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Sexta-feira, 12 de Fevereiro de 1999
I Série - Número 47

VII LEGISLATURA
4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE FEVEREIRO DE 1999

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Exmos. Srs. José Ernesto Figueira dos Reis
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei n.os 237 a 239/VII e dos projectos de lei n.os 615 a 619/VII.
Ao abrigo do artigo 76. º, n.º 2, procedeu-se ao debate, requerido pelo PCP, sobre a Agenda 2000. Após o Sr. Deputado José Saraiva ter procedido à apresentação do relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Jaime Gama), os Srs. Deputados João Amaral (PCP), Manuel dos Santos (PS), Carlos Encarnação (PSD), Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Isabel Castro (Os Verdes), António Brochado Pedras (CDS-PP), Octávio Teixeira e Lino de Carvalho (PCP), António Martinho (PS), Luís Marques Guedes e Francisco Torres (PSD), Joel Hasse Ferreira (PS), Guilherme Silva (PSD), Medeiros Ferreira (PS) e Artur Sousa Lopes (PS).
No encerramento do debate, usaram da palavra, além do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (Seixos da Costa), os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Octávio Teixeira (PCP), António Brochado Pedras (CDS-PP), Azevedo Soares (PSD) e Medeiros Ferreira (PS).
Entretanto, foram aprovados os projectos de resolução n.os 112/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 332/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 64/VII (PSD), 113/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 333/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 65/VII (PSD), e 114/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 334/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 66/VII (PSD), e rejeitados os n.os - 115/VII - Cessação da vigência do

Decreto-Lei n.º 335/98, de 3 de Novembro (PSD) (apreciação parlamentar n.º 67/VII (PSD), 116/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 336/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 68/VII (PSD), 117/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 337/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 69/VII (PSD), 118/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 338/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 70/VII (PSD) e 119/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 339/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 71/VII (PSD).
Mereceu ainda aprovação, na generalidade, a proposta de lei n.º 183/VII - Define as bases gerais a que obedece o estabelecimento, gestão e exploração de serviços postais no território nacional, bem como os serviços internacionais com origem ou destino no território nacional.
Finalmente, a Câmara aprovou, em votação final global, as propostas de alteração, aprovadas na especialidade peta Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativas ao Decreto-Lei n.º 115-A/98, de 4 de Maio, que aprova o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como dos respectivos agrupamentos [apreciação parlamentar n.º 52/VII (PCP).
Finalmente, foi aprovado o voto n.º 146/VII - De pesar pelo falecimento da pintora Maluda, tendo a Câmara guardado, de pé, um minuto de silêncio. Produziram intervenções, além do Sr. Presidente, os Srs. Deputados António Brochado Pedras (CDS-PP), Teresa Patrício Gouveia (PSD), Fernando Pereira Marques (PS), Isabel Castro (Os Verdes) e António Filipe (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 20 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes Dias.
António Manuel Carmo Saleiro.
Armando Jorge Paulino Domingos.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Casimiro Francisco Ramos.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Pedro da Silva Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís António do Rosário Veríssimo.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Ferreira Jerónimo.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Eduarda Bento Alves Ferronha.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge Lúcio Arsênio.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Bagos e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Sónia Ermelinda Matos dá Silva Fertuzinhos.
Victor Brito de Moura.

Partido Social Democrata (PSD):

Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António d'Orey Capucho.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho. Arménio dos Santos.

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Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandès Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Póvoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Carlos Brochado de Sousa Pedras.

Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Rui Manuel Pereira Marques.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

Alexandrino Augusto Saldanha.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodela Machado.
António Luís Pimenta Dias.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Carmem Isabel Amador Francisco.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Deputado independente:

José Mário de Lemos Damião.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os seguintes diplomas: projectos de lei n.os 620/VII - Criação da rede pública de casas de apoio a mulheres vítimas de violência (Os Verdes), que baixou à 11.ª Comissão, 621/VII - Elevação à categoria de vila da povoação de Santa Luzia, no município de Tavira (PSD), que baixou à 4.ª Comissão, e 622/VII - Altera o regime de instalação de novos municípios previsto na Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro, para a situação de não ocorrência de eleições em prazo curto (PCP), que baixou à 4.ª Comissão; propostas de lei n.os 241/VII - Regula a utilização de meios técnicos e controlo à distância para fiscalização do cumprimento da obrigação de permanência na habitação prevista no artigo 201.º do Código de Processo Penal, que baixou à 1.ª Comissão, e 240/VII Autoriza o Governo a legislar em matéria de direito de autor e direitos conexos.

O Sr. Presidente: - Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados,; deu entrada na Mesa, está a ser dactilografado e vai ser distribuído um voto de pesar pelo falecimento da pintora Maluda. Aguardo a vossa concordância para que, hoje mesmo, em momento posterior, talvez no final dos trabalhos, se possa discutir e votar o voto.

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Vamos dar início ao debate requerido pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, sobre a Agenda 2000.
Para uma intervenção, na qualidade de Deputado relator da Comissão de Assuntos Europeus, tem a palavra o Sr. Deputado José Saraiva.

O Sr. José Saraiva (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A Assembleia da República é convocada para, no âmbito do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, promover uma abordagem sobre a Agenda 2000 - documento da Comissão Europeia, realizado a solicitação do Conselho Europeu e tornado público em 16 de Julho de 1997.
Este debate em Plenário surge, assim, oportuno e poderá constituir também o reforço da tomada de consciência pela Assembleia da República do que verdadeiramente está em jogo na mais difícil de todas as negociações políticas desde que Portugal é membro de pleno direito da União Europeia.
Registe-se, todavia, que a Comissão de Assuntos Europeus havia já decidido promover um conjunto de audições sobre a Agenda 2000 quando o Grupo Parlamentar do PCP propôs este debate, que se revela de grande momentâneidade.
O que se discute, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é um complexo dossier político que pretende marcar os próximos anos futuros da União Europeia - de 2000 a 2006 - e cujos traços identificadores se poderiam resumir num conjunto de interrogações implícitas na pergunta-chave: que políticas e que dinheiro temos para o ,que queremos?
Acresce que os sinais do comportamento político do euro, nestes primeiros dias de vida, se confortam os que estiveram na base do que foi necessário fazer para estar na primeira linha, como sucedeu com as autoridades de Portugal, nem por isso dissipam uma certa inquietação face a posições por vezes contraditórias dos nossos interlocutores, ou até mesmo irredutíveis dos nossos parceiros sobre a Agenda 2000.
Vejamos: a Comissão Europeia apresentou um documento base que aponta a despesa global da União Europeia para os sete anos e, simultaneamente, pretende alterar a repartição de verbas.
Justo é afirmar que se trata de um conjunto de três documentos - o documento-base, que acabei de referir, o Regulamento dos Fundos (de Março de 1998) e o Relatório sobre os Recursos Próprios da União (de Outubro de 1998) - matrizadores de um histórico cenário: a incorporação de povos. cujas elites outrora (note-se, ainda há menos de 10 anos) olhavam para a União Europeia como um bastião do capitalismo multinacional, que repudiavam, mas que hoje a olham ansiosos, vivendo o desejo de ascenderem a esse novo paradigma. político da Europa.
Este aspecto, o da adopção de novos Estados membros, que não é menos importante, deve estar sempre presente quando nos debruçarmos sobre o complexo dossier que é a Agenda 2000, que pretende marcar os próximos anos, no decorrer dos quais se procederá a um aprofundamento e alargamento da União Europeia. E este último, com certeza, será o mais significativo de toda a história comum contemporânea da Europa e, necessariamente, originará alterações institucionais - aliás, está já prevista, para o próximo ano, a abertura de uma conferência intergovernamental para o efeito - e deverá estabelecer um padrão de comportamento dos decisores de modo a que a «União seja mais forte e mais ampla».
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Sublinhemos que a questão do alargamento aparece, por agora, um tanto ao quanto «congelada», o que de todo pode vir a constituir um desânimo para os países candidatos que tudo têm feito para aderirem em breve, com esforços e sacrifícios que se reflectem nas próprias vidas dos povos.
Todavia, a negociação da Agenda 2000 deve ter em conta que ainda será possível a adesão de alguns países candidatos durante a sua vigência. No entanto, a pré-adesão aparece reforçada na agenda ao ser criado um novo instrumento - o partenariado para a adesão -, que proporcionará uma gestão programada plurianualmente, bilateral, integrada e coerente das verbas disponibilizadas para os países candidatos. Ou seja, para além do Programa Phare, propõe a Comissão, note-se, retirar dos fundos agrícola e estrutural contribuições que atingem 3000 mecu/ano.
Desde o seu aparecimento que a Agenda 2000 suscitou reacções emotivas, designadamente entre nós. O Governo e oposições, bem como diversas instituições responsáveis e personalidades, evidenciaram o seu protesto: Portugal ficava a perder, fundamentalmente, porque a Comissão Europeia se propunha manter inalterado o patamar financeiro - 1,27% do PIB, que corresponde, objectivamente, a 1,13% -, embora ampliasse as responsabilidades e, como é óbvio, também as despesas, designadamente as ajudas de pré-adesão.
A resistência de alguns países membros em não considerarem a possibilidade de aumentar os recursos próprios da União Europeia, com alguns mesmo a pedirem «o seu dinheiro de volta» ... - a lembrar o caso da Sr.ª Thatcher, noutros tempos! -, outros a protestarem perante a possibilidade de o princípio da coesão económica e social vir a ser atingido e, consequentemente, verem diminuídos os envelopes financeiros a que recorriam para superar dificuldades e atrasos e, desse modo, se aproximarem das médias de prosperidade da União Europeia.
Mais grave: das propostas da Comissão ficou claro que os países da «coesão» (Espanha, Grécia, Irlanda e Portugal) eram os mais sacrificados, visto que as acções estruturais iam diminuindo de 37% do total de despesas, no ano 2000, para 30,8% em 2006.

Em síntese, poderia dizer-se que a dificuldade reside no conflito entre quem paga mais e quem paga menos, ou entre países com graus diferentes de desenvolvimento, ou até mesmo, parafraseando Francisco Lucas Pires, podemos estar perante uma «luta entre os ricos do Norte e os pobres do Sul por causa do Leste».
Portugal tem sido coerente, e tem manifestado, sem hesitações, o apoio político aos que «batem à porta» dos 15, mesmo sabendo que pode vir a ser prejudicado.
Neste quadro, pode dizer-se que Portugal tem encontrado palavras de compreensão e de apoio para as suas legítimas reivindicações de não ver substancialmente afectado o nível de fluxos financeiros e de programas comunitários. E a perspectiva ensaiada por alguns sobre o facto de os países do euro não merecerem continuar a beneficiar da ajuda para a coesão é não só irrealista como moralmente injusta, se não mesmo perversa e claramente violadora dos princípios consignados no Tratado de Maastricht! Todos estamos de acordo.
Até Março de 1998, o debate praticamente assentou em generalidades, o que, aliás, ficou patente no tipo de conclusões a que se chegou no Luxemburgo. Aí, basicamente, deixou-se um tema em aberto, o binómio de recursos próprios/linha directriz agrícola, e apenas se assentou na

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dúpla programação para os 15 e para os candidatos. O restante da Agenda 2000 que evoluiu no Luxemburgo teve a ver com as decisões sobre o alargamento.
Apenas a partir de Março, com a apresentação do novo Mapa das Perspectivas Financeiras e dos Regulamentos dos Fundos (Geral, Feder, Fundo Social, IFOP e Fundo de Coesão), a verdadeira negociação começou, criando-se os «Amigos da Presidência» e «Conselheiros Financeiros» (dependente do ECOFIN) e «Desenvolvimento Rural» (este grupo dependente do Comité Especial Agricultura/Conselho de Agricultura).
O essencial da discussão, a partir de então, centrou-se no Regulamento Geral, discutido nos grupos das «Acções Estruturais» e «Amigos da Presidência». Repete-se o facto de este regulamento observar um modelo diferente do passado, ao comportar aquilo que nos pacotes anteriores eram o Regulamento-quadro e o Regulamento de Coordenação e, também, parte substancial dos regulamentos específicos dos diversos fundos.
Estes regulamentos específicos mantêm-se, contudo, embora com uma importância mais reduzida.
A Agenda 2000, e em particular a sua nova programação financeira, importa sublinhar, surge num ambiente substancialmente novo no plano europeu, enquadrado pela necessidade de comportar o alargamento a Leste e a Sul e de, simultaneamente, garantir que os Estados membros mantenham um comportamento ao nível macro-económico bastante rigoroso e exigente, por forma a cumprir o que se comprometeram no Pacto de Estabilidade.
Acresce que a União Europeia, após Amsterdão, alargou as suas competências e áreas de intervenção a novos domínios, alguns dos quais justificariam, na nossa perspectiva, um maior compromisso de montantes financeiros.
Todavia, o ambiente entre os Estados membros revela uma tendência maioritária, no sentido de evitar um aumento dos recursos da União Europeia, o que, de certo modo, se explica pela necessidade de redimensionar a União Europeia para comportar o alargamento, sem que esse alargamento represente um aumento exponencial de encargos. Melhor dito: verdadeiramente, era preciso mais dinheiro para o orçamento dos 15 que, em 1999, ronda os 20 biliões de contos e que, em 2006, se prevê atinja 22 biliões de contos.
Neste enquadramento, em Julho de 1997,foi apresentada a Agenda 2000, proposta que comporta, em síntese, o quadro financeiro, a reforma das políticas da União e o futuro alargamento da mesma.
No quadro das rubricas orçamentais verifica-se que a PAC - a mais consistente política da União, que representa 44% da despesa - é preservada e até mesmo ligeiramente aumentada. Ao mesmo tempo, as políticas estruturais (ajudas regionais, Fundo de Coesão e iniciativas comunitárias),começam a diminuir a partir de 2002, coincidindo com o aparecimento, nesse mesmo orçamento, de verbas para o alargamento.
Em traços largos, o que se pretende na PAC é aprofundar a reforma McShary, de 1992, que poderá acentuar os desequilíbrios entre produções, produtores e países, ainda para mais num quadro territorial mais vasto e quando se reabrem as negociações da Organização Mundial do Comércio, que visam, essencialmente, liberalizar os produtos agrícolas.
A primeira consideração a tirãr desta situação é que as despesas do alargamento se fazem, essencialmente, à custa da rubrica destinada a apoiar as regiões e os países mais pobres da União Europeia. Ora, assim sendo, Sr. Presi-

dente e Srs. Deputados, Portugal é duplamente penalizado: não só é dos mais pobres como algumas das suas regiões são as mais pobres das pobres ...
Para os chamados países da «coesão» (Portugal, Espanha, Grécia e Irlanda), este plano orçamental é bastante negativo. Acresce que, sendo Portugal, de entre esses países, o único que não beneficia substantivamente da PAC, já que o modelo agrícola europeu não é adaptável ao figurino português e, como se referiu, a PAC é preservada na proposta da Comissão, o nosso país é o mais prejudicado, dado que a rubrica das ajudas estruturais - a única que nos interessa - é a única que diminui efectivamente para os 15.
É nesta perspectiva de certo modo sombria que o Governo, acompanhado dos partidos da oposição, tem manifestado, desde o início, o seu desagrado pela proposta da Comissão, que considera injusta, não equitativa e particularmente penalizadora para Portugal.
A agravar esta circunstância sublinha-se o facto de a Região de Lisboa e Vale do Tejo, onde se encontra um terço da população portuguesa e que contribui com cerca de 42% do PIB, dever abandonar o chamado «Objectivo 1», isto é, o das regiões com maior concentração na aplicação dos fundos. E um facto lastimável deixar de apoiar uma região-motora - apesar de tudo, desigual no seu interior, onde se registam algumas assimetrias - com argumentos falaciosos.

Igualmente, o facto de não ser dada qualquer majoração específica na proposta da Comissão às regiões ultraperiféricas - onde se incluem os Açores e a Madeira -, que são apenas mantidas no «Objectivo 1», onde sempre se situaram por virtude do seu PIB per capita, torna o caso português muito singular. Sucede até que o Tratado de Amsterdão introduziu um novo artigo - artigo 299.º, n.º 2 que prevê a possibilidade de o Conselho adoptar medidas particulares a favor das regiões ultra-periféricas.
Neste quadro, os representantes dos governos regionais da Madeira e dos Açores foram ouvidos pela Comissão de Assuntos Europeus, manifestaram as suas preocupações e elencaram um conjunto de propostas concretas e de reivindicações que não podem, consequentemente, deixar de ser tidas em conta.
Por outro lado, a posição que tem vindo a ser avançada por alguns países, em oposição à proposta da Comissão; de afastar os Estados membros que passaram à terceira fase da União Económica e Monetária do usufruto do Fundo de Coesão não tem qualquer sentido, insiste-se, e vem agravar o contexto negocial para Portugal.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa, mas atingiu o limite de tempo disponível. Agradeço-lhe que termine.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Esse fundo destina-se a criar infra-estruturas e seria grave que Portugal não pudesse beneficiar dessa situação.
O esforço que o Governo tem vindo a desenvolver, de sensibilização dos seus parceiros, conduziu a que, neste momento, seja um dado adquirido, entre os 15, que existem especificidades portuguesas, ou, melhor dito, um caso português a ter em conta à mesa das negociações.
Nesse sentido, os partidos representados na Comissão de Assuntos Europeus têm idêntica posição, de suporte à capacidade negocial do Governo, pois estamos convictos de que a reunião do Conselho Europeu que se aproxima e a que terá lugar mais tarde, em Março, podem constituir momentos decisivos.

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O Governo tem a intenção de fechar a negociação da Agenda 2000, e seria útil que assim fosse. Em todo o caso, não deve fechar-se uma negociação que possa vir a ser penalizadora para os interesses portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos a alegria de ter connosco, a assistir à sessão, 40 alunos da Escola Básica do 2 º e 3 º ciclos Marquesa de Alorna, de Lisboa, 90 alunos da Escola E.B. 2.º e 3.º ciclos Dr. Ruy d'Andrade, do Entroncamento, 20 alunos do Instituto Nossa Senhora da Encarnação, da Benedita, 44 alunos da Escola Tecnológica, Artística e Profissional do Vale do Minho e 27 alunos do Externato Irene Lisboa, de Arruda dos Vinhos, para os quais peço um carinho.

Aplausos gerais, de pé.

Para introduzir o debate, após o relato do autor do relatório da Comissão de Assuntos Europeus, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus: Da nossa parte, PCP, tomámos a iniciativa de requerer a realização deste debate sobre a Agenda 2000 porque se trata de uma matéria de grande importância para o futuro do País e seu desenvolvimento.
Por isso, consideramos que a Assembleia devia ter sobre ela uma qualificada intervenção, ao nível do Plenário, que significasse o seu empenhamento e atenção. Por isso, consideramos que os portugueses e portuguesas deviam encontrar neste debate parlamentar o sinal de alerta que os chamasse a intervirem como cidadãos num processo cujas consequências, a termo, sobre eles recaem.
A Agenda 2000 - como sublinha muito bem o relatório do Sr. Deputado José Saraiva - vale nas suas consequências pelo pacote financeiro em que se traduz. A,ameaça é muito directa: as propostas da Agenda 2000, cuja justificação é o alargamento da União Europeia, traduzem-se numa forte penalização de Portugal, que receberia menos fundos e veria assim enormemente dificultada a aproximação às economias europeias mais desenvolvidas em termos reais.
Portugal, a par da Grécia, o país mais pobre da União Europeia, seria o país mais penalizado e connosco, também penalizados, seriam os outros países chamados «da coesão».
O que representa esta situação? É preciso dizê-lo com clareza aos nossos parceiros da União Europeia e à opinião pública europeia, como é necessário dìzê-lo, naturalmente, também, aos portugueses.
Estas opções da União Europeia significariam, se fossem concretizadas, que a União Europeia teria abdicado de cumprir uma das suas razões de ser, aquela que mais toca os povos e países que têm o direito de esperar da integração mais desenvolvimento, isto é, teria significado o abandono do reforço da coesão económica e social.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Tudo se teria passado como num jogo armadilhado. Os países fortes da Europa, a começar pela Alemanha, rebocaram a União Europeia até ao limite da

consagração dos seus interesses: o mercado único, a moeda única, o Banco Central Europeu com um comando fortemente centralizado, a fixação, mesmo fora de qualquer tratado, de fortes condicionantes nas políticas orçamentais e de endividamento público, bem como nas políticas salariais e de consumo através das fortes restrições aos níveis de inflação. Conseguindo com tudo isto o seu patamar de interesses, esses países desinteressaram-se. A União Europeia seguinte, a da coesão económica e social, já não era com eles. A plebe que se amanhe!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Esta não é a construção europeia desejável, pela qual desenvolvem esforços as forças de progresso.
Falei de armadilha e demonstra-se com facilidade: por que razão não começou a União Europeia por levar a coesão económica e social até um patamar razoável de concretização, para depois equacionar, se quisesse, a União Monetária e eventuais regras orçamentais de endividamento e preços? Por que é que foi feito ao contrário? Por que é que se começou pelos interesses dos mais fortes?
O que está em jogo neste debate sobre a Agenda 2000 é, de facto, um conflito - como muito bem sublinha o relatório do Sr. Deputado José Saraiva - entre o grupo de países e interesses para os quais a União Europeia é uma união monetária num mercado único com fortíssimo controlo orçamental e de preços e salários e o grupo de países que vê nos fundamentos da União Europeia a possibilidade de promover, entre as nações, povos e cidadãos que a compõem, uma igualdade de oportunidades, que exige, antes de mais, a aproximação das economias reais e a realização de políticas sociais de progresso, tudo num quadro de concretização da coesão económica e social.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A partir do momento em que Portugal, com a moeda única, perde as políticas monetária e cambial como políticas autónomas e, com o pacto de estabilidade, fica fortemente limitado na execução de políticas orçamentais viradas para a criação rápida de infra-estruturas de desenvolvimento e para a execução de políticas económicas e sociais que o promovam a concretização, pela União Europeia, das políticas para a coesão económica e social, esta adquire um sobre-valor como instrumento indispensável para o progresso do País.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Esta realidade é uma realidade que não pode ser esquecida nem escamoteada!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador:- Para vences este desafio, o Governo português deveria ter percebido, desde a primeira hora, que isso só é possível no quadro de uma forte mobilização política e social e com o empenho determinado da opinião pública nacional. Deveria ter percebido que o êxito só era, ou melhor, só é possível com uma posição negocial forte, apoiada e clara.

Aplausos do PCP.

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Mas não foi assim! O Governo preferiu os ademanes da política de bastidores, a alcova mais ou menos confidencial da família política, as pequenas e médias «trocas e baldrocas», os conciliábulos com pretensos aliados de conjuntura, as inventadas conquistas de pequenos passos tornados sempre de ida e volta, tudo numa pretensa teia sem resultados palpáveis nem garantidos.
O que mostra a realidade desta União Europeia é que o Governo português não encontrou, até agora, nas famílias socialista e social democrata nada mais do que umas boas palavras pela frente e umas melhores «facadas pelas costas».

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O PCP apela a uma grande determinação política e social nacional em torno dos objectivos e interesses de Portugal neste processo. Neste debate, o PCP informa o povo português sobre o papel insubstituível que lhe cabe neste processo, se tomar nas suas mãos a defesa de um patamar negocial que concretize uma Europa de coesão económica e social e que, assim, sirva o desenvolvimento de Portugal e a aproximação da economia portuguesa, em termos reais, à economia do conjunto dos países da União Europeia.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quando todos os estudos apontam para o facto de Portugal ser quem mais perde com a Agenda 2000, incluindo os estudos de reputados institutos estrangeiros, quando se fala em perdas de 500 milhões no período ou mesmo de 200 milhões/ano, nas piores propostas apresentadas por um grupo de países, Portugal tem de contar, antes de tudo, com a determinação dos portugueses. Só com ela pode vencer este duro desafio!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É preciso, antes de tudo, que se ponha no devido lugar a questão do alargamento, não para, à partida, questionar o alargamento aos países e povos que manifestem a vontade de integrar a União Europeia mas, pura e simplesmente, para dizer qual é a posição de Portugal face aos efeitos do alargamento.
O alargamento, para as economias fortes, significa mais mercado e mais campo paia investimento. Para os países de economia mais débil, nalguns pontos, o alargamento traz mais concorrência e novos e complexos desafios. Por isso, o alargamento, para ser útil ao conjunto da União Europeia, exige o reforço das políticas de coesão económica e social para países que hoje já estão na União Europeia, como Portugal. Não podem ser os países que não ganham com o alargamento, ou seja, os países mais débeis, a suportarem o seu custo.

Aplausos do PCP.

Mas é isso que a Alemanha e os seus parceiros de economia forte querem fazer: querem desviar as verbas dos fundos estruturais hoje afectos aos países da coesão, como Portugal, para as ajudas aos países do alargamento, mantendo intocado o seu próprio esforço financeiro e o retorno que obtêm da União Europeia nas políticas de que beneficiam. Os fundos estruturais desceriam, na hipótese menos má, de 39 mil milhões de euros, em 1999, para

31,4 mil milhões, em 2006, e, na versão pior, para 25,6, nesse ano de 2006.
Por isso, da nossa parte, PCP, denunciamos como puro conformismo político aceitar como inevitável que o alargamento seja feito com o actual tecto de despesa de 1,27% do PIB comunitário. Isso é aceitar à partida o «comportamento de saque» dos países de economia forte que querem tirar da União Europeia o máximo proveito com o mínimo de custos,...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Exactamente.

O Orador: - ...é aceitar, à partida, que as políticas de coesão económica e social possam ser sacrificadas e com elas os países que fazem parte da União Europeia. O número 1,27% é tão pouco um tabu que, no Pacote Delors II, para a Europa ainda a 12 - sem alargamento, portanto - chegou a ser proposto um total de 1,37%!
Portugal deve defender com clareza que o actual tecto de 1,27% seja exclusivamente para financiamento das despesas da União Europeia com a sua composição a 15, sendo o alargamentó financiado com novas verbas.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Em caso algum Portugal poderá aceitar uma redução de verbas para fundos estruturais.. Estes devem manter-se a preços constantes, com os mesmos critérios de distribuição (isto é, sem relevância do critério de emprego) e com a consideração da sua aplicação tendo em atenção, fundamentalmente, a prosperidade das nações e não das regiões.

Aplausos do PCP.

