O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1427

Sábado, 21 de Fevereiro de 1998 I Série - Número 43

DIÁRIO da assembleia da república

VII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE FEVEREIRO DE 1998

Presidente: Exmo. Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte

Secretários: Exmo. Srs.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 30 minutos.

Foi apreciado o Decreto-Lei n.º 381-A/97. de 30 de Dezembro, que aprova o Regulamento Consular [apreciação parlamentar n.º 46/VII (PSD)], tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Comunidades Portuguesas (José Lello), os Srs. Deputados Paulo Pereira Coelho (PSD), José Calcada (PCP), Carlos Luís (PS) e Nuno Correia da Silva (CDS-PP).
O Decreto-Lei n.º 4/98, de S de Janeiro, que estabelece o regime jurídico das escolas profissionais, foi igualmente apreciado (apreciação parlamentar n.º 47/VII (CDS-PP)]. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa (Guilherme d'Oliveira Martins), os Srs. Deputados Nuno Correia da Silva (CDS-PP), Luísa Mesquita (PCP), José Cesário (PSD), José Ribeiro Mendes (PS) e Castro de Almeida (PSD).
A proposta de lei n.º 117/VII - Estabelece os princípios gerais que regem a organização e o funcionamento da identificação criminal, foi discutida, na generalidade. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Justiça (Lopes da Mota), os Srs. Deputados Miguel Macedo (PSD). António Filipe (PCP), Ferreira Ramos (CDS-PP), Luís David Nobre (PSD) e Antão Ramos (PS).

O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas.

Página 1428

1428 I SÉRIE - NÚMERO 43

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto Bernardas Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
António Manuel Carmo Saleiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
João Pedro da Silva Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueira.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
José Tomás Vasques.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Góes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gradas.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Américo de Sequeira.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.

Página 1429

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1429

Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Armelim Santos Amaral. Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos dar início à apreciação do Decreto-Lei n.º 381-A/97, de 30 de Dezembro, que aprova o Regulamento Consular apreciação parlamentar n.º 46/VII (PSD).
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pereira Coelho.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Social Democrata entendeu submeter a ratificação o Decreto-Lei n.º 381/97, que estabelece o Regulamento Consular.
Esta iniciativa resulta do facto de termos constatado que o referido diploma comporta algumas contradições e revela não ter sido previamente debatido pelos mais directos interessados, sejam eles os utentes, sejam os funcionários, sejam os representantes dos utentes, e aqui não posso deixar de lamentar que os Deputados, por um lado, e o Conselho das Comunidades Portuguesas, por outro, tenham sido completamente esquecidos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Tal postura revela que a proclamada governação em diálogo não passa de uma operação de propaganda ou, então, pelo menos, o Conselho das Comunidades Portuguesas, como órgão consultivo por excelência, deveria ter sido previamente ouvido.
Fica assim demonstrada a consideração e a utilidade que o Governo dá ao Conselho, de cuja criação se vangloriou mas ao qual não deu meios para funcionar e também, pelos vistos, não interessa que funcione. Esta foi a demonstração cabal de .que o Governo só está interessado em valorizar episodicamente os poucos factos que foi capaz de concretizar, não obedecendo a uma política concertada e responsável para o sector das comunidades.

Página 1430

1430 I SÉRIE - NÚMERO 43

A actualização do regulamento consular era obviamente uma necessidade imperiosa, mas a forma como apareceu só se explica numa lógica de propaganda política. É inadmissível que o Conselho das Comunidades Portuguesas não tenha sido previamente ouvido. Se não serve para apreciar esta matéria, então para que serve ? Não será certamente para confraternizar com o Sr. Secretário de Estado de quatro em quatro anos!
A falta de informação prévia fica amplamente documentada quando se lê o Regulamento e ficamos a pensar que terá sido feito tão em segredo que nem dentro do Ministério foi suficientemente debatido, tais as contradições políticas e até administrativas que se detectam. Poderíamos falar na clara falta de entendimento e de interacção e de interacção com outros ministérios, resultando em duplicação de funções com evidente sobreposição e gastos suplementares desnecessários, levando até à ideia de, futuramente, termos dois organismos na mesma área a tratar de economia, cultura, etc. Também se constata que os que existem, o ICEP e o Instituto Camões, não cumprem as funções para que foram criados ou, então, ignoraram completamente tal realidade. Em qualquer caso, raciocínios graves, convenhamos!
Podíamos ainda falar na evidente precipitação ao não terem consultado previamente o sindicato dos trabalhadores consulares, bem como a associação sindical, de diplomatas, pois tudo indica haver contradição quanto à defesa dos interesses em termos do respectivo estatuto e carreira profissional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com alguma apreensão que verificamos o aparecimento de uma nova figura funcional, que serão os futuros assessores consulares.
Numa primeira análise, podemos concordar que é necessário dotar os consulados de pessoal com formação académica superior. Estamos de acordo. No entanto, é óbvio que as áreas escolhidas para as futuras assessorias são discutíveis face ao quadro actual mas, por outro lado, esquecem a área jurídica, que se nos apresenta como uma das principais a ser considerada dadas as manifestas carências nesta área.
Não queremos sequer pensar que o aparecimento dos assessores se prende mais com a necessidade de o PS colocar uns tantos boys. Na verdade, não se compreende que tais assessores venham a assessorar um funcionário diplomático de carreira, o cônsul, e sejam nomeados politicamente pelo ministro, numa mera lógica de confiança pessoal. Esta situação poderá levar-nos, a vários raciocínios, como sejam a menor confiança na capacidade e competência dos titulares de carreira. Esta- figura de assessores, tal qual é tipificada neste diploma, só tem paralelo com os assessores de cargos. políticos do Governo, só que a grande diferença nestas circunstâncias é que eles não serão. escolhidos por quem vão assessorar! No mínimo», é desconcertante... !
Assim, entendemos que, a existir tal figura funcional, o recrutamento deve obedecer a concurso público e com a garantia de licenciatura adequada à função. Por outro lado, é dado ao arquivista um perfil e função que acarreta a criação de numerosos lugares novos, pois tal figura não existe na esmagadora maioria dos postos consulares. As próprias funções colidem com as de outros hierarquicamente superiores.
A criação da «comissão de acção social e cultural» parece sobrepor-se às funções do chefe de posto e dos assessores que, aliás, dela fazem parte. Ao contar com dois elementos eleitos pela comunidade portuguesa residente e inscrita na respectiva área consular, parece-nos acertado quanto ao objectivo de fomentar a participação dos portugueses na vida do consulado, mas entendemos que deveria ser dada a possibilidade de ser o Conselho das Comunidades Portuguesas a indicar localmente esses representantes: Assim, evitaríamos duplicação de eleições, sempre problemáticas, e dar-se-ia ao Conselho mais uma oportunidade de se embrenhar nesta questão, sendo certo que o Conselho é eleito democraticamente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O presente diploma comporta um acréscimo de custos para o orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que importa saber se estão devidamente avaliados. Isto ocorre quando foram reduzidas as verbas disponíveis, para os consulados.
Assim, esperamos que não estejamos perante mais uma lei que não é para implementar mas tão-só para marketing político. É bom que o Governo, no seu todo, reflicta sobre este diploma, pois parece-nos que não foi objecto de atento estudo pelos Ministérios da Economia, das Finanças e ainda pelo próprio Ministério dos Negócios Estrangeiros, dado não se vislumbrar onde entra o papel das embaixadas na coordenação da actividade dos consulados, tal qual eles agora aparecem neste Regulamento com poderes e funções alargadas.
Neste sentido, entregamos na Mesa, da Assembleia da República algumas propostas de alteração que pretendem traduzir as preocupações expostas e com o intuito de, em sede de discussão na especialidade, todos contribuirmos para um Regulamento mais equilibrado, dando-se a oportunidade de ouvir algumas entidades que lamentavelmente não foram ouvidas, como seja o sindicato dos trabalhadores consulares e o Conselho das Comunidades Portuguesas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Desde 1987 que tínhamos vindo a reclamar a existência de um novo Regulamento Consular, é fomos mesmo os primeiros a fazê-lo. O Regulamento Consular até há pouco vigente, no seu núcleo essencial, e para além de legislação posterior, pontual e dispersa, data de 1920, pelo que, se algum respeito ainda nos mereceria, seria o respeito a que nos devemos sentir obrigados para com os anciãos.

Risos.

Não é esta uma razão bastante em termos de lei, nomeadamente em função da sua inadequação à realidade. O mundo mudou muito desde a segunda década deste século e quer a realidade consular quer a da emigração pouco têm a ver com as actuais. O contexto sociológico e político é radicalmente diverso e radicalmente diversos os caminhos geográficos da emigração. Tudo obrigava à feitura do novo Regulamento Consular.

Por isso, tudo obrigava a que ele fosse construído com a maior participação possível, particularmente das entidades obrigatoriamente competentes nesta matéria. Nenhuma pretensa urgência legitima o carácter confidencial e quase secreto com que o Governo elaborou o Decreto-Lei n.º 381/97. Pode até dizer-se que quem aguardou 77 anos

Página 1431

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1431

pela feitura de um novo Regulamento Consular pode perfeitamente aguardar mais uns meses ou mesmo mais um ano. Ou será que o «diálogo» não vale isso? Pelos vistos, para o Governo e para o Sr. Secretário de Estado das Comunidades, não vale mesmo!
E faço aqui um parêntesis na minha intervenção escrita para saudar a presença do Sr. .Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas em Portugal, coisa que, como sabem, é bastante rara.

Risos.

Como claramente decorre da substância do Decreto-Lei n.º 381/97, muito do seu articulado tem a ver, directa ou indirectamente, com o estatuto profissional dos trabalhadores das missões diplomáticas e consulados portugueses no estrangeiro. No entanto, o Sr. Secretário de Estado José Lello não sentiu, nem ao de leve, a necessidade ou a obrigação, legal e constitucional, 'de ouvir a respectiva organização sindical. Não satisfeito com este «claro» espírito de abertura, o' Sr. Secretário de Estado reforçou-o « mandando às urtigas», com a mesma ligeireza, o Conselho das Comunidades Portuguesas, o qual constitui, nos termos legais, um «órgão consultivo do Governo para as políticas relativas à emigração e às comunidades portuguesas»!
Em termos de cumprimento da lei ou em termos de prática do diálogo, estamos conversados!
Mas não se trata apenas da estranha metodologia de trabalho que conduziu ao decreto-lei e que não se reduzia a questões de mero formalismo, antes configura deficiências de substância. O articulado do Regulamento é abundante em generalidades e lugares comuns, bem pouco típicos da linguagem e dos conceitos que devem enformar os dispositivos legais, e o seu preâmbulo é, a este respeito, perfeitamente exemplar ou quase caricatural. Diz-se, por exemplo, que ele se firma em regras «flexíveis e elásticas (...)» adjectivação que, francamente, mais parece inspirada em algum folheto publicitário de lingerie.-...

Risos.

... «(...) porque se quer proteger o novo Regulamento Consular da turbulência legislativa dos nossos dias», o que mostra que os seus autores, quaisquer que tenham sido, não sabemos quais, têm a saudável ambição de que ele dure, pelo menos, outros 77 anos.

Risos.

No artigo 19.º diz-se que «poderá ser constituída junto de cada posto consular de carreira uma comissão de acção social e cultural» e no artigo 20.º definem-se as respectivas funções. Quando se diz que «poderá ser constituída», não se afirma que «terá de ser constituída» e não ficam nada claros os critérios que condicionam uma tão grande latitude de decisão. E quanto às funções atribuídas à comissão, são de tal modo latas e difusas que colidem, ou se sobrepõem, ou duplicam, por exemplo, as do Instituto Camões - se é que ele tem algumas! -, ou as das coordenações de ensino, ou mesmo as do ICEP. Em contraste com estas funções, que eu chamaria opor excesso», torna-se ainda mais evidente e inaceitável a falta de uma clara função de apoio jurídico às comunidades, sistematicamente exigida pelos nossos emigrantes.
Mas o que de todo em todo este novo Regulamento Consular não podia deixar de prever era a possibilidade

de existência de mais uns lugarzinhos para os amigos e aqui o Regulamento não os desaponta! À revelia de qualquer carreira dos trabalhadores consulares, aí estão os artigos 21.º e 77.º, permitindo o rega-bofe da nomeação dos assessores consulares «por livre escolha ministerial». Ao diálogo, que já se viu o que deu, acrescenta-se assim a transparência. De facto, não há quaisquer dúvidas de que é perfeitamente transparente o que se pretende com estas nomeações. Só que se torna assim muito frágil a fronteira que deveria ser nítida, entre, por um lado, esta «transparência» e, por outro, o despudor e a governamentalização.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.

O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: O PSI) invocou a este Plenário o Regulamento Consular (um Regulamento inovador), que corresponde às legítimas aspirações do normal funcionamento daquilo que deve ser um consulado nos dias de hoje. E já aqui foi dito que o anterior Regulamento Consular data de 7 de Março de 1920, quase 80 anos.
Interrogar-se-ão os Srs. Deputados o que seria um posto consular há 80 anos, mesmo num consulado-geral, por exemplo, em Paris. Limitar-se-ia a meros actos administrativos, à emissão de documentos de identificação, de passaportes, de bilhetes de identidade, enfim, aquilo a que uma repartição normal procede em termos administrativos.
Porém, hoje, a realidade é outra. Costumamos dizer que são cerca de 4 a 4,5 milhões de emigrantes e de Iusodescendentes espalhados pelo mundo. A agressividade comercial, económica, é, hoje, diferente daquilo que era há 80 anos; as nossas relações culturais devem ter, hoje, uma outra agressividade do que aquilo que era há 80 anos; o ensino da língua e da cultura portuguesa deve ter uma presença onde existem comunidades diferentes do que aquilo que era há 80 anos. Porém, uma simples reflexão quero trazer a esta Câmara.
Em 80 anos, ninguém alterou o Regulamento Consular. O PSD, que teve esta pasta no Governo 18 anos consecutivos'- repito, 18 anos consecutivos com esta pasta das Comunidades Portuguesas , não alterou uma só vírgula, não fez uma única proposta para alterar um regulamento feudal, caduco, obsoleto e desactualizado.

Aplausos do PS.

É hoje, sem dúvida, com algum espanta e admiração, que vejo subir àquela tribuna um Deputado (eleito pelos emigrantes, que também já era Deputado antes de ter sido eleito a I de Outubro de 1995),...

O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - que nunca antes o tinha feito, levantado a sua voz para questionar o seu Governo sobre um Regulamento Consular obsoleto, caduco, feudal, que. não funcionava!

Aplausos do PS.

Eu diria que V. Ex.ª e andou distraído!
Mas, agora, depois de ouvir a sua intervenção, terei de dizer-lhe que é preciso ser atrevido para fazer uma intervenção como a que V. Ex.ª fez!

Página 1432

SÉRIE = NÚMERO 43

Vozes do PS: - É' verdade! É verdade!

Risos do PSD.

O Orador: -

Sr. Deputado, no que diz respeito aos

assessores consulares, ouvi esta semana um posto emissor dizer que o Sr. Deputado Marques Mendes, líder do Grupo Parlamentàr do PSD, tinha conhecimento de um rol de nomeações no Ministério dos Negócios Estrangeiros para lugares políticos. Desta bancada, desafio V. Ex.ª e o líder da sua bancada a indicar-me uma só nomeação no Ministério dos Negócios Estrangeiros para qualquer cargo político. '

'Aplausos do PS.

O Sr. Deputado sabe que todos os conselheiros culturais, todos os conselheiros económicos e todos os conselheiros adidos de imprensa são ainda os mesmos que foram nomeados pelo seu governo?! '

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Militantes seus!

