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Quinta-feira, 23 de Abril de 1998 I Série Número 6O

VII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE ABRIL DE 1998

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.

Antes do ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação da interpelação ao Governo n.º 14 VII, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantais Garantias relativo à retoma de mandato de um Deputado do PSD.
Em declaração política, o Sr Deputado Luís Marques Mendes (PSD) deu conta das conclusões saídas do Congresso do PSD realizado em Tavira, entre 18 e 20 de Abril p p. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Filipe Madeira (PS) - que também exerceu o direito de defesa da honra da sua bancada, assim como o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Costa) -, Octávio Teixeira (PCP), Acácio Barreiras - que respondeu a um direito de defesa da honra exercido pelo Sr. Deputado Luís Queiró (CDS-PP) - José Junqueiro, Rui Namorado e Joel Hasse Ferreira (PS).
Em interpelação à Mesa, o Sr. Deputado Nuno Abecasis (CDS-PP) deu conta da apresentação, no Senado dos Estados Unidos da América, de um projecto de resolução, subscrito por um conjunto de representantes do Estado de New Jersey, visando que os Estados Unidos da América suportem um referendo internacionalmente supervisado em Timor para determinar o estatuto político de Timor Leste, reconheçam a necessidade da participação directa dos timorenses nas negociações tripartidas e trabalhem activamente para, para junto das Nações Unidas e dos seus aliados, fazer com que se concretizem, tão depressa quanto possível, as resoluções que as Nações Unidas já tomaram sobre Timor Leste
Foi aprovado o voto n.º 1O9/VII - De pesar pelo falecimento da Eng.ª Virgínia Moura (PCP e PS), tendo-se pronunciado, além do Sr Presidente, os Srs Deputados Pedro Baptista (PS), Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes) e João Amaral (PCP). No fim, a Câmara guardou um minuto de silêncio.
Foi também aprovado o voto n.º 11O/VII - De pesar pelo falecimento do Prof. Doutor Pereira de Moura (PCP, PS e PSD), tendo feito intervenções, além do Sr. Presidente, os Srs. Deputados Octávio Teixeira (PCP), Ana Catarina Mendonça (PS), Manuela Ferreira Leite (PSD) e Luís Queiró (CDS-PP). No fim, a Câmara guardou um minuto de silêncio.
Procedeu-se ao debate de urgência requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre a situação da saúde em Portugal e perspectivas de futuro. Usaram da palavra, a diverso título, além da Sr.ª Ministra da Saúde (Maria de Belém Roseira), os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), José Barradas e João Rui de Almeida (PS), Bernardino Soares (PCP), Nelson Baltazar (PS), Jorge Roque Cunha (PSD), Alberto Marques (PS) e Moura e Silva (CDS-PP).

Ordem do dia. - A Câmara aprovou o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias relativo ao recurso, interposto pelo PCP, de admissibilidade da proposta de lei n.º 169/VII - Aprova a Lei Eleitoral para a Assembleia da República, tendo-se pronunciado os Srs. Deputados Jorge Lacão (PS), Luís Sá (PCP) e Guilherme Silva (PSD).
Foram apreciadas as Contas Gerais do Estado relativas aos anos de 1994 e 1995 que foram aprovadas, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Orçamento (João Carlos Silva), os Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira (PS), Manuela Ferreira Leite (PSD), Duarte Pacheco (PSD), Matos Leitão (PS), Augusto Boucinha (CDS-PP) e Manuel dos Santos (PS).
Procedeu-se ainda à discussão projecto de resolução 80/VII. - Recomenda ao Instituto de Comunicação Social a sensibilização da concessionária de serviço público de televisão para a necessidade de tradução gestual da cobertura noticiosa dos principais acontecimentos nacionais e estrangeiros (CDS-PP), tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Augusto Boucinha (CDS-PP), Amândio Oliveira (PSD), Bernardino Soares (PCP) e Antão Ramos (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 55 minutos.

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Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido socialista (PSD):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
António Manuel Carmo Saleiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
João Pedro da Silva Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Rodrigues Costa de Brito.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria de Lurdes Ferreira da Silva Farinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Eduarda Bento Alves Ferronha.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira coelho de Sena Lino.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Paulo Jorge Lúcio Arsénio.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos santos Namorado.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Teresa Maria Gonçalves Gil Oliveira Pereira Narciso.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António da Silva Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Artur Rayder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.

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Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguei Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno José Vaz. Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Augusto Torres Boucinha.

Fernando José de Moura e Silva.
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Deputado independente:

José Mário de Lemos Damião.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa e foi admitida a interpelação ao Governo n.º 14/VII - Sobre política geral (Os Verdes).
Nas últimas reuniões plenárias foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: na reunião plenária de 1 de Abril - ao Instituto Nacional para Aproveitamento dos Tempos Livres dos Trabalhadores, formulado pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Arménio Santos; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, formulados pelo Sr. Deputado António Rodrigues; a diversos Ministérios e à Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, formulados pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Joaquim Matias.
Na reunião plenária de 2 de Abril: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Victor Moura, Jorge Roque Cunha e João Amaral; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, formulado pelo Sr. Deputado Arnaldo Homem Rebelo; ao Ministério da Administração Interna, formulado pela Sr.ª Deputada Jovita Ladeira; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Soares Gomes, aos Ministérios da Saúde e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Miguel Relvas; à Secretaria de Estado do Turismo,

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formulado pelo Sr. Deputado Américo de Sequeira; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Rui Pedrosa de Moura; aos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade e da Economia, formulados pelo Sr. Deputado Rodeia Machado.
Na reunião plenária de 3 de Abril: ao Governo, formulados pelos Srs. Deputados Mota Amaral e João Amaral, aos Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Américo de Sequeira; à Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação e ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Abecasis; a diversos Ministérios, formulado pelo Sr. Deputado Joaquim Matias.
Na reunião plenária de 14 de Abril: ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Nuno Abecasis; ao Ministério da Administração Interna, formulado pela Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia; aos Ministérios do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelo Sr. Deputado Francisco Torres; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado José Calçada.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: no dia 2 de Abril, Joaquim Matias, na sessão de 19 de Dezembro; Ricardo Castanheira, na sessão de 28 de Janeiro; Jorge Roque Cunha no dia 17 de Fevereiro.
No dia 3 de Abril, Manuela Aguiar. na sessão de 21 de Janeiro, no dia 3 e nas sessões de 11, 18 e 19 de Fevereiro; Mota Amaral, na sessão de 23 de Janeiro: Silvio Rui Cervan, na sessão de 6 de Fevereiro; Maria José Nogueira Pinto, na sessão 18 de Fevereiro.
Nos dias 6, 7 e 8 de Abril, Moreira da Silva, na sessão de 2 de Julho, Carlos Coelho, no dia 16 de Dezembro; Aires de Carvalho, na sessão de 8 de Janeiro. Isabel Castro, na sessão de 9 de Janeiro; Jorge Roque Cunha, na sessão de 14 de Janeiro. Maria do Carmo Sequeira, na sessão de 16 de Janeiro; Manuela Aguiar, na sessão de 22 de Janeiro; Silvio Rui Cervan, na sessão de 6 de Fevereiro, Duarte Pacheco, na sessão de 4 de Março.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre retoma de mandato de Deputado.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, o objectivo estratégico claro, uma proposta alternativa de relatório e parecer é do seguinte teor: «Em reunião da Comissão de assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades, Garantias, realizada no dia 22 de Abril de 1998, pelas 9 horas e 30 minutos, foi
observada a seguinte retoma de mandato de Deputado: Grupo Parlamentar do Partido
social democrata (PSD). - Antonino da Silva Antunes ( Círculo Eleitoral de Viana do Castelo), em 21 de Abril corrente, inclusive, cessando Américo de Sequeira.
O parecer da Comissão vai no sentido de que a retoma do mandato em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.»

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr. Presidente, Srs. Deputados: Realizou-se no passado fim-de-semana, em Tavira, o XX Congresso do PSD. Foi, como é timbre da história do PSD, um congresso vivo, participado e mobilizador, um congresso de grande riqueza cívica e democrática. Durante três dias foram debatidas ideias, propostas e estratégias políticas, à vista de todos, em total liberdade e com uma preocupação essencial: servir Portugal e os portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Graças a uma excelente cobertura dos órgãos de comunicação social, os portugueses, simpatizantes ou não simpatizantes do PSD, puderam partilhar deste singular momento de afirmação democrática. Ironia das ironias, num momento em que a moda é criticar os partidos, a política e os políticos, o Congresso de um partido, e partido da oposição, mostrou bem como é possível dignificar a vida política democrática, estimular um salutar debate de ideias, discutir com frontalidade, seriedade e elevação e ir ao encontro dos Portugueses e de muitas das suas preocupações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este não foi um Congresso qualquer, muito menos um Congresso de rotina ou circunstância. Ao invés, foi o Congresso de um partido com alma, com ambição e com vontade de vencer os desafios do futuro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este Congresso não ocorreu num momento qualquer, bem pelo contrário: ele teve lugar num momento em que o País começa a sentir a desilusão do desgoverno socialista e a reclamar a oportunidade da mudança política e da alternância democrática.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O PSD saiu deste Congresso com um objectivo estratégico claro, uma proposta alternativa de poder que é mobilizadora e um líder ainda mais reforçado e prestigiado.

Aplausos do PSD.

O objectivo estratégico é claro: fazer Portugal mudar de rumo e de política, no estilo, na forma e sobretudo na substância, com menos palavras e mais acção, menos promessas e mais realizações, dando aos portugueses condições para melhor enfrentarem o presente e com mais confiança construírem o seu futuro. É um objectivo de geração, mais, muito mais, que uma mera estratégia de poder ou de eleição.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A proposta alternativa de poder é fortemente mobilizadora - assumir a liderança de uma alter-

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nativa democrática para Portugal, que envolva um novo governo, uma forma diferente de governar, mas, sobretudo, uma nova maneira de olhar Portugal e de agir perante os problemas dos portugueses.
Uma alternativa popular e reformista, fundada em valores, em ideias e em soluções concretas para Portugal, aberta à nossa esquerda e à direita, a forças políticas e sociais que coincidam na necessidade de mudar de Governo e de política, virada para vencer o impasse a que Portugal está a chegar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, deste Congresso saiu um líder ainda mais reforçado e prestigiado. O Professor Marcelo Rebelo de Sousa era já, por mérito próprio, o líder incontestado da oposição. A forma convicta, firme e determinada como conduziu o partido até aqui e, sobretudo, como propôs e defendeu a sua estratégia política - com ambição, com coragem e com sentido de futuro - fizeram com que os portugueses o vejam. cada vez mais, como a alternativa real à chefia do Governo de Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Um líder que não hesita nem vacila, venham as pressões de onde vierem, mesmo dos mais poderosos, porque o Governo de Portugal deve ser dirigido com autoridade, com coragem e, sobretudo, com sentido do interesse nacional.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portugal precisa de mudar de Governo e de mudar de política!
Este Governo tem tido condições excepcionais para governar: tem estabilidade política no Parlamento, apoio sem reservas do Presidente da República, condições económicas altamente favoráveis e, porventura, irrepetíveis no futuro.
Um Governo assim podia e devia governar. Era sua obrigação e responsabilidade, mas não governa, não reforma e, sobretudo, não prepara o futuro; exibe e ocupa o poder, mas não o exerce; tem um mandato para cumprir e um programa para realizar, mas nem honra o mandato que recebeu nem cumpre o programa a que se obrigou.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este Governo navega à vista, sem rumo, sem alma e sem ideal; não age, quanto muito reage, de forma pontual, casuística e quantas vezes contraditória; vive dos rendimentos, da herança que recebeu e do capital amealhado; cria ilusões no presente e compromete o futuro, hipotecando os próximos orçamentos e as próximas gerações.

Aplausos do PSD.

É um Governo que vive no deslumbramento e na ilusão, na ilusão de que o euro - a sua única e exclusiva preocupação - é o princípio e o fim da nossa vida colectiva; na ilusão de que entrar na Moeda única é, logo, atingir o reino da felicidade ou o nível de desenvolvimento dos países mais ricos da Europa; na ilusão de que tudo vai bem e que, por um passe de mágica, acabará melhor;
na ilusão de que basta sorrir, dialogar e criar comissões ou grupos de trabalho para que os problemas encontrem solução; na ilusão, enfim, de que não precisa de governar porque os problemas vão desaparecendo ou esquecendo.
Este é o Governo do deslumbramento e da ilusão! Os portugueses, esses, vivem cada vez mais no reino da desconfiança e da desilusão.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É um Governo que cultiva a aparência, mas despreza a realidade: é o Governo do Dia da Droga, da semana dos hospitais, do mês da festa e do espectáculo, do ano do circo, do quadriénio do actor... Tudo ilusão e aparência, cada vez menos realidade!...

Aplausos do PSD.

Na aparência, as finanças do Estado estão folgadas, na realidade os bolsos das pessoas não se encheram e Portugal é hoje mais injusto do que era antes.
Na aparência, a carga fiscal não aumenta; na realidade, os portugueses sentem que pagam mais na contribuição autárquica, na colecta mínima e em aumentos de alguns bens e serviços essenciais.
Na aparência, o desemprego está contido; na realidade, a promessa de novos empregos não se cumpriu. O desemprego dos jovens começa a ser preocupante e em algumas zonas do País - no norte, no Alentejo ou no Vale do Ave - as bolsas de pobreza não diminuíram.
Na aparência investe-se mais na saúde; na realidade, a situação da saúde agrava-se.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Algum português discorda que as listas de espera nos hospitais aumentam? Que as urgências não melhoram? Que os prometidos médicos de família não surgem? Que o sofrimento das pessoas é maior? A Ministra da Saúde, essa, enche os écrans de sorrisos, os microfones de palavras doces e o País de novos diagnósticos, sempre diagnósticos e mais diagnósticos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E quando a OCDE anuncia o descontrolo na saúde, a Senhora Ministra - pasme-se! - conclui que, até que enfim, tem dados para reflectir: sempre a reflectir, sempre a sorrir, mas nunca por nunca a decidir!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Na aparência, a educação é a grande paixão; na realidade, a qualidade na educação não melhora, a autoridade dos professores diminui, as escolas profissionais não aumentam e algumas até são ameaçadas de encerramento. O ziguezague na questão das propinas desafia a autoridade do Governo e a tão prometida paz nas universidades é cada vez mais uma utopia e uma miragem.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Na aparência, a segurança social vai bem e a solidariedade é maior; na realidade, para além de algu-

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mas louváveis medidas pontuais, os pensionistas e reformados não vêem aumentado o seu poder de compra, os portugueses que hoje trabalham sentem, cada vez mais, incerteza quanto às suas reformas futuras e o desnorte atinge o ponto de não se saber se existem um, dois ou três livros brancos sobre o estado da segurança social em Portugal.
O Primeiro-Ministro, esse, fugindo uma vez mais às suas responsabilidades, propõe pactos de regime com a oposição, como se a clareza da política e a obrigação de governar pudessem ser substituídas por uma nova versão da União Nacional dos tempos modernos.

Aplausos do PSD.

Numa palavra: o Governo socialista, cada vez mais transformado num desgoverno clientelista, aumenta e agrava as injustiças sociais; os mais pobres continuam mais pobres e os ricos ficam mais ricos; a economia cresce, mas a justiça social não aumenta; há mais riqueza no País, mas é uma riqueza que se concentra cada vez mais e se distribui cada vez menos.

Aplausos do PSD.

Para alguns, a fuga aos impostos continua. Para a generalidade dos portugueses e das pequenas e médias empresas aplicam-se novos impostos.
Para os mais vulneráveis e excluídos da sociedade vão as palavras do Primeiro-Ministro e as promessas dos Ministros. Para alguns poderosos e ricos, vai o desvelo, o favor e a ajuda do Governo e do Primeiro-Ministro.
Este é um Governo de contrastes: socialista em teoria, adora, na prática, o grande capital. Socialismo no poder é sinónimo de grandes empresários, com favores, a ganharem mundos e fundos. Foi assim no passado, como todos se recordam, e volta a ser assim no presente. Não é preciso ir mais longe, são os próprios empresários que o confessam.

Aplausos do PSD.

O problema não está em haver grandes grupos económicos, bem pelo contrário: numa economia de mercado e, sobretudo, em tempo de forte competição internacional é saudável e desejável que tal suceda.
O problema está em o Governo só se preocupar com alguns, uma meia dúzia de grandes e poderosos, e não com todos os empresários, sejam pequenos, médios ou grandes; o problema está em o Governo não ter regras claras iguais para todos - e agir, relativamente a alguns, com a deformação corporativa do favor, do compromisso e do privilégio;...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... o problema está em o poder político democrático não saber situar-se, como sempre se deve situar em democracia, acima do poder económico, sem dependências, sem cumplicidades de favor e sem promiscuidades.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Esta atracção fatal do Governo pelo neoliberalismo e pela protecção a alguns grupos económicos atingiu, nos últimos tempos, proporções nunca vistas. Meia dúzia de senhores e grupos alcançaram - pela mão de um Governo dito socialista - um peso económico e político nunca antes conhecido, a não ser no tempo do Estado Novo.
São nomeações de gestores ligados a grupos privados para empresas do Estado em cujos sectores esses grupos têm interesses manifestos e públicos; são negócios feitos pelo Estado - directamente ou por interposta longa manus - para ajudar ou servir, objectivamente, interesses de grupos privados e não do próprio Estado; são alterações estratégicas no sector energético e outras com prejuízo manifesto para os consumidores e sem justificação plausível, dando lugar às maiores dúvidas sobre quais serão os verdadeiros interesses e motivações para esta alteração de política; são estratégias de privatizações que não se explicam, que não se percebem e cujos critérios são, no mínimo, duvidosos ou nebulosos; é sobretudo o facto de o Estado ter sempre um tratamento de excepção para alguns - sempre os mesmos, uma meia dúzia de privilegiados enquanto nega o mesmo critério e o mesmo apoio à generalidade dos portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este comportamento do Governo é ética e politicamente inaceitável. Não é claro nem é transparente.

Aplausos do PSD.

É um comportamento impróprio para o Estado, gerador de suspeições inadmissíveis, ostentatério em relação aos portugueses que vivem e sofrem desigualdades e injustiças sociais gritantes.
Bem pode o Primeiro-Ministro arvorar-se em vítima, bem podem os Ministros perder o verniz e a cabeça e mostrarem irritação à flor da pele. Melhor será que esclareçam o que deve ser esclarecido, que assumam a responsabilidade dos actos que praticam e das situações de favor que criam, que arrepiem caminho antes que seja tarde, que passem a comportar-se como um Governo de todos e não apenas de alguns.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Congresso do PSD marca o início de um novo cicio político para Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por nós, aqui estamos, aqui estaremos, fiéis às nossas convicções, a construir a alternativa de governo que o País precisa, a aprofundar as ideias e as soluções que os portugueses reclamam, a agir com confiança e muita determinação. A trabalhar por Portugal e para os portugueses, com a coragem de ganhar mas, sobretudo, de mudar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Luís Filipe Madeira, Octávio Teixeira, Acácio Barreiros, José Junqueiro e Rui Namorado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.

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O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Deputado Luís Marques Mendes, quem ouvisse aqui, hoje, o seu discurso e não tivesse visto a televisão - que deu em directo o Congresso do PSD, em Tavira -, pensaria que V. Ex.ª não esteve lá e não ouviu os debates que lá tiveram lugar.
V. Ex.ª veio aqui dizer que o Governo é um desastre, que só faz malefícios a este País. Bom, a decorrência lógica dessa situação seria a de que o Governo estaria em perigo iminente de perder estrondosamente as próximas eleições. Mas, pelo contrário, todos os intervenientes no Congresso do PSD, desde os mais graduados dirigentes aos militantes mais anónimos, concordaram que não era possível ganhar ao PS, pois, face à governação que tem vindo a desenvolver-se, a derrota era certa e a única hipótese, mesmo remota, seria a de uma aliança com o PP do Presidente Paulo Portas.

Aplausos do PS.

Não bate a bota com a perdigota ou, então, V. Ex.ª não percebeu o que se passou no Congresso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No Congresso do PSD, para quem esteve de fora a assistir, o que se passou foi o seguinte: não houve nenhum Pepino, o Breve, que quisesse destronar o rei e acharam melhor que o rei continuasse até ao fim... E é óbvio qual é o rim!... Todos sabem qual é o fim e, em 1999, vão sepultá-lo e vão, então, disputar a coroa... Mas é em 1999, porque já está tudo perdido - aliás, foi isso que se disse no Congresso.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A única hipótese era aquela, aliás, até um eminente dirigente do PSD disse, ajuizadamente, que o ideal seria este dirigente com outra estratégia, porque assim não se queimavam tanto... Mas ninguém se quis queimar; só houve um, que vai ser o cordeiro de Deus neste sacrifício que os senhores vão fazer à democracia.
Quanto ao resto, os senhores discutiram e organizaram-se no plano interno do PSD, o que é, bom não só para o partido do Governo como para o regime democrático, ou seja, é bom que a oposição se reorganize e repense os seus programas.
Ontem, ouvi o Presidente do PP, Dr. Paulo Portas, dizer que nem se desviaria um milímetro das regras... O PSD vai saber como isso é,...

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Não foi nada disso!

O Orador: - ... porque aquele parceiro vai ser duro. Mas ainda bem, para ver se põe o PSD na ordem e se consegue dar luta a um governo relativamente ao qual apesar de tão mal governar, segundo dizem - o PSD não tem confiança de ser capaz de ganhar-lhe nas próximas eleições.
Sr. Deputado Luís Marques Mendes, para além desta questão interna - que é saudável e que é a oposição feita pelo principal partido e por um partido menos numeroso, que mesmo assim, apesar de continuar a sê-lo, porque, creio, vão ter 16 Deputados nas próximas eleições, é uma garantia boa, por não ser fácil tê-la, mas este é um problema interno vosso, dos dois partidos, para a resolução do qual vos desejo boa sorte nos limites da democracia, pois esta dirá quem merece ganhar, e esperamos para ver, embora os senhores já o tenham confessado no Congresso -, os senhores também falaram para fora e para o PS e o vosso presidente, o Professor Marcelo Rebelo de Sousa adiantou insinuações que, creio, não podem ficar assim. Os senhores deverão tomar as medidas necessárias para esclarecer o que se passa, sob pena de o vosso presidente passar por um mero insinuador, que não tem coragem de concretizar as suas acusações.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, vou fazer apenas três comentários, sendo o primeiro no sentido de constatar que o senhor e, seguramente, os seus colegas seguiram atentamente os debates do nosso Congresso. Ainda bem! Mas mais importante do que o terem seguido atentamente, e com isso nos congratulamos, espero e desejo, sinceramente, que tenham aprendido algo para o futuro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O segundo comentário é sobre a nossa estratégia política para o futuro. Antes, durante e depois do nosso Congresso, o PS tem evidenciado publicamente uma grande preocupação com a estratégia do PSD. Ou seja, o Sr. Deputado nem percebe que está a dar a conclusão a si próprio, ao seu partido e ao País. Se alguém tivesse dúvidas da bondade, da justeza e do acerto desta estratégia, o nervosismo, a preocupação e o incómodo do PS teriam dissipado todas as dúvidas. Estamos no bom caminho!

Aplausos do PSD.

Terceiro comentário: no Congresso e, depois dele, também aqui, falamos, acima de tudo, do País e para o País, com afirmações pesadas, que traduzem elementos que estão à nossa disposição, com a convicção, que hoje o País têm e em relação à qual o senhor não desmente, não esclarece, não dissipa as dúvidas, de que algo na relação entre algum poder económico e o poder político está mal e vai mal, de que alguma relação de favor, de cumplicidade, de privilégio para alguns põe em causa o princípio da igualdade entre todos e o princípio de que o poder político deve estar sempre acima do poder económico. Não são insinuações, são afirmações!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Concretize!

O Orador: - São afirmações, e hoje os portugueses têm a sensação de que há aqui «gato escondido com o rabo de fora», de que há aqui algo de menos claro, menos conhecido e mais obseuro. Em relação a essas questões, a melhor prova de que algo está, de facto, a ocorrer de mal, negativamente, e tem de ser denunciado é o facto de o senhor e a sua bancada dizerem nada. Pela nossa parte, continuaremos a fazer esta denúncia, que é a prova de que temos princípios, acima de tudo, temos convicções

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2008 I SÉRIE NÚMERO 60

e nada nem ninguém nos fará calar na denúncia destas situações, que não são boas, de forma alguma, para a defesa do interesse nacional.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da consideração da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Mendes é inaceitável o que acabou de dizer. O PSD, o seu presidente e V. Ex.ª dirigem acusações genéricas, supergenéricas, ao Governo e ao PS. É um tipo de acusação que teve época, no tempo da Inquisição, em que o acusado tinha de descobrir o crime que tinha cometido e, se não acertasse, era condenado. Já passámos essa fase. Acabei de os convidar, à sua bancada e ao seu partido, a explicarem o que querem dizer com isso, cominando logo a condenação, a de que o seu presidente é irresponsável e caluniador se não concretizar aquilo que diz.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, acusem concretamente. Os senhores têm, ao vosso dispor, uma panóplia de meios para esclarecer o que se passa. Digam do que nos acusam. Não podem vir com acusações genéricas, do tipo «cheira a gato escondido com o rabo de fora». Isso é material zoológico e eu não sou perito em zoologia, em saber se há rabo de gato, rabo de tigre ou casca de laranja. O seu partido tem a obrigação, em nome da transparência da vida democrática, de concretizar perante o País as suspeitas, dizendo em que caso, em que empresa, que favorecimento, que alianças espúrias há entre o Governo... Alianças espúrias porque ilegítimas, favorecimentos condenáveis se ilegítimos, pois o favorecimento não é, per si, condenável, é-o se for ilegítimo.
Os senhores têm essa obrigação devido ao respeito que devem a vós próprios, sob pena de passarem por boateiros, como um jornal que apenas faz boatos e insinuações, não os concretizando. Os senhores não são esse jornal ainda, pois não? Espero que não!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Filipe Madeira. afinal, não ouviu atentamente tudo quanto se passou no Congresso e depois dele.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Exactamente!

