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I Série – Número 8
Quinta-feira, 18 de Novembro de 1999

VIII LEGISLATURA
1. A SESSÃO LEGISLATIVA (1999-2000)


DIÁRIO da Assembleia da República


Presidente: Ex. mo Sr. António de Almeida Santos






SUMÁRIO
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 30 minutos.
Antes da ordem do dia. – Deu-se conta da apresentação dos projectos de lei n. os 10 e 11/VIII, da proposta de lei n.º 1/VIII e dos projectos de resolução n. os 3 e 4/VIII, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Foi aprovado um parecer da Comissão Eventual de Verificação de Poderes relativo à substituição de um Deputado do PS.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) abordou a necessidade de se proceder à revisão do regime de avaliação do impacte ambiental, tendo informado que o seu grupo parlamentar vai apresentar um projecto de lei nesse sentido e criticado o Governo pela falta de vontade política nesta matéria. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Manuel Queiró (CDS-PP).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Basílio Horta (CDS-PP) criticou o Governo pela solução encontrada para o caso Champalimaud/Santander, que considerou uma desautorização e uma submissão à Comissão Europeia, em contradição com afirmações produzidas durante o debate do Programa do Governo. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Manuel dos Santos (PS), Lino de Carvalho (PCP), Francisco Louçã (BE) e Manuela Ferreira Leite (PSD).
Foi aprovado o voto n.º 4/VIII – De saudação ao ex-Presidente do Conselho de Administração da sociedade Porto 2001, S.A., Dr. Artur Santos Silva, pela acção desenvolvida no âmbito do projecto Porto _ Capital Europeia da Cultura (PSD). Usaram da palavra os Srs. Deputados António Montalvão Machado (PSD), Isabel Pires de Lima e Manuel Alegre (PS), Francisco Louçã (BE), Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), João Amaral (PCP) e Isabel Castro (Os Verdes) e também o Sr. Presidente.
Após discussão, foi igualmente aprovado o voto n.º 8/VIII – De pesar pelo massacre de Santa Cruz em 12 de Novembro de 1991 (PS, PSD, PCP, CDS-PP, Os Verdes e BE), sobre o qual intervieram os Srs. Deputados Natália Carrascalão (PSD), Carlos Luís (PS), Bernardino Soares (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP) e Manuel Alegre (PS).
Procedeu-se ao debate de urgência, requerido pelo PCP e pelo PSD, sobre o acordo de pescas com Marrocos. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário das Pescas (José Apolinário), os Srs. Deputados Honório Novo (PCP), João Maçãs (PSD), Paulo Portas (CDS-PP), António Martinho (PS), Lino de Carvalho (PCP) e Luís Fazenda (BE).


Ordem do dia. – Procedeu-se à apreciação da proposta de resolução n.º 116/VII – Aprova, para ratificação, a Convenção de Conciliação e Arbitragem no quadro da OSCE, concluída em Estocolmo a 15 de Dezembro de 1992, no Terceiro Conselho Ministerial da OSCE, tendo proferido intervenções, além do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas (José Lello), os Srs. Deputados Henrique de Freitas (PSD), Mafalda Troncho (PS), Bernardino Soares (PCP) e Francisco Louçã (BE).
Foi igualmente apreciada a proposta de resolução n.º 117/VII – Aprova o Tratado entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha para a Repressão e Tráfico Ilícito de Droga no Mar, assinado em Lisboa a 2 de Março de 1998. Usaram da palavra, além do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, os Srs. Deputados Telmo Correia (CDS-PP), Nuno Baltazar Mendes (PS), António Filipe (PCP), Francisco Louçã (BE) e Carlos Encarnação (PSD).
Por fim, foi apreciada a proposta de resolução n.º 137/VII – Aprova o Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado na Praia, Cabo Verde, aos 17 de Julho, pelos Governos da República de Angola, da República Federativa do Brasil, da República de Cabo Verde, da República da GuinéBissau, da República de Moçambique, da República Portuguesa e da República Democrática de S. Tomé e Príncipe, tendo-se pronunciado, além do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, os Srs. Deputados Manuel Frexes (PSD), Rosado Fernandes (CDS-PP), Luísa Mesquita (PCP) e António Braga (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 45 minutos.

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Eram 15 horas e 30 minutos.


Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:


Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alexandre António Alves Chaves
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António Jorge Freire de Brito Calvete
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carlos Alberto
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Dinis Manuel Prata Costa
Eduarda Maria Castro de Sousa
Eduardo Ribeiro Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Carlos da Costa Ferreira da Silva
João Francisco Gomes Benavente
João Macedo Lourenço
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rodrigues Pereira dos Penedos
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Manuel Carvalho Carito
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luís Pedro de Carvalho Martins
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António dos Santos
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Joaquim Barbosa Ribeiro
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Luísa Silva Vasconcelos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Nelson Madeira Baltazar
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Caio Roque
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo


Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António d'Orey Capucho
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António de Carvalho Martins
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado

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Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria de Fátima Caeiro Queimado Amaral
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Natália Gomes Filipe
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas


Partido do Centro Democrático Social – Partido Popular (CDS-PP):
António de Magalhães Pires de Lima
António José Carlos Pinho
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
José Augusto Meleiro Rodrigues
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís José de Mello e Castro Guedes
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia


Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro


Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda


ANTES DA ORDEM DO DIA


O Sr. Presidente : – Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.


O Sr. Secretário (Artur Penedos): – Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram aceites, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n. os 10/VIII – Lei de bases da segurança social (PCP), que baixou à 9.ª Comissão, e 11/VIII – Altera a Portaria n.º 29/89, de 17 de Janeiro, que aprova a Tabela de Perfis Psicofísicos e de Inaptidões para Efeitos de Prestação do Serviço Militar (Os Verdes), que baixou à 1.ª Comissão; proposta de lei n.º 1/VIII – Alteração à Lei n.º 87B/98, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 1999), que baixou à 5.ª Comissão; projecto de resolução n.º 3/VIII – Sobre a «taxa Tobin» (BE); apreciações parlamentares n. os 3/VIII – Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho, que aprova o novo Estatuto dos Militares das Forças Armadas (PCP) e n.º 4/VIII – Decreto-Lei n.º 439

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O Sr. Presidente : – Srs. Deputados, o parecer está em discussão.


Pausa.


Não havendo inscrições, vamos votar.


Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.


O Sr. Presidente : – Inscreveram-se, para declarações políticas, o Sr. Deputado Basílio Horta e a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia. Vejo que o Sr. Deputado Basílio Horta non est hic . Se a bancada do CDS-PP não me garantir que ele vai entrar como uma seta dentro dos próximos minutos, darei a palavra à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e depois dar-lha-ei a ele.


Pausa.


Tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, para uma declaração política.


A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Regime de Avaliação de Impacte Ambiental, incompreensivelmente, continua por rever em Portugal. Significa isto que inúmeros projectos continuam a culminar em obras que não são sujeitas a uma avaliação de impacte ambiental séria, quer porque não são sujeitos a parecer vinculativo resultante do estudo de impacto ambiental, quer porque não envolvem seriamente uma discussão pública desejável, que, muitas vezes, não passa de mera farsa porque não é tida em conta, quer porque a implementação das medidas minimizadoras fica por efectuar, quer ainda porque continuam a permitir decisões anteriores aos estudos que mais não servem do que encomendas de argumentos para justificar decisões previamente tomadas.
Com isto, continua a desvirtuar-se todo o processo de avaliação de impacte ambiental, desvirtuando todo o sentido deste regime, que tem como objectivo a avaliação dos efeitos de determinadas obras no meio ambiente, no território e na qualidade de vida dos cidadãos, tal como define a Lei de Bases do Ambiente. E, com isto, continua o Governo a permitir que os interesses dos grandes grupos económicos se sobreponham a um direito fundamental dos cidadãos, previsto na Constituição da República Portuguesa: o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado.
Ora, a questão é precisamente essa. Que outra razão haveria para o eterno adiamento da revisão do Regime de Avaliação de Impacte Ambiental, quando, em termos discursivos, o Governo e o PS afirmam da necessidade dessa revisão e, na prática, inviabilizam todas as hipóteses de alteração e credibilização do regime? É assim por demais visível que o problema reside na falta de vontade política do Governo nesta matéria, chegando ao limite do profundo desrespeito pelos direitos das pessoas. É que, de uma vez por todas, tem de se ter em conta que a avaliação de impacte ambiental não tem por objectivo proibir projectos, inviabilizar tudo e mais alguma coisa, mas tem um objectivo fundamental, que é avaliar da sustentabilidade ambiental, social e económica dos projectos, é escolher, muitas vezes, a opção mais equilibrada de entre opções diversificadas e minimizar os custos do empreendimento de determinadas obras.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio ser, porventura, justo reconhecer que o Grupo Parlamentar de Os Verdes tem dado um precioso contributo para a discussão e análise desta matéria na Assembleia da República. Desde logo, com a apresentação de um projecto de lei, na anterior legislatura, que propunha um novo Regime de Avaliação de Impacte Ambiental, que acabou por ser rejeitado e que foi sempre acompanhado do argumento, por parte do Governo e do PS, de que se estava a ultimar uma alteração à Directiva Comunitária 85/337/CEE, da qual, aliás, já se conheciam todos os princípios e pressupostos, afirmando-se que não faria sentido legislar antecipadamente, permitindo-se assim a continuidade de inúmeros atentados ambientais. O mesmo argumento, aliás, que o PSD dera em Maio de 1992 para justificar a rejeição de iniciativas legislativas sobre a matéria, o que então o PS contestou.
Entretanto, o Estado português sentava-se no banco dos réus do Tribunal de Justiça, por transposição incorrecta da Directiva 85/337/CEE, o que levou Os Verdes a solicitar um debate de urgência nesta casa, na medida em que o Decreto-Lei n.º 186/90 deixava de fora inúmeros projectos sujeitos a avaliação de impacte ambiental. E, afinal, antes da revisão da dita directiva, o Governo teve que mexer na legislação sobre a matéria, de modo a permitir, no mínimo, uma transposição correcta, pelo Decreto-Lei n.º 278/97, sendo que as consequências desta «brincadeira» pesaram por certo nos bolsos dos contribuintes.

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O Sr. Presidente : – Sr.ª Deputada, dê-me licença de a interromper.
Há um ruído de fundo na sala e peço aos Srs. Deputados que façam o silêncio possível para que a Sr.ª Deputada possa fazer-se ouvir em condições.
Queira continuar, Sr.ª Deputada.


A Oradora : – Sr. Presidente, dizia eu que, na verdade, provou-se que a autorização legislativa não serviu para mais do que o arrastamento do processo. Daí nada resultou! Como adverte o Sr. Provedor de Justiça, em recomendação dirigida ao Sr. Presidente da Assembleia da República, a autorização legislativa, nos termos constitucionais, caduca com o termo da legislatura e voltamos, por isso, à estaca zero. E imaginem os Srs. Deputados que esta história toda decorreu com o XIII Governo Constitucional, que assumia como sua prioridade, ao nível ambiental, a credibilização dos estudos de impacte ambiental! Desta prioridade resultou um «tudo na mesma» durante uma legislatura inteira. Olhando agora para o Programa do XIV Governo, a vergonha resultante das atitudes de descrédito já conseguiu eliminar dos textos essa conversa!
Sr. Presidente e Srs. Deputados, Os Verdes consideram que basta de brincadeiras com coisas tão sérias quando se trata de um dos instrumentos fundamentais de política para o ambiente como é a necessidade de uma avaliação de impacte ambiental séria, credível e, fundamentalmente, responsável por um desenvolvimento sustentável que afine progresso e preservação ambiental e qualidade de vida. Ou se trata de reconhecer que o regime de avaliação de impacte ambiental não serve, de uma vez por todas, e há vontade política na sua alteração, ou, então, que se reconheça que o único objectivo é o dinheiro que entra com projectos de grande impacto no meio ambiente, e que serve interesses que em nada têm que ver com desenvolvimento equilibrado. Por isso, esta declaração política serve também para informar que Os Verdes
vão voltar a apresentar novo projecto de lei para a revisão do Regime de Avaliação de Impacte Ambiental e esperemos que desta vez a Assembleia da República dê a volta necessária à garantia do futuro no ambiente, território e qualidade de vida em Portugal.


Aplausos de Os Verdes e do PCP.


O Sr. Presidente : – Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.


O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): – Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, há um pressuposto fundamental na sua intervenção que é o de que o facto de os estudos de impacte ambiental não terem carácter vinculativo desvirtua por completo o seu papel. Poder-se-ia pensar que, sem um carácter vinculativo, os estudos acabam por não servir o seu objectivo, acabam por não servir para nada. Ora, a meu ver e no desta bancada, as coisas não são exactamente assim: os estudos acabam por desempenhar, em Portugal, sobretudo para as obras e para os projectos mais polémicos, um papel de despertar as consciências e de chamar a atenção para que não podemos desprezar e devemos valorizar, inclusivamente, esta circunstância.
Chamo a atenção da Sr.ª Deputada para o facto de que há certas obras de iniciativa pública que se destinam, justamente, a actuar na área ambiental e que seria desejável, a nosso ver, que se começasse a mudança por aí. Não é por acaso que os estudos não são, eles próprios, vinculativos, alguma razão há-de haver. Mas, a desejarmos uma mudança, será bom não apontar para uma mudança radical e preferir uma mudança gradativa.
A pergunta que deixo à Sr.ª Deputada é se não será mais positivo, nessa circunstância, defender que, para certos tipos de obra, passem os estudos a ter carácter vinculativo.
Por exemplo, quanto à localização da incineradora para resíduos tóxicos industriais perigosos em Estarreja, decidida pelo governo da altura, ou quanto à incineração em cimenteiras, decidida já por este Governo, é sabido que os estudos de impacte ambiental desautorizaram a decisão que foi tomada, isto é, evidenciaram que a decisão teve um carácter político. Assim, pergunto se não será, de momento, mais avisado propor que, para projectos deste tipo, com incidência ambiental, de iniciativa pública e de grande dimensão, aí sim, os estudos passem a ter carácter vinculativo.


Vozes do CDS-PP : – Muito bem!


O Sr. Presidente : – Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.


A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): – Sr. Presidente, Sr. Deputado: Agradeço a questão que acaba de me colocar. No entanto, quem ouvisse o pedido de esclarecimento do Sr. Deputado podia ser levado a pensar que a nossa reivindicação relativamente à credibilização dos estudos de impacte ambiental passaria, única e exclusivamente, pelo carácter vinculativo do parecer dado por estes estudos. Não se trata, naturalmente, disso, embora essa seja uma questão, na nossa perspectiva, importante para a credibilização e utilidade dos próprios estudos de impacte ambiental e da própria avaliação de impacte ambiental, que, como sabe, não se resume aos

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O Sr. Presidente : – Também para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. António Champalimaud tem todo o direito de proteger os seus interesses, desde que respeite a lei. O Banco Santander tem todo o direito de tentar conquistar, em Portugal, a quota de mercado que fixar como objectivo, desde que respeite a Constituição e a lei portuguesas. Em termos políticos de interesse do Estado, não deve esta Assembleia analisar ou sequer comentar as condutas de agentes privados, desde que respeitadoras das leis e das instituições.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – O que deve interessar a esta Assembleia da República é conhecer em detalhe a política do Governo relativamente ao sistema financeiro nacional e saber se o Governo considera ou não indispensável manter em mãos nacionais os principais centros de decisão do mercado, como forma de garantir, numa Europa alargada, a nossa autonomia e a nossa identidade.
Todos os países, sem excepção, defendem os seus interesses de uma forma firme e vigorosa. É ver como a Alemanha, a França e a própria Espanha o fazem, não temendo entrar em conflito com a Comissão quando estão em causa aspectos considerados vitais para a preservação da sua autoridade política. Portugal não pode aceitar que a riqueza ou a influência política sirvam de critério para justificar dois pesos e duas medidas na valoração das condutas dos governos quando está em causa a defesa de relevantes interesses nacionais.
Por isso, o CDS-PP entende mal, entende mesmo muito mal, que o Governo português resolva ou pretenda resolver uma situação delicada decorrente de uma decisão sua fundamentada em relevantíssimos interesses nacionais, submetendo-se por inteiro ao diktat da Comissão.


Aplausos do CDS-PP.


É uma profunda desautorização e é um péssimo precedente, substancialmente agravado com a ida apressada do Ministro das Finanças e da Economia a Bruxelas, dando, interna e externamente, a imagem de, qual Egas Moniz, estar pronto a fazer a paz a qualquer preço para salvar a presidência portuguesa. Se Paris valia bem uma missa, a presidência portuguesa, seguramente, não vale tamanha humilhação.
Quanto à forma adoptada pelo Governo para solucionar o chamado problema «ChampalimaudSantander», assaltam-nos inúmeras dúvidas e não poucas perplexidades.
Em primeiro lugar, durante a campanha eleitoral para as eleições realizadas há meia dúzia de dias e ganhas pelo Partido Socialista, o Governo sempre justificou e defendeu politicamente o veto ao negócio privado celebrado entre o Sr. Champalimaud e o Banco Santander com base na garantia de que o terceiro maior grupo financeiro português não iria para Espanha. Durante a discussão do Programa do Governo, o novo Ministro veio a esta Assembleia reafirmar que se mantinha a posição oficial do Estado português. Então, como pode o Governo justificar, decorridos apenas 40 dias sobre o acto eleitoral, a quebra do seu compromisso para com os portugueses, aparecendo agora a dar o dito por não dito, ao permitir que o Banco Santander e, consequentemente, os espanhóis, integrem os bancos Totta e Crédito Predial, ficando assim com uma quota de 10% do mercado nacional, bem maior do que aquela a que, na situação anterior, podiam aspirar?
Por outro lado _ e peço a especial atenção do Partido Socialista para isto _, se for confirmada a notícia hoje veiculada pelo Diário Económico de que o Santander vai ficar com a participação de 24,5% do Grupo Champalimaud no capital da Petrocontrol, ficando com a porta aberta para entrar no capital da GALP, teremos de concluir que o Governo é totalmente insensível à passagem para mãos estrangeiras, designadamente espanholas, de centros decisores nevrálgicos da nossa economia e do nosso sistema financeiro.


Aplausos do CDS-PP.


Foi pena, Srs. Deputados do Partido Socialista, que não o tivessem dito durante a campanha eleitoral, pois os portugueses ter-lhesiam, seguramente, sabido dar a devida resposta.
Numa outra perspectiva, analisando o papel da Caixa Geral de Depósitos nesta operação, teremos, desde logo, de nos espantar com a insólita e creio que única circunstância de o Governo intervir neste processo simultaneamente como parte, enquanto accionista único da Caixa, e como juiz, enquanto decisor administrativo do mesmo. Talvez o facto de o Sr. Ministro acumular as Finanças com a Economia o confunda sobre quais os limites à intervenção do Estado na economia. O Sr. Ministro, embora tenha mudado de líder e de convicções, pelo menos neste caso ainda não mudou de estilo.

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O Orador : – Aliás, a nossa perplexidade aumenta quando constatamos que o Ministro avaliza o negócio feito pelo Governo consigo próprio e com o Banco Santander, dispensando autorizações que julgávamos indispensáveis, nomeadamente, no caso, as autorizações do Banco de Portugal e do Instituto de Seguros de Portugal.
Por outro lado, como compatibiliza o Governo o respeito que diz ter pelo mercado quando nele intervém num momento em que estão ainda em curso três ofertas públicas de aquisição sobre sociedades objecto deste negócio? O Sr. Ministro, embora seja um recém convertido, para não lhe chamar «cristão novo», não pode ignorar que o respeito pelo mercado vive de comportamentos concretos e não de meras proclamações.
O Governo ter-se-ia indignado quando aqui afirmámos que a intervenção da Caixa, nos moldes em que foi realizada, se traduzia afinal num verdadeiro processo de nacionalizações. Porém, como explicar que o Presidente do Conselho de Administração da Caixa tenha ontem vindo expressamente admitir que esta instituição pode vir a integrar definitivamente a Mundial Confiança e o Sotto, aumentando assim enormemente a estrutura e a dimensão do grupo que já é o maior grupo financeiro português?!