O Orador: - Assim sendo, V. Ex.ª não encontra um só nome... E desafio-o...

O Sr.. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Militantes do PS!

O Orador: - Tenha calma, Sr. Deputado! Desafio-o a fazer a prova em contrário de uma simples nomeação!
Sabe o que é que fizeram VV. Ex.ª com as pessoas do antigo instituto de apoio às comunidades, portuguesas? Nomearam-nas, integraram-nas todas no quadro do Ministério dos Negócios Estrangeiros; são verdadeiros comissários políticos desde a França à Alemanha, Bélgica e por aí fora... Integraram-nas nos consulados e são verdadeiros comissários políticos!
V. Ex.ª nunca se preocupou com um único concurso! Indique uma só nomeação! E esse o desafio que lhe faço. Indique um só nome no Ministério dos Negócios Estrangeiros que tenha sido nomeado por este Governo!
Sr. Deputado Paulo Pereira Coelho, V. Ex.ª tem andado muito distraído. Não entende V. Ex.ª que este Regulamento Consular obedece, como, tive oportunidade de dizer-lhe, às novas agressividades, à módernidade dos dias de hoje, àquilo que deve ser um posto consular na actividade comercial, económica, cultural, e ainda à cooperação com os países da União Europeia e, muito em particular, com os países da CPLP, onde não existem postos consulares e onde podemos estender a nossa acção consular, sempre que solicitada por esses países, de forma a que lhes possa ser dada protecção em diversas áreas.
Nunca, no passado, VV. Ex.ª tiveram a coragem de fazer um documento, um instrumento, que é vital para as comunidades portuguesas. VV. Ex.ª andaram não digo 80 mas 18 anos distraídos. Nessa matéria, tiveram responsabilidades consecutivas. Estiveram 18 anos à frente desta pasta e não mexeram uma vírgula, nunca questionaram, daquela tribuna, a alteração desse Regulamento, muito menos V. Ex.ª, Sr. Deputado, que andou distraído e continua a andar.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Aos costumes disse nada!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, assiste a esta reunião plenária um grupo de 50 alunos da Escola Secundária de Garcia de Orta, do Porto, para quem peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma verdadeira interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que tarei chegar à Mesa o documento onde estão espelhadas algumas nomeações feitas por este Governo, ferido em conta o desafio feito pelo Sr. Deputado Carlos Luís.

Protestos do PS.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - São chefes de divisão do Ministério dos Negócios Estrangeiros!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): -.Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste campeonato de nomeações, parece cada vez mais difícil saber quem é o partido vencedor.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo foi sensível à insistência que temos feito sobre a necessidade de estabelecer e construir o «cadastro» económico e cultural da diáspora portuguesa.
Congratulamo-nos, por isso, com a instituição, nos consulados mais importantes, de assessorias nas áreas económica e cultural. Consideramos que estas novas funções, conjugadas com o equipamento ou a informatização que deverá ser efectuada, permitirá obter os conhecimentos necessários para, finalmente, se dar início ao registo de todas as' actividades ecónómicas de Portugal, das suas características e da sua dimensão.
Julgo.oportuno realçar que este recenseamento não se esgota, e não se deve esgotar, nos países de língua oficial portuguesa, vai mais além, e tem de ir mais além, alcança toda a presença de portugueses no mundo, dando conteúdo e expressão ao conceito que o Partido Popular, repetidas vezes, levantou nesta Câmara - o conceito da lusitaniedade.
Todavia, há uma preocupação que também temos e queremos agora expressar: a eficácia destes .serviços, para nós, depende da qualidade e da quantidade dos meios técnicos, mas, seguramente, depende, sobretudo, da qualidade dos meios humanos: É fundamental que o desempenho destas funções de tão elevada responsabilidade seja feito por quadros qualificados, diria mesmo pelos melhores quadros, e só será possível seleccionar os melhores se o recrutamento for.feito por concurso.

Página 1433

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1433

No diploma apresentado, ao contrário do desejado, verificamos que estes funcionários serão objecto de nomeação, o que, a nosso ver, para além da falta de transparência e da própria credibilidade sempre inerente a qualquer. nomeação, pode estar significativamente prejudicada a eficácia e o fim último deste mesmo diploma. Estaremos, por isso mesmo, atentos aos resultados efectivos da aplicação daquilo que hoje é, ou foi, criado no diploma que hoje é discutido e, da mesma forma que reclamámos no passado, insistimos na constituição destes serviços, cuja operacionalidade, eficácia e desenvolvimento iremos acompanhar de perto.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas (José Lello): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O facto de o Grupo Parlamentar do PSD requerer a apreciação deste decreto-lei, que cria o novo Regulamento Consular, tem em si mesmo aspectos positivos, designadamente quando no texto do requerimento que suscita este debate é referido ser, e cito, «perfeitamente justificada a sua alteração com vista à adequação aos tempos modernos e às novas necessidades e obrigações a que urge dar resposta». Com efeito, o anterior regulamento tinha 77 anos e, de facto, havia um conjunto de legislação dispersa que tornava absolutamente inoperativa a gestão efectiva dos consulados. Daí ter-se criado um Regulamento inovador,e para ser inovador é preciso , naturalmente, entrar em novas áreas, designadamente nas que são, pelos vistos, objecto da polémica do Sr. Deputado, que, no fundo, aparece aqui como um «Velho do Restelo» contra a inovação, a modernidade, as reformas.
Sr. Deputado Paulo Pereira Coelho - e respondo também ao Sr. Deputado José Calçada -, depois de 77 anos, urgia alterar este Regulamento, visto não o ter sido da vigência da participação do PSD no Governo. E foi alterado, por minha iniciativa, em dois anos.
A questão que coloca tem a ver com a figura dos assessores consulares. Em primeiro lugar, gostava de dizer que a criação desta figura não abre qualquer lugar no quadro dos consulados.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Pois não! O mal é esse!

O Orador: - O objectivo é cobrir áreas de intervenção cultural, económica e social previstas nos artigos 64.º,65.º e 66.º, porque tal irá permitir rentabilizar e racionalizar a representação do Estado ao nível consular. Em segundo lugar, e para sermos claros, isto só se aplica aos consulados-gerais, e há apenas 23 consulados-gerais.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Apenas?!

O Orador: - Digo-lhe, por exemplo, que na zona de Paris, onde há o Consulado-Geral de Paris e o Consulado-Geral de Versailles, tal não é aplicável porque nessa zona está sediado um conselheiro social, na Embaixada e existe o Instituto Camões e o ICEP. Logo, este tipo de actividades constituiria uma duplicação, pelo que não é aplicável. Porém, o mesmo não acontece já no Consulado em Nogent-sur-Marne, porque o seu estatuto de simples consulado não prevê, além disso, a possibilidade de haver assessores consulares.
Este é o retrato da zona de Paris, que, porventura, o interessaria.
Ora, em países federais, fora das áreas de influência da capital, onde estão sediadas as embaixadas, é necessário uma recolha de informação comercial, económica, política e de uma presença cultural a fim de a canalizar para a Embaixada e para o Ministério dos Negócios Estrangeiros, que, por sua vez, naturalmente, a fará seguir para o ICEP, e essa correspondência está pré-figurada no artigo 34 º.
Por exemplo, em São Francisco, na Califórnia, que, se fosse um país autonomizado, seria a sétima economia do mundo, o ministro do comércio seria o Dick Machado, seria português. Não faz sentido que não se tenha uma relação íntima com uma economia desta dimensão para recolher este tipo de informações, a fim de rentabilizar a nossa presença no Estado, e não nos podemos dar ao luxo de não congregar sinergias para que efectivamente possamos estar presentes. Aliás, quero dizer-lhe que os próprios delegados do ICEP nessas regiões podem ser eles os próprios assessores económicos.
Mas o Sr. Deputado fala em concursos públicos e noutras coisas tais, que, pelos vistos, aqui estão na moda...
Ora, este diploma não inova na criação de lugares de livre escolha. A criação deste tipo de assessorias não é feita por este diploma, já era feita.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD)

O Orador: - Quem inovou neste domínio não foi este diploma. Aliás, não era sequer necessário este diploma para fazer estas nomeações, porque tal já vinha de antecedente legislação, já era de livre escolha ministerial.
Sabem quantos foram os conselheiros ou assessores que eu nomeie, desde que estou no Governo?

O Sr. Carlos Luís (PS): - Zero!

O Orador: - E os senhores sabem-no. Zero! Até posso dar-lhes os nomes...

O Sr. Carlos Luís (PS): - E quantos é que o PSD nomeou?

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Não é verdade! Já fiz a entrega na Mesa de um documento que mostra que o que está a dizer não é verdade, Sr. Secretário de Estado!

O Orador: - Sr. Deputado Paulo Pereira Coelho, gostava que estivesse atento ...

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, peço que criem condições na Sala para que o Sr. Secretário de Estado se possa fazer ouvir.
Faça favor de prosseguir, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Essa legislação é o Decreto-Lei n.º 133/85, de 2 de Maio, do tempo do «consulado» da ex-Secretária de Estado Manuela Aguiar,...

Vozes do PS: - Muito bem!

Página 1434

1434

1 SÉRIE -VÚMERO 43

O Sr. Paàlo Pereira Coelho (PSD): - Isso é do tempo do Bloco Central!

O Orador: - ... que, no seu artigo 5.º, criou, e passo a citar, «para coadjuvar a acção da representação diplomática consular de apoio aos emigrantes e às comunidades portuguesas no estrangeiro, conselheiros e adidos sociais (:..)» e, mais, essa legislação, Sr. Deputado, permite a contratação. por três anos, tacitamente renovada, no mesmo posto, desses cidadãos.
.Ora, .este Regulamento é bem mais restritivo. Em primeiro lugar, pòrque restringe apenas e só aos consuladosgerais este tipo de nomeações, vedando-as, portanto, aos restantes consulados; depois, só é possível em comissão de serviço e não por mera celebração de contrato, como acontecia a todo o tipo, de pessoal - e eu não quero entrar nessa terminologia dos boys e dos job's, os senhores já nos deram 10 anos para percebermos suficientemente como isso funcionava!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: = Se quiserem, demonstro aqui que dos conselheiros sociais que estão neste momento em funções há seis por contrato, Já os encontrei nesta situação, e continuam, tendo sido apenas rodados..E por aí, se calhar, aparecem as nomeações; porque alguns estavam há 11 anos ininterruptamente no mesmo posto,..

O Sr. Carlos Luís (PS): - Que vergonha!

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Se foi há 11 anos, foram nomeados pelo ministro socialista Jaime Gama!

O Orador: - :.. e eu não mudei nenhum, aliás, sujeitando-me a críticas do meu próprio partido. Restringi-me apenas a rodá-los de posto, porque entendo absolutamente inaceitável que permaneçam no mesmo posto constantemente, enquanto os diplomatas rodam. .

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Se foi há 11 anos, foram nomeados pelo ministro socialista Jaime Gama!

O Orador: - Não foram, não! Aí é que está! Não foram, Sr. Deputado! Estes dos 11 anos foram, mas por proposta da Sr.ª Deputada Manuela Aguiar, os outros foram... Aliás, quero dizer-lhe que mesmo quando cheguei à Secretaria de Estado havia uma nomeação para Londres, que não foi sequer aceite pelo Tribunal de Contas, porque não só não tinha qualificação para ser conselheiro social como ía para lá não para trabalhar com os emigrantes mas para fazer um doutoramento, e o Tribunal de Contas verificou isso.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Fez muito bem!

O Orador: - E este foi nomeado pelo Dr. Durão Barroso!
Quanto ao arquivista, de que o senhor fala, não implica aumento de encargos, o que se terá de fazer é adequar a terminologia das carreiras às funções. Hoje há, naturalmente, funcionários que exercem esse tipo de funções, as de arquivista, nos consulados.

Em relação à Comissão da Acção Social e Cultural, questão levantada pelo Sr. Deputado José Calçada - e aqui também saúdo a intervenção do Sr. Deputado Nuno Correia da Silva -, é uma iniciativa que visa criar uma inter-relação mais forte e dinâmica entre os consulados e as comunidades portuguesas. Os senhores criticam à saciedade a distância que muitas vezes existe entre consulados e as comunidades portuguesas. Ora, isto apenas pretende criar uma estrutura dinâmica com cinco pessoas; é um grupo de trabalho que, naturalmente, inova nessa aproximação e ultrapassa algumas das... Dir-lhe-ei por graça, Sr. Deputado Paulo Pereira Coelho, que isto é como as comissões fabriqueiras nas paróquias, onde o pároco tem de ter uma ligação, em relação aos paroquianos, através da participação dos leigos. Neste caso, o que sé pretende é estreitar a relação consulados/comunidades, uma cooperação em áreas naturalmente sociais e culturais, mas tem apenas e só uma função meramente. cqnsultiva.

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Aí estamos de acordo!

O Orador: - Aliás, já hoje há comissões ad hoc desse estilo, como a Comissão do 10 de Junho, a Comissão das Festas do Divino Espírito Santo, e aí está a ligação.
Quanto à eleição - é curioso -, a não previsão de mecanismos de eleição é propositada, Sr. Deputado, já que não é função do Estado imiscuir-se ou dirigir-se nos modos de organização das comunidades portuguesas. Aliás, esta é uma constante não apenas deste diploma mas de todos os diplomas legislativos. que consagram órgãos colegiais com representatividade de organizações representativas da sociedade civil. A eleição no seio do associativismo; quero referir-lhe, Sr. Deputado,...

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Secretário de Estado, peço-lhe que termine, pois já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Aliás, quero dizer-lhe que esta eleição no seio do associativismo era curiosamente a solução preconizada pela Sr.ª Deputada Manuela Aguiar para o próprio Conselho das Comunidades.
Para terminar, até porque não tenho muito tempo, quanto às funções que conllituam designadamente com a coordenação do ensino, suscitaram-se de tacto algumas dúvidas, mas já foi enviada uma circular aos postos para que não passe pela cabeça de ninguém que isso aconteça. Os conselheiros das comunidades não foram ouvidos, porque este diploma foi aprovado em 14 de Outubro e já estava na tramitação normal no seio do Governo e de todas as informações que foram necessárias na altura em que eles se reuniram.
Quanto aos sindicatos, e còin isto termino, não foram ouvidos, nem tinham de ser, porque este diploma, dado o seu carácter remissivo, não contende com carreiras, com quadros, com questões sindicais, com o estatuto dos funcionários nem com o estatuto dos diplomatas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada, ao qual o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas responderá em 2 minutos, tempo cedido pelo PS.

Página 1435

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1435

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, não se trata, em bom rigor, de uma grande questão, quero apenas lembrá-lo que agora, quase no fim, a terminar, como quem não quer a coisa, disse tranquilamente que os sindicatos não foram ouvidos nem tinham de ser ouvidos. É verdadeiramente espantoso que possa ouvir isto de quem leu o diploma! Pensamos que o Sr. Secretário de Estado não terá rodeado a elaboração do diploma de um secretismo tal que o não conheça - espero! De modo que, como isso não deve ser verdade, como deve conhecer o diploma, verifica, com certeza, que, embora - e admito de maneira indirecta, há todo um conjunto de implicações, por acção ou omissão, naquele estatuto que está neste momento a ser discutido, para os trabalhadores da área consular.
Portanto, não fazia mal algum, bem pelo contrário - e. parece-nos até que o deveriam ter feito -, ouvir o sindicato a respeito dos artigos que tivessem implicações potenciais ou directas nas carreiras.
Quanto ao Conselho das Comunidades, já agora gostava que o Sr. Secretário de Estado dissesse alguma coisa sobre isto, pois omitiu. O Conselho das Comunidades também não tinha de ser ouvido?! Não foi ouvido nem tem de ser ouvido?! Então, o Conselho das Comunidades existe para quê?! Gostava de saber, pois o Sr. Secretário de Estado omitiu isto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.

