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Sábado, 24 de Março de 2001 I Série - Número 64

DIÁRIO da Assembleia da República

VIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2000-2001)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 23 DE MARÇO DE 2001

Presidente: Ex.mo Sr. João António Gonçalves do Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. José Ernesto Figueira dos Reis
José de Almeida Cesário
António João Rodeia Machado
António José Carlos Pinho

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.
Foi discutido, na generalidade, a proposta de lei n.º 62/VIII - Altera a Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro, que aprova o regime da publicação, identificação e formulário dos diplomas, no sentido de atribuir relevância jurídica para todos os efeitos legais à versão electrónica do Diário da República. Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (Vitalino Canas), os Srs. Deputados Miguel Macedo (PSD), António Filipe (PCP), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) e Cláudio Monteiro (PS).
Ainda na generalidade, foi discutida a proposta de lei n.º 59/VIII - Autoriza o Governo a legislar no sentido de alterar o estatuto da associação pública denominada Ordem dos Farmacêuticos, tendo-se pronunciado, além do Sr. Secretário de Estado da Saúde (José Miguel Boquinhas), os Srs. Deputados Joaquim Ponte (PSD), Pedro Mota Soares (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), João Sequeira (PS) e Luís Fazenda (BE).
Procedeu-se à discussão conjunta dos projectos de resolução n.os 105/VIII - Adopta um plano de emergência no perímetro das minas da Urgeiriça (Os Verdes), e 99/VIII - Recomenda ao Governo medidas concretas para resolver o problema da radioactividade nos resíduos e nas minas de urânio abandonadas (PSD), tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia (Vítor Santos), os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Miguel Ginestal (PS), Ana Manso (PSD), Carlos Alberto Santos e Joel Hasse Ferreira (PS), Joaquim Matias (PCP), Rosado Fernandes (CDS-PP), Luís Fazenda (BE) e Renato Sampaio (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 10 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António Bento da Silva Galamba
António Fernandes da Silva Braga
António Fernando Marques Ribeiro Reis
António Fernando Menezes Rodrigues
António José Gavino Paixão
António José Santinho Pacheco
António Manuel Dias Baptista
António Manuel do Carmo Saleiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Bruno Renato Sutil Moreira de Almeida
Carla Maria Nunes Tavares Gaspar
Carlos Alberto
Carlos Alberto Dias dos Santos
Casimiro Francisco Ramos
Cláudio Ramos Monteiro
Eduardo Ribeiro Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Pereira Serrasqueiro
Filipe Mesquita Vital
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Gil Tristão Cardoso de Freitas França
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco d'Almeida
Isabel Maria dos Santos Barata
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge Tinoco de Faria
Isabel Maria Soares Pinto Zacarias
Jamila Barbara Madeira e Madeira
João Francisco Gomes Benavente
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José Alberto Leal Fateixa Palmeiro
José Aurélio da Silva Barros Moura
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Carlos Pinto Basto Mota Torres
José da Conceição Saraiva
José Ernesto Figueira dos Reis
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Rosa do Egipto
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Manuel dos Santos Silva Patrão
Luís Manuel Ferreira Parreirão Gonçalves
Luís Miguel Gomes Miranda Teixeira
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel António dos Santos
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Margarida Maria Santos Soares da Rocha Gariso
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria do Céu da Cruz Vidal Lourenço
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria José Vidal do Rosário Campos
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Alexandre Homem de Oliveira Fonseca
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Leal Marqueiro
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Alves Peixoto
Vítor Manuel Caio Roque
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Álvaro dos Santos Amaro
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Martins Narciso
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António d'Orey Capucho
António Manuel da Cruz Silva
António Manuel Santana Abelha
Armando Manuel Dinis Vieira
Arménio dos Santos
Armindo Telmo Antunes Ferreira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos José das Neves Martins
Carlos Parente Antunes
Domingos Duarte Lima
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Eugénio Fernando Sá Cerqueira Marinho
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Jorge Loureiro de Reboredo Seara
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa

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João Bosco Soares Mota Amaral
João José da Silva Maçãs
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rêgo Mendes Martins
José Luís Campos Vieira de Castro
José Miguel Gonçalves Miranda
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Castro de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Barata Frexes
Manuel Maria Moreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria do Céu Baptista Ramos
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Nuno Miguel Marta de Oliveira da Silva Freitas
Nuno Miguel Sancho Cruz Ramos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rui Fernando da Silva Rio
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Alexandrino Augusto Saldanha
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
João António Gonçalves do Amaral
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Octávio Augusto Teixeira
Vicente José Rosado Merendas

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
António José Carlos Pinho
António Manuel Alves Pereira
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Mota Soares
Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Sacadura Cabral Portas
Raúl Miguel de Oliveira Rosado Fernandes
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

Bloco de Esquerda (BE):
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem de trabalhos consiste da discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 62/VIII - Altera a Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro, que aprova o regime da publicação, identificação e formulário dos diplomas, no sentido de atribuir relevância jurídica para todos os efeitos legais à versão electrónica do Diário da República.
Para introduzir o debate, em representação do Governo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.

O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros (Vitalino Canas): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 62/VIII, de alteração à Lei n.º 74/98, de 11 de Novembro (Lei Formulário), visa atribuir relevância jurídica plena à publicação electrónica do Diário da República, determinando-se dessa forma que todos os prazos legais, nomeadamente para efeitos de vacatio legis, passem a ser contados a partir da disponibilização do jornal oficial através da Internet.
Assim, a única data juridicamente relevante é a da publicação electrónica do Diário da República, assegurando-se que é essa a data impressa na versão em suporte de papel. Eliminam-se, dessa forma, os suplementos distribuídos em data posterior à que consta do seu texto, garantindo maior certeza e segurança jurídicas na entrada em vigor dos diplomas legais.
Por outro lado, a versão electrónica do Diário da República deve incluir obrigatoriamente nos termos da proposta de lei, além da data da publicação na Internet, a data da distribuição postal da versão em suporte de papel, para que os utilizadores possam facilmente aceder ao mesmo sem necessidade de manter a assinatura desta versão do jornal oficial. Esta solução afigura-se mais correcta do que a atribuição durante um período transitório de relevância jurídica às datas das duas versões do Diário da República.
De facto, apesar de esta segunda hipótese ser aparentemente mais prudente e gradual, acarretaria graves inconvenientes ao nível da certeza e segurança jurídicas, visto que passariam a co-existir duas datas com igual relevância jurídica, suscitando enormes dúvidas quanto à contagem dos prazos legais e efectiva entrada em vigor dos diplomas. Esta solução foi, aliás, objecto de um parecer negativo da Imprensa Nacional - Casa da Moeda, que se pronunciou favoravelmente à proposta do Governo em cuja elaboração colaborou activamente.
Outra vantagem importante da proposta agora em discussão prende-se com a uniformização do prazo de vacatio legis para todo o território nacional e para o estrangeiro, eliminando-se desfasamentos entre as diferentes regiões do País, nomeadamente as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, visto que a Internet proporciona um acesso praticamente instantâneo a todos os destinatários (aproveita-se também para eliminar a referência a Macau). Sendo certo que a uniformização do prazo de vacatio legis pressupõe a redução dos prazos actualmente previs

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tos para as Regiões Autónomas e para o estrangeiro, esse encurtamento não se afigura lesivo dos interesses dos destinatários que aí residem, uma vez que o acesso à Internet não está sujeito à morosidade e aos atrasos inerentes à distribuição postal.
Nesta medida, atribuição de relevância jurídica à publicação electrónica traduz-se numa redução dos desfasamentos entre as várias regiões do País, até porque é conjugada com o objectivo constante do Programa do Governo de promover o acesso generalizado à Internet.
Quanto aos prazos de resposta supostamente mais morosos para os destinatários residentes naqueles regiões, não nos parece que constituam obstáculo à uniformização do prazo de vacatio legis por duas razões.
Primeiro, porque o Governo já tomou medidas no sentido de permitir que as respostas, quer no âmbito de processos judiciais quer perante a Administração Pública, por exemplo, sejam enviados também por correio electrónico e por fax.
Segundo, porque os prazos de resposta contam-se sempre a partir da notificação ou citação dos processo judiciais e, por outro lado, quando esteja em causa a impugnação administrativa ou contenciosa de actuações administrativas que careçam de publicação em Diário da República o Código de Procedimento Administrativo, no seu artigo 73.º, e a lei do processo dos tribunais administrativos, no seu artigo 28.º, prevêem prazos diferentes em função da residência dos particulares interessados.
Refira-se, aliás, que a Assembleia Legislativa Regional dos Açores, que já se pronunciou sobre esta proposta de lei, assumiu o encurtamento do prazo de vacatio legis como, justamente, uma das vantagens da proposta em apreço.
A alteração legislativa agora proposta pelo Governo contribui ainda para facultar a todos os intérpretes e aplicadores do direito, bem como aos cidadãos em geral, um meio mais simples e célere de acesso ao Diário da República, sem que isso que represente custos acrescidos para os utilizadores.
De facto, apenas se exige o pagamento de uma assinatura, tal como acontece actualmente para a versão em suporte de papel, evitando-se, inclusivamente, uma duplicação de gastos, na medida em que os utilizadores poderão optar por manter apenas a assinatura via Internet uma vez que é a publicação electrónica que tem relevância jurídica, a partir do momento em que este diploma seja aprovado, para todos os efeitos legais.
Aliás, para os grandes utilizadores do Diário da República, tais como os tribunais, os serviços da Administração Pública, as sociedades, os escritórios de advogados e as empresas, existem enormes vantagens de espaço, bem como a facilidade de busca na opção apenas pela assinatura da versão electrónica do Diário da República.
A presente proposta de lei visa, ainda, proceder a uma interpretação actualista do artigo 119.º, n.º 1, da Constituição, no sentido de garantir que o Estado acompanhe o desenvolvimento das novas tecnologias da informação. À luz desta interpretação actualista do referido preceito constitucional, a publicação em Diário da República garante o inteiro e cabal cumprimento das exigências de publicidade constantes daquela disposição.
Não se vislumbra, por isso, qualquer desconconformidade com o texto constitucional pelo facto de se eliminar a exigência legal que o Diário da República seja distribuído no dia correspondente à sua data. Efectivamente, aquela exigência justificava-se pelo facto de apenas ser atribuída relevância jurídica à versão em suporte de papel do Diário da República, contando-se o prazo da vacatio legis a partir da sua efectiva distribuição, que deveria por isso coincidir com a data impressa no próprio jornal oficial.
Ora, se a entrada em vigor dos diplomas legais passa a contar-se a partir da publicação electrónica, a data de distribuição da versão em suporte de papel deixa de ser determinante para efeitos de publicidade dos diplomas.
A orientação adoptada na presente proposta de lei integra-se plenamente no Programa do Governo, que tem vindo a privilegiar o desenvolvimento da sociedade da informação e a promover a utilização generalizada da Internet, através da criação dos meios tecnológicos e jurídicos necessários à concretização desse fim.
Neste contexto, a solução que o Governo submete agora à apreciação desta Assembleia contribui decisivamente para alcançar estes objectivos, na medida em que traduz uma nova concepção do Estado relativamente à importância dos novos meios da sociedade da informação, razões pelas quais o Governo pede que a presente proposta de lei mereça a aprovação de VV. Ex.as.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Secretário de Estado teve oportunidade de traçar o quadro jurídico das alterações que se pretendem introduzir nesta matéria. Evidentemente que a minha bancada partilha da preocupação e da vontade do Governo de, progressivamente, se ir simplificando, modernizando e, portanto, facilitando o acesso dos cidadãos a novas tecnologias, garantindo, assim, uma maior eficácia do conhecimento das leis e dos diplomas relevantes nos termos em que vem proposto no diploma ora em discussão.
Para não estarmos a repisar os aspectos que estão contidos na proposta de lei, interessa levantar duas questões.
A primeira é a de saber se será prudente, no actual estado de coisas, em Portugal, passarmos a privilegiar como relevante para efeitos jurídicos exclusivamente a publicação do Diário da República na Internet.
Aliás, quero chamar a atenção da Câmara para o facto de, em vários países da União Europeia que recorrem já ao suporte electrónico para a publicação dos diplomas legais, essa publicação (tanto quanto é do nosso conhecimento) ocorrer sempre em concorrência com a publicação em suporte de papel, como, de resto, vai continuar a suceder em Portugal. Contudo, nesses países, ao contrário do que se quer fazer em Portugal, a data de referência para relevância jurídica não é a data do suporte electrónico mas a do suporte de papel.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Justamente por isso, ao contrário daquilo que o Sr. Secretário de Estado aqui afirmou, entendemos que pode haver dúvidas quanto à conformidade desta solução apresentada na proposta de lei relativamente ao artigo 119.º da Constituição. Isto porque, suprimindo-se desta lei a exigência de que a distribuição do Diário da República ocorre na data que é aposta em cada uma das

