O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 543

Quinta-feira, 26 de Outubro de 2000 I Série - Número 15

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 25 DE OUTUBRO DE 2000

Presidente: Ex.mo Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte

Secretários: Ex. mos Srs. José Ernesto Figueira dos Reis
Manuel Alves de Oliveira
António João Rodeia Machado
António José Carlos Pinho

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 50/VIII e das apreciações parlamentares n.os 31/VIII e 32/VIII.
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Ética, relativo à retoma de mandato de um Deputado do CDS-PP.
Foi discutido, na generalidade, o projecto de lei n.º 243/VIII - Lei de bases da política de família (PSD), tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Trabalho e da Solidariedade (Rui Cunha), os Srs. Deputados Maria Eduarda Azevedo (PSD), Margarida Botelho (PCP), Isabel Barata, Margarida Rocha Gariso e Maria de Belém Roseira (PS), Ana Manso (PSD), Luís Fazenda (BE), João Rebelo (CDS-PP), Maria Celeste Correia (PS), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) e Sónia Fertuzinhos e Maria do Rosário Carneiro (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 30 minutos.

Página 544

0544 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos José Gonçalves Vieira de Matos
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Eduardo Ribeiro Pereira
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco D'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Barbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rodrigues Pereira dos Penedos
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António dos Santos
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino
Maria Luísa Silva Vasconcelos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António de Carvalho Martins
António D'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Manuel Marta Gonçalves
Domingos Duarte Lima
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho

Página 545

0545 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Santos Pereira
Francisco Augusto Caimoto Amaral
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maçãs
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Fernando da Silva Rio
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Cândido Capela Dias
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Natália Gomes Filipe
Maria Odete dos Santos
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello Branco
António de Magalhães Pires de Lima
António José Carlos Pinho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

Bloco de Esquerda (BE):
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas que deram entrada na Mesa.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, a proposta de lei n.º 50/VIII - Autoriza o Governo a alterar o Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, que estabelece o regime jurídico da urbanização e da edificação, que baixou à 1.ª Comissão, e as apreciações parlamentares n.os 31/VIII (PSD) e 32/VIII (PCP), relativas ao Decreto-Lei n.º 242/2000, de 26 de Setembro, que altera o Decreto-Lei n.º 72/91, de 8 de Fevereiro (regula a autorização de introdução no mercado, o fabrico, a comercialização e a comparticipação de medicamentos de uso humano.
Em matéria de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (José Reis): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o relatório e parecer da Comissão de Ética refere-se à retoma de mandato do Sr. Deputado António Pires de Lima (CDS-PP), em 23 de Outubro corrente, inclusive, cessando Herculano Gonçalves.
O parecer da Comissão de Ética é no sentido de admitir a retoma de mandato em causa, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Sr.as e Srs. Deputados, por agendamento potestativo do PSD, vamos proceder à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 243/VIII - Lei de bases da política de família (PSD),.
Para iniciar o debate, tem a palavra a Sr. Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Numa sociedade em permanen

Página 546

0546 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

te e acelerada mutação, em que os padrões cívicos e comportamentais têm vindo a enfrentar rápidas e profundas convulsões, o grau de perenidade e a sustentabilidade da família estão naturalmente em risco.
No entanto, a família continua a representar o primeiro e mais marcante espaço de realização, desenvolvimento e consolidação da personalidade humana, no qual o indivíduo se afirma, enquanto pessoa e cidadão.
Mais ainda, a família é também o veículo duradouro de convivência natural e solidária entre diferentes gerações e, bem assim, o núcleo transmissor de princípios éticos, cívicos, sociais e educacionais.
A família deve, pois, constituir para todas as pessoas o lugar privilegiado de criação, crescimento e autonomia, de livre expressão de afectos, de realização e de liberdade. Por isso, é um imperativo político preservar um espaço tão vital para o desenvolvimento das pessoas e da comunidade, onde, em primeira instância, se inculcam valores basilares para a convivência em sociedade e para a coesão do tecido social.
Vivemos hoje uma época em que a aceleração dos ritmos de vida, a dinâmica própria da sociedade de consumo, a competição desenfreada e a obsessão pelos referenciais económicos conduzem à proliferação de mecanismos de desagregação da instituição família e a um quase convite para forças centrífugas no seu seio.
Todavia, muitos de nós reconhecem que é no âmbito da família que melhor poderão conciliar-se as linguagens da razão e do afecto, os deveres sociais com a afirmação individual, a noção de justiça com a assunção da liberdade.
Daí que a família seja - e deva continuar a ser - o fundamento de uma visão humanista da sociedade, o repositório dos valores dos povos, a escola básica de transmissão desses valores e a primeira célula de vivência afectiva, relacional, social, cultural, que permite o desenvolvimento harmonioso da pessoa humana.
E enquanto «célula básica e vital da sociedade», com uma função insubstituível, como núcleo de transmissão da vida e como centro primário de educação, há que reinserir e centrar a família no próprio processo de desenvolvimento, reconhecendo-a como sujeito activo de intervenção social e económica e não como simples destinatário passivo de medidas assistenciais de carácter fragmentado e pontual.
A família preenche hoje, como no passado, uma imensa gama de funções que os poderes públicos não podem, nem devem, substituir.
Ao Estado não cabe funcionalizar, tentaculizar ou sufocar a família, mas, pelo contrário, compete-lhe tutelar e promover a identidade, a vitalidade e os espaços de organização, autonomia e liberdade, próprios da instituição familiar.
Aliás, o Estado democrático moderno deve definitivamente assumir a família como o elemento nuclear da sociedade e como o espaço natural de realização da pessoa humana e da solidariedade entre gerações.
De facto, importa ter consciência de que não há solidariedade nacional sem solidariedade social.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Não há solidariedade social sem solidariedade geracional. Não há solidariedade geracional sem solidariedade familiar.
Assim, impõe-se criar condições que garantam a globalidade, a compatibilização e a integração das várias políticas sectoriais com incidência na vida das famílias, conferindo-lhes dimensão familiar consentânea.
Visto que a família funciona como o mais genuíno «barómetro» social e económico das sociedades, uma política de família significa centrar nesta o fundamento natural e o ângulo por excelência da análise e da busca de soluções para os problemas das pessoas.
No essencial, importa ter consciência de que o progresso da humanidade passará sempre pela família e de que todas as soluções que a ignorem ou minimizem continuarão condenadas ao fracasso ou ao efémero.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ciente do papel insubstituível e central das famílias portuguesas no desenvolvimento humano e na revitalização da nossa sociedade, o Partido Social Democrata acredita na profunda necessidade de o País adoptar uma lei de bases da política de família, verdadeiro alfobre de uma política de família séria e sustentada.
Nessa mesma linha, o Partido Social Democrata apresentou, na passada sessão legislativa, a esta Assembleia um pacote de medidas sensíveis, tendente a cobrir domínios de patente vulnerabilidade na área envolvente da família, procurando dar resposta política consequente, num terreno em que Governo evidenciava, e evidencia, uma clamorosa apatia e uma insuportável inércia.
Nesta iniciativa, demos especial importância e prioridade ao acolhimento dos idosos na família; à maternidade e paternidade em relação a filhos com deficiência; à especificidade das famílias numerosas; à conciliação entre a vida familiar e profissional; ao incentivo à natalidade.
Todavia, este pacote de projectos mereceu a velha sentença da «esquerda unida»…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Esquerda unida?!

A Oradora: - … e, numa postura concertada de «bota-abaixo», foi pura e simplesmente rejeitada por este Parlamento.
O registo histórico deste arcaísmo político ficou devidamente lavrado nos anais desta Assembleia - e fará história, obviamente dito.
Mas o que continua a ser relevante e vital para a maioria dos portugueses é olhar para o futuro. Por isso, o Partido Social Democrata apresenta, novamente - é reincidente, se assim quiserem -, a esta Câmara um projecto de lei de bases da política de família, diploma que encerra os princípios fundamentais orientadores de uma política que facilite a coesão da célula familiar, promova uma maior equidade na repartição da riqueza entre as famílias e estabeleça o equilíbrio e a harmonia entre gerações no seio da família.
A presente lei de bases da política da família é bem o reflexo da importância que o Partido Social Democrata dá às questões sociais e a sua apresentação é prova de responsabilidade política e democrática. E fá-lo, na firme convicção de que, na presente Legislatura, a instituição família continuará a não constituir uma prioridade política nem do Governo, nem do Grupo Parlamentar do PS.
De facto, a tradição política do Partido Socialista demonstra à saciedade que o seu código genético é manifestamente adverso, senão mesmo alérgico, à instituição família.
Todavia, quando foi necessário ganhar o poder, quando foi necessário conquistar o coração do eleitorado do

Página 547

0547 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

centro, o Eng.º Guterres, na linha de que os fins justificavam os meios, meteu a família no cocktail dos Estados Gerais. Então, a contragosto, o PS calou e aguardou pela sua oportunidade de retomar a velha agenda.
E foi assim que a esta paixoneta passageira se sucedeu a proclamação de umas tantas «pias intenções» e a utilização da família para ornamentar discursos e produzir efeitos especiais altamente mediatizados.
No final, foi sem surpresas que a verdadeira agenda socialista acabou por vir ao de cima. Então sucedeu-se o ciclo dos pretensos projectos-bandeira: as uniões de facto mascaravam as uniões de homossexuais; a descriminalização do aborto; a descriminalização da droga, projectos que então dividiram - como hoje continuam ainda a fracturar - a sociedade portuguesa. Um bom trabalho e um bom serviço às famílias!
Mas, mais recentemente, o segundo Governo do Eng.º Guterres foi ainda mais longe, se é possível, e por omissão, por acção irreflectida, inaugurou um novo ciclo - pasme-se! - de penalização das famílias portuguesas.
Lembremo-nos da redução da bonificação das taxas de juro nos empréstimos para aquisição da casa de morada de família, e estamos falados!
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Contra esta ultrapassada lógica política quase anti-família é premente operar uma decisiva viragem política e repor a família no centro das futuras políticas públicas. Tanto mais que, no horizonte de apenas duas décadas, a transformação do perfil demográfico da sociedade portuguesa o irá manifestamente exigir.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A futura agenda política do País reclama uma política dirigida à família, de matriz transversal, coerente e integrada. Enquanto o Governo se mantiver imobilizado no seu arcaísmo político em matéria de família, o PS está liminarmente fora deste desafio e consigo arrastará a sociedade portuguesa.
No limiar do século XXI, com o Partido Social Democrata a família será, segura e convictamente, um tema da nova agenda política para o País.
É o nosso compromisso, que renovamos com as famílias portuguesas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - No abstracto, muito bem; no concreto é que não!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, para pedir esclarecimentos, inscreveram-se as Sr.as Deputadas Margarida Botelho, Margarida Rocha Gariso e Isabel Barata.
Para formular o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Botelho.

A Sr.ª Margarida Botelho (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, duas questões muito concretas em relação ao vosso projecto de lei.
Uma é sobre a base XXV, onde se refere uma expressão que nos faz alguma impressão, que é a «vida familiar normal». Ora, a nossa questão é a de saber exactamente o que é, para a bancada do PSD, uma «vida familiar normal»,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Boa pergunta!

A Oradora: - … tanto mais que, durante audições, realizadas na legislatura passada, sobre as uniões de facto, chegámos à conclusão, juntamente com vários especialistas, que uma das grandes transformações deste século à volta das questões da família é a de esta deixar de estar centrada nas questões do contrato e passar a estar centrada nas questões da afectividade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - E é um pouco complicado podermos dizer o que é ou não «normal» em questões de afectividade.
A outra questão, também muito concreta, diz respeito à base XIII e prende-se com o direito ao reagrupamento familiar dos imigrantes. É que eles têm um direito cujo exercício preocupa tanto a bancada do PCP que, na recente discussão sobre a lei de imigração, apresentámos uma proposta de alteração que garantia mais direitos ao reagrupamento familiar de imigrantes e, em relação a esta proposta do PCP, as bancadas do PS, do PSD e do CDS-PP votaram contra!
A nossa pergunta é esta: qual é a diferença entre os emigrantes, com e, e os imigrantes, com i, no que concerne ao direito ao reagrupamento familiar?

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Margarida Botelho, relativamente à primeira questão, não vou aqui contradizê-la no que respeita à utilização dos termos «vida familiar normal». Se, eventualmente, em vez de «normal» estivesse «tradicional», a Sr.ª Deputada também viria pegar pelo termo. E viria pegar pela simples razão de haver o arquétipo, a ideia, perfeitamente construída, de que o Partido Social Democrata não reconhece as novas formas de vida familiar. E, no entanto, reconhecemos! Já foi dito aqui, e já o provámos várias vezes. Temos a vida familiar normal, no sentido tradicional - o pai, a mãe, o filho e a filha, eventualmente com o cão e com o peixinho, e é uma família feliz -, mas também temos as famílias monoparentais, que reconhecemos,…

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Exactamente!