Vozes do PS: - Oh!

O Orador: - As acusações não são genéricas mas, sim, a afirmação de situações e de casos concretos. O Sr. Deputado e o seu Governo já deviam, a esta hora, em vez de se esconderem atrás de alguns grupos económicos, que de repente parecem ser os porta-vozes do Governo,..

Protestos do PS.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Isso é inaceitável!

O Orador: ... Ter esclarecido situações que, publicamente, o líder do meu partido denunciou. Mas eu coloco-lhas aqui, para o senhor poder esclarece-las.

Protestos do PS.

Vejamos o caso das nomeações. Há duas empresas controladas pelo Estado em que, recentemente, o Governo nomeou como respectivos presidentes dois gestores - e não está em causa a sua competência pessoal - ...

Protestos do Deputado Luís Filipe Madeira, do PS .

... ligados a empresas privados que têm interesses nesses mesmos sectores. Ou isto é esclarecido, e são dois casos, pelo menos, ou levantam-se as maiores dúvidas, as maiores suspeitas, a acusação de cumplicidades, de favores e de privilégios.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Onde está a vossa preocupação, hoje, da transparência, perante estes dois casos?! Fico por aqui, quanto a nomeações.

Vozes do PS: - Quais?!

O Orador: - Passemos ao segundo exemplo. Já explicaram o caso Autodril, em que o Estado perdoa milhões de contos, investe outros milhões de contos, tudo em nome ou com o pretexto da Fórmula 1?! Não há Fórmula 1, o Estado continua a perdoar e não denuncia esse contrato?!

Aplausos do PSD.

Pergunto: se o Estado não denuncia esse contrato, que favores há a pagar, que interesses há a esconder, onde está a transparência do Estado em relação a um negócio que é ruinoso e é um mau exemplo de como o Estado se comporta?!
Outro exemplo: a Torralta, Sr. Deputado. Como vê, concretizamos tudo. Explique-me, por favor, por que razão a concessão do jogo, naquele caso, é feita por ajuste directo, quando em todos os outros casos, no País, é por concurso. Explique-me, por favor, por que razão o imposto do jogo, naquele caso, é inferior ao imposto pago por outros concessionários, noutros jogos. Explique-me qual foi o critério seguido na atribuição daquela concessão a um determinado grupo económico em concreto, aliás, a um grupo económico que, nos últimos tempos, tem sido favorecido em vários tipos de negócios.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, explique também o que o líder do meu partido já disse. Como é que o Governo de Portugal considera tão estrategicamente importante e prioritário investir numa cadeia de supermercados no Brasil? Em Portugal, vendem e privatizam empresas, no Brasil, estão a comprar empresas. É um péssimo exemplo. A não ser que o Sr. Deputado consiga explicar aos portugueses que uma cadeia de supermercados no Brasil é estratégica para Portugal, é uma questão absolutamente essencial.

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São sempre e sempre os mesmos grupos, os mesmos interessados, os mesmos privilegiados. Sr. Deputado, tem aqui casos demais para que esta acusação seja grave. De duas, uma: ou dá explicações ou temos de concluir que, havendo acusações a mais e respostas a menos, os senhores também têm dúvidas e suspeições, por isso muitos de vós estão calados, por isso muitos de vós e do Governo ficam atrás dos grupos económicos e não são capazes de dar uma explicação ao País e aos portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, sob a figura da interpelação, porque este debate não contém a possibilidade de rebater as questões colocadas pelo Sr. Deputado Luís Marques Mendes, lembro à Mesa que, por terem sido feitas perguntas directas e estas terem ficado sem resposta, pelos menos directa, poderia parecer que o PS não tem resposta. Mas tem resposta! Porém, admiramo-nos de que o PSD, com tão graves suspeitas, não tenha provocado uma das situações que o Regimento prevê, ou seja, um debate sobre estas matérias, um inquérito, tendo-se limitado a trazer aqui estas questões incidentalmente.

Vozes do PSD: - Desminta!

O Orador: - Referi, Sr. Presidente, que o que estava em causa era favorecimentos ilegítimos. O Deputado Luís Marques Mendes, mais uma vez, jogando com cartas viciadas, disse: nomearam duas pessoas, mas não está em causa a sua qualidade, competência ou seriedade. Se isso não está em causa, então, o que está em causa?!

Protestos do PSD.

Ou as pessoas são suspeitas e estão mal nomeadas ou, então, são pessoas sérias e competentes e, para além do partido a que pertencem ou da cor religiosa que têm, estão bem nomeadas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Quanto ao caso Autodril, lembro apenas que este é um processo que nasceu com o governo do PSD, que financiou a recuperação do autódromo a fundo perdido, sem cuidar sequer de ressalvar o futuro.
No que toca à Torralta, é conhecido o estado em que o PSD deixou este caso.

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa no mesmo sentido.

O Sr. Presidente: - Já esperava isso, Sr. Deputado. Como sabe, é sempre assim e a Mesa não pode contemporizar com situações destas. Há figuras regimentais que podem utilizar, como o tratamento eventual de assuntos de interesse relevante, e parece que consideram isto de interesse relevante, no âmbito das quais qualquer dos grupos parlamentares pode intervir. Peço desculpa, mas não posso deixar desvirtuar a figura da interpelação à Mesa.
No entanto, neste caso, embora lembrando uma vez mais que o desvirtuamento de uma regra regulamentar não dá direito ao tratamento de igualdade, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes, pelo mesmo tempo que a teve o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, vou ser brevíssimo, porque vou fazer três telegráficos comentários, sendo o primeiro, para dizer o seguinte: depois das acusações feitas nos últimos dias pelo líder do meu partido, se os senhores tivessem a consciência tranquila, teriam feito hoje, já, uma declaração política a esclarecer e a desmentir tudo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Segundo comentário: essa seria a postura mais correcta, a única correcta, em vez de, de uma forma cobarde, estarem a esconder-se atrás dos beneficiados, que são alguns grupos económicos.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O terceiro comentário é para dizer que, em matéria de Autodril, tudo se resume a esta fórmula: Portugal perdeu o grande prémio, a empresa em causa ganhou, de facto, um grande prémio.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já se retiraram alguns dos alunos que estavam a assistir aos nossos trabalhos. Antes que aconteça o mesmo em relação aos restantes, informo que estão connosco, ou já estiveram, alunos da Escola Preparatória Padre Franklin, de Vieira de Leiria, da Escola Secundária Tomaz Pelayo, de Santo Tirso, da Escola Preparatória Damião de Góis e da Escola EB 2,3 de D. Dinis, de Leiria.
Para eles, peço a vossa habitual saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Para exercer o direito regimental de defesa da consideração do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (António Costa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o PSD saiu do Congresso de Tavira como o partido da infâmia.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, peço-lhe o favor de seleccionar bem as suas palavras.

O Orador: - O PSD não hesitou sequer, no discurso de encerramento do seu Congresso, em referir-se a um drama pessoal que atingiu a vida familiar de um membro do Governo, presente na sala, para conspurcar o bom nome do Governo de Portugal.

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Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, até agora foram ouvidas intervenções vivas, como é bom que elas sejam, sem que se tenha feito o ruído que se faz sentir agora. Vamos continuar a ouvir calmamente aquilo que se diz, desde que seja dito com a correcção devida.

O Orador: - O Sr. Deputado Luís Marques Mendes veio aqui hoje, gozando da sua imunidade e sem precisar um facto que seja,...

Vozes do PSD: - Não ouviu!

O Orador: - ... lançar insinuações, que não são sérias ou, então, não lhe são merecidas, pois se são para serem levadas a sério têm de ser fundamentadas e devem sê-lo aqui e agora.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Já foi feito!

O Orador: - O que não é possível é dirigir ao Governo as acusações que o PSD tem dirigido, dizendo de forma vaga, «seis grandes grupos», «uma determinada empresa», «duas empresas»... Mas quais são os grupos? Quais são as empresas? Que actos é que este Governo praticou? Porque o único caso que, até agora, o PSD concretizou refere-se ao que designaram por «supermercado falido», no Brasil, que não é um supermercado mas uma cadeia de distribuição e que não é falida mas lucrativa.

Vozes do PSD: - Ah...

O Orador: - Essa é uma decisão relativamente à qual os senhores têm, aliás, boas condições para a conhecer, visto que é uma decisão tomada pelo IPE, pelo respectivo administrador para a área da internacionalização, que o Sr. Deputado Luís Marques Mendes conhece muito bem, porque foi durante muitos anos seu colega de governo, o Sr. Eng.º Faria de Oliveira.

Aplausos do PS.

Este Governo não se comporta, na política, como, com pena, temos visto o PSD comportar-se nos últimos dias. Portanto, para nós, é claro que em democracia não há espaço para a suspeição e não toleraremos que haja espaço para a suspeição quanto aos actos praticados por este Governo. Aliás, mesmo quanto à Autodril, que aqui invocou pela vigésima vez, nos últimos meses, o Governo já veio a Plenário e à Comissão dar explicações.
De qualquer modo, o que quero dizer, Sr. Presidente, é que o Sr. Ministro da Economia ou qualquer outro membro do Governo estão disponíveis para, na próxima semana, no dia e hora que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite convocar, estarem presentes na Comissão de Economia, Finanças e Plano, a fim de prestarem prestar todos os esclarecimentos ao PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Ministro.

O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente.
Convido, por isso, o Grupo Parlamentar do PSD e, em particular, o Dr. Luís Marques Mendes, a documentar-se e informar-se, a fim de que, na próxima semana, na Comissão de Economia, Finanças e Plano ou noutra que entendam por mais adequada, o Governo possa prestar todos os esclarecimentos sobre todas as matérias relativamente às quais VV. Ex.as queiram ser esclarecidos.
Agora, há uma coisa que manda a hombridade: é que até porem os factos em cima da mesa, até concretizarem sobre o que querem ser esclarecidos, não podem invocálos para atingirem a honra, a honorabilidade, o bom nome deste Governo ou de qualquer dos seus membros.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, constato, em primeiro lugar, com agrado, o facto de o Sr. Ministro ter vindo dar uma «ajudinha» ao Grupo Parlamentar do seu partido.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Deixe-se disso!

O Orador: - Mas não chegou, Sr. Ministro! Depois de ouvi-lo, a primeira constatação que faço é a seguinte: de facto, o senhor faz parte de um Governo que já sabíamos que não governava. Agora, perante a denúncia de casos e citações concretas, que os portugueses já perceberam, o senhor - como, de resto, se viu nos últimos dias - e o seu Governo, todos os ministros, falam desesperados e irritados, a perdendo o verniz, perdendo a cabeça. Aos factos, respondem zero,...

Vozes do PS: - Quais factos?

O Orador: - ... aos costumes, dizem nada, porque argumentos para desmentir e esclarecer as situações denunciadas, os senhores não têm, não conseguem apresentar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Segundo comentário: é absolutamente lamentável - só o digo en passant - que o Sr. Ministro tenha dito que o líder do meu partido, no encerramento do Congresso, teve qualquer atitude menos correcta para com um seu colega de Governo.

O Sr. Ministro do Assuntos Parlamentares: - Teve!

O Orador: - Isso é inadmissível!

Protestos do PS.

Vamos aos factos, porque aquilo que se espera de um membro do Governo é que venha desmentir os factos que apresentei aqui, há instantes.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Exactamente!

O Sr. Ministro do Assuntos Parlamentares: - Foi zero!

O Orador: - Sr. Ministro, vou repetir. Pode ser que o senhor ajude mais do que o seu grupo parlamentar.

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Primeiro facto: qual é a transparência que existe no facto de dois gestores...

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Competentes!

O Orador: - ... serem nomeados para duas empresas do Estado, quando eles que estão ligados a empresas privadas bem conhecidas e que têm interesse nesses sectores para onde foram nomeados? Onde está a clareza? Onde está a transparência? Desmente este facto, Sr. Ministro?

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Ministro do Assuntos Parlamentares: - O Sr. Deputado permite-me que o interrompa?

O Orador: - Faça favor, Sr. Ministro. Mas tem de ser um caso concreto!

O Sr. Ministro do Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado Luís Marques Mendes, espero que, em sede de comissão, tenha a amabilidade de fazer o que aqui não faz, que é dizer quais são as empresas, quais são os grupos, quem são os gestores. O que são dois gestores, o que são dois grupos, o que são interesses e qual é o papel desses gestores nas empresas? Concretize, Sr. Deputado! O senhor não concretiza, mas até à reunião da comissão tem tempo.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Não desmente!...

O Orador: - O senhor está farto de saber que se trata, por um lado, da Transgás e, por outro, da Portucel. O que o senhor não tem são factos para desmentir os argumentos!

Aplausos do PSD.

Já agora, e também en passant, o Sr. Ministro vai fazer o favor de estudar, para depois dar uma explicação, como é que, no caso da Transgás - e a acrescentar à gravidade daquilo que já aqui denunciei -, o Primeiro-Ministro, ao fim de três anos do mandato de um gestor, que veio a demitir, o elogiou publicamente, tendo-o considerado um modelo de competência e renovado o seu o mandato. Seis ou sete meses depois, demite-o e substitui-o por este gestor com ligação a um grupo económico com interesse nesse sector. Além do mais, isto custou, em termos de indemnização, ao erário público - o que significa aos bolsos dos portugueses - 70 ou 80 000 contos. É uma gravidade a acrescentar à outra gravidade e fica para o senhor responder mais tarde.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Segundo facto, Sr. Ministro: a Autodril foi um negócio feito, já todos os portugueses conhecem, em nome da fórmula 1.

O Sr. Ministro do Assuntos Parlamentares: - Não!

O Orador: - Não existe fórmula 1, Sr. Ministro, mas perdoaram-se milhões de contos e investiram-se muitas centenas de milhar de contos em obras inúteis. Sr. Ministro, a pergunta é simples: por que é que, não existindo fórmula 1, se mantém de pé o negócio? Por que é que o Estado não denuncia o acordo? No princípio, o Grande Prémio de Fórmula 1 era o argumento, afinal é o pretexto, a não ser que isto se explique por a+b. Se não, a suspeita de favores a pagar e de interesses a encobrir é totalmente legítima.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Terceiro exemplo de um facto para o senhor: Torralta. Por que é que, neste caso, o jogo foi atribuído sem concurso e por ajuste directo? Por que é que naquele caso foi feito o contrário do que foi feito em todos os outros sítios do País?
Dou-lhe já, gratuitamente, mais esta informação: em todos os casos de concursos para zonas de jogo noutros pontos do País, quando eles foram feitos, o Estado ganhou, porque as propostas subiram relativamente aos valores iniciais. Ora, neste caso, foi feito o contrário!
Já agora, também en passant, explique por favor, como é que o imposto do jogo pago nesse caso pelo concessionário, é inferior ao pago por outros concessionários de outras zonas de jogo do País.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, isto são factos. Responda com factos. porque se não a conclusão é simples: contra factos não há argumentos! E não se esconda o Governo nem atrás de grupos económicos, contra os quais nada temos, nem atrás de outros tipos de gestores.
O PSD não nomeou gestor de empresa alguma, não fez negócio com o Governo para a nomeação de qualquer gestor ou director. Quem manda no IPE é o Governo, não é o partido da oposição, não é o Partido Social Democrata.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Ministro do Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, eu tive o cuidado de tomar boa nota dos cinco casos que o PSD indicou...

O Sr. Presidente: - Desculpe, Sr. Ministro, mas tem de caracterizar a figura regimental ao abrigo da qual pretende usar da palavra.

O Sr. Ministro do Assuntos Parlamentares: - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro do Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, o PSD indicou cinco casos: a Portucel, a Transgás, a Autodril, o caso Torralta e o caso da cadeia de distribuição no Brasil. São estes cinco casos.

Risos e protestos do PSD.

Destes, já tomei a devida nota. Agradecia que o Grupo Parlamentar do PSD, se tiver mais dúvidas sobre mais

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2012 I SÉRIE - NÚMERO 6O

casos, queira ter a amabilidade de comunicar ao Governo, à Câmara e ao País, até à data e à hora que a Sr.ª Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano marque para a reunião com o Sr. Ministro de Economia, quais são os outros casos relativamente aos quais pretende esclarecimentos, para que possa ter a resposta cabal, como é importante que tenha, para que tudo seja claro e transparente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Luís Marques Mendes, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Mendes, como há pouco referiu, no início da sua intervenção, quase que foi impossível a um português, pelo menos aos que não têm acesso à TV Cabo, que quisesse ver televisão não de assistir ao Congresso do PSD.

Risos.

Por conseguinte, também tive de ouvir algumas passagens desse Congresso. E anotei que houve, de facto, um aspecto que esteve sempre no centro da discussão, a estratégia do poder. Isso esteve presente em todas as intervenções e em todos os debates que se fizeram: se era mais fácil aceder ao poder deste modo ou de outro; se era mais fácil ser já ou daqui a mais alguns meses; se era mais fácil ser sozinho ou acompanhado - bem ou mal, não faço apreciações desse género...
O que não ouvi foi uma discussão sobre estratégia de política alternativa. E. nesse aspecto, gostaria de colocar duas ou três questões. Isto é, se o PSD, depois do Congresso. aparece apenas como uma alternativa de poder ou como alternativa de política. Aí que se me suscitam as grandes dúvidas: quais são as alternativas de política? Qual é, por exemplo, a alternativa política definida pelo PSD para a educação?
Quando o PSD esteve no Governo criou a tese da taxa natural de desemprego e o actual Governo considera natural o desemprego. Há aí alguma alteração, alguma estratégia alternativa de política?
O PSD sempre referiu que era necessário precarizar o emprego para que a economia se desenvolvesse. Não vejo que haja grande diferença nessa matéria com o Governo actual, com a política actual, com a estratégia actual.
Há pouco, o Sr. Deputado referiu - e também foi referido no Congresso do PSD - a necessidade de aumentar o poder de compra dos reformados, VV. Ex.as, tirando o aumento havido em 1987, nos oito anos seguintes também não aumentaram o poder de compra dos reformados. É aí que reside a alternativa?!
A alternativa residirá, ao fim e ao cabo, para não dar mais exemplos, em medirem a vontade da governação pelos números de quilómetros de auto-estrada que cada um faz?! O governo que constrói 800 km é melhor do que aquele que promete construir 1000 km?! É esta a alternativa?!

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - É melhor o primeiro!

O orador: - O Sr. Deputado referiu, depois, a questão do poder económico, que aliás tem estado presente neste debate. Posso dizer-lhe que na altura em que o Sr. Deputado referiu os dois casos «cheirou-me a esturro». Aliás, cheirou-me a gás, mas o que não consegui cheirar foi aquele cheiro da Portucel,...

Risos do PCP.

... quando passamos pela fábrica, que é mais activo que o do gás.

Vozes do PS: - Mas também é gás!

O Orador: - De facto, na altura, não me tinha cheirado à Portucel, ou melhor à celulose, mas isto já está esclarecido.
Sr. Deputado Luís Marques Mendes, a questão central do PSD nesta matéria não é por a política global favorecer as grandes empresas, os grandes grupos económicos, porque esses os senhores também favoreceram. Será apenas por a política deste Governo favorecer mais uns grupos do que outros? Não será apenas por estes grupos não serem coincidentes com os outros grupos que terão sido eventualmente beneficiados antes, pelo seu governo?
Por último, o Sr. Deputado Luís Marques Mendes teve certamente um lapsus linguae na sua intervenção, quando disse que depois deste Congresso o Dr. Marcelo Rebelo de Sousa era o líder da oposição. Foi claramente um excesso, um lapsus linguae, pois não é certamente o líder da oposição. Não o foi até agora, nem o será! A oposição é muito mais vasta do que o PSD. Admito que tenha deixado de ser apenas o líder do PSD, que agora seja também o líder do PSD e do PP.

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Calma!

O Orador: - Será por isso que os Srs. Deputados do PP acharam por bem manter neste debate o prudente silêncio de Conrado?!

Aplausos do PCP.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Tenha calma, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, o primeiro comentário que gostaria de fazer é relativamente à sua primeira afirmação, de que no fim-de-semana era difícil ver outro programa de televisão que não fosse o Congresso do PSD. Sr. Deputado, como é sabido, público e notório, hoje, as televisões funcionam, em grande medida, em função das audiências. Ora, isso só significa que o País queria, verdadeiramente, ouvir o que se passava no Congresso do PSD. Muito obrigado.

Aplausos do PSD.

O segundo comentário tem a ver com o espanto do Sr. Deputado quanto à ideia de alianças. Vindo em particular do Sr. Deputado, que tem ao seu lado um colega que é aliado de outro partido na Câmara Municipal de Lisboa, não percebo qual é o espanto de V. Ex.a!

Risos do PSD.

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23 DE ABRIL DE 1998 2013

É o Sr. Deputado João Amaral, evidentemente, que cumprimento afectuosamente.
O terceiro comentário é sobre se temos uma estratégia política ou de poder. Sr. Deputado, temos as duas coisas. Temos uma estratégia para mudar de política acima de tudo, para mudar o rumo da política, a forma de fazer política, a substância da política, por contraste nítido e claro, como dali expus, em relação a este Governo que não governa, não reforma, não prepara o futuro.
Agora, é evidente que um partido central do sistema, como nós, quer mudar de política e tem obviamente a sua estratégia para alcançar o poder. Alcançar o poder não pelo poder, não para o exibir e muito menos para o traficar, mas para o exercer no cumprimento de um mandato e de um programa, responsabilizando-se perante os eleitores e os portugueses.

Aplausos do PSD.

Vozes do PS: - Demagogia!

O Orador: - O quarto comentário, Sr. Deputado, é relativo aos grupos económicos. Há uma diferença total entre os senhores e nós. Nós somos a favor de uma economia de mercado, de bons grupos económicos, porque somos defensores da economia de mercado e porque a competição internacional assim o exige. É bom, é positivo, é necessário, é desejável! Agora, somos contra o favorecimento de uns em detrimento de outros. Somos contra o facto de um governo não ter regras iguais para todos: a uns tudo exige, a outros tudo perdoa!
Aos portugueses em geral aplica mais impostos, a outros, grupos económicos, perdoa impostos. Em relação a alguns grupos económicos, que ainda por cima não são sequer, nem de longe nem de perto, a generalidade, o Governo tem, de facto, a deformação corporativa do favor, do privilégio e do compromisso, e dá aqui a ideia, um Governo dito socialista - e já tivemos outros exemplos, quando o PS, noutros tempos, também esteve no poder -, de que não há nada, nada!
Como pode um Partido Socialista no poder, rapidamente, se abraçar ao grande capital e fazer alguns exemplos de falta de clareza e de transparência, como aqui apontei? Mas o mais grave ainda é que, perante os factos, não os desmentem e alguns deles, que já aqui hoje referi e repeti à saciedade, não são sequer do último Congresso, vêm de há muito, muito tempo, o que significa que não têm explicação, o que significa que estão a criar aqui uma onda de suspeição muito grave.
Isto é muito mau para a vida política e democrática, pelo que estes casos devem ser de facto clarificados. O País tem direito a uma explicação!
Hoje, numa palavra, aquilo que se sente no País é isto: a riqueza aumenta para alguns, concentra-se cada vez mais em alguns, e distribui-se cada vez menos pela generalidade dos portugueses. E isto vem de um Governo socialista!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Barreiros.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Mendes, começam mal a aliança de direita.
O Sr. Deputado Luís Marques Mendes, ao fim de dois dias de debate, traz-nos aqui meia dúzia de calúnias e insinuações, dois ou três ataques sem qualquer fundamento, o que também nos levanta uma suspeição: o que é que o PSD andou aqui a fazer durante todo este tempo se tinha conhecimento de factos que diz serem tão graves? Por que é que não exerceu os seus direitos de oposição, através da constituição de comissões de inquérito? Ou esteve a guardar tudo para o discurso do líder?

Protestos do PSD.

Mas, como já aqui foi dito, esperamos que a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite convoque o mais urgentemente possível a Comissão de Economia, e aí terão a oportunidade de apresentar e de discutir, cara a cara com os Srs. Ministros, as tais coisas graves que não são capazes de concretizar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas do Congresso de Tavira, deste Congresso do PSD, sai só isto e nada mais?! É um muito mau começo para a aliança de direita, porque no Congresso de Tavira não se passou, naturalmente, só isto e este conjunto de calúnias, de insinuações, pretende disfarçar o essencial do que se passou no Congresso, ao qual todos estivemos atentos.
O PSD procedeu a uma alteração essencial na sua estratégia: até aqui procurava mobilizar o voto útil da direita; agora, após o seu Congresso, vai oferecer o partido à direita. VV. Ex.as, em Tavira, não elegeram um líder mas dois líderes, e, por acaso, até falaram mais do ausente do que do presente. Foi, aliás, muito interessante ouvir ontem o Dr. Paulo Portas a explicar-vos como é que se forma um partido de direita - embora ele seja mais especialista em destruí-los do que em construí-los, aos partidos, claro! Mas, enfim, lá vos explicou como é que se forma um partido de direita.
De facto, foi essa aliança de direita que de lá saiu, e não venham disfarçar o essencial desse debate político, recorrendo, sobretudo, a manobras de diversão. Assumam! Não é crime algum virar à direita, nem constituir um partido de direita!

Protestos do PSD.

Para nós, isso até traduz um esclarecimento essencial da vida política e é, no fundo, regressar à vossa crença natural.

Protestos do PSD.

Agora, um partido de direita, como pretendem constituir juntamente com o PP, é, em nosso entendimento, uma clarificação da vida política, mas é uma clarificação que vai ao arrepio do sentido dos portugueses. Em nosso entendimento, o PSD fez um discurso no sentido de que o País está numa desgraça, o que não corresponde de forma alguma à realidade. Até teve o desplante de dizer que este país, de oito séculos, corre o risco de se afundar se a aliança de direita não ganhar as eleições em 1999!
Mas não é este o problema, Sr. Deputado! O País não corre qualquer risco de se afundar, o PPD é que corre um risco muito grande de se afundar. E sabe qual é o vosso principal problema? É que o País está a verificar que quanto mais o PPD se afunda melhor está!