O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas: - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Calçada, clarificando, o que eu disse foi que, formalmente, o sindica-to não tinha de ser ouvido, na medida em que o Regulamento não implica com carreiras nem com o estatuto, o qual está, como disse, e bem, a ser discutido. O que se pretendeu neste Regulamento Consular é que tudo o que tivesse a ver com carreiras e com estatutos fosse remissivo, até para dar maior sustentabilidade a este diploma, que não pode ser mudado todos os dias. Não quero que dure 77 anos, mas quero que tenha a estabilidade suficiente para estar adaptado ao decorrer dos tempos.
Portanto, o facto de dizer que não tinha de ser ouvido é, porventura, demasiado forte e contendeu com os seus ouvidos - e penalizo-me por isso -, mas o que quero dizer é que não tinha de ser ouvido formalmente, mas o sindicato ou membros dessa área, embora não formalmente, tiveram conhecimento desta situação.
Queria dizer-lhe ainda, quanto ao Conselho das Comunidades - não tive tempo para explicitar isso na altura porque não dispunha de tempo -, que a eleição e a institucionalização do Conselho. das Comunidades decorreu sobre este diploma. E quando houve a reunião do Conselho das Comunidades já ó diploma estava na Presidência do Conselho de Ministros e foi aprovado nesses termos. E também penso que, de modo nenhum, contende com o Conselho das Comunidades - aliás, a abertura até está aqui, estando nós a ouvirmos as pessoas na sede própria, os representantes próprios, que são os senhores.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, está concluído o debate. O diploma em apreço baixa à 2.ª Comissão.
Passamos ao ponto seguinte da ordem de trabalhos: a apreciação parlamentar n.º 47/VII, da iniciativa do CDS-PP, relativa ao Decreto-Lei n.º 4/98, de 8 de Janeiro, que estabelece o regime jurídico dás escolas profissionais.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 4/98 revela, no entender do Partido Popular, uma perigosa desconfiança sobre as escolas profissionais.
O Partido Popular foi a primeira voz a reclamar a prevalência do primado da qualidade sobre a lógica da quantidade. Sempre afirmámos que o Estado não pode nem nunca poderia demitir-se da necessária fiscalização para que este ensino ganhasse credibilidade, respeitabilidade e prestígio. Todavia, uma coisa é fiscalizar, outra coisa, bem diferente, é comandar ou controlar. O novo regime jurídico cria uma teia burocrática que atrofia a livre iniciativa e provoca uma morosidade muito perigosa na resposta aos processos, morosidade que põe em causa a saúde financeira das escolas, a sua consolidação e a sua autonomia.
Para melhor compreender o alcance das mudanças introduzidas, convido os Srs. Deputados a fazerem uma análise comparativa entre aquilo que era o regime anterior e aquilo que são as alterações produzidas por este Decreto-Lei: antes, as escolas tinham como assegurada a reposição do número de turmas; agora, o Ministério da Educação só .assegura a reposição durante dois ciclos, ignorando os compromissos já assumidos pelas escolas profissionais. Antes, era livre a fixação do valor da propina, constituindo um estímulo à autonomia financeira; agora, a lei impõe limites, sem garantir qualquer continuidade do financiamento dos cursos. Antes, as receitas geradas pelas propinas permitiam à escola investir na qualidade do seu projecto educativo, investir em instalações, em equipamentos e na formação dos seus próprios professores; agora, com propinas limitadas e controladas pelo Governo, as escolas necessitam de autorização prévia do Ministério da Educação para desenvolvimento das suas actividades. Antes, estabelecia-se uma relação de parceria através dos contratos-programa; agora, o Estado desvincula-se do compromisso assumido perante as escolas profissionais. Antes, encorajava-se e incentivava-se o desenvolvimento e a afirmação da própria escola; agora, define-se por listagem as actividades que as escolas podem ou não podem desenvolver. Antes, era flexível a estrutura orgânica da escola; agora, padroniza-se, ao pormenor, toda a sua orgânica funcional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, estou em crer que a alteração foi bem intencionada, mas foi também muito mal formalizada. A estrutura anterior não era melhor, mas a verdade é que as mudanças nada melhoraram, e é bom recordar que as escolas profissionais têm como principal objectivo responder às comunidades envolventes; é bom recordar que não há cursos bons e cursos maus; é bom recordar que há cursos mais ajustados e cursos menos ajustados à envolvente dessas mesmas escolas profissionais; é bom recordar que o ensino profissional tem múltiplas dimensões e encontra a sua verdadeira riqueza na sua própria diversidade.
Todos ouvimos, vezes sem conta, nesta Câmara, Deputados de todas as bancadas referirem e sublinharem a

Página 1436

I SÉRIE-NÚMERO 43

importância do ensino profissional. É estranho, muito estranho, que um diploma que estabelece o regime jurídico destas escolas não seja discutido, debatido e enriquecido por esta Assembleia. O pedido de apreciação parlamentar que o Partido Popular apresenta, permite que este diploma baixe à comissão, através das propostas que fizemos questão de entregar na Mesa desta Assembleia, onde todos poderemos e deveremos enriquecê-lo e melhorá-lo. Acredito que nenhum grupo parlamentar, nenhum Deputado, pretende estar dispensado desta nobre discussão. Contamos, por isso, com a vossa colaboração.

Aplausos do CD3-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente e Srs.. Deputados, a Assembleia da República analisa hoje a apreciação parlamentar n.º 47JVII, apresentado pelo CDS-PP, relativa ao Decreto-Lei n.º 4/98; que estabelece o regime jurídico das escolas profissionais. Justifica-se, entretanto, uma reflexão sobre o percurso destas escolas, desde a sua criação em 1989, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 26, de 21 de Janeiro, revogado posteriormente pelo Decreto-Lei n.º 70, de Outubro, de 1993.
A sua criação ocorreu numa .conjuntura particular e resultou, quase exclusivamente, de orientações políticas temporalmente datadas. No primeiro ano, foram criadas 50 escolas e hoje ultrapassou-se, largamente, a centena, para além da existência de dezenas de pólos de. extensão de alguns destes estabelecimentos de ensino profissional. Um conjunto muito diverso de. entidades participaram e participam como promotoras na criação destas escolas desde câmaras municipais, a associações empresarias e sindicais, a entidades privadas. No entanto, a territorialização deste subsistema não foi, nem é, uniforme ao longo do País. As assimetrias são evidentes, particularmente no que se refere à marcada tendência de litoralização; concretamente, a faixa litoral entre Braga e Setúbal concentra 63% do total dos estudantes. Não obstante este facto, no ano lectivo de 95/96, este subsistema era já frequentado por cerca de 30.000 alunos. Convirá recordar que as escolas profissionais têm a vindo a conviver lado a lado, primeiramente com os cursos técnico-profissionais,-e posteriormente com os cursos tecnológicos, a partir da generalização da reforma no ensino secundário. No entanto, desta convivência não resultou, até ao momento, a redução da sua procura por parte dos alunos que terminaram a escolaridade obrigatória. Apesar de partilharem alguns itens comuns com os cursos tecnológicos, actualmente em vigor, os cursos profissionais distinguem-se, do ponto. de vista formativo, não só por acentuarem o peso das componentes técnica, tecnológica e prática do currículo, mas também por oferecerem uma maior diversidade de áreas de formação.
No relatório de avaliação das escolas profissionais,. efectuado em cumprimento do despacho n.º 2 do Ministério da Educação de 8 de Janeiro de 1996, e concluído em Abril do mesmo ano, afirma-se que «o ensino profissional carece de ser repensado» e, diz-se ainda, «sendo embora certo que grande parte das graves dificuldades das escolas profissionais são mais problemas de tesouraria do que problemas de financiamento, é ainda verdade que o apoio comunitário, .tal como hoje o conhecemos, tem por horizonte 1999 e, portanto, começa a ser urgente redefinir o enquadramento financeiro das escolas profissionais».
No que ao enquadramento institucional diz respeito, o relatório chama a atenção para a situação «paradoxal» vivida por estas escolas, «são organizações (...) habilitadas com ampla autonomia» e «na prática combinam alguma discricionaridade nos procedimentos de gestão do pessoal com uma forte dependência (...)» do Estado. No que se refere à preferência da opção por este subsistema, pode afirmar-se que 'a sua diversidade çonstitui um vector da sua própria sustentação. A procura tem-se mantido superior à oferta. Das razões que levam os alunos afazer esta escolha, há uma leitura heterogénea, ou seja, não só se, concretiza como opção para os jovens que pretendem uma orientação predominante para.uma via de formação terminal e qualificante mas também para aqueles que querem prosseguir estudos.
Quanto aos resultados obtidos ao longo destes quase dez, anos, a avaliação efectiva afirma «que o ensino profissional não garante emprego (...)» explicitando que «nisto não se distingue de nenhum outro subsistema, se ressalvarmos o particularíssimo caso da licenciatura em Medicina (...)».
Neste relatório, de avaliação são feitas algumas recomendações ao Ministério da Educação que nos parecem justas e fundamentais e que passam pela renovação da aposta no ensino profissional, pela consolidação das escolas profissionais como instituições educativas e pela alteração dó modelo de financiamento que, a manter-se, tornar-se-ia impeditivo do desenvolvimento do subsistema.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É verdade!

A Oradora: - A publicação do Decreto-Lei em Janeiro último, que suscitou esta apreciação parlamentar, parece resultar deste processo de avaliação. E aqui é indispensável referir a não .assumpção, por, parte do Governo, durante o espaço/tempo que_,mediou o terminus da avaliação - Abril de 1996 - e o Decreto-Lei agora em análise, de qualquer medida, apesar, da urgência com que foram sugeridas. É, de facto, muita tempo - dois anos - agravado ainda com algumas suspeições do Governo sobre o ensino profissional, para além de,declarações, ambíguas relativas ao encerramento de algumas escolas e uma cumulativa indefinição sobre o que se pretendia fa-, zer na área do ensino profissional. Não obstante,.e apesar, do seu tardio aparecimento, o Decreto-Lei que pretende estabelecer agora o regime de criação, organização e funcionamento destas escolas, 'n.ão é suficientemente clarificador do que, nesta matéria,.q Governo pretende e não é isento, mesmo, de algumas preocupações. No entanto, são visíveis alguns. objectivos moralizadores,. que poderão pôr fim a algumas situações menos claras, quer na área do financiamento, quer na área do,estatutó profissional dos docentes e outros técnicos, e mesmo no esclarecimento da .relação entre as escolas e,as respectivas entidades proprietárias. O diploma reafirma que estas escolas profissionais são, preferencialmente, estabelecimentos de ensino privado e que o Estado pode, também, criar escolas deste subsistema, obviamente de carácter-público. São estabelecidos requisitos para a criação e funcionamento das escolas, que dependerão, em termos científicos e pedagógicos, da tutela do Ministério da Educação. E, no que se refere ao financiamento, prevê-se a possibilidade ,de comparticipação pública para o subsistema privado, através de contratos-programa, em condições que se encon-
tram especificadas. _

Página 1437

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1437

No entanto, como já o dissemos, há matéria que o Decreto-Lei não explicita, deixando-a dependente de futura regulamentação, como é o caso dos contratos-programa com o Estado, concretamente o n.º 7 do artigo 20.º. É evidente o quadro de instabilidade que decorre do facto de não se saber exactamente quem terá o apoio previsto, e que é tanto mais grave ainda quando se trata de escolas que estão neste momento a funcionar. Também o artigo 30.º, no seu n.º 8, garante que «para efeitos de financiamento, a reposição anual do número de turmas,, por um período de dois anos de ciclo de formação», tempo que consideramos escasso e que pode ser indício de graves preocupações. Esta transitoriedade, temporalmente determinada, parece configurar-se com o terminus dos apoios comunitários. É indispensável que o Governo deixe claro a sua não desresponsabilização para além desse terminus, o que significa dilatar temporalmente estas garantias. E, neste quadro, de não desresponsabilização do Governo, em termos de financiamento futuro, reconhecida a dimensão de complementaridade do ensino profissional, é indispensável reflectir sobre e alargar simultaneamente a matriz de formação profissional que tem servido o ensino profissional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Este subsistema é simultaneamente uma resposta à formação e à educação e não pode ver reduzido, como tem vindo a acontecer, o apoio financeiro às suas estruturas de enquadramento pedagógico. Só assim se cumprem as duas vertentes - o ensino e a formação profissionais. Consideramos que, pelo conjunto das profundas implicações que têm no moderno processo de desenvolvimento individual e colectivo, estas duas vertentes constituem uma das frentes mais importantes da política educativa. Por isso, a responsabilidade do Estado nesta matéria é incontornável: quer na defesa da escola pública, reavaliando a articulação da educação-escola-formação-vida activa; quer no apoio a dar às escolas profissionais, conferindo-lhes uma verdadeira legitimidade, no respeito péla construção da territorialidade educativa e suas redes de formação.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, por todas estas razões defendemos uma maior celeridade na efectivação de medidas que respondam às legítimas expectativas, quer das comunidades onde este subsistema se integra, quer dos jovens que nele encontraram e continuam a encontrar o sucesso escolar, quer dos trabalhadores docentes e não docentes que aí concretizam os diferentes projectos educativos. E a primeira dessas medidas, passa, obviamente, pela regulamentação urgente deste Decreto-Lei num diálogo permanente com as escolas profissionais.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, as escolas profissionais serão, porventura, a única experiência pedagógica nacional ,no domínio da formação para a vida activa com pleno sucesso em Portugal no pós -25 de Abril. Após o encerramento das escolas comerciais e industriais e a experiência falhada da chamada via profissionalizante do ensino secundário, é inquestionável que as escolas profissionais atingiram uma dimensão e uma capacidade de mobilização da sociedade portuguesa até aqui jamais conseguida. Trata-se de 160 escolas com um. total de 27.000 alunos, com uma abrangência de todo o território nacional. É pois indiscutível o seu sucesso!

Porém, como todas as experiências, existem problemas que afectam inquestionavelmente o seu livre e normal desenvolvimento. Em primeiro lugar, trata-se de escolas que nasceram em resultado de uma mobilização excepcional de inúmeros agentes da sociedade portuguesa com os quais o Estado contratualizou um regime de funcionamento que interessava ao sistema educativo português. Foram empresas, sindicatos, cooperativas, autarquias, associações empresariais e laborais, que se juntaram livremente com um espírito de iniciativa ímpar, criando cursos que foram ao encontro das necessidades e aspirações locais, com níveis de empregabilidade elevadíssimos. Por tudo isto, o Estado apenas necessitou de dar alguma orientação inicial e de garantir um sistema de financiamento numa lógica de corresponsabilização, que, aliás, se encontra muito aquém do que é dispendido, por exemplo, no sistema de formação profissional do Ministério do Emprego. Trata-se, assim, de uma experiência que nasceu para «respirar livremente» ao nível da sociedade civil, sem as teias paralizantes da burocracia de alguns departamentos do Ministério da Educação e das regras asfixiantes da contabilidade pública.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Porém, não é isso que se tem verificado, sobretudo nos últimos tempos! Aquilo a que temos assistido e que agora se confirma no regime jurídico que hoje apreciamos, é exactamente uma tentativa de regulamentar tudo e mais alguma coisa, de burocratizar a todo o custo o aparecimento dos novos cursos, de limitar desesperadamente a livre utilização de verbas em escolas que, é bom recordar, são empresas privadas. É inadmissível e contraditório, Srs. Deputados, que isto se passe exactamente num momento em que se defendem publicamente teses que apontam para uma crescente autonomia das escolas públicas.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É contraditório, de facto!