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – O CDS não pediu a privatização isolada e por si só da Caixa Geral de Depósitos, porque considera esta instituição um instrumento fundamental do equilíbrio e da própria moralização do sistema financeiro, mas discorda com igual intensidade da opção de transformar a Caixa no tal banco de verdadeira dimensão europeia, feito à custa do mercado e das entidades privadas nacionais.


Aplausos do CDS-PP.


De outro modo, Portugal corre o sério risco de adoptar o modelo próximo do de algumas antigas repúblicas do leste europeu, caracterizado pelos grandes protagonistas dos sectores chave da economia e das finanças serem empresas privadas multinacionais, convivendo com grandes sociedades de capitais públicos. Algo muito semelhante ao que ocorreu aqui em 1975, quando as sociedades estrangeiras e multinacionais foram as únicas a ficarem imunes às nacionalizações que se abateram sobre as empresas portuguesas.


Aplausos do CDS-PP.


O CDS-PP lança daqui o seu alerta ao País para que a história se não repita, até com alguns dos mesmos protagonistas, só que agora aparentemente reciclados ou aditivados.


Risos do CDS-PP.


Finalmente, uma última questão.
Quanto é que vai custar aos contribuintes portugueses esta intervenção da Caixa? É que no último Orçamento do Estado a Caixa foi objecto de uma dotação de 50 milhões de contos para reforço do seu capital. Ora, será muito provável que a Caixa, para fazer aquisições no valor de centenas de milhões de contos, necessite de novo reforço
de capital para manter integralmente o ratio de solvabilidade. Se assim é, de quanto vai ser esse reforço? Consta tal reforço do orçamento suplementar ontem entregue nesta Assembleia? É que devia constar!


O Sr. Manuel dos Santos (PS): – Se for necessário!


O Orador : – Sê-lo-á, certamente. A menos que queiram levar a Caixa à falência!


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Parece evidente que é!


O Orador : – Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS-PP aguarda com a maior expectativa a ida do Sr. Ministro da das Finanças e da Economia à respectiva comissão parlamentar para explicar aos portugueses em que consiste e como vai ser aplicado este novo modelo que ironicamente podemos classificar de dirigismo estatal da economia de mercado.


Aplausos do CDS-PP.


Entendemos igualmente indispensável ouvir o Sr. Presidente da Caixa Geral de Depósitos sobre as questões especificamente pertinentes à gestão desta instituição e ao seu relacionamento com a tutela. O CDS-PP tirará, então, as suas conclusões e assumirá as iniciativas políticas tendentes a corrigir abusos ou distorções e a acautelar direitos ou legítimas expectativas de entidades privadas nacionais, na óptica de uma economia social de mercado incompatível com qualquer tipo de capitalismo de Estado, economia cada vez mais transparente, mais socialmente justa e mais consciente do papel que lhe cabe desempenhar na preservação da identidade nacional.


Aplausos do CDS-PP.


O Sr. Presidente : – Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Basílio Horta, os Srs. Deputados Manuel dos Santos, Lino de Carvalho, Francisco Louçã e Manuela Ferreira Leite.
Para pedir esclarecimentos, tem, então, a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.


O Sr. Manuel dos Santos (PS): – Sr. Presidente, Sr. Deputado Basílio Horta, apreciei muito os três primeiros minutos da sua intervenção. Foi pena que, depois, tivesse «descarrilado»!
V. Ex.ª diz, entre outras coisas seguras e certas, três coisas fundamentais. Em primeiro lugar, que alguns países da União Europeia não têm qualquer problema em entrar em conflito com a Comissão, quando se trata de defender o interesse nacional. Foi exactamente o que fez o Governo português, foi exactamente o que fez Portugal.


Vozes do PS : – Muito bem!


O Orador : – V. Ex.ª também disse que é necessário que haja uma política de defesa dos relevantes interesses nacionais. Foi exactamente essa política que o Governo levou a cabo, é exactamente essa política que o Governo continua a levar a cabo.
V. Ex.ª ainda disse uma outra coisa e devo confessar que essa é surpreendente. Talvez sejam os novos tempos da sua bancada! V. Ex.ª disse que a condição económica, a riqueza material, não deve ser um elemento de favori

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O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): – É humanistacristão!


O Orador : – Ainda bem que V. Ex.ª referiu isso, porque é exactamente isso que defendemos, Sr. Deputado Basílio Horta. Aliás, foi exactamente isso que esteve na origem de uma comissão de inquérito cuja constituição aprovámos nesta Assembleia na anterior legislatura, comissão que se destinou a investigar alguns actos dos governos do PSD, tendo concluído, de forma inequívoca e clara, a existência de um claro favorecimento do governo de Cavaco Silva ao Sr. António Champalimaud.
Como vê, se V. Ex.ª tivesse ficado por aqui, tudo bem. Infelizmente, aconteceu-lhe como àquele senhor que caiu do 12.º andar, veio por ali abaixo atrapalhado e, quando chegou ao nível do résdochão, disse: «Até agora, tudo bem»! O problema era o que vinha a seguir! E V. Ex.ª, a seguir, disse um conjunto de coisas completamente contraditórias com tudo o que tinha dito anteriormente.


O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): – Quais?!


O Orador : – Claro que se salvou a parte final, em que reclamou a presença do Sr. Ministro das Finanças e da Economia _ e, seguramente, o Sr. Ministro virá a esta Assembleia quando as comissões estiverem instaladas _, em que reclamou informação, que, seguramente, virá, e, sobretudo, quando disse que o CDS-PP reservará a sua posição final para quando tiver um conhecimento mais detalhado da situação.
O que V. Ex.ª não pode é defender o imperativo da defesa dos interesses nacionais e, por outro lado, não querer que o Estado intervenha no mercado. Como V. Ex.ª sabe, compete ao Estado regular o mercado e, obviamente, para regular o mercado, para regular a concorrência e para defender os tais relevantes interesses nacionais que V. Ex.ª refere, e muito bem, é necessário utilizar mecanismos apropriados. Ora, a utilização da Caixa Geral de Depósitos como instrumento fundamental e fulcral era absolutamente necessária.


O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): – Bem lembrado!


O Orador : – Naturalmente, não vou criticar, até porque não conheço em pormenor, a referência que fez a uma notícia do Diário Económico de hoje. Aliás, V. Ex.ª não disse isso com grande convicção, já que disse «Se for verdade que (…). Se eventualmente se verificar que (…).». De qualquer modo, eu, como lhe digo, não conheço a notícia, não tive oportunidade de ler esse jornal e, portanto, não posso fazer qualquer comentário sobre isso.
Há, contudo, uma coisa que lhe quero dizer muito claramente, Sr. Deputado: vivemos num mundo globalizado, pelo que, se é verdade que o investimento directo estrangeiro vai ocupando algumas posições em Portugal, também é verdade que o investimento directo português vai ocupando algumas posições no exterior.


O Sr. José Junqueiro (PS): – Muito bem!


O Orador : – Lembro-lhe, por exemplo, o caso da Cimpor e o caso das cadeias de distribuição, da EDP, da Portugal Telecom, etc. Tal quer dizer que, nesse mundo globalizado, o que é fundamental, como V. Ex.ª diz _ e devo dizer-lhe que estou inteiramente de acordo consigo _, é defender o interesse nacional. Ora, o comportamento do Governo, quer do governo anterior, quer do actual, neste caso concreto, entrando em conflito com a Comissão, foi claramente um comportamento de defesa do interesse nacional.
Temos, aliás, Sr. Deputado, algumas boas razões para estarmos satisfeitos com o relacionamento que temos tido com a Comissão. Lembro-lhe, para terminar, que ainda ontem o Governo português conseguiu impor à Comissão uma mudança de política relativamente à exportação da madeira de pinheiro. Como vê, o interesse nacional está substancialmente defendido e o Governo português tem esse interesse em consideração.


Aplausos do PS.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Mas o Santander também quer o dinheiro?!


O Sr. Presidente : – Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Responderei com muito gosto ao Sr. Deputado Manuel dos Santos, pelo menos àquilo que é respondível.
Creio que o Sr. Deputado Manuel dos Santos _ e peço-lhe que não me leve a mal por lho dizer _ deve ser o único português, já que não conheço mais nenhum, que pensa que a posição do governo anterior é igual à posição deste Governo!


Risos do CDS-PP.


Compreendo que o Sr. Deputado Manuel dos Santos diga, como camaradas seus disseram, que era essencial para Portugal resolver esta questão e que esta foi a maneira mais hábil e expedita de o fazer. Não concordo com esta visão da intervenção do Estado nem com esta visão da estratégia das prioridades do Governo, mas admito que me digam isto.
Contudo, não concordo com estas visões e foi isso que fui ali dizer. Por que é que não concordo? Não concordo porque penso que a Comissão tem os seus direitos e que o Governo português tem os seus direitos e os seus deveres e que para estes é que há tribunais. Não é um problema gravíssimo os tribunais julgarem de uma maneira ou de outra, mas já é um problema mais grave, de cada vez que a Comissão diz que não, irmos «a correr» como foi o Sr. Ministro. Vimos na televisão que o Sr. Ministro foi para ali «a correr», dando todas as explicações, de cerviz baixa e, mesmo assim, a Comissão ainda diz: «Não! Nós exigimos que o veto seja expressamente levantado! Não chega mudar o negócio!». E o Ministro – que já esteve não sei quanto tempo à espera do Administrador do Santander e que até perdeu os telejornais por causa disso, coitado – tem de vir outra vez, dizendo: «E agora, como é que eu vou fazer?! Tenho mesmo de sofrer a humilhação fatal e final de dizer que levantamos o veto, desautorizando tudo o que o governo anterior fez?!».
Sr. Deputado Manuel dos Santos, compreenderá que, se bem o conheço, não acredite que o senhor, no fundo, concorda com isto.

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O Orador : – Não pode! O senhor, que foi membro de um governo e a quem vi defender posições intransigentes em nome do interesse público e nacional, não pode concordar com isto! Pode, enfim, dizer alguma coisa para justificar aquilo que, em nosso entender, é injustificável...
O CDS-PP, por história e por posição, é um partido que acredita claramente na Europa e que sempre a defendeu ao longo da sua história, com mais ou menos cepticismo.


O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): – Houve uma época em que isso não era assim tão claro!


O Orador : – Como sabe, a questão europeia atravessa horizontalmente todos os partidos. Se o Sr. Deputado olhar para dentro do seu partido, verá o que é que lá tem!


O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): – Mas pouco!


O Orador : – Pouco, não! Muito! Muitíssimo!
Dizia eu que o facto de acreditarmos na Europa não significa que não tenhamos em conta a necessidade de, numa Europa cada vez mais alargada, preservarmos cada vez mais a nossa identidade.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – E, em nosso entender, ela preserva-se pela cultura e pela economia, que são coisas que se resolvem.
Peço ao Sr. Deputado que, num dia em que tiver tempo, faça um pequeno exercício. Ponha um «transparente» sobre a Lei dos Sectores, a antiga Lei dos Sectores do falecido Melo Antunes, e veja bem quais eram os sectores prioritários da economia e onde é que esses sectores se encontram hoje, veja em que mãos se encontram hoje esses sectores, começando pela EDP. O senhor vai ver que conclusões tremendas tira desse exercício!
Como há pouco dizia, brincando, Paris não valia uma missa para alguns reis que não eram católicos. Para nós, este tipo de procedimento constitui um precedente extremamente grave.
Finalmente, devo dizer-lhe que é evidente que defendemos uma economia social de mercado e não um neo-liberalismo primário. Somos um partido de democratascristãos e, como tal, temos pessoas mais ou menos liberais. Eu, por exemplo, não sou um neo-liberal nem nunca o fui na minha vida. Contudo, sempre lhe digo que uma coisa é intervir no mercado, racionalizando, moralizando, assegurando a concorrência, e outra coisa muito diferente, Sr. Deputado, é fazer negócios…


O Sr. Presidente : – Agradeço que termine, Sr. Deputado.


O Orador : – Termino já, Sr. Presidente.
Ainda por cima, quando esses negócios são feitos consigo próprio, pois é o Estado que tem de negociar com ele próprio. Isso é que é incrível, e único, na história económica portuguesa.


Aplausos do CDS-PP.


O Sr. Presidente : – Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – Pelos vistos, o único partido que agora defende o neo-liberalismo primário é o Partido Socialista.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Parece evidente!


O Orador : – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Concordamos que esta nova etapa do «romance» que é, já, o negócio entre António Champalimaud e os espanhóis do Banco Santander tem ainda muito por esclarecer. Por isso mesmo, o Grupo Parlamentar do PCP requereu já a vinda do Sr. Ministro da Economia, ou do Sr. Ministro das Finanças – ou de ambos, simultaneamente – à Comissão de Economia, Finanças e Plano, para esclarecer o muito que há para esclarecer.
Desde logo, Sr. Deputado, para esclarecer uma coisa tão simples como, por exemplo, responder aos muitos «ses» que o Sr. exMinistro Sousa Franco escreveu num significativo artigo no suplemento de economia do Expresso da semana passada. Seguramente que ele sabe mais deste «romance» que todos nós juntos.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Sabe de certeza!


O Orador : – Mas o Sr. ex-Ministro Sousa Franco poderá, talvez, responder a outros «ses», Sr. Deputado, nomeadamente, a um outro «se» que tem a ver com o papel que foi dado à Caixa Geral de Depósitos neste processo.
Ao contrário das preocupações do Sr. Deputado – não tenha medo, Sr. Deputado, porque não tem razões para essas preocupações – e ao contrário do que o Sr. Ex-Ministro das Finanças disse ao Financial Times , temos muitas e fortes razões para suspeitar que a intervenção da Caixa Geral de Depósitos, neste processo, não tem a ver, infelizmente, com o reforço do sistema financeiro público português ou com a sua utilização como instrumento para a sua estruturação nos quadros da defesa do interesse nacional. Tem a ver, sim, unicamente, com o servir como um instrumento que o Governo tinha à mão ou servir de intermediário para regular os interesses dos vários grupos privados financeiros. Servir de intermediário, se calhar, para a tal 4.ª fase, que ainda está muito por clarificar, que é a passagem de uma parte deste património dos espanhóis para um grupo privado português, seja ele o BCP seja ele o Espírito Santo. Vamos ver se não será isso, Sr. Deputado.
Portanto, se assim for, é evidente que este é um papel que nós não aceitamos, exactamente pelas razões contrárias às suspeitas ou preocupações do Sr. Deputado.


O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): – Ainda bem!


O Orador : – Para nós, Sr. Deputado, a questão central que deveria resultar da intervenção do Governo, neste processo, era procurar que uma alavanca tão importante para a economia portuguesa como é aquela que constitui o conjunto do sistema financeiro e segurador do ainda Grupo Champalimaud, pudesse voltar às mãos do sector financeiro público português e servir como elemento de fortalecimento da nossa economia, designadamente do sector financeiro.

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O Sr. Presidente : – Agradeço que termine, Sr. Deputado.


O Orador : – … aos interesses nacionais? Esta é uma questão que valeria a pena discutirmos, Sr. Deputado. Seguramente, é do interesse nacional trazer esta discussão à colação.


Aplausos do PCP.


O Sr. Presidente : – Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que 15 segundos chegam para responder ao Sr. Deputado Lino Carvalho, porque é muito simples: a democracia é exactamente isto, Sr. Deputado, e onde V. Ex.ª vê Estado, nós vemos iniciativa privada.


O Sr. Manuel dos Santos (PS): – E nós estamos no meio, na linha justa!


O Orador : – Vocês não estão em parte nenhuma!


O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): – Depende do dia, depende do mês…


O Orador : – Como eu estava a dizer, Sr. Deputado Lino de Carvalho, onde vocês vêem Estado, nós vemos iniciativa privada e quero apenas fazer um apontamento em relação ao que V. Ex.ª disse, ou seja, que é pena que a Caixa Geral de Depósitos acabe por perder e que os nossos receios não têm razão de ser… Vamos ver!
A questão é esta: o que é que faz ao resto do sistema financeiro português? Como é que o reorganiza? Este é que é o problema. Acha que ele fica bem como está, ou nacionalizao também? Julgo que não será lógico ir por aí!
Finalmente, o Sr. Deputado fez uma pergunta: para que é que servem as privatizações? Respondo-lhe com outra: para que é que serviram as nacionalizações?


Aplausos do CDS-PP.


O Sr. Presidente : – Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.


O Sr. Francisco Louçã (BE): – Virá, certamente breve, o dia em que se possa discutir com mais detalhe – tanto na Comissão como, eventualmente, em Plenário – os contornos deste negócio e da sua evolução.
Queria, no entanto, a propósito desta intervenção, pedir os esclarecimentos que considero necessários.
Antes de mais, queria felicitá-lo, Sr. Deputado Basílio Horta, porque creio que na sua intervenção conseguiu o que é raro para o mais hábil dos oradores desta Casa: conciliar, numa mesma intervenção, pontos de vista tão diferentes.
Ouvi, com a mesma atenção, o Deputado «nacionalista» contra a assistência completa do Governo à Comissão, no contexto desta segunda posição, deixando, aliás, perpassar a suspeita de que era partidário do primeiro veto e da «solução Sousa Franco»; ouvi o Deputado «privatizador» a acentuar a importância da empresa e, portanto, da privacidade do acto empresarial que, em última análise, como compreenderá, remete sempre para a possibilidade de a vender a quem quer que seja – por outras palavras, uma vez privatizada uma empresa, nenhuma barreira pode hoje ser constituída quanto ao facto de ela poder ser vendida, também a estrangeiros; mas ouvi, finalmente, um terceiro Deputado, ouvi, até, um Deputado «colectivista» que apelava à intervenção do Estado num sector tão sensível como o sector financeiro e a regulação do sector bancário.
Quero, portanto, felicitá-lo, porque creio que, na diplomacia florentina que é necessária para a articulação destas três intervenções, o fez com brilhantismo e, aliás, em muito pouco tempo.
No entanto, deixa-nos, ou deixa-me, pelo menos a mim, a dúvida sobre se não haverá aqui uma tentativa de dirimir um conflito entre o CDS e o PP, nestas várias interpretações.


O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): – Essa parte é connosco!


O Orador : – E nas soluções salomónicas que são necessárias para este tipo de arranjo, devo citar-lhe, para terminar, que há, nestas frases feitas como a que utilizou para coroar o seu discurso, remetendo para uma doutrina da economia social de mercado, mais pela publicidade do que pela razão, mais pela retórica política do que propriamente pelos conteúdos de fundo, «há muitos alçapões e não menos perigos».
Devo dizer-lhe, por isso, que tem ilustres antecedentes a este respeito. Faz agora cinco anos, no dia 15 de Novembro de 1994, em Bogor, na Indonésia, um presidente muito ilustre explicou que o seu país passaria a ser regido, justamente, pela doutrina da economia social de mercado: esse presidente chama-se Jiang Zemin…
Bem-vindo ao clube, Sr. Deputado Basílio Horta!


Risos do PS.


O Sr. Presidente : – Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de dizer, também muito brevemente,

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Aplausos e risos do CDS-PP.


Tem de concordar que também é um cocktail difícil. Talvez mais difícil do que o equilíbrio que o Sr. Deputado diz que eu fiz.
Quero focar dois pontos, apenas, para lhe dizer o seguinte: não concordei nem deixei de concordar com o Governo anterior. Aliás, o Ministro da Finanças era uma pessoa que eu respeitava muito – e não posso deixar de dizer aqui que o Sr. Prof. Sousa Franco é uma pessoa que merecia,…


A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): – E merece!


