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Sexta-feira, 5 de Janeiro de 2001 I Série - Número 35

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 4 DE JANEIRO DE 2001

Presidente: Ex.mo Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte

Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
José de Almeida Cesário
António João Rodeia Machado
António José Carlos Pinho

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.

Antes da ordem do dia.- Deu-se conta da apresentação de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Manuel dos Santos (PS) salientou as reformas estruturais levadas a cabo pelo Governo, nomeadamente a reforma fiscal, tendo respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rui Rio (PSD) e Maria Celeste Cardona (CDS-PP).
Também em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) reclamou uma intervenção urgente no planalto de Santarém, onde, devido ao mau tempo que se tem feito sentir, já aluiu o monte de Alcáçova e parte da muralha histórica. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Jorge Lacão (PS), José Eduardo Martins (PSD) e Luísa Mesquita (PCP).
O Sr. Deputado António Martinho (PS) congratulou-se com a assinatura do contrato de concessão da auto-estrada Interior Norte, parte significativa do IP3, que considerou uma infra-estrutura fundamental para aquela zona do País, e chamou a atenção para a necessidade de construção de uma rede viária complementar. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Abelha, Adão Silva e Fernando Costa (PSD).
A Sr.ª Deputada Ana Manso (PSD) insurgiu-se contra o esquecimento com que os governos do Eng.º António Guterres têm tratado as gentes do distrito da Guarda, tendo, no fim, respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Bernardino Soares (PCP), Carlos Santos e Victor Moura (PS).
Foi aprovado um parecer da Comissão de Ética relativo à retoma e à substituição de dois Deputados do PS.
A Câmara aprovou o voto n.º 107/VIII - De pesar pela calamidade ocorrida na freguesia de Portela, no concelho de Arcos de Valdevez (PS), após o que a Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio. Intervieram, além do Sr. Presidente, os Srs. Deputados Artur Torres Pereira (PSD), Honório Novo (PCP), Henrique Campos Cunha (CDS-PP) e Manuel dos Santos (PS).

Ordem do dia.- Foi discutido, na generalidade, o projecto de lei n.º 257/VIII - Confere aos municípios o direito à detenção da maioria do capital social em empresas concessionárias da exploração e gestão de sistemas multimunicipais (PSD), tendo usado da palavra, a diverso título, além dos Srs. Secretários de Estado do Ambiente (Rui Gonçalves ) e dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães), os Srs. Deputados Manuel Moreira (PSD), Sílvio Rui Cervan (CDS-PP), Joaquim Matias (PCP), Renato Sampaio (PS), Fernando Costa e Jaime Marta Soares (PSD), Honório Novo (PCP), António Capucho (PSD), Isabel Castro (Os Verdes) e João Amaral (PCP).
Procedeu-se à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 316/VIII - Confirma o passe social intermodal como título nos transportes colectivos de passageiros e actualiza o âmbito geográfico das respectivas coroas (PCP), tendo intervindo, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado dos Transportes (Guilhermino Rodrigues), os Srs. Deputados Joaquim Matias (PCP), Herculano Gonçalves (CDS-PP), Lucília

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Ferra (PSD), José Manuel Epifânio (PS), Isabel Castro (Os Verdes) e Manuel Queiró (CDS-PP).
A Câmara aprovou ainda dois pareceres da Comissão de Ética autorizando um Deputado do PS e outro do PSD a deporem em tribunal, por escrito, como testemunha.
Finalmente, foi debatida, na generalidade, a proposta de lei n.º 37/VIII - Autoriza o Governo a aprovar um regime jurídico
para a concessão intermunicipal do serviço público de gestão urbana de uma área compreendida nos limites da Zona de Intervenção da Exposição Mundial de Lisboa (EXPO 98). Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado do Ambiente, os Srs. Deputados José Eduardo Martins (PSD), Manuel Queiró (CDS-PP), Honório Novo (PCP), Margarida Rocha Garizo e Casimiro Ramos (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 20 minutos.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Dinis Manuel Prata Costa
Eduardo Ribeiro Pereira
Emanuel Silva Martins
Fernando Alberto Pereira Marques
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gil Tristão Cardoso de Freitas França
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rodrigues Pereira dos Penedos
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António dos Santos
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Joaquim Barbosa Ribeiro
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria José Vidal do Rosário Campos
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Lontrão Carola
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António de Carvalho Martins
António d'Orey Capucho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha

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António Paulo Martins Pereira Coelho
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Manuel Marta Gonçalves
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando José da Costa
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Jaime Carlos Marta Soares
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maçãs
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Sancho Cruz Ramos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Alexandrino Augusto Saldanha
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Cândido Capela Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello Branco
António de Magalhães Pires de Lima
António José Carlos Pinho
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Mota Soares
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
Maria Helena Augusto das Neves Gorjão

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário da Mesa vai ler o expediente.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: na reunião plenária de 21 de Dezembro - ao Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Santos; a diversos Ministérios, formulados pelos Srs. Deputados Isabel Zacarias e Miguel Ginestal; ao Ministério da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados Joaquim Sarmento e Manuel Moreira; ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, formulados pelos Srs. Deputados Hermínio Loureiro e Machado Rodrigues; ao Ministério do Equipamento Social, formulado pelo Sr. Deputado Bruno Vitorino; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Costa; a diversos Ministérios, formulado pelo Sr. Deputado Cândido Capela; aos Ministérios da Cultura e da Saúde, formulados pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; ao Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; aos Ministérios da Saúde e da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado Pedro Mota Soares; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado João Rebelo.
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: no dia 29 de Dezembro -

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Mafalda Troncho, na sessão de 9 de Fevereiro; Manuel Moreira, nas sessões de 22 de Março e 3 de Outubro; Lino de Carvalho, no dia 19 de Abril; Eugénio Marinho, na sessão de 17 de Maio; Francisco Louçã, no dia 12 de Julho; Pedro Mota Soares, no dia 30 de Agosto e na sessão de 6 de Novembro; Altino Bessa, na sessão de 27 de Setembro; Luís Fazenda, na sessão de 4 de Outubro; Carlos Martins, na sessão de 11 de Outubro; Isabel Castro, na sessão de 7 de Novembro.
No dia 3 de Janeiro - Vicente Merendas, na sessão de 3 de Fevereiro; Barbosa de Oliveira, no dia 14 de Fevereiro; Natália Filipe, na sessão de 6 de Abril; Heloísa Apolónia, no dia 19 de Julho; João Rebelo, nos dias 28 de Julho e 30 de Agosto; Honório Novo e Bernardino Soares, no dia 13 de Setembro; Lucília Ferra, na sessão de 28 de Setembro; Manuel Moreira, na sessão de 4 de Outubro; Paulo Portas, no dia 10 de Outubro e Cândido Capela, na sessão de 30 de Novembro.
Foram ainda respondidos os requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: no dia 29 de Dezembro - José Cesário, na sessão de 4 de Outubro e Nuno Teixeira de Melo, na sessão de 2 de Novembro.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma declaração política, em nome do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: A grande crítica que, ao longo de cinco anos de governação socialista, tem sido feita pelos partidos da oposição ao executivo de António Guterres é a de ausência de reformas estruturais, sem que seja explicado como é que, de um momento para o outro, isto é, de há cinco anos para cá, se concluiu pela indispensabilidade das ditas reformas ou sem que, de forma mais concreta, sejam definidas as tão desejadas reformas estruturais.
Corrijo-me: há uma reforma que, sistematicamente, tem sido reclamada a da redução significativa da despesa pública e do peso de Estado, esquecendo-se sempre onde esteve a origem do aumento da despesa pública e sobretudo quem foi o chamado «pai do monstro».
Infelizmente, este clamor oposicionista tem tido eco, em certos casos, em determinados meios de comunicação social, sem que também das opiniões expressas nesses órgãos se possa concluir, muito claramente, sobre a intensidade e a identificação das reformas reclamadas.
É banal reclamar melhor saúde, melhor educação, melhores acessibilidades, maior competitividade das empresas públicas, melhor Administração Pública, melhor justiça, menor regulamentação da vida colectiva, melhor sistema eleitoral, melhor articulação dos órgãos nacionais, locais e regionais, etc., etc.
Só que estas reclamações são óbvias e, além de mais, eternas, pois haverá sempre lugar a melhorar tudo aquilo que é decisivo para a formação da riqueza e do bem-estar dos portugueses. Este é, aliás, o dever de todos os governos e não apenas dos governos socialistas.
Não é justo, contudo, ignorar completamente algumas reformas estruturais, segundo um critério dominante da classificação, que foram concretizadas pelos governos socialistas e que começam agora a exercer uma extraordinária influência sobre o nosso futuro.
Em primeiro lugar, a reforma das mentalidades, que permitiu criar uma nova relação entre governantes e governados sem crispações, em ambiente de diálogo e assente no princípio inabalável de que todos, e, portanto, também o Governo, podem errar.
Este é o espírito da nova maioria criada nos Estados-Gerais que com tanto sucesso foi aplicado, sobretudo, no primeiro governo de António Guterres,
Depois, a reforma da solidariedade, que permitiu, por um lado, a institucionalização do rendimento mínimo garantido que trouxe condições de dignidade indispensáveis a uma boa parte das famílias portuguesas e, por outro lado, permitiu consolidar o princípio da discriminação positiva a favor do crescimento das pensões sociais ou de mais baixo valor contributivo.
Aliás, também foi importante para esta reforma a atitude, ela própria uma reforma, do Estado em cumprir escrupulosamente as leis a que se obriga e, desde logo, a lei de bases do sistema de segurança social.
Também a reforma da escolaridade obrigatória, nomeadamente do ensino pré-escolar, que criou condições para a transformação do ensino em Portugal, cujos frutos, inequivocamente, serão colhidos em momento oportuno, como, aliás, está a suceder na Irlanda, que é um exemplo tantas vezes mal invocado aqui, neste Parlamento, alavancando, assim, as condições de sucesso para o futuro da sociedade portuguesa.
Por fim, a reforma das finanças públicas, que foi indispensável para a integração de Portugal na «Eurolândia», com todas as vantagens para o nosso crescimento económico e social daí decorrente e, sobretudo, com a garantia da criação de condições de enquadramento financeiro susceptíveis de permitir a modernização do tecido produtivo nacional.
Ainda a aplicação criteriosa dos II e III Quadro Comunitário de Apoio, que assenta em programas de desenvolvimento regional, económico e social, transparentes e claros, justos e equitativos, voltados para o futuro e para a indispensável modernidade da sociedade em que nos inserimos.
Srs. Deputados, surgiu agora a reforma fiscal. Trata-se apenas da primeira parte da reforma fiscal, aquela que diz respeito à tributação do rendimento das pessoas e das empresas. Quis-se, claramente, um modelo de justiça e equidade, defeniu-se inequivocamente um processo que é, simultaneamente, de desagravamento fiscal, de combate à fuga e à evasão e de instrumento de crescimento económico e modernização do País.
Optou-se por um modelo de intervenção activa no processo de desenvolvimento, rejeitando a neutralidade do sistema, tão cara às teses liberais. Poderia esperar-se que, finalmente, alguém notaria e no limite aplaudiria. Mas o que é que vemos e ouvimos? Os grupos económicos com ameaças de pressões, os analistas políticos com dúvidas, os partidos de direita preocupados com os votos dos partidos da esquerda, os meios de comunicação social incrédulos e, na maior parte das vezes, negativistas. Imaginar o mundo segundo as nossas próprias insuficiências e fragilidades parece, ainda, ser o destino de boa parte dos portugueses que militam nos partidos da direita.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Ainda sobre a reforma fiscal, que alguns consideram - e bem! - a principal de todas as reformas, e apesar de muito já ter sido dito dentro e fora deste Parlamento, vale a pena sinalizarmos três ou quatro pontos essenciais. Os últimos acontecimentos e reacções, nomeadamente dos grupos económicos, são significativos e, de algum modo, tiveram o mérito de qualificar e identificar totalmente a natureza desta reforma. Têm razão os Srs. Deputados da direita: a reforma fiscal é uma reforma socialista, é uma reforma que podemos qualificar à esquerda e, portanto, quando a qualificam dessa forma, têm VV. Ex.as muita razão, porque é uma reforma a favor de Portugal e dos portugueses.

Aplausos do PS.

E foi neste contexto que a reforma fiscal foi apresentada. O Sr. Primeiro-Ministro, aqui mesmo, quando apresentou as várias etapas que hão-de integrar a reforma fiscal, assegurou, de uma forma muita clara, que o objectivo não era a obtenção de maior receita fiscal, mas sim o de uma melhor repartição da carga fiscal por todos os portugueses levando aqueles que não pagam a pagarem e, sobretudo, levando aqueles que já pagam a pagar, se possível, bastante menos.
Lembro, aliás, aos Srs. Deputados que, segundo estudos insuspeitos, cerca de 25% (ou 2,5 milhões de contos), que podiam ser cobrados em termos de receitas fiscais em Portugal, não o são, porque há fuga e evasão fiscais.
Srs. Deputados, por um momento, imaginem que era possível cobrar essas receitas e imaginem que, segundo esta filosofia, de verdadeiro pacto de justiça fiscal, estabelecida entre o Governo e os cidadãos, seria possível, de um momento para o outro, reduzir, em mais de 30%, a carga dos portugueses que trabalham, e porque trabalham pagam impostos.
Portanto, Srs. Deputados, a grande característica desta reforma, que fique muito claro, é a do desagravamento fiscal e não precisamos de esperar muito tempo para ver e consolidar esta expectativa e para fazer a prova destas afirmações.
Espero apenas que os Sr. Deputados, e, já agora, os meios de comunicação social, estejam atentos aos recibos de vencimento dos trabalhadores por conta de outrem já a partir de Janeiro do ano corrente. Aí verificarão, inequivocamente, que, na maioria dos casos, principalmente nos casos de vencimentos mais reduzidos, o desagravamento fiscal é uma realidade inquestionável, é uma realidade incontornável.

Aplausos do PS.

Não é preciso esperar pelo fim do ano, basta esperar pelo fim de Janeiro do corrente ano para ter a prova provada do que estou a firmar.
Portanto, Srs. Deputados, não nos venham dizer que não fazemos reformas estruturais. As reformas estruturais, essenciais para o País, são feitas dia-a-dia, são feitas a todo o momento e nunca estão acabadas. E aquela que seria, será e, necessariamente, terá de ser, a essencial de todas as reformas estruturais, ou seja, a reforma fiscal, está neste momento em curso e será levada, seguramente, a bom porto por esta Assembleia da República com o impulso do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: A reforma fiscal está a ser feita para Portugal e para os portugueses. Para Portugal, porque, independentemente de outros objectivos, é preciso prosseguir o esforço de modernização e desenvolvimento que o País percorre de maneira acentuada nos últimos cinco anos; para os portugueses, porque é fundamental que paguem menos impostos, mas sobretudo que paguem os impostos que o seu dever de cidadania lhes impõe. E para esta tarefa de índole nacional todos os partidos, todas as forças sociais, todos os grupos de pressão têm de ser necessariamente convocados.
Esta não é uma tarefa exclusivamente partidária, embora o Partido Socialista tenha muito orgulho em a ter assumido e protagonizado; esta é uma tarefa nacional e, portanto, nenhum partido, sobretudo aqueles que querem ter responsabilidades governativas, se pode eximir deste tipo de responsabilidades.
É, pois, lamentável que, neste quadro, o principal partido da oposição se tenha colocado completamente fora da reforma fiscal, tenha estado sistematicamente contra a reforma fiscal, como aliás ficou evidenciado, na semana passada, num insólito comunicado da direcção do Sindicato dos Quadros Bancários, afecto a VV. Ex.as e também ao PP,…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: - …onde se faziam os mais primários ataques e as mais insidiosas acusações à reforma fiscal. Isso espelha bem qual é o vosso pensamento sobre esta importante reforma que, infelizmente, também espelha bem a expectativa que podemos ter em relação a VV. Ex.as.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Rui Rio e Maria Celeste Cardona.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio.

O Sr. Rui Rio (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, considero espantoso que o PS venha falar nestes assuntos, porque esta matéria, de forma notória, incomoda politicamente o PS, portanto devia falar em coisas mais agradáveis.
O Sr. Deputado começou por falar em reformas estruturais, que reformas estruturais se fizeram e o que é que se está a notar das tais reformas estruturais. Em matéria de segurança social o que é que se nota? O que é que alterou na segurança social depois da aprovação de uma nova lei-quadro? Não aconteceu, nem vai acontecer nada!
Relativamente àquilo que os senhores chamam reforma fiscal, e que foram umas alterações aos Códigos do IRC e do IRS, vêm aqui dizer que os primeiros sintomas são positivos. Mas, Sr. Deputado, os primeiros sintomas não poderiam ser mais negativos, com a saída de capitais e com todos, na prática, a contestarem aquilo que os senhores fizeram.

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Sr. Deputado Manuel dos Santos, permita-me que lhe diga o seguinte: o senhor disse que há uma diminuição da carga fiscal e que ganha quem tem pago os seus impostos. Porém, Sr. Deputado é o contrário: a receita fiscal, em 2001, vai crescer 9,2%, o produto crescerá cerca de 6%, pelo que para que isso que o senhor disse seja verdade era preciso que o crescimento fosse igual; ora, ao não ser igual quer dizer que os senhores fizeram estas alterações para terem mais receita e com isso fazerem mais despesa. Os senhores reduziram o IRS de uma forma minúscula e aumentam a vossa despesa e a vossa receita em 9,2%.
Portanto, estas alterações aos Códigos foram feitas para os senhores terem mais receita, para os senhores gastarem mais e não para os portugueses pagarem menos impostos. Esta é verdade! Por isso digo que fico espantado como V. Ex.ª fala nesta questão, sujeito a que isto lhe seja dito.
Sr. Deputado, a questão que quero colocar-lhe tem outra profundidade em termos estruturais.
Portugal recebeu o I e o II Quadros Comunitários de Apoio, estando agora no âmbito do III Quadro Comunitário de Apoio, que é significativo, o maior que até à data recebeu. Durante o I e o II Quadros Comunitários de Apoio Portugal convergiu com a União Europeia. Exactamente quando começa a receber o seu terceiro Quadro Comunitário de Apoio, o maior e o último, Portugal começa a divergir, ou seja, Portugal diverge no momento em que mais é ajudado para convergir.
Se eu perguntar ao PS de quem é a responsabilidade disto, o que me responde? Alguns responderão que a responsabilidade ainda é do cavaquismo, ou seja, culparão o cavaquismo; outros, mais drásticos, dirão que a responsabilidade é do povo, que o povo não é capaz!
A pergunta que lhe faço, Sr. Deputado Manuel dos Santos, é a seguinte: de quem é a responsabilidade de Portugal começar a divergir no momento em que mais ajudado é para convergir com a União Europeia?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim entender, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, V. Ex.ª fez vários comentários e deixou várias perguntas, mas não poderei responder-lhe sistematicamente a todas por ausência de tempo, como perceberá. Porém, há uma rejeição preliminar que quero fazer, referente à sua ideia de que esta reforma visa arranjar mais receita fiscal.
Sr. Deputado, permita-me que lhe diga, com simpatia, no início do novo milénio, sem que veja nisto nada de ofensivo - agora tenho de ter muito cuidado de cada vez que esgrimo aqui os meus argumentos, pois, caso contrário, é logo pedida a palavra para defesa da consideração -, que o caminho mais fácil seria o PS ter lançado um imposto sobre a demagogia: V. Ex.ª pagaria imenso e as receitas fiscais aumentariam também imenso, Sr. Deputado!

Aplausos do PS.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - O Manuel Monteiro também pagava!

O Orador: - Não seguimos esse caminho! Foi claramente proposto um pacto de justiça fiscal, que parte da divisão do bolo, ou, se quiserem, do queijo, que não cresce, por um número maior e mais significativo de pessoas. Aliás, tive o cuidado de dizer-vos que, segundo um estudo insuspeito, que o senhor também conhece, neste momento são não cobradas, em Portugal, receitas fiscais da ordem de 2,5 milhões de contos.
Bastava que esses impostos e essas receitas fossem cobradas,…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - E vão ser!

O Orador: - … para que, por uma distribuição equitativa pela restante base de colecta, diminuíssem significativamente os impostos, sobretudo daqueles que pagam.
Porém, Sr. Deputado Rui Rio, o senhor não pode continuar a confundir - faço-lhe um apelo como colega de uma escola de mérito e de excelência que ambos frequentámos - receita fiscal com carga fiscal, com pressão fiscal e com estrutura fiscal. O que o senhor disse é uma confusão pegada! Qualquer professor do 1.º ano chumbava-o liminarmente!

Protestos do PSD.

O senhor disse que a receita fiscal vai crescer cerca de 9% enquanto o crescimento do produto é só de cerca de 6%. Então, por que cresce a receita fiscal, Sr. Deputado, admitindo que isso acontece?! Cresce por causa do crescimento do produto, mas também por causa das medidas de luta contra a evasão e fraude fiscais!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Claro!

O Orador: - Não tem nada a ver com o que o disse, Sr. Deputado Rui Rio! Já expliquei isto 10, 15, 20 vezes e começo a ficar cansado!… O senhor não consegue aprender, portanto, não há nada a fazer! Esta é a questão essencial!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Quanto à questão da convergência, Sr. Deputado, penso que só a si disseram que vai haver divergência, porque é suposto medir-se esse aspecto no fim do ano seguinte.
Sr. Deputado, para não me cansar muito - não é meu hábito fazê-lo, mas quando é de boa proveniência utilizo este recurso -, aconselho-o a ler um artigo excelente, publicado no último Diário de Notícias, por um homem sério da área política do CDS-PP, o Professor Xavier Pintado,…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Da nossa área política são todos sérios!

O Orador: - … sobre as reais condições de evolução, nos últimos anos, da economia portuguesa e as perspecti

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vas da sua evolução para o futuro. Talvez aí o senhor possa encontrar muita explicação para as asneiras que diz em termos de convergência e de divergência, que não têm base científica alguma.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, ouvi-o com atenção falar de temas que, como sabe, me são caros, relativamente aos quais trabalhei de forma árdua em conjunto com Deputados de outras bancadas, inclusive da sua.
Já disse isto várias vezes, mas gostaria de referir aqui que os vossos objectivos são por nós partilhados, isto é, queremos baixar os impostos de quem já muito paga. Porém, Sr. Deputado Manuel dos Santos, há uma coisa que o senhor não pode dizer com ar de quem diz verdades indesmentíveis: admitindo que vai haver, de facto, diminuição de impostos, isso só se verificará, no que diz respeito aos trabalhadores por conta de outrem, no final, nos reembolsos.
A actualização das taxas de retenção era uma obrigação que não decorre desta reforma fiscal, Sr. Deputado!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - O senhor sabe isso tão bem quanto eu!
Era uma vergonha o que estava a passar-se! As taxas de retenção - indico-lhe o artigo, se quiser - estavam completamente desactualizadas das taxas de imposto que deviam ser pagas. Era uma vergonha que o Estado ficasse com o dinheiro dos contribuinte e só no final do ano, com muitos meses de atraso, procedesse ao respectivo reembolso.
Já agora, deixe-me dizer-lhe que quanto a juros indemnizatórios também estamos conversados: ninguém está pagando juros a quem deixa lá o seu dinheiro durante um ano inteiro!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não é verdade!

A Oradora: - Se este é o pacto de justiça fiscal que o PS quer fazer com quem paga, desculpe-me a expressão, mas «vou ali e já venho», como dizia no outro dia!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Deputado Manuel dos Santos, queria também chamar-lhe a atenção para o seguinte: houve alguém, neste Parlamento, que, atempadamente, avisou para as consequências que pressentíamos que iriam ocorrer com esta reforma fiscal, como os senhores lhe chamam.
Não foi preciso esperar muito tempo. Começámos bem recentemente a ver artigos, comentadores e pessoas que lidam com estas matérias preocupados com várias vertentes daquilo que os senhores designam de reforma fiscal.
Para além de avisos que foram sendo feitos no que diz respeito à possibilidade de esta reforma fiscal levar os capitais a investir noutros países, parece que algumas empresas pretendem deslocar as suas sedes para outros países.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Está de acordo com isso?!

A Oradora: - Deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que se trata de países que tratam bem a riqueza, o crescimento e o desenvolvimento!

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Pois é!

A Oradora: - São países que percebem que lhes resta a política fiscal para captar investimentos. Sabe para quê, Sr. Deputado? Para criar riqueza! Sabe para quê, Sr. Deputado? Para que os seus cidadãos enriqueçam e paguem mais impostos! Isto é muito simples, não tem nada de enganar!
Julgo que deslocar sedes de empresas, na liberdade de movimentos de capitais e de trabalho, não é nada que possa ser perseguido do ponto de vista fiscal.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Manuel dos Santos, pergunto-lhe, muito sinceramente, como vai resolver esta questão. Será, como alguns já dizem, reformando a reforma?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, começaria por agradecer à Sr.ª Deputada Maria Celeste Cardona a ajuda que me deu, pois em boa parte concordou com referências que aqui fiz, nomeadamente reconheceu, embora fazendo a ligação a outro tipo de origem, que os trabalhadores portugueses, a partir de Janeiro deste ano, vão ver significativamente diminuída a sua retenção na fonte.

Protestos do CDS-PP.

Aliás, cá estaremos para ver os recibos na altura própria!
Sr.ª Deputada, também lhe agradeço os aspectos em que divergiu de mim, porque há uma coisa de que tenho a certeza (aliás, fizemos vários debates sobre esta questão com elevação, respeito e amizade): a minha reforma fiscal, a reforma fiscal do Grupo Parlamentar do PS não é a sua reforma fiscal, não é a reforma fiscal do seu grupo parlamentar. Isso é claro como água, Sr.ª Deputada!

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Esse é que vai ser o problema!

O Orador: - Por acaso, estou espantado que um partido como o PSD, que quer ser governo um dia, se coloque desta maneira simplista e primária fora desta reforma estrutural, como se colocaram. Isso é que me espanta!
Porém, que o PCP assuma aqui a sua natureza de partido de classe e defenda os interesses da classe que repre

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senta não me espanta nada. Ainda bem que estão aí! Ainda bem que este tipo de interesses se encontra representado na Assembleia da República. Essa é a questão de fundo!
Por exemplo, a Sr.ª Deputada falou muito na influência da reforma fiscal no crescimento económico e nos processos de desenvolvimento económico e social. Eu disse que, ao contrário das teses liberais, para nós, socialistas, a política fiscal deve ser um instrumento activo de intervenção,…

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Então, usem-na!

O Orador: - … não deve ser neutral. Não se deve limitar a financiar minimamente, como os senhores desejariam, a despesa pública, deve ter um sentido de intervenção.
Por exemplo, tributar a riqueza, sobretudo a especulativa, é um objectivo social perfeitamente pensável por mim, pela minha bancada e pelos partidos de esquerda! Isso é fundamental!

Aplausos do PS.

Protestos do CDS-PP.

Distribuir a carga fiscal de forma mais equitativa, fazendo uma discriminação positiva a favor dos que trabalham, é perfeitamente legítimo para mim, para a minha bancada e para os partidos de esquerda, Sr.ª Deputada!
A senhora vem falar na fuga de capitais. Bem, podemos conversar sobre isso no corredor, porque já ouvi muitas «histórias» desde que a reforma foi promulgada pelo Sr. Presidente da República, já várias pessoas me perguntaram como poderiam resolver problemas que criaram no passado. Que os resolvam como entenderem, porque esses problemas foram criados no passado de forma ilegal e, sobretudo, o que para mim é muito mais importante, socialmente injusta à fuga de capitais.
Mas esses capitais pagavam alguma coisa ao erário português até este momento?

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Claro que não! Evasão total!

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Pagavam, sim!

