem, várias oportunidades e momentos em que poderia ter solicitado ao Sr. Ministro da Justiça urna investigação desses casos para apurar se, no passado, tinha havido ou não caso destes.
Uma coisa não tem nada a ver com a outra e o passado não pode branquear a responsabilidade dos políticos que, hoje, têm a responsabilidade de evita que isto aconteça.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não é branquear. É uma questão de verdade!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa não se deixará instrumentalizar.
Vou dar, ainda, a palavra, uma vez que a pediu, ao Sr. Deputado Carlos Encarnação para intervir sobre o mesmo assunto.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, é só para dizer que o Sr. Deputado José Magalhães mais não fez do que documentar a sua distracção. Aliás, não quero entrar em competição com o Partido Socialista sobre esta matéria.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não tem é memória!

O Orador: - A nossa intervenção, ontem, em relação a esse caso foi uma intervenção muito séria, porque se tratava realmente de una matéria muito séria que abrangia as relações entre o Governo e o Sr. Presidente da República e mantemos tudo quanto dissemos. Não sabemos se o caso que agora foi trazido é exactamente igual ou não,

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mas ternos a grata surpresa de poder dizer que certamente não é igual.

O Sr. José Magalhães (PS): - É pior?

O Orador: - Ocaso de um homem, como ontem se verificou, que está foragido da prisão desde Outubros que, na altura em que são apreciados os indultos, não se sabe se está na prisão ou se está fora é de tal maneira caricato para o funcionamento do sistema que mereceu, e continua a merecer, o nosso reparo, assim como a responsabilidade da informação a prestar pelo Sr. Ministro da Justiça ao Sr. Presidente da República.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, repito, a Mesa vai pedir ao Sr. Ministro ela Justiça as informações que foram solicitadas.
Creio que já posso anunciar que temos a companhia agradável como sempre de um grupo de 8 alunos da Escola Secundária da Sities, um grupo de 74 alunos da Escola Secundária de Tondela e ura grupo de 50 alunos da Escola Secundária Camilo Castelo Branco de Vila Nova de Famalicão, para quem peço uma saudação.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente: - Vamos, agora, dar início ao debate de urgência, requerido pelo Partido Popular, sobre o regime disciplinar para o ensino básico e secundário.
Para introduzir o debate, tem a palavra a Sr. Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo. Sr.ªs e Sr s. Deputados: Se tivéssemos tempo para tratar o essencial, essencialmente este debate deveria começar por urna questão prévia, de antropologia política sobre a natureza do homem.
Não nos podendo permitir a esses luxos intelectuais, por razões de Regimento; gostaríamos, entretanto, de deixar dito, quanto à natureza humana, que, pessoalmente, não nos situando nos abismos pessimistas de um Maquiavel ou de um Hobbes que viram no homem um Caim em potência, ou um predador nato dos seus irmãos, tão pouco alinhamos com os entusiasmos rousseaunianos que em cada criatura vêm um «bom selvagem», puro e generoso, só estragado pela sociedade e pelo Estado.
Numa perspectiva cristã e conservadora, vemos rio homem uma natureza plástica, moldável, disputada entre o bem e o mal, nascida para aquele mas sempre tentada pelo outro. Por isso mesmo, as instituições sociais devem ajudar à perfectibilidade, que é função também da educação; premiando os bons comportamentos e punindo os maus.
Outra questão importante é o equívoco permanente em torno da igualdade de oportunidades. Tal equívoco é, aliás, natural. Uma certa esquerda encheu-nos até a exaustão com utopias igualitaristas que se consumiram ria sua própria falsidade, logo inutilidade. Uma vez mais, numa mistura de socialismo e de catequese, a confusão campeia.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo. Sr.ªs e Srs. Deputados: É da nossa consciência comum que arranca o esforço colectivo de dar a cada cidadão uma oportunidade. A oportunidade que transforma em prática direitos sociais meramente programáticos. A oportunidade que permite a cada um, independentemente dá sua condição social e económica, aceder a níveis de dignidade e promoção. E em que é que se traduz esse esforço colectivo?
Desde logo em mil milhões de contos/ano, arrecadados pelo fisco e colectados, sobretudo, aos trabalhadores por conta de outrem, aos que não querem ou não podem evadir-se fiscalmente à classe média. Mas também no esforço de manter operacional uma gigantesca rede de estabelecimentos de ensino e garantir o seu normal e regular funcionamento. E ainda no esforço, muitas vezes titânico, de milhares de professores, técnicos de educação, funcionários que, diariamente, se mobilizam numa cruzada contra obstáculos e dificuldades várias de uma mal disfarçada desmoralização. E por fira no esforço de milhares de famílias que não vêm ria escola uma receita de substituição ou compensação às suas dificuldades ou fracassos e prosseguem, com determinação e coragem, a tarefa de criar os seus filhos.
Ora, não está em causa a nossa consciência comum quanto à importância decisiva de um sistema educativo público. Tão pouco está em causa o esforço colectivo em que ela se traduz. O que está em causa são os erros fatais de interpretação de objectivos e metodologias que dividem a consciência e deitam a perder o esforço investido.
Os problemas sociais nas sociedades desenvolvidas tendem a agravar-se. Há que saber ciar-lhe respostas adequadas, mas em sede de um sistema. próprio, de solidariedade e acção social, actuante e eficaz. Nunca apenas em sede do sistema educativo. Se a criança não tem casa, nem comida, nem afecto ela não terá nunca, apenas porque entra ria escola, uma oportunidade igual a outra criança que tenha casa, comida e afecto. Esta desigualdade pesada e estigmatizante tem de ser resolvida e minimizada a montante, sob pena de esta criança se manter um fracasso, apenas não declarado.
Questão diferente daqueles que precisam de um reforço social para atingirem um nível de igualdade em matéria de oportunidades são aqueles que não reúnem condições de educabilidade por não terem as qualidades necessárias a serem educáveis, logo educados. Ora, a escola fez-se para ensinar a ler, escrever e contar e também, se possível, para ensinar a raciocinar, a pensar, a referenciar. Quem não está sistematicamente predisposto a aprender, não pode ser ensinado. Mais: é alguém que vitimiza diariamente os educáveis - que são a maioria - e perturba o esforço colectivo que torra possível o funcionamento do próprio sistema.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: o projecto de estatuto disciplinar ora em apreço enferma, pois, do nosso ponto de vista, dos seguintes erros capitais: não considerar, como objectivo principal do sistema educativo, a educação - acção ou efeito de educar, de desenvolver as faculdades físicas, intelectuais e morais das criança e dos jovens -...

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - ... ruas, pelo contrário, ver na escola um espaço cruzado de educação, de acção social, animação cultural, de ersatz familiar, etc.; não responsabilizar, criando um quadro claro de deveres como contrapartida ao direito a ser educado, ensinado, instruído; substituir a exigência pela permissividade, retirando prémio e castigo, penalizando fortemente os que cumprem; vulnerabilizar o professor, o agente educativo, prendendo-o numa teia de comportamentos inconsequentes e atentatórios da sua autoridade: preferir paliativos a soluções.

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Ora, se estamos confiantes de que a participação activa na discussão deste projecto, de professores experientes e pais responsáveis, será suficiente para limpar o articulado de todas as inconsequências e fantasias já nos preocupa a questão de fundo, os pressupostos filosóficos em que o projecto assenta: o de que as sanções têm como objectivo principal «visar a formação cívica e democrática do aluno» e não dissuadir ou/e punir.
Ou seja, um comportamento reiterado a social ou antisocial, por força de um raciocínio meramente quantitativo, torna-se assim qualitativamente aceitável. E perguntamos: desde quando pode ser considerado «leve» um comportamento que, de forma sistemática, «desrespeita o direito à educação e ensino dos restantes alunos»?
Tal só será possível se o Governo considerar igualmente «leve» o direito à educação e ensino, que, contudo, sabemos, é um direito constitucionalmente consagrado. Aliás, se para o Governo a suspensão ou a expulsão significam sempre a entrega do aluno indefeso aos malefícios da rua, então a escola significará para o mesmo Governo uma espécie de jardim de infância ou parqueamento pira adolescentes. É com que consequências?

O Sr. Jorge Ferreira (CDS-PP): - Muito hem!

A Oradora: - Por outro lado, em que ponto desse anteprojecto se poderá descortinar a ideia de que a avaliação de um comportamento tem de fazer-se como um lodo, uma sucessão de actos efectivamente qualificados positiva ou negativamente?
E o que significa, afinal, a mudança de turma e/ou a mudança de escola numa actuação de comportamento efectivamente negativo? Significai mais uma oportunidade? Uma experiência? Um disfarce? Uma impotência do sistema? É que o aluno mal comportado não é uma vítima, como VV. Ex.ª erradamente pensam, mas, antes vitimiza os outros, os que querem educar e os que querem ser educados.

Vozes do CDS-PP: - Muito hem!

A Oradora:- Ora, um estatuto disciplinar destina-se a desencorajar os comportamentos anti-sociais e a puni-los, até porque a recuperação do f

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Pedro Baptista e Manuel Alegre.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Baptista.

O Sr. Pedro Baptista (PS): - Sr. Presidente e Sr. Deputados. aproveito o ensejo para desejar um bom ano para todos.
Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto. vou falar com a motivação de quem trabalhou 20 anos como professor do ensino secundário, que nunca expulsou um aluno da sala de aula, embora tenha sido bom ter tida a possibilidade de o fazer, e também tenha visto. durante todos estes anos, muitos alunos com comportamentos difíceis tornarem-se alunos com comportamentos mais positivos e até óptimos alunos quando tiveram uma pedagogia positiva e, por que não dizê-lo? um pouco de carinho e de amor pedagógico para os ajudar.
Quero dizer que gostei de ouvir as palavras de V. Ex.ª, que, no sentido de catequese, foi um acto de contrição e, no sentido de socialismo, uma autocrítica, na medida em que V. Ex.ª, com a intervenção que fez, não poderá fazer obnubilar aquilo que VV. Ex.ª do PP têm andado a dizer durante todo o mês de Dezembro. É que VV. Ex.as estiveram a lançar na opinião pública três grandes mistificações, que eu queria aqui invectivar.
Primeiro, VV. Ex.as andaram ,a dizer que este diploma não foi posto à discussão com os professores, o que é rotundamente falso, na medida em que o mesmo está em debate exactamente desde o dia 5 de Dezembro, não só com VV. Ex.as mas também com outros parceiros e esperamos que venham muitas propostas construtivas, muitas achegas, das numerosas bancadas e dos numerosos parceiros. Aliás, até sei que o prazo que estava previsto para 14 de Janeiro foi prorrogado até ao fim de Janeiro, suponho que até ao glorioso dia 31 de Janeiro!

O Sr. João Carlos Silva (PS): - Muito bem!

O Orador:- Em segundo lugar, quero dizer que VV. Ex.as incorreram numa outra grave mistificação quando andaram a dizer - e V. Ex.ª, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, estava ao lado do Presidente do seu partido, porque ainda agora estive a rever as imagens passadas na televisão - que este diploma procurava acabar com a possibilidade. de os alunos serem expulsos das salas de aula.
Ora, isto é inteiramente falso: no artigo 22.º, sobre medidas cautelares, mantém-se a possibilidade de o professor pôr fora da sala de aula o aluno quando a situação é extremamente difícil e quando está posto em causa o processo de ensino/aprendizagem.

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, permita-me concluir com uma terceira questão. Como não tenho tempo, direi apenas, muito sinteticamente, à Sr.ª Deputada que a escola não vai substituir a família, Imas a escola dirigida pela política do Governo socialista não pode marginalizar nem excluir definitivamente aqueles que têm um comportamento mais difícil. A escola não pode entregar esses homens à rua!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não pode entregar esses homens aos traficantes de droga! Porque, como dizia Victor Hugo, Sr.ª Deputada, «ce que l'école rejete, la prison profite» o que a escola rejeita, a prisão aproveita. E isso os socialistas não querem!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, sendo V. Ex.ª uma pes-