O Orador : – … da minha parte, o maior respeito e a maior consideração. Ponto final! É uma questão pessoal que nada tem a ver com questão política.
A questão, portanto, não é essa e eu não tenho nada de saber se fez bem ou se fez mal. O que eu digo é que nós não devemos ter medo dos tribunais. Não devemos! Se há um conflito de interesses, há tribunais para julgar.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – Nós não temos de, por via administrativa, pôr interesses, que são de claro e relevantíssimo interesse nacional, nas mãos de um ministro ou de um governo.
Há atitudes que se tomam e que têm de ser levadas até ao fim, sob pena de perdermos a credibilidade interna e, fundamentalmente, a autoridade externa.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – Quanto ao problema da China, do Jiang Zemin, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que nós, graças a Deus, não temos nenhuma Praça de Tianamen. Nós respeitamos os direitos liberdades e garantias e, agora, até concordamos com o Sr. Deputado Carlos Carvalhas, quando diz que os direitos fundamentais, os direitos civis e políticos devem prevalecer sobre os direitos económicos.
Bem-vindo, também, ao clube, Sr. Deputado, se é que quer entrar neste clube!...


Aplausos do CDS-PP.


O Sr. Presidente : – Para formular um pedido de esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Ferreira Leite.


A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): – Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Basílio Horta, pelo debate que aqui se viu hoje percebe-se que, sobre esta questão, todas as bancadas apenas conseguem fazer perguntas. Mesmo o Sr. Deputado Manuel dos Santos, que tentou de alguma forma ser afirmativo, tenho poucas dúvidas de que só fez perguntas. O que significa e justifica o facto de que todas as bancadas menos a do Partido Socialista terem pedido a vinda do Ministro da Economia à Comissão, porque, evidentemente, é apenas aí, junto da Comissão, que o Ministro da Economia poderá explicar e responder às perguntas que todos nós temos para lhe fazer.
Disse o Sr. Deputado Manuel dos Santos, bastante ufano relativamente à posição portuguesa, que Portugal entrou em conflito e que muitos países entram em conflito com a Comissão.
Creio que isso é saudável, desde que tenha um objectivo. Mas quando não se percebe qual é o objectivo e quando qualquer um de nós fica perplexo sem perceber onde ele está – a única coisa que vimos foi alguma perda de credibilidade do País perante o exterior –, não consigo entender onde está o benefício desse conflito.


O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): – Muito bem!


A Oradora : – Mas tenho poucas dúvidas, Sr. Deputado Basílio Horta, de que aquela posição que o Governo assumiu pela voz do Primeiro-Ministro, dizendo que Portugal não era a «república das bananas», era uma posição claramente eleitoralista, porque correspondia ao período em que estávamos.
Neste momento começo a perguntar-me se o Primeiro-Ministro, ao passar aí por Lisboa, verificar que, afinal, em vez de um banco eles levaram dois, qual é o nome que ele dará a esta república.


Aplausos do PSD.


O Sr. Presidente : – Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.


O Sr. Manuel dos Santos (PS): – Não me quer dar do seu tempo Basílio? É que eu é que devia responder!


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não há uma pergunta mas uma afirmação, que merece a minha inteira concordância.
Quero apenas focar um aspecto, já que foi mencionado. Em relação ao Banco Totta, olhando um bocadinho para trás, se nós estivéssemos no governo, talvez não tivéssemos vendido a golden share que o Estado tinha no Totta. Só isso!


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Muito bem!


O Sr. Presidente : – Srs. Deputados, terminaram os pedidos de esclarecimentos e respectivas respostas em relação à questão em discussão.
Vamos passar à leitura, discussão e votação de dois votos: um voto de saudação, apresentado pelo PSD; e um voto de pesar assinado por todos os grupos parlamentares.
A Sr.ª Secretária da Mesa vai passar a ler o voto n.º 4/VIII – De saudação ao ex-Presidente do Conselho de Administração da sociedade Porto 2001, S.A., Dr. Artur Santos Silva, pela acção desenvolvida no âmbito do projecto Porto _ Capital Europeia da Cultura, apresentado pelo PSD.


A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): – O voto é do seguinte teor: O Grupo Parlamentar do PSD propõe ao Plenário da Assembleia da República um voto de reconhecimento ao Presidente do Conselho de Administração da Sociedade Gestora do Porto 2001, Dr. Artur Santos Silva, pela acção desenvolvida no âmbito do projecto nacional Porto 2001 – Capital Europeia da Cultura.
Da acção do Dr. Artur Santos Silva podemos afirmar que o Porto e o País saíram beneficiados com a capacida

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O Sr. Presidente : – Para iniciar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.


O Sr. António Montalvão Machado (PSD): – Sr. Presidente, antes de mais, permita-me que lhe dirija os meus respeitosos cumprimentos e que, através de V. Ex.ª, estenda também esses cumprimentos a todas as Sr. as e Srs. Deputados de todos os grupos parlamentares.


O Sr. Presidente : – Muito obrigado, Sr. Deputado.


O Orador : – O PSD tem a maior das honras em apresentar e em submeter à votação este voto de saudação, o n.º 4 desta legislatura, por quatro razões essenciais que passo a enunciar: em primeiro lugar, porque desta forma se reconhece a competência e o muito saber do Dr. Artur Santos Silva, abundantemente demonstrados ao longo da sua vida pelos mais variados projectos que liderou; em segundo lugar, porque desta forma se reconhece o sucesso pessoal e profissional do Dr. Artur Santos Silva em todas, mas todas, as actividades que desenvolveu; em terceiro lugar, porque desta forma se reconhece o seu prestígio e a sua credibilidade públicas, jamais rejeitadas pelos portugueses em geral e pelos portuenses em particular; finalmente, porque desta forma se reconhece a seriedade de meios intelectuais do Sr. Dr. Artur Santos Silva, bem demonstrada, também, nos nove meses em que exerceu o cargo de que ora se demitiu.


Vozes do PSD : – Muito bem!


O Orador : – O Dr. Artur Santos Silva demitiu-se porque se mostravam violados princípios, porque se mostravam violados valores e porque se desrespeitaram compromissos anteriormente assumidos pelo Governo. Quando assim for, o PSD está, e estará sempre, a favor do respeito pelos princípios, pelos valores e pela satisfação de compromissos anteriormente assumidos.


Vozes do PSD : – Muito bem!


O Orador : – É por tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a aprovação do presente voto é, evidentemente, um acto de solidariedade para com um ilustre filho do Porto, uma insigne figura do Norte, que prestigiava, nas funções que exercia, Portugal e os portugueses, mas é, sobretudo, e muito mais do que isso, um acto de inteira justiça, que os Deputados desta Câmara lhe devem prestar.


Aplausos do PSD.


O Sr. Presidente : – Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima.


A Sr.ª Isabel Pires de Lima (PS): – Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: É a primeira vez que tomo a palavra nesta Assembleia, pelo que me cabe saudá-los de modo particular e manifestar o empenho que estou disposta a pôr no trabalho que fui chamada a desenvolver neste órgão de soberania, procurando não defraudar as expectativas dos que me elegeram.
Também a bancada do PS pretendeu apresentar um voto de saudação à Prof.ª Doutora Teresa Lago, pela sua nomeação, e ao Dr. Artur Santos Silva, pelo trabalho desenvolvido no âmbito do projecto Porto – Capital Europeia da Cultura 2001, mas o PSD não permitiu que o fizéssemos.
Associamo-nos, pois, ao voto saudação pelo trabalho dedicado do Dr. Artur Santos Silva, que lançou as bases da construção do projecto Porto – Capital Europeia da Cultura 2001, em cuja candidatura e concepção a Câmara Municipal do Porto, a sua vereação da cultura e o Sr. Ministro da Cultura se empenharam desde o primeiro momento.
O Dr. Artur Santos Silva é alguém com forte inserção na realidade local, que revelou grande sensibilidade às aspirações da cidade, designadamente ao nível das questões de requalificação urbana. É alguém com um perfil ético marcado pela seriedade e rigor, que sempre imprime às suas funções de gestor.
Como acreditamos que não há personalidades insubstituíveis, embora lamentando o abandono do Dr. Artur Santos Silva, cremos que o projecto Porto – Capital Europeia da Cultura 2001 será levado a bom porto.


Aplausos do PS.


O Sr. Manuel Alegre (PS): – Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.


O Sr. Presidente : – Faça favor, Sr. Deputado.


O Sr. Manuel Alegre (PS): – Sr. Presidente, sob a forma de uma interpelação à Mesa, quero deixar aqui um testemunho. Em primeiro lugar, de homenagem pessoal às conhecidas virtudes de integridade cívica, moral e pessoal do Dr. Artur Santos Silva, que, de certa maneira, personificam as conhecidas virtudes das pessoas da cidade do Porto.
Mas quero também deixar aqui um testemunho sobre um lado menos conhecido do Dr. Artur Santos Silva, que conheço há muitos anos. Fomos companheiros em Coimbra e acho que fui a pessoa que o levou a uma primeira reunião clandestina do, então, MUD Juvenil, na casa do Prof. Bacalhau, que V. Ex.ª bem conheceu, em Celas. Ninguém se sentava, então, em cadeiras do poder, nem financeiro, nem económico, nem cultural, nem político, sentávamo-nos no chão, porque a casa estava desabitada, não tinha cadeiras e, cá fora, havia a repressão, a PIDE e o risco.
Ora, o Dr. Artur Santos Silva, com aquela modéstia que o caracteriza, correu esses riscos, participou nas batalhas da Academia de Coimbra contra a ditadura do Estado Novo, fiel às suas tradições republicanas e democráticas, que lhe vinham de família, apesar de ter uma carreira brilhante, tendo chegado, depois, como se sabe, a assistente do Prof. Teixeira Ribeiro. Foi sempre um homem

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Aplausos do PS e do CDS-PP.


O Sr. Presidente : – Sr. Deputado, como sabe, não fez uma interpelação. Porém, quando é a amizade que dita as violações ao Regimento, é perdoável.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.


O Sr. Francisco Louçã (BE): – Creio que é profundamente desprestigiante para esta Assembleia que lhe seja submetido um voto, sob esta forma, neste momento.
A pedido de várias bancadas, haverá, amanhã, um debate com o Ministro da Cultura, que incide sobre a matéria deste voto. A pedido de várias bancadas, entre as quais a do proponente, será discutido, em sede de comissão, com a presença do Dr. Artur Santos Silva, o balanço da sua gestão na sociedade Porto 2001, S.A.
Antes de se obterem os esclarecimentos que esta Assembleia entendeu necessários e imprescindíveis, submeter a discussão, a priori , a uma votação que condicione essas conclusões, porque impõe um veredicto e uma opinião global acerca do resultado desta mesma gestão que está em discussão, tanto quanto à experiência da sociedade administradora quanto a respeito daquela que foi dirigida pelo Ministério da Cultura, parece-me que é, se não uma infracção às normas, que certamente não será, pelo menos e seguramente uma infracção à regra do bom senso e da discussão qualificada com princípios e informação suficiente.
No quadro deste debate, aliás, suscitaram-se acusações graves. Disse o Dr. Santos Silva que foram cometidos erros grosseiros por parte do Ministério, que merecem atenção e reflexão. E é justamente por se considerar a importância e a seriedade do Dr. Santos Silva que essas acusações devem ser levadas a sério e não devem ser subordinadas a uma jigajoga política, que antecipa todas as conclusões desse debate em sede própria.
Por isso mesmo não nos podemos associar naturalmente a esta votação.
Devo dizer, para terminar, que há uma expressão que aparece incidentalmente na intervenção do proponente mas que me parece francamente preocupante e merece 10 segundos de atenção na Assembleia da República. Não votarei nem deixarei de votar qualquer resolução a respeito da actividade ou da personalidade do Dr. Santos Silva por ele ser filho do Porto, porque não o farei, naturalmente, a respeito de qualquer outro cidadão português por ser filho de Carnaxide, por ser filho de Lisboa ou por ser filha de Santarém. Esse argumento não deve pesar num órgão que tem como função representar a Nação. E digo-o, porque se ouviu, em público, um autarca ilustre deste país, o Sr. Vieira de Carvalho, dizer que a substituta, a Doutora Teresa Lago, não merecia a indigitação por não ser filha do Porto, o que certamente afectaria também personalidades ilustres nesta administração e no projecto Porto – Capital Europeia da Cultura 2001, como o Dr. Fernando Gomes, o Prof. António Barreto e muitos outros, que também não nasceram no Porto.
A irrelevância desse argumento obriga-nos a desconsiderá-lo e, por razões porventura mais vastas, obriga também a desconsiderar esta moção.


O Sr. Presidente : – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.


O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): – Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Partido Popular associa-se a também a este voto. E associa-se pela figura do Dr. Artur Santos Silva que extravasou, e extravasa, os limites do Porto, que extravasou, e extravasa, os limites da região norte, que extravasou, e extravasa, os limites de Portugal, como se queria e se quer que o Porto seja a capital europeia da cultura. Ora, a escolha de uma figura que extravasa todos esses limites, locais, regionais ou nacionais, era, por si só, uma escolha acertada.
O Dr. Artur Santos Silva sai do exercício do seu cargo porque nele foram incompreendidos três «ii» e três «cc»: nele foram incompreendidos o «i» de integridade, o «i» de isenção e o «i» de independência; nele foram também incompreendidos o «c» de competência, o «c» de capacidade e o «c» de correcção.
Desejo toda a sorte à administração e à nova presidente da sociedade Porto 2001, S. A., , S. A., mas isso não faz com que muitos dos protagonistas desta história, deste lamentável folhetim estejam isentos de erros. E isso também não faz com que o Dr. Artur Santos Silva saia deste processo como entrou: de cabeça levantada!
O Dr. Artur Santos Silva é um homem para quem o contacto com o dinheiro nunca fez com que deixasse de ser um homem de cultura e um homem de progresso.


Aplausos do CDS-PP.


O Sr. Presidente : – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.


O Sr. João Amaral (PCP): – Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto que está em discussão e vai ser votado tem um objecto claro e definido: trata-se de a Assembleia saudar e louvar a acção desenvolvida pelo Dr. Artur Santos Silva no cargo que exerceu, da máxima responsabilidade, no âmbito do projecto «Porto – Capital Europeia da Cultura 2001». É isso que está em discussão, neste momento.
Amanhã, discutiremos com o Sr. Ministro a sua responsabilidade nessas questões e poderemos ainda, quando tivermos oportunidade de apreciar um voto apresentado pelo Partido Socialista, pronunciar-nos sobre a indicação do novo nome e, de alguma forma, expressar a quem vai exercer o cargo o nosso empenhamento – e seguramente o de todos – em que, do exercício do cargo, resulte para o Porto e para o País aquilo que todos desejamos.
No caso concreto do Dr. Artur Santos Silva é importante este acto, em que a Assembleia se empenhou, de saudar, de aplaudir o trabalho que ele realizou. Não podemos deixar de lamentar que o seu trabalho e o da sua equipa tenha sido interrompido por razões que vamos ter a oportunidade de discutir, mas que, desde já, à partida, considero que foram prejudiciais para os interesses da cidade do Porto, para os interesses da cultura portuguesa e para os nossos interesses como país e como povo.

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Aplausos do PCP.


Vozes do PSD e do CDS-PP : – Muito bem!


O Sr. Presidente : – Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.


A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria dizer que o objecto deste voto nos parece claro e ele é o de não deixar de assinalar a intervenção, que do nosso ponto de vista foi extremamente positiva, do Dr. Santos Silva no seu envolvimento para erguer o projecto «Porto – Capital Europeia da Cultura 2001».
Este é um projecto que é importante para a cidade, para a região e para o País e, do nosso ponto de vista, entendemos que é de toda a justiça e que faz todo o sentido que a Assembleia se pronuncie sobre alguém que pôs em marcha este movimento, que deixou a sua marca e que, naturalmente, nem ele nem a equipa que com ele sai demissionária podem ser, pura e simplesmente, esquecidos.
O Dr. Santos Silva – como já foi referido – é alguém que reuniu, porventura como poucos teriam reunido, o consenso político na cidade do Porto e que nos meios culturais dessa cidade foi também pacificamente reconhecido. Seguramente que não é indiferente a isso aquilo que é a sua personalidade e, independentemente de amanhã irmos discutir as razões que, lamentavelmente, conduziram à sua demissão e à da sua equipa, entendemos que este voto é um voto de saudação a alguém e não a antecipação de uma crítica ou uma crítica a dois tempos que, provavelmente, a maioria dos partidos políticos aqui representados vai fazer a uma atitude e a uma forma de estar de um determinado Ministro, de um Governo, que, do nosso ponto de vista, só é preocupante porque põe em risco um projecto que merecia mais do que uma saída desta forma, nesta fase.


A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): – Muito bem!


O Sr. Presidente : – Srs. Deputados, permitam-me também que eu, nesta oportunidade, como velho amigo e admirador do Sr. Dr. Santos Silva lhe preste uma sentida homenagem.
Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação do voto n.º 4/VIII – De saudação ao Presidente do Conselho de Administração da Sociedade Gestora do Porto 2001, Dr. Artur Santos Silva, pela acção desenvolvida no âmbito do projecto nacional Porto 2001 _ Capital Europeia da Cultura (PSD).


Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP e do PCP e a abstenção do BE.


Srs. Deputados, como é normal o voto será levado ao conhecimento do Sr. Dr. Santos Silva.
Antes de passarmos ao segundo voto, anuncio que está connosco um grupo de 50 alunos da Escola Alfredo da Silva do Barreiro. Saudemo-los, como é habitual.


Aplausos gerais, de pé.


Srs. Deputados, vamos passar à leitura e depois à discussão e votação do voto n.º 8/VIII – De pesar pelo massacre de Santa Cruz, que o Sr. Secretário José Cesário vai ler.


O Sr. Secretário (José Cesário): – Sr. Presidente, Srs. Deputados, o voto n.º 8/VIII – De pesar pelo massacre de Santa Cruz em 12 de Novembro de 1991, subscrito por Deputados de todos os grupos parlamentares, é do seguinte teor:
O massacre do Cemitério de Santa Cruz, em Díli, perpetrado pelas forças militares indonésias em 12 de Novembro de 1991, foi mais um dos inúmeros actos de barbárie infligidos sobre o povo timorense, por uma potência ocupante que durante mais de 20 anos se empenhou numa política de verdadeiro terror genocida.
Desde a invasão do território de Timor, a 7 de Dezembro de 1975, que o povo timorense vinha sendo vítima das opressão e agressão indonésias e se registavam sistemáticas e brutais violações dos Direitos do Homem, mas o massacre de Santa Cruz provocou uma onda geral de indignação e despertou a comunidade internacional para a gravidade da situação vivida em Timor Leste, a qual Portugal há muito vinha denunciando em todas as instâncias internacionais.
A violência demente a que o mundo assistiu em Santa Cruz constituiu um marco histórico no alerta das consciências, forçando a Indonésia a inverter a sua política e permitindo a sucessão lenta e penosa dos passos que conduziram à actual situação em que os timorenses têm nas mãos o seu futuro como Estado independente, oitavo membro da Comunidade de Países de Língua Portuguesa e primeiro país lusófono na região da ÁsiaPacífico.
Para que a indiferença e o esquecimento não vençam sobre o terror e sobre a memória de todos aqueles que perderam a vida nos «Santos Cruzes» de que se fez a luta de Timor Leste pela sua liberdade e independência, os Deputados subscritores propõem ao Plenário que a Assembleia da República expresse um voto de pesar pelos eventos trágicos de 12 de Novembro de 1991.


O Sr. Presidente : – Srs. Deputados, para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Natália Carrascalão.


A Sr.ª Natália Carrascalão (PSD): – Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: Antes de iniciar a minha intervenção, gostaria de me dirigir a si, Sr. Presidente, para lhe manifestar o quanto me honra usar da palavra nesta Assembleia pela primeira vez e saudar todas as Sr. as e Srs. Deputados.


