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Sexta-feira, 2 de Abril de 2004 I Série - Número 72

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 1 DE ABRIL DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões
Henrique Jorge Campos Cunha
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.
Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 121/IX, das propostas de resolução n.os 64 e 66/IX, dos projectos de lei n.os 422 a 425/IX, do projecto de resolução n.º 240/IX e da interpelação n.º 12/IX.
O Sr. Presidente saudou a eleição do Sr. Deputado António José Seguro (PS) e dos demais membros para a direcção do Grupo Parlamentar do PS, o que foi agradecido pelo Deputado em causa. Também apresentaram saudações os Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD) e Bernardino Soares (PCP).
Procedeu-se ao debate da interpelação n.º 11/IX - Sobre política externa (BE). Após terem proferido intervenções, na fase de abertura, o Sr. Deputado Francisco Louçã (BE) e a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas (Teresa Patrício Gouveia), usaram da palavra, a diverso título, além daqueles oradores, os Srs. Deputados José de Matos Correia (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Almeida Henriques (PSD), José Vera Jardim (PS), Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP), Luís Fazenda (BE), António Filipe (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Alda Sousa (BE), Maria Eduarda Azevedo (PSD), Diogo Feio (CDS-PP) e Vítor Ramalho (PS).
No encerramento da interpelação, intervieram a Sr.ª Deputada Alda Sousa (BE) e a Sr.ª Ministra.
A Câmara aprovou o voto n.º 145/IX - De congratulação pelo sucesso da Selecção Portuguesa de Râguebi no Torneio Europeu (PS), tendo-se pronunciado os Srs. Deputados Manuel Alegre (PS), Costa e Oliveira (PSD) - que também contraprotestou em relação a um protesto exercido pelo Sr. Deputado José Lello (PS) - e João Pinho de Almeida (CDS-PP).
O voto n.º 146/IX - De solidariedade com os trabalhadores da Bombardier (BE), também mereceu aprovação, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Francisco Louçã (BE), Miguel Frasquilho (PSD), António Filipe (PCP), Miguel Coelho (PS) e Diogo Feio (CDS-PP).
O projecto de resolução n.º 239/IX - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 28/2004, de 4 de Fevereiro, que estabelece o novo regime jurídico de protecção social na eventualidade doença, no âmbito do subsistema previdencial de segurança social (PCP), foi rejeitado.
Não mereceu aprovação, na generalidade, o projecto de lei n.º 387/IX - Altera o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis no caso dos prédios cuja propriedade esteja registada em regiões com regime fiscal claramente mais favorável (BE).
Na generalidade, a proposta de lei n.º 116/IX - Aprova o regime jurídico aplicável à realização de ensaios clínicos com medicamentos de uso humano, foi aprovada.
Foram, ainda, aprovados dois requerimentos, um, apresentado pelo PCP, BE e Os Verdes, de baixa à Comissão de Educação, Ciência e Cultura, sem votação, pelo prazo de 90 dias, do projecto de lei n.º 415/IX - Altera o Decreto-Lei n.º 123/99, de 20 de Abril, que aprova o Estatuto do Bolseiro de Investigação (PCP), e outro, apresentado pelo PSD, de baixa à Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, sem votação, da proposta de resolução n.º 44/IX - Aprova, para ratificação, a Decisão do Conselho, reunido ao nível dos Chefes de Estado ou de Governo, de 21 de Março de 2003,

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relativa a uma alteração do n.º 2 do artigo 10.º dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.
Em votação global, foi aprovada a proposta de resolução n.º 57/IX - Aprova, para ratificação, o Acordo sobre a Participação da República Checa, da República da Estónia, da República do Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca no Espaço Económico Europeu, assinado no Luxemburgo, em 14 de Outubro de 2003.
Em votação final global, mereceu aprovação o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 366/IX - Revisão da lei-quadro que define o regime e forma de criação das polícias municipais (PSD e CDS-PP).
Também em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, relativo à proposta de lei n.º 114/IX - Cria as comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios.
O texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 117/IX - Aprova medidas preventivas e punitivas a adoptar em caso de manifestações de violência associadas ao desporto, e ao projecto de lei n.º 410/IX - Altera a Lei n.º 38/98, de 4 de Agosto, que estabelece medidas preventivas e punitivas a adoptar em caso de manifestações de violência associadas ao desporto (BE), também mereceu aprovação em votação final global.
O texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 81/IX - Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2000/43/CE, do Conselho, de 29 de Junho de 2000, que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica, tendo por objectivo estabelecer um quadro jurídico para o combate à discriminação baseada em motivos de origem racial ou étnica, foi aprovado em votação final global.
Após aprovação, na especialidade, do artigo 34.º do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 118/IX - Estabelece o regime temporário da organização da ordem pública e da justiça ao contexto extraordinária da fase final do Campeonato Europeu de Futebol - EURO 2004, o referido texto final mereceu igualmente aprovação em votação final global. No fim, produziram declaração de voto os Srs. Deputados Hugo Velosa (PSD) e Jorge Lacão (PS).
A Câmara aprovou, ainda, quatro pareceres da Comissão de Ética, dois de substituição de igual número de Deputados do PSD e dois a autorizarem dois Deputados, um do PSD e outro do CDS-PP, a deporem, por escrito, como testemunhas, em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 35 minutos.

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Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Alberto Pedro Caetano
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Bernardino da Costa Pereira
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa

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José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscata Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

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Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Santos de Magalhães
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

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Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Botelho Correia Sousa
Francisco Anacleto Louçã
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: a proposta de lei n.º 121/IX - Autoriza o Governo a legislar sobre o regime jurídico das armas e suas munições, que baixou à 1.ª Comissão; as propostas de resolução n.os 64/IX - Aprova o Acordo entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da Região Administrativa Especial de Hong-Kong da República Popular da China relativo à transferência de pessoas condenadas, assinado em Hong-Kong, em 24 de Maio de 2001, que baixou à 2.ª Comissão, e 66/IX - Aprova o Acordo entre o Governo da República Portuguesa e o governo da Região Administrativa Especial de Hong-Kong da República Popular da China relativo ao auxílio judiciário mútuo em matéria penal, assinado em Hong-Kong, em 24 de Maio de 2001, que baixou à 2.ª Comissão; os projectos de lei n.os 422/IX - Promoção e valorização dos bordados de Castelo Branco (PS), que baixou à 8.ª Comissão, 423/IX - Elevação a cidade da vila da Costa da Caparica, sita no concelho de Almada, no distrito de Setúbal (Deputado do CDS-PP Narana Coissoró), que baixou à 4.ª Comissão, 424/IX - Altera o Código de Processo Penal, nomeadamente no que se refere ao segredo de justiça, às escutas telefónicas e à prisão preventiva (BE), que baixou à 1.ª Comissão, e 425/IX - Lei de organização e funcionamento da Comissão Nacional de Protecção de Dados (PSD e CDS-PP), que

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baixou à 1.ª Comissão; o projecto de resolução n.º 240/IX - Constituição de uma comissão eventual para análise e acompanhamento da construção do futuro aeroporto internacional (PS); e a interpelação n.º 12/IX - Sobre desenvolvimento sustentável, centrado nas políticas de ambiente, de ordenamento do território e de transportes (Os Verdes).
Em matéria de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a nossa sessão de hoje é integralmente preenchida com a interpelação n.º 11/IX - Sobre política externa (BE), mas, para que ela tenha um conteúdo útil, precisa de ser feita ao Governo, que ainda não se encontra presente.
Entretanto, enquanto aguardamos pela presença do Governo, aproveito para cumprimentar o novo líder parlamentar do Partido Socialista, bem como a sua equipa, que foi eleito, ontem, pelo seu grupo parlamentar.
Desejo as maiores felicidades ao Sr. Deputado António José Seguro e aos demais membros da direcção do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António José Seguro (PS): - Sr. Presidente, quero agradecer, em meu nome pessoal e no da direcção da bancada do PS, as palavras simpáticas e elegantes com que o Sr. Presidente nos quis distinguir e dizer que, da nossa parte, apesar das divergências, continuaremos a ser, nesta Câmara, Deputados empenhados em dar o nosso melhor, através de uma oposição positiva e construtiva, para ajudar a resolver os problemas do País.
Por isso, aproveito este momento para agradecer as palavras de V. Ex.ª e também para, simultaneamente, dirigir à Câmara e desejar a todos bons trabalhos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, em meu nome pessoal e no da bancada do Grupo Parlamentar do PSD, quero felicitar o Sr. Deputado António José Seguro e os restantes membros da direcção agora eleita, desejar-lhes as maiores felicidades no desempenho das suas novas funções e dizer-lhes da disponibilidade leal do nosso grupo parlamentar para, no espaço próprio e nas incumbências próprias de cada grupo parlamentar, poderemos ter aqui uma cooperação institucional, em nome da dignificação da Assembleia, do Parlamento e da vida política.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, é para, nos mesmos termos, saudar a eleição do Sr. Deputado António José Seguro e de toda a sua direcção, desejar-lhes votos de bom trabalho e garantir que manteremos a colaboração e o relacionamento leal e institucional que tem pautado as relações entre as nossas bancadas e que espero e estou certo de que continuará a pautar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, visto já se encontrar presente o Governo, nas pessoas do Sr. Primeiro-Ministro, da Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas e do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, a quem aproveito para cumprimentar, estamos em condições de iniciar a interpelação sobre política externa, apresentada pelo BE.
Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Há cerca de um ano, na Cimeira dos Açores, quatro governantes - George W. Bush, Tony Blair, Durão Barroso e o seu saudoso José Maria Aznar - anunciaram ao mundo que iria começar uma nova guerra. Dois dias depois iniciou-se a ocupação do Iraque, que se prolonga até agora. O que está aqui em debate com o Primeiro-Ministro é o balanço deste ano de política externa portuguesa.
Quando confrontado com esta interpelação, o Governo sugeriu que a única data possível para

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responder sobre o que fez durante todo este ano seria o dia de hoje, 1 de Abril. Começo por homenagear, sinceramente, esta escolha do Ministro Luís Marques Mendes, que é uma atitude de comovente honestidade política, uma tocante homenagem do vício à virtude, porque, se durante um ano inteiro o Governo mentiu ao povo português sobre a guerra que apoiou, o único dia em que o Dr. Durão Barroso poderia falar verdade é mesmo hoje.
Esperemos, por isso, que hoje, finalmente, nos diga alguma verdade sobre esta grande mentira.
É por isto, Sr. Primeiro-Ministro, que era a si que competiria explicar o que disse e o que fez - e é indelicado e até desagradável deixar a Ministra dos Negócios Estrangeiros, que não tinha funções governativas quando a mentira começou, na situação de isolamento nesta Assembleia.
O Primeiro-Ministro, aliás, sairá dentro em pouco, com uma conveniente vénia à Assembleia, como já fazia protocolarmente o seu antecessor, mesmo que, neste caso, seja a sua honradez e seriedade política que vai ser discutida. O Sr. Primeiro-Ministro, em matéria que lhe diz directamente respeito, prefere deixar a Ministra sozinha com o incontornável Sr. Ministro Luís Marques Mendes.
Por isso, peço-lhe, Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, que transmita ao Primeiro-Ministro a nossa condenação por um ano de mentira. Durante um ano, a política externa portuguesa contribuiu para a guerra, para agravar a crise do Médio Oriente, e contribuiu, sobretudo, para dividir a União Europeia. Ao fazer parte do eixo da mentira, seguiu a palavra e as ordens do único governo de extrema-direita do ocidente, como tão bem lhe chamou Freitas do Amaral: aboliu o direito internacional, declarou a guerra preventiva como regra, arrogando-se o império, o poder e a possibilidade de atacar quem quisesse, quando quisesse, como quisesse. Permitiu, desta forma, contra todas as promessas, mesmo as que foram feitas nesta Assembleia, a construção do "muro da vergonha" para roubar os direitos dos palestinianos à sua terra e à sua independência. E os resultados, Sr. Primeiro-Ministro, são lamentáveis: nem democracia, nem justiça, nem paz, nem combate ao terrorismo!
Pelo contrário, o governo português contribuiu e contribui para a mentira que reforça a desordem internacional; contribuiu e continua a contribuir para a pilhagem do Médio Oriente; e, pior do que tudo - e disso vamos falar -, contribuiu e contribui para reforçar a principal central do terrorismo à escala internacional.
Comecemos pela mentira.
A guerra, no princípio, só tinha um pretexto: era preciso derrubar Saddam Hussein, porque as suas armas de destruição maciça constituíam um perigo para o mundo. Foi isto que o Primeiro-Ministro aqui repetiu, sem cessar.
No comunicado do Governo português, duas horas depois de Colin Powell ter apresentado o seu caso na ONU, dizia-se que "se registam especialmente as gravações e fotos que indiciam a manutenção pelo Iraque de armas de destruição maciça, químicas e biológicas".
Na Carta dos Oito, escrevia Durão Barroso: "Enviámos uma mensagem clara de que livraríamos o mundo do perigo trazido pelas armas de destruição maciça de Saddam Hussein".
No comunicado da Cimeira dos Açores afirmava-se que "qualquer presença militar no Iraque (seria) temporária, com o objectivo de promover a segurança e eliminação das armas de destruição maciça".
No Parlamento, naturalmente, o Primeiro-Ministro repetiu o mesmo a 18 Março, dizendo que o objectivo que o Governo sempre prosseguiu foi "a defesa intransigente do desarmamento do Iraque", e no dia seguinte, 19 Março, veio dizer que "A ditadura iraquiana é uma ameaça à paz. Desarmar o Iraque é um objectivo essencial (…)".
Ora, agora, sabemos que as armas eram mentira e que o pretexto era mentira. Aliás, até conhecemos a origem da mentira. O Primeiro-Ministro tinha a certeza de que havia, no Iraque, armas químicas e biológicas, porque tinha recebido um relatório dos serviços secretos britânicos nesse sentido - tenho comigo a cópia do relatório, para o caso de o Sr. Primeiro-Ministro querer voltar a ter o gosto de passar os olhos por este texto extraordinário.
O relatório dos serviços secretos britânicos é uma falsificação grotesca e ficou famoso por ter levado Blair a declarar no Parlamento britânico que Saddam Hussein poderia usar, em 45 minutos, armas químicas e biológicas (pág. 5 do relatório).
Todo o relatório é uma confabulação sinistra. Tudo é falso! David Kay, o chefe da CIA, que foi o responsável pela operação de 1200 agentes que durante um ano procuraram as armas, demitiu-se e pediu um inquérito sobre a mentira. Não há armas de destruição maciça!
Hans Blix, o chefe dos inspectores da ONU, explicou que quem queria encontrar bruxas na Idade Média conseguia sempre - mas as armas são piores do que as bruxas, desaparecem sem dar cavaco a ninguém!
Colin Powell sabia onde estavam 20 instalações e descreveu-as num mapa na ONU - mentira!
Rumsfeld sabia de todas as localizações - mentira!
Durão Barroso sabia tudo sobre tudo o que os outros sabiam - mentira!

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Havia armas, mas as únicas encontradas foram aquelas que vários governos venderam, como aquele de que Durão Barroso fez parte, entre 1985 e 1990.
É certo que, apanhado na teia da mentira, o Primeiro-Ministro tem vindo dizer que, quando disse que a prioridade eram as armas, queria dizer outra coisa, que não eram as armas. E usou dois argumentos que, hoje, vão ser repetidos aqui: a guerra justificava-se por respeito e fidelidade aos aliados e para impor a democracia nos países ocupados.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Até que enfim que diz a verdade!

O Orador: - É isto que o Governo e a maioria vão repetir no dia 1 de Abril, naturalmente.
Mas estes argumentos são ainda mais graves do que a mentira, porque já não têm sequer a desculpa de terem resultado de um engano provocado por uma mentira dos serviços secretos britânicos. Nesta matéria, estamos no coração da política externa. Quem escolhe os seus aliados, Sr. Primeiro-Ministro, fá-lo com pleno conhecimento de causa. E o senhor sabia o que estava a fazer nesta matéria.
Ora, no dia 1 de Fevereiro de 2003, Durão Barroso disse no Parlamento: "(…) sou contra todas as ditaduras e penso que é bom para a Humanidade o dia em que elas caem; sou contra todos os regimes que, por exemplo, tratam as mulheres como seres de 2.ª classe, revolta-me que tal aconteça (…)".