A Oradora: - … porque não reconhecer é fechar os olhos à realidade. E nós não fechamos os olhos à realidade, sejam elas monoparentais de pai, sejam monoparentais de mãe, merecem-nos todo o nosso apoio!

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Aliás, nós sugerimos medidas em benefício dessas famílias, que merecem tanto apoio quanto as outras. Portanto, não há qualquer forma de discriminação.
Quanto à segunda questão, imigrantes, com i, ou emigrantes, com e (depende da perspectiva em que nos situarmos, se na perspectiva da entrada no País, se na perspectiva da saída do País), uma coisa é certa: as medidas de reagrupamento merecem, por si, em arquétipo, em construção abstracta, todo o nosso apoio. Isso é indiscutível! Só que não podemos estar a ver esse problema destacado

Página 548

0548 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

de uma política global a favor da imigração. Nesse sentido, ou bem que estamos a construir, em conjunto, uma postura e uma política global, condensada, densa, com conteúdo e com substracto, ou bem que estamos a construir uma medida apenas pontual para, de algum modo, agitar a bandeira e tirar ganhos políticos disso mesmo. Com isso, não contem connosco!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Barata.

A Sr.ª Isabel Barata (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Eduarda Azevedo, estamos aqui para debater uma matéria da maior importância para a sociedade portuguesa: a família que, de acordo com a Constituição, é um elemento fundamental da sociedade, tendo assim direito à protecção e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus elementos.
O Governo actual consagrou como uma das suas prioridades programáticas o apoio à família e à igualdade entre homens e mulheres, instituiu o Alto Comissário para a Igualdade e Família, criou o Conselho Nacional de Família e aprovou a Resolução do Conselho de Ministros n.º 7/99, que aprova o plano para uma política global de família.
Ainda como exemplo de algumas das medidas adoptadas por este Governo com repercussões importantes na vida das famílias poderei citar: o rendimento mínimo garantido, como forma de combate à pobreza e à exclusão social; a rede de educação pré-escolar e de creches; o apoio aos idosos, nomeadamente a nível domiciliário e na melhoria da qualidade de funcionamento dos equipamentos sociais; o reforço do apoio à maternidade e à paternidade; o aumento da protecção às crianças em risco; e as políticas de promoção de emprego.
Assim sendo, Sr.ª Deputada Eduarda Azevedo, atendendo a que este projecto de lei que apresentam hoje nada acrescenta ao quadro normativo português, nem implica qualquer melhoria nas políticas relativas à família que estão a ser desenvolvidas pelo Governo, perguntar-lhe-ia se este projecto de lei tem algum outro objectivo, que não o de criar uma lei inócua, na tentativa de fomentar nos cidadãos a convicção errónea de que o PSD está, efectivamente, a contribuir com alguma mais-valia para as famílias portuguesas.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Barata, não posso deixar de lhe dizer que, relativamente à família, é talvez com alguma mágoa que VV. Ex.as - não nós e muito menos a sociedade portuguesa - nunca ouviram o Primeiro-Ministro dizer que tinha a paixão da família. No fundo, em relação à família, não lançou aquelas expressões um pouco de latin lover, como a paixão da educação e a paixão da saúde. Então, por que não a paixão da família?
A verdade é que, na prática, aquilo que a Sr.ª Deputada acabou por mencionar é apenas o conjunto das tais «pias intenções» para realizar no futuro. Mas que futuro? A médio ou a longo prazo, certamente, e as famílias portuguesas não estão na disposição de aceitar esse lapso temporal tão longo e, sobretudo, essa indefinição de reticências.
Além do mais, devo dizer-lhe que a política de família, as medidas esparsas, pontuais, conjunturais de política de família que até agora têm sido desenvolvidas se centram basicamente em licenças de maternidade e de paternidade, licenças de aleitação e pouco mais do que isso. Mas há muito mais! E os idosos? E as crianças com deficiências? Não fará tudo isso parte da política de família? Hoje, a política de família, como eu dizia há pouco com um ar caricatural, em resposta à Sr.ª Deputada Margarida Botelho, apenas engloba verdadeiramente o pai, a mãe, o filho e a filha, se existirem, não esquecendo o cachorro e o passarinho!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Rocha Gariso.

A Sr.ª Margarida Rocha Gariso (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, as posições que o PSD assume sobre a política da família revestem-se de grandes ambiguidades, incoerências e contradições. Na verdade, aquilo que teoricamente preconizam cheios de boas intenções sobre esta matéria esbarra frontalmente com a vossa prática ao longo dos anos, desde o governo PSD até ao presente.
Assim, não se compreende que teoricamente digam defender as famílias e que, na prática, quando se discutem nesta Assembleia as medidas que dão concretização efectiva às necessidades dessas mesmas famílias, o PSD não vote favoravelmente. Sucedeu com a lei de bases da segurança social recentemente aprovada nesta Câmara, onde se consagra o novo sistema de protecção designado protecção à família, um novo regime de prestações familiares, com a adopção do princípio da diferenciação positiva, e o inequívoco apoio às famílias de maior dimensão e com debilidades. Sucedeu também com a proposta de lei de reforma fiscal, que preconiza medidas que beneficiam as famílias, como é o caso do alargamento da dedução das despesas de educação às creches e ao pré-escolar com majoração da dedução no tocante às famílias numerosas, assim como o reforço dos benefícios fiscais à poupança, à habitação e aos seguros de saúde. Relativamente a estas matérias, que, seguramente, têm enorme alcance e importância para as famílias portuguesas, o PSD não vota favoravelmente.
No entanto, a Sr.ª Deputada ainda poderá mostrar aos portugueses que estamos errados ao pensar deste modo sobre a actuação do PSD nesta matéria. Diga-nos, pois, se V. Ex.ª e o restante Grupo Parlamentar do PSD estão na disposição de votar favoravelmente a proposta de Orçamento do Estado para 2001, onde estão incluídas várias medidas, nomeadamente de natureza fiscal, que vão beneficiar claramente as famílias portuguesas, já que estas agradeceriam.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Margarida Gariso, devo dizer-lhe

Página 549

0549 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

que, pelo encaminhar da sua intervenção - que, por sinal, trazia escrita, pelo que não sei se ouviu o que eu disse na minha intervenção -, já calculava que iria redundar no ponto em que redundou, ou seja, que iria perguntar se nós faríamos depender as explicações que viesse agora apresentar da aprovação da proposta de lei do Orçamento.
Ó Sr.ª Deputada, vamos tratar de coisas sérias com honestidade!

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - O Orçamento não é sério?!

A Oradora: - As outras são também coisas sérias, mas têm outra sede e outro momento para serem tratadas. Já não basta, Sr.ª Deputada, que, neste momento, o Hemiciclo esteja bastante vazio? Nunca se perguntou por que é que as questões da família são tratadas essencialmente por mulheres?! Certamente, já fez essa pergunta!
Mas deixe-me ir ao encontro da sua pergunta, sobretudo de um aspecto que gostava de sublinhar. A Sr.ª Deputada deu muita ênfase à questão da fiscalidade e das medidas a favor da família. Diria que o que está em jogo neste momento, com este Governo e com esta suposta reforma fiscal, é, precisamente, uma suposta reforma fiscal. Portanto, não podemos falar de reforma, de «reformazinha» ou de revitalização da fiscalidade, antes pelo contrário. Já agora, deixe-me também acrescentar que mesmo aquilo que está programado, projectado e proposto a família não tem qualquer contemplação. As famílias numerosas, especialmente, não são pouco mais ou menos contempladas.
Sr.ª Deputada, há uma coisa que temos de ter presente, e esta é a grande mensagem que temos no nosso projecto de lei: as políticas públicas devem ter todas como mainstreaming a problemática da família. Quando não têm, Sr.ª Deputada, são uma falácia, um «faz-de-conta»! A menos que, como disse na minha intervenção, o Partido Socialista tenha uma agenda anti-família, defendendo-a da boca para fora, mas, na prática, estando pouco preocupado com ela.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Isso não é verdade!

A Oradora: - Aquilo que a Sr.ª Deputada refere são preconceitos ideológicos, os mesmos preconceitos que tem em relação à segurança, ao poder do Estado, à autoridade do Estado, etc.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei agendado potestivamente pelo PSD hoje em discussão e denominado lei de bases da política de família, em nosso entender, enferma de um erro de base e é desnecessário. Enferma de um erro de base, porque, como o seu próprio nome indica, pretende definir a política de família, competência essa que, em nossa opinião, não pertence à Assembleia da República.
Por outro lado, é desnecessário, porque se limita a repetir o que está já consagrado na Constituição, não significando qualquer desenvolvimento relativamente a esta. Pelo contrário, pode ser visto como uma rearrumação ou uma diferente sistematização em instrumento evidentemente menos nobre daquilo que a Constituição já consagra, o que não pode ser, como é evidente, o objectivo de uma lei de bases.
Dou como exemplo o facto de a base II do projecto de lei, sob a epígrafe «Família e Estado», corresponder ao artigo 36.º da Constituição, da mesma maneira que o direito à participação das famílias através das instituições representativas dos seus interesses representa uma repetição do que já vem consagrado na Constituição, da mesma forma, ainda, que a globalidade e a integração da política de família já vem estabelecida na Constituição e da mesma maneira, também, que o direito à conciliação entre a vida familiar e profissional já vem consagrado no artigo 59.º da Constituição.
Significa isto que estejamos contra a definição de uma política de família? Com certeza que não! Muito pelo contrário! Significa esta nossa posição que o quadro de princípios e de referência estabelecido na Constituição relativamente à família - e, repito, à família - está claramente definido e atribui-lhe mesmo a natureza de elemento fundamental da sociedade. É neste entendimento que, para além de uma disposição específica intitulada «Família» - o artigo 67.º já atrás mencionado -, a nossa Lei Fundamental estabelece em vários dos seus capítulos, designadamente os relativos aos direitos, liberdades e garantias pessoais, aos direitos e deveres económicos, aos direitos e deveres sociais e aos direitos e deveres culturais, disposições específicas dirigidas à família e ao reforço da natureza que começou por lhe atribuir. Nos termos constitucionais, incumbe, em nosso entender, ao Governo definir a política de família. O que fez! Desde logo no seu programa, tanto no do XIII como no do XIV Governos Constitucionais. Submeteu-os à aprovação da Assembleia da República e foram aprovados.
Por outro lado, encontra-se em curso, no desenvolvimento e cumprimento desses programas, a execução do plano para uma política global de família, aprovado pela Resolução de Conselho de Ministros n.º 7/99, de 9 de Fevereiro. Estabelece, pela primeira vez, este plano um conjunto de medidas integradas que conferem as condições práticas de exercício dos direitos constitucionalmente consagrados às famílias, pois é disto que deve agora tratar-se, de exercício de direitos e da atribuição de condições práticas para o exercício de direitos consagrados. Assume-se também, pela primeira vez neste domínio, um compromisso público e publicado de avaliação das políticas desenvolvidas no prazo de dois anos, prazo este ainda não decorrido.
A lógica que presidiu à elaboração deste plano para uma política global de família foi a da transversalidade e a da integração. Efectivamente, uma política global de família não pode ser executada através da mera soma das políticas sectoriais classicamente exercidas, mas através de uma avaliação em termos de impacto na família de cada uma dessas políticas sectoriais e de uma integração dos múltiplos aspectos que elas assumem, com o objectivo de proporcionar respostas globais a problemas globais também.
Tudo isto no desenvolvimento (especificamente neste domínio da família) da execução de políticas sociais, que no anterior governo assentaram no primado do reconhecimento do direito à dignidade através da atribuição a todos