O Sr. Presidente : – Muito obrigado, Sr.ª Deputada.


A Oradora : – Gostava também de saudar todo o povo português pela determinação e pelo empenho que emprestaram à causa de Timor Loro Sae nos seus momentos mais difíceis.

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18 DE NOVEMBRO DE 1999






O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Muito bem!


A Oradora : – O massacre de Santa Cruz ficará na história de Timor Loro Sae indelevelmente associado ao princípio do fim da ocupação ilegal de Timor pela Indonésia.
É pena que tenha sido preciso tanto para abalar as consciências internacionais e fazer ouvir o grito de um povo oprimido.
A mediatização dos acontecimentos, por vezes criticada, assumiu nesta era da globalização e neste caso particular uma importância fundamental: o grito de que falamos não voltou a ser silenciado.
É caso para dizer que as imagens assumiram nesta última década características de uma nova «arma» que, se esgrimida com saber junto da comunidade internacional, é capaz de operar verdadeiras revoluções na tradicional condução das relações internacionais.
Julgamos também que, neste final de século, a questão de Timor Loro Sae deve servir como paradigma de uma nova postura internacional dos Estados. O relativismo civilizacional e cultural reinante não pode nem deve sobrepor-se a valores e a princípios absolutos e universais.
É tempo de perceber que uma vida humana vale o mesmo em qualquer ponto do globo.


Vozes do PSD : – Muito bem!


A Oradora : – Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: Queremos, nesta Câmara, expressar a nossa profunda esperança e o nosso desejo de que o Timor livre se reinvente com a mesma beleza, expressividade e paz que nos inspiram as palavras e as imagens de Ruy Cinatti.
Como mãe estou certa de que encontraremos nos olhos das crianças que aprenderam a sofrer em silêncio por Timor o futuro de um novo Estado capaz de construir e partilhar a mesma «comunidade de sonhos». Foi por esta que muitos lutaram e pereceram.
Porque, hoje e aqui, queremos recordar e honrar a memória dos que perderam a vida em Timor Loro Sae, o Partido Social Democrata propõe ao Plenário da Assembleia da República um voto de pesar que foi subscrito por todos os grupos parlamentares.
Para que o massacre de Santa Cruz jamais se repita e para que a História não volte para trás, lutemos sempre contra a indiferença e o esquecimento.


Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os Verdes.


O Sr. Presidente : – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Luís.


O Sr. Carlos Luís (PS): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista associa-se a este voto, ao momento que faz parte da história de Timor e que faz parte pela negativa.
No dia 12 de Novembro de 1991 tinha lugar, no Cemitério de Santa Cruz, o massacre que ficou conhecido pelo genocídio e pela barbárie. E foi necessário correr muito sangue para que a consciência internacional agisse perante a passividade, a indiferença e quando não a conivência das potências que ajudaram a Indonésia a perpetrar os genocídio, a barbárie e o sofrimento de um povo indefeso que lutava com a consciência de uma nação, com uns milhares de cidadãos que apostaram, determinantemente, que tinham direito à autodeterminação e à independência.
E essa consciência colectiva de um povo que fez calar a voz às potências que colaboraram com o genocídio, com os militares e com as autoridades da Indonésia possibilitou, a partir do massacre de Santa Cruz, que a causa de Timor tivesse visibilidade na comunidade internacional.
E é hoje aqui, neste Hemiciclo, mais uma vez, que nos associamos à vontade colectiva desse povo, do povo de Timor Leste, que durante todos estes anos lutou para que a sua dignidade como povo e como nação fosse reconhecida pela comunidade internacional. E nesta mesma tribuna todos os grupos parlamentares, todos órgãos de soberania e a sociedade civil portuguesa se têm vindo a associar a esta causa e nunca nos calámos perante as atrocidades da Indonésia.


Vozes do PS : – Muito bem!


O Orador : – Assim sendo, hoje recordamos o massacre, aqui, com mágoa, mas ao mesmo tempo com a satisfação de vermos um povo a caminho da sua autodeterminação e da sua independência.
E desta tribuna gritámos que apenas queríamos para Timor que fosse encontrada uma solução global, justa e internacionalmente aceite.


Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os Verdes.


O Sr. Presidente : – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.


O Sr. Bernardino Soares (PCP): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP associa-se ao voto de pesar apresentado em relação a um massacre de intolerável brutalidade como o que ocorreu no Cemitério de Santa Cruz a 12 de Novembro de 1991.
E a verdade é que, ao assinalarmos o nosso pesar e este massacre condenamos a violência perpetrada pela Indonésia, nesse dia e nesse lugar, mas não deixamos também de condenar toda a violência de que, desde 7 de Dezembro de 1975, foi alvo o povo de Timor pelo opressor indonésio, que nessa data invadiu aquele território, aquele país.
O marco histórico que é o massacre no Cemitério de Santa Cruz é também uma representação de todos os massacres que talvez mais silenciosamente foram sendo feitos ao longo de todos estes anos, ao longo de todos estes dias em que o povo timorense lutou pela sua independência, pelo seu direito à autodeterminação.

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I SÉRIE–NÚMERO 8




Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os Verdes.


O Sr. Presidente : – Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.


A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Subscrevemos este voto no exacto sentido em que entendemos que é importante que a memória seja respeitada.
Porventura, o massacre de Santa Cruz não foi maior do que muitos outros massacres que foram silenciados, mas foi aquele que, depois da ocupação militar pela Indonésia e do genocídio cometido durante anos, permitiu confrontar os poderes com o olhar e as imagens de um estado de terror, de violência que estava instalado.
Foi porventura esse momento que permitiu que as palavras e os alertas que alguns de nós tentámos lançar tivessem sequência; foi isso que permitiu que as opiniões públicas mundiais se envolvessem e pressionassem os seus governos, governos que sabiam dos massacres, governos que alimentaram militarmente, durante anos, a ditadura militar indonésia mas que se esquivavam sempre ao confronto do olhar, à realidade.
Pensamos, por isso, que lembrar o massacre é lembrar as vítimas ignoradas desta brutalidade, é lembrar a importância de que os crimes não fiquem impunes e a necessidade de julgar todos aqueles que são responsáveis de crimes contra a Humanidade e é lembrar que Timor, que sempre teve – e queremos que continue a ter – o consenso de todas as forças políticas – e não só – da sociedade portuguesa, é uma causa que continua a precisar de nós e que vai, por isso, merecer – e deve merecer – também a nossa atenção no futuro.


Aplausos de Os Verdes, do PS, do PSD, do PCP e do CDS-PP.


O Sr. Presidente : – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.


O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): – Sr. Presidente e Srs. Deputados: Apoiamos sem reservas este voto, que demonstra, se ainda fosse necessário fazê-lo, que esta Câmara continua a viver e a acompanhar, passo a passo, a situação em Timor Leste.
Por isso, não esquecemos os momentos mais significativos da luta do povo timorense pela sua liberdade e não esquecemos também aqueles que por ela mais se sacrificaram.


Vozes do CDS-PP : – Muito bem!


O Orador : – Santa Cruz foi o facto que revelou à opinião pública mundial que o terror existia e que um povo resistia em Timor Leste; foi um verdadeiro virar de página do povo de Timor pela sua independência.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – Santa Cruz foi possível graças à determinação da Igreja e à coragem da juventude timorense, que desafiou o terror, as ameaças e as tentativas de desmobilização para estar presente no cemitério.
Por isso o nosso voto, mais do que um voto de pesar é um voto de homenagem às vítimas e também um voto de esperança. E um voto de esperança, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em primeiro lugar, de que esta Câmara mantenha sobre a questão de Timor a máxima coesão, consenso e vontade de intervir – e a Assembleia da República teve, nesta matéria, sempre uma posição muito clara; um voto de esperança, em segundo lugar, de que a juventude timorense continue a demonstrar a coragem e o espírito de sacrifício de sempre – na paz e no momento da construção do seu país, essa coragem e essa determinação vão ser pelo menos tão necessárias como o foram no período da privação das liberdades; e, finalmente, Sr. Presidente, um voto de esperança de que a comunicação social continue a acompanhar activamente a questão de Timor e de que, parafraseando um anterior presidente da Comissão Eventual de Acompanhamento da Situação em Timor Leste, o Professor Adriano Moreira, «este assunto não passe à categoria dos temas dispensados e não tenhamos um dia de lembrar o esquecimento».


Aplausos do CDS-PP, do PS e do PSD.


O Sr. Presidente : – Srs. Deputados, associo-me, comovidamente como acontece quando se trata de Timor, às vossas palavra de indignação e de esperança e, parafraseando um velho desejo do grande Mahatma Gandhi, faço votos de que Portugal possa ajudar os nossos irmãos de Timor a secar as lágrimas de todos os olhos.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.


O Sr. Manuel Alegre (PS): – Sr. Presidente, creio que seria justo lembrar neste momento – e associar, de qualquer maneira, a este voto – o nome de um Deputado que consagrou grande parte da sua actividade à causa de Timor Leste, o saudoso Deputado Nuno Abecasis.


Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do CDS-PP e de Os Verdes.


O Sr. Presidente : – Essa foi uma verdadeira interpelação, que faz todo o sentido. Espero que todos nós estejamos de comovido acordo.
Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação do voto n.º 8/VIII – De pesar pelo massacre de Santa Cruz, em Díli.


Submetido à votação foi aprovado por unanimidade .


Srs. Deputados, o voto vai ser levado ao conhecimento do Comandante Xanana Gusmão e do Ministro dos Negócios Estrangeiros.


Aplausos gerais, de pé.


Srs. Deputados, vamos iniciar o debate de urgência que foi agendado para hoje, requerido pelos Grupos Parlamentares do Partido Comunista Português e do Partido Social Democrata, sobre o Acordo de Pescas com Marrocos.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

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18 DE NOVEMBRO DE 1999





O Sr. Presidente : – Obrigado, Sr. Deputado, por mim e por todos.


O Orador : – Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Quando esta Assembleia debateu, em Abril de 1997, o Acordo Comercial entre a União Europeia e Marrocos, o PCP justificou então o seu voto contra porque, entre outras razões, não tinham sido previstas as contrapartidas necessárias à renovação do Acordo de Pescas para além do seu termo, em 30 de Novembro deste ano, enquanto, por outro lado, as facilidades comerciais, agrícolas e outras então concedidas não tinham limite previsto.


O Sr. Octávio Teixeira (PCP): – Muito bem!


O Orador : – Na altura o Governo afirmou, com alguma agressividade até, tal como o fez o Grupo Parlamentar do PSD, que o PCP estava enganado, que as duas questões estavam ligadas e que o Acordo Comercial era essencial para a aprovação do Acordo de Pescas com Marrocos.
Vê-se agora quem tinha razão!


O Sr. Octávio Teixeira (PCP): – Muito bem!


O Orador : – Há precisamente um ano, na sequência de uma visita de uma delegação do Parlamento Europeu a Marrocos, escrevi ao titular da Secretaria de Estado das Pescas dando-lhe nota da preocupação do PCP sobre o futuro deste acordo e sugerindo os passos que, em nossa opinião, deveriam ser dados para negociar a respectiva renovação.
Estávamos longe de pensar que praticamente nada de eficaz fosse feito durante este lapso de tempo e que estivesse eminente, numa reedição do sucedido durante sete longos meses do ano de 1995, a paralisação total da frota nacional a operar em Marrocos.
Há um ano dissemos ao Governo que era fundamental agir para que o Conselho de Ministros mandatasse atempadamente a Comissão para iniciar negociações no sentido da renovação deste acordo de pescas e, assim, evitar paralisações na actividade da frota portuguesa. A verdade é que só no passado mês de Outubro o Conselho decidiu conferir tal mandato negociador à Comissão.
Há um ano dissemos ao Governo que as negociações não deveriam visar a obtenção de acordos radicalmente diferentes do actual, através do qual se compram licenças para pescar em águas marroquinas, mas o que é certo é que o tal mandato tardio conferido à Comissão prevê, como objectivo central – diria quase único –, estabelecer um acordo baseado na criação única de sociedades mistas.
O Governo parece ter esquecido que um tal acordo não serve a frota portuguesa, do tipo familiar, que não possui capacidade tecnológica, administrativa e financeira para criar sociedades mistas.
O Governo quer também esquecer-se – e fazer-nos esquecer – que um acordo de sociedades mistas exige o
abate de barcos à frota nacional, obriga à sua matrícula em Marrocos, obriga à descarga de todo o peixe capturado em portos daquele país e obriga à contratação de tripulações quase inteiramente marroquinas.


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – Exactamente!


O Orador : – O Governo quer ocultar que uma tal solução provocaria também o desemprego massivo em Sesimbra, que tem mais de 50% dos seus pescadores a trabalhar em Marrocos, e teria consequências bem graves em Olhão e na Fuzeta.
Há um ano aconselhámos o Governo a potenciar as características próprias da frota portuguesa em Marrocos – cerca de 40 barcos (e recordo, Sr. Secretário, que eram 51 em 1995 –, face perante às mais de 450 embarcações espanholas, capturando a nossa frota sobretudo peixe-espada, espécie que só os portugueses pescam e comem.
O Governo nada conseguiu, já que nenhuma referência a este facto está contemplada no mandato conferido à Comissão.


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – Exactamente!


O Orador : – Neste contexto, pergunta-se: primeiro, vai o Governo aceitar que um futuro acordo com Marrocos preveja unicamente o estabelecimento de sociedades mistas?
Pela sua parte, o PCP considera que o Governo só deverá aceitar um acordo do tipo misto que, paralelamente à possibilidade da criação de algumas sociedades mistas, preveja a manutenção de uma quantidade de licenças capazes de garantir a manutenção da actual frota nacional em Marrocos.
Segundo, que alternativas para esta frota tem o Governo caso apareça uma proposta de acordo apenas com sociedades mistas?
Considera o Governo que é alternativa aceitável promover – como, aliás, já sugeriu em documento oficial, de Julho de 1998 – novos abates de embarcações, fazendo regressar em força uma política que tristemente se notabilizou durante os governos de Cavaco Silva? Ou, pelo contrário, estará o Governo disposto a potenciar, como é necessário e desejável, através de negociações bilaterais, as vantagens específicas da nossa frota em Marrocos?
Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A inércia do Governo, do Conselho e da Comissão vai provocar a paralisação da frota portuguesa a operar em Marrocos a partir do final do mês e por um período de tempo ainda indeterminado, pois a primeira reunião formal de negociações está, infelizmente, apenas prevista para 20 dias depois de o acordo caducar.
Exigem-se, assim, compensações financeiras adequadas e suficientes a atribuir a pescadores e armadores, pagas desde o início da paralisação.
Registamos o facto de, como foi tornado público – mas que gostaríamos, Sr. Secretário de Estado, de aqui ver confirmado ou desmentido –, a Comissão estar preparada para atribuir uma compensação aos pescadores espanhóis 50% superior àquela que é destinada aos pescadores portugueses.
Registamos também o facto de, ainda segundo o que veio a lume na comunicação social, a Espanha ter requerido atempadamente tais compensações e de que o Governo português apenas comunicou telefonicamente as necessidades portuguesas já no final do mês de Outubro.

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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Exactamente!


O Orador : – Terceiro, o Governo garante que as compensações financeiras serão pagas directamente aos pescadores? Ou tal pagamento será feito por interpostas pessoas, como ocorreu, muitas vezes em 1995?
Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ciclicamente a negociação do Acordo de Pescas com Marrocos cria total instabilidade num segmento relevante da frota artesanal em Portugal.
As dificuldades crescentes na negociação tanto deste como de outros acordos de pesca com países terceiros coloca na ordem do dia a discussão sobre o futuro da política comum de pescas.
Por isso, importava sublinhar que o PCP considera essencial renegociar o futuro desta política comum, pelo menos nos dois aspectos seguintes: em primeiro lugar, conseguir a manutenção das 12 milhas na exclusiva soberania nacional e defender o alargamento dessa soberania para as 24 milhas, zona marítima que passaria a ser destinada unicamente à frota nacional, tal como, recordo, foi, aliás, aprovado nesta Casa e no plenário do Parlamento Europeu por iniciativa dos Deputados do PCP; em segundo lugar, exige-se que o quadro legislativo comunitário passe a contemplar a possibilidade de estabelecer negociações bilaterais que contemplem especificidades próprias e que no caso português, a existirem, teria permitido resolver não só a questão de Marrocos como criar a outros segmentos da frota novas oportunidades de pescas, designadamente nas águas territoriais dos PALOP.
Não podemos continuar, Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, a aceitar uma política comum de pescas cuja orientação fundamental é reduzir a nossa capacidade pesqueira, é abrir completamente as nossas águas e remeter Portugal para o estatuto de mero importador de produtos de pesca.


Aplausos do PCP.


O Sr. Presidente : – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Maçãs.


O Sr. João Maçãs (PSD): – Sr. Presidente, permita-me que, antes de iniciar esta minha primeira intervenção, lhe apresente os meus cumprimentos e os torne extensivos a todos os Srs. Deputados.


O Sr. Presidente : – Obrigado, Sr. Deputado.


O Orador : – Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. as e Srs. Deputados: Debatemos hoje um tema de indiscutível interesse nacional, que o Partido Social Democrata, acompanhado de outras forças políticas, entendeu agendar com carácter de urgência.
Muito embora o sector das pescas não assuma um grande peso no produto interno bruto, a verdade é que não pode ser desprezado em termos económicos e que não é
admissível ignorar o que representa em termos sócio-culturais e ambientais; a actividade piscatória marcou – e continua a marcar – de forma muito vincada a vida de múltiplas comunidades ao longo de toda a nossa costa.
Como estarão recordados, desde a adesão de Portugal – e também da Espanha – à Comunidade Económica Europeia, em 1986, sucederam-se os convénios transitórios em matéria de pesca.
A União Europeia vem estabelecendo acordos de pesca com o Reino de Marrocos desde 1992, tendo o último sido celebrado em finais de 1995 em consequência, diga-se, de um inegável esforço do então Governo do Partido Social Democrata, atingindo o seu terminus no último dia do mês de Novembro de 1999, ou seja, dentro de escassos 15 dias.
Eis-nos perante a questão: o prazo está a terminar e ainda não existe novo acordo!
A coberto do acordo ainda em vigor, operam em águas marroquinas cerca de 40 embarcações portuguesas, oriundas, sobretudo, de Sesimbra, do Algarve e de Peniche, as quais envolvem mais de 1000 postos de trabalho directo.
O grande dilema que se coloca é o de não existirem no momento quaisquer garantias de que venha a ser celebrado um novo acordo, o que, a verificarse, implicaria uma situação dramática quer para os pescadores, quer para a frota, quer ainda para as indústrias ligadas ao sector, com os reflexos de ordem social e económica que daí adviriam e facilmente se depreendem.
Acontece que há mais de um ano que se vislumbram fortes indícios de que Marrocos terá deixado de estar interessado em renegociar o referido acordo com a União Europeia, uma vez que parece valorizar hoje muito mais os seus recursos haliêuticos e estar a ser permanentemente assediado por parte de grandes potências pesqueiras internacionais, como o Japão, a Correia do Sul e, sobretudo, a Rússia.
Como agravante, tenhamos presente ainda o facto de alguns Estados membros serem da opinião de que o custo orçamental dos acordos de pescas com países terceiros é excessivo, o que nos parece uma apreciação pouco sustentável.
Como se estas reticências não bastassem deparamos com notícias várias e recentes, veiculadas pela agência Reuters , as quais referem não encarar Rabat a possibilidade de renegociação do acordo, adiantando ainda que será colocado um ponto final sobre a matéria no próximo dia 6 de Dezembro, aquando da reunião já marcada com o Comissário Fischler. Aliás, o próprio Comissário Fischler, segundo o Jornal de Notícias de 7 de Novembro, terá também dito, na cidade de Santiago de Compostela, que iria fazer os possíveis para que as negociações sobre o Acordo de Pesca com Marrocos fossem iniciadas ainda durante este mês de Novembro, muito embora desconhecesse o que Marrocos pretendia efectivamente, o que, por sua vez, o deixava sem saber que tipo de oferta podia fazer.
Se a tudo isto, que poderá ser muito pouco, mas que também poderá significar muito, acrescentarmos a notícia do jornal espanhol El País de 9 do corrente mês, onde se lê que representantes da UGT, das Organizações Obreras do Mar e dos Ministérios da Agricultura e do Trabalho chegaram a consenso quanto às ajudas a conceder à frota que opera em Marrocos caso não seja renovado o acordo, especificando, desde logo, que o governo espanhol havia aceite as pretensões dos sindicatos e assumia pagar aos pescadores cerca de 180 contos por mês e aos armadores

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18 DE NOVEMBRO DE 1999



















O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Política europeia!