O Orador: - O drama é que já não pagavam! Portanto, se já não pagavam, então, continuem a não pagar! Mas espere pela volta, Sr.ª Deputada, porque quando esses capitais chegarem aos ordenamentos jurídicos e fiscais da Espanha, da Alemanha, da Inglaterra, da Itália ou de outro qualquer país (não estou a pensar nos que fogem mas, sim, nos tais outros, e a Sr.ª Deputada sabe a que me refiro) e as pessoas perceberem que vão ter de pagar muito mais vão retornar a Portugal. Não tenho sobre isso dúvida alguma!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Maria Celeste Cardona (CDS-PP): - Baixa a receita, sobe o rendimento mínimo!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aluiu parte do monte de Alcáçova e com ele parte da muralha histórica de Santarém e da EN114. Está tudo a vir abaixo, depois de anos e anos de degradação progressiva perfeitamente visível e dos consequentes alertas de várias entidades e organizações!
O LNEC (Laboratório Nacional de Engenharia Civil) elaborou estudos e relatórios que sempre apontavam para a urgência de uma intervenção adequada, designadamente com a drenagem das águas pluviais, com o saneamento básico com implicações nas encostas, com a limpeza das linhas de água que jorram pelas barreiras da cidade, com a rearborização para suster essas mesmas barreiras, com o controlo do espaço urbanístico que pesa sobre as encostas do planalto escalabitano e com a intervenção urgente sobre os impactos das vibrações provocadas pela passagem do comboio junto ao planalto de Santarém.
A própria candidatura de Santarém a património mundial pela UNESCO foi um alerta, na medida em que foi suspensa, em grande parte, devido ao estado de degradação e de fragilidade das várias encostas.
Perante tudo isto, incompreensivelmente, a resposta do Governo tem sido profundamente inadequada. A inércia tem vingado e, com toda esta passividade das entidades responsáveis, as barreiras de Santarém têm sido objecto de uma degradação progressiva e, agora, fatal numa parte fundamental e significativa.
Digo «fatal», Sr. Presidente e Srs. Deputados, porque o técnico do LNEC que ontem esteve no local já deixou claro, segundo a informação que tenho, que, numa parte, já não é possível recuperar o património perdido e que as ameaças de maiores derrocadas são previsíveis.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Verdes fizeram várias propostas, em sede de Orçamento do Estado, com o objectivo de garantir uma verba específica para intervenção sobre as encostas do planalto escalabitano. Infelizmente, essas propostas foram rejeitas pelo PS.
Provavelmente, se as propostas de consagração de verba para o fim referido que Os Verdes já haviam apresentado noutros orçamentos do Estado tivessem passado, as quais se destinavam a intervenções de conservação e de prevenção da degradação das barreiras, hoje, não se gastariam milhares de contos a procurar repor património, em alguma parte já irrecuperável. O princípio da prevenção é, na verdade, sempre o que acarreta menores custos, que não restem dúvidas sobre isso.
Os Verdes dirigiram também, ao longo dos anos, sucessivos alertas, quer localmente, quer na Assembleia da República, onde tomámos iniciativas de pressão sobre o Governo no sentido de procurar garantir uma acção urgente sobre o valioso património histórico-cultural e natural em questão, património esse de valor nacional, como afirmou o representante do Governo em resposta a Os Verdes numa sessão de perguntas ao Governo, afirmando que «o que está em causa é, acima de tudo, um patri

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mónio que não é só de Santarém, é um património nacional, de todos».
Aliás, nessa mesma resposta, em Abril de 1998, o Sr. Secretário de Estado Ricardo Magalhães referiu que «foi criada, há alguns meses, uma equipa e quando eu estiver de posse de resultados objectivos virei aqui, quando bem entenderem, traduzir esse programa de acção. No entanto, quantas vezes aqui venho e me apontam o dedo porque só adianto exercícios de planeamento? Pois bem, este não é um exercício, é um programa de acção e quando o tivermos pronto, com todo o gosto, virei apresentá-lo à Assembleia da República». Como bem alertava a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita num aparte, nessa mesma sessão, «se ainda houver encostas»!
Estamos, pois, no início de 2001 e esta Assembleia nunca conheceu qualquer plano de acção. Pior: o monte de Alcáçova está a aluir e com ele as muralhas e a EN114.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta declaração pretende ser mais um alerta para a necessidade de intervenção sobre todo o planalto de Santarém. Hoje já há, como referi, património destruído e irrecuperável, mas é preciso intervir urgentemente sobre a globalidade das encostas, sob pena de ameaça séria de derrocada de boa parte desta base de Santarém e da consequente ameaça de pessoas e bens.
Porque a Assembleia da República não pode alhear-se desta questão, Os Verdes já propuseram uma deslocação a Santarém da Comissão de Administração e Ordenamento do Território, Poder Local e Ambiente, convidando também as Comissões de Educação, Ciência e Cultura e de Equipamento Social, para que, em concreto, se veja a degradação do património aí provocada pelo mau tempo, agravada pela falta de vontade política, traduzida em incapacidade de intervir atempadamente sobre este património e também a necessidade de intervenção, não só sobre a generalidade das barreiras em concreto mas ainda sobre os planos de edificações que nelas se suportam e sobre a linha de comboio, que deve ser desviada devido às vibrações provocadas, que, segundo o LNEC, têm implicações significativas.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, Os Verdes lamentam profundamente ter tido razão quanto às previsões que fizeram em relação ao desabamento das barreiras, porém, esta previsão não se sustentava em qualquer bola de cristal ou em crispação política, baseava-se antes num olhar atento sobre a situação do planalto escalabitano, bem como em relatórios técnicos conclusivos sobre o estado da situação. Com tudo isto contrastou a inércia e a passividade do Governo.
Quero, por fim, em nome do Grupo Parlamentar Os Verdes, saudar os Bombeiros Voluntários de Santarém e os trabalhadores da Câmara Municipal de Santarém, que, durante todos estes dias, com os riscos inerentes ao estado da encosta, tentaram fazer tudo o que estava ao seu alcance para minimizar os efeitos do mau tempo sobre o planalto de Santarém e o monte de Alcáçova em concreto.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Jorge Lacão, José Eduardo Martins e Luísa Mesquita.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente e Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, quero, em primeiro lugar, manifestar-lhe compreensão e uma atitude solidária entre todos aqueles que quiserem exprimir, de forma positiva, uma preocupação pelo problema sério e real que se vive no planalto de Santarém e particularmente no monte de Alcáçova.
É uma questão estrutural, como todos sabemos, é um sério problema de instabilidade geológica daquela zona, manifesta e criticamente afectado pela onda de temporais que estão a assolar o País em geral e a região de Santarém particularmente, problema este que, como também sabemos, se agudiza numa outra dimensão que a Sr.ª Deputada não tratou - não tinha de tratar tudo em simultâneo -, ou seja, as cheias, que preocupam - e muito! - as populações ribeirinhas do Ribatejo.
No sentido em que a Sr.ª Deputada aqui exprimiu a intenção de mobilizar a atenção dos Deputados e, inclusivamente, de fazer uma visita ao local para acompanhamento da situação, permito-me desde já declarar, particularmente, interpretando também o ponto de vista e a posição dos Deputados de Santarém eleitos nas listas do Partido Socialista, inteira disponibilidade para incrementar essa iniciativa.
Ontem mesmo, e ao longo de um largo período da tarde, eu próprio acompanhei o que se está a passar no monte de Alcáçova, tendo testemunhado o esforço feito pelas autoridades locais - pelo Presidente da Câmara, pelo Governador Civil em representação do Governo, pelos Serviços de Protecção Civil, pelos bombeiros, como a Sr.ª Deputada aqui referiu - no sentido de minimizar o problema e de evitar o pior, na medida em que situações destas ainda possam, de alguma maneira, ser minimizadas.
Também testemunhei que, por um lado, o IPAAR tem vindo a acompanhar a situação - como sabe, há obras noutras zonas do planalto e das encostas que têm vindo a merecer a intervenção activa do IPAAR - e, por outro lado, que o LNEC está a fazer levantamentos dos danos mais recentemente ocorridos, numa tentativa de encontrar respostas técnicas adequadas, que obviamente não resultarão nunca do discurso tribunício e têm de resultar da capacidade de intervenção técnica aplicada aos problemas locais.
Neste sentido, o que eu quero testemunhar à Sr.ª Deputada é que ninguém está de olhos fechados…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, a sua eloquência é irresistível, mas o Regimento é irredutível. Tem de terminar.

Risos.

O Orador: - Sr. Presidente, tem toda a razão, e com a sua observação me calarei, testemunhando à Sr.ª Deputada que, construtivamente, tudo faremos para ajudar a minimizar o problema de Santarém, que a todos preocupa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, quero, em primeiro lugar, registar com agrado a disponibilidade do Grupo Parlamentar do Partido Socialista para aceitar a proposta que Os Verdes fizeram no sentido da deslocação de uma delegação de Deputados a Santarém, o que me parece perfeitamente necessário para que essa delegação de Deputados possa inteirar-se, em concreto, da situação que hoje se vive no planalto de Santarém.
No entanto, gostava de fazer o reparo seguinte: o Sr. Deputado manifestou agora toda a disponibilidade para minimizar os efeitos já provocados pelo mau tempo, agravados, na nossa perspectiva, pela inércia do Governo relativamente a esta matéria, mas bom teria sido, Sr. Deputado, que se tivessem unido esforços para evitar o que aconteceu.
Portanto, como referi na minha intervenção, o princípio da prevenção é sempre o que acarreta menor custos e também menos dissabores. Neste caso concreto, porque de facto estamos aqui a falar da perda de um património histórico-cultural extremamente relevante, de grande valor nacional, o que importava não era minimizar os efeitos do que já aconteceu mas sim evitar que tivesse acontecido aquilo que aconteceu.
O Sr. Deputado falou também da necessidade de encontrar agora respostas técnicas adequadas, mas essas respostas técnicas adequadas estavam encontradas há já muito tempo e constam dos sucessivos relatórios e estudos feitos pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil. O que faltava apenas era vontade política para a concretização dessas respostas técnicas já levantadas. Agora vamos levantar respostas técnicas para quê?! Para aquilo que se estragou?! Para tentar recuperar o que é irrecuperável?!
Sr. Deputado, pena é que tenham acordado tão tarde.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, saudamos, obviamente, a oportunidade e o interesse da sua intervenção, até porque não é preciso ser escalabitano - e eu não sou - para sofrer com aquilo que se viu ontem nas Portas do Sol, que são património de todos os portugueses, como é património de todos os portugueses aquela muralha.
Sr.ª Deputada, a primeira pergunta que quero colocar-lhe diz respeito à muralha de Santarém e é a seguinte: conhece alguma iniciativa concreta da Câmara Municipal de Santarém, socialista há 25 anos, alguma iniciativa concreta, para além da propositura, no papel, do Centro Histórico de Santarém a património mundial, para tratar aquela muralha? É que a única intervenção que lá houve foi a levada a cabo pelos privados que aí exploram uma unidade hoteleira. E o resultado está à vista!
Depois, o Sr. Deputado Jorge Lacão falou - e muito bem - que os problemas não se resolvem com discursos tribunícios mas sim com acção. E, como falou das cheias, vou recordar-lhe qual tem sido a acção do Governo socialista relativamente às cheias e ao desassoreamento das valas de Alpiarça e de Azambuja, essenciais para a drenagem das cheias do Tejo: antes da chegada do Governo socialista havia hastas públicas para a extracção de inertes no Tejo, o preço das areias era de 300$/m3 e proporcionava uma receita de 0,5 milhões de contos, que fazia o desassoreamento dessas duas valas; com a chegada do vosso Governo o preço da areia baixou para 50$/m3, concursos públicos nem vê-los, dinheiro não há, a receita perdeu-se em 0,5 milhões de contos/ano…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Já lá foi agora?

O Orador: - Eu não preciso de lá ir agora porque estive lá há um mês e vi a situação em que estão as valas de Alpiarça e da Azambuja. Se aquela cheia não está a ser drenada é porque os senhores tiveram como propósito a quebra de receitas do Estado, necessárias para fazer essa intervenção.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - O senhor é muito novo!…

O Orador: - Sr. Deputado, eu posso ser novo, mas tenho memória de, há muitos anos, quando os governos eram do PSD, vê-lo a passear de barco nas cheias. Mas este ano, Sr. Deputado, ainda não o vi lá!

Risos.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - O pedido de esclarecimento foi mais dirigido ao Sr. Deputado Jorge Lacão, mas quem tem de responder é a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Deputado, na parte que toca aos comentários e às perguntas feitas ao Sr. Deputado Jorge Lacão terá de ser ele a responder.
Aquilo que gostaria de referir é que registo, naturalmente, o apoio do PSD à iniciativa de Os Verdes.
Quanto à falta de iniciativa e à inércia do Governo sobre esta matéria também já a isso me referi, mas é bom lembrar-nos há quanto tempo a degradação progressiva do planalto de Santarém vem acontecendo.
O Sr. Deputado referiu também um problema extremamente importante, o da extracção de areias, que Os Verdes consideram também profundamente escandaloso. No entanto, creio que tem conhecimento de uma iniciativa que tomámos junto da Comissão de Administração e Ordenamento do Território, Poder Local e Ambiente, no sentido de esclarecermos algumas questões relativamente a esta matéria escandalosa.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, começo por dizer que partilho com a Sr.ª Deputada todas as preocupações que aqui trouxe e que a minha disponibilidade para todas as acções propostas é total. Penso que fez bem em lembrar a todos nós que esta não é a primeira vez, agora que a queda da muralha se concretizou, que a questão é trazida a esta Assembleia.

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Em 1996, numa intervenção feita exactamente no mês de Janeiro, quando o Inverno era também rigoroso, a questão foi também aqui discutida. A nossa preocupação - e fui eu quem fez essa intervenção - era não só a queda das muralhas, património classificado desde 1917, como também o ruir das barreiras de toda a encosta do planalto e a sua queda sobre a linha férrea, tendo então lembrado que era preciso tomarem-se medidas preventivas. Não falávamos por adivinhar o que iria acontecer, fizemo-lo porque partilhávamos também os estudos dos técnicos do Laboratório Nacional de Engenharia Civil, que, desde o início da década de 80, se deslocam a Santarém quase todos os invernos para dizer à autarquia socialista e ao Sr. Governador Civil que correm risco as muralhas das Portas do Sol e que correm riscos as barreiras que envolvem todo o planalto, concretamente com a indicação de medidas muito claras, concretas e objectivas, que passam por um saneamento básico melhorado, que passam por aquilo que será a preocupação do escoamento pluvial devidamente confinado e não espalhado por todas as barreiras, que passa por uma política de solos conveniente, por um ordenamento territorial que não é cumprido no planalto de Santarém, porque é demasiado reduzido para a especulação imobiliária e, logo, há que fazer crescer o planalto, criando um território não sustentado e pondo em perigo inúmeras casas de habitação e não só as barreiras e as muralhas.
Portanto, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e Sr. Deputado Jorge Lacão, não estamos a falar de tragédia, estamos a falar de incúria, de negligência e de irresponsabilidade. A incúria, a negligência e a irresponsabilidade têm nome: no Governo é o Governo do Partido Socialista, na autarquia escalabitana é o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Santarém, do Partido Socialista, na governação civil é o Sr. Governador Civil do distrito de Santarém.
Quero dizer-lhe também que se partilho com a Sr.ª Deputada as suas preocupações não posso partilhar a leviandade televisiva do Sr. Governador Civil e do Sr. Presidente da Câmara,…

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - … que disseram, durante 48 horas, que aquilo que aconteceu em Santarém foi perfeitamente imprevisível, passando um atestado de perfeita nulidade a todos os técnicos e investigadores que, ao longo dos anos, se deslocaram a Santarém, prevendo o que iria acontecer. E vai acontecer com certeza, porque já caíram 15 m, 50 estão para cair, a EN114 está interrompida e se não tivéssemos hoje a ponte Salgueiro Maia não seria possível passar para a zona sul do distrito.
Aliás, a situação das cheias em Santarém não é uma calamidade, não é uma tragédia. É, sim, uma boa causa, já que estamos perante uma planície aluvial que, caso aproveitada, daria de comer a Portugal inteiro.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, se assim o entender, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (PCP): - Sr. Presidente, gostava também de registar o apoio do PCP às iniciativas tomadas pelo Grupo Parlamentar de Os Verdes e frisar que a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, conhecedora da matéria, já que é da região, tem intervindo bastante sobre esta questão, nomeadamente ao nível parlamentar.
Parece-nos, Sr.ª Deputada, que quando o Partido Socialista conhece as más consequências da sua política, onde incluo também, naturalmente, as omissões da sua governação, gosta de justificá-las com a inevitabilidade. Ora, na nossa perspectiva, a derrocada das barreiras de Santarém não são uma inevitabilidade, como não são, de forma alguma, uma imprevisibilidade, porque os sucessivos relatórios e estudos apontavam precisamente para estas ameaças.
Portanto, creio eu, ao Partido Socialista resta apenas assumir a sua responsabilidade nesta matéria.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção sobre assunto de interesse político eventualmente relevante, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Teve lugar, no passado dia 30, no Salão Nobre da Câmara Municipal de Chaves, a assinatura do contrato de concessão da auto-estrada Interior Norte ao consórcio NORSCUT.
Esta concessão, tal como outras já adjudicadas pelo Governo, inclui a concepção, construção e exploração de uma parte significativa do IP3, estende-se da fronteira de Chaves até Viseu, numa extensão de 150 Km, com um investimento superior a 100 milhões de contos e encurtará para metade o tempo que actualmente demora a percorrer a distância que separa aquelas duas dinâmicas cidades do Interior Norte do País.
Se alguma dúvida subsistisse sobre a importância do IP3 como infra-estrutura fundamental para todo o Interior Norte, ela ter-se-ia dissipado na cerimónia a que me refiro. Aliás, nas palavras do Primeiro-Ministro, que presidiu, esta auto-estrada constitui mais um passo para dar resposta a dois objectivos que o actual Governo definiu para as infra-estruturas rodoviárias, a saber: transformar uma rede de auto-estradas do litoral numa verdadeira rede nacional de auto-estradas e duplicar a actual rede existente. Mas, ainda nas suas palavras, ela mostra-se de grande importância não só para todo o Interior Norte, designadamente, para a região de Trás-os-Montes e Alto Douro e, de uma forma ainda mais evidente, para o distrito de Vila Real, mas também para todo o País.
Não estranhei, pois, a presença maciça de tantos flavienses, que souberem merecer esta visita do Primeiro-Ministro e de mais quatro membros do Governo, quando, há meses atrás, manifestaram o seu desencanto pelo atraso no avanço desta obra e vieram para a rua reivindicá-la. Mas estiveram também presentes autarcas dos distritos de Vila Real, Bragança e Viseu, bem como Deputados eleitos por Vila Real e Viseu. E, para reforçar a ideia da sua importância transfronteiriça, participou ainda na cerimónia o Presidente do Governo Regional da Galiza, Fraga Iribarne, acompanhado por autarcas e outras personalidades daquela região vizinha.

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Realço este facto, Srs. Deputados, e sublinho a diversidade e a pluralidade destas presenças, porque assim se reconhece o valor desta infra-estrutura, que pode desempenhar um importante papel no desenvolvimento de toda a região. O seu traçado não andará muito longe do que foi, até 1992, a linha do Corgo ou a actual EN2, que, por sua vez, acompanharam as depressões dos rios Tâmega e Corgo no percurso que respeita ao distrito de Vila Real. Ela constituirá como que a «espinha dorsal», em termos de rodovias, deste mesmo distrito, ligando os concelhos de Chaves, Vila Pouca de Aguiar, Vila Real, Santa Marta de Penaguião e Peso da Régua.
Ora, uma correcta estratégia de desenvolvimento impõe que se passe de imediato à fase seguinte, que é a da preparação da construção de uma rede viária complementar ou beneficiação da rede existente que possibilite uma ligação rápida e segura dos restantes concelhos a este itinerário principal e às cidades e vilas que atravessa. Assim se explica a necessidade de melhorar com urgência a EN103 entre Montalegre e Chaves, as estradas Boticas/Vidago, já em fase de adjudicação, bem como as de Valpaços/Vila Pouca de Aguiar, Mondim de Basto/Vila Real, Sabrosa/Vila Real, assim como o arranque, sem hesitações, do IC5 e do IC26.
Este eixo, que se estende de Verín a Peso da Régua, e, porque não dizê-lo, a Lamego, Castro Daire e Viseu, constituirá, assim, uma força centrípeta que dará coesão a toda esta região, mas de um modo especial ao distrito de Vila Real. É que não pode esquecer-se que a função de trânsito mais rápido entre a Europa, o norte de Espanha, designadamente a Galiza, e a Área Metropolitana do Porto, Braga e Aveiro, que se fará pela A7, ou o centro do País, não pode ser a única virtualidade desta auto-estrada. Ela deve potenciar, de igual modo, a circulação da riqueza dentro da própria região.
O IP3, quando em pleno funcionamento, pode e deve, por exemplo, tornar mais evidente a vantagem de instalar no Douro as caves de vinho do Porto que outros meios de transporte e outras exigências sociais levaram, noutros tempos, para Vila Nova de Gaia. Ele facilitará o transporte deste produto para a Europa e tornará possível um transporte em condições mais vantajosas dos granitos da zona das Pedras Salgadas para o porto de carga de Lamego no Douro navegável e dos produtos de cerâmica de Chaves, bem como de outros produtos, como o azeite e a carne certificados, para todo o País. De igual modo, os complexos termais de Pedras Salgadas, Vidago e Chaves ou as paisagens dos parques naturais que os transmontanos têm sabido preservar ficarão mais perto de todos os portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que é preciso, agora, é que o processo avance sem mais hesitações, sem mais empecilhos, sejam eles de natureza jurídica ou de qualquer outra. Será bom que o IP3 não seja obstruído por um qualquer «lobo ibérico», por importante que ele seja, ou por outro tipo de «lobos», que já fizeram atrasar, e demasiado - excessivamente demasiado -, esta infra-estrutura, reconhecidamente fundamental para a região e para o País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, encontram-se a assistir aos nossos trabalhos cerca de 60 alunos da Escola Secundária da Ramada, para os quais peço a vossa tradicional saudação.

Aplausos gerais, de pé.

Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado António Martinho, inscreveram-se os Srs. Deputados António Abelha, Adão Silva e Fernando Costa.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Abelha.

O Sr. António Abelha (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Martinho, de uma forma global tenho de concordar com a sua intervenção, porque, em muitos pontos da mesma, se poderá ver uma crítica, por vezes cruel, em relação ao Governo socialista.
É certo que a promessa foi feita em 1995 e que cinco anos já passaram. No entanto, ao contrário do que o Sr. Deputado António Martinho disse, de que os flavienses souberam merecer a presença do Primeiro-Ministro, diria que, pela primeira vez, o Primeiro-Ministro começará a merecer alguma confiança por parte dos flavienses, dos transmontanos e dos durienses. Há muito para fazer!
O Sr. Deputado repetiu, até à exaustão, que é necessário que o processo avance. Isso significa pouca confiança no Governo do Partido Socialista.
Fez, depois, algo que o Partido Socialista e, principalmente, o Sr. Primeiro-Ministro não tiveram coragem de fazer em Chaves, ou seja, de falar das obras que é necessário concluir na rede viária e que estiveram votadas ao abandono nestes últimos anos. Falou de uma série delas que me escuso a repetir, mas falou numa que é essencial: a A7. Dá a impressão que o Sr. Primeiro-Ministro chegou a Chaves, levava um embrulho muito bem feito - até condizente com a época que atravessamos -, mas que deixou um bilhete para os flavienses e para os transmontanos a dizer que só entrega a «prenda» daqui por cinco anos. Foi isso que o Sr. Primeiro-Ministro foi, de momento, fazer a Chaves. E não o fez sem pensar. Escolheu Chaves, porque sabe que aí tem de apostar muito fortemente visto que se aproximam outras eleições. Sei que tanto o Sr. Primeiro-Ministro como outros membros do Governo não deixarão, ao longo do ano, de aí acorrer mais vezes.
No entanto, Sr. Deputado António Martinho, queria colocar-lhe algumas questões. V. Ex.ª tem conhecimento - nós não temos, porque o Governo não nos responde aos requerimentos - da calendarização correcta do IP3, no distrito de Vila Real, nos lanços Régua/Vila Real, Vila Real/Vila Pouca, Vila Pouca/Vila Verde de Raia/Chaves? Sabe V. Ex.ª se já está, ou não, em curso - como dizia o Ministro João Cravinho - o estudo de impacte ambiental de Vila Pouca/Chaves e até mesmo de Vila Real/Vila Pouca?
Sr. Deputado António Martinho, não basta uma promessa, não basta um «embrulho» muito bem feito. Os transmontanos esperam mais, estão fartos de promessas e de cinco anos de abandono a que foram votados por este Governo.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Se quiser responder desde já, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, vou já responder a esta questão.
Sr. Deputado António Abelha, sobre a calendarização, não há como consultar a resolução do Conselho de Ministros n.º 171-A/2000. As coisas são feitas com transparência e ela está lá. Todos gostaríamos que o IP3 já estivesse construído e sei que o Sr. Deputado é da mesma opinião.
Quanto ao abandono, Sr. Deputado António Abelha, residindo V. Ex.ª em Chaves, deixe-me apenas lembrar que este Governo quis fazer auto-estradas a nível nacional, mas também quis que o gás natural beneficiasse todo o País, tendo sido Chaves a primeira cidade do interior a dele beneficiar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, também para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Adão Silva.

O Sr. Adão Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Martinho, veio V. Ex.ª trazer, hoje, ao Plenário, um elemento de relevante importância, não apenas para Chaves, não apenas para o distrito de Vila Real, mas, como disse, e muito bem, para todo o País e, particularmente, para toda a região Norte do País.
Também me quero congratular, sinceramente, com o facto de vermos que uma obra tão importante e tão necessária para o desencravamento do Interior Norte do País, finalmente, parece que vai avançar - parece que vai avançar! E, por isso, nada mais me pode dar alegria, sendo eu também um transmontano, tal como V. Ex.ª.
No entanto, V. Ex.ª fez uma afirmação que me deixa um pouco preocupado: disse que com a realização do IP3 e a materialização da A7 fica assim traçado o eixo prioritário que faz a ligação entre o Norte de Portugal e a Europa.
Ora, Sr. Deputado, esta sua afirmação deixa-me preocupado, não porque não seja importante este eixo - é, com certeza!...

Risos do Sr. Deputado do PS António Martinho.

V. Ex.ª está a rir porque percebe onde quero chegar. Quero chegar à noção de que, finalmente, fica claro que o Governo andou a sofismar e a tentar, de algum modo, camuflar um abastardamento, uma secundarização do eixo do IP4. Até aqui, era muito claro para todos nós que o IP4 era, de facto, o eixo prioritário que ligava a região do Interior Norte do País e que desencravava esta região para o Litoral e para a Europa. Ficamos a saber que agora não é assim. Agora, o IP4 mantém-se, quietamente, no plano secundário.
Sr. Deputado, agradeço-lhe sinceramente a explicitação que fez da tribuna, porque só agora se faz «luz no meu espírito», que me explica a sensação de abandono e de condições precárias do IP4 e que me leva a ver bem a sensação de desinteresse em relação à duplicação do traçado do IP4 entre Amarante e Quintanilha.
Por último, gostaria de salientar a «via sacra» que é o facto de este Governo socialista não ser capaz de acabar o IP4, construindo a ponte de Quintanilha e 1,5 Km que faltam de ligação entre as duas nações.
Sr. Deputado, gostava, pois, que me esclarecesse se há, ou não, esta secundarização do IP4, porque os transmontanos pensam que há e V. Ex.ª veio aqui dizer «assim seja».

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.

O Orador: - Para concluir, gostaria de dizer que espero sinceramente que não haja mais «Lobos» que nos tirem o desejo de desenvolvimento equilibrado no distrito de Vila Real.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, respondo conjuntamente aos restantes pedidos de esclarecimento.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem, então, a palavra, para formular um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Fernando Costa.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Martinho, começo por manifestar solidariedade pela sua satisfação dado o norte transmontano ir, finalmente, ver uma obra muito importante. Tem razões de sobra para estar satisfeito, apesar deste atraso. E tem, ainda, uma dupla razão para estar satisfeito: é que o norte transmontano vai ser servido pelo IP3 com características de auto-estrada, sem pagar qualquer portagem, o que creio ser justo e importante para o desenvolvimento daquela região.
Porém, gostaria de o advertir do seguinte: não tenha muita esperança no arranjo, na melhoria das vias paralelas e alternativas, pela razão clara de que aquilo que foi prometido, nos mesmos termos, às vias do Oeste está praticamente por fazer.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Já está feito!

O Orador: - O Sr. Deputado Casimiro Ramos, porque é do Oeste, devia ter a obrigação de conhecer a estrada da Dagorda para Peniche e a de Óbidos para Rio Maior. O senhor está a tomar «o todo pela parte», porque foi feito um arranjo - o arranjo do troço Bombarral/Torres Vedras -, do qual o senhor, como Deputado, e o Governo se deviam envergonhar, visto que, apesar de se terem gasto 1,5 milhões de contos, pouco ou nada melhorou as condições da estrada.
Mas, estava eu a dizer ao Sr. Deputado António Martinho para moderar as esperanças que tem, porque, a acontecer no Nordeste Transmontano aquilo que está a acon

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tecer no Oeste, nem daqui a muitos anos VV. Ex.as vão ter as merecidas estradas.
Para terminar, pergunto, Sr. Deputado: qual é o critério, qual é a justiça para que as populações de Mirandela, Chaves e Lamego - que utilizam uma via rápida, chamemos-lhe auto-estrada - não paguem, e muito bem, portagens e as populações que utilizam as estradas de Óbidos para Rio Maior, de Rio Maior para Santarém, de Bombarral para Torres Vedras, das Caldas da Rainha para Leiria e - pasme-se! - da Marinha Grande para a auto-estrada vão ter de pagar portagens?

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Vamos ver!

O Orador: - Sr. Deputado Osvaldo Castro, gostaria que «fôssemos ver». Mas, com Deputados como o senhor e com presidentes de Câmara como os do seu município, este Governo não será sensibilizado para a grave injustiça que é o facto de a população do Oeste ter de pagar portagens em zonas nas quais, pelos mesmos critérios de Trás-os-Montes ou do Fundão, não deveriam pagar.
Sr. Deputado António Martinho, naturalmente que, como Deputado do Norte e do País, tem razões para estar satisfeito…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado Fernando Costa, com tanto percurso por estradas que conheço, e que têm muitas curvas, o senhor ultrapassou o seu tempo. Tem de terminar.

Risos do PS.

O Orador: - Sr. Presidente, têm muitas curvas e muitos buracos! A estrada que vai de Lisboa para as Caldas da Rainha nem sequer se devia chamar uma auto-estrada…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - … devido ao grave estado em que se encontra.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Adão Silva, não sou, nunca fui e nunca serei uma pessoa com responsabilidades políticas com uma visão minimalista das coisas e que não considera esta afirmação como uma afirmação fundamental.
Sr. Deputado Adão Silva, para mim, o que é importante para o distrito de Vila Real é sempre igualmente importante para o distrito de Bragança e vice-versa.
Por isso, não abdico de considerar o IP4 como uma rodovia fundamental e estruturante para todo o norte do País, apesar de me congratular pelo facto de se estar prestes a iniciar a construção de um outro IP, também estruturante para essa região.
É importante que o IP3 avance e que o IP4, por ter sido integrado na rede de auto-estradas nacional por proposta desta Assembleia, comece, efectivamente, a ganhar corpo.
Quem, em tempos, secundarizou o IP4 - e houve uma polémica acerca disso -…

O Sr. Francisco de Assis (PS): - Gravíssima, aliás!

