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Quinta-feira, 18 de Março de 2004 I Série - Número 64

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 17 DE MARÇO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Henrique Jorge Campos Cunha

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 120/IX, das propostas de resolução n.os 60 e 61/IX, do projecto de resolução n.º 234/IX, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Em declaração política, o Sr. Deputado Pedro Duarte (PSD) recordou a sublevação militar de 16 de Março de 1974 e as últimas eleições legislativas que deram lugar ao actual Governo, a quem louvou pelas reformas de fundo levadas a cabo, apesar da conjuntura interna e externa, com vista ao crescimento e convergência com a União Europeia. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Elisa Guimarães Ferreira (PS) e Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP).
Também em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes) lamentou o posicionamento do governo espanhol perante o ataque terrorista, em Madrid, e congratulou-se com o resultado das eleições espanholas, tendo ainda criticado o Governo português pelas promessas feitas durante a campanha eleitoral que não têm sido cumpridas.
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP) congratulou-se pela reacção do povo espanhol ao atentado terrorista ocorrido em 11 de Março e pelos resultados das eleições entretanto realizadas, tendo condenado o terrorismo e chamado a atenção para políticas securitárias que daí podem surgir, criticando ainda a política económica e social do Governo. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Telmo Correia (CDS-PP).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Luís Fazenda (BE) condenou todos os terrorismos e os governo mundiais que, em nome do combate ao terrorismo, fazem a guerra, tendo ainda lembrado a falta de medidas de combate a este fenómeno.
Finalmente, também em declaração política, o Sr. Deputado José Junqueiro (PS), além de pedir explicações ao Primeiro-Ministro sobre o encerramento da Bombardier, ex-Sorefame, teceu diversas críticas ao Governo, nomeadamente em relação à política económica, à concretização do comboio de alta velocidade, à construção do aeroporto da Ota e à situação na TAP. No final, respondeu a um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Marco António Costa (PSD).
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 84.º do Regimento, o Sr. Ministro da Administração Interna (Figueiredo Lopes) informou a Assembleia das recentes medidas tomadas pelo Governo de reforço da segurança nacional. Seguiu-se um debate, no qual intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro, os Srs. Deputados Luís Marques Guedes (PSD), António Costa (PS), António Filipe (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Francisco Louçã (BE), Telmo Correia (CDS-PP) e Carlos Carvalhas (PCP).
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Ética autorizando um Deputado do CDS-PP a depor, por escrito, como testemunha, em tribunal.

Ordem do dia. - Procedeu-se ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 114/IX - Cria as comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado das Florestas (João Alves Soares), os Srs. Deputados Manuela Cambra (CDS-PP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Miguel Paiva (CDS-PP), José

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Miguel Medeiros (PS), Vítor Reis e Maria Ofélia Moleiro (PSD), Honório Novo (PCP) e Luís Fazenda (BE).
Foi ainda apreciado, na generalidade, o projecto de lei n.º 417/IX - Oitava alteração à Lei n.º 29/87, de 30 de Junho - Estatuto dos Eleitos Locais (PSD e CDS-PP), sobre o qual se pronunciaram os Srs. Deputados Manuel Oliveira (PSD), José Augusto Carvalho (PS), Honório Novo (PCP) e Miguel Paiva (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 15 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Alberto Pedro Caetano
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos de Sousa Pinto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra

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José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos

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Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Santos de Magalhães
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte

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Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 120/IX - Aprova a Lei-Quadro dos Museus Portugueses, que baixou às 7.ª e 4.ª Comissões; propostas de resolução n.os 60/IX - Aprova, para ratificação, a Convenção entre a República Portuguesa e a República Eslovaca para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento, assinada em Bratislava, em 5 de Junho de 2001, que baixou à 2.ª Comissão, e 61/IX - Aprova, para ratificação, a Convenção

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entre a República Portuguesa e a República da Eslovénia para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento e o património e seu Protocolo Adicional, assinados em Liubliana, em 5 de Março de 2003, que baixou à 2.ª Comissão; e projecto de resolução n.º 234/IX - Redução da vulnerabilidade sísmica do edificado (PSD e CDS-PP).
Foram apresentados na Mesa diversos requerimentos.
No dia 9 e na reunião plenária de 10 de Março: aos Ministérios da Saúde, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Defesa Nacional, da Administração Interna, dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas e da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulados pelos Srs. Deputados Francisco Louçã, José Junqueiro, Bruno Dias, Luís Fazenda, António Filipe e Bernardino Soares; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro e aos Ministérios da Economia, da Ciência e do Ensino Superior e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário; ao Governo e aos Ministérios da Economia, da Segurança Social e do Trabalho e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelo Sr. Deputado Honório Novo; aos Ministérios da Saúde, da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, da Ciência e do Ensino Superior, da Justiça, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, da Educação, da Segurança Social e do Trabalho, das Finanças, da Administração Interna e à Secretaria de Estado do Ordenamento do Território, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; à Câmara Municipal de Coruche, formulado pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
O Governo respondeu, no dia 1 de Março, aos requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados José Miguel Medeiros e Victor Baptista.
Foram ainda respondidos, no dia 1 de Março, os requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados António Galamba, Luís Miranda, Diogo Feio, Herculano Gonçalves.
É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar os nossos trabalhos deste período de antes da ordem do dia, antes de mais, com as declarações políticas.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Precisamente há dois anos atrás, perante a debandada do governo socialista, o País foi chamado a votar.
Os portugueses, a 17 de Março de 2002, exerceram o seu direito inalienável, conquistado em Abril de 1974, de eleger os seus representantes, optando pelas propostas políticas preferidas e, assim, indirectamente escolhendo os seus governantes.
Esta é uma conquista que, por ser muitas vezes dada como adquirida, nem sempre é devidamente valorizada.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Para nós, no PSD, umas eleições democráticas merecem sempre ser assinaladas, independentemente dos resultados alcançados pelas diferentes forças políticas.
Aliás, gostaria de aproveitar esta oportunidade para lembrar, numa referência que me parece ser da mais elementar justiça, que ainda ontem - dia 16 de Março - se celebrou a passagem do 30º aniversário da sublevação do Regimento de Infantaria das Caldas da Rainha.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Bem lembrado!

O Orador: - Vale a pena aqui afirmar que este acontecimento, tão poucas vezes recordado, reforçou e impulsionou decisivamente o Movimento das Forças Armadas, ajudando a despertar a própria população portuguesa para a possibilidade de uma mudança tão desejada e que se veio a concretizar, felizmente, uns dias mais tarde, a 25 de Abril.
Contudo, gostaria hoje de assinalar aqui as eleições de há dois anos atrás, que representaram uma mudança de políticas e de orientação estratégica para o nosso país.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O resultado de 17 de Março de 2002 significou um sinal de esperança e uma janela de oportunidades para Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Há dois anos, o País acordou de uma ilusão!

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Durante seis anos de irresponsável governação socialista - onde, por sinal, pontificaram os seus actuais líderes -, o País gastou o que não tinha, desperdiçou irrecuperáveis oportunidades e perdeu tempo face ao futuro, hipotecando assim a melhoria efectiva da qualidade de vida dos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O cenário era particularmente difícil. Houve até quem, com propriedade, classificasse de "pântano" os momentos que se viviam. O Pântano: foi este o título, recorde-se, que o autor entendeu conceder à sua obra.
Com efeito, nestes dois anos de governação, assistimos à conjugação de um conjunto de factores externos particularmente delicados e inibidores de crescimento e desenvolvimento.
Desde logo, em Março de 2002, tornou-se fundamental o combate ao estado calamitoso das nossas contas públicas, assentes num contagiante despesismo cego, que assim reforçou uma cultura de consumismo desenfreado e consequente endividamento.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas também ao nível internacional estes foram dois anos de instabilidade no âmbito das relações internacionais, de indefinição no futuro institucional da União Europeia e em que uma forte crise económica, à escala mundial, abalou, em simultâneo, as grandes potências globais: os Estados Unidos, o Japão e a Europa.
Com efeito, este Governo herdou as consequências nefastas da desastrosa acção socialista e teve de enfrentar a complexa conjuntura internacional. No fundo - não tenhamos medo das palavras -, este Governo assumiu a responsabilidade de, num momento particularmente adverso, recuperar o País que, na verdade, caminhava para o abismo.
A gravidade da situação teve, contudo e paradoxalmente, o mérito de tornar inequívoca a necessidade de uma postura activa na busca de uma profunda mudança. E foi isso, felizmente, o que aconteceu.
Vivemos hoje, em Portugal, um tempo novo, com um Governo novo. Novo na atitude, na coragem, nos objectivos estratégicos e na consciência social assumida.
Na atitude, porque este Governo, perante as dificuldades herdadas e as adversidades surgidas, sempre optou por encarar a realidade, falando verdade aos portugueses, assumindo os inevitáveis sacrifícios, em prol do bem-estar dos portugueses, mesmo que, eventualmente, com prejuízos para a sua própria popularidade.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas este Governo tem igualmente como uma das suas marcas irrefutáveis a coragem.
Coragem para implementar reformas de fundo - estruturais - em sectores que a tradição considerava intocáveis e que os "velhos do Restelo" consideravam sagrados.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Deixo apenas alguns exemplos, paradigmáticos da referida coragem na acção governativa: a reforma das leis laborais, essencial para a produtividade e competitividade nacionais; as reformas na educação, perspectivando uma mais eficaz e integral formação para os nossos recursos humanos; as reformas nas políticas de saúde e do medicamento, tornando-os mais acessíveis para todos; a reforma da tributação do património, tantas vezes prometida mas tantas vezes também adiada no passado; a reforma da Administração Pública, qualificando e modernizando este sector; e a efectiva descentralização, partindo de "baixo para cima" e não sendo imposta às diferentes comunidades locais.
Por outro lado, este Governo marca igualmente a diferença pela clara assumpção de objectivos estratégicos para o País: em primeiro lugar, pondo as contas em dia, invertendo a perigosa tendência para o total descontrole das finanças públicas; em segundo lugar, promovendo a produtividade nacional, a competitividade das nossas empresas e o investimento público de qualidade; e, em terceiro lugar, não menos relevante, apostando em sectores estruturantes para o nosso futuro, como a ciência e a investigação.
Por último, gostaria de realçar uma outra característica não menos marcante do actual Governo: refiro-me à sua inegável consciência social.
O Governo deu e dá permanentes sinais desta prioridade. Por exemplo: incrementando os genéricos, baixando assim o preço dos medicamentos; reformando o nosso sistema de segurança social; implementando uma nova lei da adopção; combatendo o crime fiscal, lançando os programas de emprego e protecção

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social e de recuperação de áreas e sectores deprimidos; aumentando as pensões e reformulando o abono de família, promovendo o seu aumento e o 13º mês para as crianças e jovens mais carenciados.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aqui tentei evidenciar a atitude, a coragem, os objectivos estratégicos e a consciência social do Governo do nosso país e desta maioria que convictamente o apoia, estando consciente que somente foram enunciadas algumas das medidas que reflectem a singular veia inconformista e reformadora deste Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O País enfrenta um momento determinante. A realidade que nos envolve é delicada, como podemos facilmente aferir se olharmos para o imparável fenómeno de globalização económica e social, para o alargamento e aprofundamento da União Europeia, para a corajosa implementação de reformas estruturantes no País, para o relançamento da economia, para a aposta assumida no ensino e na investigação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - São desafios que impõem o melhor de todos nós.
Tal como foi assumido pelo Sr. Primeiro-Ministro desde a sua entrada em funções, esta legislatura poderá ser dividida, claramente, em duas fases: uma primeira, entre 2002 e 2004, para pôr as contas públicas em ordem e para lançar as reformas necessárias ao País, criando assim, condições para a retoma da economia;…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … e uma segunda fase, entre 2004 e 2006, para encetar um processo sustentado de crescimento e de convergência com a União Europeia. Isto é, depois de consertarmos, este é o tempo para construirmos. Também aqui se falou verdade desde o primeiro minuto, nada omitindo aos portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos no caminho certo para vencer os desafios do futuro. Estamos a preparar um melhor País, onde todos os portugueses possam viver com mais segurança e com mais justiça social e bem-estar. O País tem hoje um rumo.
Por isso, jamais cederemos a tentações eleitoralistas ou a oportunismos efémeros. Sempre estaremos ao lado do interesse nacional, a lutar por Portugal e pelos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao orador, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elisa Guimarães Ferreira.

A Sr.ª Elisa Guimarães Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, acabei de ouvir o que disse relativamente ao balanço dos dois anos de governação, e é um triste balanço.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - É um triste balanço, Sr. Deputado, porque se esqueceu de dizer que o Governo foi eleito com uma palavra de esperança, mas a partir do momento em que tomou posse essa esperança foi destruída, dia após dia, mês após mês, até nos encontrarmos, neste momento, com um País que não é mais do que um País desorientado, diria mesmo encalhado.

Vozes do PS: - É verdade!

A Oradora: - É um País que, neste momento, tem das maiores taxas de desemprego da Europa; é um País - o único - que está em divergência absoluta com o resto da Europa em termos de crescimento; é um País sem futuro. E a prova máxima de que é um País sem futuro - enquanto este Governo mantiver a falta de rumo que tem tido -, é que os senhores, passados dois anos, em vez de falarem do que fizeram e do futuro que têm previsto para Portugal, continuam a falar do passado, como se ainda estivessem em campanha eleitoral.

Vozes do PS: - Muito bem!

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A Oradora: - Sr. Deputado, os senhores ganharam as eleições há dois anos. Quando é que decidem falar do presente e do futuro e das vossas responsabilidades?

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Quais são as vossas metas para o futuro?
O Sr. Deputado continua a enunciar os mesmos projectos imaginários com que ganhou as eleições, mas já passaram dois anos!
Os senhores consideram, seriamente, que fizeram uma reforma na saúde? O senhor já viu o estado das listas de espera?

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - A senhora é que parece que ainda não viu!

A Oradora: - O senhor considera que saldou ou saneou as contas públicas? É que temos um défice real de 5% do PIB e, neste momento, os senhores preparam-se para vender património para conseguirem, no próximo ano, construir um défice que satisfaça Bruxelas!
Os senhores têm a noção de que, neste momento, temos meio milhão de desempregados, sem esperança de vida para a o futuro?
Sr. Deputado, ao comemorarem dois anos de governação, é altura de se apresentarem, corajosa e decentemente, perante os portugueses! Digam aos portugueses não o que vão fazer em termos teóricos, mas o que fizeram, o que concretizaram e como é que tencionam tirar o País do lamaçal em que o enterraram. Os senhores não podem continuar a esconder-se, falando do passado e atribuindo as culpas ao passado ou à conjuntura internacional.
Os senhores são Governo, governem! Os senhores são Governo, têm uma maioria absoluta, não se escondam atrás de ninguém. Digam aos portugueses o que fizeram, qual é o futuro que lhes reservam e como é que pretendem lá chegar! Porque anunciar retomas, e passaram este ano todo a anunciá-las, sem dizer porque é que vai haver retoma… Os senhores estão sentados à espera que o resto da economia mundial retome e nos arraste atrás dela.
"Caiam no real", sejam honestos e sérios e percebam que são Governo. Governem, Srs. Deputados!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte, para responder.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Elisa Guimarães Ferreira, cumprimento-a e agradeço a questão que me coloca.
Gostaria de lhe dizer que me parece que, por vezes, o Partido Socialista tem a tentação de confundir um bocadinho o estado da oposição com o estado do País, mas há uma grande diferença!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Nesse sentido, compreendo que diga que, quando olha para estes dois últimos anos, o balanço é triste. Percebo que diga que se sente desorientada. Agora, não tenha a tentação de falar pelos portugueses, dizendo que o País está desorientado e encalhado.
Confiamos nos portugueses - se calhar, é uma diferença que nos distingue. Acreditamos nos portugueses e sabemos que os portugueses olham para o Governo e vêem hoje um rumo para o País. Sabem que este Governo assumiu uma estratégia clara desde o primeiro minuto, não enganando os portugueses, dizendo-lhes sempre a verdade, designadamente que, quando vencemos as eleições e atingimos a responsabilidade de governar o País, a situação era particularmente delicada e difícil. Isto foi dito desde o primeiro minuto!
Nunca tivemos a tentação, ao contrário de outros no passado, de tentar camuflar a realidade, embelezá-la num pacote eventualmente cor-de-rosa mas que por dentro era particularmente negra e difícil para os portugueses.
É também uma diferença que nos distingue: nós falámos verdade no passado, falamos verdade hoje e continuaremos inevitavelmente a falar verdade no futuro.
Sr.ª Deputada, confesso que quando a vi pedir a palavra pensei que iria aproveitar esta oportunidade para justificar por que razão o governo do Partido Socialista - de que, aliás, a Sr.ª Deputada fez parte - não aproveitou as circunstâncias particularmente benéficas de expansão económica, verificadas nos anos

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de governação liderada pelo Eng.º António Guterres, para lançar as reformas necessárias, pôr as finanças públicas portuguesas em ordem, não as deixando derrapar como tristemente se verificou.
Infelizmente, tenho de chegar à conclusão que, de facto, o Partido Socialista não tem emenda. Não percebeu! Já tinha ficado com essa sensação quando verifiquei quem era o cabeça de lista que VV. Ex.as tinham escolhido para o Parlamento Europeu, mas hoje penso que isso ficou mais claro ainda.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Sr.ª Deputada, instâncias internacionais, credíveis e, penso, imparciais, reconhecidas por todos, como por exemplo a Comissão Europeia ou o Banco de Portugal, afirmam peremptoriamente que era inevitável que houvesse um momento de reajustamento da economia portuguesa depois do descalabro da governação socialista. Foi isso que foi assumido por nós, desde o primeiro minuto.
É um momento difícil, sabemo-lo. Estamos a lutar, pedindo sacrifícios aos portugueses, nomeadamente ao nível do desemprego. Mas é precisamente com este "trabalho de sapa", rigoroso, que tem vindo a ser implementado nestes dois anos que podemos hoje dizer que estão lançadas todas as condições para relançar a economia portuguesa, para melhorar o bem-estar dos portugueses e para, no fundo, podermos acreditar que o desenvolvimento e a qualidade de vida dos portugueses é um dado adquirido para todos.
Estamos orgulhosos do que estamos a fazer. Temos um rumo para o País e não vamos vacilar!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos ao orador, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, sou daqueles que pensa que não vale muito a pena estar aqui a falar do passado, a relembrar até à exaustão aquilo que foi a governação do Partido Socialista. De facto, a maioria está aqui para governar.
Há, de todo o modo, um aspecto que me parece que o próprio Partido Socialista ainda não compreendeu, que é este: a maioria, para governar, tem de pedir sacrifícios aos portugueses, e pediu muitos sacrifícios aos portugueses durante estes dois anos.
Porém, o que o Partido Socialista, porventura, não percebe é como é que alguém de bom-senso pode pedir sacrifícios aos portugueses e não lhes justificar esses mesmos sacrifícios que são pedidos.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É evidente que, se o Governo entra em funções, se a maioria se propõe implementar medidas que em si mesmas são de rigor e não propriamente uma imagem do que foi o desperdício desse outro tempo de governação, quem faz tal pedido tem de justificar os sacrifícios que estão à vista e que, hoje, apresentam resultados.
Há pouco, em conversa, recordei uma expressão do Eng.º António Guterres quando cessou funções. O Eng.º António Guterres explicou então aos portugueses que abandonava o Governo para evitar o "pântano". Foi, pois, uma expressão, não da maioria mas de um dirigente do Partido Socialista - o "pântano".
Ora, agora, passados dois anos, é bom olhar para este nosso esforço e reflectir sobre qual o "pântano" a que estaria a referir-se o Eng.º António Guterres. Ao défice? Ao estado das contas públicas? Ao estado da Administração e da justiça? Ou estaria a referir-se à própria incapacidade do Partido Socialista, então no governo, em lidar com todo este problema, com esta conjuntura desfavorável que ele próprio tinha criado?
Devo dizer que, passados estes dois anos, ainda não cheguei a uma conclusão. Ainda tenho dificuldade em saber se o "pântano" a que se referia o Eng.º António Guterres era a conjuntura desfavorável que a sua governação tinha criado ou se era a incapacidade do seu próprio governo, de que faziam parte alguns dos que hoje falam, em lidar com a situação.
Independentemente dessa questão, que é a que menos me importa, Sr. Deputado, deixo-lhe algumas questões.
Parece-me que, hoje, decorridos dois anos de governação - e este é um exemplo positivo que o País percebe -, a conjuntura desfavorável que herdámos começa a alterar-se. Hoje, o défice está controlado. Hoje, a generalidade dos indicadores, não só do INE mas também da União Europeia, começa a ser favorável ao exercício da governação. Hoje, as reformas fundamentais estão feitas, falta agora produzirem

