O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 3229

Quarta-feira, 26 de Maio de 1999

I Série - Número 90

VII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 25 DE MAIO DE 1999

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos

Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 40 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei n.ºs 278 e 279/VII, da proposta de resolução n.º 144/VII e dos projectos de lei n.ºs 685 e 686/VII.
A Câmara apreciou, na generalidade, o projecto de lei n.º 664/VII - Adopta medidas de combate à propagação de doenças infecto-contagiosas em meio prisional (Os Verdes), que foi aprovado. Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Aires de Carvalho (PS), Guilherme Silva (PSD), José Niza (PS), António Filipe (PCP), Nelson Baltazar (PS), Jorge Roque Cunha e Francisco José Martins (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 40 minutos.

Página 3230

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto Bernardes Costa.
Alberto de Sousa Martins.
Aníbal Marcelino Gouveia.
António Alves Cardoso.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António de Almeida Santos.
António Manuel Carmo Saleiro.
António Rui Esteves Solheiro.
Arlindo Cipriano Oliveira.
Armando Jorge Paulino Domingos.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Casimiro Francisco Ramos.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Francisco Manuel Pepino Fonenga.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Rosa do Egipto.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Maria Teixeira Dias.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira.
Júlio da Piedade Nunes Henriques.
Júlio Meirinhos Santanas.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís António do Rosário Veríssimo.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Eduarda Bento Alves Ferronha.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge Lúcio Arsénio.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Raimundo Pedro Narciso.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel dos Santos Namorado.
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos.

Partido Social Democrata (PSD):

Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
António Costa Rodrigues.
António d'Orey Capucho.
António de Carvalho Martins.
António dos Santos Aguiar Gouveia.
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado.
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
Arménio dos Santos.
Carlos Eugénio Pereira de Brito.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.

Página 3231

Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Filomena Maria Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Carlos Barreiras Duarte.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Póvoas.
José de Almeida Cesário.
José Guilherme Reis Leite.
José Júlio Carvalho Ribeiro.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Rezende Moreira da Silva.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Joaquim Barata Frexes.
Manuel Maria Moreira.
Maria de Lourdes Lara Teixeira.
Maria de Lurdes Borges Póvoa Pombo Costa.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Vasco Manuel Henriques Cunha.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

António Almeida Figueiredo Barbosa Pombeiro.
António Carlos Brochado de Sousa Pedras.
Augusto Torres Boucinha.
Fernando José de Moura e Silva.
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Pedro José Del Negro Feist.
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura.
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

Alexandrino Augusto Saldanha.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
António Luís Pimenta Dias.
Bernardino José Torrão Soares.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Joaquim Manuel da Fonseca Matias.
Lino António Marques de Carvalho.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Ecologista Os Verdes (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

Deputado independente:

José Mário de Lemos Damião.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta do expediente entrado na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa e foram admitidos, os seguintes diplomas: proposta de lei n.º 278/VII - Estabelece o regime jurídico da publicação ou difusão de sondagens e inquéritos de opinião os órgãos de comunicação social, que baixou à 1.ª Comissão; proposta de lei n.º 279/VII - Autoriza o Governo a legislar no âmbito do desenvolvimento da Lei de Bases do Ordenamento do Território e do Urbanismo, em matéria de atribuições das autarquias locais no que respeita ao regime de licenciamento municipal de loteamentos urbanos e obras de urbanização e de obras particulares; proposta de resolução n.º 144/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção Europeia sobre a nacionalidade, aberta à assinatura em Estrasburgo, em 26 de Novembro de 1997, que baixou às 1.ª e 2.ª Comissões; proposta de resolução n.º 145/VII - Aprova, para ratificação, a Convenção entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República da Índia para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre rendimento, assinado em Lisboa, em 11 de Setembro de 1998, que baixou às 2.ª e 5.ª Comissões; projecto de lei n.º 685/VII - Criação da comarca da Batalha (CDS-PP), que baixou à 1.ª Comissão; e projecto de lei n.º 686/VII - Cria o Observatório da Justiça (PCP), que baixou à 1.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem do dia de hoje que será completamente

Página 3232

preenchido com a discussão do projecto de lei n.º 664/VII - Adopta medidas de combate à propagação de doenças infecto-contagiosas em meio prisional (Os Verdes), que é um agendamento potestativo.
Para introduzir o debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr Presidente, Srs. Deputados: A realidade das doenças infecto-contagiosas em meio prisional é profundamente dramática. A sua incidência é muito elevada e a tendência evolutiva é para um aumento contínuo deste drama.
Essa realidade é conhecida, foi seguramente objecto de confirmação por parte dos Srs. Deputados que durante a Legislatura tiveram oportunidade de se deslocar a um número significativo de estabelecimentos prisionais, designadamente por via de diferentes comissões parlamentares e por Os Verdes tem sido, de facto, confirmada nas diferentes procuras que temos feito para conhecer esta tendência.
Mas foi o relatório do Sr. Provedor de Justiça, em 1996, sobre o meio prisional, que veio fazer um estudo sistematizado sobre a matéria e constitui um instrumento de trabalho fundamental para quem sobre a mesma pretenda intervir. Nesse relatório faz-se a seguinte afirmação: "O panorama das doenças infecciosas em meio prisional é, neste momento, de tal forma preocupante que exige a tomada de medidas imediatas, sob pena de se comprometer de forma irremediável a saúde e, em última análise, a vida da população reclusa e de originar graves riscos para a saúde pública".
Já este ano, em 1999, o novo relatório do Sr. Provedor de Justiça sobre o meio prisional afirma o seguinte: "São assustadores, Sr. Ministro, os números associados às doenças infecciosas em meio prisional e é ainda mais preocupante a evolução que os mesmos registam quando comparados com os recolhidos há dois anos e meio atrás".
Significa que se a situação era muito grave em 1996 em 1999 ela é ainda mais dramática. Afinal, se cerca de 25% dos reclusos estão infectados por hepatites víricas, se cerca de 11% dos reclusos são seropositivos, a situação é, de facto, aterradora e se a tuberculose mais que duplicou em dois anos e meio, a situação é, de facto, alarmante - e estamos a falar de casos declarados, porque se formos aos não declarados, então, o número dispara por aí acima.
Ora, parece-nos que a resposta de intervenção nesta matéria não tem sido adequada à situação dramática existente. Desde logo, a resposta do Sr. Ministro ao primeiro relatório da Provedoria de Justiça apresentou uma certa desculpabilização ou uma adaptação quase de inevitabilidade à realidade existente. Já tivemos também oportunidade de questionar o Sr. Ministro da Justiça sobre a matéria aqui, no Plenário, e a resposta ficou muito aquém do que seria desejável e possível em termos de medidas a adoptar. Parece-nos que poderia ter sido feito mais, porque é preciso pôr um travão rápido nesta evolução galopante de casos de reclusos infectados.
Foi perante esta realidade, esta efectiva preocupação da incidência e tendência evolutiva das doenças infecciosas em meio prisional, que Os Verdes entenderam que não é possível esperar mais. É preciso agir no sentido de procurar inverter esta tendência evolutiva, de minimizar rapidamente a situação e de procurar erradicar, a longo prazo, a incidência das doenças infecciosas em meio prisional.
Foi no sentido de contribuir com seriedade para este objectivo que o Grupo Parlamentar de Os Verdes apresentou o projecto de lei agora em discussão. E foi pela urgência da matéria também que entendemos usar este projecto de lei como nosso agendamento potestativo, garantindo assim a sua discussão nesta Legislatura.
Este projecto de lei adopta um conjunto de medidas de combate à propagação de doenças infecto-contagiosas em meio prisional, com três componentes fundamentais: o rastreio, o tratamento e a prevenção.
Propõe-se, assim, que todos os estabelecimentos prisionais ofereçam periodicamente a todos os reclusos a possibilidade de realização de testes de rastreio.
Na verdade, esta hoje não é uma prática na maioria das penitenciárias do País. É que a maior parte do estabelecimentos prisionais só faz o rastreio aquando da entrada do recluso na prisão; outros só o fazem a grupos considerados de risco e há até os que, pura e simplesmente, não os fazem.
Ora, se considerarmos que o ingresso em estabelecimento prisional é por si só um factor de risco, dada a realidade da incidência de doenças infecciosas nos mesmos e dadas as características existentes na maior partes das prisões, onde os facilitismos de contágio ganham proporções mais significativas, então depressa se percebe a necessidade de alargar a todas as penitenciárias e a todos os reclusos a realização dos testes de despistagem periódicos.
Agora o que se salvaguarda é que o rastreio de doenças de carácter não epidémico, como ao VIH, só possa acontecer com o consentimento do recluso, de modo a não cometer qualquer violação dos seus direitos. Este princípio pressupõe, obviamente, a informação do recluso sobre os rastreios está a fazer, o que temos algumas dúvidas que se faça em todas as penitenciárias quando é retirado o sangue para análises, e também a informação ao recluso da utilidade e benefício na realização dos testes.
Em relação ao resultado dos testes, garante-se o princípio da confidencialidade do acto médico, de modo a não proceder a qualquer violação dos direitos do recluso. Alarga-se essa confidencialidade à direcção do estabelecimento prisional quando razões de ordem estritamente médica indicarem que há grave risco de perigo de contágio aos restantes membros da comunidade prisional, o que tem ser sempre devidamente fundamentado.
Mesmo quando se aplicar esta excepção procura envolver-se o recluso nessa decisão, de alargar a confidencialidade à direcção da prisão, requerendo o consentimento do mesmo.
No fundo, a informação à direcção do estabelecimento prisional acerca estado patológico do recluso deve ser uma verdadeira excepção, quando, na verdade a sensação que dá é que em muitos estabelecimentos prisionais constituiu uma regra. É que quando o perigo de contágio é grande, ou quando o estado da doença é avançado, o recluso requer cuidados médicos intensivos e, por isso, deve ser transferido para onde possa receber esses cuidados. Por outro lado, o que as direcções das penitenciárias devem fazer é tomar medidas de cuidados de higiene e segurança na generalidade dos comportamentos na prisão e, portanto, tomar precauções gerais em relação a toda a comunidade prisional.
Propõe-se que os resultados dos testes sejam transmitidos ao recluso infectado por pessoal médico, de modo a

Página 3233

garantir um imediato acompanhamento adequado à situação psicológica e patológica do recluso. Portanto, entendemos que o acompanhamento psicológico é também muito importante, o que, por norma, não acontece.
Para além disso, garante-se expressamente que o recluso infectado tenha acesso aos mesmos tratamentos que teria em meio livre com a possibilidade, por isso, de ter acesso aos cuidados de saúde necessários ao seu estado de doença e propõe-se que todos os estabelecimentos prisionais adoptem, com carácter de urgência, medidas de prevenção adequadas a evitar facilitismos de contágio, de modo a travar o alastramento da incidência de doenças infecto-contagiosas.
Essas medidas preventivas devem ser gratuitas e dirigidas para os reclusos e também para o pessoal trabalhador nas prisões, indicando-se, expressamente, a informação regular e esclarecedora sobre os meios de prevenção, comportamentos de risco, formas de propagação de doenças, consequências de comportamentos de risco, de modo compreensível para todos, tendo em conta o grau de alfabetização dos visados.
Indica-se a generalização de programas de vacinação, o que não acontece em todos os estabelecimentos prisionais e fica, na generalidade, muito aquém do desejável a distribuição regular de preservativos a todos os reclusos, garantindo a sua privacidade, e não o seu acesso apenas a pedido expresso, o que é um factor de inibição de uso do preservativo e, ainda, a distribuição regular de material de desinfecção, garantindo a sua suficiência.
Garantem-se, ainda, outras formas de prevenção, que se revelem eficazes, ou seja, todas as que venham contribuir para a diminuição da incidência de doenças infecciosas e que se revelem positivas devem ser aplicadas e generalizadas a todos os estabelecimentos prisionais.
É aqui que Os Verdes abrem a porta à possibilidade de se aferir do alargamento do projecto de troca de seringas em meio livre, que tem sido reconhecidamente positivo, ao meio prisional.
Era interessante que se pudesse avançar com um projecto-piloto nesse sentido, de modo a aferir do seu resultado, porque não é possível alhearmo-nos do facto de a maior parte dos reclusos ser toxicodependente de drogas injectáveis. E não se trataria, como já o afirmou o Ministro Sócrates, de um programa requintado; tratar-se-ia de jogar com todos os meios eficazes para combater as doenças infecciosas em meio prisional.
Estabelece-se, entretanto, o princípio da não discriminação, inibindo-se formas de segregação pelo facto de se suspeitar ou tratar de recluso infectado. A um recluso infectado deve dar-se o acompanhamento médico adequado, o que pode, obviamente, implicar medidas restritivas de coabitação e convívio normal, o que tem de ser sempre devidamente fundamentado pelo pessoal médico. Propomos que em caso de medidas restritivas de coabitação se recorra sempre ao internamento hospitalar e não ao isolamento em cela.
Cremos que estas medidas de prevenção propostas, aplicadas conjuntamente, em todos os estabelecimentos prisionais, devidamente coordenadas pela Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, levará à diminuição da incidência de doenças infecciosas em meio prisional a médio e a longo prazos. No seu conjunto serão um passo positivo para a inversão da tendência, hoje de aumento, das doenças infecciosas.
É preciso não esquecer que actuar em relação às doenças infecciosas em meio prisional é actuar também no meio livre, na medida em que muitos são os contactos dos reclusos fora das prisões, em circunstâncias diversas, e por isso é contribuir e agir dentro do estabelecimento onde se cumpre a medida privativa de liberdade, mas também fora dele ou com reflexos fora dele.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Porque consideramos que a Assembleia da República deve acompanhar esta matéria, de modo mais regular e directo, propomos que os estabelecimentos prisionais apresentem anualmente um relatório indicativo do cumprimento das medidas agora propostas e do resultado dessa aplicação, que o dirijam à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e que esta, então, apresente um relatório anual global, dando conta da situação a nível nacional à Assembleia da República.
Cremos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que este é um contributo sério que Os Verdes dão para o combate à propagação de doenças infecto-contagiosas em meio prisional, que, sinceramente, desejamos ver concretizado nas prisões portuguesas como salvaguarda de um verdadeiro problema de saúde pública.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto, Aires de Carvalho e Guilherme Silva.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, o meu pedido de esclarecimento pretende apenas constatar, ao fim e ao cabo, que o relatório especial que o Provedor de Justiça apresentou à Assembleia da República, em 1996, caiu, no que respeita ao Governo, em saco roto.
Pela intervenção da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia fiquei a saber que nenhumas medidas formam tomadas. Aliás, quando li o projecto de lei de Os Verdes pareceu-me que nele estavam contidas medidas elementares, não porque fossem despiciendas mas, sim, porque já deveriam ter sido tomadas.
Portanto, a situação que temos, neste momento, é de total inoperância do Governo ou indiferença - o que seria pior! - perante um relatório que é altamente preocupante e que já fez três anos. Ou seja, as medidas elementares quer de prevenção quer de controlo da propagação das doenças infecto-contagiosas em meio prisional não foram tomadas.
Quero, ainda, constatar aqui o seguinte: o sistema prisional tem, entre outras funções, a de promover a reinserção social do preso na vida activa. Ora, era bom que começássemos este debate por pensar que nem sequer somos capazes de nas prisões portuguesas promover uma morte digna para os que estão doentes.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, em primeiro lugar, quero agradecer-lhe as considerações que fez.

