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Quinta-feira, 4 de Fevereiro de 1999 1573
I Série - Número 43
DIÁRIO
Da Assembleia da República
VII LEGISLATURA
4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE FEVEREIRO DE 1999
Presidente: Ex.ma Sr. António de Almeida Santos
Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca
SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei n.os 233 a 236/VII, dos projectos de lei n.os 608 a 614/VII, do projecto de resolução n.º 110/VII e de respostas a requerimentos
Em declaração política, o Sr. Deputado Rui Rio (PSD) teceu críticas à forma como o Governo está a conduzir a política económica e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Manuel dos Santos (PS) e Lino de Carvalho (PCP)
O Sr. Deputado João Carlos Duarte (PSD) acusou o Governo de incumprimento de promessas na região do Oeste, tendo respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Casimira Ramos (PS) e Duarte Pacheco (PSD).
O Sr. Deputado José Carlos Tavares (PS) defendeu a necessidade da melhoria do Serviço Nacional de Saúde e realçou o esforço que está a ser feito naquele sentido no distrito de Viana do Castelo No final, respondeu a pedidas de esclarecimento dos Srs. Deputados Roleira Marinho e Carvalho Martins (PSD).
O Sr Deputado Lino de Carvalho (PCP), a propósito do anúncio jeito pelo Governo de um plano regional de emprego para o Alentejo, criticou a política governamental de combate ao desemprego, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento das Sr.ªs Deputadas Mafalda Troncho (PS) e Manuela Ferreira Leite (PSD), e deu esclarecimentos ao Sr. Deputado António Salero (PS), que exercera o direito de defesa da honra
Ordem do dia. - For apreciada, na generalidade, a proposta de lei n.º 215/VII - Autoriza o Governo a legislar sobre o regime geral das empresas públicas e sector empresarial do Estado, tendo intervindo, a diverso título, além do Sr. Ministro das Finanças (Sousa Franco), os Srs. Deputados Octávio Teixeira (PCP), Ruí Pedrosa de Moura (CDS-PP), Carlos Brito (PSD) e Manuel dos Santos (PS).
O projecto de lei n.º 596/VII - Cria um cadastro obrigatório de acidentes de automóveis e motociclos, visando aumentar a segurança rodoviária e a defesa do consumidor (PS) foi discutido na generalidade. Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Paulo Neves (PS), Moura e Silva (CDS-PP), Calvão da Silva (PSD) e Bernardino Soares (PCP)
Foi ainda discutido, na generalidade, o projecto de lei n.º 588/VII - Torna obrigatória a afixação do preço dos produtos em dígitos (Os Verdes), tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Calvão da Silva (PSD), Fernando Serrasqueiro (PS), Bernardino Soares (PCP) e Augusto Boucinha (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 10 minutos.
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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
António Manuel Carmo Saleiro.
Armando Jorge Paulino Domingos.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Casimiro Francisco Ramos.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís António do Rosário Veríssimo.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Ferreira Jerónimo.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Eduarda Bento Alves Ferronha
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Paulo Jorge Lúcio Arsênio
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Victor Brito de Moura
Partido Social Democrata (PSD):
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Alberto Queiroga Figueiredo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António d'Orey Capucho.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
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Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Póvoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Vasco Manuel Henriques Cunha.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
António Carlos Brochado de Sousa Pedras.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Kruz Abecasis.
Rui Manuel Pereira Marques.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.
Partido Comunista Português (PCP).
Alexandrino Augusto Saldanha.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
António Luís Pimenta Dias.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Octávio Augusto Teixeira.
Partido Ecologista Os Verdes (PEV):
Carmem Isabel Amador Francisco.
Isabel Maria de Almeida e Castro.
Deputado independente:
José Mário de Lemos Damião.
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas e as respostas a requerimentos que deram entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de lei n.ºs 233/VII - Regulamenta a dispensa de horário de trabalho, com adaptabilidade dos trabalhadores menores, dos portadores de deficiência e das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes, que simplifica alguns procedimentos na organização do tempo de trabalho, designadamente os que envolvem actos de relacionamento entre os empregadores e a Inspecção-Geral do Trabalho, que baixou às 8.ª e 12.ª Comissões, 234/VII - Sobre a revisão do estatuto político-administrativo da Região Autónoma da Madeira (ALRM), que baixou à U Comissão, 235/VII - Permite a regularização excepcional das situações de falso trabalho independente, através da celebração de contratos de trabalho a termo, que baixou à 8.ª Comissão, e 236/VII - Desenvolve e concretiza o regime geral das contra-ordenações laborais, através da tipificação, clarificação e classificação das contra-ordenações correspondentes à Violação dos diplomas reguladores do regime geral dos contratos de trabalho, ,que baixou, igualmente, à 8.ª Comissão; projectos de lei n.os 608/VII - Sobre a elevação de Maceda à categoria de vila (PSD), que baixou à 4.ª Comissão, 609/VII - Sobre a criação da freguesia de Boavista dos Pinheiros, no concelho de Odemira (PS), que baixou, também, à 4.ª Comissão, 610/VII - Sobre a criação da freguesia de Longueira-Almograve, no concelho de Odemira (PS), que baixou, igualmente, à 4.ª Comissão,
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611/VII - Sobre a elevação da freguesia de Maceda, no concelho de Ovar, à categoria de vila (PS), que baixou ainda à 4.ª Comissão, 612/VII - Altera a Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), que baixou às 1.ª e 4.ª Comissões (PCP), 613/VII - Sobre a alteração da denominação da freguesia de Tomar a Santa Maria dos Olivais, no concelho de Tomar (PSD), que baixou à 4.ª Comissão, e 614/VII - Sobre a elevação da Póvoa de Santa Iria a cidade (PSD), que baixou, igualmente, à 4.ª Comissão; projecto de resolução n.º 110/VII - Visa a regulamentação da legislação que garante a protecção às mulheres vítimas de violência (CDS-PP).
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: no dia 27 de Janeiro de 1999 - Pedro da Vinha Costa, na sessão de 11 de Novembro; Fernando Pedro Moutinho, no dia 26 de Novembro; Isabel Castro, na sessão de 2 de Dezembro; Alexandrino Saldanha, no dia 5 de Janeiro; no dia 28 de Janeiro de 1999 - Joaquim Sarmento, na sessão de 11 de Novembro; António Gouveia, na sessão de 19 de Novembro; João Pedro Correia, na sessão de 9 de Dezembro; Manuel Moreira, na sessão de 11 de Dezembro.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar na segunda parte do período de antes da ordem do dia.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.
O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tudo aquilo para que o PSD tem vindo a alertar, nos sucessivos debates sobre a política económica deste Governo, acaba de ser corroborado pela própria Comissão europeia 1á não somos só nós a dizer que a política orçamental socialista não é a mais adequada.
O Executivo insiste em não tomar medidas de contenção da despesa e levanta demagogicamente a bandeira da redução do défice como um alto desempenho da sua parte. Essa redução do défice não só é muito insuficiente, face ao ciclo económico que estamos a atravessar, como, fundamentalmente, é baseada apenas no aumento das receitas de impostos, na redução dos juros da dívida pública e nas receitas das privatizações.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Traduzido em bom português quer isto dizer que o verdadeiro esforço que o Governo fez para a redução do défice é praticamente nulo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - As despesas- correntes sem juros cresceram 41% nestes quatro anos de desempenho socialista. Mais 2 215 milhões de contos de gastos, sem que, ao nível dos serviços prestados, se note qualquer melhoria. Mais 2 215 milhões de contos para prestar, basicamente, o mesmo nível de serviços.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Quem está a pagar este despesismo são, obviamente, os portugueses, através dos seus impostos, cuja receita cresceu, no mesmo período de tempo, mais de 39%.
As críticas que Bruxelas faz hoje a Portugal são mais do que lógicas: Portugal não aproveitou o ciclo económico para fazer a consolidação orçamental. Os socialistas adiaram para o futuro tudo aquilo que já deveria ter sido feito ontem. Os socialistas adiaram, irresponsavelmente, a consolidação orçamental para o momento em que não só o crescimento económico será menor como as receitas de privatizações mais baixas e as taxas de juro sem mais descidas.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em vez de porem cobro aos sucessivos buracos orçamentais do Ministério da Saúde, optam por desorçamentações mais ou menos habilidosas que não só Bruxelas como o próprio Tribunal de Contas não se cansam de reprovar.
Em vez de fazerem uma gestão rigorosa da despesa pública, optam por aumentar a carga fiscal.
Em vez de fazerem as reformas estruturais que a nossa sociedade há muito reclama, optam por recorrer ao endividamento oculto, sob a denominação de portagens virtuais ou de guerra em sistema de leasing.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Em vez de preparar o futuro, optam por esconder o presente.
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a economia portuguesa a crescer cerca de 4% não pode haver perdão para um Governo que não aproveita essa conjuntura favorável para preparar devidamente o nosso futuro colectivo.
Portugal vai ter de fazer cortes na sua despesa e reduções no seu défice em momentos de menor crescimento, o que, naturalmente, obrigará a um esforço perfeitamente evitável.
É isso que Bruxelas hoje nos vem dizer. É evidente que, do ponto de vista meramente nominal, o Pacto de Estabilidade que o Governo português apresenta em Bruxelas parece correcto. O problema é a estratégia que está a ser seguida para que esses valores possam ser alcançados.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - A quebra dos salários reais no ano de 1998, devido à derrapagem da inflação, é já o primeiro prenuncio de tudo o que o PSD tem vindo a dizer e que Bruxelas, agora, impiedosamente, também refere.
Com a inflação a derrapar e com a política monetária dirigida em Frankfurt em função da taxa de inflação da União Europeia e não em função do desempenho dos piores Governos da União, é óbvio que resta apenas a política orçamental para evitar essa derrapagem.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador - Nada que o Governo não soubesse. Nada que seja novidade. Só que os socialistas, como sempre, esperaram que as coisas acontecessem para depois agir.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Muito bem!
O Orador: - E as coisas já estão a acontecer. Uma taxa de inflação homóloga de 3,2% em 1998 contra uma correspondente taxa da zona do euro de apenas 0,9%. Isto
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significa, no quadro actual de moeda única, que as nossas empresas perderam competitividade por culpa da política orçamental deste Governo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E é bom que se alerte para o facto de que essa perda de competitividade não diz apenas respeito a quem exporta, diz respeito a todas as empresas que se situam em mercados de bens transaccionáveis, ou seja, na esmagadora maioria, porque, como é óbvio, não só os nossos produtos que ficam mais caros lá fora são também os produtos provindos dos outros países da União Europeia que ficam mais baratos cá dentro.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Por isso, o Sr. Ministro das Finanças está muito enganado, quando diz que esta alta taxa de inflação é o preço que pagamos para ter menos desemprego. Não é verdade! É precisamente ao contrário!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Num mercado único com moeda única, uma maior taxa de inflação significa perda de competitividade das nossas empresas, logo, significa uma potencial perda de postos de trabalho e não um potencial ganho.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - É evidente que há uma solução relativamente simples para repor a nossa taxa de inflação a níveis competitivos. Bastava baixar o preço da gasolina na proporção a que o petróleo tem baixado para que a evolução da inflação passasse logo a ser outra. Só que essa solução é muito difícil de tomar por um Governo que precisa mais do aumento de impostos do que o Diabo precisa de almas.
Aplausos do PSD.
Com o crescimento das despesas correntes a níveis insustentáveis, é lógico que o Governo não consegue abrir mão do forte aumento do imposto sobre a gasolina que todos temos vindo a pagar. O preço no consumidor não se altera, mas a verdade é que, face à descida do preço do petróleo, estamos todos á pagar muito mais imposto ao Estado.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - E se este aumento de inflação é muito grave para as empresas e para os salários reais, é dramático para a poupança. Todos os portugueses que, neste momento, têm as suas poupanças aplicadas em depósitos a prazo têm um juro líquido ridículo e inferior à inflação. Quer isto dizer que a poupança da nossa classe média está, neste momento, remunerada a taxas negativas. Quem tem verbas aplicadas no banco e não conhece formas mais sofisticadas de aplicações, está a perder dinheiro.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Capital mais juros valem menos no fim do período de capitalização do que valia apenas o capital no inicio desse mesmo período.
O Sr. Azevedo Soares (PSD): - É verdade!
O Orador: - É uma dura realidade do ponto de esta social que não penaliza os ricos, porque esses têm outros meios de defesa, penaliza, basicamente, a classe média e as suas parcas poupanças.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - O crescente endividamento das famílias portuguesas, que começa a atingir níveis preocupantes, não está, seguramente, dissociado deste fenómeno. Com uma inflação superior à taxa de juro líquida, os portugueses, percebendo que, ao poupar, estão a perder, optam, naturalmente, por gastar ou mesmo por se endividarem.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados O Governo tem dito repetidamente que não temos razão. Terá de dizer também que os relatórios do FMI não têm razão. Terá de explicar adicionalmente que os estudos da OCDE também não têm razão. Mas, a partir de hoje, tem uma tarefa ainda mais complicada: passou a ter de explicar também à Comissão europeia que está errada.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Estarão, eventualmente, todos errados na óptica do Governo, mas é já tempo de o PS começar a reparar no autismo do seu Executivo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - É bom que o Partido Socialista perceba o que o Governo insiste em não querer perceber e consiga, assim, explicar ao Sr. Primeiro-Ministro que é tempo de começar a governar.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Cada dia de mera contemplação passiva da realidade traduz-se, inevitavelmente, no futuro, em mais um "puxão de orelhas" de Bruxelas. Só que esses "puxões de orelhas" não são o mais grave. O mais grave é o adiamento do País e os sacrifícios desnecessários que os portugueses têm de suportar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Rui Rio, os Srs. Deputados Manuel dos Santos e Lino de Carvalho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
Vozes do PSD: - Ah!
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, estou a ver que os Srs. Deputados do PSD estão muito entusiasmados. Gostam muito de me ouvir. Obrigado pela vossa atenção e aceitação.
Começo por dar os parabéns ao "futuro ministro" Rui Rio.
Vozes do PSD: - Ainda bem!
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O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Então ganhamos as eleições!
O Orador: - É que o Sr. Deputado Rui Rio entende que o eleitorado português é um conjunto de pessoas desenformadas e que, sobretudo, vota contra os seus interesses, pelo que, naturalmente, dar-lhe-á uma grande maioria. Parabéns, Sr. Deputado Rui Rio! Só que, como o senhor sabe, a realidade não é essa! Todas as sondagens, todas as consultas, todo o pulsar da população portuguesa vai exactamente no sentido contrário do catastrofismo que V. Ex.ª aqui apresentou. Portanto, o senhor vai ter de estar aqui mais quatro anos, qual Cassandra desactualizada, a dizer as mesmas coisas, segundo o mesmo ritmo e com a mesma inverdade.
Vozes do PS: - Muito bem!
Protestos do PSD.
O Orador: - Sr. Deputado Rui Rio, o que o senhor aqui disse é o que sempre diz! Diz aqui, diz na Comissão de Economia, Finanças e Plano, diz em todos os debates que tem connosco!
O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Por isso é que ele não é socialista!
O Orador: - O senhor diz que é preciso diminuir a despesa corrente. Muito bem? É preciso diminuir a despesa corrente. Já não o quero preocupar, perguntando-lhe o que é que entende por despesa corrente, mas, já agora, de uma vez por todas, diga-nos que despesa corrente é que o senhor diminui! O senhor propõe a diminuição de salários da função pública ou o despedimento dos trabalhadores da função pública? O senhor propõe a paralisação dos serviços públicos? Não, Sr. Deputado Rui Rio! O que o senhor propõe, naturalmente, não propondo nada, é o aumento da carga fiscal que este Governo se recusa a fazer!
Protestos do PSD.
Para obter as soluções que o Sr. Deputado Rui Rio aqui apresenta, naturalmente, só haveria uma hipótese: aumentar á carga fiscal. Mas, como sabe, temos o compromisso de não aumentar a carga fiscal e não deixaremos de o cumprir até ao fim da legislatura.
Hoje de manhã, na Comissão de Assuntos Europeus, acusei um colega seu de bancada..., acusei, não, referi que um colega seu de bancada fazia intervenções lendo os artigos dos jornais, ou seja, lia o jornal de manhã e, depois, organizava a sua intervenção em função desse jornal. Estava muito longe de pensar que essa < febre" já era generalizada na sua bancada. Mas já percebi por que é que o senhor fez a intervenção que fez: leu um jornal qualquer de hoje, leu mal, como de costume, e encontrou aí o alfa e o omega da sua intervenção. Aparentemente, a Comissão europeia teria reflectido sobre o programa de estabilidade e crescimento apresentado pelas autoridades portuguesas e, como alguns artigos de alguns jornais, ao lado de grandes elogios a esse plano de estabilidade e crescimento, colocam algumas legítimas dúvidas, como, por exemplo, a de não ser suficientemente progressivo o esforço das finanças portuguesas no sentido do equilíbrio e, repare, não é não ser progressivo é não ser suficientemente progressivo -, V. Ex.ª encontrou a oportunidade para fazer a intervenção que fez. Aliás, fê-la a destempo, porque, como saberá, hoje mesmo, a Comissão Europeia aprovará, como seu, o documento de crescimento e estabilidade que foi apresentado pelo Governo português. Portanto, amanhã, tudo o que o senhor ali disse não tem sentido! O que o senhor ali disse só teria sentido' se, por exemplo, a Comissão Europeia reprovasse o programa que foi apresentado por Portugal. E o senhor sabe muito bem que esse programa foi elogiado, que esse programa será tomado e aprovado!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Manuel dos Santos, agradeço-lhe que termine.
O Orador: - Portanto, Sr. Deputado Rui Rio, o senhor fez o discurso do costume, a demagogia do costume e a desinformação do costume. E isso não é útil!
O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - Vou já terminar, Sr. Presidente, se me deixar.
E isso não é útil, sobretudo para os seus interesses, porque, com esse tipo de discurso, já ninguém o leva a sério e ninguém leva a sério o seu partido.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.
O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Deputado Manuel dos Santos, em primeiro lugar, desde logo, uma contradição: o Sr. Deputado disse que eu fiz, mais uma vez, o mesmo discurso de sempre, para mais à frente dizer que Bruxelas me deu oportunidade de hoje fazer este discurso. Está a dar-me razão! Bruxelas está a dizer aquilo que nós dizemos há muito tempo.
Não foi, pois, Bruxelas que me deu esta oportunidade! Repeti aquilo que sempre temos dito!
Por outro lado, a questão da inflação é também uma questão nuclear. Aliás, eu não referi, na minha intervenção, um aspecto também importante: como sabe, a inflação divide-se por sectores, sendo maior nuns sectores, menor noutros, e a inflação média é a que nós todos sabemos. Mas onde ela é maior é precisamente no sector dos bens alimentares, o que quer dizer que, para um partido socialista, que diz que as pessoas estão primeiro, a inflação ainda é pior do que aquela que eu referi, porque naquilo que pesa nas classes mais desfavorecidas ela foi ainda pior do que a inflação média que Portugal registou no ano passado.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - É evidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, que eu sei como é que hei-de pegar na minha poupança e aplicá-la de uma forma mais rentável, mas o grosso das pessoas não tem nenhuma licenciatura em economia, não sabe lidar com o dinheiro, aplica-o no banco. E a verdade é que essas pessoas, ,que poupam, que têm o dinheiro no banco - aliás, é uma tradição portuguesa ter uma poupança elevada -, estão, neste momento, a perder dinheiro. Ou seja, a taxa de juro é, neste momento, inferior à inflação, o que é particularmente penoso do ponto de vista social.
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Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Perguntou-me depois o que é que eu queria que mudasse, que despesas é que eu queria cortar... Sr. Deputado, já uma vez fiz aqui uma elencagem... Mas, para pegar numa de conjuntura, já reparou no balanço da Radiotelevisão Portuguesa? Já reparou que os prejuízos aumentam e as audiências baixam?
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Não seja ridículo!
O Orador: - Dei-lhe um exemplo que está na ordem do dia!
Sr. Deputado Manuel dos Santos, tiro da sua intervenção a seguinte conclusão no que toca à negociação da Agenda 2000, os portugueses podem estar descansados, porque o Sr. Primeiro-Ministro vai chegar a Bruxelas com um argumento de peso para conseguir evitar a perda de fundos que se avizinha. Ò Sr. Primeiro-Ministro vai dizer, em Bruxelas: «Dêem-me dinheiro, porque estou em primeiro lugar nas sondagens em Portugal»!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para formular o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, também nós pensamos que há razões para fortes preocupações quanto ao estado real da nossa economia.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Mas o estado real do PSD é pior!
O Orador: - O que desconfio, Sr. Deputado, é que as razões pelas quais temos essas preocupações e pelas quais criticamos o estado da economia não são, provavelmente, as mesmas pelas quais o PSD também se pronuncia,...
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É natural!
O Orador: - ... porque, em nossa opinião - e o Sr. Deputado explicá-lo-á -, na «carruagem» que conduz a esse conjunto de preocupações, o PSD também tem lá um lugar assegurado, logo na «locomotiva». E refiro-me a três aspectos, Sr. Deputado.
Primeiro, o Sr. Deputado acabou de dizer, na sua intervenção, que, para o PSD, a estratégia inerente ao pacto de estabilidade que o Governo apresentou a Bruxelas está correcta. Ora, a nossa tese sobre essa matéria é exactamente a oposta. É que um dos problemas com que hoje a economia portuguesa se confronta são os condicionamentos macroeconómicos que o pacto de estabilidade impõe à economia portuguesa, as dificuldades e, portanto, os constrangimentos que ela coloca a uma convergência real da economia.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Poderemos estar num quadro de convergência nominal - vamos ver por quanto tempo! -, mas não estaremos, seguramente, num quadro de convergência real das economias.
E quer um exemplo, Sr. Deputado? O Governo fala muito no crescimento do PIB e nos vários elementos que justificam o seu crescimento, designadamente o nível da despesa pública e o nível do consumo privado, mas, como todos sabemos, o que se está a verificar no País não é um aumento do consumo privado com base no crescimento real dos salários e do poder de compra, mas, sim, com base num preocupante crescimento do nível de endividamento das famílias portuguesas.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Crescem os salários, também cresce o poder de compra!
O Orador: - Portanto, quando este ciclo, quando esta conjuntura terminar, o que poderemos ter, seguramente, é uma crise de proporções bastante elevadas e sobredimensionadas. Isto tem a ver com políticas internas, mas também tem a ver com consequências inerentes a esse pacto de estabilidade que VV. Ex.ªs têm vindo a apoiar e a aplaudir.
Segundo, o problema da política de privatizações, na qual o Governo do PS tem ido, porventura, mais longe do que foi o governo do PSD, diminuindo cada vez mais as políticas públicas neste terreno e também não contribuindo daí para, com o estímulo necessário das políticas públicas, poder proporcionar elementos de crescimento sustentável da economia portuguesa e do aumento do rendimento real das famílias portuguesas.
Por último, Sr. Deputado, refiro-me ao problema da fragilização da legislação laboral, outra linha de ataque em que o Governo do Partido Socialista se tem sustentado e que também conduz, obviamente, com todos os outros elementos, à criação de um quadro preocupante quanto à economia e quanto à situação social em Portugal.
Este são, Sr. Deputado, alguns dos grandes vectores pelos quais nos preocupamos e pelos quais temos críticas a fazer ao Governo do Partido Socialista, e é sobre eles que gostaria de ouvir a opinião do Sr. Deputado Rui Rio, do PSD.
Sr. Deputado Rui Rio, não o trato por «futuro Sr. Ministro», como o fez o Sr. Deputado Manuel dos Santos - ele começa sempre as suas intervenções por aí -, primeiro, porque acho que a AD não vai «passar do adro»,...
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Diga lá como é que sabe!?
O Orador: - ... é algo que vai morrer à nascença. O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar!
O Orador: - Mas não é só por isso. Compreendo que o Sr. Deputado Manuel dos Santos comece sempre as suas intervenções, no Plenário, recorrendo à memória dos lugares institucionais. É um problema de saudade, é um problema do subconsciente!
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Isso percebe-se!
O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Orador: - Para terminar, o Sr. Deputado referiu-se à política económica do PS como uma política diabólica, uma espécie de política do inferno. Por isso, a minha pergunta é a seguinte: qual é o lugar do PSD neste inferno, nesta política diabólica do PS?
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Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.
O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, o lugar do PSD, em matéria ,europeia...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - É na oposição, por muitos anos!...
O Orador: - Efectivamente, o lugar do PSD, neste momento, é na oposição. Não tenha qualquer dúvida.
Agora, o lugar do PSD, em matéria europeia - e é essa a questão do Sr. Deputado Lino de Carvalho -, é a mesma de sempre, e aquilo que para o PCP é uma crítica para nós é um elogio. Temos fortíssimas responsabilidades, senão mesmo responsabilidades determinantes, pelo facto de Portugal estar na moeda única, o que o PCP contesta.
Vozes do PSD: - Muito bem?
O Orador: - E, nessa medida, o que é um ataque coerente, por parte do PCP, é da nossa parte interpretado como um elogio, também coerentemente, à luz das nossas ideologias.
Vozes do PSD. - Muito bem!
O Orador: - Mas quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que o nosso lugar, pese embora a crítica implícita ao PCP, é o lugar da história, o lugar que a história permite que Portugal ocupe neste momento. E as teses que o Sr. Deputado Lino de Carvalho defende, em consonância com aquilo que o PCP tem dito, relativamente ao défice público, à inflação (ou seja, que um défice não deve ser baixo, deve
ser alto ou, pelo menos, deve ser mais alto, que a inflação não tem de ser baixa, tem de ser mais elevada, por combate ao desemprego), todas elas, estão ultrapassadas.
Digo-lhe, por exemplo, que, enquanto numa economia fechada, V. Ex.ª provoca um défice público e, portanto, provoca procura dentro do País; numa economia aberta, como é a nossa neste momento, se V. Ex.ª fizer um défice público,
provoca procura em toda a União Europeia. Porém, quem vai pagar esse défice são só os portugueses. Por isso é que é óbvio que, hoje, um défice baixo tem uma lógica que não tinha há 20 anos atrás. Por isso é que, em moeda única, Sr.
Deputado, a inflação tem de estar nos mesmos parâmetros da inflação média na Europa, porque se ela é mais elevada, os nossos produtos são mais caros, e. se são mais caros as nossas empresas perdem competitividade.
Portanto, a inflação elevada não combate o desemprego, ,bem pelo contrário, acentua-o!
E evidente que tudo aquilo que eu disse são preocupações que temos, seguramente iguais às do PCP, mas à luz de ideologias distintas. Temos todas estas divergências, mas há, pelo menos, um traço comum entre aquilo que os dois
'dissemos, que tem a ver com o endividamento das famílias e com uma coisa, que também está implícita nas suas palavras e que nos preocupa cada vez mais, que é a diferença entre a taxa de juro e a taxa de inflação, que se resume a
uma realidade que o PS criou, neste momento, no País, que é uma realidade dramática. É que, neste momento, os portugueses pagam para ter o dinheiro no banco!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para o tratamento de assunto de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos Duarte.
O Sr. João Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Faz hoje um ano que o Governo foi derrotado definitivamente no processo que o País e os portugueses ficaram a conhecer como a "guerra contra as portagens do Oeste".
Vozes do PS: - Outra vez!?...
O Orador: - Faz hoje um ano que as populações de Leiria e do Oeste viram coroados de êxito os esforços de dois anos de luta, travada dia a dia.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Grandes heróis do Oeste!...
