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Sábado, 27 de Janeiro de 2001 I Série - Número 42
DIÁRIO da Assembleia da República
VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 26 DE JANEIRO DE 2001
Presidente: Ex.mo Sr. João António Gonçalves do Amaral
Secretários: Ex. mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Manuel Alves de Oliveira
António João Rodeia Machado
António José Carlos Pinho
S U M Á R I O
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 20 minutos.
O projecto de lei n.º 98/VIII - Criação do Dia Nacional sem Carro (Os Verdes) foi discutido na generalidade, tendo usado da palavra, além do Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Rui Gonçalves), os Srs. Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), Maria Santos (PS), Lucília Ferra (PSD), Manuel Queiró (CDS-PP), Joaquim Matias (PCP) e Francisco Louçã (BE).
De seguida, foi apreciada a proposta de resolução n.º 39/VIII - Aprova, para ratificação, o Protocolo que consolida a Convenção Internacional de Cooperação Para a Segurança da Navegação Aérea (EUROCONTROL), de 13 de Dezembro de 1960, na sequência de diversas modificações introduzidas, e adoptado em Conferência Diplomática reunida em Bruxelas em 27 de Junho de 1997, e respectivo Protocolo Adicional, referente à substituição do Acordo Multilateral relativo a taxas de rota, de 12 de Fevereiro de 1981, ratificado por Portugal, em 2 de Maio de 1983. Intervieram, além do Sr. Secretário de Estado dos Transportes (Guilhermino Rodrigues), os Srs. Deputados Manuel Frexes (PSD), Pedro Mota Soares (CDS-PP) e Mota Torres (PS).
Foi apreciado o Decreto-Lei n.º 108/2000, de 30 de Junho, que cria o Conselho Sectorial do Turismo [apreciação parlamentar n.º 21/VIII (PSD)], tendo usado da palavra, além do Sr. Secretário de Estado do Turismo (Vítor Neto), os Srs. Deputados Patinha Antão (PSD), Lino de Carvalho (PCP), Telmo Correia (CDS-PP) e Jamila Madeira (PS).
Foi também apreciado o Decreto-Lei n.º 227-B/2000, de 15 de Setembro, que regulamenta a Lei n.º 173/99, de 21 de Setembro [apreciação parlamentar n.º 27/VIII (PSD)], tendo usado da palavra, além do Sr. Secretário de Estado da Agricultura (Luís Vieira), os Srs. Deputados José Salter Cid (PSD), Rosado Fernandes (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP) e Gavino Paixão (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 5 minutos.
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O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 20 minutos.
Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Casimiro Francisco Ramos
Dinis Manuel Prata Costa
Eduardo Ribeiro Pereira
Fernando Alberto Pereira Marques
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gil Tristão Cardoso de Freitas França
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d'Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Barbara Madeira e Madeira
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro da Silva Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel António dos Santos
Manuel Maria Diogo
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria José Vidal do Rosário Campos
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Brito de Moura
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Caio Roque
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo
Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António d'Orey Capucho
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Armindo Telmo Antunes Ferreira
Artur Ryder Torres Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Parente Antunes
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
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Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Francisco Baptista Tavares
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Jaime Carlos Marta Soares
João Bosco Soares Mota Amaral
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José da Silva Maçãs
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Natália Guterres Viegas C. da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Nuno Miguel Sancho Cruz Ramos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Manuel Cruz Roseta
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
Alexandrino Augusto Saldanha
Ana Margarida Lopes Botelho
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas
Partido Popular (CDS-PP):
António José Carlos Pinho
António Manuel Alves Pereira
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Mota Soares
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raul Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro
Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
Maria Helena Augusto das Neves Gorjão
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ler o expediente.
O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram aceites, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 352/VIII - Intervenção de forças militares portuguesas no estrangeiro (PSD), que baixou à 3.ª Comissão, e 353/VIII - Criação de um observatório nacional dos efeitos das alterações climáticas (PS), que baixou à 4.ª Comissão, e o projecto de resolução n.º 101/VIII - Sobre política de transportes colectivos, particularmente um novo regime de passes sociais (PSD).
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, vamos passar à ordem do dia, dando início a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 98/VIII - Criação do Dia Nacional sem Carro.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lembram-se, por certo, todos os Srs. Deputados que, no dia 22 de Setembro do ano passado, todos os olhares se concentravam sobre algumas cidades do País, as quais, aderindo a uma campanha europeia do dia sem carro, limitavam a circulação do automóvel individual nos centros urbanos.
Este projecto de lei, hoje em discussão, não surgiu na sequência dessa campanha europeia, uma vez que já tinha sido apresentado antes disso. Contudo essa campanha, restrita a apenas um dia, veio reforçar a convicção de Os Verdes sobre a utilidade da instituição de um dia sem carro, mas a acontecer todos os anos numa determinada data.
É que, na verdade, com a experiência havida, foi possível notar que, nesse dia, houve uma reflexão alargada sobre a qualidade de vida nas cidades e a implicação do uso, até à exaustão, do transporte individual motorizado na degradação dessa qualidade de vida.
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Foi possível concluir que as cidades com menos carros seriam mais saudáveis, mais bonitas, menos cansativas e mais acolhedoras. E foi possível concluir também que para haver menos carros é preciso que os transportes colectivos se ofereçam em quantidade e com qualidade adequadas para se tornarem uma primeira opção dos cidadãos.
A iniciativa foi de tal modo positiva que, de acordo com um inquérito promovido ao nível europeu, 85% das pessoas inquiridas eram a favor da repetição da iniciativa e em 50% dos casos queriam que ela tivesse lugar uma vez por semana.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que Os Verdes pretendem com este projecto é a instituição do Dia Nacional sem Carro, generalizado a todos os centros urbanos do País, a assinalar todos os anos num determinado dia.
E porque já houve um dia sem carro, ao abrigo da campanha europeia referida, o qual teve lugar no dia 22 de Setembro de 2000, e sendo que poucas, mas algumas cidades portuguesas aderiram a essa iniciativa no ano passado, faria todo o sentido que passasse todos os anos a ter lugar nessa mesma data, isto é, 22 de Setembro, pressupondo esta opção a alteração do artigo 1º do projecto de lei explicando mesmo a razão de escolha desse dia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, os objectivos deste projecto de lei são fundamentalmente os seguintes: chamar a atenção do Governo para a necessidade de investimentos nos transportes públicos; sensibilizar as autarquias para a necessidade de promoção de formas de mobilidade menos poluentes; divulgar as vantagens para a saúde pública e para o ambiente decorrentes do uso individual do automóvel, contribuindo para menos poluição atmosférica, para menor índice de ruído e menos stress, sensibilizar os cidadãos em geral para as graves consequências da poluição atmosférica ao nível da saúde humana e do ambiente, estimulando a participação individual de cada um com a utilização do transporte colectivo ou alternativo.
Mas um dia simbólico desta natureza tem outras vantagens, como a de testar anualmente a consequência das políticas adoptadas e testar as respostas que constituem, em cada momento, as diversas formas de mobilidade alternativas ao carro e também a procura e a resposta dos cidadãos, respectivamente, a essas modalidades de transporte e às políticas prosseguidas.
E porque temos consciência que as pessoas só aderem por opção ao transporte colectivo ou alternativo se virem vantagem nisso, se for acessível a todos, e porque hoje os transportes dessa natureza não dão resposta nem ao nível da quantidade, nem da qualidade, Os Verdes propõem que no dia sem carros haja isenção do título de transporte.
Procurámos, ainda, que toda a sociedade se envolvesse neste dia simbólico, dando, inclusivamente, possibilidade de iniciativa das comemorações às organizações não governamentais, com o apoio dos poderes públicos.
Este projecto de lei abrange todas as cidades do País e prevê a implementação de consequentes medidas de incentivo e de apoio para fomento, em larga escala, dos transportes colectivos nesse dia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, a necessidade de adopção de políticas sérias e eficazes para promoção dos transportes colectivos e alternativos às escalas nacional, regional e local e a consequente diminuição da circulação automóvel é tanto mais premente quanto preocupantes são as realidades em que cada vez mais nos afunilamos.
O transporte rodoviário é uma das principais causas de emissões de CO2, o principal gás de entre os seis que provocam efeito de estufa e que contribuem para o aquecimento global do Planeta. Depois do protocolo de Quioto, no seio da União Europeia, Portugal comprometeu-se a ter como limite o aumento de 40% de emissões de CO2 até 2010, tendo como valores de referência os de 1990.
Na perspectiva de Os Verdes este foi um negócio muito mau em termos de restrição dos níveis de poluição, dado que enquanto se acordava a diminuição de emissões, Portugal queria era aumentá-las. Mas não é dessa discussão que agora se trata. O certo é que o relatório da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa torna claro que se não forem tomadas medidas positivas para a diminuição de emissões de CO2, entre as quais se inclui, em grande medida, políticas de fomento ao transporte colectivo e o desincentivo do carro individual, ultrapassaremos muito o nosso compromisso e atingiremos, em 2010, quase 70% de aumento de CO2, o que é muito preocupante.
As cidades estão cada vez mais saturadas. É sabido que os automóveis ocupam demasiado espaço dentro dos centros urbanos, que, também em termos de ordenamento e de impacte visual, as cidades e as pessoas ficariam a ganhar com menos carros a obstruir passagens de peões ou a esconder passeios e passadeiras, a provocar a lentidão do tráfego, ou até a deixar receosa qualquer pessoa que se aventure a utilizar uma bicicleta numa cidade.
A nuvem de fumo que paira sobre os grandes centros urbanos é cada vez mais densa, e as cidades com menos carros, para além de menos poluição atmosférica, seriam ainda brindadas com menores índices de ruído, pelo que a saúde humana tudo teria a ganhar com isso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Dia Nacional sem Carro é uma excelente oportunidade para que de uma forma maciça se experimentem formas diferentes de transporte dentro das cidades e para as cidades, com abdicação, em grande número, do automóvel individual.
É uma oportunidade excelente para que quem tem competências de decisão e de acção nas políticas de transportes e das cidades perceba as medidas que urge tomar para retomar qualidade de vida nos grandes centros urbanos, promovendo novas formas de viver com bem-estar e promovendo a saúde humana, evitando níveis de poluição e de saturação levados muitas vezes ao extremo do que já não é tolerável.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.
A Sr.ª Maria Santos (PS): - Sr. Presidente, caros colegas: Muitas têm sido as iniciativas realizadas em vários países da Europa na década de 90, visando sensibilizar os cidadãos para uma mobilidade urbana mais consentânea com as exigências ambientais.
Ainda há relativamente pouco tempo, em 1998, por decisão do Ministério do Ordenamento do Território e do Ambiente, de França, foi lançada uma campanha «Na cidade sem o meu carro», cujos efeitos foram de tal modo positivos que, no ano seguinte, se estendeu a outros países, envolvendo 156 cidades de França, de Itália e da Suíça.
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Mais uma vez, o seu resultado foi bastante favorável, vindo a abranger cerca de 22 milhões de pessoas. Destas, 80% manifestaram-se, imediatamente, a favor da sua continuidade.
De facto, constatou-se que estes eventos não só granjearam inúmeros adeptos, como tais acções eram condizentes com as prioridades da União Europeia quanto a transportes urbanos e a uma política de sustentabilidade para as cidades.
Daí que, em 2000, a Comissária do Ambiente da União Europeia e os Ministros do Ambiente de Portugal, de França e de Itália, tenham lançado a campanha «O dia europeu sem carro», enquadrado pelo Programa Life-Ambiente.
Esta iniciativa, que decorreu no dia 22 de Setembro, visou alertar os eleitos locais e os cidadãos em geral, nomeadamente, para a urgência de novas atitudes «compatíveis com uma melhoria da mobilidade urbana e com a protecção do ambiente», bem como para a «redescoberta da cidade, dos seus habitantes e do seu património».
Das suas conclusões, podem destacar-se a troca de informações entre as comunidades locais e as diversas entidades envolvidas, designadamente quanto a diferentes meios de transporte e a novos planos de circulação, bem como sobre a partilha de experiências alusivas a melhores práticas no domínio da mobilidade sustentável.
Por outro lado a efectivação de uma sondagem em seis cidades europeias (Lille, Turim, Hamburgo, Copenhaga, Barcelona e Helsínquia), permitiu concluir que a maioria das pessoas apreciou esta intervenção.
Apurou-se também que esta comemoração, uma vez por ano, é insuficiente para reduzir o ruído, melhorar a qualidade do ar, conter a poluição ou alterar significativamente os comportamentos citadinos.
Daí que o fomento do diálogo entre cidades se tenha revelado fundamental, para fortalecer e alargar futuras campanhas, transformando uma efémera actividade, numa mais consistente reflexão e actuação que ajude a corporizar uma verdadeira política urbana sustentável.
Jornadas como estas, ao representarem um importante instrumento de «pedagogização» podem, igualmente, dinamizar a nossa cultura ambiental. Tanto mais que nas sociedades ocidentais impera aquilo a que hoje, de uma maneira geral, se chama o «espírito automóvel».
Assim, um dos maiores desafios que se nos colocam neste tipo de campanhas, onde a participação voluntária é crucial, é precisamente o de estimular o aparecimento de alternativas à utilização maciça do automóvel.
Isto é, medidas que, permitindo embora o pleno exercício do direito individual de escolha, reorientem e racionalizem o uso dos transportes públicos, sem esquecer a introdução dos chamados «veículos amigos do ambiente».
É neste tipo de intervenção que poderá residir muito do potencial sucesso das avaliações técnicas e das opções políticas susceptíveis de inverter o actual nível de pressão sobre o ambiente, trazendo vantagens significativas à vida das populações.
Evidentemente que actividades como estas não se substituem às medidas de fundo de âmbito comunitário, sejam as que dizem respeito às alterações climáticas ou a outras políticas de maior fôlego que constituem, aliás, o «pano de fundo» de dias emblemáticos, como o agora festejado «Dia Europeu sem Carro».
A utilidade destas iniciativas não se fazem sentir a curto prazo, precisando de um período razoável de implementação e de adesão nacional, se se quiserem eficazes e perenes.
No actual contexto, a eventualidade da institucionalização imediata de um dia obrigatório seria, quanto a nós, precipitada e contraditória, tendo em conta as premissas anteriormente mencionadas, com realce para o sucesso já obtido.
Esta medida viria a constituir um lamentável retrocesso político, pois fragilizaria a crescente participação social, levaria a uma quebra da actual confiança e criaria condições adversas para uma maior implantação das políticas ambientais.
Muitas das cativantes manifestações de entusiasmo, autenticidade e criatividade que lhes estiveram associadas, seriam, aliás, transformadas em meras formalidades burocráticas forçadas, e poderia semear-se um campo propício a um indesejável autoritarismo.
Por isso, uma decisão oficial, impondo um dia nacional sem carros, não seria consentânea com o renovado fluir de acções de sensibilização, entre as quais se inclui a necessidade de debater a alteração de comportamentos, dadas as novas exigências de mobilidade urbana e a correspondente utilização dos veículos particulares.
Presentemente, torna-se ainda urgente federar vontades e alargar a mais municípios esta temática. Depois, a seu tempo, se estabelecerá alguma obrigação, se for caso disso!
Vozes do PS: - Muito bem!
A Oradora: - O mérito da iniciativa do Dia Europeu sem Carro, promovida pelo Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, que envolveu os Municípios de Aveiro, Beja, Évora, Leiria, Lisboa, Porto e Sintra, é, neste momento, genericamente, reconhecido.
O balanço do dia 22 de Setembro de 2000, variando em alguns aspectos de localidade para localidade, foi globalmente positivo. Os cidadãos envolvidos testemunharam a melhoria da qualidade de vida no centro urbano, sobretudo, no que toca ao ruído, à segurança e à convivialidade.
Note-se que, em todas as localidades, os níveis de tráfego, fora dos perímetros, foram significativamente inferiores aos dos dias normais, registando-se uma menor incidência de acidentes rodoviários.
Mesmo em cidades consideradas como menos «cicláveis», devido ao seu relevo, as bicicletas constituíram uma das mais agradáveis surpresas desse dia.
Em todas as localidades foram realizadas actividades de promoção de veículos utilizando energias menos poluentes. A partir do inquérito realizado aos peões, verificou-se que estes tinham recorrido ao automóvel particular menos 24,9%; tinham utilizado o transporte colectivo mais 13,3%; tinham caminhado mais 9,8%; tinham utilizado a bicicleta mais 1,7% do que normalmente, enquanto os níveis de qualidade do ar variaram um pouco em relação aos outros dias, sendo que, em algumas situações localizadas, certos parâmetros sofreram ligeiros aumentos.
Globalmente, dentro das áreas restritas, os parâmetros mais importantes (óxido de azoto e monóxido de carbono) baixaram cerca de 10,%.
Acresce que, em termos gerais, a redução do ruído foi muito sensível dentro das áreas reservadas: 30% dos níveis de pressão sonora. Este aspecto foi mesmo assinalado pelos peões, como um dos elementos mais marcantes do dia.
Os únicos parceiros que apresentaram uma avaliação negativa do dia sem carros foram, em algumas, cidades, os
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comerciantes, argumentando terem tido níveis mais baixos de vendas. Lisboa e Porto apresentaram-se como cidades mais vazias do que o habitual, tendo-se identificado um pequeno número de casos em que empresas comerciais ou de serviços optaram por fechar as suas portas. Contudo, nas localidades de menor dimensão este problema não se colocou.