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resultados. Há uma unidade da coligação em torno do Governo que é indiscutível. Hoje, o Governo dá sinais de apoio à economia, como, por exemplo, há pouco tempo, em Famalicão, através do Programa Dínamo, em que foram concedidos milhões de contos de apoios a empresas do sector têxtil e do calçado.
Portanto, Sr. Deputado, perante esta conjuntura, que me parece ser de mudança - e relembro que o mandato deste Governo é para quatro anos e não para dois, embora a oposição, irresponsavelmente, queira tirar conclusões ao fim de apenas dois anos -, perante estes novos sinais, pergunto-lhe como justifica a atitude da oposição. Pergunto-lhe se entende que é uma atitude responsável ou se, pelo contrário, a oposição deveria ter uma atitude mobilizadora de todos os portugueses com vista ao esforço que lhes é pedido.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, agradeço a sua questão e, de facto, tenho de corroborar as suas afirmações.
Desde logo, deixo claro que é óbvio que não gostamos nem desejamos falar do passado. Temos os pés bem assentes no presente e os olhos postos no futuro - para nós, isso é claro e inequívoco -, contudo, temos a preocupação de falar verdade aos portugueses.
Ora, para falar verdade aos portugueses, justificando o que é hoje a acção governativa e o que são os propósitos e os objectivos estratégicos para o País, é preciso fundamentarmo-nos na realidade que encontrámos quando chegámos ao poder, na situação em que estava o País há dois anos atrás, após a governação socialista. É por isso que nos referimos ao passado.
Na verdade, o que encontrámos quando vencemos as eleições há dois anos, a tal situação de "pântano", é bem claro para trazer à colação e à evidência a contradição em que hoje vive o Partido Socialista. É que saíram, fugiram à governação do País com o argumento de que o País estava a caminhar para um "pântano", mas, contraditoriamente, ainda não tiveram a humildade suficiente para reconhecer os próprios erros. Portanto, vêm hoje, aqui, defender exactamente as mesmas opiniões, os mesmos propósitos, as mesma ideias, nomeadamente quanto ao modelo económico e de desenvolvimento para Portugal, que defendiam enquanto estavam no governo.
Há, pois, uma contradição insanável e enquanto o Partido Socialista não conseguir ultrapassá-la, naturalmente não estará preparado para ganhar a confiança dos portugueses.
Uma outra questão que aqui trouxe e que gostaria de comentar prende-se com a conjuntura em que vivemos, hoje em dia já favorável. É que é importante que fique claro que, desde o primeiro o dia, foi assumido pelo Sr. Primeiro-Ministro que a presente legislatura teria a duração de quatro anos, já que não temos o hábito de fugir às nossas responsabilidades,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … e poderá ser dividida em dois momentos distintos.
Um primeiro momento de reajustamento, para tentarmos consertar o que foram os erros do passado, para tentar pôr as contas públicas em ordem, para criar as condições necessárias, nomeadamente através de reformas estruturais, para o relançamento da economia. Haverá um segundo momento, a iniciar precisamente em 2004, em que, agora, sim, vamos começar a crescer e os portugueses poderão começar a sentir, no dia-a-dia, a retoma da economia, a melhoria, infelizmente não no imediato, no que diz respeito ao emprego e a outros sectores fundamentais, do ponto de vista social, para a sua vida.
É com certeza neste segundo momento, na segunda fase desta legislatura, que vamos conseguir crescer economicamente, convergir com a União Europeia e, assim, tornarmo-nos um país mais desenvolvido.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A mentira foi sancionada em Espanha.
Um facto cujo significado e repercussões políticas estão para além-fronteiras, que demonstra a supremacia da democracia, a vontade inquebrantável de um povo de fazer, sem medo, uso da sua liberdade e dos seus mecanismos de participação democrática contra aqueles que, com recurso à violência e ao terror, a procuraram, em Madrid, brutalmente aniquilar.

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Dado revelador, também, da recusa dos cidadãos, em Espanha, em continuar a confiar num poder político que, sem escrúpulos, não hesitou em mentir, em utilizar para fins eleitorais um monstruoso ataque terrorista que provocou milhares de vítimas, para tecer uma maquinação sem paralelo, construída sobre a censura, sobre a ocultação, sobre a manipulação de todo em todo inaceitáveis.
Uma maquinação agora, como tinha sido no passado com a catástrofe ecológica do Prestige, para dissociar e diluir a responsabilidade do governo de Espanha, então numa maré negra, hoje no envolvimento directo e activo numa guerra que a esmagadora maioria da opinião pública espanhola tinha firmemente rejeitado.
Uma guerra ilegal, ilegítima, inútil, que, há um ano, foi decretada nas Lajes, em território nacional, e que - é hoje claro para todos - não tornou o mundo menos ameaçado, menos vulnerável, pelo contrário, acentuou o fosso entre povos e culturas, favoreceu o fundamentalismo e o desequilíbrio e a insegurança a nível planetário.
Srs. Deputados, estas são eleições que, ao eleger um novo governo, criam condições para um diálogo bilateral mais frutuoso em domínios que Os Verdes consideram essenciais, como o da segurança marítima, que pouco avançou em todo este tempo, o da questão do nuclear, que, em Espanha, é uma ameaça à nossa segurança, e, ainda, nos domínios do uso sustentável da água e da cooperação transfronteiriça em defesa dos recursos naturais.
Umas eleições que nos remetem inevitavelmente para uma reflexão, de que não pode ser dispensado o poder político, sobre as consequências da fuga à verdade e da quebra de confiança dos cidadãos em relação aos que, exercendo o poder, mentem.
Uma reflexão que, em nosso entendimento, é da maior oportunidade, no momento em que se assinalam dois anos de exercício de funções da maioria PSD/PP. Um Governo e uma maioria que, também ele em nome de uma mentira, afinal, quanto a provas que não existiam, envolve Portugal num conflito que, de modo acrescido, pode pôr em risco a nossa segurança.
Um Governo que, em nome de uma mentira - a melhoria das condições de vida dos cidadãos -, aumentou os impostos, ao invés de, como tinha prometido, reduzi-los.
Um Governo que, em nome de uma mentira - a de que a crise económica já está ultrapassada e a retoma está prestes a chegar -, continua sem adoptar medidas activas para a criação de emprego e assiste impávido à destruição do tecido social e ao drama de milhares de portugueses e de suas famílias.
Um Governo que, em nome de uma mentira - a de que a segurança alimentar já estaria assegurada depois do escândalo de há um ano -, continua a negligenciar aquela, mesmo em domínios tão delicados quanto a alimentação das crianças.
Um Governo que, em nome de uma mentira - a de que a União Europeia teria abandonado os compromissos de Quioto -, continua a negligenciar o combate às alterações climáticas, que é decisivo de ponto de vista da solidariedade entre gerações.
Um Governo que, em nome de uma mentira - a de que tudo faria para aumentar a segurança marítima e a prevenção da poluição, quando da catástrofe ecológica do Prestige -, continua a deixar os nossos mares e as nossas costas "ao Deus dará", com a vergonha de vermos o nosso país sancionado no plano internacional.
Sr.as e Srs. Deputados: Um Governo que prometeu bem-estar aos cidadãos - e desse modo conquistou o poder - e cuja desastrosa governação é um factor de atraso, de falta de modernização, de degradação da qualidade de vida dos cidadãos, é, seguramente, um factor de não desenvolvimento do País.
Em suma, Sr. Presidente, Srs. Deputados, um Governo que, pela sua acção, tem feito das suas promessas uma falsidade, uma mentira que, é convicção de Os Verdes, também ela, um dia, será sancionada pelos portugueses.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Talvez há muito não se discutisse tão intensamente como por estes dias a democracia e a sua defesa.
Assistimos a momentos difíceis para a democracia e para a liberdade. Assistimos à barbárie dos atentados terroristas, em Madrid, com o seu cortejo de morte, destruição e dor, que não deixa imune ninguém que ame e defenda os valores democráticos e preze a vida humana.
Mas não é possível, também, ficar indiferente à manipulação fria e calculista que se seguiu, à utilização do poder do Estado para benefício eleitoral de um partido, ao condicionamento directo da informação e à imposição de uma verdade falsa aos meios de comunicação.
E isto não pode ser apenas qualificado, como fizeram muitos dos porta-vozes da direita portuguesa,

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como um problema de má gestão pelo PP e pelo governo de Aznar. Trata-se de uma gravíssima violação de princípios básicos da democracia e da ética política e é assim que a questão deve ser qualificada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A reacção democrática do povo espanhol reforça a confiança na democracia e no seu exercício pelo povo. Mas esta situação chama a atenção para os múltiplos factores que, na sociedade, ameaçam mesmo a pluralidade na realização das próprias eleições: a manipulação da comunicação social, a censura dos tempos modernos, a apropriação do aparelho de Estado naquilo que ele tem de mais poderoso e também de mais sensível, os serviços de informações e as forças de segurança.
Foi em Espanha mas ninguém pense que estamos, entre nós, imunes a estes fenómenos.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - E se, do que se passou na vizinha Espanha, se pode concluir que o povo ainda pode ser quem mais ordena, deve também retirar-se a lição de que são múltiplos os factores que condicionam nas sociedades - e também na nossa - o pleno exercício da própria democracia política e eleitoral.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sempre, na história, o terrorismo prejudicou o caminho do progresso dos povos. Porque fez e faz milhares de vítimas inocentes mas também porque serve objectivamente de pretexto justificativo para reacções securitárias e restritivas de direitos liberdades e garantias.
E no momento em que se avolumam já desproporcionadas dramatizações das questões de segurança, por exemplo, na informação tablóide, escrita ou televisiva, é indispensável reafirmar que serão totalmente inaceitáveis caminhos de restrição injustificada das liberdades ou tentativas de aproveitar este clima para promover ofensivas de carácter securitário ou repressivo, como também é indispensável, neste momento, rejeitar a xenofobia e a culpabilização de comunidades imigrantes ou cidadãos estrangeiros pela criminalidade ou pela insegurança.
Não se combatem nem previnem atentados contra a democracia com a sua própria amputação.
Não se combate a violência violentando os direitos dos que são as suas vítimas, os cidadãos e os povos.
A garantia da segurança e da tranquilidade públicas, que, compreensivelmente, estão hoje, de forma particular, entre as preocupações dos portugueses, exigem sem dúvida uma atenção especial. Mas ela deve assentar em políticas preventivas que passem pela cooperação e entreajuda entre as forças de segurança nacionais e com as de outros países e na absoluta transparência e controlo democráticos dos mecanismos utilizados, e deve passar, também, pela motivação das forças de segurança, desde logo indo ao encontro do que sejam reivindicações justas e razoáveis.
Aliás, o Primeiro-Ministro começa mal nesta matéria ao restringir os contactos sobre a questão a um dos partidos da oposição, em contraste com a decisão do Presidente da República de chamar todos os partidos ao Palácio de Belém.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Por estes dias, assinalou-se também a passagem de um ano sobre o triste espectáculo da cimeira dos Açores, em que Durão Barroso fez o papel de mestre-de-cerimónias da guerra já decidida.
Mesmo estando os portugueses maioritariamente contra a guerra, mesmo sendo ela ilegal à face do direito internacional, falou mais alto a subserviência à política de Bush.
Há mais de um mês que desafiámos o Primeiro-Ministro a explicar aos portugueses como foi convencido da veracidade da existência de armas de destruição em massa. O País continua à espera da resposta, mas a sua demora em responder deixar entrever a realidade de que todos já suspeitávamos: não havia provas, nem armas, nem nenhuma outra justificação para o envolvimento de Portugal nesta guerra que não fosse o apoio a uma política predadora dos recursos petrolíferos e de imposição do domínio do império norte-americano naquela região.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A invasão do Iraque não tinha como objectivo combater o terrorismo. É hoje evidente que o mundo, como, aliás, notou há dias Romano Prodi, está mais ameaçado pela violência e pelo terrorismo do que há um ano atrás.
O terreno lavrado pelas bombas americanas é fértil para a sementeira dos fundamentalismos de todos os tipos.

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Esta guerra, esta invasão, esta ocupação do Iraque em que o País está envolvido não tem emenda nem legitimação possível. É indispensável retomar da política da paz e da cooperação entre povos igualmente soberanos, pondo fim imediato à presença da GNR na ocupação do Iraque.

Aplausos do PCP e da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se há razões para condenar a política externa do Governo, não faltam, contudo, razões de política interna para combater a sua acção.
Dois anos depois das eleições legislativas, a política do Governo agravou a recessão e a crise económica, provocou o aumento do desemprego, aumentou a precariedade e a insegurança no trabalho, fez baixar os salários reais ao mesmo tempo que contribuiu para o aumento dos preços de bens essenciais, diminuiu o investimento reprodutivo e nas funções sociais.
Durão Barroso afadiga-se a garantir que a retoma já lá vem. Certamente algum dia virá. Até hoje, nenhuma recessão se prolongou eternamente. Mas a questão é que é a política do Governo que atrasa a recuperação do País e que a tornará mais débil quando acontecer.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Este Governo não é apenas responsável pela situação presente, está a hipotecar o futuro. É o próprio Governo que afirma que vamos divergir, pelo menos até 2006, da média europeia de crescimento, quando Durão Barroso prometeu na campanha eleitoral que, com ele, o País cresceria todos os anos dois pontos percentuais acima da média europeia.
O Governo quer deixar-nos um País sem recursos e sem instrumentos para promover o desenvolvimento, com mais sectores e empresas estratégicas privatizados, com uma legislação laboral penalizadora dos trabalhadores, com os sectores sociais entregues aos interesses privados, com uma economia cada vez mais subcontratada e dependente.
O Governo é responsável pelos sucessivos encerramentos de empresas e pela destruição do aparelho produtivo nacional, de que é também exemplo o encerramento, hoje anunciado, da Bombardier/ex-Sorefame, perante a passividade desta maioria e deste Governo.
O estado do País exige um forte sobressalto político e democrático que abra caminho à interrupção desta política desastrosa para os portugueses.
O País precisa de mostrar o cartão vermelho a esta política. Os portugueses podem contar com o PCP na luta por uma política que sirva os seus interesses e os do País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, aproveitando a sua intervenção, queria assinalar um ou dois aspectos que nos parecem importantes, o primeiro dos quais tem a ver Espanha e com as considerações que V. Ex.ª fez sobre as eleições espanholas.
Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que o problema dos espanhóis é isso mesmo, é um problema dos espanhóis, e a questão espanhola é um problema que diz respeito aos espanhóis.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Risos do PS.

O Sr. Honório Novo (PCP): - E o Iraque é um problema que diz respeito a quem?

O Orador: - Há uns anos atrás, havia uns adeptos de futebol que, como os seus clubes portugueses não ganhavam nada, faziam-se sócios do Real Madrid e do Barcelona e iam lá ver os jogos e comemorar as vitórias desses clubes. Ora, acho que alguma da esquerda portuguesa está nessa situação. À falta de ideias, à falta de soluções, envolvidos numa total crise de liderança, preferem comemorar os resultados em Espanha porque são os únicos que têm para comemorar.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - No entanto, Sr. Deputado, isso é normal, é legítimo e até chegamos a achar divertido.

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É indiscutível que, em Espanha, houve um erro. É indiscutível que os governos devem exercer a gestão da sua política de informação em função da verdade e atendendo sempre à verdade e que o governo espanhol cometeu um erro na gestão dessa mesma informação. Para além de factores que são normais, como o fechar de um ciclo de oito anos, em que perdeu o centro-direita e ganhou a esquerda democrática, dentro da normalidade, poderá ter havido um erro.
Em qualquer caso, Sr. Deputado, para além daquilo que é, do ponto de vista do progresso do país e da economia, o excelente resultado de oito anos de governação do Sr. Aznar,…

Vozes do CDS-PP: - O que é importante!

O Orador: - … não deixaria de sublinhar o seguinte facto: os políticos portugueses, quando criticam as posições de políticos espanhóis, designadamente de políticos do PP espanhol, sobre a questão do terrorismo e dos erros que tenham sido cometidos, deviam ter, a meu ver, alguma contenção e alguma moderação.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Sim, senhor!

O Orador: - E alguma contenção e alguma moderação, por uma razão simples: é que nenhum dos senhores sabe o que é estar perto de uma bomba da ETA, nenhum dos senhores conhece de perto esse tipo de violência, enquanto que o próprio Presidente do Governo, Aznar, foi vítima de um atentado, ao qual sobreviveu quase por milagre. Isso implicaria, do meu ponto de vista, alguma contenção e algum respeito.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, Sr. Deputado, quero dizer-lhe o seguinte: do nosso ponto de vista, o terrorismo é uma ameaça, é uma ameaça importante, que tem de ser combatida através da união dos europeus e de laços transatlânticos sólidos. Por isso, não errámos, tomámos a opção certa nessa matéria e mantemo-la.
Agora, Sr. Deputado, há algo que não é aceitável e que os senhores fazem muitas vezes, que é uma espécie de terapia de substituição: é insinuar que os culpados do terrorismo são as democracias ou os primeiros-ministros das democracias e não os terroristas.
Ora, os culpados são os terroristas. São sempre os terroristas!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Termino, perguntando-lhe, Sr. Deputado, se esse seu entusiasmo pela Espanha tem ou não a ver com os resultados da Esquerda Unida.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, a primeira pessoa a quem tem de dizer que não devia imiscuir-se e interessar-se tanto pela campanha eleitoral e pela política espanholas é ao Primeiro-Ministro Durão Barroso, que foi discursar a um comício do PP espanhol,…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - E em espanhol!

