O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1457

Quinta-feira, 28 de Janeiro de 1999 1457

I Série - Número 40

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 27 DE JANEIRO DE 1999

Presidente: Exmo. Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Carlos Manuel Duarte de Oliveira
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 20 minutos.

Antes de ordem do dia. Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Ferreira do Amaral (PSD) deu conta da constituição da Alternativa Democrática como novo projecto político, tendo criticado o Governo pela política que tem levado a cabo. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Rui Namorado (PS).

Ordem do dia.- Foi discutido, na generalidade, o projecto de lei n.º 600/VII - Aceleração do processo judicial atrasado (PSD). Usaram da palavra. a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Matos Fernandes), os Srs. Deputados Antonino Antunes (PSD). António Brochado Pedras (CDS-PP), José Magalhães (PS), António Filipe (PCP), Jorge Lacão e Nuno Baltazar Mendes (PS), Guilherme Silva (PSD) e Joaquim Sarmento (PS).
O projecto de lei n.º 571/VII - Processo especial urgente de tutela efectiva do gozo da liberdade pessoal (PCP) foi também apreciado na generalidade. tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Odete Santos (PCP), Francisco Peixoto (CDS-PP), Jorge Lacão é Nuno Baltazar Mendes (PS) e Guilherme Silva (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 25 minutos.

Página 1458

1458 I SÉRIE - NÚMERO 40

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
António Manuel Carmo Saleiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Armando Jorge Paulino Domingos.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Casimiro Francisco Ramos.
Cláudio Ramos Monteiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva..
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira.
Júlio Meirinhos Santanas.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís António do Rosário Veríssimo.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Ferreira Jerónimo.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Paulo Jorge Lúcio Arsênio.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Alberto Queiroga Figueiredo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António d'Orey Capucho.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Edmundo Montalvão Machado.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.

Página 1459

28 DE JANEIRO DE 1999 1459

Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Carlos Pires Póvoas.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Vasco Manuel Henriques Cunha.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Rui Manuel Pereira Marques.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

Alexandrino Augusto Saldanha.
António Filipe Gaião Rodrigues.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

Deputado independente:

José Mário de Lemos Damião.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os requerimentos e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, nas últimas reuniões plenárias, foram apresentados na Mesa vários requerimentos. Na reunião plenária de 13 de Janeiro de 1999: ao Ministério da Educação, formulados pelos Srs. Deputados Castro de Almeida e Bernardino Soares; ao Ministério da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados José Cesário e Jorge Roque Cunha; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Hermínio Loureiro.
Na reunião plenária de 14 de Janeiro de 1999: ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Castro de Almeida; ao Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pelos Srs. Deputados Carlos Duarte e João Carlos Duarte; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado José Cesário; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; ao Ministério das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Na reunião plenária de 15 de Janeiro de 1999: ao Governo, formulado pelo Sr. Deputado Mota Amaral; à Secretaria de Estado do Desporto, formulado pelo Sr. Deputado Hermínio Loureiro; ao Ministério do Ambiente, formulado pela Sr.ª Deputada Carmen Francisco.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados, no dia 19 de Janeiro de 1999: Fernando Pedro Moutinho, na sessão de 24 de Junho; Teresa Patrício Gouveia, no dia 1 de Setembro; Sílvio Rui Cervan, na sessão de 11 de Novembro; Manuel Alves de Oliveira, na sessão de 12 de Novembro; Isabel Castro, no dia 17 de Novembro e na sessão de 2 de Dezembro; José Cesário, Roleira Marinho e Fernando Pereira, na sessão de 19 de Dezembro; Rodeia Machado, no dia 24 de Novembro.

Página 1460

1460 I SÉRIE - NÚMERO 40

No dia 21 de Janeiro de 1999: Maria José Nogueira Pinto, na Comissão Permanente de 10 de Setembro; Ricardo Castanheira, na sessão de 1 de Outubro; Alexandrino Saldanha, na sessão de 15 de Outubro; Carmen Francisco, na sessão de 21 de Outubro; António Brochado Pedras, na sessão de 18 de Novembro.
Em matéria de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Constituiu-se na semana passada a Alternativa Democrática. É o primeiro passo para a concretização de um novo projecto político para Portugal, visando mudar o governo, mudar de política e, sobretudo, mudar a forma e o estilo de fazer política em Portugal.
O actual Governo socialista está esgotado. Foram grandes as expectativas que gerou. São enormes as desilusões que criou. Ao longo de três anos de mandato, o Governo socialista ocupou as cadeiras do poder, mas verdadeiramente nunca exerceu o poder. É um Governo que não decide, que não reforma e que não faz obra. Adia tudo quanto é de decidir, finge que estuda para nunca ter de reformar, inaugura as obras dos outros e não consegue lançar obra nova alguma.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É, na prática, um Governo que fala e promete muito mas faz pouco ou praticamente nada. É, numa palavra, o Governo da incapacidade total e absoluta.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os socialistas comportaram-se ao longo deste mandato como verdadeiras forças de ocupação do Estado. Ocuparam tudo o que havia a ocupar. Na Administração Pública, na economia estatizada, na comunicação social pública, ao nível nacional como no plano local ou regional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Onde havia um lugar a preencher, logo havia um socialista a nomear. Onde havia uma réstia de poder a controlar, logo surgia o Governo socialista a impor a sua vontade.
Tudo era motivo e pretexto para o ,Governo socialista ocupar o Estado e controlar as esferas do poder. Mas tudo servia, ao mesmo tempo, de motivo e pretexto para nunca governar, para nada resolver e para tudo adiar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Este Governo socialista passa à história como o Governo que conseguiu ter todas as condições do mundo para governar e que, apesar disso, conseguiu passar todo o tempo do mundo sem nunca verdadeiramente governar.

Aplausos do PSD.

Desperdiçaram uma oportunidade única, porque tiveram estabilidade, porque dispuseram de apoio presidencial, porque desfrutaram de uma conjuntura económica excepcionalmente favorável. Tiveram tudo isto e falharam. Tiveram todas estas condições e não cumpriram. Tiveram um mandato para fazer e não fizeram.
Um governo assim é um mau governo. Não serve Portugal, não prepara o futuro, não realiza o sonho e o ideal dos portugueses.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No Fim de todo este tempo, os resultados estão à vista de todos: reformas, nem vê-14s; mudanças na sociedade, nem pensar; o que não estava bem há quatro anos atrás está hoje pior do que antes; a situação degradou-se em muitos sectores e os portugueses podem hoje estar anestesiados mas não estão nem confiantes nem mobilizados para os desafios do futuro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - No plano social a situação começa a ser preocupante. As injustiças sociais aumentam em vez de diminuírem. Na saúde, é o salve-se quem puder. Quem puder ter dinheiro está bem; quem não tem, espera mais tempo por uma consulta e aguarda mais anos por uma operação.
São meses e anos de listas de espera nos hospitais, que este Governo socialista não só não resolveu como deixou agravar. Ao nível das pensões de reforma é o que se sabe. O País cresce, o salário mínimo aumenta e as míseras pensões de reforma - de 20 ou 30 contos cada - estão cada vez mais longe de atingirem, pelo menos, o valor do salário mínimo nacional. Nos impostos, os portugueses e, em particular, as classes médias - sentem claramente os efeitos do Governo socialista.
Este agravamento das injustiças sociais não é, afinal, um fenómeno surpreendente. A história demonstra que, quando um governo finge que governa mas não governa, quando um governo adia por sistema, quando não reforma absolutamente nada, simplesmente porque julga que assim dura mais tempo, quando um governo ocupa o poder com esta atitude, a primeira consequência disso, o sinal que chega mais cedo, o resultado que mais rapidamente se revela, é o do agravamento das injustiças sociais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Infelizmente já chegámos aí. A nova legião de injustiçados, que aumenta todos os dias, é um resultado directo de não se terem feito já há dois ou três anos as reformas que era necessário que tivessem sido feitas.

Aplausos do PSD.

A carga fiscal aumentou em mais de dois pontos percentuais. Quem vive do seu trabalho e não foge aos impostos paga hoje mais imposto do que pagava antes. Antes já pagava muito, agora paga ainda mais. Ao contrário, quem fugia aos impostos, continua hoje a fugir ou foge cada vez mais - porque este Governo socialista

Página 1461

28 DE JANEIRO DE 1999 1461

fala de combater a evasão fiscal mas passou três anos sem tomar uma única medida para realmente combater a evasão fiscal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os jovens têm hoje mais angústias e mais dificuldades em obter um emprego. Basta olhar para os inquéritos de opinião. Nunca como agora a preocupação do emprego, por parte dos jovens, foi tão grande e tão acentuada, sem esquecer que este Governo socialista conseguiu criar uma nova forma de desemprego: o desemprego de jovens licenciados, daqueles que, tirando um curso superior, esperam e desesperam por não conseguirem obter um posto de trabalho. Tudo porque este Governo socialista cruza os braços e resigna-se; é um Governo que não gere o presente e não prepara o futuro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E tudo isto sem esquecer o drama das pessoas que vivem nas áreas urbanas. Este Governo socialista não olha para os dramas, para os flagelos e para as injustiças de quem vive e, às vezes até só sobrevive - nas grandes áreas urbanas e suburbanas de Lisboa e do Porto. Aí, na Grande Lisboa e no Grande Porto, onde vivem milhões de portugueses, não há qualidade de vida nem justiça social; há desespero, há droga, há angústia, há insegurança, há sofrimento, há pobreza e há exclusão social.
Este Governo socialista fecha os olhos, finge que não é nada com ele, faz de conta que o tempo tudo resolve. Porque este Governo socialista é assim mesmo: tem desvelo, olhos e ouvidos para quem tem poder, para quem tem força, para quem se manifesta, para quem faz erguer a sua voz, mas esquece os mais fracos, os mais carenciados e os mais desfavorecidos da sociedade.

Aplausos do PSD.

Este é o retrato da injustiça social que o desgoverno socialista agravou. Este é o resultado de um mandato perdido e de uma oportunidade desperdiçada. Estes são os factos que reclamam uma mudança de governo e de política.
Portugal precisa de um novo governo, de um governo que realmente governe, decida e reforme.
Portugal precisa de uma nova ideia de governo, uma ideia marcadamente social, porque as preocupações sociais têm de estar presentes no dia a dia de um governo responsável. Portugal precisa de um governo que pense nas classes médias, que fomente o espírito de iniciativa das classes médias, que aposte na pujança e na capacidade inovadora e empreendedora das classes médias. As classes médias, em Portugal, estão asfixiadas de impostos, de burocracia e de espartilhos que cerceiam a sua capacidade e espírito de modernidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portugal precisa de um governo que faça uma opção prioritária pelos mais desfavorecidos. Não é uma opção de circunstância, é, sim, uma opção ética, de justiça e de solidariedade.

Portugal precisa de um governo que mude radicalmente o mundo urbano, que dê condições de vida, de confiança e de esperança às nossas cidades, hoje estranguladas por um crescimento selvagem, desordenado, e a qualidade que obtiveram não foi, de maneira alguma, nem sequer aproximadamente, melhorada por este Governo.
Portugal precisa de um governo de futuro e com visão de futuro. Portugal precisa, ao fim de contas, de mudar de governo. É essa a aposta da Alternativa Democrática, é esse o nosso desafio, é essa a oportunidade que se abre aos portugueses, é essa a razão do nosso esforço, do nosso empenho e do nosso trabalho.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Portugal merece um novo governo. Os portugueses merecem um governo melhor. É por Portugal, é pelos portugueses e com os portugueses que queremos construir um futuro melhor, com mais justiça e maior solidariedade.

Aplausos do PSD e de alguns Deputados do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Namorado.

O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Ferreira do Amaral, queria colocar-lhe duas questões, mas, antes disso, não posso deixar de constatar que V. Ex.ª não teve autorização do Partido Popular para se recordar que fazia parte de um partido europeu. V. Ex.ª escondeu a Europa, no seu discurso, porque, realmente, isso poderia introduzir algumas fricções com o vosso parceiro, que agora vos tutela, em termos europeus.

Risos do CDS-PP.

Por outro lado, V. Ex.ª fez hoje o discurso que foi feito por todos os elementos dessa bancada desde o princípio da legislatura. V. Ex.ª fez o discurso com que se debateu, sem êxito, na disputa pela Câmara Municipal de Lisboa e revelou uma grande desfaçatez ao vir imputar ao Partido Socialista aquilo que um dos responsáveis máximos do cavaquismo soube fazer durante o seu consulado, isto é, ocupar exaustivamente o aparelho do Estado de uma maneira verdadeiramente avassaladora.
Mas, na verdade, o que fica como resultado deste balanço é que V. Ex.ª apresentou aqui uma Alternativa Democrática que se esconde, como, aliás, seria de prever, atrás do seu próprio passado. Pode dizer-se que é um plágio do vosso próprio passado.
Realmente, não é de estranhar que um, partido que, sendo liberal, se chama social democrata, aliado com um partido que, sendo conservador, se diz popular, apresente uma alternativa que é apenas uma tentativa de limitar perdas. Portanto, no fundo, estamos perante uma forma de ficção, com que nos vamos defrontar nos próximos tempos.
Mas essa ficção, apesar de tudo, tem um risco: é que, hoje, podemos constatar com facilidade, porque é uma evidência, que na AD tem muito mais força, muito mais prestígio, a memória dos líderes da primeira versão do

Página 1462

1462 I SÉRIE - NÚMERO 40

que os líderes actuais. É, pois, no fundo, uma alternativa que, por um lado, se esconde atrás de uma sigla que não se atreve nem a assumir nem a renegar.
Na verdade, VV. Ex.as são uma espécie de "faz-de-conta". Aquilo que se poderia dizer que, na primeira vez, foi um tanto dramático mas não chegou a ser trágico, agora arrisca-se a ser uma comédia que pode chegar a farsa.
Do ponto de vista substancial, VV. Ex.as também se revelaram imediatamente

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Quando é que isso foi escrito? Foi escrito em 1979?!

O Orador: - O vosso parceiro entende que VV. Ex.as já não se conseguem defender sozinhos. É de louvar essa solidariedade! Na verdade, VV. Ex.as combinam duas insuficiências: por um lado, não se atrevem á enfrentar sozinhos o Partido Socialista, no que são acompanhados por aqueles

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, agradeço-lhe que termine, pois já ultrapassou o seu tempo.

O Orador: - As questões que eu gostaria de colocar, em termos globais e que, de certo modo, são a demonstração, por contraste, daquilo que V. Ex.ª disse, são no
sentido de saber se pensa que o Primeiro-Ministro de Portugal, se o Governo tivesse a prática que V. Ex.ª descreveu, seria tão requisitado para vir a liderar a Comissão Europeia. Considera que os países, europeus são
tão distraídos que convidariam para encabeçar a Comissão Europeia alguém que estivesse num governo e que tosse o que o Sr. Deputado disse?

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Onde é que está o convite? Quem convidou quem?

O Orador: - Tenham calma, tenham calma!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - A segunda questão que lhe queria colocar é a seguinte: recorreria o PSD à Alternativa Democrática se tivesse um arremedo de esperança de poder,
sozinho, desafiar o PS nas próximas eleições?

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ferreira do Amaral.

O Sr. Ferreira do Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, vejo que teve a premonição do que eu ia dizer à Câmara, porque as perguntas já vinham escritas e, naturalmente, já sabia que perguntas havia de fazer sobre
a minha intervenção.
Quanto à primeira questãão, sobre a Europa, devo dizer que o Sr. Deputado acaba por responder à mesma no fim.

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Não fale muito da Europa!

O Orador: - Na realidade, o Sr. Primeiro-Ministro não resolve os problemas que há em Portugal, o que o Sr. Deputado não contestou, mas faz discursos sobre a Europa. Julgo que não é isso que os portugueses esperam da sua atitude, gostaríamos muito que fizesse o discurso da Europa, sim, mas que resolvesse os problemas de cá!
Sr. Deputado, permita-me que faça uma reflexão sobre a atitude do Partido Socialista três anos e meio depois de estar no Governo. De tacto, o que o poder vos fez, Srs. Deputados! Os senhores entraram nesta Câmara e neste Governo com sonhos, alguns dos quais partilhados por toda a Câmara, devo dizer, com objectivos, com métodos novos e propostas novas e, rapidamente - mais rapidamente do que se esperaria -, o poder degradou-vos.
Na realidade, hoje, os Srs. Deputados já não pensam mais nada, o Partido Socialista já não pensa mais nada, já não propõe metas, já não propõe objectivos, muito menos, sonhos, o que propõe é manter-se a si próprio, o mais tempo possível.
Sr. Deputado, isto é o contrário da Alternativa Democrática. O que nós propomos é uma nova meta, uma nova fronteira aos portugueses. E sabe como é que se revela melhor essa sua atitude, Sr. Deputado? É que os senhores já não contestam as propostas que a Alternativa Democrática faz e as soluções que propõe - já não contestam!

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Quais são?

O Orador: - O que contestam é que haja alternativa, porque os Srs. Deputados já ficam incomodados pelo simples facto de haver uma alternativa ao vosso poder cor-de-rosa, hoje em dia, em Portugal. Vai haver, Srs. Deputados, e, pior do que isso, as más notícias que trago aos Deputados socialistas são as seguintes: é que vai haver essa alternativa e os portugueses vão preferi-la!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram IS horas e 40 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 600/VII - Aceleração de processo judicial atrasado (PSD).
A Mesa gostaria de saber quem se inscreve para iniciar o debate.

Pausa.

Srs. Deputados, sendo o projecto de lei do PSD, deve ser este partido a iniciar o debate, mas se ninguém se inscreve, terei de suspender a sessão.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - E isto é para a aceleração do processo!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, ou interrompemos os trabalhos ou o PSD desiste de apresentar este projecto de lei.

Pausa.

Página 1463

28 DE JANEIRO DE 1999 1463

Para uma interpelação, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, quero apenas dizer-lhe que não é necessário interromper a sessão. Como o Sr. Presidente acabou de notar, o período de antes da ordem do dia, embora com prolongamento, foi invulgarmente curto. Já chamámos o Sr. Deputado que vai fazer a intervenção, que só por lapso não está aqui, pelo que dentro de meio minuto poderemos dar início ao debate deste projecto de lei.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Se esta é a alternativa, estamos conversados!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, assim, interrompo os trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, assim sendo, peço-lhe que interrompa a sessão por 10 minutos.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos interromper os trabalhos.

Eram 15 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 50 minutos.