Em Lisboa, um número não quantificável de pessoas optou por tirar um dia de férias antecipando o fim-de-semana, o que não retira mérito à iniciativa. No entanto, tenhamos presente que nenhuma função urbana, serviço público ou empresa de dimensão apreciável, deixou de laborar.
Sr. Presidente, permito-me agora, muito sucintamente, assinalar algumas medidas ou propostas que já constituem avanços ambientais: adopção de um dia por mês sem carros no centro histórico de Sintra; projectos para a aquisição de autocarros não poluentes, que estão a ser implementados por empresas de transportes colectivos municipais de Aveiro, Barreiro, Braga, Coimbra e Portalegre); proposta de criação de uma terceira via no IC19 para transportes públicos e viaturas com 3 ou mais passageiros; criação de duas novas carreiras para servir o perímetro urbano de Braga; apoio a estudos, tendo em vista a introdução de autocarros com propulsão a pi1ha de combustível, um recurso que faz libertar água, em vez de gases poluentes e que deverão ser postos a circular no Porto e em Lisboa, em 2003; a aquisição de autocarros a gás natural para a Carris e Serviços de Transportes Colectivos do Porto; a introdução do bilhete único Carris/Metro; a criação de ciclovias em várias cidades, com destaque para o protocolo estabelecido entre a Câmara Municipal de Lisboa e a Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta;
Sr. Presidente, caros colegas: A iniciativa «Na cidade sem o meu carro», que em tão boa hora foi desencadeada pelo Governo, será, seguramente, consolidada, ampliada e, futuramente, centrada nas autarquias e no dinamismo que as ONG também lhe souberem imprimir.
O Grupo Socialista acredita firmemente nas potencialidades e virtualidades de uma acção de cidadania, que não precisa de se escudar na obrigatoriedade da lei para se afirmar pujante, promissora e plenamente integrada no pulsar da urbe.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lucília Ferra.
A Sr.ª Lucília Ferra (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Com a presente iniciativa legislativa, pretende o Grupo Parlamentar de Os Verdes instituir o Dia Nacional sem Carro, propondo para o efeito a data de 25 de Setembro.
Considerando os riscos para a saúde pública decorrentes da poluição atmosférica produzida pela circulação automóvel, bem como os prejuízos causados ao ambiente e ao meio natural, mormente o efeito estufa e o consequente aquecimento global do Planeta, pretendem os signatários do projecto em apreciação, alertar o Governo para a necessidade de investir nos transportes públicos e apostar na efectiva articulação entre operadores, criando uma rede eficiente, cómoda, segura e capaz de satisfazer cabalmente as necessidades das populações.
Nesta linha de preocupações, o artigo 2.º do projecto lei em análise enuncia os objectivos a alcançar, nomeadamente: alertar os poderes públicos para a necessidade de investir nos transportes públicos; sensibilizar as autarquias locais para a necessidade de promover formas de mobilidade menos poluentes; sensibilizar a opinião publica nacional, especialmente os cidadãos das áreas urbanas, para a problemática da poluição atmosférica e respectivas consequências ao nive1 do ambiente; divulgar as vantagens para o ambiente e saúde pública decorrentes da utilização de transportes públicos em alternativa ao uso de transporte individual; estimular a progressiva utilização de transportes colectivos e alternativos, como a bicicleta, em detrimento do uso do transporte individual; divulgar a importância da participação individual dos cidadãos na defesa do ambiente.
O diploma em análise determina ainda que a organização das comemorações fique a cargo de organizações não governamentais, auxiliadas por entidades públicas e privadas, através da disponibilização de meios materiais e logísticos.
Pretendem igualmente os signatários da iniciativa legislativa, a isenção do título de transporte nos transportes colectivos dentro das cidades, no Dia Nacional sem Carro, criando o Governo, para o efeito, formas de compensar os respectivos operadores de transporte.
O artigo 5.º da iniciativa legislativa dispõe sobre restrições à circulação, cabendo às autarquias locais um papel regulamentador e orientador do trânsito.
Não obstante o interesse de alguns propósitos enunciados na medida legislativa, cujas preocupações partilhamos, entendemos ser fundamental reforçar a ideia de que a mera institucionalização de um dia sem carro, longe de resolver os problemas que se colocam às sociedades modernas e relativamente aos quais urge encontrar respostas eficazes, pode ajudar a esconder o laxismo governamental.
O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Mais, entendemos que esta iniciativa é susceptível de ser interpretada como manifestação de oposição à utilização do transporte individual, perspectiva que de todo não partilhamos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - Somos sim, efectivamente, favoráveis à promoção e implantação do transporte colectivo como verdadeira alternativa.
Assim, o Dia Nacional sem Carro deveria, em nossa opinião, dar lugar ao Dia Nacional dos Transportes Colectivos.
Vozes do PSD: - Muito bem!
A Oradora: - Conhecendo nós o Governo socialista como bem conhecemos, com a sua demonstrada incapacidade de agir e inércia em reformar, somos levados a crer que a aprovação deste projecto conduziria a que tudo ficasse rigorosamente na mesma.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Também é verdade!
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A Oradora: - O Governo aproveitar-se-ia da iniciativa legislativa para fazer crer que o problema da ineficácia e inexistência de transportes colectivos ficava resolvido com a mera comemoração nacional do evento.
O Sr. António Capucho (PSD): - Não queriam mais nada!
A Oradora: - Ora o PSD pretende encontrar soluções apropriadas ao dia-a-dia dos Portugueses e ao desenvolvimento equilibrado do País e não vender sonhos ou ilusões que podem apenas servir para adiar as reformas a implementar.
Nesse sentido, apresentámos, em 1990, a Lei de Bases do Sistema de Transportes Terrestres, diploma que previa a elaboração de planos de transportes articulados com os planos de urbanização e de ordenamento do território e a instituição de comissões metropolitanas de transportes.
Os governos do PSD planearam e executaram projectos estruturantes, nomeadamente a gare do Oriente, obra que integra os conceitos de verdadeiro interface e de intermodalidade. Porém, decorridos cinco anos de exercício do poder socialista, tardam novas soluções e a esperança, essa, vai desaparecendo.
O Governo prometeu, no seu programa eleitoral: «(…) melhorar significativamente a oferta de transportes públicos urbanos e suburbanos de modo a assegurar uma alternativa competitiva que diminua a dependência do transporte individual (…)». Todavia, dura e implacavelmente, a realidade é outra.
A procura de transportes colectivos urbanos pelos cidadãos tem vindo a diminuir preocupantemente, dado aqueles estarem cada vez mais desajustados da realidade e cada vez menos servirem os interesses das populações.
Isto porque, em abono da verdade, o Partido Socialista fecha os olhos à evidência e pouco ou nada faz em prol de uma política consistente de transportes públicos.
O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!
A Oradora: - De facto, assistimos apenas e tão-só ao anúncio pomposo, como é apanágio do Sr. Ministro do Equipamento, que muito aprecia a pompa e circunstância, de que havia já criado, por decreto-lei de Setembro de 2000, as comissões metropolitanas de transportes de Lisboa e Porto, prevista na Lei de Bases. Assim pretendeu o Governo mostrar empenho e trabalho, exibindo com orgulho a sua obra - um decreto-lei!
Porém, além da publicitação, em Plenário, do referido decreto-lei, pouco ou nada mais existe ou se vislumbra na governação socialista.
Bem sabemos que o Governo é lento a pensar e mais lento ainda a actuar - isto a avaliar pelas prioridades do Sr. Primeiro-Ministro, que são, de momento e a saber, «ir para a estrada», na preparação da sua reeleição para secretário-geral do partido.
Contudo, o País e os portugueses não podem continuar à espera que o Sr. Primeiro-Ministro resolva os problemas internos do PS para só depois, quando encontrar tempo e disposição, se dedicar ao governo da nação.
Hoje, cada vez mais, milhares de pessoas, sobretudo nas áreas metropolitanas, são obrigadas a deslocar-se das suas residências para o trabalho, levando para o efeito horas infindáveis em congestionamentos de trânsito, sem que tenham acesso a uma verdadeira rede de transportes, economicamente acessíveis, seguros, cómodos, atractivos e adequados às necessidades de mobilidade.
Se, por um lado, se afigura urgente repensar o conceito de cidade, criar condições, nomeadamente através da descentralização de serviços e da captação de investimento para as chamadas «zonas suburbanas» e possibilitar às pessoas viver e trabalhar na sua terra, é fundamental definir e concretizar uma política eficaz para o sector dos transportes.
E iniludível que a política de ocupação do solo e ordenamento do território, associada ao crescimento demográfico e ao alargamento das zonas suburbanas, tem conduzido ao aumento da mobilidade. Consequentemente, a ausência de transportes colectivos apelativos tem levado a que os cidadãos recorram cada vez mais ao transporte individual, sendo conhecidos os inconvenientes e riscos de tal opção, quer ao nível da sustentabilidade (poluição atmosférica e sonora), quer ao nível da qualidade de vida urbana (congestionamentos e restrições do espaço púbico para lazer).
Conscientes de que é preciso arrepiar caminho e inverter esta tendência, apresentámos já um projecto de resolução que estipula um prazo de 60 dias para o Governo apresentar publicamente uma estratégia para os transportes colectivos que favoreça a utilização dos transportes públicos, assegure o aumento da intermodalidade e promova a qualidade de vida das populações.
Este projecto de resolução destina-se a sensibilizar o Governo e a obrigá-lo a fazer aquilo a que permanentemente se furta: governar, agir e reformar. Trata-se de um contributo que não esgota nem o nosso interesse nem a nossa vontade de modificar a situação existente. Porém, como compreenderão, por enquanto - mas apenas por enquanto - não nos cabe a nós governar.
Isto porque, para os portugueses, já não restam dúvidas de que a verdadeira alternativa ao descalabro da governação socialista está no Partido Social Democrata!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, assistem hoje aos nossos trabalhos um grupo de 40 alunos da Escola Profissional de Setúbal e um grupo de 104 alunos da Escola Básica dos 2.º e 3.º Ciclos Pedro Eanes Lobato, da Amora.
Peço, para eles, o nosso cumprimento habitual.
Aplausos gerais, de pé.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como seria o mundo sem filas de automóveis, de manhã, para entrar nas grandes cidades (ou nas pequenas, porque isso também já vai acontecendo)? Um mundo em que as pessoas andassem de transporte colectivo ou circulassem a pé ou de bicicleta dentro das cidades? Um mundo em que as pessoas não chegassem com muito stress ao seu local de trabalho? Um mundo onde não existisse poluição atmosférica que provocasse quebras de ambiente ou de saúde pública, que não aumentasse a percentagem de CO2 na atmosfera provocando um efeito de estufa, que não agredisse a camada de ozono? Seria um mundo completamente diferente do nosso.
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Ao imaginar este mundo, lembro-me de um verso do nosso poema nacional, Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões: «Se não podemos experimentá-lo, só nos resta imaginá-lo». Portanto, temos de imaginar um mundo assim.
Acontece que, para além de o imaginar, há pessoas que o querem experimentar. Só que, para o experimentarem, têm de prejudicar, e muito, a vida das pessoas, porque as pessoas não têm alternativa, ou seja, tal como o mundo e a vida lhes são oferecidos, as pessoas precisam do seu automóvel. Como tal, trata-se de um exercício de algum lirismo, mas que exige uma imposição com o seu grau de violência.
A iniciativa europeia do Dia Europeu sem Carro é a vários títulos louvável porque não obriga ninguém, depende da vontade das cidades de se organizarem para fazerem um dia deste tipo, tentando, evidentemente, não prejudicar muito as pessoas. Aliás, algumas cidades praticam este dia dando às pessoas a possibilidade de escolherem. Em todo o caso, as cidades não são obrigadas, e muito menos o são os países. Em Portugal, o Governo organizou a nossa participação no Dia Europeu sem Carro, que incluiu seis cidades.
Era necessário que alguém chamasse a atenção, que tivesse uma posição crítica e contrária à autorização demasiado fácil, facilitista, laxista e até demagógica para iniciativas desta natureza, nomeadamente quando partem do uso de competências de um Governo que pouco ou nada faz para modificar a situação, refugiando-se atrás de uma atitude meramente propagandística que consistiu em utilizar esse dia para dizer que estava do lado de um mundo perfeito para o qual nada faz.
Foi isso que o nosso partido fez e foi, aliás, por isso que o nosso presidente foi criticado e acusado de múltiplas malfeitorias, dizendo-se que estava a fazer uma utilização oportunista das dificuldades que iriam ocorrer, que a crítica era fácil, mas era algo que não se deveria fazer. É certo que essa posição era necessária, uma aproximação progressiva das posições do Dr. Paulo Portas, o que, aliás, é de bom augúrio, nomeadamente para as eleições autárquicas para a Câmara Municipal de Lisboa.
À partida, este projecto parece querer fazer a nacionalização da iniciativa europeia. Isso terá até um cariz patriótico e, nesse sentido, até veríamos uma feição simpática nesta iniciativa. Mas debrucemo-nos mais em detalhe sobre a mesma.
Quais são os objectivos desta iniciativa? Estão divulgados, estão escritos no próprio projecto de lei. São os seguintes: chamar a atenção, sensibilizar as autarquias, sensibilizar a opinião pública, divulgar e difundir, estimular, divulgar a importância.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que estes objectivos já estão cumpridos com a realização deste debate. Agora, não é preciso prejudicar a vida das pessoas para os cumprir! Já chega, ficámos com estes objectivos cumpridos!
É certo que este projecto tem também alguns aspectos menos criticáveis. Por exemplo, a circulação não é impedida a todos os automóveis nem em todas zonas. Assim, se as pessoas quiserem mesmo ir de automóvel, desde que arranjem mais dois passageiros, já o podem fazer. Mas, em todo o caso, é um transtorno para a vida das pessoas.
Tem alguns aspectos negativos, como seja o facto de abranger todas as cidades. Pois se a maior cidade e mais bem equipada para resolver os seus problemas, que é Lisboa, causou às pessoas o transtorno que se viu, o que será em todas as cidades que, em média e em geral, não têm a mínima preparação para atender a um pedido desta natureza feito pelos poderes públicos!?
Considero, pois, que, estando cumpridos os objectivos enunciados no próprio projecto de lei e sendo necessária a continuação de uma posição crítica, o CDS-PP não tomará outra atitude que não seja a da continuação da que já tomou e não viabilizará este projecto. Aliás, estou convencido de que o Governo ficará contente com este apoio implícito, e até explícito, à sua iniciativa por parte do Partido Ecologista Os Verdes, o qual verá no partido que apoia o Executivo, o Partido Socialista, uma atitude favorável. Assim, este projecto avançará e nós teremos ocasião, mais tarde, de continuar a nossa atitude de crítica.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias.
O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, nem de propósito, no dia de discussão do projecto de lei de criação do Dia Nacional sem Carro, tive alguns problemas ao chegar à Assembleia…!
Risos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A criação do Dia Nacional sem Carro, proposto pelo Partido Ecologista Os Verdes, terá o voto favorável do PCP. O nosso apoio provém, desde logo, do facto de uma iniciativa desta natureza constituir uma afirmação da posição de princípio de que as melhorias das acessibilidades, da mobilidade e da qualidade ambiental, indissociáveis da melhoria da qualidade de vida das pessoas, passa também por uma alternativa à política de transportes que este Governo vem prosseguindo.
Na situação actual, a utilização do automóvel não é, como por vezes se pretende fazer crer, uma opção individual, antes resultando de uma imposição por falta de alternativas eficazes, mesmo nas deslocações pendulares casa/trabalho ou escola/trabalho.
No nosso país continuam a ser encerradas estações de caminho-de-ferro e desactivadas linhas de comboio com o argumento da rentabilidade. Depois de anos e anos sem investimento na modernização da via e do material circulante, conclui-se, então, que o número de passageiros tem vindo a reduzir, como se pudesse ser aceitável outro cenário. A linha passa a dar prejuízo e deixa de se justificar, tanto mais que não é aceitável que todo o País subsidie determinada carreira de comboios, ou outra qualquer, mas justifica, e justifica-se, a construção de auto-estradas com portagens virtuais, essas, sim, rentáveis para as empresas exploradoras! A política que este Governo prossegue é ou não a do império do automóvel?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O recurso automóvel individual não só não resolve os problemas da mobilidade como antes os agrava. Nas áreas metropolitanas, são as intermináveis filas com prolongadas esperas; nos centros das cidades, é o caos no estacionamento e o ambiente insuportável. Os gases que contribuem para o efeito de estufa não cessam de aumentar no nosso país e, entre estes gases, a percentagem dos provenientes dos escapes dos automóveis é cada vez maior.
De acordo com recentes estudos da Universidade Nova, Portugal ultrapassará os níveis a que se tinha comprometido com a assinatura do Protocolo de Quioto. Entretanto,
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não é conhecida uma única medida do Governo para travar este aumento de emissões.