O Orador: - … onde até garantiu o apoio de Portugal ao próximo futuro - felizmente, afastado - governo do PP.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Portanto, proponho-lhe que, nos próximos encontros com o Sr. Primeiro-Ministro, lhe transmita essa sua opinião, que me parece "assentar que nem uma luva" ao Dr. Durão Barroso.
A minha intervenção não foi sobre a Espanha, Sr. Deputado. Penso que os acontecimentos, em Espanha, merecem uma análise séria, porque são importantes para todos os que se preocupam com a democracia e com o exercício dos direitos democráticos, mas a minha intervenção não foi sobre isso. Foi para

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retirarmos também daí algumas lições para o nosso país.
Por outro lado, quero assinalar que considero grave e lamentável que o Sr. Deputado Telmo Correia tenha mantido a tese, de que a direita portuguesa tem feito gala e usado nestes últimos dias, de que esta questão da manipulação da informação sobre as pistas dos eventuais responsáveis pelos bárbaros atentados de Madrid é apenas uma questão de má gestão, um erro de gestão.
Não, Sr. Deputado! Não se trata de um erro de gestão! Trata-se de um gravíssimo atropelo ao funcionamento da democracia, ao respeito pelos direitos dos cidadãos e à ética política que deve conduzir as forças políticas em cada momento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, o que esta atitude merecia era uma condenação firme dos procedimentos e do que eles significam e não apenas qualificar a questão como um problema de má gestão ou um erro inócuo, como se não tivesse tido a ver com uma das mais graves violações da democracia que tem acontecido nos últimos tempos.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Depois, o Sr. Deputado certamente que também quer ignorar que o facto de, em Espanha (como em Portugal), a população maioritariamente ter manifestado a sua opinião contra a participação na guerra e na ocupação do Iraque, terá sido um elemento muito importante na derrota do PP e do Sr. Aznar nas eleições do passado domingo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - E, já agora, da Esquerda Unida!

O Orador: - É que o sentimento contra a guerra e contra o envolvimento de Espanha (como de Portugal) nesta guerra é certamente um elemento importante para a análise desse resultado.
Falou-nos ainda o Sr. Deputado da questão do terrorismo. Quero dizer-lhe com toda a serenidade que, se há partido nesta Assembleia que conhece bem na pele o que é o terrorismo e os atentados bombistas, esse partido é o PCP, como o Sr. Deputado Telmo Correia bem sabe.
E quero dizer-lhe, Sr. Deputado Telmo Correia, que, evidentemente, os culpados pelos atentados terroristas são os terroristas que os praticam - disso não há qualquer dúvida! - e eles devem ser encontrados e punidos pelos actos bárbaros que cometeram.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar imediatamente, Sr. Presidente.
Mas há também que ter a clarividência de dizer que a intervenção dos Estados Unidos e dos seus aliados no Iraque contribuiu para acentuar os terrorismos e a violência no mundo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Somos todos espanhóis! Dissemos com raiva, amargura e lucidez, muita lucidez.
Sofremos com os "comboios da morte", com o terror absoluto. Somos todos espanhóis, na condenação e perseguição de todo o terrorismo, de todo o terrorismo. A barbárie do terror não tem justificação.
Mas também somos espanhóis quando recusamos a política da mentira. Da mentira das armas de destruição em massa no Iraque, da mentira de uma guerra de ocupação, com milhares de vítimas civis, da mentira da informação manipulada. Da mentira da Cimeira das Lajes, dita da paz e de onde saiu o ultimato da guerra. Quem não recorda o Primeiro-Ministro português, há um ano, a falar da "oportunidade para a paz", a poucas horas, a pouquíssimas horas, dos primeiros bombardeamentos sobre Bagdad?
Os espanhóis, perante o horror da matança, tiveram vergonha de Aznar e da manipulação. Disseram a Aznar que o seu governo não tinha legitimidade política ou moral para conduzir qualquer combate que fosse. Apontaram também o dedo a Bush, Blair, Berlusconi, Barroso e outros. Qual é a legitimidade política e moral de uma coligação internacional fundada na mentira em série? Serial liars e serial killers!
Por que será que os editorialistas e a maioria dos comentadores políticos, a par com a nossa exposta direita, se recusa a ver este simples facto? Porquê continuar a insistir na ideia de que os meios justificam

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os fins?
Por que é que não valorizam, todos eles - comentadores, editorialistas e políticos de direita -, na escolha democrática dos povos de Espanha, a exigência de legitimidade, da verdade e da paz?
A estratégia de Bush e dos neoconservadores desenvolveu e atolou a guerra preventiva, a escalada dos conflitos, e alimentou o terrorismo. Essa é uma verdade que já não escapa a ninguém. O interesse real não era impedir novos 11 de Setembro, o interesse não era desmantelar a Al-Qaeda, o interesse era, como se vê, o interesse congénito da Helliburton, dos contratos petrolíferos e da reconstrução do Iraque.
Depois do 11 de Setembro, não vimos o desmantelamento dos offshore, onde se acoitam as redes criminais, não vimos o combate às redes de tráfico de armas. Não vimos nenhuma medida séria para que os sistemas judiciários punissem organizações terroristas. Vimos apenas o campo de concentração de Guantanamo, prisioneiros sem culpa formada nem defesa legal. Guantanamo é um convite à multiplicação de Al-Qaedas, é o ecrã no mundo das chamadas "garantias democráticas"…
Depois do 11 de Setembro, não vimos nenhum passo construtivo para alcançar a paz no conflito israelo-palestiniano. O último "roteiro para a paz" foi totalmente destruído pelo muro da vergonha na Cisjordânia e pelas "mãos livres" desse psicopata que é o Primeiro-Ministro de Israel, Sharon. Será que não se apercebem que cada quilómetro daquele muro é um arsenal para células terroristas?
Apesar dos insistentes apelos de Kofi Annan, depois do 11 de Setembro, as potências da coligação ou do G-8 não tomaram nenhuma iniciativa credível para combater a fome, a doença, a dívida do Terceiro Mundo. A preocupação de Bush com a SIDA, em África, é um acto patético e sem consequências. Será que não se apercebem de que a polarização da riqueza e dos recursos só cria desespero e espaço para o fundamentalismo religioso?
A retirada das tropas do Iraque é um acto de combate e de coragem, um acto de coerência. Nada justifica a mentira na política internacional.
Aqueles que mais descaradamente ou mais subtilmente vão fazendo passar a tese do choque das civilizações querem fertilizar os fundamentalistas muçulmanos e os fundamentalistas cristãos, estejam eles em Riade ou em Washington. Os líderes mundiais das várias referências religiosas opõem-se completamente a esse cenário medieval. Por que deixaram de os ouvir?! Por que deixaram de ouvir os líderes das várias referências religiosas?
A União Europeia tem a responsabilidade de se demarcar da política da administração Bush, de ter iniciativas positivas e concretas face ao Oriente Médio, ao Mediterrâneo, de cooperação económica e solvência dos fluxos comerciais com África e com a Ásia, de investir seriamente no combate às epidemias nestes continentes. E aqui a responsabilidade é de todos: dos que apoiam a guerra e dos que a desaprovam. É preciso investir seriamente na solidariedade. Perguntem aos eleitorados se não estão de acordo. Verão a resposta! Se há coisa que os espanhóis perceberam - e perceberam muito bem! - é que não basta investir em segurança, porque esse é sempre o anfiteatro de novos horrores.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo português está em tempo de autocrítica. Bem podem achar que as ondas políticas de Espanha não chegam cá. Curiosamente, sempre acharam o contrário e até por excesso. Mas a mentira é insuportável e, a pouco e pouco, o choque da manipulação dá lugar à consciência de que o Governo é frívolo. O Primeiro-Ministro já não se ri, como o fazia, com o Primeiro-Ministro britânico, à porta do n.º 10 de Downing Street. Então, Durão Barroso explicava que Blair já sabia distinguir os Josés de Espanha e de Portugal. Hoje, até o Tony "está em maus lençóis".
A ironia maior é ver o Governo atrás do Presidente da República. O mesmo Governo que desafiou o Presidente da República nesta crise internacional, o mesmo Governo que, até hoje, não deu um contributo para a reforma das instituições internacionais, a não ser o seu apreço e o seu apego desmedido à NATO.
A retirada do contingente militar da GNR seria um primeiro passo. A presença desse contingente nem sequer tem nada a ver com um calendário de transição no Iraque. Há uma questão de dignidade nacional que tem de ser reparada. O povo português foi enganado e o Primeiro-Ministro tem de assumir essa responsabilidade.
Aqui ninguém cede ao terrorismo, mas também não cedemos à guerra e à mentira! Nesta mensagem, somos todos espanhóis!
Participando no eixo da mentira, Durão Barroso criou mais um défice, o pior, o mais gravoso, o que não lhe podemos perdoar, o défice de credibilidade e de verdade.
Dois anos depois de ter ganho as eleições, este Governo deve ser julgado todos os dias pelo que faz e, em particular, por este pesadíssimo défice: um défice na política externa, mas também um défice nas políticas internas. Dois anos depois, o País está muito pior: tem mais desempregados e tem menos investimento; tem mais pobres e tem mais injustiça; tem menos direitos e, sobretudo, tem mais irresponsabilidade; tem mais negocismo e tem menos transparência.
Estes foram dois anos annos horribilis para Portugal. A maioria tomou conta de tudo, os boys ocuparam o poder e os escândalos vão-se seguindo. O povo, esse, está pior.

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Dois anos depois de ter ganho as eleições, a maioria e Durão Barroso teme as próximas eleições gerais e o veredicto dos portugueses, e Durão Barroso até já anunciou que pode, eventualmente, perder as eleições europeias. Ainda bem que assim é, tudo faremos para confirmar essa derrota e as próximas derrotas desta maioria de direita, que constitui o pior Governo que o País conheceu desde o 25 de Abril. Um Governo que não tem verdade, o Governo de todos os défices.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dois anos depois, é preciso dizer a verdade. E dizer a verdade significa chamar a atenção do Primeiro-Ministro e do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação, o qual esteve ontem nesta Assembleia, dizendo estar convicto de que há condições para que a ex-Sorefame, fábrica de comboios da Bombardier na Amadora, retome a produção e ultrapasse a má fase que atravessa, sobretudo importante quando há um interesse estratégico sobre o material circulante que decorrerá da implementação das novas vias ferroviárias.
O Sr. Ministro das Obras Públicas disse isto ontem, aqui, na Assembleia, e hoje foi feito o anúncio oficial do encerramento da Bombardier, com o despedimento de todos os trabalhadores, o que representa um escândalo para o Governo, uma má forma de comemorarem os dois anos de Governo e exige-se aqui, e amanhã, que o Primeiro-Ministro não fique calado e venha dizer sobre esta matéria aquilo que é importante dizer.

Aplausos do PS.

Dois anos depois, é preciso dizer a verdade! A opinião pública portuguesa está preocupada com os recentes acontecimentos que enlutaram o povo espanhol que viveu, e vive, com preocupação os efeitos e as causas do terrorismo na sua face mais brutal e mais cobarde.
A população espanhola sentiu, com particular dor, os horrores dos "comboios da morte" e com inusitado vigor demonstrou que não tolera o terrorismo nem a mentira daqueles que elegeram para governar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sabendo, como agora se sabe, que o Presidente do Governo Espanhol, José Maria Aznar, telefonou directamente aos responsáveis de alguns órgãos de comunicação social para manipularem a informação, a preocupação com os comportamentos de uma direita em desespero, que tem em Portugal um fã incondicional, o Primeiro-Ministro, Durão Barroso, é agora uma preocupação muito mais profunda.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Dois anos depois, é preciso dizer a verdade! Com esta "escola", até aonde irá o Primeiro-Ministro Durão Barroso? Abusará de todos nós? Manipulará a opinião pública? Não dirá a verdade aos portugueses? Uma e as outras coisas, infelizmente, são verdade. O Primeiro-Ministro Durão Barroso abusa, manipula e não diz a verdade aos portugueses.

Aplausos do PS.

Abusa dos portugueses e utilizou-os na campanha eleitoral espanhola para dizer num comício partidário que 100% dos portugueses apoiavam o Partido Popular de José Maria Aznar, o mesmo partido, imagine-se, que foi rejeitado quase por 70% do voto dos espanhóis. Então, por que raio é que seria bom para os portugueses aquilo que os espanhóis rejeitaram?

Aplausos do PS.

Manipula a opinião pública porque quer vender aos portugueses "gato por lebre", os resultados convenientes da economia espanhola, mas omitindo, então, por exemplo, que o objectivo superior de Durão Barroso será conseguir, como no país vizinho, 11,2% de desemprego e fazer com que o emprego que sobra atinja 37% de precariedade, ou seja, quase três vezes mais do que a média da União Europeia.
Dois anos depois, é preciso dizer a verdade, e Durão Barroso não diz a verdade aos portugueses!

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Em primeiro lugar, porque diz ter, finalmente, a casa arrumada quando, na verdade, este Primeiro-Ministro leiloeiro já nada tem em casa que possa arrumar. Ficará para a História como o Primeiro-Ministro que vendeu Portugal a retalho, o Primeiro-Ministro "barateiro".

Aplausos do PS.

Depois, para quem elegeu o défice como desígnio nacional, nada mais dramático do que constatar que todos os anos ele bate à porta dos 5%. Vejam bem que até os bonecos do Contra-Informação deram conta desta graça, qual publicidade da Vodafone, rindo o "Furão", fora do carro, até mais não poder, sempre que a "Manuela" lhe repete que o défice é de 2,8%.

Risos do PS.

Em terceiro lugar, anunciou a retoma, o bem-estar, mas esqueceu-se de dizer aos portugueses que o desemprego continua a crescer, que atinge quase 0,5 milhão de famílias e que, durante Fevereiro, continuou a crescer à média de 100 novos desempregados por dia. No entanto, Sua Ex.ª o Primeiro-Ministro está contente porque o desemprego aumenta devagar, como quem morre devagar, mas morre, e como se isso para ele até fosse bom!

Aplausos do PS.

Dois anos depois é preciso dizer a verdade!
Por isso, era bom que o Governo dissesse a verdade sobre dois projectos estruturantes para Portugal:
Em 9 de Fevereiro, uma delegação de socialistas de Aveiro, Viseu e Guarda reuniu com o PSOE de Castilla y León, na presença de Jesus Caldera, porta-voz nacional. Com ele, em conferência de imprensa, anunciaram exigir aos governos dos dois países uma antecipação para 2010 do calendário para a ligação em alta velocidade entre Aveiro e Salamanca, bem como imputariam aos respectivos Governos uma inexistente componente, significativa, de investimento público.
Durão Barroso, na cimeira luso-espanhola da Figueira da Foz, com o pretérito José Maria Aznar, deitou foguetes, anunciando, com pompa e circunstância, a concretização da linha de TGV ligando Aveiro, Viseu, Guarda e Salamanca até 2015.
Acontece que, entre as propostas prioritárias para Portugal feitas por Durão Barroso à União Europeia, este projecto não só não aparece como desaparece e, por isso, nem tão-pouco foi abordado o financiamento que não existia. Durão Barroso omitiu tudo isto e já mandou o às vezes Ministro, às vezes vereador, Carmona Rodrigues começar a dizer na comunicação social que é tudo muito caro, que são precisos muitos túneis, ou seja, que não compensa e que nada vai ser feito.
Na Ota a estratégia é semelhante. Depois das indefinições lamentáveis de Valente de Oliveira "ora não faz, ora faz", Carmona Rodrigues começou por dizer que não ia fazer; depois de advertido, disse que iria fazer; mas agora, apanhando boleia do TGV, já vai dizendo que este investimento não justifica o outro. Até quando é que o Governo vai continuar a omitir a verdade aos portugueses? E até quando vai durar este comportamento de "barata tonta" assumido pelo Governo?

Aplausos do PS.

Dois anos depois é preciso dizer a verdade!
Tão grave como um Governo que não diz a verdade é um Governo sem autoridade e que põe o País a andar para trás, que não executa, que atrasa e que empata.
Sem autoridade, porque, por exemplo, perante o folhetim lamentável da TAP não consegue pôr ordem na casa. O Eng.º Cardoso e Cunha, que representa o Governo na TAP - diga-se de passagem, um despesismo desnecessário -, diz que o "Estado é um parceiro inútil, que o Governo não ajuda e que é preciso despedir mais trabalhadores".
O Administrador Fernando Pinto, pelo contrário, envolve os trabalhadores nos objectivos da empresa e procura prestigiar a companhia. Perante a notícia de êxito na exploração da TAP, em 2003, o Governo congratulou-se com o facto, enquanto o Eng.º Cardoso e Cunha, perante a mesma notícia, diz não saber de nada e desqualifica a empresa. O que decide o Governo? Nada! Disse ontem o Ministro Carmona Rodrigues, institucionalmente nessa qualidade - nunca se sabe! -, que não se passava nada, que tinha havido um empolamento de algumas afirmações, um fait divers, que as contas ainda não estavam prontas. Então por que é que o Governo se congratulou com os resultados que não existem?

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Queira concluir.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente!
Cardoso e Cunha procedeu mal, mas o Governo e Carmona Rodrigues não agiram melhor.
Por isso, Srs. Deputados, não tendo agora tempo para ler 38 das muitas centenas de obras que o PSD tem empatadas, direi que é por isso que, a partir de amanhã, faremos aqui uma interpelação e uma série de debates de urgência, para que o Governo, tema a tema, caso a caso, a começar pela Ota, venha aqui, depois de dois anos, dizer a verdade.

Aplausos do PS.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Cá estaremos!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Marco António Costa.

O Sr. Marco António Costa (PS): - Sr. Deputado José Junqueiro, ouvimos com atenção a intervenção que proferiu, aliás de muito mau gosto. De mau gosto, porque utiliza para com o Primeiro-Ministro de Portugal de uma linguagem pouco urbana e pouco civilizada, que nós, obviamente, não subscrevemos nem aceitamos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - De mau gosto, porque o Sr. Deputado fez uma intervenção que, para além da agressividade e da adjectivação que usou, faltou à verdade nas afirmações que atribuiu ao Sr. Primeiro-Ministro.
A verdade é que quando o Sr. Primeiro-Ministro manifestou solidariedade ao PP espanhol fê-lo em nome do Partido Social Democrata, na qualidade de seu Presidente.

Vozes do PS: - Não!

O Orador: - O PSD subscreve essa posição no seu todo, porque não foge às suas responsabilidades. É essa a cultura do PSD e é essa postura que manteremos no futuro. Não é por o Partido Popular ter perdido as eleições que hoje vamos deixar de apoiar a atitude do seu governo em Espanha ao longo de anos. Aliás, atitude muitas vezes reconhecida pelo então Sr. Primeiro-Ministro António Guterres, que não poupava elogios à acção do Sr. Aznar enquanto Primeiro-Ministro de Espanha.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas, Sr. Deputado, não chegasse o facto de ter usado uma linguagem pouco urbana e pouco educada relativamente ao Sr. Primeiro-Ministro, o Sr. Deputado ainda se permitiu fazer uma tropelia política injustificada. Disse o Sr. Deputado que a Bombardier iria encerrar e que era incompreensível que por parte do Governo não houvesse uma atitude relativamente a essa situação. Como sabe, a Bombardier é uma empresa privada e, como tal, tem de reger-se pelas normas do direito privado e do direito público relativamente a concursos.
O Sr. Deputado sabe que, neste momento, está em análise na Metro do Porto a aquisição de novas unidades, mais 10 veículos de metro ligeiro de superfície. Tratou-se de um concurso público internacional em que a Bombardier, juntamente com a Siemens, concorreu. O que é que o Sr. Deputado quer? Que a Metro do Porto, à revelia do direito, atribua por ajuste directo à Bombardier a adjudicação dessa empreitada?! É isso que o Sr. Deputado pretende?
O Sr. Deputado deve assumir com clareza que tipo de atitude pretende que o Estado assuma relativamente a esta matéria. Se é isso que o Sr. Deputado deseja, tem de assumir que quer que seja feita uma tropelia relativamente ao direito e ao Estado português e que a Metro do Porto tome uma atitude à margem do direito.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Queira concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, termino já!
O Sr. Deputado sabe muito bem da resposta do Ministério das Obras Públicas sobre esta matéria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado, em primeiro lugar, agradeço a questão que me colocou e, tal como disse o Sr. Presidente, o Sr. Deputado "esgotou-se".

