Página 2281
Sexta-feira, 8 de Maio de 1998 I Série - Número 67
DIÁRIO da Assembleia da República
VII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1997-1998)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 7 DE MAIO DE 1998
Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos
Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
José Ernesto Figueira dos Reis
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.
Antes da ontem do dia. - Deu-se conta da apresentação do Inquérito parlamentar n.º 7/VII, de requerimentos e de resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Francisco de Assis (PS) congratulou-se com a entrada de Portugal no euro e criticou as recentes posições políticas do PSD. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Octávio Teixeira (PCP).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Carlos Encarnação (PSD) referiu-se igualmente à adesão de Portugal ao euro, criticando o Governo por não fazer as reformas estruturais a que se comprometeu.
Foi aprovado o voto n.º 112/VII - De protesto pela instalação de um cemitério nuclear em Aldeadávila (Os Verdes), sobre o qual intervieram os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Joaquim Mattos (PCP), Paulo Neves (PS) e Artur Torres Pereira (PSD).
Foi igualmente aprovado o voto n.º 114/V11 - De congratulação pela passagem do Dia Nacional da Segurança Social (Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social), tendo usado da palavra os Srs. Deputados Elisa Damião (PS), António Rodrigues (PSD), Rodeia Machado (PCP), Moura e Silva (CDS-PP) e Barbosa de Oliveira (PS).
Procedeu-se ao debate de urgência, da iniciativa do CDS-PP, sobre o aumento das taxas de contribuição autárquica praticada por vários municípios. Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Pedro Feist (CDS-PP), Octávio Teixeira (PCP), Rui Rio (PSD), Manuel Varges (PS), Manuela Ferreira Leite (PSD), Manuel Monteiro (CDS-PP) e Joel Hasse Ferreira (PS).
Ordem do dia. - Foi debatida, na generalidade, a proposta de lei n.º 155/VII - Aprova o estatuto fiscal cooperativo. Intervieram, a diverso título, além dos Srs. Secretários de Estado do Emprego e Formação (Paulo Pedroso) e do Orçamento (João Carlos da Silva), os Srs. Deputados Augusto Boucinha (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), Lalanda Gonçalves (PSD) e Paulo Neves, Rui Namorado e Raimundo Narciso (PS).
Foi aprovado o projecto de deliberação n.º 49/VII - Alteração à Deliberação n.º 15-PL/89, de 7 de Dezembro (Presidente da AR), tendo feito intervenções os Srs. Deputados Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Rodeia Machado (PCP), Carlos Luís (PS) e Carlos Coelho (PSD).
Entretanto, foi aprovado, em votação final global, o texto final apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à proposta de lei n.º 158/VII - Define as regras sobre publicação, identificação e formulário dos diplomas.
A Câmara aprovou ainda três pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias autorizando dois Deputados do PS e outro do PSD a deporem em tribunal como testemunhas.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 55 minutos.
Página 2282
2282 I SÉRIE-NÚMERO 67
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 25 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
António Manuel Carmo Saleiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.,
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Pedro da Silva Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Rodrigues Costa de Brito.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria de Lurdes Ferreira da Silva Farinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Eduarda Bento Alves Ferronha.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Paulo Jorge Lúcio Arsênio.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Teresa Maria Gonçalves Gil Oliveira Pereira Narciso.
Victor Brito de Moura.
Partido Social Democrata (PSD):
Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
Página 2283
8 DE MAIO DE 1998 2283
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
José Mendes Bota.
Luc7ia Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Maria de Lurdes Lara Teixeira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Nuno José Vaz.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
António Almeida Figueiredo Barbosa Pombeiro.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Manuel José Flores Ferreira dos Ramos.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Pedro José Del Negro Feist.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
Deputado independente:
José Mário de Lemos Damião.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa o inquérito parlamentar n.º 7/VII - Constituição de uma Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar para apreciação dos actos dó Governo e das suas orientações de parceria em negócios envolvendo o Estado e interesses privados.
Foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: no dia de 28 de Abril de 1998, aos Ministérios do Ambiente e dos Negócios Estrangeiros, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Castro de Almeida; e ao Ministério da ,Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Lino de, Carvalho.
Na reunião plenária de 29 de Abril de 1998, ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das
Página 2284
2284 I SÉRIE-NÚMERO 67
Pescas, formulados pelos Srs. Deputados Cruz Oliveira e Costa Pereira; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Fernando Pedro Moutinho, Carvalho Martins e Luís Sá; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Mendes Bota; à Secretaria de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, formulado pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; aos Ministérios da Administração Interna è da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação; e a diversos Ministérios formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
Na reunião plenária de 30 de Abril de 1998, ao Ministério do Ambiente, formulados pelos Srs. Deputados António Saleiro e Costa Pereira; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; a diversos Ministérios, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Alves de Oliveira; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Frexes; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; à Secretaria de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, formulado pelo Sr. Deputado Roleira Marinho; e a diversos Ministérios e aos Conselhos de Administração da EDP, Transgás, Sociedade Portuguesa de Gás, TAP e IPE, formulado pelo Sr. Deputado Luís Queiró.
O Governo respondeu aos requerimentos formulados pelos seguintes Srs. Deputados:
No dia 29 de Abril de 1998 - António Filipe, na sessão de 9 de Maio; Arnaldo Homem Rebelo, na sessão de 5 de Fevereiro; e Mafalda Troncho, nas sessões de ll e 18 de Fevereiro.
No dia 30 de Abril de 1998 - Jorge Valente e Bernardino Soares, na sessão de 15 de Janeiro; Lucília Ferra, Mota Amaral e Lino de Carvalho, na sessão de 18 de Fevereiro; Manuela Aguiar, na sessão de.5 de Março; e José Cesário, na sessão de 16 de Março.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, inscreveram-se para declarações políticas os Srs. Deputados Francisco de Assis e Carlos Encarnação.
Tem apalavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.
O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A decisão formal, tomada pelos governantes dos países da União Europeia, no passado fim-de-semana, em Bruxelas, de criar o euro e a inclusão de Portugal no núcleo de países fundadores do mesmo constitui motivo suficiente para promover, em sede parlamentar, uma avaliação serena da natureza e amplitude dos desafios e carrinhos que se deparam no horizonte da Europa e do nosso país. Tal avaliação não pode deixar de incorporar uma reflexão mais aplicada sobre as circunstâncias mais significativas que caracterizam a actualidade política nacional.
Antes de mais, convirá afirmar que temos hoje razões para celebrar o feito alcançado, quer na perspectiva europeia quer no plano estritamente português. Na perspectiva europeia, porquanto se afigura claro que a União Europeia acaba de transpor uma importante fronteira no seu processo evolutivo, dando um passo gigantesco no sentido da materialização dos objectivos que inspiraram e animaram os seus pais fundadores. A criação do euro, consubstanciando a opção por um modelo de federalismo monetário e superando, assim, atávicas noções de soberania nacional, constitui uma poderosa alavanca que não deixará de impulsionar o movimento conducente à construção de uma verdadeira identidade europeia em múltiplos domínios políticos.
No plano nacional, há também que salientar a importância da adesão, logo no momento da sua fundação, à moeda única, já no que tal situação representa no âmbito estritamente económico, abrindo novas perspectivas de desenvolvimento ao País, já no que tal facto significa no domínio político, concorrendo decisivamente para a superação de um estatuto de nação periférica e alheia às grandes decisões europeias que historicamente tanto prejudicou Portugal.
Há, pois, motivos para exprimir um franco regozijo, mas há sobretudo razões para analisar, reflectir e agir. E, aliás, desejável que, em torno das questões europeias e de tudo quanto na política interna releva desta dimensão, agora mais incontornável, se manifeste, sem qualquer tipo de censura, o pluralismo das opiniões e ideias que caracteriza e estrutura o debate político numa sociedade democrática.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - A Europa e, em particular, as políticas a ela referentes não estão condenadas a permanecer num limbo meta-político, impermeável à discussão pública e à expressão das naturais divergências democráticas.
Para nós, socialistas, o euro deve constituir um instrumento fundamental em ordem à afirmação da União Europeia como um bloco regional de primeiro plano, num mundo cada vez mais interdependente e globalizado. Não concebemos a moeda única como a última etapa de um processo encerrado mas, antes, como um meio imprescindível para a promoção do crescimento económico, a criação de emprego, a melhoria das condições de vida dos cidadãos e a preservação do modelo social europeu.
Não ignoramos que, no momento da sua concepção, na sequência da queda do muro de Berlim, da desintegração do império soviético e da reunificação alemã, o processo conducente à unificação monetária da União Europeia foi impregnado de sinais próprios do ambiente político-económico então dominante e que era caracterizado pela prevalência do pensamento neo-liberal. Face à degradação definitiva do modelo marxista-leninista, de teor dirigista e estatizante, vivia-se a hora da sacralização do mercado e da anatemização de tudo quanto tinha a ver com o Estado e com a esfera pública.
Mas, entretanto, as coisas mudaram e a realidade encarregou-se de pôr cobro a tal estado de embriaguez ideológica. Constatada a incapacidade evidenciada pelos governos de inspiração liberal para enfrentar com sucesso os grandes problemas emergentes neste final de século, a maioria dos povos europeus voltou a confiar eleitoralmente nos socialistas e sociais-democratas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Perante o fantasma do desemprego estrutural, a degradação dos rendimentos do trabalho, o avanço da insegurança social, as ameaças ao Estado-Providência, o ressurgimento de desigualdades iníquas, os europeus voltaram a confiar na família política que, no pós-guerra, havia dado um contributo decisivo para a edificação da economia social de mercado. E eis, de novo, a esquerda democrática no poder.
É certo que muitas alterações ocorreram nos últimos 20 anos, impedindo a recuperação acrílica do paradigma de
Página 2285
8 DE MAIO DE 1998 2285
governação que caracterizou a acção desta corrente política até à ocorrência do primeiro choque petrolífero. A revolução individualista da década de 80, com a inerente valorização do princípio da responsabilidade individual, a emergência de uma nova visão acerca do papel e da função social da empresa, a revalorização do mercado e da concorrência, a desconfiança nas burocracias anónimas e tentaculares, tudo isto teve eco à esquerda e foi criticamente absorvido e integrado no património programático dos partidos socialistas e sociais-democratas.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - E é também por isso que nós, socialistas, somos profundamente europeístas.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Porque compreendemos que só à escala europeia se podem reconstituir mecanismos reguladores que organizem os mercados, consolidem uma protecção social moderna e concorram para a concretização de uma verdadeira igualdade de oportunidades. É este o caminho que queremos percorrer para enfrentar os desafios da globalização económica e cultural, aproveitando as suas :vantagens, que são inúmeras, e minorando as suas consequências perniciosas, que poderão ser algumas.
A esquerda democrática, no plano europeu, não é hoje uma corrente política remetida para quixotescas acções de resistência à mudança, encerrada numa espécie de conservadorismo corporativista e receosa do futuro; bem pelo contrário, é ela própria um agente fundamental do progresso e da modernidade.
Se é este o espírito que nos anima no plano europeu, é ele também que nos inspira no contexto nacional: Desde a sua investidura que o actual Governo tem vindo a apostar na concretização progressiva da convergência estrutural da economia portuguesa com as restantes economias comunitárias. Verificamos, com agrado, que tal objectivo tem vindo a ser alcançado.
Portugal não só foi capaz de cumprir todos os critérios da convergência nominal como tem também vindo a registar um ritmo de crescimento económico superior à média comunitária. Com este Governo tem sido possível levar a cabo uma rigorosa política de consolidação orçamental, visando o equilíbrio estrutural das finanças públicas, sem afectar negativamente o crescimento da economia, o nível do investimento público e a qualificação e reforço das funções sociais do Estado.
Tudo isto demonstra que se está a trilhar com êxito o caminho da modernização do País. Ciente, contudo, dos estrangulamentos e dos obstáculos a superar, o Governo tem revelado igualmente assinalável empenhamento na realização de significativas alterações que visam modernizar o Estado, reforçar a sua acção reguladora, melhorar a qualidade da sua relação com os cidadãos, coloca-lo ao serviço das iniciativas e aspirações dos indivíduos. Nesse sentido têm sido, gradual e progressivamente, tomadas decisões que introduzem modificações nos mais diversos domínios da vida pública. O Governo, elevando-se para além do puro casuísmo experimentalista, elaborou mesmo um documento que enviou à Assembleia da República, onde, de forma sistémica, conceptualiza a sua vontade reformista.
É hoje claro que o executivo tem um rumo, dispõe de instrumentos de navegação, age em função de uma visão e norteado por uma ambição para Portugal.
Infelizmente não se pode afirmar o mesmo da oposição e, em particular, da força política a quem teoricamente incumbe a tarefa de constituir uma alternativa de poder credível no nosso país. Atrevamo-nos a formular perguntas simples: alguém sabe hoje o que verdadeiramente pensa o PSD sobre as grandes questões do nosso tempo e do nosso país? Alguém se arriscaria a tentar adivinhar a natureza de uma eventual governação protagonizada pelo PSD? Conhecem-se-lhe convicções sólidas, orientações claras, posições rigorosas?
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não!
O Orador: - Para além da retórica vazia da reivindicação reformista em abstracto, que reformas preconiza em concreto o PSD? Que estratégia de desenvolvimento nacional sustenta, que prioridades elege, que linhas programáticas valoriza? Que visão, que ambição, que projecto fundamentam hoje a actuação política dó PSD? Em bom rigor, não nos parece que haja alguém em condições de responder a estas perguntas, a começar pelo próprio líder do PSD.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - A inconsistência programática, que caracteriza o maior partido da oposição, acaba por reflectir-se negativamente na qualidade do debate político, na medida em que o amputa de um pólo alternativo dotado de credibilidade e capacidade de produção de um discurso sério e apelativo. Verificamos, aliás, com crescente preocupação, que esta insuficiência se tem vindo a acentuar a olhos vistos.
Na sequência de um congresso, em que a nota mais relevante residiu na constatação pública de que triunfam dentro do PSD os que não acreditam no triunfo do PSD na competição política democrática nacional, o que, aliás, relevo mais do desânimo do que de qualquer tipo de hiper-lucidez analítica, tem este partido enveredado pela produção de um discurso político que raramente afirma e quase sempre se recolhe na insinuação, que investe mais na difamação do que na crítica fundamentada e acentua preferencialmente uma atitude negativista, abdicando de um postura construtiva. Até ao Congresso de Tavira, o PSD era o partido do tacticismo inconsequente, desde essa ocasião, transformou-se no partido do populismo indecente.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Ao acusar o Governo de prosseguir uma política reaccionária e ao pretender ilustrar tal tese com referências a alegados favorecimentos concedidos a alguns grupos económicos privados, o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa está apenas, pelo recurso a um registo populista, a pretender esconder o vazio programático do seu projecto e a unanimidade da solução política que pretende construir. A instrumentalização de minúsculos ressentimentos, assentes num fundo cultural anti-liberal e desconfiando da iniciativa e do espírito de empreendimento, 4 que o PSD agora despudoradamente recorre, é bem a expressão do desnorte que afecta o partido.
Aliás, ao reagir como está a reagir à política económica do Governo, o PSD dá sinais de um duplo arcaísmo, o arcaísmo próprio de quem não possui uma estratégia destinada a abordar os desafios da globalização e da internacionalização económicas e o arcaísmo reflexo de quem se
Página 2286
2286 I SÉRIE-NÚMERO 67
recusa a admitir que o socialismo democrático se não fixou estaticamente naquilo que era uma parte do seu pensamento há 50 anos atrás.
Para o PSD parece ser um escândalo verificar que o PS não estigmatiza a iniciativa privada, não cultiva uma visão estatizante da economia, não estabelece qualquer antinomia irredutível entre o Estado e o mercado. O PSD da era populista revela-se avesso à modernidade e prisioneiro de atavismos sem sentido.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - É por isso natural que este partido se exima a participar num debate estruturado em torno da apresentação de ideias, projectos e propostas concorrentes e alternativas e tenda a remeter-se para o campo da confrontação de suspeitas, insinuações e infâmias. O PSD prefere investir nas calúnias que inventa a apostar na discussão das reformas que ainda não concebeu. Essa é, aliás, a consequência mais deplorável do tipo de intervenção' pública que tem vindo a ser desenvolvida pelo PSD.
Daí que saudemos energicamente a decisão do Governo de solicitar à Procuradoria-Geral da República uma investigação rigorosa sobre a veracidade ou falsidade das acusações formuladas pelo PSD.
O Sr. Presidente: - Agradeço que abrevie, Sr. Deputado.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Não é só o Governo que tem o direito e o dever de salvaguardar o seu bom nome, são também os Portugueses que têm o direito de saber quem tala verdade e quem mente nesta particular questão. Ainda bem que o Governo cultiva uma visão exigente da ética da República, de resto coincidente com aquilo que é o património do partido nesta matéria. Esperemos tranquilamente pela conclusão dos inquéritos, na convicção de que estamos, Governo e PS, á dar um contributo inestimável para o revigoramento das instituições democráticas e o reforço da confiança dos portugueses nas mesmas. À calúnia opomos a transparência, à infâmia e à suspeição respondemos com a vontade de tudo clarificar e esclarecer.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Nesta nova fase, tão decisiva, da vida nacional, o PS está empenhado em concorrer para a promoção de um debate sério e para a execução das medidas apropriadas, visando a modernização do País, a qualificação dos portugueses, o reforço da coesão social e .ª consagração de uma verdadeira igualdade de oportunidades. Temos suficiente cultura democrática para percebermos a importância de uma oposição que, divergindo de nós no plano programático, se não afaste de uma atitude construtiva, nem abdique de sustentar um projecto alternativo sério para Portugal. Não é bom para a democracia que o debate se polarize entre quem encara com seriedade a responsabilidade de governar e quem e limita a agregar e estimular pequenos ressentimentos, como não é também conveniente que a imaginação discursiva da oposição se esgote no recurso a uma argumentação populista, vazia e até mesmo perigosa.
Daí que queira terminar esta intervenção exortando o PSD a assumir uma nova postura, mais compatível com a sua importância e de acordo com a natureza da função que lhe cabe exercer: É sempre negativo que um grande partido seja dominado por um espírito sectário ou que uma força política com vocação governativa se deixe acantonar numa postura meramente tribunícia.
É em nome do fortalecimento do' debate democrático que exortamos o PSD á dizer o que pensa sobre o País, que prioridades estabelece, que reformas em concreto privilegia e que conteúdo lhes atribui. Bem sabemos que esse caminho é mais difícil de prosseguir do que aquele que consiste em insinuar a suspeita e a calúnia, mas a democracia é um regime por natureza exigente, sob pena de ser ela própria vítima de alguma desconfiança popular.
O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - Assuma, pois, o PSD em plenitude as suas responsabilidades na vida democrática portuguesa, já que nós, na oposição ou no poder, nunca deixámos de assumir as nossas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, gostaria de começar por saudar o seu regresso a esta Câmara depois do desastre que teve, mas não vale a pena perguntar-lhe se já está completamente recuperado do ponto de vista físico, porque a sua intervenção e aquela entrada de rompante contra todos os marxismos que possam existir por este país mostram claramente que V. Ex.ª está, de facto, a 100%, em condições de recuperação política do seu discurso.
O Sr. Deputado veio juntar a sua satisfação à satisfação dos pais fundadores do euro e acredito que assim seja, que haja muita satisfação, embora se tenha visto, nos últimos dias, ou no início desta semana, alguma satisfação envergonhada, designadamente por parte de alguns membros do Governo e outros defensores acérrimos do euro.
Mas a questão que gostaria de lhe colocar é se essa satisfação dos pais fundadores não está em contraste flagrante com a insatisfação, com o descontentamento e com a. preocupação que mostram os filhos, isto é, os povos, e, no caso concreto, o povo português, que, aliás, teve oportunidade de o demonstrar nas manifestações populares do 25 de Abril e do 1.º de Maio que, há pouco, se verificaram no nosso país.
V. Ex.ª, certamente, nessa altura, estaria, por razões de saúde, retido em casa, mas terá tido conhecimento, com certeza, daquilo que foram a grandeza e a vivacidade dessas manifestações.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - Diz V. Ex.ª, na sua intervenção, que o Governo está para além dos casualismos. E pergunto-lhe se é uma comprovação de que o Governo está, de facto, para além dos casualismos a coincidência de, nos últimos dias, entrevistas do Ministro da Economia, do Ministro das Finanças e do Primeiro-Ministro terem dito que, afinal, as tão proclamadas reformas estruturais já não serão para esta Legislatura, terão de aguardar por uma próxima Legislatura. É essa a comprovação da sua afirmação de que o Governo do PS está para além dos casualismos?
O Sr. Rui Namorado (PS): - Essa pergunta poderia. ser feita pelo PSD!
Página 2287
8 DE MAIO DE 1998 2287
O Orador: - V. Ex.ª, Sr. Deputado, vai permitir-me que eu faça as perguntas que bem entenda, não!? Não me quer fazer censura!... Não quer fazer censura prévia às minhas perguntas, principalmente quando são dirigidas ao presidente do seu grupo parlamentar!...
Mas, Sr. Deputado Francisco de Assis, há uma última questão que lhe quero colocar. Agora não vou falar-lhe sobre a sua clara adesão ao pensamento único, considerando que isso é a esquerda moderna - não percebo como é que a esquerda moderna pode rever-se num pensamento único, que é fundamentalmente dominado pelas forças mais liberais -, mas gostaria de colocar-lhe uma última questão, uma questão que V. Ex.ª colocou ao PSD, mas que não tem a ver apenas com o PSD, e, aliás, julgo que exige uma clarificação pública da posição do PS sobre essa matéria.