O Dia Nacional sem Carro terá os objectivos de sensibilização da opinião pública e também dos poderes públicos, factor essencial para a concretização de uma mudança da política de transportes. Naturalmente, em sede de especialidade, procuraremos introduzir algumas alterações a este projecto, até para que não se venha dizer que, em vez de uma posição assumida, será uma imposição e uma chatice ou um grave problema para quem não tem outra alternativa nas suas deslocações pendulares.
Mas o essencial do Dia Nacional sem Carro não é o show-off ou o aproveitamento momentâneo que, por vezes, algumas entidades pretendem fazer. O essencial do Dia Nacional sem Carro, o que deve resultar do esforço da sua mobilização e preparação é a tomada de medidas políticas no sentido de encontrar verdadeiras alternativas para os diferentes tipos de transporte e para as diferentes necessidades de mobilidade das populações. Na análise que fizemos, neste Plenário, da adesão de Portugal ao Dia Europeu sem Carro já manifestámos essa situação e a necessidade de serem tomadas medidas eficazes de promoção dos transportes públicos. Devo dizer aos Srs. Deputados que não concordam com esta iniciativa que não se trata de um ataque ao automóvel individual, trata-se de arranjar soluções para a mobilidade, para as acessibilidades que o automóvel não resolve, havendo outras possibilidades de resolver estes problemas, quer através de transportes públicos quer de transportes não poluentes.
Por isso, este projecto tem o nosso apoio e, em sede de especialidade, terá a nossa contribuição para, se possível, com o consentimento dos proponentes, ser melhorado.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A apreciação que tem sido feita deste projecto de lei de Os Verdes é, no mínimo, surpreendente: o Partido Socialista inviabiliza-o porque o considera inconveniente; o PSD inviabiliza-o porque considera que ele cria um alibi para o Governo; o Sr. Deputado Manuel Queiró, em nome da bancada do Partido Popular, considerou que o Governo ficaria contente com este projecto, que inviabilizará pelas razões invocadas. E tanto pode a fé que até foi encontrar nesta argumentação uma aproximação entre o PSD e o Sr. Deputado Paulo Portas. Tudo é possível no exercício da liberdade de opinião, mas o certo é que, por razões exactamente contrárias, exactamente contraditórias, exactamente opostas, os votos cruzam-se, sendo todos negativos.
No entanto, este projecto de lei merece uma apreciação cuidada, não só porque os problemas que coloca são problemas com os quais teremos de viver e que teremos de tentar resolver, e o voto negativo é a forma mais simples de nos abstermos desta reflexão, e até da sua convocação, mas, sobretudo, porque, no seu concreto, ela deixa uma margem de manobra, que é sugerida pela própria experiência do dia sem carro que tivemos em Setembro.
É certo que há soluções práticas desta proposta que suscitam dúvidas. E referirei duas: a primeira é o facto de as comemorações serem da iniciativa das organizações não governamentais. Sem prejuízo da participação destas, parece-me que a responsabilidade predominante deve ser necessariamente de entidades públicas. Manifesto também alguma reserva em relação ao artigo 4.º, no sentido de a compensação ser feita através de benefícios fiscais, e não através de outra forma.
Mas o essencial que esta proposta propõe é uma reflexão e uma primeira medida sobre o impasse que temos em termos de política de transportes e de cidade e, desse ponto de vista, ela merece todo o apoio. Ela define - o que foi dito, e que, aliás, era suficiente para que fosse votada favoravelmente - uma margem de actuação dos próprios municípios na definição das áreas de intervenção que lhes deixa toda a latitude para tomarem a sua responsabilidade. Também se estabelece que automóveis particulares com mais de duas pessoas poderão atravessar essas áreas de intervenção.
O problema que se coloca é basicamente o seguinte: a não se modificarem os comportamentos das famílias e a aproximar-se o grau de motorização da sociedade portuguesa de outras sociedades desenvolvidas europeias, como a alemã, a proposta que Os Verdes apresentam para o dia sem carros terá brevemente de ser tratada num âmbito totalmente distinto. Tal como outras cidades europeias já fazem, a restrição do atravessamento por transportes privados terá de ser estendido no projecto de lei (que propõe um dia) para todos os dias do ano. Tenhamos nós o grau de motorização da Alemanha e estejamos certos de que a baixa de Coimbra, do Porto ou de Lisboa terão de ser zonas de intervenção exclusivas para os transportes públicos em todos os dias úteis do ano e não somente num dia sem carros.
Portanto, a manter-se a situação actual, estas serão as opções que um dia teremos de encarar, e mais vale que as discutamos em sede própria, tomando-se iniciativas legislativas para desenvolver os transportes colectivos e, portanto, a capacidade de opção de todos os cidadãos nas nossas cidades. Assim seja, pois, viabilizada esta proposta para que, a partir dela, possa o Governo ser confrontado com a responsabilidade que a Assembleia assume sobre esta mudança essencial na política de transportes.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.
O Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Rui Gonçalves): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não posso começar a minha intervenção sem deixar de fazer referência ao facto de ter planeado chamar a atenção desta Câmara para um pouco de falta de imaginação de Os Verdes ao apresentarem este projecto de lei…
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Ai o ciúme!
O Orador: - …, ao quererem institucionalizar uma acção que já existe na prática e que tão bons frutos deu. Mas, depois, pensei que talvez não fosse uma boa ideia porque o PSD descobriu, na proposta de Os Verdes, um inescapável apoio ao Governo para este se eximir às suas responsabilidades. Ora, como os Srs. Deputados bem sabem, o que o Governo não faz é fugir às suas responsabilidades, estando aqui hoje, mais uma vez, para demonstrar que as medidas que têm vindo a ser tomadas nos últimos
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anos inverteram uma situação de facto preocupante relativamente à promoção dos transportes públicos.
Parece-me que, antes de falar sobre o dia sem carros, importa referir que a tendência que existia no princípio dos anos 90, e que se acentuou até 1995, de diminuição da procura dos transportes públicos já não se verifica. E posso dar-vos dois números significativos: a CP transportou, em 1995, 924 milhões de passageiros, mas, em 1999, já transportou 965 milhões; por outro lado, em Lisboa, os transportes públicos tinham, em 1991, 1,1 milhões de passageiros, em 1995 tinham 924 000 passageiros e, em 1999, recuperaram para 965 milhões de passageiros. Ou seja, no tempo do Governo do Partido Socialista estancou-se a redução da procura dos transportes públicos, e em alguns deles de forma assinalável.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não podemos apenas falar genericamente sobre a inexistência de uma política para os transportes, sobre a diminuição da procura dos transportes públicos quando isso é claramente desmentido pelos números. Aliás, basta os Srs. Deputados utilizarem os transportes públicos da região de Lisboa, a CP, o metropolitano, os novos autocarros da Carris, para perceberem que, nestes últimos cinco anos, muito tem sido feito para melhorar a qualidade, a atractividade e a eficácia dos transportes públicos. De outra maneira não seria possível a recuperação da frequência dos transportes públicos.
Mas é importante assinalar um outro aspecto: não basta haver transportes públicos, é preciso que se criem condições de utilização dos mesmos, condições essas que têm de ser consagradas com o recurso a medidas voluntaristas, sendo que algumas delas passam por iniciativas como a do dia sem carros.
Portanto, o Governo vem aqui, de certa maneira, e apesar de tudo, aplaudir a iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes, porque este partido percebeu que o dia sem carros era uma grande iniciativa. O PCP e o PSD também perceberam, apenas o CDS-PP descobriu que havia um problema com o dia sem carros. Mas, como todos se recordarão, no próprio dia 22 de Setembro, o Dr. Paulo Portas teve uma grande dificuldade em explicar às pessoas porque é que estava contra o dia sem carros. É importante lembrar que o Dr. Paulo Portas disse que o dia sem carros ia ser uma catástrofe, …
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - É mentira!
O Orador: - … que em Lisboa não se poderia circular e que as pessoas não poderiam chegar aos hospitais. Depois, no fim do dia 22 de Setembro, a única coisa que conseguiu encontrar foi uma senhora que teve dificuldade em levar o filho ao colégio, nada mais do que isso - recordem-se da conferência de imprensa dada pelo Dr. Paulo Portas.
Recordemos, sejamos honestos, que o dia 22 de Setembro foi uma iniciativa que teve um sucesso completo em Portugal. Todas as sondagens feitas o demonstram, a nível nacional, regional e europeu. Portanto, o que está em causa é sabermos se vale a pena institucionalizar, de forma obrigatória, mecânica, este dia sem carros. Sou de opinião que não o devemos fazer, que não devemos ter um dia fixo, obrigatório, com regras pré-definidas para o dia sem carros. Penso que a iniciativa deve decorrer como decorreu a nível nacional, europeu, e até fora da Europa - gostaria de vos lembrar que países com dificuldades de mobilidade, como a Tailândia, a Colômbia e a Argentina, também já promoveram iniciativas no seguimento do Dia Europeu sem Carros. Aliás, recordo que, na Colômbia, em Bogotá, uma cidade conhecida pela sua pouca atractividade, o dia sem carros foi um sucesso completo, de tal maneira que - e digo isto a título de anedota, mas é verdade - os índices de criminalidade desceram naquele dia e nos dias seguintes.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Os gangs não puderam andar de carro!
O Orador: - Exactamente!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Estava tudo em casa!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, em resumo, o que é que é importante assinalar em relação a estas iniciativas? Temos de dar liberdade e oportunidade às autarquias e às forças sociais para optarem pela forma como o vão fazer, quando o vão fazer e as áreas a abranger.
Como sabem, no próximo dia 14 de Fevereiro, a vila de Sintra terá um dia sem carros. Outras vilas e cidades de Portugal já anunciaram iniciativas deste tipo nas mais variadas alturas, com os mais variados enquadramentos. Proponho à Câmara que, elogiando o dia sem carros, elogiando este tipo de iniciativas, não as tente fixar num só dia, com um só âmbito, e que continue a deixar à iniciativa das autarquias, do Governo e das forças da sociedade civil a forma de as organizar e o modelo da sua institucionalização.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Queiró, para o que dispõe de 29 segundos.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, o Dr. Paulo Portas não disse que a aplicação nacional do Dia Europeu sem Carro iria, necessariamente, ser uma catástrofe; disse que se as pessoas saissem seria uma catástrofe, caso contrário seria um dia sem carros e sem pessoas, e foi isso que aconteceu. E, depois do que aconteceu, a defesa que o Sr. Secretário de Estado fez da aplicação a Portugal do Dia Europeu sem Carro é a continuação de uma hipocrisia. É que dispomos de números que demonstram que, pura e simplesmente, o que aconteceu foi o decretar de um feriado nacional em Lisboa. É essa questão que o Sr. Secretário de Estado quer ultrapassar, invertendo o juízo da realidade que se impõe.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.
O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Queiró, no seguimento do Dia Europeu sem Carro e da polémica que se motivou sobre a adesão ou não das pessoas, foram pedidos números objectivos a várias entidades empregadoras. Mas também pedimos os valores de frequência de veículos nas pontes Vasco da Gama e 25 de Abril. Como todos os Srs. Deputados sabem, é através dessas duas pontes
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que as pessoas, quando vão para os seus fins-de-semana prolongados, maioritariamente se deslocam. Ora, gostaria de comunicar à Câmara que pedimos os números de quinta e sexta-feiras e os resultados foram os mesmos, com mais ou menos 500 carros em relação à quinta-feira anterior, tendo havido na sexta-feira uma redução acentuada do trânsito nessas duas pontes. Mais: não houve um único serviço público, uma única actividade económica que tivesse sido prejudicada no Dia Europeu sem Carro.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - As pessoas não vieram!
O Orador: - Com a devida vénia, peço, a esse respeito, para invocar o artigo de um conhecido articulista do Diário de Notícias, muito próximo do PSD, que escreveu a dizer que veio a Lisboa e que conseguiu fazer tudo aquilo que se tinha proposto fazer, tendo ficado muito surpreendido com isso.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Com certeza! Não havia ninguém!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Foi o único!
O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, penso que os números falam por si. E mais importante que as impressões são os números!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia. Para além do tempo que tinha ainda dispõe de tempo cedido pelo PCP:
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostava apenas de fazer alguns comentários relativos a afirmações que aqui foram feitas por diversos Srs. Deputados.
Começando pelo Sr. Deputado Manuel Queiró, direi que, na nossa perspectiva, o grande transtorno para a vida das pessoas é aquele que acontece, actualmente, todos os dias.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - Exactamente!
A Oradora: - O infindável trânsito, as longas filas de espera, a tremenda poluição atmosférica e os níveis de ruído bastante elevados provocados pela insustentável presença do automóvel nas cidades, tudo isso representa, sim, transtorno diário para a vida das pessoas.
O Sr. Manuel Queiró (CDS-PP): - O Governo é que não faz nada!
A Oradora: - Por outro lado, desejo referir-lhe que este projecto não pretende, de todo, a nacionalização de uma iniciativa europeia, até porque, como o Sr. Deputado sabe, este projecto de lei apareceu antes da promoção desta iniciativa, apesar de estar a ser discutido nesta altura.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Retirou-lhe o único mérito que tinha!
A Oradora: - Este projecto de lei não vem, portanto, na sequência da iniciativa que decorreu, mas teve em conta um dos argumentos que hoje referi quando procedi à respectiva apresentação.
Por outro lado, relativamente a algumas afirmações feitas pela Sr.ª Deputada Lucília Ferra, deixei bem claro na minha intervenção que este projecto de lei não visa, obviamente, resolver problemas - a competência para a resolução destes problemas cabe a entidades específicas, nomeadamente ao Governo e às autarquias locais. Pretende, sim, que seja criado um dia simbólico, não para esconder, de todo, a ineficácia das políticas prosseguidas e o laxismo, nomeadamente do Governo, relativamente à promoção do transporte público e à redução da circulação automóvel nos grandes centros urbanos, mas sim, pelo contrário, para demonstrar precisamente a ineficácia dessas políticas prosseguidas.
Dando resposta ao receio da «pompa e circunstância» que a Sr.ª Deputada manifestou, não é por acaso que Os Verdes propõem que as comemorações deste dia fiquem a cargo das ONG, no sentido de lhes poder dar voz na reivindicação e na defesa de uma política de transportes públicos adequada às necessidades dos cidadãos, não no sentido de fazer um grande espectáculo neste dia sem carros, mas para que este dia possa passar a ser de grande reflexão nacional sobre as necessidades e sobre a problemática dos transportes públicos, com tudo o que daí decorre em termos de ambiente e de saúde humana.
Da parte do Partido Socialista, obviamente, e mais uma vez, só registo contradições! Diz que a iniciativa é excelente - tanto o Sr. Secretário de Estado como a Sr.ª Deputada Maria Santos a aplaudem -, mas repeti-la, nem pensar!
Protestos do PS.
Aliás, o Governo do Partido Socialista pretende fazer repetidamente destes dias o dia do «folclore»! Foi assim com o dia D, sobre as questões da droga e da toxicodependência, foi assim com o dia sem carro, em 22 de Setembro do ano 2000. Mas repetir essas experiências, nem pensar! Porquê, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo? Precisamente porque, nestes dias, o Governo também se sentiu incomodado nas reivindicações e nos protestos pela ineficácia das políticas que prossegue relativamente a estas matérias. O Governo gosta pouco de ser incomodado e sente que, tendo acontecido este dia, não voltará a repeti-lo.
Registo também que o Partido Socialista, segundo a Sr.ª Deputada Maria Santos, sente-se satisfeito com as medidas tomadas pelo Governo no que toca à promoção do transporte público e à redução do transporte individual. Aconselho-lhe apenas, Sr.ª Deputada, a leitura atenta do relatório da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa que determina que, se forem tomadas medidas adequadas e se prosseguir naquilo que tem acontecido em termos de ineficácia das políticas para a promoção dos transportes públicos, ultrapassaremos, em larga escala, aquilo a que nos comprometemos em termos de poluição no que se refere às emissões de CO2.
Srs. Deputados, penso que o chumbo deste projecto determinará a perda de uma oportunidade excelente para uma reflexão nacional anual sobre esta matéria.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.
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O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: - Sr. Presidente, uso da palavra só para esclarecer um equívoco da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
O Governo é favorável a que haja dias sem carros. O Governo é favorável a que as autoridades locais desenvolvam iniciativas neste âmbito.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Mas o Governo não as quer desenvolver!
O Orador: - Aliás, Sr.ª Deputada, gostava de lhe anunciar que já está a ser preparado pelo Governo, pelas autarquias e pelas forças vivas da sociedade o dia sem carros em 2001. Até é possível que este ano não haja um dia sem carros, pode acontecer que haja dois ou três dias seguidos, porque, como a Sr.ª Deputada sabe, o dia 22 de Setembro calha num sábado. Algumas autoridades locais já manifestaram o interesse de que esse dia tenha lugar não apenas ao sábado - há quem diga que fazer ao fim-de-semana é muito fácil -, mas durante todo o fim-de-semana. Inclusivamente, autoridades locais já disseram que o fariam a partir da sexta-feira.
É esta liberdade, esta variabilidade, esta opção das autoridades locais e das forças vivas da sociedade que têm de ser tidas em conta e que queremos manter de uma forma livre.
A Sr.ª Deputada disse - e consideramo-lo inconveniente - que as organizações não governamentais têm de organizar o dia sem carros. As ONG poderão, ou não, querer associar-se a estas iniciativas!