Vamos, agora, iniciar o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 600/VII - Aceleração de processo judicial atrasado (PSD).
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Antonino Antunes.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, queria dizer que, se não me enganei, estava previsto um período de 18 minutos para poder falar. Apercebi-me há pouco de que tinha apenas 9 minutos, pelo que estive a fazer alguns cortes de última hora na minha intervenção. Estive, de certa forma, Sr. Presidente, a poupar-lhe o trabalho de ter de me mandar calar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma acção de reivindicação de propriedade entrou num tribunal cível em 1985 e esteve parada, sem qualquer despacho, durante 12 anos. Em Dezembro de 1997, os autos foram remetidos ao tribunal administrativo e não se sabe ainda quando será marcado julgamento. Este processo jaz nos nossos tribunais há 14 anos.
No ano de 1992, foi elaborada uma escritura de justificação notarial com vista ao registo de um prédio. Essa escritura foi impugnada em juízo. No ano de 1997 - cinco anos depois! -, teve lugar a audiência de julgamento e ficaram assentes os factos provados. Deles se vê que o impugnante não tem razão. A decisão não tem nada de difícil.
Decorrido um ano e três meses sobre a data da audiência, ainda não existe sentença e, no dia em que o advogado falou no caso ao Sr. Juiz, este abriu um armário repleto de processos e limitou-se a dizer: "isto foi o que `herdei' quando há dias tomei posse do cargo".
A sentença que há-de absolver o réu continua por dar. O prédio continua por registar. O dono continua impedido de o transaccionar ou de o hipotecar, continuando até impedido de obter uma simples licença de obras. Enquanto isto, o autor, que moveu a acção, nunca pagará qualquer indemnização pelos prejuízos que lhe causou, porque não tem património. E o dono, há sete anos transformado em réu por vontade do vizinho e condenado a ser réu por culpa do sistema, em sete anos que já lá vão, perdeu a oportunidade do negócio, viu passar o tempo de construir, perdeu a força e a vontade de fazer a obra, revoltou-se, sofreu e continua revoltado e sofrido perante a passividade de uns tantos e a impunidade de todos.
Tenho os números e as demais referências dos casos que citei. Mas eles não passam de simples exemplos tirados à sorte entre tantos e tantos que enxameiam os nossos tribunais. Porque, nos últimos anos, o cenário vem ficando mais carregado em cada dia que passa. Porventura, não serão dos mais expressivos nem dos mais graves paradigmas da anormalíssima morosidade que hoje caracteriza o estado da justiça em Portugal, que descaracteriza o sistema da sua administração judiciária e que mina os alicerces do Estado de direito.
Quando os tribunais julgam tarde, julgam mal, por mais perfeitas que as sentenças sejam. O que hoje traz os portugueses alarmados já não é só a lentidão dos processos, é a paralisação que redunda em denegação da justiça.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E isso conduz os particulares à tentação de procurar fora dos tribunais, por ínvios caminhos e por processos que não são legítimos, outras soluções para os seus litígios. Ou leva-os a conformarem-se com a injustiça não reparada, descrentes como estão na eficácia do recurso às instâncias judiciais, o que é igualmente perigoso e grave!
É neste quadro negro que surge a proposta de lei ora em discussão neste Plenário.
Se os cidadãos não recorrem aos tribunais dentro de certos prazos - tantas vezes curtos -, os seus direitos caducam ou prescrevem. Se não praticam os actos processuais dentro do prazo - sempre curto e rígido - que lhes é fixado, têm três dias a mais, pagos a preço de ouro e sob pena de efeitos cominatórios que vão até à inadmissibilidade de produção de prova. Mas nenhuma sanção decorre da inércia e do atraso dos tribunais.
Os processos atrasados ficam, assim, nas secretarias ou nos gabinetes dos juizes, acumulando pó, indiferentes aos problemas que lhe estão subjacentes, por mais delicados e graves que eles sejam.
São numerosos os escritórios de advogados onde, no Verão, aparece o cliente emigrante a perguntar pelo estado da sua causa e a levar durante anos sucessivos a mesma resposta: "O seu processo está como no ano passado: aguarda despacho.".
Entretanto, o Estado português vem somando condenações no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem por não administrar justiça em tempo razoável e só não soma mais porque os portugueses e os seus advogados sentem uma natural relutância em expor a sua desgraça nas instâncias internacionais.

Página 1464

1464 I SÉRIE-NÚMERO 40

Mas esses cidadãos perdem-se, depois, entre queixas e exposições individuais dirigidas, por vezes em simultâneo, a entidades que vão desde o Provedor de Justiça até ao Presidente da República. Elas provocam um inútil crescendo de burocracia que, quase sempre e quando muito, redunda em meras acusações de recepção e em respostas vagas.
Não faz sentido que a lei deixe desprotegidos os particulares perante atrasos tão anómalos.
Propomos com esta iniciativa que quando o processo estiver parado durante mais de três meses, possa o cidadão requerer a sua aceleração judicial.
Apresentada a "reclamação" no próprio processo, o Sr. Juiz dispõe de 10 dias para fazer "subir" as fotocópias do processo ao Conselho Superior da Magistratura. Mas se o Sr. Juiz despachar o processo no prazo de 10 dias, o incidente acaba logo ali.
É uma medida que promete dar um contributo muito importante para a redução do número de processos judiciais atrasados.
Aliás, este projecto não aparece isolado. Apresentámos recentemente outros destinados a combater problemas estruturais do sector da justiça: a criação de assessores licenciados em direito para aliviarem os juízes é uma delas. É evidente que esta iniciativa não é contra os juízes nem contra os funcionários judiciais.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - É lá agora!...

O Orador: - Ela visa, pelo contrário, a defesa do mérito e do prestígio tanto dos magistrados como dos funcionários judiciais, que também não dispõem ainda de um expediente processual capaz de assegurar força e consistência às suas reivindicações, tantas vezes feitas por eles próprios e tantas vezes caídas em saco roto: como acontece quando não são criados a tempo novos juízos e novas secções; quando se não preenche nem amplia o quadro de funcionários judiciais; quando aos juízes é distribuído um número incomportável de processos; quando lhes não fornecem sequer um computador; quando lhes não proporcionam o recurso a uma biblioteca minimamente apetrechada; quando lhes não permitem descontar em IRS o preço dos livros ou dos computadores, se eles os comprarem do seu bolso para suprir aquelas carências ...
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Até há bem pouco tempo, havia no Código de Processo Civil um texto que dizia o seguinte: "A justiça deve ser pronta!". Esse artigo desapareceu, em nome da ideia de que um princípio meramente programático não tinha ali a sua sede. Só que nunca mais encontrou outra sede e o certo é que a justiça está cada vez mais longe da realidade da vida e dos cidadãos.
Ainda há pouco agendámos o projecto de lei da privatização do notariado, que faz parte do Programa do Governo mas que o Governo se preparava para deixar na gaveta. Viabilizámos as alterações ao Código de Processo Penal, ao Código Penal, à Lei Orgânica do Ministério Público e à Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais. Só nos opusemos àquilo que era exagero, àquilo que constituía factor de descontentamento, de afronta entre as polícias e de crispação entre os juízes, magistrados do Ministério Público e advogados.
Evitámos uns erros e minimizámos outros, na exacta medida da força dos nossos votos. No silêncio das Comissões, convencemos o Governo e o partido que o apoia da razoabilidade e do acerto das nossas críticas. Fizemos aprovar, na especialidade, correcções e mudanças ditadas pela experiência e pelo bom senso, mas nunca inviabilizámos a aprovação de qualquer diploma estruturante dimanado do Governo nem sequer travámos as suas iniciativas.
Se o Governo, agora, reconhece o fracasso da sua actuação na área da justiça, não pode assacar culpas à oposição. Deve "pôr a corda ao pescoço" e responder pelo que não fez.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Este projecto de lei, só por si, resolverá muitos mas não todos os problemas da justiça em Portugal. Apresentamo-lo na circunstância temporal em que o Governo, há semanas atrás reunido em S. Julião da Barra para fazer o exame de consciência de três anos de exercício, anunciou que no ano 2000 se vai apaixonar pela justiça. Como se essa paixão, Sr. Presidente e Srs. Deputados, como se qualquer paixão fosse coisa que se pudesse anunciar para o ano que vem! Quem, em quatro anos, não teve o dom de se apaixonar, o mais que tem a fazer é refugiar-se em platónica contemplação.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Este Governo não resolveu nenhum dos problemas endémicos e estruturais da justiça em Portugal. Deixou-os crescer até ao limiar da implosão de que hoje tanto se fala. Não teve sensibilidade para repor na lei aquele princípio da celeridade processual, na ciência de que sem princípios básicos e programáticos não há disciplina, não há regras, não há método nem firmeza que subsistam. Remendou aqui e ali, sem fazer peça nova. Tapou nuns sítios e destapou noutros tantos.
Só para dar alguns exemplos, direi que ainda há dois anos atrás o certificado de admissibilidade de nome ou denominação necessário à constituição de uma sociedade comercial demorava de cinco a oito dias. Hoje, demora um mês e meio e afasta investidores nacionais e estrangeiros.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Dizemos que já se não justifica a manutenção do Registo Nacional de Pessoas Colectivas destacado dos Serviços das Conservatórias e do Registo.
Ninguém entende já que se mantenham intocáveis a burocracia e o enredo associados às escrituras e aos registos nem a excessiva carga fiscal que incide sobre a construção de imóveis e que fazem com que as casas sejam, em Portugal, mais caras do que em muitos países da Europa.
Hoje não se compreende que um casal desavindo não possa, num só processo de divórcio por mútuo consentimento, fazer simultaneamente a partilha dos bens, evitando, assim, a proliferação de novos processos judiciais ligados à partilha e às promessas de partilha do seu património.
Hoje ninguém compreende que o Ministério da Justiça não tenha chamado a si a tarefa de estudar a melhor forma possível de reduzir o que há de disperso, de múltiplo, de confuso e até de repetitivo na produção legislativa.
A justificação de um dia de falta de um juiz de direito rege-se, hoje, por quatro leis, três decretos-lei, dezasseis artigos, nove números e duas alíneas - tudo legislação

Página 1465

28 DE JANEIRO DE 1999 1465

dispersa, mas em vigor, que começa num diploma de 1984 e termina num outro de 1996!
Tenho, de resto, em meu poder este ofício, saído agora de um Tribunal da Relação, que exibo porque fui autorizado a fazê-lo, onde a um magistrado é dado a saber que a sua falta foi justificada ao abrigo de todas aquelas leis, decretos-lei, respectivos artigos, números e alíneas que, só identificados pelas letras e algarismos, enchem todo este papel.
Este nosso projecto de lei é importante pelo que promete de resultados práticos, mas é, acima de tudo, simbólico.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Diz bem, «promete»!

O Orador: - Porque aquilo que estamos a fazer e os exemplos do que mais o Governo podia e devia ter feito mostram que, ao fim destes anos de oposição construtiva e responsável, também na área da justiça, o PSD pode ser alternativa.

(O Orador reviu.)

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Brochado Pedras.

O Sr. António Brochado Pedras (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados, em primeiro lugar, quero dizer ao Sr. Deputado Antonino Antunes que somos ambos profissionais do foro e sabemos que o diagnóstico que fez da situação da justiça em Portugal é, infelizmente, absolutamente verdadeiro. A justiça está num estado caótico, mas, certamente, os cidadãos que contactem com o seu articulado poderão exprimir uma preocupação séria, que é a seguinte: será que, face aos milhares e milhares de processos cíveis, fiscais e administrativos pendentes em tribunal, a facilidade de dirigir pedidos ao Conselho Superior da Magistratura para que desencadeie este processo de aceleração não poderá conduzir ao efeito perverso de «inundar» o Conselho Superior da Magistratura, travar a acção dos próprios tribunais e conduzir a um objectivo diferente daquele que pretendia com o seu projecto?
Julgo que esta é uma questão pertinente que o Sr. Deputado poderá certamente esclarecer. Como sabe, fui eu o relator deste seu projecto, vejo nele virtudes e julgo que é oportuno, mas temos a obrigação de esclarecer a opinião pública e evitar que surjam estas preocupações, que podem ser perigosas se não atalhadas em devido tempo.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Antonino Antunes, informo-o que ainda estão inscritos, para pedirem esclarecimentos, os Srs. Deputados José Magalhães, António Filipe e Jorge Lacão. Pergunto-lhe se pretende responder separadamente a cada um dos pedidos de esclarecimento, salientando que também está presente o Governo, pelo que, porventura, quererá administrar o seu tempo de forma diferente.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Prefiro responder em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para um pedido de esclarecimento, tem, então, a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Antonino Antunes: Se esta iniciativa é o rosto do PSD e da sua capacidade, esta iniciativa é o rosto de uma aberração. A prova máxima dessa aberração é que, submetida ao juízo do Conselho Superior da Magistratura que, sobre a matéria, foi consultado pelo Sr. Deputado relator, Deputado António Brochado Pedras, esse órgão teve ocasião de dizer que entende que não é esta a forma mais adequada para a actual situação dos tribunais judiciais portugueses, considerando antes preferível o acrescentamento e aperfeiçoamento de outro domínio do quadro legal, a que, aliás, se pode acrescentar um conjunto de reformas práticas em relação aos meios confiados aos tribunais - designadamente meios organizativos, logísticos, informáticos, instalações e outras condições de trabalho dos magistrados de ambas as magistraturas, das quais depende a aceleração do movimento processual -, melhorando a sua performance, o que é, evidentemente, muito necessário.
Mas o que gostaria de sublinhar é a inenarrável demagogia que está subjacente ao discurso com o qual V. Ex.ª procura fundamentar este pequeno «aborto» legislativo. Isto porque a ideia de criar uma providência de aceleração do que não estiver acelerado geraria, se aplicada por múltiplos operadores como V. Ex.ª, uma situação difícil.
V.Ex.ª vê o mundo à imagem do seu escritório: X centenas de processos; V. Ex.ª a acelerar os não acelerados; V. Ex.ª a mandar cartas aos juízes e a dizer-lhes «Ah! Ah! Aquele processo está atrasado, meu! Cuidado, porque eu queixo-me ao Conselho Superior da Magistratura!». E faz desabar sobre o juiz uma pressão minudente, tendente a acelerar o seu processo.
Este processo é «filho» de uma visão paroquial e egoísta que, francamente, deveria estar arredada da reflexão sobre o sistema jurídico.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, é uma visão completamente irresponsável sobre as consequências, porque o máximo que V. Ex.ª criaria, através desta «pílula» mágica que demagogicamente intenta como sendo a salvação do sistema, se fosse aplicada, seria uma espécie de necessidade de criar uma máquina de aceleração da aceleração, face aos milhares de impulsos dados por milhares de operadores.
O Sr. Presidente da República chamou a atenção do Supremo Tribunal de Justiça, na passada semana, para um aspecto absolutamente vital da situação dos tribunais. É que, nos tribunais, há operadores - e o Sr. Bastonário, neste ponto, foi concorde - com interesses distintos, com interesses conflituais. Se V. Ex.ª propicia a uns e a ou-

Página 1466

1466 I SÉRIE-NÚMERO 40

tros, no domínio cível e nos outros domínios que o seu projecto abrange, um mecanismo deste tipo, não medido e contido, como o que aprovámos, por proposta do Dr. Fernando Nogueira, em matéria de aceleração em processo penal, se V. Ex.ª exorbita essa solução que, em condições prudentes e medidas, tem procurado, então, tem de fazer duas coisas: primeiro, criar uma super-polícia para os juízes, que é o que V. Ex.ª cria, através deste meio, e, segundo, dotar o Conselho Superior da Magistratura de um orçamento bojudo, capaz de arcar com os inquéritos necessários, para a polícia dos juízes cumprir o seu dever.
No fundo, Sr. Deputado Antonino Antunes, ainda está viva no seu coração a ideia, tão típica do cavaquismo, de que o que é preciso, em relação aos juízes, é pô-los na ordem e terem alguém com a mão forte em cima. Não é essa a nossa ideia, Sr. Deputado Antonino Antunes. Queremos dar-lhes meios, a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais é para aplicar, será aplicada com meios, e essa nova filosofia expressa a demagogia que é o rosto do PSD no momento actual.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado Antonino Antunes responderá agora aos dois primeiros pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra, Sr. Deputado Antonino Antunes.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No fundo, as perguntas dos Srs. Deputados António Brochado Pedras e José Magalhães fundem-se. Têm apenas uma diferença: o Sr. Deputado António Brochado Pedras apresentou-as com um carácter que eu reputo de seriedade e as do Sr. Deputado José Magalhães foram feitas numa outra óptica, que eu me dispenso de comentar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Numa óptica panfletária!

O Orador: - Quero apenas dizer uma coisa, Sr. Deputado José Magalhães: há pouco tempo, V. Ex.ª acusava-me de eu tomar a posição dos juízes contra o Ministério Público; não queira hoje pôr-me do lado do Ministério Público contra os juízes, porque eu e a minha bancada não estamos contra ninguém.

Protestos do PS.

Quero dizer-lhe, Sr. Deputado José Magalhães, que não há soluções milagrosas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Há!...

O Orador: - Não quero apresentar aqui soluções milagrosas, mas digo-lhe que o nosso projecto de lei tem duas partes: uma, que é essencial, que já deu provas, está no Código de Processo Penal, onde os juízes têm três dias para remeter o processo (e nós damos-lhe 10!); a outra é que, no processo penal, apresentada uma reclamação, ela tem de subir ao Conselho Superior da Magistratura, mas,
no nosso projecto de lei, ela não tem de subir ao Conselho Superior da Magistratura, pois só sobe se, no prazo de 10 dias, o juiz ou o funcionário não puserem o processo em andamento.
Sr. Deputado, lembro-lhe que, apesar de tudo, o projecto de lei que já está em vigor há 10 anos não entupiu nada e este também não vai entupir. Há uma coisa que o senhor não compreende, porque nunca foi advogado - e penso que não é -, porque se não havia de pensar que os advogados não são irresponsáveis. Aliás, Sr. Deputado, concedo que, se isso não estiver claro, seja posto na lei, porque estes requerimentos podem e devem ser necessariamente filtrados pelos advogados, que, mais do que ninguém ou tanto como V. Ex.ª, estão interessados em que a justiça não entupa e que os problemas se resolvam.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mais respeito também, Sr. Deputado José Magalhães, pelos Srs. Advogados!
Para terminar, só quero dizer-lhe o seguinte: tenho muita admiração por V. Ex.ª, temos um diálogo muito franco, muito aberto na Comissão e admiro quanto V. Ex.ª sabe de tudo. De facto, Sr. Deputado. eu não sei de informática como V. Ex.ª sabe. Só que há uma diferença muito grande: eu não venho aqui falar de informática!
(O Orador reviu.)