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edições, pode criar-se uma situação que não é desejável do ponto de vista da certeza e da segurança jurídicas.
É certo que o Governo diz que, com a passagem da data de referência com relevância jurídica do suporte de papel para o suporte electrónico, pela tecnologia que é empregue, podemos acabar com as diferenças de vacatio legis que hoje ocorrem para a entrada em vigor dos diplomas consoante se esteja no território continental, nas regiões autónomas ou no estrangeiro. Como sabem, hoje, nos termos da lei, esses prazos vão dos 5 aos 30 dias, conforme as situações. Através desta solução, o Governo elimina essa diferença. É uma vantagem. É verdade que é!
Mas, Sr. Secretário de Estado, eu não confiaria tanto, como aparentemente V. Ex.ª aqui quis expressar, na tão extensa cobertura do País e tão generalizado acesso, designadamente dos escritórios de advocacia, à Internet, como o Sr. Secretário de Estado aqui fez.
É certo que hoje, regra geral, os cidadãos têm um acesso maior à Internet. No entanto, não julgo que seja um acesso tão generalizado quanto aquilo que se pensa.
Por isso, Sr. Secretário de Estado, a terminar, permitia-me sugerir que, eventualmente, o Governo e, evidentemente, a Assembleia da República, na reponderação desta matéria, pudessem, porventura, encontrar uma solução mista. Isto é, avançar para a solução que o Governo preconiza, mas dar um período de dois ou três anos de adaptação a esta situação, para que, no final desse período, na avaliação que se fizesse de todas as situações, pudéssemos garantir que da solução que é proposta pelo Governo não acresce qualquer problemas. Isto porque não temos qualquer dúvida de que, em termos futuros, vamos ter que caminhar para esta solução.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: A minha intervenção sobre esta matéria vai ser breve. Quero apenas suscitar um problema que, do nosso ponto de vista, não ficou bem explicado, quer na proposta de lei quer na intervenção do Sr. Secretário de Estado, e que suscita alguma reserva.
Trata-se da questão das datas de entrada em vigor.
Como é evidente, compreendemos que ter acesso à edição electrónica do Diário da República facilita a vida a quem com ele trabalha. Nos serviços públicos, nas empresas, nos escritórios de advogados, a consulta da versão electrónica tem todas as vantagens, sendo desejável que se generalize o mais possível.
Contudo, o problema tem que ver com a data de entrada em vigor dos diplomas, o que tem efeitos, como é natural. Basta pensarmos em nós próprios e no prazo que decorre para que um decreto-lei, do Governo, seja chamado à apreciação parlamentar.
Até agora, a data relevante para esse efeito é a data da distribuição da edição do Diário da República. Isto é, se o Governo publicar hoje um decreto-lei num suplemento do Diário da República com data do mês passado, não está precludido o prazo para que os Deputados o possam chamar à apreciação parlamentar. Portanto o prazo começaria a contar da data da distribuição do Diário da República.
No entanto, quando se diz que a data de entrada em vigor de um diploma é a data da sua disponibilização no Diário da República electrónico, coloca-se o problema de saber o que acontece se a distribuição na versão de papel for posterior. Ou seja, qual é, de facto, a data relevante?
Quanto a este aspecto, não me parece que possam ser prejudicados os direitos de quem não tem acesso à Internet mas apenas tem acesso à edição electrónica do Diário da República.
Creio que não é aceitável uma solução em que, no dia em que é distribuído um diploma em suporte de papel do Diário da República, se diga: «Este diploma que é hoje distribuído em suporte de papel está em vigor há dois meses, porque foi essa a data da sua publicação na versão electrónica». Creio que, como isso, se iriam prejudicar direitos legítimos das pessoas.
Portanto, se se quer dar relevância à data da disponibilização na Internet, do nosso ponto de vista, é um dever inquestionável que a versão em suporte de papel seja disponibilizada na mesma data. Se não, criamos um problema em que os utilizadores da versão em suporte papel ficam seriamente prejudicados nos seus direitos relativamente ao conhecimento que tenham da entrada em vigor dos diplomas.
Evidentemente que o problema estaria resolvido se houvesse uma generalização do acesso à Internet, mas essa generalização ainda não existe, pelo que tem de se ter em conta também os interesses e os direitos legítimos de quem não tenha acesso à Internet.
Neste momento, é um problema de que se fala muito - e com razão -, dado o avanço e a invasão, positiva, da informática no dia-a-dia de todos nós, mas há um problema de infoexclusão, em relação ao qual todos temos de fazer alguma coisa para que não se acentuem as desigualdades entre quem tem acesso a estas tecnologias e quem não tem. Creio que uma medida destas, imponderada, iria reforçar as dificuldades dos infoexcluídos. Penso que poderíamos evitar perfeitamente isso, não criando uma disparidade entre a data da entrada em vigor dos diplomas, de acordo com a data da sua disponibilização na Internet, e não deixando quem não tem acesso à Internet sujeito à contingência de ver diplomas legais entrarem em vigor sem possibilidade de terem disso conhecimento.
Gostaria, pois, que o Sr. Secretário de Estado, uma vez que ainda dispõe de tempo, se referisse a este ponto, porque creio que ele tem grande importância neste contexto.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Popular julga que a análise desta iniciativa legislativa não se esgota em si mesma e, muito embora não seja propriamente polémica, peca largamente por defeito.
Quer parecer-nos, Sr. Secretário de Estado, que, muito embora não nos choque a possibilidade de a entrada em vigor dos diplomas passar a contar da data da sua disponibilidade na Internet, já que o Governo faz tanto gáudio das virtualidades da sociedade da informação e de tudo o mais que, com ela, está associado, atentas as implicações que cada Diário da República tem para os cidadãos, atento o custo de uma página da Internet, que, tanto quanto sei, está na ordem dos 300 contos anuais, julgo que o que

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hoje se devia estar a discutir era o acesso gratuito dos cidadãos ao Diário da República…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … e não tanto se a entrada em vigor se verifica com a data da sua disponibilidade na Internet ou com a data da sua publicação em suporte de papel, porque não é por aí que vem grande mal ao mundo.
Seja como for, esta iniciativa também nos demonstra que, para o Governo socialista, as prioridades em matéria de combate aos problemas da justiça, que, como sabemos, são estruturais, estão completamente invertidas.
Havia tanta coisa sobre os problemas da justiça que o Governo nos podia trazer aqui hoje para discutir com carácter de urgência; no entanto, o que é que nos traz aqui? Mais uma vez, uma virtual medida relacionada com a Internet. Esta iniciativa demonstra-nos, por isso, que, tal como já vimos afirmando há muito tempo, as prioridades do Governo em matéria de justiça estão completamente invertidas.
Porque, Sr. Secretário de Estado, quando a justiça, em Portugal, continua a sofrer os gravíssimos problemas estruturais, que, já há vários anos, lhe dão um carácter quase de terceiro mundista, o Governo, ao invés de atacar de frente estes problemas, refugia-se nestas virtudes da Internet, convencido de que o recurso a estas tecnologias do ano 2000 vão resolver milagrosamente os problemas de uma justiça que, infelizmente, sabemos qual é.
Tivemos, ontem, a notícia da videoconferência, que aplaudimos, e, de facto, é muito vantajosa - não o discutimos; hoje, discute-se a relevância desta publicação electrónica do Diário da República; amanhã, vamos recorrer ao suporte digitalizado…
Só que, entretanto, Sr. Secretário de Estado, continuamos a ter tribunais com gravadores obsoletos e que, em muitos casos, não funcionam, onde V. Ex.ª quer fazer o registo da prova, e não o pode fazer, e lá tem o magistrado de continuar a escrever à mão, porque o tribunal não tem um mísero gravador que funcione.
Os Srs. Magistrados continuam a ter de comprar computadores do seu bolso, porque, nem que queiram aceder às maravilhas da Internet, o Estado não lhes fornece, como seria suposto, um computador para terem no seu gabinete a fim de o fazer.
Por outro lado, os Srs. Magistrados também, até há bem pouco tempo e ainda em muitos casos, se quiserem aceder a bases de dados, por exemplo, de jurisprudência ou de legislação, têm que pagar do seu bolso a assinatura, não só do acesso à Internet mas também a assinatura da própria página relativa a essas bases de dados, porque o Estado não lhes dá esta faculdade, privando-os, assim, de um instrumento de trabalho essencial.
Os tribunais, em muitos casos, continuam sem ter sequer uma biblioteca ou um obsoleto papel e o livrinho por onde todos estudamos e que, pelo menos, do nosso ponto de vista, continua a trazer-nos grandes ensinamentos. Essas bibliotecas, que tão essenciais são, que tão antigas eram e que tantos lucros nos podiam trazer a todos, também, na maior parte dos tribunais, não existem.
Muitos tribunais continuam a nem sequer ter salas condignas para os advogados e, por via disso, eles lá se vão amontoando, como se sabe, pelos corredores, juntamente com testemunhas, com arguidos, com peritos - sabe-se lá com quem mais!… -, sem as mínimas condições e sem que possam exercer a profissão com a dignidade que, desde logo, a lei exige que lhes seja consagrada.
O segredo de justiça continua a ser impunemente violado todos os dias, sem que sejam tomadas medidas eficazmente, com vista a combater esse problema.
Numerosas comarcas continuam sem juízos essenciais ao exercício efectivo da justiça instalados, apesar de numerosos reivindicações das populações, um pouco por este país fora.
As cadeias continuam a promover o convívio indiscriminado de preventivos e de presos, de pessoas doentes e de pessoas que não são doentes, de presos por criminalidade violenta e de presos por outro tipo de criminalidade.
Enfim, Sr. Secretário de Estado, poderia continuar com a lista, porque ela é infindável.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (José Magalhães): - Mas o tema é o Diário da República!

O Orador: - No entanto, o diploma que estamos aqui a discutir - e folgo em ver que, ao menos, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares não é de todo indiferente à minha intervenção (é sinal de que poderá fazer com que alguma coisa mude, se assim o entender) -, não só pega por defeito, porque, como já disse, e repito, Sr. Secretário de Estado, caso não tenha estado atento nessa parte,…

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Estive! Estive!

O Orador: - … o que devíamos estar aqui a discutir era o acesso gratuito ao Diário da República,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … que VV. Ex.as podiam facilmente facultar, e não tanto a data da publicação…
Porque é isto que hoje estamos aqui a discutir, havendo tanta coisa mais importante cuja discussão o Governo deveria estar a promover, então, também isto nos demonstra que para o Governo português a ordem das prioridades em matéria de justiça está completamente invertida.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por isso lhe digo, Sr. Secretário de Estado da Presidência - e com isto termino -, que, muito embora nada tenhamos a objectar a este diploma, que, certamente, merecerá a nossa aprovação, deixamos, em todo o caso, esta ressalva, para que, daqui para o futuro, e caso o Governo ainda tenha tempo para o fazer, o que duvidamos, tente fazer alguma na justiça e mude, já que, porventura, não se pode mudar aquilo que é essencial, isto é, o Governo português.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não resisto em começar a minha interven

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ção por dizer que o Sr. Deputado Nuno Melo, certamente, ou se enganou no debate…

Risos do PS.

… ou, então, não percebeu que não só não estamos a discutir os temas da justiça como também o Sr. Secretário de Estado Vitalino Canas não tem qualquer responsabilidade directa nessa matéria.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Só que a principal implicação deste diploma diz respeito à justiça!

O Orador: - Sr. Deputado, percebo que lhe tenham atribuído a si o pelouro da justiça e que, portanto, o seu discurso se centre nele, mas, como deve perceber, numa Assembleia legislativa do que se trata, em primeiro lugar, é da feitura de leis. Essa é a nossa primeira tarefa. O que está aqui em causa é uma questão que diz respeito à feitura das leis e aos seus efeitos.
Portanto, este problema é, em primeiro lugar, um problema nosso, e não apenas do Governo, e tem de ser tratado com a seriedade com que, apesar de tudo, a questão foi tratada, não obstante as dúvidas suscitadas pelas outras bancadas.
Eu, aliás, a meio da sua intervenção, comecei a desconfiar que, afinal, já não é o PCP que tem a «cassete» mas, sim, o PP, porque, de facto, ela parece que é reiteradamente utilizada em todos os debates.

Risos do PS.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Agora é o PS!

O Orador: - Há duas questões fundamentais que, julgo, devem ser ponderadas com seriedade: por um lado, a questão da certeza e da segurança jurídicas e, por outro, o problema do acesso à informação jurídica, designadamente o acesso ao direito e à informação legislativa.
Foram aqui suscitadas algumas questões pertinentes que, julgo, merecem ponderação adequada, nomeadamente em sede de especialidade, quanto ao problema da incerteza da data e os efeitos que isso pode ter na vigência e na eficácia das leis.
Não creio que a dúvida suscitada pelo Sr. Deputado António Filipe seja um problema, porque creio que ele está resolvido no próprio texto da proposta de lei que temos perante nós, nomeadamente no artigo em que se estabelece a obrigatoriedade de criação de um registo onde conste a referência à data da distribuição electrónica do Diário da República, tornando, aliás, a questão da data da efectiva disponibilização uma questão mais certa do que ela é hoje. É que, como sabe, hoje, aquilo que se diz ser a data da distribuição é a data em que o Diário da República é disponibilizado nas lojas da Imprensa Nacional - Casa da Moeda e em que é expedido pelo correio, mas não é a data em que os assinantes do Diário da República efectivamente o recebem, porque, em alguns casos, há um desfasamento de vários dias, para não dizer, em alguns casos, de várias semanas.
Portanto, o problema não é tanto da data que está inscrita no Diário da República, como sendo a data dos diplomas legais aí publicados, porque esse desfasamento já existe hoje entre a data que está inscrita no papel e a data da efectiva distribuição e, portanto, vai continuar a existir entre a data que está inscrita na versão electrónica e a data da sua disponibilização efectiva.
O que acontece é que há um registo da disponibilização efectiva e, portanto, a partir deste momento, é possível saber em que momento é que se inicia a contagem do prazo.
A uniformização, que foi referida, nomeadamente, pelo PSD, é a principal vantagem desta alteração, isto é, a circunstância de a disponibilização electrónica ser feita no mesmo dia para todo o território e para todos os destinatários, mesmo aqueles que estão fora do território nacional.
Porque, como é evidente, já lá vai o tempo em que havia uma efectiva distância, mas a comunicação, não só a electrónica mas também as outras formas de comunicação, já encurtou essa distância e já não faz sentido, apesar de tudo, hoje, no ano 2001, que a Madeira e os Açores tenham uma vacatio legis superior àquela que existe no continente, nem, porventura, os cidadãos que residem no estrangeiro. Mas, enfim, em relação a esses, admito que há, apesar de tudo, alguma diferença…
Efectivamente, a informação hoje circula com a rapidez que todos nós sabemos e isso significa que é verdade que, seja por via electrónica, seja por via de outros meios de comunicação, incluindo o próprio envio postal, há uma rápida disponibilização da informação em todo o território nacional, incluindo a Madeira e os Açores, e não faz sentido prolongar esse prazo de vacatio legis por mais 30 dias.
Isto porque não é só o problema da vacatio legis, como o Sr. Secretário de Estado muito bem disse, é também o problema da eficácia dos actos administrativos que estão sujeitos a publicação obrigatória. E, como sabe, em relação a estes, hoje em dia, as leis do contencioso administrativo estabelecem prazos diferenciados para a sua eficácia, porventura criando uma vantagem injustificada para aqueles que não residem no território continental.
A outra questão que, de alguma forma, foi referida por todas as bancadas tem que ver com o problema do acesso à informação e, em particular, o problema da infoexclusão, que o Sr. Deputado António Filipe levantou como sendo uma questão que desaconselharia a solução proposta pelo Governo.
Devo dizer que não creio que a infoexclusão seja diferente quando falamos de infoexclusão electrónica ou de infoexclusão em suporte de papel. O Sr. Deputado não vai querer convencer nem a minha bancada, nem o Governo, nem ninguém no País de que as pessoas em geral têm acesso mais fácil e mais célere ao Diário da República em suporte de papel do que em formato electrónico.
Desde logo, porque, ao contrário do papel, que só pode ser acedido gratuitamente em bibliotecas, onde é preciso as pessoas deslocarem-se, porque, se não, tem de ser assinado e tem de ser pago à Imprensa Nacional - Casa da Moeda, a versão electrónica, não obstante ter uma assinatura para o acesso integral à versão electrónica, nomeadamente para o acesso à base de dados do Diário da República, como sabe, provavelmente até pelo uso que faz dela, está disponível gratuitamente para os Diários da República publicados nos últimos 15 dias. Isto significa que há, desde logo, a possibilidade de acesso gratuito através do acesso electrónico, não só porque há mecanismos de acesso gratuito à própria Internet mas também porque a própria versão electrónica do Diário da República está disponível gratuitamente.