O Orador : – Fazemos votos para que o Governo aprenda, de facto, com os erros e omissões que cometeu, de forma a que situações como estas não deixem de ser devidamente equacionadas em 2002, aquando da reforma da Política Comum de Pescas.


Aplausos do PSD.


O Sr. Presidente : – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: É uma pena que os debates que esta Câmara tem, regular e periodicamente, sobre a situação do sector pesqueiro sejam uma avaliação dos prejuízos e da melhor forma de limitar os danos, em vez de serem, como podiam ser, debates sobre um novo arranque, um novo começo, para a nossa frota, para a nossa pesca e para o bem-estar das gentes do mar.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – Gostava de, a este título, abordar este tema do Acordo com Marrocos do ponto de vista dos factos, da visão europeia deste Acordo e da posição portuguesa face a ele – e tirar, depois, alguma conclusão.
A situação, de facto, é indesmentível: no próximo dia 30, os barcos vão parar, o que significa que, em boa medida, os pescadores podem ficar no desemprego ou numa situação que está no limite do que é a dignidade do trabalho: serem pagos para não produzir. Tudo isto só vem adensar o campo de pobreza em que a política comum de pescas transformou o nosso sector pesqueiro.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – Por outro lado, é provável que alguns – para não dizer muitos – dos armadores que ainda sobram neste mercado venham, mais uma vez, a pedir o abate da frota que resta. Portanto, mais uma vez, adensa-se o «cemitério de barcos» em que a política comum de pescas transformou a nossa capacidade pesqueira.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Exactamente!

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O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Exactamente!


O Orador : – … em resolver a tempo um problema que, todos sabíamos, ia colocar-se.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – Finalmente, há insensatez da política do Conselho e da Comissão Europeia. Insensatez porque, em cada questão económica, a Comissão Europeia prefere a visão globalizadora e não atende a um princípio que ainda consta dos Tratados, por muito que alguns Deputados, nesta Câmara, o não defendam: o princípio de preferência comunitária.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Exacto!


O Orador : – O que é que aconteceu? Demos um acordo comercial sem prazo e obtivemos um acordo pesqueiro com prazo, o que significa que Marrocos colocou os produtos que entendia no espaço europeu, mas Portugal e os outros interessados em pescar em Marrocos só podem pescar até ao dia 30 de Novembro. A contrapartida a que tínhamos direito era exígua no prazo.
Mais uma vez – como aqui se vê pelo confronto entre a atitude comercial, em geral, e a atitude relativamente às pescas, em especial –, pescas e lavoura são, sistematicamente, a moeda de troca que governos da União Europeia, nomeadamente os portugueses, dão para proteger sectores que consideram política e eleitoralmente mais convidativos.
Finalmente, este problema revela os erros da visão federal nas políticas comuns da União.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – Gostava de chamar a vossa atenção para o paradoxo da situação em que Portugal se encontra: a Europa não consegue negociar com Marrocos porque Marrocos não quer; Portugal não pode negociar com Marrocos porque a Europa não deixa.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Exacto!


O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – A situação em que nos encontramos é absurda!


O Sr. Manuel Frexes (PSD): – Isso é óbvio!


O Orador : – Como O Sr. Deputado vai ver, não é tão óbvio assim! Porque nem a Europa garante o nosso direito a pescar, a nós, País marítimo,…


O Sr. Manuel Frexes (PSD): – Isso é absurdo!


O Orador : – … nem nós podemos, em alternativa, tratar da nossa própria relação com Marrocos,…


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Pois não!


O Orador : – … nós, País vizinho de Marrocos!
É mais ilógico ainda. Como todos sabem, o Acordo de Pescas interessa muito a poucos países da União Europeia: interessa, nomeadamente, a Portugal e a Espanha. Mas os indiferentes não ajudam e os concorrentes prejudicam! Os indiferentes não nos deixam fazer negociações bilaterais e os concorrentes, como sabem, prejudicam a nossa posição porque o problema de Marrocos é com Espanha, com a natureza da sua pesca e com a dimensão do que os espanhóis pescam, não é com a natureza da nossa pesca…


O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – … nem com o que os nossos pescadores lá fazem!


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – Portanto, estamos a ser sistematicamente prejudicados por esta concepção federalista das políticas comuns europeias…


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Exactamente!


O Orador : – Em termos de reflexão e porque vem aí a revisão da política comum de pescas, chamo a atenção para o seguinte: o vosso federalismo, segundo o qual não é possível a um Estado fazer um acordo bilateral com um país terceiro, não defende o interesse europeu e prejudica o interesse nacional!
A nossa flexibilidade, que é a alternativa ao federalismo, não prejudica o interesse europeu, porque ninguém ficará prejudicado com um acordo entre Portugal e Marrocos,…


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Exactamente!


O Orador : – … mas defende o interesse nacional, o direito dos nossos armadores de não terem de abater os barcos, o direito dos nossos pescadores poderem ter o seu «ganha pão» com trabalho e dignidade nos mares de Marrocos!


Aplausos do CDS-PP.


O Orador : – Se entenderem que esta é uma posição escassamente europeísta,...

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O Orador : – … recomendo, apenas, a leitura de um relatório do Parlamento Europeu que é muito interessante sobre o futuro da política comum de pescas e que pretende resolver este paradoxo: o relatório da Sr.ª Eurodeputada Carmen Fraga, membro do Partido Popular Europeu e, portanto, insuspeita de qualquer atitude antieuropeísta. Este relatório defende, na sua conclusão 21.ª, a possibilidade de, no futuro, os Estados organizarem bilateralmente, de acordo com o princípio da subsidiariedade, a sua relação com Estados terceiros. A nós, isto parece-nos uma evidência!


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Claro!


O Orador : – Se o facto de, dentro de dias, deixarmos de ter direitos de pesca, deixarmos de ter dignidade no trabalho para os pescadores e vida empresarial para os armadores que dependem daquele mercado, não vos chega para desbloquear este tipo de política que impede a relação bilateral com Marrocos em matéria pesqueira, então que chegue, pelo menos, o relatório da Eurodeputada Carmen Fraga, vossa colega em termos de pensamento federalista. É ela quem nos diz que, realmente, no futuro, é preciso flexibilizar a política comum de pescas, porque a rigidez não interessa a ninguém, a não ser àqueles que queiram paralisar, uma vez mais, o nosso sector pesqueiro.


O Sr. Presidente : – Agradeço que termine, Sr. Deputado.


O Orador : – Sr. Presidente, para terminar, gostaria de dizer que, a nosso ver, é necessário que o Governo negoceie, em termos aceitáveis e de equidade, as compensações; precisamos de saber o que vai acontecer aos postos de trabalho indirectos (porque disso não temos notícia) e, sobretudo, preparemo-nos, a sério, para a renegociação da política comum de pescas, se queremos resolver esta situação que nenhum português de bom senso pode entender.


O Sr. Presidente : – Sr. Deputado, tem de terminar.


O Orador : – Sr. Presidente, só para terminar, direi que ninguém entende que Portugal tenha, à sua frente, o mar que tantos invejam e que dele não possamos tirar qualquer proveito.


( O Orador reviu .)


Aplausos do CDS-PP.


O Sr. Presidente : – Tem a palavra para uma intervenção, o Sr. Deputado António Martinho.


O Sr. António Martinho (PS): – Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr. as e Srs. Deputados: Alguns partidos da oposição requereram este debate de urgência a pretexto de o acordo de cooperação em matéria de pesca entre a União Europeia e Marrocos estar a chegar ao seu termo no final deste mês. Legítimo, naturalmente!
Legítimo será também que o Governo, o Sr. Secretário de Estado das Pescas que participa no debate e o Grupo
Parlamentar do Partido Socialista tragam aqui os seus pontos de vista e dêem nota das diligências relativas ao assunto em análise, bem como das medidas de política de pesca que têm vindo a ser desenvolvidas desde que os portugueses decidiram confiar os destinos do País ao Partido Socialista.
Mas será talvez, também, legítimo questionar o momento do debate. Só agora, Srs. Deputados, se aperceberam do problema? Só agora detectaram dificuldades para o sector? Só agora descobriram possíveis inconvenientes…


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Isso não é verdade! A discordância é muito antiga!


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – Ó Martinho!...


O Orador : – … para armadores, pescadores…


O Sr. Presidente : – Srs. Deputados, agradeço que oiçam em silêncio.


O Orador : – … e outros trabalhadores ligados à actividade da pesca nas águas marroquinas ao abrigo deste acordo?
Por sua vez, o Governo soube, oportunamente, tomar algumas iniciativas sobre esta questão que remontam a Março de 1998, Sr. Deputado Honório Novo! Através delas identificaram-se as dificuldades decorrentes do termo do Acordo, sensibilizaram-se as instituições europeias que têm a ver com o sector, estreitaram-se laços e formas de cooperação com Marrocos – país soberano, aliás –, potenciando relações de vizinhança e interesses comuns, enfim, estudaram-se alternativas.
Foi, também, na sequência destas iniciativas que, em Março de 1999, a Comissão Europeia diligenciou no sentido de se dar início ao processo negocial.
A 10 de Junho próximo passado, por proposta do Governo português, o Conselho de Ministros da União Europeia aprovou uma Declaração instando a Comissão a desenvolver, conjuntamente com Marrocos, a identificação e a elaboração de novos mecanismos de cooperação nas pescas. Nela se reconhece, de igual modo, a importância sócioeconómica do acordo.
Recentemente, a 26 de Outubro, o Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas entregou em mão, ao Comissário Fischler, uma carta alertando, mais uma vez, para o impacto sócioeconómico da paragem da frota e do termo do acordo com Marrocos, propondo a adopção de uma medida específica para apoio a armadores e pescadores afectados.
E neste ponto, Srs. Deputados, quero crer que nos acompanharão na concordância plena relativamente a esta reivindicação. Aliás, este conjunto de iniciativas desmente bem a acusação ao Governo, por parte de alguns Srs. Deputados, de inacção,...


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – E omissão!


O Orador : – ... acusação que repudiamos, como fica demonstrado.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr. as e Srs. Deputados: Há nesta Assembleia quem defenda que se deve caminhar para o estabelecimento de acordos de pesca bilaterais, no caso, entre Portugal e Marrocos. Vêem nesse tipo de acordo algumas virtualidades.

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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Como?


O Orador : – Foi assim que, entre 1996 e 1999, se verificou um forte apoio à pesca local e costeira que representa 91% das embarcações registadas em Portugal e 63% do emprego.
Foram, assim, apoiados 1526 projectos, num total de 4,2 milhões de contos. Ora, entre 1992 e 1995, apenas tinham sido apoiados 510 projectos envolvendo só 1,6 milhões de contos.
Também neste período os projectos aprovados no âmbito do PROPESCA, do ICPESCA e do SIPESCA quase duplicaram e o montante de investimento subiu de 15,9 milhões de contos, no período de 1992 a 1995, para 23,6 milhões, entre 1996 e 1999.
Muitas outras medidas foram tomadas no sentido do desenvolvimento sustentado do sector, com um esforço claro do investimento na área da investigação que, nos quatro anos entre 1996 e 1999, ascendeu a 8,5 milhões de contos.
Outras medidas não menos importantes foram tomadas – refirome a medidas marcadamente sociais. E, neste domínio, algumas oposições souberam acompanhar o Grupo Parlamentar do PS e o Governo para encontrar soluções.
Espero bem que, na problemática hoje em análise e com as explicações dadas pelo Governo, semelhante atitude se possa verificar.


Aplausos do PS.


O Sr. Presidente : – O Sr. Deputado Lino de Carvalho pediu a palavra para defesa da honra e consideração da bancada.
Tem a palavra.


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – Sr. Presidente, pedi a palavra exactamente para usar, com todo o rigor, essa figura regimental.
O Sr. Deputado António Martinho acusou o PCP de só agora ter «acordado» para esta questão. Ora, o Sr. Deputado António Martinho não tem, seguramente, a memória curta, mas, se está esquecido, eu recordo-lhe.
Recordo-lhe que, a pedido de várias bancadas, entre as quais a do PCP, o primeiro debate que teve lugar nesta Assembleia no início da anterior legislatura foi precisamente sobre esta questão. Concretamente, tratouse de uma reunião da comissão competente com a presença do Ministro Jaime Gama.
O Sr. Deputado António Martinho, seguramente, não deverá estar esquecido de que, por iniciativa do PCP, toda a anterior equipa do Ministério da Agricultura foi chamada várias vezes à Comissão de Agricultura a fim de ser debatida esta matéria.
De igual modo, seguramente não estará esquecido de que foi neste Plenário, aquando da discussão do acordo comercial com Marrocos, que suscitámos esta matéria. Na altura, votámos contra, exactamente porque considerámos que não estavam garantidas as contrapartidas necessárias, ao contrário do PS e do PSD, que votaram a favor, e do PP, que viabilizou o acordo comercial com Marrocos e que, embora hoje venha criticá-lo por causa da questão das contrapartidas, o viabilizou na altura.
O Sr. Deputado António Martinho também sabe, seguramente, que se no Parlamento Europeu há Deputados de alguma força política que tenham suscitado permanentemente esta questão têm sido os do PCP. Aliás, o meu camarada Deputado Honório Novo, enquanto esteve no Parlamento Europeu, fez parte de uma delegação que se deslocou expressamente a Marrocos para tratar desta matéria com as autoridades desse país. Portanto, Sr. Deputado, não tenha memória curta!


O Sr. Manuel dos Santos (PS): – Está à sua frente, na tribuna do Governo, quem discutiu isso!


O Orador : – Sr. Deputado Manuel dos Santos, tenha calma! O Sr. Deputado ainda não se acalmou desde a última legislatura!
Tenha calma, Sr. Deputado, porque não estou a dizer que fomos só nós…


O Sr. Manuel dos Santos (PS): – O senhor disse: «fomos só nós»!


O Orador : – Sr. Deputado Manuel dos Santos, tenha calma! A sua bancada é que acusou o PCP de só agora se ter lembrado desta matéria. O Sr. Deputado ouviu!
Continuando, Sr. Deputado António Martinho, neste contexto, seguramente reconhecerá que se enganou e virá responder que não foi bem isto o que disse.

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Aplausos do PCP.


O Sr. Presidente : – Tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho, para dar explicações, se assim o desejar.


O Sr. António Martinho (PS): – Sr. Presidente, aproveitarei a oportunidade para tornar claro o teor da minha intervenção que, de facto, foi mal interpretada pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Na verdade, questionei esta Câmara, referindo-a genericamente, mas o Sr. Deputado Lino de Carvalho considerou que as minhas palavras se restringiam ao PCP.


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – Então, pertencemos todos à mesma «família»?!


O Orador : – Repare, Sr. Deputado: também me referi genericamente ao comportamento de algumas bancadas desta Assembleia relativamente a medidas de política social.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Ainda pior!


O Orador : – Sr. Deputado, espere um bocadinho! Já trato de si, se for preciso!
Continuando, o Sr. Deputado podia ter-se recordado de que a sua bancada também participou activamente nos trabalhos para encontrar medidas de política social para o sector da pesca, o que nunca escondi, e acho importante que o reconheçamos.
No que diz respeito às tomadas de posição de Deputados no Parlamento Europeu, até posso mostrar-lhe a acta da sessão do dia 28, em que parece que também estava presente o Sr. Deputado Paulo Portas. Nessa sessão, dois Deputados portugueses do PS pronunciaram-se sobre esta questão e debateram-na de forma clara, reivindicativa, defendendo os interesses do País no quadro da preparação da renegociação do acordo entre a União Europeia e Marrocos.
Aliás, Srs. Deputados, sabemos que, na legislatura anterior, quando o actual Secretário de Estado das Pescas, José Apolinário, desempenhava as funções de Deputado ao Parlamento Europeu, recebíamos muita informação que era veiculada por ele próprio, sinal evidente de
que ele trabalhava e o fazia em articulação com a Assembleia da República.


Vozes do PS : – Muito bem!


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – O problema é que, depois, chegou a Secretário de Estado e esqueceu-se do trabalho que fez enquanto Deputado!


O Sr. Presidente : – O Sr. Deputado Paulo Portas pediu também a palavra para defesa da honra da sua bancada.
Penso que este é um dos raríssimos casos em que seria, talvez, desejável que os Srs. Deputados fossem menos sensíveis…


Risos.


Faça favor, Sr. Deputado.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Sr. Presidente, até admitiria ceder à sua solicitação, mas não há dúvida nenhuma de que a intervenção precedente do Deputado António Martinho confirmou que visava, também, a bancada do CDS-PP.


O Sr. Presidente : – Sr. Deputado, o Presidente só tem direito a dizer algumas graças uma vez por outra. Não tem outra defesa.


Risos.


O Orador : – E mantenha-se assim, Sr. Presidente!
Gostava de começar por dizer que, em matéria de interesse nacional, não interessa quem «leva a taça».


O Sr. António Martinho (PS): – Estamos de acordo!


O Orador : – Não duvido da boa e recta intenção de qualquer Deputado desta Câmara ou de qualquer Deputado ao Parlamento Europeu quando discute os direitos de Portugal nos mares de Marrocos.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – O que aqui quero discutir é o sistema, a política, e não quem mais fez por quem.
Nessa matéria, temos a consciência tranquila, e isso basta-nos! O número de intervenções que fizemos, em Plenário ou em comissão, tanto nas instituições nacionais como nas europeias, responde por nós. Quanto às intervenções que ouvi, proferidas por Deputados de outras bancadas, nesta sede e no Parlamento Europeu, só tenho uma coisa a fazer: saudá-las, porque ajudam o meu país. Não me interessa saber quem «leva a taça» em matéria de defesa do interesse nacional.


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – O que lhe agradeço, Sr. Deputado António Martinho, é que não se dirija à bancada do CDS-PP como se algum dia tivesse-mos esquecido o problema das pescas, a defesa dos direitos dos nossos pescadores ou dos nossos armadores.

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Risos do CDS-PP e do PSD.


… e, mesmo assim, duvido!
Há uma coisa de que pode ter a certeza: o interesse que se nota no Comissário Fischler pelos direitos da pesca de Portugal em Marrocos é, certamente, bem menor do que o interesse que ele revela pelos lagos austríacos, onde nada temos a defender...


Vozes do CDS-PP : – Muito bem!


O Sr. Presidente : – Tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho, para dar explicações, se assim o desejar.


O Sr. António Martinho (PS): – Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, é tão legítimo defender os interesses de Portugal nas fragas do Tua como na planície ou na lezíria ribatejanas.


Aplausos do PS.


