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Quarta-feira, 4 de Outubro de 2000 I Série - Número 7

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE OUTUBRO DE 2000

Presidente: Ex.mo Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
José de Almeida Cesário
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.os 306 e 308/VIII e das apreciações parlamentares n.os 25 e 26/VIII.
Foi aprovado o voto n.º 81/VIII - De pesar pelo falecimento de dois soldados do contigente nacional em Timor Leste (PS, PSD, PCP, CDS-PP, Os Verdes e BE), após o que a Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio. Usaram da palavra, além do Sr. Presidente e do Sr. Ministro da Presidência (Guilherme d'Oliveira Martins), os Srs. Deputados Carlos Encarnação (PSD), Manuel dos Santos (PS), Bernardino Soares (PCP), Francisco Louçã (BE), Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP) e Isabel Castro (Os Verdes).
Foi discutido e rejeitado, na generalidade, o projecto de lei n.º 302/VIII - Estabelece as bases gerais da coordenação, equipamento, reorganização e reestruturação das forças de segurança (CDS-PP). Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro da Administração Interna (Nuno Severiano Teixeira), do Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Luís Patrão) e do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Eduardo Cabrita), os Srs. Deputados Paulo Portas (CDS-PP), Luís Fazenda (BE), Jorge Lacão (PS), Miguel Macedo (PSD), Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), António Filipe (PCP) e António Dias Baptista (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Martinho
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos José Gonçalves Vieira de Matos
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Dinis Manuel Prata Costa
Eduardo Ribeiro Pereira
Emanuel Silva Martins
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco D'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Jorge Lacão Costa
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rodrigues Pereira dos Penedos
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António dos Santos
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Luísa Silva Vasconcelos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Caio Roque
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António de Carvalho Martins
António D'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
António Paulo Martins Pereira Coelho
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Manuel Marta Gonçalves
Domingos Duarte Lima
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Feliciano José Barreiras Duarte

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Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Santos Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maçãs
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Macedo Abrantes
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Cândido Capela Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Natália Gomes Filipe
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
Altino Bernardo Lemos Bessa
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello Branco
António Herculano Gonçalves
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da França
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
José Martins Pires da Silva
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Mota Soares
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 306/VIII - Reforma dos impostos sobre o rendimento (CDS-PP), que baixou à 5.ª Comissão, e 308/VIII - Garante o acesso aos medicamentos contraceptivos de emergência (PCP), que baixou à 8.ª e à 13.ª Comissão; apreciações parlamentares n.os 25/VIII - Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto (Altera o Código do Processo Civil, na redacção que lhe foi dada pelos Decretos-Leis n.os 329/95, de 12 de Dezembro, 180/96, de 25 de Setembro, e 375-A/99, de 20 de Setembro, e o Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 383/99, de 23 de Setembro (PSD), e 26/VIII - Decreto-Lei n.º 209/2000, de 2 de Setembro (Reorganiza, sob a forma empresarial, a gestão da carteira de títulos do Estado e do património imobiliário público, através da criação da PARPUBLICA, reestruturação da PARTEST) (PSD).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, creio haver consenso para a discussão e votação do voto n.º 81/VIII - De pesar pelo falecimento de dois soldados do contingente nacional em Timor Leste, até porque o voto é subscrito por todos os grupos parlamentares.
O Sr. Secretário vai proceder à sua leitura.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

Ao tomar conhecimento do acidente que vitimou dois soldados portugueses do contingente nacional em Timor Leste, a Assembleia da República, como órgão de soberania eleito pelo povo português:
Presta a sua homenagem aos militares e comandos envolvidos em missão naquele território;
Consciente dos esforços e sacrifícios que a democracia exige, orgulha-se do empenhado esforço dos militares

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portugueses que integram as forças da ONU na manutenção da paz naquele território;
Manifesta a sua solidariedade e empenho no esforço de manutenção da paz que as Nações Unidas estão a desenvolver em Timor Leste para garantir a concretização do desejo de independência, expresso massivamente pelo povo timorense no referendo de 30 de Agosto de 1999.
A Assembleia da República, reunida em sessão plenária, expressa a sua profunda mágoa pela perda da vida dos dois militares e apresenta às famílias enlutadas e ao Alto Comando Militar o sentimento do seu pesar.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Pertencemos a uma geração que viu morrer amigos e familiares na guerra. Essa memória está longe de nos tornar insensíveis.
Sabíamos todos que as novas missões militares, que visam garantir ou impor a paz, não eram, nem são, isentas de riscos; sabíamos todos que os acidentes ou as baixas em combate são, infelizmente, possíveis.
Que podemos nós fazer contra a adversidade? Preocupemo-nos que os nossos soldados disponham das melhores condições de intervenção, dos convenientes meios, das capacidades técnicas e operacionais que minimizem os riscos. A tanto chega o nosso contributo e não mais! E depois, quando as más notícias nos batem à porta, resta-nos exaltar a disponibilidade e honrar o sacrifício.
Sabemos que, com a presença militar portuguesa, muitas outras vidas têm sido poupadas; sabemos que não é inútil a dádiva. Acreditamos que vale a pena continuar e estar mesmo ali, ou sobretudo ali, onde os perigos espreitam e se desafia a sorte.
A causa da paz somou duas vítimas mortais. Que as suas famílias saibam como compartilhamos o luto e como esse luto amargo enobrece Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Julgo que pouco haveria a acrescentar ao que os representantes dos grupos parlamentares redigiram sob a forma de voto de pesar. Está lá tudo.
Gostaria, no entanto, de, associando-me a algumas das palavras proferidas pelo Sr. Deputado Carlos Encarnação, lembrar à Câmara e à opinião pública que Timor foi uma causa nacional. Foi uma causa em volta da qual os portugueses se uniram, construíram laços de solidariedade e, sobretudo, laços de esperança.
Portanto, o que é desejável, neste momento, é que este infausto acontecimento, cuja probabilidade de ocorrer existia (mas que poderia não existir, pois, às vezes, a matemática e o cálculo de probabilidades também se enganam), não ponha em causa isto que foi um olhar da Nação portuguesa - e refiro Nação e não Estado português, porque foi efectivamente a Nação portuguesa que teve esse olhar - para o futuro, para a paz, para o desenvolvimento, para a democracia e para o progresso em Timor.
Naturalmente que estas palavras, sendo, de algum modo, de circunstância, não são totalmente consoladoras para as famílias dos militares que perderam a vida. Portanto, o que é que, neste momento, podemos dizer a essas famílias? Naturalmente, associarmo-nos à respectiva dor, dizendo-lhes que estamos com elas nessa mesma dor e, sobretudo, que esperamos sinceramente e tudo faremos, enquanto Deputados, políticos e representantes da Nação, para que a morte desses dois jovens não seja gratuita e para que, com base nesse sacrifício, se possa construir um país desenvolvido, um país são e um país de futuro em Timor Leste.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em nome da bancada do PCP, queremos também associar-nos a este voto, enviando, em primeiro lugar, uma palavra de solidariedade às famílias dos militares portugueses vítimas deste acidente, bem como aos restantes militares e comandos que desempenham a sua missão em Timor Leste, fazendo votos de que os problemas e as contingências em que prestam o seu serviço sejam da melhor maneira e rapidamente resolvidos, com a plena consciência de que esta missão que desempenham é do maior interesse para o povo timorense mas é também de grande interesse para Portugal e para todo o mundo, dado que se está a dar corpo e possibilidade a que um país possa, finalmente, ter a sua independência.
Para isso, tivemos também que pagar este preço, sendo, portanto, importante que a nossa solidariedade fique aqui bem expressa pela voz da Assembleia da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Os soldados portugueses em Timor, que, hoje, estão de luto, têm tido um papel importantíssimo no combate às chacinas que as milícias, no passado, impuseram à sociedade civil e que, hoje, se mantêm quando se tenta impor uma situação de reféns a tantos milhares e milhares de famílias timorenses.
Os soldados portugueses têm-se oposto, dessa forma, à barbárie, ao massacre e à devastação e têm contribuído, com generosidade e com esforço, para que esta transição para um país independente em toda a sua dignidade possa ser feita da melhor forma, preservando e garantindo a democracia.
Por isso, devem ser honrados e por isso a Assembleia da República, como sempre tem feito até hoje, inclinando-se perante a memória destes dois soldados mortos, homenageando-os, apresentando as suas sinceras condolências às suas famílias e aos seus camaradas de armas, mantém a mesma atitude de sempre de solidariedade para com uma missão humanitária, humanista, tão profundamente importante e tão dignificadora do nosso esforço nacional.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Foi com muita comoção que soubemos, hoje de manhã, da

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morte de dois militares portugueses em Timor, ocorrida em circunstâncias dramáticas e que, digamos, era, de certo modo, previsível que, um dia, pudesse suceder, dado que a missão que os nossos militares estão a cumprir em Timor é uma missão de risco.
A Assembleia da República, mais uma vez, manifesta uma unanimidade de sentimento perante esta questão de Timor. Julgo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que esta é a atitude correcta, dado que as nossas forças estão em Timor no desígnio de darem cumprimento ao mandato que lhes foi dado por um povo que quer ter a independência e que, durante 20 anos, lutou por ela.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, associo-me aos votos dos meus colegas. Julgo que a Assembleia deve transmitir o seu pesar às famílias enlutadas e a melhor homenagem que podemos prestar aos militares que morreram em Timor é que esta Assembleia não seja avara nas condições que têm de ser dadas aos nossos militares para cumprirem a sua missão em Timor Leste e outras missões de conservação de paz em que se virem envolvidos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Naturalmente que a notícia que atingiu hoje o nosso país, da morte destes dois militares portugueses, é extremamente perturbadora. São duas vidas que se perdem, são duas pessoas, dois compatriotas nossos, que não estavam numa missão qualquer. Do nosso ponto de vista, trata-se de uma missão com uma natureza totalmente distinta de todas as outras. Os militares portugueses estão em Timor em defesa da paz, em defesa da segurança e da vida dos timorenses e, mais do que isso - e isso é visível no modo como o estão -, estão envolvidos não só como militares mas como cidadãos de corpo inteiro nessa defesa, investindo todo o seu esforço para que aquele seja um país que possa desenvolver-se.
Naturalmente, os militares portugueses que estão em Timor têm consciência do risco e do perigo, mas é forte e visível que, compreendendo-o, o assumem com alegria e orgulho.
Portanto, penso que a palavra da Assembleia da República é dirigida, em primeiro lugar, naturalmente, às famílias dos militares portugueses que faleceram, em segundo lugar, aos seus companheiros, os quais, seguramente, estão perturbados com esta perda, e é uma palavra para que o Governo garanta, na medida do possível, todas as condições para minimizar os riscos desta missão, que, naturalmente, deve corresponder ao envolvimento que o povo português teve e à forma como este se empenhou na defesa da paz em Timor Leste.

O Sr. Presidente: - Também para intervir na discussão do voto, tem a palavra o Sr. Ministro da Presidência.

O Sr. Ministro da Presidência (Guilherme d'Oliveira Martins): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ante a memória dos dois soldados que encontraram a morte em Timor Leste, o Governo não pode deixar de exprimir o seu mais profundo sentimento de pesar perante as famílias enlutadas e as Forças Armadas portuguesas.
Como já foi aqui dito por todos, trata-se de uma missão de paz e de solidariedade, pelo que há que somar estas duas vidas às de todos quantos deram o melhor de si pelo nascimento de uma nova nação democrática e livre, que todos queremos que seja Timor Leste.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, junto a minha homenagem e o meu sentido de pesar aos vossos.
Não havendo mais pedidos de palavra, vamos proceder à votação do voto.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos então guardar, de pé, um respeitoso minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, o voto vai ser transmitido às famílias enlutadas e o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, agradeço-lhe que identifique a matéria da ordem de trabalhos que coloca em causa.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa tem a ver com o seguinte: vamos debater um diploma que está relacionado com a segurança interna e, aquando do debate sobre o Estado da Nação, o Sr. Primeiro-Ministro ficou de enviar à Assembleia elementos relativos ao número de agentes incorporados nas forças de segurança e ao número de elementos saídos das forças de segurança nos anos de 1999 e de 2000. Este é um elemento de informação importante para o debate que vamos ter hoje e queria que a Mesa me informasse se recebeu esses elementos que o Sr. Primeiro-Ministro ficou de enviar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, que eu tenha conhecimento, a Mesa não os recebeu.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr Deputado?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, o Governo está em condições de informar a Mesa de que tem na sua posse, e vai entregar de imediato, os elementos a que o Sr. Deputado Guilherme Silva fez referência. Tenho apenas de tomar algumas providências técnicas para garantir que isso aconteça.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, agradeço que os faça chegar à Mesa para os pôr a circular.
Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 302/VIII - Estabelece as bases gerais da coordenação, equipamento, reorganização e reestruturação das forças de segurança (CDS-PP), que é um agendamento potestativo do CDS-PP.
Para introduzir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS-PP considera que a definição de uma nova política de segurança é a maior urgência institucional do Estado.
Demos à segurança uma prioridade que é de todos conhecida. Se chegámos aqui com ideias pensadas e opções articuladas é porque fomos, desde o início, o partido que mais denunciou a crise e mais se esforçou por encontrar alternativas.
Quando ninguém mais colocava na agenda política a subida da criminalidade, o CDS-PP fê-lo sozinho e fez bem.
Quando o Governo ainda negava uma evidência, um sentimento de insegurança traduzido em números assustadores, o CDS-PP, sozinho, contribuiu para que a verdade se soubesse.
Quando, nesta Assembleia, vigorava uma certa lei do esquerdismo, segundo a qual o problema está sempre no abuso de um polícia, enquanto o delinquente passa despercebido ou é desculpado, o CDS-PP deu voz às vítimas e, a nosso ver, fez bem.

O Sr. João Amaral (PCP): - Isso era no tempo do Manuel Monteiro!

O Orador: - Hoje, a sociedade portuguesa está diferente e é mais exigente.
No plano da ideologia, os portugueses sabem que a segurança é uma condição do exercício da liberdade e por isso mesmo recusam a tese tão em voga, tão fácil e tão enganadora, segundo a qual mais segurança significa menos liberdade.
No plano do Estado, reclamam eficácia contra o crime e conhecem as fraquezas insuportáveis do actual modelo de organização policial.
Na questão da segurança e da autoridade, o CDS-PP teve razão; é uma boa razão para nos ouvirem com mais atenção.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Observemos, em primeiro lugar, os factos.
Embora a última revisão da Lei de Segurança Interna date do início da década de 90, a criminalidade registada não parou de subir. Comparemo-la, exactamente, desde 1991 até 1999: o número de crimes registados subiu de 243 243 para 362 859. Em menos de 10 anos, cerca de 120 000 crimes mais.
Podemos, seguidamente, usar outra grelha de leitura quanto a estes dados.
Se bem me lembro, o Partido Socialista chegou ao poder acusando o anterior Primeiro-Ministro de não sentir nem perceber a insegurança que se vivia nas ruas pela modesta razão de que tinha guarda-costas.
Ora, em 1994, a GNR e a PSP registaram 2843 roubos por esticão; em 1999, a GNR e a PSP registaram 5370 roubos por esticão. No ano em que «a laranja azedou», os furtos em carros e de carros eram já 40 228; no ano em que «a rosa começou a murchar», o número de assaltos a carros e em carros subia para 54 205.
Conclusão: os guarda-costas ficaram, os crimes aumentaram, mas as vossas promessas falharam.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Actualizemos, aliás, estes dados, para que nada escape a um debate que consideramos importante.
Temos, connosco, estatísticas que permitem já comparar a evolução da criminalidade em 1999 com o primeiro semestre do ano 2000. A tendência é uma vez mais preocupante! A média mensal de participações de crimes à PSP era, no ano passado, 15 784; essa mesma média atinge, este ano, 16 620.
A inflação de crimes continua a disparar e só na PSP, ultrapassaremos as 200 000 ocorrências este ano, o que é um aumento de 13% num ano! É muito crime para tão pouca resposta da política de segurança!
Consultados os movimentos de inquérito na Polícia Judiciária, também sobre o primeiro semestre de 2000, verificamos tendências de criminalidade que se agravam.
Em primeiro lugar, quanto à subida da criminalidade violenta, os homicídios tentados ou consumados estão 7,8% acima do ano passado, as ofensas à integridade física, nomeadamente as qualificadas, subiram 41,6% e os raptos e os sequestros já cresceram 19% face à média do ano passado.
Em segundo lugar, um verdadeiro sinal de alerta quanto a crimes económicos, facto a que não deve ser alheio o «apertar do cinto» e a noção de novas dificuldades. Face à média de 1999, os registos do primeiro semestre de 2000 apresentam mais 88% nos crimes de falsificação, mais 80% nos crimes de passagem de moeda falsa e mais 42% nos diversos tipos de burla. Este sinal é qualitativamente diferente do que tínhamos conhecido em anos anteriores.
Em terceiro lugar, mas não por último, a persistente subida da «criminalidade comum», aquela que todos os dias gera insegurança psicológica, desconfiança da polícia e da justiça e uma revolta surda contra o clima de impunidade perante a delinquência.
Atenção, Governo: o roubo por esticão, bem lidas as estatísticas, soma e segue, 17,4% acima do ano passado; os roubos a lojas e residências estão em progresso real, com mais 21% do que a média do ano anterior, e dois tipos de furto, em escolas e em gasolineiras, registaram, em seis meses, um acréscimo brutal de, respectivamente, 66,2% e 109,3%.
Em seis meses, para apenas dar um exemplo, ficaram registados na Polícia Judiciária 90 postos de gasolina assaltados e em 12 meses do ano passado esse registo era de 86.
Com toda a clareza e a maior preocupação, damos o retrato das vítimas, nem sempre presente nos debates nesta Assembleia, no reino do socialismo: pelo menos 5494 carros roubados por mês; cerca de 384 lojas assaltadas por semana; 468 cidadãos vítimas de assaltos, por dia, o que dá, se quisermos considerar o horário do Estado, um assalto em cada minuto e, se quisermos descontar o sono, um assalto em cada dois minutos.
Como? Infelizmente, a criminalidade participada não chega a 1/3, de acordo com os observadores científicos, da que efectivamente é praticada! As estatísticas da vida, em matéria de segurança, são bem piores do que as estatísticas oficiais!
Há medo e há medo de ter medo; há insegurança e não há confiança na política de segurança.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para nós, democratas-cristãos, o que falhou não foi apenas um ministro ou um Governo. O que é um fracasso é o modelo errado e errático de organização das forças de segurança em Portugal.
É evidente que há causas económicas, sociais e morais na evolução da criminalidade. Quando falha a família, quando

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fracassa a escola, quando soçobra a cidade, quando não se previne a imigração, quando não se controla a violência na televisão, quando o País e o mundo são todos os dias mais desiguais, é evidente que o crime avança!
No entanto, falta razão àqueles que, perante as consequências, só sabem falar das causas, mas quando têm tempo para tratar das causas nada fazem por elas.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Ora, a política de segurança vale por si própria e desempenha fins específicos. É desse aspecto, sobretudo desse, que estamos hoje aqui a tratar.
Uma nova política de segurança implica, a nosso ver, oito conceitos-chave: primeiro, coordenação de forças, hoje inexistente; segundo, reforço dos efectivos, hoje minado pela burocracia; terceiro, concentração estratégica, em defesa dos territórios mais difíceis e com uma estratégia concertada de ataque aos principais tipos de crime; quarto, modelo de proximidade, até aqui experimental e hesitante; quinto, motivação dos agentes, tantas e tantas vezes desgastados, agastados e humilhados; sexto, avaliação de produtividade, que faça ressaltar o mérito, o risco, o sacrifício e a competência na política de recursos humanos que enquadra as forças de segurança; sétimo, sistema de informações tão eficaz como democrático, há tanto tempo adiado e tão necessário à prevenção; oitavo, respeito pela hierarquia e defesa da autoridade, em que os socialistas foram, lamentavelmente, negligentes.
O passo estruturante para esta nova política passa por unir o que está dividido, coordenar o que está perdido e dotar a política de segurança de uma visão global e integrada, que substitua, na estratégia e nas operações, o clima de rivalidade explícita, de ciúme de protagonismo e de ineficiência de resultados, que nesta prioridade nacional e de cidadania, que é devolver segurança aos cidadãos, tem caracterizado o actual modelo.
Por isso, o CDS-PP apresenta, hoje, um projecto de lei de bases que corrige, moderniza e potencia a Lei de Segurança Interna.
Encaremos o problema tal qual ele existe e, sobretudo, não tentemos escondê-lo.
Pergunta-se: as forças de segurança estão coordenadas e conjugadas entre si, em Portugal? Respondemos nós, pela nossa parte: obviamente, não estão coordenadas nem conjugadas.
Cada força sabe de si e, em situação de aperto, a PJ, a PSP, a GNR e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras são frequentemente encontrados às «caneladas» entre si.