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soa assumidamente de direita, sinto-me inclinado a felicitá-la porque talvez V. Ex.ª tenha feito hoje, nesta Câmara, um dos discursos culturalmente mais conservadores, mais reaccionários e mais à direita que alguma vez foram feitos na Assembleia da República.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Devo dizer-lhe que talvez nem mesmo Salazar, cujos discursos eu li e que tinham o sentido da fórmula, tenha levado tão longe o seu cepticismo acerca do Homem e da natureza humana e não levou com certeza tão longe, pelo menos no que respeita à escola pública, a defesa do elitismo e da desigualdade. Eu ainda fiz a escola primária no tempo em que a propaganda oficial e ele próprio defendiam que bastava «saber ler, escrever e contar» e também no tempo em que, quando o professor entrava na escola, se fazia a saudação nazi. Dir-se-ia que é um simples detalhe, mas também o Le Pen chamou um simples detalhe aos campos de concentração! Penso que é preciso saber ler, escrever e contar e que a escola deve ensinar a ler, escrever e convir: mas, num regime democrático, num regime republicano, a escola não se fez apenas para se saber ler, escrever e contar, fez-se essencialmente, para formar cidadãos, porque só formando cidadãos se pode aplicar o velho princípio republicano e democrático da igualdade de oportunidades.
Por isso, a escola que nós defendemos, a escola que tem de existir num Portugal democrático, não pode ser a escola de que V. Ex.ª hoje aqui falou, porque essa está atrás mesmo daquela que, no ensino público, Salazar criou durante o seu regime.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Srs. Deputados Pedro Baptista e Manuel Alegre, como tenho pouco tempo, vou tentar responder em conjunto.
Começo por dizer que me congratulo por ter feito um discurso de direita porque sou de direita e acho que é tempo de a direita aqui talar sem medo, como pensa e trazer aqui o seu pensamento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Se o Sr. Deputado Manuel Alegre não tinha ouvido aqui, ainda, até hoje, um discurso de direita, é pena! E esta matéria, curiosamente, é uma matéria ideológica: aquilo que eu exprimi, é um pensamento partilhado por muita gente de direita obviamente não partilhado pela esquerda. Mas é um pensamento, curiosamente. repescado pela Professora Filomena Mónica a propósito deste mesmo tema, em que ela rejeita os princípio rousseaunianos e, como calcula, Sr. Deputado Manuel Alegre, a Sr.ª Professora Filomena Mónica está longe de partilhar as mesmas ideias que eu, mas decerto meditou sobre as mesmas questões.
Quero dizer-lhe que não há cidadãos que não saibam ler, escrever e contar. Portanto, quando os Srs. Deputados vêm «pintar» a escola socialista, não vêm «pintar» nada de novo. Isto é, a escola, seja qual for o Governo, tem essa função básica, primeira, que é a de ensinar a ler, escrever e contar para que cada criança se possa defender como cidadão; depois disso, eu acrescentei ensinar a pensar, a reflectir e a referenciar. E depois disso, digo-lhe: olhe para o estudo recentemente feito sobre a iliteracia e verifique que vive num país com 50% de iletrados! Portanto, a escola não é socialista, não é social-democrata, não é democrata cristã, não é comunista - é uma escola e tem a obrigação de formar cidadãos e não há cidadãos, nem analfabetos, nem iletrados. A nossa preocupação, hoje, não Pode ser a do analfabetismo, tem de ser a da iliteracia.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Queria ainda dizer que a desigualdade é um dado adquirido, Sr. Deputado Manuel Alegre, por mais que lhe doa. Infelizmente, nós vivemos num mundo com desigualdades. Daí a nossa preocupação em criar um quadro de igualdade de oportunidades. E pergunto-lhe: sendo as oportunidades escassas podem ser desbaratadas por rocia dúzia, prejudicando todos os outros? É que, no fundo, o que o Sr. Deputado Manuel Alegre e o Sr. Deputado Pedro Baptista querem defender é urna minoria que atenta contra o direito constitucionalmente consagrado a se ser ensinado! É isso que nós contestamos: é que a escola se desfoque da sua função principal para estar completamente virada para um trabalho, que é, sem dúvida, muito importante, sobretudo nas sociedades desenvolvidas, nas sociedades modernas, com os problemas sociais que bem conhecemos, porque a ela, escola, nada vai substituir! A escola não é mãe, não é pai, não é assistente social, não é animadora cultural, porque, se for isso e não for a outra coisa, esses crianças não terão a oportunidade que todos nós lhe queremos dar.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente, dizendo ao Sr. Deputado Pedro Baptista que não é verdade o que disse. Quando visitei a Escola da Amadora (penso que está referir-se a isso), como a Sr.ª Secretária de Estado poderá dizer-lhe, o documento não tinha sido distribuído. Por infelicidade, decerto não por culpa do Governo, o documento veio para os jornais antes de ir para as escolas; certamente que já foi agora distribuído. Eu própria disse, da tribuna, que, ao ser distribuído, muitas das suas fantasias cairão, porque quem está no terreno e sofre estas agruras se encarregará de o fazer.

Aplausos elo CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para unia intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Ministros e Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Começo por advertir que a minha intervenção não trará qualquer valor acrescentado à questão de saber se a qualidade de funcionamento das escolas e se a disciplina nas escolas é uma questão de esquerda ou de direita. Colocaremos a nossa ênfase na questão da qualidade, e essa ultrapassa a esquerda e a direita.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Uma vez mais, o Governo socialista dá provas de falta de coragem, de contradição flagrante entre

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o que diz e o que faz, de ineficácia nas medidas que propõe, de incapacidade de reconhecer e resolver os problemas reais.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Isso não é verdade!

O Orador: - E o problema real que nos ocupa é a indisciplina nas nossas escolas. Sabemos todos que as causas são de diversa natureza e que o combate à indisciplina implica um conjunto diversificado de acções. Também sabemos que os bairros degradados, o isolamento, a exclusão social e a pobreza favorecem a indisciplina e que as más condições de algumas escolas, a falta de espaços, a degradação de instalações a insuficiência de apoios pedagógicos constituem, igualmente, factores de agravamento das condições de disciplina das escolas.
Tudo isto é verdade, tudo isto merece cuidados e respostas apropriadas. Mas por que será, então, que em escolas novas. com boas condições de funcionamento e inseridas nos melhores meios sócio-económicos existem igualmente problemas de indisciplina. É que para além de tudo o que já referi, a indisciplina cresce na proporção inversa da autoridade dos professores! Não podemos contemporizar com o laxismo, a permissividade, o 1

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O caminho a seguir para mudar este estado de coisas é o do reforço da autoridade do professor, por um lado, e a diminuição da burocracia nos processos disciplinares, por outro. Enquanto que, para o PSD, a revisão do estatuto disciplinar passa pelo reforço da autoridade dos professores, o Governo pelo contrário. retira ao professor toda e qualquer competência disciplinar. De acordo com o projecto do Governo, a aplicação de uma sanção disciplinar envolve um ritual tão complexo, tão burocrático e tão moroso que acaba por desincenfivar os professores de desencadearem qualquer procedimento disciplinar.
Não resisto a apresentar o exemplo de um aluno que insulta o professor na sala de aula. Imaginemos que isto teve lugar logo a seguir às féria da Páscoa. De acordo com o Governo tudo se passará da seguinte forma: primeiro, o professor recebe o insulto e informa o aluno que. no final da aula, iniciará procedimento disciplinar contra ele; segundo, terminada a aula, o professor participa o facto ao director de turma; terceiro, o director de turma procede a uma averiguação sumária (ouve, pelo menos, o aluno e, sendo este menor, o respectivo encarregado de educação) e dispõe de oito dias para concluir, por escrito, as averiguações; quarto, considerando a gravidade do procedimento do aluno, o director de turma remete as suas conclusões para o director executivo ou presidente do órgão de administração e gestão da escola; quinto, o director da escola, pretendendo acautelar os direitos e deveres dos elementos envolvidos, convoca uma reunião do conselho de turma disciplinar (que se efectuará no prazo máximo de cinco dias úteis): sexto, ouvido o conselho de turma disciplinar, o director determina a realização de diligências complementares, para o que dispõe de mais cinco dias; sétimo, concluídas as diligências, o director da escola tem dois dias para fundamentar a decisão e conclui que o aluno deverá realizai- durante três semanas actividades úteis à comunidade escolar: oitavo, o aluno interpõe recurso da decisão para o que dispõe de cinco dias:
nono, o processo do aluno é remetido para o director regional de educação, que tomará a decisão final sem dependência de qualquer prazo; décimo, termina o ano lectivo e o aluno inscreve-se no ano seguinte, noutra escola. Ainda de acordo com o Governo, o cumprimento das medidas educativas disciplinares não se transfere para a nova escola, o que significa que a infracção do aluno não leve nenhuma consequência.
A conclusão a tirar é óbvia: percebendo, antecipadamente, que será este o desfecho de um processo disciplinar, o professor tenderá a nem sequer fazer a participação inicial. Terá de fazer de conta que não ouviu o insulto do aluno. Mas, se a medida disciplinar chegar a ser efectivamente aplicada, terá decorrido tanto tempo que o aluno já nem se lembra da infracção que cometeu.

Aplausos do PSD.

Insisto novamente: o projecto do Governo diminui a autoridade do professor e aumenta a burocracia da tramitação processual. Este projecto é bem o exemplo da falta de coragem deste Ministério da Educação. Não vai directo ao problema, prefere passar-lhe ao lado. Não encara de frente as soluções, enreda-se em complexas tramitações. É um projecto ineficaz porque não irá resolver problema nenhum. Mas é também um projecto contraditório com o anunciado reforço da autonomia das escolas. Embora fazendo referência a um regulamento da própria escola, este projecto entra em detalhes tão regulamentadores que não se vê espaço para qualquer autonomia da escola.

O Sr. José Magalhães (PS): - No seu tempo é que era bom!

O Orador: - E o que dizer da medida projectada pelo Governo de transferir de turma um aluno indisciplinado, durante uma semana? Não consigo vislumbrar qualquer vantagem, antes só vejo inconvenientes. Esperemos que, até ao fim do debate alguém se levante para defender esta proposta.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não acredito!

O Orador: - Sr. Presidente. Sr. Deputados, Srs. Membros do Governo: Percebe-se bem a reacção muito negativa dos professores a este projecto do Governo. Num ambiente geral de crise de autoridade, os professores esperariam do Governo qualquer medida que os aliviasse da sensação de impotência e de fragilidade no combate à indisciplina. Esperariam medidas de apoio e de valorização do seu papel de educadores. A proposta do Governo, pelo contrário, diminui a autoridade do professor, deixa-o entregue a si mesmo, mais isolado, mais só e mais descrente.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Isso não é verdade!

O Orador: - É um absurdo este projecto do Governo. Só vai pôr as escolas a funcionar pior e diminuir a autoridade dos professores.
Por isso, aqui deixamos um aviso claro: se o Governo não arrepiar caminho, se não abandonar este projecto sem nexo e sem sentido, o PSD proporá a sua rejeição e avançará com uma alternativa que dê autoridade aos professores e condições pata que haja disciplina nas escolas. O tempo que vivemos é de exigência, não é de facilidades.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate de urgência que decorre hoje, motivado por um projecto de diploma do Governo que veio a público recentemente e que pretende consagrar como objecto a formulação de um «código de conduta» e a explicitação de um «estatuto» para os alunos dos ensinos básico e secundário, parece indiciar que o problema fundamental do sistema educativo é a insurreição disciplinar nas escolas portuguesas - e desta errada constatação até ao desejo do PP de una escola repressiva foi um golpe de mágica.
Se, em 1912, Durkheim ainda afirmava que «Toda a educação consiste num esforço contínuo para impor i1 criança modos de ver, de pensar e de agir,...», hoje. em matéria de educação e pedagogia, o objectivo fundamental é o de assegurar às crianças e aos jovens uma formação que tenha em conta a sua personalidade, o seu futuro e o reforço do respeito dos direitos e das liberdades fundamentais.
No entanto, as medidas adoptadas pelo Governo do PS têm-se evidenciado de tal modo inadequadas que têm permitido a alguns, demagogicamente, a apresentação de propostas que põem em causa a defesa da escola pública de qualidade e questionam o direito í1 educação e ao ensino em condições de igualdade de oportunidade de aceso e sucesso escolares.
Quanto ao projecto de diploma, merece-nos dois tipos de reflexão: o primeiro tem que ver com a metodologia utilizada pelo Ministério da Educação para a sua apresentação pública; o segundo com a validade pedagógica do conteúdo. A Sr.ª Secretária de Estado da Educação e Inovação, confrontada com as críticas generalizadas ao projecto, considera que não há razões para se preocupar, até porque, afirma «Em Portugal há pouco muito de debate». É esta leitura da sociedade portuguesa que explica o comportamento repetente do Ministério da Educação. Dá conhecimento à comunicação social do projecto, determina que o dia 15 constitui o terminus do debate e, porque em Portugal não há debate, não considera importante dar conhecimento do texto aos sindicatos, às associações representativas dos professores, dos pais e encarregados de educação, dos alunos, ou, simplesmente, enviar o documento para as escolas, atempadamente.
Mesmo assim, sem tempo para reflectir e debater, é aquilo que se vê. Imagine-se agora que o Ministério da Educação era mesmo defensor do diálogo, ouvia os parceiros sociais, avaliava as suas propostas. construía opiniões que fundamentassem as decisões. Mas não o é! Não o faz nem o fez, e é reincidente no incumprimento.
Se, quanto à discussão pública, o Ministério da Educação denunciou, mais uma vez, a sua incapacidade para cumprir qualquer Pacto Educativo com respeito pelos interlocutores, no que se refere à substância do diploma, é no mínimo um texto de literatura surrealista. Identificado o objectivo primeiro, que segundo o projecto é «construir unia escola de qualidade, capaz de garantir a todos o direito à educação e a uma justa e efectiva igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolares», é inconcebível que, segundo os seus autores, este objectivo passe sumariamente pela estratégia da normalização de regras de conduta dos alunos, ou pela punição dos mesmos, quando os normativos disciplinares não forem cumpridos: E mesmo a este nível é irrealista.
Afirma-se no preâmbulo que são necessárias «respostas claras consistentes e sistemáticas da escola, da família e da comunidade». Comecemos pelas escolas sem biblioteca, sem espaços próprios para os alunos, sem espaços cobertos ou descobertos para actividades extracurriculares, sem bar ou sem refeitório e com salas para 20 alunos onde é necessário colocar 40. E as famílias que se confrontam diariamente com problemas de desemprego, de habitação, de saúde e de pobreza. E na comunidade, onde estão as instituições especializadas e apetrechadas para enfrentar as consequências do 4ue enunciámos ou para resolver as causas? Onde estão os recursos humanos e materiais acrescidos para responder aos problemas sociais que são transportados, cada vez com mais intensidade, para o interior da escola?
A tudo isto responderá o código de conduta explícito no regulamento da escola? Claro que não, e o Governo e o Ministério da Educação sabem-no!
Vale a pena agora reflectir sobre alguns dos itens que constituem os direitos dos alunos e que deverão integrar o regulamento. Dos 14 destacamos três, embora a leitura seja a mesma para os restantes: ter acesso a uma educação de qualidade; beneficiar de actividades e medidas de apoio específicas; beneficiar de apoios e complementos educativos adequados às suas necessidades específicas.
Formulam-se os direitos, mas ignoram-se as condições necessárias ao seu exercício e que são da responsabilidade do Ministério da Educação que não as garante na grande maioria das escolas. Seria indispensável que, hoje, o Governo desse número, sobre os serviços de psicologia e orientação escolares existentes, sobre os apoios e complementos educativos e depois os comparasse com a totalidade de alunos e escolas do País. Então constataríamos que este diploma se dirige a um sistema educativo virtual que em nada se assemelha ao sistema educativo português.
Se até aqui, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo identificámos a ausência de sentido entre o discurso do diploma e a realidade do País, a partir do capítulo IV a situação é outra.
Não tendo o Ministério da Educação dúvidas quanto à ausência de condições de trabalho para alunos e professores na maioria das escolas, e não tendo o Governo do PS tomado medidas pala inverter esta situação, só lhe restou uma alternativa: enviar para a escola e para a família todas as responsabilidades na resolução dos problemas, desresponsabilizando-se cada vez da construção de uma escola pública de qualidade.
É esta? a filosofia sempre subjacente às exíguas medidas (ornadas pelo Governo em matéria educativa. A proposta de lei do ensino pré-escolar retirava ao Governo a responsabilidade de criar uma rede pública de educação pré-escolar. A lei do financiamento do ensino superior desresponsabiliza o Governo em matéria de investimento e cobra o ensino superior aos alunos através das propinas. O decreto-lei dos curricula alternativos desresponsabiliza o Governo na obrigatoriedade de garantir a igualdade de oportunidades e responsabiliza os alunos pelo seu insucesso, excluindo-os dos curricula regular.
E nesta filosofia se enquadram também as medidas educativas disciplinares. Não temos tempo para analisar individualmente a validade pedagógica de cada uma; no entanto, há incorrecções de fundo que é indispensável referir. A tipificação dos comportamentos em leve, grave e. muito grave é Lima proposta inútil. O mesmo comportamento