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Palavras certas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Só que, meses depois, mandou o seu Ministro da Defesa à Arábia Saudita fazer um contrato militar.
Vamos falar deste seu aliado, Sr. Primeiro-Ministro. Na Arábia Saudita não há parlamento, não há Constituição, não há partidos políticos, não há imprensa livre. É um regime de fascismo teocrático, onde as mulheres não têm direitos, não podem viajar sem autorização, não podem mostrar o rosto, não podem conduzir um carro e onde a polícia religiosa, a Mutawa'een, tem tribunais e prisões próprios, onde se amputam, chicoteiam ou matam as presas e presos por delito religioso, sem direito de apelo e sem advogado. Aqui está o seu aliado, Sr. Primeiro-Ministro!
O Ministro Paulo Portas não foi, em 3 e 4 de Junho, a Riade explicar aos dirigentes sauditas como é que o seu Primeiro-Ministro anseia pelo dia em que a ditadura caia, ou como se revolta pelo tratamento dado às mulheres. O Ministro Paulo Portas foi reunir-se com o Príncipe Abdel Aziz, para negociar contratos para a reparação de material militar saudita e para abrir - veja-se só! - as academias militares portuguesas a oficiais sauditas. Foi fazer negócios com um regime fascista.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Orador: - Ora, é na Arábia Saudita que está o centro do terrorismo mundial. Uma política externa dedicada a combater o terrorismo saberia que a pista saudita está por detrás do financiamento e armamento dos 300 000 mujahedines, que hoje se chamam taliban, no Afeganistão, e que foram eles que acolheram, protegeram, apoiaram, armaram e financiaram um tal Ossama bin Laden. Saberia que a pista saudita está por detrás da guerrilha fundamentalista do UÇK, no Kosovo. Aliás, saberia que, em ambos os casos, a Casa Branca apoiou, financiou e armou estes grupos.
O resultado, naturalmente, foi o reforço do terrorismo internacional. Não foi a democracia.
O negócio que o Governo está a fazer com a Arábia Saudita, Sr. Primeiro-Ministro, é uma vergonha que demonstra o cinismo sem fronteiras. Aqui, veio prometer-nos democracia e respeito pelas mulheres e pelos seus direitos, mas está disposto a vender armas, tecnologia e conhecimentos a fascistas e a fundamentalistas. Isto é falta de seriedade! É falta de princípios democráticos. É uma política externa obediente a alguns aliados, mas esses aliados foram, são e serão cúmplices do terrorismo. O seu Governo, Sr. Primeiro-Ministro, continua a insistir em vender armas à pior escumalha do Planeta.
Naturalmente, esta aliança tem, por isso mesmo, o seu preço. O preço, aliás, é a mentira, já não sobre outras armas mas pior ainda, é sobre a democracia.
Veja, Sr. Primeiro-Ministro, os resultados desta ocupação do Afeganistão e do Iraque.
A Constituição do Afeganistão estabelece: no artigo 1.º, uma república islâmica; no artigo 3.º, que nenhuma lei pode ser contrária ao carácter sagrado do Islão; no artigo 45.º, que a educação obedece à religião islâmica; no artigo 118.º, que só podem ser nomeados juízes se obedecerem à lei islâmica; e, no

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artigo 145.º - que "pérola" magnífica, Sr. Primeiro-Ministro -, que o predomínio constitucional do fundamentalismo islâmico é inalterável para todo o sempre. Esta Constituição nunca pode ser alterada, no que diz respeito à liberdade religiosa.
Democracia, então!
A Constituição iraquiana imposta pelas autoridades ocupantes declara, no artigo 7.º, que o islão é a religião oficial do Estado e que é considerado fonte de legislação. No Iraque não há imprensa livre, não há direitos das minorias, não há julgamentos, há ocupação e terror.
Este é o resultado - e não se poderia esperar outra coisa - de uma democracia imposta pelas armas: o triunfo constitucional do fundamentalismo islâmico; o negócio com países que são centros internacionais do terrorismo; o apoio a regimes fascistas islâmicos, como o saudita, ou narcotraficantes, como o regime afegão.
Mas há, é claro, uma explicação para esta vertigem.
Vejamos o que diz Dick Cheney, o actual Vice-Presidente dos Estados Unidos da América: "O bom Deus não decidiu colocar o petróleo somente onde há regimes amigos dos Estados Unidos. Por isso, temos de estar preparados para operar em lugares onde, tomando em consideração todos os elementos, algumas pessoas normalmente não iriam. Mas nós vamos onde há negócios". "Vamos onde há negócios", mesmo que o "bom Deus" se tenha enganado, porque não deixou todo o petróleo debaixo da Casa Branca.
É claro que o Vice-Presidente americano sabe do que está a falar, pois ele foi um dos conselheiros da empresa norte-americana Unocal, que negociou com os taliban um gasoduto no Afeganistão, já depois de bin Laden ter provocado o primeiro atentado contra as Torres Gémeas. Dick Cheney foi, depois, presidente da Halliburton, que, durante os anos 90, vendeu secretamente equipamentos ao Iraque, à Síria, à Líbia e ao Irão e que, hoje, é a principal beneficiária da reconstrução do Iraque.
Afinal, como dizia o Subsecretário Wolfowitz, "Vejamos as coisas com simplicidade. A diferença mais importante entre a Coreia do Norte e o Iraque é que o Iraque nada num mar de petróleo".
Corrigindo o "bom Deus", estes aliados vão onde for preciso para buscar um mar de petróleo.
Sr. Primeiro-Ministro, a política externa não pode basear-se na mentira, nem no cinismo, nem na guerra, nem no apoio a regimes ou à lei do terror.
O senhor teve uma oportunidade de contribuir para uma política externa europeia credível e com uma voz no mundo; teve a responsabilidade de ser europeu numa Europa de paz; teve a possibilidade de ser um estadista que, num tempo de incerteza e dificuldade, contribui para resolver e não para agravar os problemas do mundo. Escolheu o Sr. Primeiro-Ministro "fugir em frente" com a mentira; a mentira das armas, primeiro; a mentira que constitucionaliza o fundamentalismo islâmico, depois; e agora, a pior de todas, a mentira que é o negócio militar com o regime terrorista saudita.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Queira concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Pelo menos hoje, aqui, Sr. Primeiro-Ministro, tem a possibilidade de terminar com um ano de mentiras. Quer, Sr. Primeiro-Ministro? É disso capaz? A escolha é sua, mas, com a sua escolha, vamos ficar a saber como iremos ser governados nos próximos dois anos, até chegar o dia da moção de censura a que estará sujeito aquando do voto de todos os portugueses e portuguesas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Informo a Câmara de que já se encontram inscritos dois Srs. Deputados para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Francisco Louçã, mas, conforme os princípios regimentais, vou, primeiro, dar a palavra à Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas para uma intervenção em nome do Governo.
Tem a palavra, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas (Teresa Patrício Gouveia): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me uma palavra prévia: na semana passada, o Primeiro-Ministro esteve nesta Assembleia a participar num debate sobre este mesmo assunto, respondeu a todas as questões que lhe foram colocadas e, inexplicavelmente, quem ficou calado foi o Sr. Deputado Francisco Louçã.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

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A Oradora: - O Sr. Deputado Francisco Louçã nada disse, nada perguntou. De modo que tiro as minhas conclusões e penso que a sua intervenção não tem razão de ser.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Não faz ideia do que é o Parlamento!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os problemas globais de insegurança têm condicionado a agenda internacional. Por isso, a política externa portuguesa tem participado activamente, no plano europeu e no quadro da relação transatlântica, nas iniciativas que se desenvolveram no âmbito da criação de condições de segurança internacional.
Neste contexto, Srs. Deputados, este debate é bem-vindo. Trata-se de uma oportunidade para, com clareza, enunciarmos as nossas posições quanto a uma questão que, sobretudo desde 11 de Setembro de 2001, se tem tornado o centro do debate político em todo o mundo. Refiro-me, claro, à questão do terrorismo, que, naquela data, de forma espectacular e absoluta, declarou guerra aberta aos valores da democracia e dos direitos do Homem, que perfilhamos, e à segurança dos Estados e dos cidadãos, onde quer que eles se encontrem.
Nesta Casa, todos, sem excepção, estamos e estaremos unidos na sua condenação e no combate a este flagelo niilista e cobarde.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - É esta a minha convicção! Digo mais: tenho, disto, a certeza absoluta!
Dito isto, partindo daqui, verdade é que, nesta condenação e neste combate, fazemos análises distintas, tomámos caminhos diferentes e até usámos linguagens diferentes. E é bom que clarifiquemos, entre nós, essas diferenças, para nós e para os portugueses que nos estão a ouvir, e que representamos.
Vamos então ao que nos separa. E devo dizer que nos separam, desde já, do Bloco de Esquerda os seus pressupostos, ao ter suscitado uma interpelação ao Governo sobre política externa, na sequência dos atentados do passado dia 11, em Madrid. Isto equivale a dizer, por outras palavras, que, para o Bloco de Esquerda, estes atentados vêm demonstrar o mal fundado das posições tomadas, que os atentados têm apenas um destinatário específico - os que participaram na coligação contra Saddam Hussein - e que o Governo português deveria rever as suas posições, eventualmente, a exemplo do futuro Governo espanhol. Em nada concordamos com esta análise.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Perante a ameaça do terrorismo fundamentalista islâmico, qual é o interesse português? Desde logo, prevenir agressões no território nacional e contribuir para o combate da comunidade internacional aos movimentos terroristas, até à sua completa derrota.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É um combate permanente contra inimigos que não descansam, nem nos dão quartel. Digo inimigos avisadamente. Quem destruiu as torres de Manhattan, quem atacou as gares de Madrid, há três semanas, quem assassinou, em massa, turistas alemães, na Tunísia, e australianos, em Bali, cooperantes franceses, em Karachi, e funcionários consulares britânicos, em Istambul, foram grupos terroristas da constelação al-Qaeda. Uns receberam instruções dela, outros só a inspiração, mas a sua causa é a mesma. Não tenhamos ilusões! O inimigo são eles e também quem lhes dê doutrina e dinheiro. É essencial nunca esquecer isto!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Não pensar, como alguns na Europa parecem pensar, que o inimigo são os Estados Unidos e a Administração Bush. Nem pensar, como nos Estados Unidos alguns parecem pensar, que o inimigo são os europeus ou, pelo menos, uma parte dos europeus.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - O inimigo é o braço armado do fundamentalismo islâmico e o que eles querem é

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enfraquecer o poder e o prestígio dos Estados Unidos e dos seus aliados, em toda a parte, mas, sobretudo, no mundo muçulmano, afastar americanos de europeus e impedir a modernização e a democratização dos países árabes.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Querem estabelecer, de Marrocos ao Afeganistão, regimes fundamentalistas, onde a única educação seja corânica, a única lei seja a sua versão pura e dura da lei islâmica, com pena de morte, amputações e lapidação de adúlteras, onde as mulheres não tenham direitos, incluindo o direito à educação, e andem tapadas da cabeça aos pés.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - E a Arábia Saudita?!

A Oradora: - Não precisamos de tentar imaginar um país assim. Basta lembrarmo-nos do Afeganistão dos taliban.
O combate colectivo contra este terrorismo tem dois objectivos paralelos: um é o de impedir novos ataques e punir os que se realizaram, o outro é o de impedir que o mundo árabe e o Médio Oriente resvalem para o caos incontrolável, com consequências desastrosas para a Europa e para o mundo.
Por isso, fosse qual fosse a posição que cada um tomou, no ano passado, em relação à guerra, todos os aliados na NATO e os restantes Estados-membros da União Europeia têm um interesse vital em que a recuperação do Iraque seja um sucesso. E este sucesso é possível, apesar do terrorismo, da criminalidade comum, das dificuldades de construção de um sistema político decente, num pano de fundo de divisões étnicas e falta de tradições democráticas.
Na minha recente visita ao Iraque, pude constatar isso mesmo: transformações da realidade iraquiana, impensáveis há apenas um ano atrás, desde logo, uma lei transitória de administração, conforme aos direitos humanos e que reconhece os direitos das mulheres e a liberdade de culto, um Conselho do Governo, que é a instituição mais representativa que o país já conheceu, um calendário político definido para a adopção de uma Constituição e para a eleição de um governo legítimo em Janeiro de 2005 e a garantia de que o Iraque não constitui uma ameaça para os seus vizinhos.
Não aceito que se considere a instalação da democracia no Iraque um projecto absurdo e inviável. Ouvi vezes demais dizer o mesmo de Portugal, com idêntica convicção, no tempo de Salazar.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sondagens de opinião recentes mostram que a maioria dos iraquianos acham que vivem melhor agora do que no tempo de Saddam Hussein, acham também que um regime político democrático é possível e desejável no seu país, querem que a administração da coligação se vá embora, mas querem também uma presença militar estrangeira, até serem capazes de se ocuparem sozinhos da sua segurança, e querem ainda que o país permaneça uno, que não se fragmente entre xiitas, sunitas e curdos.
Srs. Deputados, o Governo português é a favor de uma nova resolução das Nações Unidas que enquadre juridicamente o Iraque a seguir a 30 de Junho.
A presença das Nações Unidas facilitará a participação, na reconstrução do Iraque, de outros países, até agora relutantes. Um Iraque estabilizado e democrático terá efeitos benéficos na região.
De resto, desde o derrube de Saddam, a região tem vindo a dar sinais animadores: o Coronel Khadafi resolveu abrir o seu arsenal de armas de destruição maciça à inspecção internacional; sob pressão dos Estados Unidos e da União Europeia, o Irão passou a cooperar com a Agência Internacional de Energia Atómica; a Síria, pela primeira vez, desde há muitos anos, libertou presos políticos; no Afeganistão perspectivam-se eleições legislativas e presidenciais, caminhando-se para um processo de estabilização.
Há, pois, progressos, desde há um ano, mas há ainda muito por fazer, nomeadamente um avanço real da resolução pacífica da questão israelo-palestiniana.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Entende o Governo português que esta questão só conhecerá uma solução, quando ambas as partes se empenharem decididamente num diálogo político. Não é com atentados terroristas ou com assassinatos que se conseguirá uma saída para a escalada da violência.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Mas a potência mais capaz de, realmente, levar as partes a entenderem-se são os Estados Unidos. Temos transmitido a Washington a nossa preocupação nesta matéria, sublinhando a necessidade de um envolvimento consistente e continuado no processo de paz no Médio Oriente - envolvimento dos Estados Unidos, mas também da União Europeia, da Rússia e das Nações Unidas.
Srs. Deputados, um ano decorrido, desde o começo da guerra, mostra que um Iraque seguro, próspero e governado democraticamente não só é possível como vem a caminho. Quanto melhor coordenado for o apoio internacional mais depressa a tarefa será cumprida.
O Governo a que pertenço continuará a dar a sua ajuda ao processo, enquanto tal for necessário e na medida em que, em cada momento, for considerado possível.
Devo sublinhar que não estou a falar de três ou seis meses. Alguns anos serão precisos antes de a comunidade internacional se poder retirar. Tal não nos deverá espantar.
No Kosovo, uma administração das Nações Unidas e uma força militar da NATO estão instaladas desde 1999 e não poderão sair de lá tão cedo, como, ainda há dias, pudemos confirmar.
Tal como a guerra do Iraque, a guerra do Kosovo foi desencadeada sem um mandato do Conselho de Segurança das Nações Unidas e Milosevic não desobedecera, durante 12 anos, a 17 resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas, não utilizara armas químicas contra compatriotas e vizinhos, não desenvolvera nem tentara adquirir armas de destruição maciça. Por outras palavras, Milosevic representava um perigo muito menor para o mundo e para os seus concidadãos do que Saddam Hussein.
Há um ano, os governos americano e inglês e os respectivos serviços de informações, os serviços de informações e os governos da Alemanha e da França, o Secretariado das Nações Unidas, todos, estavam inteiramente convencidos de que Saddam dispunha de armas proibidas, prontas a serem utilizadas.

O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): - Todos menos o chefe dos inspectores!

A Oradora: - Estão, neste momento, a decorrer inquéritos nos Estados Unidos e no Reino Unido para apurar a fiabilidade das fontes de informação.
Srs. Deputados, quero recordar hoje, aqui, entretanto, as decisões adoptadas no último Conselho Europeu, desde logo o compromisso político da cláusula de solidariedade para com um Estado-membro alvo de acções terroristas, a criação de um fundo de apoio às vítimas do terrorismo, o reforço da cooperação entre as bases de dados europeias e os sistemas de informações e, finalmente, a criação de um cargo de coordenador da luta contra o terrorismo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Portugal não enjeitará nenhuma responsabilidade nesse combate.
Os portugueses receberam, do Presidente da República e do Primeiro-Ministro, mensagens de firmeza e serenidade. Recordo as palavras avisadas do Presidente da República: "estamos bem onde estamos, qualquer que tenha sido a posição de partida".

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Gostaria ainda de recordar aqui o debate de há oito dias e os pontos de vista expressos pelo Partido Socialista quanto ao tema do terrorismo e à criação de condições necessárias para assegurar a reconstrução do Iraque e a sua plena soberania política.
Estas posições vêm construindo, juntamente com as do Governo, um amplo consenso nacional, o que naturalmente reforça a posição portuguesa na cena internacional.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos seguros da nossa razão e fazemos parte de uma frente internacional coesa e decidida. Qualquer transigência da nossa parte seria um erro grave e diminuiria o nosso crédito junto de parceiros, de um lado e de outro do Atlântico. Em vez de reforçar a nossa segurança, ela aumentaria a nossa vulnerabilidade.
Srs. Deputados, estou segura de que esta é a linha de rumo que melhor serve os interesses de Portugal e dos portugueses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Francisco Louçã para uma interpelação à Mesa, informo que a Mesa já regista oito pedidos de palavra para solicitar esclarecimentos à Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas.
Tem a palavra, Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, gostava de dar um esclarecimento, visto que a Sr.ª Ministra entendeu começar a sua intervenção com uma referência pessoal completamente descabida,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

… segundo a qual eu teria ficado silencioso no último debate sobre esta matéria com o Sr. Primeiro-Ministro. Sucede, e este esclarecimento é-lhe devido, que a bancada do Bloco de Esquerda tem uma intervenção no debate mensal com o Primeiro-Ministro e o Deputado Luís Fazenda fez essa intervenção, exprimindo, naturalmente, o ponto de vista da bancada, que é também o meu. Portanto, sinto-me perfeitamente representado, Sr.ª Ministra, razão pela qual não se deve preocupar com isso.
A alusão a que eu me teria calado, no entanto, Sr.ª Ministra, é de tal mau gosto que nem consigo acreditar que tenha sido sugerida pelo Ministro Luís Marques Mendes.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Francisco Louçã, lembro que as interpelações são dirigidas à Mesa e não à Sr.ª Ministra, que não faz parte da Mesa.
Vou agora dar a palavra aos Srs. Deputados que se inscreveram para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Francisco Louçã.
Assim, tem a palavra o Sr. Deputado José de Matos Correia.

O Sr. José de Matos Correia (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, a intervenção que V. Ex.ª aqui fez confirmou aquilo que nós já sabíamos antes de a ouvir: o Bloco de Esquerda e V. Ex.ª não vieram aqui para colocar questões sérias mas para fazer um daqueles exercícios de retórica política em que V. Ex.ª se tornou especialista.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O Bloco de Esquerda sabe que não há nada de novo a dizer sobre a questão do Iraque, porque o Governo já veio, vezes sem conta, à Assembleia, prestar esclarecimentos sobre esta matéria e há menos de uma semana o Sr. Primeiro-Ministro, de novo, aqui respondeu a mais perguntas sobre este problema. Contudo, isto não importa, porque, para o Bloco de Esquerda, o que conta é aparecer, é dar nas vistas, é provocar.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E a razão disso é muito simples: o Bloco de Esquerda não tem, verdadeiramente, causas, Sr. Deputado, tem conveniências; não tem projectos, tem slogans!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado Francisco Louçã, para o Bloco de Esquerda, a agitação é um fim em si mesmo. O comportamento do Bloco de Esquerda é bem a prova de que o populismo e a demagogia também estão na extrema-esquerda.
Quanto ao Iraque, e já que quis aqui trazer essa questão, deixe-me dizer-lhe o seguinte: o Governo teve sempre uma postura clara nesta matéria, consentânea com os nossos valores e interesses. Portugal sempre disse que privilegiava uma solução pacífica do conflito iraquiano e que a ONU deveria ter uma intervenção determinante nesta matéria, mas também sempre dissemos que, se houvesse guerra, apoiaríamos politicamente os nossos aliados, porque, para nós, não há hesitações quando de um lado estão a liberdade e a democracia e do outro lado está o regime de terror e de ditadura de Saddam Hussein.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Para nós, não havia lugar a uma neutralidade, que seria, objectivamente, colaborante.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É pena que o Bloco de Esquerda, que se esforça tanto para organizar manifestações contra os Estados Unidos da América, não tenha feito exactamente a mesma coisa para protestar, nas ruas, de forma veemente, contra a ditadura de Saddam Hussein. É muita pena, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Iraque está hoje bem melhor do que estava com Saddam Hussein, Sr. Deputado. E sabe porquê? Porque descobriu o valor inestimável da liberdade. E, se tem dúvidas, pergunte aos homens e às mulheres iraquianas, que, hoje, até têm o direito de protestar, livremente, nas ruas do Iraque, contra aquilo de que não gostam.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Há problemas sérios no Iraque? Certamente que sim, mas são provocados por aquela escassa minoria que quer fazer voltar o Iraque ao tempo das trevas.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Do que o Iraque precisa é do reforço do envolvimento internacional. Abandonar o Iraque, como V. Ex.ª pretende, seria dar àquela minoria o sinal errado.
Daí que eu pergunte: crê V. Ex.ª, por 1 minuto, que seria responsável sair do Iraque quando se aproxima o momento decisivo da transição política? Crê V. Ex.ª que há alternativas viáveis para a situação actual? E quais são as alternativas que V. Ex.ª apresenta?