O Sr. João Amaral (PCP): - Falta a Polícia Marítima!

O Orador: - Quem perde? O cidadão! Quem ganha? O ladrão!

Aplausos do CDS-PP.

Como afirma um dos melhores investigadores portugueses, no combate ao crime só há duas equipas: a equipa da lei e a equipa dos fora-da-lei. Se a equipa da lei se divide, tal facto só aproveita aos outros!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Para quem tenha dúvidas, apresentemos alguns exemplos práticos: se houvesse coordenação entre a Polícia Judiciária e a PSP alguma vez as duas instituições teriam feito a guerra surda que fizeram para se saber quem tinha detido os suspeitos certos no caso da CREL?
Se houvesse coordenação entre a Polícia Judiciária e a GNR alguma vez aquela teria de andar a perguntar às confederações de agricultores quantas herdades, montes ou terras tinham sido assaltadas, porque disso não tinham registo, num surto de criminalidade no campo que atinge os ricos, os remediados e os pobres, os pastores, os rendeiros e os agrários?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Se a coordenação fosse efectiva, mesmo no combate à droga, onde a lei a prevê, alguma vez a Polícia Judiciária e a Brigada Fiscal andariam de «candeias às avessas» só por não comunicarem entre si as operações, com a Polícia Judiciária a queixar-se de que anos de investigação são deitados ao mar e a Brigada Fiscal a justificar-se por questões de competência e legitimidade?
Se houvesse coordenação seria possível que, neste ano, entrem 500 candidatos para a escola de polícia quando é estimável que, em Janeiro de 2001, outros 500, se não mais, vão aposentar-se?
Se houvesse coordenação, seria possível o planeamento de meios da Guarda Nacional Republicana permanecer com um quadro por preencher em 1749 guardas, tão necessários à segurança mas tão dispensáveis para o Governo?
Se houvesse coordenação, seria possível o Conselho de Ministros aprovar uma Lei Orgânica da Polícia Judiciária em que se prevê, para reforço da investigação criminal, 2435 agentes quando existem, hoje, pouco mais de 1000 e a média de formação anual na respectiva escola é de 150 agentes?
Contam que esperemos mais 10 anos para completar esse quadro, tal como esperámos nos últimos 10 anos, quando o quadro legal já era muito superior ao efectivo prático?
Se houvesse coordenação real e não apenas legal, seria possível os tribunais já estarem a enviar para a PSP e a GNR os processos que passaram a ser da sua competência, embora, em casos como os de Lisboa e do Porto, as brigadas tenham de esperar pela capacidade do efectivo?
Se houvesse coordenação, por exemplo, entre a PSP e a GNR, seria possível a permanência de milhares de guardas em Lisboa, cidade que só de forma excepcional é da sua jurisdição mas que, paradoxalmente, necessita de patrulhamento efectivo?
Se houvesse coordenação, permaneceríamos com uma Guarda Nacional Republicana que não recebe instrução específica para um dos crimes mais frequentes e lamentáveis da vida portuguesa, o do fogo posto, ao lado de uma Guarda Florestal que, não recebendo instrução policial, em todo o caso, recebeu poderes de detenção que quase nunca usa?

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Se houvesse coordenação, continuaríamos a viver conflitos territoriais ridículos entre a Guarda Nacional Republicana e a Polícia de Segurança Pública, em que um agente da PSP não detém um assaltante porque do lado de lá da rua já é zona rural e não está presente a GNR?

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Se houvesse coordenação, não teríamos já informação suficiente para perceber que o modelo das superesquadras pode ter racionalidade mas não dá segurança e que o modelo do patrulhamento por viatura pode ser eficaz na perseguição mas não o é na prevenção?
Se houvesse coordenação, viveríamos uma situação como a que vivemos, de bloqueio corporativo nas informações estratégicas, porque as bases de dados da Polícia Judiciária, da Polícia de Segurança Pública, da Guarda Nacional Republicana e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, embora sejam do Estado e da política de segurança, na prática, são geridas como bases de dados de «capelinha», só acessíveis ao respectivo capelão?
Se houvesse coordenação, viveríamos ainda na pré-história da eficiência, com 30 a 40% dos efectivos da PSP e da GNR enquadrados ou aquartelados em tarefas de secretaria, manutenção e limpeza, em vez de estarem na rua a fazer policiamento ou patrulhamento?
Se houvesse coordenação, continuaria o atentado à inteligência que é um agente da PSP ter mais vantagens estatutárias em estar atrás de uma secretária do que em andar na rua a fazer policiamento?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Se houvesse coordenação, continuaria o atentado à confiança dos cidadãos que é uma mera participação de um crime poder demorar cerca de uma hora e meia, tantos e tão inúteis são os papéis que o agente tem de preencher?
Se houvesse coordenação, o que aconteceria a esse desafio à racionalidade que é, tantas vezes, a demora de meses para que o Ministério Público entregue a competência à Polícia Judiciária para fazer uma investigação?
Se houvesse coordenação, seria razoável este sistema de avaliação, que, no essencial das forças de segurança (que é a sua base), continua a ser meramente o da antiguidade, quando os países civilizados optaram, e bem, por avaliações de mérito, de risco, de sacrifício e de competência?

Vozes do PS: - E há!

O Orador: - Se houvesse coordenação, continuaríamos a ter ministros que não separam a concepção da operação e que, por isso, acabaram por ser comentadores de crimes sem serem capazes de, ao mesmo tempo, conceber uma estratégia contra a criminalidade? Teríamos hierarquias desvalorizadas, tanta é a ânsia dos titulares em anunciar feitos ou medidas?
Coloquei uma dúzia de perguntas mas poderia ter colocado centenas! Talvez os ouvidos da maioria sejam surdos a estas perguntas, mas as mesmas estão na inteligência e na coragem de quem, em Portugal, nas forças de segurança, dá o melhor de si próprio para garantir uma sociedade menos insegura.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Antes de nos acusarem proverbialmente de sermos um partido securitário, convinha que esclarecessem e reflectissem na total descoordenação a que chegou este modelo de organização das forças de segurança em Portugal.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em abono do imobilismo, não se venha dizer que a Lei de Segurança Interna já prevê os seus mecanismos de coordenação: o que prevê é consultivo, não é operacional; o que recomenda é uma assessoria, não é um centro de decisão.
Diz quem participou em reuniões do Conselho de Segurança Interna, realizadas semestralmente, e do gabinete coordenador, realizadas trimestralmente, que sessões mais enfadonhas não há. Trata-se de consultas formais, sem alcance estratégico, esporádicas, sem verdadeiro traço de continuidade, e não raro com instruções discretas para que cada força diga o menos possível, sobretudo, do que sabe.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É uma vergonha!

O Sr. João Amaral (PCP): - Segredo de Estado!

O Orador: - Em contrapartida, a história continua a registar como o caso mais exemplar de coordenação entre as forças de segurança aquele em que foi reduzido a escrito um protocolo de coordenação e cooperação que levou a pôr termo ao aparelho terrorista das FP 25 de Abril.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não se venha afirmar, por outro lado, que na organização da investigação criminal também há indícios de uma certa coordenação. Desde logo, o nosso problema não são indícios mas, sim, práticas continuadas de conjugação e complementaridade entre as forças de segurança. Para além disso, a investigação não esgota as tarefas das forças de segurança e é na prevenção que a coordenação começa por falhar.
Acresce que mesmo nesse modelo o Governo hesitou. Se coordenar é também escolher, o Governo, entre a administração interna e a justiça, não escolhe.
Do que falamos quando nos referimos a coordenação é de um centro de decisão vital com cabeça conhecida, autoridade estabelecida e sequência territorial.
Convinha, enfim, meditar nos modelos de organização dos países europeus, com quem, nesta matéria, infelizmente, estamos em convergência de criminalidade. Há duas soluções e uma excepção, a portuguesa. Uma solução é ter várias polícias mas um só ministério a dirigir a política de segurança. Foi esse o modelo escolhido pela Espanha, pela França e pela Itália. Outra solução é, no essencial, ter uma só polícia, que junta a prevenção e a investigação, organizada em departamentos, seja por especialidades, seja por territórios. Este é o modelo inglês e, a partir deste ano, o escolhido pelos belgas. A excepção é Portugal, porque temos várias forças de segurança e vários ministérios a mandar. Resultado: ou não mandam ou acabam por mandar mal!
O que o nosso projecto de lei pretende é dar uma resposta, certamente melhorável e apta a receber todos os contributos, a um modelo de organização das forças de segurança que, a nosso ver, está em crise e não tem emenda.
Queremos clarificar que há uma coordenação, que a mesma tem um ministério de tutela, um director próprio, obrigações específicas e uma sequência em todos os distritos do País. Queremos também clarificar que essa coordenação é importante para definir uma estratégia contra o crime, que o País não tem, para cruzar informações, circunstância que hoje é estranha às forças de segurança,

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e para conjugar operações, facto que hoje é uma mera excepção.
Este é, para nós, um bom debate. Pode a lógica da maioria recusar, pensar no assunto e escolher outro caminho, mas sabemos que é um bom combate, porque uma nova política de segurança implica fazer escolhas quanto à organização, ou, por outra, à desorganização, das forças de segurança, hoje, em Portugal.

Aplausos do CDS-PP, de pé.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Paulo Portas, os Srs. Deputados Luís Fazenda, Jorge Lacão e Miguel Macedo.
Tem a palavra, Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, a sua intervenção trouxe-nos uma retrato de ocorrências criminais variadas. Digo-lhe, sem acrimónia, que, em determinado momento, parecia uma extrapolação do jornal O Crime.

Risos do PS.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Infelizmente, já é de todos os jornais!

O Orador: - Não basta descrever sequencialmente, entre vários períodos políticos, a evolução do crime, é preciso analisar as suas causalidades, tipologias e aquilo que afecta na sociedade portuguesa, com as suas diversas incidências.
Pareceu-me, por isso, pouco rigorosa e fiável a sua descrição. Para além disso - não leve a mal que lho diga -, pareceu-me que a sua intervenção veio um pouco na esteira programada de umas certas operações de comunicação, em que V. Ex.ª é mestre: primeiro, dos espoliados do Ultramar; depois, dos lavradores e, agora, dos agentes policiais.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Acha mal?

O Orador: - Seguir-se-á, certamente, qualquer outra forma de comunicabilidade política, para que haja um pouco mais de objectividade naquilo que o CDS-PP pretende.
Sr. Deputado, como percebe, estou a desvalorizar a fiabilidade da sua intervenção. No entanto, gostaria de adiantar que o Sr. Deputado nada nos trouxe sobre o estado primitivo em que se encontra a nossa investigação acerca dos crimes económicos e as debilidades de acusação que nessa área existem e também nada nos disse acerca de como desenvolver a polícia de proximidade, como desenvolver medidas, certamente contrárias à sua filosofia mas, a nosso ver, absolutamente justificáveis, de legalização de drogas leves, etc., que diminuiriam a criminalidade comum, nomeadamente o furto comum, porque uma boa parte da pequena criminalidade, como sabe, está associada à toxicodependência. Aliás, não é por acaso que o Sr. Deputado, em toda a sua intervenção, de mais de 20 minutos, não falou uma única vez da toxicodependência e da criminalidade a ela associada.
Sr. Deputado Paulo Portas, permita-me, contudo, que lhe faça duas ou três perguntas, sem que fique com a reserva de que há um certo esquerdismo que culpa sempre a polícia dos seus abusos mas que desculpa aqueles que ofendem a lei.
Queremos a defesa da lei, queremos a defesa da legalidade e queremos que a polícia tenha capacidade de actuação. Certamente que o Estado de Direito democrático também se defende contra os abusos policiais.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Já não é mau!

O Orador: - Isso é uma carga cínica que, invariavelmente, o Partido Popular usa, mas que, claramente, não corroboramos.
Sr. Deputado Paulo Portas, é este o caminho para a polícia única? Será constitucional ter unidades de intervenção conjunta,...

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - ... uma polícia única e uma única base de dados central, incluindo serviços de informações e segurança? Será constitucional ter uma ficha única do cidadão, desde a pequena infracção até à investigação de terrorismo e sabotagem?
Sr. Deputado Paulo Portas, isto é, de facto, o «polvo» policial, não compaginável com o Estado de Direito democrático.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas, para responder, desde já, se assim o entender.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, sei que a especialidade do Bloco de Esquerda não é propriamente a política de segurança.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - É a demagogia!

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É da insegurança!

O Orador: - Agora, o Bloco de Esquerda tem de aprender a aceitar as convicções dos outros. Falar nos espoliados é um direito que temos,…

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É um direito e um dever!

O Orador: - … porque acreditamos que as pessoas que um dia vieram de África, sem ter culpa nenhuma na descolonização, foram as suas principais vítimas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Falar nos antigos combatentes é honrar a memória dos nossos mortos.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - Falar nos reformados é falar naqueles que consideramos que são, em Portugal, os mais pobres.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Falar nas pessoas que são vítimas de assaltos é falar no exercício de uma liberdade que está condicionada pela falta de segurança.

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O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não discuto a sua legitimidade para ter convicções. Porém, perca o mau hábito de discutir a legitimidade dos outros para terem as suas próprias convicções.

Aplausos do CDS-PP.

Queria dizer-lhe, ainda, que, qualquer dia, com a evolução da criminalidade, até no Jornal de Letras vai haver notícias de ocorrências criminais.

Risos do CDS-PP.

O Sr. João Amaral (PCP): - É o Crime da Estrada de Sintra!

O Orador: - Queria acrescentar, também, que um dos aspectos preocupantes da evolução da criminalidade, no primeiro semestre deste ano, é o aumento da criminalidade económica - citei-o na minha intervenção - e se há matéria em que é extraordinariamente preocupante a diferença entre o país legal e o país real é na incapacidade das forças de segurança para absorverem as competências de investigação que o Governo lhes pretende determinar, a começar pela Polícia Judiciária, cujo quadro de investigadores está a menos de metade do que o Governo quer. Assim é muito difícil fazer política criminal!
Por isso, uma das coisas que me parece manifesto é que é preciso que alguém tenha, com responsabilidade e sobre escrutínio democrático, uma visão global das forças de segurança e uma coordenação das polícias e da guarda, que é absolutamente decisiva para se pouparem ineficiências e se maximizarem resultados.
Este modelo existe em toda a Europa, Sr. Deputado Luís Fazenda, e por mais que VV. Ex.as venham em trânsito da Albânia para a União Europeia hão-de reconhecer que o sistema de segurança democrático, no modelo ocidental democrático, é bastante melhor do que as políticas securitárias e totalitárias que VV. Ex.as encontravam nos vossos modelos «alegres» de socialismo real.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, Sr. Deputado Luís Fazenda, não crie fantasmas: a Polícia Judiciária tem uma base de dados, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras tem uma base de dados, a Polícia de Segurança Pública tem uma base de dados, a Guarda Nacional Republicana tem uma base de dados. Não crie uma intentona nem crie fantasmas!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para formular o seu pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, ouvimo-lo, agora mesmo, pôr em causa e em crise a eventual competência de um dos grupos parlamentares em matéria de segurança. O que significa que, a contrário, o Sr. Deputado Paulo Portas se arroga uma especial competência, e do seu grupo parlamentar, em matéria de segurança e aqui nos pretende fazer valer essa mesma competência.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, a meu ver, seria de esperar da sua intervenção menos a lógica gongórica do discurso e mais a demonstração do mérito do projecto de lei que aqui nos trouxeram.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Verdade seja que, acerca dessa demonstração de mérito, muita coisa ficou por dizer. Onde o Sr. Deputado Paulo Portas pretendeu demonstrar a originalidade da proposta, verificamos que vem propor a criação de uma direcção nacional das forças de segurança para extinguir, na actual Lei de Segurança Interna, o actual Conselho Superior de Segurança Interna, e onde vem criar um conselho de planeamento e coordenação vem, a seguir, extinguir um existente Gabinete de Coordenação de Segurança.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Não funciona!

O Orador: - Diz o Sr. Deputado Paulo Portas: «Isto assim se justifica porque os outros que quero extinguir têm funções de pouca operacionalidade». No entanto, vamos ver as competências dos novos organismos propostos pelo Sr. Deputado Paulo Portas e, em oito dessas competências, apenas duas revelam alguma operacionalidade e efectividade. E essas, pela sua verdadeira natureza, são competência política do Ministro da Administração Interna ou do Ministro da Justiça, no exercício da sua função tutelar relativamente às polícias.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É caso para dizer, como, também, já algumas vezes aqui foi citado, que a iniciativa do Sr. Deputado Paulo Portas traz alguma coisa de positivo e alguma coisa de original. Mas é manifesto que aquilo que é positivo não é novo e aquilo que é original não é bom.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Isso é que não é original! É do Soares Martinez e do Marcelo Caetano!