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Junqueiro, eu disse que o tempo do Sr. Deputado Marco António Costa se tinha esgotado, expressão que uso relativamente a todos os Srs. Deputados.

O Orador: - Sr. Presidente, então não ouvi correctamente; julguei ouvir dizer que o Sr. Deputado se tinha esgotado…
Mas colocaria a seguinte questão ao Sr. Deputado Marco António Costa: como é que o Sr. Primeiro-Ministro trata bem todos os portugueses se, ao longo destes dois anos, enviou para o desemprego cerca de 0,5 milhão de famílias?! Como é que o Sr. Primeiro-Ministro é educado para os portugueses quando lhes promete um futuro risonho, emprego, bem-estar, segurança para as famílias e todos os dias assistimos a despedimentos permanentes?!
O Sr. Primeiro-Ministro é um vendedor de ilusões, faz ilusionismo político, e isso é uma coisa que não calaremos e, contrariamente ao que o Sr. Deputado possa pensar, não consentiremos.
Por outro lado, quero dizer-lhe que compreendo a sua dificuldade em responder às questões que coloquei. Os senhores não têm argumento, os senhores representam um não-Governo, os senhores nem sequer governam mal, pura e simplesmente não governam, e são, em matéria de objectivo, um autêntico desastre.

Protestos do PSD.

E aproveito o tempo de que disponho para informar a Câmara - é preciso dizer a verdade dois anos depois - porque é que este Governo põe o País a andar para trás, não executa, atrasa e empata: variantes de Tavarede e Miranda do Corvo, nós de Loulé, Faro, Gouveia, Castelo de Vide e Ferreira do Zêzere, acesso ao porto de Setúbal, variantes de Arcos de Valdevez, Tondela, Carregal do Sal e Vouzela, ponte internacional de Quintanilha, ligação a Macedo de Cavaleiros, Ponte de Sôr e acessos, Unhais da Serra, Covilhã… - até é preciso respirar, Sr. Deputado -,…

Aplausos do PS.

…variante de Estremoz, variante de Trancoso, ligação da Nazaré à EN1, circular de Leiria, Alter-do-Chão, Portalegre, alargamento do nó de Carregueiros…
Sr. Deputado, até vou parar por aqui para não estar a maçar mais, mas sempre lhe dou mais dois ou três exemplos: via do Tâmega, Trafaria de Pêra, ligação da A23 a Tomar...
Sr. Deputado, sabe o que é trágico nisto? É que os senhores não dizem a verdade. E sabem porquê? É que os senhores fintaram mais uma vez esta Câmara porque reduziram em 37,5%, no Instituto das Estradas de Portugal, as verbas para estas obras.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo também se esgotou!

O Orador: - Portanto, esta obras não serão feitas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, conforme é do conhecimento de todos, o Governo solicitou o uso da palavra no período de antes da ordem do dia de hoje, ao abrigo do n.º 2 do artigo 84.º do Regimento, de forma a o Sr. Ministro da Administração Interna informar a Assembleia da República das medidas tomadas pelo Governo de reforço da segurança nacional.
Tem, pois, a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna, que dispõe de 8 minutos.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Figueiredo Lopes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde o 11 de Setembro que a segurança dos Estados se encontra sob a ameaça de uma vaga de terrorismo de pendor extremista religioso, global na sua abrangência e extremamente letal quanto aos

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seus efeitos.
Os bárbaros atentados de Madrid vêm relembrar-nos que nenhum Estado, nenhuma sociedade, nenhuma região do planeta está imune ao terrorismo. O terrorismo ataca em qualquer região, de qualquer forma, sem olhar a escrúpulos e sem medir consequências. Apenas com uma preocupação: ceifar vidas humanas indefesas e inocentes, colocar em causa a paz e a tranquilidade, afrontar a liberdade e a democracia.
Basta que nos lembremos dos atentados ocorridos na Turquia, em Marrocos, na Arábia Saudita, no Quénia ou na Indonésia.
Por isso é que o terrorismo - todo o terrorismo - é inaceitável.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso é que, perante o terrorismo, os democratas, todos os democratas, só podem ter uma atitude: a atitude da condenação, da firmeza e da determinação.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Quem hesita, quem cede ao medo, favorece o terrorismo. Quem é firme, convicto e determinado ajuda a combater o terrorismo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Dessa atitude de firmeza e convicção democrática deram os espanhóis um grande exemplo ao mundo quando no dia seguinte aos atentados se concentraram aos milhões nas praças públicas, sem ceder ao medo e ao terror.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A prevenção e o combate ao terrorismo está hoje, de modo especial, no centro das preocupações do Governo, particularmente depois dos atentados de Madrid. Tal como sucede, de resto, com vários outros países da Europa.
Apesar dos nossos serviços e forças de segurança não terem conhecimento de nenhuma ameaça credível dirigida contra Portugal, foi adoptado um conjunto de medidas que, sem ceder à "paranóia securitária", visa reforçar a vertente preventiva, através de uma aposta clara na visibilidade e no reforço do sentimento de segurança dos cidadãos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Queremos ser muito claros: Portugal dispõe hoje de um quadro institucional e de meios de acção que lhe permitem actuar a nível interno e externo.
No plano institucional, o Gabinete Coordenador de Segurança tem vindo a desempenhar um papel de relevo, particularmente na articulação eficaz entre as várias forças e serviços de segurança. Noutra vertente, a Unidade de Coordenação Anti-Terrorista, criada em Fevereiro de 2003, tem assumido uma importância capital sobretudo na troca e cruzamento de informações, algo de essencial à prevenção e ao combate ao terrorismo.
Esta unidade especializada é integrada actualmente pela Polícia Judiciária, a PSP, a GNR, o SIEDM, o SIS, o SEF e, mais recentemente, pela Autoridade Marítima.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E se é assim no plano institucional, importa sublinhar que, na sequência dos atentados de Madrid, o Governo procedeu ao reforço das medidas e dos meios operacionais de intervenção.
Destaco, de modo especial: o reforço da prevenção, através do patrulhamento de áreas sensíveis e estratégicas - ou seja, para citar algumas, o sistema de transportes e infra-estruturas viárias, locais de grande aglomeração de pessoas, instalações diplomáticas, instalações oficiais, reforço da vigilância da fronteira terrestre e marítima, com recurso intensivo ao sistema de controlos móveis -, tratando-se, na verdade, de um esforço muito grande que envolve mais de 20 000 homens e mulheres das forças de segurança que diariamente estão a trabalhar para a segurança dos portugueses; o reforço da pesquisa e análise de informações e a intensificação da cooperação europeia e internacional; o reforço da coordenação técnica

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e operacional entre as forças e serviços de segurança - na sequência dos atentados de Madrid, procedemos ao reforço da UCAT, que passou ao modo de funcionamento permanente, 24 horas sobre 24 horas, e a produzir diariamente relatórios que são simultaneamente remetidos ao Primeiro-ministro e ao Ministro da Administração Interna; e, finalmente, o aumento dos índices de prontidão dos serviços de protecção e socorro de forma a conter e limitar as consequências de qualquer incidente.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Todas estas medidas estão já em aplicação plena, muitas delas são mesmo notórias e visíveis por parte dos cidadãos. Para além destas medidas visíveis, há, porém, um conjunto de outras actividades que estão a ser desenvolvidas na retaguarda, as quais, pela sua sensibilidade, não mencionarei em pormenor.
No entanto, posso dizer que o trabalho de análise e de compreensão do fenómeno terrorista é tão ou mais importante que as restantes actividades que são testemunháveis por todos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Nós acreditamos que só com informação objectiva e actual é possível afastar e evitar reacções emocionais, as quais poderiam ter consequências desastrosas para o sentimento de segurança dos portugueses e para o exercício normal dos direitos, liberdades e garantias consagrados no Estado democrático de direito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O terrorismo é, por natureza, um fenómeno transnacional. Por isso, ao nível externo, o Governo desenvolve a prevenção e combate ao terrorismo através da cooperação bilateral e multilateral, tanto em ligação com outras forças e serviços de segurança estrangeiros, como em sede de organizações como a União Europeia, o Conselho da Europa ou as Nações Unidas.
No âmbito da União Europeia, Portugal tem totalmente operacional o gabinete nacional SIRENE, através do qual todas as forças e serviços de segurança têm acesso ao Sistema de Informações Schengen. Portugal dispõe ainda de oficiais de ligação na Europol e participa activamente em vários grupos de trabalho ao nível da União.
Na próxima sexta-feira, em Bruxelas, realizar-se-á uma reunião dos Ministros Europeus da Administração Interna. É uma reunião importante, sobretudo para impulsionar os trabalhos e as medidas que, no quadro europeu, devem ser tomadas para prevenir e combater o terrorismo. A Europa tem aqui uma grande e importante responsabilidade a assumir.
A presidência da União Europeia está a examinar novas iniciativas tendentes a melhorar a coordenação e a cooperação entre a União Europeia e as Nações Unidas, em particular a definir formas de apoiar o importante trabalho do Comité Anti-Terrorismo das Nações Unidas.
Mas não podemos abrandar a vigilância e a acção, especialmente em Portugal, quando estamos em vésperas de eventos de grande impacto, como o Euro 2004, o Rock in Rio e as grandes peregrinações de Fátima.
Por isso, quero aqui anunciar que o Governo já decidiu que, por ocasião do Euro 2004 e do certame de grande mobilização popular Rock in Rio, não serão aplicados os mecanismos Schengen, sendo, em consequência, reposto o sistema de controlo de fronteiras.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É mais uma medida para a prevenção do terrorismo, mais uma medida destinada a garantir a segurança e a tranquilidade dos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ninguém pode garantir, em absoluto, que Portugal está imune ao terrorismo. Mas também não há qualquer ameaça específica e credível que justifique qualquer sentimento de pânico ou de especial preocupação.
Os portugueses devem estar, por isso, serenos e vigilantes. A serenidade é a aliada principal do combate ao terrorismo. A vigilância é um dever cívico de todos os cidadãos.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Perante a praga dos que fazem a sua vida a assassinar pessoas indefesas e a ameaçar a nossa civilização, todos nós, Estado e cidadãos, só podemos ter uma mensagem clara e responsável: a mensagem da unidade, da firmeza e da cooperação. Sem medo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É assim que o terrorismo se vence. É assim que se garante a paz, a liberdade e a democracia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, abre-se de imediato o debate, sendo o primeiro orador inscrito o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Ministros da Administração Interna e dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: A liberdade e a democracia têm muitos inimigos, dos quais o mais totalitário é o terrorismo. Sob qualquer forma, em qualquer parte do mundo e a qualquer pretexto, o terrorismo é sempre intolerável.
Não há explicação, não há justificação nem há perdão para a matança indiscriminada de homens, mulheres e crianças, indefesos e inocentes.
É criminoso usar-se o terrorismo como arma política e é vergonhoso usar-se o terrorismo como argumento em política, tentação a que algumas forças políticas irresponsáveis não conseguem resistir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Para além do terrorismo em si mesmo, o pior serviço que se pode fazer à liberdade e à democracia, que são os seus alvos, é procurar explicá-lo ou encontrar-lhe pretextos políticos, porque esse é o caminho que mais fragiliza o seu combate e antes leva ao seu branqueamento.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Tentar responsabilizar terceiros ou imputar a outros as razões da sua acção é, afinal, desresponsabilizar os próprios terroristas, é fazer o jogo que objectivamente lhes interessa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não sejamos ingénuos. O que o terrorismo visa é matar a liberdade, acabar com a democracia e espezinhar os mais elementares direitos da pessoa humana.
É precisamente por estas razões que ele tem de merecer de todos nós um repúdio sem reservas nem cedências e um combate sem medo nem quartel.

A Sr.ª Adriana de Aguiar Branco (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Como o Sr. Ministro deixou claro, o Governo está decidido e empenhado nesse combate, para o qual tem mobilizado as forças e os serviços de segurança.
Embora concordando com tudo aquilo que nos veio hoje transmitir, permita-me, Sr. Ministro, que reforce três aspectos que para nós são essenciais. É nosso entendimento que o combate ao terrorismo exige unidade, firmeza e cooperação.
Unidade, firmeza e cooperação a começar na nossa própria casa.
Desde logo no plano institucional, entre todos os órgãos de soberania,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … exactamente como tem impecavelmente acontecido na perfeita sintonia, que com muito agrado aqui registamos, entre o Sr. Presidente da República, o Governo e a esmagadora maioria nesta Assembleia, na forma como abordamos e encaramos o problema.

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O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas também no plano internacional. O terrorismo é hoje um inimigo transnacional, que não conhece fronteiras nem soberanias.
A unidade e a cooperação a nível internacional, a começar pelo nosso espaço europeu, é uma prioridade, como referiu o Sr. Ministro, em que temos de apostar sem complexos, devendo tudo fazer para a consolidar e aprofundar.
Nos momentos trágicos, como o vivido na passada semana, aqui ao lado, na vizinha Espanha, todos partilhamos e sentimos como nossa a dor e a insegurança das vítimas mais directas destes ataques terroristas.
Mas é necessário, também nesses momentos, que todos tenhamos a noção de que a responsabilidade de adoptar medidas de segurança e de prevenção contra novos ataques, para os quais devemos estar preparados, deve ser partilhada com todo o mundo livre e democrático,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … porque ninguém está imune, porque de todos se exige a vigilância, como o Sr. Ministro referiu. É um dever de cidadania.
Foi sobre isso que o Sr. Ministro aqui nos veio falar. Fique o Sr. Ministro seguro da nossa plena adesão.
Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: O terrorismo é a face mais desumana do homem. É dever colectivo de todos os homens e mulheres do mundo repudiá-lo e, por todos os meios, combatê-lo, com a adopção responsável mas determinada de medidas de segurança, com a aposta na intensificação da cooperação internacional e, sobretudo, com a firmeza das nossas convicções em defesa da liberdade, da democracia e dos direitos fundamentais da pessoa humana.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A bancada do PSD apoia e confia integralmente no Governo para a tomada de decisões operacionais nesta matéria e saúda a sintonia que o Governo tem sabido construir com o Sr. Presidente da República, com este Parlamento e com o principal partido da oposição.
Acreditamos, sinceramente, que este é o caminho certo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, registamos com satisfação que tenha vindo hoje ao Plenário da Assembleia da República transmitir uma mensagem de tranquilidade ao País.
Perante a ameaça terrorista só há uma atitude possível para os democratas: unirem-se de forma firme e determinada no combate a essa ameaça.

Vozes do PS, do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, permita-me que lhe chame a atenção para o seguinte: não obstante a surpreendente violência do horroroso atentado que atingiu Madrid na semana passada, estes atentados não devem nem podem constituir uma surpresa para nenhum de nós. A existência da ameaça significa precisamente a potencialidade de, a qualquer momento e em qualquer lugar, a mesma se concretizar num bárbaro atentado.
Significa isto que a atitude dos Estados democráticos e da União Europeia não pode ser a de dizer, ciclicamente, "aqui d'el-rei, é preciso tomar medidas". O combate ao terrorismo e à sua ameaça tem de ser uma atitude constante e permanente de execução de um programa devidamente planeado.
Nesse sentido, Sr. Ministro, queria dizer-lhe, em primeiro lugar, que neste momento é prioritário no País devolver confiança aos portugueses - calma, serenidade e tranquilidade. E, como disse o Secretário-Geral do Partido Socialista, o Governo pode estar certo de que nunca estaremos do lado da exploração do medo, estaremos sempre solidários e unidos no combate contra o terrorismo.

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Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas, para que haja tranquilidade, é preciso que sejam dados sinais, e o primeiro sinal essencial é o da unidade da voz que fala em nome do Governo. Não se pode repetir o que aconteceu nos últimos dias, com diversos membros do Governo emitindo mensagens contraditórias para o conjunto da opinião pública.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Essa agora!

O Orador: - Em segundo lugar, é fundamental acabar o trabalho que está por acabar, desde logo do ponto de vista legislativo.
Sr. Ministro, há mais de 1 ano que estão paralisadas na 1.ª Comissão da Assembleia da República duas iniciativas legislativas do primeiro pacote de combate ao terrorismo, a das buscas domiciliárias nocturnas e a das equipas de investigação conjunta, que permite a actuação conjugada das polícias de investigação dos diferentes Estados-membros e, por sua vez, destas com a Europol.
Não se compreende essa paralisia.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, é necessário um sinal inequívoco quanto aos meios. É preocupante que o SIRESP (Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal) não tenha um horizonte concreto de concretização; que quanto ao SIIC (Sistema Integral de Informação Criminal) não haja notícia de ter havido qualquer avanço; que quanto aos quadros da força que tem a competência exclusiva de investigação criminal em matéria de terrorismo - a Polícia Judiciária - haja notícia pública de que o preenchimento dos quadros se fará por via do recrutamento dos quadros existentes e necessários noutras forças de segurança.
Em quarto lugar, é essencial um sinal de tranquilidade relativamente às forças de segurança. Não dá segurança aos portugueses a sucessiva publicação de notícias, força de segurança a força de segurança, serviço de segurança a serviço de segurança, sobre ameaças de greves ou conflitos laborais entre os trabalhadores e os funcionários dessas forças e o Governo.
Em quinto lugar, é necessário um escrutínio permanente relativamente ao dispositivo de segurança. Não podemos ter a ilusão de que está sempre tudo coberto, porque a experiência revela que há sempre algo que está a descoberto.
Eu próprio fui ontem surpreendido, ao aterrar no aeródromo de Bragança - e dizem-me que o mesmo se passa no aeródromo de Vila Real -, com o facto de não haver controlo de metais, nem de passageiros nem de bagagens de voos que aterram ou que circulam no aeroporto da Portela.
Foi a casualidade da minha agenda que me levou ontem a Bragança. Não sei o que acontece noutros pontos, mas este é um escrutínio necessário e permanente que tem de ser feito.
Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, podem contar com uma atitude firme e determinada da nossa parte, com total disponibilidade para se avançar, mas também com a exigência de ser concluído o que está a meio.
Termino com uma referência à necessidade urgente de o Governo concretizar a proposta de lei de reforma dos serviços de informações, já anunciada e reanunciada há muito tempo. Nenhum de nós pode ignorar que para que exista tranquilidade junto dos portugueses é necessário que os portugueses sintam que foi feito tudo o que havia a fazer.
Há uma coisa que, em verdade, temos de dizer aos portugueses: nunca ninguém poderá garantir que não terá lugar um acto terrorista, mas o que temos de garantir aos portugueses é que todos fizemos tudo o que estava ao nosso alcance para o prevenir e para o reprimir, se ele vier a ocorrer.