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pode ser diferentemente evidenciado e ter diferentes consequências e como uma diversa avaliação. Mas pior ainda que esta inutilidade é a mundividência que enforma as medidas punitivas, concretamente a transferência de turma, as actividades úteis à comunidade, a transferência de escola e a expulsão, cujo valor remediativo é, no mínimo, duvidoso. Quanto à transferência de turma, estamos convictos de que é impensável a sua concretização. Os autores desta medida não pensaram nas consequências que a mesma terá na turma donde o aluno é excluído, na turma onde o aluno é colocado como punido e por isso segregado e muito menos no aluno. Só assim é possível propor esta medida pseudo-educativa e pseudodiscipliiiar.
E as actividades úteis à comunidade? Quem estará disposto a obrigar o aluno a cumprir este castigo porque de castigo se trata? As tarefas do conteúdo cívico deverão integrar o curriculum e nunca constituir punições realizadas em horas extraordinárias não previstas rio horário.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Finalmente, quanto à transferência de escola e à expulsão. Nem uma. nem outra constituem novidade e, até hoje, não existem estudos que permitam avaliar do seu benefício pedagógico.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Considerarmos que o único mérito deste projecto de diploma é a reflexão que provocou. Não é possível reconhecer-lhes outros benefícios. Ao Ministério da Educação, valera a pena lembrar que de instituições já tínhamos um «Pacto» cheio e que cada vez mais são urgentes as acções.
Acções que estão fora das possibilidades da escola e que são da responsabilidade do Governo. Acções que não ignorem, como o projecto o faz, que a gravidade das situações vividas nas escolas excede o quadro simplista da indisciplina. Acções eficazes, capazes de responder às necessidades, aos anseios e às expectativas (Li comunidade educativa e não unia mera listagem de procedimentos, alguns já em prática e cuja ineficácia é reconhecida. Acções pedagógicas que não decorram de uma concepção da educação individualista e anti-social, que não transformem a escola em espaço de segregação e penitência. irias acções pedagógicas que façam da escola espaço de s

Aplausos alo PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, a palavra ao Sr. Deputado Rui Namorado.

O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, há um mérito incontornável na iniciativa do Ministério dei Educação que originou este debate: veio suscitar a discussão sobre uma das áreas cruciais do nosso sistema educativo; veio suscitar um debate pondo a nu a completa inadequação do normativo em vigor para resolver os problemas funcionais das nossas escolas que envolvem a disciplina e a distribuição dos direitos e deveres no seio das comunidades escolares.
O primarismo com que alguns tenores da oposição reagiram à iniciativa do Ministério da Educação, revelando um. desconhecimento profundo sobre o que essencialmente está em causa, serviu para mostrar- como um certo trauliteirismo ideológico substitui com demasiada frequência urna análise objectiva e informada dos problemas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não desconhecemos que no seio dos intervenientes no processo educativo e especialmente entre os professores, se suscitou um clima de algum alarme em torno do que foi difundido publicamente como sendo as consequências do novo regime disciplinar nas escolas. É um alarme saudável, na medida em que reflicta uma preocupação sincera com a vida nas escolas, ou um receio de que as mudanças em análise se revelassem inadequadas. Mas é um alarme injustificado se tivermos em conta os sentido geral do projecto em análise e os termos em que realmente está formulado o seu articulado.
Na verdade, o projecto do diploma aqui em debate, partilhando uma visão optimista do homem e da sociedade e, portanto, de todos os elementos da comunidade educativa, não deixa de ter em conta a realidade vivida no dia-a-dia das escola. Mas ter em conta as escolas que temos, numa sociedade que não inventámos, não pode ser sinónimo de nos conformarmos com a situação vivida. Não queremos que as escolas potenciem os factores sociais de exclusão e marginalização o, queremos que a escola se assuma contra as inércias sociais que perpetuam injustiças e desigualdades, embora saibamos que ela nunca o conseguirá sozinha.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso mesmo, a aposta que fazemos na criatividade, ria iniciativa e na responsabilidade dos professores, dos pais e dos estudantes, não pode de modo nenhum confundir-se com o alijar de responsabilidades por parte do Estado. Queremos incentivar protagonismos, não queremos fugir à responsabilidade que cabe ao Estado.
Do mesmo modo, propõe-se que os pais acompanhem rias escolas tudo aquilo que implique com a disciplina dos seus filhos, de modo a que as garantias processuais dos cidadãos se projectem em pleno em quaisquer processos que digam respeito a disciplina e ao risco de sanções. Mas não esquecemos que esse desejável protagonismo dos pais na comunidade educativa nunca pode significar a possibilidade de bloqueamento dos mecanismos de defesa dessa comunidade, sob peita de se negar a si próprio.
Paralelamente, sem esquecer a centralidade dos que aprendem em qualquer comunidade educativa, não podemos ignorar a importância e a especificidade dos que nela exercem a profissão docente. No projecto em debate não está em causa, nunca poderia estar em causa, a importância e a autoridade dos professores.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Como pedagogos, eles sabem que têm que gerou- cumplicidades afectivas que encorajem as aprendizagens e todos sabemos que essa capacidade de gerar entusiasmos nos alunos não só não é incompatível com a autoridade dos professores como dificilmente funcionará sem ela.
O diploma em análise está, como aqui tem sido dito, numa fase em que são úteis sugestões e críticas. Deve, no entanto recordar-se, urna vez mais, que esta em causa a instituição de um quadro normativo genérico que, pela sua própria natureza, implica a necessidade de vir a ser completado pelos regulamentos internos dos vários estabelecimentos de ensino.

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O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Não estamos perante um corpo normativo exaustivo, vocacionado para vigorar isoladamente. Também isto, não deve ser esquecido.
As sociedades actuais geradoras de exclusão, de desigualdades, de angústias mais ou menos difusas não têm na escola o espelho mágico que as possa reflectir justas, democráticas e felizes. Mas podem ter na escola um factor de combate às suas imperfeições que pode tanto melhor desempenhar a sua função quanto mais claro estiverem para nós os seus limites e as suas virtualidades.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Com esta iniciativa, procura-se evitar que os problemas de disciplina actuais se agravem, não em nome de uma escola-caserna, mas em nome de uma escola democrática.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr: Ministro da Educação.

O Sr. Ministro da Educação (Marçal Grilo): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Dadas as características do debate, não utilizarei um discurso escrito, mas farei algumas considerações relativamente ao tema em apreço.
Primeira nota, este debate nasce de uma iniciativa nossa, do Governo e do Ministério da Educação por uma razão simples: é que entendemos que o país necessita de pegar na matéria da disciplina e tratá-la de uma forma séria. O Regulamento que existe não serve, ninguém o segue, alguns mesmo nem o conhecem!

O Sr. José Magalhães (PS): - É um facto!

O Orador: - As sanções do actual regime de disciplina apenas contemplam a exclusão, a exclusão e a exclusão. Fizemos o lançamento deste debate em simultâneo com o projecto de autonomia e gestão das escolas. E fizemo-lo propositadamente, porque o regime de disciplina, tal como o entendemos, faz parte integrante do projecto da escola.
Para responder a algumas das questões que aqui foram levantadas, permitam-me que lhes diga que o PSD não tem qualquer autoridade para falar nesta matéria, pois esteve 15 anos no governo e nunca pegou na matéria da disciplina. Aliás, penso, mesmo, que os Sr. Deputados que aqui estão nem sabem o que era o regulamento de disciplina que tinham nas suas mãos.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Não lhe pegaram, nem de frente, nem de lado! Nunca pegaram nesta matéria, não sabem o que ela é, nem a importância que tem.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A segunda questão tem a ver com a forma como entendemos esta proposta. A nossa proposta, temos que o dizer com clareza. assenta no regime de autoridade e de reforço da autoridade. Só reforçando a autoridade do professor e dos professores é possível ter um regime de disciplina. A autoridade dos professores resolve-se através do esquema organizativo da escola. Cada escola tem de ter o seu regime disciplinar. Como dizia a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, hoje de manhã ou ontem à noite, à Rádio Renascença, cada escola tem de ter o seu regime disciplina- próprio, porque cada escola tem a sua comunidade e os seus problemas. É assim que deve ser e é assim que vai ser.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este regime de autoridade não é um autoritarismo nem é uma prepotência, é uma autoridade do professor, que deve exercer-se dentro da sala de aula, que tem a ver com a competência do professor, com a forma como ele se faz respeitar e se relaciona com os seus estudantes.
Posso dizer à Câmara - e isso continuará enquanto eu for Ministro da Educação - que nós confiamos nos nossos professores. Sabemos que os professores sabem como se deve lida- com as suas crianças. O regulamento que apresentamos não tem qualquer conceito teórico, assenta naquilo que eu próprio tenho visto nas escolas portuguesas e, sobretudo, nas que têm maior número de problemas.
Um regime disciplinar, tal como um regime de autonomia e de gestão, assenta na própria escola e na responsabilidade de quem está na escola: os professores, os pais e os estudantes, desde que a lei o preveja, como é o caso do ensino secundário.
Esta responsabilização acrescida das escolas não tem a ver com a desresponsabilização do Estado. O Estado tem a obrigação, como em muitos países se faz, de ter um quadro normativo global que serve depois para que cada escola tenha o seu regime disciplinar próprio e o seu regime de autonomia e gestão próprio.
Para além da autoridade e da estabilidade das escolas, que temos de preservar e de que já demos provas mais do que suficientes, há um debate que tem de se fazer, que seguramente não é pior se fazer hoje, mas que está no centro das questões que estamos a discutir. A este respeito, temos de ser claros. Há os que defendem uma escola que fomenta a exclusão e acentua as desigualdades e os que defendem uma escola que combate a exclusão e promove a igualdade. Ora, nós estamos claramente do lado da escola que combate a exclusão e promove a igualdade. A escola fez-se e tem por missão instruir, educar e formar cidadãos e não excluir as nossas crianças das escolas.

Aplausos do PS.

Se me é permitido dizê-lo - respondendo à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, e sabe a simpatia que tenho por si -, nunca as crianças, na escolaridade obrigatória, deixam de ser educáveis. As crianças, na escolaridade obrigatória, são sempre educáveis. Temos é de saber como ws devemos educar e qual é o mecanismo que temos de fazer actuar para as educar. Em minha opinião, não podemos fazer e dizer como a Sr.ª Deputada, no outro dia: «quando as crianças deixam de ser educáveis». As crianças nunca deixam de ser educáveis. É para isso que serve a escolaridade obrigatória.

Aplausos do PS.

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É por isso que a escolaridade obrigatória teve sempre, em todos os países, mesmo em Portugal, quando era apenas de quatro anos, como no meu tempo, um regime especial de faltas, um regime especial disciplinar. Temos é de entender que a escolaridade obrigatória, hoje, é de nove anos e é nesse período de tempo que lemos de dar a garantia de defender o direito inalienável das crianças a serem educáveis, cada uma da sua maneira e não propriamente atirando-as para a rua por «dá cá aquela palha».

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Para mim, este debate nasce daquilo a que eu chamaria um equívoco, provocado porque um líder partidário emitiu uma opinião sem ter lido o documento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ou seja, disse claramente que, em Portugal, ase crianças deixavam hoje de poder ser expulsas das sala de aula. Gostaria de esclarecer o seguinte: o diploma que apresentámos mantém toda a grelha de sanções, a qual, aliás, estou convencido, muitos dos Srs. Deputados não conhecem. Sobre esta grelha de sanções, o que há que introduzir - e a nossa proposta vai nesse sentido - são os mecanismos de prevenção, de integração, de correcção e de educação das crianças. São esses mecanismos que faltam, porque, como é óbvio, as faltas muito graves devem ser exemplarmente punidas tal como está definido no código de sanções.
Muitos dos Srs. Deputados nunca tiveram de tomar, como eu tive, uma decisão que custa muito tomar, que é a de fazer um despacho dizendo que urna criança com 14 ou 15 anos deixa de poder estudar durante um ano, em todas as escolas do território português. Isto custa como os Srs. Deputados não podem imaginar. Infelizmente, já fui colocado perante esta situação tive de tomar esta decisão e tomei-a depois de garantir que, efectivamente, estávamos perante um casso da maior gravidade e tinham sido esgotados todos os mecanismos anteriores.
O mecanismo de sanções existente manter-se-á e é com ele que pretendemos trabalhar. Não queremos é que restem dúvidas sobre a importância que atribuímos à recuperação das crianças, que, por razões muitas vezes externas à escola, têm um comportamento incorrecto. A escola tem de ter a capacidade de integrar e de defender e de não excluir estas crianças.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Quero deixar ainda uma nota muito breve em relação à questão do regime burocrático em vigor, que certamente não é do conhecimento da Câmara, nem do PSD, em virtude da intervenção que aqui fez.
No actual estatuto, ou seja, naquele que está em vigor, verificamos que os prazos de burocracia são muito mais compridos do que os que nós propomos, incluindo os do Código do Procedimento Administrativo. Isto é, os prazos que estão hoje no Código do Procedimento Administrativo, definido pelo partido de V. Ex.ª. são fortemente encurtados pela proposta que agora fazemos.
Se o Parlamento entende dever fazer este debate, e nós ternos a honra e o privilégio cie sermos convocados pata vir a este debate explicar a nossa posição, também queremos dizer o seguinte: a partir de agora. têm todos a enorme responsabilidade de apresentar propostas e sugestões em relação à nossa proposta, porque o que está verdadeiramente em causa não é um decreto-lei novo, como se quis fazer crer à opinião pública. 0 que fizemos foi lançar um documento para discussão, e tivemos a coragem, de o fazer no sítio certo. Se os partidos não o conheciam, foi porque não tiveram, como era sua obrigação, os seus representantes no Conselho Nacional de Educação para poderem receber o documento que foi entregue no dia 4 de Dezembro.
Deixo uma última nota sobre as condições nas escolas. Há escolas que, de facto não têm ainda as condições necessárias para poderem ter o seu projecto de autonomia, de gestão e para cumprirem tudo aquilo que gostaríamos. Mas, não esqueçamos, este é um processo gradual. Dou-vos apenas um exemplo: no ano passado, Loriga não tinha essa possibilidade, porque não tinha uma escola nova como tem hoje, e o mesmo se passava com o Cercal, Miragaia, no Potro, Vila de Rei ou Albufeira.
Em todas as escolas novas, à medida que se vão fazendo, vão-se criando as condições. Nós não esperamos pelo país utópico, pela utopia de termos todas as escolas com todas as condições, caso contrário, nunca modificaríamos rigorosamente nada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Educação, os Srs. Deputados C

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, agradeço a sua benevolência.
O Sr. Ministro da Educação disse que tem esta matéria em estudo e em discussão. Espetamos que esta matéria não seja como tudo o que se passa com este Governo e o Ministério da Educação: está sempre tudo em estudo e em discussão, o que tardam são as decisões. Queremos que este processo chegue a final e não fique, como todos os outros, em estudo e em discussão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro pediu propostas e sugestões, mas não ouviu o meu discurso. As nossas propostas e sugestões são as que passo a resumir: queremos que o diploma retorce a autoridade. dos professores, ao contrário da sua proposta, e que o senhor diminua a burocracia da tramitação processual, ao contrário da sua proposta.
São estas as nossas propostas. São clavas, só falta passá-las a escrito, Sr. Ministro.

