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Sábado, 17 de Janeiro de 1998 I Série - Número 29
VII LEGISLATURA 3.A SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE JANEIRO DE 1998
Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos
Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 20 minutos.
A Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP) deu conta do lapso do seu partido relativamente à votação do projecto de resolução n.º 73/VII e solicitou a respectiva correcção, tendo a Mesa apenas considerado o resultado proclamado.
Procedeu-se à apreciação da proposta de resolução n.º 46/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção sobre Segurança Nuclear, adoptada em Viena, em 17 de Junho de 1994, no âmbito da 38.ª Sessão da Conferência Geral da Agência Internacional da Energia Atómica, assinada por Portugal, em 3 de Outubro de 1994. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (Luís Amado), os Srs. Deputados José Calçada (PCP), Eurico Figueiredo e José Barradas (PS), Rui Gomes Silva (PSD), Isabel Castro (Os Verdes) e Nuno Abecasis (CDS-PP).
Foram igualmente apreciadas, conjuntamente. as propostas de resolução n.ºs 49/VII - Aprova, para ratificação, a Emenda ao artigo XIII da Convenção Constitutiva da União Latina, assinada em Paris, em 15 de Maio de 1954, e 52/VII - Aprova, para ratificação, o Acordo entre a República Portuguesa e a União Latina (estabelecimento da União Latina), assinado em Paris, em 6 de Setembro de 1995, que regula o regime de privilégios e imunidades que Portugal confere à delegação da União Latina em Lisboa. Intervieram, além do Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, os Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca (PCP), Laurentino Dias (PS), Rui Gomes da Silva (PSD) e Nuno Abecasis (CDS-PP).
A proposta de resolução n.º 58/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção n.º 138 da Organização Internacional do Trabalho sobre a idade mínima de admissão ao emprego foi também apreciada, tendo produzido intervenções, além do Sr: Secretário de Estado da Segurança Social e Relações Laborais (Ribeiro Mendes), os Srs. Deputados Maria do Carmo Sequeira (PS) - que fez a síntese do relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades -, Moura e Silva-(CDS-PP), Gonçalo Almeida Velho (PS), António Rodrigues (PSD) e Odete Santos (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 11 horas e 55 minutos.
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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 20 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
António Manuel Carmo Saleiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Augusto Carlos dos Santos Leite.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Pedro da Silva Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Moreira Raposo.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.
Partido Social Democrata (PSD):
Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Costa Rodrigues.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
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Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomis Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
Luc1ia Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Sérgio André da Costa Vieira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Armelim Santos Amaral.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.
A Sr. Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, apelo para V. Ex.ª no sentido de ainda ser possível rectificar a posição de voto da minha bancada expressa ontem relativamente ao projecto de resolução n.º 73/VII, em relação ao qual, e na sequência da discussão tida na semana passada sobre esta matéria aqui no Plenário, o Deputado Luís Queiró se manifestou contra. A votação «contra» era obviamente contra o Decreto-Lei n.º 205/97 e não contra o projecto de resolução, que determina a cessação da vigência do mesmo.
Sei que o lapso foi da minha bancada e não queremos transferir esse ónus para ninguém, muito menos para a Mesa, mas pergunto a V. Ex.ª se descortina aqui alguma possibilidade no sentido de clarificar esta situação uma vez que a posição da bancada, manifestada em intervenções do Sr. Deputado Luís Queiró, foi sempre num sentido e agora há uma manifesta discordância com o sentido de voto.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, o resultado da votação de ontem foi proclamado pelo Sr. Presidente e consta das actas. A sua intervenção, em nome do seu grupo parlamentar, também constará e fica como um elemento de interpretação do pensar do CDS-PP relativamente ao documento que ontem foi votado.
Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia tem como conteúdo a proposta de resolução n.º 46/VII Aprova, para ratificação, a Convenção sobre Segurança Nuclear, adoptada em Viena, em 17 de Junho de 1994, no âmbito da 38.ª Sessão da Conferência Geral da Agência Internacional da Energia Atómica, assinada por Portugal, em 3 de Outubro de 1994.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros- e Cooperação.
O Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação (Luís Amado): - Sr; Presidente, Srs.
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Deputados: O Governo submete à Assembleia da República a aprovação, para ratificação, da Convenção sobre Segurança Nuclear, adoptada em Viena, em 17 de Junho de 1994, no âmbito da Agência Internacional da Energia Atómica. Esta Convenção, aberta à assinatura em 20 de Setembro de 1994 na 38.ª sessão da Conferência Geral da Agência Internacional da Energia Atómica, foi assinada por Portugal em 3 de Outubro de 1994 e veio completar um conjunto de instrumentos de cooperação internacional preparados sobre a égide da referida organização em matéria de segurança nuclear dos quais foram já ratificados por Portugal a Convenção sobre Protecção Física de Materiais Nucleares, em 1979, aprovada pela Resolução n.º 7/90, 4 de Janeiro, e a Convenção sobre Notificação Imediata de Acidentes Nucleares, aprovada pela Resolução n.º 22/92, de 2 de Abril.
A presente Convenção entrará em vigor em 24 de Outubro de 1996 por se encontrar reunido já o número exigido de vinculações desde 26 de Junho de 1996. Tratando-se de um instrumento jurídico que, muito embora tenha como objecto específico a segurança das centrais nucleares, garantindo a uniformização mínima das condições de segurança, poderá contribuir para o estabelecimento de uma cultura de segurança nuclear a nível mundial e de um clima de utilização favorável a exploração segura desta forma de energia pelo que se afigura de todo o interesse a sua aprovação pela Assembleia da República.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, a palavra ao Sr. Deputado José Calçada.
O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr.--- e Srs. Deputados: A presente proposta de resolução n.º 46/VII visa aprovar a Convenção sobre Segurança Nuclear aberta à assinatura em Viena, em 20 de Setembro de 1994, na 38.ª Sessão da Conferência Geral da Agência Internacional da Energia Atómica, e assinada por Portugal a 3 de Outubro de 1994. A Convenção tem por objecto a uniformização mínima das garantias de segurança das centrais nucleares sob jurisdição ou controlo de qualquer Estado Parte.
É verdade que Portugal não possui qualquer central nuclear, nem parece que venha a possuí-las dentro do presente quadro científico, tecnológico e industrial.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Mas, por outro lado, o problema da segurança das centrais nucleares assume-se inevitavelmente como transnacional, e as consequências de eventuais acidentes nucleares não se compadecem com a existência de fronteiras, seja qual for a sua natureza. Acresce a circunstância, nada despicienda, de os nossos vizinhos espanhóis terem vindo a demonstrar uma particular tendência para edificarem ou tentarem edificar instalações nucleares seja no rio Tejo, seja na bacia hidrográfica do Douro, seja uma central para a produção de energia eléctrica, já construída, seja um depósito de detritos nucleares, ainda em projecto. Aprovarmos convenções como a que neste momento é colocada à nossa consideração é, desde logo, e para além de uma questão estritamente técnica, um imperativo de natureza ética e política que, também por esta via, reforça e legitima a capacidade negocial do nosso país neste domínio. Na verdade, a energia nuclear, quer na sua aplicação pacífica quer na militar, não é apenas mais uma forma de energia mas é uma forma de energia qualitativamente diferente. E de tal modo assim é que desde o seu aparecimento colocou ao Homem - e a cada homem - problemas ético-político quase insuportáveis. De início, é verdade, apenas no âmbito da sua aplicação militar. Albert Einstein - o mesmo que escreve uma carta ao presidente norte-americano Roosevelt convencendo-o da necessidade de se ganhar a corrida aos nazis no fabrico de uma bomba nuclear, e Niels Bohr (dinamarquês), e Enrico Fermi (italiano), e Robert Oppenheimer (por acaso, americano), ficam horrorizados com a barbárie americana sobre as populações civis de Hiroshima e Nagazaki; 6 e 9 de Agosto de 1945 ficarão para eles como datas de vergonha na história da humanidade, e o fardo absurdo dos 110 000 mortos e dos 100 000 feridos imediata e directamente causados pelas bombas conduzi-los-á a uma luta corajosa pela paz e contra os armamentos nucleares até ao fim das suas vidas. Por isso mesmo, Robert Oppenheimer foi perseguido pelo maccarthyismo, destituído de todas as suas funções, acusado de «comunista», ostracizado e apenas reabilitado já nos inícios dos anos 60! A energia nuclear transformou-se então, e naturalmente, num palco privilegiado para a afirmação, quer da consciência social e ético-política do cientista, quer do carácter não neutral da própria investigação científica e tecnológica.