O Orador: - Em segundo lugar, tem sido patente, particularmente desde 1995,' uma evidente falta de confiança nestas escolas, começando por se afirmar repetidamente que algumas deveriam fechar as portas, sem nunca se dizer quais, para agora se vir confirmar a redução de expectativas a longo prazo ao estipular-se um horizonte máximo de dois ciclos de formação, seis anos, como prazo limite em que se garante a manutenção do actual número de turmas. Todos nós sabemos bem que o desenvolvimento de uma normal actividade educativa pressupõe uma grande estabilidade em qualquer estabelecimento de ensino. Uma escola para o ser, tem de se desenvolver com horizontes bem largos! Só assim é possível haver empenhamento de professores, de gestores, de empresas colaborantes, criando uma verdadeira escola, sem a sombra permanente do cutelo sobre a sua vida tão curta. É preciso que o Governo perceba que a defesa do sistema educativo português não se faz ao nível dos discursos, mas sobretudo na acção prática governativa. Senhores governantes, deixem-se de conversa e passem a uma acção coerente com aquilo que se diz!

Página 1438

I SÉRIE-NUMERO 43

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, não resisto a colocar aqui algumas curiosidades práticas e contradições do sistema que se têm permitido que subsistam e a que este regime jurídico não dá qualquer resposta: sabem os Srs..Deputados, por acaso, que o financiamento aprovado para os cursos de 1997 a 2000, iniciados no passado mês de Setembro, só há poucos dias, em Fevereiro, foi comunicado às escolas profissionais? Digam-me, por favor: que moral tem uma administração pública que por uma coisa destas, com todo este atraso, para a seguir vir exigir o cumprimento de regras rígidas na gestão pedagógica, administrativa e financeira destas escolas? Como é possível garantir um normal desenvolvimento da actividade educátiva quando se iniciam as auIas sem se conhecer de quanto se dispõe para despesas a fazer de imediato?
Sabem igualmente os Srs. Deputados que estas.escolas dispõem de significativos recursos financeiros, provenientes do Fundo Social Europeu, para alugarem os mais diversos equipamentos para os seus cursos, mas que estão absolutamente, impedidas, hoje, de os adquirirem definitivamente, o que lhes daria uma estrutura completamente diferente com óbvias vantagens para a sustentação de um sistema educativo profissional com bases e estruturas sólidas? Que sistema é este em que se privilegia o desperdício em vez do investimento duradouro?
Sabem também os Srs. Deputados que o mesmo Estado que é tão lesto a pedir-nos os nossos impostos, deve a estas escolas verbas relativas a 1996? Não estamos a falar de dívidas com dois ou três meses de atraso, estamos a falar de dois anos, Srs. Deputados! É um escândalo!
Saberão igualmente os Srs. Deputados que o Estado vem exigir a estas escolas, duma forma hipócrita, a demonstração dos níveis de empregabilidade dos seus diplomados para a aprovação de novos cursos, quando o ignora totalmente nos cursos tecnólógicos das escolas públicas, nos cursos de formação profissional do Ministério do Emprego e, o que é mais grave, no ensino superior particular e cooperativo? ...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - É lamentável! ...

O Orador: - Por tudo isto, pensamos muito francamente que o Decreto-Lei n.º 4/98, agora em apreciação, fica muito aquém do que seria de esperar. Porém, o mais importante é a apreciação, não propriamente do seu articulado, que admitimos que pode ser melhorado, mas sobretudo da prática do Ministério da Educação a partir daqui para com as escolas profissionais. O Estado não pode continuar a desresponsabilizar-se face a estas escolas. Para nós, elas foram sempre ensino de primeira, para o actual Governo, francamente, tal não parece verificar-se. Se o Sr. Ministro da Educação, quer preservar o futuro destas escolas tem de confiar nelas e, fundamentalmente, libertá-las da máquina paralisadora da administração central. Permita-lhes que elas voem livremente e serão os nossos jovens os únicos beneficiados; em caso contrário, é contra eles que tudo isto se virará. Que fique, porém, claro que para nós esta teria sido uma oportunidade soberana para, em vez de um decreto sobre as escolas profissionais, se ter legislado globalmente sobre todo o ensino profissional português.

Aplausos do PSD.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): -Esta intervenção calou o PS!.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o, Sr. Deputado José Ribeiro Mendes.

O Sr. ]osé Ribeiro Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Já aqui foi referido o «antes»; e o «antes» é que, quando este Governo tomou posse, a situação das escolas profissionais em Portugal era perfeitamente caótica ...

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Isso é verdade!

O Orador:. - ... com um défice de mais de 50 milhões de contos! E a verdade é que era necessário tomar medidas. Assim, o Ministério da Educação encomendou um estudo de avaliação, que é do conhecimento público, e, resultante desse estudo de avaliação, foram feitas negociações com as entidades representativas das escolas profissionais, que conduziram ao texto do diploma em apreciação.

Vozes do PSD: - Ficou tudo na mesma!

O Orador: - Diga-se, aliás, que este diploma tem o acordo da Associação Nacional das Escolas Profissionais. E, para sublinhar algumas das vantagens deste diploma, eu diria que se acabou de vez com a ambiguidade da responsabilização -que é necessário- fazer na gestão das escolas profissionais. Este diploma apura e clarifica a responsabilização que é necessário ser feita nas direcções das escolas profissionais, deixando de haver ambiguidade entre promotores, entre directores e entre um conjunto de entidades que, quando era necessário responsabilizar, todas elas fugiam a isso... ; Já aqui foi referido que deixa de haver autonomia. Srs. Deputados, não podemos pensar qúe entidades-privadas que são financiadas pelo Estado não precisam de obedecer a critérios rigorosos e exigentes para que possam vir a ser financiadas pelo Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, também já aqui foi dito que as ligações ao meio ficariam prejudicadas. Entendo não ser verdade, porquanto está especificado, nos requisitos de pré-autorização de funcionamento dessa escola essas mesmas condicionantes de ligação ao meio! Além disso, um dos órgãos criados no âmbito deste diploma é o Conselho Consultivo, onde têm assento e representação todas as outras entidades ligadas ao meio.
Este diploma aparece no contexto do subsistema do ensino secundário que, nas suas diversas vertentes, o ensino regular, o ensino recorrente e o ensino profissional -, tem de ser clarificado e obedecer a critérios bem rigorosos, e bem claros. Não se pode aceitar que um dos subsistemas do ensino secundário, como é o caso das escolas profissionais, possa certificar profissionais para a vida activa, por um lado, e estudantes para o ingresso no ensino superior, por outro, sem, que, de facto, existam esses requisitos a que as escolas profissionais têm de obedecer
É assim o nosso entendimento que este Governo tem assegurado e olhado com particular atenção para as escolas profissionais. Veja-se que, em 1995, o número de alu-.

Página 1439

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1439

nos que existia era de 26 000 e, hoje, o número de alunos é ainda maior, quando no todo dos alunos do ensino secundário o número é mais reduzido.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Qual é o número?!

O Orador: - O número actual - posso responder-lhe, Sr. Deputado - é de 26 347! Já fica a saber!
Portanto, apesar de haver uma redução do número global de alunos no ensino secundário, há um aumento do número de alunos nas escolas profissionais.
Há, de facto, um olhar deste Governo para o ensino profissional, para as escolas profissionais, e o consolidar do sistema através deste mesmo diploma.
Em suma, pretende-se - e julgamos que se consegue através deste diploma garantir a qualidade do sistema de ensino nas escolas profissionais, dando a devida relevância que este subsistema merece no contexto do ensino em Portugal.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Ribeiro Mendes, vou colocar-lhe duas questões muito breves que atestam a desconfiança com que os senhores encaram as escolas profissionais.
Diga-me, Sr. Deputado, como é possível virem aqui dizer que para vós o ensino profissional é, e foi sempre, uma prioridade e, aquando da discussão da última revisão constitucional, os senhores foram lestos no pedido de constitucionalização do ensino artístico e, pura e simplesmente, omitiram qualquer referência em relação ao ensino profissional.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Votaram contra! Ainda é mais grave!

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Recusaram-no!

O Orado: - Para além disso, Sr. Deputado, esclareça claramente como é que justifica a confiança nestas escolas, com a imposição, nas disposições transitórias do articulado que está em causa, dos dois ciclos de formação, .como horizonte máximo para reposição de turmas nestas mesmas escolas. O que aqui se está a fazer, Sr. Deputado, é a dizer a estas escolas que têm direito a manter o número de turmas que já existem durante seis anos, no máximo. É que não há nenhuma escola que possa crescer de uma forma livre durante seis anos, que é a duração do ensino secundário - três mais três. Isto é dizer-lhe que têm o seu fim à vista! Isto é absolutamente inadmissível, Sr. Deputado!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Ribeiro Mendes.

O Sr. José Ribeiro Mendes (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Cesário, dir-lhe-ia que, em relação ao ensino artístico, essa é, de facto, como sabe, em termos internacionais, uma das vertentes do ensino que se prevê vir a ser da maior importância para o desenvolvimento do País...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Ninguém põe isso em causa!

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Até aí estamos de acordo!

O Orador: e para o, desenvolvimento do mundo, se quiser.
Cada vez mais o homem precisa de dar azo à sua actividade criativa e precisa de a afirmar no contexto da sua formação, por um lado, e no contexto da sua aprendizagem, por outro.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas isso não invalida, de modo algum, que não seja dada prioridade também ao ensino profissional, como, aliás, acontece e tem sido a prática deste Governo, através dos números que acabei de referir na intervenção que fiz, por um lado, e através dos investimentos que têm sido garantidos, por outro, exactamente para a manutenção deste mesmo subsistema de ensino.
Quanto à questão que referiu de estarem, desde já, previstos dois ciclos, deixe-me corrigi-lo - permita-me que o faça - referindo-lhe que dois ciclos de ensino não são seis anos, uma vez que são os primeiros três anos e, depois, os segundos três anos. Não soma três mais três mas, sim, um mais três, que é um ano de funcionamento de três anos e o outro ano mais três. Portanto, são quatro anos...

O Sr.. José Cesário (PSD): - Pior!

O Orador: ... que estão garantidos através deste mesmo diploma.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Não estou a perceber!

O Sr. Carlos Coelho.(PSD): - É melhor explicar melhor!

O Orador: - Vou explicar melhor! Sei que o Sr. Deputado tem dificuldade em perceber e tanto assim é que errou na afirmação que fez.
Mas deixe-me concluir, dizendo-lhe o seguinte: é relevante que, desde já, estejam garantidos dois ciclos de formação. Nada diz, nem nada o indica, que, no final destes dois ciclos de formação que estão contemplados neste diploma...

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Esse é que é o problema!

O Orador: - ... este ensino vá terminar,...

O Sr. Carlos Coelho (PSD): -.Foi este Governo que decidiu fechar as escolas profissionais!

O Orador: - ... nem o Sr. Deputado tem autoridade para inferir esse tipo de raciocínio.
Está garantido, desde já, o financiamento para estes dois ciclos e nada indica que não esteja garantido no futuro,

Página 1440

até porque estão a decorrer negociações com a Comunidade Europeia, negociações essas que têm em vista exactamente.garantir o financiamento para a continuação deste mesmo ensino.

Vozes do PS: - Muito bem!

. O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa (Guilherme d'Oliveira Martins): - Sr. Presidente, Sr.º` e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero deixar aqui a afirmação de um princípio, que .é o de que o subsistema das escolas profissionais é para manter e consolidar, mesmo e sobretudo depois de 1999.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. José Cesário (PSD): - Muito pouco, Sr. Secretário de Estado! .

O Orador: - Srs. Deputados, esta questão é fundamental, porque, enquanto se estava aqui a discutir, ainda agora, o tema da renovação de cursos e turmas; é preciso dizer-se, com clareza, que, em 1995, esta renovação, na prática, não estava garantida.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E não estava garantida por uma circunstância: é que o subsistema das escolas profissionais foi concebido para ser financiado, no âmbito do Quadro Comunitário de Apóio, com uma partilha que seria 75.% para o Fundo Social Europeu, 12,5% para o Ministério da Educação e sistema.

Aconteceu que, na negociação do II Quadro Comunitário de Apoio, não foi possível garantir o financiamento a 75% pelo Fundo Social Europeu. Apenas este Governo, e apenas este ano, conseguiu garantir que esse princípio possa ser aplicado, tal como tinha sido definido desde o início. Esta é a questão fundamental.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - É uma vantagem!

O Orador: - Por outro lado, a responsabilidade do Estado foi assumida no âmbito deste Quadro Comunitário de Apoio, uma vez que foi o Orçamento do Estado que cobriu a parte que não estava garantida relativamente a este financiamento e é o Orçamento do Estado que garantirá, no futuro, a subsistência e a consolidação deste subsistema.

O Sr. António Braga (PS): - Então, não há aplausos do PSD?!

O Orador: - Vejamos os números: sabem que hoje temos 427 000 alunos no ensino secundário, dos quais 80 000 estão nos cursos tecnológicos e 26 400, como já foi aqui dito, nos cursos das escolas profissionais.
Mas vamos mais adiante: a verdade é que o número médio de entradas nas escolas profissionais nos anos 1994 e 1995 foi de 8400 alunos e a entrada média nos anos lectivos de 1996/1997 e 1997/1998 foi de 10000 alunos, concretamente de 9900 no primeiro ano e 11 277 novos 12,5% para a Segurança Social. Este era o

I SÉRIE-NÚMERO 43

alunos neste ano lectivo. Este foi o número, o que significa que abrimos as escolas profissionais a 11000 alunos este ano, com inscrições novas, enquanto que a média na primeira metade do exercício tinha sido apenas de 8400. Esta é a questão! E a realidade demonstra-se com factos e não com processos de intenção.
Importa salientar que este diploma garante, em primeiro lugar, o futuro das escolas profissionais; em segundo lugar, o estatuto das escolas profissionais; e, em terceiro lugar, a abertura de actividades das escolas profissionais a outros domínios fundamentais, designadamente a cursos de especialização tecnológica ou artística, cursos vocacionados de índole artística no nível do 3.º ciclo do ensino básico, cursos de ensino recorrente básico e secundário e acções de formação pós-laborai para activos. Tudo isto são aproveitamentos indispensáveis das poténcialidades das escolas profissionais, cuja actividade não podemos limitar. Mas não podemos esquecer que, neste desenvolvimento, há um equilíbrio que tem de ser garantido: o equilíbrio com o ensino tecnológico no nível secundário, que foi aqui muito bem referido pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, equilíbrio esse que é indispensável com responsabilização pública, uma vez que não pode haver no ensino secundário, tecnológico e profissionalizante alunos de 1.ª e alunos de 2.ª.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta questão é absolutamente fundamental... '

O Sr. José Ribeiro Mendes (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... e o Estado tem de se responsabilizar relativamente a ela.

O Sr. António Braga (PS): - Palavras avisadas!

O Orador: - Srs. Deputados, há uma outra questão, que tem a ver com o ensino artístico. Importa salientar e elogiar aquilo que está a ser feito nas escolas profissionais neste domínio. As escolas profissionais artísticas, que, desde o início, sempre defendemos, são um caso de êxito, que deve ser apoiado e incentivado. Não se faça, pois, uma oposição artificial entre o ensino profissional e o ensino artístico, uma vez que há uma complementaridade óbvia, que tem de ser realçada e garantida.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem! Quem fez a oposição na revisão constitucional foi o PS!