Vozes do PS: - Ah!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António
Costa): - Seria melhor!

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O Orador: - Mas não esperará que as passemos a escrito...
O Sr. Ministro disse que tem confiança nos professores e fez um discurso muito bonito a esse respeito. O problema é que o Sr. Ministro diz algo que depois não leva à prática no seu projecto. Já lhe dei o exemplo do ridículo da tramitação processual que contém o seu projecto de diploma,...

Protestos do PS.

... mas gostaria de ser prático acerca disto.
Sr. Ministro, a legislação em vigor permite que o professor tenha algumas competências disciplinares. O seu projecto de diploma não dá uma competência disciplinar ao professor! O professor não tem qualquer competência disciplinar. Desafio o Sr. Ministro, que vai ter agora essa oportunidade, a dizer qual é a competência disciplinar que o professor tem. No seu projecto de diploma, toda a competência disciplinar é entregue ao director de turma, ao conselho disciplinar da turma, ao conjunto dos professores, ou ao presidente do conselho directivo. O professor, dentro da sala de aula, não tem qualquer competência!

O Sr. Ministro da educação: É o regime vigente! Eu mando-lhe uma cópia!

O Orador:- Conheço muito hem o regime vigente. Sr. Ministro. O problema é que o seu projecto ele diploma vai no sentido contrario ao daquele que deve ir. Neste momento. os professores têm poucas competências disciplinares, mas têm duas. Na lei actual, que conheço muito bem, têm duas; nas sua proposta, passam para zero. Diga-nos, Sr. Ministro, qual é a competência disciplinar que dá ao professor dentro da sala de aula.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Gostaria de colorir mais Lima questão, Sr. Presidente, com o devido respeito.
Sr. Ministro, há processos disciplinares que são escritos, quando são mais graves, e há outros que são venhais, para serem mais céleres, para terem resposta eficaz, sempre com garantias de defesa dos alunos. Na sua proposta, todos os processes são escritos, são burocráticos, atrasam!
Finalmente. Sr. Ministro, faço-lhe uma última pergunta, com a autorização do Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - faça favor Sr. Deputado, mas rapidamente.

O Orador: - Sr. Ministro, diga-me, diga à Câmara, diga ao País, qual é o sentido da sua proposta de transferir o aluno de uma turma para outra. Essa é a melhor forma de desautorizou o professor de lhe dizer: «não sabe lidar com este aluno, e passa para aquele outro professor a responsabilidade de lidar com ele». Desse modo, cria contritos com os professores. não resolve qualquer problema de autoridade e disciplina.

O Sr. Presidente: - Informo que a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, a quem deu a palavra, cedeu 2 minutos à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita e 1 minuto à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, pelo que só pode usar 3 minutos do seu tempo.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, é o tempo necessário para fazer um pedido de esclarecimento.
Sr. Ministro da Educação, se me permite, gostaria de começar por afirmar duo, com este projecto de diploma, o Governo, através do Ministério da Educação, pretende mais uma vez parecer que está a resolver questões quando, na verdade, está a desviar a atenção daquilo que é essencial. Na perspectiva de Os Verdes, é este o significado do projecto (1e diploma hoje em discussão: enquanto se discute isto, desvia-se a atenção de outras matérias.
Dizia o Sr. Ministro na sua intervenção que este é um projecto da iniciativa do Governo. É, de facto, porque o Ministério da Educação anda preocupado em intervir naquilo que a comunidade educativa não reivindica, que não é ele facto essencial nem são as questões mais preocupantes do nosso sistema educativo.
Sr. Ministro, para deu um exemplo relativamente a esta alienação, questiono o seguinte: o que é falar de disciplina ou de indisciplina relativamente a turmas com mais de 30 alunos? O que é falar de disciplina ou de indisciplina no que toca a estabelecimentos de ensino precários, inacabados, degradados ou até provisórios? O que é folar de disciplina ou de indisciplina, Sr. Ministro, em relação a programas extensíssimos, com os quais os professores ainda se confrontam e, naturalmente, também os alunos? O que é falar de disciplina ou de indisciplina, Sr. Ministro, relativamente a escolas que nem pavilhões gimnodesportivos têm, onde há falta de equipamento, de material, etc.? Com esta realidade, Sr. Ministro, peço imensa desculpa, mas o Ministério não tem tido a mínima preocupação e ela tem sido evidente pela acção que tem tomado ao longo destes dois anos.
Portanto, este projecto. Sr. Ministro, na nossa perspectiva, não vem alterar nada de substancial, nem tão pouco a questão da exclusão, de que ainda há pouco o Sr. Ministro falava, uma vez que a mantém neste diploma.
Gostaria ainda de colocar urna outra questão. Tendo a Sr.ª Secretária de Estado afirmado que esse projecto vai ser muito participado, muito aberto, etc., o que é que o Ministério da Educação já está disposto a alterar, depois das críticas que, permanentemente, se têm ouvido em relação a este diploma, nomeadamente das transferências de turma até às transferências de escola? Em relação a este aspecto, que tem sido hipercriticado, e que é que o Sr. Ministro já está disposto a alterar, com um processo tão aberto e participado como o Ministério diz?
Por último, Sr. Ministro, permita-me só um comentário, relativamente a uma sua afirmação feita aquando da intervenção, de que este diploma não Significa de modo algum uma desresponsabilização do Estalo, uma vez que essa desresponsabilização não passa por aqui. Eventualmente, não, Sr. Ministro, mas passará, come é natural, pela questão das propinas, pela questão da gestão e da autonomia das escolas de forma como o Governo a pretende levar a cabo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, dispondo de 3 minutos.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Muito obrigado, Sr. Presidente. mas pense que não precisarei dos 3 minutos.

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O Sr. Ministro da Educação subiu àquela tribuna com três objectivos suficientemente explícitos, o que nem sempre acontece: assumir-se como único eliminado, acusar todos, fundamentalmente os professores, de ignorantes e descansar o PP de que o projecto não tem novidades. E mantém exactamente as mesmas medidas disciplinares, do tal quadro legislativo, que textos desconhecem, com exclusão do Sr. Ministro e da sua equipa.
Assim, pergunto, Sr. Ministro: para quê o diploma? Para quê perder tempo? Com certeza, ele constitui, nem mais nem menos, um motivo de distracção, como que uma cortina de fumo a grande medida que já está em discussão pública, que é o contrato de autonomia, que vai retirar a representatividade aos professores, aos alunos, aos país, aos encarregados de educação, esse, sim, de grande importância. Com este diploma o Sr. Ministro pretende efectivamente esconder a realidade da discussão.

Vozes do PCP: - Muito hem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, diria que este debate teve a sua utilidade, em primeiro lugar, porque, não obstante a investida do Sr. Deputado Manuel Alegre sobre a minha condição de Deputada de direita, não irá dúvida de que louve alguma similitude naquilo que foi dito por todas as bancadas, excepto pela bancada do Partido Socialista, que continua a pensar que é de grande auxílio ao Governo vir dizer coisas que não têm qualquer interesse e que são repetitivas. Mas não há dúvida de que este projecto cria perplexidade, legítimas, independentemente das componentes ideológicas, a praticamente todas as bancadas e aos Deputados que intervieram.
À questão da recuperação dos educáveis e dos recuperáveis, se hem se recorda, Sr. Ministro, contrapus os educáveis aos recuperáveis e verifiquei com gosto que. a dada altura, o Sr. Ministro disse a seguinte frase: «lemos de recuperar as crianças». Portanto, o Sr. Ministro concorda comigo. Tem educáveis e recuperáveis. Aquilo que peço é que não os confunda. Isto é, uns têm de ser recuperados, outros podem ser educados e os recuperáveis, quando recuperados, poderão ser educados, antes disso não podem.

Vozes do CDS-PP: - Muito hem!

A Oradora: - Portanto, mais vale esta lucidez der que...

Protestos do PS.

Peço desculpa, mas mais vale esta lucidez, porque é assim mesmo. Aliás, o Sr. Ministro disse «é preciso recuperá-los» e não disse «é preciso educá-los». Alguns precisam de ser recuperados antes de serem educados.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - E nós sabemos porquê. Muitas vezes a culpa não é deles, outras vezes será deles, mas a responsabilidade é sempre nossa.
Quero ainda dizer-lhe uma outra coisa. Se o Sr. Ministro também concorda com a ideia de que a cada escola eleve ser dada alguma margem de manobra para poder criar o seu modus vivendi, o seu modus convivendi, gostaria de pergunta como é que compatibiliza esta questão disciplinar com uma qualificação de comportamentos que, peço desculpa, com o devido respeito, não tem pés nem cabeça, e com uma tipificação das medidas disciplinares que, da mesma forma, também não tem pés nem cabeça.

Vozes do CDS-PP: - Muito hem!

A Oradora: - Ou seja, logo à partida, isso não é inibitório de em qualquer escola poder haver a possibilidade de se criar uma forma de convivência com a questão da indisciplina com vista a sustê-la ou a resolvê-la?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação, dispondo de 5 minutos.

O Sr. Ministro da Educação: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, vou ser breve em relação às questões colocadas, que são pertinentes, agradecendo muito o facto de as terem colocado.
Às questões colocadas pelos Srs. Deputados do PSD vou dar duas- respostas muito rápidas. A competência disciplinar dos professores é concretamente aumentada, porque, como não se mexe na grelha, ou seja a advertência e a ordem de saída mantêm-se, o que passa a existir é um artigo l2.º, em que ao professor cabe também a prevenção e a resolução do problema dentro (Ia sua sala de aula.
Quanto ao papel do professor dentro da escola, é evidente que este sai reforçado por uma razão muito simples: o professor vai poder sentir por detrás dele uma instituição, uma estrutura, um órgão, que o suporta nas suas próprias decisões em matéria disciplinar, ao contrário do que existe hoje, onde o professor. isso, sim, estás completamente isolado, porque a escola não tem um regime disciplinar, próprio. Mas passará a tê-lo através desta legislação.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Não tem?!

O Orador: - O problema da burocracia é diferente daquele que coloca. E que o regime que aqui está apresentado - e já tive ocasião de o dizer - simplifica o Código do Procedimento Administrativo, e nunca podemos deixar de foral a defesa das o dos cidadãos.

Vozes do PS: - Muito hem!

O Orador: - A defesa das garantias dos cidadãos é absolutamente essencial como forma de a escola educar todas as nossas crianças e jovens nas regras da cidadania.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, também lamentamos que ainda haja escolas onde temos de ter turmas com um número excessivo de alunos. Mas, cuidado!, este não é o único factor que deve ser posto em causa. Por exemplo, há países, como é o caso da Inglaterra, onde a maior parte das turmas, na escolaridade obrigatória, têm mais de 30 alunos. O problema não é este, o problema não é quantitativo mas, sim, relativo aos apoios que essas crianças têm durante as aulas em turmas com 30 alunos.

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Em relação aos edifícios e aos gimnodesportivos, só para lhe dar uma ideia do esforço que fizemos, devo dizer que nos últimos dois anos construiram-se 177 novas escolas e 61 pavilhões e,...

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Há ainda muitas escolas a funcionar sem pavilhões gimnodesportivos!

O Orador: - ... no ano de 1998, irão construir-se mais 49 pavilhões. É evidente que «Roma e Pavia não se fizeram num dia», não somos capazes de fazer para todos, depois de termos estado 13 anos sem se construir qualquer pavilhão desportivo. Temos de ter uma enorme capacidade para recuperar as escolas que foram construídas sem pavilhões.

O Sr. Carlos Marta (PSD): - Não é verdade, Sr. Ministro! Isso não é verdade!