O Orador: - … foi o governo do PSD. Nessa altura, estando na oposição, eu próprio denunciei aqui essa situação.
Sr. Deputado Fernando Costa, registo com agrado que, sendo Deputado pelo distrito de Leiria, se não estou em erro, do Oeste, digamos, venha colocar uma questão relativamente a Trás-os-Montes e Alto Douro, que, convenhamos, é muito importante para todo o País. Muito obrigado, pelas suas palavras.
Começo por dizer-lhe, quanto a esta problemática de auto-estradas com pagamento de portagens e as termos de SCUT, em ambos os casos é paga portagem; simplesmente, no primeiro caso, a portagem é paga directamente pelo utilizador, enquanto, no segundo, ela é paga pelo Orçamento e não directamente pelo utilizador.
Compreendo a sua preocupação, Sr. Deputado, mas vou dizer-lhe uma coisa. Já tenho dito que, para mim, que sou de Vila Real, são importantes as obras que estão a ser feitas no aeroporto de Pedras Rubras, como é importante um novo aeroporto no País, mas também para o Oeste são importantes estas SCUT, Sr. Deputado, pois constituem uma via de saída para aquela zona.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ora, quero ver os meus amigos do Oeste, incluindo o Sr. Deputado, a passearem, por exemplo, na SCUT do interior norte para irem visitar o Montesinho, ou o Barroso, ou mesmo para irem até à Galiza. Acho que é esta ideia, que aqui é veiculada pelo Sr. Deputado através da questão que colocou e que estou a reforçar com a minha resposta, que é importante mostrar a todos os portugueses.
De facto, devemos mostrar a todos que a auto-estrada do interior norte é importante para todos os portugueses, incluindo para os do Oeste e mesmo para os do Algarve.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Dir-lhe-ei, ainda, Sr. Deputado, que fiz uma afirmação acerca da necessidade de ligar ao IP3 os concelhos que lhe são laterais, o que, para mim, é uma ideia de desenvolvimento. O IP3 é importante para o País para que circule riqueza no distrito de Vila Real e na região de Trás-os-Montes. Esta circulação far-se-á com mais vantagens se conseguirmos ligar, entre outros, Valpaços a Vila Pouca, Boticas a Vidago, Mondim de Basto a Vila Real, Sabrosa às proximidades de Vila Real. Desta forma, criaremos uma rede que potenciará o desenvolvimento.
Isto que digo não é um «recado», porque sei que esta ideia também é a do Governo que apoio e gostaria que a mesma começasse a ser concretizada amanhã mesmo, se possível.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma declaração de interesse político relevante, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

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A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O assunto que me traz a esta tribuna relaciona-se com o esquecimento e a falta de respeito com que os governos socialistas do Engenheiro António Guterres têm tratado as gentes do distrito da Guarda.
O primeiro governo socialista foi mau para o distrito da Guarda, mas o segundo é, certamente, o pior, aliás, é, de certeza, o pior Governo de sempre.
Mais parece, Sr.as e Srs. Deputados, que o Governo socialista anda a fugir à Guarda.
Sendo as acessibilidades e a saúde dois grandes pilares do desenvolvimento, era justo que o Governo agisse, de forma profunda e determinada, sobre estes factores, principalmente nas regiões mais desfavorecidas.
O Governo devia intervir e adoptar medidas de discriminação positiva que minorassem as desigualdades e promovessem a solidariedade e o desenvolvimento equilibrado do País.
Mas, na realidade, o que faz este Governo? É certo que, no discurso político, nunca tivemos tanto diálogo e tanta solidariedade, mas, na prática, nunca tivemos tanta desigualdade e tanta discriminação. Nunca, como hoje, a riqueza nacional foi distribuída de forma tão desigual e tão pouco solidária.
O Governo fala de solidariedade, mas vira à desigualdade e engana os guardenses.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na Guarda o descontentamento generaliza-se e a revolta instala-se face a tanta injustiça e discriminação que levam a Guarda a ter tão baixos níveis de infra-estruturas e de serviços públicos.
Em termos de dinheiros públicos, a Guarda, em 2001, baixou de posição relativa e foi relegada para penúltimo lugar. Divergindo da tendência de crescimento do País, a Guarda, em relação ao ano anterior, perdeu quase 10% do investimento público. Até no Programa POLIS foi penalizada e dos escassos 10,5 milhões de contos inicialmente anunciados, só lhe restaram 7,5 milhões de contos.
Estas discriminações, absurdas e inexplicáveis, fazem atrasar e perigar, irremediavelmente, o sonho de desenvolvimento para as gentes da Guarda.
A maior parte das obras estruturantes foi anulada, adiada ou simplesmente contemplada com verbas simbólicas do «faz de conta».
Basta ver o que se passa com as acessibilidades.
A substituição do IP5 por uma verdadeira auto-estrada passou de sonho a pesadelo, pois que, no real e passados cinco anos, temos tolerância zero, segurança mínima, mas com buracos no máximo.
O IP2, o outro eixo estruturante desta região, promessa do Partido Socialista de 1995, continua eternamente adiado e, apesar de os primeiros trabalhos terem começado apenas há alguns dias, o ritmo é de tal maneira lento que, a manter-se, bem podem desesperar as gentes da Guarda até à sua conclusão.
Os túneis da Serra da Estrela foram adiados e ficam à espera de uma avalanche de estudos e de dinheiros públicos que tardam em chegar.
A Linha da Beira Baixa carece de urgente modernização e reconversão na sua total extensão, incluindo, especialmente, o troço entre a Guarda e a Covilhã.
O traçado e o mau estado das estradas nacionais e regionais de ligação entre os vários concelhos do distrito, ao IP5, à Guarda ou a Viseu está a desesperar, diariamente, as gentes da região, a afastar os visitantes e a gorar as expectativas de renovação do tecido empresarial.
Se o panorama das acessibilidades é péssimo, o estado da saúde no distrito da Guarda é dramático e tem vindo a agravar-se.
Persistem as dificuldades de acesso aos cuidados de saúde, às consultas, aos meios auxiliares de diagnóstico e às cirurgias; é vergonhosa a carência de recursos humanos; é insustentável a crescente desmotivação dos profissionais de saúde; é escandalosa a ausência de um plano estratégico; é incompreensível o desinvestimento e o atraso tecnológico; é incompreensível o atraso da chegada da TAC, a inexistência de ressonância magnética, a não abertura da unidade de cuidados intensivos; é inexplicável o atraso da reestruturação física do hospital da Guarda.
É, ainda, inaceitável o estado actual do hospital de Seia, que mais parece um hospital do terceiro mundo, onde chove nas enfermarias como chove na rua e onde os doentes são transferidos do bloco operatório para as enfermarias pelo exterior do edifício.
A saúde, na Guarda, está no pior do pior, sem referências e sem estratégias. A saúde, na Guarda, Sr.as e Srs. Deputados, está falida da razão e do coração.
Mas se o estado geral da saúde é preocupante, o estado de saúde da pediatria é alarmante.
Há precisamente 492 dias e 492 noites que as 40 000 crianças do distrito da Guarda não têm acesso a cuidados de saúde. Há precisamente 11 808 horas e 708 480 minutos que as 40 000 crianças do distrito da Guarda são discriminadas.
Foram 15 meses de promessas e de compromissos adiados e não cumpridos. O «caso da pediatria» é a demonstração clara da falência total da política socialista.
Nem as inúmeras audiências, conferências de imprensa, manifestações de rua, intervenções mediáticas e até uma marcha lenta no IP5, promovidas pelo Movimento Cívico pela Criança, foram suficientes para sensibilizar o Governo.
O Sr. Primeiro-Ministro nada disse, a Ministra da Saúde pouco se ouviu e o Partido Socialista tudo fez para manipular, abafar, baralhar e distrair.
O «caso do helicóptero» para transporte aéreo de doentes é disso testemunha. Tal como apareceu, depressa desapareceu. Fez muito barulho quando aterrou, mas, passados 15 dias e pela calada, voou e não mais voltou. Sem equipamentos adequados, sem profissionais especializados em fisiologia de voo, sem concurso público, sem autorização de voo, sem certificação da pista. Os nossos receios, infelizmente, confirmaram-se: era tudo virtual, era tudo do «faz de conta».
Todos os socialistas o sabiam, mesmo assim, festejaram, mas agora, depois da bronca, ninguém autorizou, ninguém viu.
Haja, pelo menos, vergonha…! Se não fosse triste, até era divertido.
Mas a culpa, Sr.as e Srs. Deputados, não pode morrer solteira.
O Governo, de uma forma ligeira e irresponsável, fez o que não devia e da pior maneira. O Governo precipitou-se e, numa operação de falsa cosmética, cometeu um erro trá

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gico para a empresa e, mais uma vez, enganou e faltou ao respeito de todos os guardenses.
Por isso, o Partido Social Democrata exige o apuramento das responsabilidades, doa a quem doer.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Até quando será necessário protestar na rua, aparecer nos telejornais ou ter destaque nas primeiras páginas dos jornais, para que os problemas da pediatria e da saúde, na Guarda, sejam resolvidos?
Até quando será necessário sofrer e morrer para que os problemas do IP5, do IP2 e das estradas regionais da Guarda sejam resolvidos?
Até quando o distrito da Guarda será discriminado, prejudicado, e marginalizado pelos governos socialistas do Engenheiro António Guterres?
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao contrário do que o Presidente da República afirmou e, certamente, referindo-se ao Partido Socialista da Guarda, o PSD e a Guarda não estão mudos.
O PSD e a Guarda reclamam, sim, uma nova política para bem dos guardenses, para bem do País. O PSD e a Guarda reclamam uma acção política solidária. O Partido Social Democrata persistirá, de forma coerente, séria e responsável na defesa dos interesses dos guardenses.
Pela nossa parte, não desanimamos e continuaremos a lutar pela valorização do distrito da Guarda e das suas gentes.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos inscreveram-se os Srs. Deputados Bernardino Soares, Carlos Santos e Victor Moura.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Manso, as questões que aqui trouxe têm, sem dúvida, importância e, desde logo, a questão específica dos cuidados de saúde no distrito da Guarda assume um relevo ainda maior.
É que o distrito da Guarda figura em último lugar no que diz respeito ao investimento hospitalar, isto é, ao financiamento e aos meios adjudicados às estruturas hospitalares no nosso país.
É que o distrito da Guarda figura em último lugar no que diz respeito ao número de médicos por habitante e, também, no índice de colocação dos médicos nas unidades de saúde.
É que trata-se de um distrito que já arca com o peso da interioridade, que suporta o custo da desertificação que as sucessivas políticas, quer dos governos do PSD, quer dos do Partido Socialista, têm vindo a acentuar, dependendo ainda mais, por esse motivo, da existência de cuidados de saúde de qualidade por forma a fixar a população e a promover o desenvolvimento.
É que, independentemente de muitas outras questões fundamentais para o desenvolvimento de uma região, a existência de cuidados de saúde de qualidade, com acesso fácil para todos os cidadãos, com profissionais e instalações à altura, é um instrumento fundamental para fixar a população, para desenvolver a região e para promover a qualidade de vida dos que lá vivem.
É por isso que é especialmente preocupante a situação de duas unidades hospitalares do distrito da Guarda que visitámos há poucos dias, os hospitais de Seia e da Guarda.
No que diz respeito ao hospital de Seia, é de valorizar e salientar o esforço dos respectivos profissionais, já que o mesmo não tem listas de espera, estando mesmo a conseguir resolver o problema das listas de espera existentes em outros hospitais, e abriu novas especialidades, mas, como resposta a este esforço, continua a existir, por parte do Ministério da Saúde, uma completa indefinição absolutamente inaceitável no que diz respeito à construção de novas instalações hospitalares.
A verdade é que, na anterior Legislatura, o governo determinou a elaboração de um estudo para decidir entre a construção de um novo hospital ou a remodelação do velho edifício existente, que data de 1930. A verdade é que a actual Sr.ª Ministra já determinou que se fizesse um novo estudo sobre a matéria, mas apenas foi dado conhecimento público do estudo da ARS, o qual concluiu pela necessidade da construção de um novo hospital, até num outro local com melhores acessos.
Tanto no que diz respeito a este hospital como ao da Guarda, são igualmente inaceitáveis as carências em recursos humanos que se verificam, quer ao nível das especialidades médicas, designadamente da pediatria, quer ao de outros profissionais, o que põe em causa a qualidade e a segurança dos cuidados de saúde que são prestados à população do distrito.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr.ª Deputada Ana Manso, há ainda outros pedidos de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Santos.

O Sr. Carlos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Manso, acho que não falou da Guarda e, antes de formular-lhe a minha pergunta, apetece-me dizer-lhe uma coisa. A intervenção que V. Ex.ª fez nesta Câmara é o pior serviço que, até hoje, vi ser prestado ao meu distrito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - Vou explicar-lhe por que digo que é o pior serviço, Sr.ª Deputada! Com amigos destes, a Guarda não precisa de outros!
Sr.ª Deputada, fala V. Ex.ª de acessibilidades, de pólos de desenvolvimento, da saúde. Acaso não terá sido durante os governos do PS que se fizeram mais centros de saúde naquele distrito do que na vigência de todos os governos do vosso partido? Eis uma pergunta para V. Ex.ª me responder.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Não basta atirar pedras, é necessário saber do que se está a falar!
Passemos à questão do hospital da Guarda.
Sr.ª Deputada, acaso não foi V. Ex.ª administradora daquele hospital?
Diga-me lá, Sr.ª Deputada, quais foram os bons ofícios que, na altura, desenvolveu junto do governo do seu partido para que o hospital da Guarda não tivesse chegado ao ponto a que chegou?
Acaso V. Ex.ª não sente nada interiormente que a chame à razão?

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Passemos à questão do IP2.
Sr.ª Deputada, acaso os Deputados do PSD eleitos pelo círculo eleitoral da Guarda não eram contra a construção da auto-estrada da Beira Interior? Talvez não saiba, Sr.ª Deputada, mas vai ter de responder-me.
Ainda relativamente ao IP2, acaso não foi o Governo do Partido Socialista que decidiu a construção da auto-estrada da Beira Interior? E não estão já a decorrer as obras da mesma? Estão!
Quanto ao IP5, acaso não foi o Governo do Partido Socialista que decidiu duplicar esta via, desde Vilar Formoso até Aveiro, processo que está a ser ultimado para ser entregue ao consórcio vencedor do concurso? Foi!
V. Ex.ª mente; não é daquela terra!

Protestos do PSD.

Mas há mais, Sr.ª Deputada.
Voltemos ao hospital da Guarda. Acaso V. Ex.ª, quando era administradora daquela casa, não deu pela falta de um TAC, da ressonância magnética, dos raios-x e das obras todas?! Afinal, na altura, V. Ex.ª foi administradora de quê?

Protestos do PSD.

Sr.ª Deputada, esses instrumentos para a saúde dos guardenses também já estão decididos. Vão ser instalados no hospital da Guarda.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Mais promessas!

O Orador: - V. Ex.ª sabe!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, terminou o seu tempo. Tem de concluir.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente, apesar de este assunto dar «pano para mangas»,…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - As «mangas» já estão muito compridas, Sr. Deputado.

O Orador: - Vou rematar, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Faça favor.

O Orador: - Quanto à linha da Beira Baixa, felicito-a, mais uma vez, por ter falado no troço Guarda/Covilhã. Quem o encerrou? Foi o governo do seu partido, foi o Governo de Aníbal Cavaco Silva.
Sr.ª Deputada, fale da Guarda, fale do que conhece, fale do que sabe e não queira vir para aqui enganar os guardenses.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Victor Moura.

O Sr. Victor Moura (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Manso, penso que antes de se fazer uma intervenção nesta Casa é preciso haver alguma contenção e, sobretudo, algum decoro.
Não podemos ter a memória curta como V. Ex.ª demonstrou ter. Sou do tempo, ainda na anterior Legislatura, quando o Governo de Cavaco Silva tinha terminado as suas funções, em que via em Gouveia bandeiras negras de fome! Via em toda aquela região da corda da serra as fábricas a encerrar!

Vozes do PS: - Bem lembrado!

Protestos do PSD.

Teve de ser o Governo do Partido Socialista a tomar medidas e, hoje, as fábricas lá estão, com muito mais gente a trabalhar, a receber os seus vencimentos e satisfeitos no seu local de trabalho.
Mais: foi feito mais investimento. A Sr.ª Deputada, com certeza, ignora as novas fábricas de transformação, nomeadamente de produtos regionais, que empregam hoje mais de uma centena de pessoas. Além disso, foi estancado o movimento de saída dos jovens daquele distrito. Estas coisas não se resolvem nem se vêm os seus resultados de um momento para o outro. O que me choca mais é que, sendo a Sr.ª Deputada desse sector, venha falar da saúde, nomeadamente da carência de recursos humanos. Foi o governo do PSD, o Governo de Cavaco Silva, o responsável pela situação calamitosa dos recursos humanos na área da saúde.

Protestos do PSD.

Gostava de ouvir a Sr.ª Deputada dizer que medidas propõe para irem para lá pediatras.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Onde é que eles estão? Os pediatras deviam ter surgido no tempo do vosso governo. E o vosso governo ignorou e desleixou essa realidade. Ora, é obvio que, hoje, as consequências recaem sobre o Partido Socialista, porque foi o Partido Socialista que tomou medidas de carácter estrutural nessa área, criando novas faculdades de medicina e abrindo novas vagas nas escolas de enfermagem para criar novos recursos de saúde.

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Não podemos falar apenas em instalações físicas, porque também aí vocês cometeram erros flagrantes.
Falou no hospital de Seia. Nesse hospital vocês fizeram um investimento de centenas de milhares de contos em terreno alheio, num hospital que é da misericórdia! Não sei o que é que defendem agora. Agora defendem que esse investimento seja abandonado e feito um novo hospital.
É tão bom estar na oposição para dizer palavras demagógicas e para vir aqui, com completo despudor, falar demagogicamente para as pessoas e para amanhã o seu discurso ser transcrito na comunicação social! Isso não é fazer política séria, Sr.ª Deputada! Estamos aqui para falar do nosso distrito, para o valorizar, para falar das coisas boas que ele tem - e felizmente tem muitas coisas boas. Aposto no nosso distrito, aposto nas medidas de carácter estrutural que este Governo está a fazer, nomeadamente nas finanças locais, canalizando mais verbas para as câmaras que o merecem.
Tenho uma palavra de louvor para este Governo e de muito respeito e consideração para as pessoas do nosso distrito.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso, dispondo, para o efeito, de 5 minutos.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, agradeço ao Sr. Deputado Bernardino Soares, porque comigo ou em situações diferentes visitou o hospital de Seia e o hospital da Guarda. O Deputado Bernardino Soares não é da Guarda, mas eu vivo lá todos os dias. Tiro a «fotografia» diariamente desta região, porque sinto o que as populações sofrem. O Deputado Bernardino Soares foi lá e bastou-lhe uma ida à Guarda e a Seia para ver o drama que as 40 000 crianças e os 180 000 habitantes da Guarda passam no dia-a-dia nos acessos aos cuidados de saúde.
Mais uma vez, muito obrigado, Sr. Deputado Bernardino Soares,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - … porque, num flash rápido ao distrito da Guarda, ficou com uma ideia muito clara contrariando aquela que os Deputados do Partido Socialista têm quando vivem lá todos os dias.
Agradeço também aos Deputados Carlos Santos e Victor Moura, mas não entendo de forma alguma o vosso nervosismo. De forma nenhuma! Cada um anda para seu lado: um puxa para um lado, o outro puxa para o outro. Quando vejo um não vejo o outro. Esta é a questão. Será que vos pesa na consciência a ausência sistemática do Deputado Victor Moura na Guarda ou do Deputado Carlos Santos em Seia? Pesa-vos tanto na consciência?
As vossas intervenções nada trazem de novo. Estão cheias de hipocrisia e de demagogia. As vossas referências são permanentemente uma constante do vosso discurso, mas, infelizmente para a Guarda e para o País, como acontece com todos os outros elementos do Partido Socialista, é uma ausência permanente de acções.
O País diverge da União Europeia; ainda por cima a Guarda diverge do resto do País. Só para falar-vos em dinheiros públicos, em vez de atacar o «fosso» entre o litoral e o interior, em vez de atacar as desigualdades entre o litoral e o interior, o PIDDAC para este ano aumentou em 4% no País, o Governo do Partido Socialista penalizou a Guarda com menos 10%.

Protestos do Deputado do PS Carlos Santos.

Sr. Deputado, eu não o interrompi, peço-lhe que me deixe falar.
Sr. Deputado, se, em 2000, eu tinha 20,2 milhões de contos e, em 2001, tenho 18,5 milhões…

Protestos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, peço-vos que não entrem em diálogo.

A Oradora: - Mas já não me espanta nada disso, porque o ridículo surgiu do Partido Socialista da Guarda, que, negando e manipulando a evidência dos números, quis fazer crer, enganando os guardenses, que este o PIDDAC para 2001 seria o salvador de todos os problemas da Guarda. Ora, isto não é verdade!
Vamos agora a três questões concretas.
O caso do helicóptero, que vocês criaram, que festejaram na pista, sem certificação, pois, em 15 dias, o helicóptero não fez um único serviço, porque os profissionais do hospital são competentes e não entram na demagogia nem na hipocrisia do Partido Socialista, e de repente voou. Agora ninguém viu! Ninguém autorizou, mas o helicóptero «fugiu» de vez. Só depois de ter surgido a bronca!
Ainda vos digo outra: a questão dos pediatras é da vossa inteira responsabilidade, porque, até ao dia 1 de Setembro 1999, havia cinco pediatras no hospital, e os boys do Partido Socialista, a incompetência do conselho de administração do hospital, é que fizeram com que dois fossem corridos para o hospital de Viseu. Esta é uma culpa vossa, e têm de aguentar com ela.
Ainda vos digo mais: o hospital da Guarda foi uma bandeira vossa. Em 1995, a Guarda ia ter um hospital novo ou um novo hospital. Conclusão: andámos cinco anos - repito, cinco anos - a fazer planos directores e, até hoje, obras de reestruturação profunda do hospital foram zero.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

Protestos do PS.

A Oradora: - Não fizeram uma única!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Em relação ao aparelho de TAC, ele estava encomendado há três anos, Sr. Deputado Carlos Santos. Há três anos que o conselho de administração do hospital insiste em adiar este processo. Não só não veio o TAC, como não pediram a ressonância magnética.

Protestos do PS.

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O hospital de Seia foi a vossa bandeira. Em 1999, prometeram um hospital novo.

O Sr. Carlos Santos (PS): - Não é verdade!

A Oradora: - Está escrito, Sr. Deputado!
O hospital de Seia foi promessa vossa de construção de raiz. Pediram o projecto, aprovaram-no, alteraram-no e agora renegaram-no. O que é que fizeram em relação ao hospital de Seia?

Vozes do PSD: - Nada!

O Sr. Carlos Santos (PS): - Não é verdade!

A Oradora: - É verdade, Sr. Deputado! No hospital de Seia chove como na rua, as enfermarias estão cheias de baldes para apanhar água, os doentes têm as camas molhadas, há ratos por tudo quanto é sítio e não sobem ao telhado, porque não o conseguem reparar. Esta era a vossa promessa: a construção de um novo hospital em Seia! Onde é que ele está?
Para terminar, quanto ao IP5, deixámos a A14 com o projecto feito, em 1995. Até hoje, passados cinco anos, nem substituição, nem duplicação e muito menos auto-estrada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PS e contraprotestos do PSD.

A Oradora: - Parece que os Deputados Carlos Santos e Victor Moura não estão no distrito da Guarda, não percorrem as estradas do distrito, caso contrário saberiam perfeitamente que essa é uma questão que têm de resolver.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura de um relatório e parecer da Comissão de Ética relativo à retoma e à substituição de Deputados.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à retoma de mandato, nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto do Estatuto dos Deputados, do Sr. Deputado Fernando Gomes, do PS (círculo eleitoral do Porto), cessando Barbosa Ribeiro, em 21 de Dezembro passado, inclusive, e à substituição, nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea p), do Estatuto dos Deputados, do Sr. Deputado José Penedos, do PS (círculo eleitoral de Coimbra), por Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos, com início em 1 de Janeiro corrente, inclusive.
O parecer vai no sentido de que a retoma de mandato e a substituição em causa são de admitir, uma vez que se verificam os requisitos legais.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, o parecer está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, temos, para apreciar e votar, o voto n.º 107/VIII - De pesar pela calamidade ocorrida na freguesia de Portela, no concelho de Arcos de Valdevez (PS), que já vem da semana passada e que vou passar a ler: «Os Deputados do Partido Socialista do distrito de Viana do Castelo, ao tomarem conhecimento da trágica calamidade que ocorreu na freguesia de Portela, no concelho de Arcos de Valdevez, exprimem os seus sentimentos de pesar e a sua solidariedade para com a família das vítimas, manifestando a sua convicção de que o Governo lhes proporcionará os meios adequados à reparação dos danos que se verificaram.»
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Torres Pereira.

O Sr. Artur Torres Pereira (PSD): - Sr. Presidente, como é natural, o PSD não deixará de se associar a este voto que estimamos absolutamente legítimo, razoável e compaginável com os acontecimentos.
Só não compreendemos como é que o Governo do Partido Socialista não teve, até hoje, qualquer acto, qualquer iniciativa, qualquer decisão que vise minorar os prejuízos sofridos pelas populações de Lanhelas - e não é de agora, já é de alguns meses - e fecha os olhos às legítimas reivindicações do município de Arcos de Valdevez em relação às calamidades que têm surgido, não só este ano como no ano transacto, nos dois invernos que causaram prejuízos orçados em milhares de contos e sofrimento sem conta às populações.
O Governo a isto diz zero, não toma uma iniciativa, não cobre qualquer prejuízo, não declara o estado de excepção e, hoje, no exercício de requintada hipocrisia - peço desculpa pelo termo e com o devido respeito -, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista vem propor um voto de solidariedade com uma parte dos interessados das calamidades que têm atingido o distrito de Viana do Castelo. É uma vergonha, Sr. Presidente!
Todavia, em relação às populações abrangidas, não deixaremos de dar o nosso voto favorável.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, o PCP associa-se ao voto proposto pelo Partido Socialista e considera que a discussão deste voto não justifica que os partidos façam dele terreno de luta política.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Não vamos falar do mesmo tipo de promessas não cumpridas em relação a populações de Arcos de Valdevez, de Lanhelas ou de outras populações ao longo de todo o País. Vamos apenas associarmo-nos a este voto, no que ele tem de singelo e de pesar pelo falecimento das pessoas, apresentando às famílias das pessoas falecidas o pesar do Partido Comunista Português.

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Vozes do PCP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Campos Cunha.

O Sr. Henrique Campos Cunha (CDS-PP): - Sr. Presidente, começo por apresentar os meus cumprimentos a V. Ex.ª, Sr. Presidente da Assembleia da República.
Srs. Deputados, o Partido Popular associa-se também a este voto de pesar para com as vítimas deste desastre sucedido em Arcos de Valdevez e, ao mesmo tempo, apela ao Governo para que, desta vez, a ajuda a estas famílias seja célere, o que, nas outras vezes, não tem sido.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Partido Popular associa-se a este voto de pesar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, agradeço e retribuo os cumprimentos.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome da bancada socialista, quero afirmar que o nosso apoio a este voto subscrito por três Deputados da nossa bancada está traduzido no acontecimento que nele se descreve e lamentar, muito sinceramente, o teor da intervenção do Sr. Deputado do PSD, manifestamente desajustada e empobrecedora do acto nobre que a Assembleia vai de seguida tomar, aprovando, estou seguro, este voto de pesar por unanimidade.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, a Mesa associa-se também a este voto, sobretudo na parte em que exprime os seus sentimentos de pesar e a sua solidariedade para com as famílias das vítimas.
Vamos proceder à votação do voto n.º 107/VIII - De pesar pela calamidade que ocorreu na freguesia de Portela, no concelho de Arcos de Valdevez (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, proponho que façamos 1 minuto de silêncio em honra das vítimas.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

O voto será transmitido às famílias das vítimas.
Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 257/VIII - Confere aos municípios o direito à detenção da maioria do capital social em empresas concessionárias da exploração e gestão de sistemas multimunicipais (PSD).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A insistência no tema que hoje apresentamos a debate nesta Câmara resulta directamente de uma visão mesquinha e auto-suficiente do Governo - e do partido que o suporta - sobre os princípios e regras básicas do funcionamento de um sistema verdadeiramente democrático e descentralizado. Afirmo-o, desta forma clara e sem pejo, por acreditar que é na frontalidade e na transparência de uma postura consciente, crítica e evolutiva que radicam as profundas e sólidas bases de uma sã prossecução dos interesses gerais e vitais para toda a nossa comunidade.
A questão é simples e explica-se em duas palavras: o Governo teima em manter para si o controlo da gestão dos sistemas multimunicipais de abastecimento de água, saneamento e resíduos de sólidos urbanos, afastando as câmaras municipais do poder de decisão numa matéria que é crucial para a vida de cada concelho.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A tradição fortemente municipalista do nosso país assenta na convicção, que tem vindo a ser corroborada pela prática, de que os fenómenos de proximidade entre decisores políticos e destinatários reforçam a objectividade, a eficácia e a segurança das medidas de gestão e, como tal, tendem a resultar, a um tempo, num incremento do bem-estar dos cidadãos e, a outro, numa saudável satisfação do dever cumprido por parte dos órgãos da Administração.
E é precisamente neste tipo de enquadramentos políticos - mais reais e mais próximos dos genuínos interesses de todos - que a prática deste Governo tem vindo a revelar uma absoluta e sistemática incapacidade de abertura, numa clara demonstração de um verdadeiro autismo político.
A verdade, Srs. Deputados, é que, chumbada que foi a regionalização, o Governo socialista tem um saldo zero em matéria de medidas efectivas da descentralização.
O PSD, quando foi governo, promoveu e deu corpo a uma das mais profundas reformas de que há memória na área da gestão municipal, a saber, a racionalização do exercício das actividades de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos.
Na verdade, consequentemente à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 379/93, de 5 de Novembro, assistiu-se à implementação efectiva destas actividades que, embora tendo constituído desde sempre atribuições autárquicas, vinham denunciando relevantes debilidades para a sua plena consecução por parte dos municípios. Tratou-se, pois, num momento histórico bastante preciso, de proporcionar às autarquias as indispensáveis capacidades técnicas e de gestão para levarem a bom porto e de uma forma plenamente eficaz os poderes que, neste sector, lhes estavam legalmente cometidos. Tarefa da qual falam por si os resultados obtidos na prática e que - infeliz

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mente! - por tantas e tantas vezes, a arrogância deste Governo tem vindo a fazer arvorar, egoisticamente, como bandeiras suas.
E o que para a história ficará como, de todo, inadmissível e política e eticamente intolerável é a atitude vergonhosa do Governo socialista de haver procedido, por decreto, a uma autêntica detonação da lei aprovada pela Assembleia da República que, volvidos seis anos sobre a aplicação do aludido Decreto-Lei n.º 379/93, visou, tão-só, conferir aos municípios o direito à detenção da maioria do capital social nas empresas concessionárias da exploração e gestão dos mencionados sistemas multimunicipais.
Recorde-se e atente-se na torpeza dos meios empregues por um Governo, que fez publicar, em 29 de Outubro de 1999, um decreto-lei que revogou a lei, da iniciativa do PSD, publicada apenas quatro dias antes, bem como a evidente conivência política do Presidente da República, que sancionou todo este inqualificável procedimento.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, porque as acções ficarão, para sempre, com quem as praticou e, sobretudo, porque se não deixa o PSD aprisionar por quaisquer receios no que tange às suas mais profundas convicções e ao sentido do interesse público - por mais inquinados que sejam os métodos empregues pelo poder socialista -, vimos agora, e uma vez mais, insistir num propósito que se justifica em si próprio pelo bom senso e clarividência que encerra,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … qual seja, o da efectiva descentralização, para o nível municipal, de competências que, em si mesmas e antes de tudo o mais, dizem respeito aos próprios municípios e à directa satisfação das populações por eles servidas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E, deste modo, o presente projecto de lei visa, especificamente: fazer impender sobre o Estado o dever de disponibilizar às autarquias locais as necessárias participações sociais nas referidas empresas concessionárias com vista à eventual assunção, por aquelas, de uma participação maioritária no respectivo capital social; estabelecer que essa transmissão de participações deverá ser realizada pelo seu valor nominal; fixar um prazo certo para a declaração, pelas autarquias, aos accionistas públicos nestas sociedades, da sua intenção de exercer, ou não, o seu direito à participação maioritária; conferir aos municípios interessados um direito de acrescer, na proporção do capital que já detêm, na aquisição das participações sociais que, na mesma sociedade, não tenham vindo a ser subscritas pelos restantes sócios municipais; determinar aos conselhos de administração das empresas abrangidas pelo presente regime a obrigação de desencadear a promoção dos procedimentos conducentes à sua plena aplicação.
O presente projecto de lei colheu já, por duas vezes, o apoio expresso da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, tratando-se, por isso, uma vez mais, de uma oportunidade soberana para confirmar uma verdadeira descentralização de poderes.
É que, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, só não evolui com a experiência e resiste teimosamente à mudança para o bem comum quem, de todo, se deixou calcinar pela erosão própria de um exercício de poder pouco democrático e transparente…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, convido, desde já, o Partido Socialista a, num claro e inequívoco exercício dos princípios democráticos de descentralização e de devolução de poder aos órgãos representativos das populações, a aprovar a presente iniciativa legislativa.
Era bom que os Srs. Deputados socialistas não tivessem um discurso junto das populações e uma actuação contrária aqui no Parlamento!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não há qualquer razão séria, não partidária, que adie por mais tempo a assunção, por parte dos municípios envolvidos, da gestão dos interesses que os servem. É o próprio interesse das comunidades locais que o exige!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Moreira, se outra razão não fosse válida para a discussão deste projecto de lei, apenas e só o preâmbulo e a génese do mesmo e a discussão que aqui foi feita na Assembleia da República, há um ano atrás, sobre aquele que considerámos um acto de terrorismo constitucional, que foi unanimemente considerado como uma atitude politicamente censurável e que foi por esta Câmara, por todos os grupos parlamentares aqui representados, à excepção do Partido Socialista, politicamente censurado, já a fariam valer a pena.
Mas há mais: o Partido Socialista tinha hoje aqui uma oportunidade para poder «corrigir o carril» e voltar a ter uma atitude de respeito por esta Assembleia. Hoje, foi este diploma, desta vez, foi com esta matéria, mas amanhã poderá ser com qualquer outro partido e com qualquer outra matéria e será igualmente censurável um comportamento idêntico ao que está em causa.
Sr. Deputado Manuel Moreira, nós somos a favor do conteúdo normativo deste diploma e quero perguntar-lhe se acredita mesmo que podemos efectivamente ter este mea culpa e este acto de respeito por este Parlamento, por este órgão de soberania.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