O Orador: - Esta, é a questão fundamental. .
Uma última palavra, Srs. Deputados, diz respeito à confiança. A confiança é, neste, domínio, um dos.aspectos centrais e não há melhor prova e garantia de confiança do que dizer que este subsistema é para manter, apoiar, incentivar e desenvolver.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta é a questão fundamental e é peste princípio, subjacente a este diploma, que pôs termo à indefinição e a uma situação extraordinariamente grave: quando se tratava de pedir responsabilidades às escolas profissionais e não se sabia qual ou quais entidades-poderiam responder por essa responsabilidade. Esta é a ques-

Página 1441

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1441

tão fundamental e este é o ponto que gostaria de deixar aqui bem claro. Afirmei-o sempre, desde o momento em que tomei posse, assim como este Governo: as escolas profissionais são para manter, mas não é para manter um sistema em que haja discriminação e divisão entre filhos e enteados. Entendemos que é fundamental o desenvolvimento do ensino secundário, com incentivo claro das vias tecnológicas, profissionalizantes e artísticas. Esta é a questão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa, quero dizer-lhe que ouvi com muito agrado a sua intervenção e concordo com tudo o que disse.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa: Ainda bem!

O Orador: - Só tenho pena que aquilo que o Sr. Secretário de Estado disse não seja aquilo que diz a lei. O problema é esse e é aí que divergimos.
Sr. Secretário de Estado, todos nos recordamos que as escolas profissionais chegaram a estar numa situação caótica e que a sua criação foi uma odisseia terrível. Mas isso pertence ao passado e nós estamos a falar do futuro. E, com toda a franqueza, o Governo não pode afirmar o seu mérito e as suas virtudes por aquilo que o PSD não fez - o PSD não fez, pagou por isso e não sei por quanto tempo irá pagar.
No entanto, a questão fundamental é esta: este diploma cria ou não uma burocratização, que vai inevitavelmente prejudicar o bom funcionamento das escolas profissionais? E que, Sr. Secretário de Estado, há pormenores como este: as escolas têm de fornecer elementos de informação ao Ministério da Educação sobre os níveis de empregabilidade dos' cursos que estão a ministrar, quando, a meu ver, essa é uma competência que o Ministério para a Qualificação e o Emprego, actual Ministério do Trabalho e da Solidariedade, deve ter, pois deve conhecer o País e saber quais os níveis de empregabilidade em cada região, se quisermos, em cada concelho, de cada curso. Serão as escolas que devem dirigir-se aos centros de emprego e pedir os dados que eles têm, para, depois, os ir levar ao Ministério da Educação? Não me parece que as escolas tenham de fazer de carteiro... Penso que é uma burocracia absolutamente absurda.
Quanto a questões mais importantes, como a própria autonomia das escolas, Sr. Secretário de Estado, obviamente que o Estado, quando financia e, através de contratos-programa, atribui verbas consideráveis para o funcionamento das escolas, tem de fiscalizar. Mas uma coisa é fiscalizar as verbas atribuídas pelo Estado e outra é limitar as propinas que essas mesmas escolas podem cobrar. Por que é que as escolas não podem ter autonomia para possuir o seu projecto financeiro, o seu projecto de desenvolvimento, e, em função daquilo que querem ser, definir as regras e os caminhos que têm de percorrer para lá chegar? Não posso entender por que é que há este coarctar e limitar de autonomia, que julgo ser fundamental, estando nós a falar de escolas profissionais.
Mais uma vez, volto a repetir: não há cursos bons e cursos maus; há cursos mais ajustados e cursos menos ajustados. Se calhar, é preciso fazer a destrinça, mas essa faz-se por via dos contratos-programa que o Governo, através do Ministério da Educação, faz ou não. Agora, ser o Governo a definir a própria orgânica de funcionamento das escolas - sendo certo que, provavelmente, é preciso avançar e dar alguns passos no sentido da responsabilização, pois sei bem que, muitas vezes, a responsabilidade < morria solteira» e ninguém era responsável...

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, o seu tempo esgotou-se. Peço-lhe o favor de concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Em conclusão e com toda a objectividade, Sr. Secretário de Estado, pergunto-lhe: por que razão esta burocracia, por que razão este coarctar de autonomia e por que razão as escolas profissionais têm de fornecer ao Ministério da Educação, que é órgão do Governo, aquilo que outro órgão, o Ministério para a Qualificação e o Emprego, actual Ministério do Trabalho e da Solidariedade, deve ter, ou seja, os dados quanto à empregabilidade?

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Castro de Almeida, que beneficia de cedência de tempo por parte do Partido Ecologista Os Verdes.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa, penso que este debate não tem de enredar-se na questão de saber se, hoje, ó número de alunos é superior ou inferior em 100 ou em 200. Apesar disso, o número de alunos, hoje, nas escolas profissionais, contrariamente ao que diz o Sr. Deputado José Ribeiro Mendes, diminuiu relativamente a 1995. Se quisermos usar esse indicador como sinal da prioridade e da relevância política que o Governo atribui às escolas profissionais, teremos de considerá-lo como um elemento negativo - eram 27 000, em 1995, e são 26 400, agora, pelo que o número diminuiu.
Porém, o Sr. Secretário de Estado vem dizer que o que interessa é que este Governo socialista autorizou uma entrada superior de estudantes. É verdade que autorizou uma entrada em número superior, Sr. Secretário de Estado, mas os estudantes são em número inferior.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa: Não são!

O Orador: - E sabe porquê, Sr. Secretário de Estado? Porque, apesar de ter autorizado um número superior, o mesmo Governo a que V. Ex.ª pertence encarregou-se de destruir a credibilidade e a confiança nas escolas profissionais e, hoje, elas são menos procuradas do que antes.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa: Não são!

O Orador: - Assim, apesar de ter um maior número de lugares autorizados, os' estudantes procuram menos as escolas profissionais.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

Página 1442

I SÉRIE-NÚMERO 43

O Orador: - Aquilo que interessa, Sr. Secretário de Estado, é clarificarmos o nosso posicionamento acerca da importância das escolas profissionais. É fácil dizer que são importantes e que apostámos nelas. O problema é que, do nosso ponto de vista, o Governo socialista não acredita verdadeiramente no mérito das escolas profissionais.
O Sr. Secretário de Estado começou aqui a sua intervenção dizendo que o Governo tomava o compromisso de manter e de consolidar as escolas profissionais, mas terminoú-a dizendo algo completamente diferente, ao referir que o Governo queria manter, ampliar e desenvolver. Gostaríamos que a .verdadeira fosse a última afirmação, a de ampliar e desenvolver o sistema. É que este sistema, Sr. Secretário de Estado, ou se amplia e desenvolve ou morre. E todas as soluções que o Governo aponta neste decreto-lei vão no sentido de deixar estiolar, morrer e cair, uma por uma, as escolas profissionais. Este.sistema, Sr. Secretário de Estado, ou tem um mínimo de 'dimensão crítica para se afirmar na sociedade ou deixa de ser interessante, deixa de ser credível, deixa de ter procura por parte dos alunos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Castro de Almeida, o seu tempo esgotou-se. Faça favor de concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente, apenas com a explicitação de uma diferença substancial de filosofia entre a nossa posição e a do Governo. Este decreto-lei aponta no seguinte sentido: os promotores privados que tomem a iniciativa de constituir as escolas profissionais que o Governo cá estará para pagá-las. Nós, diferentemente, entendemos que o Governo não pode eximir-se da sua responsabilidade de ser também parceiro, promotor, incentivador e dinamizador da criação de escolas profissionais. Queremos, de facto, que o Governo se assuma não apenas como banqueiro e financiador das escolas profissionais mas também como parceiro dinamizador das mesmas. O ensino profissional não pode estar exclusivamente dependente da iniciativa privada como este Governo está a pretender fazer.

Aplausos do PSD.

O Sr. José Ribeiro Mendes (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Ribeiro Mendes (PS): - Sr. Presidente, gostaria de solicitar a distribuição de um documento com os números que aqui foram referidos como estando errados. Efectivamente, tenho aqui um documento, que terei todo o gosto em ceder às diversas bancadas, onde se refere exactamente que o número de estudantes nas escolas profissionais, em 1994/1995, era de 26 198 e, actualmente, é de 26 347, pelo que aumentou. Ora, no sentido de ripostar e de dar alguma credibilidade às intervenções do Sr. Deputado, terei todo o gosto em fazer-lhe chegar este mesmo documento.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado, faça favor de fazer chegar à Mesa esse documento para ela o mandar distribuir aos grupos parlamentares.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Mofa Amaral): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Castro de Almeida (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Ribeiro Mendes solicitou a distribuição de um documento que irá no sentido de comprovar a tese que aqui defendeu e eu peço ao Sr. Presidente que mande também distribuir, preferencialmente em folhas não cor de-rosa, os documentos que existiam no Ministério da Educação, em 1995, e que diziam que, nessa altura, o número de estudantes era de 27 000.

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Era o INE privativo do PSD!

O Orador: - Não questiono os 26.400 que dizem existir agora; não questionem os 27.000 que existiam em 1995, de acordo com as informações disponíveis, nessa altura, no Ministério da Educação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Castro de Almeida, a Mesa não pode distribuir documentos que estejam na posse do Ministério da Educação e muito menos em folhas cor-de-rosa ou em qualquer outra cor.
Para responder aos pedidos de esclarecimento formulados, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Educativa: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Castro de Almeida, o Sr. Deputado acaba de suscitar uma questão interessante sobre as estatísticas oficiais. Ora, as estatísticas oficiais, aceites pelas próprias escolas profissionais, dizem aquilo que é óbvio e são estas: por um lado, há um aumentó do número de alunos e, por outro, há também um aumento das primeiras entradas. Essa é que é a questão fundamental relativamente à sustentabilidade do sistema. Tudo o mais são falácias, porque os números são os números e as entradas são a demonstração da consolidação e da sustentabilidade do sistema. Esta é a questão e tudo o mais são outros aspectos marginais.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Nuno Correia da Silva, ainda bem que me põe a questão dessa forma, uma vez que tive oportunidade de salientar que garantimos o finaõciamento, até 1999, a 75%, pelo Fundo Social Europeu.
No passado recente, havia, de facto, problemas suscitados pelas próprias instâncias comunitárias em relação à aplicação destes fundos e o Ministério da Educação pôde garantir, até 1999, através de um sistema claro e controlado, que a Comunidade reorientasse fundos comunitários para assegurar o que não foi assegurado no momento próprio na negociação do II Quadro Comunitário de Apoio. Esta é que é a questão.
Há aqui uma condicionante fundamental e temos de ponderar dois pratos da balança: um é o que pretendemos

Página 1443

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1443

e garantimos no que toca à autonomia, outro é o rigor e, sobretudo, o que era indispensável demonstrar neste momento, isto é, a boa fé, o empenhamento das instituições relativamente à regularização de situações passadas. Esta é a questão fundamental.
Quando, no início do ano passado, o Sr. Ministro da Educação e eu próprio nos deslocámos a Bruxelas, fomos confrontados com dúvidas muito profundas que pudemos ultrapassar, tendo garantido, para esta fase, um acompanhamento redobrado para assegurar que o futuro das escolas profissionais possa manter-se, não à custa de sacrifícios dos contribuintes nacionais mas à custa da orientação correcta e adequada dos fundos comunitários. Esta é a questão fundamental e temos de encará-la nas suas diferentes vertentes.
Em conclusão, devo dizer que é bom que esta questão seja discutida nesta Câmara, é bom que se coloquem todas as implicações que acarreta, mas é preciso compreender que, de facto, a história das escolas profissionais começou de forma atribulada, pelo que temos de garantir-lhes estabilidade e consolidação e temos de proceder com rigor, aspecto este que é fundamental.
Relativamente aos pagamentos em atraso, Srs. Deputados do PSD, talvez esse seja um tema não muito oportuno para ser suscitado pelo vosso partido,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Carlos Marta (PSD): - Mas como?

O Orador: - ... uma vez que, no início do II Quadro Comunitário de Apoio, não estava garantido o mínimo para o subsistema funcionar. Esta é que é a questão!

Aplausos do PS.

O Sr. José Cesário (PSD): - Mas, agora, por que razão não pagam?

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Não há mais inscrições, pelo que está encerrada a apreciação do Decreto-Lei n.º 4/98, de 8 de Janeiro [apreciação parlamentar n.º 47/VII (CDS-PP)]. Entretanto, deram entrada na Mesa propostas de alteração apresentadas pelo CDS-PP e pelo PSD, as quais, juntamente com o Decreto-Lei, baixam à 6.ª Comissão para discussão e votação na especialidade.
Sr.- e Srs. Deputados, vamos dar início à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 117/VII - Estabelece os princípios gerais que regem a organização e o funcionamento da identificação criminal.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça, para proceder à apresentação da proposta de lei.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça (Lopes da Mota): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: As minhas primeiras palavras são para cumprimentar VV. Ex.ª e para expressar o meu prazer renovado em estar presente nesta Assembleia, desta vez para proceder à apresentação da proposta de lei de identificação criminal.
A presente proposta de lei prossegue basicamente cinco objectivos.
O primeiro objectivo consiste em reunir e actualizar, de forma sistemática e coerente, as normas reguladoras da identificação criminal, fazendo cessar a desactualização e a dispersão normativa existentes nesta matéria e suprindo definitivamente uma grave lacuna resultante da não entrada em vigor da Lei n.º 12/91, de 21 de Maio, publicada há quase sete anos.
A identificação criminal rege-se actualmente pelo Decreto-Lei n.º 39/83, de 25 de Janeiro, e por normas de organização e de funcionamento dispersas por, pelo menos, mais quatro diplomas legais cuja identificação consta da norma revogatória.
Acresce, ainda, que a publicação da Lei n.º 12/9j, sem que se tenha iniciado a sua vigência, tem sido responsável por alguma confusão dos operadores judiciários nesta matéria. Basta lembrar que, segundo dados dos serviços, a grande parte das decisões judiciais relativas à não transcrição dos registos para efeitos de emprego se baseia na Lei n.º 12/91, na errada convicção da sua vigência.
Ainda quanto a este ponto há que levar em conta a revisão do Código Penal de 1995, com incidência no regime de penas e consequentes reflexos no registo criminal, nomeadamente no que se refere às decisões e factos registáveis.
O segundo objectivo visa adequar o quadro legal regulador da identificação criminal e de contumazes à estrutura orgânica entretanto adoptada, 'consagrando e harmonizando as soluções estabelecidas e articulando devidamente as competências previstas.
Como é sabido, o Centro' de Identificação Civil e Criminal foi extinto pelo Decreto-Lei n.º 148/93, de 3 de Maio, tendo as respectivas atribuições sido separadas e repartidas por direcções de serviços integradas em direcções-gerais - à identificação civil no âmbito da DGRN (Direcção-Geral dos Registos e Notariado) e a identificação criminal no âmbito da DGSJ (Direcção-Geral dos Serviços Judiciários).
Terceiro objectivo: reformular algumas das grandes linhas enformadoras da identificação criminal, em especial no tocante à sua' adequação às exigências constitucionais relativas às garantias em processo penal e à protecção de dados pessoais.
Por um lado, está em causa o problema da sujeição a registo criminal de decisões anteriores à condenação criminal transitada em julgado. Está em causa a sua própria conformidade constitucional e a coerência sistemática jurídico-penal, tendo em conta, nomeadamente, o sentido e extensão do princípio da presunção da inocência do arguido até ao trânsito em julgado da decisão, a sua eventual justificação ou necessidade processual em confronte com o volume de informação e respectivo tratamento que a comunicação desta implica.
Por outro lado, está em causa a necessidade de adequar expressamente o quadro legal regulador de um registo tão sensível, como é o registo criminal, às exigências formuladas pela Lei n.º 10/91 - Lei de protecção de dados pessoais face à informática (contemporânea da Lei n.º .12/91 e posterior à regulamentação do registo criminal vigente nesta matéria).
O quarto objectivo consiste em rever e actualizar as normas de organização e funcionamento do registo criminal, por forma a possibilitar, decisivamente, a introdução de novas tecnologias e a simplificação de procedimentos.
Fundamentalmente, trata-se de consagrar a necessidade, aliás já expressa na Lei n.º 12/91, e, na linha dos anteriores diplomas que regulamentaram esta matéria, de recorrer a meios informáticos para a recolha e o tratamento da informação, bem como para a emissão de certificados.
Finalmente, o quinto objectivo: consagrar o quadro legal regulador do registo de contumazes.