Página 550

0550 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

das condições mínimas de subsistência, e tendo este Governo fixado um novo desígnio nacional - o de ultrapassar, no prazo de uma geração, o atraso estrutural que nos separa do centro da União Europeia -, assumindo que a nova geração das políticas sociais, tendo a família como foco, são um instrumento essencial para alcançar esse desígnio.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Poderá, pois, ser este o tempo e o momento para nos pronunciarmos sobre a oportunidade da política definida, apesar de não estar ainda decorrido o prazo assumido para a sua avaliação. Não nos dispensamos, contudo, de o fazer. Com efeito, alguém tem dúvidas sobre a importância neste domínio da redução das taxas de desemprego, pois que é no exercício de uma actividade que nós nos desenvolvemos e temos capacidade de nos afirmar no contexto individual, familiar e social?
Alguém tem dúvidas sobre a importância do alargamento da rede do pré-escolar e do sistema público de ensino em todos os seus graus como factor inequívoco de investimento nas pessoas e no desenvolvimento das famílias?
Alguém tem dúvidas sobre a importância do alargamento da rede de serviços e equipamentos destinados às crianças, aos adolescentes e jovens e aos dependentes em geral como factor de apoio às famílias?
Alguém tem dúvidas sobre a importância do alargamento do planeamento familiar e da saúde reprodutiva como factores inerentes ao desenvolvimento da maternidade e da paternidade responsáveis?
Alguém tem dúvidas sobre a importância do acesso à habitação adequada como factor essencial de preservação da intimidade pessoal e da privacidade familiar?
Alguém tem dúvidas sobre a importância da conciliação entre a vida familiar e profissional como indispensável à prevenção de tensões e ao desenvolvimento de um ambiente familiar saudável?
Alguém tem dúvidas sobre a importância do combate à violência na família, não só como luta exigida pelo respeito pelos direitos humanos mas também como garantia de criação de um ambiente proporcionador de boas condições de desenvolvimento das pessoas?
Alguém tem dúvidas sobre a importância do reconhecimento social do trabalho não remunerado como factor que induz a partilha de tarefas e o desenvolvimento do respeito mútuo no contexto da instituição familiar?
Alguém tem dúvidas sobre a importância de uma política fiscal que, dirigida à redução das desigualdades, promova o adequado tratamento das famílias, designadamente das famílias numerosas?
Alguém tem dúvidas sobre a importância do reforço do associativismo familiar como indispensável à participação na formulação das políticas dirigidas às famílias como indissociáveis do exercício da actividade cívica que a todos deve mobilizar?
Poderia alongar-me indefinidamente nestas como noutras questões, mas não é ocasião para isso.
O facto de a resposta às mesmas ser inequivocamente negativa significa isso que tudo está conseguido e realizado? Evidentemente que não! Estamos ainda longe de atingir os resultados propostos. Pela sua complexidade e vastidão, a tarefa é demorada em termos de realização.
Por isso, incumbe a esta Câmara esse «sim», o poder e o dever de fiscalizar a acção do Governo, no cumprimento dos objectivos que se propôs.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista não abdica dessa sua competência e desse seu dever de fiscalização da acção do Governo.
Por isso mesmo, assume hoje, nesta Câmara, o compromisso de promover, no próximo ano, e na sequência do termo do prazo fixado na Resolução do Conselho de Ministros n.º 7/99, de 9 de Fevereiro, que aprova o plano para uma política global de família, um debate público que permita aprofundar a avaliação das realizações conseguidas e promover a definição de novas metas calendarizadas, que permitam dar condições práticas às famílias para o exercício dos direitos que a Constituição lhes atribui e reconhece.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, inscreveram-se as Sr.as Deputadas Ana Manso e Maria Eduarda Azevedo.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, começo por agradecer a leitura que fez das várias bases incluídas no nosso projecto de lei de bases da política de família. É certo que no-las leu mais uma vez; no entanto, gostaria de colocar-lhe duas questões.
Primeiro, a Sr.ª Deputada começou por referir que a lei de bases por nós proposta é um erro de base e dispensável, mas depois, ao longo da sua intervenção, veio dizer-nos que, afinal, não tem dúvidas sobre as 33 bases ali referidas. Diz-nos que não está tudo conseguido, que não está tudo realizado e, até, nos convida para um debate público.
A questão que lhe coloco prende-se com o seguinte: o plano para uma política global de família é mais um dos estudos de V. Ex.ª - nisso, tem o top, deve ter atingido o record! -,mas, depois da Resolução do Conselho de Ministros n.º 7/99, de 9 de Fevereiro, que nós saibamos, nada foi acrescentado.
Pergunto: se agora está preocupada com o facto de ter feito um plano para uma política global de família e de este ainda não ter sido concretizado, então por que é que não cria um espaço e não aprova a lei de bases da política de família que estamos a propor? Será por uma questão de teimosia e de birra por parte do Partido Socialista em relação à lei de bases da política de família por nós proposta? Ou será mais uma hipocrisia do Partido Socialista, que fala na família, mas depois não lhe reconhece a dignidade para ter, ela própria, uma lei de bases?
Temos uma Lei de Bases do Sistema Educativo, temos uma Lei de Bases da Saúde, temos uma Lei de Bases da Segurança Social. Por isso, pergunto: então, a família não tem dignidade para ter uma lei de bases?

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Manso, também lhe agradeço as questões colocadas, porque me dão a oportunidade de, mais

Página 551

0551 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

uma vez, fazer precisões, na medida em que me parece que, neste contexto, estamos um pouco baralhada, quer quanto a conceitos quer quanto a conteúdos.
Devo dizer-lhe que aquilo que referi e que li foi aquilo que já consta da Constituição da República e que a vossa lei de bases repete.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Em meu entender, uma lei de bases tem que permitir o desenvolvimento daquilo que já está consagrado na nossa Lei Fundamental. E da mesma maneira que a Sr.ª Deputada referiu que há uma Lei de Bases da Saúde, uma Lei de Bases da Segurança Social e uma Lei de Bases do Sistema Educativo, também é verdade, como disse, que não há uma lei de bases sobre política de saúde, tal como não há uma lei de bases sobre política do sistema educativo, nem uma lei de bases sobre política de segurança social. Foi mesmo aí que eu quis chegar!

Vozes do PS: - Claro!

A Oradora: - Também quero dizer à Sr.ª Deputada que não me importo nada de ser a campeã dos estudos, porque eles fazem muita falta num país como o nosso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Por isso é que se utilizam!

A Oradora: - Penso que a Sr.ª Deputada gostará, com certeza, de ter acesso a bons estudos, tal como eu gosto de ser a sua co-autora ou promotora. Todavia, a Sr.ª Deputada enganou-se, mais uma vez, em relação a estes estudos, porque, nessa altura, eu estava no governo como titular da pasta da saúde, não sendo, pois, responsável pela política de família. Devo, aliás, dizer-lhe que, enquanto responsável sectorial pela saúde, tive todo o gosto em partilhar na elaboração deste documento, que contém um capítulo importantíssimo - sobre o qual, obviamente, podem ser prestadas contas - quanto ao desenvolvimento que mereceu o tema da saúde reprodutiva e do planeamento familiar.
Não se trata, portanto, de hipocrisia, e não se trata de falta de atribuição de um estatuto de dignidade à família. Pelo contrário, aquilo que afirmei é que a família é tão importante - tendo, inclusivamente, esta Casa aprovado, em sede de Constituição, um conjunto de princípios e um quadro de referência -, que uma lei de bases, qualquer que ela seja, nunca pode limitar-se a repetir aquilo que já está consagrado na nossa Lei Fundamental, sob pena de o fazer através de um instrumento menos nobre.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Aquilo que importa, hoje, é dar condições práticas para o exercício desses direitos. Foi para isso que me assumi como fiscalizadora do Governo, ou seja, para avaliar se ele fará aquilo que se comprometeu fazer e para verificar se o fará com a extensão e a qualidade que eu, como cidadã e como Deputada do Partido Socialista, exijo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, deixe-me dizer-lhe, em primeira lugar, que a sensação que tenho é a de que a análise que a Sr.ª Deputada fez do projecto de lei de bases da política de família apresentado pelo Partido Social Democrata foi, essencial e indiscutivelmente, um bom exercício técnico-jurídico. Eventualmente, o sabor do regresso aos bancos de faculdade!…
Mas vou deixar, agora, esse aspecto, que, de resto, é sempre muito saudável intelectualmente, para sublinhar dois pontos fundamentais.
A Sr.ª Deputada colocou a questão em termos da fiscalização que o Parlamento deve fazer quanto à acção do Governo. Quanto a isto, faço-lhe uma pergunta relativamente ociosa: mas que acção do Governo? Essa já foi fiscalizada. Ela é tão escassa que já se viu o que é e aquilo que foi feito.
Contudo, o manancial de coisas a fazer é imenso. E aí, Sr.ª Deputada, como deve calcular, primeiro, não é a Assembleia que se substitui ao Governo, depois, enquanto membro da bancada do Partido Socialista, não venha pedir aos membros da bancada do Partido Social Democrata que apresentem um programa para colmatar as vossas lacunas.
O que está em causa, antes de mais, é reproduzir em texto de lei - lei, essa, com uma dignidade formal e material, que é a lei da Assembleia da República -, e sistematizar, dando um conteúdo ordenado e interligado aos mesmos princípios que encontramos na Constituição. A partir daí, o Governo deve levar isso mesmo à prática.
Portanto, Sr.ª Deputada, deixemo-nos de planos, deixemo-nos de debates, sobretudo quando os planos e os debates são apenas isso! Não me leve a mal quando lhe digo que essa sugestão que acabou de fazer faz-me tremer, porque faz ver que a Sr.ª Deputada, através dessa sua sugestão, pode querer trazer para a área da família aquilo que foi a prática do Governo a que a Sr.ª Deputada pertenceu enquanto ministra da saúde quanto à reprodução de planos e planos, e de grupos e grupos, que faziam relatórios e relatórios… Nós queremos acções concretas. É disso que nós, bem como as famílias portuguesas, temos falta!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, devo dizer-lhe em primeiro lugar que a análise que fiz não se tratou de um mero exercício técnico-jurídico, embora seja sempre bom e estimulante. Isto é, para quem anda há muito tempo arredada da possibilidade de aprofundar os seus conhecimentos de base, evidentemente que se trata de uma situação interessante.
No entanto, não é esse o caso, porque a questão de fundo permanece. Ou seja, não há necessidade de uma lei de bases que se limite a repetir aquilo que está consagrado na Constituição, pelas razões que eu já referi.
Realmente repito-me, na medida em que as questões também se repetiram. Contudo, gostaria de dizer também à Sr.ª Deputada que não basta afirmar que nada foi feito para que nada tenha sido feito.

Página 552

0552 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Isto é, quando se afirma que nada foi feito, e foi feito muito, está-se à partida a entrar num erro de avaliação, para não lhe chamar outra coisa, porque aquilo que considero que deve ser a elegância das relações parlamentares não mo permite. Todavia, quero dizer-lhe que os dados objectivos estão à mostra, são conhecidos, são públicos,…

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Então, publiquem-nos!

A Oradora: - … e o plano para uma política global de família aponta no sentido que a Sr.ª Deputada pretende.
Aliás, porque me pareceu da sua intervenção que a Sr.ª Deputada desconhece esse plano para uma política global de família, tenciono fazer cópia do mesmo para lho entregar, porque todo ele está especificado em termos de medidas e acções concretas, que são aquelas que a Sr.ª Deputada pretende ver realizadas.
Se quer que lhe dê algum exemplos, posso referir-lhe alguns, olhando para esse plano, designadamente nas questões que estão ligadas, por exemplo, à educação, à cultura, à comunicação social e aos tempos livres.
A Sr.ª Deputada conhece com certeza aquilo que tem sido o alargamento da rede do pré-escolar, porque têm sido muitas vezes referidos os números. Não me diga que não se trata de uma medida de apoio à família e que não é uma medida de investimento nas crianças, porque penso que a Sr.ª Deputada estará de acordo com ela!
Da mesma maneira, também a promoção da participação na vida da escola por parte dos pais e encarregados da educação, como a Sr.ª Deputada saberá também, através da nova lei de gestão dos estabelecimentos educativos, foi reforçada.
Correndo um outro capítulo, como, por exemplo, o da saúde, a Sr.ª Deputada sabe que, em termos de alargamento do acesso a consultas de planeamento familiar e das consultas que se prendem com a melhoria dos indicadores da saúde materna,…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr.ª Deputada, terminou o seu tempo. Tem de concluir!

A Oradora: - Sr. Presidente, eu ficaria, com certeza, a enumerar exemplos por mais meia hora.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Pois é, mas há um regimento que não o permite, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Com certeza, Sr. Presidente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Botelho.

A Sr.ª Margarida Botelho (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei do PSD defende uma política de família que não se coaduna, hoje, com a realidade sociológica de família. Esta é objecto de várias políticas, nas várias áreas, dirigidas aos vários membros do agregado familiar, não se dirigindo à família como ente jurídico que já não tem acolhimento no nosso direito.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - O PCP já frisou no recente debate sobre o «cartão da família», proposto pelo PSD, a enorme discrepância existente entre algumas boas intenções aqui aparentemente espelhadas e o voto que essa bancada deu em relação a propostas que, de facto, protegem os trabalhadores, as famílias e os seus membros.
Escuso-me a aprofundar o que o PCP já denunciou na sessão de 27 de Setembro, mas há que sublinhar as posturas do PSD nesta questão: abstenção - e consequente chumbo - no que se refere à gratuitidade dos manuais escolares e à introdução de uma lei de financiamento do ensino superior assente na comparticipação às famílias, as mais penalizadas da Europa, para que os seus filhos prossigam os estudos. Foi também o PSD quem aumentou a idade da reforma das mulheres e é o PSD que está normalmente ao lado do patronato na desregulamentação e precarização do mundo do trabalho.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Há algumas passagens deste projecto de lei que nos merecem atenção especial, pelo que revelam do conceito extraordinariamente conservador de família do PSD, e desde logo, na Base XXV, a referência, para nós misteriosa, a «uma vida familiar normal», que não sabemos sinceramente o que é, quem a define, nem o que acontece a quem tem a desgraça de não corresponder ao parâmetro da normalidade.
Na discussão da proposta de lei n.º 35/VIII, que autorizava o Governo a alterar o regime jurídico que regula a entrada, a permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, recordamos que o PSD, com o PS e o CDS-PP, votaram contra a proposta do PCP, que garantia «o direito ao reagrupamento familiar aos estrangeiros membros da família de um cidadão residente que com ele tenham vivido noutro país, que dele dependam ou que com ele coabitem em território nacional».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É verdade!

