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Sexta-feira, 21 de Março de 2003 I Série - Número 102

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 20 DE MARÇO DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD) falou sobre o início do conflito armado no Iraque, tendo depois respondido aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Bernardino Soares (PCP), Paulo Pedroso (PS) e Isabel Castro (Os Verdes), que também exerceu o direito de defesa da honra da sua bancada.
Entretanto, o Sr. Deputado Luís Fazenda (BE) recorrera da decisão do Sr. Presidente de não aceitar que os Deputados do seu partido envergassem camisolas com a frase "Não em nosso nome!". Intervieram sobre o assunto os Srs. Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Lino de Carvalho (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Luís Marques Guedes (PSD) e José Magalhães (PS). Rejeitado o recurso, o Sr. Deputado Luís Fazenda informou a Câmara de que o seu grupo parlamentar não iria participar nos trabalhos do Plenário, apenas estaria presente para as votações.
Retomado o período de declarações políticas, também o Sr. Deputado Telmo Correia (CDS-PP) teceu considerações sobre o começo da guerra no Iraque.
De igual modo, o Sr. Deputado José Vera Jardim (PS) reiterou as posições do seu partido sobre o início da acção de força unilateral no Iraque. Respondeu, depois, aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Telmo Correia (CDS-PP) e Marco António Costa (PSD).
O Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP) falou igualmente da guerra do Iraque e respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Nazaré Pereira (PSD) e Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP).

Ordem do dia. - Foi aprovado um parecer da Comissão de Ética relativo à substituição de um Deputado do PCP.
Foram discutidos, em conjunto, os projectos de resolução n.os 119/IX - Processo Penal - Audição parlamentar de avaliação (PS) e 132/IX - Novos rumos da política criminal: responsabilidade penal das pessoas colectivas e mediação penal (PSD e CDS-PP), tendo sido aprovados. Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Jorge Lacão (PS), Miguel Paiva (CDS-PP), Assunção Esteves (PSD), Odete Santos (PCP) e Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP).
Foram debatidos e votados, na generalidade, o projecto de lei n.º 189/IX - Assegura a defesa e a valorização da calçada de vidraço à portuguesa (PCP) - que foi rejeitado - e os projectos de resolução n.os 128/IX - Sobre a criação de um regime especial das pequenas explorações de pedreiras para calçada ou outros inertes (CDS-PP) e 131/IX - Protecção das explorações de inertes para a calçada de vidraço à portuguesa (PSD), que foram aprovados. Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Luísa Mesquita (PCP), Joel Hasse Ferreira (PS) - que fez a síntese do relatório da Comissão de Economia e Finanças -, Paulo Baptista Santos (PSD), Isabel Gonçalves (CDS-PP), Ofélia Moleiro (PSD), Heloísa Apolónia (Os Verdes), José Miguel Medeiros e Luiz Fagundes Duarte (PS) e Luísa Mesquita (PCP).
Foi aprovado o voto n.º 46/IX - De pesar pelo falecimento da Professora Andrée Crabbé Rocha (PS), a cuja apresentação procedeu a Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima (PS).
Foi igualmente aprovado o voto n.º 47/IX - De pesar pela morte da escritora Maria Ondina Braga (PS), que foi apresentado pelo Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte (PS).
A seguir à aprovação dos dois votos a Câmara guardou 1 minuto de silêncio.

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O projecto de lei n.º 213/IX - Visa regular os processos de deslocalização de empresas (PCP) foi rejeitado na generalidade.
Em votação global, foram aprovadas as propostas de resolução n.os 30/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo n.º 13 à Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, relativo à abolição da pena de morte em quaisquer circunstâncias, aberto à assinatura em Vilnius, a 3 de Maio de 2002, 32/IX - Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a República da Roménia sobre readmissão de pessoas em situação irregular, assinado em Lisboa, em 26 de Setembro de 2002, e 33/IX - Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a República da Estónia sobre readmissão de pessoas em situação irregular, assinado em Lisboa, em 12 de Novembro de 2001.
Foi aprovado um requerimento, apresentado pelo BE e pelo PS, solicitando a baixa à Comissão de Educação, Ciência e Cultura, pelo prazo de 60 dias, do projecto de lei n.º 79/IX - Define o número máximo de alunos por turma no ensino não superior (BE).
A proposta de lei n.º 44/IX - Autoriza o Governo a legislar sobre certos aspectos legais dos serviços da sociedade da informação, em especial do comércio electrónico, no mercado interno, transpondo para a ordem jurídica nacional a Directiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de Junho de 2000, foi aprovada na generalidade, na especialidade (com propostas de aditamento apresentadas pelo PSD e pelo CDS-PP) e em votação final global. Usaram da palavra os Srs. Deputados José Magalhães e António Costa (PS), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), Luís Marques Guedes (PSD), Bernardino Soares e Odete Santos (PCP) e Gonçalo Capitão (PSD).

Foi aprovado, na especialidade e em votação final global, o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, relativo à proposta de lei n.º 24/IX - Estabelece o regime de criação, o quadro de atribuições e competências das áreas metropolitanas e o funcionamento dos seus órgãos e ao projecto de lei n.º 110/IX - Altera a forma de constituição dos órgãos e reforça os poderes e meios de actuação das estruturas e funcionamento das Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto (PCP).
Mereceu também aprovação, na especialidade e em votação final global, o texto final, apresentado pela mesma Comissão, relativo à proposta de lei n.º 37/IX - Estabelece o regime de criação, o quadro de atribuições e competências das comunidades intermunicipais de direito público e o funcionamento dos seus órgãos e ao projecto de lei n.º 204/IX - Regime de criação, atribuições, competências e funcionamento das comunidades intermunicipais (PS), tendo proferido declarações de voto os Srs. Deputados Ana Paula Malojo (PSD), Miguel Paiva (CDS-PP) e José Augusto Carvalho (PS).
A Câmara aprovou três pareceres da Comissão de Ética, autorizando Deputados do PS e do PSD a prestarem depoimento por escrito no âmbito de processos que correm em tribunal.
Após discussão, foi igualmente aprovado um outro parecer da mesma Comissão relativo ao levantamento da imunidade parlamentar a um Deputado do PSD, tendo-se pronunciado sobre o assunto, a diverso título, os Srs. Deputados Vítor Ramalho (PS), Bernardino Soares (PCP), Eugénio Marinho (PSD), Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP), António Costa (PS), Bernardino Soares (PCP), Guilherme Silva (PSD) e Jorge Lacão (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 10 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Agostinho Veloso da Silva
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira

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Jorge Lacão Costa
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Santos de Magalhães
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
Antonino Aurélio Vieira de Sousa
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Joana Beatriz Nunes Vicente Amaral Dias
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa diversos requerimentos.
Nos dias 10, 11 e 17 e nas reuniões plenárias de 12 e 13 de Março - ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado José Apolinário; ao Primeiro-Ministro e aos Ministérios da Administração Interna, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e ao Governador Civil de Leiria, formulados pelos Srs. Deputados Isabel Castro, João Teixeira Lopes, José Miguel Medeiros, Paula Malojo, Luís Miranda e Heloísa Apolónia; aos Ministérios da Segurança Social e do Trabalho e da Economia, formulados pelos Srs. Deputados Capoulas Santos, Jerónimo de Sousa, Miranda Calha e Fernando Pedro Moutinho; a diversos Ministérios e ao Governador Civil da Guarda, formulados pelos Srs. Deputados Bruno Dias, Fernando Serrasqueiro, José Saraiva, Mota Andrade, Luísa Mesquita e Fernando Cabral; aos Ministérios da Justiça, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e das Finanças, formulados pelo Sr. Deputado Eugénio Marinho; ao Ministério da Cultura, formulados pelos Srs. Deputados Maria Santos e Renato Sampaio; à Sociedade Euro 2004 e a diversas câmaras, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministério da Defesa Nacional, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe.
O Governo respondeu a requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
Nos dias 12 e 13 de Março - Álvaro Castello-Branco, Gonçalo Capitão, Carlos Alberto Gonçalves, Francisco Louçã, José Manuel Pavão, Carlos Luís, Carlos Rodrigues e Marco António Costa.
Nos dias 14 e 17de Março - Ana Drago, Jerónimo de Sousa, António Filipe, Isabel Castro, José Saraiva e Fernando Cabral.
No dia 18 de Março - Bruno Dias, Fernando Pedro Moutinho, Nuno Teixeira de Melo, Manuel Cambra, João Teixeira Lopes e Luísa Mesquita.

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Por sua vez, nos dias 07, 10, 13, 14, 17 e 18 de Março, foi recebida resposta a requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Ascenso Simões e António Galamba.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Numa das duas declarações da Cimeira Atlântica, realizada no último fim-de-semana, na ilha Terceira, na Região Autónoma dos Açores, consignou-se: "O desafio de Saddam às Resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que exigem o desarmamento da sua capacidade nuclear, química, biológica e de mísseis de longo alcance, levou à imposição de sanções contra o fraque e tem diminuído a autoridade das Nações Unidas. Durante 12 anos, a comunidade internacional tentou persuadi-lo a desarmar evitando assim um conflito militar e, mais recentemente, através da adopção unânime da Resolução n.º 1441. A responsabilidade é dele. Se Saddam recusar, mesmo agora, cooperar plenamente com as Nações Unidas, incorrerão sobre ele próprio as sérias consequências previstas na Resolução n.º 1441 e em anteriores resoluções".
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Infelizmente, o apelo último e o esforço derradeiro para conseguir o desarmamento do Iraque pela via diplomática, ou seja, a preocupação do Primeiro-Ministro, do Governo português e de Portugal para que a paz, hoje e no futuro próximo, fosse, ela própria, assegurada por meios pacíficos gorou-se.
Há poucas horas atrás, foi desencadeada, pelos Estados Unidos, uma acção militar contra o Iraque. Trata-se de um momento particularmente difícil para o mundo.
Este é um momento em que, também no plano interno, não faz sentido que se possa colocar a mera luta político-partidária à frente do interesse nacional, acima da unidade do Estado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Trata-se de um momento em que sinto a necessidade de expressar três sentimentos ou preocupações que se traduzem em três simples palavras: firmeza, esperança e serenidade.
Firmeza num conflito que não desejávamos e que tudo fizemos para evitar, esgotando para tanto todos os meios políticos e diplomáticos que estavam ao nosso alcance.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não tendo sido possível, infelizmente, evitar o conflito, claro ficou na posição de Portugal, assumida ao mais alto nível do Estado, pelo Primeiro-Ministro e pelo Sr. Presidente da República, que não participaremos no conflito com forças militares, como ficou claro que estamos, inequivocamente, ao lado dos nossos tradicionais aliados com quem partilhamos valores que prezamos, como a liberdade e a democracia.
E fazemos votos de que à firmeza na decisão corresponda uma acção eficaz e rápida, certos de que do seu sucesso advirá um mundo mais seguro e mais livre.

O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, importa também adiantar uma sentida palavra de esperança.
Esperamos e desejamos que possa ser poupada a vida de inocentes e que este conflito termine com o menor sofrimento possível para todas as partes.
Saddam Hussein pôde evitar a guerra. Não quis evitar a guerra.
Cabe agora aos Estados Unidos e aos seus aliados na acção militar tudo fazerem para que as populações civis, as pessoas inocentes, o povo do Iraque, já tão martirizado pela ditadura, não seja atingido.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O objectivo é desarmar o Iraque, o que, como os factos demonstram, impõe o derrube do ditador de Bagdade. O objectivo é libertar o povo iraquiano e assegurar-lhe um futuro digno e livre.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Por último, uma palavra de serenidade.
Conforme asseguraram, ao mais alto nível do Estado, o Sr. Presidente da República e o Sr. Primeiro-Ministro, a segurança dos portugueses e a sua protecção estão, felizmente, garantidas.
Mas serenidade e tranquilidade é também afirmar, numa hora tão difícil quão delicada como esta, a nossa coesão e a nossa unidade nacional.
Como ficou claro nas últimas intervenções públicas do Sr. Presidente da República e do Sr. Primeiro-Ministro, o Estado português fala a uma só voz.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Governo e o Presidente da República proclamaram, em uníssono, a defesa dos superiores interesses nacionais.
Anteontem, aqui, na Assembleia da República, o Sr. Primeiro-Ministro apelou ao sentido de Estado e a um esforço de compromisso de todos em nome da unidade nacional.
Ontem, o Sr. Presidente da República sublinhou, em sintonia com o Governo, que este é um tempo de convergência, é um tempo de unidade nacional, um tempo de unir e não de dividir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É, por isso, um tempo que, pesem embora as divergências, não faz qualquer sentido valorizar e muito menos fazer prevalecer o mero combate político-partidário.
O que faz sentido, sim, é corresponder ao apelo do Sr. Presidente da República e gizar um esforço de compromisso entre os órgãos do Estado e entre os principais agentes políticos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste quadro, os maiores partidos portugueses, que têm estado historicamente unidos em torno dos grandes objectivos nacionais que se jogam na União Europeia, na NATO e na relação transatlântica, têm a obrigação de seguir e de reforçar o grande sentido de responsabilidade que o Sr. Presidente da República e o Sr. Primeiro-Ministro evidenciaram na afirmação

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externa do Estado português e na defesa do interesse nacional.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Está fora de causa que é legítimo, mesmo neste quadro, ter divergências. Querer, a propósito deste quadro, cavalgar a onda do mero combate político-partidário já não é aceitável. Isso é subalternizar Portugal, isso é colocar em segundo lugar os portugueses!

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não é isso que os portugueses desejam nem o compreendem.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Entendeu e bem, ontem, o Sr. Presidente da República, na comunicação que dirigiu ao País, sublinhar os princípios que devem reger o Estado nestas ocasiões graves da vida internacional em que nos inserimos. São princípios simples: da unidade nacional, da serenidade, da coesão e do superior sentido de responsabilidade.
Os princípios anunciados e o apelo à unidade dos órgãos de soberania, por parte do Sr. Presidente da República, não podem deixar de levar a que o Partido Socialista, o maior partido da oposição, pesem embora as divergências, só possa ter um caminho a seguir neste novo quadro que se nos apresenta, o caminho da responsabilidade: ponderar a retirada da moção de censura apresentada na emotividade do frentismo radical em que se deixou envolver, quebrando o consenso de anos em matéria de política externa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Insistir nessa via não é promover a unidade nacional nem corresponder ao apelo do Sr. Presidente da República. Persistir nesse caminho é agudizar, em matéria tão delicada, o combate político-partidário.
Retirar a moção de censura não é de forma alguma desvalorizar as divergências; é, antes, mostrar vontade e capacidade de fazer um esforço de compromisso no essencial. E o essencial, o que está fundamentalmente em causa é a coesão dos portugueses e a unidade nacional.
É por entender bem o essencial que o PSD saúda o esforço de entendimento e de compromisso que, ao mais alto nível do Estado, em matéria tão delicada, e de forma irrepreensível, fizeram o Governo e o Presidente da República. Este é um bom exemplo de quem tudo faz para colocar o País em primeiro lugar.
Espero, pois, e desejo que o Partido Socialista, pelas responsabilidades que tem e pelo seu passado em matéria de política externa, saiba interpretar este exemplo e retire dele todas as ilações, correspondendo ao apelo do Chefe de Estado.
Reafirmo que este é um tempo de unir e não de dividir, é um tempo de congregar e não de separar.
Da nossa parte, tudo fizemos e continuaremos a fazer para unir; tudo continuaremos a fazer para um esforço de convergência e de compromisso. Cada um assumirá as suas responsabilidades.
A nossa responsabilidade como maioria, de que não abdicamos, é a de apoiar o Governo no entendimento com o Sr. Presidente da República, na inequívoca afirmação externa do Estado português e na defesa intransigente dos interesses de Portugal e dos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, há diversas questões prévias a tratar.
Atendendo às circunstâncias que estamos a viver, com o começo, hoje mesmo, da guerra no Iraque, é óbvio que todos os partidos quererão fazer declarações políticas. No entanto, tal só poderá ser feito no entendimento de que, nesse caso, excederemos certamente o tempo limite fixado no Regimento. É, pois, necessário que nos entendamos todos sobre isto.
Não quero privar ninguém do direito de se pronunciar sobre matéria de tal delicadeza, com a qual temos de lidar com a maior transparência e igualdade de direitos para todos. Apelo, pois, aos diversos grupos parlamentares, já que têm as suas declarações políticas preparadas para apresentar perante o Plenário, que limitem ao mínimo possível o debate ao nível de pedidos de esclarecimento e respectivas respostas em relação a cada orador; caso contrário, é manifesto que não conseguiremos cumprir atempadamente a nossa ordem de trabalhos.
Há um outro assunto prévio sobre o qual quero informar a Câmara.
Antes do começo da sessão, verificando que os Srs. Deputados do Bloco de Esquerda envergavam camisolas com sinais demonstrativos da respectiva posição no momento presente, pedi-lhes o favor de prescindirem dessa manifestação das suas posições, sendo certo que sempre terão o direito de manifestá-las mediante o uso da palavra em Plenário.
No princípio da presente Legislatura, a propósito de um pequeno incidente havido logo que subi a esta cadeira presidencial, já tinha marcado esta minha posição, que julgo ser razoável. Mais tarde, relativamente a esta matéria, ouvi os Vice-Presidentes da Mesa da Assembleia da República, que manifestaram uma posição de absoluta concordância no sentido de que, dentro do Hemiciclo, não devem ser permitidas outras manifestações que não o livre uso da palavra por todos os membros do Parlamento.
Os Srs. Deputados do Bloco de Esquerda não quiseram aceitar o pedido que lhes dirigi e disseram mesmo que iriam recorrer para o Plenário da minha decisão de não permitir manifestações desse tipo na Sala das Sessões - nem nas galerias nem tão-pouco entre os membros do Parlamento.
Julgo ser esta a altura de recorrerem para o Plenário dessa minha decisão porque, com toda a franqueza, se há Srs. Deputados que não aceitam a autoridade do Presidente da Assembleia este está em muito difícil situação para sequer poder olhar para eles e, portanto, para ouvir os seus pedidos de palavra, conceder-lhes a palavra, etc.
Portanto, de forma a que a nossa reunião decorra com toda a normalidade, dou a palavra ao Sr. Deputado Luís Fazenda para que recorra para Plenário da minha decisão a fim de que votemos essa questão e possamos prosseguir os nossos trabalhos, já que há inscrições para o uso da palavra por parte do parte do Bloco de Esquerda e eu não queria, de forma alguma, privá-los de manifestarem as suas opiniões.
Sr. Deputado Luís Fazenda, tem a palavra para recorrer para Plenário da minha decisão de não permitir outras manifestações que não sejam o uso da palavra livre por

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parte dos Srs. Deputados no Hemiciclo do Palácio de S. Bento.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não se trata de questionar a autoridade do Presidente da Assembleia da República, mas aquilo que entendemos ser manifestamente um excesso dessa autoridade.
Na verdade, hoje, "dia 1" da guerra, esta foi a forma como nós entendemos - e, em termos regimentais, respeitando a dignidade deste Parlamento - exprimir o nosso luto e a nossa revolta para com o início desta guerra de agressão à margem do Direito Internacional.

Aplausos do BE.

Sr. Presidente, terei de contrariá-lo, porque não houve qualquer assentimento entre os grupos parlamentares acerca deste assunto, nem no princípio desta Legislatura nem há pouco tempo.
Devo notar-lhe que no Parlamento Europeu é um acto comum, bem como em vários Parlamentos da Europa. Ainda há poucos dias, pude ver o ex-Presidente da República Mário Soares empunhando um cartaz no Parlamento Europeu juntamente com muitos Eurodeputados portugueses.
Não entendo por que é que o Sr. Presidente quer estabelecer aqui essa regra! E, nesse sentido, considerando que não é razoável a sua posição, recorro para o Plenário a fim de que possa decidir.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Gostava de assinalar que, ainda há dois dias, um Sr. Deputado apareceu em Plenário com um autocolante também relacionado com a questão do Iraque e eu pedi ao respectivo grupo parlamentar que tivesse a bondade de o prevenir - como, aliás, fiz hoje, delicadamente, antes do início da sessão - para que retirasse o autocolante, o que ele fez. E até lhe agradeço muito o ter permitido resolver esse assunto sem quaisquer incidentes.
Sobre este pequeno incidente de hoje, vou dar a palavra, por ordem de inscrição, ao Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, o sentido da minha interpelação é sobre uma outra questão, a primeira, que o Sr. Presidente colocou.

O Sr. Presidente: - Então, permito-me dar-lhe a palavra ulteriormente.

O Sr. José Magalhães (PS): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, gostaria de dizer, desde já, que discordo em absoluto do entendimento que o Sr. Presidente faz desta questão. O respeito e o desrespeito não passam seguramente por aqui. Mas, já que o entendimento do Sr. Presidente é esse, pergunto-lhe se, em seu entender, um lenço com o símbolo da paz é também um atentado àqueles que estão nesta Câmara e uma falta de respeito para com ela.

Aplausos de Os Verdes, do PCP e do BE.

O Sr. Presidente: - Não, Sr.ª Deputada, um lenço com o símbolo da paz, tendo eu de confessar que não consegui identificá-lo, manifestamente não desrespeita a Câmara.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - É porque vê mal!

O Sr. Presidente: - De resto, disse aos Srs. Deputados do Bloco de Esquerda que se, porventura, tivessem vindo de luto, não teria qualquer objecção a fazer.
Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, é para uma interpelação à Mesa, uma vez que o Sr. Presidente, na sua intervenção, invocou e relembrou uma reunião com os Vice-Presidentes a propósito de um outro incidente idêntico ocorrido no início desta Legislatura e, pela minha parte, queria precisar a opinião que, na altura, dei.
De facto, essa reunião realizou-se e todos concordámos que será desejável que a forma de expressão da opinião de todos os grupos parlamentares e de todos os Srs. Deputados seja feita através da palavra. Em todo o caso, como o Sr. Presidente estará recordado, eu próprio - aliás, não só eu, mas falo por mim -, logo na altura, referi que me parecia que não era possível impedir que um qualquer Sr. Deputado, que quisesse exprimir a sua posição através da utilização de alguma peça de vestuário, o fizesse. E até referi um exemplo, aliás, agora trazido à colação pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, que era o de como estabelecer a fronteira entre uma camisola ou um lenço ou, ainda, entre uma camisola, um lenço e um emblema, como este que eu próprio trago aqui, na lapela, e que diz "Não à guerra".
São fronteiras delicadas e penso que, nessa matéria, Sr. Presidente, não deveríamos impedir que cada Sr. Deputado, de forma, aliás, perfeitamente pacífica, possa utilizar as formas de expressão que entenda melhor manifestarem a sua opinião.
Foi essa, na altura, a opinião que referi e queria voltar a sublinhá-la, porque tem sido essa a minha sensibilidade sobre esta matéria.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Assinalo ao Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho que é preciso ter muito boa visão para distinguir que o seu pin significa um protesto contra a guerra, o que não se passa exactamente com a atitude dos Srs. Deputados do Bloco de Esquerda.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, sobre esta matéria, e não obstante considerarmos que há, no dia de hoje e no momento de hoje, questões mais importantes a discutir do que a indumentária do Bloco de Esquerda, que não nos parece ser o tema mais importante nem mais interessante neste Plenário,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - … eu, admitindo até, Sr. Presidente, que, em algumas circunstâncias, este novo traje possa, do meu

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ponto de vista pessoal - e gostos não se discutem… -, representar uma melhoria,…

Risos e aplausos do CDS-PP e do PSD.

… e considerando ainda que é difícil que exista esquerda folclórica sem folclore, julgo que, em qualquer caso, os termos em que a questão se coloca, Sr. Presidente, são razoáveis da parte de V. Ex.ª e os termos da resposta do Bloco de Esquerda constituem um desafio à ordem institucional do Plenário e à autoridade de V. Ex.ª.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PS.

Nesse sentido, essencialmente, o meu grupo parlamentar votará contra o recurso interposto pelo Bloco de Esquerda e a favor da posição expressa pelo Presidente da Assembleia.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, foi sem surpresa que ouvi o Sr. Deputado Luís Fazenda dizer que este assunto não tinha sido falado. De facto, o bom senso não se fala; tem-se ou não se tem!!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E o Bloco de Esquerda, com esta sua atitude, demonstra a falta de senso que tem relativamente àquilo que devem ser os trabalhos da Assembleia da República.
De resto, chamo a atenção do Sr. Presidente para o seguinte: que autoridade tem, amanhã, o Sr. Presidente ou a Mesa para invectivar cidadãos que se comportam indevidamente neste Hemiciclo quando são os próprios Deputados a dar estes exemplos tristes?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PCP, do BE, de Os Verdes e de alguns Deputados do PS, batendo com as mãos nos tampos das bancadas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço o favor de não baterem nas tampas das carteiras, porque sabem perfeitamente que isso danifica os instrumentos electrónicos de trabalho da Assembleia da República aí instalados.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - É evidente, Sr. Presidente, que o que está aqui em causa, numa actuação como a que hoje os Srs. Deputados do Bloco de Esquerda aqui estão a realizar, não é seguramente o sagrado exercício do contraditório que deve ser exercido nesta Câmara! É apenas a atracção pelo espectáculo: dois ou três minutos na televisão, o que, de resto, já conseguiram. Portanto, se já o conseguiram, o bom senso apelaria a que eles retirassem essas vestes ridículas e deixassem a Assembleia trabalhar normalmente.

Protestos do BE.

Deixo só uma pergunta no ar: se isto é a interpretação daquilo que deve ser uma afirmação política relativamente a um debate, o que é que os Deputados do Bloco de Esquerda trarão vestido, ou não trarão vestido, quando aqui discutirmos o nudismo?

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Isto é sério!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Respeite a liberdade de expressão!

O Orador: - É evidente, Sr. Presidente, que nós, pela nossa parte, subscrevemos a posição do Sr. Presidente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está em curso, neste momento, uma acção militar de grande gravidade, pelo que julgo que a Câmara ganharia se esta outra questão fosse examinada na sede própria. Nós sabemos que, com excepção de situações que atentem contra o decoro ou contra a ordem pública, há uma tradição nesta Câmara quanto ao traje e quanto às insígnias, mas não em relação a outras expressões, e o juízo sobre isso é largamente subjectivo e tem sido remetido para a decisão pessoal e política de cada Deputado.
Julgamos que, nas presentes circunstâncias, Sr. Presidente, seria muito positivo que V. Ex.ª convocasse, de imediato e muito rapidamente, uma reunião da Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Porquê?!

O Orador: - … porque o Plenário deve ser poupado a perder tempo e a gastar tempo intensamente com o secundário.
Fazemos esta proposta formalmente e apelamos a que seja ouvida.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado José Magalhães, não vou convocar uma reunião da Conferência de Líderes para discutir esse assunto. Discuti-lo-emos certamente em próxima reunião, mas não vou interromper o Plenário para fazer essa discussão.
De resto, há um recurso, que temos de votar, sem prejuízo de, em Conferência de Líderes, voltarmos ao assunto oportunamente. E que fique claro, como é óbvio, que não vou obrigar os Srs. Deputados do Bloco de Esquerda a tirarem os seus trajes de hoje, porque não sei exactamente o que trazem por baixo deles.
Srs. Deputados, vamos, então, votar o recurso, apresentado pelo Sr. Deputado Luís Fazenda, da decisão do Sr. Presidente de não aceitar que os Deputados do seu partido envergassem camisolas com a frase "Não em nosso nome!".

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP, do

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BE, de Os Verdes e de alguns Deputados do PS e a abstenção do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tendo o recurso sido rejeitado, a minha posição é mantida…

Protestos de alguns Deputados do PS.

Mas, conforme referi, não obrigarei os Srs. Deputados a tirar os seus trajes e prosseguiremos o nosso debate, voltando esta questão a ser discutida na Conferência de Líderes.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares. Está, agora, em discussão a intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito obrigado por me lembrar, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Guilherme Silva, a primeira coisa que quero assinalar é que, no dia triste para a humanidade em que começa uma guerra de consequências imprevisíveis…

Protestos do Deputado do CDS-PP Narana Coissoró.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Esteja calado! Isto são coisas sérias!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, tem de haver o maior silêncio. Este assunto é suficientemente grave para exigir o maior respeito pelas posições de cada um. Portanto, peço a todos o favor de se manterem em silêncio para ouvirmos os oradores.
Faça favor de prosseguir, Sr. Deputado.

O Orador: - É caso para perguntar, Sr. Presidente, o que é mais desrespeitoso do debate parlamentar: se as vestes dos Srs. Deputados do Bloco de Esquerda ou as "bocas" dos Srs. Deputados do CDS-PP.

Aplausos do PCP.

Sr. Deputado Guilherme Silva, voltando à sua intervenção, a primeira coisa que quero assinalar é que, neste dia grave para a Humanidade, a sua intervenção não teve uma palavra de preocupação em relação à irresponsabilidade desta guerra, ao sofrimento que vai causar ao povo iraquiano ou aos inocentes que vão sofrer as consequências de actos que não são da sua responsabilidade - isso, para o PSD, não tem qualquer importância no dia de hoje.
Quero ainda dizer-lhe, Sr. Deputado Guilherme Silva, que houve na sua intervenção uma instrumentalização não aceitável das declarações do Sr. Presidente da República. É que o Sr. Presidente da República reafirmou que considera esta ofensiva militar, esta guerra sem mandato das Nações Unidas ilegítima.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Essa é que é a verdade! E não aquela que o Sr. Deputado tentou aqui fazer crer: a de que haveria uma concordância nacional nesta matéria.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Sem dúvida, hoje é um dia triste para a Humanidade, porque começa uma guerra que não sabemos como vai acabar, mas que, isso sabemo-lo, vai certamente trazer prejuízos incalculáveis para muitas populações e para a Humanidade.
Sabemos, por outro lado, que o início desta guerra é também a derrota política dos que a querem fazer: a Administração Bush, os seus aliados e também o Governo português. É que, como o povo português, povos por todo mundo manifestam sistematicamente a sua oposição a esta escalada belicista, a que o Governo do PSD e do CDS-PP nos quis associar, de forma chocante, com a Cimeira vergonhosamente realizada em território nacional, ainda há bem poucos dias.
A verdadeira unidade a que nos queremos associar é a unidade dos que preferem a paz à guerra, dos que reconhecem que há uma ofensiva ilegítima, injusta e inaceitável dos Estados Unidos da América e dos seus aliados e dos que criticam justamente e não se revêem na posição do Governo português, que atrela o País a esta ilegítima guerra, a esta ofensiva sem mandato, a esta guerra que visa impor o domínio americano naquela região do mundo.
Essa é a unidade que queremos e julgamos que é aí que estão os sentimentos maioritários do povo português.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Guilherme Silva, há mais oradores inscritos para pedir esclarecimentos. Deseja responder em conjunto ou em separado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Separadamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, dispõe de 3 minutos para responder ao Sr. Deputado Bernardino Soares. Tem a palavra.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado Bernardino Soares, penso que, porventura, por influência das camisolas dos seus Colegas mais próximos, o Sr. Deputado está a ouvir pior- mas eu vou mandar-lhe uma cópia da minha intervenção -, porque se tivesse ouvido bem teria naturalmente verificado que dediquei grande parte da minha intervenção às preocupações relativamente às populações inocentes e manifestei até o meu desejo de que haja o mínimo de consequências para ambas as partes envolvidas no conflito.
Portanto, a minha preocupação humanitária, a preocupação humanitária do PSD está muito bem patente na minha intervenção.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, Sr. Deputado, a sua intervenção vem confirmar várias coisas: primeira, já em 1991 o PCP, apesar de haver uma deliberação do Conselho de Segurança das Nações Unidas, esteve contra o conflito que se desencadeou no Iraque.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Já ontem se lembrava que essa posição já tinha sido assim hesitante relativamente ao conflito com

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o nazismo, já também nessa matéria, nesse conflito mundial, os partidos comunistas não foram claros na sua posição.

Vozes do PCP: - É mentira! Que é isto? Mentiroso!

O Orador: - Portanto, nesta matéria de princípios…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mentiroso!

O Orador: - Ó Sr. Deputado, bastava ter ouvido o Sr. Primeiro-Ministro Blair, ontem no Parlamento britânico, para ter percebido essa referência.
Srs. Deputados, repito: nesta matéria de princípios felizmente - e contrariamente àquilo que o Sr. Deputado diz -, não houve aqui nenhuma sintonia entre o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Presidente da República. Se o Sr. Presidente da República não sentisse que havia uma injustificação para este conflito não tinha a posição clara, que felizmente assumiu em nome do Estado português, de autorizar a utilização do espaço aéreo português, de autorizar a utilização da Base das Lajes.
Esta é uma questão clara relativamente à qual o Governo por um lado, o Sr. Presidente da República, por outro, o Estado português assumiu uma posição inequívoca de apoio aos nossos aliados…

O Sr. Bruno Dias (PCP): - De apoio à guerra!