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - Digo-lhe, com franqueza, porque gosto da franqueza nas relações pessoais e também nas relações políticas, que faço estas perguntas no quadro deste debate parlamentar mas não tenho qualquer esperança na sua resposta, Sr. Deputado, porque V. Ex.ª é muito eficaz a criticar mas raramente acerta quando se trata de apresentar posições construtivas e sérias.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Francisco Louçã, responde já, ou no fim?

O Sr. Francisco Louçã (BE): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, de facto, é difícil estabelecer qualquer tipo de diálogo consigo nesta matéria,…

Vozes do CDS-PP: - Muito!

O Orador: - … registando até que V. Ex.ª, hoje, no dia 1 de Abril, demorou qualquer coisa como 9 minutos para dizer a primeira verdade.

Vozes do CDS-PP: - É verdade!

O Orador: - Ao fim de 9 minutos, disse a primeira verdade, que foi a de que a posição do Governo português tinha sido correcta, proporcional e de solidariedade para com os seus aliados, como aqui foi dito, várias vezes, pelo Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

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Demorou 9 minutos, Sr. Deputado!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - E está a melhorar!

O Orador: - E a dificuldade na capacidade de dialogar, Sr. Deputado Francisco Louçã, está no seguinte: nós nunca tivemos qualquer tipo de ambiguidade em relação a nenhum tipo de terror, ao contrário do Bloco de Esquerda,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - … que, várias vezes, teve posições ambíguas sobre o terrorismo. Aliás, basta recordar as vossas posições em relação à ETA, em Espanha.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em relação ao Iraque, Sr. Deputado - comecemos por aí -, é possível discutir a situação entre democratas e dentro da própria divisão que se gerou na Europa, ou seja, entre aqueles que entendiam que havia razão para a solidariedade com o aliado americano e aqueles que entendiam que a posição francesa era a mais correcta e equilibrada. Este diálogo é possível! Mas esta não era a posição do Bloco de Esquerda! O Bloco de Esquerda era contra qualquer intervenção no Iraque, com ou sem mandato das Nações Unidas, com ou sem cobertura das organizações internacionais.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

E aqui, Sr. Deputado, já não há diálogo possível, porque os senhores estão fora do quadro das Nações Unidas! E não só estão fora do quadro das resoluções das Nações Unidas como - dizem - são contra as nossas alianças, são contra as nossas alianças estruturais!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Pergunto-lhe, Sr. Deputado Francisco Louçã, se o Bloco de Esquerda nos pode dizer, claramente, que em relação às Nações Unidas, no caso do Iraque, era indiferente e quanto aos aliados têm dúvidas. Os senhores são a favor - e digam-no, claramente, preto no branco - de que Portugal seja membro da NATO, como sucede com todos os partidos democráticos em Portugal, ou são contra a presença de Portugal na NATO?

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É importante sabê-lo, porque também já sabemos que, quanto a uma maior cooperação na defesa europeia, os senhores disseram aqui que são contra e que não a aceitam.
A conclusão é óbvia: de acordo com a vossa posição, ficaríamos fora de qualquer política externa razoável, que deve ser europeia, atlântica e lusófona.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Ficaríamos completamente fora de qualquer política externa razoável para Portugal.
A verdade é esta, Sr. Deputado: o senhor pode dizer que Ossama bin Laden é saudita - é verdade! -, mas também sabe que é um dissidente e que era no Afeganistão que ele estava.
Acredito que os senhores entendam que o Afeganistão, com os taliban, estava melhor do que está hoje, a mim, não me parece, entendo que o Afeganistão estava muito pior com os taliban do que está hoje.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - E também entendo que o Iraque, com Saddam Hussein, estava pior do que está hoje. Esta é que é a verdade!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha. Peço-lhe que termine.

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O Orador: - Termino, Sr. Presidente, dizendo apenas mais uma coisa ao Sr. Deputado Francisco Louçã.
O problema para a falta de credibilidade da vossa política externa, Sr. Deputado,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Qual política?!

O Orador: - … é o de que, se ela fosse seguida, Portugal só seria respeitado em dois sítios: na cimeira de Porto Alegre e nas manifestações de rua contra a globalização. Não nos ouviriam em mais lado algum!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, dispondo de um máximo de 5 minutos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, percebe-se, destas duas intervenções e do tom do que aí vem, por que é que o Ministro Luís Marques Mendes foi tão sábio ao propor o dia 1 de Abril para este debate.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Ah!…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Foi em homenagem ao BE!

O Orador: - Fica bem esclarecido que com mentiras se começou, com mentiras se continua e com mentiras se vai acabar!
Srs. Deputados, posso emprestar-vos, e talvez até à Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, se ela não o conhecer, o relatório dos serviços secretos britânicos em que se baseou o nosso Primeiro-Ministro. Esse relatório começa por falar das localizações certas das armas químicas e biológicas.
Perguntava Hans Blix, com muita graça: como é possível ter 100% de certeza sobre a existência das armas e 0% de certeza sobre a sua localização?! Mas, é claro, este não era um problema do PSD!

Vozes do CDS-PP: - Responda às perguntas!

O Orador: - Pensei que o Sr. Deputado José de Matos Correia falou me viesse confirmar a informação do Sr. Deputado António Nazaré Pereira, que, com a ousadia que caracteriza os Deputados do PSD, aqui há tempos deu nesta Assembleia, com o mapa exacto das localizações das armas. Dizia ele: "Armas nucleares? Eu sei onde estão! Estão em Qaim, Kadat, Qa Qaa, Tuwaitha. Armas Biológicas? Também sei onde estão! Em Taleju, Mohamediat e Daura. Armas químicas? Também sei onde estão! Estão em Faluda!". Ele sabia tudo!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Responda às perguntas!

O Orador: - Era tudo mentira, Srs. Deputados! Tudo mentira, de alto a baixo! Não nos peçam, portanto, face à guerra justificada pela mentira, que adiramos à lógica da guerra.
A pergunta pertinente nunca é se estavam melhor ou pior no tempo de Saddam ou se ficaram melhor ou pior depois. O Iraque estava mal no tempo de Saddam! Mas por que não perguntaram ao Sr. Primeiro-Ministro, que já se ausentou da Sala, por que teve ele tanto à-vontade para vender armas a Saddam Hussein? Na altura em que ele era um bom cliente, não se queixavam os Deputados da maioria, nem sugeriam manifestações de rua, Sr. Deputado José de Matos Correia.
O Sr. Deputado não era do PSD em 1988? E, em 1988, não houve o massacre de Halabja? Não houve vários milhares de curdos mortos por armas químicas? Em 1988, Durão Barroso não estava no governo? E o governo não estava a vender armas a Saddam Hussein?
Em 1989, o que aconteceu? Deixou de vender armas a Saddam Hussein?! Sabe a resposta, não sabe? Continuou a vender armas a Saddam Hussein! O senhor esteve nas manifestações? Posso dar-lhe um panfleto que fiz, nessa altura, protestando e denunciando esse massacre.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Só faz panfletos!

O Orador: - Estive nas manifestações, como esteve toda a esquerda, Sr. Deputado!

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Em contrapartida, aqueles negociantes que vendiam armas e que ainda hoje consideram justificável vender armas podem explicar tudo e o seu contrário.
Quando o Sr. Deputado Telmo Correia tomou a palavra, pensei que viesse defender o Ministro Paulo Portas, dizendo que é preciso vender armas à Arábia Saudita, que é indispensável fazer negócios com aquela boa gente da Arábia Saudita,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Responda às perguntas!

O Orador: - … que combater o fundamentalismo é apoiar a Casa de Saud, é apoiar a família real da Arábia Saudita, um país que não tem Constituição, não tem partidos, não tem leis, não tem direitos; tem uma polícia religiosa que espanca as mulheres se, nas ruas, o seu rosto ou o seu tornozelo é visto por detrás das vestes islâmicas. Este é o preço do fundamentalismo!
É absolutamente escandaloso que estejam dispostos a abdicar dos mais elementares princípios de humanidade e de política internacional só por obediência, porque o grande chefe da Casa Branca assim decide, mesmo que tenha sido ele a financiar os taliban, mesmo que tenha sido ele a apoiar os fundamentalismos islâmicos, mesmo que seja ele a manter o apoio ao regime da Arábia Saudita.
Aqui há, de facto, uma divisória, a divisória entre a mentira e o debate político sério; é querer manter, custe o que custar, uma mentira. Ela caiu! Ninguém acredita nela!
Richard Clarke, o conselheiro sobre o terrorismo do Presidente George Bush, veio declarar que, contra a sua opinião, o Presidente queria começar por atacar o Iraque em resposta ao massacre de 11 de Setembro de 2001. A resposta de Rumsfeld - vejam bem como ele explicava - foi a seguinte: "Não há suficientes alvos no Afeganistão, por isso vamos bombardear o Iraque". Isto está nas actas do Congresso norte-americano, dito por uma pessoa tão autorizada como Richard Clarke.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Responda à questão da NATO!

O Orador: - É esta lógica da guerra que não aceitamos! E a lógica da guerra, Srs. Deputados Telmo Correia e José de Matos Correia, é a lógica da mentira.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Os senhores tornam-se mentirosos compulsivos para defender a lógica da guerra, custe o que custar,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Responda às questões!

O Orador: - … mesmo que tenham ao vosso lado fascistas islâmicos e terroristas fundamentalistas, como têm e como, pelos vistos, se orgulham de continuar a ter.

Aplausos do BE.

Vozes do CDS-PP: - Não respondeu a nada!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou agora dar a palavra aos Srs. Deputados que se inscreveram para pedir esclarecimentos à Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, na sua intervenção, que naturalmente já trazia escrita, explicou que se querem restabelecer regimes fundamentalistas em que a única educação é corânica e a única lei é a sua versão pura e dura - pena de morte, amputações, lapidação de adúlteras, as mulheres não têm direitos e andam veladas da cabeça aos pés - e acrescenta que não precisamos tentar imaginar um país assim, basta lembrarmo-nos do Afeganistão dos taliban.
A Sr.ª Ministra tem razão: isto é o Afeganistão dos taliban! Mas, infelizmente, Sr.ª Ministra, é também com a Constituição de Hamid Karzai que, hoje, se instala o regime islâmico fundamentalista no Afeganistão.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Isso não é verdade!

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O Orador: - É certo que não é o único.
Já tinha sido colocada a seguinte pergunta ao Sr. Primeiro-Ministro, que dela se escapuliu, mas a Sr.ª Ministra não vai, com certeza, deixar de responder: então, como é que, se recusa os regimes que desta forma penalizam as mulheres e os seus direitos, que penalizam os aspectos essenciais dos direitos humanos, o Governo português negoceia com a Arábia Saudita?
É certo que a Sr.ª Ministra não precisa de imaginar… Aliás, devo dizer-lhe, com muita solidariedade, que a Sr.ª Ministra nunca poderá negociar com um governo da Arábia Saudita. Paulo Portas pode, mas a Sr.ª Ministra, que é uma mulher, nunca poderá sentar-se com o príncipe que representa o ministério da defesa da Arábia Saudita, porque ele nunca o aceitaria. Esta é a vergonha desse regime e é, naturalmente, a vantagem das democracias, no respeito pelos direitos. E isto é que é fundamental.
Por isso, a Sr.ª Ministra não vai à Arábia Saudita, não espero que vá - e desejo-lhe até que nunca lá vá - e espero que possa tomar connosco a palavra contra este regime escandaloso de fascismo teocrático que é a Arábia Saudita.
Sr.ª Ministra, o Sr. Ministro Paulo Portas esteve, nos dias 3 e 4 de Junho último, na Arábia Saudita e fez um comunicado onde se escreve que o Governo vai fazer um acordo de cooperação bilateral na defesa.
Sr.ª Ministra, esse acordo já está escrito? É dito nesse comunicado, em Junho, que a proposta de texto já está a ser preparada no Ministério da Defesa Nacional. Já estão feitos os acordos sobre as condições em que oficiais sauditas vêm para as academias militares portuguesas? As Forças Armadas nada tiveram a dizer? Não têm vergonha dessa situação?!
Foi nomeado, no Ministério da Defesa Nacional, o Major José António dos Reis Mendonça como responsável pelas relações bilaterais entre Portugal e a Arábia Saudita. Não sei se foi consultada, Sr.ª Ministra, mas hoje o Governo português nomeia um major das Forças Armadas portuguesas responsável pelo acompanhamento dos contratos militares de formação e de apoio tecnológico à Arábia Saudita. Não pensa que este é um regime que nem precisamos tentar imaginar?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, tem de terminar, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Termino de imediato, Sr. Presidente.
Tem alguma coisa a dizer-nos sobre o contrato que está em curso e que talvez já esteja assinado, Sr.ª Ministra?

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Não respondeu a nada!

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Ministra fez saber à Mesa que responderá a grupos de três oradores.
Dou, portanto, a palavra ao Sr. Deputado Almeida Henriques.

O Sr. Almeida Henriques (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, começo por cumprimentá-la vivamente e por dizer-lhe que, de facto, assuntos desta importância têm de ser tratados com serenidade, seriedade e frontalidade, sem demagogias, com segurança e com determinação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Foi isto que verificámos na intervenção que V. Ex.ª aqui trouxe, onde determinados princípios e pontos de partida deveriam ter merecido a unanimidade de todas as pessoas desta Câmara, tais como a necessidade de uma forte concertação no seio da União Europeia e em termos mundiais para aprofundar a luta contra o terrorismo, a reafirmação, como o Sr. Primeiro-Ministro já fez, do terrorismo como um mal absoluto que todos temos de combater e o combate ao terrorismo como uma palavra de ordem que todos deveríamos aqui ter. Efectivamente, os terroristas são criminosos e, portanto, são os nossos inimigos.
Não se pode, pois, confundir terrorismo com fé, nem com conflitos entre civilizações e culturas. E foi com esta determinação que o último Conselho Europeu foi particularmente importante, pois discutiu e aprovou medidas concretas para aprofundar esta luta, como a aplicação de legislação comunitária nos vários países e mecanismo de cooperação, como a Sr.ª Ministra referiu na sua intervenção.
Também aqui, mais uma vez, Portugal deu boas provas, verificando-se, por exemplo, que o terrorismo já constava do normativo português, em termos de moldura penal, e da transposição de directivas

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comunitárias.
Abordando um outro aspecto da intervenção da Sr.ª Ministra, quero dizer que apreciei a visita que fez ao Iraque. A Sr.ª Ministra esteve lá e teve oportunidade de ver e de comprovar como as coisas se passam.
Essa sua visita relâmpago, como muitos lhe chamaram, foi, de facto, de uma grande oportunidade, não só numa lógica de mobilização da opinião pública mas também numa lógica de solidariedade para com os portugueses que lá se encontram a servir uma causa e a servir e a honrar o nome de Portugal.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A Sr.ª Ministra contactou o corpo da GNR, falou com os responsáveis políticos e com várias pessoas, tendo tido oportunidade de confrontar e de verificar na prática certos aspectos.
Sr.ª Ministra, com objectividade, o que viu? Que realidade concreta observou? Como avalia aquela situação? Enfim, como vê - e gostava que aprofundasse esta questão -, no médio prazo, a estabilidade do território, a estabilidade das populações e a instalação da democracia?
Sr.ª Ministra, são estas as questões muito concretas que quero deixar-lhe.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, neste nosso primeiro diálogo no Plenário, permita-me que lhe dirija cordiais e, com a sua autorização, amigos cumprimentos. É com muito prazer que dialogo consigo agora, e com maior prazer ainda porque, certamente, vai elucidar o meu espírito sobre um conjunto de questões muito concretas relativamente às quais consideramos importante conhecer o pensamento da Ministra dos Negócios Estrangeiros.
Sr.ª Ministra, realizamos hoje, aqui, um debate sobre política externa, que não é exactamente a mesma coisa que um debate sobre o terrorismo. É um debate sobre política externa.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - É certo que o terrorismo é hoje o grande problema que a sociedade internacional defronta e que também nós, europeus, defrontamos, como ainda há umas semanas, dolorosamente, o soubemos. Se não o sabíamos já, tomámos consciência dele.
Mas, Sr.ª Ministra, as perguntas que tenho a colocar-lhe são muito concretas.
Considera a Sr.ª Ministra, na sua avaliação, que a guerra do Iraque, designadamente depois da vitória das forças da coligação, contribuiu para diminuir o risco de terrorismo no mundo, ou, pelo contrário, que o agravou?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Considera a Sr.ª Ministra, no seu entender, que a guerra no Iraque, tal como tinha sido visionado pelos seus principais fautores, contribuiu para solucionar ou caminhar mais para uma solução do conflito do Médio Oriente, ou, pelo contrário, que o agravou?

O Sr. António José Seguro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Entre o multilateralismo e a adesão plena à Carta das Nações Unidas, transcrita no documento de Solana, aprovado na União Europeia, ou o unilateralismo da Administração americana ou, pelo menos, de alguns próximos dela, a qual deles é que V. Ex.ª adere, se, naturalmente, houver conflito, como já foi o caso?
Sr.ª Ministra, em seu entendimento, a luta contra o terrorismo e os perigos de turbulências variadas no mundo e na Europa ganhou ou perdeu com a divisão da Europa?
Para terminar, Sr.ª Ministra, considera ainda que há uma nova Europa e uma velha Europa?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas.

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A Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, Portugal relaciona-se com a Arábia Saudita no mesmo quadro de relacionamento que mantém com os outros países da região.
Aliás, recordo-lhe que, ainda recentemente, se deslocaram à Arábia Saudita representantes de vários países europeus, nomeadamente da Alemanha, da Polónia, de França e de Inglaterra, e um dos objectivos era justamente a discussão dos direitos humanos e do Estado de direito. São, sobretudo, estes os objectivos do nosso diálogo, não só à Arábia Saudita mas também aos países do Mediterrâneo e do Golfo, nomeadamente no que respeita a iniciativas de âmbito europeu.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - O que o Ministro Paulo Portas está a fazer é sobre direitos humanos?

A Oradora: - Condenamos, com firmeza, a violação dos direitos humanos onde quer que ela tenha lugar, seja na Arábia Saudita, seja onde for.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Com as armas que vocês vendiam!

A Oradora: - Sr. Deputado, não me parece que venha a propósito da presença da coligação no Iraque falar sobre a evolução dos direitos humanos em sentido negativo. Aliás, Sr. Deputado, é corrente ouvir dizer que, neste momento, o Iraque está pior do que no tempo do Saddam Hussein.

O Sr. António Filipe (PCP): - Que consequências tiraram disso?