O Orador: - O que é que verdadeiramente não estamos a altera' e que pensamos poderá ser alterado. Estamos a receber no Ministério um número muito significativo de sugestões e propostas de alteração a este regime disciplina', como estou seguro de que vamos receber em relação ao regime de autonomia e gestão. E o trabalho que vai ser feito dentro do próximo mês e meio é o de recolher toda esta informação, tratá-la e depois encontrar as formas adequadas. Não somos autistas, nunca o fomos, estamos receptivos às propostas que nos forem feitas e à medida que entendemos que elas se adaptam e integram rio espírito do que entendemos dever ser estes diplomas elas serão tidas em conta.
Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, aquilo a que chamou «perplexidade legítima» não tem, a meu ver, razão de ser, porque o projecto que apresentamos toca numa questão que, em minha opinião, é essencial e que tem muito a ver com o que disse do educável e recuperável. Tem de se distinguir o que é uma Segunda oportunidade e uma última oportunidade. A Europa está hoje a discutir esta matéria, e eu próprio, em várias reuniões no Conselho de Ministros da União Europeia, tive ocasião de dizer à Sr.ª Edith Cresson que é uma grande defensora das escolas de segunda oportunidade, que isto não me parecia serem escolas de segunda oportunidade imas escolas de última oportunidade. Penso que temos de esgotar a segunda oportunidade dentro da própria escola, porque como diz, quando se faz a recuperação da criança é sinal de que ela já está foi-a, já se excluiu, já foi excluída, pelo que lemos de a segurar pelas boas razões dentro da escola temos de dar urna grande importância à segunda oportunidade. O que este diploma pretende, o que gostaríamos de atingir, é a defesa intransigente da segunda oportunidade.

A Sr.ª Maria José Nogueira finto (CDS-PP): - Mas não à custa dos outros!

O Orador: - Nunca à custa dos outros. Por isso é que
temos de ter uma grande flexibilidade em relação aquilo que se prosa dentro de cada escola e na comunidade educativa em que a escola está inserida, porque, como dizia a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto ontem à noite, é essencial que tenhamos a noção de que este não é um
problema de uma grande dimensão. Felizmente, estes problemas de gravíssima indisciplina estão inseridos em limites muito bem definidos.
Posso dar aqui os números que temos relativamente aos casos mas graves: em dois anos, em cerca de 1,8 milhões de estudantes, tivemos apenas 16 casos de pena máxima, ou seja do chamado grau 6.º, que é aquela que vem à minha mão, em que só o Ministro tem capacidade... E isto mostra que, cora a diversidade e multiplicidade de casos, cada escola deve ter o seu regime.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, já esgotou o tempo, pelo que peço que termine.

O Orador: - Peço só ura segundo, Sr. Presidente, para terminar.
E, curiosamente, o que nós verificamos é que é nas escola de maiores problemas onde estes métodos foram ensaiados. Se visitar uma escola como a Azevedo Neves ou como a do Monte da Caparica ou como a Escola de Alfornelos, verifica que são escolas inseridas em comunidades muito difíceis e onde esta segunda oportunidade foi dada com grande sucesso, o que nos surpreendeu e nos daí grande satisfação para apresentar este diploma.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por terminado o debate de urgência sobre «regime disciplinar para o ensino básico e secundário», requerido pelo CDS-PP; e com ele o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem do dia com o debate conjunto, na generalidade, dos projectos de lei n.os 379/VII - Lei das associações de deficientes (PCP) 436/VII - Associações de pessoas portadoras de deficiência (PSD), 437/VII - Observatório para a integração das pessoas portadoras de deficiência (PSD) e 438/VII - Incentivos ao emprego domiciliário de trabalhadores portadores de deficiência (PSD).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde sempre que as pessoas com deficiência são discriminadas. Trata-se de uma verdadeira e gritante violação dos direitos humanos que acontece em todos os países e sociedades, independentemente do seu maior ou menor desenvolvimento ou das suas diferenças culturais.
As Nações Unidas dedicam, desde há muito, atenção
,aos direitos das pessoas com deficiência. Assim, o ano de 1981 foi o Ano Internacional das Pessoas Deficientes e a reflexão desenvolvida, desde então, levou, uma década depois, a adopção das «Regras geras sobre a igualdade de oportunidades para as pessoas corri deficiência».
Acontece que, para além da existência de políticas anti-sociais, que penalizam exponencialmente os deficientes, mesmo em relação ao resto da sociedade, instala-se generalizadamente o desrespeito dos seus direitos específicos e caos seus direitos em concreto.

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Quer isto dizer que, para além de sofrerem as agruras das políticas anti-sociais. que também no nosso país campeiam há veios anos, enfrentam ainda a negação dos seus direitos e apoios mais elementares.
A isto se junta a estigmatização cultural e social que cot1tinua a existir. A realidade é a do desrespeito e desconhecimento dos direitos que, embora insuficientes, já foram alcançados. São direitos por vezes desconhecidos mesmo pelos próprios.
Só por isso, seria já clara a importância do papel das associações de deficientes como veículo fundamental e indispensável para a defesa, a divulgação e o alargamento dos direitos das pessoas com deficiência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas também pela sua actividade própria, pelo envolvimento que conseguem dos seus associados para a resolução dos problemas que os afectam, são as associações de deficientes o principal motor da diminuição do fosso que impede a plena integração das pessoas com deficiência na sociedade.
A nossa Constituição reconhece a importância destas organizações e obriga o Estado a apoiar o seu esforço. Também as Regras Gerais das Nações Unidas lhes dedicam um artigo, no sentido de serem apoiadas e de participarem na definição das políticas oficiais a nível local, regional e nacional.
Em Portugal o trabalho das associações de deficientes tem sido o mais importante contributo para que a vida das pessoa seja melhorada e para que a sua plena integração seja cada vez mais conseguida. A capacidade de intervenção nas diversas áreas específicas a que se dedicam, bem como a conjugação de esforços que conseguem atingir, mostram, inequivocamente e sem margem para dúvidas, a força e a adia do movimento associativo dos deficientes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - São exemplos disso a existência da Confederação Nacional dos Organismos de Deficientes, que. entre outras iniciativas, levou a cabo, há pouco mais ele um ano, o 2.º Parlamento Nacional de Deficientes, do qual saíram diversas propostas concretas, que, na sua maioria, continuam por concretizar por este Governo.
Por todas estas razões se impõe unia lei como a que o PCP propõe, que reconheça direitos e assegure a participação plena e intervenção das associações de deficientes. enquanto contributo na definição das políticas e da legislação no domínio da reabilitação e integração social das pessoas com deficiência.
Propõe-se ainda que lhes sejam dados instrumentos para uma mais eficaz defesa dos direitos e interesses dos deficientes, com especial destaque para a possibilidade de se constituírem assistentes nos processos-crime por violação de direitos de pessoas com deficiência.
Propõe ainda o PCP diversas isenções e regalias que auxiliem estas associações a suportar os custos do seu funcionamento e actividade.
A leitura do projecto do PCP, apresentado alguns meses antes dos do PSD, praticamente dispensa a leitura do projecto de lei n.º 436/VII, do PSD.
Para manifestar a sua concordância com o proposto pelei PCP, bastaria ao PSD declará-lo aqui no Plenário. Resolverem ir mais além e apresentarem um projecto de lei que, deixando de fora direitos importantes, é quanto ao resto uma síntese empobrecedora do projecto do PCP.
é, provavelmente esta uma necessidade do PSD de massajar a sua própria consciência, pesada e atormentada por muitos anos de uma política que esqueceu a integração dos deficientes,...

O Sr. João Amaral (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - ... degradou as suas condições de vida e ignorou os protesto e os direitos de participação das suas associações representativas.
O caso é tanto mais grave quanto se verifica que, afinal, mesmo direitos fundamentais, como o do crédito de tempo para os dirigentes associativos, ficam, até neste projecto actual, esquecidos.

O Sr. José Calçada (PCP): - Uma vergonha!

O Orador: - O crédito de tempo para os dirigentes associativos não é um privilégio, é um direito e uma necessidade, não tanto dos dirigentes mas, sobretudo, das suas associações e de todos os deficientes.
Muito do que, apesar de tudo, foi feito para a integração dos cidadãos portadores de deficiência deve-se à acção das associações ele deficientes, tantas vezes lutando contra política e medidas contrárias aos seus direitos.
Por isso, alargar a capacidade de acção das associações de deficientes, dando melhores condições aos seus dirigentes e consagrando os seus direitos, é melhorar a defesa e a concretização de uma cada vez maior integração dos cidadãos portadores de deficiência na nossa sociedade.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mas o PSD propõe ainda no seu projecto de lei uma medida que acaba por denunciar algum menor empenhamento na valorização das associações de deficientes. Trata-se da proposta que atribui ao Governo a competência para avaliar se uma associação desta área tem ou não representatividade genérica.
É uma ingerência na autonomia do movimento associativo, para a qual não se encontra qualquer justificação. Mais do que isso, ignora a realidade das associações de deficientes, a sua capacidade de organização, que chegou até ato facto de terem organizado em confederação, que já existe, funciona e tem um papel positivo e activo na proposta de soluções concretas para os diversos problemas que existem nesta área.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora com atraso, tem neste momento a Assembleia da República a possibilidade de dotar de um quadro legal bastante mais favorável as associações de deficientes. Não ficarão resolvidos com isto os problemas das pessoas com deficiência, mas, pelo menos, ternos agora a oportunidade de dar melhores condições àqueles que mais lutam pelos deficientes, que são eles mesmos.

Aplausos do PCP, de Os Verdes e do Deputado do CDS-PP, Nuno Abecasis.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

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O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, quero felicitá-lo pela iniciativa e por trazer a esta Câmara um debate que, penso, é pertinente, tem toda a oportunidade e deve ser feito.
Gostava, entretanto, de colocar-lhe algumas questões. Em primeiro lugar, penso que, de facto, a maior ambição de um deficiente é continuar a poder sonhar, a ter esperança de realizar os sonhos, a ter capacidade de superar a sua deficiência e a ter direito a participar na vida social e na vida cívica, como qualquer outro cidadão.
Penso que, nessa matéria e nessa medida, os poderes públicos têm. urna responsabilidade acrescida, mas, infelizmente, nem sempre ela tem sido assumida e cumprida.
Penso também que o Partido Popular fala sobre esta matéria com alguma autoridade, porque, nas câmaras municipais a que presidimos, sempre promovemos a integração dos deficientes, sempre desenvolvemos políticas por forma a que eles tivessem uma participação e um lugar onde se pudessem afirmar e por forma a poderem superar essa mesma deficiência. Como exemplo disso, temos o Sr. Engenheiro Abecasis, que foi quem, enquanto Presidente da Câmara. Municipal de Lisboa, protagonizou as primeiras medidas de verdadeira integração e afirmação dos deficientes.
A questão que lhe quero colorar, Sr. Deputado, é, tão-só, esta: no artigo 4.ª do projecto de lei que apresenta, que diz respeito aos direitos de participação e intervenção, o Sr. Deputado refere o direito de participação e de intervenção á associações de deficientes, mas apenas no âmbito nacional, porque quanto ao âmbito regional ou local, como lhe queira chamar, apenas lhes atribui direitos de consulta e de informação. E nesta medida que penso haver aqui uma contradição e, por isso, gostaria de ouvir a sua opinião sobre isto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bernardino Soares, tem mais um pedido de esclarecimento. Deseja responder já ou responde no fim aos dois pedidos de esclarecimento?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, não lhe vou pedir qualquer esclarecimento, apenas lhe quero fazer uma pequena anotação.
Em primeiro lugar, V. Ex.ª e a sua bancada não são campeões da consciência social. Nós não chegamos tarde, não estamos a imitar quem quer que seja, estamos igualmente sensibilizados para a problemática da deficiência, muito nos orgulhamos por isso e, portanto, não puxe pelos galões, porque eles são imerecidos no seu caso.
Em segundo lugar, devo dizer-lhe também que se pretende fazer chicana política acerca da questão de deficiência, não conte comigo, não conte com a bancada do PSD. É apenas um aviso!

O Sr. Presidente: - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, é nossa intenção, quando consagramos os direitos de participação e de intervenção directa na definição das políticas em relação aos problemas desta área, fazê-lo não só a nível nacional mas também a nível regional, a nível local e a todos os níveis em que haja uma efectiva importância das decisões tomadas nesta área.
Estamos, obviamente, abertos para melhorar as soluções que aqui apresentamos, mas quero chamar-lhe a atenção para o artigo 7.º do nosso projecto de lei, em que se indicia precisamente a necessidade de esta colaboração ser não só a nível das grandes linhas da política nesta área mas também em relação às questões mais concretas e mais localizadas, que, muitas vezes, têm uma importância fundamental na melhoria da qualidade de vida das pessoas com deficiência, no aumento da sua capacidade de integração e na diminuição das barreiras que continuam a existir para a sua plena integração na sociedade.
Portanto, a nossa preocupação é também nesse sentido e este artigo 7.º expressa claramente a nossa intenção de caminhar para aí.
Em relação às palavras da Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, devo dizer-lhe que não pretendi, com a minha intervenção, nem o PCP pretende, fazer qualquer chicana política em relação a este assunto.
Mas, independentemente do agrado com que vemos o PSD, em tansas matérias, como as do seu projecto de lei, coincidir na apreciação que faz das necessidades que há de dotar a associações de deficientes com um quadro legal que lhes permita ler acesso a uma série de direitos que hoje ainda não têm, permita-me que lhe diga que ficaram esquecidas ou ficaram propositadamente de fora no projecto de lei do PSD - é uma questão de opção política - uma série de questões que, na nossa opinião, são muito importantes.
É muito importante, em nossa opinião, que os dirigentes associativos das associações de deficientes tenham a possibilidade de dedicar mais tempo ao trabalho válido e indispensável que têm nas suas associações. É por isso que instituímos e propomos no nosso projecto de lei a questão do crédito de tempo. É isso que falta no projecto de lei do PSD.
Se a Sr.ª Deputada considera isto chicana política, enfim, será a sua avaliação, mas parece-me mais do que isso, que é uma verdadeira necessidade nesta área e que é uma proposta justa e com verdadeiros reflexos na acção das associações de deficientes e na melhoria das condições de vida dos deficientes deste país.

O Sr. José Calçada (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - Por outro lado, quero ainda dizer-lhe que há uma outra questão que aflora no seu projecto de lei e que, a nosso ver, é bastante reprovável, que é a de se considerar que deve ser a tutela governamental a reconhecer se as associação de deficientes são ou não de representatividade genérica.
Ora, parece-nos que, sendo as associações de deficientes, como quaisquer outras, aquando da sua constituição e da elaboração dos seus estatutos, fiscalizadas pelas entidades competentes até à publicação destes mesmos estatutos no Diário ela República, não deve caber, para além disso, senão às próprias associações, aos seus associados, àqueles que as constituem, a definição do seu âmbito de acção, a definição do seu âmbito de actuação.

