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Quarta-feira, 4 de Maio de 1999 I Série - Número 80

DIÁRIO
Da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 29 DE ABRIL DE 1999

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.
Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 275/VII, dos projectos de lei n.ºs 668 e 673/VII, das apreciações parlamentares n.ºs 96 a 98/VII e de requerimentos.
Em declaração política, o Sr. Deputado António Capucho (PSD) falou das conclusões do 22.º Congresso Nacional do PSD, realizado durante o último fim-de-semana em Coimbra, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Francisco de Assis (PS) - que viria a dar explicações a uma defesa da honra feita pelo Sr. Deputado Pacheco Pereira (PSD) -, Octávio Teixeira (PCP) e Luís Queiró (CDS-PP).
Ordem do dia. - Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projectos de lei n.ºs 591/VII - Alteração do Decreto n.º 15 355 (PCP), 592/VII - Aprova o novo regime sancionatório das touradas com touros de morte (revoga o Decreto n.º 15 355, de 14 de Abril de 1928) (PS) e 648/VII - Altera a Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro (Lei da protecção dos animais) e revoga o Decreto n.º 15 355, de 14 de Abril de 1928 (Deputado do CDS-PP Francisco Peixoto). Intervieram no debate, a diverso titulo, os Srs. Deputados Rodeia Machado (PCP), António Saleiro (PS). Francisco Peixoto (CDS-PP), Roleira Marinho (PSD) - na qualidade de relator da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas -, Rosa Maria Albernaz (PS), Miguel Macedo (PSD), Paulo Arsénio (PS), Barbosa de Melo (PSD), Lino de Carvalho (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Francisco Torres (PSD), Rui Namorado (PS) e Azevedo Soares (PSD).
A proposta de lei n.º 142/VII - Lei de bases gerais da caça foi também discutida na generalidade, tendo usado da palavra, a diverso- titulo, além do Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural (Vítor Barras), os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), José Carlos Póvoas (PSD), António Maninho (PS), Álvaro Amaro (PSD), Rui Marques (CDS-PP), Francisco Camilo e António José Dias (PS) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Foi ainda discutido, na generalidade, o projecto de lei n.º 650/VII - Alteração ao estatuto dos eleitos locais (PSD, PS e CDS-PP). Intervieram os Srs. Deputados Pimenta Dias (PCP), António Gouveia (PSD). Júlio Faria (PS) e Rui Marques (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 40 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto Remardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Cardoso.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Guimarães Fernandes* Dias.
António José Martins Seguro.
António Manuel Carmo Saleiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Armando Jorge Paulino Domingos.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.,
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Casimiro Francisco Ramos.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando. Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Rui Gaspar de Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Caudal.
Luís António do Rosário Veríssimo.
Mafalda Cristina Mata de. Oliveira Troncho.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel António dos Santos.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria Eduarda Bento Alves Ferrenha.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto.
Mário Manuel Videira Lopes.
Martim Afonso Pacheco Gradas.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Paulo Jorge Lúcio Arsénio.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.

Partido Social Democrata (PSD):

Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Alberto Queiroga Figueiredo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António d'0rey Capucho.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Carlos Eugênio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.

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Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Domingos Dias Gomes.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugênio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Póvoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende, Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Pombo Costa.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Vasco Manuel Henriques Cunha.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Almeida Figueiredo Barbosa Pombeiro.
António Carlos Brochado de Sousa Pedras.
Fernando José de Moura e Silva.
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Pedro José Dei Negro Feist.
Rui Manuel Pereira Marques.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Rui Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

Alexandrino Augusto Saldanha.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
António Luís Pimenta Dias.
Bernardino José Torrão Soares.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Odete dos Santos. Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai anunciar os diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 275/VII - Aprova o regime penal especial para jovens entre 16 e 21 anos, que baixou à l." Comissão; projectos de lei n.ºs 668/VII - Visa a criação de Comarca de Campo Maior, que baixou à 1.ª Comissão, e 673/VII - Visa a criação da freguesia de Triana, Rio Tinto, que baixou à 4.ª Comissão; apreciações parlamentares n.ºs 96/VII - Visa apreciar o Decreto-Lei n.º 120/99, de 16 de Abril, que criou o sistema especial de controlo e fiscalização ambiental da co-incineração, 97/VII - sobre o Decreto-Lei n.º 121/99, de 16 de Abril, que atribui a competência prevista no artigo 4.º da Lei n.º 20/99 à Comissão Científica, Independente criada pelo Decreto-Lei n.º 120/99 e faz cessar a suspensão da vigência das normas sobre fiscalização e sancionamento das operações de co-incineração constantes do Decreto-Lei n.º 273/98, de 2 de Setembro, e 98/VII - sobre o Decreto-Lei n.º 100/99, de 31 de Março, que estabelece o regime de férias, faltas e licenças dos funcionários e agentes da administração central, regional e local, incluindo os institutos públicos que revistam a natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos.
Foram apresentados na Mesa os requerimentos seguintes: no dia 26 e na reunião plenária de 28 de Abril de 1999, aos Ministérios da Economia e do Trabalho e da Solidariedade, formulado pelo Sr. Deputado Alexandrino Saldanha; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e Administração do Território, formulados pelos Srs. Deputados Francisco Fonenga e José Cesário; ao Ministério da Cultura, formulado pela Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado.
Em matéria de expediente é tudo, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de mais, queria informá-los de que amanhã terá lugar a celebração do 50.º aniversário da constituição do Conselho da Europa. É necessário que o acontecimento tenha o devido realce, por isso, convido formalmente todos os Srs. Deputados a estarem presentes na Sala do Senado pelas 11 horas para assistir a essa celebração.
Inscreveu-se para uma declaração política o Sr. Deputado António Capucho, a quem concedo a palavra.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Sis. Deputados: Em cumprimento de uma saudável tradição parlamentar, subo a esta tribuna para prestar alguns esclarecimentos sobre as conclusões do 22.º Congresso Nacional do PSD reunido no passado fim-de-semana, na cidade de Coimbra.
Por razões conhecidas, o PSD viu-se recentemente na contingência de mudar de liderança e de estratégia políticas, a pouco mais de um mês das eleições europeias e a menos de cinco meses das eleições legislativas.
Só um partido como o nosso, profundamente enraizado nas populações e na sociedade civil e com uma base militante muito dinâmica e generosa, seria capaz de promover com êxito esta mudança em tão curto prazo de tempo, e mostrar-se apto, perante os cidadãos, a enfrentar com sucesso os desafios eleitorais que se aproximam.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A estratégia política por nós aprovada em Coimbra não pretende nem pode ser confundida com um manifesto eleitoral e ainda menos com um programa de governo.
Isso seria manifestamente precipitado e prematuro.
Previamente à apresentação de propostas concretas para a governação do País, vamos aprovar as premissas da acção política e lançar as bases de uma nova cultura política, redefinindo o papel a desempenhar pelo nosso Partido. Foi o que fizemos em Coimbra.
Assumimos, então, o compromisso de apresentar ao País, no início de Setembro, o nosso Programa de Governo: um programa credível, com objectivos concretos, bem definidos e calendarizados. Antecipar essa iniciativa seria demagógico e irresponsável.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sem embargo, o Congresso adoptou as traves-mestras em que assentarão as propostas a submeter aos eleitores, depois de discutidas com a sociedade civil e aprovadas internamente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde que em 1995 se fechou em Portugal um ciclo político, nada de verdadeiramente novo surgiu na política nacional. O PS limitou-se a receber e a administrar, geralmente mal, a herança dos governos do PSD.

Aplausos do PSD. Protestos do PS.

Desde 1995, todos os dias se adiam as oportunidades para mudar. Nem a aproximação do novo milénio motivou um PS demasiadamente conformado e acomodado para promover as reformas urgentes.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Incapaz de decidir, não querendo incomodar ou desagradar a determinados sectores ou corporações, o PS adia sistematicamente a aplicação das reformas que o futuro exige, contorna os problemas complexos, hesita no caminho, foge às responsabilidades, escuda-se no diálogo, não realiza nem concretiza.

Aplausos do PSD.

O PS consome a Legislatura a tecer uma rede tentacular de dependências políticas, a instalar um clientelismo perigoso, discriminatório, pantanoso e ainda por cima «despesista».

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): -Muito bem!

O Orador: - Nunca, como hoje, estivemos tão perto da «mexicanização» do Estado, em Portugal.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD reafirma-se como alternativa de governo para Portugal. Acreditamos que é possível vencer a desconfiança de muitos portugueses nas instituições e nos seus titulares.
Noutros momentos decisivos da nossa história recente, em que o País esteve adiado, foi no PSD que os portugueses depositaram a sua confiança.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O País exige que o PSD seja o intérprete da modernidade em Portugal.

O PSD saberá compreender e exprimir os desafios deste virar de século e ajudar Portugal a preparar-se para os enfrentar com sucesso. O PSD não hesitará nas decisões que a defesa dos interesses nacionais requer. O PSD saberá estar ao serviço da inovação sem questionar o respeito pelos valores da tradição humanista portuguesa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD reafirma a profunda convicção nos princípios do ideário social-democrata e numa concepção personalista da política.
Para nós, a pessoa humana é a medida última de todas as coisas. Porque temos esta concepção, valorizamos, como ideia essencial, o princípio da igualdade de oportunidades, sem o confundir com igualitarismo. Tal como não confundimos personalismo com individualismo.
Não somos liberais: não confiamos na capacidade do mercado para resolver, por si só, todos os problemas que afectam a vida colectiva.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso nos empenhamos na realização dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais, pressuposto indispensável da garantia da dignidade humana de cada um.
Queremos o Estado na sua justa medida: menos Estado e melhor Estado! Não aceitamos um Estado que se abstenha de agir, tolerando as injustiças sociais, mas também não queremos um Estado com excesso de intervencionismo, pondo em causa a liberdade individual.
Queremos um Estado verdadeiramente descentralizado, que valorize em especial o papel das autarquias locais como estruturas demonstradamente mais aptas para resolver muitos dos problemas das populações.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD saído do Congresso de Coimbra é um partido que se pretende globalmente renovado.
A essência reformista do partido, a sua matriz original, interclassista e vincadamente nacional, saem reforçadas com a nova liderança do Dr. José Manuel Durão Barroso.
Assumimos na íntegra o património social-democrata, acumulado desde Francisco Sá Carneiro, mas incorporando as mudanças inerentes à evolução dos tempos.
Queremos servir sempre e melhor os interesses dos nossos concidadãos, incluindo os que têm votado noutros partidos. Queremos um PSD aberto, dinâmico, não sectário nem dogmático, capaz de conduzir com credibilidade a luta por um país moderno e competitivo, mais próspero e mais justo.
Queremos assumir um esforço particular em direcção aos jovens, quantas vezes desiludidos com uma política que pouco lhes diz. Queremos que esses jovens encontrem na nossa agenda reformadora as razões de uma participação cívica que contribua para a sua plena realização.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: As eleições europeias não devem ser vistas como a primeira volta das legislativas.

Vozes do PS:- Ah!

O Orador: - O Parlamento Europeu é agora um palco privilegiado de construção de uma união cada vez mais estreita entre os povos do nosso continente e um espaço essencial para a realização de interesses específicos dos diversos sectores da sociedade portuguesa. Por isso, as eleições europeias merecem o nosso maior empenhamento.
O Partido Socialista socorre-se do Dr. Mário Soares, procurando uma espécie de consagração supostamente suprapartidária, mas essa pose engana cada vez menos eleitores. Eleitores a quem também é devido um esclarecimento cabal sobre a candidatura para a presidência do Parlamento Europeu do Dr. Mário Soares, e sobre a verdadeira dimensão política dessas funções.
Convinha, já agora, também esclarecer de uma vez por todas por quanto tempo e em que circunstâncias é que o cabeça de lista do Partido Socialista tenciona exercer o mandato. Será por seis meses? Por um ano?
É pena, Srs. Deputados, e é sintomático que o Dr. Soares não tenha aceite debates televisivos a dois, ao contrário do que fizeram, em 1994, o Dr. António Vitorino e os demais cabeças de lista, candidatos ao Parlamento Europeu.

Aplausos do PSD.

Nessa altura os confrontos frente a frente organizados por um canal de televisão revelaram-se como o método mais favorável ao esclarecimento dos eleitores.
Srs. Deputados, para as eleições europeias, a nossa aposta é clara: apresentamos uma equipa liderada pelo Dr. José Pacheco Pereira para trabalhar, séria e eficazmente, pela Europa e, nesta, por Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, são as eleições legislativas que constituem a oportunidade, por excelência, para Portugal recuperar o atraso acumulado desde 1995 e preparar-se convenientemente para os grandes desafios que já nos batem à porta e se acumulam em fila de espera.

Protestos do PS.

A globalização está aí para ficar. Já passou o tempo para debater se é boa ou má. O que importa é encarar de frente as suas consequências, aproveitar o que de positivo ela encerra e preparar a resolução dos problemas que inevitavelmente nos acarreta.
A competição global será ganha por aqueles que tiverem maior capacidade para interpretar o sentido das mudanças em curso.
O País apercebe-se de que, agora, existe uma alternativa credível ao Governo do Partido Socialista; o País acredita que é possível mudar e que vale a pena mudar.
O PSD, com a renovação da sua estratégia e a liderança do Dr. José Manuel Durão Barroso, reforça a convicção nos eleitores de que é a força política capaz de protagonizar uma nova proposta de governo para Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O nosso objectivo é convencer para vencer.
Estamos preparados para aceitar, nos termos ditados pela vontade dos portugueses, o mandato para governar Portugal.
Dizemos a todos os que não se revêm na actual governação socialista que o voto que não seja no PSD é um voto inútil, um voto que objectivamente serviria para consolidar o PS no poder.

Protestos do PS.

Mas queremos deixar claro que, no exercício do mandato que estamos prontos a assumir - se essa for a vontade dos eleitores, como esperamos -, aceitaremos a colaboração e a participação de todos aqueles que claramente não pactuam com o actual desgoverno socialista e estiverem connosco na construção de uma alternativa credível.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos últimos quatro anos Portugal perdeu tempo, demasiado tempo. A rosa murchou! É tempo de mudar: com o PSD e com Dr. Durão Barroso.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado António Capucho os Srs. Deputados Francisco de Assis, Octávio Teixeira e Luís Queiró. Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Capucho, permita-me que comece por saudá-lo como um dos novos rostos do PSD, e, pelos vistos, como novo porta-voz do PSD nesta Assembleia da República.

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Devo dizer-lhe que, verdadeiramente, o Sr. Deputado nada disse no discurso que acabou de produzir perante esta Câmara.

Risos do PSD.

E se isto foram as conclusões do Congresso do PSD, bem poderemos retirar daí a ilação de que durante três dias os senhores debateram as questões internas, mas não tiveram preocupações para com o País e não foram capazes de encontrar uma única solução, uma única ideia, um único projecto para responder às questões que se colocam hoje em Portugal.

Aplausos do PS.

Nós, de resto, já tínhamos essa dúvida em relação à nova liderança do PSD, porque há muito que vimos construindo a noção de que a nova liderança do PSD tem um excesso de gravidade e insuficiência de ideias. Tem muita pose e pouco projecto,...

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Falso!

O Orador: - ... foi construindo um percurso com base na gestão de muitos silêncios, mas o silêncio pode permitir a emergência de uma imagem. O silêncio nunca dará origem ao surgimento de um verdadeiro projecto mobilizador para Portugal.

Aplausos do PS.

E o discurso que o Sr. Deputado aqui fez foi bem a demonstração desse vazio, dessa total inanidade do ponto de vista programático e do ponto de vista das ideias. O discurso que o Sr. Deputado aqui fez poderia ter sido feito há 10 anos e poderá, provavelmente, voltar a ser feito daqui a 10 ou 15 anos; considerações genéricas, reiteração dos grandes princípios orientadores da acção do Partido Social-Democrata - muitos deles demonstrados,, depois postos em causa na prática governativa do PSD quando teve oportunidade de a levar a cabo neste País durante muitos anos -, e nada mais!
Sobre o País, o Sr. Deputado colocou-se - para usar uma metáfora simples - como uma espécie de médico que faz, em primeiro lugar, um mau diagnóstico da situação, e, em segundo lugar, reconhece à partida que não tem qualquer terapêutica para atender aos problemas com que o País se possa confrontar. Reconheceu, claramente, que não tem soluções. Aliás, isso vem na sequência daquilo que foi uma das mais curiosas declarações do Dr. Durão Barroso no Congresso-que foi, de resto, ao que parece, muito aplaudida -, no sentido de dizer que o PSD dentro de quatro meses, finalmente, terá um projecto para Portugal, o que nos leva, até, a concluir que no Congresso do PSD não elegeram verdadeiramente uma comissão política para liderar o partido mas uma espécie de gabinete de estudos para analisar os problemas do País e tentar encontrar soluções para Portugal.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, é muito pouco para um partido que tem uma enorme responsabilidade na vida nacional!
Temos um profundo respeito pelo PSD, pelo que o PSD representa e temos noção da importância do contributo que o PSD tem de dar para o debate político nacional. Por isso, é com grande preocupação que continuamos a assistir a este resvalar contínuo do PSD, que, de Congresso em Congresso, se vai encaminhando para um vazio, cada vez mais absoluto, que o impede de se constituir numa alternativa verdadeiramente credível, válida e susceptível de gerar uma ampla mobilização na sociedade portuguesa.
O mesmo se deve dizer em relação às questões europeias.
Tenho uma enorme estima pessoal e intelectual pelo Sr. Dr. Deputado Pacheco Pereira, mas, até aqui, ainda não vi o Sr. Deputado Pacheco Pereira enunciar qualquer ideia acerca das questões europeias. Já fez várias reivindicações, já falou sobre o modus faciendi destas eleições, mas, até aqui, sobre a Europa, a única ideia que o Sr. Deputado Pacheco Pereira trouxe para o debate político foi a de dizer que a Europa precisa de ideias novas, mas não trouxe, ainda, qualquer ideia em concreto, nenhuma ideia para que se possa saber qual é o conjunto de princípios, de programas, de orientações e de projectos que o PSD preconiza em matérias europeias.
Também penso que esse debate é fundamental e também entendo que o momento ideal para o travar é este em que vão ter lugar eleições europeias, mas é essencial que se passe da questão meramente formal e se comece a debater aquilo que nos aproxima e aquilo que nos afasta em tomo da substância das questões.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente. Em suma, neste Congresso, o PSD olhou para dentro, proeurou resolver as suas questões internas. Se as resolveu ou não, é uma questão que só o futuro dirá.
Mas neste Congresso o PSD, uma vez mais, revelou-se totalmente incapaz de olhar para Portugal e de encontrar soluções para as questões que se colocam aos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Para defesa da consideração, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Terá de ser no final, Sr. Deputado. Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, antes de mais nada, agradeço os seus cumprimentos, mas lamento dizer-lhe, para começar, que não percebo como pode permitir-se dizer que eu nada disse do alto daquela tribuna. Talvez nada do que disse lhe tenha agradado a si e à sua bancada...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É porque, manifestamente, se eu nada disse, não percebo para quê tanto nervosismo da bancada de V. Ex.ª...

Aplausos do PSD.

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Desde os meus tempos de Deputado Europeu nunca vi uma bancada reagir dessa forma de tal maneira grotesca que quem está no uso da palavra tem dificuldade - com a fraca insonorização desta sala - em proferir o seu discurso. No Parlamento Europeu, de resto, era a extrema direita que costumava fazer esse «terrorismo»... Aqui, foram VV. Ex.ªs.

Protestos do PS.

Seja como for, registo que se as minhas declarações foram inócuas, se o Congresso para nada serviu, então por que é que S. Ex.ª o Primeiro-Ministro, já porventura terá delegado em alguns dirigentes do partido - os habituais, de resto - e membros do Governo, para virem atacar pessoalmente o Dr. José Manuel Durão Barroso e as conclusões do nosso Congresso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Constato, por outro lado, que, tendo eu criticado, no uso do meu direito parlamentar e de responsável de um partido da oposição, não apenas a acção governativa como até a vossa candidatura ao Parlamento Europeu, V. Ex.ª não disse uma palavra em defesa do seu Governo e do seu cabeça de lista ao Parlamento Europeu,...

Vozes do PSD: - Não consegue!

O Orador: - ... limitando-se a dizer que o nosso candidato não tem ideias. Olhe: tem-nas! Ele, aliás, pediu a palavra, mas, desde já, adianto o seguinte: se quer conhecer melhor as ideias dele e cotejá-las com as do seu cabeça de lista, convença o seu cabeça de lista a aceitar um debate frente a frente com ele.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Capucho, gostaria de começar por, institucionalmente, cumprimentar a nova Direcção do Partido Social-Democrata e de também tecer algumas considerações sobre a sua intervenção e sobre algumas questões suscitadas no Congresso, e não propriamente sobre o Congresso em si.
A primeira questão é esta: V. Ex.ª veio aqui reafirmar algo que tinha sido afirmado durante o Congresso, ou seja, que deste Congresso sai um PSD renovado. O problema é a comprovação dessa renovação! Nós, até agora, tivemos conhecimento da renovação de caras. Isso é um facto! E julgo que há um caso exemplar: a cara do responsável pelas portagens na Ponte 25 de Abril, o Eng.º Ferreira do Amaral, foi, substituído pela cara do responsável pelas polícias na Ponte 25 de Abril; o Dr. Dias Loureiro.
O problema é a renovação de políticas! E, pelos vistos, seremos obrigados a esperar, pelo menos até Setembro, para sabermos se há alterações de políticas, se há renovação da política.
Aliás, V. Ex.ª começou a sua intervenção dizendo que, «após o fim do ciclo político de 1995, nada de novo surgiu na política portuguesa». Estava a referir-se, implicitamente, ao Governo do PS, mas estava também, implicitamente, incluído que nada de novo surgiu no PSD.
É uma critica que tem o legitimo direito de fazer ao seu próprio partido e às anteriores direcções do seu partido, mas convém não esquecer que essa inexistência de novidade política abrange não apenas o Governo mas também o PSD.
Mas o mais importante para nós é que, de facto, vem confirmar, pela sua voz, aquilo que sempre temos afirmado: é que, em termos das políticas, pelo menos até Setembro - veremos quando VV. Ex.ªs apresentarem as vossas estratégias políticas e as vossa políticas -, não há alteração de políticas depois de 1995. Por conseguinte, estranha-se muito - e estranhamos nós, embora anotemos isso - o subir de tom em relação à critica ao Governo do PS. Porque se eles não mudaram as políticas, como é que se justifica da vossa parte essa subida de tom?
Nós temo-lo criticado precisamente por isso: é que as políticas não alteraram depois de 1995 e, pelos vistos, não vão alterar-se no próximo futuro e não vão alterar-se também em Setembro, quando conhecermos o vosso programa eleitoral.
Mas uma última questão - e essa eu gostaria de frisar, porque é para mim a questão central daquilo que nos trouxe aqui o Sr. Deputado António Capucho - é a concepção de democracia que o PSD nos apresenta neste momento. No Congresso tinha-nos apresentado uma concepção democrática extremamente incorrecta, que pouco ou nada tem a ver com a democracia, que é a questão dos debates a dois.
O Dr. Durão Barroso quer debater apenas e só com o Eng.º Guterres; o Sr. Deputado Pacheco Pereira quer debater apenas e só com o Dr. Mário Soares; e V. Ex.ª agora vem acabar esta tese da bipolarização com aquela afirmação que ali fez, ou seja, que «todo o voto dos descontentes, com o Governo do PS que não seja para o PSD é um voto inútil». Um voto inútil por quê, Sr. Deputado? Um voto inútil para um partido que teve as mesmas políticas que estão a ser seguidas pelo Governo do PS? Mas, para além disso, e fundamentalmente, que concepção política é essa de que «ou é por nós ou é contra nós», pura e simplesmente?!
VV. Ex.ªs, o PSD, neste momento, apenas lutam pela bipolarização ou pela bipartidarização do regime democrático português!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Octávio Teixeira, muito obrigado pelas simpáticas palavras que me dirigiu e à Direcção Nacional do Partido Social-Democrata, eleita no passado fim-de-semana. Registo o cumprimento e também o comportamento muito correcto da sua bancada neste debate.
Quero dizer que, evidentemente, me estava a referir à acção governativa quando referi que nada de novo aconteceu na cena política portuguesa. Era nesse âmbito, embora noutros âmbitos da política portuguesa também pouca coisa de novo possa ser registada, nomeadamente do partido de V. Ex.ª se me permite o aparte.

Risos do PSD.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Como já vem sendo hábito!

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O Orador: - Seja como for, gostaria de esclarecer um tema, que, aliás, também me foi colocado pelo Sr. Deputado Francisco de Assis e que é o seguinte: era totalmente irresponsável da parte do partido e da moção subscrita pelo Dr. José Manuel Durão Barroso apresentar um programa eleitoral de governo poucos dias depois de ter sido confrontado com o vazio de poder dentro do Partido Social-Democrata.

Vozes do PS: - Ah!...