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2014 I SÉRIE - NÚMERO 60

Aplausos do PS.

Desde que deixaram de ser governo, os salários reais cresceram, as medidas concretas, em relação à pobreza, foram tomadas - é, aliás, curioso ouvir falar o PPD de pobreza, quando, como governo, nunca falou nesta matéria: foi até pena não terem reparado, enquanto estiveram no governo, que existia pobreza em Portugal, porque, com certeza, com um coração tão bondoso como o vosso, teriam tornado alguma medida...
Desde que vocês saíram do governo estamos a crescer acima da média europeia, o desemprego está a diminuir e o País está bem. Quer dizer, quanto mais o PPD se afunda, melhor está o País!

Aplausos do PS.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - É um país maravilhoso!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Acácio Barreiros, o primeiro comentário é ainda em relação à acusação, às suspeições, que de facto levantámos. Eu sei que o senhor considera mais cómodo discutir estas coisas um pouco à porta fechada, em comissão, mas nós preferimos discuti-las em plenário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Para a próxima semana está agendada uma interpelação ao Governo, na qual, perante todos os portugueses, terá de explicar e esclarecer esta situação.

Aplausos do PSD.

A segunda questão colocada por V. Ex.ª tem a ver com o virar à direita ou à esquerda. O primeiro comentário que isto me suscita é o seguinte: hoje, ouço o senhor - e já ontem ouvi o mesmo de um seu companheiro de partido - dizer: o PSD vira à direita! Depois, ouço um ministro do Governo que os senhores apoiam, dizer: o discurso do PSD parece o do Dr. Carlos Carvalhas! Então, em que ficamos? É à direita ou à esquerda?

Risos do PSD.

Dou-lhe um conselho, Sr. Deputado: entendam-se, organizem-se, não digam uns uma coisa e outros outra.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Até aconselharia que recomendassem ao Sr. Primeiro-Ministro que, numa das suas próximas passagens por Portugal, metesse ordem na «casa», pusesse todos a falar no mesmo sentido...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... e a rumar na mesma direcção.

Aplausos do PSD.

O terceiro comentário, Sr. Deputado, quanto ao virar à direita: isso seria de facto muito difícil. E sabe por quê? Porque esse espaço já está ocupado. Os senhores, nos últimos tempos, encarregaram-se de ocupar totalmente esse espaço...

Aplausos do PSD.

... e nós, mesmo que quiséssemos caminhar nesse sentido, corríamos o risco de ter já a poria encerrada, porque o PS tomou conta desse espaço, e até de encontrar lá o Ministro Pina Moura, que agora resolveu, num afã vertiginoso, passar do lado que todos conhecemos para o outro lado, que é a chamada direita dos interesses. Ora, eu não estou interessado em encontrar-me lá nem com os senhores nem o Ministro Pina Moura!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Mendes, assistimos neste Congresso do PSD, que, aliás, seguimos com algum interesse, pelo menos da minha parte, àquilo que foi o desvirtuamento das questões essenciais. VV. Ex.as criticaram duas ou três coisas, durante dois ou três dias.
A primeira questão foi a do diálogo, mas não era grave. Os senhores criticaram o diálogo na segurança social, que tinham deixado e publicitado como arruinada; os senhores criticaram o diálogo ao nível das forças da segurança e na sua reforma, que deixaram depauperadas de meios humanos e materiais; os senhores criticaram o diálogo ao nível da função da pública, querendo fazer esquecer que tinham preparado um vastíssimo plano de desemprego, que começava exactamente pelo quadro de excedentários.

Protestos do PSD.

E criticaram esse diálogo fazendo uma instigação clara e concreta ao conflito social, substituindo-se assim àquilo que já não existe na sociedade portuguesa, a um qualquer vulgar partido de extrema esquerda.

Protestos do PSD.

Em segundo lugar, os senhores demonstraram a insuportabilidade de estar na oposição. Porquê? Porque podiam, durante três dias (foram três dias perdidos!), ter avançado com ideias e propostas para o País. Mas os senhores, durante três dias, apenas fizeram uma coisa: o jogo da partilha, com outro partido da oposição, de um poder que não vão, por acaso, alcançar, tendo-se esquecido, «pataca a mim, pataca a ti», de falar de reformas essenciais.
Por exemplo, não falaram sequer numa proposta para a reforma fiscal - os senhores, que deixaram a maior injustiça e os maiores perdões fiscais do País; não falaram na reforma da justiça, tendo deixado as cadeias e os tribunais como ficaram; não falaram nas propostas para a saúde, tendo deixado a saúde no estado em que ficou; não falaram nas medidas para o emprego, que, durante dez anos do vosso governo, aumentou de 200 e tal mil desempregados para cerca de meio milhão, isto com o vosso Primeiro-Ministro, Cavaco Silva, e com alguns ministros que estão hoje sentados nessa bancada!

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23 DE ABRIL DE 1998 I SÉRIE - NÚMERO 2015

Por isso, meus caros Srs. Deputados, gostaria de vos dizer o seguinte: entre aquilo que os senhores fizeram e aquilo que nós estamos a fazer existe a diferença que há entre quem quer liderar ou confirmar essa coisa da liderança do PSD e de uma pseudo liderança da oposição, e quem quer, como o Governo e o PS, governar o País e conferir bem-estar aos portugueses.
Por último, coloco-lhe uma questão essencial: tendo ontem o Dr. Paulo Portas apontado uma metodologia, depois de um rasgadíssimo elogio ao novo líder do CDS-PP, PSD, PP, PSD, CDS-PP,...

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Está muito confuso, está!

Risos do CDS-PP.

O Orador: - ... enfim, depois de ter feito um rasgadíssimo elogio, gostaria de lhe perguntar qual a resposta a esta metodologia. É que o Dr. Paulo Portas já disse que «o PSD vai ter de se reunir connosco em cimeiras, para discutir, assunto a assunto» - aliás, assuntos nos quais têm grandes afinidades, como sejam os assuntos europeus - e, hoje de manhã, o PSD já veio dizer que quem marca o calendário e a metodologia é o PSD! Então, em que é que ficamos, com esta nova «Aliança Democrática»?

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para defesa da honra da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Afinal, sempre fala! Pensei que já só falasse o PSD!

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, a intervenção do Sr. Deputado José Junqueiro, aliás, como algumas outras intervenções anteriores, temos de o reconhecer, tinha como objectivo provocar a minha bancada. O meu pedido de defesa da consideração é, no entanto, muito tranquilo, porque VV. Ex.as bem podem esforçar-se mas nós não nos deixaremos provocar!
Contudo, temos de vos recordar aqui duas ou três pequenas coisas: no espaço de um mês, VV. Ex.as assistiram a dois congressos, de dois partidos que são soberanos e que adoptaram as estratégias, maioritariamente, que os seus militantes quiseram. Isso os senhores não podem ignorar!

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Não têm congressos! Não fazem congressos!

O Orador: - Queria dizer que os senhores, perante estes dois congressos, oscilam entre a graçola e a nervoseira. Façam o favor de nos revelar aqui o vosso verdadeiro estado de espírito: estão nervosos com estes congressos ou estão apenas com graçolas que não revelam outra coisa senão a vossa falta de espírito democrático?
Queria dizer-vos ainda o seguinte: com efeito, nestes dois congressos, abriu-se a possibilidade de diálogo entre dois partidos. E depois, Sr. Deputado?! E depois?! É isto que quero perguntar-lhe: o vosso nervosismo resulta do facto de o diálogo entre os partidos e dos partidos com a sociedade e com outras forças sociais ter deixado de ser um monopólio vosso? É essa a razão por que VV. Ex.as ficaram tão nervosos?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, tenho todo o gosto em dar as explicações necessárias e penso até que V. Ex.ª não terá ficado ofendido comigo, até porque, como sabe, as graçolas dos congressos não vêm da bancada do PS mas de dentro dos vossos próprios partidos, e são essas que, de alguma maneira, divertem o País.
Em segundo lugar, queria dar-lhe os meus parabéns por ter feito esta intervenção e ter pedido a defesa da honra da bancada, porque eu estava a pensar que isto já estava a funcionar bem e que o PSD já estava a falar também pelo PP ou pelo CDS-PP. Assim, ficámos esclarecidos de que as coisas, afinal, ainda não estão tão afinadas e que ainda há um pequeno espaço, por enquanto, para essa liberdade de pedir esclarecimento.
Sr. Deputado, para terminar, direi que temos imensa consideração mas VV. Ex.as, durante o vosso Congresso, tal como o PSD durante o respectivo Congresso, tiveram algo próprio da Aliança Democrática: é que VV. Ex.as também discutiram o poder mas foram incapazes, durante os dias dessa reunião, de apresentar ao País uma qualquer proposta daquelas que eu referi. O que está em causa é o poder, não é Portugal nem as vossas propostas para Portugal!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Namorado.

O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, talvez já tenham sido focadas os pontos nucleares, mas eu não resisto a colocar duas questões ao Sr. Deputado Luís Marques Mendes. Com a primeira, não posso deixar de colmatar uma injustiça que está a resultar deste debate: é que não se felicitaram os verdadeiros ganhadores do Congresso do PSD e, realmente, queria começar por felicitar os Drs. Durão Barroso e Santana Lopes por terem conseguido escapar da liderança do PSD!
Na verdade, eles conseguiram enfraquecer a liderança do Dr. Marcelo Rebelo de Sousa sem terem caído no lugar onde ele está. De facto, o actual líder do PSD enfrentava um problema difícil: ele considerava escassas as hipóteses de poder ganhar qualquer eleição em 1999 mas não tinha meios de se libertar dessa situação; então, optou por uma de duas saídas: ou reforçava a sua liderança e plebiscitava a sua proposta política, ou saía da liderança e entregava «a batata quente» a um dos seus sucessores anunciados.
Forçados a sair da toca, os seus sucessores anunciados aplicaram, no entanto, uma receita inesperada: enfraqueceram, de uma maneira dramática, a posição política do Dr. Marcelo Rebelo de Sousa mas auto-esvaziaram-se como alternativas possíveis, e o que ficou no terreno foi uma alternativa entre a liderança enfraquecida do Dr. Marcelo Rebelo de Sousa e o vazio! Ora, perante esse vazio, ele ficou condenado a suportar o resto do mandato até 1999! Na verdade, ele foi forçado a recuar porque, da proposta de aliança com o CDS-PP. apenas sobreviveu uma nebulosa política, onde até o CDS-PP cabe! Foi essa a condição para conseguir o que pretendia e, feliz coinci-

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2016 I SÉRIE - NÚMERO 60

dência, com um voto a mais do mínimo exigido para não se demitir!
Por outro lado, o recuo foi consumado quando o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa foi forçado a esquecer a outra componente da exigência, que era ter no Conselho Nacional um nível de apoio idêntico àquele com que a sua moção foi aprovada, porque, de facto, ele tem aí a menor maioria possível, ele tem um pálido voto de vantagem no Conselho Nacional. Podemos dizer que essa é «uma batata quente» que ficou agora na mão do Prof. Marcelo Rebelo de Sousa mas com menos condições do que o que tinha antes. Assim, a minha pergunta é esta: Sr. Deputado Luís Marques Mendes, como apoiante do Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, acha que tem alguma razão para se congratular?
A outra questão foi-me sugerida por algo que já foi aqui dito e sublinhado por V. Ex.ª. Recentemente, constatámos que o PSD considerava que ser de direita era um qualificativo negativo, era um qualificativo desprimoroso. Verificámos, afinal, que o problema do PSD é de má consciência: não se aceita como aquilo que é, isto é, um partido de direita! Agora, percebemos por que é que têm essa tendência de saltitar: bate primeiro à porta da Internacional Socialista, peregrina depois por alguns grupos europeus, ancora-se agora, para já, na Democracia Cristã! A pergunta que me sugere este problema é a seguinte: então, mas se ser de direita, se ser reaccionário é um defeito para o PSD, por que perverso masoquismo político VV. Ex.as vão procurar alternativar-se com um partido confessadamente de direita, que não tem complexos em ser de direita e aceita aquilo que parece e que é? Como é que combinam esta dicotomia?
Por último, uma referência muito passageira perante algo em que os senhores têm insistido, ou seja, de que o PS não governa, de que o futuro é negro. Os vaticínios de VV. Ex.as, de 1995 até hoje, têm, desde já, um denominador comum: nenhum se cumpre!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça favor de terminar.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Dado que VV. Ex.as consideram ser um defeito básico a ausência de reformas estruturais, apenas lembramos a VV. Ex.as que já foi com essa «música» que romperam o Bloco Central, mas foram depois para o poder durante 10 anos, oito dos quais com maioria absoluta, e durante esses 10 anos esqueceram-se das reformas estruturais. Logo que estiveram em condições, não as realizaram, mas exigem-nas agora ao PS. Acha que é política e eticamente sustentável exigir aos outros aquilo que foram incapazes de fazer durante 10 anos?

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o entusiasmo é grande, mesmo antes de eu começar a falar! Muito obrigado!

Risos do CDS-PP.

Com uma invulgar falta de seriedade e rigor, o Dr. Luís Marques Mendes trouxe a esta Câmara um conjunto de insinuações aleivosas e descabeladas suspeições. Espero que estes assuntos da área económica, onde o Dr. Luís Marques Mendes se mexe manifestamente de forma ainda mais desajeitada do que o habitual, e sobre os quais a informação de que disponho é a de que foram feitos com a maior correcção, sejam devidamente analisados e não sejam esquecidos na Comissão de Economia, Finanças e Plano ou onde quer que sejam tratados. Estou perfeitamente certo de que, no que toca à Comissão de Economia, Finanças e Plano se verificará a correcção da actuação do Governo nestes domínios. Espero, mesmo, que não deixe cair estes assuntos, ao contrário das audições da Siemens, onde «a montanha pariu um rato» e há dois anos que as audições estão paradas! Estamos disponíveis, como já foi dito, para esclarecer estes assuntos na Comissão de Economia, no Plenário, onde quiserem. Temos a consciência tranquila!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - No fim, ficará claro que a estratégia energética do Governo é correcta, que a estratégia da política de privatizações é a adequada e que a estratégia de internacionalização é a correcta e é concretizada por políticos, por técnicos e por gestores de gabarito.
A Comissão de Economia, Finanças e Plano, Sr. Deputado Luís Marques Mendes, contrariamente ao que V. Ex.ª julga, tem as portas abertas para tratar destes assuntos. Se já lá foi o Dr. Luís Marques Guedes, V. Ex.ª também pode entrar!
Ora bem, o que é que procura o Dr. Luís Marques Mendes, com estes ataques descabelados às áreas económicas por parte de um partido de direita? Procura o eleitorado do lumpen, que bebe da demagogia, com uma política de direita e uma linguagem esquerdista. Isto porque, no meu entender, o líder que os senhores acabaram de eleger não é o herdeiro de Cavaco, nem sequer de Maquiavel; a inspiração bebe-a em César Bórgia! E só fala da forma que fala, porque sabe que nunca irá governar. E, aqui, o seu líder parlamentar segue a máxima «calunia, calunia, que sempre alguma coisa fica». Porque, neste domínio como noutros, mas aqui com particular gravidade, o vosso interesse não é esclarecer mas tentar confundir!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Mendes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Sr. Presidente, nesta minha última intervenção, nesta tarde, queria começar por constatar o seguinte: cinco vice-presidentes da bancada a colocarem-me questões, mais a ajuda de um ministro, e os senhores conseguem esta coisa extraordinária - falar, falar, falar, falar sem dizer coisíssima nenhuma e, sobre as questões concretas, rigorosamente nada. É, de facto, mau demais para parecer verdade.

Aplausos do PSD.

Chega quase a meter dó! É mau demais para parecer verdade!
E, de facto, estiveram todos atentos, no passado fim-de-semana, ao que parece, ao nosso Congresso, mas a conclusão primeira que se tira é a de que continuam sem perceber e sem aprender nada. E, de facto, mau demais para parecer verdade!

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Em segundo lugar, o Sr. Deputado José Junqueiro ainda não percebeu, ao fim de dois anos e meio, que o Governo está no poder e, por isso, é suposto governar. Quem chega ao poder é suposto não exibir o poder mas exercê-lo; é suposto não apenas ocupar o poder mas trabalhar na execução do programa a que se mandatou.

O Sr. José Junqueiro (PS): - E a reforma fiscal?! E a reforma da segurança social?!

O Orador: - Fala o Sr. Deputado na reforma fiscal, na reforma da segurança social, na reforma da justiça... Mas quem é que está no poder? Os senhores pensam que alguma vez vão connosco criar uma nova «União Nacional»? Disso estão livres! Por aí não vão bem!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Rui Namorado esteve aqui a dissertar sobre a nossa estratégia política. Um dia destes, ainda vamos ter de lhe arranjar um lugar num congresso para ir lá dar o seu contributo, tal a vontade e o afã com que quer discutir as questões internas do PSD!

Risos do PSD.

Em particular, vi-o preocupado não tanto com a estratégia e com as propostas mas mais com as listas e, portanto, vamos tentar, no futuro, encontrar uma forma de conciliar essa sua pretensão!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É que há listas de Deputados para escolher daqui a uns tempos e, portanto, é natural que essa sua preocupação tivesse vindo ao de cima!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas os Srs. Deputados Rui Namorado e Joel Hasse Ferreira deram-me oportunidade de eu dizer isto, agora em tom mais sério porque é mais grave: o que o líder do meu partido disse há dias e aquilo que eu hoje aqui acrescentei, com exemplos e factos concretos, não são bagatelas, não são casos para se tratarem como coisas menores, nem são casos apenas e só ou fundamentalmente de questões económicas, são, acima de tudo, questões de natureza política muito sérias ....

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - E éticas!

O Orador: - ... são, sobretudo, questões de natureza ética. Não é uma questão de direita ou de esquerda, é uma questão de ética, de princípios e de convicções. E porque esta é uma questão muito séria, os senhores vão ter de se habituar a esta coisa muito simples: o Governo, já que os senhores não são capazes, porque nunca percebem o que se está a passar ou, se percebem, têm de ficar calados porque não conseguem, de facto, desmentir, tem de dar aqui, e não lá, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, explicações convincentes ao País. O que está a acontecer em algumas situações ou é esclarecido de uma forma cabal ou é clarificado de uma forma profunda ou isto é, de facto, eticamente deplorável.
E desde já lhes digo o seguinte: o líder do meu partido apontou alguns exemplos, eu acrescentei hoje mais alguns, mas é bom que se preparem, porque «a procissão ainda vai no adro».

Aplausos do PSD.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra. Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para comunicar à Assembleia da República um facto que me parece da maior relevância. Refere-se a Timor e é o seguinte: no dia 1 de Abril, um conjunto de representantes do Estado de New Jersey apresentou um projecto de resolução no Senado dos Estados Unidos da América.
Esse projecto de resolução visa que os Estados Unidos da América suportem um referendo internacionalmente supervisado em Timor para determinar o estatuto político de Timor Leste, reconheçam a necessidade da participação directa dos timorenses nas negociações tripartidas e trabalhem activamente para, para junto das Nações Unidas e dos seus aliados, fazer com que se concretizem. tão depressa quanto possível, as resoluções que as Nações Unidas já tornaram sobre Timor Leste.
Sr. Presidente, é a primeira vez que uma resolução destas chega à Câmara dos Representantes dos Estados Unidos da América, subscrita por um conjunto significativo de representantes.
Quero participar isto à Assembleia da República, dada a relevância que me parece envolver este documento, e dizer que tomei conhecimento dele através de uma organização existente nos Estados Unidos da América LAMETA -, constituída por nossos concidadãos que aí vivem, aí trabalham e aí têm desenvolvido uma acção relevantíssima em tornar evidente a razão de Timor Leste.
Peço que esta Assembleia reconheça o valor desses nossos compatriotas e quero dizer que eles próprios estão a desenvolver uma acção junto de todas as comunidades dos Estados Unidos da América para que pressionem os seus representantes e os seus senadores para apoiarem esta resolução.
A Assembleia da República, através da Comissão Eventual para Acompanhamento da Situação em Timor Leste, já pediu ao Governo para que o embaixador em Washington contacte directamente os representantes das várias comunidades e, em nome da Comissão, eu próprio escrevi a todas as comunidades portuguesas nos Estados Unidos da América para que se desencadeie, tão depressa quanto possível, o máximo da pressão de que formos capazes sobre o Senado e a Câmara dos Representantes.
Não quero esconder a relevância e a importância que poderá resultar da aprovação desta resolução e pedia a todos os partidos e a todos os Srs. Deputados que, de uma maneira ou de outra, possam ter influência junto das comunidades portuguesas nos Estados Unidos da América que, nos próximos dias, desencadeiem todas as acções possíveis para que todos os senadores e todos os representantes sejam tocados em favor de Timor Leste.

Aplausos gerais.

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2018 I SÉRIE - NÚMERO 60

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado Nuno Abecasis, pela informação que nos trouxe, que se reveste, de facto, da maior importância.
Agradecia-lhe que me fizesse chegar o texto concreto dessa informação para também eu ver o que posso fazer em prol de uma atitude de lobbying, que agora parece que começam a ser permitidas, legalizadas e até tão autorizadas. Só em Washington há 30 000 empresas de lobbying.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do voto n.º 1O9/VII - De pesar pelo falecimento da Eng.ª Virgínia Moura, apresentado pelo PCP e PS.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

Faleceu no passado dia 19 de Abril uma das figuras maiores da resistência contra a ditadura e do combate pela liberdade e pela democracia.
Ao longo dos 82 anos da sua vida, a Eng.ª Virgínia Moura esteve sempre na primeira linha de todos os grandes momentos e lutas pela liberdade. Participou nas candidaturas à Presidência de Norton de Matos, Ruy Luís Gomes, Arlindo Vicente e Humberto Delgado. Participou no MUNAF, no MUD, na Associação Feminina Portuguesa para a Paz, no Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, no Movimento Democrático Nacional.
Foi duramente perseguida pela ditadura, tendo-lhe sido negado o acesso à Função Pública e tendo sido presa pela PIDE 15 vezes.
O seu empenhamento político traduziu-se na sua adesão ao Partido Comunista Português, partido onde militou activamente até à sua morte e a cujo Comité Central pertenceu ainda no tempo da clandestinidade.
Como mulher, foi a primeira na obtenção da licenciatura em engenharia civil e sempre se afirmou, na sua prática de vida, como uma lutadora activa contra as discriminações e pelo exercício sem complexos nem temores dos seus direitos de plena cidadania.
Como figura do mundo da cultura, desenvolveu intensa actividade em jornais e revistas, com o pseudónimo de Maria Salema. Promoveu a edição da revista Sol Nascente e diversas conferências, com a participação de Teixeira de Pascoaes, Maria 15abel Aboim Inglês e Maria Lamas.
A Eng.ª Virgínia Moura era uma mulher do Norte, nascida em Guimarães, mas vivendo toda a sua vida no Porto. Sempre os trabalhadores, o povo, as mulheres do Porto, contaram em todas as suas grandes e pequenas lutas com a sua determinação, a sua coragem, o seu empenhamento na causa da justiça, do progresso e da liberdade.
A Eng.º Virgínia Moura viveu com o companheiro de sempre, o Prof. Lobão Vital, também já falecido, com quem partilhou uma história de profundo amor e entendimento, dando à sua vida uma dimensão humana particularmente tocante e rica.
A Eng.ª Virgínia Moura foi distinguida em vida com a Ordem da Liberdade, tendo recebido também a Medalha de Honra da Cidade do Porto e do Movimento Democrático das Mulheres.
Na hora do seu falecimento, a Assembleia da República evoca a sua exemplar figura de mulher e lutadora pela liberdade e manifesta a sua profunda mágoa e pesar, que transmite à família enlutada, aos amigos de sempre, à cidade do Porto, que foi sua.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Baptista.