O Orador: - E, designadamente, não é bom porque vem colocar a situação extraordinária de, contra a Constituição, ingerindo abertamente na própria auto-organização do Governo, usurpar responsabilidades de direcção política, directamente estabelecidas na ordem dos ministros, para as colocar numa espécie de «super director» das forças de segurança - uma espécie de «big brother» das polícias, que o Sr. Deputado Paulo Portas agora inventou -, ao qual queria dar todas as responsabilidades que politicamente devem ser assacáveis a um Governo mas que o senhor queria colocar ao nível da administração pública.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Big brother ou little powers?

O Orador: - Que ficaria depois, do ponto de vista político, para o exercício da função ministerial? Eis aquilo a que o Sr. Deputado Paulo Portas, manifestamente, não responde. Como, aliás, não responde quando invoca aqui questões de descoordenação pela circunstância de esta Assembleia, no final da sessão legislativa, ter justamente aprovado uma Lei de Organização da Investigação Criminal…

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O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - … que dá todas as respostas a muitos dos problemas que o Sr. Deputado Paulo Portas aqui colocou.

O Sr. Presidente: - Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Orador: - O Sr. Presidente manda-me calar e calar-me-ei, por óbvia disciplina ao comando do Sr. Presidente.
Tinha mais questões para lhe colocar, mas talvez daqui a pouco tenha ainda oportunidade para o fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, não é uma ordem. É um pedido.
Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Jorge Lacão fez uma citação académica que nada tem de original, embora seja boa. Foi o Prof. Marcelo Caetano que, dirigindo-se ao Prof. Soares Martinez - curiosos personagens para V. Ex.ª citar -, afirmou, um dia, a tese que V. Ex.ª traz: «Tem coisas boas e coisas originais. Pena que as coisas que sejam boas não sejam originais e pena que as coisas originais não sejam boas».

O Sr. José Barros Moura (PS): - Exactamente!

O Orador: - De modo que V. Ex.ª copiou e copiou de fonte estranha.
No entanto, queria dizer-lhe que V. Ex.ª acabou de me dar razão, porque, evidentemente, o que não funciona é o Conselho Superior de Segurança Interna, que reúne de seis em seis meses, e o grupo coordenador, que reúne trimestralmente. Se V. Ex.ª se der ao trabalho de falar com quem participou nas reuniões, ou tentar, um dia, consultar as actas, verá que são reuniões formais, sem qualquer vocação estratégica, que são reuniões meramente consultivas, sem qualquer decisão substantiva, pelo que os problemas de coordenação permanecem.
De resto, como a lei já tem uns anos, já é possível verificar se os órgãos nela previstos foram, ou não, eficazes. Não foram!
Como demonstrei na minha intervenção, não pretenda o Sr. Deputado reduzir o problema da coordenação das forças de segurança à investigação criminal, porque esta não esgota as tarefas das forças de segurança, e mesmo as formas de coordenação na investigação criminal são hesitantes e estão por provar.
Portanto, o que queremos é uma visão global, diferente e, a nosso ver, melhor da política de segurança, que implica coordenação das forças, capacidade operacional conjunta e sequência territorial. Nada disso existe, hoje!
Finalmente, uma de duas, tem de escolher: ou pensa que queremos um big brother ou pensa que, afinal, damos little powers aos órgãos que criamos. Ou é um grande irmão ou tem pequenos poderes, agora escolha! Mas não é nada disso! É uma coisa que existe em toda a Europa: coordenação das forças de segurança, um ministério à cabeça, autoridade conhecida e escrutinável democraticamente, eficácia na coordenação e eficácia nos resultados. Isto existe em toda a Europa; a excepção é Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para formular o seu pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, queria colar-lhe duas ou três questões que vêm na sequência das que foram colocadas pelo Sr. Deputado Jorge Lacão.
O PSD tem também, ao longo dos últimos tempos, manifestado sérias preocupações com este domínio da segurança e temos chamado particularmente a atenção para a circunstância de se ter vindo a degradar ao longo dos últimos anos, com sinais de evidente falta de coordenação entre as forças de segurança.
Entendemos, evidentemente, que esta matéria não pode passar ao lado do debate político aqui, na Assembleia da República, e julgamos até que a premência desta questão não ficou, nem pouco mais ou menos, debelada com a recente aprovação da Lei de Organização da Investigação Criminal. Do nosso ponto de vista, esta lei vem agravar algumas das questões que se punham já no domínio da coordenação de segurança, justamente na medida - como então dissemos - em que se mantinha uma bicefalia de coordenação entre o Ministro da Justiça e o Ministro da Administração Interna, que presidiam ex aequo, sem nenhuma distinção, ao conselho coordenador criado nessa Lei de Organização da Investigação Criminal, a qual é tão relevante quanto comete, com mais força ainda, a forças de segurança como a PSP e a GNR poderes de investigação criminal.
Na altura, dissemos que esta opção que foi tomada nesta legislação não nos agradava, porque entendíamos que não ia resolver o problema de fundo.
No entanto, Sr. Deputado Paulo Portas, a proposta do CDS-PP também nos suscita muitas reservas, justamente porque há aqui uma questão de fundo que não é assumida inteiramente e que queremos assumir.
O Sr. Deputado Paulo Portas teve oportunidade de percorrer aqui as soluções que são encontradas nos diversos países europeus: umas em que um só ministério coordena todas as forças de segurança e as polícias e outras em que há mais do que um ministério a coordenar as diversas forças de segurança. O CDS-PP vem hoje, aqui, apresentar-nos uma solução que não é «nem carne nem peixe».

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Não é verdade!

O Orador: - Mantêm-se dois ministérios com forças de segurança e com polícias distintas - ou, melhor, até há mais do que dois ministérios - e, depois, há um director nacional de segurança que coordena todas as forças de segurança. As nossas reservas são estas: como é que o director nacional de segurança - que é, aliás, uma figura esquisita, permitam-me a expressão, sem desprimor -, que depende do Ministro da Administração Interna, pode coordenar a Polícia Judiciária, que depende do Ministério da Justiça? Como é que o director nacional de segurança, que tem o estatuto de secretário de Estado, vai, ele próprio, superar esta incapacidade de coordenação que advém, do nosso ponto de vista, da circunstância de não haver um comando claro, transparente e vertical em relação às forças de segurança?

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O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Só para terminar, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Paulo Portas, temos, hoje, uma concepção em que entendemos que é possível dar um passo em frente, ou seja, reunir no mesmo ministério todas as forças de segurança e a Polícia Judiciária, e fazer aí a coordenação necessária das forças de segurança, porque, nisso, estamos de acordo consigo.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, muito brevemente, dir-lhe-ei que uma das virtudes do projecto de lei do CDS-PP é a de suscitar um debate importante sobre modelos de uma melhor política de segurança para o futuro.
Pela minha parte, não posso aceitar um modelo em que vários ministérios têm autoridade sobre várias forças de segurança. Não estou de acordo com isto.
A tradição portuguesa é estranha à fusão entre a Polícia Judiciária e a Polícia de Segurança Pública - e, no entanto, aceito discutir o tema porque não tenho preconceitos e, portanto, devo estar aberto a tentar perceber qual é a melhor solução - e, no quadro da evolução das nossas Forças Armadas, o papel reservado à Guarda Nacional Republicana é especial e, portanto, não se pode fazer uma fusão total de forças.
Nós, CDS-PP, à semelhança do que fizeram os espanhóis, avançamos com uma questão muito clara: a sede do poder, em matéria de segurança interna, está no Ministério da Administração Interna (MAI) - e, agora, não pense nos ministros, pense na função -, dizêmo-lo com toda a clareza, assim como, noutros países, está genericamente atribuída ao Ministério do Interior. Quanto a nós, a obrigação do MAI é fazer a coordenação entre os directores da Polícia de Segurança Pública, da Polícia Judiciária, da Guarda Nacional Republicana e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Entendemos que fica clara a cadeia de comando, fica clara a autoridade, fica clara a sede do poder e também ficam claros os resultados que se podem obter.
Admitimos soluções que ainda vão mais longe? Admitimos, sim senhor, com a leve diferença de que nós apresentámos um projecto de lei e os senhores ainda não.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Ainda não!

O Orador: - Assim, o CDS-PP repete o que já disse há pouco. Estamos abertos a todas as sugestões para melhorar o projecto de lei; como estamos é que não podemos ficar! Devo dizer-lhe, ainda, que quem votar contra quer ficar como está.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva para uma intervenção.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: A situação a que chegou a segurança em Portugal, com os governos socialistas e as crescentes inquietações dos portugueses que vêem cerceada a sua liberdade e, em consequência, posto em causa o pleno exercício da cidadania, justifica uma particular atenção das oposições a tão sensível e delicada, quão importante, área do Estado.
Não temos dúvidas de que o projecto de lei do PP agora em discussão insere-se nesta linha de preocupações e pretende ser um contributo positivo para um acréscimo da eficácia das forças de segurança na prevenção e no combate à criminalidade.
Que há um problema grave de coordenação e de articulação das forças de segurança é por demais evidente. Ele tem estado presente em diversas situações que tiveram projecção pública, como foram os casos da discoteca Luanda e dos assaltos na CREL e às bombas de gasolina.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É, pois, urgente pôr termo a esta imagem de descoordenação, de atropelo recíproco e até de latente conflitualidade entre forças de segurança, que as desacredita e desprestigia as instituições e o Estado, numa área já de si tão degradada como é a da segurança interna.
Mas exactamente por assim ser, as opções a tomar e as soluções a adoptar em matéria de coordenação das forças de segurança têm de ser profundamente reflectidas e pensadas, acautelando-se os riscos de, perversamente, constituírem elas próprias fonte de conflitualidades, acentuando nos cidadãos o sentimento de insegurança, de ineficácia das forças policiais e da inerente degradação da autoridade do Estado.
Tratando-se, como se trata, de uma questão muito séria e essencial a qualquer política de segurança, não podemos, como maior partido da oposição, deixar de dar o nosso contributo crítico, adiantando, desde já, as nossas reservas relativamente às soluções preconizadas pelo projecto de lei n.º 302/VIII, do CDS/PP.
Naturalmente que, em Comissão, se for caso disso, e, porventura, a par de outras iniciativas ou propostas que os vários grupos parlamentares entendam apresentar, será possível aprofundar a análise, na especialidade, do projecto de lei em discussão, introduzindo-se-lhe as alterações e benfeitorias de que, do nosso ponto de vista, carece.
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Importa, neste alegado início de um novo ciclo de governo socialista, aproveitar esta oportunidade para recapitular a situação da segurança interna em Portugal neste momento.
Começo, assim, por saudar o novo Ministro da Administração Interna, Dr. Severiano Teixeira. E a minha primeira felicitação é por ser isso mesmo (e só isso, e já não é pouco), apenas Ministro da Administração Interna.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Fica, para já e em princípio, acautelado o risco de o Sr. Ministro fazer da Administração Interna um desporto em part-time, bem como fica afastado o risco de trazer para a área da segurança «os usos, os truques e as praxes» do futebol, que muito respeito, mas cuja importação para as questões de Estado é de todo indesejável.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem! Já chega!

O Orador: - Da nossa parte, Sr. Ministro, pode contar com uma oposição responsável e construtiva, franca e

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aberta, preocupada, antes de mais e acima de tudo, com Portugal e com os portugueses.
Pode, pois, estar certo de que não vamos recorrer à demagogia política e eleitoralista que caracterizou o discurso sobre segurança do Partido Socialista, quando na oposição. Nessa altura, o Sr. Eng.º Guterres não se cansava de apregoar, insistentemente, um assalto de que fora vítima um seu familiar. ao mesmo tempo que não se coibia de proclamar, no debate do Estado da Nação, nesta Assembleia, no último governo do PSD, em 1995, que iria caber ao futuro governo do PS restaurar a autoridade do Estado que, segundo ele - imagine-se! -, os governos do Prof. Cavaco Silva deixaram gravemente degradar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Extraordinário!

O Orador: - Nós não iremos por aí, Sr. Ministro. Não vamos retaliar, mas vamos continuar a manifestar, sem reservas, as nossas discordâncias e a expressar as nossas críticas, a denunciar os erros, as falhas e as omissões do Governo, bem como a formular as nossas propostas e alternativas.
As questões relativas à segurança entroncam em pilares fundamentais do Estado e envolvem vertentes essenciais aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, que se não compadecem de meros aproveitamentos político-partidários e eleitoralistas de ocasião.
O PSD recusa-se, ainda que isso envolva custos de menor visibilidade e de perda de projecção mediática, a adoptar, nesta matéria, um discurso demagógico e populista.
O maior partido da oposição, que é a única alternativa de governo, em Portugal, não pode abdicar de uma atitude responsável e construtiva, sem prejuízo de denunciar o muito que vai mal em matéria de segurança no País.
Os governos do PS e a esquerda, em geral, têm um complexo antipolicial e lançaram um discurso contra os agentes e as forças de segurança, humilhando-os e desvalorizando-os.
Não pode haver terreno mais propício à criminalidade do que a inversão de valores que os governos do Eng.º Guterres propagaram e deixaram que se instalasse, com toda a desmotivação que isso gera nas forças de segurança e nos seus agentes.
Daí, também, o aumento da criminalidade e as novas formas de que se vem revestindo.
90% dos crimes localizam-se nas grandes áreas metropolitanas de Lisboa, Porto e Setúbal. 70% da criminalidade está associada ao consumo de droga, o que torna incompreensível propostas permissivas nesta matéria.
Nos últimos anos, acentuou-se, exactamente naquelas áreas geográficas e na criminalidade que ali se envolve, a envolvência de menores, muitas vezes em gangs organizados.
Do próprio Relatório de Segurança Interna ressalta uma tendência geral de aumento de criminalidade que, globalmente considerada, andou, em 1999, pela ordem dos 6%.
E não vale a pena o discurso do seu antecessor, Sr. Ministro, de que Portugal, felizmente, não tem o grau de criminalidade nem os crimes graves que se registam noutros países da União Europeia. Importante é travarmos e invertermos esta tendência de crescimento da criminalidade, combatendo e eliminando as suas causas e apostando mais na prevenção.
Mas a questão é ainda preocupante pelo tipo de criminalidade que regista maiores aumentos e pelos contornos de que se reveste.
É exactamente a criminalidade que mais directamente toca com as pessoas que maior aumento regista.
Se não vejamos: em 1999, o furto e o roubo por esticão aumentaram 23,9%; o furto na rua aumentou 39%; os assaltos a bombas de gasolina aumentaram 52,9%; os raptos e sequestros aumentaram 20,6%; a extorsão aumentou 38%; os furtos em residências aumentaram 3%; os furtos de veículos aumentaram 4%; os furtos em veículos aumentaram 10,7%; os crimes contra a vida em sociedade aumentaram 17%; os crimes de abuso de cartão de crédito aumentaram 30,8%; os crimes informáticos aumentaram 148%, registando-se um aumento de 660% relativamente ao acesso indevido ou ilegítimo ou de intercepção ilegítima; o tráfico de droga aumentou 15,4%.
Curiosos são também os números relativamente ao aumento da criminalidade contra o Estado, confirmando a sua degradação e a perda de autoridade: o crime de agressão contra agentes de autoridade aumentou 20,4%; os crimes de desobediência aumentaram 14%; a resistência e a coacção sobre funcionários aumentaram 20,5%; os crimes de peculato aumentaram 35,7%.
Nos primeiros cinco meses deste ano houve um aumento de roubos, segundo a Polícia Judiciária, da ordem dos 12%.
A GNR registou, naquele período, mais 3220 participações de crimes contra as pessoas e contra o património do que em igual período do ano passado.
Enquanto se verifica todo este estado de coisas, que intensifica e alarga um sentimento generalizado de insegurança nos cidadãos, que fez o Governo para pôr cobro a esta situação e inverter esta perigosa tendência?

Vozes do PSD: - Nada!

O Orador: - O Governo desautorizou as forças de segurança e permitiu que, no seu seio, se generalizassem procedimentos públicos que as desacreditam e minam a confiança que os cidadãos e as instituições nelas devem ter.
Não há uma atitude de estímulo às forças de segurança e o Governo não cumpre a lei aprovada nesta Assembleia, regulamentando-a, de forma a assegurar o subsídio de piquete e de turno a que os agentes da PSP têm direito. Não respeita o seu estatuto nem assegura a atempada promoção dos seus oficiais.
Tudo isto, aliás, tem precedentes graves.
Os portugueses, incluindo os agentes policiais, assistiram aos conflitos que o anterior governo do Eng.º Guterres criou, entre magistrados judiciais e magistrados do Ministério Público e entre estes e a Polícia Judiciária, o que acabou com a demissão do Director da Polícia Judiciária, sujeito a um processo-crime de contornos indesejavelmente políticos.
Esta desagregação do Estado, a afectação da credibilidade do poder judicial e esta conflitualidade institucional não deixaram de constituir um péssimo exemplo, como não deixaram de ter os seus efeitos de contágio, que é necessário travar antes que seja tarde demais.
O Governo, nestas matérias, em vez de atacar as causas, opta sempre pelo mais fácil, como acontece com a despenalização do consumo das drogas leves e como se viu no caso de Barrancos.
A droga constitui uma fonte acrescida de criminalidade. O Governo não estuda nem pondera, designadamente em termos de saúde, as soluções mais adequadas. Entende o

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Governo que, para acabar com a criminalidade associada à droga, é preciso descriminalizar o seu consumo. Começa pelas leves e Deus sabe onde acabará!? Ou seja, o Governo segue o caminho mais fácil - abdica, recusa o referendo.
Consta haver mafias organizadas a actuar em Portugal e a promover o tráfico e a exploração de pessoas. O Governo limita-se a pedir à Procuradoria que investigue.
Lembram-se de um Ministro da Administração Interna que afirmou publicamente «esta não é a minha Polícia»?
Lembram-se da forma como foi anunciada a implementação da Inspecção-Geral da Administração Interna, como órgão de verdadeira «caça ao polícia», passando, nessa linha, o Inspector-Geral a ser o protagonista do MAI, com subalternização do próprio Ministro?
As sementes estavam lançadas e germinaram.
Combateu-se a polícia, não se combateu o crime. A partir daí, foi o descalabro que se conhece, culminando no aumento geral da criminalidade, instalando-se um crescente sentimento generalizado de insegurança.
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: É muito frequente vermos sustentada e defendida a ideia de que nas sociedades em que o Estado garante a ordem, a segurança e a tranquilidade públicas, põe-se em causa, por alegado autoritarismo, os direitos fundamentais dos cidadãos.

Vozes do PSD: - Ao contrário!