O Orador: - Mas não perdem pela demora! De resto, o Partido Socialista, que, por vezes, se mostra um discípulo fiel de Maquiavel, sabe que o bem deve ser feito a pouco e pouco. E, portanto, daqui até ao início de Setembro, terá conhecimento das nossas propostas, credíveis, realistas e calendarizadas, para os problemas do povo português.
Em relação à renovação, o Sr. Deputado, evidentemente, pode não gostar de determinadas caras que fazem parte dos órgãos nacionais do PSD, mas a renovação ocorreu. Não ocorreu como o Partido Socialista faz, para «agradar a gregos e a troianos», quando, por exemplo, para cumprir as quotas, alarga os órgãos à medida dos pedidos de entrada nos seus órgãos do Partido Social-Democrata.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Podíamos ter feito isso, mas não fizemos! Portanto, não foi possível «agradar a gregos e a troianos», mas fizemos uma renovação, que é patente e notória.
Sr. Deputado, não procuramos a bipolarização pela bipolarização. Temos um projecto que é governar Portugal e manifestamo-nos como alternativa credível para governar o País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Capucho, como deve calcular, ouvimos a sua intervenção com a maior atenção e até com a maior expectativa, mas - devo dizer-lhe - uma expectativa, apesar de tudo, já não tão grande quanto aquela com que assistimos ao Congresso deste fim-de-semana, porque V. Ex.ª não veio aqui trazer nada de novo nem nada que fosse mais consistente do que aquilo que lá foi dito.
No entanto, disse-nos outras coisas importantes, que merecem aqui um comentário. A primeira é esta: V. Ex.ª disse que a estratégia que aprovaram no vosso Congresso não traduz um programa eleitoral nem um programa de governo. Ó Sr. Deputado, a primeira coisa que lhe quero dizer é que demos bem conta disso!

Risos do CDS-PP e do PS.

Na verdade, não constituiu nem um programa de governo nem um programa eleitoral! Foi um diagnóstico da situação! Tantas vezes aqui fizemos juntos esse diagnóstico, Sr. Deputado!

O Sr. Acácio Barreiros (PS): - Essa agora foi forte!

O Orador: - O Sr. Dr. José Manuel Durão Barroso, hoje líder do partido, a quem aproveito para cumprimentar democraticamente, como é óbvio, referiu-se e reflectiu muito sobre os anseios e os problemas das crianças, dos jovens, dos idosos, dos deficientes, dos funcionários públicos, dos pensionistas...

O Sr. José Junqueiro (PS): - E vai estar assim a reflectir até Setembro!

O Orador: - De facto, reflectiu isso tudo! E basta até ler os jornais para fazer reflexões assim! Mas, na realidade, depois, soluções concretas prometeu-as para daqui a 120 dias. Isso é que para nós é extraordinário!
Sr. Deputado, quero dizer-lhe o seguinte: da nossa parte, temos respostas para todos esses problemas e para todos esses anseios que foram diagnosticados pelo Sr. Deputado Durão Barroso no Congresso. E mais: vamos apresentá-las, e não precisamos de quatro meses, precisamos apenas de mais algumas horas, como V. Ex.ª irá ver! E vamos assumir aqui muito do legado daquilo que aqui fizemos em conjunto durante um ano! E aí estão as respostas! E nós assumimos esse legado de esperança, dessa esperança pela qual V. Ex.ª também aqui se bateu. E, com certeza, não quer que lhe leia alguns artigos de jornais, que, à cautela, fui trazendo para aqui,...

Vozes do PSD: -Leia, leia!

O Orador: - ... nem aquilo que o Sr. Dr. Alberto João Jardim diz da vossa nova direcção!
Em segundo lugar, quero dizer-lhe o seguinte: V. Ex.ª, mais uma vez, referiu aqui uma ideia peregrina, que o Sr. Deputado Pacheco Pereira já defendeu, ou seja, o desafio que fez para que houvesse debates a dois. Ó Sr. Deputado, por muita renovação que haja no seu partido, por muitas voltas que dê o seu partido, não podemos deixar de ligar à história do Partido Social-Democrata, e tenho de recordar aqui - e esperava não ter de o fazer - o que se passava no governo de que fez parte o Dr. Durão Barroso, o governo do Dr. Cavaco Silva, que dizia que «recusava os debates a dois e a quatro, porque não estava para promover os dirigentes da oposição».

Vozes do CDS-PP e do PS: - Muito bem!

O Orador: - Eu lembro-me disso, Sr. Deputado! E pergunto-lhe com que legitimidade é que V. Ex.ª vem agora exigir debates apenas a dois e se V. Ex.ª não está apenas a querer, por esta via, evitar a discussão das ideias que não são património vosso, são património nosso, e que temos tanto direito de discutir com VV. Ex.ªs como com o Dr. Mário Soares e com os candidatos a Deputados do PCP, nas próximas eleições e nos programas eleitorais que vamos debater na campanha eleitoral.

O Sr. Silvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, cuidado por que o luto aliviado ainda é cinzento, não é cor de laranja e risonho, como V. Ex.ª o está a fazer!
Em terceiro lugar, quero ainda falar-lhe sobre o voto útil. E sobre o voto útil, Sr. Deputado, quero dizer-lhe o seguinte: V. Ex.ª referiu que o voto dos descontentes que não seja no PSD é um voto perdido. Olhe que não, Sr. Deputado! Não é um voto perdido! E aqui aproveito para recordar-lhe uma frase que ficou no nosso legado, daquilo que eu discuti consigo e com tantos colegas do seu par-

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tido, há uns meses atrás: é que a oposição, de facto, não deve atacar a oposição!
Acho muito bem que V. Ex.ª se concentre no Partido Socialista e no Governo, porque nós vamos fazer a mesma coisa. Aí a nossa estrada é paralela! E já dissemos, Sr. Deputado, que nós não atacaremos o PSD e apenas responderemos em legítima defesa.
Para terminar, sobre o voto útil, recordava-lhe apenas aquela frase sábia do Professor Adriano Moreira: «o voto útil só é útil para quem o recebe, não é útil para quem o dá»..

(O Orador reviu).

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: -Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, quero agradecer-lhe também os cumprimentos que nos dirigiu e dizer-lhe que, de facto, a vossa bancada também teve um comportamento absolutamente exemplar.

Risos do PS.

Refiro-me às interferências aquando do discurso, que, evidentemente, não vieram dessa bancada!
Mas a vossa bancada ficou manifestamente incomodada, pelo seu tom de voz, pela sua exasperação em relação ao meu discurso! É estranho!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): -Muito bem!

O Orador: - E estão a fazer uma confusão monumental a propósito dos debates a dois! Presumo, aliás, que o Sr. Deputado Octávio Teixeira também incorreu nesse erro na sua intervenção, segundo me foi referido, porque não reparei. Mas apresso-me a esclarecer: nós não queremos ter o monopólio dos debates a dois...

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Ah!

O Orador: - Aquilo que sugerimos é que se faça tal como foi feito em 1995, com o apoio do Dr. António Vitorino e do vosso cabeça de lista, Dr. Manuel Monteiro, em que, por iniciativa de uma televisão privada, se realizaram debates entre os vários cabeças de lista, dois a dois, que se revelaram a melhor forma de esclarecer o eleitorado, e é isso que queremos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, até agora, ainda não tivemos qualquer resposta em relação a esta proposta por parte dos destinatários.
Quero esclarecer, mais uma vez, Sr. Deputado, que opina que eu nada de novo trouxe em relação ao Congresso - e ainda bem! -, que vim aqui apenas para relatar e para transmitir, como é praxe parlamentar, aquilo que se passou no nosso Congresso, e não para inovar em relação a isso, e que entendemos por bem apresentar em devido tempo, quando nós entendemos oportuno, e não quando convém a VV. Ex.ªs ou ao Governo socialista, a nossa proposta de governo, calendarizada e concretizada.
Não pense que não há ideias! Obviamente que há! O senhor sabe qual é o nosso património em cada uma das áreas de governação, mas queremos é discuti-las com os nossos militantes, com a sociedade civil e oportunamente a apresentaremos de acordo com o nosso timing - e com o nosso calendário.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, desculpe que lhe diga, mas na sua intervenção constato que não houve uma única palavra a propósito da governação socialista, não houve uma única palavra critica ao partido maioritário e ao seu governo. VV. Ex.ªs regressaram ao velho hábito de fazer oposição à oposição - que vos faça bom proveito porque o eleitorado está atento a isso!

Aplausos do PSD. O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Isso é mentira!

O Sr. Presidente: - Para defesa da consideração da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Queiró.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, utilizando esta figura regimental, o que quero fazer é mais a defesa da consideração intelectual da bancada e não tanto a defesa da honra, dizendo ao Deputado António Capucho o seguinte: o Sr. Deputado não pode dizer que nós voltámos a qualquer tempo anterior, da «muleta» ou lá o que é que o Sr. Deputado quis dizer...
O que eu disse foi que nós seguiríamos - e aí até em paralelo com VV. Ex.ªs - no ataque e na crítica ao Partido Socialista e ao Governo do Partido Socialista.
O Sr. Deputado ouviu o que nós dissemos! E eu até disse mais: referi que o nosso caminho seria aquele que nós assumimos, desde há muito tempo, pelo menos desde o nosso último Congresso, segundo o qual não estaríamos aqui para atacar a oposição mas, sim, para atacar e criticar o Governo onde ele deve ser atacado. Portanto, o Sr. Deputado compreenderá que eu tenha de fazer esta correcção, porque assim se repõe a verdade e V. Ex.ª ficara pelo menos limitado no efeito fácil que quis tirar relativamente a uma coisa que eu não disse.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - É preciso ser rigoroso!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Queiró, constato o seu recuo a propósito da intervenção que fez.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para defender a consideração pessoal relativamente ao pedido de esclarecimento feito pelo Sr. Deputado Francisco de Assis, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco de Assis, é natural que o senhor diga que eu não disse uma linha sobre a Europa, porque a Europa que me interessa não é a vossa, não é a Europa

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dos socialistas, não é a Europa do egoísmo nacional, não é a Europa que não tem um único projecto face ao futuro, não é a Europa que esgotou em grande parte a esperança em relação ao destino europeu, não é a Europa como ela foi fundada pelos grandes dirigentes democratas-cristãos do pós-guerra.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Isso é o discurso do Guterres!

O Orador: - Portanto, é natural que eu não fale da vossa Europa.
São os senhores que têm obrigação de explicar por que razão se reconhecem numa Europa e por que razão não dizem uma linha face a uma Europa que permitiu a cena humilhante do Primeiro-Ministro português a ser humilhado pelo Primeiro-Ministro alemão, em público, e os senhores a ficarem calados porque são ambos companheiros da Internacional Socialista. Esse é que é o vosso problema e não é, certamente, o nosso!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito fraco!

O Orador: - Portanto, a Europa de que vamos falar é uma Europa completamente diferente. Podem continuar até ao fim da campanha a dizer que eu não falo da Europa, porque eu certamente não falarei da vossa Europa a não ser para a criticar.
Mas ainda bem que hoje me dá uma oportunidade para falar, porque eu aproveito esta oportunidade para denunciar...

Risos do PS.

Espero que os Srs. Deputados ouçam...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): -Não é fácil!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Estamos todos de castigo para ouvir!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, façam favor de fazer silêncio.

O Orador: - É que eu quero que ouçam bem...

Vozes do PS:- Ah!

O Orador: - É que não faço uma campanha baseada no sistemático e quotidiano engano aos portugueses, como é a circunstância de o candidato do Partido Socialista se é encontrar em Estrasburgo pedindo audiências aos presidentes dos grupos parlamentares do Parlamento Europeu em nome não da sua candidatura como deveria ser mas em nome do Movimento Europeu que, que eu saiba, não concorre às eleições em Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma fraude!

O Orador: - E isso é um engano, porque o candidato do Partido Socialista apresenta-se lá fora a pedir audiências em nome da presidência do Movimento Europeu, que é um movimento federal que tem inclusive na sua constituição elementos do Partido Social-Democrata, e cá dentro o aparelho do Partido Socialista apresente essas audiências como fazendo parte da campanha do seu candidato para obter um lugar no Parlamento Europeu e na presidência do Parlamento Europeu. Isso é um engano e como engano que é os senhores têm de esclarecê-lo, porque eu quero saber se é o Partido Socialista que vai às eleições em Portugal ou se é o Movimento Europeu que vai às eleições em Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, se o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, não vejo em que é que tenha ofendido a honra perdida do Sr. Deputado Pacheco Pereira. Fui muito claro naquilo que disse e que reitero, mas o que o Sr. Deputado acabou de dizer vem dar razão às minhas asserções anteriores, ou seja, sobre questões europeias o Sr. Deputado até hoje nada disse.

Vozes do PS: - Zero!

Aplausos do PS.

O Orador: - O senhor limitou-se a fazer um discurso negativo, o discurso da critica ao dizer: «Esta Europa não é a minha Europa», a «vossa Europa»...
Sr. Deputado, esta é a nossa Europa, é uma Europa com muitos problemas, é uma Europa com muitas dificuldades, é uma Europa que tem de ser equacionada em todas as suas dimensões: no plano civilizacional, no plano cultural, no plano social, no plano político e no plano económico. E nenhum destes planos exclui qualquer outro, são todos igualmente importantes e é nessa perspectiva que temos de travar um debate sério sobre as questões europeias. Nós esperávamos que o Sr. Deputado produzisse ideias sobre a Europa - de resto, anunciou-as aqui há dias, mas até agora só produziu insultos, proeurou denominar a lista do Partido Socialista e atacar o cabeça de lista do Partido Socialista às eleições europeias.
Ainda pensei que o Sr. Deputado Pacheco Pereira vinha aludir - e felizmente não veio - à questão dos debates, ao desafio para os debates, à necessidade de haver debates, mas, como já foi salientado nesta Câmara, não assiste qualquer legitimidade moral a quem durante anos foi uma espécie de maítre à penser do cavaquismo e nunca ergueu a sua voz para reclamar a realização de debates em Portugal quando o Professor Cavaco Silva se recusava a travar debates com os seus adversários políticos directos. Haverá debates, Sr. Deputado, mas o que nós não aceitamos é que alguns queiram assumir nesta disputa eleitoral uma espécie de papel de grandes educadores do País que vêm agora trazer todas as novidades, todas as novas ideias sobre a Europa e que depois no concreto não trazem uma única ideia. Não sei se o Dr. Mário Soares ouviu o discurso que o Deputado Pacheco Pereira proferiu no Congresso do PSD,...

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Era bom que tivesse ouvido!

O Orador: - ... mas eu ouvi e segui-o com atenção. E o que pude ouvir foi um desafio, de resto legítimo, ao Dr. Mário Soares para debater com ele - e certamente com os

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outros candidatos-as questões que se vão colocar no âmbito das eleições europeias. Houve também uma tentativa de denominar em absoluto a lista do Partido Socialista, mas não ouvi o Dr. Pacheco Pereira apresentar aos congressistas do seu partido aquilo que são as suas próprias posições sobre a Europa. O senhor disse: «A minha Europa não é essa». Então, Sr. Deputado, diga qual é a «sua» Europa!

A Sr.ª Maria Manuela Augusto (PS): - Não sabe!

O Orador: - Diga quais são as suas concepções para a Europa, traga-as aqui para o debate, porque, Sr. Deputado, deverá certamente saber que em relação a muitas matérias sobre a Europa nem subsistirão divergências insanáveis entre nós, porque há um conjunto de preocupações fundamentais que todos temos em relação ao processo de construção europeia.
Sr. Presidente, de facto, como não ofendi o Sr. Deputado Pacheco Pereira, não lhe dei quaisquer explicações e reitero em absoluto o que disse.
Há pouco quando intervim, cometi um lapso dado que não cumprimentei o Sr. Deputado Durão Barroso pelo facto de ele ter sido eleito para a presidência do PSD. Quero aproveitar a circunstância para lhe apresentar agora os meus cumprimentos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.

O Sr. Pacheco Pereira (PSD): - Sr. Presidente, quero por via da Mesa pedir ao Partido Socialista que me esclareça acerca da questão do Movimento Europeu sobre o qual foi particularmente omisso o Sr. Deputado Francisco de Assis.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco de Assis.

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Sr. Presidente, quero apenas lembrar ao Sr. Deputado Pacheco Pereira que o Sr. Dr. Mário Soares não viu os seus direitos cívicos coarctados pela circunstância de ser candidato ao Parlamento Europeu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 15 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar ao período da ordem do dia iniciando a discussão conjunta dos projectos de lei n.º 591/VII - Alteração do Decreto n.º 15 355 (PCP), 592/VII - Aprova o novo regime sancionatório das touradas com touros de morte (revoga o Decreto n.º 15 355, de 14 de Abril de 1928) (PS) e 648/VII - Altera a Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro (Lei da protecção dos animais) e revoga o Decreto n.º 15 355, de 14 de Abril de 1928 (Deputado do CDS-PP Francisco Peixoto).
Para introduzir o debate, em representação do seu partido, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Quero começar por saudar os representantes da população de Barrancos que assistem hoje aos nossos trabalhos e que esperam legitimamente que a Assembleia da República reconheça e faça justiça aos seus anseios e aspirações; que a Assembleia da República reconheça que as festas anuais de Barrancos, em Agosto, são uma vivência colectiva de toda a população, que se devem realizar em paz e tranquilidade em toda a sua expressão, de usos e costumes nunca até aqui interrompidos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): -Muito bem!

O Orador: - Festas essas de cariz popular e religioso, pois são em honra da sua padroeira Nossa Senhora da Conceição de Barrancos e que têm o seu ponto alto com uma corrida de touros à espanhola levada a efeito na praça central da vila, que serve de praça de touros (nesta ocasião) e que culmina com a morte do touro na arena.
A praça central da vila de Barrancos é, desde sempre, o local das festas colectivas de Barrancos. É ali que decorre o Natal comunitário, passado à volta de uma enorme fogueira, onde a população se diverte, confraterniza, convive e compartilha das mesmas tradições seculares bem enraizadas no povo e que são o seu maior património.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Têm também património edificado que pretendem a todo o tempo, através da sua autarquia, defender.
O Castelo de Noudar é um desses monumentos que se perde na memória dos tempos e que só a força e a determinação da população e da sua autarquia têm feito com que se preserve. Está este castelo em vias de ser recuperado, para fruição de toda a sua gente e aos que quiserem ali demandar. É um património, é um legado de gerações que se não quer perder e que se tenta a todo o custo recuperar, como também não se quer perder tudo aquilo que se traduz na sua memória colectiva, como povo, de gentes de paz e de bem.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Barrancos é uma vila alentejana com raízes profundas do seu povo, mas é também uma vila próxima, eu diria mesmo vizinha de Espanha. É que a sua vivência, as suas raízes bebem também nas tradições espanholas. É natural! Que povo, que conviveu com outros povos, não teve aculturação? O povo português é rico nessa aculturação. Deu da sua cultura a outros povos e bebeu da suas culturas, e, também por isso, somos um povo rico de tradições, de usos e costumes que não devemos nem podemos malbaratar.
Barrancos é exemplo disso: sofreu as influências da cultura espanhola e por isso as suas festas tradicionais, levadas a efeito em Agosto, culminam com uma tourada, como de resto um pouco por todo o Alentejo, com particular destaque para a morte do touro na arena, em que os toureiros contratados são oriundos da vizinha Espanha ou de países da América Latina.

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E uma tradição que se perde na memória dos tempos e que, de forma ininterrupta, se realiza pelo menos desde que foram proibidas touradas com touros de morte em Portugal, ou seja, pelo menos desde 1928.
Barrancos é uma vila pequena, com poucos habitantes, mas com homens e mulheres de fortes sentimentos e gentes de paz; viveu durante muitos e muitos anos no mais perfeito anonimato para os meios de comunicação social; nunca ninguém se lembrou de Barrancos e das suas gentes, quando acolheram no seu seio refugiados da guerra civil espanhola e lhes prestaram a sua enorme solidariedade; nunca, ou poucas vezes, se lembraram da população barranquenha, quando muitos deles tiveram de migrar para fora ou dentro do seu próprio País, quando ali não existia trabalho que sustentasse a família.
A população de Barrancos não é como se pretende fazer crer, com alguns anúncios despropositados mas seguramente bem financiados, um povo que não tem sensibilidade e cujas tradições advêm de costumes bárbaros. O povo de Barrancos é um povo cuja cultura assenta numa profunda relação humana de solidariedade, de partilha e de amizade.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): -Muito bem!

O Orador: - Barrancos tomou-se notícia nos media nacionais quando uma providência cautelar, entregue num tribunal de Lisboa, por cidadãos que nada têm a ver com a região, nem com os seus usos e costumes, tentaram impedir as festas em honra da sua padroeira com a tradicional corrida de touros à espanhola.
O Decreto n.º 15 355, de 14 de Abril de 1928, caiu em desuso em Barrancos porque nunca chegou, efectivamente, a ser aplicado.
Conhecendo essa realidade, mas igualmente conscientes de que pendia sobre eles a decisão da providência cautelar, a Comissão de Festas, a Comissão de Defesa das Tradições Barranquenhas, a Câmara Municipal de Barrancos e outros fizeram chegar ao Grupo Parlamentar do PCP e a outros grupos parlamentares a sua posição sobre estas matérias e a forma de ser encontrada uma solução legislativa que garantisse o que desde há muito é uma realidade.
Foi neste contexto que o PCP apresentou o projecto de lei que hoje aqui apreciamos e em cuja «Nota justificativa» afirmamos que apesar de a disposição do Decreto n.º 15 355, de 14 de Abril de 1928, proibir touradas com touros de morte, durante todo o período da ditadura e posteriormente até hoje, elas foram levadas a efeito praticamente sem interrupção em determinados e circunscritos pontos do território nacional como é o caso de Barrancos.
Por outro lado, e por analogia, referimos que a lei francesa acolhe já as touradas na forma que assumam a tradição local e no artigo n.º 521-1 do Código Penal francês, através de um dispositivo legal inserido pela Lei n.º 653, de 1994, cujo critério relevante é a invocação de «tradição ininterrupta».
Acresce salientar que no Agravo do Tribunal da Relação de Lisboa sobre a providência cautelar é o próprio juiz relator que reconhece razão à Comissão de Festas e ao povo de Barrancos quanto ao futuro ao afirmar: «Sem necessidade de se determinar se, presentemente, tais touradas são proibidas por lei, mas mesmo admitindo que o sejam, certo é que o legislador que parece não ter grande reacção contra elas, não se pronunciando com toda a clareza para pôr termo a dúvidas que ainda existam, pode pretender autorizá-los em determinadas circunstâncias excepcionais nomeadamente em alteração à vontade de alguma população.»
Por isso, Srs. Deputados, o projecto de lei do PCP propõe-se assim criar um dispositivo legal que acolha a tradição local e onde esta se tenha mantido desde 1928, como é o caso de Barrancos. Que fique claro que o projecto de lei do PCP não propõe a alteração da proibição dos touros de morte em Portugal, o que se pretende é que a Assembleia da República reconheça e legitime os usos e costumes de uma população, ancorados na cultura e na vivência de um povo e que faz parte integrante do seu património colectivo; o que se pretende é que, no respeito por outras sensibilidades, se acolha a diversidade da nossa cultura, não querendo uniformizar o que não é uniformizável.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos a assistir aos nossos trabalhos um grupo de 50 professores dos 2.º e 3.º ciclos da Escola Fernando Pessoa, de Lisboa; um grupo de 14 formandos do curso de técnicas administrativas do Concilium de Almada e um grupo de 12 formandos do Curso de Contabilidade e Gestão do Concilium de Almada, do concelho de Almada.
Está também a assistir a este debate um numeroso grupo de cidadãos, suponho que de Barrancos, uns sendo favoráveis aos projectos de lei que se vão discutir e outros não o sendo. Lembro a esses cidadãos que temos muito gosto em recebê-los nesta Câmara, mas que não têm o direito, nem podem manifestar-se pró ou contra esses projectos, o que seria considerado uma falta de respeito para com a Assembleia da República. Não faço, naturalmente, esse juízo da população de Barrancos.
Para todos estes cidadãos que estão a assistir aos nossos trabalhos, peço uma saudação dos Srs. Deputados.

Aplausos gerais, de pé.

Para apresentar o projecto de lei n.º 592/VII - Aprova o novo regime sancionatório das touradas com touros de morte (revoga o Decreto n.º 15 355, de 14 de Abril de 1928) (PS), em representação do seu grupo parlamentar, tem a palavra o Sr. Deputado António Saleiro.

O Sr. António Saleiro (PS): - Sr. Presidente, permita-me que também saúde a população do meu distrito, a população de Barrancos.
Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Tal como aconteceu em França, a questão dos touros de morte em Portugal levantou um vivo debate sobre esta problemática, que irá, certamente, conduzir à aprovação de um novo regime penal neste âmbito. Assim, pretende-se que o Código Penal, tal como em França, preveja com carácter de excepção que não são tidas por actos cruéis as situações das corridas com touros decorrentes de tradições locais e ininterruptas. Aliás, neste sentido também se inclinou o Tratado de Amesterdão ratificado por esta Assembleia, nomeadamente em matéria de ritos religiosos, tradições culturais e património regional.
É fácil constatar, portanto, que é perfeitamente defensável a adopção de um quadro legislativo respeitador do Direito internacional e europeu sem pôr em causa as tradições nacionais, regionais ou locais que, pela sua prática reiterada aceite, se converteram em costume.

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O projecto de lei que, com outros ,Srs. Deputados, apresento a esta Câmara adopta o princípio geral da proibição dos touros de morte em Portugal, mas salvaguarda contudo, excepcionando, as lides com touros de morte praticadas segundo a tradição.

No caso vertente, é Barrancos que está em causa. Digo Barrancos porque se pratica a morte de um touro em lide. Ninguém desconhece que se tem assistido, por parte do Estado, e desde sempre, à sua aceitação tácita por omissão. Talvez por isso nem se possa dizer que houve abuso, porque foi consentido.

A verdade é que a actual lei proíbe, consentindo ou não. Mas, tendo havido esse consentimento, ano após ano, fácil é concluir que, afinal, o que está mal é a lei. Digo que está mal porque não foi de encontro à realidade de um povo, à sua vontade colectiva, aos seus hábitos e aos seus costumes, isto é, a lei, que é feita para servir as pessoas e bem, neste caso, não serviu ou, melhor, serviu mal porque não foi cumprida. E quando uma lei não é cumprida, ano após ano, com a compreensão daqueles a quem compete aplicá-la, é porque, de facto, não serve, logo, muda-se! Digo muda-se porque, existindo, tem de se fazer cumprir. Lei é lei e é para se cumprir ou, caso contrário, o poder cai na rua e ninguém cumpre coisa alguma!