Página 1444

1444 I SÉRIE - NÚMERO 43

Embora previsto na Lei n.º 12/91, o registo de contumazes, enquanto tal, não tem disciplina jurídica, apesar de a contumácia ter sido introduzida no nosso sistema jurídico já lá vão 10 anos, com o novo Código de Processo Penal. Trata-se, nomeadamente, de esclarecer que informação se regista, como se recolhe, a quem se divulga, por que formas e em que condições, qual a duração do registo. Neste momento, apenas existem apenas disposições orgânicas atribuindo competências nesta matéria à DGSJ, prevendo a existência do ficheiro e a responsabilidade desta Direcção-Geral pela sua organização e manutenção.
Tendo em conta estes objectivos, a presente proposta visa consagrar em matéria de identificação criminal algumas alterações de fundo.
Em primeiro lugar, no que se refere ao objecto e aos princípios gerais que regem a identificação criminal, é evidente a manutenção da linha de continuidade que se tem verificado na disciplina jurídica desta matéria expressa nos diplomas legais mais recentes. Refiro-me, nomeadamente, ao Decreto-Lei n.º 251/71, de II de Junho, que foi um diploma de grande importância neste domínio, ao Decreto-Lei n.º 64/76, de 24 de Janeiro, e ao Decreto-Lei n.º 39/83, de 25 de Janeiro, ainda vigente.
Se a definição do objecto pouco inova, já assim não sucede quanto à expressa consagração dos princípios por que deve reger-se a actividade de identificação criminal, constantes do artigo 2.º da proposta. Procede-se, pela primeira vez, à consagração autónoma de princípios com particular ressonância em matéria de identificação criminal, agora como princípios próprios do registo criminal: os princípios da legalidade, da autenticidade, da veracidade, da univocidade e da segurança dos elementos identificativos. Actualmente, estes princípios apenas são expressamente referendados a propósito da identificação civil e só por via indirecta se pode concluir pela sua aplicabilidade à identificação criminal.
Por outro lado, surgem expressamente consagradas - tal como na Lei n.º 12/91 que, neste ponto, praticamente se reproduz - algumas normas de organização e funcionamento da maior relevância. Destacaria as respeitantes à informatização do registo criminal e, consequentemente, a possibilidade de acesso directo ao registo informatizado - tarefa que está a ser aprofundada e desenvolvida de imediato e para cujo êxito se mostra fundamental a revisão da lei vigente -, a noção de organização do registo criminal em ficheiro central e a exclusiva atribuição da competência para a emissão de certificados do registo criminal aos serviços de identificação criminal.
Um ponto que se considera da maior importância traduz-se na consagração expressa das garantias de protecção dos dados pessoais objecto do registo, mesmo que - e saliento este ponto - os registos não se encontrem informatizados.
Nesta matéria, por um lado, define-se, na proposta de lei. a entidade responsável pelas bases de dados, nos termos e para os efeitos previstos na Lei n.º 10/91, a qual, tendo em conta a actual orgânica, deverá ser o Director-Geral dos Serviços Judiciários.
Por outro lado, consagra-se o direito de acesso à informação por parte do titular, quer a informação conste quer não conste de registo informático, e estabelece-se a forma de exercício desse direito para ambas as situações, através da consulta do conteúdo integral do respectivo ficheiro, que poderá ser uma consulta física do próprio registo no caso de ficheiro manual.
De notar que, neste ponto, se estabelece uma importante inovação relativamente à Lei n.º 12/91, que apenas estabelece o direito de acesso e prevê a forma de aceder relativamente aos registos informáticos.
Um outro ponto, que igualmente nos parece do maior relevo, quer pelo seu significado jurídico-penal, quer pela sua incidência em termos de nacionalidade e eficácia de procedimentos, nomeadamente ao nível da tramitação e desenvolvimento do processo penal, tem a ver com a delimitação do âmbito do registo criminal a decisões transitadas em julgado que integrem uma condenação definitiva e as vicissitudes da execução da pena, especialmente o seu termo.
É uma matéria em que se pretende introduzir uma alteração profunda, extraindo, a este nível, as necessárias consequências do princípio da presunção da inocência que impõe, do nosso ponto de vista, a eliminação do registo das decisões anteriores ao julgamento - refiro-me aos despachos de pronúncia e equivalentes - e das decisões finais que não sejam decisões condenatórias.
Segue-se, nesta opção, a lição do direito comparado e da melhor doutrina que vê no registo de tais decisões uma violação do princípio constitucional da presunção da inocência.
Trata-se, além disso, de decisões que. no regime em vigor, apenas podem ser certificadas para fins estritamente processuais e que, face ao regime restritivo do actual Código de Processo Penal em matéria de conexão de processos, não têm justificação nem utilidade e de que resultam efeitos perversos de grande impacto na tramitação dos processos e no trabalho das secretarias judiciais e dos serviços centrais de identificação criminal, com prejuízos evidentes ao nível da celeridade do processo. Basta referir, a lápis grosso, que cerca de 5/6 dos boletins preenchidos pelas secretarias e comunicados aos registos centrais de identificação, num universo de cerca de 250 000 por ano, com a correspondente extracção e junção de recibos aos processos, não tem qualquer efeito útil. A eliminação deste trabalho burocrático permitirá, sem qualquer dúvida, obter um substancial alívio da carga de trabalho das secretarias judiciais e dos serviços centrais de registos e abolir um conjunto significativo de actos inúteis de pedidos e comunicações de informação entre tribunais após a designação do dia para julgamento, que, muitas vezes, levam ao adiamento deste, com o efeito multiplicador de comunicações aos intervenientes processuais, e, em consequência, criará condições para uma maior celeridade do processo e uma ainda maior rapidez de resposta dos serviços de registo criminal, com resultados óbvios na celeridade da justiça. É também com medidas desta natureza, apostando na racional idade e economia de procedimentos, sobretudo quando, como é o caso, atingem proporções de grande massificação, que obteremos uma melhor justiça.
O aperfeiçoamento da regulamentação do acesso ao registo por particulares constitui igualmente uma preocupação desta proposta legislativa.
Visa-se, designadamente, possibilitar a limitação do acesso à informação por razões e para fins sem qualquer dignidade ou justificação objectiva (artigo 12.º, n.º 3).
Neste domínio, a situação actual configura-se sinteticamente nos seguintes termos: tratando-se de certificados para fins de profissão e emprego, a lei estabelece um regime restritivo, por óbvias razões de ressocialização e de não estigmatização - neste caso, a informação é limitada às interdições judiciárias do exercício da profissão ou ac-

Página 1445

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1445

tividade ou à certificação de antecedentes criminais que a lei reguladora do exercício da profissão exija. Porém, se o certificado se destinar a outros fins, não existem restrições específicas, o que permitiria concluir que, em tais casos, o conteúdo do certificado poderia ser todo o conteúdo do registo. Ora, cremos que, quanto a este ponto, se deverá igualmente estabelecer alguma restrição, sem 'prejuízo, obviamente, do direito de consulta, que é matéria diversa. Daí a formulação da proposta constante do artigo 12.º, n.º 3.
Em matéria de reformulação dos prazos de cancelamento definitivo (e utiliza-se a terminologia «cancelamento definitivo» por nela estar definitivamente absorvida a figura da reabilitação de direito), a proposta estabelece, por razões de proporcionalidade - indo também, neste caso, ao encontro do sentido da melhor doutrina -, uma relação entre os prazos de cancelamento definitivo e a medida da pena principal ou da medida de segurança aplicada - artigo 15.º, n.º I alínea a) -, variável em função da gravidade da pena.
Nesse sentido, expressamente sé propõe a consagração de prazo de cancelamento das decisões que tenham aplicado pena acessória - artigo 15.º, n.º I alínea c) -, com claros reflexos no âmbito da delimitação do conteúdo dos certificados emitidos para fins particulares. Este ponto não está claro na lei actual, o que pode levar a entender-se que o registo da sanção acessória se deverá manter enquanto durar a pena principal. Pensamos que a solução proposta será a que melhor se ajusta à própria finalidade da pena acessória.
Finalmente, ao nível das inovações da proposta de lei, pretende-se consagrar o quadro legal regulador do registo de contumazes.
Neste sentido, e aprofundando o que neste ponto se prevê na Lei n.º 12/91, definem-se claramente a natureza e o fim do registo de contumazes e estabelecem-se as respectivas regras de acesso, por forma a possibilitar o regular funcionamento de um registo centralizado de contumácias, indispensável para atingir plenamente os objectivos deste instituto (artigos 18.º a 20.º).
Diria que, quanto a este ponto, não é necessário sublinhar a importância vital de que se reveste para o instituto da contumácia a existência de um registo central informatizado, actual e fidedigno, facilmente acessível (on Tine) a todas as entidades públicas envolvidas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes são, em síntese, os traços fundamentais da presente proposta de lei.
Tenho fundadas razões para crer que, também quanto a esta matéria, poderá formar-se um amplo consenso nesta Assembleia, à semelhança, aliás, do que sucedeu com a discussão da Lei n.º 12/91, sem prejuízo, obviamente, de normais afinamentos de pormenor na especialidade, para o que me permito desde já oferecer o nosso contributo. Estaremos todos, assim, a contribuir para um melhor direito numa área tão sensível como esta e para uma melhor justiça.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, ouvimos com atenção a sua intervenção sobre esta matéria que, aliás, só na aparência é de menor interesse porquanto aqui se coloca em grande extensão um conjunto de questões que se prendem directamente com direitos fundamentais dos cidadãos e respectivas garantias.
Devo dizer que, em termos gerais, parecem-nos correctas as propostas contidas nesta proposta de lei, pelo que a nossa apreciação positiva será transmitida à Câmara através da intervenção que o meu colega Luís Nobre fará em seguida.
Posto isto, vou colocar-lhe uma questão.
Todos sabemos o que se passou entre a entrada em vigor da legislação de 1983, a aprovação da lei de 1991 e o que, agora, é sujeito à apreciação da Assembleia da República através da presente proposta de lei. No entanto, há uma questão que não vejo tratada nesta proposta de lei e que, ao invés, estava contida na que foi apresentada em 1991, que aqui foi discutida e que, aliás, mereceu amplo consenso de toda a Câmara.
Refiro-me ao registo especial de menores que é revogado expressamente nesta proposta de diploma e que, como o Sr. Secretário de Estado certamente recordará, era regido por um regime especial, consagrado naquela outra proposta de lei de 1991, registo esse que parecia particularmente adequado no que toca à especial garantia que é preciso existir relativamente aos menores que tenham sido objecto de decisão dos tribunais sobre questões que os afectem.
Ora, agora, o Governo revoga expressamente aquela legislação e esta proposta de lei nada contém sobre a matéria, pelo que gostaria de saber qual vai ser o regime aplicável às situações que têm a ver com os menores que são objecto de decisões dos tribunais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, muito obrigado pela sua pergunta.
A questão do registo especial de menores também foi considerada no âmbito desta proposta de lei. Quanto a este ponto, a nossa ideia é a de manter em vigor o regime que está consagrado no Decreto-Lei n.º 39/83 e penso que isto está excepcionado na norma revogatória. Não tenho aqui, neste momento, o Decreto-Lei n.º 39/83, o Sr. Deputado fará o favor de me ajudar, mas a norma revogatória excepciona os artigos que se reterem ao registo especial de menores. Portanto, repito, a nossa ideia, quanto a este ponto, é a de manter em vigor o que está em vigor e, no âmbito da reforma do direito de menores, que oportunamente apresentaremos a esta Assembleia, actualizarmos também a regulamentação do registo de menores.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, dá-me licença que peça um pedido de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Faça favor, Sr.Deputado.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Justiça, então, julgo que vai ficar prejudicado um dos objectivos fundamentais desta proposta de lei, que é, justamente, o de termos num só diploma um conjunto de regras que há-de determinar a matéria do re-

Página 1446

I SÉRIE-NÚMERO 43

gisto criminal. A ser como o Sr. Secretário de Estado diz, e. não. tenho, neste momento, oportunidade nem tempo para rapidamente conferir, vamos continuar com uma situação um pouco absurda que podíamos aproveitar para rever, de modo a ter num só diploma, e não em vários, os regimes aplicáveis em relação a esta matéria. Julgo que podíamos inserir nesta proposta de lei, com vantagens para todos e creio que ainda estamos em tempo -, a especial regulamentação em relação a esta matéria, sem ficarmos presos ou ancorados à legislação de 1983.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: - Sr: Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, sabemos que a questão do registo de menores não tem tratamento idêntico em todas os sistemas, pois há sistemas que o introduzem no registo criminal e há outros que o tratam separadamente, mas a nossa tradição é no sentido de incluir o regista de menores na regulamentação própria do registo criminal. Portanto, em relação a esta matéria, dir-lhe-ia que, por enquanto, manteremos este sistema.
A questão é, basicamente, a seguinte: todo o direito de menores está, neste momento, a ser objecto de uma profunda reflexão e as próprias medidas aplicadas aos menores irão, naturalmente, ser alteradas, pelo que pensamos que ainda neste ano poderemos apresentar uma proposta nesse domínio.
Assim, optamos por manter aquilo que está estabelecido, para não cairmos no risco de virmos, brevemente, alterar esta lei. Em comissão poderemos ver melhor este aspecto, mas a ideia é, basicamente, esta, uma vez que ainda não temos o direito de menores actualizado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Justiça, Srs. Deputados: Esta matéria da identificação criminal foi razoavelmente consensual em 1991, quando aqui discutimos, pela última vez, uma proposta de lei sobre a matéria, e, exceptuando algumas questões que eu próprio irei suscitar, em nome da minha bancada, parece que também o será desta vez.
No entanto, há algo que não pode deixar de ser mencionado que é o facto de, desde logo, nas primeiras palavras do preâmbulo desta proposta de lei se referir que a lei aprovada em 1991 nem sequer chegou a entrar em vigor, porque a respectiva regulamentação não foi elaborada, o que é algo dê espantoso e, no fundo, faz com que tenhamos de nos questionar sobre o que andámos aqui a fazer.
Na V Legislatura, em 1991, a Assembleia da República aprovou uma lei, que, na altura, foi considerado um diploma importante sobre esta matéria. Passou-se toda a VI Legislatura, passou-se já mais de metade da VII Legislatura e faz-se uma nova proposta de lei, onde se refere que a outra, que já tem sete anos, nem sequer chegou a entrar em vigor. Ora, isso obriga-nos, desde já, a formular votos para que a lei que resultar da presente iniciativa legislativa não tenha a mesma sorte, até porque contém disposições que estão dependentes de regulamentação, o que só por si, conhecidos os antecedentes da legislação sobre esta matéria, suscita grandes preocupações.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esperemos que, desta- vez, aquilo que for aprovado seja regulamentado, como tem de ser, e entre, efectivamente, em vigor.
Mas, relativamente a esta matéria, quero referir três aspectos.
Em primeiro lugar, quero salientar, como aspecto que nos parece positivo, a delimitação do âmbito do registo crimina! que é proposta.
De facto, no próprio relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades-e Garantias, refere-se que «... a principal alteração que se detecta reside no tacto de os despachos de pronúncia, ou equivalentes, as decisões que revoguem aqueles e as decisões absolutórias, nos casos em que tenha havido despachos daquela natureza, não estarem agora, sujeitos a registo...», o que é algo que saudamos, ou seja, que constem do registo criminal as condenações a que um cidadão fique sujeito mas as decisões de absolvição e os simples despachos de pronúncia não devem, efectivamente, ser matéria constante do registo criminal. Não há qualquer necessidade disso; pelo contrário, não apenas a presunção de inocência dos arguidos mas o facto de terem sido absolvidos faz com que não tenham matéria que deva constar do registo criminal. Portanto, esta delimitação do objecto material que deve constar do registo é algo que saudamos.
Problemas que não saudamos e que devem ser alvo de discussão na especialidade têm a ver com o âmbito do artigo 7.º, que, dó nosso ponto de vista, carece de justificação relativamente a alguns aspectos. Quando se referem as entidades que devem ter acesso à informação sobre a identificação criminal, aparecem entidades que até agora não estavam previstas na legislação em vigor e algumas delas nem são directamente referidas. Tal é o caso das entidades que forem «autorizadas pelo Ministro da Justiça para a prossecução de fins de investigação científica ou estatísticos», bem como das entidades - e retiro-me agora à alínea e) do artigo 7.º - «com competência legal para garantir a segurança interna e prevenir a sabotagem, o terrorismo, a espionagem e a prática de actos que, pela sua natureza, podem alterar ou destruir o Estado de direito constitucionalmente estabelecido, no âmbito da prossecução dos seus fins».
Ou seja, algumas destas entidades já estão previstas na alínea b), onde se referem as «entidades que, nos termos da lei processual, recebam delegação para a prática de actos de inquérito ou instrução», na medida em que tenham necessidade de aceder à informação sobre os registos criminais, mas, relativamente à entidade prevista na alínea e), que, à partida, é o SIS, como se trata de uma entidade que não tem competência legal para a prática de actós de inquérito ou instrução, convinha que houvesse alguma justificação, da parte do Governo, para apresentar uma proposta desta natureza, alargando a esta entidade o acesso directo ao registo criminal.
Pela nossa parte, não vemos justificação! Até aqui não tem sido assim e, portanto, seria bom que houvesse uma explicação cabal sobre. quais as razões que levam o Governo a propor este alargamento do acesso directo aos dados do registo criminal, por forma a abranger também o SIS.