O facto de a Região de Lisboa e Vale do Tejo ter atingido o patamar de 75% do PIB per capita da União deve ser visto precisamente a esta luz. A Região de Lisboa e Vale do Tejo representa 42% do PIB nacional. Retirá-la do Objectivo 1 e, portanto, do actual nível de acesso aos fundos estruturais, seria comprometer a possibilidade de um efectivo reforço do processo de desenvolvimento do País, dado o papel liderante e determinante que a Região de ,Lisboa e Vale do Tejo tem nesse processo de desenvolvimento.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Governo - temos de o dizer - foi negligente nesta área, porque o problema já estava à vista tia: muito tempo e nada foi feito atempadamente para lhe dar solução. Agora, é preciso fazer toda a força, sem hesitações e sem qualquer espécie de negócios descabidos!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Seria descabido e inaceitável - sublinho -, por exemplo, qualquer negócio em torno do Fundo de Coesão, aceitando restrições dos fundos estruturais e assumindo como compensação o respeito integral do Fundo, de Coesão. Isto não era um negócio, era, pura e simplesmente, uma fraude, pela simples razão de Portugal; por ter PIB per capita inferior a 90% da média comunitária, ter direito ao Fundo de Coesão por força no disposto no próprio Tratado de Maastricht, sem dependência de qualquer cum

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primento do pacto de estabilidade nem qualquer penalização pelo facto de ter acedido ao euro. É um direito, um direito próprio, não é nenhum favor nem serve de compensação para nada!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Portugal deve, nesta questão dos fundos estruturais, ter o máximo cuidado com alguns truques pouco claros com que alguns pretendem frustrar os compromissos assumidos. Por exemplo, é o que se passaria com a fixação das verbas dos fundos como autorizações de despesa, que se perderiam como receitas do País se não fossem aplicadas nos destinos e prazos previstos, retirando qualquer possibilidade de reafectação ou reescalonamento e eliminando o conceito de atribuição definitiva de fundos, substituindo-a por uma espécie de abertura de créditos perdidos se não fossem utilizados como a Comissão impusesse.
Outro truque é afixação de uma cláusula de reserva, um x por cento, verbas que ficariam cativas para reutilização pela Comissão, caso isso fosse necessário. Mesmo dando como certo que essa reutilização seria feita no próprio país e não noutros, isso pode dar à Comissão uma margem de ingerência injustificada e pode comprometer opções nacionais próprias, aquelas que sejam nacionalmente consideradas mais adequadas.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Outro truque consiste nos atrasos de pagamento por forma a conseguir, na prática, níveis de despesa mais baixos do que aqueles que estão previstos orçamentalmente. Isso foi feito nestes últimos anos, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus e Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, foi feito com as despesas autorizadas a não ultrapassarem o 1,13% do PIB da Comunidade, dando assim uma espécie de «razão prática» para justificar a futura afectação da diferença, que seria de 0,14%, às verbas de pré-adesão do alargamento.
Esta é uma falsa «razão prática», porque as despesas têm de ser feitas, algum dia, têm de ser feitas mais tarde, mas este truque, apesar de muitas vezes denunciado (por exemplo, pelo meu' camarada europeu do PCP, Joaquim Miranda, que o referiu muitas vezes, directamente, até, a membros do governo) não foi encarado pelo Governo como devia ter sido, foi encarado com alguma negligência.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Quanto ao capítulo dos recursos próprios, da União Europeia, Portugal não pode aceitar que a sua reforma seja feita por forma a dar exclusiva satisfação à Alemanha e a outros países de economia forte, mantendo-se em caminhos pantanosos como o do chamado «justo retorno» - imagine-se, justo retorno! -, quando se esquece, nas contas, todo o retorno económico que esses países obtêm da simples existência do mercado único e da União Monetária funcionando nos moldes que impuseram.
Propostas como a de renacionalização dos custos da PAC são totalmente inadmissíveis para países cujas produções são as menos apoiadas, como é o caso da agricultura portuguesa.
O financiamento da União Europeia, para ser justo e adequado, deve basear-se fundamentalmente na riqueza de,

cada país, no seu produto nacional bruto e, portanto, deve ter uma fórmula progressiva que atenda à situação dos mais pobres e faça ressaltar as maiores possibilidades dos mais ricos.
É absolutamente inaceitável que hoje, Portugal, que representa 1,2% do PNB da Comunidade, contribua para as receitas da comunidade com 1,4%. É absolutamente escandaloso que isto suceda!
Quanto à PAC, Portugal deve bater-se por uma reformulação do seu actual modelo, em termos e condições que desenvolveremos numa intervenção que o meu camarada Lino de Carvalho fará, estabelecendo uma linha de defesa da agricultura portuguesa visando três objectivos: salvaguardar a sua especificidade no quadro do reconhecimento da diversidade das agriculturas europeias, defender o direito a produzir e à segurança alimentar e assegurar a modernização e o aumento das produtividades.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Este conjunto de pontos referenciais de negociação - e que consubstanciaremos num projecto de resolução que já entregámos na Mesa da Assembleia - deve ser assumido pelo País como uma plataforma para defesa dos interesses de um Portugal mais desenvolvido e socialmente justo numa Europa melhor, com mais coesão económica e social.
Estes pontos referenciais de negociação devem ser defendidos pelo Governo, como devem ser aprovados pela Assembleia e assumidos pela sociedade no seu conjunto, pelas organizações de trabalhadores, pelas organizações económicas, pelas autarquias e pela vida nacional no seu conjunto.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Todas as pessoas percebem que hoje, partidariamente, é mais interessante fazer uns «números» com os candidatos ao Parlamento Europeu, mas aquilo que está em jogo neste debate em torno da Agenda 2000 é, de facto, o mais importante para o País.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O PCP propõe também à Assembleia que a Subcomissão para a Coesão Económica e Social da Comissão de Assuntos Europeus, Subcomissão que preparou este debate, tenha um papel mais activo no conhecimento e acompanhamento do processo negocial, um acompanhamento mais permanente, mais próximo dos negociadores e, por isso, também, mais fundamentado e influente.
Não há pruridos que justifiquem que, num momento tão crucial de negociação, não se criem as condições para um acompanhamento mais completo da situação por parte da Assembleia da República, com a sua composição pluripartidária.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Governo afirmou que aceitava o empenhamento alemão na aprovação da Agenda 2000 já em Março. Mas é preciso dizer que o empenhamento nacional fundamental não é no prazo, é no conteúdo.

0 Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

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O Orador: - O Sr. Ministro Jaime Gama já afirmou que o alargamento não pode ser feito somente à custa dos mais pobres.
Bem dito quanto à referência aos mais pobres, mas elimine o Sr. Ministro dessa expressão o «somente», porque isso é admitir o que não pode ser admitido.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O alargamento, pura e simplesmente, nunca pode ser feito para benefício das economias fortes à custa das economias débeis e dos países pobres.

Aplausos do PCP.

Da nossa parte, PCP, não nos temos poupado a esforços no sentido de encontrar soluções justas para o nosso País, e quero aqui ressaltar e saudar o papel dos três Deputados do PCP no Parlamento Europeu, Joaquim Miranda, Sérgio Ribeiro e Honório Novo,...

Aplausos do PCP.

...pelo trabalho que têm feito no Parlamento Europeu mas também pelo intensíssimo trabalho que têm feito no nosso País em defesa da produção nacional, de soluções adequadas, e também pelo trabalho de alerta para perigos como os que estão contidos nesta Agenda 2000.
Esta é a contribuição que aqui estamos a dar hoje por imperativo de defesa dos interesses do nosso País e do nosso povo, numa Europa de coesão que seja para Portugal uma oportunidade de progresso e desenvolvimento.
Mas, se assim não for, há um recurso, legítimo, adequado e possível, dado que estão em jogo interesses vitais do País e da própria construção europeia. Este recurso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é o recurso ao direito de veto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr: Presidente, Sr. Deputado João Amaral, vou analisar a sua intervenção à luz daquilo que tem sido o seu pronunciamento nos tempos mais recentes sobre as questões europeias e, portanto, não vou esgotar-me exactamente no discurso que acabou de fazer mas vou ter em conta aquilo que tem sido o seu legítimo e correcto pronunciamento em várias instâncias, desde as jornalísticas até à Comissão de Assuntos Europeus.
Devo dizer que quatro dos pontos que marcaram a sua intervenção merecem o meu acordo. O Sr. Deputado manifestou preocupação, nós também manifestamos, o Governo também manifesta - aliás, o Sr. Primeiro-Ministro já disse que estamos perante uma negociação extremamente complexa e difícil. Portanto, esta é uma preocupação consciente e activa.
O Sr. Deputado admitiu a hipótese de existir uma armadilha de alguns países ricos ou, pelo menos, de alguns sectores de países ricos e, embora essa me pareça uma fantasmagórica concepção de como funcionam as coisas a nível internacional, até sou capaz de admitir que essa armadilha possa efectivamente existir, sobretudo se a situarmos em espaços muito restritos desses tais países ricos.

O Sr. Deputado acaba de fazer um apelo ao reforço activo à participação do Parlamento, com o qual também estou de acordo, embora esse reforço já exista na medida em que o Parlamento tem uma Comissão de Assuntos Europeus a funcionar, que está, aliás, a desenvolver um trabalho extremamente meritório - neste momento, estão em curso, como V. Ex.ª sabe, várias audições exactamente sobre essa temática, já se fizeram sete ou oito e vão seguramente fazer-se mais 10 ou 12 -, estando a Assembleia da República, efectivamente, a acompanhar esta matéria e as preocupações do Governo da única maneira que pode.
Aliás, este debate - e louvo o PCP por isso, nomeadamente V. Ex.ª, que foi o representante do PCP neste debate - é uma experiência interessante e um exemplo do que referi, pelo que julgo que todos nos podemos congratular com a situação.
Finalmente, V. Ex.ª fez um apelo ao reforço activo da participação e, digamos, da pressão, no bom sentido da palavra, sobre o Governo, o que julgo que também é importante. Penso que é importante que quer as instituições sociais quer a própria opinião pública, seja ela a escrita ou a que é menos reconhecida em termos comunicacionais, sejam alertadas para aquilo que está em jogo. Nesse sentido, julgo que também posso comungar dessa linha matriz do seu discurso.
Agora, sem me referir à forma como encerrou a sua intervenção - aliás, terei oportunidade de exprimir a posição oficial do Partido Socialista a propósito disso no discurso que farei em altura oportuna -, esquecendo um pouco essa questão, gostaria de fazer uma pergunta muito singela e simples.
O Sr. Deputado participou activamente em várias reuniões da Comissão dos Assuntos Europeus, exprimiu os pontos que vista que entendeu e, aliás, outros Deputados, incluindo eu próprio, exprimimos pontos de vista muitos parecidos com o seu. Pergunto: o Sr. Deputado viu ou não, da parte Governo, essa preocupação e um sentido muito grande de responsabilidade e, sobretudo, muita confiança na estratégia diplomática que tem sido seguida ou, pelo contrário, encontrou um Governo perfeitamente vencido, prostrado, determinista no sentido de «o que vier vem»?
Em suma, a pergunta que lhe coloco é esta: o que é que V. Ex º viu no outro lado? Viu um Governo determinado, com uma estratégia negocial ou viu um Governo passivo? Essa é que me parece ser a resposta importante. Embora eu saiba o que V. Ex.ª viu, não sei bem é o que V. Ex.ª vai dizer que viu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Manuel dos Santos, pode estar sossegado porque não vou desiludi-lo, vou dizer o que vi.
Faço apenas uma pequena ressalva em relação à questão da armadilha. Utilizei a expressão «como que uma armadilha» mas devo dizer-lhe que, olhando para o seu lado direito, para o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, e olhando em frente, para quem se senta na bancada do Governo, vejo «velhos» Ministros, embora jovens de idade,...

0 Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Experientes!

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O Orador: - ... enfim, pessoas com suficiente experiência do que é a negociação internacional para lhe dizerem que armadilhas como esta são o bê-á-bá do relacionamento internacional. Portanto, não creio que tenha feito alguma imputação especial ao espírito com que os países ricos se conduziram no quadro da União Europeia.
Aliás, fiz a pergunta de uma forma simples: por que é que não se seguiu outro caminho? Por que é que não se começou pela coesão económica e social? Era mais difícil? Podia ter algumas dificuldades? Admitamos que sim, que teria mais umas dificuldades. Mas não teria sido muito mais importante para o conjunto dos países, dos povos, de cada um de nós, de cada um dos cidadãos? Por que é que se fez essa opção, nesses termos? Foi essa a questão que suscitei. Suscitei-a e, digamos, o Sr. Deputado caracterizou-a, no quadro geral da minha intervenção.
O que fiz, na tribuna, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, e dando sequência a iniciativas que já tomámos, foi chamar à atenção para a importância enorme deste processo, para a necessidade da mobilização nacional em torno desta questão, isto é, para a necessidade da mobilização da opinião pública, de uma opinião pública vigilante, alerta e interventora, e para a necessidade de todos nós, neste próprio debate, através das nossas intervenções, podermos carrear elementos informativos que permitam uma melhor intervenção a todos, ao conjunto do País, sendo certo que quem está a negociar é o Governo.
A proposta que fiz em relação à Comissão de Assuntos Europeus, que louvo pelo trabalho que faz, que louvo, na pessoa do Sr. Deputado José Saraiva, pelo relatório que fez - não é isso que está em questão -, não é uma proposta dirigida à Comissão mas ao Governo e tem o seguinte conteúdo: uma possibilidade de a Subcomissão de Acompanhamento da Coesão Económica e Social poder ter um contacto mais directo, mais próximo, mais continuado, mais permanente, nesta fase crucial, parece ser extremamente importante, pela componente pluripartidária que caracteriza a Assembleia da República. É este o sentido da minha proposta.
Quanto ao que vi no Governo - e espero que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, que é fundamentalmente quem está em questão, não se ofenda com o que vou dizer -, não tenho qualquer dúvida em dizer que vi um Governo dialogante.

O Sr. José Saraiva (PS): - Empenhado!

O Orador: - Nisso o Sr. Secretário de Estado esteve à altura de todos os diálogos e de toda a capacidade de diálogo.
Agora, o que gostava de ter visto era o Governo sair da redoma da esperança de que as pequenas negociações, familiares, com os amigos, pelos corredores, naquele jeito, enfim, muito típico, conseguissem ajeitar bem os interesses de Portugal e fazer uma coisa diferente, que era vir junto da opinião pública e ter a iniciativa que não teve. Ao longo deste tempo, devo dizer-lhe que não vi o Governo confiante, aberto, disponível para a iniciativa pública, apelando à energia portuguesa. Não vi esse Governo!

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Não vi esse Governo e por isso fiz esta intervenção e disse, há pouco, ao Governo que preferir as «alcovas» da família socialista, que, afinal, é melhor na

«facada» do que no serviço ao País, não é, de facto, o caminho aceitável. O caminho é outro, o caminho é o da transparência, o caminho é o da mobilização nacional, o caminho é o de, como estamos aqui a fazer, neste momento, por nossa iniciativa, trazer os problemas para cima da mesa, trazer os problemas ao conhecimento dos portugueses e, com eles, lutar pela defesa dos nossos interesses e por uma Europa mais coesa, que sirva melhor os interesses de Portugal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Chegamos a este debate com uma consciência muito nítida do nosso contributo para a edificação da União Europeia e com a certeza de um posícionamento que sempre fez prevalecer o interesse nacional e a unidade da sua afirmação externa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A Europa é, para nós, mais do que um caminho para uma solução económica e financeira, uma questão civilizacional e cultural.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E, por isso, não é por demais salientar que as posições assumidas têm oferecido sempre uma garantia de responsabilidade.
Queremos o melhor para a Europa, porque queremos o melhor para Portugal e sem esquecer o objectivo essencial de tentar conseguir, sempre, o melhor para os portugueses.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Temos a certeza de que foi em nome destes princípios que, ao longo do tempo, advogámos os equilíbrios necessários.
Não ignoramos que sem a realização da União Europeia Portugal e os portugueses viveriam pior.
Não desprezamos o facto de, concordando com Francisco Lucas Pires, participarmos na maior revolução europeia desde a de 1917, na Rússia, a revolução da moeda única. Uma revolução que, ao contrário da outra, respeita a vontade dos povos e se predestina à prosperidade das nações.

Este é, portanto, um momento marcante de todas as nossas vidas como Estados e como povos. Dentro dele, a próxima cimeira europeia, anunciada para Março, surge como uma especial etapa decisória na fase actual do processo de construção europeia.
Sabe-se que, além da Agenda 2000, neste momento em discussão, outros dois temas dominam o horizonte das preocupações.
Sabe-se que a reforma do financiamento da União é a verdadeira pedra de toque do futuro.
Sabe-se ainda que as condicionantes da terceira fase da União Económica e Monetária e as perspectivas do alargamento oferecem o pano de fundo em que estas questões se desenvolvem.
Como continuar o esforço europeu, como manter e reforçar a coesão económica e social, como alimentar o or-

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çamento comunitário sem tornar insuperável a controvérsia que em cada Estado contribuinte líquido se gera, eis a quadratura do círculo a resolver. Não que algum dos Estados membros ponha em causa o projecto e os seus benefícios evidentes. Não que algum dos Estados membros deixe de reconhecer que a situação actual é de relativa prosperidade, com baixa generalizada das taxas de juro e inflação controlada em quase todos. E não que se deixe de reconhecer que o por vezes penoso e difícil caminho para a terceira fase da União Económica e Monetária não tenha sido qualquer coisa que valeu a pena.
O conjunto dos países do euro reconhecem hoje, sem qualquer reserva, que o rigor observado na realização das políticas necessárias lhes garantiu condições particularmente favoráveis.
Claro que nem todos os países tinham, à partida, iguais condições e óbvio se torna fazer uma distinção entre a dimensão relativa das dificuldades por cada um enfrentadas.
Simplesmente, mais Europa, como se pretendia, significava um caminho irreversível e uma opção entre arriscar e ficar definitivamente para trás.
Não se ignorava o fim pretendido. Não se ignorava a razão pela qual se caminhava. Mas quantas vezes, ao longo deste percurso, se questionou a possibilidade de atingir o objectivo? Quantas vezes muitos dos que, em PortugaI, estão hoje na primeira linha de defesa da União Europeia e das suas consequências positivas duvidaram do seu êxito?
É hoje fácil enumerar as virtudes, salientar a estabilidade económica, contabilizar as poupanças que, para os cidadãos, resultam, por exemplo, das taxas de juro actuais, comparadas com as anteriores, ou a maior facilidade de obter ganhos com a baixa taxa de inflação.
Há mesmo alguns países e pessoas que, por obra destas facilidades, vivem nas nuvens, gastam mais do que devem, andam como que anestesiados.
Um tal panorama positivo faz qualquer um sonhar com o impossível e obter o que não pode. É por essas e por outras que, às vezes, se confunde tanto uma política social com uma política de facilidades. É por essas e por outras que, nestas circunstâncias, o apelo ao endividamento das famílias é tão forte. É assim que no nosso País já muitos economistas alertam para o perigo que resulta do aumento vertiginoso deste endividamento das famílias, que chega mesmo a ultrapassar o endividamento das empresas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Chega mesmo a parecer, a quem ouve e lê tantas declarações de contentamento, que por obra de algum súbito e singular milagre se produziu a visão desta realidade. Não foi assim!
Mas o que se exige, hoje, é a manutenção do equilíbrio e a progressão do crescimento. E, principalmente, a garantia de que tudo aquilo que acumulámos ao longo do tempo, designadamente a credibilidade e a capacidade demonstradas, se não percam nem diminuam. Um passo atrás é hoje um passo em falso.
A construção da União Europeia não se faz apenas de benefícios nem de alegrias. É um processo complexo e difícil que exige uma enorme capacidade de visão institucional, uma permanente atenção às alianças a construir, uma identificação muito clara de, a cada momento, qual a melhor forma de defender o interesse nacional.

0 Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A União Europeia corresponde a uma actividade de negociação permanente. Só pode ser bem sucedida se os países que a integram se entenderem solidariamente empenhados na sua gradual consolidação.
Mas tudo se torna substancialmente mais difícil porque a União é composta por países com capacidade económica diversa e com graus de desenvolvimento distintos.
É conveniente lembrar que alguns, como acertadamente dizia um autor, podem queixar-se de ter chegado à integração com 30 anos de atraso. E é por isso que a história da integração de Portugal é uma história exemplar.
A ideia da especificidade da situação portuguesa não é de agora. O seu reconhecimento implicou não só duríssimas negociações, realizadas em anteriores etapas e, felizmente, concluídas com êxito, como ainda programas especialmente adequados à realidade nacional.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esquece-se, muitas vezes, que algumas negociações aconteceram em momentos de dificuldades conjunturais e que outras impuseram mesmo a ameaça da invocação do interesse vital.

Vozes do PSD: - Bem lembrado!

O Orador: - Os governos de então cumpriram, com êxito, a sua quota-parte de responsabilidade. Conseguiram um evidente ganho para o interesse nacional e criaram condições para, até ao final do século - como bem constatava o líder da oposição dessa época -, ser garantida a facilitação dos fundos estruturais necessários.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Podem inventar-se todas as críticas. Há que reconhecer que, sem o contributo e o incentivo encontrados, Portugal não surpreenderia hoje muitos dos seus parceiros.
Mas o facto é que Portugal, tendo realizado os critérios de convergência com acrescida dificuldade, continua a ser um dos países mais pobres da União.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não tem assim qualquer sentido que lhe sejam recusados os instrumentos económico-financeiros que lhe permitam garantir o fortalecimento do seu tecido produtivo e a realização da convergência real.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - O desafio que neste momento se encontra perante nós é o de saber ultrapassar aquilo que Francisco Lucas Pires considerava «a estreiteza da Agenda 2000 que queria financiar tudo - coesão, alargamento, revisão da PAC e nova política social - com o "pêlo do mesmo cão"».

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Saraiva (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Há, de facto, um dado que não podemos escamotear e pelo qual se conclui que os governos não estão dispostos a aumentar as despesas com a União.

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Há países que se dizem impossibilitados, pelas pressões políticas internas, de manter os níveis relativamente elevados das suas contribuições. Há algumas desigualdades e desperdícios que fomentam algum mal-estar entre os países membros.
Só que, do ponto de vista português, o actual quadro antecipa um conjunto considerável de dificuldades.
No âmbito do alargamento, Portugal não ignora que vai ser especialmente prejudicado. Há sectores muito sensíveis e há, sobretudo, uma necessidade de financiamento suplementar que a nova situação coloca.
A situação a que o Governo deixou chegar a agricultura portuguesa é crítica.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Há perda de rendimento acumulada dos agricultores: 14%, em 1997, e 12%, em 1998, para só citar os dois últimos anos. Há um desnível grande entre a média europeia de apoios comunitários e a média nacional, há uma dificuldade suplementar que advém das características dos produtos e do próprio modelo de produção.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A mera consideração dos índices de prosperidade regional sem ter em conta os índices de prosperidade nacional levaria à exclusão da Região de Lisboa e Vale do Tejo da aplicação dos fundos estruturais. Situação, esta, tanto ou mais absurda quanto, em contrapartida, várias regiões da Grã-Bretanha passaram a poder integrar o Objectivo 1, em função de um arranjo administrativo das NUT que o governo inglês, em tempo devido, sabiamente, empreendeu.
Em suma, Portugal perderia fundos estruturais, manteria uma situação desfavorável nas ajudas à agricultura, importaria crises em alguns sectores produtivos mais débeis, ou seja, perderia capacidade de realização de infra-estruturas, sofreria uma redução da sua capacidade produtiva, veria aumentado o desemprego, estaria à mercê de desequilíbrios da balança de pagamentos.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Desta imagem retiramos o verdadeiro significado do problema que se nos coloca.
E certo que as declarações dos vários envolvidos nas negociações têm sido contraditórias. Já assistimos a declarações de Jacques Santer pelas quais Portugal poderia ver aumentados os fundos a receber; já lemos opiniões concordantes com a posição nacional, proferidas pela Comissária Wulf-Mathies; já ouvimos o Governo português dizer que alguns responsáveis alemães reconheciam a especificidade do caso português; já foi dado a entender que o fundo de coesão podia ser aumentado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Bem lembrado!

O Orador: - Tal significa, tudo somado e ponderado, que, afinal, se abrem janelas de oportunidade nas negociações a empreender. Seria, aliás, péssimo que o Governo português entrasse nas negociações com o espírito de perder o menos possível. Qualquer esforço negocial deve situar-se num patamar de exigência superior.
Que fique bem claro que o PSD não deixará nunca de apoiar o interesse nacional. Assim o temos feito em todas as circunstâncias e instituições nas quais participamos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Não é verdade! Tem sido ao contrário! É uma vergonha!

O Orador: - Queremos ajudar e não prejudicar a posição portuguesa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas não pode restar qualquer hipótese de dúvida de que é ao Governo que compete realizar esta actividade negocial.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Essa é boa! Essa eu não sabia!

O Orador: - E, em função da razão e da força da singularidade da posição portuguesa, não queremos admitir senão um resultado positivo.
A avaliação do interesse nacional, feita entre os parceiros da União, pode resultar também da contribuição que aqui oferecemos.
A pressão exercida equivale à soma de todas as declarações de vontade dos partidos representados, concretamente, aqui, nesta Assembleia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nós, PSD, temos connosco a experiência de negociações anteriores e a certeza de que a manutenção de uma posição firme nos pode fazer ganhar. E temos também a consciência de que os egoísmos nacionais podem ser apenas relativos e não absolutos.
Afinal, acreditamos que a vontade de continuar a construir uma União forte e coesa pode e deve ser superior a meras contabilidades de votos a realizar em cada país, mesmo que algumas campanhas eleitorais se tenham feito em nome dos benefícios nacionais imediatos e principalmente porque, muitas vezes atingido o poder, se assiste a mudanças de orientação favoráveis à maior flexibilidade na definição das balizas da decisão política.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É por isso mesmo que, não nos querendo de modo algum substituir ao Governo mas num espírito de empenhada ajuda, entendemos enriquecer este debate com o texto de uma resolução que apresentamos em conjunto com o CDS-PP, naquela que é a primeira iniciativa dos dois partidos em matéria europeia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Risos do PCP.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - É para subir um pouco mais nas sondagens?!

O Orador: - E, repito, assim nos permitimos sugerir que o Parlamento vote em tempo oportuno e adopte como seus um conjunto...

Protestos do PS.

Penso que já estão satisfeitos!...

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O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Há uma intranquilidade reinante na bancada do PS!