A Oradora: - É, no mínimo, hipócrita fazer esta votação e colocar agora neste projecto de lei o direito ao reagrupamento das famílias de emigrantes portugueses no estrangeiro, omitindo os casos dramáticos dos famílias dos estrangeiros que se fixam no nosso país.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Ao propor que os pais se possam «opor a que os filhos sejam obrigados a receber conhecimentos que não estejam de acordo com as suas convicções éticas e religiosas», o PSD está, na realidade, a abrir caminho para que os pais possam impedir os filhos de receber conhecimentos científicos e técnicos que se oponham às suas convicções, esquecendo que os pais não podem, segundo a lei, interferir no opção religiosa dos maiores de 16 anos e também que prerrogativas deste género levaram a que, nos Estados Unidos, se fizesse um referendo estadual para decidir o que aprendiam os meninos no escola sobre o surgimento do homem. A teoria criacionista ou a teoria evolucionista? Os pais dos meninos decidiram em referendo que, para efeitos escolares, Deus tinha criado o homem.

Página 553

0553 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Penso que ninguém nesta Assembleia quer deixar em aberto esta possibilidade de obscurantismo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Perante este projecto de lei, ao PCP só resta o voto contra. De resto, ao apresentar um projecto de lei muito semelhante aos que já tinha apresentado noutras legislaturas e muito semelhante aos projectos do CDS-PP, o PSD já deveria saber que não recolhe o apoio desta bancada.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Já aqui foi referido, e partilhamos dessa opinião, que este projecto de lei de bases nada acrescenta em relação àquilo que são os dispositivos constitucionais sobre a família e, em alguns aspectos, até empobrece as directivas constitucionais,…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Claro!

O Orador: - … pois está mais recuado do que muita da legislação ordinária que, directa ou indirectamente, tem a ver com políticas com incidência na família.
Recordo que, apesar da garra e da determinação com que a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo aqui falou das famílias com cachorrinhos, peixinhos e outras coisas afins, esqueceu-se totalmente, por exemplo, de dar incidência neste suposto projecto de lei de bases às uniões de facto, uma forma de família. Tanto assim é que a lei já aprovada nesta Assembleia da República, aliás, restritiva do ponto de vista da consideração dos vários géneros, já considera não só a equiparação ao casamento de um conjunto de situações de união de facto, como, inclusivamente, introduziu o conceito de morada familiar, que é totalmente alheio neste projecto de lei de bases da família, porque, pretendendo, embora, dar algum verniz liberal no desenvolvimento conceptual deste projecto de lei de bases, de facto, o Partido Social Democrata está atido ao conceito tradicional de família e não entende que a família tem, hoje, heterogeneidade de formas e não uma única forma.
Aliás, até na economia da lei, como entender que a família monoparental seja equiparada à família? É um absurdo! A família monoparental tem a dignidade de uma família nuclear tradicional, não tem de haver uma base específica para equiparar a família monoparental, uma espécie de família de 2.ª, à família nuclear tradicional, ou seja, naquela palavrinha maldita, à família normal.
De facto, dizendo a Sr.ª Deputada do PSD que se trata de uma iniciativa que não visa levantar bandeiras político-partidárias, que tem uma intencionalidade construtiva na sociedade portuguesa, e uma vez que o diz, devo referir que, mesmo tecnicamente, este projecto de lei de bases é bastante rudimentar e de uma imprecisão muito grande em muitas das suas disposições.
Aludo, mais uma vez, a esta questão: quando se diz que os pais podem objectar, podem opor-se, por razões éticas ou religiosas, ao ensino dos seus filhos, ficamos sem saber se são ambos os pais, o encarregado de educação ou a encarregada de educação. Como é? São os pais que residam com os filhos? Podem nem sequer residir com os filhos! É uma disposição tão genérica, tão imprecisa, que não tem condição de regulamentação.
Eu diria até, Srs. Deputados do PSD e Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, que esta base me parece de mais do que duvidosa constitucionalidade, como, a seu tempo, se veria, o que também não deixaria de ser interessantíssimo, porque a que é que iriam os pais, tomados neste englobamento, objectar? À Literatura? À Biologia? À História? À Educação Física? Eu sei lá! Não tem qualquer sentido! Para isso é que a Constituição, já hoje, garante a liberdade de escolha.
O ensino público é laico e nele há programas aprovados, que são da competência educativa do Governo. Se os encarregados de educação ou aqueles que dispõem, em alternativa, do poder parental, não estão de acordo, têm outras opções, que podem, inclusivamente, ser de raiz confessional ou religiosa. Não podemos é, pela «porta do cavalo», procurar aqui uma disposição que vem, objectivamente, violar o carácter laico do sistema público educativo.
Sr.as e Srs. Deputados, penso que este projecto de lei de bases não toca nos problemas essenciais, ou seja, nas várias áreas onde deve incidir, para a família, não como entidade abstracta e com esse pecado original que está lá incito da família tradicional, mas nos seus vários grupos, nas suas relações interpessoais, nas mulheres, nos homens, nos idosos, nos adolescentes e nas crianças, porque hoje uma política social avançada faz-se legislando, executando e trabalhando para os vários grupos que as famílias encerram.
Por estas razões e outras que talvez fosse ocioso aduzir, tanto é o interesse das bancadas da direita hoje por este debate, deixaria apenas a nota de que, de facto, não por preconceito ideológico mas por abertura à realidade, estamos a ler várias formas de família, várias famílias, não estamos a ler, por preconceito ideológico, uma família que, depois, se tolera que tem umas adaptações.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Os senhores só toleram as adaptações!

O Orador: - O preconceito ideológico está do lado da direita e está no desinteresse manifesto a que a própria direita votou hoje este debate.

O Sr. José Barros Moura (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.
Embora o Sr. Deputado Luís Fazenda disponha apenas de um minuto, o PCP cede-lhe tempo para poder responder.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, verdadeiramente, a dúvida que tenho para lhe colocar tem a ver com algo que V. Ex.ª, se calhar, não sabe, mas vai ficar a saber.
Na Carta Europeia dos Direitos Fundamentais, a amplitude de redacção do artigo sobre a família, cobrindo a família dita tradicional, a tal com pai, mãe, filho e piriquito, de que há pouco me esqueci, as famílias monoparentais e as outras formas de famílias, as formas disfuncionais de família, foi introduzida porque eu fiz muito barulho, por

Página 554

0554 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

que respeito muito essas realidades. Elas existem e têm de ter cobertura também neste caso concreto da legislação comunitária.
O Sr. Deputado José Barros de Moura secundou-me, indiscutivelmente, mas tenho a consciência de que fui muito desagradável pela insistência. Isto é para dizer que, se não há preconceito do vosso lado, não nos imputem preconceitos nessa matéria, porque não temos qualquer preconceito.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A dúvida não existe, portanto, foi mais um esclarecimento.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, em tempo cedido pelo PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, julguei que também me ia cumprimentar por ser um homem a falar, já que tinha invocado que apenas as Srs. Deputadas entravam neste debate.
V. Ex.ª partiu de um pressuposto errado, tem uma premissa falsa: é que eu também não estou de acordo com a Carta Europeia dos Direitos Fundamentais.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Você não está de acordo com nada!

O Orador: - Que a Sr.ª Deputada possa entender que esse seu intensíssimo trabalho e militância pelo alargamento do conceito de família é uma boa via, nada tenho a opor; é o seu posicionamento, é a sua ideia sobre isso, mas insisto que a ignorância do vosso projecto, dito de lei de bases, sobre realidades com as uniões de facto, como a situação das famílias monoparentais, equiparadas às outras e não com a mesma dignidade das outras, penso que vale por si.
Se me referi ao preconceito ideológico foi porque a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo, desde logo da tribuna, imputou às chamadas esquerdas unidas preconceitos ideológicos. Como vê, agi em legítima defesa.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre). - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: A família é uma instituição natural e básica da vida social, tendo vindo a ser progressivamente valorizadas as funções que desempenha no plano social, económico e cultural.
É internacionalmente reconhecido o papel da família no processo de desenvolvimento sustentável, considerando-se a instituição familiar como agente positivo da harmonização da sociedade.
A legitimidade da política familiar assenta não em bases ideológicas mas no reconhecimento de factos objectivos, como a função social, cultural e económica da família, a responsabilidade na educação dos filhos, a sua importância como lugar primeiro de expressão da solidariedade entre gerações, a promoção da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres e a necessidade de partilha de responsabilidades familiares.
Pretende-se, com este projecto do PSD, responder às necessidades das famílias, para que estas, potenciando as suas capacidades, cumpram as funções que lhes são próprias, nomeadamente educando os jovens de hoje, que são a população activa e responsável de amanhã.
Nesse sentido, a política familiar não é a soma de diversas políticas sectoriais, mas, como política transversal, deve dar dimensão familiar às políticas sectoriais e desenvolver-se a nível nacional e local. Daí a necessidade de uma lei de bases.
Verifica-se, em Portugal, actualmente, uma verdadeira ausência de política familiar. Enquanto estrutura fundamental da sociedade, a família deve ser apoiada e incentivada directa ou indirectamente pelo Estado. Ora, o sistema de apoio familiar existente em Portugal, ao contrário de promover a constituição de famílias, parece desincentivá-la. Não existe uma política tendente a compatibilizar os tempos de trabalho, de família, de educação e de lazer. Constata-se, portanto, nesta matéria, uma falta de visão estratégica quanto aos problemas demográficos e sociais que se colocam com a diminuição da taxa de natalidade e o envelhecimento populacional.
Como é do conhecimento de VV. Ex.as, o CDS-PP tem vindo a defender a existência de um diploma que contenha os princípios fundamentais orientadores de uma política de promoção, apoio e dignificação da família.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Já na anterior legislatura, o nosso partido tentou sensibilizar a Câmara, com a apresentação de quatro diplomas que tinham por fim a obtenção dos objectivos que o projecto hoje em discussão se propõe. No entanto, salvo honrosas excepções, nunca a esquerda parlamentar mostrou vontade política para encarar este problema de protecção das famílias portuguesas.
Temos esperança que hoje, algum tempo volvido, possamos, em conjunto e numa atitude construtiva, conseguir as melhores soluções para este problema.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Defendemos, por isso, a protecção da maternidade e da paternidade como valores humanos e sociais inalienáveis, não apenas biológicos mas sobretudo educativos e relacionais; a consolidação da função da família enquanto transmissora de valores e veículo de coesão e solidariedade geracionais; o fortalecimento do associativismo familiar e a voz das famílias, enquanto consumidores e utilizadores de bens públicos; o aumento do grau de informação sobre direitos familiares; o reforço do carácter global e integrado das várias políticas sectoriais e redistributivas com incidência familiar; o combate às várias formas de violência social e familiar e a garantia da protecção e do desenvolvimento da criança antes e depois do seu nascimento.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS-PP sustenta aquilo que sempre defendeu nesta matéria. Mantemo-nos, assim, coerentes com os valores democrata-cristãos de defesa intransigente da família enquanto pilar essencial da sociedade portuguesa, que se quer socialmente mais justa e com melhor qualidade de vida.