O PSD fez ao Governo do PS acusações de favoritivismo político a vários grupos económicos. O Governo respondeu, lançando a questão para eventuais ilegalidades no favoritivismo que tem concedido a esses grupos. E eu pergunto: o Governo atirou para o campo da legalidade, agora, no campo político, no campo do haver ou não favorecimento político, objectivo e subjectivo, por parte do Governo do PS, o que é que o PS, o que é que o Grupo Parlamentar do PS, faz? Fica a ver? Fica a "assobiar para o ar" ou assume a posição claramente de jogar à defesa nesta matéria? E, se joga à defesa, explique-nos e ao povo português que razões os levam a jogar à defesa numa matéria tão complicada e tão complexa.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.
O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, começo por agradecer as referências que fez ao meu estado de saúde, mas olhe que, hoje em dia, não é preciso estar em grande forma para fazer um violento ataque às teses marxistas-leninistas, tal é o grau de desactualização que elas, de forma evidente, colocam. Basta olhar para a História com um sentido minimamente crítico, que é aquilo que os senhores ainda não foram capazes de fazer, para imediatamente fazer uma leitura da natureza daquela que acabei de fazer na intervenção que proferi da tribuna.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Agora o que está a dar é o Karl Popper!
O Orador: - Quanto às duas ou três questões que colocou, quero dizer-lhe o seguinte: em relação à questão do pensamento único, isso poderia levar-nos a uma ampla discussão. Começaria, por dizer-lhe que pior do que o pensamento único é o pensamento fixo, é o pensamento que não é capaz de integrar as alterações ocorridas na realidade, que desiste da análise social e económica, que não percebe as grandes mutações entretanto verificadas e que permanece prisioneiro de um modelo de representação política que poderá ter tido sentido noutras épocas e noutras circunstâncias, mas está hoje francamente desactualizado.
E quero crer mesmo que o problema histórico e estrutural do PCP é precisamente este. Ninguém pede ao PCP que adira às teses do pensamento único, agora o que pedimos ao PCP é que desista das teses de um pensamento fixo, que tem como efeito o fixa-los excessivamente numa época que, felizmente, já não é a nossa. E, em relação à Europa, é isso também que nos diferencia.
Eu disse, na intervenção que acabei de fazer, que reconhecíamos a natureza das circunstâncias em que o euro tinha sido formado e que o euro tinha sido permeável aos sinais resultantes da circunstância de essa época estar marcada pela prevalência teórica do pensamento liberal em todos os sentidos. Vivia-se, então, claramente a época da sacralização do mercado, anatemizava-se tudo o que tivesse a ver com o Estado e com a intervenção pública. Felizmente essa época passou. Justamente porque os governos de inspiração conservadora, os governos de inspiração liberal, não foram capazes de responder aos problemas emergentes neste final de século no contexto europeu é que os povos dos diversos países da Europa foram fazendo opções pelos partidos socialistas, trabalhistas e sociais-democratas, por essa Europa fora.
Agora, a nossa diferença é que nós entendemos que o euro, não sendo um ponto de chegada, não sendo um fim último de um processo encerrado, é, de facto,...
Vozes do PCP: - É o paraíso anunciado!
O Orador: - Uma diferença entre mim e os senhores é que nunca acreditei em nenhum paraíso absoluto, fosse anunciado pelo euro, fosse anunciado por Lenine, fosse anunciado por qualquer tipo de interpretação marxista.
Aplausos do PS.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Estão fartos de o anunciar todos os dias!
O Orador: - Esta também é uma diferença! E é esta diferença que nos permite, a mim e à bancada do PS, olhar para a realidade com um sentido crítico, com vontade transformadora, mas olhar para a realidade também com o pragmatismo suficiente, para que da nossa acção resultem efectivas transformações e se concorra para a melhoria das condições de vida das pessoas e para a superação das desigualdades que, de uma forma evidente, também nos indignam.
De modo que, em matéria europeia, concebemos claramente o euro de uma forma evidente, é um instrumento fundamental para a promoção do crescimento económico a nível europeu e para impulsionar no plano político a construção de uma nova arquitectura europeia, porque temos a noção muito exacta de que é hoje a um nível ,europeu que se podem reconstituir funções reguladoras, que, no passado, estiveram associadas à intervenção dos Estados nacionais, mas, agora, dado o fenómeno da globalização e da internacionalização económica e da interdependência económica e cultural, só podem ser eficazmente resolvidas se transferidas para essa esfera europeia, para essa esfera mais lata. É esta a nossa visão: uma visão ambiciosa e claramente ancorada e fundada nos valores referenciais da esquerda democrática.
O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - Permita-me só, Sr. Presidente, que responda à segunda questão colocada, que tem a ver com a circunstância de eu ter salientado o facto de o Governo ter solicitado à Procuradoria-Geral da República que pro-
Página 2288
2288 I SÉRIE-NÚMERO 67
cedesse a um inquérito para averiguar da veracidade ou da falsidade das calúnias e das infâmias lançadas ao Governo pelo PSD, alegando eventuais - ilegítimos e ilegais, a serem verdade - casos de favorecimento de determinados grupos empresariais privados.
O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Orador: -- Vou já terminar, Sr. Presidente.
Há aqui dois planos diferentes: há o plano político e nesse é natural que tenhamos posições diferentes - é natural que o PS continue a pensar que há uma antinomia verdadeiramente irredutível entre o Estado e o mercado; é natural que o PCP continue a pensar que é mau para o País que haja grandes grupos económicos com estratégias de internacionalização acertadas, é normal que o PCP continue a desconfiar exageradamente da iniciativa privada. Mas, do ponto de vista político, é bom que se enuncie essa fractura.
O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Não estamos espantados por o PCP pensar assim; estamos, sim, espantados pelo facto de o PSD dar sinais de que está a pensar exactamente da mesma maneira. Ao fim e ao cabo, o que nos causa um profundo espanto e nos suscita uma grande perplexidade e deu origem...
O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - ... à minha intervenção, a que, aliás, a bancada do PSD não respondeu, foi justamente isso.
Quanto ao resto, esperemos pelos esclarecimentos dos Srs. Deputados.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, informo a Câmara de que se encontram a assistir à sessão plenária vários grupos de alunos das Escolas Secundária de Campos de Melo, da Covilhã; Secundária Aurélia de Sousa, do Porto; E. B. 2,3 de Arroja; C+S de Pedrógão Grande; e E. B. 2,3 André de Resende, de Évora.
Para eles, peço a vossa habitual saudação.
Aplausos gerais, de pé.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, a falta que V. Ex.ª aqui fez! Cumprimento-o e saúdo-o pelo seu regresso. Bem preciso era!
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que vou hoje aqui dizer não pode resumir-se a uma cerimónia ritual. Tem, forçosamente, de ser uma declaração serena e responsável, de apreciação positiva, pelo facto registado.
Portugal faz parte, por mérito próprio, dos 11 países que integram o primeiro grupo do euro. E conseguiu este feito graças, em primeira linha, aos esforços, sacrifícios e participação empenhada dos portugueses.
Há 12 anos atrás, iniciou-se um longo e difícil processo, que assumiu os contornos de uma verdadeira saga colectiva.
Os portugueses quiseram demonstrar que eram tão capazes como os outros, tão europeus como os demais.
Foi um projecto de todos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É natural e legítimo que a primeira palavra seja para estes mesmos portugueses.
Aplausos do PSD.
Durante 10 anos, governos liderados pelo Prof. Cavaco Silva fizeram desse projecto a sua primeira prioridade.
Sem as reformas empreendidas, sem as medidas corajosas tomadas, não seria possível atingir a estabilidade económica, vencer crises, aguardar com confiança e tranquilidade o futuro.
Com o decurso do tempo, todos compreenderão por que é que foi absolutamente necessário não fraquejar, não hesitar um segundo, não quebrar na vontade.
Seria possível estar hoje no euro, sem arrancar com as privatizações, sem reformar o sistema tributário, sem prosseguir a convergência monetária, sem aderir ao SME?
Seria possível este resultado se, durante 10 anos, se não optasse pela contenção e redução da despesa pública, privilegiando o investimento em infra-estruturas?
Seria possível viver 10 anos de braços cruzados, à espera do próximo acto eleitoral e de saber se se devia ou não defender interesses instalados ou ter medo de gerar descontentamentos pela mudança?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Há dois anos atrás, nada começou do zero. O País tinha objectivos e tinha políticas.
Por isso, é também natural que uma segunda palavra seja para o Prof. Cavaco Silva e para o PSD, enquanto força política responsável pela linha de rumo traçada.
Aplausos do PSD.
Desde 1995, assumiu o poder outro partido e outro governo. Não sofreu quebra o ideal europeu. Havia consenso no essencial. Havia fórmulas diversas anunciadas.
Até agora, este Governo conseguiu manter a marcha dos indicadores económicos ho caminho exigido. Fez opções diferentes, mas conservou a ideia da convergência. Beneficiou de um país unido, no essencial, para responder às dúvidas externas sobre as nossas capacidades. Teve a seu lado, responsavelmente, o maior partido da oposição.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Pelo rumo que manteve, pelo momento que viveu, no Conselho Europeu, representando os portugueses, a ele se deve uma terceira palavra.
Sem qualquer reserva, sem qualquer intenção escondida, congratulamo-nos com o conseguido, felicitamos o Governo, saudamos nele o País.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Esta foi uma vitória de Portugal. Só é pena que o Sr. Primeiro-Ministro, neste particular momento, não tenha encontrado tempo para vir à Assembleia da República falar da Cimeira que assinalou este facto histórico.
Página 2289
8 DE MAIO DE 1998 2289
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O que continua a preocupar-nos e, porventura, a dividir-nos é o que se segue a este momento.
O projecto, o tal projecto a que nos referimos, não acaba aqui. E porque temos consciência disso, permanecemos, na nossa função de oposição, com a mesma constância e a mesma convicção, a afirmar aquilo que nos distingue e as soluções ou políticas que entendemos exigíveis.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Assim será nos próximos 10 anos!
O Orador: - Não fizemos esta viagem toda, tão dura e tão penosa, para "morrer na praia". Não nos satisfaz a chegada. É preciso continuar a ousar. É obrigatório persistir e consolidar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Até agora - e os senhores vão ficar contentes ao ouvir isto -, este Governo tem vivido de uma farta herança e da inércia resultante.
Um Governo que recebe, de 1995 a 1'998, mais de 1600 milhões de contos de privatizações, não é um Governo infeliz; um Governo que encaixa mais de 180 milhões de contos, no mesmo período, com a baixa das taxas de juro, não é um Governo desprotegido; mas um Governo que aumenta a despesa corrente em mais de 1160 milhões de contos, de 1995 a 1998, é um Governo despreocupado e ineficaz.
Por isso é que não estamos tão preocupados com o passado e estamos bem mais preocupados com o futuro.
Sem continuação das reformas e sem a sua concretização a um ritmo conveniente, não poderá ninguém ficar tranquilo nem confiante. .
E, por mais que o pretenda, o Governo não convence ninguém.
Parar por quatro anos sem continuar as reformas, é uma enormidade. É escandaloso demais.
É por isso que o Dr. João Salgueiro se interroga: "Encontro dificuldade em perceber como é que a maior parte dos portugueses consegue viver sossegado numa situação tão desfavorável em relação ao futuro".
É ainda esse o sentido das afirmações do Prof. Vital Moreira quando salienta: "Este Governo dá-se definitivamente mal com as reformas, ameaçando terminar a legislatura com um enorme défice de realização em relação ao prometido e ao devido".
Ou o pensamento traduzido de José Lamego ou de Vítor Cunha Rêgo.
E é esse o reflexo do apelo do Sr. Presidente da República quando reafirma que a reforma fiscal é essencial.
Que é isto? Conluiaram-se todos estes opinadores contra o Governo?
Não. O Governo é que, pela voz do Ministro Pina Moura, se aliou a eles.
É o Ministro e não o seu sósia (ou um duplo) que, em confissão pública, esclarece já não ser tempo para fazer as reformas que urgem.
E o pior é que todas as instituições internacionais reconhecem que as reformas que faltam são absolutamente necessárias e fundamentais. Sem elas será impossível continuar a aguentar este tremendo esforço.
Hoje mesmo, uma agência americana atribui a Portugal o pior rating do euro e o argumento decisivo é ligado ao desleixo nas reformas estruturais.
O Governo, atingido o êxtase, mantém-se, lânguido, na fase do mais profundo torpor.
É um Governo de braços caídos, como quaisquer bons e simpáticos grevistas desejosos de consideração social.
Como é que, neste panorama, o Primeiro-Ministro vem acusar alguém de provocai a quebra de confiança, se ninguém demonstra confiar na sua capacidade para continuar a fazer o que é preciso?
Como é que o Primeiro-Ministro vem transformar alguém, ou o Líder da oposição, no inimigo a abater quando tem tantos obstáculos a ultrapassar que só dele dependem?
Como é que o Primeiro-Ministro quer conquistar o País se não o mobiliza ou se o mobiliza apenas para o deixa andar?
Como é que o Primeiro-Ministro quer comprometer a oposição com aquilo que é uma estratégia de desistência, de adiamento, de irresponsabilidade?
Se o Primeiro-Ministro não quer. incomodar ninguém, é lá com ele.
Se o Primeiro-Ministro não quer governar, é connosco.
O Governo tem um ano para governar, querendo.
O Primeiro-Ministro não pode transformar o que lhe resta do mandato num passeio de férias.
Todos nós, todos os portugueses, pagaremos este passeio, mais tarde ou mais cedo, com juros acrescidos.
O Primeiro-Ministro existe para liderar o Governo e para decidir.
Não é preciso para inaugurar o que os outros fizeram ou para se limitar a ser o mestre de cerimónias. Nem é tarefa meritória do Primeiro-Ministro esgotar-se em campanhas contra o líder da oposição.
Seria pouco e mau demais que o governo existisse apenas para fazer oposição à oposição.
É que, talvez sem querer, transmite esta preocupação a todo o Governo e os cidadãos pensam que o Governo não tem mais nada que fazer.
O mais recente exemplo das Jornadas Parlamentares do Partido Socialista fala por si.
Foram elas utilizadas para inovar nas reformas? Não!
O silêncio sobre elas só serviu para lhes deitar mais terra para cima.
O Governo e o Partido Socialista não trataram do futuro, fixaram-se na vitimação defensiva.
O líder do PSD é a ameaça permanente.
Há dúvidas ou suspeições políticas?
Há mecanismos de fiscalização da Assembleia que se anunciam?
O Governo transforma-se em acusado e requer a investigação da existência do crime.
Isto é, o Governo quer sempre e só ser a vítima.
Ou porque a Oposição não cede aos seus encantos e não se lhe substitui nos sacrifícios do acto de governar. Ou porque a Oposição quer que a Assembleia assuma os seus poderes próprios. Desconfiar do Governo é crime. Discordar do Governo é sedição.
A Oposição, fazendo o que deve, é o mal. O Governo, não fazendo o que deve, é o bem.
Trata-se de uma lógica simples, a mais perversa, a mais absurda.
Não é assim que se constrói a confiança.
Como diz Fukuyama, "A confiança não reside nos circuitos integrados ou nas fibras ópticas. A confiança emerge
Página 2290
2290 I SÉRIE-NÚMERO 67
da prática de comportamentos de valor e a sua diferença ou ausência numa sociedade é determinada por hábitos, por costumes, por atitudes morais..."
Estar sempre pronto a fazer um negócio privilegiado, perdoando dívidas, com os mais poderosos e tentar passar sub-reptíciamente um aumento de impostos para milhões de pequenos ou médios contribuintes é o contrário da construção da confiança.
Quem assiste a este tipo de comportamentos não pode calar a sua denúncia.
É nossa obrigação avisar, alertar os portugueses, esclarecer e lutar pelo interesse de todos.
O Governo e o Partido Socialista não nos intimidam, não nos inibem, não contam com o nosso silêncio.
O inquérito parlamentar, aquele que W. Ex.as não querem, vai mesmo ser feito e vai sê-lo em nome da democracia.
O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - Para terminar, Sr. Presidente, quero dizer o seguinte: perguntou, há pouco, o líder do Grupo Parlamentar do Partido Socialista o que seria um governo do PSD. A resposta é tão simples que até me custa a dar, mas, todavia, vou mesmo dá-la para gáudio de todos. É tão simples como esta: um governo do PSD era mesmo um governo, isto é, governava.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo pedidos de esclarecimento e antes de passarmos ao debate de urgência requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, vamos discutir e votar os votos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura do primeiro voto, que entrou, o voto n.º 112/VII - De protesto pela instalação de um cemitério nuclear em Aldeadávila, apresentado por Os Verdes.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor: .
Considerando que o Estado espanhol decidiu retomar publicamente o seu projecto de construção de um cemitério nuclear junto à fronteira portuguesa, em Aldeadávila de la Ribera;
Considerando que essa instalação, agora também admitida numa proposta de estudo do Senado espanhol, visa armazenar definitivamente os resíduos radioactivos de alta densidade provenientes das centrais nucleares espanholas, cuja capacidade de armazenamento se está prestes a esgotar;
Considerando que a concretização de tal projecto, fortemente contestado pelas populações de ambos os lados da fronteira, constituiria uma ameaça permanente para a vida e a segurança das pessoas;
Considerando ainda as graves implicações ambientais, sociais e económicas que desta instalação resultariam para toda a região, muito em particular para toda a bacia do rio Douro;
Considerando, por último, que a construção deste cemitério nuclear corresponderia, de facto, à condenação definitiva daquela região e à hipoteca do seu futuro,
A Assembleia da República delibera:
1 - Exprimir a sua viva oposição a qualquer projecto de instalação de um cemitério nuclear junto à fronteira portuguesa.
2 - Apelar ao Governo português, no sentido do seu empenhamento activo junto do Estado espanhol para exigir informação, condenar este projecto e exigir o seu abandono definitivo.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr." Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: Apesar de o teor deste voto por nós apresentado ser suficientemente claro, em todo o caso, faz sentido, já que de algum modo a discussão deste tema foi feita há uma semana e pode não estar devidamente assinalada, dizer algo mais sobre ele.
O sentido deste voto é o de, perante um projecto do Estado espanhol, que decorre do seu próprio programa nuclear, de deposição num maciço geológico, situado na bacia do Douro, de resíduos radioactivos de alta actividade, dizer que, pára nós, este projecto de instalação é profundamente lesivo para Portugal, não só do ponto de vista ambiental como do ponto de vista económico e social.
Os concelhos transmontanos mais directamente agrangidos - Mirandela, Freixo de Espada à Cinta e Mogadouro - já se posicionaram, tendo participada, aliás, numa acção de protesto em Aldeadávila contra esta instalação. No dia 17, vai haver uma nova demonstração pública de protesto no território português, que aglutina os representantes locais de ambos os lados da fronteira, associações de produtores e de agricultores e movimentos e associações anti-nuclearistas e em defesa da vida e da paz. Ora, é nossa opinião de que a Assembleia da República Portuguesa não pode, perante esta situação - que não era de todo desconhecida, porque a deliberação de 1991 do governo espanhol, em relação ao seu programa nuclear e ao armazenamento de resíduos nucleares, colocava claramente esta localização como uma hipótese e identificava a bacia dó Douro como um dos locais para cemitério nuclear -, deixar de tomar uma posição, que, a nosso ver, se traduz em exigir informação, protestar e dizer claramente que Portugal rejeitou a opção nuclear e não quer herdar a opção nuclear espanhola.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!
O Sr. Presidente:- Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Manas.
O Sr. ]Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-nos extremamente oportuno este voto de protesto apresentado por Os Verdes, uma vez que não faz mais do que exprimir o sentido e o sentimento das populações, que, aliás, já se manifestaram oportunamente contra um atentado aos seus direitos e contra uma medida do governo espanhol tomada sem qualquer informação às populações e sem a clarificação necessária dos perigos que podem ou não advir de uma instalação deste tipo.
Parece-nos extremamente importante o segundo ponto do voto de protesto, porque o Governo português não pode, como até aqui, manter-se calado perante uma. situação destas.
Na verdade, o protesto das populações fez parar mas não abandonar este projecto do governo espanhol.
As notícias vindas a público dizem que este projecto ficará congelado durante 10 anos, mas a questão tem de ser definitiva e deve ser vista pelo Governo português, que
Página 2291
8 DE MAIO DE 1998 2291
não pode ficar à espera que sejam as populações a manifestar-se, manifestando a sua oposição clara para a tranquilidade de todos nós.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr.ª Deputada Isabel Castro, como a senhora admitiu na sua intervenção de abertura deste debate, há, um atraso no momento da discussão deste voto de protesto em relação ao momento em- que ele foi apresentado.
De facto, desde essa altura até ao momento presente passou-se alguma coisa e a senhora sabe-o: o Senado espanhol decidiu não permitir a construção do cemitério nuclear junto à fronteira portuguesa e mandou estudar outras alternativas e suspender este assunto, pelo menos, por um prazo de 15 anos.
Portanto, a situação que está definida nos considerandos do voto de protesto é completamente descabida.
De qualquer maneira, como a Sr.ª Deputada Natalina Moura aqui mencionou na semana passada, o PS e o Governo português estão, com certeza, o mais possível de acordo em garantir empenhadamente que não se construa qualquer cemitério nuclear junto à fronteira portuguesa e associamo-nos a todas as manifestações que vão nesse sentido.