Por falar em interesses nacionais, e já que o Sr. Deputado Lino de Carvalho lembrou com precisão, e muito bem, a reunião da Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares realizada nesta Assembleia, em 1995, no dia 6 de Novembro – e apesar de eu ser transmontano, de junto das arribas do Tua! – , vou citar um ilustre ribeirinho, digno Deputado desta Assembleia até à anterior legislatura. Vou, pois, citar o meu colega e camarada do Algarve, Luís Filipe Madeira – e talvez se lembre que foi em articulação consigo.
Dizia ele: «(…) o partido que requereu este debate começou por falar no interesse nacional, mas é óbvio que o interesse nacional não é exclusivamente aquele que o PP entende ser (…)».


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Foi o que eu disse!


O Orador : – Sr. Deputado, de facto, o senhor defende o interesse nacional, mas tome nota: à sua maneira e na sua perspectiva, todas as bancadas defendem o interesse nacional,…


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Foi o que eu disse!


O Orador : – … tal como o Partido Socialista, neste caso, nesta bancada e, naturalmente, no Governo.


Aplausos do PS.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Então, houve um conjunto de esquecimentos de todos!


O Sr. Presidente : – Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda, para uma intervenção.


O Sr. Luís Fazenda (BE): – Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: O Bloco de Esquerda acompanha a preocupação das comunidades piscatórias pela não renovação em tempo útil deste Acordo de Pescas entre a União Europeia e o Reino de Marrocos e pela iminente e consequente paralisação da frota pesqueira a operar nas águas deste último.
Serei conciso e muito directo.
Perguntamos, à semelhança do que outras bancadas já fizeram, o porquê do atraso na renegociação deste Acordo, o porquê de, no actual Quadro Comunitário de Apoio, não podermos empunhar novos instrumentos jurídicos que nos levem a acordos bilaterais, sendo certo que a maior parte dos conflitos daqui emergentes e as dificuldades negociais provêm do Reino de Espanha e não da República Portuguesa.
Pergunto, ainda, por que motivo, mesmo tendo em consideração a paridade do poder de compra, há uma diferença entre as compensações previstas, em caso de paralisação, para os nacionais portugueses e para os nacionais espanhóis.
Pergunto, ainda, no âmbito da renegociação dos acordos com Marrocos que será feita pela União Europeia, qual a posição portuguesa acerca da eventual pesca em águas que serão adjacentes ao Sara Ocidental. Levanto esta questão porque devemos ter uma posição unívoca nesta matéria.
É que, de modo geral, reprovámos, por exemplo, que a Austrália utilizasse privilégios económicos no mar de Timor graças a acordos com a Indonésia. Assim, pergunto: que política tem Portugal, hoje, nessa matéria, relativamente a águas que virão a fazer parte da futura república árabe saraui? Faço esta pergunta porque, como também é do nosso conhecimento, aquele território tem em curso um processo de autodeterminação, direito que lhe é reconhecido pelas Nações Unidas. Portanto, em matéria de coerência e de defesa do direito internacional, pergunto qual a posição do nosso país em relação a esta questão.
Por fim, pergunto, também, ao Sr. Secretário de Estado das Pescas o porquê da pressão para a implementação de uma política fortemente aberta às empresas de capitais mistos quando não parece haver apetência para tal, nem por parte dos armadores, por razões comerciais e tecnológicas, nem muito menos por parte dos trabalhadores da pesca, porque as tripulações das embarcações virão a ser constituídas praticamente por marroquinos, os quais auferem salários muito mais baixos do que os dos pescadores portugueses.
Sr. Secretário de Estado, são estas as questões que queríamos pôr em evidência, manifestando desde já total abertura para participar em debates posteriores e para uma discussão mais de fundo que tem a ver com a política comum de pescas e com um conjunto de normativos da União Europeia que são lesivos de direitos nacionais.


O Sr. Presidente : – Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Pescas, para uma intervenção.


O Sr. Secretário de Estado das Pescas (José Apolinário): – Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: Sendo esta a minha primeira intervenção nesta Assembleia na presente Legislatura, permita-me, Sr. Presidente, que o saúde de uma forma muito especial. É um insigne democrata e figura de referência deste Parlamento.


O Sr. Presidente : – Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.

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Aplausos do PS.


O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): – Agora é tarde!


O Sr. Presidente : – Para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado, Inscreveram-se os Srs. Deputados Honório Novo e Paulo Portas.
O Sr. Deputado Paulo Portas dispõe de 1 minuto que lhe foi concedido pelo Grupo Parlamentar do PS.
O Governo já não tem tempo para responder, pelo que agradeço sejam muito sucintos que eu darei ao Governo o tempo necessário para uma resposta breve.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.


O Sr. António Martinho (PS): – Sr. Presidente, pretendo só informar que, naturalmente, nós também concedemos ao Governo o tempo que nos resta.


O Sr. Presidente : – Sr. Deputado, o tempo será transferido.
Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.


O Sr. Honório Novo (PCP): – Sr. Presidente, congratulo-me com esta dádiva da bancada do Partido Socialista. Creio que é a única forma de poder ouvir algumas respostas, já que o Partido Socialista não as dá.
O Sr. Secretário de Estado também não deu resposta a nenhuma das seis perguntas que enumerei ao longo da minha intervenção. Se o Sr. Secretário de Estado quiser, terei todo o privilégio em voltar a colocar-lhas. Trata-se de um conjunto de perguntas sobre a forma, meios, níveis, e a quem atingem os pagamentos pelas paralisações, bem como sobre se o Governo está ou não disposto a aceitar um novo acordo baseado exclusivamente em sociedades mistas.


O Sr. António Martinho (PS): – Respondeu!


O Orador : – Sr. Deputado, eu ainda ouço bem, o senhor é que parece que só ouve parte daquilo que é dito.
Quais são as alternativas que o Governo prevê no caso de haver um acordo baseado exclusivamente em sociedades mistas? Não me respondeu a nada disto. Suponho que o Sr. Secretário de Estado está tão atrapalhado com a negociação do acordo com Marrocos que nem sequer sabe o que é que há-de responder.


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – Muito bem!


O Orador : – Mas, para além disso, o Sr. Secretário de Estado refere que há, neste momento, 28 embarcações, cerca de 700 trabalhadores dependentes do acordo de pescas com Marrocos.
Eu já tinha conhecimento disto, mas, de uma forma propositada, não o disse na minha intervenção, porque comprova que a evolução deste acordo já reduziu a frota e já reduziu o número de trabalhadores muito para além do que o próprio acordo previa.


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – Exactamente!


O Orador : – Conforme o Sr. Secretário de Estado sabe, tão bem como eu, a base de partida era a de um licenciamento de 51 embarcações e a base de chegada, ao fim do ainda actual acordo, era de 43 embarcações. Ora, já vamos em 28 embarcações, pelo que já superou largamente o previsto na redução de licenças em Marrocos.
Lamento que o senhor, de uma forma tão simplista e tão linear, anuncie previamente uma redução já tão drástica da frota, uma redução tão significativa dos trabalhadores implicados e diga que ainda temos acordo.
O que acontecerá se não tivermos acordo ou se, eventualmente, o novo acordo for feito à base de sociedades mistas? Será o deserto total nesta frota.


O Sr. Octávio Teixeira (PCP): – Muito bem!


O Orador : – Mas, Sr. Secretário de Estado, não podemos falar meias verdades, temos de dizer a verdade completa, e gostava de o corrigir: é que, como sabe, tão bem ou melhor do que eu, um novo acordo requer um novo mandato, decidido pelo Conselho, à Comissão. E em 10 de Junho, ou em Março, como disse o seu mau defensor de bancada, não foi decidido nada sobre mandatos.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Só em Outubro!


O Orador : – Só em 25 de Outubro, num Conselho de pescas onde o senhor estava, foi decidido conferir um mandato, como é necessário e imprescindível, para que as negociações se iniciassem.

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Vozes do PCP : – Muito bem!


O Orador : – Mas também gostava de o esclarecer sobre as negociações bilaterais. Repare, Sr. Secretário de Estado, é preciso modificar aquilo que há quando é necessário e quando consideramos fundamental modificá-lo. Se a legislação comunitária é o que é, então mude-se!


O Sr. Presidente : – Sr. Deputado, agradeço-lhe que termine!


O Orador : – Termino já, Sr. Presidente.
O Governo teve 12 meses para tentar alterar isso; se não o alterou é porque não tem vontade política para o fazer.
Sr. Secretário de Estado, para terminar, devo dizer-lhe que se o nosso representante em matéria de pescas, o meu amigo José Apolinário, está no Conselho Europeu só para receber recados e não forçar alterações, mais valia que o Sr. Eng.º António Guterres nomeasse, sem desprimor para V. Ex.ª, um carteiro. Era mais fácil!


Aplausos do PCP.


O Sr. José Barros Moura (PS): – Completamente ridículo!


O Sr. Presidente : – Sugeria ao Sr. Secretário de Estado das Pescas que respondesse conjuntamente aos dois pedidos de esclarecimento, dado o escasso tempo de que dispõe.


O Sr. Secretário de Estado das Pescas : – Sr. Presidente, como considero que foram aqui ditas palavras – apesar da palavra «amigo» – que me parece não serem muito correctas, tais como «distraído», «atrapalhado», «falta de vontade política», «carteiro», quero aqui dizer o seguinte: se até agora não tivéssemos desencadeado as iniciativas que já desencadeámos, estaríamos numa posição de fragilidade. Mas não estamos.


O Sr. António Martinho (PS): – Muito bem!


O Orador : – Tomámos as iniciativas apropriadas junto da Comissão, não podemos fazer qualquer negociação bilateral; quem tem de apresentar o mandato é a Comissão, que vai a Conselho. E no mês de Setembro houve dificuldades para aprovar esse mandato, porque Estados-membros tentaram impedir que houvesse um mandato de negociações.
Portanto, a meu ver, o Sr. Deputado fez uma análise incorrecta da situação.
De resto, sobre os apoios e as questões que colocou, quero dizer-lhe o que, já em Dezembro, pescadores e armadores envolvidos nesta operação, isto é, abrangidos pela actividade de pesca em Marrocos, receberão as respectivas ajudas, seja através de medidas comunitárias, seja através de medidas nacionais


O Sr. José Barros Moura (PS): – Muito bem!


Vozes do PSD : – Quanto?


O Orador : – E se for através de medidas nacionais, naturalmente teremos em conta o que foi pago em 1995 e acrescentaremos a esse montante alguma taxa de inflação, como parece justo.


Vozes do PSD : – Quanto?


O Sr. António Martinho (PS): – Ouçam!


O Orador : – Esta é a resposta que quero dar à intervenção que fez, Sr. Deputado Honório Novo.


Aplausos do PS.


O Sr. Presidente : – Sr. Deputado Paulo Portas...


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Pescas, agradeço, em primeiro lugar, ao Partido Socialista o facto de me ter cedido 1 minuto, minuto que tenciono usar para formular uma pergunta do ponto de vista conceptual e uma outra, muito prática.
Primeiro, a pergunta conceptual.


O Sr. Presidente : – Tencionava conceder-lhe mais 1 minuto, mas o Sr. Deputado antecipou-se. Não tive, por isso, a possibilidade de anunciar que dispõe de 2 minutos para pedir esclarecimentos.


O Orador : – Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Secretário de Estado afirma que a hipótese de acordos bilaterais implica, para o Estado que os celebrar, a necessidade de os financiar. Não me oponho a esse raciocínio, embora ele seja discutível como tese geral. Mas há uma pergunta que lhe quero fazer: o Sr. Secretário de Estado prefere pagar, para não pescar, ou pagar, para ter o direito a pescar? Esta, sim, é uma pergunta fundamental à sua consciência, não apenas de governante, mas também de socialista...


O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): – Muito bem!


O Orador : – Ou, se quiser: prefere receber para não trabalhar, ou pagar para ajudar a que os nossos pescadores e armadores continuem a ter trabalho? Esse tipo de financiamentos, significativos da solidariedade interna, existe a variadíssimos títulos no Orçamento do Estado, e nunca vi negá-lo como princípio!
Por último, Sr. Secretário de Estado, uma pergunta muito concreta, e compreenda que em nome de toda a Câmara a formule: quanto, precisamente quanto – em tostões, em euros, em pesetas, como entender! –, rigorosamente quanto, vão receber os nossos pescadores e os nossos armadores por mês?


Aplausos do CDS-PP.


O Sr. Presidente : – Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Pescas. Entretanto, foi-lhe cedido mais algum tempo.

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O Sr. Presidente : – Dispõe de pouco mais de 3 minutos para responder, Sr. Secretário de Estado.


O Sr. Secretário de Estado das Pescas : – Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, se houver uma medida comunitária, a nossa posição é de que a contribuição para pescadores e armadores tem de ser igual, sejam eles portugueses ou espanhóis.


O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): – Ah!


O Orador : – Como ainda não abandonámos essa bandeira e esperamos a resposta da Comissão aos contactos que estabelecemos, não estou em condições de responder à questão que colocou.
Se não houver, em tempo útil, resposta a esta medida específica, por parte da Comissão Europeia, assumiremos, no plano nacional, iniciativas, seja utilizando fundos nacionais, seja utilizando fundos comunitários, eventualmente não utilizados no âmbito do período financeiro 1994/1999. Mas não deixaremos de pagar contrapartidas financeiras durante o mês de Dezembro.
Quanto à questão de princípio, prefiro pescar sem pagar...


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – Oh!


O Orador : – Refiro-me à questão de princípio enunciada pelo Sr. Deputado Paulo Portas, porque, no meu entendimento, a política comum de pescas tem quatro pilares essenciais:...


O Sr. Lino de Carvalho (PCP): – «Sol na eira e chuva no nabal!»


O Orador : – ... uma política de estruturas, uma política de mercados, uma política de recursos e uma política externa.
O que está a ser feito, por alguns Estados-membros, é a contestação deste pilar da política externa, sublinhando os custos/benefícios desta política externa.
No meu entendimento, não é correcto pôr em causa a natureza e a razão de ser dos acordos internacionais de pesca. Naturalmente, teremos de reflectir como intervir nesta matéria. Não considero tabu a relação bilateral mas, neste momento, tal não é possível, do ponto de vista jurídico, do Direito Comunitário, e não é possível desde 1976: já fazia parte do acervo comunitário quando entrámos na União Europeia, também está expresso nos tratados e, por essa razão, temos de trabalhar no quadro daquele que é o papel da Comissão Europeia.


Aplausos do PS.


O Sr. Honório Novo (PCP): – Ó Apolinário, e o que é que fez para alterar isso?


O Sr. Presidente : – Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.


Eram 18 horas e 20 minutos.


ORDEM DO DIA


O Sr. Presidente : – Srs. Deputados, vamos iniciar o período da ordem do dia coma apreciação da proposta de resolução n.º 116/VII – Aprova, para ratificação, a Convenção de Conciliação e Arbitragem no quadro da OSCE, concluída em Estocolmo a 15 de Dezembro de 1992, no Terceiro Conselho Ministerial da OSCE.
Entretanto, peço ao Sr. Deputado João Amaral o favor de me substituir na direcção dos trabalhos.


Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.


O Sr. Presidente : – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.


O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas (José Lello): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Saúdo todos os Srs. Deputados nesta minha primeira intervenção, que será muito sucinta, na nova Legislatura.
Venho aqui apresentar, para ratificação da Assembleia da República, a Convenção de Conciliação e Arbitragem no Quadro da OSCE – Organização para a Segurança e Cooperação na Europa.
Como VV. Ex. as sabem, Portugal é um Estado membro e de pleno direito da OSCE, tendo aderido à então CSCE em Agosto de 1975, Organização que, em 1994, daria lugar à OSCE.
Pela presente Convenção, estabelece-se um Tribunal de Conciliação e Arbitragem como instância jurisdicional de recurso possível dos Estados membros da OSCE para a resolução pacífica de diferendos no âmbito desta organização internacional. Uma temática que considero de dramática oportunidade face à turbulência que se verifica, designadamente, na região do Cáucaso, como é do conhecimento de todos os Srs. Deputados.
Esta Convenção estabelece, assim, que a conciliação seja assegurada por uma comissão específica de conciliação, constituída, para cada diferendo, e que a arbitragem seja assegurada por uma tribunal arbitral, igualmente constituído para cada diferendo.
Diria que esta Convenção se compagina com o Programa do Governo, no qual se estabelece, naturalmente, a prossecução de uma política externa eficaz, tendo em conta a maximização da actividade multilateral, e a qualidade de membro da União Europeia impõe responsabilidades acrescidas na intervenção multilateral, designadamente na Organização para a Segurança e Cooperação na Europa, de que a Cimeira de Lisboa da OSCE, em 1996, e a actual candidatura de Portugal à presidência em exercício, de 2002, constituem expressão elucidativa.
A ratificação da presente Convenção insere-se, pois, indirectamente, também, nas políticas comunitárias relacionadas com esta matéria.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique de Freitas.


O Sr. Henrique de Freitas (PSD): – Sr. Presidente, permita-me que saúde V. Ex.ª e que lhe transmita da minha honra em usar da palavra pela primeira vez, neste Hemiciclo, sob a sua presidência.

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O Orador : – Também saúdo, na pessoa de V. Ex.ª, todas as Sr. as Deputadas e todos os Srs. Deputados da VIII Legislatura.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Convenção de Conciliação e Arbitragem no quadro da CSCE, assinada em Dezembro de 1992, e presente hoje a esta Câmara, constitui uma importante etapa no processo de desenvolvimento das capacidades operacionais desta Organização em matéria de resolução pacífica de diferendos, reflectindo o ambiente estratégico da década de 90.
Década que viu ruir a velha Europa, dividida artificialmente, e viu nascer uma nova Europa que se pretendia «inteira e livre», de Vancouver e Vladivostok, e proclamasse a sua adesão aos valores do Estado de direito e a uma mesma concepção dos Direitos do Homem.
Foi assim, que os Estados signatários da Acta Final de Helsínquia se viram confrontados com a alternativa de refundar o processo CSCE, dotando-o de novas missões e estruturas, e escrever a História do presente, ou encerrar o e reduzir a Acta Final a um documento de arquivo destinado à História do passado.
Num ano marcado pela libertação de Nelson Mandela, pela eleição de Boris Yeltsin, pela invasão iraniana do Koweit, pela unificação alemã, pela atribuição do Nobel da Paz a Gorbachev, a resposta foi a assinatura a 21 de Novembro da «Carta de Paris para uma Nova Europa», verdadeira certidão de óbito da Guerra Fria e acto refundador de uma CSCE que se institucionalizará em Janeiro de 1995 como a Organização de Segurança e Cooperação na Europa (OSCE).
Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: Se é certo que podemos reconhecer no processo de Helsínquia o estabelecimento de medidas de confiança que ajudaram a normalizar, institucionalizar e pacificar as relações EsteOeste, e até encará-lo como consciência moral da Europa pela feliz enumeração do seu Decálogo, a verdade é que a CSCE, no que à resolução pacífica de diferenças diz respeito, não estava dotada de capacidade operacional. A CSCE jamais geriu crises ou conflitos.
E só agora, no quadro da desglobalização estratégica do pósGuerra Fria e no quadro da conflitualidade, cada vez menos internacional e cada vez mais etnicizada – como demonstra Hassner –, é que a CSCE deu os primeiros passos na operacionalidade da resolução pacífica dos diferendos.
Pudéssemos nós saudar, neste Parlamento e no decorrer desta legislatura, o sucesso da candidatura portuguesa à presidência da OSCE em 2002, que contribuiria, estamos certos, para novos e decisivos passos nessa operacionalidade.
Empurrada pela realidade internacional de «paz possível, guerra provável» que o drama jugoslavo e os conflitos na região da exUnião Soviética, a CSCE avançou logo em 1991 com a criação de um Centro de Prevenção de Conflitos, mandatado pela Carta de Paris para analisar «uma gama de métodos aplicáveis à resolução pacífica dos diferendos, nomeadamente a intervenção obrigatória de um terceiro Estado».
Em 1991 é, também, aprovado um documento, agora em La Valletta, intitulado «Disposições relativas a um processo CSCE para a resolução pacífica dos diferendos», que vem permitir aos Estados do processo CSCE a possibilidade de submeterem um diferendo bilateral a um organismo da própria CSCE.
Mas, se considerarmos que este organismo não tinha carácter permanente, que as suas decisões não eram vinculativas, que o processo de resolução pacífica de diferendos não se aplicava aos conflitos resultantes de questões relativas a fronteiras e à integridade territorial dos Estados, concluímos pelo reduzido alcance destas propostas.
Será em Helsínquia, em 1992, que se procederá a um vasto debate sobre as capacidades operacionais da CSCE para a gestão de crises e conflitos. E será também em Helsínquia que se debaterá um projecto franco-alemão de convenção, bem como um conjunto de propostas britânicas e norte-americanas relativas a processos de conciliação.
Este debate motivou a convocação de uma nova reunião especificamente encarregada de negociar «um conjunto global e coerente de meios de resolução pacífica de diferendos, nomeadamente a criação de um Tribunal de Conciliação e Arbitragem».
É assim, Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados, que o Conselho Ministerial, reunido em Estocolmo em 1992, adopta a Convenção de Conciliação e Arbitragem, hoje em discussão e que teve por base um projecto francês de Robert Badinter.
«O Projecto Badinter» – como assim ficou conhecido –, concebido a partir da ideia de uma grande Europa baseada nos valores da Acta Final de Helsínquia e da Carta de Paris, exigia a instituição, no seio da CSCE, de uma jurisdição permanente encarregada de prevenir e resolver conflitos interestaduais pela conciliação e arbitragem.
Tal jurisdição teria o mérito, ainda nas palavra de Badinter, de consagrar o primado do direito internacional na grande Europa, reforçar o prestígio da CSCE e evitar no continente europeu uma tragédia semelhante à existente na ex-Jugoslávia.
Ss. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: Das disposições constantes da Convenção em apreço, bem como do protocolo financeiro que lhe está associado, permitam que salientemos três aspectos.
Primeiro, a afirmação do carácter subsidiário da Convenção face a outros meios de negociação, já que não se tenciona afectar a competência, nem do Tribunal Internacional de Justiça, nem do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, nem do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, nem do Tribunal Permanente de Arbitragem.
Em segundo lugar, o carácter não vinculativo do resultado do processo de conciliação.
Por último, o Tribunal de Conciliação e Arbitragem não deve ser considerado um órgão da OSCE, mas, sim, um tribunal constituído no seio da OSCE.
Ss. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: Para o PSD, o voto favorável à ratificação a conceder pelo Parlamento português a esta Convenção, que entrou em vigor a 5 de Dezembro de 1994, ilustra o adágio segundo o qual, mesmo a mais longa das viagens, começa com um pequeno passo.