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Por outro lado, isso significa também que há necessidade de discutir o problema da generalização do acesso aos meios de comunicação, designadamente à Internet, e, inclusive, há que discutir os problemas referidos pelo Sr. Deputado Nuno Melo, designadamente o problema do acesso ao direito e do que isso pode implicar em termos de obrigação do Estado de, no futuro, disponibilizar gratuitamente o Diário da República. E, sobre esta matéria, eu e, julgo, todos os que aqui se encontram estaremos disponíveis para discutir essa questão, que é pertinente e que, mais tarde ou mais cedo, terá de ser colocada.
Há um imperativo constitucional de acesso ao direito e à informação jurídica, estabelecido no artigo 20.º da Constituição, que implica, designadamente, que tendencialmente esse acesso deva ser disponibilizado de forma gratuita; aliás, o Governo tem promovido diversas iniciativas para que o próprio acesso à Internet, se não for disponibilizado gratuitamente, seja, pelo menos, disponibilizado, em termos de maior acessibilidade, à generalidade dos cidadãos.
Assim, julgo que é importante tirar a conclusão de que a proposta de lei tem a virtualidade de, por um lado, actualizar aquilo que é a realidade, nomeadamente da produção legislativa, perante as novas tecnologias de comunicação, criando um sistema que acresce em certeza e segurança jurídicas e não em incerteza e insegurança jurídicas, como foi suscitado por alguns, e, por outro lado, caminhar no sentido do acesso pleno à informação e, sobretudo, no sentido do acesso ao direito e à informação jurídica, designadamente à informação relativa.
Como sabe, há um princípio jurídico sempre invocado, que é o de que a ignorância da lei não aproveita a ninguém. Ora, se a ignorância da lei não aproveita a ninguém, é preciso criar formas para que os cidadãos não ignorem a lei.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP). - Sr. Presidente, prescindo, uma vez que o Sr. Deputado Cláudio Monteiro já me esclareceu na parte final da sua intervenção.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.

O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, quero apenas referir três temas que percorreram algumas das intervenções dos Srs. Deputados, nomeadamente o tema da acessibilidade, o tema da segurança e o tema da gratuitidade, começando por agradecer ao Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo ter-me confundido com o Ministro da Justiça, o que muito me apraz.

O Sr. António Capucho (PSD): - Lá chegaremos!

O Orador: - Começando pela questão da acessibilidade, eu diria que, neste momento, o universo a que é destinado essencialmente o Diário da República é composto por dois grupos de pessoas ou de entidades.
Em primeiro lugar, por um universo composto pelos advogados, pelos juízes, pelos operadores jurídicos em geral, pelas empresas. É um universo que, hoje em dia, já tem, creio, praticamente todo ele, acesso à Internet, pelo que não será afectado por esta mudança que queremos introduzir. Aliás, devo dizer que, hoje, mesmo sem que o Diário da República electrónico tenha relevância jurídica, mesmo sendo apenas um mero instrumento de consulta, esse universo já corresponde a cerca de 4000 assinantes do Diário da República electrónico. O Diário da República electrónico não tem relevância jurídica mas já tem este sentido apelativo para este tipo de entidades - advogados, empresas, operadores jurídicos, etc.
Em segundo lugar, por outro grupo de cidadãos e de entidades, que são aqueles que não lidam diariamente com o Diário da República e que, para terem acesso a ele, ou recorrem às bibliotecas, aos sítios onde ele se encontra depositado, ou vão às lojas da Imprensa Nacional comprá-lo. Os Srs. Deputados não ignorarão que o Diário da República não se vende na banca dos jornais, vende-se nas lojas da Imprensa Nacional - Casa da Moeda, que também não existe em cada esquina.
Portanto, eu diria que este instrumento que agora estamos a introduzir no nosso ordenamento jurídico vai reforçar e não restringir as condições de acessibilidade. O cidadão normal, que hoje tem de ir à loja da Imprensa Nacional, que não existe em todo o lado, vai passar a fazê-lo em sua casa, ou em casa de um vizinho, ou numa biblioteca pública ao pé de si.
Quanto à questão da segurança jurídica, não pense que fica afectada por esta melhoria que nós introduzimos. Creio que, a partir do momento em que o Diário da República tem uma data, e uma data só, que é a data em que está disponível na Internet, através do acesso da Internet, a segurança jurídica aumenta.
Quanto à questão da gratuitidade, surpreende-me que seja o CDS-PP a pedir a gratuitidade deste serviço público.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Porquê?

O Orador: - Em todo o caso, devo dizer, Sr. Deputado, que não é verdade que a Imprensa Nacional tenha apenas os custos que referiu. A Imprensa Nacional tem uma estrutura, a estrutura de suporte de papel vai manter-se e tem de ser sustentada. O que vai suceder a partir do momento em que esta medida entre em vigor é que o Diário da República electrónico passará a ter cada vez mais assinantes e o suporte de papel passará a cada vez menos clientes, como é óbvio, pelo que a Imprensa Nacional deixará de ter também um conjunto de recursos resultantes da venda do Diário da República.
Só há duas hipóteses: ou a Imprensa Nacional continua a ter a possibilidade de se fazer pagar pelo serviço que presta ou, não tendo essa possibilidade, o Estado, através do Orçamento do Estado, tem de lhe dar esses fundos.
Creio que a situação que existe hoje é mais favorável do que estarmos a fornecer fundos, através do Orçamento do Estado, para a Imprensa Nacional funcionar.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Nuno Teixeira de Melo e Miguel Macedo. Como o Sr. Secretário de Estado só dispõe de 1 minutos para responder, peço aos Srs. Deputados que tenham em atenção esse facto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

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O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, até admito que V. Ex.ª tenha a ambição, legítima, de vir a ascender à categoria de Ministro. Convirá, em todo o caso, que eu não o confundi com o Sr. Ministro da Justiça, não só por razões óbvias (não é verdade?…) mas, quanto mais não seja, porque me dirigi a V. Ex.ª expressamente na qualidade de Secretário de Estado, pelo que é evidente que essa questão não se põe!
Sr. Secretário de Estado, faço esta intervenção apenas para salientar que a Imprensa Nacional - Casa da Moeda não vive apenas da publicação do Diário da República. Há inúmeras publicações que são efectuadas pela Imprensa Nacional - Casa da Moeda e que lhe garantem um suporte financeiro.
Em todo o caso, a partir do momento em que o acesso maioritário ao Diário da República passe a ser por via digital, obviamente que a necessidade de publicação do Diário da República em suporte de papel será menor e, consequentemente, os custos também serão mais reduzidos, razão pela qual esse problema não se põe.
Seja como for, atentas as virtudes da sociedade da informação, atento o interesse do Diário da República para a generalidade da população e atento o serviço público que, nesta matéria de informação, o Governo diz que quer prestar, julgo que prestaria um bom serviço e garanto-lhe, Sr. Secretário de Estado, que o Governo gasta dinheiro muito mais mal gasto noutras coisas e que se justificaria, quanto mais não fosse, um acréscimo, com base no Orçamento do Estado, de uma verba destinada à Imprensa Nacional - Casa da Moeda.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, apenas duas questões em relação à sua última intervenção.
Uma tem a ver com a questão da segurança. Já agora, não se falou (mas, porventura, o Sr. Secretário de Estado terá informação sobre essa matéria) numa das questões que se deve colocar aqui, que é a de saber se hoje a Imprensa Nacional - Casa da Moeda tem condições de garantir que o texto que está em suporte electrónico é um texto inalterado e inalterável por quem tem acesso a ele. Ou seja, se, a partir de agora, a data de referência para efeitos jurídicos passa a ser aquela, nos termos do que vem proposto pelo Governo, que é aposta no suporte electrónico, a Imprensa Nacional - Casa da Moeda tem condições de garantir que o texto que está em suporte electrónico é um texto inalterado e inalterável por quem tem acesso a ele? Não sei por que meio tecnológico é que tal pode ser feito, mas coloco essa questão.
Outra tem a ver com uma questão que coloquei há pouco e em relação à qual o Sr. Secretário de Estado não respondeu. Não deixa de me causar alguma impressão que os países da Europa onde já co-existe o suporte electrónico e o suporte de papel continuem a optar - tanto quanto é do nosso conhecimento, tendo em conta o levantamento que foi feito na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias - por que a data de referência para efeitos jurídicos seja a do suporte de papel, e refiro os exemplos da Áustria, da Dinamarca, da Espanha, da Finlândia e da França. Na Islândia e na Itália, só há suporte de papel, no Reino Unido, como se sabe, é uma situação diferente. Em todos esses casos, a data de referência que é determinada na legislação desses países para efeitos jurídicos é a do suporte de papel.
A questão que coloco ao Sr. Secretário de Estado é a de saber se é por acaso que tal acontece em todos estes países, e estamos a falar, evidentemente, de legislação recente, por força das circunstâncias e do suporte tecnológico, que varia entre 1997 e 1999.
Esta é a questão que coloco, mais uma vez, ao Governo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros.

O Sr. Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros: - Sr. Presidente, procurando responder às perguntas que me fizeram, confirmo que a Imprensa Nacional - Casa da Moeda não vive apenas dos recursos que consegue cobrar pela venda do Diário da República, mas gostaria de salientar que a Imprensa Nacional é, hoje, uma empresa totalmente consolidada e equilibrada. E eu não gostaria de quebrar o equilíbrio, não gostaria de passar a ter também um problema financeiro na Imprensa Nacional - Casa da Moeda.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Prefiro manter aquilo que existe, porque creio que não vale a pena romper esse equilíbrio.
Quanto à questão de saber se a Imprensa Nacional está em condições de garantir a segurança, porventura, o Sr. Deputado não saberá mas a Imprensa Nacional tem, nesta altura, dos melhores meios de garantia de segurança ao nível do know how e ao nível da tecnologia que tem à sua disposição. Não sei se o Sr. Deputado sabe que, por exemplo, os cartões de crédito, e outros, são feitos na Imprensa Nacional, justamente porque esta é, neste domínio, uma empresa líder no nosso país. Se a Imprensa Nacional não estiver em condições de garantir a segurança, ninguém mais certamente estará em Portugal. Creio, pois, que ela está em condições de o fazer.
Em todo o caso, continuará a haver o suporte de papel, portanto, haverá também essa rede de que continuaremos a dispor.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Secretário de Estado, peço-lhe que abrevie.

O Orador: - Quanto ao que é feito noutros países, posso informar o Sr. Deputado que há países que, nesta altura, estão, pura e simplesmente, a pensar em abandonar o suporte de papel e ficar apenas com a edição electrónica.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Quais são?

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, concluída a discussão da proposta de lei n.º 62/VIII, informo que a mesma será votada na próxima quinta-feira, à hora regimental.
Vamos passar à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 59/VIII - Autoriza o Governo a legislar no

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sentido de alterar o estatuto da associação pública denominada Ordem dos Farmacêuticos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.