O Orador: - Também faz hoje um ano que o Sr. Presidente da República se dirigiu a esta Assembleia, através de uma mensagem, expressando o seu desejo de patrocinar soluções que contribuíssem para evitar tensões institucionais, em nome da estabilidade política, devendo dar "uma resposta adequada às preocupações legítimas manifestadas pelas associações e entidades locais".
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República deve orgulhar-se do muito que contribuiu para a resolução deste grave problema social e político.
O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Este Parlamento, e em particular todos aqueles que estiveram ao lado das populações, deram um contributo decisivo para emendar um dos piores erros que o Governo cometeu desde que está em funções.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - As portagens do Oeste ficarão na história desta legislatura como um dos casos políticos onde mais se sentiu a arrogância, a chantagem e a incompetência do Governo.
Vozes do PS: - Ah!...
O Orador: - O Governo é o Ministro João Cravinho acabaram com as portagens nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto com o argumento de que as populações não tinham alternativas rodoviárias e ferroviárias, e fizeram o contrário em Leiria e no Oeste.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Com o acordo político de 3 de Fevereiro de 1998, ficou provado que o autismo e a arrogância, em política, podem e devem ser derrotados. Utilizando urna linguagem desportiva, o Governo perdeu por cinco a zero.
Aliás, aos golos marcados com as decisões favoráveis do Provedor de Justiça, em Julho de 1997; do Tribunal de Contas, em Outubro do mesmo ano; da Assembleia da República; em,6 de Novembro; e do Tribunal Constitucional, em 21 de Dezembro, somou-se o acordo político de
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3 de Fevereiro de 1998. Esse acordo político foi uma vitória, essencialmente, das populações e dos que apoiaram e sempre acreditaram na justiça, permitindo assim anular decisões desastrosas, escandalosas, e que, em tempo oportuno, foram devidamente desmascaradas, censuradas e, em grande parte, emendadas por autarcas e dirigentes associativos e também pelos órgãos de soberania já referidos.
Ficou claro que um movimento cívico, quando defende causas justas, atinge os seus objectivos. Nesta luta cívica e política provou-se que é possível, com coragem e assumindo todos os riscos, pessoas de todas as idades, condições sociais e ideias políticas, unirem-se e lutarem contra a injustiça, a mentira e o terrorismo político.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - O grande derrotado foi o Governo e o Ministro Cravinho, que acabaram por ter de engolir "em seco" tudo o que, durante um ano, recusaram.
Risos do PS.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Você é que está a "meter água"!
O Orador: - O Sr. Ministro João Cravinho, como sabem, é que meteu muita água! Por isso é que os senhores ficam incomodados!...
Ele que fez e chamou tudo à população de Leiria e do Oeste e ao Sr. Provedor de Justiça, região que foi chamada "República da Pêra Rocha", "índios chupistas", "grupelho", "que deviam andar de carro de bois", "incompetentes", etc.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Uma vergonha!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A solução encontrada, em Fevereiro de 1998, em que o Sr. Presidente da República teve um papel decisivo, tinha datas faseadas para cumprimento de cada um dos seus pontos. Ninguém pediu essas datas. Foi o Ministro João Cravinho, por iniciativa própria, que as assumiu.
A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): - Tal e qual! ...
O Orador: - O Governo produziu, no mês de Fevereiro, actos normativos e actos administrativos, assumindo uma calendarização para o compromisso. Em carta de 3 de Fevereiro de 1998, enviada ao Sr. Presidente da Assembleia da República, e também através de despacho a assumir o acordo, o Sr. Ministro João Cravinho assumiu que transformaria, em alternativa, a EN8, numa extensão de 23 km, em cerca de 40% da via, com um investimento de 1,5 milhões de contos. Dizia que, até 20 de Abril do ano corrente, iria ter o projecto de execução deste empreendimento concluído, devendo a obra ser lançada com urgência, já que se encontraria inscrita no P)DDAC 98, no programa 3 da Modernização da Rede Complementar.
Na verdade, o ponto da situação é que, neste momento, tudo está encravado. Disse que suspenderia também, na prática, o pagamento de portagens no IC1/A8, entre Torres Vedras e Caldas da Rainha, até ao arranjo da ENB. O ponto da situação, neste momento, é que este é o único ponto cumprido (através de uma portaria conjunta do Ministério das Finanças e do Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território). Mas verdade também seja dita que a população de Torres Vedras foi contemplada com uma prenda de mais de 70$ de portagem entre os troços de norte e sul de Torres Vedras.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Mais água, mais água!...
O Orador: - Na mesma altura, o Ministro Cravinho, através de despacho, delegou competências no Secretário de Estado das Obras Públicas para execução imediata e cumprimento das restantes medidas do acordo, dizendo que deveria acelerar-se o pagamento das indemnizações pelas expropriações já fixadas e não pagas e em dívida, há anos, nos troços em causa e, ainda, que todas as situações pendentes em matéria indemnizatória deviam ser regularizadas. Na alínea c) do despacho determinou que, até 15 de Março do ano corrente, deveria ser feito e apresentado um relatório de execução pela Junta Autónoma de Estradas.
O ponto da situação é que, neste momento, está tudo na mesma!
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Também se assegurariam variantes á ENB, em Torres Vedras, Óbidos, Bombarral e Caldas da Rainha, de modo a garantir vias alternativas sem encargos para os utilizadores locais, de acordo com o objectivo de descongestionamento dos centros urbanos. O despacho assume que estes estudos deveriam estar feitos pela Secretaria de Estado das Obras Públicas até 30 de Abril do ano corrente.
O ponto da situação é que, neste momento, está tudo na mesma!
Mais, que iria fazer-se um investimento na rede viária do Oeste de cerca de 12 milhões de contos, em especial no IP6, Peniche/Caldas da Rainha, com cinco milhões de contos, com praticamente todas as obras a serem lançadas em 1998.
O ponto da situação é que, neste momento, está quase tudo na mesma!
O despacho, na alínea g), assumiu que todos os semestres a Secretaria de Estado deveria preparar um relatório a fazer o ponto da situação de todas as medidas em curso, no âmbito do acordo. O ponto da situação é que, como é óbvio, não o fazem porque não têm quase nada para relatar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um ano depois, não fica mal recordarmos como o Governo socialista, que foi eleito com base em promessas de muito diálogo, neste processo; deixou cair essa máscara, ao coagir e perseguir, através das forças de segurança e das autoridades fiscais, os principais responsáveis associativos e autárquicos.
Este caso das portagens do Oeste, infelizmente, serviu para concluir que, para Leiria e para o Oeste, este é o pior Governo desde o 25 de Abril de 1974.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Orador: - Este Governo tem discriminado esta região do País de forma escandalosa, desde que está em funções. Nunca, como nestes últimos três anos, o investimento público foi tão baixo.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Isso é mentira!
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O Orador: - Nunca nenhum Governo como este tomou tantas decisões atentatórias dos interesses das populações desta zona do País (portagens do Oeste, lixos tóxicos na Maceira, morte da Linha do Oeste, etc.).
Dir-se-á, portanto, que esta atitude de abandono e incumprimento a que o Governo votou o acordo do ano passado se inscreve no seu procedimento normal. Só que, neste caso, foi também o Sr. Presidente da República e esta Assembleia da República que patrocinaram e se empenharam numa solução que resolvesse o imbróglio em que o Governo se metera.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Um ano sem cumprir o acordado é um ano de desrespeito pelo Presidente da República e por esta Assembleia. Mas é, sobretudo, mais um ano de completo desprezo pelas populações de Leiria e do Oeste.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado João Carlos Duarte, os Srs. Deputados Casimiro Ramos e Duarte Pacheco.
Tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Ramos.
O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Carlos Duarte, gostaria de aproveitar a sua intervenção para lhe colocar uma ou duas questões.
Não deixo de salientar o facto de o Sr. Deputado trazer ao Plenário as questões, as preocupações e as carências do Oeste. Pena é que as traga nesse tom, recordando situações relativamente às quais não compartilhamos todos, no Oeste, a forma como foram feitas algumas das reivindicações.
O Sr. Deputado levanta uma bandeira quanto às portagens do Oeste, mas é pena que não seja pelo motivo por que, eventualmente, não se deveria pagar portagens no Oeste, que é o estado do piso, a forma como foi pavimentado essa responsabilidade cabe ao governo do PSD -, e que hoje parece uma pista de motocross.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Mas o senhor traz aqui este assunto por outras razões, ignorando e não esclarecendo suficientemente uma questão fundamental: o Governo tem, no momento, para fazer, cerca de 1500 km de auto-estradas, 1400 km de outras .estradas, investimentos que ascendem a mais de 1500 milhões de contos. A fazer como os senhores faziam, essas obras demorariam cerca de 25 anos, atendendo ao orçamento da Junta Autónoma das Estradas. O processo da concessão faz com que a auto-estrada de Torres Vedras, que levou 14 anos a fazer, levaria 16 anos e, assim, vai ser feita em dois anos e meio.
A questão que lhe vou colocar é a seguinte: o senhor vai voltar a fazer campanhas e manifestações contra as portagens da nova auto-estrada até Rio Maior? Quer que ela seja feita em 20 anos em vez de ser feita em dois anos e meio? O senhor quer, de facto, a alternativa que foi permitida pelo Governo, no sentido de se fazerem outras vias de comunicação enquanto a auto-estrada não estaviver completamente acabada ou não quer esses investimentos e, pelo contrário, quer é ter os meios pagos pelo Estado, ao prolongar-se no tempo, como os senhores faziam, sem que o Oeste tivesse as vias de comunicação que eram necessárias?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos Duarte.
O Sr. João Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, agradeço muito as questões que fez o favor de colocar, mas podemos concluir que o senhor e a bancada do Partido Socialista não estão nada incomodados com a falta de cumprimento do acordo assumido pelo Governo. Com certeza que as populações que o elegeram < ficarão muito satisfeitas" pela posição que o senhor tomou, pelo menos porque não comentou' absolutamente nada...
Mas, passando rapidamente às questões que colocou, devo dizer que é preciso os senhores terem muito pouca vergonha para virem falar de falta de investimento no Oeste e no distrito de Leiria, onde, até hoje, não lançaram uma única obra de estradas, nem sequer um metro de alcatrão! É preciso não ter vergonha para falar da forma como o fez!
Aplausos do PS.
Mais: ao ritmo a que os senhores pensam e fazem, todo o trabalho que foi feito no distrito de Leiria e na Região Oeste não demoraria 14 anos mas,' sim, se calhar, 50, porque os senhores só falam em investimentos virtuais. Os senhores falam em investimentos e falam em milhões, mas não fazem. E a realidade é que verificamos que, passados quatro anos, em relação ao IC 1 - a própria Junta Autónoma das Estradas tem desdobráveis -, que deveria ter sido feito até à Figueira da Foz, não existe 'um metro de auto-estrada, nem mais nada!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Também para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado João Carlos Duarte, gostaria de o saudar pela sua intervenção e por ter trazido, mais uma vez, o Oeste aqui, ao Parlamento. Com a repetição de intervenções sobre aquilo que o PS e este Governo não têm feito na região, talvez o Partido Socialista e os seus Deputados se sensibilizem e comecem a governar para a nossa região. Temos de repetir até à exaustão! Bem-vindo e obrigado pela sua intervenção!
O Sr. Deputado falou do compromisso que o Governo assumiu há um ano com a população do Oeste e com o Presidente da República e a verdade é que esse foi um compromisso "para inglês ver", ou, neste caso, "para destino ver". Até ao momento, nada daquele compromisso foi cumprido, o que não representa só desrespeito pela população do Oeste, é desrespeito por esta Casa e pelo Sr. Presidente da República e não nos podemos calar perante essa situação.
Em concreto, relativamente a obras, já nos disse que nada foi feito! Sobre o IC11, onde é que ele está? O Sr. Ministro João Cravinho disse, recentemente, no Cadaval,
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que a sua concretização começa a ser uma preocupação para o futuro governo. Sobre a CP, o Sr. Deputado Henrique Neto, em silêncio, penitencia-se sobre as suas promessas de duplicação e electrificação da linha (em vez disso, hoje temos o encerramento de estações num curto espaço de tempo). A A10 será, talvez, uma verdade para o próximo milénio, pois neste já não será, com certeza! Logo, o que é que este Governo fez de concreto? Nada!
Sr. Deputado, como sabe, o IC1 prolonga-se para Norte, até à Galiza, e o que sei é que algumas das zonas atravessadas pelo IC 1 não pagam portagem, pelo que lhe pergunto se sabe por que é que o Oeste foi discriminado, por que é que outras zonas do País não pagam portagem nessa via e por que é que este Governo resolveu taxar o Oeste.
A segunda pergunta prende-se com o seguinte: o Sr. Ministro João Cravinho teve o desplante de dizer que o Oeste pagaria portagens por ser uma região rica. Recentemente, um plano de desenvolvimento regional pedido pela Associação de Municípios do Oeste, na sua maioria socialista, chegou à conclusão de que o Oeste está 17% abaixo do rendimento médio dos portugueses. Não é, pois, uma região rica, é uma região pobre! O Sr. Deputado pensa que o Sr. Ministro João Cravinho vai retirar aquilo que disse, vai recuar e o Oeste vai ficar sem as suas portagens, visto que, afinal, não somos uma região rica mas, sim, uma região pobre?
Vozes do PSD: - Muito bem!
Ainda em relação ao plano estratégico apresentado pela Associação de Municípios do Oeste, liderada pelos autarcas do Partido Socialista, diga-se que é uma boa iniciativa, mas também está no papel, pelo que vamos ver se irá ser posta em prática ou quantos anos é que isso irá demorar.
O Sr. Ministro João Cravinho considera de toda a importância, para 'o País e para a região, a A8 ou o IC 1. Vamos ver até que ponto é que os autarcas do Partido Socialista conseguem demover o Sr. Ministro João Cravinho... Também não me admiraria que o Sr. Ministro "desse o dito por não dito", porque ele já mudou de opinião várias vezes.
Aliás, o Sr. Deputado Henrique Neto, aquando da campanha eleitoral - e nem sei o que hei-de dizer, pois o Sr. Deputado Henrique Neto não levanta a sua voz em defesa das populações que o elegeram no distrito de Leiria -, foi um "maquinista" ou o coordenador de um "comboio do descontentamento". Devo dizer-lhes, Sr. Deputado Henrique Neto e Srs. Deputados do Partido Socialista do distrito de Leiria, que podem contar comigo e com muita gente do PSD para organizar um novo "comboio do descontentamento" no distrito de Leiria, para levantar a nossa voz contra o que não está feito e foi prometido. Daí, um abraço de solidariedade para o senhor, a quem peço que levante a sua voz, como Deputado do poder e do Partido Socialista.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos Tavares.
O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Carlos Duarte
O Sr. João Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, agradeço também ao Sr. Deputado as questões colocadas.
Verdade seja dita, todas as populações da região lutaram contra as portagens, e todos sabemos com que fundamentos. Não é que não queiramos ter portagens; podemos ter portagens, mas queremos estar em condições de igualdade com toda a população, com todos os portugueses. O que não se compreende é que, durante toda a manifestação de indignação em relação a esta matéria, tenha havido
autarcas dos distritos de Leeiria e de Lisboa, concretamente, de Torres Vedras, que estiveram totalmente ao lado do Governo e do Partido Socialista esquecendo-se das populações.
Isso foi uma falta de sensibilidade para com as preocupações das populações e para com a situação em causa, e por isso mesmo é que hoje a população de Torres Vedras tem de pagar 70$ - foi uma prenda de Natal atrasada - por cada vez que vai a Lisboa, ou seja, 140$ a mais do que o que pagava em Dezembro. Isso foi um desleixo, uma despreocupação total por parte dos autarcas do Partido
Socialista, na altura da resolução deste problema.
Aliás, não se compreende como é que, no norte do País, no mesmo ICI, são inaugurados alguns troços sem qualquer tipo de portagens, ou seja, com portagens virtuais.
Quando se fala em investimentos, podemos verificar que o lema que o Partido Socialista tinha, há alguns anos atrás, quando estava na oposição, dizendo "primeiro as pessoas, depois os números", inverteu-se totalmente: agora, para o
Partido Socialista primeiro estão os números e os investimentos e depois as pessoas. O pior é que não fazem investimentos, prometem mas não fazem, estudam mas não fazem e há "portugueses de primeira" e "portugueses de
segunda".
O Sr. José Carlos Tavares (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É preciso melhorar e defender o Serviço Nacional de Saúde e corrigir os erros do PSD.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!
O Orador: - Foram muitos anos de agressões, bloqueios e escassez de recessos orçamentais em relação ao Serviço Nacional de Saúde, fazendo com que este não pudesse cumprir o aumento dos objectivos da universalidade que lhe estão pressupostos. Os cidadãos sentem que o Serviço Nacional de Saúde esteve durante muitos anos, até 1995, subfinanciado e sentem, ao mesmo tempo, que é, de todos os sistemas, o que cria mais condições para resolução das desigualdades em saúde. A partir de 1996 foram introduzidos mecanismos de competição dentro do sector público e entre os sectores público e privado, como essenciais da reforma e da melhoria da saúde e necessários para se obterem ganhos de produtividade naquela área. A descentralização na saúde é centrada nas administrações de saúde de âmbito regional, com autonomia administrativa e financeira. Os montantes serão transferidos para as ARS, que poderão celebrar acordos e convenções com as unidades de saúde públicas, particulares e privadas, na procura da melhor relação custo/qualidade Tudo isto terá como corolário investimentos adicionais em programas nacionais, merecendo realce a melhoria em 100 milhões de contos do programa de incentivos a transplantes, entre outros.
No Orçamento do Estado, a despesa consolidada do Ministério da Saúde ascende a 1 bilião e 46 milhões de contos. Representando 5,1% do PIB e 14% da despesa da Administração central, este valor representa um aumento de 9,7% em relação ao Orçamento anterior. Convém não
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esquecer que no PIDDAC estão inscritos 44,3 milhões de contos, o que representa um aumento de 4,5% face à previsão das inscrições para 1998.
Todos temos consciência de que muitos portugueses irão se sentem satisfeitos com a qualidade dos serviços de saúde, mas também é verdade que um número cada vez maior de cidadãos acredita no Serviço Nacional de Saúde, ao qual se dirigem cada vez mais, porque têm confiança nos seus serviços.
As dívidas do Serviço Nacional de Saúde são também uma área de grande preocupação, onde os gastos com medicamentos assumem uma parte significativa. Nesta matéria, é imperioso e necessário rever as normas existentes para a autorização de abertura de novas farmácias. Pretende-se uma abertura criteriosa e sustentada que permita que o acesso a novas entidades, sem prejuízo de rigor técnico, deixe de ser apanágio de licenciados na área, não se chegando, contudo, a uma abertura universal, em que pode haver perigos vindos da concorrência global internacional.
Para o PS, um sistema do tipo do Serviço Nacional de Saúde é, de todos, o que cria mais condições para a redução de desigualdades, porque acentua a componente de qualidade e de humanização dos cuidados, tornando necessários um pacto social e um pacto de regime em matérias de saúde.
A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No respeitante à ARS norte e, concretamente. à sub-região de Viana do Castelo, é com o sistema local de saúde do Alto Minho que se pretende assegurar a prestação de cuidados de saúde à população residente na área geográfica desse distrito. As necessidades de saúde dos 250 000 habitantes são satisfeitas pelos profissionais que trabalham nos 13 centros de saúde, 34 extensões e 2 hospitais, por convencionados e por alguns prestadores individuais privados.
Sendo que a saúde das populações constitui objectivo último de todos os serviços de saúde, nenhuma instituição terá o exclusivo dos cuidados de saúde. Assim, com a implementação do serviço local de saúde do Alto Minho, pretende-se conseguir uma melhor articulação entre inter-serviços e inter-profissionais de saúde, optimizando os recursos públicos e privados.
Em 1994, foram criadas, pelo anterior governo, duas unidades de saúde em Viana do Castelo que, praticamente, nada contribuíram para melhorar os problemas de saúde das pessoas. Assim, desde 1996, já com o actual Governo, levaram-se à prática os conceitos de articulação inter-institucional entre os conselhos de administração dos dois hospitais e a coordenação da sub-região d4saúde. Esta prática levou a concluir que esta área geográfica constituía a adequada dimensão para urna única unidade funcional de saúde. Este processo de mudança de atitudes iniciou-se entre os responsáveis dos dois hospitais, sob a coordenação da SRS, tendo envolvido, progressivamente, todos os directores de serviços hospitalares, os directores de centros de saúde e as direcções-chefias de enfermagem, alargando o processo aos convencionados, privados, segurança social, autarquias, IP5S, ONG e à população.
Relativamente ao sistema de informática, foram instalados os programas SINLTS e Sonho nos dois hospitais e nos centros de saúde, o que possibilitará a cobertura integral do território, tornando mais eficaz e célere a cobertura do distrito.
A análise da realidade da sub-região em relação à localização dos centros de saúde e respectivos SAP leva-nos a considerar a necessidade de reformular - o que fizemos - a organização do horário de trabalho nos centros de saúde, assegurando a abertura de todas as sedes dos centros de saúde, diariamente, das 8 às 20 horas, o que não acontecia ainda há ano e meio. É a primeira vez que temos a cobertura total e integral do distrito. As excepções a este horário, para mais, são as seguintes: Caminha, porque, no período estival, está assegurado o serviço 24 horas por dia durante toda a semana, e Arcos de Valdevez que, por determinação da população, consultada por inquérito, escolheu o horário entre as 8 e as 18 horas.
Esta reorganização dos serviços permitiu uma excelente diminuição na procura dos serviços de urgência do Hospital de Viana do Castelo, que se situa em menos de 36%, e uma melhoria no acesso aos cuidados de saúde, dada a mais fácil comunicação entre o médico de família e o médico hospitalar, estabelecendo circuitos prioritários triados pelos médicos de família - os "envelopes azuis".
O propósito da sub-delegação de saúde de Viana do Castelo, de construir uma unidade funcional de saúde e caminhar para um sistema local de saúde, permite um entrosar de vontades em que todas as instituições e os seus profissionais estarão envolvidos numa dinâmica de trabalho que está a conduzir a reorganização das consultas externas do Hospital de Viana do Castelo.
No que respeita à articulação entre os centros de saúde e os hospitais, podemos afirmar que esta foi essencial na melhoria da qualidade de prestação de cuidados de saúde e da sua humanização. Foi neste sentido que a comissão de humanização propôs, o que foi aceite, o alargamento do regime de visitas a todos os dias da semana, sem limites de visitas das 15 horas às 19 horas e 30 minutos, tendo sido ainda criada a figura do acompanhante, que pode permanecer junto dos doentes a partir das 11 horas e 30 minutos.
Também é importante desenvolver mecanismos de contratualização com a agência de acompanhamento da ARS norte, com o intuito de dar uma resposta global, mais eficiente e sustentada aos problemas da saúde do nosso distrito, permitindo ajudar a solucionar, na medida do possível, as listas de espera. Nesta perspectiva, efectivaram-se dois programas de recuperação de listas .de espera de cirurgia e ortopedia, contemplando, respectivamente, 300 e 150 intervenções.
Quanto ao Hospital Conde Bertiandos, o seu objectivo final visa a construção de uma unidade diferenciada de prestações de cuidados de saúde, ao nível das falências de fisioterapia, reumatologia, medicina interna e geriatria, que está a ser concretizada, depois de tantos e tantos anos em que nada teve e nada foi capaz de realizar.
Quanto ao Hospital de Viana do Castelo, é de notar, entre outras inovações, a criação de um sector TAC. Quanto ao departamento de psiquiatria e de saúde mental, parece ser de grande oportunidade que os internamentos agudos possam ser efectuados dentro do hospital geral, evitando assim o estigma social de tais internamentos e passando a dispor do apoio de outras especialidades quando necessário. Neste sentido, vão implementar-se iniciativas que permitam encontrar soluções de apoio social para os doentes que se encontram estabilizados e ocupam vagas em internamento hospitalar, designadamente protocolos com as misericórdias e outras instituições de solidariedade social. Foram também realizados pela ARS e pelos próprios profissionais dos serviços programas para execu-
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tarem tarefas em horas extraordinárias, aproveitando os serviços existentes, o que permitiu atingir um resultado favorável. Neste momento, aproveitando o lançamento a nível nacional, pelo Ministério da Saúde, de um programa de melhoria de acessos no valor de 6 milhões de contos, Viana do Castelo prepara-se para ser nele incluído. Como resultado, temos a eliminação de listas de espera nos centros de saúde, a inversão significativa da tendência das consultas na urgência para consultas externas...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Falso!
O Orador: - ... e a consequente diminuição das listas de espera. Assim, 14 especialidades não têm lista de espera, 7 baixaram e apenas 5, por razões diversas, aumentaram, não sendo a este caso estranha a greve selvagem e sem princípios dos médicos independentes.
O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!
O Orador: - Em relação às listas de espera, tenho a sublinhar que diminuíram em cerca de 60% na generalidade, não havendo qualquer lista de espera para clínica geral e tendo passado, em cirurgia geral, de 2400, há três anos, para 360, em 1998.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O distrito de Viana do Castelo tem carências enormes em múltiplos aspectos, mas um sector em que nunca está tudo totalmente resolvido, aspirando sempre as pessoas infinitamente a mais e melhor, é, sem dúvida, o da saúde. Todavia, temos de reconhecer o esforço extraordinário que está a ser feito neste sector, com as construções de novos centros de saúde em Caminha e Paredes de Coura, as negociações em Vila Nova de Cerveira, Ponte de Lima e Póvoa, o alargamento do período de consultas nos centros de saúde concelhios, assim como nos hospitais de Viana do Castelo e de Ponte de Lima, com a melhoria do equipamento dos centros de saúde e a melhor articulação entre os hospitais e entre estes e os centros de saúde, sob a coordenação da sub-delegação regional dé saúde do distrito de Viana do Castelo.