O Sr. Pedro Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Conhecemos Virgínia Moura quando, pouco mais do que crianças, despontávamos para a consciência de que as coisas não tinham de ser como eram e de que, para deixarem de o ser, era preciso lutar pela liberdade.
Desde a primeira hora, em Virgínia Moura, a figura, o gesto, a palavra, o sorriso, o riso ou o esgar determinado em reuniões clandestinas, em realizações republicanas e democráticas ou frente-a-frente com as ordens do terror fascista da polícia de choque, da Legião ou da PIDE, tornaram-se para nós, como para muitos outros, um modelo, uma referência. Referência pela voz altissonante na ditadura do silêncio; referência pelo colorido de ousar pensar no império do cinzento; referência pela altivez combatente, quando campeava o medo e os mais fracos soçobravam, corcovando-se, referência pela alegria quando partia
para as lutas, certa de que, pela causa da liberdade, tudo valia a pena; referência pela solidariedade, generosidade, palavra amiga, reconforto, quando a repressão marcava com as suas sequelas.
Toda a minha geração, em particular a portuense, foi marcada decisivamente pela figura de Virgínia Moura. Não são palavras de conveniência, são palavras de verdade que quero comunicar a todos os Srs. Deputados e, em particular, aos Srs. Deputados do PCP, tanto que, quando o rodar do tempo e a liberdade de pensar nos separaram, em todos nós se manteve o respeito e a admiração, manteve-se a referência do desprendimento da Eng.ª Virgínia Moura e da sua entrega indómita ao combate antifascista.
E quando, nas masmorras, enfrentávamos as provas da solidão, a imagem da Eng.ª Virgínia Moura, que tantas vezes por elas tinha passado, ajudava-nos a sentir que, afinal, solitário rimava com solidário e enfrentávamos não a solidão mas a prova da solidariedade.
Em meu nome e em nome do PS, expresso o testemunho da solidariedade com o PCP nesta hora de luto pelo falecimento da sua militante Eng.ª Virgínia Moura e anuncio o apoio do PS ao voto de pesar apresentado.
Guimarães da sua nascença, o Porto de toda a sua vida e Portugal de toda a sua causa estão mais pobres com a morte de Virgínia Moura! Mas se, como disse o poeta, «há mortes que pesam como as montanhas», a de Virgínia Moura tem o peso das do País inteiro, que perduram como exemplo de uma vida para sempre!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em nome do Partido Popular, associar-me a este voto de pesar pelo falecimento da Eng.ª Virgínia Moura.
Separavam-nos da Eng.ª Virgínia Moura todas as convicções políticas, mas, nesta altura, é importante salientar que ela teve a coragem de, numa altura onde mais fácil era resignar-se, onde mais cómodo era calar-se, onde o difícil era lutar, e lutar por aquilo em que acreditava e que seria, na sua óptica, o melhor para a sua cidade e para o seu país, estar sempre na linha da frente, na linha da coragem e na linha da luta.
Se a política é feita essencialmente de combate, há, sinceramente, que, nesta altura, elogiar todos aqueles que lutam por aquilo em que acreditam, da forma desinteres-

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sada como o fez sempre a Eng.ª Virgínia Moura. Ficou, pelo menos, o exemplo de uma pessoa com a qual não concordávamos politicamente, mas tínhamos, seguramente, de a admirar pela sua coragem e pela sua diferença.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em nome de Os Verdes, expressar as nossas condolências ao PCP pela perda de uma das suas mais destacadas dirigentes.
Julgo, além do mais, que a Eng.ª Virgínia Moura, mais do que uma grande e histórica militante do PCP, é, seguramente, alguém que é património de toda a resistência antifascista em Portugal, no sentido em que a sua personalidade inconformista, viva, lutadora e corajosa, que marcou gerações, passa para além dessas gerações como um exemplo das mulheres que, com coragem, agiram e lutaram em defesa dos seus ideais.
É perante essa mulher e as muitas mulheres que, seguramente, nela revêem um exemplo de coragem que, em nome de Os Verdes, quero exprimir as nossas sentidas condolências.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero agradecer aos Srs. Deputados que intervieram - muito particularmente ao Sr. Deputado Pedro Baptista mas também aos Srs. Deputados Silvio Cervan e Isabel Castro - a forma como aqui se expressaram sobre a Eng.ª Virgínia Moura, realçando a sua figura de humanista, de combatente pela liberdade e de mulher.
A minha camarada Virgínia Moura faleceu e o País, como disse, e muito bem, o Sr. Deputado Pedro Baptista, ficou mais pobre. É e a Virgínia Moura era uma força de alma enorme. O Óscar Lopes conta, numa entrevista que deu acerca do falecimento da Virgínia Moura, que, quando estavam presos, a Virgínia falava tão alto para os «pides» que se ouvia pela cadeia toda, e que, com isso, dava força aos outros. Ele conta: ela usava uns sapatos altos, batia com os tacões no chão com força e falava-lhes alto. É que ela era uma mulher de coragem, transparente, de rosto bem firme, olhando de frente a vida, olhando-a com a determinação e a coragem que emprestou a todos os seus actos.
Mas a Virgínia Moura, que era uma mulher de liberdade, sempre se cingiu ao quotidiano do povo com quem viveu, fundamentalmente o povo do Porto. E julgo muito importante lembrar aqui que a Virgínia era uma porta sempre aberta para todas as causas, tanto as grandes, as que tinham a ver com os grandes movimentos, como as pequenas, por mais pequenas e mais humildes que fossem. Em todas elas, ali estava a Virgínia, disponível, compatível, com o seu sorriso e a sua determinação.
Quero ainda lembrar aqui um outro aspecto, que está registado no voto e nos dá uma outra componente. A Virgínia era uma lutadora da liberdade, da democracia, da resistência e, às vezes, as pessoas ficam limitadas a esse campo. Porém, a Virgínia era uma grande alma de mulher, pelo que talvez também seja importante assinalar aqui como ela viveu, todos esses anos, com o Arq.º Lobão Vital um grande e profundo amor. Um amor de mulher e de homem, juntos combatendo em todas as circunstâncias. Em todos os sítios, se podia ver o Lobão Vital - também já falecido - e a Virgínia Moura, lado a lado, os dois com o mesmo empenho e os dois com um grande e mútuo amor, o que é sinal de muito humanismo.
Por isso, quando aqui nos despedimos da Virgínia Moura, despedimo-nos de uma resistente, de uma lutadora, de uma grande mulher, de um grande ser humano.

Aplausos do PCP e do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero juntar a minha voz à de todos os Srs. Deputados que exaltaram a figura de Virgínia Moura. Conheci-a através de um irmão de minha mãe, o Prof. Rodolfo Abreu, já falecido, que era também do Partido Comunista. Irradiava dela uma força muito impressiva, que não deixava ninguém indiferente. Ela foi, de facto, uma referência de coragem e de combatividade na minha juventude - e até muito depois disso -, viveu por ideias e ideais e morreu com eles.
Quero juntar a minha voz aos sentimentos de pesar do Partido Comunista, endereçando quer ao partido, na pessoa do Sr. Secretário-Geral, quer à família enlutada os meus sentidos pêsames.
Srs. Deputados, vamos votar o voto n.º 1O9/VII - De pesar pelo falecimento da Eng.ª Virgínia Moura, apresentado pelo PCP e PS.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos guardar um respeitoso minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ler, agora, o voto n.º 110/VII - De pesar pelo falecimento do Prof. Doutor Pereira de Moura, apresentado pelo PCP, PS e PSD.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

Francisco Pereira de Moura foi uma eminente figura de economista, de respeitado professor, de interveniente político e cívico extremamente dedicado e empenhado.
Tendo estudado engenharia, muito novo, rapidamente evoluiu para a área dos estudos de economia, onde se notabilizou pela importância, qualidade, rigor e capacidade de investigação e divulgação. Foi um divulgador do saber, um investigador e um questionador do saber organizado; mas foi essencialmente um pedagogo e um formador. Não têm conta o número de economistas e outros profissionais das áreas económicas, laborais e empresariais que beberam os ensinamentos do Prof. Pereira de Moura e que os utilizaram para desenvolver e aprofundar a sua reflexão. O ensino da economia no ISEG e em Portugal muito ficou a dever ao magistério do Prof. Pereira de Moura, é justo reconhecê-lo.
O Prof. Doutor Pereira de Moura foi também uma figura de eminente cidadão, política e civicamente interveniente.
Usou a sua função de Procurador à Câmara Corporativa para contestar o antigo regime e lutar pela sua evolução. Confrontado com o imobilismo do regime ditatorial, não hesitou, a partir de 1968, em contestá-lo abertamente. Na

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Comissão Promotora de Voto, nos Congressos de Aveiro e nas campanhas eleitorais de 1969 e 1973, militou na Oposição Democrática, lutando frontalmente contra o regime de Salazar e Marcelo Caetano. A sua coragem e verticalidade custou-lhe mesmo a demissão da Universidade e da Função Pública, na sequência da sua participação na vigília contra a guerra colonial na Capela do Rato.
Após o 25 de Abril, ocupou funções governamentais, mas rapidamente recentrou a sua atenção no ensino, na divulgação e na investigação em ternas económicos.
A Assembleia da República homenageia a memória do professor e do cidadão Francisco Pereira de Moura.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, gostaria aqui de recordar e de homenagear a memória do Prof. Francisco Pereira de Moura.
Recordo-o fundamentalmente como professor. Foi meu professor como o foi de várias gerações que passaram pelo antigo ISCEF e era um daqueles professores que, dando aulas de economia, logo no primeiro ano, nos «abria» o desejo e a vontade de estudar economia. Não sei se o maior elogio que poderei fazer ao Prof. Francisco Pereira de Moura, enquanto professor, não será o de que ele era um daqueles professores a cujas aulas nunca tínhamos vontade de faltar. Era um homem que, desde o início, nas suas lições de economia, nos mostrava, ao expor, sem ser necessário dizê-lo expressamente, que a economia não era uma ciência tecnocrática, não existia de si para si e por si, mas tinha sempre um fim e um objectivo social. Aliás, tive oportunidade de assistir à sua última aula e também aí, no que diria ter sido talvez a sua última brilhante aula de economia, ele manteve-se fiel a esses princípios.
Recordamos ainda o Prof. Francisco Pereira de Moura como cidadão, cidadão interveniente, a partir do momento em que perdeu toda e qualquer veleidade de que pudesse haver uma alteração positiva na vida política e social do País, vinda de dentro do próprio regime. Ao assumir e ao convencer-se disso, não teve a mínima dúvida em publicamente se apresentar como um opositor e lutar para que a liberdade pudesse regressar ao nosso país.
São estas as razões que, de momento, me parecem mais poder suscitar o nosso reconhecimento à memória de Francisco Pereira de Moura.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Prof. Doutor Francisco Pereira de Moura foi um homem de coragem que deixa na sociedade portuguesa o exemplo da integridade pessoal, de quem se bate por ideais, por princípios, sacrificando a sua vida pessoal em prol dos valores da solidariedade, da liberdade e da justiça social.
Foi um excelente economista, que, nas suas salas de aula, no ISEG, deixou um legado de conhecimentos para todos quantos com ele de perto tiveram oportunidade de privar. Foi um verdadeiro pedagogo e formador.
0 Prof. Doutor Francisco Pereira de Moura foi um exemplo de cidadão, política e civicamente, participativo. Mesmo fazendo parte da Câmara Corporativa, foi um crítico do antigo regime, lutando por um Portugal desenvolvido, evoluído, justo, solidário e livre.
Militou na Oposição Democrática, onde enfrentou corajosamente o regime de Salazar e Marcelo Caetano. Lutou pela mudança que urgia em Portugal e, após o 25 de Abril, apesar de ter ocupado funções governamentais, voltou a dedicar-se ao ensino e à investigação no domínio económico.
0 Partido Socialista associa-se a este voto de pesar, homenageando nesta Câmara um homem que deixa saudade a todos os portugueses, em particular àqueles que lutaram por um regime democrático em Portugal.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Sr. Prof. Francisco Pereira de Moura notabilizou-se na vida pública portuguesa não só pela sua actividade política mas, fundamentalmente, pela sua actividade docente e como economista.
Não se estranha que eu não tenha qualquer afinidade de natureza política com o Prof. Francisco Pereira de Moura. No entanto, sempre admirei a sua coerência de vida em relação às suas ideias e a sua honestidade intelectual na forma como as defendia.
Colaborei muito de perto como o Prof. Francisco Pereira de Moura quando ele teve a iniciativa de impor junto das instituições, na altura consagradas, o primeiro exemplo de gestão democrática da escola, concretamente da Escola Superior de Economia. Participei com ele nessa experiência e dela tenho uma grata recordação. Mas especialmente gostaria de evocar o Prof. Francisco Pereira de Moura como economista e professor. Considero que o Prof. Francisco Pereira de Moura revolucionou o ensino da economia neste país, na medida em que, naquela época, o ensino da economia, o seu conteúdo, era muito controlado, a visão dada dos diferentes sistemas económicos não abrangia todos aqueles que eram susceptíveis de ser conhecidos e foi o Prof. Francisco Pereira de Moura quem, pela primeira vez, introduziu na escola uma maior visão e, portanto, um diferente conteúdo na análise da ciência económica.
É com alguma emoção que recordo o Prof. Francisco Pereira de Moura e julgo que ele será um exemplo para todos os professores que passaram por aquela Escola. Ele revolucionou não só o conteúdo da ciência económica como, muito especialmente, a forma como se relacionava com os alunos. Nesse aspecto, ele foi um exemplo que dificilmente será superado.
À família apresento os meus sentidos pêsames.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

0 Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 País perde sempre quando desaparece um dos seus notáveis, um dos seus ilustres.
Não sou economista nem formado na escola de Lisboa; pessoalmente apenas posso dizer que, desde que me recordo, ouvi junto dos meus próximos falar do Prof. Pereira de Moura e ouvi falar bem.
0 Prof. Francisco Pereira de Moura, embora estivesse nos antípodas das nossas convicções políticas, foi indiscutivelmente um democrata e um cidadão atento à realidade que o circundava, aos problemas e às perplexidades próprias dos diversos tempos que viveu.

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Francisco Pereira de Moura - e este aspecto é-me muito grato assinalar - foi também um universitário, um investigador e um pedagogo. São estas qualidades, que demonstrou no exercício não só da cidadania e da intervenção política como do munus universitário e de investigador na área da economia, que aqui evocamos e queremos registar neste momento, associando-nos ao voto de pesar que a Assembleia da República vai votar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero dizer-vos que também conheci o Prof. Francisco Pereira de Moura. E conheci-o antes de o conhecer, pois, não tendo podido faltar às suas aulas porque não fui seu aluno, nunca «faltei» à leitura dos seus textos. Ele ajudou-me a perceber algo de economia, o pouco que fui começando por perceber, e senti que ele reabilitou, de facto, a ciência económica da imagem negativa que lhe impunha o regime de então. Ele fazia comigo - e com todos os que lutavam e resistiam - parte daquele partido, de muitos partidos, que se opunha ao partido único. E, quando o conheci, no I Governo Provisório, estava ansioso por conhecê-lo pessoalmente. Ele não me desiludiu: verifiquei que ele tinha uma personalidade forte e só ia por onde queria. Esse facto ficou bem marcado num conflito que teve com o, então, Presidente da República, que lhe impunha que ele fosse de gravata às reuniões do Conselho de Ministros. Ele resistiu sempre ao uso da gravata, pelo que acabaram por fazer uma transacção na base da camisola de gola alta. Naquele momento, foi a única salvação para a República. Não houve outra hipótese de lhe impor a gravata, porque a gravata, para ele, tinha o significado de uma coleira ou coisa parecida.
Fiquei com a imagem de um homem com uma personalidade muito forte e rica e arquivei para sempre uma grande admiração por ele neste momento transmudada em saudade, como é óbvio.
Damos assim os nossos sentimentos de pesar ao PCP e à família enlutada.
Srs. Deputados, vamos, então, votar o voto n.º 110/VII.
De pesar pelo falecimento do Prof. Doutor Pereira de Moura, apresentado pelo PCP, PS e PSD.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos guardar um minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

Srs. Deputados, o voto será transmitido à família enlutada e, aproveitando a presença do Sr. Secretário-Geral do PCP, peço-lhe que se considere notificado.
Srs. Deputados, vamos passar ao debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar ao CDS-PP, sobre a situação da saúde em Portugal e perspectivas de futuro.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.º Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Saúde: Julgo que é a primeira vez nesta legislatura que V. Ex.ª vem a um debate de urgência sobre a saúde e folgo que a iniciativa tenha partido da minha bancada.
Não agendámos este debate para falarmos de se e como vai V. Ex.ª reformar, mas, sim, para falarmos de se e como vai V. Ex.ª governar. Ou seja, para que nos responda que fez a Sr.ª Ministra com o Serviço Nacional de Saúde, este Serviço Nacional de Saúde - que lhe foi entregue há mais de dois anos, com os seus 500 estabelecimentos, 100 000 trabalhadores e 800 milhões de contos de orçamento.
A sua obrigação era a de gerir o sistema, arrumá-lo, reorganizá-lo e, para tal, do nosso ponto de vista, não precisa de reformas; precisa de vontade, de decisão e de priorização. Aliás, queremos deixar politicamente bem claro que a nossa disponibilidade para um pacto de regime não invalida uma posição de protesto relativamente a esta inércia governamental, pois, para nós, as reformas são essenciais, mas por outras razões. As reformas não podem, em circunstância alguma, constituir alibis para essa inércia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra: Elenquei alguns aspectos muito concretos e começaria pelos recursos humanos. São suficientes, mas estão mal distribuídas ou são insuficientes? Dizemos que 700 000 pessoas em Portugal não têm médico de família só nó distrito de Lisboa 16 000 e no distrito de Setúbal 170 000.
Sabe-se que existem 2500 médicos que têm o seu futuro em cheque. Então? Se os médicos estão mal distribuídos, o que vai fazer para distribuí-los melhor? Se são insuficientes, o que vai fazer para colmatar essas insuficiências? Como pensa V. Ex.ª resolver o problema das urgências sem que antes os cuidados de saúde primários dêem resposta suficiente? E como pode transferir cerca de quatro milhões de consultas das urgências para os cuidados primários se estes não têm médicos, partindo do princípio de que essas consultas, não sendo urgentes, são, contudo, necessárias? Pensa que, neste primeiro nível, será necessário incluir algumas especialidades de acordo com as necessidades mais frequentes da população? Já agora, diga-me Sr.ª Ministra: é preciso uma reforma estrutural para resolver esta questão? Julgamos que não!
Quanto às listas de espera. Devem-se a quê? À falta de médicos? À falta de pessoal administrativo ou de enfermagem? A períodos reduzidos de consulta? A maus circuitos? À baixa utilização das instalações e dos equipamentos? À falta de recursos? Se sim, quais? Será necessário reformar para conseguir uma efectiva capacidade de resposta com aquilo de que dispomos? Julgamos que não! E neste quadro de desorganização e carências, como pensa resolver a velha questão da subversão das funções hospitalares?
Quanto ao défice, ele deve-se ou não a um subfinanciamento? Não sabemos! No documento da reforma, apresentado pelo Sr. Primeiro-Ministro, e da responsabilidade do seu Ministério, não se vislumbra um número, uma única projecção.
Também não sabemos como o Sr. Ministro das Finanças prevê o crescimento do sector da saúde e o seu peso relativo no conjunto do sector público administrativo. Qual é, afinal, a política orçamental do seu Governo relativamente à saúde?
Também, em bom rigor, não sabemos quanto custa a saúde, mas tão-só quanto gasta - aliás, também não sabemos como gasta.
O Serviço Nacional de Saúde precisa de mais financiamento ou a «arrumação» e reorganização do sistema, com consequentes ganhos de eficiência e redução da taxa de desperdício, seriam suficientes, sobretudo se juntássemos a isso o reforço da equidade, o que tem ganhos, como sabe, e se conseguíssemos acabar com o chamado doente múltiplo pela sua ligação imediata ao respectivo financiador? Medidas simples, como a do famigerado «car-

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tão de utente», que não sabemos onde está e como está, como a política integrada do medicamento e a introdução de indicadores de gestão.
Quanto à prestação de cuidados de saúde, a situação é paradigmática. V. Ex.ª apresentou um projecto que mantém o sector convencionado apenas tolerado para solução dos estrangulamentos e insuficiências do Serviço Nacional de Saúde e não como um parceiro com o qual o Serviço Nacional de Saúde partilha a prestação sempre de acordo, note-se, com uma estratégia de saúde nacional, num quadro de regulamentação e fiscalização por parte do Estado.
A Sr.ª Ministra já tem a carta sanitária pronta? Já sabe qual é a efectiva capacidade de resposta em consultas e meios de diagnóstico do Serviço Nacional de Saúde? V. Ex.ª já decidiu - como compete a quem tem de governar - o que é que pode e deve ser feito no sector convencionado e o que pode e deve ser feito pelo Serviço Nacional de Saúde? É que se trata de uma decisão estratégica que lhe compete. Se não, então, como pode perspectivar, deste modo, o sector convencionado?
Quanto à organização, fala-se muito de autonomia e de descentralização. O estatuto jurídico dos hospitais constitui um dos instrumentos privilegiados para atingir esse desiderato. Mas o que é, afinal, autonomia? Ao fim e ao cabo, não é mais do que a possibilidade de definir a produção, perspectivar o orçamento e gerir, de acordo com tudo isto, os recursos humanos. Ora, este novo estatuto dos hospitais não permite estes objectivos.
As administrações regionais de saúde, de que V. Ex.ª tanto fala, confundindo-nos a todos com a tal função de agência, serviram, pelo menos, para descentralizar? Julgamos que não! E vou dar dois exemplos: o caso do Hospital S. Francisco Xavier e do Hospital Egas Moniz, que tem os seus conselhos de administração constituídos e em funções, mas é a Administração Regional de Saúde de Lisboa que decide, subitamente, por cima da cabeça de todos, uma fusão sem dar uma explicação a ninguém.
Veja-se, por exemplo, a nível do planeamento, que competia claramente à Administração Regional de Saúde, e no que se refere à reorganização dos cuidados de saúde daquela região, a falta de planeamento que tem presidido à abertura do Hospital da Feira, onde ainda, neste momento, não se sabe o que vai acontecer às outras unidades de saúde. E, por exemplo, o que é que se está a passar com o Hospital Conde Ferreira, no Porto?
Por fim, Sr.ª Ministra, parecem-nos surpreendentes alguns objectivos apontados por V. Ex.ª como dependentes de uma reforma: na área da saúde da mulher e da criança, do planeamento familiar, do diagnóstico pré-natal, da terceira idade e dos doentes terminais.
Primeiro, não se percebe a quantificação do objectivo em relação a dados actuais, que não são referidos; segundo, não se percebe como é que este objectivo não foi alcançado e vai passar a ser. Porquê? Quais as medidas que vão ser adoptadas? Por que é que é necessário reformar para assegurar o cumprimento de programas essenciais, que já estão em execução há tantos anos?
Dado o pouco tempo de que dispomos, fiz-lhe perguntas simples e peço-lhe apenas respostas muito simples.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Barradas.

O Sr. José Barradas (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, as perguntas que dirigiu à Sr.ª Ministra sustentam uma visão que, obviamente, não é nossa. A nossa visão é esta: defesa de um Serviço Nacional de Saúde para todos. Por isso, o nosso objectivo é melhorá-lo e não acabar com ele, como pressuponho que seja o de V. Ex.ª.
A oposição - e ainda hoje, aqui, ouvimos dizer isso - diz que este Governo, nesta área, nada fez e que é só diálogo, só sorrisos... Ou seja, para V. Ex.ª e para a oposição, para se ser eficaz, é preciso ser-se autista, autoritário ou antipático.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - O que é preciso é governar!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Já começa a funcionar a AD?!

O Orador: - Sr.ª Ministra, queria lembrar-lhe o seguinte provérbio: «para palavras loucas, orelhas moucas»!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Queira V. Ex.ª continuar a brindar-nos com o seu simpático sorriso, porque daí não vem nenhum mal ao Serviço Nacional de Saúde, nem ao País.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Para a oposição Serviço Nacional de Saúde é sinónimo de acessibilidades, listas, as famigeradas listas de que já aqui ouvimos falar, e financiamento. Para nós, é isso. Mas é mais: para nós, é mais oferta de cuidados e melhor funcionamento dos serviços. tudo integrado numa estratégia cujo único objectivo deve ser o de reforçar o Serviço Nacional de Saúde.
Quanto à estratégia, este Governo tem-na. Está aqui, neste livro que vos mostro. Convinha que V. Ex.ª o lesse, pois, certamente, ficaria mais esclarecida sobre este assunto.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente!

O Orador: - Aqui estão os objectivos temporizados, quantificados e qualificados, alguns dos quais já estão a ser implementados.

O Sr. Bernardino Vasconcelos (PSD): - Esse livro é muito rebuscado!

O Orador: - Quanto à oferta dos cuidados de saúde, temos hoje mais apoio à criança, mais apoio ao idoso, mais apoio nos cuidados continuados - aliás, ainda ontem foram inaugurados mais cuidados continuados em Santarém -, mais apoio aos toxicodependentes, mais CAT, mais dinheiro para os internamentos, mais informação. Já agora, aproveito para lembrar ao Sr. Presidente e a esta Câmara que todos os anos surgem mais três milhões de novos infectados, alguns dos quais são nossos concidadãos.
Finalmente, o financiamento, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, é do Orçamento do Estado que o queremos, porque esse é o único que nos dá garantias de sustentar o objectivo político, que é o da defesa do Serviço Nacional de Saúde. A diferença é esta: quando, em 1995, este Governo tomou conta do sector da saúde, o orçamento disponibilizado foi de 3,8% do PIB e dois anos passados foi de 5,1 %, ...

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O Sr. José Junqueiro ( PS): - Bem lembrado!

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Que contas mal feitas!

O Orador: - ... o que significa mais recursos para melhores e mais cuidados de saúde.
Termino, fazendo-lhe uma pergunta muito simples: conheço o seu pensamento nesta matéria e ouço-a muitas vezes falar de direitos, de melhorias, de igualdade. Nessa circunstância, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, por que defende o opting out? Por que é que quer afastar alguns portugueses do direito que têm a um Serviço Nacional de Saúde melhorado?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.º Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, para responder.

O Sr. Presidente: - Mas o Sr. Deputado fez uma intervenção...

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, ele questionou-me...

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, a figura regimental que o Sr. Deputado invocou foi a de intervenção e durante a mesma pode fazer perguntas... De qualquer forma, dou-lhe a palavra para prestar os esclarecimentos que desejar.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, julguei que o Sr. Deputado José Barradas tinha feito um pedido de esclarecimento, mas percebo que não seja, porque se fosse eu ia esclarecer o Sr. Deputado e isso era muito desagradável para ele.

Vozes do PS: - Esclareça, esclareça!

O Sr. Presidente: - Vai ter tempo noutra oportunidade, Sr.ª Deputada.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

Pausa.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, peço desculpa, mas eu quero fazer uma pergunta à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto...

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tinha de inscrever-se na altura própria.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Eu inscrevi-me na altura.

O Sr. Presidente: - Qual altura?

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, queira desculpar, mas, enquanto a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto estava a intervir, da minha bancada, através do Sr. Deputado José Junqueiro, foram inscritos os Srs. Deputados José Barradas e eu para fazer perguntas à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto. Só isto!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas chegou ao meu conhecimento, através do Sr. Secretário - a confusão não sei de quem é - de que havia duas intervenções por parte do PS e eu inscrevi o senhor no fim da lista das intervenções. Aliás, o senhor devia ter refilado quando eu dei a palavra ao seu colega.
Peço, pois, desculpa, mas eu não tive culpa alguma. Mas, já agora, fica assim.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares...