Vozes do PS e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - E para que todos possamos estar de consciência tranquila, é necessário completarmos todo o trabalho que ainda está por fazer, e que é bastante.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, registamos que tenha vindo hoje à Assembleia da República discutir estes problemas com todos os partidos, ao contrário do que fez ontem o Sr. Primeiro-Ministro, que se limitou a discuti-los com um dos partidos da oposição.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, este assunto tem de ser debatido com total sentido de responsabilidade. Pela nossa parte, estamos dispostos a assumir todas as responsabilidades.
Importa não criar alarmismos que não tenham justificação e importa combater qualquer psicose que se possa criar na população sobre os problemas do terrorismo susceptível de alterar a tranquilidade de que os cidadãos necessitam para viver a sua vida em condições de normalidade. Importa ainda não criar climas securitários que são sempre pouco saudáveis para um regime democrático. Portanto, registamos também afirmações que o Sr. Ministro fez hoje aqui neste sentido.
Sabemos que o mundo não está mais seguro, pelo contrário. Sabemos que o terrorismo não tem escrúpulos, não tem princípios, actua friamente e mata indiscriminadamente. Sabemos que a forma como tem sido conduzido o chamado combate ao terrorismo, sob a batuta da administração Bush e com o apoio do Governo português, não tem tornado o mundo mais seguro, bem pelo contrário. Entendemos que a luta contra o terrorismo deve ser uma luta firme e sem equívocos, mas uma luta lúcida. Não pode ser um combate tão irracional como é o próprio terrorismo.
Perante isto, Sr. Ministro, é preciso actuar contra o terrorismo com decisão, com serenidade e com sentido de responsabilidade na prevenção de eventuais ameaças e na garantia da segurança e tranquilidade das populações. Responsabilidade que o Sr. Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro não teve. O Sr. Ministro José Luís Arnaut não deu uma boa imagem da forma como se deve actuar para o combate necessário a qualquer alarmismo injustificado. Os portugueses dispensam Ministros que afirmam ter conhecimento de ameaças e dizem que não as levam a sério. Só esperamos que as ameaças não tenham mais credibilidade do que tem o Ministro Adjunto, José Luís Arnaut - esse, sabemos que não tem nenhuma.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Os portugueses precisam de ter garantias de que as forças e serviços de segurança funcionam com profissionalismo, com coordenação operacional, com meios adequados e com pessoal motivado. E quando o Sr. Ministro da Administração Interna afirma, perante justas reivindicações dos profissionais da Polícia de Segurança Pública, da Guarda Nacional Republicana ou do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que este ano não há condições para resolver nenhum desses justos problemas que são colocados, o Governo não está a dar o sinal positivo que é necessário para aumentar o nível de confiança dos portugueses na actuação das polícias.
Sr. Ministro da Administração Interna, a segurança e a tranquilidade garantem-se com meios, com condições, com motivação dos profissionais das forças de segurança; não se combate apenas com discursos. Ora, aquilo a que temos assistido da parte do Governo nesta matéria tem sido unicamente a discursos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, veio trazer ao Parlamento uma questão que é de enorme importância.
Julgo que para todos é claro que o terrorismo é, em qualquer circunstância, totalmente inaceitável. O terrorismo é uma ameaça à liberdade, é uma ameaça à democracia, é uma ameaça à paz. Estamos de acordo que é uma ameaça global, sem rosto, sem fronteiras.
Precisamente por ser um perigo real e global, tem de ser combatido sem tréguas, tendo como limite de combate apenas os próprios direitos fundamentais que o terrorismo põe em causa, devendo tudo deve ser feito para o prevenir de modo eficaz.
Recusamos o recurso ao terrorismo, como recusamos a sua utilização política seja para que efeitos forem.

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Se todos temos consciência de que este é um perigo real e de que a forma como o mundo evoluiu não é no sentido de que possamos estar mais tranquilos, de prevenir fundamentalismos e excessos, de contribuir para um mundo mais seguro e mais equilibrado, parece-nos que o que Governo tem de vir dizer, hoje e agora, a todos os partidos - porque pela nossa parte (e julgo que da parte de todos) aceitamos que o desafio do combate ao terrorismo é algo a que ninguém se pode dispensar - é que nos dá também garantias em dois aspectos fundamentais para o combate ao terrorismo: desde logo no plano europeu, do ponto de vista da cooperação e da articulação internacional, e do ponto de vista da organização do nosso país.
A forma como alguns serviços ainda estão desorganizados, as prioridades estranhas do ponto de vista da criminalidade e a falta de coordenação são aspectos preocupantes, como é igualmente preocupante que, perante alguns eventos que se vão realizar, se possa negligenciar algo que é um perigo e uma ameaça real.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidentes, Sr. Ministro, a sua primeira palavra foi sobre firmeza, mas aquilo que aqui lhe critico é falta de firmeza.
O Governo foi fraco quando obedeceu a ordens e mandou tropas para o Iraque sob a sua tutela directa. É por firmeza que essas tropas não deveriam lá estar. Portugal, em contrapartida, deveria estar a contribuir para uma solução de paz, não por medo, mas por coragem.
Aliás, a retirada das tropas do Iraque deve ser totalmente independente dos trágicos acontecimentos de Madrid, simplesmente porque nunca deveriam ter ido para lá.
Mas porque o Governo quer firmeza e porque a oposição exige firmeza, queria deixar-lhe muito claro o nosso ponto de vista nos debates que vão ocorrer a partir de agora.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, desta bancada nunca ouvirão uma palavra sobre atentados que não ocorreram e que virtualmente podem vir a ocorrer. Não ouvirão uma palavra de discussão sobre hipóteses de atentados. Ouvirão que a segurança é parte da liberdade e deve defender a liberdade em nome da liberdade. E diremos "sim" a todas as medidas concretas que protejam a liberdade.
Por isso mesmo, Sr. Ministro, lhe direi também três "não": "não" a escutas telefónicas ou a outros meios de intercepção que estejam à margem da lei e que sejam utilizados sem a protecção da lei, como tantas vezes acontece em Portugal, ao ponto de o Presidente da República ter tido de falar sobre isso; dir-lhe-ei "não" a vídeo-vigilância que não seja legal - Sr. Ministro, ontem, o Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados veio ao Parlamento dizer-nos que já havia meios legais de vídeo-vigilância no acesso a estádios de futebol que eram utilizados ilegalmente para vigiar habitações privadas! E dir-lhe-ei também "não" à utilização da restrição admissível em relação a riscos nas fronteiras quanto ao levantamento de Schengen, "não" à utilização ilegal, como aconteceu há um ano atrás, contra Deputados deste Parlamento, contra a voz deste Parlamento, contra a voz do Governo, que protestaram contra a proibição de entrada em Espanha. Que não haja a vergonha, Sr. Ministro, de esse levantamento de controlo de fronteiras ser feito só em função da cor da pele e de preconceitos políticos, porque isso seria diminuir a liberdade.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, falou-nos de alguns aspectos que, à partida, consideramos essenciais em relação a este tema: seriedade e verdade, serenidade, mas também firmeza e determinação.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, a primeira coisa que é preciso fazer quando falamos da questão do terrorismo é compreendermos a ameaça e sabermos com o que estamos a lidar.
O terrorismo não é único, não é sequer definível por um único padrão, mas tem em causa objectivos que são perfeitamente perceptíveis de serem compreendidos: o primeiro, é o de pôr em causa a democracia; o segundo, é o de destruir a liberdade; o terceiro, e o fundamental, é o de instigar o medo, o receio, e obrigar as democracias e os países que vivem em liberdade a alterar o seu padrão e o seu comportamento de vida.

O Sr. Gonçalo Capitão (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - Este é o objectivo do terrorismo.
Definido este objectivo, é preciso, para além da firmeza e da determinação no combate a esse mesmo terrorismo, recusar já e peremptoriamente o discurso do alarmismo.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - O discurso do alarmismo tem um padrão: o de certas ambiguidades contra o conceito do terrorismo, ambiguidades que entendem que o problema não é o fanatismo nem o grau de fanatismo, mas certas causas por definir e que, no limite, levam a discursos de um grau de irresponsabilidade tão grande como aquele que ontem foi feito pelo Secretário-Geral do Partido Comunista Português,…

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

… procurando dizer que os responsáveis pela possibilidade de uma ameaça terrorista são os líderes da democracia. Não são! Os responsáveis são sempre os terroristas. É sempre necessário combater os terroristas.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É preciso clarificar esse aspecto e dizer também que esta associação que ouvimos sempre entre a presença de forças de segurança portuguesas no Iraque, cujo trabalho nos honra, e a questão do terrorismo e dos atentados é uma associação falsa.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Porque o que está em causa no Iraque, hoje em dia, é ajudar à estabilização e à transição, com a cobertura das Nações Unidas.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Isso é óbvio e indiscutível. Não é verdade que tenha sido por força da questão do Iraque que há atentados terroristas. Vejam os atentados em Marrocos, vejam os atentados na Indonésia e pensem que não há instituição que esteja a salvo. Nem a Cruz Vermelha, nem as Nações Unidas. Foi por isso que Sérgio Vieira de Melo morreu.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Ministro, esta firmeza tem de ter consequências.
Gostaria de lhe perguntar sobre os resultados deste trabalho e destes conselhos que têm sido mantidos.
Por outro lado, gostaria que falasse da relevância para Portugal, mesmo antes do atentado de 11 de Março, em Madrid, no nosso conceito de segurança e no nosso conceito estratégico, do terrorismo e da ameaça do terrorismo.
A noção que temos, designadamente a nível da própria a Unidade de Coordenação Anti-Terrorista (UCAT), é que esta preocupação e a articulação das forças de segurança portuguesas estava prevista e pensada mesmo antes deste atentado de Madrid. Esta é uma matéria relevantíssima porque este combate faz-se a nível interno, gerando unidade e capacidade das forças de segurança, e a nível externo, estabelecendo parcerias entre todas as democracias, unindo, juntando e colaborando, como ainda ontem dizia - e bem - o Comissário europeu António Vitorino.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

É esse o caminho que tem de ser prosseguido.
O combate ao terrorismo só actua de uma forma interventiva e preventiva da segurança, porque é a liberdade que queremos proteger.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

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O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Gostaria de agradecer a participação de todos os Srs. Deputados e, se me é permitido, tendo em conta o tempo que me é concedido, de fazer alusão a algumas questões que me impressionaram de modo particular.
Em primeiro lugar, e começando pelo Sr. Deputado Francisco Louçã, quero dizer-lhe, muito francamente e com toda a simpatia, que hoje o seu discurso parecia o de um "cordeirinho", porque, na verdade, as suas atitudes e, sobretudo, as tomadas de posição públicas que tem assumido são perfeitamente inaceitáveis no que respeita à retirada da GNR do Iraque e às escutas, ao que lhe respondo com poucas palavras: Portugal assume compromissos na ordem internacional, que cumpre. Portugal é um país credível, que está no Iraque juntamente com um conjunto de países, algumas dezenas de países que se associaram para ajudar o povo iraquiano ao estabelecimento da paz, da liberdade, da segurança e da democracia, e Portugal cumpre, com toda a firmeza e determinação, os compromissos que assume na ordem internacional. É assim que tem de ser. De outra maneira era ceder ao terrorismo!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em relação à segunda questão, devo dizer que o Sr. Deputado, ao criticar o problema das escutas, no fundo estava a criticar o nosso sistema de direito, porque tudo está a ser feito no rigoroso e estrito cumprimento da lei e tudo está estabelecido no quadro da legitimidade e do Estado de direito.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Não é o que diz a Ordem dos Advogados!

O Orador: - Digo-lhe, Sr. Deputado, que fazer um discurso nesses termos, de fraqueza, de cedência, é fazer um discurso a favor do terrorismo!

Vozes do PSD: - Muito bem!

Risos do BE.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ó Sr. Ministro, tenha juízo!

O Orador: - O Sr. Deputado António Filipe teve hoje uma atitude que apreciei, e que quero reconhecer como sendo muito responsável, mas não posso deixar passar em claro o facto de ela ser contrastante com o que, ontem, todos os órgãos de comunicação social anunciaram acerca da atitude irresponsável do Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - É verdade!

O Orador: - Ao acusar, ao "apontar o dedo" ao Primeiro-Ministro no sentido de ser responsável relativamente a tudo aquilo que de mal possa acontecer - inclusive o terrorismo -, o Sr. Deputado Carlos Carvalhas está objectivamente a fazer o "jogo" do terrorismo!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - É isso mesmo!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, temos de compreender que, nestas matérias, estamos, ou não, do lado do Estado de direito, do lado da democracia, da liberdade e da segurança. E gostei particularmente de ouvir a intervenção do Sr. Deputado António Costa, porque esse é o sentido da responsabilidade, o sentido da clareza com que estes problemas têm de ser abordados, mas também o da legitimidade do maior partido da oposição em sublinhar aquilo que, na sua opinião, tem de ser feito. Exactamente por isto, e com a consideração que me merece, quero responder a duas ou três questões que o Sr. Deputado sublinhou.
Em primeiro lugar, no que respeita à reorganização do Serviço de Informações de Segurança, gostaria de lembrar que a preocupação do Sr. Primeiro-Ministro desde o início foi a de desenvolver esta análise em perfeita articulação com o maior partido da oposição. Penso que é assim que tem de ser, o que não significa desconsideração para com os outros grupos parlamentares, porque, na verdade, trata-se de matérias em que é preciso criar o máximo de consenso e, por isso mesmo, pensamos que é perfeitamente normal desenvolver este debate com o Partido Socialista.

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No quadro das reuniões que tiverem lugar, é possível prever que, no início de Abril, o Governo estará em condições de apresentar um projecto de revisão da lei orgânica dos serviços de informações, diria mais, do sistema de informações da República, que gostaríamos de continuar a desenvolver com a colaboração e a audição do Partido Socialista. Seja qual for o resultado (procuraremos naturalmente um consenso), estamos determinados a fazer essa revisão, porque o nosso objectivo, Srs. Deputados, é o de conferir maior eficácia à actividade destes serviços cuja acção é essencial no quadro da prevenção e da análise de tudo o que tem a ver com os actos de defesa da segurança do Estado e dos cidadãos.
Sr. Deputado António Costa, a propósito de uma outra questão que referiu, e que me preocupa por ter constatado algumas falhas no sistema de segurança de certos aeródromos que citou, gostaria de sublinhar que todo o dispositivo territorial das forças e serviços de segurança, nomeadamente a Guarda Nacional Republicana e as restantes autoridades, foi mobilizado para cobrir todos os pontos sensíveis, tais como aeródromos, aeroportos, sistema de comunicações, redes viárias e aglomerações de população. Posso admitir que, no momento concreto em que o Sr. Deputado esteve nesse local, tenha havido alguma deficiência, da qual tomarei nota, mas V. Ex.ª pode ter a certeza de que todo o dispositivo nacional está mobilizado para prestar uma atenção específica a esta matéria.

O Sr. António Costa (PS): - Não há aparelhos!

O Orador: - Uma outra questão é a que o Sr. Deputado acaba de indicar, a do próprio equipamento do aeródromo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não há!

O Orador: - Essa é obviamente uma questão em relação à qual não vai pedir directamente responsabilidades ao Ministro da Administração Interna, porque são as autoridades aeronáuticas que terão de responder por isso.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, o seu tempo esgotou-se. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Concluo, Sr. Presidente, dizendo que o Governo está a fazer tudo aquilo que é possível fazer, no quadro da dotação do meios necessários, para garantir a segurança das pessoas e bens. Tenho a garantia do Sr. Primeiro-Ministro e da Sr.ª Ministra das Finanças de que, nestas circunstâncias, não haverá dificuldades em fazer mais investimentos a favor do reforço da segurança.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E é nesta convicção que nós, Srs. Deputados, temos de continuar a trabalhar, na certeza, porém, de que não estamos imunes, de que o terrorismo não tem rosto, não tem hora, nem local de actuar, e é só com um espírito de resistência, de vigilância e de prevenção que podemos impedir os efeitos desastrosos e catastróficos desse grande mal que afecta todas as nossas sociedades.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental da defesa da honra pessoal, em relação a uma referência feita pelo Sr. Ministro da Administração Interna, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas. Dispõe, para o efeito, de 3 minutos.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, não deveria, do meu ponto de vista, fazer afirmações com base em títulos de jornais.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Eu ouvi na televisão!

O Orador: - O Sr. Ministro tem os seus serviços, e, antes de vir ao Parlamento, deveria ter lido o que eu afirmei.
O que afirmei, repito, é que não se combate o terrorismo com terrorismo de Estado. Não se combate o terrorismo substituindo o direito internacional pelo autoproclamado direito dos Estados Unidos da América de bombardearem, a milhares de quilómetros de distância, um outro país, criando vítimas inocentes. Não se combate o terrorismo com uma guerra de ocupação e com uma guerra preventiva.

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Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Demagogia!

O Orador: - Do nosso ponto de vista, combate-se o terrorismo, também aqui em Portugal, motivando as Forças Armadas, e, para isso, é necessário cumprir as promessas do Dr. Paulo Portas; é necessário ir ao encontro de reivindicações justas destas mesmas forças de segurança.
Sr. Ministro da Administração Interna, o povo espanhol, com a resposta que deu e com a compreensão que teve do fenómeno, também está a favorecer o terrorismo?!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Não é nada disso!

O Orador: - Creio que irresponsabilidade é o facto de o Ministro da Administração Interna vir aqui fazer afirmações sem ter em conta o que foi afirmado.
Do nosso ponto de vista, defende-se o nosso país e combate-se o terrorismo motivando as forças de segurança e retirando as forças da GNR do Iraque.
Era isto que queria dizer-lhe, e espero que leia com atenção aquilo que eu afirmei e que não faça afirmações com base em títulos de jornais.
O Sr. Primeiro-Ministro é responsável do ponto de vista em que enviou forças de GNR para o Iraque.

Vozes do PCP: -Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É uma vergonha!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Isso é indecente!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Nem teve palmas!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Carlos Carvalhas fugiu completamente à questão principal,…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … porque o que eu li, o que foi dito foi que o Sr. Deputado disse que o Primeiro-Ministro de Portugal seria politicamente responsável por qualquer problema, por qualquer atentado terrorismo que fosse levado a cabo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - Isto é inaceitável! Isto é irresponsável! Isto não pode ser entendido senão como cedência ao terrorismo, porque é isto que eles pretendem; é esta cedência que eles pretendem!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Isto é fazer o "jogo" do terrorismo, e nós não podemos aceitar esta situação!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de darmos início ao período da ordem dia, o Sr. Secretário vai proceder à leitura de um parecer da Comissão de Ética, que se refere a uma diligência judicial que terá lugar amanhã.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo do Tribunal judicial da Comarca do Cartaxo - Processo n.º 241-A/2001 -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Herculano Gonçalves (CDS-PP) a prestar depoimento, por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 17 horas.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem do dia com o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 114/IX - Cria as comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios.
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Florestas.