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Por outro lado, também entendemos que protagonizar e propor uma medida que se traduz na tutela. por parte de uma entidade governamental, da definição desta ou daquela característica, desta ou daquela capacidade de acção de qualquer associação de deficientes é uma ingerência, não aceitável, no movimento associativo em geral, é uma ingerência, não aceitável, no movimento dos deficientes e denuncia um desconhecimento ou um desrespeito pelo trabalho válido que tem sido feito nesta matéria e pela capacidade de organização que estas associações têm no nosso país.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para apresentar os projectos de lei n.ºs 436/VII, 437/VII e 438/VII, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: O direito de cidadania percorre universalmente todos os membros da sociedade e pressupõe que cada cidadão goze de uma efectiva igualdade de oportunidades.
Uma sociedade moderna, cívica e com sentido de solidariedade deve criar as mais amplas condições para que as pessoas portadoras de deficiência possam desenvolver-se e afirmar-se em paridade com os restantes concidadãos.
A Constituição Política Portuguesa consagra o princípio da igualdade de todos os cidadãos perante a lei, rejeitando, implicitamente, todas as formas de discriminação. Todavia, na sociedade portuguesa, a deficiência é ainda, e frequentemente, fonte de discriminações, sendo urgente, por isso, uma resposta política decidida e adequada.
Importa criar condições efectivas que permitam, na prática, às pessoas portadoras de deficiência ser cidadãos de corpo inteiro, com os mesmos direitos e as mesmas obrigações que os demais, de modo a poderem participar activamente na vida cívica, política, económica, social e cultural do País.
Assim sendo, compete ao Estado promover campanhas de sensibilização e de informação da população, para que a sociedade tenha maior consciência das pessoas portadoras de deficiência, dos seus direitos, das suas necessidades, das suas potencialidades e da sua real contribuição. Compete-lhe também legislar em conformidade com as necessidades específicas deste segmento da população. de forma a anular o estigma de que, ao longo dos anos, enfermou o conceito de deficiência.
Mas, neste contexto, não é menos verdade que cabe igualmente às associações de pessoas portadoras de deficiência um papel essencial na defesa e promoção dos direitos e interesses das pessoas com deficiência e bem assim na respectiva integração social e familiar na sua valorização e realização pessoal, cívica e profissional.
Daí que as associações de pessoas com deficiência devam gozar de direitos especiais de acção e participação, desde a possibilidade de contribuírem Para a definição das políticas de integração e de reabilitação até à promoção da eliminação de barreiras sociais, física, psicológicas, económicas e outras e à plena aceitação das pessoas portadoras de deficiência como membros efectivos da sociedade.
É com este propósito que o Partido Social Democrata apresenta a esta Câmara o projecto de lei-quadro das associações de pessoas portadoras de deficiência, com direitos específicos, com valores e com interesses concretos, que urge providenciar e proteger.

Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A reabilitação e a integração das pessoas portadoras de deficiência devem mobilizar toda a sociedade portuguesa.
A resolução dos gravíssimos problemas das pessoas com deficiência não se compadece com a adopção de medidas pontuais, exigindo antes uma definição e um planeamento da política nacional de reabilitação.
Para tanto, urge sensibilizar e consciencializar a sociedade para os custos morais e económicos que advêm para todos nós da marginalização de milhares de cidadãos e do seu impedimento real em participar de forma plena na vida do País, que, assim, não pode beneficiar do contributo de todos os seus cidadãos e dos seus respectivos saberes.
E se o Estado deve assumir as suas responsabilidades no que concerne ao apoio a organizações de e para as pessoas com deficiências, não é menos certo que a integração e a reabilitação são tarefas que hão-de ser desenvolvidas em parceria social, com envolvimento sério e efectivo de um leque significativo de entidades.
Será dessa conjugação multidisciplinar de esforços que há-de decorrer a necessária e desejada eficácia. Será dessa articulação de vontades e desse empenhamento e envolvimento críticos que há-de resultar uma crescente consciência colectiva para a problemática da integração das pessoas com deficiência.
É com este propósito que o Partido Social Democrata propõe a esta Câmara a criação do observatório para a integração cias pessoas portadoras de deficiência, com tarefas como a definição dos indicadores de uma efectiva integração social e profissional das pessoas com deficiência, a formulação de propostas tendentes a promover a referida integração e o apuramento anual da situação nacional cias pessoas portadoras de deficiência.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A integração social das pessoas portadoras de deficiência passa inquestionavelmente pela expansão das oportunidades de emprego.
Ora, o emprego domiciliário tem virtualidades insuspeitas, na medida em que pode permitir ultrapassar ou mesmo eliminar obstáculos relacionados com condições de saúde, segurança e fadiga e, bem assim, com a necessidade de assistência pessoal, garantias de acessibilidade de transportes e superação de barreiras arquitectónicas, com que as pessoas com deficiência se vêem confrontadas.
Assim, porque importa estimular este tipo de trabalho, no interesse das pessoas portadoras de deficiência e da sociedade em geral, o Partido Social Democrata apresenta a esta Câmara o presente projecto de lei, que visa criar incentivos ao emprego domiciliário de trabalhadores portadores de deficiência, quer mediante contratação por tempo indeterminado, com maior estabilidade, quer para prestação de serviços.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, quero dizer-lhe que concordo com a maior parte daquilo que nos quis dizer daquela tribuna.
Também penso que a maior riqueza da vida de um homem é a contínua descoberta de si próprio, das suas capacidades, das suas vocações e das suas aptidões, é a constante procura da realização de sonhos, que permite esquecer os infortúnios do presente e ter a confiança de

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que o amanhã será diferente. E é aqui que a deficiência, tantas e tantas vezes, marca a sua presença. É esta confiança de que o amanhã será diferente que é quebrada, é a incerteza, é a angústia, que substitui a esperança.
Quero dizer-lhe que os diplomas apresentados pelo PSD têm boas intenções, mas são parcos em soluções. Penso que a solução do trabalho domiciliário é uma boa solução, mas, com tecla a franqueza, no projecto de lei apresentado a promoção do emprego domiciliário esgota-se nos benefícios fiscais. Penso que poderíamos ir mais além, e era sobre isso que gostava de questionar a Sr.ª Deputada, sobre a disponibilidade do PSD para analisar outras soluções.
Uma pensão de algumas dezenas de contos é sempre muito pouco e é apenas um remendo. Penso que a faculdade de um deficiente poder remir essa pensão. ou seja, receber o seu montante, para lhe permitir criar o seu próprio emprego, investir e, dessa forma, realizar-se, seria uma solução que eventualmente concorreria e responderia às verdadeiras aspirações dos deficientes.
É que, por vezes, para aliviarmos a nossa consciência, discutimos aqui o aumento das pensões, um aumento de 10% ou 20%, que, sobre 30 000$ ou 40 000$, não é nada, Sr.ª Deputada, não é o que vai resolver o problema dos deficientes.
Penso que a sensibilidade de serem remidas as pensões, seria tuna solução que deveríamos ponderar e considerar.
De qualquer maneira, da mesma forma que felicitei o Sr. Deputado do PCP, felicito a Sr.ª Deputada, por trazer a esta Câmara este debate.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, agradeço-lhe ter-me permitido, com a resposta ao esclarecimento que solicita, dizer que estou certa de que não leu com a devida atenção o projecto que apresentamos sob a forma de incentivos ao emprego domiciliário. É que não se trata de pensões nem de subsídios. Aliás, o PSD neste domínio muito concreto - e não só - diverge profundamente do Governo. Se pensa-mos no que foi o anúncio do Dia Internacional da Pessoa Com Deficiência, vemos que o Governo proeurou tirar dividendos políticos da manipulação tecnocrática dos aumentos de subsídios.
Ora, aquilo que entendemos - e penso que podemos falar até em termos muito largos, ou seja, também em nome dos deficientes e das associações de pessoas com deficiência - é que uns e outras não querem «caridadezinha». O aspecto do apoio financeiro é fundamental, mas o que estas pessoas pretendem, como qualquer um de nós, porque não há diferença alguma, é ensino, emprego e transportes adequados à sua especificidade.
Assim sendo, ultrapassámos a fase do aumento dos subsídios para entrarmos no emprego, na resposta a um anseio que é natural em qualquer cidadão e, por isso mesmo, também natural nos cidadãos portadores de deficiência. E o incentivo fiscal que aqui se encontra previsto é dirigido ao empregador, para que ele não olhe de lado o candidato deficiente, para que ele o olhe como outro qualquer e, sobretudo, tenha em conta que o candidato com deficiência não é igual ao candidato que não a tem. Por isso mesmo, pode eventualmente ser mais prático, porque mais cómodo para o candidato - não para a empresa ou para o empregador -, que ele esteja a trabalhar em casa, fazendo, por exemplo, traduções ou processamento de texto ou outro tipo de trabalho domiciliário, que evita que ele esteja sujeito aos constrangimentos das ditas barreiras arquitectónicas, as mais significativas para os deficientes, e que possa ser útil à sociedade.
Não é caridade, não é subsídio, é reconhecimento do valor profissional, de realização profissional, que, para os trabalhadores portadores de deficiência, é tão importante quanto para Iodos nós.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando falamos de pessoas portadoras de deficiência referimo-nos a 9,16% da população portuguesa.
O pacote legislativo que, hoje, analisamos tem o mérito de chamar a atenção para um debate que concita, na sociedade portuguesa, largos consensos, que, nem sempre se traduzem em medidas concretas e em benefícios efectivos para estes cidadãos portugueses.
Os portugueses têm uma taxa de deficiência ao nível das médias comunitárias. Porém, algumas das causas da deficiência e os baixíssimos níveis de inserção no mundo do trabalho devem ter a nossa preocupação e empenhamento.
O maior índice de deficiência é de locomoção, que atinge 357 000 cidadãos, sem que os progressos na eliminação de barreira,; arquitectónicas e nos transportes sejam satisfatórios, embora se verifique uma melhoria significativa no acesso a aparelhos e na recuperação de quase todas as incapacidades.
As mulheres são o maior número de pessoas portadoras de deficiência, o que está relacionado com o aumento das deficiências a partir dos 65 anos de idade. Portanto, a necessidade de medidas especiais de apoio à mulher na prevenção de doenças que frequentemente encurtam a sua vida activa e qualidade de vida nem sempre tem merecido melhor observação.
Muito preocupante é ainda a origem (Ias deficiências, sendo elevadíssima a percentagem das, originárias na gravidez e no parto, o que reflecte a situação social e cultural da mulher portuguesa e a insuficiência na assistência à maternidade. A hereditariedade representa a causa de 14,35% das deficiência, a gravidez 14,39% e o parto 11,51%. No conjunto, são metade da origem da deficiência psíquica. A coincidência de maior número de casos tias regiões do norte e do interior confirmam a necessidade de intensificar a acção cultural e preventiva junto das populações, na protecção à gravidez e ao parto, de forma mais eficaz.
Também os acidentes, domésticos, rodoviários e de trabalho e a doença profissional são responsáveis por 17% das incapacidades físicas, sendo que as de origem laboral, 7%r, superam as causas naturais da vida, o envelhecimento.
Os baixos níveis de educação são um grande obstáculo à empregabilidade: 90%, dos incapacitados motores não têm qualquer escolaridade, tal como 45% das deficiências psíquicas. Este é, na verdade, o principal obstáculo à autonomia económica, mas não o único.
Nunca, como hoje, na decisão das empresas, pesaram tanto os factores imediatistas de produtividade, avaliada apenas a partir do interior da empresa, de costas para a sociedade em que está globalmente inserida.
As novas tecnologias e os novos modelos de organização