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O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan, concordamos, e por isso tivemos o cuidado de fazer um pouco o historial deste diploma no seu próprio preâmbulo, de que o Sr. Deputado referiu uma das partes, com o facto de ter havido aqui uma afronta inqualificável, em todos os sentidos. Estou cá há muitos anos, passei por várias Legislaturas e devo dizer-lhe que foi a primeira vez que vi uma lei da Assembleia da República ser aprovada e publicada no Diário da República e, passados quatro dias, o Governo, numa atitude que considero de total desrespeito pela instituição parlamentar, publicar um decreto-lei a revogar essa mesma lei.
O próprio Presidente da Assembleia - permito-me citar o que consta do nosso projecto de lei - afirmou, a este propósito: «Concordo que, politicamente, é chocantíssimo que, no dia seguinte, o Governo revogue uma lei, da véspera, da Assembleia da República». É o Presidente da Assembleia da República, o Dr. Almeida Santos, que faz esta afirmação pública, porque ele, como é evidente, procurou interpretar aquela que julgo dever ser a posição de todos os Deputados desta Casa, que é a de defender as instituições parlamentares, o normal funcionamento das mesmas, a relação que deve existir entre os diferentes órgãos de soberania e o respeito pelas competências de cada um. De facto, nesta questão, o Governo socialista mostrou uma total insensibilidade!
Por isso, como sou um homem de fé e de esperança, acredito que a Assembleia da República possa repor a sua vontade nesta Legislatura, fazendo aprovar de novo um diploma que manifeste claramente ao País e ao poder local que, em matérias que são da sua competência, como são o tratamento dos resíduos sólidos urbanos, a das rede de saneamento básico e a das nascentes de águas, matérias que dizem essencialmente respeito às comunidades locais, às populações locais, se dê essa faculdade… É que no nosso diploma não pomos isto como imperativo mas apenas como uma faculdade! Trata-se de dar aos municípios que o desejarem e estiverem abrangidos por estes sistemas multimunicipais a possibilidade de serem os detentores da gestão destes sistemas, das empresas que os integram, porque, melhor do que ninguém, eles saberão gerir e defender os interesses das comunidades locais.
É este o nosso grande objectivo, e assim se demonstra quem é que está a favor da descentralização e quem está a favor de uma atitude centralista, jacobina, como demonstrou estar o Governo do Partido Socialista e a bancada que o tem apoiado!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Joaquim Matias.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 257/VIII coloca esta Câmara e cada um dos Srs. Deputados perante uma decisão cujo alcance ultrapassa em muito os efeitos imediatos e conjunturais do interesse político partidário do seu articulado, de alteração de um artigo do Decreto-Lei n.º 379/93, de 5 de Novembro, e a revogação do Decreto-Lei n.º 439-A/99, de 29 de Outubro.
De facto, a votação final irá reflectir a coerência com princípios fundamentais do nosso regime democrático. Desde logo, com a descentralização administrativa, com o respeito pelas atribuições das autarquias locais e a competência dos seus órgãos, mas também com a cedência ao interesse de grupos económicos subitamente atraídos pelas novas indústrias do ambiente e, em particular, pela exploração lucrativa de serviços públicos essenciais, como a distribuição de água para consumo doméstico.
Finalmente, visa repor uma questão política essencial do regime democrático dado que, com o Decreto-Lei n.º 439-A/99 e a apreciação parlamentar subsequente, o Governo e o Grupo Parlamentar do PS subverteram a competência legislativa, conferindo ao Governo supremacia legislativa sobre a Assembleia da República. Inqualificável!
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A gestão e exploração do sistema de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, do sistema de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e do sistema de recolha e tratamento de resíduos sólidos, são atribuições das câmaras municipais. O elevado valor das infra-estruturas instaladas é património de cada um dos municípios. E a competência para fixar o valor das tarifas de consumo e as taxas a pagar pelas populações pertence aos órgãos do município democraticamente eleitos.
Passar este património, estas atribuições e competências para sistemas multimunicipais onde a totalidade dos municípios, ficando em minoria de capital, perdem o controlo do serviço, é uma atitude centralizadora e atentatória da independência do poder local,…

Aplausos do PCP e de alguns Deputados do PSD e do CDS-PP.

… sendo que, ainda por cima, é o capital resultante da atribuição dos fundos de coesão que constitui a participação maioritária do poder central no sistema.
O Decreto-Lei n.º 379/93, que permitiu esta escalada contra o poder local, contou, e ainda conta hoje, com a nossa firme oposição. O PSD, que, na altura no governo, foi o seu autor, já reconheceu parte do erro, numa atitude que saudamos e persiste na sua correcção, pelo que conta com o nosso apoio nesta iniciativa. Lamentável é que o PS pelo facto de ter passado da oposição para o Governo tenha passado a defender uma lei que considerava má!
Significativo foi, na altura, o Partido Socialista considerar que o PSD queria, com essa iniciativa legislativa, retirar competências às câmaras municipais e, agora, o Governo do Engenheiro Guterres pressiona os municípios para a criação de sistemas multimunicipais. Aguardamos, aliás, que o Governo nos responda a um requerimento em que solicitamos os documentos comprovativos da concordância dos municípios para a criação do sistema multimunicipal do Alto Alentejo com maioria do capital do IPE - Águas de Portugal (foi criado por decreto), que refere esta concordância no preâmbulo, enquanto alguns municípios afirmam não a ter concedido.
Lamentamos também a pressão inaceitável e inqualificável exercida sobre os municípios da península de Setúbal e a sua associação, cujas candidaturas ao fundo de coesão para construção do sistema de estações de

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tratamento de águas residuais e da adutora de águas estão retidas pelo Governo português, através do Ministério do Ambiente, como forma de pressão para criação do sistema multimunicipal respectivo, igualmente com maioria do capital do IPE - Águas de Portugal. Isto é vergonhoso!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Pela nossa parte, o presente projecto de lei terá o nosso voto favorável, assim como já o tivera a Lei n.º 176/99, de 25 de Outubro.
Consideramos, todavia, que constitui apenas um pequeno passo nas alterações que devem ser feitas ao Decreto-lei n.º 379/93, de 5 de Novembro. Outras alterações mais profundas serão necessárias, incluindo a sua adaptação a legislação posterior, como é o caso do regime jurídico das empresas intermunicipais, mais adequado à gestão destes sistemas, que contou também, para a sua aprovação, com os votos do Partido Socialista.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por que terá o Partido Socialista mudado de opinião em cinco anos? Sem dúvida terá de haver uma estratégia subjacente a esta atitude centralizadora, estratégia que é, afinal, a cedência à estratégia dos grupos económicos e aos seus interesses.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Através da futura privatização da empresa Águas de Portugal pelo IPE será entregue às multinacionais do sector o controlo do valioso património municipal, devidamente acrescido das verbas do fundo de coesão, alienando-se pelo caminho uma competência dos órgãos municipais. Esta estratégia ficou, aliás, evidente, quando o Governo anterior, igualmente do PS, impediu a EPAL de concorrer ao concurso público para a privatização da exploração do sistema de abastecimento de água à cidade de Setúbal.
Por fim, a revogação do Decreto-lei n.º 439-A/99, de 29 de Outubro, visa não apenas regularizar esta situação e devolver aos municípios a maioria do capital dos sistemas multimunicipais, permitindo-lhes exercer as suas atribuições e competências indevidamente espoliadas, como visa igualmente corrigir o grave precedente criado.
O Governo, utilizando truques e habilidades, com a publicação deste decreto-lei, revogou uma lei da Assembleia da República ainda antes de esta entrar em vigor, isto é, vetou, de facto, a Lei n.º 176/99, de 25 de Outubro, competência que, constitucionalmente, não lhe cabe. E, com a mesma habilidade, usando os 115 Deputados, impediu a apreciação parlamentar do Decreto-lei n.º 439-A/99. Isto é, a competência legislativa ficou subvertida, passando o Governo a ter supremacia sobre a Assembleia da República.
Com a aprovação deste projecto de lei, também esta situação aberrante do nosso regime democrático será ultrapassada.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 257/VIII, do PSD, em apreciação, apresenta-se com o objectivo de conferir aos municípios servidos por sistemas multimunicipais o direito de deterem uma participação maioritária nas respectivas sociedades gestoras.
Não vou tecer quaisquer comentários ao teor dos motivos justificativos do projecto, pela simples razão de que utiliza uma linguagem imprópria de uma iniciativa legislativa como é um projecto de lei.
Da apreciação que fazemos do projecto de lei facilmente se conclui que o mesmo não só é redutor para a participação dos municípios na gestão dos sistemas multimunicipais como impõe a todos os municípios e sistemas multimunicipais o modelo único de gestão e, sobretudo, revela um profundo desconhecimento da realidade dos municípios portugueses.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Oh!…

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - De que diploma está a falar?!

O Orador: - Ao contrário do que se pretende afirmar no projecto de lei, os municípios têm hoje opções diversas no que toca aos modelos de gestão dos sistemas de abastecimento de água, tratamento de águas residuais e valorização de resíduos sólidos.
As soluções são variadas e os municípios começam a diversificar as suas formas de participação e gestão, quer em alta ou em baixa, podendo ser uma gestão directa, delegada ou mista. Os sistemas intermunicipais podem ser detidos entre 1% e 100% pelos municípios sem qualquer restrição, pelo que não se compreende este projecto de lei.
Também a pretensão dos autores do projecto de lei de terem um sistema multimunicipal gerido essencialmente pelos municípios não faz sentido, uma vez que hoje, essa possibilidade está plenamente consagrada nos actuais modelos de gestão.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A eventual aprovação deste projecto de lei seria uma ingerência intolerável numa associação empresarial feita de livre vontade entre as partes,…

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não apoiado!

O Orador: - … abalando fortemente a confiança dos investidores nos sistemas multimunicipais, provocando o seu desinteresse no modelo em causa, isto é, traduzindo-se, na prática, pelo seu abandono no sector do ambiente e na impossibilidade de constituição de novos sistemas multimunicipais com os municípios que assim o pretendam.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Está a delirar!

O Orador: - Este modelo assenta os seus méritos na «empresarialização» e na gestão profissional dos grandes projectos de investimento no sector do ambiente. Trata-se de um modelo exemplar na implementação da

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sua gestão e na construção de importantes infra-estruturas, tendo sido mesmo a gestão profissional e a tomada de decisões baseadas em conceitos empresariais que contribuíram para o seu sucesso e, com a aprovação deste projecto de lei, estes princípios seriam postos em causa.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A eventual aprovação do projecto de lei trará, necessariamente, consequências negativas na execução da vertente do fundo de coesão do III QCA,…

Vozes do PSD: - Porquê?!

O Orador: - … não só porque aumenta o risco de incumprimento dos cronogramas de execução dos projectos, conduzindo à eventual perda de financiamentos, mas também porque diminui a credibilidade da solução portuguesa, onde a condução empresarial na concretização e gestão das infra-estruturas multimunicipais constitui, segundo a Comissão Europeia, um exemplo de sucesso na aplicação dos fundos de coesão que a própria Comissão recomenda aos países candidatos ao alargamento.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não podemos aprovar um projecto de lei baseado somente no conhecimento que temos das Áreas Metropolitanas do Porto e Lisboa.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Este é um projecto nacional!

O Orador: - É necessário conhecer o país real, de norte a sul e do litoral ao interior.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - É! E o Alto Alentejo!

O Orador: - Os municípios não têm todos a mesma dimensão e a mesma capacidade financeira e sabemos que, devido a dificuldades financeiras, em seis dos nove sistemas multimunicipais de águas residuais constituídos até ao momento os municípios não subscreveram a totalidade do capital de 49% que lhes foi reservado.
Se tivermos em conta que os novos sistemas multimunicipais a criar são essencialmente em zonas do interior, em que os municípios dispõem de menos recursos, não podemos pôr em causa a possibilidade de estes projectos se concretizarem.
Temos também de ter em atenção o crescimento do endividamento dos municípios já que, em consequência da assumpção da maioria do capital na gestão das sociedades concessionárias de sistemas multimunicipais, eles teriam de se responsabilizar pelo endividamento bancário destas sociedades.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - E qual é o problema?!

O Orador: - Em finais de 2000, este endividamento bancário ascende a 80 milhões de contos.
O envolvimento financeiro dos 92 municípios nos nove sistemas multimunicipais de águas e águas residuais e dos 110 municípios nos 11 sistemas de resíduos sólidos criados até ao momento é, actualmente, de 11,7 milhões de contos.
O envolvimento financeiro actual das Águas de Portugal nos nove sistemas multimunicipais e nos 11 sistemas de resíduos sólidos é de, aproximadamente, 92 milhões de contos.
O Plano Estratégico de Abastecimento de Água e de Saneamento de Águas Residuais prevê um investimento nos sistemas plurimunicipais, até 2006, de, aproximadamente, 480 milhões de contos.
O fundo de coesão irá comparticipar em cerca de 260 milhões de contos, pelo que os restantes 220 milhões de contos terão de ser mobilizados pelos promotores dos projectos.
Assim, e pressupondo que os sistemas em exploração não vão aumentar os seus actuais níveis de endividamento, os accionistas maioritários das sociedades concessionárias terão de se responsabilizar pela mobilização de, pelo menos, 300 milhões de contos.
A generalidade dos municípios portugueses não tem capacidade para fazer face a estas exigências financeiras.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não devemos alterar, sobretudo, a relação de forças entre municípios accionistas dos sistemas multimunicipais.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei proposto é incoerente e favorece os municípios com maior poder financeiro.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Essa é que é a questão!

O Orador: - O artigo 3.º-A do projecto de lei já existe, está publicado e em vigor, no Decreto-lei n.º 439-A/99, de 29 de Outubro. Ou seja, hoje, os municípios têm já a possibilidade de deter a maioria do capital nos sistemas multimunicipais e até hoje nenhum dos municípios utilizou este mecanismo para poder ter esse capital.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Isso é falso!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Está a falar sem conhecimento!

O Orador: - Por conseguinte, este artigo nada vem acrescentar à lei vigente, dado que os municípios já têm hoje o direito de ter essa participação maioritária no capital das empresas multimunicipais.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - É mentira!

O Orador: - Os n.os 3 e 4 do artigo 2.º do referido projecto de lei podem levar a que os muitos municípios com fraco poder financeiro não consigam (ou mesmo não queiram) adquirir a sua parte. Isto levará a que a repartição accionista entre os municípios, que foi acordada exclusivamente entre eles numa base equitativa ou de repartição de caudais, seja agora deturpada e a relação da participação no capital das empresas pode ficar substancialmente alterada.

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Pelo exposto, podemos considerar que este projecto de lei é inadequado, incoerente e, sobretudo, não serve os interesses das populações, dos municípios portugueses nem do poder local.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Fernando Costa, Sílvio Rui Cervan, Jaime Soares e Honório Novo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Costa.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a tratar de uma matéria importantíssima na vida das pessoas, que é o recurso e o direito à gestão da água, sendo esta um bem essencial.
Permita-me, Sr. Presidente, por falar de água, que o saúde de uma forma especial, o poeta da Sr.ª das Tempestades, do puro som, o poeta do mar, o poeta que tanto tem defendido as causas ambientais, seja da poluição do ar, seja do saneamento da Foz do Arelho. Deixe-me que saúde o poeta que melhor cantou as belezas e as forças do mar Atlântico e da Foz do Arelho.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: A primeira parte da minha intervenção tem de se revestir de um profundo protesto em relação à intervenção que acabei de ouvir.
A ser certo aquilo que o Sr. Deputado do Partido Socialista acabou de afirmar - e creio que é autarca na Assembleia Municipal do Porto -, as suas afirmações são da maior gravidade para o poder autárquico.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado insulta o poder local quando diz que o facto de os municípios terem a maioria da participação do capital social nestas empresas descredibiliza estas empresas. O Sr. Deputado veio aqui dizer claramente que os municípios são incompetentes, que não sabem gerir os seus recursos próprios, enfim, que os municípios são entidades de menos bem e de menor competência!
Sr. Deputado, só lhe falta a coragem para dizer pura e simplesmente que estas atribuições devem ser retiradas aos municípios. É a consequência lógica! É a interpretação que se há-de fazer das suas afirmações!
Se diz que a participação dos municípios nestes projectos descredibiliza, reduz a sua rentabilidade, põe em causa os fundos comunitários, então, Sr. Deputado, tenha a coragem - o seu Governo já fez coisas piores ou coisas mais arrojadas! - de dizer que se deve retirar o abastecimento e o tratamento de águas a todos os municípios!
O Sr. Deputado veio dizer que o País real não é Lisboa nem o Porto. Sou presidente de uma câmara que vai, amanhã, assinar um contrato de concessão com as Águas de Portugal ou com o IPE (essa empresa que tem milhares de contos para fazer publicidade na televisão, o que ainda não consegui entender) e são os munícipes que vão pagar essa grande factura!
Sr. Deputado, no Oeste como em Setúbal, os municípios só vão assinar o contrato, porque a isso são obrigados. O Sr. Deputado disse que os sistemas intermunicipais podiam ser detidos entre 1% e 100% pelos municípios sem qualquer restrição, mas esquece-se que logo é apontada a sanção de que não há fundos comunitários se o IPE não se associar, se as Águas de Portugal não se associarem.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - No Oeste, 14 municípios defenderam que deviam ter 51%. Repare no exemplo da Câmara Municipal de Torres Vedras, onde é vereadora a esposa do Sr. Secretário de Estado da Administração Local! Todos os municípios queriam ter 51%.
Sr. Deputado e Autarca, o que diz é um escândalo!
Mas vou mais longe. É outro escândalo - e esta lei não aborda essa questão…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, tem de concluir. Já ultrapassou 1 minuto.

O Orador: - Sr. Presidente, dê-me apenas mais 2 minutos, descontados no tempo do meu partido.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Não pode. Tem mesmo de concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Como eu dizia, o outro escândalo é este: os municípios são obrigados a pagar as infra-estruturas que fizeram e - pasme-se! - aos municípios só é atribuído o valor da obra que não foi comparticipada. A comparticipação comunitária passa para propriedade…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, lamento muito mas, de acordo com o Regimento, tem de terminar. Não tenho outra solução.

O Orador: - Sr. Presidente, termino com o meu grito de revolta contra este atentado ao municipalismo e ao poder autárquico.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, agradeço, muito sensibilizado, as suas palavras. Sei que partilhamos a mesma paixão pela Foz do Arelho e por aquela região atlântica da qual o Sr. Deputado, como presidente, tem uma responsabilidade que não é a minha, já que a minha é apenas poética. Mais uma vez, muito obrigado pelas suas palavras.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan ( CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a minha pergunta é muito concreta.
O Sr. Deputado Renato Sampaio trouxe-nos, hoje, informações novas. Disse que todos os grupos parlamentares, à excepção do Partido Socialista, estavam completamente equivocados, porque, afinal, já é possível realizar aquilo que o diploma em discussão consagra.
Ora, então, para ficarmos todos de bem uns com outros e para o Partido Socialista dar a todos os outros

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grupos parlamentares a possibilidade de mostrar que estavam completamente errados, basta aprovar o diploma em discussão para que tudo fique como está! Como as duas situações são absolutamente idênticas, não há qualquer problema! Conhecendo eu, como conheço, o Sr. Deputado Renato Sampaio, sei que não deixará, seguramente, de ser essa a posição do Partido Socialista!
Mas, Sr. Deputado, deixo-lhe mais uma nota, que me parece importante. Se o Sr. Deputado seguisse a minha sugestão, mais não faria do que aquilo que o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Vila do Conde e Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses diz que é a atitude correcta. Assim, V. Ex.ª estaria a agradar ao Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses e seu colega e camarada de partido Dr. Mário Almeida e ficaríamos todos bem. Ficaria não só o Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses mas também o Partido Socialista, porque diz que esta questão já está estabelecida no actual ordenamento jurídico, e os outros quatro partidos, que estão a dizer coisas completamente sem razão, ficariam também satisfeitos, porque já defendem este aspecto desde o início e, portanto, até estariam capazes de perdoar um incidente constitucional sobre o qual aproveito para lhe para pedir a sua opinião.
Sr. Deputado, independentemente de todos sabermos que constitucionalmente um decreto-lei pode revogar uma lei em tudo o que não seja reserva absoluta ou relativa da Assembleia, independentemente de todos nós termos esse conhecimento, pergunto se, enquanto protagonista político, enquanto actor político, enquanto Deputado, membro desta Assembleia, não fere a sua sensibilidade que uma lei, quatro dias depois de ser publicada, seja revogada por um decreto-lei.
O Sr. Deputado pensa que esta Assembleia sai prestigiada com acidentes, repito, com acidentes, como este?
Gostava de ouvir a sua opinião, porque sei que é sensível a estas questões.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Costa, concordo inteiramente com a primeira parte da sua intervenção, ou seja, com o elogio que faz ao Sr. Presidente da Assembleia, Deputado Manuel Alegre, e meu camarada.

O Sr. Sílvio Rui Cervan ( CDS-PP): - Com essa primeira parte, todos concordam!

O Orador: - Não concordo, em absoluto, com a segunda parte. E não concordo, por uma simples razão - e, provavelmente, ou eu me exprimi mal, admito-o, ou o Sr. Deputado não ouviu bem a minha intervenção: o que eu afirmei não foi a descredibilização do sistema ou do poder local mas, sim, e reafirmo, que, hoje, com a legislação que temos…
Aliás, aproveito para responder ao Sr. Deputado Sílvio Cervan que ganharíamos tempo se aprovássemos já este diploma, mas, se calhar, ganharíamos mais se todos tivessem lido com atenção o Decreto-Lei n.º 439-A/99, porque o n.º 1 do artigo 1.º diz que o artigo 3.º-A do Decreto-Lei n.º 379/93 passa a ter a seguinte redacção: «Os municípios servidos por sistemas multimunicipais podem deter uma participação maioritária no capital da sociedade concessionária da respectiva exploração (…)».

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Mas o IPE não quer!

O Orador: - Se o tivesse lido!…
Mas, como eu estava a dizer, o que eu afirmei, e reafirmo, é que, hoje, já é possível os municípios deterem a maioria de capital em empresas multimunicipais.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - Aquilo que eu também disse foi que seria a descredibilização do sistema se, a meio do percurso, alterássemos completamente as regras do jogo, ou seja, se hoje obrigássemos o IPE a vender a sua participação aos municípios, mesmo sem os municípios o quererem.

O Sr. Sílvio Rui Cervan ( CDS-PP): - É preciso serem muito «amiguinhos»!

O Orador: - Isto porque, hoje, os municípios já podem deter a maioria do capital, e nenhum deles utilizou essa possibilidade, através desta lei…

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É falso!

O Sr. Fernando Costa (PSD): - O meu município quer e os do Oeste também, mas o IPE não deixa!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, fala um de cada vez! Não estamos na praça pública!

O Orador: - Sr. Deputado, o que acontece é que, quando existem sociedades, estas terão de ser feitas entre partes e há partes que concordam e partes que discordam. Se querem fazer uma sociedade com o IPE e este não está interessado em ter uma minoria…
Agora, grave foi o que aconteceu no passado, em que a lei obrigava o IPE a deter maioritariamente o capital. E mais: a chantagem foi feita, por exemplo…

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Sr. Deputado, lembro que a chantagem foi feita, por exemplo, na Águas do Douro e Paiva, em que o anterior Secretário de Estado dos governos de Cavaco Silva, sabendo que a Área Metropolitana do Porto estava sem água, só permitiu a construção da ETA (Estação de Tratamento de Água) de Lever se fosse constituída uma empresa com os capitais maioritariamente do Estado.
Isso foi uma chantagem política, e isso, hoje, não acontece!

Vozes do PSD: - Isso é falso!

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O Orador: - Hoje, a lei diz é que o IPE só entra se tiver uma maioria do capital, se não a tiver, não entra! Não está interessado em fazer uma sociedade em minoria.

Protestos do PSD.

Por isso, Sr. Deputado, o que eu disse, e reafirmo, é que hoje é possível, embora os municípios ainda não tivessem recorrido a esse mecanismo.

Vozes do PCP: - Não é verdade!

O Orador: - Mais, Sr. Deputado: há municípios, como referi na minha intervenção, que nem os 49% quiseram subscrever, porque não têm capacidade financeira para tal!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Marta Soares.

O Sr. Jaime Marta Soares (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, em primeiro lugar, peço ao Sr. Presidente que não contabilizasse no meu tempo estas palavras que vou dizer de imediato e que se dirigem essencialmente a V. Ex.ª.
Quero dizer ao meu colega de bancada Fernando Costa que V. Ex.ª, apesar de ser nascido em Águeda, é um património de Coimbra e que muito me orgulho, como Deputado de Coimbra, em cumprimentá-lo, nessa situação, e saudá-lo.
Sr. Deputado Renato Sampaio, o senhor passou um atestado não só de menoridade mas também de incompetência aos municípios portugueses. Só gostaria que os munícipes do Porto ouvissem a sua intervenção, porque duvido que V. Ex.ª mais alguma vez conseguisse ser eleito para a Assembleia Municipal do Porto, tal foi o atentado com que V. Ex.ª se dirigiu agora aos autarcas de Portugal!
Gostaria de lhe dizer que não só há razões duvidosas sobre a forma como foi revogada esta lei como também é anti-social a forma como o fizeram e para onde nos querem encaminhar. É de uma forma prepotente que querem obrigar os municípios a aderir e não é como o Sr. Deputado, há pouco, disse. É de uma forma prepotente, porque quem não aderir à empresa não tem verbas para levar por diante as suas obras, nem no próprio Quadro Comunitário de Apoio.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Essa é que é a verdade!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É muito grave!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado, o que é mais grave, gravíssimo, é que o património existente nos municípios portugueses, que foi criado à custa do esforço e, muitas vezes, do seu endividamento para responder rapidamente às necessidades das populações, nem esse é contabilizado como um valor próprio dos municípios, passa para o Estado. Eu diria, se pudesse utilizar o termo, mas não o utilizo, que é um desvio, para não dizer outra coisa, um autêntico roubo aos municípios portugueses fazer passar esse património para a pertença da empresa.

Vozes do PS: - Não é não!

O Orador: - Sr. Deputado, ouça mais esta: toda esta questão foi alvo de profunda reflexão e de discussão no âmbito da Associação Nacional de Municípios Portugueses, que tem como associados todos os municípios de Portugal, alguns de maioria socialista, e é presidida por um socialista, e esta Associação, por unanimidade, aprovou sempre a lei tal e qual como ela estava. VV. Ex.as, hoje, querem pôr em causa e não aprovar o projecto do Partido Social Democrata.
Mas, Sr. Deputado, há muito mais coisas, como é o caso da lei das novas competências, que, há ano e meio, está na gaveta e os senhores não são capazes de a negociar, de a regulamentar e a pôr cá fora.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Efectivamente, a regionalização não passou, os senhores «encheram a boca» com a descentralização, mas os municípios portugueses cada vez mais estão debaixo da tutela de um poder central discricionário que esqueceu as propostas que fez aos municípios portugueses.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Isto não pode continuar e estas verdades têm que ser ditas para que o povo português saiba a demagogia com que o Partido Socialista respeita o poder local.
E nós, meus queridos amigos, não temos dúvidas de que a Associação Nacional de Municípios Portugueses, que pugna todos os dias pela defesa dos interesses das populações, cada vez mais tem de entender, e entende-o, que o seu maior inimigo está efectivamente no poder central e, neste caso concreto, no Partido Socialista.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado Jaime Soares, estou «derretido» com as vossas «ternuras», mas continuo inflexível no Regimento.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, compreende-se a posição incómoda do Deputado Renato Sampaio, porque pouca gente perceberá a lógica do Partido Socialista nesta matéria. Suponho que o Partido Socialista não é capaz de responder a esta pergunta: o que é que faz correr o Partido Socialista nesta matéria?

O Sr. Jaime Marta Soares (PSD): - A gente até sabe!

O Orador: - Por isso, o Deputado Renato Sampaio tenta confundir quem o ouve. Fala em empresas intermunicipais e municipais, que não estão em discussão neste pro

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jecto de lei, porque o que está em discussão são as empresas multimunicipais de captação e distribuição de água em alta, por exemplo, e esquece-se de dizer que o Governo, o IPE, não deixa que os municípios possam, se quiserem, deter 51% do capital social, fazendo chantagem sobre as autarquias.

O Sr. Sílvio Rui Cervan ( CDS-PP): - Nem diga nada!

O Orador: - O Sr. Deputado Renato Sampaio tenta atirar com areia para os olhos de quem o ouve. Porquê? Porque agita o fantasma dos investidores que vão fugir das empresas multimunicipais, esquecendo que os investidores são empresas públicas municipais ou do Estado e que os dinheiros são comunitários, são públicos, são do Fundo de Coesão.
O Sr. Deputado Renato Sampaio insiste e, depois, tenta manipular a opinião favorável ou desfavorável da Comissão Europeia perante estas empresas, esquecendo que, com isso, está a atribuir um atestado de incompetência e de incapacidade ao poder local e está a duvidar da capacidade financeira dos municípios - alguns têm-na mas, se a não tivessem, passariam a tê-la por via de fundos que são comunitários, que são públicos e que são do Fundo de Coesão.
O que faz correr o PS nesta matéria? De facto, o PS, nesta matéria, subalterniza o poder local, despreza o poder local, faz chantagem sobre o poder local, afasta as populações de decisões que lhe deviam competir…

Vozes do PSD: - Claro!