O Sr. Secretário de Estado das Florestas (João Alves Soares): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A eficácia de toda a estratégia da defesa da floresta contra incêndios depende, em última análise, do saber dos diferentes actores e da capacidade de coordenar a acção dos agentes que, em cada momento, desenvolvem actividades no domínio da prevenção, da detecção e do combate aos fogos florestais.
A recente criação da Agência para a Prevenção de Incêndios Florestais, no âmbito do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, tem por objectivo o reforço e a estruturação central da prevenção, vigilância, detecção e apoio ao combate aos fogos florestais, instituindo-se, assim, um modelo orgânico com funções de planeamento e coordenação (central, repito) como estava, aliás, previsto, como objectivo prioritário, na Lei de Bases da Política Florestal, aprovada por unanimidade nesta Câmara, em 1996.
A Agência vem, assim, preencher uma lacuna no sistema, visando tornar a acção da Administração mais eficaz em matéria de incêndios florestais, actuando de forma concertada, procurando soluções conjuntas e assegurando a interligação entre as diferentes entidades com responsabilidades na prevenção e protecção da floresta contra incêndios.
Acontece que nem a Lei de Bases da Política Florestal seria efectivamente respeitada, nem a Agência poderia induzir acções eficazes em grande parte do território nacional, se não se criassem, ao nível municipal, entidades afins capazes de concertarem estratégias e de implementarem acções concretas de prevenção e protecção das florestas contra incêndios.
O diploma hoje presente ao Parlamento é o reconhecimento da indispensabilidade e das mais-valias proporcionadas pelo poder autárquico municipal em matéria de defesa da floresta contra incêndios.
Espera-se das comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, sob a presidência e a orientação do eleito local, a congregação de esforços e estratégias dos serviços locais com responsabilidades na gestão e conservação das áreas florestais (estejam estas responsabilidades ancoradas no Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas ou no das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente), o conhecimento dos planos e meios dos corpos de bombeiros do concelho e ainda o planeamento da intervenção e o conhecimento do dispositivo das forças locais de segurança em caso de incêndio.
A estas vontades juntar-se-á a voz e a acção das organizações representativas dos produtores florestais locais e de outras entidades com relevante papel na floresta do concelho de forma a que, em consonância com os meios da câmara municipal, se possa elaborar um plano concelhio de defesa da floresta onde se prevejam e planeiem, de forma integrada, as intervenções das diferentes entidades com competências em matéria de protecção civil, em geral, e de defesa da floresta, em particular.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É neste âmbito que melhor se poderá sensibilizar a população e é neste quadro que deverá ter lugar a criação de grupos de autodefesa, cujo embrião são as equipas de sapadores florestais já constituídas e recentemente reforçadas, destinadas a mobilizar os cidadãos e as suas organizações representativas.
Não se trata pois de sobrecarregar os municípios com mais competências sem os respectivos meios.

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Trata-se tão-só de pôr ordem no edifício jurídico hoje existente e que já, desde 1980, prevê textualmente, no artigo 3.° do Decreto Lei n.º 327/80, de 26 de Agosto - repetido, aliás, ipsis verbis na Lei n.º 10/81, de 10 de Julho -, que "os municípios têm responsabilidades em matéria de protecção civil".
Tudo isto afinal para enfatizar que a actual proposta de lei não implica despesas adicionais para as câmaras municipais, antes reorganiza as suas competências em matéria de defesa da floresta contra incêndios, criando as condições para que todas as entidades representadas nestas comissões contribuam para o colectivo no exercício das respectivas competências próprias.
Trata-se, adicionalmente, de consolidar um órgão de nível autárquico dotado de competências e objectivos próprios, não o reduzindo a um mero órgão consultivo do presidente de câmara, como, aliás, o não são as actuais comissões especializadas de fogos florestais, que agora se pretendem extinguir.
As comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, cuja criação é agora proposta, são de facto a pedra angular do edifício que pretende consubstanciar uma mais eficaz preservação da floresta contra esse seriíssimo risco que é o fogo florestal.
Fica, pois, à consideração deste Parlamento a oportunidade de concretizar uma medida que se traduzirá, na prática, no reforço da preservação do património florestal nacional, através do envolvimento crescente e consequente do poder autárquico e dos diferentes agentes que, a nível local, têm responsabilidades na floresta portuguesa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Cambra.

O Sr. Manuel Cambra (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Florestas, a proposta de lei n.º 114/IX, que hoje discutimos, visa a criação das comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios.
No fundo, esta proposta de lei, que é apresentada à Assembleia da República, prevê a criação de miniagências ao nível municipal e a integração no sistema municipal de protecção civil, que visa, a este nível, levar a efeito as medidas concretas de defesa e prevenção de incêndios florestais integradas num plano municipal de defesa da floresta que defina as orientações necessárias para o efeito e que inclua a previsão e planeamento integrado das intervenções das diferentes entidades perante a ocorrência de incêndios.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Assim, e através desta proposta de lei, o Governo reconhece a importância das autarquias locais na prevenção e protecção da floresta no que aos incêndios florestais diz respeito. Muitas são as autarquias que hoje desempenham um papel decisivo nesta matéria, nomeadamente no que se refere à prevenção dos incêndios florestais. Mas há ainda muito a fazer.
É importante que os autarcas desempenhem este papel de coordenação e de prevenção, um papel activo em todo os sistemas de combate aos incêndios florestais, porque são eles que, todos os dias, contactam mais de perto com a realidade e, como tal, que melhor a conhecem.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, as comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios desempenharão acções claramente executivas que se traduzem em novas competências que são transferidas para os municípios. Estas novas competências exigem uma maior e melhor preparação quer em meios humanos quer em meios técnicos e financeiros.
Como tal, Sr. Secretário de Estado, pergunto-lhe: parece-lhe que o apoio técnico e administrativo a estas novas comissões, por parte do Serviço Municipal de Protecção Civil, será suficiente para o seu bom funcionamento?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, gostaria de o questionar quanto ao modo de financiamento do gabinete técnico florestal, que me parece essencial para o funcionamento destas comissões.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Florestas.

O Sr. Secretário de Estado das Florestas: - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Manuel Cambra pergunta-me, em concreto, que tipo de apoio técnico e administrativo a comissão concelhia de protecção civil pode dispensar a esta comissão municipal e se o mesmo é suficiente.
Do entendimento que temos da missão que está perante as comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, obviamente que este apoio não é total, não é satisfatório, não é completo. Daí pensarmos que a institucionalização da comissão municipal é, como referi na minha intervenção, a oportunidade para que todas as entidades com representação local possam contribuir com as suas competências, ajudando, numa lógica autárquica da defesa da floresta contra incêndios.
Consequentemente, vai caber aos departamentos do Ministério da Agricultura presentes na comissão concelhia e ao departamento do Ministério do Ambiente presente na comissão municipal de defesa da floresta contra incêndios, com os seus meios e o seu saber, o reforço da capacidade técnica da comissão municipal. Donde, trata-se de juntar esforços locais, porque entendemos que essas competências se perderiam se vertessem apenas na direcção do poder central.
Há um local, há uma oportunidade para que o saber e as competências dos serviços locais dos Ministérios da Agricultura e do Ambiente, nomeadamente - e, depois, em matéria menos técnica, mais operacional, no domínio das forças de segurança, designadamente da GNR -, revertam a favor do saber autárquico na defesa da floresta contra incêndios. Trata-se, por isso, de juntar meios e vontades locais.
Quanto a saber se os meios são suficientes, obviamente que todos os meios poderão ser necessários e seria desejável que existissem mais meios. Estamos a contar que a agência nacional de protecção da floresta contra incêndios (e está previsto nas suas competências) possa vir a ser dotada - e esperamos que isto possa ocorrer já no Orçamento para 2005 -, de modo a concorrer para o apoio técnico dos gabinetes técnicos, que, estes sim, estão previstos a nível municipal.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Florestas, penso que é inegável a importância de uma estrutura representativa de várias instituições locais com responsabilidade em matéria de gestão e planeamento florestal. De qualquer modo, penso que é fundamental apercebermo-nos da eficácia das propostas que apresentamos.
É justamente por isto que desejo colocar algumas questões ao Sr. Secretário de Estado, na medida em que esta proposta de lei atribui claramente, como competências às comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, entre outras: a elaboração de um plano de defesa da floresta, para além do plano nacional e dos planos regionais de ordenamento florestal; o desenvolvimento de acções de sensibilização da população; a promoção da criação de grupos de autodefesa dos aglomerados populacionais e respectiva dotação de meios de intervenção; a execução da cartografia de infra-estruturas florestais; e proceder à sinalização das infra-estruturas florestais de prevenção e protecção da floresta.
Ora, ao contrário daquilo que o Sr. Secretário de Estado aqui afirmou, a opinião da Associação Nacional de Municípios Portugueses é de que estas competências representam, de facto, competências acrescidas para os municípios e não são acompanhadas da necessária compensação financeira para a execução das mesmas. Na verdade, o relatório e o parecer da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) é muito claro na sua conclusão, dizendo: "Em face do exposto, a Associação Nacional de Municípios Portugueses emite parecer desfavorável ao projecto em apreço, reafirmando que estão em causa novas competências e que estas têm de ser acompanhadas dos correspondentes meios financeiros".
É por isto que eu gostava, Sr. Secretário de Estado, que explicitasse melhor esta contradição entre aquilo que V. Ex.ª acabou de referir e a informação que acabo de citar da Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Por outro lado, eu gostaria de perceber se, para além da coordenação, existe de facto algum tipo de hierarquia entre a agência nacional e estas comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Florestas.

O Sr. Secretário de Estado das Florestas: - Sr. Presidente, Sr.ª Heloísa Apolónia, agradeço as suas questões.
A primeira questão que coloca diz respeito ao conjunto de competências das comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, que, na visão da Associação Nacional de Municípios Portugueses,

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representa um acréscimo de competências.
Contudo, se olharmos para o edifício legislativo que existe hoje (e tive ocasião de o fazer na Associação Nacional de Municípios Portugueses com umas largas dezenas de presidentes de câmara), verificamos que esta legislação não traz objectivamente competências acrescidas, o que faz é arrumá-las na sede da comissão concelhia, em vez de estarem dispersas, como sucede hoje, ora pelo presidente de câmara, ora pelas comissões especializadas de fogos florestais, ora por órgãos informais que têm existido com um carácter quase sazonal, porque existem durante meses e desaparecem a seguir. Donde, não há propriamente uma contradição nesta proposta; o que eu diria, com o devido respeito, é que há uma contradição na posição da Associação Nacional de Municípios Portugueses, que (e vou usar uma expressão talvez um pouco violenta) aproveita esta questão para se pôr numa posição um pouco "mercantilista", que é a de: "Se temos de receber competências, recebamos também dinheiro"!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Será mercantilista ou será lógica?

O Orador: - Na verdade, o que sucede é que estas competências são rearrumadas. Por exemplo, a lei publicada em 1993, que estabelece a obrigação dos planos municipais de intervenção da floresta, já prevê esta obrigação relativamente ao presidente de câmara. Por consequência, esta não é uma questão nova. O que acontece é que há uma nova arrumação de competências e não um acréscimo de competências.
Mais: no seio das comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios pretende-se que cada um dos membros presentes contribua com as suas competências para o resultado da comissão municipal. Não se está a atribuir, no âmbito da comissão municipal, competências ao presidente de câmara para delas fazer o uso integral.
Quanto à questão que coloca relativamente à hierarquia, não há obviamente hierarquia entre a Agência e as comissões. Pretende-se, isto sim, que a Agência seja um facilitador do trabalho das comissões, nomeadamente (e referiu o levantamento de cartografia) dispondo dos serviços centrais que dão a informação base para que as comissões municipais possam desenvolver o seu trabalho com o apoio da Agência de base.
Admite-se - e esta é uma filosofia que a própria legislação da Agência prevê - que, dotada dos respectivos meios financeiros, a Agência possa acorrer às necessidades financeiras das comissões municipais para fins específicos das suas competências.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Florestas, Sr.as e Srs. Deputados: Começo, naturalmente, por saudar de modo particular não só a presença do Sr. Secretário de Estado mas também a apresentação que nos faz das comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, comissões estas que, no fundo, procuram estruturar a nível local os modos de intervenção no que se refere à prevenção, detecção e combate aos incêndios florestais. E, de facto, é necessário agir também nesta matéria e neste caso concreto ao nível local. Desde logo porque as florestas têm uma importância vital pela sua contribuição essencial para o equilíbrio ecológico, particularmente no que refere à regulação do ciclo hidrológico, mudanças climáticas e preservação da biodiversidade, mas também - e não menos importante - pela sua importância económica e social e pela sua incidência nas comunidades e na vida das pessoas, nos bons e nos maus momentos.
Ou seja: a floresta tem uma relevância económica considerável, constituindo uma verdadeira riqueza nacional responsável por cerca de 4% do PIB nacional. Tem ainda efeitos de grande relevância em termos ambientais, paisagísticos, de lazer e muitos outros. Mas tem igualmente nefastas consequências, aqui numa outra vertente, em todos os seus aspectos, quando é consumida por incêndios.
Por isso, importa tomar as medidas necessárias para evitar situações como as que ocorrem todos os anos no Verão ou por alturas do Verão. E importa fazê-lo tirando ilações das insuficiências e ineficiências que, há décadas, se vêm fazendo sentir e que, no ano passado, atingiram as proporções de todos conhecidas, pelo que é preciso que as medidas sejam consequentes e eficazes.
É necessário, por isso, envolver a comunidade científica não só no diagnóstico mas, sobretudo, na definição das medidas e acções a encetar. E, nesse particular, recordo aqui que o Dr. Domingos Xavier Viegas, ilustre estudioso destas matérias, refere expressamente a necessidade de não só envolver diversas entidades mas também que estas trabalhem próximo da realidade e de forma articulada.
É esta, precisamente, a filosofia destas comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, que, convém referi-lo, surgem num contexto mais vasto da reforma do sector florestal, reforma esta assente num conjunto de medidas, das quais destaco, pela sua importância, as seguintes: criação da direcção

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-geral dos recursos florestais; criação do programa "sapadores florestais"; criação do fundo florestal permanente; criação da agência para a prevenção de incêndios florestais; criação de uma estrutura de missão para o planeamento da intervenção e coordenação das acções de recuperação das áreas florestais afectadas pelo fogo no ano transacto; e criação destas comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios.
De onde resulta uma teia de medidas e estruturas, devidamente articulada, que permitirá - é a nossa convicção - resolver ou, pelo menos, atenuar os vários problemas e fragilidades evidenciados pelos acontecimentos do Verão do ano passado.
Numa estratégia de defesa da floresta e combate aos incêndios estruturada em três níveis fundamentais - nacional, distrital e municipal -, falamos agora, portanto, da actuação ao nível municipal. E esta é, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados, a estratégia certa. Di-lo qualquer raciocínio imediato e intuitivo, dizem-no também os especialistas, e disseram-no também inúmeras personalidades e entidades que foram ouvidas na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais.
Haverá, porventura, necessidade de ponderar algumas questões, desde logo algumas suscitadas pela Associação Nacional de Municípios Portugueses, designadamente - e refiro apenas uma - quando alerta para o facto de a composição das comissões municipais poder dificultar o exercício das suas atribuições de carácter executivo. Pois que se pondere, mas pondere-se também a necessidade, de acordo com a preocupação, de resto, aqui já expressa pelo Sr. Deputado Manuel Cambra, de estas comissões terem, de facto, mecanismos e meios para agir, para actuar, de acordo também com o que o Sr. Secretário de Estado aqui referiu, mas que não se perca a noção das prioridades, que não se esqueça que urge agir e que tem de se actuar com vista à defesa do mais importante recurso renovável do País - a floresta.
É esta a preocupação que V. Ex.ª, Sr. Secretário de Estado, aqui nos trouxe; é esta acção que esta proposta de lei nos dá conta. Eu diria que também neste particular se vê que Portugal está em acção.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Medeiros.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Florestas, Sr.as e Srs. Deputados: O facto de só hoje, seis meses passados sobre a tragédia dos incêndios de 2003, o Governo vir a esta Assembleia apresentar a proposta de lei n.º 114/IX, que cria as comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, é bem elucidativo da prioridade e da eficácia com que tem vindo a tratar o problema da prevenção e do combate aos incêndios florestais.
O Governo conseguiu a proeza, aliás bastante negativa, diga-se de passagem, de, com excepção da criação do fundo florestal permanente -curiosamente uma medida de natureza fiscal - e da estrutura de missão para a reflorestação, que é uma missão a médio e longo prazo, não ter cumprido um único dos prazos que se impôs a si próprio, no que respeita à apresentação dos diplomas previstos na Resolução do Conselho de Ministros de 31 de Outubro de 2003, que aprovou as grandes linhas orientadoras da reforma do sector florestal e calendarizou as medidas legislativas tendentes à sua concretização.
Na verdade, apesar da pompa e circunstância com que foi divulgado o comunicado do Conselho de Ministros de 4 de Fevereiro, no qual era suposto o Governo mostrar serviço neste domínio, a conclusão a que se chega no final da sua leitura é a de que apenas duas, das seis medidas nele previstas dadas como concretizadas e que constituem a coluna vertebral do sistema, estavam em condições de avançar, desde logo: a criação do fundo de florestal permanente e a estrutura de missão para a reflorestação.
Em qualquer dos casos, e apesar da sua inquestionável importância, trata-se de duas medidas cujo alcance é de médio e longo prazo, logo sem qualquer significado prático, no que respeita à prevenção e ao combate, já no corrente ano de 2004.
A comprovar o que aqui acabo de afirmar está o facto de tanto o diploma que cria a Agência para a prevenção dos incêndios florestais como o diploma que cria o novo programa de "sapadores florestais" na dependência da direcção-geral dos recursos florestais e, bem assim, o próprio diploma que cria esta direcção-geral se encontrarem ainda e há data em audição pública, o que tem como consequência prática a impossibilidade da sua entrada em vigor enquanto esta não estiver concluída e o diploma aprovado em versão final e definitiva pelo Conselho de Ministros.
O Governo não cumpre os prazos que ele próprio define e com os quais se compromete publicamente. Comporta-se como um mau aluno que nem com os seus próprios erros está disposto a aprender, e, neste caso, com uma diferença fundamental: as consequências não sobram para o aluno, sobram para o País.
Ou seja, de todas aquelas medidas de cariz eminentemente operacional e que era suposto estarem concretizadas, no calendário do próprio Governo, até 31 de Janeiro, nenhuma está em condições de ser posta em prática.

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Esta é, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, a lamentável realidade com que nos confrontamos hoje, seis meses volvidos sobre a tragédia do último Verão e a poucos dias do início da época crítica de 2004.
Já em Dezembro de 2003, tive oportunidade, nesta Câmara, de manifestar, em nome da minha bancada, a nossa profunda preocupação com a preparação do dispositivo de prevenção para 2004, que, já na altura, considerávamos significativamente atrasada. Agora, três meses depois, a nossa preocupação não só não desapareceu como, infelizmente, se acentuou bastante.
Parece que, ao longo deste tempo, as únicas preocupações que o Governo teve foram as de encontrar bodes expiatórios para o sucedido em 2003 e as de produzir mediáticas resoluções e comunicados do Conselho de Ministros, que ainda nada produziram, para além de expectativas e desespero dos agentes no terreno, particularmente dos municípios e dos bombeiros, por vezes tão injustamente tratados e reconhecidos.
Lembremo-nos apenas do atraso com que têm sido processados os pagamentos aos bombeiros para reposição do material que tinham operacional antes dos incêndios de 2003 e daquilo que o próprio Sr. Secretário de Estado das Florestas acabou aqui de dizer relativamente àquele que é, na sua visão, o mercantilismo subjacente à atitude das câmaras municiais, da qual nós, manifestamente, discordamos.
Quanto ao diploma que hoje aqui estamos a discutir,…

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Enfim, o diploma!