Naturalmente que, para que os representados se revejam nos seus representantes, não podemos em silêncio aceitar o seu mandato, neste caso das gentes humildes e boas de Barrancos, que de bárbaros, cruéis e ferozes nada têm, bem pelo contrário! Assim, há que ir acabando com o silêncio ao encontro da dignidade antropológica e cultural daquele povo.

Não se pretende, com este projecto, um quadro de privilégio ou de desigualdades na unidade do ordenamento jurídico, pretende-se, sim, o contrário. O privilégio existe com o actual quadro ou, melhor, se não se cumpre a lei estamos a privilegiar o infractor, que o não é no verdadeiro sentido da palavra, porquanto não há decreto nem lei que acabe com uma tradição, e os sucessivos governantes perceberam isso.

Em Barrancos, é essa a verdadeira questão, porque, do berço à cova, encontram aquele sentimento em todas as fases da vida, quer residam em Barrancos ou não.

Aquela tourada é um elemento de coesão social do barranquenho. Eu diria mesmo que, se sem negros não há Pernambuco, se calhar, sem touradas hão haveria barranquenhos. Mais ainda: acabar com aquele costume é apoucar o barranquenho!

À sua presença hoje, aqui, não é mais do que querer respeitar a legalidade, mas também é demonstrar que têm um querer que é raro, e está provado, e que não tomaram o xarope da dormideira.

Querem também evitar incoerências, equívocos e ambiguidades; querem, naquela Praça da Liberdade e em honra de Nossa Senhora da Conceição, o reforçar do orgulho, da especificidade, da realidade ancestral daquela comunidade.

Nem se diga que o acto da morte do touro causa em quem vê e assiste a vontade da violência, porque, em todo Portugal, onde a criminalidade é menor é precisamente em Barrancos.

Aplausos de alguns Deputados do PS.

Escusam, pois, de vociferar, na praça pública, incoerências contra as nossas intenções, nomeadamente a de oportunismo político, porque o que queremos, tão-só, é que a legalidade se cumpra e que se lhes não tire o pouco que lhes resta, porque basta-lhes o isolamento.

Sr. e Srs. Deputados: Está aqui um povo, pela minha voz e pela voz de outros Deputados, do meu partido ou não, e com a sua presença, a reclamar tão-só a sua identidade; pedem tão-só que não os ameacem com bastões e que os deixem ser felizes.

Acabar com as festividades anuais de Barrancos, que incluem as touradas, seria, pois, terminar com a alegria, a eloquência e o sentimento mais profundo e genuíno de toda uma população que vive dentro do seu concelho e que se encontra espalhada um pouco por toda a parte.

Em Barrancos matam-se touros, é verdade! Há sangue, é verdade! Há quem não goste, também é verdade!

Eu próprio já estive por duas vezes nas festas de Barrancos e nunca assisti a uma tourada, mas dar-me-á isso a legitimidade, enquanto Deputado, de não permitir aos outros que vivam como sempre fizeram, com elevado civismo, educação e respeito pelo próximo? Estaremos aqui para defender aquilo de que gostamos e de que não gostamos ou para fazer sentir e transmitir aquilo que é o nosso país?

Os barranquenhos são uma gente ordeira, afável e amiga de qualquer visitante, desconhecido ou não, que por ali passe ou por ali pare. Se os barranquenhos sempre nos respeitaram, é esta, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a hora exacta para lhes retribuir.

Em Barrancos, sacrificam-se cinco animais por ano. Desde 1928 caíram, em Barrancos, cerca de 350 touros. É bom lembrar que só no decorrer do ano de 1998 as ganadarias portuguesas exportaram para Espanha e França cerca de 2000 animais para serem lidados e mortos em redondéis do país vizinho.

Se não permitirmos que, em nome duma prática ancestral dum determinado ponto do nosso território, sejam sacrificados cinco animais por ano e permitirmos a exportação de 2000 para serem mortos da mesma forma aqui mesmo ao lado, estamos a fomentar a hipocrisia no País.

Comparando com o sempre muito citado exemplo da escravatura, seria como dizer: «Nós não temos escravos em Portugal, mas exportamos escravos para Espanha», ou seja, «nós achamos mal, mas promovemos o seu comércio para que outros façam aquilo que achamos cruel».

Não será isto ter dois pesos e duas medidas? Será que se pode ficar com as mãos limpas e com as consciências tranquilas sabendo que estamos a exportar animais nossos para serem tratados barbaramente aqui, paredes meias?

O civismo de um povo não se determina, certamente, pelas touradas, determina-se pela forma como as minorias religiosas, políticas ou étnicas são tratadas pela população de um qualquer Estado. Estes exemplos é que constituem «barómetros» de civismo mais ou menos avançado de uma comunidade, de uma população ou de um povo.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando, há algumas semanas atrás, aqui discutimos a chamada questão das leis de protecção dos animais, em nome da bancada do PPD/PSD, o Sr. Deputado Barbosa de Melo dizia: «A diversidade e a variedade das formas e expressões culturais fazem parte essencial do património e da identidade dos portugueses. Só os ditadores, os centralistas, os iluminados e os vanguardistas parecem acreditar, ou fazer acreditar, que a uniformidade é a nossa regra de vida». E continuava: «A tradição, à escala nacional, nas artes, nos usos e costumes, nas festas e nas desgraças, é feita de muitas tradições».

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Está na mão de cada um de vós, Srs. Deputados, respeitar o povo de Barrancos e não ter a tentação de ser centralista, iluminado ou vanguardista.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para introduzir o debate do projecto de lei n.º 648/VII - Altera a Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro (Lei de Protecção dos Animais) e revoga o Decreto-Lei n.º 15 355, de 11 de Abril de 1928 (CDS-PP), tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Peixoto.

O Sr. Francisco Peixoto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª e Srs. Deputados: Pretende-se, com a presente iniciativa legislativa, trazer ao debate desta Câmara um tema que há muito, entre nós, urge descomplexadamente debater, na convicção mesmo na certeza de sermos dos pouquíssimos povos que, a par de uma singular e específica interpretação, seremos, acima de tudo, também os detentores de um património único e raro no mundo; mundo este que parece, em todo o caso, entender e aceitar e sempre a sua singularidade extraordinária bem mais e melhor do que alguns de entre nós que, por a não aceitarem o que é sempre absolutamente respeitável e compreensível , se não deveriam permitir, porém, ao excesso argumentativo susceptível, ele mesmo, de constituir uma injúria, mas sobretudo de defraudar, na essência, o debate que se pretende.

Refiro-me, como todos já entenderam, à tauromaquia. Tauromaquia que, sem margem para qualquer dúvida, é uma actividade, um exercício ou, melhor, uma arte, como a seguir veremos, absolutamente extrema e excessiva, mesmo objectivamente cruenta, mas sendo precisamente por isso que encontra a sua justificação; justificação essa que se fez perpetuar pelos séculos e que constitui um património cultural definido e mesmo até um santuário dos mais recônditos mistérios e encantamentos do espírito e da alma humana.

Essencial, absolutamente essencial de todo imprescindível , é que esses pressupostos constituintes da genuinidade e da «verdade» da tauromaquia se mantenham e se verifiquem sempre, de forma a que esse património viva e que socialmente, e até mesmo culturalmente, o carácter da excepcionalidade justificante aconteça.

É impossível, creio bem, definir tauromaquia, não pela ciência, pela técnica ou mesmo pela arte que representa, mas pelo sortilégio, pelo encantamento, pelo mistério, pela constante e fortíssima irresistível descoberta dos mais extraordinários e longínquos recantos da sensibilidade humana e da complexidade do seu espírito.

Como definir a amálgama fortissimamente compactada criada no toureio e entendida, sentida e amada pelo público, composta de uma indizível solidão e intinúsmo dilacerados pelo absoluto da morte, pela sua iminência e também, a uma vez, pelo «voyerismo» do público e, logo de seguida, pela sua própria participação na comunhão do sentimento agudamente criado?

Como explicar o sortilégio que decorre da paixão da hipersensibilidade com o instinto visceral, com o medo brutal sempre superado pelo valor que se revela sublimemente sereno, majestoso, cândido e absolutamente puro, gerando a graça?

Como falar do medo espalhado pela superstição, pela religião e até mesmo pelo paganismo?

Como definir a morte no seu império íntimo e a ressurreição que sempre acontece em cada acto tauromáquico?

Como escutar os silêncios que sempre então acontecem?

Em 1934, numa conferência que proferiu na Columbia Umversity de Nova Iorque, dizia Ignácio Sanchez Mejia, aquele mesmo que, no ano seguinte, morreria numa arena e suscitaria a Frederico Garcia Lorca, que dizia que a tauromaquia era a festa mais culta que há hoje no mundo, um dos seus mais famosos e geniais poemas (precisamente o «Lianto por Ignácio Sanchez Mejia»), que o touro era o perigo e a morte que nos cercava por toda a parte, que nos espera, que vem ao nosso encontro sem que o possamos evitar, e que o toureiro é o que joga com o perigo enganando a morte e traficando com ela; e que o faz com arte e alma para não morrer.

Dizia Bergamím que no toureiro tudo o que não é milagre é artifício.

No toureio, sem a presença do risco e do medo não há sentido, não há tauromaquia; a tauromaquia é ela a justificação do excesso. É a emoção, o espírito, o sentimento dessas imagens e dessas sensações, dessas coisas da alma, que justifica a tauromaquia.

Fundamental é, portanto, manter essa justificação que existe, não porque Goya, Picasso, Miro, Dali, Júlio Pomar a pintaram, ou porque Lorca, Benjamim, Montherland, Camilo José Cela, Pablo Neruda, Ortega y Gasset, Fialho de Almeida e até o nosso Manuel Alegre a cantaram ou escreveram, mas porque acontece no coração do mais anónimo português! E é isso que, em Portugal, se tem vindo a perder constantemente.

Não sei por que complexo, por que estranho e recente fado insistimos, alguns poucos, em não sermos nós próprios e em envergonham-nos do que temos e do que somos.

Gostaria de, a este propósito, saudar o povo de Barrancos pela clara assunção das suas tradições, dos seus costumes e dos seus sentimentos. É que parece ninguém querer importar-se com a, agora sim, barbárie que, lentamente, se vai instalando com a gratuitidade de um espectáculo que entre nós, e cada vez mais, é um espectáculo momo, previsível, determinado, «standardizado» e, por isso mesmo, defraudador da tauromaquia e prisioneiro de estereótipos criados por quem nada sabe e assim conduz a tauromaquia portuguesa à falência, à desvitalizaçâo e à erradicação.

Não me refiro, neste particular, a outra coisa que não seja à necessidade de nos preocuparmos, todos, com a recuperação, cada vez mais urgente, da «verdade» e da autenticidade e, assim, da própria justificação de um crescente número dos nossos espectáculos taurinos, repondo, deste modo, o que é nodal em tauromaquia, seja no seu segmento português ou espanhol, precisamente através de uma primeira de outras medidas que, mantendo o princípio da proibição de corridas com touros de morte, prevê, porém, um regime, e não um caso concreto, de excepção, tutelado pelas câmaras municipais e pela Direcção Geral de Espectáculos no escrupuloso cumprimento e limites da própria lei.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Deputado Roleira Marinho, na qualidade de relator do projecto de lei n.º 592/VII, pediu a palavra para resumir o relatório da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas. Agradeço que seja o mais sucinto possível.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

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O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 592/VII, oriundo da bancada parlamentar do Partido Socialista, pretende aprovar um novo regime sancionatório das touradas com touros de morte, revogando o Decreto n.º 15 355, de 14 de Abril de 1928.

O projecto de lei apresenta como inovação o acolhimento, por excepção, de corridas de touros de morte na observância de tradições locais ancestrais e ininterruptas que se realizem anualmente em dias em que se comemore determinado evento histórico.

No relatório, aprovado por unanimidade em comissão, faz-se o cotejo da evolução do quadro legal sobre as touradas com touros de morte desde 1836, focando-se, sucessivamente: o decreto de 1836, que considerava as touradas com touros de morte como um divertimento «bárbaro e impróprio de nações civilizadas»; o decreto de 30 de Junho de 1837, que revogava o decreto anterior e remetia a questão para os regulamentos policiais em vigor, deixando, portanto, a matéria na alçada da autoridade municipal;
o Decreto n.º 5650, de 1919, que considerava acto punível toda a violência exercida sobre os animais, revogando a legislação em contrário; a Portaria n.º 2700, de 6 de Abril de 1921, que considerava que a legislação sobre as touradas com touros de morte não tinha sido inteiramente respeitada, pelo que repunha em vigor o Decreto n.º 5650, de 1919, antes referido. E, por sua vez, é publicado, em 1928, o Decreto n.º 15 355, que estabelece que ficam absolutamente proibidas as touradas com touros de morte em quaisquer lugares, hierarquizando um conjunto de penas sancionatórias para os prevaricadores.

É este diploma que está em vigor e que a iniciativa legislativa em apreciação se propõe revogar, substituindo-o pelo novo clausulado.

Na «Exposição de motivos» remete-se para a discussão ultimamente ocorrida em França, que levou à aprovação de um novo regime penal que passou a prever, com carácter de excepção, que não são tidas por actos cruéis as situações, designadamente de corridas de touros, decorrentes de uma tradição local e ininterrupta, com o entendimento de que a tradição local é uma tradição que persiste num conjunto demográfico determinado por uma cultura comum, os mesmos hábitos, as mesmas aspirações e afinidades e uma mesma forma de sentir as coisas e de se entusiasmar por elas com as mesmas representações colectivas e mentalidades. Igualmente remete para o protocolo anexo ao Tratado de Amesterdão, assinado em Outubro de 1997, onde, sobre a protecção e o bem estar dos animais, se diz que se poderá respeitar simultaneamente as disposições legislativas e administrativas dos Estados membros, nomeadamente em matéria de ritos religiosos, tradições culturais e património regional.

Refere-se, no relatório, que em comissão, na apreciação do articulado do projecto de lei, se registaram e comentaram algumas imprecisões de redacção e de sistematização, mas que se entendeu que se deveria deixar tal assunto para tratamento em sede de especialidade, caso a iniciativa legislativa venha a obter votação positiva na apreciação, na generalidade, no Plenário da Assembleia da República.

São estas as considerações que, enquanto relator, me cabe fazer na apresentação do relatório que, repito, foi aprovado por unanimidade em comissão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a. palavra a Sr. Deputada Rosa Maria Albemaz.

A Sr. Rosa Maria Albemaz (PS): - Sr. Presidente, vou tentar, no minuto de que disponho, dizer aquilo que penso.

O Sr. Presidente: - Só se for uma interpelação à Mesa, Sr. Deputada.

A Sr.3 Rosa Maria Albemaz (PS): - É uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, V. Ex.ª tem o poder de aceitar os projectos de lei ou de recusá-los sempre que considerar que não são constitucionais. Coloco esta questão ao Sr. Presidente sobre algo que penso ser uma fraude à lei, pedindo, por isso, que tenha em consideração o caso, por exemplo, do projecto de lei apresentado pelo CDS-PP, que pede a revogação da Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro, e do Decreto-Lei n.º 15 355, de 14 de Abril de 1828.

Fazem-no alegando, como dizem no seu projecto de lei, que são pela proibição dos touros de morte em Portugal e que consideram que tal facto choca com a sensibilidade da maioria do povo português e com a opinião pública (isto é dito no projecto de lei apresentado pelo CDS-PP!), mas, ao mesmo tempo, pedem a excepção não só para certos casos, em que alegam a tradição e a cultura popular, mas, sim, para todo o País, dando o exemplo de que poderia haver abertura para os festivais de touros luso-espanhóis e dou o exemplo deste nome porque, realmente, não choca a opinião pública.

Neste projecto de lei, dão a possibilidade às câmaras municipais de autorizar estes espectáculos, não permitindo, como acontece na lei existente, o recurso à Direcção Geral dos Espectáculos.

E pedem a despenalização! Pedem tudo, nada mais há para pedir! E alegando sempre as tradições e a cultura do povo!

Para mim e, ainda bem, para a maioria do povo português cultura é permitir que os seres humanos sejam mais sensíveis, mais inteligentes e mais civilizados. As tradições só são respeitáveis quando não violem os valores da nossa civilização!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Rosa Maria Albemaz, se bem entendi a sua interpelação, considera inconstitucional o projecto de lei originário do CDS-PP.

A Sr.º1 Rosa Maria Albemaz (PS): - Considero sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Rosa Maria Albemaz, como sabe, essa minha competência só existe no momento da admissão ou não admissão dos projectos de lei.

A minha atitude tem sido a de admitir todos os projectos de lei e de chamar a atenção para as normas que considero inconstitucionais, mas não inviabilizando as que não estão feridas de inconstitucionalidade.

Não é fácil este problema de saber se uma lei que não tem o carácter genérico de aplicação a todo o âmbito do País, mas tem o carácter de. aplicação a uma vila, a uma população, etc. , preenche ou não o requisito da generalidade. Digamos que é uma generalidade excepcional em relação à generalidade mais vasta. Não é, pois, um problema de resposta fácil.

No entanto, se o diploma vier a ser aprovado, todos os Srs. Deputados, como sabem, podem tomar a iniciativa

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de requerer a declaração da inconstitucionalidade junto do Tribunal Constitucional, se o Sr. Presidente da República vier a promulgar o diploma. Portanto, está sempre aberta uma porta para corrigir uma eventual inconstitucionalidade que exista.

A Sr.º1 Rosa Maria Albemaz (PS): - Sr. Presidente, agradeço...

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, não voltei a dar-lhe a palavra.

A Sr.ª Rosa Maria Albemaz (PS): - Sr. Presidente, é só por l minuto...

O Sr. Presidente: - Sr.8 Deputada, não voltei a dar-lhe a palavra.

Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Peixoto, para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Francisco Peixoto (CDS-PP): - Sr. Presidente, a minha interpelação é no sentido de pedir à Mesa o favor de fazer entregar o projecto de lei do meu partido à Sr.ª Deputada Rosa Maria Albemaz porque, de facto, penso que ela não o tem, o que deve ter sido um lapso dos serviços da sua bancada,...

A Sr.ª Rosa Maria Albemaz (PS): - Tenho! O Orador: - ... e com certeza não o leu! A Sr.ª Rosa Maria Albemaz (PS): - Li, li!

O Orador: - Sr.ª Deputada, repare que, quando falo em autorização dada pelas câmaras municipais, não esqueço que a mesma está sempre sujeita à tutela do regime geral da Inspecção-Geral dos Espectáculos. Repare, ainda, que não propomos a criação de nenhum caso específico nem concreto para um aspecto pontual do nosso país. Trata-se de um regime excepcional.

Aliás, o que pretendi fazer durante os 7 minutos que durou a minha intervenção foi concordar em que, de facto, a tourada é um espectáculo excessivo, mas que tem uma justificação. Essa justificação foi a que tentei dar.

V. Ex.ª é livre de concordar ou não. Pela nossa parte, consideramos estas circunstâncias justificativas perfeitamente procedentes e é por isso que apresentamos o projecto de lei precisamente no sentido que acabei de expor.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvimos já, neste debate, as razões, os fundamentos e os propósitos dos que pretendem uma alteração do quadro legal a que estão sujeitas as corridas de touros em Portugal.

Em maior ou menor medida, de forma mais ou menos excepcional, a verdade é que todos os projectos de lei hoje em apreciação resultam numa mesma consequência: consentir a realização legal de touradas com touros de morte no nosso país.

Invocam-se para tanto duas razões fundamentais, a saber: por um lado, a persistência de tradições locais, que afirmam pretender salvaguardar, e, por outro lado, a natureza excepcional para não dizer única destas situações.

No mais, é fácil traçar a distinção entre os diferentes projectos de lei.

Mais afoito e radical, o Partido Popular, mantendo embora a proibição genérica para as touradas com touros de morte, pretende a sua descriminalização total, optando por integrar esta matéria no quadro do direito contra ordenacional e remetendo para as câmaras municipais a competência para autorizar as touradas com aquelas características.

Aparentemente mais tímido porque mais sorrateiro, o Partido Socialista opta por manter a criminalização das touradas com touros de morte, mas consente neste tipo de touradas sempre que «decorram de uma tradição local, ancestral e ininterrupta, nos dias em que o evento histórico anual se realize.»

Menos complicativo e, por isso, mais expressivo, o Partido Comunista Português reafirma a vigência do Decreto n.º 15 355, de 1928, salvo quando se verifique tradição local que se mantenha desde aquele ano, o que, constata, ocorre no caso das touradas realizadas em Barrancos por ocasião da festa anual de Agosto.

Seja como for, a consequência é sempre a mesma: consentir a realização legal de touradas com touros de morte em Portugal.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nenhum destes projectos de lei reclama propósitos de desenvolvimento social, de progresso e de modernidade para fundamentar as suas opções.

Nenhum destes projectos de lei pondera adequadamente o efeito multiplicador que, inelutavelmente, haveria de resultar da possibilidade, ainda que excepcional, de realização legal de touradas com touros de morte no nosso país.

Nenhum destes projectos de lei cuida sequer de perspectivar as consequências a prazo para a tradicional corrida à portuguesa.

Nenhum destes projectos de lei reflecte as preocupações já emergentes noutros países, com não menos antigas e profundas tradições tauromáquicas, que ensaiam restrições crescentes quanto à idade mínima dos espectadores das touradas.

Nenhum destes projectos de lei devia esquecer a já longa tradição portuguesa de proibição de touradas com touros de morte.

Dois destes projectos consideram que o costume pode sobrepor-se à lei geral mesmo que se trate, como é o caso, de direito criminal.

Dois destes projectos ignoram ostensivamente que uma lei criminal tem aplicação em todo o território nacional, não sendo consentidas quaisquer excepções mesmo quando, como sucede nas regiões autónomas, as respectivas assembleias representativas detêm já consideráveis poderes legislativos. Ou seja, no domínio da lei criminal e no quadro do nosso ordenamento político e jurídico-constitu-cional, não são consentidos e nem são desejáveis pluralismos jurídicos que só podem resultar em absurda e injustificada derrogação dos princípios da legalidade e da igualdade dos cidadãos.

Reafirmar estes princípios não é, pois, uma questão menor cuja apreciação deva ser remetida para a aprazível e, tanto quanto possível, distanciada especulação intelectual de um reduzido .número de conhecedores e cultores da ciência jurídica. È que ceder nestes princípios seria escamotear o núcleo estruturante do Estado de direito, escancarando as portas ao arbítrio e consentindo, assim, uma intolerável discriminação.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

• O Orador: - Não está em causa o povo de Barrancos...

O Sr. António Saleiro (PS): - Está, está! O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Isso é que está!

O Orador: - ... nem o respeito que nos merece. Estão em causa princípios fundamentais de qualquer sociedade organizada num Estado fundado no direito e legitimado pela vontade democrática dos cidadãos.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: É confesso o propósito dos autores destes projectos de lei de consagrarem um regime de excepção para Barrancos.

Assim sendo, como manifestamente é, seria exercício inglório não reflectir nesta intervenção os acontecimentos do último Verão, acontecimentos que, de resto, tiveram ampla cobertura noticiosa.

Relembremos os factos: por decisão do 13.º Juízo Cível da Comarca de Lisboa, e no âmbito de uma providência cautelar não especificada requerida pela Sociedade Protectora dos Animais contra incertos, foi determinada a proibição da realização das corridas com touros de morte por ocasião das festas de Barrancos.

Em consequência, foram notificadas as forças de segurança, o Ministro da Administração Interna e o Governador Civil de Beja da decisão do tribunal, tendo em vista assegurar o integral cumprimento daquela decisão judicial. Como é do conhecimento público, não foi respeitada esta decisão judicial.

Aparentemente determinado, a princípio, cedo se percebeu que o Governo estava enredado em fatais hesitações que determinariam a sua incapacidade em fazer cumprir de forma adequada aquela decisão judicial.

Esquecido, assim, dos seus deveres constitucionais e singularmente igual a si próprio, o Governo isentou-se da responsabilidade que lhe advém da circunstância de ser governo.

Ao escolher este caminho, o Governo comprometeu a sua autoridade, fortaleceu a convicção de que o poder da força pode sobrepor-se ao poder da lei e do direito, desautorizou o Estado e ridicularizou o poder judicial.

O Sr. Azevedo Soares (PSD): - É verdade!

O Orador: - A ridícula invocação de um obseuro regulamento da GNR para tentar justificar a incapacidade de assumir as suas responsabilidades políticas seria um momento de galhofeira comédia não fora a gravidade das suas evidentes consequências.

Um governo que justifica o não cumprimento de uma decisão judicial a que estava obrigado, invocando uma norma do regulamento da GNR, é um governo que perdeu o sentido das suas responsabilidades constitucionais e legais. É, verdadeiramente, uma caricatura de governo.

Sendo chocante para o Estado de direito que queremos ser, este comportamento só surpreendeu os mais desatentos. Que mais esperar de um Governo que tem como Primeiro-Ministro alguém que, sistematicamente, foge dos problemas e recusa as responsabilidades?

A resposta é clara. O resultado é, também, inevitável. Para o Estado de direito democrático e para a democracia, foi lamentável. Para a autoridade do Estado foi deprimente.

Com tudo isto, com todo este caso, perdeu o País e perdeu a democracia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado, para pedir esclarecimentos.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, tenho ideia de que V. Ex.ª nem leu devidamente o projecto de lei do PCP nem ouviu o que eu disse há pouco na intervenção.

É que, efectivamente, o que pretendemos é manter o princípio da proibição de touros de morte em Portugal, abrindo uma excepção para o caso de Barrancos, dados os costumes daquela população, dada a tradição que se mantém ininterrupta há mais de 70 anos.