O Orador: - … e por isso é que, se calhar, se percebe que a empresa Águas do Douro e Paiva tenha decidido, por intervenção do Governo, que a água vai aumentar 6% na região do Porto e que os seus funcionários de alta patente passem a ter direito a 16 meses de remuneração, porque naturalmente está afastada das populações e as populações não controlam.
Mas o que faz correr o PS, em nossa opinião, é o que está por trás deste negócio. E o que está por trás deste negócio é a eventual privatização da Águas de Portugal e do IPE e a entrega desse negócio chorudo aos privados,…

Aplausos do PCP e do PCP.

… para que eles detenham um serviço público que é essencial no nosso país e que é, entre outros, o abastecimento de água pública às populações!

Aplausos do PCP.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - E o cidadão é que vai pagar!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. António Capucho (PSD): - Não tem resposta!

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jaime Soares, se fosse verdade aquilo que disse, é evidente que eu teria alguma dificuldade em apresentar-me ao eleitorado do Porto. Porém, com a intervenção que fiz, não tenho qualquer espécie de dúvida em andar de cara levantada no Porto e apresentar-me claramente ao eleitorado. Não tenho qualquer tipo de dúvida!

O Sr. Honório Novo (PCP): - Eles não o ouvem e esse é o mal!

O Orador: - O que eu disse aqui, e continuo a afirmar, foi que, hoje, através da legislação em vigor, aos municípios portugueses é facultada a possibilidade, em empresas multimunicipais, de deterem a maioria do capital.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Não insista que isso não é verdade!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - É verdade, é!

O Orador: - Sr. Deputado Fernando Costa, continuo a afirmar que é verdade.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não conhece a realidade!

O Orador: - Provavelmente, não leram o artigo nem o sabem ler!
Srs. Deputados, eu costumo ser uma pessoa delicada e não queria dizer-lhes que, provavelmente, não têm a legislação ou não a souberam ler! Mas eu vou ler-lha!

O Sr. Sílvio Rui Cervan ( CDS-PP): - Então, vá lá! A ver se percebemos!

O Orador: - O n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 439-A diz o seguinte: «O artigo 3.º-A do Decreto-Lei n.º 379/93, de 5 Novembro, na redacção da Lei n.º 176/99, de 25 de Outubro, passa a ter a seguinte redacção: (…) Os municípios servidos por sistemas multimunicipais podem deter uma participação maioritária do capital da sociedade concessionária da respectiva exploração e gestão, no respeito pela regra da maioria pública do capital social referida no n.º 1 do artigo 3.º.»
Isto significa que - e, já agora, respondo também ao Sr. Deputado Honório Novo - nestas sociedades multimunicipais e pela legislação em vigor é sempre garantido que a maioria do capital fica no sector público, quer seja das autarquias, quer seja do Estado. Portanto, está garantido através disto.
Agora, o que importa saber é quem poderá deter a maioria do capital, ou seja, se poderão ser os municípios ou se poderá ser o Estado e, neste caso, concluímos que qualquer um deles o pode fazer. Para além disso, continuo a afirmar que uma sociedade é feita pela livre vontade dos parceiros que a constituem.
No que respeita à questão dos fundos comunitários, creio que esse é um sofisma que estão aqui a levantar, porque sabemos que é necessária a presença do Estado nas empresas multimunicipais para que haja acesso ao Fundo de Coesão. Aliás, é por isso que estas empresas se constituem!
O Sr. Deputado Jaime Soares referiu a falta de respeito do PS para com o poder local. Por isso, tenho

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de lhe perguntar se conhece maior falta de respeito pelo poder local do que a não aplicação da Lei das Finanças Locais.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Muito bem! Bem lembrado!

O Orador: - Quer maior atentado ao poder local do que a falta de cumprimento da Lei das Finanças Locais, que espoliou claramente os municípios portugueses de milhões e milhões de contos?! Esta falta de cumprimento espoliou os municípios e o senhor vem falar de roubo, nesta altura, através do património?!
Sr. Deputado Jaime Soares, V. Ex.ª sabe perfeitamente que o património das câmaras e municípios passa para as empresas numa negociação entre o município e as empresas e que não há qualquer outra avaliação.

O Sr. Jaime Marta Soares (PSD): - Não há outra avaliação?!

O Orador: - Não! Há uma negociação entre os municípios e a empresa e, em função dessa negociação, passa-se o património.
Há, contudo, uma coisa que não consigo entender. Como é que os senhores estão tão preocupados com a questão da alta passar para empresas multimunicipais em que os municípios detêm a maioria do capital e não estão preocupados com a privatização de muitos serviços municipalizados que muitas câmaras do PSD querem fazer?! Como é que não estão preocupados com a concessão e privatização de muitos serviços e sistemas de água, quer em alta, quer em baixa?!

Aplausos do PS.

O Sr. Jaime Marta Soares (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jaime Marta Soares (PSD): - Para defesa da honra pessoal, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Nesse caso, tem de aguardar pelo fim do debate, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Rui Gonçalves): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Chega agora a minha vez de intervir, para participar no debate do projecto de lei n.º 257/VIII, apresentado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira e pelo Partido Social Democrata.
Gostava de dizer, em primeiro lugar, que me surpreende o facto de o Sr. Deputado Manuel Moreira vir mais uma vez, particularmente nesta altura, apresentar este projecto de lei!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Quem apresenta o projecto de lei é o Partido Social Democrata!

O Orador: - Diria que este facto constitui, hoje e agora, uma tentativa de manipulação das regras de funcionamento do Parlamento!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Quem é o senhor para vir aqui dizer isso?!

O Orador: - Gostaria, aliás, de recordar os Srs. Deputados do PSD que o n.º 4 do artigo 167.º da Constituição diz especificamente que os projectos de lei definitivamente rejeitados não podem ser renovados na mesma sessão legislativa, salvo nova eleição da Assembleia da República. Como os Srs. Deputados sabem, ainda não decorreu uma nova eleição da Assembleia da República, nem decorrerá a breve prazo.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sessão legislativa não é o mesmo que legislatura, Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - O senhor não sabe o que é uma sessão legislativa! Confunde sessão legislativa com legislatura!

O Orador: - Sr. Presidente, gostava de recordar que este projecto foi apresentado no dia 30 de Junho de 2000, o que espero que esclareça cabalmente os Srs. Deputados!

Protestos do PSD e do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, agradeço que façam silêncio! O Sr. Deputado António Capucho já pediu a palavra e, por isso, no fim da intervenção do Sr. Secretário de Estado, poderá falar, de acordo com o que dispõe o Regimento!
Faça favor de continuar, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Sr. Presidente, reafirmo que este projecto foi apresentado no dia 30 de Junho de 2000! Espero que este facto esclareça os Srs. Deputados!

O Sr. João Amaral (PCP): - A sua observação é contra o Presidente da Assembleia da República?! É que, nesse caso, ele não deveria ter aceite o projecto de lei!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado João Amaral, se quer falar, faça favor de se inscrever! V. Ex.ª conhece bem o Regimento!

O Sr. António Capucho (PSD): - Triste figura, Sr. Secretário de Estado!

O Orador: - Ora, o projecto em apreço corresponde a uma cópia milimétrica de um pedido de apreciação parlamentar ao Decreto-Lei n.º 439-A/99, de 29 de Outubro, que não mereceu o acolhimento desta Câmara. Só o recurso a uma mudança de forma sem alteração da substância permite que estejamos mais uma vez a discutir o mesmo assunto.
No entanto, o que aqui é importante é a substância da iniciativa e confunde-nos esta insistência. Como é sabido, o Decreto-Lei n.º 379/93, de 5 de Novembro, foi aprovado por um governo do PSD e é da responsabilidade política da Deputada desta Câmara Teresa Patrício

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Gouveia. O PSD, em essência, nunca nos conseguiu demonstrar o que é que mudou para que tenha de haver uma alteração deste diploma. Pelo contrário, o regime instituído pelo diploma tem dado excelentes provas e é mesmo considerado exemplar pela União Europeia e utilizado como exemplo para os novos Estados que se preparam para entrar na União.
Como alguns Deputados desta Casa disseram esta tarde, a actual redacção do diploma já permite que os municípios ou quaisquer outros sócios, ao abrigo do direito de preferência na alienação dos títulos representativos do capital social, se tornem sócios maioritários. Neste contexto, vejo-me forçado a recordar aos Srs. Deputados que nem o Decreto-Lei n.º 379/93 nem o Decreto-Lei n.º 439-A/99 obrigam a qualquer repartição específica do capital social entre as entidades públicas accionistas, sendo, portanto, legalmente permitidas todas as combinações possíveis. As autarquias, aliás, podem - e, nalguns casos, fazem-no - deter exclusivamente o capital das empresas do sector do ambiente. Na maioria dos sistemas até agora criados, embora não em todos, as entidades públicas accionistas detêm 100% do capital, os quais são repartidos, de uma maneira geral, em 51% para o IPE e 49% para os municípios utilizadores. Esta repartição resultou dos acordos estabelecidos entre todos os accionistas e o poder concedente e, como digo, não é igual em todos os sistemas, pelo que varia de sistema para sistema.
Esta solução tem permitido uma condução profissional e eficiente na implantação e desenvolvimento dos sistemas, dada a elevada competência técnica que é reconhecida, nacional e internacionalmente, tanto à Águas de Portugal como à Empresa Geral do Fomento.
Todos os sistemas têm sido concebidos, projectados e executados dentro dos orçamentos previstos, com correcta e atempada utilização das dotações do Fundo de Coesão que lhes foram afectadas e em perfeita harmonia com os municípios envolvidos. Até ao momento, como os Srs. Deputados sabem, já foram investidos mais de 300 milhões de contos neste sector, o que representa o maior investimento feito em toda a União Europeia neste domínio, sendo, por isso, um sinal da robustez do sistema existente em Portugal.
Gostaria, aliás, de salientar um facto que alguns dos Srs. Deputados querem ou pretendem esquecer. Sucede que a Águas de Portugal e a Empresa Geral do Fomento têm tido um papel moderador e conciliador dos interesses às vezes antagónicos entre os outros parceiros das empresas multimunicipais. Não há, com estas razões que são claras e objectivas e que estão fundadas no terreno pela existência dos sistemas e pelo cumprimento do seu papel, justificação para que se mude substantivamente o sistema que está implantado. Além do mais, este projecto do PSD constitui uma intromissão aberrante da Assembleia nas relações entre accionistas de sociedades anónimas, impondo unilateralmente a uma das partes uma relação diferente da estabelecida entre todas as outras.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Mas o entorse está para trás!

O Orador: - A estipulação da venda das acções ao preço nominal é uma enormidade, dados os investimentos já feitos - mais de 300 milhões de contos - e o trabalho já realizado. Quem não quer ver esta realidade pura e objectiva não está a contribuir para o desenvolvimento do País, mas, sim, para desencadear a destruição de um sistema eficaz, colocado no terreno e que, como digo, é um exemplo a nível internacional.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - V. Ex.ª, de facto, é o Conde de Abranhos!

O Orador: - A estipulação da cedência das acções feita com dispensa do consentimento das assembleias gerais é, como os Srs. Deputados calculam, outra enormidade. O objectivo seria, certamente, o de retirar ao Governo, enquanto representante do accionista Estado, qualquer hipótese de intervenção neste negócio, entre aspas, bem entendido.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Tire as aspas!

O Orador: - Gosto de salientar que as empresas deste sector, com a orientação, apoio e enquadramento do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território e da Águas de Portugal, têm conduzido todos os processos de concepção, projecto e construção dos sistemas multimunicipais em perfeita harmonia com os municípios, assegurando a obtenção, em condições vantajosas, de apoio nas instituições bancárias nacionais e internacionais, de entre as quais saliento o Banco Europeu de Investimentos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, o que não é admissível discutir nesta Câmara é a total desconsideração das sociedades comerciais criadas e em funcionamento, ultrapassando a vontade das suas assembleias gerais.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - E a vontade das autarquias, interessa?!

O Orador: - A Assembleia da República não pode, pura e simplesmente, afastar as regras de funcionamento das sociedades comerciais, fixando por lei o exercício de um direito, estabelecendo um preço e um prazo de venda. Dificilmente, quero salientar, seria possível encontrar um exemplo mais acabado de dirigismo económico e de manipulação por via legislativa do funcionamento de uma pessoa colectiva de tipo societário.
A terminar, cabe-me salientar e estranhar os aplausos do PSD à intervenção do PCP, quando o mesmo PSD se opunha à privatização dos sistemas de água, iniciados, aliás, pelo próprio PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, apesar de ter chegado a hora em que geralmente procedemos às votações, a verdade é que o único diploma que poderia ser votado é este mesmo que está agora em discussão. Como tal, não haverá votações regimentais.
Para defesa da honra da bancada, tem a palavra o Sr. Deputado António Capucho.

O Sr. António Capucho (PSD): - Sr. Presidente, pretendo, de facto, defender a honra da minha bancada, já que

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o Sr. Secretário de Estado se permitiu dizer que a bancada do PSD manipula as regras de funcionamento desta Casa.
Gostaria de dizer que o Sr. Secretário de Estado é reincidente em fazer nesta Casa, em relação à minha bancada, com um ar arrogante - permita-me que lho diga com todo o respeito, Sr. Secretário de Estado - e com uma sobranceria que é absolutamente inaceitável, acusações que não lhe aceito!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E, ainda por cima, ignorantes!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A sua sorte, Sr. Secretário de Estado, foi o seu colega, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, estar ao telefone. Caso contrário, V. Ex.ª tinha levado, no mínimo, um toque ou uma canelada…

O Sr. João Amaral (PCP): - Ou um coice!

O Orador: - … para não dizer asneiras! Vou explicar-lhe porquê! Não somos nós quem manipula as regras e, para além disso, V. Ex.ª não pode confundir impunemente sessão legislativa com legislatura. Se este diploma fosse inaceitável ou indevido, então, a crítica que V. Ex.ª nos estava a dirigir era também dirigida ao Sr. Secretário de Estado José Magalhães, que, em Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, assistiu ao agendamento deste diploma sem ter levantado qualquer problema, como não tinha de fazer. Por fim, essa crítica era também dirigida ao Sr. Presidente da Assembleia da República, que admitiu o diploma, porque, necessariamente, tinha de o fazer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Como tal, V. Ex.ª, antes de, com esse seu ar sobranceiro, levantar arrogantemente acusações de manipulação ao funcionamento desta Casa, devia estudar o Regimento e, especialmente, a Constituição da República Portuguesa!

Aplausos do PSD e do Deputado do PCP João Amaral.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, é óbvio que o comentário que fiz é de natureza política!

Vozes do PSD, do PCP e do CDS-PP: - Ah!

O Orador: - Não estava em causa a questão formal, o que, aliás, está explicado, porque, obviamente, a figura utilizada pelo PSD foi diferente.
No entanto, do ponto de vista político, penso que a crítica se mantém e se justifica!

O Sr. António Capucho (PSD): - Está desculpado!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado António Capucho aludiu, em termos que, julgo, são menos adequados, e julgo que o fez motivado por uma emoção que tenho dificuldade em compreender, a uma forma de relacionamento do Governo que, manifestamente, não existe. Como tal, a palavra «canelada» ou outras expressões corporais serão próprias de outras circunstâncias, mas, seguramente, não desta bancada.
Discutamos isto seriamente em termos políticos!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, penso que seria bom para o prestígio da instituição parlamentar que ultrapassássemos esta fase, porque houve aqui várias inadequações, sendo certo que umas puxam as outras!
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sílvio Rui Cervan.

O Sr. Sílvio Rui Cervan ( CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, V. Ex.ª veio a esta Assembleia, hoje, trazer-nos uma série de adjectivos e qualificar as iniciativas da Assembleia.
De facto, V. Ex.ª é membro do Governo, está aqui a cumprir uma das obrigações que decorrem desse facto, só que veio aqui não para responder mas para qualificar as nossas iniciativas enquanto Deputados.
Quero também dizer-lhe o seguinte: V. Ex.ª, no âmbito e no calor do debate, quando deu explicações ao Sr. Deputado António Capucho, teve uma resposta que me parece relevante para esta discussão. Disse que não pretendeu atacar a bancada do PSD, que apenas fez uma crítica política e que, portanto, era politicamente censurável o PSD, um ano depois, voltar com a mesma iniciativa à Assembleia da República.
Ora, V. Ex.ª podia ter aproveitado para nos dizer se não é censurável quatro dias depois o Governo mudar uma iniciativa desta Câmara. Para V. Ex.ª um ano é muito tempo, um ano é politicamente censurável, mas quatro dias depois, Sr. Secretário de Estado, quatro dias depois!… É que não está aqui em causa a questão legal, nem o valor normativo dos diplomas do Governo ou dos diplomas da Assembleia, essa parte todos nós conhecemos, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - É a ética, Sr. Deputado!

O Orador: - O que está aqui em causa é o respeito por este órgão de soberania ao qual V. Ex.ª vem dizer que teve - e passo a citar - «uma intervenção aberrante», Sr. Secretário de Estado. Este órgão de soberania ao qual V. Ex.ª veio dizer que desconsiderou o Governo com esta iniciativa!

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O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - É preciso ter lata!

O Orador: - E não é - pasme-se, Sr. Presidente e Srs. Deputados! - que o Secretário de Estado vem dizer que o Governo é que está desconsiderado pela Assembleia da República, por esta, quatro dias depois, dar como sem efeito uma norma da Assembleia da República?!…
Pergunto: como é que é possível 230 Deputados, legitimamente eleitos nesta Casa, aceitarem que um membro do Governo venha dizer que estamos no âmbito de uma «intervenção aberrante», de uma enormidade e de uma desconsideração?
Sr. Presidente, Srs. Deputados, fica à consideração de todos, mas fica também para resposta de V. Ex.ª, o seguinte: ninguém pode aceitar como justa e como boa a sua intervenção. Gostaria, pois, de um comentário seu quanto à diferença de critérios que utiliza para um ano e para quatro dias.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Moreira.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, o meu líder parlamentar já teve oportunidade de focar um aspecto que consideramos essencial que é o estilo como o senhor se dirige a esta Câmara e a forma como desrespeita aquilo que consideramos ser fundamental em democracia: o Parlamento.
Além disso, quero recordar V. Ex.ª (porque, como já disse o líder do meu grupo parlamentar, o senhor confunde legislaturas com sessões legislativas) que o diploma que o Governo - a nosso ver, mal - revogou através de um decreto-lei, quatro dias depois de ser publicado no Diário da República, é um diploma que foi discutido e votado na anterior legislatura. Foi na anterior legislatura, Sr. Secretário de Estado! Entretanto, houve eleições legislativas no dia 10 de Outubro de 1999.
Por isso, perante a enormidade que o Governo fez de desrespeitar a vontade maioritária do Parlamento em legislatura anterior, e porque consideramos que aquilo que consta do projecto de lei por nós apresentado - que foi aprovado pela Assembleia da República como a Lei n.º 176/99, de 25 de Outubro - é realmente essencial para dar uma resposta mais eficiente e eficaz às preocupações das comunidades locais em matéria de tratamento de resíduos sólidos urbanos, de saneamento básico e de abastecimento de águas, entendemos que era nossa obrigação política repor de novo a iniciativa legislativa nesta nova legislatura, para que a Assembleia reafirmasse a sua vontade e para que obrigasse o Governo a respeitar a sua vontade soberana. Porque, felizmente, no regime democrático constitucional em que vivemos, o Governo é que depende da Assembleia da República e não o contrário!
Aliás, devo dizer que a bancada do PS acusou muitas vezes o meu partido, quando este era o suporte do governo maioritário de Portugal, de este governamentalizar a Assembleia da República, mas nós, jamais - em tempo algum! - tivemos a ousadia de revogar uma lei aprovada pela Assembleia da República, fosse ela ou não da iniciativa do partido maioritário (na altura, o PSD), fosse ela oriunda de partidos da oposição, como era o caso do Partido Socialista.
E os senhores, apesar de nunca terem tido a maioria absoluta nesta Câmara (porque apenas conseguiram um empate com o mesmo número de Deputados do conjunto dos partidos da oposição), tiveram a arrogância de, mesmo antes da abertura desta legislatura, revogar uma lei da Assembleia da República que foi votada por maioria nesta Câmara.
É isto que demonstra a falta de consideração e de respeito por este Parlamento e, neste caso, pela instituição principal da democracia portuguesa.
E, Sr. Secretário de Estado, porque o senhor disse numa das passagens da sua intervenção que aquilo que está aqui em jogo é um negócio - pôs-lhe apenas aspas -, quero dizer-lhe o seguinte: o melhor é o senhor tirar as aspas, porque o facto que o Governo quer defender é um negócio. Isto porque quer tentar fidelizar forçadamente 10 milhões de consumidores, para depois, através desse monopólio, tentar privatizar e fazer um grande encaixe financeiro de modo a poder dar respostas aos grandes desvarios que o Governo PS tem levado a cabo no plano económico-financeiro - o que, aliás, continuará a fazer se permanecer no poder.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ora, nós já percebemos isto há muito tempo, e é isso que não queremos que aconteça!…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, já ultrapassou o tempo de que dispunha. Tem de terminar.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, dizendo que não queremos que isso aconteça, porque estamos, acima de tudo, com a preocupação de conseguir aquilo que é importante para servir Portugal, para servir cada uma das comunidades e, neste caso, para dar condições para que o poder local exerça cada vez mais,…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - … da melhor forma, as suas funções, dando resposta positiva aos problemas das populações.
É isso que está em jogo, e foi isso que pretendemos com o projecto de lei que apresentámos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, a Mesa tem uma inscrição do Sr. Deputado Fernando Costa; contudo, o PSD já não tem tempo disponível.

O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Presidente, o Bloco de Esquerda cede-me tempo para formular o meu pedido de esclarecimentos.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Nesse caso, faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Fernando Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, não lhe vou colocar questões políticas mas, sim, questões técnicas e económicas.
O Sr. Secretário de Estado disse que isto era um negócio. E é! É um grande negócio. Aliás, eu chamar-lhe-ia um «negócio da China». Isto porque o IPE, para além do privilégio que tem de se associar sem ter de concorrer, investindo 7,5% num total de 100%, fica dono da gestão deste empreendimento, porque 85% dos empreendimentos são feitos com fundos comunitários. Ou seja, o IPE investe 7,5% e os municípios 7,49% e o IPE faz a gestão com a maioria absoluta de capital, mas pior, obriga os municípios a pagar-lhe o preço que ele quer.
Vou dar-lhe um exemplo: enquanto o tratamento de águas residuais numa ETAR, em termos normais, nas Caldas da Rainha ou em Almada custa cerca de 40$/m3 ou 50$/m3, o IPE estabelece já para o tratamento das águas residuais do Oeste 80$ no próximo ano e estabeleceu, no ano passado, 75$. Sabe porquê, Sr. Secretário de Estado? Porque o IPE quer a amortização de todo o investimento, incluindo a do capital a fundo perdido dos fundos comunitários.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Terminou o tempo que lhe foi cedido, Sr. Deputado. Tem de concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, ainda me resta tempo.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Da parte do Bloco de Esquerda não tem! O Bloco de Esquerda deu-lhe só 1 minuto.

O Orador: - Sr. Presidente, só mais 1 minuto para concluir o meu raciocínio.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr. Deputado, não posso inventar um Regimento à medida de cada Deputado, por muita simpatia que o Deputado me mereça. O Regimento é igual para todos, por isso tem de concluir. Aliás, há uma deliberação da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares para que haja rigidez e critérios uniformes.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, perguntando ao Sr. Secretário de Estado o seguinte: quando todos os municípios estiverem de acordo em deter a maioria do capital, o senhor e o Governo, que tutela o IPE, aconselham o IPE a ceder a maioria do capital? O Sr. Secretário de Estado dá-me esse compromisso? Porque, se assim for, a Associação de Municípios do Oeste vai pedir a maioria de capital. Fico à espera da sua resposta, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, pelo que percebi - e neste aspecto entendo que devo penitenciar-me perante a Câmara -, a questão do estilo acabou por se sobrepor à questão da substância. Portanto, nas intervenções que foram feitas nesta segunda fase os Srs. Deputados incentivaram e falaram especificamente sobre a questão do estilo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - São as duas: o estilo e a substância!

O Orador: - Vamos falar sobre a substância do que nos traz aqui, porque penso que a questão do estilo está resolvida e ultrapassada.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Sílvio Cervan e à afirmação de que eu desconsiderei o Parlamento, os Deputados e a Câmara, felizmente tomei umas notas tomadas e posso repetir exactamente o que eu disse no discurso.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Já está na acta!

O Orador: - Os Srs. Deputados talvez não tenham ouvido bem, dado o barulho que havia na Sala.

Protestos do PSD.

Vou passar a ler: «O que não é admissível é a total desconsideração da personalidade das sociedades criadas, ultrapassando a vontade da assembleia geral pelo recurso a um acto legislativo».
Ora, Srs. Deputados, penso que isto é claro!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - São capitais públicos!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Não é seu, é do Estado!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, vamos criar condições para que a Assembleia possa funcionar. Cada um tem o seu tempo para usar da palavra de acordo com as normas regimentais. Neste momento, está no uso da palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente, por isso, se alguém entender que tem razões para responder, pedirá a palavra para usar dela em devido tempo.
Faça favor de continuar, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Srs. Deputados, estou a ver que continuamos na questão do estilo,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Se calhar, ainda arranja uma fundação!

O Orador: - … mas vamos passar à questão da substância, que penso ser mais importante.
Qual é o problema da proposta do Deputado Manuel Moreira?

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - É do PSD, não é do Deputado Manuel Moreira!

O Orador: - Peço-lhe desculpa, Sr. Deputado.
Digo: qual é problema da substância da proposta do PSD? É que essa proposta é apresentada como uma proposta para melhorar a situação de modo a que as empresas e os sistemas multimunicipais funcionem melhor,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O problema é não ser do PS!

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O Orador: - … para que o País seja melhor servido. Ora, é isso que falta aqui provar, e é isso que falta demonstrar. Porque os sistemas multimunicipais estão o terreno, têm provas dadas, têm os investimentos feitos e têm o trabalho feito.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - E as autarquias, não têm?

O Orador: - Ora, o que temos de ver é se há razões para mudar a situação.
Como os Srs. Deputados facilmente calculam, como a experiência demonstra e como a prática que está no terreno o prova, estes sistemas são o melhor que temos no caminho, porque não fogem à realidade!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, por favor, uma coisa são os apartes, outra coisa é impossibilitar que os trabalhos possam prosseguir.

O Orador: - A questão é esta: temos 300 milhões de contos investidos desde o tempo do PSD, isto é, desde 1993, e nenhum país da União Europeia conseguiu investir tanto dinheiro neste sector como Portugal, porque nenhum país da União Europeia montou tão cedo estes sistemas como Portugal. E o mérito é todo do PSD! Por que é que vamos mudar, se o PSD não demonstra porquê? É que vir aqui, simplesmente, acusar o PS de ser centralista, de ser contra os municípios, de ser contra as regiões, nada disto tem a ver com a substância, nada disto tem a ver com os sistemas que estão no terreno, nem com a percentagem de portugueses que estão servidos com o abastecimento de água, com o tratamento de resíduos - que em 1995 eram praticamente inexistentes - ou com o tratamento das águas residuais à sua porta. E isto é que é importante!
Nestes últimos sete anos, houve um desenvolvimento marcado no País. Os níveis de atendimento subiram em todos estes sectores. Porquê? Também por causa do sistema que está implantado e dos seus méritos. Isto é que é importante e não as questões de estilo!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, não resisto falar sobre as questões de forma, porque entendo que essas têm relevância política.
O insulto que foi feito ao Parlamento é um insulto à democracia e se o Governo entende escolher esta via para se desprestigiar, esse é seguramente um caminho que lhe cabe a si. Mas parece-me ser normal que a Câmara reaja.

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Em relação à questão substantiva que está em discussão, e sobre a qual o Governo pouco disse, gostaria de dizer, em primeiro lugar, que para Os Verdes a água é um bem patrimonial, é um recurso que pertence a todos, o que para nós significa que não pode entrar numa lógica linear de mercado. Ou seja, pelas implicações que tem do ponto de vista social, do ponto de vista ético, do ponto de vista ambiental, do ponto de vista da saúde pública, em nosso entender, é grave que se possa ficar refém de modelos de gestão ou de figurinos institucionais que possam permitir, ainda que a prazo - e a situação que hoje se coloca é uma situação de inquietação não no imediato mas a prazo -, um qualquer exclusivo, um qualquer monopólio. Isto porque esse monopólio significa que os cidadãos vão ficar reféns de opções que têm reflexos na qualidade da água que lhes é servida e no preço e, ainda, que os municípios vão ficar sem liberdade de opção de gestão de um bem que, naturalmente, tem um significado estruturante para o desenvolvimento do território pelo qual respondem politicamente perante os cidadãos em cada quatro anos.
É também por isso que para nós esta não é uma questão ideológica, é uma questão de princípio, ou seja, é a afirmação da autonomia do poder local, da sua liberdade não condicionada e da garantia do serviço público, porque é de serviço público que estamos a falar quando falamos de um bem que tem reflexos ambientais e na saúde pública. É perante isto que, do nosso ponto de vista, a questão em debate deve ser enquadrada.
Independentemente de o projecto de lei aqui trazido a debate reflectir e reproduzir uma iniciativa anterior do PSD - e essa história é bem conhecida, independentemente de todos sabermos que a filosofia que o PSD hoje critica foi uma filosofia da qual, no passado, foi o protagonista e o criador,…

O Sr. José Reis (PS): - Isso é verdade!

A Oradora: - … a verdade é que essa filosofia é errada, e o PSD hoje assume isso, e, por outro lado, é bom recordar que o Partido Socialista, no passado, foi um feroz opositor a um sistema em que não está em discussão saber se os municípios têm ou não iniciativa privada como parceira nos seus modelos de gestão de abastecimento, está, sim, em discussão saber se os municípios têm o poder de decidir sobre esse modelo de gestão. É exclusivamente por isso que a questão de conferir aos municípios a maioria de capital social tem extrema importância.
O Governo tem vindo a guiar-nos nesta discussão, fugindo à questão essencial, que é a de saber por que razão está a empurrar os municípios para uma solução única, por que é que está a chantagear os municípios, e são múltiplos os exemplos da chantagem que é feita,…

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem! É um escândalo!

A Oradora: - … porque há diferentes formas de pressão política exercidas sobre os municípios. E, sobre esta chantagem, é bom que nos interroguemos por que corre o Partido Socialista, por que é que o Partido Socialista está tão interessado em menorizar o poder local, por que é que está tão interessado em circunscrever a sua autonomia, por que é que a quer lhe quer retirar o

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poder de decidir sobre uma matéria que é fulcral para o desenvolvimento da região pela qual presta contas perante os cidadãos.
Julgo que seríamos todos excessivamente inocentes e correríamos o risco de ser pouco responsáveis se não percebêssemos que aquilo que, a prazo, vai acontecer, findo o financiamento e finda a instalação deste processo, e a partir do momento em que o monopólio esteja instalado, é, muito provavelmente, a privatização das águas de Portugal,…

Aplausos do PSD.