Página 1447

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1447

Quanto à alínea b), é evidente que se percebe que as entidades que, nos termos da lei processual, recebam delegação para a prática de actos de inquérito ou instrução devem ter acesso aos dados do registo criminal, no âmbito desse processo, o que não se percebe é por que razão, em abstracto, o SIS há-de ter esse acesso directo.
Enfim, é uma questão que deixo aqui, na medida em que nos parece que esta alínea e) do artigo 7.º não tem justificação.
Outro problema diz respeito ao acesso directo aos ficheiros, previsto no artigo 14.º da proposta de lei. Aqui se estabelece que as entidades referidas no artigo 7.º, que acabei de citar, com toda a latitude, têm acesso directo ao ficheiro central informatizado, em articulação com os serviços de identificação criminal e a Direcção-Geral dos Serviços de Informática. Esta matéria tem de ser regulamentada, como o próprio artigo propõe, pelo que me parece que seria de toda a importância que, na discussão na especialidade, houvesse, da parte do Governo, uma informação sobre os termos em que pretende vir a regulamentar esta matéria.
Independentemente da discordância que formulei há pouco em relação ao âmbito das entidades que devem ter acesso aos dados do registo criminal, importa saber em que termos é que se processa o acesso directo ao ficheiro central informatizado por parte das entidades que, não 0 detendo directamente, nos termos da legislação que vier a ser aprovada, passarão a detê-lo.
Portanto, do ponto de vista dos interesses que cumpre salvaguardar nesta matéria, é da maior importância que a Assembleia seja informada detalhadamente sobre os termos em que tal possibilidade de acesso será facultada, para que sejam efectivamente defendidos os interesses que importa salvaguardar, na medida em que se trata de dados que, evidentemente, do ponto de vista dos direitos e garantias dos cidadãos, são muito sensíveis.
Também para nós esta matéria reveste grande importância é na discussão na especialidade deve ser suficientemente clarificada.
Pela sua importância, são estas as questões que entendemos dever, desde já, colocar, nesta fase do debate na generalidade.
Como é natural, estamos inteiramente disponíveis para, em sede de especialidade, participar detalhadamente na discussão desta matéria, de modo a encontrar as soluções adequadas e que tenham condições para entrar em vigor, ao contrário do que aconteceu ou, melhor dizendo, do que não aconteceu com a lei aprovada em 1991.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira Ramos.

O Sr. Ferreira Ramos (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Justiça, Srs. Deputados: Muito brevemente, quero expressar em Plenário a posição do Partido Popular em relação à proposta de lei n.º 117/VII, referindo que, embora seja óbvio que não estamos perante uma matéria demasiado estimulante, estamos, certamente, perante uma matéria da maior importância, uma vez que tem conexão com direitos fundamentais e garantias dos cidadãos.
O Sr. Secretário de Estado da Justiça, não obstante a falta de estímulo desta matéria, foi capaz de nos trazer aqui uma intervenção profunda acerca dos objectivos e das razões que motivaram o Governo a elaborar esta proposta de lei. Tratou-se de uma reflexão ë de uma intervenção extensas e claras, mas, de resto, perante os objectivos já constantes do preâmbulo do diploma, o Partido Popular não poderia ter outra resposta que não tosse exactamente a da disponibilidade do seu contributo para a sua aprovação.
Importa, no entanto, suscitar aqui duas questões, a primeira das quais surgiu já no decurso deste debate, motivada por uma segunda intervenção do Sr. Secretário de Estado, e prende-se com a oportunidade de estarmos, nesta altura, a realizar esta discussão.
O Sr. Secretário de Estado, respondendo a um pedido de esclarecimento, referiu que estariam em curso - e estão, como todos sabemos - alterações mais profundas a nível legislativo, prenunciando, de alguma forma, a possibilidade de, num futuro próximo, nomeadamente em relação ao registo de menores, se virem a produzir alterações legislativas.
Nessa medida, a minha primeira pergunta vai no sentido de saber se, na verdade, a ser aprovada esta proposta de lei, ela não virá, em breve momento, a ser alvo de novas alterações.
A segunda questão, também já abordada neste debate mas que importa vincar, corresponde àquilo que é a prática e quê não é elogioso para o nosso sistema jurídico, que é o facto de termos normativos vanguardistas, insusceptíveis de qualquer crítica, mas que, muitas vezes, não se tornam eficazes, no mínimo por incapacidade regulamentar.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Assim sendo, Sr. Secretário de Estado, faço-lhe uma pergunta muito directa: se a Lei n.º 12/91 tinha o prazo de um ano para ser regulamentada pelo Governo e não bastaram sete anos para implementar essa regulamentação, em relação a esta proposta de lei, que também traz a obrigação de ser regulamentada no prazo de seis meses, gostava de saber se não iremos ter um período demasiadamente excessivo para o Governo torná-la exequível, eficaz e consequente.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Nobre.

O Sr. Luís David Nobre (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A iniciativa legislativa que hoje discutimos, pretende estabelecer os princípios gerais que regulamentarão a organização e funcionamento, bem como as garantias conferidas aos particulares no âmbito da identificação criminal. Deste modo, optou o Governo por destacar do quadro normativo que regulamenta as normas atinentes à identificação dos cidadãos as matérias específicas da identificação criminal, opção esta, que julgamos relacionada com a distinção orgânica operada em 1994, entre identificação civil e criminal mediante a atribuição de competências diversas, quer à Direcção-Geral dos Registos e Notariado, quer à Direcção-Geral dos Serviços Judiciários.
Trata-se, contudo, de uma opção diversa da realizada pelo legislador de 1991, que, com o apoio unânime desta Câmara, optou por englobar no mesmo diploma legislativo quer as matérias que hoje discutimos, quer as matérias

Página 1448

respeitantes à.identificação civil. Çonforme,todos sabemos, as normas aprovadas em 1991 não chegaram a vigorar no nosso ordenamento jurídico devido à ausência de regulamentação da mesma, pelo que se mantiveram em vigoras normas respeitantes à identificação criminal, constantes do Decreto-Lei n.º 39/83, normativos. esses que carecem de, actualização, atendendo não só aos desenvolvimentos legislativos verificados nos últimos IS anos. bem como à evolução tecnológica e científica ocorrida neste lapso de tempo mediante a introdução e massificação do uso de meios informáticos, com ás consequentes melhorias da qualidade da informação prestada aos seus destinatários.
Assim, importa apreciar a presente proposta de lei tendo, em consideraçãó as soluções propostas, bem como as alterações legislativas decorridas no âmbito da legislação penal. Após a sua . apreciação poderemos afirmar que a presente iniciativa preconiza um.conjunto de soluções legais já anteriormente previstas na lei de identificação civil e criminal, sendo que poderá serconsiderada como um texto de continuidade e .evolução em relação aos normativos anteriormente aprovados por esta Câmara.
Sucede contudo que, para além de reiterar algumas soluções já acolhidas, inova noutras matérias mediante a adopção de soluções quedarão pleno acolhimento a princípios constitucionais, os quais, aliás, merecem a nossa aprovação. Deste modo, importa conferir.devida nota à exclusão, no âmbito do_registo,criminal, das decisões próprias do processo penal, que não traduzem uma decisão condenatória, sendo excluídas as decisões de pronúncia ou de carácter equivalente, as quais, não constituindo uma apreciação de carácter conclusivo sobre determinada.conduta, não devem ser objecto de inscrição em sede de registo criminal. Assim, é conferido ao princípio constitucional da presunção de inocência pleno acolhimento em sede de registo criminal, uma vez que, apenas é permitida a inscrição de decisões relativas a factos sobre os quais já se formulou um juízo conclusivo e não de uma mera decisão indiciária.
Igualmente merece a nossa aprovação o facto,de o registo criminal passar a -abranger os factos com relevância registrai praticados por estrangeiros residentes em' Portugal, sendo esta alteração necessária em virtude das alterações ocorridas no âmbito do livre estabelecimento e residência de cidadãos comunitários, bem como de modo a permitir a inscrição dos antecedentes criminais de cidadãos pertencentes a países terceiros.
Analisando a iniciativa, em concreto gostaríamos de fazer, de modo sucinto, as seguintes menções.
,No artigo 6.º da mencionada proposta'é retomada' quase. na íntegra a norma. constante do artigo' l6.º da Lei n.º 12/91, sendo que no seu teor não é devidamente acautelado o modo como terceiros, invocando interesse do.próprio, poderão aceder aos dados constantes do registo criminal.com inteira legitimidade. Deste modo e sendo certo que a presente proposta deléi carece de regulamentação específica para. que possa entrarem vigor, julgamos desde já necessário alertar os autores de tais normas para precisar em que condições e para além do próprio, outros, terceiros, invocando interesse daquele, possam aceder a tais dados. .
Igual cautela regulamentar deverá ser concedida.à previsão do artigo 7.º desta iniciativa, que concede a possibilidade de pleno acesso ao registo criminal .de entidades devidamente autorizadas pelo Ministro da Justiça, cuja finalidade de. tal acesso não seja a da investigação criminal mas, sim, finalidades próprias de investigação cientí-

SÉRIE - NÚMERO 43

fica ou estatística. Trata-se, pois, de uma inovação legislativa cuja finalidade última não deixamos de com-,-preender mas cuja configuração deverá ser estabelecida mediante critérios objectivos de todos conhecidos e não ao, mero critério discricionário do membro -do Governo competente.. ,
O direito à identidade pessoal, consagrado constitucionalmente, merece uma protecção devida, de todos conhecida, não podendo elementos decisivos deste conceito serem conhecidos por terceiros .sem a devida protecção e segurança.
Iguais.cautelas deverão ser conferidas à disposição constante do n.º 4 do artigo 9.º da presente proposta. De acordo com os seus termos, será permitida a emissão de cer-. tificados de registo criminal quer em instalações judiciárias, quer nas instalações das entidades referenciadas no artigo 7.º da mesma proposta. Sendo o esforço- de desce-ntralização e de aproximação da administração ao cidadão enunciado nesta proposta louvável, julgamos que a mesma será, nos seus exactos termos, de muito difícil exiquibilidade atenta a enunciação constante do referido artigo.
Assim, poderiam ser emitidos certificados de registo
criminal nas instalações judiciárias, instalações do Minis
ferio Público, instalações policiais; os serviços de reinte
gração social e em todas, as demais entidades previstas no
artigo 7.º. Deste modo e atentas os inúmeros locais em
que nos termos da lei poderiam ser emitidos certificados
deste tipo, julgamos que os mesmos dificilmente poderão
funcionar de modo simultâneo sem o manifesto prejuízo
da operacionalidade do sistema ou com percas de segu
rança e confidencial ida0e no acesso aos dados deste re
gisto... _
De igual modo, mantemos dúvidas, que poderão contudo ser esclarecidas em sede de regulamentação, quanto às soluções previstas no artigo 14.º.da presente iniciativa acesso directo ao ficheiro central informatizado -, as quais- deverão merecer sempre cautelas e restrições por forma a obviar o seu uso indevido.
No respeitante ao cancelamento de registos, vimos manifestara nossa concordância comas soluções ora propostas em relação ao normativo anterior, uma vez que estas permitem adequar os métodos de .cancelamento com maior rigor e objectividade.
Por último, gostaríamos de ser esclarecidos da razão
pela qual não optou o Governo por incluir nestas normas
o regime especial de registo de menores, que é expressa
mente revogado, sem. .que resulte da exposição de moti
vos as razões de tal opção legislativa. Durante o debate,
algumas explicações foram fiadas, mas gostaríamos, con
tudo, que tal matéria tosse devidamente apreciada em sede
de especialidade. -
Deste modo e aterìtas as vicissitudes anteriormente referidas, a presente proposta merecerá a nossa anuência, sendo certo'que ficaremos a aguardar quais as soluções regulamentares que o Governo irá.adoptar, por forma a adequar as normas ora propostas à vivência concreta do sistema; ias quais permitirão uma apreciação mais conclusiva da sua virtude. Assim e como no passado, daremos a nossa concordância a esta matéria atenta, a sua relevância para a definição e implementação das' políticas criminais

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma, intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Antão Ramos.,