O que talvez então se não pudesse adivinhar era que, duas ou três décadas depois, questões semelhantes se viessem a colocar em torno da aplicação pacífica da energia nuclear, nomeadamente no domínio da edificação de centrais para a produção de energia eléctrica. Há questões graves na área da segurança de funcionamento que se mantêm debilmente «resolvidas». Se os acidentes de Calder Haf, no Reino Unido, ou de Three Miles Island, nos Estados Unidos, já deveriam ter sido encarados como avisos muito sérios nessa área. o caso de Chernobyl demonstrou claramente que agimos demasiadas vezes como aprendizes de feiticeiro. Neste momento, a generalidade dos países detentores de uma parcela significativa de energia eléctrica com origem nuclear ou suspendeu a construção de novas centrais, como é o caso da França e dos Estados Unidos, ou, embora por razões diferentes, enveredou pela via do desmantelamento e desactivação de algumas unidades, como acontece na Suécia ou nos países da ex-URSS. Mas a verdade é que os problemas levantados pelas centrais nucleares não terminam com a sua desactivação. Os detritos nucleares resultantes, perigosamente radioactivos, vão assim manter-se por vários milhares de anos, hipotecando o futuro cote perguntas para as quais continuamos angustiadamente sem respostas. No plano ético e no plano político, «não podemos continuar a bombardear Hiroshima e Nagazaki» agora no silêncio de contentores vitrificados ou sob mausoléus de milhares de toneladas de betão e chumbo. A permanente construção da história, em que o homem já tanto conseguiu, não pode transforma-la, à história, e aos filhos dos nossos filhos, em reféns de quaisquer formas de cinismo circunstancial e definitivamente trágico.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para apresentar o respectivo relatório da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, o Sr. Deputado Eurico Figueiredo.
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O Sr. Eurico Figueiredo (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o relatório da 4.ª Comissão, cujo parecer foi aprovado por unanimidade, é do seguinte teor:
A Conferência de Estocolmo de 1972, de iniciativa da ONU, subordinada ao tema «Há só uma terra», lançou as bases de um desenvolvimento preservando o ambiente. Foi nela criado o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e aprovada a Declaração de Estocolmo onde se afirma que «os recursos naturais do Globo (...) devem ser preservados no interesse das gerações presentes e futuras». A Resolução n.º 35/80 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 1980, proclama a responsabilidade histórica dos Estados no que respeita à preservação da natureza para as gerações presentes e futuras.
A Comissão Mundial do Ambiente e do Desenvolvimento (WCED) foi criada por resolução das Nações Unidas de Outubro de 1983, presidida por Gro Brundtland, e o seu relatório «Our Common Future», apresentada à 42
sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas de Outubro de 1987 propõe o modelo do «desenvolvimento sustentável». O desenvolvimento sustentável implica o pressuposto básico de um «desenvolvimento que dê respostas às necessidades do presente sem comprometer as possibilidades de as gerações futuras darem respostas às delas». A ECO-92, do Rio de Janeiro, confirma estes conceitos, sendo as prerrogativas das gerações futuras protegidas pelo direito internacional.
A utilização da energia nuclear, fora dos contextos médicos e de investigação básica tem difícil suporte económico se são tidos em conta os custos quanto ao armazenamento e controlo dos resíduos nucleares para os quais a ciência ainda não deu respostas segurizantes, apenas deixando o pesadelo de responsabilizar, por milhares de anos, os nossos descendentes, em operações de armazenamento, controlo e vigilância de quantidades incontroláveis de resíduos mortíferos.
Na nossa opinião, a utilização, numa perspectiva de desenvolvimento, da energia nuclear, não é «sustentável», sendo pois, ética e cientificamente, insustentável. A generalização dos resíduos nucleares vai ainda facilitar o aparecimento do terrorismo nuclear, o que poderá vir a ser o maior pesadelo da humanidade. São também da nossa memória recente o conhecimento que os desastres em instalações nucleares não têm fronteiras e envolvem parcialmente ou globalmente todo o planeta provocando custos humanos e ambientais incomensuráveis.
Nesta perspectiva, Portugal, que não optou pela utilização da energia nuclear, está em boas condições éticas, ainda por cima ameaçado por lixeiras nucleares nas nossas fronteiras e centrais nucleares, em Espanha, nos rios internacionais, para lutar pela proibição da energia nuclear com objectivos energéticos (e militares), objectivo que ultrapassa, como fundamentação, este parecer.
Neste parecer esqueci, e a presidência de V. Ex.ª faz-me lembrar, que também os Açores são ameaçados muitas vezes pelos eventuais depósitos nas fossas abissais do seu mar territorial e aqui devemos, obviamente, solidarizar-nos com esta parcela do nosso território.
É, todavia, a Convenção sobre Segurança Nuclear, adoptada em Viena em 17 de Junho de 1994, no âmbito da Agência Internacional de Energia Atómica - AIEA -, um instrumento de cooperação internacional que continua a Convenção sobre Protecção Física de Materiais Nucleares, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 7/90, de 4 de Janeiro, e a Convenção Sobre a Notificação Imediata de Acidentes Nucleares, aprovada pela Assembleia da República, em 2 de Abril de 1992. Tem como objectivo, obviamente desejável, aumentar o nível de segurança nuclear, prevenir acidentes e mitigar as consequências dos mesmos, harmonizar os critérios de segurança nos Estados membros.
Tem particular relevância para Portugal reforçando a sua posição no quadro do Acordo Luso-Espanhol em matéria de segurança das instalações nucleares espanholas e garantindo, para o futuro, que se deverá ter em conta a opinião dos signatários vizinhos quanto à localização de futuras centrais nucleares.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O parecer aprovado é do seguinte teor:
A Comissão Parlamentar de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, tendo em conta a importância da matéria em análise, os interesses nacionais expressos na proposta de resolução n.º 46/VII, que aprova, para ratificação. a Convenção sobre Segurança Nuclear adoptada em Viena em 17 de Junho de 1994 no âmbito da Agência Internacional de Energia Nuclear - AIEA -, e ò disposto na alínea i) do artigo 161.º da Constituição da República Portuguesa, é do parecer que a mesma, porque cumpre as condições regimentais em vigor, está em condições de ser apreciada em Plenário.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Eurico Figueiredo, agradeço as suas palavras de solidariedade relativamente aos aspectos peculiares do problema dos resíduos nucleares na Região Autónoma dos Açores e aproveito para referir à Câmara que sempre tem sido posição constante dos órgãos de governo própria da Região Autónoma dos Açores opor-se com toda a firmeza, tendo reclamado nos fora de soberania da República, ao depósito no fundo do mar de quaisquer resíduos nucleares partindo do princípio, pela grande perigosidade que envolvem, que não é no mar que devem ser depositados.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Barradas.
O Sr. José Barradas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A energia é essencial para o progresso económico e social. Apesar disso, 40% da população mundial vive ainda privada da fruição deste bem. E, pois, essencial que a política energética faça parte dos objectivos gerais da política económica comunitária, com vista à salvaguarda do interesse e bem-estar públicos, do desenvolvimento sustentável, da coesão social e económica e da protecção dos cidadãos.
Para além destes objectivos gerais, a política energética deve conciliar a competitividade com a segurança e a protecção ambiental e, ao nível da União Europeia, a solidariedade nas escolhas estratégicas feitas pelos Estados membros.
Um mercado fragmentado ao nível europeu, no que concerne à produção e distribuição de energia, remeteria todas as actividades nessa área para o nível nacional, inviabilizando a criação e desenvolvimento de redes transeuropeias capazes de criar infra-estruturas de produção, transporte e distribuição que permitam melhorar com segurança a competitividade comunitária, a desejável protecção ambiental, a partilha de novas tecnologias mais limpas e renováveis, o intercâmbio de experiências no
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domínio do fomento da cooperação na investigação tecnológica e nas novas abordagens de gestão de recursos.
Na União Europeia é reconhecida a importância e o papel estratégico do sector energético, nomeadamente o nuclear, situação que deverá manter-se, sobretudo tendo em conta que o ritmo de desenvolvimento previsto aumentará o consumo nos próximos 20 anos.
Ora, atendendo à importância da contribuição da energia nuclear para os objectivos de desenvolvimento da Europa, esta alternativa deverá permanecer em aberto, sondo certo que um dos seus objectivos é o desenvolvimento sustentável e uma das suas preocupações, como em qualquer outra opção, é o da salvaguarda e segurança das populações.
Actualmente, 50% da energia produzida na Europa é garantida por fontes autóctones. É previsível que nos próximos 20 anos esse valor diminua para os 30%, se tivermos em conta um ritmo de crescimento do consumo de 1 % ao ano.
O problema agudiza-se se tivermos em conta que, quer na ex-União Soviética, quer nos PECO, ó consumo subirá a um ritmo superior.
Por via disto, não parece possível desactivar as centrais nucleares existentes, em especial as construídas em território da ex-União Soviética. Contudo, parece necessário intervir, a seu pedido, no desenvolvimento dos programas nucleares do leste da Europa, através de vários meios: assistência técnica especializada, a fim de permitir restaurar sistemas de controlo eficazes; cooperação política, viabilizando protocolos de parceria a terem expressão na revisão dos acordos de não proliferação; e cooperação aduaneira, policial e judiciária, no âmbito do programa de segurança e controle da EURATOM.
Para além disso, é desejável encorajar, através de novos programas de financiamento, o recurso a formas de energias diversificáveis e renováveis, o desenvolvimento de sistemas combinados de calor e electricidade, quer renovando as centrais existentes, quer apostando numa outra geração tecnologicamente mais avançada, quer ainda modernizando as redes de transporte de electricidade, oleodutos e gasodutos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No que mais especificamente diz respeito à protecção da saúde dos cidadãos e do ambiente da Europa contra radiações ionizantes, a Directiva n.º 80/836/EURATOM fixa as normas relativas à protecção sanitária da população e dos trabalhadores contra o perigo de radiações e prevê as obrigações dos Estados membros em matéria de protecção sanitária.