Página 555

0555 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Portanto, o meu partido votará favoravelmente este projecto de lei de bases do Partido Social Democrata.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Assumindo convictamente a importância da família na sociedade portuguesa, o PSD apresenta, hoje, na Assembleia da República, esta iniciativa sobre a lei de bases da política de família.
Fazemo-lo porque estamos convictos de que a lei de bases da política de família é um instrumento eficaz e eficiente de promoção e melhoria do bem-estar e da qualidade de vida das famílias portuguesas.
Fazemo-lo porque consideramos que é um diploma integrador de todo o conjunto de iniciativas por nós apresentadas neste Plenário e ao País e corresponde à nossa preocupação de lançar as bases para a implementação de uma política que defenda e promova as famílias.
Fazemo-lo porque consideramos ser a lei de bases da família o desenvolvimento natural do princípio constitucional.
Só uma política global da família pode assumir uma dimensão transversal, influenciando todas as políticas sectoriais, desde a área fiscal à educação, à saúde, à habitação, ao trabalho, à segurança social e à justiça, entre outras.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Convencidos de que a família contempla os valores e as referências pelos quais vale a pena lutar, consideramos fundamental equacioná-la e revitalizá-la, num esforço concertado de grande responsabilidade.
A Constituição da República Portuguesa é muito clara ao reconhecer a família como elemento fundamental da sociedade e ao atribuir ao Estado a incumbência de definir uma política de família, com carácter global, coerente e integrado.
Mais de 26 anos depois da instauração da democracia em Portugal, a família continua a ser o principal porto de abrigo para a maioria dos portugueses. Isto quer dizer que quatro em cada cinco portugueses consideram a família como a instituição mais importante da sociedade.
Estes dados contrariam os que, à partida, pensam que a família corresponde a um modelo estanque ou estereotipado. Nada de mais errado!
Com efeito, nos últimos 30 anos, mudanças significativas e tensões diversas têm afectado a família nuclear. Alteraram-se as concepções e as práticas familiares, bem como os papéis sociais.
Na era da globalização, sentimos que tudo se conjuga para aumentar os constrangimentos ao secular espaço familiar, pondo em perigo a saúde e, direi mesmo, a sobrevivência da família.
Nos grandes centros, a preocupação é maior e mais grave: a família corre o risco sério de ser atingida e mesmo desagregada.
No entanto e independentemente do facto de a família ser uma realidade em mutação ou um espaço social dinâmico, ela deverá ser sempre um quadro relacional, onde a grande questão em causa é a afectividade e o desenvolvimento integral do ser humano.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A família é, para o PSD, uma dimensão estratégica de relevância vital e daí a nossa aposta muito forte em apresentarmos esta iniciativa.
A lei de bases da família é a demonstração clara e inequívoca da grande sensibilidade e preocupação do PSD pelas questões sociais, pelas pessoas e pelas famílias. Esta iniciativa é a demonstração clara e inequívoca da grande responsabilidade e coerência do PSD em relação à família. Esta iniciativa é a demonstração clara e inequívoca do grande interesse do PSD pelas questões económicas e sociais, culturais e éticas das famílias.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A forma como defendemos a família determina o nosso grau de desenvolvimento civilizacional e o nosso modelo de referência.
Habitualmente enaltecida e enfatizada nos discursos, a família tem sido desprotegida, esquecida ou desvalorizada e, direi mesmo, agredida e penalizada, principalmente em matéria fiscal e no acesso a bens e serviços de natureza social.
Apoiar a família através de uma política coerente que valorize o seu papel, enquanto elemento estruturante da sociedade portuguesa, é, pois, uma missão patriótica.
O Governo tem o dever de definir e executar políticas que harmonizem e que impeçam a espiral de agravamento do bem-estar e da qualidade de vida das famílias.
Há, no entanto, duas coisas que são fundamentais para a revitalização da família e para a aprovação da lei de bases da família: vontade política e coerência: vontade política, no sentido de pôr em prática uma dinâmica transversal de solidariedade social das famílias; coerência, no sentido de dar justo relevo à família e defender os seus direitos.
Mas, na prática, as famílias estão e continuam a estar desprotegidas: Portugal é um dos países da União Europeia com piores índices a nível da protecção social da família; a proporção de pobres é uma das maiores da União Europeia; cerca de 28% das famílias portuguesas têm um rendimento inferior a 50% da média nacional; cerca de 92% do rendimento das famílias portuguesas, segundo dados do Banco de Portugal, é para pagar dívidas às instituições bancárias. Para um Governo que quer um país mais próspero e socialmente mais desenvolvido estes números não enganam. Apoiar a família, através de uma política efectiva que reconheça a sua alta missão social, constitui, pois, um objectivo estratégico de desenvolvimento do País.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A família é um espaço dinâmico e privilegiado de consolidação do sistema democrático, de uma democracia justa, coesa e paritária. Permanece, no entanto, um fosso entre o discurso e a prática que é urgente rever: mais de 2/3 do trabalho doméstico não remunerado é feito pelas mulheres; as mulheres gastam o dobro do tempo com os filhos; a igualdade de oportunidades só continua a ser vista do lado da mulher.
Por outro lado, assistimos à consolidação de um consenso cada vez mais amplo sobre a função crucial das famílias no processo de desenvolvimento e no sistema educacional: dados científicos demonstram que a produtividade aumenta quando os trabalhadores passam mais tempo com a família; o sucesso escolar aumenta quando o ambiente familiar é equilibrado e saudável; dados científicos provam que a violência diminui quando os pais passam mais tempo em família.

Página 556

0556 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Entendemos, então, que os problemas das famílias não se podem apenas resolver pela via jurídica, mas a lei de bases da família, em nossa opinião, constitui um excelente contributo. Entendemos que os problemas das famílias não se resolvem apenas, a jusante, com acções mediáticas de consumo fácil,
Não podemos resolver os problemas de carências somente através da atribuição de subsídios. Temos de ter uma política económica e social de protecção e promoção das famílias e de promoção do emprego seguro.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Estado deve reconhecer a especial função da família na sociedade e promover e valorizar o seu nobre papel na educação, na saúde, na segurança social, no apoio aos idosos e deficientes e na conciliação entre a vida profissional e familiar.
O Estado deve reconhecer e estimular o papel privilegiado da família na convivência natural e solidária entre gerações.
A política de família tem de ser a primeira e a grande prioridade do Estado e, pela sua transversalidade, deve reunir um esforço de todos, num amplo consenso, num verdadeiro pacto de regime.
Num contexto de desenvolvimento sustentável e equilibrado, a família, como unidade base, desempenha, assim, um papel fundamental. É por isso que estamos firmemente convictos de que a Assembleia da República, depois deste debate sério e sereno, quase feito por mulheres e para mulheres, vai viabilizar o nosso diploma. Outra coisa não seria de esperar. As famílias portuguesas não o entenderiam e não o aceitariam. Só a ausência de vontade e disponibilidade políticas, ou uma mera teimosia, pode servir de argumento para rejeitar a lei de bases da família.
Quero crer que não vai ser o caso - espero que não seja e que não aconteça, desta vez, o que aconteceu relativamente à «Via Verde para a Família». É que se o fosse, a afirmação repetida de que a família é o pilar da sociedade seria apenas um slogan inconsequente.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal deve ter uma política activa de apoio à família. Portugal deve caminhar no sentido da valorização humana, social e cultural da família. Portugal deve caminhar no sentido da revitalização da família como o centro e o coração da solidariedade entre as diferentes gerações. Portugal deve caminhar no sentido da valorização do papel da família e da melhoria do seu bem-estar e da qualidade de vida.
Apoiar a família, apoiar os princípios e valores humanos, culturais, morais e éticos que ela representa, significa ter consciência e reconhecer o papel e a importância da família como grande pilar da sociedade.
Apresentámos uma plataforma e um enquadramento jurídico para uma política global, coerente e integrada, justa e solidária da instituição da família. O que se espera, pois, é que, sem clubismo partidário e sem hipocrisia, haja acordo para lhe dar tradução prática e, assim, abrir caminho à revalorização e dignificação da família.

Aplausos do PSD.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, as Sr.as Deputadas Maria Celeste Correia e Maria de Belém.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Manso, as propostas do PSD nesta área denotam algumas preocupações sérias - não originais, mas sérias. Em nome dessa seriedade e cingindo-me ao diploma que apresentaram, gostaria, para já, de lhe dizer que as questões de família não se resumem a questões de mulheres, são questões de toda a sociedade.
Depois, quero colocar-lhe duas questões, a primeira das quais tem a ver com o seguinte: relativamente às famílias de imigrantes, os senhores referem, na Base VII do vosso diploma que «Na definição da política de família serão garantidas as características específicas de cada comunidade étnica e religiosa» e, na Base XII, sob a epígrafe «Famílias de imigrantes», que «Será promovida a integração das famílias de imigrantes, respeitando e valorizando a sua especificidade cultural». Saúdo estas duas disposições, Sr.ª Deputada, mas gostaria de dizer-lhe o seguinte: os senhores não ignoram que, hoje, Portugal é uma sociedade multicultural e que temos, no nosso seio, famílias que apresentam diversidades culturais que nos colocam questões centrais e bastante sérias. Por exemplo, há, em Portugal, comunidades que admitem que o homem tenha mais do que uma mulher. Ora, nestes casos, o que quero perguntar-lhe é como é que o PSD se propõe respeitar e valorizar essas e outras especificidades culturais.
A segunda questão tem a ver com o seguinte: os senhores dizem-se defensores do conceito «menos Estado, melhor Estado», mas verifico que, nesta iniciativa, remetem, única e sistematicamente, para o Estado a resolução de todas as questões relacionadas com a política de família - «o Estado disporá», «o Estado apoiará», «cumpre ao Estado», «incumbe ao Estado» e, por aí fora, são expressões recorrentes no vosso diploma. Ora, o que quero perguntar-lhe é se não é da opinião de que esta questão não deve ser só colocada como uma obrigação do Estado e que a sociedade civil também tem aqui uma palavra a dizer.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Celeste Correia, gostava que o seu pensamento fosse transmitido a todo o grupo parlamentar e lançamos o seguinte desafio: se a lei de bases que estamos a propor tem algumas incorrecções ou algumas deficiências, estamos completamente disponíveis para, em sede de especialidade, corrigi-la, desde que isso não desvirtue completamente a conceptualização que lhe está subjacente e que, naturalmente, devido a alguns estereótipos, não pode agradar a todos os grupos parlamentares.
Em relação às questões directas que colocou, penso que não ouviu bem aquilo que dissemos…

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Li!

A Oradora: - … quanto a estarmos quase só a discutir mulheres e para mulheres. Essa é uma questão em que, julgo, a família é transversal e que diz respeito a todos os géneros, e só lamento que, estando nós aqui a discutir uma lei de bases da família, não tenha envolvido todos os nossos colegas nessa mesma discussão.

Página 557

0557 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Em relação à outra questão que nos coloca, Sr.ª Deputada, continuo a dizer-lhe que estamos disponíveis para fazer as alterações que entendamos por bem e que não desvirtuem o nosso projecto de lei.
Quanto à sua última questão, é bom que leia, mais uma vez, o nosso projecto de lei de bases,…

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Li-o bem!

A Oradora: - … porque nunca, em nenhuma das bases, referimos o domínio ou a interferência directa do Estado, em termos da família. E leia a Base XXIII, que fala do associativismo familiar.

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Não leu bem a lei de bases!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - A Sr.ª Deputada Maria de Belém já leu…

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Já li, sim, Sr. Deputado Carlos Encarnação. Leio sempre tudo.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr.ª Deputada, faça o favor de se dirigir ao Presidente e de não manter diálogo.

A Oradora: - Sr. Presidente, se me dá licença…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Agora, dou.

A Oradora: - É que não reparei, Sr. Presidente, que o microfone já estava ligado.
Sr.ª Deputada Ana Manso, gostaria de sublinhar que, na sua intervenção, foram indicados muitos dados científicos para sustentar a vossa posição. Ora, que eu saiba, os dados científicos obtêm-se na sequência de estudos - e estudos credíveis. Portanto, quero saudar esse apreço pelos estudos, que também tenho.

Vozes do PS: - Mais uma incoerência!

A Oradora: - Porém, quero também dizer-lhe o seguinte: tão válidos são esses estudos, que detectam uma especial fragilidade da nossa situação, como são válidos os dados quantificados nos estudos de avaliação relativamente àquilo que tem sido o progresso, aquém do desejável, do necessário e daquilo que nos propomos fazer no sentido prosseguir, desenvolver e aprofundar uma política de apoio à família, que, obviamente, não é propriedade do PSD, em termos daquilo que é a preocupação com algo que, como aqui foi referido, a própria Constituição define como elemento fundamental da sociedade.
Mas aquilo que continuei a não perceber, depois da sua intervenção, Sr.ª Deputada Ana Manso, foi o facto de, por um lado, considerar que esta lei de bases era essencial para dar tradução prática aos direitos consagrados na Constituição, e, por outro, a lei de bases não permitir - pelo menos, em minha opinião - qualquer tradução prática daquilo que são os direitos consagrados na Constituição.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, como sempre, a Sr.ª Deputada falou, falou, falou, mas não disse nada.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Disse, disse!

A Oradora: - Mais valia, então, não ter falado, não ter intervindo. Falou-nos dos estudos. É óbvio, Sr.ª Deputada, que nós fazemos sempre os estudos, mas a questão não é essa. Aliás, aí, nesse aspecto a Sr.ª Deputada foi exímia, durante os quatro anos em que esteve à frente do Ministério da Saúde, só que, depois, não concretizou os estudos. Ora, nós, pelo nosso lado, fizemos um levantamento de estudos, de dados, mas para depois os utilizarmos.
Agora, é caso para dizer: dessa «conversa mole» já tenho a minha dose, já tenho a dose que me chega, pelo que a dispenso. Mais, não, muito obrigada, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): - Não há tradução prática!

Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Como nota prévia, gostaria de dizer à Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira que, em 26 de Junho de 1997, teve lugar nesta Assembleia um debate de dois projectos de lei, sendo que um deles, o projecto de lei n.º 290/VII - Lei de Bases da Família, era subscrito pelo CDS-PP e o outro, o projecto de lei n.º 295/VII - Lei de Bases da Política de Família, era originário do PSD, sem que, à data, houvesse conhecimento desta Resolução do Conselho de Ministros n.º 7/99, de 9 de Fevereiro, que hoje é justificativa da inviabilização deste diploma por parte do Partido Socialista, sendo que esses projectos de lei eram em tudo iguais à lei de bases que hoje aqui se discute e sendo que, também nessa data, o Partido Socialista votou contra, rejeitando o diploma, conjuntamente com o Partido Comunista Português e com o Partido Ecologista Os Verdes.
Ou seja, isto demonstra bem que aquilo que é a razão de princípio do Partido Socialista na análise deste diploma é, pura e simplesmente, inviabilizá-lo. Não tem a ver, como justificação dessa viabilização, com o facto de, hoje, termos esta Resolução do Conselho de Ministros, porque, antes, ela não existia, nem outra coisa qualquer. Tem, pura e simplesmente, a ver com a vossa vontade de inviabilizar este diploma.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Em todo o caso, como referi, o projecto de lei n.º 243/VIII, hoje em análise, é em tudo igual aos anteriores, é, inclusivamente, igual a um projecto de lei do CDS-PP que foi pioneiro nesta matéria.
Deixe-me que lhe diga, Sr.ª Deputada Ana Manso, que, certamente por lapso, na exposição de motivos deste projecto de lei é referido um capítulo V que, depois, não

Página 558

0558 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

existe no articulado. Isso sucede, certamente, por lapso, mas, em todo o caso, não deixa de ser relevante.
No que mais importa e na substância, como é evidente, este diploma vai merecer o voto favorável do CDS-PP. Outra coisa não seria de esperar.
Ainda tive dúvidas sobre qual seria o comportamento da esquerda; afinal, agora, não tenho qualquer dúvida e pergunto-me por que é que tive essas dúvidas. Supunha que a esquerda iria rejeitar, mais uma vez, o diploma; agora, tenho, efectivamente, certeza disso. E porquê? Pela razão única e evidente de que o Governo, e a esquerda, em geral, não tem uma política integral para a família. A família não é uma prioridade nacional para a esquerda.
Julgamos que, ao inviabilizar este diploma, a esquerda não inviabiliza apenas mais um projecto de lei mas, sim, um conjunto fundamental de normas com natureza estruturante e programática em sede de política de família. Compreende-se!...
A esquerda, neste exemplo particular o Bloco de Esquerda (que ouvi, há bocado, defender tudo o que é posição radical, como sempre; infelizmente, tudo o que não é radical passa-lhes um bocadinho ao lado),…

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Olha quem fala!

O Orador: - … que usou de tanta demagogia em sede de política de imigração, que tanto invocou, aqui, as questões do reagrupamento familiar, as quais, de resto, também são importantes para o CDS-PP, como é evidente, vai inviabilizar um diploma que, na Base XIII, refere que «Serão desenvolvidas medidas que assegurem o direito ao reagrupamento familiar, atendendo em especial às famílias de imigrantes».
Ou seja, na teoria, e quando há que especular e falar para a bancada da imprensa, VV. Ex.as invocam tudo, pedem tudo, porque sabem, à partida, que não pode ser viabilizado, mas quando, na prática, está em discussão um diploma que, na substância, está de acordo com aquilo que, hipoteticamente, se viu nas vossas convicções, VV. Ex.as votam contra! Mas nisto toda a esquerda está convosco, diga-se!
A mesma esquerda que se propôs despenalizar o aborto e foi derrotada em referendo, também, hoje, coerentemente, vota contra um projecto de lei que na Base XVII assegura «(…) a protecção e o desenvolvimento da criança antes e depois do seu nascimento».

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Também nesta parte, como é evidente, não podiam votar de outra forma.
Mas, mais: a esquerda, que se propõe despenalizar e liberalizar o consumo de droga - e sei o que digo e porque o digo, porque, efectivamente, trata-se disso - sem ouvir as famílias em referendo, como estas, de resto, pretendem e demonstraram-no de forma cabalmente, coerentemente, também, tem de votar contra este diploma, porque este, na Base XXI, consagra o reconhecimento da «(…)função fundamental da família na prevenção e recuperação dos toxicodependentes e dos alcoólicos». Portanto, como é evidente, quando não se dá voz às famílias numa questão fundamental como é a da despenalização da toxicodependência, agora, também por maioria de razão, não se lhes permite tal por esta via.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Mais: a esquerda, que não permite que se acabe com o pagamento de sisa no todo, nem em parte, como já foi sugerido mais do que uma vez pelo CDS-PP, e que tributa pesadamente e há largos anos as famílias portuguesas, …

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - … também, com coerência, hoje, tem de votar contra este projecto de lei, porque ele, na Base XXV, refere que «Devem ser criadas condições para que cada família possa dispor de uma habitação (…)».
Mais: na Base XXX refere-se que o Governo deve assegurar «(…) um regime fiscal adequado à protecção, manutenção e desenvolvimento integral da família (…)», o que, efectivamente, não temos. Portanto, também em coerência, a esquerda tinha de votar contra este diploma.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Mais ainda: uma esquerda que é incapaz, e neste caso o Governo com mais propriedade, de acabar com o caos no Sistema Nacional de Saúde (pelo qual, de resto, foi responsável, durante largos anos, uma ilustre Deputada que, hoje, nos prestou uma das mais interessantes intervenções), com as listas de espera, com a falta de médicos, com tudo aquilo que vai mal na saúde, em Portugal, também, em razão da coerência, tem de votar contra este diploma, porque ele, na Base XXVI, consagra o acesso das famílias a cuidados de saúde. E como é evidente, com o sistema de saúde que temos, as famílias, seguramente, não têm direito a aceder a uma saúde de qualidade e que lhes garanta os seus mais elementares direitos nesta sede.
Mais: a esquerda, que não consegue acabar com a tráfico nem com o consumo de estupefacientes nas cadeias, que não separa os presos e os detidos em função da gravidade da sua criminalidade, que não consegue resolver problemas de sobrelotação nas cadeias, que não dá a assistência conveniente às mães que estão detidas e aos seus filhos, coerentemente, também, tinha de votar contra este tipo diploma, porque este, na Base XXIX, diz que «Deverão ser criadas condições nos estabelecimentos prisionais no sentido de garantir o equilíbrio e a estabilidade da família».
Portanto, usando uma expressão que a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira utilizou há pouco, diria: ninguém tem dúvidas daquilo que acabei de dizer, nem de muito mais coisas que eu poderia dizer se não fosse o pouco tempo de que disponho!
A posição da esquerda, antes, na VII Legislatura, aquando da análise dos diplomas que referi, um dos quais da autoria do CDS-PP, e hoje (hoje temos a certeza), é de total coerência na sua posição em sede de discussão e debate na Assembleia da República. No passado, em sede de votação, a esquerda, em coerência com a sua incompetência para resolver problemas essenciais das famílias portuguesas, e não havendo qualquer resolução do Conselho de Ministros, votou contra um diploma estruturante e programático essencial para todas as famílias portuguesas. Hoje, em coerência, essa decisão mantém-se, e é pena! É pena e, como sempre, demonstraremos por actos aquilo que o PS apenas materializa em slogans.

Página 559

0559 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Connosco, verdadeiramente, em primeiro lugar estão as pessoas! Connosco, verdadeiramente, em primeiro lugar estão as famílias! Por isso, este projecto de lei, que é em quase tudo igual aos que antes estiveram em discussão, irá merecer, obviamente, a nossa aprovação.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, gostaria de dizer-lhe que a sua preocupação com as famílias portuguesas e com a temática da família me pareceu tudo menos séria, porque 90% do seu tempo de intervenção foi gasto a falar da direita e da esquerda e a tentar transformar a questão da família, que, afinal, é uma questão de toda a sociedade e que, portanto, deveria dizer respeito a todas as bancadas desta Câmara, numa questão e numa prerrogativa da direita que só a direita sabe tratar e que só a direita tem defendido.
Reportando-me exactamente à lei de bases em questão, digo-lhe que, quando muito, ela é inócua e poderia ser aprovada com esse fundamento. A lei de bases não é nenhuma varinha de condão. Como aqui foi demonstrado, ela não trás nada de novo, não permite nada de prático, não concretiza rigorosamente nada, quando muito é uma súmula de enunciados que, de alguma forma, foram aprovados por toda a Assembleia da República.
Gostaria também dizer-lhe que, avaliando os últimos resultados eleitorais, sem resolução relativa ao plano para uma política global de família, as famílias portuguesas confiaram à esquerda o seu destino.

Vozes do CDS-PP: - Já estão muito arrependidas!

O Sr. António Capucho (PSD): - Distraíram-se!

A Oradora: - Gostaria também de dizer, só para terminar, que o PS não recebe lições do CDS-PP nem do PSD nesta matéria!
Temos consciência do que fizemos, temos consciência do que há para fazer, e é trabalhando que vamos continuar!
Mas digo-lhe, Sr. Deputado, transformar esta questão numa questão de direita ou numa questão que não é querida à esquerda só revela que, de facto, o senhor tem muitos complexos relativamente à esquerda, que deveria resolver antes de os trazer para aqui!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, o facto de o PS ser Governo porque assim o quiseram os portugueses, certamente para arrependimento de muitos (muitos mais hoje do que ontem), …

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - … só aumenta a vossa responsabilidade em relação às famílias. E, porque isso acontece, então viabilize-se o diploma.

Vozes do CDS-PP: - Nem mais!

O Orador: - Mais: a Sr.ª Deputada disse que o diploma é inócuo, que o diploma não concretiza. Mas a Sr.ª Deputada Ana Manso já manifestou a disponibilidade do Partido Social Democrata para o alterar em sede de especialidade. Portanto, concretize-se aquilo que VV. Ex.as entendem que não está concretizado!
Se a questão é partidária ou não? É evidente que ela não deve ser partidária!

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): - Não é essa a questão!

O Orador: - Para nós, a questão da família é, verdadeiramente, uma questão nacional! Mas quem vai demonstrar que, para a esquerda, ela é uma questão partidária, é a própria esquerda, porque nós, para defendermos a família, vamos votar favoravelmente este diploma (a nossa posição é clara), mas a esquerda, com a posição que irá tomar, em bloco,…

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - E a direita não é em bloco?

O Orador: - … vai demonstrar claramente que para ela a questão é partidária, uma vez que se vai demarcar da direita na análise de uma questão que para nós é essencial.

Vozes do CDS-PP: - Nem mais!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria do Rosário Carneiro.

A Sr.ª Maria do Rosário Carneiro (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Debate-se, hoje, de novo, um projecto que tem como objectivo privilegiado a valorização e o reconhecimento do grupo que é a família e do conjunto de políticas por ele inspirados e para ela orientados.
Este debate decorre, hoje, pelo menos de forma aparente, nos mesmos termos e com as mesmas premissas com que o fizemos há três anos, nesta mesma Câmara.
Hoje, também como há três anos, quando se discutiam os projectos de lei do PSD e do CDS-PP sobre esta mesma matéria, intervenho em nome dos princípios que determinaram a participação de Deputados centristas democratas-cristãos no Grupo Parlamentar do PS.
Princípios que assentam no primado da pessoa e no reconhecimento do valor essencial que a família representa como seu grupo primeiro, mais natural e mais estruturante.
Princípios que assentam na convicção de que é necessário dotar a sociedade dos instrumentos, do quadro legal e do enquadramento institucional que garante a plena inclusão deste grupo que é a família; que reconhece o seu papel decisivo enquanto elemento de coesão social; e que reforça, assim, a confiança das comunidades, na medida em que contribui para a formação e robustecimento do «nexo comunitário».
Princípios que implicam, naturalmente, o desenvolvimento de políticas sociais horizontais na sua base e que são condição para a construção de comunidades inclusas e mais solidárias.

Página 560

0560 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Por isso, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, hoje, como há três anos, manifestamos o apoio à iniciativa agora em debate e disponibilizamo-nos para a trabalhar em sede de especialidade. E manifestamos o nosso apoio, porque entendemos que este é um bom «pretexto» para ensaiar uma reflexão sistemática, que a questão exige de forma permanente, e para iniciar a definição articulada dos mecanismos de intervenção, que são cada vez mais urgentes.
É por todos sabido e reconhecido que as famílias preenchem, desempenham, um enorme conjunto de funções sociais, educativas, afectivas, culturais, integradoras, que nenhuma administração, nenhum Estado, consegue eficazmente assumir, ou terá sequer o direito de «nacionalizar». Deste reconhecimento decorre, naturalmente, que as famílias deverão ser assumidas como o «sujeito» das políticas sociais e não como seu destinatário passivo, numa perspectiva eminentemente assistencialista.
A grande maioria dos benefícios e das prestações enquadrados nos esquemas de protecção social destinam-se quase que exclusivamente a proteger direitos individuais e só muito raramente visam o apoio à família enquanto grupo específico que é. Dizendo de outra forma: a concessão de benefícios individuais, independentemente das formas familiares, em nome de uma suposta neutralidade das políticas sociais, tem sido factor de discriminação para com as famílias.
Num momento, como é o presente, em que as famílias estão a ser sujeitas a enormes e importantes modificações na sua estrutura, em que o tecido social apresenta sinais evidentes de erosão, em que a anomia invade os comportamentos sociais, imperioso se torna, assim, encontrar formas de revitalização dos traços essenciais deste grupo.
Não é tolerável que as famílias afectadas por crises de rotina, de passividade e de descompromisso social sejam levadas a fechar-se sobre si próprias e deixem de preencher as funções de que depende a sociedade no seu todo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É indiscutível a premência da resolução dos problemas de natureza política e económica e, bem assim, das questões que se colocam nos planos da segurança social, do emprego, da educação, das condições de vida, da habitação, da urbanização, etc.. Mas é também indiscutível que a sua superação está associada à capacidade de defender intransigentemente a instituição familiar.
O debate sobre este projecto de lei de bases é pois o «pretexto» para recolocar a família no quadro da definição e da acção política, reconhecendo-a como detentora de identidade e individualidade próprias e como a «célula-base» da sociedade. Mas é também o «pretexto» para reflectir sobre o papel do Estado no quadro de uma política de família. Papel esse que decorre da realização do princípio da subsidiariedade, nomeadamente pela criação de condições que apoiem a natalidade no seio das famílias, que reconheçam os inalienáveis valores da maternidade e da paternidade, que estimulem o voluntariado, que incentivem e premeiem a auto-organização e o associativismo familiares. Papel esse que decorre do princípio da subsidiariedade na definição, de forma global e integrada, de políticas sociais e redistributivas de incidência familiar.
A discussão que será feita em torno do próximo Orçamento do Estado deverá ser ela também um bom «pretexto» para avaliar se as políticas públicas são a favor ou contra as famílias.

Aplausos do CDS-PP e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - A encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Trabalho e da Solidariedade.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Trabalho e da Solidariedade (Rui Cunha): - Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: Como tive oportunidade de sublinhar há alguns dias, nesta Câmara, aquando da discussão de vários projectos de lei sobre questões de família, os Governos do Partido Socialista têm considerado prioritária a protecção da família bem como a promoção e a valorização do seu papel como elemento fundamental da sociedade.
Algumas das medidas então explicitadas serviram para demonstrar o resultado do trabalho realizado na melhoria das condições de vida e de bem-estar das famílias e, em particular, de todos os seus membros.
Nos últimos anos, as famílias passaram a ter melhores apoios, intensificou-se a construção de equipamentos sociais, aumentou-se significativamente a frequência da educação pré-escolar, prosseguiu-se uma política de novas prestações familiares, de apoio a idosos e a deficientes, o que teve efeitos imediatos nas condições de vida, em particular dos mais desprotegidos e carenciados.
Não posso deixar, assim, de agradecer ao Grupo Parlamentar do PSD o facto de ter apresentado uma iniciativa legislativa por via da qual me permite explicitar algumas das medidas e das políticas desenvolvidas em prol da melhoria efectiva do bem-estar das famílias.
Também não posso deixar de assinalar a particularidade deste projecto, rejeitado na anterior legislatura, renovando-se a sua apresentação sem alterações de assinalar. Então, no seio de vários projectos, era notória a diferenciação na concepção de família e os objectivos preconizados por cada um, sendo certo que este projecto não representava, como não representa, qualquer valor acrescentado, quer ao dispositivo constitucional quer à legislação em vigor.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Tal confirma uma falta de imaginação do PSD, que não consegue apresentar um novo projecto, nem sequer melhorar o que apresentou há mais de um ano, o que vem acontecendo de modo repetido.
O projecto, quando não apresenta dispositivos meramente redundantes ou repetitivos dos preceitos constitucionais e restante legislação em vigor, apresenta explicitações que resvalam perigosamente para a ingerência ilegítima no seio da família.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aproveito mesmo para recordar que o XIII Governo Constitucional aprovou a Resolução n.º 7/99, essa, sim, um verdadeiro programa global e integrado de apoio à família e que constitui o quadro de referência das políticas sectoriais de incidência familiar.
Este texto resultou de uma longa e aturada reflexão e debate no seio do Conselho Nacional da Família e contou com a participação de diversas entidades, das quais destaco as organizações de família.

Página 561

0561 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Embora tenha sido este um dos textos mais vastos e completos, não posso deixar de realçar o importante papel que tem desempenhado o Conselho Nacional de Família, ora denominado Comissão Nacional de Família, de forma permanente e activa, na promoção e avaliação da política de família desenvolvida pelo Governo.
Por seu lado, quero ainda referir que o Governo, no seu modo próprio de governar, próximo das pessoas e das comunidades, apoiando as iniciativas representativas dos cidadãos, criou o quadro de apoio ao «associativismo familiar».
O quadro legal em vigor, sumariamente referido, torna evidente a desnecessidade deste projecto. Com efeito, as medidas adaptadas no apoio às famílias e ao direito de participação das famílias na definição das políticas são mais vastas e efectivas do que preconiza o projecto de lei do PSD.
O projecto de lei em discussão adopta uma forma vaga e meramente programática, fórmula esta que já tem consagração em sede própria, a Constituição da República Portuguesa. Assim sendo, quer por razões substantivas ou de conteúdo, quer por razões de economia legislativa, não se mostra necessária a adopção do projecto ora em discussão.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apoiar a família e criar as condições para a realização pessoal dos seus membros tem constituído um dos vectores fundamentais e prioritários da acção do Governo. Apesar das insuficiências que ainda se verificam, fruto do atraso induzido pelos governos anteriores, que não acolhiam com a atenção merecida o apoio às famílias e aos membros que as compõem, foi desenvolvido um esforço acrescido, com a alocução de meios sem precedentes nos últimos anos, evidenciado, nomeadamente, pelo enorme crescimento do orçamento da acção social.
Realço que o orçamento da acção social, um dos vectores de apoio à política de família, passou de 87 milhões de contos, em 1995, para cerca de 206 milhões de contos, orçamentados para o ano de 2001, significando este montante um crescimento de mais 25 milhões de contos face ao ano anterior, a que corresponde uma percentagem de mais de 15% de aumento.
É minha convicção que percorremos um longo percurso num tempo muito curto, prevendo-se que, ultrapassado este atraso, se venha a entrar numa velocidade de cruzeiro, cujas medidas visem essencialmente dar resposta às questões levantadas pela evolução demográfica e às necessidades específicas e particulares de cada local em concreto. A preparação das condições para evoluir nesse sentido está a ser feita a dois níveis: com a criação das redes sociais e o levantamento, a nível nacional, da oferta de equipamentos e serviços de apoio social.
A rede social, consensualizada com os restantes parceiros sociais em sede de Comissão de Acompanhamento do Pacto de Cooperação para a Solidariedade Social, integra as diversas iniciativas com actividade na região, quer sejam públicas ou sociais, e visa dar apoio à identificação das necessidades e à gestão racional e eficiente dos meios disponíveis para as satisfazer. Aproveito para referir que a rede social está já em funcionamento em 37 concelhos.
Ao nível do conhecimento da realidade de equipamentos e serviços, foi já recentemente publicado, pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade a Carta Social, documento onde é identificada a oferta de equipamentos e serviços de natureza social em todo o território e a que qualquer cidadão tem acesso através da Internet.
Sublinho que a rede de equipamentos e serviços serve simultaneamente de apoio a uma série de projectos e programas de intervenção social, contribuindo decisivamente para prevenir situações de exclusão social e para melhorar as possibilidades de êxito das iniciativas de reinserção social.
Este instrumento, fundamental para o conhecimento real do País nestas questões, estará em permanente aperfeiçoamento, tanto mais que existe um enorme dinamismo na sua criação, em resultado de um sentir solidário das populações mas também dos instrumentos de apoio criados nos últimos anos.
Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: É claro que as políticas de família não se reduzem às políticas sociais, no entanto convém recordar que, com a posse do XIII Governo, foi necessário e urgente tomar medidas imediatas de combate à pobreza e à exclusão social, num momento particularmente difícil, porquanto se tinha escondido, ao longo de anos, que havia pobreza e exclusão, pelo que a situação das pessoas nestas situações foi-se agravando, sendo que a criação do rendimento mínimo garantido configurava, para os seus críticos, uma situação de catástrofe social e financeira.
No entanto, foi o rendimento mínimo garantido que permitiu às famílias carenciadas a manutenção de um rendimento de subsistência e a adopção de medidas contratualizadas que visam a integração social das pessoas e das famílias.
Com o rendimento mínimo garantido proporcionou-se o acesso às acções de qualificação e formação profissional a cerca de 6000 pessoas e o regresso à escola das crianças e dos jovens identificados através desta forma de intervenção, o que aconteceu para mais de 17 000 crianças em idade escolar que haviam abandonado a escola, a que acrescem 13 000 jovens que foram orientados para o ensino recorrente.
Promoveu-se o acesso à educação pré-escolar e às creches, medidas que, no caso concreto dos beneficiários do rendimento mínimo garantido, adquirem uma importância acrescida.
Através destas fases prévias à escolaridade, fomenta-se o acesso a estruturas de apoio fundamentais na melhoria das condições de saúde física e psíquica das crianças e, bem assim, na supressão das desvantagens, criando as condições para terminar com o círculo vicioso da pobreza, que se transmitia de geração para geração.
Promoveu-se o acesso ao emprego para as pessoas em idade activa, o que foi conseguido para cerca de 23 500 pessoas beneficiárias do rendimento mínimo garantido.
O normativo constitucional, profundamente marcado pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, reconhece e impõe a obrigação de garantir o direito à segurança social e o acesso aos serviços de apoio, no combate aos factores de risco que põem em causa o bem-estar sócio-económico das pessoas especialmente vulneráveis.
Os direitos de cidadania a que estes normativos fazem alusão, pressupõem um status adquirido de direitos e obrigações civis, sem os quais uma grande proporção de pessoas ficará incapacitada de participar nos processos sociais e políticos, restando-lhe apenas sofrer as consequências do que vai acontecendo, enquanto espectadores das próprias vidas.

Página 562

0562 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Foi por via do rendimento mínimo garantido que muitas famílias voltaram a desempenhar uma função social e a serem reconhecidas e valorizadas no seio da sua comunidade, isto é, passaram a ser cidadãos no pleno gozo dos seus direitos e obrigações. Podemos assim dizer que o rendimento mínimo garantido é uma medida essencial para a política de família e para a promoção dos direitos humanos, elemento fulcral da política de família.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: O Governo defende a construção de uma sociedade que assenta na prosperidade económica e social, na valorização do conhecimento, na diversidade cultural e na coesão. Procura-se, assim, desta forma, desempenhar um papel activo na promoção de uma sociedade mais equilibrada e solidária.
É importante prosseguir na senda do crescimento económico interligado com a coesão social, combatendo e prevenindo os novos riscos de exclusão social através da combinação da inovação com a inserção social.
Estes princípios mostram-se fundamentais no duplo objectivo estratégico de combater o desemprego e de elevar a taxa de emprego, num conceito amplo de bem-estar social. E este conceito amplo de bem-estar social engloba tanto a garantia de rendimentos face a riscos sociais como a qualidade do trabalho e das oportunidades de vida.
A empregabilidade surge como um factor central no que diz respeito à integração social. Na prossecução desse objectivo de combate ao desemprego e da procura de mais e melhor emprego desenvolvem-se iniciativas e concretizam-se princípios que visam o seguinte: em primeiro lugar, a criação de oportunidades de emprego, combinando os princípios da iniciativa, da responsabilidade, da justiça social e da solidariedade; em segundo lugar, o desenvolvimento de novas formas de regulação do mercado de trabalho, combinando flexibilidade e segurança, através do reforço dos laços entre os parceiros sociais. Para tal tem sido reforçado o papel das políticas activas de emprego, a modernização dos sistemas de protecção social e o aumento da eficácia das políticas de combate à exclusão social enquanto rede fundamental de suporte; em terceiro lugar, a formação ao longo da vida com ênfase na adaptabilidade.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A promoção do emprego e o reforço da formação profissional ocasionam a situação de quase pleno emprego em que hoje vivemos, mesmo para as pessoas que possuem baixa qualificação. Estamos, assim, em presença de diversos instrumentos que, em conjunto e de forma integrada, promovem as condições de vida e de bem-estar das famílias.
O rendimento mínimo garantido e as políticas activas de emprego constituem dois instrumentos fundamentais na promoção do bem-estar das famílias e dos seus membros, mantendo as condições económicas e sociais para a sua integração.
Por seu lado, o Orçamento do Estado e a reforma fiscal recentemente entregues nesta Câmara contêm medidas que, a serem adoptadas, constituem um enorme contributo na melhoria das condições de vida das pessoas e das famílias, particularmente das classes mais desfavorecidas. Desde logo, o desagravamento fiscal nos rendimentos, consubstanciado na elevação acentuada do patamar mínimo dos rendimentos isentos e na diminuição da taxa nos restantes escalões.
Realço as deduções ou abatimento, em sede de IRS, dos encargos com os idosos, as despesas com as creches e os jardins de infância e restantes despesas com a família. Tudo isto a par das já consagradas deduções e abatimentos que têm em conta a dimensão do agregado familiar.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Pese muito embora as críticas, parte delas demagógicas, envoltas no manto do endividamento, os últimos anos permitiram o acesso à habitação de um número elevado de pessoas e de famílias.
Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: A protecção da família e a criação das condições para a realização dos seus membros tem sido concretizada pelo Governo, através da realização de uma sociedade coesa, com a promoção de políticas de inserção social e de acesso à cidadania de formas de actividade económica.
O Governo tem prestado uma particular atenção aos grupos especialmente vulneráveis, como sejam os idosos, as crianças e os jovens. Neste sentido, o aumento anual das pensões foi feito de maneira diferenciada em benefício dos pensionistas que auferem mais baixos montantes.
A recentemente aprovada lei de bases do sistema de solidariedade e de segurança social, que cria um verdadeiro sistema de garantia dos direitos de cidadania, permite agora adoptar metodologias de intervenção mais vastas e eficazes no combate às consequências nefastas dos riscos sociais e no apoio às famílias, efectuado através do sistema autonomizado de protecção à família.
O apoio à população idosa constitui uma preocupação e uma prioridade na acção governativa, concretizada não só através do aumento das pensões, com adopção clara da diferenciação positiva, mas também da oferta de serviços e da disponibilização de equipamentos no apoio a este estrato da população.
Os lugares em lar, os centros de dia e de convívio, o apoio domiciliário e as famílias de acolhimento, que abrangiam 95 000 pessoas em 1995, abrangem, hoje, mais de 140 000.
No que se refere ao apoio domiciliário, que possui a vantagem de manter a pessoa idosa no seu meio social, junto da sua família, vizinhos e amigos, passámos das 20 000 pessoas apoiadas, em 1995, para 40 000, em 1999, com o compromisso de este número duplicar durante a presente legislatura. No final deste ano, este serviço servirá cerca de 50 000 pessoas.
O Plano Avô, recentemente aprovado, mais que promover o aumento das respostas orientadas para as pessoas idosas, visa introduzir a melhoria acentuada da qualidade dos serviços de natureza social referenciados. Neste sentido, estão praticamente concluídas as normas que servem de base à certificação de qualidade destinada aos lares de idosos. De qualquer forma, lembro que foram criados os livros de reclamações nos lares públicos e privados, precedentes fundamentais na indução à melhoria dos serviços prestados.
A fiscalização efectuada pelos respectivos serviços do Ministério do Trabalho e da Solidariedade tem dinamizado um sentir social da importância de garantir um efectivo bem-estar às pessoas residentes nos lares. Mas se, por