Gostaria de assinalar que, no ano passado, houve ONG que colaboraram na organização, houve outras que apenas observaram a iniciativa e houve ainda outras que criticaram a iniciativa. Vamos, portanto, deixar as ONG ter o seu papel social. Não compete ao Governo e à Assembleia dizer o que é que elas devem ou não fazer.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, o debate deste projecto de lei está encerrado. A sua votação terá lugar na próxima quinta-feira, à hora regimental.
Vamos, de seguida, proceder à discussão da proposta de resolução n.º 39/VIII - Aprova, para ratificação, o Protocolo que consolida a Convenção Internacional de Cooperação Para a Segurança da Navegação Aérea (EUROCONTROL), de 13 de Dezembro de 1960, na sequência de diversas modificações introduzidas, e adoptado em Conferência Diplomática reunida em Bruxelas em 27 de Junho de 1997, e respectivo Protocolo Adicional, referente à substituição do Acordo Multilateral relativo a taxas de rota, de 12 de Fevereiro de 1981, ratificado por Portugal, em 2 de Maio de 1983.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Transportes.
O Sr. Secretário de Estado dos Transportes (Guilhermino Rodrigues): - Sr. Presidente, os instrumentos que se encontram para aprovação desta Assembleia consistem em dois protocolos. O primeiro protocolo altera a convenção internacional que cria a EUROCONTROL; o segundo protocolo, que é um protocolo adicional, altera os mecanismos e os procedimentos no que diz respeito às taxas de rota.
Como sabem, a EUROCONTROL é uma organização que foi criada em 1960, inicialmente por sete países, e tem como objectivo fundamental melhorar os mecanismos que dizem respeito à navegação aérea. Ambos os protocolos foram adaptados em conferência diplomática, realizada em Julho de 1997, em Bruxelas, e foram subscritos por Portugal.
As alterações que foram introduzidas, tanto na convenção que criou a EUROCONTROL como no protocolo adicional, visam, por um lado, adaptar os mecanismos de decisão da organização à evolução que houve no transporte aéreo. Por outro lado, tal como referi inicialmente, a EUROCONTROL era composta apenas por sete países, sendo neste momento composta por 30, pelo que teve de ser alterado o método de decisão, passando do método por unanimidade para decisões por maioria qualificada, no sentido de o tornar operativo e não bloquear os processos de decisão na organização.
Por outro lado, ainda, há uma redefinição de competências no sentido de clarificar o papel da EUROCONTROL, nomeadamente no que diz respeito à harmonização dos sistemas e procedimentos de controlo de tráfego na Europa. Tudo isto tem a ver com o forte crescimento que o tráfego aéreo teve nos últimos anos, que deriva de problemas de congestionamento, fundamentalmente na Europa Central, e que tem impactos negativos na vida de todos nós como utilizadores de transporte aéreo.
Estas alterações vão, pois, no sentido de fazer face aos problemas que referi, tendo, em suma, como objectivo a melhoria dos sistemas de controlo de tráfego, com reflexo na vida dos cidadãos. E, sendo estas alterações indispensáveis para a melhoria das condições em que se efectua o transporte aéreo na Europa, considero de particular importância que Portugal ratifique estes protocolos, pelo que solicito a sua aprovação por esta Assembleia.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Frexes.
O Sr. Manuel Frexes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Secretário de Estado explicou aqui, com clareza, o alcance da proposta de resolução apresentada à Assembleia da República relativa à ratificação do protocolo que está relacionado com a segurança da navegação aérea (EUROCONTROL).
Este assunto foi discutido em sede de Comissão dos Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação e foi apresentado o respectivo relatório, sendo que na votação realizada já esta semana, na Comissão, registou-se a unanimidade de todos os grupos parlamentares no sentido de aceder à ratificação pedida pelo Governo relativamente a esta matéria, até porque se trata de matéria urgente e importante para a harmonização e resolução de problemas devidos ao imensíssimo aumento de tráfego registado na última década e cuja projecção, no futuro, na próxima década, irá para valores substancialmente superiores aos existentes neste momento. Ou seja, no anterior ponto da ordem de trabalhos apreciámos um problema que se prende com o Dia Nacional sem Carro e, provavelmente, qualquer dia, teremos de apreciar um «Dia Nacional sem Aviões», dado que o congestionamento do espaço aéreo já não anda longe daquele que se verifica nas vias terrestres.
Para além disso, estão também em causa questões relacionadas com a aplicação das novas tecnologias, nome
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adamente com a introdução de mecanismos ligados às novas tecnologias que permitam a regulação do tráfego aéreo, e uma outra, bem importante, que é a de uma interconexão cada vez maior e mais global, quer com o espaço dos Estados Unidos, quer com o espaço asiático, a fim de criar corredores que permitam um fluxo aéreo cada vez mais simples. Provavelmente já sucedeu com alguns dos Srs. Deputados, como já sucedeu comigo, e provavelmente já sucedeu com alguns membros do Governo, estar cerca de uma hora no ar à espera de obter autorização para a aterragem em qualquer aeroporto, na medida em que estão, efectivamente, muitas vezes, substancialmente congestionados.
Esta nova regulação permite um entendimento que venha a resolver e a precaver eventuais problemas relacionados com situações que tenham a ver com riscos desnecessários nesta matéria, pois, para isso, tem de haver um entendimento entre Estados, tal como sucede já na Europa, que, neste caso, já está a agir de uma forma mais global, em outros blocos, onde este entendimento tem vindo a ser conseguido.
Neste sentido, o PSD nada tem a opor, louva esta iniciativa e deseja que ela seja aprovada e ratificada, para que entre em vigor no mais curto espaço de tempo possível.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A proposta de resolução n.º 39/VIII, que aprova, para ratificação, o protocolo que consolida a Convenção Internacional de Cooperação para a Segurança da Navegação Aérea (EUROCONTROL), de 13 de Dezembro de 1960, na sequência de diversas modificações introduzidas, e adoptado em Conferência Diplomática reunida em Bruxelas em 27 de Junho de 1997, e respectivo Protocolo Adicional, referente à substituição do Acordo Multilateral relativo a taxas de rota, de 12 de Fevereiro de 1981, ratificado por Portugal, em 2 de Maio de 1983, merece o apoio da bancada do CDS-PP e, obviamente, o seu voto favorável.
Este apoio assenta na intenção de realizar a harmonização e a integração necessárias, com vista a criar um sistema uniforme de gestão do tráfego aéreo seguro e eficiente, bem como um sistema comum de taxas de rota eficaz, de forma a construir uma maior segurança no espaço aéreo, merecedor, portanto, da nossa concordância.
Entre os objectivos mais relevantes deste protocolo e fazendo referência às suas principais disposições, destaco, pela sua importância: a intenção de promover a harmonização de regulamentações aplicáveis aos serviços de tráfego aéreo; desenvolver a capacidade disponível para responder ao pedido de tráfego aéreo e garantir a sua mais eficaz utilização, através da criação, exploração e desenvolvimento conjuntos de um sistema comum de gestão dos fluxos de tráfego aéreo na Europa, no âmbito da implementação de um sistema europeu uniforme da gestão do tráfego aéreo; participar na concepção, implementação e controlo de um sistema global de navegação por satélite; e, finalmente, a intenção de identificar novas possibilidades de acções comuns no domínio da concepção, implementação, controlo ou exploração de sistemas e serviços de navegação aérea.
Por tudo o que acabei de dizer, o CDS-PP votará favoravelmente esta proposta de resolução.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mota Torres.
O Sr. Mota Torres (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Também o Partido Socialista, naturalmente, vai associar-se à votação favorável da ratificação deste protocolo que consolida a Convenção Internacional de Cooperação para a Segurança da Navegação Aérea e fá-lo com um sentimento partilhado hoje internacionalmente, que é o de que a pressão sobre o tráfego aéreo é cada vez mais substancial e, muitas vezes, impeditiva de um normal funcionamento das viagens aéreas. Portanto, justifica-se plenamente que, em termos de segurança e em termos de rapidez e eficácia dos transportes aéreos, sejam adoptadas medidas de carácter e abrangência internacional que permitam manter a segurança e a eficácia, tal como têm vindo a ser encaradas pelos organismos internacionais.
Em 1960, pelo que este é já um percurso com cerca de 40 anos, criou-se a primeira convenção internacional que hoje aqui se trata de consolidar pela ratificação e, mais tarde, por uma associação da Comunidade Europeia, da Agência Espacial Europeia e da Organização Europeia para a Navegação Aérea, criou-se, finalmente, uma convenção que, com os protocolos adicionais à primeira, de 1960, e com o protocolo adicional sobre as taxas de rota, viria a ser aprovada em Conferência Diplomática dos vários países intervenientes, em Bruxelas, em 1997.
Estamos hoje, portanto, a ratificar um documento da maior importância para a regularização e para a segurança dos transportes aéreos e, por isso mesmo, talvez valha a pena lembrar a solicitação feita pelo Conselho à Comissão, no sentido de que esta se pronunciar sobre a matéria, ao que a Comissão respondeu, no dia 1 de Dezembro de 1999, reafirmando a intenção de criar um céu único europeu e recomendando, entre outras medidas, a necessidade de agir a curto prazo e de reformar a gestão do tráfego aéreo.
O presente protocolo visa, portanto, de uma forma pormenorizada, introduzir mecanismos de segurança e de eficácia nos transportes aéreos.
Como eu disse, no início, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, naturalmente, votará favoravelmente a ratificação constante da proposta de resolução n.º 39/VIII.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que o debate da proposta de resolução n.º 39/VIII está encerrado. Nos termos regimentais, a sua votação deveria ser feita de imediato mas, se estiverem de acordo, realizar-se-á na próxima quinta-feira.
Pausa.
Uma vez que ninguém se opõe, assim se fará.
Passamos ao ponto seguinte da ordem do dia, que é a apreciação do Decreto-Lei n.º 108/2000, de 30 de Junho, que cria o Conselho Sectorial do Turismo [apreciação parlamentar n.º 21/VIII (PSD)].
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.
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O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD decidiu requerer a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 108/2000, de 30 de Junho, que cria o Conselho Sectorial do Turismo.
À primeira vista parece uma decisão surpreendente.
A Lei Orgânica do Ministério da Economia prevê a existência destes conselhos para todos os sectores tutelados pelo Ministério - indústria, construção, energia, comércio e turismo - e a todos atribui as mesmas competências genéricas: assegurar a participação dos sectores privados na preparação e execução das políticas do Ministério, promover a informação e o estudo sobre a evolução das actividades económicas sectoriais e propor iniciativas em prol da modernização e desenvolvimento do tecido produtivo.
Nem a decisão de criar estes conselhos, nem a fixação das suas competências mereceram, na altura, oposição vibrante da Câmara. Por quê, então, sujeitar a apreciação parlamentar um diploma que apenas se propõe dar corpo institucional a uma política pública em curso? Excedeu o conteúdo o continente? Foi distorcido algum princípio fundador do relacionamento que deve existir entre a tutela pública e o sector privado? Ficou comprometida alguma orientação de política pública de grau superior à da política sectorial para o turismo?
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Por estranho que pareça, o diploma em apreciação consegue fazer o pleno de respostas afirmativas em todas estas questões, como de seguida passo a demonstrar.
Em primeiro lugar, o conteúdo excede o continente, quer no plano formal, quer no plano substantivo. No plano formal, o diploma navega na confusão conceptual e semântica. A lei orgânica fixa, e bem, no âmbito das atribuições do Ministério, quatro competências genéricas aos conselhos sectoriais. O diploma em apreciação fixa, e mal, três competências adicionais ao Conselho Sectorial do Turismo, às quais chama erradamente atribuições. Devia, outrossim, no plano formal, ter fixado ao Conselho Superior do Turismo competências específicas expressamente contidas nas quatro competências genéricas taxativamente enumeradas pela lei orgânica para todos os conselhos sectoriais.
Não viria, porém, grande mal ao mundo se o conteúdo excedesse o continente apenas neste plano formal. Problema maior reside no artigo 3.º, porque é que aí se fixa que o Conselho deverá acompanhar e formular propostas quanto à actividade do Observatório do Turismo, e para se entender o âmbito das suas funções importa saber que competências lhe foram fixadas. Ora, de entre estas, se encontra a de proceder «à análise, cruzamento e divulgação de informação estatística sectorial produzida por várias entidades». E é aqui que o conteúdo extravasa o continente no plano substantivo, porque, como é sabido, a competência para produzir estatísticas económicas é um poder exclusivo do Instituto Nacional de Estatística, pelo que o interesse nacional fica melhor defendido com o reforço do orçamento e dos recursos técnicos do Instituto Nacional de Estatística do que com a transferência de tal tarefa para um recém-criado Observatório, ainda por cima no interior de uma direcção-geral (no caso, a do Turismo), com a inerente perda de garantia de transparência e rigor científico que, irremediavelmente, lhe está associado.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A violação deste princípio fundamental em que assenta a credibilidade do sistema estatístico nacional seria, por si só, motivo substantivo bastante para suscitar esta apreciação parlamentar, mas outros motivos existem também graves.
É que, analisando a composição que se prevê para o Conselho se verifica estar-se em presença de uma estrutura pesadíssima (44 conselheiros, pasme-se!), tendo o Observatório um conselho coordenador com 24 membros (pasme-se, igualmente!). Acresce que quer num quer noutro órgão predominam os representantes da esfera pública. Eis porque, a nosso ver, se viola o princípio fundador essencial do relacionamento entre a tutela pública e o sector privado em órgãos de conselho da tutela - uma relação, no mínimo, de paridade nas votações das recomendações, sob pena do órgão de conselho se converter numa caixa de ressonância do diktat e da propaganda ministerial.
Por fim, o diploma viola uma orientação de política pública que deveria sobrepor-se às políticas económicas sectoriais. Refiro-me, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, à política de descentralização. Prometeu - e bem! - o governo socialista da passada Legislatura que o Observatório de Turismo ficaria localizado no Algarve, e a Universidade do Algarve apetrechou-se em recurso humanos e operacionais para honrar a responsabilidade. Mas o actual Governo socialista, do mesmo Primeiro-Ministro, deu o dito por não dito e, a Faro, preferiu Lisboa, e, à universidade, preferiu a direcção-geral.
Cabe perguntar se, nem por ser a primeira região de turismo estrangeiro do País, nem por concentrar dois terços da capacidade de investigação universitária nacional sobre o turismo, nem por o turismo dominar a sua economia, como em nenhuma outra região, o Algarve pode acolher um órgão administrativo de âmbito nacional, ainda que modesto. Se assim não é, o que pode esperar-se da política de descentralização deste Governo? Um nada e uma mão-cheia de nadas!
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: São estas três razões de fundo que justificam esta apreciação parlamentar. VV. Ex.as têm as alterações ao diploma que por nós são propostas, pelo que termino a minha intervenção.
Aplausos do PSD.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Turismo.
O Sr. Secretário de Estado do Turismo (Vítor Neto): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, em primeiro lugar, quero agradecer ao Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata por ter trazido o turismo à discussão nesta Casa, porque penso que já era altura de isso acontecer.
Todavia, o documento apresentado pelo PSD no pedido de apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 108/2000, de 30 de Junho, que cria o Conselho Sectorial do Turismo, é muito curioso. O que sucede é que o Partido Social Democrata não põe em causa a bondade ou a necessidade de um Conselho Sectorial do Turismo, nem, tão-pouco, a validade dos seus objectivos. Antes pelo contrário, aca
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ba por, aparentemente, exaltá-los, como o Sr. Deputado Patinha Antão acaba de fazer, ao falar da institucionalização de um fórum de debate tão livre e responsável, abrangente e equilibrador dos interesses públicos e privados. Isto é, precisamente, o que está no diploma.
No entanto, Sr. Deputado, é estranho, porque foi o Partido Social Democrata que liquidou, extinguiu, em 1994, o Conselho Nacional de Turismo, criado em 1987 pelo governo do Partido Social Democrata.
O Sr. Carlos Alberto (PS): - Exactamente!
O Orador: - Extinguiu esse órgão consultivo, dizendo que ele não se teria mostrado habilitado a contribuir para a realização dos objectivos de harmonização dos interesses privados com os valores patrimoniais do Estado, cuja tutela competia ao Estado. Dizia, então, o governo do Partido Social Democrata que o Executivo assegurava o diálogo com as associações empresariais, ou seja, com as forças privadas, no âmbito do Conselho Económico e Social, do qual nenhuma organização de turismo fazia parte. Curiosamente, quando nesta Casa se tratou de votar a entrada da Confederação do Turismo Português para o Conselho Económico e Social, o Partido Social Democrata votou contra!
Como tal, Sr. Deputado, estamos perante contradições muito fortes, as quais o Governo do Partido Socialista procurou corrigir, tentando desfazer o grave erro que foi a eliminação do Conselho Nacional do Turismo. O Governo do Partido Socialista criou o Conselho Sectorial do Turismo com o objectivo de construir um grande fórum de diálogo, de discussão e de concertação sectorial para a definição da política de turismo. O turismo é um sector jovem no nosso país e é um sector que não tem ainda uma afirmação em termos políticos e institucionais correspondente à sua importância económica. O turismo tem um estatuto inferior a outros grande sectores económicos do nosso país e, por isso, é de toda a importância para a economia do turismo a consagração deste órgão.