Na verdade, a lei de 1928 caiu em desuso, nunca foi aplicada, nem durante o governo do PSD!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Ora, agora, não se compreende a posição do Sr. Deputado Miguel Macedo. Ou, por outra, gostaria que nos dissesse se o que V. Ex.º1 e o PSD pretendem é proibir as touradas com touros de morte em Barrancos e que, no próximo mês de Agosto, a GNR vá contra a população barranquenha, vá bater na população barranquenha. Gostaria que nos dissesse se é essa a disposição que V. Ex.ª e o seu partido estão a provocar com essa vossa posição.

Há mais uma questão que queria colocar-lhe, Sr. Deputado Miguel Macedo. É que, no distrito de Beja, o PSD vai dizer, nomeadamente à população barranquenha, que o Grupo Parlamentar do PSD tem liberdade de voto em relação a esta matéria, mas aqui, no Parlamento, o mesmo PSD diz que não há liberdade de voto e que vai votar contra.

Assim, gostaria que V. Ex.ª clarificasse este aspecto para que os representantes da população barranquenha que se encontram nas galerias a assistir a esta sessão saibam qual é, efectivamente, a posição do PSD sobre esta matéria.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E agora?! Responda!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Miguel Macedo, há mais uma inscrição para um pedido de esclarecimento, mas tem pouco tempo disponível para responder. Assim, sugiro que responda apenas no fim.

Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Arsénio, para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Paulo Arsénio (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, gostaria de começar por dizer que, em matéria de Barrancos, o «novo» PSD saído do último congresso é igual ao «antigo», ou seja, não trouxe rigorosamente nada de novo, trouxe-nos o vazio, trouxe-nos a indecisão, e acabámos de ouvir um discurso completamente inócuo e sem nada de novo relativamente a esta matéria. Isto é, em matérias importantes, o PSD diz nada.

Quanto à regionalização, não servia a que foi apresentada pelos outros partidos, mas o PSD não apresentou qualquer proposta própria. Em matéria de lixos tóxicos, o PSD considera que não serve a solução da co-incineração proposta pelo Governo, mas não apresentou qualquer outra solução.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Relativamente à questão de Barrancos, nada serve para o PSD, mas também não traz nada de novo nem apresentou qualquer solução.

Aplausos do PS.

O que é estranho, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que, no passado dia 17 de Março, quando aqui foram debatidas questões relativas à protecção dos animais, o Sr. Deputado Barbosa de Melo dizia o seguinte: «(...) a diversidade e a variedade das formas e expressões culturais fazem parte essencial do património e da identidade portugueses. Só os ditadores, os centralistas, os iluminados e os vanguardistas parecem acreditar ou fazer acreditar que a uniformidade é a nossa regra de vida. O maior erro estará sempre em pretender impor a todos, em matéria tão sensível, a visão de alguns. À escala nacional, nas artes, nos usos, nos costumes, nas desgraças e nas festas, a tradição nacional é feita de diversas tradições (..º)».

Ora, o que eu gostaria de saber é qual é o verdadeiro PSD, qual é o PSD com que podemos contar. Se é com aquele PSD, humilde, solidário e compreensivo para com a realidade da população portuguesa, que o Deputado Barbosa de Melo aqui nos trouxe, ou se, pelo contrário, podemos é contar com este PSD, centralista, iluminado e vanguardista, que hoje nos foi trazido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo para responder, em conjunto, aos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, serei muito rápido porque um meu colega de bancada ainda irá fazer uma pequena intervenção.

Sr. Deputado Rodeia Machado, li bem o projecto de lei do PCP. Em resposta à questão que me colocou, dir-lhe-ei apenas que, justamente, nós queremos o cumprimento do princípio que, aliás, os senhores reafirmam no vosso projecto de lei: o de que, em Portugal, há proibição de touradas com touros de morte e que, justamente, a criminalização do incumprimento da lei é um dos elementos que garante a efectividade da lei. Portanto, Sr. Deputado Rodeia Machado, nesse aspecto, estamos de acordo. Não há qualquer diferença entre o senhor e nós próprios.

A diferença que existe é a que assinalei na minha intervenção, e essa é uma questão essencial. É que, para nós, não pode haver um país com dois sistemas criminais. Para nós, não pode haver uma lei criminal que se aplique numa vila, numa freguesia ou num concelho e se não aplique na freguesia, na vila ou no concelho vizinho. Não faz sentido, não é essa a tradição portuguesa.

Ora, os senhores não podem escamotear esta questão que é essencial para um Estado que é organizado segundo princípios do direito e da legalidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): -Então, quer que a GNR vá lá bater nos barranquenhos!?

O Orador: - Sr. Deputado, ninguém pediu para a GNR ir bater em ninguém!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Então, proíbe a lei!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, não lhe dei a palavra!

Sr. Deputado Miguel Macedo, faça favor de continuar, mas tem de terminar, pois já ultrapassou o tempo que tinha disponível.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Eu só queria dizer que estamos a pedir uma coisa tão simples quanto esta para qualquer Estado de direito democrático: que sejam cumpridas as decisões judiciais! Só isso, mais nada! Se isto constitui alguma originalidade, peço desculpa pela originalidade, mas mantenho-a!

Respondendo ao Sr. Deputado Paulo Arsénio, apenas quero dizer-lhe que, de facto, é muito preocupante quando um Deputado do Partido Socialista vem dizer que constitui um tipo de iluminismo, de vanguardismo ou de outras coisas que tais o facto de invocarmos aqui princípios fundamentais do Estado de direito, princípios jurídicos e constitucionais fundamentais. É que, Sr. Deputado, é com base nesse desprendimento por questões essenciais do nosso ordenamento jurídico que, muitas vezes, se constituem aberrações sociais e políticas cuja existência, obviamente, não está na minha mente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Não sei bem ao abrigo de que figura regimental, Sr. Presidente. Era para defender-me de algumas invocações!

O Sr. Presidente: - Então, é para defesa da honra! Tem a palavra para esse efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, fui citado várias vezes e sinto-me desvanecido por ter sido citado e apuradamente citado. Contudo, gostava de referir o objecto sobre o qual me pronunciei: tratava-se, na altura, de discutir se os animais tinham direitos contra as pessoas, se eram titulares de direitos em nome de um fundamentalismo qualquer e eu disse que não, que a personalidade jurídica é que é sustentáculo de direitos e que as tradições que fazem parte da nossa relação com os animais são variáveis de um lado para o outro. E isso envolve a caça, o adestramento de animais envolve tantas coisas! E também, eventualmente, as touradas.

Mas quero dizer aos que me citaram-e fico muito feliz com as vossas intenções-que, se tivesse focado este problema em concreto, vos diria que sou neste caso hipertradicionalista: gosto da tradição mais antiga, que é a tradição legislativa! Também há uma tradição legislativa em Portugal e eu gosto de a respeitar e que ela seja respeitada sempre!

Aplausos do PSD e do Deputado do PS, Pedro Baptista.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

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O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de disponibilizar à Mesa e ao Sr. Deputado Miguel Macedo o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que, como sabe, deu provimento à Comissão de Festas de Barrancos.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Arsénio.

O Sr. Paulo Arsénio (PS): - Sr. Presidente, é apenas para dizer que não ataquei o Sr. Deputado Barbosa de Melo, apenas me limitei a citá-lo com base na sua intervenção feita no passado dia 17.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - A verdade é que já falta hoje, Sr. Deputado Barbosa de Melo, quem defenda, contra a sua opinião e a minha, que os animais são sujeitos de direito, o que implicará uma subversão de toda a ciência jurídica tradicional. Mas, enfim, estamos em tempos modernos!

Aplausos do PS e do Deputado do PSD, Azevedo Soares.

Para uma intervenção, tem a palavra a ST." Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a apreciação dos projectos de lei em discussão, trata-se de determinar se, em Portugal, sendo proibida a realização de touradas de morte, se vai ou não excepcionar este princípio para os casos onde essa tradição se mantém ininterrupta há muitos e muitos anos. Não sendo os touros de morte tradição do nosso país, o certo é que se pratica há muito tempo, em Portugal, este tipo de touradas, designadamente, como aqui já foi referido, em Barrancos. Certamente influiu aqui a situação geográfica destas localidades, a sua proximidade a Espanha.

Porém, não há, na nossa perspectiva, defesa da tradição que se imponha perante a defesa de princípios, especialmente quando consideramos que essas tradições contrariam esses princípios. Não é nada contra os barranquenhos (quero deixar isto aqui bem claro), que, aliás, têm um sentido comunitário grande; não é nada contra nenhuma população em especial, é meramente a afirmação e a defesa de princípios que consideramos justos e por isso defendemos convictamente.

Para além disso, ou se proíbe os touros de morte em Portugal, considerando-se, como o faz o Decreto n.º 15355, um divertimento impróprio, ou se permite. Agora, considerar que na generalidade do território português é um divertimento impróprio, mas que, nomeadamente, numa localidade portuguesa ele é próprio, sendo que mantém exactamente as mesmas características de espectáculo, é uma contradição que, na nossa perspectiva, não faz sentido. Os touros de morte é daquelas coisas que é ou não é; e, se é, é para todos. Na nossa perspectiva, obviamente, não é! Nem deve ser!

As touradas de morte têm essa característica, que é fazer do acto de matar uma festa, fazer da morte do touro, e disso mesmo, um espectáculo, para além do comummente designado como tourada, ou associado à tourada. Isso é que, na nossa perspectiva, é algo inaceitável.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - E dirão alguns: mas matam-se animais para comer e agora contesta-se a morte do touro? Porém, na verdade, o que está em causa não é que se matem animais para fins alimentares! O Homem é carnívoro, a predação é um acto normal e de equilíbrio natural e, portanto, não contestamos que se matem animais para comer, com as condições de higiene e segurança necessárias e com o menor sofrimento para o animal, uma vez que hoje isso é perfeitamente possível.

E poderão dizer também: mas e se a finalidade da morte do touro na arena for para fins alimentares? Então, para além de outros requisitos exigíveis, porquê matar em praça pública, fazendo da morte, como tal, um espectáculo público? E que, na verdade, um objectivo deste tipo de touradas é o de ver o touro morrer. Este espectáculo da morte é contra os princípios de Os Verdes. Não é, de facto, esta a nossa postura no dia a dia, não é esta a nossa forma de entendimento da vida e da relação com o meio que nos envolve, o que significa com as restantes espécies animais, com as espécies vegetais, com os recursos hídricos, etc. Partimos fundamentalmente do respeito pelo que nos envolve e pelo que somos.

E serão apenas os touros de morte a única forma de violação dessa postura perante o meio e a natureza? Não existem outras formas de violação dos animais? Existem com certeza, e de certeza! Mas um mal não justifica a existência de outro mal. Por isso também. Os Verdes tomaram a iniciativa de apresentar um projecto de lei para a protecção de animais não humanos, aqui, na Assembleia da República.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Verdes já deixaram claro, aquando da discussão do nosso projecto de lei para a protecção dos animais, que, do ponto de vista do sofrimento do animal, não é relevante se estamos perante touradas de morte ou não; o que causa sofrimento ao animal é o sucessivo picar do touro, o sucessivo enfraquecimento do animal potente com o qual o homem, mais frágil, se confronta, procurando pô-lo à sua medida de força. Ora, nós não cremos ser esse o objectivo do aficcionado; isto é, cremos que quem assiste a uma tourada normal não vai com o espírito bárbaro de ver o animal sofrer.

Por isso, até seria interessante descortinar formas de, mantendo o espectáculo tauromáquico, e, portanto, a lide do animal, fazer com que ele não fosse ferido, perfurado e ensanguentado, substituindo essa prática por outras ou pelo uso de outros materiais que não provocassem o sofrimento do bicho. Usar a criatividade, a inteligência do Homem e aquilo que também o avanço das tecnologias permite, pondo-as ao serviço do espectáculo e da cultura e, neste caso concreto, também da protecção do animal.

Aplausos dos Deputados do PS, Pedro Baptista e Rosa Albemaz, e do Deputado do PSD, António Barradas Leitão.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Peixoto.

O Sr. Francisco Peixoto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, quer queiramos quer não, todos nós recebemos uma herança, neste caso, cultural, que é a tauromaquia.

Gostaria de perguntar à Sr.3 Deputada quais as soluções que teria para a eventualidade de a proibição de touradas, com morte ou sem morte dos touros, acontecer em Portugal. É que o touro de lide é um produto específico e exclusivo da tauromaquia, ou seja, é uma espécie animal

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que viveu na Europa mas que só vive hoje em Portugal e em Espanha precisamente porque há um espectáculo taurino. Isto porque, quer queiramos quer não, a economia comanda a vida, pelo menos em larga medida, não a de alguns toureiros que arriscam a vida ou dos forcados, que fazem isto gratuitamente, mas de outros sectores determinantes da sociedade. Portanto, para que os touros possam subsistir como raça e como animais vivos, tem de haver acumulação do preço da carne e do preço da bravura, que é o preço que se paga ao ganadeiro, criador de touros, para que haja o espectáculo tauromáquico. Ou seja, há quem conclua, com alguma razão, que, se não houvesse corridas de touros, pura e simplesmente, não havia mais touros.

Neste contexto, quero perguntar-lhe que solução é que veria para preservar esta espécie animal.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.2 Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Peixoto, não sei se ouviu a parte final da minha intervenção mas não me oponho nem Os Verdes se opõem, naturalmente, à preservação de algumas formas tradicionais que acontecem em Portugal como as touradas ditas normais. Inclusivamente, apontamos com algum interesse a possibilidade de se criarem, de se estudarem, de se viabilizarem algumas formas... Sr. Deputado, não me parece ridículo! O Sr. Deputado fez uma expressão que me parecia de surpresa por aquilo que eu estava a dizer. O nosso princípio é o de pôr a criatividade do homem, a inteligência do homem ao serviço da nossa cultura e do nosso espectáculo. E por que não, por isso, preservar algumas das nossas formas tradicionais, preservando simultaneamente a defesa do animal e a defesa de alguns princípios que a nós. Os Verdes, são profundamente caros?

Sr. Deputado, a preservação da cultura é compatível também com a preservação dos animais. O Sr. Deputado entende que não, mas nós entendemos que sim, que é possível, repito, pôr a criatividade e a inteligência do homem ao serviços dos espectáculos e da cultura.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Torres.

O Sr. Francisco Torres (PSD): - Sr. Presidente, estamos em presença de três projectos de lei - o PSD não apresentou qualquer projecto de lei, nem Os Verdes e, obviamente, estes diplomas, para baixarem à comissão, terão de ser votados na generalidade. Assim, uma baixa imediata à comissão, sem votação, seria, em termos políticos e morais, a mesma coisa que a aprovação na generalidade destes três projectos de lei, e parece-me que isso só se pode fazer por consenso.

Ora, não tendo o Partido Social Democrata apresentado qualquer projecto de lei e havendo apenas uma questão fundamental não há aqui questões de pormenor, mas apenas uma questão a que temos de responder, que é a de saber se queremos touros de morte ou se somos contra os touros de morte, porque queremos preservar a tradição portuguesa e a sua diferença relativamente a Espanha, queremos a humanização das próprias corridas à portuguesa -...

A Sr.8 Rosa Albemaz (PS): - Muito bem!

O Orador: -... estando, portanto, em causa apenas este ponto e mais nenhum, obviamente que fazer baixar à comissão os três diplomas apenas com a discussão e sem a votação na generalidade seria subverter o espírito democrático desta Câmara, seria evitar que, neste Plenário, uma maioria de Deputados que está contra os touros de morte pudesse exercer o direito de voto...

A Sr.ª Rosa Albemaz (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... e essa votação seria ultrapassada por uma votação na «secretaria», isto é, os diplomas baixariam à comissão especializada como se houvesse alguma questão de pormenor a discutir nesta matéria!

Julgo, pois, Sr. Presidente, que estaremos em condições de votar os projectos de lei para que o povo português possa saber quem vota «sim» e quem vota «não» e, para terminar, nós Partido Social Democrata, não falamos para as galerias, falamos para o povo português, que é quem representamos nesta Assembleia!

Aplausos da Deputada do PS, Rosa Albemaz.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Talvez convenha clarificar se essa posição é do Sr. Deputado Francisco Torres ou se é também do PSD!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Francisco Torres, o problema que coloca só tem oportunidade no momento da votação, que será na próxima quinta-feira. Então, sim, se verá o problema, se se vota ou não se vota, se baixa sem votação, para o que terá de haver um requerimento que terá, ele próprio, de ser votado. Portanto, estamos a antecipar posições que cabem na próxima quinta-feira e não hoje.

O Sr. Rui Namorado (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Namorado (PS): - Sr. Presidente, gostaria de saber se esta é uma posição individual do Sr. Deputado Francisco Torres ou se é da bancada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não tenho o direito de fazer essa pergunta.

O Sr. Azevedo Soares (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Azevedo Soares (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de informar o Sr. Deputado Rui Namorado que, naturalmente, os membros da direcção da bancada do PS sabem quem são os membros da direcção da bancada do PSD.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta fase final, convém deixar claro o que está em discussão quanto ao projecto de lei do Partido Comunista Português.

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Como foi salientado pelo meu camarada Rodeia Machado, o projecto de lei do PCP não põe em causa a legislação global sobre touros de morte em Portugal.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O que o nosso projecto de lei aponta claramente é no sentido de saber - e os Srs. Deputados do PS sabem que é isso - se queremos ou não conformar a lei com a tradição secular que é praticada em Barrancos desde 1928 e que, por isso mesmo, fez com que a lei caísse em desuso nessa parte do território nacional.

Por isso, só há duas soluções, Srs. Deputados: uma, é a de manter o que tem sido a hipocrisia ao longo destes anos, a hipocrisia que vos mantém aqui hoje e aquilo que tem sido a vossa actuação, inclusivamente enquanto foram governo - as touradas fazem-se contra a lei, mas fecha-se os olhos e essa é uma atitude hipócrita, Srs. Deputados: outra, é a de saber se, de facto, aquilo que os Srs. Deputados do PSD, que estão contra o nosso projecto de lei, pretendem é, no fundamental, dizer ao Governo, se o diploma for rejeitado, para, no próximo mês de Agosto, nas festas de Barrancos, abrirem as portas à repressão contra a população de Barrancos! Esta é a questão, Srs. Deputados. Não há três questões! Estas são as questões!

Os senhores estão agora muito ciosos em fazer cumprir a lei em todo o território nacional, sabendo que, naquele caso concreto, há uma tradição secular ininterrupta desde 1928 que fez a lei cair em desuso! Mas os senhores, enquanto estiveram no governo, ignoraram essa realidade e hoje, por razões que nada têm a ver com este problema, isto é, por meras razões de estrita luta partidária, vêm dizer «rejeite-se a lei!», continuando, portanto, a manter-se a posição hipócrita ou, em alternativa, no próximo mês de Agosto, o Governo lança a repressão, lança a GNR sobre a população de Barrancos. É esta a posição do PSD e não qualquer outra, Sr. Presidente!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É este o ponto que tem de ser clarificado no momento da votação a esta Câmara, ao País e à população de Barrancos!

Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 1427 VII - Lei de bases gerais da caça.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural.

O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural

(Vítor Barros): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A caça é uma actividade que se confunde com a própria evolução física, mental e social da espécie humana, só tendo perdido alguma importância no advento das sociedades agrícolas. Não deixou, ainda assim, ao longo da história, de constituir uma importante fonte de proteínas animais de parte da população rural.

Com a sedentarização das populações, o seu aumento e a exploração do espaço mais próximo das cidades, vilas e aldeias, a caça rapidamente se tomou rara e, como tal, símbolo dos poderosos, na qual ocupavam grande parte do tempo de ócio.

Também por isso, os territórios de caça foram, ao longo da história, um dos primeiros alvos das convulsões sociais.

Em Portugal, logo na primeira dinastia, vários reis determinaram proibições em vastos domínios da coroa para proteger a floresta, mas tendo como fim último e prioritário a protecção da caça.

No entanto, face à concepção da caça que tem vindo a ser consagrada na nossa ordem jurídica, segundo a qual os animais selvagens constituem res nuliius, está profundamente interiorizado na população o direito a apropriar-se dos espécimes que, por qualquer meio, logrou apropriar-se não importa onde.

O enquadramento legal da actividade cinegética, surgido em 1967, dá alguns passos na ligação entre a posse da terra e a «posse» da caça, restringindo, no entanto, o conceito aos seus aspectos de turismo e lazer.

Em 1974 e 1975, foi publicada legislação que inverte este sentido, no intuito de democratizar a fruição da caça. O processo atribuiu ao Estado a responsabilidade de ordenar todos os terrenos cinegéticos e instituiu uma rede de reservas que deveria servir para garantir a protecção da fauna cinegética e o repovoamento do restante território. Face aos resultados negativos deste modelo para os recursos naturais e para a consciência cívica da sua conservação, foi possível em 1986 publicar a Lei n.º 30/86, de 27 de Agosto, que consagra já, como princípios básicos, o ordenamento para uma gestão sustentável dos recursos cinegéticos e o reconhecimento da caça enquanto factor de valorização e apoio da agricultura e da economia regional e nacional.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão da caça constituiu, porventura, o dossier mais polémico herdado pela equipa ministerial da agricultura, aquando da sua tomada de posse, no final de Outubro de 1995. Manifestações, ameaças constantes de confrontação e um clima geral de contestação foram as notas dominantes das «aberturas de caça» dos últimos anos do governo anterior.

Por isso, a primeira preocupação deste Governo, relativamente a este sector, foi a criação de condições que permitissem um clima de diálogo tendente a anular as principais causas responsáveis pelos antagonismos existentes.

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Com este intuito, decidiu-se reformular a composição do Conselho Nacional da Caça e da Conservação da Fauna, retirando peso à representação do Estado e reforçando o da sociedade civil, e adoptar uma postura de arbitragem e de rigorosa equidistância face aos diversos interesses em. jogo.

Foi, assim, publicado, em 14 de Agosto de 1996, o Decreto-Lei n.º 136/96, cujas mais importantes alterações foram: a igualização, para ambos os regimes, dos dias e épocas de caça e do número de exemplares de espécies migradoras a abater; a abolição do denominado «processo do edital»; o alargamento da participação da sociedade civil através da constituição, com amplos poderes, dos conselhos cinegéticos municipais.

A segunda preocupação consistiu na adopção de um vasto conjunto de medidas tendentes a aumentar a eficácia da Administração e a acentuar a sua transparência e isenção.

Foi, assim, decidido extinguir a Empresa Nacional de Desenvolvimento Agrícola e Cinegético, S. A. - ENDAC, empresa pública, cujo património foi reconvertido, privilegi-

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ando-se os fins sociais e ambientais. Destacam-se a régie cooperativa Tapada de Mafra, centro turístico cinegético e de educação ambiental, a criação de quatro «santuários» de caça para protecção da fauna selvagem e a criação de 11 zonas de caça social.

O Sr. António Martinho (PS): -Muito bem!

O Orador: - Reformularam-se os serviços de caça do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas; melhorou-se a fiscalização através de uma dignificação e reforço em meios humanos e materiais da Guarda Florestal; aplicou-se com rigor a legislação em vigor.

A terceira preocupação traduziu-se na concepção de um enquadramento legislativo que permitisse uma gestão sustentável dos recursos cinegéticos numa perspectiva de médio e longo prazo.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A lei actualmente em vigor encontra-se, em certa medida, desactualizada quer devido a algumas das suas disposições terem decorrido de uma conjuntura sócio-política entretanto ultrapassada quer devido à regulamentação posterior que a desvirtuou.

Urge, por isso, tirando partido dos 12 anos decorridos desde a sua primeira regulamentação, aprofundar a evolução consagrada pela Lei n.º 30/86, de 27 de Agosto, no sentido de que a exploração dos recursos cinegéticos contribua para as duas vertentes fundamentais da exploração deste recurso: constituir um instrumento para a conservação da fauna, de toda e não apenas da cinegética, e dos habitais que a suportam; poder suportar uma actividade económica sustentável, porque baseada num recurso renovável, que se pode revestir de uma importância fundamental em termos de desenvolvimento rural, particularmente nas zonas mais desfavorecidas.

O Sr. António Martinho (PS): -Bem visto!

O Orador: - Para que estes dois objectivos sejam atingidos, é fundamental que, ao contrário da lei ainda em vigor, só haja lugar a um regime cinegético que garanta em todo o território o ordenamento cinegético. E isto por uma razão muito simples: aquilo que não é de ninguém não é acarinhado por ninguém, pelo que, se ainda por cima é explorado, o resultado certo é a exaustão.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta degradação do recurso caça é incompatível, por outro lado, com os compromissos internacionais que Portugal, ao longo dos anos, tem vindo a estabelecer quer directamente quer como Estado-membro da União Europeia.

Mas a degradação dos recursos cinegéticos não se deve apenas à ausência de ordenamento. As alterações ao uso do solo levadas a cabo ao longo da história, e, com especial relevo, neste século, colocaram muitas populações de espécies cinegéticas e não cinegéticas num equilíbrio instável, tendo mesmo desaparecido nalgumas partes do território, onde estavam presentes há algumas dezenas de anos, ou ocorrendo apenas residualmente.

Para este desequilíbrio contribuem a degradação do habitat, em virtude das alterações das actividades agro-pecuárias e florestais, a pressão dos predadores oportunistas, as doenças e uma pressão cinegética desajustada dos acréscimos anuais das populações.

De uma forma geral, as espécies não cinegéticas, nomeadamente os predadores como o lobo, o lince, muitas aves de rapinas, entre outros, sofrem as consequências deste desequilíbrio, em virtude da escassez de presas, que se vem juntar à degradação do seu habitat natural.