Aplausos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas faz mal! Já era tempo de aprender!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Antonino Antunes, dentro em pouco pronunciar-me-ei sobre esta iniciativa legislativa, mas há uma questão que gostaria de lhe colocar, desde já, porque esperava que ela fosse referida na sua intervenção e creio que não foi.
Este projecto de lei procede a uma importação para o processo cível de uma disposição que consta do artigo 109.º do Código de Processo Penal, relativo à aceleração processual. Eu esperava que o Sr. Deputado se referisse a esse facto e às razões que o tinham levado, nesta fase, a propor que seja feita essa importação, embora as situações sejam diferentes - mas, mais adiante, pronunciar-me-ei em concreto sobre a iniciativa.
Porém, o que gostaria, agora, de saber ë qual o balanço que o Sr. Deputado faz do facto de existir essa disposição, que não é nova, nem sequer é recente, no Código de Processo Penal. Será que o facto de existir um incidente de aceleração processual, previsto no artigo 109.º do Código de Processo Penal, tem conduzido aos resultados espectaculares que o Sr. Deputado invocou? Considera que temos hoje uma situação completamente diferente, ou seja, a nível do processo penal não existem problemas de maior porque há um incidente de aceleração processual basicamente semelhante àquele que o Sr. Deputado aqui propõe? Aliás, V. Ex.ª reproduz quase ipsis verbis o artigo 109.º do Código de Processo Penal.

Página 1467

28 DE JANEIRO DE 1999 1467

Sr. Deputado, é nessa experiência positiva, é o facto de o problema estar aí resolvido que o leva a pensar que, se utilizarmos figura semelhante no processo cível, resolvemos os problemas? Se não é, e se o Sr. Deputado reconhece que, apesar de existir essa figura no Código de Processo Penal, subsistem muitos problemas e atrasos processuais, então, qual é a razão que o leva a pensar que, a nível do processo cível, uma figura destas iria resolver problemas?
É este, neste momento, o problema que gostaria de colocar, sem prejuízo de, posteriormente, fazer outras observações relativamente ao conteúdo desta iniciativa legislativa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Também, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Antonino Antunes, disse, há pouco - e nesse ponto estou de acordo consigo -, que estamos no domínio de uma matéria para a qual não há receitas milagrosas. Em todo o caso, aquilo que o Sr. Deputado propõe no seu projecto de lei aparenta querer ser uma receita milagrosa. Daí, a meu ver, algum paradoxo. Paradoxo que, de resto, resulta do facto de o Sr. Deputado, aparentemente, enquanto autor do projecto, estar caído na crença, que me permito qualificar de ingénua, de que é possível fazer comparações de simetria simples com aquilo que se passa no domínio do Processo Penal.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Simplesmente, o Sr. Deputado não deveria ignorar que o Processo Penal trata, por sua natureza, de matérias atinentes ao regime de direitos, liberdades e garantias de natureza pessoal, que, essas sim, exigem um tratamento de celeridade, especialmente previsto na Constituição da República Portuguesa.
Ora, o Sr. Deputado quer fazer uma medida extensiva a todo o domínio do cível sem distinguir sequer as áreas em que, no cível, poderia haver matérias no domínio dos direitos, liberdades e garantias de natureza pessoal, relativamente a todos os demais domínios. Ou seja, nem na simetria, que, então, de acordo com a lógica da sua posição, se exigiria para o cível, o Sr. Deputado resolve adoptar no seu projecto, que é, para além de tudo o mais, demasiado amplo e, como tal, por esse mesmo facto, não pode "cirurgicamente" permitir as medidas de aceleração que prevê. Por isso, ele vai cair num outro vício, que é, Sr. Deputado, o dever de, implicitamente, sugerir a esta Câmara que o problema dos atrasos na apreciação processual, que hoje- decorrem nos nossos tribunais cíveis, é, sobretudo, uma responsabilidade subjectiva dos respectivos juízes.
Mesmo que não tenha sido essa a intenção do Sr. Deputado, em vez de procurar encontrar as dificuldades reais do sistema, o senhor vem aqui admitir que isto tudo se resolveria se juízes, virtualmente inertes, pudessem ser estimulados, por forma adequada, pelo Conselho Superior da Magistratura.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas verifiquemos, então, o outro lado da questão. Disse o Sr. Deputado, em resposta ao Sr. Deputado José Magalhães: "se o senhor fosse advogado, saberia como é". Ou seja, implicitamente - e, neste caso, não só implicitamente mas explicitamente - confessou que o que o senhor quer é um novo instrumento processual nas mãos da advocacia para dirimir, por via do Conselho Superior da Magistratura, a possibilidade de priorizar os seus próprios processos pendentes em tribunal. A consequência seria inevitável: como o Sr. Deputado não delimita a área da aceleração processual possível, nós teríamos, amanhã, inevitavelmente, o Conselho Superior da Magistratura "engarrafado" pelos procedimentos, pela via em que o Sr. Deputado sugere. E, então, a consequência garantística só poderia ser uma: daqui a seis meses, daqui a um ano, o Sr. Deputado Antonino Antunes estaria aqui a apresentar um outro projecto de lei para regular os termos do atraso dos processos pendentes de apreciação no Conselho Superior da Magistratura.
Ou seja, está a atirar-nos para lógicas de ciclo vicioso, nenhuma delas respondendo aos problemas estruturais com que, neste momento, as questões do Processo Civil e do Processo Penal estão em reflexão na nossa ordem do dia.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Os senhores nem isso fazem!

O Orador: - Conjunto de razões pelas quais, Sr. Deputado, lhe faço uma pergunta no seguinte sentido: não admitiria, no mínimo, restringir o alcance do seu projecto àquelas áreas que contendessem exclusivamente com os domínios dos direitos, liberdades e garantias de natureza pessoal? Dá-me ideia de que não é esse o seu desiderato. E eventualmente, não sendo o seu desiderato, tenho de fazer-lhe a pergunta consequente: não admite retirar o seu projecto de lei por ser não só intempestivo como verdadeiramente improcedente?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Antonino Antunes.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Sr. Presidente, quero, antes de mais, reparar uma injustiça, uma vez que não respondi cabalmente às perguntas do Sr. Deputado
António Brochado Pedras, não obstante ter ficado impressionado pela pertinência e oportunidade das mesmas.
Sr. Deputado António Brochado Pedras, apreciei muito o seu relatório, como já lho disse em sede de Comissão, e reputo de muito ajustadas as duas observações que me fez. Mas quanto a elas, tenho dois argumentos que, só por si, respondem. Em primeiro lugar, temos a experiência do Código de Processo Penal, que mostrou como este incidente funcionou sem criar disfunções no sistema. Em segundo lugar, admito - e já o disse - que, em sede de especialidade, fique muito claramente consignado que estes incidentes só possam ser suscitados pela intervenção do advogado, ao contrário do que acontece no Código do Processo Penal, onde qualquer cidadão pode escrever uma carta ao Sr. Juiz para ser junto ao processo e desencadear aquele outro processo.

Página 1468

1468 I SÉRIE-NÚMERO 40

Penso, pois, que não se justificam essas suas apreensões.
Sr. Deputado António Filipe, quanto ao mérito do incidente ligeiramente diferente que existe no Código do Processo Penal, devo dizer-lhe que, ainda hoje, soube de uma observação feita pelo Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados, em que referiu, expressamente, que tem conhecimento - e naturalmente que tem conhecimento pela posição em que está - de que o incidente que está no Código de Processo Penal, desde 1987, tem produzido bons resultados, apesar de tudo.
Seria muito pior se ele não existisse.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Jorge Lacão, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que o senhor não me ofende se disser que estou aqui a defender os interesses dos advogados, na justa medida, Sr. Deputado, em que os advogados defendem os interesses dos cidadãos com isenção, com pertinência, com força, com independência, com garra, como V. Ex.ª não vê alguém fazê-lo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à pergunta que me fez sobre se admitíamos a possibilidade de, por alguma forma, restringir a aplicação generalizada desta medida, já disse aqui que estamos receptivos a discuti-la. Mas penso que não devemos ir tão longe, porque aquilo que disse de se obrigar o advogado a subscrever o requerimento, só por si, já é bastante. Mas porque não há-de haver outras soluções?!... Estou a lembrar-me de que temos três ou quatro grandes tribunais, onde este problema seria particularmente candente (Vila Franca de Xira, Guimarães, Lisboa...), mas porque não pensar-se numa cláusula transitória para estes casos?! VV. Ex.as, que tão peritos são em cláusulas de salvaguarda,...

Risos.

... como, há pouco tempo, o foram em sede de Orçamento do Estado, porque não aceitam que se faça aqui uma cláusula de salvaguarda para este momento transitório, se se provar, ou se chegarmos à convicção, que pode haver algumas dessintonias, algumas confusões no meio de tudo isto?!...
Quero também dizer-lhe que, mais boa vontade, não dá. Não podemos governar pelo Governo, não podemos fazer mais do que esta oposição construtiva, de dar ideias.
VV. Ex.as não governam. Então, deixem-nos governar, quando chegar a altura!
(O Orador reviu.)

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, quero dar-vos conta de que se encontram a assistir à sessão um grupo de 48 alunos da Escola C+S Professor Armando de Lucena da Malveira, um grupo de 45 alunos da Escola Secundária da Sertã, um grupo de 30 alunos da Escola Secundária David Mourão Ferreira de Lisboa e um grupo de 50 alunos da Escola Básica do 2.º e 3.º ciclos do Alto do Moinho, de Loures, para quem peço a vossa habitual saudação.
Pedia aos Srs. Deputados que os cumprimentássemos e saudássemos como é habitual!

Aplausos gerais, de pé.

Entretanto, o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes solicitou a palavra para que efeito?

O Sr: Nuno Baltazar Mendes (PS): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, faço a seguinte interpelação a V. Ex.ª: o Sr. Deputado Antonino Antunes referiu que o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados se terá pronunciado sobre o projecto de lei que aqui apresentou, no sentido de considerar muito positiva a solução encontrada para o Código de Processo Penal. Hoje de manhã, na Comissão; o Sr. Deputado Relator, António Brochado Pedras, referiu - de uma forma muito sintética, aliás - que tinha tido uma comunicação com o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados relativamente a este projecto de lei e teve oportunidade de me dizer o que é que o Sr. Bastonário lhe tinha transmitido acerca deste projecto.
Ora, não tendo o Sr. Relator usado da palavra no início deste debate, como era seu direito na qualidade de relator, faríamos, na pessoa de V. Ex.ª, essa interpelação no sentido de o Sr. Deputado António Brochado Pedras esclarecer neste Plenário qual tinham sido, efectivamente, o comentário e a resposta que o Sr. Bastonário lhe tinha dado e que transmitiu aos Deputados da l.º Comissão.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem! É justo!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Muito obrigado, Sr. Deputado, por essa sábia interpelação.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Matos Fernandes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, os meus cumprimentos respeitosos.
Num intróito muito rápido - e dirigindo-me sobretudo aos ilustres signatários deste projecto de lei -, devo dizer que, sendo eu um aprendiz de jurista, pouco ou nada sei perante os autores deste projecto.
Mas, recordando o princípio da interdependência dos órgãos de soberania, quero, apenas, respeitosissimamente, sugerir que, para além daquilo que é transcrito do Código de Processo Penal e se, porventura, este projecto se converter um dia numa lei - estamos em fim de milénio e, como diria Camões, "continuamente vemos novidades" substituíssem a expressão processo judicial por tribunal judicial, sob a pena de a expressão processo judicial, pela sua amplitude, levar inclusive o incidente da aceleração aos processos de fiscalização concreta no Tribunal Constitucional às outras ordens jurisdicionais, e, designadamente - e parece ser essa a intenção dos proponentes - aos

Página 1469

28 DE JANEIRO DE 1999 1469

Tribunais Administrativos e Fiscais, que têm processos judiciais, mas não são tribunais judiciais. Uma vez que na "Nota justificativa" se fala em Tribunais Cíveis, Administrativos e Fiscais, não entendo o que fazem VV. Ex.as ao Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Esta, no espírito de colaboração humilde que aqui me traz, era a primeira nota.
A segunda nota era a de - conhecendo VV. Ex.as melhor do que eu a jurisprudência constante do Tribunal Constitucional sobre a litigância de má fé - recordar que a aplicação do artigo 456.º do Código de Processo Civil neste incidente de aceleração vai abrir um princípio do contraditório,...

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - ... ou seja, o Conselho Superior da Magistratura vai ter, sob pena de inconstitucionalidade, de alertar a parte que, levianamente, negligentemente, suscitou o incidente para lhe dizer: "Olha que és capaz de apanhar com umas UC como litigante de má-fé. O que é que tens a dizer a isto?". Vejam só onde isto pode conduzir! Porque o Código de Processo Penal não diz isto. É mais hábil e prudente e fala num decaimento com a aplicação de uma soma entre x e y UC's.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem dito!

O Orador: - Finalmente, quanto a este artigo 3.º que no parecer do ilustre Relator é considerada uma original e interessante hipótese da extinção imediata do incidente -, deixem-me que lhes diga o seguinte, meus senhores: jubilei-me na semana passada como juiz, ao fim de mais de 30 anos de magistrado... e, por amor de Deus!, isto pode ser, involuntariamente, um instrumento de coacção terrível sobre os juizes... !

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Pior do que isso, isto pode ser uma incitação a que os juizes decidam depressa e mal!

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Muito bem!

O Orador: - Senão vejamos: como é que eu, notificado para responder ao incidente, respondo? Respondo da forma seguinte: "Ao Ministério Público. Visto. Notifique-se o autor para explicar melhor não sei o quê..." Despachei! Despachar no sentido literal é mandá-lo para fora da secretária.

Vozes do PS: - Exacto!

O Orador: - Há várias maneiras de "despachar", embora eu só tenha conhecido uma: trata-se de resolver os problemas, e, a maior parte dos juizes é assim que o entende. Isto é um perigo! Isto pode ser uma manobra de coacção psicológica.
Por outro lado, Sr. Presidente e Srs. Deputados, isto vai gerar situações graves, que já aqui foram apontadas, de verdadeira desigualdade dos cidadãos perante a lei. Porque se alguém quiser que os seus processos andem para a frente, abre sucessivos incidentes de aceleração e estaríamos aqui, não tenham dúvidas, não daqui a um ano - que é muito optimismo - mas daqui a seis meses a discutir a aceleração da aceleração, como já foi aqui referido.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente!

O Orador: - De resto, pergunto, com que quadro de inspectores o Conselho Superior da Magistratura se pode haver para cumprir o que aqui se diz e que é: "Ir logo ver o que se passa, quais os problemas de organização e porquê"? Penso que, enfim, tirando o exagero serão cerca de metade dos juizes a inquirir outra metade e depois faz-se um roulement, ou seja, um terço a inquirir dois terços?
Ouvi há dias, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as linhas programáticas para a área da justiça do que venha a ser a Alternativa Democrática. Refere-se a gravíssima situação da justiça, refere-se a nossa dependência dos corporativismos... e eu pergunto: quem conseguiu, ainda que em termos extremamente desagradáveis, pôr cobro a uma greve dos funcionários aos tribunais de turno, que durava desde 1994? Em termos muito desagradáveis, mas tivemos de fazê-lo. Fala-se em dar poder ao juiz na gestão do seu tribunal... Meu Deus!... Pergunto-me: quem geriu a justiça durante 17 anos? A quem pertenceu a ideia de retirar a gestão e a disciplina dos funcionários judiciais do Conselho Superior da Magistratura, inventando e instituindo o Conselho dos Oficiais de Justiça?

O Sr. José Magalhães (PS): - O Laborinho!

O Orador: - A quem pertenceu a ideia de dentro de um quadro de funcionários judiciais "rachá-los" ao meio e instituir os funcionários judiciais para as secretarias judiciais e os funcionários de justiça para os serviços do Ministério Público?

Vozes do PS: - Ao PSD!

O Orador: - Meu Deus! Não é preciso ter-se muita memória e 17 anos não são 17 dias...!
Por que é que a reforma do Código de Processo Civil de 1995, que este Governo aceitou, com ligeiros aperfeiçoamentos - e, respondendo, até, a uma pergunta inteligentemente formulada pelo Ex.ª Relator deste projecto -, não inseriu na lei de processo civil a figura da aceleração processual? Porque quem geria a justiça neste tempo e presto-lhe justiça, passe o pleonasmo- sabia onde se ia meter!

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Sabia a situação terrível que ia criar. Pois se o mesmo governo, suportado pelo mesmo partido, conhecia, desde 1987, a figura da aceleração processual que constava do Código de Processo Penal, é caso para perguntar por que é que não vinha logo a jeito na maior reforma do processo civil que se fez desde 1939 incluir a aceleração processual no processo civil.
Sabem porquê, Sr. Presidente e Srs. Deputados?
Porque em 1990, em Portugal, entraram 203 000 processos cíveis, mas, em 1995 entraram 400 000, e, em 1997,

Página 1470

1470 I SÉRIE - NÚMERO 40

entraram 506 209. Ou seja, 1990 tinha sido o ano ideal para se mexer nestas coisas, porque entraram 203 000 processos, acabaram 203 000, mas já vinham de trás 260 461 processos.
Em 31 de Dezembro de 1995, praticamente quando entrámos em funções, só em matéria cível entraram nos tribunais portugueses 400 000 processos, números redondos, e passaram para o ano seguinte cerca de 500 000 processos.
Em 1997, a entrada de processos foi explosiva: passou de 400 000 para 506 000 e a pendência de processos passou de 500 000 para 742 967.
De tudo isto, em 31 de Dezembro de 1995, em Lisboa - que é um caso à parte -, pendiam no Tribunal Cível de Lisboa um terço dos processos cíveis de todo o País, ou seja, 175 000, mas dois anos depois, pendiam, em Lisboa, metade dos processos cíveis de todo o País 321 002, e, de acordo com números provisórios de 1998, entraram em 31 de Dezembro de 1998, só na Comarca de Lisboa - e, pela primeira vez, há uma descida na entrada de processos -, 132 000 processos, mas estão pendentes para 1999 cerca de 380 000 processos, mais precisamente, 374 358 processos.
Esta desaceleração tem vários motivos, mas há um para o qual eu me permitia chamar a atenção de VV. Ex.as: com o procedimento de injunção, modificado por nós há poucos meses, entraram em Novembro e Dezembro, só em Lisboa, 7488 requerimentos de procedimento de injunção - que são, praticamente, tantos quantos os procedimentos requeridos desde que, em 1994, a figura foi posta em vigor. Tenho os números de Janeiro deste ano até ao dia de ontem, às três da tarde, e o ritmo mantém-se.
Por fim - e os números são maçadores, mas falam mais do que as palavras -, posso dizer-lhes que em termos de total nacional, em 31 de Dezembro de 1997, entraram em todos os tribunais portugueses, incluindo inquéritos, mais processos do que números de habitantes, 1 126 073... Findaram, apesar de tudo, 963 259 processos, passaram para 1998 a brutalidade de 1 306 743 processos. Nesta pendência de 1 300 000 processos só um terço ou cerca de um terço pertence à Comarca de Lisboa com 427 058 processos.
A medida, Sr. Deputado, cuja boa intenção, obviamente, não ponho em causa - V. Ex.ª além de distinto advogado foi magistrado, portanto, conhece os dois campos -, é, salvo o devido respeito, inoportuna, como aqui já foi dito.
Se o Sr. Deputado leu o Diário de Notícias do passado dia 18 de Janeiro, há um artigo de um juiz do Palácio da Justiça de Lisboa, que é um juiz de boa categoria, técnica e mental, que diz textualmente o seguinte: "Só eu - diz o juiz - vou ser causador de 2700 desses incidentes".
Eu pedia, aprovada que foi a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais, estando em acelerada feitura o regulamento da lei orgânica que vai modificar - esperamos nós - este panorama, esta situação. Estando nós, finalmente, em condições de acudir ao caos que é a Comarca de Lisboa - e a Comarca de Lisboa está assim porque foi criada, e bem, a Comarca da Amadora em 1993 mas não possível ainda, lamentavelmente, conseguir um edifício, ainda que provisório, com um mínimo de dignidade para instala-la.