Aplausos do PSD.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mafalda Troncho.


A Sr.ª Mafalda Troncho (PS): – Sr. Presidente, nesta minha primeira intervenção na nova legislatura, queria

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O Sr. Presidente (João Amaral): – Muito obrigado, Sr.ª Deputada.


A Oradora : – Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O actual Governo volta a apresentar à Assembleia da República a proposta de resolução n.º 116/VII, que aprova, para ratificação, a Convenção de Conciliação e Arbitragem, no Quadro da OSCE, concluída em Estocolmo, a 15 de Dezembro de 1992, no Terceiro Conselho Ministerial da OSCE.
O Acto Final de Helsínquia, da Conferência de Segurança e Cooperação na Europa (CSCE), assinado em 1 de Agosto de 1975, marcou o começo oficial de um processo diplomático flexível que criou, na Europa, uma estrutura de diálogo entre os dois blocos.
A CSCE, um pouco na tradição das grandes conferências internacionais do século XIX, foi desenvolvendo a sua acção ao longo dos anos, tendo atingido pontos altos na Conferência de Belgrado (1977), na Conferência de Madrid (198083), na Conferência de Viena (198689), na Cimeira de Paris (1990) e na Cimeira de Budapeste (1994), que contribuíram para o reforço do clima de segurança e cooperação a que deram origem..
Na Cimeira de Paris, mercê da evolução política registada no Bloco de Leste, deu-se início à institucionalização da CSCE, com a criação de um Conselho, um Comité de Altos Funcionários, um Centro de Prevenção de Conflitos em Viena, um Gabinete de Eleições Livres em Varsóvia e um Secretariado em Praga. Este movimento de institucionalização foi aperfeiçoado na Cimeira de Budapeste, onde o nome de CSCE foi mudado para Organização de Segurança e Cooperação na Europa, ficando assim a traduzir mais fielmente a nova realidade.
A Convenção de Conciliação e Arbitragem no Quadro da OSCE, que vamos analisar, é o resultado de um longo e diversificado trabalho, na área da resolução pacífica de conflitos, iniciado ainda nas reuniões preparatórias da Conferência de Helsínquia de 1975. Esta Convenção estabelece um tribunal de conciliação e arbitragem como instância jurisdicional de recurso possível dos estados participantes na OSCE para a resolução de um diferendo. A Convenção responde ao sentimento de necessidade de um sistema de resolução pacífica de diferendos no âmbito da OSCE. O objectivo é a resolução de conflitos que não tenham sido resolvidos num razoável período temporal através de negociação que sejam apresentados pelos Estados parte na Convenção e ou pelos Estados participantes na OSCE através da conciliação e, quando adequado, da arbitragem de acordo com as disposições da Convenção.
Atentas todas as considerações já proferidas, somos de parecer que a proposta de resolução n.º 116/VII reúne todas as condições para ser aprovada, sem prejuízo de se ter em conta uma maior segurança jurídica dada pela comparação entre o texto em inglês e a versão portuguesa.


Aplausos do PS.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Srs. Deputados, a Sr.ª Deputada Mafalda Troncho foi a relatora desta proposta de resolução na legislatura passada.
Chamo a atenção do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Lello, para o texto do relatório, onde foi detectado um conjunto de deficiências
de tradução e algumas incongruências, chamemos-lhe assim, no títulos. Creio que há, pelo menos uma, que é de importância material, porque é uma deficiência de tradução: onde se diz «renováveis de seis anos» deve dizer-se «renováveis de seis meses». Chamo-lhe a atenção para isto, porque o texto terá de ser publicado com essas correcções.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.


O Sr. Bernardino Soares (PCP): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de resolução que hoje analisamos propõe a ratificação da Convenção de Conciliação e Arbitragem no Quadro da OSCE. Criam-se, através desta Convenção, mecanismos para prevenir, impedir e resolver conflitos com o respeito das soberanias, com o respeito do direito de cada Estado se vincular ou não à jurisdição de cada comissão de conciliação ou de cada tribunal arbitral e com o respeito do princípio da reciprocidade no acatar das decisões de cada um destes órgãos.
A OSCE é, aliás, o espaço para a implantação efectiva de um sistema de segurança e cooperação na Europa que é, constantemente, «torpedeado» pela submissão aos ditames expansionistas da política da NATO. A opção, aqui, é entre a criação de um clima de confiança, de desmilitarização, de equilíbrio de forças e de estabilidade na Europa com vista à manutenção da paz e da segurança e a política da imposição unilateral da ingerência, da manutenção do bloco políticomilitar NATO, do aumento das suas missões, da área de influência e do novo modelo de forças.
Nesta opção, o que faz o nosso Governo? O nosso Governo, este mesmo que no traz esta proposta, é o que se submete aos ditames da NATO e dos Estados Unidos e o mesmo que aqui defende o novo conceito estratégico desta organização.


Vozes do PCP : – Muito bem!


O Orador : – Provavelmente, Sr. Presidente, Srs. Deputados, este Governo sofre de um fenómeno de dupla personalidade. É uma espécie de «Dr. Jeckyll and Mr. Hyde», mas a opção é, infelizmente, cada vez mais pelo «Mr. Hyde».


Aplausos do PCP.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.


O Sr. Francisco Louçã (BE): – Muito obrigado Sr. Presidente.
Uma intervenção breve para registar que, tendo ouvido com atenção as intervenções de outras bancadas e a intervenção do Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, ficaram-me, no entanto, algumas dúvidas fundamentais sobre, não tanto o texto – foi, aliás, acrescentado que alguma insegurança sobre isso seria justificável, dados os erros de tradução –, mas mais sobre o seu impacto factual, sobre a sua capacidade de cumprir esta virtude de arbitragem nos conflitos entre os Estados.
Aparentemente, esta matéria padece de duas fragilidades. Uma, é que este esforço arbitral está subordinado a uma ordem jurídica espartilhada. Afirma-se no texto que há um carácter subsidiário desta convenção relativamente a outros pilares da ordem jurídica que se pretende consti

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O Sr. Presidente (João Amaral): – Não havendo mais intervenções sobre esta proposta de resolução, está encerrado o debate. A sua votação terá lugar amanhã, no período regimental de votações.
Vamos agora apreciar a proposta de resolução n.º 117/VII – Aprova o Tratado entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha para a Repressão e Tráfico Ilícito de Droga no Mar, assinado em Lisboa a 2 de Março de 1998.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.


O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas : – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito sucintamente, referiria que, através da celebração deste Tratado que agora é posto à apreciação de VV. Ex. as , se procura uma cooperação mais ampla entre os dois Estados, tendo em conta o fenómeno do tráfico ilícito de estupefacientes e substâncias psicotrópicas em conformidade com o Direito Internacional do Mar.
Este Tratado destina-se, assim, fundamentalmente, a dotar as autoridades de Portugal e de Espanha dos meios adequados à cooperação, tendo em conta a necessidade de se reprimir este tráfico ilícito, designadamente no mar, no que respeita ao princípio da liberdade de navegação, envolvendo a estreita cooperação das autoridades dos dois Estados, procurando desenvolver-se toda esta acção conjunta de cooperação num quadro gerador de confiança que é fundamental no relacionamento entre Portugal e Espanha.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.


O Sr. Telmo Correia ( CDS-PP): – Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Apresenta o Governo à Assembleia o Tratado entre Portugal e o Reino de Espanha tendo em vista a repressão do tráfico ilícito de droga no mar.
O Grupo Parlamentar do CDS Partido Popular não pode deixar de manifestar a sua aprovação face a tal iniciativa.
Com efeito, merece o nosso apoio toda e qualquer medida que vise aumentar a eficácia no combate à criminalidade, designadamente à prevenção e à repressão do tráfico de droga.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos temos particular consciência de que o tráfico se opera cada vez mais no mar e que, sem uma cooperação estreita entre os Estados poderemos, eventualmente, ganhar batalhas pontuais, mas a guerra estará perdida.
Dizêmo-lo com a legitimidade de quem nunca foi defensor de soluções liberalizantes ou aceitou que esta guerra possa, alguma vez, ser perdida ou que se possa, sequer, baixar os braços.
Por outro lado, o Tratado ora sujeito a aprovação inserese no âmbito das relações entre Portugal e a Espanha, cuja cooperação, em matéria de política criminal e de segurança, só pode merecer, obviamente, a nossa aprovação.
Não é possível, hoje, perante a globalização, também, da actividade criminal, dirigida por grandes multinacionais do crime, desenvolver qualquer combate eficaz sem uma cooperação cada vez mais estreita entre Estados e, em particular, entre Estados vizinhos.
Fazem, por isso, todo o sentido o direito de representação e a legitimidade de intervenção dos artigos 4.º a 7.º do presente Tratado.
Preocupam-nos unicamente, no seu conteúdo, alguns aspectos relacionados com a renúncia de jurisdição e o exercício do direito de exigir a libertação, sem outros condicionantes.
Preocupanos, também, aproveitando esta discussão, sobretudo que, para além do âmbito do Tratado, seja assegurada a capacidade das autoridades portuguesas no cumprimento dos seus nobres objectivos. Sabemos que os meios disponíveis, designadamente as célebres lanchas rápidas, são escassos e que estamos longe de ter a capacidade suficiente de resposta…


O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): – É verdade!


O Orador : – … a uma criminalidade cada vez mais marítima, dado que o próprio controle existente nos aeroportos a isso o obriga. O que é, naturalmente, agravado pela inexistência de controlo de fronteiras terrestres e pelas deficiências que, sistematicamente, temos vindo a apontar ao sistema de Schengen. Tudo isto aumenta, do nosso ponto de vista, a fluidez da circulação de produtos ilícitos por via terrestre, exigindo, portanto, um maior controlo naval e costeiro.
Trata-se, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, da célebre corrida entre a lebre e a tartaruga, sendo que a lebre (os traficantes), ao contrario da lebre da fábula, não pararam para descansar e que, bem pelo contrário, dispõem, à custa de um negócio criminoso e altamente lucrativo, dos mais modernos meios e do mais sofisticado equipamento.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para nós, o combate à droga deve ser a prioridade das prioridades da política criminal, e esta passa, forçosamente, pelo reforço de meios e, designadamente, dos importantes meios navais e aéreos.
O presente Tratado, inserido no âmbito da cooperação entre Estados e do desenvolvimento de uma política global de reforço de cooperação entre entidades policiais e de política criminal, merece o nosso apoio, exigindo, no entanto, um esforço suplementar da parte portuguesa para

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Vozes do CDS-PP : – Muito bem!


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Baltazar Mendes.


O Sr. Nuno Baltazar Mendes (PS): – Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. as e Srs. Deputados: O presente Tratado, que está neste momento à nossa apreciação, celebrado entre Portugal e a Espanha, para a repressão do tráfico ilícito de droga no mar, é, em nosso entender, um instrumento muito importante e mesmo, porque não dizê-lo, de estratégica importância no combate à droga e ao tráfico de droga.
Importa ter em atenção que, hoje, ao nível do tráfico de droga, nos debatemos com associações criminosas, como já aqui foi referido, com poderosos meios financeiros e com grande capacidade de organização, conhecida, aliás, das próprias autoridades policiais, quer nacionais quer internacionais.
Por outro lado, tudo o que se relaciona com droga, tudo o que tem a ver com o tráfico de droga e onde, obviamente, imperam avultadas importâncias em dinheiro, não tem pátria.
Por outro lado ainda, todos sabemos que o branqueamento de capitais que lhe está associado é outro instrumento absolutamente vital para este tráfico, cujo combate urge implementar.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, todos temos também consciência de que a réplica eficaz a este combate não pode ser exercida exclusivamente à escala nacional. Na passada legislatura, tivemos aqui muitos debates relativos a esta matéria e, por muitas críticas que sejam feitas, não há dúvida de que hoje é absolutamente decisivo e determinante para este combate que haja alguma estratégia a nível da União Europeia.
Por outro lado, não podemos ignorar que Portugal e Espanha têm grandes fronteiras marítimas comuns. Não sendo sequer preciso conhecer determinado tipo de estatísticas e mesmo alguns procedimentos que têm sido utilizados ultimamente, há que dizer que a defesa da fronteira sul, relativamente a Marrocos (de que ainda há pouco aqui falámos a propósito das pescas), é muito sensível. Esta defesa da fronteira sul, nomeadamente através da cooperação com outros países do mediterrâneo, é, para nós, absolutamente importante.
Além disso, é evidente que este Tratado vem possibilitar uma cooperação entre Portugal e Espanha, nomeadamente entre as marinhas portuguesa e espanhola, que nos parece de muita importância e de vital necessidade no que diz respeito a este combate. Todos sabemos que muitas apreensões importantes de droga só são efectivamente possíveis quando são feitas em alto mar, pois todos sabemos que este combate é bastante mais difícil e de sucesso bastante mais duvidoso quando estas mercadorias chegam a terra.
Portanto, se, neste momento, nos congratulamos com este Tratado e com a necessidade absoluta de agilizar processos que ele revela, não nos assusta absolutamente nada que Portugal assuma algumas responsabilidades nesta
matéria, conjuntamente com Espanha, que possam levar a resultados que não temos tido até hoje.
Há ainda que realçar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que toda esta estratégia bilateral entre Portugal e Espanha se articula, de alguma forma, com o reforço que, nos últimos anos, ao nível da União Europeia, nomeadamente com a consolidação do terceiro pilar, tem vindo a ser concretizado e defendido e estamos em crer que terá agora uma nova oportunidade de se reforçar e de se concretizar.
Por tudo isto, embora entendendo algumas críticas que possam ser feitas (e é velha aquela crítica das fronteiras terrestres de Portugal, como se o resultado do combate à droga em Portugal fosse diferente daquele que, neste momento, estamos a conseguir no âmbito da União Europeia e, mais concretamente, no âmbito do espaço Schengen), gostaria de desafiar aqueles que defendem esse controlo das fronteiras terrestres.
Não sei que controlo diferenciado é esse, pois, ouvindo o Sr. Deputado do Partido Popular, como acabei de ouvir há pouco, percebi que aquilo que o Partido Popular defende, neste momento, é que Portugal deve sair do espaço Schengen, deve fechar as suas fronteiras terrestres, deve ter fronteiras fechadas fora da própria União Europeia, para, com isso, conseguir outros resultados. Fiquei sem perceber, porque aquilo que compreendi das palavras do Sr. Deputado foi que este deficiente controlo das fronteiras terrestres decorre do facto de Portugal, no âmbito da União Europeia, ter as suas fronteiras abertas da forma que tem, ainda que tal seja decorrente e no âmbito do espaço Schengen.
Portanto, não nos parece que seja essa a solução. O que nos parece é que, quer no âmbito da União Europeia, quer no âmbito de tratados bilaterais como este que Portugal teve oportunidade de celebrar e outorgar com Espanha, se poderá conseguir um combate mais eficaz a algo que, evidentemente, é uma praga. É importante que admitamos que este é um meio importante ao serviço da repressão do tráfico de droga, mas, quando abordamos esta questão e tudo aquilo que tem a ver com a droga, temos de ter em atenção que existem outros mecanismos e, sobretudo, que há um combate ao nível da prevenção que não pode ser descurado; bem pelo contrário, tem de continuar a ser implementado e assumido por todos os responsáveis nacionais de todas as instituições, independentemente do nível em que se encontrem.
Sr. Presidente, termino exprimindo a posição da bancada do Partido Socialista, que vai no sentido da aprovação deste Tratado e de aceitação da proposta de resolução que lhe está subjacente.


Vozes do PS : – Muito bem!


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.


O Sr. António Filipe (PCP): – Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Este acordo bilateral celebrado com Espanha, embora correspondendo a um apelo que foi feito na última Assembleia Geral das Nações Unidas, especialmente dedicada ao problema da droga, no sentido de que os vários Estados celebrassem acordos bilaterais destinados a combater o grande tráfico de droga, particularmente em alto mar, visa corresponder a uma forma de cooperação bilateral possível entre dois

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O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): – Não há! Nem a remos!


O Orador : – Nos programas dos vários governos e em sucessivos Orçamentos do Estado as lanchas têm sido mencionadas. Não queria exagerar, mas creio que, na última década, poucos terão sido os Orçamentos do Estado, se é que houve algum, que não tivesse inscrita uma verba para as tais lanchas rápidas!


O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): – Exactamente!


O Orador : – Numa interpelação ao Governo que fizemos mais ou menos a meio da legislatura anterior, tive oportunidade de dizer que as lanchas rápidas demoram mais a chegar ao Tejo do que demorou Vasco da Gama a chegar à Índia em 1498!
De facto, tivemos oportunidade de reparar que, no Programa do Governo, vêm, mais uma vez, referidas as lanchas rápidas, agora prometidas para a próxima legislatura. Vamos ver se quem cá estiver, na IX Legislatura, não estará ainda a exigir, pelo menos – que diabo! –, alguma lancha rápida, dado que continuamos a não ter nenhuma!
Isto para não falar no célebre sistema LAOS, pois, reconhecidamente, são mais os espaços da costa que não estão vigiados do que aqueles cujos sistemas de vigia estão a funcionar.
Há, de facto, um problema de combate ao tráfico de droga que utiliza as costas portuguesas que está por resolver e para o qual é necessário que sejam postos a funcionar os meios que estão, desde há muito, prometidos para que haja uma vigilância mínima das costas portuguesas. Há também toda uma colaboração com autoridades de outros Estados que deve ser mantida e intensificada para que esse tráfico de droga seja impedido. É que isso é muito importante!
Mais do que uma política assente na repressão dos consumidores, que, quanto a nós, devem ser tratados como doentes e não como criminosos, o importante é que os esforços da repressão se concentrem na alta criminalidade associada à droga. Daí que também o combate ao tráfico de droga no alto mar, que constitui o objecto deste Tratado, tenha a sua importância como aspecto complementar de um esforço muito mais profundo que é necessário desenvolver.