Mas não se pense, no entanto, que da actividade do homem deriva sempre a degradação do recurso cinegético. A verdade é que, ao longo dos anos, espécies houve que tiveram uma evolução positiva quer em efectivos quer na sua distribuição, em virtude das alterações introduzidas nos biótipos pela agricultura, silvicultura e pecuária. Por esta mesma razão e porque vivemos num período de grandes mudanças ao nível da agricultura e florestas, muitos problemas se levantam relativamente à manutenção ou, mesmo, sobrevivência de certas populações de espécies da nossa fauna e flora.

Como demonstram inúmeros casos em vários países europeus mas, também, alguns já em Portugal, só com um efectivo maneio do habitat, que poderá significar investimentos avultados, acompanhado de uma gestão das populações tecnicamente fundamentada, será possível restabelecer alguns destes equilíbrios das populações das espécies cinegéticas e não cinegéticas.

No entanto, o debate da caça centra-se demasiadas vezes ora na protecção das espécies animais ora nos direitos dos caçadores, esquecendo que hoje, quando bem conduzida, a caça pode ser a base de uma importante actividade económica, tão mais importante quanto tem muitos dos seus locais de excelência nas zonas mais deprimidas do nosso pais, onde a agricultura e a silvicultura encontram muitas dificuldades de viabilização.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - De facto, a actividade cinegética implica exercício físico e é praticada ao ar livre, reunindo muitas das características crescentemente procuradas pelas populações urbanas. Pode e deve estar associada a outras actividades de observação da fauna, da paisagem e, genericamente, de fruição do espaço rural.

Estas actividades, se bem conduzidas, podem constituir um importante contributo para o rendimento das explorações agrícolas e, pela venda de produtos e prestação dos serviços associados, para o rendimento das comunidades locais. É, por isso, um contributo importante e não desprezável para o desenvolvimento rural.

A sua importância para o desenvolvimento rural toma-a fundamental em regiões mais desfavorecidas, onde só a diversificação das actividades das explorações poderá contribuir para a redução da dependência das ajudas à agricultura que, nalguns casos, constituem mais de metade do rendimento das explorações.

Face às limitadas alternativas destas regiões, nenhuma potencialidade deverá ser desperdiçada. Mas mesmo nas restantes áreas do interior, onde ainda é possível desenvolver outras actividades agrícolas e florestais com alguma nacionalidade económica, a caça poderá constituir um complemento importante.

O Sr. António Martinho (PS): -Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A perspectiva de diversificação de actividades quer ao nível das explorações agrícolas quer ao nível do rendimento das famílias no espaço rural tem pautado a política deste Governo, considerando que nenhum recurso poderá ser desper-

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diçado quando o nosso principal objectivo é manter uma população rural com uma qualidade de vida aceitável no limiar do ano 2000, desempenhando a função que a sociedade no seu todo lhe reconhece enquanto guardiã dos recursos naturais, dos valores culturais e da soberania territorial.

Este princípio está consignado na Lei de Bases da Política Florestal, que, no seu artigo 11.º, reconhece que «a conservação, o fomento e a exploração dos recursos silvestres, nomeadamente cinegéticos, aquícolas e apícolas, associados ao património florestal, constituem actividades inerentes ao aproveitamento integrado e sustentável do meio rural.»

E acrescenta: «Devem ser promovidas e adoptadas as formas de gestão optimizadas, nomeadamente de carácter associativo, que conciliem a sua utilização económica e os equilíbrios ambientais.»

A actividade cinegética reveste-se, ainda, de uma grande importância para a manutenção da identidade e coesão das comunidades rurais, dado o seu profundo enraizamento em largas faixas da população, nomeadamente nas populações rurais e naquelas que mantêm ligações ou têm raízes no meio rural, sendo, por outro lado, uma das razões que leva os naturais deslocados a regressarem periodicamente à sua terra natal. Estes factos possuem uma evidente importância social e económica.

Das duas ordens de razões atrás explicitadas, as de conservação da natureza e as de ordem sócio-económica e demográfica, decorre a necessidade da- existência de uma entidade que, para cada porção do território, assuma a responsabilidade do seu ordenamento e gestão e que possa, por isso, explorar o recurso que constitui a caça.

Só assim será possível uma exploração sustentável da fauna cinegética e alcançarmos, num futuro próximo, um capital cinegético que dê juros para todos.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A presente proposta tenta responder a estes desafios, tendo elegido como princípios básicos a compatibilização da gestão dos recursos com os interesses dos diferentes intervenientes, o ordenamento de todo o território cinegético e a adequação da legislação à novas realidades e preocupações conservacionistas do meio ambiente.

Deste modo, vários são os aspectos inovadores e que aprofundam as possibilidades da conservação e exploração sustentável dos recursos, sem porem em causa o direito das pessoas ao exercício da caça e tentando alargar a participação da sociedade na orientação destas questões.

Assim, extingue-se o regime cinegético geral, problemático em termos da gestão sustentável dos recursos naturais. A dualidade dos regimes é, deste modo, substituída por um só regime cinegético que tem como princípio basilar o ordenamento de todo o território nacional.

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Preconiza-se a criação de áreas de refugio de caça para fins .de protecção das espécies cinegéticas; cria-se a figura de zona de caça de interesse municipal que, em conjunto com as zonas de caça de interesse nacional, incluirão uma parte substancial dos terrenos cinegéticos nacionais e que pretendem garantir a disponibilidade de áreas ordenadas, com «recursos cinegéticos», acessíveis a todos os caçadores.

Alarga-se a abrangência territorial e a futura oferta de oportunidades de caça aos caçadores locais, nomeadamente aos com menos posses e sem terra, e cria-se a figura de zona de caça de interesse rural, que pretende incentivar e promover a multifuncionalidade das explorações agrícolas e agro-florestais, garantindo não só uma gestão adequada e racional dos recursos naturais mas, também, uma diversificação apropriada do rendimento dos agricultores, através de uma produção diferenciada, e de qualidade, de bens e serviços.

Consagra-se o direito à não caça, indo ao encontro de uma sensibilidade crescente de certas faixas da sociedade, de indiferença ou rejeição da actividade cinegética, e concretizam-se disposições para prevenir situações de exercício da caça por pessoas que não se encontram em condições de o fazer com segurança, nomeadamente por se encontrarem sob efeito de álcool, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo; estabelece-se uma taxa de alcoolémia máxima para o exercício da caça e a fiscalização da caça fica aberta a autoridades de âmbito municipal.

Para terminar, faço um apelo a todos os intervenientes e interessados nesta matéria que se mantenham atentos e participem no processo de regulamentação que se seguirá à aprovação desta proposta, contribuindo, assim, para que a legislação da caça e a sua implementação seja um verdadeiro instrumento ao serviço da conservação dos recursos naturais e do desenvolvimento rural.

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Estamos, igualmente, disponíveis para, em sede de debate na especialidade, discutir e alterar todos os aspectos susceptíveis de melhoria, desde que o espírito desta proposta não seja desvirtuado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir, esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural, esta proposta de lei do Governo tem uma peculiaridade que é «tique» da governação socialista. É que, sempre com a ideia de, aparentemente, agradar a toda a gente, o Governo acaba por apresentar uma proposta de lei que engana todos, desagrada a todos e vai criar mais problemas do que aqueles que pretende resolver.

Vou dar-lhe um exemplo, Sr. Secretário de Estado, porque não tenho tempo para mais, exemplo esse que tem a ver com a introdução, no nosso ordenamento jurídico cinegético, do conceito de direito à não caça.

Primeiro, tratando-se de um conceito novo, era suposto que o Governo o desenvolvesse na lei. Mas não! O Governo introduz o conceito de direito à não caça e refere que ele fica por regulamentar. Por regulamentar como? Em que condições? Em que termos? Com que contornos? Sr. Secretário de Estado, exigia-se mais quando se alterarão profundamente o ordenamento jurídico do regime cinegético em Portugal.

Mais, Sr. Secretário de Estado: ao introduzir esta questão, exactamente para procurar agradar a certos sectores de opinião, o Governo abre a porta à alteração do regime jurídico tradicional da caça em Portugal, substituindo a ideia dá caça como bem comum pela de caça como bem privado, propriedade do proprietário.

Simultaneamente, gostava que o Sr. Secretário de Estado me esclarecesse como é que vai resolver o problema

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da introdução do direito à não caça, mais a mais cruzado com a criação das chamadas zonas de caça de interesse rural, em que só pode caçar o gestor ou quem ele convide, bem como se vai ou não abrir a porta para a recriação dos coutos privados em Portugal.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas eles não existem?!

O Orador: - Mais ainda, Sr. Secretário de Estado: esta é uma lei que pretende fomentar o associativismo, mas se, por hipótese e a hipótese é possível , existirem três ou quatro proprietários no Alentejo, ou no Ribatejo, que requeiram o direito à não caça em zonas territorialmente contínuas, o que o Governo está a fazer é a abrir a porta para liquidar todo o regime associativo ou o regime turístico dessa zonas!
Estes são os esclarecimentos que gostava de obter do Governo relativamente a uma questão nuclear da proposta de lei, tanto mais nuclear quanto ela depende da forma como for concretizada, porque esta lei, neste aspecto, é pouco mais do que zero.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural, que dispõe de 3 minutos para o efeito.

O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural: - Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostava de dizer ao Sr. Deputado Lino de Carvalho que se trata de uma lei de bases cujo artigo 46.º indica precisamente as questões que vão ser regulamentadas a posteriori,...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - São quase todas!

O Orador: - ... e uma delas é o direito à não caça.
Esta lei reconhece que o direito à não caça corresponde a uma proibição do exercício da caça em determinado espaço quer pelo proprietário quer por terceiros e por períodos renováveis.
Como já referi na intervenção que fiz, pretende-se, com esta figura, reconhecer a existência de sensibilidades crescentes na sociedade que não aceitam bem ou rejeitam mesmo esta actividade. Portanto, havia, de facto, que garantir o direito que assiste a estas pessoas de não se caçar nos seus terrenos.
O direito à não caça vai ser regulamentado existe um artigo que estabelece a sua regulamentação e, ao ser regulamentado, pensamos que ele apenas deve contemplar uma opção ética. Ou seja, na medida em que corresponde a uma situação de ordenamento mínimo onde o recurso caça não vai ser explorado, portanto, não contribui para as suas funções sociais e económicas, não é qualquer pessoa que vai poder exercer este direito à não caça. Embora estejamos já a estudar esta questão, posso dar-lhe um exemplo de um mecanismo a que se pode recorrer: o do tipo objecção de consciência. No fundo, quem alegar o direito à não caça não poderá caçar em parte alguma do território nacional, ficando mesmo impedido de tirar licença de caça. Vai ser, pois, criada uma série de mecanismos que vão restringir em muito a utilização do direito à não caça.
Ou, então e era esta a questão que o Sr. Deputado levantou , em concelhos onde três ou quatro grandes proprietários invoquem o direito à não caça, nos quais seja significativo o regime do direito à não caça, vamos ter de fazer o acompanhamento técnico e vai ter de haver um contacto muito próximo com os proprietários por forma a evitar estragos na agricultura e na floresta. Poderemos ter de obrigar a organizar caçadas pontuais para ultrapassar esta questão.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ó Sr. Secretário de Estado, que grande confusão!

O Orador: - Sr. Presidente, estou a responder ao Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Faça favor de continuar, Sr. Secretário de Estado.

Sr. Deputado Lino de Carvalho, faça favor de não interromper.

O Orador: - Por outro lado, o Sr. Deputado Lino de Carvalho cruza esta questão com a das zonas de caça de interesse rural e levanta o espantalho do retomo ao couto privado. Efectivamente, não é assim, porque a questão das zonas de caça de interesse rural está ligada à multifuncionalidade da agricultura, que queremos reforçar.
Para além da produção de bens alimentares, de bens silvícolas, de produtos animais, etc., queremos que a exploração agrícola produza também bens cinegéticos por forma a reforçar, de facto, a multifuncionalidade da exploração agrícola. Portanto, não se procura com isto fazer qualquer confusão com o couto privado. Isto não é uma situação de privilégio em que as pessoas, no fundo, tinham uma ligação directa da caça com a propriedade. Nós valorizamos a caça enquanto produto da terra, que tem de ser produzido dentro do plano que a exploração agrícola terá de apresentar, integrando as componentes agrícola, silvícola, cinegética, etc.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Carlos Póvoas.

O Sr. José Carlos Póvoas (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Sr. Secretário de Estado: Falar de caça, hoje em dia, é só por si polémico.
Vivemos na era do politicamente correcto, uma atitude mental que tantas vezes vive ao sabor do oportunismo de ocasião e do «deixa andar» das modas passageiras.
Além disso, actualmente em Portugal, o Governo e a sua maioria nesta Assembleia apenas norteiam a sua actividade pelos indicadores de opinião, esquecendo os problemas reais e tentando fazer esquecer as soluções necessárias. Não foi nem é essa a nossa determinação política, nem a nossa conduta cívica. Somos pelas soluções objectivas, com base nos princípios que entendemos como correctos.
Para nós, o exercício da caça deverá ser normalizado de molde a harmonizar e compatibilizar as virtudes lúdicas, económicas, desportivas, sociais e ambientais, de forma a evitar que o aproveitamento do potencial cinegético se transforme num foco permanente de conflitos e de tensões.
A caça é uma actividade com raízes ancestrais, tão velha quanto a existência da humanidade, quer nas suas vertentes de sobrevivência, quer nas vertentes rituais, que moldaram culturalmente o homem e a sua aproximação à natureza.

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Entre nós, a caça possui um cariz marcadamente popular. Actualmente, a caça terá de ser vista como um factor de riqueza nacional, regional e local, de apoio e valorização do mundo rural. Para tal, será necessário que todo o território nacional seja objecto de ordenamento racional e harmonioso, tendo em vista uma correcta e equilibrada gestão e exploração dos recursos cinegéticos existentes, numa perspectiva de respeito pela natureza e pela preservação das espécies.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados:
O projecto de lei que hoje discutimos é dirigido a cerca de 300 000 praticantes e a mais uma dezena de milhar de cidadãos que, por um motivo ou por outro motivo, estão directamente ligados ao exercício da caça.
Esta actividade tem, nas suas fileiras, o mais variado tipo de cidadãos, quer em termos culturais, sociais, ou económicos. Não é por isso fácil tipificar o perfil do caçador a não ser pelo denominador comum do gosto de uma prática ao ar livre e de são convívio.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: A história identifica a existência de alguns conceitos regulamentadores da prática da caça.
O primeiro conceito, de génese romana, consiste no rés nulius, ou seja, a coisa que, sendo de todos, não é de ninguém, susceptível, consequentemente, de apropriação pelo primeiro que, de qualquer forma, dela se quisesse apropriar.
O segundo conceito, de origem germânica, diz que o direito de caça nada mais era do que a regalia do senhor feudal, não constituindo a caça mais do que um produto da terra.
Hoje, atendendo às realidades económicas e sociais do País, não é possível aplicar qualquer um dos conceitos por si só. E porquê, Srs. Deputados? Nas regiões onde predomina a pequena propriedade, a caça, pela sua mobilidade, nasce num prédio, alimenta-se e vive em vários. Assim, perde-se o conceito do produto da terra.
O rés nulius, o outro conceito- que considera a caça como uma dádiva da natureza, em que o homem pouco intervém, também não se pode aplicar nos dias de hoje.
Se equacionarmos o aumento progressivo de caçadores, o desenvolvimento dos meios de comunicação e transporte, somado ao abandono progressivo das terras e, consequentemente, à falta de cultivo, o uso excessivo de herbicidas e pesticidas aliados à falta de apoio de repovoamento no final de cada época de caça, assiste-se ao extermínio passivo das espécies cinegéticas, como resultante deste sistema. Como resolver, então, o problema?
Pelo que foi dito, parece óbvio que só com um ordenamento correcto e bem definido de todo o território será possível o fomento da criação, a alimentação e a protecção das espécies cinegéticas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nesse sentido, foi dado um grande passo com o estabelecimento da lei respeitante à caça. Lei n.º 30/86, através da qual se proeurou definir um quadro normativo que conciliasse os diferentes interesses em presença: caçadores nacionais, caçadores regionais, agricultores, administração e público em geral, compatibilizando-os com o ordenamento jurídico da legislação europeia, com as necessidades de protecção, conservação e fomento dos recursos cinegéticos e da natureza em geral do nosso País.
Houve, assim, coragem e determinação política em 1986: foi a criação de um regime cinegético especial.
É certo que se cometeram alguns erros e que houve algumas omissões, conforme, aliás, salienta o Acórdão n.º 866/96, do Tribunal Constitucional, mas ninguém de boa fé pode negar que, desde então para cá - e a experiência mostra-o claramente -, a recuperação do nosso património cinegético foi, e é, feita à custa das zonas de caça de interesse turístico e associativo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Decorridos 13 anos desde a publicação da Lei n.º 30/86 - e tal como acontece com outros diplomas legais -, torna-se necessário corrigir alguns excessos e adaptá-la à realidade actual, aperfeiçoando-a, tendo em conta uma vasta experiência adquirida.
Em relação ao futuro, que novidades traz a proposta de lei do Governo do PS?
O que é que se pode esperar de uma proposta de lei de um Governo socialista - socialista "à portuguesa", entenda-se ?! É que, efectivamente, este PS, à falta de melhor, poderia seguir o exemplo dos camaradas espanhóis, mas infelizmente não é o caso.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim, resta-nos, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, primeiro, uma overdose demagógica do habitual diálogo; segundo, as já tristemente célebres indefinições; terceiro, a dualidade ou disparidades de critérios.
Resta, obviamente, à oposição fazer bem o trabalho de casa para que, no mundo rural e cinegético, haja desenvolvimento e progresso. É esse o nosso propósito.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados Sr. Secretário de Estado, permitam-me que faça alguns comentários à proposta de lei apresentada.
Sobre o direito à não caça, nos termos em que é definido pelo Governo, é reconhecido que ninguém poderá caçar em terrenos alheios sem o consentimento do proprietário. No plano dos princípios, nada temos a opor. Ficamos, sim, é sem saber se o presente diploma, em contrapartida, permite o direito à caça. Isto é, os proprietários, querendo, podem ou não reservar para si o direito à caça, ou para quem entendam transferir esse direito?
Ainda no que se refere ao direito à não caça, o diploma é omisso e ficamos assim sem saber quem se responsabiliza pelas indemnizações de prejuízos causados pelas espécies cinegéticas nos terrenos agrícolas vizinhos.
Ficamos também sem saber se, por uma questão de coerência, todo aquele que requerer o direito à não caça poderá exercer o direito de caçar em qualquer outro terreno nacional.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, no campo específico do direito à não caça há muito a fazer e nada, mesmo nada, poderá ficar por regulamentar.
Outra pretensa novidade é a criação de zonas de refugio, onde a caça passa a ser total ou parcialmente proibida. Quer isto significar que o direito à caça passa a ser do Estado. Não será precisa muita imaginação para percebermos um novo tipo de boys a ocuparem e a dedicarem-se a mais jobs, vendendo e oferecendo benefícios, consoante os seus próprios interesses.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas mais grave, Srs. Deputados: o Estado passaria a. ser o dono da caça sem sequer necessitar do consentimento dos proprietários. E pior do que tudo isto é o facto de não haver sequer uma palavra de compensação/indemnização pela posse do produto da terra.

Com a aprovação desta proposta, voltávamos novamente às nacionalizações.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Era bom que o Governo estivesse atento a estas coisas!

O Orador: - De acordo com esta coerência socialista nas nacionalizações da terra, o Governo poderia criar as zonas de caça de interesse nacional e zonas de caça de interesse municipal sem audição prévia dos proprietários. Estaríamos, assim, perante uma clara violação do direito de propriedade, o que, em nosso entender, põe em causa a própria constitucionalidade desta disposição, tendo em conta o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 886/96, publicado no Diário da República em 18 de Fevereiro.
Srs. Deputados, no nosso entender, as taxas só têm razão de ser se o Estado prestar qualquer serviço relacionado com a caça, como, por exemplo, o seu fomento e a sua protecção, a desmatação das zonas de caça e a abertura de caminhos florestais. Mas nada disto está previsto no presente diploma.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: O Governo, com este diploma, quer colocar-se na posição do senhor feudal todo poderoso, definindo-se, assim, no artigo 15.º "prioridades e limitações dos diversos tipos de zonas de caça".

O Sr. António Martinho (PS): - Ehh!

O Orador: - O Estado guarda a priori 50% para zona de caça, nacional e municipal, ficando assim os restantes 50% para as zonas de caça de interesse turístico, associativo e rural.
Como atrás afirmei, a recuperação do nosso património cinegético fez-se com a vontade dos privados e esta delimitação, para além de ser constitucionalmente duvidosa, representa uma séria machadada no processo de recuperação já iniciado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo, com esta proposta de lei, em vários aspectos, mais não faz do que uma reforma da caça em tudo semelhante ao que de pior houve na reforma agrária, com todo o tipo de usurpações e manipulações em benefício de interesses pouco claros.
Para finalizar, Srs. Deputados, queria afirmar, em nome do PSD, que este diploma suscita dúvidas de constitucionalidade em alguns aspectos e daí a necessidade da sua alteração na especialidade. De qualquer forma, o PSD irá viabilizar, na generalidade, esta proposta de lei.
É necessário que o presente diploma sofra profundas alterações para se evitar a dualidade de critérios, a injustiça, a indefinição, tão ao gosto daqueles que gravitam à roda do actual poder e que oferecem facilidades para depois venderem facilidades.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Carlos Póvoas, tem a palavra o Sr. António Martinho.
O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente...

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Aguarde, se faz favor, que o Sr. Deputado José Carlos Póvoas tome o seu lugar!

O Orador: - Não se preocupe, Sr. Deputado Carlos Encarnação, eu espero! Espero todo o tempo que for necessário para que o PSD se recomponha e possa participar no debate. É isso que pretendemos!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): -E nós estamos há três anos à espera que o Governo governe!

O Orador: - Sr. Deputado José Carlos Póvoas, esta iniciativa legislativa, pese embora o que o Sr. Deputado afirmou, é mais um bom exemplo da capacidade deste Governo para ouvir a sociedade e tomar decisões sobre os problemas.
Quando o Governo tomou posse, em 1995, o dossier da caça era, sem dúvida, um dos mais polémicos - aliás, o Sr. Secretário de Estado já o disse aqui -, fruto de uma lei de 1986 que os sucessivos governos do PSD não foram capazes de regulamentar devidamente. Escrevi, nos meus apontamentos, "porque não puderam", mas talvez, de acordo com a intervenção do Sr. Deputado José Carlos Póvoas, seja melhor dizer "porque não quiseram". Daí o clima generalizado de contestação que se vivia. Tomava-se, pois, necessário tomar decisões de conjuntura, no curto prazo, e decisões de fundo. Foi tão simplesmente isto que o Governo fez.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Decisões?! Vem falar de decisões?!

O Orador: - O Governo reformulou a composição do Conselho Nacional da Caça: adoptou uma postura de arbitragem; utilizou a margem de manobra possível na alteração da regulamentação da lei em vigor.
Por outro lado, adoptou medidas que levassem a uma maior eficácia da Administração e acentuassem a sua transparência e isenção. Mas não se ficou por aqui. Foi mais além e, com base num consenso alargado da sociedade, a partir do acolhimento das reivindicações de diversos intervenientes, com grande equilíbrio e sentido de justiça, preparou esta proposta de lei de bases que já está há dois anos no Parlamento. Esta proposta de lei serve para todos!
Ousaria dizer que, desta Câmara, ela também é merecedora do consenso que já conseguiu na sociedade, consenso político - convenhamos. O facto de não haver propostas globais alternativas, em meu entender, denota-o.
Pergunto ao Sr. Deputado José Carlos Póvoas se partilha ou não desta opinião.

Risos do PSD.

Pergunto-lhe se considera ou não que a filosofia desta proposta e os princípios que a enformam são, efectivamente, merecedores de uma atitude claramente afirmativa.

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Sr. Presidente, permite - Srs. Deputados, vem a propósito lembrar-isto para os mais velhos e está ali um que foi Secretário de Estado da Agricultura, por isso, talvez se lembre desses tempos - que, em 1995, houve várias iniciativas legislativas sobre este assunto. O Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentou também um projecto de lei, prova cabal de uma atitude construtiva em oposição, marcando posição, apresentando as suas propostas e participando com seriedade nesse debate, não fez afirmações como as que ouvi hoje neste debate, quando o Sr. Deputado trouxe aquilo "espantalho" da reforma agrária, de que veio falar na vossa linguagem recente,...

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Qual linguagem?!

O Orador: - ... que tem sido muito comum nos vossos discursos, e era importante, Sr. Deputado José Carlos Póvoas, que clarificasse a posição do seu grupo parlamentar.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente. Está o PSD disponível para, numa atitude positiva e afirmativa, votar favoravelmente esta proposta de lei e colaborar no seu trabalho, em sede de comissão, visto que não tem alternativa, ou vai, efectivamente, votar contra?

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): Sr. Presidente permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Para exercer o direito regimental de defesa da honra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não me leve a mal mas peço aos Srs. Deputados que não sejam hipersensíveis em matéria de defesa da honra. É que, neste caso, tenho a impressão de que, de facto, só com uma grande exigência ética se pode considerar que a sua honra foi ofendida, como, aliás, é habitual. Peco-lhes, pois, que façam um esforço...
Não quero, de forma nenhuma, censurar a vossa sensibilidade nem substituir-me a ela, mas há casos manifestos em que não há ofensa da honra e os Srs. Deputados invocam essa figura regimental sem qualquer espécie de legitimidade.
De qualquer forma, tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, verificará que anotei, com toda a sinceridade e atenção, a observação que acabou- de fazer mas, como Presidente desta Câmara, com honra, que sei que assume, e com o aplauso de todos nós, não apoiará nem aplaudirá, com certeza, que um Deputado de qualquer bancada se dirija a outro Deputado de qualquer outra bancada-e, pessoalmente, não tenho quaisquer problemas em que me chamem "dos mais velhos", porque os anos já passaram, não é por aí -, dizendo "está para ali um que foi Secretário de Estado".
Sr. Presidente, confesso que me senti ofendido e o Sr. Presidente, certamente, não aplaude esta forma de tratamento, como disse, seja da bancada socialista ou de outra. Mas, se me permite,...

O Sr. Presidente: - É evidente que não aplaudo, Sr. Deputado, mas o Sr. Deputado António Martinho disse "está ali um" e não "está para ali um", pelo que, apesar de tudo, há uma pequena diferença. De qualquer modo, mesmo assim, não estou de acordo.

Faça favor de prosseguir, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, muito obrigado pelo seu apoio ao meu pedido de defesa da honra.
Quanto à substância do que disse o Sr. Deputado António Martinho, só poderia discutir se não houvesse leitura das perguntas escritas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, vou dar uma explicação muito simples: efectivamente, olhei para a bancada do PSD, lembrei-me de que o Sr. Deputado Álvaro Amaro foi Secretário de Estado...

Vozes do PSD: - Isso é que é memória!

O Orador: - ... e presumi que o Sr. Deputado, em 1985, tivesse sido Deputado. Se o não foi, lamento, mas não houve qualquer ofensa, porque não usei a expressão "está para ali um". Efectivamente, não a usei è existe uma gravação para o confirmar.
Mas, Sr. Deputado Álvaro Amaro, já agora, deixe-me perguntar-lhe: será que o Sr. Deputado tem algum problema em ter sido Secretário de Estado, num determinado momento, desse governo?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Foi "pior a emenda do que o soneto". A verdade é essa!

Risos. Aplausos do PSD.

Para responder ao Sr. Deputado António Martinho, tem a palavra o Sr. Deputado José Carlos Póvoas.

O Sr. José Carlos Póvoas (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, parabéns pela sua observação.

Sr. Deputado António Martinho, de facto, reparei que o Sr. Deputado trazia a pergunta feita de casa e leu-a correctamente, sem quaisquer problemas.

O Sr. António Martinho (PS): Faço o trabalho de casa!

O Orador: - Faz muito bem! Parece-me importante que se faça o trabalho de casa. Mas fosse qual fosse a minha intervenção a sua pergunta seria sempre a mesma!

Vozes do PSD: - Exactamente! Protestos do PS.

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O Orador: - Imagine que eu mudava o discurso... Portanto, a sua observação vale o que vale.

O Sr. Luís Marques Mendes (PSD): - Exactamente! Protestos do PS.

O Orador: - Calma, Srs. Deputados.

Se a proposta de lei está há dois anos no Parlamento, a culpa não é nossa, a culpa é do seu Governo, que a devia ter agendado há mais tempo.

Vozes do PSD: - Muito bem! Exactamente!

O Orador: - Pela nossa parte, nunca colocámos qualquer obstáculo, pelo contrário, até queremos resolver o problema e é para isso que cá estamos.

O Sr. António Martinho (PS): - Onde é que está o projecto de lei?

O Orador: - Já lá vai, Sr. Deputado. Tenha calma!

A nossa posição é muito simples: queira o Sr. Secretário de Estado dizer aqui que, de facto, está de acordo em reduzir ou, melhor, em anular os 50%, porque é essa a nossa vontade, e em regulamentar como deve ser o direito à não caça que o PSD viabilizará o projecto de lei. Agora, W. Ex.ª têm de se definir e deixar a dualidade de critérios - é essa a nossa preocupação -, para não haver inconstitucionalidades.

Se VV. Ex.ªs chegassem aqui e trouxessem uma lei clara e objectiva, o PSD viabilizava-a de imediato, assim, estamos à espera de que nos dêem respostas.
Se o Sr. Secretário de Estado disser aqui "Sim, senhor, o Sr. Deputado José Carlos Póvoas tem toda razão, vamos rever a proposta de lei", nós, com certeza, votaremos a favor.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Carlos Póvoas, quero dar-lhe apenas um pequeno esclarecimento: até ver, o Governo ainda não agenda quando quer.

Risos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): -Esse "ainda" é que nos preocupa!...

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: O PCP, desde sempre, pauta as suas posições sobre a actividade cinegética no quadro dos seguintes parâmetros: consideração da prática da caça como uma actividade de base e raiz popular e lúdica a que todos os interessados devem ter acesso, sem distinções de natureza económica ou social, podendo constituir, simultaneamente, um recurso económico complementar para os agricultores e para o País;...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ... defesa do princípio do ordenamento cinegético de todo o território como base da organização, protecção, renovação e exploração dos recursos e das espécies cinegéticas; consideração de que o princípio do ordenamento cinegético não se esgota exclusivamente na submissão da organização da caça às chamadas zonas de caça, pois no até agora chamado regime geral também pode e deve haver lugar ao ordenamento cinegético; defesa do associativismo como instrumento desse ordenamento; defesa da concepção romanista da rés nullius ou da liberdade de caçar, que é aquela que enforma, desde sempre, a tradição do ordenamento jurídico no nosso País.
Neste quadro, criticámos a Lei n.º 30/86 e posicionamo-nos face à proposta de lei do Governo agora em apreciação.
É sabido que a lei de 1986 introduziu novos factores de desequilíbrio e desnecessários focos de tensão social. Mas também é claro que a actual proposta de lei do Governo vai introduzir novos e sérios motivos de preocupação e desestabilização, sem qualquer garantia, entretanto, de que o ordenamento cinegético será conseguido.
Primeira crítica: a consagração do "direito à não caça" numa formulação completamente vaga, cuja definição dos termos concretos se deixa para regulamentação.
O direito à não caça abre a porta à substituição, no nosso ordenamento jurídico, da concepção secular da caça como um bem público comum - oriunda do direito romano-pela concepção germânica assente na ideia de que o direito à caça nada mais é do que uma regalia dos senhores da terra.
Como afirma o Acórdão n.º 866/96, do Tribunal Constitucional, e cito, "deve reconhecer-se que a caça, pela sua constante mobilidade não vive... num só prédio...". O acórdão reconhece ainda - com o que o PCP também está de acordo - que "a inteira liberdade de caçar, em face de uma legião de caçadores que aumenta progressivamente e de uma área com condições de vida para a caça cada vez mais reduzida, equivaleria à destruição total das espécies dentro de poucos anos"..
Conclui o citado Acórdão: "chegamos, assim, à conclusão de que nenhum dos sistemas em presença contém em si a virtualidade de solucionar convenientemente o problema venatório" e, se assim é, e porque "temos de eleger um deles, porque na realidade não dispomos de outros, então parece que estará indicado dar preferência ao sistema tradicional. E pensa-se..." - refere ainda o Acórdão -"... que ele poderá conduzir a resultados satisfatórios se houver a decisão necessária para o corrigir de harmonia com as realidades dos tempos de hoje".

ra, é este equilíbrio que, em nossa opinião, a proposta de lei não resolve e põe em causa com a consagração, sem mais, sem regulamentação, do "direito à não caça".
Entretanto, nas condições concretas do nosso País, designadamente nas regiões de grande propriedade do Alentejo e Ribatejo, esta concepção da "não caça" pode conduzir ao regresso aos grandes coutos privados proibidos depois do 25 de Abril. Basta, Srs. Deputados, que o proprietário requeira a proibição a terceiros da caça nos seus terrenos mas decida, invocando o direito de propriedade e numa interpretação agora legitimada a contrario sensu pelo recente acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, caçar ele próprio e os seus amigos.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - Estão os Srs. Deputados e o Governo em condições de garantir que este quadro está fora de hipótese? Então, não seriam suficientes, para o efeito que querem no direito da não caça, as chamadas "áreas de refu-

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gio de caça", previstas nos artigos 7.º e 38.º da proposta de lei? Por que não se optou por um direito de não exercício temporário da caça, por exemplo, por razões de defesa das espécies?

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Mas mais, Srs. Deputados: a consagração da faculdade da proibição da caça exercida, por exemplo, por um conjunto territorialmente contínuo de proprietários - isto é possível - vai desarticular e até inviabilizar muitas reservas de caça hoje submetidas, por exemplo, ao regime associativo ou turístico e terá consequências negativas, além do mais, para o equilíbrio natural das espécies e para os processos de fomento e reprodução ordenada das espécies, exactamente o oposto daquilo que o Governo afirmou pretender com esta proposta de lei.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A confusa explicação que o Sr. Secretário de Estado aqui trouxe, a este propósito, só veio ampliar as nossas preocupações e as nossas críticas.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Segunda crítica: a multiplicação de figuras de ordenamento, em que a figura de zona de caça de interesse rural, a que só terão acesso "os caçadores autorizados pelo respectivo gestor", é, obviamente, outra forma de abrir caminho aos coutos privados.
Terceira crítica: é de todo em todo inadequada a possibilidade prevista na proposta de o policiamento e fiscalização da caça poderem vir a ser atribuídos às autarquias, que não têm nem vocação, nem meios, nem preparação para este tipo de fiscalização.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quarta crítica: o facto de o Governo deixar para regulamentar os aspectos mais substanciais e polémicos da proposta, como o direito à não caça, o conteúdo das zonas de interesse rural, a detenção, o comércio e o transporte das espécies cinegéticas, o regime da concessão da faculdade de caçar, as taxas devidas, os períodos venatórios e os processos de caça, os campos de treino de caça,...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Tudo adiado para daqui a dois anos!

O Orador: - ... a constituição, atribuições, competências e funcionamento dos conselhos cinegéticos, etc. Tudo fica para regulamentar!

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): -Dois anos!...

O Orador: - É a técnica do Governo do Partido Socialista, onde todos parecem copiar o Eng. Guterres: quando os problemas se tomam mais complicados,...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Adia-se!

O Orador: - ... "assobia-se para o lado" e enchem-se os discursos e as propostas de lei com muita conversa vazia.
Estas são quatro críticas estratégicas que condicionam o nosso sentido de voto.
Um outro aspecto que tem originado larga polémica é o de limitar as áreas abrangidas por zonas de caça associativa e turística a 50% da área total dos respectivos municípios. A verdade é que a sua formulação concreta, tal como está proposta, esvazia de sentido a mesma e cria novos desequilíbrios. A lei actual já prevê essa norma mas aplicada à "área total com aptidão cinegética no País e em cada região cinegética". É a lei do PSD! Agora, o Governo finge manter a mesma norma, para iludir os caçadores do regime geral, mas altera a formulação de 50% da área total com aptidão cinegética para "50% da área total do município". Na prática, isto significa a submissão de todo ou quase todo o território cinegético às diversas figuras das zonas especiais de caça. Com esta formulação, procuraram iludir-se, por sua vez, as reclamações dos caçadores do chamado regime geral. É outro tique deste Governo: finge querer agradar a gregos e troianos; ilude uns e ilude outros; desresponsabiliza-se, quando lhe convém, de assumir opções, acabando por criar mais problemas e mais injustiças.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É um tique que atravessa toda esta proposta de lei.

A questão dos 50% tem de ser esclarecida, sendo possível, na opinião do PCP, encontrar-se uma verdadeira solução, até transitória, que, não discriminando ninguém no livre direito de acesso à caça, ordene cinegeticamente todo o território nacional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os 250 000 caçadores com licença existentes em Portugal, dos quais mais de 75% são de origem popular, mereciam uma melhor lei.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): -Muito bem!

O Orador: - O ordenamento e a exploração equilibrada dos recursos cinegéticos exigem uma lei mais ponderada e tecnicamente capaz.

Aliás, o Partido Socialista tem de tal modo consciência das fragilidades desta proposta que a deixou esquecida na gaveta o maior espaço de tempo que lhe foi possível.
O Partido Socialista sabe que esta proposta vai criar mais problemas do que aqueles que alegadamente pretende resolver. E é exactamente por isso que o PCP a rejeita.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Marques.

O Sr. Rui Marques (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Falar de caça é falar de uma actividade essencialmente lúdica, ligada a um comportamento atávico, praticado por mais de 300 000 portugueses e que, pela sua importância económica, pode e deve aproveitar-se como importante factor de desenvolvimento das zonas mais pobres do interior do País.
Falar de caça hoje é afirmar a indissociável relação entre este recurso e a actividade agrícola e é também relevar o papel que o próprio turismo cinegético cada vez mais representa nas débeis economias das zonas de maior potencial venatório.

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Falar de caça é ter presente que se está perante um recurso natural renovável e que só uma gestão sustentada pode permitir a sua exploração racional.
Falar de caça deve ser, ainda, ter-se a consciência de que cada vez mais a sociedade civil, com regras claras, deve intervir como gestora capaz, reservando ao Estado um papel supletivo e de fiscalização.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei agora em apreciação tem, do nosso ponto de vista, o facto positivo de entender ou de pretender que se ordene todo o território nacional, pondo fim, como se sabe, ao regime geral ou chamado regime livre, mas tem de negativo vários erros ou equívocos de que nos permitimos elencar apenas alguns, aqueles que julgamos mais penalizadores.
Primeiro equívoco: o Governo não quer a aplicação atempada da lei. A aprovar-se esta proposta, só passados pelo menos dois anos e meio teríamos uma lei eficaz.
Segundo: esta proposta de lei, ao contrário do que o Governo anuncia, não reforça a participação da sociedade civil, aumenta, isso sim, a participação do Estado e das autarquias. É uma proposta estatizante.

O Sr. António Martinho (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Terceiro: ao arrepio do que foram as posições do Partido Socialista num passado recente, esta lei não respeita os direitos dos proprietários. O Partido Socialista não aceitava antes, e nós continuamos a não aceitar, a dispensa de autorização expressa - dos proprietários para afectação dos seus terrenos às zonas de caça de interesse nacional ou municipal, as conhecidas zonas de interesse público.
Quarto equívoco: esta proposta institui proprietários e associações de caçadores de primeira e proprietários e associações de caçadores de segunda.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Quinto equívoco: também ao invés do que seria de esperar, esta proposta de lei não fomenta nem privilegia o movimento associativo, antes o subalterniza.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sexto equívoco: o Governo pretende transferir competências no âmbito da fiscalização da caça para as autarquias, medida que nos parece verdadeiramente inaceitável.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas comecemos, então, pelo princípio. Na exposição de motivos, diz o Governo, e passo a citar: "a actual lei consagra soluções que têm gerado grande controvérsia entre os vários intervenientes da caça". Esta constatação deveria implicar que o Governo, com a máxima celeridade, propusesse as medidas adequadas e correctoras. Não obstante, verificamos o quê? Verificamos que a presente proposta só entrará em vigor um ano após a data da sua publicação e que, depois disso, o Governo ainda quer dispor de mais um ano para regular sobre um pacote de 14 matérias directamente relacionadas com este diploma e que agora ficam em aberto. Significa isto que esta lei demoraria pelo menos dois anos e meio a ser aplicada.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E mais um dos muitos exemplos em que o Governo parece que faz mas não faz, adia, na sua habitual lógica dilatória.
Passemos à apreciação do segundo equívoco atrás referido.
Diz o Governo que, com esta proposta de lei, se reforça a participação da sociedade civil. Quer com isto, naturalmente, dizer que o cidadão passa a ser mais interveniente, enquanto o Estado reduz a sua participação. Bem queríamos nós que assim fosse mas, na realidade, assim não é. Senão, vejamos.
Consigna esta proposta de lei cinco tipos de zonas de caça, duas ligadas ao sector público - as de interesse nacional e municipal - e três ligadas a sectores da sociedade civil - as de interesse associativo, de interesse rural e de interesse turístico.
Ora, o Governo propõe que o conjunto das três zonas a constituir por iniciativa da sociedade civil não possa ocupar, em cada município, mais do que 50% do respectivo território, ficando todo o restante espaço para zonas municipais ou nacionais.
Expliquem-nos como é possível falar-se em reforço quando o que verdadeiramente se propõe é uma limitação, um estrangulamento e um claro retrocesso.
Mais: na prática, mais de 60% do território nacional ficará cinegeticamente ordenado por reservas municipais, ou seja, a quase totalidade do sector público. Isto significa mais Estado e, seguramente, pior Estado. E aqui reside um outro erro da proposta.
Já em 1967, a Lei n.º 2132 admitia a possibilidade de as câmaras municipais requererem a concessão de coutadas de caça, possibilidade que não suscitou qualquer entusiasmo.
A lei actualmente em vigor também desafia os municípios à constituição de zonas de caça sociais, mas a falta de entusiasmo mantém-se.
Não queira agora o Estado obrigar os municípios a executar uma tarefa de que ele próprio se sente incapaz...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - ... e que a sociedade civil, com toda a certeza, executará melhor.
As autarquias não estão vocacionadas para este tipo de actividade.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É nossa opinião que a Administração Pública se deve reservar para um papel suplementar, devendo só intervir quando o movimento associativo ou a iniciativa privada falharem.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Esta proposta de lei estabelece, como se viu, dois regimes distintos para criação de zonas de caça: um para as do sector público, outro para as de iniciativa da sociedade civil. Nestas, as da iniciativa da sociedade civil, obriga-se à obtenção de autorização expressa dos proprietários para afectação dos seus terrenos à zona de caça;
naquelas, nas públicas, incompreensivelmente, o proprietário não é ouvido nem achado com vista à inclusão dos seus terrenos nas respectivas zonas de caça. Não percebemos esta dualidade de critérios e acresce ainda o facto de considerarmos de duvidosa constitucionalidade o teor desta norma.

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Entendemos também que esta proposta, com a regra já referida dos 50%, institui proprietários e associações de caçadores de primeira e proprietários e associações de caçadores de segunda.
No mesmo município, àqueles que primeiro requererem uma zona de caça é-lhes reconhecido um direito mas, uma vez atingido o limite dos 50%, ou seja, a quem requerer mais tarde, já não se reconhece o mesmo direito. Recorrendo a uma frase que celebrizou alguém "quem chega primeiro come, quem chega depois cheira".

O Sr. António José Dias (PS): - Essa é boa!

O Orador: - A antecipação não pode ser um critério utilizável na atribuição de um direito de propriedade. E este critério é tanto mais injusto quanto se sabe que uma qualquer propriedade tem um legítimo valor acrescentado quando afecta a uma zona de caça não pública.
Muitas propriedades rurais deste País passariam a valer mais ou menos, não em função do seu potencial agrícola e venatório, mas em função da taxa de cobertura municipal.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O movimento associativo constitui, para nós, um dos pilares do verdadeiro ordenamento cinegético é o meio mais adequado para se formar e educar os caçadores.
Ao invés do que seria de esperar, esta proposta de lei não fomenta nem privilegia o movimento associativo, antes o penaliza.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Primeiro, porque a famigerada regra limitativa dos 50% reduz a sua expansão, diminui a sua importância e "atira-o" para uma situação de concorrência desigual com as zonas de interesse municipal.
Segundo, porque, na prática, um caçador associado se vê excluído da possibilidade de usufruir das zonas de caça públicas. No artigo 17.º escalonam-se as prioridades de acesso a estas zonas de caça. No universo dos caçadores, este artigo atribui prioridade absoluta aos não associados. Quer dizer, quem teve a iniciativa de constituir ou ajudar a constituir qualquer uma das muitas associativas deste País, vê-se agora preterido relativamente aqueles que se alhearam do movimento mais importante no processo de ordenamento cinegético.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um último aspecto é o de que esta proposta do Governo nos anuncia como novidade de relevo a faculdade do proprietário recorrer ao direito à não caça. A nós, que, desde há muito, defendemos este princípio, cumpre-nos recebê-lo com agrado e dizer que gostaríamos de o ver regulamentado no próprio diploma. O que temos ouvido a vários responsáveis socialistas é que limita a sua aplicação à objecção de consciência, não obstante não estar expressa em parte alguma da proposta. Se assim é, julgamos ser excessivamente redutor.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Temos do direito à não caça a noção de que é paralelo, idêntico, ao direito à caça e ambos devem ser tidos como parte de um direito mais geral: o direito de gestão da caça ou, melhor dito, o direito de gestão dos recursos cinegéticos. Como alguém diz, está a reconhecer-se apenas meio direito.
Reconhecido o direito de gestão dos recursos cinegéticos, compete ao seu titular usá-lo num ou noutro sentido. Aliás, não é para nós aceitável que, enquanto a não caça é reconhecida como um direito dos proprietários, que se adquire por mero requerimento e sem pagamento de taxas, para o direito à caça se recorra à figura da concessão e ao respectivo pagamento de taxas. Há uma clara dualidade de critérios.
O Estado aparece como gestor dos recursos cinegéticos no que concerne ao direito à caça, mas já não se assume como tal no direito à não caça. Esta contradição reside, quanto a nós, no facto desta proposta consubstanciar uma noção estatizante da gestão dos recursos cinegéticos. Ao Estado não compete gerir este recurso, incumbe, isso, sim, uma função incentivadora, reguladora e arbitrai.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mas, a reconhecer-se o direito à não caça apenas como situação de objecção de consciência, gostaríamos de ver esclarecido o seguinte, Sr. Secretário de Estado: um qualquer proprietário tem dois terrenos; pode requerer o direito à caça para um e o direito à não caça para outro? Mais: fica ou não obrigado a requerer este direito para todos os seus terrenos? Terceira questão: um possuidor de carta de caçador pode requerer o direito à não caça?

Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados:

Tudo indica que esta proposta de lei seguira para comissão, com vista a apreciação em sede de especialidade. Estamos certos de que as reflexões e os contributos por nós - trazidos a esta discussão serão valiosos para uma substancial melhoria da proposta de lei. Merecem-nos esta atenção todos os intervenientes na caça: os caçadores, os proprietários e os ambientalistas.
Reiteramos, finalmente, a nossa intenção de trabalhar para uma lei que dê a real importância desta actividade como travão ao processo de desertificação em curso nas zonas mais pobres do interior do País.

Aplausos do CDS-PP e de alguns Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Rui Marques, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Camilo.

O Sr. Francisco Camilo (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Marques, depois de ouvir a sua intervenção com toda a atenção, concluo que aquilo que é a defesa deste diploma, ou seja, o pilar do ordenamento cinegético, foi também defendido por V. Ex.ª e estou convencido de que é defendido por todos aqueles que sabem o que é a caça e a querem defender.
A questão que quero colocar ao Sr. Deputado tem a ver com o seguinte: é difícil, numa matéria como esta, ter um amplo consenso na sociedade portuguesa e todos sabemos que esta proposta de lei de bases chegou aqui, ao Parlamento, com algum consenso conseguido. Provavelmente, não é a melhor lei de bases gerais da caça, mas, com a abertura que o Governo já aqui mostrou e com a disponibilidade que haverá por parte dos grupos parlamentares, na especialidade, estou convencido de que poderemos concluir uma lei boa, que satisfaça todos os interesses em jogo.
A questão que coloco ao Sr. Deputado é a de saber se, perante todo este quadro, com esta abertura, com esta

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vontade e, sabendo nós que, ao longo de 10 anos, houve pouco arrojo nesta matéria-temos de reconhecer que, desde 1986 até hoje, houve pouco arrojo nesta matéria-, V. Ex.ª não entende que este diploma, que está aqui em discussão, merece, por parte do seu grupo parlamentar, um voto positivo.
E a questão concreta é esta: será ou não este diploma melhor do que o que existia há 10 anos? Temos ou não de contribuir todos para isso? Gostaria de ouvir na sua resposta a posição do seu grupo parlamentar, em termos do que será o vosso voto, sobre se vale ou não a pena votar este diploma, que penso que vai, sem dúvida alguma, ultrapassar aquilo que existia até à data, nesta matéria.
Estou convencido de que quem tem a ganhar com isto é a caça, é o País, são os caçadores, são os que defendem o associativismo. Contrariamente a algumas reservas-não direi dúvidas-que o Sr. Deputado deixou, considero que esta lei de bases defende o associativismo e penso que há abertura, nesta matéria, para podermos todos contribuir para que, de facto, esta seja uma boa lei de bases.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Marques.

O Sr. Rui Marques (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Camilo, começaria por lhe dizer o seguinte: assistimos, a partir de 1974, a um verdadeiro extermínio de todo um recurso cinegético nacional-acompanhou isso tão bem ou melhor do que eu. Digo-lhe isto para me referir à lei que entrou em vigor em 1986 e para, sem qualquer tipo de complexo, lhe dizer que esta lei foi uma verdadeira "pedrada no charco" porque introduziu duas novidades no panorama cinegético nacional que revolucionaram completamente o sector: o início da criação do movimento associativo, com o aparecimento das reservas associativas, e o princípio do ordenamento não só por parte do Estado, como vinha sendo desde 1974.
Portanto, quando me pergunta se considero que esta lei não é melhor do que a de 1986, quero dizer-lhe que considero que, em 1986, foi a lei possível, foi muito boa, inverteu completamente o sentido das coisas, e temos de apreciar cada uma das leis no seu tempo. Como tal, não me peça para dizer qual é melhor ou qual é pior porque não faço esse tipo de apreciação.
Gostaria também de lhe dizer que o que estamos hoje aqui a discutir é uma lei de agora, da qual lhe quero dizer, com toda a sinceridade, que esperava mais. Não posso negar que tem um aspecto que considero muito positivo, que é o facto de tentar alargar a todo o território nacional uma lógica de ordenamento. Mas, já agora, deixe que lhe diga, porque não o fiz na minha intervenção, que gostaria que esta proposta apontasse uma data limite para o ordenamento de todo o território nacional, o que ela não faz.
Penso que esse é um facto positivo mas, como disse na minha intervenção, há alguns aspectos negativos e que eu gostaria também de ver corrigidos agora, em sede de discussão. Registo com apreço e satisfação - e espero que estas palavras não caiam em "saco roto" ou, melhor, tenho a certeza de que não cairão em "saco roto" - a abertura do Governo ou, pelo menos as vossas palavras de abertura, pois, embora o Governo não vá participar na discussão em sede de especialidade, VV. Ex.ªs funcionam aqui
um pouco como "câmara de eco" do Governo, e fico com alguma esperança, embora contida, de que consigamos, na procura do consenso, pois também temos esse objectivo, uma lei que sirva todos os caçadores, todos os proprietários, todos os ambientalistas, enfim, todos os intervenientes neste processo.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António José Dias.