O Sr. Secretário de Estado da Saúde (José Miguel Boquinhas): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que hoje trazemos à Assembleia da República resulta, no essencial, de uma iniciativa da Ordem dos Farmacêuticos no sentido de se proceder a alterações ao Estatuto da Ordem dos Farmacêuticos, a fim de o adequar às novas exigências resultantes quer de alterações a nível da organização e funcionamento do Estado, quer da entrada de Portugal na União Europeia, que veio trazer novas questões às Ordens profissionais, nomeadamente no que se refere à livre circulação de pessoas e bens e ao direito de estabelecimento.
Mas a proposta pretende também dotar a Ordem dos Farmacêuticos de mais e maiores responsabilidades administrativas, para um cumprimento mais eficiente dos fins a que se propõe.
Para evitar a dispersão da regulação do exercício profissional, entendeu-se também que se deveriam incorporar nesta proposta normas e princípios deontológicos da profissão.
Naturalmente que este novo estatuto tem de ser aprovado no âmbito de uma nova lei de autorização legislativa, já que a Ordem dos Farmacêuticos é, por natureza, uma associação pública e esta matéria inscreve-se na esfera da reserva relativa da competência legislativa da Assembleia da República.
O novo estatuto que se pretende levar a efeito tem diversos preceitos inovadores face ao anterior.
Atribui mais e maiores responsabilidades administrativas à Ordem dos Farmacêuticos, designadamente no que toca a exercer acções de inspecção que lhe sejam delegadas pelo Ministério da Saúde, a coadjuvar o Estado em acções de acesso dos cidadãos aos cuidados farmacêuticos e medicamentosos, à certificação de serviços farmacêuticos, à regulamentação do ingresso e do acesso dos farmacêuticos nas carreiras da função pública e à emissão ou revalidação de cédulas e de atribuição de títulos de especialidade.
Integra legislação dispersa, como é o caso da matéria constante de directiva comunitária anteriormente transposta para a ordem interna por meio de diploma avulso - Decreto-Lei n.º 111/94, de 28 de Abril, sobre a inscrição dos nacionais dos Estados membros da União Europeia e de Estados terceiros.
Decidiu-se ainda a integração do código deontológico da Ordem, através da sistematização dos princípios deontológicos fundamentais, concretizados em deveres gerais dos farmacêuticos e em deveres especiais de cada ramo de farmácia, no sigilo profissional, nos deveres atinentes à publicidade e informação, nos deveres para com os utentes e para com os colegas e outros profissionais de saúde.
A este propósito, atribui-se competência aos órgãos internos para a aprovação de um código deontológico, em conformidade com o estatuto.
O acesso à Ordem fica limitado aos licenciados em Farmácia ou em Ciências Farmacêuticas, salvaguardando-se os direitos adquiridos.
A Ordem poderá condicionar a validade da cédula profissional, também designada por carteira profissional, à frequência de acções de formação contínua ou a unidades de crédito, ambas a regulamentar internamente.
Dá-se nova sistematização a matérias de grande relevância, como sejam a matéria disciplinar, podendo, no entanto, a Ordem, através dos seus órgãos internos, aprovar um regulamento disciplinar de carácter procedimental, e o funcionamento e a convocação dos órgãos colegiais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O novo Estatuto da Ordem dos Farmacêuticos, que se pretende levar a efeito e para o qual o Governo apresenta esta proposta de lei, em articulação e no cumprimento do seu programa, foi elaborado com o máximo dos consensos e pretende dotar a Ordem dos Farmacêuticos de um instrumento moderno e eficiente, já que o anterior tem mais de 20 anos.

A Sr.ª Luísa Portugal (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Ponte.

O Sr. Joaquim Ponte (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar, com a autorização de V. Ex.ª, Sr. Presidente, por cumprimentar e saudar a presença nesta sessão do Sr. Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos, Dr. João Silveira, a quem também especialmente me dirijo.
O Governo apresentou a esta Assembleia uma proposta de lei de autorização legislativa para alterar o estatuto da associação pública denominada Ordem dos Farmacêuticos.
O Grupo Parlamentar do PSD ouviu sobre esta matéria a Ordem dos Farmacêuticos, como sempre faz em situações similares, e tem uma opinião positiva sobre a proposta de novos estatutos. Os actuais têm mais de 20 anos e não reflectem a evolução verificada no exercício da profissão, nas últimas duas décadas. A integração europeia, entretanto verificada, a evolução do sistema de saúde e a publicação de legislação comunitária relativa à profissão farmacêutica justificam, sem dúvida, a actualização dos estatutos, que significam, em nossa opinião, um avanço positivo na regulamentação da profissão.
A Ordem e os farmacêuticos ficam mais responsabilizados quanto aos aspectos deontológicos e disciplinares.
Chamamos, todavia, a atenção para o regime de publicidade das sanções disciplinares (artigo 122.º da proposta de estatutos), que talvez deva ser alterado por forma a que essa publicidade não tenha lugar antes do trânsito em julgado da respectiva decisão.
É instituído o exame à Ordem, o que, não sendo propriamente uma novidade, pois existe em várias outras instituições congéneres, constitui uma solução adequada à realidade actual do ensino e à livre circulação de profissionais no espaço comunitário.
Em coerência com a instituição do exame à Ordem, os novos estatutos prevêem a acreditação de cursos, que, nuns casos, dispensam aquele exame e, noutros, permitem o acesso a especializações dentro da profissão.
Por último - e esta parece-nos ser a alteração mais relevante -, prevê-se a renovação periódica obrigatória da carteira profissional. Numa profissão de saúde, como é a profissão farmacêutica, este aspecto parece-nos francamente inovador e positivo.
A ideia de que uma licenciatura constitui, só por si, uma garantia de qualidade de exercício profissional para o res

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to da vida é, a nosso ver, errada. A necessidade de formação contínua e de renovação periódica da carteira profissional têm, por isso, o nosso acordo.
Nestes termos, o Partido Social Democrata votará favoravelmente a proposta de autorização legislativa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me que também cumprimente o Sr. Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos, Dr. João Silveira, que está presente nesta sessão, acima de tudo porque sabemos - o nosso grupo parlamentar tem consciência disso - que foi por uma forte influência da Ordem dos Farmacêuticos que hoje estamos aqui a discutir esta proposta de lei.
Antes de mais, é necessário reconhecermos a importância profissional desta Ordem - Ordem de utilidade pública, como todas as ordens profissionais -, representante de uma classe profissional que desempenha uma acção social e um papel essencial na prestação dos cuidados de saúde e no acesso de todos os portugueses aos cuidados de saúde.
Fundada em 1835, a Sociedade Farmacêutica de Lisboa, depois de um conjunto de importantes evoluções, viu, em 1972, ser-lhe conferido o estatuto de ordem profissional e só em 1979 foi publicado o seu estatuto de Ordem, com todos os deveres e direitos que lhe são inerentes. Ora, a discussão que estamos aqui hoje a ter é exactamente sobre a revisão deste estatuto de 1979.
Convém também recordar à Câmara e ao País que este estatuto está em processo de revisão desde 1998. De facto, há mais de três anos que se está a tentar fazer a sua revisão. Ora, parece-nos importante que a revisão deste tipo de legislação possa ser mais célere, exactamente para que não tenhamos, como temos hoje, em vigor um estatuto que tem mais de 20 anos e que obviamente precisava de ser revisto.
Também não podemos esquecer as competências que a Ordem, enquanto tal, tem na discussão dos cuidados de saúde; a competência que tem de colaborar com o Governo e com todas as instituições na definição e prossecução de uma política nacional de saúde e com outras ordens profissionais e científicas; a competência que tem no âmbito da cooperação internacional com outras entidades farmacêuticas, quer de países de língua portuguesa quer de outros países; a competência que tem na formação farmacêutica, na promoção de congressos, conferências e seminários sobre temas científicos; a competência que tem (e esta é uma competência fundamental das ordens profissionais) na atribuição da carteira profissional aos seus membros e uma série de outras, nomeadamente a do exercício profissional farmacêutico.
Por tudo isto e sendo o seu estatuto de 1979, era obviamente necessária e urgente uma revisão desse estatuto. Ora, essa revisão merece, da parte da bancada do CDS-PP, um total apoio e, em nosso entender, como referi há pouco, devia até já estar feita.
Há um conjunto de mudanças significativas neste estatuto, mas há, por outro lado, duas ou três notas importantes que queremos deixar à reflexão da Câmara e que, eventualmente, poderão consubstanciar duas ou três alterações pontuais, nomeadamente quando se está a fazer este processo de revisão.
A primeira diz respeito à mudança do conteúdo do que é o acto farmacêutico, onde se alarga um conjunto de competências que nos parecem muito importantes. Porém, o alargamento destas competências pressupõe algo também muito importante, que é o dever real de colaboração - mais do que um simples dever de cordialidade para com os outros profissionais de saúde, nomeadamente nesta área, no sentido em que cada vez mais temos equipas técnicas multidisciplinares de todos os profissionais de saúde, onde os farmacêuticos são uma peça fundamental -, que, em nosso entender, devia ser reforçado, repito, não como um dever técnico de cordialidade mas, acima de tudo, como um dever efectivo de colaboração com os outros profissionais de saúde, nomeadamente em ciências médicas, as quais estão em permanente evolução e onde cada vez mais se está a recorrer, e bem, a equipas multidisciplinares. Isso, no entendimento desta bancada, é algo muito importante.
Confesso-vos que também temos algumas dúvidas acerca da suspensão preventiva dos farmacêuticos antes de existir uma decisão transitada em julgado dos órgãos jurisdicionais da Ordem dos Farmacêuticos. Parece-nos que aqui também podia haver uma pequena revisão. O mesmo se diga relativamente à publicidade das decisões disciplinares, enquanto se aguarda um recurso para um tribunal ou uma decisão de um tribunal. Julgamos que aqui era importante fazer algumas pequenas reformulações.
De qualquer forma, há aspectos muito positivos nesta revisão do estatuto. Não vou elencá-los todos, porque isso seria exaustivo, mas gostava de salientar um deles, pela importância que tem neste sector profissional, que é o das regras da publicidade. Ora, aqui também se podia arranjar critérios mais objectivos e mais definidos, cuja seriação, em concreto, caberia, depois, à Ordem fazer. De qualquer forma, temos aqui critérios balizadores do que é a publicidade e do que são as regras publicitárias neste sector.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por dizer que viabilizaremos esta proposta de lei, que, aliás, traduz as reflexões da própria Ordem dos Farmacêuticos, que aqui também aproveito para saudar em nome da bancada do PCP.
Depois, gostaria de acrescentar o seguinte: hoje, assistimos, na sociedade portuguesa e na área da saúde, a uma importância cada vez maior desta profissão. Essa é uma realidade objectiva que faz com que tenhamos também de dar uma cada vez maior atenção a esta actividade profissional, tratando-se de uma profissão com grande especialização técnica e científica e com uma importância decisiva nas questões da política do medicamento. É uma profissão que tende a assumir maiores responsabilidades, tanto na área da investigação como na da farmácia de oficina, designadamente, nesta última, de informação cada vez mais importante aos utentes, com o que isso até pode contribuir para a redução dos gastos excessivos e desajustados com medicamentos, ou com a informação especial em medicamentos de venda livre e que tenham contra-indicações especiais - e veja-se também o que acontecerá, conforme nos foi bem expresso em comissão especializada, relativamente à contracepção de emergência.

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A importância desta profissão e o assumir de maiores responsabilidades verifica-se também nos hospitais, a propósito da reorganização da farmácia hospitalar, de uma indispensável maior racionalidade e melhor gestão das farmácias hospitalares, tendo até em conta um compromisso assumido pela Sr.ª Ministra da Saúde, quando iniciou funções, ao dizer que esta seria uma área de grande intervenção do Ministério da Saúde, que, infelizmente, não tem tido o desenvolvimento que estas declarações nos poderiam fazer esperar mas que reafirma a importância dos farmacêuticos e da sua presença nos hospitais e nas farmácias hospitalares.
Finalmente, gostaria de dizer que algumas preocupações ultimamente expressas pela Ordem dos Farmacêuticos devem merecer a atenção desta Câmara. Refiro-me concretamente às questões do ensino e da formação, designadamente à questão, até referida na abertura do Congresso dos Farmacêuticos, na semana passada, do licenciamento pelo Governo de um curso, na área da Farmácia, numa universidade privada que, à semelhança de situações idênticas que a mesma universidade introduziu a propósito de outras profissões na área da saúde como a medicina dentária, tem um plano de curso cujo primeiro ano consiste, em grande parte, no ensino de línguas estrangeiras. Aliás, tenho comigo uma aproximação a esse plano de estudos do qual constam cinco cadeiras, que são Língua Estrangeira, Língua Inglesa I, Língua Inglesa II, Estudos Europeus e Métodos e Técnicas de Comunicação.
Ora, trata-se aqui de o Governo estar a permitir e a promover a homologação de cursos sem grande preocupação com o que são as necessidades de formação nesta área, como noutras, e parece-me inadmissível que se aceite este tipo de formulação, ainda por cima quando o curso já funcionava e a homologação é retroactiva para abranger o ano lectivo que já está em curso. Não é assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que ajudaremos a prestigiar e a melhorar a qualificação dos profissionais de farmácia.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, quero saudar e assinalar a presença de um grupo de 55 alunos da Escola Básica do 1.º Ciclo n.º 2 de Paio Pires; um grupo de 20 alunos da Escola Secundária do Dr. Azevedo Neves, da Damaia; um grupo de 12 alunos da Escola Secundária de Alvide e um grupo de 27 alunos da Escola Profissional de Setúbal.
Para todos eles, peço a vossa cordial saudação.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para intervir, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, muito sinteticamente, manifestar a nossa concordância com a proposta de revisão do estatuto da Ordem dos Farmacêuticos, hoje em discussão.
Em primeiro lugar, porque ela acolhe as propostas que foram feitas pela Ordem dos Farmacêuticos (e esse é, naturalmente, um aspecto que é importante sublinhar) e, em segundo lugar, porque ela reflecte uma evolução natural que ocorreu na indústria farmacêutica nas últimas décadas.
É fundamentalmente devido a essa evolução num sector tão nevrálgico quanto este - a qual trouxe modificações que explicam a actualização do estatuto da Ordem dos Farmacêuticos - que me parece importante reflectir e chamar a atenção para o papel de responsabilidade acrescida que a indústria farmacêutica e a Ordem dos Farmacêuticos têm, neste momento, num País como o nosso: eles têm de ser aliados do Governo e das várias entidades para orientarem os consumidores a terem novos comportamentos; eles são fundamentais para fazerem pedagogia, para informarem os cidadãos.
Por isso, pensamos que se trata de um sector de actividade fundamental para contribuir para as mudanças que é importante operar no sector da saúde e na sociedade portuguesa. É seguramente assim, têm de ser considerados como parceiros dessa modificação e esperamos vivamente que continuem a colaborar com o Governo.