Já agora, gostava também de dizer ao Sr. Deputado Patinha Antão que não percebo o porquê dos problemas que levantou quanto à paridade e à representação do sector público e privado no Conselho Sectorial do Turismo. Não sei se o Sr. Deputado sabe que no Conselho Nacional do Turismo, criado pelo vosso governo e eliminado pelo vosso governo, havia 31 representantes do sector público e 18 representantes do sector privado. Pois bem, no actual Conselho Sectorial do Turismo existe uma representação paritária, já que há 21 representantes públicos e 21 representantes privados, e, neste caso, estamos a considerar representantes públicos aqueles que têm alguma carga política, não estando, certamente, próximos das posições políticas do Governo - estou a referir-me, concretamente, às regiões de turismo, onde, como sabe, há diferentes cores políticas, já que pertencem a diferentes partidos políticos, e, por exemplo, às regiões autónomas, onde isto também acontece. Como vê, o Governo está longe de estar em maioria política nesse órgão. De qualquer modo, isso não tem importância para nós, porque o que interessa é ter um fórum do qual constem os representantes do alojamento, da restauração, das agências de viagem, dos rent-a-car, do golfe, dos casinos, dos parques de campismo, das pensões, do termalismo e das regiões de turismo, ou seja, representantes de todas as associações representativas deste importante sector económico do nosso país.
Para além disso, os senhores, no vosso documento, põem em causa a representação de algumas entidades privadas, como é o caso da Associação Turismo de Lisboa (ATL) e o da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), e penso que não há qualquer razão de ser para isso. Estas duas organizações estão presentes no Conselho Sectorial do Turismo, mas estão presentes com base nos critérios que foram para tal definidos. E se tivéssemos definido outros critérios, teríamos de trazer para este órgão dezenas de outras organizações regionais que estariam presentes com todo o mérito. Como tal, é muito importante que a ATL tenha dois membros no Conselho Sectorial do Turismo e que a AHETA tenha um membro, porque, se não os tivessem, seria na quota do Governo que essas duas organizações teriam entrado.
Atenção, Sr. Deputado, penso que é muito perigoso estarmos a definir a importância das associações e das regiões. O Sr. Deputado sabe que somos ambos da mesma região, do Algarve, e todos sabemos qual é a importância turística dessa região. Contudo, quero lembrá-lo de que há muitas maneiras de honrar a importância turística do Algarve. Relembro a V. Ex.ª que, na vigência do QCA I, o vosso governo apenas destinou 6% do Sistema de Incentivos Financeiros às Infra-estruturas Turísticas (SIFIT), que era o mais importante programa financeiro de investimento no turismo, ao Algarve. Destinaram apenas 6% do SIFIT para o Algarve, Sr. Deputado! Gostaria ainda de lhe recordar que, no que respeita ao QCA II, que teve início no vosso governo, se não tivesse sido a alteração feita pelo governo do Partido Socialista, a de alterar os critérios de utilização do SIFIT, teria acontecido a mesma coisa. Mas não! Conseguimos atribuir ao Algarve qualquer coisa como 20% do SIFIT. Porquê?! Porque nos mecanismos anteriores não havia a possibilidade de construir novas unidades hoteleiras. Havia, portanto, uma visão que discriminava totalmente o Algarve.
Recordo-lhe que, nestes últimos anos, fizemos investimentos fortíssimos, dos quais é exemplo o Programa Milénio e outros, no que toca ao Algarve.
Em relação a esta questão da importância das organizações e das regiões, posso dizer-lhe - e estão aqui Deputados de todas as regiões do País que compreendem, certamente, o que estou a dizer - que o Governo tem uma política nacional de turismo que, sem dúvida, reconhece o papel importante do Algarve, porque esta é a zona turística mais importante do nosso país, mas não deixa de dar atenção a todas as outras regiões, do norte, do centro, do sul, do litoral e das regiões autónomas. Esta é a política nacional que temos e o Algarve, como é evidente, está sempre em primeiro lugar pela sua importância, mas há muitas maneiras de encarar esse primeiro lugar.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Nessa tem razão!
O Orador: - Em relação ao Observatório, tenho de dizer que a Unidade Técnica Executiva do Observatório de Turismo fica em Lisboa e tem três pessoas. Não é um organismo político com presidente, vice-presidente e benesses ligadas às estruturas desse tipo. É uma estrutura técnica que se chama Unidade Técnica Executiva que faz parte de uma rede de sete observatórios regionais que compõem
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o Observatório propriamente dito e que correspondem às áreas económicas do nosso país, às NUT II, que incluem os Açores e a Madeira. O Algarve tem a sua unidade técnica, o seu observatório regional, em rede com este e integrado no Centro de Estudos Universitários de Turismo da Universidade do Algarve. As nossas colaborações com a Universidade do Algarve são muito fortes e não vejo, portanto, razão nas vossas críticas nem penso que os objectivos a que nos propusemos sejam desvirtuados com a estrutura que criámos.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sem prejuízo da existência de largas áreas de consenso estratégico em vários sectores da sociedade portuguesa sobre o turismo e a sua importância, há, seguramente, muitos ângulos de crítica sustentada à política de turismo do Governo. É o caso da necessária descentralização, que tarda, e é o caso da reformulação da lei-quadro das regiões de turismo, que não avança e que, do que se conhece, vai no sentido de um maior controlo da administração central, desconcentrada, sobre as regiões, etc.
Todavia, nesse conjunto de críticas, não incluímos o Conselho Setorial do Turismo nem entendemos as razões que levam o PSD - aliás, o próprio Sr. Deputado disse que essa vossa atitude, para alguns, pareceria insólita e, de facto, parece - a requerer esta apreciação parlamentar.
Mais do que isso, Sr. Deputado: lendo as propostas de alteração que o PSD acabou de apresentar, concluo que «não joga a bota com a perdigota», porque o que consta no preâmbulo como justificação da apreciação não está concretizado em qualquer dessas propostas de alteração, que são outras, nada têm a ver com os motivos pelos quais o PSD a apresentou.
O Sr. Patinha Antão (PSD): - O Sr. Deputado leu mal!
O Orador: - Aliás, francamente, até pensei que o PSD tivesse retirado esta apreciação parlamentar, porque sei que ela decorre de uma visita que a Confederação Portuguesa do Turismo fez aos vários grupos parlamentares. Aquando dessa visita explicámos, com toda a clareza, que estavam errados - aliás, tinham feito mal as contas, o que reconheceram no final -, pelo que pensámos que o PSD acabasse, por ele próprio, por retirar esta apreciação parlamentar.
Na justificação original para esta apreciação parlamentar, o PSD começa por referir a ausência de paridade entre o sector público e o sector privado, e eu não percebo esta lógica de raciocínio, Sr. Deputado - e sou insuspeito nesta matéria!
O Conselho Sectorial do Turismo tem 23, mais 10, mais 5 entidades, digamos assim, e, das 23 entidades que estão aqui previstas, 11 são, de facto, representativas da administração central, ou do Governo ou da administração central desconcentrada. Ou seja, 23 entidades são representativas de estruturas associativas, sejam elas empresariais, sejam elas regiões de turismo da Associação Nacional de Municípios Portugueses ou da Confederação do Turismo Português. E não me parece que estas estruturas sejam meros elementos de propaganda do Governo. Logo se verá! Contudo, há aqui, claramente, uma composição que não vai na linha daquilo que são os argumentos apresentados pelo PSD.
Mais, Sr. Deputado: o Conselho só poderá integrar os 10 conselheiros após consulta à Confederação do Turismo Português, o que nos parece excessivo, porque se dá à Confederação um papel de tutela sobre esses 10 conselheiros, que me parece absolutamente excessivo e desproporcionado.
Em suma, este era o primeiro argumento que o PSD invocava e que, depois, deixa cair, porque nas propostas de alteração nada disto é alterado, o que, em minha opinião, não tem sentido.
Um outro argumento apresentado no preâmbulo da apreciação parlamentar que, depois, não aparece nas propostas de alteração é a ausência de estruturas sectoriais de turismo na composição do Conselho. Aliás, a apreciação menciona a ATL e a AHETA, mas também não está lá a ADTURN!
Protestos do Deputado do PSD Patinha Antão.
Não, não…! O Sr. Deputado não conhece o texto com o qual…
Protestos do Deputado do PSD Patinha Antão.
Então, está lá! Está aqui! Diz-se: «Em segundo lugar, constata-se que na composição do Conselho não estão contempladas (…)»
Protestos do Deputado do PSD Patinha Antão.
Ó Sr. Deputado, por isso é que eu digo que as propostas que entregou agora nada têm a ver com o pedido de apreciação feito pelo PSD. Porque aqui refere-se a não representatividade da ATL e da AHETA. E eu diria: pois, não! Nem está a ADTURN, nem está a união de outros sectores. Aliás, a propósito da apreciação parlamentar e desta ideia original do PSD, devo dizer que recebemos um fax da União das Associações de Hotelaria e Restauração do Norte de Portugal no qual se insurgem contra a lógica de fazer do Conselho Sectorial do Turismo, que tem uma lógica de representação nacional, uma representação espartilhada por interesses regionais. Faltam esses e faltarão seguramente muitos mais, e, neste ponto, estou de acordo com o Sr. Secretário de Estado, que diz poderem entrar por via de outras estruturas, que são a sua representação. Por exemplo, não sei se sabe que a ATL é vice-presidente do Confederação do Turismo Português e que a AHETA pertence a estruturas associativas do sector.
O terceiro argumento, para o facto de a sede ser em Lisboa, prende-se com questão da descentralização. Este talvez pudesse ser o único argumento sólido para esta apreciação parlamentar, que me parece, peço desculpa, francamente precipitada, Sr. Deputado. Porém, fui ler o diploma e, tanto para o Conselho Sectorial do Turismo como para o Observatório do Turismo, não consta a instituição da sede, a única coisa que está é em relação à Unidade Técnica Executiva, o que até se compreende que assim seja, por razões de operacionalidade estatística.
No fundo, o Sr. Deputado acabou por resumir as suas propostas à intervenção na área estatística que recobre as funções do INE. Mas, Sr. Deputado, isso também têm o
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Observatório do Comércio e o Observatório do Emprego, alguns criados ainda no tempo do governo do PSD, que produzem estatística interna, útil para os operadores, mas que não recobre o conjunto de estatísticas globais do Instituto Nacional de Estatística. Portanto, não me parece que haja aqui qualquer contradição.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, termino como comecei, referindo que temos seguramente muitas razões de crítica ao Governo em matéria de política de turismo, designadamente nas ligadas à descentralização, que tarda aí - parece, aliás, que, no que toca à descentralização, o Governo diz que vai, mas, depois, tem receio de avançar e confunde descentralização com desconcentração, como se verifica em relação às regiões de turismo. Mas não é, seguramente, neste terreno do Observatório ou do Conselho Sectorial do Turismo que essas críticas se colocam. Por isso, não acompanhamos o PSD nas suas propostas.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: O PSD apresenta um pedido de apreciação parlamentar em relação a uma matéria que, a nosso ver, é importante.
O primeiro aspecto que gostaria de focar, depois de ouvir atentamente quer o Sr. Deputado Patinha Antão, quer o Sr. Secretário de Estado do Turismo, quer o Sr. Deputado Lino de Carvalho, que, tal como eu, não é algarvio, não tendo por isso qualquer conhecimento especial sobre este problema…
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas o turismo não é só no Algarve!
O Orador: - É verdade, faço a referência apenas porque os oradores anteriores invocaram essa qualidade, Sr. Deputado.
Mas, como eu estava a dizer, depois de ouvir os oradores anteriores, gostaria de dizer ao Sr. Secretário de Estado que o CDS-PP partilha a ideia genérica de que a política e o poder político não têm dado ao turismo a atenção que este merece, não tem tratado o turismo como o sector de actividade com a importância que os seus principais agentes intervenientes - como o Sr. Secretário de Estado sabe, e bem! - reclamam. E, de facto, este sector não tem merecido, da parte do poder político, essa consideração e atenção.
Como o Sr. Secretário de Estado não se cansa de dizer, sempre que tem oportunidade de falar sobre o assunto, o turismo é um sector económico, não só estratégico para o País como aquele que, no meio de uma desgraça mais ou menos generalizada, produz bons resultados, resultados de sucesso, sendo certo que, em nossa opinião, esses mesmos resultados têm muito pouco ou quase nada a ver com aquilo que o poder político, designadamente o Governo, tem feito nesta área e, sobretudo, com o que não tem feito. Os resultados derivam, em particular, das condições iniciais do País para este mesmo sector, de circunstâncias favoráveis para o País e da iniciativa privada e do esforço dos agentes empresariais neste sector. E aquilo que era de esperar do poder político numa área que é transversal - isto não é só consigo, Sr. Secretário de Estado, como é evidente, pois estamos a falar de uma área transversal que tem a ver com questões que passam muito para além daquilo que é sua responsabilidade directa integrada no Ministério da Economia, como as infra-estruturas, a cultura, o transporte aéreo e inúmeras circunstâncias que influem no turismo - não foi cumprido nem executado. Portanto, em nada se beneficiou ou potenciou este sector.
Concretamente, em relação à proposta do PSD, eu diria que, tendo em conta as preocupações do sector, talvez este não fosse um tema essencial, mas entendeu o Sr. Deputado Patinha Antão trazer esta matéria à nossa consideração.
Apesar de fazer esta reserva à partida, eu diria duas coisas muito simples: em relação à preocupação manifestada pelo Sr. Deputado quanto ao Algarve, acompanharemos essa preocupação, porque o que se regista aqui, efectivamente, é que o Governo, mais uma vez, perdeu a oportunidade de dar um sinal claro de que percebeu a mensagem dos portugueses quando, designadamente, «chumbaram» a regionalização. Era de esperar algum tipo de medidas! O CDS-PP apresentou propostas, não na área do turismo mas noutras áreas, no sentido de algumas instituições de referência em Portugal pudessem ser transferidas para fora de Lisboa, designadamente em relação ao próprio Banco de Portugal e ao Tribunal Constitucional. Propusemos a saída de Lisboa destas instituições, porque é um sinal de que estamos atentos ao resto do País.
Ao criar-se uma instituição deste tipo talvez fizesse todo sentido dar-se esse sinal à zona turística por excelência do País, que é o Algarve. Talvez fizesse sentido, e por isso acompanho o Sr. Deputado Patinha Antão nessa ideia e preocupação.
Quanto ao segundo aspecto, já não sei muito bem, porque este «pinguepongue» entre o Sr. Deputado Patinha Antão, que vem criticar um Governo que está em funções há cinco anos por não estar a fazer aquilo que deve, e o Sr. Secretário de Estado, que responde com um Governo que estava em funções há 10 anos, para dizer que na altura não o fizeram, não me parece, sinceramente, a forma mais interessante de discutir as perspectivas futuras do turismo.
O Sr. Deputado Patinha Antão diz «Os senhores, agora, não estão a fazer bem!» e o Sr. Secretário de Estado responde: «Mas os senhores, quando lá estavam, também não fizeram!». E nós o que temos a ver com isso! O que queremos saber é que se vai fazer daqui para a frente e não, propriamente, o que se fez há não sei quanto tempo atrás. Não é esta a nossa preocupação, como é evidente!
Em relação ao que se está a fazer agora, eu diria, Sr. Secretário de Estado, que a solidariedade, nem sempre fácil, do Sr. Deputado Lino de Carvalho - digo isto, porque o Sr. Deputado Lino de Carvalho é um Deputado exigente neste tipo de coisa, e, portanto, nem sempre dá com esta facilidade a sua solidariedade - tem a ver de facto com o modelo adoptado. Contudo, talvez fosse possível encontrar um modelo mais equilibrado, porque, precisamente, grande parte da iniciativa, do dinamismo, da novidade, da inovação, vem do sector privado. Sei que agora há dinheiro, dinheiro significativo, para a formação, mas também aqui os privados terão um papel fundamental, porque é precisamente deles que vem grande parte dos apoios. Por isso, talvez fosse desejável que uma instituição deste tipo fosse mais equilibrada e tivesse maior componente do sector privado e menos peso da administração pública.
Começamos a ler o artigo relativo à composição e verificamos que, antes de aparecer alguém que não seja representante de ministério, de um organismo do Estado, etc.,
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e tem de se seguir a lista por aí fora, o peso da administração pública, em minha opinião, é muito grande nesta mesma composição, o que é natural que mereça o apoio do Sr. Deputado Lino de Carvalho.
De resto, eu diria mesmo que o Sr. Deputado Lino de Carvalho se inspirou numa leitura atenta do Diário de Notícias de hoje neste seu apoio e nesta sua ajuda ao Ministério da Economia.
Risos do CDS-PP e do PSD.
Certamente que o primeiro sinal dado pelo Sr. Ministro das Finanças, e não pelo Sr. Secretário de Estado, de que era necessário uma aproximação ao PCP para fazer disto uma coisa pública, cada vez mais pública, merece, de facto, esse entendimento.