Porém, apesar de com muito esforço financeiro e com o empenhamento dos profissionais e dos dirigentes se tentarem colmatar as necessidades sentidas, é óbvia e notória a falta de profissionais nos quadros do pessoal de saúde na área deste distrito. Foi por causa da escassez de médicos e do desemprego da classe médica em Espanha - e não havendo praticamente qualquer problema de comunicação linguística com os médicos espanhóis, até porque são um recurso normal e permanente no que respeita à medicina privada por parte da nossa população-fronteiriça, que demanda as terras de Espanha para usufruir dos seus serviços - que, em boa hora, o Ministério da Saúde permitiu o recrutamento destes profissionais de saúde espanhóis. Neste sentido, e porque, infelizmente, continuará a haver, por culpa do numerus clausus nunca banido pelo anterior governo, carência de médicos portugueses por muitos anos, será necessário, para suprir as vagas existentes e uma vez que os médicos portugueses não as preencham, continuar com as portas abertas aos médicos espanhóis - que são também da Comunidade Europeia - para preenchimento das vagas que, porventura, fiquem desertas nos concursos nacionais. Espero que esta necessidade seja acompanhada de uma atitude que sirva de estimulo para que haja subsídios ou quaisquer outras formas de incentivo para a deslocação dos nossos médicos para a periferia, até porque daqui a 5 ou a 10 anos atingir-se-á o cume das necessidades de clínicos gerais e, portanto, de médicos de família. Todavia, é de salientar que os médicos espanhóis contratados para suprir a falta de clínicos portugueses no distrito de Viana do Castelo estão a prestar um serviço que é do agrado das populações em geral e da própria administração de saúde. A titulo de curiosidade, é bom saber que os primeiros três clínicos espanhóis que vieram trabalhar para Portugal fizeram exame de candidatura ao internato de medicina geral e familiar e que é sua intenção, quando terminarem, concorrer para ficarem nos quadros dos serviços dessa região. Não é demais relembrar que foi o numerus clausus, tão limitador do acesso aos cursos de medicina, que provocou este estrangulamento. É no sentido de ultrapassar estas lacunas graves na oferta dos cursos superiores que, este ano, o Governo se propõe alterar o numerus clausus, a forma de recrutamento para medicina e a abertura de duas novas universidades. Como há uma grande procura enquanto a oferta é extraordinária e incompreensivelmente minúscula na área da medicina, e uma vez que se pretende implementar uma nova universidade em Braga, é oportuno que Viana do Castelo, como pertencente a esta área geográfica e à circunscrição da Universidade do Minho, esteja disposta a receber no seu seio uma área da saúde como o pólo da Universidade do Minho, que pode ser na área da medicina, na área ocupacional, na odontologia, na fisioterapia ou em qualquer outra área negociar com a Universidade do Minho. É também importante a inserção da escola de enfermagem no Instituto Politécnico de Viana do Castelo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: quero agradecer a todos os Deputados da Comissão de Saúde, na pessoa do seu Presidente, a visita de trabalho que efectuaram ao distrito de Viana do Castelo. O contacto directo e consequente levantamento e observação in loco dos problemas será, com certeza, um incentivo e um acréscimo de responsabilidade para a resolução dos problemas. Não quero deixar de chamar a atenção para o facto de que são imperativos do Governo: definir uma estratégia que evite a promiscuidade e que clarifique a relação entre o sector público e privado na área da saúde; criar e implementar mais infra-estruturas, instalações e equipamentos adequados às novas exigências; afectar mais dinheiro ao orçamento da saúde, sem prejuízo de maior e melhor rigor nos gastos, para que haja ganhos significativos nos custos da saúde, tendo, neste caso, um comportamento diametralmente oposto ao do governo anterior; garantir mais e melhor investigação e inovação; flexibilizar o numerus clausus no acesso aos cursos de medicina e implementar as duas novas universidades e mais escolas de enfermagens. Por tudo isto, parece ser uma necessidade irrefutável avançarmos no futuro para um pacto de regime na área da saúde, da educação, da segurança social e, sobretudo, do sistema fiscal.
Para terminar, nunca podemos esquecer que, no que respeita à saúde das pessoas, a procura dos serviços será sempre infinitamente elástica e os recursos serão sempre escassos para a demanda, que cada vez é maior e mais exigente em relação à qualidade dos serviços prestados. Centros dos recursos disponíveis, houve um sério esforço de todos os profissionais de saúde, nomeadamente no meu distrito, para se conseguir uma maior racionalidade e uma melhor optimização dos meios, com a consequente maior satisfação das pessoas que procuram os serviços de saúde.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Carlos Tavares, inscreveram-se para pedir-lhe esclarecimentos os Srs. Deputados Roleira Marinho e Carvalho Martins.
Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Roleira Marinho.
O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Carlos Tavares, cada vez que V. Ex.ª sobe àquela tribuna traz-nos a cor rosa, pintada no melhor tom. Infelizmente para nós, aquilo que tem acontecido no distrito com o Governo socialista é um descalabro.
Gostaria de lembrar-lhe, Sr. Deputado, que depois do lançamento dos centros de saúde efectuados pelo PSD e já lá vão quase quatro anos - nada de novo apareceu no sector da saúde. Os senhores não concluíram qualquer centro de saúde, os senhores não lançaram qualquer centro de saúde novo, mas os senhores vêm aqui falar como se o distrito já estivesse coberto com centros de saúde. No que respeita ao próprio centro de saúde da cidade de Viana de Castelo, que se vai esperando há longo tempo e cujo projecto estava pronto com o governo do PSD, ainda nem sequer apareceram as máquinas para se lançarem os alicerces.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - É um escândalo!
O Orador: - E diz V. Ex.ª que está tudo a funcionar e que está tudo "nos carris"!
Sr. Deputado José Carlos Tavares, as especialidades de psiquiatria, que, no distrito, ocupam duas instalações - na Gelfa e em Paredes de Coura -, estão em precaríssimas condições e W. Ex.as comprometeram-se a incluir no Orçamento do corrente ano 500 000 contos para o hospital psiquiátrico da Gelfa. Onde estão esses 500 000 contos? E as instalações de Paredes de Coura que continuam completamente abandonadas, parecendo um pardieiro? O Partido Socialista não deu um passo em frente para recuperar essas instalações!
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, quais são os investimentos adicionais, de que V. Ex.ª ali falou e que disse terem sido feitos no sector da saúde no distrito de Viana de Castelo.
O que é que os senhores fizeram quanto ao alargamento de especialidades do hospital? Continuam a falar, a ter muitas palavras, mas a não fazer coisa alguma!
Em relação à recuperação das consultas em atraso, vem V. Ex.ª dizer que está tudo "nos conformes" a não ser uma ou outra especialidade em termos de intervenção?!... Penso que a Comissão de Saúde, quando se deslocou ao distrito, terá feito esse inventário, mas V. Ex.ª dizer o que disse, quando há especialidades que têm quatro anos de atraso'...! O Sr. Deputado sabe isso, tem essa informação, mas vem aqui deturpar tudo aquilo que a Comissão de Saúde terá ouvido no distrito e vem aqui trazer dados que são completamente errados!
A única informação que o senhor trouxe e que parece que é verdadeira - se bem que a devesse ter omitido, porque é uma condição que não é nova, nada de novo traz e não serve as populações - é relativa à maior humanização que existe, consequência do alargamento dos horários de visita aos doentes do hospital. Francamente, Sr. Deputado, se pensa que isto é suficiente para aquilo de que o sector precisa no nosso distrito, estamos entendidos, tal como estamos entendidos com o Partido Socialista e com a política de saúde desenvolvida, particularmente, no distrito de Viana do Castelo.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de conceder a palavra ao próximo orador inscrito, informo que estão presentes a assistir à sessão um grupo de 20 professores da Escola Secundária de Serpa, um grupo de 16 alunos da Escola Profissional de Almada, um grupo de 23 alunos da Escola Secundária Luís de Camões, de Lisboa, e um grupo de 50 alunos da Escola EB 2/3 do Alto do Moinho.
Saudemo-los!
Aplausos gerais, de pé.
Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Carvalho Martins.
O Sr. Carvalho Martins (PSD): - Sr. Deputado José Carlos Tavares, eu estava lá em baixo e, de repente, ~R na televisão que o Sr. Deputado estava a fazer uma intervenção. Aumentei o volume do som da televisão e fiquei deveras estupefacto porque o Sr. Deputado estava a falar da saúde.
Devo dizer, com toda a sinceridade, que é preciso ter muita "lata" para falar da saúde do distrito de Viana do Castelo, quando o Sr. Deputado esteve, como eu estive, numa reunião onde estiveram presentes vários presidentes de câmaras do distrito. E, se bem se lembra, os quatro presidentes das câmaras - e são todos socialistas - utilizaram expressões que vou recordar para o Sr. Deputado perceber exactamente que o que eles pensam é totalmente o contrário daquilo que o Sr. Deputado disse. Um disse o seguinte: "No meu concelho tenho uma verdadeira `panela de pressão', estou cheio de a aguentar. Um dia destes tiro a minha mão de lá e os senhores vão ver as consequências". Outro disse claramente que a saúde no distrito estava pior do que há quatro anos. E outro ainda disse claramente que aquilo que foi apresentado no distrito era um quadro rosa mas que a situação era muito, muito negra.
Sr. Deputado José Carlos Tavares, perante quatro intervenções de presidentes de câmaras socialistas, V. Ex.ª tem a "lata" de vir dizer que a saúde no distrito de Viana do Castelo está melhor?! Por amor de Deus! Oiça os seus camaradas e depois tire as conclusões!
A segunda nota que me parece importante é a seguinte: fala agora da Universidade do Minho para que seja criado um pólo no distrito de Viana do Castelo para a Faculdade de Medicina. Tenho pena que V. Ex.ª não nos tenha apoiado quando aqui fizemos barulho. É que levantámos, inclusivamente, em Viana do Castelo muitas bandeiras, bandeiras que a JSD dominou, mas o Partido Socialista esteve calado no distrito de Viana do Castelo em relação à criação da Faculdade de Medicina no distrito. Penso que era importante que, hoje, o Sr. Deputado dissesse que vai lutar por uma Faculdade de Medicina no distrito de Viana do Castelo e não por um pólo da Universidade do Minho, porque disso, meu caro amigo, estamos à espera há muito tempo e sabemos que nunca mais chega!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder aos dois pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado José Carlos Tavares.
O Sr. José Carlos Tavares (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, admiro-me que o Sr. Deputado Roleira Mari-
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nho esteja tão mal informado sobre o que se passa no nosso distrito. Fizemos melhorias substantivas e, embora os senhores tivessem posto alguma pedra, também puseram muitos engulhos.
Foi pena que o Sr. Deputado não tivesse acompanhado a visita da Comissão de Saúde durante dois dias a todos os locais onde fui. Independentemente de ter já vastíssimos conhecimentos acerca desta matéria, engrandecias cone a visita da Comissão de Saúde.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Não parece, não parece!
O Orador: - Quanto às listas de espera, o Sr. Deputado sabe perfeitamente que não há listas de espera nos centros de saúde; sabe perfeitamente que nos hospitais estão a ser reduzidas significativamente as listas de espera em todas as circunstâncias e especialidades, excepto nas cinco que referi, situação que tem a ver também com essa greve "selvagem" que foi feita por médicos irresponsáveis.
Temos os centros de saúde a funcionar das 8 às 20 horas excepto em Arcos de Valdevez, onde, por incumbência da própria da população que exprimiu a sua opinião através de um inquérito, só funcionam até às 18 horas.
Em relação a Caminha, como sabem, por causa do período estival, a zona de Moledo - como todos os Srs. Deputados conhecem (e passo a publicidade) -, e a própria zona de Caminha, na foz do rio Minho, levam sempre a população a crescer 10 a 15 vezes mais e, por isso, têm 24 horas de assistência.
O Sr. José Barradas (PS): - Muito bem!
O Orador: - Quanto ao sistema local de saúde, os Srs. Deputados sabem perfeitamente que é quase um paradigma o que se está a fazer em Viana do Castelo - com todo 0 respeito que tenho pelos profissionais. Não é que seja unia situação óptima porque em saúde, como sabe, nunca há óptimo - nós queríamos um médico mim hospital à saída da porta e eu não queria viver 80 anos, queria viver 150 anos! É óbvio que isto se passa assim! Mas, dentro dos possíveis e da escassez de meios, tem de ser dada unia nota positiva ao comportamento daquela equipa de saúde de Viana do Castelo, dos hospitais e dos centros de saúde.
Quanto à questão das instalações, devo dizer que estamos a remodelar todas as instalações no distrito, nos centros de saúde e nas extensões. Vão ser inaugurados, brevemente, dois novos centros de saúde, o de Caminha e o de Paredes de Coura.
Há obras de vulto que os senhores nunca fizeram em Ponte de Lima, por exemplo a ligação funcional e espacial do Hospital Conde de Bertiandos, que é o de Ponte de Lima, com o centro de saúde, criando um sinergia funcional de espaço e de pessoas, o que criou uma situação de maior bem-estar e de melhor atendimento para todos - e o Sr. Deputado sabe-o perfeitamente.
Quanto aos presidentes de cântaras, na última parte da minha intervenção apelei para que houvesse necessidade de um pacto de regime, para o futuro, em áreas essenciais como a saúde, a educação, a segurança social e o regime fiscal - porque dizem respeito a todos - independentemente da observação e dos valores que possamos ter em matéria de ideário político.
Sem uma verdadeira reforma do sistema fiscal nunca poderá haver uma equidade em termos de toda a realidade e universo políticos portugueses.
Quanto ao facto de os autarcas pedirem mais..., evidentemente também eu aqui pedi e todos pedimos...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Não nos apercebemos disso!
O Orador: - Percebemos nitidamente que a procura é infinita e é realmente elástica e os presidentes de câmaras estão sempre insatisfeitos apesar de estarem mais satisfeitos agora do que estavam anteriormente.
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Não se notou!
O Orador: - Curiosamente, Sr. Deputado, a saúde não é só a questão dos hospitais e desse espaço, não é só a questão dos técnicos mas há externalidades à saúde: é o caso das acessibilidades. Com a auto-estrada que fizemos de Ponte de Lima a Valença, com o IC1 para o Porto, agora demora-se 30 minutos, podendo chegar-se à cardiologia em 30 minutos e não morrer no caminho, como acontecia antes quando se demoravam duas horas e meia de transporte, que foi a situação que os senhores nos deixaram.
Vamos avançar, brevemente, com o IC1 para Caminha e depois para Valença, com o IP9, para as pessoas virem de Ponte de Lima para o Hospital de Viana do Castelo em 8 ou 10 minutos e não em 45 minutos ou em uma hora.
Tudo isto são ganhos da saúde, não só para a terapia como também para a precaução. Porquê? Porque não se gasta tanto, não nos enervamos tanto. Há uma melhoria de condições de vida, o que vai ter um reflexo positivo nos gastos da saúde, devido ao stress, devido à diminuição das úlceras. Certamente, naquela zona do País, o esforço que temos feito, em termos globais, é também no sentido da resolução dos problemas de saúde.
Aplausos do PS.
O $r. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começou pelo Alentejo o "carrossel" pré-eleitoral. Não há dia ou semana em que altos funcionários da Administração Central, Secretários de Estado, Ministros ou o Primeiro-Ministro não anotem na sua agenda uma visita ao Alentejo neste ano santo de eleições europeias e legislativas.
São semanas do Governo de que ninguém recorda resultados; anúncios de novos investimentos estrangeiros que nunca são concretizados; anúncio do estudo da viabilidade de novos filões nas mulas de Aljustrel já conhecidos há gerações; anúncio da abertura da Base Aérea de Beja ao tráfego civil quando, afinal, a mímica coisa que foi aberta até ao momento foram os velhos armazéns da BA 11 para receberem os resíduos da doença das vacas loucas.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente!
O Orador: - Para a semana lá temos, de novo, o Primeiro-Ministro a lançar a primeira pedra de uma nova fábrica cujo balanço só poderá fazer-se depois das próximas eleições. A seguir teremos seguramente, pela enésima vez nos últimos anos, o anúncio da construção da Barragem dos Minutos.
Poderíamos multiplicar os exemplos, mas estes são suficientes.
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Foi neste quadro, de trepidante excitação pré-eleitoral, que o Engenheiro António Guterres anunciou recentemente mais um Plano Regional de Emprego. Lançada a operação ficam a imagem e os ecos do anúncio porque o balanço concreto dos resultados de mais este plano só podem também ser aferidos na próxima legislatura.
Mas por que é que o Governo e o Primeiro-Ministro, que na última campanha eleitoral para as legislativas tinham anunciado um Plano de Emergência contra o Desemprego, não anunciaram antes o agora publicitado Plano Regional de Emprego a tempo de ser feito o balanço dos seus resultados antes das próximas eleições? A verdade é que o PS e o Primeiro-Ministro sabem que estes sucessivos planos de emprego a nada têm conduzido de sustentável e, como confiam que a memória é curta, estão convencidos de que o que fica na retina é a propaganda do anúncio sucessivo de medidas que nunca são concretizadas.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente!
O Orador: - O plano de emergência contra o desemprego, anunciado na campanha eleitoral, nunca viu a luz do dia; depois, a Ministra para a Qualificação e o Emprego anunciou um plano territorial para o emprego e os resultados são nulos; a seguir, o Governo anunciou umas celebradas redes regionais do emprego de que não se conhece qualquer resultado. Agora é um Plano Regional de Emprego de que seguramente também jamais se conhecerão as consequências em tempo útil, tal como nunca foram publicitados os resultados da operação "Alter do Chão", anunciada pelo então Primeiro-Ministro Cavaco Silva, em Junho de 1995, com o chamado Programa das Iniciativas de Desenvolvimento Local ou das denominadas Acções-Piloto a favor dos Desempregados de Longa Duração anunciadas em Setembro de 1995 e reanunciadas, em Janeiro de 1996.
Entretanto o Eng.º António Guterres confia que ninguém exija ao seu Governo que apresente os resultados dos planos anteriores antes de anunciar novos planos.
Aliás, este novo plano agora anunciado é a demonstração por si só do fracasso e do carácter propagandístico de que, no essencial, se têm revestido todos estes anúncios. Ao afirmar, como afirma, apesar da linguagem cuidadosa, e cito o próprio plano: "que o andamento do mercado de emprego confirma as tendências negativas anteriores, que a evolução da população empregada foi de sentido negativo, que os valores do desemprego continuam a ser os mais elevados do Continente e a manterem-se acima dos 36 000 desempregados", o Governo está a confessar o fracasso, no essencial, das suas políticas, dos seus numerosos planos, mesmo considerando já decréscimos pontuais e não sustentados dos dados estatísticos referentes ao desemprego.
O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Trata-se de um fracasso confirmado em diagnósticos do próprio Centro Regional de Segurança Social do Alentejo quando afirma, num estudo sobre a pobreza na região, que existe - e cito - "um número crescente de pessoas" que entram ou permanecem "em situações em que não têm acesso à satisfação das suas necessidades básicas".
O Partido Socialista confia na memória curta dos mediatizados tempos de hoje e que, por isso, ninguém se lembre e ninguém pergunte pelos resultados dos anúncios anteriores. Mas engana-se, Engenheiro Guterres! É que a nossa memória não é curta e estamos aqui para lho lembrar e para lembrar ao Partido Socialista - cito o que vem no plano - que se "a conjuntura económica da região Alentejo tem vindo a apresentar nos últimos anos uma tendência de continuada evolução desfavorável" como confessa no plano. Isso deve-se exclusivamente - lembramos nós - às políticas de quem tem estado no Governo, ontem o PSD, hoje o Partido Socialista que podem, aliás, agradecer ao poder local e a alguns agentes económicos regionais o facto da situação não ser mais grave.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!
O Orador: - É que não há políticas sociais de combate ao desemprego que se salvem sem políticas sustentadas de desenvolvimento económico, sem investimento público numa região fortemente carenciada de capitais próprios, sem estímulos especiais ao investimento produtivo e, em particular, às pequenas e médias empresas. Mas o que tem acontecido é exactamente o contrário: dos já magros 544 milhões de contos previstos inicialmente no Il Quadro Comunitário de Apoio para o investimento no Alentejo não chegam a 250 milhões de contos o valor dos projectos até agora aprovados, quando já estamos na recta final do respectivo período.
As obras de Alqueva, um grande empreendimento estruturante para a região, não estão a contribuir significativamente para a diminuição do desemprego (só 38% de um total de 700 trabalhadores empregues é que são oriundos da região) e o atraso na definição de questões estratégicas para o futuro do empreendimento faz correr seriamente o risco de se perderem grande parte das suas potencialidades; não se conhecem com exactidão as consequências do recente Convénio Luso-Espanhol sobre a disponibilidade de caudais designadamente em anos de seca que permitam não pôr em causa o empreendimento e, em particular, a água necessária à rega dos 110 000 hectares previstos no projecto, o Governo recusa-se a intervir no modelo fundiário sem o que se assistirá ao escândalo das mais-valias de um investimento público de mais de 353 milhões de contos, a preços actuais, servirem fundamentalmente para a valorização das terras de sequeiro dos grandes proprietários; não há uma definição dos novos sistemas culturais tanto para as áreas regadas como para o imenso sequeiro existente que permita aproveitar investimento Alqueva e preparar uma agricultura de futuro; não há um programa de na área da transformação agro-industrial. Não há, em sauna, um verdadeiro programa integrado de desenvolvimento para a região, sendo que o tão celebrado Pro-alentejo não é mais do que uma alavanca de promoção dos quadros socialistas na região.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais do que mediatizados circuitos em anos eleitorais, exige-se do Governo seriedade na abordagem dos problemas do desemprego; exige-se do Primeiro-Ministro que preste contas de tantos planos, pactos, programas e acções contra o desemprego anunciados repetidamente desde o início do seu mandato; exige-se um programa sério de reforço do investimento público e de desenvolvimento sustentado para o Alentejo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, as Sr.ªs Deputadas Mafalda Troncho e Manuela Ferreira Leite.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mafalda Troncho.
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A Sr.ª Mafalda Troncho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, antes de colocar-lhe duas questões, gostaria apenas de fazer um pequeno comentário.
Do segundo trimestre de 1994 a 1997, segundo dados do INE, a taxa de desemprego desceu a nível nacional, e isso afectou todas as regiões.
No Alentejo, do segundo trimestre de 1996 para o segundo trimestre de 1997, a taxa de desemprego baixou de 12,2% para 11,5%, ou seja, quase 1%. Não acredito que a diminuição da taxa de desemprego no Alentejo se deva apenas ao crescimento económico do País; deve-se essencialmente a uma vontade política deste Governo no sentido de fazer um desenvolvimento integrado que abranja todas as regiões.
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - O expoente máximo desta vontade foi o empreendimento Alqueva e os seus fins múltiplos, com um investimento de mais de 400 milhões de contos.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Refiro ainda que só no distrito de Évora foram feitas obras: o Hospital do Patrocínio, outro dos "elefantes brancos", a Pousada da Juventude, que durante 10 anos, numa cidade património mundial, não existiu, apesar da Secretária de Estado do PSD ser de Évora; a Siemens com mais de 400 postos de trabalho, a central de camionagem, a garantia da continuidade da Portucel, o Mercado Abastecedor Regional de Évora, a importância do rendimento mínimo garantido e dos projectos de luta contra a pobreza. E podia também referir a auto-estrada até ao Algarve...
O plano regional para o emprego no Alentejo está integrado, como sabe, no plano nacional. Pretende promover-se a criação de emprego, fazer a transição adequada dos jovens para a vida activa, combater o desemprego de longa duração e a exclusão social. Tem, ao contrário do esvaziamento que o Sr. Deputado quis dar a este projecto, metas quantitativas. A primeira das quais é a de diminuir a diferença da taxa de desemprego do Alentejo em relação à nacional para metade; criar mais 400. mil postos de trabalho e 2500 estágios profissionais. Posso dizer-lhe também, Sr. Deputado, que o Alentejo, infelizmente, continua a ser uma das regiões mais atrasadas da Europa quando comparada com o PIB per capita e com todos os problemas que desconhecemos.
Pergunto ao Sr. Deputado se, corri franqueza, pode mesmo dizer que este Governo em três anos não deu provas de vontade política em desenvolver o Alentejo, em promover o emprego.
Quero perguntar-lhe ainda se podemos contar com o PCP neste esforço suprapartidário que é o de dar oportunidades que são dadas ao aos alentejanos as mesmas resto dos portugueses.
Finalmente, quero fazer um pequeno comentário. Ainda bem que os governantes deste Governo vão ao Alentejo. Não tenho quaisquer saudades do tempo em que conhecia o governantes deste País pela televisão.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.
A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, ouvi a intervenção que fez sobre os problemas que se põem não só ao distrito de Évora e penso, fundamentalmente, que a sua crítica é em relação ao processo utilizado por este Governo nos sucessivos anúncios dos mesmos empreendimentos, que, apostando numa fraca memória dos portugueses, vai repetindo sucessivamente para dar a ideia de um grande dinamismo e, simultaneamente, não fazer o que quer que seja.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - É um exagero muito grande!
A Oradora: - A pergunta básica que lhe quero fazer, Sr. Deputado, é se a sua intervenção foi motivada por revolta ou por espanto, isto é, se se espanta que o Governo faça isto no distrito de Évora. O Governo nada tem feito nos últimos três anos e meio, é só assim que actua e, portanto, Sr. Deputado, espero que a sua intervenção não tenha sido motivada pelo espanto.
Protestos do PS.
Sr. Deputado, Évora tem problemas sérios no que respeita ao desemprego. E a despeito do que disse a Sr.ª Deputada do Partido Socialista, que, pelos vistos, fica satisfeita quando o desemprego baixa de 12% para 11% quando se trata de uma percentagem muito superior à média nacional - mas ela satisfaz-se com pequenas coisas e percebe-se porquê: é, praticamente, um milagre que nada fazendo, se consiga fazer baixar o desemprego de 12% para 11%.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - E no seu governo duplicou!
A Oradora: - Mas, penso que relativamente ao desemprego, a despeito de todos os anúncios, não vai ser muito possível ter-se grandes esperanças relativamente a esse distrito. E se, Sr. Deputado, já entrámos em campanha eleitoral, existem outras zonas do País como, por exemplo, as zonas suburbanas do Porto em que a taxa de desemprego também é muito superior, mas onde existem muito mais votos do que no distrito de Évora, e o problema, de Évora é o número de votos.
Portanto, a minha esperança, no sentido da resolução dos seus problemas, é realmente diminuta.
Por fim, gostaria também de perguntar se, no meio de tanto anúncio, o Sr. Deputado era capaz de saber - eu não sei! se por acaso o Governo já anunciou algo para resolver os grandes problemas dos pequenos comerciantes de Évora.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as perguntas feitas e, aliás, saúdo-as, porque com a minha intervenção dei oportunidade a que Deputados de outras bancadas eleitos pelo Alentejo, designadamente do Partido Socialista, falassem neste Plenário dos problemas do Alentejo. Já não é mau...!
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Estamos aqui para ajudar!
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O Orador: - Mas, Sr.ª Deputada Mafalda Troncho, em primeiro lugar, esperava que a Sr .B Deputada respondesse às questões que coloquei, sobretudo a de saber qual é o balanço feito de três ou quatro planos de combate ao desemprego que, em cada ano desta Legislatura, o Governo tem feito na região.
A Sr.ª Deputada falou-me na baixa de umas décimas entre um trimestre e outro,...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Décima a décima, enche a galinha o papo!
O Orador: - ... mas se é mesmo assim, Sr.ª Deputada, então como é que explica que no Plano Regional de Emprego que VV. Ex.as apresentaram esteja escrito que: < A conjuntura económica da região tem vindo a apresentar, nos últimos anos, tendências de continuada evolução decrescente e desfavorável face às restantes regiões do continente; que o andamento registado entre o primeiro e o segundo trimestres de 1998 confirma a tendência negativa anterior com variações de menos 1,9% e 0,2%, respectivamente, no Alentejo e no resto do continente; que se diga que a evolução da população empregada tem sido de sentido negativo - agora, nesta altura; que se diga que a variação do emprego encontrada no segundo trimestre de 1998 em relação aos trimestres anteriores foi de sentido negativo, etc."?
Sr.ª Deputada, quem diz isto não sou eu mas, sim, o Plano Regional de Emprego do Partido Socialista divulgado há poucos dias pelo Sr. Primeiro-Ministro, que confirma que os números que lhe dão não correspondem bem à realidade, e, mesmo estes números estatísticos, sendo inferiores à realidade social, como sabe - porque a estatística do desemprego, infelizmente, é muito inferior à realidade social -, porventura são aqueles que configuram mais perto da verdade, que é a de uma situação grave do desemprego.
Mas, mesmo que eu desça umas décimas, Sr.ª Deputada - todos ficaremos satisfeitos com isso -, a verdade é que o desemprego continua, como o Governo reconhece, numa média acima dos 36 000 desempregados, que é a média dos últimos 10 anos, a média mais alta do continente e com graves problemas económicos como o próprio Plano reconhece.
Até admito, Sr.ª Deputada, que o desemprego tenha baixado umas décimas, sabe porquê? Porque diminuiu o desemprego nos boys alentejanos.
Risos do PSD.
E, portanto, o Proalentejo a CCR, aqueles inúmeros organismos que foram criados, e que têm tantos e tantos comissários socialistas, naturalmente, terão contribuído para a redução do desemprego registado nos centros de emprego, admito isso Sr.ª Deputada.
Risos do PCP e do PSD.
Mas, olhe: em Agosto de 1998, para um desemprego de 36 000, registado nos centros de emprego no. Alentejo, havia ofertas de emprego de 476 unidades. Estão aqui! Esta é a realidade que, porventura, retrata com mais fidelidade a realidade social do que os números que a Sr.ª Deputada trouxe.
A Sr.ª Deputada referiu a Siemens... Mau exemplo! Quando estamos com um problema na mão que é o de
saber se o desinvestimento da Siemens vai ou não conduzir ao seu encerramento ou à diminuição da sua actividade...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - O que é que o Sr. Deputado propõe?
O Orador: - ... Mas, a Sr.ª Deputada referiu uma grande obra: a auto-estrada para o Algarve. Exactamente! E para a emigração sazonal para o Algarve, para se lá ir trabalhar quando não se encontra trabalho no Alentejo.
Sr.ª Deputada, sabe o que é que isto significa? Significa que os 20 milhões de contos anunciados pelo Governo no Plano Regional do Emprego... - sabe o que é que o Governo fez, Sr.ª Deputada? Não sabe? Mas eu digo-lhe, porque desconfio que também estão a enganá-la no seu partido...
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - O Sr. Deputado nada disse!
O Orador: - É que não é um tostão a mais para o combate ao emprego! Os 20 milhões de contos que foram agora anunciados não são mais do que a multiplicação, por quatro anos, dos cinco milhões de contos que estão inscritos no orçamento anual normal.
O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - É isso, Sr.ª Deputada! Não é mais um tostão sequer num Plano que, por si só, também tem muitas debilidades.
Em relação à questão da Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite, e, para terminar, devo dizer-lhe que não estou nem revoltado nem espantado, mas constato e critico esta realidade que não pode ser escondida, nem através de permanentes circuitos pré-eleitorais, permanentemente mediatizados, nem através do anúncio sucessivo das mesmas medidas que depois nunca são concretizadas e cujo balanço nunca é feito.
E eu desafio aqui o Governo, uma vez que está aqui o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares António Costa, que é o responsável pela ligação com o Governo, e que estão também presentes os Srs. Deputados do Partido Socialista,...
O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe que termine, Sr. Deputado.
O Orador: - ... desafio o Governo e desafio o Partido Socialista a apresentarem resultados concretos do Plano Territorial de Emprego anunciado no primeiro ano da Legislatura, do programa das redes regionais de emprego apresentado no segundo ano da legislatura e, agora, também, deste novo Plano Territorial de Emprego. É este o balanço que queremos: o balanço da realidade, não o balanço de circuitos e de dados pré-eleitorais.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Saleiro pede a palavra para que efeito?
O Sr. António Saleiro (PS): - Para defesa da honra pessoal, Sr. Presidente.
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O Sr. Presidente: - Uma vez que está terminado o debate, tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Saleiro (PS): - Sr. Presidente, faço a defesa da honra tendo em atenção o facto de que o Sr. Deputado Lino de Carvalho falou aqui nos boys
alentejanos. Gostaria, pois, de saber a quem é que se re- Risos do PCP.
feria ou a que serviços é que se referia, se, por exemplo, ao Parque Natural do Guadiana, onde, naturalmente, estão pessoas nomeadas por este Governo - nunca iria, com certeza, o Sr. Deputado dizer que o Dr. Cláudio Torres é um boy, parto do princípio de que não queria dizer isso...
Portanto, tenho de levantar a questão. Gostaria também de responder a uma questão concreta.
Quando o Sr. Deputado se refere ao Plano e à razão pela qual ele foi apresentado agora, devo dizer que foi precisamente porque se chegou à conclusão de que é no Alentejo que há a média mais elevada de desemprego. Por isso é que se fez o Programa. Nemm poderia ser por outra razão tinha de ser por essa.
De qualquer modo, houve aqui uma questão que o Sr. Deputado quis subestimar e que foi a questão da auto-estrada, até parece que nem a quer... Se não a quer, diga!
Não tem grande interesse...? Se calhar também não quer o eixo Sines/Sevilha, possivelmente também não quer Alqueva, nem a zona franca de Beja, enfim, tantas outras coisas que poderíamos apresentar...
Sr. Deputado, ao dizer que não tem havido rigorosamente nada feito por este Governo também está a culpar um pouco as autarquias, e está a culpá-las porque sabe perfeitamente que tem sido de mãos dadas com as autarquias - e este Governo conseguiu fazê-lo - que se têm feito muitas obras. Os Srs. Deputados sabem isso perfeitamente, portanto, não vale a pena iludir a questão. Até no combate ao desemprego o problema se tens resolvido. Mas, se tem havido problemas nos programas específicos do Alentejo, por onde é que estes têm entrado? Os programas específicos do Alentejo têm entrado, Sr. Deputado, quer queira quer não, pelas autarquias e com as autarquias! Não venha aqui dizer ou dar a entender que nada tem sido feito, porque, no fundo, não está a penalizar apenas o poder central mas também o poder local, o que penso ser injusto.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho para dar explicações, se assim o entender.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, como viu, parece-me que não ofendi a honra de ninguém...
O Sr. Presidente: - Isso é normal, sem prejuízo da evocação frequente da figura.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O que parece é que o Sr. Deputado Saleiro se arrependeu tardiamente de não ter decidido fazer pergunta alguma. Porque parece que ele era de Beja e os Deputados que o antecederam são de Évora... Por isso ainda veio fazer perguntas a tempo e horas. Está bem!
Sr. Deputado António Saleiro, só duas notas: onde foram criados os "tachos" ou os jobs job the boys?
O Sr. Deputado não se sentiu atingido... não?! No Proalentejo, as CCP, Sr. Deputado, o senhor lembra-se de um...
Protestos do Deputado do PS António Saleiro.
O Sr. Deputado lembra-se de um actual vice-presidente da CCR que, quando foi eleito, nomeado de surpresa, fez uma entrevista a dizer: "Bom, reconheço que não tenho currículo, mas esta nomeação é muito boa para o meu currículo futurou?
Pois olhe, eu lembro-me, não digo é o nome!
Mas o PEDISA, a Administração Regional de Saúde, a CCR, são apenas alguns exemplos, Sr. Deputado.
Já agora, quanto à auto-estrada para o Algarve, o Sr. Deputado está de acordo com o traçado que ela tem, tão longe de um traçado que poderia ser promotor de um desenvolvimento do interior alentejano, designadamente, lembro-lhe, do concelho de que o Sr. Deputado foi Presidente da Câmara tantos anos? Está de acordo com isso, Sr. Deputado?! Não sei se está!
E, Sr. Deputado, onde está a rede regional hospitalar e onde está o Hospital Regional que o Partido Socialista prometeu nas eleições? Ainda não os vi, Sr. Deputado!
Quanto à zona franca de Beja que o Sr. Deputado tem vindo aí a felicitar, está aqui o Sr. Ministro das Finanças e penso que é altura do Sr. Ministro revelar se, de facto, o Governo está de acordo com uma nova zona franca de Beja, para sabermos se isso não passa por mais uma "operaçãozita" pré-eleitoral para marcar o lugar na lista.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Mafalda Troncho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: - Para que efeito Sr.ª Deputada?
A Sr.ª Mafalda Troncho (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação.
O Sr. Presidente: - Espero que seja! Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Mafalda Troncho (PS): - Sr. Presidente, gostaria apenas de deixar aqui claro que é com muita pena que verifico que a postura do PCP não se tem modificado, postura, aliás, que foi igual quando se tratou de Alqueva: o PCP sempre defendeu o Alqueva quando 0 Alqueva não era possível e, quando passou a ser possível, o PCP passou a dizer que o Alqueva para nada servia.
Aplausos do PS
O Sr. Presidente: - Já dois Srs. Deputados pediram para usar da palavra para interpelações à Mesa, mas eu não vou deixar que interpelações deste género se multipliquem. Não me levem a mal, mas não posso fazer isso, nem ao Sr. Deputado Lino de Carvalho nem ao Sr. Deputado António Saleiro. Não dou a palavra para a interpelação. Lamento muito! A menos que me digam qual é o problema de funcionamento dos trabalhos ou de declarações da Mesa que justifiquem a interpelação. Sé me disserem, terei muito gosto em dar a palavra. Diga, Sr. Deputado Lino de Carvalho...
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, eu ainda não disse para que é que pedia a palavra!
O Sr. Presidente: - Então diga, se faz favor.
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O Sr. Lano de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, quero pedir a palavra para defesa da consideração.
O Sr. Presidente: - Nesse caso, tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Lano de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, o tempo da cassette já passou! Agora, estamos no tempo da diskette!
Risos do PCP.
Portanto, não vale a pena repetir esse discurso, porque esse discurso já não colhe, Sr.ª Deputada!
A Sr.ª Deputada referiu o Alqueva. Como sabe, o PCP, as organizações regionais do partido e os Deputados temos sido grandes defensores do Alqueva. Mas, já agora, faço-lhe uma pergunta: a Sr.ª Deputada é capaz de me garantir aqui que o recente Convénio Luso-Espanhol sobre a distribuição das águas dos rios fronteiriços não coloca problemas á garantia dos caudais necessários para, viabilizar o empreendimento e, designadamente, para fazer a rega dos 110 mil hectares? É capaz disso? A Sr.ª Deputada é capaz de me dizer onde é que está em acção...
Sr.ª Deputada, está a ouvir-me ou está a falar com o Sr. Deputado Manuel dos Santos?
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Ela ouve com os ouvidos e fala com a boca - não precisa das duas coisas ao mesmo tempo!
O Orador: - Sr.ª Deputada, é capaz de me dizer onde é que está em funcionamento o Centro de Regadio Experimental para o Alqueva? Já começou? A Sr.ª Deputada é capaz de me dizer onde é que está a definição dos novos sistemas culturais que hão-de viabilizar o empreendimento na valia agrícola? A Sr.ª Deputada é capaz de me dizer onde é que está o Plano Regional de Ordenamento para o Alqueva que, pelo facto de não estar aprovado, está já a atrasar a aprovação de um conjunto de projectos de investimento turístico na região? Sobre o Alqueva, são estas perguntas que lhe deixo. Seguramente que a Sr.ª Deputada vai recolher informação, vai estudar esta matéria e nos trará um dia destes aqui a resposta, Sr. Presidente.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Orador: - De resto, Sr.ª Deputada, o PCP sempre esteve, está e continuará a estar com o desenvolvimento do Alentejo!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mafalda Troncho.
A Sr.ª Mafalda Troncho (PS): - Sr. Presidente, Sr Deputado, talvez eu não seja a pessoa mais habilitada e digo-o com humildade - para responder a algumas das questões que me colocou, mas posso dizer-lhe uma coisa, enquanto alentejana e enquanto socialista: quanto mais a luta aquece, maior a força do PS e a minha vontade!
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Saleiro, pediu a palavra para que efeito?
O Sr. António Saleiro (PS): - Sr. Presidente, para defesa da consideração.
O Sr. Presidente: - Contra quem?
O Sr. António Saleiro (PS): - Sr. Presidente, foi invocado aqui o meu nome pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho e levantou algumas questões a que tenho o direito de...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, mas não defendeu já a sua consideração quanto à intervenção do Sr. Deputado Lino de Carvalho?
O Sr. António Saleiro (PS): - Mas foi na segunda intervenção, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso não tem cabimento. Não podemos multiplicar as defesas da honra, ,quando não é óbvio que houve uma ofensa clara.
O Sr. António Saleiro (PS): - Mas eu estou a invocar a mesma figura que o Sr. Deputado invocou e foi-lhe concedida a palavra, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Eu sei! Mas acontece que ele a invocou pela primeira vez e o Sr. Deputado pela segunda e na sequência de intervenções do mesmo Deputado!
O Sr. António Saleiro (PS): - Assim, ficam algumas questões por esclarecer.
O Sr. Presidente: - Sei que sim, e lamento muito, mas o Sr Deputado pode fazer uma intervenção amanhã ou quando quiser, no período antes da ordem do dia! Não podemos multiplicar as defesa da honra em relação à intervenção de um mesmo Deputado. Isso é que não posso permitir. Não há tradição nesta Casa. Não me leve a mal!
O Sr. António Saleiro (PS): - Levo, levo!
O Sr. Presidente: - Sei que não leva, Sr. Deputado!
Srs. Deputados, terminámos o período antes da ordem do dia.
Eram 17 horas e 20 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 215/VII, originária do Governo, que autoriza este a legislar sobre o regime geral das empresas públicas e do sector empresara, ai do Estado.
Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Sousa Franco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta que tenho a honra de fundamentar é da competência reservada da Assembleia da República, mas o Governo também quis que viesse aqui, além disso, por representar um enquadramento legislativo de uma importante reforma de uma parcela do Estado democrático português. E é importante a dois títulos: porque representa uma exigência evidente do Estado português nesta viragem do século e porque corresponde a um compromisso do Governo no âmbito do seu. programa, que assim se cumpre também. Uma exigência que, pensamos,
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poderá merecer o consenso desta Câmara, permitindo dotar o sector empresarial do Estado de um regime legal moderno e adequado, no âmbito do qual ele seja objecto de políticas eficientes, alternativas, diversificadas.
De facto, hoje, o estatuto-base das empresas públicas é o Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril, modificado por um decreto-lei de 1984 e por uma lei de 1990. Bastaria isso para nos recordar do arcaísmo desse estatuto. Passaram quatro revisões constitucionais, a abertura e a internacionalização da economia portuguesa, a entrada no Euro e na União Económica e Monetária, a nova configuração do sector empresarial do Estado, em resultado, nomeadamente de privatizações, e este decreto-lei que, ao tempo, tinha a sua justificação, é hoje completamente caduco. Dou apenas um exemplo: combinando o modelo burocrático de empresa pública com aquilo que era a respeitável mas datada concepção académica de Marcello Caetano, ele tem como base a empresa pública como uma espécie de instituto público desburocratizado. Hoje, existem apenas 17 empresas públicas deste tipo, e o estatuto-base apenas a essas se aplica na totalidade; há 670 sociedades anónimas, 178 sociedades por quotas, 61 participações públicas em cooperativas - e nada disso tem o regime geral. Bastaria esse exemplo para demonstrar que, se o modelo é inadequado, ele também já não se aplica a nada e a base legal do sector empresarial do estado, hoje, é praticamente vazia.
Pensamos, por isso, que bastaria esta razão para justificar a necessidade de um regime legal capaz de enquadrar as empresas que, efectivamente, existem - não apenas as 17 mas as cerca de 1000 empresas de comparticipação pública dominante ou exclusiva que ainda hoje existe dotando-as de critérios de eficiência, modernidade e flexibilidade. Não podem ser unidades burocráticas e administrativas, que sejam apenas uma maneira de gastar o dinheiro dos contribuintes para cobrir a má gestão e os prejuízos - têm de ser formas de intervenção do Estado que não desperdicem o dinheiro dos contribuintes. Por outro lado, o sector empresarial do Estado é e continua a ser um importante instrumento de intervenção. E, em terceiro lugar, este regime procura dar um enquadramento que seja conforme com o modelo social plural, definido pela Constituição, de um sector empresarial dinâmico a par do social e do privado.
Pensamos que o 'trabalho que o Governo fez para isso foi um trabalho sério, que fundamenta urna reforma de fundo. A comissão presidida pelo Dr. Emílio Rui Vilar fez o diagnóstico do actual sector empresarial do Estado, apresentando o Livro Branco do Sector Empresarial do Estado em 1998. Um outro grupo de trabalho, presidido pelo Professor Eduardo Pais Ferreira, preparou a base quer desta proposta de autorização legislativa quer do decreto-lei que, se a Câmara assim o entender e o aprovar, será publicado para lhe dar execução. A Lei do Orçamento para 1996 contém já - e o Governo está a preparar a execução disposições sobre o registo das participações do Estado e sobre a fiscalização dessas participações pela Inspecção-Geral de Finanças, sendo certo que já em 1996 o Governo concentrou a gestão das participações na Direcção-Geral do Tesouro, extinguindo um Gabinete de Análise e Financiamento do Sector Empresarial do Estado.
Esta reforma corresponde, pois, a uma necessidade e esperamos que seja consensual -, mas corresponde também à concretização de uma visão do Governo expressa no seu programa. Nós não estamos com aqueles que querem liquidar o sector empresarial do Estado - queremos um sector empresarial do Estado novo, dinâmico, importante como instrumento de intervenção e regulação da economia. Mas também não estamos com aqueles que querem um sector empresarial do Estado a dar prejuízos, com uma espécie de lixo administrativo acumulado, a viver à custa dos contribuintes; um sector empresarial do Estado que dê prejuízos e seja uma mera colecção de empresas burocráticas ineficientes é profundamente negativo em todas as economias - queremos um sector empresarial do Estado moderno, com sentido, ao serviço dos contribuintes, e não como fundamento para gastar o dinheiro deles.
E, se isto significa uma aplicação da política do Governo e do seu programa, permito-me sublinhar apenas estes pontos: desde 1978 até ao ano passado, em 21 anos, o sector empresarial do Estado, sistematicamente, deu prejuízo, isto é, mais despesa do que receita, o que significa dinheiro dos contribuintes para financiar empresas públicas ineficientes. Com excepção de seis anos: três, 1990, 1991 e 1993, tiveram um resultado favorável na ordem de 130 milhões de contos no seu total; os outros três, que são os três anos deste Governo, 1996, 1997 e 1998, tiveram resultados favoráveis de gestão do sector empresarial do Estado na ordem de 10 vezes mais do que os outros três anos - 1300 milhões de contos! Começámos por gerir bem o sector empresarial do Estado e não enterrar dinheiro dos contribuintes nele; mas permitir, pela gestão do sector empresarial do Estado, um instrumento eficiente e não uma fonte de prejuízos que os contribuintes financiam com os seus impostos, nunca se fez isso antes.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Orador: - Mas fizemos mais: logo em 1996, um despacho do Secretário de Estado das Finanças, determinou que a Inspecção-Geral de Finanças fizesse um inquérito, que conduziu a um relatório desse ano, sobre a situação remuneratória do sector empresarial do Estado; e começaram a introduzir-se medidas desde o próprio ano de 1996 até ao presente. Por outro lado, como o Tribunal de Contas menciona no último relatório do ano passado, reduzimos o montante das indemnizações compensatórias, que era, em 1996, de mais de 44 milhões de contos, para 34, em 1997, e para 36, em 1998; e contratualizámos com a Lusa, com a TAP e com a Air Condor, e também com a RTP essas indemnizações compensatórias. Pensamos que só assim será possível que o sector empresarial do Estado eficiente deixe de ser uma maneira de drenar, para cobrir prejuízos de má gestão, os dinheiros dos contribuintes.
Também redimensionámos o sector empresarial do Estado: os dois programas de privatizações para 1996/97 e 1998/99 não foram apenas uma maneira de obter a receita - foram uma maneira de dotar o Estado de um sector empresarial em que o serviço público esteja ao serviço dos contribuintes e não seja uma desculpa para gastar mal os dinheiros dos impostos. A presença de empresas privatizadas como a Portugal Telecom, a EDP, a Brisa ou a Cimpor entre as maiores empresas europeias, a sua presença na internacionalização, quer no Brasil quer em tantos países de língua portuguesa, a sua presença no desenvolvimento do mercado de capitais e na democratização desse mercado de capitais, que se tornou desenvolvido e passou a ser uma forma razoável de aplicação de poupanças dos portugueses, tudo isso deu sentido ao programa de privatizações que não é um programa neoliberal mas é, isso sim, um programa de racionalização do sector empre-
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sarial do Estado. Por isso mesmo, o que pretendemos como política é dotar o Estado de um sector empresarial eficiente, na linha do que estamos a fazer.
Não pensamos que nos transportes seja possível uma privatização maciça - embora a TAP deva ser privatizada, os transportes devem ser serviços públicos colectivos.
No sector energético, a reestruturação da holding de energia será uma peça importante da afirmação do aparelho produtivo português, tal como o será a continuação da reestruturação do sector das pastas e papel.
E ao afirmar claramente que o Grupo Caixa-Geral de Depósitos, principal grupo financeiro português, não devia e não deve ser privatizado, demonstrámos a consciência de que esse é o principal instrumento para que o sector financeiro português esteja, ao menos em parte, sempre nas mãos de portugueses.
Estes são exemplos de que pensamos que o sector empresarial do Estado, através das privatizações, deve ser tornado eficiente, mas, através da manutenção de um núcleo estratégico fundamental, deve ser colocado ao serviço de uma intervenção moderna e eficiente do Estado na economia global.
Aplausos do PS.
A forma tradicional de empresa pública deve, pois, ser relativamente minorizada e é esse o sentido desta proposta de lei. Sublinho que, fundamentalmente, a proposta de lei visa: mantendo, embora, a forma tradicional de empresa pública, apontar para uma disciplina das sociedades de capitais públicos, exclusiva ou maioritariamente públicos, o que permitirá a presença no território nacional de empresas que explorem serviços públicos ou serviços de interesse económico geral; a generalização do acesso dos cidadãos, em condições financeiras equilibradas e sem discriminações, a bens e serviços essenciais; o fornecimento de serviços ou a gestão de actividades cuja rentabilidade não se encontre assegurada, mas que sejam estratégicos para a economia nacional; a imposição a certas empresas de obrigações específicas de interesse económico geral; a prestação de serviços de carácter universal por entidades de serviços públicos em sectores vedados, pelo desenvolvimento de formas de concertação com utentes, associações .representativas destes, entidades sociais ou mesmo entidades privadas; e a participação efectiva dos trabalhadores na vida das empresas, num quadro de economia participativa e sem prejuízo da indispensável flexibilidade gestionária.
É por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que esta proposta de lei, garantindo um novo sector empresarial do Estado, que seja um instrumento de intervenção em economias abertas, modernas, competitivas, que valorize o dinheiro dos contribuintes em vez de sugar para prejuízos de má gestão o dinheiro dos impostos e que seja um instrumento de competição e de afirmação da economia nacional na economia global, tem sentido para nós. Será um bom sector empresarial ao serviço do povo português e não uma causa de desperdício dos seus impostos.
Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.
O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, V. Ex.ª começou a sua intervenção, se bem anotei, mais ou menos dizendo que trazia hoje, aqui, a reforma de uma importante parcela do Estado português. As palavras terão sido mais ou menos estas, pelo menos o sentido, certamente, foi este.
A minha dúvida é saber se isto é uma parcela tão importante do Estado português, se está, digamos, em consonância com aquilo que o Governo tem vindo a fazer no âmbito do sector empresarial do Estado, designadamente no âmbito das privatizações.
Aliás, o Sr. Ministro também referiu que o Governo não pretende acabar com o sector empresarial do Estado, mas eu dir-lhe-ia que, se não pretende, disfarça muito bem, Sr. Ministro! Com a avalanche de privatizações que tem feito, com todo o processo de liberalização que tem vindo a desenvolver - e estou a falar apenas na liberalização em termos do processo de privatizações e do que está relacionado com esse processo -, o Governo disfarça bem. Se não quer acabar com o sector empresarial do Estado, disfarça bem essa sua intenção.
E há aqui uma questão, Sr. Ministro, que eu suscitaria, porque foi novamente colocada: é a questão dos prejuízos, o tentar justificar o desmantelamento do sector empresarial do Estado, designadamente as privatizações, com o argumento de que as empresas dão prejuízo. A questão não é essa! Ou, melhor, a questão que se coloca é esta: as empresas que têm vindo a ser privatizadas, e todas as empresas que foram privatizadas pelo Governo do Partido Socialista, não eram empresas que davam prejuízos, foram as empresas mais lucrativas do sector empresarial do Estado. Essa é que é a questão!
Por conseguinte, não vale a pena estar a colocar a privatização num campo diferenciado ou, melhor, tentar ligar as privatizações aos prejuízos que o sector empresarial do Estado terá dado - e não vamos agora discutir essa questão -, porque o que tem vindo a ser privatizado são as empresas com maiores índices de rentabilidade. Isso é um facto que nem o Sr. Ministro nem o Governo podem desmentir.
De qualquer modo, Sr. Ministro, o meu pedido de esclarecimento muito concreto é este: a questão da alteração do regime legal do sector empresarial do Estado em si é um problema normal. Passaram-se 23 ou 24 anos! É um sistema normal! O Sr. Ministro há-de compreender aliás, tomando a sua expressão de que é uma reforma importante de uma importante parcela do Estado - que nós, para fazermos a análise daquilo que o Governo pretende, precisamos de mais elementos do que a proposta de lei de autorização legislativa.
Ora, o Sr. Ministro anunciou que tem já feito o projecto de decreto-lei que há-de vir a ser publicado, se esta proposta de lei de autorização legislativa lhe for concedida. Portanto, Sr. Ministro, o que, neste momento, lhe pergunto é o seguinte: por que é que, não fornece esse anteprojecto de decreto-lei à Assembleia da República - e, em nosso entender, deve fazê-lo -, para que possamos analisar a proposta de lei de autorização legislativa com muito mais substância do que ela contém no seu conteúdo actual?
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
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O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, disse e mantenho que o sector empresarial do Estado, no seu conjunto, e não cada empresa, como é óbvio, é uma importante parcela do Estado português. Mas precisamente por ser importante é que não pode ser um corpo gangrenado, não pode ser um conjunto de empresas sem sentido, uma espécie de lixo empresarial. É essa limpeza que temos estado a fazer e que pensamos que é necessário que seja concluída.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, há partidos comunistas que estão na Europa a fazer programas de privatização tão ambiciosos como o nosso - é o caso de França. A privatização é uma maneira de dotar os países de sectores empresariais do Estado modernos e de evitar que eles tenham, em economias competitivas e em sectores que necessariamente carecem de gestão e até de propriedade empresarial, perfeitos abortos empresariais.
V. Ex.ª disse que foram privatizadas empresas lucrativas, mas recordo-lhe que não há muitos anos a EDP dava prejuízo. A perspectiva da privatização, só em si, provoca melhorias de gestão, e vieram lucros. Mas além disso, a abertura do sector energético, que é inevitável neste mês de Fevereiro, a abertura das telecomunicações no ano 2000, que é inevitável, põem de vez de lado qualquer ideia de manter monopólios protegidos no sector empresarial do Estado. A concorrência exige gestão empresarial; a gestão empresarial, em muitos caso, exige propriedade privada das empresas.
Entendemos que a privatização é um pilar imprescindível de reforma dos sistema produtivo português e uma maneira de dotar o Estado de um sector empresarial, nuns casos com participações minoritárias e noutros com participação zero.
O Estado não precisa de ter nada na Tabaqueira, basta-lhe que ela dê lucros para arrecadar os impostos. A nacionalização da Tabaqueira não teve qualquer sentido, ocorreu por acaso. Sempre os países ganham em cobrar impostos de empresas tabaqueiras que não são estratégicas e que são privadas. Este é um exemplo, mas há muitos outros.
Foram empresas privadas que assumiram a liderança da internacionalização da economia portuguesa, a presença no Brasil e nó espaço de língua portuguesa, a presença no estrangeiro.