O Sr. Presidente (João Amaral). - Para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado João Sequeira.

O Sr. João Sequeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Apresenta o Governo, hoje, perante esta Câmara, a proposta de lei n.º 59/VIII, que visa autorizá-lo a legislar no sentido de alterar o estatuto da associação pública denominada Ordem dos Farmacêuticos.
Sendo a Ordem dos Farmacêuticos, por natureza, uma associação pública, esta é uma matéria da reserva relativa da competência da Assembleia da República, de acordo com o prescrito na alínea s) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa. Deste modo, o Governo, ao apresentar esta proposta de lei, cumpre o estatuído naquele preceito constitucional.
Pretende-se, através desta iniciativa legislativa, autorizar o Governo a legislar no sentido de alterar o estatuto da citada Ordem.
De acordo com as alíneas a) a i) do artigo 2.º da proposta governamental, que define o seu sentido e extensão, visa-se: «Definir a natureza, sede e atribuições da Ordem, procedendo a uma revisão profunda do estatuto em vigor;» «Especificar os tipos de membros da Ordem e os procedimentos de inscrição e titulação dos mesmos, designadamente no que diz respeito a nacionais de Estados membros da União Europeia e de Estados terceiros;» «Estabelecer como condição de inscrição na Ordem a frequência de estágio prévio e como condição da respectiva titulação a frequência de acções de formação;» «Definir a estrutura orgânica da Ordem, bem como as atribuições e competências de cada órgão;» «Conferir responsabilidades administrativas acrescidas à Ordem para mais eficiente cumprimento dos seus fins ontológicos na área da saúde, e, mais precisamente, na do medicamento;» «Estabelecer o processo de eleição e de referendo;» «Definir o regime patrimonial e financeiro da Ordem;» «Estabelecer os princípios deontológicos da actividade de farmacêutico, independentemente do sector público, privado, cooperativo ou social, onde a mesma se desenvolve;» e «Estabelecer o respectivo regime disciplinar, sem prejuízo das normas disciplinares aplicáveis no contexto laboral em que desenvolvem a sua actividade, nomeadamente no que toca à aplicação de sanções suspensivas do exercício da actividade.».
Estabelece ainda o Governo que a autorização legislativa tem a duração de 120 dias, contados a partir da sua entrada em vigor.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo, ao apresentar esta proposta

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de lei, materializa mais um dos objectivos postulados no Programa do Governo, no domínio da saúde.
A iniciativa de proceder a alterações ao estatuto da Ordem, corporizada nesta proposta, resulta de um impulso fundamental da Ordem dos Farmacêuticos e de um trabalho de anos.
Esta revisão profunda, por todos considerada imperiosa, mereceu também um consenso alargado durante a fase de discussão a que o estatuto esteve sujeito.
É sempre oportuno lembrar que o estatuto da Ordem dos farmacêuticos data de 1979. Durante estes mais de 20 anos, muitas foram as alterações ocorridas no funcionamento e na organização do Estado. Papel fundamental para este estado de coisas teve a entrada na União Europeia, introduzindo um conjunto de novas questões, designadamente no que diz respeito à livre circulação de pessoas e bens e ao direito de estabelecimento. Acresce a tudo isto a quantidade de escolas desde então criadas, com as subsequentes problemáticas ao nível da qualidade e da competição na área laboral.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei governamental tem como objectivos fundamentais dotar a Ordem dos Farmacêuticos de mais e maiores responsabilidades administrativas e incorporar normas e princípios deontológicos da profissão. Pretende-se, assim, um mais eficiente cumprimento dos fins que a Ordem se propõe prosseguir e evitar a dispersão da regulamentação do exercício profissional.

A Sr.ª Luísa Portugal (PS): - Muito bem!

O Orador: - Esta proposta, que, como referimos, resulta de um enorme consenso, é adequada à realidade que visa regular e é dotada das notas de inovação e de modernidade necessárias para enquadrar o futuro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Queria também exprimir a convergência do Bloco de Esquerda com este processo legislativo, o qual está a seguir trâmites inteiramente correctos e goza da geral concordância, não só no que respeita à dignificação mas, sobretudo, a uma maior capacitação social dos farmacêuticos.
Como tal, acompanhamos esta proposta de lei de autorização legislativa e votá-la-emos favoravelmente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para intervir, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Saúde.

O Sr. Secretário de Estado da Saúde: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Naturalmente, o Governo ouviu com muita atenção as intervenções dos diversos grupos parlamentares, atenderá às propostas de alteração que fizeram e estudá-las-á, no sentido da sua eventual incorporação no novo estatuto.
Evidentemente, o novo estatuto foi feito com base num grande diálogo e numa enorme colaboração com a Ordem dos Farmacêuticos, o que gostaria de salientar. Por isso, ela também será ouvida a este propósito, no sentido de se tentar chegar a um consenso o mais alargado possível.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - E um novo curso de farmácia?!…

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, o debate sobre a proposta de lei n.º 59/VIII está encerrado.
A votação desta proposta de lei será feita na sessão plenária da próxima quinta-feira, à hora regimental.
Vamos entrar no ponto seguinte da ordem de trabalhos, que é a discussão conjunta dos projectos de resolução n.os 105/VIII - Adopta um plano de emergência no perímetro das minas da Urgeiriça (Os Verdes) e 99/VIII - Recomendar ao Governo medidas concretas para resolver o problema da radioactividade nos resíduos e nas minas de urânio abandonadas (PSD).
Para apresentar o projecto de resolução do seu grupo parlamentar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A situação em que se encontra a generalidade das minas abandonadas no País é grave - sendo particularmente preocupante a do complexo da Urgeiriça - e coloca, de há anos, um conjunto muito vasto de problemas, para os quais Os Verdes têm insistentemente alertado.
Problemas de segurança, ao nível da circulação das pessoas, problemas ambientais, ao nível do impacto paisagístico, mas, fundamentalmente, problemas ao nível dos ecossistemas afectados e dos diferentes graus de contaminação provocados, quer se fale do solo, da água ou do ar.
Problemas ambientais que constituem ainda - e este é o caso concreto - uma autêntica ameaça à saúde pública das populações vizinhas, pelo tipo de minério explorado, o urânio, cuja radioactividade, e consequente perigosidade, aliada à poluição química, é preciso não subestimar.
É partindo da constatação desta realidade e estando conscientes do risco que ela envolve e da responsabilidade que incumbe ao Governo - que neste caso é da entidade pública que explora a Empresa Nacional de Urânio (ENU) - de avaliar esse risco e de tomar decisões rápidas em conformidade que o nosso projecto de resolução se justifica.
Apresentamos propostas perante o cenário dantesco que caracteriza, de há muitos anos, o imenso complexo da Empresa Nacional de Urânio, sediada na Urgeiriça, perante o tipo de tratamento químico que tem sido utilizado, ao longo de anos, na separação deste minério e perante as montanhas de resíduos de urânio que estão a céu aberto, sem qualquer vedação, convivendo paredes-meias com pessoas, cuja segurança, saúde e bem-estar é responsabilidade de todos preservar.
Propomos algumas medidas que são conhecidas, porque o Governo admite equacioná-las, a prazo, no Programa Operacional de Economia, embora não tenha ainda definido um calendário nem disponibilizado verbas para as mesmas. Do nosso ponto de vista, isso não invalida - pelo contrário, justifica plenamente, até no quadro do futuro plano de reabilitação e de recuperação - a adopção de um conjunto de medidas, com carácter de urgência.
Sugerimos medidas que identificam questões, hierarquizam acções e que se propõem agir, desde já, em nome das populações mais gravemente afectadas, não só do distrito da Guarda mas também dos distritos de Coimbra e de Viseu, nos quais se situam muitas das minas deste complexo.

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É, pois, este o sentido da nossa proposta, perante alertas que de há muito estão lançados, perante a assunção do risco que as populações correm, perante problemas que estão identificados de há muito pelas autoridades, designadamente pelas autoridades locais de saúde pública, perante o conhecimento do resultado das investigações da equipa médica do Hospital Universitário de Coimbra e, mais recentemente, perante a conclusão do relatório feito pelo Instituto Geológico e Mineiro (IGM), com base num protocolo celebrado com a Direcção-Geral do Ambiente, em que são identificadas medidas que é necessário adoptar com urgência.
O que propomos, em concreto, é, em primeiro lugar, que se comece pelo princípio, ou seja, que se delimite, identifique, sinalize e vede cada uma das minas deste complexo mineiro, evitando a circulação de pessoas, logo a contaminação por acidentes, os quais, lamentavelmente, se têm verificado.
Propomos, em segundo lugar (aliás, de acordo com as conclusões do estudo caracterizador feito pelo IGM), que se evitem práticas agrícolas e de pastoreio numa área que tem de ser delimitada com um perímetro de protecção, evitando dessa forma a mais do que provável contaminação das comunidades locais, por via da cadeia alimentar.
Propomos ainda, em terceiro lugar, que se proceda, desde já, de uma forma sistematizada e não pontual, à monitorização da qualidade das águas subterrâneas nas zonas envolventes à exploração mineira, para dela dar conhecimento às respectivas autoridades locais (municípios, autarquias, direcções regionais de saúde, direcções regionais de ambiente), medidas essas de compreensível e particular relevância dada a proximidade da barragem da Aguieira, do rio Mondego e de captações de água para consumo humano, em relação às quais, como é assumido pela própria ENU, há probabilidades de contaminação, particularmente favorecidas em ano de cheias, como o actual.
Trata-se de medidas que visam ainda, chamando a atenção para isso, a absoluta necessidade de se proceder a um correcto acondicionamento, identificação e selagem de todo o minério de urânio e produtos derivados, designadamente urânio empobrecido, que, ao longo dos anos, têm resultado da exploração mineira.
Medidas também para que, em termos de ordenamento do território, já que tal nunca aconteceu no passado, se tenha em vista prevenir ocupações humanas em zonas de radiação radiológica ou química.
Por último, Sr.as e Srs. Deputados, trata-se de medidas para que as comunidades locais, em contacto com esta realidade por razões naturais ou que decorrem desta exploração ao longo de anos, sejam submetidas a uma vigilância epidemiológica activa para garantir uma minimização de riscos, a saúde pública e o seu bem-estar.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Ginestal.

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, quero começar por dizer que acompanhamos as suas preocupações e propostas para resolver o problema da radioactividade nos resíduos e nas minas de urânio abandonadas, nomeadamente adoptando medidas concretas no perímetro das minas da Urgeiriça.
Durante décadas, foi acumulado um passivo ambiental que deve merecer uma acção determinada para a salvaguarda do ambiente, mas também da saúde pública das comunidades que vivem na área envolvente.
Sabe, certamente, a Sr.ª Deputada que até 1996 nada tinha sido feito para estudar e definir áreas de intervenção e prioridades para requalificar ambientalmente essas minas. Foi por aí que o Governo do PS começou, e é a partir desses estudos, desenvolvidos pelo IGM (Instituto Geológico e Mineiro), pela Direcção-Geral do Ambiente e pela ENU, que acabam por identificar-se as situações mais preocupantes e que exigem uma intervenção prioritária: Urgeiriça, Cunha Baixa, Quinta do Bispo e Bica.
Não podendo ter sido ontem, este é o momento de agir! É tempo de o País retribuir a uma região que foi tão sacrificada pelo dito interesse nacional.
Neste quadro, gostaria de colocar-lhe as seguintes questões: Sr.ª Deputada, não considera estranho o facto de o projecto de resolução do PSD não explicitar a intervenção prioritária nas minas do distrito de Viseu, designadamente em Cunha Baixa, Quinta do Bispo e Urgeiriça?
A Sr.ª Deputada acompanha-nos na recomendação ao Governo de que deve garantir a utilização e aproveitamento dos conhecimentos científicos e capacidade técnica e humana que a ENU adquiriu durante décadas de funcionamento, utilizando-os agora na premente recuperação ambiental das minas?
Pensamos, assim, que o texto que nos é apresentado ficaria mais rico e abrangente, respondendo com maior rigor às legítimas preocupações das populações locais, das autarquias envolvidas e, estou certo, da Assembleia da República.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Ginestal, é evidente para nós que o problema do risco ambiental e de saúde decorrente da exploração mineira que, durante anos, foi feita pela ENU não se circunscreve ao distrito da Guarda. Portanto, Bica, Cunha Baixa e Quinta do Bispo são seguramente zonas de risco, como o são, do ponto de vista de Os Verdes, outras zonas do distrito de Coimbra. Dou-lhe também o exemplo de Sevilha, situada perto da barragem da Aguieira e que, para nós, não é um aspecto que possa deixar de ser colocado.
Para nós, é claramente importante uma intervenção global, porque se trata de um problema global que põe em risco a saúde e o ambiente.
Reconhecemos que, durante anos, não se fez nada, do mesmo modo que reconhecemos que, durante esse tempo, Os Verdes não se calaram. Portanto, durante anos o problema existiu, durante anos chamámos a atenção para ele, em 1996 dão-se os primeiros passos e, em 1998, é elaborado um plano. Porém, este plano, de médio e longo prazo, não invalida, do nosso ponto de vista, o projecto de resolução que apresentamos, porque qualquer projecto global tem de ser faseado. Ora, o que propomos é o limiar mínimo de segurança, tendo de ser tomadas as medidas com carácter de urgência.
Sr. Deputado, a última questão que colocou foi a de saber em que medida estamos abertos, ou não, a que os trabalhadores da ENU sejam parte activa do processo se

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guinte. É nosso entendimento que esta empresa, que até é pública, tem um conhecimento adquirido pela sua própria actividade profissional, durante anos a lidar com aquela mina, pelo que os seus trabalhadores são seguramente as pessoas melhor habilitadas em determinadas áreas para, na fase seguinte, após o encerramento da exploração da ENU, serem envolvidas na recuperação.
Seguramente que estas pessoas, como também profissionais de saúde e do ambiente, terão de ser parceiros a integrar a recuperação que importa fazer e que, do nosso ponto de vista - insisto -, tem de conter uma fase de adopção de medidas de urgência num curto prazo.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, informo que o Grupo Parlamentar do PS apresentou, na Mesa, uma proposta de substituição dos textos dos projectos de resolução que estamos a discutir, que será apreciada na sessão da próxima quinta-feira, juntamente com os projectos de resolução.
Para apresentar o projecto de resolução do seu grupo parlamentar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Em 19 de Janeiro passado, no debate aqui realizado sobre a radioactividade no distrito da Guarda, anunciámos e apresentámos o projecto de resolução que hoje debatemos.
Com esta iniciativa, o Partido Social Democrata demonstra, mais uma vez, a sua preocupação quanto a um problema grave, de consequências incalculáveis ao nível da saúde pública e da qualidade do ambiente. No mesmo sentido vai a iniciativa do Partido Ecologista Os Verdes.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O distrito da Guarda é, juntamente com a Urgeiriça e o Alto Alentejo, uma das zonas mineiras onde se localizam os jazigos de urânio. Ora, acontece que a maior parte dessas minas encerraram e foram votadas ao abandono sem que tenham sido alvo de qualquer requalificação ou recuperação ambiental. É caso para dizer que a riqueza de outrora está hoje transformada numa miséria desoladora.
De facto, no ano passado, em Julho de 2000, o Governo determinou, de forma ligeira e irresponsável, o encerramento da exploração de 58 minas de urânio e o seu abandono sem qualquer tratamento, apesar de a comissão de trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio ter denunciado e alertado para os perigos que daí advinham, apesar de técnicos e responsáveis dos mais variados quadrantes terem alertado para a perigosidade da situação. Porém, como sempre, o Governo não ouviu, não agiu, não governou.