Não temos esta visão de que este tipo de entidades e organismos devam ser tão públicos, devam ter um peso público tão grande ou tão excessivo, e, neste sentido, sem considerarmos que isto resolva algumas das questões de fundo - e talvez, depois, haja oportunidade de discutir com o Sr. Secretário de Estado outras questões, eventualmente, de fundo e até mais importantes do que estas -, sem fugirmos ao tal grande consenso estratégico que o País tem em relação a este sector e sem considerarmos que é uma questão essencial, apesar disto, acompanharemos as preocupações do Sr. Deputado Patinha Antão e, portanto, votaremos favoravelmente o pedido e as propostas de alteração que ele quer que sejam feitas em sede de Comissão.
Vozes do CDS-PP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Jamila Madeira.
A Sr.ª Jamila Madeira (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 108/2000, de 30 de Junho, que hoje apreciamos, por iniciativa do Grupo Parlamentar do PSD, constitui, para o Partido Socialista e para esta bancada, um considerável avanço no claro reconhecimento de que o turismo é, efectivamente, a principal actividade económica do País, e para isso requer um conselho sectorial especializado.
Este decreto-lei visa a criação do Conselho Sectorial do Turismo, como órgão fundamental de consulta, para que esta área de intervenção, no âmbito das atribuições do Ministério da Economia, possa ter o devido apoio.
Deste modo, procura-se promover a articulação dos responsáveis da política do turismo e dos interesses privados ligados ao sector, no sentido de alcançar a efectiva estruturação de um política de turismo participada.
Com este diploma, o Governo cumpre não apenas um desígnio do seu Programa Eleitoral, que é nosso dever cumprir, mas também, e sobretudo, dá resposta às exigências de participação e de intervenção dos diversos organismos públicos e privados, que, durante largos anos, se viram impossibilitados de directamente influenciar a política de turismo em Portugal.
No entanto, é de notar que, apesar desta impossibilidade, estes agentes nunca se abstiveram de procurar, mesmo que autonomamente, atingir o objectivo de um turismo de qualidade em Portugal.
Ao proporem a presente apreciação parlamentar, VV. Ex.as, Grupo Parlamentar do PSD, invocam um desequilíbrio entre os organismos públicos e privados neste órgão e mesmo um défice de representatividade deste, o que me deixa pressupor uma concordância com os objectivos e a estratégia definidos pelo Governo nesta matéria, divergindo apenas em algumas questões de forma.
A primeira questão que me é suscitada - e já foi referida pelo Sr. Secretário de Estado, mas não posso deixar de a reforçar - é o facto de ser o PSD a levantar estas questões, no que é acompanhado pelo CDS-PP, sobre a representatividade do órgão, preocupado que está com a sua substância e interesse. Mas continuo sem perceber! Afinal de contas, por que razão extinguiu o PSD um órgão equiparado a este? Aliás, contra todas as opiniões do sector, o PSD liquidou qualquer possibilidade de os agentes do turismo contribuírem conjuntamente, com a sua reflexão e aconselhamento, para o desenvolvimento qualitativo do turismo neste país.
Mas mais: quando o PSD refere a actual composição do Conselho Sectorial do Turismo, pouco temos de referir, pois praticamente todas as entidades públicas estão representadas e mesmo as entidades citadas também estão representadas. Não sei, se calhar, o Sr. Deputado Lino de Carvalho tinha razão, já passou tempo e, se calhar, por um motivo ou outro, o pedido já deveria ter sido retirado, porque, efectivamente, as organizações que são citadas nesta apreciação parlamentar estão representadas por via das suas grandes organizações, como a Confederação do Turismo Português ou a Associação Nacional das Regiões do Turismo, entre outras.
Por outro lado, também coloco a questão do peso da participação dos organismos públicos do sector de forma desequilibrada face ao seu número de lugares, que nem é totalmente verdade. Se, efectivamente, existe um desequilíbrio mínimo, o importante é realçar que este é um conselho consultivo, é um órgão de reflexão e de aconselhamento. Que eu consiga perceber, o importante é que haja a presença destes órgãos, que haja a contribuição dos organismos públicos nestas discussões, e não sou eu que vou escolher quais são os organismos públicos nem quais são os organismos privados que vão estar fora.
Aliás, a difícil escolha é dizer se isto vai ser um órgão deliberativo, mas, como órgão consultivo, acho que não o será, e, portanto, não é sustentável a necessidade de garantir um equilíbrio claramente aritmético, que VV. Ex.as várias vezes referem no vosso pedido de apreciação parlamentar.
No entanto, devo admitir que foi com grande satisfação que verifiquei que uma das grandes questões que é frisada, por parte do PSD, nesta apreciação parlamentar é a preocupação com a descentralização dos organismos, claramente uma preocupação em dotar o País de uma descentralização administrativa. Pena é que ela venha tarde e que essa preocupação não tenha sido vista quando o PSD teve poderes, muitos poderes, para a preconizar.
Vozes do PSD: - E o PS também! Era a reforma do século!
O Orador: - Neste caso concreto, o Observatório Nacional de Turismo, por acaso presidido por um conterrâneo nosso, procurou, em vez de uma localização simbólica, uma localização eficaz - e é isto que se pretende do Observatório Nacional de Turismo - junto daquelas que são as suas fontes fundamentais de informação, concreta
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mente o INE e o Banco de Portugal, onde ele se alimenta directamente. Com certeza que isto é muito importante.
Mas, de qualquer modo, não gostaria de terminar esta minha intervenção sem referir que é importante perceber que o PSD ou mudou de opinião ou alguma coisa se passa, porque não compreendo, com tanto regionalismo presente nesta apreciação parlamentar, como é que os dirigentes do PSD fizeram campanha contra a regionalização!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.
O Sr. Patinha Antão (PSD): - Sr. Presidente, agradeço as intervenções do Sr. Secretário de Estado e também as dos Srs. Deputados que já se pronunciaram sobre esta matéria e vou aproveitar o tempo de que disponho para responder às questões colocadas e para avançar alguns considerandos adicionais.
Dirijo-me, em primeiro lugar, à Sr.ª Deputada Jamila Madeira para notar e sublinhar a sua paixão pelo turismo - e, Sr.ª Deputada, fica-lhe muito bem -, mas parece-me, em todo o caso, que pecou um pouco por excesso, porque vir dizer que o turismo é a principal actividade económica do País é uma exaltação que, apesar de interessante, é um pouco excessiva.
Em segundo lugar, Sr.ª Deputada, quero deixar aqui algumas notas de correcção em relação ao que disse. Em matéria de produção estatística da área do turismo, concordará que o Banco de Portugal nada tem a ver com isso, mas com certeza que a produção de estatísticas deve obedecer, e, por lei, obedece, às competências exclusivas que o Instituto Nacional de Estatística exerce. E é no contexto de delegação dessas competências que a produção de estatísticas deve poder - e bem! - ser feita por outras entidades, nomeadamente por um observatório como este. Este é um princípio fundador que temos de acolher.
Terceira nota que gostava de deixar, agora quanto à sua análise relativamente à descentralização: Sr.ª Deputada, eu gostava de recordar, porque o Sr. Secretário de Estado do Turismo também não respondeu objectivamente a esta questão, que a localização do Observatório Sectorial do Turismo não foi proposta pelo PSD, a localização foi proposta, prometida reiteradamente, pelo primeiro Governo socialista.
É matéria de facto, Sr. Secretário de Estado, não é verdade?
O Sr. Secretário de Estado do Turismo: - Não é verdade!
O Orador: - Não é verdade?!
O Sr. Secretário de Estado do Turismo: - Não é verdade!
O Orador: - Então, V. Ex.ª assume que não é verdade. É um facto que V. Ex.ª assume que não é verdade. Mas eu digo-lhe e provo-lhe que é verdade.
Mas sobre esta decisão da legislatura anterior do Governo socialista dizemos: «Decisão incorrecta». Não por causa do exemplo em si mesmo, mas por causa do princípio da descentralização. Se, de facto, o Algarve não merece a localização de um observatório de turismo, que é um organismo público modesto, que serviços é que VV. Ex.as estão dispostos a descentralizar para o Algarve? Ou, por exemplo, como dizia, há pouco, o Sr. Deputado Telmo Correia, por que é que não estão dispostos a admitir que o Tribunal Constitucional possa ir para Coimbra? Nós defendemos também essa posição. VV. Ex.as têm grandes dificuldades…
O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Essa era uma grande ideia!
O Orador: - Relativamente à intervenção do Sr. Deputado Lino de Carvalho, quero dizer fundamentalmente o seguinte: fiquei surpreendido pela sua intervenção e vou utilizar um primeiro considerando que não tenho por hábito utilizar, mas, de facto, V. Ex.ª, na sua intervenção, parece ter dado voz clara àquilo que o Sr. Ministro das Finanças disse hoje em entrevista no Diário de Notícias: «É necessário uma aliança entre o Governo e o PCP».
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Vamos ao concreto!
O Orador: - Houve aqui uma divisão de trabalho: o Sr. Secretário de Estado do Turismo falou em história; V. Ex.ª falou na matéria concreta das alterações. Mas também falou mal!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Parece que eu tinha razão!
O Orador: - Falou mal, Sr. Deputado! V. Ex.ª leu os considerandos sobre os quais propusemos esta apreciação e respigou duas coisas,…
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Quatro!
O Orador: - … isto é, o facto de a Associação de Turismo de Lisboa e de a AHETA não terem uma entrada directa na composição do Conselho, e não têm, mas têm essa entrada, como disse o Sr. Secretário de Estado, através dos seis representantes da Confederação do Turismo Português. Achamos que o problema está resolvido.
Na nossa proposta de alterações, como V. Ex.ª devia ter lido, Sr. Deputado, não pomos em causa a composição, o que pomos em causa… O Sr. Deputado poderá gostar de órgãos com 44 elementos para tomarem simples deliberações, que são recomendações, são conselhos, mas nós achamos que isso é uma coisa pesadíssima e, portanto, propusemos um sistema de votação que reduz esses direitos de voto e consagra um princípio, que V. Ex.ª não aprova, com certeza, que é um princípio tripartido: a esfera pública tem um terço dos votos, a esfera empresarial privada tem outro terço dos votos e a esfera do poder local, regional e das associações de consumidores tem o outro terço dos votos. Parece-nos equilibrado, mas, se VV. Ex.as não estão de acordo, vamos discutir isso, porque, como sabe, este diploma vai baixar à Comissão de Economia, Finanças e Plano.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Dá mais votos ao Governo do que aqueles que ele tem agora!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.
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O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Mas, sobre a matéria, gostaria de dizer o seguinte: por que é que não estamos a discutir as coisas mais essenciais relativamente ao turismo? Sr. Secretário de Estado, há um ano, prometeu uma lei de bases do turismo - estamos à espera! Quando o Sr. Secretário de Estado trouxer cá uma coisa que se chama o novo desenho das regiões de turismo, estaremos cá para discutir; se não trouxer, tomaremos a iniciativa.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Turismo.
O Sr. Secretário de Estado do Turismo: - Sr. Presidente, creio que este debate coloca, a todos nós, a necessidade urgente de termos algum tempo nesta Casa para fazermos uma discussão aprofundada sobre os problemas do turismo. Confunde-se aqui uma política nacional de turismo com os prémios ou o sublinhar desta ou daquela região; confunde-se estruturas - o Sr. Deputado chama Observatório Sectorial do Turismo, confundindo Conselho Sectorial do Turismo com Observatório do Turismo…
O Sr. Patinha Antão (PSD): - Não! Não, Sr. Secretário de Estado!
O Orador: - São duas coisas diferentes. Não há nenhum Observatório Sectorial do Turismo! Há um Conselho Sectorial do Turismo, que é um órgão de consulta largamente representativo, que é um órgão de acompanhamento e de aconselhamento do Governo, onde estão em maioria, de forma clara, todas as associações empresariais e as associações regionais de turismo - e o Governo faz isso porque acredita que este sector precisa de uma política de parceria e do contributo de todos. E, não só aceita esse desafio como o promoveu, tentando responder ao vazio que o PSD deixou ao ter eliminado as estruturas de diálogo em matéria de turismo. Além disso, o Observatório do Turismo é um órgão técnico.
Já agora, gostaria de introduzir aqui um novo conceito: nós não vamos fazer um observatório do turismo, vamos criar sete observatórios do turismo,…
O Sr. Patinha Antão (PSD): - Não quiseram criar um e agora vão criar sete observatórios!
O Orador: - … com uma Unidade Técnica Executiva em Lisboa, de coordenação desse conjunto de observatórios em rede. E já agora, para o Sr. Deputado também ter conhecimento, em Lisboa vai funcionar um Observatório de Lisboa em colaboração com a Associação de Turismo de Lisboa (ATL)…
O Sr. Patinha Antão (PSD): - A lei só prevê um!
O Orador: - Mas a rede tem sete!
O Sr. Patinha Antão (PSD): - O Governo vai criar sete?!
O Orador: - Sim, sim!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não é possível estabelecer diálogo desse tipo!
O Orador: - A Unidade Técnica Executiva, que tem sede em Lisboa, tem três quadros, é uma unidade de coordenação.
Já agora, Sr. Deputado, era bom que se informasse porque existe uma colaboração há décadas entre o Ministério da Economia, a Direcção-Geral do Turismo e o Instituto Nacional de Estatística, existem protocolos de colaboração na área do turismo, com funções perfeitamente definidas para cada um destes sectores. Isto não é uma intromissão no terreno do Instituto Nacional de Estatística - o INE está integrado no Conselho Sectorial e no Observatório do Turismo e continua a fazer o seu trabalho; a única coisa que existe é uma tentativa de uma coordenação ainda maior entre estas entidades. É disto que se trata e não de uma invasão de competências.
Falou-se aqui da importância do turismo. A Sr.ª Deputada do PS referiu, e bem, a importância económica do turismo e o Sr. Primeiro-Ministro, há poucos dias, na inauguração da BTL, sublinhou que o turismo era um dos sectores estratégicos do desenvolvimento da nossa economia. O que não é novidade! No Plano Nacional de Desenvolvimento Económico, o Governo sublinha claramente a importância económica do turismo.
Mas há mais, Srs. Deputados! Isto não foi só sorte! O turismo teve bons resultados nestes anos, porque os empresários investiram, porque acreditaram na coerência da política do Governo.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Não é isso que eles próprios dizem!
O Orador: - Houve e há política do Governo e os resultados são também consequência disto. Não é só sorte!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, visto não haver mais inscrições, dou por finda a apreciação parlamentar n.º 21/VIII (PSD). Foram apresentadas pelo PSD propostas de alteração que, nos termos regimentais, baixam, conjuntamente com a apreciação parlamentar, à 5.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos agora dar início à apreciação do Decreto-Lei n.º 227-B/2000, de 15 de Setembro, que regulamenta a Lei n.º 173/99, de 21 de Setembro [apreciação parlamentar n.º 27/VIII (PSD)].
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Salter Cid.
O Sr. José Salter Cid (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Agricultura, Srs. Deputados: Aquando da discussão da Lei de Bases da Caça, na anterior Legislatura, o PSD, sentindo que o Governo estava a criar graves dificuldades aos proprietários e caçadores na renovação das zonas de caça existentes, decidiu dar o benefício da dúvida e, abstendo-se, deixou aprovar aquela que viria a ser a Lei n.º 173/99. Quando, um ano depois, o Governo veio regular esta Lei, através do Decreto-Lei que agora está em apreciação nesta Assembleia, verificámos que as nossas expectativas de uma legislação equilibrada tinham sido goradas.
Vozes do PSD: - Exactamente!
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O Orador: - Só agora conseguimos compreender o total alcance do artigo 12.º da Lei de Bases e do artigo 6.º do Regulamento. O que diz tal artigo é muito simples: o Estado é monopolista da gestão dos recursos cinegéticos em Portugal, podendo transferi-los ou concessioná-los. No caso de transferir, formam-se as zonas de caça nacionais e as zonas de caça municipais; no caso de concessionar, formam-se as zonas de caça turísticas e zonas de caça associativas.
E agora vem o busílis da questão: no caso de transferência, esta é feita para associações de caçadores, proprietários, associações de defesa do ambiente, autarquias e - pasme-se! - não é necessária autorização dos proprietários para os seus terrenos ficarem sob a alçada destas associações; ou seja, há uma espécie de nacionalização indirecta da utilização cinegética dos terrenos privados. Está agora claro, porque se dizia no artigo 16.º da Lei, que o estabelecimento das zonas de caça mediante concessão carece de acordo prévio. Era preciso estar por dentro do segredo para se perceber que, pelo contrário, o estabelecimento de zonas de caça mediante transferência não carece de acordo prévio. É uma espécie de «gato escondido com o rabo de fora»! Esta problemática já deu, aliás, muita celeuma existindo um Acórdão do Tribunal Constitucional que definiu a inconstitucionalidade das normas que permitem a constituição de zonas de caça sem o acordo prévio do proprietário.
O Sr. Secretário de Estado seguramente vai dizer que há uma diferença substancial: é que às zonas de caça nacionais e municipais têm acesso todos os caçadores. Mas, Sr. Secretário de Estado, às zonas de caça turística também têm acesso todos os caçadores e, no entanto, é necessário acordo prévio. Relembro-lhe o artigo 9.º onde se diz que às zonas de caça turística têm acesso todos os caçadores que cumpram as normas privativas de funcionamento das mesmas. Ora isto é, precisamente, o que acontece nas zonas de caça nacionais e zonas de caça municipais só que as normas de funcionamento vêm noutro artigo, que é o artigo 22.º. Mas não é só no artigo 22.º, também no artigo 16.º se define o acesso, que, forçosamente, tem de ser restrito, às zonas de caça nacionais e às zonas de caça municipais.