O Orador: - Os juízos radicais e as generalizações apressadas pecam sempre por falta de rigor e, muitas vezes, tornam-se intimidatórios ou inibitórios do correcto e adequado exercício da autoridade.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É necessário, em matéria da maior relevância para o normal funcionamento das instituições democráticas e da cidadania, actuar sem complexos e sem ressuscitar fantasmas de há muito definitivamente enterrados.
Na verdade, todos sabemos que os regimes totalitários, a pretexto da defesa da ordem, utilizam as forças policiais e de segurança na repressão, ilegítima e abusiva, dos cidadãos e na supressão dos seus mais elementares direitos e liberdades. A ordem é arvorada a valor supremo na hierarquia e na filosofia política dos regimes opressores, que a História recente, e mesmo a actual, regista como formas de totalitarismo, tanto de direita como de esquerda.
Ninguém quer uma segurança que pague tão alto preço. Mal por mal, e apesar de tudo, mais vale suportar o custo de alguma intranquilidade do que o atropelo e o espezinhar da liberdade e do direito. Ninguém quer um Estado policial ou securitário!
De forma diversa tem de ser equacionada a questão da segurança nas sociedades democráticas, com a delicadeza e as dificuldades de conciliar o respeito pelos direitos e liberdades individuais e pela dignidade da pessoa com a pronta e eficaz intervenção da autoridade para prevenir e reprimir o crime e as actividades ilícitas.
Questão essencial à segurança é, como facilmente se percebe, a prevenção. Neste domínio a primeira tarefa do Estado é evitar que a segurança seja posta em causa, ou seja, compete-lhe, antes de mais, a adopção de medidas adequadas a evitar que ocorram situações de violação da lei que, pela sua natureza, designadamente criminal, atentem com a segurança de pessoas e bens.
Se o Estado só intervém para reprimir, para reagir ao facto consumado, significa que só o faz quando a segurança dos cidadãos já foi perturbada e os seus direitos violados pelos que prevaricam.
Porém, para que o Estado exerça, de forma eficaz, esta que deve ser a sua prioridade, necessário se torna que esteja munido dos instrumentos adequados. Aqui também vamos esbarrar com hesitações e reticências que organizações de má memória deixaram no nosso subconsciente colectivo. É preciso assumir, sem rodeios, a necessidade de prestigiar e apetrechar os nossos serviços de informações e criar mesmo um serviço de informações criminais, não sendo legítimo que, em democracia, se associe tais instrumentos a polícias políticas que, em nome da segurança do Estado, reprimiram, no passado, as liberdades e a livre expressão do pensamento e das ideias.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O carácter sofisticado e organizado que a criminalidade hoje assume, os poderosos meios económicos de que dispõe e as vastas redes internacionais que envolve não se compadecem de amadorismos nem de complexos quanto à implementação de serviços de informações, eficazes e credíveis.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É preciso ter consciência de que uma das vias para atentar contra a democracia e pôr em causa as sociedades abertas e plurais, minando-as, é exactamente fragilizá-las pela via da insegurança, da violência e da criminalidade crescentes.
Tal estado de coisas gera um sentimento geral de insegurança, um clima de medo e de receio, cerceando-se, dessa forma, a liberdade das pessoas, ao mesmo tempo que se atenta com os direitos e integridade das vítimas e dos seus bens. Tenha-se presente que não falta quem, malevolamente, tente imputar tais males a uma alegada incapacidade das democracias para garantirem a segurança dos cidadãos.
É preciso combater estas perigosas tendências, prestigiando e credibilizando as forças de segurança e as polícias, o que passa pela sua adequada remuneração, pela dignificação do seu estatuto e por assegurar a sua coordenação e um adequado sistema de informações criminais.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, temos de ser intransigentes e implacáveis relativamente aos abusos de autoridade e aos excessos policiais. Mas é preciso distinguir o trigo do joio e não confundir a árvore com a floresta.
É indispensável restaurar a relação de confiança entre os cidadãos e as forças de segurança.
Vale a pena referir aqui algumas das medidas que nos parecem importantes e indispensáveis na área da segurança.
Proceder à reestruturação das forças de segurança com vista a conferir-lhes maior operacionalidade, coordenação e adequação aos novos desafios que se lhes colocam na prevenção e combate ao crime. A nossa proposta é a da integração das forças policiais e de segurança num só

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ministério. As soluções que estão sobre a mesa - a lei de organização da investigação criminal e, agora, o projecto de lei do PP - não respondem a esta questão e criam o risco de um órgão ou órgãos coordenadores serem eles próprios, perversamente, fontes de conflitualidade e desacreditarem ainda mais a responsabilidade pela segurança em Portugal.
Assegurar maior rigor nos critérios de selecção e formação dos elementos das forças de segurança.
Libertar os agentes das forças de segurança de funções burocráticas e administrativas, recorrendo, para essas tarefas, a funcionários e mesmo, em alguns casos, como sejam as notificações judiciais, a empresas privadas devidamente habilitadas e credenciadas.
Rever todo o procedimento relativo aos delitos praticados por menores, de forma a evitar que sejam instrumento de actuação de bandos organizados.
Autonomizar o crime de incitamento à delinquência juvenil, punindo os instigadores, não apenas como autores morais mas, cumulativamente, pelo crime de incitamento.
Adoptar uma política de imigração séria, solidária e responsável, controlada e rigorosa, evitando as bolsas suburbanas de marginalizados e socialmente excluídos.
Combater a pobreza e adoptar uma política arrojada no tocante à droga, sem dar sinais de facilitismo e de permissividade, apostando na recuperação e no tratamento dos toxicodependentes, proporcionando aos tribunais os meios necessários à adopção de tais medidas.
Adoptar uma política de ordenamento urbano, em particular nas áreas metropolitanas, que elimine os guetos, áreas onde se concentra cerca de 90% da criminalidade.
Restaurar uma educação que privilegie os princípios e os valores. A escola é fundamental. Se formarmos homens, no seu verdadeiro sentido, não deixaremos que os jovens sejam excluídos ou se auto-excluam.
Valorizar e apoiar a família em recíproca complementaridade com a escola.
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: O pedido de desculpas do Sr. Primeiro-Ministro pelos seus graves erros de governo, designadamente na área da Administração Interna, não chega para estimular as forças de segurança, diminuir a criminalidade, reparar as vítimas e restituir aos portugueses a tranquilidade e o sentimento de segurança por que tanto anseiam e é indispensável à plena cidadania a que têm direito!
É imperdoável, face ao que assistimos em matéria de delinquência juvenil, aos gangs e a assaltos de menores e à sua evasão dos estabelecimentos de reinserção social, para a prática de crimes violentos, como aconteceu, ainda recentemente, com os evadidos do Colégio do Mondego, na Guarda, o que se está a passar com a legislação de menores.
Aprovámos nesta Assembleia, há mais de um ano, a Lei Tutelar Educativa e as medidas de internamento em regime aberto, semiaberto e fechado. Mais de um ano levou o Governo para regulamentar a lei e ainda não providenciou os meios necessários para a sua execução.
O Sr. Ministro da Justiça diz que só em 2001 a lei será aplicada e, só então, proceder-se-á a esta coisa elementar que é a separação de menores vítimas de violência, de menores delinquentes, muitas vezes autores dessas mesmas violências.
E até 2001? Vamos continuar a assistir a este ciclo, recorrente, de os menores serem presentes ao tribunal e voltarem para a marginalidade e para a prática criminal, sem que os juízes tenham meios para assegurar o seu adequado internamento com vista à sua reeducação, recuperação e reinserção social?
E as forças de segurança? Que é feito do subsídio de piquete e de turno da PSP, aprovado nesta Assembleia, por proposta do PSD, também há mais de um ano, e que aguarda, desde então, a regulamentação e implementação por parte do Governo?
Agora que vem aí a proposta de lei do Orçamento de Estado e tem havido dinheiro para manter esta escandalosa política artificial em matéria de combustíveis, Sr. Ministro, exija a inclusão, no Orçamento, das verbas necessárias ao pagamento daqueles subsídios.
Não pactuamos com este «deixa andar» nem com a política irresponsável do «faz de conta» ou da cabeça na areia, como faz o Governo, em matéria de segurança.
Sr. Ministro da Administração Interna, o Sr. Primeiro-Ministro tem utilizado, em várias ocasiões, números contraditórios no respeitante à incorporação de novos agentes nas forças de segurança, sem, no entanto, ser muito claro quanto ao número de agentes que, em cada ano, cessam funções, por aposentação ou outras razões.
O próprio Relatório de Segurança Interna de 1999, curiosamente, fala no número de efectivos incorporados naquele ano, mas não fala no número de agentes que saíram, no mesmo período, de cada uma das forças de segurança.
Fica aqui o desafio de saber se V. Ex.ª, Sr. Ministro, e o Governo estão na disposição de assumir o compromisso, que nós próprios, quando formos governo, assumimos de incorporar a cada ano mais 10% do número de efectivos existentes em cada uma das forças de segurança, o que corresponde, sensivelmente, ao número dos que saem e à satisfação das necessidades que se apresentam.
Desta forma, ponha-se termo a especulações e a manipulações de números que não prestigiam os responsáveis políticos nem as próprias forças de segurança.
Fica, pois, aqui, Sr. Ministro, este desafio.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, começo por expressar a minha concordância com grande parte da sua intervenção, dizendo-lhe, inclusivamente, que estamos plenamente abertos e dispostos a discutir a futura coordenação num só ministério. Esperamos, no entanto, que «quem quer o mais desde já aprove o menos», porque nós propomos um passo para chegar àquela situação e, portanto, é natural que «quem quer o mais» aprove desde já «o menos».

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, quero dizer-lhe que concordo particularmente consigo quanto à matéria da droga e quanto ao facto de que, ao contrário do que é dito nesta Assembleia pelas bancadas de maior radicalismo à esquerda, a legislação relativa à droga que está aprovada por esta Assembleia vai causar sérios problemas.
Só não percebo - e daí que peça a sua ajuda neste ponto - é por que razão, perante uma lei tão má e depois de suscitadas as questões, a própria Assembleia Legislativa Regional da Madeira acabou por aprová-la também.

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Repito, pois, que estou de acordo consigo, mas, de facto, não percebo o que terá acontecido e qual a razão por que foi feita essa aprovação.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, muito obrigado pelas questões que me colocou.
Começo por dizer-lhe que, em matéria de segurança, esse princípio que enunciou «quem aprova o mais aprova o menos» não é tão linear como pode parecer, porque o «menos» pode ter consequências perversas, como denunciei, e, portanto, não ser passível de uma adesão como aquela que se coloca em relação ao «mais».
Não obstante, digo-lhe que o meu partido não vai tomar posição de voto que inviabilize o vosso projecto de lei, porque entendemos que o mesmo pode constituir uma base de trabalho que, aprofundada e melhorada, poderá vir a ter virtualidades. Portanto, fica esclarecida esta questão.
Passando à questão que colocou relativamente à aprovação por parte da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, respondo-lhe que o Sr. Deputado foi influenciado por uma deturpação da comunicação social.
Na verdade, a Assembleia Legislativa Regional da Madeira não aprovou nem tomou qualquer posição favorável relativamente à solução substantiva contida na lei da droga, mas, pura e simplesmente, emitiu um parecer, expressando a sua concordância quanto à parte respeitante às disposições que previam a intervenção da Assembleia Regional na promulgação de diplomas regionais para a implementação da referida lei.
Sr. Deputado, quero dizer-lhe que ficaria bastante satisfeito se a Assembleia da República e os grupos parlamentares que nela têm assento fossem sensíveis àquele parecer em termos de não alterarem, pelo menos, a parte da lei em que se prevê a reserva e o respeito pelo espaço próprio das autonomias.
Portanto, foi apenas naquela medida, e exclusivamente quanto a esta questão instrumental e processual, que o parecer se pronunciou e não já sobre a questão substantiva, relativamente à qual - não tenho dúvidas, embora não possa responder por todos os grupos parlamentares com assento na Assembleia Legislativa Regional, designadamente pelo vosso - o PSD está contra, em ambas as sedes.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Nuno Severiano Teixeira): - Sr. Presidente, sendo a primeira vez que tenho a honra de me dirigir a esta Câmara, não poderia deixar de cumprimentar V. Ex.ª, e, na pessoa do seu Presidente, saudar a Assembleia da República, como Casa da democracia que é, e, se me permite, estender esta saudação a todos os Srs. Deputados e grupos parlamentares.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Ministro.

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Podendo não o fazer, quis hoje estar presente ao debate sobre o projecto de lei que acaba de ser apresentado pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP porque ele toca um problema um dos problemas mais importantes para a sociedade portuguesa a propósito do qual gostaria de deixar algumas considerações.
A segurança dos cidadãos é a primeira prioridade das preocupações do Ministério da Administração Interna. Mas, sejamos claros, a segurança dos cidadãos é uma questão de todos nós, é uma questão nacional, que, independentemente das filosofias, das ideologias ou das linhas de acção política que em democracia legitimamente possamos ter, é uma questão nacional, e é assim que deve ser tratada. É uma questão de Estado, e é como questão de Estado que a queremos encarar.
Sejamos objectivos: a insegurança é um problema sério. Estamos preocupados com ela e estamos decididos a combatê-la. Mas sejamos também honestos: nas suas causas, a insegurança não é um problema que dependa exclusivamente do Governo - também não é, Sr. Deputado Paulo Portas, um problema que dependa das oposições -, é uma questão estrutural das sociedades modernas, é uma questão estrutural das sociedades desenvolvidas do mundo contemporâneo.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sim, sim, não há dúvida nenhuma!

O Orador: - Podemos e devemos, independentemente das políticas de natureza económica, social ou até cultural, de inclusão, atacar a prevenção e o controlo das suas consequências.
Mas, em abono da verdade, diga-se que, embora as taxas de criminalidade desenhem uma tendência de clara subida, em Portugal elas encontram-se muito abaixo da média europeia, segundo os dados que temos da Europol 1/3 abaixo da média europeia.
É certo que a criminalidade, designadamente a pequena criminalidade contra o património, o furto, o roubo por esticão, que geram a insegurança psicológica nos cidadãos, tem vindo a crescer, gerando este tipo de insegurança. Mas, Sr. Deputado Paulo Portas, essa tendência não se verifica - pelo menos, são os números que tenho - no que diz respeito a crimes violentos.
Devo dizer que, com isto, não quero minimizar o problema, não quero consolar-me com «o mal dos outros posso eu bem», mas é importante para compreender e afrontar o problema que o enquadremos nas suas proporções e no seu contexto.
Srs. Deputados, sobre o projecto de lei que o CDS-PP apresenta estamos de acordo num objectivo: o combate à criminalidade e à insegurança. Poderemos mesmo estar de acordo no que diz respeito à necessidade de reforço e aperfeiçoamento da coordenação - ela está a ser feita através da nova lei de investigação criminal. Onde já não poderemos estar de acordo é no modo, no método e nos mecanismos de coordenação que são propostos.
É à Assembleia da República que compete a definição das grandes linhas enquadradoras do edifício jurídico que constitui o regime normativo do sistema de segurança interna e, nessa perspectiva, vemos este como outros contributos da maior importância para a definição do problema.
O Governo, mais do que aberto, está interessado em discutir e ver aprovados os instrumentos legislativos que sejam considerados necessários para o bom funcionamento do sistema de segurança interna, porém, de uma forma

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séria, de uma forma ponderada e de uma forma que não ceda a experimentalismos sociais, que podem ser úteis e positivos em algumas áreas, mas julgo que não devem ser experimentados numa área tão fundamental como é um pilar do Estado que é a segurança interna.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O sistema de segurança interna em Portugal é constituído por uma base de diplomas legais que alicerçam todo um sistema que vai da Lei de Segurança Interna, à Lei-Quadro do Serviço de Informações, até agora à recente Lei de Investigação Criminal, mas falta, a este nível, uma lei de regime e dispositivo das forças de segurança, que a última revisão constitucional remeteu como reserva absoluta da Assembleia da República.
É sobre este edifício normativo da segurança interna, longamente sedimentado, desde a década de 80, e baseado num consenso nesta mesma Assembleia, que agora se vem - perdoe-se-me aqui a metáfora agrícola - enxertar um projecto de lei, que, tanto quanto consigo ver, talvez não preveja todas as consequências que vai provocar ao nível da estabilidade e da coerência do próprio sistema. E isto, quer do ponto de vista jurídico, quer do ponto de vista operacional, quer mesmo do ponto de vista político.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Do ponto de vista jurídico, teríamos um verdadeiro turbilhão legislativo no sistema legal da segurança interna, porque a aprovação deste diploma implicaria que, em sua regulamentação, se viessem a introduzir alterações e ajustamentos significativos, pelo menos na Lei de Segurança Interna, na lei de organização da investigação criminal e nos diplomas que regulamentam as leis orgânicas da PJ, da GNR, da PSP, dos SIS e do SEF e dos próprios guardas florestais.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sim senhor, tem razão!

O Orador: - Pior do que isto era que a própria lógica, coerência e identidade do próprio sistema poderiam ver-se afectadas, o que geraria conflitos e disfuncionalidades internas que estamos longe de prever na sua totalidade.
Apenas um entre vários exemplos: em matéria de coordenação no domínio da investigação criminal, o projecto em apreço não só não salvaguarda a arquitectura da recente lei de investigação criminal, como, inclusive, define um regime que é parcialmente contraditório, sobretudo ao nível de uma questão fundamental, que é o Sistema Integrado de Informação Criminal.
Por outro lado, ao nível operacional, a nova estrutura proposta potenciaria também uma conflitualidade, não só entre entidades a nível nacional, mas também com forças e serviços a operarem no terreno.
A Direcção Nacional das Forças de Segurança, aqui proposta, constitui um organismo com uma estrutura pesada, integrando órgãos centrais, distritais e regionais, que seriam atribuídos às diferentes forças de segurança. Ora, é necessário ter presente, por um lado, que esta estrutura não se articula com o disposto na Lei de Investigação Criminal e, por outro lado, parece poder provocar desajustamentos funcionais, porque, justamente, onde procura a coordenação teríamos, em zonas geograficamente contíguas, a coordenação atribuída a forças de segurança que seriam diferentes.
Mais: julgo que se poderia acrescentar que se toma aqui o todo pela parte, se toma aqui a árvore pela floresta, ou seja, a segurança interna não é exclusivamente a criminalidade. E, nesta matéria, poderíamos chegar ao absurdo de ter a fazer prevenção ou controlo da ordem pública forças, inspectores, por exemplo, da Polícia Judiciária.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Bem observado, Sr. Ministro!