O Orador: - … ele decorre de uma exigência improrrogável, dado que se trata de substituir as CEFF (Comissões Especializadas de Fogos Florestais) municipais por um novo organismo, designado por comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, que, naturalmente, vem suprir e ultrapassar um vazio que se arrastava há um ano, criado por este Governo quando extinguiu a CNEFF (Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais), deixando sem qualquer orientação ou directiva as estruturas municipais de defesa da floresta. Já lá vão praticamente dois anos desde que este Governo está em funções, e apenas temos assistido a reformas e a contra-reformas, continuando todo o problema por resolver.
No entanto, e apesar da demora em chegar à Assembleia, o presente diploma nem por isso responde e incorpora todas as necessidades.
Ao não prever os meios financeiros necessários à concretização dos objectivos propostos, suscitou, desde logo - e muito bem! -, o parecer negativo da Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Por outro lado, ao não prever a inclusão das juntas de freguesia na sua estrutura, marginaliza, desde logo, a autarquia mais próxima da floresta e dos proprietários e aquela que mais sente no dia-a-dia os problemas com os quais a floresta se debate e que revela um profundo conhecimento do terreno, conforme ficou amplamente demonstrado na audição em que a ANAFRE (Associação Nacional de Freguesias) teve oportunidade de participar nesta Assembleia e que foi reconhecido amplamente por todos os partidos na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais.
Por último, ao não incluir os representantes das escolas e dos agrupamentos de escolas, deixa de lado aqueles que, no futuro, serão o garante de que teremos cidadãos conscientes, amigos da floresta e que tudo farão para a defender - e isto parece-nos uma lacuna bastante grave e que urge ser reparada.
Neste quadro, parece-nos que seria mais prudente que o presente diploma baixasse à comissão para nele serem introduzidas as modificações e melhorias consideradas oportunas e que, no prazo de uma semana, pudéssemos concluir aqui a sua aprovação em votação final.
Atentos os atrasos já registados e o facto de a maioria das autarquias nesta altura já terem, na ausência de orientações, desencadeado, de motu proprio, os mecanismos que habitualmente utilizam, esta sugestão não significaria um atraso problemático, permitindo, pelo contrário, dotar os municípios de um instrumento mais adequado ao seu desempenho neste domínio.
Aqui fica, pois, Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado e Sr.as e Srs. Deputados, o nosso contributo para este debate, que se reveste da maior importância para o País e para os nossos concidadãos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Reis.

O Sr. Vítor Reis (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Miguel Medeiros, quero dizer, em primeiro lugar, que estranhei a forma como V. Ex.ª abordou este problema perante a proposta de lei que o Governo aqui nos traz.
Penso que é claro que o Governo nos traz uma proposta que visa criar a nível local uma estrutura que dê resposta àquelas que são as necessidades de organização e de coordenação entre as diversas entidades

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que, no âmbito municipal, podem dar o seu contributo nesta matéria.
Daí que a primeira coisa que estranho é que V. Ex.ª confunda participação com eficácia, quando, se calhar, podemos conseguir as duas coisas. O que estou a querer dizer com isto, Sr. Deputado, é que estranho que o senhor reclame pela participação de juntas de freguesia num processo que todos nós sabemos ser um processo de coordenação em termos municipais, quando aquilo que a proposta de lei nos traz é precisamente o envolvimento dos agentes municipais nesta matéria.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O segundo aspecto, este, sim, o mais grave, Sr. Deputado, é a forma como o senhor deturpa o que se está a passar. O Governo está a cumprir um calendário de uma reforma florestal que o seu governo prometeu fazer e atrasou.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Exacto!

O Orador: - E o interessante é que o senhor vem dizer que esta medida chega aqui com seis meses de atraso, quando os senhores estiveram seis anos para implementar o fundo florestal permanente e não o fizeram.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Seis anos!

O Orador: - Seis anos, Sr. Deputado!

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Bem lembrado!

O Orador: - Talvez os senhores se tenham esquecido… Os senhores poderiam ter demorado seis anos, mas tê-lo feito. Porém, os senhores demoraram seis anos e não o fizeram.

O Sr. Marco António Costa (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E aqui nós não estamos com atrasos, Sr. Deputado. Gostava de recordar-lhe o calendário a que o Governo se propôs em matéria de reforma florestal.
Sr. Deputado, qual é a opinião do Partido Socialista, porque esta é a questão central, quanto à concentração de competências em matéria de prevenção na área do Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e na criação da Secretaria de Estado das Florestas? A questão central da reforma florestal, Sr. Deputado, é esta, e o papel destas comissões tem a ver com isto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Medeiros.

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vítor Reis, fico profundamente espantado quando o oiço estranhar o facto de eu me ter referido às juntas de freguesia. Não percebo como é que o senhor, que até é um homem com uma grande experiência no poder local e a quem eu ouvi fazer protestos de grande consideração e até, no dia da audição com a ANAFRE, citar o excepcional exemplo e o profundo reconhecimento pelo trabalho por esta desenvolvido, se espanta por eu estar a levantar a questão das juntas de freguesia, que são uma estrutura autárquica que está, naturalmente, inserida e que é completamente indissociável da estrutura municipal e que são a primeira linha neste processo? Não percebo!
Sr. Deputado Vítor Reis, relativamente aos seis meses de atraso, quero dizer-lhe que os senhores não têm seis meses de atraso, os senhores, como dizia o meu camarada Vieira da Silva ontem ou anteontem numa sessão partidária, só têm "travão e marcha atrás". O que os senhores fizeram foi parar uma coisa que existia e que se sabia ter defeitos mas que funcionava e que tinha trabalho feito no terreno, que era a CNEFF, extinguiram-na, quando chegaram ao Governo (e tinham toda a legitimidade para o fazer), criaram o Núcleo de Protecção da Floresta dentro do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil, que foi uma coisa que ninguém percebeu, nem nunca se deu por ele, deixaram completamente desestruturada toda a orientação para as CEFF municipais e, agora, o que estão a fazer, com dois anos de atraso, é a vossa obrigação, porque estragaram o que havia. Se formos a ver bem, os senhores não estão com seis meses de atraso neste processo mas com 24 meses de atraso.

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Não se esqueçam que arderam 500 000 ha o ano passado…

O Sr. Vítor Reis (PSD): - O quê?!

O Orador: - Exactamente! E aconteceu o que aconteceu!

O Sr. Vítor Reis (PSD): - Está a crescer!

O Orador: - Não! Não está a crescer! O senhor sabe que é verdade.
Portanto, os senhores têm um problema para resolver. Os senhores criaram grandes dificuldades ao País, baralharam toda a estrutura e têm procurado lançar para cima dos bombeiros todos os anátemas e mais alguns sobre esta matéria.
Agora, ficámos a saber que o Sr. Secretário de Estado também acha que os municípios são mercantilistas, quando, legitimamente, pedem mais meios para exercerem mais competências.
Afinal, estamos perante um partido que esteve 18 anos no governo antes de o Partido Socialista lá chegar e nada fez nesta matéria, até extinguiu a Secretaria de Estado das Florestas, e agora vem dizer que nós em seis anos nada fizemos. Certamente, teremos cometido erros, mas pagámos por eles nas eleições; os senhores pagarão, provavelmente, nas próximas eleições, não vai perder pela demora.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Florestas, Srs. Deputados: O sector florestal português constitui uma riqueza estratégica cuja necessidade de preservação e de desenvolvimento recolhe a unanimidade nacional.
De um ponto de vista ambiental, é decisiva a sua contribuição para a conservação da natureza, para a promoção da biodiversidade, para a defesa contra a erosão, para a correcção dos regimes hídricos e para a qualidade da água e do ar.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Numa visão económica e social, a fileira florestal gera, no seu conjunto, cerca de 3% do valor acrescentado bruto da economia e 38% do território nacional está florestado.
Apesar da importância ambiental, económica e social da floresta, nem sempre, Sr. Deputado José Miguel Medeiros, a política tem sido consentânea com os princípios da prevenção, vigilância e apoio no combate aos incêndios florestais.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - A ténue gestão florestal, o excessivo parcelamento fundiário, o desordenamento e o abandono em que se encontram largas áreas florestais, sem desmatação e eliminação dos desperdícios lenhosos, entre outras razões, conduzem a situações de calamidade e catástrofe, como aquelas que se verificaram no Verão passado.
Todas as questões relacionadas com os fogos florestais são extremamente importantes no que toca não só aos aspectos económicos e ambientais mas, fundamentalmente, no que diz respeito às vidas das populações.
Os fogos, em primeiro lugar, evitam-se e só depois se combatem.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Muito bem!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Chamem o Ministro Figueiredo Lopes para ouvir isto!

A Oradora: - Parece-nos que a prevenção passa pelo planeamento, pelo ordenamento da floresta pelo plantio de novas espécies adequadas ao clima, pela sensibilização dos proprietários florestais e também pelo emparcelamento.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Muito bem!

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A Oradora: - Como sabemos, o primeiro patamar de responsabilidade legal no domínio da protecção civil e, consequentemente, no combate aos fogos florestais é o municipal.
Hoje, temos constituídas cerca de 220 comissões municipais de fogos florestais.
Como modo de dar resposta aos muitos problemas estruturais que o sector florestal enfrenta, o Governo aprovou, a 31 de Outubro de 2003, uma resolução que aprova as grandes linhas orientadoras da reforma estrutural do sector das florestas.
Da referida resolução consta o objectivo da criação das comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, enquanto centros de coordenação e acção local, no âmbito e sob a coordenação das câmaras municipais. É no cumprimento deste objectivo que se insere a presente proposta de lei n.º 114/IX, ora em debate neste Plenário.
Esta iniciativa legislativa fecha um modelo orgânico que se quer actuante e que naturalmente dê resposta à necessidade de estruturação da prevenção, da vigilância, da detecção e do apoio ao combate aos incêndios florestais.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - O modelo orgânico tem uma estrutura central de coordenação denominada "Agência para a Prevenção de Incêndios Florestais". As comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios são parte deste modelo para intervenção avançada ao nível local, em articulação estreita com a Agência.
Serão miniagências ao nível municipal, a integrar o sistema municipal de protecção civil, a quem incumbe levar a efeito medidas concretas de defesa e prevenção dos incêndios florestais, integradas num plano municipal de defesa da floresta que defina as orientações necessárias para o efeito e que inclui a previsão e planeamento integrado das intervenções das diferentes entidades perante a ocorrência de incêndios.
Contudo, não se pense que as comissões serão instâncias dependentes ou posicionadas na hierarquia da agência nacional. Se tal acontecesse estaríamos perante um problema por contrariar o princípio de autonomia do poder local.
Daí que, para o PSD, seja inquestionável que a comissão municipal de defesa da floresta contra incêndios seja uma entidade subordinada ao poder municipal, presidida pelo presidente de câmara, funcionando em articulação com a Agência para a Prevenção de Incêndios Florestais.
A presente iniciativa legislativa, numa perspectiva descentralizadora, inova em relação às competências das extintas Comissões Especializadas de Fogos Florestais, que, agora, têm atribuições e competências novas, como: articulação, no âmbito da sua área geográfica, das actuações dos organismos com competência em matéria de incêndios florestais; elaboração de plano de defesa da floresta; proposta de investimentos nos domínios da prevenção e protecção da floresta, bem como, proceder à execução dos mesmos; promoção de grupos de autodefesa; elaboração de carta de infra-estruturas e sinalização das mesmas de prevenção e protecção da floresta; aprovação de planos do fogo controlado.
Tudo isto, Srs. Deputados, é inovador em relação às CEFF.
Relativamente à composição da comissão, parece-nos que seria de incluir um representante dos sapadores florestais não só por constarem da Resolução do Conselho de Ministros mas fundamentalmente pelo facto de o diploma próprio, aprovado em 4 de Fevereiro passado, abrir a possibilidade de outras entidades públicas ou privadas constituírem equipas de sapadores, retirando o exclusivo às associações florestais.
Por outro lado, parece-nos que faria todo o sentido que, na composição da comissão, o presidente de câmara pudesse prioritariamente convocar representantes da instituição militar. A participação dos militares em funções de prevenção e combate aos fogos florestais é cada vez mais acentuada, aliás, é este procedimento que pode ser tomado na sequência das medidas apontadas no Livro Branco dos Incêndios Florestais Ocorridos no Verão de 2003.
O PSD entende como positiva a obrigatoriedade de constituição da comissão no prazo de 30 dias para os municípios cujo território se encontre classificado como zonas de risco ou áreas críticas.
De outro modo, parece-nos ajustado que o apoio técnico e administrativo sejam assegurados pelo Serviço Municipal de Protecção Civil, ficando na disponibilidade da câmara municipal criar gabinete técnico específico.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Já não nos parece tão ajustado que, em matéria de incêndios florestais, em situação de acidente grave, calamidade, ou catástrofe, a Comissão assegure o apoio técnico ao Centro Municipal de

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Operações de Emergência e Protecção Civil.
Mas não se retire destas considerações divergências quanto ao conteúdo.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Bem pelo contrário, Sr. Secretário de Estado, entendemo-las como contributos positivos para um texto legal que se quer, em plenitude, aplicado.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Com esta iniciativa legislativa (e, agora, falo muito especialmente para o meu colega de distrito, Deputado José Miguel Medeiros) fica concluído em seis meses o quadro legal das grandes linhas orientadoras da reforma do sector das florestas, ficando assim um quadro normativo da prevenção, detecção e combate aos fogos florestais completo - em seis meses e não nos seus seis anos anteriores!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - O PSD felicita o Governo pela celeridade e prioridade que conferiu a esta causa.
Estamos certos de que a sua aplicação por todos os intervenientes, com novos meios bem direccionados, evitará dramas e catástrofes que, de ano para ano, infelizmente, se têm repetido.
Estamos certos de que a sua aplicação com novos meios evitará danos ambientais e patrimoniais que são, como se sabe, apenas reparáveis no sacrifício do futuro dos nossos filhos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Medeiros, mas, como o PSD já dispõe de muito pouco tempo para a resposta, espero que as perguntas sejam de resposta "sim" ou "não".

O Sr. José Miguel Medeiros (PS): - Sr. Presidente, vou ser muito rápido.
Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro, começo por agradecer-lhe a monografia que nos fez sobre a floresta portuguesa, fico-lhe muito grato e penso que todos apreciámos esta parte. De facto, é bonita, é interessante e estamos todos de acordo.
Agora, eu percebo a incomodidade que os senhores têm relativamente a esta matéria. Percebo! É de facto um problema.
Sr.ª Deputada, veja o que se diz neste jornal: "Não se está a trabalhar como deveria". Sabe quem diz isto? O presidente da Comissão de Coordenação da Região Centro, em Vila de Rei, a propósito da questão das florestas.
Mais: "as câmaras municipais são as entidades certas para arrancar com a defesa da floresta" - disse, em 23 de Novembro, o Sr. Secretário de Estado das Florestas - e, agora, vem aqui dizer-nos que, afinal, as câmaras municipais são mercantilistas porque estão a pedir mais meios, já que lhe está a ser cometida a principal responsabilidade. Não são, assim, umas competenciazitas, é a principal responsabilidade, como a Sr.ª Deputada aqui muito bem disse, inclusivamente, fazendo valer, e bem, a autonomia do poder local.
Portanto, penso que de facto é fantástica e espantosa a forma como os senhores conseguem fazer de conta que nada se passa, que está tudo bem e que vivemos no melhor dos mundos.
Ainda por cima, a Sr.ª Deputada disse que o fizeram em seis meses, que já está pronto. Bom, a Secretaria de Estado só existe há seis meses, mal seria que nada tivesse feito! O problema é que os diplomas não estão em condições de entrar em vigor, estão em audição pública, pelo menos, é esta a informação que temos.

Protestos do PSD.

Agora, o problema é que as câmaras municipais - e peço que as oiça! - dizem-nos todas que não têm orientações, que ninguém sabe como isto vai funcionar. Este é um problema! De facto, os senhores têm feito uma grande barafunda e uma grande balbúrdia nesta matéria, mas não vos valem nem "livros brancos", nem "azuis", nem "verdes", nem "amarelos", porque, infelizmente, as coisas estão assim.
Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, se está, ou não, a favor, e se o PSD concorda ou não, de que as juntas de freguesia e as escolas, enquanto elementos essenciais para a prevenção, porque, de acordo com o Livro Branco, a prevenção falhou na divulgação da sensibilização - diz-se lá isto, na pág. 15, salvo erro -

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estejam representadas nesta comissão, que nem sequer é de combate mas sobretudo de prevenção.
Portanto, seria bom que os senhores respondessem de facto a esta questão mais do que andarem a dizer que, em concelhos como Freixo de Espada-à-Cinta ou Vila de Rei, é importante estarem lá os militares. Os militares têm de estar na agência nacional e no campo global. Ao nível local, não faz sentido obrigar as Forças Armadas a terem um representante em cada concelho.

Protestos do PSD.

Que os tenham nos distritos, muito bem; agora, esta ideia parece-nos uma "fuga para a frente" e uma forma airosa de tentar dar a ideia de grande sentido de Estado, quando, na prática, quem vai ter de combater e quem, no terreno, vai dar essa resposta e essa ajuda são as juntas de freguesia e as escolas para o futuro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Queira concluir.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
E eu gostava de saber o que é que o PSD pensa sobre isto concretamente, não é agora andarmos aqui a falar da estratosfera, nem do etéreo. Temos de falar de coisas concretas para que não haja mais de 600% da área ardida, que foi o que aconteceu no ano passado.

Vozes do PS e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Maria Ofélia Moleiro, tem a palavra para responder.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Sr. Presidente, eu não tenho tempo para responder a uma pergunta tão grande e que merece uma resposta grande.

Vozes do PSD: - A Mesa dá um minuto!

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Sr. Presidente, a Mesa dá-me um minuto?

O Sr. Presidente: - A Mesa dá-lhe meio minuto.

A Sr.ª Maria Ofélia Moleiro (PSD): - Muito obrigada, Sr. Presidente.
Passo, então, a responder ao Sr. Deputado José Miguel Medeiros, a quem agradeço as perguntas que me formulou e a sua intervenção.
Quero, aliás, começar já por dizer-lhe o seguinte: o Sr. Deputado quer a verdade, não quer? Quer que se fale de coisas concretas? Não quer que se fale da floresta, não quer que se fale da estratosfera, nem da biosfera, nem da biodiversidade?
Eu vou dar-lhe um elemento muito concreto - sei que já passou muito tempo e que o senhor esqueceu, mas isto que vou passar a ler é muito concreto: O Primeiro de Janeiro, quinta-feira, 27 de Agosto de 1998, "Vara - suponho ser Armando Vara - condiciona pastorícia e formaliza nova entidade para prevenção de incêndios", "Governo prepara pacote legislativo para combate aos fogos florestais".

Vozes do PSD: - É uma vergonha! Fez zero!

Protestos do PS.

A Oradora: - Ora, eu tenho muita pena…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se.

A Oradora: - Já, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Já, infelizmente.

A Oradora: - Muito obrigada, Sr. Presidente!
Sr. Deputado, quanto ao resto, respondo-lhe lá fora.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Nos meus tempos de juventude, essa expressão "lá fora" era prenúncio de cenas mais violentas, espero que não venha a ser o caso…

Risos.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Florestas, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei através do qual o Governo pretende criar as "comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios" enferma de, pelo menos, em nossa opinião, quatro vícios de conteúdo que, a não serem ultrapassados, poderão relegar (parafraseando o que o Sr. Presidente da Assembleia da República tem dito sobre a matéria) esta proposta para a "prateleira" dos diplomas sem possibilidade de ser aplicados e, portanto, destituídos de utilidade no tempo certo!
Em primeiro lugar, é absolutamente questionável a natureza executiva das responsabilidades que se pretendem atribuir às câmaras municipais.
Não se vislumbra como é que pode ter capacidade executiva um órgão composto por um autarca, um representante do Instituto de Conservação da Natureza, outro da Direcção-Geral dos Recursos Florestais, mais um dos Corpos Concelhios de Bombeiros, ainda outro da GNR, e um outro das organizações de produtores florestais!...