Página 1449

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1449

O Sr. Antão Ramos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Justiça, Srs. Deputados: A presente proposta de lei visa estabelecer os princípios gerais que regem a organização e o funcionamento da identificação criminal que se encontra ainda regulada fundamentalmente no Decreto-Lei n.º 39/83, de 25 de Janeiro.
O regime do referido decreto-lei sofreu, entretanto, duas alterações importante: uma, de fundo, atinente às informações emitidas para fins profissionais e outra de natureza orgânica, decorrente da extinção do Centro de Identificação Civil e Criminal com a consequente atribuição da identificação civil à Direcção-Geral dos Registos e Notariado e da identificação criminal e do registo da contumácia à Direcção-Geral dos Serviços Judiciários.
Embora inovador em alguns pontos, o diploma em apreciação, que, como foi dito também, estabelece o quadro normativo base regulador da Identificação Criminal, perfila-se, fundamentalmente, na esteira da Lei n.º 12/91, de 12 de Maio, a denominada Lei da Identificação Civil e Criminal, que, por não ter sido ainda regulamentada, não chegou a entrar em vigor.
Por um lado, impõe-se aperfeiçoar o regime da identificação criminal às previsões legislativas sobre a protecção de dados informatizados, o que ganha particular acuidade quando, por exemplo, se revela desejável a emissão descentralizada de certificados de registo criminal negativos.
Por outro lado, a própria função da identificação criminal tem sido objecto de marcada evolução. Perante um panorama assim, em que avulta a deficiente resposta legislativa face às actuais necessidades, e considerando ainda o melindre de que sempre se revestem as questões relativas à identificação criminal, revela-se indispensável um novo diploma que actualize as disposições da Lei n.º 12/91 e dê cobertura às prescrições legislativas referentes à protecção de ,dados pessoais informatizados, desiderato este para que a presente iniciativa legislativa contempla respostas satisfatórias.
Como é sabido e já aqui foi referido, o registo criminal é de origem recente e, na sua configuração moderna, mergulha as suas raízes em concepções político-criminais com pouco mais de um século de evolutiva existência. Desde o início, o instituto da identificação criminal vem norteado pela necessidade do conhecimento dos antecedentes criminais dos arguidos. Como é sabido, a responsabilidade do agente do crime é agravada por circunstâncias de natureza pessoal, como sejam a reincidência e a sucessão de crimes. O mesmo ocorre com os delinquentes habituais ou por tendência, categorias que integram os delinquentes perigosos e de difícil correcção. Daí a relevância do registo dos antecedentes.
Por outro lado, ao certificar negativamente a ausência de antecedentes, podia o instituto contribuir para provar a atenuante do bom comportamento anterior. A identificação criminal reveste, assim, natureza instrumental relativamente ao direito penal, perseguindo a finalidade de lhe conferir maior eficácia no plano da sua realização prática e concreta e seguindo-lhe porém as vicissitudes.
Assim, quando o direito penal se encontrava conformado por um sistema punitivo retributivo ou mesmo quando concede à prevenção geral, prevalecendo então a necessidade de extrair da punição o exemplo reactivo da comunidade face às condutas desviantes, compreende-se a necessidade de conferir notoriedade às penas criminais e de lhes conferir ampla publicidade. Quando assim sucede, a

divulgação e publicitação das penas como que faz parte significativa da própria sanção criminal.
Não é assim, porém, quando o direito penal se encontra mais conformado com os princípios da prevenção especial em que se intenta, prevalentemente, adaptar a pena à personalidade do agente, tendo em vista a sua ressocialização. Tem-se assim afirmado o sentido da primazia a conceder à ressocialização dos delinquentes, como corolário lógico do princípio expresso 'no artigo 65.º do Código Penal, de que nenhuma pena envolve, como efeito necessário, a perda de direitos civis, profissionais ou políticos, disposição essa que também assume dimensão constitucional.
Ora, quando se confere primazia à reinserção social do delinquente, então, a utilidade do conhecimento dos antecedentes criminais dos delinquentes ganha uma configuração muito diferente, resultando, porém, mais humanitária e subordinada ao mais completo respeito pela dignidade da. pessoa, já que, naturalmente, se eliminam os estigmas degradantes e, tanto quanto possível, se liberta o delinquente da carga dos seus antecedentes criminais.
Este carácter instrumental da identificação ,criminal aflora ainda no domínio da determinação da medida da pena e no que concerne à própria investigação criminal.
De qualquer modo, seguro é, que o registo criminal, que continuava a constituir instrumento para aplicação das sanções pelos tribunais, não perdia a sua natureza estigmatizante, resultando não só do amplo acesso ainda consentido a terceiros mas sobretudo pelo vexame que permitia se pudesse abater sobre o condenado. Nessa medida, a despeito da grande importância de que se reveste na prática judiciária, impõe-se a limitação dos seus fins e o controlo do seu uso e organização.
Daí que se explicitem no diploma em apreciação os princípios por que se deve reger a organização e o funcionamento do registo criminal, não restando dúvidas de que, na economia do diploma, se afigura estar devidamente acautelado o respeito pelos mencionados princípios, revelando-se paradigmática a adopção de um estrito numerus clausus sobre os factos registáveis e com a apertada regulação. do acesso à informação e do seu controlo.
Um dos tópicos relevantes do presente diploma reside no âmbito do registo criminal, tal como vem descrito no artigo 5.º da proposta governamental, sendo de realçar aqui duas notas fundamentais. Em primeiro lugar, o facto de apenas se encontrarem sujeitas ao registo as decisões condenatórias já transitadas em julgado. Isto releva para uma configuração de uma moldura de antecedentes criminais com real eficácia para a realização dos pertinentes fins penais e não representa mais do que um mínimo de efeito estigmatizante ditado pela função do instituto e não tolhe o efeito ressocializador pretendido com as reacções penais, e releva ainda pela depuração do instituto dos actos de registo sem utilidade significativa, para não dizer inúteis, e geradores de efeitos perversos de burocratização e paralisia do processo. Ganha aqui especial relevância a eliminação do registo do despacho de pronúncia, ou equivalente.
Do meu ponto de vista, a solução preconizada no diploma afigura-se ajustada à realidade e é á que melhor serve os princípios constitucionais que regem o nosso processo penal e os princípios modeladores do próprio registo criminal.
Quanto à problemática, sempre actual e sempre actualizável, do acesso à informação contida no registo criminal quer pelo próprio titular, quer por terceiros, julga-se que se encontram devidamente acautelados os prin-

Página 1450

1450 I SÉRIE - NÚMERO 43

cípios fundamentais que o limitam, já porque as condições de acesso se encontram legal e taxativamente enunciadas, já porque o respectivo controlo se encontra adequadamente conseguido.
Efectivamente, a responsabilidade pela base de dados compete ao Director-Geral dos Serviços Judiciários, que assegura o direito de informação e de acesso aos dados pelos respectivos titulares e, naturalmente, a sua actualização e correcção das inexactidões, velando ainda pela legalidade das consultas ou das, comunicações de informações.
Quando às formas de acesso aos dados pessoais, ela é livre para os titulares e condicionada ao exercício das res- . pectivas competências funcionais no âmbito do processo penal para os magistrados judiciais e do Ministério Público e para fins de inquérito ou instrução às entidades que, nos termos da lei processual, recebam delegação para a prática desses actos. Para outras situações porém, só mediante autorização do Ministro da Justiça,.quase sempre precedida de parecer fundamentado dos.serviços do registo, é possível o acesso à informação registada.
Um outro aspecto em que se revelam as preocupações tendentes a salvaguardar o direito à imagem e à reserva da vida privada dos cidadãos, expurgando a publicidade das decisões criminais da sobrecarga de vexame e agressão à sua dignidade de pessoa, é no tocante à emissão de certificados para tios de emprego ou de exercício de profissão ou actividade, solução já contemplada na legislação anterior e mantida no diploma:
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: O presente diploma, servindo o objectivo de permitir o conhecimento dos antecedentes criminais de uma pessoa e acautelando a carga negativa que a sua publicitação pode acarretar, mantém no essencial a arquitectura do registo criminal existente, isto sem embargo de se processar a sua actualização e acolhendo e dando cumprimento às disposições referentes à protecção de dados pessoais informatizados.
Expurgada a prática de actos sem utilidade aparente e prosseguindo claros objectivos de simplificação, eficiência_e nacionalidade, revertendo para soluções favorecedoras da celeridade processual, corresponde ao que se encontra consagrado na generalidade dos países europeus. A pre-' sente proposta de lei colhe o apoio da bancada do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção final no debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria, antes de mais, de felicitar a Câmara e congratular-me pelo consenso obtido em torno desta proposta. Pensamos que, de facto, as soluções propostas são as melhores mas estamos disponíveis para, na especialidade, vermos alguns aspectos de pormenor que tenham de ser melhor reflectidos.
Relativamente à questão colocada por Deputados. de várias bancadas e que tem a ver com a regulamentação, de facto, lamentavelmente, volvidos estes sete anos, temos uma lei sem entrar em vigor. Quando enfrentámos esta questão, punham-se duas hipóteses: ou avançávamos com um decreto-lei para regulamentar a Lei n.º 12/91 ou íamos examinar se haveria questões que eventualmente envolveriam a sua alteração. Começámos a trabalhar no decreto-lei para regulamentar a Lei n.º 12/91 e deparámos que havia pontos que eram inultrapassáveis porque excediam a competência do Governo.
Sendo assim, para actualizar a Lei n.º 12/91 e para enfrentar os novos problemas que entretanto se colocavam, outra alternativa não teríamos a não ser a apresentação de uma proposta de leia esta Assembleia da República. Isto quer dizer que começámos por fazer o decreto-lei e depois dele feito fizemos a lei, que foi extraída do decreto-lei.
Portanto, quanto ao decreto-lei, Srs. Deputados, peçolhes que estejam descansados porque ele está «prontinho» e só precisamos da autorização legislativa para que possa ser aprovado e publicado. E, naturalmente. teremos todo o gosto em enviar o projecto de diploma a esta Assembleia da República, para que possa ser examinado por todos vós.
Quanto às questões postas pelo Sr. Deputado António Filipe, relativamente às entidades que têm acesso, temos duas inovações, as alíneas e) e i). Começando pela alínea i), que tem a ver com as autorizações para fins de investigação científica ou estatísticos, devo dizer que a lei anterior, a lei de 76, previa que houvesse acesso para estes fins, mas, inexplicavelménte,.º decreto-lei de 83 aboliu esta possibilidade. Andámos à procura da razão: não a encontrámos e surgiu apenas uma referência de um professor de direito de Coimbra que diz que foi, pura e simplesmente, lapso do legislador. E por aí nos ficámos!
A nossa ideia é abrir esta possibilidade, o que, aliás, acontece em todos os sistemas, mas naturalmente que estes dados são anónimos, estando fora de questão o acesso nominativo a registos, pois este acesso é apenas para investigação ou fins estatísticos, como aqui se diz. O conhecimènto da informação relativa a arguidos e condenados,, obviamente protegida pelo anonünato, é fundamental para fazer trabalhos de investigação no domínio da criminologia, estudos de follow up referentes a arguidos, condenações e todas estas matérias. Penso que este é um bom contributo que podemos dar ao desenvolvimento das ciências criminais no nosso país..
Em relação à proposta constante da al ínea e), é evidente que o que está aí previsto é o SIS, já que ela reproduz, exactamente, o artigo 21.º da Lei n.º 30/84. De qualquer modo, esta é uma proposta que, como é natural, pomos nas mãos dos Srs. Deputados.
O SIS apresenta a necessidade de ter acesso a informação de natureza criminal e ao registo criminal; o SIS é, nos termos da Lei n.º 20/87, uma força ou serviço de segurança, um organismo que prossegue objectivos de prevenção criminal, actuando na área criminal, embora sem competências para a investigação. Ora, a questão que se põe é a de saber se uín organismo que tem competências no domínio da prevenção criminal, relativamente a crimes desta natureza, pode ou não ter acesso a informações relativas a condenações de arguidos transitadas em julgado.
Francamente, não nos parece que tal possa ferir algum princípio nesta matéria. Da nossa parte, estaríamos abertos a admitir esta possibilidade, já que se trata de uma matéria em que temos de ser muito objectivos, dizendo, muito claramente, qual é a informação que o SIS pode tratar. E esta parece-me, francamente, uma matéria que pode ser «ácedível» pelo SIS. No entanto, deixamos este ponto à ponderação dos Srs. Deputados, como é óbvio.

Vozes do PS: - Muito bem!

Página 1451

21 DE FEVEREIRO DE 1998 1451

O Orador: - Quanto à questão colocada pelo Sr. Deputado António Filipe, relativa ao artigo 14.º da proposta de lei, é óbvio que, querendo nós avançar com o sistema informatizado, temos de permitir o acesso directo à informação. Devo dizer-lhe que, neste momento, temos 58 terminais de acesso nas secretarias judicias - avançou-se com a primeira experiência em finais de 1995. com nove acessos -, acessos esses que já extraem, anualmente, milhares de certificados de registo criminal, o que permitiu uma grande aceleração, já que reduzimos prazos de seis meses para 10 e 15 dias. Estamos a fazer um esforço enorme para a actualização dos registos criminais e pensamos que temos de prosseguir nesse caminho.
É evidente que há hoje uma grande definição, já que. informaticamente, temos acesso aos registos negativos, e nós queremos, com esta lei, criar condições para possibilitar também a extracção dos registos positivos. Temos, para isso, de expurgar o registo criminal de uma quantidade enorme de informação sem qualquer interesse para efeitos de registo. Pensamos, por isso. que a aprovação deste diploma representa uma condição fundamental para a realização dessa ideia.
Quanto ao registo de menores, para concluir, temos de fazer aqui uma reflexão de fundo - e isso e algo que. naturalmente, iremos propor à Assembleia da República. A questão que se põe é a de saber se deve ou não ser objecto de registo uma decisão que aplica uma medida a um menor, partindo do princípio de que o menor não pratica um crime: o menor é inimputável, pratica um facto qualificado como crime e, portanto, é objecto de uma lei própria, podendo-lhe ser aplicadas medidas de protecção, de educação, de assistência, etc.
Ora, o que pergunto é se devemos manter o registo de aplicação destas medidas confundido com o registo criminal. Francamente, parece-me que não devemos misturar estas matérias, embora seja essa a situação no nosso país. e continua a ser assim. Nós mantemos esse estado de coisas, transitoriamente, mas temos muitas dúvidas sobre a sua manutenção.
Outros sistemas optaram por soluções diferentes. Por exemplo, podia configurar-se a possibilidade de criar um registo desta natureza no Instituto de Reinserção Social, mas é preciso separar a informação relativa a menores da respeitante a maiores que são condenados pela prática de crimes, situação que não se verifica no caso dos menores.
Esta é, portanto, uma questão que tem de ser devidamente ponderada, pelo que iremos formular também uma proposta nesse sentido.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Presidente. Sr.ª e Srs. Deputados, a lista de oradores inscritos está esgotada, pelo que declaro encerrado o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 117/VII. A votação deste diploma terá lugar em próxima oportunidade, nos termos regimentais.
A próxima reunião plenária realiza-se na quarta-feira, dia 4 de Março, às 15 horas, e a respectiva ordem do dia carece ainda de acertos a fazer em sede de Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, pelo que será oportunamente divulgada.
Desejo a todos bom fim-de-semana e um bom período de Carnaval.

Está encerrada a sessão.

Eram 13 horas.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
José da Conceição Saraiva.
Jovita de Fátima Romano Ladeira.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.

Partido Social Democrata (PSD):

António Fernando do Cruz Oliveira.
Domingos Dias Gomes.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
José Mendes Bota.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Manuel Fernando do Silva Monteiro.
Nuno Kruz Abecasis.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP): Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

Página 1452

1452 I SÉRIE-NÚMERO 43

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

Depósito legal n.º 8818/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P

1 - Preço de página para venda avulso, 9$50 (IVA incluído).

2 - Para os novos assinantes do Diário da Assembleia da República, o período da assinatura será compreendido de Janeiro a Dezembro de cada ano. Os números publicados em Outubro, Novembro e Dezembro do ano anterior que completam a legislatura serão adquiridos ao preço de capa.

3 - O texto final impresso deste Diário é da responsabilidade da Assembleia da República.

PREÇO DESTE NÚMERO 247$00 (IVA INCLUÍD0 5%)

Toda a correspondência, quer oficial, quer relativa a anúncios e a assinaturas do «Diário da República» e do «Diário da Assembleia da República» deve ser dirigida à administração da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, E. P., Rua de D. Francisco Manuel de Melo, 5 -1099 Lisboa Codex

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×