O Orador: - Ora, isto é algo que, querendo fazer coordenação, pode, eventualmente, gerar descoordenação. O modelo de segurança que parece desenhar-se revela-se, portanto, algo indefinido, mas a questão fundamental é de natureza política.
Entendemos que, em matéria de segurança interna, a coordenação superior não poderá fazer-se sem considerarmos algumas condições: em primeiro lugar, não devemos confundir o que é coordenação política com comando operacional. Este é um ponto absolutamente fundamental.
Em segundo lugar, ela não deve estar concentrada e exercida por órgãos sem plena legitimidade democrática.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Criados pela Assembleia!

O Orador: - Não teria de responder politicamente perante a Assembleia um funcionário ainda que equiparado a subsecretário de Estado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É isso que o Governo também deveria fazer na área das polícias.

Vozes do PS: - Ouçam, ouçam!

O Orador: - Finalmente, atender aos diferentes interesses e aos diferentes valores que estão em jogo nas diferentes forças.
Ora, esta estrutura de coordenação parece não corresponder a estes requisitos. Impõe, de fora, um corpo que é desprovido de legitimidade democrática e que concentra poderes de coordenação e de comando em forças de distinta natureza.
As competências de planeamento e de coordenação superior das forças de segurança são, e devem continuar a ser, competências políticas, com o Governo assessorado pelos seus dirigentes e pelos próprios serviços, como hoje é, nos diversos órgãos de conselho que promovem a coordenação em matéria de segurança interna, desde o Conselho Superior de Segurança Interna, ao Conselho Superior de Informações, ao Conselho Coordenador dos Órgãos de Polícia Criminal e ao próprio Gabinete Coordenador de Segurança.
Mas a coordenação deve e tem de fazer-se também no quotidiano, e essa coordenação faz-se, com maior eficácia, através das estruturas próprias das forças e serviços aos diversos níveis orgânicos, em cada área geográfica e num modelo que é de flexibilidade.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Não hesite, Sr. Ministro!

O Orador: - De resto, o respeito pela natureza distinta de cada uma das forças de segurança é essencial à identidade do modelo de segurança interna que temos em

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Portugal. E penso que o interesse nacional aconselha a que tenhamos forças de segurança interna de diferente natureza.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O sistema de segurança interna é, pois, uma árvore sólida, uma árvore com raízes profundas que não deve ser abanada ao sabor de conjunturas.
A casa não se começa a construir pelo telhado, mas sim pelos alicerces, e é isso que o Governo tem vindo a fazer de forma sustentada, desenvolvendo uma estratégia de modernização do modelo de segurança interna, dotando as forças e os serviços de segurança dos recursos humanos técnicos e financeiros e redefinindo as suas competências ao nível da investigação criminal e criando novos mecanismos de coordenação e integração ao nível superior e ao nível operacional.
Mas estamos empenhados em fazer mais numa área onde, de resto, não estamos em total desacordo com aquilo que dizem que é o planeamento estratégico. De facto, é importante que não respondamos aos estímulos, é importante que ao nível da segurança interna tenhamos capacidade de análise, de previsão e de planeamento estratégico, e o Ministério da Administração Interna está, neste momento, com um figurino institucional que pode vir a ser desenhado, a pensar neste órgão, que possa fazer, independentemente do figurino que tenha, a função de planeamento estratégico. Se se faz ao nível da segurança internacional, porque é que não se faz ao nível da segurança interna?!
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A segurança dos cidadãos é uma questão demasiado séria para que possa ser deixada à querela partidária, diria mesmo para que possa ser deixada aos ciclos eleitorais. A segurança dos cidadãos deve ser encarada a longo prazo, deve ser consensualizada nesta Assembleia e em torno de objectivos estratégicos para a segurança interna, deve preservar a estabilidade institucional do sistema e deve consolidá-lo aperfeiçoando-o e adaptando-o às novas exigências.
Neste espírito, o Governo, no cumprimento do programa que apresentou a esta Câmara, compromete-se a vir a esta Assembleia, ainda durante a presente sessão legislativa, apresentar uma proposta de lei sobre o regime e dispositivo das forças de segurança que possa responder aos novos desafios que, em termos de segurança, se colocam às sociedades contemporâneas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Administração Interna, inscreveram-se os Srs. Deputados Jorge Lacão, António Filipe, Telmo Correia, Guilherme Silva e Luís Fazenda.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, Dr. Severiano Teixeira, no primeiro momento em que tenho ocasião de dirigir-lhe a palavra na Assembleia da República, queria desejar-lhe as maiores felicidades no exercício do cargo e o maior sucesso no seu desempenho à frente do Ministério.
Como o Sr. Ministro salientou, trata-se de uma área que a todos deve convocar numa lógica de máximo consenso nacional possível e de uma matéria de Estado em que tudo o que fizermos para unir e não para dividir, para estabelecer convergência e não divergência, é um sinal da nossa própria responsabilidade democrática.
Por isso, Sr. Ministro, permita-me que saúde o anúncio que aqui nos trouxe, o de que o Governo se compromete a apresentar uma lei-quadro definidora do regime geral das forças de segurança, dando assim cumprimento, aliás, ao dispositivo constitucional para termos uma visão global e integrada do dispositivo geral das nossas forças de segurança. E, mesmo que não fosse esse o seu mais evidente propósito, o Sr. Ministro estabeleceu um contraste, permita-me que o sublinhe, com a lógica da iniciativa do CDS-PP.
O que é que o CDS-PP nos apresentou aqui? Na sua própria designação, apresentou-nos aquilo a que chamou uma lei de «bases gerais». Do que se trata? Após olharmos para a actual arquitectura das nossas forças de segurança, o que se pretende não é uma lei de bases gerais mas, sim, uma lei-quadro com natureza estatutária, lei essa que, por sua vez, esteja imbuída de uma filosofia que não sirva para contradizer o esforço legislativo feito até agora nos vários domínios, que vão da investigação criminal à prevenção e às próprias funções de repressão de criminalidade, distribuídas e ajustadas territorial e funcionalmente e em função da especialidade pelas várias forças e serviços de segurança, mas que, ao contrário, permita dar a essa lei-quadro a natureza de uma lei de cúpula que integre em harmonia o conjunto dos contributos legislativos e de sistema até agora já elaborados e preparados.
É exactamente nessa linha que o Sr. Ministro avaliou o significado de dotar de coerência última o regime geral das nossas forças de segurança. E, manifestando inteira concordância com esse propósito, gostaria de colocar-lhe a seguinte questão: justamente em nome do princípio da máxima convergência, está o Governo disponível para encetar um debate nacional, alargado e aberto, fazendo o concurso de participação das forças de oposição para que esta lei, na medida do possível, no momento da apresentação formal, possa reflectir o máximo consenso possível da sociedade portuguesa?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, agradeço as palavras que me foram dirigidas pelo Sr. Deputado Jorge Lacão e, em nome do Governo e do Ministério da Administração Interna, quero responder-lhe, desde já, afirmativamente. O Governo não só está aberto como está interessado em encontrar um conjunto de objectivos estratégicos que devem ser consensuais - e consensualizados, em primeiro lugar, nesta Casa, naquelas que são matérias de Estado, como é o caso da administração interna e da segurança interna.
A questão da segurança dos cidadãos e do edifício legislativo que o suporta deve ser matéria de consenso, consenso esse que começa aqui. E, repito, o Governo não só está aberto como está interessado na abertura desse grande debate que possa dar origem ao completar de todo o edifício da segurança interna.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, começo por saudá-lo

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pela sua primeira presença na Assembleia da República nessa qualidade e faço votos para que, através da sua actuação à frente do Ministério, seja possível resolver pelo menos alguns dos problemas - que são muitos! - com que a segurança dos cidadãos se confronta.
O discurso aqui proferido pelo Sr. Ministro, no qual referiu as causas mais vastas da insegurança dos cidadãos e responsabilizou não apenas o Governo como a sociedade, globalmente, por esse problema, sendo em si mesmo correcto, não é tudo, porque esse tipo de discurso costuma ser utilizado, muitas vezes, para mascarar alguma incapacidade de resolver os problemas. Portanto, é verdade, é correcto aquilo que disse, pois não é apenas através da política do Ministério da Administração Interna ou do Governo que hão-de resolver-se esses problemas, mas também é evidente que existem muitos problemas que compete, exclusivamente, a esse Ministério resolver!
É evidente que a insegurança tem soluções que não são policiais, mas também exige medidas policiais. Além do mais, sendo esta uma área onde o Governo tem acumulado fracassos, vivemos hoje uma situação que é muito grave para os cidadãos e que é necessário, com urgência, inverter.
O Sr. Ministro fez-nos aqui uma promessa que importa registar: a de que, ainda nesta sessão legislativa, o Governo apresentará a esta Assembleia uma proposta de lei sobre regime e dispositivo das forças de segurança. A ideia de que a Assembleia da República deve ser chamada a aprovar as grandes opções em matéria de segurança interna é algo que sempre defendemos - aliás, já apresentámos iniciativas legislativas nesse mesmo sentido nesta Câmara -, por isso aguardamos com expectativa esse debate e a aprovação de uma lei dessa natureza.
Entendemos, porém, que é necessário que não se adiem as medidas políticas que são urgentes em matéria de garantia da segurança dos cidadãos porque estamos à espera que, um dia, a Assembleia da República venha a aprovar tão importante diploma legislativo.
Neste sentido, importava que o Sr. Ministro, nesta sua primeira presença na Assembleia da República, nos desse conta de algumas orientações que pretende imprimir ao seu Ministério em termos essenciais, designadamente em relação a questões decisivas e, desde logo, acerca do policiamento de proximidade. Os vários governos do Partido Socialista sempre afirmaram que o policiamento de proximidade era uma das suas prioridades, no entanto verificámos que, realmente, assim não foi!
Nessa matéria, importa tomar medidas que assegurem, de facto, o policiamento de proximidade, designadamente através da afectação dos meios materiais e humanos necessários, o que nos coloca perante uma questão que se prende com a ocupação de profissionais das forças de segurança em múltiplas tarefas que não têm rigorosamente nada que ver com o policiamento. Gostaria, pois, de perguntar ao Sr. Ministro qual vai ser actuação do seu Ministério nessa matéria.
Para terminar, Sr. Presidente, coloco uma segunda questão que diz respeito ao regime de direitos aplicáveis aos profissionais das forças de segurança: qual é a sua posição, Sr. Ministro, em matéria de sindicalismo na PSP e em matéria de reconhecimento de direitos associativos aos profissionais da GNR?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, é com muito gosto que respondo, tanto quanto me seja possível, às questões que me colocou.
Em primeiro lugar, sobre o policiamento de proximidade, não temos qualquer dúvida, nem tenho eu qualquer dúvida, de que essa é uma orientação que o Ministério da Administração Interna assume por inteiro e está empenhado em desenvolver. Estão em funcionamento e em desenvolvimento um conjunto de acções - que vão ser reforçadas - de policiamento de proximidade. É conhecido o Programa Escola Segura, mas está a fazer-se algum investimento também ao nível dos idosos.
Portanto, alguns programas estão a funcionar e estamos a fazer esforços no sentido de que outros possam vir a entrar em funcionamento com a maior brevidade possível, certo de que - e este é um dado que lhe deixo - a formação dos agentes, ao nível da doutrina e da técnica do policiamento de proximidade, está a desenvolver-se a um bom ritmo.
Quanto à minha posição sobre o sindicalismo na polícia e na GNR, devo dizer que estão em causa duas forças que têm natureza completamente diferente e, portanto, terão de ser tratadas de acordo com a especificidade da sua natureza. Em matéria de polícia, é conhecida a posição do Governo - deu entrada, aliás, nesta Assembleia, uma proposta de lei sobre essa matéria, que aguarda, julgo eu, discussão; já em relação à GNR, tendo esta uma natureza de força de base militar, a minha posição é que não deve haver esse tipo de sindicalismo.

O Sr. António Filipe (PCP): - Falei de direitos associativos da GNR e não de sindicalismo!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, permita-me que também o cumprimente no exercício dessas funções, mas, ao cumprimentá-lo, não deixo de dizer-lhe que registei no seu discurso demasiada satisfação e demasiado optimismo. O Sr. Ministro referiu, por várias vezes, que «estávamos a fazer…, estava a acontecer…, o Governo estava a responder…» e eu dei por mim a pensar: se estão a fazer, se está a acontecer e se estão a responder, por que é que o Sr. Ministro está nessa tribuna? Porque, estando a responder e a fazer, não era suposto que o Sr. Ministro aí estivesse, nesse cargo e nessas funções!

Aplausos do CDS-PP.

Mas já que está, e eu saúdo-o por isso - saúdo, inclusivamente, o tom simpático e cordato que pôs na sua intervenção, o que significa, para nós, um progresso e uma melhoria que não deixamos de registar -, queria fazer-lhe duas ou três perguntas concretas.
Efectivamente, Sr. Ministro, a questão é que não está a fazer-se, nem está a acontecer, porque os números que apresentamos são reais, baseiam-se nas próprias forças de segurança. E, segundo todas as indicações que temos, se se verificou uma ligeira baixa nos números da criminalidade em 1996 e 1997, em 1998 e 1999 esses números disparam e aumentam, claramente! Há uma inversão de um certo ciclo de tendência de baixa. Essa é, portanto, a realidade.

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Além do mais, deixe-me que lhe diga que, em relação a este ano em concreto, o crime violento - não naquele que mais incomoda as pessoas, como aqui tantas vezes dissemos - parece estar a aumentar claramente, o que constitui mais um fenómeno preocupante a somar a todos os outros.
Primeira questão concreta, Sr. Ministro: o Secretário de Estado da Administração Interna - sempre afirmei que me parecia menos mal, pelas várias declarações que proferiu (por isso aí estará e aí continuará!)...- foi muito infeliz ao declarar, há uns tempos atrás, ao Correio da Manhã, que o subsídio de turno e de piquete não eram pagos porque a lei não estava bem. Ora, num Estado de direito democrático, a lei é para cumprir, não é para discutir se está bem, se está mal!
Portanto, os subsídios de turno e de piquete deveriam, pura e simplesmente, ser pagos.

Aplausos do CDS-PP.

Em segundo lugar, permitia-me citar-lhe a seguinte frase: «Por outro lado, todas as polícias poderiam ser subordinadas a uma mesma tutela, o Ministro da Administração Interna. Esta solução pode eliminar conflitos latentes entre polícias e permite uma fiscalização efectiva da sua actividade». Esta frase é do Dr. Rui Pereira, responsável pelo SIS, que consigo tem de trabalhar e que, pelos vistos, partilha a nossa opinião e as nossas preocupações nesta matéria.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Um outro conhecedor desta realidade, afirma: «Temos de encarar seriamente o comando único das polícias por uma questão de eficácia». E, mais à frente, quando lhe perguntam como, ele responde: «Com um director nacional e um comandante para cada uma das forças». Esta frase é do anterior responsável pela Polícia Judiciária, Dr. Fernando Negrão.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, como vê, nós estamos bem acompanhados nesta matéria!

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - A última pergunta que lhe formulo, uma vez que terminou o tempo de que dispunha, é esta: vai ou não avançar para um comando único? Vai ou não implementar esta política? É que, até agora, disse muito pouco sobre a matéria.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, a razão pela qual aqui estou prende-se com o respeito que tenho pela Assembleia da República e, em particular, pelo partido que propõe este projecto de lei.
Em segundo lugar, relativamente ao optimismo excessivo de que falou, não penso que seja optimismo, é realismo e, sobretudo, determinação,…

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Exactamente!!

O Orador: - … determinação no sentido de poder trabalhar, de dar o melhor que possa e saiba ao Ministério da Administração Interna.
Sobre a questão da coordenação e das pessoas com quem tenho de trabalhar, posso citar-lhe, desde já, um documento que me foi fornecido pelo próprio director do SIS, no qual se pode ler: «(...) É por tudo isto que se julga contraproducente criar mais uma estrutura de coordenação. Importa melhorar o funcionamento das estruturas que já existem, procedendo às reformas necessárias para o efeito». Esta é a informação que tenho do Sr. Director-Geral.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Então, é porque o Director-Geral do SIS tem duas opiniões!

O Orador: - Uma vez que o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna foi interpelado directamente, dar-lhe-ia a palavra para poder intervir. Ou melhor, pergunto ao Sr. Presidente se poderia dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, o direito de pedir esclarecimentos tem destinatário certo, não há delegação para dar resposta. Mas, se os Srs. Deputados entenderem que podemos abrir uma excepção, se houver consenso nesse sentido, como é para prestar um esclarecimento, a Mesa não se opõe.
Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Luís Patrão): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço a oportunidade que me concedem de poder repor, do meu ponto de vista, alguma verdade de alguns factos.
Em primeiro lugar, devo dizer que desde que tenho as funções em que me encontro actualmente, nunca prometi aquilo que não posso dar. Prometo, contratualizo e combino aquilo que posso dar. Ora, o subsídio de turno e de piquete de que o Sr. Deputado falava há pouco - talvez não saiba, mas estas sessões parlamentares também servem para esclarecer os Srs. Deputados da realidade dos factos e dos números que estão por detrás deles - custa 13,5 milhões de contos cada ano.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Está na lei!

O Orador: - E neste momento não temos 13,5 milhões de contos para fazer face ao problema da PSP.

Protestos do CDS-PP.

Mas, mais do que isso, Srs. Deputados, e sem querer criar polémica à volta de um problema que tem a sua génese e a sua explicação natural, devo dizer que temos feito um esforço, pois gastámos este ano mais de 200 milhões de contos com as forças de segurança e empreendemos os esforços necessários…

Protestos do CDS-PP.

Srs. Deputados, talvez não valha a pena prestar esclarecimentos se não estão interessados neles...!
O que o País quer e precisa é que esse dinheiro sirva para mobilizar, para empenhar mais meios, para pôr mais homens na rua e para insistir no patrulhamento das nossas cidades

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e das nossas vilas. O Ministério está empenhado em destinar o dinheiro que tem vindo a ser disponibilizado pelo Orçamento do Estado para esses fins, não é necessariamente para cumprir com regras que, tendo consagração legal, têm de ser regulamentadas para serem aplicadas. Não estando regulamentadas, não podemos ser pagar esses subsídios.