Assim, pensamos que o ponto dois do voto de protesto é descabido, porque está ultrapassado, mas ao ponto um - e já o dissemos a semana passada - damos o nosso assentimento.
Em nosso entender, este voto de protesto só peca, neste momento, por estar desadequado da realidade em relação às próprias decisões das autoridades espanholas e dos pedidos de esclarecimento e das informações que o Governo português em devida altura exigiu das autoridades espanholas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr: Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD associa-se a este voto de protesto, porque, em primeiro lugar, está colocado ao País um problema sério, que tem a ver com a saúde pública, com a preservação do meio ambiente de uma dada região e com ameaças palpáveis à economia nacional e à economia dos produtos mais conhecidos e mais importantes daquela região como seja o vinho do Porto.
O facto de esta questão já ter sido colocada em 1987, o facto de ela ter sido na altura temporariamente abandonada e a circunstância de ela ter vindo agora a ser retomada, leva-nos a crer que qualquer decisão de qualquer instituição do Estado espanhol, que respeitamos, se traduz no fundo na substituição de uma ameaça de curto prazo por uma ameaça de médio e longo prazos.
Não podemos ficar sujeitos a quaisquer ameaças deste género e não podemos aceitar que as ameaças sejam diferidas no tempo, tranquilizando as consciências da nossa geração mas fazendo impender sobre as próximas gerações, sobre as gerações vindouras, ameaças que nenhum de nós ficaria de bem com. a nossa consciência se lhas transmitisse e não soubesse resolver um problema mas, sim, adiá-lo.
Assim, parece-nos que deve haver, por parte do Estado português, uma atitude inequívoca e uma posição indubitável de firmeza perante Espanha quanto à possibilidade dê, em qualquer altura no futuro, instalar um depósito de resíduos nucleares radioactivos junto às bacias hidrográficas dos rios que são comuns a Portugal e Espanha.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Srs. Deputados, esta não é uma questão do presente ou do futuro; é, sim, uma questão de todo 0 tempo que tem de ser resolvida pela nossa geração.
E esta responsabilidade que o Grupo Parlamentar do PSD não pode nem quer deixar de assumir hoje e aqui.
Aplausos do PSD.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, a bancada parlamentar do PS pretende saber se é possível, porque o deseja, fazer a votação do voto de protesto ponto por ponto.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, suponho que ninguém se opõe...
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, gostaria de, sob a figura regimental da interpelação à Mesa, dizer ao Grupo Parlamentar do PS que fez uma leitura incorrecta da minha intervenção.
Eu retomei esta questão, porque o Grupo Parlamentar do PS, como o Sr. Presidente bem sabe, há uma semana não quis votar este voto e requereu o seu adiamento para a sessão de hoje, usando de um direito que tem e que eu não contesto.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Não, não!
A Oradora: - O segundo aspecto - e este é que é substantivo e vamos ver que não fugimos ao que estamos a discutir, que é demasiado sério para brincadeiras - tem a ver com o seguinte: o problema que está colocado no voto é claro.
Há, de facto, uma retoma deste assunto por parte do Estado espanhol, que tem razões muito objectivas para o fazer quais sejam a de ter armazenar os seus resíduos radioactivos, uma vez que está no limite de tempo para encontrar uma localização, pois a sua capacidade de armazenagem está a chegar ao fim.
Entre os seis locais que estão admitidos e considerados está a bacia do Tejo. Portanto, da semana passada para esta a evolução não significa outra coisa que não o facto de um grupo de estudo do Senado espanhol - e só isso! - ter colocado dúvidas em relação a esta localização, o que não invalida de modo algum que a Assembleia da República se posicione e apele ao Governo português para
Página 2292
2292 I SÉRIE-NÚMERO 67
que o Estado português tome uma posição clara nesta matéria.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, vamos votar o voto de protesto que está dividido em dois pontos, por isso pedimos a sua votação separada.
Relativamente ao segundo ponto do voto de protesto, gostaria de lembrar à Mesa que esta diligência junto do Governo espanhol está concretizada e concluída. Portanto, o que vamos é "chover sobre o molhado"...
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, alguém se opõe a que se faça a votação por pontos?
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.
O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, do nosso ponto de vista, irão faz sentido a votação separada, visto que isso corresponderia, na prática, a diferir uma atitude que não podemos deixar de exigir por parte do Governo e do Estado português, não resolvendo o problema que temos na frente e metendo a nossa cabeça na areia.
Não queremos, pois, meter a nossa cabeça na areia, Sr. Presidente.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente:. - Srs. Deputados, parece-me que não há consenso para votarmos separadamente os dois pontos do voto...
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, apenas para registar que um pedido deste género nesta Assembleia não tem tido habitualmente como resposta das outras bancadas a que agora foi dada pelo Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, há aqui duas coisas diferentes: uma é a questão política, que foi tornada clara. Percebeu-se o que é que o PS quer ou, melhor, o que não quer!
O PSD, por seu lado, tornou clara a sua posição através da interpelação do Sr. Deputado Artur Torres Pereira.
Para nós, só faz sentido votarmos e aprovarmos este voto em conjunto, mas outra questão é a formal: desde que um grupo parlamentar requeira a votação ponto por ponto e desde que isso seja possível, isso é automaticamente aceite e não creio que valha a pena apresentar um requerimento nesse sentido e votá-lo.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, então, volto a perguntar se algum grupo parlamentar se opõe a que o voto de protesto seja votado separadamente.
O Orador: - Sr. Presidente, essa é uma faculdade que o Regimento dá a cada grupo parlamentar, ou seja, a possibilidade de requer a votação autónoma de parte de um documento.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, então, se todos estão de acordo vamos votar separadamente o voto de protesto.
Srs. Deputados vamos votar o. n.º 1.
Submetido à votação foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, vamos votar o n.º 2.
Submetido à votação foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.
Srs. Deputados, o voto será comunicado ao Governo através do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um requerimento, exercendo um direito que tem sido entendido como potestativo, no sentido de que o voto de congratulação, subscrito por Deputados do PSD e relativo ao facto de Portugal ser um dos membros fundadores do euro, fique para a próxima sessão legislativa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, presumo que esse requerimento está requerido nos termos regimentais e portanto não há nada a discutir sobre essa matéria.
Gostaria apenas que o Sr. Presidente identificasse o grupo parlamentar que tomou essa iniciativa.
O Sr. Presidente: - Foi o Grupo Parlamentar do PS.
O Orador: - Então, o PS não quis votar o voto de congratulação sobre a entrada de Portugal no euro.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: -.Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, é claro que o preâmbulo e a redacção provocatória, na linha recente de alguns dos Deputados do PSD, obriga. a que de facto se se quer fazer um voto sério isso seja devidamente tratado entre os grupos parlamentares que estão disponíveis para negociar uma redacção.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não precisa de justificar o requerimento. É um direito potestativo e está admitido.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ler o voto n.º 114 - De congratulação pela passagem do Dia Nacional da Segurança Social, apresentado pela Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): -- Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto de congratulação é do seguinte teor: "A Assembleia da República resolve:
1 - Saudar as expectativas encorajadoras do sistema de Segurança Social e o diagnóstico preliminar elaborado
Página 2293
8 DE MAIO DE 1998 2293
na sua pluralidade, de acordo com o qual, apesar da existência de áreas de desprotecção social e da necessidade de garantir a sustentabilidade do sistema a longo prazo, não se verificam indícios de crise no curto prazo.
2 - Congratular-se com o estudo desenvolvido pela Comissão do Livro Branco para-a Reforma da Segurança Social, que abre caminhos para a reforma estrutural do sistema, com base nas propostas destinadas a reforçar a sua sustentabilidade e a ampliar a sua eficiência e equidade, prosseguindo a solidariedade social.
3 - Promover o debate, de modo a que a reforma a empreender resulte da concertação entre as várias forças políticas e sociais e propicie, por um lado, a garantia do equilíbrio financeiro do sistema e, por outro, o reforço da coesão social."
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Damião.
A Sr.ª Elisa Damião (PS) - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta Assembleia, com o patrocínio de V. Ex.ª, realizou já, em torno da reforma da Segurança Social, dois colóquios, acompanhou a 8.ª Comissão os trabalhos da Comissão do Livro Branco e espera acompanhar, até a nível internacional, na próxima Conferência da OIT, os trabalhos e as reflexões sobre a necessidade de reformar estes importantes sistemas no sentido de continuarem a contribuir para a solidariedade e a protecção social, sobretudo dos mais fragilizados.
Esta Comissão congratula-se, pois, particularmente, com o Dia Nacional da Segurança Social, que decorre amanhã, e coloca grande expectativa na acuidade destas reformas e no sentido social que elas devem ter.
A maioria dos Deputados da Comissão de Solidariedade e Segurança Social quis, desta maneira - e já que amanhã não há Plenário -, manifestar o seu apoio a ,esta iniciativa e lembrar que o bem-estar é indispensável à felicidade das pessoas e ao equilíbrio das próprias sociedades.
Vozes do PS:- Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.
O Sr. António Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este voto de congratulação vem no sentido que todos nós comungamos, o de que a Segurança Social precisa de ser reformada urgentemente, dado que as decisões que se tomam hoje repercutem-se, necessariamente, tanto no nosso futuro como no das gerações vindouras.
O estudo que a Comissão do Livro Branco para a Reforma da Segurança Social elaborou não introduziu propostas claras e concretas de forma a que decorressem decisões, apenas abriu pistas relativamente a este debate de forma a que se tomassem decisões, decisões que ainda não há, mas que se exige que sejam tomadas rapidamente. E associamo-nos a este voto de congratulação pelo Dia Nacional da Segurança Social no sentido de contribuir para que, rapidamente, surjam essas mesmas propostas, claras, concisas, concretas em termos de futuro, :de forma que, rapidamente, se evidenciem os contornos do regime do futuro.
Também nós privilegiamos o equilíbrio do sistema e a coesão social, mas também nós queremos contribuir, de uma forma clara, como temos contribuído no quadro desta Assembleia, para discutir soluções, as quais esperamos que, rapidamente, o Governo consiga propor nesta Assembleia da República para que também aqui possa vir a ser discutidas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.
O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação a este voto de congratulação, o Grupo Parlamentar do PCP tem, desde logo, duas posições, ou seja, congratula-se pela passagem do Dia Nacional da Segurança Social, mas o voto está escrito de tal forma que não podemos associar-nos, naturalmente, à não congratulação pelas decisões da Comissão do Livro Branco, porque neste momento debate-se a reforma da Segurança Social, as decisões da Comissão do Livro Branco não foram universais, ou seja, nem toda a Comissão votou da mesma forma, há uma posição dos majoritários e dos minoritários na Comissão do Livro Branco e, portanto, nós não estamos de acordo com a congratulação que vem desenvolvida no voto.
Outro, sim, é o nosso pensamento sobre o sistema de Segurança Social, que, em nosso entender, deve assentar naquilo que a Constituição define, um sistema universal dê Segurança Social, um sistema assente num princípio de redistribuição, um sistema solidário e que tenha como fim o património que os trabalhadores descontaram ao longo de toda a vida. Consideramos que isso deve ser tido como ponto fundamental.
Não podemos admitir um sistema de Segurança Social em que haja "plafonamento" e em que seja afastada, de todo em' todo, a questão da solidariedade social, que é ponto fundamental na questão da Segurança Social em Portugal.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Popular, associar-me a este voto de congratulação pela passagem do Dia Nacional da Segurança Social e, a propósito, tecer algumas considerações.
É hoje claro - sobre isso parece que não restam dúvidas a ninguém - que é preciso proceder à reforma da Segurança Social. Há até mesmo quem afirme que a manutenção do actual sistema contribuiria para a sua falência.
No entanto, queremos aqui dizer que essa reforma tem de ser a busca de soluções para o equilíbrio e a sustentabilidade do sistema de Segurança Social, e que as reformas não podem, em circunstância alguma, pôr em causa todos os trabalhadores que, de alguma forma, contribuíram para o País que hoje somos e que, mesmo tendo pensões de miséria, não podem nem devem ser postas em causa.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Oliveira.
Página 2294
2294 I SÉRIE-NÚMERO 67
O Sr. Barbosa de Oliveira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De uma forma muito breve, queremos associar-nos a este voto de congratulação - que, de resto, aprovámos na Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social - e manifestar o nosso duplo regozijo, pelo facto de a maioria desta Câmara aprovar e pelo facto de termos ouvido que o PSD, finalmente, vai dar o seu contributo a esta reforma da Segurança Social, apresentando propostas concretas.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, foi requerida pelo Partido Comunista Português a votação, em separado, dos três números do voto n.º 114 - De congratulação pela passagem do Dia Nacional da Segurança Social (apresentado pela Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social). Alguém se opõe a que assim procedamos?
Pausa.
Como ninguém se opõe, vamos votar o n.º 1.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, passamos à votação do n.º 2.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS1PPP e votos contra do PCP e de Os Verdes.
Srs. Deputados, vamos agora votar o n.º 3.
Submetido à votação foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, a votação será comunicada ao Sr. Ministro do Trabalho e Solidariedade, através do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Srs. Deputados, vamos entrar no debate de urgência requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre o aumento das taxas de contribuição autárquica praticada por vários municípios, o qual não contará com a presença do Governo, uma vez que o Sr. Ministro informou a Mesa que não vê qualquer justificação para estar presente, uma vez que se trata de um assunto da administração autárquica.
Risos do PSD.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado
Pedro Feist.
O Sr. Pedro Feist (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, começo por lamentar a posição do Governo, que vem mostrar aquilo que a seguir direi e a pouca importância que dá a esta matéria.
Ao requerer o agendamento de um debate de urgência sobre o aumento das taxas de contribuição autárquica praticado por vários municípios, o CDS-15P visa dois grandes objectivos.
Em primeiro lugar, chamar a atenção dos portugueses para aquilo que é uma violação clara e inequívoca de um dos principais compromissos assumidos pelo Governo do Partido Socialista. Este compromisso, o de não aumentar os impostos, foi uma das bandeiras da campanha e uma das principais ideias dos programas - eleitoral e do governo - com que o Partido Socialista. conquistou os votos dos eleitores.
E enquanto, numas áreas, o Governo se limita a reflectir e a elaborar estudos que preparam as reformas iludindo, por omissão, a legítima presunção de que cumpriria as suas promessas, noutras desmente-o, despudoradamente, todos os dias e os portugueses começam a percebê-lo, nas suas vidas, nos seus bolsos, no defraudar das suas expectativas e na negação dos seus direitos.
E assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, chegamos ao segundo motivo que conduziu o CDS-PP a este debate: a defesa dos direitos dos portugueses. E os direitos dos portugueses não são, talvez ao contrário do que alguns pensam, uma realidade abstracta.
Falamos, neste caso, dos direitos dos senhorios e dos direitos dos inquilinos, ambos ofendidos com o agravamento de uma taxa que fornece aos senhorios o argumento bastante para que se escusem, sem que o possamos estranhar, a fazer obras nas casas de que são proprietários.
Falamos dos direitos de .uma classe média que anseia por uma casa própria e que vê penalizado esse seu desejo, legítimo, de ter e não de enriquecer.
Falamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, dos direitos dos jovens, que deveriam receber do Estado incentivos à aquisição de propriedade imobiliária, não só na forma de incentivos e isenções mais ou menos prolongadas, mas também na de garantia de incidência minimalista na taxa de contribuição autárquica.
Falamos também dos direitos dos investidores, que vêem vetada a possibilidade de optar pelo investimento imobiliário para posterior arrendamento, num dramático cenário de ausência de oferta de arrendamento urbano a preços comportáveis.
Por fim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, falamos do direito a um Governo coerente e verdadeiro, um Governo que respeite e cumpra os compromissos que assumiu. Falamos de um Governo que proceda à reforma do sistema fiscal, reforma essa pela qual, à semelhança de tantas outras que se comprometeu a fazer, continuamos a esperar.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Partido Popular quer saber, o Partido Popular quer que o País saiba o que dizem hoje os Srs. Membros do Governo e os Srs. Deputados do Partido Socialista perante a realidade.
Deixemos, pois, as intenções, as previsões, as promessas e os desejos para nos concentrarmos nos factos, e esses, Sr. Presidente e Srs. Deputados, são incontornáveis: é um facto que o limite máximo da taxa de contribuição autárquica aumentou de 1 para 1,3%; é um facto que este é um aumento de 30% da taxa de contribuição autárquica; é um facto que muitas câmaras municipais optaram pela adopção do limite máximo na aplicação da taxa de contribuição autárquica; é um facto que muitas dessas câmaras são dirigidos por executivos socialistas, comunistas e até sociais-democratas.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, as câmaras municipais dirigidas por executivos do CDS-PP não aumentaram essas mesmas taxas.
É por tudo isto que hoje, os portugueses querem perceber por que é que os Srs. Deputados do PS votam favoravelmente uma medida com o argumento de que ela não traduz qualquer aumento dos impostos, resultando muito possivelmente no contrário e, em seguida, os colegas socialistas dos Srs. Deputados socialistas adoptam, nas respectivas câmaras, os limites máximos estabelecidos para estas taxas.
Nós não percebemos e os portugueses também não.
Página 2295
8 DE MAIO DE 1998 2295
Por último Sr. Presidente e Srs. Deputados, o CDS-PP e os portugueses gostavam de saber se, no entender do V. Ex.as, esta alteração legislativa teve ou não resultados perversos na sua aplicação e se, à semelhança do que acontece com o CDS-PP, estão ou, não disponíveis para subscrever a redução para 1 %o do limite máximo da taxa de contribuição autárquica, proposta que o CDS-PI? assume na próxima discussão do Orçamento do Estado para 1999, uma vez que não se antevê a possibilidade de o Governo proceder, tal como se comprometera, a uma reforma global da tributação da propriedade.
E isto porque, em nosso entender, esta questão não pode ser analisada ou solucionada isoladamente. A questão da taxa de contribuição autárquica não pode ser separada de questões essenciais como a fixação do valor matricial, as avaliações e a determinação das isenções.
E estas questões dependem das competências, da diligência, ou do critério das câmaras municipais? Não, não dependem! Sabem-no os Srs. Deputados, sabêmo-lo nós e sabe-o o Governo. Sabemos todos que são questões da competência do Governo, sabemos todos que são questões que urge resolver de uma forma integrada, através de critérios claros uniformes e objectivos, como sabemos todos que estes problemas não podem continuar a depender de soluções isoladas, de tentativas pontuais de ultrapassar a inércia de um Executivo que tem à sua disposição diversos estudos que não utiliza, estudos que apontam para soluções que o Governo não adopta e não faz por adoptar.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, nós sabemos que é sempre mais fácil transferir o ónus da decisão para outros, neste caso para as câmaras municipais. Mas queremos, acima de tudo, que os senhores saibam, que os portugueses saibam, que este tipo de soluções mais do que ineficiente é iníquo e, deste modo, completamente inaceitável.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Vai anunciar que o PCP baixará a contribuição autárquica para 0,9%.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos termos em que foi proposto - "Sobre o aumento das taxas da contribuição autárquica praticada por vários Municípios" -,este debate, suscitado pelo Grupo Parlamentar do CDS/PP, exige, da parte do PCP, desde logo, a clarificação de uma questão de princípio.
A fixação da taxa da contribuição autárquica, dentro dos limites constantes da lei, é uma prerrogativa exclusiva das assembleias municipais que, assim, exercem o poder tributário próprio das autarquias locais constitucionalmente consagrado.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Por isso, não aceitamos que a Assembleia da República possa pretender questionar o livre exercício desse direito próprio pelas assembleias municipais, porquanto isso significaria pretender passar um atestado de menoridade ao poder local.
Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!
O Orador:- Admitamos, porém, que o CDS-PP se expressou incorrectamente quando requereu este debate e que o seu objectivo é o de questionar o facto de a Assembleia da República ter alterado, em Dezembro de 1996, os limites mínimo e máximo do intervalo dentro do qual as assembleias municipais podem legalmente fixar as taxas da contribuição autárquica.
Assim sendo, dificilmente se consegue entender que o CDS-PP, que, tal como nós próprios, na altura se absteve na votação da referida norma, só passados que foram 17 meses se tenha apercebido da posição de voto que então assumiu. Ao promover este debate, o CDS-PP pretende passar a si próprio um atestado de irresponsabilidade na votação do Orçamento do Estado, ou o faz por razões que, certamente, a razão não pode entender.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Por seu lado o PSD, que nestas coisas populistas não gosta de ficar atrás, e muito menos atrás do seu novo e bem-amado aliado para futuros actos eleitorais, já se apressou a apresentar um projecto de lei sobre o tema, projecto de lei que, a final, mais não visa do que antecipar o próximo Orçamento do Estado para 1999, o qual, nos termos constitucionais e legais, apenas deverá ser discutido e votado depois do dia 15 de Outubro do ano corrente.
Como o Presidente do PSD já pré-anunciou, no Congresso de Tavira, que o PSD viabilizaria o Orçamento do Estado para 1999, esta jogada de antecipação deverá querer significar, apenas e tão-só, que o PSD quer monopolizar os "louros" de uma nova alteração dos limites da taxa da contribuição autárquica. E é evidente que esta tentativa de monopolização assenta em bases exclusivamente altruístas e ninguém deve confundi-la com qualquer espécie de eleitoralismo fácil.
De qualquer modo, o facto de este debate se realizar dá-nos a nós, ao PCP, a possibilidade de, com seriedade, encararmos o problema de fundo, a questão do peso da contribuição autárquica sobre os contribuintes que a ela estão sujeitos.
E a questão de fundo é que, independentemente de o limite máximo da taxa ser de 1% ou de 1,3%, a verdade é que o peso fiscal é excessivo, situação resultante, basicamente, de duas ordens de razões interdependentes.
Por um lado, porque a contribuição autárquica está concentrada num reduzido número de contribuintes. A maior parte dos sujeitos passíveis deste imposto estão isentos.
Estão isentos, e esta é a segunda razão pela qual o valor tributável da grande maioria dos prédios rústicos e urbanos se encontra profundamente desactualizado.
E enquanto este problema não for resolvido, a contribuição autárquica continuará a pesar excessivamente sobre um reduzido número de contribuintes e a ser fonte de uma grande injustiça relativa entre os detentores de património predial. E não serão mais ou menos acalorados jogos verbais de demagogia populista, que conduzirão à resolução do problema.
Ele só será resolvido com a reforma necessária da tributação do património.
E, nesse campo, na omissão dessa reforma, os principais e grandes responsáveis são, sem margem para dúvidas, os Governos: os do PSD até 1995; o do PS de então para cá.
Talvez seja conveniente recordar que o Código da Contribuição Autárquica, apresentado por um governo do PSD e aprovado pelo seu Grupo Parlamentar, manteve em vigor as anteriores regras de determinação do valor tributável
Página 2296
2296 I SÉRIE-NÚMERO 67
até que visse a luz do dia um Código das Avaliações. Desde 1988 até 1995, os governos do PSI) e a sua maioria absoluta nesta Câmara nunca se dispuseram a apresentar tal código.
Idêntica é a responsabilidade do Governo do PS nestes dois anos e meios de governação. Sempre poderão dizer que já apresentaram um estudo sobre a matéria, que, independentemente da sua maior ou menor bondade, propunha a aplicação de critérios mais ou menos objectivos para a determinação actualizada do valor patrimonial dos prédios rústicos e urbanos. A verdade, porém, é que, depois disso e até hoje, o Governo não apresentou qualquer proposta de lei à Assembleia da República e meteu na gaveta do esquecimento esses ou quaisquer outros critérios.
O Sr. José Calçada (PCP): - Bem lembrado.
O Orador: - Aliás, é esta a prática que o Governo do PS vem reiteradamente assumindo no mundo da reforma do sistema fiscal. Muito proclamada nos textos programáticos da "nova maioria" e do Governo, a reforma fiscal do Partido Socialista deu lugar a um vazio confrangedor e, fundamentalmente, fortemente penalizador de um número reduzido de contribuintes. Quer eles sejam os trabalhadores por conta de outrem quer sejam os casais mais jovens que por ausência de alternativa válida têm vindo a ser obrigados a recorrer à aquisição de habitação própria.
Srs. Deputados, basta de demagogia.
Sem efectiva reforma da tributação do património, sem um adequado e justo alargamento da sua base tributável, não se resolve o problema da carga da contribuição autárquica. A menos que se queira lesar fortemente as receitas municipais e, em particular, as receitas dos grandes municípios urbanos, em que maiores e mais dispendiosas são as exigências de investimentos em infra-estruturas.
E sem uma reforma fiscal mais ampla, continuará a imperar a injustiça que sacrifica a generalidade dos trabalhadores por conta de outrem.
E é o Governo que tem essa responsabilidade!
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.
O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Membros do Governo, contava eu poder dizer, mas a não presença do Governo hoje, aqui, demonstra bem o seu incómodo com a situação presente. A sua não presença pouco tem também a ver com a política de diálogo. .
Mas, Sr. Presidente, admitindo que o Sr. Ministro das Finanças nos está a ver na TV-Cabo, começo por me dirigir à sua pessoa e assim, Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Deputados, quando, em Dezembro de 1996, se discutiu o Orçamento do Estado para o ano transacto, o Partido Social-Democrata foi o único que votou contra a proposta do Partido Socialista, que visava um brutal aumento da contribuição autárquica.
Nessa altura, pela voz do Sr. Deputado Duarte Pacheco, apelámos para o bom senso desta Câmara, no sentido de não se aprovar uma proposta que consignava um incompreensível aumento de impostos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - O Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apesar de ter repetidamente prometido aos portugueses que jamais aumentaria os impostos, fez orelhas moucas ao nosso apelo e votou favoravelmente o que não devia ter votado. Com ele abstiveram-se comprometedoramente todos os restantes grupos parlamentares. Formou-se aquilo que, em linguagem socialista, se poderia apelidar de coligação negativa. Coligação negativa, aliás, muito negativa, especialmente para os jovens e para os pequenos proprietários.
Decretou-se, nessa altura, um aumento de 30% da contribuição autárquica, na certeza de que os efeitos nos bolsos dos contribuintes seriam apenas sentidos no início de 1998, ou seja, já depois das recentes eleições autárquicas.
Em discurso arrebatado, o actual Secretário de Estado do Orçamento, à data eminente Deputado da então nova maioria, sintetizou a proposta em torno de um argumento fundamental: a Câmara não estava perante uma proposta de aumento de impostos mas, sim, um reforço do poder local. Reforço esse que, segundo o orador, correspondia aos anseios das próprias autarquias.
O PS tinha, assim, conseguido descobrir o argumento justificativo para qualquer aumento de impostos. À luz desse princípio, nunca mais haverá, em Portugal, aumentos de impostos. Passará a haver satisfação de anseios, no campo da educação, da saúde, da segurança social, enfim, nas múltiplas aplicações que um governo pode fazer com os impostos que cobra.
Só que, Sr: Presidente, em matéria de anseios, temos também de atender aos dos contribuintes, os quais ouviram, repetidas vezes, durante a campanha eleitoral, que jamais haveria aumento de impostos.-
Por isso, entendemos propor a reposição da taxa de l % como limite máximo para a contribuição autárquica, através de um projecto de lei já entregue na Mesa da Assembleia da República, cuja discussão está agendada para daqui a uma semana. É a oportunidade que todos têm de rectificar um aumento de impostos injusto e que penaliza, em primeira linha, a classe média. Com a apresentação dessa proposta concreta, evitamos que este debate de urgência se fique apenas pelas palavras. Queremos dar-lhe utilidade e, para isso, nada melhor do que ir de encontro aos anseios dos portugueses, que se sentem injustificados com uma medida, em má hora, aprovada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 1995, esta Assembleia, com outra composição política, resolveu - e bem - reduzir em 30% a taxa máxima de contribuição autárquica, ao mesmo tempo que procedia a um ajustamento dos valores matriciais, de acordo com a antiguidade dos prédios. Os mais antigos sofreram actualizações mais elevadas e os mais recentes, obviamente, menos elevadas. Por essa via, os mais antigos ficaram a pagar basicamente a mesma coisa que pagariam se não tivesse havido qualquer alteração e os mais recentes tiveram uma redução substancial da sua tributação.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Foi uma medida tomada por quem tinha plena consciência de que a situação, tal como ainda hoje está, representa uma clara injustiça para os proprietários de prédios recentes face aos proprietários de prédios mais antigos. Foi uma medida preocupada com uma promessa política vulgarmente designada por justiça fiscal.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
Página 2297
8 DE MAIO DE 1998 2297
O Orador: - O PSD não entende por que razão o PS não optou por fazer o que essa mesma justiça fiscal recomenda, em lugar de cegamente impor um aumento de taxas, aplicado de forma indistinta a todos os prédios, independentemente da sua antiguidade. Mesmo que a preocupação fosse apenas o aumento da carga fiscal, havia formas bem menos injustas de o fazer.
A falta de coragem para fazer as reformas que o País necessita e o Orçamento do Estado reclama acaba por redundar em situações deste género. Não é nada que nos deva admirar! Taxas de activação nas chamadas telefónicas, colectas mínimas, engenharias financeiras para justificar cortes nos incentivos às pequenas e médias empresas ou aumentos da contribuição autárquica são, todas elas, medidas cuja origem está, obviamente, na necessidade de angariação de verbas para pagar o défice de coragem política.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Se assim não fosse, o País estaria, neste momento, não à espera de uma decisão desta Assembleia sobre o projecto de lei do PSD mas, sim, a debater a reforma da tributação do património. Seria assim se o Governo português olhasse para o euro, tal como, aliás, não se cansa de tentar proclamar, como um ponto de partida e não como um ponto de chegada.
Olhar para a moeda única como ponto de partida é, acima de tudo, preparar o futuro e fazer as reformas que o País necessita. Olhar para o euro como ponto de chegada é utilizar este êxito nacional para um grande lançamento de foguetes com inegável impacto político, mas, infelizmente, com contrapartida directa no bolso dos contribuintes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tal como quando a medida foi aqui votada, continuamos a discordar do aumento de 30% na taxa de contribuição autárquica. Tal como nessa altura, seremos consequentes e iremos lutar para que esta Assembleia revogue, urgentemente, a injustiça que cometeu.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Varges.
O Sr. Manuel Varges (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate está fora de tempo, não tem sentido, revela uma enorme falta de rigor e, permitam-me, alguma falta de seriedade política.
Vozes do PS: - Muito bem!
Vozes do PSD e do CDS-PP: - Não apoiado!
O Orador: - Em primeiro lugar, esta discussão está. fora de tempo porque, como é sabido, o intervalo das taxas de contribuição autárquica que a cada município cabe depois fixar é decidido em cada ano por esta Assembleia da República, no quadro da discussão e aprovação do Orçamento do Estado.
Logo, daqui a cinco meses, quando se iniciar nesta Casa a discussão da proposta de lei de Orçamento do Estado para 1999, será o tempo próprio para aprofundar esta questão. Aos partidos políticos caberá sempre o papel de concordar, de discordar ou de apresentar, querendo, propostas de alteração à proposta de lei de Orçamento, nomeadamente sobre esta matéria.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Como é sabido" Srs. Deputados, o aumento do limita máximo da taxa de contribuição autárquica para os prédios urbanos de 1% para 1,3%...
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Dá jeito ao João Soares!
O Orador: - ... ocorreu aquando da aprovação do Orçamento do Estado para 1997, ou seja, quase há dois anos, e o CDS-PP, nessa ocasião, não apresentou, nem no debate na generalidade nem na especialidade, qualquer proposta de alteração sobre esta matéria.
Vozes do PS: - Exactamente!
O Orador: - Também na discussão do Orçamento do Estado para 1998 não houve, por parte do CDS-PP ou de outro partido, qualquer proposta de alteração nesta mesma matéria. Assim, concluímos que os partidos, nomeadamente o CDS-PP, andaram quase dois anos convencidos de que neste domínio, como em muitos outros, não havia qualquer injustiça.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Está a concluir mal!
O Orador: - Porque, de facto, não há!...
Estado, pois, a cerca de cinco meses de se iniciarem os trabalhos de apreciação do Orçamento de Estado para 1999, perguntamo-nos por que razão o CDS-PP e o PSD querem antecipar uma discussão que sempre teve o seu tempo marcado.
Em segundo lugar, como disse, este debate de urgência não tem sentido. Teria tido sentido, sim, quando 0 PSD, em 1994, trouxe aqui a proposta de lei de Orçamento do Estado para 1995. No seu artigo 42.º, o PSD fez aprovar uma tabela de factores de actualização do valor tributável dos prédios urbanos. Aí, sim, obrigaram-se os proprietários dos imóveis registados antes de 31 de Dezembro de 1988 a um aumento de 30% na sua contribuição autárquica, sem qualquer responsabilidade das autarquias, disfarçando, depois, essa valorização com uma diminuição do tecto máximo de 1,3%, que o PSD sempre praticou desde 1989, para 1 %.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - De referir, a este propósito, que o Conselho Geral da Associação Nacional de Municípios Portugueses, reunido em Coimbra em 15 de Novembro de 1996, aprovou uma moção em que, no seu ponto 9.1, manifestava as suas preocupações sobre a diminuição da receita da contribuição autárquica e da sisa, derivada do decréscimo das taxas aprovadas pelo PSD, quando aqui tinha maioria, em 1994.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!
O Orador: - Pretendendo o PSD, com estes factores de actualização que aprovou, resolver o problema do desajustamento entre o valor real e actual dos imóveis e
Página 2298
2298 I SÉRIE-NÚMERO 67
o valor registado à data da sua compra, não teve o PSE) a coragem de ir mais longe. Não só não resolveu o problema - que não é simples, reconheça-se - como manteve a enorme injustiça em relação aos que hoje adquirem o seu andar a preços actuais de mercado e pagam a contribuição autárquica com base nesse valor, que é sempre, no mínimo, 10 vezes superior aos que o adquiriram há 15 ou 20 anos.
Registo, aliás, com alguma estranheza, Srs. Deputados do PSD, que nenhum dos Deputados do PSD membro da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente está presente neste debate,...
O Sr. José Junqueiro (PS): - É muito estranho e é bem lembrado!
O Orador: - ... o que pode significar que na bancada do PSD poderá, afinal, não haver muito concordância sobre esta matéria.
Em terceiro lugar, este debate de urgência revela uma enorme falta de rigor e de seriedade política.
Não é sério nem rigoroso afirmar que se retomou o limite máximo de 1,3% sem referir também, com justiça, que se reduziu o limite mínimo de 0,8% para 0,7%.
Como também não é sério nem rigoroso omitir que a competência para deliberar sobre estas taxas, como já foi aqui afirmado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, pertence às assembleias municipais.
De igual Podo, não é sério nem rigoroso, como até é falso, afirmar que a contribuição autárquica, em Portugal, aumentou 30% pelo simples facto de, há dois anos, se ter assumido a possibilidade de os municípios retomarem o limite máximo de 1,3%,...
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Quais?!
O Orador: - ... que o PSD instituiu, ou adoptarem; uma diminuição para 0,7%, para o limite mínimo que o PS fixou.
É tão falso, e revela tanta falta de rigor e seriedade, que o CDS-PP não se deu conta, faz de conta que não sabe ou não quer mesmo saber que apenas 48 municípios em Portugal adoptaram, até hoje, o limite máximo de 1,3%,...
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Quais?!
O Orador: - ... sendo 22 deles do PSD, e houve 65 municípios que adoptaram uma redução para 0,7%.
Protestos do CDS-PP.
Ou seja, Srs. Deputados, houve 65 municípios que até reduziram as suas taxas, há apenas 48 que as aumentaram, há 157 que mantiveram as suas taxas entre os 0,8% e 1 %, que o PSD sempre adoptou. Querem agora convencer-me os Srs. Deputados do CDS-PP que, matematicamente, isto significa um aumento de 30% na contribuição autárquica em Portugal! Dispenso essas lições, como economista e como matemático!
Vozes do CDS-PP: - Só Lisboa já chega! Já lhe explicamos como!
O Orador: - Mas este debate também não faz sentido nem é sério porque, em primeiro lugar, os senhores não quiseram debater este assunto na discussão do Orçamento do Estado para 1997: depois, não o quiseram discutir aquando da discussão do Orçamento do Estado para 1998; e, pelos vistos, também não o querem debater no local e momento próprios, na discussão do Orçamento de Estado para 1999.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Cá estaremos!
O Orador: - Mas o mais grave é que, apesar de quererem discutir esta matéria hoje e não quando for o seu tempo próprio, na próxima discussão do Orçamento do Estado para 1999, daqui a cinco meses, ainda se propõem voltar a repetir esta mesma questão daqui a uma semana, quando os vossos parceiros de coligação aqui apresentarem, como já disseram, um projecto de lei que vai no mesmo sentido deste debate de urgência, ou seja, no da diminuição do limite máximo da taxa da contribuição autárquica para 1%. Aliás, este debate não faz sentido, porque, como é lógico, não vai ser objecto de deliberação, mas o projecto de lei do PSD sê-lo-á
Portanto, não tem qualquer sentido este vosso pedido de debate de urgência.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!
O Orador: - Sobre o projecto do PSD, Sr. Deputado Rui Rio, falaremos daqui a uma semana, mas é curioso desde já realçar três coisas interessantes que a sua intervenção sugeriu.
Em primeiro lugar, também o PSD, na página 2 do seu projecto de lei, afirma que "a contribuição autárquica foi aumentada de I% para um máximo de 1,3%" e conclui "ou seja, 30% de aumento",...
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Não deve morar
em Lisboa!
O Orador: - ... sem referir sequer, porque seria de justiça referi-la, a diminuição do limite mínimo para 0,7% e sem constatar o que é uma realidade nesta matéria, ou seja, que houve 65, municípios que adoptaram o limite mínimo proposto pelo PS e 157 que mantiveram os limites por que anteriormente se regulavam.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, e é curioso, o Sr. Deputado Luís Marques Mendes, que não está presente mas é o primeiro subscritor do vosso projecto de lei, tem um estatuto estranho: é líder do grupo parlamentar e, simultaneamente, presidente de uma assembleia municipal que, por acaso, não cumpriu o limite de 1%, o que os senhores entendem como injusto e calamitoso. Seria bom que, com coerência, o Sr. Deputado Luís Marques Mendes, que é o primeiro subscritor do vosso projecto, repito, no seu município e junto dos seus deputados municipais, tivesse propalado a ideia de que, afinal, como os senhores dizem no vosso projecto, há um "sentimento generalizado de revolta pela injustiça desse aumento". Ele deveria ter propalado essa ideia junto dós vossos eleitores e dos vossos representantes municipais em Oeiras.
Em terceiro lugar, não deixa de ser estranho que tanto o PSD como o CDS-PP clamem justamente por medidas profundas de reforma fiscal e, ao mesmo tempo, não contribuam para o aprofundamento das discussões e audições
Página 2299
8 DE MAIO DE 1998 2299
já havidas na Comissão de Economia, Finanças e Plano com a Comissão de Reforma da Tributação do Património e outras entidades competentes sobre a matéria, onde nos centrámos sobre as questões da sua correcta avaliação, desde o anterior conceito de "valor padrão por metro quadrado" ao novo conceito de "valor base territorial".
A própria Associação Nacional de Municípios Portugueses entende e reafirma, em parecer de 16 de Abril último, há menos de um mês, que as soluções de fundo passam pela necessidade de que " Assembleia da República e o Governo corrijam as injustiças verificadas, reforçando a equidade entre proprietários, através do reforço da base tributável, o qual pode e deve levar a um considerável decréscimo das taxas aplicáveis".
Tanto mais que é de todos conhecido que o Governo sobre esta matéria já decidiu, por resolução do Conselho de Ministros de 23 de Janeiro, no sentido de que a tributação do património deve ser efectuada através da criação de um imposto único sobre a riqueza mobiliária e imobiliária, com a simultânea extinção da contribuição autárquica, do imposto municipal da sisa e do imposto de sucessões e doações.
Como a reforma da tributação sobre o património não pode esquecer que esta constitui uma receita importante das autarquias locais, temos consciência, e o Governo também, de que esta reforma da tributação sobre o património tem de realizar-se em articulação com a reforma da Lei das Finanças Locais.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, queira terminar.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Propor ajustamentos casuísticos ou pontuais, mas sem perder o sentido das grandes reformas, é sempre possível neste local e no tempo próprio, desde que assumidos com sentido de responsabilidade e de seriedade política, o que, como demonstrámos, não é o caso deste debate de urgência.
Para debates como este, e pelo que foi já dito, não contarão certamente connosco.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.
O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Varges, fez mal em falar naquela medida de 1995. O que aconteceu em 1995 foi o seguinte: baixámos a taxa em 30% e aumentámos o valor matricial 'de forma escalonada, sendo o máximo 30%. Portanto, no máximo, as pessoas ficaram iguais, que foi o caso dos proprietários dos prédios antigos, e todos os demais baixaram. Se VV. Ex.as, agora, querem aumentar outra vez a taxa, terão de repor o valor matricial que existia.
Mas ainda bem que falou nessa medida, porque assim fica claríssima a diferença entre o que aconteceu em 1995 e o que aconteceu agora.
Quanto à contabilidade que fez, sobre umas câmaras terem aumentado as suas taxas, outras terem diminuído e outras terem mantido as que já praticavam, em primeiro lugar, V. Ex.ª fez a contabilidade num tom baixinho, porque é Deputado por Lisboa e em Lisboa a taxa aumentou, portanto, é bom que os seus eleitores não ouçam;...
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito baixinho!
O Orador: - ... depois, se não tivessem feito a alteração que fizeram, os aumentos seriam zero, não haveria uma que tivesse subido de l% para 1,3%. Pode estar tranquilo quanto a essa matéria.
Para concluir, deixe-me dizer o seguinte, que é o mais importante: esta medida encerra uma contradição flagrante, pois, por um lado, o PS prometeu que não havia aumento de impostos,...
Vozes do PS: - E não há!
O Orador: - ....e, por outro, o PS diz que, em matéria de tributação do património, há uma grande injustiça, tanta que até nomeou uma comissão para fazer uma reforma que ultrapassará essa injustiça. Os senhores, ao aumentarem a taxa, em primeiro lugar, aumentam os impostos, depois, aumentam a injustiça, porque não estão a tributar os que não pagam, estão a tributar em mais 30% os que já pagam,...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - ... portanto, os senhores estão a fazer mais 30% de injustiça.
Em conclusão, Sr. Deputado, os senhores não vão fazer reforma alguma, por isso é que estão a aumentar os impostos para arranjar dinheiro, repito, não vão fazer reforma nenhuma, e, depois, não têm qualquer respeito por aquilo que prometem aos portugueses!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Manuel Varges não tem tempo para responder, mas a Mesa concede-lhe um minuto. Agradeço que seja conciso. Tem a palavra.