… do IPE e, portanto, a colocação dos municípios numa posição de subalternidade.
É perante essa posição de subalternidade quanto a um bem em relação ao qual não é possível fazer uma escolha, porque ninguém pode ter duas torneiras em casa, ninguém pode optar por dois sistemas, é perante este sistema que nós, Os Verdes, dizemos, uma vez mais, que apoiaremos este projecto de lei do PSD, porque ele vem eliminar uma filosofia pela qual o PSD foi responsável, mas contra a qual hoje, diferentemente, se posiciona.
Portanto, sem pejo e não porque sejamos estáticos e não pensemos diferente, julgo que, quando pensamos em nome do interesse público, do ambiente e da saúde, manter posições não é um problema é, seguramente uma virtude.

Vozes do PSD: - Muito bem!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, a Assembleia da República tem sido frequentemente criticada pela comunicação social por estarem pouco Deputados presentes no Plenário. Quero cumprimentar a Sr. Jornalista que se encontra na bancada da imprensa pela maneira conscienciosa como tem seguido os trabalhos parlamentares esta tarde.

Aplausos gerais.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Trata-se de uma intervenção muito breve para colocar duas questões de substância, que são aquelas que o Sr. Secretário de Estado do Ambiente gosta.
A primeira questão de substância tem a ver com o princípio da concorrência do poder legislativo entre a Assembleia da República e o Governo, pois o Governo subverteu esse princípio através de um truque inqualificável,…

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … arrogando-se o direito de transformar esse princípio de concorrência num princípio de supremacia do Governo sobre a Assembleia da República, que não existe.
A segunda questão de substância é a defesa da autonomia e dos direitos do poder local, que o Governo ignora, porque é centralista na sua forma de conceber e de actuar em relação a todo este processo.
Em relação a essa matéria, devo dizer ao Sr. Secretário de Estado que, se se espantou com os aplausos do PSD em relação à intervenção da bancada do PCP relativamente a esta matéria, não se esqueça que há aplausos iguais em relação a esta iniciativa da parte das câmaras do Partido Socialista, que talvez seja o partido de V. Ex.ª.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Qual é o saldo do debate que nos trouxe aqui esta tarde? Eu diria que o saldo, infelizmente, é magro.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Quando for administrador das empresas das águas, vai ser alto!

O Orador: - O PSD apresentou uma proposta que nada vem adiantar à resolução dos problemas do País, como eu aqui acabei de demonstrar esta tarde…

Protestos do PSD e do PCP.

Os Srs. Deputados teimam em não me deixar falar da substância, mas acho que já é altura de me poderem escutar durante um ou dois minutos sem esses comentários que apenas servem para distrair.
Diria que, sobre a substância, este diploma nada traz de novo, nada adianta para o desenvolvimento do País,…

Vozes do PSD: - Traz para os boys!

O Orador: - … antes, se fosse aprovado, iria causar confusão e perdas económicas para o País, para os municípios e para os munícipes.

Vozes do PSD: - Para os boys!

O Orador: - O sistema que está montado é um sistema - e tenho de o repetir, porque parece que alguns dos Srs. Deputados não querem ou não gostam de ouvir - eficaz, é um sistema capaz e que dá provas. Mais: é um sistema aberto e que permite várias soluções. E elas estão aí! Os Srs. Deputados podem questionar, mas há sistemas intermunicipais, há sistemas multimunicipais com maioria do capital da administração central e sistemas multimunicipais com maioria do capital de outros agentes, há sistemas unimunicipais. Temos como exemplo a Valorsul, Sr. Deputado, na qual, aliás, os municípios até vão aumentar a sua participação no capital social, como o Sr. Deputado deve saber. Isto é só um exemplo, mas há mais pelo País.
Portanto, as soluções existem, estão no terreno, há todo um quadro de soluções que podem ser escolhidas

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pelos municípios e pelos vários agentes. Por quê afunilar as soluções? Por quê pôr em causa um sistema que funciona? Só posso compreender isso por haver talvez da parte do PSD não uma vontade de construir mas uma vontade de pôr em causa o trabalho que tem estado a ser feito.
Srs. Deputados, o meu voto sincero é que esta iniciativa do PSD, mais uma vez, não mereça a aprovação desta Câmara…

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Mais uma vez, não! Ela foi aprovada anteriormente!

O Orador: - … e que o sistema que existe se possa desenvolver.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para defesa da sua honra pessoal, tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Marta Soares.

O Sr. Jaime Marta Soares (PSD): - Sr. Presidente, eu não fui apenas ofendido pelo Sr. Deputado Renato Sampaio mas também pelo Sr. Secretário de Estado do Ambiente e, por isso, aproveito para, ao mesmo tempo, defender a minha honra em relação aos dois.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Não, não, Sr. Deputado!

O Orador: - Não pode ser, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente (Manuel Alegre). - Não. Defende a sua honra pessoal. É conveniente ler o Regimento de vez em quando para facilitar a vida ao Presidente!

O Orador: - Ó Sr. Presidente, errare humanum est! Todos nós erramos! Quantas vezes o Sr. Presidente…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Tem a palavra para defender a sua honra pessoal.

O Orador: - Sr. Deputado Renato Sampaio, gostava de saber qual é a sociedade em que um qualquer município tenha a maioria do capital, porque o Sr. Deputado disse que eu menti, não foram exactamente estas as palavras, mas chamou-me mentiroso.
Gostaria de dizer-lhe que no governo do Professor Cavaco Silva, em relação ao qual V. Ex.ª disse que, durante dois anos, a Lei das Finanças Locais não foi cumprida, a fasquia era sempre colocada na altura certa para os municípios saberem aquilo com que contavam, mas o Primeiro-Ministro do seu partido, Sr. Eng.º António Guterres, disse aos municípios portugueses - todo o País ouviu -, e até o disse em congressos dos próprios municípios, que, em quatro anos, duplicava as suas verbas, no entanto, nesses quatro anos de mandato, em valores globais finais, não chegou a aumentar 20%. Portanto, Sr. Deputado, tire daí as devidas ilações e veja quem é que é mentiroso!
Em relação às grandes questões, o Sr. Secretário de Estado é ainda muito jovem e, porventura, não viveu a realidade e o espírito do 25 de Abril…

Risos do Deputado do CDS-PP Manuel Queiró.

… e das suas vitórias, ditas por todo o povo português. E as vitórias que, efectivamente, Portugal teve com o 25 de Abril foram a liberdade, a democracia e o poder local. Portanto, é preciso que tome isto em devida nota, porque é muito importante que o fique a saber de uma vez por todas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jaime Soares, eu jamais me atreveria, nesta Câmara, a chamar mentiroso seja a quem for, muito menos a V. Ex.ª. Portanto, como é óbvio, não lhe chamei mentiroso. Acho que o senhor sabe que nunca lhe chamaria isso, e há as gravações que o podem comprovar. O que lhe disse, e agora repito, embora por outras palavras, é que o que PSD expressa com este tipo de diplomas é um problema de má consciência, má consciência em relação ao poder local,…

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Não é verdade!

O Orador: - … má consciência em relação à regionalização, má consciência em relação ao não cumprimento da Lei das Finanças Locais. Há um problema que é a questão central é que os governos do PSD não cumpriram a Lei das Finanças Locais! Essa é que é a verdade!
Enquanto nós respeitamos claramente o poder local, cumprindo a Lei das Finanças Locais…

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Vê-se agora! Então votem o diploma! Onde é que está a descentralização?!

O Orador: - Ó Sr. Deputado Manuel Moreira, não me faça falar sobre o problema,…

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Fale, fale! Nós estamos aqui para o ouvir!

O Orador: - … porque há uma questão que é central: os municípios do PSD na Área Metropolitana do Porto estão eles próprios a concessionar, em baixa, todas as águas a empresas estrangeiras e a grupos económicos estrangeiros. É verdade! É em Paredes, é em Vila da Feira e Gaia prepara-se para fazer a mesma coisa!
Portanto, Sr. Deputado Manuel Moreira, sobre a matéria das concessões e sobre este problema o senhor tem má consciência.

Protestos do Deputado do PSD Manuel Moreira

Desculpe, Sr. Deputado Manuel Moreira, o senhor tem má consciência sobre esta matéria.
Sr. Deputado Jaime Soares - é a si que tenho de dar explicações - nunca me atreveria a chamar mentiroso a um Deputado e muito menos ao senhor, como é evidente. O que lhe disse, e digo, é que o PSD não cumpriu a Lei das

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Finanças Locais, e isso é uma constatação que toda a gente conhece.

Aplausos do PS.

O Sr. Jaime Marta Soares (PSD): - E o PS está a cumprir?!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Srs. Deputados, terminámos o debate do projecto de lei n.º 257/VIII.
Vamos passar à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 316/VIII - Confirma o passe social intermodal como título nos transportes colectivos de passageiros e actualiza o âmbito geográfico das respectivas coroas (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Um sistema tarifário é sempre uma parte integrante e indissociável de uma política de transportes públicos. Assim, o nosso projecto de lei, que confirma o passe social como título universal de transportes e alarga o âmbito das suas coroas a todo o território da Área Metropolitana de Lisboa, deve ser entendido como uma medida que visa, antes de mais, contribuir para uma política que promova a utilização destes transportes. Não é a única medida que pode e deve ser tomada com este objectivo, mas é seguramente uma medida decisiva e indispensável.
O passe social intermodal, com uma utilização de 4,1 milhões de unidades por ano, sem dúvida o título de transporte mais utilizado na região de Lisboa, criado em 1976, fruto de transformações sociais com origem no 25 de Abril de 1974, constituiu na altura um factor de inegável justiça social e, simultaneamente, de promoção dos transportes públicos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - As famílias, e em particular as de menores recursos, viram reduzidos e limitados os gastos fixos com os transportes do seu agregado. A mobilidade das populações aumentou o seu acesso à participação social e ao usufruto das actividades lúdicas e culturais sem custos adicionais, enquanto, por outro lado, as empresas de transporte público melhoraram a sua rentabilidade, obtendo mais passageiros transportados por captação de novos utentes, melhor taxa de ocupação da frota e maior velocidade comercial.
Entretanto, a privatização de empresas públicas de transportes ou o seu desmantelamento, com vista à criação de sectores rentáveis para os entregar posteriormente à exploração privada, proporcionaram chorudos negócios e nem sequer foi garantida a obrigatoriedade para estas empresas de prestação de serviços públicos mínimos, nem a aceitação do passe social. Orientadas exclusivamente pelo lucro, as empresas de transporte público acabaram, pura e simplesmente, com todas as carreiras que, na sua óptica, não davam a rentabilidade pretendida, proibiram o uso dos passes, deixando isolados totalmente ou em grande parte do dia importantes aglomerados populacionais que só passaram a poder recorrer ao transporte individual.
Novas e importantes infra-estruturas colocadas à disposição desses novos operadores, como a travessia ferroviária do Tejo, não estão a ser exploradas como parte integrante da malha metropolitana de transportes com o objectivo de melhorar qualitativamente o conjunto e captar passageiros para o transporte público, seguindo antes uma orientação de linha individual alternativa às carreiras rodoviárias que foram suprimidas e às travessias fluviais cujos acessos foram prejudicados.
Mais de uma centena de passes diferentes foram criados na Área Metropolitana de Lisboa. Válidos só na cidade de Lisboa, por combinação de vários operadores, existem 58 passes diferentes, o que diz bem das restrições impostas à mobilidade das populações e da falta de complementaridade entre os diferentes modos de transporte.
O custo do passe social aumentou em comparação com o salário mínimo nacional. O passe L123 representa actualmente 11,3% do valor do salário mínimo quando, em 1980, representava 8,67%, isto é, mais 30,3%. O passe não acompanhou o movimento centrípeto das populações habitando cada vez mais na periferia. Enquanto o passe L, válido só na cidade de Lisboa, reduziu a mais de metade o seu peso específico, o passe L123, para as zonas mais afastadas, quase duplicou. Globalmente, no entanto, perdeu 1 400 000 utentes.
Segundo o inquérito à mobilidade na Área Metropolitana de Lisboa, geram-se diariamente cerca de 3,6 milhões de viagens motorizadas por dia, sendo 2,25 milhões efectuadas em transporte individual e apenas 38% efectuadas por transporte público - isto numa área metropolitana onde 35,5% das famílias não têm automóvel.
Os espaços urbanos foram invadidos por automóveis, degradando até aos limites do insuportável a qualidade de vida das populações. A produção de gases que contribuem para o efeito de estufa não pára de aumentar e o peso das emissões produzidas pelos escapes dos automóveis continua a crescer, rondando já os 80%, no sentido contrário aos compromissos internacionais assumidos pelo Estado português nesta matéria, designadamente na assinatura do Protocolo de Quioto.
No entanto, a melhoria dos transportes públicos, que é urgente e indispensável, depende essencialmente da vontade política. Sem minimizar a importância de infra-estruturas fundamentais cuja realização está ainda em curso ou simplesmente planeada, como a expansão do Metro, uma nova travessia do Tejo com componente ferroviária, o Metro Sul Tejo ou a conclusão da CRIL e da CRIPS, já hoje é possível, com um maior aproveitamento das infra-estruturas existentes, melhorar substancialmente os transportes públicos na Área Metropolitana de Lisboa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passados 24 anos após a sua criação, o passe social intermodal necessita de uma remodelação para continuar a cumprir os objectivos iniciais, ainda válidos na diferente situação actual. A promoção e o desenvolvimento do passe social são indissociáveis da promoção e desenvolvimento do próprio serviço público de transportes colectivos.
O presente projecto de lei trará benefícios directos para as populações da Área Metropolitana de Lisboa e contribuirá decisivamente para uma correcta política de transportes. Reforça o âmbito do passe social, tornando o seu uso

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universal, isto é, válido em todos os percursos efectuados por empresas públicas ou privadas, escolhendo os utentes livremente o modo de transporte e o percurso que mais lhes convém, sem custos adicionais. Alarga a área do passe social às populações que usam diariamente os transportes da região de Lisboa e que, actualmente, têm que fazer parte do percurso com outro título, com aumento dos custos de transporte, como é o caso das populações de Cascais, Sintra, Loures, Vila Franca de Xira, Alenquer, Azambuja, Samora Correia, Moita, Montijo, Alcochete, Palmela, Setúbal e Sesimbra.
O passe social passará a servir uma população de aproximadamente 2,3 milhões de habitantes, ou seja, mais 700 000 (44%) do que actualmente. Reduz os gastos das famílias com transportes, contrariando os aumentos brutais dos custos do passe que, ao longo dos últimos anos, se têm verificado. Da população servida com o passe actual, 62,5% beneficiará directamente de redução de custos por alargamento das coroas actuais, valor que será largamente compensado com o aumento previsível de passageiros para o sistema.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Responsabiliza o Governo pela distribuição de receitas e impõe um critério claro desta distribuição, acabando com a situação actual que vem constituindo um escandaloso financiamento de alguns operadores privados através do passe social, que serve para tudo! Somam umas largas centenas de milhares de contos por ano as verbas do passe que, pertencendo a empresas públicas como o Metro, a Carris, a Transtejo, etc., são indevidamente dadas aos operadores privados, como a Rodoviária de Lisboa e os Transportes Sul do Tejo.
Melhora a qualidade do transporte, pois, sendo a distribuição de receitas proporcional aos passageiros, todas as empresas públicas ou privadas terão de melhorar a qualidade de oferta como forma de atrair mais passageiros.
Compensa as empresas dos serviços sociais que prestam através da introdução da indemnização compensatória objectiva, numa lógica de rede, que terá necessariamente em conta os ganhos globais do sistema e contribui para a aplicação de uma política correcta de transportes públicos, a qual nunca poderá existir sem um correspondente sistema tarifário adequado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Recentemente, discutimos nesta Assembleia a promoção da utilização do transporte público na sequência do Dia sem Carros, em 22 de Setembro. Todos os Deputados concordaram com a necessidade de nos empenharmos nesta tarefa prioritária de melhorar os transportes públicos. Por iniciativa dos Deputados do Partido Socialista, foi aprovado um projecto de resolução que recomendava ao Governo o reforço de medidas de promoção dos transportes colectivos, especificando inclusivamente a criação de títulos de transporte multimodais. Também o Sr. Ministro anunciou a criação de um bilhete intermodal, como o experimentado no Dia sem Carros.
Eis aqui, pois, um projecto de lei que é indiscutivelmente uma contribuição para a promoção e incentivo da utilização do transporte público, que esperamos ver apoiado pelos outros partidos no sentido de instituirmos não o Dia sem Carros mas todos os dias com menos carros e mais e melhores transportes públicos.

Aplausos do PCP.

Entretanto, assumiu a Presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Gonçalves.

O Sr. Herculano Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Um grupo de Deputados do PCP apresentou um projecto de lei no sentido de, fundamentalmente, confirmar o passe social intermodal como título nos transportes colectivos de passageiros e actualizar o âmbito geográfico das respectivas coroas.
O princípio subjacente a este projecto visa corrigir os desajustamentos, em função das reais necessidades de deslocação da população, das zonas abrangidas pelos actuais passes, potenciados pela crescente expansão da área urbana, que se caracteriza por um cada vez maior distanciamento entre a habitação e o local de emprego. O CDS-PP concorda com as razões de ordem social subjacentes ao princípio social desta iniciativa legislativa, que, a concretizar-se, conduzirá não só a um aumento dos utentes com acesso ao passe intermodal, como contribuirá para incentivar a utilização do transporte colectivo em detrimento do transporte individual.
Mas se o CDS-PP concorda com as razões de ordem social, já coloca sérias reservas ao modo como os proponentes da iniciativa legislativa agora em discussão pretendem dar-lhe concretização.
Com efeito, o alargamento das áreas geográficas abrangidas pelo passe intermodal pressupõe que as empresas do sector que actuam nas respectivas áreas estejam dispostas a oferecer e - ponto relevante que o mero voluntarismo político não afasta - tenham capacidade e disponibilidade financeira para suportar os novos encargos. Aqui, o que está em causa é que, actualmente, a grande maioria das empresas que operam no sector estão profundamente descapitalizadas, situação esta que se traduz no envelhecimento precoce e já crónico das suas frotas,...

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - ... com os consequentes riscos que isso representa para a segurança dos seus utentes e a progressiva degradação da qualidade do serviço público prestado pelas mesmas.
Para a concretização desta iniciativa legislativa é preciso, previamente, determinar que níveis de procura - ao nível dos utentes - é que estão em causa, para que se possa dimensionar o nível de oferta do respectivo serviço público. Isto é, as empresas do sector precisam de ter uma ideia aproximada do nível de receitas em causa para que possam determinar se dispõem, ou não, de capacidade e disponibilidade financeira para suportar o alargamento do seu raio de acção, assegurando a segurança e qualidade do serviço público que prestam.

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A não ser assim, a ser imposto unilateralmente o alargamento das áreas geográficas, como se prevê na parte final do artigo 3.º da presente iniciativa legislativa, corre-se o risco de uma boa ideia ser inviabilizada à partida: é que as empresas que poderiam assegurar a prestação do serviço público, atenta a sua actual situação financeira (descapitalizadas), poderão passar sérias dificuldades financeiras com as consequência que, do ponto de vista social, isso acarreta.
Acresce que a realização do enquadramento financeiro e económico tem ainda uma virtualidade não despicienda: é que se as empresas do sector souberem, ainda que aproximadamente, qual a percentagem de utentes abrangida pelo alargamento do seu raio de acção, com maior facilidade poderão determinar o esforço a ser feito.
A questão do enquadramento financeiro e económico é vital para o «sucesso» desta oportuna iniciativa legislativa, sendo certo que a atribuição da indemnização compensatória não resolve nem sequer atenua o problema da descapitalização.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Mais: a questão da atribuição da indemnização compensatória coloca ainda duas questões não menos relevantes. A primeira consiste em saber até onde é que o Estado está disposto a ir, qual o nível de prejuízos que o Estado pretende suportar, e a segunda é saber se os proponentes da presente iniciativa legislativa fizeram um estudo do impacto financeiro para os cofres do Estado que um compromisso desta iniciativa representa, sendo certo que exemplos como o da RTP e da TAP, ao nível dos prejuízos e do endividamento, não se devem propagar.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Neste contexto, a presente iniciativa legislativa merece o voto favorável na generalidade do CDS-PP, sem prejuízo das reservas supra expostas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Lucília Ferra.

A Sr.ª Lucília Ferra (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com o projecto lei em análise pretende o Partido Comunista Português conseguir uma maior afirmação e utilização do passe social intermodal nos transportes colectivos de passageiros, bem como uma actualização do âmbito geográfico das coroas respectivas. Consideram os signatários do projecto que o passe social, introduzido após o 25 de Abril de 1974, aumentou a mobilidade da população e constituiu um factor fundamental na promoção de uma maior justiça social.
Constituindo um dos pilares do serviço público de transportes, entendem os seus subscritores que a utilização deste título deve ser incentivada e promovida.
Porém, alegam que a exploração por entidades privadas de alguns segmentos de transportes colectivos de passageiros e o crescimento e expansão da malha urbana conduziram a desajustamentos entre os passes sociais existentes e as reais necessidades das populações que utilizam os transportes colectivos, situação que urge ultrapassar.
De realçar que os instrumentos legais que disciplinam a matéria em apreço remontam a 1976/1977, sendo inquestionável a necessidade de se proceder a actualizações que tenham em conta a dinâmica dos últimos 20 anos. Assim sendo, o alargamento da linha das coroas a novos núcleos residenciais visa não apenas ampliar o universo dos utentes com acesso a passe mas também melhor servir as populações utilizadoras, nomeadamente através da redução dos encargos a suportar pelas famílias. Deste modo, contribuir-se-á para a promoção do uso do transporte colectivo em detrimento da utilização do transporte individual, cujos inconvenientes são por todos nós conhecidos.
Reconhecendo a importância e bondade da medida legislativa em discussão, bem como a necessidade iminente de se proceder a ajustamentos no sistema em vigor, suscitam-se-nos, porém, algumas questões relevantes que importa considerar. Desde logo, a questão da vocação dos órgãos de soberania e da racionalidade na utilização dos meios existentes.
Em nosso entender, a definição de uma política de transportes colectivos parece tratar-se de matéria para a qual o Governo se encontra especialmente vocacionado, caindo no âmbito da sua esfera de actuação política e administrativa.
Na verdade, o Governo dispõe de instrumentos e mecanismos que melhor possibilitam ajustar as normas vigentes às novas realidades existentes, instrumentos e mecanismos esses que não estão directamente ao alcance da Assembleia da República. Existem direcções-gerais, na dependência do Governo, capazes de desenvolver estudos e pareceres, de aferir necessidades e de estimar custos, habilitando o Governo a proceder aos ajustamentos mais consentâneos com as necessidades das populações e com a realidade do País.
Deve o Governo definir com clareza que modelo preconiza, depois de analisar esses estudos, de ouvir as autarquias locais e de auscultar as necessidades das populações, e clarificar uma política para o sector dos transportes.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - É fundamental promover, sem delongas, verdadeiras alternativas ao transporte individual, incentivando a utilização dos transportes colectivos, protegendo o ambiente e melhorando a qualidade de vida de todos os portugueses que trabalham longe da sua área de residência.
Outra questão relevante que importa considerar prende-se com o alcance geográfico da medida legislativa ora proposta. Entende o PSD que, sendo a grande Área Metropolitana de Lisboa aquela que mais reclama uma intervenção urgente, dado o seu crescimento exponencial nas últimas décadas, não pode esta mesma Assembleia da República esquecer a Área Metropolitana do Porto, nem tão-pouco a realidade decorrente do todo nacional.
Assim, reconhecendo a importância e a actualidade do projecto oriundo do PCP, evidenciamos aqui a necessi

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dade da definição de uma política nacional de transportes colectivos, lançando ao Governo o desafio de a promover e convidando-o a assumir cabalmente as suas funções na condução da política geral do País. Nestes termos, e seguindo esta linha de orientação, o PSD apresentará um projecto de resolução a instar o Governo a reestruturar urgentemente o sistema actualmente em vigor.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Porém, reconhecemos que a força anímica de um Governo cujo Primeiro-Ministro nem os seus próprios Ministros consegue controlar leva-nos a crer, cada vez mais, que a política nacional de transportes será mais uma das tarefas a desenvolver por um Governo que não este. Hoje, é cada vez mais notório perante Portugal e perante os portugueses que o Governo do Eng.º António Guterres chegou ao final da «linha».

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Epifânio.

O Sr. José Manuel Epifânio (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando falamos em transportes públicos, principalmente nas grandes áreas metropolitanas, falamos de um problema actual que exige de nós todos um grande esforço no sentido da sua melhoria, quer qualitativa, quer de eficácia, quer ainda e principalmente na sua vertente de plena satisfação das necessidades e interesses de todos aqueles que diariamente os usam para poderem exercer o seu direito ao trabalho.
Quando falamos de transportes públicos e do sistema a eles associado, sentimos todos a necessidade de propor ideias novas, soluções novas, enfim, de pôr em prática uma reforma urgente do actual estado em que se encontram os principais vectores inerentes à mobilidade dos cidadãos.
É, portanto, salutar que esta Assembleia procure analisar e discutir um problema que a todos afecta. Será certamente desse conjunto de discussões sobre sistemas e políticas associadas que, num futuro próximo, será possível ver implementadas na prática as soluções que farão inverter o actual estado das coisas.
O projecto de lei n.º 316/VIII, apresentado pelo Grupo Parlamentar do PCP, que hoje estamos aqui a discutir, tem o mérito de, pelo menos, trazer de novo a este Plenário a possibilidade de voltarmos a discutir em conjunto este importante problema.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como todos sabemos, a criação do passe social intermodal teve a paternidade de um Governo do Partido Socialista, o que, como devem calcular, muito nos honra. A forma de organização inicial desse passe social baseou-se na criação de um conjunto de coroas circulares irradiando de um centro, no caso vertente, a Baixa Pombalina. A situação que se vivia na década de 70, quer no que respeita a mobilidade dos cidadãos, quer ainda na organização do sistema de transportes, permitiu, com grande sucesso, esse passo fundamental que foi o da criação do passe social intermodal.
Mas, como tudo na vida, as condições que levaram a pensar o sistema da forma como foi idealizado também mudaram. Hoje, pouco ou nada é igual àquilo que se vivia na década de 70. Hoje, existem eixos estruturantes na mobilidade dos cidadãos na Área Metropolitana de Lisboa, normalmente associados à linha férrea,…

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Isso é que é um erro!

O Orador: - … que começam a ganhar importância crescente na estruturação do sistema em complemento às iniciais coroas concêntricas, fazendo surgir um conceito novo na reorganização desse sistema, acrescentando-lhe faixas paralelas a esses eixos.
O mercado, como é natural, soube adaptar-se a essa nova realidade, através da criação dos chamados passes combinados (combinados entre duas ou três empresas), poupando nos «desperdícios» - o sistema de coroas obriga a envolver todo o conjunto de empresas que opera nos corredores que trespassam as coroas - e, dessa forma, onerando menos o cidadão que, perdendo na quantidade, ganha na eficácia e nos custos.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Isso não é verdade!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O actual sistema de passes sociais tem de ser alterado. Mas isso obriga-nos a procurar suportar as nossas opções políticas em estudos técnicos profundos, por forma a resolver efectivamente o problema e não enveredarmos por uma posição inconsistente, incoerente e demagógica, como aquela que hoje aqui nos é apresentada pelo PCP.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Está a ver, Sr. Deputado Joaquim Matias? Escusava de ouvir isto!

O Orador: - Inconsistente, desde logo porque se baseia em legislação revogada. A legislação citada no artigo 1.º do projecto de lei, as Portarias n.os 779/76, 229-A/77 e 736/77, foram revogadas pela Portaria n.º 50/94, a qual, por sua vez, foi revogada pela Portaria n.º 951/99, de 2 de Outubro. Ou seja, a legislação citada relativa à criação, em Lisboa, da prática de passes sociais, em que foram definidos quais os operadores, os títulos e as áreas de validade dos passes intermodais (vulgarmente designadas por coroas) foi alterada. Houve, portanto, uma evolução do sistema tarifário para uma nova tipologia de passes combinados entre as empresas, de acordo com as necessidades dos percursos efectuados. A celebração deste tipo de protocolos está em vigor desde a publicação de Decreto-Lei n.º 8/93, de 11 de Janeiro, cuja portaria regulamentadora revogou a legislação citada no n.º 1 da proposta de lei do PCP.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas este projecto de lei também é incoerente porque as áreas geográficas definidas pelas quatro coroas, propostas no artigo 2.º do projecto de lei, se regem pela mera divisão administrativa do território ao nível da freguesia, não tendo em conta a lógica que preside ao funcionamento do sistema de transportes. Esta situação origina a exclusão de núcleos popu

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lacionais que, face à rede de transportes, deveriam estar incluídos e, por outro lado, a inclusão de outros núcleos que aparecem claramente desfasados da lógica de um sistema integrado de transportes que está subjacente ao passe intermodal.
De facto, sem se entender qual foi o critério que não o administrativo, a delimitação proposta origina descontinuidades geográficas dentro da mesma coroa: na margem norte, não existe continuidade geográfica nem na coroa 2 nem na coroa 3, isto é, existem zonas contíguas que não são abrangidos pelo sistema de coroas. Por exemplo, Almargem do Bispo, Pêro Pinheiro e Mem Martins ficam fora do limite abrangido; no corredor de Loures, passa-se directamente da coroa 1 para a coroa 3 - por exemplo, Loures/Santo Antão do Tojal/S. Julião do Tojal, integradas na coroa 1, e Lousa/Fanhões/Bucelas, integradas na coroa 3. A noroeste, a coroa 1 é o limite da área abrangida pelos passes e algumas localidades da freguesia de Almargem do Bispo, actualmente incluídas na coroa 3, não estão contempladas no projecto de lei do PCP.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Deputado, o senhor não sabe geografia! Veja este mapa! Onde é que está a descontinuidade?!

O Orador: - Estas situações, se não forem devidamente acauteladas, podem levar a que o utente, cuja viagem tem origem e destino na mesma coroa, tenha de atravessar outra coroa, o que obrigará a adquirir um passe mais caro sem que a distância percorrida o justifique.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Arranjem outros pretextos para rejeitar o projecto! Esses não servem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não é possível pensar, hoje em dia, que a revisão do sistema tarifário possa passar por uma simples ampliação das coroas sem que sejam definidos objectivos de racionalização e eficiência do sistema, acompanhados de uma repartição equilibrada dos custos. Há necessidade de suportar decisões desta natureza em estudos efectuados com este objectivo.
O Estudo sobre a Reestruturação do Sistema Tarifário da Área Metropolitana de Lisboa, que, com a participação de todos os operadores intervenientes no sistema de passes da AML e sob a coordenação da Direcção-Geral de Transportes Terrestres, está a ser realizado e que aponta objectivos específicos com calendarização definida,…

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Tenha vergonha! Nem devia falar nisso!

O Orador: - … permitir-nos-á, em conjunto com outros, o acesso à informação técnica essencial à formatação das decisões políticas específicas que ajudem a um aumento da procura do uso do transporte público.
Este projecto de lei, apresentado pelo PCP, pelo contrário, não procura resolver ou sequer colaborar na resolução do problema do uso do transporte público na Área Metropolitana de Lisboa. Este projecto de lei do PCP limita-se a cumprir a sua função de panfleto demagógico!