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - É sempre a mesma coisa!

A Oradora: - Só a mediatização do Kosovo e do seu urânio empobrecido veio, por arrastamento, chamar a atenção e despertar as consciências dos portugueses para o caso do urânio e das minas abandonadas no nosso país. Mesmo assim, apesar de bombásticas, as notícias parecem não ter suscitado qualquer cuidado ou preocupação por parte do Governo ou da Administração Pública.
Os 10 milhões de contos anunciados e a recuperação de quatro das 58 minas não passaram ainda, infelizmente, de mera propaganda política. O que na realidade aconteceu foi apenas a substituição de algumas placas de sinalização das minas - que, de branco e vermelho, passaram a amarelo e preto - e, imagine-se, a instauração do já famoso e famigerado processo de averiguações ao médico do hospital da Guarda que teve a coragem de publicamente falar a verdade.
O Governo deu mais do mesmo, isto é, quase nada, preferiu esconder em vez de resolver o problema, preferiu perseguir um elemento da comunidade em vez de defender toda a comunidade. O Governo preferiu calar, abafar e amordaçar em vez de dialogar!
Parece que o dito «Governo do diálogo» pretende instaurar a «lei da rolha». Sr. as e Srs. Deputados, haja a coragem política de pôr fim a este processo que intimidou quem, de facto, merecia ser aplaudido!
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, na verdade, ao longo de cerca de 80 anos, a exploração de urânio trouxe significativas receitas ao País: riqueza, trabalho e alegria. Ainda em 1999, a Empresa Nacional de Urânio anunciava publicamente que, em 2001, a produção aumentaria de 29 para 100 toneladas/ano. No entanto, inexplicavelmente, em Março de 2000, a Empresa Nacional de Urânio contraria a sua intenção e dá por encerrada a actividade de exploração, ficando apenas reduzida à recuperação e reabilitação ambiental por um período de cinco a sete anos.
A agravar a situação, e para surpresa geral, passados apenas quatro meses, foi publicamente anunciado o encerramento imediato da empresa, com o desmantelamento das suas instalações e o inevitável despedimento dos seus trabalhadores.
Este ziguezague, só por si, denuncia, uma vez mais, a irresponsabilidade com que o Governo lida com questões tão sensíveis para a saúde pública e para o ambiente como sejam as do urânio e da radioactividade.
Será que o Governo tem consciência da dimensão e da gravidade da situação? Ou será que é preciso fazer uma excursão de ministros?
Sr.as e Srs. Deputados, falemos em problemas concretos.
Que fazer aos milhões de toneladas de resíduos radioactivos das escombreiras?
Que fazer às soluções ácidas dos mais de 3 milhões de toneladas de materiais rejeitados no tratamento químico da exploração do urânio?
Que fazer e qual o nível de contaminação das linhas de água na região que desaguam directamente no rio Mondego ou noutras bacias hidrográficas?
Que fazer com a eventual contaminação da cadeia alimentar?
Que fazer com os elevados níveis de concentração de radão nas habitações, muito acima do valor ambiental natural aceitável e do valor médio nacional?
Que fazer, ainda, com a venda e utilização das escombreiras como materiais de construção das habitações?
Ou que fazer com os elevados índices de neoplasias e as fortes suspeitas de causalidade?
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Face à gravidade da situação, o PSD recomenda ao Governo que proceda a uma eficaz recuperação e tratamento ambiental das zonas afectadas pela exploração de urânio. O PSD recomenda ainda que os trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio sejam envolvidos nesse processo, pois são os melhores e talvez únicos garantes reais de uma eficaz protecção da saúde pública e do ambiente. E tudo isto enquanto é tempo!

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O PSD recomenda também a elaboração de um estudo epidemiológico da radioactividade e das suas implicações na saúde pública e na qualidade do ambiente.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As regiões mineiras abandonadas precisam de políticas ambientais sérias e eficazes. As gentes que heroicamente resistem e ainda não abandonaram essas regiões não podem, elas próprias, continuar a ser abandonadas. Será que é preciso esperar por mais tragédias para que o interior do País também seja considerado e não esquecido?
Até quando é preciso esperar por um olhar solidário que dê a estas gentes o tratamento que a sua dignidade merece e exige? Até quando é preciso esperar para que o interior seja uma prioridade estratégica no desenvolvimento integrado do País?
É neste quadro que os presentes projectos de resolução ganham particular significado. Têm eles o mérito de concretizar aquilo que todos sabem: há um problema ambiental e de saúde pública nas zonas afectadas pela exploração de urânio e hoje abandonadas.
Por tudo isto, Sr. as e Srs. Deputados, é legítimo esperar que os projectos em debate mereçam a vossa adesão ou aceitação. Apelamos, por isso, à sua aprovação, mas, se for caso disso, estamos disponíveis para contribuir para um consenso que permita excepcionalmente, após votação na generalidade, fazer baixá-los à especialidade de modo a que se tente elaborar um texto que responda ao essencial. Ora, o essencial é proteger e garantir a saúde pública e a qualidade do ambiente das zonas afectadas pela exploração do urânio.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Alberto Santos.

O Sr. Carlos Alberto Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Manso, as recentes notícias vindas a público acerca dos efeitos nocivos que as minas abandonadas podem provocar aos cidadãos instalaram o pavor em todos quantos residem nas áreas onde se processou a extracção de urânio.
É verdade que a reabilitação ambiental das antigas minas de minérios radioactivos, exploradas em Portugal de 1909 a 1990, primeiro para a produção de rádio e, a partir de 1994, exclusivamente para a produção de urânio, é urgente, mas a urgência dessa reabilitação não é de agora, é de há muito imperiosa.
Estranho, todavia, que só após este Governo ter mandado analisar o tema, estudar e propor o tratamento a fazer, quer nas minas propriamente ditas, quer dos desperdícios entretanto amontoados, todos acordem para o problema, nem todos de forma serena e atenta, alguns até preferindo instalar o pavor nas populações, roçando mesmo a insensatez e a irresponsabilidade política.
Com o sentido de responsabilidade e preocupado com a saúde pública, procurando tranquilizar e assegurar alguma serenidade na população, eu próprio sugeri ao Governo a constituição de uma comissão científica e interdisciplinar para avaliar e prescrever o tratamento de tão grave mas velho problema. E sobre isto também é bom que se diga que vários foram os governos, entretanto em funções, que nada fizeram para que a herança histórica de que estamos aqui a falar fosse hoje menos pesada e gravosa.
A Sr.ª Deputada Ana Manso, ao fazer nesta Assembleia, no passado dia 19 de Janeiro, o número que fez e ao proferir as considerações alarmistas que proferiu, demonstrou irresponsabilidade política e pouco apreço pela vitalidade económica da região que lhe deu os votos para aqui estar. A Guarda não pode ser tratada desta forma.
Que os índices de radão na Guarda são superiores à média nacional já todos sabíamos; que a Sr.ª Deputada se interrogue sobre o porquê de uma tão elevada taxa de cancro de estômago no distrito da Guarda, aceitamos; que a Sr.ª Deputada questione este Governo acerca daquilo que o governo do seu partido não foi capaz de fazer no passado recente, aceitamos - é acto de contrição; que a Sr.ª Deputada queira fazer demagogia nesta Assembleia para se candidatar à Câmara Municipal da Guarda, é lá consigo; que, por via deste ou de outro assunto, a Sr.ª Deputada Ana Manso ponha em causa, interrogando-se publicamente - e com isso lança suspeição -, a qualidade da água engarrafada na região, isso é inaceitável e só próprio de quem quer prejudicar a economia do distrito da Guarda, que tão mal V. Ex.ª também aqui representa; que, por via deste ou de outro assunto, a Sr.ª Deputada Ana Manso ponha em causa, interrogando-se publicamente - e com isso lança suspeição - se a água da rede pública da região da Guarda é ou não quimicamente analisada, é inadmissível.
A Sr.ª Deputada Ana Manso é, pois, responsável, desde 19 de Janeiro, pelos possíveis prejuízos para as empresas do sector emergentes das suspeições que então lançou.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - É manifestamente irresponsável que, em qualquer lugar - e muito menos nesta Assembleia -, sem base científica alguma, V. Ex.ª tenha atentado contra a economia do distrito da Guarda.
E, já agora,…

O Sr. Presidente (João Amaral): - E, «já agora», tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - … com tantas e tantas minas abandonadas, há tantos anos, no distrito da Guarda - e não é esse o caso da mina da Bica -, o que é que fizeram os governos do seu partido em prol da requalificação ambiental nos anos em que estiveram no poder?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Santos, apesar da linguagem e até do tom que utilizou, a que já começou a habituar-nos, não ser adequado (direi mesmo que é até excessivo) - e quero dizer à Câmara que fique descansada, pois não é esta a linguagem nem este tom que é usado na Guarda, uma cidade bonita, que necessita de vozes pela positiva, não da do Sr. Deputado -, quero, no entanto, agradecer a sua intervenção. É bom sinal que, agora, o Sr. Deputado também esteja preocupado com um problema que, de fac

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to, inquieta todas as populações e comunidades que vivem nas zonas envolventes às minas de urânio abandonadas.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Ele não sabe!

A Oradora: - De certeza que o Sr. Deputado Carlos Santos não lê os jornais, porque se os tivesse lido sabia que, desde Agosto do ano passado, o problema da radioactividade e das minas abandonadas no distrito da Guarda vem preocupando a população.
Mas o seu nervosismo, ainda que a despropósito - é isso que me parece -, é apenas e tão-só o sinal da arrogância que já lhe é peculiar,…

O Sr. Carlos Alberto Santos (PS): - Isso é consigo!

A Oradora: - … para além de ser a demonstração clara e inequívoca da incapacidade e da incompetência do vosso Governo para resolver os problemas. Prefere sempre passar à margem deles! E mais: não é capaz de garantir condições de segurança para as populações e para a comunidade que vivem à volta destas regiões e, acima de tudo, de minimizar os riscos.
Mas, Sr. Deputado, a gravidade da situação deveria preocupá-lo e devia também não só preocupar o Governo como nele despertar uma atitude responsável de intervenção, que o levasse a adoptar um plano de emergência com medidas concretas e eficazes para minorar os riscos e resolver o problema da segurança.
Em vez disto, o que é que o Governo fez?

Vozes do PSD: - Nada!

A Oradora: - Quase nada ou praticamente nada.
Mas eu vou lembrá-lo, porque o senhor tem andado muito distraído e não leva a sério a política do ambiente e muito menos a Guarda. É que se as levasse a sério teria feito uma intervenção totalmente diferente.
Aliás, sabe qual foi a preocupação do vosso Governo? Foi abrir um processo de averiguações ao médico que teve a honestidade de dizer publicamente a verdade sobre essas coisas, alertando para a perigosidade e para a necessidade de alguns cuidados a ter nessa região.

O Sr. António Capucho (PSD): - É verdade, é um escândalo!