Mas repare, Sr. Deputado: nós, que entendemos que o sector empresarial deve deixar de ser um sugadouro do dinheiro dos contribuintes, como foi durante estes 21 anos, excepto nos três últimos anos, como já demonstrei, achamos que é necessário que haja um núcleo imprescindível de sector empresarial, e esse núcleo tem certos serviços públicos essenciais - já referi o dos transportes -, exige a reestruturação de sectores mais largamente privatizáveis, como os da energia ou das pastas e papel, e exige, em nosso entender, a manutenção, num sistema de livre circulação de capitais e num sistema de globalização financeira, da Caixa-Geral de Depósitos, do Grupo Caixa, como grupo integralmente público.
É isto que significa considerar o sector empresarial do Estado como parte essencial do Estado português. Não manter no Estado português aquilo que está melhor nas mãos de privados, não manter no Estado português empresas inviáveis, que não têm outro destino a não ser serem extintas, ruas manter instrumentos fundamentais de uma política de intervenção, concorrencial, aberta, competitiva e internacionalizada.
Sr. Deputado, mencionei a existência de um anteprojecto que existe do grupo de trabalho presidido pelo Professor Eduardo Paz Ferreira, que é um anteprojecto de decreto-lei. Não vemos qualquer dificuldade em que ele seja fornecido em sede de comissão aos grupos parlamentares, mas sublinho que, naturalmente, a iniciativa legislativa do Governo terá de ser ponderada pelo próprio Governo. Trata-se de um anteprojecto legislativo e, a esse título, não vemos inconveniente em fornecê-lo, tal como à versão provisória do relatório, à Assembleia da República em comissão especializada, porque será, porventura, a sede própria.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Pedrosa de Moura.
O Sr. Rui Pedrosa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 215/VII, ora em discussão, e que pretende autorizar o Governo a legislar sobre o regime geral das empresas públicas e sector empresarial do Estado, parece-nos, por si, um ponto de partida, que, esperamos, possa ser adequadamente concretizado.
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - O socialismo na gaveta!
O Orador: - As bases gerais das empresas públicas são ainda as constantes do Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril.
Ora, todos temos presente os enormes buracos financeiros que sempre caracterizaram as empresas públicas e a melhoria nos seus níveis de rentabilidade verificados após a alteração dos seus métodos de organização e gestão.
Lembrem-se, por exemplo, os casos das empresas Portugal Telecom e EDP, as quais foram eficazmente saneadas, com o objectivo de despertarem o interesse dos investidores nos seus processos de privatização, e que apresentam, actualmente, níveis recorde de resultados líquidos.
Por outro lado, e como últimos exemplos de desperdícios dos recursos públicos, continuamos a ter de apontar os casos da TAP e da CP.
Concorda-se, pois, com o Governo quando este afirma, admitindo que o Estado é mau gestor, que "a reorganização do sector empresarial do Estado é, neste momento, tarefa urgente dada a necessidade da sua inserção na dinâmica de modernização e desenvolvimento exigidos pela competição mais intensa no espaço comunitário e mesmo global da economia".
Portugal tem assistido, nos últimos anos, não só à diminuição do peso do Estado na economia mas também à transformação da grande maioria das empresas públicas em sociedades anónimas. Tal consubstancia, segundo o Governo, uma clara opção pela adopção de mecanismos de Direito Privado, tornando-se, assim, mais clara a participação do sector público no próprio mercado.
Nos termos do presente diploma - e também nos termos do Direito Comunitário positivo -, terão materialmente de se considerar empresas públicas as sociedades nas quais efectivamente o Estado exerça influência dominante, e isto independentemente da adopção da forma concreta de empresa pública.
Por outro lado, as sociedades anónimas resultantes da transformação de empresas públicas, embora sujeitas ao regime de fiscalização admitido no Código das Socieda-
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des Comerciais, são também elas objecto de legislação específica, para além dos poderes especiais de controlo atribuídos à Inspecção-Geral de Finanças e ao Tribunal de Contas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Apresenta o Governo alguns exemplos legislativos relativos à necessidade de centralização e especialização da gestão das participações do Estado relativas a determinados sectores de actividade, considerando ser necessário acentuar esta tendência legislativa no sentido da concepção de uma tutela do Estado de pendor empresarial, através, nomeadamente, da constituição de sociedades gestoras de participações sociais.
Não estando posta em causa a manutenção de direitos especiais associados a missões de serviço público, é defendida a necessidade de que esses serviços de interesse económico geral sejam devidamente enquadrados e balizados, sujeitando o restante do sector empresarial do Estado às normas da concorrência, procurando-se, assim, afastar quaisquer distorções neste domínio.
Também estas são, e sempre foram, as nossas preocupações.
Sejam, pois, bem vindos, Srs. Membros do Governo... ! Para nós há sempre um lugar para o arrependido!
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O maior pendor para uma tutela de tipo empresarial por parte do Estado; as directivas comunitárias que obrigam a limitações nas relações entre Estado e o seu sector empresarial e que evitem distorções na concorrência; e a lógica actual de diminuição do peso do Estado na economia portuguesa, são exemplos claros de factos concretos que fazem com que o Partido Popular considere que esta proposta de lei, a ser concretizada correctamente, poderá ser um passo no sentido de permitir um menor desperdício de recursos públicos, através de uma gestão mais profissional e eficaz, bem como uma melhor prestação de serviços aos consumidores.
No entanto, para além do óbvio controlo a assegurar, por exemplo pelo Tribunal de Contas, entendemos ter de ser prevista, com grande rigor, a possibilidade de se poder exigir a prestação de informações especiais que permitam um acompanhamento da gestão desses activos públicos por parte do Governo e da própria Assembleia da República.
É também com alguma preocupação que temos vindo a observar "fenómenos de desorçamentação" de verbas públicas que, em algumas situações, acabam por ser facilitados precisamente pela maior "sofisticação" do sector empresarial do Estado.
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Temos de ver isso!
O Orador: - Falamos, por exemplo, num caso sobejamente conhecido, em que o Estado alienou a uma empresa, por ele detida a 100%, acções de empresas públicas a reprivatizar, as quais posteriormente foram alienadas pela mesma no âmbito do processo de reprivatização.
Realizava, assim, a referida empresa mais-valias pela diferença entre o preço de compra e o preço de venda estabelecido para a operação de reprivatização, mais-valias que eram distribuídas ao accionista Estado sob a forma de dividendos. Esses dividendos, no âmbito do Orçamento do Estado, eram classificados como receitas correntes, pelo que essas mais-valias realizadas, sendo receitas de reprivatização, não eram aplicadas nos termos impostos pela lei.
Neste caso, nunca chegámos a saber se a referida empresa...
Esses dividendos, no âmbito do Orçamento do Estado, eram classificados como receitas correntes, pelo que essas mais-valias realizadas, sendo receitas de reprivatização, não eram aplicadas nos termos impostos pela lei.
Neste caso, nunca chegámos a saber se a referida empresa actuava como um meio de flexibilizar a gestão da carteira de títulos do Estado ou como um meio de proceder à desorçamentação de receitas de reprivatizações. Falamos, obviamente, do caso PARTEST!
Não é, pois, para nós, completamente seguro afirmar que as novas sociedades que visam gerir participações sociais não possam dar azo a este tipo de expedientes!
Mas lembremos outro caso, que tem vindo a lume ultimamente. Notícias recentes têm dado conta da decisão do Estado de proceder a um aumento do capital de uma empresa pública, com o objectivo de cobrir parte dos prejuízos acumulados de exercícios anteriores.
Prepara-se o Estado para transferir acções de empresas a privatizar em 1999, as quais são avaliadas em cerca de 120 milhões de contos, evitando que essa verba, a transferir em 1999, fosse incluída no Orçamento de Estado para 1999 e, assim, evitando a sua discussão e votação nesta Câmara. Falamos, obviamente, do caso da CP, ao qual voltaremos em momento oportuno.
A possível proliferação de sociedades gestoras de participações sociais na órbita do Estado poderá, de facto, incentivar este género de operações de transferência de activos do Estado, à margem do respectivo Orçamento anual.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Partido Popular, tendo até em conta os aspectos positivos vertidos na presente proposta de lei, espera sinceramente que a mesma não venha a potenciar novas possibilidades de omitir do Orçamento do Estado a discussão sobre a virtualidade ou oportunidade de determinadas aplicações de recursos públicos que, geralmente, são bastantes significativas.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Orador: - Cabe-nos a nós, a todos nós, denunciar e lutar para que este tipo de situações não ocorra.
Mas, também aqui, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, não estará tanto em causa uma questão de legislação, mas, sobretudo, uma questão de boa prática governativa, o que, diga-se, tem faltado amiúde.
Ficaremos atentos, na certeza, porém, de que não passaremos cheques em branco.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Vem o Governo solicitar autorização para legislar sobre o regime geral das empresas públicas e sector empresarial do Estado. Trata-se de matéria profundamente estrutural da economia portuguesa, assumida esta como sistema de economia mista.
O Estado português desempenha, e deseja continuar a desempenhar, não só uma função ordenadora como também uma acção de intervenção como agente económico.
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Partindo de uma posição muito estatista e subordinada aos princípios da Administração Pública, a intervenção do Estado como agente económico veio a evoluir nuns certo hibridismo, obrigado pelos compromissos sucessivos entre uma visão mais estatista e uma outra mais liberal da economia.
Nesta evolução, dois paradigmas tiveram grande saliência, constituindo mesmo marcos dessa evolução: a empresa pública e a sociedade anónima de capitais, exclusiva ou parcialmente, públicos, sem embargo de esta última vir a ser considerada, no direito comunitário, também como empresa pública. De certo modo, é o repor de unia situação que havia sido perturbada por uma deriva que procurava aplicar princípios de economia de mercado a actividades anteriormente desenvolvidas por organizações de cariz marcadamente burocrático.
No entanto, estas organizações sempre tiveram bastante dificuldade em compatibilizar a sua razão de ser inicial o serviço público onde estaria em causa o interesse geral e este não seria melhor representado que pelos poderes públicos - com as leis da concorrência. Nesta altura, havia uma sobreposição entre o serviço público, acção realizada, e serviço público, sistema realizador, que, só muito - recentemente, se vem esbatendo e permitindo a completa separação pela via das concessões.
E evidente que a noção de serviço público, mais no sentido de acções a realizar, continua a justificar-se pelo carácter de interesse geral que as suas prestações assumem. Mas também é evidente que a noção de interesse geral varia no tempo e segundo a evolução dos diversos países.
A questão que se pode colocar é se o interesse geral é a satisfação das necessidades elementares ou aquilo que só pode ser realizado pelos poderes públicos.
Entre estas duas interpretações extremas, pode considerar-se como serviço público toda a actividade em que há responsabilidade pública pelo facto da comunidade ser chamada a intervir. E há responsabilidade pública quando coincidem duas circunstâncias: admitir-se em economia de mercado dever responder-se a um imperativo de solidariedade nacional, isto é, de redistribuição de recursos, e visar-se um objectivo do serviço essencial à colectividade.
Face a esta evolução do conceito de serviço público, não podem os organismos e empresas públicas, genericamente referidos como todas as organizações realizadoras de serviço público e dependentes do Estado, refugiarem-se na protecção do monopólio de Estado ou na estabilidade da sua manutenção a todo o custo.
Por outro lado, importa avaliar e configurar a noção de serviço público, face às legítimas aspirações e expectativas dos cidadãos da época actual.
As fronteiras entre público e privado são extremamente fluidas e é muito fácil transpô-las. A flexibilidade das soluções é cada vez maior e os organismos e empresas públicas não podem continuar a ignorar, mais ou menos olímpica ou magestaticamente, os seus clientes, participantes de facto e de direito no serviço público.
A contemplação do cliente no serviço público acarreta inevitavelmente o conceito de qualidade. Este integra e condensa diferentes perspectivas da qualidade: a qualidade esperada, a qualidade percebida, a qualidade desejada e a qualidade conseguida. Esta última é a verdadeira qualidade, que não se mede pela intenção, porque a qualidade é o resultado.
Neste sentido, tem-se pretendido que o sector empresarial do Estado seja modernizado e desenvolvido com vista "à competição mais intensa no espaço comunitário e mesmo global da economia". Por outro lado, atenta-se nas mais recentes orientações referentes ao enquadramento das empresas públicas na União Europeia, designadamente no que concerne à sujeição das mesmas aos normativos do direito da concorrência.
No fundo, trata-se de uma disputa permanente das fronteiras entre o verdadeiramente público e o verdadeiramente privado, com zonas de constrangimento asseguradas por derrogações ao regime geral aplicável às empresas públicas e ao princípio da sujeição às normas da concorrência.
Pretende salvaguardar-se, no plano nacional, um conjunto de situações especiais, enquadradas por "especiais missões de interesse económico geral" que se continuam a atribuir a empresas públicas.
A colocação destas no regime de concorrência parece apontar não só para a abertura do mercado nacional, onde se movimentam empresas públicas e empresas privadas, como também para o mercado comunitário, onde se movimentam empresas públicas dos diversos países comunitários e empresas privadas. Daí que, no plano nacional, se deva acautelar uma transição segura e eficaz.
Há todo um movimento no sentido da aplicação às actividades do sector empresarial do Estado do que de mais moderno se vem fazendo no sector privado, nomeadamente quanto à centralização e especialização da gestão das participações relativas a determinada área de actividade. Daí "a evolução para uma concepção empresarial próxima da privada e a constituição de sociedades gestoras de participações sociais".
Com uma certa dose de paradoxal - onde fica a flexibilidade sempre anunciada? -, reforçam-se e multiplicam-se os controlos de gestão, mais ou menos marcados pela visão burocrática e legalista da Administração Pública.
Por outro lado, aponta-se a autonomia como meio adequado ao desenvolvimento da eficácia e da qualidade, mas estabelece-se um regime de unia certa "liberdade condicionada", que vai reduzir substancialmente os resultados pretendidos. A coexistência de duas culturas de gestão na mesma organização retira-lhe a coerência indispensável para o seu sucesso. Assine sendo, há mesmo que reduzir esta solução "às especiais missões de interesse económico geral".
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: No presente pedido de autorização legislativa, são indicados, de um modo geral, os sentidos dessas missões, nomeadamente a acessibilidade geográfica, a acessibilidade individual, o suporte de elevados investimentos, as redes, a segurança global dos fornecimentos, a restrição de actividades ao sector público, as prerrogativas delegadas de autoridade do Estado, a concertação com os utentes.
Mas os objectivos finais desta autorização configuram, pelo seu conteúdo, uma mudança que poderá ser significativa no sector empresarial do Estado.
Na realidade, o conceito de empresa pública, o regime jurídico aplicável às empresas públicas, o regime derrogatório do regime geral de direito privado das empresas públicas, os instrumentos de gestão facilitadores dos diversos controlos, os princípios gerais da gestão económico-financeira, o exercício do controlo do Estado através de sociedades gestoras de participações sociais, a participação dos trabalhadores na gestão ou no controlo da actividade das empresas e o regime e a competência para julgamento dos litígios relativos ao exercício de prerrogativas de autoridade são suficientemente estruturais para justificarem uma metodologia de legislar bem diferente da
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autorização legislativa. Acrescentem-se as medidas que hão-de permitir um serviço para o cliente-cidadão e para a qualidade.
Impõe-se, portanto, que o Governo traga à Assembleia da República a respectiva proposta de lei sobre o regime geral das empresas públicas e sector empresarial do Estado para ser debatida e votada, na generalidade e na especialidade.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.
O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Começaria por saudar, em primeiro lugar, o Governo por ter tomado esta iniciativa, que era absolutamente indispensável e necessária, e, em segundo lugar, o Sr. Ministro das Finanças, num outro registo, que a seguir formularei.
Digo que esta iniciativa era indispensável e necessária, porque todos nós sabemos que o conceito de empresa pública que vigorava em Portugal e que se encontra, aliás, datado, como o Sr. Ministro das Finanças teve o cuidado de referir, tinha pouco a ver com o conceito de empresa pública utilizado no direito positivo comunitário e, portanto, havia aqui, quer em matéria de aplicação de ajudas do Estado quer noutras áreas, nomeadamente nas
da concorrência, manifestamente uma distorção.
Sem procurar fazer ironia, direi que o Governo também contribuiu para esclarecer algumas mentes, até agora pouco esclarecidas, acerca do que é verdadeiramente uma empresa pública. Isto porque até já vimos inquéritos parlamentares com o fundamento de serem investigadas operações de empresas públicas que, até agora, até haver esta proposta de lei, não são empresas públicas, uma vez que
as empresas públicas tinham, como o Sr. Ministro referiu, e têm, um estatuto específico muito especial, nomeadamente, concordante com a lei aprovada em 1990
Saúdo o Sr. Ministro das Finanças porque podia ter-se limitado a introduzir este debate nesta óptica eminentemente jurídica, mas, ao invés, em meu entender, aproveitou esta oportunidade para lançar uma verdadeira discussão acerca
da modernização do sector empresarial do Estado.
Julgo que esta iniciativa é bem-vinda e que, aliás, o Parlamento deverá voltar a esta matéria dentro de algum tempo, porque, parece-me, temos todos de nos entender sobre alguns conceitos e algumas práticas, que podem ser
utilizados, nomeadamente, em matéria de organização económica do Estado.
Recordo-me de uma tese antiga - que, aliás, nunca convalidei, mas que fez o seu percurso - que apontava no sentido de vivermos, nos planos legislativo e
institucional, com duas verdadeiras Constituições, que, aliás, seriam contraditórias, no entender de quem defendia essa tese, chamadas Constituição económica e Constituição política - a Constituição política era liberal, democrática, etc., a Constituição económica um bocadinho menos.
Repito que nunca foi essa a minha tese, nunca foi essa a minha interpretação do texto constitucional como um todo, uma vez que sempre entendi que a filosofia e os objectivos da organização económica eram perfeitamente conciliáveis com os objectivos da chamada Constituição política. De todo o modo, reconheço que havia, em matéria de organização económica, alguns conceitos e, sobre-
tudo, a fluidez de alguns conceitos, que permitiam justificar este tipo de interpretação.
Foi, aliás, por isso que o Partido Socialista, sem complexos, nos momentos temporais adequados, aceitou proceder à revisão da Constituição e das leis fundamentais em matéria de organização económica, no sentido da sua adaptação a um mundo em constante mutação e colocando progressivamente novos desafios. Fizemo-lo, em 1982 e, posteriormente, em 1989, aquando das respectivas revisões constitucionais, e fizemo-lo, entre 1982 e 1989, relativamente a várias leis que foram aprovadas nesta Assembleia, desde a lei das indemnizações e leis sobre a possibilidade de venda de participações sociais do Estado até à famosa lei de delimitação dos sectores, de 1977, que, como sabem, teve três ou quatro novas versões. Isto significa, pois, que o Partido Socialista esteve sempre aberto à realidade e, sobretudo, à mutação que essa realidade ia introduzindo nos objectivos e nos imperativos da Constituição económica.
Agora, Srs. Deputados, não podemos, de forma alguma, fechar os olhos a essa mesma realidade e, sobretudo, não podemos confundir isto - como, aliás, disse o Sr. Ministro, e muito bem, e, por isso, saudei-o, específica e pessoalmente - com aquilo que é a matriz essencial do pensamento do Partido Socialista em matéria de organização económica. E essa matriz essencial, em resumo, é a de que a existência de um sector empresarial do Estado é um instrumento fundamental de progresso, de solidariedade e de equidade e que, naturalmente, tudo deve ser feito para colocar esse sector empresarial do Estado ao serviço desses objectivos muito claros. Portanto, sobre isso - não haja a mais pequena dúvida! -, não temos quaisquer espécie de complexos nem aceitamos qualquer tipo de crítica.
Hoje, com a globalização e com a necessidade de regular essa mesma globalização, a famosa subordinação do poder político ao poder económico... perdão, do poder económico ao poder político...
Risos do PCP.
Srs Deputados, se não têm mais nada a dizer senão fazer uma referência lateral a este manifesto erro de linguagem, estamos conversados.
Dizia eu que a subordinação do poder económico ao poder político não se faz com o paradigma da posse, que era característico de outras sociedades e de outras ideologias, mas através da regulação das políticas de competitividade e de concorrência. E o sector empresarial do Estado não pode estar de fora desse tipo de regulação: não pode estar de fora das políticas de competitividade nem pode estar de fora das políticas de concorrência.
Por isso, o Governo fez bem em apresentar esta proposta de lei de autorização legislativa, que visa exactamente criar condições para adequar a intervenção do sector empresarial do Estado a estes mesmos objectivos.
Srs. Deputados, o Partido Socialista, embora se tenha abstido por razões laterais - se os Srs. Deputados quiserem perder algum tempo, explicá-las-ei -, aceitou claramente, e foi, aliás, um dos "fundadores" dessa lei fundamental, a Lei Quadro das Privatizações, o processo das privatizações, em Portugal. E aceitou-o em obediência a determinados objectivos, que estão inscritos na respectiva lei e que têm vindo a ser cumpridos. Todos os relatórios, incluindo o Livro Branco a que o Sr. Ministro se referiu e que foi elaborado sob a coordenação do Sr. Dr. Rui Vilar,
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apontam neste sentido e os próprios relatórios do Orçamento do Estado que têm Vindo a ser publicados ao longo destes quatro anos são, a esse título, verdadeiramente significativos.
Com as privatizações, dinamizou-se, por exemplo, o mercado decapitais, o que era absolutamente fundamental; com as privatizações, modernizou-se, por exemplo, o próprio sector empresarial do Estado - o Sr. Ministro já referiu, e ninguém o negará, que, nos últimos três anos, se obteve um volume de saldo positivo financeiro no sector empresarial do Estado verdadeiramente significativo; com as privatizações, foi possível criar, em relação ao sector empresarial do Estado, políticas de competitividade que o defendem das agressões do exterior e do próprio sector privado.
Portanto, estamos no bom caminho. E, porque estamos no bom caminho, parece-me perfeitamente aceitável e justificável esta iniciativa do Governo, designadamente do Sr. Ministro das Finanças.
Aliás, aproveito para dizer o seguinte: os Srs. Deputados estão permanentemente a reclamar aqui reformas estruturais e, ainda hoje, ouvimos um Sr. Deputado, sem saber muito bem do que falava, reclamar reformas estruturais. Ora, a reforma do sector empresarial do Estado, a sua colocação ao serviço de objectivos que o Sr. Ministro definiu e que, agora, aqui recordei, é também uma reforma estrutural. É uma reforma estrutural que está em curso e esta iniciativa legislativa é uma peça essencial dessa mesma reforma estrutural.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Muito bem!
O Orador: - Portanto, nós, os Deputados do Partido Socialista, estamos perfeitamente de acordo com a iniciativa do Governo e apoiá-la-emos. Aliás, saudamos a posição de bom senso aqui revelada pelo CDS-PP, através do Sr. Deputado Rui Pedrosa de Moura, uma vez que, independentemente das críticas que formulou, sobretudo no plano político e na parte final da sua intervenção, teve consciência clara de que, efectivamente, o que está em jogo é a criação de condições para melhorar o sector empresarial do Estado.
Os Srs. Deputados conhecem - e não vamos perder muito tempo com isso, pois não estamos no fórum adequado - as funções que são atribuídas ao Estado. Essas funções podem ser exercidas através do chamado sector público administrativo, que inclui um subsector do Estado, a segurança social, etc., como os Srs. Deputados sabem, e através do sector empresarial do Estado. Ora, é esta realidade que hoje é cada vez menos possível distinguir, uma vez que há algumas funções e a prestação de alguns serviços e bens públicos que se confundem numa e noutra área, que é fundamental modernizar e fazer evoluir no sentido da competitividade.
O Governo tem feito um grande esforço, naturalmente ainda inacabado, porque a tarefa é complexa, no domínio da modernização da Administração Pública, havendo várias medidas que apontam nesse sentido. Portanto, o vector do sector público administrativo está claramente a ser equacionado. E até temos o exemplo recente da aprovação aqui da lei das empresas públicas regionais e locais, que é também, relativamente ao sector empresarial regional e local, um contributo neste mesmo sentido.
Assim sendo, esta medida legislativa, como outras que seguramente serão apresentadas pelo Governo e pelo Ministério das Finanças, enquadra-se exactamente nessa perspectiva.
Termino, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, relembrando aqui que os grandes objectivos que se colocam à política económica do País e que o Governo tem vindo, de maneira concertada e coerente, a concretizar começaram por ser a preparação das finanças públicas para o euro. Penso que ninguém põe em causa o sucesso dessa preparação, que não foi um sucesso artificial, pelo que julgo completamente despropositado trazer aqui à colação situações que são manifestamente marginais e que, aliás, estão muito mal contadas - estou a referir-me naturalmente à questão da PARTEST.
Foi, portanto, um sucesso a preparação feita pelo Governo das finanças públicas, tendo em conta a sua caminhada para o euro. Será um sucesso o processo de consolidação orçamental, que o Sr. Ministro das Finanças apresentou, ontem, em sede de comissão, e que, presumo, a comissão, hoje mesmo, terá aprovado, como será um sucesso o aumento do crescimento económico em Portugal e, sobretudo, porque é uma marca identificadora e muito importante do nosso projecto político, a prioridade cada vez maior e absoluta aos sectores sociais, que são aqueles que fazem a diferença e permitem formular políticas de solidariedade e de equidade.
Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira,
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Deputados: Em relação à proposta de lei em discussão, de pedido de autorização legislativa, diria - aliás, repetiria, porque penso que já o disse há pouco - que, em termos de princípio, não temos objecção a que se possa fazer uma reformulação quer do modelo organizativo do sector empresarial do Estado quer do regime legal, na medida em muitos anos passaram entretanto. Não temos sequer grandes problemas em aceitar que se possa fazer, em termos de modelo organi7ativo, uma opção que favoreça mais a lógica dita de operação empresarial, no sentido de menor dependência do dia-a-dia, digamos assim, de uma qualquer tutela ministerial, embora enquadrada dentro das grandes orientações que são determinadas pela tutela governamental, é evidente, na medida em que é o seu accionista ou o seu accionista maioritário.
Para nós, a questão não reside nesse modelo organizativo, mas, fundamentalmente, como, há pouco, já tive oportunidade de referir, em tudo aquilo a que temos vindo a assistir, ou seja, a vaga liberalizadora, desregulamentadora e privatizadora que tem levado a afastar o sector empresarial do Estado da actividade económica, fundamentalmente das empresas que são mais rentáveis mas também em diversos e múltiplos sectores de actividade, mesmo naqueles em que se poderá dizer que têm principalmente a ver com a prestação de serviços públicos ou semi-públicos, visto que isso é, talvez, pouco discutível.
Relativamente a esta questão gostaria de fazer uma referência: quando se defende o sector empresarial do Estado e as empresas públicas como nós o fazemos - usando agora o termo em sentido amplo, independentemente de serem E.P. ou S.A. -, o problema não é existir um monopólio. Aliás, as empresas que ainda estão no sector
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empresarial do Estado, ou, pelo menos, grande parte delas, têm demonstrado que também em concorrência podem ser empresas dependentes do Estado, isto é, cuja propriedade é do Estado, e cumprirem, em termos de objectivos estratégicos, para além de manterem o equilíbrio económico e financeiro que é natural que seja exigido em grande parte das situações, alguma orientação estratégica por parte do Governo tendo também em conta interesses de vária índole, incluindo os de natureza social.