Página 3234

Gostaria de referir que, na nossa perspectiva, as medidas tomadas pelo Governo, dada a gravidade da situação que se vive relativamente à evolução das doenças infecto-contagiosas em meio prisional - que é muito maior do que cá fora e percebe-se bem porquê, pois estamos a falar de um meio muito específico, com características muito específicas -, ficaram muito aquém daquelas que seriam as necessidades e até as possibilidades de actuar nesta matéria. Isto parece-nos evidente!
Relativamente à Circular n.º 9/97, de Novembro, que procurou garantir o fácil acesso dos reclusos aos preservativos e a material desinfectante a lixívia, devo dizer que essa medida não é cumprida em muitos dos estabelecimentos prisionais, não existindo, sequer, fiscalização das poucas determinações que foram tomadas nesta matéria.
Ora, isto, na nossa perspectiva, é preocupante como o é a realidade que se vive nos estabelecimentos prisionais e é sobre ela que gostaríamos de agir. Portanto, o nosso grande objectivo é pegar nestas medidas de prevenção, nesta forma de tratamento e alargá-la a todos os estabelecimentos prisionais e a todos os reclusos no sentido de, a médio prazo, pelo menos, termos uma resposta de inversão da tendência hoje evolutiva, amanhã, esperemos, de diminuição de incidência das doenças infecto-contagiosas.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Aires de Carvalho.

O Sr. Aires de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, antes de mais, quero dizer à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto que tenho em meu poder um exemplar de algumas cópias da Provedoria de Justiça, nomeadamente do relatório de 1998, que me parece que a Sr.ª Deputada não leu e, assim sendo, eu farei com que cheguem a essa bancada.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Se tiverem alguma utilidade!

O Orador: - Tem, tem; vai ver que tem!
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, quero, antes de mais, cumprimentá-la pela preocupação manifestada sobre a necessidade de adopção de medidas de combate à propagação de doenças infecto-contagiosas nos meios prisionais - aliás, quero dizer-lhe que aceito como séria a preocupação de V. Ex.ª da mesma maneira que são sérias todas as iniciativas tomadas pelo Governo nesta matéria.
Cumprimento-a, porque desde há muito tempo que entendo que neste assunto deve ser feito um esforço nacional, colectivo, amplamente consensual para o qual todos e quaisquer contributos serão manifestamente importantes.
No entanto, não posso, simultaneamente, deixar de manifestar alguma desilusão quer quanto a alguma fraseologia utilizada na "Exposição de motivos" deste projecto de lei quer quanto a alguma falta de perspectiva e de inovação sobre os caminhos a percorrer.
A verdade é que este projecto de lei nada veio acrescentar, quanto a nós, àquilo que está sendo feito. Senão, vejamos: o relatório de 1996 da Provedoria de Justiça refere o seguinte sobre este assunto: "O panorama das doenças infecciosas em meio prisional é, neste momento, de tal forma preocupante que exige a tomada de medidas imediatas, sob pena de se comprometer de forma irremediável a saúde e, em última análise, a vida da população reclusa e de originar graves riscos para a saúde pública." Aliás, isto está até de acordo com aquilo que a Sr.ª Deputada, ainda há pouco, referiu.
Mas a verdade é que, perante esta recomendação e com base numa situação herdada, este Governo não baixou os braços, tendo mesmo insistido neste combate, através da implementação de medidas concretas e objectivas. Isso mesmo está transcrito num outro relatório da Provedoria de Justiça de 1998, que passo a citar:…

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Tem de lê-lo todo!

O Orador: - Essa sugestão serve para todas as bancadas!
Como estava a dizer, um outro relatório de 1998 da Provedoria de Justiça, que passo a citar, refere o seguinte: "Reconheço, Sr. Ministro, o esforço realizado, nestes dois anos e meio, na área da saúde nas prisões, estruturas ao nível das instalações médicas, equipamentos clínicos, campanhas de sensibilização para a promoção da saúde em meio prisional e programas de apoio a toxicodependentes, desenvolveram-se um pouco por toda a parte." É pena que V. Ex.ª, Sr.ª Deputada, sobre isto também tivesse feito tábua rasa.
Mas todo este esforço está, aliás, bem identificado nas folhas 5, 6 e 7 do relatório da Comissão de Saúde.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - A Sr.ª Deputada preferiu, antes, invocar outra fase do relatório da Provedoria de Justiça de 1998, onde, embora não imputando culpas ao Governo, identifica, no entanto, uma evolução preocupante dos números, quando em comparação com os de há dois anos e meio atrás.
Não é, contudo, minha intenção defender aqui a inevitabilidade de uma realidade dramática que, hoje, efectivamente, existe.
No âmbito de um contributo sério que será sempre bem-vindo, há, no entanto, na minha perspectiva, que elencar outros factores que pesam.
O primeiro é a manutenção da tendência de crescimento da população prisional.
O segundo é o de a contaminação não ser apenas feita na prisão. Quantos e quantos é que, à entrada, já não estarão infectados?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço que termine.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Mas estes factores não foram referidos na sua intervenção, pelo que gostaria que os comentasse.
Da mesma forma, gostaria de questioná-la sobre se os autores deste projecto de lei reconhecem ou não o esforço do Governo nesta matéria?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

Página 3235

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Aires de Carvalho, antes de mais, agradeço a questão que colocou e gostava de tecer dois ou três comentários, em jeito de resposta.
O Sr. Deputado considera que este projecto de lei não traz nada de novo. Ora, se todas as medidas de prevenção estão estabelecidas em todos os estabelecimentos prisionais e direccionadas para todos os reclusos e para todo o pessoal trabalhador nas prisões, conforme prevê e deseja o nosso projecto de lei, então, Sr. Deputado, de facto, temos de inovar muito mais e de nos preocupar relativamente ao que vamos fazer e que outras medidas vamos tomar quanto à incidência de doenças infecto-contagiosas em meio prisional. O Sr. Deputado não acredita na prevenção. Será isso?
Quanto às medidas existentes e se elas existem, Sr. Deputado, de facto, há estabelecimentos prisionais onde se distribuem preservativos e onde se distribui material desinfectante. Mas, Sr. Deputado, isto significa que é possível fazê-lo! Se estas situações existem, significa que é possível fazê-lo e que tem resultados positivos, como o Sr. Deputado sabe. Mas, então, o que é importante é conjugar todos estes meios de prevenção em todos os estabelecimentos prisionais e destiná-los a todos os reclusos. E se o Sr. Deputado conhece o sistema prisional em Portugal e os estabelecimentos prisionais portugueses, sabe que isso não existe.
Mas vamos continuar a citar o valioso relatório do Sr. Provedor de Justiça, que, de facto, é um instrumento de trabalho muito importante relativamente a esta matéria, só para dar alguns exemplos de estabelecimentos prisionais que não efectuam rastreio ao VIH: estabelecimentos prisionais do Funchal, de Pinheiro da Cruz, de Aveiro, de Viana do Castelo, de Portimão, etc. E dou-lhe também alguns exemplos de estabelecimentos prisionais que não fazem distribuição de material desinfectante: Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus, Estabelecimento Prisional Regional de Aveiro, estabelecimentos prisionais de Bragança, de Chaves, de Torres Novas, de Viana do Castelo, etc. A vacinação da hepatite B, por exemplo, em muitos estabelecimentos prisionais não é administrada a presos preventivos e a reclusos condenados a menos de 6 meses de prisão, porque consideram que não é tempo suficiente para estabelecer as três doses.
Ora, Sr. Deputado, aquilo que o nosso projecto de lei vem fazer é dar força de lei e um contributo extremamente importante no sentido de que estas medidas preventivas, o rastreio e o tratamento sejam assegurados a todos os reclusos, em todos os estabelecimentos prisionais. Isso é importante!
Portanto, em relação a esta questão, basta de medidas esporádicas, basta de pouco financiamento aqui e ali! Vamos desenvolver, com determinação, uma acção séria relativamente àquela que é a realidade hoje existente em Portugal. E, repito, mais uma vez, incluindo todos os reclusos, em todos os estabelecimentos prisionais.

O Sr. Presidente: - Para formular o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, a minha primeira referência vai para a constatação da arrogante ausência do Governo,…

O Sr. José Barradas (PS): - Até estava admirado!

O Orador: - … que a uma matéria da delicadeza e da importância desta, que é objecto da iniciativa de Os Verdes, não deu a menor atenção. Aliás, aquando da apresentação do projecto de lei n.º 224/VII, do PSD, que este vem complementar, e que tem a ver com os núcleos de acompanhamento médico ao toxicodependente recluso, o qual está a ser apreciado na especialidade, já então o Governo se manteve ausente. Quero, pois, lamentar esse facto.
A minha segunda referência serve para registar aqui algo de estranho. Há pouco, o Sr. Deputado Aires de Carvalho inscreveu-se para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada e a verdade é que fez uma intervenção. É curioso que trazia já o seu pedido de esclarecimentos escrito, o que revela alguma má consciência,…

Protestos do PS.

… alguma previsão do que ia ser dito. E o Sr. Deputado Aires de Carvalho lembrou, inclusivamente, à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto que não teria lido o relatório do Sr. Provedor.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Li, mas não me serviu de nada!

O Orador: - Parece que o Sr. Deputado é que não terá lido esse relatório, o qual vem transcrito, em parte, no projecto de lei que estamos a debater, onde o Sr. Provedor, dois anos e tal passados sobre o anterior relatório, refere, de forma clara, o seguinte: "São assustadores, Sr. Ministro, os números associados às doenças infecciosas em meio prisional e ainda mais preocupante a evolução que os mesmos registam, quando comparados com os recolhidos há dois anos e meio atrás". Ou seja, o Sr. Provedor volta a chamar a atenção para o agravamento da situação e para a ausência de medidas adequadas a travar esse agravamento por parte do Governo.

O Sr. Aires de Carvalho (PS): - Isso não consta do relatório!

O Orador: - Não consta, porque V. Ex.ª não sabe ver o sentido integral do relatório. Não basta ler, no relatório, apenas as partes em que o Sr. Provedor, com isenção, como não podia deixar de ser, tendo em conta a figura que representa, faz referência a esta ou àquela medida, porque esta é a conclusão que se pode retirar. Portanto, Sr. Deputado, faça a leitura integral e não apenas daquilo que lhe agrada.

Vozes do PS: - Afinal, para quem é a pergunta?