O Orador: - E assim nos permitimos sugerir que o Parlamento vote em tempo oportuno e adopte como seus um conjunto de princípios que sirvam de enquadramento e suporte à posição portuguesa.
Parece-nos, por exemplo, oportuno acentuar a preocupação e a definição, de um modelo de financiamento da União que se baseie na capacidade contributiva e tenha em conta os critérios de prosperidade nacional.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A Agenda 2000 deveria ser condicionada ao cumprimento deste princípio. O próprio Conselho Económico e Social não deixa de salientar esta mesma posição.
Seria, aliás, em função disso que se admitiria que as perspectivas financeiras da União acomodassem uma estabilização do orçamento para o período 2000/2006 ao nível mínimo de 1,27% do seu PNB e que se promovesse o aumento dos fundos estruturais e de coesão para que 0,46% do PNB representasse também o limiar mínimo para os actuais Estados membros, destinando-se 2/3 deste montante às regiões Objectivo 1.
Como será exigível admitir que, em função das exigências acrescidas pela introdução do euro, o quadro financeiro para Portugal, no período considerado, seja superior ao nível de apoios do anterior quadro.
Como não sofrerá contestação 0 objectivo da reforma necessária dos fundos estruturais, tendo em conta o seu especial efeito, a fim de garantir um tratamento equitativo entre as diferentes regiões. É diferente ser rico num país rico e ser rico num país pobre.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como não se poderá nem deverá perder de vista a reforma da PAC, porque não projecta a utilidade devida para Portugal em razão das nossas especiais condições e, por isso, exige a adaptação necessária. Os sectores mais frágeis da agricultura portuguesa devem ser por ela abrangidos, quer em função da fragilidade das produções, quer em função da sua localização em regiões miais desfavorecidas, quer em função de medidas estruturais de desenvolvimento rural.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como, sem a clara afirmação da especial vulnerabilidade de alguns sectores produtivos em face do alargamento, não será devidamente documentada a gravidade com que encaramos a situação futura, prova de que nela se funde a demanda de compensações financeiras.
Como a garantia da realização da convergência real não pode deixar de se ligar à manutenção do nível do fundo de coesão, sob pena de se permitir o entendimento da sua dispensabilidade, o que objectivamente contrariaria o Tratado.
Como a manutenção do acesso da Região de Lisboa e Vale do Tejo a instrumentos financeiros é essencial por si própria e em função do desequilíbrio interno desta Região, bem como do efeito induzido no desenvolvimento de todo o território nacional.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Como a garantia conseguida com a inclusão no Tratado de programas específicos para as regiões ultraperiféricas não pode deixar de exigir a sua prática e não a sua eliminação, como aconteceu com o programa REGIS.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Por último, a prevenção crucial de que quase nada significaria a manutenção ou o aumento dos fundos comunitários se os regulamentos destinados à sua utilização se viessem a caracterizar pela delimitação de condições de acesso ou de execução que inviabilizassem, na prática, o seu crescimento efectivo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se de um contributo claro, responsavelmente assumido. Com ele, a União encontrar-se-á melhor com Portugal; com ele, Portugal manterá o rumo e os portugueses sentir-se-ão mais perto da União.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: À volta da sugestiva designação de «Agenda 2000», o célebre documento da Comissão Europeia, realizado a solicitação do Conselho e divulgado em Julho de 1997, discutimos, uma vez mais, o futuro da Europa Comunitária.
Claro que a Agenda 2000 trata exclusivamente da com-
ponente financeira da construção europeia mas tem sido
claro que é este pilar, no momento, o elemento fundador
mais estruturante dessa construção.
Acresce, ainda, que vivemos o tempo primeiro da fase inicial da harmonização monetária, que, de resto, tem correspondido integralmente às expectativas, e, neste quadro, a importância da partilha dos recursos comunitários torna-se mais relevante.
Não nos iludamos, contudo! As dificuldades da negociação em curso são reais e são particularmente complexas e difíceis para Portugal, que até agora tem sido receptor de significativos fluxos financeiros - de resto bem aplicados na convergência real da economia portuguesa -, mas que tem de preparar-se para um futuro de partilha com regras, ritmos e valores diferentes.
Bem avisado tem estado o Sr. Primeiro-Ministro ao chamar a atenção da opinião pública portuguesa para esta realidade, em paralelo com o exercício de uma política sagaz e activa, defensora dos verdadeiros interesses portugueses, no novo quadro de solidariedade e numa fase de integração cada vez mais aprofundada.
E é também por isso que esta iniciativa do PCP, ao chamar à discussão no Plenário, neste momento, esta matéria, em complemento, aliás, da acção mais discreta, mas nem por isso menos eficaz que tem vindo a ser desenvolvida pela Comissão de Assuntos Europeus, é de louvar e aplaudir.

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Não tenho dúvidas em afirmar que o que pretende o PCP é habilitar o Governo português com o juízo político do Parlamento que sirva como elemento de alavancagem das suas opções e como instrumento de suporte para as suas iniciativas.
Não está em causa, nem seguramente o esteve aquando da formulação desta iniciativa, qualquer objectivo de enfraquecer ou criticar o Governo, num momento particularmente crucial da negociação, pois tal atitude seria, inevitavelmente, voltada contra os interesses nacionais.
Esta minha convicção não é sequer abalada por dois acontecimentos recentes da luta política neste Parlamento, com origem no PSD, que prejudicaram objectivamente os interesses nacionais.
Refiro-me, como é bom de ver, ao decantado episódio da Partest que foi objecto de um aproveitamento inqualificável e só não produziu efeitos devastadores porque a política orçamental estava claramente blindada, e o juízo negativo por antecipação e, claro, desastrado e incorrecto feito aqui recentemente a propósito da suposta avaliação da Comissão Europeia e do ECOFIN sobre o Plano de Estabilidade e Crescimento de Portugal.
São métodos e exemplos que seguramente não serão seguidos, com responsabilidade e para o futuro, sobretudo quando está em causa, de uma forma ainda mais determinante, como é o caso da proposta de Agenda 2000, o interesse de Portugal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: De uma forma porventura demasiado simplista, diremos que o que está em causa nesta negociação para Portugal é o volume de fundos comunitários a que teremos acesso nos próximos anos (200012006) - que conhecemos como III Quadro Comunitário de Apoio e a manutenção de regras de solidariedade e acessibilidade conformes com o princípio da coesão económica e social, que é um princípio estruturante e decisivo na constituição europeia.
Por outras palavras, Srs. Deputados, importa definir não só o valor do bolo mas, de igual modo, a fatia que nos toca e as regras a que seremos sujeitos para a poder comer.
É inaceitável que os recursos comunitários à disposição de todos diminuam no próximo período de seis anos e, sobretudo, é inaceitável no actual quadro de exigência política que tem de integrar o reforço do princípio da solidariedade e encontrar resposta para o compromisso do alargamento.
Por isso é de igual modo inaceitável que a parte de Portugal no quadro global dos recursos seja diminuída. Não há qualquer razão de natureza política, técnica ou financeira que justifique essa ocorrência.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Muito bem!

O Orador: - Portugal fez um grande esforço de convergência nominal nos últimos anos e conseguiu no último triénio uma considerável aproximação em termos de convergência real. Por isso, acedemos ao euro e partilhamos com as economias mais desenvolvidas as suas vantagens e as suas limitações.
Mas a economia portuguesa é, ainda, uma economia fraca no contexto da Europa. O rendimento médio português situa-se ainda nos 73% do rendimento médio europeu e no espaço geográfico e social português as disparidades são enormes, injustas e absurdas.
Há, assim, ainda um longo percurso a fazer que depende, naturalmente, da vontade nacional e dos portugueses,

mas que não pode passar sem a aplicação dos mecanismos de solidariedade.
Em nenhum dos textos legislativos da Comunidade - e aqui estou de acordo com o Sr. Deputado João Amaral está consagrado o princípio da eliminação do acesso ao Fundo de Coesão para os países que entretanto entraram na primeira fase da moeda única.
Portugal não pode aceitar este princípio e muito menos dar acolhimento a qualquer proposta para a sua eliminação, pois tal contraria, como já disse, um princípio estruturante da construção europeia - post Maastricht - que é o princípio da coesão económica e social.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: - Também é inaceitável que as regras de acesso aos fundos comunitários sejam alteradas num sentido que coloque em dificuldade os países de menor grau de desenvolvimento.
Algumas das propostas iniciais apresentadas à discussão traduzir-se-iam, na prática, numa transferência de recursos de países menos desenvolvidos do Sul da Europa para países mais prósperos da União.
Este efeito nefasto acentuar-se-á se vingar a proposta apresentada pelos países mais ricos que visa diminuir drasticamente os recursos financeiros destinados às políticas estruturais em favor dos recursos financeiros destinados às chamadas políticas internas.
Vem, aliás, a propósito lembrar aos Srs. Deputados que com a reformulação dos mecanismos dos fundos estruturais dos programas comunitários e das iniciativas comunitárias no quadro da Agenda 2000 têm consequências directas na forma como Portugal vai beneficiar dos fundos disponíveis no IR Quadro Comunitário de Apoio entre 2000 e 2006.
Está em preparação, e deverá ser assumido para a semana pelo próprio Primeiro-Ministro, o chamado Plano Nacional de Desenvolvimento Social que será colocado à discussão pública. Este Plano é, na prática, uma espécie de prefácio do III QCA e as decisões que se obtiverem a nível da Agenda 2000 vão ter implicações imediatas no conjunto de projectos, programas e propostas que integram tal Plano.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Não tenhamos ilusões! A fase actual da construção europeia coloca desafios estimulantes e orienta-se por objectivos nobres 'e mobilizadores, mas gera, esperemos que transitoriamente, uma certa febre de egoísmos nacionais.
É com esta realidade que temos de conviver, sem prejuízo de assumirmos a imperatividade de ultrapassar os obstáculos que nos sejam colocados.
O congelamento nominal, que acolhe uma diminuição real dos recursos próprios da comunidade, em 1,27% do PIB é, em certo sentido, a tradução desses egoísmos e dessas dificuldades.
As reivindicações dos países contribuintes líquidos da União, sem levar em conta os efeitos significativos dos chamados desvios de comércio, quer se concretizem na forma do cheque inglês ou do princípio do justo retorno, são dificuldades íniludíveis.
A rejeição primária do princípio da prosperidade nacional seria absurda e incompreensível. Desconhecer estas limitações ou ignorá-las poderia ser desastroso para os interesses nacionais.
E é por isso que o Governo, e bem, tem assumido uma posição activa na linha da frente da definição das políti-

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cas europeias e tem vindo a sensibilizar os seus parceiros para a existência de um «caso português», com a sua especificidade quer no aspecto das fragilidades quer na óptica das suas oportunidades.
Caso português que passa, por exemplo, pelo absurdo estatístico de situar todo o País nas zonas elegíveis para o Objectivo 1 dos fundos estruturais, mas que se prepara para eliminar dessa acessibilidàde zona de Lisboa e Vale do Tejo, ela própria enormemente desequilibrada em índices de progresso, de crescimento económico e de bem-estar social.
Caso português que se caracteriza por contribuir, pelo menos estatisticamente, com 5 das suas regiões de planeamento para as 25 regiões mais pobres de toda a Europa Comunitária.
Mas, ao assumir a estratégia da existência de um caso português, o Governo não se coloca numa posição subalterna, antes enfatiza numa lógica de solidariedade e, portanto, numa lógica europeia, a inevitabilidade do aparecimento, a curto prazo, de casos com as mesmas características e singulares especificidades.
E este, pois, o quadro negocial português: firme onde pode ser firme, flexível onde o deve ser.
Neste quadro negocial alguns valores devem ser inegociáveis: o primeiro é o da coesão, pois este é um princípio estruturante e inalienável na construção da Europa do futuro.
O segundo valor é o da solidariedade que nos obriga a colocar os problemas do emprego, mesmo que não seja o do desemprego português, e da exclusão social na primeira e principal das solidariedades. Sem esquecer que a realidade do emprego não é só a realidade estatística, é muito mais a realidade social, é muito mais o conceito complexo e sugestivo da empregabilidade que o Governo português introduziu na agenda política europeia.
Finalmente, o terceiro valor tem a ver com o alargamento. Portugal definiu o seu apoio ao alargamento da União Europeia, aos países do Leste Europeu, verificadas que sejam .as condições políticas, jurídicas, sociais e económicas que o possibilitem.
Este, Sr. Deputado João Amaral, é um valor intocável na óptica da Europa que queremos, mas também na passageira incomodidade da negociação da ajuda financeira.
Temos confiança no Governo português que vem demonstrando sabedoria e capacidade diplomática para ultrapassar as dificuldades.
Temos plena consciência de que a componente política de apoio do Parlamento é, neste quadro e neste contexto, particularmente importante.
É esta, assim, a lição que queremos tirar deste debate.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A discussão sobre a Agenda 2000 tem a máxima relevância numa altura em que toda a construção europeia sofre de muitas dúvidas e incertezas.
Interesses paralelos, algumas vezes contraditórios, estão em jogo nesta negociação.
Para o Partido Popular cumpre a defesa intransigente do «interesse nacional», interesse esse que se manifesta, desde logo, em quatro áreas que reputamos de essenciais para Portugal.

Os portugueses não podem ser castigados pelo esforço feito no cumprimento dos critérios de convergência, que, sendo instrumentos importantes, não são objectivos económicos em si mesmos.
Na discussão da Agenda 2000 está em jogo um quadro de repartição de' verbas para sete anos (de 2000 a 2006), sete anos que se querem de desenvolvimento para Portugal e que para o Partido Popular constituem uma última hipótese para Portugal se aproximar da média dos Quinze, que são ainda hoje médias bem longínquas.
Portugal não é um país rico, não é um país que possa prescindir das ajudas dos fundos estruturais nem dos fundos de coesão.
Uma Europa forte tem de ser uma Europa solidária com os menos ricos e menos desenvolvidos. Nós somos dos menos ricos e dos menos desenvolvidos e não podemos nem devemos ter complexos de assumi-lo.
Portugal espera que o Governo português explique uma coisa simples aos nossos parceiros: «Há um caso português» com as suas inerências, com as suas dificuldades, com as suas necessidades e esperamos a cooperação e a coesão, pressupostos basilares da construção europeia em que acreditamos.
A nossa agricultura, as nossas pescas, a nossa indústria, as nossas vias de comunicação, as nossas infra-estruturas são ainda, em larga medida, muito deficitárias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma palavra para o dossier da Região de Lisboa e Vale do Tejo: esta região, que representa quase um terço da população portuguesa e mais de 40% do PIB, deixa de ser considerada Objectivo 1, porque ultrapassa os 75% da média comunitária prevista para este item.
Para o Partido Popular há toda a razoabilidade que este decréscimo seja lento e gradual, que, por um lado, não ponha em causa qualquer das obras em fase de execução mas que, por outro, não ponha também em causa algumas que estão há muito anunciadas e em fase de lançamento.
Lisboa e Vale do Tejo é uma região que ultrapassa já os 75% da média comunitária, mas é também verdade que está ainda algo distante de alcançar essa mesma média. Exige-se, portanto, na gestão destes fundos muito gradualismo para a Região de Lisboa e Vale do Tejo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lemos na comunicação social alguma dúvida sobre a posição portuguesa face a um eventual alargamento, nem sempre clara ou, pelo menos, nem sempre explicita.
A posição do Partido Popular face a esse mesmo alargamento, e por várias vezes reiterada pelos seus eurodeputados é simples: somos favoráveis a um alargamento faseado e negociado que nunca ponha em causa a coesão económica e social e que, por consequência, nunca possa penalizar aqueles que são já, hoje, os menos desenvolvidos dos Quinze.
Sublinhamos aqui o papel prioritário que representa para os Partidos Democratas Cristãos Europeus a ajuda a povos e países que lutam por ver as suas jovens democracias implementadas e solidificadas.
A adesão dos mais de Dez países que formalizaram a sua candidatura deve, como tal, ser feita por passos lentos mas seguros que aumentem a solidariedade sem prejudicar a coesão que hoje se visa atingir entre os Quinze e que está ainda muito distante dos números por nós, portugueses, pretendidos.
As notícias de que Portugal perde muitos e muitos milhões com o alargamento e que é altamente penalizado por

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este não podem, para nós, ter qualquer aceitação ou cabimento.
Sem entrar agora e aqui na discussão sobre se o alargamento será o abandono do aprofundamento, queria, no entanto, deixar claro que para o Partido Popular essa não seria nunca uma alternativa que pudéssemos aceitar. Esse seria, aliás, para nós, o mais egoísta e o mais perigoso dos caminhos a seguir.
Mas há- um terceiro ponto que é, para nós, decisivo na defesa do «interesse nacional». As regiões ultra periféricas, Açores e Madeira, têm que ser contempladas com programas específicos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Muito bem!

O Orador: -São regiões que quer pelas suas características quer pela sua especificidade que não atingem senão metade do PIB comunitário.
Chegamos, aliás, à triste conclusão de os Açores e a Madeira figurarem no indesejável rol das 10 regiões menos desenvolvidas da Europa.
O Tratado de Amesterdão teve a virtualidade de incluir um preceito (artigo 255.º, n.º 2) exactamente com vista ao tratamento do caso das regiões ultra periféricas. Refira-se, aliás, que é essa também a vontade dos representantes políticos de todos os partidos políticos com representação nos Açores e na Madeira.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O interesse nacional terá também de ser defendido nas difíceis negociações da PAC. A agricultura é um sector em evolução cujos contextos político, económico e social têm vindo a modificar-se.
A política agrícola deve adaptar-se às transformações em curso para preparar o terreno das futuras mudanças no sector.
A reforma de 1992 foi uma adaptação dessa política, contudo a perspectiva de um alargamento da União com a adesão dos PECO (Países da Europa Central e Oriental), as tendências de mercado a longo prazo, a próxima ronda de negociações da Organização Mundial de Comércio e o debate mais alargado sobre uma maior integração dos aspectos ambientais, sociais e de desenvolvimento rural na política agrícola são elementos importantes a considerar.
Na perspectiva do alargamento, entendemos que a agricultura portuguesa enfrentará problemas devido, sobretudo, a custos de produção mais baixos dos PECO, quer pelas maiores dimensões de muitas das explorações agrícolas destes quer pelos menores custos dos seus factores de produção, designadamente do trabalho, já que se julga que as diferenças quanto à capacidade de gestão e ao grau de integração do sistema agrícola não serão tão pronunciadas.
Devemos ainda aproveitar o debate da Agenda 2000 para discutir a correcção de outros desequilíbrios ainda mais gritantes do que os que motivam a proposta, como é o caso da iniquidade distributiva da PAC.
Entendemos que a PAC tem sido, claramente, uma política de anti-coesão, estando concebida nos actuais moldes para apoiar os produtos do norte da Europa e os países mais ricos no plano agrícola, tornando-se cada vez mais difícil a criação de condições para o tão desejado reequilíbrio da PAC. Isto é, enquanto que para a França e Alemanha vão mais de 40% das verbas do FEOGA-Garantia, para Portugal vieram 2,1 % destas verbas, bem menos do que a percentagem da nossa população.

Acresce ainda o facto, com o qual não podemos de forma alguma concordar, do privilégio dado a determinados produtos a apoiar. Ao distinguir como objectivos quantificados os cereais, a carne bovina e os produtos lácteos, é provocado um acréscimo de encargos de 6,1 milhões de euros com as ajudas directas e as transferências a ultrapassarem largamente a redução das despesas de mercado.
Assim, são beneficiados os produtos especialmente significativos nos países ricos do Norte, onde estas produções representam 50 a 65%.
Em relação aos produtos do Sul constatamos tão-somente um rol de intenções, o que, sem dúvida, revela, uma vez mais, o desequilíbrio proposto nesta Agenda entre a protecção e o apoio concedidos aos produtos da Europa do Norte e os concedidos aos produtos da Europa do Sul.
A opção ao nível da PAC é simples: queremos ou não que Portugal tenha um mundo rural vivo? O Partido Popular quer!
Queremos ou não que esse mundo rural dê aos nossos agricultores a possibilidade de se realizarem e prosperarem como os seus demais colegas europeus? O Partido Popular quer!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O desafio máximo da União Europeia é o da coesão económica e social. O desafio máximo de uma Europa forte tem de começar pela concretização de uma Europa justa. O desafio máximo que se põe a Portugal no seio destas negociações é, afinal; apenas um: ajudar a fazer uma Europa forte, uma Europa justa e, portanto, uma Europa económica e socialmente mais solidária e mais coesa.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Com a realização deste debate, a Assembleia da República tem hoje a oportunidade privilegiada de discutir, em moldes alargados, uma questão fundamental para o futuro europeu e de Portugal - a Agenda 2000.
É um debate que ocorre numa fase crucial no tocante à definição do que será o quadro financeiro da União até ao ano 2006, ou seja, é um debate que ocorre no momento em que se está a fazer a discussão sobre quais os principais instrumentos e sobre quais as principais regras a seguir relativamente a algumas políticas comunitárias. Políticas comunitárias essas que, de modo incontornável, são traços identificadores da lógica do projecto europeu e que terão reflexos marcantes no nosso país, nos nossos interesses mais directos, tanto no presente como no futuro.
O documento estrvturante em causa, a Agenda 2000, está invariavelmente condicionado na sua análise pelo espartilho imposto pelo pacto de estabilidade.
A Agenda 2000, na complexa soma das componentes que lhe estão associadas - quadro financeiro, reforma da PAC e futuro alargamento -, vai confrontar Portugal, julgamos que não por cepticismo mas por realismo, com uma negociação não isenta de dificuldades.
A Agenda 2000 vai, acima de tudo - é essa a nossa convicção -, determinar, não tanto no imediato mas a longo prazo, um futuro incerto, de contornos, no mínimo, cinzentos e inquietantes para o nosso país.

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É uma realidade que, no entendimento de Os Verdes, reclama não o cruzar de braços, não o conformismo, tão pouco a resignação áo «mal menor» que, não.raro, têm, em diferentes momentos, marcado a nossa atitude acomodada, discreta e submissa perante a Comissão, mas que reclama antes, dentro e fora das instituições, discussão viva, combativa e desassombrada de todas as questões envolvidas. Questões essas que a especificidade da realidade do nosso país, por um lado, e a própria sobrevivência do projecto político europeu - que só resistirá se vier a ser solidário e coeso -, por outro, é forçoso não ignorar!
São questões, em tempo de encruzilhada, às escalas europeia e planetária, que nos levam a questionar não só numa perspectiva de curto prazo, plena de pragmatismo como o nosso colega Deputado José Saraiva, enquanto relator da Comissão de Assuntos Europeus, o faz, dizendo: «(...) que dinheiro temos, para que o queremos?», mas questões, que implicam ir e ver forçosamente mais longe, exigindo a responsabilidade de se adoptar uma visão prospectiva, de longo prazo, que nos habilite a dizer (como alguém referia, com graça, há alguns dias) «o que queremos ser, quando formos grandes». Ou, dito de outro modo ainda, que projectos para Portugal, e para os portugueses temos, independentemente dos fundos? Para onde queremos ir? Que projecto de construção pretendemos para a Europa? Que papel dentro dela o do nosso país? E, nessa óptica, que compromisso assumimos de, através da nossa intervenção, a poder diferentemente, nos seus caminhos, influenciar?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: A questão do alargamento da União Europeia - que, recordo, Os Verdes defendem como princípio político para uma Europa do Atlântico aos Urais - está momentaneamente congelada. Circunscreve-se, para já, a uma vontade simbólica (a avaliar pela verba, também ela simbólica, que lhe está destinada) e confina-se, provavelmente, no máximo, no curto prazo ao horizonte limitado de um país, a Polónia. Este alargamento à Polónia é, porventura, ditado mais por razões de interesse directo de um país, a Alemanha, do que por razões de solidariedade face a outros.
Á questão do alargamento conjuga-se, contudo, no imediato, com outras que estão em discussão e lhe estão intimamente associadas: a reforma da política agrícola comum (PAC) e o futuro Quadro Comunitário, como realidades sombrias para Portugal, que não podem ser escamoteadas; a reforma dos fundos comunitários que a, concretizar-se, poderá significar o fim da atribuição do fundo de coesão a países, como Portugal - o fim imposto pela aceitação da óptica alemã e dos demais países ricos da União, obviamente a prevalecente, segundo a qual estes fundos apenas visariam reforçar os Estados membros mais pobres, nunca os que, como Portugal, já participam do euro.
Trata-se de uma leitura que importa, de todo em todo, contrariar, particularmente no tocante ao nosso país, desmontando a sua falsa argumentação e recusando a feroz penalização que comportaria, numa dupla perspectiva para o nosso país, acentuando ainda mais a já desigual partilha dos recursos dentro da União Europeia, de que somos destinatários.
É um critério inaceitável de quem pretende que as despesas do futuro alargamento se façam à custa da rubrica destinada ao apoio dos países mais pobres da União Europeia, como Portugal, ou seja, o critério de quem preten

de que o futuro da União se faça à custa da coesão, à custa do desenvolvimento, à custa do equilíbrio dentro da própria Europa, dos seus povos e das suas regiões.
Esta intenção, a não ser frontalmente contrariada, iria permitir que Portugal, apesar de deter cinco das mais pobres regiões de toda a União Europeia, pudesse, num futuro mais ou menos próximo, ver diminuir em cerca de um terço os fundos estruturais que actualmente recebe.
Portugal teria a Região de Lisboa e Vale do Tejo (abusivamente chamada de «rifa», mas certamente menos rica num país pobre do que qualquer região pobre num país rico) duramente penalizada ao ser excluída do Objectivo 1. Esta exclusão acarretaria efeitos desastrosos numa região em que vivem mais de 2,5 milhões de portugueses, que contribui com um terço da produção nacional e onde se concentra um quarto dos desempregados. E que seria penalizada por imposição de critérios egoístas dos países mais ricos, apesar das enormes carências do seu parque habitacional, das assimetrias do seu interior, da falta de equipamentos, das bolsas de exclusão e de pobreza, da degradação do espaço urbano, do enorme défice ambiental.
Trata-se de uma proposta politicamente inaceitável, entendem Os Verdes, ainda que camuflada ou suavizada por prestações que os regimes transitórios significariam, os quais atenuariam, eventualmente, a dor, mas manteriam intocável um mal que, uma vez aceite, se tornaria definitivo!
É, pois, um diagnóstico fortemente preocupante para uma situação que se tenderá a agravar, a prazo, pela associação devastadora, para Portugal, da PAC, cuja revisão. se anuncia.
A PAC, é bom lembrar, mantém Portugal com uma das agriculturas mais débeis de toda a Europa e anualmente expulsa, no nosso país, para as grandes metrópoles enormes massas de populações desenraizadas vindas do interior.
A PAC colocou a nossa dependência agro-alimentar face ao exterior em níveis perfeitamente insustentáveis e outra coisa não tem sido que não o desprezo pelas características e pelas potencialidades das produções mediterrânicas - o azeite, as hortofrutícolas, o vinho -, em favor das produções do Norte da Europa.
A PAC acentuou desequilíbrios demográficos, transformou Portugal, quase sempre, em contribuinte líquido de opções que se têm revelado culturalmente perigosas, socialmente injustas, ambientalmente suicidárias.
Pretende-se reformar a PAC reproduzindo precisamente a desastrosa orientação desta década e da pesada herança que lhe está associada.
Em nosso entendimento, é imperioso equacionar diferentemente a PAC, tendo em conta a evolução dos mercados. Para Os Verdes, uma nova política agrícola passa por colocar o emprego, os preços, a qualidade dos produtos agrícolas e o equilíbrio ecológico no centro das atenções futuras, ou seja, implica dominar a produção, produzir de forma diferente, respeitar o ambiente.
Trata-se de uma nova orientação que não se encontra na prioridade da exportação e na baixa de preços, que não se basta nas ajudas compensatórias, que passa por instrumentos de modulação ou de condicionalização das ajudas para favorecer ó emprego e o ambiente, mas terá, seguramente, de buscar-se em instrumentos, hoje inexistentes, de apoio concreto à qualidade dos produtos, à agricultura biológica, à saúde dos consumidores; à diversificação das produções, à preservação do equilíbrio ecológico.