Aliás, julgo que, neste momento, uma atitude razoável, independentemente de questões político-ideológicas, sobre o papel do sector empresarial do Estado levará qualquer governo, a não ser que seja completamente liberal, a ter um sector empresarial do Estado nas suas economias, designadamente no contexto de um Estado membro da União Europeia e não o inverso, como muitas vezes se houve dizer.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Mesmo quando as políticas económicas favorecem o mercado, julgo que ninguém de bom senso recusa que há vazios, insuficiências e deturpações no funcionamento do mesmo e, por conseguinte, o Estado deve manter a obrigatoriedade de actuar nessa área, não apenas em termos de regulamentação ou fiscalização mas também, em muitas situações, em termos de intervenção directa nas actividades económicas.
Já há pouco referi - e não vou voltar a essa matéria - o facto de as empresas que têm estado a ser privatizadas serem fundamentalmente aquelas que têm dado maiores resultados, mas, já que o Sr. Ministro das Finanças falou no Livro Branco do Sector Empresarial do Estado, gostaria de recordar-lhe, embora não possa citar de memória, que, a certa altura, no capítulo das Conclusões, se refere um conjunto de empresas que tem vindo a dar, nos últimos anos - aliás, temos colocado essa questão, aqui, na Assembleia -,recursos substanciais para o Orçamento, quer através dos dividendos quer através dos impostos directos, chamando-se a atenção para o facto de, com o processo de privatizações, essas receitas desaparecerem, a curto ou a médio prazo, do Orçamento.
Gostaria ainda de focar mais dois ou três aspectos sobre esta matéria. Há pouco referi que não temos problemas em que possa ser dada atenção ao sentido operacional das empresas públicas, sem descurar, designadamente, as responsabilidades que grande parte das empresas que, neste momento, ainda têm uma participação do Estado possuem no âmbito social, o que faz suscitar, por exemplo, a questão dos transportes públicos.
O Sr. Ministro das Finanças disse, há pouco, que, em princípio, os transportes públicos que existem se manterão no sector empresarial do Estado. Porém, para além da gestão empresarial, têm de haver outras perspectivas, como, por exemplo, a social. Ora, do nosso ponto de vista, é inaceitável que, este ano - e a questão está em que não é só este ano, mas, sim, nos últimos anos -, os preços que mais sobem nos transportes públicos sejam os dos passes sociais. Então, os passes sociais, que são aqueles que, em princípio, deveriam ter subjacente a ideia de levar mais pessoas a utilizar os transportes públicos, para abandonarem ou reduzirem a utilização dos transportes privados, são os que têm os maiores aumentos?! Esta situação, do nosso ponto de vista, não pode inserir-se numa perspectiva de boa gestão do sector empresarial do Estado.
O mesmo acontece com a questão dos telefones: no ano passado, discutimos aqui, na Assembleia da República, a propaganda fraudulenta da Portugal Telecom e o que é mais interessante é que esta empresa não aprendeu. Neste momento, continua a fazer propaganda falsa, dizendo que quem telefona, em Portugal, passa a gastar menos e não faz a distinção entre as chamadas inter-regionais, as chamadas de uma cidade para outra, do norte para sul, etc., escamoteando o problema das chamadas locais, sendo que, mais uma vez, quem as faz, de um modo geral, são pessoas que, possivelmente, deveriam ser mais favorecidas, e não o são, em termos dos aumentos.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!
O Orador: - Isto também acontece quando se prevê a privatização dos notários, que é um serviço público, ou, pelo menos, semi-público, e, para a preparar, se fazem alterações nas tabelas dos emolumentos, aumentando-se substancialmente emolumentos sem haja .qualquer lógica para tal facto para reduzir outros que interessam a determinado conjunto de empresas.
Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, Srs. Deputados: Também não convém esquecer, em relação a toda esta matéria do sector empresarial do Estado, que todas as privatizações que têm existido até este momento, para além de outros aspectos, têm tido resultados negativos nas perspectivas do emprego e dos direitos dos trabalhadores, o que não deve ser prosseguido, deve ser travado, e as empresas do sector empresarial do Estado devem ter um papel de liderança nos direitos laborais, nos direitos dos trabalhadores, no progresso.
Terminaria, Sr. Presidente, Sr. Ministro e Srs. Deputados, recordando aquilo que, há pouco, referi ao Sr. Ministro das Finanças em pedido de esclarecimento. Da nossa parte, é absolutamente necessário, para analisar esta proposta de lei de autorização legislativa, que tenhamos o anteprojecto do decreto-lei que o Governo pretenderá vir a publicar, se, eventualmente, esta proposta de lei for aprovada.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Congratulo-me com este debate, agradeço as contribuições, reafirmo a disponibilidade do Governo não apenas para dialogar com o Parlamento mas também para lhe fornecer os elementos de que dispomos, neste momento, e pedia licença para esclarecer apenas três ou quatro questões que foram objecto de perguntas específicas, nomeadamente do Sr. Deputado do Partido Popular, Rui Pedrosa de Moura, mas também de outros Srs. Deputados, que fizeram perguntas expressas ou implícitas.
Pensamos que é fundamental que se esclareça de vez um estatuto do sector empresarial do Estado em que o conceito de empresa não seja o da velha empresa pública burocrática, das quais, como já disse, há cinco do Estado, 12 do Estado associado a municípios e algumas municipais, nos termos da lei que esta Assembleia já aprovou, mas cerca de 1000 vivem num estatuto que está indefinido.
Ora, nos termos de uma directiva comunitária de 1990, as empresas públicas devem ser aquelas em que os poderes públicos exercem uma influência dominante em virtude da detenção da maioria de capital social, da disposição
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da maioria dos votos ou do poder de designação de mais de metade dos membros de órgãos de administração, direcção ou fiscalização. Esta clarificação é decisiva e corresponde a um acto de gestão eficiente e empresarial na perspectiva da organização..
Pensamos que essa gestão eficiente e empresarial deverá, depois, ser também desenvolvida - e foram vários os pontos levantados pela bancada do Partido Popular -, no que se refere á aplicação de normas de concorrência nos sistemas de concorrência imperfeita, duopólio ou monopólio limitado, mesmo que aberto, através da existência de autoridades reguladoras e, sempre, das autoridades de defesa da concorrência.
Recordo que foi sob proposta deste Governo que a Assembleia aprovou uma Lei de Delimitação dos Sectores de Produção claramente compatível com os nossos compromissos europeus e com a abertura necessária em termos de globalização.
Por outro lado, recordo que a profissionalização eficiente e competitiva, bem como o regime das participações do Estado, deverá ser objecto de regulamentação posterior, naturalmente a partir desta lei. Não está em causa, na autorização legislativa nem, como é evidente, na intenção do Governo ao utilizá-la, qualquer modificação do regime actual de privatizações, que é uma legislação existente em que não queremos mexer, mas, isso sim, que as participações tenham uma gestão racionalizada, que até hoje não têm.
A autorização que VV. Ex.as votaram na Lei do Orçamento permitir-nos-á legislar nessa matéria num outro domínio que é complementar deste.
Quanto á pergunta sobre as sociedades gestoras de participações sociais, a resposta é positiva. Pensamos que, para a generalidade dos sectores, a racionalização da posição do Estado accionista não pode consistir na velha tutela, completamente ultrapassada, do Decreto-Lei n.º 260/76, como foi sublinhado, nomeadamente, pelo Sr. Deputado Carlos Brito, e também não pode consistir num despacho dado, na véspera, por dois ou três ministros á Direcção-Geral do Tesouro, porque alguém lhes recorda que vai haver uma assembleia geral no dia seguinte, como tem acontecido, até agora, sempre.
É necessário que haja sociedades gestoras de participações sociais responsáveis pela racionalização e pela orientação e acompanhamento permanentes por sectores. No Ministério das Finanças elas existem para certos sectores estratégicos: o IPE Investimentos e Participações do Estado, comum papel importante na área do ambiente, da cooperação e em certos sectores de internacionalização, e a PARTEST, como instrumento de gestão empresarial das participações financeiras do Estado. Está a ser criada, num trabalho conjunto dos Ministérios das Finanças e da Economia, a holding da energia, que será uma SGPS com vocação especial para a gestão do sector do gás natural e dos derivados de petróleo. É necessário que este modelo seja ampliado, progressivamente, a outros sectores, na linha, que o Governo apoia, do Livro Branco do Sector Empresarial do Estado.
A ideia de recurso às SGPS é a adequada a uma gestão empresarial eficiente e é necessária para que evitemos a velha tutela burocrática e ineficaz ou o casuísmo amorfo, anárquico e anómico que, neste momento, caracteriza a intervenção do Estado na gestão das empresas.
Por outro lado, quero sublinhar uma coisa. A propósito da PARTEST, empresa instituída em 1991, cujo regime legal é de 1991 e que em nada alterámos, que sempre praticou as mesmas operações desde 1991, só que, agora, com mais eficácia e eficiência, houve um lamentável processo de intenções. Esta empresa geriu bem as participações do Estado. A entrega de acções como forma de realização de capital é legal e é transparente. Os rendimentos da PARTEST são receitas efectivas. A única coisa que esteve em causa foi a qualificação das mesmas como receitas correntes ou como receitas financeiras. Tudo o resto é impecável, tudo o resto foi positivo e eficiente e tudo o resto deve ser desenvolvido como forma de gestão eficiente do sector empresarial do Estado e das participações sociais, poupando dinheiro aos contribuintes.
Recordo que, à amortização da dívida pública, de 1987 a 1995, foram afectos 593,5 milhões de contos. Ora, só nos dois anos seguintes - 1996 e 1997 -,foram afectos àquela amortização 925,3 milhões de contos. Isto também é poupar o dinheiro dos contribuintes! Não é só passar a tirar de rendimento 10 vezes mais do que nos três anos anteriores, de entre os 18 anos em que houve sector empresarial do Estado antes de entrada em funções deste Governo.
A redução da dívida pública, de 66%, e em ascensão, como estava em 1995, para valores da ordem de 58%, este ano - e, como W. Ex.as sabem, cada ponto percentual do PIB representa mais de 190 milhões de contos! -, também é poupar o dinheiro dos contribuintes, também é racionalizar a gestão do sector empresarial do Estado.
Por isso, queria dizer, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que esta discussão é importante. Modernização e eficiência significam, ao mesmo tempo, um sector empresarial do Estado, não vazio, Sr. Deputado Octávio Teixeira, mas eficiente.
Consideramos que as privatizações que fizemos foram bem feitas, foram eficientes, traduzem uma reforma estrutural, no sentido positivo, do sector empresarial, do mercado de capitais português, da internacionalização e da modernização.
Consideramos que há sectores que são abertos, são competitivos, são de gestão privada, carecendo, essencialmente, de inovação empresarial, que a iniciativa privada, em termos mistos ou até em termos exclusivos, é capaz de desenvolver bem e que a iniciativa pública é capaz de desenvolver mal. O transporte aéreo, as telecomunicações, são exemplos característicos. Há, porventura, erros que têm de ser corrigidos, mas estes últimos são sectores que ou são privatizados ou morreriam numa burocracia ineficiente, que em nada serviria a economia portuguesa nem o povo português.
O desafio, Sr. Deputado Carlos Brito, é o desafio da qualidade, efectivamente.
Pensamos que o que fizemos até agora vai no sentido de defender os interesses dos contribuintes, ainda não a restabelecer o equilíbrio. De facto, o que os contribuintes gastaram com o sector empresarial do Estado, desde 1978 até hoje, são 4893 milhões de contos. O que conseguimos reaver até agora, ao final de 1998, foi 3042 milhões do contos. Ainda há um grande prejuízo, mas se não fosse a gestão deste Governo, esse prejuízo ainda estaria praticamente no valor dos tais cerca de 4000 milhões.
Este é o caminho em termos quantitativos e a ele deve acrescentar-se a melhoria qualitativa, para que haja um sector empresarial do Estado ao serviço do povo e não um sector empresarial do Estado "em cima das costas" do povo, a aumentarlhe os impostos para cobrir prejuízos. Este é o nosso critério, é neste sentido que vai esta proposta de lei.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que está encerrado o debate da proposta de lei n.º 215/VII, a qual será votada na sessão de amanhã, à hora regimental.
Passamos ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos para hoje, o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 596/VII - Cria um cadastro obrigatório de acidentes de automóveis e motociclos, visando aumentar a segurança rodoviária e a defesa do consumidor (PS).
Para proceder à apresentação do projecto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.ªs e Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: O Partido Socialista tem sabido intervir, de forma corajosa e com coerência, na área da segurança rodoviária.
Nesse sentido, é interessante verificar as mudanças operadas em concreto, que se revelam nas estatísticas do sector mas, especialmente, no crescimento da consciência e da preocupação que a nossa sociedade, em geral, tem vindo a dar à problemática dos acidentes de viação e, em particular, ao esforço para a sua contenção, diminuindo-os em número e nas consequências nefastas que, normalmente, destes decorrem.
Todos, independentemente das nossas opções político-ideológicas, dedicamos a maior atenção ao que se passa nesta área e ficamos verdadeiramente impressionados com a realidade do que se passa nas nossas estradas.
Apreciamos o esforço das nossas autoridades policiais em todas as tarefas que dedicam à prevenção destas situações e o apoio que estão sempre prontas a prestar para a redução das infracções e controlo do tráfego em geral. É justo, nesta ocasião, dedicar-lhes a nossa homenagem, o que, tantas vezes, enquanto cidadãos, não temos oportunidade de fazer, e devemos-lhes tanto.
É um esforço enorme em que, essencialmente, estão envolvidos os cidadãos automobilistas, mas o Estado tudo deverá fazer para aumentar o sucesso desse esforço.
Muito foi feito na melhoria das condições de circulação rodoviária, mas é um trabalho nunca acabado. Muito foi conseguido, precisamente, com a melhor formação e aumento de efectivos dos agentes da autoridade, mas ainda há que fazer mais e melhor.
Também na área da sinalização e da melhoria das condições de trânsito e, no que a nós diz respeito, na adequação das medidas legislativas que enquadram o sector, é preciso fazer mais. Neste caso, muitas medidas têm sido tomadas e outras melhoradas ou adequadas às necessidades da procura incessante de tráfego.
A iniciativa que, hoje, apresentamos nesta Assembleia vem, precisamente, no sentido de aperfeiçoar e contribuir para que, através do aumento da informação ao consumidor, possa influenciar-se positivamente as condições de segurança rodoviária, pela aferição da qualidade do parque automóvel em circulação nas nossas estradas.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Está já implantado o sistema de inspecção periódica obrigatória que, neste mesmo sentido, veio introduzir melhorias apreciáveis nas condições das viaturas em circulação. É preciso continuar neste caminho, pelo que este nosso projecto de lei cria agora a possibilidade de se instituir, também, um sistema de inspecção voluntária dos veículos.
Assim, em qualquer momento, o proprietário, ou um qualquer interessado na aquisição de um veículo, poderá submetê-lo, voluntariamente, a uma inspecção que há-de aferir a sua qualidade intrínseca, dando maiores garantias ao seu condutor habitual ou ao adquirente, sendo que o primeiro poderá sempre intervir, preventivamente, na melhoria ou reparação de órgãos essenciais ao funcionamento do seu veículo e, portanto, na segurança do próprio e dos que com ele convivem nas estradas portuguesas.
Por outro lado e como já se disse, pretende-se, ainda, que seja possível conhecer o histórico de qualquer viatura que entre no circuito comercial, ou seja, que os acidentes graves, e apenas estes, passem a figurar num registo cadastral de cada viatura e que esse registo seja acessível aos interessados na sua aquisição.
Hoje, a quem queira comprar um veículo em estado usado só resta acreditar na palavra de quem vende quanto às condições intrínsecas deste bem, dar atenção ao modelo em causa e ao ano da matrícula e, daí, ajustar o preço. Apenas isto! O adquirente, seja o proprietário de um stand ou um particular a quem este vende, normalmente nada mais sabe sobre aquele automóvel ou motociclo. Pensamos que pode saber e deve mesmo saber mais e, assim, nasce este cadastro de acidentes.
Repito, Sr. Presidente; Sr.ªs e Srs. Deputados, que só os acidentes graves passarão a estar sujeitos a registo obrigatório.
Queremos distinguir aqueles acidentes que ponham em causa a qualidade intrínseca do bem e as condições de segurança do seu uso dos outros acidentes em que apenas se trata de "chapa batida", pois estes, depois de reparados, afinal, nada influenciam sobre o desempenho da viatura na estrada - e repare-se que menciono o desempenho da ,viatura e não o do condutor, pois que acidentes existem provocados pelo estado de deterioração de órgãos essenciais da viatura, como sejam o sistema de direcção, de suspensão e travagem entre outros e que nada têm a ver com a perícia do condutor.
Neste caso e no que ao condutor diz respeito, o seu dever reside na responsabilidade cívica de registar o sucedido, quando a situação o justifique, isto é, quando o acidente seja grave, por forma a colaborar, também ele, para o aumento da segurança rodoviária que ainda contribui para tantas vidas perdidas, cidadãos estropiados e tantas famílias tristes no nosso país.
Este dever de colaboração é extensível aos agentes policiais que tomem conta da ocorrência e às seguradoras envolvidas; caso contrário, assistirá o direito, ao adquirente, de anular o negócio.
Hoje, nesta Assembleia, podemos e queremos dar o nosso contributo para alterar este estado de coisas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva, para pedir esclarecimentos.
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Neves, para além de não questionar a importância de que se reveste o encontrar de um mecanismo que, em cada momento, possa aferir as condições técnicas de um automóvel, a leitura deste projecto de lei suscitou-me algumas questões, que gostaria de colocar-lhe.
A primeira é uma constatação: o Sr. Deputado, de alguma forma, desacredita os centros de inspecção periódica obrigatória porque não os considera no seu documento. Ora, parece-me que faria todo o sentido que criássemos as condições para credibilizar o trabalho desenvolvido por
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aqueles centros de inspecção. Portanto, parece-me que há um reconhecimento da sua parte de que, de facto, os centros de inspecção não estão a cumprir com a respectiva obrigação.
A segunda questão prende-se com a necessidade, expressa no projecto de diplomá, da criação do cadastro de acidentes de automóveis e de motociclos junto da Direcção-Geral de Viação.
Presumo que o que se pretende é fazer o cadastro do automóvel e não o cadastro do condutor. Ora, parece-me que faria mais sentido que este cadastro pudesse ser efectuado junto das conservatórias do registo automóvel.
A terceira e última questão prende-se com a responsabilidade perante terceiros.
De acordo com o projecto de lei, as pessoas e entidades a quem incumbiria o dever de promover o averbamento no cadastro e que não o façam são solidariamente responsáveis pela restituição do valor que o veículo custou e pelo pagamento dos prejuízos que, entretanto, venham a ser reclamados pelo comprador.
Pergunto se não admite que, um dia destes, à porta do Sr. Ministro da Administração Interna, se forme uma fila de reclamantes, exigindo o ressarcimento dos danos causados nos termos em que o projecto de lei propõe.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Moura e Silva, agradeço as questões que me colocou e vou tentar responder a todas elas.
O Sr. Deputado disse que não acredito nos centros de inspecção periódica de veículos. Ora, é óbvio que acredito, tanto que, neste projecto de lei, está claramente inscrita a vontade de criar uma nova inspecção de veículos que é a chamada "inspecção voluntária". Neste momento, apenas existem inspecções periódicas obrigatórias e, com este projecto de lei, também passará a existir a inspecção voluntária, a ser efectuada, precisamente, nos centros de inspecção periódica.
Mas os adquirentes precisam de saber mais. É que, ao comprar um bem que, frequentemente, lhe "leva" grande parte do seu ordenado e que põe em causa a segurança da utilização para si, para a sua família e para os outros cidadãos que circulam nas estradas, o adquirente precisa de saber mais. Precisa de saber se o preço que pagou é verdadeiramente ajustado em relação ao bem que está a adquirir, que tem determinado número de anos e que, obviamente, poderá ter sido envolvido em acidentes graves Assim, o adquirente precisa de saber e, se puder saber, deve caber ao Estado facultar-lhe essa possibilidade como instrumento de regulação importante.
Quanto à questão de o cadastro de acidentes dever ser efectuado junto das conservatórias do registo automóvel, poderia concordar com essa, sua perspectiva, mas a verdade é que foi constituído um grupo de trabalho para, a partir de agora, passar a haver o chamado "documento único", o que todas as associações do sector têm defendido como sendo essencial para o mercado.
O referido grupo de trabalho irá proceder à junção das tarefas que são efectuadas neste momento pelas conservatórias do registo automóvel com as que são desempenhadas pela Direcção-Geral de Viação, por forma a que a titularidade da propriedade do veículo e os registos contidos no livrete passem a constar de um único documento, em princípio tutelado pela Direcção-Geral de Viação. Daí que, neste projecto de lei, as competências sejam desde já atribuídas à Direcção-Geral de Viação.
Acresce, Sr. Deputado, que, neste momento, embora este cadastro ainda não exista, as autoridades policiais já reportam à Direcção-Geral de Viação todos os sinistros ocorridos no País. Agora, o que é preciso é qualificar esses sinistros no sentido de constarem ou não deste cadastro, que, como afirmei, apenas se destina ao registo de acidentes graves.
Finalmente, quanto à possibilidade de, no futuro, haver filas de eventuais reclamantes à porta do Sr. Ministro, tal não vai acontecer porque, como é evidente, estamos num Estado de direito democrático pelo que, de acordo com a lei, todas as pessoas que tiverem reclamações a fazer hão-de dirigir-se a um tribunal e não à porta de um qualquer ministro. Isto é evidente!
Portanto, caberá ao tribunal, em função da lei do consumidor - e neste caso desta lei -, dirimir o litígio. Se, no momento do negócio" houver dolo ou se houver uma informação que deveria ter sido prestada e não foi, então, nesse caso, o negócio deve ser anulado, pois entendemos que quem compra deve saber o que está comprar.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para unta intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.
O Sr. Calvão da , Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O diploma que agora estamos a discutir tem como epígrafe "Criar um cadastro obrigatório de acidentes de automóveis e motociclos, visando aumentar a segurança rodoviária e a defesa do consumidor".
Este diploma tem um propósito válido; todavia, julgo que não é o caminho mais adequado para o resultado pretendido. Penso que este caminho é demasiado burocratizante e que, por isso mesmo, num tempo em que se luta pela desburocratização, devemos evitá-lo, sendo possível encontrar uma solução mais simples e, porventura, tão eficaz ou mesmo mais eficaz.
Quero com isto dizer que a ideia de haver um registo dos acidentes sofridos pelos automóveis é boa, porque permitirá ao possível comprador ter um retrato completo e mais fiel do bem pretendido, não comprando assim, muitas vezes, "gato por lebre", ou seja, permitir-lhe-á ter um maior conhecimento do estado do veículo assim como um conhecimento mais consciente.
Mas será necessário institucionalizar um cadastro? Não teremos nós, já hoje, a partir de outros mecanismos já existentes, a possibilidade de atingir o mesmo resultado? Penso que sim! Aproveitando os institutos existentes.
Em primeiro lugar, há hoje um seguro de responsabilidade civil obrigatório para os automóveis e isto significa que as seguradoras podem perfeitamente registar todo e qualquer acidente comunicado. E, nessa medida, qualquer transacção de um veículo segurado pode ficar sujeito à apresentação de uma certidão ou certificado dos acidentes sofridos, ou da ausência de acidentes, pelo automóvel que se quer comprar.
Em segundo lugar, a ideia que subjaz a este diploma é a da segurança rodoviária em geral, que é também um objectivo muito louvável que devemos atingir ou pelo menos perseguir. Ora, julgo que essa segurança pode também ser atingida através da exigência, para a transacção de automóveis usados, da apresentação de um certificado passado por um centro de inspecção, autorizado nos ter-
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mos do Decreto-Lei n.º 254/92, de 20 de Novembro, que regula a matéria. Ou seja, é fácil, a partir dos instrumentos que temos, potenciando os seus resultados e sem criar novos mecanismos excessivamente burocratizantes, atingir aquilo que o diploma, e muito bem, pretende obter.
Para isso, proponho que no Código de Registo de Bens Móveis, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 277/95, de 25 de Outubro, no artigo 20.º, se acrescente apenas um novo número e isto será suficiente para tudo ficar resolvido de modo simples e eficaz.
Hoje, no artigo 20.º, n.º 2, diz-se: "Para a transmissão e oneração do bem móvel sujeito a registo (...)" - que é o caso dos automóveis - "(...) apenas é exigida a forma escrita" Depois fala-se no reconhecimento de assinatura, o que, entretanto, em nome da desburocratização, já foi superado, bastando a indicação do número do bilhete de identidade e a identificação das partes.
O número a introduzir, que seria o n.º 3, o qual julgo que resolveria o problema dos relutados pretendidos através deste diploma, seria, numa redacção que ainda não tive ocasião de "afinar", aproximadamente o seguinte: "A transmissão ou constituição onerosa de direito real sobre veículo automóvel usado está ainda sujeita, sob pena de anulabilidade, à apresentação de certificado de inspecção do veículo passado há menos de três meses por centro de inspecção, aprovado nos termos do Decreto-Lei n.º 254/92, de 20 de Novembro, e de certificado passado pela companhia de seguros relativo à existência ou inexistência de acidentes sofridos pelo veículo segurado.".
Assim, Srs. Deputados, teríamos duas formas: uma, a clássica, de interesse público, que o actual decreto-lei do Código de Registo Predial impõe - a forma escrita - e que, como todos sabemos, se não for cumprida tem como consequência a nulidade; a que acrescentaríamos, agora, más dois requisitos de forma diferente com uma finalidade meramente de protecção do comprador e que, se não verificados, gerariam a anulabilidade do contrato, com o comprador a poder argui-la exercendo o direito potestativo correspondente.
E digo do comprador, porque pode ser um comprador não consumidor, sendo o consumidor apenas uma das qualidades em que intervirá ou poderá intervir um comprador. Não podemos é usar a protecção do consumidor, só porque é unia bandeira moderna, a "torto e a direito" e, Srs. Deputados, tem sido mais a "torto" do que a "direito".
(O Orador reviu.)
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tema palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a debater, hoje, nesta Assembleia, uma iniciativa que versa sobre um problema que existe e é real. De facto, uma parte - provavelmente não a maior, mas uma parte - da sinistralidade rodoviária tem origem nos problemas que os veículos que circulam possam ter, como afirma este projecto, eventualmente até em consequência de acidentes anteriores. Se a isto aliarmos a falta de recursos dos portugueses para aceder, como desejariam, a viaturas novas, o que leva a um maior dinamismo do mercado de usados pela necessidade de a ele recorrerem, então, de facto é preciso proteger os compradores de veículos usados contra eventuais danos no veículo que vão adquirir e que ponham em causa a sua segurança, a segurança rodoviária, deixando-o indefeso neste processo de compra. '
Portanto, é necessário um sistema que garanta a qualidade e a segurança dos usados, o que também é útil para disciplinar e proteger quem recorre a este tipo de mercado.
O cadastro que o Partido Socialista propõe é um sistema possível, que, provavelmente, terá de merecer, na especialidade - se, eventualmente, for aprovado -, alguns aperfeiçoamentos, porque tal como está exige, por um lado, uma fiscalização bastante difícil e complicada e, por outro, uma agilidade necessária que não leve a que, pela burocratização deste problema, esta obrigação acabe por cair em desuso ou, pior, a ser contornada, à margem da lei, para que as obrigações impostas por uma eventual legislação deste tipo não inviabilizem ou dificultem os negócios que se pretende fazer.