A fonte de contaminação que resulta do reprocessamento dos combustíveis irradiados das centrais nucleares é perigosa e representa elevado risco de contaminação das pessoas e do ambiente.
Estas e outras preocupações acentuam á necessidade de reforçar o conhecimento e o controlo exercido pelos governos dos Estados membros.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes Silva.
O Sr. Rui Gomes Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, Srs. Deputados: As minhas primeiras palavras são de saudação à Câmara. Tendo exercido as funções de Deputado durante as V e VI Legislaturas, é a primeira vez que uso da palavra nesta Câmara depois de um interregno. Faço-o com orgulho, e aproveito esta oportunidade para cumprimentar VV. Ex.a, esperando, com certeza, durante o tempo que aqui permanecer, merecer o vosso respeito e contribuir muito humildemente para dignificar a Assembleia da República. A todos vós, os meus cumprimentos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de resolução que aprova, para ratificação, a Convenção sobre Segurança Nuclear, adoptada em Viena, em 17 de Junho de 1994, no âmbito da 38.ª sessão da Conferência Geral da Agência Internacional da Energia Atómica, assinada por Portugal em 3 de Outubro de 1994, integra um conjunto de elementos de cooperação internacional preparados sob a égide da Agência Internacional da Energia Atómica e referentes à matéria de segurança nuclear.
A esta matéria, Portugal tem vindo a vincular-se desde 1990, tendo em vista dois grandes objectivos: o da cultura da segurança nuclear a nível mundial e o da utilização favorável à exploração segura desta mesma forma de energia.
Portugal, como já aqui foi referido por alguns dos intervenientes anteriores, não tem instalações de energia nuclear, mas é um país preocupado com esta situação. Aliás, essa preocupação também se pode encontrar nas referências feitas no preâmbulo a esta matéria: em primeiro lugar, e desde logo, à utilização da energia nuclear de forma segura e de modo a não ser prejudicado o meio ambiente; em segundo lugar, à prevenção de acidentes em instalações nucleares e da incidência transfronteiriça desses mesmos acidentes; em terceiro lugar, à actualização jurídica e dos sistemas de segurança.
Os objectivos desta mesma Convenção são o de alcançar e manter um elevado nível de segurança nuclear em todo o mundo, através do reforço das medidas nacionais e da cooperação internacional, da defesa de instalações nucleares contra riscos radiológicos, de forma a que sejam protegidos os indivíduos, a sociedade e o ambiente, e da possibilidade de prevenir eventuais acidentes com consequências radiológicas.
Portugal deve, acima de tudo, entender esta Convenção como uma forma de verificar se o acordo é bem cumprido pelos países com instalações nucleares. São as obrigações decorrentes do Capítulo II, pelo que o PSD entende que, também nesta matéria, o Governo deve entregar à Assembleia da República todas as informações que entenda úteis e que possam elucidar os Srs. Deputados sobre o cumprimento das obrigações aí referidas.
Por estas razões, o PSD votará favoravelmente esta proposta de resolução.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Convenção que o Governo nos submete para ratificação é, porventura, uma das questões mais importantes e sérias que à Assembleia da República é dado discutir.
Estamos a falar de energia nuclear, de algo que, do ponto de vista planetário, tez reequacionar todos os conceitos de segurança e éticos que têm de pautar o uso das energias.
Isto significa, para nós, Os Verdes, que esta é uma forma de energia que, de todo em todo. recusamos, por
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constituir uma ameaça à segurança, à vida e ao planeta do ponto de vista ambiental, e por ser algo que até hoje a Humanidade não provou saber utilizar e controlar, com segurança.
Creio que a própria realidade daquilo que é hoje a herança nuclear - mais de 30 milhões de vítimas da radioactividade em todo o mundo, associadas também a duas questões que marcam de forma extremamente dolorosa a Humanidade, com a utilização da bomba atómica em Hiroxima e, depois, em Nagasaki - merece uma reflexão para quem é partidário do recurso à energia nuclear.
Esta Convenção tem extrema importância, quando falamos na Europa, que é o continente mais nuclearizado do mundo. Localizam-se aqui 217 reactores e a opção nuclear não é, de modo algum, travada. Do ponto de vista europeu, a opção nuclear continua a absorver significativa parte do orçamento europeu em matéria de investigação.
Para nós, esta questão é de particular relevância, quando um dos problemas mais graves que se coloca em relação à energia nuclear é precisamente o dos resíduos, do seu transporte, do seu armazenamento e do seu manuseio.
Vivemos numa Europa sem fronteiras, e o nuclear não conhece fronteiras. Vivemos paredes meias com um país que tem em funcionamento centrais nucleares, algumas reconhecidamente de duvidosa segurança. Vivemos paredes meias com centrais nucleares em bacias de rios portugueses internacionais. Três quartos do transporte de resíduos são feitos por mar, e Portugal e a nossa zona económica exclusiva estão nessa rota. Destaca-se, em especial, a zona económica exclusiva dos Açores, que tem sido clandestinamente utilizada para imersão de resíduos nucleares.
Pelas razões referidas, esta é uma questão que envolve grande importância para Os Verdes, daí também a importância que damos à discussão desta proposta de resolução.
Como, para nós, a ratificação desta Convenção não deve ser um mero pró-forma, uma formalidade protocolar a que Portugal se obriga, há aspectos concretos que ela implica. Obviamente, não é ao Ministério dos Negócios Estrangeiros que cabe a responsabilidade de dar respostas nesta matéria mas, sim, ao Governo, e o Sr. Secretário de Estado, no fundo, está aqui em representação do Governo. Por isso, as questões que coloco têm de ser colocadas.
O problema que a ratificação de um documento desta natureza implica, em Portugal - um país onde não há uma entidade reguladora em matéria nuclear, pelo contrário, toda a lógica dos últimos anos tem sido no sentido do desmembramento da entidade que centralizava as questões do nuclear, designadamente do Gabinete de Protecção e Segurança Nuclear, que foi extinto já pelo anterior Governo -, numa matéria como esta, que determina uma grande centralização de poder e responsabilidade, é o de saber que medidas concretas o Estado português se compromete a tomar.
A Convenção que vamos ratificar implica, do ponto de vista da segurança e prevenção, que é uma questão-chave para Portugal, investimento em meios humanos, técnicos e financeiros. Refere o Governo, na nota introdutória, que os gastos nesta matéria seriam marginais se tivéssemos uma estrutura montada, que não existe, para fazer este acompanhamento. O campus de Sacavém, onde está situado o único reactor nuclear português, utilizado para investigação, está parado e não há qualquer equipa técnica a dar-lhe suporte. 0 grupo técnico de emergência português é uma coisa ridícula, pois é apenas composto por um técnico superior.
Sendo assim, pergunta-se: em caso de uma ameaça nuclear, por acidente, em Espanha, que meios efectivos tem Portugal? É que eles não existem.
Portanto, estas são questões que têm de ser colocadas, e há seguramente uma dúvida que a ratificação desta Convenção nos suscita: é dito na alínea c) que Portugal passa a ter acesso a informação de carácter reservado, que, de outro modo, não teria. Dizer-se isto significa, para nós, que Portugal não tem, neste momento, um canal directo de acesso à informação sobre a segurança das centrais nucleares espanholas. Gostaríamos, pois, de saber se assim é ou não, ou que informação adicional ou outro acesso Portugal passa a ter.
Em resumo, penso que esta Convenção é, mesmo para aqueles que, como Os Verdes, são totalmente adversos ao recurso à energia nuclear, fundamental no sentido da garantia da segurança dos portugueses, mas pressupõe e implica desde já uma tomada de decisões e um quadro legislativo, que não existe e que - e alertamos o Governo para o facto - é forçoso vir-se a criar rapidamente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.
O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo envia-nos para ratificação a Convenção sobre Segurança Nuclear, adoptada em Viena já no ano de 1994. A primeira surpresa que me causa este facto é a de uma matéria tão importante como esta ter demorado quase cinco anos a chegar ao Parlamento para ratificação.
Hoje, Srs. Deputados, o problema já não se coloca como se colocava há uns anos atrás, quando qualquer país poderia fazer ou não a sua opção nuclear, e, se não optasse pelo nuclear, estaria protegido de todos os riscos. Chernobyl mostrou-nos bem que assim não era; as fugas em algumas centrais nucleares americanas também nos mostraram bem que assim não era; mesmo em Inglaterra alguns acidentes também vieram mostrar o mesmo; e talvez outras coisas, ainda não detectadas, possam vir, num futuro próximo, demonstrar a existência de alguns riscos.