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O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, já excedeu o seu tempo em dois minutos, pelo que tem de terminar.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo. Sr.ªs e Srs. Deputados: O conjunto de questões que a Agenda 2000 suscita é complexo e está muito para além dela própria. Esta é, pois, uma boa oportunidade para o Governo fazer o que, por regra, não é feito: reflectir para além das fachadas, olhar para além dos ciclos eleitorais. Do que se trata não é de brincar aos heróis, de ceder ao «facilitismo» ou à demagogia fácil; trata-se é de assumir a discussão pública, transparente e frontal do projecto europeu, tantas vezes proclamado mas, não raro, sem hipóteses, em nome daqueles em quem se ergue ser por eles discutido e questionado.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Jaime Gama): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo quer começar por agradecer à Assembleia da República e aos distintos parlamentares que acabaram de intervir a oportunidade da realização deste debate, não porque ele não se tenha vindo a fazer entre o Governo e a Comissão de Assuntos Europeus de uma forma muito particular, ao longo destes meses, mas porque o seu carácter de reunião pública também lhe confere a projecção necessária para um assunto que, como bem lembrou o Sr. Deputado João Amaral, é de grande relevância e projecção nacionais.
A Agenda 2000 representa um vastíssimo conjunto de opções e também um debate que marcarão o futuro da Europa para lá do ano 2000. Pelo menos no período de 2000 a 2006, estes grandes vectores estratégicos, quer.no plano da sustentação e viabilização financeiras, quer no plano de reformas essenciais para as políticas internas, quer também no quadro da reforma de uma das políticas mais importantes da União - a política agrícola comum -, encontrarão aqui a marca de uma verdadeira referência.
A Agenda 2000 é importante para nós não apenas pelas matérias que contém para a Europa, pelas matérias e pelas implicações que tem para Portugal, mas também pela circunstância de que será o nosso país a «arrancar» com a presidência da gestão da Agenda 2000 no primeiro semestre do novo milénio. Há aqui um quadro de responsabilidades que nos diz muito e, por isso, este debate temi uma implicação profunda na vida política portuguesa, não apenas para o Governo mas também para a oposição, para os parceiros sociais, para os agentes económicos e para a opinião pública em geral.
A Agenda 2000 tem três grandes eixos de desenvolvimento. O primeiro é a grande prioridade da Europa no fim da «guerra fria», o desafio do alargamento, o desafio da incorporação dos países que mudaram de sistema político e económico e em relação aos quais a Europa desenvolvida, corporizada na União Europeia tem um dever histórico de solidariedade, o qual nós próprios, os portugueses, não poderemos nem devemos enjeitar, visto que somos também objecto desse desiderato - aquilo que é bom para nós, aquilo que foi bom para nós será, deverá ser bom para os outros. Portugal está aqui num quadro de particulares responsabilidades em relação ao primeiro item da Agenda 2000: o alargamento.
A decisão do alargamento, como todos se recordam, foi tomada no Conselho Europeu de Copenhaga em 1993, por um impulso político e por um impulso. histórico. Ninguém, nessa altura, quis fazer contas, ninguém pediu relatórios sobre as implicações do alargamento em relação à União Europeia, tal como ela se encontrava constituída. É uma decisão que não é questionável, que é, eu diria, nesta Câmara, por todos sufragada. O Sr. Deputado João Amaral acabou de referir o seu acordo em relação a ela, dizendo que não está em causa o alargamento, que gostaria, todavia, de ver primeiro mais consolidados o aprofundamento, a coesão, mas que o alargamento é verdadeiramente inquestionável. É bom que isso também aconteça na Assembleia da República para termos plataformas mais alargadas e progressivas em relação ao consenso europeu.
Naturalmente, ao mesmo tempo que a União quer realizar o desiderato do alargamento, ela tem de reformar as suas políticas, por um lado, porque essas políticas exigiam e exigem reforma e, por outro lado, porque o imperativo do alargamento coloca a, própria União na necessidade de ajustar os seus procedimentos internos antes de proceder à etapa da incorporação dos novos aderentes e de saber cuidadosamente gerir os períodos de transição para as novas integrações. E aí é que, na discussão da Agenda 2000, estão em causa os dossiers tão importantes para nós como o emprego, o ambiente, a política científica e tecnológica, a coesão económica e social e o seu futuro numa Europa alargada, a política agrícola comum e a projecção da União Europeia na sua relação externa, quer na sua relação económica e comercial externa, reforçada agora à luz das responsabilidades da existência de uma moeda única, quer também da sua diplomacia, da sua política externa, da sua política de segurança à escala global.
Ninguém, na Assembleia da República, põe em causa que estes pontos sejam vectores importantes da agenda europeia e congratulo-me com a circunstância de nenhum. dos grupos parlamentares portugueses vir questionar a substância, a essência, a razoabilidade de qualquer destas políticas. Pode haver nuances na apreciação mas não há verdadeiramente um corte radical em relação a qualquer destas matérias, o que também contribui para reforçar o consenso nacional em torno do projecto europeu.
Naturalmente, o alargamento e a necessidade das reformas internas da União vêm colocar a questão que não foi colocada quando se decidiu, em 1993, optar pelo alargamento. E aqui surge todo o problema da perspectiva financeira, do novo quadro financeiro que, naturalmente, como em qualquer orçamento de um Estado ou de uma organização internacional, tem o problema do controlo da afectação da despesa, por um lado, e o problema da receita, por outro lado.
Neste debate, a perspectiva dos países é, obviamente, diferenciada. O debate tem sido introduzido na União Europeia, por um lado, por pane daqueles que - satisfeitos com a forma como a construção da Europa no sentido de um mercado único, de uma união económica e monetária, por virtude da competitividade das suas economias, tem representado enormes vantagens de escala - querem agora colocar o problema de uma melhoria do seu mecanismo de contribuição financeira para a Europa e, por outro fado, daqueles que têm vantagens no sistema de financiação da União Europeia. E, quanto a este aspecto, não me refiro apenas aos países da coesão, refiro-me também a outros ricos, porque os nichos de oportunidade de acomodação e de prazer na União Europeia não se colocam apenas ao nível dos países desenvolvidos, colocam-se ao nível de

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muitas das economias desenvolvidas, uns por terem encontrado sistemas em que a sua contribuição é muito menor em proporção do que é o seu produto em termos europeus, outros por se terem instalado no «sistema de financiação» da política agrícola comum e outros, ainda, porque detêm vantagens que resultam do funcionamento da economia real - enfim, esses têm uma perspectiva que é, eu diria, mais colocada do lado da despesa do que do lado da receita, neste debate.
O fundamental para que este debate seja feito de uma forma racional é que ele decorra simultaneamente numa perspectiva em que cada país assegure os seus interesses nacionais, que são sempre estáticos, mas também interesses dinâmicos e que o faça numa perspectiva europeia, por forma a que o debate sobre a Agenda 2000 não se transforme num debate gerador de correntes, estados de espírito ou perspectivas que ponham em causa, perante as opiniões públicas e os países, a própria ideia de projecto europeu e de construção da Europa. Isso nem sempre tem acontecido, mas é necessário dar um contributo para que essa tendência seja significativamente reforçada.
Devo, aliás, dizer a VV. Ex.as que, se comparamõs o debate sobre a Agenda 2000 no Parlamento português, o parlamento de um país que está confrontado com problemas específicos na discussão destas matérias, com idênticos debates em parlamentos congéneres, a primeira constatação a fazer é a da elevada sensibilidade europeia dos parlamentares portugueses em perspectivar exigências e pontos de vista importantes para a negociação portuguesa e isso é, sobremaneira, relevante.
Qual é o nosso conceito central de negociação? O nosso conceito central de negociação é o de que é justo realizar o alargamento, de que é necessário reformar e rever algumas das políticas e de que é também necessário proceder a um financiamento das reformas e do alargamento em que não haja sacrificados predominantes ou exclusivos e em que, sobretudo, se não venha a constatar que a maior percentagem de contribuição para o desiderato do alargamento acaba por ser a daqueles que menos capacidade têm no interior da organização e desse projecto. Por isso, sempre dissemos desde o início que nos batíamos não por uma ausência de responsabilidade ou participação em relação ao custo destas operações mas pelo desiderato de uma repartição equitativa de encargos em relação a este grandioso projecto.
Neste sentido, consideramos que o documento da Comissão de Assuntos Europeus foi uma boa base de trabalho e que, com base nesse documento, era necessário proceder às reflexões no Conselho nas suas diversas componentes, não apenas no Conselho de Assuntos Gerais ou no Conselho ECOFIN, mas também no Conselho Agrícola, nas formações responsáveis pela política regional e no Conselho Europeu. Consideramos ainda que, do nosso ponto de vista, o objectivo nesta negociação era o de continuar a manter para o período 2000/2006 o mesmo grau adequado de sustentação ao desenvolvimento da economia nacional, do que aquele que foi encontrado no quadro passado. Esse é um objectivo que nos parece razoável e é também um objectivo que acomoda a circunstância de o País, entretanto, se ter desenvolvido economicamente, ter ajustado alguns dos seus padrões de desenvolvimento económico e social e, consequentemente, também não poder encarar esta nova negociação na perspectiva estática em que foi colocada ou a negociação de adesão para a primeira fase da intègração, ou mesmo a negociação do próprio I Quadro Comunitário de Apoio,

que sustentou até agora e vai sustentar até ao fim deste ano o apoio ao desenvolvimento nacional.
Neste sentido nos temos batido nas negociações, no campo da chamada «batalha dos conceitos», que são os instrumentos que depois fixam as prioridades e as alocações financeiras, para que critérios como o do emprego sejam entendidos não na sua dimensão sincrónica mas na sua dimensão diacrónica, tendo em linha de conta o nível de preparação, de habilitações, de formação profissional, da valoração educativa da mão-de-obra. Temo-nos batido, ainda, para que a prosperidade nacional seja um factor importante na alocação das transferências regionais, para que Lisboa e Vale do Tejo seja uma região que venha a ser objecto de um fasing out suficientemente diferenciado e não disruptido, para a manutenção do fundo de coesão e da sua aplicabilidade a países que ingressaram na moeda única e para que iniciativas comunitárias, em especial as que se possam aplicar às regiões autónomas, se mantenham no quadro negociai futuro.
Temos, igualmente, no quadro agrícola, favorecido uma reorientação da política agrícola comum, norteada pelo objectivo de redução de preços com compensação nas ajudas directas, desde que estabelecidas três condições para essa transferência: em primeiro lugar, um reequilíbrio das ajudas por sectores, regiões e produtores; em segundo lugar, um modelo agrícola menos vulnerável, na perspectiva da evolução das negociações comerciais internacionais no quadro da globalização e da Organização Mundial do Comércio; e, em terceiro lugar, fazendo-a respeitar objectivos mais conformes com as temáticas do ambiente e do emprego na área agrícola. Significará isto um reforço da opção por políticas de desenvolvimento rural e uma diferenciação no nível de compensações nas reduções de preços que ocorrem nas reformadas organizações comuns de mercado, favorecendo os pequenos produtores e as regiões agrícolas de baixos rendimentos, por forma a que a redução de ajudas directas venha a sustentar uma política de activação do desenvolvimento rural, estendida a toda a União. Isto, naturalmente, tendo consciência de que a opção pelo desenvolvimento rural deve ser uma prioridade na reforma da política agrícola comum, para que ela não assente numa matriz absurda definida pelos países fundadores da União e cuja aplicação ao nosso país ainda represente uma maior distorção quanto ao que devem ser as finalidades de uma política agrícola justa, de uma política agrícola impulsionadora da competitividade, de uma política agrícola respeitadora de condicionamentos ambientais e de uma política agrícola inserida numa óptica de desenvolvimento rural e de geração e formação de emprego. Tem sido este o nosso objectivo genérico-no quadro da negociação.
Em relação ao financiamento e à perspectiva orçamental, naturalmente nós favorecemos uma alteração no mecanismo da receita e o nosso debate incide, neste momento, numa forma diferenciada de contemplar o factor produto nacional na maneira de realizar o sistema de recolha de recursos financeiros para a União, visto que Portugal, à sua dimensão, já é aí um país numa situação distorcida, na medida em que tendo 1,3% do produto da União Europeia, contribui com 1,4% dos recursos, havendo aqui um claro desfasamento, que é contrário à situação de países de economia mais rica, onde, apesar desse desnível económico, se verifica a situação inversa, isto é, participações maiores no PNB e participações menores no financiamento dos recursos comunitários.

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Também na área da despesa nos temos oposto a um conceito de estabilização que não significa a noção, que prezamos, de conservação de rigor nas contas e na gestão orçamental da União — aí temos dado, até, o exemplo de sermos um dos países que mais e melhor fiscaliza os gastos comunitários —, mas sim de não admitirmos que o conceito de estabilização seja entendido pêlos países que muitas vezes o propõem como uma forma encapotada de, com isso, significar unicamente contenção ou redução de margens de despesas para aquelas políticas cuja redução de despesa signifique, ipso facto, majoração na participação dos benefícios da União Europeia. Estamos, por isso, a desenvolver uma linha que, simultaneamente, nos coloca numa área de defensores do rigor orçamental, mas com diferentes critérios, sendo que consideramos já suficientes as margens de poupança previstas pela Comissão, quer quanto ao tecto PNB para a despesa total, quer quanto ao tecto PNB para as políticas estruturais, quer mesmo nas poupanças implícitas da linha directriz agrícola e na poupança implícita que está contida numa projecção de cenário para a introdução da data dos primeiros alargamentos, que, de todo, não é realista, ou seja, assegurando-se, dessa forma, margens mais do que suficientes para realizar poupanças aplicáveis em outras áreas.
Gostava de dizer que neste debate fui particularmente sensível a alguns argumentos. E o Governo bem pode dizer que deste debate incorpora, como argumentos, todas as intervenções de W. Ex.ªs, sem excepção. O problema não é o de encontrar os argumentos, o problema é o de converter os argumentos...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): — Em resultados!

O Orador: — ... numa linha negociai sustentada, e é isso que procuramos fazer com o apoio de VV. Ex.ªs. Daí, a importância de uma reunião como esta.
O Sr. Deputado João Amaral diz: «Não pomos em causa o alargamento, pensamos nos seus efeitos...». Nós também. O que vamos procurar é gerir os efeitos, mas já é importante que estejamos de acordo quanto ao alargamento.
Depois, diz: «É necessário que o Governo tenha posições negociais fortes e apoiadas...». Posições negociais fortes supomos que temos, e não nos reconhecemos nessa caricatura de negociação palaciana que o Sr. Deputado João Amaral julgou fazer a propósito da nossa intervenção.
Diz ainda o Sr. Deputado João Amaral: «O Governo dialoga, (...)» - vá lá, faz um aplauso ao Governo nesse ponto! - «(...) mas não mobiliza...». Pois bem, a partir deste debate, por iniciativa do Partido Comunista Português, o Governo também mobiliza.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Não, não! O PCP é que mobiliza o Governo! É um bocadinho ao contrário!

O Orador: — Mobiliza a Assembleia da República e agradece ao Partido Comunista Português que mobilize para este efeito e até que organize uma manifestação em Bruxelas a favor dos fundos estruturais.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Um pouco na linha do Sporting!

O Orador: — Os vossos autarcas, que têm beneficia-do com essas políticas, podem também participar numa
manifestação dessa natureza. Seria um contributo extremamente importante para reforçar ainda mais a posição portuguesa.
O Sr. Deputado Carlos Encarnação e o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan protagonizaram a estreia da nova AD em matéria europeia. É importante o facto de a AD ter contribuído para ampliar o espaço europeu nesta parte do Hemiciclo. Já é um trabalho que se fica a dever a esta iniciativa política, porque, naturalmente, isso também reforça o campo de manobra do Governo e do País.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): — Muito bem!

O Orador: — É um contributo interessante, mas, sobretudo, um contributo importante.
O Sr. Deputado Carlos Encarnação diz: «Portugal vai ser muito prejudicado com o alargamento...». Não sou tão céptico, Sr. Deputado, temos de ver tudo numa perspectiva dinâmica.
Por outro lado, não acredito que, em 1993, os senhores tivessem decidido o alargamento tendo a perspectiva de que Portugal ia ser tão prejudicado e não acredito que não tenham pedido os estudos prévios necessários para saber se isso ia produzir um efeito tão negativo. Mas talvez o desígnio histórico se tivesse sobreposto a essa análise de implicações e de consequências. Nós somos pela opção do desígnio histórico, mas V. Ex.ª não pode se tão crítico e tão céptico quanto a uma decisão que foi também de V. Ex.ª.
Depois, pergunta: «Onde deixou o Governo a agricultura portuguesa?». Bom, é uma declaração para consumo interno. Pois bem, o governo, em 1992, teve a oportunidade de fazer uma reforma da PAC onde podia ter introduzido os objectivos que precisamente agora, com o apoio de V. Ex.ª, vão ser introduzidos na Política Agrícola Comum.

O Sr. António Martinho (PS): — Muito bem!

O Orador: — Portanto, estamos precisamente na altura de suprir uma deficiência que resulta de uma grande perda de oportunidade em 1992. É isso que estamos a fazer.
V. Ex.ª diz: «Lisboa e Vale do Tejo é urna região que vai sair do objectivo 1...», referindo ainda a aplicação do factor prosperidade nacional. Na realidade, isto não está relacionado com o factor prosperidade nacional. A aplicação do factor de prosperidade nacional permitirá gerir um melhor ou pior faseamento da saída de Lisboa e Vale do Tejo do objectivo 1. Mas V. Ex.ª sabe perfeitamente que a fixação do plaflond em 75% do PNB para uma região sair do objectivo l foi fixada na negociação do Tratado de Maastricht pelo governo de V. Ex.ª — que nós apoiamos, não estou a pôr isso em causa, aliás, isso é público. VV. Ex.ªs, nessa altura, não apoiaram, mas agora apoiam.
Risos do PS.
Portanto, também é preciso ter isso em conta, porque, desse modo, alargamos mais a família europeia e passamos a fazer parte de um consenso ainda mais alargado, que eu diria «um consenso verdadeiramente imbatível».

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contributo do comissário português na Comissão ao elaborar e subscrever o projecto Agenda 2000.
Há, pois, aqui uma matéria de enorme consenso. Sr. Deputado Carlos Encarnação, quando vejo, nas palavras de V. Ex.ª, frases que podem ser profundas dúvidas ou críticas ao projecto de Agenda 2000, apresentado pela Comissão, estou a ver o trabalho que teve o comissário português na Comissão para poder chegar ao ponto de subscrever a Agenda 2000, tal como é apresentada nesta versão da Comissão. É um esforço que também o País muito agradecerá neste debate sobre a Agenda 2000.
Pois bem, a parte que mais me custou da intervenção de V. Ex.ª foi, convictamente, o seu lamento em relação ao endividamento das famílias. É que V. Ex.ª leu apenas o título da imprensa, não leu o conteúdo da notícia, e esqueceu que as famílias portuguesas continuam a ser as que mais poupam e aforram relativamente à União Europeia, a seguir à Itália, o que nos dá, nesse ponto, uma margem de estabilidade enorme. Mas também se esqueceu de dizer que esse aumento de endividamento é para aquisição de casa própria em mais de 80% dos casos. Esse é que é o grande facto social que V. Ex.ª não deve nem pode ignorar. Ou seja, trata-se da circunstância de, nos últimos dois anos, ter havido 450 mil novas casas que foram vendidas a novas famílias, relançando o mercado de habitação e permitindo realizar uma política de acesso a bens sociais indispensáveis, resultado da estabilização financeira, da forma como o Governo prosseguiu, com rigor, o controlo orçamental, que logrou a entrar na moeda única, com a redução da inflação e das taxas de juro. Há aí uma mudança radical que V. Ex.ª tem de entender, porque não deve apresentar o resultado catastrófico daquilo a que chama endividamento das famílias, sem considerar que está aí uma mudança social significativa no rendimento e no bem-estar das famílias nunca alcançada em anos precedentes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Para concluir, gostaria de dizer o seguinte: o Governo vai prosseguir, reforçado agora com este apoio maciço do Parlamento português, a sua linha de orientação em sede de Agenda 2000. Fá-lo-emos na perspectiva daqueles que têm objectivos coerentes a alcançar, os que já vos expliquei, em nome do Governo. Criticaremos a mentalidade anti-europeia daqueles que se apresentam no debate da Agenda 2000 apenas com a perspectiva do contribuinte líquido, o que nos parece a génese de um pensamento anti-europeu deplorável, mas, por outro lado, também não prosseguiremos este debate da perspectiva portuguesa no quadro mental do assistencialismo puro e simples, pelo que a defesa dos nossos interesses tem de ser realizada numa perspectiva dinâmica que incorpore igualmente a nossa capacidade para influir na agenda europeia, no seu conjunto. S6 assim é que teremos a credibilidade adequada para proteger os interesses portugueses, mas protegê-los de uma forma dinâmica.
Estamos perante uma negociação muito difícil, estamos a enfrentá-la, e este debate é importante. Mas também gostava de deixar claro o seguinte: o debate da Agenda 2000 é difícil, mas não é o debate de ou sobre uma catástrofe ou um mau resultado. É um debate positivo que tem atrás de si resultados positivos na construção da Europa, prefigurados no quadro mais radical, com a criação da moeda única e as suas implicações à escala internacional, mas também resultados positivos no quadro do de-

senvolvimento português, que materializam um balanço positivo sobre a adesão de Portugal à União Europeia e a comparação entre aquilo que é hoje a economia. na sociedade portuguesa e aquilo que era a economia da sociedade portuguesa quando Portugal entrou na União Europeia.
Temos desafios pela frente, mas a agenda europeia é precisamente um centro de debate onde se vai dar resposta positiva a esses desafios. Por isso, temos que o perspectivar numa lógica de realismo, de optimismo racional e não numa lógica de receios ou de diabolização sistemática sobre o futuro, que constituem as modalidades mais perversas de justificar a inacção ou ausência de opções.
Congratulo-me com o facto de o debate da Agenda 2000, o teor das intervenções e a evolução de posições políticas neste Hemiciclo em torno da ideia europeia terem também demonstrado como o projecto europeu era correcto, como a ideia europeia era justa e como, hoje, ninguém, nesta Assembleia, se levanta para apresentar uma alternativa ao crescimento e desenvolvimento nacionais fora da União Europeia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, os Srs. Deputados António Brochado Pedras, Octávio Teixeira e Carlos Encarnação.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Brochado Pedras.

O Sr. António Brochado Pedras (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, quero colocar a V. Ex.ª duas questões muito singelas.
É patente, a propósito da discussão da Agenda 2000, que há interesses conflituantes entre os países do Norte, ricos, ditos contribuintes líquidos e os países do Sul, mediterrânicos, pobres, normalmente tidos como beneficiários dos fluxos financeiros da União.
Infelizmente, o contraponto entre uns e outros países não se pauta apenas pela riqueza, porque também sabemos que, normalmente, os países do Norte são mais previdentes, planeiam a longo prazo e, sobretudo, planeiam a pensar nos instrumentos de que dispõem; são cautelosos. Em contraponto, os países do Sul apresentam, normalmente, planos e projectos em cima do joelho, sem meditarem convenientemente sobre eles e sobre os meios de que dispõem para depois os concretizar.
Sei que estas negociações que vão decorrer em Berlim são difíceis e, portanto, vão depender da habilidade diplomática dos Estados e dos seus representantes.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Fiquei convencido, pela intervenção de V. Ex.ª, porque não a achei suficientemente convincente nem viva, que iríamos ter alguma dificuldade nessa altura. Sei também que, em Bruxelas, aquilo que se diz de manhã normalmente não é igual ao que se diz à noite, os representantes do Estado são volúveis. Diz-se, até, para significar esta mudança frequente de vontades por parte dos Estados, que o mesmo dia é, simultaneamente, dos «falcões» e das «corujas».
Portanto, temo que as negociações possam não chegar a bom termo. Nessa eventualidade, pergunto a V. Ex.ª se o Estado português tem objectivos, planos e políticas bem pensadas e bem gizadas, que possa esgrimir e mostrar para

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que, num futuro próximo, ainda que não seja aquele que é apontado na Agenda 2000, possa realmente vir a usufruir e a dar aos portugueses projectos credíveis que possam ser concretizados pelo nosso país. Esta é a primeira questão.
A segunda questão prende-se com a problemática das alianças. Até há bem poucos dias, dizia-se que o Estado português não tinha aliados e estava isolado entre os países pobres, mesmo em relação à Espanha. Dizia-se que a Espanha, apesar de prejudicada, era menos prejudicada do que Portugal, porque dependia menos de fundos estruturais.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Eu sei que, normalmente, os partidos socialistas gostam de se proclamar os mais solidários de todos.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Por outro lado, constatei que, neste processo, foram precisamente governos socialistas, da Holanda e da Alemanha, a mostrarem menos solidariedade pelos outros.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Bem lembrado!

O Orador: - Será que, efectivamente, o apoio do governo do nosso vizinho Aznar e do Partido Popular é que vai ser determinante para que Portugal consiga aquilo que pretende?

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Ou será que V. Ex.ª e o Sr. Primeiro-Ministro terão encantos para conseguir a solidariedade junto dos partidos sociais-democratas para nos poderem apoiar nesta conjuntura bem, difícil?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Fui informado que o Sr. Deputado Carlos Encarnação se inscreveu não para pedir esclarecimentos mas para a defesa da honra. Lamento ter frustrado a sua prioridade.
Tem, agora, a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD):.- Sr. Presidente, a culpa foi minha. Peço desculpa, porque na altura ouvi citar o meu nome como inscrito para pedir esclarecimentos e não corrigi de imediato. Mas fi-lo para não prejudicar os trabalhos, foi numa boa intenção.

O Sr. Presidente: - Não há lugar a culpas. Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, tal como V. Ex.ª, o Sr. Ministro com certeza também compreenderá que é sempre com boa intenção que tomamos iniciativas, designadamente esta, que apresentámos agora conjuntamente com o CDS-PP, em relação a matéria europeia.

Tocou-me profundamente a sensibilização que V. Ex.ª teve para com esta iniciativa e o gáudio que ela em si provocou: «Gaudium et spes», diria. V. Ex.ª ficou com este sentimento de gáudio e certamente também com um sentimento de esperança por ver acrescida a nossa responsabilidade em matéria europeia, responsabilidade essa acompanhada de instrumentos concretos que permitem a si e ao seu Governo dizer lá fora aquilo que nós queremos.
Em segundo lugar, Sr. Ministro, em relação a 1993 e ao alargamento: nem V. Ex.ª, nem o PCP, nem ninguém, aqui, neste Parlamento; questionou o alargamento. Nem era possível questioná-lo em 1993 (como o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus muito bem acena), porque se tratava de uma declaração política, e, nesse ano, enquanto estavam na oposição - e V. Ex.ª era um brilhantíssimo Deputado - V. Ex.ª não teve a lembrança de elabbrar um documento em que exigisse ao governo de então as contas para 1999. Mas, V. Ex.ª fez bem, porque, na altura, se tratava de uma decisão política. Entre 1993 e 1999 vão seis anos, e, portanto, entretanto já se poderia ter feito alguma coisa, que V. Ex.ª não exigiu na altura, mas que agora julga ser retroactivamente devida e possível.