O Orador: - A questão que quero colocar à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia é a seguinte: a Sr.ª Deputada sabe que há um projecto de lei, apresentado pelo PSD, sobre núcleos de acompanhamento médico aos toxicodependentes reclusos, o qual está a ser apreciado na especialidade e vai ser votado em breve, penso eu, em votação final global, pelo que gostaria de saber qual a posição do seu partido sobre esse diploma, designadamente se considera ou não que são duas iniciativas conjugadas, e que este que agora aqui apresentam vem, digamos, numa linha complementar e correspondendo

Página 3236

bem de perto às questões que o Sr. Provedor de Justiça suscita e às soluções para que aponta.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, antes de mais, agradeço a questão colocada.
Em primeiro lugar, gostaria de referir, como o fiz na minha intervenção, que é verdade e que não podemos esquecer que a maior parte dos reclusos são toxicodependentes. Aliás, as medidas preventivas que avançamos no nosso projecto de lei também têm isso em conta e cremos que seria necessário usar de todas as formas que se aferissem como positivas no sentido de atacar esta tendência evolutiva da incidência das doenças infecto-contagiosas em meio prisional.
Portanto, é uma realidade que não podemos esquecer, muito pelo contrário temos de a ter em conta, no sentido de actuar correctamente sobre ela.
Relativamente ao projecto de lei apresentado pelo PSD, que está agora a ser discutido, na especialidade, na Comissão Eventual para o Acompanhamento e a Avaliação da Situação da Toxicodependência, do Consumo e do Tráfico de Droga, consideramos que todas as medidas que venham actuar a este nível são, de facto, positivas, se bem que os dois projectos de lei tenham um âmbito um pouco diferente, pois o do PSD vai mais no sentido de atingir directamente as medidas de tratamento aos toxicodependentes e o nosso está direccionado concretamente para as doenças infecciosas em meio prisional, embora esteja muito ligado, obviamente, à realidade da toxicodependência nas prisões.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero informar que se encontram a assistir aos nossos trabalhos um grupo de 18 alunos do Curso de Técnicos Administrativos de Lisboa, um grupo de 45 alunos da Escola EB 2/3 de Rebordosa e um grupo de 45 alunos da Escola Básica 2/3 de Vale de Milhaços. Peço, para todos eles, uma saudação muito carinhosa.

Aplausos gerais, de pé.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, começo por me dirigir ao Sr. Deputado Aires de Carvalho, que está preocupado com o facto de a bancada de Os Verdes só ter acordado agora, para lhe dizer que o Sr. Deputado está ainda a dormir e parece-me que é isso mesmo que temos vindo a apreciar, ou seja, que, de facto, está tudo a dormir.
Mas quero dizer-lhe mais, Sr. Deputado: conheço o relatório e o facto de o conhecer em nada me tranquiliza! O Sr. Deputado referiu o relatório de 1998 como se ele contivesse aquilo que todos desejávamos que contivesse,…

O Sr. José Barradas (PS): - Não foi isso que ele disse!

A Oradora: - … ou seja, que, em 1996, houve um conjunto de alertas, mas o Governo, entretanto, cheio de zelo, adoptou um conjunto de medidas e o Sr. Provedor, dois anos mais tarde, vem dizer que a situação melhorou grandemente, quando não é isso que sucede.

O Sr. Aires de Carvalho (PS): - Não foi isso que disse!

A Oradora: - Esta minha curta intervenção destina-se a dizer três coisas que, do meu ponto de vista, são importantes.
Em primeiro lugar, estamos a discutir as consequências de causas que já há muito mais de 10 anos deveriam estar a ser devidamente tratadas.
A população prisional alterou-se substancialmente, como todos sabemos, pelo que o sistema prisional e, concretamente, os espaços físicos têm de ser alterados em função dessa alteração da população prisional. E é muito diferente ter presos que adoecem e ter doentes presos. Esta é que é a questão! É que, neste momento, uma grande parte da população prisional é uma população doente e é preciso saber se o sistema prisional tem capacidade para, com dignidade, ter uma população doente. E não são presos que adoecem, como sucedia antigamente, quando partiam uma perna ou um braço, ou tinham uma apendicite e iam para o Hospital de Caxias. Não! É uma população que entra para os estabelecimentos prisionais doente! Aliás, muita dela entra doente e até nunca fez um exame médico, nem tem um boletim de saúde! E é este universo que, depois, num círculo fechado, tem um efeito de propagação muito grande.
Quero dizer que só me surpreende o projecto de Os Verdes, porque considero que as medidas propostas eram medidas básicas que o Governo já deveria ter tomado. Não quero dizer que já devessem estar hoje, todas, em aplicação, com o mesmo nível, em todos os estabelecimentos prisionais, mas deviam constituir ou fazer parte de uma circular aos serviços.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É uma questão administrativa!

A Oradora: - Mas, como não há circular, nem serviços, nem quem faça circular os serviços, temos de aceitar que esta iniciativa de Os Verdes é uma iniciativa humanitária que deve merecer a maior atenção.
Assim, deixo também aqui uma questão que penso que mereceria alguma meditação, na análise do projecto de Os Verdes, que é a seguinte: como a população prisional é uma população doente, como estamos a pensar em doentes presos e não em presos que adoecem, o que é uma realidade substancialmente diferente, duvido que alguma vez o sistema prisional tenha capacidade para lhe dar o tratamento devido. Por isso, pergunto o que é que aconteceu, em termos estatísticos, a uma medida que foi aqui aprovada, a qual previa que os doentes com SIDA fossem para casa.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Em fase terminal!

A Oradora: - É que é isso que deveria suceder! Em fase terminal, esses doentes deveriam ir para casa! Ora, visitei recentemente o Hospital de Caxias e esses doentes estão lá!

Página 3237

Mas há ainda outro aspecto que os Srs. Deputados têm de ponderar: até hoje ainda não se encontrou cura para a SIDA mas existem medicamentos que permitem que um doente com SIDA dure mais anos. Isto significa que eles estão naquele calvário, num hospital que não está destinado a esse fim, durante mais tempo. Portanto, é preciso pôr o sistema de saúde ao serviço dos doentes que estão presos - não é dos presos que adoecem, é dos doentes que estão presos - e isso significa, por exemplo, tratar presos toxicodependentes em comunidades terapêuticas. Porque não? Quer dizer, este também é um exercício de imaginação que era suposto o Governo fazer!
Há, pois, aqui medidas que penso que obrigariam àquilo de que o Dr. Laborinho Lúcio ainda recentemente falou, de uma forma que considero muito inteligente, e que consiste em dizer que não basta uma simples articulação entre o sistema de saúde e o sistema prisional. Esta não é uma questão metodológica, é uma questão ideológica! No momento em que a população prisional está doente, o sistema de saúde tem de estar integrado numa articulação com o sistema prisional que vai mais longe do que uma simples metodologia.
Como tal, gostaria só de deixar aqui esta recomendação no sentido de se analisar, na especialidade, porque penso que algumas situações teriam claramente de ser tratadas fora dos estabelecimentos prisionais e de dizer que só por uma total inoperância do Governo é que se justifica que, neste momento, esta Câmara esteja a decidir sobre uma matéria que já há muito deveria estar a ser aplicada.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Niza.

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, daqui a pouco farei uma intervenção um pouco mais exaustiva em relação a esta questão, mas quero, desde já, referir alguns aspectos, até porque o exagero de afirmações, tal como as que fez, não é o seu estilo.
A Sr.ª Deputada disse que o relatório do Provedor de Justiça de 1996 caiu em "saco roto" e eu vou-lhe demonstrar, daqui a pouco, que caiu num grande "saco", onde se gastou muito dinheiro e se fez muita coisa, para o que lhe vou falar através da voz do Sr. Provedor de Justiça, não da minha.
Esta é uma discussão séria, foram aqui focados aspectos sérios e vou-lhe colocar uma questão que talvez não tenha saída fácil em termos de soluções à vista. Estamos aqui a falar dos reclusos doentes como se tudo isso começasse na prisão. Acontece que há trabalhos feitos sobre este assunto e um deles, feito pelos serviços de saúde dos serviços prisionais, dá-nos um dado que me surpreendeu bastante, que é o seguinte: no primeiro trimestre de 1997, nos tais rastreios que já se estão a fazer, por rotina, nas prisões, 68,4% das pessoas que entraram para a prisão para cumprir penas tinham hepatites B e C. Há, portanto, três momentos a considerar: o de antes da prisão, o do cumprimento da pena e o da saída.
Aqui, há outro aspecto importante que, às vezes, tenho a impressão de que também não é tido em conta, que é a questão da mobilidade prisional. Em cada ano que passa, embora as prisões estejam superlotadas, a renovação da população prisional é imensa. Por exemplo, em 1997, entraram 8000 e tal cidadãos para cumprir penas e saíram quase 7000. Isto passou-se num ano!
Considerando esta alta rotatividade na mobilidade nas prisões e considerando que as pessoas estão doentes antes, podem estar doentes durante e vão estar doentes depois, há que conciliar os dois sistemas que, de acordo com a Constituição, garantem aos cidadãos a saúde, que são, por um lado, o Ministério da Saúde, que também está dentro das prisões, mas está, sobretudo, fora das mesmas, e o Ministério da Justiça, com os serviços que tem vindo a organizar.
Portanto, peço-lhe que faça alguma reflexão sobre esta questão, porque, de facto, trata-se de um aspecto real mas que muitas vezes é ignorado.

Vozes do PS: - Muito bem.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto para responder.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, considero que colocou o dedo na ferida, porque, realmente, como referiu, 68,4% (o número que eu tenho é de 70%) da população prisional já entra doente na prisão - penso que foi isso que quis dizer. Eu fiz a distinção entre a população prisional que adoece e os doentes que são presos porque é isso que, hoje, muda completamente o perfil da população prisional.
Estamos, portanto, perante um problema que não é só português mas está generalizado e que tem como causa a questão da droga. Nós sabemos tudo isto, pelo que o que eu disse foi que este problema requer medidas específicas.
Em primeiro lugar, considero que estes 70% que já entram doentes constituem um indicador negativíssimo da saúde em Portugal - este é o primeiro ponto que todos temos de aceitar com humildade -, na medida em que se trata de uma população que escapa às malhas do Serviço Nacional de Saúde, que escapa a toda e qualquer hipótese de uma primeira consulta, de uma primeira triagem, sendo, pois, um indicador negativo da forma como o nosso Serviço Nacional de Saúde funciona. Mas, uma vez esta população entrada nas prisões, há que distinguir medidas elementares como é o caso dos rastreios, de outras medidas, que admito que são complexas, no sentido de se saber como é que, naquele espaço, uma população doente pode, simultaneamente, cumprir pena e ser tratada - penso que esta é que é a questão.
Mas há medidas que são relativamente simples e elementares, e que o Sr. Deputado poderá, na sua intervenção convencer-nos a todos que estão a ser tomadas - oxalá que sim, mas parece-me que não -, e há outras mais complexas.
Desta forma, eu distinguiria aqui duas questões. Por um lado, temos a situação de doença de cidadãos portugueses que cometem crimes, pelo que passam à situação de reclusos, situação esta que constitui um mau indicador em relação ao Serviço Nacional de Saúde e que é preciso ter em consideração no sistema prisional, o qual tem de se adaptar a essa situação com razoabilidade. Por exemplo, eu penso que as prisões não se podem transformar a ponto de poderem dar uma resposta perfeita e que não devem proliferar os hospitais prisionais, devendo os reclusos ser tratados nos hospitais normais. Na verdade, considero que não vale a pena que os

Página 3238

serviços prisionais criem os seus próprios serviços, devendo, sim, fazer uma interligação muito eficaz entre os serviços de saúde do Serviço Nacional de Saúde e os estabelecimentos prisionais.
A outra questão é a de saber se, perante este cenário, aquele mínimo que todo o bom senso aconselha e que é preventivo - porque o rastreio é preventivo e, se eu não souber quem está contaminado, não posso tratar quem está doente nem proteger quem ainda não está! - está a ser feito. O que vejo aqui é que, pela grande complexidade de algumas medidas que reconheço não serem fáceis de tomar "do pé para a mão", não se tomam medidas que são extremamente simples e que, no fundo, são estas que Os Verdes vêm, agora propor.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em intervenção que aqui fizemos não há muito tempo, inserida na interpelação do PCP ao Governo sobre justiça, abordando a situação do sistema prisional, afirmei a nossa convicção de que a verdadeira imagem de um país é dada pelas suas prisões. A forma como são tratados os cidadãos privados de liberdade é sempre, em cada país, o espelho do respeito com que são encarados os direitos fundamentais de todos os seus cidadãos.
O respeito para com a dignidade dos reclusos e a preocupação com a função ressocializadora das prisões são sinais de maturidade democrática e são questões essenciais quanto ao respeito pelos direitos humanos.
Na falta de membros do Governo, algum dos Srs. Deputados do Partido Socialista se encarregará de dizer que nos últimos anos aumentou o investimento no sistema prisional com a construção de mais prisões, com o alargamento de algumas das já existentes, com um esforço considerável no melhoramento das condições de reclusão - aliás, ainda há pouco, o Sr. Deputado José Niza nos informou que vai chamar a si essa tarefa. Não negamos que esse esforço tem sido feito e que a situação do sistema prisional melhorou nos últimos dois anos, quando comparada com a enorme crise que atravessou nos anos de 1995 e 1996. E temos consciência, obviamente, de que o sistema prisional é obrigado a confrontar-se com problemas que não gera, mas que é obrigado a gerir.
Mas seria irresponsável da nossa parte ter um juízo de satisfação perante uma realidade que continua a ser inquietante. O sistema prisional português continua a ser mais punitivo que ressocializador. É um sistema que reflecte as disfunções da aplicação da justiça: está cheio de pequenos delinquentes, muitos deles presos preventivamente ou a cumprir sucessivas penas pela prática reiterada de furtos ou de crimes ligados à toxicodependência, mas faltam lá os criminosos de colarinho branco e os poderosos, que a justiça se revela incapaz de punir. É um sistema que se confronta com gravíssimos problemas quanto à assistência médica aos reclusos, sendo um meio de grande incidência e de propagação da toxicodependência e da SIDA e de outras doenças contagiosas. É um sistema que, visando prevenir e combater a criminalidade, acaba, objectivamente, por reproduzir condições para a reincidência e para a consolidação de percursos criminosos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quando, em 1996, o Provedor de Justiça elaborou um excelente estudo sobre as condições prisionais, concluiu pela insuficiência da prestação de cuidados de saúde à população prisional, agravada pela proliferação de doenças infecciosas em meio prisional.
Não há muito tempo, foram divulgadas as conclusões de um novo levantamento da situação nas prisões, recentemente efectuado pela Provedoria de Justiça, destinado a avaliar a evolução verificado desde o relatório de 1996. Nas conclusões que extrai, o Provedor de Justiça regista evoluções positivas, mas não deixa de exprimir preocupações quanto a graves deficiências que se mantêm, quer no plano do alojamento, quer no da ocupação, quer no do enquadramento legislativo do regime penitenciário, do sistema de execução de penas ou do Instituto de Reinserção Social, quer - e saliento este ponto, pela sua gravidade - ao nível da saúde.
Diz o Provedor de Justiça que, no que à saúde diz respeito, "persiste alguma indefinição sistémica que se reflecte nalguma desarticulação que se sentiu no terreno entre os vários níveis existentes, com eventual sobrecarga nuns casos e défice de aproveitamento noutros, bem como na precariedade da situação jurídico-laboral de boa parte dos quadros médicos e paramédicos.
A grande pressão exercida pela toxicodependência e pelas doenças infecciosas, conduzindo, ademais, a um esforço financeiro brutalmente acrescido cada ano que passa, exige um empenhamento mais esforçado, não só do Ministério da Justiça, mas de todo o Estado, essencialmente do Ministério da Saúde, enquanto serviço governativo com a atribuição de velar pela saúde pública."
De facto, a saúde constitui, também do nosso ponto de vista, um dos mais graves problemas com que se confronta o sistema prisional e para o qual só têm sido encontradas respostas precárias, pontuais e assentes em boas vontades.
A população prisional é, como se sabe, extremamente carenciada. Muitos reclusos entram na cadeia já com graves problemas de saúde ou, pelo menos, com grandes carências de assistência médica. É uma situação para a qual a prisão evidentemente não concorre, mas que não pode deixar de tentar resolver, tanto mais que esta situação se agrava e potencia no ambiente prisional.
Numa recente publicação editada pela Associação Contra a Exclusão Pelo Desenvolvimento (ACED), num texto assinado pelo Professor Jorge Torgal, sobre a saúde na prisão, pode ler-se, a dado passo, que "um sistema penal anacrónico, torna as prisões portuguesas um centro incubador e transmissor de doenças. Doenças graves, frequentemente mortais, que afectam uma população jovem". E acrescenta: "A situação não é resolúvel construindo mais cadeias... A legislação que faz do toxicodependente um criminoso e não um doente, que excluindo o afasta do tratamento e da recuperação social, que ao segregar e perseguir agrava a sua condição de saúde e o afasta do diagnóstico e tratamento das tão frequentes doenças transmissíveis concomitantes à toxicodependência, a legislação iníqua e ineficaz

Página 3239

em vigor, constitui a primeira causa da gravíssima situação existente quando se analisa a saúde dos detidos em prisões portuguesas."
De facto, com uma população prisional em que avulta a presença de inúmeros toxicodependentes, onde há uma enorme taxa de seropositividade, onde alastram doenças infecto-contagiosas, torna-se urgente encontrar respostas para as gritantes insuficiências que os serviços prisionais revelam e reconhecem, a este nível.
Dispondo apenas de um hospital prisional central, em Caxias, de algumas enfermarias criadas em estabelecimentos prisionais, de uma comunidade terapêutica em meio prisional (no Estabelecimento Prisional de Lisboa) e de algumas alas livres de drogas, e a braços com uma impressionante falta de meios humanos quanto a médicos e enfermeiros, os serviços prisionais têm procurado responder a este gravíssimo problema através de protocolos com o SPTT e com serviços regionais do Ministério da Saúde. Do nosso ponto de vista, não pode ser apenas essa a solução. Uma questão tão grave como é a da saúde nas prisões não pode ser resolvida apenas com base na boa vontade, embora ela seja, como em tudo na vida, indispensável.
É preciso que, para além do protocolo com o SPTT, que permitiu iniciar a introdução de programas de redução de riscos em meio prisional e que importa intensificar, se desenvolva uma mais ampla cooperação entre os Ministérios da Saúde e da Justiça que permita dotar as prisões com os recursos técnicos e humanos indispensáveis para assegurar condições aceitáveis de assistência médica nas prisões.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Em resumo, Srs. Deputados, os graves problemas do sistema prisional estão muito longe da resolução. Dirá o Governo, e dirá o Partido Socialista, que investiu muito mais no sistema prisional do que os governos anteriores e que, em comparação com a situação existente há uns anos atrás, as coisas melhoraram. Simplesmente, a comparação que tem de ser feita não é com as condições deploráveis que existiram no passado, mas sim com o mínimo que se exige para que sejam hoje respeitados direitos elementares dos cidadãos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Não se pretende que seja o sistema prisional a suprir deficiências de acesso da população em geral a cuidados de saúde, nem tão pouco se ignora que os problemas de saúde detectados e agravados no sistema prisional se reflectem para além do próprio sistema, mas, ainda assim, não podemos fechar os olhos perante as gravíssimas insuficiências do sistema de saúde em meio prisional, tendo em conta as suas particulares exigências. E, nesse sentido, entendemos que o projecto de lei que o Partido Ecologista Os Verdes hoje traz a discussão nesta Assembleia constitui um excelente contributo.
Este projecto de lei reflecte não apenas uma justa preocupação com a propagação de doenças infecto-contagiosas em meio prisional mas também uma reflexão séria sobre as medidas urgentes para a prevenir e combater. Saudamos, por isso, Os Verdes por esta meritória iniciativa legislativa, que não temos qualquer dúvida em aprovar na generalidade.
Como muito bem refere o Provedor de Justiça, na introdução ao seu excelente relatório, "resulta do nosso ordenamento jurídico que a privação da liberdade não deve consistir no simples pagamento de uma dívida do delinquente para com a sociedade. Antes, a prisão deve procurar alcançar os objectivos de uma assistência prisional e pós-prisional com vista a auxiliar os presos a prosseguir, uma vez recuperada a liberdade, uma vida de acordo com os princípios de uma sã convivência social dentro dos parâmetros da Constituição".
Sr. Presidente e Srs. Deputados: É certo que falta ainda muito para que esse objectivo possa ser atingido, mas são iniciativas como esta que encurtam o caminho para lá chegar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, gostaria de saber qual é a sua opinião sobre o seguinte ponto: um cidadão português preso é um cidadão português e, portanto, é um beneficiário do Serviço Nacional de Saúde, e o que está a acontecer é que, ao mesmo tempo que a população prisional se torna, do ponto de vista sanitário, mais crítica e mais cara, o Serviço Nacional de Saúde dá-se ao luxo de considerar que não são utentes seus mas, sim, utentes dos serviços prisionais, com a trágica consequência de ou os serviços prisionais se dotarem dos meios que o Serviço Nacional de Saúde tem, e isso será sempre uma impossibilidade, ou, então, estamos a criar uma desigualdade entre um cidadão preso e um cidadão não preso!
Quando falou no protocolo associado à ideia de uma boa vontade, percebi muito bem o que o Sr. Deputado quis dizer: é que, muitas vezes, estas coisas são conseguidas porque à frente de um e do outro serviço estão duas boas almas, mas, pensando numa perspectiva mais política, no sentido etimológico da palavra, teria de haver um esforço, uma capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde aos cidadãos portugueses que, circunstancialmente, estão detidos. Quem conhece, por exemplo, o Hospital Prisional de Caxias, percebe que um doente terminal não pode estar ali, não obstante todo o esforço do pessoal médico e de enfermagem e dos técnicos de saúde e auxiliares, como poderia estar noutro hospital. Eu não sei, por exemplo, se o problema do quadro do pessoal já foi resolvido! E, se não foi, durante a noite, nomeadamente, não há a assistência que há noutros hospitais.

Portanto, pergunto se seria melhor insistir para que o Serviço Nacional de Saúde, não apenas pela via da boa vontade mas pela via de um direito constitucionalmente garantido, prestasse aos cidadãos portugueses detidos uma assistência na doença ou se seria preferível lutar, de uma forma que penso ser um pouco utópica e talvez sem resultados a curto e a médio prazo, pela criação de um sistema quase paralelo, uma vez que se trata de doenças muito caras e que, neste momento, caem sobre o orçamento dos serviços prisionais e não sobre o da saúde.

Página 3240

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, agradeço a sua questão e devo dizer que, no essencial, concordo com a perspectiva que acaba de exprimir.
De facto, nós próprios tivemos oportunidade de, no âmbito da preparação da interpelação que fizemos sobre a justiça, visitar o estabelecimento prisional de Lisboa e de tomar contacto com as dificuldades existentes, aliás relatadas pelo próprio Director-Geral dos Serviços Prisionais, para que os serviços prisionais possam resolver, minimamente, problemas gravíssimos com que se confrontam a nível dos cuidados de saúde que é necessário fornecer à população reclusa. E se nalguns problemas prisionais se encontram soluções na base, como disse, das boas almas, em que é possível o director de uma prisão ou o responsável pelo serviço regional respectivo do Ministério da Saúde encontrarem uma solução, que é sempre precária mas que consegue resolver alguns problemas, de facto, do nosso ponto de vista, essa não é a forma de resolver os problemas, pelo que concordamos com o que disse, ou seja, que o recluso é um cidadão a quem deve ser garantido o acesso aos cuidados de saúde de que necessite e que não é pelo facto de ele estar privado de liberdade que deve, ainda por cima, ser privado do acesso a cuidados de saúde.
Portanto, do nosso ponto de vista, é também necessário que o Ministério da Saúde, evidentemente em colaboração com a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, encontre soluções estáveis que garantam a quem esteja recluso num estabelecimento prisional do nosso país não ser privado do acesso, que lhe é devido, a cuidados de saúde.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há algo de paradoxal na situação que obriga a esta intervenção legislativa e que nos obriga a fazer este debate.
Efectivamente, a situação de adversidade que a própria reclusão envolve deveria ter como reverso - aliás, na linha das preocupações de ressocialização e de recuperação dos reclusos - o aproveitamento desta oportunidade por parte do Estado para garantir aos reclusos, nessa adversidade de reclusão, particularmente aos reclusos doentes, a assistência médica que lhes permitisse recuperar ou, pelo menos, minorar as suas enfermidades.
Ora, assiste-se exactamente ao contrário: a reclusão, a prisão, que compete ao Estado assegurar e gerir, que deveria ter, ao menos, o aproveitamento dessa oportunidade para esse efeito, funciona, infelizmente, de forma exactamente contrária, ou seja, é um veículo privilegiado do aumento dos contágios das doenças infecto-contagiosas, algumas delas, infelizmente, ainda incuráveis.
E esta é a primeira reflexão que devíamos fazer sobre esta matéria, tanto mais que temos o número que se segue e que é perfeitamente arrepiante: 70% da nossa população prisional está enferma, com doenças infecto-contagiosas.
Significa isto que, em bom rigor, 70% dos estabelecimentos prisionais deviam ser prisões-hospitais, para poderem dar resposta a esta situação. Isto dá bem a noção da inversão das coisas que se processaram no mundo prisional, o que devia, realmente, obrigar-nos a uma reflexão aprofundada.
O relatório dos serviços prisionais de 1997 constata e confirma os dados que passo a descrever e que todos sabemos serem efectivamente assim: que há uma correlação estreita entre o consumo de drogas injectáveis e essas manifestações de patologias orgânicas de tipo infeccioso; que, na população reclusa entrada, não tem deixado de aumentar a prevalência da seropositividade; que esta afirmação é sustentada, a nível nacional, por uma correlação entre o número dos casos notificados de SIDA a partir do estado prisional e o crescimento do número de novos casos referenciados da consulta de infecciologia, nomeadamente dos estabelecimentos prisionais de Lisboa e do Porto; que a prevalência da seropositividade no ano de 1996 foi de 15% e que, no ano de 1997, foi já de 16,7%, com a constatação de que há casos em número crescente e preocupante de reclusos que estão, simultaneamente, infectados por tuberculose, hepatite e SIDA.
Isto é algo de uma desumanidade que nada tem a ver com aquela que é, em princípio, a nossa forma de estar no mundo. Esta coabitação de uma sociedade democrática com prisões que têm este tipo de situações é algo que, neste final de século, não é minimamente aceitável.
Aliás, o Sr. Presidente da República, em declarações recentes, feitas num colóquio sobre a situação prisional, chamava a atenção de que esta, dizia ele: "(…) injustificada discriminação (…)" - porque de uma discriminação se trata - "(…) que a ética censura e a Constituição proíbe. Mas a verdade é que o sistema oficial prisional português mantém esta violação a elementares direitos fundamentais e à Constituição." Portanto, mantém esta situação.
Os jornais dão-se conta, designadamente o Público, que em cada 10 reclusos 7 estão infectados com SIDA, com hepatite ou com as duas, como há pouco referi, e que há um morto nas nossas cadeias em cada cinco dias.
Enquanto isto, o que é que, efectivamente, se faz? Face à necessidade que o Parlamento teve quanto a esta iniciativa - que eu quero, mais uma vez, louvar -, como dizia há pouco a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, nós analisamos a proposta de lei n.º 664/VII e verificamos - se levarmos isso a um constitucionalismo extremo - que há aqui uma ofensa ao princípio da separação de poderes, que há a necessidade de o Parlamento pôr numa lei normas que são de administração prisional, que são normas de decisões administrativas. Mas como elas não são tomadas, o Parlamento não pode ficar indiferente e tem de vertê-las para o texto legislativo. É esta a situação com que nos deparamos.
Srs. Deputados, tenho à minha frente o relatório de uma associação de apoio aos reclusos que fala em coisas deste tipo, relativamente ao estabelecimento prisional de Pinheiro da Cruz: "Os últimos pisos das alas não têm água canalizada nem casas de banho próprias; os duches das alas estão todos degradados, com acumulação de sujidade, só

Página 3241

funcionando, em média, duas saídas de água com pouca pressão; em todas as alas funciona o chamado balde sanitário."
Face à existência de situações deste tipo nos estabelecimentos prisionais, como é possível garantir que estas doenças não se acentuem e não se propaguem?
Enquanto isto, o que é que nós vemos da parte do Governo e da administração prisional? Como há pouco disse a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, nem sequer a única circular que existe sobre a matéria é cumprida. Srs. Deputados, esta é uma matéria demasiado séria para se fazer humor sobre ela, mas é quase ridículo, repito, é quase ridículo, o conteúdo da circular n.º 9/97, do Director-Geral dos Serviços Prisionais.
Sugere-se, entre outras coisas, a entrega sistemática, em todas as entradas e juntamente com os produtos de higiene habitualmente distribuídos, de dois preservativos e de um pequeno frasco com lixívia. E acrescenta: "Saliente-se, por último, a necessária discrição e a privacidade que estas metodologias exigem e que, estamos certos, encontrarão eco em VV. Ex.as."
Mas será que, perante este panorama, é a entrega de dois preservativos e de um pacote de lixívia as medidas a tomar para o combate a este flagelo?
Srs. Deputados, isto é demasiado sério! Mas nem isto, como diz a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, é cumprido.

O Sr. José Niza (PS): - Isso é demagogia! Isso é ridículo!

O Orador: - Mas é também no relatório dos serviços prisionais de 1997 que - e, repare-se, estamos em 1999 e trata-se do relatório dos serviços prisionais de 1997 - se justifica a não adopção de medidas por via de um diploma que vai ser aprovado para reestruturar os serviços nesta área. Diz-se assim: "Significa simplesmente que, havendo a intenção de proceder à completa reestruturação das normas institucionais na área da saúde, se entende relegar para esse novo diploma o desenvolvimento orgânico desta direcção de serviços. Como atrás se referiu, o projecto desse diploma já foi elaborado e remetido à consideração do Ministério da Justiça, aguardando aprovação (…)" -…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Até hoje!

O Orador: - ... que se aguarda - "(…) com grande expectativa face à premente e evidente necessidade de reestruturação integral do sector da saúde."
Srs. Deputados, em 1997 a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais reconheceu isto, ou seja, que estava com uma grande premência, com uma grande expectativa. Estamos em 1999 e eu pergunto: onde é que está esse diploma, Srs. Deputados?

Protestos do PS.

É que se passaram já dois anos de degradação destas situações.
E o que é que diz o Sr. Ministro da Justiça? Nesse mesmo colóquio em que interveio o Sr. Presidente da República, o Sr. Ministro da Justiça disse esta coisa realmente espantosa: que a política penitenciária está muitas vezes refém da política criminal que lhe está a montante. E faz esta afirmação como se só a política penitenciária tivesse a ver com ele, como se ele nada tivesse a ver com a política criminal que está a montante. Isto é uma coisa de bradar aos céus! A técnica desculpabilizante das responsabilidades governativas chega a este ponto: eu não sou responsável por aquilo que também sou responsável.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nesta como noutras áreas!

O Orador: - É a síntese da posição do Sr. Ministro da Justiça.
E é por isso que, quanto a isto, deparamos com opiniões insuspeitas - elas vêm de áreas que não têm qualquer suspeição -, como a do Dr. Vilaverde Cabral, que, referindo-se à situação prisional, diz: "(…) 40% dessa população prisional é constituída por esses preventivos, muitos dos quais se encontram entre aqueles que ali morrem sem sequer serem julgados e sem a assistência médica nem a companhia das famílias a que têm direito como seres humanos. Quanto a mim, este conjunto de factos configuram a violação encapotada dos direitos humanos, indigna de um país que se pretende moderno e democrático."
Não foi nenhum Deputado do PSD que faz esta afirmação, foi o Dr. Vilaverde Cabral.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E há um técnico reputado em saúde pública, o Dr. Jorge Torgal, que escreveu também isto quanto à situação da saúde nas prisões: "A gravíssima epidemia da tuberculose multirresistente, seguramente a maior que ocorreu na Europa, e a elevadíssima mortalidade são evidências nas prisões portuguesas que nos cobrem de vergonha como cidadãos de um país que celebra a Convenção Universal dos Direitos do Homem."
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas de Os Verdes, não precisamos de mais para dizer que vamos votar favoravelmente o vosso projecto de lei.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Baltazar.

O Sr. Nelson Baltazar (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, gostava de perguntar-lhe algumas coisas, tendo em conta certos aspectos que temos vivido ao longo destes anos.
Como o Sr. Deputado sabe, uma das vozes que ora se levanta também - e bem, no meu entender - contra alguns destes aspectos é a do Dr. Laborinho Lúcio, que foi ministro da Justiça durante alguns anos, aquando do vosso mandato. Também o Dr. Fernando Nogueira, que foi igualmente ministro da Justiça no governo PSD, já escreveu um artigo sobre esta matéria.
Gostava de relembrar-lhe que as prisões portuguesas tinham, na altura em que o Governo do Partido Socialista

Página 3242

tomou posse, o dobro de pessoas, ou seja, havia o dobro de reclusos relativamente à capacidade das prisões.
Gostava ainda de relembrar que todas as questões que o Deputado Guilherme Silva aqui assinalou - e bem, naturalmente, porque estamos todos preocupados com elas - já aconteciam nos 10 anos de mandato do PSD. E, que eu saiba, nada foi feito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Gostava também de relembrar o Sr. Deputado que, durante os quatro anos deste mandato, de V. Ex.ª, da vossa parte, não vimos praticamente nada ser proposto nesta base.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Homessa!

O Orador: - Ainda bem que agora estão de acordo com a proposta de Os Verdes.
Gostava ainda de lhe relembrar que o relatório do Provedor de Justiça que V. Ex.ª mencionou tem mais coisas do que aquelas que V. Ex.ª citou. V. Ex.ª apresentou a situação como sendo dramática, de escândalo, uma situação que é preciso ressalvar, mas gostava de lhe ler uma passagem desse mesmo relatório de 1998, que diz o seguinte: "Reconheço, Sr. Ministro, o esforço realizado nestes dois anos e meio, na área da saúde, nas prisões. Estruturas ao nível das instalações médicas, equipamento clínico, campanhas de sensibilização para a promoção da saúde em meio prisional e programas de apoio a toxicodependentes desenvolveram-se um pouco por todo o lado."

O Sr. José Barradas (PS): - O Sr. Provedor de Justiça teve a visão integral!

O Orador: - Será que V. Ex.ª não leu também a parte em que se diz que, de facto, há dois anos e meio a regra era a inexistência nestes locais de instalações afectas a cuidados de saúde e que hoje - ou seja, em 1998 - se vive, nos estabelecimentos prisionais, relativamente a instalações afectas a cuidados de saúde, um ambiente que o Sr. Provedor de Justiça considerou agradável, um ambiente que vai no bom caminho?
O que lhe pergunto é se o Sr. Deputado sabe que hoje, nas prisões, temos mais do dobro de apoios médicos de clínica geral do que aqueles que tínhamos em 1994.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - Sabe, por exemplo, que temos cinco vezes mais apoio psiquiátrico e psicológico do que tínhamos em 1995?

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Quantos é que estão no quadro?!

O Orador: - Sabe que temos três vezes mais apoio de enfermagem do que tínhamos em 1995?
Sr. Deputado, continuo a dizer-lhe que não estamos satisfeitos e, por isso mesmo, estamos a trabalhar e, por isso mesmo também, apoiamos iniciativas que, naturalmente, beneficiem e melhorem este sistema.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nelson Baltazar, começo por lembrar que também é do relatório do Sr. Provedor de Justiça, do mais recente, a afirmação de que são assustadores os números associados às doenças infecciosas em meio prisional e ainda mais preocupante a evolução que os mesmos registam, quando comparados com os recolhidos há dois anos e meio atrás!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A evolução!

O Orador: - O Sr. Deputado sabe qual era a situação da população prisional quando o PSD assumiu o poder?

O Sr. José Barradas (PS): - Só está mal nos últimos dois anos!…

O Orador: - Sabe qual foi o único governo português que, nos últimos 20, 25 anos, construiu novos estabelecimentos prisionais? Sabe qual foi o governo que teve a coragem de encerrar o estabelecimento prisional de Monsanto, precisamente porque tinha situações como estas que os senhores mantêm nas restantes prisões, neste momento, em Portugal?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sabe qual foi o único governo que teve a coragem de encerrar esse estabelecimento e de assumir a responsabilidade disso? Lembra-se dessa realidade?
Queria saber ainda quais são os estabelecimentos prisionais ou as prisões hospitalares que este Governo vai inaugurar em breve, por obra sua e por projecto seu.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Nenhuma! Zero!

O Orador: - Quero ainda lembrar o que diz, em relação a esta situação nas prisões, o Professor Figueiredo Dias, como Presidente da Fundação Internacional Penal e Penitenciária. Diz o Sr. Prof. Figueiredo Dias que "As prisões portuguesas são um local de crescimento exponencial onde grassam as doenças transmissíveis, enquanto os responsáveis se vêem incapacitados de travar a degradação e são confrontados com exiguidade de meios.". Os meios são os que o seu Governo lhes dá!

Aplausos PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terá a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Niza, intervindo ainda neste debate a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e o Sr. Deputado Francisco José Martins.
De qualquer modo, quero avisar-vos que o Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes requereu, no uso de

Página 3243

um direito potestativo, que a votação se faça hoje. Assim, convido-vos a convocarem as "tropas da retaguarda" para se dirigirem ao Plenário, a fim de, na hora da votação, o termos mais "municiado" de presenças do que temos agora. Bem sei que há muito trabalho de comissões, mas, de qualquer modo, convido as direcções das bancadas a chamar o maior número possível de Deputados.
Para uma intervenção, tem, então, a palavra o Sr. Deputado José Niza.

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia: Começaria pelo fim, ou seja, informando a Assembleia da posição do Partido Socialista em relação a este diploma.
Na generalidade, vamos votar a favor deste projecto de lei, porque, se não o fizéssemos, estaríamos a dar uma espécie de voto de desconfiança ao Governo, na medida em que, estando o Governo a executar medidas, algumas delas já em perfeita rotina e todas elas contemplando as vossas propostas, não podemos senão saudar o vosso projecto de diploma. Vamos, então, votar a favor, mas reconhecemos também que aquilo que hoje nos é proposto já está a ser praticado, embora, logicamente, não a 100%, já que assim não poderia ser. Fica, portanto, dada a informação.
Há uma outra questão que gostaria de colocar de uma forma politicamente honesta, que está relacionada com a realidade portuguesa dos últimos anos e que não podemos contornar. Penso que devemos reconhecer que estamos todos de acordo ao dizer que enfrentamos aqui um problema muito complicado. Tal como acontece com a toxicodependência, não podemos responsabilizar os governos e os ministros por não inventarem a cura milagrosa para o cancro ou para a SIDA, já que estes são males que existem e, fazendo-lhes frente, os governos não podem fazer milagres. Realmente, aquilo que se passa com a situação prisional é muito complicado, é preocupante, e o Provedor de Justiça, quer no relatório de 1996, quer no relatório de 1998, é perfeitamente correcto ao fazer o diagnóstico que faz. No entanto, o que me interessa enquanto Deputado e enquanto membro do Partido Socialista, é saber se o meu Governo está, ou não, a fazer aquilo que deve para enfrentar e combater estes fenómenos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Claro que não!

O Orador: - Sr. Deputado, tenho a impressão de que valia a pena termos um debate "frio", porque, realmente, estamos a tratar de coisas que não fui eu que inventei. Estamos a tratar de coisas que estão num relatório, que, aliás, estará na posse do seu grupo parlamentar, que foi recentemente elaborado pelo Ministério da Justiça e que tem um capítulo sobre os serviços prisionais.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Também o tenho aqui!

O Orador: - Então, se também o tem aí e se o leu…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Tenho-o aqui e citei-o! O Sr. Deputado é que não o leu todo!

O Orador: - Não, eu li-o todo, mas o Sr. Deputado apenas citou o que lhe interessava e eu agora vou citar o que me interessa!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Então, ficamos quites!

O Orador: - Em relação às questões relacionadas com a saúde nas prisões e às verbas disponíveis para estas matérias, o que é que tínhamos em 1995 e o que é tínhamos em 1997? No hospital prisional e na clínica psiquiátrica, gastaram-se, em 1995, 450 000 contos, enquanto em 1997, ou seja, há dois anos, já que não há números actualizados, se gastaram 660 000 contos. Isto quer dizer que houve um aumento de 46%.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas a população prisional também cresceu!

O Orador: - Pois cresceu, mas cresceu apenas 15%, enquanto as verbas aumentaram 46%!
Em matéria de exames complementares de diagnóstico, gastaram-se, em 1995, 260 000 contos e, em 1997, 360 000 contos. Ou seja, houve um aumento de 38%. Em relação aos medicamentos, houve, em dois anos, um aumento de 600 000 contos para 840 000 contos, ou seja, um aumento de 40%. No que diz respeito ao pessoal, houve um aumento de 568 000 contos para 820 000 contos, ou seja, um aumento de 47%. No que concerne aos equipamentos, segundo diz o relatório, passámos de zero…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Tem aí o número de mortos?!

O Orador: - Estou a falar de equipamentos, não estou a falar de mortos! Cada um no seu "caixão"! Neste momento é de equipamentos que estou a falar!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, lembro-lhe que foi ouvido em silêncio. Peço-lhe que deixe também falar em silêncio o Sr. Deputado José Niza.

O Orador: - Como no equipamento partimos do zero, podemos supor que, se calhar, estavam mortos. De qualquer modo, em 1997, já se tinham gasto 625 000 contos em equipamentos.
Finalmente, Sr. Deputado, já que leu com tanta atenção os extractos do relatório, agradecia que tomasse atenção a este. Em matéria de obras, ou seja, de fazer enfermarias, etc., em 1995, gastaram-se 100 600 contos e, em 1997, 4,07 milhões de contos. Foi um aumento de 4045%!

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - E em instalações de saúde?!

O Orador: - Se isto não é, efectivamente, um esforço importante feito em dois anos, não sei qual será o milagre que os Srs. Deputados exigem do Governo.
Mas há mais: em relação ao número de consultas, este aumentou 20%, de 1995 para 1996; em relação a análises, estas aumentaram 53%, de 1995 para 1996 e 20% de 1996 para 1997; em relação às consultas de clínica geral, houve um

Página 3244

aumento de 249% e, em psiquiatria, houve um aumento de 384%; em relação aos serviços de enfermagem, houve um aumento de 22%.
Em relação aos recursos humanos, é preciso fazer uma paragem, porque nenhum governo, seja o vosso ou o nosso, inventa especialistas. Como sabe, um psiquiatra leva 12 anos a formar-se e, portanto, neste momento, temos aquilo que temos. Há sérias dificuldades em recrutar essas pessoas quer para os serviços prisionais, quer para a toxicodependência, quer para a assistência em geral. Neste momento, pelo que julgo saber, os privilegiados nesta matéria estão a ser os serviços prisionais e os CAT, em desfavor, por exemplo, da saúde mental em geral. Mas, em relação a isso, posso dizer-lhe que, em 1996, havia 27 clínicos gerais, tendo passado a haver 54, ou seja, exactamente o dobro. Em psiquiatria, havia apenas três especialistas, tendo passado a haver 15, ou seja, cinco vezes mais.

O Sr. José Barradas (PS): - Mas o Sr. Deputado Guilherme Silva só quer saber dos mortos!

O Orador: - Em relação aos enfermeiros, passámos de 35 para 114, ou seja, passámos a ter mais do que o triplo do que tínhamos. Obviamente, estes números são de 1997 e estamos em 1999. Não sei dizer-lhe qual foi a tendência da subida nestes dois últimos anos, mas, seguramente, hoje ainda haverá mais.
Por outro lado, falou-se muito dos relatórios do Sr. Provedor de Justiça e é evidente que há um parágrafo "assassino" em termos de diagnóstico. O relatório tem 149 páginas, mas há, realmente, um parágrafo que é preocupante e que, logicamente, é aquele que os Srs. Deputados citaram, que é o diagnóstico da situação.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É a conclusão!

O Orador: - Contudo, gostaria de vos recordar, porque julgo ter o direito de o fazer, que este relatório tem 149 páginas dedicadas exclusivamente à saúde prisional. Já aqui citei a parte em que o Sr. Provedor de Justiça diz ao Sr. Ministro que reconhece o esforço realizado, mas posso ainda citar algumas frases relativas às instalações médicas. Diz-se, em relação a este aspecto, que "É bem distinta da de 1996 a realidade hoje vivida nos estabelecimentos prisionais do País, no que toca às instalações afectas à prestação de cuidados de saúde.". Diz o Sr. Provedor que é bem distinta esta realidade da que se vivia em 1996.
Por outro lado, diz ainda: "Verifico, assim, também que os estabelecimentos prisionais de maior dimensão, designadamente o de Lisboa, foram, no geral, dotados das instalações adequadas à prestação de cuidados de saúde. Fez-se a construção de enfermarias nos estabelecimentos centrais e especiais, registando-se uma evolução positiva na realidade do sistema prisional actual.". Saliento que estou apenas a citar telegraficamente algumas frases.
Noutra passagem, diz-se: "A evolução positiva, entre 1996 e 1998, é mais qualitativa do que quantitativa.". Já em matéria de equipamento médico, diz-se que "Os primeiros socorros encontram-se igualmente assegurados em todos os estabelecimentos.". Isto é dito pelo Provedor de Justiça, não sou eu que estou a dizer.
Em relação ao pessoal médico e paramédico, diz-se: "Registo a intenção do Ministério de V. Ex.ª, constante, segundo afirmado, de um projecto de alterações à Lei Orgânica da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais na área da saúde, de promover o recrutamento de pessoal médico e paramédico, mediante a atribuição de incentivos, designadamente ao nível da promoção de carreira."
Há apenas uma coisa que o Sr. Deputado não tem a obrigação de saber, porque a tudo o resto tem acesso, como têm todos os Srs. Deputados. O que o Sr. Deputado não sabe, tendo dito que o Governo tinha prometido fazer uma reformulação da legislação relacionada com esta matéria, é que essa reformulação vai ser feita. Tenho aqui uma cópia do documento que vai subir a Conselho de Ministros dentro de alguns dias. Logicamente, esta é uma cópia reservada, da qual o Sr. Deputado, oportunamente, terá conhecimento.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - São acessos privilegiados ao poder!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já pedi o favor de não estabelecerem diálogo directo. É preciso respeitar quem está no uso da palavra para se ser respeitado quando se está nessa precisa posição.

O Orador: - Os senhores também já tiveram esse privilégio e, aliás, é normal que os Deputados e os grupos parlamentares trabalhem com os seus governos. Há alguma anomalia nisto?! Penso até que é de elogiar! Pelo menos,…

Protestos do Deputado do PSD, Guilherme Silva.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, não me leve a mal, mas não está a ligar importância alguma às minhas advertências. O senhor tem de dar o exemplo. Tenha paciência!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Dá-me licença que use da palavra, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Não, não dou! Dar-lha-ei, se ma pedir, depois de o orador que está no uso da palavra terminar. Tenha paciência, mas não pode sabotar a intervenção só porque lhe apresentam argumentos que o senhor não gosta. Se calhar, o orador também não gostou dos seus.
Tenha paciência, não pode estabelecer diálogo quando alguém está no uso da palavra.

O Orador: - Agradeço, Sr. Presidente, a sua advertência. De facto também agradecia que me deixassem continuar.
Estava eu a citar transcrições do relatório de 1998 do Sr. Provedor de Justiça. Em relação aos rastreios, que são propostos no diploma de Os Verdes, o relatório diz o seguinte: "se, por um lado, a maioria dos estabelecimentos centrais e especiais já têm como assente a realização, à entrada do recluso no estabelecimento, de análises de rotina ao sangue e à urina e de testes de despistagem do HIV e hepatites (...)". Portanto, a proposta de Os Verdes é muito oportuna, mas o Governo já está a fazer os rastreios nos estabelecimentos prisionais.

Página 3245

O mesmo se passa em relação às vacinações. O Sr. Provedor da Justiça diz, no mesmo relatório, o seguinte: "aplaudo, neste capítulo, a iniciativa da direcção-geral no que toca a planificação e acompanhamento da vacinação contra a hepatite B, dirigida à população reclusa e a funcionários e praticada actualmente na globalidade dos serviços prisionais". As campanhas de vacinação estão a ser feitas no universo, a 100% - diz ele!
Em relação à prevenção das doenças infecciosas, diz também o Sr. Provedor de Justiça o seguinte: "Registo, com agrado, constar do plano de actividades (...), importantes iniciativas neste campo, como um programa de distribuição de folhetos informativos sobre toxicodependência e sexualidade e acções de formação para mulheres sobre planeamento familiar". Isto já estava a ser feito, há uns tempos.
Embora não vá ocupar mais tempo com este assunto, quero apenas dizer que se, efectivamente, o relatório de 1996 foi utilizado contra o Partido Socialista, porque era um relatório crítico, embora estivesse de acordo com uma realidade anterior que não tinha nada a ver connosco, o de 1998 altera completamente as coisas. Portanto, temos a obrigação e o direito de o utilizar, porque consideramos o Sr. Provedor de Justiça uma pessoa idónea, que, ainda por cima, nada tem a ver com o Partido Socialista, foi, aliás, presidente do PSD, e temos toda a confiança nele. Não o consideramos uma força de bloqueio, como já foi considerado antes.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, estamos à vontade.
Ainda que o Sr. Provedor de Justiça tenha apresentado um relatório desta natureza, que é abonatório para o Governo, ele não disse que se resolveu tudo, nem podia dizer. Porém, em três anos e meio, o que é que os senhores queriam que fizéssemos mais? Milagres?!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em matéria de legislação, afinal de contas, estamos aqui porque somos Deputados e legisladores, e é bom que lhes recorde alguns diplomas já em vigor neste Governo. Havia um, feito em 1979, que já ninguém se lembra, sobre as prisões e o direito dos reclusos; fez-se outro em 1993; depois, houve uma pausa; e, agora, finalmente, retomámos a legislação. Por exemplo, a Lei n.º 45/96 aborda o problema da colaboração dos serviços prisionais com os serviços de saúde, em matéria de toxicodependência.
O Sr. Deputado sabe que, durante os 10 anos de governo do PSD, os vários ministros de saúde e da justiça nunca conseguiram fazer um protocolo entre os dois ministérios. Finalmente, agora, conseguiu-se!

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Não é verdade! O estabelecimento prisional de Lisboa vive da experiência...!

O Orador: - Desculpe, eu estava lá, porque representava, nessa altura, curiosamente, o Sr. Dr. Fernando Nogueira, na Comissão Coordenadora do Projecto Vida.

Vozes do PSD: - Está a ver ?! Coisa que hoje não é possível!...

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quanto menos somos parece que mais barulho fazemos. Peço-vos o favor de se silenciarem.

O Orador: - Srs. Deputados, citei a Lei n.º 45/96 e vou citar agora um decreto-lei, sobre a nova orgânica dos serviços prisionais, que criou os lugares de um subdirector geral e um director de serviços, que não existiam nas prisões. No universo das prisões, não havia quem tomasse conta e fosse responsável pela área da saúde; neste momento, temos serviços que são responsáveis por essas matérias.
Temos também a Resolução n.º 72/96, onde se faz um conjunto de acordos interministeriais para a toxicodependência, doenças infecto-contagiosas, saúde mental, formação profissional dos reclusos, plano nacional de saúde para os estabelecimentos prisionais, vacinação do pessoal prisional e dos reclusos contra doenças infecciosas, inserção profissional do recluso e ex-reclusos... Isto está a ser feito, já se fez e vai continuar a fazer-se!
Recentemente, há um diploma do Governo, sobre a estratégia nacional de combate à droga, da iniciativa do Ministro José Sócrates, que também foi aprovado em Conselho de Ministros e é considerado um documento totalmente inovador, porque não tinha havido, até hoje, em Portugal, uma estratégia de luta contra a droga.
Finalmente, existe este diploma, que citei há pouco, que irá a Conselho de Ministros e vai pôr um ponto final na matéria, em toda a questão relacionada com a saúde.
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, tenho estado aqui a falar de outras coisas, mas vou falar agora sobre o vosso diploma. Ao contrário do que disse o Sr. Deputado António Filipe, não vim aqui substituir o Governo, nem ele precisa de ajuda destas; estou exactamente a dizer o que um Deputado que se preparou para um debate encontrou sobre a matéria e nada mais do que isso.
Em relação ao vosso diploma, as medidas estão a ser tomadas. De facto, Os Verdes gostariam que houvesse uma aceleração maior, mas é impossível, porque, como já disse, mesmo que se queira ir mais rápido, em certas situações, não se pode.
Quando, por exemplo, se fala de recursos humanos, de médicos, de psiquiatras, de enfermeiros, sabemos que eles não estão ali "à venda no supermercado", têm de fazer a sua formação académica para existirem. Se falar com os responsáveis pela saúde, a qualquer nível, verificará que essa é a dificuldade maior. Construir um hospital, arranjar uns milhões de contos e pôr a construção civil a funcionar, isso faz-se em dois ou três anos, agora, formar um técnico é que é mais difícil. Ora, é isto que temos de ter em consideração para não andarmos a enganarmo-nos uns aos outros.
Em relação às vossas propostas, creio que a mais inovadora e útil é a da elaboração de um relatório anual sobre estas questões. Quanto ao resto, nomeadamente rastreios, campanhas de vacinação, prevenção feita em meio prisional, a distribuição de água de Javel e de lixívia, para desinfecções, a distribuição de preservativos, tudo isso está a ser feito. Não estou a querer dizer que está a ser feito a 100% das unidades, mas, nas principais prisões, que são, de longe, aquelas que têm mais população, isso já

Página 3246

está a funcionar e a tendência, com ou sem esta vossa proposta, é no sentido de as coisas se aproximem destas soluções.
Porém, a situação que se criou foi tão grave que não se pode resolver de um dia para o outro.
Quero dizer-lhe que vamos votar favoravelmente, na generalidade, o vosso diploma e, em sede de especialidade, veremos outras questões, porque houve algumas que ficaram pouco explicadas, designadamente uma, que considero importante, relativa à troca de seringas. Penso que a Sr.ª Deputada disse, mas não tenho a certeza, porque não se ouvia aqui muito bem, mais ou menos isto: "em matéria de troca de seringas, fica uma porta aberta". Só que, Sr.ª Deputada, não está muito bem explicado o que é que se pretende com isto.
Já agora, aproveito para colocar-lhe uma questão, que tem a ver com as seringas. A alteração da legislação, isto é, a descriminalização do consumo, altera completamente o esquema, porque, a partir daí, uma coisa que era ilícita deixa de o ser, passando a ser lícita. Tudo isso altera o funcionamento interno do esquema prisional. Portanto, vamos ter de pensar quais são as consequências daquilo que, no fim de contas, o Governo anunciou, que é a despenalização do consumo, que vai ter incidência neste aspecto. É esta, aliás, a interpretação dos serviços prisionais e isso vai libertá-los de muitos problemas que tinham, porque deixarão de os ter a partir daí.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, está a terminar o seu tempo e ainda tem um Deputado inscrito para pedir esclarecimentos. Agradecia que gerisse o seu tempo de acordo com esse facto.

O Orador: - Está a terminar o meu tempo e a minha imaginação, que também já estava a dar sinais…
Ficarei por aqui, Sr. Presidente.
(O Orador reviu.)

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradecia que o Partido Socialista me deixasse formular o meu pedido de esclarecimento porque o meu colega Francisco José Martins está inscrito e precisará de seis ou sete minutos para formular a sua intervenção.
A questão que se coloca, Sr. Deputado José Niza, é que as prisões deveriam ser o local de eleição...,

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Local de eleição não são as prisões, por enquanto!...

O Orador: - ... para que muitas das pessoas que estão fora do sistema nacional de saúde pudessem ser integradas nele. E dou vários exemplos: poderia ser atribuído o cartão do utente, poderiam fazer-se diagnósticos e tratamentos, enfim, todas as medidas de reinserção. Esta é a questão de fundo.
Em contrapartida, o Sr. Deputado José Niza, preocupado com os fantasmas do passado, onde teve um tratamento, pelos vistos, privilegiado dos governos do PSD, vem aqui colocar questões que nada têm a ver com este debate.
Em relação ao estabelecimento prisional de Lisboa, que é o estabelecimento "modelo" e "montra" dos governantes relativamente a esta matéria, foi feito um rastreio da tuberculose onde, dos 2000 prisioneiros, houve 1000 que fizeram o rastreio radiológico. O Sr. Deputado sabe qual foi a taxa de incidência? Foi de 994 por 100 000, isto é, 21 vezes a incidência nacional e 17 vezes a incidência do distrito de Lisboa, que é o distrito que, como sabe, tem uma incidência superior.
Sr. Deputado, acha que isto não é preocupante? Não está preocupado?

Protestos do PS.

Agradecia que me deixassem terminar. O mesmo acontece, quer em relação à hepatite C...

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, as minhas recomendações são de via dupla. Há pouco eram os senhores a serem vítimas do ruído que estava a fazer o PSD; agora, dá-se o inverso. Tenham paciência, mas têm de respeitar as minhas injunções. Todos!
Por mais que vos custe, tenham paciência, Srs. Deputados!
Faça favor, Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.

O Orador: - Sr. Presidente, este tempo de interrupção continuou a ser descontado no tempo do PSD, pelo que agradecia que, depois, tivesse alguma complacência para com o meu colega.
Sr. Deputado José Niza, se for feito um rastreio a nível dos produtos do pulmão, nomeadamente à expectoração, estes números aumentam. Por isso, Sr. Deputado, a situação necessita de medidas de emergência. São ou não necessárias?
Segundo aspecto, quanto à população prisional versus médicos, não vou aqui transcrever aquilo que o Sr. Provedor de Justiça disse mas há um défice claro, quer em termos clínicos, quer em termos de consulta de especialidade. O Sr. Deputado acha que, não sendo suficientes, não é preciso fazer nada, não é preciso mais médicos no serviço prisional?
Terceiro e último aspecto, o Sr. Deputado sabe que quando se recorre ao exterior, as prisões têm de fazer pagamentos ao Serviço Nacional de Saúde. Creio que contribuiríamos decisivamente para a melhoria de tudo isto se esses tratamentos pudessem passar a ser por conta do Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Niza.

O Sr. José Niza (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tenho a impressão que o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha

Página 3247

gostaria de ter ouvido aquilo que eu não disse e, depois, como não ouviu o que eu disse, veio referir coisas que eu disse e que não disse... Estou a plagiar um pouco a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, no seu Congresso... Tem direitos de autor...

Risos.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Já está no domínio público!...

O Orador: - Sr. Deputado, disse aqui, mais do que uma vez, que a situação nos preocupa a todos e preocupa-me a mim em particular. Quanto aos diagnósticos feitos sobre ela, nada há em desacordo! Portanto, não me atribua coisas que eu não disse. Eu também não disse que não queria mais médicos nos hospitais, o que eu disse foi que há poucos médicos para serem contratados, o que é diferente!
O senhor não pode inventá-los e eu também não! A única coisa que eu podia fazer era deixar a vida política e voltar à medicina, aliás, para prejuízo dos doentes, pois, após 20 anos, já não estava em grande situação para exercer.
Foi citado aqui o texto de um grande amigo meu, o Prof. Jorge Torgal, que conheço desde os tempos da Faculdade de Medicina. O bacilo de Koch não foi inventado pelo Eng.º António Guterres! O bacilo de Koch já existia antes.

Risos.

O que aconteceu foi que o "raio" do bacilo...

O Sr. Azevedo Soares (PSD) : - O "raio" do bacilo?! O bacilo merece uma certa dignidade!

O Orador: - Não, porque ele está a portar-se mal. Ele tornou-se resistente e não era! Havia medicamentos para o combater e agora é mais difícil.
Portanto, voltamos à mesma questão, Sr. Deputado. Gostava de saber, como disse há pouco, quantos tuberculosos existem à entrada das prisões. Por isso, nesse aspecto, o rastreio é fundamental. Eu não sei, pelo menos não tenho essa informação, o que não quer dizer que ela não exista.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Se o senhor não tem, é difícil nós termos!

O Orador: - Há muita coisa que eu não sei, Sr. Deputado.
Essa questão é importante, mas não acho que tenha algum sentido responsabilizar o Governo por causa de um bacilo.
(O Orador reviu.)

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Está hoje em debate o projecto de lei n.º 664/VII, da iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes, sob a epígrafe "Adopta medidas de combate à propagação de doenças infecto contagiosas em meio prisional".
É sabido quanto a situação da saúde nas prisões é preocupante, sendo que, entre 1996 e 1998, o panorama no meio prisional se agravou, o que justificaria por parte das entidades responsáveis, em particular o Governo, uma atenção especial e a tomada de medidas urgentes visando responder eficazmente à grave situação em que se encontra a população reclusa, e prevenir o futuro à luz dos graves riscos que poderão advir para a saúde pública.
Neste ponto, importa ter presente o relatório sobre o meio prisional, elaborado em 1996 pela Provedoria da Justiça, onde se acentuavam já as preocupações em matéria de saúde nas prisões e a absoluta necessidade de avançar com medidas para responder a tal situação, mas, sobretudo, idêntico relatório que a mesma Provedoria da Justiça realizou em finais de 1998, onde se afirma, nomeadamente, quão assustadores são os números associados à toxicodependência e às doenças infecciosas, quando comparados com os recolhidos há dois anos e meio atrás.
Na verdade, permanece entre 60% a 70%, em qualquer dos anos, o número de toxicodependentes declarados.
Quanto aos doentes com SIDA, a taxa, que era de 1,6%, em 1996, é, em 1998, de 3%, tendo o número de seropositivos aumentado em idêntico período de 8,9% para 11%.
A hepatite B e C, que em 1996 era de 10,5%, atingiu, em 1998, 25,4%, e quanto à tuberculose, os números aumentaram de 0,8% para 1,75%.
Perante este triste cenário, em particular no que concerne à toxicodependência e às doenças infecciosas, o relatório do Provedor considera estas como "as sombras negras" do sistema em matéria de saúde, concluindo o Sr. Provedor da Justiça dizendo que a situação exige "um empenhamento mais esforçado não só do Ministério da Justiça mas de todo o Estado, essencialmente do Ministério da Saúde".

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Concretamente, é manifesto que o relatório da Provedoria da Justiça é bem uma chamada de atenção para as responsabilidades do Governo, assente nas carências e na falta de resposta eficaz perante a problemática da saúde no meio prisional.
A falta de instalações médicas adequadas, bem como de equipamento médico, a insuficiência de pessoal médico e paramédico, psicólogos e, de forma acentuada, enfermeiros são exemplos vivos da carência de meios técnicos e recursos humanos capazes de responder às reais necessidades dos estabelecimentos prisionais, sem que o Governo consiga dar resposta a esta preocupante situação.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O direito à prestação da saúde é um direito fundamental que assiste a todos os portugueses, recaindo sobre o Estado a incumbência de estabelecer políticas de prevenção e tratamento da toxicodependência. E, dando expressão a este princípio constitucional, a política de saúde do Estado português deve ser executada em ordem a "obter a igualdade dos cidadãos no acesso aos cuidados de saúde, seja qual for a sua situação económica e onde quer que vivam, e adoptar medidas especiais relativamente a grupos sujeitos a maiores riscos".