O Orador: - Pese embora não ser essa a posição do Sr. Deputado Bernardino Soares e do seu partido, não queira dizer que não é essa a posição do Sr. Presidente da República!
Mais uma vez lhe digo: em matéria de princípios fez muito bem o Sr. Primeiro-Ministro, fez muito bem o Governo português em não hesitar entre a liberdade e a democracia e entre o totalitarismo e a ditadura…

O Sr. António Costa (PS): - Totalitarismo e ditadura?

O Orador: - Entre o terrorismo e a paz…

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Entre a guerra e a paz!

O Orador: - As questões são postas com esta clareza. E quando em matéria de princípios se atingem e põem as questões com esta clareza não há que hesitar em nenhuma circunstância.
VV. Ex.as, como eu dizia há dias, podem ter alguma satisfação efémera nalgumas sondagens, mas na História o lugar será do Governo português, do Sr. Primeiro-Ministro e do Sr. Presidente da República.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para defesa da honra da bancada, suponho que por alusões feitas pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, serei muito breve, mas gostaria de dizer que só, certamente, por lapso de linguagem, no calor do debate, é que o Sr. Deputado Guilherme Silva terá dito que os comunistas portugueses estiverem hesitantes na luta contra o nazismo.

Protestos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço silêncio.

O Orador: - Isto porque o Sr. Deputado Guilherme Silva sabe - e com toda a serenidade lhe digo - que os comunistas portugueses, que este Partido Comunista Português, esteve sempre contra o nazismo, lutou contra o fascismo num tempo em que ainda não havia outros partidos e tem nessa matéria um património e uma história que não podem ser insultados dessa forma.
Repito: apenas posso aceitar que essa declaração, que decerto vai corrigir, possa ter sido feita por lapso de linguagem no calor deste debate.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, com certeza que não vai querer que seja eu, nem V. Ex.ª, a reescrever a História.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O Pacto Germano-Soviético da responsabilidade de Ribbentrop e Molotov estão na História como uma situação inequívoca de apoio de comunistas ao nazismo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Risos do PCP.

Tenho pena que VV. Ex.as tenham tido companheiros que tenham deixado isto na História, mas a culpa não é minha.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, não é exactamente para pedir esclarecimentos, mas para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a interpelação à Mesa tem sempre prioridade.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, há pouco tentei fazer uma interpelação à Mesa, mas o Sr. Presidente não autorizou.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não me apercebi de que pediu a palavra para uso dessa figura regimental, porque se não, obviamente, que a teria autorizado.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, gostaria de dizer que não entendemos que a votação que há pouco ocorreu não tenha consequências, porque as tem.
Depois de termos ouvido um conjunto de considerações sobre moda e outro tipo de graçolas que ofenderam aquilo que é a nossa forma, e a de muitos outros Deputados hoje na Europa, de exprimirem o seu luto e a sua indignação

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pelo começo desta guerra em que já se começara a somar mortos civis, a chegada de refugiados à Jordânia e todo esse cortejo de horrores, fizemo-lo com toda a seriedade e não aceitamos continuar nos trabalhos e nos debates sob censura do autoritarismo da maioria.

Vozes do PSD: - É melhor!

O Orador: - Sr. Presidente, não aceitamos, também, que a discussão em Conferência de Líderes fique como que uma espécie de ameaça velada à expressão própria daquilo que são Deputados eleitos pelo povo.
Nesse sentido, Sr. Presidente, comunico-lhe que nos retiramos dos trabalhos e voltaremos na altura das votações.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa regista a sua clara posição e respeita-a.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Guilherme Silva, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pedroso.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, o mundo vive hoje um dia de luto. As razões pelas quais entendemos que o mundo vive hoje um dia de luto serão seguidamente apresentadas aquando da nossa declaração política, mas ouvindo o Sr. Deputado Guilherme Silva devo dizer-lhe, com toda a sinceridade, que não sinto nas suas palavras a percepção da gravidade da situação que o mundo vive hoje.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado insiste, tal como o PSD e o Governo insistem, em não ver que quando se pretende desarmar um perigo militar a melhor forma é desarmar sob o controlo de inspectores, provocar os danos militares e a perda de capacidades militares e pouparem-se as vidas civis. Os senhores insistem em não ter visto isto que deviam ter visto no momento oportuno e que se assim tivesse sido pelas posições que os senhores apoiaram teria evitado que esta guerra estivesse a acontecer, teria sido dada a oportunidade que o Sr. Hans Blix voltou a insistir que gostaria de ter tido para que esta questão fosse resolvida, desarmando pelos mecanismos de verificação das Nações Unidas aquilo que até agora não poderia ter sido.
Os senhores insistem em não perceber que associaram Portugal e a sua bandeira aos preparativos de uma guerra anunciada no momento em que havia ainda condições para desarmar pela paz.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Os senhores insistem em não ver que, como disse ontem o Sr. Presidente da República, o comportamento de não esgotar os caminhos pacíficos de solução é um comportamento que não corresponde à tradição jurídico-cultural portuguesa reflectida na Constituição.
Os senhores insistem em não ver que foram os senhores, e o governo, que retiraram, neste momento, o Governo de Portugal daquele que é o consenso institucional, a nossa tradição jurídico-cultural vertida na Constituição.
Os senhores insistem em não ver que foram os senhores que quebraram a unidade fundamental e a preservação das posições portuguesas.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Os senhores, Sr. Deputado Guilherme Silva, insistem em não ver que o Governo português esteve associado à provocação de uma guerra que, neste momento, e nestes moldes, poderia ter sido evitada prosseguindo o objectivo de desarmamento do Iraque.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Deputado Paulo Pedroso, compreendo o seu incómodo nesta matéria, porque o senhor é vítima de um partido que anda aos ziguezagues em tudo, designadamente em política externa, que era a última coisa que se esperava.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quando se tratou do Kosovo não foi preciso resolução das Nações Unidas, agora que se trata do Iraque já é preciso resolução das Nações Unidas. Quem mudou não foi o PSD! Quem mudou, de forma grave, em matéria de política externa foi o Partido Socialista! Nós estamos do lado dos nossos aliados, onde sempre estivemos e onde sempre esteve Portugal, independentemente dos governos dos últimos 25 anos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado está, ainda, incomodado porque o seu partido, sem sentido de Estado, fez tudo para que houvesse um conflito institucional entre o Governo e o Sr. Presidente da República.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Orador: - O Sr. Presidente da República, que, naturalmente, tem um superior sentido de Estado, soube assegurar o entendimento necessário com o Sr. Primeiro-Ministro, porque, quando estão em causa Portugal e os portugueses, o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Presidente da República sabem ter a opção certa e nunca põem à frente, ao contrário dos senhores, meras questões político-partidárias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, hoje em que o mundo está a assistir à guerra, do nosso ponto de vista, a mensagem do Sr. Presidente da República ao País é de enorme gravidade. E, Sr. Deputado, a forma como abordou esta situação é a clara prova da enorme indiferença da sua bancada por aquilo que está a acontecer.
Estamos a falar de uma agressão militar que tem, sobretudo, como destinatários e vítimas pessoas totalmente inocentes, o que vai significar é a morte de seres humanos. Neste momento, mais pessoas estão a morrer porque há uma agressão militar e há uma enorme falta de respeito por essas mortes que podiam, e deviam, ter sido evitadas. Acho que é inaceitável isso não só não ter sido feito

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pelo Governo que o senhor apoia mas, ainda por cima, não haver agora a compreensão do respeito e da gravidade do momento que estamos a atravessar.
A esmagadora maioria dos cidadãos portugueses, aliás, com grande clareza, manifestou a sua adesão à paz e penso que era esse silêncio, era esse respeito que esta Câmara deveria demonstrar, mas parece-me que toda a condução dos trabalhos até hoje e o posicionamento da sua bancada e da bancada de direita são uma vergonha que consideramos inaceitável.
Sr. Deputado, como, aliás, o Sr. Presidente da República diz, estamos a falar de uma agressão militar sem qualquer base jurídica; estamos a falar de um tempo novo em que se retorna ao uso da força, ou seja, a recusa da lei; estamos a falar do desprezo pela tradição jurídico-constitucional portuguesa e pelos princípios da comunidade internacional.
Penso que, neste momento, não compreender o risco do que tudo isto pode vir a significar é para o maior partido representado nesta Câmara - a ser esse o sentimento de todos os Deputados da sua bancada e eu desejaria que não fosse - algo de muito lamentável e perigoso para o nosso país.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, vou dizer-lhe muito simplesmente qual é o sentimento dos Deputados desta bancada - expressei-o, aliás, na minha intervenção, quando referi que era indispensável que se fizesse tudo para evitar o sofrimento do povo iraquiano e para que haja o mínimo de danos em ambas as partes envolvidas no conflito. Mas há uma diferença: nesta bancada estamos preocupados com 12 anos de extermínio do povo curdo, com 12 anos de atrocidades de Saddam Hussein…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … e a sua bancada esteve 12 anos calada acerca dessas atitudes de Saddam Hussein!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Deputada Isabel Castro pediu a palavra para que efeito?

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Para defesa da honra da bancada, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, é totalmente inaceitável que alguém que pertence a um partido político que apoia um Governo que vendeu armas, que silenciou o extermínio do povo curdo se permita dar lições, com uma moral que não tem,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - … a um partido que, com clareza, sempre foi contra os conflitos belicistas, quaisquer que eles fossem, porque não acreditamos, ao contrário do Sr. Deputado, que é pela via das armas que se chega à paz.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, há pouco V. Ex.ª refugiou-se na circunstância de não haver resolução das Nações Unidas para este conflito e, ao fim e ao cabo, vem agora dizer que também é sensível às atrocidades que, ao longo de anos, Saddam Hussein cometeu internamente, em relação ao seu povo, e designadamente em relação ao povo curdo. Mas, em 1991, apesar da resolução das Nações Unidas, V. Ex.ª também esteve contra a invasão do Iraque, ou seja, não esteve contra as atrocidades que Saddam Hussein mantinha internamente, em relação ao povo iraquiano, nem contra as atrocidades cometidas sobre o povo curdo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Às 2 horas e 35 minutos de hoje teve início a intervenção militar no Iraque. O momento é, do ponto de vista internacional, de gravidade, de preocupação e de responsabilidade.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A guerra, ainda que movida contra um regime e um ditador sanguinários, é sempre um testemunho trágico das imperfeições do homem e, enquanto tal, indesejável.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Assim sucede com este conflito, apesar de as acções militares desencadeadas serem consequência de um processo que ainda que indesejável era, neste preciso momento, inevitável.
A História, Sr. Presidente e Srs. Deputados, produz, ciclicamente e com uma cadência inevitável, tiranos paranóicos da dimensão de Hitler, de Staline ou de Mao Tsé Tung. Só a vitória global das liberdades e da democracia garantirá, no futuro, que este grau de paranóia não se volte a repetir. Para que fique claro, na nossa opinião, Milosevic ou Saddam Hussein têm já um lugar reservado nesta galeria de horrores, nesta sinistra galeria de psicopatas e de tiranos.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Há cerca de 35 anos que Saddam Hussein usa, contra o seu próprio povo, os instrumentos da repressão, do terror e recorre a uma política de genocídio.
Saddam Hussein, como hoje mesmo disse Osni Mubarak, é, em última análise, o primeiro e o último responsável pela intervenção militar e por esta segunda guerra no Golfo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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Quando um governo e um Estado acumulam armas de destruição maciça e continuamente as usam contra o seu próprio povo, invadem os seus vizinhos e incumprem sucessivamente, ao longo de 12 anos, resoluções das Nações Unidas, esse governo torna-se, num mundo marcado pela ameaça terrorista (tão visível no dia 11 de Setembro de 2001), uma ameaça intolerável.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A inevitabilidade da intervenção resulta ainda do impasse que foi gerado na comunidade internacional. Era naturalmente desejável que esta falasse a uma só voz, mas algumas divisões geradas podiam, no limite, resultar numa espécie de sistemática "ameaça do não uso do força", o que daria, em última análise, a Saddam Hussein a escolha sobre desarmar ou não, quando e como, deixando nas suas mãos, num autêntico jogo de esconderijo, a decisão e o calendário, o que era inaceitável, obviamente!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Impõe-se hoje à Assembleia da República reflectir sobre a posição portuguesa em relação ao conflito. E, neste contexto, ouvimos as importantes intervenções, de ontem e de hoje, do Sr. Presidente da República e do Sr. Primeiro-Ministro de Portugal.
Em primeiro lugar, cumpre salientar o esforço de consenso e de seriedade posto nesta posição e o importante apelo de S. Ex.ª o Presidente da República ao dever dos órgãos de soberania, Assembleia da República incluída, de preservarem a unidade nacional.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Como seria de esperar, o Presidente do República Portuguesa foi coerente com a sua sensibilidade perante o problema, sério na sua função de garantia da unidade nacional e responsável nas palavras de confiança e tranquilidade que dirigiu aos portugueses.
Como portugueses só temos de nos orgulhar pelo sentido de Estado demonstrado pelos principais responsáveis políticos, designadamente por Durão Barroso e Jorge Sampaio.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

As suas intervenções remeteram, de uma vez por todas e definitivamente, para os anais do ridículo aqueles que, num momento tão grave, quiseram explorar divisões ou apelar ao conflito institucional.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os que apelaram ao conflito institucional só podem hoje ficar decepcionados e a sua decepção é a medida da dignidade das instituições democráticas em Portugal.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A posição portuguesa perante o conflito é clara e inequívoca. É inequívoca ao afirmar que Portugal desejava um maior envolvimento das Nações Unidas e do seu Conselho de Segurança;…

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … é correcta ao determinar o não envolvimento de Portugal ou de forças militares portuguesas neste mesmo conflito (tendo, portanto, uma atitude proporcional) sem decisão do Conselho de Segurança;…

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … é solidária com as democracias envolvidas neste mesmo conflito ao garantir - ainda ontem o Sr. Presidente da República o referiu - o apoio logístico, designadamente a utilização da Base das Lajes; é, por último, inequívoca na condenação do regime iraquiano e, como ontem foi dito, no desejo de que, no Iraque, o seu povo possa aceder à liberdade e à democracia.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Se a posição portuguesa é clara, o CDS-PP deixa aqui hoje, também, um apelo igualmente claro, dirigido ao maior partido do oposição.
O Partido Socialista começou por dizer, a propósito da Cimeira dos Açores, que era inaceitável que Portugal não estivesse nela como membro de pleno direito - chegou mesmo a dizer que seria uma vergonha se o Primeiro-Ministro de Portugal não estivesse nos Açores! A seguir, baralhou-se e, como de costume, entre o tradicional desejo de Mário Soares, de proximidade ao PCP, e os últimos desejos da sua porta-voz, de aproximação ao Bloco de Esquerda, o Partido Socialista acabou por condenar a Cimeira dos Açores e condenar a participação do Primeiro-Ministro português. Foram muitas contradições, e contradições lamentáveis!
Ainda assim, neste momento, verificado o acordo institucional entre Governo e Presidente da República, designadamente na concessão de apoio logístico aos nossos aliados e na utilização da Base das Lajes, verificado o apelo à unidade nacional por parte do Sr. Presidente da República, era tempo de o PS ler este apelo como uma oportunidade e aproveitar, nem que seja o fim-de-semana, para reflectir um pouco e dar um sinal de unidade nacional, de consenso nacional, retirando a sua moção de censura.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O momento, como todos os momentos difíceis, deve ser de serenidade, de confiança institucional e de agrupamento de todos os portugueses em torno das suas instituições e dos seus máximos representantes.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Termino, dizendo que é isto que é de esperar de uma força política moderada e responsável.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Deixo uma última palavra: neste momento, os nossos desejos estão, naturalmente, com a libertação do Iraque e com a libertação do povo iraquiano, esperando o mínimo de vítimas civis e que este conflito chegue rapidamente ao seu termo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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O Orador: - As nossas inquietações e preocupações estão com as populações civis que no Iraque, no Koweit ou em qualquer país vizinho possam ser atingidas pelo conflito.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A nossa solidariedade está com os nossos aliados e, também, com os militares que, no Iraque, combatem em nome de valores em que acreditamos.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Acreditamos, firmemente, hoje como no passado, num Mundo livre da paranóia dos ditadores, em que os valores supremos dos direitos humanos, da liberdade e da democracia possam ser universais e respeitados por todos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Iniciou-se esta madrugada uma acção de força unilateral contra o Iraque. É um momento grave para o Mundo e para os portugueses.
A guerra é sempre uma tragédia humana, mas é tanto mais tragédia quanto mais poderia ser evitada.

Aplausos do PS.

A guerra só é admissível quando claramente se tiverem esgotado todos os meios pacíficos de resolução dum conflito.
Sempre, desde o primeiro momento, defendemos o apoio às Nações Unidas, aos esforços diplomáticos e ao trabalho dos inspectores. Não foi essa, afinal, a solução que prevaleceu. A partir sobretudo - e lamentavelmente - da Cimeira dos Açores ficou claro, com os ultimatos aí feitos, que a guerra, sem apoio em resolução específica do Conselho de Segurança, ia ser a solução. Ao contrário do que o Primeiro-Ministro pretendeu fazer crer aos portugueses, essa reunião ficará conhecida como a cimeira que fechou as portas à diplomacia - a diplomacia não se faz com ultimatos - e escancarou-as para a guerra.

Aplausos do PS.

Esta guerra não é legítima. Só o seria, como sempre defendemos, com uma resolução específica do Conselho de Segurança que permitisse o uso da força.
Também sempre defendemos que o objectivo do desarmamento do Iraque é essencial para a paz e a segurança internacionais, não apenas porque o Iraque é uma brutal ditadura, opressora dos mais elementares direitos humanos, mas porque é um regime agressor que, ao longo dos anos, recusou a colaboração franca e leal com as Nações Unidas com vista ao desarmamento. Mas este desarmamento estava a ser obtido, com problemas e dificuldades, é certo - o trabalho dos inspectores estava em curso, precisava de mais tempo e de ser reforçado e que a pressão a todos os níveis continuasse.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, esta guerra é também uma precipitação.

Aplausos do PS.

Este processo, conduzido como foi, de forma errática e arrogante, abriu uma crise internacional de extrema gravidade. Essa crise verifica-se, em primeiro lugar, nas Nações Unidas, centro por excelência de regulação da vida internacional, com o desrespeito das opções aí repetidamente tomadas e com a clara violação da Carta que significa a acção unilateral iniciada esta madrugada. Mas também na NATO e, dum modo geral, nas relações transatlânticas, onde o entendimento e a cooperação baseadas no diálogo franco e aberto deram lugar à crispação e ao mal entendido, quando não ao violento ataque verbal;…

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - … mas também na construção europeia, sobretudo na vertente de uma política externa e de segurança comuns, postas flagrantemente em causa pela obstinação de alguns. O pilar europeu e a relação transatlântica são matrizes e prioridades indiscutíveis da nossa política externa.
A Europa e os Estados Unidos constituem, na sua mútua relação e conjunto empenhamento nas instâncias internacionais, elemento essencial para a estabilidade e a segurança internacionais. Por isso mesmo, são também dramáticos os efeitos desta decisão de, à margem do Direito Internacional, iniciar uma acção militar contra o Iraque.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - E Portugal aparece claramente associado a esta iniciativa, mesmo que por força de decisão e clara determinação do Sr. Presidente da República e Comandante Supremo das Forças Armadas se tenha evitado o pior - a participação ou a colaboração militar no conflito.

Aplausos do PS.

A grande coligação de forças que foi possível conjugar noutras alturas, a partir de amplos consensos entre a Europa e os Estados Unidos, tem hoje uma expressão dramaticamente reduzida. Para esta situação contribui decisivamente uma concepção unilateralista que acabou por vingar.
Portugal sempre propugnou e se bateu por uma ordem internacional capaz de assegurar "a paz e a justiça nas relações entre os povos", como consta da Constituição da República. E o Direito Internacional é a única legitimidade que podemos aceitar para regular as relações internacionais. Essa é a garantia de todos face ao poder de facto dos mais fortes.

Aplausos do PS.

A ordem internacional por que tanto nos temos batido sai fragilizada desta guerra. Quando é a "lei dos mais fortes" que impera, desaparecem as garantias de todos, mas sobretudo as dos mais fracos.

Aplausos do PS.

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A não compreensão desta realidade por parte do Governo português afasta-o do consenso em matéria de política externa vigente durante as últimas décadas. É uma responsabilidade a que não pode escusar-se.
A clarividente e serena declaração do Sr. Presidente da República, em situação de tanta gravidade para Portugal e para os portugueses, é uma contribuição essencial para começarmos, a partir de agora, a refazer o que se encontra desfeito: a unidade da Europa, a reposição duma sã e equilibrada relação transatlântica e o reassumir pelas Nações Unidas do seu papel central nas questões da paz e da segurança.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - A violação do Direito Internacional com a acção agora iniciada não nos deve inibir na acções para conseguir atingir aquele objectivo essencial para o País. A guerra destrói, destrói vidas, traz sofrimentos incalculáveis às populações, faz imperar o medo e a ansiedade. Neste caso também atinge brutalmente as relações, instituições e princípios fundamentais para a vida em sociedade com paz e segurança.
Esperemos que esta guerra possa terminar rapidamente e que cause o mínimo (que sempre será muito) de sofrimento e desolação.
Apelamos também para que os portugueses sigam as sábias palavras do Sr. Presidente da República e mantenham a serenidade. Mas exigimos ao Governo que tome de imediato todas as medidas necessárias à criação desse ambiente de serenidade.
A cada guerra renasce a esperança dos homens de que seja a última.
Há uma coisa que não poderemos reparar: que o Governo português tenha conduzido Portugal para o palco dos defensores duma guerra ilegal. É um erro gravíssimo, cujas consequências, para todos nós, são ainda difíceis de calcular.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Muito bem!

O Orador: - Por nós, temos a determinação para, a partir dum debate para o qual também nos convocou o Sr. Presidente da República, contribuirmos para recolocar Portugal no lugar donde nunca deveria ter saído: a defesa do Direito como supremo e último regulador da vida internacional e o apoio activo e empenhado às instituições garantes da paz e da segurança internacionais.

Aplausos, de pé, do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Vera Jardim, não perderei tempo, como é óbvio, a discutir consigo matéria de valores, de princípios ou de condenação de ditaduras. Penso que, nessa matéria, temos, óbvia e logicamente, a mesma opinião, pelo que não vale a pena entrarmos nessa discussão, não é consigo essa discussão.
Queria, no entanto, fazer-lhe uma ou duas perguntas.
Em primeiro lugar, quero sublinhar que o Partido Socialista - e V. Ex.ª, apesar do esforço que fez, não conseguiu fugir a esse facto - andou um pouco perdido nesta matéria e na própria consideração da cimeira dos Açores.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E ainda anda!

O Orador: - "E ainda anda", é verdade! Designadamente, quanto à cimeira dos Açores.
O Partido Socialista, no dia 14, dizia, pela voz do seu Secretário-Geral (não era a nova porta-voz, que diz umas coisas um pouco menos pensadas…!), que "o PS espera que Durão Barroso esteja nos Açores de pleno direito. É uma vergonha se o Primeiro-Ministro português não estiver na cimeira dos Açores" - esta era a versão 1. Dois dias depois - versão 2 -, o PS dizia que "a participação de Durão Barroso é inqualificável". Ora, não se percebe! Não se percebe o que é que o Partido Socialista quer nesta matéria,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … tal como não se percebe como é que o Partido Socialista se agarra à questão da comunidade internacional quando foi o próprio Partido Socialista que, em Portugal, mais defendeu a tal ideia da ameaça sistemática do não uso da força. É preciso ser claro nesta matéria.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Gostava que o Partido Socialista compreendesse e percebesse duas coisas fundamentais.
Em primeiro lugar, que saísse, de uma vez por todas, dessa sua ideia de estímulo ao conflito institucional.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado, da tribuna, continua a dizer: "Presidente da República 'sim', Governo 'não'". O senhor ainda não percebeu que, neste momento, já não há a posição do Presidente da República e a posição do Governo?! Neste momento, há uma posição de Portugal!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Repito, neste momento, há uma posição de Portugal. E claríssima! Nós, Portugal (não é "nós" maioria, "nós" Governo nem "nós" Presidência da República), queríamos que tudo se tivesse passado no quadro das Nações Unidas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Nós, Portugal, não participamos no conflito porque não houve nova resolução do Conselho de Segurança.

Protestos do PS.

Nós, Portugal - e o Sr. Presidente da República disse-o ontem -, estamos solidários com os nossos aliados e, concorde ou não o PS com a concessão da Base das Lajes - e o Sr. Presidente da República disse ontem que a única posição aceitável para Portugal era ser solidário com os aliados e prestar apoio logístico e a Base das Lajes -, pergunto o que pensa o PS sobre essa matéria.

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Nós, Portugal, estamos com os nossos aliados e nós, Portugal, aí, sim, estamos de acordo, condenamos o regime iraquiano.
Neste momento, o que há é uma posição de Portugal, e é pena que um partido com a história, com o grau de responsabilidade do PS, que levou Portugal para a Europa, que sempre foi a favor da NATO e que sempre foi a favor da relação transatlântica não esteja neste consenso nacional -…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … isso, sim, é que é pena, Sr. Deputado! - e que, numa matéria deste tipo, esteja ao lado do PCP e ao lado do BE.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, dizendo que isso é uma irresponsabilidade. Assim é difícil que o PS possa voltar a ser governo em Portugal nos tempos mais próximos. Que raio de política externa teria o País…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - … se esta fosse condicionada pelo PCP ou pelo BE? Não é aceitável, Sr. Deputado!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, agradeço as suas questões.
Devo esclarecê-lo, antes de mais, que nós só estamos ao lado de uma entidade: o PS. De mais ninguém!

Vozes do CDS-PP: - Ah…!

O Orador: - E estamos bem acompanhados, Sr. Deputado. Estamos bem acompanhados!
Sobre a cimeira dos Açores, naturalmente que, anunciada a cimeira e, sobretudo, anunciada como uma tentativa séria para fazer vingar a paz, não poderíamos tomar outra atitude que não esperar - e foi isso que fizemos.
Hoje, Sr. Deputado, se abrir toda a imprensa internacional que se refira à cimeira dos Açores, sabe como lhe chamam? A "cimeira da guerra"!! Ainda ontem, o Guardian se referia à "cimeira da guerra"! É assim que é tratada a cimeira dos Açores!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso são os jornalistas!

O Orador: - Quer o senhor queira quer não queira, é a "cimeira da guerra"! Porque se tornou claro, Sr. Deputado, que, à saída dos aviões que levavam de volta as pessoas que participaram na cimeira, essa decisão estava tomada. Não foi sete ou oito horas depois que ela foi tomada, foi ali! Nos ultimatos que daí foram dirigidos - ultimatos insuportáveis, Sr. Deputado! - ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, eram bem visíveis as intenções de guerra que ali estavam. E, de duas, uma, Sr. Deputado: ou o Sr. Primeiro-Ministro foi enganado para os Açores ou sabia o que lá ia fazer. Qualquer das duas coisas é grave! Não sei qual será a mais grave!…

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, o senhor fala do consenso - aliás, muito se tem falado do consenso e de quem acabou com o consenso. Eu pergunto-lhe se quem disse esta frase está fora do consenso ou dentro do consenso e se foi ele quem rompeu o consenso: "(…) só é legítima, face ao Direito Internacional [a guerra], nos casos claramente tipificados na Carta das Nações Unidas."

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Por isso, Portugal não participou no conflito!

O Orador: - Quem disse isto foi, ontem, o Sr. Presidente da República às 20 horas e 30 minutos. Foi ele quem quebrou o consenso?! O Sr. Presidente da República quebrou o consenso?!

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem perguntado!

O Orador: - É que é outra hipótese! E se foi ele quem quebrou o consenso, então, nós também o quebrámos, porque sempre defendemos esta tese!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - Os senhores é que defendem outra tese!

O Orador: - Sr. Deputado, já agora, permita-me que lhe responda também com uma questão: como é que o Sr. Deputado faz a leitura desta frase…

Protestos do PSD.

Sr. Presidente, se me der mais um pouco de tempo e abrir uma excepção ao Regimento, certamente que os Srs. Deputados da bancada do PSD quererão fazer algumas perguntas! Estão tão inquietos em querer fazer perguntas…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso não é possível! Faça favor de responder ao Sr. Deputado Telmo Correia.

O Orador: - … que eu, se o Sr. Presidente quiser abrir uma excepção, com todo o gosto, responderei aos Srs. Deputados do PSD!

O Sr. Presidente: - Vai ter ocasião de responder porque se inscreveu um Sr. Deputado do PSD.

O Orador: - O Sr. Presidente da República disse ontem: "Foi esta [a não participação de Forças Armadas portuguesas] a minha posição, desde a primeira hora, para

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o caso de não haver uma resolução específica do Conselho de Segurança."

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E o Kosovo?!

Protestos do PSD.

O Orador: - Sr. Presidente, eu insisto: como estes Srs. Deputados estão cheios de vontade de fazer perguntas e como devem ter perdido a ocasião de as fazer, talvez se pudesse abrir um novo período de perguntas!
Como é que o Sr. Deputado Telmo Correia interpreta isto? Acho que só há uma maneira de interpretar, e todos nós sabemos do que estamos a falar: é que foi o Sr. Presidente da República quem tomou a decisão determinante de que não haverá um soldado português envolvido em operações militares!

Aplausos do PS.

Isso, Sr. Deputado, isso custa-vos! Isso custa-vos! Mas, como já disse, felizmente (e, obviamente, outra coisa não seria de esperar), o Sr. Presidente da República tem sempre defendido esta posição.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - E em relação à Base das Lajes?!

O Orador: - Sr. Deputado, em relação ao uso da Base das Lajes, nós gostaríamos, antes de mais, de ser informados de algumas coisas. De algumas coisas, Sr. Deputado! Designadamente, os termos dos pedidos que foram feitos, os prazos por que são válidos esses pedidos. Gostaríamos de ser informados sobre isso. Mas o Sr. Deputado, estou certo, fará as diligências imediatas e adequadas para que sejamos informados sobre essa matéria!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso não é responder!

O Orador: - Depois, daremos a resposta!

Aplausos do PS.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Fugiu à pergunta!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Isso é uma fuga!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Marco António Costa.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vera Jardim, foi indisfarçável a forma como tentou fugir à questão da Base das Lajes,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … porque ontem, sobre essa matéria, o Sr. Presidente da República não perguntou por prazos nem por termos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Disse, preto no branco, que, sobre essa matéria, Portugal tinha tomado a decisão correcta e o Governo português tinha actuado em consonância com a opinião dele.

Aplausos do PSD.

É verdade que o Partido Socialista, durante os últimos dias, conduziu toda a sua estratégia política no sentido de trazer o Sr. Presidente da República para um conflito institucional com o Primeiro-Ministro.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Perderam!

O Orador: - Mas também é verdade que, ontem à noite, ficaram sem essa possibilidade de conflito institucional.
E, perante aquilo que foi a intervenção do Partido Socialista nos últimos dias sobre matérias tão concretas como solicitar a intervenção do Sr. Presidente da República para desautorizar o Sr. Primeiro-Ministro quanto a uma declaração de princípio que me parece muito clara, ontem, o Sr. Presidente da República negou essa possibilidade ao Partido Socialista. E sobre a questão das Lajes, também anunciou a sua posição.
Sr. Deputado, falou da Carta das Nações Unidas e nós ouvimo-lo com atenção, mas não conseguimos perceber como é que pode existir, como o Sr. Deputado Luís Marques Guedes já teve oportunidade de dizer numa outra ocasião, direito internacional de primeira e direito internacional de segunda. Então, no caso do Kosovo, em que não houve resolução do Conselho de Segurança, era legítima a intervenção,…

O Sr. António Costa (PS): - Era!

O Sr. Paulo Pedroso (PS): - E o Sr. Deputado tinha a obrigação de saber porquê!

O Orador: - … e agora não é legítima a intervenção, só porque não há resolução do Conselho de Segurança!?…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Sr. Deputado, uma coisa, hoje, era esperada do Partido Socialista: que, sobre uma matéria de importância como é a autorização para a utilização da Base das Lajes, o Partido Socialista não se refugiasse em questões de forma nem em questões secundárias e que, com clareza, quanto aos princípios desta matéria, pudesse anunciar aqui a sua posição. Mas sabe porque é que não o fez hoje, Sr. Deputado? Porque foi o líder do Partido Socialista quem, no debate com o Sr. Primeiro-Ministro, levantou essa questão e ontem foi respondida pelo Sr. Presidente da República. É indisfarçável o vosso incómodo, mas é essa a razão!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, deixo-lhe uma pergunta muito concreta, já que, quanto à questão das Lajes, já percebemos que o PS não tem posição nem nunca vai responder. Quanto a uma questão que hoje se coloca no plano internacional, porque a política é dinâmica e tem de ser vista a cada momento - hoje, temos uma situação de

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guerra, que, obviamente, também lamentamos mas que só existe porque houve um tirano que conduziu a comunidade internacional para esta situação -,…

O Sr. Artur Penedos (PS): - Isso é hipocrisia!