O Sr Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, V. Ex.ª falou na Região de Lisboa e Vale do Tejo e no limite de 75%, e falou bem! Só que V. Ex.ª, certamente porque não terá ouvido, não anotou o que eu tinha dito. O que comparei foi isto:«Lisboa e Vale do Tejo podia continuar». E podia continuar porquê? Reportando-me àquilo que V. Ex.ª disse em relação a critérios anteriores, Lisboa e Vale do Tejo já tinha, antecipadamente, ultrapassado o critério, mas manteve-se, porque o critério era político e suficientemente dócil e dúctil para a comportar.
Por outro lado, se o Governo tivesse querido resolver o problema em antecipado, como seria sua obrigação, teria feito aquilo que eu na minha pobre intervenção disse, que era o que se fez na Grã-Bretanha.

Vozes do PS: - Oh!

O Orador: - Portanto, V. Ex.ª, com o exemplo da Grã-Bretanha, alterando as NUT permitiria que certas regiões dentro da Região de Lisboa e Vale do Tejo pudessem perfeitamente continuar no objectivo comum.

Os Srs. Luís Marques Guedes e Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Assim, V. Ex.º está limitado ao phasing out, mas de qualquer das maneiras poderia ter feito isso de outra maneira.
Última parte, Sr. Ministro: fiquei sensibilizado - e o Sr. Presidente também estará sensibilizado para me conceder mais trinta segundos a fim de que eu termine...

O Sr. Presidente: - A minha sensibilidade não tem fim, Sr. Deputado.

O Orador: - Compreendo, Sr. Presidente, mas em 30 segundos terminaria, dizendo que fiquei extremamente sensibilizado também, Sr. Ministro, com a sua vocação para a economia e as finanças públicas. V. Ex.ª não se

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lembrou foi daquilo que a Comissão Europeia disse ao Governo Português em matéria de consolidação orçamental.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Não diga disparates!

O Orador: - A Comissão Europeia, na semana passada, disse que não era suficiente, mas isso são águas passadas, são matérias de outros Ministérios.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Só diz disparates!

O Orador: - Permita-me, Sr. Ministro, encerrar apenas com a referência que V. Ex.ª fez ao título dos jornais. Em relação a esta questão acrescentar-lhe-ia que não foi um título, Sr. Ministro. V. Ex.ª, se calhar, leu o título, mas eu li: «Hemâni Lopes, Sarsfield Cabral, João César das Neves...» e ainda «...António de Almeida». Hoje mesmo, Sr. Ministro!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Leia os documentos! Se quiser os documentos oficiais eu dou-lhos!

O Orador: - E são os quatro economistas consagrados - um dos quais ex-colega do Governo de V. Ex.ª que acabam de dizer aquilo que eu próprio disse.
E se houvesse alguma dúvida em relação a isso, a limitação que foi feita ao crédito para a habitação significaria que o Governo também estava atento - não V. Ex.ª, mas o resto do Governo - a este fenómeno. Dívida é dívida, Sr. Ministro, seja para a compra da casa, seja para a compra do carro, seja para a compra dos bens de cada
dia!

Aplausos do PSD.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Vai ver, muito em breve, o que pensam os donos das casas!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra para dar explicações, querendo, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Presidente, em relação ao Sr. Deputado Carlos Encarnação e à honra a defender, nem há explicações a dar, no bom sentido! Mas há a oportunidade de lhe prestar um esclarecimento, que é o seguinte: essa modalidade, que V. Ex.ª congeminou, de fazer desdobrar num artifício de geografia departamental Lisboa e Vale do Tejo teria por consequência uma transferência de recursos financeiros para o conjunto da actual área de Lisboa e Vale do Tejo muitíssimo inferior àquilo que é a expectativa menos optimista de todo e qualquer cenário. Porque V. Ex.ª acabaria por pôr a zona urbana de Lisboa, que é onde reside a maioria da população, numa média tão elevada que seria impossível gerir qualquer phasing out para esse conjunto e não iria beneficiar, de todo em todo, uma área com menor população e que, por via desse seu artifício, teria de ser integrada em outros esquemas normais. É uma teorização que não parece saída da cabeça de V. Ex.ª.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, uma vez que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros tem ainda um outro pedido de esclarecimento e vai responder conjuntamente aos dois, vamos passar à votações, já que estamos na hora estabelecida nos termos do Regimento.

Logo a seguir darei a palavra ao Sr. Deputado Octávio Teixeira para formular o seu pedido de esclarecimento e depois ao Sr. Ministro para responder aos dois pedidos conjuntamente.
Vamos, pois, dar início às votações com o projecto de resolução n.º 112/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 332/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 64/VII (PSD)].

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PS.

Srs. Deputados, vamos agora passar à votação do projecto de resolução n.º 113/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 333/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 65/VII (PSD)].

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PS.

Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 114/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 334/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 66/VII (PSD)].

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PS.

Srs. Deputados, vamos agora votar o projecto de resolução n.º 115/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 335/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 67/VII (PSD).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos agora passar à votação do projecto de resolução n.º 116/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 336/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 68/VII (PSD)].

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos agora passar à votação do projecto de resolução n.º 117/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 337/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 69/VII (PSD)].

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos agora passar à votação do projecto de resolução n.º 118/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 338/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 70/VII (PSD)].

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

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Srs. Deputados, vamos agora passar à votação do projecto de resolução n.º 119/VII - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 339/98, de 3 de Novembro (PSD) [apreciação parlamentar n.º 71/VII (PSD)].

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos de seguida votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 183/VII - Define as bases gerais a que obedece o estabelecimento, gestão e exploração de serviços postais no território nacional, bem como os serviços internacionais com origem ou destino no território nacional.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP e votos contra do PCP e de Os Verdes.

A proposta de lei que acabou de ser votada baixa à 4.ª Comissão.
Finalmente, Srs. Deputados, vamos passar à votação final global das propostas de alteração, aprovadas na especialidade pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, relativas ao Decreto-Lei n.º 115-A/98, de 4 de Maio, que aprova o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como dos respectivos agrupamentos [apreciação parlamentar n.º 52/VII (PCP)].

Submetidas à votação, foram aprovadas, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PS.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, era só para anunciar que o PCP fará chegar a sua declaração de voto sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Terminadas as votações, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira para formular um pedido de esclarecimentos ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

Pausa.

Srs. Deputados, se concordassem - e creio que há consenso nesse sentido -, uma vez me esqueci de o fazer no momento em que terminaram as votações, penso que podíamos passar à discussão e votação do voto de pesar n.º 146/VII.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, não chegámos a um consenso porque o Grupo Parlamentar do PCP não deu a sua concordância para interromper prolon-

gadamente a sessão de perguntas ao Sr. Ministro que estava a decorrer.

O Sr. Presidente: - O que propõe, Sr. Deputado? Que o voto de pesar seja discutido e votado no fim da sessão de perguntas ou no fim dos trabalhos?
Acontece que recebi uma informação, vejo que inexacta, de que havia consenso nesse sentido, no entanto não me parece que haja problema.
Vamos, então, continuar os pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira para formular o seu pedido de esclarecimento.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: três perguntas rápidas, a primeira das quais sobre a questão dos consensos.
Consensos em termos meramente verbais, orais, é fácil! O problema é confirmar os consensos na prática. E quando o Sr. Ministro refere que, pelos vistos, haverá consenso nas grandes questões que devem-ser defendidas no âmbito do debate da Agenda 2000 por parte de Portugal, depois verifica-se que, em termos práticos, não parece ser assim. Quando o Sr. Ministro refere que o relatório da Comissão é uma boa base de trabalho e quando V. Ex.ª, Sr. Ministro, refere que não deve haver sacrificados determinantes, está, ao fim e ao cabo, à partida, a aceitar que possa vir a haver custos a serem suportados pelos países que não os deviam suportar.
Aliás, é neste mesmo sentido que as ilações que V. Ex.ª extrapola sobre eventuais coincidências de posições relativamente ao projecto da União Europeia... V. Ex.ª sabe que não é assim, porque defendemos um projecto de construção da União Europeia substantivamente diferente daquele que tem sido defendido pelo Governo nas instâncias comunitárias. Nós defendemos, de facto, uma Europa social e uma Europa da coesão.
A segunda questão, Sr. Ministro, é sobre a problemática do alargamento.
É evidente, já aqui foi referido pelo meu camarada João Amaral, que para o PCP a questão do alargamento não está posta em causa, lógica e naturalmente, desde que o alargamento seja feito no respeito pela vontade dos pobres e países respectivos, etc., em que haja interesses comuns e em que, ao fim e ao cabo, o alargamento seja feito em benefício dos países que já estão na União Europeia e daqueles que vão entrar.
Mas, V. Ex.ª referiu, ainda a respeito do princípio do alargamento, que, em 1993, quando houve a decisão política do alargamento, não se pensou na problemática económica, ou seja, nas consequências económicas e financeiras. Sr. Ministro, certamente, que ninguém terá pensado, nessa altura, que o alargamento seria feito sem haver a correspondente actualização dos recursos financeiros necessários para fazer esse alargamento. Ninguém - aliás, o próprio Governo de V. Ex.ª já teve oportunidade para tal, depois de 1993, no ano do Tratado de Amsterdão sentiu a necessidade de fazer uma alteração ao Tratado de Maastricht, retirando de lá o princípio fundamental da coesão económica e social e, por conseguinte, o alargamento terá de corresponder a esse princípio, e, logo, a questão do aumento do financiamento.
Mas isto conduz-nos à terceira e última questão, Sr. Ministro, que se refere ao problema da defesa dos interesses nacionais. V. Ex.ª diz que todos os países defendem os interesses nacionais - os ricos e os não ricos, ou os po-

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bres, como nós. O problema é que há aqui uma questão substancialmente diferente: é que nós, quando defendemos, e fazemos a defesa que fizemos, com base no princípio da coesão económica e social, estamos a fazer uma defesa dos interesses nacionais, mas uma defesa legítima face aos próprios tratados existentes. Os pises ricos, quando fazem a defesa daquilo que fazem contra o princípio da coesão económica e social, não têm legitimidade para o fazer. Nesse sentido, Sr. Ministro, julgo que, se o Governo continuar a abrir as portas em sede de negociação para que os países mais pobres, como Portugal, sejam prejudicados, certamente que poderá ver manifestações mobilizadas pelo PCP não em Bruxelas mas eventualmente à porta do Palácio das Necessidades.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder conjuntamente aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Brochado Pedras e Octávio Teixeira, tem a palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: — Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Deputado do CDS-PP colocou duas questões, a primeira em relação a um cenário catastrófico sobre o não resultado destas negociações. Não temos essa perspectiva; vai ser uma negociação difícil, mas é uma negociação que tem de ser concluída e nada mais imperativo para fazer terminar uma negociação do que ser absolutamente imperativo ela terminar.
Em relação à segunda pergunta que coloca, pois bem, nós gerimos este problema com governos de outros países membros da União Europeia e, naturalmente, havendo interesses diferentes na negociação em determinadas áreas, interesses coincidentes noutras, a negociação tem de ser conduzida tendo em conta essa diversidade. Nesse contexto, o diálogo que temos mantido — o Primeiro-Ministro, eu próprio, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus — com todos os governos europeus, sem excepção, seja de países da área dos contribuintes líquidos, seja de países da área da coesão, é a prova de que estamos a encarar essa negociação numa perspectiva correcta, e numa perspectiva nacionalmente correcta.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira fez duas perguntas que foram duas precisões de posição, e eu aceito-as como tal. Na verdade, houve diferença entre consensos orais e consensos na prática. Mas, nesta primeira precisão de sentido, acabou bem, porque disse: «Há diferenças profundas quanto ao projecto de construção da União Europeia...» É suficiente! Quanto ao alargamento, também fez uma precisão, mas para concluir, de forma correcta, que o alargamento era importante e que a conservação da política de coesão era igualmente relevante.
Um terceiro ponto, que não é uma pergunta, é urna constatação que sublinho inteiramente, isto é, que a defesa da conservação da coesão como princípio enformador dos tratados é correcta, legítima, juridicamente acertada e que, por isso, nós temos razão quando advogamos a sua preservação e não têm razão os que querem revogar ou derrogar os tratados à luz de subterfúgios de interpretação, verdadeiramente improcedentes, sobretudo quando o Tratado de Amsterdão reforçou o quadro de visibilidade da coesão económica e social na arquitectura dos próprios tratados que regulam a União Europeia. Não sei se isso
surpreenderá V. Ex.ª, mas Jaime Gama subscreve inteiramente Octávio Teixeira!

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A reforma da Política Agrícola Comum é verdadeiramente um dos «nós górdios» da Agenda 2000 e do próximo futuro da União Europeia. O modo como a reforma da PAC for resolvida permitirá aferir se, mais uma vez, o Governo português opta por uma política de pequenas trocas que acabam por se traduzir em progressivas dificuldades para o aparelho produtivo nacional, no caso o aparelho produtivo agrícola, ou por uma postura em que, questionando o próprio modelo actual da PAC, se coloca ao lado dos sectores mais lúcidos e contribui para uma nova estrutura da política agrícola, garantindo desse modo o futuro sustentado da agricultura portuguesa.
Como é sabido, o actual modelo da PAC mergulha os seus contornos e as suas orientações no contexto histórico em que foi criada. Concebida numa Comunidade a seis e com o objectivo confesso de aumentar a produção agro--pecuária numa Europa altamente deficitária em bens alimentares, a PAC desde logo foi orientada, na definição dos objectivos e no desenho dos apoios, para as grandes produções dos países que então constituíam a Comunidade. Cereais, carne de bovino e leite constituíram assim as primeiras grandes produções apoiadas.
As orientações iniciais da PAC tiveram, sem dúvida, sucesso quantitativo (a Comunidade passou de deficitária a excedentária), embora à custa da liquidação de centenas de milhar de pequenas explorações, a uma concentração da produção e fundiária e a uma multiplicação das despesas agrícolas. Só que, entretanto, os sucessivos alargamentos da Comunidade conduziram a realidade do mundo rural a uma agricultura mais diversificada tanto do ponto de vista dos sistemas culturais como do ponto de vista da estrutura das explorações agrícolas. Realidade nova esta que coincidiu com o início de irracionais políticas restritivas do aumento da produção, independentemente das responsabilidades de cada país nos alegados excessos de produção; com o início de um processo tendente a reduzir as despesas orçamentais da Comunidade à custa da política agrícola e com orientações tendentes à cada vez maior liberalização dos mercados no quadro da integração da agricultura nas negociações do GATT.
A reforma da PAC de 1992, defendida e aprovada em pleno consulado do PSD e da presidência portuguesa, foi o culminar de uma primeira etapa deste processo altamente lesivo para os interesses da nossa agricultura e dos nossos agricultores.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Muito bem!

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e o facto de se ter, por interesse dos grandes países exportadores, alargado à agricultura os mecanismos da ultraliberafzação do comércio mundial, obrigando a uma artificial descida de preços só parcialmente compensados por ajudas ao rendimento (o que constitui também uma das linhas mestras de orientação propostas para a próxima reforma, Sr. Ministro!), conduziu a que hoje mais de metade (56%) do rendimento total do sector agrícola da União Europeia resulte de apoios comunitários. Só que, pelas razões que expus, 83% dos apoios foram para três produtos: culturas arvenses, leite e carne de bovino. Entretanto, os chamados produtos mediterrânicos tiveram um nível de apoios que não ultrapassa os 7%, se excluirmos o tabaco.
Um exemplo concreto: os cereais beneficiam de ajudas directas à produção correspondente a 58% do respectivo rendimento total; os produtos mediterrânicos - o vinho, as frutas e os hortícolas - não beneficiam de qualquer ajuda directa à produção. Esta distribuição completamente desequilibrada dos apoios - beneficiando as chamadas produções continentais e prejudicando as produções do Sul - é, aliás, contraditória com o facto de serem os sectores agrícolas dos países ditos mediterrânicos (Portugal, Espanha, Itália e Grécia) que mais contribuem para o valor acrescentado bruto (VAB) agrícola da União Europeia: 53% contra 47% dos países do Centro e do Norte da Europa.
De todo este quadro, resulta que o nível de apoios por agricultor dos países mediterrânicos seja três a seis vezes inferior ao que recebem os agricultores dos países do Centro e do Norte da Europa. Mas mesmo esta realidade, já de si desequilibrada, agrava-se quando fazemos uma análise mais fina, país a país. Aqui, os agricultores portugueses aparecem como os que menos apoios recebem da Comunidade: 1.100 ECU por activo agrícola em apoios aos preços e 800 ECU por activo agrícola em ajudas ao rendimento, quando a média na União Europeia é, respectivamente, de 6.800 ECU e de 3.700 ECU; para não citarmos a Grécia, onde é 2.900 e 2.600 ECU; a Espanha, 3.700 e 4.100 ECU; a Itália, e por aí adiante. Perdoem-me o excesso de dados estatísticos, mas só assim conseguimos ter uma visão séria e fundamentada do que significa a afirmação, tantas vezes repetida, de que a actual PAC descrimina as agriculturas e os agricultores do Sul, e, em primeiro lugar, a agricultura familiar. Mas, chegados aqui, é necessário recordar que o País também tem culturas continentais - cereais e oleaginosas, carne e leite - que não pode nem deve abandonar pela sua importância nacional, regional e social, e para as quais é necessário continuar a garantir políticas que as não inviabilizem.
Mas há mais elementos a reter neste diagnóstico. A PAC foi forjada para uma agricultura altamente profissionalizada - de que a Holanda, que está na sua origem, é o paradigma - e, portanto, os regulamentos comunitários privilegiam os agricultores ditos profissionais. Os apoios são atribuídos em função da produção, da dimensão das explorações e do tempo de trabalho que cada um dedica à actividade agrícola. Só que, em Portugal (e, em geral nos países do Sul), a realidade é completamente outra. Nós temos uma agricultura de base essencialmente familiar, a tempo parcial, policultural. Os regulamentos comunitários e a sua repetição mecânica pelos governos portugueses faz com que, por um lado, os apoios se concentrem nas explorações de maior dimensão e que, por outro, mais de metade dos agricultores portugueses não tenham acesso a apoios ao investimento nem aos apoios às

regiões desfavorecidas. Só podem apresentar projectos de investimento os agricultores que dediquem mais de metade do seu tempo de actividade à agricultura e retirem dela mais de metade do seu rendimento. Tal como só têm acesso às indemnizações compensatórias os agricultores «profissionais». Se soubermos que, em Portugal, o grau de profissionalização é de cerca de 25% contra valores que oscilam entre os 58% e os 75% nos países do Centro e do Norte da Europa, então percebe-se porque é que o grosso dos agricultores portugueses está fora de qualquer sistema de apoios. E percebe-se também que o sistema faça com que, em Portugal, os apoios se concentrem particularmente nas explorações de recorte latifundista que têm como orientação económica predominante os cereais e as oleaginosas. Estas culturas, que contribuem somente com 1,7% para o Valor Acrescentado Bruto (a preços de mercado), beneficiaram em 1996 de um nível de ajudas ao rendimento de 190% nos cereais e de 216% nas oleaginosas quando, em contraste, as explorações predominantemente de tipo familiar, assentes na horticultura, na fruticultura e no vinho, que contribuem com mais de 50% para o valor acrescentado bruto, tiveram um nível de suporte zero.
Srs. Deputados, quando falamos em Agenda 2000 e reforma da PAC, é isto que está em causa. É este modelo que acabei de apresentar. Ora, a solução desta questão não é compatível com remendos, com pequenos negócios, com moedas de troca, em que a agricultura e os agricultores portugueses saem sempre a perder.

Aplausos do PCP.

A solução desta questão não é compatível com a renacionalização dos custos da PAC, em que 25% das ajudas directas à produção seriam suportadas pelos orçamentos nacionais. Independentemente da dimensão global concreta que este valor assuma - e que está longe de estar esclarecido -, o princípio da renacionalização é inaceitável para Portugal e põe em causa o princípio da coesão e da solidariedade tão apregoados nos tratados. Porque a renacionalização pode levar a um acréscimo de encargos para o Orçamento nacional, que pode eventualmente chegar a cerca de metade das despesas nacionais actuais com a agricultura; porque a renacionalização, tendo presente as capacidades orçamentais de cada país e o exemplo da dimensão que já hoje assumem as ajudas nacionais por agricultor, conduziria a que se acentuasse o desequilíbrio entre os rendimentos dos agricultores portugueses e dos restantes países; porque a renacionalização desequilibraria ainda mais os apoios às produções, com prejuízo para as culturas mediterrânicas; porque a renacionalização significaria que, durante décadas, os países setentrionais foram apoiados para que as suas agriculturas se desenvolvessem e agora os agricultores portugueses teriam de pagar os custos da irracionalidade da PAC.
O Governo português, aliás, deve dizer claramente qual é a orientação que defende nesta matéria e em tudo o que tem a ver com a reforma da PAC. A -proposta da Comissão e a renacionalização é uma boa base de trabalho, como defende o Ministro dos Negócios Estrangeiros e a Secretaria de Estado dos Assuntos Europeus? Ou é inaceitável, como por vezes afirma, para consumo interno, o Ministro da Agricultura, que já chegou a afirmar que esta proposta da PAC só passaria por cima do seu cadáver? Faço votos, Sr. Ministro, para que não tenhamos brevemente mais uma baixa no Governo!

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O PCP rejeita qualquer orientação baseada em novas e generalizadas descidas de preços ao produtor, que nunca são compensadas pelos apoios ao rendimento, como sabemos; que sacrifique a agricultura portuguesa no altar das negociações como moeda de troca de hipotéticos ganhos noutras áreas da Agenda 2000; bem como rejeitamos que a solução para o financiamento da comunidade seja encontrada à custa dos agricultores portugueses, em que - para usar a sua expressão de há pouco, Sr. Ministro - os sacrificados predominantes seriam seguramente os portugueses, os agricultores portugueses. Mas o Governo português não pode cobrir-se exclusivamente com as consequências da PAC.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Porque há responsabilidades nacionais iniludíveis nas políticas que têm sido seguidas. Ao longo destes anos, após a integração comunitária, ontem com o PSD, hoje com o PS, o que se tem feito é uma gestão política e clientelar dos apoios e dos subsídios. Não se apostou no que seria essencial: uma reconversão estratégica, tecnológica e ao nível dos sistemas produtivos que permitisse reorientar os sistemas culturais para uma agricultura de sucesso e competitiva em que o caso do Alentejo é, a este propósito, paradigmático. Não se apoiou prioritariamente a agricultura familiar, que é o suporte fundamental do nosso tecido agrícola. Não se apostou no rejuvenescimento da população activa agrícola nem na renovação da sua formação e qualificação profissional. Não se investiu na investigação. Não se estimulou nem o associativismo de produção nem de comercialização, para os agricultores poderem fazer face às novas exigências do mercado distribuidor. Deitaramse aos campos, em particular aos campos dos grandes proprietários e do sector agro-alimentar, centenas de milhões de contos sem resultados eficazes. Não se acompanham as negociações externas com países terceiros que afectam os interesses nacionais como foi o recente e escandaloso acordo negociado entre o Comissário Deus Pinheiro e a África do Sul, permitindo que este País - e outros! - continuem a usar a denominação «Porto» num vinho que fabricam.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Hoje, a agricultura portuguesa está mais fragilizada, mais empobrecida, mais desertificada. Não é isto, Srs. Deputados, a fotografia da falência de uma política?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça o favor de terminar.

O Orador: - Estou a terminar, Sr. Presidente.
O que fazer neste quadro? Avançamos dez propostas.
Primeira: recusar o modelo «pronto-a-vestir» da PAC que querem continuar a impor-nos e defender a aplicação do princípio da coesão, da solidariedade e do reconhecimento da diversidade das agriculturas europeias, rejeitando uma reforma feita às fatias, produto a produto, sem uma revisão global do figurino da PAC.
Segunda: defender o direito a produzir e o direito de cada povo se alimentar. Reclamar para a agricultura três valências: produção de alimentos de qualidade para os

consumidores; preservação da ocupação e do ordenamento do território; preservação do meio-ambiente.
Terceira: recusar a renacionalização dos custos da PAC.
Quarta: propor que seja dado aos produtos mediterrânicos tratamento similar aos concedidos às produções dos países setentrionais introduzindo para aqueles o sistema de apoios à produção e de medidas de suporte de preços, no respeito, aliás, pelas conclusões do Conselho Europeu «jumbo» de Setembro de 1993.
Quinta: defender a modulação, isto é, a fixação de apoios degressivos ao investimento e de um tecto para as ajudas ao rendimento, fixando-se um limite máximo por exploração. A modulação deveria também permitir uma majoração dos apoios tendo em conta o emprego gerado e o rendimento médio dos produtores europeus.
Sexta: alargar o acesso aos apoios ao investimento, bem como as indemnizações compensatórias a todos os agricultores.
Sétima: estabelecer um sistema .de apoios que permita dar resposta a explorações assentes numa agricultura policultural e que estimulem a reconversão tecnológica e cultural.
Oitava: ligar os apoios à produção à função de preservação do meio-ambiente e ocupação do território e à produção de produtos regionais de qualidade.
Nono: não aceitar que a agricultura portuguesa fique amarrada aos seus níveis históricos de produção e produtividade, porque tal significa amarrar o atraso da agricultura portuguesa ao seu próprio atraso.
E décima e última, Sr. Presidente: recusar o agravamento do processo de liberalização dos mercados agrícolas com o desaparecimento das ajudas e da protecção existentes para os produtos agrícolas, em curso no seio da OCDE e da OMC.
Estas são a nossa reflexão, as nossas preocupações e críticas, as nossas propostas para um tema de inegável importância nacional e decisivo para a configuração da Europa que se quer construir. Uma Europa onde recusamos que seja eliminado, em nome dos sacrossantos interesses do mercado e das restrições orçamentais, um sector produtivo essencial à segurança alimentar dos consumidores, ao futuro dos produtores e ao seu rendimento, e à sobrevivência e desenvolvimento de um mundo rural moderno e dinamizador do território.
Sr. Presidente, os meus agradecimentos pelo tempo que utilizei.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não encontrei antídoto contra a sua veemência!
Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, na sua intervenção uma série de «nãos» são «sins», porque é preciso distinguir aqui entre uma política que nós todos criticámos e a política recente do Governo na agricultura, com prioridades diferentes de outras que existiam antes.
Relativamente às suas 10 propostas - foi pena elas terem sido lidas com exigências de tempo -, algumas merecem, naturalmente, uma reflexão aprofundada, mas há uma ou outra, Sr. Deputado, que me parece que não vêm do Deputado Lino de Carvalho nem do Partido Comunista. Algumas dessas propostas parece que estão no outro

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mundo; outras, efectivamente, têm realismo e assentam em preocupações.
O Sr. Deputado não acha que a estratégia do Governo português nas negociações da Agenda 2000, quando procurou desenvolver uma estratégia de uma forma global, foi vantajosa para Portugal? Efectivamente, há o reconhecimento, por intervenções diversas — e hoje gerou-se aqui esse reconhecimento — de que essa estratégia foi adequada.
E no que se refere às negociações da reforma da política agrícola comum, não é verdade que o Governo e o Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas têm procurado apresentar propostas, não estão só à defesa, indo ao encontro das nossas realidades agrícolas, tão diversas no que respeita a agricultores, a regiões e a sectores?
Não é verdade que o objectivo definido na Cimeira do Luxemburgo de conduzir a soluções economicamente sãs e viáveis, socialmente aceitáveis, tem tido uma resposta com propostas por parte do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Governo português?
Concordamos que o sistema de ajudas em vigor é prejudicial para Portugal. Estamos de acordo com isso. Outros, porventura, não estarão, mas nós estamos de acordo com isso! Não se adequam às condições agro-ecológicas portuguesas e à realidade sócio-estrutural. Nós rejeitamos, Sr. Deputado, a renacionalização da PAC, mas quer parecer-me que há outros Deputados ou há outros partidos que deixam entreaberta a porta para o co-financiamento. Foi o que me pareceu poder ler numa declaração do Sr. Deputado Arlindo Cunha no Parlamento Europeu, ainda na semana passada. Pela nossa parte, o Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas foi bem explícito ao rejeitar o co-financiamento nesta reforma.
Mas, neste processo negocial, julgo que todos podemos e devemos concordar que são coerentes as propostas que vão no sentido de beneficiar os produtores mais pequenos, mais desfavorecidos e de regiões de baixos rendimentos; que é correcto defender verbas específicas e significativamente aumentadas para o desenvolvimento rural; que é ajustável à nossa realidade propor a modelação das ajudas em função da dimensão das explorações e do nível de produtividade. E eu sei que propostas concretas estão em Bruxelas, da iniciativa do nosso Governo.
Mas, Sr. Deputado, perante tudo isto, as minhas três perguntas finais: como valoriza a atitude do Governo português neste processo negociai? Admite ou não a justeza dos objectivos e estratégias? E por que não reconhecer que a estratégia do Governo português é claramente merecedora de apoio?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho, que dispõe, para o efeito, de 2 minutos que a Mesa lhe concedeu.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — Sr. Presidente, eu não quero, de novo, abusar do tempo concedido...

O Sr. Presidente: — Assim espero!

O Orador: — ... e, portanto, direi rapidamente ao Sr. Deputado António Martinho, primeiro, que foi, seguramente, porque, na parte final da minha intervenção, tive de
acelerar que V. Ex.ª não pôde seguir com cuidado as 10 propostas, e também não as vou aqui repetir, mas estou em crer que o Sr. Deputado, depois de as ler, estará, então, em condições de me dizer em concreto qual é aquela que é de «outro mundo», porque, pelo que vejo, são todas deste mundo muito concreto e, sobretudo, são do nosso mundo agrícola, que é o que interessa quando estamos a discutir a estratégia de Portugal em relação à Comunidade Europeia.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — A segunda questão tem a ver com a estratégia do nosso Governo — no fundo, a sua pergunta é esta — em relação à Agenda 2000.
O Sr. Deputado disse — e bem! — «estratégia do Governo» e não do Ministro tal ou tal e a questão que todos nós precisamos saber, em matérias fundamentais de política agrícola comum, é qual é, de facto, a estratégia global do Governo, que irá, penso eu, fazer uma intervenção no encerramento do debate e terá oportunidade de dizer se é a favor ou contra o princípio da renacionalização.
É verdade, como o Sr. Deputado diz, que o Deputado Arlindo Cunha, do PSD, numa proposta de emenda que apresentou a um relatório no Parlamento Europeu, porventura por precipitação, fê-la de um modo tal que abria a porta à renacionalização. O Sr. Deputado Arlindo Cunha já veio explicar, em carta que hoje foi distribuída à Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, que, exactamente por se ter precipitado, depois votou contra a sua própria proposta.

Vozes do PSD: — Não foi isso!

O Orador: — Mas, enfim, essa questão esteve, de facto, em cima da mesa.
Agora, Sr. Deputado, em matéria de contradições, o Governo não está isento, porque, enquanto oiço o Ministro dos Negócios Estrangeiros e o Sr. Secretário de Estado e o Sr. Ministro Gomes da Silva, depois do Conselho de Cardiff, dizerem que a proposta da Comissão é uma boa base de trabalho, o que significa admitir o princípio da renacionalização, o actual Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas diz que não. Ora, nós queremos saber qual é, de facto, a resultante destas afirmações contraditórias do Governo.
Portanto, Sr. Deputado, esta questão que ponho para a reforma da PAC poderia pô-la, por exemplo, quando oiço o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros dizer aqui, como disse há pouco, que aceitava como princípio de discussão a ideia da redução dos preços. É essa a posição do Governo? Não pode ser, seguramente!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

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Portanto, peço ao Sr. Presidente e à Mesa que fizessem distribuir pelo Plenário a carta enviada, hoje mesmo, pelo Sr. Deputado Arlindo Cunha, em que explica que não houve qualquer lapso. A intervenção dele foi na defesa dos interesses nacionais e explica cabalmente o por quê da sua iniciativa e qual foi o desenvolvimento que essa iniciativa teve no próprio Parlamento Europeu, para que não subsistam dúvidas e seja reposta a verdade.

O Sr. Presidente: - Essa carta foi-me enviada a mim?

O Orador: - Sr. Presidente, vou enviá-la à Mesa e peço que a Mesa a mande distribuir.

O Sr. Presidente: - Agradeço, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Sobre a Agenda 2000, reflectimos detalhadamente ao longo do último ano em sede de Comissão de Assuntos Europeus. Interessa agora, quando já se fala de uma nova conferência intergovernamental (CIG), olhar para o futuro, sobretudo para a nossa postura, face ao processo de integração europeia.
Interessa, por isso, olhar, também para os desafios internos da Agenda 2000.
Como escreveu Francisco Lucas Pires, em posfácio ao seu derradeiro livro, «(...) o que está à nossa frente é, em qualquer caso, uma "nova" Europa, perante a qual o mínimo a fazer é despertar um espírito de recomeço e nova partida».
Entrámos agora numa fase aparentemente mais dura (em matéria de negociação), mas, na verdade, muito mais política do que tecnocrática.
Com efeito, os negociadores passam, de facto, a negociar, de forma mais clara, o «deve e haver» das várias políticas.
Os políticos poderão, ao fazer política, pondo em causa o funcionamento das instituições e a sua democraticidade, as prioridades da União Europeia para os seus eleitores e para os seus programas políticos, gerar a dinâmica necessária a uma nova fase de integração.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Julgo que já estamos a viver essa nova fase e muitos ainda não o perceberam.
Serão, agora mais que nunca, os políticos que terão que dar uma resposta aos problemas que hoje estamos aqui a discutir.
A Espanha e Portugal têm um dilema: ou adoptam o que era a tradicional «postura grega» e apenas protestam e «ameaçam», como meros negociadores de fundos; ou se adaptam finalmente à nova era política e propõem também reformas para a Europa que sirvam os seus verdadeiros interesses de longo prazo, preparando-se antecipadamente para elas.
É este o único modo de fazer política na União Europeia. E, por esta via, há muito a fazer na defesa de uma Agenda 2000 que vá ao encontro dos nossos interesses de longo prazo, enquanto portugueses e enquanto europeus.
O Governo encomendou três estudos sobre as consequências para Portugal do alargamento da União Europeia

e sobre a Agenda 2000. O PSD encomendou um outro estudo sobre o impacto do alargamento.
Todos os estudos sobre as consequências para Portugal do alargamento aos PECO chamam a atenção para as vulnerabilidades da economia portuguesa; para os malefícios da inclusão do critério do desemprego na atribuição dos fundos estruturais;...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... para a subsídio-dependência em que vivemos; para as distorções criadas pela PAC; para vários aspectos negativos do processo negociação em curso sobre a Agenda 2000, que discutimos em detalhe na Comissão de Assuntos Europeus ao longo dos últimos meses; para a necessária adaptação à liberalização do comércio internacional; e para a situação específica da economia portuguesa, ela própria periférica e numa clara fase de transição. Ou seja, não é o alargamento que é preciso evitar ou protelar mas certas políticas da União Europeia que é preciso reformar.
Mais uma vez, só teremos capacidade negociai se formos consequentes na nossa atitude, se adoptarmos o lema «o que é bom para Portugal é também bom para a Europa».
Se, por hipótese, adoptássemos a ideia pedincha da mera «compensação» com fundos, nada ganharíamos e perderíamos capacidade negocial.
Portugal deve, quer por razões políticas, quer por razões económicas, continuar a posicionar-se na linha da frente na defesa do alargamento, naturalmente acautelando os nossos interesses, e, ao mesmo tempo, lutar pelas reformas necessárias à União e a Portugal.
Ao estar na União Europeia e na União Económica e Monetária, Portugal está, à partida, no clube dos ganhadores, mas precisa fazer mais, para além da aposta no euro, para ser um verdadeiro ganhador.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Esperemos que, pelo facto de termos
apostado bem no euro, possamos agora apostar, por ante
cipação e com muito mais determinação, na qualidade de
vida.
As prioridades da presidência alemã nesta matéria constituem, aliás, uma oportunidade única para a adaptação da diplomacia portuguesa à nova Europa em que vivemos.
É fácil perceber quais são ou quais serão as futuras orientações políticas da União Europeia. Resta saber se o queremos perceber, como fazem os países que tiram verdadeiro partido das instituições e políticas comunitárias, ou se as queremos ignorar, ficando a discutir «pacotes» e «arranjos», com saudades do passado.
Conseguimos chegar ao euro, acabando com a possibilidade das desvalorizações; é agora preciso acabar com as derrogações.
É necessário actuar ao nível dos incentivos, não dirigidos ao investimento estrangeiro mas a todo o investimento, não através de incentivos errados, como seja a mera redução indiscriminada dos custos energéticos, que é como quem diz venham para cá poluir à vontade, mas através de uma fiscalidade incentivadora da criação de empresas e de empregos de futuro.
É aqui que ainda reside a nossa vantagem comparativa.
Alguns dos países mais competitivos do mundo fazem
parte da União Europeia, têm uma forte protecção social,,

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laborai e ambiental e, por isso, têm tido capacidade de resposta à crescente globalização da economia, sobrevivendo mesmo à recente liberalização do comércio internacional e até às recentes desvalorizações asiáticas.
Temos, por isso, que apostar, em primeiro lugar, em nós próprios. Podemos estar certos de que, se não apostarmos na qualidade, não haverá língua, lusitanidade ou universalidade que nos valham.
Em vez de pedir derrogações ou não implementar directivas, devemos adoptar directivas que vão mais além na defesa dos nossos interesses de longo prazo.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Não resisto a citar novamente Lucas Pires, que escreveu, pouco antes de nos deixar: «quando, alguns partidos, reconhecem que a Europa já não é uma escolha mas uma necessidade, eis mais uma razão para, sobretudo, os europeístas, poderem agora passar à crítica da insuficiência e da impotência da Europa actual e fazerem a pergunta logicamente subsequente: sim, mas qual Europa?».
S6 uma maior integração política poderá ajudar à nossa realização como portugueses enquanto europeus, dando-nos mais espaço para fazer valer as nossas qualidades.
Precisamos de nos livrar do provincianismo nacionalista e da mentalidade proteccionista dos interesses organizados; precisamos de nos livrar dos entraves diplomáticos relativamente a todas as tentativas europeias de cooperação; precisamos de nos livrar dos oportunismos e de tudo o que é supérfluo para a nossa afirmação no mundo; precisamos de regressar ao primado da política.
O debate é hoje entre progressistas e conservadores, como o foi nos EUA, no século passado, e na União Soviética, no tempo da Perestroìka.
Nós encontramo-nos entre os primeiros. Não aderimos ao projecto europeu apenas pelos seus benefícios económicos, por mera conveniência política e tão-pouco por arrasto dos acontecimentos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Bem lembrado!

O Orador: - É isto que devemos ter em conta quando defendemos os nossos interesses específicos, as políticas e os recursos adequados às nossas necessidades nesta negociação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: -Para uma intervenção, tema palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A importância do debate da Agenda 2000 está bem expressa não só na forma como esta Assembleia tem acompanhado o assunto como no relevo que gradualmente a comunicação social nacional e europeia lhe têm vindo a dar deforma crescente.
A Comissão Parlamentar de Assuntos Europeus que, sob a clarividente presidência do Deputado Medeiros Ferreira, decidiu promover oportunamente um conjunto de audições, já as efectuou, aliás, com eurodeputados portugueses, membros do Governo das Regiões Autónomas e elementos do Conselho Económico e Social, tem procurado acompanhar cuidadosamente este processo, tendo-o também debatido, numa das últimas reuniões, com o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

Sr. Presidente, o que está em causa verdadeiramente no dossier da Agenda 2000 é a necessidade de compatìbìlìzar o processo de alargamento da União Europeia aos países do Centro e Leste europeu com a manutenção do esforço de coesão económico-social no âmbito da União.
E não nos devemos deixar intimidar por propostas que reduzam os montantes ou proponham a redução de montantes a serem aplicados no reforço dessa mesma coesão económico-social, mas queremos, decididamente, apoiar os esforços dos governantes e negociadores portugueses no sentido da obtenção de uma situação final equilibrada.
Srs. Deputados, Caros Colegas: Convém estarmos conscientes de que, para além das contradições de interesses entre países da coesão e países mais ricos, existem também algumas contradições de interesses entre diversos Estados dos mais desenvolvidos da Europa. Se é verdade que, globalmente, lhes interessará não aumentar, ou até reduzir, o orçamento global da União, não é menos verdade que se deverá encarar e discutir a redistribuição de algumas responsabilidades e encargos entre alguns deles.
Como também é importante, e interessaria aprofundar, a análise aqui rapidamente aflorada pelo Sr. Deputado João Amaral sobre as alterações no quadro de competitividade económica europeia que o alargamento trará e as suas consequências para Portugal. É claro que o alargamento a Leste, do meu ponto de vista, poderá aumentar.mais as ameaças para a economia portuguesa do que as oportunidades. Mas este aspecto é tão importante para analisar, quando se fala da coesão económico-social, como os efeitos dos fundos e da PAC.
Interessa procedermos a uma reflexão sobre o quadro monetário em que se inscreve esta negociação da Agenda 2000, num momento histórico em que a União se encaminha para construir um único espaço monetário, a partir da actual zona do euro, alargada gradualmente dos 11 aos 15 e, mais tarde, englobando progressivamente futuros Estados aderentes.
A coesão política desta União, cuja construção ganha progressivamente contornos mais aperfeiçoados, terá que assentar não apenas nas instituições políticas existentes e num espaço monetário que se unifica e queremos consolidar mas também numa coordenação de políticas económicas, cujo aprofundamento será exigido pelo próprio funcionamento do espaço unificado do Euro.
Sr. Presidente, temos, no entanto e simultaneamente, que compreender várias questões, várias delas já abordadas com profundidade no relatório do Sr. Deputado José Saraiva ou superiormente analisadas nas intervenções do Sr. Deputado Manuel dos Santos e do Sr. Ministro Jaime Gama.
Srs. Deputados, todo este dossier das negociações, envolvendo a chamada Agenda 2000, tem de ser encarado com a seriedade necessária por parte das forças políticas e sociais portuguesas. E a que temos assistido, recentemente? Certamente a algumas intervenções interessantes e a uma defesa de interesses nacionais por parte de algumas forças e sectores políticos, mas convém irmos eliminando as cabriolas políticas diversas e algumas manobras canhestras, bem como as actuações demagógicas por parte de determinados sectores partidários.
Sejamos claros: punhamos o nome aos actores sociais e políticos.
Procurará o PSD, com o discreto apoio do seu novo parceiro europeísta, estabelecer tão alto a fasquia dos objectivos, de forma a que nunca ou muito dificilmente possam ser atingidos? E para quê? Para, em qualquer caso,

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seja qual for o resultado final obtido, possam vir a dizer que o Governo falhou, que Portugal foi prejudicado!

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - Convém que continuem a pretender defender os interesses nacionais e não a quererem dificultar a actuação dos negociadores portugueses. Seria uma atitude irresponsável que nunca poderemos vir a aceitar!

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, afloram sempre dois PSD em todos os debates, como neste: um, mais europeísta e civilizado, e outro, a pender-lhe a tendência para o ultramontano e trauliteiro. Em qualquer caso, quero referir ao Sr. Deputado Francisco Torres que fiquei satisfeito com o apoio que deu à nova medida incluída no Orçamento do Estado para 1999, que justamente alarga aos investidores portugueses alguns apoios que já estavam previstos para investimentos estrangeiros pelo governo anterior.

O Sr. José Magalhães (PS): - Aí está!

O Orador: - E, quanto ao PCP, o que dizer? Conjugam-se no seu interior duas atitudes. E nós esperamos sinceramente que a preocupação com os interesses nacionais, no quadro da construção europeia, sobrelevará certamente as antigas atitudes hostis face à União Europeia. Não podemos participar às arrecuas na construção europeia! E todos os grandes partidos nacionais e forças sociais são indispensáveis! Temos, no entanto, que, em qualquer momento, ponderar as armas adequadas a cada fase, neste espaço de compromisso, coesão, competição e lutá, que é a União Europeia.
Na nossa perspectiva e neste caso, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o interesse nacional português coincide, grosso modo, com o grande objectivo da coesão económico-social europeia.
Nesse sentido, diria que é claro que o processo de avanço equilibrado da construção europeia deverá obrigar a uma mais completa reformulação da PAC. Concebida para satisfazer essencialmente as necessidades das agriculturas da Europa centro-ocidental, é necessária a sua reformulação, nomeadamente, mas não só, no sentido de se dar maior peso ao apoio aos produtos da Europa meridional e da zona mediterrânica. Por outro lado, o próprio processo de alargamento da União leva a verificar a inaplicabilidade da actual PAC aos países, candidatos do Centro e Leste europeu, no seu conjunto; efectivamente, a manterem-se as regras actuais, a simples aplicação da PAC à Polónia inviabilizaria os actuais limites orçamentais da União Europeia.
Em síntese - e isto é importante -, há que estarmos conscientes da difícil compatibilização do que poderíamos chamar de quatro vértices: primeiro, a manutenção do limite orçamental de 1,27% do PIB da Europa da União; segundo, a construção da política agrícola comum, na sua actual forma; terceiro, um apoiado alargamento a leste; quarto, a continuidade de um nível de fundos comunitários que garanta a manutenção e o reforço da coesão económica e social. As características definitivas da Agenda 2000 evidenciarão como se romperá este quadrilátero de contradições com a nossa (de Portugal) qualificada participação.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Um espaço monetário único exige, logicamente, a

coordenação gradual das políticas económicas e um avanço no sentido de uma maior harmonização fiscal.
Uma ambição europeia mais forte obrigará, certamente, a que se venha, mais tarde ou mais cedo - gostaríamos de mais cedo do que mais tarde -, a pôr em causa o tecto de 1,27% do que poderíamos chamar de «Produto Europeu Bruto» como limite orçamental e, obviamente, os limites que, por segurança, prudência ou vontade de poupança, alguns procuram estabelecer a um nível ainda menos ambicioso. É necessário, no entanto, percebermos que a atitude não poderá ser a de cada país exigir tudo para si próprio e nada para os outros, atitude que afagaria o chauvinismo, mas faria perder credibilidade; deverá ser, sim, a de negociar soluções equilibradas, que garantam a coesão económico-social europeia e reforcem as condições prévias ao alargamento. Um espaço monetário unificado e a exigência da solidariedade europeia implicam um enorme e lúcido esforço negocial, com realismo, determinação e empenhamento, da forma como o nosso Governo está a conduzir.
Como já foi, aliás, afirmado, com brilhante poder de síntese, é preciso que, no final desta negociações, «ninguém tenha uma solução óptima, para que ninguém tenha uma solução péssima».
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito gostaríamos que o País no seu conjunto, todas as forças sociais e políticas, se apresentasse unido, apoiando os esforços dos nossos negociadores, do nosso Governo, nesta difícil discussão da Agenda 2000. O interesse nacional assim o exige. Esperemos que, para alguns sectores políticos, a bandeira partidária não venha a contar mais do que o azul da Europa, nem se sobreleve obviamente aos interesses nacionais. Para outros, entre os quais nos incluímos, mas não estando sozinhos, muito pelo contrário, o interesse nacional, neste caso, identifica-se claramente com o da coesão social e económica europeia.
Por nós, socialistas, pretendemos e apoiamos a melhor solução para Portugal, que será, certamente, a que reforça a coesão social e económica europeia e, com ela, o avanço do processo de construção da União Europeia!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao usar da palavra a propósito da Agenda 2000, sinto que terei de fazer uma intervenção «ultraperiférica» e, como tal, muito chegada ao fim do debate e necessariamente curta.
Mas por isso, também, as distâncias que represento, quer geográfica, quer económica, como ainda social, exigem-me, para que possa ser minimamente ouvido, redobrado esforço e empenho.
Todos sabemos, e não seria sério não reconhecer, que estamos perante negociações difíceis e da maior importância para o nosso país.
Estando em causa, como estão, superiores interesses de Portugal, devemos, acima de tudo, concertar entendimentos e procurar convergir quanto ao essencial, que salvaguarde o melhor possível a nossa posição nas várias vertentes dos fundos comunitários para o período de 2000 a 2006.
Mas é exactamente para que nos entendamos quanto ao essencial e para que encontremos o mais amplo denomi-

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nador comum que é importante não abdicarmos, enquanto oposição, das críticas que consideramos adequadas e das opiniões que temos por pertinentes e válidas, naturalmente imbuídas de acrescidas preocupações de defesa dos interesses de Portugal.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não podemos, aliás, deixar de manifes
tar alguma apreensão por, aqui ou ali, se revelar no dis
curso do partido do Governo algum europeísmo deturpa
do, afirmando-se que, primeiro, está a Europa e, depois,
Portugal.
Antes de mais, esta não é a forma correcta de colocar a questão da nossa presença e participação na construção da União Europeia.
Por outro lado, as questões que se colocam, no âmbito da Agenda 2000, relativamente a Portugal, não envolvem, ou não devem envolver, a dicotomia Portugal/Europa em termos de subalternização de uma das partes.
Na verdade, não obstante o esforço de recuperação dos últimos 12 anos, Portugal ainda está longe de atingir as metas que o coloquem a par dos países mais desenvolvidos da Europa, além de que mantém profundas assimetrias internas, como as que se registam entre as regiões autónomas e o continente.
Por ser assim, a União Europeia, ao prosseguir o seu percurso, designadamente pela via desejável do alargamento, tem de encontrar a forma, e mesmo o necessário reforço financeiro, para que tal não aconteça com quebra do esforço de coesão económica e social e de correcção de assimetrias, que já vinha fazendo, com particular incidência nos países do Sul, mais carenciados.
Para tanto, não.é necessário qualquer incompreensível posição contrária ao alargamento, mas já é justificável que nos batamos pela criação das condições adequadas à sua efectivação, sem prejuízo do ritmo de melhoria económica e social dos países que já integram a União Europeia.
E esta atitude não envolve qualquer chauvinismo, já que a Europa em que nos integramos e que queremos ajudar a construir não pode ser pensada tão-só com preocupações de mero alargamento de mercados e de influências, com maior ou menor valor estratégico, mas como uma Europa, económica e socialmente, coesa, que não se compadece com a interrupção ou, sequer, abrandamento do esforço de recuperação dos países, económica e socialmente, mais atrasados e já membros, de pleno direito, da União Europeia.
Neste contexto, assume particular relevância, no caso português, a problemática das regiões ultraperiféricas da Comunidade, em que se integram os Açores e a Madeira.
Esta, aliás, não é uma realidade nova para a União Europeia e, se é certo que o particular atraso dessas regiões continua a justificar regras preferenciais e apoios específicos, também não é menos verdade que a opção das regiões autónomas de integrarem, de pleno, sem estatutos menores, a então CEE trouxe à Comunidade um valor acrescentado, já pela sua localização geográfica, já pela vastidão da sua zona económica exclusiva e mar territorial, o que não pode ser desprezado nem esquecido.
E Portugal tem, a propósito das regiões autónomas, argumentos dos mais relevantes para que continuem a ser assegurados apoios específicos para as regiões ultraperiféricas, adoptando-se mesmo um programa próprio, sucedâneo do REGIS, que tantos benefícios trouxe a ambas as regiões.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É bom lembrara declaração comum dos Estados-membros da CEE, anexa ao Tratado de Adesão, em que todos se vincularam a este apoio às Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores. Como não deve ser esquecido que foi Portugal, através do, então, Primeiro-Ministro, Professor Cavaco Silva, que-fez vingar, pela primeira vez, no seio da União Europeia, na Cimeira de Rodes, de Dezembro de 1988, o princípio e conceito da ultraperiferia, como base de adopção de regimes preferenciais e de apoios específicos, que tão importantes benefícios trouxeram às regiões autónomas e muito contribuíram para o aprofundamento do princípio da continuidade territorial.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seria paradoxal e incompreensível que, por via do artigo 299.º do Tratado de Amesterdão, se tenha passado a reconhecer, em sede de direito comunitário institucional, que não em meras disposições de direito derivado, as especificidades das regiões ultraperiféricas e, agora, da Agenda 2000, adviesse uma diminuição sensível dos apoios comunitários às regiões ultraperiféricas, ou seja, no nosso caso, aos Açores e à Madeira, que são parte integrante do Estado português, e não meros departamentos ultramarinos, e têm um PIB per capita dos mais baixos de todas as regiões da Europa.
O Governo tem, pois, argumentos, bastantes e de sobra, para, a par da defesa global dos interesses de Portugal, se bater, fundadamente, por programas específicos e adequados às regiões ultraperiféricas, lembrando-se, no que à Região Autónoma da Madeira diz respeito, como área particularmente sensível, a da habitação social.
Naturalmente que atitudes internas do Governo que indiciam discriminação das regiões autónomas, por meras razões político-partidárias, em sede de Orçamento do Estado e na forma como atribui apoios em casos de «intempéries», como aconteceu recentemente com o flagelo causado à agricultura da Madeira pelo mau tempo em que nenhum apoio concedeu, não reforça moralmente os nossos responsáveis pelas negociações da Agenda 2000.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado, até porque ainda tem um pedido de esclarecimento e tenho de lhe dar tempo para responder.