Mas há mais, Sr. Secretário de Estado: de acordo com os artigos 22.º e 25.º do Decreto-Lei, o exercício da caça nas zonas de caça nacionais e municipais está sujeito ao pagamento de taxas que (não se diz, mas depreende-se) vão para as associações que fazem a gestão dos ditos recursos cinegéticos.
Em suma, não só é possível que associações privadas se apropriem das propriedades alheias para a exploração dos seus recursos cinegéticos como também ainda podem cobrar taxas sobre a utilização dessa propriedade alheia.
Ora o PSD não pode de maneira alguma concordar com este procedimento. E pensamos que os outros partidos nesta Assembleia, designadamente os Srs. Deputados do PS, também não podem concordar com este processo. Ainda por cima, Sr. Secretário de Estado, consta nos meios cinegéticos nacionais que não se vão proceder à renovação de muitas zonas de caça associativas e turísticas para que os terrenos possam passar para zonas de caça municipais. A ser verdade - e desde já digo que não acredito - era caso muito grave, mas veremos o que acontece no próximo Conselho Nacional de Caça, que se realiza daqui a uma semana.
Mas há mais ainda, Sr. Secretário de Estado: poderá não ser possível recusar a inclusão de uma propriedade numa tal zona de caça municipal ou nacional. Tomemos então um exemplo muito simples: um proprietário rural, num concelho com mais de 50% da área afecta a zonas de caça turísticas e a zonas de caça associativas, não pode, ao abrigo desta lei, constituir no seu concelho mais zonas deste tipo. Há um grupo de caçadores que resolveu solicitar a inclusão da sua propriedade numa zona de caça municipal; esse grupo de caçadores, por acaso, é constituído pelos seus maiores inimigos locais, por pessoas que não lhe merecem a mais pequena consideração. Como o proprietário tem licença de caça, não pode, segundo o artigo 26.º, requerer a não caça, tem, pois, de estar sujeito a ver a sua propriedade gerida por indicação de pessoas em quem não confia, sem hipótese de a retirar! Acontece ainda que se vislumbra aqui um flagrante tratamento de desigualdade: um proprietário vê rentabilizados os seus terrenos ao arrendá-los de livre vontade a zonas de caça turísticas e a zonas de caça associativas; enquanto outro, vizinho daquele, assiste impotente a uma ocupação sem poder escolher quem, na sua propriedade, explora os recursos cinegéticos.
E não se compare esta situação com a alternativa do terreno livre, já que aí o próprio Tribunal Constitucional reconhece haver um bem social que se sobrepõe ao bem particular justamente por ser praticado por toda a gente, sem limitações. De resto, em nenhum lugar da Constituição se encontra um genérico direito à caça, Sr. Secretário de Estado, o que quer dizer que, não sendo um direito constitucional, não pode legitimar qualquer restrição de direitos, liberdades e garantias ou de direitos fundamentais da mesma natureza, tais como o direito à propriedade ou à iniciativa económica privada. De, facto é bom lembrar que o direito à propriedade privada é um direito constitucional que vem previsto no artigo 62.º e que não pode nem deve ser subvertido por um decreto-lei de regulamentação da Lei de Bases Geral da Caça. Mas, se isso não bastasse, o artigo 267.º, n.º 5, da Constituição prevê o direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes digam directamente respeito. De duas, uma: ou o Governo ouve os interessados antes de criar uma zona de caça ou, então, o procedimento de criação de tal zona de caça em terrenos de terceiros é inconstitucional.
Estas são, Sr. Secretário de Estado, as principais objecções quanto ao Decreto-Lei n.º 227-B/2000. Quanto ao resto, o que propomos são pequenas alterações a alguns artigos que, do nosso ponto de vista, só vêm melhorar o diploma. E esperamos para ver o que vai acontecer com as 23 ou 24 portarias que o decreto-lei prevê que venha a regular este regulamento, propondo desde já retirar uma, Sr. Secretário de Estado. Neste afã regulador, prevê o artigo 30.º, n.º 4, definir com o Sr. Ministro da Economia a traça arquitectónica dos edifícios a construir nas zonas de caça turísticas. Pensamos que talvez não sejam as pessoas indicadas para o fazer; e, à laia de descentralização, de que o PS tanto diz gostar, propomos que tal caiba às câmaras municipais de cada região.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura.
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O Sr. Secretário de Estado da Agricultura (Luís Vieira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de me referir às várias questões abordadas pelo Sr. Deputado José Salter Cid, gostaria de, numa breve introdução, relembrar alguns factos, que me parecem importantes.
A Lei n.º 173/99, de 21 de Setembro, foi aprovada nesta Assembleia apenas com os votos contra do PCP, tendo-se o PSD, a quem se deve esta iniciativa parlamentar, abstido.
Esta Lei culminou um longo processo conduzido pelos governos do Partido Socialista, com o objectivo claro de apaziguar os caçadores, introduzindo maior justiça e equilíbrio na gestão dos recursos cinegéticos, o que passou por duas fases essenciais.
Numa primeira fase, em que procurámos pacificar as relações entre caçadores e proprietários, através da publicação de um novo decreto regulamentar da Lei n.º 30/86, de 27 de Agosto, e do cumprimento do Ácordão n.º 866/96, de 18 de Dezembro, do Tribunal Constitucional.
Numa segunda fase, tivemos como objectivo a concepção de um enquadramento legislativo que permitisse uma gestão sustentável dos recursos cinegéticos, numa perspectiva de médio e longo prazos.
E a verdade é que conseguimos pacificar os caçadores - longe vão as aberturas tempestuosas da caça! -, ao mesmo tempo que se criaram as condições para se caminhar no sentido do ordenamento integral de todo o território nacional.
Com a publicação da Lei n.º 173/99, de 21 de Setembro, ficou o Governo responsabilizado, ao abrigo do seu artigo 46.º, por regulamentá-la no prazo de um ano. Foi o que fizemos, cumprindo o prazo.
O PSD refere no seu pedido de apreciação parlamentar a este decreto-lei de regulamentação que gostaria de entender os fundamentos que presidiram à elaboração do diploma - parece que tem algumas dúvidas. Pois bem, aí vão eles (os quais se encontram, aliás, vertidos na Lei, aqui aprovada): é firme convicção do Governo a necessidade de atingir o ordenamento da fauna cinegética em todo o território nacional, como única forma de garantir a conservação sustentável do património faunístico; por outro lado, o Governo também está ciente da sensibilidade social da actividade cinegética e da necessidade de criar condições para que todos os caçadores - repito, todos os caçadores - possam exercer aquela actividade dentro das normas estabelecidas e em respeito pelos princípios internacionalmente aceites.
O equilíbrio entre estes dois princípios gerais, consagrados na lei, é fundamental para a existência da paz social necessária ao desenvolvimento da actividade e para a sua aceitabilidade pelo conjunto da sociedade.
Consagra-se também o direito à não caça, indo ao encontro de uma sensibilidade crescente de certas faixas da sociedade, e, dado ainda tratar-se de uma actividade que envolve certos riscos, concretizam-se disposições para prevenir situações de exercício da caça por pessoas que não se encontram nas condições ideais.
Srs. Deputados, Sr. Deputado José Salter Cid, foi no respeito estrito por estes princípios que procedemos à regulamentação da Lei.
Assim, passando agora concretamente às questões que abordou, gostaria de começar por dizer que estranho muito que seja o Partido Social Democrata a colocar a questão da integração de terrenos privados em zonas de caça nacionais ou municipais, quando o sistema implementado pelo Decreto-Lei n.º 311/87, de 10 de Agosto, e as várias revisões que teve ao longo do tempo, conhecido pelo «processo do edital», permitiram a constituição de inúmeras zonas de caça sem acordos dos proprietários, situação conflituosa que herdámos e que decidimos, em boa hora, alterar, em 1996, antes de o Tribunal Constitucional, em Dezembro desse mesmo ano, se ter pronunciado no mesmo sentido.
O Sr. Gavino Paixão (PS): - Bem recordado!
O Orador: - Lembro que nos vimos obrigados a reinstruir mais de 400 processos, referentes, nomeadamente, a zonas de caça associativas, constituídas por aquele processo e que foram atingidas pela declaração de inconstitucionalidade, o que implicou a regularização da situação patrimonial com cerca de 300 000 proprietários ou arrendatários.
Lembro isto, porque parece que a memória do PSD é curta.
Protestos do PSD.
Não exigimos acordos na constituição de zonas de caça nacionais e municipais, porque se trata de uma transferência de gestão da caça, num determinado espaço, que o Estado faz para uma entidade, a qual pode ser da mais variada natureza (clubes de caçadores, associações de produtores florestais, autarquias, etc.), e que está aberta a todo e qualquer caçador, com vantagens acrescidas para os proprietários fundiários incluídos naquela zona de caça, porquanto constituem a primeira prioridade de entre todos os tipos de caçadores no acesso a essa zona de caça.
Como isto contrasta com tantas zonas de caça criadas à revelia do acordo dos proprietários, onde estes eram até impedidos de caçar! E tivemos, infelizmente, muitos casos, a maioria dos quais, hoje, resolvidos.
Aliás, isto é sustentado judicialmente no, já referido, acórdão do Tribunal Constitucional, que não considera inconstitucional aquele acto no que respeita a zonas de caça sociais e zonas de caça nacionais, apenas o considera relativamente a zonas de caça associativas, dado que, naquelas situações, prevalece a função social da propriedade, o acesso dos caçadores é universal, estando ainda os proprietários em situação privilegiada face aos restantes caçadores.
O Sr. Deputado talvez esteja a confundir a transferência de gestão com a concessão que é feita a um grupo restrito de caçadores beneficiados. Não! As duas figuras não são confundíveis: ambas são ou podem ser legitimamente accionadas pelo Estado - e penso que ninguém aqui foi enganado, que isto ficou claro, aquando da discussão da lei na Assembleia da República - e respondem a interesses diferenciados, respondem a grupos com racionalidades sociais e comportamentais distintas.
O que acabei de dizer não significa, no entanto, que não possa haver entendimentos entre os futuros gestores das zonas de caça nacionais ou municipais e os proprietários, por forma a minimizar ou ultrapassar eventuais conflitos de interesses.
Protestos do Deputado do PSD José Salter Cid.
Lembro ainda, Sr. Deputado, que, em muitas zonas de caça nacionais e municipais, serão certamente necessárias
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acções de ordenamento, por forma a poder disponibilizar caça, e que ficou previsto, no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 227-B/2000, de 15 de Setembro, a necessidade de as autoridades que as efectuem obterem autorização dos proprietários.
O Sr. Deputado referiu também que o Governo não aprovaria zonas de caça turísticas ou associativas, por forma a deixar implementar o sistema das zonas de caça municipais. Isso é falso! Não sei onde o senhor foi buscar essa ideia, se tem valores… Desconheço-o, porquanto, nós, em Março de 2000, no limiar da anterior campanha, tínhamos nos serviços 755 processos da mais diversa natureza, sendo que, deste total, mais de 90% estão decididos ou em vias de decisão - e lembro que, no dia 2, realizar-se-á uma reunião do Conselho Nacional da Caça e da Conservação da Fauna, onde serão presentes muitos destes processos para análise e aprovação - e os restantes 9,3% aguardam conclusão por diversas razões, de entre as quais, a maioria, a falta de elementos (lista de caçadores, cartografia, falta de acordos, etc.) e, noutros casos, a falta de parecer da Direcção-Geral de Turismo ou do Instituto da Conservação da Natureza. Portanto, é completamente falso que eu tenha retido processos para dar caminho a outros, como o Sr. Deputado acabou de insinuar.
Penso que abordei todas as questões que colocou.
Vozes do PS: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.
O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: O Sr. Secretário de Estado saiu à caça e praticamente já levou todas as peças que restavam.
O Sr. Gavino Paixão (PS): - É bom caçador!
O Orador: - Sim…
Tem havido uma questão medieval da caça, em Portugal, extremamente apreciada pelos portugueses, ignorando a riqueza que ela representa em todo o espaço nacional, que são centenas de milhar de hectares, que, neste momento, estão despovoados, desérticos, e que não constituem fonte de rendimento para ninguém, nem para o Estado.
Há naturalmente um fundamento totalitário, tanto na Lei de Bases como no decreto-lei que a regulamenta, que é o de o Estado se arvorar no único gestor de recursos cinegéticos.
Evidentemente, é um processo que, em Portugal, é normal. Somos todos filhos do Estado Novo e muitos de nós não sentem repugnância alguma em ver que o «Velho das botas» ainda continua vivo e de boa saúde na nossa mente!
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Eu também era filho, mas prenderam-me!
O Orador: - Ora, ora, meu caro amigo, vossemecê é o mais parecido com ele! Vá lá…
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - V. Ex.ª estava sempre ao lado! Eu estive na prisão!
O Orador: - O problema é seu…
O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, o assunto é a caça.
O Orador: - Sobretudo, há uma coisa que é considerada quase que um crime, um anátema, em Portugal: é ter lucro - Mehrwert, como diz, em O Capital, Karl Marx - com qualquer actividade. De maneira que o maldito Mehrwert faz uma impressão danada aos governantes portugueses, mesmo a alguns que não se dizem de esquerda, imagine!… Estamos todos contaminados. Por isso, os coutos turísticos são sistematicamente perseguidos. Noutro dia, a um conhecido meu até lhe pediram análises da água para ver se o couto estava em condições - até admitia que lhe pedissem uma análise de urina, para ver se ele estava em condições físicas para aguentar um couto…
De qualquer maneira, Sr. Secretário de Estado, sei que há uma nítida sanha contra os proprietários. E o facto de terem acabado com o nome de «couto privado»… É que ele existe em Espanha! O senhor vai à raia de Espanha e vê que eles da pobreza conseguiram fazer alguma riqueza, enquanto que nós da riqueza conseguimos fazer alguma pobreza - aliás, foi sempre a nossa arte, a de «dar tiros nos pés»!
A verdade é que este regulamento em nada vem melhorar uma lei de bases que, já por si, era deficiente e que passou - é verdade, foi um acto de boa vontade - com as abstenções do PSD e do PP. É verdade! Isso temos de reconhecê-lo! Enfim, os erros estão feitos, as coisas são assim… Mas também ninguém sabia que a intenção dos governantes era tão malévola e tão parcial…
Risos do PS e do PSD.
É que se pensa sempre que, apesar de tudo, são seres humanos e que ainda são susceptíveis de alguma bondade. Mas, pelos vistos, não! E, pelos vistos não, porquê? Este artifício, de as zonas de caça nacionais e as zonas de caça municipais se fazerem sem autorização dos proprietários e de, depois, o ordenamento ter de ser feito com autorização dos proprietários, vai criar conflitos entre as partes em confronto.
Se não houvesse tanta corrupção em Portugal, eu até podia admitir a existência de coutos municipais, mas vão criar-se máfias a nível local, que, naturalmente, se vão aproveitar e ameaçar os presidentes dos municípios. Enfim, é evidente que isto poderá não acontecer. Ainda há seres bons. Eu não os vejo muito, mas ainda há alguns seres com alguns princípios.
Não há qualquer dúvida de que há contradições graves e um sentimento de domínio do Estado sobre toda a vida económica portuguesa.
A verdade é que a serra do Algarve continua com 300 000 ha que não têm uma peça da caça! A verdade é que, se for para a zona que vai do Sabugal à Régua, não vê caça! A verdade é que nas zonas desertificadas de Trás-os-Montes não se vê caça! Enfim, aquilo que poderia ser uma riqueza não o é! E meu Deus, temos o exemplo dos espanhóis, que, desde há muito tempo, conseguiram arranjar coutos sociais e coutos privados e a verdade é que ninguém é privado da caça!
Sei que a maior parte dos caçadores, se lhes fizesse um inquérito, diriam que gostariam de pertencer a um couto associativo, que tem sido um sucesso.
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É evidente que, se começarem a fazer aquilo que foi sempre timbre da Inquisição, a prova da pureza de sangue, e, se à quinta geração encontrarem um judeu, põem-no na fogueira! É isto que os senhores estão a fazer!
Além de descenderem do «velho António de São Bento», descendem também daqueles familiares do Santo Ofício, cuja profissão tanto honrava certas famílias portuguesas!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Muito obrigado, Sr. Deputado Rosado Fernandes. Mandam as regras da boa educação agradecer a sua intervenção.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, fazendo minhas as suas palavras, passo à intervenção,…
O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Força!
O Orador: - … porque é suposto estarmos a discutir um pedido de apreciação parlamentar sobre a lei da caça, e é nesse terreno que me vou fixar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje, já assisti a dois actos de contrição, um do PSD e outro CDS-PP, em relação à viabilização que fizeram, em 1999, da Lei de Bases Gerais da Caça.
O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Não fui eu. Foi o meu pai!
O Orador: - Sr. Deputado, não negue o seu pai!