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, penso que terá havido um lapso, que não é da culpa da bancada do PS...

O Sr. Presidente: - Isso eu não sei de quem é! A mim, chegou a informação de dois pedidos de inscrição para duas intervenções e foi isso que foi anotado pela Mesa.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, eu estava ao lado do Sr. Deputado José Junqueiro quando ele utilizou o telefone e inscreveu dois Deputados do PS, durante a intervenção da Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, para fazer perguntas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, então, dou a palavra ao Sr. Secretário que recebeu o telefonema, porque eu não quero ficar como responsável por este imbróglio.
Tem a palavra, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, é muito simples: a informação que chegou à Mesa, por parte da bancada do PS, foi a de que pretendia inscrever dois seus Deputados para intervirem no debate, designadamente o Deputado José Barradas e o Deputado João Rui de Almeida.
Acontece que não me foi dito que se tratavam de pedidos de esclarecimento. Tratavam-se de duas inscrições, e foi isso que fizemos.

O Sr. Presidente: - Estamos, então, esclarecidos.
Assim sendo, vou dar a palavra à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto para responder ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado José Barradas, não sem antes pedir que, da próxima vez, sejam mais claros para ver se nos entendemos.
Tem, pois, a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, vou ser muito breve a esclarecer o Sr. Deputado José Barradas.
Sr. Deputado, gostar do SNS, considerar a importância do SNS não é para si nem para mim, é para 10 milhões de portugueses. é geri-lo bem. Essa é que é a prova evidente da importância que se dá ao SNS: geri-lo bem, porque geri-lo mal é condená-lo, certamente, a uma falência e a juízos de valor que poderão ser injustos.
Sr. Deputado, não se aflija com o meu opting out. Vá ler o programa eleitoral do Partido Socialista, Sr. Deputado José Barradas! Vá lê-lo!

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2024 I SÉRIE - NÚMERO 60

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Rui de Almeida.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, a questão política central da sua intervenção pode resumir-se a dois ou três pontos.
O primeiro é o facto de a direita querer acabar com o Serviço Nacional de Saúde.

Risos da Deputada do CDS-PP Maria José Nogueira Pinto.

Assumam isso! A direita nunca gostou e quer acabar com o Serviço Nacional de Saúde. A direita quer obrigar os doentes a pagar nos hospitais e nos centros de saúde.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A direita não tem uma visão solidária para a saúde.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Olhe o Belmiro a comprar os hospitais!

O Orador: - Não quer que o Estado tenha essa responsabilidade social! Por isso, V. Ex.ª fez uma intervenção destrutiva, cujo alvo é o Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Está a embaraçar a Sr.ª Ministra! Não a embarace!

O Orador: - São críticas não para solucionar os problemas mas para tentar demonstrar que o Serviço Nacional de Saúde não é viável. Mais uma vez, ficámos a saber que a direita é contra, mas também, mais uma vez, ficámos sem saber quais são as vossas propostas concretas. A direita, V. Ex.ª, Sr.ª Deputada, nunca apresentou nesta Assembleia qualquer iniciativa legislativa para criar outro modelo de saúde. Assim, a minha primeira pergunta é: para quando essa iniciativa legislativa?
A segunda questão tem a ver com um dado novo: a direita do «CDS - Paulo Portas» tem agora uns «primos direitos», ou seja, o PPD/PSD.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PS13): - Oh! Estão mesmo preocupados!

O Orador: - Fizeram um acordo e vão realizar cimeiras temáticas. Ora, esta questão tem a ver com as tais cimeiras temáticas. Pergunto: a saúde faz parte dessas cimeiras temáticas? Pergunto ainda: vão apresentar, com os «primos direitos», algumas iniciativas legislativas para esse tal novo modelo de saúde?

Aplausos do PS.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP)-- Só isso? Tão fraquinho!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CI)S-PP): Sr. Presidente, Sr. Deputado João Rui de Almeida, ao trazer aqui a questão da AD, mostra que, embora Presidente da Comissão Parlamentar de Saúde, nada mais tem para dizer neste debate,...

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - ... o que não deixa de ser lamentável, sobretudo para o PS, e desagradável para a Sr.ª Ministra, porque essas defesas acabam por ser bastantes desagradáveis para os próprios, penso eu, se bem conheço a Sr.ª Ministra.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Não venha com essa resposta!

A Oradora: - Sr. Deputado, não penso que estes jornais que tenho comigo, e que exibo, sejam de direita, nem que estes sejam títulos de direita. Nada disto é de direita, provavelmente. Esta é a situação do Serviço Nacional de Saúde, não é a direita, e, Sr. Deputado, não feche os olhos, porque tem particulares responsabilidades!
Eu nunca quis acabar com o SNS, Sr. Deputado. Pelo contrário, dei alguns anos da minha vida ao serviço do SNS, com muito gosto e algum proveito para o SNS. Não sei se V. Ex.ª fez o mesmo, mas eu fi-lo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O sector da saúde foi, sem dúvida, um dos mais atacados pela política neoliberal do Governo do PSD, o que se traduziu em profundas perdas no direito à saúde dos cidadãos portugueses.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - É falso!

O Orador: - O que se exigia, e exige, na política de saúde é a inversão completa desta tendência, valorizando e investindo no Serviço Nacional de Saúde, instrumento privilegiado para garantir um acesso pleno e democrático dos cidadãos à saúde.
Apesar deste imperativo, continua a degradar-se a situação do SNS e não há, da parte do Governo, uma opção clara para a sua defesa e modernização, nem sequer a capacidade para concretizar algumas intenções positivas, de modo a dar acesso, por parte dos cidadãos, aos cuidados de saúde.
São as listas de espera para consultas de especialidade nos hospitais. São os milhares de utentes sem médico de família. É a falta de cuidados prestados nos domicílios a doentes que têm dificuldades em dirigir-se aos centros de saúde. É a falta de médicos, de enfermeiros e de outros técnicos, que limita fortemente a resposta às necessidades das populações. São as comparticipações insuficientes e os reembolsos demorados, que tornam medicamentos indispensáveis bens de luxo que poucos podem alcançar.
Face a tudo isto, o Governo afirma repetidamente a sua prioridade aos cuidados primários de saúde, mas, na prática, fecham-se extensões de centros de saúde necessárias às populações e inscrevem-se verbas irrisórias no PIDDAC,

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que adiam por mais tempo a construção de instalações essenciais para muitas populações.
E repetem-se, dia após dia, à chuva e ao sol, as filas de pessoas desde as 4, 5 e 6 horas da manhã à porta dos centros de saúde, na tentativa desesperada de conseguir consulta para si ou para um familiar.
Nos hospitais continua a sobrecarga da urgência, enquanto nas consultas externas as demoras aumentam, pagando os doentes esta ineficiência com a degradação do seu estado de saúde.
A resposta do Governo não é o alargamento ou a melhor organização dos hospitais mas, sim, a alteração do estatuto jurídico dos hospitais, avançando-se no caminho da desregulamentação laboral e do ataque às carreiras profissionais e abrindo-se a porta para uma gradual e mal disfarçada desresponsabilização do Estado, à semelhança do que acontece noutros sectores sociais.

Vozes do PCP: - Exacto!

O Orador: - Outra área em que a situação é de grande gravidade é a dos recursos humanos. O interior do País está já hoje quase sem médicos e a carência alastra a nível nacional. Todos assumem que esta situação atingirá níveis insustentáveis dentro de alguns anos, mas as medidas tardam em chegar.
Quanto aos enfermeiros, nem é preciso esperar alguns anos. Estamos já hoje numa situação insustentável e, mesmo, nos centros urbanos é cada vez mais frequente encontrar quadros de hospitais e de centros de saúde preenchidos em menos de metade no que diz respeito ao pessoal de enfermagem.
É generalizado o recurso aos regimes de acumulação de funções, com evidentes prejuízos para a vida dos profissionais mas também para a qualidade dos cuidados prestados.
É uma situação insustentável que exige resposta imediata, nomeadamente, através da abertura do numerus clausus em medicina e enfermagem. Não é admissível que as escolas de enfermagem estejam a formar, por decisão política, apenas metade do que poderiam fazer. Não é admissível que hoje se formem, por ano, nas faculdades de medicina, menos médicos do que há 4O anos atrás.
Esta degradação do Serviço Nacional de Saúde passa também, e evidentemente, pelas questões do financiamento. É verdade que o SNS deve ser melhor administrado e que há ganhos de rendimento a atingir. Mas isso não pode fazer esquecer a existência de um permanente e sucessivo subfinanciamento do SNS, responsável por grande parte da degradação a que se assistiu nos últimos anos.
Mais ainda: ao contrário do que nos tentam fazer crer, a solução não é diminuir direitos e reduzir o SNS a um sistema assistencial de cuidados mínimos garantidos, enquanto aos restantes só quem tem dinheiro tem acesso. A solução é atacar os interesses instalados dos que se servem com abundância do orçamento da saúde e diminuir as margens de lucro das multinacionais dos medicamentos e dos equipamentos, do sector convencionado, onde imperam os monopólios na hemodiálise e nas análises clínicas, ou dos construtores civis, que, entre atrasos e reformulações de projectos, embolsam mais uns milhões à custa do erário público.
Para isso, não houve, nem há, vontade nem coragem.
Que fique claro que os custos com que a política de saúde se deve preocupar são os que paga a saúde dos portugueses e os da discriminação de quem menos pode e mais precisa dos cuidados de saúde.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Baltazar.

O Sr. Nelson Baltazar (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, a sua intervenção, nesta Câmara, apresenta claramente uma visão catastrófica do Serviço Nacional de Saúde e da prestação de cuidados de saúde aos nossos cidadãos. Parece-me que, em relação a tudo aquilo que disse, eu seria capaz de dizer exactamente o contrário.
É evidente que há algumas questões que gostaria de lhe colocar. Considera - e esta é uma questão imediata - que é possível resolver os problemas ou as questões levantadas com a falta de médicos no Serviço Nacional de Saúde em dois anos? Se pensa assim. ficamos esclarecidos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Eu não disse isso!

O Orador: - Então, agradecia que dissesse aquilo que entende.
Em relação a algumas questões que focou, lembro que estão já implementadas e em execução algumas experiências inovadoras, como os grupos do Projecto Alfa,...

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Eh!

O Orador: - ... os contratos-programa dos hospitais, a resposta residencial a grandes dependentes - questão que, efectivamente, focou -, ...

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - A quantas pessoas?!

O Orador: - ... os serviços de apoio domiciliários, os projectos de cuidados continuados, etc. Já está introduzido o cartão do utente, há muito falado, há muito considerado necessário e agora em fase de implementação.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Onde?!

O Orador: - Finalmente, temos coisas feitas.
Gostaria ainda de lhe deixar alguns números, que também ajudam a comprovar se, efectivamente, o SNS está ou não mais eficiente.
Os centros de saúde apresentam uma oferta de atendimento superior a 5%, os hospitais apresentam unia oferta de consultas externas superior a 2O% e, neste momento, os centros de atendimento a toxicodependentes por distrito, permitem aumentar o número das primeiras consultas em 32% e o das consultas de seguimento em 29%.
Sr. Deputado, a sua visão catastrófica comportará quilo que os nossos cidadãos habitualmente respondem? E que 35% da população reconhece que existiram efectivas e sensíveis melhoras na prestação de cuidados de saúde e 72% dos cidadãos consideram e já se aperceberam que a nossa Ministra, a Ministra da Saúde, tem uma boa estratégia para a reforma da saúde em Portugal.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nelson Baltazar, é curioso que venha falar

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das experiências inovadoras no âmbito dos centros de saúde. Tenho aqui comigo uma moção de um concelho do seu distrito, o distrito de Santarém, em que, por unanimidade, a Assembleia Municipal de Santarém se pronuncia contra o encerramento de 11 - imagine, 11! - extensões de centros de saúde, apenas num concelho.

Vozes do PS: - Isso é falso!

O Orador: - É esta a prioridade aos cuidados de saúde a que o Sr. Deputado deve referir-se! Certamente, o Sr. Deputado Nelson Baltazar não conhecia ainda esta experiência inovadora!...
Sr. Deputado, eu não disse em qualquer ponto da minha intervenção que o problema dos médicos se resolvia em dois anos. O problema é que já há dois anos, pelo menos, quando o seu Governo e a sua Ministra entraram em funções, que se sabia que este problema existia e até agora não vimos ainda medidas para o resolver. É precisamente por este problema não se resolver em dois anos que é necessário tomar medidas rapidamente. Se calhar, não é preciso tornar tão rapidamente as medidas que põem os Srs. Deputados do PS a discutir nos corredores e no bar sobre em que cidade ou em que federação regional fica a faculdade de medicina, mas é preciso intervir rapidamente no numerus clausus das faculdades de medicina e das escolas superiores de enfermagem, que são absolutamente limitados, politicamente limitados, e só não crescem não por incapacidade de formação das próprias escolas mas porque, politicamente, tanto o Ministério da Saúde, como o Ministério da Educação, como o Governo, não estão disponíveis para abrir os numerus clausus que hoje existem nestas áreas, pondo em perigo o futuro do País...

Protestos do PS.

"" em cuidados de saúde e na formação de recursos humanos, quer na área médica, quer na da enfermagem.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, Sr.ªs, e Srs. Deputados: Não é possível, neste debate, falar sobre as «reformas da saúde em Portugal», até porque, na prática, estaríamos a falar da reposição do célebre filme «à procura da reforma perdida».
Faremos, pois, uma incursão, em áreas onde hoje já não é possível esconder as primeiras consequências da ausência de medidas, que são, com mais pormenor, duas: as listas de espera e as urgências.
Temos dito e repetido que o Ministério da Saúde está mais interessado em promover a imagem da Sr.ª Ministra da Saúde do que em resolver os problemas que afectam o sistema de saúde em Portugal.
Mais de 900 dias após a tomada de posse do Governo, assistiu-se ao disparar da despesa na saúde, com descontrole financeiro e sem melhoria da qualidade.
Mais de 900 dias depois, a situação dos médicos de família é esta: números oficiais apontam para cerca de 700 000 cidadãos em todo o País sem médico de família, o Presidente da Sub-região de Setúbal diz que, só em Setúbal, há 150 000 pessoas sem médico de família. Um cidadão que hoje se dirija a um centro de saúde em qualquer ponto do País muito dificilmente fica com um médico de família.
Mais de 900 dias depois, verifica-se a ausência de política em relação aos medicamentos, os atrasos no cartão de utente, a instabilidade na saúde materno-infantil, na luta antituberculose, na política de saúde mental, no apoio aos diabéticos, a desorientação nas medidas de investimentos em infra-estruturas.
Foi prometido que o Hospital de Santa Maria da Feira abriria em Março, mas ainda hoje as unidades que à volta estão não sabem exactamente o que vai ser o Hospital de Santa Maria da Feira.
O economicismo impera. Visíveis só encerramentos: da urgência das Taipas, da urgência do Pulido Valente, do Hospital Conde Ferreira, de um hospital - à escolha - em Lisboa, de dezenas de serviços de atendimento permanente e de extensões de centros de saúde um pouco por todo o País, bem como a fusão do Hospital de S. Francisco Xavier e do Hospital Egas Moniz.
A indecisão crónica e a preocupação em manter a boa imprensa tem sido a «pedra de toque» da actuação do Ministério da Saúde, em vez da procura da solução dos problemas.
A relutância do Partido Socialista em promover reformas foi evidente na revisão constitucional, é evidente na sua acção diária e evidentíssima nos textos apresentados pelo Governo nesta Assembleia: generalidades, intenções, e pouco mais.
Durante dois anos, justificaram a falta de medidas com o Conselho de Reflexão, não sendo depois suficientes as soluções milagrosas prometidas no contrato de legislatura, no Programa Eleitoral, no Programa do Governo, na estratégia para o virar do século, nas grandes orientações para 1997, nos planos estratégicos das ARS, das agências de acompanhamento e do resultado das inúmeras comissões ou grupos de trabalho. Tanto papel e tão pouca obra!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. António, reformado, com 50 anos, residente na margem sul do Tejo, «necessita de uma intervenção eminente na área cardíaca», vai ao seu hospital de referência e será operado, com bastante sorte, em princípios de 1999!
Em muitos hospitais centrais de Lisboa e Porto, a espera para operações para a prótese da anca é de mais de dois anos. O mesmo acontece com operações às cataratas, às varizes, etc., etc. Dois anos de espera, Srs. Deputados!
Depois de ter desbaratado uma experiência realizada pelo anterior Governo de contratação com o sector privado lucrativo, Misericórdias, IPSS, o chamado Plano de Erradicação de Listas de Espera, após limadas as insuficiências que as experiências iniciais normalmente têm, resolveria de uma forma mais rápida os problemas das pessoas que desesperam para poderem ver depois de removida uma catarata e para poderem andar após a implantação de uma prótese na anca.
O preconceito da «contratação com o sector privado» de que só com os grandes e poderosos é que se podem fazer acordos e a síndroma da «pesada herança» fazem com que não se produzissem as alterações no programa e se passasse à acção.
O que fez o Governo, então!? Foi pensar e concluiu que a solução seria um plano dentro do sector público, exclusivamente.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Só planos!

O Orador: - E as pessoas continuam a desesperar à espera...

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O PSD exige, hoje, como o fez sob a forma de requerimento, que sejam tornadas públicas as listas de espera, hospital a hospital, especialidade a especialidade, das datas em que os cidadãos foram propostos para intervenção cirúrgica e da data previsível da solução dos problemas. Não pedimos mais do que isso!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Se o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira se informar junto de Sua Excelência o seu irmão, verá que tenho razão no que digo.
O PSD exige um plano de emergência para a solução deste problema. Recordo, aliás, o que está a acontecer no sistema de saúde, tão caro a VV. Ex.as, que é o sistema de saúde inglês, que ainda há 15 dias disponibilizou 1 bilião de libras para ajudar a resolver este problema. Portanto, haja coragem!
Agir. Sempre que o Ministério da Saúde ouve esta palavra treme, fica em pânico. Adia, reflecte, cria uma comissão!
E não fica por aqui a indecisão. A Comissão, ou o grupo de trabalho, propõe medidas e, se causam a mais ténue contestação, gaveta com elas!
Acham os Srs. Deputados do Partido Socialista que estou a exagerar?
Haveria muitos exemplos a dar. Darei só um, o das urgências.
Para tentar encontrar soluções globais para o problema das urgências, uma comissão de peritos - ainda nomeada pelo Dr. Paulo Mendo, comissão essa que viu confirmada a confiança pela Sr.ª Dr.ª Maria de Belém - apresentou as conclusões e propostas de recomendação, no início de 1996. O que fez o Ministério? Quando precisava de decidir, delegou nas administrações regionais de saúde.
A resposta, a requerimento do PSD, em 1996, a Sr.ª Ministra da Saúde disse que, em Outubro, seriam tomadas as primeiras medidas. O que fizeram as administrações regionais de saúde, para além não só de encerrarem as urgências das Taipas, do Hospital Pulido Valente e dos serviços de atendimento permanente irias também de alterarem as áreas de influência de alguns hospitais?
Srs. Deputados, basta ir aos serviços de urgência, basta ver o que se lá passa. Imaginem, então, o que lá se sente!
Quase me esquecia - estava a ser injusto - de dizer que foi feito algo, apressadamente, por sinal, por causa da Expo 98: investiram-se algumas verbas para, em três meses, dar uma aparência diferente nos locais de atendimento. Contudo, um pouco mais de planeamento e de rigor seria útil e menos oneroso.

O Sr. José Barradas (PS): - E o que é que vocês fizeram?!

O Orador: - É que já sabíamos que íamos ter a Expo 98, há muitos anos!
Ora, se o Governo nem estas medidas de boa política governativa toma, como é que vai apresentar uma reforma estrutural? As reformas estruturais não devem ser para melhorar a imagem deste ou daquele membro do Governo, não devem ser o alinhavar de boas intenções ou mais um pretexto para conferências de imprensa, não devem ser a criação de um mundo virtual cor-de-rosa.
Continuaremos a exigir ao Governo que as propostas de reforma passem da generalidade ao concreto, das grandes intenções para a solução dos problemas, do papel para as pessoas. Parece que, perante os problemas, o Governo se resigna, baixa os braços, até sorri.
Nós não nos resignamos perante as dificuldades, não desistiremos de defender todos aqueles que vêem no dia-a-dia a degradação do sistema de saúde, que sentem cada mais dificuldade no acesso ao sistema de saúde e, por isso, não calaremos a nossa voz.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Marques.

O Sr. Alberto Marques (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, estive a ouvi1o com toda a atenção, e porque V. Ex.ª começou a falar de filmes, passou-me a imagem. durante toda a intervenção, do filme do Deputado do PSD «falando ao espelho»... Deu-me a sensação de que V. Ex.ª estava a falar, justamente, para o seu partido, «revendo ao espelho» aquilo que o seu próprio partido não foi capaz de fazer nos dois primeiros anos de governação, com maioria absoluta, neste país, em matéria de saúde e sentindo-se perturbado pelo facto de este Governo, em dois anos e meio, para sermos correctos, de governação,...

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - 900 dias!

O Orador: - ... ter sido capaz de corrigir os desvios gravíssimos e a inoperância do vosso governo em matéria de correcção, reforma e organização do Serviço Nacional de Saúde.
Pareceu-me que V. Ex.ª estava a fazer uma peça de oratória do passado ao espelho... E mais: pareceu-me que V. Ex.ª faltou ao Congresso de Tavira, porque a sua intervenção, que até foi interessante de ouvir, provavelmente impediu-o de estar lá e de ter ouvido com mais clareza as indicações finais do seu líder partidário.
Sr. Deputado, porque a matéria de saúde é muito séria e porque não pode haver apenas tempo para a diversão e para a ironia, a pergunta que lhe coloco é tão simples quanto isto: está ou não o PSD seriamente disponível, como já tem sido aqui afirmado por outros Deputados da sua bancada, para colaborar de modo sério naquilo que é a defesa dos interesses dos portugueses, garantindo-lhes saúde, com acessibilidade, com qualidade e com o atendimento que todos nós provavelmente desejamos?
Esta é que é a questão séria e não aquilo que disse na sua intervenção, na qual, pretendendo dizer tudo, acabou por não dizer nada.
Sr. Deputado, sejamos construtivos, não tenhamos apenas a preocupação de fazermos números políticos nesta Assembleia quando falamos em questões fundamentais para o nosso país, como a saúde, a educação e outras.
Sr. Deputado, há que ser claro: está ou não o PSD seriamente disponível para participar na nossa preocupação de corrigir, com uma estratégia que está escrita e que é assumida claramente, a assistência a todos os portugueses, para que Portugal seja um país em que a saúde seja, de facto, de qualidade?

O Sr. António Filipe (PCP): - O melhor é irem trabalhando e não ficarem à espera deles!

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Marques, o pior serviço que podemos prestar aos portugueses é não reconhecer a situação actual, que é perfeitamente evidente.

Vozes do PS: - Prove!

O Orador: - É ou não verdade que existem listas de espera de dois anos para a cirurgia da prótese da anca? É ou não verdade que existem situações de espera de mais de dois anos para a cirurgia de cataratas?
V. Ex.ª sabe tão bem ou melhor do que eu que essa é a realidade. Não peça ao PSD que, sem o apoio do povo, sem o voto do povo, governe este país! Quem tem de apresentar as reformas é o Governo! Aliás, desde a revisão constitucional - e já estão esquecidos desse pequeno ponto de vista - que vimos dizendo que é fundamental encontrar aqui formas de trabalhar em conjunto nesta área. Porém, Sr. Deputado, não me diga que a única forma de trabalhar a sério é dizer bem do Governo, como VV. Ex.as fazem! A nossa obrigação, como eu referi, é a de dar conta daquilo que se passa no nosso país!
É ou não verdade que houve um decreto-lei, aprovado pelo Governo, no sentido de encerrar o Hospital Conde Ferreira? É ou não verdade que a urgência do Hospital Pulido Valente vai encerrar? E ou não verdade que a urgência das Taipas encerrou? E os centros de saúde? E os serviços de atendimento permanente, etc ... ?
Em 9 minutos não temos oportunidade de dizer tudo aquilo que se passa neste sistema, mas tenho a certeza, Sr. Deputado, que quando o PSD ganhar as eleições muitas das respostas vão ser positivas e, então, contaremos, certamente, com a colaboração do Partido Socialista de forma a resolverem-se esses problemas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.

A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de pedir à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, que foi quem ddespoletou este debate de urgência, que me facultasse a sua intervenção, designadamente a parte das questões, para eu poder responder ponto por ponto, uma vez que tentei tirar
variadíssimas notas mas não consegui apanhar tudo. E porque a Sr.ª Deputada integra o grupo parlamentar que solicitou este debate de urgência, deverei dirigir-me a si em primeiro lugar. No entanto, enquanto aguardo por esses elementos, a que responderei em parte - pedirei ao Sr. Secretário de Estado que responda ao restante -. gostaria de aproveitar para esclarecer algumas questões que aqui foram levantadas pelo Grupo Parlamentar do PSD.
Começo por precisar uma afirmação do Sr. Deputado Jorge Roque Cunha - se não entendi bem, terá ocasião de me esclarecer -, quando diz que o Ministério da Saúde está interessado em promover a imagem da Ministra.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Está mais interessado!

A Oradora: - É uma afirmação que condeno violentamente, e vou dizer-lhe porquê: é que não são os membros do Governo que estão à frente do Ministério da Saúde. Se o Sr. Deputado dissesse que o meu Gabinete promovia a minha imagem, eu não levaria a mal, agora que o Sr. Deputado diga que o Ministério da Saúde promove a minha imagem é de uma injustiça tremenda, que não aceito nem permitiria, pela forma como estou na política e como sempre estive nas funções que exerci ao longo de mais de 25 anos.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - O Sr. Deputado, que é bastante mais jovem do que eu, poderá ter acesso ao meu curriculum profissional e solicitar a informação sobre a maneira como sempre estive nos lugares e nos cargos que exerci. Devo afirmar aqui, publicamente, que, a partir do momento em que estes debates no Plenário passaram a ser transmitidos pela televisão, o tom das intervenções mudou bastante. Gostaria de referir, aproveitando a transmissão televisiva, que não invisto absolutamente nada na minha imagem pessoal, que estou neste lugar como sempre estive em todos os outros, nunca tive a preocupação da minha imagem pessoal. O que tive foi unia formação profissional e estou nas coisas de uma maneira e com uma vontade que não passa pelo privilégio da imagem. E se alguém aqui está preocupado com a imagem não sou eu, são, nomeadamente, os Srs. Deputados, que sistematicamente invocam a questão da saúde e a questão da imagem da Ministra da Saúde, promovendo cada vez mais a minha imagem. Pedia-lhes para não o fazerem.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Aliás, tenho todo o gosto em convidar o Sr. Deputado a passar um dia comigo no meu Gabinete, pois certamente gostaria de ver como é que lá se trabalha, onde não há promoções de imagem individuais, muito menos do membro do Governo responsável por essa área, porque isso seria para mim absolutamente inadmissível e inaceitável.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

A Oradora: - Já de posse dos elementos que solicitei à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, gostaria de referir-me especificamente à questão dos recursos humanos, de que os Srs. Deputados Jorge Roque Cunha e Bernardino Soares também falaram.
Um dos números que foi referido por duas vezes foi o dos 700 mil utentes sem médico de família. Devo dizer, muito claramente, que os 700 mil utentes que são determinados como não tendo médico de família são encontrados com base nos números de clínicos gerais existentes em toda a população portuguesa. Como os Srs. Deputados sabem, há muitas pessoas que têm subsistema, que prescindem de ter médico de família e, portanto, esse número e esse valor absoluto não é eventualmente o mais correcto. De qualquer maneira, toda a gente sabe que há falta de médicos de família em Portugal e, por isso, se tem feito um investimento no sentido de abrir por completo a capacidade formativa do Ministério da Saúde em termos dos internatos de especialidade de clínica geral e essas vagas têm vindo a ser preenchidas.
Como os Srs Deputados sabem, até porque foi uma medida tomada no tempo dos governos PSD, na área da saú-

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de, a idoneidade dos serviços é definida entre a Ordem dos Médicos e o Ministério da Saúde. Essa idoneidade é, efectivamente, encontrada em função das capacidades formativas dos serviços e essa capacidade formativa existente, que é todos os anos avaliada, é disponibilizada na totalidade em termos das vagas, que têm sido todas abertas para efeitos de formação em clínica geral, porque é uma área onde temos carência, e as projecções apontam para que venhamos a ter mais carências.
Pergunta o Sr. Deputado do PCP o que é que se tem feito relativamente a esta matéria e também outros Srs. Deputados questionam quer a capacidade formativa das escolas de enfermagem quer as capacidades formativas das faculdades.
Como sabem - e consta da nossa estratégia, que os Srs. Deputados conhecem, pelo menos o Sr. Deputado Bernardino Soares tenho a certeza que leu e analisou -, uma das metas a atingir para o ano lectivo 1998/1999 é o aumento em 50% da disponibilidade de vagas para enfermeiros nas escolas superiores de enfermagem. Já este ano houve um aumento, ainda não muito expressivo, mas foi acordado com as escolas de enfermagem que para o ano 1998/1999 haveria um esforço de acréscimo de 50% da capacidade formativa.
Em relação aos numerus clausus, como aqui foi referido, estou muito mais preocupada com esta questão do que efectivamente com uma nova faculdade, tendo em conta que o problema já existe há pelo menos cinco anos, ou mais, logo não é de hoje, altura em que era possível fazer as projecções adequadas. Este problema não foi criado por mim, como é óbvio, já existe e deve ser analisado para ser efectivamente resolvido, e, neste sentido, existe uma articulação com as faculdades de medicina a fim de se aumentar a capacidade formativa.
O Sr. Deputado Jorge Roque Cunha tem algumas dúvidas sobre o sucesso desta iniciativa e desta articulação com as faculdades de medicina, mas penso que é uma boa área, uma das tais áreas em que, sendo e constituindo uma preocupação para o País - uma vez que, das intervenções aqui feitas, a todos vi defender a questão do Serviço Nacional de Saúde e da acessibilidade dentro do Serviço Nacional de Saúde -, é interessante que haja participação activa de todos os grupos parlamentares no sentido de se considerar que este é um problema importante para a sociedade portuguesa. Mas se os Srs. Deputados levantam a questão do alargamento dos numerus clausus e, depois, já não a consideram como tal, devo dizer que, para mim, esta é uma preocupação, mas que também é vossa, pelo que retirei das vossas intervenções.
Quanto às listas de espera, o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha referiu que o actual Governo desperdiçou o PERLE...

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Desperdiçou a experiência do PERLE!

A Oradora: - Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que a experiência do PERLE foi avaliada pelo serviço do Sr. Provedor de Justiça por ocasião da apreciação do abaixo-assinado de 14 000 pessoas a queixarem-se das listas de espera existentes no Serviço Nacional de Saúde e considerou que esta não foi uma experiência de sucesso - se quiser, posso mandar-lhe parte da cópia desse documento, embora pense que já a entreguei ao Sr. Deputado - e que foi muito cara para as questões que conseguiu resolver.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Muito cara?!

A Oradora: - Devo dizer-lhe que, em 1997, o Ministério da Saúde celebrou acordos com ARS, não foi só com as instituições do Serviço Nacional de Saúde, no sentido de recuperar cerca de 30000 cirurgias em atraso e que estão actualmente em discussão, também com um investimento específico dirigido para a recuperação das listas de espera, projectos de contratualização em todas as administrações regionais de saúde, pelo que não é justo, nem verdadeiro, dizer-se que se tem um mau relacionamento e que - não gostaria de empregar a expressão utilizada pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto o sistema convencionado é apenas tolerado e não um parceiro. Não é, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto. O sistema convencionado, sendo enquadrado por regras específicas, tem condições para ser um parceiro, em relação ao qual podemos contratualizar aquilo que são intervenções nas áreas onde, efectivamente, temos de conseguir mais ganhos de saúde para os portugueses.
A Sr.ª Deputada manifestou expressamente a sua preocupação com o acompanhamento da grávida, que é também uma preocupação do Ministério da Saúde. No entanto, penso que concordará comigo em que é mais adequado garantir que o que é comprado em termos de ecografias, para efeitos de seguimento da gravidez, seja comprado dentro dos programas de seguimento da grávida e não como era muitas vezes feito. E a Sr.ª Deputada sabe, até porque falou na urgência da organização do sector, aquilo que tem sido uma tentativa enorme de dirigir os recursos de aquisição fora do Serviço Nacional de Saúde, para conseguir intervenções em áreas específicas, por forma a dirigir-se esse esforço financeiro do Ministério para áreas que são mais desprotegidas e que devem merecer o adequado seguimento por parte do Serviço Nacional de Saúde.
Srs. Deputados, lamento não responder a todas as questões, mas já esgotei o meu tempo disponível. Como na próxima semana teremos uma reunião a nível da Comissão Parlamentar de Saúde, se me derem oportunidade, responderei a algumas das questões que aqui foram levantadas para além de, como é óbvio, abordar o tema dessa reunião.
Muito obrigada, Sr. Presidente, pela sua tolerância.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Informo a Câmara que se encontram inscritos, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto, Bernardino Soares, Moura e Silva e Bernardino Vasconcelos. Porém, este último Sr. Deputado já não dispõe de tempo, pelo que não poderá formular o seu pedido de esclarecimento.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CI)S-PP): Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, em primeiro lugar, quero dizer que lamento muito que estes debates sejam perturbados por um excesso de afã da bancada do PS,...

Risos do PS.

... que poderia dar o tempo de que dispõe à Sr.ª Ministra, pois foi ela que viemos aqui ouvir.

O Partido Socialista confunde unia coisa que a Sr.ª Ministra nunca poderá confundir, que é um plano de refor-

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ma com um plano de gestão. A Sr.ª Ministra, que eu saiba, teve altas responsabilidades numa instituição hospitalar e sabe bem que há muito a fazer neste puro plano da arrumação,...

A Sr.ª Ministra da Saúde: - E fiz!

A Oradora: - ... que não podemos desprezar, como a bancada do PS despreza animadamente.
Quero dizer-lhe que a questão dos convencionados - como penso que a Sr.ª Ministra, felizmente, mantém a sua sanidade mental não vai aqui fazer saltos ideológicos que não são para aqui chamados -, para mim, assenta no seguinte: o Estado, estrategicamente, deve dizer aquilo que deve ficar no SNS e aquilo que pode não ficar. E quando digo «deve ficar» não é só saber se já há capacidade instalada mas porque estrategicamente pode ser do interesse público que fique, pura e simplesmente, consoante as matérias. É esta a definição que não está feita. Como não está feita, pergunto: como é que pode haver um decreto lei das convenções? Porque o que eu esperava que a Sr.ª Ministra dissesse era: «isto, pela sua natureza, fica no Estado, isto, pela sua natureza, pode ir para os privados, e a evolução vai ser feita desta ou daquela forma ... ». Assim é que se criavam as tais regras que impediam o parasitismo, relativamente ao qual todos estamos em desacordo, mas também não se pode criar uma incerteza num sector como este.
Gostaria ainda de perguntar-lhe o seguinte: com a sua experiência, entende que este Estatuto Jurídico dos Hospitais é de facto um bom instrumento de autonomia para os hospitais? E, finalmente, entende como positiva a visão da bancada do PS, que considera que eu penso assim porque sou de direita, que o Deputado Bernardino Soares pensa assim porque é comunista e que aqueles senhores pensam assim porque são sociais-democratas e que nalgumas coisas pensamos todos o mesmo, somos capazes de ter razão ... ?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, o facto de as sessões serem transmitidas por meios televisivos não influenciam o tom da intervenção do PCP neste Hemiciclo. De facto, o que condiciona o tom de intervenção do PCP neste Hemiciclo é a sua satisfação, ou não, em relação às políticas que vão sendo seguidas e aos assuntos que estão a ser debatidos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E a verdade é que nesta matéria o nosso desagrado tem vindo a crescer, uma vez que estamos à espera da concretização de uma série de intenções e da inversão de uma determinada política que tarda em chegar. Portanto, é natural que o nosso veemente desagrado seja cada vez maior, logo manifestado com maior veemência nesta Câmara.
Muito concretamente, em relação ao Estatuto Jurídico dos Hospitais, pergunto-lhe, Sr.ª Ministra: considera que o caminho para melhor gerir aquilo que são as capacidades e as necessidades de gestão hospitalar é o do progressivo afastamento da tutela pública ou o de uma tutela pública mitigada no novo Estatuto Jurídico dos Hospitais? E, par isso, é preciso diminuir os direitos dos profissionais? E preciso, para melhorar o funcionamento dos serviços de saúde, nomeadamente dos hospitais, fazê-lo à custa dos direitos adquiridos e garantidos dos profissionais de saúde? Penso, Sr.ª Ministra, que o caminho é outro, que, dentro da regulação pública, é possível encontrar melhores formas de gestão. No entanto, penso que o facto de ser muito difícil implementá-las e de a coragem para o fazer ser escassa leva a que se encontrem soluções que tendem a sair fora da regulação pública e que abrem a porta para uma desresponsabilização que, a nosso ver, não é admissível e que não vem trazer qualquer melhoria na gestão dos hospitais do nosso país.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.

O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, peço desculpa por não fazer qualquer crítica acerca do sorriso, simpático, aliás, tanto mais que me parece natural, pois penso que ninguém pode ser condenado pelo sorriso que tem.

Vozes do CDS-PP: -- Muito bem!

O Orador: - A minha preocupação, a minha condenação, é bem outra: tem a ver com as expectativas que criou e que não foi capaz de resolver.
Sr.ª Ministra, fomos recentemente confrontados com notícias veiculadas pela comunicação social, que nos dão conta da sua intenção de promover, no próximo mês de Junho, em todos os hospitais, uma semana de reflexão. Segundo as mesmas fontes, a intenção de V. Ex.ª, ao patrocinar esta iniciativa, é a de promover uma melhor assistência aos doentes, evitando que os mesmos se percam nos circuitos viciados, e de igual modo formar uma ideia concreta das razões que estão na origem destes vícios. Seria caso para perguntar: por onde tem andado a Sr.ª Ministra?!
Volvidos que são quase três anos de mandato, não podemos deixar de constatar - e fazêmo-lo com alguma consternação - que a Sr.ª Ministra insiste na reflexão sem passar à acção. Ou seja, o resultado de quase três de anos de reflexão não é mais do que o firme propósito de continuar a reflectir, e só a reflectir.
No entendimento do CDS-PP, não é necessário reflectir durante quase três anos para verificar que a realidade da saúde em Portugal é uma realidade de falta, de falta generalizada e quase uniforme, de faltas supríveis e, no entanto, não supridas, de lacunas colmatáveis e, contudo, não colmatadas. E, isto, Sr.ª Ministra, é, em nossa opinião, um facto inquestionável que não pode ser justificado com o argumento único da falta de meios e solucionado com a receita única da reflexão.
A verdade, Sr.ª Ministra, é que falta quase tudo em quase todo o lado. Faltam médicos no interior, mas também faltam no litoral; as longas listas de espera nos centros de saúde e hospitais são um dado incontornável, falemos nós da província ou da periferia de Lisboa ou Porto. E faltam médicos como faltam enfermeiros; faltam camas como faltam meios auxiliares de diagnóstico; falta pessoal auxiliar como falta pessoal administrativo. E porquê? Porque é que não são preenchidas as vagas do quadro de

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pessoal administrativo? Porque V. Ex.ª não acha necessário ou porque o Sr. Ministro Sousa Franco não deixa? A necessidade de preenchimento destas vagas, unanimemente reconhecida e motivo de reivindicação constante por parte dos directores hospitalares, o resultado directo desta recusa, reiterado em manter este défice permanente, é a manutenção da fraca qualidade dos serviços prestados.
Para nós é, de certo modo, natural que as preocupações do Sr. Ministro Sousa Franco se centrem essencialmente no facto de a Sr.ª Ministra gastar pouco; já não nos parece natural que V. Ex.ª conhecendo este grave problema, não diligencie no sentido de o resolver urgentemente. Para o verificar, V. Ex.ª reflecte; para o solucionar, V. Ex.ª recomenda reflexão.
Para terminar, Sr.ª Ministra, um doente que demora várias horas para ser atendido num banco de urgência de um hospital não necessita de reflectir para perceber o estado em que as coisas estão. Sr.ª Ministra, os profissionais de saúde que atendem todos os dias estes doentes sabem que não é reflectindo, e só reflectindo, que se pode fazer mais e melhor. Assim, perguntamos: e a acção, Sr.ª Ministra, quando e como?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Bernardino Vasconcelos, peço desculpa por não lhe dar a palavra para formular um pedido de esclarecimento à Sr.ª Ministra da Saúde, mas o critério que tem sido seguido é este: a Mesa concede tempo a quem o não tem para poder responder a perguntas formuladas e no interesse dos próprios inquiridos, mas não dá tempo para perguntar além do limite do próprio tempo. Enquanto não alterarmos este critério, não me levem a mal, mas não posso alterá-lo.
Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde, dispondo, para o efeito, de 3 minutos, tempo cedido pela Mesa.

A Sr.ª Ministra da Saúde: - Sr. Presidente, vou tentar responder, em 3 minutos, ao essencial das questões, o que vai ser difícil, ou melhor, vai ser completamente impossível.
Começo por abordar a questão referida pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, relativamente àquilo que é a definição estratégica, do que deve ficar no SNS e do que pode ser entregue aos privados, independentemente - disse a Sr.ª Deputada - da capacidade instalada no sector público. Ora bem, isto não poderia ser feito antes da Carta de Equipamentos de Saúde, que foi concluída em relação àquilo que são os meios auxiliares de diagnósticos ou aos principais. Quanto àquilo que a Sr.ª Deputada diz, «independentemente da capacidade instalada», não é assim, porque se tenho num serviço recursos humanos e recursos técnicos tenho a obrigação de os pôr a render. Portanto, é indispensável que essa questão da afiança, da negociação e da definição estratégica da colocação dos privados em relação a determinadas áreas, não colida com aquilo que já são as responsabilidades do Serviço Nacional de Saúde e que devem ser postas a render em benefício dos cidadãos.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Dá-me licença que interrompa?

A Oradora: - Faz favor.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Se o Sr. Presidente me permitir, gostaria de lhe dizer, Sr.ª Ministra, que, quando disse «independentemente» disse também outra coisa, e essa é que me parece importante: mesmo que o SNS não tenha, mas se se considerar, estrategicamente, que deve ter, então deve ter e não convencionar - é o contrário. Deve não só aproveitar tudo o que tem como, eventualmente, em áreas estratégicas dos cuidados de saúde, não convencionar e ter...

A Oradora: - A Sr.ª Deputada sabe que é essa a forma actual de construir os PIDDAC e que os sistemas locais de saúde, pretendendo abranger tudo aquilo que são os recursos existentes numa determinada área, sejam eles públicos, privados ou sociais, têm como preocupação esse serviço, independentemente de quem é a titularidade. Mas tudo deve obedecer a uma estratégia de saúde e não fazer-se coisas só por fazer, porque a gestão dos recursos, que são escassos, deve ser feita de acordo com aquilo que são as prioridades em termos de ganhos em saúde. Penso que a Sr.ª Deputada concordará comigo que esta é uma forma adequada de ver o problema.
Quanto a saber se o novo estatuto é, ou não, instrumento bom para gerir o SNS, deve sê-lo - é essa a nossa convicção. Aproveito esta pergunta para responder também ao Sr. Deputado Bernardino Soares que diz considerar que este estatuto jurídico dos hospitais, que foi apresentado, segue o caminho do afastamento da tutela pública e de retirar os direitos adquiridos pelos profissionais de saúde. O Sr. Deputado sabe que o respeito pelos direitos adquiridos dos profissionais é uma questão de princípio, e tal nunca esteve em causa, aquilo que está em causa, e que considero indispensável para gerir de outra maneira o SNS, designadamente os seus recursos humanos, é fazer a discriminação positiva, distinguindo quem, efectivamente, sabe estar ao serviço dos outros e em função de objectivos de produção com qualidade e quantidade, e não, pura e simplesmente, considerar que, por ter um vínculo de administração pública, já fez tudo o que tinha a fazer ao serviço dos outros. É esta capacidade de gerir os recursos humanos de uma forma diferente em função daquilo que é o investimento que cada profissional faz, ao serviço e no cumprimento da sua missão, que penso ser absolutamente indispensável.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Ministra, já terminou o seu tempo. Agradeço que conclua.

A Oradora: - Sr. Presidente, se me conceder uns segundos de benevolência, gostaria de referir ainda que todos sabem que é tremendamente injusto dizer que este Ministério esteve três anos a reflectir. O Ministério da Saúde definiu estratégias, fez planos de acção regionais pela primeira vez, avaliou a sua execução, definiu e está a avaliar trimestralmente aquilo que são as medidas contidas a nível desses mesmos planos que constituem compromissos por parte dos serviços de saúde.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Ministra, Srs. Deputados, findo o debate de urgência, terminámos o período antes da ordem do dia.

Eram 18 horas e 35 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrando na ordem do dia, vamos passar à discussão do parecer da Co-

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missão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo ao recurso, interposto pelo PCP, de admissibilidade da proposta de lei n.º 169/VII - Aprova a Lei Eleitoral para a Assembleia da República e que mereceu a seguinte votação em comissão: votos a favor do PS, votos contra do PSD e do PCP e a abstenção do CDS-PP. O parecer conclusão, aprovado com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP, é o seguinte: «Em vista da pertinência de abertura do processo legislativo relativo à reforma do sistema eleitoral para a Assembleia da República, e em consonância com despacho de admissão, de 31 de Março de 1998, pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, da proposta de lei n.º 169/VII, dá-se por admitida a referida proposta e indefere-se o recurso apresentado pelo Grupo Parlamentar do PCP, que deu causa ao presente parecer».
Sr. Deputado Jorge Lacão, na sua qualidade de relator, tem a palavra, caso queira.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, se houver acordo nesse sentido, parece-me que seria útil começarmos por ouvir os autores do recurso.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não é a isso que me referia.

O Orador: - O Sr. Presidente referia-se à apresentação do próprio relatório?

O Sr. Presidente: - Exacto.

O Orador: - Sr. Presidente, se estiver de acordo com a minha sugestão, gostaria de pedir para ser dispensado da matéria, por supor que ela é do conhecimento de todos os grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Claro que sim - e o relógio agradece!
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá para dar início ao debate.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, este recurso é apresentado por uma questão de coerência, embora, como é evidente, tenha o destino anunciado: se o PS, depois de ter apontado numerosas inconstitucional idades ao projecto de lei do PSD, votou a favor do indeferimento do recurso do PCP acerca do projecto do PSD, por maioria de razão o fará a propósito da proposta de lei apresentada pelo Governo. No entanto, como, para nós, a coerência é uma questão importante, entendemos apresentar este recurso. E fizemo-lo, no fundamental, pelas seguintes razões: entendemos, em primeiro lugar, que a definição de círculos eleitorais é uma matéria fundamental de qualquer sistema eleitoral; e é tão importante que a Constituição obriga a uma maioria qualificada de dois terços para efeitos de aprovar esta matéria. Ora, a nosso ver, não faz sentido - e isso mostra bem como estamos perante um debate fora de tempo - que o Governo apresente duas alternativas de círculos regionais, consoante haja e não haja regionalização, e não apresente qualquer proposta de círculos uninominais, como não poderia fazê-lo, atendendo a que está em curso uma rectificação do recenseamento eleitoral que pode levar à eliminação de dezenas, quiçá de centenas, de milhares de eleitores, alterando profundamente os dados da situação.
Isto mostra bem - sublinho este aspecto - que este debate tem lugar fora de tempo, mas mostra igualmente bem que não faz sentido discutir uma proposta ou um projecto de lei que não contém uma matéria tão estruturante como a definição de círculos eleitorais.
Um segundo aspecto que gostaríamos de sublinhar é que, a nosso ver, não faz também sentido, num Estado unitário, que se defina um sistema eleitoral caracterizado pelo círculo nacional, por círculos parciais e por círculos uninominais para o continente, e que não se admita idêntico regime para as regiões autónomas, sabendo-se, de resto, que houve uma tradição nos Açores, ao longo de todo o século XIX, de um círculo eleitoral dos Açores Oriental e um círculo dos Açores Ocidental. Independentemente desta questão, se os círculos uninominais têm tantas virtudes como se supõe que os autores defendem, então não faz sentido propor dois sistemas eleitorais, estando como estamos perante o mesmo país e perante um Estado definido como unitário - unitário, altamente descentralizado e com regiões político-administrativas mas, em todo o caso, um Estado unitário.
Por isso mesmo, colocamos esta questão ao Plenário, conscientes de que há outras matérias políticas da maior importância que ficarão para o debate que terá lugar amanhã.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, penso que é dado assente e adquirido, no domínio parlamentar, que as inconstitucionalidades de que possam enfermar projectos ou propostas de lei que devem passar pelo crivo do Sr. Presidente da Assembleia da República devem ser inconstitucionalidades incontornáveis e inultrapassáveis no âmbito da própria discussão dos diplomas. Aliás, o actual Sr. Presidente da Assembleia da República, Almeida Santos, tem tido - e, a meu ver, bem - uma prática correcta, que é uma prática tendente a alertar o Plenário e as comissões para situações de eventual inconstitucionalidade ou de dúvidas de constitucionalidade, mas nunca de rejeição dos diplomas.
Não fazendo a avaliação de que não está perante uma situação sem conserto constitucional, no caso de um diploma que apresentasse uma só disposição a proibir o direito à greve - um tal diploma não teria conserto -, o despacho inequívoco do Sr. Presidente da Assembleia não seria o despacho avisado que ele faz alertando para esta ou aquela inconstitucional idade mas um despacho de rejeição do diploma. Fora disso, seria deslocar para o Presidente da Assembleia da República uma posição prévia do Tribunal Constitucional, o que seria absurdo. Isto tem as suas regras, as instituições têm as suas competências e a prática correcta é, indiscutivelmente, aquela que o Sr. Presidente da Assembleia vem adoptando. Se não tivesse o cuidado, que ele tem, de alertar para as inconstitucionalidades, poderia apor, pura e simplesmente, um despacho de admissão sem esse alerta. Mas o alerta é enriquecedor e é também importante para o nosso trabalho.
Neste caso, sem discutir agora a inconstitucionalidade ou não que os recorrentes aqui apontam, e sem discutir, eventualmente, outras inconstitucionalidades, designadamente do projecto do PS, quando não garante o

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duplo voto às regiões autónomas, fazendo valer uma solução diferente para o continente - aliás, quero dizer aqui que até tendo a defender a criação de círculos uninominais nas regiões autónomas, não sendo essa a solução que, nesta fase, vem apresentada no projecto do PSD, mas que, na especialidade, podemos aprofundar e ultrapassar -, seria de todo inaceitável que, numa matéria como esta, com a importância que tem a reforma do sistema eleitoral, pela qual todos ansiamos, o Sr. Presidente da Assembleia da República, por uma dúvida de inconstitucionalidade ou por uma inconstitucionalidade detectada mas ultrapassável, desde logo impedisse que a Assembleia apreciasse o projecto e que a tramitação legislativa seguisse a sua normal apreciação e evolução.
E neste ponto que entendo não poder concordar com o recurso do PCP. Vamos, na especialidade e nas várias fases do processo legislativo, aprofundar a questão e corrigir as inconstitucionalidades que eventualmente existam. E esta a nossa posição, daí que votaremos contra o recurso e no sentido do parecer, que aponta para a sua não admissão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, politicamente falando, este recurso, apresentado pelo PCP, arriscava-se a ficar deserto por, a meu ver, insuficiente alegação e até convicção dos próprios na sua sustentação. Na verdade, os argumentos aduzidos pelo PCP para pôr em causa a conformidade constitucional da proposta de lei apresentada pelo Governo não pareceram à 1.ª Comissão razoavelmente procedentes. Em primeiro lugar, pelas razões genéricas aqui apresentadas já pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, depois, também em concreto, quanto ao mérito dessas mesmas alegações.
Pretender que a não delimitação geográfica, constante da proposta inicial, dos círculos uninominais seria razão a obstar ao prosseguimento do processo legislativo é desconhecer que a mesma proposta estabelece, de forma muito clara, os critérios materiais para a delimitação geográfica desses mesmos círculos uninominais, viabilizando assim que, na apreciação da generalidade, o tema, obviamente relevante e estruturante, seja da integral compreensão de todos os Deputados.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, no plano constitucional, a exigência de formação de maioria especialmente qualificada é uma exigência óbvia, mas em sede de votação final global, e não no momento da votação na generalidade de um diploma. Donde, também por esta razão, não procederem os argumentos do PCP quanto à inviabilidade de que a proposta procedesse nesta fase.
O outro tipo de argumento, ou seja, a circunstância de, na proposta de lei, se prever a criação de círculos uninominais no território do continente e o mesmo não ocorrer no território das regiões autónomas, leva a que tenhamos de considerar que, independentemente de qualquer solução legislativa final, a razão de ser dessa opção é uma razão de ser que se fundamenta não pela circunstância do estatuto autonómico das regiões autónomas no seu plano jurídico-formal mas, sim, pela circunstância factual de a estrutura geográfica e morfológica de distribuição demográfica nessas partes insulares do território português conduzir a uma maior dificuldade na configuração dos círculos uninominais e, sobretudo, na sua delimitação em função da sua razão de ser, que é a da maior aproximação entre os eleitos e os eleitores, o que tomaria, provavelmente, de aproximação difícil, na estrutura dos círculos uninominais, a solução que se pretendesse encontrar.
Ou seja, não há, por esse efeito, qualquer quebra, como o PCP pretende, do princípio da unidade do Estado, há, quando muito, uma aplicação do princípio da subsidiariedade no funcionamento desse mesmo Estado em atenção às realidades concretas do País.
Ora, os círculos uninominais não são, nos termos da Constituição, círculos necessários, impostos pela própria Constituição, são, como sabemos, círculos facultativos e, por essa mesma razão, não há aqui um dever impositivo da Constituição ao legislador ordinário, logo não vemos também razão para que se suscitasse em torno desta questão um problema de desconformidade constitucional.
O princípio da igualdade não está, por isso, essencialmente posto em causa, nem por qualquer outra forma, mesmo que não essencial, e também verificámos que essa alegação, nas palavras de há pouco do Sr. Deputado Luís Sá, digamos, não mereceu do próprio grande esforço argumentativo, certamente por na bancada do PCP se compreender a improcedência essencial desse tipo de argumento em confronto com a proposta de lei.
Diria, portanto, que o recurso do PCP vai ter como desfecho natural o ter uma recusa no Plenário da Assembleia. Estou certo de que o PCP está inteiramente conformado com a decisão e, mais do que conformado, provavelmente, o próprio PCP, embora não o possa expressamente declarar, acabará por estar de acordo com a inteira pertinência da decisão que o Plenário tomará.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Olhe que não! Olhe que não!