O Orador: - - … hoje, nesta circunstância em que temos um aliado de muitos e muitos anos, os Estados Unidos da América, e uma democracia em conflito com uma ditadura, de que lado estaria um governo do Partido Socialista?! Estaria do lado do Iraque, do lado dos Estados Unidos ou, simplesmente, "lavaria as mãos" deste conflito e esconder-se-ia a emitir uma posição sobre esta matéria?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, nós já tivemos ocasião de responder a essa última questão, a única que me pôs.
Seguindo na peugada do Sr. Primeiro-Ministro, os senhores, tal como naqueles filmes que nós víamos em que há o "bom" que vai atacar os "maus" e termina sempre com a vitória do "bom" sobre os "maus", os senhores, repito, dividem o mundo da seguinte forma: há os "bons" e há os "maus"…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Às vezes!

O Orador: - … e tem de se estar do lado dos "bons", obviamente, porque não se deve estar do lado dos "maus"!
Sr. Deputado, nós estamos do lado da legalidade internacional, do Conselho de Segurança, do apoio às Nações Unidas. É aí que estamos!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Ah! Agora! E o Kosovo?!

O Orador: - Sr. Deputado, da tribuna, não me ouviu fazer a crítica acerba, veemente, do regime de Saddam Hussein e dizer que era um regime perigoso para a paz e a segurança?! Nós temos dito isso! Mas alguém tem dúvidas sobre isso?! Olhe, Sr. Deputado, o Canadá tem dúvidas sobre isso? O México tem dúvidas sobre isso?

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - A França!

O Orador: - São os vizinhos dos Estados Unidos da América, que sempre estiveram com os Estados Unidos da América nas coligações! O senhor já viu o problema? O Canadá está contra, o México está contra. São dois exemplos muito concretos! Ora bem, e porquê? Não estão a favor… Os senhores, com essa divisão, querem pôr-nos do lado dos "maus"! Não tentem! Não tentem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas diga: de que lado está?!

Aliás, já há pouco…

Protestos do PSD.

O Sr. José Sócrates (PS): - Calma! Ouçam com atenção!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não pode haver diálogo! Cada um exprime as suas opiniões e os outros ouvem em silêncio!

O Orador: - Estão excitadíssimos! São os tambores da guerra que excitam as pessoas, certamente!
Portanto, Sr. Deputado, com serenidade, lhe respondemos: estamos do lado da legalidade internacional. É desse lado que estamos!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso não existe!

O Orador: - Em relação à Base das Lajes deixe-me dizer-lhe o seguinte: é evidente que o Sr. Presidente da República tem uma informação obviamente completa e adequada sobre a questão.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Mas confia nele!

O Orador: - Nós não temos nada, Sr. Deputado! O que é que fundamentou o pedido dos Estados Unidos? Quando foi feito? Foi repetido? Por quanto tempo é a autorização? Para que efeitos? Em que condições?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso não interessa para nada!

O Orador: - O Sr. Deputado sabe esclarecer-me sobre estas questões?! É que se nos esclarecer nós respondemos! Nós não sabemos nada! Sabemos apenas que a Base das Lajes está a ser utilizada, mais nada!

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não respondeu a nada!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje é um dia de enorme gravidade para a história da humanidade. É um dia em que se inicia uma guerra de consequências imprevisíveis, que ninguém sabe como e quando vai acabar e que consequências terá para o mundo e para a humanidade. Sabemos, no entanto, que é uma guerra que mexerá fundo na situação do Médio Oriente e que certamente abrirá a porta a novas agressões de Sharon e afastará mais ainda a resolução do problema do Médio Oriente.
É preciso também lembrar, neste momento, que muitos dos que falam das resoluções da ONU se esquecem de referir que as inúmeras resoluções que condenam a política israelita em relação aos palestinianos não estão a ser cumpridas, e nem por isso se vê, da parte da Administração Bush e dos seus aliados, uma atitude semelhante à que estão a tentar agora.

Aplausos do PCP.

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Esta é uma guerra que tem oposição por todo o mundo. É inquestionável a oposição que povos de todo o mundo, pelas mais diversas maneiras e com as mais diversas manifestações, têm expressado em relação a esta ofensiva belicista, mesmo nos próprios Estados Unidos da América, contrariando as "declarações de cassete" de que quem protesta contra a guerra está a dar vazão a um sentimento de anti-americanismo. Não! São protestos contra uma guerra injusta, protestos, esses, que se propagam por todo o mundo, incluindo nos Estados Unidos da América. E é inquestionável a oposição de muitas personalidades mundiais, de 41 prémios Nobel americanos, de diversas personalidades dos mais variados quadrantes e, até, do Papa.
Dizem alguns dos que normalmente subscrevem e se apoiam política e ideologicamente na doutrina da Igreja que os que agora invocam a posição do Vaticano pela paz estão em chocante contradição com o não aceitarem algumas opiniões noutros momentos. Mas a verdade é que o que é chocante é que aqueles que sempre seguem a orientação da doutrina da Igreja, neste campo tão grave, como é o da guerra e da paz, façam letra morta das palavras, inclusive, do Papa e do Vaticano.

Aplausos do PCP.

Essa é que é a inovação e a originalidade neste momento!
Esta guerra, ilegítima e sem mandato das Nações Unidas, tem também a oposição do Sr. Presidente da República, claramente reafirmada ontem e que não admite interpretações abusivas, como já alguns tentaram fazer.
Mas, se os Estados Unidos e os seus aliados avançaram com a guerra, é inequívoco que têm neste momento uma pesada derrota política e diplomática: porque não conseguem convencer os povos do mundo de que esta guerra é justa; porque não conseguem esconder quais são as verdadeiras intenções na guerra; e porque não conseguiram, apesar de todas as pressões, impor no Conselho de Segurança, uma maioria que lhes fosse favorável.
Ninguém consegue esconder as verdadeiras intenções da guerra. Todos sabem os interesses petrolíferos que estão por detrás desta ofensiva.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Todos sabem da importância geoestratégica que tem para os Estados Unidos da América a ocupação daquele território. E é de uma enorme hipocrisia que os que, durante muitos anos, ignoraram a ditadura sanguinária de Saddam - que teve o PCP como primeiro e, durante muitos anos, único partido a condená-la nesta Assembleia da República - venham agora invocá-la, como se fosse novidade, para justificar as suas acções belicistas.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E não se importaram com o embargo nem com as crianças!

O Orador: - E nem vale de nada, agora, o exemplo de 1991, porque a guerra de 1991 demonstra cabalmente que quem sofreu, nesse momento e nos anos que se seguiram, foi o povo iraquiano, não foi o ditador Saddam Hussein.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O Governo português usou nesta matéria de uma "política da atrelagem" inaceitável à ofensiva belicista de Bush e dos seus aliados, que não prestigia Portugal na cena internacional - porque o que prestigia um país é levantar a sua voz de forma independente, não submissa, pela defesa da paz; é levantar a sua voz pela defesa da legalidade internacional, e não assumir a doutrina norte-americana da Administração Bush como verdade inquestionável, como fez o nosso Governo.
O Governo sempre aceitou a guerra unilateral, mesmo quando não foi capaz de o dizer ainda na Assembleia da República. O Governo aceitou e quis ser anfitrião da "cimeira da guerra", que se destinava - tomada que estava a decisão - a pressionar os membros do Conselho de Segurança. O Governo desrespeita os princípios da Constituição da República Portuguesa: o princípio da resolução pacífica dos conflitos internacionais e o princípio da não ingerência nos assuntos internos de outros Estados.
E, se há unidade no nosso país e na nossa sociedade, ela faz-se contra a guerra e em torno da paz; ela faz-se contra a conduta do Governo português e na defesa de uma postura pela paz no plano internacional do nosso Estado. É essa luta pela paz e contra a guerra que vai ao encontro dos sentimentos dos portugueses!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Quem contraria esta unidade nacional é o Governo, com a sua conduta e com a sua política.

Aplausos do PCP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: É preciso não esquecer que a guerra não é um jogo, não é um conjunto de mapas, de modelos, de miniaturas e de planos apresentados na televisão com grande pompa e circunstância.

Vozes do PCP: - Bem lembrado!

O Orador: - A guerra é uma tragédia humana: significa a morte e a chacina de inocentes; significa a destruição de um país; significa o sofrimento de um povo oprimido por uma ditadura e já martirizado pela guerra anterior e pelo embargo que se seguiu;…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - … significa a imposição do poder unilateral dos Estados Unidos da América; significa um ataque às Nações Unidas e ao direito internacional.
É por todas estas razões e pelo que a guerra significa que à guerra dizemos: "não!".

Aplausos do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos os Srs. Deputados António Nazaré Pereira e Nuno Teixeira de Melo.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Nazaré Pereira.

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O Sr. António Nazaré Pereira (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, ouvi com muita atenção a sua intervenção,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - E está de acordo!…

O Orador: - … e devo dizer que nada ouvi de novo.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - E os senhores dizem alguma coisa de novo?!

O Orador: - E felicito-o, Sr. Deputado. A sua intervenção podia aplicar-se em Janeiro de 1991.
De facto, Sr. Deputado, manifesto o meu apreço pela permanência das vossas posições. Ao contrário, por exemplo, de outros partidos nesta Assembleia, como o Partido Socialista, que muda permanentemente de posições numa estratégia de ziguezague, reconheço que o PCP não tem essa estratégia e mantém a sua integridade de pensamento.
Isso foi o que levou, Sr. Deputado, a que a Comissão Política do Comité Central do Partido Comunista Português tivesse afirmado a 10 de Janeiro de 1991 o seguinte, que passo a citar: "Portugal está a ser progressivamente envolvido neste gravíssimo conflito através da cedência de bases militares". E podia continuar,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - E continuava bem!

O Orador: - … acrescentando o seguinte: "O PCP salienta que a procura de uma solução pacífica não deve ficar condicionada a qualquer data nem depender de perigosa e inaceitável pretensão dos Estados Unidos".

Aplausos do PCP.

Como vê, Sr. Deputado, o PCP mantém-se coerente no seu discurso…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente ao contrário do PSD!

O Orador: - … e poderia facilmente adoptar estas mesmas palavras,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Coisa que não acontece convosco!

O Orador: - … sempre coerente, contra qualquer posição dos Estados Unidos, num anti-americanismo primário,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não é nada! Olhe, vá falar com o Martin Sheen e com a Susan Sarandon!

O Orador: - … que, de facto, só pode ser explicado por nessa altura existir uma União Soviética e por nessa altura, e agora, o PCP ainda ser herdeiro daquilo que já caiu com o Muro de Berlim.
Devo acrescentar que reconheço que o Sr. Deputado nessa altura não integrava o Comité Central do Partido Comunista Português, mas reconheço também que aprendeu muito depressa esse mesmo discurso.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É natural! É porque é inteligente!

O Orador: - É?… É pena é que não tenha aprendido as coisas boas!… Mas, Sr.ª Deputada, isso acontece a muitos!…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É, é! E as coisas boas são as vossas!…

O Orador: - Reconheço também que, ao afirmar estes princípios, o Sr. Deputado estava, em 1991, do lado da entidade agressora, que na altura era exactamente o mesmo agressor - Saddam Hussein - que está neste momento em completo e total desrespeito pelas várias resoluções do Conselho de Segurança da ONU.
Portanto, Sr. Deputado, fica uma pergunta: mantém-se do lado dos ditadores?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha terminou.

O Orador: - Mantém-se do lado daqueles que, sucessivamente, não estão de acordo com o direito internacional? Mantém-se do lado daqueles que, sucessivamente, desrespeitam o direito internacional?

Vozes do PSD: - Muito bem!

Protestos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Bernardino Soares questiona-se e indigna-se pelo facto de algumas bancadas, nomeadamente a minha, não se reverem ou não citarem o Papa com mais frequência nesta questão.
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que não se preocupe com isso, porque, nomeadamente, para a minha bancada, os ensinamentos da doutrina social da Igreja estão sempre presentes, e portanto o Papa também está sempre presente. Por isso, não se preocupe se não o citamos. Ou, pelo menos, não se preocupe tanto como nós nos preocupamos quando o vemos a si a citar o Papa. Porque V. Ex.ª, que sempre disse mal dele, estar a citá-lo agora é que é para nós verdadeiramente preocupante. Mas também demonstra muita "coerência" nos vossos argumentos!…
Mas, Sr. Deputado, há duas questões em relação às quais gostava de ter uma resposta.
A primeira tem que ver com o argumento reiterado do Partido Comunista no que toca à associação que faz entre a acção norte-americana e os interesses de petróleo na zona do Iraque.

Vozes do PCP: - Não!… É lá agora!…

O Orador: - Mas, curiosamente, nunca ouvi da parte do Partido Comunista qualquer referência aos interesses que a França tem, via TotalFinaElf, que a Rússia tem, via Lukoil, e que a China tem, via China´s National Petroleum Company, no Iraque, com negócios da ordem dos 45 milhões de contos - no caso concreto dos franceses, inclusivamente, com um contrato para exploração de 25% das reservas de petróleo do Iraque, que, como sabe, são as segundas maiores reservas do mundo.

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O Sr. Honório Novo (PCP): - É por isso que há esta guerra! Ainda não percebeu?!…

O Orador: - Em relação a este aspecto os senhores querem justificar a acção americana, mas são completamente omissos quanto à mesma motivação no que toca a outros países, nomeadamente estes três que acabo de referir, o que não deixa de ser curioso pelo facto de usarem dois pesos e duas medidas!…

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Como não deixa de ser curioso que VV. Ex.as se indignem pelo facto de, na vossa perspectiva, que não é a nossa, os Estados Unidos terem invadido um país soberano sem mandato da ONU, quando curiosamente, num regime bem perto dos vossos corações e muito longe em termos de distância, a China invadiu o Tibete. Há opressão, Sr. Deputado! Há violação dos direitos humanos, Sr. Deputado! Todos os dias morrem lá crianças,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Milhares e milhares de crianças mortas!

O Orador: - … as mesmas crianças que ontem tanto preocupavam o Secretário-Geral do seu partido. E que me conste, Sr. Deputado, não tivemos Deputados europeus do Partido Comunista a marcharem via Pequim e a reclamarem contra a violação dos direitos humanos, pedindo a desanexação do Tibete!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Porquê, Sr. Deputado?!…Porquê?!…

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - É inteligente, mas não sabe responder!

O Orador: - Sr. Deputado, para terminar, vou referir-lhe uma outra ameaça bem maior, porventura.
Recentemente, a Coreia do Norte lançou mísseis sobre o mar japonês em experiências que visam atemorizar o Japão, a sua vizinha Coreia do Sul e todo o Ocidente.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Já que fala no Japão, podíamos falar sobre quem lançou as bombas sobre Hiroxima e Nagasaki!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, tempo de que dispunha terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Termino, Sr.ª Presidente.
Sr. Deputado, nunca ouvi da sua parte uma palavra de indignação contra estas experiências norte-coreanas. Pelo contrário, a única coisa que ouvi foi considerá-las, porventura, particularmente democráticas.
Portanto, Sr. Deputado, é em relação a estas questões que gostava que desse alguns esclarecimentos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Quais questões?!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr.ª Presidente, a observação da parte final da intervenção do Sr. Deputado Nuno Teixeira e Melo já foi sobejamente esclarecida, e o Sr. Deputado sabe que não corresponde à verdade!
Sobre as questões da opinião do Papa João Paulo II, o que manifestámos aqui - aliás, tenho de o reconhecer - foi o respeito pela opinião quando concordamos e quando discordamos.

Vozes do CDS-PP: - Ah!…

O Orador: - Ora, há-de reconhecer que é singular que uma bancada que sempre utiliza essa opinião como orientação político-ideológica - e tem direito a isso! -, neste caso, ignore completamente esse posicionamento.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - E foi apenas isso que quisemos aqui salientar.
O Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo referiu também o problema das empresas petrolíferas, a questão dos recursos petrolíferos. Agora, há uma grande diferença entre as duas posições. Sabe qual é? É que os Estados Unidos vão fazer uma guerra com base nisso, com essa justificação e com esse objectivo! O nosso problema aqui é a guerra! Esse é que é o problema!

Aplausos do PCP.

E, portanto, o Sr. Deputado não se esconda atrás da repartição do petróleo. Diga se quer a guerra ou se quer a paz. Mas já sabemos que, neste caso, quer a guerra!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - E em relação ao Tibete?!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Há alguma resolução da ONU?!

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - A China veta!

O Orador: - Ao Sr. Deputado António Nazaré Pereira pergunto: quem é que sofreu com a guerra de 1991? Foi o ditador Saddam Hussein? Não foi! Foi o povo iraquiano que sofreu com a guerra de 1991 e com o embargo que se lhe seguiu, que não teve resultados em relação à ditadura de Saddam Hussein, mas teve muitos resultados na morte e na falta de assistência a populações indefesas do Iraque. Essa é que foi a consequência da guerra.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Morreram 5000 a 6000 crianças por mês!

O Orador: - Em 1991, como agora, o que dizemos, Sr. Deputado, é que o povo iraquiano não merece ser a vítima desta guerra, mas é o povo iraquiano que a vai sofrer.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Não é o Saddam que vai morrer!

O Orador: - Esta é que é a realidade.

Aplausos do PCP.

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Já agora, que o Sr. Deputado falou de coerência, da nossa coerência, gostava de lhe perguntar o que é que o PSD dizia, antes de 1991, em relação à ditadura sanguinária de Saddam Hussein…

Vozes do PCP: - Zero!

O Orador: - … ou o que é que dizia o PSD em 1985, quando o Saddam Hussein bombardeou os curdos com gás tóxico,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - … e que nós condenámos publicamente em Portugal.

Vozes do PCP: - Zero!

O Orador: - O que é que o PSD dizia sobre isso? Zero! Zero!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Exacto! Estavam escondidos debaixo da mesa!

O Orador: - Os senhores dizem que nós somos anti-americanos primários, o que é manifestamente mentira. Os senhores é que são anti-Saddam secundários,…

Aplausos da Deputada do PCP Odete Santos.

… porque só descobriram que eram anti-Saddam quando isso passou a ser conveniente para a estratégia dos Estados Unidos da América!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - O Sr. Deputado também nada disse - e termino, Sr.ª Presidente - em relação ao desrespeito claro pelos princípios da Constituição da República que constitui esta atrelagem do nosso país, pela mão do Governo, à guerra injusta e ilegítima que está a ser feita, nem sobre o sentimento do povo português sobre esta matéria. Mas o Sr. Deputado, que é da maioria que apoia o Governo, devia preocupar-se com uma conduta do Governo que não tem qualquer correspondência na vontade popular dos que elegeram este Parlamento, dos que o elegeram a si e à sua bancada, e essa é que devia ser a preocupação democrática deste Governo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 45 minutos.

ORDEM DO DIA

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem do dia, começando por apreciar e votar um parecer da Comissão de Ética, que tem a ver com a substituição de um nosso colega, para permitir que ele possa participar hoje nos trabalhos do Plenário.
Tem a palavra, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer refere-se à substituição do Sr. Deputado Jerónimo de Sousa (PCP) (Círculo Eleitoral de Setúbal), com início em 20 de Março corrente, inclusive, pelo Sr. Deputado Vicente Merendas.
O parecer é do seguinte teor: "A substituição em causa é de admitir."

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se as ausências do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos, agora, proceder à discussão conjunta dos projectos de resolução n.os 119/IX - Processo Penal - Audição Parlamentar de Avaliação (PS) e 132/IX - Novos rumos de política criminal: responsabilidade penal das pessoas colectivas e mediação penal (PSD e CDS-PP).
Para apresentar o projecto de resolução n.os 119/IX, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É com grande empenhamento e expectativa de um trabalho profícuo que o Grupo Parlamentar do PS traz à agenda parlamentar o tema da avaliação do regime processual penal.
O que pretendemos é dar lugar a um processo participado, sereno e frutuoso de avaliação geral e objectiva das condições, dificuldades e possibilidades de efectivação de uma justiça penal à altura do que dela se exige num Estado de direito. E essa exigência passa, necessariamente, por imperativos como o da realização da justiça em tempo útil, da eficácia do combate ao crime, da aptidão para punir com adequação e proporcionalidade e para reintegrar com sustentabilidade, num quadro de regras e procedimentos aptos a conciliar as exigências de uma investigação eficiente com as impostergáveis garantias dos arguidos e, importa tê-lo cada vez mais presente, dos direitos das vítimas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Haverá, certamente, quem não deixe de formular a tradicional pergunta do porquê agora e por iniciativa do PS.
Responde-se, por antecipação: porque tanto se serve o País no Governo como na oposição; porque temos da justiça uma visão de Estado, que nos impele a promover em seu torno uma consciência partilhada das exigências da sua actualização; porque submeter agora o processo penal ao crivo de uma opinião atenta e qualificada vai, afinal, na mesma linha de orientação com que, nas anteriores legislaturas e com os anteriores governos PS, se lançaram reformas fundamentais, desde os principais regimes processuais a institutos tão relevantes, particularmente nos dias que correm, como o dos jovens e crianças em risco ou o da educação tutelar educativa.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Circunscrevendo-nos apenas ao domínio da política criminal, lembre-se, com pertinência, o largo

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espectro de iniciativas tomadas. Elas vão desde a criação do DCIAP, no âmbito do Ministério Público, ao NAT junto da Procuradoria Geral da República, à reorganização policial da investigação criminal e ao reforço das competências processuais da Polícia Judiciária, ao estabelecimento de medidas especiais de combate à criminalidade organizada e económico-financeira, à introdução da possibilidade da vigilância electrónica, ao regime especial de protecção de testemunhas e a medidas diversificadas de simplificação e combate à morosidade processual.
Persistem, no entanto, questões da maior relevância por avaliar. Por exemplo:
A de saber as razões pelas quais em Portugal é o tempo médio da pena de prisão claramente superior ao da maior parte dos países da União Europeia;
A de saber as razões porque representa, entre nós, a prisão preventiva a mais alta taxa relativamente às prisões definitivas;
A de saber se, estando o sistema prisional cronicamente em excesso - actualmente com uma população prisional de mais de 14 000 detidos para uma disponibilidade instalada de acolhimento de 11 380 lugares -, numa tendência que se agrava, estaremos perante uma inevitabilidade ou se, perante o problema do combate ao crime, outras medidas de prevenção e integração se impõem.
Mas, a par de tais questões, outras igualmente fulcrais devem ser colocadas, recuperando-as, precisamente, das orientações essenciais do legislador no movimento de modernização do processo penal - vai para mais de 15 anos, intercalados de vários momentos de actualização.
Recordemos, então, o que tem estado em causa:
O incremento de um paradigma processual na base de uma estrutura acusatória, integrada por um relevante momento de investigação, mediante definição do estatuto próprio do arguido e com delimitação de funções entre o Ministério Público, o juiz de instrução e o juiz de julgamento;
A distinção entre criminalidade pequena e criminalidade grave, entre soluções desjudiciarizadas, de participação, oportunidade e consenso, por um lado, e de conflito e de garantia do contraditório, por outro, com a correspondente diversidade de tratamento processual;
A agilização do processo no sentido da maior desformalização da justiça penal, com reforço da ideia de celeridade;
A efectivação do duplo grau de jurisdição.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em face de tal quadro orientador, impõe-se avaliar o grau de efectividade das soluções concretamente prefiguradas. Tal como parece aconselhável suscitar novas reflexões, eventualmente capazes de questionar o vigente paradigma processual.
É neste central objectivo que se fundamenta a presente proposta de realização de uma ampla audição parlamentar em torno do processo penal - avaliação da sua execução e virtualidades de inovação.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Nesse sentido, aqui reproduzimos várias das questões merecedoras de esclarecimento:
Primeiro, que balanço é possível apresentar, designadamente quanto:
a) Aos índices de utilização da possibilidade de suspensão provisória do processo e respectivos resultados de ressocialização, mediante o recurso a injunções e a regras de conduta?
b) À utilização do processo sumaríssimo e respectivos resultados no que respeita à aplicação expedita e consensual de sanções alternativas à prisão?
c) Às possibilidades de convolar em soluções de tratamento e ressocialização os casos - e tantos são, particularmente no domínio da toxicodependência - mais carecidos de soluções de recuperação para a vida do que de impulso para a mais grave delinquência?
Segundo, no domínio da acção penal,
a) Qual o peso relativo dos processos por crime com pena de prisão não superior a cinco anos, com prova simples e evidente, introduzidos em julgamento sob processo abreviado, de modo a que não tenham decorrido mais de 90 dias entre a data do crime e a do julgamento?
b) Qual o índice de introdução de casos em processo sumário e consequente julgamento célere, compaginável com os casos de flagrante delito por crime punível com prisão de limite máximo não superior a três anos?
Terceiro, como se avalia a relevância da cooperação dos serviços de reinserção social com à actividade judiciária?
Quarto, que avaliação é possível fazer dos termos de aplicação do novo regime de organização e cooperação policiais em matéria de prevenção e investigação criminal, particularmente quanto:
a) Ao momento em que se tem efectivado a distribuição das competências de investigação entre as polícias e à eficiência e tempo de processamento dos inquéritos?
b) À estruturação e utilização do Sistema Integrado de Informação Criminal?
Quinto, que avaliação, em especial, é possível fazer e que repercussão daí advém para a eficiência do processo penal, relativamente:
a) A modelos de intervenção, investigação e conservação de prova, nos casos mais sensíveis, envolvendo vítimas e/ou testemunhas menores, carecidas de especiais cuidados e particular protecção?
b) À concretização do sistema de apoio às vítimas de crimes, quer no plano indemnizatório, quer, em particular, no caso das mulheres vítimas de violência, e à criação das legalmente previstas secções de atendimento em meio policial?
c) Ao nível da criminalidade grave e mais complexa, às capacidades estabelecidas, tanto ao nível dos meios jurídicos como de polícia científica, tanto em sede de Polícia Judiciária como do Ministério Público?

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Sexto, numa avaliação da dinâmica do processo penal, como se avalia o grau de cumprimento dos principais prazos ordenadores aí estabelecidos para os actos judiciários, particularmente os relativos ao período do inquérito, da instrução, da marcação e da realização das audiências de julgamento e dos tempos de apreciação dos recursos?
Sétimo, importa reequacionar certos aspectos relevantes do actual paradigma, por exemplo, relativamente ao inquérito:
a) Averiguar em que medida será possível flexibilizar a fase da obtenção dos meios de prova, por forma a, por exemplo, permitir: o seu registo para memória futura e válido aproveitamento em julgamento, sobretudo quanto a

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depoimentos obtidos na presença de advogado; a mais célere introdução de queixa em julgamento, sempre que sejam evidentes os meios de prova e o Ministério Público não verifique improcedência legal;
b) Avaliar em que medida, e em nome de uma mais intensa participação dos sujeitos processuais, pode, com razoabilidade: admitir-se que, uma vez ultrapassados os prazos do inquérito, sem que o despacho fundamentado os amplie, ao assistente se reconheça o direito de introduzir a acção em juízo e ao arguido o de suscitar a instrução ou, nos casos de inércia, o inerente arquivo do processo; densificar-se mais os direitos de cooperação processual, tanto do arguido como do assistente, em termos mais responsabilizantes para uns e para outros e mais clarificadores da condução policial ou judiciária do processo, particularmente quanto a diligências de obtenção de prova ou de informação sobre a fase processual, naturalmente sempre sem prejuízo da eficácia da investigação;
c) Ponderar, relativamente ao segredo de justiça, as possibilidades de uma melhor graduação de soluções em face dos bens jurídicos ou direitos a proteger.
Oitavo, justifica-se também que nos interroguemos, na linha, aliás, da Decisão-Quadro relativa ao estatuto da vítima, tomada na União Europeia sob o impulso da presidência portuguesa, que importa transpor, até onde é legítimo avançar em soluções que permitam vias de mediação e conciliação entre arguido e queixoso, designadamente dotando este, enquanto vítima ou assistente, de apoio judiciário permanente, vias essas capazes de, acompanhadas e avalizadas pela competente autoridade judiciária, servir em primeira linha a concreta realização dos direitos das pessoas concretas bem mais do que os intuitos de uma justiça solene e abstracta, por vezes mais interessada em reintegrar simulacros estereotipados de autoridade do que em ministrar providencias efectivas a quem mais delas careça. Por isso se impõe, com especial acuidade, reequacionar todo o estatuto das vítimas, especialmente as mais vulneráveis.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha terminou. Conclua, por favor.

O Orador: - Sr.ª Presidente, vou concluir tão rapidamente quanto possível.
Nono, noutro plano do processo, julga-se pertinente interrogar outros aspectos do funcionamento e da organização dos tribunais.
Décimo, noutro plano ainda necessariamente, justifica-se colocar também em equação o actual regime dos recursos.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O debate em torno destas matérias é inteiramente relevante e mais relevante o será se elaborado num quadro de um amplo consenso entre os vários grupos parlamentares e inteiramente colocado à participação qualificada.
É isso que se deseja com a proposta da presente audição parlamentar. Se assim o fizermos, com espírito positivo e construtivo, ganhará a justiça e todos poderemos colaborar para reforçar a confiança dos cidadãos nas nossas instituições e valorizar para todos o seu estatuto de cidadania.

Aplausos do PS e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado Miguel Paiva inscreveu-se para pedir esclarecimentos, mas o Sr. Deputado Jorge Lacão não dispõe de tempo para responder.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, o Grupo Parlamentar do CDS-PP cede 2 minutos.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, quero expressar o nosso acordo à avaliação que aqui se preconiza do direito processual penal, sendo certo que nos parece haver uma ligeira contradição.
Pese embora a argumentação que o Sr. Deputado Jorge Lacão começou por utilizar, dizendo que, estando na oposição, não se demite das funções que lhe estão atribuídas enquanto Deputado, que, de resto, reconheço e louvo, a verdade é que faria muito mais sentido que esta avaliação fosse feita no âmbito da actividade governativa do Partido Socialista, onde os mecanismos que teria à disposição seriam, seguramente, muito mais amplos e eficazes.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ainda sobre estas matérias e no que toca, por exemplo, à oportunidade da avaliação agora, concretamente quanto ao caso das buscas domiciliárias nocturnas em situações de criminalidade especialmente violenta ou altamente organizada, a verdade é que existem iniciativas do próprio Partido Socialista e também nossas.
Por isso, a pergunta muito concreta que faço ao Sr. Deputado é a de saber se essas iniciativas, designadamente as do Partido Socialista, não deviam ter esperado por esta avaliação para, em função dos resultados, serem depois apresentadas.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Paiva, agradeço a sua questão porque me permite dizer que, suponho, a iniciativa que tomámos está na inteira linha de concordância com o testemunho dado pelos governos do PS, particularmente na área do Ministério da Justiça.
Permita-me que lhe recorde.
Houve, como sabe, um extraordinário empenhamento na reforma de alguns institutos jurídicos fundamentais. Veja o que aconteceu, por exemplo, no domínio da acção executiva em que foi lançado um larguíssimo debate nacional, envolvendo as universidades, os operadores judiciários, nós próprios, enquanto Deputados, na última legislatura, no sentido de todos poderem abertamente participar e dar um contributo qualitativo para aquilo que acabou por ser o último resultado recentemente vindo a lume.
A mesma coisa foi feita na reforma do processo administrativo. Toda a matéria do contencioso administrativo foi

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igualmente objecto do maior esforço de actualização doutrinária de que há memória, relativamente a um ponto em relação ao qual há 20 ou 30 anos se reivindicava a necessidade de uma reforma neste domínio e que pôde, finalmente, ser feita com o concurso mais alargado de todos.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

O Orador: - É isto que também queremos fazer no domínio do processo penal, agora, aqui sentados nesta bancada, mas concorrendo com o mesmo espírito, para permitir a participação das universidades, dos operadores judiciários, de todos aqueles que possam dar uma contribuição qualitativa e empenhada para, sem qualquer visão prévia prejudicial, por um lado, olharmos para o processo penal e verificarmos o que é que ele tem de bom e que, eventualmente, por razões operativas, tem dificuldades numa plena eficácia de concretização e, por outro lado, questionarmos o próprio paradigma, no sentido de verificarmos até onde é que inovações com mais consensualidade, mais participação, mais responsabilização dos sujeitos judicias poderão ser feitas a benefício de uma justiça penal, que todos queremos que, simultaneamente, permita uma adequada prevenção geral, garanta a necessária prevenção especial e, sobretudo, não se esqueça da vítima, ela própria a necessitar de uma cada vez maior atenção relativamente àquilo que lhes é devido e que é, naturalmente, a reintegração dos bens e dos valores que tiverem sido afectados por efeito de prática criminal.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Tudo isto nós temos de procurar fazer…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, a Mesa concedeu um pouco mais de tempo. Agora, peço-lhe que conclua.