Nessa altura, também se pensava que quando se fazia a opção nuclear era suficiente a escolha de uma tecnologia segura. A experiência tem vindo a mostrar que a segurança no campo da energia nuclear, sob qualquer das suas formas, desde a produção da energia a todas as outras, incluindo a experimental, é qualquer coisa de vivo, que muda constantemente. As medidas de segurança não são as mesmas numa central nova e numa central velha, não são as mesmas num reactor experimental ou num hospital e numa central de produção de energia, não são as mesmas na guarda de resíduos e noutra qualquer circunstância. Isto significa que não basta assinar um acordo, embora seja urgente e necessário assina-lo, e aderir a uma convenção sobre segurança nesta área.
A Sr.ª Deputada Isabel Castro colocou bem o problema ao dizer que se um país aderir a todas estas convenções mas não tiver os instrumentos necessários para tornar efectiva esta segurança tal de pouco lhe vale. E, Sr. Secretário de Estado, com algum conhecimento de causa lhe digo, repetindo, aliás, o que disse a Sr.ª Deputada Isabel Castro: o nosso instrumental, no que diz respeito a esta área, serve para pouco mais do que para medir a radioactividade do rio Tejo, e com isto não iremos longe.
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Falamos sobre centrais nucleares de produção de energia, mas convém não esquecer que o reactor de Sacavém seria suficiente para atirar com a cidade de Lisboa pelos ares, e ele está descuidado. Já tivemos técnicos competentes nesta área, que faziam uma vigilância diária da instalação, mas hoje não é o caso.
Portanto, não vamos cair na situação de aqui ratificarmos e darmos o apoio à adesão a uma convenção de segurança e termos, por outro lado, as «capoeiras» todas abertas, para que os pássaros possam voar por todos os lados, porque há energia» nuclear em Portugal, há-a nos hospitais, em Sacavém e noutros sítios de produção industrial. Estou convencido de que o País tem de fazer um esforço, que significa investimentos muito largos e treino de pessoal em número suficiente, para que a ratificação que hoje aqui fazemos não seja uma pura ficção.
Fica-lhe, Sr. Secretário de Estado, esta recomendação. O senhor, que está ligado aos negócios estrangeiros, veja bem em que condições estamos realmente a aderir a isto.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - O Sr. Deputado José Calçada, no momento próprio, manifestou o desejo de pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Barradas, o que, por lapso, a Mesa não registou.
Visto o PCP não dispor de tempo para a formulação deste pedido de esclarecimento, mas tendo sido a Mesa informada de que seria muito curto, esta atribui-lhe l minuto.
Tem a palavra, Sr. Deputado José Calçada.
O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, muito obrigado pela condescendência e por esta ofensa, se bem que relativa, ao Regimento, mas gostaria de fazer uma pergunta muito simples, que não demora mais do que 30 segundos.
Sr. Deputado José Barradas, não entendi, mas o defeito deve ser meu, certamente, pelo que gostaria que fosse clarificado, a posição que a bancada do PS, ou eventualmente do Governo do PS, ou ambos, ou cada um de per si têm sobre a energia nuclear em Portugal, nomeadamente na área da construção de centrais nucleares. Ninguém percebeu.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Barradas.
O Sr. José Barradas (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calçada, muito obrigado pela oportunidade que me deu de poder esclarecer algo que, porventura, não ficou claro na minha intervenção.
Não estamos aqui a discutir a posição do PS sobre a energia nuclear,...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... mas a discutir - e peço-lhe o favor de entender isto - uma outra coisa.
Quando foram construídas as centrais nuclear na Europa, ninguém pediu a minha ou a sua opinião,...
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - ... porque, se ma tivessem pedido, seria, ou seríamos, sucessivamente contra. A verdade é que deparamos com uma situação: a existência de um conjunto de centrais nucleares, quer na Europa, quer fora da Europa. E o que nos traz aqui é a ratificação de um instrumento jurídico, que, do meu ponto de vista, embora tendo por objectivo específico a segurança das centrais nucleares de que Portugal não dispõe - e quanto a isto não há qualquer dúvida -, pode contribuir não só para o esclarecimento de uma cultura mundial e nacional sobre esta matéria mas, sobretudo - e a Sr.ª Deputada Isabel Castro já o disse, e é verdade, temos próximo das nossas fronteiras instalações nucleares espanholas, pelo que Portugal pode, por via disso, sofrer as consequências de algum acidente -, ao aderirmos a esta Convenção, estamos, por um lado, a ter acesso a elementos de análise sobre a matéria, que não teríamos se estivéssemos fora dela, e, por outro (e também é importante dizer-se isto), vamos reforçar a nossa posição no acordo luso-espanhol relativamente a esta matéria.
A posição do PS sobre energia nuclear não é neste momento aqui invocada, provavelmente alguns de nós terão opiniões diferentes sobre este assunto. No entanto, o que está de facto em causa são as vantagens evidentes de aderirmos, face à situação gerada, a um mecanismo de controlo, a um instrumento que nos dá um controlo evidente sobre aquilo que existe neste momento, em termos reais, na Europa e no Mundo.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Eurico Figueiredo (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para que efeito?
O Sr. Eurico Figueiredo (PS): - Sr. Presidente, também fui questionado pelo Sr. Deputado José Calçada, pelo que gostaria de responder sob a forma de intervenção.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Eurico Figueiredo (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calçada, o senhor, que, durante dois anos, foi membro da 4.ª Comissão, sabe perfeitamente que a «cultura» desta comissão é a de que um parecer corresponda a um compromisso pessoal polémico e que, depois, no que diz respeito à parte final, haja consensos entre os diferentes partidos quanto ao que deve ser submetido a Plenário.
Ora, eu próprio, Eurico Figueiredo, Deputado do Partido Socialista, comprometi-me, polemicamente, com a posição que é a minha e, que eu saiba, não existe no Programa do Partido Socialista nada de absolutamente inequívoco no que diz respeito ao nuclear. Ainda agora, dizia, em voz baixa, que esperamos que no próximo congresso do PS esta matéria seja um assunto polémico e disse ainda que comprometer-me-ia pessoalmente a que o PS, enquanto tal, assuma um compromisso relativamente ao nuclear.
Posto isto, reenvio-lhe a pergunta que fez, pois gostaria de saber qual é a posição do movimento comunista internacional sobre o problema nuclear, qual tem sido a posição do Partido Comunista Português sobre a política nuclear da China e, ainda, se não é na ex-União Soviética que foram «feitas» as maiores misérias ao nível do nuclear e onde existem os mais trágicos problemas ao nível de centrais nucleares.
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Repito que gostaria que o Partido Comunista esclarecesse qual é, neste momento, o «tom», isto é, se ainda é um Partido Comunista «clássico» ou se é outra coisa qualquer com que devemos lidar como tendo relativamente ao nuclear uma posição completamente diferente da que era tradicional neste domínio por parte do ex-mundo comunista e que era desastrosa.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.
O Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma palavra final muito rápida para dar nota das observações feitas, algumas pertinentes, relativamente à política do Governo neste sector, embora tenham exorbitado manifestamente da esfera de competências próprias do Ministério dos Negócios Estrangeiros, aliás, como foi reconhecido, quer pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, quer pelo Sr. Deputado Nuno Abecasis.
Deixo-vos uma nota final para contrariar o tom alarmista da intervenção da Sr.ª Deputada Isabel Castro no que diz respeito à gestão da informação relativa às centrais nucleares espanholas, dando conta à Câmara de que mantém-se em vigor o acordo luso-espanhol em matéria de segurança nas instalações nucleares e está a ser plenamente acompanhado por ambas as partes.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate desta proposta de resolução.
Antes de passarmos ao ponto seguinte da ordem do dia, informo os Srs. Deputados, com satisfação, que se encontram nas galerias, a assistir aos nossos trabalhos, um grupo de 51 alunos da Escola Nova Apostólica, de Carcavelos, um grupo de 47 alunos da Escola Secundária de Arroios e um grupo de 50 alunos da Escola Secundária de Santo António, do Barreiro. Peço à Câmara uma saudação especial para os nossos visitantes.
Aplausos gerais, de pé.
Srs. Deputados, vamos passar à apreciação conjunta das propostas de resolução n.ºs 49/VII - Aprova, para ratificação, a Emenda ao artigo XIII da Convenção Constitutiva da União Latina, assinada em Paris, em 15 de Maio de 1954, e 52/VII Aprova, para ratificação, o Acordo entre a República Portuguesa e a União Latina (estabelecimento da União Latina), assinado em Paris, em 6 de Setembro de 1995, que regula o regime de privilégios e imunidades que Portugal confere à delegação da União Latina em Lisboa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.
O Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo apresenta à Assembleia duas propostas de resolução relativas à União Latina.
A primeira visa aprovar a emenda ao artigo 13.º da Convenção Constitutiva da União Latina, assinada em Paris, em 15 de Maio de 1954, a qual regula a composição e o funcionamento do Conselho Executivo.
A iniciativa da emenda foi apresentada por Portugal e pelo Uruguai e aprovada no 14.º Congresso da União Latina, em Dezembro de 1994. Propõe-se adaptar a composição da organização, designadamente através do seu Conselho Executivo, à evolução que a organização tem tido nos últimos anos, permitindo que novos Estados membros da União Latina, designadamente países africanos de expressão portuguesa, possam ser eleitos para aquele Conselho, pelo que se propõe a alteração da composição deste último, de 10 para 12 membros, podendo alterar-se este número futuramente, sob proposta do Conselho ao Congresso, sem a necessidade de rectificações à Convenção.