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do trabalho podem constituir um aliado valioso de muitas pessoas com deficiência.
Há que fazer um esforço que, mesmo em termos económicos, será sempre compensador na aposta em todas as formas de qualificação e integração pelo trabalho, destacando-se os apoios ao teletrabalho e à transformação e adaptação dos postos de trabalho, como alguns dos meios mais eficazes de integração pelo trabalho.
Muitas das Chamadas reestruturações servem apenas para excluir os trabalhadores portadores de deficiência ou incapacidade, mesmo aqueles vítimas de acidente ou doença profissional, ao serviço da empresa.
A prevenção, reabilitação e inserção das pessoas com deficiência constitui para o Partido Socialista uma matéria suprapartidária. O respeito e solidariedade que nos merecem estes cidadãos fazem com que a nossa acção seja sempre insuficiente e que consideremos absolutamente essencial o contributo e determinação de todas as forças políticas e sociais lia defesa e promoção dos direitos e interesses das pessoas portadoras de deficiência.
O Partido Socialista apresentou-se ao eleitorado português reconhecendo que o modo como as pessoas deficientes são tratadas impede-as do exercício da cidadania plena e, com vista a inverter tal situação, apresentou um vasto conjunto de medidas, que estão a ser implementadas e das quais me permito destacar as seguintes: a promoção de iniciativas que satisfaçam as condições necessárias à existência de um instrumento de coordenação das políticas e dos meios, dos níveis central, regional e local, para a integração das pessoas com deficiência: a garantia aos deficientes dos meios específicos paul a sua mobilidade social e laboral; o incentivo e apoio às associações de deficientes, privilegiando o diálogo com os interlocutores mais válidos neste domínio, para definir o estatuto do dirigente associativo e regulamentar os apoios financeiros, e a promoção da solidariedade com aqueles que necessitam de meios e compensações especiais para acederem à cidadania.
Na concretização destas medidas, defendemos uma participação activa dos próprios cidadãos com deficiência, assim como de todos os agentes que, nas comunidades, devem intervir no processo.
Por outro lado, a nossa aposta não é definir uma política sectorial para as pessoas com deficiência, Imas, antes, ter em conta os interesses destes cidadãos na definição de cada uma das política.
Não podemos espera apenas que o Acordo de Concertação Estratégica e o Livro Verde da Comissão sobre Parceria para uma Nova Organização do Trabalho, que constituem princípios fundamentais de reintegração no trabalho pela via da formação e requalificação profissional, sejam aplicados e respeitados automaticamente.
É necessário sistematizar as acções pedagógicas, fiscalizadoras, e punir, na opinião pública e na imagem das empresas, as situações dramáticas que hoje se vivem em silêncio.
Daí que seja bem-vindo o reforço do movimento associativo e seria de grande injustiça não salientar o impulso que o Governo lhe deu, em cumprimento do seu programa eleitoral.
A nova lei orgânica, o Decreto Regulamentar n.º 56/97, extinguiu o anterior Secretariado Nacional de Reabilitação e criou o Secretariado Nacional de Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência, colocando a integração como um plano prioritário.
O Decreto-Lei n.º 225/97 deu corpo à Recomendação de 9 de Abril de 92 do Conselho da Europa para estabelecer laços de coordenação entre os organismos, as adminis1raçCxïs, central e local, as famílias e as associações, com vista à integração das pessoas com deficiência.
Assim se constituiu o Conselho Nacional para a Reabilitação e Integração das- Pessoas com Deficiência, que proporciona a participação dos serviços públicos, dos parceiros sociais e do movimento associativo interveniente nas áreas da prevenção, reabilitação. e integração.
O Governo promoveu, ainda, um vasto conjunto de medidas, das quais destaco as seguintes: o Decreto-Lei n.º 123/97, de 22 de Maio, sobre barreiras arquitectónicas; a regulamentação do financiamento das ajudas técnicas para as pessoas com deficiência; melhor articulação entre a Administração e os cidadãos, designadamente com cidadãos com deficiência representados no Fórum Cidadão/Administração; o desenvolvimento de projectos de apoio às pessoa« com deficiência, por exemplo, na área do emprego, o Eixo Horizon, o projecto RENNACE, que visa a criação de uma rede nacional de núcleos de atendimento e de acessibilidade para o universo do sistema nacional cie reabilitação, e o projecto ATINOVA, que visa identificar o funcionamento de centros de avaliação, prescrição, financiamento, treino, manutenção e retoma de ajudas técnicas.
Por outro lado, foi com grande agrado que vimos o Governo português contribuir, no âmbito da recente revisão do Tratado de União Europeia, para a introdução de uma cláusula antidiscriminatória, relativamente aos cidadãos europeus com deficiência.
Neste contexto, consideramos positivas as iniciativas apresentadas pelos partidos da oposição, hoje em debate, relativamente às quais me permito fazer os seguintes comentários: quanto aos projectos de lei n.ºs 379/VII, do PCP, e 436/VII, do PSD, punhos referentes às associações de deficientes, os mesmos merecem o nosso acolhimento, não obstante, em sede de discussão e aprovação na especialidade, deverem merecer ajustes e benfeitorias, tendentes à aprovação de um quadro jurídico adequado, eficaz e que consubstancie os justos anseios do movimento associativo, tanto mais que o Governo promoveu uma discussão pública com as associações interessadas, que concluiu em Setembro passado, havendo, neste momento, um processo de negociação em finalização, a ser brevemente presente ao Parlamento.
A criação de um regime específico aplicável a estas associações, com uma clarificação e reforço dos seus direitos, é para o Partido Socialista urna questão legítima e urgente. Trata-se, pois, de uma medida que o próprio Governo já desencadeou e da qual tencionamos participar, e que é reforçada pela mais-valia dos contributos deste movimento associativo.
Considerámos, pois, que, após a discussão da proposta governamental, poderemos partir para uma discussão, na especialidade, dos três, diplomas, convictos de que o Parlamento produzirá um diploma final consensulizado não só pelas forças. políticas como, inclusivamente, pelos principais destinatários do mesmo.
No que concerne ao projecto de lei n.º 437/VII, do PSD, que visa a criação de um observatório para a integração das pessoas portadoras de deficiência, o mesmo afigura-se-nos uma medida desproporcionada e inoportuna, designadamente tendo em conta a recente criação do Conselho Nacional para a Reabilitação e Integração de Pessoas com Deficiência, esse, sim, com estas funções.

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De facto, ao invés de estarmos a duplicar as estrutura, melhor e mais adequado afigura-se-nos rentabilizar as que existem e que estão já em funcionamento. De uma análise atenta ao projecto proposto pelo PSD, verifica-se que as competências atribuídas ao observatório pretendido já se encontram, hoje, atribuídas ao Conselho Nacional para a Reabilitação e Integração de Pessoas com Deficiência e melhor seria que a participação das associações e dos interessados se consubstanciasse no Observatório do Emprego, já existente, bem como noutros com igual interesse.
Assim, trata-se de um projecto de diploma que contém normas que poderão levantar dificuldades quer no plano jurídico, quer no plano prático. Com efeito, a aprovação do presente diploma, tal como se encontra redigido, tem implicações ao nível da organização do Governo.
Parece-nos mais adequado promover a participação das associações de deficientes nas estruturas existentes, de forma multidisciplinar, nomeadamente, repito, no Observatório do Emprego.
Por último, relativamente ao projecto de lei n.º 438/VII, do PSD, que visa criar incentivos à contração domiciliária de pessoas com deficiência, dir-se-á que os objectivos que lhe estão subjacentes se afiguram minimalistas e à Sr.ª Deputada Eduarda Azevedo, que acusou o Governo de eleitoralista, gostaria de dizer que este diploma não me parece atingir, ele sim, outros objectivos que não esses -, quando o PSD sabe que se encontra em vigor um sistema que contempla vários mecanismos de incentivo à contratação destes trabalhadores, independentemente da natureza do vínculo jurídico-laboral que tenham, seja ou não trabalho domiciliário.
Com efeito, para além das pessoas deficientes gozarem de benefícios fiscais acrescidos relativamente aos demais trabalhadores - e bom seria que muitos trais pudessem beneficiar -, as entidades empregadoras também gozam de um regime especial. A Lei n.º 127-B/97, de 20 de Dezembro, Orçamento do Estado para 1998. Prevê já incentivos aos empregadores, aquando da criação de postos de trabalho a trabalhadores em regime de desigualdade.
Também no domínio da segurança social, as entidades empregadoras que empregam pessoa.,; com deficiência pagam apenas 12,5% dos encargos sociais, nos termos do Decreto-Lei n.º 299/86, de l9 de Setembro, que a Sr.ª Deputada conhece, e estão isentas no pagamento de contribuições por um período de dois anos, quando empreguem pessoas com deficiência com idades compreendidas entre os 16 e os 30 anos, nos termos do Decreto-Lei n.º 257/86, de 27 de Agosto.
Com base no disposto no Decreto-Lei ti." 247/89, de 5 de Agosto, as entidades empregadoras que admitam pessoas com deficiência beneficiam ainda de um subsídio de compensação, de um subsídio para eliminação de barreiras arquitectónicas, de um subsídio ele adaptação dos postos de trabalho, de um subsídio de acolhimento personalizado e de um prémio de integração, medidas estas que, a ser aplicadas, são, de facto, eficazes na empregabilidade nas pessoas portadoras de deficiência.
Sem menosprezar as iniciativas do Parlamento, este processo tem o inegável enriquecimento dos contributos dos parceiros e dos mais interessados. Daí que entendamos que os diplomas em apreço devam ser debatidos em sede da 8.ª Comissão, conjuntamente com as propostas do Governo, e que aí sejam feita, a exemplo do que acontece com os acidentes de trabalho e outros em que seguimos esta metodologia, audiências ao Secretariado Nacional de Reabilitação, ao Conselho Nacional para a Reabilitação e Integração elas Pessoas Portadoras de Deficiência, onde têm assento as, associações, às associações especificamente e ao Governo, para que este processo legislativo resulte de um vasto consenso e tenha efectividade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, uma vez que a Sr.ª Deputada Elisa Damião já está instalada, já pode responder-me.

O Sr. José Magalhães (PS): - Instalada, no bom sentido!

A Oradora: - Instalada, no bom sentido! Nem outra coisa seria de esperar, dito por mim, dito por si, Sr. Deputado, já não saberia se diria o mesmo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Oh, isso é injusto! Que injusto!

A Oradora: - Mas a vida está cheia de injustiças, Sr. Deputado!
Sr.ª Deputada Elisa Damião, gostei de ouvi-la talar no Conselho Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoa s Portadoras de Deficiência, porque isso permite-me perguntar-lhe se, por acaso, não comunga - e esta é uma pergunta de retórica, pois, obviamente, de si, não estou à espera de uma resposta afirmativa - de uma crítica que frequentemente é feita a este novel Conselho Nacional: é uma mega-iniciativa - estamos na fase das «mega», mas das mega-promoções e era bom que se ficasse por aí, porque as mega-iniciativas acabam por redundar em nada ou coisa nenhuma - e é um órgão de staff do ministro.
Além do mais, é de uma operacionalidade discutível e discutida. E discutível por uma razão muito simples: a sua composição é gigantesca - e por isso digo que é uma mega-iniciativa -, são «só» 35 pessoas! Por seu turno, as reuniões são muito periódicas: saí uma vez por trimestre! Isto é chocante!
Ora, o que pretendemos com o observatório para a integração das pessoas portadoras de deficiência é criar um acicate, desde logo, para o Governo, que precisa de um acicate, uma vez que o Conselho Nacional não acicata coisíssima nenhuma - não direi que este é um «nado morto» finas está «comatoso», por natureza e por dúvidas -, e também para a sociedade. Com a criação deste observatório, não queremos aliviar piamente consciências, queremos números exactos relativamente à deficiência em Portugal, queremos a integração das pessoas com deficiência através da apresentação de propostas concretas, com consistência, feitas à luz de critérios adequados, portanto, não «em cima do joelho», não ao sabor das tendências e das inspirações do momento, mas com carácter cientifico.
Por outro lado, fiquei altamente perturbada e preocupada pela circunstância de, ma sua intervenção, ter dito, primeiro, que estes projectos de lei irão baixar à comissão - até aqui não me preocupei, pois esta é a tramitação normal, e muito saudável, na vida democrática portuguesa -, mas, depois, disse que. os projectos irão «esperar» na comissão pelas propostas do Governo. Ora,

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como o Governo vai iniciar o seu proverbial diálogo - e aqui é que reside a minha preocupação -, só receio que essa espera não corresponda a um adiamento para «as calendas gregas».
Penso que as pessoas portadoras de deficiência não perdoariam a todos nós - é que, aí, seríamos todos medidos pela mesma bitola - nem, eventualmente - porque não? -, à Sr.ª Deputada em concreto.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.

A Sr.ª Elisa Damião (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Eduarda Azevedo, agradeço as suas aunáveis considerações.
Sei que a Sr.ª Deputada tem preocupações sinceras relativamente a esta e a outras matérias, preocupações essas de que comungo em grande parte porque é francamente certo que, sendo a nossa legislação sempre generosa, estando os governos sempre preocupados e nunca sendo os diversos programas de governo parcos em promessas sobre matérias desta natureza, a verdade é que a concretização das políticas fica sempre muito aquém das nossas expectativas. Daí que, como se disse, estas sejam matérias suprapartidárias em que os contributos de todos têm, pelo menos, o grande mérito de colocar na ordem do dia um debate que tende a ser esquecido, que tende a ser residual no contexto político nacional. Aliás, olhando-se para o Parlamento e para as pessoas que intervêm nestas matérias, verifica-se que são sempre as mesmas e que têm sempre pouco «público».
Porém, Sr.ª Deputada, devo dizer que está a sor injusta para com o Conselho Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência. É que nada impede que, em vez de duplicar esta organização, possamos tomar medidas para a tornar- mais eficaz e mais efectiva a sua função, sobretudo em matéria de emprego, na qual eu própria e o meu partido lemos enormes preocupações.
Por exemplo, o Observatório de Emprego reúne duas vezes por mês e bom seria que lá estivessem representadas as associações e este Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência e que, nessa sede, pugnassem pelos interesses (Ias pessoas portadoras de deficiência.
Em todo o caso, penso que mais útil do que criar um novo órgão seria fazer a discussão em torno do que já existe. Por isso nos propúnhamos fazer este debate amplo, o que também não será cómodo para nenhuma das partes, que certamente será desenvolvido com os interessados, num processo de algum modo original em temos do processo legislativo. Penso que este processo foi muito bem sucedido aquando da revisão constitucional pois, quando as organizações foram ouvidas e se tomou conhecimento da perspectiva dos interessados, o debate foi bastante mais interessante e útil. Aliás, a própria reviso constitucional, mesmo nesta matéria, teve em atenção algumas das sugestões que então foram dadas.
Quanto à nossa proposta de se ter em consideração a proposta. de lei que o Governo irá apresentar, o que sucede; é que a mesma está em fase de franca conclusão. Na verdade, já há contributos das associações, e, neste momento, está-se em fase de negociï1o. Em todo o caso, está sempre na mão dos grupos parlamentares requererem a votaç2o destes projectos de lei que agora baixam à comisso. Penso é que n

Vozes do PS:- Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, devo dizer que nos parece que esta é uma discussão de extrema importância. Somos um País que, infelizmente, tem um número muito grande deficientes por razões várias: devido à guerra colonial, devido a uma elevadíssima sinistralidade rodoviária e de trabalho. Portanto, se outras razões não houvesse - e, do nosso ponto de vista, existiriam sempre -, esta era urna razão para a importância deste debate.
Penso que deve considerar-se cada vez mais alargada a designação de pessoas portadoras de deficiência, pois, no nosso país, há um elevadíssimo número de pessoas idosas, pelo que, crescentemente, vai ter de resolver-se um outro tipo de problemas respeitantes a pessoas que têm mobilidade reduzida. Este é.. pois, claramente, um problema de não discriminação, de cidadania e de direitos humanos e parece-me que constitui razão suficientemente séria para a importância de tudo o que possa dizer-se e, sobretudo, fazer-se, em torno desta matéria.
A primeira questão que - abordo tem a ver com os projectos de lei que, apesar de tardios, vêm ao encontro do que é uma reivindicação velha de anos do movimento associativo, isto é, a consagração de um estatuto para as associações. Em termos do processo de revisão constitucional, este estatuto acolheu algumas propostas, designadamente de Os Verdes, c, quanto a nós, resolve um problema essencial: as políticas que têm a ver com as pessoas portadoras de deficiência devem ouvir, em primeiro lugar, aqueles que delas sofrem.
Tudo o que se visa com estes projectos de lei em apreço é, sobretudo, considerar as associações como um parceiro privilegiado em termos de direito à informação, de direito à participação, de direito à consulta, não só em relação a matérias e a definição de políticas que lhes digam respeito mas também em relação ao processo legislativo. Na verdade, parece-me que este é um caminho que importa ser aprofundado.
Há ainda um conjunto de aspectos que decorem desta definição do estatuto, os quais têm a ver com o direito de participação em várias; instancias, designadamente em ternos do Conselho Económico e Social, e com o tempo de antena.
Um outro aspecto que me parece muito importante é o da definição do estatuto do dirigente associativo. É que é óbvio que se se pretende a participação dos cidadãos que integram as associações há que ter em conta que alguns provavelmente, não tantos quantos desejaríamos - estão inseridos no mundo do trabalho, pelo que importa que a sua participação possa ser garantida. Portanto, esta é uma questão importante.
Por outro lado, parece-me ainda de ter em. conta um aspecto relativo ao projecto de lei que também está em discussão e que propõe a criação de incentivos ao emprego de pessoas portadoras de deficiência.
A questão do emprego das pessoas portadoras de deficiência é muito importante e tem sido objecto de reflexão em muitos países que têm optado por diferentes caminhos. Há países que optaram por definição de quotas, nalguns existem apoios específicos e incentivos fiscais concedidos às empresas que acolhem estes cidadãos, noutros há aspectos que têm a ver com o emprego produzido. Enfim, são muitas as soluções a adoptar.