O Orador: - Vou concluir de imediato, Sr.ª Presidente.
… tudo isto, estou ciente, vamos ser capazes de o fazer num clima de grande empenhamento. É esse o nosso principal contributo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para apresentar o projecto de resolução n.º 132/IX, tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Esteves.

A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Os projectos de resolução hoje apresentados ao Plenário da Assembleia da República, assumindo o desafio já lançado na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que é o Parlamento repensar o direito penal e o direito processual penal, num debate multidisciplinar, inauguram uma das mais importantes cruzadas desta Legislatura.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Desde logo, pelo desígnio de construir uma nova política criminal, mais humana e eficaz, mais integrada e coerente, decidida a remover as formas anacrónicas do sistema penal, aberta a novos paradigmas, e concretizando um modelo de intervenção política de responsabilidade partilhada.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - O que a audição parlamentar alargada põe de relevo é uma notável relação discursiva entre os diferentes poderes do Estado, e entre o Estado e a sociedade, e, nessa relação, o papel central do Parlamento.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - É este modelo de relação que é conforme ao projecto constitucional. Perante os novos desafios da modernidade, a optimização dos direitos não se atinge por um modelo mecanicista de separação estática de poderes. Antes, dita para as instituições novos paradigmas de actuação e reconfigura o Parlamento como estratego fundamental desses paradigmas.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A razão é esta: na Constituição, a organização e o funcionamento dos poderes estão ordenados à garantia dos direitos. Os valores que formam os direitos - da autonomia, da universalidade e da participação igual - são os mesmos valores que formam o Parlamento. A natureza moral da génese democrática confere ao Parlamento uma radical legitimidade para suscitar a actuação dos diferentes poderes em ordem à realização do projecto constitucional.
Uma maior comunicação entre o Parlamento e os operadores judiciários, uma maior comunicação entre o Parlamento e as autarquias no sentido do aperfeiçoamento do direito vigente, não dissolve a racionalidade que separa as diferentes esferas de competência. O que faz é remover a falácia de raciocinar por contraposição, de separar o sistema de poderes do sistema de direitos.
A reconfiguração do papel do Parlamento em vista da efectividade dos direitos assinala-lhe esta tarefa fundamental de impulso para uma estratégia de colaboração entre os poderes.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - E assinala-lhe uma outra tarefa: a de fazer os cidadãos co-autores da decisão pública, que é dizer, a de ajudar a sociedade a engendrar o político a partir de si mesma.
E se há um lugar paradigmático para uma estratégia de colaboração entre os diferentes poderes do Estado e entre o Estado e a sociedade, ele é o da justiça penal. A justiça penal mobiliza-nos para a assunção de uma responsabilidade partilhada.
Quem disse que as estruturas de governo dos tribunais não devem subir as escadas do Parlamento? Quem disse que as autarquias não devem subir as escadas do Parlamento? Quem disse que a sociedade não deve interagir com os processos da legislação? A Constituição não o disse, visto que exige a mobilização de todos os indivíduos, de todos os poderes, de todas as formas organizatórias para a realização dos direitos.

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O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A estratégia funcional, o modo de relação dos órgãos de Estado e o seu programa de acção têm sempre esta fundamentalidade dos direitos subjacente.
O que vai envolvido nos projectos de resolução que hoje se apresentam e deve ser sublinhado é o poder de impulsão do Parlamento para uma relação discursiva entre os poderes. Verdadeiramente, é o Parlamento a tomar consciência de si no sistema constitucional, a tomar consciência da sua cumplicidade com o sistema de direitos, a tomar consciência da sua natureza moral.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Muitos são os temas que haverão de ser discutidos à mesa da 1.ª Comissão, na senda de uma justiça penal: o doseamento das penas, a esclerose do sistema de liberdade condicional, o comportamento judiciário em relação à prisão preventiva.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - O Parlamento tem de enfrentar os medievalismos do direito penal, a desproporção entre as penas que são dadas aos crimes contra o património e as que são dadas aos crimes contra as pessoas. Tem de distinguir o que é a função da prisão preventiva do que é a função da polícia, para não dar à primeira o que deve caber à segunda. Tem de balizar o espectro da insegurança sem a vertigem da dissolução de uma cultura de garantias.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Tem de impor a escolaridade alargada nas prisões, porque há formas de paternalismo legítimo. Tem de se comprometer com o Governo na procura de um mecenato humanitário, na promoção da leitura e da arte como ingredientes de estruturação da personalidade dos detidos, na formação de protocolos com as empresas para instalar nas prisões a formação profissional verdadeira e o trabalho que realiza.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Tem de sensibilizar as autarquias para a oferta quotidiana de medidas alternativas à prisão. E tem de mobilizar as mesmas autarquias e também os privados para a reinserção social.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Parlamento é o lugar central da construção da justiça. Um direito penal injusto atenta contra a humanidade do homem de que toda a Constituição está cativa. Um direito penal injusto marca o insucesso da própria sanção, o nosso insucesso.
Não é fácil o desafio que nos propomos. É um desafio à nossa boa vontade e à nossa imaginação.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Ele envolve um intenso processo de humanização da acção política, convoca o Estado e a sociedade, reposiciona a relação dos poderes. Ele impõe a comunicação entre o Parlamento e os tribunais, a republicanização das magistraturas, a remoção de anacronismos da filosofia das penas e da sua execução. Ele impõe o activismo político de novos protagonistas no conseguimento de medidas alternativas à prisão e nos processos de reinserção social.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - O Parlamento tem de olhar com a mesma determinação os direitos das vítimas e as garantias dos reclusos. Tem de tomar a sério a ideia de que a medida justa, como critério de justiça, tem no direito penal a sua afirmação mais eloquente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Tem de modificar leis existentes que se ultrapassaram no tempo e que não só não respondem ao ambiente social como causam disfunções nesse ambiente. Tem, enfim, de promover a adaptabilidade do sistema político-jurídico aos novos desafios, se quer preservar a própria legitimidade.
Um direito penal justo requer sempre a perspectiva crítica de um órgão de legitimidade qualificada, como é o Parlamento. Exige que o Parlamento se assuma como instância crítica de todos os poderes, incluindo os tribunais, que o Parlamento que cria o direito tenha algo a dizer sobre o modo de aplicação do direito.
O Parlamento detém um estatuto único na afirmação dos novos paradigmas de actuação política. A Constituição exige-lhe mesmo que seja não apenas um "Parlamento em legislação", mas também um "Parlamento em acção". E exige a cada um de nós aquela dignidade de membro legislador de uma legislação universal, em que a perspectiva é sempre a de "nos sentirmos no lugar do outro".

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Nós consideramos que é de uma grande importância fazer estas audições parlamentares. Aliás, a Sr.ª Deputada Assunção Esteves, no início da sua intervenção, salientou a importância, nestas matérias, do exercício da democracia participativa - não usou esta expressão, mas foi efectivamente o que quis dizer. Na verdade, é importante que essa democracia funcione de modo a que se atinja um direito penal justo, como disse, e um direito processual penal justo, também como disse.
Portanto, vamos votar a favor das duas iniciativas legislativas.
No entanto, gostaria de dizer que haverá avaliações diferentes em relação à forma como foram evoluindo o direito penal e o direito processual penal.
Logo no início, antes da alterações ao actual Código de Processual Penal, como sabe, foram feitas afirmações, nomeadamente por parte do Ministério Público, no sentido de que o modelo só conseguiria ser cumprido com eficácia se lhe fossem disponibilizados meios para cumprir as tarefas que o Código de Processo Penal lhe cometeu. Esse novo modelo constituiu uma alteração relativamente

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ao modelo até aí em vigor, que incluía os juízes de instrução com muitos mais poderes do que hoje têm, quando funcionam como juízes de instrução, os quais foram perdendo a importância também porque não lhes deram os meios de que eles necessitavam para cumprir as tarefas que tinham na legislação processual penal.
Acontece que, com o novo modelo, não se verificou que fossem conferidos ao Ministério Público os meios necessários e a partir daí, em matéria processual penal, assistiu-se a um deslizar - deslizar, no sentido da morosidade da justiça -,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - … e dos tribunais para o exterior, por força do direito processual penal que tínhamos, não foi criada a confiança do cidadão na justiça, por força, repito, da morosidade da justiça.
Desde logo, aquele instituto da contumácia que nos deixou a todos muitas marcas, porque conduziu à injustiça - à injustiça, repito! - de as pessoas que tinham sido constituídas arguidas com uma acusação não serem julgadas, o que afastava a justiça dos cidadãos…

Vozes do PCP: - Exactamente!

A Oradora: - … pela frustração que sentiam com a situação.
Entretanto, a par deste modelo processual penal, creio que faltaram outras reformas (aliás, continuam a faltar), nomeadamente, em relação ao direito penitenciário. A Sr.ª Deputada Assunção Esteves falou, e muito bem, na questão premente da liberdade condicional, que tem de ser repensada por forma a que sirva efectivamente para a ressocialização.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Mas não só a liberdade condicional. Também em relação aos condenados, se não for efectivado o objectivo das penas, que é a ressocialização, não estaremos a proteger as vítimas nem os seus direitos, porque serão potenciais novas vítimas quando o condenado sair da prisão sem ser ressocializado.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, a reforma do direito penitenciário, a reforma da execução das penas são importantíssimas para criar o direito à segurança.
A par disto, e com certeza não irei abarcar todos os temas nem nunca tive a pretensão disso (aliás, todas estas matérias são muito complexas), quero também deixar a nota de que, através da criminalidade organizada, através da expansão de grandes redes de tráfico de droga, de tráfico de pessoas, de terrorismo e em paralelo com a falta de políticas sociais que evitassem exclusões e pobreza, se observaram, em matéria de direito penal, fenómenos que considero muito preocupantes. É que o direito à segurança não é direito securitário; bem pelo contrário, o direito securitário é um direito cego, é aquilo que alguém, muito recentemente, e hoje já foi aqui falado, chamou justiça sem limites. Essa justiça sem limites julga-se radicada em poderes divinos mas é, afinal de contas, uma injustiça, uma suprema injustiça.
Por isso mesmo, considero que há motivos para ter preocupações mas, depois, nas audições, isto será, com certeza, desenvolvido.
O Partido Socialista apresenta um projecto de resolução que iremos votar a favor, mas isso não quer dizer que eu esteja de acordo com tudo o que dele consta. Refiro-me, nomeadamente, à questão das buscas domiciliárias nocturnas - fazem-lhe uma referência - e ao mandado de detenção europeu, que são dois fenómenos que já considero integrados numa "viagem" pelo direito securitário. E, de facto, penso que, para construirmos o direito à segurança, temos de afastar-nos do direito securitário e, ao mesmo tempo, desenvolver políticas sociais para que as pessoas pobres e excluídas não se sintam atraídas por novas formas de criminalidade que, depois, em certos meios, encontram, de facto, um amplo campo para se desenvolver. Não há coisa que me tenha feito mais impressão, na minha vida de advogada, do que ver que, em bairros pobres, em bairros pobres de uma cidade, se desenvolvia o comércio da droga vendida a pessoas pobres que tinham de recorrer a certas formas de criminalidade para arranjar dinheiro para a droga.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr.ª Deputada, terminou o tempo de que dispunha, pelo que lhe peço o favor de concluir.

A Oradora: - Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Por isso, as políticas sociais são, efectivamente, muito importantes.
Terminaria, pois, dizendo que me parece importantíssimo que estas questões sejam pensadas pela Assembleia da República em cooperação com a sociedade.

Vozes do PCP e do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É obrigação desta Câmara adequar a legislação penal e a legislação processual penal à evolução dos tempos e aos valores da comunidade, desde logo para que a justiça possa ser aplicada de forma consequente e sentida como justa e como contrapartida da comunidade mas também para que seja aplicada de forma célere e para que não sejam as razões de natureza processual a causar a desconfiança no sistema, o que, de forma fácil ou mais ou menos fácil, poderá ser evitado.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - De todo o modo, temos como certo que, se esta é uma obrigação da Assembleia da República, também é obrigação desta Assembleia da República que, em matérias tão importantes, as alterações sejam feitas muito ponderadamente, muito avisadamente.
A legislação penal e a legislação processual penal, que exigem, desde logo, a sua eficácia, são pedras-de-toque, "pedras de ouro" - temo-lo como certo - de todo o sistema. Por isso, temos defendido sempre, ao longo de múltiplas intervenções, que, como regra, quaisquer alterações

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nesta sede não devem ser casuísticas, muito menos devem andar ao sabor de emoções e muito menos ainda devem andar ao sabor de reivindicações dos media, por muito que uns ou outros temas sejam mais apelativos.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Julgamos, ainda assim, e com este espírito, que chegou o momento de, verdadeiramente, se promover um amplo debate que permita uma reforma de fundo, a qual, até por razões de dignidade, deve ser a Assembleia da República a promover. Isto apesar de uma responsabilidade que, institucionalmente, deve ser de todos, deve ser dos Deputados que representam todos os partidos e deve ser também a de apoiar o governo do País, seja ele qual for, na definição da estratégia por um Portugal mais justo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Há matérias que são susceptíveis de debate político-partidário - temo-lo como certo -, que justificam uma acareação mais ou menos especulativa, dependendo das bancadas, mas há outras matérias que devem, efectivamente, merecer um esforço tanto quanto possível consensual, da parte dos Deputados de todas as bancadas. E nesse exemplo terão, certamente, o CDS-PP, desde logo pela forma como trabalhámos na última legislatura, quando o governo era socialista e quando o Ministro da Justiça era o Dr. António Costa. Verificaram, então, como, em matérias de justiça tidas por fundamentais, o CDS-PP, os Deputados do CDS-PP colaboraram com o Governo e com o Sr. Ministro no aperfeiçoamento de diplomas e, mais do que isso, no aperfeiçoamento das deficiências, algumas das quais muito sérias e, às vezes, até escusadas, com que os diplomas nos apareciam aqui, na Assembleia da República.
Portanto, em sede de trabalho na 1.ª Comissão, os Deputados do CDS-PP, como os Deputados do PSD - recordo-me, particularmente, do Sr. Deputado Montalvão Machado, que tinha uma muito avisada intervenção nestas áreas -,…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Não se esqueça do Deputado Luís Marques Guedes!…

Risos do PS.

O Orador: - … colaboraram no sentido do aperfeiçoamento de diplomas que, repito, nos surgiram aqui com muitas deficiências. E a nossa colaboração fez-se numa lógica: a lógica de um esforço, que é nacional, no sentido de tornar Portugal mais justo e, portanto, não transformando em matérias para debate político matérias que não devem ser objecto desse tipo de debate, que é eminentemente especulativo.
Com este espírito - e isto subjaz ao essencial do projecto de resolução que hoje foi apresentado e que o CDS-PP também subscreveu -, entendemos que chegou o momento de promover um amplo debate por uma verdadeira reforma de fundo.
No plano desta colaboração institucional, deve adiantar-se, desde já, também por via de imperativos de disposições comunitárias, duas matérias. Estas matérias, sem prejuízo de muitas outras que devem ser abordadas, são adiantadas no projecto de resolução: a questão da responsabilidade penal de pessoas colectivas e a questão da mediação penal. Trata-se de duas questões que nos são impostas por via da nossa integração na Comunidade, mas que, ainda que não o tivessem sido, se justificava que fossem aqui discutidas, por necessidade da dita reforma e também de se adequar a nossa legislação àquela que é a evolução constante do sentimento da comunidade.
Por isso, salienta-se também, neste projecto de resolução, uma preocupação: a de, com as audições propostas, se dotar a Assembleia da República e cada um dos Deputados - e com isso se beneficia também o Governo - de um contributo fundamental dos conselhos e dos ensinamentos do melhor da nossa magistratura, do melhor da nossa advocacia, do melhor das nossas autoridades de polícia, do melhor das nossas instituições com conhecimento de causa, numa palavra, envolvendo no processo legislativo - seja no próprio seja no auxílio à iniciativa legislativa do Governo - o melhor da inteligência nacional. Se o fizermos, saberemos que estamos, como nos compete - e termino, Sr.ª Presidente -, a promover melhores leis e a permitir a elaboração de leis verdadeiramente representativas do sentimento da comunidade, que é o que nos pedem e é por isso que aqui estamos.
Com este espírito, aprovaremos, naturalmente, os projectos de resolução em discussão.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, chegámos ao fim deste ponto da ordem de trabalhos.
Vamos, agora, proceder à discussão conjunta do projecto de lei n.º 189/IX - Assegura a defesa e a valorização da calçada de vidraço à portuguesa (PCP) e dos projectos de resolução n.os 128/IX - Sobre a criação de um regime especial das pequenas explorações de pedreiras para calçada ou outros inertes (CDS-PP) e 131/IX - Protecção das explorações de inertes para calçada de vidraço à portuguesa (PSD).
Para apresentar o projecto de lei n.º 189/IX, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas: Permita-me, Sr.ª Presidente, que comece por saudar a presença nas galerias dos muitos cidadãos dos distritos de Leiria e Santarém que nos dão a honra de aqui estarem hoje a assistir à discussão do conteúdo do projecto de lei que apresentámos e que pretende assegurar a defesa e a valorização da calçada de vidraço à portuguesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Estou convicta de que as audiências concedidas à associação que os representa nas Comissões de Economia e Finanças, de Educação, Ciência e Cultura e de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente foram determinantes na construção de um conhecimento mais aprofundado da situação em que se encontram e das suas legítimas preocupações.
A Lei de Bases do Património Cultural considera, no seu artigo 1.º, que integram o património cultural todos os bens de interesse relevante que reflictam "(…) valores de memória, antiguidade, autenticidade, originalidade, raridade,

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singularidade ou exemplaridade." e consagra, no seu artigo 91.º, que "Especial protecção devem merecer (…) os modos tradicionais de fazer, nomeadamente as técnicas tradicionais de construção e de fabrico (…)".
É neste contexto que se considera o projecto de lei que hoje discutimos e que tem como objectivo assegurar a defesa e a valorização da calçada de vidraço à portuguesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - "Uma arte que é de poucos e que muitos pisam sem olhar", afirma Eduardo Martins Bairrada, no livro Empedrados Artísticos de Lisboa, publicado em 1985.
Uma arte que, porque novidade, nos distinguiu em 1900 em Paris, em 1905 em Manaus, em 1906 no Rio de Janeiro, em 1909 na cidade do Cabo, em 1913 em Nápoles e em 1929 em Sevilha.
Uma arte que o calceteiro-poeta António Mateus iniciou em 1955, com apenas 14 anos de idade, quando muitos, afirma ele, eram ainda os "ourives do chão". No entanto, mais tarde lamentará: "Fala-se tanto em preservar,/Mas disso não vejo eu nada!/Pois a arte de calcetar,/É da mais desamparada".

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - De facto, a calçada de vidraço à portuguesa constitui uma forma tradicional de tratamento do espaço urbano que, assumindo valor estético genuíno, não pode deixar de ser considerada como uma verdadeira manifestação da nossa cultura, reconhecida e apreciada mesmo internacionalmente.
No entanto, esta forma tradicional de revestimento artístico de passeios confronta-se, actualmente, com enormes dificuldades, quer ao nível da obtenção da matéria-prima quer ao nível da formação profissional específica.
São também estas razões que sustentam a necessidade de formular um conjunto de medidas capazes de defender e valorizar esta arte tradicional. Medidas que deverão visar, em primeiro lugar, as condições de obtenção da matéria-prima, que ocorre nas pedreiras de calcário (branco, preto ou rosa), que são, na sua maioria, de pequenas dimensões.
Os calcários seleccionados têm características específicas, por isso designados de vidraço, porque, quando fracturados, têm de se apresentar lisos e brilhantes.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - A especificidade delimita, naturalmente, as áreas de extracção em todo o maciço calcário português, situando-se predominantemente nos distritos de Leiria e Santarém.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Estas explorações ocorrem sobretudo em plano de encosta, onde o desmonte, em grande parte manual, é selectivo e produzido à superfície e não em profundidade.
Estes procedimentos de fabrico artesanal minimizam os prejuízos e os desperdícios da actividade de exploração e facilitam a reposição da morfologia do terreno e da flora, com espécies autóctones, à medida que a exploração avança.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - A importância económica desta actividade tem vindo a aumentar significativamente nos últimos 20 anos, não só como recurso de sobrevivência, perante a grave crise industrial e agrícola que se fez sentir nessas regiões, mas também pela potencial procura interna e externa, quer no espaço da União Europeia, quer noutros locais, como, meramente a título de exemplo, Japão, China, Austrália, Estados Unidos ou América Latina.
A Associação de Exploradores de Calçada à Portuguesa, recentemente formada, estima que existam cerca de 300 explorações com 1000 trabalhadores e com uma facturação anual de 50 milhões de euros. Empresas de pequena dimensão, fundamentalmente de cariz familiar, que entre si exploram o calcário, escoam o produto e assentam a calçada.
A calçada é um produto praticamente indestrutível, sendo, por isso, difícil a sua substituição, apesar da existência no mercado de alguns produtos sucedâneos de menor resistência e beleza.
Também a formação profissional e a valorização dos trabalhadores que executam esta arte tem de ser objecto de especial atenção, dado que são actores fundamentais na preservação deste património. Isto porque, como afirma um calceteiro com décadas de experiência na arte de calcetar, "qualquer um mete as pedras, mas cobrir toda a área e acabar o trabalho para dar certinho no fim, isso é que não é para todos".

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - "É uma arte com potencialidades criativas, exercida por profissionais em extinção e que importa preservar" afirma, mais uma vez, Martins Bairrada em Empedrados Artísticos de Lisboa.
Diz, a propósito, Gaspar Nero, professor do Instituto Superior Técnico: "A calçada à portuguesa corresponde a uma solução técnica de princípios simples, que veio a revelar-se inovadora e dotada de enormes vantagens funcionais, económicas, estéticas e artísticas que (…) beneficia e homogeneíza a leitura de uma cidade por vezes tão mal tratada pelo seu edificado".
O projecto de lei que hoje discutimos propõe exactamente a defesa e a valorização da calçada de vidraço à portuguesa, enquanto manifestação antiga, autêntica, original e singular do nosso património cultural. Propõe, por isso, o texto em discussão a criação de uma comissão constituída por representantes do poder central (Ministérios da Economia, da Cultura e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente) do poder regional e local (Associação Nacional dos Municípios Portugueses, câmaras municipais e áreas protegidas) e, ainda, por representantes das associações de exploradores das pedreiras de calçada para este fim específico e por representantes das estruturas representativas dos trabalhadores do sector.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Atribui-se a esta comissão, entre outras funções, a certificação e a fiscalização da autenticidade da exploração e produção da calçada de vidraço, a sua divulgação

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e promoção e, ainda, a formação e valorização da profissão de calceteiro.
Reconhecida a especificidade destas pedreiras, propõe-se que seja criado um regime especial de licenciamento de pesquisa e exploração que salvaguarde o cumprimento das normas em vigor no que à segurança, saúde e protecção do ambiente diz respeito.
A comissão deverá propor ao Governo, no prazo máximo de 60 dias a partir da sua nomeação, o projecto de estatutos, definidores da sua estrutura, serviços, competência e funcionamento e, ainda, uma proposta de regime especial de pedreiras de calçada à portuguesa.
A comissão terá a sua sede em Leiria e, naturalmente, poderá abrir delegações em qualquer outro espaço do território nacional e será tutelada pelo Ministério da Economia.
A comissão deverá ainda designar um representante na Comissão Nacional para a Promoção dos Ofícios e das Micro-Empresas Artesanais, criada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 4, de 1 de Fevereiro de 2000.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de diploma que está em apreciação é o nosso contributo para assegurar a defesa e a valorização deste bem cultural, que é a calçada à portuguesa.
Estamos disponíveis para avaliar todas as restantes propostas e para analisar todas as contribuições que, em sede de especialidade, queiram apresentar.
Defendemos, no entanto, que o quadro legal deve sustentar estes pressupostos que acabámos de enunciar, garantindo soluções justas, equilibradas e adequadas à actividade económica dos trabalhadores do sector e das suas famílias que retiram daí o sustento diário.
A terra dá-lhes, generosamente, o que a vida inúmeras vezes lhe roubou. Connosco poderão contar.
Espero que seja também essa a vontade dos Srs. Deputados, particularmente dos da maioria que sustenta o Governo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Paulo Batista Santos, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Relator, Joel Hasse Ferreira, para apresentar o relatório e parecer da Comissão de Economia e Finanças, sobre o projecto de lei n.º 189/IX.
Tem a palavra, Sr. Deputado, dispõe de 3 minutos.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, o projecto de lei n.º 189/IX refere-se à tradição e interesse na utilização da pedra. É uma matéria-prima de grande relevo, seja em combinação com outros matérias ou sozinha.
Na anterior legislatura, foi apresentado um projecto de lei sobre a protecção das edificações realizadas com o recurso à pedra pelo Sr. Deputado Vítor Moura e outros Deputados do PS, que foi debatido em Plenário, mas não chegou à votação final global.
A Lei de Bases do Património Cultural considera que integram o património cultural aqueles bens imateriais que constituam parcelas estruturantes da identidade e da memória colectiva portuguesas.
No relatório faço uma referência ao poeta Cesário Verde, a propósito do trabalho dos calceteiros e dos canteiros.
Menciono, também, a necessidade de valorizar a calçada à portuguesa na renovação dos espaços públicos e na requalificação de zonas urbanas de relevante significado histórico, vivencial e cultural.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Pretende-se a utilização de programas como o PROCOM e o URBCOM na renovação de zonas urbanas.
Quanto aos aspectos ambientais a ter em conta, é de salientar o Decreto-Lei n.º 69/2000, sobre a Avaliação do Impacto Ambiental, que transpõe, em boa parte, a Directiva Comunitária n.º 97/11/CE, de 3 de Março de 1997.
Há questões importantes de carácter social e económico. É preciso salvaguardar o equilíbrio entre os interesses e as perspectivas histórica, cultural, ambiental, económica e social. Neste contexto, a Comissão considera (e aprovou por unanimidade) que o conjunto de interesses regionais e ambientais podem ser salvaguardados pela participação de representantes do Governo, das autarquias e de outras entidades, nomeadamente representantes dos trabalhadores e dos empresários do sector, na comissão para a defesa e valorização da calçada de vidraço à portuguesa, cuja criação se propõe.
Portanto, em conclusão, o presente projecto de lei abarca um assunto de carácter relevante; a utilização da calçada à portuguesa pode contribuir para a valorização e requalificação de zonas urbanas; a lei deve garantir que a exploração das pedreiras se faça em condições de sustentabilidade e de preservação da qualidade ambiental; e, como referi, a defesa dos interesses económicos e sociais abrangidos poderá ganhar com a criação desta comissão de defesa e valorização da calçada de vidraço à portuguesa.
Neste sentido, o tema é relevante e o Plenário tem toda a oportunidade de se pronunciar sobre ele e se, como desejamos, for discutido na especialidade em Comissão, poderá ser aperfeiçoado para garantir o equilíbrio entre estes diferentes aspectos em causa.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Batista Santos.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, desejo, em primeiro lugar, cumprimentar o Grupo Parlamentar do PCP pela iniciativa que tomou de preocupação na defesa e valorização da calçada à portuguesa,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Mas não viabilizam!

O Orador: - … bem como, acrescento, de atenção com os trabalhadores que desenvolvem a actividade de exploração de lajes para muros tradicionais de pedra.
Aproveito, igualmente, para cumprimentar os cidadãos presentes nas galerias e interessados nesta matéria, de uma forma especial os dirigentes da Associação de Exploradores de Calçada à Portuguesa e todos aqueles que se deslocaram dos concelhos de Porto de Mós e arredores para assistir à nossa reunião plenária.

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O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Então, viabilize o nosso projecto de lei!!

O Orador: - A minha primeira palavra é para sublinhar a absoluta necessidade de este Parlamento apontar soluções concretas ao Governo para a resolução dos problemas que se colocam a estas tradicionais actividades de trabalho da pedra, sobremaneira reconhecendo as suas especificidades e enquadrando-as na legislação nacional e europeia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - É por isso que devem aprovar o nosso projecto!

O Orador: - Nesse sentido, recuso a ideia de quaisquer aproveitamentos políticos sobre uma matéria que deveria ser consensual nesta Câmara, para que resolvesse efectivamente o problema às pessoas,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Olha quem fala!

O Orador: - … e só não o foi - que fique claro! - por que o Grupo Parlamentar do Partido Comunista se furtou ao diálogo com a bancada da maioria.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - O senhor é um mentiroso!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Que vergonha!

O Orador: - Sr.ª Deputada Luísa Mesquita, desejo colocar-lhe duas breves questões.
Pergunto-lhe, em primeiro lugar, se V. Ex.ª não considera no mínimo discutível, como defendeu o Sr. Deputado Relator, para não dizer de todo impraticável, a solução legislativa apontada na vossa iniciativa, onde se preconiza um regime de excepção para estas explorações, assente na ideia original da não aplicabilidade de todas as normas nacionais e europeias - leiam-se as constantes do Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio, que transpõe para a ordem jurídica interna tão-só duas directivas comunitárias - e ignorando também o sentido da comunicação oficial da Comissão Europeia, de 3 de Maio de 2000, que define as regras de promoção do desenvolvimento sustentável na indústria extractiva dos países da União Europeia.
Para terminar, gostaria de saber se V. Ex.ª não concorda ser inconsequente e mesmo supérflua a criação de uma nova comissão especificamente para a calçada à portuguesa, quando já existe uma Comissão Nacional do Programa para a Promoção dos Ofícios e das Micro-Empresas Artesanais - que se ocupa precisamente destes assuntos, entre outros - e, sobretudo, quando o País reclama contenção na despesa pública.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Paulo Batista Santos, quero acreditar que faltou à verdade só porque o seu grupo parlamentar não o informou, particularmente a direcção da sua bancada. Apesar de todos os esforços feitos pelo Grupo Parlamentar do PCP e por mim própria, em contactos com todos os Deputados da sua bancada responsáveis por esta área e particularmente eleitos pelos distritos de Santarém e de Leiria, de facto, os senhores não quiseram ajudar a resolver o problema, não quiseram participar nesta discussão!!

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): - Não é verdade!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Não seja mentiroso!

A Oradora: - Portanto, o Sr. Deputado, de facto, falta à verdade, para não lhe chamar mentiroso.
A segunda questão que o Sr. Deputado coloca não tem qualquer razão de ser. A constituição e a criação de uma comissão para a certificação e valorização da calçada não impede a integração de um representante desta comissão na comissão que o Sr. Deputado referiu. São duas questões diferentes.
Já se verificou uma situação idêntica a esta, aquando da criação de uma comissão para a defesa e salvaguarda da tapeçaria de Arraiolos que exactamente integra essa Comissão e que os Srs. Deputados apoiaram. Só não apoiam e não vão viabilizar este projecto de lei porque é subscrito pelo PCP e não foi feito nem subscrito pelo PSD!
Esta é que é a questão de fundo, que deve ser aqui dita para todas as pessoas ouvirem: falta de lealdade, não assumir os seus compromissos. É o voto fácil de quem promete e não cumpre!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

Vozes do PSD: - Ninguém nos disse nada, Sr.ª Deputada.

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): - Peço a palavra para uma interpelação à Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sobre que assunto, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): - Sr.ª Presidente, a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita transmitiu à Câmara um conjunto de informações que não correspondem à verdade, pelo que gostaria que a Sr.ª Presidente fizesse chegar ao Grupo Parlamentar do PCP a comunicação da Comissão Europeia, de 3 de Maio de 2000, sobre a promoção do desenvolvimento sustentável da indústria extractiva não energética dos países da União Europeia, para que fiquem esclarecidos da não aplicabilidade desta norma.