Página 563

0563 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

um lado, aumentou a exigência na melhoria dos serviços a prestar à população idosa, por outro lado, estão a ser criadas as condições para o aparecimento e desenvolvimento dos projectos de qualidade promovidos pela iniciativa privada. Estão a ser desenvolvidos os trabalhos necessários para o efeito com a participação de representantes da iniciativa privada e das organizações dos consumidores.
Por outro lado, o turismo sénior, promovido pelo INATEL contempla um número cada vez maior de pessoas idosas, embora fosse nosso desejo que incluísse todos os que desejam participar neste programa. Fica o repto à iniciativa privada para seguir o exemplo do INATEL na criação de programas que visem a ocupação e dinamização da população idosa.
As crianças também têm merecido um apoio especial da parte do Governo. O desenvolvimento e promoção da educação pré-escolar, com a vertente educativa e o prolongamento do horário, atinge já hoje a esmagadora maioria das crianças da respectiva faixa etária.
O esforço desenvolvido pelo Governo no apoio às iniciativas públicas das autarquias, às instituições particulares de solidariedade social, às mutualidades e às misericórdias cresceu fortemente nos últimos anos através da alocação de verbas importantes, induzindo ao aumento do número das crianças a frequentar os estabelecimentos mas também à melhoria da qualidade do serviço prestado.
Recentemente adoptado, o programa Creches 2000, destinado às crianças até aos 3 anos, procura aumentar a criação dos lugares em equipamentos, quer seja em estabelecimentos públicos, privados ou sociais, mas também a melhoria da qualidade dos serviços prestados.
À semelhança do Programa de Apoio à Iniciativa Privada Social, destinado ao fomento da criação dos lugares em lar, está a ser criado um sistema de apoios à iniciativa privada que crie lugares em creche. Também será fomentada a criação de lugares em amas reconhecidas e credenciadas pela segurança social.
Nos referidos casos, em especial na educação pré-escolar e nas creches, estamos em presença de instrumentos fundamentais no apoio às famílias pela possibilidade que criam de permitir, em plena igualdade, o acesso de ambos os cônjuges ao trabalho ou, nos casos das famílias monoparentais, a possibilidade de suprir as dificuldades resultantes da sua dimensão.
Acresce, no caso específico das crianças e jovens em risco, a nova legislação adoptada que visa dar uma resposta mais eficaz aos problemas sociais e individuais resultantes do seu comportamento.
A separação das vítimas dos agressores permite, através de respostas do âmbito do sistema de justiça e do sistema da solidariedade e segurança social, adoptar medidas diversas mas mais adequadas a cada grupo e a cada criança e jovem em particular.
Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: A protecção da família contra os factores de destruição ou desagregação e a criação das condições que propiciem a realização pessoal dos seus membros impõem a adopção de medidas e tarefas, cujas políticas referidas constituem a resposta do Governo ao imperativo legal mas, especialmente, ao cumprimento efectivo do seu programa.
A aplicação das diversas políticas sociais de incidência familiar, de forma global e integrada, constitui uma prática do Governo. O Programa Global e Integrado de Apoio à Família, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 7/99, de 9 de Fevereiro, constitui uma referência e uma exigência na adopção de medidas de incidência familiar pelas diversas áreas do Governo.
Passo a referir exemplos de medidas de apoio à família, considerada como um todo, ou à realização pessoal dos seus membros.
A política fiscal, potenciada com a proposta de reforma, sobre a qual os Srs. Deputados vão ter oportunidade de se pronunciar brevemente, com a introdução da justiça fiscal e uma especial sensibilidade para as famílias, por via da isenção do pagamento do IRS quando possuam baixos rendimentos. Redução das taxas de incidência nos restantes escalões, ao que acrescem os abatimentos e as deduções com origem na dimensão da família, composição e despesas efectuadas;
As medidas activas para a criação e promoção do emprego, das quais destaco o Mercado Social de Emprego e o Programa Operacional de Emprego, Formação e Desenvolvimento Social, que visam actuar preventivamente perante os fenómenos de desemprego e promover a inserção social das pessoas com maior risco de desemprego de longa duração;
As prestações familiares, que assumem a discriminação positiva, através da qual o seu valor atinge montantes superiores para as famílias de mais baixos rendimentos mas também premeia as que têm mais filhos;
A oferta de formação e qualificação, fundamentais num ambiente de mudança das necessidades do mercado do trabalho;
O apoio às famílias mais carenciadas das prestações pecuniárias e as intervenções que visam melhorar as condições de vida e a integração social, realizadas através do rendimento mínimo garantido;
O Programa Nacional de Luta Contra a Pobreza, que tem promovido e apoiado, a nível nacional, projectos que visam minorar as assimetrias e desníveis económicos e sociais que afectam as famílias mais carenciadas;
O alargamento da rede de estabelecimentos para a educação pré-escolar pela sua importância para as crianças, em especial as oriundas de famílias mais carenciadas, bem como das creches, amas e famílias de acolhimento para as crianças até aos 3 anos de idade. Em ambos os casos, estamos perante medidas da maior importância na promoção da igualdade entre cônjuges, pela possibilidade que cria de ambos acederem ao mercado de trabalho, e também de inegável alcance no apoio às famílias monoparentais;
O aumento e diversificação de serviços prestados à população idosa, do lar de idosos ao apoio domiciliário, com incidência nos centros de convívio, famílias de acolhimento, centros de apoio temporário, entre outros;
A ocupação dos tempos livres através do turismo sénior, que é da maior importância na dinamização deste estrato etário;
Também as actividades dos tempos livres (ATL) para crianças mas, especialmente, para os jovens, a quais visam a respectiva ocupação em actividades úteis entre o período lectivo e o fim da jornada de trabalho do respectivo agregado familiar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A ocupação dos ATL atingiu uma dimensão tão importante que aconselha a sua regulamentação em vista à melhoria das suas potencialidades e, assim, constituir mais um instrumento de apoio às famílias. Esta análise está a ser feita de forma articulada com as associações

Página 564

0564 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

de pais, com os Ministérios da Educação e do Trabalho e da Solidariedade, com a Secretaria de Estado de Defesa do Consumidor, com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, com a Associação Nacional de Freguesias, com a Deco e com as instituições particulares de solidariedade social;
O aumento acentuado, mas ainda reconhecidamente insuficiente, das estruturas de apoio às crianças, jovens e adultos dependentes.
De uma maneira geral, a «cruzada» na melhoria das condições de funcionamento dos estabelecimentos e da prestação dos serviços de natureza social, quer possuam a natureza pública ou sejam promovidos pela iniciativa privada ou social.
De realçar que o Governo tem privilegiado a articulação e a parceria com as associações de famílias, as uniões das instituições particulares de solidariedade social, com as mutualidades, com as misericórdias, com os municípios e com as freguesias para adoptar a política de família, mas também a política social, que visa, directa ou indirectamente, a melhoria das condições de vida e de bem-estar das famílias.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Pacto de Cooperação para a Solidariedade Social, sobejamente conhecido de todos, é a referência máxima dessa parceria na concepção e promoção das políticas.
Com estas medidas de apoio directo às famílias consideradas como um todo ou indirectamente, por se destinarem aos seus elementos individualmente considerados, está a promover-se a melhoria das condições de vida e de bem-estar das famílias, realizando o dispositivo constitucional mas, em especial, o Programa do Governo.
Utilizando uma expressão mencionada pela Sr.ª Deputada Eduarda Azevedo na sua intervenção, é clamorosa a apatia do PSD quando não conhece estas medidas, que não estão apenas a ser implementadas e participadas pelo Governo mas, sim, em pareceria com toda a sociedade, parcerias estas cada vez mais activas e territorializadas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Em suma, e para terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, podem crer que lamento que o PSD não tenha tido o engenho e a arte de apresentar um projecto de lei de mais amplo alcance político e social.
Reprovado na anterior legislatura, não foram introduzidas modificações que permitissem uma outra consideração e apreciação. Não se vislumbram medidas e acções que corporizem o sentido de uma verdadeira e real lei de bases da família.
Pese muito embora as boas intenções na sua elaboração, o projecto de lei acaba por repetir ou nada acrescentar aos dispositivos constitucionais e constituir um retrocesso à legislação em vigor, maioritariamente produzida na vigência dos governos do Partido Socialista. Aliás, também quanto a este ponto, através das intervenções do PSD, há uma demarcação claramente assumida: para o PSD, as políticas de apoio às famílias farão parte da futura agenda política; para o Governo, elas estão na primeira página da actual agenda política, desde o primeiro dia, e continuam a estar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Estão na primeira página do discurso!

O Orador: - As medidas de política económica e social levadas a cabo pelo Governo constituem um contributo importante, mesmo fundamental, na melhoria do bem-estar das famílias.
Embora iniciado, estamos certos que existe um longo caminho a percorrer até que todas as famílias tenham um estatuto de dignidade e de bem-estar.
O Governo, com a sua política, está ciente que vai no sentido certo do cumprimento efectivo e pleno dos direitos humanos e da promoção dos direitos de cidadania. Só assim alcançaremos uma sociedade mais humana, mais justa e mais solidária, onde nós e as nossas famílias gostaremos de viver.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, chamo a vossa atenção para a presença, na tribuna do corpo diplomático, da Presidente do Grupo de Amizade Alemanha-Portugal, acompanhada de uma delegação, que veio participar na sessão de inauguração da exposição sobre o parlamento alemão, que terá lugar no Museu da Assembleia da República.
Peço uma saudação da Câmara.

Aplausos gerais, de pé.

Srs. Deputados, como o PSD não requereu a votação do diploma hoje em debate, está encerrada a sua discussão.
A Câmara volta a reunir amanhã, às 15 horas. Após um período antes da ordem do dia, procederemos ao debate da proposta de lei n.º 42/VII e do projecto de lei n.º 254/VIII, com votações regimentais às 18 horas.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 30 minutos.

Entraram, durante a sessão, os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
Manuel Francisco dos Santos Valente
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge

Partido Social Democrata (PSD):
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Henrique José Monteiro Chaves
José Manuel Macedo Abrantes
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Octávio Augusto Teixeira

Partido Popular (CDS-PP):
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da França

Página 565

0565 | I Série - Número 15 | 26 De Outubro De 2000

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
António Alves Martinho
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Dinis Manuel Prata Costa
Emanuel Silva Martins
João Rui Gaspar de Almeida
José Manuel de Medeiros Ferreira
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Maria José Vidal do Rosário Campos
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Vítor Manuel Caio Roque

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
António Paulo Martins Pereira Coelho
João Bosco Soares Mota Amaral
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
José de Almeida Cesário
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Manuel Joaquim Barata Frexes
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Pedro Manuel Cruz Roseta

Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Partido Popular (CDS-PP):
José Martins Pires da Silva
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Mota Soares
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Maria Helena Augusto das Neves Gorjão

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×