Portanto, será preciso encontrar um sistema que não imponha unia burocratização tal que obrigue aqueles que neste mercado se movimentam e pretendem adquirir ou vender um veículo automóvel a cair na tentação de contornar a lei, resolvendo as situações à margem da mesma.
Este diploma, proposto pelo Partido Socialista, embora apresente algumas soluções - e o Sr. Deputado Calvão da Silva já propôs outras, pelo que, provavelmente, na especialidade, haverá necessidade de apurarmos a melhor -, é vago, nomeadamente no que diz respeito à gravidade do acidente.
O registo em cadastro só seria obrigatório para os acidentes cuja gravidade ponha em causa as características de segurança do veículo, mas é muito difícil definir numa designação, num normativo abstracto, o que é esta gravidade. Há, pois, aqui uma linha difícil de difícil inscrição.
Por outro lado, julgo que não está completamente claro quem tem obrigação - se todos a têm, em que situação e em que condições - de enviar para registo a notícia do acidente, ficando provavelmente bastante desprotegidas as situações em que não estão presentes autoridades policiais, que não são assim tão poucas como isso, ou em que, até, não haja intervenção das companhias de seguros, o que também acontece.
Admito até que possam existir situações em que não há intervenção das autoridades policiais, em que não há intervenção das companhias de seguros e, contudo, a danificação do veículo justifique a inscrição neste registo que se propõe. Portanto, haveria aqui uma fragilidade que era preciso suprir.
De resto, há também outro problema que é preciso ponderar na formulação que se encontrar. Se um determinado acidente é grave e, por isso, deve constar do tal registo e do tal cadastro - passando o veículo a ser "cadastrado" -, então, ficamos aqui colocados perante um dilema que é o seguinte: ou este dano é possível de ser reparado, readquirindo o veículo todas as possibilidades e potencialidades de segurança - e aí, provavelmente, o fundo desta iniciativa não teria tanta razão de ser porque estariam garantidas essas situações - ou, então, isso não é possível e, em bom rigor, ele não deve circular. Assim, julgo que há aqui que precisar, exactamente, os momentos e as situações a que se destina esta legislação.
Está muita coisa por regulamentar neste projecto. Enfim, é um projecto do Partido Socialista e, portanto, a tendência para deixar que seja o Governo a regulamentar tudo é talvez bastante grande. Provavelmente, se este projecto for aprovado, vamos ter de aligeirar um pouco este
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ónus, esta carga, de trabalho para o Governo, no sentido de regulamentar esta legislação.
Julgo que há aqui algumas matérias em que ganharíamos se fosse a Assembleia da República a definir as situações que estarão em vigor nesta legislação, mas, e concluindo, parece-nos que este projecto traduz uma preocupação legítima e devemos encontrar as melhores soluções para chegar ao fim que é proposto e, na especialidade, devemos encontrar as formulações necessárias para que não se criem equívocos, para que o projecto não caia em desuso e para que os direitos dos compradores, dos consumidores fiquem devidamente assegurados.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A necessidade de encontrar um mecanismo legal que crie a obrigatoriedade de, a todo o momento, se conhecer o estado técnico de segurança dos automóveis e motociclos, ou seja, a criação de um cadastro obrigatório de acidentes, parece ser uma preocupação comum, por isso merece elogios a proposta do Sr. Deputado Paulo Neves.
Com este projecto de lei, o PS pretende criar um cadastro obrigatório de acidentes de automóveis e motociclos, visando aumentar a segurança rodoviária e a defesa do consumidor. '
De facto, parece ser preocupação de todos tudo fazer para combater, resolver ou atenuar os altos níveis de sinistralidade verificados nas nossas estradas, colocando Portugal como o país da União Europeia com maior número de acidentes mortais e, ao mesmo tempo, com o parque automóvel mais envelhecido.
Contudo, essa constatação manifestada na "Exposição de motivos" não encontra, quanto a nós, correspondência no corpo do projecto.
De acordo com o articulado - com algumas imprecisões, ou mesmo com muitas imprecisões, e com uma tendência de remeter para regulamento muito do que deveria ser já matéria da lei -, é notório que a preocupação se direcciona para o consumidor/automobilista.
Nesta medida, e reconhecendo a necessidade de acompanhar uma maior dinâmica, verificada nos últimos anos, do mercado de automóveis usados, a par dos modernos meios técnicos que possibilita as reparações dos veículos acidentados, consideramos que a intenção do projecto de lei é louvável, na medida em que tenta defender o consumidor/automobilista - área na qual já existe legislação.
Analisando mais pormenorizadamente o diploma, o projecto de lei pretende criar o cadastro de acidentes de automóveis e motociclos, o qual funcionará junto da Direcção-Geral de Viação. Contudo, parece-nos que o sistema proposto irá burocratizar excessivamente o processo de comercialização de veículos, podendo ser posta em causa a capacidade de resposta da DGV.
Prevê ainda o projecto de lei a inscrição obrigatória no cadastro de acidentes de automóveis e motociclos de todos os acidentes ocorridos com esses veículos que sejam susceptíveis de afectar as suas qualidades intrínsecas ou as suas condições de segurança, nos termos a definir pelo Governo em diploma regulamentar. Seja!
Contudo, o artigo 5.º do projecto de lei em análise prevê que o registo dos acidentes seja efectuado com base na entrega dos elementos do acidente pelo proprietário, pela companhia de seguros e pela entidade policial competente. Com toda a franqueza, tenho dificuldade em entender como o proprietário ou as entidades policiais poderão ajuizar sobre a gravidade do acidente e, concomitantemente, ter facilidade em constatar a inutilidade do disposto no caso, mais frequente do que seria desejável, de sinistros que não envolvem a intervenção de autoridades policiais e/ou companhias seguradoras.
No entanto, ainda que estas entidades sejam chamadas a intervir, coloca-se, inevitavelmente, a questão da existência de habilitação técnica para produzir um juízo que se pretende vinculativo no que concerne a questões que, objectivamente, estão fora do seu foro.
Assim, a menos que se pretenda criar brigadas mecânicas - diria eu, especializadas - da PSP ou da GNR, ou impedir a reparação dos veículos até à realização de uma peritagem por parte da entidade seguradora, dispensável e dispensada em frequentes casos, não se nos afigura viável ou exequível a louvável pretensão que subjaz à proposta apresentada.
Deste modo, e não querendo nem podendo deixar de, mais uma vez, louvar a iniciativa do Sr. Deputado Paulo Neves, entendemos que as soluções encontradas não são as mais equilibradas no que toca à forma e à exequibilidade, pelo que, em caso de baixa à comissão competente, não deixaremos de, em sede própria, contribuir para serem introduzidas as melhorias que entendemos necessárias, no sentido de tornar efectiva a utilidade potencial deste projecto de lei.
O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Neves.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão essencial que eu gostaria que ficasse bens esclarecida é a de que a norma que define a gravidade dos acidentes, que este projecto de lei visa regular especificamente, está prevista, precisamente pelas mesmas palavras, no n.º 2 do artigo 116-0 do Decreto-Lei n.º 2/98, que aprova o novo Código da Estrada, e. inclusive, dá condições e poderes às autoridades policiais para, nos casos de acidentes que ponham em causa as condições de segurança do veículo, apreender o livrete a essa viatura. Portanto, este projecto de lei aparece claramente em coerência com o decreto-lei que aprova o novo Código da Estrada.
Como o Sr. Deputado Bernardino Soares acabou de mencionar, e muito bem, este projecto de lei foi elaborado por um Deputado do Partido Socialista e, de facto, está em coerência com a política do Governo. Com efeito, o novo Código da Estrada já avança nesse sentido e define o que significam as condições de segurança e a qualidade intrínseca do veículo. Essa é que é a questão essencial.
Hoje, num acidente grave - é esse tipo de acidentes que vai ficar sujeito a registo obrigatório -, a autoridade policial já tem poder para apreender o livrete e para reter a viatura até à peritagem oficial, que decidirá se a mesma poderá ou não continuar a circular. Quanto a este ponto, estamos esclarecidos.
Aliás, esta questão também resolve o que o Sr. Deputado Calvão da Silva aqui mencionou sobre o projecto de lei.
Sr. Deputado Calvão da Silva, quero dizer-lhe que não concordamos que sejam as companhias de seguros, enquanto operadores no mercado, também a regular o mercado.
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O Sr. Deputado saberá, com certeza, melhor do que eu que as seguradoras fazem, elas próprias, a retoma de veículos por elas segurados, voltando a colocá-los no mercado de usados. Ou seja, é preciso que quem opere no mercado não seja o regulador desse mercado.
Sobre a burocracia, e para terminar, já que todos chamaram a atenção para esse ponto, apenas digo que neste momento todos os acidentes ocorridos em Portugal estão registados em dois cadastros: um, que é privado, o das seguradoras - todos nós temos um ficheiro com os acidentes que sofremos -, e outro, na Direcção-Geral de Viação. Aliás, essa informação está publicada no "Relatório 1997", do Observatório da Segurança Rodoviária em Portugal.
Em suma, o cadastro já existe. Apenas queremos que ele seja conhecido do público adquirente das viaturas nessas condições.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Também desconfia das companhias de seguros!
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, como ainda disponho de tempo, peço a palavra para uma intervenção ou para um pedido de esclarecimento, como entender.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Então, para uma intervenção, uma vez que o Sr. Deputado Paulo Neves já não dispõe de tempo para responder a pedidos de esclarecimento.
Para uma intervenção, tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Neves, não entendi a sua desconfiança relativamente às seguradoras, por uma razão muito simples: o Sr. Deputado acabou de confirmar que esse cadastro ou registo já existe nas seguradoras.
O Sr. Paulo Neves (PS): - Existe em relação aos condutores, não em relação às viaturas!
O Orador: - Não é em relação aos condutores, Sr. Deputado!
O Sr. Paulo Neves (PS): - É, é!
O Orador: - O Sr. Deputado desconhece que já hoje, por lei, as companhias seguradoras são obrigadas a passar um certificado para que se possa transferir o seguro.
O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - É verdade!
O Sr. Paulo Neves (PS): - Por causa do condutor!
O Orador: - Não é verdade! É do próprio automóvel! E, se assim é, é possível que, a partir desse mesmo registo - por lei, ele acaba por ser obrigatório -, possa ser passada uma certidão do que lá conste, a fim de que os compradores saibam a história completa desse automóvel.
Ouça, é-me indiferente que seja a seguradora ou outra entidade...
O Sr. Paulo Neves (PS): - Não é indiferente, Sr. Deputado, porque a seguradora é interessada no negócio, é operadora no mercado!
O Orador: - Não é nada! Isso apenas vale para os salvados.
A obrigatoriedade só vale para os salvados - já o invoquei em comissão -, de acordo com o decreto-lei que alterou o Código da Estrada, isto é, já hoje se comunicam esses acidentes, quer à Conservatória do Registo Automóvel, quer à Direcção-Geral de Viação. Isso já é assim por lei!
O que não podemos é estar a multiplicar leis, só paia dizer que legislamos, quando é inútil! E criar leis sobrepostas a leis, se é unia inutilidade, não justifica o serviço público dos representantes eleitos pelo povo.
É nesse sentido que lhe estou a perguntar, Sr. Deputado Paulo Neves, se vê com bons olhos que seja menos burocratizado o processo para atingir a finalidade que propõe, finalidade que é justa e válida.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Não havendo mais oradores inscritos, dou por encerrada a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 596/VII, que será votado amanhã, à hora regimental. Foram anunciadas propostas de alteração, que baixarão à comissão competente, se o projecto de lei obtiver vencimento na votação na generalidade.
Srs. Deputados, passamos ao último ponto da ordem de trabalhos, a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 588/VII - Torna obrigatória a afixação do preço dos produtos em dígitos (Os Verdes).
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Os portugueses são, enquanto consumidores, perante a Constituição da República Portuguesa, titulares de direitos fundamentais. Direitos fundamentais que, numa óptica de protecção da saúde e da segurança dos cidadãos, garantem a qualidade de bens e serviços, bem como a defesa dos interesses económicos de cada um, que é responsabilidade do Estado promover e efectivar.
Ora, a concretização desses direitos de consumidores tem de ser pensada no contexto de um tempo e de uma sociedade cuja lógica é a de gerar lucro a qualquer preço e no imediato; uma sociedade orientada para o consumismo exacerbado; uma sociedade aprisionada pela ditadura dos objectos, que se afirma pelo ter e não pelo ser e pelo estímulo de padrões' de consumo, social, ambiental e eticamente insustentáveis. É, pois, prioritário modificar esta situação.
Esta é uma preocupação para a qual diferentes instituições, designadamente a Organização das Nações Unidas, vêm alertando, desde 1995.
Esta é uma realidade que exige, no plano das políticas de consumo, no entendimento de Os Verdes, a adopção de múltiplas medidas que favoreçam uma melhor utilização dos recursos naturais, a redução dos níveis de consumo e a sua racionalização, o travar do endividamento das famílias, a crescente certificação e segurança dos produtos, medidas políticas essas suportadas por uma informação e uma intervenção pedagógica orientada para diferentes sectores da sociedade, a fim de provocar uma alteração dos, padrões de consumo e dos padrões culturais.
E, pois, movidas por esta preocupação mais global que as Deputadas do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes apresentam este projecto de lei, que deve ser interpretado como contributo, pequeno embora, da mudança que, estamos conscientes, é preciso operar.
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O projecto de lei n.º 588/VII visa obrigar à afixação do preço dos produtos em dígitos, - numa óptica de melhoria de informação do consumidor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O direito à informação é, numa perspectiva global, um elemento imprescindível, logo de grande importância, para uma política de consumo sustentável.
O direito à informação assume, contudo, particular relevância na situação em concreto de uma escolha perante a pequenez do consumidor, a sua fragilidade e desprotecção face ao gigantismo das imensas máquinas de publicidade, publicidade essa que, servindo-se de uma intencional terminologia sofisticada e sugestiva de alta qualidade, tantas vezes ilusória, bombardeia com mensagens, na maior parte dos casos falsas, os cidadãos consumidores indefesos.
É neste contexto que se compreende a informação. Uma informação cuja importância os novos mecanismos de venda, sugeridos ou agressivamente impostos pelo mercado a cada cidadão, torna mais evidente, chamando a atenção para a necessidade de se adoptarem medidas - bem simples por vezes, como no caso presente - que possibilitem a sua efectivação.
É, pois, este ò exacto sentido do projecto de Os Verdes e da proposta que ele encerra, que agora vos é presente para discussão. Uma proposta que nasce de uma preocupação nossa, mas que vai ao encontro de preocupações por outros partilhadas, nomeadamente por várias associações de consumidores e, de entre estas, o Centro de Estudos do Direito do Consumo.
É uma medida que vem preencher uma lacuna que, seguramente, muitos de nós já detectaram no dia-a-dia, na nossa experiência - mais ou menos dolorosa, isso depende do gosto de cada um! - de fazer compras, particularmente nas grandes superfícies.
Do que se trata, e esse é, no essencial, o nosso objectivo, é de ultrapassar a situação inaceitável com que frequentemente, como consumidores, nos deparamos, particularmente nas grandes superfícies comerciais, quando nos propomos escolher um qualquer produto para o comprar, quando nos interrogamos sobre o seu preço e quando dele não temos nenhum outro vestígio que não o indecifrável código de barras, certamente útil, mas manifestamente insuficiente.
Uma situação que contraria o direito à informação, que condiciona a livre escolha, que omite dados fundamentais, como é, obviamente, o preço, elemento essencial de qualquer contrato. O preço é elementar numa escolha e é nosso direito, em termos comparativos, poder ponderar.
Logo, Srs. Deputados, estou a falar de situações frequentes que prejudicam urna escolha consciente, que potenciam fraudes e se reflectem na lesão dos nossos interesses económicos enquanto consumidores.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A proposta que fazemos é, pois, a de colmatar uma falha existente na nossa legislação, falha essa que o Decreto-Lei n.º 138/90, na omissão - como, aliás, é visível no nosso quotidiano , não ultrapassou.
O que se pretende, repito, é preencher esta lacuna e estabelecer a exigência de que, nos preços que sejam postos nos produtos através de etiqueta contendo código de barras, a esse revolucionário pequeno "livre- trânsito", se junte, obrigatoriamente, sempre em separado, o valor ou seja, o preço - correspondente em dígitos.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sr.ª Deputada Isabel Castro, li com muita atenção o diploma apresentado por Os Verdes, onde é manifesta a preocupação e o objectivo a atingir na defesa dos consumidores em geral e, obviamente, de todos os compradores. Mas, se concordo com o objectivo a atingir, julgo que, por um lado, a fundamentação do diploma não é inteiramente exacta e correcta e, por outro, tenho muitas e sérias dúvidas acerca da necessidade deste diploma.
Mais uma vez, e logo pela segunda vez hoje, em tão pouco espaço de tempo, vejo-me confrontado com um tema geral das sociedades modernas, de legislar por legislar, de não olhar para as leis existentes e esgotar as suas virtualidades e de pensar que apresentamos bons resultados desde que possamos quantitativamente dizer que fizemos x leis.
Sr.ª Deputada, em primeiro lugar, creio que a fundamentação é incorrecta, porque me parece que parte de um equívoco grande ao dizer que o consumidor se vê confrontado corri o facto de o preço se encontrar definido apenas em código de barras, tal como se diz na "Exposição de motivos" do vosso diploma, ficando, portanto, o consumidor sem saber quanto custa o produto, o que não é exacto.
De facto, o código de barras, tanto quanto me pude informar e tanto quanto eu pensava saber e confirmei-o e se estiver errado, então retiro tudo quanto vou dizer não contém o preço mas, sim, uma indicação que, depois, a máquina registadora identifica e ai, sim, é que aparece na contabilização geral para somar os preços dos produtos.
O código de barras contém outros dados que o vendedor, o hipermercado ou qualquer retalhista, entendeu por bem lá colocar e por isso é que é de barras e ninguém pode lê-lo a não ser a máquina, porque os consumidores não podem através do código de barras ficar a saber o preço do produto - aliás, teria toda a razão a fundamentação do diploma se assim fosse, mas não sendo já não terá razão.
De facto, se assim fosse, é óbvio ' que, neste momento, pela lei actual, já se incorreria numa contra-ordenação grave, que mereceria o respectivo auto e as respectivas coimas.
A lei actual proíbe aquilo que a Sr.ª Deputada quer vir impor, a meu ver, partindo de um equivoco que, uma vez esclarecido, pode permitir um rápido entendimento acerca do resultado a dar a este diploma.
A lei actual é muito clara ao dizer, logo no n.º 2 do artigo 1.º, que "Os géneros alimentícios e os produtos não alimentares postos à disposição do consumidor devem conter também o preço da unidade de medida (...)". Também no artigo 5.º, onde se referem as formas de indicação do preço, se diz o seguinte: "1 - A indicação dos preços de venda e da unidade de medida deve ser feita de modo inequívoco, fácil e perfeitamente legível, através da utilização de letreiros, etiquetas ou - listas (...)", especificando-se no n.º 2 o que se entende por letreiro, etiqueta e lista.
Ora, o que nos interessa para este efeito é a etiqueta, entendendo-se, tal como consta da alínea b) do n.º 2, que "Etiqueta, todo o suporte apenso ao próprio bem ou colocado sobre a embalagem em que este é vendido ao públi-
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co, podendo, no entanto, ser substituída por inscrição sobre a embalagem, quando a natureza desta o permita;".
Também neste artigo os n.º5 4 e 5 são importantes. Diz-se no n.º 4 o seguinte: "Em qualquer caso, a indicação do preço deve ser feita na proximidade do respectivo bem ou no local em que a prestação do serviço é proposta ao público, de modo a não suscitar qualquer dúvida ao consumidor. No n.º 5 refere-se que "Os bens ou prestações de serviço, vendidos ao mesmo preço e expostos ao público em conjunto, podem ser objecto de uma única marcação de preço.".
De duas, uma, Sr.ª Deputada: ou nós eliminamos este número deste artigo, coisa que o vosso projecto de lei não faz, e pura e simplesmente não permite o que o n.º 5, que não revoga, permitirá e continuará a permitir, ou seja, que "Os bens ou prestações de serviço, vendidos ao mesmo preço e expostos ao público em conjunto; podem ser objecto de uma única marcação de preço", ou, então, a Sr.ª Deputada não pode impor que em cada unidade no código de barras, leia-se, na etiqueta, se coloque o preço individual.
Por isso, julgo que assente a ideia de que o código de barras não indica o preço, assente que não é de revogar o n.º 5 acabado de ler, que permite, como já disse, quando se trata de bens vendidos ao mesmo preço, uma única marcação do preço, assente que este número deve continuar a existir, então, não há razão para impor o preço em dígitos, nunca no código de barras, mas, sim, na etiqueta contendo também ao lado o código de barras.
Assim, a proposta que faço é a de que, neste n.º 5, acrescentar-se-ia, lodo a seguir, um n.º 6, passando o actual n.º 6 a n.º 7, onde, se diria mais ou menos o seguinte: "Sempre que seja aposta a um produto etiqueta com código de barras, dela..." - e não dele, como diz o vosso diploma - "... deve constar em dígitos o preço total de forma facilmente reconhecível e perfeitamente legível.".
Creio que assim já compatibilizaremos a lei que temos com uma certa preocupação que a Sr.ª Deputada tem, não eliminando de todo, revogando-o, o n.º 5 do artigo 5.º, mas dizendo - e percebe-se que os destinatários são os, grandes hipermercados e não os pequenos retalhistas - que, se há possibilidades de pôr um código de barras, também há a obrigação de pôr lado a lado o preço em dígitos, indo assim ao encontro dos dois grandes interesses: os dos pequenos retalhistas, que nunca usam código de barras, e são muitos, infelizmente, em Portugal, e os interesses dos consumidores, e são muitos mais, que em grandes hipermercados encontram o código de barras, encontram um preço exposto numa grande prateleira, que às vezes podem não saber ler bem, mas é legal face à actual lei, e passam a ter, uma vez que há código de barras, o preço em dígitos na etiqueta ao lado do código de barras ou na própria etiqueta onde está o código de barras. Esta é a alteração que proponho.
Quanto ao mais, eu não tocaria na lei e tudo o mais no seu diploma não vale a pena, porque há uma questão de fundo que é importante: há uma nova directiva, que é conhecida de todos, que é preciso transpor até ao próximo ano, o mais tardar em 18 de Março do ano 2000, directiva essa do Parlamento Europeu e do Conselho de 16 de Fevereiro de 1998, Directiva n.º 98/6-CE, relativa à defesa dos consumidores em matéria de indicação dos preços dos produtos oferecidos aos consumidores.
Esta directiva pouco ou nada vem adiantar relativamente às directivas anteriores e ao nosso decreto-lei, que já transpôs as directivas anteriores, mas a fórmula que eu sugeri é já uma maneira de transpor aquela que, para mim, é a norma fundamental da nova directiva a transpor no futuro, que diz, no seu artigo 4.º, que u0 preço de venda e o preço por unidade de medida devem ser inequívocos, facilmente reconhecíveis e perfeitamente legíveis". Se bem reparou, a redacção que eu propus já vai ao encontro desta pretensão, que, aliás, já está na lei portuguesa através de fórmulas semelhantes, quando propus que se acrescentasse um número referindo que o preço total deverá constar em dígitos de forma facilmente reconhecível e perfeitamente legível.
E mais não digo a não ser louvar-lhe o propósito, convencido de que, todavia, no método podemos melhorar.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, não se trata de um pedido de esclarecimento, mas apenas para dizer que há um lapso no nosso projecto de lei e essa é uma das razões que pode suscitar equívoco. Refiro-me, concretamente, ao n.º 1 do artigo 1.º - aliás, o Sr. Deputado suscitou essa questão - onde deverá figurar, em vez de "(...) deve dele constar obrigatoriamente (...)", "(...) deve dela constar obrigatoriamente (...)", o que altera completamente o sentido.
Sr. Deputado Calvão da Silva, é evidente que o código de barras é um < livre trânsito", tem uma função determinada quando a leitura óptica é feita e, porque essa leitura é feita com uma determinada programação, é o momento em muitas das situações em que o preço surge visível.
Portanto, o objectivo do código de barras não é o de conter o preço, mas ele aparece associado ao preço e no momento último da compra, que é o momento do pagamento, desvirtuando aquilo que, do nosso ponto de vista, deve ser feito, ou seja, o preço deve aparecer no momento em que o consumidor faz a sua escolha.
Em segundo lugar, Sr. Deputado, no artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 138/90, que refere as formas de indicação do preço, o n.º 1 é claro, mas parece-me que a sua clareza deixa de existir não só por questões que têm a ver com falhas de fiscalização mas também, penso eu, porque a formulação do próprio enunciado, no que se refere ao letreiro, à etiqueta e à lista, tal como estão concebidas nas três alíneas do n,0 2, gera confusão. É que se dá por adquirido que o simples facto de estar associado ao código de barras, porque é feita a leitura óptica e aparece o preço, é uma forma de ter o preço marcado, ou seja, de cumprir a lei. E julgo que não 'se cumpre a lei!
Portanto, nesse sentido, pergunto-lhe se, em seu entendimento, não é aqui, nesta caracterização que é feita, em termos de formas de marcação do preço e de indicação clara do preço, que reside o problema e a transformação a fazer.
É evidente que há uma questão de fundo, que é a de saber se se deve caminhar no sentido de alterar o diploma ou de o complementar com um outro diferente. Mas essa é uma questão diferente, a partir do momento em que a proposta assume a forma de iniciativa parlamentar, isto é, de projecto de lei, e não do Governo.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Calvão da Silva.
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, tenho muito gosto em dialogar
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consigo, é sempre interessante, e sobre esta matéria julgo que começamos a poder encontrar-nos num ponto.
Acredito que seja lapso a redacção do artigo 1.º que propõem, no que se refere à palavra "dele" ou "dela". Só que, a partir do momento em que se refere a palavra "dele", já fica sem grande valor todo o resto da redacção do artigo e também a própria motivação, constante daquela passagem que, há pouco, li. E por quê? Penso que a questão, e parece-me que isso está no espírito do autor ou da autora do projecto, é a seguinte: vamos a um grande supermercado, há uma prateleira enorme, o preço só está marcado uma vez e estão lá 100, 500, 1000 ou 2000 unidades. Mas o preço tem de estar lá, porque, se não estiver, isso é ilegal, qualquer inspecção o detecta e será levantado o auto, com tudo o que se lhe segue. Portanto, o consumidor, teoricamente, pode saber o preço porque está marcado, não está no código de barras, não está em cada uma das unidades mas está marcado e é lícito ou, pelo menos, legal que assim seja, em face do n.º 5 do artigo 5.º da actual lei. Sendo os produtos todos iguais, as pessoas compram um deles e o preço é igual em todos. Isso é legal, o n.º 5 do artigo 5.º do decreto-lei permite um único preço para 500 ou milhares de produtos. Portanto, o preço está lá, ó consumidor é que, às vezes, distraidamente, pode não o ler.
Assim, de duas, uma: ou eliminamos, pura e simplesmente, este n.º 5 ou, a manter-se, então, vamos ao encontro da pretensão da Sr.ª Deputada, que me parece legítima. E, na medida em que cada uma das unidades tem um código de barras, por que não a etiqueta indicar, em dígitos, o preço? Isto é claríssimo! Não vai "chatear" ou aborrecer - sobretudo porque isso é quase impraticável no país que somos, no país que temos - os pequenos retalhistas; que não têm código de barras nem etiquetas e têm só um preço para todas as unidades, o que é obrigatório, e, ao mesmo tempo, onde isso é praticável e viável, protege mais e melhor o consumidor, exigindo, na etiqueta, junto ao código de barras, o preço em dígitos. Parece-me que isto é muito claro, se viável, se praticável. Estou consigo nesta parte, na outra não posso estar.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.