A Oradora: - Na realidade, do ponto de vista de Saddam Hussein está pior e do ponto de vista da polícia política está muitíssimo pior; a nível daquela violência que vemos na televisão, há, de facto, problemas e eu tive a ocasião de o constatar.
No outro dia, na televisão, ouvi alguém dizer que as minorias e os direitos das mulheres estavam em risco. É claro que no tempo de Saddam não estavam em risco, porque essas minorias, nomeadamente as curdas, eram bombardeadas com armas químicas. Logo, o risco era imediatamente eliminado.
Também os xiitas foram chacinados na sequência da guerra do Golfo e não podiam praticar a sua religião no Iraque. Logo, não havia de facto problemas, porque o risco desaparecia do Iraque. Mas se eu fosse iraquiana, Sr. Deputado, e se não pertencesse à elite de Saddam Hussein, preferia o risco de hoje às certezas de ontem.
Sr. Deputado, a lei iraquiana, que V. Ex.ª criticou e que há dias foi aprovada, é a lei mais livre de todo o mundo árabe.
Na realidade, o Iraque tem vindo a registar bastantes e notáveis melhorias, já que tem mais energia eléctrica, há mais escolas a funcionar, há mais 3 milhões de criança vacinadas, os gastos com a saúde aumentaram 30 vezes.
Portanto, Sr. Deputado, não me venha dizer que a coligação veio piorar a situação no Iraque, porque isso não é verdade. Aliás, bastava ter lido os resultados de uma sondagem recentemente publicada para saber que 85% dos iraquianos são da opinião de que, neste momento, a coligação não deve sair do Iraque.
Sr. Deputado, deixe-os falar, deixe que eles sejam ouvidos e, sobretudo aqui, oiçamos o que os próprios iraquianos dizem.
Quanto às questões que me foram colocadas pelo Sr. Deputado Almeida Henriques, gostava de dizer que me impressionou - e quando estive no Iraque falei com entidades várias, sobretudo com iraquianos que se ocupavam da preparação da lei provisória daquele país, encaminhando o processo político em curso - a sua determinação, a sua capacidade política, a sua serenidade e a enorme vontade que tinham em prosseguir o processo político e em voltar a integrar a comunidade internacional. Também me falaram das dificuldades ao nível da segurança, e todos, sem excepção, agradeceram a presença portuguesa no Iraque.
Recordo também, da visita que fiz aos soldados da GNR situados no Iraque, a forma serena e segura como estes soldados estão a entender a razão de ser da sua missão, o orgulho que têm naquilo que estão a fazer e o seu grande entendimento do sentido da missão das Forças Armadas em questões de preservação da paz - e esta é uma missão de preservação da paz.
Quero também agradecer ao Sr. Deputado José Vera Jardim as palavras que me dirigiu e dizer-lhe…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Ministra, o seu tempo esgotou-se. Queira concluir.

A Oradora: - São só mais 30 segundos, Sr. Presidente.

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Sr. Deputado José Vera Jardim, quero dizer-lhe que o multilateralismo é, naturalmente, o caminho que escolhemos no relacionamento internacional e nas missões de paz. O conflito do Médio Oriente é uma questão central em toda esta região, mas também não me esqueço de que o "roteiro para a paz" foi construído na sequência do problema do Iraque. A resolução destas questões é naturalmente uma prioridade, mas a primeira condição para a resolução deste problema é os próprios iraquianos quererem entender-se. E, como é óbvio, a comunidade internacional, no seu conjunto, deve acompanhar estes objectivos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr.ª Ministra, com os meus cumprimentos e os cumprimentos da minha bancada, gostaria de colocar-lhe duas questões.
A primeira é a de que um número crescente de opiniões vai no sentido de que o combate eficaz ao terrorismo exigirá uma perfeita coordenação da NATO, da União Europeia e das Nações Unidas.
Na União Europeia, os Estados que são membros da NATO coexistem com outros Estados que, historicamente, adoptaram uma postura neutralista, como são os casos da Suécia, da Áustria, da Irlanda e da Finlândia - no caso particular da Finlândia, neste momento, com um grande debate sobre a sua adesão ou não adesão à NATO.
Pensa V. Ex.ª, Sr.ª Ministra, que o desenvolvimento da política de segurança e defesa, actuando em perfeito sincronismo com a Aliança Atlântica, pode assegurar o envolvimento dos países europeus ditos neutrais nas acções de prevenção e de combate ao terrorismo, que, insisto, dizem respeito a todos os países livres que defendem os valores da democracia e da coexistência pacífica, que se expressam num multilateralmente actuante?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A segunda questão, Sr.ª Ministra, é relativa à política africana, porque estamos muito centrados noutras questões e, de facto, a lusofonia é um dos vectores fundamentais da nossa política.
Começo por salientar o facto de esta ter sido uma semana em que ficou ainda mais claro o interesse de Portugal por África. As visitas que o Sr. Presidente da República fez a Cabo Verde e o Sr. Primeiro-Ministro a Moçambique foram um êxito e a Assembleia da República não pode senão congratular-se com o seu sucesso e com o reforço dos nossos laços com aqueles dois países.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Mas este fim-de-semana realizaram-se eleições na Guiné-Bissau, que decorreram com elevada participação e espírito cívico mas com uma desorganização que não favorece a imagem daquele país junto das instâncias internacionais, e o risco de uma deriva preocupa-nos muito. E as notícias das últimas horas não nos acalmam!
Conhecendo os esforços que a diplomacia portuguesa desenvolveu junto de instâncias internacionais, nomeadamente da União Europeia, no sentido de não ser abrandado o apoio àquele país - esforços coroados de êxito, assinale-se - e tendo por isso razões legitimadoras acrescidas para o fazer, pensa o nosso Governo, através dos canais adequados, fazer um apelo aos dirigentes da Guiné-Bissau no sentido de que as divergências que os separaram nas eleições sejam ultrapassadas, de que o país rapidamente retome a normalidade, seja nomeado um governo que possa governar com estabilidade e, por consequência, esteja em condições de corresponder ao auxílio solidário dos países dadores?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Penso que os líderes políticos da Guiné-Bissau têm de estar à altura do civismo dado pelo seu povo. Aquele país lusófono não pode "auto-marginalizar-se" num contexto internacional com uma agenda tão carregada que não permite ocupar-se daqueles que não querem ajudar-se a si próprios.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

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O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, disse que o combate ao terrorismo unia todos nesta Câmara, mas, como é habitual, o CDS-PP mais excessivo entendeu descortinar alguma ambiguidade do Bloco de Esquerda no combate ao terrorismo.
Devo dizer-lhe, para que sobre isso não fique qualquer sombra de dúvida, que o BE condena inequivocamente o terrorismo. Conheci de perto, coisa que não sei se alguém da bancada do CDS-PP conheceu, a morte, por atentado à bomba, de três amigos e camaradas desde 1976, e por isso não tenho qualquer ambiguidade no combate ao terrorismo, venha ele de onde vier.
Mas, Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, o debate é mesmo sobre o cinismo em política externa. Aquilo que depreendemos é que o Governo não tem princípios mas, sim, conveniências, e são essas conveniências do Governo que estamos aqui a discutir. Reparamos que, primeiro, o Sr. Primeiro-Ministro e, agora, a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros nada nos disseram sobre a pergunta tão simples do contrato militar com a Arábia Saudita. Mas essa é uma conveniência, não é um princípio! Isso é que é o verdadeiro retrato do cinismo político internacional!
Dou-lhe ainda um outro exemplo: a Sr.ª Ministra falou, na sua intervenção, sobre a Líbia. Ora a Líbia, que tinha decidido, há mais de nove meses, propor a ida de inspectores da Agência Internacional de Energia Atómica para as fiscalizações, decidiu, por razões económicas, "reingressar" na comunidade internacional e o que gostaríamos de saber, se é que a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros pode esclarecer-nos, porque já o seu antecessor não esclareceu, era o que foi o então Sr. Ministro fazer à Líbia neste transcurso…
Como foi público e notório - saiu nas primeiras páginas dos jornais -, reuniu com o Sr. Coronel Kadafi e, uns meses depois, há sinais de incentivo do Reino Unido e dos Estados Unidos em relação ao regime da Líbia, que não se preza de ser uma democracia e que continua assumidamente responsável pelo atentado terrorista de Lockerby.
Tudo isso foi rapidamente esquecido - lá estão as tais conveniências e não os princípios… A troco de quê? A troco de um acordo para a Shell, que foi celebrado no dia seguinte ao do encontro do Primeiro-Ministro português com o Primeiro-Ministro britânico, Tony Blair, em Tripoli! E diz-nos o insuspeito ministro de Tony Blair Michael Mitchor, em artigo recente no The Guardian, que os contratos celebrados no exacto de dia em que houve o aperto de mão entre Tony Blair e Kadafi valem centenas de milhões de libras para a Shell.
Portanto, a pergunta não é ofensiva e é óbvia: o que é que o seu antecessor foi fazer à Líbia, que mensagem levava ele do nosso Governo e sobre o quê? Ou foi "carteiro de terceiros"?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Esta outra pergunta, sem ofensa, é também óbvia: será que o Governo português também está a trabalhar para a Shell? Por princípios ou por conveniências?...

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, no passado mês de Março, um Subsecretário de Estado norte-americano, de nome John Bolton, anunciou, em Lisboa, que Portugal vai organizar uma reunião com países africanos para discutir o seu envolvimento na luta contra a proliferação de armas de destruição massiva. Sublinho que este Subsecretário de Estado norte-americano não anunciou qualquer iniciativa norte-americana mas, sim, uma iniciativa do Governo português proposta, segundo foi noticiado pela comunicação social, numa reunião realizada precisamente em Portugal contra a proliferação.
Esta notícia confronta-nos com o facto insólito de uma iniciativa portuguesa ser anunciada, em Portugal, por um responsável pela Administração norte-americana. É, no mínimo, insólito!!
Chamamos a atenção para a própria iniciativa e para o facto de não ter sido dada qualquer informação, nem a esta Assembleia nem ao País, sobre que iniciativa é, afinal, esta.
Pelas notícias vindas a público, sabemos que não é uma iniciativa tomada no âmbito da NATO, mas que envolve apenas 14 países; sabemos também que não decorre ao abrigo de qualquer tratado internacional que tenha sido celebrado por Portugal, porque, nesse caso, a Assembleia da República teria sido chamada a aprovar para ratificação esse tratado internacional; e sabemos ainda que o Sr. Ministro da Defesa, questionado pelo PCP na Comissão Parlamentar de Defesa Nacional sobre que iniciativa era esta, também disse nada saber dado que esta iniciativa decorria apenas a nível diplomático e sob a tutela do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Portanto, não sabemos que iniciativa é esta, nem para dizer bem nem para dizer mal. A iniciativa poderá ter os seus méritos, que ignoramos.

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Assim, gostaríamos de saber como justifica o Governo o facto de ser um responsável pela Administração norte-americana a anunciar iniciativas do Governo português, numa reunião realizada precisamente em Portugal,…

O Sr. Honório Novo (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - … em que consiste a iniciativa contra a proliferação, qual é o seu enquadramento institucional e qual é a participação que Portugal tem ou pretende ter.
Queríamos saber também por que razão é que, tendo os trabalhos no âmbito desta iniciativa contra a proliferação decorrido desde Junho de 2003, segundo é relatado na comunicação social, nunca foi dada a mínima informação à Assembleia da República acerca destas actividades.
Solicitamos, portanto, que a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros nos dê uma informação precisa sobre a iniciativa contra a proliferação, porque, se não o fizer, não nos restará outra solução que não seja a de tentar perguntar à Embaixada dos Estados Unidos, o que manifestamente seria inadequado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, para responder.

A Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia, também partilho a sua preocupação sobre o que se passa na Guiné. Estamos a acompanhar essa questão. Enviámos uma equipa de observadores portugueses e participámos da equipa de observadores da CPLP. Fizemos comunicados apelando a que aceitem os resultados eleitorais, na sequência do relatório que missões da União Europeia e da CPLP fizeram para declarar as eleições justas e transparentes.
Portanto, temos acompanhado esta questão com o maior interesse. Ainda ontem falei com o meu Colega Ramos Horta, que tem estado como enviado especial da CPLP a acompanhar este assunto, pedindo-lhe que, imediatamente após a visita que está a realizar à Polónia, volte à Guiné.
Estamos conscientes dos riscos, da fragilidade do sistema neste período de transição política, da importância que as eleições se realizem de uma forma transparente e justa e sejam aceites pela comunidade política da Guiné - e sabemos que essa é também uma condição para que a comunidade internacional apoie este país.
Temos acompanhado esse assunto com interesse e temos intervindo junto da comunidade internacional nesse sentido. Esperamos que as eleições se concluam de forma positiva.
O Sr. Deputado Luís Fazenda fala-me de princípios, mas há aqui uma questão fundamental relacionada com o Iraque. O que está em curso no Iraque é um processo de instituição de uma democracia, da criação de liberdades, coisa que não havia no regime anterior.
Portanto, não percebo esta obsessão por não ver que aquilo que está efectivamente em causa, quando têm lugar atentados terroristas, é impedir que, no Iraque, se concretize com sucesso um processo democrático, porque isso será o fim dessa gente, desses cobardes que atentam contra este processo. Eles não estão a atentar contra a coligação mas contra o processo de instalação de uma democracia naquela região, porque sabem que isso será o seu fim. Esse é que é o ponto! Não ver isto é inverter completamente a questão que aqui está em causa. Penso que é preciso pensar nisso, Sr. Deputado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - E a Arábia, Sr.ª Ministra?

A Oradora: - Sr. Deputado, já lhe expliquei qual é o nosso ponto de vista relacionado com a Arábia Saudita ou com qualquer outro país com quem temos relações diplomáticas.
Portanto, para ser clara, o que conduz a uma escalada de violência não é a presença da coligação mas a procura de instalação de um sistema democrático naquela região.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - E a Líbia, Sr.ª Ministra?

A Oradora: - Sr. Deputado António Filipe, não compreendo a sua obsessão com os americanos.

Risos do PCP e de Os Verdes.

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Não compreendo, sinceramente. Penso que se refere à chamada proliferation security initiative, ou seja, à iniciativa relativamente à segurança contra a proliferação de armas de destruição massiva, que se traduz numa iniciativa político-diplomática que está a ser levada a cabo por um número alargado de países - incluindo países europeus, os Estados Unidos e outros países - que estão interessados na não proliferação das armas de destruição massiva. Consiste em aperfeiçoar sistemas de controlo de transporte e de circulação deste tipo de armamento. É tão simples como isto.
Portanto, se fosse a si, Sr. Deputado António Filipe, preocupava-me mais com a eficácia deste processo e desta iniciativa do que em saber quem é que fez declarações em Portugal - porque Portugal é um país livre, faz declarações quem quer!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Supõe-se é que temos um governo, não?…

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, penso que, cada vez mais, os portugueses não confiam neste Governo. E, para além de tantas outras opções políticas profundamente negativas, estou em crer que o envolvimento do Governo português na guerra do Iraque foi uma razão relevante para essa falta de confiança dos portugueses.
O argumento determinante para a guerra, já foi dito e redito, foi a existência de armas de destruição em massa no Iraque, que constituíam, de acordo com as palavras do Sr. Primeiro-Ministro Durão Barroso, "um grande perigo para a Humanidade". Hoje, já depois da guerra e, na sua sequência, da morte de muitos inocentes e justamente perante a inexistência dessas armas de destruição em massa, os autores da guerra estão a aferir da credibilidade das fontes (como disse a Sr.ª Ministra) que relatavam a existência de armas de destruição em massa no Iraque.
Sr.ª Ministra, se isto "não é de loucos", como é que classifica isto?
Os Verdes consideram que caberia ao Governo português reconhecer o erro e demarcar-se dessa política. O Governo deveria, com seriedade e em função dos factos que hoje conhecemos, pedir desculpa aos portugueses e reconhecer que foi totalmente enganado: ou que quis deliberadamente ser enganado ou que ingenuamente foi enganado. No entanto, em vez disso, continua a fazer vénia aos Estados Unidos da América e a dizer hoje que nunca disse o que disse relativamente ao argumento das armas de destruição em massa.
Sr.ª Ministra, verdade e dignidade é o que hoje se pede ao Governo em matéria de política externa, porque só isso poderá determinar a credibilidade da política externa portuguesa daqui para a frente.
Mas deixe-me expressar também uma preocupação, Sr.ª Ministra, é que, lido o programa deste Governo, no capítulo da política externa não há uma referência à determinação do Governo na promoção da paz no mundo. O vosso modelo de diplomacia, a vossa política externa é totalmente centrada na subjugação aos Estados Unidos da América - e, portanto, quando falamos em obsessão deveremos dirigi-la aos seus autores de facto - e a certas organizações belicistas, como a NATO.
Contudo, gostaria ainda, Sr.ª Ministra, de questioná-la sobre o seguinte: a falta de água potável, decorrente também do fenómeno das alterações climáticas, ameaça ser um dos maiores factores de conflito internacional neste século. Nesse sentido, gostaria de saber por que é que as conclusões do último Conselho Europeu decorrido em Bruxelas, no capítulo que dedicou ao Protocolo de Quioto - em que é feita uma referência expressa ao facto de a Rússia não ter ratificado este Protocolo -, não fazem qualquer referência nem apontam o dedo à posição vergonhosa dos Estados Unidos da América, que se demarcaram completamente da sua responsabilidade de ratificar o Protocolo de Quioto.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Sousa.

A Sr.ª Alda Sousa (BE): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, dou-lhe hoje, nesta interpelação, a terceira oportunidade de responder à pergunta, que já foi colocada na semana passada ao Sr. Primeiro-Ministro e hoje renovada, sobre os contratos com a Arábia Saudita no que diz respeito à reparação de material aeronáutico e ao acolhimento de militares sauditas em Portugal. Gostaria de ver esta questão respondida.

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O Sr. Primeiro-Ministro afirmou na semana passada e a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros reafirmou hoje que o Governo tinha feito bem em entrar para a coligação da guerra que invadiu o Iraque porque se tratava de uma batalha pela democracia.
Gostaria também de questioná-la sobre um aspecto central da política externa do seu Governo, que é o capítulo das relações com Angola, e de perguntar-lhe de que forma se enquadra e beneficia a política externa portuguesa de uma colaboração tão acrítica como a que o Governo, em particular o Sr. Primeiro-Ministro, mantém com o regime angolano.
Será que a Sr.ª Ministra considera um Estado de direito um país como Angola, que há anos aguarda a realização de eleições livres e onde uma cleptocracia corrupta vive luxuosamente, enquanto o povo sofre as consequências da guerra e dos roubos?
Será uma democracia um país que sistematicamente se recusa à transparência pública de fiscalização de contas, que tem sido sugerida por imensas organizações internacionais, incluindo o FMI?
O que tem a dizer sobre um país em que - sabe-se agora por informação proveniente de documentos do FMI que vêm em confirmar aquilo que a Global Witness já tinha afirmado -, entre 1997 e 2002, desapareceram dos cofres do Estado mais de 4000 milhões de dólares, aproximadamente a mesma quantia que o governo angolano gastou em programas sociais durante o mesmo período de tempo, enquanto é sabido que uma em cada quatro crianças angolanas morre antes dos 5 anos de idade e um milhão de pessoas deslocadas estão dependentes da ajuda alimentar internacional?
E o que tem a dizer do caso Pierre Falcone, Sr.ª Ministra? Ele é acusado pela justiça francesa de comércio ilícito de armas, abuso de bens sociais, fraude fiscal e tráfico de influências; está incriminado pela justiça suíça por branqueamento de dinheiro, em dois inquéritos separados, um sobre as comissões ou "luvas" pagas no âmbito das vendas de armas a Luanda durante a guerra civil e o outro sobre a utilização do dinheiro da transacção da dívida de Angola à Rússia que teria sido desviado em proveito de dignitários políticos.
É o mesmo governo angolano que concede a Pierre Falcone o estatuto de diplomata, nomeando-o ministro-conselheiro da delegação permanente angolana na UNESCO.
Pode-nos confirmar, Sr.ª Ministra, se o Dr. Durão Barroso, quando foi em visita privada assistir ao casamento da filha do Presidente angolano, teve oportunidade de referir algum descontentamento com estes escândalos e com a actuação deste regime cleptocrata e corrupto?