Aplausos do PCP.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.


O Sr. Francisco Louçã (BE): – Muito obrigado, Sr. Presidente.
Uma breve intervenção para registar, em primeiro lugar, que o Bloco de Esquerda votará a favor da ratificação deste Tratado, em segundo lugar, para dizer que, por breve que seja o tempo que lhe dedicamos, esta discussão suscita uma referência a uma outra, que é necessária e que será, naturalmente, agendada no decurso desta Legislatura, que é a discussão de fundo sobre as políticas de combate à criminalidade e à toxico-dependência.
Quis o Deputado Telmo Correia fazer uma referência, cuja franqueza lhe agradeço, dizendo que não poderia baixar os braços e declarar que esta guerra estava vencida. Creio que é importante que haja uma declaração de expansão bélica a esse respeito; no entanto, é minha convicção de que qualquer política que se baseasse unicamente no combate ao narcotráfico estaria condenada à partida. Creio, aliás, que os números indicam que essas políticas têm vindo a ser condenadas e, provavelmente, estarão condenadas ainda no futuro.
Naturalmente, a discussão portará não só o combate à criminalidade mas mais ainda aquelas consequências que têm a ver com o combate à toxico-dependência no plano interno. O facto de se tentar impedir, por todos os meios constitucionais e de direito, este grande tráfico deixa ain

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O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.


O Sr. Carlos Encarnação (PSD): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas dizer que votaremos favoravelmente a ratificação deste Tratado, que vemos aparecer com algum agrado, sendo certo que nos parece que já não falta quase nada, do ponto de vista dos acordos, tratados, convenções, recomendações, em relação a esta matéria. Portanto, desse ponto de vista, a «armadura» é completa. Faltam é meios..., mas essa é outra questão!
Em relação a este Tratado, gostaria de dizer que, sendo Portugal um País particularmente vulnerável ao tráfico de droga, designadamente ao tráfico de droga realizado através da rota atlântica, através do mar, e tendo Portugal um interesse estratégico importante no triângulo entre os Açores, a Madeira e as Canárias, sendo esse triângulo uma das possíveis zonas de entrada com maior frequência de toda a droga que, por esta rota, abastece a Europa inteira, é evidente que Portugal tem de se preocupar particularmente com esta questão.
Este acordo surge na sequência de um outro existente entre Portugal e Espanha, datado, se não estou em erro, de 1993 ou 1994, que já colocava os meios dos dois países em utilização possível comum para efectuar este combate. Portanto, não se trata de uma novidade. Apenas se acrescenta, na sequência da recomendação das Nações Unidas, o combate previsto em alto mar, utilizando, eventualmente, meios militares ou de outra natureza.
Neste âmbito, também reconheço – e o Sr. Secretário de Estado certamente permitir-me-á fazer este cumprimento – uma evolução importante do ponto de vista do Partido Socialista, porque, na altura em que discutimos pela primeira vez se poderiam ou não ser utilizados meios militares em relação ao combate à droga, houve alguns Deputados da bancada do Partido Socialista e que, então, intervieram que entendiam esta solução como ferida de inconstitucionalidade. Diziam eles, nessa altura, que não se podiam juntar as duas coisas, que não se podia combater a criminalidade com meios militares. Vejo agora, felizmente, que evoluíram nessa perspectiva!
Na altura em que Portugal fez esse acordo com Espanha também se dizia que havia uma perda de soberania por Portugal utilizar meios espanhóis em relação ao combate à droga. Mas isso, penso eu, representava mais,
nessa altura, uma visão limitada do acontecimento, uma visão um pouco exterior à questão, uma visão menos dramatizada do problema! A partir do momento em que a droga passou também a ser com o Partido Socialista o seu «inimigo público n.º 1» esbateram-se essas fronteiras de utilização e o Partido Socialista foi reconduzido ao bom caminho!


Risos do Deputado do PS José Junqueiro.


Diz o Sr. Deputado José Junqueiro que certamente nem todo o bom caminho, e com razão. Porque aquilo que é dito no Tratado é isto: Portugal e Espanha podem utilizar meios comuns. Só que é evidente que Espanha ficará sempre a perder, infelizmente, porque Portugal não tem praticamente meios comuns para utilizar e para dar em troca à Espanha. É um «pacto leonino» que estamos a celebrar, sendo certo que é a nosso favor e utilizando os meios de Espanha!
Quero, portanto, celebrar o contentamento do Sr. Deputado José Junqueiro com esta solução e cumprimentar o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas por, finalmente, o Governo apresentar, para ratificação, um Tratado que é muito importante e que vai completar, como eu disse, a «armadura» em relação à luta contra o tráfico de droga.


Vozes do PSD : – Muito bem!


O Sr. Presidente (João Amaral): – Srs. Deputados, como não há mais pedidos de palavra, dou por encerrado o debate relativo à proposta de resolução n.º 117/VII, cuja votação será amanhã, à hora regimental.
Vamos passar à discussão da proposta de resolução n.º 137/VII – Aprova, para ratificação, o Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado na Praia, Cabo Verde, aos 17 de Julho, pelos Governos da República de Angola, da República Federativa do Brasil, da República de Cabo Verde, da República da Guiné-Bissau, da República de Moçambique, da República Portuguesa e da República Democrática de S. Tomé e Príncipe.
Para apresentar a proposta de resolução, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.


O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas : – Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Protocolo em apreciação, subscrito conjuntamente pelas Partes no âmbito da CPLP e assinado na cidade da Praia, em 17 de Julho de 1998, tem como objecto a actualização do articulado do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado em Dezembro de 1990.
Deste Protocolo que agora submetemos à apreciação de VV. Ex. as resulta o relançamento de todo este processo, visando a entrada em vigor do dito Acordo Ortográfico, que, até à data, carecia de ratificação de todas as Partes. O objecto imediato deste Protocolo é a elaboração de um vocabulário ortográfico comum da língua portuguesa, tão completo quanto possível, que possa contribuir para a normalização no tocante às terminologias científicas e técnicas.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Frexes.

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O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas : – Sr. Presidente, peço a palavra.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para que efeito, Sr. Secretário de Estado?


O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas : – Sr. Presidente, foram-me pedidas respostas, pelo que, em termos regimentais, só tenho ao meu dispor a figura da intervenção e fála-ei quando V. Ex.ª quiser.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Creio que haverá acordo para que o Sr. Secretário de Estado fale depois de todas as intervenções, o que lhe permite responder não só a esta mas também a outras. Se o Sr. Secretário de Estado estiver de acordo...


O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas : – Com certeza, Sr. Presidente.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Dou, então, a palavra ao Sr. Deputado Rosado Fernandes.


O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não houve hífen ortográfico ou ortodoxo que ligasse aqui mais Deputados para ouvir falar do Acordo Ortográfico. Foi exactamente o que aconteceu nos países que eram afectados por esta «grave doença» que sempre atacou os portugueses desde 1911, que é a de fazerem contínuas reformas ortográficas. Nada faz vibrar mais um português do que uma reforma ortográfica! O hífen..., maravilha!
Lembro-me do Graça Moura, que defendia, com entusiasmo, a abolição do hífen, lembro-me de várias vestais da minha Faculdade, que defendiam uma contra-reforma ortográfica, e eu, que fui aluno do Professor Rebelo Gonçalves, que foi o autor da reforma ortográfica de 1945, e já fui obrigado a escrever açúcar com dois «ss», açúcar com «ç» e outras palavras que já nem ouso repetir...
A verdade é que os países não sentem necessidade de que haja uma uniformização de qualquer acordo ortográfico, mas também é verdade que os países mais ricos não perdem dinheiro com acordos ortográficos. O defeito dos ricos é poupar; o defeito dos pobres é gastar! De maneira que vemos que os americanos continuam com o seu boro, com «b», «o», «r», «o», como se pode ver escrito por aí nos maços de tabaco, e os ingleses continuam a escrever borough , com «b», «o», «r», «o», «u», «g», «h», que é muito mais complicado. Portanto, o Marlborough inglês não é o mesmo que o Marlboro americano!

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Risos do CDS-PP.


... e eu digo isto depois deste Acordo Ortográfico, em que os meus colegas de Coimbra andaram furiosos debatendo sobre se punham acento grave, acento agudo ou acento circunflexo, hífen ou não hífen…
E, meu Deus, falta-nos um dicionário! Falaram do meu antigo aluno Malaca Casteleiro e disseram que ainda não acabou o dicionário da Academia. Mas, como sabem, o primeiro dicionário da Academia acabou na palavra «azurrar» _ foi nesta palavra que acabou o primeiro volume do dicionário da Academia, do século passado…


Risos.


Este ainda não zurra, porque nós ainda não o vimos!…


Risos.


Meus queridos amigos e colegas, eu não quero estragar a vontade ao Sr. Secretário de Estado e dir-lhe-ei que aprovaremos esta proposta de resolução, mas com o desejo de que isto até falhe, porque não há qualquer dúvida de que o pidgin portuguese vai existir. Não há qualquer dúvida de que o crioulo é o crioulo, o brasileiro é o brasileiro e o português daqui é o português daqui.


Vozes do CDS-PP : – Muito bem!


O Orador : – Mas façam um dicionário! Eu, quando tenho de estudar uma regência de adjectivo ou de substantivo, vejo-me aflito e tenho de recorrer ao Dicionário de Francisco Fernandes, que é um lexicógrafo brasileiro.


O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas : – Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?


O Orador : – Diga.


O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas : – Por favor, a mim, que me chamo Lello, não me peça para fazer um dicionário.


Risos.


O Orador : – Como estava a dizer, quando pretendo encontrar uma regência de um verbo, tenho, por exemplo, de recorrer ao dicionário de Francisco Fernandes. Aliás, no outro dia descobri _ mirabile dictum _ que o melhor dicionário de português que ainda hoje está comprável é o Aurélio Buarque de Holanda, que é brasileiro; o Dicionário da Porto Editora é louvável, mas não é um bom dicionário, pois não tem exemplos da literatura.
Ora, tinha sido preferível que a Academia se concentrasse num bom dicionário e noutros dicionários, visto que não temos lexicógrafos em Portugal – assim como seria preferível que o Governo se concentrasse nas lanchas rápidas! –, do que estarem sempre a pensar em uniformizar a língua que os povos não vão uniformizar. O português crioulo será o português crioulo..., mas, agora, uma coisa é importante: é, de facto, uniformizarem e chegarem a um acordo sobre a terminologia técnica e científica.


O Sr. Manuel Frexes (PSD): – Exactamente!


O Orador : – Mas sobre isso nem cá temos acordo. Porquê? Porque há uns que são influenciados pela bibliografia francesa, outros pela bibliografia alemã, outros pela bibliografia inglesa… A verdade é que primeiramente foi a francesa _ nós ainda dizemos embrayage e não clutch para o carro.
Portanto, digo-vos, sinceramente: vamos votar esta proposta de resolução, mas é com um voto de piedade por simpatia e por mais nada. De resto, poupem-me mais ortografias, deixem-me o hífen em paz!


Aplausos do CDS-PP.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.


A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de passar a dar a nossa opinião sobre esta matéria, devo dizer que teria sido muito importante, para que pudéssemos, de algum modo, opinar acerca desta proposta de alteração que estamos a discutir, que o Sr. Secretário de Estado começasse por informar esta Assembleia do estado do Acordo.
Contactando algumas das partes interessadas, contactando algumas academias e algumas instituições, normalmente a resposta que ouvimos é esta: mas ainda há acordo? Estávamos convencidos de que não! Que tinha caído em 1991, depois em 1994 e que já não existia!
Portanto, era extremamente importante que o Sr. Secretário de Estado, em vez de nos ler os artigos sujeitos a alteração – que todos nós já lemos, porque sabemos ler –, nos tivesse dito exactamente em que estado está o Acordo.
Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, estamos aqui a incorrer, mais uma vez, numa concepção que, na nossa perspectiva, é incorrecta e que está nem mais nem menos na continuidade da que ocorreu em 1991, ou seja, a entregar a esta Assembleia uma decisão meramente política por se considerar que esta Câmara é incapaz de encontrar soluções técnicas e muito menos linguísticas.
De facto, em 1991, foi entregue a esta Casa uma mera decisão política que, apesar de tudo _ e quem ouviu a discussão de 1991 apercebeu-se disso _, teve uma discussão acalorada, aprofundada, que conseguiu encontrar algumas incongruências, alguns erros, algumas metodologias perfeitamente incorrectas na construção do Acordo. Para além disso, e acima de tudo, foi reconhecido por muitos Deputados desta Casa de que tinha havido uma atitude e um pragmatismo político que tinha apostado, fundamentalmente, no sigilo e no constrangimento para encontrar o resultado político do Acordo e que desse sigilo e desse constrangimento tinham sido afastados professores, linguistas, editores, livreiros e muita e muita gente de reconhe

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Vozes do PCP : – Muito bem!


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.


O Sr. António Braga (PS): – Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não resisto a começar por saudar o Sr. Deputado Rosado Fernandes e dizer-lhe que cada um de nós tem as nossas heranças, com «h»: é que o PP votou a favor deste Acordo Ortográfico no tempo adequado.
Por outro lado, devo também dizer-lhe que não estamos muito longe quanto à abordagem que faz relativamente à língua. De facto, a língua não se regula nem por lei nem por decreto – aliás, nós dissemos isso, em tempo oportuno, quando se aprovou aqui, em 1991, pela maioria absoluta do PSD, o Acordo Ortográfico.
Dissemos também outras coisas: que, independentemente de estarmos com muitas divergências quanto ao seu conteúdo – e, na altura, a discussão foi muito acalorada mesmo na sociedade civil, dita assim –, os próprios prazos que constavam do Acordo e que, na altura, foram aprovados (e isso foi dito aqui com toda a clareza) eram incumpríveis, porque não havia condições, nem nos países que subscreveram o Acordo nem em Portugal, para fazer, nomeadamente, a harmonização científica e técnica da língua.
Nesse sentido, o Governo e os socialistas têm uma herança. A herança nossa – deixe-me também dizê-lo deste modo – é um acordo feito, e o que está feito, disse-o bem o Sr. Deputado Rosado Fernandes, está feito!
Naturalmente que não é o Acordo que vai alterar o funcionamento da língua na vida das pessoas. A língua faz-se com a história, com a história da cultura, no caso da cultura portuguesa, e, nesse sentido, nós dizemos que o Acordo já faz parte da cultura portuguesa. Há muitos anos, houve várias tentativas de se fazer sucessivos acordos ortográficos e, portanto, o Acordo é já, em si, um elemento da cultura portuguesa.
A verdade é que, neste momento, o Governo trata de ser realista e de colocar no Acordo o que é possível e desejável que lá esteja contido. Ou seja, as instituições, nomeadamente as academias, devem entender-se e encontrar a harmonização possível e desejável nos domínios científico e técnico e não marcar prazos, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita. Isto porque se há matérias em que os prazos são susceptíveis de raramente ser cumpridos é numa

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Aplausos do PS.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas.


O Sr. Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas : – Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foram feitas considerações, algumas de recorte fino, que não deixei de
apreciar, como foi a do Sr. Deputado Rosado Fernandes _ e eu não quero interferir com o seu hífen e com as considerações que fez _ e algumas perguntas; no entanto, eu de modo algum quero aqui suscitar o debate que foi realizado em 1991, não é essa a minha intenção, nem sequer estou preparado para um debate dessa ordem, como compreenderão.
Aliás, a pergunta que eu mais temia e que poderiam tê-la feito era sobre o que é que o Sr. Secretário de Estado, enquanto Deputado, em 1991, disse e fez em relação a esta matéria, na medida em que, em 1991, eu, enquanto Deputado desta Casa, e mais 17 Deputados votámos contra o Acordo, coisa que não aconteceu em relação a Deputados de outras bancadas que agora afirmam, veementemente, a necessidade de mudar, de interferir, de alterar, de ressuscitar esse debate. Não sei que posição tomaram! Eu votei contra na altura e agora estou aqui numa posição institucional a assumir e a assegurar, como me compete, os acordos internacionais do Governo a que pertenço, independentemente, até, de esse Acordo ter sido feito por um governo que suscitou a assinatura de um acordo prévio ortográfico, governo, esse, a que V. Ex.ª, Sr. Deputado Manuel Frexes, pertencia…


O Sr. Manuel Frexes (PS): – Não, não!


O Orador : – Mas assegurou a continuidade…, e bem!
Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que no dia em que eu sair do Governo, se, eventualmente, vier para esta Câmara, jamais abordarei as questões em relação às quais geri no Governo. Voltarei para outras, porventura, serei até mais explícito na intervenção dessas áreas, porque, a não ser assim, corro o risco de ser juiz em causa própria.
V. Ex.ª colocou-me perguntas, designadamente a de saber o que fez o Governo em relação a este Acordo. Sr. Deputado, V. Ex.ª compreenderá que pertenceu a um governo que suscitou a assinatura de um acordo prévio ortográfico em 1986, que conseguiu que o Acordo fosse assinado em 1990 e que depois, já quando V. Ex.ª participava de forma activa e dinâmica no governo, não conseguiu mais do que três ratificações.
Pergunta-me o que é que nós fizemos, desde então. Olhe, Sr. Deputado, através de um trabalho diplomático importante e estratégico, conseguimos que fosse criada a CPLP e esta matéria está a ser dirimida nessa sede. Está a fazer-se um trabalho profundo, naturalmente com a participação de todos e não com um protagonismo especial de Portugal. Esta tessitura tem que ser feita com todos!
Diz o Sr. Deputado que não me compreende. Bom, é preciso, talvez, um acordo fonético ou algo assim, porque eu apenas disse que o que estava em causa era a alteração dos prazos a que estávamos circunscritos para relançar este processo e concertarmos um vocabulário ortográfico, tendo em conta a normalização do léxico científico e técnico, porque essa é uma matéria essencial, como foi referido pelo Sr. Deputado António Braga.
Nós temos que evoluir no sentido do dicionário, da multimédia, porque é por aí que se travam as batalhas do próximo milénio, se queremos defender a língua. Esta matéria está a ter a sua tramitação em sede dos acordos, das negociações e do entendimento que se estabeleceu ao nível da CPLP.
Em relação ao instituto internacional da língua portuguesa, devo dizer que ele foi constituído já como integrante da CPLP. Estão em construção as instalações e a sede será em Cabo Verde. Esperemos que ele se faça,

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Aplausos do PS.


O Sr. Presidente (João Amaral): – Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos para intervir, dou por encerrada a discussão da proposta de resolução n.º 137/VII.
A próxima sessão realiza-se amanhã, quinta-feira, às 15 horas, constando de um período de antes da ordem do dia, com um debate de urgência, requerido pelo CDS-PP, sobre «Porto _ Capital Europeia da Cultura 2001», e de
um período da ordem do dia, com discussão das propostas de resolução n. os 140, 142 e 145/VII.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.


Eram 19 horas e 45 minutos.


Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:


Partido Social Democrata (PSD):
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes


Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:


Partido Socialista (PS):
Carlos Alberto Dias dos Santos
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Carlos das Dores Zorrinho
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge


Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho
Domingos Duarte Lima
João Bosco Soares Mota Amaral
José Luís Fazenda Arnaut Duarte


A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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