Protestos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, estou certa de que todos os Srs. Deputados conhecem os textos relevantes que estão em discussão.
Para apresentar o projecto de resolução n.º 128/IX - Sobre a criação de um regime especial das pequenas explorações de pedreiras para calçada ou outros inertes, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

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A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aproveito, também, para cumprimentar os cidadãos presentes hoje nas galerias, que se deslocaram aqui para acompanhar os trabalhos sobre um assunto de tão grande importância.
O CDS-PP, preocupado com a necessidade de proteger as pequenas explorações de pedreiras para calçada ou outros inertes e com as muitas famílias portuguesas cuja subsistência depende desta indústria, entendendo que o actual regime jurídico deve ser aperfeiçoado por forma a evitar danos para essas muitas famílias, apresenta um projecto de resolução a esta Assembleia.
Como sabemos, foram apresentados, sobre este tema, três iniciativas de três partidos diferentes: um projecto de lei, já apresentado pelo Partido Comunista Português, e dois projectos de resolução, apresentados pelos dois partidos da maioria, o PSD e o CDS-PP.
Ora, o CDS-PP sustenta que constitucionalmente, por se tratar de uma matéria de natureza assumidamente administrativa, deverá ser o Governo - e não a Assembleia da República - a intervir legislativamente na matéria em causa.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Ou seja, a opção do CDS-PP pela apresentação de um projecto de resolução em vez de um projecto de lei parece-nos acautelar melhor o respeito pelo princípio constitucional da separação de poderes.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS-PP pretende com a sua iniciativa, em primeiro lugar, chamar a atenção do País para este importante sector económico e, em segundo lugar, dar o nosso contributo para a criação de um regime jurídico mais justo, transmitindo ao Governo as nossas reflexões sobre alguns dos aspectos que merecerão, porventura, uma outra ponderação de valores.
Não temos a ousadia nem a pretensão de considerar que as pistas de reflexão que aqui trazemos através do nosso projecto de resolução são verdades inatacáveis e indesmentíveis. Queremos, sim, chamar a atenção para um sector económico importante no País, porque representa uma indústria tradicional portuguesa e, em muitos casos, uma indústria ainda artesanal, intimamente ligada à nossa identidade cultural e ao nosso património arquitectónico.
Na região da serras de Aire e Candeeiros, onde se situa o Maciço Calcário Estremenho, abunda a rocha ornamental calcária, a pedra para calçada, a laje e a pedra rústica, a qual tem sido explorada para os mais diversos fins. Por isso, em todas as cidades, vilas e aldeias de Portugal se utiliza essa pedra e a calçada à portuguesa.
No mercado externo é já acentuada a presença da pedra proveniente destas pedreiras. Um pouco por todo o mundo, designadamente nos países onde a presença portuguesa mais se fez sentir, foi e continua a ser utilizado este material. Encontramos, também, nos países comunitários, no Médio Oriente, na China, nos Estados Unidos e no Canadá a utilização da rocha ornamental, o que também demonstra a importância desta indústria nacional.
Ora, mais de 150 explorações dos concelhos de Porto de Mós, Santarém e Batalha trabalham exclusivamente na extracção e no corte de pedra para calçada na serras de Aire e Candeeiros.
Efectivamente, as populações dos concelhos mencionados há várias gerações que se dedicam no seu dia-a-dia à exploração deste tipo de calcário ornamental.
Na verdade, dedicam-se a esta actividade artesanal, só naquela zona, mais de 200 entidades que empregam mais de 700 trabalhadores, sem contar, evidentemente, com aqueles que também trabalham nas serrações de corte de blocos de pedra, oficinas de acabamento final, transportadores e calceteiros - e todos eles dependem, natural e directamente, desta exploração.
A exploração de pedreiras de calçada, lajes e pedra rústica é, na maior parte dos casos, um pequeno negócio de família e, normalmente, a única fonte de rendimento desta.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sucede que foram introduzidas pelos Decretos-Leis n.os 69/2000 e 270/2001 algumas alterações legislativas que vieram alterar as normas aplicáveis à exploração de pedreiras de calçada, de lajes e pedra ornamental e rústica.
Essas alterações legislativas, ditadas pela necessidade de transpor para a ordem jurídica interna directivas comunitárias, foram introduzidas sem a prévia e indispensável auscultação dos representantes deste pequeno mas importante sector da economia.
Sucede que as alterações introduzidas e actualmente em vigor podem colocar em risco a subsistência da actividade destas pequenas indústrias, na maioria dos casos, como já referi, indústrias familiares.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Interesses de ordem histórica, cultural, arquitectónica e ambiental justificam plenamente a criação de um regime especial para as pequenas explorações de pedreiras para calçada ou outros inertes, englobando aqui também as pedreiras de rocha ornamental, as de laje e as de pedra rústica.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Por isso, Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o CDS-PP entendeu recomendar ao Governo que, com a maior brevidade possível, a fim de evitar a superveniente actividade ilegal de algumas explorações, proceda à elaboração de um regime especial para as pequenas explorações de pedreiras para calçada ou outros inertes, onde se inclui a rocha ornamental, a laje ou a pedra rústica, no qual seja reequacionado o equilíbrio entre as exigências ambientais impostas e a dimensão da intervenção humana no ambiente, no caso especial destas pedreiras, atendendo designadamente à sua dimensão e profundidade que, pelas suas características, facilitam a fácil e total recuperação paisagística e ambiental em curto espaço de tempo.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Por todas estas razões e muito especialmente porque está em causa a subsistência de muitas famílias portuguesas, o regime especial para os pequenos exploradores destas pedreiras deverá conter uma definição legal do conceito de pequenas explorações de pedreiras, que as identifique por traços característicos comuns reveladores quer do seu mínimo impacto ambiental quer das suas reduzidas dimensões física e económica.

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O regime especial para estas pequenas explorações deverá conter também um processo simplificado e, sobretudo, menos oneroso de licenciamento das pedreiras para novos projectos, bem como de ampliação de pedreiras já licenciadas, designadamente no que respeita ao estudo de impacte ambiental, por forma a que o mesmo não constitua um encargo demasiado oneroso para a dimensão da exploração e que possa ser desenvolvido em conjunto para várias explorações que se encontrem representadas pela mesma associação de actividade.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Há mais alguns oradores inscritos para debater estes projectos de diploma e julgo que é razoável que adiemos as votações regimentais para o final do debate desta matéria a fim de a mesma ser objecto de votação.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Sr. Presidente, antes de iniciar a minha intervenção propriamente dita, permita-se-me uma primeira observação.
Lamento profundamente, e a minha bancada também, que o PCP, não tendo respondido às questões colocadas pelo meu Colega de bancada Deputado Paulo Baptista Santos, tenha optado por um caminho de acusação e de ofensa pessoal aos Deputados da bancada, concretamente aos eleitos pelo círculo eleitoral de Leiria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A pedra de que hoje falamos criou um dos símbolos nacionais com que mais nos identificamos e mais nos identificam, em Portugal e no estrangeiro.
Falo da calçada de vidraço à portuguesa, produzida artesanalmente com calcários fracturados pelo impacto de um pequeno martelo apresenta uma superfície lisa e brilhante.
O engenho e a criatividade estética dos artesãos deu origem a uma das mais belas artes de revestimento de solos.
Praças, ruas e passeios embelezam os espaços públicos de cidades e vilas de todo o País, sendo usados como elemento estético nos projectos de requalificação e recuperação de centros históricos e novos projectos urbanísticos. Edifícios de arquitectura moderna concebidos para espaços comerciais, culturais ou outros fins, valorizam as suas funções e reforçam a sua atractividade com a utilização da calçada à portuguesa.
As nossas memórias, pessoais e colectiva, estão povoadas de brincadeiras de infância ou de longas caminhadas nos percursos das nossas vidas sobre calçada à portuguesa.
Pisamo-la devagar, apressadamente, amedrontados, felizes ou pensativos, mas reconhecemo-la, aqui ou em qualquer parte do mundo, com as suas cores (branca, preta ou rosa), desenhando formas de rara beleza.
Na prosa ou na poesia, a Literatura Portuguesa refere-a, introduzindo-a na ficção como cenário interactivo onde a história se desenrola.
Armando Moreno, no conto Arte Portuguesa, chamando simplesmente Zé ao português que labuta desde o nascer do Sol até ao escuro da noite, eleva-o ao limbo de sonhador nas suas obras de arte: a canga, o fado e a calçada à portuguesa. Assim homenageia o povo português.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Na Expo 98, o orgulho nacional e o sentimento de portugalidade exibiram largamente a calçada à portuguesa, transformando-a no ex libris de uma das obras mais emblemáticas do século XX.
A longínqua e amada Timor, quando nasceu para o mundo das nações independentes e livres, valorizou a sua nova urbanidade com calçada à portuguesa feita por calceteiros portugueses que aí se deslocaram para construírem mais um marco de perpetuação da História de Portugal no mundo.
Ainda recentemente, vivi momentos de grande emoção e orgulho nacional quando, com autoridades francesas, inaugurei uma praça de calçada portuguesa em Biscarosse, cidade francesa geminada com o município de Pombal. O acordo de geminação determina a realização de trocas culturais. A decisão da autarquia portuguesa foi levar pedra de Porto de Mós e calceteiros de Ansião de modo a revestir a maior praça do centro da cidade francesa com calçada de vidraço à portuguesa onde foi desenhada a simbólica rosa-dos-ventos. Esta obra de arte percorre o mundo todo nas fotos e memórias dos inúmeros turistas que, anualmente, visitam aquela estância balnear francesa.
Quem são os portugueses que, genialmente mas no anonimato, produzem estas obras, contribuindo para a riqueza económica, urbanística e cultural do nosso país e também para a sua divulgação além-fronteiras? São, em primeiro lugar, os exploradores da calçada à portuguesa.
A matéria-prima provém em larga escala de explorações de inertes, de dimensão familiar ou quase familiar, localizadas, na sua esmagadora maioria, na região da Serra d'Aire e Candeeiros, abrangendo, sobretudo, os municípios de Leiria, Batalha, Porto de Mós e Santarém.
Por outro lado, é notório o crescente abandono a que tem vindo a ser votado o exercício da profissão de calceteiro.
Estes factores atestam a fragilidade de que se revestem a manutenção e o desenvolvimento deste subsector de actividade que, não obstante, constitui um dos expoentes da nossa cultura na composição estética urbana.
Historicamente, a actividade de exploração de calçada de vidraço à portuguesa foi-se compondo de trabalhadores provindos do abandono progressivo das actividades agrícolas locais, que aproveitaram a existência abundante da matéria-prima nos maciços calcários, o aumento da procura de calçada e a exigência insignificante de investimento.
Actualmente, fazendo o aproveitamento dos recursos naturais que as serras de Aire e Candeeiros oferecem, estima-se que existam mais de 200 empresas, abrangendo quase um milhar de trabalhadores e uma facturação anual de cerca de 50 milhões de euros.
O Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio, alterado posteriormente pelo Decreto-Lei n.º 75/2001, de 26 de Fevereiro, instituiu o novo regime jurídico da avaliação do impacte ambiental.
O Decreto-Lei n.º 270/2001, de 6 de Outubro, revogando o Decreto-Lei n.º 89/90, de 16 de Março, aprovou o novo regime jurídico da pesquisa e exploração de massas

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minerais/pedreiras, estabelecendo no nosso ordenamento jurídico um conjunto de requisitos para o exercício dessas actividades, correspondendo à transposição do regime de directivas comunitárias para o Direito Interno.
No entanto, não tendo em conta as reduzidas dimensão, natureza e especificidade da actividade de exploração de pedreiras para a calçada de vidraço à portuguesa, consubstanciam tais requisitos condições e exigências incomportáveis para a perpetuação da actividade e, consequentemente, fatais para a subsistência desta actividade económica.
As dificuldades são acrescidas pelo facto de a maioria das explorações se situar no Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros.
As obrigações decorrentes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 270/2001 determinam a realização de estudos de impacte ambiental, a contratação de um director técnico de exploração licenciado, a realização de escrituras públicas para os arrendamentos locais e a elaboração de planos de lavra e de pedreira, tal como se de grandes explorações se tratasse.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD ouviu os representantes destas pequenas unidades de exploração, em audiência concedida pelo grupo parlamentar e em audiências concedidas pelas Comissões de Economia e Finanças, do Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente e de Educação e Cultura.
O Grupo Parlamentar do PSD considera que as exigências reportadas trarão consequências sociais e económicas potencialmente dramáticas para todos os trabalhadores e famílias abrangidos.
O PSD considera de interesse histórico, económico e social, local, nacional e internacional, a actividade cultural tradicional que representa a manutenção da calçada à portuguesa, bem como a protecção das origens da matéria-prima.
O Governo constituiu, entre o Ministério da Economia e o Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, um grupo de trabalho para revisão do actual regime legal regulador da actividade de pesquisa e de exploração de pedreiras.
Na revisão em curso simplificar-se-á o regime aplicável aos procedimentos para o licenciamento das actividades de pesquisa e exploração de inertes destinados à construção e à manutenção da calçada de vidraço à portuguesa.
No âmbito do trabalho que está a ser desenvolvido pelo Ministério da Economia e pelo Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente destaca-se a definição das áreas passíveis de extracção dentro do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros. Para estas áreas está a ser equacionada a possibilidade de realização de avaliações de impacte ambiental conjuntas, eventualmente uma por cada área.
Esta situação irá permitir uma poupança significativa em termos de recursos financeiros e de tempo, reforçando também a capacidade de resposta do Parque aos novos pedidos de licenciamento.
Podemos anunciar que o trabalho está em fase de conclusão e que a breve trecho será publicada legislação sobre esta matéria.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD entendeu associar-se à acção do Governo nesta matéria com a apresentação do projecto de resolução n.º 131/IX, cujas recomendações reforçam o desejo de solução atempada e urgente dos problemas legais com que se debatem os exploradores da calçada de vidraço à portuguesa.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se.

A Oradora: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Saúdo todos os representantes deste importante subsector, muitos deles aqui presentes, mas perdoem-me o regionalismo e permitam-me um cumprimento afectivo pessoal e muito especial para os que labutam no meu distrito, distrito de Leiria.
A bem da construção da nossa economia, da nossa cultura e da nossa história, que o engenho e a arte não vos falte!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero saudar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista Os Verdes, todos os cidadãos que vieram hoje à Assembleia da República para assistir ao debate relativo ao projecto de lei e aos projectos de resolução que estão em discussão.
Começo por dizer que estamos claramente perante uma questão de compatibilização da preservação do ambiente com uma actividade, neste caso, das pequenas indústrias de extracção de pedra destinada à calçada de vidraço à portuguesa, sustento de muitas famílias e com um valor cultural evidente.
Trata-se da preservação de uma actividade que tem, também, consequências claras na renovação e no embelezamento urbano com material tradicional, mas, simultaneamente, deve haver uma preocupação com a beleza paisagística dos espaços naturais, procurando-se, pois, compatibilizar estes interesses.
Uma das questões que se coloca, nomeadamente pela associação representativa dos exploradores de pedreiras de calçada, prende-se justamente com a avaliação de impacte ambiental e a forma como a exigência desse processo obstaculiza, pelas suas onerosidade e morosidade, a continuação de muitas explorações destas indústrias de extracção de inertes.
No que diz respeito às iniciativas legislativas em discussão, devo dizer que os projectos de resolução apresentados pelo PSD e pelo CDS-PP, respectivamente, não resolvem o problema na perspectiva que atrás referi porque mantêm o regime de avaliação de impacte ambiental tal como está hoje instituído na lei até o Governo definir um regime especial, sem atribuírem sequer prazos para o efeito. Portanto, deixam tudo como está, limitando-se a recomendar ao Governo que mude o regime sem estabelecer prazos para tal mudança.
Quanto ao projecto de lei do PCP, resolve o problema na perspectiva que referi anteriormente, dispensando totalmente a avaliação de impacte ambiental até que a Comissão aí referida e, posteriormente, o Governo definam o regime especial de funcionamento destas pedreiras, ou seja, resolve de imediato o problema que se levanta com a avaliação de impacte ambiental, mas deixa completamente em

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aberto o que poderá resultar do regime especial a estabelecer posteriormente.
Feita esta análise, gostaria de referir expressamente o entendimento de Os Verdes sobre esta matéria. O que vou referir prende-se também com inúmeros contactos que temos estabelecido ao longo do tempo, nomadamente com autoridades de áreas protegidas onde é exercida esta actividade.
Quanto a nós, há aqui duas situações claramente distintas: o que se passa dentro do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros e o que se passa fora dele.
É que o próprio Parque Natural estabeleceu um princípio de avaliação de impacte ambiental relativamente a estas indústrias, isto é, definiu e circunscreveu as áreas onde é possível existirem estas actividades. Para tal, procedeu-se à caracterização da área e dos impactes ambientais e definiram-se medidas minimizadores relativamente aos efeitos desta indústria.
Na verdade, a avaliação de impacte ambiental é feita relativamente a esta actividade, para além de que é feita uma permanente fiscalização, garantindo-se, inclusivamente, que a recuperação paisagística seja uma realidade.
Curiosamente - e porque estamos a falar das pequenas explorações -, verifica-se que, nas pequenas pedreiras, se procede à respectiva reabilitação paisagística ao contrário do que acontece nas grandes pedreiras.
Se houver garantia de que o Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros mantém este acompanhamento que tem feito, então, quanto a nós, essa dispensa de avaliação de impacte ambiental pode acontecer, porque, na prática, a mesma é exercida por via da Direcção do Parque Natural.
Por outro lado e como referi, o problema prende-se, ainda, com as pedreiras que estão fora da área do Parque Natural porque, nesse caso, não há qualquer entidade responsável pela garantia de avaliação de impacte ambiental. Logo, o regime de isenção conduziria à não existência efectiva de uma avaliação e do conhecimento concreto dos impactes ambientais das muitas pedreiras, embora pequenas, que, no seu todo, perfazem uma área significativa.
Portanto, poderíamos encontrar diversas soluções nesta matéria: a criação de uma entidade ou, até, a definição de uma área concreta onde se fizesse a avaliação de impacte ambiental conjunta relativamente a todas as pedreiras. No entanto, o que não nos parece muito eficaz é enveredarmos pela via da dispensa de avaliação de impacte ambiental prevista na lei. Porquê? Porque tal avaliação obedece a critérios extremamente subjectivos e não há garantia alguma de que todas as pedreiras, ainda que com dimensão idêntica, fossem tratadas da mesma forma.
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Os Verdes consideram que se coloca um desafio à Assembleia da República relativamente à necessidade de preservação de uma actividade e de preservação do ambiente. Cabe-nos este desafio e, assim, não inviabilizaremos a baixa à comissão destas iniciativas, para que em sede de especialidade possamos encontrar soluções sérias e concretas que permitam essa compatibilização.
Haja, portanto, vontade por parte de todos os grupos parlamentares para procedermos a um debate e a uma definição sérios de critérios nesta Câmara relativamente a esta matéria.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Medeiros.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar e em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, quero também saudar todos aqueles que, do meu distrito e da minha região, e não só, aqui estão hoje para assistir a este debate sobre um tema que tem grande relevância económico-social para aquela região.
A discussão que aqui estamos hoje a travar prende-se com a apresentação do projecto de lei do PCP e de dois projectos de resolução do PSD e do CDS-PP. Acontece que para o Partido Socialista esta matéria tem, e sempre teve, grande relevância. De tal forma assim é que, já em Outubro de 2002, eu próprio apresentei nesta Assembleia um requerimento ao Governo no sentido de suscitar esta questão e de pedir ao Governo que esclarecesse um conjunto de matérias, designadamente no que respeita à clarificação do conceito de "impacte ambiental relevante", que esta actividade tem na paisagem e, consequentemente, na natureza, mas também sobre a possibilidade de, no actual quadro legislativo (e é essa a nossa convicção) e sem contrariar as disposições comunitárias, o Governo flexibilizar e agilizar procedimentos por forma a não inviabilizar as explorações.
Mais importante, no entanto, do que aferir méritos ou colher protagonismos, que apenas são devidos aos homens e mulheres que ao longo dos tempos têm dedicado a sua vida a esta nobre forma de expressão artística e cultural, é abordarmos o problema e contribuirmos para a sua resolução.
A exploração de pedra nos concelhos que integram o maciço calcário das serras de Aire e Candeeiros é uma actividade tradicional de grande relevância regional e com especial incidência em alguns concelhos dos distritos de Leiria e Santarém.
Trata-se de explorações, muitas delas de dimensão familiar, cujo objectivo é a produção da tradicional calçada de vidraço à portuguesa, a qual constitui um produto de grande qualidade e que se encontra espalhado por todo o território nacional e um pouco por todo o mundo, como, aliás, já hoje foi aqui referido em anteriores intervenções.
Estima-se que, na área deste maciço, existam mais de 300 explorações, a que corresponderão aproximadamente 1000 postos de trabalho e uma facturação anual de mais de 50 milhões de euros - isto, segundo os dados fornecidos (e não temos razões para duvidar deles) pela Associação de Exploradores de Calçada à Portuguesa (AECP), que também aqui saúdo pelo contributo que tem dado para a discussão desta matéria.
Trata-se, com efeito, do aproveitamento de um recurso natural local, a pedra calcária, cujo produto derivado - a calçada à portuguesa - se caracteriza por um valor acrescentado bastante significativo e constitui um importante factor de criação de riqueza ao nível regional.
Acresce que a calçada gerou o aparecimento de uma fileira económica associada, com unidades interligadas - desde os calcetamentos aos polimentos, à manutenção e à reparação de equipamentos -, o que gerou uma cadeia de valor significativa.
Atenta a estrutura de custos, verifica-se que, na repartição dos rendimentos gerados, a mão-de-obra tem aqui a parte mais significativa.

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Em síntese, podemos afirmar estar em presença de uma actividade economicamente relevante, de valor patrimonial inquestionável e de forte enraizamento sócio-cultural.
Acontece, porém, que o exercício desta actividade ocorre, sobretudo, numa área sensível, ambientalmente protegida - o Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros -, o que, por si só, obriga a uma especial atenção aos impactos desta actividade na paisagem.
Simultaneamente, por força das directivas comunitárias e da legislação nacional delas decorrente, designadamente da legislação já aqui citada, é óbvio que os requisitos de licenciamento de novas explorações e de expansão das actuais passou a estar condicionado a estudos de avaliação de impacte ambiental e a planos ambientais e de recuperação paisagística (PARP).
Acontece, porém, que a reduzida dimensão económica das explorações e, bem assim, o seu carácter familiar constituem um poderoso obstáculo ao cumprimento dos requisitos legais, designadamente no que respeita aos estudos de avaliação de impacte ambiental, atentos os respectivos custos.
Esta situação ameaça colocar em situação de ilegalidade (se é que já não está a colocar) e conduzir ao posterior encerramento de boa parte das explorações actualmente existentes, com todas as consequências económicas, sociais e culturais que isso não deixará de implicar.
A própria Associação do sector, preocupada com a situação e consciente das suas responsabilidades, tem procurado, junto das várias instituições que tutelam a actividade, encontrar soluções que permitam viabilizar estas explorações e, simultaneamente, garantir o cumprimento das normas ambientais em vigor.
Disso mesmo esta Associação deu conta a esta Assembleia nas audições que solicitou e obteve e das quais ressaltaram, objectivamente, algumas questões que importa clarificar e que merecem ter resposta por parte do Governo.
É nosso entendimento que é possível satisfazer as pretensões dos proprietários das explorações e, ao mesmo tempo, garantir o cumprimento das normas comunitárias e nacionais, viabilizando-se as explorações, salvando um património (a calçada à portuguesa) e preservando a paisagem e o ambiente.
Para tanto, é necessário adoptar medidas de clarificação por parte do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, no que respeita à regulamentação existente e, ao mesmo tempo, criar um sistema de incentivos a esta actividade, reconhecendo as suas relevâncias económica e cultural, um pouco à semelhança do que já hoje acontece com o artesanato e certas actividades no mundo rural.
Neste quadro, devemos questionar o Governo (e, particularmente, os Ministros das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, da Economia e da Cultura) sobre um conjunto de questões a que urge responder e que, manifestamente, são da sua competência e responsabilidade, a saber: quando e como pensa o Instituto de Conservação da Natureza (ICN) responder à solicitação da Associação de Exploradores de Pedra de Calçada, formalizada há cerca de um ano, no que respeita à clarificação objectiva do significado da expressão "impactes ambientais relevantes"?
O que pensa o Governo acerca da criação de um sistema de incentivos, eventualmente através do Programa Operacional da Economia, para apoiar esta actividade, designadamente admitindo a elegibilidade dos custos dos estudos de impacte ambiental, à semelhança do que já acontece com outras actividades económicas?
Admite o Governo, no quadro do Ministério da Cultura, proceder à equiparação da produção de "calçada à portuguesa" a uma actividade de tipo artesanal, concretizando o devido reconhecimento e enquadramento da sua especificidade e importância cultural e patrimonial?
São estas as questões a que é preciso dar resposta com urgência. A esta Assembleia compete estar atenta e alertar o Executivo, mas é a este, e só a este, que compete dar resposta ao problema no sítio onde ele se manifesta e com os parceiros adequados: produtores, autarquias e demais agentes locais.
É, pois, nosso entendimento que existem condições legais para que, com o actual quadro regulamentador, o Governo possa aligeirar e acelerar procedimentos, por forma a adaptá-los à realidade e especificidade das explorações, sem com isso pôr em causa as directivas comunitárias e os padrões ambientais exigíveis.
Quanto ao projecto lei do PCP, nada temos a obstar relativamente à existência de uma entidade com as características e atribuições nos domínios da certificação, fiscalização e garantia da genuinidade das explorações e da respectiva produção.
A questão mais problemática que emerge do seu projecto de lei é a que respeita à forma como vai ser aferido o impacte ambiental da actividade, uma vez que o n.º 3 do artigo 3.º isenta as explorações das normas aplicáveis do Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio, e que nos parece ter de ser acautelada, até para assegurar o cumprimento das directivas comunitárias.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - 60 dias!

O Orador: - No essencial, o Partido Socialista não discorda das recomendações contidas nos projectos de resolução do PSD e do CDS-PP e no projecto de lei do PCP, tanto no que respeita aos objectivos de valorização e preservação desta actividade como ao seu reconhecimento como património colectivo.
Já no que concerne ao seu impacte ambiental e atenta, inclusive, a localização específica desta actividade, o PS entende que cabe ao Governo encontrar os necessários equilíbrios, atentos os interesses em presença e sempre tendo em conta os equilíbrios ambientais que urge preservar e manter.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Perspectivando-se, contudo, uma intervenção legislativa e havendo, no essencial, convergência de pontos de vista nesta Câmara, o PS está totalmente disponível para trabalhar com os outros partidos em sede de comissão, tendo em vista a salvaguarda e a incorporação de todos os contributos em presença.
Pela nossa parte, e na linha das questões que, já em Outubro de 2002, apresentámos ao Governo, empenhar-nos-emos para que o trabalho em comissão venha a produzir soluções eficazes e equilibradas para resolver um problema que, tendo sobretudo um impacto regional, assume manifestamente um carácter e um interesse nacionais.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte.

O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista vê com bons olhos quaisquer iniciativas que tenham por finalidade proteger e valorizar este tipo de actividade (a produção do vidraço de calcário) e os produtos dele resultantes (a calçada à portuguesa).
Deverão, no entanto, em nosso entender, ser acautelados dois aspectos fundamentais: em primeiro lugar, que as técnicas utilizadas para o desmonte e fracção da pedra tenham em conta o que ficou consagrado na Lei n.º 107/2001 (Lei de Bases do Património Cultural) e, em segundo lugar, que as explorações de pedra destinadas a esta actividade respeitem as normas relativas à preservação do meio ambiente, até porque muitas das explorações em causa estão situadas no perímetro do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros.
Com efeito, esta lei considera que têm interesse cultural relevante os bens de carácter artístico, industrial ou técnico, entre outros, que "reflictam valores de memória, antiguidade, autenticidade, originalidade, raridade, singularidade ou exemplaridade" e determina que sejam objecto de protecção, entre outros, "os modos tradicionais de fazer, nomeadamente as técnicas tradicionais de construção e de fabrico".
Ora, a calçada de vidraço à portuguesa, tanto na sua fase de produção (na pedreira) como na fase de produto final (colocação do trabalho artístico), cabe perfeitamente nestas disposições da lei e posso dizer que este tipo de actividade artesanal esteve, em parte, presente no espírito do legislador aquando da elaboração e discussão da Lei de Bases do Património Cultural.
Relativamente à preservação do ambiente, tendo em conta que as explorações deste tipo ferem sempre a paisagem e o equilíbrio ecológico, fica claro que têm de ser tomadas todas as medidas adequadas para que os danos infligidos sejam não só recuperáveis como - e isso é fundamental - devidamente regulamentados.
Quando se trata de salvaguardar dois tipos de bens igualmente identitários e frágeis, o património cultural e o património ambiental, nenhuma precaução deverá ser evitada ou desprezada. É nesse contexto que o Partido Socialista estará disposto a trabalhar em conjunto, em sede de comissão, no aperfeiçoamento do projecto de lei n.º 189/IX, na linha das conclusões do relatório que sobre ele foi aprovado e aqui apresentado pela Comissão de Economia e Finanças.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar por reafirmar que os projectos de resolução n.os 128/IX e 131/IX, apresentados, respectivamente, pelo CDS-PP e pelo PSD não resolvem a situação vivida pelos trabalhadores e exploradores do sector das pedreiras das serras de Aire e Candeeiros.

Vozes do PCP: - Exactamente!

A Oradora: - E os Srs. Deputados do CDS-PP e do PSD sabem que é rigorosamente verdade aquilo que estou a dizer.
Foram projectos de resolução feitos à pressa para permitir a discussão conjunta com o projecto de lei do PCP.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Os Srs. Deputados do CDS-PP e do PSD sabem que, se o Governo quisesse resolver a situação, a teria resolvido neste ano em que tomou posse, e teve todo o tempo para fazê-lo.
Os Srs. Deputados do CDS-PP e do PSD sabem que o único projecto que resolve a situação dos trabalhadores e exploradores do sector é o projecto de lei do PCP,…

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não sabemos nada disso!

A Oradora: - … que evita a situação de ilegalidade que todos irão viver a partir do próximo mês de Abril.
Os Srs. Deputados do CDS-PP e do PSD vieram hoje aqui defender que todas estas pedreiras sejam ilegais a partir do próximo mês de Abril.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Os Srs. Deputados da maioria vieram aqui hoje defender que os trabalhadores e os exploradores abandonem as pedreiras…

Vozes do CDS-PP: - É falso!

A Oradora: - … e vivam das recomendações, sem nenhuma validade, que hoje aqui vieram apresentar.
Os Srs. Deputados do PSD e do CDS-PP vieram aqui dizer que os trabalhadores que hoje aqui estão presentes e os exploradores das pedreiras não têm direito ao sustento a partir do próximo mês de Abril, porque os senhores não o permitem.

Protestos do CDS-PP.

Os Srs. Deputados do PSD e do CDS-PP vieram aqui hoje demonstrar à evidência que prometem mas não cumprem.
Os Srs. Deputados do PSD e do CDS-PP vieram aqui hoje demonstrar à evidência que os políticos não são todos iguais - há Deputados que compram votos…

Protestos do PSD.

… e que não cumprem, no espaço da Assembleia da República, aquilo que é a legítima representação daqueles que em vós acreditaram nos distritos de Leiria e Santarém.
Os Srs. Deputados não merecem o voto que tiveram.

Aplausos do PCP.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Demagogia!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Sr.ª Deputada Luísa Mesquita não tem razão quando afirma o que ouvimos. Os partidos

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da maioria, o PSD e o CDS-PP, preocupados com a situação em que se encontra esta indústria, estes pequenos exploradores de calçada e outros inertes, vêm apresentar estes projectos de resolução.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Foi aqui dito também que o Governo já está a trabalhar no sentido de resolver rapidamente…

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Há um ano!

A Oradora: - … esta situação, que foi criada por uma legislação publicada no tempo do anterior governo e que afectou muitas famílias que dependem desta mesma indústria.
Preocupados com essa matéria e com a situação dessas famílias, apresentámos os nossos projectos de resolução, que não foram feitos à pressa; outrossim, foram bem pensados, por forma a resolver esta situação.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por terminada a discussão conjunta, na generalidade, do projecto de lei n.º 189/IX (PCP) e dos projectos de resolução n.os 128/IX (CDS-PP) e 131/IX (PSD), que, assim, poderão ser votados de seguida.
Até vou dar mais um passo, num sinal de compreensão e de estima para com a presença nas galerias de tantos concidadãos nossos ligados à actividade da calçada de vidraço à portuguesa - há algum tempo, recebi um grupo, que me veio apresentar uma exposição sobre a matéria, à qual o Parlamento vai dar hoje resposta -, solicitando que votemos esses diplomas logo a seguir a dois votos de pesar apresentados, que têm prioridade.
Portanto, terminada a votação dos votos de pesar, proponho que votemos esses três diplomas, porque constato a presença de um par de centenas de pessoas de trabalho que certamente querem voltar às suas casas e porque, a seguir, têm lugar votações que nos vão levar muito tempo.
Assim sendo, se os Srs. Deputados estiverem todos de acordo - e dá-me a impressão que estão -, votaríamos previamente, logo a seguir aos votos de pesar, esses três diplomas, os nossos concidadãos poderiam voltar para suas casas e nós prosseguiríamos com outros assuntos que já não lhes dizem directamente respeito.
Aproveito também para, pessoalmente, exprimir a minha satisfação por ver as nossas galerias tão abundantemente representadas por gente que se vê claramente que trabalha para o progresso do nosso país.
Srs. Deputados, antes de entrarmos no período regimental de votações, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 184 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
O primeiro texto a ser submetido à votação é o voto n.º 46/IX - De pesar pelo falecimento da Professora Andrée Crabbé Rocha (PS).
Para proceder à leitura do voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima, primeira subscritora do mesmo.
De seguida, conforme foi acordado entre todos, e tal como tem sido praxe nestas matérias, procederemos à sua votação sem mais intervenções.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima.