O Orador: - Permita-me, Sr. Presidente - por dever de ofício, tivemos de ouvir estes apartes -, que faça uma última observação de outra natureza: como eu me congratulo com as palavras há pouco proferidas pelo Sr. Deputado Guilherme Silva ao alegar no sentido de considerar não justificável...

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado, pois já ultrapassou os 3 minutos.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Estava eu a dizer o quanto me congratulo com as palavras do Sr. Deputado Guilherme Silva ao alegar considerar não justificável que, desde já, por argumentos de inconstitucionalidade, se pusesse fim ao desenvolvimento do processo legislativo, tendo ele aludido a que, no desenvolvimento desse processo, designadamente na especialidade, haveria lugar a outras ponderações possíveis, o que quer dizer que, por antecipação relativamente ao debate que amanhã vai ter lugar, o PSD declara aqui o seu compromisso, que parecia poder ser questionável, de se empenhar em viabilizar as iniciativas legislativas tendentes à reforma do sistema eleitoral. Com isso antecipadamente me congratulo, Sr. Deputado Guilherme Silva.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra, vamos passar à votação do parecer da

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Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo ao recurso, interposto pelo PCP, de admissibilidade da proposta de lei n.º 169/VII - Aprova a Lei Eleitoral para a Assembleia da República.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP.

Srs. Deputados, vamos entrar na apreciação das Contas Gerais do Estado dos anos de 1994 e 1995.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (João Carlos da Silva): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, e dado ser a primeira vez que intervenho nesta Câmara como Secretário de Estado, quero, na pessoa de
V. Ex.ª, Sr. Presidente, cumprimentar todos os Srs. Deputados, em especial os colegas de infortúnio que, durante vários Orçamentos, me acompanharam nesses trabalhos, e manifestar o meu prazer e honra em regressar a esta Câmara e para um tema tão aliciante como é a apresentação das Contas do exercício do PSD à frente do Governo.

Risos.

Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, ilustre Presidente da minha Comissão, os meus cumprimentos.
Relativamente à Conta Geral do Estado de 1994, o Governo nada tem a dizer, porque não foi responsável pela execução do Orçamento do Estado de 1994 nem pela elaboração da Conta e, portanto, oferece o merecimento dos autos.
No que se refere à Conta Geral do Estado de 1995, haverá que, relativamente a 10 meses de execução dessa Conta, tomar a mesma atitude que se tomou em relação à
Conta de 1994. Mas há a salientar que, de facto, o XIII Governo Constitucional é responsável não só por dois meses de execução do Orçamento do Estado mas também
pelo aparecimento de um «raio de sol» dentro da «tempestade» que foi a gestão de 1995, que foi o Orçamento Rectificativo de 1995, a lei de alteração orçamental, que, de certa forma, foi o ponto de viragem nas políticas orçamentais, possibilitado pela «Primavera» de Outubro de 1995, o qual começou a evidenciar-se com a apresenta ção do já referido Orçamento, que teve algumas linhas de
força importantes.
Desde logo, com o Orçamento Rectificativo de 1995, que está reflectido na Conta Geral do Estado de 1995, começou a verificar-se o atenuar dos principais defeitos da gestão orçamental, a existência de uma efectiva política de rigor orçamental, com regras bem claras e definidas; a preocupação e a consciência social das políticas financeiras - e chamaria a atenção dos Srs. Deputados de que o Orçamento Rectificativo de 1995 permitiu que a Conta Geral do Estado apresentasse já, se bem que de forma limitada, atendendo à limitação da própria lei de alteração orçamental, um maior ênfase do que aquele que inicialmente era esperado pelas questões sociais; a transparência e clareza das relações financeiras com a administração local - e chamaria a atenção de VV. Ex.ªs de
que, a partir da entrada em vigor da lei de alteração orçamental de 1995, foram reforçadas as verbas para as autarquias locais, tendo em conta um conflito grave que existia entre o Governo anterior e as autarquias locais, nomeadamente quanto à base de cálculo do IVA, tendo sido feita uma transferência de cerca de 1,5 milhões de contos para, durante o período de exercício de funções do XIII Governo Constitucional, repor a legalidade na base de cálculo do fundo de equilíbrio financeiro.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, foi dado início a um período, que felizmente se tem mantido, e a um tipo de relacionamento de legalidade e sanidade entre o Orçamento do Estado e o orçamento da segurança social, interrompendo-se, assim, o ciclo da descapitalização e a atrofia do sector da segurança social por meras decisões políticas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Concomitantemente, a promoção, classificação e planeamento do programa de privatizações, como sector de modernização, começou a evidenciar-se com a rectificação de situações que se arrastavam do passado, nomeadamente insuficiências financeiras num conjunto de entidades do sector empresarial do Estado, que viram, nessa alteração orçamental, um reforço para que se pudesse, então, dar início a um programa de redimensionamento do sector empresarial do Estado, baseado sobretudo na sanidade e na clareza das contas das empresas públicas e, logicamente, na sua maior atractividade em termos financeiros para o Estado.
Em suma, Srs. Deputados, a partir do final de 1995, a política financeira do Estado passou a subordinar-se a critérios de rigor e consolidação orçamental, com promoção do crescimento económico e com intensas políticas de solidariedade e de melhoria qualitativa e quantitativa das funções sociais do Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É isto que se me oferece dizer, Srs. Deputados, sobre a Conta Geral do Estado de 1995, naquilo que é da responsabilidade deste Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Joel Hasse Ferreira e Manuela Ferreira Leite.
Tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, sei do carinho - e ela sabe que eu sei! -, que a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite tem pela presença aqui do novel Secretário de Estado do Orçamento João Carlos da Silva.
Mas compete-me, de facto, e é com todo o gosto que o faço, saudar a presença do Sr. Secretário de Estado do Orçamento aqui no Hemiciclo.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Julgo extremamente importante referir que o Secretário de Estado do Orçamento, vindo do Parlamento, faz parte de uma equipa excelente, a quem tentaram atirar, em várias circunstâncias, «baldes de lama», e que tem resistido e colaborado na equipa que dirige efectivamente as finanças nacionais num sentido altamente positivo.
O Sr. Secretário de Estado referiu, na orientação seguida na inflexão final do ano de 1995, a questão do apoio às autarquias, e, portanto, a pergunta que lhe faço é um pouco

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no sentido de saber até que ponto - sei que hoje não temos tempo para discutir isso e que tal não virá muito a propósito na Conta de 1995 - é que essa atitude se manterá consistentemente, já que o PSD, que tão pouco apoio deu às autarquias durante os anos anteriores, depois de 1995 é que se lembra de ser o seu grande amigo.
Portanto, pergunto se podemos contar com o Sr. Secretário de Estado para, de maneira criativa, desenvolver o apoio às autarquias nas próximas propostas de lei do Orçamento do Estado.
Também já na inflexão da fase final do Orçamento de 1995 se nota uma preocupação de desenvolvimento económico, de controlo do défice e de redução continuada da dívida. E o que quero que V. Ex.ª me diga é se considera que há condições para se consolidar essa inflexão verificada no último trimestre de 1995 e, portanto, de manter o ritmo de desenvolvimento económico, de controlo do défice e de redução continuada da dívida, que, nomeadamente nos três últimos anos do cavaquismo, estavam bastante esquecidas.
Para terminar, há um aspecto importante, que vai ser desenvolvido numa das intervenções da minha bancada, que tem a ver com a necessidade de melhorar e corrigir os aspectos negativos que pautaram praticamente todos os 10 anos do Governo do Prof. Cavaco Silva - para que não seja só o Prof. Marcelo a dizer mal de Cavaco Silva, também tenho de dizer alguma coisa ... ! -, que é a questão dos aspectos negativos do conjunto de irregularidades sublinhadas pelo Tribunal de Contas, e houve, de facto, um esforço, imediatamente a partir da entrada em funções deste Governo, para que esses aspectos fossem resolvidos.
Pergunto, portanto, se podemos continuar a contar com V. Ex.ª e com a equipa em que se integra para eliminar todos esses aspectos menos cuidadosos, eivados de irregularidades, que a gestão cavaquista deixou no aparelho do Estado.
Termino, voltando a desejar a V. Ex.ª as melhores felicidades no exercício das suas funções e a garantir-lhe redobradamente que pode contar com o apoio do Grupo Parlamentar do PS.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado do Orçamento, tem mais um pedido de esclarecimento. Deseja responder já ou no final?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Respondo já, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, respondo já, atendendo à brevidade e à simpatia do Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, começando por agradecer as suas palavras e, já agora, por via indirecta, o carinho que detectou na Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
Quanto ao apoio às autarquias, de facto, desde que o XIII Governo entrou em funções, a transferência de verbas, ainda antes da transferência de competências, tem sido reforçada e acelerada. Exemplo disso é que, sem entrar em irrealismos e histerias, o Governo tem apresentado propostas credíveis para o reforço das finanças locais. A prová-lo está que, na semana passada, foi entregue à Associação Nacional de Municípios Portugueses para estudo - e posteriormente, com certeza, será entregue ao Parlamento - um ante-projecto de proposta de lei de finanças locais.
Relativamente às condições para manutenção futura da estabilidade e da consolidação financeira, com certeza, Sr. Deputado, que não só a equipa das Finanças mas todo o Governo estão empenhadíssimos no rigor, na consciência de que a despesa pública ainda é um factor importante de promoção do investimento e de apoio ao crescimento da economia e também de que um programa de privatizações não é só um programa de natureza financeira como era entendido antigamente. As empresas que eram do Estado têm sido privatizadas, tendo em atenção a necessidade de um bom encaixe para redução da dívida pública, porque isso, por sua vez, vai servir para animar a economia, de forma a que não seja necessário canalizar para o Estado um grande excesso de fundos disponíveis mas também para que as empresas públicas, pela sua racionalização enquanto empresas privadas, sejam um bom motor de alavancagem da economia privada.
Portanto, Sr. Deputado, ao contrário do passado e ainda do presente, em alguns sectores da oposição o Governo tem acertado nas suas previsões macro-económicas e elas têm vindo a ser progressivamente superadas.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, creia que é a primeira vez que cumprimento um Secretário de Estado deste Governo pelo facto de ter sido nomeado para essas funções. Sabe que o faço com a maior das simpatias e que não esqueço a colaboração sempre correcta que deu na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Também não me esqueço que as suas brilhantes intervenções, aquando das minhas, foram um elemento do currículo que o fez provavelmente chegar a esse lugar - sempre achei isso.

Risos do Secretário de Estado do Orçamento, do PS e do PSD.

Sr. Secretário de Estado, estamos hoje a discutir as Contas de 1994 e de 1995. Ora, quando se discute a Conta Geral do Estado, aquilo que se discute - e peço-lhe desculpa de dizê-lo - não é rigorosamente nada daquilo que o Sr. Secretário de Estado hoje veio trazer aqui a este Hemiciclo. É que o Sr. Secretário de Estado veio aqui defender determinado tipo de opções políticas, feitas em alguns anos ou outros, mas isso não é o que retrata uma Conta Geral do Estado, isso é o que foi discutido no Orçamento. Aquilo que se discute na Conta Geral do Estado é se a Conta, tal qual é apresentada à Assembleia da República, cumpriu ou não, em termos financeiros, aquilo que estava definido no Orçamento do Estado - e não em termos políticos mas financeiros. E, para isso, é essencial o parecer do Tribunal de Contas sobre essa matéria.
Percebo que sobre a Conta Geral do Estado de 1994 nada haja a dizer, porque as contas estavam todas rigorosamente elaboradas. Percebo que alguma coisa houvesse a dizer sobre a Conta Geral do Estado de 1995, mas também percebo que seja pouco, na medida em que temos conhecimento, pelo Diário da República, dos trabalhos conjuntos que existem entre o Ministério das Finanças e o Tribunal de Contas, concretamente, dos grupos de tra-

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balho, para analisar exactamente as orientações do Tribunal de Contas. Nessa medida, a discussão da Conta Geral do Estado nesta Assembleia perdeu todo o sentido.

Protestos do PS.

Percebo, por isso, Sr. Secretário de Estado, que tenha alterado o seu discurso e lhe tenha dado um conteúdo diverso do que esperávamos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, retribuindo integralmente os cumprimentos que me dirigiu, também sabe que a minha simpatia, assim como a minha consideração intelectual e política, por V. Ex.ª é muito grande.
De qualquer das formas, isso não invalida que, de certo modo, concorde com V. Ex.ª. De facto, vim aqui falar daquilo que foi a inversão de política que o Governo levou a cabo e não propriamente discutir os problemas que vêm relevados no relatório do Tribunal de Contas,...

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - pois deixaria isso para os Srs. Deputados apreciarem. Mas se V. Ex.ª quer - e eu não estava muito interessado em referi-lo - posso dizer-lhe que o Tribunal de Contas evidencia que, em 1995, houve algumas irregularidades ao nível do IAPMEI, nomeadamente adjudicações directas ilegais, sem suficiente transparência e imparcialidade - aliás, na apresentação do Orçamento Rectificativo, dissemos isso; que houve atrasos, indefinições e insuficiências, provocando agravamentos no custo de empreitadas - também tínhamos dito isso aquando da discussão do Orçamento Rectificativo;...

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - que houve faltas de transparência e de imparcialidade está na pág. 14 -, com adjudicação a concorrentes em falência técnica - também está na pág. 14;...

O Sr. José Magalhães (PS): - E há mais!

O Orador: - ... que houve processos de privatização à margem do regime constitucional e legal quanto à aplicação da receita - está nas págs. 38 e 39; que a segurança social estava numa lógica estrita de resolução das necessidades de tesouraria da segurança social e apenas em termos conjunturais - está na pág. 51;...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Oiça o Vieira de Castro!

O Orador: - ... que houve uma inclusão no contrato de cessão de créditos da segurança social ao Estado de uma dívida do próprio Estado, o que evidencia uma engenharia financeira dificilmente explicável - está na pág. 56; ...

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Oiça o Rui Rio!

O Orador: - ... que houve ineficiência da Administração não só na recuperação dos seus créditos mas também na permissividade e prevaricação com actos ilícitos contra a segurança social - está na pág. 58

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Oiça o Carlos Encarnação!

O Orador: - ... e que continuou a verificar-se uma descapitalização real do sector da segurança social - está na pág. 68. Ou seja, em suma, Sr.ª Deputada, aquilo que o PS, antes do relatório do Tribunal de Contas, já dizia a propósito do Orçamento Rectificativo, veio a ser confirmado pelo Tribunal de Contas.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - O que é que o Tribunal de Contas vai dizer dos anos de 1997 e 1998?

O Sr. José Magalhães (PS): - Aguardemos serenamente!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Está, hoje, a Assembleia da República, nos termos da Constituição, a encerrar o processo do Orçamento do Estado dos anos de 1994 e 1995, através da tomada das contas do Estado dos anos já referenciados.
Vai longe o dia 20 de Junho de 1991, quando a Assembleia discutiu as contas do Estado de 12 anos, ou seja, do período percorrido entre 1976 e 1988.
Hoje, a Assembleia da República tem o processo em dia, decorrente do normal funcionamento do Estado democrático em que vivemos, ou seja, da apresentação das contas pelo Governo da República, a tempo e horas, assim como do envio à Assembleia da República do relatório do Tribunal de Contas, dentro dos prazos aplicáveis, e ainda do envio atempado das respostas dos serviços e entidades envolvidas nas questões suscitadas pelo Tribunal.
Saúdo a persistência da Sr.º Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano para que todo o processo das contas do Estado tivesse a celeridade desejável, assim como os Srs. Deputados relatores da referida Comissão, Deputado Matos Leitão e Rui Rio, pela qualidade dos relatórios por eles elaborados.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A discussão política sobre as Contas de 1994 e 1995 já foi feita, em momento próprio, num debate político aceso, cuja oportunidade política teve a ver com o momento vivido aquando da apresentação das contas referenciadas.
A discussão técnica foi desenvolvida pelo Tribunal de Contas, através das questões então solicitadas e das respostas dadas pelos serviços e entidades envolvidas pelas dúvidas do referido Tribunal.
Assim, o que a Assembleia da República está hoje a fazer é um acto formal, mas, dado o desfasamento temporal face aos anos em causa, pode fazer-se uma análise mais desapaixonada das Contas do Estado dos anos de 1994 e 1995.
E, então, o que se constata?

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O Sr. José Magalhães (PS): - Isso foi dito há pouco!

O Orador - Em primeiro lugar, a procura por todas as entidades do cumprimento dos prazos constitucionais e legais para a apresentação e discussão das contas, ao invés do ocorrido antes dos governos do Partido Social Democrata.

O Sr. Carlos Coelho (PSD):- Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, que persistem dúvidas do Tribunal de Contas, em algumas rubricas, apesar da melhoria que se vinha a registar nos anos anteriores. Os serviços justificaram todos os seus actos, mas algumas das referências do Tribunal merecem a nossa reflexão e será útil que o actual Governo esteja a agir em conformidade com essas recomendações.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - Em terceiro lugar, constata-se ainda que os valores macro-económicos, nomeadamente o défice orçamental, apresentam uma trajectória favorável, representando, assim, uma boa herança para o ano de 1996 e para o novo Governo da República, cumprindo o Governo anterior rigorosamente o orçamentado.
Apesar de todas as palavras e discursos proferidos pelo Governo socialista, com o objectivo de enganar os portugueses, a verdade acabou por vir ao de cima.
Mais uma vez, o Governo falou demais e demasiado cedo.
Mais uma vez, a realidade acabou por demonstrar que o Governo socialista estava errado e que herdou uma sólida situação financeira que lhe permitiu caminhar paulatinamente até ao euro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Aprecio o humor do Sr. Secretário de Estado do Orçamento,...

O Sr. José Magalhães (PS): - O rigor!

O Orador: - ... que aqui tentou demonstrar aos portugueses que, em dois meses, conseguiu inflectir a trajectória dos 10 meses anteriores. Mero humor! Ninguém acredita nisso!

O Sr. José Magalhães (PS): - O eleitorado acredita!

O Orador: - Recorda-se que todos estes actos políticos, demonstrados nas contas do Estado, foram concretizados quando a Europa vivia a crise económica mais grave desde a 2.ª Guerra Mundial e o governo desenvolvia profundas reformas na sociedade portuguesa.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Quais?

O Orador: - Bem diferente é a situação do presente, em que o Governo socialista não aproveita a envolvente económica externa positiva para governar compatibilizando o rigor orçamental com as reformas de modernização de que o País continua a necessitar.
Face ao exposto, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o Partido Social Democrata votará favoravelmente as propostas de resolução que aprovam a Conta Geral do Estado dos anos de 1994 e 1995.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Matos Leitão.

O Sr. Matos Leitão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, Sr.ªs e Srs. Deputados: Compete à Assembleia da República, nos termos do artigo 161º, alínea d), da Constituição da República, «tornar as contas do Estado e das demais entidades públicas que a lei determinar, as quais serão apresentadas até 31 de Dezembro do ano subsequente, com o parecer do Tribunal de Contas e os demais elementos necessários».
A Lei n.º 6/91, de 20 de Fevereiro (Enquadramento do Orçamento de Estado), estabelece, no artigo 24.º, que a Assembleia da República aprecia e aprova a Conta Geral do Estado até 30 de Junho seguinte.
É no cumprimento destes preceitos, constitucional e legal, que hoje apreciamos as Contas Gerais do Estado referentes aos anos de 1994 e 1995.
Já lá vai o tempo em que as Contas Gerais do Estado ficavam adormecidas no Parlamento, com o fim óbvio de impedir o controlo político do Governo. É bom recordar que esta Assembleia debateu as Contas Gerais do Estado relativas aos anos económicos de 1990, 1991, 1992 e 1993 apenas em Outubro de 1996 e que com a discussão de hoje, relativa aos anos de 1994 e 1995, contribuímos certamente para dignificar a Assembleia da República, que deu um passo importante para a indispensável normalização da avaliação política da gestão das finanças públicas.
Também, neste aspecto, coube ao PS e à nova maioria recuperar, recuperar, e recuperou mesmo.
Apreciar a Conta Geral do Estado é, em primeiro lugar, avaliar politicamente o Governo pelo seu desempenho na gestão dos dinheiros públicos, pela política orçamental e financeira aplicadas, em suma, pela avaliação política da execução orçamental.
A Conta denuncia, entre outros aspectos, as ilegalidades e irregularidades cometidas, mas também evidencia as promessas feitas e não cumpridas.
O Relatório do Tribunal de Contas relativo ao ano de 1994 salienta diversos aspectos negativos, sendo alguns caracterizados pela manutenção de práticas reiteradas de falta de rigor técnico no processo de orçamentação e continuação da verificação de um grande distanciamento temporal entre a data dos despachos de autorização das alterações orçamentais - a partir da qual produzem efeitos e a data da respectiva publicação no Diário da República. É óbvio que «estes atrasos comprometem a transparência da execução orçamental».
É, no entanto, gratificante sublinhar que o Relatório do Tribunal de Contas, referente à Conta Geral do Estado de 1995, refere expressamente que as alterações orçamentais efectuadas indiciam maior rigor técnico no processo de orçamentação que em anos anteriores.
A Conta Geral do Estado de 1995, em consequência do Orçamento Rectificativo apresentado pelo Governo da nova maioria, quase no final do ano, revela uma viragem histórica, já sublinhada, pelo reforço das políticas relativas às questões sociais, mas também pelo reforço das transferências para a administração local de 1,5 milhões de contos, correspondentes ao período de Outubro a Dezembro, pelo qual o novo Governo foi responsável.
De salientar que a evolução da execução orçamental, na óptica da classificação funcional, exprime, relativamente às funções sociais, os seguintes montantes: no ano de 1994,

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1956 milhões de contos; no ano de 1995, 2286,1 milhões de contos, e, no ano de 1996, 2469,1 milhões de contos.
Quanto à segurança social, o relatório do Tribunal de Contas refere expressamente a preocupação pela prática irregular, que se repete de ano para ano e que compromete o efectivo controlo externo da execução orçamental, relativa à publicação tardia do respectivo decreto-lei de execução orçamental, que, nos anos de 1994 e 1995, apenas foram publicados no Diário da República em fins de Julho.
Por outro lado, a segurança social, em 1994, foi financiada através de um empréstimo do Orçamento do Estado de 118 milhões de contos e, em 1995, pela aquisição de créditos à segurança social, no valor de 180 milhões de contos, colocando-se a gestão destes créditos sob a responsabilidade da Direcção-Geral do Tesouro, tendo em vista a sua recuperação.
Ou seja, em 1994 e 1995, o financiamento da segurança social foi efectuado de forma casuística, por meios artificiais, que evidenciavam a necessidade de definir regras precisas e transparentes.
Em 1996, assistiu-se, finalmente, ao cumprimento da Lei de Bases da Segurança Social pelo Governo do PS e da nova maioria, que transferiu do Orçamento do Estado para o orçamento da segurança social o montante de 355,7 milhões de contos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Um outro aspecto prende-se com as privatizações, cuja receita é legalmente transferida para o Fundo de Regularização da Dívida Pública e que vale a pena referir: em 1994, o orçamentado era de 200 milhões de contos e o realizado foi de 93,8 milhões de contos; em 1995, estavam previstos 195 milhões de contos e realizaram-se 144 milhões de contos; em 1996, o orçamentado foi de 380 milhões de contos e o realizado de 381 milhões de contos.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, Sr.ªs e Srs. Deputados: Termino com uma referência às previsões económicas e aos resultados então obtidos, que alimentavam a ideia, dentro e fora do País, que era impossível a Portugal cumprir os critérios de convergência.
No entanto, com uma nova política orçamental, não só foi possível atingir as metas a que nos tínhamos proposto mas também reforçar e definir novas políticas de pendor social.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - As privatizações são melhores! Lá isso é verdade!