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, para responder.

A Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas: - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, sabe perfeitamente que as armas de destruição massiva não foram a razão principal do nosso envolvimento. Está farta de saber!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Está farta de dizer isso, de um tempo a esta parte, o que é diferente!

A Oradora: - É uma questão retórica, mas presumo que não terá mais questões a colocar, porque, senão, teria colocado outras questões que não tivessem sido ainda respondidas.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Coloquei algumas questões que não foram respondidas!

A Oradora: - Apenas lhe respondo com a intervenção que o Sr. Primeiro-Ministro aqui fez, justamente nessa ocasião, antes da invasão do Iraque, em que disse que "caso uma intervenção militar venha a ter lugar, Portugal vai estar no plano político e dos princípios ao lado dos seus amigos, aliados contra uma ditadura que ameaça a paz e a segurança dos povos". Esta foi a verdadeira razão!
Como disse há pouco, ainda recentemente a resolução das Nações Unidas referia que o Iraque constituía "uma ameaça à segurança e à paz internacional, devido ao seu papel na proliferação de armas de destruição massiva e aos mísseis de longo alcance e ao desafio permanente face às Nações Unidas".
Portanto, a sua pergunta foi retórica. A Sr.ª Deputada sabe perfeitamente quais foram os motivos e os fundamentos da nossa participação.
Relativamente ao que a Sr.ª Deputada considera serem as intenções belicistas da NATO, aí, realmente não posso acompanhá-la. A única coisa que posso dizer-lhe é que, amanhã, numa reunião do Conselho de Ministros da NATO, vai ser proposta, juntamente com a União Europeia, uma recomendação de combate

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ao terrorismo. Se acha que esta guerra, este belicismo anti-terrorista, não é o mais conveniente, não estamos de acordo, pelo que, realmente, não posso acompanhá-la.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Nós somos contra o terrorismo e contra a guerra! Esta é a nossa diferença!

A Oradora: - São estes os propósitos desta organização internacional, de que Portugal tem o orgulho de ser um membro fundador.
Sr.ª Deputada Alda Sousa…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - E quanto às questões sobre as alterações climáticas?

A Oradora: - Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, não disponho de mais tempo para responder-lhe, mas terei muito gosto em vir aqui fazê-lo noutra ocasião.
A Sr.ª Deputada Alda Sousa está preocupada com a corrupção na República de Angola. A Sr.ª Deputada, por acaso, está a propor que suspendamos o relacionamento com Angola? É isso que está a propor? A Sr.ª Deputada propõe que cortemos relações diplomáticas com Angola?
A corrupção é algo que combatemos onde quer que tenha lugar. Mas, como a Sr.ª Deputada pode imaginar, não vamos suspender relações com Angola, pois trata-se de um interesse nacional manter relações com este país, com quem estamos unidos por tantas razões históricas e com quem queremos cooperar para o estabelecimento de uma plena democracia nesse país.
Também me compete recordar-lhe, Sr.ª Deputada, que já não temos colónias. Felizmente, Angola já não é uma colónia portuguesa. É um país independente, que tem as suas instituições. Portanto, relativamente àquilo que diz respeito à forma como, no caso Falcone, a justiça angolana se relaciona com os seus cidadãos, esse é um problema do Estado angolano. Não são, com certeza, os tribunais portugueses que vão intervir nessa questão. Angola não é uma colónia, Sr.ª Deputada!!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Eduarda Azevedo.

A Sr.ª Maria Eduarda Azevedo (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, Sr.as e Srs. Deputados: Porque foi anunciado um debate sobre política externa, vamos abordar o tema em "banda larga".
Assim, quero começar por realçar que, exactamente de hoje a um mês, a União Europeia concretiza um alargamento sem precedentes.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - De facto, no próximo dia 1 de Maio, a União Europeia realiza o maior alargamento da sua história, com a adesão de 10 países da Europa Central e Oriental.
Após o fim da "cortina de ferro" e o colapso do comunismo, vai concretizar-se, finalmente, a aspiração de mais de 130 milhões de cidadãos. A justa aspiração de aderirem a um espaço de liberdade, convivência democrática e de respeito pelos direitos humanos, de participarem numa sociedade aberta, em que a livre circulação de pessoas reveste um carácter fundamental para a construção de uma união mais estreita entre os Estados e entre os povos, de usufruírem das oportunidades de uma economia social de mercado.
Com estas adesões, teremos finalmente a oportunidade histórica de reconciliar a Europa em torno de um verdadeiro projecto comum.
Assim, como é possível não ter havido uma palavra, um sentimento, da parte do Bloco de Esquerda em relação a este relevantíssimo facto histórico?

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Só a distracção ou, pior, a indiferença podem justificar este pesado silêncio.
Mas este ambicioso e ansiado alargamento, que mereceu um apoio contínuo e incondicional do PSD, quer no governo quer na oposição, constitui a melhor resposta para os que, militando contra a construção

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europeia, quotidianamente desafiam aqueles que, genuinamente, acreditam no ideal europeu.
É uma resposta verdadeiramente esmagadora para os que, animados por ideologias passadistas e retrógradas, não comungam dos objectivos do projecto europeu e não partilham do impulso para o novo patamar e o novo figurino da construção da Europa.
Trata-se de uma resposta que vem no tempo oportuno para quem, de forma cínica e despudorada, está sempre disposto a invocar o espírito europeu qual arma de arremesso contra os que, empenhadamente e com convicção, o prosseguem no interesse dos cidadãos.
Falo dos que têm medo do alargamento e recusam os seus desafios e as suas apostas.
Falo dos que, de forma primária e periférica, se manifestam contra um aprofundamento da integração europeia, através da afirmação da Política Externa e de Segurança Comum e de uma Política de Segurança e Defesa Comum.
Falo dos que parecem apostados em retardar o fortalecimento da Europa nestas áreas, querendo privar a União de se assumir como actor relevante no xadrez económico e político internacional.
Em suma, falo dos que rejeitam qualquer abordagem consequente da integração europeia, em todas as suas valências.
Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Quando, em Fevereiro de 2002, se iniciou a Convenção sobre o Futuro da Europa, essas mesmas vozes não perderam tempo e fizeram ouvir um clamor contra a falta de legitimidade democrática daquele fórum.
E mantiveram insistentemente essa postura de desconfiança e descrédito, na expectativa de que a Convenção não conseguisse concretizar o mandato ou os resultados ficassem aquém da audácia proclamada.
Face a esse proselitismo, tanto a afirmação de Romano Prodi, de que a Convenção tinha entre mãos o destino da Europa, como o alerta de Giscard d'Estaing para esse exercício, sui generis, que há 45 anos não tinha paralelo na construção europeia, só podem mesmo ter sido incómodos e desconfortáveis.
Hoje, não é tarde para reconhecerem nessa recusa o facto de, definitivamente, não haverem feito as pazes com a História.
É que, com a reforçada legitimidade democrática que resultou da sua composição, a Convenção Europeia preenchia todas as condições para que, com inovação e audácia, mas também com moderação e prudência, propusesse soluções para os problemas mais candentes que se colocam à grande Europa do século XXI.
E, na realidade, foi vê-la fazer propostas para permitir à União centrar a acção futura em novos paradigmas: melhor qualidade democrática e mais eficácia institucional; mais ambição política com compromisso, confiança e solidariedade dos parceiros europeus.
E foi neste contexto que, uma vez feita a entrega do projecto de Tratado Constitucional ao Conselho Europeu de Salónica, teve início, em Outubro de 2003, o segundo movimento deste compasso binário. E, então, foi a vez de a Conferência Intergovernamental entrar em cena.
Os trabalhos desenrolaram-se a um ritmo auspicioso e numa cadência harmoniosa.
Em Dezembro passado, sem dramas nem sobressaltos, ocorreu uma paragem momentânea das negociações.
Hoje, após uma aturada reflexão sobre as propostas do projecto de Tratado Constitucional, o primeiro Conselho Europeu da presidência irlandesa anunciou o regresso das negociações.
Neste cenário, o Partido Social-Democrata, consciente das importância e valia do Tratado Constitucional para o devir europeu, congratula-se vivamente com esse reinício, num clima de solidariedade e de partilha do ideal europeu pelos Estados-membros.
Em face do clima e das decisões do Conselho Europeu de 25 a 26 do passado mês de Março, podemos certificar que os chefes de Estado e de Governo deram provas de inequívoca clarividência e determinação.
Por isso, o Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata deseja que este esforço final para a aprovação do Tratado Constitucional, num espaço de tempo tão breve quanto possível, seja coroado do maior êxito e ao Governo português deseja o maior sucesso na afirmação e na defesa dos interesses nacionais e na preservação do modelo europeu que queremos para o futuro.
Também neste capítulo, de efectiva e inegável relevância, não posso deixar de assinalar a ausência de palavras de apoio e incentivo.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Face a um novo ciclo e perante este movimento de revivificação do projecto europeu, não posso - e não quero - deixar de exprimir o meu apelo à criação de um renovado consenso político, para que Portugal possa marcar uma posição activa neste singular momento da História.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Atravessamos uma fase de decisiva importância para o futuro da Europa e para a construção de uma nova ordem jurídica internacional.
A NATO alargou-se a mais um conjunto de países a Leste. A União Europeia aprovará, esperemos em breve, a Constituição para a Europa e passos importantes foram dados na definição da estratégia europeia de política externa e de segurança, elemento básico da sua afirmação como actor importante na cena internacional. Seremos 25 Estados, dentro de 30 dias.
Mas os dias de hoje são cada vez mais marcados pela insegurança e pelo risco. Há uma clara crise de confiança que se estendeu a sectores da acção política, até há pouco tempo quase imunes à crítica, senão mesmo à atenção da generalidade dos cidadãos.
É hoje já tempo de, em Portugal, fazermos o balanço da actuação do Governo de Durão Barroso face à crise do Iraque, que deixou feridas que levarão tempo a cicatrizar.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não pode passar incólume a desastrada actuação do Governo na crise iraquiana. Desde logo, no estilo de governar. A arrogância e a prepotência andaram de mãos dadas com o desacerto das decisões e a falsidade dos seus fundamentos.

Aplausos do PS.

Não é hoje mais possível governar assim. A verdade, mais tarde ou mais cedo, e cada vez mais cedo do que tarde, vem ao de cima.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Não é possível arrogar-se a detenção única da verdade, desprezar as versões divergentes, pôr de lado o diálogo, adoptar como regra o maniqueísmo do "se não estás comigo, só podes estar contra mim", deturpar a verdade. Exemplos recentes e bem próximos de nós comprovam-no.
Com a ânsia de aparecer na fotografia ao lado dos fautores da guerra, na esperança de ganhos virtuais ou na base de promessas que desconhecemos, o Governo português não deu uma contribuição lúcida, nem positiva, para o reforço da unidade europeia, nem para uma visão construtiva e solidária das relações transatlânticas.
Estas não poderão construir-se na base da competição para obter os favores de Washington. Deverão, pelo contrário, ter por base um diálogo franco e aberto, com a defesa dos valores da Carta das Nações Unidas, como fundamento, com a visão das complementaridades de recursos e vocações entre a Europa e os Estados Unidos da América.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A defesa do multilateralismo e da regulação internacional, com reforço da acção das Nações Unidas, e as reformas necessárias para dotá-la de meios capazes de fazer face aos novos desafios são hoje objectivos estratégicos fundamentais. Podem parecer utopias - e, como tal, apelidadas por alguns "próceres" da actual Administração americana -, mas esta é uma utopia pela qual vale a pena lutar, para que se torne rapidamente realidade.

Aplausos do PS.

As novas ameaças que pairam sobre nós não se resolvem com meios puramente militares. São necessárias mais e melhor informação, mais capacidade e coordenação policial e judicial, sem que isso possa afectar a matriz dos direitos, liberdades e garantias da democracia europeia.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - Já se cometeram vários erros, sobretudo por omissões, e é urgente que novos impulsos

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venham criar condições para lutar mais eficazmente contra o terrorismo e a criminalidade organizada e controlar as turbulências que vão irrompendo em várias partes do mundo, incluindo a própria Europa e os países da sua vizinhança próxima.
É tempo de deixar de lado a pura competição pela liderança, para passar a construir uma estratégia comum. A hegemonia militar não pode ser a base de um unilateralismo arrogante. A parceria equilibrada e efectiva com os Estados Unidos da América é um factor de segurança e de paz insubstituível, mas deve assentar em condições de paridade, diálogo e equilíbrio, com assumpção pela Europa das suas responsabilidades em matéria de defesa e segurança.
O Sr. Primeiro-Ministro fez, há semanas, uma admissão ou uma confissão de erros cometidos. Não indicou quais, nem em que sector da governação. É pena que não o tenha explicitado. Mas não temos dúvidas de que Portugal só perdeu com as suas tentativas frustres de aparecer na fotografia da guerra. E as atitudes divisionistas da então chamada "Nova Europa" só causaram feridas na União, que estão longe de estar saradas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A guerra do Iraque não trouxe mais segurança. Não se confirmaram as razões invocadas para a guerra, nem a posse de armas de destruição maciça, nem as ligações à Al-Qaeda do regime iraquiano. A luta contra o terrorismo poderá ter sofrido danos por omissão. O conflito israelo-palestiniano agravou-se enormemente face às novas prioridades da política externa americana e às posições cada vez mais intransigentes das partes em conflito, designadamente de Israel.
Não se vê fácil o futuro do povo iraquiano, nem se antevê caminho fácil para a reconstrução do país. Pela frente, há um imenso esforço a fazer, para não falar do trabalho de reconstrução da confiança abalada na comunidade internacional, que pode durar anos. Mais uma razão para trabalharmos, desde já e muito a sério, sob a égide das Nações Unidas e com a activa participação da comunidade internacional.

Aplausos do PS.

Fomos claramente contra a guerra ilegítima, desnecessária, precipitada. Todos os receios que, então, manifestámos vieram a revelar-se como inteiramente justificados.
Não apoiámos o envio de forças policiais para o Iraque, como sempre nos opusemos ao envio de forças militares.
Mas solidarizámo-nos, como continuamos a solidarizar-nos, com as forças da GNR que o Governo decidiu enviar, na altura em condições de segurança altamente questionáveis e sem capacidades visíveis, ainda hoje, de intervenção no terreno.

Aplausos do PS.

Esperamos que essa força possa voltar o mais rapidamente possível. Desconhecemos, como repetidamente dissemos, os exactos compromissos assumidos pelo Governo, designadamente quanto à duração de tal missão, e somos completamente alheios a esses compromissos. Entendemos como muito positivo que possa vir a criar-se nova situação, com intervenção e sob a égide das Nações Unidas, que permita perspectivar de forma diversa a participação de Portugal no esforço de pacificação e reconstrução do Iraque, incluindo, então, e só nesse caso e se necessário, com meios policiais e militares.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - A não ser assim, a nossa posição continuará a ser a mesma: não acompanharemos decisões de manutenção de forças no território iraquiano, independentemente da solidariedade com todos os que aí desempenham tão difíceis missões.

Aplausos do PS.

Esperamos que o Governo compreenda finalmente a situação internacional na sua complexidade e actue de acordo com os nossos princípios constitucionais e com os ditames do Direito internacional. Mas é urgente que o faça e que comece, desde já, a dar sinais nesse sentido.
Por nós, continuamos onde sempre estivemos - antes da guerra, depois da intervenção, antes de Madrid, depois de Madrid, antes do terrorismo, depois do terrorismo: fiéis ao compromisso com o Direito internacional e com a Carta das Nações Unidas.

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Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: A intervenção da Sr.ª Deputada Eduarda Azevedo, cingindo-se à temática europeia, foi uma oportunidade para nos elucidar sobre se o PSD já tinha alguma evolução substantiva naquilo que venha a ser o futuro Tratado Constitucional, se vamos ou não ter referendo, se o PSD já entende que há alterações significativas no Tratado que aconselhem à realização de um referendo. Porém, a Sr.ª Deputada Eduarda Azevedo, sobre isso, trouxe-nos rigorosamente nada e fez uma crítica ao Bloco de Esquerda de ignorar a temática europeia.
Face à sua distracção, quero recordar-lhe que o único debate que aqui houve, real e substantivo, sobre o referendo europeu e o Tratado Constitucional, foi exactamente proposto pelo Bloco de Esquerda.
Só que, hoje, a temática internacional vai muito para além da Europa. Aliás, como disse o Sr. Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio, a questão do Iraque marca a centralidade da política internacional. Portanto, o Bloco de Esquerda está bem acompanhado por quem analisa a política internacional e disso nos desculpará, com certeza, a Sr.ª Deputada Eduarda Azevedo!...
Disse a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, cometendo um erro grosseiro, que o que detonou esta interpelação solicitada pelo Bloco de Esquerda teriam sido os acontecimentos de Madrid. Pois não foram, Sr.ª Ministra!
O que realmente detonou esta interpelação foi o facto de, crescentemente na opinião pública, os governos do "eixo da mentira" terem menor legitimidade política, por ter sido ferida uma questão essencial de confiança entre eleitores e eleitos: a transparência e a verdade!!
É a crescente falta de legitimidade dos governos que estiveram na fotografia das Lajes que aumenta, junto da opinião pública, o pendor para não acreditar nesses governos. E foi isso que suscitou esta interpelação. E é isso que vos custa, pois têm uma enorme dificuldade em abordar o problema da transparência, da verdade e da legitimidade política.
É porque há aqui um problema de legitimidade política. Ele pode ser contornado de muitas formas, podem ser arvorados muitos princípios, depois pouco consentâneos com as realidades no terreno, mas não iludem a questão capital e central, que é a da transparência e da verdade, e do que são os governos do "eixo da mentira".
Aliás, o que está a trazer este debate, cada vez mais, para o seio da opinião pública é o facto de o Primeiro-Ministro, envergonhadamente, já não assumir os pretextos e as causas que assumiu há um ano. O Sr. Primeiro-Ministro diz-nos agora que não invocou como questão central as armas de destruição em massa, as ligações ao terrorismo, que apenas seguiu os seus aliados. Essa é já uma posição envergonhada de quem quer fugir a essa falta de legitimidade na opinião pública, de quem quer transferir para uma situação mais aceitável o que foi um desvio clamoroso em relação ao Direito internacional e a uma política para a paz.
O Sr. Primeiro-Ministro diz-nos que apenas quis seguir os aliados e até, com um ar bastante cândido, afirma que não fomos nós que declarámos guerra ao Iraque, esquecendo o que pode significar a Cimeira das Lajes, a "cimeira da guerra" e tudo o mais. Mas não é verdade que Portugal inscreveu o seu nome na coligação, que foi tornada pública, de ocupação do Iraque? A Casa Branca inscreveu o nome da República Portuguesa na coligação que sancionou a intervenção militar no Iraque e respectiva ocupação. Não declarámos guerra, mas nem os Estados Unidos o fizeram, porque hoje não se declaram guerras! Mas Portugal não pertenceu ao "carro" da guerra? Será este um facto virtual? Não é um facto virtual!!
Por outro lado, o debate é de um absurdo total. Quer a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros fazer-nos escolher entre a ditadura hedionda e bárbara de Saddam Hussein, que sempre combatemos, e esta espécie de "coisa" que neste momento está instalada no Iraque.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - As Nações Unidas!