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Escusavam de ouvir esta!

Aplausos do PS.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Nem faço perguntas, porque o senhor não percebe nada disto!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É uma vergonha!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de dizer que Os Verdes, para os quais o Dia sem Carro não foi uma acção propagandística, entendem que tem extrema importância discutir a questão do transporte público e da sua promoção. Parece-me, por isso, que a postura que o Grupo Parlamentar do PS adopta neste debate é, claramente, a atitude de um partido para o qual esse dia teve tão-só um significado panfletário, de propaganda do Governo, não correspondendo - aliás, como já se desenhava em discussões anteriores sobre esta matéria - a uma real vontade de promover o transporte público.
Ora, parece-nos que esta questão da promoção do transporte público - que, do nosso ponto de vista, é um direito - cumpre uma função social, como, aliás, o Grupo Parlamentar do PCP sublinha na exposição de motivos do seu projecto. Mas, do ponto de vista de Os Verdes, cumpre ainda uma outra função que não é suficientemente enfatizada e cuja quantificação importaria começar a fazer, e que é uma função ambiental. Parece-nos que essa função ambiental, essa função de ter em conta que a política de transportes deve considerar as questões de ambiente, porque estas são questões que têm a ver com o pagamento da factura energética e têm a ver também com a saúde pública, essa é, lamentavelmente, e continua a ser - depois da vergonha que foi a posição de Portugal em relação a Quioto e à ausência de um capítulo específico em relação aos transportes -, a enorme lacuna do Governo.
Para nós, a questão da mobilidade - mobilidade entendida como um direito dos cidadãos, que não apenas um direito de as pessoas serem diariamente transportadas (ou, dito diferentemente, despejadas) para irem trabalhar mas também, nos fins-de-semana, para o seu lazer - é uma questão fundamental. E, desse ponto de vista, rever a questão dos passes sociais, considerando uma outra «arrumação» do espaço e tendo em conta aquilo que é a explosão demográfica, o alastramento da malha urbana e a realidade do desordenamento do território, ou seja, a enorme necessidade que as pessoas têm quotidianamente de se deslocar, para ir trabalhar, estudar ou, pura e simplesmente, procurar usufruir do lazer, e em distâncias consideráveis, parece-nos que é razão suficiente para este projecto de lei ser aprovado.
Quero, pois, dizer que, independentemente de este projecto de lei ter de ser ponderado com outras questões que foram colocadas e que passam pelo envolvimento e pela audição dos órgãos da Junta Metropolitana sobre esta questão e independentemente de não repudiarmos a opinião de que os diferentes operadores

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que estão nesta zona devem ser ouvidos - e gostaria de pegar numa questão referida pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves, do CDS-PP, que falou da descapitalização das empresas e, por isso, do carácter obsoleto (e obsoleto tanto do ponto de vista ambiental como de segurança), em muitos dos casos, da frota circulante -, talvez também fosse tempo de, finalmente, o Governo, quando autoriza a concessão destes operadores, introduzir cláusulas que obrigassem a que uma parte da frota fosse composta por veículos ambientalmente menos agressivos. É, pois, tempo de se parar com propaganda e com palavras.
Parece-nos que este projecto de lei, independentemente de melhorias em sede de especialidade, é um contributo, entre outros, é um ponto de partida. Do que se viu da posição do Partido Socialista, para nós, o Partido Socialista chegou onde chegou, ou seja, fez folclore num dia e esgotou, assim, a sua intervenção e a sua consideração de que a mobilidade é um direito e a mobilidade sustentável é, mais do que um direito, uma necessidade inadiável.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais pedidos de palavra, dou por encerrado o debate…

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Então, o Governo não fala?

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes (Guilhermino Rodrigues): - Sr. Presidente, pedi a palavra para intervir.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado, peço desculpa, mas pretende usar da palavra neste debate ou relativamente à iniciativa seguinte?

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: - Neste debate, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Peço desculpa, mas daqui não consigo ver a bancada do Governo.
Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente a este projecto de lei, que actualiza o âmbito geográfico das coroas do passe intermodal, gostaria também de recordar que o passe intermodal, como se sabe, foi uma iniciativa de um governo do Partido Socialista, que, julgo, há 25 anos, quando foi introduzido, correspondia exactamente a uma necessidade de relançamento dos transportes públicos e, naquelas situações concretas e nessa altura, teve efectivamente um importante papel no relançamento dos transportes públicos. Portanto, reconheço a sua importância e louvo o Ministro de então, Rui Vilar, por ter tido a ousadia de avançar com este projecto.
No entanto, a exposição de motivos desta iniciativa apresentada pelo Partido Comunista Português tem várias incorrecções, que demonstrarei, e é, em minha opinião, perfeitamente desajustada.
Primeiro, começa por referir-se que, em muitos países comunitários, uma parte dos títulos de transporte é suportada pelas entidades empregadoras. Ou seja, o Partido Comunista, aqui, faz a regra da excepção, porque, que eu tenha conhecimento, há um único país, a França, que, em Paris, utiliza este mecanismo, com a RATP. E, de facto, há 30 anos, quando vivíamos em pleno emprego, ele tinha razão de existir, porque, nessa altura, eram os empregadores que financiavam o sistema de transportes. Hoje, pelo contrário, toda a política vai no sentido de incentivar os empregadores a fixarem-se numa determinada região. Portanto, esse é um desajuste, que, julgo, na altura em que foi lançado tinha a sua razão de ser mas, hoje, não se justifica; antes pelo contrário, hoje, todas as autarquias têm a possibilidade de criar a taxa municipal de transportes e nenhuma a utilizou, na medida em que sabe que o que lhe interessa é chamar emprego e isto seria penalizador nessa matéria.
Depois, diz-se que a política dos últimos anos conduziu a um agravamento do preço dos passes. Sr. Deputado, posso dizer-lhe que, em 1990, o passe L custava 2400$ e, em 2000, custa 3920$; se tivesse seguido a taxa de inflação, custaria 4005$. Ora, se fizer este exercício relativamente aos diferentes passes… Mas, se quiser, eu digo-lhe os preços: o L1, que custava 3175$, custa, agora, 5275$, e, se tivesse seguido a taxa de inflação, custaria 5385$. Ou seja, quando o senhor fala do aumento brutal verificado nos últimos anos, isso, de facto, não tem qualquer razão de ser.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Relativamente ao salário mínimo!

O Orador: - Mas o senhor fala do aumento brutal dos passes, quando, de facto, esse aumento não seguiu a taxa de inflação.
Um outro argumento referido é o de que Portugal apresenta uma das mais elevadas taxas de cobertura dos custos de exploração pelas receitas. Se quiser, Sr. Deputado, posso dar-lhe os dados: a Carris e o Metropolitano têm, no seu conjunto, 38% de taxa de cobertura, mas, se for a Madrid, esses transportes têm 70,2%; se for a Barcelona, têm 55,6%, e a RATP tem 42,5%, sendo objectivo, em França, que a taxa de cobertura abranja os 50%. Portanto, também aí, o projecto de lei, na sua fundamentação, é perfeitamente desajustado.
Gostaria ainda de lhe dizer que, em 1975/77, quando o passe intermodal foi criado, as portarias que o instituem referem que, só depois de desenvolvidos acordos entre os operadores, será possível concretizar o sistema de passes intermodais. Ou seja e como, aliás, o Sr. Deputado Herculano Gonçalves disse, nessa altura, foi preciso reunir e acordar com os operadores e só depois de ter o acordo dos operadores é que o governo legislou nessa matéria.
O que o senhor quer agora é, unilateralmente, impor um sistema, sem dizer nada às empresas, sem negociar com quem quer que seja. E, se reparar, houve uma integração progressiva: primeiro, criou-se o passe Carris; a seguir, foi o Metro que aderiu e criou-se o passe Carris/Metro, que é o passe L; depois, juntou-se a Transtejo, a RN e a CP e foi assim que se foi formando… Ou seja, foi de uma forma progressiva, primeiro, quanto ao âmbito de

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validade e, segundo, quanto ao âmbito de repartição de receitas.
Isto é, em 1975, apesar de grande parte dos operadores serem públicos - pelo menos, no que diz respeito à quota de mercado -, tudo isto foi negociado. Agora, os senhores pretendem fazer isto de uma forma unilateral.
Por outro lado, é evidente que o quadro de funcionamento de 1975 é perfeitamente diferenciado do actual. Quer dizer, foram tomadas opções de política que, agora, não são reversíveis, foram dadas garantias a operadores privados, alterou-se, como também já foi referido, toda a legislação tarifária, pelo que, hoje, o sistema não é o mesmo. Hoje, temos um conjunto de operadores privados, que nasceram da privatização da RN e a quem foram dadas algumas garantias, devido aos riscos que eles poderiam correr se não houvesse uma definição clara das regras. E, hoje, tudo isto é acordado com os operadores. Ou seja, qualquer alteração, e mesmo em relação aos passes intermodais, na repartição de quotas é feita através de acordos entre operadores.
Portanto, Sr. Deputado, também aí não se pode agir de uma forma unilateral. E se há algum desajustamento na repartição de quotas, isso deve-se ao facto de que ela era feita com base em inquéritos à mobilidade, o último dos quais tinha sido realizado em 1987, e, a partir daí, durante 10 anos, não se realizou qualquer outro, tendo sido este Governo que lançou um inquérito ao passe intermodal para saber qual era a quota de utilização em cada operador e para que, assim, os operadores tivessem uma base de negociação nos acordos que fazem entre si. Mas tudo isso, a ser alterado, é através de acordos entre as empresas.
Outra coisa que gostaria de dizer é que, hoje, o enquadramento em que vivemos é perfeitamente desajustado daquilo que era em 1975. Em 1975, quando isto foi feito, a taxa de motorização era de 100 carros/1000 habitantes. Hoje, em Lisboa, o número de carros por 1000 habitantes é de 350, ou seja, em média, há um carro por agregado familiar. Portanto, isto é diferente. É evidente que existem tranches da população que não têm carro, mas para esses julgo que o sistema, mesmo assim, tem respostas ao nível de tarifário.
Um outro aspecto que gostaria de focar é este: na altura, 90% das viagens que se realizavam na região de Lisboa eram viagens obrigatórias. Hoje, esse peso está muito equilibrado entre viagens obrigatórias e não obrigatórias. Evidentemente, temos um problema, que é o de, face ao aumento da taxa de motorização, ter havido uma repartição modal muito mais favorável à utilização do transporte individual, aspecto este que, julgo, devemos ter na devida conta. Mas, para isso, todos os estudos de mercado nos dizem que o factor de opção e de alteração da repartição modal não passa pelo preço; todos os estudos que temos nos dizem que os factores determinantes nas opções modais são, efectivamente, a qualidade dos transportes, em termos de conforto, regularidade e velocidade, e esta tem sido a aposta do Governo.
No fundo, o Governo tem feito apostas concretas nos transportes de qualidade e com conforto, nomeadamente no caminho de ferro e nos sistemas sobre carris. Portanto, esta tem sido, e continuará a ser, a nossa aposta.
Por outro lado, ao nível do sistema tarifário, todos nós temos a percepção de que hoje importa muito mais oferecer aos passageiros do transporte individual uma opção TI/TP, de utilização conjugada, e isso tem sido feito através da criação de interfaces. Se quiser, posso dar-lhe os investimentos feitos, mas posso dizer-lhe também que, numa legislatura, duplicámos o número de interfaces e os lugares de estacionamento junto aos interfaces quadriplicou. Ou seja, há aqui uma política que visa exactamente alterar, e, se quiser, posso provar-lhe que isto tem dado os seus resultados e dizer-lhe quantificadamente quais são os resultados desta política.
Por isso, a meu ver, a vossa proposta é perfeitamente desajustada no tempo e não vem resolver qualquer problema. Digo-lhe mais: estimamos que os encargos desta proposta para o Orçamento do Estado variam entre 15 a 20 milhões de contos/ano.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado, inscreveram-se dois Srs. Deputados, um do PCP e outro do CDS-PP, para pedir esclarecimentos e o Sr. Secretário de Estado não tem tempo para responder. Se houver acordo, o Partido Socialista cede o seu tempo, que é de 1 minuto e 15 segundos, e, depois, tentaremos ajeitar as coisas, por forma a dar tempo ao Sr. Secretário de Estado para responder.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, em primeiro lugar, o Governo e o Partido Socialista podem não querer aceitar uma proposta construtiva da oposição - não é a primeira vez que o fazem -, podem também não querer, por cobardia, enfrentar alguns dos interesses instalados na comunidade de transportes - também estão no seu direito. Mas, então, assumam-no e não dêem argumentos que não são válidos.
Então, o Sr. Secretário de Estado fala-me de 15 a 20 milhões de contos? Mas esse é o valor anual de todos os passes sociais! Isso era se se desse o passe social «de borla» a cada um dos utentes!
Como o Sr. Secretário de Estado sabe, isto introduziria, se fosse aplicado, no ano passado, cerca de 10% deste valor, mas, também como sabe pela experiência do passe social intermodal, a captação de passageiros para o sistema seria muito superior.
Quanto aos acordos com os operadores, o Sr. Secretário de Estado diz que o Governo tem feito, procurado e resolvido… Mas o que o Governo tem feito, procurado e executado conduziu-nos à situação que vivemos actualmente, em que apenas 38% das viagens motorizadas são feitas por transporte público. Estão sistematicamente a ser reduzidas, vivemos num inferno e ultrapassamos até os índices que assumimos em compromissos internacionais!
Mas já agora, relativamente ao acordo dos operados, devo dizer que hoje há passes de linha, o que não havia em 75, e o Sr. Secretário de Estado sabe tão bem como eu que a mobilidade proporcionada por um passe multimodal é extremamente diferente da que é proporcionada por um passe em linha, ou por um passe combinado! Isso é extremamente diferente!

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Mais: em todos os percursos determinados, há, por passageiro, o valor correspondente do passe em linha.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, tem de concluir. Já gastou os 59 segundos que Os Verdes lhe deram.

O Orador: - Vou mesmo concluir, Sr. Presidente.
Só quero dizer que se os operadores tiverem uma indemnização compensatória relativamente ao custo dos transportes não têm qualquer acto de reclamação, porque são pagos pelo devido valor que eles estipulam.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - O tempo que o Sr. Deputado teve a mais foi-lhe concedido por Os Verdes.
Sr. Secretário de Estado, pretende responder aos pedidos de esclarecimento em conjunto?

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: - Sim, Sr. Presidente.

O Orador: - Então, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Transportes, ao ouvi-lo falar e ao ouvir falar o Sr. Deputado José Manuel Epifânio, da bancada do Partido Socialista, veio-me à memória Zeca Afonso, com esta toada: …

Vozes do PS: - Isso não é mau!

O Orador: - … «eles chumbam tudo, eles chumbam tudo e não mudam nada».

Vozes do PS: - Não era bem assim!

O Orador: - E fiquei sem saber se chumbam pelas razões apontadas pelo Sr. Secretário de Estado ou pelo Sr. Deputado José Manuel Epifânio.
O Sr. Secretário de Estado disse que esta situação se construiu por sucessivos ajustamentos e acordos entre os operadores e que este projecto de lei é uma posição unilateral, exterior, sendo, além disso, cara e tecnicamente desajustada. O Sr. Deputado José Manuel Epifânio procurou demonstrar que a proposta era tecnicamente errada e que, se calhar, até faria outra. Portanto, ficamos sem saber exactamente por que é que chumbam esta iniciativa, bem como se querem mudar ou não.
A pergunta que lhe coloco, Sr. Secretário de Estado, é se o Governo considera que as mudanças devem continuar a operar-se por sucessivos ajustamentos ou se considera que é necessária uma mudança, nomeadamente para viabilizar financeiramente este sistema.
O Sr. Secretário de Estado queixa-se que qualquer medida que tende a melhorá-lo é cara. O Governo pensa fazer uma política de mudanças nesta matéria, nomeadamente transferir despesas e receitas de um sistema desta natureza para uma autoridade metropolitana, como se passa nos exemplos apontados lá fora?
Gostaria também de lhe conceder o tempo que me resta para que possa responder-me.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Obrigado, Sr. Deputado. O seu tempo já está transferido.
Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes, que dispõe de 2 minutos do seu tempo mais os 39 segundos que lhe foram conferidos pelo CDS-PP.

O Sr. Secretário de Estado dos Transportes: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joaquim Matias, o que lhe digo é que essa não é a nossa opção.
Nós, face àquilo que temos em cima da mesa e aos objectivos que pretendemos, sabemos que a alteração do sistema da repartição modal e a melhoria do sistema de transportes colectivos da Área Metropolitana de Lisboa não passa essencialmente pelo preço mas, sim, pela introdução de transportes de qualidade que se revelem como uma verdadeira alternativa ao transporte individual. E é isso que temos feito através de investimentos no sector ferroviário, no metropolitano e nas interfaces.
Esta é uma questão de fundo, para além de tecnicamente subscrever inteiramente as palavras do Deputado José Manuel Epifânio.
Trata-se de uma opção de política e ela tem dado os seus resultados: entre 1991 e 1995, o sistema de transportes públicos perdeu 16% da quota de mercado; entre 1995 e 1999, além de não ter perdido quota de mercado, recuperou-a, ou seja, a tendência inverteu e já está a crescer - cresceu 4,4%. Isto mostra que, de facto, esta política tem sido ajustada.
Vou passar a responder à questão colocada pelo Sr. Deputado Manuel Queiró. Digo-lhe que esta é uma opção porque, se eu introduzir esse sistema, ele acarreta maiores custos e não tenho a certeza da eficácia da medida. Por isso, prefiro a outra medida. No fundo, em vez de estar a encaminhar dinheiro para o financiamento do sistema, prefiro encaminhá-lo para o investimento e ter a certeza de que vou conseguir os meus objectivos.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Tem a certeza?

O Orador: - Não vou gastar dinheiro se não tiver a certeza de que vou conseguir os objectivos. Penso que, actualmente, o sistema pode precisar de reajustamentos, em muitos casos, e isso é importante, pois há uma parte das famílias que não têm transporte individual - portanto, têm dificuldades -, mas essas estão servidas por um sistema que, julgo, não penalizou o utente, face à filosofia inicial do passe intermodal, porque lhe deu novas alternativas sem lhe retirar as regalias que tinha.
O utente tem o passe intermodal, pode utilizar todos os operadores, ou pode, dentro destas coroas, utilizar passes de linha, que são mais baratos, porque escusa de comprar o transporte em todos os operadores, comprando só o passe dos operadores que vai utilizar.
Portanto, o que digo é que a medida proposta não é eficaz face aos problemas que temos para resolver na Área Metropolitana de Lisboa. Esta é a minha opinião.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Está concluído o debate do projecto de lei n.º 316/VIII. A votação do mesmo feita será na próxima reunião em que haja votações.
Antes de passarmos ao terceiro ponto da ordem do dia, o Sr. Secretário vai dar conta de dois relatórios da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (Rodeia Machado): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo Criminal do Tribunal de Instrução Criminal e de Comarca de Lisboa, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Álvaro Amaro (PSD) a depor, como testemunha, por escrito, no processo n.º 250/00 que se encontra pendente naquele tribunal.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário vai proceder à leitura do segundo relatório.

O Sr. Secretário (Rodeia Machado): - Srs. Deputados, a solicitação 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Penafiel, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Agostinho Gonçalves (PS) a prestar declarações, como testemunha, por escrito, no processo n.º 65/00 que se encontra pendente naquele tribunal.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos passar ao último ponto da ordem do dia, que é a discussão da proposta de lei n.º 37/VIII - Autoriza o Governo a aprovar um regime jurídico para a concessão intermunicipal do serviço público de gestão urbana de uma área compreendida nos limites da Zona de Intervenção da Exposição Mundial de Lisboa (Expo 98).
Aguardamos, por breves instantes, a chegada do Membro do Governo que vai iniciar o debate.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Sr. Presidente, permita-me que interpele a Mesa.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, em primeiro lugar, informo que o Sr. Secretário de Estado do Ambiente chegará dentro de segundos a esta Sala.
Em segundo lugar, há uma questão que foi colocada na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares e aproveitava para utilizar este tempo, se me permitir, no sentido de a equacionar desde já.
Esta proposta de lei, na opinião do Sr. Deputado Luís Marques Guedes, carece de consulta da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Nós agendámos, com consenso alargado, o debate para hoje sob uma condição, que é a de, uma vez que tudo indica que a próxima reunião plenária em que haverá votações será a do dia 18, ou seja, daqui a duas quintas-feiras, entre este momento e esse momento, organizar essa audição, a fim de que na altura em que tiver lugar a votação, na generalidade, possa estar cumprida, sob todos os pontos de vista, essa condição ou esse requisito.
Ora, como se trata de uma autorização legislativa, não baixará a qualquer comissão. Portanto, fica inteiramente nas mãos da Mesa.
Peço ao Sr. Presidente que tome diligências no sentido da organização de um procedimento que permita, por um lado, a expedição, por outro lado, o acompanhamento, a tramitação, a recolha do parecer, se a associação entender emiti-lo, e simultaneamente a sua divulgação aos grupos parlamentares e a revelação pública do seu conteúdo.
Creio que não é especialmente difícil organizar esse processo, mas é preciso assinalar a sua necessidade e ponderar como é que se deve fazer esta tramitação.
Deixo esta questão à consideração do Sr. Presidente. Tencionava fazê-lo no fim do debate, mas este é também o momento adequado para esse feito.

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Secretário de Estado é um parlamentar experiente e, portanto, falou o tempo exacto para o Sr. Secretário de Estado do Ambiente chegar.
Quanto à questão que colocou, creio que haverá possibilidade de enviar a proposta de lei, nomeadamente por fax, à Associação Nacional de Municípios Portugueses. Mas creio que o Sr. Presidente da Assembleia da República chega hoje e procederei no sentido de que seja ele a despachar, pelo que farei chegar esse pedido ao Sr. Presidente e creio que isso se poderá resolver com rapidez.
Não se pode é assegurar que a resposta será dada até ao citado dia 18, mas ver-se-á. Se isto já esperou 2 anos pode esperar mais algum tempo...
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao apresentar esta proposta de lei, o Governo pretende retomar a gestão autárquica da área pública da zona de intervenção da Expo 98.
Todos conhecemos as características de profunda degradação da zona, bem como a natureza extraordinária da intervenção que aí ocorreu. Tal intervenção permitiu criar uma zona de excelência urbanística e ambiental, que é hoje um verdadeiro caso de estudo a nível nacional e internacional, mas é agora chegado o tempo de fazer regressar aquela zona à gestão das autarquias e também de estabelecer uma relação normal entre elas e os muitos cidadãos que já residem e trabalham na zona do Parque das Nações.
O modelo que o Governo vem propor, de uma empresa tripartida para a gestão da zona, surgiu como natural numa zona de fronteira entre dois municípios, na qual existem equipamentos de grande valia técnica e urbanística.

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É para assegurar uma transição suave na gestão destes equipamentos que, por acordo dos dois municípios envolvidos e por um período transitório, a Sociedade Parque Expo 98, S.A., permanecerá na estrutura accionista da sociedade concessionária.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Por acordo?

O Orador: - Por esta via, chegamos a uma empresa tripartida, provisoriamente tripartida, na medida em que o prazo limite de permanência da Sociedade Parque Expo 98, S.A. na estrutura accionista será o de 31 de Dezembro de 2010, o qual pode ser antecipado por acordo entre os participantes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao apresentar esta proposta o Governo pretende fechar o ciclo de gestão extraordinária da zona de intervenção da Expo 98, iniciado em 1993, e devolver à gestão municipal uma zona de grande qualidade urbanística, que é fruída por cerca de 2 milhões de cidadãos por mês.
A proposta que aqui apresentamos resulta de um processo negocial entre os dois municípios e a empresa Parque Expo, abundantemente participado pelas respectivas equipas técnicas e pelas duas assembleias municipais em causa.
Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, julgo que a autorização legislativa que agora pedimos traduz uma solução equilibrada, que assegurará a qualidade urbanística e ambiental da zona de intervenção da Expo 98 não só agora como no futuro expectável.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados José Eduardo Martins e Manuel Queiró.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, vamos mas é falar do que interessa, porque do «aborto» jurídico do sistema que os senhores aqui propõem já falaremos a seguir, na intervenção.
Mas como do que se trata com esta proposta é encontrar mais uma forma de resolver financeiramente o «buraco» da Expo 98, vou aproveitar para fazer-lhe umas perguntinhas sobre os bens que pretendem transferir para esta sociedade concessionária, sobre as infra-estruturas, os bens dominiais, que no relatório de contas aparecem no imobilizado corpóreo II. Vou aproveitar para fazer umas perguntas à tutela, porque já é tempo da tutela começar a esclarecer algumas coisas.
Quando, em 1999, o «buraco apertou», os senhores fizeram um contrato-programa entre o Estado e a Sociedade Parque Expo 98, S.A, que dizia, na cláusula 11.ª, que o objecto da reestruturação financeira era, entre outros, compensar os custos relacionados com investimentos excepcionais, nomeadamente os bens dominiais.
Primeira pergunta: nos custos dos terrenos do imobiliário vendido na zona da Expo 98 estão, ou não, reflectidos os custos das infra-estruturas, como é obrigação e prática normal de qualquer urbanização?
Peço-lhe que aprenda com a elegância do colega que o antecedeu e que responda a estas perguntas.
Nesse mesmo contrato-programa, de 21 de Outubro, os senhores previam, na cláusula 13.ª, transferir para a Sociedade Parque Expo 98, Desenvolvimento e Promoção Imobiliária, S.A, 39, 5 milhões de contos destes investimentos (39, 5 milhões de contos que o Estado assumiria até 31 de Dezembro de 1999).
Segunda pergunta: sabe que a sociedade Parque Expo 98, Desenvolvimento e Promoção Imobiliária, S.A, quando assinou este contrato-programa, estava dissolvida por escritura há mais de três meses?
Terceira pergunta: três semanas depois de assinarem este contrato-programa, tiveram o descaramento de lhe fazer uma alteração, dizendo que, no âmbito dos trabalhos preparatórios para a concretização das medidas previstas no contrato-programa, em particular da cláusula 13.ª, concluíram que o tipo de activos são exclusivamente infra-estruturas e que, assim, o controle da Sociedade Parque Expo 98, Desenvolvimento e Promoção Imobiliária, S.A., nos termos definidos no contrato-programa, teria como efeito prático a assunção do correspondente passivo. Portanto, em vez de transferirem para esta sociedade, convencionaram uma nova cláusula 13.ª em que transferem 40 milhões de contos em duas tranches de 20!
Mas, depois, o relatório de contas de 1999 da Sociedade Parque Expo 98, S.A vem dizer que, ao abrigo deste contrato-programa, em 1999, amortizaram 22,5 milhões de contos de infra-estruturas. Então, Sr. Secretário de Estado, são 20 ou 22 milhões de contos?
Este contrato, assinado em 17 de Novembro, a corrigir o de 21 de Outubro, chegou a 31 de Dezembro sem ser cumprido? É isso o que quer dizer o relatório de contas da Sociedade Parque Expo 98, S.A.? É que o relatório de contas de 1999 também diz, o que explica a razão de estarmos hoje a falar neste assunto, que dos 53 milhões de contos de bens dominiais, depois de amortizados os tais 22,5 milhões de contos, sobram 30 milhões de contos. Ora, quanto a estes, o relatório de contas diz que a administração prevê que, durante o ano 2000, aqueles bens sejam transferidos para uma empresa a constituir entre as Câmaras Municipais de Lisboa e de Loures e a Sociedade Parque Expo 98, S.A.
Sr. Secretário de Estado, a pergunta que lhe faço agora é no sentido de saber, concretamente, como e quanto vão pagar as câmaras municipais por estes bens e se vão pagar muito depressa, para que a Sociedade Parque Expo 98, S.A. possa cumprir as obrigações financeiras decorrentes do empréstimo de 50 milhões de contos que contraiu em 1999, do qual, em 2000, não cumpriu sequer a primeira prestação.
Sr. Secretário de Estado, responda a estas perguntas porque da proposta de autorização falaremos a seguir.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Fui informado que o Sr. Secretário de Estado pretende responder conjuntamente as pedidos de esclarecimento. Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, a operação que o Governo hoje nos propõe vem na linha de uma política de gestão da Sociedade Parque Expo 98, S.A. com a qual o

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CDS-PP nunca concordou e que se traduziu num inevitável buraco financeiro, que, infelizmente, prevíamos. Aqui os profetas não podem ser os culpados, porque avisaram a tempo, foram amigos, mas tudo isso foi politicamente justificado com o benefício que a existência da Expo 98 significou para Portugal.
Admitamos que estamos agora na fase de, por sucessivas operações, viabilizar financeiramente a Sociedade Parque Expo 98, S.A. ou de resolver o seu problema financeiro através de uma espécie de alienação de encargos, mas fico sem saber para quem. Isto é, constato que se prevê a transferência de competências que significam despesas, mas gostaria de saber para quem são transferidas. É para as câmaras municipais? Não, mas devia ser!
Portanto, Sr. Secretário de Estado, a minha primeira pergunta é no sentido de saber a verdadeira razão que está por detrás desta fase transitória. Se, de facto, são encargos de natureza municipal, por que não são transferidos para as câmaras municipais imediatamente?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Dir-me-á que as câmaras municipais concordaram com esta situação, mas gostaria de saber que contrapartidas terão elas para aceitarem esta fase transitória.
As câmaras municipais não recebem as competências com as despesas concomitantes, que vão para uma sociedade concessionária tripartida. Então, estas despesas vão ser pagas por quem? O CDS-PP gostaria de ter uma resposta concreta sobre este ponto, isto é, gostaria de saber qual o entendimento do Governo sobre para quem são transferidos estes encargos. Se não são transferidos para as câmaras municipais mas, sim, para uma sociedade concessionária, esta tem de viver de alguma coisa, alguém vai ter de pagar!
Há, de facto, na proposta de autorização legislativa, uma alínea que, para nós, é bastante significativa, que tem a ver com o facto de a capacidade de endividamento da sociedade concessionária não estar sujeita aos limites próprios do poder autárquico. Porém, devia estar, porque com esta sociedade concessionária está a criar-se uma espécie de poder autárquico…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Paralelo!