O Sr. António Filipe (PCP): - O que é um escândalo!

O. Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Ainda não percebi porquê.

O Orador: - Porque o Tribunal da Comarca de Loures vai ser dotado, finalmente, no próximo Verão, com instalações suficientes para receberem da Comarca de Lisboa o recém-criado município de Odivelas, que era freguesia de Loures, mais as freguesias de Loures que estão na Comarca de Lisboa e que são Moscavide, Pontinha, Portela, Prior Velho e Sacavém. Porque, finalmente, conseguimos, dois edifícios com dignidade e com dimensão para tirar da rua Marquês de Fronteira, onde não é possível meter mais um funcionário nem mais um magistrado, os tribunais de Família e de Menores de Lisboa e os tribunais de Pequena Instância Cível de Lisboa. Porque vamos converter os 17 Juízos Cíveis de Lisboa em Varas Cíveis, para ficarem em liquidação, onde não entra mais nenhum processo excepto as acções ordinárias que gostaríamos que tivessem o valor de 4000 contos mas que, infelizmente (paciência!), VV. Ex.as entenderam que não podem ter um valor superior a 3000 contos. Porque vamos, efectivamente, criar Juízos Cíveis que vão arrancar a partir do zero e não como acontece com o actual regulamento em que recebem por transvase contentores de processos de uns tribunais para os outros, porque se fica sempre à espera que as coisas venham.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Peço desculpa pelo calor que tomei - não é falta de respeito pela Câmara, mas a paixão que tenho por estes problemas. Toda a minha vida, de uma maneira ou de outra, me envolvi nestas questões. Tenho de confessar - e desculpem-me, até porque já estou aposentado - que nunca me aconteceu dar um despacho a uma sentença atrasado mas tenho a certeza absoluta de que, se fosse hoje magistrado, não seriam poucas as angústias que me afligiriam por não poder cumprir os prazos processuais. Os grandes magistrados do meu tempo foram-no porque trabalharam com um número tão reduzido de processos que puderam sê-lo; mas, se regressassem e reentrassem hoje na magistratura, com o sistema que temos - e desculpem-me que vos diga, mas conhecemo-nos todos bem demais! -, com a degradação do ensino nas Faculdades de Direito, ainda que esteja a melhorar, com a degradação da própria qualidade de alguma advocacia (e temos de concordar com isso), com a própria mudança que aconteceu em relação ao funcionalismo judicial, que se tornou mais exigente... Portanto, passou-se a não ter um espírito de missão que nos era apontado, não sei se para nos elogiarem ou para terem piedade de nós, a situação modificou-se profundamente. Discutir estes problemas - e estamos todos de acordo, com certeza, como ainda há dias lembrava, insuspeitamente, o Professor Figueiredo Dias, numa notável entrevista que concedeu ao Semanário - é uma questão de Estado!

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - A conjugação de esforços entre os principais responsáveis pela justiça só tem sido possível e só foi possível nos últimos tempos por razões - peço que acreditem - que não eram imputáveis ao Ministério da Justiça mas que, por uma questão de respeito e de pudor,

Página 1471

28 DE JANEIRO DE 1999 1471

não invoco nem cito. Lembro só a VV. Ex.as que, no nosso mandato, assistimos ao insólito e espantoso fenómeno da demissão e da retirada do pedido de demissão de um presidente do Supremo Tribunal de Justiça. Até isso nos aconteceu! Efectivamente, eu concordaria em que se utilizasse o n.º 4 da deliberação de ontem, do Conselho Superior da Magistratura, porque é tempo de se quebrarem barreiras, de as pessoas conversarem e trocarem impressões - e é isso que andamos a fazer.
Para terminar, quanto a medidas práticas de aceleração, para usar as palavras do Sr. Deputado Antonino Antunes, de "um governo que não governa" (e peço desculpa por citar dois ou três exemplos muito técnicos, mas os juristas aqui presentes entendem-me): uma, que não presta, é a alteração ao artigo 3.º do Código de Registo Predial que acabou com a possibilidade de empatar as acções naquela guerra do registo ou não registo; outra, que não presta, de facto, não tem importância, não tem grandeza, é a alteração à lei do apoio judiciário que acabou com o efeito suspensivo do recurso de agravo; outra, mexendo na excelente reforma do Processo Cível que nos deixaram, é o resolver de uma vez por todas da questão da legitimidade processual, para que finalmente ficassem em sossego nas respectivas covas o Professor Barbosa de Magalhães e o Professor Alberto Reis; outra, o Código das Custas Judiciais, que VV. Ex.as se esqueceram de nos deixar, porque fizeram um Processo Civil novo, dê "bugalhos", que não encaixava num Código das Custas, de "alhos", que tivemos de fazer à pressa e em que inventámos o "ovo de Colombo" da conta única na parte final do processo.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - À pressa! Diz bem!

O Orador: - Outra evidência, de que qualquer um se poderia lembrar, mas, como nós não temos grandeza de vistas, fomos nós que nos lembrámos dela: o pagamento de custas pelo sistema multibanco e por terminais de pagamento automático. Outra ainda: a pequena, mas significativa, mexida, a que já me referi, de alteração do procedimento de injunção. Como não gostamos de fazer promessas, nem sequer em 1999, posso dizer que está em elaboração (na área da aceleração processual, se bem me faço entender, obviamente, e não noutra área qualquer) um anteprojecto que regula, em novos moldes, a cobrança de prémios de seguro - circulam em Portugal 60 000 condutores sem seguro válido eficaz e, só no ano passado, uma companhia propôs 50 000 acções para cobrança de prémios; está também em preparação um diploma que prevê o regime de recursos para o Supremo Tribunal de Justiça por forma a que, tanto quanto possível, restituir ao Supremo Tribunal de Justiça a natureza de um tribunal de revista que, pelo menos, julgue mais recursos de revista do que recursos de agravo.
Em matérias destas, uma solução como a que é proposta começa por não ser solução - entrega uma das partes de todo este contencioso positivamente "às feras"! Se o Ministério da Justiça não se sentisse na obrigação institucional de defender a justiça em sentido amplo, diria: "isto é res inter alias, façam lá os inquéritos aos juízes que quiserem"! Mas não é isto que nos interessa e nunca iremos por aí.
Se me é possível fazer um requerimento à Câmara, direi que acelerar tem muito a ver com umas tabuletas que; de longe em longe, vemos ao longo das linhas de caminhos-de-ferro e que nos aconselham "pare, escute e olhe".

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Antonino Antunes.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, ficámos a saber hoje que V. Ex.ª se jubilou. Devo dizer-lhe que tenho pena que isso tenha acontecido e devo dizer-lhe também que não o digo pela primeira vez: sempre reconheci em V. Ex.ª um dos mais distintos e sabedores magistrados com que a nossa magistratura contou nos últimos tempos.
Devo dizer-lhe também, Sr. Secretário de Estado da Justiça, que ainda há dias me deliciei com um acórdão sobre Direito Civil - Direito Comercial, que vinha publicado numa colectânea e que, neste momento, ainda está em cima da minha secretária de trabalho...
Tenho pena, Sr. Secretário de Estado! E tenho tanto mais pena porquanto, confiando eu que VV. Ex.as percam, como vão perder, as próximas eleições, esperaria que voltasse ainda para o tribunal, para continuar a enriquecer-nos coro a sua sabedoria e com a sua experiência. Aí, ficámos a perder!
Sr. Secretário de Estado, depois disto, só quero dizer-lhe uma coisa: V. Ex.ª disse que eu fui magistrado; devo dizer-lhe, em abono da verdade, que (nunca o disse e não o diria aqui se V. Ex.ª não o tivesse feito) fui juiz, fui do Ministério Público e sou juiz em licença ilimitada. Mas eu não o diria se V. Ex.ª não tivesse usado também o seu argumento de autoridade para dizer aquilo que disse. Isso faz com que eu me sinta mais à-vontade para me permitir discordar de uma observação que V. Ex.ª fez aqui: não acredito, Sr. Secretário de Estado, que qualquer juiz, em Portugal, com um simples expediente como aquele que V. Ex.ª referiu, queira defraudar esta lei que ainda acredito que saia aprovada desta Assembleia.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Acredita mal!

O Sr. José Magalhães (PS): - Desengane-se!

O Orador: - Sr. Secretário de Estado, quanto às observações que fez, não vou repetir aquilo que já disse. Só lembro o seguinte: onde está a Justiça se um advogado que não responde em cinco dias perde a oportunidade de responder; se um cidadão que não contesta uma acção em 20 pode estar cheio de direito mas perde a questão; se um processo que está parado três meses, o processo vai à conta e os particulares pagam as custas porque o Estado não perdoa... Mas se um julgamento se fez há um ano e tal, quando o juiz tem 30 dias para dar a sentença e só fim de mais 60 (passados 90 dias!) se requer a aceleração processual, isso é demais, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Essa é que é a questão!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Claro!

Página 1472

1472 I SÉRIE - NÚMERO 40

O Orador: - Ainda hoje almocei com um conselheiro nesta Assembleia da República; ainda hoje falei com muitos juízes e com muitos outros magistrados que me procuraram; e devo dizer-lhe que alguns me manifestaram algumas apreensões, mas depressa ficaram convencidos de que nada tinham a temer. Depressa ficaram convencidos não só da nossa boa intenção como dos méritos da nossa iniciativa. Só quero dizer-lhe mais uma coisa, Sr. Secretário de Estado, e com isto termino...

Entretanto, reassumira a presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: - Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - É só um minuto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Um minuto, não! Menos, Sr. Deputado!

O Orador: - V. Ex.ª falou no descalabro da Comarca de Lisboa. Sr. Secretário de Estado, vou só dar-lhe uma "dica", porque não me compete governar: se nós alterarmos uma regrazinha do Código ou da lei e impedirmos as Telecom, as sociedades leasing, todas essas grandes empresas sediadas em Lisboa, de imporem, nos seus contratos de adesão...

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - ... os pactos da Comarca de Lisboa, os processos distribuir-se-ão por todo o País e o caos acaba. E os processos reduzem-se, Sr. Secretário de Estado...

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, faça favor de concluir de imediato.

O Orador: - Reduzem-se a metade, porque não são só esses que o senhor...
(O Orador reviu.)

(Por ter sido desligado o microfone, não ficou registado o final da intervenção do orador.)

Vozes do PSD: - Que falta de respeito por parte da Mesa!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, os meus agradecimentos pelas palavras que o Sr. Deputado Antonino Antunes .me dirigiu. Não houve provocado ad agendum da minha parte ao dar conta de que o tempo passa, fiquei velho e, entretanto, me fui embora. De resto, respeitando as opiniões dos outros, sempre fui adversário de se passar da magistratura para a política e de se regressar da política à magistratura - mas esta é uma questão minha, é feitio, como diria Raul Solnado.
Quanto ao resto, concordo inteiramente com V. Ex.ª, que há muitos casos em que as decisões não são dadas em tempo útil por razões imputáveis aos magistrados; há de tudo e também há de tudo na magistratura. Por isso, no Estatuto dos Magistrados Judiciais, cujo ante-projecto está quase pronto, e por sugestão do próprio Conselho Superior da Magistratura, o regime do procedimento disciplinar vai ser mais apertado, sem diminuição de garantias mas sem o excesso de garantismo que hoje existe e, sobretudo, sem uma norma que é fatal, que é a do sistemático efeito suspensivo de recurso. Lembro-me de ter relatado, como vogal do Conselho Superior da Magistratura, a demissão de um colega que, 10 anos depois, por artes mágicas de garantismos, ainda exercia funções! Veja só: 10 anos depois!
Compreende-se perfeitamente que os senhores advogados reajam, e bem, contra atrasos imputáveis aos magistrados; mas o carácter puramente abstracto de três meses sem despacho possibilitar ao senhor advogado o "deitar o barro à parede" (desculpem-me a expressão) de conseguir que o meu processo passe a ficar menos atrasado do que os outros por virtude da aceleração processual, é injusto, cria desigualdades. É preciso que os senhores advogados tenham a coragem de denunciar situações de incompetência, situações de laxismo, situações de frouxidão, e que, através da Ordem e das delegações regionais (que sei que o Sr. Bastonário quer restaurar), o digam, e o digam corajosamente, e o digam frontalmente. Mas não podem alijar sobre terceiros a denúncia de situações que conhecem para evitarem eventuais represálias nos locais onde exercem a actividade profissional, porque isso não pode ser - desculpem que vos diga!
É este o comentário que me merece a intervenção de V. Ex.ª: de facto, trata-se de uma boa intenção, não ponho isso em causa nem vejo que haja reserva mental da vossa parte; mas não acredito na medida, considero-a extremamente inoportuna e acho que vamos rasar pela mesma medida os que cumprem e não podem respeitar os prazos e os que, podendo respeitar os prazos, não cumprem. Só no fim é que se vê, quando acabar o inquérito - e o inquérito, por mais discreto que seja, é sempre estigmatizante - que, afinal de contas, foi por culpa do funcionário, foi por culpa dos correios, foi por culpa de um perito que nunca mais entregou o seu relatório, que o processo não foi despachado. E isso é o suficiente, repito, para voltar a pedir que suspendam a instância neste domínio e que dêem mais alguns meses para que a situação se modifique.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Brochado Pedras.

O Sr. António Brochado Pedras (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, Sr.- e Srs. Deputados: Uma das primeiras funções do Estado é a administração da justiça, mormente num País que proclama na sua Constituição ser um Estado de direito.
Ora, uma das características imanentes ou estruturais da ideia de justiça é a da celeridade, da prontidão, do

Página 1473

28 DE JANEIRO DE 1999 1473

dinamismo e da rapidez. Uma justiça lenta, morosa, tardia e estática é algo em si contraditório,...

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - ... porque significa a negação do seu próprio conceito, porque representa a imagem que lhe é oposta - a da injustiça.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Como se sabe, é caótica a situação da justiça em Portugal, não era preciso o Sr. Secretário de Estado vir aqui reconhecê-lo, muito especialmente da justiça cível, administrativa e fiscal, com tribunais a rebentar pelas costuras, com milhares de processos pendentes e atrasados.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - São as "listas de espera"...

O Orador: - A título exemplificativo citarei, por todos, os casos dos Tribunais de Vila Franca de Xira, com cerca de 4000 a 5000 processos atrasados, de Guimarães, com aproximadamente 7000 processos parados, e de Pequena Instância Cível de Lisboa, com 20 000 processos atrasados.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Não pode ser!

O Orador: - Dir-se-á, pois, neste contexto, que o nosso País constitui, com toda a propriedade, o paradigma do Estado da injustiça.
No velho Código Visigótico e no nosso antigo Direito vigorava um princípio, que se traduzia na seguinte máxima rex eris si recte faceris, si non faceris non eris. Entendia-se que só poderia ser rei quem fizesse justiça, rei que a não fizesse não era digno de o ser.
Suponho que esta ideia se mantém hoje bem actual e que poderá adaptar-se ao Governo do Partido Socialista e ao Ministro da Justiça: Governo e Ministro que não conseguem administrar a justiça não deve ser Governo nem deve ser Ministro.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - "Pedras dixit"!

O Orador: - Perante esta situação, duas atitudes eram possíveis: uma, drástica, profunda, de ruptura, que c, no caso concreto - e respondendo agora concretamente ao Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes -, a posição pessoal, estritamente pessoal, do Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados. No entender dele, impunha-se a criação de um mecanismo de fiscalização permanente dos tribunais. Era uma medida muito mais profunda e muito mais drástica.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Olhe que não!

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Não?...

O Orador: - Mas, a par desta posição possível, há uma outra, parcelar, cirúrgica, pontual, do género da que é defendida pelo projecto lei em discussão. Evidentemente que sabemos que não é uma varinha de condão que vai resolver os problemas da justiça, mas, juntamente com outras medidas parcelares, é capaz, tem potencialidade de dar os seus frutos.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Mas diga o que é que Bastonário da Ordem dos Advogados diz sobre esta!...

O Orador: - Mas creio, Sr.ªs e Srs. Deputados, que estas duas posições, uma drástica e outra parcelar, podem perfeitamente co-existir! Nada impede que se leve a termo uma reforma mais profunda e que continue a existir uma medida do género daquela que já existe para o Processo Penal. E aproveito para dizer também ao Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes que o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados considera positiva a introdução no Processo Penal da norma que hoje existe para acelerar os processos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Já lá está!

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - O que é que ele disse sobre esta?!

O Orador: - Não vou agora aqui repetir as ideias que já expus no meu relatório e que dou aqui como reproduzidas. Por princípio, e como resulta à evidência, somos favoráveis à ideia que está subjacente ao projecto de lei e parece-nos inquestionável a sua oportunidade ....

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas não é isso que diz o relatório!

O Orador: - ... mas quero, desde já, contestar a afirmação do Sr. Deputado José Magalhães, que disse que é uma aberração este projecto de lei porque vai criar super-polícias dos juizes. Eu não cometo a injúria contra a inteligência do Sr. Deputado de lhe dizer que isto foi uma afirmação ponderada, séria, porque não foi e, portanto, levo a sua afirmação a título absolutamente de pura demagogia, pura demagogia,...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Mas ele é bom nisso!

O Orador: - ... porque, de facto, Sr. Deputado, o poder disciplinar sobre a Magistratura existe e é constitucional. Mal iriam os cidadãos se o seu direito à justiça não fosse defendido pelo poder disciplinar que o Conselho da Magistratura tem sobre os juizes!
E, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, sabemos que há muitos e bons magistrados como V. Ex.ª, magistrados competentes, magistrados trabalhadores, mas, infelizmente, há também calaceiros, há quem não trabalhe, há quem meta baixa para não ter de despachar! Tudo isso nos aparece!

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

Página 1474

1474 I SÉRIE-NÚMERO 40

O Orador: - E é importante dotar o País de um mecanismo que permita que as partes possam tomar iniciativa. É disso que se trata.
Claro, Sr.. Secretário de Estado, que sabemos que existe, no Estatuto dos Magistrados Judiciais, uma disposição que eu cito no meu relatório...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Exactamente!

O Orador: - ... que permite ao Conselho Superior da Magistratura estabelecer prioridades de processos! Mas, Sr. Secretário de Estado, é preciso ver que esta disposição é uma disposição funcional e pressupõe uma norma adjectiva! Como é que os cidadãos hão-de proceder? É que actualmente reina a maior das confusões nesta matéria! As pessoas, que têm processos atrasados, dirigem-se ao Sr. Procurador-Geral da República, ao Sr. Provedor da Justiça, ao Sr. Primeiro-Ministro, ao Sr. Presidente da República? Enfim, ninguém se entende! Por isso, é preciso que haja disciplina, é preciso que haja regras bem definidas e claras.
Como resulta também da preocupação que há bocadinho exprimia ao Sr. Deputado autor do projecto de lei, é evidente que poderá pensar-se em abstracto que poderá haver agora um chorrilho de queixas e exposições para o Conselho Superior da Magistratura. É certo que o Código de Processo Penal demonstrou que isso não aconteceu, mas estou convencido de que é necessário melhorar, aperfeiçoar, este seu projecto de lei, introduzindo-lhe alguns mecanismos que sirvam de crivo, que permitam uma triagem, e estou convencido de que, por exemplo, um deles é permitir que as queixas, as exposições, sejam obrigatoriamente subscritas por advogados.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Apoiado!

O Orador: - Advogados que conhecem bem o estado dos tribunais e que, certamente, não irão dirigir queixas em tribunais em que o juiz está "afogado" em 2000 ou 3000 processos, quando o próprio Ministério da Justiça considera que 800 processos é o número adequado para ele poder despachar.
De modo que confio no bom senso dos advogados, confio que é possível também outros meios para impedir essa avalanche - e estou a lembrar-me de, como V. Ex.ª sugeriu há bocadinho, arranjar aqui um possível travão no sentido de declarar que determinados tribunais sejam decretados em, estado de crise, em relação aos quais não seja possível esta exposição.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ai é?... Isso é novo!

O Orador: - Portanto, acho que há "muito pano para mangas"...
Mas, Sr.ªs e Srs. Deputados, há uma outra coisa que eu também penso que poderá ser melhorada: é que se refere no projecto de lei que um processo é considerado atrasado se está três meses sem ser despachado, quando a gente sabe que o tempo de pendência é de anos. Sugeria ao Sr. Deputado que, depois, em sede de especialidade, em vez de três meses, se arranjasse um prazo mais alargado, porventura, seis meses ou, no máximo, um ano. Deixo esta sugestão.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Para terminar, Sr.ªs e Srs. Deputados, diria que absoluta aberração é deixar as coisas como estão. Isso é que é aberração! E, portanto, proponho que, em sede de especialidade, todos os grupos parlamentares, porque todos têm essa obrigação, o Parlamento não está aqui só para exigir que o Governo cumpra, está aqui para facultar ao Governo instrumentos sérios para poder governar.

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E é nessa medida que me atrevo a solicitar a todas as bancadas que colaborem, porque têm membros que podem ser úteis, no melhoramento deste projecto de lei. E, se assim for, creio que não nos vamos arrepender e que os cidadãos portugueses só terão a lucrar com isso.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da honra da bancada.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Brochado Pedras, V. Ex.ª foi relator do relatório da Comissão sobre este projecto de lei e, nessa qualidade, teve ocasião de pedir ao Conselho Superior da Magistratura que emitisse um parecer sobre esta questão. E verdadeiramente o Conselho emitiu um parecer e este parecer é inequívoca e rotundamente desfavorável.
Acusa-me V. Ex.ª e demagogia nesta matéria.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Com alguma razão!

O Orador: - Gostaria de dizer a V. Ex.ª ue este projecto de lei é, ele próprio, o emblema da demagogia, não digo com um d grande, porque o d é pequeno, no sentido exacto de prometer o impossível e de apresentar como solução aquilo que ficou demonstrado.
Sr. Deputado, eu esperava que tivesse dito alguma coisa que rebatesse o que foi solidamente argumentado para a sua bancada pelo Sr. Secretário de Estado. Mas não! V. Ex.ª ez, ao contrário do seu relatório, que, por vezes, é medido ou que aponta dúvidas, até da sua interpelação, acabo por fazer, talvez no calor do debate, uma espécie de declaração apaixonada, "filha" talvez de entusiasmos da AD mas não "filha" da racionalidade e de nenhum facto.
Portanto, digo-lhe, .Sr. Deputado: se V. Ex.ª r dar uma aula de não demagogia, tem de inverter o rumo daquilo que disse do alto da tribuna, até porque, a meio da sua intervenção, V. Ex.ª disse uma coisa espantosa, que eu não gostava que passasse despercebida. V. Ex.ª acabou de dizer "aprovem este projecto que, a seguir, podemos dizer que há zonas do País onde esta solução acelerativa não se aplica". Então, aqui atingimos o vórtice, o zimbório da demagogia, que é prometer uma aceleração a todos e, depois, subitamente, vir dizer que há uma

Página 1475

28 DE JANEIRO DE 1999 1475

zona de travagem - acelera, trava; acelera, trava; acelera, trava.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Os senhores só travam!

O Orador: - Quer V. Ex.ª uma solução mais simbólica e mais expressiva de uma demagogia que não tem rumo e que quer jogar junto da opinião pública com uma palavra mágica "acelerar". Mas o produto que V. Ex.ª propõe é os antípodas do artigo 149.º E o artigo 149.º- e esta é a minha pergunta- que V. Ex.ª conhece bem, porque nós discutimo-lo aqui cuidadosamente, é um artigo calibrado para permitir estabelecer prioridades no processamento de causas por período considerado excessivo, sem prejuízo dos restantes processos de carácter urgente. Ou seja: confia ao Conselho, através das formas próprias, a organização e as medidas que conduzam a superar aquilo que deve ser superado e que só pode ser superado com novos meios, nova logística, nova filosofia organizativa e sim mais computadores.
O Sr. Deputado Antonino Antunes tem um desprezo pelos computadores, mas é mau para si, é mau para a advocacia, é mau para a performance do Direito. É com eles e com muitos milhões de contos investidos que vamos conseguir fazer a aceleração. E é também com bom senso, com prudência e com medida!
Quanto ao voto que V. Ex.ª pediu, digo aqui, em defesa, enfim, do mínimo de bom senso, que, em nome do combate à demagogia que V. Ex.ª criticou, nós não daremos o voto a este projecto de lei. Vamos votar contra este projecto de lei e, ao fazê-lo, votamos contra a demagogia, e aplicaremos o programa que está em execução.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado António Brochado Pedras.

O Sr. António Brochado Pedras (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, quero dizer-lhe o seguinte: o ofício que o Conselho Superior da Magistratura teve a oportunidade de me enviar, e que recebi com muito gosto, é bem claro e começa com esta afirmação: "A questão da aceleração processual não é, directamente, recusável (...)".

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas continua: "... mas já está consagrada na lei"!

O Orador: - Isto significa, sem margem para qualquer dúvida, que o Conselho Superior da Magistratura considera esta questão oportuna.
Simplesmente, o que o Conselho Superior da Magistratura entende é que existe a tal norma do Estatuto dos Magistrados Judiciais, o artigo 149.º, alínea i), que, no entendimento dele, já permite que os particulares dirijam exposições e que o Conselho Superior da Magistratura, no uso da competência que lhe é conferida pelo Estatuto, estabeleça prioridades.
Mas é preciso dizer uma coisa, Sr. Deputado José Magalhães: é que, em primeiro lugar, são absolutamente contados os casos em que o Conselho Superior da Magistratura determinou esta seriação e o que é normal é que o Conselho Superior da Magistratura solicite ao juiz do processo informações sobre as razões pelas quais o processo está parado, após o que o juiz informa o Conselho Superior da Magistratura e este limita-se a enviar ao exponente...

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Isso não é verdade!

O Orador: - ...uma informação, tal qual foi prestada pelo juiz do processo.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Isso é uma grande injustiça!

O Orador: - O Sr. Deputado faça o favor de consultar os arquivos do Conselho Superior da Magistratura.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, não há diálogo!

O Orador: - Portanto, o que o Conselho Superior da Magistratura sugere é que se aproveite esta norma que já existe e que se introduza algum melhoramento. É isso que se diz, expressis verbis, aqui no parecer.
Ora, julgo que esta opinião do Conselho Superior da Magistratura, tal qual tive oportunidade de dizer no relatório, não é juridicamente correcta.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ah, não?!

O Orador: - É que esta norma do Estatuto dos Magistrados Judiciais é uma norma de carácter funcional. Importa que os cidadãos sejam dotados dos meios objectivos, dos meios processuais, dos meios adjectivos, que permitam a concretização desse seu direito.

O Sr. José Magalhães (PS): - Nem o Marques Guedes está de acordo com isso!

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado José Magalhães, o Conselho Superior da Magistratura não é demagógico, reconhece a pertinência e a oportunidade da questão, só que sugere uma outra maneira de resolvê-la.
Assim sendo, Sr. Deputado, entendo que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ao invés de pretender travar, como parece óbvio, os processos, deve é empenhar-se, como quem quer aqui dotar o País de mecanismos sãos e justos, em colaborar para que este projecto de lei seja aprovado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Um aborto não é uma solução! Um aborto é um aborto!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, a minha interpelação tem o propósito de pedir à Mesa que faculte a possibilidade de ficar registado no Diário desta sessão,

Página 1476

1476 I SÉRIE - NÚMERO 40

porque os documentos em si não são registados na Diário da sessão, a posição exacta do Conselho Superior da Magistratura. Trata-se de um órgão do Estado que nos merece a maior respeitabilidade institucional e a sua posição, transmitida na Assembleia da República, não pode ficar menos bem esclarecida, sob pena de ficar para a História que ela era uma, sendo outra.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - O que acontece aqui é que,; no ofício em causa, o Conselho Superior da Magistratura diz: "Quanto ao teor da exposição e do articulado da proposta de lei,..." - tecnicamente, como sabemos, é um projecto de lei - "... nas respectivas pormenorizações, entende este Conselho não ser o mais adequado à actual situação dos tribunais judiciais portugueses (...)".

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Nas pormenorizações!

O Orador: - A seguir, aquilo que o Conselho admite é que, no âmbito do próprio Estatuto dos Magistrados Judiciais, a questão possa eventualmente vir a ser reponderada - mas nessa sede e não nos termos que são propostos nesse projecto.
É isto que, em nome da verdade e da posição do Conselho, agradeço à Mesa ter deixado que aqui fique clarificado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Indesmentível!

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Nas suas pormenorizações!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, faça o favor de fazer chegar à Mesa esse documento.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, quero somente dizer que esta preocupação do Sr. Deputado Jorge Lacão, de fazer com que fique acessível, nos meios de registo próprios da Assembleia, este ofício do Conselho Superior da Magistratura e de fazer uma leitura truncada, como fez, desse ofício,...

Vozes do PS: - Truncada?!

O Orador: - ... não é a melhor homenagem à fidelidade daquilo que o Conselho Superior da Magistratura nos transmite. Isso está assegurado pela circunstância de, na 1.º Comissão, conjuntamente com este relatório, ficar 0 ofício que o Sr. Relator recebeu.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Não senhor! Agora, fica junto à acta!

O Orador: - Portanto, essa questão está assegurada pelo funcionamento da 1.ª Comissão, para que fique claro para todos, pela leitura integral do oficio, que o Conselho Superior da Magistratura não põe em causa esta iniciativa como complementar daquilo que o Estatuto dos Magistrados Judiciais indica como forma de aceleração processual.

O Sr. José Magalhães (PS): - O documento já está na Mesa! O documento diz o que diz, é preciso é saber lê-lo!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Apetece-me começar como o Conselho Superior da Magistratura, dizendo que a questão da aceleração processual não é directamente recusável.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - De facto, a preocupação com a morosidade da justiça é uma preocupação justa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - E a preocupação de apresentar propostas que possam ajudar a resolver esse problema é também justa e meritória.
Agora, nós estamos confrontados com uma proposta concreta para ajudar a resolver este problema. E, aí, com esta proposta, apresentada pelo Sr. Deputado Antonino Antunes como podendo ter um grande alcance e um efeito positivo significativo nesta matéria, verificando-se, em concreto, aquilo que se propõe, não se chega a idêntica conclusão. De facto, há aqui aspectos práticos que suscitam dúvidas e reservas que a intervenção feita pelo Sr. Deputado Antonino Antunes não faria supor.
É que é fácil verificar, considerando o conteúdo concreto desta iniciativa, alguns efeitos que resultariam da consagração legal de uma medida destas, aplicável aos processos cíveis.
O primeiro efeito era inequivocamente o de criar uma lista de espera no Conselho Superior da Magistratura não há qualquer dúvida a esse respeito. E os Srs. Deputados que, ainda há algum tempo, apresentaram aqui um projecto de lei que visava alegadamente combater as listas de espera na área da saúde, estão agora aqui a propor a criação de uma lista de espera, sui generis e interminável, no Conselho Superior da Magistratura, relativa à apreciação de requerimentos de aceleração processual.

Risos do PS.

É que, de facto, foram dados números impressivos, que são conhecidos, relativamente ao número de processos judiciais pendentes, pelo que é inequívoco - e ninguém estará em condições de negar isso - que a existência de um mecanismo destes faria com que, seguramente, algumas dezenas de milhar de requerimentos de aceleração processual fossem "afogar" o Conselho Superior da Magistratura, tendo provavelmente de criar-se outra entidade

Página 1477

28 DE JANEIRO DE 1999 1477

qualquer, que não o Conselho Superior da Magistratura, exclusivamente para apreciar os requerimentos de aceleração processual.
E, depois, com que efeitos concretos? Aquilo que é proposto é que a decisão, relativamente aos requerimentos, seria: ou a de indeferir o pedido, ou a de mandar proceder a um inquérito, a concluir no prazo de 30 dias - portanto, abrir-se-ia aqui uma tramitação própria para este incidente -, ou a de determinar medidas disciplinares. Assim, verificamos que há aqui um terceiro efeito, que, no fim de contas, é aquele que acaba por ser apresentado pelo Sr. Deputado Antonino Antunes como um efeito mais eficaz, passe a redundância, que era o de esperar que o juiz, confrontado com a entrada de um requerimento de aceleração processual, fosse acelerar o processo e, portanto, despachá-lo no prazo de 10 dias, para se ver livre do requerimento de apreciação.
Permita-me, pois, que lhe diga, Sr. Deputado Antonino Antunes, que parece - e não digo que seja essa a intenção, mas objectivamente somos levados a pensar que a ideia é essa - que o requerimento é uma arma, isto é, que é esse o seu efeito prático. Portanto, dá-se aqui um pouco a ideia de que os juízes deixam atrasar os processo porque são relapsos e de que, confrontados com o requerimento, não teriam outro remédio senão despachar o processo de qualquer maneira.
Esse é um raciocínio que nos suscita reservas, na medida em que não atribuímos à preguiça dos magistrados os atrasos que se verificam nos processos judiciais. Assim como nos suscita as maiores reservas a direcção da iniciativa neste sentido.
Outro efeito seguro era o de provavelmente levar à abertura de gabinetes de advogados para minutar requerimentos de aceleração processual. De facto, nesse caso, haveria aqui, digamos, um nicho de mercado para a advocacia, na medida em que, dado o afluxo previsível de requerimentos aos tribunais... Até estamos a ver o Sr. Deputado Antonino Antunes, ali ao fundo da escadaria, com toda a possibilidade de ter uma vastíssima clientela para poder...

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Não preciso disso, Sr. Deputado!

O Orador: - Sr. Deputado, peço-lhe que não pessoalize, é uma caricatura que estou a fazer e não é meu intuito ofendê-lo, mas inequivocamente, abrir-se-ia aqui a possibilidade de largas dezenas de milhar de requerimentos poderem vir a ser minutados e apresentados nos tribunais, com evidentes reflexos também no aumento da morosidade. A menos que se trate, como está a dizer o meu camarada João Amaral, de mais uma forma de procurar encontrar soluções para a formação dos jovens advogados.
Uma última questão que quero colocar é esta: sendo apresentados requerimentos de aceleração processual, poder-se-ia dar o caso de, em relação aos processos sobre os quais foram apresentados requerimentos, se encontrar uma forma qualquer, nem que fosse através da utilização pelo juiz desta possibilidade de despachar o processo nos 10 dias seguintes, de alguns processos andarem mais depressa e outros não.
Portanto, estaríamos aqui perante uma situação que importa questionar. Isto é: qual é o critério que faz com que um processo, relativamente ao qual uma das partes tomou a iniciativa, através do seu advogado, de requerer a aceleração processual e, por essa via, foi despachado, avance e outro processo, em relação ao qual as partes não accionaram esse mecanismo, não avance e permaneça atrasado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Essa agora!

O Orador: - Assim sendo, estamos aqui perante um mecanismo que poderia criar situações de manifesta desigualdade dos cidadãos perante a justiça e esta não é uma das críticas menores que fazemos a este projecto de lei.
Parece-nos, pois, que esta solução suscita algumas dúvidas e reservas que não queria deixar de exprimir aqui. Embora seja sempre de esperar que os Srs. Deputados possam reflectir sobre está matéria e que numa eventual , discussão, na especialidade, possamos encontrar uma solução melhor do que esta que aqui nos é proposta. Pela nossa parte, estaremos evidentemente abertos a essa discussão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento ( PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Pretende o projecto de lei n.º 600/VII, do PPD/PSD, e é referido na exposição de motivos, consagrar um incidente processual tendente a compelir à aceleração do processo que se encontre anormalmente atrasado.
Para além de esta medida não ser totalmente nova na nossa ordem jurídica, o que é, aliás, assumido pelos seus autores, poderá ser um factor perturbador na administração da justiça, pela desconfiança que lança na magistratura judicial, colocando juízes contra juízes, num assomo de excesso de "garantismos", tantas vezes propiciadores de mais burocracia e menos eficácia.

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem observado!

O Orador: - Exigia-se do PSD uma visão mais robusta da justiça em Portugal, atenta a sua responsabilidade, durante os 17 anos da sua Administração que antecederam os deste Governo.
Pretender combater problemas estruturais do sector da justiça com o presente projecto de lei é revelar um enorme desconhecimento, em relação aos inegáveis e complexos problemas presentes - e estes não se controlam com meros incidentes processuais.
O projecto em apreço inspira-se nas disposições contidas nos artigos 108.º a 1.ª 10.º do Código de Processo Penal, introduzidas neste Código em 1987. Os resultados são modestos, já que não diminuíram, por essa via, os atrasos nos processos de natureza penal.
Atenta a modéstia dos resultados, impõe-se perceber as inércias processuais, para estas se poderem atacar e se encontrarem os devidos antídotos.
No ano de 1997, Portugal tinha em exercício 1267 juízes, 964 magistrados do Ministério Público e 7038 oficiais de justiça, divididos por dois mundos judiciários

Página 1478

1478 I SÉRIE - NÚMERO 40

completamente diferentes. Por um lado, o litoral, com realce para a comarca de Lisboa, sobrecarregada de processos, e, por outro, o interior, muito mais aliviado.
No plano das necessárias infra-estruturas, foram inaugurados, no último trimestre de 1998, os tribunais de Portimão, Alenquer, Cascais, Seia, Meda e Seixal, o Tribunal de Família e Menores de Aveiro, o Tribunal de Trabalho de Águeda e o Tribunal de Trabalho de Abrantes.
Até ao termo da legislatura, serão inaugurados os tribunais de Loures, que descongestionará muito do trabalho da comarca de Lisboa, Barreiro, Vila Nova de Cerveira, Fundão, Vila Real de Santo António, Marinha Grande e Vale de Cambra e o Tribunal de Trabalho da Póvoa de Varzim.

O Sr. José Magalhães (PS):- Muito bem!

O Orador: - Foram reatadas as obras do tribunal de Matosinhos. Todo este esforço é alicerçado no desiderato de tornar a justiça mais célere e eficaz.
Aliás, é justo realçar-se todo o plano de informatização da justiça portuguesa, gizado por este Governo, o que representa um enorme salto de qualidade na sua gestão e administração, num contributo sério, consistente e moderno para se atacarem os inegáveis atrasos processuais, não esquecendo a colocação recente de mais 300 funcionários da justiça e as recentes alterações ao Código de Processo Penal e à Lei Orgânica dos Tribunais, pilares fundamentais no combate às questões aqui afloradas.
Contrariamente a tal, o projecto de lei em apreço não constitui qualquer alternativa aos atrasos' dos processos judiciais. Diga-se, aliás, em abono da verdade, que os atrasos não são um problema apenas do nosso país.
Ainda recentemente, numa crónica do Diário de Notícias, escrevia o conceituado jurista Armindo Ribeiro Mendes que " as situações de atraso ocorrem em diferentes sistemas jurídicos e tendem a tornar-se mais graves à medida que os cidadãos e as pessoas colectivas se tornam mais conscientes das possibilidades de defesa e de recurso".
A iniciativa legislativa em curso sonega essa realidade e poderá contribuir não para as garantias de defesa dos cidadãos mas para o aumento de processos - mais burocracia, mais inquéritos, mais informações, mais decisões, a caberem quase todas na alínea a) do n.º 4 do artigo 2.º do diploma, atenta a densidade de processos acima explanada e que se concentra fundamentalmente na comarca de Lisboa -, podendo agravar-se ainda mais as suspeições sobre os magistrados, cada vez mais fragilizados perante a opinião pública.
É com melhores meios logísticos, melhores infra-estruturas, mais e melhores instalações, mais funcionários judiciais e a libertação dos magistrados de algumas tarefas técnicas, constituindo a sua coadjuvação por assessores, por força da Lei n.º 2/98 um passo significativo, que se podem atacar realisticamente os atrasos judiciais.
Certamente que o Sr. Deputado Antonino Antunes não se inspirou no Decreto n.º 3997, de 30 de Março de 1918. Dizia o artigo 167.º: "Os juízes de qualquer ordem ou categoria que deixarem de cumprir, dentro dos prazos fixados por esta lei,. as obrigações que por ela lhes são impostas, incorrerão na pena fixa de um ano de suspensão de exercício e de vencimento.

§ único

Esta pena ser-lhes-á imposta pelo Ministro da Justiça em processo disciplinar para esse fim instaurado".

Idem para o Ministério Público, como preceituado no artigo 169.º, que dizia: " (...) demitidos do seu cargo".
Estávamos no consulado de Sidónio Pais, é esse o seu tempo histórico.
Certamente que o Sr. Deputado Antonino Antunes também não se inspirou no Decreto de 5 de Abril, de 1911, que, através do artigo 115.º, preceituava: " O juiz que deixar de cumprir a obrigação que lhe impõe o § 7.º do artigo 23.º (reclamação por não inclusão no recenseamento), e dentro do prazo nele prescrito, incorre na multa de 100$000 a 200$000 réis", nem no Decreto de 28 de Março, de 1895, que, através do artigo 119.º, prescrevia: "Os juízes, de qualquer ordem ou hierarquia, que deixarem de cumprir, dentro dos prazos fixados por este decreto, as obrigações que ele lhes impõe, incorrerão na multa de 50$000 a 100$000 réis e sofrerão a pena de dois a seis meses de suspensão".
Estas prescrições draconianas contra os juízes não tiveram a magia de resolver as questões da justiça, que são questões de Estado, não se compadecendo com diplomas desgarrados da articulação dialéctica do seus principais agentes, magistrados, advogados, funcionários e partes processuais.
Ver nesta iniciativa a "cura dos muitos dos males de que enferma o nosso sistema judiciário", é continuar a inépcia do governo anterior, imbuído de muita retórica e pouca eficácia, é continuar o torpor daquele "engano ledo e cego, que a fortuna não deixa durar muito".
A "aparição de Damasco" do Sr. Deputado Antonino Antunes iluminou-o mal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para defesa da honra da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Joaquim Sarmento, salvo o devido respeito, excedeu-se no seu ataque a este diploma da iniciativa do PSD...

O Sr. Antonino Antunes (PSD): - Foi sem querer?

O Orador: - ... quando nos acusa de, através do mesmo, pormos a magistratura contra a magistratura.
O Sr. Deputado Joaquim Sarmento, nesse seu ímpeto, acabou por cometer, ele próprio, uma ofensa a instituições respeitadas, porque quando quis envolver-nos, nesta iniciativa, nas soluções de Sidónio Pais, não se deu conta de que equiparou o Conselho Superior da Magistratura ao governo de Sidónio Pais, uma vez que era este que procedia disciplinarmente contra os magistrados, e aqui, neste regime, é o Conselho Superior da Magistratura.
V. Ex.ª cometeu a ofensa de comparar o Conselho Superior da Magistratura ao governo de Sidónio Pais!
Srs. Deputados, o Sr. Deputado Joaquim Sarmento continuou a defesa da "sua dama" feita pelo Sr. Secretá-

Página 1479

28 DE JANEIRO DE 1999 1479

rio de Estado da Justiça. Ora, a dama do Sr. Secretário de Estado é a justiça atrasada e a justiça frágil.

O Sr. José Magalhães (PS): - Isso é ofender!

O Orador: - E ela é tão frágil que o Sr. Secretário de Estado da Justiça tem medo da sua aceleração, não vá ela, com a fragilidade, acabar por cair!
Toda a envolvência que se coloca nas reticências a este diploma não tem a ver com questões de princípio.

O Sr. José Magalhães (PS): - O Sr. Deputado não acredita no que está a dizer!

O Orador: - VV. Ex.as reparem que todo o discurso do PS, designadamente o do Sr. Deputado Joaquim Sarmento, anda à volta do seguinte: "Já temos esta solução para o processo penal!".
O que é que distingue, em termos de destinatários destas normas, os juízes. do processo penal dos juízes do processo cível? Não estamos no domínio dos princípios, porque se estivéssemos seria necessário encontrar as razões dessa diferenciação.
A questão que se coloca é esta: "Como é que vai ser possível, ao Conselho Superior da Magistratura, dar resposta a isto?". Ora, estamos a trazer para os meios jurídicos questões de intendência! Será necessário, eventualmente, reforçar os meios de inspecção do Conselho Superior da Magistratura. Eventualmente, será necessário fazê-lo!

O Sr. José Magalhães (PS): - O Sr. Deputado continua a não perceber!

O Orador: - Mas, Srs. Deputados, há uma coisa que não resulta deste diploma: a menor ofensa aos Srs. Magistrados ou aos" princípios da justiça, nem qualquer coacção relativamente ao exercício da justiça.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não parece!

O Orador: - É tão simples quanto isto: se, efectivamente, tomada esta iniciativa, o magistrado em questão não está em falta, ou seja, se a razão por que não decidiu o processo dentro de um tempo razoável ê porque está indevidamente com uma acumulação excessiva, é porque está indevidamente sem funcionários, é porque está indevidamente sem meios, tem todo o interesse em fazer repercutir para o Conselho Superior da Magistratura essas situações para que sejam tomadas medidas; se está em falta, despacha no prazo que lhe é dado. É tão simples quanto isto! Não há aqui coacção relativamente a ninguém!
O que lamento é que VV. Ex.as, designadamente o Sr. Deputado Joaquim Sarmento, desenrolem um rol vasto de acusações ao diploma e não apresentem uma única alternativa para resolver o grave problema dos atrasos da justiça em Portugal.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento ( PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, não sei em que é que as minhas palavras podem ter ofendido V. Ex.ª...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - E a bancada!

O Orador: - ... ou a sua bancada.

O Sr. José Magalhães (PS): - Nem o autor do aborto!

O Orador: - Remeto para uma parte do relatório do Sr. Deputado relator, que diz o seguinte: "O artigo 3.º contempla a original e interessante hipótese de extinção imediata do incidente se o juiz titular despachar o processo atrasado dentro do prazo de 10 dias a contar da apresentação do pedido de aceleração, caso em que não há lugar nem à instrução do processo nem à comunicação ao. CSM.".
Julgo que o debate foi concludente.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Efectivamente, V. Ex.ª quis trazer aqui uma manobra de diversão...

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - ... e, no fundo, uma tentativa desconjuntada de corrigir as graves insinuações do Sr. Deputado António Antunes.

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Mas, para completar a minha resposta, quero apenas dizer que VV. Ex.as sempre viram nos juízes um instrumento de obstrução,...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Essa agora!

O Orador: - ... uma força de bloqueio. Fizeram-no, no passado, de uma forma muito clara e continuam a não encarar os juízes de uma perspectiva correcta.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - O Sr. Deputado é que tem um ministro que põe os magistrados contra os magistrados!

O Orador: - Não, não! VV. Ex.as é que são instrumento de divisão da magistratura.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - O Sr. Ministro da Justiça é que tem desacreditado a justiça!

O Orador: - Sr. Deputado Guilherme Silva, não extravase o défice democrático para esta Assembleia.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, peço-lhes que não entrem em diálogo.
Sr. Deputado Joaquim Saimento, faça favor de continuar, mas sem diálogo.

O Orador: - O Sr. Ministro da Justiça tem desempenhado, com muita nobreza, o seu magistério, numa herança que foi legada pelo governo anterior.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Se não fossemos nós a corrigir aqui os erros...

Página 1480

1480 I SÉRIE - NÚMERO 40

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, não é possível continuar desta forma.
O Sr. Deputado Joaquim Sarmento está no uso da palavra e peço a VV. Ex.as que o deixem continuar.

O Orador: - Sr. Presidente, queria apenas expressar que, efectivamente, o debate foi concludente. As insinuações são do Sr. Deputado Guilherme Silva, eu limitei-me a trazer alguma pedagogia histórica que, certamente, feriu as susceptibilidades do Sr. Deputado Guilherme Silva e da sua bancada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 57/VII - Processo especial urgente de tutela efectiva do gozo da liberdade pessoal (PCP).
Para iniciar o debate, tema palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A última revisão constitucional introduziu, em sede de protecção dos direitos, liberdades e garantias pessoais, um preceito cuja importância deverá ser assinalada. Com efeito, na sequência de propostas apresentadas pelo PCP e pelo PS, o artigo 20.º, n.º 5, da Constituição consagrou a garantia de procedimentos judiciais céleres e prioritários destinados a tutelar direitos, liberdades e garantias pessoais contra ameaças ou violações desses direitos.
O inciso constitucional comanda ao legislador ordinário a regulamentação desses procedimentos judiciais visando a tutela efectiva de direitos, onde se destacam os que dão conteúdo à democracia participativa, como 0 direito à liberdade de reunião, de manifestação, de associação e de expressão, mas onde cabem outros direitos entre o leque dos protegidos constitucionalmente, como, por exemplo, o direito à liberdade religiosa.
A história da nossa democracia, apesar dos seus 25 anos, que já lhe conferem alguma maturidade, e mesmo a sua história recente, contém exemplos de violações de liberdades, contra as quais não dispuseram os cidadãos de procedimentos judiciais que dessem conteúdo útil aos seus direitos.
Casos como regulamentos municipais e de governos civis exigindo licenciamento para afixação de propaganda política ou para a propaganda política sonora estarão ainda presentes na nossa memória recente. Também o estão casos como o da destruição de propaganda de festas partidárias, de objectivos políticos, ou ainda proibições de concentrações junto de ministérios com a alegação, sem fundamento, de que um ministério é um órgão de soberania, as quais fizeram sentar manifestantes no banco dos réus do Tribunal de Polícia e deram origem a absolvições, e até casos de omissões da Administração, como a não publicação de estatutos de associações sócio-profissionais.
Numa época em que se generalizam os lamentos relativamente ao afastamento dos cidadãos da democracia representativa, impõe-se o cumprimento da garantia constitucional por forma a que, contra arbitrariedades, os cidadãos possam intervir activamente na vida política sem constrangimentos.
O nosso preceito constitucional - diga-se de passagem - é bem mais envergonhado do que o preceito correspondente da Constituição espanhola, que consagrou procedimentos judiciais céleres e urgentes também para direitos dos trabalhadores, como o direito à greve, ó que, aliás, também propunha o PCP.
Apesar de tal não ser aceite, o artigo 20.º, n.º 5, figura entre as benfeitorias introduzidas no texto constitucional. Cometerá o legislador uma inconstitucionalidade por omissão se não cumprir esse comando, regulando os procedimentos judiciais correspondentes ao direito consagrado, o que não dará saúde à democracia.
O projecto de lei apresentado pelo PCP visa, portanto, dar cumprimento a esse comando constitucional, colmatando a lacuna que já se verifica. Não foi nossa intenção substituir, procedimentos judiciais céleres que, em relação a direitos pessoais, já se encontram consagrados na legislação portuguesa, como acontece, por exemplo, com o habeas corpus, mas tão-só, e não é pouco, assegurar a efectivação de direitos sem a adequada protecção legal.
É tarefa de melindre, reconhece-se, fazer a destrinça daqueles que já conhecerão essa protecção. Será talvez por isso que ordenamentos jurídicos, como o espanhol, mantiveram, em relação a alguns direitos, a possibilidade da sua efectivação por mais de um meio. A sua Lei Orgânica n.º 1, de 1982, relativa ao direito à honra, à intimidade da vida pessoal e familiar e à própria imagem, prevê, no artigo 9.º, a tutela destes direitos pelas vias processuais comuns, pelo procedimento previsto no artigo 53.º, n.º 2, da Constituição espanhola - procedimentos judiciais céleres e sumários - e ainda através do recurso de amparo. Mas este será um assunto a ponderar em sede de especialidade por forma a que não se suscitem dúvidas na aplicação do direito.
Na elaboração do projecto confrontámo-nos, primeiro, com a questão de saber, relativamente aos actos da Administração, se deveria manter-se na jurisdição administrativa o procedimento célere e expedito ou se deveriam ser os tribunais judiciais o garante dos direitos, liberdades e garantias pessoais contra as arbitrariedades da Administração.
Do debate da revisão constitucional retivemos afirmações de outros Deputados no sentido de a justiça administrativa ter uma função residual e última contra aquilo que não é susceptível de impugnação e no sentido de não ser a suspensão de executoriedade, existente no contencioso administrativo, o meio adequado para estes procedimentos judiciais, por não garantir a celeridade desejada.
Em termos de direito comparado, anotámos que não causou engulhos, por exemplo, em Espanha, atribuir aos tribunais judiciais a competência para, na matéria que vimos tratando, fiscalizar os actos da Administração Pública. Optámos, assim - e pensamos que bem -, por atribuir a competência aos tribunais judiciais, mesmo em relação aos actos da Administração Pública, e o enunciado, meramente exemplificativo, que fizemos dos fundamentos da impugnação destinam-se a realçar a atribuição dessa competência.
Entre os processos de jurisdição voluntária elencados no Código de Processo Civil já se encontra contemplada

Página 1481

28 DE JANEIRO DE 1999 1481

a tutela da personalidade, do nome e da correspondência. Pareceu-nos, assim, dada a especificidade destes processos, em que se julga em função de cada caso concreto e segundo os interesses em causa, que a sede própria para regular a efectivação de direitos, liberdades e garantias pessoais seria a dos processos de jurisdição voluntária, por isso propomos que o regime destes processos se aplique subsidiariamente àquele que apresentámos no nosso projecto.
Regime que, sintetizando, se caracteriza por prazos muito curtos, aliás já existentes no nosso ordenamento jurídico, por exemplo no contencioso eleitoral; pela exequibilidade da decisão, ainda que não notificada, por ausência das partes ou do mandatário; pela impossibilidade de adiamento; pela sentença oral ditada para a acta, também já hoje prevista em certos casos no Código de Processo Civil; pelas notificações por via telefónica, telegráfica, fax, ou mesmo por e-mail quando os tribunais estiverem devidamente informatizados, conforme promessa do Sr. Ministro da Justiça; pelo carácter urgente dos procedimentos determinando que os prazos nem em férias se suspendam.
Propomos, ainda, para estes procedimentos, um valor que permita o recurso até ao Supremo Tribunal de Justiça, o efeito devolutivo do recurso, sem o que ficaria inviabilizada esta tutela efectiva que pretendemos, e o pagamento da taxa de justiça, apenas a final, situação que também se verifica noutros processos em que a importância dos interesses em causa não sujeita ao pagamento de preparos o exercício da função jurisdicional.
Se o projecto, como esperamos, conhecer a discussão na especialidade, muito há, como é óbvio, a debater e a aperfeiçoar, sobretudo ouvindo as entidades que se confrontam com a legislação e que dizem, muitas vezes, sentir dúvidas, deficiências e omissões nos diplomas quando fazem a aplicação do direito, aliás, como é recomendado pelo relator do parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias sobre o projecto de lei, o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, cuja recomendação deve, de facto, ser atendida na discussão na especialidade.
Assim, deverão ser ouvidos os conselhos superiores das magistraturas, os organismos representativos das mesmas e a Ordem dos Advogados, por forma a que não se possa ouvir, sobre a lei em perspectiva, as críticas que se vêm tecendo à produção legislativa do Governo e da Assembleia, como a que, ainda ontem, pudemos ouvir, até de uma maneira caricatural, do Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados sobre o diploma de introdução do euro, que, salvo erro, no preâmbulo, refere que é uma introdução horizontal.
Uma lei da importância da que propomos, que visa regulamentar os procedimentos judiciais que tutelem liberdades fundamentais, deverá, pois, recolher aperfeiçoamentos que, eventualmente, venham a ser propostos e que sejam considerados de atender.
Pretendemos, com o nosso projecto de lei, contribuir para o reforço da democracia, nomeadamente da participativa, em cumprimento de um preceito constitucional, sem o que - torno a lembrar - estamos a cometer uma inconstitucionalidade por omissão, desprotegendo os direitos dos cidadãos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados Francisco Peixoto e Jorge Lacão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Peixoto.

O Sr. Francisco Peixoto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, ouvi atentamente a sua intervenção, como, aliás, não podia deixar de ser, e gostaria, antes de mais, de registar dois aspectos. O primeiro é de regozijo pela abertura que demonstrou ao aperfeiçoamento deste diploma legal; o segundo é o facto de esta bancada querer saudar a iniciativa do Partido Comunista por pensar que, efectivamente, é bastante positiva.
Por a iniciativa do PCP ser positiva, preocupámo-nos com a eficácia real desta medida, a ser aprovada, por isso, há aspectos, que, aliás, já hoje foram levantados na 1.8 Comissão, sobre os quais gostaria que a Sr.ª Deputada nos desse, nesta sede, se possível, os esclarecimentos ou as soluções que entender.
Por um lado, há claramente matérias de sobreposição, pois já há regimes estabelecidos relativamente à imprensa e a todo o "mundo-crime" e há procedimentos que, pela sua complexidade e pela sua especialidade, não se compadecerão, eventualmente, com o texto deste vosso projecto de lei. Portanto, há, desde logo, o perigo evidente de haver uma confluência de competências e de haver regimes processuais que se entre cruzem, ficando assim vitimado o objectivo e o desiderato fundamentais desta iniciativa, que, volto a dizer, saudamos.
Por outro lado, Sr.ª Deputada Odete Santos, uma vez que a solução por que optou, de não enunciar taxativamente, no artigo 2.º, os fundamentos de onde arranca toda a possibilidade deste processo agora projectado, poderá criar, a montante de todo este problema, uma questão de competência que poderá ser muito difícil de dirimir, com os perigos que isso necessariamente implica mas isso seria indiferente ou quase -, perguntava-lhe se não considera que uma enumeração taxativa, susceptível de ser progressivamente corrigida, seria uma solução bem melhor para que, efectivamente, este diploma venha a ter a eficácia prática que é desejada por nós, pelo menos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Peixoto, em primeiro lugar, agradeço as suas palavras, assinalando ser positiva a apresentação, pelo PCP, deste projecto de lei.
Também nós entendemos que o projecto de lei é positivo porque, desta forma, passados quase três anos desde a revisão constitucional, poderá a Assembleia da República colmatar uma lacuna, já que, até agora, têm sido deixados sem protecção efectiva direitos, como o direito de reunião, o direito de associação, de manifestação, etc., e, de facto, os cidadãos não têm gozado das garantias necessárias para o exercício desses direitos em tempo útil.
Em segundo lugar, em sede de comissão, já tive ocasião de deixar registada a nossa abertura para considerar alguns dos problemas que podem ser levantados em relação à sobreposição. Contudo, não quero deixar de dizer

Página 1482

1482 I SÉRIE-NÚMERO 40

que, depois de levantados esses problemas, pude ainda consultar alguma legislação comparada, nomeadamente a legislação espanhola, parte da qual referi na minha intervenção inicial. Ora, de facto, pode acontecer - e é um assunto a estudar - que não haja perigo dessa sobreposição.
É que referi um exemplo, o da legislação espanhola, relativamente ao direito à honra, que prevê três espécies de procedimento para o mesmo direito e, portanto, tal pode justificar-se mesmo em relação à questão da liberdade de expressão. Repare que a liberdade de expressão em relação a um meio de comunicação social tem de ser garantida, mas também tem de sê-lo, por exemplo, em relação aos trabalhadores de um jornal e esses não têm o direito de resposta. Estas são apenas questões que estou a lançar.
Embora o direito à honra também tenha protecção no nosso Direito em sede de Código Penal, e até, nomeadamente, na Lei de Imprensa, o actual Código de Processo Civil contém uma providência - não é providência cautelar! -, um processo de jurisdição voluntária também para tutela desse direito à honra em sede de processo civil. Portanto, creio que é necessário não caminharmos assim tão depressa e não entrarmos no "facilitismo" de dizer que há sobreposição porque, na vida prática dos tribunais, muitas vezes verificamos que o facto de haver dois instrumentos não prejudica os direitos dos cidadãos, pelo contrário, garante-os duplamente. No entanto, é, de facto, uma questão a ponderar.
Aliás, penso que, no relatório da comissão, há um elenco bastante pormenorizado, feito pelo Sr. Relator, de alguns mecanismos já existentes na legislação portuguesa para garantir alguns direitos e, nesse aspecto, temos o trabalho facilitado.
Quanto à outra questão de a enunciação não ser taxativa, penso que não havia outra hipótese porque o que propomos não se refere apenas à Administração mas, também, às entidades privadas. Ora, se em relação à Administração é fácil ir ao Direito Administrativo e extrair o elenco dos vícios, em relação às entidades privadas pode haver múltiplas formas de violação de direitos e, portanto, não era possível fazer o enunciado que referiu.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado Jorge Lacão, tem a palavra, também para pedir esclarecimentos.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, também eu quero registar com apreço a preocupação manifestada pelo PCP que, como sabemos, não é uma preocupação de agora, antes tem vindo a suscitá-la em vários momentos de discussão relevante, designadamente mesmo em processo de revisão constitucional. Trata-se da questão da adequada tutela dos direitos, liberdades e garantias, e o projecto de lei que agora estamos a apreciar é disso uma natural emanação.
Na questão que colocou à Sr.ª Deputada, o Sr. Deputado Francisco Peixoto suscitou uma preocupação que, a meu ver, subsiste. Esta é a de evitar que se criem regimes de sobreposição, designadamente quanto a outros institutos que já regulam, em termos adequados, domínios de acção processual atinentes às liberdades e garantias fundamentais de natureza pessoal, porque não se trataria, no plano da técnica legislativa, de criar instrumentos em sobreposição.
É que é preciso vermos a natureza formal dos instrumentos jurídicos. Eles não são, uns relativamente aos outros, hierarquicamente colocados em plano diferenciado, de tal maneira que pudesse dizer-se, por exemplo, que a lei do processo penal ou a Lei de Imprensa tivessem um valor de lei reforçada relativamente ao diploma que agora é proposto e, como tal, permitissem jogar com os vários mecanismos processuais que, entretanto, fossem aprovados. Não, a lei mais recente, esta, derrogaria, inevitavelmente, disposições das outras leis em caso de estar em colisão, juridicamente, com disposições desses institutos jurídicos e, portanto, não podemos correr esse risco. Assim, há um grande trabalho de meditação a fazer em termos de delimitação material adequada dos direitos que podem vir a figurar neste âmbito de protecção que o PCP hoje propõe.
Mas há um outro problema, Sr.ª Deputada, para o qual, de uma maneira muito construtiva, queria suscitar a meditação. Esse problema tem a ver com a competência dos tribunais.
É que podemos comparar as soluções da ordem jurídica portuguesa, existentes ou a criar, designadamente com a espanhola, que já aqui citou, mas há um problema essencial para nós. Temos de partir da nossa ordem constitucional para construirmos soluções constitucionalmente compatíveis.
Ora, o problema que temos é o de que a definição de competências dos tribunais tem sede constitucional. É a nossa Constituição que, no domínio da repartição de competências, nos faz a distinção de competências entre os tribunais judiciais e, no caso concreto que nos interessa, os tribunais administrativos. Na verdade, a Constituição, no seu artigo 212.º, n.º 3, diz que "Compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas (...)". Ou seja, está definida, em sede de Constituição, uma competência do tribunal administrativo, a qual, depois, não pode ser retirada a esse mesmo tribunal por via de legislação ordinária.
Quando, no projecto de lei do PCP, se coloca toda a competência, de forma exclusiva, no domínio do instituto que estão a propor, tendo como tribunal competente, exclusivamente, o tribunal judicial da comarca respectiva, é evidente que se está a criar, para alguns aspectos do problema, um desaforamento relativamente às competências do tribunal administrativo.
A minha preocupação é a de que esta solução esteja ferida de inconstitucionalidade. Do ponto de vista da sua solução prática até admito que pudesse ser a melhor porque os tribunais judiciais, pela sua distribuição territorial, estão mais perto das comunidades e - até admito - estão mais perto dos cidadãos e da emergência de muitos dos problemas que, neste projecto de lei, visam tutelar. Mas uma coisa é a nossa intenção subjectiva, de legislador, perante um problema, outra coisa é o parâmetro constitucional nos termos do qual temos de encontrar a solução jurídica adequada à Constituição.
Nesse sentido, peço à Sr.ª Deputada que reflicta sobre esta observação que lhe fiz, exactamente para que o PCP não esteja fechado à dificuldade que apontei e para que, em função dela, possamos conhecer, em segunda reflexão, a posição do PCP quanto a este aspecto.

Página 1483

28 DE JANEIRO DE 1999 1483

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, quanto à primeira questão, já abordei o respectivo assunto em resposta ao Sr. Deputado Francisco Peixoto. Portanto, penso que devemos ponderar bem se, de facto, haverá sobreposição em todos os casos. É que o caso que citei, da tutela do direito à honra, não é o único na ordem jurídica portuguesa em que há mais do que uma resposta para a mesma situação. Por exemplo, recordo que, em sede de pensões alimentares para pagamento de alojamento e das despesas de habitação, pode recorrer-se a isso ou à contribuição para as despesas domésticas. Portanto, não é caso virgem haver mais do que uma resposta para a mesma situação.
Passo à segunda questão que o Sr. Deputado colocou.
Tenho muitas dúvidas que seja certa a sua afirmação de que questões relacionadas com estes direitos possam conter-se dentro do enunciado constitucional das relações administrativas.
Aliás, quando, na minha intervenção, referi as intervenções dos Srs. Deputados que disseram o que disseram quanto à justiça administrativa ser residual, etc., estava a referir-me às intervenções dos Srs. Deputados José Magalhães e Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Eu não penso que tenha sido residual!

A Oradora: - Quem falou sobre a questão de a justiça administrativa ser residual foi o Sr. Deputado José Magalhães. Isto está em acta. A não ser que a mesma tenha sido feita por aquela empresa "malvada" que fazia umas actas horríveis e que trocou tudo...!

Risos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Nunca é de excluir essa hipótese!

A Oradora: - No entanto, como dizia, Sr. Deputado Jorge Lacão, é evidente que a matéria da justiça administrativa é extraordinariamente complexa e eu própria sinto isso de uma forma especial.
Aliás, faço aqui um parêntesis para dizer que, pessoalmente, preferiria que a justiça administrativa fosse uma justiça especializada na ordem judicial.
Independentemente disto, e continuando, toda a gente reconhece que as questões da justiça administrativa são extraordinariamente complexas e, portanto, é evidente que o PCP está aberto a ponderar, a debater e a aprofundar essa questão que colocou, desde que se encontre um meio efectivamente célere, ainda que em sede de justiça administrativa.
É que, segundo os próprios profissionais da justiça administrativa, não só advogados como magistrados, a mesma precisa, "urgentíssimamente" - e com muito mais urgência do que, se calhar, os tribunais judiciais -, de uma reforma rápida...

O Sr. José Magalhães (PS) - Vem aí!

A Oradora: - Então, se vem aí, calo-me!

Risos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Vem aí sem aceleração processual! Vem devagarinho!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, porque é razoável e justo que o faça, queria estabelecer uma clara diferença entre o projecto de lei que estamos a apreciar neste momento, apresentado pelos Srs. Deputados do Partido Comunista, e aquele outro, que acabámos de discutir há bem pouco, relativamente ao chamado "processo de aceleração".
O presente projecto de lei, sim, constitui uma verdadeira aceleração contra o deficit de protecção jurisdicional. Este é, claramente, o nosso entendimento.
O que vimos há pouco, da parte dos Srs. Deputados do PSD e do projecto de lei cujo primeiro subscritor é o Sr. Deputado Antonino Antunes, foi, claramente, um projecto que, se alguma vez fosse aprovado por esta Câmara - e esperemos que não! -, criaria uma imensa instabilidade pois, como vimos, começou por ser um projecto de aceleração, mas, a determinada altura, já era de aceleração apenas em relação a algumas áreas do País, sem o ser noutras. Isto, depois de o seu subscritor nos ter apresentado esta ideia magnífica de apresentar um projecto de aceleração, logo seguido de uma "lei-travão". Ele dizia, claramente: "Queremos acelerar, mas é necessário pôr aqui travão para que a aceleração não seja demasiada"!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estas questões da justiça, como o meu colega teve oportunidade de referir, são muito sérias; são questões de Estado. Por isso tenho pena que, após a constituição desta nova AD, a primeira proposta conjunta seja este projecto que, com o devido respeito, é absolutamente inqualificável e inarrável pela solução aberrante que ele próprio consubstancia.
Mais uma vez, podemos visionar o que seria o PSD no poder: um PSD absolutamente disponível para criar mais uma guerra dentro das profissões jurídicas, uma guerra contra os próprios magistrados, contra os juízes. Algo absolutamente inacreditável!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - O Sr. Ministro da Justiça põe magistrados contra magistrados, depois nós é que temos a culpa!

O Orador: - É importante estabelecer este paralelismo com o projecto que agora estamos a discutir, porque são procedimentos desse tipo que "emperram" e põem em causa a justiça, criando problemas muito sérios.
Portanto, Sr. Presidente, antes de mais, quero deixar clara a diferença entre os dois projectos de lei hoje em discussão.
Quanto ao projecto de lei apresentado pelo PCP, gostava de salientar o seguinte:...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Os senhores estão mais inclinados para esse lado!...

Página 1484

1484 I SÉRIE-NÚMERO 40

O Orador: - ... como os Srs. Deputados sabem, no âmbito da revisão constitucional, a propósito do n.º 5 do artigo 20.º, foi discutida a matéria da protecção dos direitos, liberdades e garantias pessoais e a forma de lhes dar sequência. De alguma forma, foram claramente apontados ou referenciados, a este nível, sobretudo, a protecção do direito de manifestação e a protecção do direito de reunião, no âmbito da globalidade dos direitos, liberdades e garantias pessoais, já que, como a Sr.ª Deputada Odete Santos sabe, a formulação inicial apresentada pelo Partido Comunista Português para a revisão deste preceito constitucional era, efectivamente, outra.
Temos a perfeita consciência - nesse aspecto, louvamos claramente o projecto de lei do PCP - de que é necessário acautelar, na lei processual, procedimentos absolutamente céleres e flexíveis que possam ser adequados a garantir a protecção que esses direitos devem merecer - acima de quaisquer outros, dizemos nós. O texto constitucional já o consagra e é importante que agora, ao nível do direito positivo, possamos dar sequência a esse comando constitucional.
Naturalmente, os Srs. Deputados permitir-me-ão que faça uma referência às diversas iniciativas que o Governo tem vindo a tomar, por forma a também dar sequência a este comando constitucional noutras áreas. É o que temos vindo a fazer - como eu próprio tive oportunidade de referir hoje, aquando da discussão do relatório na 1.º Comissão -, nomeadamente, na última alteração à Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, na aprovação, ainda muito recente, da Lei de Imprensa, na Lei de Protecção de Dados, tal como na aprovação das últimas alterações ao Código de Processo Penal.
Tratou-se, sobretudo, da criação de procedimentos que, efectivamente, deram sequência, de alguma forma, ao comando constitucional nestas áreas.
Temos a perfeita noção, tal como o Sr. Deputado Jorge Lacão referiu e a Sr.ª Deputada Odete Santos aceitou de que é necessária uma revisão - e eu creio que essa revisão foi precedida de um estudo muito sério - da justiça administrativa no nosso país.
Todos temos consciência de que existem procedimentos, ao nível do Processo Civil ou do Direito Civil, destinados a fazer actuar, em tempo útil, os direitos pessoais dos próprios cidadãos. Só que, muitas vezes, esses direitos são lesados por actos administrativos que não são susceptíveis de ser postos em causa em tempo útil. Essa é uma lacuna que existe ao nível da justiça administrativa e todos os Srs. Deputados compreenderão que ela merece ser reparada e, de alguma forma, preenchida, precisamente no que tem que ver com os direitos, liberdades e garantias pessoais.
Por outro lado, no domínio próprio da acção do reconhecimento e garantia dos direitos, não se deixa de justificar que se procurem soluções mais ágeis e eficazes.
O Sr. Deputado Jorge Lacão já teve oportunidade de se referir a uma situação de hipotética inconstitucionalidade, relativamente ao n.º 3 do artigo 212.º da Constituição, situação essa que temos de ter em conta. Aliás, o Sr. Deputado Francisco Peixoto, do PP, também falou da questão da sobreposição de regimes ao nível do Código de Processo Penal e das eventuais consequências negativas dessa sobreposição.
Esta é, portanto, uma situação em relação à qual, em sede de especialidade, os Deputados do Partido Socialista se colocam, desde já, à inteira disposição de toda a Câmara, no sentido de conseguirmos que o texto final a aprovar, através do consenso que é desejável numa matéria tão importante, possa prever todas estas situações, para que essa sobreposição de regimes não aconteça.
Sr.ª Deputada Odete Santos, também me permitia fazer um comentário sobre a questão dos processos de jurisdição voluntária - matéria que nos parece de extrema importância do ponto de vista legal -, processos esses que, no entender dos Srs. Deputados do Partido Comunista Português, devem ser aplicados a título subsidiário.
Existem alguns reparos a fazer, pois discordamos de algumas das soluções propostas, mas sempre com o intuito de conseguir um quadro ainda mais favorável e mais adequado à protecção destes direitos, liberdades e garantias pessoais.
O primeiro deles prende-se, desde logo, com o facto de nos processos de jurisdição voluntária, como os Srs. Deputados sabem, não ser obrigatória a constituição de advogado. Ora, entendemos que a este nível, quando estão em causa direitos tão importantes, é desejável, um pouco na sequência do que foi defendido aquando da última revisão constitucional, que se possa prever a constituição de advogado nesses procedimentos.
Em segundo lugar, nos processos de jurisdição voluntária, as providências a tomar não estão sujeitas a critérios de legalidade, os quais não são absolutamente decisivos. Esta é outra questão que temos de ponderar, até para benefício e garantia dos direitos, liberdades e garantias pessoais, direitos que queremos afirmar: Este ponto parece-me ser absolutamente fundamental, porque poderíamos estar a criar um instrumento que, de alguma forma, por aplicação de um preceito legal previsto na lei a título subsidiário, poria em causa os próprios objectivos que se pretendem alcançar.
Em terceiro lugar, ao nível do processo de, jurisdição voluntária, existe uma outra situação que gostaríamos de ver salvaguardada, também com base no mesmo princípio. Refiro-me à revogação das resoluções.
Como VV. Ex.as sabem, nos processos de jurisdição voluntária, é possível, não obstante a existência de caso julgado, a revogação das resoluções.