O Sr. Manuel Varges (PS): - Sê-lo-ei, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Rui Rio, sabe bem que respeito e considero muito a sua capacidade de intervenção e conheço bem as suas ideias sobre esta e outras matérias.
Vamos ver se nos entendemos. Quando VV. Ex.as, em 1995, aumentaram, através das tabelas, em 30% o 'valor tributário de todos os prédios, a contribuição autárquica aumentou para toda a população, para toda a gente. E o que eu disse foi que há 222 municípios que, neste momento, têm taxas de.0,7% ou têm as que VV. Ex.as adoptaram, 0,8% ou 1 %.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E isso corresponde a que receita?
O Orador: - Logo, isto é uma medida inócua da vossa parte.
Por outro lado, Sr. Deputado, quero esclarecê-lo que, embora sendo Deputado por Lisboa, fui quatro anos vereador na Câmara Municipal de Loures e aí a taxa é de 1 %.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Ensine-os! Ensine!
O Orador: - Depois, é bom que o Sr. Deputado saiba que, de facto, todos compreendemos o que significam limites máximos e limites mínimos. Todos sabemos que houve 65 câmaras que optaram por baixar a taxa para 0,7%, e. o que significa 222 câmaras municipais com taxas abaixo de 1 %.
Página 2300
2300 I SÉRIE-NÚMERO 67
Portanto, Sr. Deputado, não queira baralhar.
No entanto, há uma coisa com a qual estamos todos de acordo: nesta matéria, há uma enorme injustiça fiscal. A comissão está a trabalhar, o Governo e o Conselho de Ministros já deliberou sobre esta matéria, e todos esperamos, de facto, que sobre o valor real dos prédios e da propriedade nos púnhamos de acordo, para que não haja as injustiças gritantes que hoje existem e que podem, eventualmente, conduzir indesejavelmente a uma diminuição das bases de incidência.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, dispondo para o efeito de 1 minuto.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, vou ser muito breve, pois apenas pretendo dar um esclarecimento e não pedi-lo.
Sr. Deputado Manuel Varges, em Oeiras, a taxa é de 1,1%,...
Vozes do PS: - Exactamente!
A Oradora: - ... decidida pela anterior assembleia municipal, cuja presidência era do PS.
Quero comunicar ao Sr. Deputado Manuel Varges que talvez por este motivo os eleitores tenham decidido escolher um outro partido para a presidência da assembleia municipal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Varges, dispondo, para o efeito, de I minuto.
O Sr. Manuel Varges (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, de facto, isso é verdade,...
Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!...
O Orador: - ... mas não esqueçamos que a proposta da taxa de 1,1% foi do Sr. Presidente da Câmara Municipal Isaltino Morais, que é do PSD, e foram os representantes do PSD que a votaram favoravelmente.
Aplausos do PS.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas o senhor falou do Deputado Luís Marques Mendes, que eu ouvi!
O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Feist.
O Sr. Pedro Feist (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há aqui algumas coisas que precisam de ser equacionadas,...
Vozes do CDS-PP: - Muitas!
O Orador: - ... e em primeiro lugar a posição política do CDS-PP em relação a esta matéria. Devo dizer que, na altura, nos abstivemos porque nos foi assegurado pelo Governo uma reforma justa da tributação do património.
Perante este compromisso, aceitámos abster-nos nesta matéria. É preciso que isto tique perfeitamente claro.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Não foi só agora que nos apercebemos da existência de muitas câmaras municipais a praticarem taxas fora do 1 %. Nós, pelo menos, temos a consciência de que nas "nossas" câmaras municipais, naquelas em que temos influência, a taxa é de 1%, e com isto pensamos que temos razão e razão moral para trazer à colação e à discussão esta matéria.
Lembro que o processo que está em causa é o da tributação dos valores matriciais. Há situações de não existência sequer de inscrições na matriz; há avaliações que não são feitas; há avaliações mal feitas e que são reduzidas (e já volto a este ponto); há actualizações que não são feitas e há isenções que são unilateralmente adoptadas, tal como na sisa anterior.
Isto significa que o Governo tem o poder discricionário de proceder nestas matérias. Fala-se tanto em poder local, mas é o Governo que decide e transfere aquilo que cobra, cobrando-se de 1,5% e remetendo para a câmaras municipais o que sobeja, com algum atraso - e graças a Deus que é com juros mais baixos, mas não deixa de ser com algum atraso -, o que provoca, por vezes, estrangulamentos de tesouraria às câmaras municipais. E sei do que falo.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Srs. Deputados do PS, aprendam! Se não querem aprender, não há nada a fazer!
O Orador: - Sr. Deputado Octávio Teixeira, a sua argumentação é, e perdoar-me-á que use o termo, de travesti político. Os senhores têm muito pouca moral para falar sobre esta matéria. Os senhores sustentaram a taxa de 1,3% fervorosamente e acerca da proposta subscrita pelo PSD e pelo CDS-PP na Câmara Municipal de Lisboa recuaram e prontificaram-se a fazer connosco um documento global...
Vozes do PS: - Olá...!
O Orador: - ... que pedisse a esta Assembleia para finalmente se fazer a reforma da tributação. Parece-me, realmente, que houve aqui, talvez da sua parte, menor conhecimento da vossa posição na Câmara Municipal de Lisboa, onde os senhores ainda pontificam.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Pontificam?!
O Orador: - Quanto a dizer que só agora nos apercebemos, Sr. Deputado, não nos apercebemos só agora. Já disse anteriormente que há muito nos apercebemos, mas o facto é que, quando quisemos discutir o orçamento da Câmara Municipal de Lisboa - e peço desculpa por evocar um pouco e rapidamente a minha situação de responsável autárquico -, não nos foi permitido, pelo que nos retirámos da sala, nós e o PSD, não foi consentido aos partidos da oposição na Câmara Municipal de Lisboa a discussão séria desta matéria, que representa oito milhões de contos na sua receita.
Sr. Deputado Manuel Varges, ainda não tive o prazer de me confrontar consigo, pelo que o cumprimento, mas quero dizer-lhe, com toda a simpatia, que considero a sua intervenção bastante deselegante,...
Página 2301
8 DE MAIO DE 1998 2301
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Outro!
O Sr. Rui Namorado (PS): - Isto é com toda a simpatia! Imagine-se se não fosse!...
O Orador: - ... por dizer que "o debate é fora do rigor e que tem falta de seriedade política". Sr. Deputado, peço-lhe desculpa, mas não lhe reconheço qualquer autoridade para evocar isto, não só em relação à nossa intervenção como às próprias afirmações que fazemos. Temos provas dadas de que sabemos tratar destas matérias, como também respeitamos as vossas próprias posições, pese as contradições que possamos ter.
Já agora, Sr. Deputado, deixe-me que lhe faça algumas perguntas, no que toca à seriedade política. Sabe o Sr. Deputado, por exemplo, no que toca à cidade de Lisboa, onde a taxa foi claramente assente no 1,3% - e não houve alternativas -,
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - É o máximo!
O Orador: - ... que só para a Caixa Geral de Depósitos foi fixado um valor de 30 milhões de contos, para efeitos de tributação, e depois baixou para 10 milhões de contos? E sabe que a não tributação do Centro Cultural de Belém representa os 30% do que estamos a falar? Sabe disto?
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - É uma vergonha!
O Orador: - Sabe, porventura, que esse valor, de mais de dois milhões de contos, dava para cobrir os valores que estamos aqui a discutir e a baixa do imposto?
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Portanto, só com estes dois valores que significam poder discricionário - mostra-se a falta de uma regulamentação e de uma discussão séria sobre uma matéria que a todos nos une, ou melhor, nos deve unir e nunca separar.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito?
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, admitindo que o Sr. Deputado Pedro Feist tenha feito uma , intervenção, para formular um pedido de esclarecimento. Caso contrário, farei uma intervenção.
O Sr. Presidente: - Realmente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, o Sr. Deputado Pedro Feist fez uma intervenção, o problema é que o CDS-PP já não dispõe de tempo para responder.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Mas eu tenho tempo para perguntar, Sr. Presidente.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, serei muito rápido.
Sr. Deputado Pedro Feist, em relação à fixação pela Assembleia Municipal de Lisboa da taxa de 1,3%, é um problema que neste momento não está em discussão. Referiu na minha intervenção que não discuto o uso do direito de qualquer assembleia municipal de fixar a taxa que entende, dentro dos critérios legalmente fixados.
Quanto aos elementos do PCP na Câmara Municipal de Lisboa - se bem percebi -,juntamente com os senhores, exigirem que seja feita a reavaliação do imposto sobre o património, estamos totalmente de acordo, e também referi isso. Por conseguinte, não há contradição.
Última nota, se o Sr. Deputado Pedro Feist não põe a questão de terem demorado 17 meses a aperceberem-se do que tinham votado, então só posso pôr mais uma hipótese, que não coloquei na minha intervenção, ou seja, que neste momento o Grupo Parlamentar do PP quer dizer que a responsabilidade exclusiva dessa votação em sede de Orçamento para (997 foi - repito, responsabilidade exclusiva do Sr. Deputado Manuel Monteiro.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Francamente, o Sr. Deputado é capaz de muito melhor!
O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Feist, dispondo de um minuto. .
O Sr. Pedro Feist (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, quanto à questão de exigir, eventualmente fiz-me entender mal ou V. Ex.ª entendeu-me mal.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Não quer entender!
O Orador: - O que eu disse, ou o que tentei dizer, foi que os elementos do seu partido que compõem a administração da Câmara Municipal de Lisboa estiveram de acordo quanto às razões que motivaram os partidos da oposição a apresentarem nesta Câmara uma proposta de redução, tal como hoje é aqui trazida por mim e pelo meu partido. Estiveram de acordo com a essência e, perante o desafio de connosco elaborarem um documento a apresentar à Assembleia da República, remeteram-no para mais tarde. Sabemos, em política, o que significa remeter para mais tarde. Foi isto que eu lhe disse.
Aliás, a nossa posição foi correctamente entendida pelo presidente em exercício, seu camarada Rui Godinho.
Segunda questão: peço-lhe que, nesta matéria, deixe de parte o meu colega Dr. Manuel Monteiro, porque penso que a questão política sobre a nossa posição na votação do Orçamento está mais do que explicada. Nós fomos atraiçoados nas nossas convicções e nas promessas que nos fizeram.
Risos.
O Sr. Presidente: - Sendo assim, tem a palavra.
O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Monteiro.
O Sr. Manuel Monteiro (CDS-PP): - Sr. Presidente, confesso que não pensava em intervir. Tenho estado, propositadamente, calado, mas, com a autorização de V. Ex.ª, quero dizer, no seguimento da intervenção do Sr. Deputado Manuel Varges - até porque tenho por hábito, talvez um hábito que esteja em desuso, honrar o passado, as
Página 2302
2302 I SÉRIE-NÚMERO 67
minhas convicções e as minhas ideias sem as mudar em nada -, que assumo a total responsabilidade por aquilo que o meu partido aqui fez, quando entendeu abster-se a propósito da matéria que referiu.
Mas, em nome dessa seriedade e desse rigor, gostaria de dizer, através de V. Ex.ª, à Câmara e, nomeadamente, ao PS, que quando o Partido Popular se absteve como se absteve, e pela minha parte em nada me arrependo de o ter feito, o Partido Popular fê-lo no pressuposto exacto de uma negociação séria, clara e pública com o Governo de que várias medidas, nomeadamente de redefinição da lei geral tributária, seriam apresentadas nesta Câmara até final de 1997.
Ora, o que aconteceu, Sr. Presidente, foi que, até final de 1997, apenas apareceu nesta Câmara um estudo de um eminente professor deste país, nomeadamente sobre a contribuição autárquica e a sisa, não tendo aparecido nada mais do que um estudo. Quando o Governo se tinha comprometido com o Partido Popular e comigo próprio, na altura presidente do Partido Popular, a apresentar uma proposta de lei...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa por o interromper, mas agradecia que condensasse a sua intervenção porque, como sabe, não está a fazer qualquer interpelação.
O Orador: - Bem haja, Sr. Presidente, pela oportunidade que me deu...
O Sr. Presidente: - Pelo amor de Deus...?
O Orador: - ... para repor, em nome do passado, a verdade, a que todos também temos direito.
O Sr. Presidente: - Muito obrigado. Sr. Deputado.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: - É para exercer o mesmo "não direito"?
Risos.
O Sr. Presidente: - Faça favor.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - É só para dizer que percebeu!
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não sou o Deputado Luís Filipe Menezes.
Risos.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Pará que fique claro, quero dizer que tudo o que o Sr. Deputado Manuel Monteiro disse relativamente às conversações é obviamente correcto, tanto quanto sei.
Porém, quero lembrar que se encontra nesta Câmara há largo tempo, enviado pelo Governo, um pedido de autorização legislativa que tem em anexo uma proposta do texto da lei geral tributária, cujo agendamento está previsto para breve prazo. Por outro lado, quero lembrar também que a Assembleia tem conhecimento das resoluções do Conselho de Ministros sobre este assunto e de três estudos sobre aspectos tributários.
Portanto, sem pôr em causa, de forma alguma, a primeira parte do que o Sr. Deputado Manuel Monteiro disse quanto ao que se passou, o que se passa neste momento e que temos condições para discutir estes diferentes aspectos: Como não quero entrar em polémica, faço apenas esta precisão.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por terminado o período de antes da ordem do dia.
Eram 17 horas e 30 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem do dia com o debate a proposta de lei n.º 155/VII - Aprova o estatuto fiscal cooperativo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Emprego.
O Sr. Secretário de Estado do Emprego e Formação (Paulo Pedroso): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, as minhas primeiras palavras, nesta sessão em que se discute o estatuto fiscal das cooperativas, são de elogio para a acção e o papel do sector cooperativo. Não é demais realçar o papel de todos aqueles que se encontram envolvidos no cooperativismo. É um trabalho meritório, um trabalho em que o espírito de iniciativa é articulado com o sentido de associativismo e uma salutar responsabilidade social. Assim, merecem uma saudação muito especial os cerca de 2,1 milhões cooperadores que, no seu quotidiano, mantêm em actividade cerca de 3000 cooperativas.
O papel histórico do sector cooperativo, as suas próprias especificidades, demonstram de forma inequívoca o seu potencial e actualidade enquanto mecanismo de reforço da coesão social e como realidade singular no funcionamento da economia. É necessário encontrarmos, no seio das nossas sociedades, novas formas de fazer face à fragmentação social, formas de articular a autonomia individual dos cidadãos com actuações solidárias e baseadas na reciprocidade.
Numa sociedade cada vez mais competitiva, revitalizar o sector cooperativo é um passo importante para o desenvolvimento, que é necessário, de novas formai de solidariedade entre os indivíduos.
Temos de ter presente que este sector, para além de o seu volume de negócios se estimar actualmente num pouco mais de 800 milhões de contos, é de primordial importância na melhoria da produção e da distribuição de bens essenciais, da qualidade de vida e na satisfação de necessidades sociais dos portugueses, nomeadamente nos cerca de 300 000 pequenos comerciantes que assim se puderam manter competitivos, salvaguardando o emprego, durante o processo de reestruturação que se seguiu ao surgimento das grandes superfícies, nas 150 000 famílias que, assim, tiveram acesso a uma habitação condigna, ou nos cerca de 800 000 agricultores, que, assim, continuam a defender a agricultura nacional e o desenvolvimento rural.
O movimento cooperativo é a expressão de uma importante realidade social, que toma a nossa sociedade mais justa e equitativa. Aliás, fá-lo como parte integrante de um vasto movimento de redinamização da economia social que tem vindo a tomar corpo, nos últimos anos, não apenas entre nós, como em toda a Europa.
Página 2303
8 DE MAIO DE 1998 2303
Vivemos num período marcado por uma complexificação progressiva da situação económica e social, um mundo em que as mutações societais ocorrem a uma grande velocidade e com características, em muitos aspectos, radicalmente novas; vivemos num mundo com novos problemas. Agir na resposta a estes novos problemas é um desafio que se coloca ao movimento cooperativo, e é minha convicção que é um desafio para o qual o movimento cooperativo possui uma resposta própria.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Uma resposta em que todas as suas especificidades poderão revelar-se mais-valias, nomeadamente no que toca à manutenção e criação de emprego economicamente viável, no interface entre a dinamizarão de actividade económica e a satisfação de necessidades sociais.
Quando se buscam soluções para incentivar o emprego à escala das pequenas unidades, para a defesa de postos de trabalho ameaçados por crises empresariais, para a dinamizarão das economias locais, é importante reconhecer que existe neste domínio e ao nível do sector cooperativo, uma experiência acumulada importante e específica.
No nosso país, e não obstante as dificuldades que muitas delas enfrentam, as cooperativas têm, hoje, uma inegável importância. Para além de serem uma forma de participação social, para além de dinamizarem economias locais e gerarem um importante emprego indirecto, as cooperativas são directamente responsáveis por mais de 63 000 postos de trabalho.
Como sabem, este Governo tem dedicado uma atenção particular e mostrado uma inequívoca vontade de incentivar a modernização do sector cooperativo. Contudo, e até em consequência do enorme espírito de independência que sempre caracterizou o sector, bem como todos aqueles que nele se encontram envolvidos, a modernização dó cooperativismo resultará da resposta que for dada pelo sector aos incentivos que o Governo tem procurado desenvolver.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, a proposta de lei relativa ao estatuto fiscal cooperativo, que aqui estamos a debater, cumpre mais um compromisso do XIII Governo Constitucional. Por outro lado, é a primeira lei fiscal destinada ao sector cooperativo que cumpre de forma coerente e integrada os imperativos consagrados na Constituição da República, desde 1976, bem como o espírito do novo Código Cooperativo, aprovado por unanimidade por VV. Ex.as, Srs. Deputados, nesta legislatura.
A proposta de lei que vos apresentamos, cumpre também um compromisso do Acordo de Concertação Estratégica, resulta de um estudo levado a cabo por uma comissão interministerial ao nível dos Ministérios do Trabalho e Solidariedade e do das Finanças e enquadra-se na reforma do sistema fiscal enunciada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 119/97, de 14 de Julho.
Esta proposta de lei reconhece as especificidades do sector cooperativo e visa transformar o regime fiscal das cooperativas de uma lógica predominantemente de benefícios para uma lógica de incentivos. Não cria benefícios casuísticos; confere unidade a legislação dispersa; exige contrapartidas do lado da acção das cooperativas para que possam aceder a eventuais incentivos; condiciona esses incentivos à relevância social das actividades e coloca-os numa óptica de sustentabilidade estrutural do sector, favorecendo a formação dos quadros, criando estímulos à poupança dos cooperativistas, ao autofinanciamento das cooperativas e ao crescimento do emprego.
Julgo que esta mudança atesta bem uma nova visão do papel das cooperativas e mostra como estamos empenhados em criar reais e efectivos incentivos para a modernização e reestruturação do sector.
O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!
O Orador: - Permitam-me que, desde já, saliente três vectores das medidas consagradas nesta proposta, sendo 0 primeiro a consagração de princípios gerais de aplicação do direito fiscal às cooperativas que vincularão a interpretação da administração, como sejam: o da autonomia e especificidade; a sujeição geral da actividade cooperativa à tributação; a não discriminação negativa e a discriminação positiva. -
0 Direito Fiscal das cooperativas respeitará, assim, as suas especificidades, sem prejuízo do contributo destas para o financiamento das necessidades colectivas, não permitindo a sua discriminação negativa face a outras entidades no desempenho de funções idênticas e provocando uma discriminação positiva do sector cooperativo em função das prioridades do desenvolvimento económico-social.
Valerá a pena referir a este propósito que foi já nesta legislatura e sob proposta deste Governo que foi aprovada uma lei que colocou fim à discriminação negativa das cooperativas de solidariedade social.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!
O Orador: - Ao ser aprovada esta proposta de lei será, por sua vez, colocado fim à injustiça praticada em 1989, ao retirar o benefício de isenção da contribuição autárquica às cooperativas de habitação económica, que envolvem necessariamente os cooperadores mais pobres, ou seja, as que mantêm os prédios em propriedade colectiva, enquanto que todos aqueles que estão no regime de propriedade individual, incluindo necessariamente todos os que têm mais recursos, continuam a beneficiar da isenção da contribuição autárquica. Por oposição a este entendimento, que vigorou desde 1989, o presente estatuto fiscal cooperativo pretende fomentar a construção de habitação social cooperativa e a melhoria da sua qualidade.
O segundo vector das medidas propostas visa facilitar a constituição de novas cooperativas e a transformação e organização das existentes, designadamente através das isenções consagradas no âmbito do imposto de selo, do imposto sucessório e do imposto municipal de sisa.
O terceiro vector, ao nível do desenvolvimento e actividade corrente das cooperativas, é a consagração do princípio da tributação genérica, em sede de imposto sobre o rendimento, a uma taxa de 20%. A diminuição da carga fiscal nas relações entre cooperativas e os respectivos membros são disso exemplo, bem como a isenção de IRC das cooperativas que criem emprego para os seus membros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, a reforma jurídico-fiscal que se encontra hoje, aqui, em debate e que esperamos que seja aprovada, é um primeiro passo, um passo estruturante, de um programa mais alargado de desenvolvimento cooperativo em que o Governo se encontra profundamente empenhado. Nesse mesmo sentido, solicitámos já ao Instituto António Sérgio do Sector Cooperativo um plano de fomento ao emprego e à formação, no âmbito do sector.