A matéria da segunda proposta de resolução visa a ratificação de um acordo entre a República Portuguesa e a União Latina, assinado em Paris, em 6 de Setembro de 1995, que regula o regime de privilégios e imunidades que Portugal confere à delegação da União Latina em Lisboa.
No fundo, procura-se conferir certeza e segurança às normas que estabelecem o estatuto jurídico-diplomático da delegação da União Latina em Portugal e, com a presente disciplina, vai-se ao encontro da orientação do Direito internacional no que toca a privilégios e imunidades das organizações internacionais. Destina-se este acordo a conceder aos funcionários da União Latina certos privilégios e imunidades, bem como isenção de impostos sobre o rendimento e de contribuições para a segurança social.
Como nota final, refira-se que a delegação da União Latina em Lisboa é composta por apenas três funcionários.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, a primeira dúvida que estas propostas de resolução, apresentadas pelo Governo, nos suscitam é no sentido de sermos esclarecidos sobre o que é e o que tem feito exactamente a União Latina.
A União Latina, segundo sabemos, foi constituída em 1954 e, desde então, não tem dado aso a grandes notícias a não ser relativamente à alteração introduzida em 1995.
Assim, gostaríamos de saber que tipo de actuação tem tido a União Latina. Além disso, uma vez que um dos objectivos da União Latina é o de promoção da cooperação intelectual entre os países que a integram, que cooperação desse género tem havido, que influência e que consequências positivas se têm verificado quanto à utilização dos valores morais e espirituais da latinidade nas relações entre os países que integram esta União?
A União Latina foi constituída por um determinado núcleo de países, mas hoje integra todos os países africanos de língua portuguesa. Já agora, qual o país que detém actualmente o cargo de Secretário-Geral da União? Quanto ao Congresso, que actuação tem desenvolvido e, sobre a Comissão Executiva, que planos de trabalho tem apresentado e posto em execução?
Uma vez que já funciona a Comunidade dos Povos de Língua Portuguesa, constituída por Portugal, os países africanos de expressão portuguesa e o Brasil, que papel têm desempenhado estes países, nomeadamente Portugal, no contexto da União Latina? Faço esta pergunta na medida em que a CPLP tem alguns objectivos idênticos aos da União Latina.
Por outro lado, segundo a Convenção Constitutiva desta organização, de 1954, o Congresso deve propor aos Estados membros planos de interesse geral a realizar nos
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respectivos territórios. Sendo assim, que planos têm sido adoptados, não apenas pelos países africanos e nos restantes, incluindo Portugal?
É que existe uma certa ambiguidade em tudo isto, pelo que pretendemos saber se foram concedidas bolsas de estudo e de que teor a artistas, cientistas, professores, estudantes ou técnicos.
Sobre o financiamento da organização, que contribuições financeiras têm sido canalizadas com vista ao sustento desta União Latina, a fim de podermos fazer ideia das suas possibilidades de intervenção.
Finalmente, queremos conhecer os últimos relatórios de actividade da União Latina para saber se há utilidade na existência desta organização que, em princípio, poderia ser bastante positiva. No entanto, uma vez que não tem havido publicidade acerca da sua actividade, gostaríamos que o Sr. Secretário de Estado nos prestasse esclarecimentos complementares como os que dizem respeito à aprovação de projectos de acordos internacionais, para podermos decidir sobre a posição a tomar quanto a esta matéria.
(O Orador reviu.)
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.
O Sr. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação: - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, teria muito gosto em responder, de forma exaustiva, a todo o conjunto vastíssimo de questões que aqui colocou, mas, como sabe, estou em funções há muito pouco tempo e essas são questões de grande especialidade relativamente ao funcionamento da União Latina.
Limitar-me-ei, por isso, a esclarecer que a União Latina esteve, efectivamente, desactivada até 1983, data a partir da qual, sobretudo na sua dimensão de articulação com os objectivos da UNESCO, passou a ter uma maior visibilidade no contexto das organizações internacionais que se desenvolvem de acordo com a doutrina e os princípios que inspiram a Convenção aprovada em 1954.
Também em relação aos países africanos de língua portuguesa, já que o Sr. Deputado fez alusão à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e à articulação dos objectivos desta com os da União Latina, informo que todos os países que são membros da CPLP integram hoje esta organização, que é a União Latina.
Precisamente por isso, com estas duas iniciativas, o objectivo do Governo foi o de propiciar melhores condições de participação, designadamente ao nível da definição das orientações e da implementação de medidas no âmbito desta União aos países africanos de língua portuguesa, já que a possibilidade de ampliação do Conselho Executivo para 12 membros e a definição de maior rigor equitativo, quer do ponto de vista geográfico quer do ponto de vista linguístico, no desenvolvimento da União Latina permitirá, sem dúvida, uma participação mais activa desses Estados nos objectivos da União.
Relativamente às questões muito particulares e especiais que o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca me colocou, terei todo o gosto em fazer chegar, ao Sr. Deputado, em particular, e à Comissão dos Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, em geral, os relatórios e toda a documentação que versam
essas matérias.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Laurentino Dias.
O Sr. Laurentino Dias (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos hoje a discutir duas propostas de resolução relativas à União Latina. Trata-se de propostas bem claras quanto aos seus objectivos, naturalmente bem entendidas e, por isso, susceptíveis de serem votadas em sentido favorável por todos os grupos parlamentares.
O nosso país é signatário de variadas convenções internacionais constitutivas de órgãos de natureza internacional e uma delas é a Convenção Constitutiva da União Latina, que data de 1954. Ora, na vida desta União, como na de qualquer outra instituição desta natureza, acontecem situações que implicam alterações à convenção inicial.
A primeira proposta - proposta de resolução n.º 49/VII - que o Governo aqui nos trouxe destina-se, objectivamente, a permitir que novos Estados membros da União Latina, designadamente os países africanos de língua portuguesa, possam, por via desta emenda, pertencer ao seu Conselho Executivo, o que não lhes era permitido dado não terem sido; como é lógico, países fundadores desta instituição.
A segunda proposta - proposta de resolução n.º 52/VII - visa permitir ou fazer aceder os funcionários da delegação de Lisboa da União Latina aos privilégios e imunidades próprios de funcionários de instituições desta natureza.
Existe uma delegação em Portugal e os funcionários ao seu serviço, tal como acontece com outras instituições de natureza idêntica à da União Latina, gozam de privilégios e imunidades em matéria de impostos, IRS e segurança social. Ora, a proposta de resolução n.º 52/VII destina-se, justamente, a regular esses privilégios e imunidades que são, por direito, atribuíveis a esses funcionários.
Quer a proposta de resolução n.º 49/VII quer a proposta de resolução n.º 52/VII versam matéria da competência da Assembleia da República, a primeira por ser uma emenda à Convenção Constitutiva da União Latina e a segunda por ter a ver com uma eventual diminuição de despesas, pois estão em causa privilégios e imunidades - se bem que muito relativos e curtos - dos funcionários desta União, e por isso vieram ambas a esta Assembleia.
Por serem iniciativas suficientemente claras, simples e objectivas nas suas disposições, terão o voto favorável do Partido Socialista, como, aliás, ficou dito em Comissão e reafirmo aqui, em Plenário.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva.
O Sr. Rui Gomes da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado. Srs. Deputados: Trata-se de uma intervenção muito breve, também para informar que o PSD 'votará favoravelmente as propostas de resolução n.os 49/VII e 52/VII. A primeira introduz uma emenda no artigo XIII da Convenção Constitutiva da União Latina e a segunda diz respeito ao Acordo firmado entre a República Portuguesa e essa mesma União Latina, assinado em Paris em Setembro de 1995, que regula o regime de privilégios e imunidades que Portugal confere à delegação da União Latina em Lisboa.
Em relação à primeira das proposta de resolução, a n.º 49/VII, escusar-me-ia de repetir os seus fundamentos, já
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referidos, aliás, nos relatórios entregues, nas palavras do Sr. Secretário de Estado e em mais três intervenções de Srs. Deputados.
Permitir-me-ia apenas e tão-só, em nome do Partido Social Democrata, realçar a possibilidade que esta emenda dá, ao alterar o artigo XIII dos Estatutos da União Latina, de eleição de representantes dos países africanos de língua portuguesa para o Conselho Executivo, nomeadamente nos n.os 3 e 4, quando se alerta para a necessidade de uma repartição geográfica e linguística. Tal permite que, no caso de haver uma modificação substancial dos membros da União, o Congresso pode alterar o número dos membros do Conselho Executivo, sob proposta deste. Ou seja, de uma forma sucinta e expedita, prevê-se a possibilidade de os países africanos de língua portuguesa virem a participar neste mesmo Conselho Executivo da União Latina.
A proposta de resolução n.º 52/VII tem apenas como objectivo o cumprimento total e eficaz dos objectivos da União Latina definidos no acordo de constituição.