A Sr.ª Isabel Pires de Lima (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o voto que apresentamos é do seguinte teor:
A académica e ensaísta de nacionalidade belga, Andrée Crabbé Rocha, acaba de nos deixar aos 86 anos, dos quais mais de 60 foram vividos em Portugal, onde se dedicou ao ensino da literatura. O seu interesse pela cultura portuguesa levara-a a frequentar em Bruxelas as aulas de Vitorino Nemésio, com quem virá a colaborar, logo em 1938, na Revista de Portugal e de quem virá mais tarde a ser assistente na Faculdade de Letras de Lisboa.
Logo nesse mesmo ano de 1938, inscreve-se num curso de férias na Universidade de Coimbra. De visita à casa do mestre, em Tovim, perto de Coimbra, inspira a um jovem poeta que lá conhece os seguintes versos:
"Lírica, a tarde cai/Com secura nas folhas;/Lírica, a minha vista vai/A olhar o que tu olhas.../Oliveiras de sonho/A ver nascer a lua.../Liricamente ponho/A minha mão na tua."
O poeta liricamente preso ao seu olhar e à sua mão era o escritor Miguel Torga, pseudónimo de Adolfo Rocha, que dois anos mais tarde se tornará seu marido. O destino de Andrée Crabbé mudara e a jovem citadina troca definitivamente a brumosa Bruxelas por um país rural e ensolarado a Ocidente, que calcorreou intrepidamente, no sentido de aprender a amá-lo e ao qual se entregou definitivamente.
Licencia-se e depois doutora-se com uma tese sobre o teatro de Garrett pela Faculdade de Letras de Lisboa, onde será assistente entre 1945 e 1947, ano em que, por razões políticas, é afastada do ensino pelo regime de Salazar por cerca de 20 anos. Nomes tão diversos como Sebastião da Gama ou David Mourão Ferreira manifestar-lhe-ão por carta a sua indignação. Quando, já depois do 25 de Abril de 1974, se tornar professora da Universidade de Coimbra, onde terminará a carreira em 1986 e onde chegou a desempenhar funções de vice-reitora, já é senhora de um vasto curriculum como ensaísta.
Para além de ter editado o Teatro de Garrett, de ter publicado trabalhos inovadores sobre as manifestações teatrais do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende e sobre o teatro de Baltasar Dias, Andrée Crabbé Rocha, dotada de uma insaciável sede de leitura e de uma intensa curiosidade intelectual, tornara-se uma mulher de uma rara erudição, conhecedora de excepção da literatura portuguesa, da Idade Média ao século XX, como é visível nos ensaios compilados em Temas de Literatura Portuguesa.
O seu livro mais conhecido, A espistolografia em Portugal, onde antologia cartas desde o século XV ao XX, editado em 1965, tornou-se uma obra de referência para todos quantos entre nós se interessam por esse género literário.
A especialização na literatura portuguesa nunca a levou a abandonar a docência da literatura francesa que sempre praticou quer nas duas Universidades onde exerceu o magistério, quer na Aliança Francesa. Isso explica que, para além de ter sido distinguida pelo Estado português com a Ordem do

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Infante D. Henrique, o tenha sido também pelo Estado francês com a Ordem Nacional de Mérito de França.
Mulher de uma enorme polivalência, foi uma professora inesquecível, uma ensaísta e investigadora de fôlego e a companheira de toda a vida de um dos grandes poetas do século XX.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista acompanha de forma sentida o voto de pesar pelo falecimento de Andrée Cabbré Rocha e apresenta à família enlutada, e muito especialmente à sua filha, a académica e ensaísta Clara Cabbré Rocha, as suas condolências.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto de pesar n.º 46/IX.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, passamos ao voto n.º 47/IX - De pesar pela morte da escritora Maria Ondina Braga (PS).
Para apresentar o voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fagundes Duarte.

O Sr. Luís Fagundes Duarte (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados:
Maria Ondina Braga morreu do modo como sempre viveu: em silêncio. E se o cerrar dos seus olhos teve o eco de umas breves notícias nos órgãos de comunicação social, de seguida, como sempre, uma vez mais, foi o silêncio.
No entanto, poucos escritores portugueses, como Ondina Braga, tiveram a força e a arte de transformar as suas vidas e as suas experiências em páginas de grande literatura: livros como A China Fica ao Lado, que Eugénio Lisboa qualificou como "invulgarmente atraente, porque é feminino e porque é incómodo". Estátua de Sal, A Personagem, Nocturno em Macau, que foi Prémio Eça de Queirós, em 1991, ou Vidas Vencidas, seu último título publicado, em 1998, são disso exemplo.
Desde 1965, Maria Ondina Braga escreveu e publicou perto de uma vintena de livros - crónicas, biografias, contos, romances -, e verteu para português obras de escritores tão importantes como Graham Greene, Pearl Buck, Bertrand Russel, John Le Carré, Herbert Marcuse, Anaïs Nin ou Tzvetan Todorov.
E tudo isto ao mesmo tempo que foi cumprindo em si, e nos livros que ia escrevendo, a tão portuguesa condição de viajante do mundo - e mais dos mundos exóticos do Oriente -, na esteira de um Fernão Mendes Pinto, de um Wenceslau de Moraes, de um Camilo Pessanha, ou de um Ruy Cinatti.
Nascida em Braga a 13 de Janeiro de 1932, Maria Ondina estudou em Cambridge e em Paris, e foi professora de Português e Inglês em Luanda, em Goa (onde se encontrava no momento da ocupação do território pelas tropas indianas), em Macau e, finalmente, em Pequim, onde, entre muitas gentes e coisas, viveu a terrível experiência do "pequinaço" - espécie de depressão que atacava os ocidentais deslocados em Pequim -, que a fez regressar, triste e saudosa, definitivamente, a Portugal, e que daria origem àquele que é um dos seus mais belos e autênticos livros, Angústia em Pequim, publicado em 1984, por ela mesma apresentado como expressão do seu reconhecimento ao povo chinês.
Muito justamente, Maria Ondina Braga orgulhava-se de ter contribuído para o estabelecimento das relações culturais entre Portugal e a China: "não posso esquecer", escreveu ela em Angústia em Pequim, que os chineses "tenham julgado útil a presença de uma escritora como eu para reiniciar relações culturais entre os nossos dois países que, de tão distantes, quase um para o outro se tornaram fabulosos".
É verdade que Maria Ondina Braga não resistiu ao "pequinaço", e desconfio que com essa dor terá morrido; mas cabe-lhe a glória de, com livros como A China Fica ao Lado, Angústia em Pequim ou Nocturno em Macau, ter finalmente encerrado a longa viagem de descoberta da China há mais de quatro séculos encetada por Fernão Mendes Pinto.
A propósito do romance A Personagem, escreveu João Gaspar Simões: "Maria Ondina Braga é a primeira mulher a escrever, entre nós, depois de Irene Lisboa, e com arte de contar muito mais subtil na sua simplicidade quase genial, o livro que a solidão da mulher (...) estava a pedir, desde que em Portugal a mulher descobriu a sua própria solidão".
Foi nesta solidão que Maria Ondina Braga viveu, viajou, escreveu e ensinou. Morreu, na sua cidade natal, no dia 14 de Março de 2003, deixando-nos uma obra de alta valia literária e de grande dimensão humana, que os Portugueses - como a quase todos os escritores que lhes traduzem a alma -, praticamente desconhecem.
Nestes termos, a Assembleia da República ergue-se em comovida homenagem à memória de Maria Ondina Braga, escritora de silêncios, que com os seus livros contribuiu para restituir aos Portugueses o orgulho por um passado colectivo construído à escala do Mundo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto de pesar n.º 47/IX.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, ergamo-nos para 1 minuto de homenagem às duas personalidades aqui evocadas.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 189/IX - Assegura a defesa e a valorização da calçada de vidraço à portuguesa (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP e do BE e abstenções do PS e de Os Verdes.

Passamos, agora, à votação do projecto de resolução n.º 128/IX - Sobre a criação de um regime especial das pequenas explorações de pedreiras para calçada ou outros inertes (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 131/IX - Protecção das explorações de inertes para a calçada de vidraço à portuguesa (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

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Srs. Deputados, o Sr. Deputado António Costa informou que fará chegar à Mesa uma declaração de voto por escrito.
Srs. Deputados, vamos agora votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 213/IX - Visa regular os processos de deslocalização de empresas (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PS.

Srs. Deputados, passamos à votação global da proposta de resolução n.º 30/IX - Aprova, para ratificação, o Protocolo n.º 13 à Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, relativo à abolição da pena de morte em quaisquer circunstâncias, aberto à assinatura em Vilnius, a 3 de Maio de 2002.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, dada a importância deste diploma, de rejeição da pena de morte, assinalo que também votei a favor, bem como os restantes membros da Mesa.
Também em votação global, vamos agora votar a proposta de resolução n.º 32/IX - Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a República da Roménia sobre readmissão de pessoas em situação irregular, assinado em Lisboa, em 26 de Setembro de 2002.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, passamos à votação global da proposta de resolução n.º 33/IX - Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a República da Estónia sobre readmissão de pessoas em situação irregular, assinado em Lisboa, em 12 de Novembro de 2001.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos votar um requerimento, apresentado pelo BE e pelo PS, de baixa à Comissão de Educação, Ciência e Cultura, pelo prazo de 60 dias, sem votação, do projecto de lei n.º 79/IX - Define o número máximo de alunos por turma no ensino não superior (BE).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Assim sendo, está prejudicada a votação, na generalidade, do referido projecto de lei.
Segue-se a votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 44/IX - Autoriza o Governo a legislar sobre certos aspectos legais dos serviços da sociedade da informação, em especial do comércio electrónico, no mercado interno, transpondo para a ordem jurídica nacional a Directiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de Junho de 2000.
O Sr. Deputado José Magalhães pediu a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, ontem, durante o debate, na generalidade, desta proposta de lei sobre sociedade da informação foi admitida a hipótese da sua baixa à comissão para votação na especialidade, na sequência do trabalho de audições que realizámos, precedendo a generalidade. Verifico que Deputados do PSD e do PP apresentaram propostas de alteração na especialidade, tendo em conta (em parte) as audições, mas também que está inscrita e prevista para Plenário a respectiva votação na especialidade. Troquei impressões com alguns dos Srs. Deputados, que me transmitiram a confirmação desta linha de orientação.
Nesses termos, Sr. Presidente, vai ser necessário arbitrar tempo para a discussão, na especialidade, destas propostas. E o facto de este diploma não baixar à comissão - o que lamentamos - vai condicionar o sentido de voto do Grupo Parlamentar do PS e, francamente, frustra muito o alcance do debate e do espírito com que fizemos a preparação e, designadamente, o relatório 1.ª Comissão.

O Sr. Presidente: - Registo a posição do Sr. Deputado José Magalhães, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Há, de facto, necessidade de arbitrar tempo para o debate, na especialidade, das propostas de alteração apresentadas e julgo que cada grupo parlamentar poderia beneficiar de 3 minutos para a respectiva discussão. Se não há objecções, é o que faremos.
Para já, teremos de proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 44/IX.
Antes, porém, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa para interpelar a Mesa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, permitia-me apelar a V. Ex.ª e à maioria para a razoabilidade de não se fazer este exercício aqui, no Plenário - que antevejo, desde já, muito complexo -, e fazer baixar à comissão o diploma, por 8 dias, a fim de aí podermos realizar, com calma e serenidade, um trabalho bem feito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a interpelação dirige-se à Mesa, mas o apelo dirige-se à maioria. Veremos qual é a resposta da maioria.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, queria salientar que já estamos em situação de incumprimento dos prazos de transposição. Contudo, ainda que assim não fosse, e apesar da utilidade de uma série de audições que foram realizadas, com a participação muito intensa de Deputados de todos os partidos, ontem durante o debate em Plenário, com a presença do Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça, constatou-se bem que o consenso (que, muitas vezes, manifestamos que é desejável) nunca seria alcançado, não com a amplitude que o Partido Socialista desde logo indicou como limite mínimo! Assim sendo, toda a

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razão perdeu a necessidade de baixa à comissão para esse efeito.
Portanto, vamos votar a proposta de lei com as alterações que o Sr. Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Justiça já anunciou que o Governo estaria na disposição de conceder.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, queria salientar que não é verdade, e até me parece incorrecto, dizer-se que "arrumarmos" o assunto nesta sede, hoje, é fazer o trabalho à pressa. Recordo ainda o Sr. Deputado António Costa que, na Conferência de Líderes, a pedido (legítimo) do Partido Socialista, e face a este problema de prazo agora lembrado pelo Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, o Governo aceitou que, antes do debate na generalidade, se realizassem algumas diligências - houve duas sessões em comissão, em dois dias diferentes, com audições com a presença do Governo e de um conjunto de entidades solicitadas pelo Partido Socialista. Esse debate fez-se exactamente para que hoje pudéssemos votar tudo.
Portanto, com franqueza, não faz sentido dizer-se que estamos aqui a votar o diploma à pressa. Esta matéria foi debatida - e bem - com audições prévias na 1.ª Comissão, o debate em Plenário só teve lugar após a realização dessas audições e as propostas de alteração foram apresentadas ao princípio da tarde para que todos pudessem conhecê-las - de resto, o Sr. Deputado José Magalhães já afirmou que elas até vão num sentido positivo, apesar de não cumprirem, eventualmente, tudo aquilo que o Partido Socialista gostaria.
Nesse sentido, a maioria entende que devem realizar-se nesta sede, ainda hoje, as três votações.

O Sr. Presidente: - Também sobre a mesma matéria, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares para interpelar a Mesa.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, julgo que o prazo de 8 dias é razoável, até tendo em conta que o prazo de transposição já está ultrapassado em mais de 1 ano, para podermos discutir, na especialidade, estas propostas em comissão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o apelo dirigir-se-ia à maioria, que não cedeu.
Srs. Deputados, após a votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 44/IX, seguir-se-á a votação na especialidade, com a atribuição de 3 minutos a cada grupo parlamentar para se pronunciarem sobre as propostas de aditamento apresentadas pelo PSD e pelo CDS-PP.
Vamos, então, votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 44/IX - Autoriza o Governo a legislar sobre certos aspectos legais dos serviços da sociedade da informação, em especial do comércio electrónico, no mercado interno, transpondo para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de Junho de 2000.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e de Os Verde e a abstenção do PS.

Conforme referi, vamos abrir o debate sobre as três propostas de aditamento, apresentadas pelo PSD e pelo CDS-PP, e no final procederemos à votação na especialidade.
Para intervir sobre as propostas de aditamento, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não se deveria apresentar primeiro as propostas?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, se os proponentes desejam apresentar as propostas, adiarei a intervenção, porque temos obviamente vantagem em ouvir a apresentação, de tal forma elas são misteriosas!

O Sr. Presidente: - Tem toda a razão, Sr. Deputado. Como tinha pedido a palavra primeiro, dei-a por ordem de inscrição.
Então, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Irei proceder à apresentação das várias propostas de aditamento, que, de resto, o Sr. Deputado José Magalhães bem compreende e já conhecia antes mesmo de as ter lido.
Ontem, aquando do debate parlamentar, percebeu-se bem até que ponto o Governo estava disposto a considerar os argumentos que resultaram das várias - muitas - audições efectuadas na 1.ª Comissão. Posteriormente, e em conformidade, foram ouvidos representantes dos vários partidos, designadamente o Sr. Deputado José Magalhães teve oportunidade de conversar com o Sr. Secretário de Estado. Ou seja, percebeu-se logo o alcance das alterações que o Governo estava disposto a contemplar - trata-se, naturalmente, de uma solução que é deste Governo, pese embora a vontade de consenso que havia.
Essas alterações ao diploma passariam, desde logo, pela consagração da possibilidade de quem tivesse interesse jurídico na manutenção de um conteúdo poder recorrer para a entidade de supervisão respectiva contra uma decisão do prestador de remover ou impossibilitar o acesso a esse conteúdo; pelo facto de a criação de meios judiciais céleres de solução de litígios não prejudicar o recurso simultâneo dos interessados aos meios judiciais existentes; e, ainda, por não prejudicar, independentemente das competências que são cometidas à ANACOM, as competências específicas de várias entidades que evitariam o dito conflito de jurisdição a que, de resto, o Sr. Deputado José Magalhães várias vezes aludiu nas suas intervenções. Portanto, ficava muito bem circunscrita aquela que seria a competência da ANACOM e das outras entidades.

Vozes do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Foi nesse sentido que os Deputados desta maioria, do CDS-PP e do PSD, apresentaram propostas de aditamento que sujeitamos à consideração da Câmara para efeitos de votação, naturalmente.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Este é o caminho mais longo para a

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transposição. Os Srs. Deputados do PSD e do PP erram, e erram muito, quando forçam a ruptura do consenso alargado que tem presidido à aprovação de propostas sobre sociedade da informação. Fazem mal! Designadamente, vão contra o parecer da Unidade de Missão, Inovação e Conhecimento da Presidência do Conselho de Ministros, que aponta para alterações que deveriam ser introduzidas já porque matriciais.
Em segundo lugar, este é o caminho mais espinhoso e mais incerto, porque a transposição que foi apresentada diverge sensivelmente da Directiva em pontos absolutamente fulcrais e, portanto enferma de diversos vícios que nós procurámos corrigir - e abrimo-nos à sua correcção.
Em terceiro lugar, manifestámos ontem a disponibilidade para viabilizarmos a proposta sob condição de um trabalho sério e adequado em sede da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - Aprovado!

O Orador: - Tal acaba de ser frustrado de uma maneira totalmente inexplicável - e não julguem que ganham tempo! Há alguma hipocrisia neste processo: o Governo pede 180 dias, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, para usar a autorização legislativa e não podemos gastar 8 dias dos que temos para aperfeiçoar a autorização?! A resposta é: "Não, não podemos", porque o PSD e o PP manifestam indisponibilidade para corrigir e sanar um dos maiores vícios da proposta de lei, a concessão à ANACOM, a título pseudoresidual, de poderes vastíssimos para intervir no dirimir de litígios e na resolução de situações de ilicitude aparente ou indiciada no ciberespaço, o que suscita problemas de diversas ordens (de conformação com a Directiva, de conformação com a Constituição, de conformação com legislação vigente) e, apesar dos argumentos e das vozes que nos chegaram à 1.ª Comissão (voz da Ordem dos Advogados e vozes de especialistas vários) de elucidação da própria intenção do Prof. Oliveira Ascensão e de teste aos vícios que a solução apontada e proposta encerra.
Os Srs. Deputados continuam surdos, mas essa surdez tem consequências.
A ANACOM não pode ter os poderes que esta autorização legislativa visa conceder-lhe, isso é contra o seu código genético e contra várias normas que têm valor e que a Assembleia da República tem de respeitar. E os Srs. Deputados utilizam uma via aventureira, imprudente e que colide com valores essenciais ao julgarem que podem legislar sobre sociedade da informação, quebrando valores essenciais da sociedade da informação livre e democrática, que a Directiva 2000/31/CE acolhe e que a Constituição torna absolutamente obrigatórios.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O PS gostaria de ter podido votar favoravelmente esta autorização e de ter podido estar associado à feitura da nova legislação que vai alterar o Código Civil, que é suposto articular-se com a nova legislação sobre supressão de formalidades que, sob a liderança do anterior Ministro da Justiça, foi introduzida, suprimindo entraves, criando condições para o comércio electrónico e para os cidadãos usarem, cada vez mais, a Internet para estabelecerem todo o tipo de relações jurídicas. Essa articulação era essencial e está, neste momento, com destino incerto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Srs. Deputados, se se somar a isso o erro crucial de não usar esta ocasião para criar confiança mas, pelo contrário, desperdiçá-la, gerando um factor de desconfiança no ciberespaço e maculando-o com uma solução erradíssima o processo de legiferação, tal é profundamente lamentável e justifica plenamente o voto contra do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o PCP também preferiria, até porque acha que se trata de uma matéria importante, que estas propostas de alteração tivessem ido para debate na especialidade em Comissão, para se poder ainda corrigir a proposta de lei, dado que não corrigem o vício que já ontem, no debate na generalidade, nós apontámos no diploma do Governo.
Na verdade, a proposta de lei confere poderes jurisdicionais a uma entidade administrativa, o que viola manifestamente a Constituição da República.
Esta Directiva mereceria melhor sorte, porque a proposta nem se conforma com a Constituição nem com a Directiva. É certo que já passou o prazo para a sua transposição, mas passou há muito, passou, salvo erro, há mais de um ano! E mais oito dias menos oito dias não ia alterar a questão. Podia alterar no sentido positivo, isto é, podiam introduzir-se alterações que pusessem a proposta de lei de acordo com o texto constitucional e com a Directiva.
Assim, como já ontem salientei na intervenção que fiz durante o debate, em vez de a lei ir fomentar o recurso ao comércio electrónico, criará, por parte dos utilizadores, uma grande desconfiança e afastá-los-á do recurso ao comércio electrónico - e não foi isto o que se quis com a Directiva.
Iremos, pois, em votação final global, manter o nosso voto contra, como já indicámos durante a votação na generalidade, porque sabíamos que as propostas não iam alterar substancialmente o diploma.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Capitão.

O Sr. Gonçalo Capitão (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a oposição queria ainda mais debate. E o Sr. Deputado José Magalhães vem aqui falar-nos em corrigir, emendar, etc. O Sr. Deputado José Magalhães, obviamente, sabe muitíssimo sobre estas matérias, mas não pode querer corporizar a versão portuguesa do antigo Vice-Presidente dos Estados Unidos Al Gore, que por vezes se apresentava em público como se fosse o pai da Internet! Repare que pode haver outras visões tão legítimas como a

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sua, mas falar em oito dias quando já estamos em incumprimento e quando o Governo também precisa do seu próprio tempo é algo que contraria aquilo a que este Governo se propôs, que é cumprir o mais escrupulosamente possível as suas obrigações para com a União Europeia, porque é também o nome de Portugal que está em jogo.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Já conseguiu dois incumprimentos: a guerra e a recessão!

O Orador: - O problema da atribuição de competências residuais e da possibilidade de essa entidade de índole administrativa vir a resolver conflitos de interesses e conflitos de direitos, onde não haja uma entidade que supervisione o sector, não nos parece tão endemonizável como os senhores estão a apontar. Tal como disse durante o debate, os direitos que podem estar no outro lado podem ser tão dignos como aqueles que estão em jogo.
O Sr. Deputado há-de explicar-me como é que, mesmo com uma providência judicial, consegue, em 48 horas, dirimir um litígio que pode expor ou bloquear, perante milhares de pessoas, assuntos da mais grave importância, quando, por outro lado, quer deixar em aberto, durante algum tempo, zonas que não estão cobertas por nenhuma entidade administrativa! Há-de explicar-me quanto tempo demora a pôr um processo num advogado, quanto tempo é que demora a entregar o processo, a ser distribuído, a ser decidido, e quais são as lesões que daí advêm, sendo que as soluções da entidade administrativa são, em todo o caso, sempre, sempre, recorríveis.
Diria também, para terminar, que a ANACOM pode receber benfeitorias orgânicas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
O que não pode é ser vista como uma espécie de Leviatan - tem credibilidade, tem experiência. Não queremos nenhuma ciber-polícia, mas também não queremos que a ciber-ocasião gere um ciber-ladrão. Com fair play lhe digo que se entramos no domínio dos "se" tudo é possível.

O Sr. José Magalhães (PS): - Até uma ciber-asneira!

O Orador: - Se estivermos errados, vamos ter de evoluir. E se as circunstâncias mudarem, obviamente mudaremos também. Agora, "se", "se", "se"… Tudo é possível, Sr. Deputado! Permita-me que, com humor e com consideração, lhe diga que "se" os meus avós fossem argentinos, eu hoje poderia ser o Batistuta, mas não sou!

Risos do PSD.

Portanto, Sr. Deputado, no domínio dos "se": e "se" transpuséssemos a Directiva?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, foram, de facto, ouvidas muitas opiniões, de várias entidades, todas elas muito estimáveis. Mas a verdade é que nós próprios temos direito a ter a nossa opinião, igualmente estimável. E como o Sr. Deputado José Magalhães não descurará, esta solução é defendida, entre outros, pelo Sr. Prof. Oliveira Ascensão que, que me conste, não é propriamente alguém que perceba pouco destas coisas do Direito! E devo confessar, com toda a franqueza, que, no limite, em caso de dúvida e mediante o confronto de opiniões divergentes, de um lado, a do Sr. Deputado José Magalhães e, do outro lado, a de Sr. Prof. Oliveira Ascensão, eu tendo a optar, até por razão de ofício, pelas do Sr. Prof. Oliveira Ascensão.
Também não deixa de ser igualmente verdade que o Governo, demonstrando uma grande abertura nestas matérias, não manteve uma posição estanque e, ouvidas todas as entidades que a 1.ª Comissão teve oportunidade de chamar, adequou aquilo que tinha sido uma solução inicial a muitas dúvidas suscitadas por forma a resolvê-las. E aquilo que também não foi dito pelo Sr. Deputado José Magalhães, como é evidente, até porque nesta fase do debate não lhe convém, é que, na generalidade, as audições realizadas pronunciaram-se pela excelência da solução governativa.

O Sr. Osvaldo Castro (PS): - O senhor não estava lá, não pode dizer isso!

O Orador: - Excepção a um ou outro ponto residual, desde logo no que toca às competências da ANACOM. Portanto, nessa matéria, teve o Governo ocasião de adequar a solução governativa às preocupações dessas entidades e à solução preconizada pelo Prof. Oliveira Ascensão, que, julgo, a todos beneficiará.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, beneficiando de cedência de tempo por parte de Os Verdes.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a irmos por este caminho, como iremos, o Governo levará daqui uma autorização legislativa que não define, em vários pontos fulcrais, o seu sentido preciso, porque ofende o artigo 165.º, n.º 2, da Constituição da República.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD) - Logo vi que era inconstitucional!

O Orador: - Mas, mais grave ainda do que isso, é que, na parte em que aponta para a criação de uma autoridade de supervisão com os poderes aqui aludidos, esse diploma suscita os problemas que já ficaram bem documentados nas actas desta reunião plenária.
Mas, mais ainda: o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo falta ao rigor e ao dever de verdade que tem quando afirma, contra factos, que as entidades que ouvimos na 1.ª Comissão se pronunciaram favoravelmente em relação a esta solução. É o contrário! Sr. Deputado, em relação à generalidade, o Partido Socialista votaria a favor se houvesse garantias de correcção na especialidade, que, infelizmente, não há. Em relação a esta solução, pelo contrário, desafio o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo a fazer prova - coisa que é impossível! - de que o que aconteceu não foi o que vou dizer a seguir: primeiro, a Unidade

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de Missão, Inovação e Conhecimento, da Presidência do Conselho de Ministros, teve a hombridade de nos dizer, através de Diogo Vasconcelos, que a ANACOM não deveria ser, em caso algum, uma espécie de regulador da sociedade da informação e que deve continuar a ser um mero regulador das telecomunicações.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - E julgo que isto é uma questão de senso comum! Só a falta de coordenação entre o Ministério da Justiça, a Presidência do Conselho de Ministros e o Ministério responsável pelas telecomunicações é que explica que uma solução destas alguma vez tivesse chegado à Assembleia da República, e não tivesse sido abortada in itinere. Fazem mal em seguir esse caminho!
Em segundo lugar, a Ordem dos Advogados alertou-nos também para estas questões, nos termos em que a Sr.ª Deputada Odete Santos há pouco acabou de invocar correctamente! A Comissão para a Protecção de Dados fez o mesmo! A DECO fez o mesmo!

O Sr. António Costa (PS): - Toda a gente!

O Orador: - E, Srs. Deputados, ouçam bem: agora, irão aprovar uma autorização, essa autorização tem o seu caminho nas instituições, terão de fazer consultas. Talvez no meio do estrondo da guerra não se ouça uma voz que agora se dedica à questão do ciber-polícia total no ciber-espaço…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente.
Mas eu vos garanto, nós vos garantimos: a questão não morre aqui, a questão acaba de começar aqui, e acaba de começar nos piores termos possíveis!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, pretende interpelar a Mesa para que efeito?

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, apenas para manifestar a V. Ex.ª - não costumo fazê-lo, nunca o fiz antes - a minha mágoa, porque V. Ex.ª há pouco tempo anunciou do rigor que iria usar na distribuição dos tempos e devo dizer, com toda a franqueza, que V. Ex.ª usa, com esta bancada, e comigo em particular, de um rigor que não usa com as outras.

Vozes do PS e do PCP: - Oh!

O Orador: - Srs. Deputados, desculpem mas estou no uso da palavra!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, peço silêncio para que o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo termine a sua intervenção.

O Orador: - E a necessidade que teve…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Que arrogante!

O Orador: - Sr. Deputado, acho extraordinário que o Sr. Deputado, que há pouco estava tão preocupado com juízos de censura, agora não me deixe falar!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, por favor dirija-se à Mesa. Foi para isso que lhe foi dada a palavra.

O Orador: - Sr. Presidente, a mim, ao fim de 2 minutos em ponto, que era o tempo de que dispunha, já V. Ex.ª se prontificava para me mandar calar, enquanto que o Sr. Deputado José Magalhães teve mais 1 minuto e 13…

Vozes do PS: - Oh!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Queixinhas!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, façam silêncio! Já é tão tarde!

O Orador: - Se for meu o erro, peço desculpa pelo facto. Mas, sinceramente, achei que devia transmitir a V. Ex.ª esta mágoa que senti porque tenho V. Ex.ª na maior consideração e estima e sei que V. Ex.ª quer ter uma gestão de tempo imparcial relativamente a todas as bancadas, à minha também. Perdoe-me se, de algum modo, fui excessivo, mas não quis sê-lo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, dado o adiantado da hora, a Mesa regista apenas a sua observação e não vai desenterrar o que está para trás. Adiante!

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, vamos então votar, na especialidade, a proposta de lei n.º 44/IX, no seu conjunto. A seguir, votaremos as três propostas de aditamento.
Srs. Deputados, está, pois, em votação, na especialidade, a proposta de lei n.º 44/IX - Autoriza o Governo a legislar sobre certos aspectos legais dos serviços da sociedade da informação, em especial do comércio electrónico, no mercado interno, transpondo para a ordem jurídica nacional a Directiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de Junho de 2000.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta de aditamento, apresentada pelo PSD e pelo CDS-PP, de um inciso no final do n.º 2 do artigo 3.º da proposta de lei n.º 44/IX.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

É a seguinte:

2 - (…), nem do recurso dos interessados aos meios judiciais existentes, em simultâneo com os meios administrativos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de aditamento, apresentada pelo PSD e pelo CDS-PP, de um n.º 3 ao artigo 3.º da mesma proposta de lei.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

É a seguinte:

3 - Pode ainda o Governo proceder à criação de mecanismo judiciais céleres de solução dos litígios emergentes da Sociedade de Informação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora votar a proposta de aditamento, também apresentada pelo PSD e pelo CDS-PP, de um inciso no final da alínea c) do n.º 2 do artigo 4.º da proposta de lei n.º 44/IX.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

É a seguinte:

c) (…), ou equiparada.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação final global da proposta de lei n.º 44/IX.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, temos agora de votar, na especialidade, o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, relativo à proposta de lei n.º 24/IX - Estabelece o regime de criação, o quadro de atribuições e competências das áreas metropolitanas e o funcionamento dos seus órgãos e ao projecto de lei n.º 110/IX - Altera a forma de constituição dos órgãos e reforça os poderes e meios de actuação das estruturas e funcionamento das Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto (PCP).
Sr. Deputado Lino de Carvalho, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, trata-se de uma interpelação à Mesa.
Penso que, em bom rigor, não se trata de um texto de substituição, porque os diplomas não foram retirados; foram votados na generalidade, foram votados na especialidade e esse é o texto final da Comissão, que resulta da votação na especialidade.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o que se passa é que esta matéria, pela sua natureza, não podia ser votada na especialidade na Comissão, tinha de ser votada em Plenário. É isso que me dizem os grandes regimentalistas aqui da Mesa!
Portanto, não havendo objecções, vamos votar, na especialidade, o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, relativo à proposta de lei n.º 24/IX - Estabelece o regime de criação, o quadro de atribuições e competências das áreas metropolitanas e o funcionamento dos seus órgãos e ao projecto de lei n.º 110/IX - Altera a forma de constituição dos órgãos e reforça os poderes e meios de actuação das estruturas e funcionamento das Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos, agora, proceder à votação final global do texto referido.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, é para anunciar que irei apresentar uma declaração de voto por escrito na Mesa.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.

O Sr. Daniel Rebelo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Daniel Rebelo (PSD): - Sr. Presidente, é também para anunciar que, nos próximos dias, será entregue na Mesa uma declaração de voto em nome dos Deputados do PSD eleitos pelo círculo eleitoral de Leiria.