O Orador: - … de tipo novo, até porque tem uma duração já definida no tempo, de legalidade e constitucionalidade duvidosas, pois não está sujeita a controlo democrático de tipo algum, e que tem uma capacidade de endividamento não sujeita aos limites próprios do endividamento do poder autárquico.
Ora, a questão está em que não é a banca que vai pagar, este pagamento também é diferido para o futuro, pois, como é tristemente hábito neste Governo, há pagamentos diferidos para o futuro. Só falta o Ministro Jorge Coelho para dizer que isto «sai de borla», porque é um project finance! Só nos faltava isso! Mas não é de borla, é um pagamento diferido para o futuro e, portanto, alguém vai pagar. Vão ser os contribuintes, directamente ou através das câmaras municipais, com as contribuições autárquicas ou outro tipo de taxas, ou através do Orçamento do Estado. Portanto, serão os contribuintes de todo o País a pagar esta «autarquia de luxo» que vai administrar, com poderes de natureza autárquica extremamente largos, a tal zona de transição entre Lisboa e Loures.
Sr. Secretário de Estado, gostaria que me desse esclarecimentos sobre estas questões muito concretas.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente, dispondo de 5 minutos.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, no que respeita à intervenção do Sr. Deputado José Eduardo Martins, ele próprio disse que as questões que colocou não têm a ver com o assunto que nos traz hoje ao Parlamento.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - O senhor não sabe a resposta!

O Orador: - Aliás, as afirmações do Sr. Deputado José Eduardo Martins já são conhecidas desta Câmara de outras alturas e de outras intervenções e já foram também respondidas por requerimentos que o Sr. Deputado teve oportunidade de fazer ao Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território e à Sociedade Parque Expo 98, S.A.
Em relação à questão que nos traz aqui, ou seja, a gestão da zona da Expo 98, gostaria de pegar nas palavras do Sr. Deputado Manuel Queiró. De facto, o que se pretende é manter uma gestão de excelência naquela zona tal como existe neste momento. Para garantir essa gestão de excelência foi acordado com os municípios criar uma estrutura que garanta o mesmo nível de atendimento a que as pessoas que frequentam a zona da Expo 98 já estão habituadas a ter.
Como vai essa instituição ser financiada? Vai ser financiada, obviamente, com as receitas que estão e irão ser criadas no local, que são as receitas normais das autarquias, as quais, neste caso, têm uma mais-valia porque a zona da Expo 98 ainda está em desenvolvimento. Há taxas, serviços e outras licenças que vão ser passadas pelas autarquias e que permitirão financiar a empresa.
Aliás, foi feita pela Sociedade Parque Expo 98, S.A. e pelos municípios envolvidos uma análise da viabilidade da própria empresa, só tendo sido proposta a sua criação porque se concebeu, e as autarquias estiveram de acordo, que a mesma podia sustentar-se com as receitas provenientes das obras e dos desenvolvimentos do próprio local e, mais do que isso, que as receitas naquela zona serão superiores ao que é necessário para manter a empresa.
Portanto, haverá receitas suplementares que irão directamente para as autarquias para o prosseguimento dos seus objectivos gerais. Mais: como eu disse, a solução permite desencadear um processo de «desintervenção» da zona da Expo 98. Penso que este aspecto deve ser valorizado aqui!
O Sr. Deputado referiu que esse processo foi feito ao longo de dois anos. Isso é verdade, mas, por vezes, é preciso um trabalho mais demorado para conseguir-se uma boa solução.
Penso que estamos em presença de uma boa solução, por isso apelo à Câmara para a apoiar, uma vez que a

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mesma tem o consenso de todos os intervenientes, é sustentável e, mais, marca o que os Srs. Deputados sempre quiseram e pediram: um fim para a intervenção da Sociedade Parque Expo 98, S.A. na área. Esse fim está marcado e não excederá 2010, que, aliás, é o fim previsto para a vida da Sociedade Parque Expo 98, S.A.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, Sr.as e Srs. Deputados: Pretende o Governo obter autorização legislativa para aprovar o regime jurídico da concessão intermunicipal do serviço público de gestão urbana de uma área inserida na zona de intervenção da Expo 98. Pretende-se, assim, criar uma empresa pública, constituída pelas autarquias de Lisboa e de Loures e, ainda, pela Sociedade Parque Expo 98, S.A. para gerir os espaços e as infra-estruturas públicas daquela zona de intervenção.
O conteúdo fundamental da autorização não nos sugere objecções, porém há elementos pouco claros no que respeita ao desenvolvimento concreto da proposta de autorização, designadamente no que respeita ao sentido e extensão da mesma.
Pretende-se, de facto, como se disse hoje, embora não esteja traduzido na proposta de lei, que esta seja uma solução transitória a utilizar até que, no futuro, possa vir a ocorrer a plena integração da área em questão na gestão dos municípios de Lisboa e de Loures, tal como, aliás, refere a exposição de motivos? Ou, pelo contrário, como sugere a alínea b) do artigo 2.º da proposta de autorização legislativa, pretende-se que esta possa vir a ser uma concessão eventualmente definitiva?
Por outro lado, pretende-se criar uma empresa pública, constituída pelos municípios de Lisboa e de Loures e pela Sociedade Parque Expo 98, S.A., mas nada se diz sobre a constituição de facto e em concreto do seu capital social. Será que os dois municípios vão ter participação maioritária? Ou serão remetidos, como se passa na legislação que acabamos de discutir sobre empresas públicas multimunicipais ou naquela que criou as sociedades gestoras do Programa Polis, para uma posição subalterna e minoritária?
Pretende-se ou não que as regras de financiamento da empresa pública a criar sejam claras, transparentes e adequadamente fiscalizáveis? Deseja-se ou não que as taxas a cobrar pelos serviços prestados sejam definidas com forte intervenção do poder decisório dos municípios envolvidos?
Estes são alguns aspectos que, em nossa opinião, não estão adequadamente clarificados nos termos da proposta de lei de autorização legislativa.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP compreende que se pretenda criar uma empresa pública que exerça de uma forma específica a gestão de uma vasta zona urbanizada que sofreu recentemente uma forte intervenção, designadamente nos últimos anos.
O PCP compreende que seja esta uma forma de dar uma resposta eficaz e de qualidade às exigências de gestão das áreas e das infra-estruturas públicas construídas nessa zona, ainda por cima abrangendo e estando situadas em diferentes municípios e em várias freguesias. Mas o PCP considera também que essa solução empresarial deve ser balizada por alguns princípios orientadores, dos quais não quer abdicar.
Antes do mais, a empresa a constituir deverá ser claramente uma solução transitória até que estejam reunidas todas as condições que permitam, no futuro, a devolução plena das áreas em causa à gestão municipal. Por outro lado, a empresa a constituir deverá ter, desde já, um capital social detido maioritariamente pelos municípios de Lisboa e de Loures ou, pelo menos, deverá permitir essa possibilidade caso estes estejam nisso interessados. A Sociedade Parque Expo 98, S.A. deverá, assim, ser remetida para uma posição minoritária.
Garantido este pressuposto, o qual deve ser contemplado no articulado, deverá ser igualmente garantida total transparência da gestão empresarial, bem como a sua adequada fiscalização democrática por parte dos eleitos municipais, designadamente no que respeita à definição dos valores das taxas a cobrar pelos serviços prestados.
Importa, assim, que o Governo aceite estes princípios e que eles venham a ser contemplados no articulado legal a aprovar ao abrigo desta proposta de lei de autorização legislativa.
Pela sua parte, o PCP, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, ficará atento e tomará posição perante a formulação legal que vier a ser adoptada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Rocha Gariso.

A Sr.ª Margarida Rocha Gariso (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos a debater a proposta de lei n.º 37/VIII, que visa autorizar o Governo a aprovar o regime jurídico para a concessão intermunicipal do serviço público de gestão de uma área compreendida nos limites da zona de intervenção da exposição mundial de Lisboa, a Expo 98.
O relevante interesse público nacional da realização da exposição mundial de Lisboa e o programa de reconversão e reordenamento urbano da respectiva zona de intervenção justificaram a adopção de um conjunto de medidas e acções tendentes à disponibilização dos solos necessários à prossecução daqueles objectivos.
Assim, os solos compreendidos na zona de intervenção da Expo 98 passaram a integrar o domínio patrimonial da Sociedade Parque Expo, sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, constituída pelo Decreto-Lei n.º 88/93, de 23 de Março, a qual afectou integralmente tais solos à montagem e realização da exposição mundial de Lisboa e ao programa de reordenamento urbanístico da área, no quadro do plano de urbanização aprovado pela Portaria n.º 640/94, de 15 de Julho, posteriormente desenvolvido por planos de pormenor devidamente aprovados.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a Expo 98 deveria ser não só o palco da exposição mundial como também a alavanca para a transformação de uma das zonas urbanas mais degradadas da cidade de Lisboa. E foi-o efectivamente. Em bom rigor, aquele pedaço de capital transformou-se

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numa das suas zonas arquitectónicas mais belas, na qual perpassa a existência de um projecto urbano de alta qualidade, visível na excelente gestão do espaço público que ali está a ser desenvolvida.
Concluída a exposição, e dando cumprimento aos objectivos traçados pelo Governo através da Resolução n.º 68/98, do Conselho de Ministros, de 19 de Maio, foi celebrado, em 24 de Setembro de 1998, um protocolo entre a Sociedade Parque Expo S.A. e os municípios de Lisboa e de Loures, no qual foram acordados os princípios para o desenvolvimento conjunto do modelo jurídico, institucional e financeiro da gestão da zona de intervenção da Expo 98, para uma fase de transição até à plena integração da área na gestão das autarquias locais envolvidas.
Em conformidade com os princípios definidos, a Sociedade Parque Expo S.A. irá transferir para o domínio público dos municípios de Lisboa e de Loures as parcelas que, no âmbito da zona de intervenção, estão, ou deverão estar, afectas ao uso directo e imediato do público, bem como o conjunto de infra-estruturas de serviço público implantadas na zona, no quadro dos investimentos realizados por aquela empresa.
Tendo como objectivo assegurar uma qualidade urbana e ambiental de alto nível, assim como a gestão conjunta e articulada entre os municípios de Lisboa e de Loures e a Parque Expo na zona de intervenção, é vontade das partes constituir entre si uma entidade de tipo empresarial com esse fim exclusivo, à qual será atribuída, por decisão dos municípios e mediante contrato de concessão de serviço público, a responsabilidade de administrar o domínio público municipal e garantir a prestação de um conjunto de serviços urbanos essenciais naquela área.
Deste modo, e atendendo à especificidade do modelo de concessão intermunicipal visado pelas partes envolvidas, assim como à necessidade de habilitar os municípios a dotarem a futura empresa concessionária de um conjunto de poderes de natureza administrativa necessários ao desempenho de serviço público de gestão urbana de que ficará incumbida, pretende a proposta de lei ora em discussão estabelecer o regime jurídico-legal adequado.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, de forma sucinta se dirá que o objecto, sentido e extensão da autorização legislativa no figurino proposto, partilhado pelas autarquias, visam criar um modelo jurídico inovador que garanta a coerência e a continuidade na excelência desta experiência.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, resulta claro que é opção dos municípios continuar a gestão conjunta daquela zona, situada na fronteira dos dois concelhos, que os levou a associar-se numa sociedade à qual atribuirão a concessão e na qual a Sociedade Parque Expo S.A. terá uma participação a extinguir até, no máximo, ao ano 2010.
Será pois no exercício da sua autonomia que os dois municípios decidirão o modo de organização dos serviços que devem assegurar relativamente a tal zona, preferindo, no caso, fazê-lo através de entidade de natureza empresarial e mediante contrato de concessão.
Refira-se ainda que o controlo e fiscalização dos eleitos locais dos municípios envolvidos na gestão da concessionária está assegurado por via do consagrado no anteprojecto de decreto-lei que aprova as Bases de Concessão da Gestão Urbana da Zona de Intervenção, designadamente nas bases XVI, XXXII e XLVIII.
A aprovação da autorização legislativa por esta Câmara dotará o Governo dos mecanismos necessários para que o projecto Expo 98 se desenvolva plenamente, no respeito pelos objectivos que desde sempre foram traçados e adaptados pelos portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ao começar este debate é preciso registar que quando discutimos a transferência de infra-estruturas da Expo 98 o Governo não soube, ou não quis, responder ao custo do que já pagou por essas infra-estruturas e assegurou que as câmaras municipais não vão dar, por essas infra-estruturas entregues à sociedade concessionária, dinheiro à Sociedade Parque Expo 98, S.A. Lembre-se que hoje, nesta Assembleia, disse isso.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, somos hoje chamados a analisar a terceira manifestação de vontade do Governo socialista para a gestão urbana do espaço da Expo 98 em menos de três anos.
Em 1998, o Governo aprovou a Resolução n.º 68/98, do Conselho de Ministros, onde incluía como objectivo estratégico da Sociedade Parque Expo 98, S.A. pós-exposição «(…) assegurar, na zona de intervenção, uma qualidade urbana e ambiental de excelência».
Em 1999, o buraco financeiro apertou e a Sociedade Parque Expo 98, S.A. precisou de vender as infra-estruturas realizadas.
Foi então celebrado, em 21 de Outubro desse ano, um contrato-programa onde se previa a realização destas tarefas, por uma sociedade, a EXPO URBE, ligeiramente dissolvida em Julho desse mesmo ano.
Em menos de três semanas, nova luz: chega o Ministro Sócrates, deita fora o acordo do Ministro Costa e entrega - para quê? - 40 milhões de contos à Sociedade Parque Expo 98, S.A., sem contrapartida de gestão dessas infra-estruturas, que agora, afinal, vão ser geridas por uma sociedade anónima de capitais públicos.
Mais um regime de excepção patrocinado pelo Governo socialista. Entre fundações e institutos para cumprir as atribuições da Administração Central e sociedades anónimas para cumprir com as competências do poder local, este Governo pratica tantos entorses que se ficar para a História só será para a do Direito Administrativo em disparate.
Em concreto, e relativamente a esta proposta, que é, afinal, uma operação de cosmética contabilística para diminuir o défice das contas da Sociedade Parque Expo 98, S.A., importa saber quanto e como vão as câmaras municipais pagar por estas infra-estruturas que agora recebem.
No texto da proposta de lei fazem-se constantemente referências ao contrato de concessão. Quais são os seus termos precisos? Como vai ser calculada e estabelecida a taxa de saneamento e de recolha de lixos? Vai haver repartição da contribuição autárquica com a concessionária? De que forma? A contribuição autárquica dos dois municípios vai ser uniformizada, pelo menos, para os

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imóveis integrados na zona de infra-estruturação? E como é que vão ser contabilizadas as infra-estruturas dos Planos de Pormenor 5 e 6, que nem sequer estão feitas?
A ser aprovada a proposta de lei em apreço, o Governo aprovará um - mais um! - regime jurídico excepcional, fazendo instituir, entre a Sociedade Parque Expo 98, S.A. e os municípios de Lisboa e de Loures uma sociedade anónima em relação à qual será concessionada, por ajuste directo, a gestão urbana de uma parcela envolvente, mas significativa, da zona da Expo 98. Ou seja, e dito de outro modo, uma sociedade anónima, a Parque Expo 98, S.A., constituirá com duas autarquias locais outra sociedade anónima, que vai receber, por ajuste directo, ou seja, sem concurso público e sob um regime estranho à fiscalização prévia do Tribunal de Contas, a concessão intermunicipal do serviço de gestão urbana que devia pertencer aos respectivos municípios.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - A este aspecto, que, no caso concreto, é verdadeiramente surrealista, acresce concluir-se da análise das disposições do projecto de decreto-lei a aprovar na sequência da entrada em vigor desta autorização legislativa, que o objecto da concessão incide, directa e exclusivamente, sobre competências ordinária, tradicional e inteiramente pertencentes à esfera das autarquias locais.

A Sr.ª Margarida Rocha Gariso (PS): - O que não é nada de novo.

O Orador: - Leia a base.
Os mais crédulos poderão julgar que, por exemplo, a remoção de animais nocivos ou a recolha do lixo - e isto é para si, Sr.ª Deputada - são tarefas altamente diferenciadas, que justificam uma sociedade anónima exclusivamente destinada para o efeito. Mas então proponha ao Governo que todas as autarquias do País constituam sociedades anónimas para recolherem os seus lixos e cumprirem as suas competências.
É bom lembrar ao cada vez mais irrealista e arrogante Partido Socialista que os interesses comuns e directos das populações locais devem ser prosseguidos pelas autarquias locais, que legitimamente as representam, e não por entidades fechadas, não democráticas, não transparentes, como é o caso desta sociedade anónima.
Com efeito, o PSD tem bem consciência do interesse público nacional de que se rodeou a realização da Expo 98 e do programa de reconversão e reordenamento urbano da respectiva zona de intervenção, posto que, quando todos os outros partidos se insurgiam com a realização deste investimento, foi um Governo do Partido Social Democrata que teimou em dá-lo aos portugueses.
Só que, chegados a esta altura, é preciso saber para que serve e para onde vai a Sociedade Parque Expo 98, S.A., cujo objecto social é - recorde-se -, desde Outubro de 1998, o projecto imobiliário, ao qual, afinal, os relatórios de contas nunca dedicam mais do que uma ou duas páginas.
Qual é, afinal - esclareça-nos, Sr. Secretário de Estado -, a área vendida por funções até ao final de 2000 e o preço de venda? Qual é o custo real, por metro quadrado, do pavimento vendido e a vender na Expo 98? Atendendo ao facto de o único objecto ser o da requalificação urbanística, praticamente ultimada, e a venda do imobiliário ainda existente, como justifica a tutela que a Sociedade Parque Expo 98, S.A. tenha 11 administradores, dos quais 7 executivos - os 4 não executivos recebem 60% do vencimento -, e cerca de 370 empregados?! Qual o motivo para gastar 160 mil contos, mais os custos de pessoal para actualização e manutenção do primeiro portal nacional vocacionado para a cultura, o lazer e o entretenimento na Expo? Será que a cultura, o lazer e o entretenimento passaram a fazer parte do objecto social da Expo 98? Ou estão, subrepticiamente, e à custa dos contribuintes, a ser subtraídos às competências do Ministério da Cultura?
De uma vez por todas, tenham vergonha, Sr. Secretário de Estado, e privatizem a Sociedade Parque Expo 98, S.A. Cada dia que passa é tarde demais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Eduardo Martins, tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Ramos.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, poderíamos pensar, com a entrada deste novo ano, que o Deputado José Eduardo Martins tivesse, de certa forma, aligeirado o seu discurso, no sentido não só de o aproximar daquilo que é o assunto, mas também de tratar o assunto e o discurso de uma forma eloquente e, de certa modo, técnica e eticamente correcta do ponto de vista político do tratamento entre partidos.
De todas as formas, parece que não, e que, pelo contrário, o período de pausa que tivemos nos trabalhos parlamentares conduziram a que o Deputado José Eduardo Martins continuasse arrogante, com a mesma forma de tratamento inaceitável do ponto de vista parlamentar e, de certa forma, agredindo politicamente.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Responda às questões. Não esteja obcecado comigo. Fale do assunto, das infra-estruturas da Expo 98!

O Orador: - Sr. Deputado, os argumentos que está a apresentar são aqueles que, precisamente, jogam contra si próprio!…

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Deixe-se de conversa, responda às perguntas!

O Orador: - O Sr. Deputado acabou de fazer uma intervenção que não tinha nada a ver com o assunto, fez uma pergunta ao Sr. Secretário de Estado que não tinha nada a ver com o assunto e quer que eu lhe faça uma pergunta sobre o assunto. Logicamente, Sr. Deputado, vou fazê-la.
Se o Sr. Deputado tivesse estudado o processo devia saber que as minutas da base da concessão já foram aprovadas pelas duas câmaras municipais! Ou seja, o texto já existe, mas o Sr. Deputado até desconhece a existência do texto-base da minuta de concessão!…

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O que quero, pois, dizer-lhe, Sr. Deputado, é que melhor será estudar o processo e fazer depois uma intervenção sobre o assunto em vez de insultar os outros partidos políticos e o Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, estou um bocadinho farto desta obsessão do Sr. Deputado Casimiro Ramos pela minha pessoa!

Risos.

Deve haver, com certeza, uma explicação.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço-lhe desculpa, mas…

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Já não disponho de mais tempo, não é verdade, Sr. Presidente?

Risos.

O Sr. Presidente (João Amaral): - É, mas a Mesa concede-lhe 2 minutos.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Eu podia ter feito ao Partido Socialista o favor de transformar este debate na discussão da minha vontade, na eloquência das minhas intervenções, na oportunidade ou inoportunidade das mesmas, mas tudo aquilo que abordei foram as infra-estruturas da Sociedade Parque Expo 98, S.A. A única pergunta que o senhor me fez foi se eu conhecia as bases da concessão e se elas não respondiam às perguntas que eu lhe fiz. E eu vou repetir-lhe as perguntas e o senhor vai ter a fineza de me dizer onde é que a resposta está nas bases da concessão.

O Sr. Casimiro Ramos (PS): - Qual era o texto?

O Orador: - Uma das perguntas que fiz ao Sr. Secretário de Estado foi a seguinte: como vai ser calculada e estabelecida a taxa de saneamento e recolha de lixo? Está aqui a resposta? Onde é que está Sr. Deputado?
Outra pergunta que fiz foi no sentido de saber se vai haver repartição da contribuição autárquica. Está aqui a resposta? Responda, Sr. Deputado!
A terceira pergunta foi se a contribuição autárquica vai ser harmonizada relativamente aos imóveis que estão na zona comum dos dois municípios. Está aqui a resposta? Responda, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma última intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na Câmara Municipal de Lisboa, o CDS-PP já votou contra a constituição desta sociedade tripartida, na linha da coerência que apontei há bocado. Aliás, creio mesmo que foi a única força política que o fez. Desde logo, porque somos contra esta ideia de criar uma espécie de autarquia em que, ainda por cima, a Administração Central comparticipa com controlo praticamente total, através da Parque Expo, e em que os poderes autárquicos são exercidos como uma espécie de «autarquia de luxo» para uma zona de «luxo», ou de «excelência», como prefere dizer o Governo.
Isto não é aceitável. Não é aceitável que os munícipes não tenham o controlo democrático dos actos autárquicos e da gestão urbana que é efectuada na respectiva zona e que as autarquias a que pertencem não o possam fazer, mesmo que tenham dado o seu acordo à constituição de uma sociedade e de um processo que é, para nós, muito pouco transparente.
Assim, esta proposta de lei de autorização legislativa vai também contar com o nosso voto contra, neste Parlamento,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … por três tipos de razões.
Em primeiro lugar, por causa deste modelo de gestão, contra o qual o CDS sempre esteve contra, pelo que qualquer sequela sua já mereceria a nossa discordância.
Em segundo lugar, porque esta autorização legislativa prevê a atribuição de um conjunto de poderes de tal modo vastos a uma entidade de tipo empresarial que parece ser mais uma forma encapotada de criar um novo órgão de poder local, só que não eleito, no qual o Estado participa, não sendo certo ou não se percebendo onde fica o controlo democrático desta nova autarquia local.
Em terceiro lugar, não se percebe por que razão pretende o Governo criar uma entidade de tipo empresarial para assegurar as funções em causa e não transfere já todas as competências, as que dão receita e as que dão prejuízo, para as respectivas autarquias locais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo, até agora, ainda não conseguiu justificar a existência desta fase de transição, a não ser aquela que aventámos, que é a de constituir, de facto, mais uma forma para sanear financeiramente a Parque Expo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E perpetuar a sua subsistência!

O Orador: - Não se percebe a motivação, mas não deixa de causar profunda estranheza que se preveja que os empréstimos contraídos pela sociedade concessionária não relevem para os limites da capacidade de endividamento dos municípios de Lisboa e Loures.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Pois claro!

O Orador: - E aqui parece-nos que temos «o rabo escondido que demonstra onde é que está o gato». Desta vez, é através do endividamento que se vai contribuir para o saneamento total do buraco financeiro da Parque Expo. E isto é grave, porque quem vai, em última análise, avalizar mais este endividamento vamos ser nós, vão ser os portugueses, ou, eventualmente, os munícipes de Lisboa

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e Loures, que, sem o saberem, estão a ser chamados, através - admitamos - do actual poder autárquico das duas Câmaras, para essa «ratoeira».
Esta estranheza é acentuada pelo facto de estar previsto que a concessão em causa seja atribuída por ajuste directo, sem necessidade de consulta de outras entidades. A ausência de controlo democrático; a ausência de limites de endividamento; a ausência de interesse público que justifique o modelo empresarial proposto; numa palavra, falta de transparência e mais uma factura para os contribuintes pagarem, são boas razões para o CDS-PP votar contra esta proposta de lei.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Afinal a intervenção do Sr. Deputado Manuel Queiró não era a última, porque existe ainda a inscrição do Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Mas eu queria ser o último!

O Sr. Presidente (João Amaral): - O Sr. Deputado terá a sua oportunidade, um dia, de ser o último.
Tem, pois, a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente para uma intervenção.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta última intervenção, convém esclarecer algumas das questões que foram levantadas neste debate e, se me permitem, começo pelas colocadas pelo Sr. Deputado Manuel Queiró que devem e merecem uma resposta.
Compreendo que o CDS-PP diga que não pode votar a favor desta proposta de lei, mas lamento que não esclareça, exactamente, qual é a solução que propunha. Apenas posso antever que o CDS-PP é de opinião que se entregue nos braços das câmaras as coisas tal como estão e, depois, as câmaras que se «desenrascassem».

Vozes do PSD: - Qual era o problema?

O Orador: - Enfim, parece que não é esta a opinião das câmaras municipais.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, peço-vos que permitam ouvir o Sr. Secretário de Estado.
Faça favor de prosseguir, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
No entanto, como é claro, esta proposta do Governo resulta de três vontades. Por um lado, da vontade do Governo de progressivamente retirar a Parque Expo da gestão daquele espaço. Penso que esta é uma vontade de toda a Câmara e que, aliás, corresponde ao que todos os partidos parlamentares, desde há muito tempo, vêm falando e exigindo. Este é um passo concreto para obter este objectivo.
Por outro lado, é também claro que esta foi a solução que mereceu o consenso das três partes - do Governo, da Parque Expo e dos dois municípios -, e, portanto, parece-nos uma solução razoável.
Mais, esta não é uma solução que dá o controlo total ao Estado ou à Parque Expo; pelo contrário, esta é uma solução que dá o controlo aos municípios, como - pensei eu - resultava claro. Mas não há qualquer problema em que as bases da concessão sejam adaptadas nesse sentido para ficar expressamente colocado que cada uma das partes nesta empresa terá um terço do capital, e, portanto, a Parque Expo ficará, apenas, com um terço e haverá uma maioria de controlo dos municípios.
Outra questão que o Sr. Deputado colocou e que me parece que é importante realçar é a dos poderes da sociedade. Os poderes que vão ser concedidos à sociedade são curtos, estão esclarecidos na base da concessão, aliás, de uma forma muito clara e são apenas…

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - As competências das autarquias locais!

O Orador: - … aqueles que dizem respeito à manutenção e limpeza do espaço público, à administração dos bens do domínio público afectos à concessão, à manutenção e limpeza, à manutenção de infra-estruturas, à manutenção da valia técnica e ao ordenamento do trânsito rodoviário e pedonal.
Se os Srs. Deputados olharem para este tipo de competências verão que elas,…

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - São das câmaras!

O Orador: - … no todo ou em parte, já são concessionadas por muitos municípios. A única novidade que há nesta solução é que se juntou numa única concessão algumas coisas que, habitualmente, não são concessionadas em conjunto. Mas é também fácil de perceber que isso se faça, neste caso em particular,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Se é tão simples, por que é que demora tanto tempo?

O Orador: - … dado que a Parque Expo já faz esta gestão habitualmente.
Quanto à questão, também importante, do prazo, a saber quanto tempo isto vai durar, penso que também está claro que isto vai ter o prazo de 20 anos. Mas, para além disso, a Parque Expo - resulta também claro da autorização legislativa e das bases da concessão - sairá, o mais tardar, em 2010!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - É verdade!

O Orador: - Outra questão importante que foi levantada pelos Srs. Deputados, não só do CDS mas também por outros, é a de saber como serão definidas as taxas a pagar. É evidente que as taxas autárquicas serão definidas pelas autarquias e, neste caso, por acordo entre as duas autarquias envolvidas.
Finalmente, foi aqui levantada uma questão de fundo, que é a seguinte: por quê a solução de empresa? Nós defendemos esta solução. Porém, consideramos razoável que haja quem diga que isto se poderia entregar directamente aos municípios, mas penso que o País fi

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1450 | I Série - Número 35 | 05 de Janeiro de 2001

 

cará a ganhar se se mantiver o esquema que o Sr. Deputado Manuel Queiró classifica de «luxo», eu prefiro dizer a excelência da gestão da EXPO 98. Penso que esta é uma mais-valia que pertence não só aos habitantes de Lisboa mas a todos os portugueses que frequentam aquela área. Já tive oportunidade de dizer que são mais de 2 milhões de portugueses que frequentam a zona da Parque Expo todos os meses e com agrado geral, como é reconhecido.
Assim, a instituição da empresa dá continuidade ao sistema que irá ser incluído e permite passar, suavemente, o know-how da Parque Expo para os dois municípios.
Há uma outra questão que foi suscitada e que é importante clarificar.
Quanto é que vai custar esta empresa? Quanto vão ter de pagar os municípios e os contribuintes?
Foi feita uma avaliação económica e, como é óbvio, os Srs. Deputados não pensarão que as câmaras municipais acordariam em ficar com um ónus suplementar para a sua gestão. O estudo que foi feito, que já é do conhecimento das câmaras municipais envolvidas, estima que os custos de gestão daquela área sejam inferiores a 2,4 milhões de contos por ano.
Por outro lado, é importante perguntar: quanto vai render esta concessão? Ora, a estimativa do saldo acumulado para os municípios, no prazo da concessão, é de 86 milhões de contos.
Finalmente e para satisfazer um pouco a curiosidade do Sr. Deputado José Eduardo Martins, que perguntou: então, qual é a parte deste «bolo» que vai parar à Parque Expo? Isso também está determinado. Tal valor está estimado em 23 milhões de contos.
Penso, assim, que estão esclarecidas as questões essenciais que foram suscitadas pelos Srs. Deputados de todos os grupos parlamentares.
Em resumo, quero dizer-vos que, embora a solução possa não merecer o acordo de todos, parece-nos que, neste momento, é a mais equilibrada e a que corresponde aos objectivos que todos devemos ter -não apenas o Governo e as autarquias envolvidas -, que são os de assegurar uma gestão de excelência naquela zona e transferir, suavemente, para os municípios o know-how e a competência da Parque Expo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, o tempo excedente utilizado pelo Sr. Secretário de Estado foi-lhe cedido pelo Partido Socialista.
Não há mais inscrições, pelo que está encerrado o debate da proposta de lei n.º 37/VIII.
Srs. Deputados, chegámos ao fim da ordem de trabalhos para hoje.
A próxima sessão terá lugar amanhã, pelas 10 horas, com a seguinte ordem de trabalhos: discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os 38/VIII e 39/VIII a que se seguirá a apreciação das petições n.os 4/VIII (1.ª) e 5/VIII (1.ª).
Nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 20 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira

Partido Social Democrata (PSD):
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas

Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
António de Almeida Santos
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Luísa Pinheiro Portugal
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Vítor Manuel Caio Roque

Partido Social Democrata (PSD):
Domingos Duarte Lima
Fernando Santos Pereira
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Manuel Castro de Almeida
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Mário Patinha Antão
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Popular (CDS-PP):
António Manuel Alves Pereira
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas

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