Os artigos I e VI da Convenção Constitutiva da União Latina alertam para a ideia de a representação desta União em Portugal desempenhar as funções atribuídas pelo seu Secretárío-Geral, assegurando o seu funcionamento administrativo normal e mantendo os direitos das representações diplomáticas e consulares. De entre esses direitos, tomo a liberdade de citar a inviolabilidade das instalações e a não permissão de que essas mesmas instalações funcionem como local de refúgio a perseguidos por delitos, conforme vem referido no artigo 1.º
O artigo VI refere-se aos privilégios e imunidades desses mesmos funcionários da União Latina, embora com a introdução de algumas limitações.
O Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, porque não vê nada que contrarie os seus princípios e porque apoia estas duas alterações, votará favoravelmente as propostas de resolução n.os 49/VII e 52/VII.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.
O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A União Latina é como todas as uniões entre Estados e resulta de um momento de exaltação, provavelmente a seguir a uma convenção onde se juntaram representantes de vários Estados que descobriram que tinham uma origem comum na civilização romana, em que o caminho a seguir depende mais dos seus membros e da sua imaginação do que de outra coisa qualquer. E é evidente que, quando uns não tiverem imaginação, aumentarão as probabilidades de outros, com alguma imaginação, fazerem alguma coisa dessa União.
Esta União, como é evidente pelos documentos que nos foram distribuídos, esteve em «hibernação» à procura do seu destino durante muito tempo, e a demonstração disso é que, durante muitos anos, teve apenas 12 elementos e, de repente, num espaço curto, passou de 12 para 34 elementos, o que pode significar também que está em vésperas de adquirir alguma dinâmica.
Recordaria aqui que, a meu ver, de entre todos os países que têm esta mesma raiz românica de linguagem, a única comunidade homogénea que existe como sub-unidade desta é exactamente a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), o que significa que os países de língua não já românica mas portuguesa poderão assumir um protagonismo muito importante no futuro desta União. E julgo que o devem fazer, porque, de facto, uma união que tem como uma das suas principais actividades o prémio de uma tradução é pouco uma união linguística, é ser pouco ambiciosa, quando sabemos exactamente que os países de África e da América do Sul estão na linha de partida para as grandes inovações do milénio que vai começar.
Sr. Secretário de Estado, ao aprovarmos estas ratificações, deixamos este recado ao Governo: «em terra de cegos, quem tem olho é rei»! Se a União Latina, até hoje, foi de cegos, mostremos que temos olho para fazer alguma coisa com ela!
Risos gerais.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, como ninguém mais deseja usar da palavra, declaro encerrado o debate. na generalidade, das propostas de resolução n.ºs 49/VII e 52/VII.
Vamos, agora, passar à discussão da proposta de resolução n.º 58/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção n.º 138 da Organização Internacional de Trabalho, sobre a idade mínima de admissão ao emprego.
Para apresentar esta proposta de resolução, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Segurança Social e das Relações Laborais.
O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social e das Relações Laborais(Ribeiro Mendes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A presente proposta de resolução n.º 58/VII retoma uma iniciativa legislativa não concluída na legislatura anterior e que estava, aliás, prevista no Acordo Económico e Social de 1990, na perspectiva da elevação da escolaridade obrigatória para nove anos e da idade de admissão ao emprego para 16 anos.
O interesse da ratificação desta Convenção pode enunciar-se do seguinte modo: demonstra, no plano internacional, que a legislação portuguesa respeita as normas internacionais sobre a interdição do trabalho infantil e, deste ponto de vista, é sabido que a OIT incentiva os Estados membros a ratificar as convenções relativas aos direitos fundamentais, só faltando a Portugal ratificar a Convenção desta idade mínima de admissão.
Por outro lado, noutras organizações internacionais, como é o caso das Nações Unidas, no quadro do Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais e da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, a ratificação da Convenção n.º 138 é um critério de aferição das legislações nacionais sobre trabalho infantil.
A situação portuguesa neste capítulo não é alterada pela ratificação, como é sabido, porque a legislação laboral prevê, desde 1991, os 16 anos como idade mínima de admissão ao emprego e de términos da escolaridade obrigatória, o que está concretizado desde o início de 1997.
Estou convencido de que todos os Srs. Deputados concordarão que é oportuna a ratificação desta Convenção da OIT sobre a idade mínima de admissão ao emprego.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): -- Para apresentar o relatório da Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Carmo Sequeira.
A Sr.ª Maria. do Carmo Sequeira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A
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proposta de resolução n.º 58/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção n.º 138 da Organização Internacional de Trabalho, sobre a idade mínima de admissão ao emprego, baixou a duas comissões, à Comissão dos Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação e à Comissão do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, que, de acordo com as disposições constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, procedeu à consulta pública das organizações representativas dos trabalhadores.
A proposta de resolução n.º 58/VII visa a aprovação, para ratificação, da Convenção n.º 138 relativa à idade mínima de admissão ao emprego, adoptada pela Conferência Internacional de Trabalho em 26 de Junho de 1973.
Através da presente proposta de resolução, nos termos da legislação em vigor, em Portugal verifica-se já, neste momento, que o ensino básico universal e obrigatório tem duração de nove anos e a obrigatoriedade da frequência termina aos 16 anos. A idade mínima geral de. admissão ao emprego dos trabalhadores abrangidos pelo Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho é de 16 anos e, nas relações de emprego público, é de 18 anos.
A Convenção n.º 138 da OIT, que procedeu à revisão das convenções sectoriais anteriores da OIT sobre a idade mínima de admissão, visa assegurar a abolição efectiva do trabalho das crianças e elevar progressivamente a idade mínima de admissão ao emprego ou ao trabalho a um nível que permita aos adolescentes atingirem o mais completo desenvolvimento físico e mental.
A referida Convenção obriga, pois, a que a idade Mínima de admissão não seja inferior à idade em que cessa a escolaridade obrigatória, nem inferior a 15 anos de idade. A presente Convenção não se aplica ao trabalho realizado em estabelecimentos de ensino ou em instituições de formação profissional, nem ao trabalho efectuado em empresas por jovens com, pelo menos, 14 anos de idade, desde que de acordo com as condições prescritas pela autoridade competente após consulta das organizações sindicais e patronais e faça, parte de um programa de ensino ou formação profissional.
Por outro lado, a Convenção admite a possibilidade de a legislação nacional poder autorizar o emprego, em trabalhos leves, de menores entre 13 e 15 anos, desde que não prejudiquem a sua saúde e desenvolvimento, a sua assiduidade escolar ou participação em programas de orientação ou formação profissional. Acresce que pode também ser autorizado o trabalho de menores de 15 anos de idade que não tenham ainda terminado a escolaridade obrigatória, nos termos definidos na própria Convenção.
Por último, a Convenção n.º 138 estabelece expressamente que a idade mínima de admissão deve ser elevada para os 18 anos em empregos que sejam susceptíveis de comprometer a saúde, a segurança ou a moralidade dos jovens.
É importante referir ainda os antecedentes. A Convenção n.º 138 da OIT foi adoptada a 26 de Junho de 1973 pela Conferência Internacional do Trabalho, não tendo ainda sido aprovada, para ratificação, pelo Estado português.
Em 1980, o Governo, visando a ratificação daquela Convenção, promoveu a sua publicação, para efeitos de apreciação pública, na separata n.º 10 do Boletim do Trabalho e Emprego, de 1 de Outubro de 1980, não tendo, nessa altura, chegado a ser aprovada para efeitos de ratificação.
Em Junho de 1995, o Governo apresentou à Assembleia da República uma proposta de resolução de aprovação para a ratificação da Convenção n.º 138 da OIT que caducou com o termo da legislatura.
Sobre os enquadramentos internacional, comunitário, constitucional e jurídico foram feitas referências no relatório que apresentei na Comissão mas que não vou mencionar aqui.
A Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, foi do seguinte parecer: a proposta de resolução n.º 58/VII, que aprova, para ratificação, a Convenção n.º 138 da OIT, sobre a idade mínima de admissão ao emprego. preenche os requisitos constitucionais e legais para subir ao Plenário da Assembleia da República para apreciação e votação: os grupos parlamentares reservam as suas posições para o Plenário da Assembleia da República.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me que, no âmbito da discussão da proposta de resolução n.º 58/VII, que, aprova, para ratificação, a Convenção n.º 138 da OIT, sobre a idade mínima de admissão, ao emprego, teça algumas considerações acerca da mão-de-obra infantil, que persiste, em total contrariedade com o que esta Convenção introduz também como objectivo, ou seja, assegurar a abolição efectiva do trabalho das crianças.
Um facto parece indesmentível: a mão-de-obra infantil existe e julgo que estamos todos de acordo na necessidade de combatê-la.
O trabalho infantil, em Portugal, constitui um cancro, que só o empenho colectivo de toda a comunidade nacional, da sua consciência e da necessidade. imperativa de pôr cobro a tal perversão, será capaz de combater.