A Oradora: - Mas eu também sei, Sr. Deputado, que V. Ex.ª, para além de não ler os jornais, também não visitou as minas, nem hoje nem ontem, porque senão estaria tão preocupado quanto eu, senão teria vivido e sentido os elevados riscos que representam o abandono, os problemas ambientais de contaminação de solos e águas e a falta de segurança.
E termino, Sr. Deputado, dizendo-lhe: passe a levar a sério a política do ambiente e passe a levar a sério a Guarda, inclusive quando dela fala. Esse é o grande défice que o Sr. Deputado tem.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Não vou referir-me à grave acusação feita ao Sr. Deputado Carlos Alberto Santos, a de que ele, seguindo o exemplo do Prof. Cavaco Silva, não lê jornais; vou referir-me, sim, ao fundo da questão.
Há aspectos muito positivos nos dois projectos de resolução em debate, do Partido Ecologista Os Verdes e do Partido Social Democrata, que respondem a preocupações reais. Sabemos que o Governo está a trabalhar, e bem, nesse sentido, e o que sugerimos, conforme tive a oportunidade de comunicar ao Governo e aos grupos parlamentares, é a unificação destes diplomas. Por isso, permitimo-nos propor já um texto de trabalho, que poderá ser aperfeiçoado daqui até quinta-feira, acrescentando, nomeadamente, um aspecto que já foi aqui referido: o da necessidade de ter em conta as importantes competências existentes na Empresa Nacional de Urânio. Há ainda que dar grande atenção - e isso já está, em boa parte, tratado nos projectos de resolução, mas convém que fique sublinhado - à saúde das populações, à reconversão ambiental e à situação dos trabalhadores. Portanto, estamos disponíveis para, além do contributo que entregámos na Mesa e que foi distribuído, colaborar num texto comum.
Quero também chamar a vossa atenção para o facto de muita coisa estar a ser feita por este Governo, de muitas coisas terem já sido levadas a cabo e dizer-vos que seria útil a Assembleia entender-se globalmente, se possível por unanimidade, com vista à aprovação de um projecto de recomendação ao Governo.
A confiança que depositamos no Governo, nomeadamente no Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia, Vítor Santos, leva-nos a pensar que aquilo que a Assembleia recomendar - em qualquer caso e muito mais neste - não será «pregar aos peixes», mas será algo que, certamente, será tido em conta

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação dos resíduos industriais no nosso país, incluindo os perigosos, foi mais do que uma vez debatida nesta Assembleia, que se pronunciou sempre sobre a necessidade de elaboração de estratégias no sentido da impreterível preservação do meio ambiente e, sobretudo, da indispensável actuação, com o objectivo de eliminar eventuais riscos para a saúde das populações.
De entre estes resíduos, assumem particular significado os provenientes da indústria mineira, quer das minas que estão no activo quer das que, entretanto, foram abandonadas e se encontram em estado deplorável, fruto de processos conturbados e pouco transparentes de encerramento de minas, em que os direitos dos trabalhadores foram muitas vezes esquecidos, a contaminação dos solos desprezada e as possíveis implicações na saúde pública e na degradação do meio ambiente completamente ignoradas, perante a passividade, por vezes até mesmo a cumplicidade, do Governo.
Galerias abandonadas, abrindo por vezes crateras à superfície do solo, com acesso ao seu interior, constituindo autênticas ratoeiras, escombreiras contendo produtos químicos perigosos, outrora utilizados na separação do

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minério, cuja lixiviação pelas águas da chuva contamina solos e cursos de água, de forma que nem sequer se conhece com rigor ou, pela acção do vento, os pós mais finos depositados em zonas residenciais, são situações correntes que urge conhecer em profundidade, com vista a tomar, de imediato, as medidas necessárias para se evitarem riscos para a saúde pública e estabelecer-se um plano realista, mas urgente, de descontaminação, até porque, eliminada esta actividade económica, as populações têm direito a um desenvolvimento sustentável, que não é possível sem uma prévia e consequente descontaminação ambiental.
No centro do País as minas de urânio estão entre a primeira prioridade e a monotorização das concentrações de radão nos solos, águas e mesmo habitações tem de constituir um esforço permanente, até pelos efeitos directos e particularmente graves que podem produzir na saúde, dada a correlação da concentração deste gás com determinado tipo de afecções.
A resposta dada pelos Ministérios do Ambiente e do Ordenamento do Território e da Economia a requerimento nosso, em que perguntávamos sobre o acompanhamento e encerramento de uma mina e a garantia de segurança das populações, é significativo sobre como se chegou à situação actual e responde por si às discussões aqui havidas sobre as responsabilidades.
O Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território referiu uma inspecção de 1997 à mina que tinha encerrado em 1992, de que se transcrevem os seguintes textos: «Foi igualmente constatado pelos técnicos as condições de segurança precária em que se encontravam galerias e escombreiras.
Ficou decidido transportar os produtos considerados perigosos, que se encontravam no laboratório, para um armazém cujas portas seriam seladas.
Foram notificados dois administradores no âmbito de um processo de contra-ordenação, por abandono de resíduos.
Na data da falência, em 1997, nenhum dos administradores mantinha funções.
Foi oficiado o liquidatário judicial para informar sobre os proprietários do terreno, para serem instados a remover as substâncias consideradas perigosas.
A precaridade da situação consiste no facto de, tendo cessado a exploração, as instalações se encontravam abandonadas sem controlo de acesso às mesmas.»
E rematou: «Considerando que a manutenção e segurança das instalações mineiras não é da competência do Ministério do Ambiente mas do Instituto Geológico e Mineiro (…) - refira-se que admito que existiam resíduos perigosos - (…) e da Direcção dos Serviços de Minas da Delegação Regional da Economia, foram remetidas a esta entidade cópias da informação.»
Por sua vez, o Ministério da Economia informava também, de forma esclarecedora: «A mina cessou a actividade em 1992.» Registe-se que os trabalhadores ficaram por receber salários em atraso e as indemnizações que lhes eram devidas.
Voltamos a citar: «A concessão foi extinta por despacho do Secretário de Estado da Indústria, em 4/8/95 com a revogação do alvará, permanecendo, no entanto, nos termos da lei, da responsabilidade da concessionária a execução dos trabalhos de segurança e recuperação ambiental.
Desde 1992 que a sociedade não responde a nenhuma das notificações que para o efeito lhe foram feitas pelo Instituto Geológico e Mineiro, tendo as mesmas sido sistematicamente devolvidas. A área ficou, assim, disponível, não incidindo sobre ela quaisquer direitos mineiros.
A falência da ex-concessionária foi entretanto decretada por sentença de 29 de Janeiro de 1997.»
Foi desta forma que se trataram os problemas e que se aligeiraram responsabilidades.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, com processos com esta exemplaridade não poderia, de forma alguma, a situação ser melhor. Entretanto, as medidas só recentemente - repito, só recentemente - anunciadas, mas não tomadas, pelos Ministros do Ambiente e do Ordenamento do Território e da Economia relativamente às reabilitações a efectuar e às verbas a disponibilizar no âmbito do Programa Operacional da Economia, são manifestamente insuficientes. É necessário tomar medidas urgentes, como atrás referimos, para salvaguardar de imediato os riscos para a saúde pública e para a degradação do meio ambiente. É ainda necessário e indispensável dotar os organismos oficiais, incluindo o Instituto Geológico e Mineiro e a Empresa Nacional de Urânio, dos meios necessários à elaboração de um plano de urgência e à sua efectiva aplicação.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rosado Fernandes.

O Sr. Rosado Fernandes (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo dizer que não sou grande especialista em minas, embora tenha uma mina de cobre. É verdade, tenho uma mina de cobre e sempre tentei saber se havia alguma história daquela mina, o que eu próprio tenho tentado fazer, mas não há registos, aliás na Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz os arquivos são mal tratados… Mas a verdade é que tenho lá a mina; a verdade é que tenho lá o cobre; e a verdade é que o cobre não deixa crescer as searas como devia ser, pelo que preciso de corrigir o solo com cal, com estrume, com uma série de coisas.
Portanto, penso que este é um problema de estudo, é um problema de ciência. E neste ponto posso testemunhar, por já ter presidido a vários doutoramentos em geologia, que geólogos que tinham trabalhado em minas, designadamente nas da África do Sul e em outras de África, prestaram brilhantes provas, porque conheciam minas.
Há, portanto, saber (agora chamam, para aí, saberes), que é um sentimento abstracto, mineiro em Portugal. E desde Carlos Teixeira, que foi, no fundo, o grande lançador de todos os geólogos deste país, que era um homem de mau feitio e catedrático da Faculdade de Ciências, que há ciência acumulada, registos e naturalmente a possibilidade de conhecer a carta mineira. Daí a tomar medidas é que vai a grande distância, porque a teoria é fantástica, a legiferação magnífica, a execução nenhuma. E é evidente que devia haver um plano para se saber o que fazer com as nossas minas.
Às vezes quase tenho um pesadelo ao ver, nas fronteiras portuguesas, um sinal de trânsito proibido por estar «fechado para obras». Isto é algo que, por vezes, se pensa que é preciso para Portugal, isto é, é preciso «fechar para obras» e realizar aquilo que falta.

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Aliás, como dizia a colega Ana Manso, quando atacada pelo Deputado Carlos Santos, que tem um belo ar rabínico…

Risos do CDS-PP e do PSD.

… e que muito me impressionou… Desde quando é que se tem a pretensão de que o Governo existe para governar? Por amor de Deus, não seja inocente! Meus amigos do PSD, tenham paciência, porque já todos passámos por inúmeros governos e todos temos criado uma «mina» de cepticismo, que, essa sim, é inesgotável e ainda não provoca contaminação à nossa volta.
O que é preciso é estudo; o que é preciso é reunir quem sabe; o que é preciso é perguntar a quem sabe; e, depois de perguntar a quem sabe, pedir ao Governo para executar e não se ficar pelas «meias tintas», porque, apesar de ser uma coisa boa para a saúde - eu sei -, é má para a saúde dos outros concidadãos. E eu estou preocupado, porque não são só as minas de urânio. Ainda me lembro da sociedade Zinckermann, veja lá,…

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - … em que o velho Zinckermann negociava com a Alemanha nazi o volfrâmio e, depois, havia outras empresas que negociavam o volfrâmio com Inglaterra e os países aliados. Foi uma altura em que houve,… Enfim, nessa altura ainda não havia os Maserati no Minho, mas na Beira houve muita gente que enriqueceu rapidamente com o volfrâmio.
Na verdade, a meu ver, deveria haver um aproveitamento das minas que se encerram; designadamente naquelas que devem ser controladas, do ponto de vista de saúde ambiental, deveria tomar-se medidas. Porém, não vale a pena discutir aqui as várias regiões e os vários caciques das zonas, porque o que é preciso é que o Governo faça, mas nós também devemos compreender que é necessário ensinar às crianças, desde pequeninas, que há perigos na natureza. A natureza é bastante desprezada na medida em que as crianças neste momento começam já a aprender algumas noções, inclusive, de física atómica. A minha geração não tinha nenhumas; tinha um desprezo total pela natureza, reconheço-o. E, quanto a isto, devo dizer que Os Verdes, apesar de muitas vezes nos quererem imolar, têm-nos ensinado muitas coisas. Embora façamos sempre aquele desconto do exagero que às vezes colocam nas coisas, a verdade é que temos aproveitado muitos ensinamentos que nos dão. Às vezes, é um exagero, mas outras vezes têm razão.
Sr. Secretário de Estado, por amor de Deus, mande estudar, há gente que sabe, consulte, execute,…

O Sr. Basílio Horta (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … feche, tente contactar também com empresas a fim de saber se a exploração se pode continuar a fazer ou não e proteja o desgraçado, o único que sabe de arqueologia mineira, que é o Dr. Gaspar da minha Faculdade de Letras, por forma a que também estude aquilo que foi a mina em Portugal, para que o País não seja tão ignorante do seu passado, tão ignorante na aplicação da ciência no seu presente e, se calhar, tão «impreparado» para preparar o seu futuro.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, encontram-se a assistir à sessão um grupo de 80 alunos do Colégio La Salle, de Barcelos, e um grupo de 100 alunos da Escola Básica 2/3, da Pedrulha, de Coimbra, para quem peço a vossa saudação habitual.

Aplausos gerais, de pé.

Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Ultrapassando algumas questões de debate autárquico ou de figuras de estilo e regressando à incidência do tema, começo onde terminou o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira, ou seja, na questão de saber se o Governo está a trabalhar bem ou mal. Não duvido do seu esforço e do da bancada do Partido Socialista, hoje, aqui. Não sei se essa esperança, de o membro da equipa do ambiente, que hoje aqui está, não vir «pregar aos peixes» - qual novo Vieira -, é efectiva, não sei se é real.
Por que será que o Governo está a trabalhar bem? Foram serviços públicos que, numa situação anedótica, inventaram a história da maior incidência de alimentação de fumeiros no distrito da Guarda, para justificar uma incidência suspeita, um aumento suspeito de neoplasias. Ora, que se saiba, não é exactamente por causa dos fumeiros que essas situações podem ou não ter um nexo de causalidade.
Também são serviços públicos aqueles que, até hoje, não têm dedicado a suficiente atenção nem sequer à sensibilização das autarquias locais. Foi-me citado que, ainda não há muito tempo, um presidente de junta de freguesia foi buscar umas escoras para ajudar a alcatroar a rua principal da sua freguesia. Isto não será feito, certamente, por qualquer tipo de vantagem económica. É, pura e simplesmente, por uma ausência de sensibilização.
Também é verdade que tem havido uma sinalização deficiente, mas também é verdade que não há uma campanha de sensibilização em torno disto. Sistematicamente, as vedações são rebentadas e todos sabemos, aqueles que se informam disto, que muitos dos sinais de sinalização servem, muitas vezes, de tiro ao alvo para os caçadores. Portanto, há aqui muito a fazer sobre isto e aí os serviços públicos têm trabalhado mal, como têm trabalhado mal naquilo que é, neste momento, a maior urgência de todo este problema. Quando se diz «aproveitar o know-how da Empresa Nacional de Urânio», não podemos esquecer que o principal accionista desta empresa é tutelado pelo Ministério da Economia e que não a quer aproveitar, quer lá pôr a EXMIN, ou seja, essa espécie de «funerária» de minas que vem substituir o know-how da actual Empresa Nacional de Urânio, S.A.
Não quero aqui entrar na discussão sobre quais as influências e os interesses que obrigam à entrada em cena da EXMIN, mas, a nosso ver, não será, seguramente, o direito comunitário, por um qualquer ordenamento dizer que uma empresa encerrada não poderá fazer a requalificação. Há muita forma de contornar esse regulamento comunitário de maneira a aproveitar todos os técnicos e trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio, S.A. e a acabar com essa voragem de falência, de encerramento e de despedimento dessas pessoas; há formas de aproveitar as capacidades desses trabalhadores e técnicos para todo o programa de requalificação ambiental.