Página 3248

Ora, a elevada taxa de toxicodependência, associada ao risco de propagação de doenças infecciosas, traduzida nos números actuais, e a precariedade cada vez mais acentuada da saúde da população reclusa, com evidentes repercussões em termos de saúde pública, acarretam para o Estado uma responsabilidade acrescida na prevenção da saúde e, em especial, na prevenção da doença nas prisões do País.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, é com grande preocupação que assistimos a uma evidente falta de capacidade do Governo para inverter a situação da saúde que, progressivamente, se vem agravando no meio prisional, apesar das recomendações que lhe vão sendo dadas com base em diagnósticos sérios e exaustivos, quanto o são os relatórios da Provedoria da Justiça de 1996 e de 1998.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Assim e face à falta de acção concreta e eficaz do Governo, é com satisfação que vemos como eminente a aprovação em sede de especialidade, com o contributo de todas as forças partidárias com assento nesta Câmara, do projecto de lei n.º 224/VII, da iniciativa do Partido Social Democrata, visando a criação de núcleos de acompanhamento médico ao toxicodependente, como forma de controlar, prevenir e reabilitar o recluso, face aos riscos que o consumo de estupefacientes por via endovenosa representa para a propagação de doenças infecto-contagiosas, nomeadamente, a sida, a hepatite B e a tuberculose.
Por outro lado, e partilhando as preocupações sublinhadas na respectiva exposição de motivos, o Partido Social Democrata reconhece como positiva a iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes, hoje em debate nesta Câmara.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Embora a aplicação do projecto de diploma tenha de ser analisada e enquadrada no âmbito mais alargado dos serviços de saúde existentes nas instalações prisionais, com recurso a meios técnicos e humanos capazes de o tornar exequível, permitam-nos, desde já, realçar quatro aspectos que destacamos nesta iniciativa legislativa, a saber: o combate efectivo e imediato à propagação das doenças infecto-contagiosas, à luz de testes de rastreio, com carácter periódico, abrangendo todos os reclusos; o acesso a todas as formas de tratamento, acompanhamento e aconselhamento disponibilizado aos membros da comunidade em geral, com a possibilidade de os reclusos se deslocarem a unidades de saúde especializadas; a aposta em medidas de prevenção geral, direccionadas quer para os reclusos, quer para o pessoal trabalhador, e, ainda, o controlo anual, pela Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e por esta Assembleia da República, das medidas tomadas e dos resultados obtidos com a aplicação da lei.
Como atrás foi referido, a precariedade cada vez mais acentuada da saúde da população prisional e a mobilidade desta, com notórias repercussões em termos de saúde pública, exigem, perante a passividade do Governo, medidas imediatas, tendentes a inverter a actual situação, sendo que o projecto de lei em apreciação vem propor soluções para uma vertente de toda esta problemática.
Por isso, consideramos e desejamos que a iniciativa legislativa que hoje apreciamos, com as mais-valias que a discussão em sede de especialidade lhe poderão dar, corresponda a um contributo importante no conjunto de medidas indispensáveis a uma efectiva melhoria da saúde nas prisões.
Assim se estará, sobretudo e fundamentalmente, a legislar em cumprimento de um direito, dos mais invocados nos nossos dias e, seguramente, dos menos concretizados: o direito à saúde.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta intervenção final, gostaria de felicitar a Assembleia da República - se me é permitido fazê-lo desta forma - pela unanimidade que se gerou relativamente à proposta apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes, porque cremos que este é um projecto sério e uma contribuição séria para o combate efectivo à incidência das doenças infecto- contagiosas em meio prisional.
Gostaria de tecer algumas considerações relativamente àquilo que aqui foi dito, nomeadamente pelo Sr. Deputado José Niza, que referiu que provavelmente a utilidade do nosso projecto de lei aqui apresentado seria levar a um acelerar da tomada de medidas concretas nesta matéria.
Sr. Deputado, se essa for uma consequência prática do nosso projecto de lei, já não é nada mau! Porque, Sr. Deputado, a urgência de intervenção nesta matéria é brutal - se me permite a expressão - e é preciso agir urgentemente. Creio que este projecto de lei dá um bom contributo, também, nesse sentido.
Por outro lado, o Sr. Deputado falou na efectiva necessidade de pessoal médico, de pessoal de enfermagem, etc., no sentido de garantir alguma eficácia relativamente a estas medidas. Pois é, Sr. Deputado, nisto, tudo tem a ver com tudo e não percebo por que é que, dada esta carência de pessoal médico, nomeadamente para esta circunstância em concreto, este Governo teima em dificultar tanto o acesso ao curso de medicina em Portugal. Sr. Deputado, há aqui questões que nos têm de fazer pensar globalmente.
O Sr. Deputado referiu também que não percebeu muito bem a questão da troca de seringas.
De facto, na alínea relativa às medidas de prevenção, onde se prevê a garantia de outras formas de prevenção que se revelem eficazes, Os Verdes entendem que poderia ser interessante fazer um projecto-piloto, em Portugal, um estudo rigoroso e sério, sobre a troca de seringas, já praticada em meio livre, transpondo esta experiência para o meio prisional. Porque estamos com seriedade neste projecto, obviamente não se trataria de o alargar de imediato a todos os estabelecimentos prisionais, sem pensar nas consequências directas disto; o que propúnhamos era um projecto-piloto, um estudo sério, em Portugal, sobre isto, porque,

Página 3249

de facto, as seringas já lá existem e, obviamente, aquilo que era proposto era uma troca.
Por outro lado, a própria lei, em Portugal, incentiva o uso de material cortante em meio prisional, nomeadamente laminas de barbear, desincentivando, curiosamente, o uso da máquina de barbear. Poderemos também considerar isto, porque se coloca uma questão de segurança relativamente às seringas mas a própria lei, hoje, incita ao uso de material cortante em meio prisional. Portanto, temos de ter alguma coerência relativamente a esta matéria.
Mas, em relação a isto, entendemos que era muito interessante avançar com seriedade com um projecto-piloto nesta matéria, em Portugal.
Depois, o Partido Socialista levou o tempo todo do debate a dizer duas coisas: primeiro, em jeito de "bocas", o Partido Socialista dizia, permanente, "Olha, agora é que descobriram!".

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não é verdade!

A Oradora: - O que nós entendemos é que se o Partido Socialista já descobriu tudo há tanto tempo devia, então, ter sido mais pronto na resposta a esta matéria, de facto, dramática. Creio que todos os Srs. Deputados tinham, pelo menos, a obrigação de conhecer esta realidade em concreto, nomeadamente o Governo, que, como é óbvio, tem poder executivo, sendo, nesta matéria, a prontidão uma prioridade; mas, pelos vistos, quatro anos não bastaram para tanto.
Em segundo lugar, o Partido Socialista, já em âmbito de intervenção, dizia sempre: "Isto está a ser feito!". Portanto, entendem os Srs. Deputados do Partido Socialista que aqui, neste projecto de lei, não há qualquer novidade, ou seja, o que o projecto propõe, já está a ser feito.
Ora, afinal, a conclusão a que cheguei é que não temos a mesma noção de "estar a ser feito". Sr. Deputado José Niza e outros Deputados do Partido Socialista, relativamente ao teste de rastreio já "estar a ser feito", não o estando a ser regularmente a todos os reclusos, ou seja, "estar a ser feito" apenas a reclusos que entram no estabelecimento prisional, é realmente "estar a ser feito"? Então, e os reclusos que são contaminados já na própria prisão, enquanto estão a cumprir a pena? Isto é "estar a ser feito"?! Não, Sr. Deputado, isto é uma medida pontualíssima, não é "estar a ser feito"!
Quanto à vacinação da hepatite B, é raro acontecer, com seriedade, em todos os estabelecimentos prisionais. Aliás, como já referi, não é feita a preventivos. Isto é "estar a ser feito"? É estar a deixar de fora uma margem importante, grande, que tem incidência, também, no meio prisional.
Não, Sr. Deputado, na nossa perspectiva, isto não é "estar a ser feito"! Portanto, não podemos cruzar o braços e ficar descansados, dizendo que tudo isto está tudo a ser feito, porque não está! Cremos que este projecto de lei vem contribuir seriamente para que isto seja realmente feito, em Portugal, e isso, na nossa perspectiva, é que é importante.
Por outro lado, porque a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto também o referiu e parece-me que era importante dizê-lo, cremos que o Sistema Nacional de Saúde deve ser envolvido nesta matéria. Se me é permitido, até, dar um exemplo referido no relatório, lembro que nele se diz que para um hospital prisional não foi comprado equipamento de tratamento e prevenção da tuberculose por o Ministério da Saúde não ter comparticipado, com o argumento de que o sistema prisional não é um subsistema do Serviço Nacional de Saúde. Ora, cremos que isto é inadmissível! Esta ou outras expressões mais fortes são a única maneira de classificar esta situação, porque estamos a falar de uma situação dramática, em Portugal, que não se compadece com esta descoordenação entre ministérios do mesmo Governo, não se compadece com a falta de financiamento e com a falta de prioridade que este Governo tem dado relativamente a esta matéria.
Por isso, Os Verdes entendem que este projecto de lei constitui uma séria orientação global de intervenção. Mais uma vez, repito: é necessário alargar o rastreio, a prevenção geral e o tratamento a todos os reclusos, em todos os estabelecimentos prisionais.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Niza.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não tem tempo! Onde é que arranjou esse tempo?!

O Sr. José Niza (PS): - Só tenho um minuto e chega-me!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria dizer à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia seguinte: o mundo não começa amanhã, com a aprovação do vosso diploma!
Já muita coisa se fez - ainda bem que se fez - e, portanto, isto é mais um passo num processo que, logicamente, queremos acelerar, como referiu no princípio da sua intervenção.
Mas não fique com a ideia de que isto começou agora… Isto até começou nos tempos do PSD, veja lá!

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Exactamente!

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Mal!

Risos do PSD.

O Orador: - Porém, fez outra afirmação que creio que é profundamente injusta. A Sr.ª Deputada disse qualquer coisa como isto: o Partido Socialista, ou melhor, o Governo Socialista está contra, digamos, a formação de médicos. Queria perguntar-lhe, muito concretamente, o seguinte: quem baixou o numerus clausus e quem vai fazer duas novas faculdades de medicina?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Natalina Moura (PS): - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Niza, é óbvio que não temos a pretensão de entender que com o nosso projecto de lei tudo se vai alterar.

Página 3250

Aliás, para além da aprovação deste projecto de lei, o que é, de facto, importante, é a sua aplicação.
Entendemos que estas matérias não devem ficar ao sabor das direcções dos estabelecimentos prisionais e de determinados indivíduos da especialidade. Portanto, em Portugal, deve existir uma orientação global, determinações claras de prevenção e de tratamento, no sentido de que se criem regras para cumprir.
Este Governo já nos habituou muito, em matéria de ambiente, nomeadamente, ao não cumprimento da legislação e o seu cumprimento é importante para a prática nestas matérias.
Relativamente a questões de educação, Sr. Deputado, não me obrigue aqui a falar de numerus clausus nem de estudante elegível, porque este Governo, de facto, tem dado um excelente contributo para afastar os estudantes e os jovens do ensino, em Portugal.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate do projecto de lei n.º 664/VII - Adopta medidas de combate à propagação de doenças infecto-contagiosas em meio prisional (Os Verdes).
Vamos, agora, passar à sua votação, na generalidade, conforme foi requerido por Os Verdes, no uso de um direito potestativo, tal como foi anunciado.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, a próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, quarta-feira, dia 26, às 15 horas. Terá período de antes da ordem do dia e do período da ordem do dia consta a discussão conjunta dos projectos de lei n.ºs 678/VII (PSD) e 680/VII (CDS-PP), por agendamento potestativo do PSD.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 40 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
Fernando Garcia dos Santos.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.

Partido Social Democrata (PSD):

António Joaquim Correia Vairinhos.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Albino Gonçalves da Costa.
António Bento da Silva Galamba.
António José Martins Seguro.
António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Henrique José de Sousa Neto.
Mário Manuel Videira Lopes.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.

Partido Social Democrata (PSD):

Alberto Queiroga Figueiredo.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
Artur Ryder Torres Pereira.
Domingos Dias Gomes.
Fernando Santos Pereira.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvão da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
Manuel Acácio Martins Roque.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Rui Manuel Pereira Marques.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

Página 3251
Página 3252

DIÁRIO da Assembleia da República
Depósito legal n.º 8818/85
IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E.P.

1 - Preço de página para venda avulso, 10$00 (IVA incluído)
2 - Para os novos assinantes do Diário da Assembleia da República, o período da assinatura será compreendido de Janeiro a Dezembro de cada ano. Os números publicados em Outubro, Novembro e Dezembro do ano anterior que completam a legislatura serão adquiridos ao preço de capa.

3 - O texto final impresso deste Diário é da responsabilidade da Assembleia da República

PREÇO DESTE NÚMERO 240$00 (IVA INCLUÍDO 5%)

Toda a correspondência, quer oficial, quer relativa a anúncios e assinaturas do "Diário da República" e do "Diário da Assembleia da República", deve ser dirigida à administração da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, E.P., Rua de D. Francisco Manuel de Melo, 5 - 1099 Lisboa Codex.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×