O Orador: - Como a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros reconheceu, não passará durante muitos anos, a não ser alterada a situação, de um protectorado norte-americano. Foi buscar o exemplo similar do Kosovo, mas esta é uma transição controlada!!
Quer obrigar-nos a escolher entre uma ditadura hedionda e um protectorado norte-americano? Então a solução para todas as ditaduras é estender protectorados norte-americanos?

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O Sr. Francisco Louçã (BE): - Exactamente!

O Orador: - É essa a política oficial do Governo português? A Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros terá as exactas dimensão e responsabilidade dessa afirmação? Creio que é de uma gravidade tremenda que coloque a questão nesses termos!!
Hoje, a liberdade de expressão é ilimitada no Iraque?... Então, foi proibida uma estação de televisão, que era credível e não propagandista do regime deposto; também foi proibido um jornal e…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Com o Saddam é que era bom…!

O Orador: - … há 10 000 presos em relação aos quais nem sequer se respeitam as condições da Convenção de Genebra!... O Iraque de hoje é, de facto, um campo de recrutamento e de treino de todas as células da Al-Qaeda.
É este tipo de comparações que temos de fazer ou há, realmente, uma terceira alternativa? Refiro-me à da auto-determinação do povo iraquiano, das suas várias etnias e correntes religiosas e laicas, na base de uma solução internacionalmente reconhecida, num acordo internacional e nas Nações Unidas?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Isso só depois de cair a ditadura!

O Orador: - Por que é que a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros evita falar de uma solução internacionalmente reconhecida? Diz que o Governo português propõe uma nova resolução das Nações Unidas e eu pergunto: com que conteúdo? Com que base? Deplorando esta administração transitória? Propondo um outro tipo de solução internacionalmente reconhecida? Não. De facto, o que se verifica é um seguidismo em relação à política norte-americana, mas, para meros efeitos de show off político, fala de uma resolução das Nações Unidas.
Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, o Sr. Primeiro-Ministro disse aqui - citando, aliás, um estadista conhecido - que o problema dos aliados é que têm opinião. Mas, na verdade, nós, Portugal, como aliados, não tivemos opinião, tivemos as Lajes. Isso foi uma expressão de subordinação e de dependência. Recordo-lhe que a Turquia ou a Itália, que são, seguramente, aliados dos Estados Unidos da América, não deram as facilidades que Portugal deu.
Face à mudança política em Espanha, o Sr. Primeiro-Ministro afirmou aqui que em Portugal - é uma espécie de acto reflexo - mandam os portugueses. Mas, realmente, não se lembrou desse princípio quando, em estrita dependência, aqui alardeava o facto de ser co-signatário da Carta dos Oito e de termos, finalmente, uma política internacional pró-activa, quando o que temos hoje é um Governo acabrunhado, um Primeiro-Ministro desgastado, a tentar dar o dito por não dito e o feito por não feito de quase tudo o que disse e de quase tudo o que fez.
Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, a que nos conduziu este seguidismo? Conduziu-nos à adopção e a corroborar as teses da guerra preventiva, ao desprestígio da nossa política externa. Portugal granjeou prestígio na cena internacional pela forma como conduziu a situação de Timor, pela forma como se comportou em relação ao referendo e à transição em Timor, pela forma como combateu a venda de armas à Indonésia, com os princípios que alardeou e defendeu na ordem internacional, todo um conjunto de princípios que hoje não são seguidos pela política externa portuguesa, que vende armas a ditaduras, que não tem um princípio de solução internacionalmente reconhecida, por exemplo, para o Iraque, como a que quisemos e pela qual lutámos em Timor.
Desprestigiámos internacionalmente o capital político da política externa portuguesa devido a esta tentativa de ficar na "fotografia da cimeira da guerra" e de todos os outros apoios e facilidades que foram concedidos.
Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, no último debate mensal, o Sr. Primeiro-Ministro "roçou" - e digo-o não exactamente como arremesso político-partidário - perigosamente a tese do "choque das civilizações". Espero que na nossa política externa não haja a tentação e a deriva para essa tese das cruzadas, porque o combate ao fundamentalismo e ao fascismo integrista é político, independentemente da base com que ele se apresenta.
Os fundamentalistas fascistas integristas islâmicos não são apenas uma seita de irracionais e de loucos; têm objectivos políticos, objectivos de estender regimes como o da Arábia Saudita a todo o mundo muçulmano e árabe. Esses são os seus objectivos políticos e eles têm de ser combatidos.
As al-quaedas são as "camisas castanhas" do tempo moderno e daquela área do mundo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Isso é verdade.

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O Orador: - Se enfrentarmos este perigo através da tese do choque das civilizações para agradar a fundamentalistas dos dois lados, estaremos a desprezar a aliança com os sectores laicos, com os sectores democráticos desses países para uma nova ordem internacional.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O tempo de que dispunha esgotou-se. Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.
A nossa defesa não é a do Ocidente, a nossa defesa é a da democracia, dos direitos humanos, da paz e do Direito internacional. E neste domínio, Sr.ª Ministra, o Governo falhou!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda apresenta hoje uma interpelação ao Governo sobre política externa. Ainda que o faça com base em pressupostos errados e posições políticas isoladas, deve dizer-se que esta interpelação chega em boa hora, pois permite que cada partido venha clarificar as suas opções quanto a esta matéria e leva ao confronto com aqueles que pretendem agora romper e denunciar um consenso de décadas quanto à nossa política externa.
De facto, em termos de política externa, o Bloco de Esquerda ou diz "não" ou é ambíguo.
Pela parte do CDS, as prioridades são fundamentalmente três: pretendemos apoiar e reforçar o papel activo de Portugal na construção europeia, acentuar a relação privilegiada com o espaço lusófono e aprofundar a relação atlântica.
Sabemos bem o legado que a nossa História, geografia e identidade traz. É com base nesses elementos que devemos perspectivar o futuro.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Comecemos pela posição de Portugal na União Europeia.
Já tive oportunidade de afirmar, neste Plenário, que a nossa integração na União Europeia tem de continuar a ser uma opção firme. A escolha europeia que Portugal em boa hora tomou não pode ser posta em causa e demonstra, aliás, o nosso pioneirismo em relação a soluções que se devem repetir noutros espaços territoriais.
Quanto às nossas prioridades dentro desta opção estratégica, considera o CDS que se deve falar claro, sublinhando três pontos essenciais.
Em primeiro lugar, sabemos bem que a soberania não se perde quando é partilhada, mas isso não nos leva a que deixemos de salientar que Portugal deve defender um modelo institucional em que seja salvaguardado o princípio da igualdade entre os Estados-membros.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Considera o CDS que a construção de um directório é contrária aos ideais que estiveram na génese da União Europeia, pois, como dizia Jean Monet, a Europa não pode ser vista como uma coligação de Estados mas como verdadeira união de povos.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Esta só se consegue com uma verdadeira solidariedade entre Estados e nunca por tentativas - de alguns - de tomada de um património que pertence a todos.
Em segundo lugar, não poderemos esquecer o nosso empenho na resposta positiva aos desafios que a adesão de 10 novos Estados representa. O alargamento é essencial, pois vai criar um factor de estabilidade, mas também é importante relembrar que a partilha dos objectivos da coesão por mais Estados vai trazer novas responsabilidades a que temos de responder de forma positiva. Portugal deve aproveitar as novas oportunidades e, nesse sentido, os objectivos da Agenda de Lisboa têm de ser, nesta fase, uma prioridade inequívoca.
Em terceiro lugar, a construção de uma política de defesa europeia deve ser um dos alicerces das

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nossas opções políticas, seguindo, aliás, as determinações do nosso Conceito Estratégico de Defesa Nacional.
Em jeito de resumo, afirmo que como projecto nacional, como opção histórica, a opção europeia marcou o nosso passado, marca o presente e marcará claramente o nosso futuro.

O Sr. José Vera Jardim (PS): - O nosso passado? Essa agora!

O Orador: - Esta é, que fique bem claro, a posição do CDS. Esperamos que a próxima campanha eleitoral não faça outros partidos esquecerem-na.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A semana deste debate demonstrou mais uma vez que Portugal inscreve as relações com África no topo da sua agenda internacional. As visitas simultâneas do Sr. Presidente da República e do Sr. Primeiro-Ministro a Cabo Verde e a Moçambique são uma clara prova desta prioridade.
O CDS defende que Portugal deve aprofundar relações baseadas em conhecimento profundo e confiança. Não podemos desperdiçar uma linguagem comum, uma maneira de estar e sentir partilhada e corporizada numa língua única. A nossa fronteira de identidade é bem clara e envolve os países de língua oficial portuguesa.
Quanto à participação activa no espaço transatlântico não se pode esquecer que, numa altura em que são incluídos novos membros na NATO e em que há claras tentativas de divisão, Portugal, como membro da Aliança Atlântica desde 1949, tem especiais responsabilidades.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O centro da actuação terá de se encontrar na diplomacia preventiva, na concertação de posições e no entendimento de que a segurança não se encontra apenas numa perspectiva militar.
Em caso de conflito devemos estar com os nossos aliados. Não mudamos, não cedemos perante aqueles que defendem o império da violência - se outros o fazem, que assumam as consequências!

Aplausos do CDS-PP.

Estas são as nossas linhas-mestras, e perante estes desafios dizemos "sim". O Bloco de Esquerda a tudo vai dizendo "não", ou diz rigorosamente nada, julgando que esta postura do contra lhe pode trazer benefícios eleitorais.
A extrema da extrema-esquerda parlamentar é contra porque os outros são a favor, pretendem quebrar consensos de anos! O CDS denunciará sempre esta postura.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Esperamos que outros não mudem de posição a bem da necessária existência de um arco de governabilidade em Portugal. Pela nossa parte estaremos sempre contra a política do "não".

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Em matérias europeias, o Bloco de Esquerda apresentou um projecto de perguntas para um referendo e anunciou, no dia 22 de Outubro de 2003, neste Plenário, pela voz do Sr. Deputado Francisco Louçã, que a sua resposta às três perguntas seria: "não, não e não".

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Está a ver como se lembra!

O Orador: - Em relação ao aprofundamento da opção europeia, a nossa resposta é "sim". O CDS sabe porque está a favor, querendo sempre melhorar.
E não venham com as alterações de posição. Sabemos bem da nossa evolução, mas o caminho da inclusão é bem melhor do que a obstinação da exclusão.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às relações com os nossos aliados, o CDS-PP combaterá sempre posições dúbias. Apoiámos a intervenção internacional na primeira Guerra do Golfo, na Bósnia, no Kosovo (e relembro ao Partido Socialista que esta operação não foi mandatada pelas Nações Unidas), no

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Afeganistão e no Iraque.
Não desejámos a guerra nem divisões na comunidade internacional. Mas quando a guerra se tornou inevitável, mantivemos Portugal onde ele sempre esteve.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Já o Bloco de Esquerda, bem como o Partido Comunista Português, parecem querer estar contra todas estas intervenções. Aliás, pela voz do Sr. Deputado Luís Fazenda, o Bloco de Esquerda assumiu neste Plenário que mesmo com uma resolução das Nações Unidas estaria contra a intervenção do Iraque. É importante citar. No dia 31 de Janeiro de 2003, disse o Sr. Deputado Luís Fazenda: "O Bloco de Esquerda está contra uma guerra no Iraque, seja unilateralmente conduzida seja através de uma coligação de países e tenha até a cobertura do Conselho de Segurança das Nações Unidas." Para quem diz que não é ambíguo na luta em relação à democracia estamos verdadeiramente conversados, Sr. Deputado Luís Fazenda…!

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Mais uma vez, assumem a postura de "contra", mesmo que contra os nossos aliados históricos. O CDS-PP, pelo contrário, nunca apoiará posições que objectivamente favoreçam os inimigos da segurança, da liberdade, da democracia e da paz. Se outros o fazem, que assumam as suas responsabilidades.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à aposta na lusofonia, nem uma palavra se ouve por parte do Bloco de Esquerda. Mas não se espantem que daqui a uns dias a Sr.ª Deputada Alda Sousa (única Deputada do Bloco de Esquerda que ainda não teve tempo de ser frontalmente contra alguma coisa)…

O Sr. José Magalhães (PS): - Que observação deselegante!

O Orador: - … venha dizer que é contra o estreitamento das relações com os povos que falam português.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Nessa ocasião estará completo o "tripé do não".
É contra esta postura que o CDS-PP está. Portugal deve contribuir para o bom senso das relações internacionais, ao lado dos nossos aliados, com opções claras e na defesa do desenvolvimento económico, da liberdade e da paz.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado Diogo Feio utilizou na sua intervenção tempo cedido pelo PSD.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Esta interpelação ao Governo realiza-se no "dia das mentiras". E é precisamente disso que vamos falar: de uma mentira.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Por isso é que o PCP vai falar!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - O dia das mentiras não é hoje; é quando o PCP quiser!

O Orador: - É uma enorme mentira, mas que, desde há mais de um ano, determina o essencial da política externa portuguesa.
O Primeiro-Ministro Durão Barroso fugiu sempre a responder a uma questão elementar: quais foram afinal as provas concludentes quanto à existência de armas de destruição em massa no Iraque que o levaram a apoiar a guerra contra esse país e a participar na sua ocupação militar.

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O Primeiro-Ministro disse ter visto essas provas e, quer se tenha tratado de uma visão ou de uma ilusão de óptica, a verdade é que a existência de armas de destruição em massa foi a razão sempre invocada como determinante para a guerra do Iraque.
As declarações proferidas pelo Sr. Primeiro-Ministro nesta Assembleia, antes de ser publicamente reconhecida a inexistência dessas armas, não deixa margem para dúvidas.
Em 19 de Novembro de 2002, afirmou aqui o Sr. Primeiro-Ministro que "o Iraque deve demonstrar por actos, e não por uma mera repetição de palavras, que desistiu dos seus propósitos de desenvolver armas de destruição maciça".
Em 1 de Fevereiro de 2003, o Sr. Primeiro-Ministro veio de novo a esta Assembleia proclamar que "Portugal deve ter uma posição intransigente contra um regime como o Iraque, que promove armas de destruição maciça".

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - Em 27 de Março de 2003, no debate das moções de censura, o Sr. Primeiro-Ministro reiterou que "a posição de Portugal, em nome dos princípios da segurança internacional e da democracia, não podia ser outra que não fosse a de ajudar os seus aliados, na medida das suas possibilidades, na neutralização de uma ditadura que ameaça o mundo ocidental com armas de destruição maciça".
Em Junho de 2003, passeando de braço dado com Donald Rumsfeld, o Ministro de Estado e da Defesa Nacional Paulo Portas reafirmou a sua convicção de que as armas de destruição em massa acabariam por ser encontradas e que só não o tinham sido até então pela simples razão do Iraque ser um país do tamanho da França.
Por muito que os defensores da guerra do Iraque digam agora que o objectivo da guerra era acabar com uma ditadura ou combater o terrorismo, não conseguem apagar da História o que diziam antes. A verdade é que esses argumentos só foram invocados como determinantes a partir do momento em que foi publicamente reconhecido que as armas de destruição maciça afinal não existiam.
Toda a justificação da guerra do Iraque foi baseada na suposta existência de armas de destruição em massa.
Em Setembro de 2002, o Presidente Bush foi às Nações Unidas garantir que o Iraque se encontrava a produzir armas biológicas.
Entre Dezembro de 2002 e Março de 2003, os inspectores da Nações Unidas realizaram mais de 900 acções inspectivas e visitaram mais de 500 locais sem nada encontrarem. Mas, entretanto, Donald Rumsfeld afirmava ter conhecimento de que Saddam deslocava as armas de destruição em massa, em cada 12 a 24 horas, escondendo-as em bairros residenciais.
Em Janeiro de 2003, no discurso sobre o Estado da União, George Bush afirmou que o regime iraquiano havia adquirido grandes quantidades de urânio num país africano e, só em Julho, ou seja, já depois da guerra, é que o Director da CIA, George Tenet, veio assumir que essa informação era falsa.
Em Fevereiro de 2003, numa longa exposição perante o Conselho de Segurança das Nações Unidas, Colin Powell apresentou provas ditas irrefutáveis de que o Iraque possuía armas químicas e biológicas e estava determinado a fabricar ainda mais. Ora, com base nessa mentira, o Governo português apoiou a guerra e participa na ocupação do Iraque com um contingente da GNR.
O Sr. Primeiro-Ministro nunca explicou aos portugueses se na questão das armas de destruição em massa mentiu com dolo ou mentiu com negligência. Se mentiu porque se deixou enganar ou se mentiu porque essa era a única forma de tentar justificar aquilo que para a grande maioria dos portugueses era, e continua a ser, injustificável.
Pior: num momento em que o futuro governo espanhol, interpretando a vontade maioritária dos cidadãos que representa, anuncia a retirada das suas tropas do Iraque e em que o Presidente da República e o Governo da Polónia indiciam uma posição semelhante, reconhecendo que a sua participação na guerra do Iraque se baseou na convicção da existência das armas de destruição em massa, ninguém compreende que o Governo português se possa manter aparentemente imperturbável.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Se o argumento da fidelidade cega aos aliados, por diversas vezes invocado pelo Sr. Primeiro-Ministro, nunca foi um argumento aceitável, a verdade é que, nos dias de hoje, esse argumento cai inteiramente pela base. O Governo espanhol vai retirar as suas tropas do Iraque e não deixará por isso de ser um país amigo de Portugal e de ser um país membro da NATO e da União Europeia.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Todos sabemos hoje que não havia no Iraque as tais armas de destruição em massa.

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O Sr. Rodeia Machado (PC): - Eles só querem o petróleo!