O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Com o projecto de lei n.º 588/VII, o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes pretende que sempre que os preços sejam colocados nos produtos através de etiqueta contendo o código de barras deve dele constar, obrigatoriamente e de forma visível, em dígitos, o preço total correspondente. O objectivo é o de que o consumidor possa conhecer o montante exacto que tem a pagar, tipificando o incumprimento de tal obrigação como ilícito de mera ordenação social punível com coima de 500 000$ a 5 000 000$, tratando-se de pessoa singular, e de 1 000 000$ a 200 000 000$, tratando-se de pessoa colectiva.
Trata-se, pois, de uma iniciativa legislativa globalmente positiva e meritória, tendo em conta os fins que visa atingir, já que o seu desiderato último é o de criar condições para que os consumidores possam exercer a suas opções de consumo de forma consciente, livre e esclarecida.
O direito à informação em geral e em particular constitui um dos direitos fundamentais dos consumidores que mereceu a tutela constitucional no artigo 60.º da Constituição da República Portuguesa e assumiu sempre, entre nós, a posição de um dos mais elementares direitos dos cidadãos.
Para o Partido Socialista, a protecção e promoção dos interesses e dos direitos dos consumidores constitui um dos eixos fundamentais da sua acção governativa. E podemos mesmo atrever-nos a dizer, sem receios, que o Governo da nova maioria foi aquele que até hoje mais se preocupou com o reforço efectivo da política de consumidores no nosso país.
Em matéria de protecção dos consumidores, o actual Governo assumiu com os portugueses o compromisso de redignificar a intervenção do Estado em defesa do cidadão consumidor, estabelecendo neste domínio um vasto conjunto de objectivos prioritários, dos quais nos permitimos destacar os seguintes: o aumento da informação aos consumidores, designadamente por via da rotulagem e das instruções de uso, a fim de o habilitar melhor para a escolha e para a boa utilização do que adquire; a concretização do direito de participação e representação dos consumidores; o reforço da consciência social da ilicitude de comportamentos contrários aos interesses e direitos do consumidor; o aumento dos meios de acção e coordenação de esforços dos serviços oficiais de inspecção económica; o controle efectivo da legalidade das mensagens publicitárias.
Estes são alguns dos nossos compromissos com os portugueses em matéria de protecção dos consumidores, os quais o Governo tem vindo, progressivamente e com o apoio dó movimento associativo, a implementar no nosso pais.
Com efeito, ao longo dos últimos três anos, o Governo tem vindo, no estrito cumprimento do seu Programa, a adoptar medidas concretas e cuja eficácia é inquestionável em cumprimento destes objectivos.
Esta Câmara teve a oportunidade de aprovar, em 1996, a nova Lei de Defesa do Consumidor, instrumento jurídico fundamental à defesa dos direitos e interesses dos consumidores.
Aprovámos, igualmente, nesta Assembleia a lei relativa aos serviços públicos, que, dando cumprimento às justas e legítimas aspirações dos consumidores, contribuiu para que estes passassem a deter uma nova posição, agora mais reforçada, face aos serviços públicos, de que se destaca a facturação detalhada e a proibição do corte do serviço essencial sem aviso prévio ao consumidor.
A estas acrescem ainda outras iniciativas legislativas de grande importância, já aprovadas, e que reforçam o direito dos consumidores à informação, como seja a relativa aos contratos de seguro automóvel facultativo, publicidade domiciliária, publicidade de produtos .e serviços milagrosos e afixação dos preços por algumas categorias de prestadores de serviços.
Trata-se, pois, de um vasto conjunto de medidas que vimos adoptando em matéria de informação e de política de protecção do consumidor, prevendo-se para o corrente ano a concretização de outras que assumem igual relevo, das quais se destaca a apresentação de uma proposta de código do direito do consumo e o reforço da política de informação e educação do consumidor, tendo em vista a sua consciencialização e o melhor conhecimento dos seus direitos.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - Nesta perspectiva, discutimos o projecto de lei n.º 588/VII com grande abertura e sensibilidade vias,
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ao mesmo tempo, com aprofunda convicção de que a sua aprovação, tal como nos é apresentado, pouco contribuirá para uma efectiva melhoria do acesso à informação por parte dos consumidores.
A iniciativa legislativa vertente, ao contrário do que parece resultar da sua epígrafe, não se dirige genericamente à obrigatoriedade da afixação dos preços de todos os produtos em dígitos mas apenas ao caso particular em que, relativamente a determinado produto, conste apenas afixação magnética em código de barras do respectivo preço.
Por outro lado, embora reconheçamos louvável o propósito dos autores do projecto de lei em discussão, importa determinar se, em face da lei vigente, ele se justifica.
Quanto a esta questão, consideramos que o regime jurídico vigente relativo à afixação de preços, estabelecido no Decreto-Lei n.º 138/90, de 26 de Abril, é bastante equilibrado, sendo certo que a sua modificação se irá impor com vista ao cumprimento das obrigações nacionais resultantes da aprovação da Directiva n.º 98/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, a qual veio criar a obrigatoriedade geral, num prazo fixado, de indicação do preço de venda e do preço por unidade de medida, salvo os produtos vendidos a granel.
Neste sentido, estão já em fase de preparação um conjunto de propostas de alteração ao Decreto-Lei n.º 138/90, já discutidas com o movimento de consumidores no âmbito do Conselho Nacional de Consumo, com vista à adequação do diploma à directiva comunitária.
Com efeito, nos termos deste decreto-lei de 26 de Abril, todos os bens destinados a venda a retalho devem exibir o respectivo preço de venda ao consumidor (artigo 1.º), sendo que a indicação dos preços deve ser feita de modo inequívoco, fácil e perfeitamente legível, através da utilização de letreiros, etiquetas ou listas, com insta a possibilitar-se a melhor informação aos consumidores (artigo 5.º, n.º 1).
Ora, se um determinado produto possui apenas uma etiqueta da qual consta um código de barras susceptível apenas de o seu teor ser lido por meios magnéticos, não constando da mesma ou de um letreiro colocado na proximidade o respectivo preço, estamos perante uma situação em que o comando legal não está a ser cumprido pela entidade vendedora, incorrendo esta numa omissão de indicação do preço, punível nos termos do disposto no artigo 64.º, n.º 1, alínea d), do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro. Ou seja, a referência a um preço através de uma mera inscrição numa etiqueta de um simples código de barras não constitui, face ao regime jurídico vigente, uma indicação suficientemente legível, porquanto não imediatamente perceptível pelo consumidor, o que constitui uma manifesta violação do direito à informação, violação, essa, já hoje punível nos termos legais referidos.
Por outro lado, o projecto de lei vertente encerra, na nossa perspectiva, uma confusão, já que visa que, no código de barras, cuja função é identificar o produto e funcionar como instrumento de gestão de stocks e racionalização dos fluxos de mercadorias, seja introduzido, em dígitos, o preço do produto. Com efeito, a obrigatoriedade da afixação de preços e o código de barras são duas realidades com finalidades distintas que não podem confundir-se.
O código de barras funciona como "bilhete de identidade" de um produto e quando a leitura óptica é feita o programa informático identifica o produto e vai ler numa base de dados a informação que lhe corresponde, designadamente o preço. É, pois, por esta razão que o código de barras se mantém inalterado, independentemente das variações do preço do produto.
O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!
O Orador: - O código de barras, cuja criação, nos Estados Unidos, remonta a 1973, expandindo-se posteriormente pelos países europeus, tem como finalidade essencial, obedecendo a normas internacionais, a identificação de todo e qualquer produto em qualquer parte do globo, desde a indústria até ao consumidor final.
De facto, com 13 dígitos, em barras e espaços, o código de barras não tem a ver directamente com o preço do produto. Os seus campos numéricos começam por incluir o código do país, a que correspondem os primeiros três dígitos, os quatro dígitos seguintes têm a ver com o número atribuído à empresa, os cinco dígitos seguintes referem-se à identificação do produto ou do item e o último dígito é de controlo, visando detectar possíveis erros de simbolização.
Para além deste aspecto, que consideramos importante ter presente, existe um outro relativamente ao qual não podemos ficar insensíveis. É que o código de barras, instrumento de gestão, apenas pode ser utilizado em estabelecimentos que disponham de terminais de pontos de venda, igualmente conhecidos por POS, e que a eles sejam conectados equipamentos ópticos destinados à sua leitura, o que significa que poucos são os retalhistas que dispõem deste equipamento instalado. Ou seja, por um lado, nem todos os produtos contêm o código de barras e, por outro, muitos estabelecimentos, por falta do equipamento adequado, não fazem dele qualquer uso.
Acresce ainda dizer, quanto ao regime sancionatório preconizado no projecto de lei em discussão, que o mesmo se nos afigura desproporcionado, podendo gerar situações de injustiça, já que não tem em linha de conta o quadro sancionatório vigente, acabando por sancionar mais gravosamente condutas menos graves, do ponto)de vista do incumprimento do direito à informação.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Assim, pensamos que a motivação que presidiu a este projecto de lei não tem suporte legal, no que concerne à suposta invocada omissão de enquadramento da situação que visaria regular no Decreto-Lei n.º 138/90.
No entanto, e para que o sentido da lei seja de todo inequívoco, pensamos que é necessária a alteração ao já citado decreto-lei, por via do seu ajustamento à Directiva n.º 98/6/CE que impõe a fixação de dois preços, e que seja considerada uma formulação técnica acordada com as associações, das entidades envolvidas, por forma a contemplar o objectivo que este projecto ambiciona.
Em nosso entender, o código de barras não deverá ser o suporte adequado, já que ele é simplesmente um instrumento de gestão criado pela sociedade civil em associação internacional.
Numa nova redacção para o diploma legal em vigor, deveria fixar-se claramente uma obrigatoriedade geral, faseada, de fixação de preços e, igualmente, deveriam ajustar-se os montantes das coimas para haver harmonia e poderem desempenhar o seu papel dissuasor com vista à punição e prevenção.
A nossa análise sobre esta matéria é a da sua coerência global, acordada com as partes envolvidas, e não um remendo burocrático que não atinge o essencial.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente (João Amaral): - Muito bem, Sr. Deputado! Finalmente, explicou-nos o que é o código de barras, porque era um mistério, um perfeito mistério.
Risos.
Ficámos a saber que vem dos americanos. Aliás, até podia perguntar ao Sr. Deputado José Magalhães se será alguma coisa relacionada com o NSA! ...
Risos.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, há uma questão que gostaria de clarificar.
Penso que o nosso projecto não estava claro, suscitou dúvidas nas várias bancadas e voltou a suscitá-las também na bancada do Partido Socialista, pelo que será, seguramente, defeito meu, pela forma de explicitar ou pela "Exposição de motivos".
Em primeiro lugar, temos para nós que o código de barras é um "livre-trânsito" que resolve muitas coisas e solucionou de forma muito prática um conjunto de questões e, portanto, não está em causa a sua alteração. Tão pouco está em causa, com o nosso projecto de lei, pois não era isso que visávamos ou que, na prática, pretendíamos, que todos os códigos de barras tenham, necessariamente, a indicação do preço, para além da outra informação contida. Aliás, isso significaria que a nossa preocupação em relação aos consumidores se circunscrevia só a determinados estabelecimentos e não à sua maioria, quando temos consciência de que há um conjunto muito grande de outros locais de venda que não tem equipamento adequado e, por isso, não vende produtos com códigos de barras. Portanto, não é ai que se coloca o problema.
O que pretendemos - é este o preciso sentido do nosso projecto é que os produtos, independentemente de terem ou não um código de barras, tenham sempre um preço Visível, na perspectiva que para nós é importante que é a da livre escolha dos consumidores, ou seja, a de permitir que, no acto de compra, o consumidor tenha acesso a toda a informação.
Assim, não contesto que foi dado um conjunto grande de passos em matéria de defesa do consumidor - aliás, os passos serão sempre grandes a partir do momento em que partimos do zero e, nesta matéria, têm sido feitas alterações. Temos, para nós, que a situação actual, tal como está prevista no Decreto-Lei n.º 138/90, não chega, só por si, para ultrapassar o problema. E não se consegue ultrapassar, não só pela ausência de fiscalização mas porque há mecanismos, que, na altura, não foram pensados, que garantam a informação a todos os produtos que são vendidos.
Por isso, pergunto-lhe, Sr. Deputado, se o Partido Socialista estaria de acordo com uma solução que obrigasse a que todos os produtos, sem excepção, tivessem obrigatoriamente, em dígitos, o preço visível, independentemente de terem ou não, como no caso de produtos com código de barras, o preço incorporado. Pergunto se essa seria uma via de ultrapassar aquilo que, do nosso ponto de vista, é uma situação prejudicial para os consumidores.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.
O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Presidente,
Sa
r. Isabel Castro, agradeço a sua pergunta e também a clarificação que já aqui foi feita, porque, de facto, algumas das críticas que fizemos foi no pressuposto de que estava a ser utilizado o código de barras para um fim que pensamos que não era o adequado.
De qualquer forma, o problema que está em debate tem de ser visto sob vários aspectos, sendo um deles a inexistência de preço. Isso é ilegal e cremos que não é um projecto de lei como este que irá resolver o problema da inexistência de preço e esse preço definido por qualquer das formas possíveis: letreiro, etiqueta ou lista, conforme o instrumento mais adequado em função do próprio produto.
Outro aspecto é o de saber se, existindo letreiro, aquilo que se quer resolver é o problema da inexistência de preço no produto, que pensamos ser neste momento legal.
Pela nossa parte, entendemos que este é um problema complexo, porque, nas grandes superfícies, como é do seu conhecimento, praticam-se regularmente acções de promoção e é aí que, segundo tenho tido conhecimento através da imprensa, se vão identificando diferenças entre um preço e outro.
Portanto, apesar de se tratar de um problema que, á primeira esta, pode parecer de fácil resolução, estamos disponíveis para ouvir as diferentes associações envolvidas neste tipo de actividade. Estamos disponíveis, como já aqui foi dito, em sede de revisão do Decreto-Lei n.º 138/90, revisão que está para breve, até pelas exigências que já foram ditas pelo Sr. Deputado do PSD, para importar a normativa comunitária, para analisar a questão da etiqueta e do letreiro, no sentido de, cada vez mais, o consumidor ter melhor informação.
De qualquer forma, das consultas que fizemos, entendemos que é um problema que tem de ser suficientemente regulamentado para não criarmos um processo muito burocrático de, a todo o momento, terem de ser alterados os preços em resultado de uma campanha, porque as grandes superfícies têm campanhas especiais e a fixação do preço no produto podia criar alguma confusão, em contradição com o próprio letreiro, que, em cada momento, poderia estar em dissonância com a marcação individual.
Trata-se de algo que é complexo, mas, pela nossa parte, estamos disponíveis para analisar a alteração neste aspecto, no sentido de podermos melhorar e facilitar a vida ao consumidor. Porém, temos também de ter em atenção as preocupações decorrentes do acréscimo de trabalho burocrático que esta situação poderia conduzir sempre que houvesse campanhas ou promoções especiais.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei que agora apreciamos insere-se numa realidade, que é a existência de uma grande pressão para o consumo na nossa sociedade e a de existirem armas desiguais entre algumas das entidades, nomeadamente as grandes superfícies comerciais, estes por um lado, e, por outro, o consumidor, que têm armas muito limitadas face a algumas ofensivas que, por vezes, lhe são dirigidas.
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É por isso que é preciso defender os cidadãos, é preciso defendê-los de algumas campanhas de marketing mais agressivas e da publicidade enganosa, conforme a legislação prevê; é preciso defendê-los das técnicas subliminares de venda que, por vezes, também se aplicam nestes estabelecimentos; e é preciso também defendê-los das habilidades, dos truques, com a inscrição do preço de determinados produtos, que existem, muitas vezes, e que levam a que existam, na prática, prejuízos para os consumidores, que se vêem enganados em relação ao preço que esperariam ser aquele que correspondia ao produto que vão comprar, o que muitas vezes não se verifica.
Portanto, a importância do direito à informação clara e eficaz é muito grande neste quadro, porque são, por nós todos, provavelmente, conhecidas situações de promoções que, afinal, não se verificam quando o produto é registado na caixa registadora, de preços de pacotes que acabam por não se verificar, o que indicia a necessidade de avançarmos um pouco mais na explicitação dos preços em todas as situações, no sentido que tem estado a ser dito.
É, pois, necessário que se avance neste sentido para aumentar a possibilidade de controlo por parte dos cidadãos do produto que compram, desde o momento em que o seleccionam até ao confronto na caixa registadora, no sítio onde vão fazer o pagamento, onde vão, ao fim e ao cabo, celebrar o contrato de compra e venda, que é, muitas vezes, um local onde não é possível, para o consumidor, aferir da discrepância ou não do preço que surge no visor da caixa registadora em relação àquilo que, supostamente, viu no expositor onde o produto se encontrava.
Portanto, julgamos que este projecto é uma contribuição muito válida neste sentido, de forma a acrescentar à garantia do direito à informação aos consumidores mais uma arma de que dispõem para a sua defesa, face às técnicas e às irregularidades utilizadas, por vezes, por algumas entidades e estabelecimentos comerciais.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Augusto Boucinha.
O Sr. Augusto Boucinha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 588/VII, da iniciativa da Sr.ª Deputada Isabel de Castro, do Partido Ecologista Os Verdes, que propõe que se torne obrigatório a afixação do preço dos produtos em dígitos, também merece do Partido Popular o melhor acolhimento.
Com efeito, o Decreto-Lei n.º 533/75, de 26 de Setembro, regulou a indicação dos preços de venda a retalho de géneros alimentares e não alimentares e de serviços, tão necessária à protecção dos consumidores e a uma sã e leal concorrência empresarial. Desde aquela data que o mercado sofreu acentuadas alterações que, como reflexo numa cada vez maior exigência de transparência informativa, bem como as obrigações que para o Estado português decorreram da adesão à União Europeia, justificou que se procedesse à reformulação desse ordenamento jurídico.
Assim, com o Decreto-Lei n.º 138/90, de 26 de Abril, proeurou-se, tendo em conta a evolução do comércio em geral, introduzir melhorias substanciais no Decreto-Lei n.º 533175, de 26 de Setembro, refinou-se o controlo, disciplinou-se o comércio e algumas das medidas introduzidas revelaram-se benéficas para o consumidor.
Com o projecto de lei ora em apreço, pretende introduzir-se mais alguns melhoramentos de forma a conferir uma maior simplicidade e clareza dos preços de venda a retalho de géneros alimentares e não alimentares e de serviços. E por que não tornar extensivo também aos preços de venda por grosso? É de todos conhecida a facilidade com que qualquer consumidor tem hoje no acesso à aquisição de produtos por grosso nos, mais diversos locais onde se pratica tal comércio. Também sabemos que, neste caso, os produtos em prateleira não contêm todos os custos, nomeadamente o IVA. A não inclusão deste imposto distorce a análise comparada de preços que qualquer consumidor faz muitas vezes ao percorrer vários grossistas ou retalhistas, tendo dificuldade em comprar onde é mais barato.
Ora, a indicação dos preços de venda em qualquer espaço comercial deve ser feita de modo inequívoco, fácil e perfeitamente legível, através da utilização de letreiros, etiquetas ou listas, por forma a alcançar-se a melhor informação para que o consumidor decida da forma que melhor entender.
É hoje prática corrente que, por razões de natureza técnicas ou por maior facilidade de manuseamento, a maior parte, se não mesmo a totalidade dos produtos comercializados, quer no mercado retalhista, quer no mercado por grosso, dos preços vêm identificados pelo código de barras, de leitura fácil para as máquinas mas inacessível para o consumidor, não fornecendo a indicação correcta do verdadeiro preço da mercadoria e, pior que tudo, prestando-se a todo o tipo de fraudes.
Na verdade, o código de barras existente nos rótulos dos vários produtos não podem ser assumidos como um meio de indicação do preço mas, sim, como um meio de identificação do produto que se encontra no seu rótulo e que não é da responsabilidade das superfícies comerciais. Esse mecanismo de identificação do produto possibilita aos comerciantes, por grosso e de retalho, uma mais eficaz gestão de stocks por via de softwares apropriados. Neste sentido, os códigos de barras não podem ser vistos como meios de indicação de preços.
Por tudo isto, é aceitável uma iniciativa deste género, na medida em que são vulgares, geralmente nas grandes superfícies, casos em que os consumidores se apercebem na caixa, aquando do pagamento, ou em casa, através do talão, que o preço pelo qual determinado produto foi efectivamente adquirido não era aquele que julgavam ter esto no letreiro, no cartaz, na lista ou na etiqueta do estabelecimento comercial.
No entanto, tendo presente os objectivos do Partido Ecologista Os Verdes, com este projecto de lei, tal consubstanciar-se-ia na obrigatoriedade da utilização de etiquetas em todos os produtos, o que, com certeza, acarretaria enormes custos para as superfícies comerciais, que, para além de terem de etiquetar todos os produtos através de um processo qualquer, mecânico ou manual, teriam que as alterar sempre que levassem a cabo qualquer promoção. Julgo serem estas as razões pelas quais a legislação nacional, inspirada nas normas comunitárias, prevê não só a utilização de etiquetas mas também a possibilidade de utilização de letreiros, salvaguardado o disposto no n.º 4 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 138/90.
A técnica legislativa aconselharia que, em vez de um diploma avulso, tal projecto, dada a pertinência e oportunidade que também consideramos, deveria ter como objectivo a introdução desta alteração no Decreto-Lei n.º 1381 90, local apropriado para especificar um dos elementos que
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consideramos essenciais para complementar o código de barras, tendo em conta o acumular de diplomas que dificulta e complica o fácil acesso e consulta do cidadão comum.
Tendo em conta estas considerações, julgo que seria aconselhável que fossem ponderadas as possíveis vantagens e desvantagens deste projecto de lei. Poder-se-ia evitar a proliferação de mais legislação na matéria, podendo, antes, considerar-se alterações ao Decreto-Lei n.º 138/90. Por outro lado, poderiam ser ponderadas outras soluções que passassem, por exemplo, pela obrigatoriedade, em grandes superfícies, da existência de um maior número de mecanismos para leitura de códigos de barras que permitissem aos consumidores, em caso de dúvida na leitura dos letreiros existentes, a verificação do preço de venda dos
produtos em questão.
Porém, pese embora a bondade do projecto de lei em apreço e da melhoria que tal projecto traria ao referido decreto-lei, julgamos tornar-se necessário o aumento da fiscalização por parte dos organismos vocacionados para tal função. E isto porque entendemos que o Decreto-Lei n.º 138/90, a ser cumprido, e com estas alterações introduzidas, em muito beneficiaria os consumidores e tornaria os preços dos produtos muito mais acessíveis e transparentes.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o 9r. Deputado Calvão da Silva.
O Sr. Calvão da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas dizer que uns dos valores fundamentais que, como jurista, devo praticar e não só ensinar - perdoem-me a repetição - é a praticabilidade de qualquer medida que se tome. E aquilo que sugeri na minha intervenção anterior é agora completado, uma vez que, concluído o debate, não colhi elementos que me convencessem. Tudo o que disse foi dito sob ressalva da praticabilidade. Ou seja, onde houver código de barras o preço será indicado em dígitos na etiqueta se isso for praticável. Isto implica, obviamente, um pleno conhecimento de causa, ouvindo as associações do sector, para saber se esta medida, que, teoricamente, gostaria que fosse possível, é praticável.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que há, relativamente a este debate, alguns aspectos a reter. Julgo que é consensual - e o PP colocou esta questão agora - que a legislação actual, tal
como existe, independentemente de poder e dever ser feito um esforço em termos da fiscalização, só por si, deixa algumas lacunas e estas têm a ver, do nosso ponto de vista, não só com a constatação que o Partido Socialista faz
de que a inexistência de preço é ilegal mas também o facto de a legislação actual permitir considerar que existe preço - ou seja, há uma situação legal - quando, eventualmente, esse preço surgir só na caixa, associado a um código dos:
de barras.
Portanto, julgo que é nesta situação em concreto que reside hoje um dos escapes para os preços não serem visíveis para os consumidores de uma forma nítida, no exacto momento em que, perante uma estante cheia de produtos que querem escolher, não têm possibilidade de comparar os preços e ter acesso à informação que -. e julgo que isto é consensual, em relação a todos - é imprescindível, na perspectiva dos interesses económicos dos consumidores.
Temos, pois, por certo que este diploma poderá melhorar, naturalmente, se se ouvirem outras associações e se se promover uma audição de entidades ligadas aos direitos do consumidor, as quais podem dar, do seu ponto de Vista, uma perspectiva da questão suscitada pelo PSD, ou seja, a da praticabilidade ou não da proposta feita.
Gostaria de dizer, no fim deste debate, que, não tendo nada a opor a que se enriqueça um projecto que pode não ser claro e a que se encontre a melhor forma de fazer aquilo que, no fundo, é a razão de ser da apresentação de um diploma, ou seja, que o mesmo tenha condições de passar para a nossa vida diária, não gostaríamos que este diploma ficasse na gaveta. Gostaríamos, pois, de poder enriquecê-lo, de chegar a uma plataforma de entendimento para algo que julgo ser consensual entre todas as bancadas que se pronunciaram, mas que isso não servisse de "veto de gaveta", como, por excesso de trabalho ou por outras razões, muitas vezes ocorre.
Como tal, nesse exacto sentido, penso que poderíamos trabalhar para aperfeiçoar um diploma que, sendo uma iniciativa legislativa, tem de ser tratado enquanto tal e não pode caminhar noutro sentido, ou seja, considerando-se hoje que teria sido melhor que a lei da iniciativa do Governo fosse diferente. É o que é e, neste momento, nove anos depois, julgo que há condições para incorporar aquilo que a directiva trará de novo - e também já foi referido que a directiva não traz muitas mais-valias à situação actual -, mas, do ponto de vista de Os Verdes, seria bom que se caminhasse, ouvindo as entidades que podem dar um contributo para enriquecer um projecto que visa aquilo que me parece ser importante, ou seja, reforçar os direitos dos consumidores.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, dado não haver mais inscrições, terminámos a ordem de trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária realiza-se amanhã. Às 10 horas e 30 minutos, haverá uma sessão solene comemorativa do nascimento de Almeida Garrett, às 16 horas e 30 minutos, uma sessão solene de boas-vindas ao Sr. Presidente da República Francesa e, às 17 horas, um período de antes da ordem do dia, do qual consta um debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre a situação do sector suinícola em Portugal, e, no período da ordens do dia, teremos a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 183/VII - Define as bases gerais a que obedece o estabelecimento, gestão e exploração de serviços postais no território nacional, bem como os serviços internacionais com origem ou destino no território nacional, bem como votações à hora regimental.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 10 minutos.
Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados.
Partido Socialista (PS):
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
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Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Partido Social Democrata (PSD):
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
António Bento da Silva Galamba.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Eduardo Ribeiro Pereira.
João Pedro da Silva Correia.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raúl d' Assunção Pimenta Rêgo.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.
Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
João Álvaro Poças Santos.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):
Pedro José Dei Negro Feist.
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Maria Odete dos Santos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.
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DIÁRIO da Assembleia da República
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