O Sr. Presidente: - Tem 3 dias para o fazer, pelo que terá de apressar-se, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos passar à votação, na especialidade, do texto final, apresentado pela Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, relativo à proposta de lei n.º 37/IX - Estabelece o regime de criação, o quadro de atribuições e competências das comunidades intermunicipais de direito público e o funcionamento dos seus órgãos e ao projecto de lei n.º 204/IX - Regime de criação, atribuições, competências e funcionamento das comunidades intermunicipais (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Ascenso Simões (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Ascenso Simões (PS): - É para anunciar que irei entregar uma declaração de voto por escrito na Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.

Vamos, agora, proceder à votação final global do texto referido.

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

A Sr.ª Ana Paula Malojo (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Ana Paula Malojo (PSD): - Para fazer uma declaração de voto oral, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr.ª Deputada. Dispõe de 3 minutos.

A Sr.ª Ana Paula Malojo (PSD): - Sr. Presidente, os Deputados do Grupo Parlamentar do PSD votaram favoravelmente o texto final relativo à criação, quadro de atribuições e competências das áreas metropolitanas, bem como o relativo às comunidades intermunicipais de direito público, porque assumiram um contrato eleitoral e um Programa de Governo que estabeleceram como prioritárias a descentralização e a desconcentração da administração central para os órgãos autárquicos.
Para o PSD, estes dois diplomas são estruturantes para a concretização deste desiderato e para que seja cumprido o que, em sentido próprio, foi apelidado de revolução tranquila.
Estes diplomas são um estímulo fundamental para a associação e a cooperação intermunicipais de modo a consolidar os diversos interesses numa perspectiva de estabilidade, intervenção e participação dos municípios. Representam a confiança do Governo nos autarcas portugueses, na sua capacidade de voluntariamente se associarem, libertos de qualquer tutela de mérito.
Não é por acaso que estes diplomas tiveram o apoio da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Desde o início do processo legislativo foram ensaiados pelos partidos da oposição processos e procedimentos que tão-só visavam adiar e protelar a aprovação destes importantes diplomas.
Não pactuamos com estas atitudes! Há um tempo para dialogar, um tempo para ponderar, mas também um tempo para decidir. O tempo para decidir é este!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - A prova de que se torna imperiosa a aprovação destes diplomas é o movimento espontâneo de autarcas que, por todo o país, se reúnem para trabalhar nas melhores formas de organização supra e intermunicipal com vista a melhor resolver os problemas das populações. É a porta desta organização que é aberta com estes diplomas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Estamos a tentar ganhar o tempo que, lamentavelmente, foi perdido durante os últimos governos, do Partido Socialista,…

Protestos do PS.

… que prometia concretizar a descentralização e anunciava medidas descentralizadoras, mas evitava a sua efectiva prática. Veja-se, a título de exemplo, o que se passou com as transferências previstas na Lei n.º 59/99.
Cabe também, aqui, recordar que, neste Plenário, no passado dia 26 de Fevereiro, o Sr. Deputado Jorge Coelho anunciou, em nome do seu Grupo Parlamentar, 15 medidas legislativas de âmbito descentralizador; mas até hoje o Partido Socialista não formalizou nem apresentou uma que fosse daquelas medidas.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Também aqui fica espelhada a vocação descentralizadora do maior partido da oposição.
Por isso, o Grupo Parlamentar do PSD entende que as propostas de lei apresentadas pelo Governo, e que serviram de base a estes textos finais com aperfeiçoamento e contributo da Assembleia da República, incorporam inequivocamente uma nova forma de organização e funcionamento de uma estrutura intermédia do Estado democrático.
Hoje, o Grupo Parlamentar do PSD sente-se honrado e gratificado com a aprovação destes diplomas, que consagram princípios de descentralização e subsidiariedade, aprofundam relações de complementaridade e de solidariedade entre municípios, potenciando o aproveitamento de novas oportunidades que ultrapassam as fronteiras municipais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar do CDS-PP votou favoravelmente os textos de substituição relativos ao regime de criação, o quadro de atribuições e competências das áreas metropolitanas e comunidades intermunicipais de direito público e o funcionamento dos respectivos órgãos, na certeza de que, decorrendo do imperativo constitucional da descentralização, representam também um tributo à autonomia municipal.
Para nós, convictos defensores do municipalismo, numa constância de que nos orgulhamos, as autarquias e os autarcas são credores da nossa simpatia, confiança e reconhecimento. Mais do que isso, são depositários da nossa esperança, num acrescido e mais célere desenvolvimento de todo o território nacional de forma harmoniosa e solidária.
Estes diplomas são instrumentos que, seguramente, os municípios saberão utilizar em prol de um país mais moderno, próspero e com mais qualidade de vida para todos os portugueses.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Augusto Carvalho.

O Sr. José Augusto Carvalho(PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, dado o adiantado da hora, apresentarei rapidamente, e na essência, as razões que determinaram o voto contra do Grupo Parlamentar do Partido Socialista: pela ausência de qualquer lógica de organização territorial da Administração Pública, consubstanciando estes diplomas

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que acabam de ser aprovados um estímulo à desarticulação da administração territorializada…

Vozes do PS: - Exactamente!

O Orador: - … e pela ausência de qualquer competência da administração central conferida por lei, frustrando assim o que se encontra estatuído no artigo 253.º da Constituição da República. Nem uma, Srs. Deputados, para amostra, é transferida directamente da administração central por efeito da aprovação destas leis. Os textos finais não conferem, apenas prevêem, competências, previsão esta que obriga à intermediação, por via contratual, da Administração Pública, violando o princípio constitucional da autonomia do poder local.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Face a esta ausência de transferência directa de competências, não é igualmente estabelecido qualquer mecanismo de transferência de recursos.
Por outro lado, a descrição taxativa, logo limitativa, de competências municipais passíveis de exercer, quer pelas áreas metropolitanas, quer pelas comunidades intermunicipais, não releva de qualquer razão de interesse público, podendo até ser contrária aos legítimos interesses das comunidades abrangidas.
Ao serem estas entidades - todas elas - constituídas por escritura pública, particularmente no que respeita as áreas metropolitanas, retrocede-se na respectiva qualificação institucional em relação ao que está estatuído actualmente para as Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto.
Aliás, peço licença para retirar a expressão que aqui usei anteriormente de que estávamos perante um "processo de clonagem". Estamos, sim, perante um processo de desqualificação destes entes autárquicos metropolitanos, que são reduzidos a simples e lineares associações de municípios, independentemente das designações. São apenas as designações que distinguem estas três figuras.

Aplausos do PS.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, é para anunciar que irei entregar uma declaração de voto por escrito sobre a futura lei das comunidades intermunicipais.

O Sr. Presidente: - Fica registado, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 119/IX - Processo Penal - Audição parlamentar de avaliação (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 132/IX - Novos rumos de política criminal: responsabilidade penal das pessoas colectivas e mediação penal (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de vários relatórios e pareceres da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal de Trabalho de Lisboa, Processo n.º 193/2002, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado António Galamba (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Vara Mista e Juízos Criminais de Coimbra, 1.º Secção, Processo n.º 280/2001, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Massano Cardoso (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Processo n.º 605/01.2TBAVR, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Rui Gomes da Silva (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial de Águeda, Inquérito n.º 253/01.7JAAVR-304, a Comissão de Ética decidiu emitir o seguinte parecer em relação ao Sr. Deputado Cruz Silva (PSD): "a) Autorizar o Sr. Deputado a prestar declarações por escrito, na qualidade de arguido, no âmbito do citado processo de inquérito; b) Pronunciar-se desfavoravelmente relativamente à aplicação de medidas de coacção, à excepção de eventual aplicação do termo de identidade e residência, tendo em atenção a necessidade de garantir o livre exercício do mandato de Deputado, e os inerentes deveres, nos termos dos artigos 155.º e 159.º da Constituição da República Portuguesa".

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

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O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Socialista não pode deixar de se pronunciar sobre este processo, reconhecendo, embora, que não é uma situação fácil, porque ele tem a ver com a imprescindibilidade da clarificação para o futuro sobre o levantamento da imunidade parlamentar para efeitos de prestar depoimentos e quando é que ele se verifica.
Em concreto, esta Assembleia está constitucionalmente vinculada, sempre que haja alguma infracção cometida por algum Sr. Deputado, a que corresponda uma pena de prisão superior a três anos, a não poder deixar de autorizar que esse Sr. Deputado preste depoimentos nos respectivos autos, ainda que de inquérito, que é o caso. Trata-se de um dever vinculado para a Assembleia.
Tem sido entendimento da Comissão de Ética e, nesse sentido, também do Plenário, e também aceite pelos tribunais, que, em todos os casos de infracções a que não corresponda uma pena superior a três anos, essas declarações podem ser prestadas por escrito. Nesta Legislatura sempre assim aconteceu, com aceitação de todos os tribunais e, naturalmente, também deste Plenário, o que neste caso nos parece correcto, porque sempre que à infracção não corresponda uma pena superior a três anos, a faculdade de a Assembleia autorizar é total, isto é, pode autorizar ou não autorizar, e, portanto, ao autorizar, o Deputado pode depor por escrito.
Ora, neste caso isto não acontece, porque a infracção cometida é uma infracção de peculato, a que corresponde uma pena superior a três anos, e, portanto, do ponto de vista do Partido Socialista, o depoimento só pode ser feito pessoalmente e nunca por escrito.
Na forma como a proposta está apresentada há que distinguir, na primeira parte, o dever vinculado de a Assembleia autorizar o Deputado a depor e, na segunda parte, depor por escrito, que têm de ser votados autonomamente. O Partido Socialista, como é óbvio, vota favoravelmente a autorização para depor, mas votará contra em relação ao depoimento por escrito, por estas razões.
Outra questão completamente diferente, e que o tribunal também suscitou, é a eventual aplicação de medidas de coacção ao Deputado em causa. Na forma como a proposta está apresentada, legitima-se que, neste caso, haja a medida de coacção termo de identidade e residência. Sucede que, do nosso ponto de vista, o exercício da actividade de Deputado é totalmente livre e a Constituição salvaguarda esse aspecto, portanto, na nossa perspectiva, é relativamente exagerado informar o tribunal de que esta medida de coacção pode ser aplicada e nenhuma outra.
Nós somos muito menos restritivos e apresentámos uma proposta - que não teve vencimento na Comissão e que, portanto, não veio a este Plenário para ser votada -, no sentido de, face à compatibilidade dos órgãos de soberania (Assembleia e tribunal), chamarmos, de alguma maneira, a atenção das únicas restrições em relação às medidas de coacção que existem, que é a da prisão preventiva, podendo, naturalmente, o tribunal pronunciar-se como bem entender relativamente a todas as outras.
Esta é uma questão central e, como é a primeira vez que vem a este Plenário nesta Legislatura, o comportamento do Partido Socialista não pode deixar de ser este, cabendo-me a mim a sua justificação.

O Sr. José Magalhães(PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero dizer, em primeiro lugar, que a versão original do parecer que foi posto à discussão consagrava esta separação das duas questões, por um lado, o levantamento da imunidade do Sr. Deputado para que possa ser ouvido na qualidade de arguido e, por outro, a questão de ele ser ouvido por escrito. Depois, na versão final, que foi, efectivamente, aprovada e enviada para a Mesa da Assembleia, acabaram por ficar as duas questões na mesma alínea.
Ora, nós consideramos, tal como o Partido Socialista aqui propôs, que é vantajoso que se possa exprimir um sentido de voto diferenciado em relação às duas questões. Portanto, propomos que se vote em separado o levantamento da imunidade para depor na qualidade de arguido - e neste caso, evidentemente, votaremos a favor, como não pode deixar de ser, pois a Assembleia está vinculada a isso - e que esse depoimento possa ser por escrito - e neste caso votaremos contra porque, como já aqui foi dito, se trata de um tipo criminal cuja pena de prisão pode ser superior a três anos. Entendemos que nesta matéria, estando a Assembleia vinculada a levantar a imunidade, não tem a prerrogativa, como nos casos em que não existe essa vinculação, de modular a forma de depoimento, admitindo que seja por escrito. Portanto, entendemos que, neste caso, a Assembleia não deve reduzir o depoimento ao depoimento por escrito e não deve pronunciar-se nesse sentido.
Em relação à questão das medidas de coacção, há, evidentemente, medidas de coacção que não são compatíveis com o exercício do mandato de Deputado, que se mantém e que está em vigor - não há qualquer imposição de suspensão do mandato, que poderá existir noutra fase e que está tipificada no Estatuto dos Deputados -, mas não vemos razão para se concluir pela impossibilidade de aplicação das medidas de coacção em geral, porque nos parece que, em relação ao leque das medidas de coacção existentes, algumas há que são, de determinada forma, compatíveis com o exercício do mandato de Deputado, pelo que não nos devemos pronunciar sobre essa matéria de forma tão taxativa e deve o tribunal, considerando, evidentemente, o exercício do mandato de Deputado, ter a capacidade de aplicá-las.
Discordamos, portanto, desta actual alínea b) e propomos também que sejam separadas as duas questões na alínea a), sendo certo que votaremos a favor do levantamento da imunidade a este Sr. Deputado para prestar depoimento como arguido.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Marinho.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste relatório quero chamar a atenção para dois pormenores.

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Estamos aqui, de facto, apenas perante uma questão nova e não perante duas, como quiseram referir os Srs. Deputados Bernardino Soares e Vítor Ramalho, que acabaram de exprimir aqui a posição que, efectivamente, foi assumida por estas duas forças partidárias na Comissão de Ética, mas que contraria toda a doutrina e toda a jurisprudência assumida ao longo de diversos anos na Comissão de Ética, e até, Sr. Presidente, antes da sua existência nesta Assembleia.
A 1.ª Comissão, anteriormente à existência da Comissão de Ética no Parlamento, sempre se pronunciou, sempre, não havendo uma única excepção, um único caso diferente que não esta posição aqui expressa agora por estas duas forças partidárias no sentido de que, efectivamente, os Srs. Deputados constituídos arguidos, levantada que seja a imunidade parlamentar, não podem depor por escrito. Gostava que me apresentassem um único caso.
Os Srs. Deputados do Partido Socialista e do Partido Comunista dizem algo que eu gostava que concretizassem em termos normativos. É óbvio que teremos sempre de aceitar a sua interpretação e a sua posição, mas não existe qualquer normativo concreto ou qualquer norma legal expressa nesse sentido. E porquê? De facto, a distinção que existe na lei, que está prevista na Constituição e no Estatuto dos Deputados, refere-se expressamente à obrigatoriedade ou não por parte da Assembleia da República de levantar a imunidade. Nada se refere, nem na Constituição, nem no Estatuto dos Deputados, relativamente a se num caso ou no outro o Sr. Deputado pode depor por escrito ou não.
Quem regula esta matéria, como os Srs. Deputados bem sabem, não é a Constituição nem o Estatuto dos Deputados, é o Código do Processo Civil e o Código de Processo Penal. É a aplicação conjugada destes diplomas legais que permite, no caso concreto, que a Assembleia da República tenha vindo, ao longo de vários anos, por interpretação subsidiária e analógica, a permitir que os seus Deputados, numa situação exactamente igual à que estamos aqui a analisar, possam, efectivamente, depor ou não por escrito.
Portanto, não compreendemos e nem aceitamos ou, melhor, se quiser, até compreendemos o problema que, efectivamente, por vezes motiva que uma bancada como a do Partido Socialista ou a do PCP venha agora alterar aquela que tem sido a sua posição de sempre e sempre assumida unanimemente na Comissão e neste Plenário e a tomar uma posição completamente diferente daquela que é o historial do Parlamento.
Sr. Presidente, permita-me que, muito rapidamente e para concluir, porque efectivamente, essa sim, é uma questão nova, me pronuncie sobre a questão da aplicação das medidas de coação, que vem suscitada, pela primeira vez, num requerimento apresentado por um Sr. Magistrado à Assembleia da República.
A nossa posição é muito clara: é óbvio que estamos aqui perante dois poderes soberanos, perante dois órgãos de soberania distintos, por um lado, o Parlamente e, por outro, os tribunais. Nós não podemos, de forma nenhuma, condicionar aquela que é uma decisão soberana e autónoma dos tribunais, mas podemos, isso sim, expressar aquela que é a nossa posição relativamente à aplicabilidade ou não aos Deputados das medidas de coação. Foi isso que fizemos e é isso que está expresso no parecer que temos hoje aqui para votar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tal como o Sr. Deputado Eugénio Marinho já referiu - e bem! - o que está aqui em causa é a possibilidade de um Sr. Deputado que esteja, ou venha a ser, constituído como arguido no processo crime poder depor por escrito perante o tribunal. É uma aplicação analógica do regime processual civil que está em causa, no caso concreto, e de que a Comissão de Ética, ao longo dos anos, se tem valido para permitir que Deputados de todas as bancadas tenham, nestas circunstâncias, prestado depoimento por escrito.
Sucede que aquilo que, hoje, o Partido Socialista aqui pretendeu fazer valer - e já antes, na Comissão de Ética, de alguma forma - é uma tese verdadeiramente peregrina, mas que não tem sustentação legal, porque aquilo que a lei diz, com toda a clareza, é que assiste a possibilidade de depor por escrito, mas em nenhum momento a lei refere que essa possibilidade só assiste a quem for acusado de crime punível com prisão até três anos ou a quem for punido com pena de prisão superior a três anos. A lei não faz esta distinção e o Partido Socialista, por razões que - devo dizê-lo e salvo o devido respeito - me pareceram eminentemente políticas, numa Comissão que não o é, ou não o deve ser, quis tratar distintamente o Deputado, que, nesta Câmara deve ter tratamento igual a todos os demais.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Muito bem!

Protestos do PS.

O Orador: - Ora, se todos os Deputados, ao longo da história deste Parlamento, e neste quadro legal, beneficiaram, sempre, da possibilidade de depor por escrito, quando isso foi deliberado em sede de Comissão de Ética, aquilo que, hoje, o Partido Socialista pretende é atribuir a um Sr. Deputado, em concreto, menos do que aquilo que já permitiu,…

Protestos do PS.

… com o voto nomeadamente destas bancadas, a Deputados do Partido Socialista. E isto não me parece justo. No limite, a votação do Partido Socialista tem, até, o seu quê de caricato, porque aquilo que constava do parecer inicial apresentado pelo Sr. Deputado relator era: a) levantamento da imunidade para constituição como arguido; b) a possibilidade de depor por escrito; c) a questão das medidas de coação.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Partido Socialista sugeriu que alíneas a) e b) fossem juntas. Portanto, aquilo que deveria ter sido votado em separado, por proposta do Partido Socialista, passou a ser analisado em conjunto. Por conseguinte, quando se passou à votação na Comissão de Ética, por proposta do Partido Socialista, teve de se votar numa única alínea a questão primeira do levantamento da imunidade e a questão segunda da possibilidade de depor por escrito, com este resultado extraordinário: é que o Partido

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Socialista com esta votação, para além do mais, no limite, viola a lei,…

Protestos do PS.

… porque votou contra o levantamento de uma imunidade que é imperativa. Se bem virmos, o Partido Socialista ao votar contra, votou contra o levantamento da imunidade parlamentar que permite a constituição como arguido deste Deputado em concreto.

Protestos do PS.

Isso é uma coisa extraordinária! É porque aquilo que a lei diz - isso, sim, e di-lo com todas as letras - é que, quando se trata de crime punível com pena de prisão superior a três anos, o levantamento é obrigatório.

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Claro!

O Orador: - Mas, tratando-se deste crime, que é punível com pena de prisão superior a três anos, o Partido Socialista votou contra.

Protestos do Deputado do PS Vítor Ramalho.

Portanto, em rigor, se todos tivéssemos votado como o fez o Partido Socialista, não tinha havido levantamento da imunidade e, de acordo com o Parlamento, este Sr. Deputado não poderia ser sujeito a julgamento, violando - isso sim -, a lei. Portanto, não tem razão o Partido Socialista.

Protestos do PS.

Mas hoje, é bom de ver também, com alguma curiosidade, que o Sr. Deputado Bernardino Soares desautoriza o Sr. Deputado Bruno Dias, que votou na 1.ª Comissão favoravelmente a esta alínea, porque a alínea era clara,…

Protestos do Deputado do PS Vicente Jorge Silva.

… a alínea estava redigida para efeitos de levantamento da imunidade e de prestação de depoimento por escrito. E o Partido Comunista, na 1.ª Comissão, perante todos esses Deputados, votou a favor…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - … e votou a favor aquilo que a alínea não distinguia. Portanto, assim sendo, naturalmente que nós vamos fazer valer aqui um argumento que é legal e que já fizemos valer na Comissão. Nós, aqui, nesta Comissão, valemo-nos de argumentos que são legais e não de argumentos políticos. E, aí de nós!, se permitirmos que o político entre nestas decisões.
Hoje, é um Deputado do PSD que está em causa,…

Protestos do PS.

… mas amanhã pode ser um Deputado do Partido Socialista ou de outro partido qualquer. E aqui o que nós procuramos representar é a Assembleia da República com todos os seus Deputados presentes!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra Sr. Deputado António Costa. Peço-lhe para ser breve, por razões óbvias.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, eu ia utilizar a mesma figura regimental do protesto, porque considero ofensivo para a minha bancada considerar-se que temos uma posição, nesta matéria, motivada por razões políticas e não por razões estritamente jurídicas.
E, muito brevemente, só para explicar ao Sr. Presidente e à Câmara que a versão que o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo aqui expressou não tem a menor correspondência com a realidade.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Tem, tem!

O Orador: - Quanto às asneiras em matéria de facto, nada mais vou dizer, só vou pronunciar-me sobre a questão jurídica.
O que está aqui em causa não é saber se um Deputado tem ou não tem a possibilidade de depor por esta ou aquela forma…

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Tem, tem!

O Orador: - Não é quanto à possibilidade, pois essa é uma possibilidade que têm todos os Deputados de qualquer partido e em qualquer circunstância e é uma possibilidade que é aferida na sua própria postura processual no processo e perante o tribunal. Portanto, não é essa a questão.

Protestos do Deputado do PSD Eugénio Marinho.

A questão que se nos coloca aqui é diversa: é a questão de saber se a Assembleia da República pode, nestes casos concretos - e perante a nova redacção dos textos constitucionais e legais que não existiam aquando de outras decisões em situações idênticas -, condicionar a autorização a uma determinada forma de depoimento. A questão não é a de saber "se um Deputado pode"; a questão é a de saber se a Assembleia pode dizer que só autoriza para que deponha em determinadas condições.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - É evidente!

O Orador: - Ora, é claríssimo do nosso ponto de vista que, neste caso - e isto todos entendemos -, a Assembleia está vinculada a conceder autorização. A questão aqui é a de saber se a Assembleia pode restringir essa autorização a uma determinada forma de depoimento. O entendimento que o Partido Socialista teve, na Comissão, e que merece o acordo da direcção da bancada do Partido Socialista - para este caso e para todos os outros que sejam idênticos, como é evidente -, é que a Assembleia não pode condicionar a autorização a uma determinada forma de depoimento. O que não prejudica que o Deputado, querendo, requeira que seja ouvido sob essa forma, e que o tribunal, querendo, lhe conceda a faculdade de depor por essa forma.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O que entendemos é que não tendo a Assembleia o poder de conceder, ou não, autorização também não tem o poder de condicionar a forma como esse depoimento se processe.

Protestos do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

É única e exclusivamente esta a questão, é este o nosso entendimento quanto a uma questão estritamente jurídica, e considero ofensivo qualquer juízo de natureza política em torno desta matéria.

O Sr. Eugénio Marinho (PSD): - Mas não é!

O Orador: - Podemos estar errados quanto à interpretação da lei; pode estar a maioria certa quanto à interpretação da lei; pode estar também a maioria errada e nós certos, mas será única e exclusivamente por razões jurídicas que determinamos o nosso sentido de voto e mais nenhuma outra.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Costa formulou a sua intervenção como sendo um protesto, o que dá direito, portanto, a um contraprotesto.
Assim, para formular um contraprotesto tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo. Dispõe do tempo regimental de 2 minutos.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, não precisarei de tanto.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Tenha serenidade, Sr. Deputado!

O Orador: - Sr. Deputado António Costa, folgo por saber que não existe qualquer motivação política, por parte do Partido Socialista. Fica-lhe bem, a si, fica bem ao Partido Socialista, principalmente - e ainda bem.
Agora, compreenda o Sr. Deputado que, face àquilo que lhe referi, é de argumentar também dessa maneira, ou de ter, pelo menos, essa motivação como razão de ser do Partido Socialista. E porquê? É porque se a lei não distingue, por que quer o PS, com a votação, distinguir? Se a lei não distingue, em momento algum…

Vozes do PS: - Distingue, distingue!

O Orador: - … e não distingue, Sr. Deputado!
Se a lei não diz, em momento algum, que só pode depor por escrito quem seja acusado de crime punível com pena de prisão até três anos , se a lei não o diz por que quer o Partido Socialista fazê-lo?
Mais, ainda, Sr. Deputado: se o Partido Socialista teve a possibilidade de votar separadamente a questão do levantamento da imunidade e, depois, a questão da prestação de depoimento por escrito, ficando, aí, completamente esclarecida a questão…

Vozes do PS: - Isso não é verdade!

O Orador: - Ou seja, o Partido Socialista poderia ter dito: sim, senhor, nós votamos favoravelmente o levantamento da imunidade, mas, não senhor, não aceitamos que o Deputado deponha por escrito, por que razão requereram a junção, numa única alínea, destas duas questões que poderiam ter sido separadas e que o relator proponente apresentou para discussão separadamente,…

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Olhe a nossa declaração de voto!

O Orador: - … e, com isso, inviabilizaram a apreciação desta forma?!
No limite, Sr. Deputado, concorde ou não comigo, ao votarem dessa forma votaram no sentido de não permitir o levantamento da imunidade! Porque esse é o resultado prático e imediato da votação do Partido Socialista. O Partido Socialista, ao votar como votou, votou contra o levantamento da imunidade parlamentar do Deputado em causa!
Em bom rigor, o que é que o Deputado do Partido Socialista diz? Diz: nós não queremos que esse Sr. Deputado preste depoimento no tribunal.

Protestos do PS.

Não é isto o que estas bancadas dizem: o que estas bancadas dizem é que este Deputado, nos termos daquilo que foi solicitado pelo tribunal, deve prestar depoimento, mas deve prestar depoimento tal como prestaram todos os outros Deputados, em tempos idos.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Costa, não tenho forma de lhe dar a palavra!

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, é só para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Ao contrário do que o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo acaba de dizer, o Sr. Deputado Vítor Ramalho, na sua intervenção, disse precisamente que desejávamos que fosse votada separadamente…

Protestos do CDS-PP.

… a autorização para depor e a forma de depoimento!

O Sr. Presidente: - Eu registei. Tomei nota desse argumento.
Mas dá a impressão de que o PS, agora, pretende que as votações sejam separadas. Pelos vistos, na Comissão é que se precipitou, ao juntar as duas.

Vozes do PSD: - Exactamente!

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Peço desculpa, Sr. Presidente, mas basta ver a nossa declaração de voto para se sentir que não é verdade o que está a dizer…

Protestos do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Há uma declaração de voto de que eu não tinha tomado conhecimento.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Peço a palavra, para formular um protesto.

O Sr. Presidente: - A propósito de quê, Sr. Deputado?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - A propósito das declarações do Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo tem de crescer e amadurecer!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, protesto, em primeiro lugar, porque os únicos que levantaram aqui o problema da argumentação política foram os Srs. Deputados da maioria, se me é permitido dizer.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo nunca mais amadurece!

O Orador: - Portanto, não se pode argumentar a bondade de uma solução, ou de outra, com o argumento de que, se concordarmos com ela, ela é boa; se não concordarmos com ela, são "motivações políticas"...
A interpretação de cada um, o que estamos aqui a tentar fazer da melhor forma, é a interpretação que, seriamente, entendemos ser aquela a aplicar-se neste caso, com as consequências que isto também tem para o futuro.
Depois, para reafirmar que do que se trata aqui é de uma autorização a que estamos vinculados e que, portanto, estando vinculados a ela, por maioria de razão não podemos condicioná-la a determinada forma. É isto o que está em causa, aqui!
Finalmente, para dizer, Sr. Presidente, que, evidentemente, porque sabemos que a Assembleia está vinculada a dar esta autorização, e apesar de discordarmos com o depoimento por escrito, votámos a favor na Comissão, como faremos aqui, se não houver separação das duas coisas, apresentando uma declaração de voto na Comissão, como o faremos aqui, se não houver separação das duas coisas,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exacto!

O Orador: - … votaremos a favor do levantamento da imunidade! Porque reconhecemos, e sabemos, que essa é a questão fundamental daquela alínea - apesar de não concordarmos com a forma do depoimento,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

Protestos do Deputado do PSD Eugénio Marinho.

O Orador: - … a que o parecer quer limitar o depoimento deste Sr. Deputado, na qualidade de arguido.
Portanto, não há aqui confusão nenhuma, nem qualquer contradição! O Sr. Deputado é que se antecipou em conclusões que manifestamente não tinham qualquer correspondência com a verdade!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Perdeu uma boa ocasião!

O Sr. Presidente: - Julgo que esta questão está mais do que suficientemente esclarecida. Portanto, pergunto se entendem haver necessidade de mais alguma intervenção.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente!

Vozes do PS: - Finalmente!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Finalmente!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, mas também lhe pedia para ser breve.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, serei muito breve.
Quero apenas referir que esta matéria do Regimento e mandados esteve durante muito tempo na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, em época a que presidi a essa Comissão, e onde, aliás, fixei o critério de serem Deputados do mesmo grupo parlamentar a relatarem os processos dos respectivos grupos e assim reciprocamente.
Mas reconheço que estamos a tratar de uma matéria de extrema delicadeza e que deve ser, obviamente, tratada de uma forma que esteja acima de qualquer questão partidária, acima da questão de o Deputado em causa ser do partido ou grupo parlamentar a, b ou c.
Ora, a primeira questão é esta: independentemente e ainda sem conhecermos a configuração indiciária deste caso concreto, o Grupo Parlamentar do PSD tomou a posição pública de que seria levantada a imunidade…

Protestos da Deputada de Os Verdes Isabel Castro.

… ao Deputado em questão para prestar declarações e ser constituído arguido.
Portanto, não é o carácter imperativo que determina esse levantamento, porque esse estava assumido.
Com uma determinada alteração constitucional e ao Estatuto, distinguir-se-á uma situação - e este será o caso - em que é imperativo o levantamento. Agora, essa é uma questão e a questão da forma de prestar as declarações é outra, e esta, no nosso entender, não é minimamente posta em causa, relativamente à prática que tem sido seguida. E já na vigência da Constituição, nesta versão, já na vigência do Estatuto dos Deputados, nesta versão, em casos semelhantes, foi autorizado pela Comissão de Ética, porventura antes da presidência do Sr. Deputado Jorge Lacão, o depoimento por escrito, a prestação de declarações por escrito, em casos inteiramente semelhantes.
O que me preocupa, a mim e ao Grupo Parlamentar do PSD - e que fique bem claro! - é o problema do precedente em relação a todo e qualquer Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Muito bem!

O Orador: - E fica aqui muito claro que, relativamente a todo e qualquer Deputado, a posição do Grupo Parlamentar do PSD será exactamente a que tomou agora, porque

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foi a que tomou no passado, em relação a Deputados dos outros grupos parlamentares em situação semelhante. E não haverá qualquer alteração em circunstância alguma.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Questão nova, que é pela primeira vez, tanto quanto sei, posta à Comissão de Ética, é a da aplicação das medidas de coação. E, relativamente a essa situação, havia que alertar o tribunal para a circunstância de não ser, face ao Estatuto dos Deputados e à Constituição, admissível a aplicação de medidas de coação incompatíveis com o livre exercício do mandato de Deputado. E esta é também uma posição, que, sendo nova, será sempre a posição do Grupo Parlamentar do PSD,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … seja qual for o Deputado que estiver em causa, independentemente de ser da bancada do PSD ou de outra qualquer.
Eram estes os esclarecimentos e era esta a posição que eu queria deixar aqui muito clara, e fazer um apelo no sentido de que estas questões sejam olhadas do ponto de vista do cuidado que se tem de ter relativamente à criação de precedentes e correntes de interpretação neste particular.
E já há um aspecto em que a Assembleia irá ficar mal: é que vai contradizer prática anterior, aliás, não vai, porque a votação da maioria vai impedi-lo, mas, se fôssemos atrás da posição dos outros grupos parlamentares, iríamos contradizer posições anteriores unânimes da Assembleia nesta matéria. É este o cuidado, é esta a delicadeza da questão.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Presidente da Comissão de Ética, Deputado Jorge Lacão, também se inscreveu para usar da palavra, de modo a marcar a sua posição.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, enquanto Presidente da Comissão de Ética, gostaria de começar por sublinhar o quanto considero positivo que o Parlamento tenha parado para reflectir sobre uma deliberação que vai tomar e que, naturalmente, é da maior sensibilidade não só para a melhor interpretação possível do Estatuto dos Deputados mas igualmente para a boa articulação de competências entre órgãos de soberania, em particular e no caso concreto, a Assembleia da República e os tribunais.
Assim, o que pretendo dizer vai tão-só no sentido de concorrer para a compreensão jurídico-constitucional do que está em causa.
Como os Srs. Deputados sabem, a revisão constitucional de 1997 alterou um parâmetro relativamente ao regime da autorização de Deputado a depor em fase de inquérito. Dizia-se, na norma constitucional, antes da revisão, que, quando a moldura penal do crime fosse superior a três anos, a decisão seria automaticamente tomada pelo tribunal; passou a resultar, com a alteração da norma constitucional, que essa decisão, como agora se verifica, passaria a ser da competência da Assembleia da República, todavia, seria uma competência vinculada, quando se verificassem os requisitos constitucionalmente prescritos.
Nesta circunstância, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a questão melindrosa que se pode colocar é a de, em algum momento e para algum efeito, a Assembleia da República tomar uma deliberação que não seja suficientemente conforme à Constituição ou à lei, de que resulte uma posição de conflito institucional entre uma deliberação da Assembleia e uma interpretação de lei por parte do tribunal. É este aspecto que, enquanto Presidente da Comissão de Ética, sobretudo, me preocupa e creio que a todos preocupará, no sentido de evitar qualquer decisão que, eventualmente, por menos conformidade, possa vir a resultar num melindre de conflito institucional quanto ao exercício de competências.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas qual conflito institucional?!