Página 2304
2304 I SÉRIE -NUMERO 67
Julgo que é importante que trabalhemos todos para a reestruturação e a dinamização do sector cooperativo. O Estado e o movimento cooperativo, bem como outras instituições, devem aliar-se para desenvolver instrumentos de apoio estrutural ao cooperativismo, instrumentos que respondam aos principais desafios que hoje enfrenta o sector.
Da parte do movimento cooperativo, permitam-me que destaque dois passos a dar, que reputo de grande importância: o reforço da dimensão organizacional, e, em alguns ramos, empresarial, e a transparência e rigor das contas, que é um desafio para todos. É necessário que no seio das cooperativas se privilegie o domínio da modernização.
Permitam-me que conclua esta minha intervenção afirmando que, para o Governo, a proposta de lei do estatuto fiscal das cooperativas pode ser melhorada, na especialidade, com o contributo dos Srs. Deputados. Estou seguro de que, ao aprovar esta proposta, todos estamos a contribuir para o desenvolvimento de uma cooperação estratégica no fomento da iniciativa cooperativa..
A mensagem de solidariedade e de reciprocidade que o movimento cooperativo tem sabido desenvolver, desde a sua fundação, é uma mensagem necessária e com enorme futuro. Este é um passo nesse sentido. Outros se lhe seguirão no desenvolvimento do imperativo constitucional e da determinação do Governo no apoio ao sector cooperativo. Espero que esta Assembleia se associe a esses passos. Mas, o maior desafio que se coloca, é aos cooperativistas, pois só eles poderão manter acesa a chama desta importante forma de acção para uma economia mais solidária.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado, os Srs. Deputados Augusto Boucinha e Lino de Carvalho. Tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.
O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados, o Partido Popular, sem complexos, não pode deixar de se congratular com a proposta de lei apresentada pelo Governo sobre o estatuto fiscal cooperativo, dada a importância que o sector cooperativo desempenha no desenvolvimento da economia nacional, pois há já bastante tempo que este sector não era objecto de qualquer tratamento fiscal favorável.
Todavia, a legislação proposta poderia e deveria ter ido um pouco mais além e ser levemente mais generosa, apresentando algumas medidas mais favoráveis. Por exemplo, as cooperativas agrícolas deveriam obter isenção plena de contribuição autárquica.
É igualmente de salientar, Sr. Secretário de Estado, o reconhecimento da importância das cooperativas agrícolas para o desenvolvimento sustentado do mundo rural e para as economias familiares das populações rurais. É por isso que entendemos como importante a manutenção das isenções já reconhecidas de IRC para os rendimentos provenientes de operações com os associados das cooperativas agrícolas, e de sisa, de imposto sucessório, de imposto de selo, tanto para as cooperativas como para os seus associados.
Ainda em relação a esta proposta de lei, o Partido Popular é de parecer que a isenção de sisa deveria ser retirada da dependência das assembleias municipais, o que, a não acontecer, representa um retrocesso em relação à actual situação.
Portanto, e para terminar, o Partido Popular pretenderia que a proposta governamental fosse, como já disse, um pouco mais generosa nos montantes previstos no crédito fiscal ao investimento e à realização voluntária do capital, o que quer dizer, Sr. Secretário de Estado, que esta proposta de lei está aquém das expectativas que as múltiplas cooperativas esperavam e desejavam.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O' Sr. Presidente: - Dado que o Sr. Secretário de Estado pretende responder no fim, tem agora a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho. Entretanto, inscreveu-se também para pedir esclarecimentos o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves. Tem a palavra, Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, costuma dizer-se que mais vale tarde que nunca, e, apesar de tardia, temos uma proposta de lei que define um quadro de benefícios fiscais e financeiros para as cooperativas, o que é um primeiro passo nó sentido de dar resposta a uma exigência constitucional, que, desde a reforma fiscal, estava esvaziada, e, por outro lado, dá resposta a legítimas expectativas do sector.
Contudo, Sr. Secretário de Estado, e registei a sua disponibilidade para tal, revelada na parte final da sua intervenção, é também nossa opinião que, em sede de especialidade, muita coisa pode ser melhorada nesta proposta de lei.
De qualquer modo, Sr. Secretário de Estado, o seu a seu dono: na sua intervenção, deu como exemplo, como uma das inovações desta proposta de lei, o facto de ela, entre outros aspectos, consignar a isenção da contribuição autárquica para os prédios propriedade de cooperativas de habitação, desde que destinados à habitação própria e cedidos pelas cooperativas aos seus membros em regime de propriedade colectiva, para acabar com uma discriminação que há em relação aos prédios que são cedidos em regime de propriedade individual. Ora, Sr. Secretário de Estado, esta disposição, como deve saber, já existe na ordem jurídica nacional, em resultado de uma alteração ao último Orçamento do Estado proposta por nós e aceite por esta Câmara.
Assim, esta é uma disposição que aqui vem mas que não faz mais do que repor aquilo que já foi aprovado em sede de Orçamento do Estado, por proposta do PCP, que teve o apoio de toda a Câmara e também do Governo, nessa altura.
O Sr. António Martinho (PCP): - Mais vale tarde que nunca!
O Orador: - Não, Sr. Deputado. A nossa proposta foi antes, faz parte do Orçamento!
A segunda questão, Sr. Secretário de Estado, tem a forma de pergunta e tem a ver com as tais alterações em especialidade, que importa discutir: porque é que, desta proposta de lei, ficaram de fora os benefícios fiscais às cooperativas de 2 º grau? Isto é, considerando que as estruturas associativas, cooperativas, neste caso, podem e devem ter o mesmo tratamento que outras estruturas de tipo associativo profissional, como sejam, por exemplo, ao nível sindical e patronal, não se compreende que as cooperativas de segundo grau não tenham sido incluídas no pacote e nesta proposta de lei de benefícios fiscais. Gos-
Página 2305
8 DE MAIO DE 1998 2305
távamos de saber porquê, dado que não nos parece que haja razão para tal.
Por outro lado, também não percebemos porque é que a isenção de sisa e de contribuição autárquica deve ficar dependente, casuisticamente, das decisões das assembleias municipais. Sr. Secretário de Estado, se se tratasse de um benefício fiscal promovido pela autarquia para ser aplicado casuisticamente numa determinada autarquia, percebia-se isso e 'justificar-se-ia esse tipo de preocupação; mas tratando-se de um benefício integral, nacional, para o sector e não para esta ou aquela autarquia, visando promover o apoio ao sector, e não .à autarquia, não se compreende esta transferência de responsabilidades para as autarquias, ou melhor, só se compreende esta transferência de responsabilidades na perspectiva - que, aliás, o Governo refere na proposta de lei - de, por esse lado, as autarquias renunciarem (o que não podem!) à compensação prevista na Lei das Finanças Locais, que o Governo seria obrigado a fazer, caso essa decisão seja, como deve ser, uma decisão de carácter genérico da própria proposta de lei.
Portanto, não se entende que esta isenção seja transferida para sede de assembleias municipais, criando eventualmente, até, diferenciações entre autarquias vizinhas, quando se trata de uma isenção de carácter nacional, virada para um sector e não virada para uma autarquia específica.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça o favor de concluir.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
É por isso, Sr. Secretário de Estado, que pensamos que esta questão deve ficar expressamente consignada na lei, como uma decisão da lei, cumprindo a Lei de Finanças Locais, compensando as autarquias. São estas as questões que queríamos colocar-lhe.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves.
O Sr. Lalanda Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, esta proposta de lei retoma, na história do processo cooperativo em Portugal, grande parte de medidas que já foram tomadas e caracteriza-se, no fundo, por não ter inovação praticamente nenhuma.
Ao ler e analisar este estatuto fiscal, estamos quase perante um repositório de medidas já tomadas, outras já consagradas em Orçamentos do Estado e outras em discussão. A questão da sistematização é um trabalho meritório, mas gostaria que o Sr. Secretário de Estado me dissesse uma medida importante e forte que este estatuto traz às cooperativas.
O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Emprego e da Formação Profissional: - Sr. Presidente, em relação às questões que me são colocadas, gostaria de começar por repetir a nossa disponibilidade para melhorar, no que houver a melhorar, esta lei, não porque entendamos que ela tem deficiências graves, mas apenas porque entendemos que é do melhor espírito de colaboração entre o Governo e o Parlamento que, nos aspectos técnicos que manifestam a vontade política e nos aspectos políticos que a podem desenvolver, haja os aperfeiçoamentos que se entenderem úteis.
Há alguns casos, e um deles foi aqui referido por vários Srs. Deputados, em particular pelo Srs. Deputados Augusto Boucinha e Lino de Carvalho, em que há, inclusive, uma simples clarificação de redacção, na medida em que, quando os Srs. Deputados interpretam que se pretendia que o imposto municipal de sisa estivesse dependente das assembleias municipais, não era isso, de todo, o que pretendíamos propor.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É o que está proposto!
O Orador: - Pretendíamos que neste artigo se referisse a contribuição autárquica e, portanto, este é um exemplo de uma das melhorias que, até diria, corresponde não apenas a uma melhoria mas, sim, a uma clarificação relativamente àquilo em que estamos de acordo com a necessidade de introdução de alterações.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho, para além disto, levanta a questão de saber por que é que ficam de fora as cooperativas de 2.º grau. Sr. Deputado, muito sinceramente, não estão de fora, porque este estatuto, como se diz no artigo 1.º, aplica-se às cooperativas de 1.º grau, de grau superior e às régies cooperativas, logo também às cooperativas de 2.º grau.
Por outro lado, é levantada pelos Srs. Deputados a questão da isenção de contribuição autárquica. Quero dizer-lhes que isto se coloca na perspectiva geral desta proposta de lei. Entendemos que esta lei, uma vez em vigor, visa a criação de incentivos às cooperativas, porque reconhecemos a sua especificidade e a sua relevância social; em matéria de contribuição autárquica, entendemos que as autarquias devem estar associadas ao reconhecimento da sua relevância social e, por isso, devem ser elas a agir neste domínio.
É levantada pelo Sr. Deputado Lalanda Gonçalves uma questão, que não posso deixar de dizer que me surpreende, quando pergunta: "mas o que é que há de novo?". Sr. Deputado, há praticamente tudo!
O Sr. Deputado fez uma leitura da proposta de lei que, do meu ponto de vista, poderá corrigir-se numa segunda leitura. Não gostaria de repetir o que já disse na minha intervenção e o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, na intervenção que vai fazer, vai enunciar, uma por uma, várias das grandes alterações e das grandes novidades, pelo que me limitaria agora a enunciar-lhe uma, até porque o Sr. Deputado só me perguntou uma: a aplicação genérica da taxa de 20% de IRC a todas as cooperativas. Não é uma novidade, Sr. Deputado?!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves.
O Sr. Lalanda Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A criação e desenvolvimento de cooperativas em muitos sectores de actividade económica permitiu o desenvolvimento de novos centros de racionalidade, que complementam e reforçam a organização dos mercados que suportam a própria iniciativa empresarial.
Página 2306
2306 I SÉRIE -NÚMERO 67
Os princípios e valores fundamentais do cooperativismo reforçam a liberdade individual, introduzem valores de solidariedade e permitem, designadamente em comunidades estruturadas, o desenvolvimento económico e social sustentado.
Todavia, o movimento cooperativo enfrentou, e ainda hoje enfrenta, sérios riscos no quadro do seu desenvolvimento: o domínio do Estado, que tem o dever constitucional de o promover e não de o limitar e ou de o absorver, e, pela própria lógica do .mercado, a sua progressiva absorção em sectores de maior rentabilidade por estruturas empresariais clássicas.
Em 1980, com a aprovação do Código Cooperativo, foram assentes as bases de um correcto desenvolvimento da actividade cooperativa em Portugal.
Entre 1980 e 1995, foi desenvolvido um importante conjunto de diplomas legislativos de enquadramento dos diferentes tipos de acção cooperativa e as sucessivas revisões constitucionais permitiram um novo enquadramento constitucional, talvez menos programático mas, por isso, talvez mais eficaz.
Em 1996, a aprovação do Código Cooperativo revisto veio criar a necessidade de os benefícios fiscais e financeiros serem objecto de legislação autónoma. Assim, é neste quadro que agora o Governo apresenta a esta Assembleia da República a presente proposta de lei, tendente a aprovar o Estatuto Fiscal Cooperativo.
Trata-se de uma proposta de lei que, pela sua importância, devia ter sido precedida de amplas consultas, tanto às principais estruturas cooperativas nacionais como a todas as entidades envolvidas no fomento cooperativo. Neste quadro, e atendendo ao normativo que regula, em termos fiscais, a relação entre as cooperativas e o poder local, também devia ter sido previamente ouvida a Associação Nacional de Municípios Portugueses e, devido também à importância deste sector para regiões autónomas, também estas deveriam ter sido consultadas, numa- época, como agora, em que nas regiões autónomas se está a adaptar o sistema fiscal às especificidades regionais.
De facto, este Estatuto Fiscal Cooperativo é discutido nesta Assembleia quando, no quadro da dinâmica europeia, os princípios do federalismo fiscal se vão acentuando, por um lado, pela intervenção cada vez maior, no quadro da política fiscal, das entidades de carácter infra-estadual e, por outro lado, pela tendência em termos supra-estaduais para uma cada vez maior harmonização das disposições de carácter fiscal de âmbito estatal.
O Estatuto Fiscal Cooperativo agora proposto pretende desenvolver, num quadro de autonomia do sector cooperativo, medidas de não discriminação e de discriminação positiva, cumprindo a determinação constitucional de fomento cooperativo.
Assim, as normas constantes nesta proposta de estatuto retomam um conjunto de disposições em vigor no domínio das isenções previstas nos códigos tributários em vigor e também tem normas transitórias revogando estas mesmas normas, porque são absorvidas por este estatuto.
Definem, em suma, um conjunto sistematizado de benefícios fiscais ou de incentivos fiscais - não vamos entrar aqui no quadro de unia discussão conceptual da diferença entre benefício e incentivo -,que, de uma forma directa ou indirecta, interferem com o imposto de selo, com o Código sobre o Imposto de Sucessões e Doações, com o Código da Contribuição Autárquica, com o imposto de sisa, com o Código do IRC, com o Código do IRS, com o Código do IVA e até com o próprio Estatuto dos Benefícios Fiscais; prevêem alterações de benefícios fiscais já existentes, convencionados ou temporários; mantêm em vigor, para efeitos fiscais, os regimes de equiparação das cooperativas a pessoas colectivas de utilidade pública e a instituições particulares de segurança social; aplicam retroactivamente, com efeitos a partir de Janeiro de 1989, o disposto no n.º 1 do seu artigo 14 º, que se refere a isenção de contribuição autárquica para os prédios cedidos pelas cooperativas aos seus membros em regime de propriedade, colectiva.
Nesta discussão na generalidade não podemos deixar de levantar algumas questões fundamentais, que terão de ser, necessariamente, analisadas na sua discussão na especialidade, como sejam: o âmbito de aplicação, procurando uma maior coincidência entre o universo de aplicação deste Estatuto e o universo de aplicação do Código Cooperativo; uma maior equidade de tratamento de todos os tipos de cooperativas, especialmente no domínio da relação entre os membros e as respectivas cooperativas; o esclarecimento da modalidade de aplicação retroactiva do disposto no n.º 1 do artigo 14.º, designadamente no que se refere à articulação do sistema de isenções com as receitas municipais e estatais; a articulação da sua entrada em vigor com o disposto na alínea g) do n.º 3 do artigo 109.º da Constituição, que dispõe que a receita cessante correspondente aos benefícios fiscais a conceder no período do orçamento anual deve ser estimada previamente e ser objecto de um relatório do Governo que deve acompanhar a proposta do Orçamento; a articulação entre este estatuto fiscal e o próprio Estatuto dos Benefícios Fiscais, no que se refere ao conceito de despesa fiscal para efeitos orçamentais.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Segundo o Governo, este estatuto fiscal cooperativo radica na necessidade de facilitar a constituição de cooperativas, definir com maior rigor as relações entre estas e os respectivos membros e reforçar os seus meios de financiamento.
Assim, salientamos, no que se refere à constituição das cooperativas, a retoma de disposições já existentes no imposto de selo, no imposto sobre sucessões e doações e na contribuição autárquica: no que se refere às relações entre as cooperativas e os seus respectivos membros, assinala-se também a retoma, e o alargamento em alguns casos, de disposições já existentes; no que se refere ao tipo de tributação em IRS do trabalho fornecido pelos cooperadores às cooperativas, a equiparação, em sede de IRS, das importâncias pagas às cooperativas de habitação a entregas dedutíveis no rendimento colectável dos cooperadores; e no que se refere às opções de incentivo, na perspectiva do contributo económico e social e reforço dos meios próprios, salientam-se as isenções já existentes no domínio do IRC, contribuição autárquica e IVA.
A análise destas medidas revela a pouca ambição deste estatuto e o seu carácter de repositório de legislação existente, nada compatível com o valor de marketing que quiseram .atribuir a esta iniciativa.
Apesar deste esforço de sistematização, que radica na apresentação deste estatuto, a realidade cooperativa é bem diferenciada e requer medidas de política activas e a introdução de uma perspectiva audaciosa e inovadora.
É esta vontade política que não temos visto desenvolver, designadamente nas vertentes de apoio à formação de cooperadores e no desenvolvimento de um quadro estável de fomento cooperativo.
Assim, e na nossa perspectiva, este debate deve significar, antes de mais, uma clara aposta num sector que não pode ser subestimado no quadro de uma economia soli-
Página 2307
8 DE MAIO DE 1998 2307
dária e num modelo de desenvolvimento sustentado de importantes sectores da actividade económica do nosso país.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - fiara pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lalanda Gonçalves, estou seriamente convencido de que nem V. Ex.ª acredita no que acabou de dizer, porque aquilo que escreveu é completamente diferente daquilo que ali leu.
E, para provar o que estou a dizer, vou mencionar aquilo que o Sr. Deputado, relator na Comissão de Economia, Finanças e Plano, escreveu sobre algumas matérias fortes, como o Sr. Deputado ainda há pouco disse ao Sr. Secretário de Estado, a respeito deste estatuto fiscal cooperativo.
Sobre o IRS disse: "trata-se de uma medida de equiparação da participação económica nos resultados da cooperativa, determinado em função de trabalho fornecido pelos membros da cooperativa a esta última (...)". O Sr. Deputado reconhece que aqui há, claramente, uma medida específica para as cooperativas, que antes tinham uma discriminação negativa de tratamento em sede de IRC.
Também, quando fala-nos n.os l e 2 do artigo 17.º, refere que esta medida, de facto, é importante. Mais à frente, quando fala sobre o n.º 4 deste mesmo artigo, diz ainda que é, com efeito, uma norma que permite abatimentos ao rendimento líquido total e que visa reforçar a capitalização das cooperativas", que o Sr. Deputado defende - e muito bem! -, porque nós também as defendemos, e, portanto, é completamente diferente daquilo que acabou de mencionar na sua intervenção.
Mais à frente, em matéria de IRC, sobre o n.º 3 do artigo 7.º da proposta de lei, diz: "Trata-se de um desagravamento da taxa de IRC aplicável ao resultado tributável equiparando-a, em termos de taxa, ao disposto no n.º 3 do artigo 69.º do Código do IRC (...)". É, pois, o Sr. Deputado que menciona claramente este 'desagravamento da taxa de IRC.
Em relação à contribuição autárquica, há claramente uma medida forte, como o Sr. Deputado pedia, em relação aos efeitos retroactivos de 1989, a uma medida da vossa reforma fiscal, que, nessa altura, fazia com que, afinal, as cooperativas tivessem outra vez uma discriminação negativa, de modo a que aqueles de mais fracos recursos que compravam casas de habitação em regime de propriedade colectiva eram discriminados em relação àqueles que o faziam em regime de propriedade individual.
O Sr. Deputado menciona isso claramente no seu relatório - aliás, um relatório muito bem feito, muito completo. E continua, por aí fora, em relação à contribuição autárquica, a tirar n ilações, sobre esta proposta de lei do Governo, completamente diferentes daquilo que o Sr. Deputado acabou de mencionar. Temos aqui mais n páginas, onde o Sr. Deputado destaca a discriminação positiva ou a equiparação das cooperativas, em termos de tratamento fiscal, contrariamente ao que até agora existia.
Sr. Deputado, julgo que, em parte, também acabei por responder à sua própria pergunta. O que lhe pergunto é por que é que ali, na tribuna, disse exactamente o contrário daquilo que escreveu no relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano sobre esta proposta de lei.
Provavelmente, tinha de dizer algo diferente, mas, desta vez, contradisse-se.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lalanda Gonçalves.
O Sr. Lalanda Gonçalves (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Neves, agradeço-lhe a questão colocada, que me permite esclarecer uma coisa tão simples quanto esta: o meu relatório é extraordinariamente descritivo e, se ler com muita atenção, verá que em relação a todas as medidas se diz "já estava previsto...
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (João Carlos Silva): - É isento!
O Orador: - ... em legislação em vigor".
Aceito perfeitamente que houve determinadas medidas, caso contrário, se fosse para fazer apenas um repositório exclusivo, não fazia sentido apresentarem o estatuto fiscal cooperativo. Portanto, introduziram algumas melhorias, digamos, na legislação em vigor.