O Sr. Presidente: - Para que efeito pediu a palavra, Sr. Deputado Paulo Portas?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, inscrevi-me para uma intervenção, a fim de lamentar o que aqui foi dito, porque é uma coisa grave.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção terá de aguardar a sua vez, Sr. Deputado.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Administração Interna, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, renovando as minhas felicitações pela sua primeira intervenção na Assembleia da República, não posso deixar de fazer duas observações.
Em primeiro lugar, registei a sua referência de que há um responsável político, um membro do Governo (e não um funcionário intercalar) que responde directamente perante a Assembleia. Fica-lhe bem essa assunção, porque nem sempre os membros do Governo têm essa forma de estar, e muitas vezes alijam as responsabilidades para os funcionários. É, portanto, louvável que V. Ex.ª assuma de parte inteira essa responsabilidade.
Segundo, V. Ex.ª referiu que a «árvore» da segurança interna não pode ser abanada em função da conjuntura. Sr. Ministro, apesar de tal ser anterior à permanência de V. Ex.ª no Governo, quem abanou mais essa «árvore» foi o Governo, e penso que, ainda antes do Outono, a deixou sem folhas! V. Ex.ª vai ter, também aí, um trabalho de «jardinagem» para recompor essa «árvore».
Não posso também deixar de colocar a questão do subsídio de piquete e do subsídio de turno, porque se trata de uma lei aprovada nesta Assembleia. O Governo gasta mais de uma centena de milhões de contos numa política de combustíveis que ninguém entende, e o Sr. Secretário de Estado acaba de assumir que não tem 13 milhões para fazer face a este encargo, que é essencial ao estímulo e à compensação dos agentes das forças de segurança, neste caso da PSP.
Pedia encarecidamente ao Sr. Ministro que se empenhasse junto do Sr. Ministro das Finanças de maneira a que a lei do Orçamento preveja isto, ou, então, que o Governo assuma uma proposta de lei para revogar aquilo que está na lei. Assuma e vote aqui nesta Assembleia! Não deixe que este escândalo surja num Estado de direito, isto é, que não se cumpra uma lei aprovada nesta Assembleia da República. Gostaria, portanto, que me esclarecesse se vai haver empenho no sentido de cumprir esta lei.
A outra questão tem a ver com estatuto da GNR. Os seus antecessores e o Sr. Primeiro-Ministro têm dito que querem manter o estatuto militar da GNR. Mas a verdade é que vai havendo alterações legislativas que apontam para um desvirtuamento desse estatuto, designadamente de legislação do Governo - e nestas coisas os conceitos e as designações têm a sua importância -, que fala em relação aos militares da GNR como «os trabalhadores», com todo o respeito por essa terminologia. Mas há que ter cautela com as designações que, nestes casos, têm o seu significado.
Queria, portanto, saber claramente se o Governo se vai empenhar em termos de não haver desvirtuamentos graduais e legislativos de cedências que desvirtuem este estatuto, com todas as consequências previsíveis que isso pode trazer.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr. Deputado, é com muito prazer que respondo às questões que me coloca, dizendo desde já que, da minha parte, enquanto Ministro da Administração Interna, empenhar-me-ei em tudo aquilo que for possível para melhorar as condições dos profissionais da Polícia de Segurança Pública e da GNR, não ultrapassando aquilo que são as impossibilidades financeiras do Estado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Basta cumprir a lei!

O Orador: - Mas farei o que puder nesse sentido. E disso podem os militares da GNR e os agentes da PSP estar tranquilos - já lhes disse.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito bem, Sr. Ministro!

O Orador: - Há, no entanto, uma segunda questão que colocou e que considero uma questão absolutamente fundamental, que é a definição e a identidade da PSP e da GNR. Nesse sentido, creio que uma lei de regime e de dispositivo da segurança interna poderá ser um instrumento legal fundamental para definir, com clareza, a identidade de cada uma das forças. Penso que naquilo que são as nuances que ainda existem, quer num caso quer noutro, poderemos encontrar o denominador comum para aquilo que são as forças de segurança. Penso que esse instrumento poderá dar um contributo muito importante na definição da identidade de cada uma delas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Ministro da Administração Interna, aproveito também para o felicitar no desempenho destas funções.
Ouvi a sua intervenção, partilho-a em muito aspectos, no entanto reparei que, em relação ao projecto do CDS-Partido Popular, tendo comentado vários aspectos e várias das suas possíveis incidências, não se referiu a uma das propostas que, a nosso ver, é aquela que traria maiores lesões à possibilidade do escrutínio democrático, que é a criação de uma base central de dados única e totalizante do ponto de vista do sistema policial e do sistema de informações.
Gostaria, portanto, de, sobre isso, ouvir um comentário do Sr. Ministro, dado que, já hoje, o cidadão tem garantias bastante difusas sobre o controlo democrático dos vários serviços de informações. A opinião pública não repousa, também, numa tranquilidade absoluta sobre a possibilidade de acesso de cada cidadão aos seus dados, sobre um escrutínio democrático rigoroso em relação àquilo que

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existe em várias bases de dados e em vários, e por vezes desencontrados, serviços de informações.
Gostaria, pois, de o ouvir comentar essa proposta do CDS-Partido Popular.
Para terminar, em relação às verbas a que há pouco se referiu, ao contrário dos partidos da direita, entendi o que disse como uma manifestação de sindicalismo do Ministério da Administração Interna face ao Governo para verbas que não estão ainda disponibilizadas no sentido da aplicação da lei. Se assim é, pareceu-me estranho e insólito, porque o sindicalismo policial e o direito de associação ainda marcam passo, mas já temos aqui uma manifestação reivindicativa.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, muito obrigado pelas suas palavras.
Em relação às questões que me colocou, gostaria de fazer duas considerações. Em primeiro lugar, para que fique claro perante esta Câmara, a minha posição é a seguinte: em todo o processo de produção de segurança interna devem respeitar-se os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. Logo, é preciso que se diga, no princípio e no fim do processo de segurança interna está, para mim, uma questão de cidadania.
Em segundo lugar, quanto à criação da base de dados, devo dizer que a sua finalidade é a do combate à criminalidade e que, pela Lei de Organização da Investigação Criminal, está previsto um sistema integrado de informação criminal, que está a ser pensado a partir da primeira reunião do conselho coordenador de investigação criminal e que procura compatibilizar, do ponto de vista tecnológico, os sistemas das várias forças no sentido de não haver quatro mas um sistema de informação que permita esse desiderato.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Paulo Portas convolou o seu pedido de palavra para uma intervenção num pedido de esclarecimentos ao Sr. Ministro da Administração Interna, embora um pouco tardio, estamos de acordo.
Assim, tem a palavra, dispondo, para o efeito, de mais 1 minuto, tempo cedido pelo Governo.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, em primeiro lugar, até por uma questão de educação, devo esclarecer que há pouco o meu colega Telmo Correia, quando ironizou sobre a circunstância de estar aí, não se referia a estar neste debate mas, sim, à contradição entre a ideia que o Sr. Ministro tem, de que tudo está bem, de que tudo está a funcionar, de que tudo está a acontecer, e a circunstância de terem mudado o Ministro da Administração Interna; isto é, de estar hoje em dia V. Ex.ª aí, na bancada do Governo, e o antigo Ministro na bancada socialista.
Porém, quero ir directamente a um assunto, porque creio que temos de esclarecer isto de uma vez. Penso que o Sr. Secretário de Estado voltou a proferir uma afirmação que é, no mínimo, ilegal! Do vosso Ministério e relativamente à ordem pública, o Sr. Secretário de Estado fez mais um apelo ou, pelo menos, deu mais um sinal do não cumprimento de uma lei da República. Ora, isto é inaceitável vindo de um Secretário de Estado da Administração Interna.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É uma desobediência!

O Orador: - Desculpe, Sr. Ministro, é uma espécie de «barranquismo» legal: as leis existem mas não se cumprem! Não pode ser, Sr. Secretário de Estado! O subsídio de turno e de piquete está na lei, no artigo 91.º, n.º 7, da Lei de Organização e Funcionamento da Polícia de Segurança Pública, onde se diz que quem fizer trabalho de turno e de piquete tem direito aos respectivos subsídios. É um direito adquirido. V Ex.ª não pode dizer que custa caro, porque senão só aplica leis baratas!
Sr. Ministro, de duas, uma: ou revoga a lei ou permite que o seu Secretário de Estado diga, repita e venha dizer à Câmara que aprovou a lei que não está disposto a cumprir. Isto não é possível! Então, se não está de acordo revogue a lei e, depois, enfrente a polícia a quem isso foi prometido.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Finalmente, Sr. Ministro, esse ano vão entrar 500 candidatos na Escola de Polícia. Quantos vão reformar-se? Qual é a sua estimativa para Janeiro? Quando é que preenche definitivamente o quadro da GNR, que tem 1749 lugares ainda disponíveis e que são necessários?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, respondendo com o máximo de objectividade possível à questão que me coloca, que, aliás, vem ao encontro de uma preocupação do Sr. Deputado Guilherme Silva, desde 1996, foram integrados nas forças de segurança, PSP e GNR, mais 10 000 novos agentes. É óbvio que, ao longo deste ano, pela normal lei biológica da vida, há pessoas que saem das forças de segurança. O saldo, entre entradas e saídas, é, neste momento, um saldo positivo de 2561 agentes na GNR e de 3039 na PSP, o que faz um total de 5600, desde 1996.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Não foi isso que perguntei?

O Orador: - Quer saber para este ano, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Quero saber para 2001.

O Orador: - Para 2001 ainda não podemos saber!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Mas têm de ter uma estimativa de reformas e de admissões! Candidatos são 500, mas quantos saem? Qual é a estimativa?

O Orador: - Neste momento, o saldo é desta natureza e, a meu ver, é um saldo altamente positivo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

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O Sr. Luís Fazenda (BE): - Por ora prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr . Deputado António Filipe para uma intervenção.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O projecto de lei que o Partido Popular coloca em discussão tem a ver com a questão da coordenação, alegadamente, nos seus próprios termos, entre as forças e os serviços de segurança. Admitamos, há um problema real de coordenação, ele existe, é conhecido, há muito que se discute a necessidade de melhorar a coordenação entre as forças de segurança e, em determinadas situações, somos confrontados com a realidade de ausência dessa coordenação. Só que verificamos que essa falta de coordenação não resulta tanto da inexistência de órgãos de coordenação mas de deficiências no seu funcionamento ou na sua articulação, porque na legislação portuguesa não faltam órgãos de coordenação. Eles estão previstos na Lei da Segurança Interna e no Decreto-Lei n.º 61/88, de 27 de Fevereiro, que a regulamenta, que criou o Gabinete Coordenador de Segurança, cuja extinção é, aliás, proposta no projecto de lei do Partido Popular - mas, de facto, existe um Gabinete Coordenador de Segurança onde estão representados os comandantes e os directores das várias forças e serviços de segurança - e também, como já foi referido, existe na recentíssima Lei de Organização da Investigação Criminal um órgão de coordenação, que é o Conselho Coordenador.
Digamos que, quer ao nível da investigação criminal, quer ao nível da segurança dos cidadãos, estão previstos, existem legalmente, órgãos de coordenação, para não falar do diploma que cria as brigadas mistas de intervenção entre a PSP e a GNR e que creio incluírem também a Polícia Judiciária.
Portanto, creio que o problema não é falta de estruturas ou de lei mas o de fazer com que essas estruturas funcionem, e interessa verificar como estão a funcionar e se estão a funcionar adequadamente.
O problema do projecto de lei do Partido Popular é que fala em coordenação mas, depois, o que propõe é, na verdade, uma estrutura de direcção. Aliás, como o seu próprio nome indica, o que está proposto neste projecto de lei é a criação de uma direcção nacional das forças de segurança.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - E não só!

O Orador: - Vai, pois, muito para além de uma estrutura de coordenação. Aliás, é uma estrutura de direcção que, como já aqui foi de alguma forma referido, se sobrepõe às direcções próprias das forças e serviços de segurança e interfere, inclusivamente, nas respectivas cadeias de comando, na medida em que prevê o seu desdobramento regional e distrital. Não se explica, em parte alguma do projecto de lei, como é que isto depois se articula com as próprias cadeias de comando das forças de segurança, parecendo, de facto, que não se articula.
Trata-se, portanto, de uma «superpolícia», que não coordena mas que, pura e simplesmente, visaria controlar. E, ainda por cima, desgradua! É que, enquanto a estrutura de coordenação prevista no Decreto-Lei n.º 61/88, o Gabinete Coordenador de Segurança, depende do Primeiro-Ministro, o que o PP propõe é que esta passe a depender do Ministério da Administração Interna. Assim, até a Polícia Judiciária, que está sob tutela do Ministério da Justiça, passaria, para este efeito, a ficar sob a tutela de um director nacional, que, por sua vez, dependeria do Ministério da Administração Interna. Há, pois, aqui algo de absurdo!
Como tal, este director nacional das forças de segurança seria uma espécie de Pina Manique dos tempos modernos;…

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - … isto é, alguém que teria amplíssimos poderes sobre a PSP, a GNR, a Polícia Judiciária, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, a Guarda Florestal e - pasme-se! - o Serviço de Informações de Segurança, não tendo minimamente em conta todo o melindre e a complexidade, do ponto de vista democrático, da fiscalização que é necessário exercer sobre o Serviço de Informações de Segurança e que, infelizmente, tem sido mal exercida.
Há, portanto, neste projecto de lei, como que uma mentalidade de criação de um Estado policial que repudiamos vivamente e que nos parece ser muito perigosa para a democracia portuguesa!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Olha quem fala!

O Orador: - Curiosamente, este projecto de lei acaba por ligar muito menos aos problemas reais de segurança dos cidadãos! Preocupa-se muito com esta estrutura, com esta «superpolícia», com o comando, mas, depois, acaba por ligar muito menos à resolução dos reais problemas de insegurança dos cidadãos. Estes problemas existem, são reais e não têm sido encontradas medidas adequadas para os resolver. Parece-nos haver, nesta matéria, muito que fazer, valendo a pena pronunciarmo-nos sobre ela.
Em primeiro lugar, há que cuidar do problema dos direitos e da dignidade do estatuto sócio-profissional dos profissionais das várias forças e serviços de segurança. E aqui há vários problemas, alguns dos quais prendem-se com a necessidade premente, do nosso ponto de vista, de dotar os profissionais da GNR com um horário de trabalho, acabando com a situação muitas vezes desumana e absurda que hoje se verifica. É necessário permitir, sem demoras, que os profissionais da PSP tenham o direito à constituição do seu sindicato e que sejam reconhecidos direitos associativos de outra natureza, mas, em todo o caso, direitos associativos, aos profissionais da GNR. É, igualmente, necessário que sejam pagos os subsídios de turno e de piquete.
Não faz qualquer sentido que tenha sido aprovada, por esta Assembleia, uma lei que prevê a atribuição desse subsídios e que o Sr. Secretário de Estado venha dizer que não a cumpre por não ter dinheiro para isso, quando se sabe que a elaboração do Orçamento do Estado tem de respeitar os compromissos que o Estado assumiu, quer por via de lei, quer por via de contrato - neste caso, o Estado assumiu um compromisso claro por via de lei, que tem de ser respeitado!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Um outro aspecto, que foquei há pouco numa questão que coloquei ao Sr. Ministro, é o da criação de condições para uma efectiva proximidade das forças policiais às populações, não apenas nas palavras mas na garantia da existência de instalações adequadas das forças

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policiais próximas das populações, designadamente na cidade de Lisboa, onde muitas das esquadras que foram encerradas aquando da célebre política das superesquadras, há uns anos atrás, nunca foram recuperadas, o que faz com que as pessoas continuem a não ter uma instalação das forças policiais, um posto policial, uma esquadra, aonde possam recorrer em caso de necessidade. Há, pois, que continuar a investir não apenas em palavras, em discursos, mas em instalações para as forças policiais.
Por outro lado, há que assegurar que muitos profissionais das forças de segurança, que têm uma formação de profissionais das forças de segurança, não estejam ocupados a fazer a limpeza dos quartéis da GNR ou com funções meramente administrativas ou impedidos às ordens de oficiais, situação que, absurdamente, continua a existir na GNR. Portanto, também é preciso assegurar que os profissionais das forças de segurança sejam-no efectivamente e sejam afectados às missões próprias, àquelas para que foram formados e não a outras, como acontece hoje.
Importa ainda salientar dois aspectos, um dos quais é a nível da formação adequada e da dotação das forças de segurança de um código deontológico que assegure um relacionamento adequado entre elas e os cidadãos. Parece-nos que tal é fundamental para a existência de um clima de confiança dos cidadãos nas forças de segurança, que é decisivo para o relacionamento adequado, e consideramos que isso pressupõe a existência de um código deontológico da actuação policial.
O segundo aspecto, também importante, tem a ver com a proximidade das polícias. Trata-se da participação efectiva das populações e do diálogo entre as forças de segurança e as populações, existindo, como existe hoje, um instrumento legal, adequado para esse efeito, que são os conselhos municipais de segurança dos cidadãos. Esse mecanismo legal que permite que este diálogo se efective foi aprovado, por unanimidade, por esta Assembleia, na sequência de um projecto de lei apresentado pelo PCP, ao qual se juntou um do PS. E é importante incentivar a existência deste tipo de estruturas de diálogo que assegure a participação dos cidadãos, através dos seus representantes, no debate concreto dos problemas da segurança.
Creio ser muito importante fazer aqui este debate e não apenas em torno de um projecto de lei que, do nosso ponto de vista, contém aspectos inaceitáveis e que contrariam aquilo que pensamos dever ser a estruturação das forças de segurança num regime democrático. De facto, é importante que a Assembleia discuta as grandes opções de segurança interna em torno de problemas como os que referi e, eventualmente, de outros que devam ser referidos e que algum grupo parlamentar entenda dever apresentar como contributo para este debate.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Não havendo inscrições para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Dias Baptista, para uma intervenção.

O Sr. António Dias Baptista (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos hoje a discutir o projecto de lei n.º 302/VIII, apresentado pelo CDS-PP, que estabelece as bases gerais da coordenação, equipamento, reorganização e reestruturação das forças de segurança.
A problemática da segurança interna é extremamente importante, porque está directamente relacionada com os direitos fundamentais dos cidadãos. Por conseguinte, a sua importância é tão grande que exige que todos os partidos, bem como todos os Deputados, tenham uma atitude responsável, recusando a tentação fácil do recurso à demagogia. Sobretudo porque - não tenhamos dúvidas - instrumentalizar um debate como o da segurança dos cidadãos mais não é do que contribuir, activa e conscientemente, para o descrédito dos partidos políticos, da política e das instituições.
As problemáticas relacionadas com a segurança interna, pelas repercussões que têm, deverão ser abordadas com uma postura de grande responsabilidade, o que pressupõe que os dados estatísticos ou contabilísticos não deverão ser utilizados como meras armas de arremesso político, sob pena de estarmos a cavar o funcionamento do sistema democrático.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Não interessa quem cometeu o crime! Interessa o crime!

O Orador: - Tenha calma, Sr. Deputado!
Importa ter a capacidade de reconhecer que, nesta como em outras matérias, todos, não somos demais para encontrar as melhores soluções e que também ninguém está isento de culpa, mas ninguém pode ser acusado de ser o único responsável. Aliás, quero desde já declarar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que a questão da segurança dos cidadãos é uma preocupação nossa, como acredito, sinceramente, que o seja de todas as bancadas.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Como já tive oportunidade de afirmar o PS e o XIV Governo Constitucional esperam e desejam que todos os partidos possam colaborar nesta importante questão de Estado que é a segurança interna.
Por esta razão, encarámos com grande expectativa o agendamento potestativo requerido pelo CDS-PP, porque tínhamos a esperança de receber algum importante contributo. Contudo, a nossa expectativa rapidamente deu lugar a uma tremenda decepção. Procuraremos explicar as razões desta decepção.
Como já foi sublinhado, a segurança interna, pela sua importância, aconselha que se procure um grande consenso sobre o seu ordenamento jurídico, o que se conseguiu com a Lei de Segurança Interna - a Lei n.º 20/87, de 12 de Junho.
Acontece que, com este projecto de lei, o CDS-PP quebra esse consenso ao introduzir profundas alterações nessa lei de segurança interna. Aliás, o projecto de lei começa por introduzir uma alteração orgânica na própria estrutura do Governo, o que, pese embora toda a abertura que o PS tem demonstrado, convenhamos, é um pouco demais!
Por outro lado, constatamos, com alguma surpresa e estranheza, que o PP trata as três principais forças de segurança por igual, não tendo em atenção o facto de a Polícia Judiciária ser predominantemente uma força que se dedica à investigação, contrariamente à PSP e à GNR, que fazem, primordialmente, prevenção, mas também investigação e repressão.
Ademais, um dos fundamentos aduzidos para a apresentação deste projecto de lei é a alegada descoordenação das forças de segurança. Contudo, importa destacar quão surpreendente é ser este um dos fundamentos, sabendo-se que a Assembleia aprovou, em 6 de Julho, a Lei n.º 21/2000, de 10 de Agosto, Lei da Organização da Investigação Criminal -, onde, entre outras importantes matérias, se define e consagra, exactamente, a coordenação dos órgãos de polícia criminal

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de competência genérica, tendo-se realizado, aliás, a primeira reunião desse conselho coordenador exactamente na semana passada.
As forças de segurança necessitam de estabilidade, não sendo desejável e muito menos aconselhável que os seus quadros normativos estejam em permanente mutação. Aliás, contrariamente ao que é referenciado na exposição de motivos deste projecto de lei, não só existe um programa do Governo como existe uma estratégia nacional de combate à criminalidade.
O Grupo Parlamentar do PS orgulha-se daquilo que os governos do PS têm feito em matéria de segurança interna, senão vejamos: foi com o PS que a PSP ganhou uma nova postura, mais civilista; foi com o PS que se alterou a política das superesquadras, tendo sido abandonada a opção tomada pelo PSD; foi com o PS que se iniciou um programa integrado de policiamento de proximidade, com as vantagens que hoje já todos reconhecem e salientam, designadamente com a abertura de muitas esquadras de bairro; foi com o PS que se iniciou o Programa «Escola Segura»; foi com o PS que se iniciou o Programa «Apoio 65/Idosos em Segurança»; foi com o PS que se iniciou o INOVAR, programa de apoio a vítimas de violência, com a criação de 50 salas de apoio às vítimas em postos e esquadras; foi com o PS que, desde 1995, se formaram 10 064 agentes e guardas e este ano entrarão ao serviço mais 2090; foi também com o PS que se implementou o programa de formação à distância para as forças e serviços de segurança, alargando os módulos de formação a domínios técnico-policiais não suficientemente abordados na formação inicial; foi com o PS que se procedeu ao reforço dos meios e equipamentos (desde 1995, foram adquiridas 4912 viaturas, 350 destas destinam-se ao Programa «Escola Segura»); foi com o PS que se implementou o Sistema de Informação da Polícia (SIPOL) e se procedeu ao lançamento da rede móvel de segurança; foi com o PS que se reforçou o apetrechamento das forças de segurança do equipamento de vigilância de costa e combate ao contrabando e ao tráfico de droga, através da entrada ao serviço de novas lanchas rápidas da brigada fiscal da GNR; será ainda com o Governo do PS que, a partir de Janeiro de 2001, deixará de ser pedido aos agentes e guardas da PSP e da GNR o esforço para a realização quotidiana das citações e notificações dos processos cíveis, o que representará a libertação de inúmeros efectivos para a sua verdadeira função, que é a de contribuir para a segurança de pessoas e bens.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quando não existem argumentos políticos relevantes para questionar o Governo tem sido habitual, com uma especial e particular incidência nesta Legislatura, que se fale da segurança dos cidadãos, fazendo apelo ao subconsciente colectivo que tem precisamente a ver com a ideia geral de segurança.
Gostaria de sublinhar que o PS não aceitará participar numa discussão baseada numa situação alarmista que, de todo em todo, felizmente, não tem justificação em Portugal. Um discurso alarmista e irresponsável sobre a segurança contribui para aumentar o sentimento de insegurança dos cidadãos, mesmo quando esse sentimento não corresponde à realidade.
Desejo terminar tal como comecei, isto é, fazendo um apelo a todas as bancadas para que seja possível estabelecer um alargado consenso nacional sobre a problemática da segurança interna, porque, apesar de tudo o que tem sido feito, continuamos insatisfeitos e queremos continuar a melhorar.
Queremos certamente obter os melhores resultados, mas também queremos que a eficácia policial seja assegurada com o respeito pelos direitos fundamentais do cidadão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, dispondo, para o efeito, de 3 minutos, tempo cedido pelo Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Dias Baptista, foi graças ao PS que tive tempo para fazer esta pergunta…

Risos do CDS-PP.

… e foi graças ao PS que tudo o que disse de facto aconteceu, mas também foi graças ao Governo do PS e à forma como o PS conduziu a política de segurança nos últimos anos que, designadamente, a criminalidade tem aumentado de ano para ano.

Aplausos do CDS-PP.

Protestos do PS.

Foi com o PS! Não foi connosco, não foi com nenhum outro partido, foi com o PS, Sr. Deputado; e isto é que é grave! Fiquei com a sensação de que o Sr. Deputado já tinha tirado as conclusões antes do debate, porque pareceu-me que estava a citar conclusões que já tinha tirado, que já vinha para o Plenário com a decepção preparada. Além desta sensação, fiquei com uma outra, a de que o Sr. Deputado não se apercebeu de que houve uma remodelação,…

Risos do CDS-PP.

… porque parecia que esse discurso estava escrito desde o outro Ministro; mas este já é o quarto, Sr. Deputado, o terceiro já passou!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - Os senhores estão contentes, estão satisfeitos, dizem que foi com o PS que se fez isto, que se fez aquilo, mas «despejam» ministros, «expulsam-nos da casa com 115 nomeações», com uma facilidade enorme. Correm com eles, Sr. Deputado!

Aplausos do CDS-PP.

Portanto, não sei se o Sr. Deputado se apercebe de que estas realidades já mudaram.
Como pedido de esclarecimento, faço apenas uma pergunta, que é geral em relação a este debate. Ouvimos, ao longo da tarde, os Srs. Deputados das bancadas mais à esquerda, designadamente o Sr. Deputado António Filipe - se calhar, influenciado por qualquer outro modelo de Estado policial, de uma outra parte do mundo -, a acusarem-nos de estar a seguir um modelo policial Pina Manique e outros mais variados. Porém, Sr. Deputado, o modelo de coordenação que propomos, em relação ao qual os senhores fazem as maiores críticas, é tão-só o modelo

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semelhante ao que existe em Espanha, em França, em Inglaterra, na Bélgica ou na Alemanha.

Protestos do PS.

O Sr. Jack Straw, ministro trabalhista inglês disse, recentemente, que era preciso uma direcção nacional, porque sem ela não se vai lá. Há que ter uma política de mérito e de resultados, e sobre isto os senhores nada diziam, mas, pelos vistos, o Sr. Deputado não percebe ainda que o Sr. Ministro já deu um grande sinal. Vamos ver se o concretiza ou se vai ficar nesta situação do «deixa estar como está para ver como fica»!
Mas, os senhores não perceberam que é preciso mudar e que a política de segurança tem vindo a falhar todos os dias!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Dias Baptista.

O Sr. António Dias Baptista (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, não vou dizer que não, obviamente, pois não é isso que está em causa. O que está em causa é que o Sr. Deputado Telmo Correia fez uma intervenção muito interessante, falou muito, muito, muito, mas não contraditou uma única afirmação em relação ao que eu disse que o Governo do PS fez.

Aplausos do PS.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não valia a pena!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Administração Interna.

Pausa.

Afinal quem vai usar da palavra é o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça. Peço desculpa pela confusão, mas não corrigi a tempo a indicação errada que me havia sido dada.
Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Tem razão, Sr. Presidente, justifica-se a confusão!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Não há coordenação!

Vozes do CDS-PP: - Sem coordenação é o que é!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça (Eduardo Cabrita): - Ora essa, Sr. Presidente, a coordenação do Governo e o bom entendimento entre os dois Ministérios justifica perfeitamente o lapso de V. Ex.ª, que entendo como um cumprimento.

O Sr. Presidente: - Não foi um lapso meu, fui induzido a erro. Não digo é por quem.

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar o Grupo Parlamentar do CDS-PP por ter possibilitado, com o agendamento potestativo desta iniciativa legislativa, a nossa presença neste debate, o que nos permite, a propósito do projecto errado no momento errado, continuar o debate certo e evidenciar, no quadro do debate que tem vindo a ser travado sobre a prevenção criminal, a segurança interna e a promoção do combate à criminalidade, quanto a coordenação e a integração de políticas têm contribuído de facto e não apenas de acordo com a busca dos sound bites adequados à entrada do telejornal das 20 horas para a mudança dos tempos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Arranje uma metáfora nova! Essa já não pega!

O Orador: - O projecto é errado, porque esse é manifestamente o resultado consensual da generalidade das intervenções feitas, salvo naturalmente a do partido proponente. O projecto é apresentado no tempo errado, porque, ao ver as actas das sessões plenárias, teria sido mais adequado o Dr. Paulo Portas, que saúdo, ter feito este debate aquando da discussão da Lei da Organização da Investigação Criminal, conforme a Acta do passado dia 16 de Junho, para não ir mais longe, ou aquando da discussão da lei tutelar educativa, de acordo com a Acta do dia 20 de Maio de 1999, indo um pouco mais longe. Nessa altura teria sido bem mais adequado dar este contributo, que, agora, é fora de tempo, embora nos permita travar o debate que estamos hoje aqui a ter.
De facto, o que tem sentido é falar de uma diferença na prática e na definição de uma estratégia que vai da prevenção criminal à coordenação operacional de forças até à actuação repressiva, desde a actuação das polícias ao exercício das competências próprias dos tribunais e dos sistemas prisional e de reinserção social. Essa coordenação e essa intervenção num quadro diferente, em que, de facto, a segurança e a liberdade dos cidadãos estão a par e passo, são óbvias quer no quadro da intervenção normativa, quer no quadro da coordenação operacional, quer, sobretudo, no quadro das medidas concretas que têm reflexos no funcionamento das forças e na vida dos cidadãos.
Desde logo, no quadro normativo, bastará dar três ou quatro exemplos. O Sr. Ministro da Justiça disse, aquando do debate do Programa do Governo, que mais importante do que fazer as leis necessárias é tomar as medidas operacionais, é introduzir as mudanças desejadas no funcionamento da estratégia de combate à criminalidade e da segurança interna.
Foi, de facto, o Governo do Partido Socialista que, em 1999, fez aprovar uma lei tutelar educativa e um regime aplicável às crianças e jovens em risco, que veio substituir um modelo de protecção que datava, na sua génese, de 1911. Foi este trazer dos conceitos de princípio de século para a realidade do virar do século que o Governo do Partido Socialista fez na Legislatura anterior e, agora, nesta Legislatura, coordenadamente, com a intervenção dos Ministérios da Justiça, do Trabalho e da Solidariedade, e da Administração Interna, tem desenvolvido um trabalho intenso que permitirá pôr em vigor, adequadamente, a lei tutelar educativa e a lei de protecção de crianças e jovens em risco já no próximo dia 1 de Janeiro de 2001.
Foi também já este Governo do Partido Socialista que trouxe não um conjunto desgarrado de boas intenções mas, sim, a Lei da Organização da Investigação Criminal, que estabelece desde um sistema integrado de investigação criminal a mecanismos de direcção política das forças responsáveis pela investigação criminal à coordenação operacional, quer de carácter nacional, quer de carácter descentralizado, ao nível das estruturas descentralizadas da

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Polícia Judiciária, da PSP e da GNR. É nesta lei de investigação criminal que se prevê designadamente a existência de oficiais de ligação da GNR e da PSP junto dos laboratórios de polícia científica e do Instituto Nacional de Polícia Científica e Ciências Criminais.
Foi ainda o Governo a que me orgulho de pertencer que, na semana passada, após a aprovação da Lei da Organização da Investigação Criminal e, como foi dito, adequadamente no debate de Junho, não só pôs desde já a funcionar o conselho coordenador previsto na lei como, no último Conselho de Ministros, aprovou a Lei Orgânica da Polícia Judiciária que a adequa aos novos desafios de uma polícia científica, de uma polícia do século XXI, de uma polícia apta aos desafios das novas formas de criminalidade e a assumir as competências que, no quadro da Lei da Organização da Investigação Criminal, lhe cabem, e não outras, no quadro de um efectivo reforço de competências operacionais, de polícias de proximidade com responsabilidades também no domínio da investigação criminal, como a PSP e a GNR.
No domínio da prevenção criminal, de que aqui se falou esparsamente, foi também este Governo, num trabalho conjunto que envolveu os Ministérios da Justiça, da Administração Interna, do Trabalho e da Solidariedade, da Educação, a Secretaria de Estado da Juventude, que elaborou um programa de intervenção e de prevenção da delinquência juvenil em 50 bairros dos distritos de Lisboa, Porto e Setúbal, identificados como de particular fragilidade, com recurso a mecanismos como o dos mediadores sociais e numa intervenção interdisciplinar que é hoje preventiva da criminalidade de amanhã.
Passemos a domínios não normativos mas operacionais, que, a determinada altura, foram aqui falados.
Foi neste ano de 2000 que, em sucessivos despachos de descongelamento, se previu a entrada na Polícia Judiciária de quase 0,5 milhar de novos efectivos entre pessoal de investigação criminal, de polícia científica e de segurança.
É este Governo que, no quadro do novo modelo de investigação criminal, exige, para ingresso na carreira de investigação criminal da Polícia Judiciária, que as pessoas detenham uma licenciatura não só em Direito, como é clássico, mas também em outras áreas, como em Química, Biologia, Engenharia, Farmácia, adequadas a tratar os desafios complexos de novos modelos de criminalidade, designadamente de criminalidade económica. Os Srs. Deputados estão, aliás, convidados a estar presentes, no próximo dia 20 de Outubro, na abertura da nova directoria da Polícia Judiciária do Porto, que é a estrutura mais moderna e que corresponde ao mais significativo investimento operacional de meios físicos, neste caso em torno da Polícia Judiciária.
É também coordenação reformar o Código de Processo Civil, libertando a PSP e a GNR de aproximadamente 400 000 notificações/ano e que distraem os agentes da Polícia de Segurança Pública e da GNR de tarefas de policiamento que se inserem nas suas competências.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Finalmente!

O Orador: - Quando o Partido Socialista chegou ao Governo Portugal era condenado pelo Comité de Tortura das Nações Unidas pelas condições do seu sistema prisional e por ter uma sobrelotação do mesmo de 60%;…

Vozes do CDS-PP: - E agora?!

O Orador: - … hoje, a sobrelotação do sistema prisional é apenas de 11% e estamos a caminho de acabar com ela no quadro desta Legislatura, e o que hoje se faz no tratamento diferenciado de detidos em nada corresponde a essa situação vergonhosa e justamente denunciada pelo Sr. Provedor de Justiça cessante.
Estou a dar-vos um quadro vasto de elementos de coordenação e de actuação,…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Um quadro cor-de-rosa!

O Orador: - … mas podem ter outros exemplos, como - e lastimável ouvir - como a situação dramática do Tribunal da Boa Hora ou das varas criminais do Porto. O que esteve em discussão este ano no Conselho Superior da Magistratura foi a eventual extinção de varas criminais em Lisboa e no Porto exactamente pelo esforço de recuperação de pendências resultante dos meios adicionais que a esses tribunais criminais foram concedidos e que permitiram estar, neste momento, a julgar já crimes ocorridos e investigados ao longo deste ano.
A coordenação faz-se normativamente, operacionalmente e com medidas concretas que revelem a capacidade de trabalho conjugado entre a Polícia Judiciária, a Polícia de Segurança Pública, a GNR e, quando necessário, órgãos de polícia criminal de competência especializada. Isto não se faz com demagogia!
Agradeço a quem permitiu trazer a este debate uma questão nacional que exige um largo consenso para o desafio que foi feito para que este ano. E o Governo está disponível para trabalhar em conjunto, tal como na sessão anterior se trabalhou em torno da Lei da Organização da Investigação Criminal, com todas as bancadas, em torno da lei-quadro do regime das forças de segurança.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministério da Justiça, quero, em primeiro lugar, dizer que, nos vários debates que se travaram nesta Assembleia, desde o início da democracia, o CDS-PP esteve sempre presente, teve sempre opinião e foi sempre representado pelos seus Deputados, e, neste sentido, é uma instituição, independentemente dos que cá estavam, em momentos diferentes da sua história.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Para além disto, quando o Sr. Secretário de Estado começou a falar na proposta errada no momento errado, fiquei na dúvida sobre se o Sr. Secretário de Estado - meu ex-colega e meu ilustre amigo - não estaria ainda a recordar-se do tempo em que era Comissário Nacional para a Regionalização.

Risos do CDS-PP.

De facto, aí, é que era a proposta errada, no momento errado, com as ideias erradas…

Aplausos do CDS-PP.

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O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - E o homem errado!

O Orador: - Nessa altura é que tudo estava completamente errado!

Aplausos do CDS-PP.

Parece-me que lhe ficou essa marca.
Em termos concretos, indo directamente àquilo que nos interessa, tudo o que disse é muito bonito - poder-se-á estar melhor nas prisões, poder-se-á estar pior, há imensas coisas bonitas e importantes. Mas há questões muito concretas em termos criminais, como estas: qual é o quadro de agentes de investigação criminal? Ele é ou não de 2435 agentes? Qual é o grau de preenchimento desse quadro?

O Sr. Presidente: - Agradeço que abrevie, Sr. Deputado, pois já não dispõe de tempo.

O Orador: - Sr. Presidente, para terminar, pergunto ao Sr. Secretário de Estado se, coordenadamente, nos consegue dizer se o Governo vai ou não pagar os subsídios de turno e de piquete, porque ainda não o conseguimos saber até este momento.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, meu caro amigo Deputado Telmo Correia, muito rapidamente, não vale a pena fugirmos ao debate que aqui nos traz hoje. Ao outro, quando quiser, tê-lo-emos onde for necessário.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Ainda?!