O Orador: - Nesse sentido, a questão que estava colocada, e que se coloca, quanto aos dois problemas, no meu entendimento, é a seguinte: saber se, em face da norma constitucional, que passou a atribuir a competência à Assembleia, ainda que vinculada, é possível que a Assembleia, tal como pode fazer nos casos em que tem a faculdade integral de autorizar e não autorizar, modele, de forma restritiva, os termos da autorização. Naturalmente, sem querer pronunciar-me no sentido do "sim" ou do "não", é exactamente esta questão dilemática que a Assembleia da República tem de decidir quanto ao primeiro problema.
Quanto ao segundo problema, o das medidas de coacção, é sabido que, por efeito da Constituição, do Estatuto dos Deputados e de jurisprudência constitucional fixada, algumas medidas de coacção não são susceptíveis de ser aplicadas a titulares de órgãos políticos com natureza representativa. Coisa diversa, eventualmente, é a Assembleia da República, para além disso, tomar posição sobre as opções de mérito que um juiz competente no processo deva tomar em relação a medidas de coacção. Esta é a outra questão dilemática sobre a qual a Assembleia da República deve pronunciar-se.
O que sugiro é que possamos pronunciar-nos, deliberando, sem anátemas de parte a parte, porque o enquadramento e a reflexão jurídica foram aprofundadamente debatidos em sede de Comissão de Ética.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, parece-me que as questões estão suficientemente esclarecidas, pelo que vamos votar o parecer, nas suas respectivas alíneas, cuja votação será feita em separado.
Registo, ainda, que há um pedido no sentido de que a alínea a) seja votada em duas partes: em primeiro lugar, a parte que diz respeito a "Autorizar o Sr. Deputado a prestar declarações (…), na qualidade de arguido, no âmbito do citado processo de inquérito;"; em segundo lugar, a parte relativa à prestação dessas declarações "(…) por escrito, (…)".
Creio que, assim, podemos clarificar as nossas posições.
Vamos, então, votar a primeira parte da alínea a), conforme acabei de enunciar.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos, agora, votar a segunda parte da alínea a), ou seja, a prestação das declarações por escrito.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

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Finalmente, vamos proceder à votação da alínea b), que é do seguinte teor: "Pronunciar-se desfavoravelmente relativamente à aplicação de medidas de coacção, à excepção de eventual aplicação do termo de identidade e residência, tendo em atenção a necessidade de garantir o livre exercício do mandato de Deputado, e os inerentes deveres, nos termos dos artigos 155.º e 159.º da Constituição da República Portuguesa.".

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e votos contra do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, chegámos ao fim do período regimental de votações.
Foi comunicado à Mesa haver um consenso entre as várias bancadas para terminarmos agora os nossos trabalhos, que, de resto, foram verdadeiramente esgotantes e versando assuntos de extrema gravidade. Isto significa, portanto, que os assuntos que constavam da ordem do dia serão agendados posteriormente e fica salvaguardado que a apreciação parlamentar n.º 46/IX, a qual era para ser debatida hoje, mantém a sua actualidade e será apreciada numa outra altura.
Antes de encerrar a sessão, informo que a próxima reunião plenária realizar-se-á amanhã, às 10 horas, e compreenderá um período de antes da ordem do dia, destinado a eventuais declarações políticas e ao tratamento de assuntos de interesse político relevante, e um período da ordem dia, onde serão apreciadas as petições n.os 6/IX (1.ª) - Apresentada por Maria Eugénia Quintela e outros, solicitando que a Assembleia da República desenvolva esforços, junto do Governo, no sentido do restabelecimento do Instituto de Inovação Educacional, requerendo informação sobre a justificação da extinção do referido Instituto, bem como sobre a política subjacente e suas implicações para os agentes educativos, 13/IX (1.ª) - Apresentada pela Comissão Nacional dos Expedicionários a Timor, solicitando que os ex-expedicionários a Timor, no período antes do 25 de Abril de 1974, sejam abrangidos no âmbito de aplicação da Lei n.º 9/2002, de 11 de Fevereiro e 14/IX (1.ª) - Apresentada pela Confederação Sindical Independente do Luxemburgo, solicitando que o âmbito de aplicação da Lei n.º 9/2002, de 11 de Fevereiro, seja alargado, por forma a abranger no seu âmbito de aplicação todos os ex-militares, bem como os emigrantes portugueses.
Srs. Deputados, nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 10 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, sobre o texto final da Lei que "estabelece o regime de criação, o quadro de atribuições e competências das áreas metropolitanas e o funcionamento dos seus órgãos", que resultou da proposta de lei n.º 24/IX

Os Deputados do Grupo Parlamentar do PSD, eleitos pelo círculo eleitoral do Distrito de Leiria, votaram favoravelmente, na especialidade e votação final global, os textos finais de substituição da proposta de lei n.º 24/IX e do projecto de lei n.º 110/IX, que estabelece o regime de criação, o quadro de atribuições e competências das áreas metropolitanas e o funcionamento dos seus órgãos, por considerarem que esta iniciativa legislativa corporiza os pressupostos constitucionais da descentralização e da subsidiariedade, através do desenvolvimento e a expansão das áreas metropolitanas a todo o território nacional.
Sublinham a acção do Governo neste domínio da descentralização, na medida em que concretizou uma reforma essencial, há muito adiada, e que consagra em definitivo a possibilidade de criação de novas áreas metropolitanas nas realidades urbanas emergentes como nova via de racionalizar e planear o desenvolvimento sustentado das regiões e a oportunidade para potenciar a resolução de problemas que ultrapassam claramente as fronteiras municipais, promovendo um aproveitamento de relações de complementaridade e de solidariedade entre os municípios.
Consideram que com esta nova realidade, que são as grandes áreas metropolitanas e as comunidades urbanas, e no âmbito das suas atribuições específicas, será possível dar corpo a uma melhor articulação de interesses supramunicipais tão vastos como a definição dos investimentos públicos, a coordenação de actuações entre os municípios e os serviços da administração central, o planeamento e as gestões estratégica, económica e social, bem como a gestão territorial na área dos municípios integrantes.
Fazem notar também que a presente iniciativa legal constitui um estímulo fundamental para a associação e cooperação intermunicipais, tendo como ponto de partida as experiências positivas das actuais associações de municípios e promovendo o desenvolvimento de novos projectos de dimensão regional, com significativos ganhos de eficiência e materializando uma distribuição de riqueza mais equitativa entre os municípios, na plena consagração do princípio da subsidiariedade e em claro benefício dos cidadãos.
Consideram em particular que o princípio consagrado neste diploma legal, onde se inscreve a necessidade de adaptação às novas realidades urbanas emergentes, com possível reforço da rede das cidades médias, corresponde à realidade actual do distrito de Leiria e reforça a convicção dos subscritores da oportunidade de criação de novas áreas metropolitanas no território nacional que, com as competências previstas, serão um instrumento capaz de impulsionar os desenvolvimentos social, económico e cultural.
Recordam ainda que os mesmos pressupostos estiveram na base da apresentação, na anterior legislatura, do projecto de lei n.º 328/VIII (PSD), que preconizava a criação da Área Metropolitana de Leiria, subscrita pelos então Deputados na Assembleia da República do PSD eleitos pelo círculo eleitoral do distrito de Leiria e que mereceu a unanimidade do Grupo Parlamentar do PSD, bem como o apoio do líder do PSD, Dr. José Manuel Durão Barroso.
Reiteram por último, a firme convicção que este processo, aprovado agora em definitivo pela Assembleia da República, não só concretiza a descentralização, como inicia um novo ciclo de oportunidades na afirmação das regiões, num quadro de reforço dos poderes das autarquias locais, porque o Governo honra o seu compromisso de complementaridade do papel dos municípios na gestão estratégica do desenvolvimento sustentado ao nível regional, e que corresponde àquilo que o Sr. Primeiro-Ministro tem designado de "reforma tranquila". E nesta reforma os 16 concelhos do distrito de Leiria estarão na linha da frente, bem como, de forma tranquila e sem pressões, os seus municípios saberão determinar se querem ou não uma grande

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área metropolitana, se querem ou não uma comunidade urbana.

Os Deputados do PSD, José António Silva - Graça Proença de Carvalho - João Carlos Barreiras Duarte - Maria Ofélia Moleiro - Paulo Batista Santos - Daniel Rebelo.

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Os Deputados do Grupo Parlamentar do PSD votaram favoravelmente o texto final relativo à criação, quadro de atribuições e competências das Áreas Metropolitanas, bem como, o relativo às comunidades intermunicipais de Direito Público porque assumiram um contrato eleitoral e um programa de Governo que estabeleceram como prioritárias a descentralização e a desconcentração da Administração Central para os Órgãos Autárquicos.
Para o PSD estes dois diplomas são estruturantes para a concretização deste desiderato e para que seja cumprido o que, em sentido próprio, foi apelidado de "revolução tranquila".
Estes diplomas são um estímulo fundamental para a associação e a cooperação intermunicipais, de modo a consolidar os diversos interesses numa perspectiva de estabilidade, intervenção e participação dos municípios.
Representam a confiança do Governo nos autarcas portugueses, na sua capacidade de voluntariamente se associarem, libertos de qualquer tutela de mérito.
Não foi por acaso que estes diplomas tiveram o apoio da Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Desde o início do processo legislativo foram ensaiados pelos partidos da oposição processos e procedimentos que tão-só visavam adiar e protelar a aprovação destes importantes diplomas.
Não pactuamos com estas atitudes… Há um tempo para dialogar, um tempo para ponderar mas também um tempo para decidir.
O tempo para decidir é este!
A prova de que se torna imperiosa a aprovação destes diplomas é o movimento espontâneo de autarcas que, por todo o País, se reúnem para trabalhar nas melhores formas de organização supra e intermunicipal com vista a melhor resolver os problemas das populações.
É a porta desta organização que é aberta com estes diplomas.
Estamos a tentar ganhar o tempo que, lamentavelmente, foi perdido durante os últimos governos do Partido Socialista que prometia concretizar a descentralização, anunciava e enunciava medidas descentralizadoras mas evitava a sua efectiva prática.
Veja-se, a título de exemplo, o que se passou com as transferências previstas na Lei n.º 159/99.
E cabe também aqui recordar que neste Plenário, no passado dia 26 de Fevereiro, o Sr. Deputado Jorge Coelho anunciou, em nome do seu Grupo Parlamentar, 15 medidas legislativas de âmbito descentralizador mas que, até hoje, o Partido Socialista não formalizou nem apresentou uma que fosse daquelas medidas. Também aqui fica espelhada a "vocação descentralizadora" do maior partido da oposição…
Por isso, o Grupo Parlamentar do PSD entende que as propostas de lei apresentadas pelo Governo e que serviram de base a estes textos finais, com o aperfeiçoamento e o contributo da Assembleia da República incorporam, inequivocamente, uma nova forma de organização e funcionamento de uma estrutura intermédia do Estado democrático.
Hoje o Grupo Parlamentar do PSD sente-se honrado e gratificado com a aprovação destes diplomas que consagram princípios de descentralização e subsidiariedade, aprofundam relações de complementaridade e de solidariedade entre municípios, potenciando o aproveitamento de novas oportunidades que ultrapassam as fronteiras municipais.

Os Deputados do PSD, Ana Paula Malojo - Manuel Oliveira - Maria Ofélia Moleiro - Diogo Luz - Fernando Lopes - Paulo Batista Santos - Pina Marques - João Carlos Barreiras Duarte - Graça Proença de Carvalho - Massano Cardoso - Jorge Pereira - Maria Eulália Teixeira.

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O Grupo Parlamentar do PCP votou contra o texto final pelas seguintes razões:
1 - A nova lei faz tábua rosa de quase 12 anos de experiências de gestão nas actuais Áreas Metropolitanas (de Lisboa e do Porto).
A prática de 11 anos mostrava à evidência que as áreas metropolitanas nunca tiveram (nem poderiam ter tido) um funcionamento supramunicipal, autónomo das Câmaras que as integram.
A experiência destes 11 anos mostrava à evidência que (sem prejuízo desta ou daquela realização concreta que deva justamente ser-lhes creditada), as Áreas Metropolitanas (de Lisboa e Porto) assentaram o seu funcionamento em presidentes de Câmara que, na maioria esmagadora das situações, se remeteram à defesa (natural e, aliás, bem compreensível) dos interesses individuais dos municípios que representam ou à lógica da "guerrilha" estéril resultante do choque entre personalidades e protagonismos.
Em 1991, aquando da aprovação da Lei n.º 44/91 que hoje foi revogada, o PCP propusera, logo aí, que os órgãos metropolitanos fossem constituídos com base na legitimação feita pelo voto directo dos eleitores metropolitanos.
Na altura ficámos isolados e a solução adoptada assentou num modelo híbrido que impediu que às novas instituições metropolitanas fosse conferida plena legitimação democrática.
A prática e a experiência de quase 12 anos fez, porém, juntar muitas vozes àquela que é, desde sempre, a posição do PCP. Por isso, há hoje muitos contributos e reflexões escritas, formais, do PS e do PSD, que passaram a reconhecer a necessidade de conferir legitimação electiva directa aos órgãos metropolitanos. Por isso, autarcas eminentes e com larga experiência na gestão das Áreas Metropolitanas, como o já falecido Professor Vieira de Carvalho, escreveram, de forma reiterada, que a evolução da estrutura dos órgãos das Áreas Metropolitanas tinha necessariamente que passar a resultar de eleição directa.
No mesmo sentido vão também reflexões do próprio Presidente da República, que ainda há cerca de dois anos reconheceu que as questões metropolitanas não poderiam ter resposta adequada se não (passasse) a existir "uma legitimação democrática do Governo da rede no que respeita às funções que lhe forem atribuídas" (…).
Infelizmente, o Governo e a maioria parlamentar que o sustenta não aceitaram estas perspectivas, contrariando aquelas opiniões e posições avisadas.

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2 - A maioria parlamentar aprovou uma lei que cria dois tipos de áreas metropolitanas: as Grandes Áreas Metropolitanas (GAM) e as Comunidades Urbanas (CU). Os critérios para a sua constituição/criação não têm por base a existência objectiva de uma realidade física, demográfica, social, económica, cultural e tradicional que imponha, por si só, a necessidade de criação de novas áreas metropolitanas.
Os critérios definidos pela maioria e impostos em lei têm mera natureza administrativa (número mínimo de habitantes, número mínimo de concelhos) que parecem adequar-se mais a certas aspirações pontuais do que à contribuição para a resolução dos problemas em verdadeiras áreas metropolitanas. Para além disso, há o facto incontornável de ficar esta lei associada à possibilidade de criar graus diferentes de áreas metropolitanas (presumivelmente com níveis diferenciados de dignificação ou, pelo menos, de relevância política).
3 - Como se disse, o PSD e o CDS conservam uma posição totalmente imobilista, voltando a impor um quadro para a constituição dos órgãos das Áreas Metropolitanas assente em actos de mero associativismo municipal, fórmula que, recorde-se, não tem minimamente em atenção a experiência adquirida.
Para além disso, a maioria PSD/CDS-PP vai ainda mais longe e desqualifica as actuais Áreas Metropolitanas (de Lisboa e Porto), remetendo a sua instituição para a figura da escritura pública. Torna-se, por isso, bem evidente o objectivo de promover a desqualificação política das actuais áreas metropolitanas.
4 - Ao contrário do enorme caudal de propaganda associada à aprovação desta lei, caudal esse iniciado logo com a apresentação do Programa do Governo, continuado depois com a organização do já "tristemente célebre" Conselho de Ministros de Tomar, de Julho de 2002, não há de facto transferência universal de novas competências para as Áreas Metropolitanas.
Não se assiste sequer à concretização da Lei n.º 159/99, que há quatro anos estatuiu a transferência de competências da administração central.
O que a maioria PSD/CDS-PP faz com esta lei, ao nível da transferência das competências, é estabelecer como regra a figura da contratualização. As transferências não são, assim, feitas de forma universal, processadas por lei, antes seguem a negociação caso a caso.
Ora, o tratamento caso a caso coloca sempre a questão de se saber quem serão os beneficiados com essa contratualização e quem serão as que vão ficar "à porta". A nova lei prevê também, no fundamental, que seja através dessa contratualização casuística que se processe a transferência dos meios financeiros para fazer face às novas competências "contratadas". É fácil imaginar o que se pode esperar da transparência (ou falta dela) em todo este processo…
5 - Ao optar, de forma, aliás, significativa e bem reveladora do "verdadeiro" espírito descentralizador desta maioria parlamentar, pela figura da "transferência de competências por medida e por conveniência", a lei hoje aprovada aponta, ao invés, para a usurpação de alguns dos poderes que hoje pertencem aos municípios.
Essa "extorsão" é bem assumida e, como tal, reveladora das intenções centralistas da maioria PSD/CDS-PP. A maioria justifica (!?) a opção com pretensas razões de eficiência (não demonstradas) e com a disponibilidade prévia dos municípios para a outorga de competências que hoje lhes pertencem. Mas a verdade é que a maioria enuncia bem quais são as competências municipais que quer retirar à esfera municipal e inscreve-as extensivamente na lei: são aquelas e não outras que, conjunturalmente, este ou aquele conjunto de municípios pudesse decidir transferir.
Quanto à "disponibilidade", é fácil imaginar a pressão que se pode gerar sobre este ou aquele município que queira continuar a exercer em plenitude as suas actuais competências…
Para além disto, a lei hoje aprovada estabelece que, uma vez concretizado o quadro que determina a "expropriação" de competências que hoje são dos municípios, essa transferência é, essencialmente, irreversível, dificilmente os municípios voltarão a recuperá-las.
Para quem, como os partidos da actual maioria, diz defender o municipalismo, não bate certamente a "bota com a perdigota".
6 - Uma nota final para dar a conhecer a posição da maioria PSD/CDS-PP perante o projecto de lei n.º 110/IX, do PCP, que visava "alterar a forma de constituição dos órgãos e reforçar os poderes e meios de actuação das estruturas e funcionamento das Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto".
Nem uma só ideia, nem uma só proposta deste projecto do PCP foi aceite pela maioria parlamentar no âmbito da discussão na especialidade.
A maioria absoluta da direita limitou-se a fazer eco das soluções governamentais, completamente fechadas no que respeita à discussão de conteúdos.

Os Deputados do PCP, Honório Novo - Rodeia Machado - Luísa Mesquita.

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Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas à aprovação do texto final da lei que "estabelece o regime de criação, o quadro de atribuições e competências das comunidades intermunicipais de direito público e o funcionamento dos seus órgãos", que resultou da proposta de lei n.º 37/IX

1 - O XV Governo Constitucional apresentou, no seu programa, o desenvolvimento de um conjunto de iniciativas legislativas que visavam promover uma "descentralização tranquila" de atribuições, competências e funções para os municípios portugueses.
Ao mesmo tempo se declarava que essas transferências seriam acompanhadas de um conjunto de novas estruturas organizacionais que permitiriam melhorar o relacionamento supra-municipal e encontrar fóruns de debate e de contratualização que tivessem como objectivo a resolução de inúmeros problemas que não têm decifração ao nível da pequena escala municipal.
Foi nesse sentido que o Governo desenvolveu e materializou a consideração legal das Autoridades Metropolitanas de Transportes, que passarão a existir nas grandes regiões de Lisboa e Porto; que apresentou na Assembleia da República iniciativas que visavam uma nova consideração das Áreas Metropolitanas e a possibilidade de criação de áreas metropolitanas de segunda ordem, designadas por Comunidades Urbanas; e ainda as novas comunidades intermunicipais.
2 - O número de iniciativas legislativas e a sua esperada importância política poderão levar os mais incautos a pensar que se tratou de uma autêntica revolução nos instrumentos

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de relacionamento entre municípios. Pura ilusão. Estas iniciativas, associadas à criação de entidades de dupla tutela política como são as novas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional e à alteração da constituição da NUT II - Lisboa e Vale do Tejo - que se viu desmembrada passando alguns dos concelhos anteriormente integrantes a incluir a NUT Alentejo e outros a NUT Centro - vão criar um país a várias velocidades, vão desestruturar as relações institucionais e vão conceber novos problemas ao nível do desenvolvimento de políticas públicas.
3 - As Grandes Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto não viram qualquer inovação substancial nas atribuições e competências, nem na estrutura dirigente, nem na forma de legitimação dos órgãos e das decisões políticas. Estas entidades, nascidas do preceito constitucional plasmado no artigo 236.º da CRP, são a mera continuação das existentes há mais de uma década, com um retrocesso evidente que entronca na "natividade" das mesmas áreas metropolitanas. Enquanto que na Lei n.º 44/91, de 2 de Agosto, as referidas áreas metropolitanas viam o seu território determinado por lei, garantindo a unidade e coesão, o que agora se permite é a existência de área de geometria variável, podendo existir desde que cumpram, na sua crase, um número mínimo de 9 municípios e de 350 mil habitantes, todos os espécimes de Grandes Áreas Metropolitanas (GAM).
Se atentarmos no último recenseamento da população é fácil verificar que os alentejanos terão condições de, observando os critérios, constituir uma GAM e que os municípios da identificada, historicamente, província de Trás-os-Montes e Alto Douro cabem, por completo, nos preceitos "inventados" pelo Governo e que a maioria parlamentar fez confirmar no Parlamento. Nada de mais anacrónico. Critérios de natureza económica, de mobilidade, de relações "intra-área", de estruturação social, encontram-se menosprezados na verificação dos juízos necessários à existência de uma GAM.
4 - E se ao nível das GAM as questões relevantes que identificamos demonstram a falência do modelo proposto, não poderemos deixar de nos "agitar" pela nova consideração das Comunidades Urbanas (CU). Estas diferentes entidades são, simultaneamente, as GAM dos pequeninos, entidades metropolitanas de segunda ordem, que garantindo os defeitos de fabrico das primeiras se afunilam nos, também estreitos, critérios de constituição. Assim, para se criar uma CU deverá observar-se o conjunto "enorme" de critérios (dois) - três municípios contíguos e 150 mil habitantes. Teremos portanto a possibilidade de verificar que um conjunto de edis, desprovidos de senso, se pode lançar na manobra, pessoalmente relevante, de criação de uma COMURB com a integração de concelhos onde o espaço rural é consideravelmente superior ao urbano, em que os problemas dos cidadãos estão ainda ao nível das infra-estruturas básicas de 1.ª geração e das necessidades educacionais, culturais e de lazer de mínima exigência e onde se não apresentam, ainda, os sinais de qualquer maleita típica dos espaços urbanos.
5 - Depois de dividir os municípios em GAM, municípios de primeira, em COMURB, municípios de segunda, vem o Governo, com uma iniciativa legislativa, que pretende integrar os "restos" - As comunidades intermunicipais. Estas resultam do lifting introduzido na designação anterior das associações de municípios de Direito Público. Nem uma atribuição a mais, mas competências e recursos a menos. Se antes se previa a consideração de uma transferência do Orçamento do Estado para as associações de municípios esta consideração desaparece agora, deixando as novas comunidades intermunicipais na total dependência dos municípios e dos seus objectivos particulares.
6 - Perante uma tal falta de ponderação teria sido importante que o Parlamento observasse outras propostas e outras "promessas". Ao nível das Áreas Metropolitanas o debate quedou-se pela discussão alternativa de uma iniciativa do PCP e na discussão sobre as comunidades intermunicipais a uma alternativa virtuosa do PS. O projecto do PS, por ser melhor do que o Governo, não mereceu qualquer atenção ou crédito por parte dos partidos da maioria. Uma espécie de "branca momentânea" impediu os Deputados do PSD e do PP na Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente de olharem, com olhos de ver, a bondade das proposições que, com toda a paciência e zelo, os socialistas trouxeram ao debate.
7 - Durante este tempo (últimos meses) foi visível a impiedosa visão dos governantes locais que desataram ao encontro de alianças territoriais insustentáveis e de parcerias para a criação das suas GAM ou das suas COMURB. E foi ainda delirantemente constatado que os autarcas se posicionam numa atitude de pré-guerra com o Ministro da tutela uma vez que este diz não aceitar um país aos retalhos e os primeiros dizem não aceitar a intromissão do segundo nas suas próprias decisões sustentadas numa lei da República. Autêntica "rebaldaria" nascida de uma falta de tino e de ajuste nas linhas telefónicas entre o Ministro das Cidades, do Ordenamento do Território e Ambiente e o Presidente da Associação Nacional de municípios Portuguesas.
8 - O debate que agora se suspende, uma vez que o resultado que destas leis sairá obrigará ao regresso da discussão, não pode impedir que todos os que assentam a sua intervenção no resultado do voto popular se sintam desobrigados ao aprofundamento da discussão e ao encontro de novas e inovadoras propostas. Assim, humildemente me componho na senda dos que entendem que Portugal deveria observar um caminho consensual que tratasse as seguintes questões:
a) A Regionalização - importaria que os partidos da governação, PSD e PS, se entendessem na necessidade de se encontrar uma forma de organização territorial supra-municipal, legitimada pelos portugueses em voto secreto e universal que poderia seguir, ou não, a tipificação prevista na CRP;
b) Os distritos - importaria que os partidos referidos se pusessem de acordo no que se refere à extinção dos Governos Civis, estruturas e instituições que se afiguram abcessos na nossa estrutura organizativa do Estado Democrático;
c) A estruturação territorial até à criação da autarquia provincial (supra-municipal ou regional) com o seguinte perfil possível:
c-a) Uma nova consideração das actuais NUT II que possibilite a separação das Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto como novas NUT II mantendo-se a restante nomenclatura nos termos anteriores a 2002;
c-b) A determinação, em sede de Convenção Luso-Espanhola, das Comunidades Ibéricas, que possam reunir Entidades Regionais de Coordenação Portuguesas e Juntas Regionais Espanholas ou Comunidades de Desenvolvimento e Ordenamento lusas e Províncias Galegas, Castelhanas, Andaluzas ou da Estremadura,

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c-c) A plena determinação das Entidades Regionais de Coordenação, agentes substitutos das Comissões de Coordenação Regional, que reúnam os municípios das actuais CCDR, destes passem a depender e destes recebam a total legitimidade, deixando de estar dependentes do Governo;
c-d) A criação de Comunidades de Desenvolvimento e Ordenamento, coincidentes com as NUT III, que não sejam meras associações de municípios como as que actualmente existem;
c-e) A identificação, dentro das Comunidades de Ordenamento e Desenvolvimento de Centros de Gestão Urbana, que agrupem municípios com grandes aglomerados populacionais e com problemas típicos desses aglomerados;
c-f) A progressão das Áreas Metropolitanas para Entidades Metropolitanas de Gestão;
c-g) A determinação de uma estrutura institucional para as Entidades Regionais de Coordenação, para as Comunidades de Desenvolvimento e Ordenamento e para as Entidades Metropolitanas que permita a existência de Assembleias Deliberativas, com a participação maioritária dos municípios e a representação das sociedade civil, a existência de Conselhos de Administração, constituídos pelos Presidentes de Câmara e ainda de Comissões Executivas, constituídas por Gestores Profissionais, eleitos pelas Assembleias Deliberativas, às quais enunciavam um Contrato de Gestão.
A importância do retorno à discussão das questões que se prendem com a organização e gestão do território verificar-se-á, inevitavelmente, nesta Legislatura. O caminho feito até aqui é demasiado curto para que nos fiquemos pelo "apeadeiro" em o Governo quis colocar este debate.

O Deputado do PS, Ascenso Simões.

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O Grupo Parlamentar do PCP votou contra o texto final pelas seguintes razões:
1 - Tal como foi referido na declaração de voto da nova lei das "Áreas Metropolitanas", a lei que cria as comunidades intermunicipais (CI), aprovada apenas com os votos do PSD e do CDS, não integra um verdadeiro processo de descentralização cuja natureza essencial seria o de atribuir às novas estruturas atribuições, poderes, competências e meios financeiros hoje detidos pela Administração Central.
O que o Governo e a maioria parlamentar fazem é instituir o sistema de contratualização casuística, (sem qualquer natureza universal, sem qualquer garantia de transparência e equidade, porventura a reboque de lógicas de conveniência de génese política e/ou partidária), através do qual se transferem apenas certas competências e respectivos meios financeiros, negociados e estabelecidos caso a caso e sem qualquer regra geral.
No caso das comunidades intermunicipais, revela-se ainda melhor a "concepção descentralizadora" do PSD/CDS-PP que estabelece em lei um quadro gigantesco de competências para estas estruturas, mas que, ao mesmo tempo, confere uma base manifestamente anã de condições e meios de financiamento e de funcionamento.
2 - Seguindo as mesmas orientações da nova Lei das Áreas Metropolitanas, a maioria PSD/CDS-PP estabelece, também para as novas comunidades intermunicipais (CI), uma clara usurpação de poderes e competências municipais, definindo em lei um conjunto de competências que pretende transferir dos municípios para as novas estruturas e criando as condições para garantir a irreversibilidade dessas situações.
Não deixa de ser curiosa a concepção descentralizadora e municipalista do PSD e do CDS, assente no princípio de que a transferência de competências da administração central para as CI deverá abranger apenas o que essa administração decida fazer por contratualização, mas em que os municípios veriam transferidas para as CI todas as competências que em termos gerais a nova Lei lhes impõe.
3 - Acresce à forma sui generis com que a maioria PSD/CDS-PP encara a descentralização, o facto de o financiamento das CI decorrer das contribuições dos municípios mas nunca por nunca ser também feito por transferências do Orçamento do Estado.
4 - A nova lei visa também liquidar a liberdade associativa dos municípios e a possibilidade de serem estes a definir e contratar entre si o leque e o alcance de responsabilidades partilhadas e geridas em comum.
Com esta lei o Governo e a maioria parlamentar que o sustenta como que forçam as novas comunidades intermunicipais de fins gerais a assumirem-se como órgãos da administração territorial do Estado Central
5 - Tendo em conta o facto de a lei impedir o princípio de que os municípios integrem simultaneamente uma Comunidade Intermunicipal de fins gerais e uma qualquer Área Metropolitana (seja ela Grande Área Metropolitana ou Comunidade Urbana), sendo basicamente idêntico o quadro de atribuições genericamente conferidas para qualquer destas três novas estruturas, excluindo-se abertamente a hipótese de as comunidades intermunicipais de fins gerais poderem receber financiamentos do Orçamento do Estado, não se entende o que poderá fazer os municípios (quaisquer que eles sejam) optarem pela constituição dessas comunidades intermunicipais de fins gerais.
Não querendo fazer futurologia, a verdade é que é de admitir que nunca venham a ser criadas comunidades intermunicipais de fins gerais. Serão uma espécie de nados-mortos gerados pela superficialidade política da maioria PSD/CDS-PP e pela sua fobia a uma autêntica descentralização administrativa.

Os Deputados do PCP, Honório Novo - Rodeia Machado - Luísa Mesquita.

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Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
Arménio dos Santos
Henrique José Monteiro Chaves
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge José Varanda Pereira
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

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Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
António Ramos Preto
João Cardona Gomes Cravinho
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Vicente José Rosado Merendas

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Maria Elisa Rogado Contente Domingues

Partido Socialista (PS):
António Fernandes da Silva Braga
Jaime José Matos da Gama
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho
Eduardo Artur Neves Moreira

Partido Socialista (PS):
Carlos Manuel Luís
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Francisco José Pereira de Assis Miranda
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Sequeiros de Castro Pontes
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque

Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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4316 | I Série - Número 102 | 21 de Março de 2003

 

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