O Orador: - Sabemos mais: sabemos que a guerra do Iraque não só não combateu com eficácia o terrorismo como prejudicou de forma dramática a luta contra o terrorismo. Quem o afirma, hoje mesmo, é o Prof. André Gonçalves Pereira num artigo publicado no jornal Público.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Sabemos que nada melhorou nem no Iraque nem no Médio Oriente, onde a situação é mais instável que nunca e onde os direitos do povo palestiniano continuam a ser diária e brutalmente espezinhados.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, perante tudo isto, o Governo português só teria uma saída decente: em primeiro lugar, reconhecer o erro; em segundo lugar, pedir desculpa aos portugueses; em terceiro lugar, anunciar a retirada do contingente da GNR que participa presentemente na ocupação do Iraque.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Ao não fazê-lo, o Governo só demonstra que até agora nada aprendeu, nada, e que só aprenderá no dia em que os portugueses lhe ensinarem a lição que o povo espanhol obrigou, recentemente, os seus governantes a aprender.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ramalho.

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não trago números no bolso. Menos mistificadores da realidade. Bem basta o retorno à sobrevivência que vivemos, na miragem de uma retoma que nunca virá. Venho reflectir sobre o que é mensurável, mas por onde passa tudo.
Não venho também falar sobre alianças que para o Governo parecem ser condicionadoras em absoluto da política externa. Quanto a alianças, e por ler a História, bastou-me o ultimato de 1890 por parte da nossa mais velha aliada.
Venho falar, repito, sobre aquilo que não é mensurável, mas por onde passa tudo: a nossa alma, forjada na dimensão de encontros seculares com povos e países e que nos ajeitou esta forma humanista e tolerante de estarmos, concedendo-nos uma cidadania mundial, apoiada numa fala comum partilhada por mais de 200 milhões de seres humanos que estão dispersos por múltiplos continentes. Hoje, nada se fala consequentemente dela. O que vemos são operações contabilísticas, a propósito de um défice. Só que este é um défice de alma, transformada agora em conversa da tanga, que não coloca os olhos no horizonte para ficarmos mais além, com um pouco mais de céu. Se isso fosse compreendido, outro galo cantaria.

Aplausos do PS.

A nossa grandeza, aquilo que nos projectou para o que somos, adormece, hoje, no baú deste nosso descontentamento, carregando-nos de enormes angústias. Não me conformo.
É por isso que também temos na política externa e nesta na cooperação aquilo que hoje temos. E o que temos é esta incapacidade de se ver que a internacionalização da nossa própria economia, quando se iniciou e cresceu, só se louvou nessa alma e jamais no défice. Com a Europa, bem entendido, mas espraiando-se, à luz do mundo de hoje, globalizado pela reconquista da memória dos caminhos que no passado cruzámos, adequando-nos hoje à realidade. É nesta concepção que deve assentar a nossa afirmação no mundo, incluindo a económica, porque esta é um instrumento de um processo e de um projecto e não um fim em si mesmo.
Diria que é ou deve ser um instrumento de um projecto que está para além dos números e não um fim de operações contabilísticas. Daí que, hoje, este nosso défice de alma se espalhe como uma mancha de óleo a todos os sectores, incluindo o próprio Orçamento. Não é por aí que lá iremos. E porque se espalha tem graves reflexos na política da cooperação. Não foi por acaso que Pessoa, ao reflectir premonitoriamente, afirmou que a nossa pátria é a língua portuguesa. Esta não é uma frase para ser incluída numa poesia. É um encaixe de um projecto sintetizado numa frase.

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Mas porque a visão deste Governo é pequenina, a acção do Instituto Camões, por exemplo, está praticamente reduzida ao pagamento dos salários dos seus funcionários. Como diria Camões, apesar da escassez de meios, não há sequer engenho e muito menos arte para mais. Menos determinação férrea que vem da alma. E porque não há a Universidade de São Petersburgo, por exemplo, que traduziu os melhores poetas contemporâneos da nossa língua para russo, não encontrou um mísero e insuficiente apoio do Instituto Camões para publicar a obra. É um exemplo, mas é um exemplo que vale por si. Como vale o processo de reestruturação da Agência Portuguesa para Ajuda ao Desenvolvimento e do Instituto Português para a Cooperação, agora fundido no Instituto Português para a Ajuda à Cooperação, que esteve - pasme-se - um ano e meio totalmente parado. Não espanta por isso que esta visão, em que a alma está completamente ausente, se tenha traduzido na redução em 52% do seu orçamento em dois anos.
Falar da cooperação, hoje, é falar de uma triste realidade. De tal forma triste que a projectada cimeira da União Europeia com África, que o Governo se obrigou a levar a efeito em Abril do ano passado, tendo incluindo no seu orçamento as despesas necessárias para o efeito, nunca se realizou. E dever-se-ia ter realizado porque era, contra ventos e marés, uma actividade absolutamente indispensável para a nossa afirmação no mundo e porque Moçambique iria ocupar, como ocupa, a presidência da União Africana e Angola era membro não permanente do Conselho de Segurança. Todos os astros estavam então conjugados. Faltava apenas aquilo que não existe: a alma de um Governo que está a desbaratar a alma do próprio País.

Aplausos do PS.

É por isso que aqui e agora não venho falar de números. Venho falar desta total incapacidade, forjada numa ausência dessa alma em levar por diante a nossa própria mais-valia e com ela a dos demais povos lusófonos, porque é essa que nos projecta no mundo. E porque assim é, as relações da sociedade civil, neste momento representadas pelas organizações não governamentais com o IPAC são o que são. Uma tristeza! As ONG, de costas voltadas para o IPAC, estão a efectuar denúncias sobre denúncias porque as suas filiadas não podem contar com o que sempre contaram, incluindo o mínimo de diálogo.
E se os instrumentos públicos vocacionados para a cooperação são hoje esta desgraça, não é outro o quadro da cooperação empresarial propriamente dita, que busca parcerias, perante a desarticulação de todos os instrumentos públicos do Governo. Atenção: não sou eu que o digo.
Recentemente, o Presidente da Agência para o Investimento falou por todos nós, embora tivesse omitido as tergiversações políticas dos objectivos que deveriam ser prosseguidos pelas empresas de capitais públicos, que são também decisivamente instrumentos de afirmação da nossa soberania lá fora. O que ontem, por exemplo, era válido para o petróleo, para o gás, para a electricidade, hoje deixou completamente de ser válido. Amanhã? Dizem-me que o amanhã a Deus pertence.
Como já se viu, invoco a verdade e nela sectores de actividade cujas empresas de grande dimensão prosseguem lá fora parcerias de cooperação. É com a venda a retalho dessas empresas, numa lógica de total endeusamento do mercado e sem norte nem estratégia, que lá vamos afirmar a política de cooperação?
O que ficará para a afirmação da nossa política externa na própria diplomacia económica, sabendo que são as empresas que a reflectem?
É, pois, insuficiente, Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros, ter visitado Moçambique recentemente. Eu sei que a senhora sabe que eu sei que é possível fazer-se muitíssimo mais. E nem sequer abordo outras questões relacionadas com outros países lusófonos, por razões de Estado, que também devo preservar.
Lamento pelo meu País esta insuficiência, esta ausência de golpe de asa, esta rotina de uma gestão absolutamente perigosa.
Eu também sei ouvir como os demais mortais porque ando na rua. O eco de todos os quadrantes sobre a ausência de uma política estratégica de cooperação é verdadeiramente ensurdecedor. Ao menos que se salvem os programas integrados de cooperação do anterior governo, a que V. Ex.ª, em boa hora, lançou tardiamente. De tudo fica apenas o exemplo desta Assembleia e as meritórias iniciativas que ela tem levado em prol da salvaguarda da cooperação desta mais-valia da nossa afirmação no mundo.

Aplausos do PS.

Mas porque, hoje, este domínio da cooperação é um desígnio nacional, faço votos para que o Executivo se lembre, ao menos, e aproveite o mês de Maio e o dia de África, que se passará em 25 de Maio, para, com toda a força, apoiar as iniciativas que, na ausência das iniciativas do Governo, os embaixadores africanos acreditados em Portugal desejam aqui concretizar. Que isso se traduza num grito de alma. Ao menos isso, Srs. Membros do Governo. É um recomeço tardio que partilharei com gosto.

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Como sabem, sou português, como todos os membros do Executivo. Quero o melhor para o meu país na afirmação desta mais-valia, que não existe.
Foi dela que falaram os nossos maiores poetas, que são os verdadeiros intérpretes do que nos vai na alma. Não nos iludamos. Eles valem mais que todos os tratados sobre números, que não nos explicam o que somos, nem os caminhos para onde vamos.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - E a propósito de um deles, direi: sinceramente, não vou por onde me querem levar!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, penso que é fundamental deixar claro neste debate quem é que de facto está a mentir. Porque a Sr.ª Ministra, ainda há pouco, quando referiu que eu sabia perfeitamente que a questão das armas de destruição em massa não tinha sido o argumento para a guerra do Iraque, disse no fundo que eu estava a mentir.
Pois eu reafirmo que este foi o argumento e faço-o sustentando-me numa acta do Diário da Assembleia da República, que passo a ler, citando algumas afirmações do Sr. Primeiro-Ministro: "E a verdade, nua e crua, é esta: a paz passa pelo desarmamento do Iraque. Esta é a vontade unânime da comunidade internacional: o desarmamento do Iraque". Mais à frente, dizia: "Desarmar o Iraque é um objectivo essencial (…)". Referia, ainda, o Sr. Primeiro-Ministro: "Ao longo dos meses, fui sempre claro e coerente: o objectivo era desarmar o Iraque, o meio privilegiado era o quadro das Nações Unidas (…)". Mais: "Mantenho, hoje, e aqui solenemente reafirmo, no momento da decisão, o que sempre afirmei: Portugal não vai declarar guerra ao Iraque; Portugal não vai enviar tropas para o Iraque (…)".
Afinal, Sr.ª Ministra, percebe agora quem é que mentiu? Sejam consequentes: retirem as tropas da GNR do Iraque. Admitam o vosso erro, admitam as vossas falsidades e sejam consequentes com a verdade!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos iniciar a fase de encerramento do debate.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Sousa.

A Sr.ª Alda Sousa (BE): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Chegámos ao fim deste debate e desde já quero dizer que o Governo perdeu uma excelente oportunidade de se afastar do eixo da mentira.
O exercício da humildade é uma componente fundamental da democracia e o mínimo que se poderia exigir era que a Sr.ª Ministra, que aqui representa o Governo, dissesse aos portugueses: "Enganámo-nos. Acreditámos em relatórios de espionagem que demonstraram estar completamente errados. Apoiámos uma intervenção militar que foi injusta, que nada tinha a ver com o combate ao terrorismo, que teve como consequências o massacre de mais de 10 000 inocentes iraquianos e o aumento do terrorismo em todo o mundo."
Mas não! O que a Sr.ª Ministra veio aqui fazer foi um exercício de ilusionismo. Veio dizer-nos que não, que nunca o apoio de Portugal à guerra foi motivado pelas armas de destruição maciça.
Já ficou mais do que provado durante este debate que isso não é verdade, que o Primeiro-Ministro disse que viu com os seus próprios olhos o relatório que supostamente provava a existência das armas de destruição maciça, o tal relatório grotesco dos "45 minutos", que continua aqui à disposição de quem o quiser consultar.
O Primeiro-Ministro repetiu, vezes sem conta, que essa é que era a questão. Mas é sempre assim: quando se entra na espiral da mentira, é difícil sair dela.
Nunca a Sr.ª Ministra ouviu nem ouvirá de nós qualquer palavra a favor do sanguinário ditador Saddam Hussein. Pelo contrário, o que ouviu e o que ouvirá, há muito tempo e antes de muitos, é a condenação. E volto a lembrar-lhe, Sr.ª Ministra, que foi um governo PSD que vendeu armas para este senhor, quando ele governava com punho de ferro o destino dos iraquianos e os mandava para a morte numa guerra insana com o Irão. Foi o governo de que na altura fazia parte o Dr. Durão Barroso.
Diz a Sr.ª Ministra que a ocupação do Iraque foi um passo indispensável na luta contra o terrorismo. Vou dar-lhe só um dado: dos 19 autores do atentado do 11 de Setembro, 15 eram sauditas. Nenhum era

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iraquiano. Não há nenhum iraquiano na liderança da Al-Qaeda. Não há qualquer ligação entre a Al-Qaeda e o Iraque. Em contrapartida, está mais do que provado que o financiamento da Al-Qaeda saiu - e sai - da Arábia Saudita.
A Sr.ª Ministra diz que a Al-Qaeda, e cito, "quer estabelecer, de Marrocos ao Afeganistão, regimes fundamentalistas onde a única educação seja a corânica, a única lei a sua versão pura e dura da lei islâmica, com pena de morte, amputações e lapidação de adúlteras, onde as mulheres não tenham direitos, incluindo o direito à educação, e andem veladas da cabeça aos pés". Diz a Sr.ª Ministra que não precisamos de tentar imaginar um país assim. Pois não.
Diz o relatório da Amnistia Internacional sobre a Arábia Saudita, quanto à pena de morte, que, no ano passado, foram executadas 48 pessoas, quanto às amputações, que, pelo menos, sete pessoas viram cortadas a mão direita, que 15 crianças foram flageladas em público por namorarem num parque, que dezenas de pessoas foram torturadas e que as mulheres não têm quaisquer direitos. O absurdo é tal que 15 crianças morreram queimadas num incêndio de um colégio interno porque os polícias religiosos não as deixaram fugir por não estarem os pais à porta.
Dizia a Sr.ª Ministra que o inimigo é quem dá doutrina e dinheiro à Al-Qaeda. Ora, quem dá a doutrina são os wahabitas da Arábia saudita, seita islâmica dominante naquele reino e que é professada por Bin Laden.
A Arábia Saudita financia em todo o mundo a expansão da doutrina wahabista, o mais repugnante fundamentalismo, que choca frontalmente com a essência do Islão.
A central do terrorismo mundial está na Arábia Saudita, mas o seu Governo, Sr.ª Ministra, quer ser fiel a este aliado. Explique-me, por favor, como é que se combate o terrorismo e ao mesmo tempo se fazem negócios com a Arábia Saudita.
A Sr.ª Ministra tenta explicar-se dizendo que tem relações diplomáticas normais com a Arábia Saudita e que, por isso, é justo estabelecer acordos bilaterais. Quando é que já ouvimos isto? Sobre a venda de armas ao Iraque. Nada de novo, portanto. Os negócios valem sempre mais do que os princípios que invocam para justificar a guerra. O Iraque ontem, a Arábia Saudita hoje.
Diz, ainda, uma coisa extraordinária: que as visitas também servem para discutir os direitos humanos. Nunca tal foi lido em nenhum dos documentos oficiais. Mas que coisa estranha! Para discutir os direitos humanos enviam um Ministro da Defesa?! Desculpe, mas não há como acreditar! Aliás, o que o Sr. Ministro da Defesa foi discutir está escrito no boletim Informação Mensal Sobre Relações Bilaterais de Defesa, n.º 6, de Junho de 2003, que diz, e cito: "Durante as conversações foram debatidos diversos assuntos de interesse para ambas as partes, de que se destacam a possibilidade de incremento da cooperação ao nível industrial de defesa, particularmente no domínio da manutenção aeronáutica, bem como a eventual frequência de cursos ministrados nas nossas academias militares por oficiais sauditas. Foi ainda sugerida a celebração de um acordo de cooperação bilateral no domínio da defesa, cuja proposta de texto está já a ser preparada na Direcção-Geral de Política de Defesa Nacional (DGPDN)". Está tudo aqui, não é um documento secreto (se a Sr.ª Ministra quer uma cópia, tenho-a aqui para lhe dar) e em nenhum lugar se fala em direitos humanos.
Voltamos a perguntar: este acordo já foi assinado? Qual é o seu conteúdo? Continuamos sem resposta, mas sabemos que a Ministra e o Governo não querem dizer uma palavra sobre isto. É um escândalo!
Portugal mantém tropas da GNR no Iraque. Participa de uma ocupação imoral, desumana e que foi feita ao arrepio da legalidade internacional. Fá-lo em nome de princípios falsos e de interesses obscuros. Se o Sr. Primeiro-Ministro fosse realmente um aliado honrado do S. George W. Bush deveria ter a coragem de lhe dizer: "Portugal vai sair do Iraque e todas tropas ocupantes deveriam fazer o mesmo."
Quanto mais a ocupação demorar, mais vai crescer a violência e piores vão ser as condições para a autodeterminação. Quanto mais prisões arbitrárias, quantas mais invasões nocturnas de domicílio, quantos mais assassinatos de civis inocentes em checkpoints mais vai ser potenciada a resistência, a violência e o terrorismo internacionais.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

A Oradora: - É hora de tomar decisões corajosas. Como já fez o Primeiro-Ministro eleito da Espanha, José Luis Zapatero, Portugal deve anunciar a retirada da GNR do Iraque.
O tempo urge. O momento é agora e, por isso, o Bloco de Esquerda entregará na Mesa um projecto de resolução para a retirada da GNR do Iraque.

Aplausos do BE.

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Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas.

A Sr.ª Ministra dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate não é uma mentira. O debate desta interpelação versou sobre uma questão que já foi debatida, que já foi discutida, que já foi analisada.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - O Bloco de Esquerda não trouxe nada de novo. Trouxe um rosário de slogans panfletários. Este debate foi, de facto, uma inutilidade política.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Bloco de Esquerda veio aqui com a sua arrogância do costume e falou de mentira.
O Bloco de Esquerda quer resumir o mundo a preto e branco, quer dividir os homens entre puros e impuros, quer reduzir uma questão da maior complexidade a um soundbyte demagógico de efeito fácil.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Este debate foi também um exercício de amálgama simplista e redutora.
Neste debate, o Governo teve ocasião de afirmar a sua política e, do confronto da discussão, consolidar as posições que tem vindo aqui a anunciar ao longo dos últimos meses sobre esta matéria.
Participámos com os nossos aliados no combate ao terrorismo e, ao contrário do que o Sr. Deputado Francisco Louçã disse no início do debate relativamente à minha hipotética solidão, devo dizer que eu não estou só, estou sustentada por uma maioria neste Parlamento.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Estou sustentada por uma série de resoluções das Nações Unidas, que dão legitimidade política às nossas posições e à nossa presença no Iraque. Eu sei que estas questões são irrelevantes para o Bloco de Esquerda, mas não o são para nós,…

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - … porque o Bloco de Esquerda já disse que, independentemente de haver ou não resoluções das Nações Unidas, seria contra a participação neste projecto de criação de uma democracia no Iraque.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Muito bem!

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Chama-se petróleo!