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Neste particular, em nome do Bloco de Esquerda, acompanho as diversas preocupações das várias bancadas. Penso que deve haver um plano realista e, por aquilo que me foi dado ver no terreno - e falei com técnicos e trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio - e por algum conhecimento que tenho desta realidade, pois morei na Urgeiriça durante vários anos, há necessidade de enfrentar, primeiro, o problema dos rejeitados, de forma a impedir a sua contaminação não apenas radioactiva mas, sobretudo, química, e, segundo, o problema das minas que, ainda hoje, estão abandonadas e a céu aberto.
Portanto, há os cobertos para fazer em relação aos rejeitados e às minas que estão a céu aberto. E era preciso que ficasse garantido nesse plano, cujas verbas hoje toda a gente desconfia serem extraordinariamente insuficientes, que tudo aquilo que tem a ver com a monitorização das galerias e a lavagem das galerias possa prosseguir sem grandes dificuldades.
Associo-me às preocupações em relação ao cultivo. Em todo o caso, há que ver que há zonas que têm uma especial radioactividade, porque não têm hoje o coberto que lhes permite diminuir as suas incidências. No entanto, não podemos ter umas visão extensiva dessa proibição de cultivo, porquanto vamos por em causa, inclusive, a economia de sobrevivência de centenas e centenas de famílias de agricultores, e não é apenas nos distritos da Guarda, de Viseu ou de Coimbra, há outras zonas. Por exemplo, em Nisa, onde nem sequer há exploração, 1 m ou 1,5 m abaixo de alguns terrenos de lavoura, existe filão, pelo que há ali uma incidência radiológica.
Creio que isto deveria ser feito com as devidas cautelas e prudências, porque não se pode, de uma forma incontrolada, proibir imediatamente o cultivo numa vasta área, mas apenas naquelas que estão muito próximas daquilo que foi a exploração do minério.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Subscrevemos, como é óbvio, as preocupações de todas as bancadas sobre a questão da requalificação ambiental das minas em Portugal.
É evidente que também recebemos conselhos não de quem fala bem mas de quem fez melhor. E o que me parece é que, melhor do que o Governo está a fazer, não houve ninguém que tivesse feito.
É evidente que reconhecemos a necessidade absoluta da reconstituição ambiental, nomeadamente das minas de urânio, com um passivo grande. Canas de Senhorim, onde se situa a sede da empresa, tem sido altamente sacrificada, basta recordarmos o passivo ambiental que lá foi deixado - não obviamente por este Governo nem pelo anterior - aquando do encerramento da Companhia Portuguesa de Fornos Eléctricos. Por isso, entendemos que deve ser criado um grande consenso.
No entanto, é preciso que fique claro, hoje, aqui, que o Governo do PS não só fez estudos como já actuou no terreno. Ou seja, o Governo tem hoje um instrumento, que é o programa de reabilitação ambiental das áreas mineiras, com as devidas prioridades, e já começou a actuar no terreno quando iniciou as obras da requalificação das minas de Jales.
Sobre esta matéria, é possível fazer mais, reconhecemos, e por isso estamos aqui a recomendar ao Governo que faça mais, faça melhor e não esqueça uma questão que, para nós, é essencial: a questão social do encerramento das minas e a sua requalificação ambiental. A questão social, em Canas de Senhorim e em toda aquela zona, é fundamental.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Por isso, queremos deixar aqui uma palavra de incentivo ao Governo para que continue uma política de requalificação ambiental de todas as minas em Portugal, sem excepção, e não só das de urânio.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia (Vítor Santos): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo esta minha intervenção realçando a profundidade do debate e saudando os dois projectos de resolução que aqui foram apresentados.
Saúdo estes projectos de resolução porque o Governo partilha das preocupações e das propostas que estão expressas nos mesmos. Tanto assim é que já foi desenvolvida uma série de acções e estão programadas várias iniciativas que vão permitir superar de forma consistente as preocupações suscitadas nos dois projectos de resolução que hoje estão a ser objecto de debate com grande profundidade.
Perguntar-me-ão: o que já foi feito? É preciso ter presente que o passivo ambiental decorrente da existência de minas abandonadas é uma herança de séculos que, diria eu, se confunde com a história do território nacional. Com efeito, como bem sabem, existem, em Portugal, 80 sítios mineiros abandonados. Portanto, face à dimensão e à gravidade do passivo ambiental decorrente da existência de minas abandonadas, o Governo definiu uma estratégia faseada.
A primeira tarefa assumida pelo Governo foi precisamente, como aqui já foi dito hoje mesmo, a de definir prioridades, e, para tal, foram desenvolvidos vários estudos aprofundados que nos permitiram identificar as situações mais preocupantes.
A nossa segunda preocupação foi a de levar muito a sério as recomendações contidas nos estudos que foram efectuados. Esses estudos não foram postos na gaveta, foram levados muito a sério.
Nesta perspectiva, foram desenvolvidos dois tipos de acções complementares: por um lado, adoptaram-se desde logo algumas das recomendações que permitiam minimizar os impactes ambientais através do desenvolvimento de acções pontuais; e, por outro, pensou-se e desenvolveu-se uma estratégia mais integrada que permita assegurar uma intervenção mais sustentável no tempo. Nesta óptica, foi necessário criar um instrumento financeiro, identificar os actores e, também, proceder a uma calendarização.
A questão que se coloca agora é a de saber que expressão prática teve esta estratégia no caso concreto das minas de urânio.
Em primeiro lugar, a partir dos estudos efectuados, foram identificadas três situações prioritárias pela ordem seguinte: Urgeiriça; o complexo Cunha Baixa-Quinta do Bispo; mina da Bica.

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Em segundo lugar, a par da produção de urânio, a ENU, como já aqui foi salientado, tem vindo a desenvolver actividades pontuais e complementares de protecção ambiental, como, por exemplo, a sinalização e a protecção das zonas de risco e também, como é bem conhecido, a neutralização das águas ácidas.
Em terceiro lugar, foi criada, no âmbito do Programa Operacional de Economia (POE), uma medida de apoio à recuperação das minas abandonadas, com uma dotação inicial de 10 milhões de contos.
Em quarto lugar, está a ser definida a programação dos trabalhos de requalificação das três áreas prioritárias que foram identificadas: Urgeiriça, Cunha Baixa-Quinta do Bispo e Bica.
As principais linhas de acção propostas nos estudos citados visam, essencialmente, a recolha de todos os materiais radioactivos que se encontram dispersos nas áreas mineiras por forma a colocá-los em depósitos enterrados, devidamente confinados e convenientemente localizados. Em princípio, serão localizados no subsolo das próprias minas.
Finalmente, quero falar-vos de um assunto que aqui foi suscitado e é de grande importância, que é a questão da ENU.
A ENU desenvolvia a actividade de produção de minério de urânio e, complementarmente, como já foi salientado por todos e também por mim próprio, as consequentes acções de protecção ambiental.
Como é bem conhecido, a ENU vai deixar de proceder à extracção e ao tratamento de urânio. Tal facto terá de ter, inevitavelmente, várias implicações, que são as seguintes: a ENU, enquanto entidade especializada na produção de urânio, irá entrar num processo de liquidação que durará entre 3 a 6 anos; paralelamente, as suas actuais funções em matéria ambiental serão cometidas a uma nova empresa pública, que não será a EXMIN mas poderá ter a designação ENU - Ambiente, que fará parte do universo empresarial da EDM (Empresa de Desenvolvimento Mineiro).
Finalmente, e não menos importante, tendo presente as preocupações de natureza social que foram manifestadas por diferentes Srs. Deputados, as competências técnicas actualmente existentes na ENU, em matéria de requalificação ambiental, serão afectadas, em benefício do próprio processo de requalificação ambiental, à nova empresa que vai ser criada de imediato.

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em conclusão, quero dizer que, sem alarmismos irresponsáveis e injustificados, mas com a preocupação que este dossier exige, o Governo adoptou a estratégia que nos pareceu mais adequada: procedemos, desde 1996, a um diagnóstico aprofundado - estes estudos levam o seu tempo! - que nos permitiu conhecer a dimensão do problema e identificar prioridades; desenvolvemos, desde 1996/97, acções pontuais que contribuíram para minimizar os impactes ambientais desde logo; e, finalmente, em 19 de Janeiro, numa altura em que esta questão também foi suscitada no Parlamento, desenhámos uma estratégia integrada de actuação a médio prazo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia, gostaria de colocar uma questão que me foi suscitada pela sua intervenção.
O processo de sinalização e de vedação já se iniciou. O Sr. Secretário de Estado identificou os três locais que são considerados prioritários, mas, como bem sabe, em todo o conjunto mineiro do País há outras situações de risco, nomeadamente Sevilha e Castelejo.
Assim, tendo ficado claro que há abertura por parte do Governo para adoptar este plano de emergência e tomá-lo como seu, pergunto: como é que projecta no tempo a execução desta primeira fase?
Em segundo lugar, gostaríamos de saber em que medida estamos a falar de resíduos radioactivos, em que medida o Instituto Tecnológico e Nuclear está a ser envolvido no que toca, por exemplo, às medidas de confinamento de resíduos que são propostas, resíduos esses que, naturalmente, não podem ser colocados num aterro com características vulgares. Igualmente nesta perspectiva, gostaríamos de saber como é equacionada pelo Governo a avaliação de impacte ambiental.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, à ENU, na sua configuração actual, e, futuramente, à ENU - Ambiente ficarão cometidas todas as tarefas de protecção, sinalização e neutralização das águas ácidas das 59 minas de urânio abandonadas na região centro do País. Trata-se de uma função complementar, mas muito importante, que tem vindo a ser assumida pela ENU e que continuará a sê-lo pela empresa que vai ser criada, cuja possível designação será ENU - Ambiente.
Finalmente, não referi na minha intervenção, mas há uma questão que é suscitada pelos dois projectos de resolução e que tem a ver com a análise dos impactes radiológicos.
Neste momento, está a decorrer um estudo, com a intervenção do IGM (Instituto Geológico e Mineiro) e do ITN (Instituto Tecnológico e Nuclear), cujo objectivo essencial é analisar os riscos para as populações decorrentes dos impactes radiológicos sobre as cadeias biológica e alimentar, correspondendo a uma das preocupações que foi suscitada pelo projecto de resolução apresentado pelo partido da Sr.ª Deputada.
A calendarização das actividades está a ser feita neste momento no que diz respeito à requalificação e ao tratamento dos resíduos que estão amontoados no exterior das minas, nomeadamente das que foram identificadas. Na verdade, está a ser feito um estudo que visa identificar as diferentes intervenções que devem ser feitas e, também, a respectiva calendarização.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso, que dispõe de tempo cedido pelo CDS-PP.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia,

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Srs. Deputados: Antes de mais, registo com agrado as preocupações manifestadas pelas várias bancadas e pelo Governo.
O problema não é do distrito da Guarda, é um problema nacional, mas penso que é na Guarda que assume maior gravidade.
Não sou alarmista, mas sou uma portuguesa responsável e preocupada, pois os poucos números disponíveis falam por si.
A nível nacional, as medições efectuadas relativamente à concretização de radão apontam para valores médios da ordem de 81 Bq/m3. Sabe o Sr. Secretário de Estado qual a média no distrito da Guarda? É de 126 Bq/m3, mas, no concelho da Guarda, a concentração de radão/m3 é de 258 Bq no interior das habitações. Isto não alarma ninguém, ou preocupa muito pouca gente?! Ou será que se trata de problemas que todos conhecem, mas que alguns não querem ver?!
Posso dizer-lhe, ainda, que, de acordo com estudos feitos, não em Portugal mas nos EUA, 30% dos casos de cancro do pulmão são provocados por concentrações de radão. Esta é, pois, uma questão que, não sendo alarmista, deve deixar preocupados todos os portugueses.
Assim, Sr. Secretário de Estado, queremos acções concretas e intervenções urgentes antes que seja tarde e aconteçam tragédias.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado, mas apenas dispõe de 31 segundos.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Economia: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Manso, pediu-me que lhe indicasse acções concretas e vou dar-lhe uma resposta que aponta para as mesmas.
Para além do estudo que já referenciei quando respondi à Sr.ª Deputada Isabel Castro, o IGM, em colaboração com o Instituto Ricardo Jorge, vai desenvolver um estudo que definirá uma metodologia que visa a vigilância epidemiológica das comunidades locais.
Eis, pois, a resposta concreta à sua questão, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): - Mas confirma os números que lhe dei, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que está encerrado o debate dos projectos de resolução n.os 105 e 99/VIII, os quais serão objecto de votação na sessão da próxima quinta-feira, no período regimental de votações.
A próxima reunião plenária terá lugar na quarta-feira, pelas 15 horas, e da ordem do dia constará do debate mensal com o Primeiro-Ministro, a que se seguirá a discussão conjunta dos projectos de lei n.os 353/VIII (PS) e 377/VIII (Os Verdes), o debate do projecto de lei n.º 358/VIII (CDS-PP) e, ainda, a apreciação do relatório da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar à gestão da TAP desde o Plano Estratégico de Saneamento Económico e Financeiro (PESEF), bem como à Organização do seu Processo de Privatização.
Nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 25 minutos.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
António de Almeida Santos
Armando António Martins Vara
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Carlos Manuel Luís
Emanuel Silva Martins
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Helena Maria Mesquita Ribeiro
João Alberto Martins Sobral
João Cardona Gomes Cravinho
João Pedro da Silva Correia
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Francisco dos Santos Valente
Manuel Maria Diogo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Teresa de Oliveira Ferreira Coimbra
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge

Partido Social Democrata (PSD):
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Paulo Martins Pereira Coelho
Artur Ryder Torres Pereira
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
Joaquim Monteiro da Mota e Silva
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Frederico de Lemos Salter Cid
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Durão Barroso
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Pedro Manuel Cruz Roseta
Pedro Miguel de Santana Lopes
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
Ana Margarida Lopes Botelho
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
José Honório Faria Gonçalves Novo

Partido Popular (CDS-PP):
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan

Bloco de Esquerda (BE):
Fernando José Mendes Rosas

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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