O Orador: - Quanto ao debate que aqui nos traz hoje, devo dizer-lhe que, só este ano, houve mais de quatro centenas de descongelamento de vagas para novos efectivos para a Polícia Judiciária,…

Vozes do CDS-PP: - Mas continua na mesma!

O Orador: - … desde pessoal de investigação criminal a pessoal de segurança, passando pelo pessoal dos laboratórios de polícia científica, dando aso a um processo, que é já hoje evidente, de recuperação de atrasos, designadamente, nos laboratórios de polícia científica. E é por isso que a nova Lei Orgânica da Polícia Judiciária, aprovada a semana passada em Conselho de Ministros, significa um passo mais no aprofundamento desta estratégia de preenchimento dos quadros necessários para uma polícia, não aquela que foi deixada pela bancada ao vosso lado, o PSD, com menos de metade dos lugares do quadro de investigação criminal preenchidos,…

Protestos do PSD.

… mas, sim, uma situação, que hoje já é diferente, que corresponde a mais de quatro centenas de lugares abertos - só este ano - e que será reforçada com a nova lei orgânica da investigação criminal.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - O que é que fizeram em seis anos?!

O Orador: - Quanto aos meios que referiu, o Governo respeita a lei e compreende o que significa «a lei dever ser regulamentada». Coordenação não significa, aqui, confusão de competências.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - E os subsídios?!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, posso concluir que chegámos ao fim dos nossos trabalhos por hoje.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Sr. Presidente, requereremos a votação do projecto de lei n.º 302/VIII.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, temos, então, de…

Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Secretário de Estado.

Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, o Sr. Ministro da Administração Interna deseja ainda usar da palavra nos termos regimentais.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro da Administração Interna tem a palavra para uma intervenção.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei muito breve, pois apenas gostaria de reafirmar, perante a Câmara, em nome do Governo e, em particular, do Ministério da Administração Interna, a segurança dos cidadãos como a primeira prioridade das minhas preocupações.

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Devo dizer que a actividade legislativa neste âmbito não se esgota na forma como encaro esta tarefa, que é de âmbito nacional, reafirmando a abertura e o interesse do Governo na procura de objectivos estratégicos que possam ser consensualizados nesta Câmara, tratando o problema da segurança como uma questão nacional, que é,…

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … nem mostrando, desde já e uma vez mais, o interesse do Governo em procurar, durante a sessão legislativa, vir a esta Câmara com uma lei de regime da segurança interna.
Quero reafirmar o empenhamento do Governo em trabalhar, quotidianamente, em torno de alguns objectivos

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fundamentais, não só continuando aquilo que tem sido feito ao nível do aumento e do reforço de efectivos - não vale a pena voltarmos à questão dos números -, ao nível da modernização das estruturas, mas inovando alguma coisa em duas outras áreas que me parecem absolutamente fundamentais e que são a da motivação das pessoas e a do planeamento estratégico,…

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … para que possamos tratar a segurança interna como aquilo que ela é: uma questão de Estado!

Aplausos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Para uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Tivemos aqui, hoje, pela primeira vez, o Sr. Ministro da Administração Interna e ouvimos a sua intervenção, deixando-nos algumas orientações sobre aquilo que pretende implementar no âmbito da segurança interna. Mas quero dizer-lhe, Sr. Ministro, que não ultrapassou algumas das nossas preocupações e das nossas dúvidas, designadamente a solução que está a ser implementada no âmbito da Lei da Organização da Investigação Criminal, no que respeita à coordenação.
Em declaração de voto, que apresentámos aquando da votação dessa lei - a qual tinha, obviamente, aspectos meritórios e, por isso, apenas nos abstivemos, não votando contra -, quanto ao aspecto concreto da coordenação, temos grandes receios de que a solução não seja a melhor, porquanto há neste órgão coordenador uma responsabilidade acrescida dado ter uma bicefalia na sua chefia: tem dois ministros a presidirem ex aequo, que têm de estar sempre, a cada momento, em inteira convergência, sob pena de a coordenação ser a descoordenação e de termos de pensar em órgãos coordenadores dos órgãos coordenadores, e nunca mais saímos deste ciclo.
Portanto, quero deixar aqui clara a nossa preocupação relativamente a esta solução. Fizemos as críticas que tínhamos a fazer e as reservas que adiantámos em relação ao projecto de lei apresentado pelo CDS-PP, mas a verdade é que a solução que está a ser implementada pelo Governo não vai, do nosso ponto de vista, resolver a questão.
Finalmente, em relação ao problema dos subsídios de turno e de piquete da PSP, continua a não ser clara a posição do Governo sobre esta matéria, e nós queríamos muita clareza nessa questão. É uma lei da República, aprovada nesta Câmara, e o Governo só tem duas hipóteses: ou cumpre a lei e este é o momento azado para o fazer, na medida em que vai apresentar a proposta de lei do Orçamento do Estado à Assembleia da República - e é aqui que tem de prever o cabimento e as verbas necessárias para cumprir o imperativo de uma lei aqui aprovada -, ou, se efectivamente discorda dessa lei, apresente uma proposta de lei à Assembleia da República a revogar aquilo que foi aqui estatuído e previsto.
Não há, num Estado de direito, qualquer outra forma de um governo, que tem a responsabilidade primeira de fazer cumprir a lei, entrar em subterfúgios e não querer assumir os ónus das suas decisões. Se a decisão do Governo é não satisfazer estes subsídios que assuma em toda a sua latitude, designadamente, no funcionamento dos meios constitucionais e legais para pôr as coisas no são. Desta forma, ficamos todos esclarecidos de que o Governo não quer atribuir esses subsídios à PSP, e pomos ponto final nesta questão.

Vozes do CDS-PP: - Não pomos nada!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Ponto final neles!

O Orador: - Pomos ponto final na medida em que a Assembleia será soberana. Se a Assembleia aprovar essa proposta de lei teremos de respeitá-la, sem prejuízo de continuarmos a reivindicar a sua manutenção.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Ah!

O Orador: - Finalmente, tendo em conta este acréscimo de competências para a PSP e GNR na área da investigação criminal, gostaria de saber se o Governo vai, efectivamente, implementar uma carreira própria de investigação criminal nestas duas forças de segurança, sob pena de estarmos a desviar efectivos, que são necessários para a segurança, para estas tarefas acrescidas nesta área.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que, na altura em que o debate vai chegando ao fim, é possível contribuir para retirar dele alguma moralidade.
Em meu entender, este foi, sinceramente, um debate útil, porque permitiu, desde logo, demonstrar quais são verdadeiramente as políticas alternativas que os partidos de oposição, que gostam de «falar alto» sobre temas certamente relevantes, e o da segurança é um deles, tiveram para apresentar. E verificámos que, embora o maior partido da oposição, o PSD, não tenha subscrito qualquer projecto de lei nesta conjuntura, porque, à medida que as conjunturas vão mudando, os pontos de vista também vão mudando, o que ele tem para apresentar é a mudança da dependência da tutela da Polícia Judiciária, do Ministério da Justiça para o Ministério da Administração Interna. Fá-la, aliás, de forma franca, fazendo uma transferência directa.
O CDS-PP teve de recorrer a um pouco mais de imaginação, pois não teve, neste momento e nesta conjuntura, a ousadia do PSD. Também quis fazer uma qualquer transferência, mas encapotada pela criação de uma superestrutura de Administração Pública que fizesse a dita direcção integrada das várias forças e serviços de segurança.
Ora, eu até estava à espera que estes partidos, nesta lógica concentracionária…

Risos do CDS-PP.

… em que agora se apresentam, também viessem hoje, aqui, apresentar a subordinação do Ministério Público ao

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Ministério da Administração Interna, porque assim, na mesma lógica e na mesma suposta coerência, todo o trabalho de combate ao crime ficaria verdadeiramente unificado, ficaria debaixo de uma mesma e única dependência.

Protestos do CDS-PP.

É claro que os Srs. Deputados registaram a caricatura do meu exemplo; só que a caricatura do meu exemplo faz caricatura da falta de coerência e de consistência das vossas próprias posições. E aqui, Srs. Deputados, o que porventura interessa relevar é o sentido que precisamos de dar a um conjunto de forças e de serviços de segurança que numa sociedade, evidentemente complexa, tem complexidades a desempenhar.
Na área da investigação, habituámo-nos durante muito tempo a considerar a investigação como uma função praticamente exclusiva da Polícia Judiciária. Mas, hoje, tivemos de concluir que, pelo regime anterior, onde, por ausência designadamente de cobertura territorial da Polícia Judiciária, não era possível fazer para muitos tipos de crimes…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Foi o caso de Chaves!

O Orador: - … uma investigação de vizinhança adequada, também era necessário atribuir responsabilidades de investigação às outras forças de segurança, mormente à Polícia de Segurança Pública e à Guarda Nacional Republicana. Mas isto, que, em governos e em momentos anteriores, foi acontecendo de forma atrabiliária, sem uma verdadeira coordenação das áreas de delimitação de competência investigatória, está agora plasmado na lei, com uma adequada inserção, quer territorial, quer funcional, da delimitação das competências de investigação. E isto é feito não prejudicando mas, antes, valorizando o esforço de polícia científica que, no domínio da investigação, é cada vez mais premente e necessária e que, obviamente, deve merecer o maior aprofundamento e a maior especialização, designadamente ao nível dos laboratórios de investigação e do sistema de informações integrado no quadro da Polícia Judiciária.
Por outro lado, Srs. Deputados, não se pode pedir às polícias que desempenhem todas as mesmas funções!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Essa é inteligente!

O Orador: - E há, obviamente, nas forças de segurança, domínios de prevenção geral em matéria de segurança e também actividades de repressão concreta relativamente ao crime que, naturalmente, lhes incumbem, devendo haver aí também matérias a estabelecer adequadamente em termos da divisão de cobertura territorial do País.
Há, para além disto, como aqui já foi sublinhado noutras intervenções, a componente do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e de outros serviços tão relevantes como o próprio Serviço de Informações de Segurança. É, obviamente, necessário estabelecer mecanismos de coordenação respeitando a vocação funcional de cada uma destas instituições.
Ora, o que acontece aqui é que o CDS-PP - e gostaria de voltar a sublinhá-lo - trouxe a aparência de uma solução, porque a verdade é que, ao querer uma direcção nacional das forças de segurança, nada mais fez do que dar-lhe uma pequena roupagem distinta, eliminando, entretanto, o Conselho Superior de Segurança Interna, que existe actualmente,…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - E que não serve para nada! Se não acredita, vá ver as actas das reuniões!

O Orador: - … e criando o conselho de planeamento e coordenação por eliminação do Gabinete Coordenador de Segurança.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Mas as funções são diferentes!

O Orador: - O mais que o Sr. Deputado Paulo Portas aqui veio dizer é que os órgãos actualmente existentes funcionam, digamos, com uma eficácia duvidosa.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Não funcionam! São consultivos!

O Orador: - Ora bem, tivessem o Sr. Deputado Paulo Portas e o CDS-PP a possibilidade de demonstrar aqui que aquilo que importa é dotar de eficiência os organismos existentes, poderíamos ter discutido nessa base. Porém, o Sr. Deputado Paulo Portas, para além de umas alegações abstractas sobre o tema, acerca disso não fez qualquer demonstração de prova; e, portanto, ao limitar-se apenas a mudar os nomes às coisas, como já vi fazer no passado em certas circunstâncias, quis alterar nominativamente certas realidades, mas, verdadeiramente, não teve a coragem de apresentar uma visão estrutural da organização das nossas forças de segurança.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Exactamente porque não teve esse fôlego é que acabou por apresentar um projecto de lei que, de acordo com a sua própria designação, é um projecto de bases gerais de coordenação.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Com certeza!

O Orador: - Como se demonstrou neste debate, a Constituição da República pede outra coisa, pede a definição de um regime integrado das forças de segurança; pede uma lei estatutária. Ora, a questão fundamental em torno desta lei estatutária é saber se ela serve para dar harmonia e integrar o esforço legislativo já feito nas várias formas de adaptação e de coordenação das forças e serviços já existentes ou se, pelo contrário, serve apenas para criar uma espécie de ideia de que é preciso fazer uma qualquer ruptura para fingir que «agora é que vai começar o dia».
Demonstraram as «alternativas» das oposições de que, verdadeiramente, não tinham alternativa!

O Sr. António Dias Baptista (PS): - Muito bem!

O Orador: - Vale, então, a pena continuar a trabalhar com um espírito de ambição em criar um sistema coerente, mas um sistema coerente que se alicerce no trabalho feito até agora e não denegando o esforço desse mesmo trabalho.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - É por isso que quero terminar saudando o anúncio aqui feito pelo Sr. Ministro da Administração Interna: teremos ainda nesta Sessão Legislativa ocasião para apreciar aquilo que agora as oposições revelaram não ter fôlego para apresentar, ou seja, uma lei de regime das nossas forças de segurança.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Isso a Constituição não pede!

O Orador: - Como também aqui foi dito pela bancada do Governo, e a bancada do PS sublinhou, queremos fazer este trabalho e contribuir para ele num clima que promova o maior consenso nacional em torno da definição desse mesmo regime. Tal significa, Srs. Deputados da oposição, que, doravante, não basta «falar alto» em matéria de segurança, é preciso falar bem, falar com rigor e com o sentido das verdadeiras necessidades e exigências do País.

Aplausos do PS.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Então, por que é que fala assim?!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por encerrado o debate e penso que podemos passar à votação…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, esperei pelo fim do debate, que V. Ex.ª anunciou agora, para colocar à consideração da Mesa um insólito que nos é revelado hoje no boletim informativo n.º 007, na parte que se refere aos trabalhos parlamentares de amanhã. O que se passa é que na pág. 15 diz-se que amanhã, nesta Câmara, mais propriamente na Sala do Senado, terá lugar uma sessão com uma delegação parlamentar da Assembleia Nacional da Bulgária, com a cooperação - veja bem, Sr. Presidente - da Assembleia da República, da região administrativa de Coimbra e da Comissão de Coordenação da Região Centro. Ora, Sr. Presidente, como não quero acreditar que isto seja provocatório, há aqui, seguramente, um lapso que em nada prestigia esta Câmara e que até é pouco pedagógico, uma vez que a visita parlamentar que recebemos da Assembleia Nacional da Bulgária é uma viagem de estudo. Como tal, destacando este formalismo erróneo, cumpre dizer que a apresentação dos trabalhos parlamentares deveria ser objecto de maior cuidado e rigor por parte desta Câmara.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, só posso dizer que estou, de facto, inocente, o que, dada a minha idade, já não é fácil! De todo o modo, gostaria que alguém explicasse o que é que isto quer dizer.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): - Talvez o secretário de estado da regionalização!

O Sr. Luís Marques de Guedes (PSD): - Sr. Presidente, num primeiro momento, cheguei a pensar que seria um tributo a V. Ex.ª, tendo em conta a sua ligação a Coimbra, mas, de facto, o Sr. Presidente está inocente!

O Sr. Presidente: - Estou tão inocente que, embora seja capaz de muitos esforços por Coimbra, nem sequer isso se passou, Sr. Deputado!

O Sr. Ricardo Castanheira (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Ricardo Castanheira (PS): - Sr. Presidente, quero tão-somente explicar que isto se deve a um lapso dos serviços de tradução da Assembleia da República, uma vez que o documento que foi enviado para S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República estava redigido em inglês, já que isto é uma organização de uma fundação europeia. Assim sendo, onde em inglês se dizia Câmara Municipal de Coimbra, passou a dizer-se em português região administrativa de Coimbra. O lapso deve-se tão-somente a isto, mas, ainda assim, é sempre um tributo ao Sr. Presidente, Dr. Almeida Santos.

O Sr. Presidente: - Agradeço-lhe muito, Sr. Deputado.
É esta a explicação que temos, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, mas não sei se é suficiente, mas de qualquer modo…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, tendo sido a minha curiosidade alertada por aquilo que referiu o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, não pude deixar de reparar que há aqui dois oradores por parte da Assembleia da República que são designados de Coordenadores da Comissão de Administração e Ordenamento do Território, Poder Local e Ambiente. Ora, eu desconheço a existência de coordenadores de uma comissão; poderá haver coordenadores dos vários partidos numa comissão, mas coordenadores de uma comissão não existem certamente, e aqui não será, estou certo disso, um problema de tradução.

Risos.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, sou, juntamente com o Sr. Deputado Ricardo Castanheira, uma das pessoas que tem muito gosto em convidar os Srs. Parlamentares búlgaros a estarem presentes na Assembleia da República e a explicação que posso dar para isso é simples. Acabo de ter conhecimento do texto constante do boletim como os demais Deputados, mas, na versão em inglês, identificam-se claramente os dois oradores, os Srs. Deputados Casimiro Ramos e João Sá, como coordenadores dos respectivos partidos na Comissão.
Infelizmente, se calhar, valeria a pena conferir, mais que não fosse com os anfitriões ou com os Deputados que convidam, as traduções, mas estou certo que não foi por má fé.

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O Sr. Presidente: - Ninguém põe em causa a boa ou má fé, Sr. Deputado, mas a verdade é que temos de melhorar os serviços de tradução da Assembleia da República, já que há muito tempo verificamos que estão deficientes, embora deva louvar o esforço de quem trabalha neste domínio.
De qualquer modo, a mim não me absorve o facto de o documento ter chegado em inglês, porque, não sendo eu muito versado em inglês, também não sou tão pouco que não perceba o que se diz nessa língua. Acabo por concluir que o li com pouca atenção, pelo que peço desculpa.
Srs. Deputados, vamos, então, proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 302/VIII - Estabelece as bases gerais da coordenação, equipamento, reorganização e reestruturação das forças de segurança (CDS-PP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP, de Os Verdes e do BE, votos a favor do CDS-PP e a abstenção do PSD.

Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se amanhã, às 15 horas, e terá como ordem de trabalhos a apreciação do projecto de resolução n.º 78/VIII (Comissão de Assuntos Europeus) e do projecto de lei n.º 301/VIII (PSD).
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
António Alves Marques Júnior
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Carlos Lourenço Tavares Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro dos Santos Amaro
Ana Maria Martins Narciso
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
João Bosco Soares Mota Amaral
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
José David Gomes Justino
José Manuel Durão Barroso
Lucília Maria Samoreno Ferra
Pedro Manuel Cruz Roseta

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
António Fernando Marques Ribeiro Reis
Carlos Alberto Dias dos Santos
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Manuel Francisco dos Santos Valente
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Vítor Manuel Alves Peixoto

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
David Jorge Mascarenhas dos Santos
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Maria Eduarda de Almeida Azevedo

Partido Popular (CDS-PP):
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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