O problema, Srs. Deputados, é que não podemos confundir o que é o estatuto fiscal cooperativo com todas as medidas que um governo deve tomar para incentivar o cooperativismo. Esta é a primeira questão.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em segundo lugar, um estatuto fiscal cooperativo, como se diz na própria proposta de lei, tem tendência para autonomizar-se. E esta autonomia, em relação ao sistema fiscal, neste estatuto, com aquelas normas, designadamente a retroactividade prevista para a questão da contribuição autárquica, coloca problemas sérios.
Portanto, Sr. Deputado, aquilo que eu disse ali da tribuna foi exactamente o que escrevi no relatório em relação ao estatuto - o senhor é que. ouviu de uma maneira e leu de outra.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como é a hora regimental das votações, vamos agora interromper o debate e passar à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 158/VII - Define as regras sobre publicação, identificação e formulário dos diplomas.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de vários pareceres da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que serão votados após a respectiva leitura.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal de Círculo de Portimão, a Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Martim Gracias (PS) a prestar depoimento, por escrito, na qualidade de testemunha, no processo
Página 2308
2308 I SÉRIE-NÚMERO 67
n.º 495/94 - 2.º Juízo, que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial de Albufeira, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Cabrita Neto (PSD) a prestar depoimento - por escrito, querendo -, na qualidade de testemunha, no processo n.º 34/96 - 1.º Juízo, que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Miguel Ginestal (PS) a prestar depoimento - por escrito, querendo -, na qualidade de testemunha, no processo c. singular n.º 372/97 - 1.º Juízo Criminal, que se encontra pendente naquele tribunal.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, vamos agora retomar a discussão da proposta de lei n.º 155/VII.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Namorado.
O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 155/VII, que aprova o Estatuto Fiscal das Cooperativas, é uma relevante iniciativa do Governo, digna do maior apreço.
Conta com o apoio do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, o que, além do mais, traduz o facto de estarmos perante o cumprimento de mais um compromisso eleitoral do PS.
O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!
O Orador: - Esta proposta de lei não é uma iniciativa isolada. Insere-se numa política de requalificação do sector cooperativo, política que, nesta legislatura, foi expressivamente assinalada pela aprovação do novo Código Cooperativo.
Quem se deixar aprisionar pelas aparências mais ostensivas, pode ser tentado a desvalorizar a realidade cooperativa como uma zona da nossa vida colectiva em retracção irreversível. Mas os custos sociais crescentes do funcionamento do mercado e a relativa ineficácia de algumas das correspondentes respostas públicas tornam aconselhável que não se menosprezem as virtualidade de todas as organizações que, não sendo públicas, também não têm um escopo lucrativo, como é o caso das cooperativas.
Por outro lado, nunca é de mais recordar que, em Portugal, existem cerca de 3000 cooperativas, envolvendo perto de 2 milhões de cooperadores, e que, só entre os países abrangidos pela Aliança Cooperativa Internacional, existem quase 700 000 cooperativas, integrando 770 milhões de cooperadores.
Este universo cooperativo não pode ignorar-se sem esquecermos que as suas potencialidade estão muito longe de estar plenamente desenvolvidas. Não é exagero, de facto, afirmar-se que, em larga medida, as cooperativas representam uma energia sócio-económica ainda latente.
Mas a sua crescente afirmação, mesmo lenta, mesmo vivendo-se num mundo em grande parte absorvido pela confrontação entre a lógica burocrática do que é publico e a lógica lucrativista do que é privado, torna-as uma realidade cada vez mais incontornável.
De facto, só por distracção ou superficialidade se esquecerá que um processo de desenvolvimento terá muito a ganhar se incorporar uma componente cooperativa relevante. O que será tanto mais evidente quanto se tiver como adquirido que o desenvolvimento sustentável não poderá deixar de ser uma rede articulada de processos de desenvolvimento local. Ora, as práticas cooperativas estão especialmente vocacionadas, pela sua própria natureza, para integrarem este tipo de desenvolvimento.
Basta recordar uma circunstância simples e óbvia: enquanto que uma empresa lucrativa pode ser transferida para qualquer outro lugar onde os capitais nela investidos possam gerar lucros mais avultados, uma empresa cooperativa está presa ao local onde os, seus cooperadores vivem. Por isso, as cooperativas são parceiros de desenvolvimento local, objectivamente mais fiáveis do. que os parceiros económicos que apenas protagonizem a rentabilização dos capitais.
Em harmonia com esta vocação. localista das cooperativas, elas são também um espaço produtivo amigo do ambiente, não predador de recursos energéticos não renováveis. Exprimem, em si próprias, a proeminência do trabalho, a instrumentalização efectiva do capital, a centralidade do humano.
Esta plena adequação à sustentabilidade do desenvolvimento é tanto mais significativa quanto se projecta também numa vocação correctora das consequências gravosas resultantes dos automatismos do mercado.
Com uma flexibilidade que não está ao alcance do sector público, ás cooperativas, no seu todo, são um elemento potenciador da elasticidade do tecido económico. Inseridas numa área que alguns chamam economia social, outros; mais neutralmente, terceiro sector, e que, para a Constituição da República Portuguesa, é o sector cooperativo e social, as cooperativas representam uma oportunidade autónoma de resistência às crises que atingem económica e socialmente as sociedades actuais.
Todavia, mais do que compensar estragos causados pela dinâmica impessoal do mercado, as cooperativas permitem combater a exclusão social e o desemprego numa perspectiva não assistencialista.
Por isso, estimular o cooperativismo é incentivar protagonismos, é proteger iniciativas, mas sem fomentar conformismos e inércias.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, incentivar as empresas cooperativas é encorajar
Página 2309
8 DE MAIO DE 1998 2309
práticas que se pautam por valores e por princípios. Valores e princípios que a Aliança Cooperativa Internacional tem vindo a textualizar, com base numa tradição já secular. Valores e princípios que a Constituição da República Portuguesa incorporou expressamente como vectores vinculativos da vida das cooperativas, não por mera opção político-jurídica, mas porque, desse modo, traduz a fundamental convergência do projecto constitucional português com a identidade cooperativa universalmente consagrada.
Por isso, pode dizer-se que o modo como as cooperativas são encaradas pela Constituição da República Portuguesa é algo de essencial ao projecto que ela própria consubstancia, não é uma simples opção conjunturalmente consensualizada pelos constituintes.
De facto, a Constituição da República Portuguesa divide o espaço não público em duas área distintas, dois sectores de propriedade dos meios de produção: o sector privado e o sector cooperativo e social. E esta distinção é tanto mais relevante quanto, entre os princípios fundamentais da nossa ordem jurídico-constitucional, se conta o da protecção do sector cooperativo e social.
Note-se que a Constituição da República Portuguesa valoriza, especificadamente, a vertente cooperativa desse sector, de que, aliás, é a componente mais importante. Na verdade, essa protecção tem como expressa concretização no texto constitucional a previsão de uma outorga legal de benefícios fiscais às cooperativas.
Ao poder político cabe decidir a medida, as condições e o sentido desses benefícios, mas não está ao seu alcance não os outorgar ou retirá-los completamente. Ou seja, os benefícios fiscais para as cooperativas são a materialização de um direito constitucionalmente consagrado.
Tal como está implícito no que tenho vindo a dizer, a Constituição da República não se ocupa da cooperatividade de uma maneira casuística e dispersa, embora os artigos com incidência cooperativa não ocupem um lugar sistemático específico. Na verdade, se os analisarmos, podemos verificar que há um conjunto de princípios estruturantes das soluções normativas por eles reflectidas.
Há, como se viu, um princípio de co-existência do sector cooperativo e social com os sectores público e privado, que se conjuga com um princípio de autonomia, que separa com nitidez o primeiro sector dos outros dois.
Há um princípio de protecção do sector cooperativo e social que, articulado com o tratamento conjunto de todas as cooperativas como se fossem uma unidade, reflecte uma valorização constitucional da cooperatividade em si própria.
Há um princípio de conformidade com a visão cooperativa da Aliança Cooperativa Internacional, que identifica o modo como se insere o movimento cooperativo português na comunidade cooperativa mundial.
Há um destaque para a liberdade cooperativa, que assinala a firme recusa de outorgar ao poder político a faculdade de perturbar as práticas cooperativas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É, portanto, evidente que o estatuto fiscal das cooperativas, ajustando-se ao que dispõe o próprio Código Cooperativo, vem ocupar um espaço normativo aberto pela Constituição da República.
Tal não pode significar, de maneira alguma, uma desvalorização da sua importância. Em si próprio, ele representa a inversão de uma tendência para a banalização das cooperativas, para a desconsideração fiscal da sua especificidade. Todavia, sendo um passo importante, não é uma chegada. Portador de uma lógica de incitamento e de estímulo, poderá ser potenciado por outras medidas políticas convergentes, quer financeiras, quer técnicas, quer mesmo administrativas. Impregnado por uma lógica de incitamento, não pode deixar de ter a mobilidade que lhe advém do seu próprio êxito, como factor de desenvolvimento cooperativo.
Por isso, é bom que se saliente que o estatuto fiscal das cooperativas não se limita a ocupar um espaço que a Constituição da República lhe abre, está em consonância com ela, insere-se no seu projecto na área cooperativa.
Neste contexto, reveste-se de um especial significado 0 artigo 2.º da proposta de lei, que enuncia os princípios gerais que enformam a interpretação e aplicação do estatuto e que são verdadeiras traves mestras do modo como a administração fiscal deve passar a encarar as cooperativas. Vale a pena recordá-los.
De acordo com o princípio da "autonomia e especialidade", o regime fiscal do sector cooperativo não se dilui .no regime fiscal geral. É autónomo e especial. Há, neste princípio, uma clara projecção neste terreno do modo como a Constituição da República encara as cooperativas, tal como atrás especificámos.
Segue-se o princípio da "sujeição geral da actividade cooperativa à tributação", que situa os benefícios outorgados fora de qualquer lógica assistencial. Também, neste aspecto, as cooperativas são elementos vivos da sociedade, resultando as vantagens auferidas da sua diferença, mas de uma diferença que não as situa à margem da vida social.
Depois, mantendo o mesmo registo de consonância com a Constituição da República e convergindo com preceitos paralelos do Código Cooperativo, consagra-se o princípio da "não discriminação negativa", segundo o qual "as cooperativas não poderão ser discriminadas negativamente face a outras entidades quando no desempenho de funções idênticas".
E, dando expressão ao princípio constitucional de protecção acima referido, consagra-se o princípio da "discriminação positiva", de acordo com o qual "o regime fiscal deverá, em função das prioridades de desenvolvimento económico-social, conceder um tratamento de apoio e incentivo ao sector cooperativo".
São estes os vectores interpretativos estruturantes do modo como a administração fiscal tem de passar a encarar as normas de direito fiscal com incidência nas cooperativas.
Este estatuto fiscal é, como se vê, um relevante instrumento de política cooperativa, que rompe com uma tradição negativa neste campo.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Como se disse, trata-se de incentivar o desenvolvimento cooperativo, o que nunca poderá ser conseguido com um excesso de intervencionismo público ou de assistencialismo e não dispensará um forte protagonismo do movimento cooperativo.
Trata-se de desencadear uma espiral de sinergias, em que ao estímulo dado pelo estatuto corresponda a criatividade cooperativa, aumentando as razões de novos apoios e multiplicando-lhes a eficácia.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: É isto que, em nome do Grupo Parlamentar do PS, me cabe dizer no debate na generalidade acerca deste diploma.
Página 2310
2310 I SÉRIE-NÚMERO 67
Esperamos que o consenso máximo conseguido quando foi aprovado o Código Cooperativo possa prolongar-se neste estatuto. A proposta de lei do Governo, resultado de um estudo detalhado e de uma aturada ponderação, tem todas as condições para servir de base a esse consenso.
Pela nossa parte, estamos abertos a participar na especialidade num trabalho de aperfeiçoamento dos preceitos que o justifiquem, desde que se respeite o sentido normativo geral do diploma.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Finalmente, embora com grande atraso em relação às promessas eleitorais, temos presente uma proposta de lei visando criar um estatuto fiscal específico para o sector cooperativo. Nada mais justo, atenta a relevância constitucional e social do cooperativismo.
O comando constitucional que determina que a lei definirá os benefícios fiscais e financeiros das cooperativas, bem como condições mais favoráveis à obtenção de crédito e auxílio técnico, tarda a ser concretizado.
E se com esta proposta de lei é dado um primeiro passo, embora parcial, com vista a dar resposta à primeira parte do texto constitucional, ainda fica a faltar a concretização de legislação que dê corpo ao acesso ao crédito e ao auxílio técnico.
Com a reforma fiscal de 1988, foi revogada a legislação que estabelecia um quadro de benefícios fiscais para as cooperativas. Desde então, exceptuando algumas medidas avulsas, não foi reconstituído um quadro global de benefícios fiscais e financeiros que desse cumprimento à Constituição e respondesse às necessidades e legítimas expectativas do sector.
Neste contexto, a proposta de lei que o Governo apresenta agora merece, e desde já o dizemos, o nosso acordo global, sem prejuízo das críticas e das alterações que, em sede de especialidade, entendermos formular e propor.
O elenco dos dispositivos que merecem o nosso distanciamento é múltiplo. Desde logo, a ausência de referências claras e explícitas em muitos dos comandos legais do estatuto fiscal às cooperativas de grau superior, designadamente às federações e confederações, que, em nossa opinião, cumpridos os preceitos cooperativos, devem ter um tratamento fiscal em tudo idêntico a outras organizações associativas de representação profissional e social. Apesar de, no artigo 1.º, ser afirmado essa aplicação, a verdade é que, Sr. Secretário de Estado, depois, em sede de alguns benefícios fiscais concretos que são propostos, não há, aparentemente, referências a esse enquadramento das cooperativas de 2.º grau.
Estou a lembrar-me, por exemplo, em relação ao IRC, da isenção dos rendimentos provenientes das quotas pagas pelos seus associados, bem como de subsídios e donativos recebidos para cumprimento dos fins estatutários. São dois exemplos concretos, mas outros haverá, seguramente.
Depois, o nosso total desacordo de que quer a isenção de sisa, quer a redução de contribuição autárquica fiquem dependentes de prévia deliberação casuística das assembleias municipais respectivas e, ainda por cima, com o objectivo de considerar esta deliberação, como o Governo refere expressamente, como renúncia à compensação prevista na Lei de Finanças Locais.
Também aqui, Sr. Secretário de Estado do Emprego, não se tratou de uma mera falha de redacção, porque, como sabe perfeitamente, no artigo 10.º, quando se fala em impostos locais, o n.º 3 refere que a usufruição dos benefícios previstos nos números anteriores, ou seja, sisa e contribuição autárquica, ficam dependentes de prévia deliberação das assembleias municipais.
Pensamos que não deve ser assim, em particular pelas razões que a proposta de lei não esconde, que é a de levar as autarquias a renunciarem à compensação prevista na Lei de Finanças Locais.
É que não estamos, como há pouco o disse, perante um incentivo fiscal ou financeiro direccionado para uma autarquia específica, da iniciativa dela própria, com vista, por exemplo, a promover o investimento e o emprego na área do respectivo município, caso em que seria compreensível e aceitável uma disposição deste género. Trata-se, pelo contrário, de um benefício genérico para ser aplicável a todo o sector cooperativo e a todo o território nacional.
Portanto, por que razão há, nestas condições concretas, que ficar sujeito à prévia deliberação de cada assembleia municipal? A razão é simples! É preciso sublinha-lo, de novo: o Governo, como diz na proposta de lei, o que pretende com esta transferência de responsabilidades é evitar o cumprimento da Lei de Finanças Locais não compensando as autarquias pelo benefício que pretende conceder ao sector cooperativo.
É esta a verdadeira razão, isto é, conceder benefícios fiscais à custa do bolso alheio!
O Sr. Rui Namorado (PS): - Não é verdade!
O Orador: - É necessário também não excluir dos apoios fiscais, designadamente quanto à redução da taxa do IRC, todas as operações com terceiros.
Estando o PCP de acordo quanto ao facto de não se permitir que a forma cooperativa seja usada fraudulentamente paia encobrir e beneficiar de apoios fiscais autênticas actividades empresariais privadas com fins lucrativos, a verdade é que há ramos do sector cooperativo em que as operações com terceiros constituem o cerne da sua actividade e no integral respeito pela lei e pelos princípios cooperativos. Estou a lembrar-me, por exemplo, dos casos das cooperativas de produção e de muitas cooperativas de transformação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo deveria, além do mais, na nossa opinião, aproveitar este diploma para intervir noutros ramos do sector cooperativo e dar um estímulo global a alguns sectores produtivos cooperativos.
Refiro-me à necessidade não só de ser reestruturado o sistema. de crédito agrícola mútuo, reorientando-o prioritariamente para o apoio ao sector agrícola, tributando os excedentes consolidados do sistema, e não caixa à caixa, não lhe exigindo o cumprimento de ratios idênticos ao sector financeiro privado, mas também de se utilizarem os instrumentos fiscais para apoiar a promoção da produção nacional, designadamente no sector agrícola.
Mas é evidente, em minha opinião, que tudo isto passa por uma reforma fiscal que, de acordo com as últimas notícias vindas a público, o Governo, atento já às próximas eleições legislativas, já decidiu adiar para depois de 1999!
Tímida, insuficiente e carecida de bastantes melhorias em sede de especialidade, a proposta de lei em apreço
Página 2311
8 DE MAIO DE 1998 2311
constitui um primeiro passo que, globalmente, merece o nosso acordo. Esse será, pois, também o sentido do nosso voto.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Namorado.
O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, o meu pedido de esclarecimento é breve e circunscreve-se à questão das relações com terceiros.
Constato que, pelo menos, o Sr. Deputado Lino de Carvalho, apesar de crítico, reconheceu o mérito global deste diploma e não fez eco de uma outra bancada, que tendo sido, ela própria, responsável pelo estrangulamento fiscal das cooperativas, não consegue distinguir entre o estrangulador e o defensor do estrangulado.
De facto, não conseguir distinguir isso é uma coisa que não concebo em V. Ex.ª e, portanto, reportando-me ao que disse relativamente ao caso de operações com terceiros e concordo consigo -, devo dizer-lhe que é preciso verificar que os terceiros são muito diferentes conforme o tipo de cooperativa. Os terceiros numa cooperativa de trabalho são os trabalhadores que não são cooperadores, não são os clientes. Portanto, o problema das operações com terceiros é idêntico para todos os tipos mas conforme o tipo de cooperativa os terceiros são diferentes. O princípio é, pois, idêntico e tem implicações paralelas.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Namorado, o PCP não tem qualquer dificuldade em apoiar sempre o que tiver que ser apoiado e em rejeitar sempre o que tiver de ser rejeitado.
Em matéria cooperativa, não era difícil ao Governo do PS trazer aqui propostas que merecessem o consenso desta Casa. É que, ao longo de tantos anos - e aqui faço-lhe a justiça de dizer que não foi por responsabilidade do PS, porque desde a reforma fiscal de 1988, que, como sabe, extinguiu o quadro de benefícios fiscais que existia desde 1980, que isso se passa -, o vazio foi tão grande nesta matéria que não era difícil ao Partido Socialista trazer iniciativas legislativas que merecessem o consenso desta Casa, iniciativas essas que não fazem mais do que corresponder a uma legítima expectativa de todo o sector cooperativo, à sua relevância social e às próprias exigências constitucionais.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Nós não fazemos só coisas difíceis!
O Orador: - Pois, também fazem coisas fáceis, como esta. Esta é fácil. É que as difíceis não as fazem VV. Ex.as...
Por outro lado, Sr. Deputado Rui Namorado, penso que estamos de acordo de que é preciso clarificar, em sede de especialidade, o que se entende por "operações com terceiros", para evitar que a administração fiscal no caso, por exemplo, de cooperativas de produção operária, em que são sócios só os seus sócios produtores, tudo o resto são operações feitas com entidades, não associados da cooperativa -, entenda, neste caso concreto, que se trata de uma entorse, de uma violação, de uma fuga, de um aproveitamento fraudulento dos princípios cooperativos para beneficiar de incentivos sob a capa de cooperativa que muitas empresas privadas lucrativas, às vezes, poderiam utilizar. Trata-se, neste caso, de uma forma de funcionamento do sector, que é inerente ao seu estatuto cooperativo, à sua função e ao seu enquadramento.
Portanto, se estas questões não forem clarificadas, o que poderemos estar a fazer nesse tipo de cooperativas e em muitas cooperativas de transformação agrícola, onde, por exemplo, aquilo que recebem dos associados para transformar são depois entregues ao mercado não associativo do respectivo sector, se estas questões não forem clarificadas, repito, o que poderemos estar a fazer é a tributar em IRC operações, com terceiros, que são verdadeiras operações inerentes à função cooperativa do sector, quando, seguramente, penso que não é esse o espírito do legislador.
É por isso que é necessário, em sede de especialidade, nesta e noutras matérias, clarificar estes aspectos.
Fozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raimundo Narciso.
O Sr. Raimundo Narciso (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A iniciativa legislativa do Governo sobre o estatuto fiscal cooperativo que hoje aqui apreciamos vem no sentido da satisfação de uma antiga reivindicação do sector cooperativo..
Esta proposta de lei insere-se no apoio mais geral às cooperativas e significa o cumprimento de uma promessa eleitoral do Governo da Nova Maioria.
O sector cooperativo e, em especial, os ramos de produção operária, das pescas, dos produtores de serviços, da habitação, da cultura e outros foram votados ao ostracismo pelos anteriores Governos do PSD. A mesma postura de costas voltadas se verificou nos anos do cavaquismo relativamente às cooperativas de 2.º grau, uniões, federações, estruturas que deixaram de poder dar o apoio indispensável à saúde deste importante sector económico de vocação social.
As cooperativas não só não dispuseram de apoio político como encontraram um ambiente fiscal e administrativo adverso, que lhes criou dificuldades, levou à ruína um número crescente de cooperativas e ao declínio de ramos inteiros.
Vem agora o Governo do Partido Socialista, e bem, criar um quadro fiscal autónomo para o sector cooperativo e contemplar situações favoráveis no plano fiscal, que, na sequência do novo Código Cooperativo, aqui aprovado em 1996, contribuirão para ajudar o sector cooperativo a recuperar das condições adversas do passado.
Fica claro, pelas medidas propostas no articulado da proposta de lei n.º 155/VII, a criação de um quadro fiscal que, não esquecendo a preocupação de não distorcer a equidade fiscal entre as diferentes tipos de empresa, harmoniza e incentiva a actividade cooperativa.
É preocupação da proposta de lei do Governo dar incentivo à constituição de cooperativas diminuindo encargos e simplificando a sua constituição, promover o aforro para a constituição e aumento de capitais próprios e o investimento produtivo, uma área de precariedade tradicional, particularmente nas pequenas e médias empresas cooperativas.
Página 2312
2312 I SÉRIE-NÚMERO 67
Com este diploma, procura-se também criar facilidades à educação e formação dos cooperantes através de dedução à colecta de IRC, de valores majorados, dedicados a elas.
Estas medidas, que importa, em sede de comissão, apreciar com detalhe, para avaliar o verdadeiro alcance no muito diversificado sector cooperativo português, procuram dar tradução a uma norma cooperativista, a educação < social" e formação profissional, constante nos estatutos das cooperativas mas que, mercê da vulgar situação de penúria, raramente ou em muito insuficiente grau se verifica na prática.
O regime fiscal cooperativo que o Governo apresenta dará autonomia e consagrará o seu carácter especial relativamente ao regime geral, pretende impedir, legalmente e na prática, as discriminações negativas e criará outras positivas. Simultaneamente, tem disposições para a moralização do sector cooperativo, como, por exemplo, a sujeição de todas as cooperativas à fiscalização da Direcção-Geral dos Impostos.
O sector cooperativo é gerador de emprego, tem grande flexibilidade e características próprias que o tornam uma arma contra o desemprego, nomeadamente para trabalhadores que encontram maiores dificuldades no mercado de trabalho habitual.
O novo estatuto fiscal cooperativo que o Governo pretende criar merece todo o nosso apoio e contará com o nosso empenho na auscultação das cooperativas e dos cooperativistas para o seu eventual aperfeiçoamento na discussão em sede de especialidade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de deixar algumas pequenas notas e, se possível, fazer uma súmula dos elogios que esta proposta de lei recebeu de todas as bancadas, proposta de estatuto fiscal cooperativo que, de certo modo, rompe com a tradição que existiu durante muitos anos, que foi a de tentar que o sector cooperativo fosse um. sector tutelado, amordaçado e atrofiado, em vez de lhe ser dado um enquadramento de incentivos não assistencialistas mas com quadros e parâmetros perfeitamente definidos que permitirão às cooperativas gerirem-se dentro dos princípios para que são criadas e que constitucionalmente lhe são atribuídos como funções das cooperativas. Penso que foi dado um excelente passo e que estão de parabéns não só o Governo mas também todas as federações e confederações que deram as suas opiniões e que foram ouvidas, sem excepção, e, com certeza, no final deste processo legislativo, estarão também de parabéns todos os Srs. Deputados, pelos contributos que puderem dar a esta proposta de lei.
Mas caberia aqui deixar também algumas notas sobre certas referências feitas, como, por exemplo, as do Sr. Deputado Lalanda Gonçalves, que acusou este projecto de falta de ambição. Talvez, Sr. Deputado! Mas esqueceu-se de distinguir a diferença que existe entre falta de ambição e nenhuma ambição. Aliás, para ver o que é falta de ambição e o que é, Sr. Deputado Lino de Carvalho, ser difícil ou fácil, poderei recordar o passado e lembrar o que foi feito entre 1985 e 1990.
Vozes do PS: - Nada!
O Orador: - Isto é, as coisas podem ser difíceis ou fáceis tecnicamente e; por acaso, este estatuto fiscal cooperativo, no plano técnico, até nem é fácil. Mas também diferente de ser difícil ou fácil é ter vontade, é ter sensibilidade política, é ter interesse por um determinado sector.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É convencer o Ministro Sousa Franco!
O Orador: - Sr. Deputado, a proposta de lei está aqui, aprovada pelo Conselho de Ministros. Só isso já basta!
Quanto a méritos e a medalhas de cortiça para quem foi o primeiro a tomar a iniciativa, nomeadamente em sede de isenção de contribuição autárquica quanto à habitação em propriedade colectiva, gostaria de recordar que, embora, de facto, por proposta do PCP, aprovada por todas as bancadas, tivesse sido introduzida essa norma,...
O Sr. 'Lino de Carvalho (PCP): - Vá lá!
O Orador: - ... ela já constava da proposta de lei que foi aprovada pelo Governo em 27 de Novembro de 1997.
De qualquer forma, a norma que está nesta proposta de lei é a que resolve o problema, não é a proposta do PCP! Se VV. Ex.as tiverem dúvidas, chamo a atenção para o n.º 4 do artigo 19 º do diploma em apreciação, porque esse é que resolve o problema. E ficaríamos por aqui.
Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, como súmula das principais características e medidas deste estatuto fiscal, gostaria de dizer que, na concretização dos princípios gerais que presidiram à sua proposta e que se baseiam na recondução do sistema de incentivos aos princípios que devem nortear a actividade do sector cooperativo, e ponderado o equilíbrio que novas soluções deveriam revestir, as características mais relevantes e inovadoras - isto para esclarecimento do Sr. Deputado Lalanda Gonçalves - são as seguintes: ao nível das obrigações acessórias de fiscalização, extinção e suspensão de benefícios fiscais e dos requisitos específicos de acesso a esses incentivos, exige-se, de forma mais permanente e rigorosa, o cumprimento ,e verificação prática das condições que justificam a atribuição de regimes fiscais mais favoráveis, contrapartida que será de entender como perfeitamente legítima e natural face à maior latitude das vantagens concedidas; ao nível do IRC, define-se uma tributação genérica do excedente líquido das cooperativas, embora em obediência a um princípio de discriminação positiva e de especialidade, aplicando-se uma taxa reduzida de 20%; aos resultados provenientes de operações com terceiros, aplica-se a taxa normal por razões de neutralidade e de competitividade. Mas, Srs. Deputados, se analisarem bem o regime em conjugação com a necessidade de aplicação de excedentes líquidos com terceiros no Código Cooperativo, verão que, mesmo quanto à aplicação dos excedentes líquidos em despesas com formação cooperativa, também aí há um regime fiscal de vantagem e de incentivo para as cooperativas. VV. Ex.as, com certeza, analisarão em devido tempo.
Haverá, portanto, assim, como efeito fomentador, nomeadamente ao nível dos ramos cooperativos da comercialização, do crédito e dos serviços e respectivas estruturas de grau superior, uma tributação à taxa geral.
Estabelece-se também uma isenção de IRC na parte respeitante aos resultados provenientes de operações realizadas com os associados para cooperativas agrícolas, culturais, de habitação e construção e de solidariedade social..
Página 2313
8 DE MAIO DE 1998 2313
No que respeita às operações com terceiros, é claro que, em sede de interpretação normativa - e não é preciso colocar normas a dizer como é que se interpreta uma lei -, numa cooperativa de produção não são consideradas operações com terceiros vender os produtos dos cooperadores a clientes.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Diga isso à administração fiscal.
O Orador: - Sr. Deputado, VV. Ex.as estão a aprovar o estatuto fiscal cooperativo!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Diga isso à administração fiscal.
O Orador: - Portanto, a lei é a lei e a administração fiscal aplica a lei!
Isso é justificado não só em razão da manutenção dos regimes de que já hoje alguns destes sectores beneficiam, como por objectivos de discriminação positiva de apoio às actividades e finalidades prosseguidas. Essas finalidades, a que são afectos os respectivos rendimentos, explicam o carácter ampliado que algumas das isenções passarão a ter.
Sempre que se observem, cumulativamente, requisitos de não assalariamento e de trabalho efectivo nas cooperativas, medidos por raios que tomem em consideração o número de trabalhadores e os membros das cooperativas, beneficiarão igualmente de isenção de IRC a9 cooperativas de qualquer ramo do sector cooperativo..
A verificação destes pressupostos de democraticidade interna na prática cooperativa, se, por um lado, vem no' seguimento das disposições fiscais tradicionais, que já hoje existem, inovam face ao regime actual. E isto porque afastam o critério de dimensão, medido por volume de negócios, como factor relevante para efeitos do incentivo, em coerência com a realidade abrangida e com a filosofia e o modelo de tributação que se pretende implementar, e não retêm, como condição de benefício, o limite de participação no capital social, não só porque tal já está disciplinado no Código Cooperativo como se mostra desadaptado face às disposições da legislação cooperativa quanto ao número' mínimo de membros e sanam, por outro lado, uma discriminação injustificável, mantida há muitos anos, relativamente a cooperativas de trabalhadores dos ramos da agricultura, da pesca, dos serviços e de outros sectores económicos face ao tratamento fiscal concedido às cooperativas de produção operária e artesanato.
Por razões de não discriminação negativa, de 'neutralidade, de transparência e certeza nas regras fiscais aplicáveis, definem-se e precisam-se conceitos e normas de incidência relativas ao excedente líquido das cooperativas, ao enquadramento tributário das participações económicas dos cooperadores e à realização de despesas não documentadas.
Evita-se e tenta-se obviar utilizações abusivas da actual legislação e garantir a transparência de actuação das cooperativas e dos seus membros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em suma, esta proposta de estatuto fiscal cooperativo trata as cooperativas como agentes económicos e sociais com maioridade, com responsabilidade, e segue uma lógica de incentivo à prossecução verdadeira dos seus fins sociais e dos princípios constitucionais que fazem com que este sector de actividade seja elevado à dignidade de referência constitucional..
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 155/VII, que será votada na próxima quinta-feira, à hora regimental.
Vamos agora passar à apreciação do projecto de deliberação n.º 49/VII - Alteração à Deliberação n.º 15-PL/89, de 7 de Dezembro, apresentada pelo Presidente da Assembleia da República, relativa a viagens de Deputados.
A Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares estabeleceu que cada grupo Parlamentar usaria da palavra durante 3 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Silvio Rui Cervan.
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero dizer, muito brevemente, que o Partido Popular está de acordo com as alterações introduzidas, porque visam não dar mais dinheiro aos Deputados, como foi incorrectamente transmitido por alguns órgãos de comunicação social, mas, sim, simplificar o sistema e torna-lo mais transparente.
Ora, com este objectivo, o de simplificação do sistema e o de torna-lo mais transparente e rectilíneo, o Partido Popular sempre esteve de acordo, pelo que votará favoravelmente o projecto de deliberação.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.
O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de alteração que está hoje em apreciação radica em duas questões fundamentais: a primeira é a de que o anterior sistema, baseado na Deliberação n.º 15-PL/89, que tem mais de oito anos de existência, sempre mostrou, ao longo da sua aplicação, a necessidade de sofrer algumas alterações e ajustamentos que o melhorassem; a segunda é a de que esses critérios deviam pautar-se por um melhor enquadramento nas viagens e despesas dos Deputados que se deslocam em serviço do órgão de soberania que é a Assembleia da República e que, como tal, devem ser tratados com toda a dignidade que o órgão merece e exige.
Os critérios a adoptar, e que estão consubstanciados no projecto de deliberação agora em apreço, trazem uma maior transparência e rigor na aplicação dos critérios das deslocações e viagens dos Deputados quando ao serviço da Assembleia da República.
Por outro lado, do ponto de vista meramente administrativo, são cometidas responsabilidades aos serviços da Assembleia da República, que até agora as não tinham, o que, em nosso entender, vem trazer uma melhoria significativa a nível processual.
Acresce ainda que a instalação de uma agência de viagens no edifício da Assembleia vem também trazer outra capacidade de intervenção, comodidade e funcionalidade às deslocações oficiais.
Cabe ainda aqui referir que os serviços de apoio aos Deputados têm vindo a melhorar significativamente, o que nos apraz registar, e que com esta nova deliberação se pretende também a sua melhoria e funcionalidade operativa.
Por último, gostaria de voltar a referir que o órgão de soberania Assembleia da República e todos os Deputados
Página 2314
2314 I SÉRIE-NÚMERO 67
que nele exercem a sua função política não exigem nem querem um tratamento de privilégio, querem tão-só ser tratados de acordo com a dignidade que o órgão de soberania merece e exige.
No respeito por estes princípios, o Grupo Parlamentar do PCP entende que o projecto que estamos a discutir vem trazer um melhor enquadramento e uma maior transparência às viagens dos Deputados e por isso votá-lo-á favoravelmente.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.
O Sr. Carlos Luís (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: o Grupo Parlamentar do Partido Socialista associa-se às intervenções anteriormente feitas sobre o projecto de deliberação n.º 49/VII, que altera a Deliberação n.º 15-PL/89, no sentido em que é imprimido um maior rigor e uma maior transparência às deslocações dos Deputados ao estrangeiro ao serviço da Assembleia da República.
Embora, desde 1989 até hoje, essa dinâmica de maior rigor e de maior transparência tenha já vindo a ser imprimida pelos anteriores Presidentes da Assembleia da República, é agora V. Ex.ª, Sr. Presidente, a introduzir estas inovações, que, como disse, visam dignificar as funções do Deputado nas suas deslocações ao estrangeiro ao serviço da Assembleia da República.
Por isso, quero felicitá-lo por esta iniciativa e dizer-lhe que o Partido Socialista votará favoravelmente este projecto de deliberação.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Sr. Presidente, quero, em nome do PSD, sublinhar que, no essencial, as alterações que V. Ex.ª ora nos propõe - e que, aliás, teve o cuidado e a gentileza de fazer após auscultação de todos os grupos parlamentares, em sede de Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares - vêm no sentido de reforçar a linha desde há alguns anos a esta parte introduzida, qual seja a de procurar, com rigor e exigência, regular as deslocações dos titulares dos órgãos de soberania que se sentam nesta Casa.
As alterações que V. Ex.ª propõe, de facto, não só introduzem mais rigor e eficácia como também não atribuem mais regalias ou privilégios aos Deputados, ao contrário do que alguns mais detractores da instituição parlamentar adorariam ver nesta iniciativa.
É também de sublinhar a circunstância de as propostas de alteração que V. Ex.ª ora nos apresenta terem como grande inovação o facto de resolverem uma omissão que tinha sido identificada no regime em vigor, a não existência de qualquer pena para eventual infracção deliberada do regime de controlo das viagens dos titulares de órgãos de soberania que se sentam nesta Casa. A partir deste momento, há mecanismos que obrigam todos a cumprir as regras e essa é, de facto, uma alteração que vai no sentido de tornar realmente eficaz o regime que já estava em vigor desde há alguns anos.
Por todas estas razões, Sr. Presidente, o PSD votará favoravelmente e com agrado esta iniciativa.
O Sr. Presidente: - Dada a unanimidade de posições de todas as bancadas, creio não haver resistência a que se proceda à votação de imediato, sem que seja levantada qualquer objecção a esse facto.
Vamos, então, votar o projecto de deliberação n.º 49/VII - Alteração à Deliberação n.º 15-PL/89, de 7 de Dezembro (Presidente da AR).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP e do PCP e o voto contra do Deputado do PS Eduardo Pereira.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Presidente, informo a Mesa e a Câmara de que farei entrega de declaração de voto na Mesa.
O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, amanhã não haverá trabalhos parlamentares, em virtude das jornadas parlamentares do PCP, pelo que a nossa próxima reunião se realiza quarta-feira, dia 13, com início às 15 horas, e terá um período de antes da ordem do dia e um período da ordem do dia, que integra a apreciação dos Relatórios e Contas de Gerência da Assembleia da República de 1994 e 1995, a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 425/VII - Constituição das associações de freguesias (PCP), a discussão, também na generalidade do projecto de lei n.º 508/VII Alteração dos artigos 2.º e 5.º da Lei n.º 22/97, de 27 de Junho, alterada pela Lei n.º 93-A/97, .de 22 de Agosto (Altera o regime de uso e porte de armas de caça, precisão, e recreio) (PS, PSD, CDS-PP e PCP) e a apreciação conjunta das proposta de resolução n.os 67/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção sobre a Segurança do Pessoal das Nações Unidas e Pessoal Associado e 100/VII - Aprova, para adesão, a Convenção sobre os Privilégios e Imunidades das Nações Unidas, adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a 13 de Fevereiro de 1946.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 55 minutos.
Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação do projecto de deliberação n.º 49/VII.
Foram muitas e variadas as críticas, levadas até à opinião pública, acerca dos princípios de atribuição de despesas de transporte, de ajudas de custo e do comportamento dos Deputados, a este respeito, ao longo de vários anos.
A imagem dos Deputados sofreu grande desgaste e um pequeno número de faltosos salpicou uma enorme maioria que cumpriu as regras estabelecidas.
De qualquer forma, as questões administrativas em causa abriram questões políticas de grande relevo e impacto nos eleitores, aconselhando que se tomassem medidas de saneamento e moralização.
Tomadas em 1989, essas medidas, exigido o preenchimento de boletins itinerários, fotocópia dos bilhetes e declaração do valor diário do hotel escolhido, não conheço nos últimos anos qualquer caso digno de relevo, digno de reparo.
Apesar de tudo, este ano, voltaram a aparecer notícias sobre o comportamento indevido dos Deputados, nem sempre se referindo o ano em que a falta foi cometida.
Porque as críticas acabaram por atingir todos os Deputados, a deliberação proposta devia ter acolhido uma larga opinião dos Deputados desta Assembleia, o que não foi feito.
Página 2315
8 DE MAIO DE 1998 2315
Teria sido conveniente ouvir a opinião dos Deputados, membros de comissões ou delegações que mais participam nos trabalhos de organizações internacionais.
Não me parece adequado o processo regimental que acabou por ser adoptado. A deliberação irá ser vista como o castigo devido a "Deputados que não cumprem as regras estabelecidas".
Quando se verifique no programa oficial de futuras deslocações de. Comissões, delegações ou' Deputados para participarem nos trabalhos de organizações internacionais, o Deputado pode fazer-se acompanhar, beneficiando 0 acompanhamento de determinadas participações pela Assembleia.
Não creio que se possa discriminar, ao ponto de esses benefícios serem apenas devidos aos cônjuges e que seja pedida prova com base na apresentação de certidão de casamento.
Os convites dirigidos a título individual a Deputados não conferem, no futuro, direito a viagens por conta da Assembleia da República, nem a abono de ajudas de custo.
Seria da maior justiça que a deliberação flexibilizasse a autorização para atender os casos em que o interesse da Assembleia e/ou a entidade que convida e o Deputado convidado, gozasse a primeira de idoneidade e reconhecimento e o segundo ocupasse uma posição na Assembleia que em conjunto aconselhassem a participação, com direito a viagens e ajudas por conta da Assembleia.
Uma agência de viagens, com contrato celebrado com a Assembleia da República, virá a dispor de instalações no Palácio de S. Bento. Logo que possível, as viagens e os hotéis passarão a ser feitos através da agência.
Não compreendo a obrigatoriedade.
Existe um restaurante em S. Bento è nenhum Deputado é obrigado a servir-se dele. Existem instalações da Caixa Geral de Depósitos e nenhum Deputado é obrigado à sua utilização.
Se for caso disso, volte-se a verificar se o conjunto de comprovantes é o adequado às verbas dispendidas pela Assembleia e $e os trajectos e os hotéis utilizados correspondem aos indicados.
Com uma agência de viagens de utilização obrigatória, os Deputados poderão vir a ser pior servidos que através das agências que utilizam. O movimento da nova agência, sem as viagens internas, será relativamente reduzido. A agência acabará por ser um telefone, um fax e um funcionário para transmitir à agência-mãe as solicitações.
Pelas razões indicadas, votei contra a aprovação do projecto de deliberação n.º 49/VII.
O Deputado do PS, Eduardo Pereira.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Partido Social Democrata (PSD):
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
Página 2316
2316 I SÉRIE -NÚMERO 67
DIÁRIO da Assembleia da República
Depósito legal n.º 8818/85
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E.P.
1 - Preço de página para venda avulso, 9$50 (IVA incluído)
2 - Para os novos assinantes do Diário da Assembleia da República, o período da assinatura será compreendido de Janeiro a Dezembro de cada ano. Os números publicados em Outubro, Novembro e Dezembro do ano anterior que completam a legislatura serão adquiridos ao preço de capa.
3 - O texto final impresso deste Diário é da responsabilidade da Assembleia da República
PREÇO DESTE NÚMERO 342$00 (IVA INCLUÍDO 5%)
Toda a correspondência, quer oficial, quer relativa a anúncios e assinaturas do "Diário da República" e do "Diário da Assembleia da República", deve ser dirigida à administração da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, E.P., Rua de D. Francisco Manuel de Melo, 5 - 1099 Lisboa Codex.