O Sr. António Filipe (PCP): - Que confusão!

O Orador: - Não se descortina como é que este órgão com esta composição poderá elaborar planos de defesa da floresta, promover a formação de grupos de autodefesa dos aglomerados populacionais, como é que poderá elaborar a cartografia de infra-estruturas florestais ou proceder à sinalização das mesmas!!
Não se entende como é que um órgão com esta composição poderá ter essa capacidade executiva, se as capacidades e as qualificações de apoio disponíveis forem apenas as que decorrem de serviços municipais de protecção civil e de eventuais gabinetes florestais municipais.
A verdade, Sr. Secretário de Estado - há-de concordar comigo - é que, de antemão, se sabe que nada foi previamente feito para dotar as autarquias para o exercício deste novo tipo de responsabilidades, o que, por maioria de razão, não as habilitará para o exercício adequado daquelas funções, ainda por cima, de carácter e natureza eminentemente executivos.
Em segundo lugar, a proposta de lei implica sempre uma atribuição de novas responsabilidades e competências ao poder local, sem que noutro plano sejam definidas e estejam garantidas condições financeiras para o respectivo exercício.
"Mercantilismo" - diz o Sr. Secretário de Estado - de quem? Do poder local, que até aceita novas responsabilidades e o que quer são os respectivos meios? Ou do Sr. Secretário de Estado e do Governo, que querem alijar responsabilidades próprias sem transferir os recursos adequados? Quem é que é mercantilista, neste capítulo?

O Sr. António Filipe (PCP): - Bem perguntado!

O Orador: - Este problema, aliás, Sr. Secretário de Estado, aplica-se à questão das florestas e à sua defesa, como se aplica a outros temas que interessam ou podem interessar ao poder local.
O Governo tem de se conformar, entre outros, com o cumprimento da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, que determina que a transferência ou a assunção de novas competências pelo poder local terão de ser necessariamente acompanhadas - suponho que o Sr. Secretário de Estado o sabe - pela transferência ou definição das respectivas formas de financiamento.
Quanto a este aspecto, essencial, a proposta de lei é absolutamente omissa e tem de ser, até por imperativos que decorrem da própria aplicação da lei, completamente reformulada.
Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados: Um terceiro elemento negativo da proposta de lei n.º 114/IX tem a ver com a garantia, que não é explicitamente assegurada, da autonomia do poder local no tratamento destas questões.
Sendo, segundo a proposta de lei, as "Comissões municipais de defesa da floresta contra os incêndios" órgãos presididos e coordenados pelos presidentes das autarquias, ou por seus representantes, a sua integração e articulação com a designada Agência para a Prevenção dos Incêndios Florestais, tutelada

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pelo Ministério da Agricultura (suponho eu) não determina, nem explicita, qual a respectiva relação hierárquica, o que, a não ser adequadamente clarificado - convenhamos, Sr. Secretário de Estado! - coloca em causa de forma insuportável (diria eu) o princípio da autonomia do poder local.
Uma última questão tem a ver com a eficácia de acção destas comissões municipais.
Carece de clara explicitação a forma como estas comissões se articularão com os serviços de âmbito naciona1 da protecção civil, designadamente com os respectivos instrumentos e meios, mormente com os que decorrem da intervenção, no terreno, de corporações de bombeiros, ou de outras entidades e instituições com capacidade operacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A quase total ausência de explicitação desta componente relevante para o conteúdo funcional das comissões municipais mostra bem quanto esta proposta de lei pode constituir uma opção ineficiente na sua articulação operacional.
E a verdade é que, teoricamente, estas comissões municipais visam substituir as antigas Comissões Especia1izadas de Fogos Florestais Municipais, que, apesar de organicamente funcionarem de forma deficiente, provaram ser minimamente capazes quanto à articu1ação e disponibilização de meios operacionais no plano local.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos assim perante uma proposta que visa criar comissões municipais contra incêndios sem que para isso estejam reunidas as condições adequadas, nem definidos os conteúdos exigíveis.
Estamos perante uma proposta que corre o risco de criar órgãos ineficazes, sem capacidade executiva, sem meios, sem recursos e sem capacidades, e, ainda por cima, potencialmente inoperacionais perante situações de real emergência.
Mas o mais grave, Sr. Secretário de Estado, é que o País corre, agora, novamente o risco de chegar ao próximo Verão sem que esteja dotado de estruturas nacionais e locais de defesa da floresta contra os incêndios.
Ao nível nacional, a Agência para a Prevenção de Incêndios Florestais não funciona, não existe!!
Ao nível local, é o que se vê, com esta discussão sobre as comissões municipais, sendo apenas uma realidade palpável com a aprovação desta proposta, a "extinção imediata das Comissões Especializadas de Fogos Florestais Municipais que, ainda por cima, asseguravam alguma capacidade operacional.
Assim, a época de fogos aproxima-se a olhos vistos e as medidas e decisões relevantes para a sua prevenção e combate, que deveriam ter sido tomadas atempadamente e com consensos alargados, não estão sequer adoptadas.
A época de fogos aproxima-se e a criação destas comissões municipais, ainda por cima da forma como o Governo a pretende fazer, leva obrigatoriamente o seu tempo, tudo apontando para que não haja tempo nem meios disponíveis para as criar e dotar de forma adequada, por forma a estarem realmente operacionais no próximo Verão em todo o País.
Esta será sempre a consequência dos atrasos nas decisões, de que é único responsável este Governo, Sr. Secretário de Estado das Florestas.
Oxalá - e digo isto sinceramente em nome do PCP - não colhamos todos, no próximo Verão, consequências trágicas deste atraso e desta ineficácia governamental.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado das Florestas, Srs. Deputados: Agora, não cuidaria de intervir sobre as questões gerais do combate e da prevenção dos fogos florestais. Esse é, certamente, um debate que iremos ter dentro de algum tempo, apesar de o Governo estar atrasado nas medidas que impôs a si próprio nesta área e de eu ter ficado perplexo quando ouvi o Sr. Ministro, na Comissão Eventual para o Incêndios Florestais, dizer que é escusado sentir-se muita angústia em relação ao próximo Verão porque é improvável que haja incêndios florestais com a mesma dimensão, quer por uma questão estatística quer porque o Inverno vai seco… Mas agora não vou entrar nesses aspectos.
Quero dizer que tem lógica, e é certamente de apoiar, que numa única entidade a nível municipal se possa fazer a interligação de todos os meios necessários para a prevenção dos fogos e a protecção da floresta. Nós nem sequer temos qualquer reserva em relação à possibilidade de essa entidade ter funções executivas e não meramente consultivas, se for esse o enquadramento entendido.
Mas, se for esse o enquadramento entendido, seria bom que ocorressem duas coisas, cumulativamente:

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em primeiro lugar, o acordo da Associação Nacional de Municípios Portugueses e, em geral, dos municípios; em segundo lugar, a clarificação exacta de quem tem a responsabilidade e o comando numa entidade desse género, porque a cadeia da responsabilidade política e decisória para funções executivas não está nada clara na proposta que nos é apresentada.
E, Sr. Secretário de Estado, sendo lógica a concentração dos meios, mal se compreende - e já referi este aspecto - que, sendo as comissões municipais, o Governo não tenha encontrado um mínimo de contratualização com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, porque vai competir aos municípios a aplicação deste tipo de medidas. Portanto, parece inadequado que nos traga aqui um diploma que não tem um mínimo de contratualização e que nem sequer tem um espaço aberto para vir a contratualizar rapidamente.
Mas também é preciso referir que as comissões não estão suficientemente alargadas. Parece-nos que elas devem ter um representante dos sapadores florestais, porque, afinal, eles são das pessoas que melhor conhecem a floresta. Mas também nos questionamos por que razão delas só fazem parte organizações de produtores florestais e não organizações de defesa ambiental e outro tipo de organizações do associativismo local, enfim, todos as que queiram convergir os seus esforços na defesa e na protecção da floresta, na prevenção dos incêndios florestais.
Por isso, Sr. Secretário de Estado, lamentavelmente, não podemos votar favoravelmente a proposta de lei, não porque a ideia em si não tenha "pernas para andar", apesar de já vir atrasada, mas porque falta um acordo com a Associação Nacional de Municípios, uma clarificação sobre o modo de funcionamento deste sistema e, ainda, porque existem dúvidas sobre como é que isto se interliga com os serviços municipais de protecção civil. Nós entendemos que esta proposta cria um terreno que, infelizmente, é uma certa barafunda e que não irá ajudar a uma eficaz protecção e prevenção dos fogos florestais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais oradores inscritos. Portanto, declaro encerrado o debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 114/IX.
Passamos imediatamente ao segundo ponto da nossa ordem de trabalhos, que é a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 417/IX - Oitava alteração à Lei n.º 29/87, de 30 de Junho - Estatuto dos Eleitos Locais (PSD e CDS-PP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Oliveira.

O Sr. Manuel Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As questões relativas ao regime de incompatibilidades e impedimentos dos eleitos locais e respectivas incidências no regime remuneratório têm sido objecto de análise especializada sem que a interpretação seja pacífica e unânime.
As funções cometidas aos titulares de cargos autárquicos são hoje incomensuravelmente diversas das de há 30 anos atrás, encontrando-se na lei também formas diversas para a organização e a participação, não obstante poder-se teorizar sobre a privatização das tarefas públicas. Mas nem por isso o serviço prestado deixa de ser público competindo à administração assegurar que no exercício das tarefas sejam observados todos os ditames impostos pela lei.
Os eleitos locais que exercerem outras funções auferem vencimentos daí resultantes não infringindo a lei reguladora.
A levar em sentido autêntico a interpretação produzida sobre a problemática do regime de incompatibilidades e impedimentos dos autarcas e respectiva incidência no regime remuneratório, somos conduzidos a situações como as que passarei a exemplificar.
O eleito local que é membro do conselho de administração dos serviços municipalizados de água e saneamento do seu concelho recebe o vencimento da câmara na totalidade, com direito a senhas de presença naqueles serviços. Porém, se o município transformar os serviços municipalizados em empresa municipal, o autarca em regime de permanência que integre o conselho de administração, mesmo que não aufira qualquer retribuição por esse desempenho, só tem direito a metade do vencimento da câmara municipal.
Parece-nos que isto se traduz numa contradição e incongruência do sistema, pois impede os eleitos locais de prestar, de forma gratuita, o seu trabalho a favor da comunidade.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Para clarificar esta incongruência, apresentámos o projecto de lei n.º 417/IX, que está em discussão.
Propõe-se uma nova redacção para o artigo 7.º da Lei n.º 29/87, que estabelece o Estatuto dos Eleitos Locais.
Propõe-se que as remunerações dos eleitos locais em regime de permanência na câmara municipal

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sejam atribuídas da seguinte forma: os autarcas que exerçam funções autárquicas em acumulação com outras funções públicas ou privadas não remuneradas recebem a totalidade das remunerações, sem prejuízo do direito a senhas de presença; os autarcas que exerçam funções autárquicas em acumulação com funções públicas ou privadas, mas remuneradas, recebem da câmara municipal 50% do valor base do vencimento legalmente estabelecido.
Por outro lado, com esta iniciativa pretende-se definir…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - … - termino já, Sr. Presidente - um quantitativo global mensal para as senhas de presença.
Trata-se, efectivamente, de um ponto que gerou alguma polémica, pelo que, da parte do PSD, há toda a disponibilidade para se encontrarem outras soluções que garantam a transparência na fixação do valor desta senhas. Por isso, esperamos de todos os grupos parlamentares soluções equilibradas para a proposta que fazemos relativamente às senhas de presença.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Augusto Carvalho.

O Sr. José Augusto Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O assunto que aqui nos traz deveria gerar uma solução consensual porque, na essência, o que os autarcas nos pedem é que se dê uma interpretação autêntica a esta questão, que se circunscreve ao facto de autarcas em permanência, ao acumularem as suas funções com outras, a título gracioso, não verem afectado o seu estatuto remuneratório. E, como sabemos, houve uma interpretação em sentido contrário.
Ora, o projecto de lei n.º 417/IX, do PSD e do CDS-PP, não apresenta, temos de reconhecê-lo, uma solução consensual. Aliás, até houve, salvo melhor entendimento, preterição de formalidades regimentais,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa é boa!

O Orador: - … que levaram ao agendamento desta iniciativa.
E houve preterição de formalidades regimentais por uma razão muito simples: é que é óbvio que não houve um relatório prévio,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Era o que faltava!

O Orador: - como é normal (dir-se-á que o Regimento também contém normas excepcionais) nestas circunstâncias.
Este projecto, isso é insofismável, no nosso entendimento, "não é amigo" dos autarcas, até porque, nos termos em que está formulado, faz passar para a opinião pública a ideia de que a Assembleia da República se disponibiliza a viabilizar, no limite, um aumento de 50% nas remunerações dos autarcas em regime de permanência, o que é perverso, o que é um mau serviço à causa do poder local e, permitam-me a expressão, sem qualquer carga pejorativa, é uma malfeitoria que os autarcas não merecem, sobretudo, neste quadro de crise económica, social e de estrangulamento financeiro das autarquias. Nesse sentido, há que fazer um esforço para obter uma solução consensual.
Saúdo a disponibilidade do Deputado Manuel Oliveira, em nome da bancada do PSD, e proponho que o projecto de lei baixe à comissão sem votação, na generalidade, para encontrarmos uma solução politicamente sustentável. Esta solução que nos é proposta atenta contra a imagem das autarquias; esta solução que nos é proposta pode afectar a credibilidade dos autarcas, que em circunstância alguma o merecem.
Trata-se de um tema de grande sensibilidade, portanto, é uma matéria que não terá da nossa parte qualquer aproveitamento, seja de que natureza for. Por isso mesmo, a natureza da matéria em causa justifica um apelo ao consenso, a uma formulação que seja, repito, imune a críticas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O artigo 7.º do Estatuto dos

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Eleitos Locais tem suscitado algumas interpretações cuja aplicação em concreto pode arrastar situações de injustiça relativa e, mais grave ainda, pode provocar a indisponibilidade de eleitos locais para o exercício de cargos em representação e no interesse da respectiva autarquia.
A presente iniciativa legislativa procura clarificar o entendimento do legislador, o que neste estrito âmbito colhe, naturalmente, o nosso acordo. Portanto, permanece claro que o eleito local que exerce funções autárquicas em acumulação com o desempenho remunerado de outras funções só poderá receber 50% do valor base da sua remuneração enquanto autarca. Isto é claro e mantém-se.
Do mesmo modo, colhe também o nosso acordo a consideração de que o eleito local que exerce funções autárquicas em acumulação com o desempenho não remunerado de outras funções deverá continuar a receber a totalidade da sua remuneração enquanto autarca, sem prejuízo do direito a receber senhas relativas à sua presença nas reuniões das instituições ou entidades onde exerce cumulativamente essas funções em representação autárquica.
O que nos afasta, e substancialmente, da solução legislativa proposta é a fixação do valor destas senhas de presença. A solução apontada no projecto de lei n.º 417/IX, do PSD e do CDS-PP, fixa um valor global para as senhas de presença igual a metade do vencimento do presidente da câmara, sendo certo que os autarcas em regime de permanência já auferem despesas de representação que podem chegar a 30% daquela remuneração.
O PCP considera que este valor é despropositado, eticamente inadequado e não defende o bom nome do poder local.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O PCP considera que o Estatuto dos Eleitos Locais, no seu artigo 10.º, fixa já valores para senhas de presença que podem e devem servir de referencial para os efeitos agora pretendidos.
Por isso, e no âmbito da discussão, na especialidade, iremos apresentar uma alteração que, em conformidade com o actual artigo 10.º do Estatuto, limita a 3% da remuneração do presidente da câmara o valor das senhas de presença que os autarcas poderão receber quando no exercício de funções não remuneradas em representação municipal.
Estamos convictos de que este é um valor razoável, de que este é um valor já hoje praticado e que nada aconselha, Srs. Deputados, muito menos a situação financeira do País tão invocada a propósito e despropósito, que possa ou deva ser ultrapassado por força deste projecto de lei.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Contrariamente ao Sr. Deputado José Augusto Carvalho, essencialmente, mas também ao Sr. Deputado Honório Novo, nós acreditamos que este projecto de lei da maioria pode contribuir para melhorar o funcionamento do poder local e também para dignificar o exercício desse mesmo poder.
É evidente que não é ainda uma grande reforma, diria até a grande reforma cuja necessidade se faz sentir, uma reforma que, por exemplo, altere estruturalmente a forma de cálculo da retribuição dos autarcas e não a faça depender do número de eleitores, o que, dizem as más-línguas, é uma das causas de desactualização dos cadernos eleitorais; que diminua as diferenças remuneratórias entre autarcas; ou, sobretudo, que insira critérios inequívocos que permitam diminuir a diferença de tratamento entre autarcas.
Sem demagogia, aceitamos que a reforma ideal deveria abranger todos os cargos públicos - o Presidente da República, Deputados, membros de governo, membros da Administração Pública central e local - e fixar uma remuneração principal acabando-se com remunerações acessórias, que por vezes distorcem o critério da sua determinação.
Mas, continuando a falar de forma clara, temos também de reconhecer que todos temos um particular pudor em discutir o assunto dos vencimentos do titulares dos cargos públicos, referindo que tal não é politicamente correcto, é contraproducente, bem como outros argumentos do género. Talvez seja, mas convenhamos que as nossas obrigações para com o País vão muito para além das comodidades políticas e é moralmente errado assistir ao desinteresse, diria mesmo que à debandada, dos mais aptos, dos mais capazes, do melhores, dos potenciais pensadores e reformistas do País para o estrangeiro, para o sector privado, para as cidades e para outros locais. É necessário aumentar o patamar de exigência, mas é igualmente preciso que o regime de remunerações dos cargos públicos atraia todas as pessoas capazes de gerir o interesse público.

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Nesse contexto, o projecto de lei apresentado pela maioria tem, desde já, um mérito inquestionável: não apenas lança o debate sobre a questão como também apresenta algumas melhorias ao regime em vigor do Estatuto dos Eleitos Locais. Podem ser insuficientes - serão, porventura - mas representam uma evolução e, em nossa opinião, no sentido certo, tanto mais quanto, e assumimo-lo com toda a frontalidade, não fugimos ao debate sobre estas questões que aqui, muito sinteticamente, têm sido abordadas.
Concluo, Sr. Presidente e Srs. Deputados, recordando que, com esta iniciativa, a maioria pretende, essencialmente, dissipar algumas dúvidas interpretativas que a redacção em vigor propicia, aproximar os cidadãos aos eleitores e contribuir para que todos os que são eleitos tenham condições de trabalho e de dignidade no exercício dos seus mandatos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A nossa convicção é a de que esta preocupação será, seguramente, partilhada por todos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, está encerrado o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 417/IX, o qual será votado amanhã, no período regimental fixado para esse efeito.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 15 horas, e o período da ordem do dia, correspondendo a um agendamento potestativo do PS, será totalmente destinado à interpelação n.º 10/IX - Debate de política geral, centrado no balanço da execução dos compromissos programáticos assumidos pelo Primeiro-Ministro (PS).
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Arménio dos Santos
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
João Barroso Soares
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Pires Epifânio

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Botelho Correia Sousa

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Maria Eduarda de Almeida Azevedo

Partido Socialista (PS):
António Fernandes da Silva Braga
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

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Partido Social Democrata (PSD):
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel Pereira da Costa
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta

Partido Socialista (PS):
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
José da Conceição Saraiva
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos

Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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