O PSD e o CDS-PP não só viabilizaram a Lei de Bases Gerais da Caça mas também participaram activamente no grupo de trabalho que foi criado no âmbito da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e muitas das soluções adoptadas na lei, incluindo algumas que, hoje, têm proposto alterar, foram propostas por estes partidos!
Nós, Srs. Deputados, como sabem, na altura, votámos contra e expusemos um conjunto de argumentações, às quais, pelos vistos, os Srs. Deputados, agora, por esse ou por outros ângulos, aderem!
Uma dessa argumentações era exactamente o facto de a Lei de Bases deixar para regulamentação posterior quase tudo o que lhe dava substância. Alertámos, na altura, que isso poderia subverter completamente o conteúdo da Lei de Bases, independentemente de, nessa altura, já termos definido a nossa posição de oposição à Lei de Bases, porque entendíamos que os parâmetros e os princípios nela estabelecidos alteravam o equilíbrio que havia em relação à exploração e ao ordenamento dos recursos cinegéticos.
Somos favoráveis à actividade cinegética como uma actividade complementar dos recursos dos agricultores, como uma actividade lúdica, no quadro de uma política de ordenamento cinegético e de promoção do associativismo, e, nesse contexto, entendemos que o associativismo e o ordenamento não se esgotavam nas chamadas «zonas de caça concessionadas» e que era possível encontrar, naquilo que se chamava «terreno livre», soluções de ordenamento para se manter um princípio social equilibrado entre quem entendia aderir a zonas de caça, tout court, e os chamados «caçadores do regime livre», que, por razões diversas (culturais, económicas, etc.), não tinham condições para nelas serem incluídos.
Na altura, como sabem, também questionámos o princípio do direito à não caça, pelo que ele poderia representar na ordem jurídica da caça: a alteração do direito romano do res nullius, ou da liberdade de caçar, por um princípio germânico, ao qual se poderia abrir a porta, com todas as consequências que isso poderia vir a ter.
Pelos vistos, os Srs. Deputados, neste momento, pensam que a regulamentação veio, pelo menos em parte, dar razão às dúvidas e às críticas que colocámos.
Em todo o caso, Srs. Deputados, as nossas críticas vão por este ângulo e não tanto por alguns outros, não direi todos, propostos pelo PSD.
Para dar um exemplo, mas depois, em sede de comissão, teremos oportunidade de discutir mais em pormenor, o PSD quer integrar, nas prioridades dos caçadores que têm acesso às zonas de caça municipais e nacionais, os caçadores que já estejam integrados noutras zonas de caça na mesma zona. Acho isso errado. Acho isso um perigo, porque é a duplicação dessa possibilidade. Aliás, esse foi um dos elementos de conflito e de choque. Se um caçador está integrado numa zona de caça numa determinada região, não há razão para duplicar a sua presença nas zonas de caça municipais dessa mesma região, as quais substituem, grosso modo, as antigas zonas de caça sociais, com todos os conflitos que isso tem, mais a mais quando todas as pessoas reconhecem que o nível de recursos cinegéticos existente é bastante limitado, podendo encontrar-se, aqui, alguns equilíbrios entre os vários caçadores que estão no terreno.
Este é um exemplo. Poderá haver, aqui, um ou outro aspecto melhor, admito que sim, porque as propostas até foram entregues agora, mas entendemos que algumas propostas apresentadas pelo PSD são capazes de agravar ainda mais os elementos que, para nós, são negativos na actual Lei de Bases Gerais da Caça e respectiva regulamentação.
Sr. Presidente, vou terminar, dizendo que, em sede de comissão, vamos ver em pormenor as propostas entregues na Mesa pelo PSD, mas penso que um dia destes vamos ter de fazer, de novo, um debate geral sobre o problema da actividade cinegética em Portugal e sobre o que temos de fazer para que, de facto, a Lei de Bases Gerais da Caça e a sua regulamentação criem um modelo ordenado de aproveitamento dos recursos cinegéticos, promovam o associativismo e criem condições para que, de uma vez por todas, o aproveitamento da actividade cinegética se faça também de acordo com os interesses ambientais e com os diversos interesses sociais que estão em presença.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.
O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, meu querido adversário, quero perguntar-lhe se, para si, a caça, além de ter um valor ambiental, também poderia constituir uma fonte de riqueza.
Quero ainda dar um pequeno esclarecimento: a velha noção da caça res nullius, no direito germânico continua
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a ser a mesma. Por mais estranho que pareça, os alemães têm o direito romano; os ingleses é que admitiram o direito visigótico, através dos saxões.
Simplesmente, a caça é, efectivamente, res nullius, porque se ela fugir do meu território para o do meu vizinho, ele pode abatê-la sem que isso constitua uma infracção. Mas o direito à caça, dizem os juristas alemães, não é res nullius mas, sim, res do proprietário.
Portanto, há aqui esta pequena diferença que gostava de esclarecer para não haver status ambiguitatis, de que o nosso Governo tanto gosta, porque este permite, de facto, a discrição e tomar as decisões que favoreçam os amigos. Mas isto são coisas da história, são coisas do presente!
Só queria perguntar-lhe se a caça pode ou não dar algum dinheiro? Acha que vai algum mal nisso?
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Lino de Carvalho, não lhe posso dar a palavra em latim para responder, dou-lha em português.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, também não posso responder em latim, porque não andei na Faculdade de Letras e na Faculdade de Economia não se aprendia latim.
O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Que sorte!
O Orador: - Sr. Deputado, porventura, não ouviu a primeira parte da minha intervenção em que afirmei, entre outros aspectos, que a cinegética deve ser também uma fonte complementar do rendimento dos agricultores. Penso que está dada a resposta.
A articulação com o ambiente é no sentido de a actividade cinegética respeitar o ambiente e também os direitos daqueles que têm, perante a caça, uma atitude de distanciamento ou que não querem ver os seus terrenos invadidos por uma actividade que, muitas vezes, como sabe, feita de uma forma desregrada, acaba por se traduzir em prejuízos para proprietários, para agricultores e, às vezes, até para simples cidadãos que usufruem das belezas da natureza.
Portanto, temos de encontrar um equilíbrio. É por isso que a chamada concepção romanística do res nullius da liberdade de caçar foi a que sempre presidiu à actividade cinegética em Portugal e que considero dever manter-se, aliás, em acórdão, o Tribunal Constitucional reafirma este princípio. Porém, não posso deixar de fazer notar que, entretanto, se multiplicou a legião, no bom sentido do termo, de caçadores.
Assim, temos de encontrar soluções equilibradas entre esse princípio, a defesa dos recursos cinegéticos, que são finitos, o seu ordenamento e o respeito em relação a todos aqueles que têm uma posição própria de distanciamento quanto à caça, bem como em relação aos proprietários que consideram que os seus terrenos não têm necessariamente de ser invadidos por caçadores.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, tem de concluir, pois já esgotou o tempo de que dispunha.
O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
É, pois, este equilíbrio que é preciso encontrar e que, pensamos, a lei não conseguiu obter.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado Lino de Carvalho, beneficiou de 1 minuto que lhe foi cedido pela Mesa para o Sr. Deputado Rosado Fernandes poder ouvir a sua resposta.
O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Isso é partidarismo!
Risos.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem de haver algum partidarismo, pois, caso contrário, estas discussões não teriam sal!
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gavino Paixão.
O Sr. Gavino Paixão (PS): - Ex.mo Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A apreciação parlamentar apresentada pelo PSD, respeitante ao Decreto-Lei n.º 227-B/2000, de 15 de Setembro, que regulamenta à Lei n.º 173/99, de 21 de Setembro, vulgo lei da caça, apesar de algumas inexactidões, que já tivemos oportunidade de constatar neste debate, tem o mérito de poder realizar uma avaliação mais serena e justa da respectiva lei e da sua regulamentação.
Refere o PSD que o Decreto-Lei n.º 227-B/2000 suscita enorme controvérsia e dúvidas quanto à sua justeza e equilíbrio para os caçadores, em resultado da aplicação deste novo instrumento legal.
Sr.as e Srs. Deputados, apelo à vossa memória, o que, creio, já foi feito pelo Sr. Secretário de Estado, para relembrar o clima de suspeição, as manifestações sucessivas, as ameaças constantes de confrontação e o clima geral de contestação que foram as notas dominantes durante os anos de 1993, 1994 e 1995. Esta situação ocorreu, porque os responsáveis políticos do PSD - é bom relembrá-lo também - nunca souberam ou quiseram enfrentar esta problemática com a serenidade e o respeito que ela merecia.
É bom recordar que foi necessário o Governo do PS criar condições que permitissem pacificar os antagonismos existentes, o que, felizmente, foi possível conseguir.
Sr.as e Srs. Deputados: A Lei de Bases Gerais da Caça, cuja regulamentação hoje apreciamos, teve como principais preocupações o ordenamento do território cinegético, sobre o qual vários intervenientes já hoje falaram, e a conservação do meio ambiente (uma vertente que me parece também essencial), motivações que encontraram, nos diversos sectores, um amplo consenso.
Figuras como as zonas de caça municipais, o melhoramento do sistema de seguros e o regime do direito à não caça encontraram no diploma regulador apaziguamento quanto a alguns receios colocados durante a discussão da Lei n.º 173/99, de 21 de Setembro. Ainda há pouco, o nosso colega Lino de Carvalho focava que, durante essa discussão, muitas foram as dúvidas que surgiram pelo facto de algumas das matérias estarem reenviadas para futura regulamentação. Creio que essa regulamentação, na sua grande maioria, veio retirar alguns dos receios que existiram nessa discussão.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A boa aceitação, na generalidade, destes instrumentos jurídicos não deve ser impeditiva, quer para o Governo, quer para a Assembleia da República, de tentar responder e clarificar algumas dúvidas ou críticas que,
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porventura, possam surgir, aliás, creio que muitas delas já foram hoje aqui esclarecidas cabalmente.
O difícil equilíbrio deve-se, do meu ponto de vista, à procura de consensos entre os diversos actores. Para uns, o exercício da caça é meramente lúdico e de carácter desportivo, mas não podemos esquecer a importância económica e ambiental que esta matéria também reveste.
A caça é, hoje, do nosso ponto de vista, uma riqueza nacional, regional e local de extrema importância para todos. O equilíbrio tentado na distribuição entre zonas de caça turísticas, zonas de caça associativas e zonas de caça municipais é mais um sinal de pacificação e de reconhecimento de diversos interesses em presença.
Sr Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Creio, sinceramente, que os motivos apresentados pelo PSD na sua apreciação parlamentar não têm razão de ser, pelo menos aqueles que hoje mais foram evidenciados neste debate.
Acredito que os contributos hoje aqui debatidos obedeceram a preocupações genuínas, mas não tentemos encontrar problemas onde eles não existem, pelo menos com a intensidade que pretenderíamos.
Estamos e estaremos atentos às dúvidas levantadas e teremos oportunidade de, em sede de Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, analisar ao pormenor as propostas apresentadas, sempre na procura de melhorar a prática de um exercício primordial para a economia nacional e para a pacificação de um sector cujos interesses são, na maioria, antagónicos.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Os diversos agentes encontraram no Governo e no Grupo Parlamentar do Partido Socialista interlocutores atentos e interessados nas suas preocupações.
Nesta, como noutras matérias, continuaremos a tentar encontrar consensos, mesmo que considerados impossíveis para muitos. Saber ouvir e agir com respeito pelo bem comum foi, e continuará a ser, o nosso lema.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Salter Cid.
O Sr. José Salter Cid (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de clarificar um aspecto referido pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
O problema da precedência pode ser explicado facilmente. Por exemplo, se sou associado numa zona de caça associativa no Alentejo ou no Ribatejo e vou a Trás-os-Montes para uma montaria tenho precedência sobre o homem dessa região, que, por acaso, também tem lá uma zona de caça associativa. O problema é este e por isso queria ver o diploma alterado. De qualquer forma, discutiremos este aspecto em comissão. É que isto não faz sentido, pura e simplesmente!
O que vejo com agrado é que, afinal, estamos todos de acordo: não queremos voltar ao que aconteceu no tempo do governo do PSD! Parece-me que quanto a isto estamos todos de acordo. O PS e o PP dizem estar de acordo, presumo que o Sr. Deputado Lino de Carvalho também, e o Sr. Secretário de Estado afirmou peremptoriamente que não queria voltar a esse tipo de problemas, de caçadores contra proprietários e de proprietários contra caçadores. Ora, parece-me que, com o diploma em apreciação, pode acontecer o mesmo.
Se quiserem fazer uma zona de caça municipal num terreno de que sou proprietário, no concelho da Chamusca, contra a minha vontade, eu não autorizo. Eu, proprietário, não autorizo! Eu, caçador, não posso retirá-lo para não caça, porque estou impedido pela lei. Então, o que faço? Sou obrigado a ficar na zona de caça municipal, que é gerida por pessoas de quem não gosto?! Não pode ser!
É este o problema que se levanta hoje, que será levantado no futuro e que, em consenso, conseguiremos resolver com toda a facilidade. Pode não ser um acordo tão tacitamente expresso como o previsto para as zonas de caça associativas ou para as zonas de caça turísticas, em que é preciso caderneta predial actualizada, autenticada em notário e assinatura do proprietário constante da caderneta, o que cria várias dificuldades e impossibilidades. Porém, parece-me que estamos todos em sintonia quanto a considerarmos que o problema existe.
Eu, como proprietário, não quero que a minha propriedade seja gerida, em termos cinegéticos, por pessoas a quem não reconheço autoridade para tal.
Vozes do PSD: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Agricultura.
O Sr. Secretário de Estado da Agricultura: - Sr. Presidente, gostaria de aproveitar esta oportunidade para responder ao Sr. Deputado Rosado Fernandes.
Sr. Deputado, estamos de acordo com todos os pontos, na medida em que o Governo vê a actividade cinegética como criadora de riqueza e de desenvolvimento rural, aliás, é para isso que estamos a trabalhar. Penso que a Lei n.º 173/99, de 21 de Setembro, e a sua regulamentação pretendem dar um contributo muito forte nesse sentido, nomeadamente ao tentar ordenar todo o nosso território.
Sr. Deputado Rosado Fernandes, quero dizer-lhe que não temos qualquer sanha contra as zonas de caça turísticas. De facto, por orientação minha e do meu colega da área do turismo, que esteve há pouco nesta Câmara, procedemos a uma operação de fiscalização junto de zonas de caça turísticas que estavam com processos de renovação ou de anexação em curso. Porém, estamos a falar de um total de 25% das zonas de caça turísticas, relativamente às quais era preciso perceber se estavam a cumprir ou não todos os planos a que se tinham obrigado no contrato de concessão que lhes tínhamos atribuído uns anos antes.
Pensava-se, inicialmente, que esta acção de fiscalização levasse a um indeferimento de muitas zonas de caça, o que, felizmente, não ocorreu, aliás, são poucas as que irão ficar pelo caminho depois da operação de fiscalização.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho acabou por não colocar qualquer questão concreta, aliás, dá-nos razão relativamente à alteração proposta pelo PSD quanto aos caçadores inseridos em zonas de caça sociais numa determinada região cinegética poderem ter acesso às zonas de caça municipais. Nesse aspecto, estamos de acordo.
Sr. Deputado Lino de Carvalho, posso dizer-lhe também que, para além de ordenar o território com o intuito de criar caça e de termos um desenvolvimento sustentável da cinegética numa relação muito estreita com preocupações de natureza ambiental, temos uma outra questão: encontrar caça a preços acessíveis para 250 000 caçadores, em Por
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tugal. É perseguindo este objectivo que estamos a legislar e a regulamentar, ao contrário do que o Sr. Deputado diz, não nos desviando um milímetro do que foi aprovado na Câmara. Penso que os princípios fundamentais vertidos na lei aprovada na Assembleia da República estão a ser respeitados por nós na regulamentação.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Não havendo mais inscrições, dou por terminada a apreciação do Decreto-Lei n.º 227-B/2000, de 15 de Setembro [apreciação parlamentar n.º 27/VIII (PSD)]. Informo que as propostas de alteração apresentadas pelo PSD baixam, juntamente com o Decreto-Lei, à 11.ª Comissão para debate e votação na especialidade.
Srs. Deputados, resta-me dar conta que a próxima reunião plenária se realiza quarta-feira, com início às 15 horas, constando da ordem de trabalhos, além do período de antes da ordem do dia, no período da ordem do dia, a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 55/VIII, bem como a discussão, também na generalidade, dos projectos de lei n.os 203/VIII, apresentado pelo BE, e 351/VIII, apresentado por Os Verdes.
Está encerrada a sessão.
Eram 13 horas e 5 minutos.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:
Partido Socialista (PS):
António Alves Martinho
Carlos Manuel Luís
Cláudio Ramos Monteiro
Emanuel Silva Martins
Helena Maria Mesquita Ribeiro
Isabel Maria dos Santos Barata
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Luísa Pinheiro Portugal
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Francisco dos Santos Valente
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Rosalina Maria Barbosa Martins
Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Paulo Martins Pereira Coelho
Domingos Duarte Lima
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Joaquim Monteiro da Mota e Silva
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José de Almeida Cesário
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Durão Barroso
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Sérgio André da Costa Vieira
Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL