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17 DE JANEIRO DE 1998 999

constituir uma ameaça à segurança, à vida e ao planeta do ponto de vista ambiental, e por ser algo que até hoje a Humanidade não provou saber utilizar e controlar, com segurança.
Creio que a própria realidade daquilo que é hoje a herança nuclear - mais de 30 milhões de vítimas da radioactividade em todo o mundo, associadas também a duas questões que marcam de forma extremamente dolorosa a Humanidade, com a utilização da bomba atómica em Hiroxima e, depois, em Nagasaki - merece uma reflexão para quem é partidário do recurso à energia nuclear.
Esta Convenção tem extrema importância, quando falamos na Europa, que é o continente mais nuclearizado do mundo. Localizam-se aqui 217 reactores e a opção nuclear não é, de modo algum, travada. Do ponto de vista europeu, a opção nuclear continua a absorver significativa parte do orçamento europeu em matéria de investigação.
Para nós, esta questão é de particular relevância, quando um dos problemas mais graves que se coloca em relação à energia nuclear é precisamente o dos resíduos, do seu transporte, do seu armazenamento e do seu manuseio.
Vivemos numa Europa sem fronteiras, e o nuclear não conhece fronteiras. Vivemos paredes meias com um país que tem em funcionamento centrais nucleares, algumas reconhecidamente de duvidosa segurança. Vivemos paredes meias com centrais nucleares em bacias de rios portugueses internacionais. Três quartos do transporte de resíduos são feitos por mar, e Portugal e a nossa zona económica exclusiva estão nessa rota. Destaca-se, em especial, a zona económica exclusiva dos Açores, que tem sido clandestinamente utilizada para imersão de resíduos nucleares.
Pelas razões referidas, esta é uma questão que envolve grande importância para Os Verdes, daí também a importância que damos à discussão desta proposta de resolução.
Como, para nós, a ratificação desta Convenção não deve ser um mero pró-forma, uma formalidade protocolar a que Portugal se obriga, há aspectos concretos que ela implica. Obviamente, não é ao Ministério dos Negócios Estrangeiros que cabe a responsabilidade de dar respostas nesta matéria mas, sim, ao Governo, e o Sr. Secretário de Estado, no fundo, está aqui em representação do Governo. Por isso, as questões que coloco têm de ser colocadas.
O problema que a ratificação de um documento desta natureza implica, em Portugal - um país onde não há uma entidade reguladora em matéria nuclear, pelo contrário, toda a lógica dos últimos anos tem sido no sentido do desmembramento da entidade que centralizava as questões do nuclear, designadamente do Gabinete de Protecção e Segurança Nuclear, que foi extinto já pelo anterior Governo -, numa matéria como esta, que determina uma grande centralização de poder e responsabilidade, é o de saber que medidas concretas o Estado português se compromete a tomar.
A Convenção que vamos ratificar implica, do ponto de vista da segurança e prevenção, que é uma questão-chave para Portugal, investimento em meios humanos, técnicos e financeiros. Refere o Governo, na nota introdutória, que os gastos nesta matéria seriam marginais se tivéssemos uma estrutura montada, que não existe, para fazer este acompanhamento. O campus de Sacavém, onde está situado o único reactor nuclear português, utilizado para investigação, está parado e não há qualquer equipa técnica a dar-lhe suporte. 0 grupo técnico de emergência português é uma coisa ridícula, pois é apenas composto por um técnico superior.
Sendo assim, pergunta-se: em caso de uma ameaça nuclear, por acidente, em Espanha, que meios efectivos tem Portugal? É que eles não existem.
Portanto, estas são questões que têm de ser colocadas, e há seguramente uma dúvida que a ratificação desta Convenção nos suscita: é dito na alínea c) que Portugal passa a ter acesso a informação de carácter reservado, que, de outro modo, não teria. Dizer-se isto significa, para nós, que Portugal não tem, neste momento, um canal directo de acesso à informação sobre a segurança das centrais nucleares espanholas. Gostaríamos, pois, de saber se assim é ou não, ou que informação adicional ou outro acesso Portugal passa a ter.
Em resumo, penso que esta Convenção é, mesmo para aqueles que, como Os Verdes, são totalmente adversos ao recurso à energia nuclear, fundamental no sentido da garantia da segurança dos portugueses, mas pressupõe e implica desde já uma tomada de decisões e um quadro legislativo, que não existe e que - e alertamos o Governo para o facto - é forçoso vir-se a criar rapidamente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo envia-nos para ratificação a Convenção sobre Segurança Nuclear, adoptada em Viena já no ano de 1994. A primeira surpresa que me causa este facto é a de uma matéria tão importante como esta ter demorado quase cinco anos a chegar ao Parlamento para ratificação.
Hoje, Srs. Deputados, o problema já não se coloca como se colocava há uns anos atrás, quando qualquer país poderia fazer ou não a sua opção nuclear, e, se não optasse pelo nuclear, estaria protegido de todos os riscos. Chernobyl mostrou-nos bem que assim não era; as fugas em algumas centrais nucleares americanas também nos mostraram bem que assim não era; mesmo em Inglaterra alguns acidentes também vieram mostrar o mesmo; e talvez outras coisas, ainda não detectadas, possam vir, num futuro próximo, demonstrar a existência de alguns riscos.
Nessa altura, também se pensava que quando se fazia a opção nuclear era suficiente a escolha de uma tecnologia segura. A experiência tem vindo a mostrar que a segurança no campo da energia nuclear, sob qualquer das suas formas, desde a produção da energia a todas as outras, incluindo a experimental, é qualquer coisa de vivo, que muda constantemente. As medidas de segurança não são as mesmas numa central nova e numa central velha, não são as mesmas num reactor experimental ou num hospital e numa central de produção de energia, não são as mesmas na guarda de resíduos e noutra qualquer circunstância. Isto significa que não basta assinar um acordo, embora seja urgente e necessário assina-lo, e aderir a uma convenção sobre segurança nesta área.
A Sr.ª Deputada Isabel Castro colocou bem o problema ao dizer que se um país aderir a todas estas convenções mas não tiver os instrumentos necessários para tornar efectiva esta segurança tal de pouco lhe vale. E, Sr. Secretário de Estado, com algum conhecimento de causa lhe digo, repetindo, aliás, o que disse a Sr.ª Deputada Isabel Castro: o nosso instrumental, no que diz respeito a esta área, serve para pouco mais do que para medir a radioactividade do rio Tejo, e com isto não iremos longe.

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