O Orador: - Dir-se-á, como diz o povo: «o que lá vai, lá vai».
Eu direi: pois é, mas é bom não esquecer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Orçamento, permita-me que o cumprimente e lhe deseje as maiores felicidades no exercício das suas novas funções, a bem de Portugal.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Em relação às Contas Gerais do Estado de 1994 e 1995, o Partido Popular espera que a apreciação das Contas venha, em breve, cumprir o seu verdadeiro papel de avaliação da execução orçamental. Isto, porque a avaliação da execução orçamental tem, em nosso entender, duas componentes fundamentais.
A primeira, de avaliação política da efectiva execução das prioridades assumidas pelo governo, aquando da apresentação de cada Orçamento do Estado. Só com a Conta Geral do Estado se poderá verificar e comprovar se as prioridades sociais, económicas e políticas de cada Orçamento do Estado foram ou não realmente cumpridas.
Ora, não faz sentido fazer esta apreciação e as considerações inerentes, quando já não existe qualquer relação entre quem apresenta a Conta Geral do Estado e quem executou e apresentou o respectivo Orçamento do Estado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - E também já existe uma relação entre vós e quem a fez, não é verdade?!

O Orador: - Isto é, este debate reduz-se a um conjunto de considerações políticas, sempre oportunas e válidas, mas sem a necessária e consequente responsabilidade política dos executivos.
Esperamos que ainda no decorrer desta sessão legislativa se venha a apreciar a Conta Geral do Estado do ano de 1996, faltando para tal unicamente, ao que sabemos, o parecer do Tribunal de Contas, que julgamos vir a receber em breve.
Assim, este Governo poderá, ele próprio, apresentar as Contas por que foi responsável, não ficando assim isento às responsabilidades da análise política, social e económica da acção governativa a posteriori, presente na apreciação da Conta Geral de Estado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Honra lhe seja feita! Ao Governo!...

O Orador: - Aliás, sobre o controlo e transparência orçamental, o Partido Popular lamenta que não se tenha criado a subcomissão parlamentar para acompanhamento da execução orçamental e para a apreciação das Contas Gerais do Estado.
Lembramos que foi o actual Secretário de Estado do Orçamento quem, aquando da apreciação das Contas Gerais do Estado de 1990 a 1993, manifestou o interesse na criação desta subcomissão...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - E agora onde é que ele anda?!...

O Orador: - Assim sendo, hoje, enquanto responsável pela elaboração do Orçamento do Estado, deve continuar, com acrescido interesse, a desejar a criação desta subcomissão.
O Partido Popular, manifesta, desde já, a sua vontade e interesse na criação desta subcomissão, esperando que ela esteja já em funções para a apreciação da Conta Geral do Estado de 1996.
A segunda componente fundamental da avaliação da execução orçamental é, em nosso entender, a adequação da execução orçamental, nomeadamente os seus desvios em relação ao inicialmente orçamentado e às previsões na elaboração dos Orçamentos do Estado.

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A elaboração da Conta Geral do Estado, bem como a sua apreciação é, em nosso entender, um instrumento fundamental de ajuda à previsão e à elaboração dos orçamentos, sem o qual tudo será feito sem qualquer adesão à realidade e sem adequação às reais necessidades orçamentais.
Em conclusão, o Partido Popular reafirma o seu desejo de poder vir, o mais breve possível, a apreciar as Contas de 1996, das quais este Executivo é plenamente responsável, e reafirmar também a sua vontade - e nossa, Sr. Secretário do Estado - em criar a subcomissão de controlo orçamental para dar maior e melhor transparência às contas públicas, transparência essa desejada e exigida pelos portugueses.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não gostaria de terminar este debate sem dizer como me congratulo pelo facto de, provavelmente pela primeira vez desde há muitos anos, esta Assembleia ter conseguido ter em dia, direi, a aprovação das Contas Gerais do Estado. É que, normalmente, este debate acabava por ser feito sem grande solenidade e, em meu entender, o momento da aprovação da Conta Geral do Estado pela Assembleia da República é muito importante.
Em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano, fizemos um grande esforço para que este assunto fosse posto em dia. Penso que com isso ajudámos a prestigiar um trabalho fundamental desta Assembleia e, por isso, em nome da Comissão da Economia, Finanças e Plano, quero felicitar todos os meus colegas da Comissão, porque conseguimos alcançar um objectivo a que nos tínhamos proposto quando iniciámos as nossas funções.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria apenas de dizer que, da parte do PS, não há qualquer objecção a que se crie a subcomissão permanente de contas. Aliás, essa é uma velha reivindicação do PS quando estava na oposição e como o PS é coerente também no Governo aceitará a criação dessa subcomissão.
Gostaria ainda de me louvar nas palavras da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, que acabou de anunciar aqui um acto incontroverso: é a primeira vez que a aprovação das Contas sucede tempestivamente.
Por último, quero associar a este feliz evento o novel Secretário de Estado, meu querido amigo João Carlos Silva, a quem desejo muitas felicidades...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Bem precisa!

O Orador: - ... e que vejo na bancada do Governo com muita alegria, pois ele está ciente de que pode contar com a nossa colaboração, bem como nós poderemos contar com a dele.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação da Conta Geral do Estado de 1994.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e CDS-PP, votos contra do PCP e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação da Conta Geral do Estado de 1995.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP.

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, vamos agora entrar na discussão do projecto de resolução n.º 90/VII - Recomenda ao Instituto de Comunicação Social a sensibilização da concessionária de serviço público de televisão para a necessidade de tradução gestual da cobertura noticiosa dos principais acontecimentos nacionais e estrangeiros, apresentado pelo CDS-PP.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.

O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As injustiças da natureza criam diferenças cruéis para aqueles que são vítimas dessas mesmas injustiças. Nada podemos fazer para mudar a natureza mas muito podemos e devemos fazer para suprir as suas injustiças.
O projecto de resolução que o Partido Popular apresenta e hoje estamos a discutir, propõe que o serviço público de televisão assuma a responsabilidade de chegar a todos os portugueses, nomeadamente àqueles que sofrem de deficiências auditivas.
O serviço público não se pode mover só por critérios comerciais ou economicistas. Não pode, não deve, não tem de entrar no concurso das audiências, sacrificando o princípio basilar do serviço público, o princípio de responder, não só às maiorias mas, sobretudo, às minorias.
São mais de 400 000 os surdos-mudos em Portugal. São 400 000 as pessoas que são preteridas pelo serviço prestado pela RTP. São pessoas que não tem acesso à informação prestada nos serviços noticiosos, são pessoas que não tem acesso aos debates políticos, desportivos ou culturais.
Penso que é bom recordar que o serviço público é financiado, sobretudo, pelos impostos, impostos esses que são progressivos, dando expressão à redistribuição que se exige num Estado solidário.
A pergunta que se coloca e que deve ser respondida é esta: deve a RTP continuar a receber dinheiro dos impostos sem prestar o serviço público que todos desejam, que todos esperam, onde ninguém seja excluído?
Pela nossa parte, não questionamos a utilidade e a necessidade de um serviço público de televisão, mas questionamos a natureza do serviço prestado pela RTP. Por isso, o projecto que apresentamos dá um passo, fundamental, para que as minorias não sejam mais vítimas das causas que os excluíram dos privilégios das maiorias.
Temos, para nós, uma premissa muito cara: as deficiências, sendo absolutas para as suas vítimas, têm de ser sempre relativas para a sociedade que tem o dever de as suprir. É esse dever que o Partido Popular quer assumir.
Recordo-me de um filme, que muito me marcou, e que a ninguém ficou indiferente, julgo, que tinha como título

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Filhos de um Deus menor. Os protagonistas eram, efectivamente, surdos-mudos. No seu argumento estavam relatadas múltiplas situações em que estas deficiências provocavam graves marginalizações das pessoas vítimas desta insuficiência.
Mas a verdade é que o título do filme, para fazer justiça ao argumento, deveria ser: filhos de uma sociedade menor ... !
A verdade é que muitas das situações de marginalização poderiam ser ultrapassadas se a sociedade soubesse e quisesse dar resposta.
Sr. Presidente, Srs. Deputados. Penso que não é pedir muito ao serviço público de televisão que traduza, por via de língua gestual ou por legendagem, os principais debates e blocos informativos da RTP. Penso, também que não colhe o argumento dos custos financeiros, pois quando se fala de justiça não discuto o seu preço. Espero, pois, que esta Câmara, após 24 anos de democracia, não discuta o preço da justiça.
Mas se quiserem seguir esse caminho, desde já, avanço com a resposta: gaste-se menos dinheiro em telenovelas, gaste-se menos dinheiro a comprar direitos de transmissão de jogos de futebol, gaste-se menos dinheiro na realização de programas ocos, bacocos e vazios, cujo o único objectivo é entrar numa competição absurda com as audiências das televisões privadas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados - Porque hoje já é tarde, não vamos adiar a resolução deste problema; por isso e para isso, peço o vosso voto.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado Amândio de Oliveira.

O Sr Amândio de Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS-PP apresenta hoje à consideração desta Assembleia o projecto de resolução n.º 80/VII, que recomenda ao Instituto de Comunicação Social a sensibilização da RTP para a necessidade de tradução gestual da cobertura noticiosa dos principais acontecimentos nacionais e estrangeiros.
Para além das referências que o próprio projecto faz aos direitos protegidos constitucionalmente e ainda àqueles que advêm da actual Lei de Televisão, poderemos acrescentar o que dispõe o actual contrato de serviço público, que regula as relações do Estado com a empresa incumbida da prestação de serviço público de televisão: a RTP.
Este contrato refere-se a essa obrigação, desde logo, no seu preâmbulo e no seu próprio texto, na alínea d) do n.º 1 da cláusula 4.º e, igualmente, na alínea d) do n.º 1 da cláusula 6.º.
Parece-nos, portanto, não estarmos em presença de qualquer necessidade de alteração legislativa mas, tão-só, da necessidade de fazer cumprir aquilo que livremente a RTP contratou com o Estado e pelo qual recebe avultados valores, infelizmente em crescendo cada vez mais incompreensível.
É evidente que não desconhecemos a dificuldades de natureza técnica, mas consideramos que as de natureza material não podem existir, por um lado, pela sua real dimensão e, por outro, porque os direitos em presença não deverão permitir uma discussão desse tipo, para implementação integral desta obrigação.
Consideramos, portanto, que deve ser feita uma aproximação gradual ao cumprimento dessa obrigação genérica e específica da RTP e consideramos também que a mesma se poderia consubstanciar, numa primeira fase, na transmissão do principal serviço noticioso diário com a tradução gestual que se pretende.
Neste período transitório, consideramos também ser da maior importância a tradução gestual dos tempos de antena nos períodos eleitorais, como reafirmação de um direito que não podemos negar a ninguém.
Cumpre ao Governo, através das Secretarias de Estado da Comunicação Social e do Tesouro, como contratantes com a RTP, fazer cumprir o que com ela estipularam, para além da sensibilização ora solicitada ao Instituto da Comunicação Social.
Está, pois, o Grupo Parlamentar do PSD totalmente de acordo com este projecto de resolução e, por isso, votá-lo-á favoravelmente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto de resolução insere-se numa especial atenção que esta Assembleia passou a dar aos problemas da comunidade surda do nosso País, tendo essa atenção sido iniciada com a apresentação de um projecto de lei do PCP, aqui aprovado por unanimidade, na generalidade, que regulamentava o acesso à profissão de intérprete de língua gestual.
A questão levantada pelo PP neste projecto de resolução tem toda a relevância, uma vez que, hoje, há uma efectiva limitação para a comunidade não ouvinte no acesso à informação e aos mais básicos serviços informativos e noticiosos na televisão portuguesa, que se consubstancia numa clara discriminação desta comunidade, que deve ser, na medida das possibilidades humanas e reais, mitigada e que deve merecer uma especial atenção do Instituto de Comunicação Social e também da empresa pública que opera na área da televisão.
Vamos ter oportunidade de abordar esta matéria, a propósito da Lei da Televisão, que vai ser aqui discutida, na Assembleia da República, na qual estão previstas algumas normas que têm a ver com esta questão e que, provavelmente, merecerão aqui algum debate.
A questão da necessidade de tradução gestual, nomeadamente da cobertura noticiosa, não pode desligar-se da necessidade de, para isto acontecer - e é de lembrar que já existe, diariamente, um serviço noticioso que, no Canal 2 da RTP, é traduzido em língua gestual, bem como o programa Parlamento, transmitido semanalmente ao sábado -, ou seja, para acontecer o alargamento que é absolutamente exigível a outros serviços noticiosos, a todos eles, e a outros programas, formativos e informativos, que passam na televisão portuguesa, haver uma maior quantidade de intérpretes de língua gestual. Deste modo, é importante também que esta Assembleia, rapidamente, leve a bom termo o processo de discussão na especialidade e aprovação final do diploma que baixou à comissão relativo ao acesso à profissão de intérprete de língua gestual.
Em conclusão, esta é uma matéria que merece toda a atenção e um grande carinho por parte da Assembleia da República e deve merecer não só a sugestão de recomendações mas à tomada de medidas concretas, tanto da parte da Assembleia da República e do Governo como também das entidades públicas que operam na área da televisão, que devem garantir o acesso destes cidadãos, que

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são tão cidadãos como quaisquer outros, aos serviços noticiosos, ao serviço público de informação, direito este que lhes assiste e que tantas vezes, até agora, ainda não está concretizado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Antão Ramos.

O Sr. Antão Ramos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A surdez é um fenómeno complexo e, como já referi noutra oportunidade, constitui a sua consequência mais evidente não tanto a incapacidade para ouvir mas a relativa inacessibilidade à linguagem falada.
É neste ponto que reside a ruptura entre a oferta de programas televisivos disponibilizados pelas estações para livre escolha dos utentes e a efectiva impossibilidade de lhes aceder por parte da população surda, para quem a linguagem falada se encontra praticamente interdita.
Para uma maioria populacional existe televisão acessível e versátil. Para um outro extracto da população existe apenas um mínimo de televisão, incapaz de responder satisfatoriamente às suas necessidades, deixando as pessoas surdas exasperadas de perplexidade perante tão inexplicável abandono.
Posta a questão nestes termos, crus mas realistas, afigura-se evidente que um estado de coisas assim, a persistir, revela-se de todo discriminatório para a população surda, já que outro sentido não pode deixar de ter a recusa na adopção de soluções que obstem à remoção de tão indesejáveis barreiras.
Sabemos muito bem quais são as premissas, que as mais das vezes não passam de puros preconceitos, em que se ancoram os juízos dos ouvintes em relação aos surdos e quase todas elas se sustentam na ideia de que se trata de pessoas portadores de uma deficiência.
Nesta instância, que é ainda a dominante, como que se privilegia a sua incapacidade para ouvir. Assim visto, o surdo é um deficiente. Sem dúvida, uma pessoa, um cidadão, mas, em todo o caso, um deficiente.
E visto como um deficiente, a máxima generosidade resvala ou para as medidas de reabilitação, ainda extremamente precárias neste domínio, ou para as medidas de cariz adaptativo e integracionista, que não têm contado sucesso assinalável.
A comunidade dos surdos, porém, sobrevive com base numa premissa bem diferente. A comunidade surda, portadora de uma língua própria e tributária de uma cultura específica, assume-se como uma minoria linguística e cultural.
Dado que se podem exprimir na sua língua gestual, que é perfeitamente idónea para habilitar o surdo a comunicar com o mundo exterior, chega a ser cruel que se persista em estigmatizar uma mera impossibilidade de acesso à linguagem oral, ignorando que semelhante situação como que se volatilizará sempre que, do lado dos ouvintes, se manifestar disponibilidade para recorrer à língua gestual.
Com a língua gestual, os surdos podem comunicar entre si e poderão igualmente comunicar com os outros. Daí que se afigure acertado tornar acessível às pessoas surdas a possibilidade de comunicação através da língua gestual. De igual modo, será acertado que se estruture a programação das emissões televisivas de forma a promover a adequação dos programas, interpretando-os para a população surda, o que, como é sabido, constitui uma das mais fortes reivindicações dessas comunidades em todo o mundo.
Embora inserida num contexto diferente, ocorre-me citar a opinião de Harlan Lane, que, numa obra extraordinária de beleza e significado, A Máscara da Benevolência, nos diz isto : «Vive entre nós uma minoria cujos indivíduos estão impedidos de utilizar a sua própria linguagem, sendo levados a aprender outra que jamais lhes será possível praticar».
O gesto acompanha qualquer tipo de comunicação oral e desde o princípio da sua aprendizagem e ao longo da sua prática constitui, para os surdos, o modo natural de comunicar.
Os intérpretes de linguagem gestual, por seu turno, prestam inestimáveis serviços à população surda, permitindo-lhe ter acesso a uma variedade de informação na sua língua gestual materna, funcionando como elo de
comunicação entre a população surda e os ouvintes.
Daí que, com a introdução na televisão de programas onde, em simultâneo com a comunicação oral para os ouvintes, se assegure, para os surdos, a comunicação por via gestual, estaremos a tomar disponível à comunidade dos surdos e aos singulares indivíduos que a compõem as inegáveis vantagens decorrentes do acesso a tão poderoso meio de comunicação social.
Mas o recurso à língua gestual não é o único meio para alcançar tão valoroso objectivo e, em muitos casos, inclusive, é de aplicação televisiva inviável.
Outro meio técnico, que conhece grande difusão, é o da legendagem da comunicação oral visionada, inclusive com recurso ao teletexto. Só que este meio técnico terá o seu emprego vedado sempre que se trate, por exemplo, de transmissões em directo, em que a única solução viável será o recurso à língua gestual.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador. - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em Portugal não se vive alheado dos problemas que afectam a comunidade de surdos em geral e, em particular, das conexas questões de comunicação.
Ainda na recente revisão constitucional se proeurou dar respostas a tais preocupações, como é o caso do artigo 74.º da Constituição,...

O Sr. José Magalhães (PS) - Bem lembrado!

O Orador - .. em que se prescreve incumbir ao Estado, na realização da política educativa, entre o mais, valorizar a língua gestual portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso à educação e da igualdade de oportunidades.
Temos em Portugal mais de 20 000 surdos profundos, a que haverá que adicionar cerca de 130 000 indivíduos com patentes dificuldades de audição.
De entre os programas televisivos mais pretendidos pela população surda destacam-se os serviços noticiosos, os debates informativos, os programas de grande informação e o desporto.
Para tornar a televisão acessível à população surda haverá certamente que recorrer à língua gestual e às legendas, com ou sem recurso ao teletexto. Mas não só.
O papel da televisão, no que respeita à salvaguarda dos interesses dos surdos, não passa apenas pela adopção intensiva e progressiva dos referidos instrumentos. Também se revela indispensável estabelecer programações especí-

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ficas para pessoas surdas e programas especiais para crianças surdas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em qualquer caso, afigura-se também importante que seja assegurada a participação de pessoas surdas e das suas associações não só para a organização da programação a transmitir, seja ela legendada ou com recurso à língua gestual, mas também para seleccionar e organizar programas especiais para surdos, sobretudo para crianças.
Sabemos que a Radiotelevisão Portuguesa, por exemplo, já transmite diária e sistematicamente programas no Canal 2 (que cobre cerca de 92% do território nacional) recorrendo à interpretação em linguagem gestual (caso do Noticiário da Tarde, dos programas Cais do Oriente e Acontece) e programas semanais como sucede com os programas Parlamento e Novos Horizontes.
Sabemos também que a mesma empresa se propõe para muito breve iniciar a transmissão de programas de entretimento, como é o caso das telenovelas, mediante legendagem suportada em teletexto.
Temos conhecimento da disponibilidade do Governo para enfrentar estes problemas, a qual está bem traduzida na proposta de lei sobre a televisão, que será objecto de debate neste Plenário, creio eu já na próxima semana, ao considerar obrigação específica da programação da concessionária do serviço público de televisão «[...] garantir, de forma progressiva, que as emissões possam ser acompanhadas por pessoas com deficiência auditiva, recorrendo para o efeito à legendagem ou à interpretação através da língua gestual, bem como emitir programação específica direccionada para esses segmentos do público [...]».

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Afigura-se meritório o presente projecto de resolução, em que se recomenda ao Instituto de Comunicação Social a sensibilização para esta problemática acabada de explicitar.
Mas é preciso que, a par das atenções voltadas para esta específica problemática, se discipline a actividade dos intérpretes de língua gestual, se proceda rapidamente ao reconhecimento da língua gestual portuguesa, se promova a sua difusão pela população e se credenciem muitos intérpretes e monitores de formação.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Estou mesmo seguro que, no respeitante à RTP, a recomendação será tão bem recebida, quanto é certo tudo apontar para que a resposta exceda, e em muito, o que singelamente aqui se recomenda.
Por isso, a bancada do Partido Socialista votá-la-á favoravelmente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Amândio Oliveira.

O Sr. Amândio Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Antão Ramos, ouvi-o atentamente e, apesar de, no essencial, todas as bancadas estarem de acordo, gostaria de lhe colocar duas ou três questões.
Quando o Sr. Deputado diz que os serviços da RTP que já são transmitidos recorrendo à interpretação em linguagem gestual cobrem 92% do território, naturalmente, também tem presente que, apesar de cobrirem 92% do território, têm shares de audiência de 4 ou 5%, contra os restantes shares de audiência dos outros canais.
Por outro lado, pergunto-lhe se o Sr. Deputado considera ou não que, face ao teor do contrato que a RTP celebrou com o Estado, e pelo qual recebe milhões de contos, nos últimos três anos, foi qualquer coisa como 108 milhões de contos - o Sr. Deputado franziu a cara, mas, se fizer as somas entre indemnizações compensatórias e outras coisas, encontrará este valor -, que há a obrigação de a RTP estar a fazer aquilo que o Sr. Deputado diz que agora, a partir da aprovação da nova lei, ela vai fazer.
É que me parece que, desde há dois anos, há, da parte da RTP, uma clara situação de incumprimento e que deveria ter havido da parte das Secretarias de Estado da Comunicação Social e do Tesouro uma tomada de atitude relativamente a este incumprimento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Antão Ramos.

O Sr. Antão Ramos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Amândio Oliveira, desconheço por completo o share de audiência do Canal 2 no que diz respeito à população surda. Quero crer que a população surda, que, não tendo outro canal onde possa efectivamente beneficiar da comunicação através da televisão, possivelmente...

O Sr. Amândio Oliveira (PSD): - E isso não é discriminação?!

O Orador: - É, sem dúvida alguma, discriminação. Mas sobre isso também há qualquer coisa mais a dizer.
Como eu estava a dizer, desconheço esse share de audiência. Não tenho dúvidas nenhumas de que o Canal 2 tem um share de audiência inferior ao Canal 1 e inferior, de longe, às privadas, mas o facto é que, como serviço público que é, cobre 92% do território nacional, o que não acontece com as televisões privadas, que têm um share de audiência reconhecido e notoriamente superior.
Quanto à obrigatoriedade de a RTP transmitir esses programas, o que está em vigor neste momento é a Lei n.º 21/92, que faz uma referência episódica à atenção a dispensar pela televisão à população surda.
No entanto, há uma coisa que posso garantir ao Sr. Deputado: é que li o debate todo e não me lembro que, da sua bancada, tivesse sido feita qualquer referência a essa preocupação, no sentido da assistência à linguagem gestual e aos surdos na RTP. Os senhores passaram isso em claro. O PSD não referiu uma única vez o problema das minorias surdas. Isso é que é um facto! Agora, se é obrigação da televisão assumir essas responsabilidades e se as efectiva actualmente, acho que ela sempre as assumiu, e a própria lei já o previa. Aliás, a recomendação vem ao encontro do espírito da Lei n.º 21/92, que está em vigor.

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Mas, Sr. Deputado, de hoje a oito dias, teremos aqui uma proposta de uma nova lei da televisão, onde o assunto está amplamente considerado e aceite.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate. Desejo uma boa vitória de Portugal sobre a Inglaterra, uma vez que já havia aqui pedidos para que o debate acabasse, porque está prestes a começar o futebol.
Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se amanhã, a partir das 15 horas, com a discussão conjunta dos projectos de lei n.ºs 509/VII - Sistema Eleitoral para a Assembleia da República (PSD) e 516/VII - Lei Eleitoral para a Assembleia da República (PCP) e da proposta de lei n.º 169/VII - Aprova a Lei Eleitoral para a Assembleia da República.

Eram 19 horas e 55 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.

Partido Social Democrata (PSD):

António José Barradas Leitão.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Alves Marques Júnior.
António Bento da Silva Galamba.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Henrique José de Sousa Neto.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.

Partido Social Democrata (PSD):

João Bosco Soares Mota Amaral.
José Mendes Bota.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Manuel Fernando da Silva Monteiro.

Partido Comunista Português (PCP):

José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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