O Orador: - É preciso que o Governo, como. reconheceu recentemente um ilustre membro do Partido Socialista, não só não se deixe deslumbrar pelo poder, como não se deixe, agora, entrar em êxtase, na mira de altos cargos nas instituições europeias, e faça com que Portugal, em vez de defender, com firmeza e intransigência, as suas posições e interesses, por reflexo condicionado do «marketing político» interno, se fique pelo «charme» e pelo discurso «bem falante», transformando a séria negociação da Agenda 2000 numa sessão de «chá e simpatia».
Não nos esquecemos da «entrada de leão» do Ministro Jaime Gama, nos Conselhos Europeus, no início da Legislatura, quando fez a promessa, esquecida (mais uma), de que o Governo viria sempre à Assembleia da República, antes e depois de todos os Conselhos Europeus.
O alegado murro na mesa do Ministro Jaime Gama, a propósito das pescas e mais concretamente da «palmeta», deve ter-lhe magoado de tal forma a mão que, a partir de

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então, ela só serve para «suaves» e inconsequentes cumprimentos protocolares de circunstância, em que se vai quedando a nossa política externa e, em especial, a política europeia!

O Sr. Presidente: - Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Da Agenda 2000 não pode, pois, advir qualquer redução de fundos, que comprometa o esforço europeu da recuperação de Portugal, do reforço da sua coesão económica e social, que poderia vir a traduzir-se, apesar de integrarmos a União Económica e Monetária, numa forma ínvia de impor uma Europa a várias velocidades, uma Europa de filhos e de enteados.
Em época de globalização, em que a Europa assume um papel de maior importância, como um dos maiores blocos, se não o maior, na economia mundial, é importante que a Europa social dê à Europa económica a voz e a autoridade bastante para procurar impor que o nivelamento social entre blocos se faça por cima, de forma a impedir que seja exactamente por via do «dumping social» que se distorça a concorrência e se ganhe maior competitividade no comércio internacional.

O Sr. Presidente: - Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Por isso, o esforço de aproximação do nível económico e social dos países mais atrasados da Europa e de correcção das assimetrias, como é o caso de Portugal e, nela, de forma mais acentuada, as suas regiões autónomas, exige que as nossas especificidades sejam tidas em conta, no âmbito das negociações da Agenda 2000.
Desta forma, que é a correcta e a mais conforme aos elementares princípios que inspiram o projecto europeu, a que aderimos, sem reservas, não tem de se discutir entre Portugal e a Europa, mas apenas lembrar que a Europa não o é sem Portugal e que será menos Europa se não tratar Portugal com fidelidade e respeito pelos princípios que inspiram o projecto europeu e decorrem dos tratados que a instituíram, que vinculam, por igual, todos os Estados-membros.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, a quem, segundo o princípio da igualdade de tratamento, terei de dar também 2 minutos.
Tem a palavra.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, fico muito admirado que o Professor Cavaco Silva tenha inventado o conceito de ultraperiferia, sem que o Grupo Parlamentar do PSD, na altura, tenha feito um projecto de resolução, recomendando ao Professor Cavaco Silva que se batesse por esse novo conceito nas reuniões do Conselho Europeu. É uma diferença de comportamento do PSD nesta bancada, que, agora, muito apreciamos, na medida em que, neste momento, o PSD apresenta projectos de resolução e, decerto, com aquela certeza de que os seus objectivos venham a ser cumpridos pelos nossos governantes.

Gostava de dizer que o Professor Cavaco Silva, ao inventar esse conceito de ultraperiferia, teve também em conta, com certeza, para além dos Açores e da Madeira, os departamentos ultramarinos franceses e as ilhas das Canárias espanholas e, portanto, portou-se como um verdadeiro europeu, para grande surpresa certamente também da bancada do PSD, que não apresentou qualquer projecto de resolução sobre esta matéria.
Mas a minha pergunta tem a ver mais precisamente com o facto de o Sr. Deputado Guilherme Silva ter participado numa reunião da Comissão de Assuntos Europeus do dia 5 de Fevereiro, em que os representantes dos governos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira estiveram presentes e em que houve, de facto, uma nuance entre os dois representantes das regiões autónomas. É que, enquanto o Secretário Regional da Economia e Cooperação Externa do Governo Regional da Madeira propôs a continuação da iniciativa comunitária REGIS, o representante do governo regional dos Açores propôs um melhor aproveitamento da iniciativa comunitária INTERREG.
Gostaria de saber qual a posição do Sr. Deputado Guilherme Silva perante esta modalidade possível do aprofundamento do apoio comunitário às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra, por 2 minutos - e nem mais um -, o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, quero registar alguma emotividade e alguma reacção que, quando se fala do nome do Professor Cavaco Silva, se verifica na bancada do Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Queio também registar o agrado com que viu, por iniciativa do governo de então, ser consagrado no seio da União Europeia a ideia da ultraperificidade e todos os benefícios que daí advieram.
Não percebi muito bem a sua referência a não termos, nessa altura, apresentado um projecto de resolução... Mas era a vós que, na altura, competia, como oposição, fazê-lo e também não o fizeram! A meu ver, a diferença é que nós cumprimos o nosso papel de oposição de forma construtiva e VV. Ex.as tinham, nessa altura, uma postura diferente da nossa na oposição. Portanto, a crítica é ainda uma crítica para dentro do seu partido.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em relação à questão que coloca, naturalmente temos sempre referido que há diferenças entre as duas regiões autónomas e não é dramático que um representante da Região Autónoma da Madeira tenha mani
festado preferência pela continuidade de um determinado programa e que o da Região Autónoma dos Açores o tenha feito por outro.
O importante é que os negociadores, que representam o País no seu todo, incluindo as duas regiões autónomas, encontrem - e não me parece que seja de todo relevante que seja uma via ou outra, podia até ser uma terceira as modalidades e os programas que sejam adaptáveis às

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especificidades das regiões autónomas e que tenham as quantificações bastantes às suas carências.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Sousa Lopes.

O Sr. Artur Sousa Lopes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Estive, em Julho de 1998, numa delegação parlamentar, em Riga, na Letónia, onde vi um povo com um projecto de esperança na liberdade reconquistada, na angústia de uma paz que chegou e que querem que permaneça, no reforço da democracia instalada, na evolução económica e social, na adesão à União Europeia. Orgulhosos na sua independência, depois de uma ocupação alemã e russa de décadas, tendo uma população em que cerca de 20% não fala lerão, mas, sim, russo.
Um país que passou de uma taxa de inflação, em 1992, de cerca de 1000%, para, em 1998, 5,4% (o valor mais baixo dos países da Europa Central e Oriental), estando em condições para aderir à moeda única quando fizer parte da UE, e com mais de 50% do comércio externo com a UE.
Um país que está a fazer um grande esforço na consolidação das instituições democráticas, com numerosos partidos, em coligações governamentais permanentes, que tem um desejo enorme de aderir à UE, na primeira fase.
Não estão «deslumbrados» com a UE, como o disse, em Paris, em 1996, de forma infeliz, um nosso ex-Deputado e hoje líder partidário, mas necessitados de consolidar, num espaço mais amplo de democracia, a paz e a evolução económica e social.
Como a Letónia, estão o Chipre, a Hungria, a Polónia, a Estónia, a República Checa e a Eslovénia, na primeira fase, a Roménia, a Eslováquia, a Lituânia e a Bulgária, numa segunda fase.
E a Rússia? Em Julho de 1997, o Primeiro-Ministro Russo Chernomirdín declarou ser objectivo do seu país a adesão à UE e que todas as reformas se orientavam nesse sentido, tendo sido reafirmada, nas conclusões do Conselho Europeu de Viena, em Dezembro de 1998, a importância da Rússia como parceiro estratégico da União.
É também uma jovem democracia em consolidação, com crises financeiras que abalaram os mercados internacionais, com um presidente cheio de poderes mas permanentemente doente, causando uma permanente angústia política, com um partido de direita radical, com uma moeda que desvalorizou 9% desde o início do ano, com um salário médio mensal de 3500$, com um salário mínimo mensal de 700$, com 29% dos cidadãos (42 milhões) a viver abaixo do limiar da pobreza, contudo com um potencial bélico e político por todos conhecido.
Uma rápida imagem de dois países que também são europeus, também têm esperança, por isso, deve haver a coragem política por parte da União Europeia para, de uma vez por todas, se definir o timing para as novas adesões, ou seja, quando entram na UE, como entram, porque havendo vontade política tudo é possível.
Veja-se o caso da ex-República Democrática Alemã. A unificação alemã não foi, e muito bem, um acto profundamente político? Houve acordos de pré-adesão? Esperaram-se anos e anos para a sua concretização? Contudo, hoje a Alemanha está unificada.

Com o alargamento, melhor nos situaremos numa Europa que é nossa, apagando definitivamente da nossa memória histórica o «Portugal do orgulhosamente sós» e passando a ser um «Portugal orgulhosamente europeu e solidário»,...

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... por isso o Governo português defende politicamente, e muito bem, as novas adesões à UE.
Num discurso, proferido em Janeiro do corrente ano, o nosso Primeiro-Ministro, Engenheiro António Guterres, dizia: «Temos uma Europa madura em muitos dos seus domínios, nos aspectos cruciais da sua economia, mas uma Europa que, ao mesmo tempo, enfrenta um desafio político da maior envergadura para poder afirmar-se e poder garantir a sua própria segurança colectiva no mundo de hoje».
A Agenda 2000, para além do emprego, do crescimento, da estabilidade e da reforma económica, tem de ter uma preocupação profunda com o alargamento, para a consolidação e estabilidade política na União Europeia, porque o conflito rebenta onde menos se espera sem se saber a sua dimensão, quem participa nele e como acaba. Num mundo em que tudo está globalizado, o conflito armado também o está; está à nossa porta e não o vemos.
O Kosovo, «do lado de lá» da Itália, é como se fosse, em imagem figurada, Almada em relação a Lisboa: ali tão perto!
Temos uma União Europeia profundamente economicista e burocrata, por vezes sem uma definição estratégica comum e a não haver Uma política externa comum, como aconteceu recentemente no ataque ao Iraque, enfraquece o prestígio mundial da União Europeia.
Que a UE se apresente ao mundo como um bloco de países economicamente desenvolvidos, mas com um espírito profundo de solidariedade e força conciliadora nos diferentes conflitos internacionais.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Orador: - Queremos uma Europa preocupada com a solidariedade e a segurança.
Existe, nos países da UE, um recrudescimento de egoísmos nacionais, principalmente na discussão da Agenda 2000, estando os diferentes países mais preocupados em defender os seus interesses, quantas vezes só numa visão eleitoralista para consumo interno, com uma visão a curto prazo sobre a lógica da solidariedade europeia, e não havendo uma opinião pública europeia, para, assim, a Europa poder «falar a uma só voz».
Não nos devemos remeter tão-só à «política do betão», não nos devemos manifestar ruidosamente pelos êxitos ou inêxitos da obtenção de fundos comunitários para Portugal no âmbito da Agenda 2000, que todos desejamos que se concretize favoravelmente em relação a Portugal na próxima reunião de Março do Conselho Europeu.
Sabemos, de antemão, o empenhamento do Governo português e a solidariedade das oposições, para podermos dizer, como um colega Deputado desta Assembleia o disse, «Quanto mais forte for a Europa, mais forte é Portugal».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, vamos dar início à fase de encerramento do

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debate. Tal como foi acordado em conferência de líderes, vou dar a palavra por ordem crescente de partidos e, depois, ao Governo.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Depois deste debate exaustivo, a conclusão que, para Os Verdes, se pode retirar é, em primeiro lugar, a,importância de, sem o espartilho, neste caso não orçamental mas, sim, regimental, se ter podido fazer a discussão de uma Agenda que é extremamente importante para Portugal e que, do nosso ponto de vista, sendo importante para Portugal e não se confinando numa negociação com prazo e hora marcada, vai muito além dessa negociação, por vários aspectos que lhe estão intimamente ligados, como, por exemplo, as questões do alargamento, que foi abordada, da política agrícola comum e, ainda, do quadro financeiro.
Parece-me que é positivo que o Parlamento discuta estas questões, como me parece que é necessário que este debate se alargue, passe para fora das paredes deste Parlamento e este assunto seja discutido pelos portugueses, como necessariamente está a ser feito noutros países da União Europeia, pois estamos a discutir questões que colocam problemas para os países que não se reflectem, no essencial, ho imediato, mas sobretudo nas consequências que podem vir a ter no futuro.
Sendo para nós claro, é assumindo politicamente, como assumimos desde sempre, o alargamento da Europa como um compromisso seu, é nosso entendimento que o mesmo não pode ser feito, pensado ou pago pondo em risco a coesão económica, o equilíbrio sustentável ou a necessidade de aproximar os vários povos e regiões da Europa a modelos não só sustentáveis do ponto de vista ambiental mas também socialmente justos.
A Agenda que está em discussão traduz claramente um conjunto muito grande de preocupações e intenções dos países mais ricos da União Europeia, dos quais, de algum modo, a Alemanha é porta-voz, cuja posição, do nosso ponto de vista, a prazo, é insustentável, pois é convicção de Os Verdes que o projecto político europeu só poderá manter-se se conseguir não agravar, antes atenuar e caminhar num sentido radicalmente oposto, as assimetrias entre povos e regiões.
Julgo que ficou claro para todos os grupos parlamentares que, neste momento, as nossas preocupações têm a ver com o facto de Portugal, que, independentemente de ter entrado no euro não passou a ser um país rico, tendo profundos problemas e sinais claros de pobreza, ter sete regiões e, dessas, cinco estarem na lista das mais pobres, podendo vir a ser penalizadas no futuro.
É nossa convicção que a possibilidade de a Região de Lisboa e Vale do Tejo sair do Objectivo 1 é extremamente negativa, pois acentuaria bolsas de pobreza e de exclusão neste espaço, acentuaria desigualdades e atrasaria ainda mais a recuperação dos enormes défices ambientais desta região. Pensamos que esta possibilidade deve ser, com firmeza, sem conformismos, colocada e debatida pelo Governo português, o qual, confesso, me parece que, independentemente dos consensos alargados sobre esta matéria e das boas intenções que naturalmente tem, não esclareceu algumas das dúvidas com que nos interrogamos, as quais gostaríamos de ter visto serem dissipadas com maior clareza ao longo deste debate.

Gostaria ainda de dizer que, na perspectiva de uma Europa que não pode viver fechada sobre si própria e que não pode ser indiferente aos grandes desafios que estão colocados à humanidade - e falo da globalização da crise ecológica, resultante, ela própria, da globalização dos mercados -, nos parece que não está suficientemente enfatizada e compreendida, nem, no espaço europeu, por parte dos países mais ricos, nem por parte do Governo, a necessidade de reformular e de pensar em moldes radicalmente novos a PAC.
Eram estas as nossas e preocupações e, de algum modo, no final do debate, ainda são estas as nossas dúvidas.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Srs. Deputados: No final deste debate sobre a Agenda 2000, importa realçar algumas questões por parte do PCP.
Em primeiro lugar, congratulamo-nos pelo amplo consenso manifestado, nesta Câmara, sobre a oportunidade e a importância de o PCP aqui ter trazido este mesmo debate. De facto, estamos perante matéria da maior relevância para o País, cuja definição concreta entrou num momento crucial.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ém segundo lugar, quero tornar a realçar, em nome do PCP, que entendemos que Portugal não deve obstar ao alargamento da União Europeia, no respeito pela livre decisão dos povos dos países candidatos e sem imposições que firam a sua soberania, mas entendemos igualmente que esse alargamento deve processar-se com respeito pelas vantagens mútuas, ou seja, sem prejuízo dos interesses dos países que actualmente integram a União Europeia, o que significa que o alargamento impõe um quadro financeiro mais alargado do que o actual.
Em terceiro lugar, consideramos essencial que a postura do Governo português neste processo negocial seja intransigente quanto à necessidade de as novas perspectivas financeiras terem como pressuposto básico e enquadrador o princípio da coesão económica e social,...

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - ... que consta-nos tratados como princípio fundamental da União Europeia mas que a prática, pelo menos até ao momento, tem vindo a desmentir.
É nesta questão básica que a defesa dos interesses nacionais ganha toda a sua força e dimensão, força que a posição aqui reiterada pelo Sr. Ministro dos. Negócios Estrangeiros tende a enfraquecer perigosamente, quando admite à partida, e até em público, a possibilidade de os custos que se anunciam serem repartidos pelos 15, isto é, pelos países mais ricos e pelos mais pobres, como Portugal. É um mau caminho, que o PCP não acompanha, antes critica.

Aplausos do PCP.

A proposta da Comissão Europeia não pode, no nosso entender, ser considerada uma boa base de trabalho, quando propõe não apenas que os actuais recursos financeiros

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para os 15 façam face aos custos da pré-adesão mas, fundamentalmente, e por acréscimo, que essa «fatia» para a pré-adesão seja retirada não às políticas internas da Comunidade, que beneficiam, pelo menos em termos relativos, mas também em termos absolutos, fundamentalmente os países mais ricos, mas, sim, aos fundos estruturais, aqueles que, em termos relativos, mais beneficiam os países pobres como Portugal.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O meu camarada João Amaral anunciou já a apresentação que fizemos, hoje, de um projecto de resolução que define princípios de referência para a negociação, pela parte portuguesa, da Agenda 2000. São 11 princípios que, não temos dúvidas, são aqueles capazes de defender o legítimo interesse nacional nesta negociação, sem subterfúgios e na prática, não apenas nas declaràções de intenções.
Neste momento, reputo importante referir o décimo primeiro dos princípios que apresentámos, que passo a citar: «No limite, se os interesses vitais de Portugal forem atingidos, o recurso ao veto deve ser encarado sem complexos». É um princípio que deve estar sempre presente na mesa das negociações, sob o risco de prejuízos indesejados poderem resultar para o País.
Para descansar o Sr. Deputado Manuel dos Santos, importa que fique claro que a possibilidade de veto a que nos referimos reporta-se ao novo quadro das despesas comunitárias, à Agenda 2000 em sentido estrito, e não à questão do alargamento, como, aliás, terá ficado bem claro na intervenção inicial do PCP neste debate.
Finalmente, quero reiterar que o PCP continuará empenhado, em toda a sua intervenção política, fora e dentro' das instituições parlamentares, em contribuir para o reforço negocial do País na defesa dos interesses nacionais, bem como em juntar os nossos esforços ao de outras forças progressistas com vista a obter-se um novo rumo para a integração europeia. Esperamos que outros, em particular o Governo de Portugal, não caminhem por caminho divergente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Brochado Pedras.

O Sr. António Brochado Pedras (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.ªs e Srs. Deputados: Ao encerrar este debate, cujo tema, aliás, ainda ficará em aberto durante alguns dias, julgo ser inquestionável a utilidade e a oportunidade do mesmo. Por isso, o que gostaria de dizer nesta altura é que o Parlamento não tem liberdade para decidir sobre a matéria em debate - a Agenda 2000. Todavia, tem poderes de controle, de apreciação, de fiscalização e de acompanhamento deste dossier e de sobre ele apresentar, discutir e votar resoluções que se traduzam em recomendações ao Governo.
Assim, discutindo hoje o documento em apreço e debatendo e votando brevemente o projecto de resolução conjunto do PSD e do CDS-PP sobre a mesma matéria, a Assembleia da República afirma, e reafirmará, a soberania do Estado português.
Nesta perspectiva, julgo útil ao País e à democracia que o Parlamento aproveite este poder e o direito de pronúncia, sobretudo quando está em jogo um documento que

irá conformar a vida dos portugueses nos próximos sete anos e, mesmo, no primeiro quartel do próximo século.
Mas, para além de útil, este debate é também oportuno. Será já nos próximos dias 24 e 25 de Março que vai realizar-se o Conselho Europeu de Berlim. É, pois, da máxima importância que, quer nas negociações e nos contactos diplomáticos preliminares quer durante aquela cimeira, o Governo português possa estribar-se numa posição firme e determinada desta Assembleia.
Dito isto, importa, talvez, extrair deste debate as conclusões e lições que o seu curso ditou.
. Os problemas essenciais a enfrentar foram aqui sumariamente descritos: possível diminuição dos fluxos financeiros; saída da Região de Lisboa e Vale do Tejo do rol das regiões pobres da União Europeia; inclusão das regiões ultraperiféricas da Madeira e dos Açores apenas no «Objectivo 1»; perigo do não reconhecimento do caso português, da sua singularidade ou especificidade como país pobre, periférico, com algumas regiões entre as mais pobres das pobres, que não beneficiou substancialmente da PAC.
A todas estas questões é preciso responder. Para tal, julgamos que os valores da manutenção da paz e da estabilidade da política na Europa, da solidariedade e da coesão económica e social dos seus Estados é dos seus povos, consagrados no tratado que instituiu a União Europeia, não são compatíveis com soluções cómodas, egoístas e iníquas. O alargamento da União Europeia tem, necessariamente, custos - e custos consideráveis! -, mas também traz benefícios, sobretudo para os países mais ricos da União que vêem, assim, alargados os seus mercados para os produtos das modernas e bem equipadas indústrias. Por isso, se são os países contribuintes líquidos os mais beneficiados com o alargamento da União ou, em qualquer caso, os menos prejudicados, é justo que sejam eles a suportar os maiores encargos daí resultantes - ubi commoda ibi incomnoda !

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, é uma tremenda injustiça penalizar Portugal por ter cumprido os critérios de convergência. É que este objectivo foi cumprido com muita disciplina e com, muito sacrifício geral.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Mas se nos trouxe vantagens e facilidades não resolveu muitos dos nossos problemas estruturais nem evitou que continuemos na cauda dos países mais pobres da Europa e, também, com regiões das mais depauperadas entre as pobres. Não reconhecer ou escamotear esta especialíssima situação é uma atitude profundamente irrealista e injusta que penaliza Portugal e viola flagrantemente a letra, o espírito e os princípios consagrados pelo Tratado de Maastricht.
Entre as soluções propostas - e, aqui, não vou perder muito tempo - contam-se medidas particulares para as regiões ultraperiféricas da Madeira e dos Açores, constantes da Constituição e do Tratado de Amesterdão, a adopção do sistema regressivo em relação à Região de Lisboa e Vale do Tejo.
O alargamento a Leste? Sim, sem hesitação, sem hipocrisia, sem reserva mental, mas segundo um processo faseado, gradual, cauteloso, sem pôr em causa a coesão dos países mais pobres da União Europeia.

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Em relação à PAC, perante a debilidade da nossa agricultura, tem de merecer uma especial atenção a renovação da estrutura produtiva familiar e o seu rejuvenescimento, reforçando-se as medidas estruturais de desenvolvimento rural.
Estamos conscientes de que temos pela frente uma das mais complexas negociações. Apesar de acreditar que seremos capazes de convencer os nossos parceiros da justeza das nossas razões e da pretensão de um tratamento específico no caso português, torna-se cada vez mais necessária a definição de objectivos.
Efectivamente, se não conseguirmos um bom acordo financeiro, o que é deveras importante é que estejam abertos os caminhos a longo prazo. Esses caminhos são os objectivos pelos quais terão de passar as políticas.
O jogo do futuro europeu de Portugal, que, no próximo mês, em Berlim, estará em cima da mesa, não poderá reduzir-se apenas aos cifrões que são importantes mas que, por si só, não farão uma Europa alargada, mais integrada e mais solidária.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Azevedo Soares, para uma intervenção.

O Sr. Azevedo Soares (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A título de encerramento, gostaria de começar por referir a atmosfera, aqui já abordada, inclusive, pelo Sr. Ministro, de alguma aproximação entre as forças políticas e, desde já, agradecer ao Partido Comunista, felicitando-o pela iniciativa que teve de trazer este debate ao Plenário. Foi útil, foi construtivo, permitiu-nos assistir a algumas aproximações, embora com nuances, e até nos permitiu ver o Sr. Ministro louvar, de algum modo, a Comissão Europeia, coisa que, no princípio deste mandato, não era frequente ou seria mesmo 0 contrário, conforme já aqui foi recordado.
Portanto, o Governo vai negociar numa posição mais reforçada porque. mais apoiada nesta Câmara pelas diversas forças políticas.
Gostaria de referir, ainda, que há duas perspectivas fundamentais sobre esta matéria que hoje discutimos: a questão do alargamento e a questão financeira da Agenda 2000.
O PSD tem uma longa tradição na sua posição quanto ao alargamento. Não a renega em aspecto nenhum, mantém-na. O que acontece - e algumas pessoas desconhecem-no ou esqueceram-se é que alguns países ou algumas forças políticas tinham duas visões completamente distintas sobre o alargamento. Por exemplo, a posição do Reino Unido sobre o alargamento não tinha o mesmo significado que a portuguesa ou a de outros países.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Excepto quando vocês se «colaram» à Thatcher!

O Orador: - Por conseguinte, o que defendemos hoje, tal como no passado, é que não gostaríamos que, em nome do alargamento, daquele que sempre defendemos e que se justifica, fosse consentida uma deriva política, estratégica, por parte de certos países, a qual levasse a prejudicar o aprofundamento da União Europeia, que sempre fez parte do nosso discurso político. Aprofundamento da União Europeia esse que, a ser prejudicado, pôr em causa um dos pilares do fundamento da União Europeia, a solidariedade entre os Estados e os povos que a compõem.

Não aceitamos que o alargamento tenha de ser feito à custa do aprofundamento e do aumento da coesão económica e social no seio da Europa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orado r: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para tentar abreviar, depois de o meu companheiro Carlos Encarnação já aqui ter referido as nossas posições, gostaria de reter, a título de resumo, o seguinte.
Parece-me que, porque conhecemos as condições reais em que está a desenrolar-se esta negociação - e sublinho «as condições reais em que está a desenrolar-se esta negociação» -, é perfeitamente realista podermos considerar como alcançáveis numa negociação condições que protejam o interesse nacional. Desde logo, através do aumento dos fundos estruturais, o que consideramos imprescindível para a prossecução do esforço de coesão económica e social. A manutenção do Fundo de Coesão nem sequer pode estar posta em causa, como se vê por argumentos que já aqui foram expendidos.

O Sr. José Saraiva (PS): - Isso é a «Roda dos Milhões»!

Risos do PS.

O Orador: - Sr. Deputado, já vi .muito sorriso sobre coisas que não eram possíveis e que, depois, se tornaram realidade! Estou certo que o Governo que os senhores apoiam vai conseguir!
A este propósito, peço oportunidade para fazer aqui um parêntesis e dizer que senti um certo optimismo, não só por parte dos Srs. Deputados do Partido Socialista como na intervenção do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, optimismo esse que partilho.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - O único pessimista é o Carlos Encarnação!