Várias organizações, como a CNASTI, a UGT. a CGTP e a FTDC, têm vindo a ocupar-se dos problemas do trabalho infantil, promovendo várias iniciativas, como colóquios, seminários, conferências e outras campanhas, com o objectivo de sensibilizar a opinião pública para o flagelo que é a exploração da mão-de-obra infantil, bem como de procurar consciencializar o poder e as instâncias competentes para a necessidade de serem tomadas medidas conducentes à penalização dos prevaricadores.
Reconhecemos alteração na dinâmica de combate ao problema. Porém, ainda, com resultados infrutíferos, sem efeitos objectivos na diminuição do problema e a merecer uma atenção mais cuidada e mais empenhada por parte do nosso Governo.
Várias razões podem ser apontadas para este problema.
Quanto a nós, a causa principal deste problema é a pobreza. Há, no entanto, outros factores, sociais e culturais, que têm permitido a perpetuação desta exploração.
A falta de recursos ou o baixo rendimentos das famílias, associados ao insucesso escolar, são factores que estão também na origem deste problema.
As poucas opções para a vida levam os jovens a abandonar a escola e a sua formação prematuramente, para irem, muitas vezes por vontade própria, rumo a um futuro onde estão destinados a juntar-se a uma classe de trabalhadores não qualificados, semi-analfabetos, num mercado de trabalho cada vez mais competitivo.
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Não é menos despiciendo o facto de a falta de mentalidade de muitos pais levar ainda a encarar o início do trabalho como uma escola de virtudes, em que à criança basta saber ler e fazer contas elementares, porque quanto mais cedo começar a trabalhar mais cedo limará os instintos de vadiagem e se preparará para a vida. Mas como, por certo, nenhum pai quer o pior para o seu filho, torna-se necessário encontrar as causas que provocam tal comportamento.
Constitui também factor encorajador os falsos e pouco escrupulosos empresários, que não olham a meios para atingir o seu único objectivo: o lucro.
Este problema, que a todos nos envergonha e que hipoteca o futuro dos nossos jovens e do País, não se resolve com simples consensos meramente discursivos. São indispensáveis medidas concretas, eficazes e urgentes.
Como atrás referi, este problema tem de ser encarado como obrigação nacional e só o empenhamento colectivo de toda a comunidade nacional porá cobro a tal perversão.
No que à proposta de resolução n.º 58/VII diz respeito, ela visa a aprovação, para ratificação, da Convenção n.º 138 da OIT, relativa à idade mínima de admissão ao emprego, adoptada pela Conferência Internacional do Trabalho de 26 de Junho de 1973, e merece a nossa total concordância.
Como os relatórios das Comissões de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação e de Trabalho, Solidariedade è Segurança Social referem, e bem, a fixação pela Convenção n.º 138 da OIT de, que a idade mínima de admissão ao emprego não seja inferior à idade em que cessa a escolaridade obrigatória, nem inferior a 15 anos, corresponde já ao estabelecido pelo regime do contrato individual de trabalho, na legislação portuguesa. Além disso, esta Convenção enquadra também as circunstâncias de excepção em que pode ocorrer fora desta limitação.
Como atrás disse, nada temos a opor. Contudo, importa que se interiorize que a legislação por si só não é suficiente, sendo necessário disponibilizar os meios para atingir os objectivos contidos na Convenção n.º 138 da OIT.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Almeida Velho.
O Sr. Gonçalo Almeida Velho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Segurança Social e das Relações Laborais, Sr.ªs e Srs. Deputados: Através da proposta de resolução n.º 58/VII, visa o Governo a aprovação, para ratificação, da Convenção n.º 138 da OIT, relativa à idade mínima de admissão ao emprego.
A Convenção n.º 138 da OIT, adoptada pela Conferência da Organização Internacional de Trabalho, em 1973, tem como desiderato último assegurar a abolição efectiva do trabalho de crianças, estabelecendo, para o efeito, uma idade mínima de admissão ao emprego e ao trabalho, com vista a permitir aos menores atingirem um desenvolvimento físico e mental completo.
Neste contexto, a proposta de resolução para ratificação da Convenção n.º 138 da OIT, apresentada pelo Governo, afigura-se-nos positiva e meritória e é acolhida com satisfação pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, convictos de que a sua aprovação se traduzirá num reforço da defesa e salvaguarda dos direitos das crianças.
A ratificação da referida Convenção, sobre a idade mínima de admissão ao emprego, para além de ser um imperativo que resulta de compromissos internacionalmente assumidos no âmbito da Organização Internacional do Trabalho, de que o nosso país é membro desde 1919, constitui ainda, e simultaneamente, um reforço do quadro legal vigente sobre a idade mínima de admissão ao trabalho e dá resposta às legítimas aspirações das associações representativas dos trabalhadores.
Para o Partido Socialista, a ratificação desta Convenção constitui um imperativo de ordem internacional, cujo cumprimento não pode continuar a ser adiado, frustrando as expectativas dos parceiros sociais, que vêm progressivamente defendendo a necessidade da sua ratificação.
Com efeito, volvidos que são mais de 25 anos sobre a data de adopção da Convenção, quando a maioria dos países membros da OIT já procedeu à sua ratificação e quando o quadro legal nacional vigente está conforme ao disposto na mesma, não se nos afigura existirem quaisquer motivos que justifiquem o protelamento da ratificação de tão importante instrumento.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.ªs e Srs. Deputados: A Convenção n.º 138 da OIT constitui, no plano, do direito internacional convencional, um importante instrumento de combate ao trabalho infantil, na medida em que impõe uma idade mínima de admissão ao emprego e ao trabalho.
Esta Convenção estabelece, como regra geral, que a idade mínima de admissão ao emprego não pode ser inferior à idade em que cessa a escolaridade mínima obrigatória, nem inferior a 15 anos de idade, admitindo, contudo, que a legislação nacional possa consagrar excepções, designadamente, permitindo o emprego de jovens entre os 13 e os 15 anos de idade, desde que as tarefas desempenhadas não colidam com a saúde e desenvolvimento do menor, não prejudiquem a sua assiduidade escolar ou a sua participação em programas de orientação e formação profissional.
Como se pode observar, trata-se de disposições que visam assegurar às crianças e jovens o seu desenvolvimento físico e psíquico nas melhores condições, impedindo, nomeadamente, que possam entrar de forma prematura no mercado de trabalho, desvirtuando, assim, as regras de livre concorrência.
De uma análise ao regime legal em vigor no nosso ordenamento jurídico sobre a idade mínima de admissão ao trabalho podemos concluir que da ratificação da Convenção .não resulta a necessidade de se revogarem quaisquer disposições normativas vigentes.
Com efeito, a idade mínima de admissão, para os trabalhadores abrangidos pelo regime jurídico do contrato individual de trabalho, encontra-se fixada em 16 anos, nos termos do artigo 122.º do Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 396/91, de 16.de Outubro. No que respeita às relações de emprego público, o artigo 22.º do Decreto-Lei n.º 498/88, de 30 de Dezembro, estabelece que a idade mínima de admissão ao trabalho é de 18 anos.
Isto significa, pois, que, à luz do regime jurídico vigente no nosso país, quer nas relações de direito privado, quer nas relações de direito público, os princípios constantes da Convenção n.º 138 da OIT encontram-se já consagrados, apontando, inclusive, para um regime mais favorável, uma vez que a regra geral da idade de admissão ao trabalho situa-se em 16 anos, não havendo, portanto, necessidade
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de se revogar a legislação em vigor, o que, por outro lado, aconselha a aprovação da presente proposta de resolução.
A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!
O Orador: - Acresce que, hoje, nos termos da Lei de Bases do Sistema Educativo, a escolaridade obrigatória é de nove anos e termina aos 15 anos de idade, o que se afigura igualmente compatível com o disposto na Convenção n.º 138 da OIT.
Trata-se, pois, da ratificação de uma Convenção importante, relativa a uma matéria que, para o Partido Socialista, é pacífica e cuja aprovação permitirá, para além do respeito pelos compromissos internacionais, um reforço dos princípios que desde sempre defendemos no domínio do combate ao trabalho infantil.
A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!
O Orador: - Com efeito, não obstante o quadro legal vigente se apresentar em consonância com os princípios vertidos na Convenção n.º 138, defendemos a sua gradual melhoria, a par da execução de uma política eficaz e continuada de erradicação do trabalho de menores.
Em suma, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista acolhe favoravelmente a proposta de resolução hoje em discussão, que aprova, para ratificação, a Convenção n.º 138 da OIT. Aprovamos esta iniciativa, convictos de que a mesma, para além de prestigiar o Estado português no plano internacional, dá resposta às justas reivindicações dos representantes dos trabalhadores e constitui um reforço do quadro legal vigente, cuja rabo vai no sentido da tutela dos interesses das crianças.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.
O Sr. António Rodrigues (PSD):.- Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Segurança Social e das Relações Laborais, Sr.ªs e Srs. Deputados: A ratificação da Convenção n.º 138 da OIT, embora importante, não passa de um mero acto formal.
Com efeito, a legislação portuguesa relativa à protecção do trabalho de jovens é vasta e mais exigente do que o disposto no instrumento normativo que hoje apreciamos.