O Sr. António José Dias (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.ªs e Srs. Deputados: Desde os tempos mais remotos que os povos da terra caçam, fazendo esta actividade parte integrante das suas raízes, da sua cultura e da sua identidade.
No nosso país, existem cerca de 350 000 portugueses com carta de caçador, pelo que a actividade venatória, quer na sua componente sócio-económica quer, igualmente, no seu aspecto lúdico e cultural, apresenta uma importância relevante.
Em finais de 1995, quando o actual Governo do PS tomou posse, esta foi, porventura - e isso mesmo já foi dito aqui hoje - uma das heranças mais polémicas, um dos dossiers mais controversos, perante o qual eram necessárias respostas e decisões urgentes, equilibradas e pacificadoras. Isso mesmo foi conseguido e o mundo cinegético português, hoje, vive num clima de grande e progressiva tranquilidade.

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Todos recordamos os tempos de enorme polémica, de grandes crispações, de radicalização e de descontentamento generalizado que caracterizou as "aberturas de caça" nos últimos anos.
O actual Governo soube actuar com rapidez, e com conhecimento, contratualizando os interesses envolvidos, dialogando e decidindo com determinação e sensibilidade.
A entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 136/96, de 14 de Agosto, constituiu um passo decisivo para a pacificação e o equilíbrio da actividade venatória, que será complementado com a aprovação da lei de bases que estamos a debater.
Esta proposta de lei, que o Governo aprovou em 14 de, Agosto de 1997, tem como princípio orientador uma concepção actual e moderna de um modelo de gestão sustentável dos recursos- cinegéticos, numa perspectiva de futuro e de ordenamento desta actividade para os próximos anos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Este diploma, que consegue responder às preocupações de equilíbrio e de justiça, resulta de uma ampla base de consenso dos diferentes intervenientes, o que naturalmente só foi possível em virtude de o Governo ter demonstrado a capacidade e a eficácia necessárias para adequar a legislação aos tempos actuais, assente num pilar fundamental de que hoje a caça só pode ser pensada de forma ordenada e organizada para contribuir de forma decisiva para o equilíbrio ecológico do mundo em que vivemos.
Longe vão os tempos em que se encontrava caça em qualquer lugar, proliferando as espécies cinegéticas com

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alguma abundância em qualquer ponto do País. Os tempos mudaram. Os tempos são outros e hoje esta nostalgia do passado não faz qualquer sentido nem tem qualquer viabilidade.
Dantes, podíamos colher sem semear. Hoje, para colhermos alguma coisa, é necessário semear muito e cuidar com grande dedicação daquilo que semeamos. Hoje, não é legítimo, não é justo nem é possível praticar o acto venatório de forma indiscriminada. Há que cuidar e gerir, fomentar e proteger.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O caçador actual tem uma nova concepção da actividade cinegética, em que coloca sempre o primado da qualidade sobre a quantidade e em que sabe que só promovendo um acertado investimento poderá mais tarde auferir o correspondente "juro".
Por isso é que este proposta de lei n.º 142/VII, apresentada pelo Governo, preconiza, de forma inequívoca, o ordenamento de todo o País, embora de forma gradual, respeitando o quadro da realidade existente e compatibilizando as vontades e os interesses dos diferentes intervenientes.
Esta proposta de lei de bases é, também por isso, inovadora e sensata, rejeitando como ponto de partida alterações súbitas que, com toda a certeza, nada contribuiriam para uma correcta e ponderada organização e evolução da caça em Portugal. Define todo o âmbito da actividade cinegética, incluindo as chamadas práticas de caça mais minoritárias, para o que, penso, é oportuno ter coragem política de forma a não permitir excessos de uma certa moda, uma certa tendência proteccionista e proibitiva, um radicalismo administrativista, que em nada vem ajudar à solução do problema, nem vem de encontro ao objectivo da protecção dos animais.

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - Penso que, se esta moda vingar, terá precisamente o efeito contrário, ou seja, a degradação e abandono dessas mesmas espécies e, consequentemente, dos ecossistemas de que necessitam para viver.
Proteger é muito mais do que proibir, proteger nunca é abandonar. Pensando desta forma, o diploma em apreço consagra a criação de refúgios, tendo precisamente em vista a protecção das espécies.
Com o objectivo de consolidar o clima de serenidade que se tem vindo a instalar, é fundamental acabar com essa dicotomia discriminatória, actualmente ainda existente, entre os regimes geral e especial, criando um único regime de caça.
A criação de novas figuras de ordenamento, envolvendo directamente na gestão da caca as organizações de caçadores, de agricultores, de ambientalistas e as autarquias, também se nos afigura como um passo útil e necessário.
De igual modo, a consagração do direito à não caça é entendido como a possibilidade que os diversos titulares sobre os prédios rústicos têm de requerer a proibição da prática da caça nos seus terrenos, na óptica de objector de consciência.
São alguns dos princípios consagrados nesta proposta de lei, cuja aprovação se toma imprescindível, já que também é inovadora no sentido de reforçar a segurança dos cidadãos, designadamente através da implementação do controle da alcoolémia durante o exercício da caça. É, por todos os princípios que consagra, uma nova e importante lei que, igualmente, reformaria o actual sistema de policiamento e fiscalização, tendo em vista o aumento da sua eficácia.
A discussão do tema correspondente ao mundo da cinegética, porque é apaixonante, é controversa e necessita sempre de uma grande base de consenso, de tolerância e de pragmatismo. É este patamar de convergência que espero encontrar para que esta proposta de lei de bases da caça seja aprovada nesta Assembleia.
Com a certeza de que nada é perfeito, e ainda bem, também necessariamente esta lei vai precisar, em sede de especialidade, de ser pontualmente burilada, para o que todos devemos demonstrar desde já uma grande abertura.
Sendo uma lei moderna, sabe aceitar o respeito pela demais legislação em vigor, nomeadamente o Código Civil, consagrando que os poderes de gestão da caça podem ser exercidos por outras entidades que não exclusivamente o proprietário da terra.
É uma lei oportuna e equilibrada porque preconiza e respeita um necessário período de adaptação e de transformação para ordenar todo o País.
É uma lei moderna e adaptada à realidade actual porque reconhece a prática da caça como uma actividade lúdica e desportiva, complementar da agricultura, fomentadora do turismo, com interesse económico relevante.
É uma lei oportuna, equilibrada e moderna porque percebe que a defesa da actividade venatória passa invariavelmente pela defesa do meio ambiente, pelo equilíbrio das espécies, pelo desenvolvimento dos meios rurais, principalmente do interior do nosso país.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com muitos avanços e recuos, a caça chegou ao final deste milénio como uma importante actividade de lazer, apaixonante para uns, indiferente e tolerada para outros. A pressão que alguns grupos ambientalistas e ecologistas exercem tomaram-na uma actividade polémica e controversa.
Em vésperas de um novo século, já não faz sentido discutirmos a propriedade da caça, já não faz sentido polemizarmos a sua prática em eventuais regimes livre ou condicionado. A discussão actual deverá ser sobre a melhor forma de, no próximo milénio, podermos continuar a caçar, de forma ordenada, de forma democrática e em pleno respeito pelas regras da natureza.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - A última inscrição é a da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito rapidamente, gostaria de vincar alguns princípios que nos parece importante que sejam vincados, relativamente a esta proposta de lei de bases.
Gostaria de dizer, em primeiro lugar, que, na nossa perspectiva, a regulação do exercício da caça, por si só, não vem pôr um ponto final nem influir unicamente sobre a diminuição das espécies cinegéticas, sobre o desequilíbrio na reprodução de algumas espécies ou, até, pôr um ponto , final à extinção de algumas espécies que se encontram já nessa situação. Parece-nos que, de facto, esta questão é

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muito mais complexa e abrangente e, relativamente à mesma, não vimos resposta por parte do Governo.

Refiro-me a uma política que tem sido prosseguida no sentido da destruição da floresta, da agricultura e, portanto, de práticas agrícolas que, por si só, faziam o equilíbrio natural e, como tal, faziam naturalmente a preservação de determinadas espécies cinegéticas. Refiro-me claramente à prossecução de políticas de desordenamento florestal, com uma monocultura intensiva, pois não vimos como é que grande parte das espécies cinegéticas sobrevive rodeada de eucaliptos, e tão-só de eucaliptos, só para dar um exemplo, e também a uma política de prossecução da desertificação do mundo rural e do abandono agrícola.
Cremos, pois, que estas questões são fundamentais, tal como é fundamental uma viragem completa na prossecução de uma política florestal e agrícola para a verdadeira preservação das espécies cinegéticas, até porque algumas experiências têm provado que esta prática agrícola é fundamental, nesta perspectiva. Um repovoamento que foi feito há relativamente pouco tempo ou, se me permitem a expressão, uma "re-cultura" que foi já levada a efeito, provou um repovoamento animal imediato.
É também oportuno colocarmos a questão da política que se prossegue nas nossas áreas protegidas e pensarmos por que é em algumas delas existe menos caça do que fora delas. Significa isto que a política que se prossegue, em termos de ordenamento, nas nossas áreas protegidas é também bastante prejudicial à reprodução e à dinamização das espécies cinegéticas.
Se refiro isto é só para dizer que não é a regulação do exercício da caça, por si só, que virá resolver esta questão. Naturalmente que a regulação do exercício da caça é fundamental, até para pôr um ponto final a alguns excessos desta prática.
Em relação a esta lei de bases da caça em concreto, quero assinalar que ela estipula um princípio fundamental, na nossa perspectiva: o reconhecimento do direito à não caça. Agora, é óbvio que a forma como este princípio é apresentado nesta proposta de lei é de tal modo vago que não nos deixa descansados relativamente à regulamentação deste princípio. O Sr. Secretário de Estado adiantou mais algumas coisas sobre esta matéria, mas isso não nos deixa descansados em relação a esta regulamentação e, portanto, em relação à prática deste princípio, que, repito, nos parece-nos fundamental mas não ficamos descansados no que respeita à sua prática, por aquilo que é apresentado nesta proposta de lei.
Portanto, era importante que ela determinasse mais em concreto e que não deixasse tão em aberto este princípio que, na nossa perspectiva, será importante se for regulamentado num determinado sentido.
Gostava também de realçar o facto de este direito à não caça só ter lógica se, de facto, na caça, em concreto, ele funcionar como uma objecção de consciência e se este direito à não caça - e isso parece-nos fundamental - só puder ser atribuído a não caçadores. Agora, a forma vaga como isso está previsto na proposta de lei é, na nossa perspectiva, preocupante.
Por outro lado, parece-nos também que esta proposta de lei deixa de fora algumas questões importantes. Para já, há a assinalar o facto de a generalidade dos caçadores não ter tido conhecimento desta proposta de lei. Esta foi uma reclamação de muitos...

O Sr. Francisco Camilo (PS): -Essa agora!...

A Oradora: - Não sei se aquilo que chega ao Grupo Parlamentar de Os Verdes é o mesmo que chega ao Grupo Parlamentar do PS ou se, de facto, o Grupo Parlamentar do PS fecha os olhos a algumas coisas a que nós não fechamos. Portanto, estou a falar daquilo de que tive conhecimento, daquilo que chegou ao meu grupo parlamentar. Portanto, como creio que tenho o direito de ser porta-voz dessas pessoas, devo dizer que chegaram ao Grupo Parlamentar de Os Verdes algumas reclamações pelo facto de a generalidade dos caçadores não ter tido conhecimento desta proposta de lei, o que é pena.
Por outro lado, deixa de fora algumas questões fundamentais relativas ao exercício da caça, que vêm sendo reclamadas por diversas associações ambientalistas e têm a ver com o fomento do uso dos cartuchos sem chumbo. Como o Sr. Secretário de Estado sabe, os cartuchos com chumbo têm um grau de toxicidade muito elevado, o que tem provocado o aumento da poluição dos nossos recursos hídricos. Portanto, parece-nos que este é um dado a ter em conta.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr.3 Deputada. Esgotou o seu tempo.

A Oradora: - Sr. Presidente, muito obrigada pela chamada de atenção, termino já.

Tinha comigo mais alguns exemplos para dar ao Sr. Secretário de Estado mas, visto ter terminado o tempo de que dispunha, quero apenas deixar, em jeito de conclusão, a seguinte ideia: esta lei de bases é omissa em relação a muitas questões e não é o facto de ser uma lei de bases que pode servir de desculpa a esse tipo de omissões.
Por outro lado, parece-nos que ela estabelece alguns princípios importantes, muito vagos, que precisam de ser aprofundados.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Maninho pede a palavra para que efeito?

O Sr. António Marimbo (PS): - Sr. Presidente, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e dizer que, como ela não dispõe de tempo para responder, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista disponibiliza-lhe 2 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr.3 Deputada Heloísa Apolónia, foram vários os Deputados que, nas suas intervenções, afirmaram que esta proposta de lei é vaga, que não vem regulamentada. Creio que todos nós sabemos o que é uma lei de bases!... Ora, estamos perante uma lei de bases da caça, não estamos perante decretos regulamentares ou decretos-leis! Há, efectivamente, que distinguir e se é a verdade que esta lei, porque abrange um conjunto de artigos, já tem um volume de articulado considerável, se fossemos regulamentá-la como alguns dos Srs. Deputados pretendem, estávamos, de facto, a fazer um conjunto de decretos-leis-tudo bem! - numa proposta de lei, o que ia muito além daquilo que se pretendia.
Sr.ª Deputada, não deve estranhar fazer-lhe este pedido de esclarecimento, pois, efectivamente, a sua intervenção suscitou-me algumas questões, que têm a ver com um certo desfasamento entre afirmações suas e o que vem na imprensa.

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Se há, de facto, uma corrente de opinião que pode dizer que esta lei avançou significativamente, essa corrente de opinião é a dos ambientalistas, e nós temos citações de artigos publicados na imprensa, como a que vem publicada no Diário de Notícias, onde, em relação à não caça, uma associação ambientalista diz que "(...) é um direito fundamental, um dos factores mais positivos da nova lei, a faculdade de os proprietários, os usufrutuários, os arrendatários, quando o contrato de arrendamento rural inclua a gestão cinegética, requererem, por períodos renováveis, a proibição de caça nos seus terrenos."

Sr.ª Deputada, citei uma associação ambientalista!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - E depois?! O que é que isso tem?!

O Orador: - Uma outra afirmação, feita a um outro órgão de comunicação social, refere que: "Durante meses a fio e ainda na anterior legislatura, os campos estavam extremados: eram os caçadores do regime livre, os das associativas e os ambientalistas. Depois de muito se ter debatido e discutido, e também graças à intervenção, já no Governo socialista, do então Secretário de Estado Capoulas Santos, conseguiram-se alguns consensos e a adopção do princípio da não caça, além de novas filosofias de fiscalização e de formação de reservas. Para os ambientalistas, o direito à não caça foi um ponto de honra."
Sr.ª Deputada, perante este sentir da opinião pública e face a algumas das suas afirmações, gostava que me dissesse: é verdade ou não que há progressos significativos? É verdade ou não que o Grupo Parlamentar de Os Verdes podia votar favoravelmente esta lei?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, nos 2 minutos que o Partido Socialista lhe concedeu, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Martinho: Deixe-me, em primeiro lugar, dizer-lhe que o rótulo de associação ambientalista não é suficiente para levar Os Verdes a serem seguidistas de tudo o que é formado pelas associações de ambiente! O que mais nos faltava era que, tanto em Plenário como fora dele, não pudéssemos reservar-nos o direito de expressar as nossas opiniões e as nossas ideias sobre o que aqui é proposto. Ora, creio que foi isso, precisamente, o que acabámos de fazer relativamente a esta lei de bases da caça.
Como o Sr. Deputado reparou, não deixei de mencionar algumas das questões referidas nesta lei de bases da caça que consideramos importantes, sobretudo, como o Sr. Deputado referiu, o princípio da não caça. Só que, na nossa opinião, esse princípio é de tal forma vago e abstracto que se toma perigoso. E nós não sabemos se ele está elaborado de uma forma que não vá, de facto, existir!
Portanto, o facto de estarmos perante uma lei de bases não significa que tudo tenha de ser vago e que tudo seja remetido para uma futura regulamentação. É que o eterno problema é que vocês - e recordo a Lei de Bases da Agricultura e outras leis de base que aqui foram discutidas-, sempre com o pretexto de estarmos perante uma lei de bases, de uma enunciação de princípios, deixam a concretização de algumas matérias para futura regulamentação. Ora, na nossa perspectiva, isso é que é importante, porque era fundamental que questões tão
essenciais como o princípio que referi ficassem mais precisas na própria lei de bases, para sabermos com o que é que podíamos contar.

O Sr. Presidente: - Para dar alguns esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado-Adjunto da Ministra do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra do Ambiente: - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Rui Marques levantou várias questões e terminou de uma maneira com a qual estou de acordo. De facto, o direito à não caça é uma das peças fundamentais desta nossa proposta de lei, que deve ser paralelo ao tal direito à caça.
Aliás, ainda a semana passada - isso vinha na imprensa, não sei se repararam - o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos proferiu uma sentença que condenou a França, na sequência de uma acção posta por um conjunto de pequenos proprietários rurais que exigiram o direito à não caça. E eles ganharam esse processo contra o Estado francês.
Portanto, esse é um direito moderno, de uma sociedade moderna, é uma das peças fundamentais que considerámos nesta lei de bases. Ora, reduzi-lo ao mecanismo que eu dei meramente como exemplo, o da objecção de consciência, é muito redutor. Estou perfeitamente de acordo consigo e acho que, ai, temos de trabalhar mais, temos de ver questões como aquela que pôs, ou seja, se um proprietário com mais de uma herdade pode invocar o direito à não caça numa delas e na outra não, etc. Realmente, temos de estudar essas coisas, por forma a fazer uma boa regulamentação deste direito, que, para nós, é uma das peças essenciais da proposta de lei.
Depois, gostava de esclarecê-lo de que há apenas um ano para regulamentação e não dois, como disse. Aliás, se vir os artigos 46.º e 52.º, constatará que a regulamentação e a entrada em vigor são simultâneas e apenas em um ano.
Quero também dizer-lhe que não é "mais Estado". O Sr. Deputado falou em "mais Estado", mas, se reparar, o n.º 2 do artigo 14.º da proposta de lei abre a possibilidade de o Estado transferir para as autarquias locais tanto as associações de caçadores como de agricultores, de produtores florestais e de defesa do ambiente, bem como a gestão das áreas de caça nacional ou a gestão das zonas de caça de interesse municipal.
Portanto, não pode dizer que é "mais Estado", porque nós abrimos a possibilidade de esses terrenos serem geridos por associações de agricultores ou de caçadores.
Relativamente ao facto de não haver acordo quando um terreno é integrado numa zona de caça de interesse municipal ou de interesse nacional, gostava de dizer-lhe que, embora não esteja previsto na legislação o acordo prévio escrito-isso é apenas para as concessões e isto não são zonas concessionadas, são zonas cuja gestão o Estado delega a outro tipo de instituições -, tem de haver uma audição prévia dos proprietários. Isso faz parte do Código do Processo Administrativo, não se entra em qualquer terra sem que o seu proprietário seja ouvido e sem que para isso ele tenha dado o seu acordo verbal.
Portanto, reconhecemos o associativismo como parceiro privilegiado na gestão e penso que, no essencial, foram essas as questões levantadas.
Relativamente à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e à afirmação que fez de que haver caça passa por outro tipo de políticas e não apenas - e meramente - pelo facto de

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haver ou de não haver ordenamento, quero lembrar-lhe que eu disse isto na minha intervenção e que continuo a pensar que assim é. Aliás, no fim do, hoje começam a surgir políticas que nos permitem inverter o desordenamento florestal, a monocultura e a desertificação. Estou a lembrar-me, por exemplo, de que temos já um Plano de Desenvolvimento Sustentável da Floresta aprovado - e não tínhamos; hoje temos os planos regionais de ordenamento florestal aprovados- e não tínhamos; e que temos planos de gestão florestal.
Portanto, estamos com políticas para ordenar e não para desordenar e o nosso interesse é...

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - As características da nossa floresta não estão alteradas!...

O Orador: - Sr.ª Deputada, estou de acordo e disse isso na minha intervenção.

Também o Sr. Deputado José Carlos Póvoas falou da questão do direito à não caça e, a esse respeito, eu tinha pensado dizer-lhe que, de facto, a França foi condenada, muito recentemente. Aliás, parece que já está disponível na Internet na sua totalidade e o Público de Sábado trazia também um pequeno artigo sobre isso.
O Sr. Deputado referiu-se ao não consentimento dos proprietários, mas eu devo dizer-lhe que o processo do edital não é nosso, se bem que já tenha sido este Governo, mesmo antes do Acórdão do Tribunal Constitucional de 18 de Dezembro de 1996, que aboliu este processo. Abolimos este processo do edital com um decreto-lei do Verão de 1996 e demos a possibilidade de desanexarem os seus terrenos das zonas de caça aos proprietários dos prédios que não deram o seu acordo. De facto, já demos provas de que há respeito pelo consentimento dos proprietários.
De resto, como lhe digo e como já disse ao Sr. Deputado Rui Marques, nas reservas de caça nacionais e municipais, porque não se trata de uma concessão, é meramente uma delegação de gestão, não é necessário o acordo escrito dos proprietários. Aliás, o acórdão do Tribunal Constitucional, se reparar bem, só levanta a questão relativamente às turísticas e às associativas e não às sociais. que era a única forma que existia na altura.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Bem prega Frei Tomás!...

O Orador: - O Sr. Deputado pergunta quem fica responsável pelos estragos das zonas de caça. Devo dizer-lhe que, se reparar no n.º 3 do artigo 37.º da proposta de lei, lá se diz que "O disposto no número anterior aplica-se, com as devidas adaptações, às zonas de não caça", enquanto o número anterior diz que "(...) são obrigadas a indemnizar os danos que o exercício daquelas actividades cause nos respectivos terrenos e terrenos vizinhos."
Relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho, e deixando para o fim a questão dos 50%, que é a questão fundamental, posso dizer que já respondi a algumas na minha intervenção inicial, que o Sr. Deputado apelidou de "resposta confusa".

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Já respondeu, mas ninguém percebeu!

O Orador: Então, se me deixarem, vou tentar explicar.

No fundo, o direito à não caça é uma peça fundamental que temos nesta proposta de lei. O direito à não caça vai ter de ser regulamentado, já que é evidente que a lei é muito abrangente. No entanto, esta é também uma lei equilibrada que tenta, de facto, compatibilizar a gestão dos recursos de caça com os vários interesses que estão em jogo e que são muitos.
Dizia eu que o direito à não caça é um dos aspectos fundamentais desta legislação.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Isso já percebemos!

O Orador: - Isso já percebeu!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Quanto a isso estamos de acordo!

O Orador: - Certo! O direito à não caça vai ter de ser regulamentado.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Daqui a dois anos?!

O Orador: - Não. No prazo de um ano! O Sr. António Martinho (PS): - Não brinquem!

O Orador: - Dizia eu que o direito à não caça tem de ser regulamentado, o que pode acontecer através de mecanismos vários. É evidente que eu disse que não vai ser qualquer pessoa que vai ter direito a exercer ou a pedir o direito à não caça. Vamos ter de regulamentar isto dentro de algumas restrições, já que não vamos ficar com concelhos onde não se pode caçar porque toda a gente invocou o direito à não caça. É evidente que vamos ter de regulamentar isto. É um dos aspectos que vai ter de ser regulamentado e pode sê-lo através de um mecanismo do tipo do objector de consciência, pode ser através de uma comissão de acompanhamento que vai levar a que haja aberturas de caça pontuais, etc.
Relativamente à zona de caça de interesse rural, na qual o senhor vê o ressurgimento dos coutos privados, também dizemos que não é isso que procuramos. Quem pedir esta zona de caça de interesse rural vai ser obrigado a apresentar um plano global de gestão e de ordenamento da sua exploração, onde a actividade cinegética vai ser considerada a par da actividade agrícola, silvícola, etc. Fazemos isto para podermos fomentar a multifuncionalidade das explorações agrícolas, que é o que nos interessa. Em muitas regiões, esta é quase a única hipótese de viabilizar as explorações agrícolas.

Aplausos do PS.

Por último, referir-me-ia à questão dos 50%.

Protestos do Deputado do PCP Lino de Carvalho.

Sr. Deputado Álvaro Amaro, peço desculpa, mas estamos aqui a alterar uma lei que era sua e* eu fiz aqui a justiça de considerar que era uma boa lei e que, na altura, foi um avanço. Disse ainda que há que aprofundar essa lei e o senhor está com "bocas"!

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Com "bocas"?!

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O Orador: -Estava com "bocas", sim! Eu reparei! Enfim, pretendia dizer que aceitamos que a questão dos 50% - questão que foi colocada por dois grupos parlamentares -, na generalidade, possa ter alguma evolução, porque, no caso de não haver pressão por parte das zonas de caça de interesse municipal, já que as autarquias não estão vocacionadas para este tipo de questões e de problemáticas, nós aceitamos, dentro de algum prazo, que possa haver evolução das outras formas de gestão e de ordenamento cinegético que estão previstas na proposta de lei.
Penso que, no essencial, respondi às questões que me foram colocadas.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Já respondeu, mas ninguém percebeu nada!

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado, informo-o de que o tempo a mais que gastou foi-lhe concedido pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Creio que o Sr. Deputado Lino de Carvalho quer gastar os 12 segundos de que dispõe...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, pretendo gastar os 12 segundos de que disponho e 3 minutos que o PSD me concede e que agradeço desde já.

Risos.

O Sr. Presidente: - Muito bem. Então, tem a palavra.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, quero, mais uma vez, agradecer ao PSD a disponibilidade de tempo.
Sr. Secretário de Estado, há uma coisa em que estamos de acordo: é que, a introdução da figura do direito à não caça é uma questão nuclear desta proposta de lei.

O Sr. António Martinho (PS): - Proposta de lei que é inovadora!

O Orador: - Só que, Sr. Secretário de Estado, exactamente por isso é que o Governo não nos pode vir pedir um cheque em branco para uma coisa que nem o próprio Governo sabe como é que vai regulamentar. Esta é que é a questão central!

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Isso já percebemos todos!

O Orador: - Sr. Secretário de Estado, este é um debate político numa Câmara política que vai legislar, não é qualquer questão de ordem pessoal. Como sabe, tenho a maior consideração pessoal por V. Ex.ª, mas estamos a legislar e não pode ser pedido a esta Câmara que aceite aprovar uma lei com uma figura nova no ordenamento jurídico cinegético para, depois, quando perguntamos ao Governo que ideias tem, verificarmos que o Governo não tem qualquer ideia sobre isto!

Vozes do PS: - Isso não é verdade!

O Orador: - O Sr. Secretário de Estado fala na ideia do objector de consciência, que deu como exemplo, mas nem sequer é isso que cá está! O que está na proposta de lei é o seguinte: "É reconhecido o direito à não caça, entendido como a faculdade de os proprietários (...), em condições a regular, requererem a proibição da caça nos seus terrenos." Isto nada tem a ver com o direito à objecção de consciência. Isto aproxima-se muito mais da ideia que há pouco levantei e das preocupações que temos de que o direito à não caça se transforme, exactamente, numa forma de se proibir a caça de outros nos seus terrenos, sendo apenas os proprietários a fazê-lo. É o que está aqui, Sr. Secretário de Estado, nesta "porta aberta".

O Sr. António Martinho (PS): - Isso vai ser clarificado!

O Orador: - Ó Sr. Deputado, se o Sr. Secretário de Estado nem sabe o que é isto, como é que o Sr. Deputado sabe?! É capaz de me explicar?! Se explicar, dou-lhe a palavra, Sr. Deputado!
O Sr. Secretário de Estado invoca o Acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, de 29 de Abril, a propósito de uma questão que ocorreu em França.

Sr. Secretário de Estado, não devemos invocar questões apenas porque lemos algo sobre elas nos jornais. Eu tenho o acórdão, Sr. Secretário de Estado, e o acórdão coloca uma questão que eu, há pouco, coloquei ao Sr. Secretário de Estado. E que a invocação do direito de propriedade e a alteração da figura do rés nullius, de acordo com a concepção germânica da caça como propriedade do senhor da terra, pode levar a que, de hoje para amanhã, com a introdução deste conceito, o que nós venhamos ter, de facto, no ordenamento cinegético do País seja o regresso aos grandes coutos privados, designadamente na zona da grande propriedade.
Mais, Sr. Secretário de Estado: o Governo diz que quer promover o associativismo, as reservas associativas e as reservas turísticas, mas o Sr. Secretário de Estado não me respondeu a esta questão que, em tese, é possível. Se houver quatro proprietários em Sousel, de que me lembrei porque estou a olhar para o Sr. Deputado Artur Torres Pereira, apesar de a sua zona de caça turística estar muito mal,...

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Está a olhar para mim, porque já lhe demos 3 minutos!

O Orador: - ... ou noutra zona de grande propriedade com áreas territorialmente contínuas, que requeiram o direito à não caça - e não há qualquer razão para se dar a um e não se dar a outro -, todas as reservas de caça associativas ou turísticas dentro dessa área ficam completamente inviabilizadas e destruídas.
O que quero saber é como é que o Governo resolve isto. Vai dar a uns e não dá a outros?! Dá na propriedade A e não dá na propriedade 5?! Ó Sr. Secretário de Estado, estas são questões de fundo que esta lei coloca e nem percebo como é que o PSD e o PP dão o benefício da dúvida a uma lei que tem uma questão que é nuclear e sobre a qual o. Governo não tem orientação e nada sabe, dizendo que se há-de regulamentar em condições que podem, efectivamente, inverter por completo o sentido que, alegadamente, se pretende atingir.
Esta é que é a questão central, Sr. Presidente, e é por isso que votaremos contra.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de fazer uma pergunta ao Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, só pode fazer essa pergunta se conceder ao Sr. Secretário de Estado tempo para lhe responder, visto que o seu partido ainda tem tempo para isso.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, assim sendo, a nossa bancada concederá, depois, tempo ao Sr. Secretário de Estado para responder.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Álvaro Amaro, peco-lhe desculpa, mas reparo agora que o Sr. Deputado Rui Marques já tinha pedido a palavra. Contudo, pensei que fosse para uma intervenção...

O Sr. Rui Marques (CDS-PP): - Não, Sr. Presidente, pretendo pedir esclarecimentos.

O Sr. Presidente: - Assim sendo, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Marques.
Contudo, realço que, nesse caso, também terá de conceder tempo ao Sr. Deputado do PCP, já que ele não tem tempo para lhe responder. No entanto, o Sr. Deputado Rui Marques também não tem tempo para lhe dar, já que apenas dispõe do tempo que lhe foi concedido. A não ser que o Sr. Deputado Rui Marques decida dar metade dos 3 minutos de que dispõe ao Sr. Deputado Lino de Carvalho...

O Sr. Rui Marques (CDS-PP): - Sr. Presidente, se o Sr. Deputado Lino de Carvalho utilizar o mesmo esquema que utilizou há pouco, tenho a certeza de que tem tempo para responder, visto que o PSD lho dará.

Risos.

O Sr. Presidente: - Mas eu não vi o PSD nomear o Sr. Deputado Rui Marques como gestor do seu tempo.

O Sr. Rui Marques (CDS-PP): - Sr. Presidente, pretendo apenas pedir um esclarecimento, já que o Sr. Secretário de Estado, quando respondia, dirigiu-se à minha pessoa e eu queria...

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado quer pedir um esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Rui Marques (CDS-PP): - Quero, sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Mas o Sr. Secretário de Estado já falou e já houve mesmo uma intervenção depois da sua.

O Sr. Rui Marques (CDS-PP): - Bem sei, Sr. Presidente, e é por isso que apelo à sua generosidade.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, faça uma intervenção, Sr. Deputado.
De qualquer modo, e antes disso, peco-lhe que deixe o Sr. Deputado Álvaro Amaro formular o seu pedido de esclarecimentos. Peco-lhe desculpa, mas as coisas são o que são.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural, tem, então, a palavra o Sr. Deputado Álvaro Amaro.

O Sr. Álvaro Amaro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, como terá reparado, não era minha intenção questioná-lo neste debate, porque nada posso juntar ao brilhantismo da intervenção da minha bancada, já sem falar das outras bancadas, porque, como compreenderão, não o posso fazer.
De qualquer maneira, e em primeiro lugar, quero dizer-lhe que, para usar a sua expressão, não mandei qualquer "boca". Respeito muito o papel do Governo, já que tenho muita honra em ter sido membro do governo.
Quero formular-lhe uma questão que, para mim, é vital. Eu não quero entrar na discussão, visto que estaríamos aqui muito tempo e que teremos, porventura, oportunidade de fazê-lo em sede própria. Aí teremos mesmo oportunidade de discutir a caça, mais do que a questão política.
Todavia, registo também o seu aplauso ao tempo, como há pouco dizia o Sr. Deputado Rui Marques e como disse o meu companheiro de bancada José Carlos Póvoas, em que uma lei fez o que fez em relação ao País, .pese embora divergências e erros. Contudo, o facto de discutirmos hoje uma lei da caça em paz e serenidade não é um crédito seu ou do seu Governo mas, sim, de quem, pelo menos no governo de que eu era, com muita honra, um humilde membro, tinha um rumo por si definido. Hoje, felizmente, a caça em Portugal tem não apenas um importante peso económico, cultural e social como é também uma actividade lúdica praticada por muitos e, como aqui foi dito, tolerada por muitos.
A questão vital, Sr. Secretário de Estado, na minha opinião, é saber se se pretende evoluir nestas vertentes que referi ou se se deixa parar no tempo. Já aqui foi referida a evolução do associativismo em Portugal. Sr. Secretário de Estado, sabe quantas associações de caçadores havia em 1986? Três! Sabe quantas há hoje? Nem sei o número actualmente, mas são milhares!...

O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural:- Há 1200!

O Orador: - E isso é fruto dos caçadores e dos agricultores, não é do Governo, não é do Estado.

Sabe quanto representa, em termos económicos, a evolução da caça, ao longo de 10 anos, nalguns concelhos do País? É que a caça não se faz no Terreiro do Paço, faz-se justamente nas zonas do desenvolvimento rural, como aqui foi dito por Deputados de todas as bancadas. Trata-se justamente das zonas mais deprimidas. E a questão-chave é a de que a lei que o Governo aqui apresenta, assim como o discurso do Sr. Secretário de Estado dizem: "nós queremos também evoluir nestas vertentes, quer no fomento ao associativismo quer no fomento à vertente económica" e, por outro lado, falam ainda numa coisa muito importante, que é a tendência para o ordenamento total do País.
Sr. Secretário de Estado, eu aplaudo vivamente, mas a questão que coloco é esta: como é que compatibiliza esta norma de querer ordenar o País com uma limitação de 50% por concelho? O que gostaria de ouvir da boca do Sr. Secretário de Estado era apenas isto: "em sede de especialidade, o Governo (ou o Partido Socialista) está disponível para fazer cair esta norma". Se a fizer cair é porque é

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coerente com o princípio genérico; se não a fizer cair, então, estamos aqui a iludir as questões.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Para além de "assinar por baixo", há a velha questão - e eu também estou de acordo, estou completamente de acordo, disse-o na altura, escrevi-o-do direito à não caça. Mas como aqui é dito, e muito bem, o direito à não caça tem de estar consagrado na lei, porque senão é passar um cheque em branco àquilo que pode ser perigoso em termos de caça.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Agora, Srs. Deputados, para poder gerir os trabalhos, tenho de perguntar ao Sr. Deputado Lino de Carvalho se ele usou da palavra para fazer uma intervenção ou se foi para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, eu fiz uma intervenção. E já agora....

O Sr. Presidente: - Não, não! Agora, não vai usar da palavra! Responda só ao que eu lhe perguntei.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, não vou...

O Sr. Presidente: - Desculpe, mas não lhe dei a palavra. Pedi-lhe apenas que me esclarecesse se tinha feito uma intervenção ou se tinha pedido esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, não vou intervir no debate, só quero dizer que há pouco...

O Sr. Presidente: - Desculpe, mas não lhe dou a palavra. Há uma ordem a cumprir, não posso pô-lo à frente de quem quer que seja.
O Sr. Deputado fez uma intervenção, logo, o Sr. Deputado Álvaro Amaro fez também uma intervenção e não um pedido de esclarecimento, uma vez que falou depois do Sr. Secretário de Estado.
Nesse caso, vou dar também a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Deputado Rui Marques, que dispõe apenas de 3 minutos.

Faça favor, Sr. Deputado Rui Marques.

O Sr. Rui Marques (CDS-PP): - Sr. Presidente, serei breve.

Em primeiro lugar, quero dizer ao Sr. Deputado Lino de Carvalho que, ao contrário do que o Sr. Deputado disse, nós não demos a anuência à forma como a questão da não caça está expressa na proposta. Não demos o nosso acordo, o que demos, isso sim, foi o benefício da dúvida - e cá estaremos para discutir isso em sede de especialidade. Esta é que é a questão, esta é que é a verdade!
Em segundo lugar, eu não tinha intenção de voltar a intervir sobre esta proposta de lei, mas o Sr. Secretário de Estado suscitou-me uma questão, uma vez que, em resposta à minha intervenção e à critica que fizemos à regra dos 50%, o Sr. Secretário de Estado respondeu-nos com o teor do artigo 14.º. Acontece que, propositadamente, eu não me referi a este artigo na minha intervenção, porque considerei ser uma matéria muito técnica, mas vejo-me agora obrigado a fazê-lo porque o Sr. Secretário de Estado o trouxe à colação.
Ora, o que o artigo 14.º diz é o seguinte: o Estado pode transferir para as associações de caçadores a gestão das áreas referidas a terrenos cinegéticos não ordenados, com vista à constituição de zonas de caça de interesse municipal.
O que é que isto configura? Configura uma forma enviesada de constituição de reservas associativas, mas com dois vícios. Sabe quais são, Sr. Secretário de Estado? O primeiro é o de que "o Estado pode transferir", isto é, o Estado só transfere quando quiser e para quem quiser. É um poder discricionário do próprio Estado. O segundo vício é o. de se constituir reservas associativas de uma forma enviesada e sem autorização expressa dos proprietários.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lino de Carvalho só tem tempo para um suspiro e não mais!...

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, não quero intervir, só quero dar uma explicação à Mesa, porque, há pouco, quando fiz a minha intervenção em tempo cedido pelo PSD, poderia ter ficado a ideia de que eu abusei do PSD. Não é verdade, porque, antes disso, já tinha solicitado pelo telefone interno ao PSD a cedência desse tempo, não foi qualquer abuso...

Risos.

O Sr. Presidente: - Não houve, não! A Mesa sabia disso, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural.

O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural: - Sr. Presidente, o PSD também me tinha dado dois minutos, que eu vou aproveitar.
Relativamente à questão que o Sr. Deputado Lino de Carvalho apresentou, já lhe tinha dito - e penso que não fui ouvido -, aliás, tinha-lhe garantido que, se um proprietário invocar o direito à não caça, não caçam lá terceiros nem caça lá o proprietário. Portanto, não há aqui a mínima hipótese de criarmos um couto privado. Já lhe tinha dito isto numa primeira intervenção. Portanto, no fundo, estou a reafirmar e a garantir isso. Não quero mudar o vosso sentido de voto, de certeza que não vou mudar, mas quero que fique claro, até porque já o tinha afirmado.
Relativamente ao que o Deputado Álvaro Amaro disse, e também um pouco na linha do que disse o Deputado Rui Marques, temos também uma apreciação muito positiva do trabalho feito pelas zonas de caça associativas. Infelizmente, não tenho o número actualizado, mas, neste momento, deve haver à volta de 1200, havendo já cerca de dois milhões de hectares neste regime. Nas reservas turísticas também há oitocentos e tal mil hectares, que têm contribuído de uma maneira impressionante para o desenvolvimento rural, sendo uma riqueza que está a ser criada em Portugal, sobretudo, em zonas desfavorecidas.

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Porém, também temos de olhar para outra realidade, que é a de outro tipo de caçadores, com menos recursos, que também têm de ter terrenos para caçar. O que eu disse aqui - e volto a reafirmar - é que há mecanismos de flexibilização na legislação que nos permitem, por um lado, poder "passar a gestão para" e, por outro, o Sr. Ministro da Agricultura, segundo proposta dos concelhos cinegéticos municipais, pode também aumentar a área dos 50%.
Além disso, estamos abertos, em sede de especialidade, para discutir uma alteração a este articulado, no sentido de, se no prazo de x anos (não interessa agora quantos, vamos ver), não avançar, não houver dinâmica por parte' das zonas de caça de interesse municipal, poderem avançar outras formas cinegéticas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo inscrições, damos por terminada a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 142/VII - Lei de bases gerais da caça.
Vamos passar à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 650/VII - Alteração ao estatuto dos eleitos locais, apresentado pelo PSD, PS e CDS-PP. Espero que o facto de ser apresentado por estes três grupos parlamentares facilite o debate e a redução do tempo necessário para o mesmo, que, como sabem, é de cinco minutos para cada grupo parlamentar.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pimenta Dias.

O Sr. Pimenta Dias (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A dignificação do exercício de cargos políticos ao nível do poder local democrático tem, a nosso ver, que ser alcançado no respeito e valorização da autonomia das autarquias locais e no reforço dos seus meios financeiros e das suas atribuições e competências. O projecto de lei que estamos a discutir não tem como objectivo contribuir para tal desiderato. Muito pelo contrário, visa tão-só satisfazer as reivindicações remuneratórias de certos eleitos locais que têm do exercício do poder local uma visão redutora e economicista.

O Sr. João Amaral (PCP): -Muito bem!

O Orador: - Os mesmos eleitos que têm do poder local uma ideia centralista e castradora do debate democrático e da livre expressão de todas as forças políticas representadas nos órgãos autárquicos, património maior das conquistas que povo português alcançou com 25 de Abril de 1974, tendo sido, recentemente, comemorado o seu 25.º aniversário.
A actividade desenvolvida pelos eleitos locais na resolução dos problemas das populações que representam não pode, pois, ser confundida com o exercício de uma actividade profissional regular. Pelo contrário, o exercício de funções autárquicas tem que ser uma dádiva permanente à causa das populações e do desenvolvimento local.
É por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que entendemos mal a presente iniciativa legislativa. É por isso que estamos frontalmente contra as propostas consignadas neste projecto de lei.
Presentemente, muitos Srs. Presidentes e Vereadores em regime de permanência já apresentam nas tesourarias das respectivas câmaras municipais as despesas de representação que realizam no exercício das respectivas funções, entrando estas nas despesas correntes dos municípios. Ora, o projecto de lei em discussão não acautela devidamente tal situação, podendo suceder que, no futuro, eleitos menos escrupulosos continuem a apresentar para pagamento tais despesas, paralelamente ao recebimento das despesas de representação preconizadas. Este é, para nós, um ponto essencial para a garantia da transparência na gestão autárquica.

O Sr. João Amaral (PCP): -Muito bem!

O Orador: - Acresce que os valores percentuais propostos são algo exagerados, tendo em linha de conta quer os parcos meios financeiros das autarquias quer os salários médios dos portugueses, nomeadamente dos servidores do Estado. Não se compreende, de resto, a diferença de tratamento entre os presidentes e os vereadores em regime de permanência, só podendo ser explicada à luz do acerbado presidencialismo que muitos dos nossos autarcas, infelizmente, cultivam.
Os autores deste projecto de lei dirão que os nossos eleitos locais são mal remunerados. Se essa é a verdadeira questão, então, Srs. Deputados, tenha-se a frontalidade e a coragem de propor o aumento dos vencimentos dos eleitos locais, em vez de se seguir uma via enviesada, procurando contornar a polémica e a indignação dos portugueses que tal proposta provocaria, apresentando a esta Câmara uma medida susceptível de gerar situações duvidosas no exercício do poder local.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Gouveia.

O Sr. António Gouveia (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 650/VII, que propõe a alteração ao estatuto dos eleitos locais, justifica-se para reparação de uma grande injustiça em relação aos autarcas em exclusividade de funções.
Se considerarmos que, no rigoroso regime de incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, todos aqueles que desempenham funções políticas têm despesas de representação, à excepção dos presidentes de câmaras e dos autarcas, e que, ultimamente, todos estes benefícios foram extensivos a chefes de gabinete, chefes de divisão, chefes de repartição, etc., facilmente se compreende que será uma injustiça se os autarcas, que também são titulares de cargos políticos e têm direito - e muito bem! - ao regime de incompatibilidades, não tiverem também direito às mesmas regalias que os outros agentes políticos que desenvolvem as mesmas funções.
Acresce ainda, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, na minha experiência como autarca, durante 17 anos, senti essa dificuldade, razão pela qual tenho agora força moral e experiência suficientes para dizer que, não desempenhando agora essas funções, é uma grande injustiça esse tratamento desigual para os presidentes de câmaras e todos os autarcas em regime de exclusividade em relação àqueles que desenvolvem a actividade política.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Se considerarmos ainda, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, nos últimos anos, têm vindo a ser transferidas muitas responsabilidades e novas competências - e bem! - para os municípios, sendo os presiden-

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tes de câmaras e os autarcas os responsáveis por essas mesmas responsabilidades e por esse mesmo acréscimo de competências, importa também que se faça justiça com a presente iniciativa legislativa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Faria.

O Sr. Júlio Faria (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Juntamente com colegas de outros grupos parlamentares e tendo em conta o facto de estarmos numa situação em comum, que é termos sido autarcas, entendemos avançar e apresentar esta iniciativa legislativa que tem como objectivo assegurar aos presidentes de câmaras e vereadores em regime de permanência a possibilidade de disporem do direito a abono para despesas de representação, à semelhança do que acontece com todos os outros titulares de cargos políticos. Efectivamente, não se compreende que, tendo estes autarcas, fruto do desempenho da sua função, significativos encargos com a mesma, não vejam assegurado por lei aquilo que está ao alcance de outros titulares de cargos políticos.
Por isso, pensamos que a Assembleia, ao aprovar, se assim for o caso, esta nossa iniciativa legislativa, vem reparar uma lacuna existente na lei ao assegurar o direito a abono para despesas de representação a esses titulares de cargos políticos.
Pensamos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que esta iniciativa legislativa acontece num momento oportuno. Procurando rebater o que disse o Sr. Deputado Pimenta Dias, na sua intervenção, ao afirmar que: "Se se constata que os autarcas têm um vencimento escasso, assuma-se, então, a coragem de apresentar uma iniciativa legislativa que vise reparar essa situação", devo referir que é nosso entendimento, é meu entendimento, que não são apenas os autarcas que hoje não dispõem de um vencimento significativo e compatível com aquilo que é o desempenho da sua função. Entendemos que esta matéria há-de ser tratada em momento oportuno por esta Assembleia não apenas em relação aos eleitos locais mas a outros titulares de cargos políticos. Neste momento, o que interessa é reparar esta lacuna no que diz respeito aos eleitos locais.
E, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr. Deputado Pimenta Dias, pensamos que também é correcto fazer a distinção entre os presidentes de câmaras e os vereadores em regime de permanência. Não se trata de assegurar qualquer presidencialismo mas, sim, de cumprir aquilo que decorre da própria lei. Ou seja, o presidente de câmara, fruto da sua intervenção, da sua qualidade de representante externo do município, tem, naturalmente, outro tipo de encargos e solicitações quer junto das mais diversas instâncias quer correspondente a iniciativas para as quais é convidado. Esta situação faz jus a essa distinção que nos parece absolutamente legítima.
Daí que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, consideremos que, com esta iniciativa legislativa, que dispõe de um grande consenso e de um amplo apoio nesta Assembleia - e pensamos mesmo que, quando avançamos para a Associação Nacional de Municípios Portugueses, esse apoio é total-, vimos assegurar aos eleitos locais em regime de permanência a possibilidade de, com maior dignidade, desempenharem as suas funções.
Por último, ainda em relação à intervenção do Sr. Deputado Pimenta Dias, quando diz que pode haver uma situação em que o eleito local vem dispor desta verba para despesas de representação e continua a apresentar à sua autarquia verbas correspondentes, gostaria de referir que cremos que não haverá eleitos locais que assim procedam. De qualquer forma, se assim for, lá está a lei para clarificar essa situação.
Pensamos que devemos assegurar que os eleitos locais em regime de permanência possam dispor deste apoio com rigor, com transparência e com direito a uma igualdade de tratamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Marques.

O Sr. Rui Marques (CDS-PP): - Sr. Presidente, está quase tudo dito, gostaria apenas de dizer que a Associação Nacional de Municípios Portugueses vem reclamando, desde há longa data, esta compensação aos autarcas que - queria que ficasse claro - não é uma remuneração, não é uma regalia, é tão-só o pagamento de despesas de representação.
Não podia deixar de notar que os subscritores deste projecto de lei são quase todos ex-autarcas que desenvolveram actividade nos executivos municipais e que hoje exercem actividade parlamentar; portanto, conhecem bem a actividade autárquica, portanto muito próximo da população. Atrever-me-ia, até, a dizer que, provavelmente, de todos os cargos políticos são os autarcas aqueles que mais despesas de representação têm e, por isso, penso que esta medida é muito justa.
Foi também levantada a questão da diferenciação entre presidentes de câmaras e vereadores. Parece-me que esta questão se torna evidente, bastando para isso olhar para o que se passa aqui, na Assembleia, ao nível dos próprios Deputados, em que há diferenças, há escalonamentos; são as regras naturais da vida. É assim que as coisas se processam, e nada temos a opor.
Em suma, queria dizer que estamos de acordo com este projecto de lei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que está terminado o debate.

A próxima sessão plenária realiza-se amanhã, quarta-feira, dia 5 de Maio, a partir das 15 horas, com período de antes da ordem do dia e do período da ordem do dia vai constar a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 241/VII-Regula a utilização de meios técnicos de controlo à distância para fiscalização do cumprimento da obrigação de permanência na habitação prevista no artigo 201.º do Código do Processo Penal, a discussão, também na generalidade, da proposta de lei n.º 256/VII - Altera o Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de Outubro, que aprovou o regime jurídico de protecção às vítimas de crimes violentos e, ainda, a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 225/VII - Autoriza o Governo a rever o Código de Processo do Trabalho.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 40 minutos.

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Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

José Manuel de Medeiros Ferreira.
Sérgio Carlos Branco Banos e Silva.

Partido Social Democrata (PSD):

António Edmundo Barbosa Montalvão Machado.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.

Deputado independente:

José Mário de Lemos Damião.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Albino Gonçalves da Costa.
António Bento da Silva Galamba.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.

Partido Social Democrata (PSD):

António Paulo Martins Pereira Coelho.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Augusto Torres Boucinha.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Isabel Maria de Almeida e Castro.

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