O Orador: - Tirando a pequena subtileza do discurso do Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira a propósito das intenções do PSD neste debate - mas isso são subtilezas que só lhe ficam bem! -, prossigo com o que queria dizer.
Quanto à compensação pelos efeitos dos prejuízos em determinadas áreas e actividades económicas que, efectivamente, vão decorrer para Portugal devido ao alargamento e, acima de tudo, pela saída, que, aparentemente, se torna inevitável - oxalá não o fosse! -, da Região de Lisboa e Vale do Tejo da classificação de região de Objectivo 1, esta última é uma circunstância muito penalizadora para Portugal, muito penalizadora para a Região de Lisboa e Vale do Tejo e estou certo que, na negociação, é possível garantir uma compensação significativa.
Por fim, apenas quero dizer que, no fim da negociação, gostaríamos de ver que aos números alcançados viessem a corresponder regulamentos de execução também aceitáveis.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira, para uma intervenção.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Penso que,

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no fim deste debate, poderíamos resumi-lo da seguinte maneira: todos nós estamos de acordo com a divisa «tudo pelos tratados, nada contra os tratados!».

O Sr. José Magalhães (PS): - Sem dúvida!

O Orador: - Significa isto, exactamente, que os tratados que enformam a União Europeia são, ainda, a melhor defesa para os seus Estados membros.
Creio que recordar, neste momento, após a conclusão deste debate, que nada se poderá fazer na negociação da Agenda 2000 contra a letra e o espírito dos tratados internacionais que ligam Portugal à União Europeia é uma das garantias com que este Governo, ou qualquer outro, parte para essas negociações internacionais.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sem dúvida!

O Orador: - O Partido Comunista quis - e bem, na nossa perspectiva - tomar a iniciativa de agendar este debate antes da conclusão da negociação difícil e complexa da Agenda 2000.
Foi um iniciativa meritória mas eu, como Presidente da Comissão de Assuntos Europeus - e abro aqui um parêntesis -, gostaria de acentuar que a própria Comissão dos Assuntos Europeus já tinha aberto um ciclo de audições sobre esta matéria para que se pudesse produzir um relatório seguido de um projecto de resolução que não fosse um projecto de resolução partidário, mas um projecto de resolução que resultasse, exactamente, de uma discussão pluripartidária no interior da Comissão dos Assuntos Europeus.
Este debate tem como resultado o facto de os partidos da oposição terem querido apresentar projectos de resolução sobre uma negociação internacional em curso. Projectos de resolução que não tiveram em conta outro critério que não a própria capacidade analítica, formativa e programática desses mesmos partidos, que não têm minimamente em conta o facto da negociação ser uma negociação com mais 14 Estados membros e, portanto, são projectos de resolução que, na minha perspectiva, Sr. Presidente, terão de ser trabalhados ao nível da comissão competente, que creio deverá ser a Comissão dos Assuntos Europeus.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, uma das propostas que neste final de debate a bancada parlamentar socialista faz é que os projectos de resolução que deram entrada na Mesa, apresentados pelo Partido Comunista e pelo Partido Social Democrata, venham a descer à Comissão dos Assuntos Europeus para um tratamento a nível dessa Comissão.
Aliás, o que se passou ontem na Comissão dos Assuntos Europeus, o comportamento que o Partido Social Democrata teve ontem nesta Comissão, foi, desde logo, a previsão do que haveria por parte quer do Partido Social Democrata, quer da Partido Popular, que se portou de uma maneira politicamente mais ardilosa, eu diria mais articulada, enquanto o Partido Social Democrata foi muito grosso na maneira como conduziu essa questão na Comissão dos Assuntos Europeus. Mas gostava de felicitar quer o Partido Social Democrata quer o Partido Popular por terem apresentado em conjunto um projecto de resolução.
É que; Sr. Presidente, não se deve confundir um projecto de resolução com um primeiro esboço de um pro-

grama eleitoral para o Parlamento Europeu. Compreendo que o Partido Social Democrata e o Partido Popular, tendo já as listas, precisem de um programa para o Parlamento Europeu, mas deveriam ter feito ao contrário, ou seja, deveriam ter começado por apresentar o programa e depois elaborar as listas. Mas, repito, compreendo que tenham de fazer esse esforço de articulação - primeiro as pessoas e depois as ideias.
Sr. Presidente, de qualquer maneira e para terminar, gostaria de felicitar mais uma vez a iniciativa do Partido Comunista Português e reconhecer que o PCP fez, em todo este debate, um exercício bastante rigoroso do que pode ser uma posição crítica perante a União Europeia, o que eu saúdo. E saúdo porque creio que falta no interior de cada país, de cada Estado membro, partidos políticos que apresentem um espírito crítico sobre a construção europeia, com propostas concretas e construtivas. Isto faz falta e por isso o felicito.
Para terminar, Sr. Presidente, gostaria ainda de dizer que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, obviamente, não apresentou nenhum projecto de resolução porque confia na forma como o Governo tem conduzido as negociações sobre a Agenda 2000 e confia que os seus resultados serão sempre os melhores possíveis para Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Medeiros Ferreira considerou a hipótese de estes projectos de resolução poderem vir a ser trabalhados ao nível da Comissão de Assuntos Europeus.
Como sabem, regimentalmente, os projectos de resolução não baixam às comissões, a menos que haja consenso nesse sentido. Se houver assentimento, terei muito gosto em determinar que baixem.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, pretendo apenas referir que o nosso projecto de resolução vai seguir os seus trâmites habituais e, portanto, será agendado- e votado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os trâmites habituais não prevêem baixa às comissões dos projectos de resolução, a menos que haja consenso. Se não há consenso, o projecto de resolução não baixa Comissão de Assuntos Europeus.

O Orador: - Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Medeiros Ferreira.

O Sr. Medeiros Ferreira (PS): - Sr. Presidente, gostaria só de perguntar o que é que leva o Partido Social Democrata a quebrar um consenso...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o Partido Social Democrata não quebrou o consenso, porque ele não se chegou a formar.

O Orador: - Sr. Presidente, como foi a única bancada...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não vale a pena discutirmos isso agora. Penso que mesmo sem a baixa «ofi-

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cial», se quiserem, o Presidente da Comissão pode trocar impressões com os seus pares sobre a matéria, mas não a título oficial, uma vez que o Regimento não o permite a não ser excepcionalmente e não há consenso nesse sentido.

O Orador: - Mas, Sr. Presidente, deixe-me fazer um apelo ao Partido Social Democrata para tornar o seu projecto de resolução passível de discussão pluripartidária na Comissão dos Assuntos Europeus.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Encarnação, o senhor ouviu o apelo. Muda a sua opinião?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, a única coisa que digo ao Sr. Deputado Medeiros Ferreira é o seguinte: se quiserem votar já o documento, muito bem. Se não quiserem, vamos agendá-lo para uma próxima reunião.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o projecto de resolução não pode ser já votado, salvo se houver consenso nesse sentido. É a mesma coisa!

O Orador: - Então, será agendado e, na altura, será discutido e votado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Afinal, quem quebra o consenso é o PS!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há consenso para que o projecto de resolução seja discutido em Comissão, pelo que só o poderá ser a título informal.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS):- Sr. Presidente, pedi a palavra para fazer uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente invocou o Regimento e, portanto, gostava que me indicasse qual é a norma regimental que impede que uma iniciativa legislativa chamada projecto de resolução tenha um despacho de V. Ex.ª nesse sentido.

O Sr. Presidente: - É assim, Sr. Deputado. O entendimento é esse. Agora, não tenho tempo de ir procurar a norma, mas confie em mim.

O Orador: - Então, Sr. Presidente, o melhor é discutirmos isso na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, uma vez que se trata de uma matéria...

O Sr. Presidente: - Será ageridado para discussão na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.

O Orador: - Agora, a apreciação e a interpretação que fazemos do Regimento é que um projecto de resolução pode perfeitamente baixar a uma comissão, como qualquer iniciativa legislativa.

O Sr. Presidente: - Pode, Sr. Deputado. Mas não é obrigatório que baixe.

O Orador: - Sr. Presidente, quanto à votação, pelas razões que já foram expostas, é evidente que a bancada socialista ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não vamos aqui enxertar uma querela regimental...

O Orador: - Sr. Presidente, não é uma querela regimental.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os projectos de resolução, a menos que haja consenso nesse sentido, nunca baixam às comissões. É a prática desta Casa. Assim, não havendo consenso, não baixam.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, creio que não há consenso para os projectos de resolução baixarem à Comissão de Assuntos Europeus.

O Sr. Presidente: - É evidente!

O Orador: - Pela nossa parte, não levantámos essa questão,...

O Sr. Presidente: - Eu vi que não!

O Orador: - ... mas aceitaríamos que pudessem baixar, porque mesmo assim, pelos menos o nosso projecto, a qualquer momento, por nossa iniciativa, poderia ser agendado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro!

O Orador: - Seria sempre um direito nosso. Porém, não havendo consenso, isso não impede que a Comissão ...

O Sr. Presidente: - Claro que não impede que, a título informal, a Comissão discuta o assunto.

O Orador: - Sr. Presidente, permite-me que conclua?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Orador: - Dizia eu que nada impede que a Comissão dos Assuntos Europeus tome ela a iniciativa de preparar um texto próprio, eventualmente com os contributos que há em cima da mesa.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro! Claro!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Essa é outra questão!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, este assunto está esclarecido. Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (Seixas da Costa): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Antes de mais, gostaria de renovar, por parte do Governo, a nossa saudação à iniciativa que o Partido Comunista Português teve de agendar este debate.
Através deste debate, parece-nos que ficou provada se não a total consonância com todas as posições que o Governo tem vindo a tomar - porque algumas das leituras que alguns dos partidos da oposição fazem relativamente a esta matéria têm uma perspectiva algo fundamental ista, radical, daquilo que é o argumentário do Estado português -, pelo menos foi extremamente útil lançar este debate em Plenário.
Antes de entrar propriamente nos pontos concretos que queria referir, gostava de fazer duas notas relativamente à

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intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva. A primeira tem a ver com a assiduidade — ou com a suposta falta de assiduidade — por parte do Governo perante esta Assembleia, em matéria europeia, nomeadamente após os conselhos europeus.
Gostava de vos dizer que, nesta matéria, o Governo não tem lições a receber.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): — Pelo contrário!

O Orador: — Em relação ao passado e sobre o modo como este Governo se tem comportado relativamente à Assembleia da República, em matéria de assiduidade e de informação acerca de questões de natureza europeia, julgo que estamos perfeitamente conversados, quer em relação aos conselhos europeus, antes e depois dos quais houve sempre debate a nível da Comissão dos Assuntos Europeus, quer em relação à conferência intergovemamental, como ainda noutro dia foi relevado, pois estivemos presentes cerca de 15 vezes nessa mesma comissão.
Há ainda um ponto que a Sr." Deputada Isabel Castro há pouco referiu, relativamente à Comissão, dizendo que havia pormenores que neste debate não ficaram esclarecidos.
De facto, tenho pena que a Sr.ª Deputada, durante as três horas que passei na Comissão dos Assuntos Europeus detalhando estas questões relativamente à Agenda 2000, não tenha tido a oportunidade de colocar essas questões e tentar esclarecer esses pormenores. Não sei se é o «barulho destas luzes» que é necessário para que esses pormenores sejam realçados, porque a sede normal de discussão deste tipo de questões é também a Comissão dos Assuntos Europeus.
O segundo ponto que queria abordar, relativamente à intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva, tem a ver com as regiões ultraperiféricas e é evidente que estas regiões são uma preocupação constante do Governo português.
O Sr. Deputado citou — e bem — a intervenção tida pelo Professor Cavaco Silva relativamente à inserção de uma declaração interpretativa junto do Tratado de Maastricht.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Não é preciso ter ciúmes!

O Orador: — Mas já agora valeria a pena ter a justiça de pensar e dizer que o Primeiro-Ministro António Guter-res conseguiu introduzir no Tratado de Amesterdão, e não no Tratado de Maastricht, um artigo específico relativamente às regiões ultraperiféricas, artigo esse, aliás, que a seu tempo foi claramente saudado pêlos governos das regiões autónomas.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): — Bem lembrado!

O Orador: — Relativamente a esta discussão e às questões que estão presentes no âmbito da Agenda 2000, gostava de dizer, Sr.as e Srs. Deputados, que me parece ter ficado claro não existirem alternativas expressas à orientação que o Governo tem vindo a seguir nesta negociação. Não vi aqui expressas, nem no plano táctico, nem no plano estratégico, quaisquer alternativas práticas que pudessem indiciar que a linha que tem vindo a ser seguida por parte do Governo é uma linha menos correcta.
Julgo que, relativamente à proposta original da Agenda 2000 — e penso que é muito importante que, quando se fala de Agenda 2000, se tenha um pouco também a ideia de que esta Agenda já se alterou ao longo do tempo —, demos uma resposta concreta à Comissão, uma resposta técnica e uma resposta política, e fizemos um argumentário sólido junto dos vários Estados membros e junto da própria Comissão.
O Primeiro-Ministro português, mais do que uma vez, teve ocasião de falar com os seus homólogos europeus sobre esta matéria e a nível do Governo tem sido feito todo um esforço de esclarecimento relativamente a essa questão.
Julgo ainda ser de sublinhar que a noção do caso português foi pela primeira vez introduzida pelo Governo e mais tarde foi mediaticamente aproveitada. Mas foi introduzida pelo Governo, quem suscitou a questão de acumulação negativa de efeitos foi o próprio Governo e esta noção, claramente, Sr.ªs e Srs. Deputados, passou hoje para o discurso europeu.
É evidente que temos de gerir o modo como isto se vai projectar no resultado final desta negociação, mas é evidente que a noção de que há um caso especifico português, hoje, é algo que está interiorizado a nível dos nossos parceiros e da própria Comissão Europeia.
Por outro lado, gostava de dizer também que o esforço negocial que se fez durante este ano e meio teve o seu resultado. E teve o seu resultado já, por exemplo, na clarificação da importância do conceito de desemprego ou na importância da prosperidade nacional, que a própria Comissão Europeia veio a apresentar em Outubro do ano passado. Isto vem ao encontro daquilo que eram as preocupações do Governo português e não é por acaso que a Comissão Europeia traz essa clarificação dessa zona que tinha ficado mais ou menos cinzenta ao nível da proposta da Agenda 2000.
Também os regulamentos evoluíram, Sr. Deputado Azevedo Soares. As propostas iniciais dos regulamentos eram muito mais gravosas e, não só por intervenção portuguesa, convém dizê-lo, mas também por intervenção de vários países, isso tem vindo a diminuir e há uma menor discri-cionaridade em termos da intervenção da Comissão Europeia no futuro. Julgamos que, em particular, o projecto de regulamento geral de fundos — dado que os regulamentos sectoriais são hoje menos importante que o regulamento geral de fundos —, sofreu avanços significativos e penso que podemos estar a caminho de uma solução positiva.
Creio, como disse, que não há alternativas negociais, que não há outras hipóteses em termos de negociação. Pensamos que a linha que tem vindo a ser seguida pelo Governo português é a linha correcta. Nós vamos ser julgados, não necessariamente pela leitura pontual da estratégia mas essencialmente pêlos resultados, e são esses resultados, os resultados para nós e para os outros Estados membros, que eu penso que é importante trazer, mais cedo ou mais tarde, a esta Câmara.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Orador: — Gostava de acrescentar o seguinte, Sr. Presidente e Srs. Deputados: é importante que haja algum realismo no que se pede e no que se coloca a nível da negociação.

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ção, mas, depois, o seu próprio projecto de resolução refere que é preciso um quadro financeiro para Portugal, no período de 2000 a 2006, claramente superior ao nível de apoios do anterior quadro.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Se esta é, de facto, uma perspectiva realista e de conhecimento das condições em que se está a processar esta negociação, francamente, tenho algumas dúvidas ...
O Sr. Deputado Carlos Encarnação referiu-se, a certa altura, num tom vagamente irónico, à declaração feita pelo Presidente da Comissão, o Presidente Santer, no sentido de que Portugal poderia ter mais 15% dos fundos. Não sei se era ironia, mas, se não era, gostava de saber com que ironia o Sr. Deputado vê o próprio Presidente do seu partido dizer que Portugal poderá sair desta negociação com mais 20% dos fundos!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Os Srs. Deputados do PSD têm de resolver este problema rapidamente, e creio que a melhor maneira de o fazer seria através da apresentação de uma proposta no sentido de trazer à Comissão dos Assuntos Europeus o Comissário Europeu Deus Pinheiro, para este lhes dar uma ideia mais realista sobre o modo como está a decorrer esta negociação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por encerrado o debate requerido pelo Grupo Parlamentar do PCP, ao abrigo do n.º 2 do artigo 76 º do Regimento, sobre a Agenda 2000.
Srs. Deputados, vou proceder à leitura do voto n.º 146/VII - De pesar pelo falecimento da pintora Maluda, apresentado por mim próprio, pelo PS, pelo PSD, pelo CDS-PP, pelo PCP e por Os Verdes.
Faleceu a pintora Maluda. O País perdeu uma das suas mais originais artistas plásticas.
Natural de Goa, foi em Lourenço Marques que a sua vocação despontou. A sua obra artística é uma viagem a caminho do rigor e da perfeição.
Servindo-se de temas simples - ficarão para sempre famosas as suas janelas, os seus pitorescos quiosques e as suas paisagens, urbanas rigorosamente perspectivadas e despidas de presença humana -, conseguiu efeitos plásticos raras vezes entre nós conseguidos.
Quando tentou o retrato, revelou-se uma apreciável retratista. Um dos seus últimos retratos, o do Prof. Vítor Crespo, exposto na galeria dos ex-Presidentes da Assembleia, é a prova disso.
Dotada de proverbial simpatia humana, deixa um vazio impreenchível entre os seus amigos e admiradores.
A Assembleia da República, na sua sessão de hoje, aprovou um voto de sentido pesar, expressando à família enlutada a suas mais sentidas condolências.
Para uma breve intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Brochado Pedras.

O Sr. António Brochado Pedras (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A bancada do Partido Popular associa-se sentidamente a este voto.

Maluda foi uma talentosa artista - o seu talento é visível nesta Assembleia, no retrato qúe V. Ex.ª acabou de mencionar e que se encontra na galeria dos ex-Presidentes da Assembleia da República - que pintou inúmeras janelas e retratou, de forma magistral, inúmeras personagens.
O Partido Popular quer, neste momento, desta «janela» da Assembleia da República, dizer um adeus muito sentido e muito saudoso à pintora. Sabendo que ela amava a luz, ela terá, sem dúvida, a suprema alegria de poder, eternamente, banhar-se na luz etérea.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Patrício Gouveia.

A Sr.ª Teresa Patrício Gouveia (PSD): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata também gostava de invocar hoje, aqui, essa personalidade singular que foi a Maluda, como singular foi a sua pintura, e lembrá-la, sobretudo, pela maneira independente, genuína e original como desenvolveu o seu percurso artístico, bastante independente das tendências dominantes, das modas e das doutrinas dos críticos. Talvez por isso ela tenha sido capaz de tocar tão directamente o público, que a compreendeu e, através dela, desfrutou o prazer da contemplação da pintura.
Diz-se que os homens estão ausentes da pintura da Maluda. Mas não estiveram ausentes da sua vida, pelo contrário. Com eles, ela foi generosa na partilha da sua amizade e na disponibilidade com que, em muitas ocasiões, quis intervir civicamente, com a sua presença e com a sua palavra.
Maluda nasceu em Goa, viveu em Moçambique, mas foi em Lisboa que se encontrou com os aspectos mais genuínos, mais consistentes da sua pintura. E foi essa Lisboa, assim como outras paisagens do nosso país, que ela nos deu a ver, dando-nos imagens que não tínhamos.
Por essa razão, gostava de a invocar e, sobretudo, de lhe agradecer essas imagens e o olhar que nos deixou.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.

O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do PS associa-se ao voto de pesar, de que V. Ex.ª é primeiro subscritor.
A pintora Maria de Lurdes Ribeiro, que ficaria conhecida por Maluda, sendo também uma pintora de grande mérito como retratista - como é referido no voto proposto -, foi essencialmente uma pintora de paisagens vazias de pessoas, mas, sobretudo, uma pintora de Lisboa, do seu casario, dos seus telhados, das janelas e dos quiosques, num estilo muito peculiar, geométrico, que, na sua aparente simplicidade, evidenciava um glande sentido da cor e da luz.
Tornou-se o que pode chamar-se uma artista popular, no que de bom tem esta expressão, para o que contribuiu, como é sabido, a vasta reprodução que as suas obras tiveram, nomeadamente através de um meio de grande difusão como são os selos de correio.
Foi uma pintora que viria, assim, a ocupar um lugar singular no meio artístico nacional, lugar que ficou vazio.

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O Grupo Parlamentar do Partido Socialista expressa também as suas condolências à família enlutada.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr' Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os-verdes): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, também me quero associar a este voto de pesar pelo falecimento da pintora Maluda.
Como já foi referido, a pintura de Maluda tem um toque muito peculiar, o toque do geometrismo, o toque da luz. Ela deu do País, sobretudo do Sul, do Alentejo e do Algarve, múltiplos registos, mas é na cidade que ela adoptou como sua, a cidade de Lisboa, a que se associa irremediavelmente a sua obra, que ela se torna conhecida.
As janelas que ela abriu para as pracetas de Lisboa, para o rio, para as sardinheiras, para as pessoas, para a luz. É nessa cidade, onde viveu, onde criou laços de amizade, onde viveu bem consigo e com os outros e de onde ela agora parte, que ficará, seguramente, o maior registo e o que muitos portugueses recordarão e terão como presente, da parte de alguém que conseguiu, como poucos, ser conhecido da generalidade dos portugueses.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A pintora Maluda é uma grande figura da pintura portuguesa contemporânea, e continuará a sê-lo, apesar de falecida, uma vez que as suas obras continuarão a poder ser admiradas por todos nós.
Um jornal de hoje chama-lhe «pintora de Lisboa». Parece-nos que esse é um justo qualificativo para quem pintou Lisboa com um estilo inconfundível, extraordinariamente característico e de uma rara beleza plástica.
Nesta Assembleia existe o retrato do Professor Vítor Crespo, da autoria de Maluda, já muito bem referido neste voto de pesar como uma obra notável desta pintora, enquanto retratista, mas parece-nos que ficaria muito bem neste Palácio uma outra obra de Maluda, porventura representativa daquele estilo tão característico e inconfundível desta artista.
Fica a sugestão, talvez seja possível concretizá-la um dia.
Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, queria expressar a nossa total adesão a este voto e as nossas condolências aos familiares.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Presidente, se me permite, também gostava de usar da palavra.

O Sr. Presidente: - Tenho muito gosto em dar-lhe a palavra.
Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Governo também se quer associar na homenagem à pintora Maluda, por ocasião do seu falecimento.

Maluda contribuiu e continuará a contribuir para fixar imagens nítidas, rigorosas, claras e transparentes do nosso país, em especial da cidade de Lisboa. Num momento em que tantos grandes artistas que pintaram Lisboa vão morrendo, é também esta uma caminhada para que a sua obra continue a estar presente, através do azul do céu, das ruas, dos beirais, das chaminés, da bordadura em amarelo, castanho ou azul, das construções, do branco límpido e transparente e dos cortinados da cidade de Lisboa.
Maluda é, porventura, a pintora portuguesa mais associada, esteticamente, ao fado. Ela não era uma pintora nãif, mas uma pintora popular; não era uma pintora hiper-realista, mas uma pintora realista que continuará, seguramente, para além da sua morte, a estimular o nosso gosto estético e o modo de conhecer e amar melhor o nosso país e a sua capital, Lisboa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, de todos nós, talvez apenas eu tenha conhecido a Maluda quando ela era uma jovem a despontar para a pintura. Fui para Lourenço Marques com 25, 26 anos e, na altura, ela teria 18 anos. Era um ser humano encantador, já então, com uma luminosidade nos olhos extraordinária que conseguiu transpor para a sua pintura. E manteve-se sempre esse ser humano, com a linearidade das suas paisagens.
Em Portugal fez muitos amigos e sabia cultivar as amizades. Uma das maiores foi Amália Rodrigues, outra artista, que deve estar, neste momento, profundamente emocionada com a perda da sua amiga. A arte quer-se com a arte, e elas fizeram uma amizade muito comovente e muito positiva.
Sinto uma grande mágoa pela morte da Maluda. Acompanhei a evolução da sua pintura, desde as primeiras pinceladas, necessariamente titubeantes, até à perfeição das últimas. Foi, de facto, como se escreve no voto de pesar, uma caminhada no sentido da perfeição.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 146/VII, subscrito por Deputados de todos os grupos parlamentares.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

O voto será transmitido à família enlutada, família que não é numerosa - tinha mais amigos do que familiares.
Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 10 horas, e terá como ordem do dia a discussão conjunta dos projectos de lei n.os 590/VII (PCP), 607/VII (PSD) e 619/VII (PS) e a apreciação das petições n.os 237/VI, 292/VI, 323/VI e 63/VII.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 20 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação e relativa à votação final global das propostas de alteração, aprovadas na especialidade pela Comissão de Educação, Ciência e Cultura, sobre o Decreto-Lei n.º 115-A/98, de 4 de Maio, que aprova o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como dos respectivos agrupamentos [apreciação parlamentar n.º 52/VII (PCP)].

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A votação favorável do Grupo Parlamentar do PCP às alterações ao Decreto-Lei n.º 115-A/98, que «Aprova o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, bem como dos respectivos agrupamentos», resulta do facto de se considerar que algumas melhorias foram introduzidas no texto em causa, quando sujeito a apreciação parlamentar por proposta do PCP.
Particularmente, o reforço das competências do conselho pedagógico, uma mais efectiva e democrática participação de todos os níveis de ensino nos agrupamentos constituídos e ainda a garantia de participação de pais e encarregados de educação, sempre que possível, através das suas estruturas representativas.
No entanto, e apesar das alterações conseguidas em sede de comissão, o texto contém ainda matéria que põe em causa: a gestão democrática das escolas, conquistada após 25 de Abril de 1974; a responsabilidade do Estado face à Educação e ao Ensino; a qualidade da Escola Pública.
Todas estas matérias, entre outras, foram objecto de propostas por parte do PCP, que foram rejeitadas pelos restantes grupos parlamentares presentes nas reuniões da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura, aquando da discussão da apreciação parlamentar.
Nestes termos, o voto favorável do PCP não exprime um juízo de aprovação do conjunto deste diploma mas tão-só uma intenção de viabilizar alterações que são, apesar de insuficientes, positivas.

Os Deputados do PCP:
Luísa Mesquita.
Pimenta Dias.
António Filipe.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):

José Augusto Santos da Silva Marques.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Vasco Manuel Henriques Cunha.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Bento da Silva Galamba.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
José de Matos Leitão.
Mário Manuel Videira Lopes.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.

PartidoSocial Democrata (PSD):

Alberto Queiroga Figueiredo.
António Costa Rodrigues.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Domingos Dias Gomes.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Manuel Durão Barroso.
Pedro Augusto Cunha Pinto.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Nuno Kruz Abecasis.
Pedro José Del Negro Feist.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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DIÁRIO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

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