Não obstante esta Convenção ter sido apresentada já por duas vezes a este Parlamento, os normativos existentes e que a ela se reportam, como é o caso do Decreto-Lei n.º 396/91, de 16 de Outubro, que já fixava em 15 anos a idade mínima de admissão ao trabalho, entretanto fixada em 16 anos, por referência ao cumprimento dos nove anos de escolaridade obrigatória já se encontram salvaguardados.
O combate ao trabalho infantil é um imperativo para todos nós, que não se fixa em declarações mas que se afirma em acções concretas, e que pouco ou nada tem evoluído com este Governo. Exige-se, assim, acção - permanente e constante.
A ratificação desta Convenção - e decorreram dois anos para que o Governo aprovasse a proposta de resolução hoje em apreciação -, constituindo um acto formal, contribui para a reflexão sobre o flagelo do trabalho infantil, o qual importa eliminar com rapidez, não se compadecendo, pois, com acções dilatadas no tempo.
A fixação da idade mínima para o exercício de funções no mercado de trabalho constitui uma preocupação generalizada e consensual, na medida em que o estabelecimento da mesma cumpre vários objectivos, entre os quais se destaca a protecção do direito dos jovens ao desenvolvimento sustentado da sua integração na vida activa, o combate ao trabalho infantil e a garantia do cumprimento da escolaridade obrigatória.
No entanto, se a lei é clara quanto ao exercício de trabalho dependente é omissa quanto ao exercício de funções em regime liberal ou trabalho independente. Sem prejuízo de situações específicas que a referida Convenção e a Lei Geral do Trabalho excepcionam, o trabalho independente merece uma regulamentação idêntica, se não até superior, por parte do legislador.
O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Muito bem!
O Orador: - O estabelecimento de restrições à idade mínima de admissão para o trabalho dependente ou subordinado poderia levar a que se recorresse à modalidade alternativa do chamado «recibo verde». Por isso, deverão salvaguardar-se as situações de trabalho independente por jovens, com a mesma fundamentação que leva à fixação da idade mínima para o trabalho subordinado.
O actual enquadramento normativo português, embora integre os princípios enunciados em vários acordos internacionais, nomeadamente na Carta Social Europeia, aguarda ainda a transposição da Directiva n.º 94/33/CE,, que, apesar de prevista no Acordo de Concertação Estratégica, viu já o prazo aí previsto ser ultrapassado sem a respectiva transposição. A sua concretização proporcionará um novo regime destinado à protecção da prestação de trabalho por jovens.
Esperamos que aqui, como no que respeita à fixação da idade mínima para o trabalho independente, o Governo não deixe para o futuro as obrigações que lhe estão cometidas, no sentido de proteger o trabalho de menores.
O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Seria mesmo desejável que, aproveitando o cumprimento integral da presente Convenção, se elevasse a idade mínima para o acesso ao trabalho, como já acontece relativamente ao emprego público, e ao que a Convenção já prevê para situações de emprego em que existam riscos para a saúde, segurança, desenvolvimento físico, psicológico, moral ou social dos jovens.
Para além disto, importa que se regulamente, de forma específica, o trabalho de menores, nos termos do estabelecido na já referida Directiva comunitária, assegurando a devida protecção das formas de prestação de trabalho pelos jovens, de modo a nunca pôr em causa a sua formação e a sua adequada integração na vida activa.
Naturalmente, o PSD votará favoravelmente esta Convenção, que, aliás, já existe, em termos de enquadramento legislativo português. Mas, mais do que o direito, exige-se uma acção política positiva relativamente ao trabalho infantil. Esperamos, pois, que, com o voto favorável que hoje damos ao Governo relativamente a esta matéria, ele corresponda com as acções necessárias para impedir que este flagelo continue.
Aplausos do PSD e de alguns Deputados do PS.
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O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Segurança Social e das Relações Laborais, Srs. Deputados: Uma vez que a ratificação desta Convenção não oferece, de facto, quaisquer dificuldades e que a legislação portuguesa até é mais avançada nesta matéria, convém realçar aqui alguns pontos que me parecem fundamentais.
Em primeiro lugar, quero sublinhar a inexplicável e indesculpável delonga no tempo entre a data desta Convenção e a sua ratificação pelo Estado português 25 anos -, já aqui assinalada. E se, em termos de direito laboral, isso foi ultrapassado pela nossa legislação, em termos internacionais, a aposição de assinatura pelo Estado português teria sido de uma importância simbólica grande, porque em 1996, segundo revelam os dados da OIT, dos 173 países da OIT apenas 49 tinham ratificado a Convenção, o que denota que o mundo encara as crianças de uma maneira que nem sequer encontro termos para a definir. É uma vergonha o que se passa a nível mundial!...
De facto, as fotografias que, por exemplo, Sebastião Salgado tirou sobre o trabalho humano por todo o mundo, indicam e apontam essa vergonha.
Gostaria também, de chamar a atenção para as estimativas da OIT relativas a dados de 1995, segundo os quais Portugal é apontado como um dos quatro países da Europa onde existe trabalho infantil, sendo Portugal o país onde essa taxa de trabalho infantil é maior, 1,8% só referentes a crianças dos 10 aos 14 anos.
De facto, na origem do trabalho infantil já aqui foram apontadas muitas causas. Entendemos que a pobreza é a primeira causa do trabalho infantil, havendo evidentemente outras, mas a exclusão das famílias e os níveis de pobreza para que são atiradas obrigam-mas a recorrer a esta espécie de trabalho como forma de completar o rendimento familiar.
Para além disso, a falta de perspectivas, o insucesso escolar e a falta de acesso a uma escola de qualidade são também factores importantes. Aliás, estas duas considerações constavam de um preâmbulo já no remoto ano de 1982, quando o PCP apresentou aqui na Assembleia da República um projecto de lei de combate ao trabalho infantil, no qual se previa a criação de uma estrutura nacional, que vem agora recomendada nos mais recentes documentos da OIT, de combate ao trabalho infantil e de envolvimento das comunidades locais nesse combate.
Infelizmente, o nosso projecto de lei foi rejeitado, porque o PSI) resolveu votar contra sem qualquer explicação, mas o facto é que nele já vinha esta menção.
O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Muito bem!
A Oradora: - Srs. Deputados, a nível internacional, gostaria de assinalar que se passa alguma coisa que, creio, tem por trás alguma dose de hipocrisia, porque têm vindo a ser aprovadas nos tratados comerciais as chamadas «cláusulas sociais» que impedem que se comprem artigos que tenham sido fabricados com mão-de-obra infantil e eu não estou contra isto, mas o pior é o que está por trás...
Em termos de exportações, há também os chamados «diplomas sobre as etiquetas» que devem garantir que não foi usado trabalho infantil no fabrico dos artigos. Aliás, isto está relacionado com o escândalo que houve na Campeonato da Europa de Futebol ao saber-se que as bolas eram feitas com trabalho das crianças do Paquistão...
Neste aspecto, tudo bem! Mas o que interessa perguntar é se estas medidas têm por trás as disposições necessárias, que promovam o desenvolvimento dos países, e a cooperação internacional com os países mais pobres para que depois não se diga que ainda ficaram pior!...
Estas medidas, absolutamente necessárias para combater este flagelo, são a cooperação para o desenvolvimento e não o agravamento da dívida dos países subdesenvolvidos.
O Sr. José Calçada (PCP): - O resto é mentira!
A Oradora: - Resta-me acrescentar que aprovamos a ratificação desta Convenção quando já está em preparação uma nova convenção sobre o trabalho infantil.
De facto, em Junho do corrente ano, a OIT reunirá para preparar uma nova convenção, que entrará em vigor em 1999 - pelo menos, assim está anunciado.
Resta-nos esperar que o Estado português não demore mais 25 anos a ratificar essa convenção.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria ainda de referir que está a decorrer a marcha internacional contra o trabalho infantil, marcha essa que organizações não governamentais, reunidas em Haia, em 1997, e na sequência da marcha das crianças da índia pela liberdade, em Abril de 1996, resolveram fazer. Esta marcha decorre entre Janeiro é Junho de 1998. Temos ecos do que se passa em França e do que esse país está a fazer, integrado nessa marcha. Aqui, em Portugal, salvo grande distracção da minha parte, ecos não ouço nenhuns.
Aplausos do PCP e da Deputada do PS Rosa Albernaz.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate da proposta de resolução n.º 58/VII.
Srs. Deputados, antes de dar por encerrada a sessão, resta-me anunciar que a próxima reunião terá lugar na quarta-feira, pelas 15 horas, constando do período de antes da ordem do dia o debate de urgência, requerido pelo PSD, sobre «as últimas medidas no domínio fiscal anunciadas pelo Ministro das Finanças. sendo a ordem do dia preenchida com a discussão das propostas de lei n.os 136/VII e 138/VII e 139/VII.
Eram 11 horas e 55 minutos.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca.
Almeida. José António Ribeiro Mendes.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
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Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
José Mendes Bota. Luís Filipe Menezes Lopes.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Social Democrata (PSD):
Antonino da Silva Antunes.
António de Carvalho Martins.
António Manuel Taveira da Silva.
António Roleira Marinho.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Domingos Dias Gomes.
João Calvão da Silva.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.
José Manuel Costa Pereira.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
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