O Sr. Francisco Peixoto (CDS-PP): - Bem lembrado!

O Orador: - Ora, entendemos que, a este nível, não deve ser admissível a revogação das resoluções ou das decisões, a não ser em sede de recurso e com o efeito que está previsto e com o qual concordamos.
Antes de terminar, e pese embora estejamos na disposição de dar o nosso assentimento à globalidade do projecto de lei e às soluções que ele consagra, gostaria de referir o seguinte: o direito de acesso garantido a quem recorre aos tribunais não pode deixar de abranger quem a eles acede contra vontade, isto é, o réu ou o requerido contra quem a acção ou a providência é proposta.
O que é que queremos dizer com isto? Queremos dizer que os prazos que constam do projecto de lei são de tal maneira diminutos e reduzidos que, de alguma forma, podem pôr em causa a audição daqueles contra quem, eventualmente, as decisões ou as resoluções serão tomadas. Portanto, se é fundamental que quem acede aos tri-

Página 1485

28 DE JANEIRO DE 1999 1485

bunaís tenha uma decisão em tempo útil e em prazo razoável, é absolutamente necessário que o princípio do contraditório não possa ser posto em causa.
Entendemos que tal não acontece no projecto de lei apresentado, mas, de qualquer forma, interessaria que, ao nível dos prazos fixados, pudesse ser feita uma avaliação um pouco mais cuidada nesta matéria. Este aspecto prende-se, aliás, com a ponderação, que tem de ser feita neste tipo de diplomas, entre o valor da segurança e o valor da justiça. Já vivemos tempos - tempo demasiado! - em que o valor da segurança estava sempre acima do valor da própria justiça. Ora, nós entendemos que essa ponderação deve ser feita e levada em linha de conta com todo o cuidado.
Por outro lado, a decisão não deve ser proferida com base num fundamento de direito sobre o qual as partes não tenham tido a possibilidade de, previamente, se pronunciarem. Ou seja, temos de ter uma perspectiva clara relativamente à verificação, até às últimas consequências, do princípio do contraditório.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nestas circunstancias e nestas condições, estamos disponíveis para, em sede de especialidade, podermos encontrar o texto mais adequado, por forma a que os direitos, liberdades e garantias pessoais possam ser exercitados, dando assim sequência a um normativo constitucional hoje em vigor.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, ouvi com muita atenção a sua intervenção e registei algumas críticas. Gostava que V. Ex.ª explicitasse que prazos pensa propor para situações de manifestação, em que, por vezes, a proibição aparece pouco tempo antes. A este propósito, recordo-lhe a intervenção do Sr. Deputado José Magalhães, em sede da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, gabando um sistema jurídico dos Estados Unidos da América que permitiu que fosse accionada, em Chicago, uma acção deste género, por causa de uma manifestação, acção essa que obteve resposta em 24 horas!
Gostaria, pois, de saber que prazos é que o Sr. Deputado pensa propor, para que estas situações não se protelem.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes, que dispõe de pouco mais de 1 minuto.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Sr. Presidente, 1 minuto será suficiente.
Sr.ª Deputada Odete Santos, muito obrigado pela questão que me colocou. Obviamente, os prazos têm de ser curtos, mas absolutamente específicos.
A questão que referi está relacionada com uma outra que considero fundamental: a possibilidade de a entidade ou de a pessoa requerida poder ser ouvida. Isso é que me parece absolutamente decisivo, porque tínhamos um outro caminho, o dos procedimentos cautelares, onde há a possibilidade da não audição do requerido. Mas essa não é, efectivamente, a solução que está em cima da mesa.
Nesta matéria, poderemos encontrar uma solução que pode preencher esta nossa preocupação, de forma a conseguirmos prazos curtos - concordo consigo nesse ponto -, mas absolutamente específicos e relativos a casos concretos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Peixoto.

O Sr. Francisco Peixoto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A quarta revisão constitucional veio aperfeiçoar o regime constitucional dos direitos, liberdades e garantias, quer reconhecendo aos cidadãos novos direitos, quer desenvolvendo outros já existentes, quer ainda procedendo à clarificação de situações diversas directamente conexas com o exercício daqueles mesmos direitos.
Em todo o caso, é imperativo dizer, de uma forma muito positiva, que, hoje como então, saudamos esta iniciativa, não obstante a consciência que também temos de que há sempre muito por fazer e aperfeiçoar em tudo o que concerne a um regime tão sensível e importante como este.
Um dos novos direitos reconhecidos foi, precisamente, o, do acesso a procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter a tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações de direitos, liberdades e garantias pessoais. Esta necessidade é inversamente proporcional à operatividade, agilidade e eficácia do nosso sistema e' máquina judiciárias, o que é o mesmo que dizer que esta iniciativa é não só urgentíssima mas também particularmente necessária.
Trata-se, com efeito, de garantir ou de poder garantir em tempo útil a tutela judicial efectiva desses mesmos direitos, até porque sem meios jurisdicionais adequados não há efectiva tutela de quaisquer direitos.
O regime proposto, em concreto, ao remeter para o quadro legal dos processos de jurisdição voluntária regulados no Código de Processo Civil, desapossa, no entanto, desde logo os requerentes da direcção e da condução efectiva do próprio processo, já que - e como decorre da própria proposta - o tribunal não tem de se esgotar naquilo que lhe é levado a conhecimento, podendo investigar livremente os factos, coligir provas, ordenar iniciativas mas, sobretudo, admitir os meios de prova que, no seu único e exclusivo critério, repute de necessários, bem como também nas providências que decidir não está necessariamente sujeito a critérios de estrita legalidade mas, antes, de conveniência ou oportunidade.
Não tendo motivo algum para não aceitar esta solução, aguardaremos, atentamente, no entanto, para ver os seus resultados práticos.
A natureza urgente, as formas extraordinárias de proceder às diversas notificações, a par do regime das custas com dispensa do pagamento prévio de preparos e da atribuição do efeito meramente devolutivo aos recursos interpostos das decisões proferidas nesta matéria, são corolários equilibrados entre a necessidade de respostas céleres e o garantismo que em circunstância alguma poderá ser esquecido ou subalternizado.

Página 1486

1486 I SÉRIE - NÚMERO 40

Porém, algumas dúvidas, melhor, uma reflexão mais ponderada, nos merecem dois aspectos distintos susceptíveis de poderem comprometer a utilidade prática desta iniciativa. Por um lado, o recurso aos tribunais judiciais no caso de se pretender impugnar um acto administrativo, o que poderá não só implicar uma sobreposição e um conflito de competências mas também, dada a particular especialidade desta matéria, nem sempre dar resultados mais desejáveis... Tenho em ideia, neste particular, precisamente o regime dos processos de jurisdição voluntária. Por outro lado, a questão mais relevante é, precisamente, a que decorre do facto de o artigo 2.º deste projecto de lei, ao tratar da fundamentação destas providências judiciais, elencar com carácter meramente enunciativo alguns dos fundamentos.
A incerteza que envolverá outros fundamentos não explicitados poderá gerar e potenciar situações processuais labirínticas, designadamente de recurso, que acabarão, necessariamente, por vitimar o desiderato positivo deste diploma.
Perante isto, talvez fosse mesmo de tentar uma definição taxativa mas segura que, desde logo, garantisse um fácil acesso, efectivo, a este regime, sem embargo de posteriores correcções.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Odete Santos, quero saudá-la e ao seu partido por esta iniciativa e dizer-lhe que, como se deve lembrar, na revisão constitucional, o PSD deu todo o seu apoio a esta alteração do n.º 5 do artigo 20.º da Constituição, em termos de prevermos a criação de mecanismos legais que dêem uma tutela e uma garantia efectiva aos direitos, liberdades e garantias pessoais; esta necessidade nós sentimo-la. Porém, apesar de a nossa Constituição ser reconhecidamente talvez aquela, entre todas as do mundo, que maior reconhecimento dá aos direitos, liberdades e garantias pessoais, a verdade é que sabemos que, na prática, infelizmente, na hora, em tempo útil, muitas vezes, esses direitos, liberdades e garantias pessoais são irremediavelmente preteridos.
E se é verdade que nesse momento da revisão constitucional esta preocupação tinha toda a razão de ser, hoje, no estado a que chegou a nossa Administração Pública, no estado a que chegou a justiça, no estado de despotismo com que são tratados vários cidadãos no exercício dos seus direitos de manifestação,...

O Sr. José Magalhães (PS): - "Despotismo"!?

O Orador: como se vê pelas manifestações de agricultores,...

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

... como se vê no atropelo por parte Administração relativamente a vários direitos, por exemplo no que diz respeito às decisões da incineração dos resíduos tóxicos, etc., este diploma ganhou, efectivamente, uma oportunidade extraordinária.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PS): - Que descoberta!

O Orador: - Não deixa de ser sintomático, Sr.ª Deputada, que, apesar de este diploma merecer algumas alterações na especialidade, o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes tenha sido tão escrupuloso, diria mesmo tão excessivamente zeloso na elencagem tão extraordinária que fez de todos os defeitos deste diploma...

Protestos do Deputado do PS Nuno Baltazar Mendes.

... que me leva a pensar que a ideia é a de o Partido Socialista arrastar uma longa discussão na especialidade de maneira a que este diploma não seja lei na vigência deste consulado que está prestes a terminar.

Protestos do PS.

É a leitura que faço da enfatização que o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes fez, descobrindo mais defeitos do que virtudes neste diploma. Quando se vai muito para as questões processuais, quando se vai muito para as questões de forma, diluindo ou secundarizando os aspectos substantivos, Sr.ª Deputada, anuncia-se alguma coisa que não será muito boa. Estamos já todos alertados para essa manobra que foi deixada de forma suficientemente descoberta para que não passasse despercebida!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - De maneira que pode contar connosco para ultrapassar essa manobra e essa inércia.
Quero ainda dizer que não faço a leitura que o Sr. Deputado Jorge Lacão faz relativamente aos problemas da intervenção da jurisdição comum nesta questão,...

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Também não tenho!

O Orador: - ... acho até que devemos caminhar nesse sentido, eventualmente, excepcionando, se detectarmos situações que, pela sua conexão administrativa, tenham de ter outro trato. Mas este diploma e os seus intuitos exigem uma proximidade do cidadão, proximidade que é dada pelos tribunais de comarca, pelos tribunais da jurisdição comum, não é dada pelos tribunais no estado actual, pelo menos, da nossa justiça administrativa. Portanto, não vale a pena, também aí, o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes arranjar mais' uma fuga, mais tarde a filtragem, a restrição... Mais um passo também para a salvaguarda do poder que atropela!

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Quem o viu e quem o vê!

O Orador: - Sr. Deputado, "quem me viu e quem me vê" não é nada, o "espectáculo" era outro, felizmente! O espectador pode ser o mesmo mas o "espectáculo" é que não tinha a desgraça que este tem! Portanto, não viole a minha liberdade de apreciação, que é uma liberdade que respeita a verdade. Que isso o incomode, eu compreendo.

O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): - Não! De maneira nenhuma!

Página 1487

28 DE JANEIRO DE 1999 1487

O Orador: - Apesar de alguma dificuldade de a televisão transmitir tudo o que no País acontece, alguma coisa vai aparecendo e é o suficiente para justificar o que tenho estado a dizer.
Sr.ª Deputada Odete Santos, efectivamente, em princípio, não temos essa restrição relativamente à jurisdição comum. Poderemos ter algum problema relativamente à forma de processo subsidiário que está aqui indicado, pela natureza das questões; podemos ter problemas quanto à questão dos prazos que não podem ser muito alargados, mas também, em defesa de valores que este diploma tem, não pode também fazer-se um atropelo a outros princípios e valores.
Portanto, neste contexto, conte com a nossa disponibilidade para, em sede de especialidade, vermos quais são as situações que podem ser excepcionadas em matéria de foro que tendencialmente devem ser o foro e a jurisdição comuns. Tenha também a certeza de que vamos estar atentos para que este diploma não fique nas gavetas da 1.ª Comissão e possa, evidentemente, garantir a sua eficácia.
Por outro lado, é necessário, realmente, ter alguma cautela na elaboração do diploma, uma cautela que tem a ver com a questão já referida de haver algumas providências que podem ter alguma sobreposição, porque, infelizmente, também há, muitas vezes, uma tendência dos nossos tribunais para lançarem mão de questões prévias, de questões processuais, de excepções e, portanto, se deixarmos, enquanto legisladores, demasiada margem a que essa possibilidade possa ocorrer estamos, nós próprios, a criar algumas dificuldades ou a criar razões e meios para que o diploma não atinja, na prática, o desiderato e a eficácia que todos queremos que ele tenha. Vemos que, em Portugal, há várias entidades estatutariamente vocacionadas para a defesa dos direitos, liberdades e garantias e isso decorre das missões do Provedor de Justiça, do Estatuto do Procurador-Geral da República e do Ministério Público, do Estatuto dos Magistrados Judiciais, mas a verdade é que, como eu disse no início da intervenção, na hora, no momento próprio, em tempo útil, muitas vezes, esses direitos são irremediavelmente comprometidos, irremediavelmente atropelados, sem que daí advenha mal para quem os atropela e para quem os compromete. Portanto, nesta medida, este é um instrumento extremamente importante.
Fizemos um bom trabalho na revisão constitucional ao abrir esta oportunidade, está lançado um primeiro passo para se completar esse trabalho e dar resposta à exigência constitucional e vamos fazê-lo de forma a que ele não tenha "portas abertas" para se comprometer a si mesmo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, terminámos a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 571/VII, que será votado amanhã.
A próxima sessão plenária realiza-se, amanhã, quinta-feira, com início às 15 horas, e terá como período de antes da ordem do dia um debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PSD, sobre a urgente necessidade de levantamento de suspensão e reanimação do Sistema de Apoio a Jovens Empresários, e no período de ordem do dia proceder-se-á à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 222/VII - Estabelece o regime e forma de criação das polícias municipais, à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 197/VII - Regula a identificação civil e a emissão de bilhete de identidade de cidadão nacional e à discussão, também na generalidade, da proposta de lei n.º 196/VII - Autoriza o Governo a legislar a dissecação lícita de cadáveres e extracção de peças, tecidos ou órgãos para fins de ensino e de investigação científica.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 25 minutos.

Documento do Conselho Superior da Magistratura
enviado à Mesa, para publicação, a pedido
do Deputado do PS Jorge Lacão, relativo
à discussão do projecto de lei n.º 600/VII

O Conselho Permanente, hoje reunido, apreciou o texto recebido neste órgão em 21.01.99, dado o seu carácter urgente, tanto mais que temos a notícia de que a proposta de lei será apreciada amanhã na Assembleia da República, por isso, antes do prazo de 10 dias que nos foi sugerido.
Dessa apreciação resultou, em síntese, o seguinte:
1. Regista-se com prazer que a Assembleia da República tenha ouvido este órgão de Estado sobre uma matéria que respeita às suas competências, desejando que seja uma prática com sequência no futuro;
2. O Conselho Superior da Magistratura entende que a questão de aceleração processual não é, directamente, recusável mas já está consagrada na Lei (artigo 149.º, alínea i) da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho), com resultados práticos e concretos significativos na medida em que este Conselho tem ordenado, em bastantes casos, o processamento prioritário de determinados processos;
3. Quanto ao teor da exposição e do articulado da proposta de lei, nas respectivas pormenorizações, entende este Conselho não ser o mais adequado à actual situação dos Tribunais Judiciais Portugueses, considerando-se, antes, preferível que qualquer acrescentamento ou aperfeiçoamento do apontado normativo da Lei n.º 21/85, entendido como adequado, deveria ser feito em sede de revisão da mesma Lei, processo actualmente em curso, segundo se pensa;
4. Se, para o efeito, for considerado conveniente, o Conselho Superior da Magistratura dispõe-se através dos seus representantes a dialogar pessoalmente com os Srs. Deputados.

O Presidente, Jaime Octávio Cardona Ferreira

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Domingos Fernandes Cordeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.

Página 1488

1488 I SÉRIE - NÚMERO 40

Partido Social Democrata (PSD):

António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Manuel Durão Barroso.
Lucilia Maria Samoreno Ferra.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Carlos Brochado de Sousa Pedras.
Pedro José Del Negro Feist.

Partido Comunista Português (PCP):

António Luís Pimenta Dias.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Bento da Silva Galamba.
António de Almeida Santos.
Carlos Manuel Luís.
Fernando Alberto Pereira Marques.
João Pedro da Silva Correia.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Maria Eduarda Bento Alves Ferronha.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.

Partido Social Democrata (PSD):

António Paulo Martins Pereira Coelho.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José de Almeida Cesário.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
Luís Carlos David Nobre.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Manuel Cruz Roseta.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Nuno Kruz Abecasis.

Partido Comunista Português (PCP):

António João Rodeia Machado.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Carmen Isabel Amador Francisco.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL:

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×