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Sem querer desvalorizar esse projecto de lei do Partido Social Democrata em discussão, peno que encerra um vício que me parece algo preocupante. É que, quando falamos em emprego, em primeiro lugar, temos de considerar, a montante, quais são as condições de emprego e, portanto, em que termos é que as pessoas portadoras de deficiência chegam ao emprego. Ora, isto coloca-nos um conjunto de outros problemas que estão por resolver, em termos do modo como está a ser feito o acesso ao sistema de ensino, de como as pessoas podem garantir a sua formação profissional, em termos de saber como é que se garante uma participação social cívica e cultural destes cidadãos com um maior grau de autonomia, o que implica resolver problemas muito complicados nos transportes, nas acessibilidades, em tudo o que tem a ver com mobilidade.
Portanto, nada tendo de reservas quanto ao trabalho exercido no domicílio, parece-me que o que deve privilegiar-se é o trabalho exercido fora de casa. O que queremos é que os deficientes saiam do mundo fechado a que são condenados, o que queremos é criar condições para que possam deslocar-se, não só para trabalhar mas para usufruírem de outros direitos que. neste momento, lhes estão vedados. Por isso, .julgo que esta iniciativa, tendo alguma importância, não pode esconder um outro - aspecto que me parece fundamental e que é o de resolver o problema da participação e do direito ao trabalho dos cidadãos deficientes.
Concluo, dizendo que somos favoráveis a estes projectos de lei no seu conjunto mas pensamos que há aspectos a resolver em sede de especialidade. Parece-nos muito claro que os direitos dos deficientes têm estado por demais adiados e ou o Governo tem propostas concretas a apresentar nesta área concreta, como já teve noutras, de modo a serem discutidas em comissão de imediato ou, não sendo assim, creio que adiar é atentar contra a resolução de um problema que consideramos prioritário.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o último orador inscrito é o Sr. Deputado Nuno Abecasis, a quem vou dar a palavra em seguida. Antes. porém, gostaria de lembrar que, no fim desça intervenção, daremos início ao período regimental de votações.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Abecasis (CIAS-PP ): - Sr. Presidente., Srs. Deputados: As vezes, a vida e o acaso criam-nos algumas surpresas e colocam-nos algumas armadilhas no caminho. E o caso de hoje e felizmente que isso acontece.
Estamos a discutir, devo dizer que com alguma falta de calor, um problema vital para a sociedade portuguesa. Estamos a fazê-lo no dia seguinte a termos analisado os estatutos das organizações não governamentais para o ambiente e das organizações não governamentais, para o desenvolvimento. Devo dizer que o fizemos de forma bem mais quente do que aquela a que. hoje, assistimos aqui.
Ainda bem que o destino nos pôs esta armadilha no caminho, porque esta Assembleia vai ser confrontada com a sua escala de valores para saber se é mais importante haver algumas espécies em vias de extinção do que alguns homens em vias de exclusão. que é o que estamos a discutir hoje.
Não é por acaso, Srs. Deputados, que não conheço nenhuma organização de deficientes que tivesse partido de iniciativa pública. todas elas foram organizadas, laboriosamente, pelas famílias que tinham deficientes no seu seio. Foi assim no caso das CERCI, no caso da Liga para Deficientes Motores, no caso dos deficientes profundos e de todos os casos da longa série de deficiências que encontramos na nossa sociedade.
O problema que se nos põe é tão simplesmente o de saber se devemos falar de integração ou de outra coisa muito mais importante do que isso, o direito à participação. Pergunta Srs. Deputados, se vamos excluir desta nossa lei aqueles que estão em Fátima, no Centro Paulo VI, de deficiências profundas, se consideramos que eles não estão a participar na sociedade portuguesa ou a valorizá-la, se os consideramos como pessoas dispensáveis.
É esta transformação profunda, mais do que as estatísticas, que importa, porque o resto-as estatísticas - resolver-se-á por si próprio, no dia em que estivermos convencidos de que todos os seres humanos têm o direito a participar na sociedade em que nasceram, na sociedade que os fez vir a este mundo. Alguns participarão só pelo sofrimento, valorizando moralmente a sociedade, outros participarão de outras maneiras.
Posso dizer-vos, desde já. que nunca poderei participar no coro do teatro Nacional de S. Carlos, pois não sei cantar! Sou deficiente sobre esse aspecto. Mas também posso dizer-vos que criei, na Câmara Municipal de Lisboa, um serviço que tinha por única missão saber qual o posto de trabalho adequado a cada tipo de deficiência. Graças a isso, hoje, a Câmara Municipal de Lisboa tem alguns milhares de trabalhadores deficientes, que são dos melhores trabalhadores que lá estão. E eu digo-vos porquê: porque lhes foi dado algo impensável, ou seja, nunca pensaram ter o direito a um posto de trabalho na sociedade, mas ele foi-lhes dado. Agarraram-se a ele com «unhas e dentes» e tolos os dias batalham por conservá-lo.
Numa fábrica, onde passei a minha vida inteira, os melhores soldadores por pontos eram todos surdos-mudos. Os melhores soldadores das carruagens de metropolitano, onde os meus amigos Deputados andam, que, sem bitolas, têm um passo de soldadura igual, sempre igual, ao décimo de milímetro, são deficientes, são surdos-mudos!
O problema está em saber se queremos ou não avaliar a capacidade de cada cidadão para poder contribuir, como é do seu direito, para a melhoria da nossa própria sociedade, aceitando que alguns só vão colaborar pelo sofrimento, porque tão têm outra capacidade que não a de sofrer.
Mas esta, meus amigos, é uma questão séria de mais para ser tratada com frialdade, com números ou estatísticas, porque ela entra e bule com toda a consciência nacional e põe-nos o problema de saber se este país pode dispensar milhões de pessoas que são atingidas pela deficiência, bem como o problema de saber se, paia algumas profissões, os deficientes não serão muito melhores do que nós próprios, que temos a perfeição que Deus nos deu.
Meus amigos, proponho à Assembleia da República, a todas as bancadas parlamentares, porque este não é um problema partidário, mas, sim, de consciência nacional, que analisemos, simultaneamente, estes projectos de lei e as propostas de lei relativas às organizações não governamentais de ambiente e de cooperação para o desenvolvimento, porque esta também é uma organização não governamental. Vai-nos ver qual é o grau de afeição das nossas consciências nos valores que nos são propostos.

Aplausos do CD.S-PP.

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896 I SÉRIE - NÚMERO 25

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate dos projectos de lei n.os 379/VII, 436/VII, 437/VII e 438/VII. Creio que estaremos em condições de os votar, na sequência das outras votações previstas.
Srs. Deputados, vamos dar início às votações, começando por votar o projecto de deliberação n.º 15/VII - Debate parlamentar sobre o ambiente (Os Verdes). Como deu entrada uma proposta de alteração quanto ao ponto n.º 2, vamos votar separadamente os pontos n.os 1 e 2.
Em primeiro lugar, vamos votar a proposta de alteração ao n.º 2 do mesmo e só depois se votará ou não o texto do n.º 2 constante do projecto, consoante seja ou não aprovada a alteração. Estão, com certeza, lembrados que o n.º 2 proposto...

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, queria apenas informar a Mesa que tinha ficado acordado entre todos os grupos parlamentares que a proposta de substituição, ontem distribuída pelas diversas bancadas, substituiria, de facto, o texto do n.º 2 do projecto de deliberação.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, vamos votar, conjuntamente, os n.os 1 e 2 do projecto de deliberação, já identificado, adoptando como n.º 2 o texto da proposta de alteração.

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

O Sr. Deputado José Magalhães pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PS): - Para urna interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, se bem percebi, V. Ex.ª submeteu este diploma à votação na generalidade, na especialidade e final global.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, trata-se de um projecto de deliberação e, por isso, a votação é única, é global.

O Orador: - Mas sofreu uma proposta de alteração, de qualquer das formas.

O Sr. Presidente:- Não, Sr. Deputado, acabou de ser anunciado que a proposta de alteração foi retinida e adoptada como n.º 2 do projecto de deliberação.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Foi assumido pelas proponentes!

O Orador: - Sr. Presidente, está perfeito e, portanto, em condições de ser publicado na II Série do Diário da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Exacto, assim será publicado.

Srs. Deputados, segue-se a votação do projecto de deliberação n.º 47/VII - Prorrogação do período de funcionamento da Comissão Eventual de Inquérito ao Aval do Estado à UGT (PAR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos agora votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 87/VII - Define o estatuto das organizações não governamentais de ambiente (Revoga a Lei n.º 10/87. de 4 de Abril).

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O diploma baixa à 4.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 114/VII - Aprova o estatuto das organizações não governamentais de cooperação para o desenvolvimento.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O diploma baixa à 2.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, dos projectos de lei que foram hoje objecto de discussão, a começar pelo projecto de lei n.º 379/VII - Lei das associações de deficientes (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O diploma baixa à 1.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 436/VII - Associações de pessoas portadoras de deficiência (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O diploma baixa à 8.ª Comissão.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, o projecto de lei que acabou e ser aprovado, na generalidade, por unanimidade deverá baixar, na especialidade, à mesma comissão a que V. Ex.ª mandou baixar, e hem, o projecto de lei apresentado pelo PCP sobre a mesma matéria.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é natural que tenha razão, não reflecti sobre o problema e tive por boa a indicação dos serviços. Peço. por isso, aos serviços que revejam essa indicação e me digam se a confirmam ou revogam, de acordo com o sugerido pelo Sr. Deputado Carlos Coelho.
Entretanto, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 437/VII - Observatório para a integração das pessoas portadoras de deficiência (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de. Os Verdes e a abstenção do PS.

O diploma baixa à 8.ª Comissão, tal como o projecto de lei anterior.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 438/VII - Incentivos ao em-

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9 DE JANEIRO DE 1998 897

prego domiciliário de trabalhadores portadores de deficiência (PSD).

Submetido c) votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contar do PS.

Pergunto aos serviços se já chegaram a alguma conclusão.

Pausa.

Os serviços mantêm a indicação de que o primeiro projecto de lei - o projecto de lei n.º 379/VII - deve baixar à 1.ª Comissão e os restantes à 8.ª Comissão.
Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, independentemente da opinião dos serviços, o que deve prevalecer aqui é a sua decisão...

O Sr. Presidente: - Eu sei, mas apenas pretendi que o Sr. Deputado fosse confrontado. com a manutenção, pelos serviços, da opinião que me deram. Vamos, então, ver quem é que tem razão.

O Orador: - A questão é muito simples, Sr. Presidente. As duas iniciativas referem-se ao mesmo assunto: a lei das associações de deficientes. Ora, para que o Parlamento possa aprovar urna única lei sobre esta matéria tem de fazer a fusão dos dois textos e é impossível proceder a essa fusão se o projecto de lei do PCP baixar à 1.ª Comissão e o do PSD à 8.ª Comissão! Tratando-se de direito de associação, parece evidente que a comissão competente é a 1.ª e não a 8.ª
Portanto, como o Sr. Presidente disse, faz lodo o sentido que as outras duas iniciativas legislativas do PSD baixem à Comissão do Trabalho, Solidariedade, Segurança Social e Família, irias não o primeiro projecto de lei, porque tem a ver com o direito de associação. Este tem de baixar à 1.ª Comissão, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para que nessa comissão se faça a fusão das duas iniciativas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, salvo erro, foi isso que eu disse, isto é, que o projecto de lei n.º 379/VII baixaria à 1.ª Comissão e todos os outros à 8.ª Comissão.
Faço uma rectificação: os projectos de lei n.ºs 379/VII e 436/VII baixam à 1.ª Comissão. Tem toda a razão, Sr. Deputado Carlos Coelho. Já os projectos de lei n.ºs 437/VII e 438/VII baixam à 8.ª Comissão. Assim é que está certo.
Srs. Deputados, por último, o Sr. Secretário vai dar conta de um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Secretário (Artur Penedos). - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 11.º Juízo do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Manuel Alves de Oliveira a prestar depoimento, por escrito, na qualidade de testemunha, em processo que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos. próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 10 horas, e terá como ordem do dia o debate das ratificações n.ºs 38/VII (CDS-PP) e 39/VII PSD) e a apreciação parlamentar n.º 41/VII (PCP).
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Jorge Manuel Dunas Martins Rato.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.

Partido Social Democrata (PSD):

Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Luís Carlos David Nobre.
Movia Teresa finto Basto Gouveia.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Partido Comunista Português (PCP):

Maria Odete dos Santos.

Faltaram n sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Fernandes da Silva Braga.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Mário Manuel Videira Lopes.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui do Nascimento Rabiça Vieira.

Partido Social Democrata (PSD):

António Manuel Caveira da Silva.
Artur Ryder Torres Pereira.
João Álvaro Poças Santos.
José Augusto Gama.
Manuel Joaquim Barata Frexes.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Afonso de Pinto Gaivão Lucas.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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898 I SÉRIE - NÚMERO 25

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