A Oradora: - Para nós, repito, as resoluções das Nações Unidas não são irrelevantes.
Estou sustentada por esta maioria, pelas resoluções das Nações Unidas, pela companhia de 18 países europeus, por um conjunto de 35 outros Estados que participam politicamente nesta coligação e estou, ainda, sustentada pela vontade partilhada por toda a comunidade internacional de dar luta, sem trégua, ao terrorismo internacional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Trata-se de uma guerra que combatemos juntamente com os nossos aliados, mas que não foi declarada pela coligação. Recordo que a guerra foi declarada pela Al-Qaeda e é contra esta guerra que eu tenho a certeza de que todos nesta Casa, incluindo o Bloco de Esquerda, estão unidos, porque, no que diz respeito à nossa presença no Iraque, devo dizer-lhe, Sr. Deputado Francisco Louçã, que, usando uma frase sua, que subscrevo completamente, "a segurança é parte da liberdade em nome da liberdade".

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O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

A Oradora: - No Iraque, existe actualmente liberdade de associação, de informação e de expressão. Os iraquianos têm-se manifestado regularmente pelas mais diversas causas. Participaram recentemente em grandes marchas contra o terrorismo.
Por ocasião do aniversário da intervenção da coligação no Iraque, o Bloco de Esquerda trouxe aqui um debate, mas eu não vi, no Iraque, nenhuma grande manifestação contra a coligação.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

A Oradora: - Srs. Deputados, somos a favor de um sistema democrático no Iraque, somos a favor da criação de um Estado laico e de condições para o estabelecimento das liberdades individuais.
Estamos com a União Europeia e não nos acusem de a dividir com esta participação, porque se tivéssemos que fazer a história das divisões, iríamos parar a outro lado.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Srs. Deputados, somos pelo multilateralismo no plano europeu e no plano da comunidade internacional. Multilateralismo, Sr. Deputado José Vera Jardim, é certamente o caminho que queremos continuar a seguir. No entanto, não reforçamos o multilateralismo e as suas instituições se permitirmos o desrespeito das suas resoluções por criminosos que agem contra o direito e contra a humanidade.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

A Oradora: - Se fosse preciso tirar consequências sobre a relação entre o resultado das eleições francesas e outros resultados eleitorais que aqui foram evocados para demonstrar o mal fundamentado das nossas posições, bastaria vermos o resultado das eleições francesas, o qual demonstra que nada tem a ver com o Iraque.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Falou-se também na hipótese de retirar as nossas forças do Iraque. Essa retirada seria, certamente, desastrosa e irresponsável.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

A Oradora: - A nossa presença no Iraque, Srs. Deputados, está enquadrada num mandato das Nações Unidas, e cremos que assim continue a ser.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Aliás, recordo, Srs. Deputados, que a primeira coisa que fez um candidato democrata - repito, um candidato democrata -, quando um país da coligação anunciou que iria retirar-se do Iraque, foi justamente pedir que não o fizesse.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Nós manteremos as nossas forças, se assim nos for pedido, desejavelmente com a continuação do enquadramento das Nações Unidas e sempre que isso nos for possível. Isto, Srs. Deputados, não é seguidismo. Seguidismo é correr atrás do mais fácil para agradar a toda a gente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E o curioso, Srs. Deputados, é que somos acusados de seguidismo justamente pelos mesmos que recomendam que sigamos o exemplo de outro governo e de outro país a propósito da retirada das nossas forças.

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Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Gostaria também de dizer uma palavra a propósito de Timor. Foi aqui sugerido que seguíssemos o mesmo método, mas há aqui uma questão fundamental, Sr. Deputado Luís Fazenda. Não podemos comparar a questão de Timor com esta, porque no caso de Timor tínhamos do outro lado um Estado e um propósito político. Com quem é que nos sentávamos à mesa, neste caso, Sr. Deputado? O que é que iríamos negociar? Iríamos negociar a destruição das nossas sociedades ocidentais?

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Porque é disso que se trata, Sr. Deputado! O que está aqui em causa não é o choque das civilizações. Não é nada disso que se trata! Essa é justamente a conclusão a que os terroristas querem que cheguemos.

Protestos do Deputado do BE Luís Fazenda.

Os terroristas não propõem coisa nenhuma. Por isso não há civilização nenhuma em confronto com a civilização ocidental. O que se pretende é apenas impor à bomba uma sociedade em que eu, por ser mulher, não possa falar livremente como o faço nesta Casa.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Deputado, não há qualquer confronto de civilizações. Do lado de lá não temos civilização nenhuma! Eles apenas aceitam a minha morte, a morte das sociedades livres e a morte de instituições como esta em que estamos, em que a liberdade é o valor mais alto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encerrado o debate da interpelação n.º 11/IX, sobre política externa, suscitado pelo Bloco de Esquerda, vamos passar de imediato ao período regimental de votações.
Chamo, desde já, a atenção dos Srs. Deputados para o facto de que teremos de fazer uma votação por processo electrónico a propósito de um dos artigos de uma das leis que vai ser hoje votada em votação global.
Srs. Deputados, vamos, antes de mais, proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.
Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 155 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Vamos começar pelo voto n.º 145/IX - De congratulação pelo sucesso da Selecção Portuguesa de Râguebi no Torneio Europeu, apresentado pelo PS.
Para apresentar o voto, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, apresentámos este voto porque, embora as nossas atenções estejam concentradas no EURO 2004 e embora eu próprio seja um adepto do futebol, há mais mundo para além do futebol e há mais desporto para além do futebol.
Há outras modalidades desportivas que têm dado grandes vitórias a Portugal, como recentemente sucedeu nos campeonatos do mundo de atletismo com uma medalha de outro e uma medalha de prata. Apesar disso, como disse o Prof. Moniz Pereira, temos uma pista que custou centenas de milhares de contos, mas não há sítio coberto para a colocar.
Agora, esta vitória da Selecção Portuguesa de Râguebi constitui um dos maiores feitos de sempre do desporto português.
O râguebi é uma das modalidades desportivas de maior projecção mundial. Portugal era um parente pobre. Foi feita pelo novo seleccionador Tomás Morais uma verdadeira renovação e revelação no râguebi e, com esta vitória no Torneio Europeu das Nações, Portugal passa a ocupar um lugar de destaque e a ser uma das equipas cimeiras do râguebi europeu.
Isto tem tanto mais significado quanto é certo que a prática desportiva amadora implica grandes sacrifícios. Houve jogadores da Selecção Portuguesa de Râguebi que conquistaram este triunfo que, conforme entrevistas públicas, puseram em risco as suas profissões e a sua estabilidade profissional para poderem participar nos treinos e nos próprios jogos.
Esperamos que este triunfo contribua para o desenvolvimento do espírito do desporto amador, que

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haja mais atenção e mais apoios ao desporto amador e que, nomeadamente, a imprensa desportiva e o serviço público de televisão dêem mais atenção a estes feitos do desporto amador, porque as medalhas olímpicas e os grandes sucessos não vêm só através do futebol.
Quero, portanto, transmitir as nossas felicitações à Selecção Portuguesa de Râguebi, à sua equipa técnica, e apontar este exemplo a todas as modalidades desportivas, a todos os desportistas portugueses e, sobretudo, à juventude portuguesa.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa e Oliveira.

O Sr. Costa e Oliveira (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, um pouco à margem deste voto, e complementando o que o Sr. Deputado Manuel Alegre acabou de dizer, permita-se-me apenas que refira que quem encaixotou a pista e quem deixou as dívidas não fomos nós, Sr. Deputado, mas alguém bem perto do Sr. Deputado.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O que interessa e aquilo que está em causa, Sr. Presidente, é que o feito da Selecção Portuguesa de Râguebi foi de facto notável e merece o nosso justo destaque.
O râguebi é uma modalidade desportiva muito interessante, que defende valores éticos e morais com grande firmeza. Dele se diz que é um desporto de gente dura, jogado por cavalheiros, ao contrário de outras modalidades que são de cavalheiros, mas jogadas por gente, algumas vezes excessivamente dura.
Este sucesso de campeão europeu na série B corresponde a um trabalho base no râguebi nacional que me atrevo a dizer que tem décadas de esforço e culmina agora pela mão do técnico Tomás Morais e de um conjunto de tão briosos praticantes.
Aliás, penso que o desporto nacional atravessa uma fase de grande destaque. Por aqui têm passado os feitos do desporto Paralímpico de muitas modalidades, de títulos europeus e mundiais. Há bem pouco, homenageámos Carlos Lopes, o maior atleta português de todos os tempos.
Mas o râguebi e o seu honroso título, que agora estão em causa, vão também constituir um excelente exemplo, vão servir de estímulo, desde já, para os inúmeros jovens, alguns mesmo muito jovens, que o praticam, e para os menos jovens, estudantes ou outros.
Agradeça-se ao râguebi, então, o seu feito. Agradeça-se a forma elevada como o râguebi, os seus técnicos e praticantes continuam inseridos na globalidade da actividade desportiva, tão fundamental no desenvolvimento, que se pretende salutar, dos portugueses.
Por tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Partido Social Democrata solidariza-se com este voto por se congratular com o resultado de tão grande destaque da nossa selecção nacional de râguebi.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, naturalmente que o Grupo Parlamentar do CDS-PP também se congratula com este feito da Selecção Portuguesa de Râguebi.
Este feito é extremamente importante e, se calhar, muita gente não tem noção do alcance que tem a vitória da selecção nacional no torneio das seis nações B. Isto quer dizer que, na Europa, onde há cinco países com largas dezenas de anos de tradição no râguebi e, de há poucos anos também, juntou-se a estes países a Itália, há seis países que disputam uma competição fechada, em que nenhum outro país pode entrar. São a elite do râguebi europeu.
Há depois um outro torneio, com outras seis selecções, que este ano foi vencido (e esta é a prova de que foi vencido) pela nossa selecção. Neste torneio, participam selecções que, por exemplo, tiveram há pouco tempo na taça do mundo de râguebi, prova em que a Selecção Portuguesa nunca participou; em que participam selecções que têm muitos jogadores, a maioria deles profissionais, facto que não acontece com a Selecção Portuguesa de Râguebi; países que têm no râguebi uma das suas principais modalidades, facto que também não acontece com este desporto em Portugal.
Assim, no ano passado, Portugal começou a construir um percurso de vitórias neste torneio das seis nações B de râguebi. E ninguém conseguia acreditar, apesar de Portugal ir vencendo sucessivamente os jogos, que poderia chegar a esta vitória. Acontece que as vitórias se foram sucedendo, com uma pequena

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excepção de um jogo na Roménia, essa sim, também uma grande potência do râguebi a nível mundial.
Ficou, assim, de parabéns uma das modalidades, porventura, mais esquecidas por toda a comunidade desportiva e mesmo por toda a sociedade portuguesa; uma modalidade que tem uma tradição particular, que não é uma tradição mediática mas uma tradição de muitos anos, de muitas equipas, de muitos clubes, de muitos jogadores, que foram apostando no râguebi como uma modalidade que, para além da formação desportiva, sempre teve a tradição de ter uma grande formação humana associada à prática desportiva e que, apesar de muitas vezes ter a fama de ser um desporto violento, é um desporto de formação de homens e de formação de personalidades.
É por isso que damos os nossos parabéns à Federação Portuguesa de Râguebi, aos treinadores da Selecção Portuguesa de Râguebi, com particular destaque para o seleccionador nacional, Tomás Morais. Também ele foi formado no râguebi, foi jogador, é hoje em dia treinador e representa uma nova geração de treinadores portugueses, que são muitas vezes mediatizados no futebol, mas que noutras modalidades também merecem destaque.
Esta é uma selecção que teve poucos apoios. Neste momento, em que nos congratulamos com esta vitória, podemos fazer todos os esforços para que a Selecção Portuguesa de Râguebi receba os apoios de que necessita, para que possa um dia tornar realidade o sonho de vermos Portugal numa taça do mundo de râguebi, com todo o brio que caracteriza estes jogadores e com todo o brio que caracteriza o râguebi nacional.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Sobre a condução dos trabalhos, suponho.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, quero referir-me, sobretudo, a algo que aqui foi dito por alguém que enfatizou os valores morais e éticos e, a certa altura, num momento de regozijo como é este de estarmos a festejar esta grande vitória, que é um grande feito do desporto nacional, veio dizer que alguém que está neste espaço teria alguma responsabilidade em relação a uma pista de atletismo que estaria encaixotada.
Sr. Presidente, saberá V. Ex.ª que não há confusão entre o que é devido ao Estado e o que é devido ao associativismo democrático e independente, que nada tem a ver com a tutela do Estado. E neste caso, para além disso, a responsabilidade dessa matéria é da Câmara Municipal de Lisboa,…

Protestos do PSD.

… cujo presidente está mais preocupado com casinos, com pistas de gelo e outras coisas semelhantes do que em criar condições para que haja uma pista coberta para a prática de atletismo na capital do País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Lello, julgo que a sua intervenção se enquadraria melhor na figura regimental do protesto do que na da interpelação à Mesa, porque, de facto, a Mesa sobre essa matéria nada tem a dizer. Apenas a regista.
Porventura, o Sr. Deputado Costa e Oliveira deseja contraprotestar?

O Sr. Costa e Oliveira (PSD): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Costa e Oliveira (PSD): - Sr. Presidente, se me permite um comentário, direi que não fui eu que comecei a falar de râguebi e passei para as pistas encaixotadas e das pistas encaixotadas para os casinos. Eu limitei-me a corresponder a um comentário que foi feito sobre algo que, pensei, se dirigia à minha bancada e apenas quis repor a verdade.
E, quando defini um espaço em redor do Sr. Deputado Manuel Alegre, não pretendi atingir ninguém em particular, mas um Sr. Deputado entendeu vir à liça com esta matéria. Mas a culpa não foi minha, Sr. Presidente.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - A explicação está dada.
Vamos proceder à votação do voto n.º 145/IX - De congratulação pelo sucesso da Selecção Portuguesa de Râguebi no Torneio Europeu (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Ao vencer o último jogo contra a selecção da Rússia, a Selecção Portuguesa de Râguebi conquistou o título de campeã europeia na série B. É um dos grande feitos de sempre do desporto português.
Em Portugal, o râguebi é uma modalidade amadora, que exige muito espírito de sacrifício para conseguir conciliar as actividades de estudo ou profissionais com a prática desportiva. O sucesso desta selecção deve-se em grande parte à renovação feita pelo técnico Tomás Morais. Mas deve-se também ao esforço colectivo da equipa e à abnegação dos jogadores, alguns dos quais tiveram de pôr em risco a sua vida profissional para poderem participar nos treinos e nos jogos.
O triunfo da selecção nacional de râguebi tem um efeito pedagógico para todo o desporto amador e em especial para o desenvolvimento do râguebi em Portugal. Não podemos esquecer que esta é das mais populares modalidades desportivas em muitos países, como o Reino Unido, a França, a África do Sul, a Austrália ou a Nova Zelândia.
Não há dúvida de que este feito desportivo pode valorizar e projectar a imagem de Portugal no mundo. Por essa razão e porque é uma incumbência do Estado português, nos termos do artigo 79.º da Constituição, "(…) apoiar a prática e a difusão da cultura física e do desporto (…)", a Assembleia da República congratula-se com o triunfo obtido pela selecção nacional de râguebi no Campeonato da Europa e saúda todos os seus atletas, bem como a sua equipa técnica, fazendo votos para que este sucesso histórico contribua decisivamente para um maior reconhecimento público e institucional do desporto amador no nosso país.

O Sr. Presidente: - O voto será transmitido à Federação Portuguesa de Râguebi.
Srs. Deputados, vamos passar à discussão do voto n.º 146/IX - De solidariedade com os trabalhadores da Bombardier, apresentado pelo BE.
Para apresentar o voto, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda sugeriu o texto de um voto de solidariedade com os trabalhadores da Bombardier, que beneficiou de sugestões apresentadas por várias bancadas e que temos a expectativa de que registe a preocupação da Assembleia com a destruição do que tem sido uma unidade produtiva que tem tido um papel histórico no nosso país, com a consequente e muito grave implicação da perda de centenas de postos de trabalho.
É certo que este não é o primeiro caso de uma falência, de uma coacção, de uma ameaça, de uma possibilidade de um despedimento colectivo, de uma estratégia para fechar uma empresa. É, no entanto, simbólica. A reacção que a Assembleia tenha a este respeito deve ser demonstrativa da sua preocupação com os trabalhadores da Bombardier, como com todas as outras empresas que, noutras circunstâncias antes desta, sofreram a mesma situação e com aquelas que possam vir a passar pelos mesmos tormentos, no futuro.
Privatizada a Sorefame, esta foi adquirida, depois de várias transacções, pelo maior fabricante mundial de comboios - a Bombardier. E, ao fim de 60 anos de actividade, a empresa confronta-se com a possibilidade de encerramento ou com a possibilidade, ainda não claramente delimitada, de impor um despedimento colectivo para conseguir uma substituição por outsourcing, de tal modo que, sem direitos, uma pequena partes destes trabalhadores continue a operar no domínio da actividade da empresa para manter a Bombardier, indirectamente, no mercado, através de alguns dos seus administradores, por via de uma empresa de fachada. É a resposta a esta situação que exige uma preocupação, uma atenção e uma solidariedade.
Os trabalhadores da Bombardier manifestaram-se hoje e estão em greve. Hoje, procuraram uma palavra do Primeiro-Ministro e ontem estiveram no Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, procurando respostas do Governo. E continuarão a insistir, combatendo a possibilidade de um despedimento colectivo, que não aceitam, e têm razão para não aceitar, e procurando que haja uma política que, no entendimento do poder político, com a contribuição da autarquia e com a responsabilização da administração da Bombardier a nível nacional e internacional, permita manter esta

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empresa.
É por isso que o voto propõe três temas fundamentais: uma manifestação de solidariedade e uma preocupação com a defesa dos postos de trabalho; uma insistência na recusa da utilização dos terrenos da Bombardier para qualquer processo de especulação urbanística; e, fundamentalmente, uma forte recomendação ao Governo para que possa contribuir para a preservação desta unidade produtiva, que é decisiva no sector ferroviário nacional.
Terminarei, insistindo neste aspecto estratégico, decisivo para a política nacional: Portugal precisa de uma ferrovia, precisa da competência técnica para construir estes equipamentos, e, como a França, a Espanha e outros países europeus, deve concentrar essa capacidade e garanti-la mesmo que o sector privado, por razões de especulação internacional ou outras, dela queira abdicar.
Uma estratégia pública competente será aquela estratégia que garante que, em Portugal, há capacidade, como hoje existe, e que não se perde a capacidade de engenharia, de conhecimento, de tecnologia, de intervenção, de construção e de reparação que nos permite contribuir para a vida deste sector ferroviário.
É isto que diremos quando votarmos este voto de solidariedade com os trabalhadores da Bombardier.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Frasquilho.

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No seguimento do recente anúncio, pela administração do Grupo Bombardier, do plano de reestruturação da empresa, que prevê a extinção de sete unidades de produção e a redução de 6600 postos de trabalho em toda a Europa, no que se inclui a extinção da unidade de produção da Amadora e a dispensa definitiva de cerca de 400 trabalhadores, o Grupo Parlamentar do PSD não pode deixar de manifestar a mais profunda consternação pela eminente extinção de uma actividade industrial que se encontra enraizada no concelho da Amadora há mais de 60 anos e pela perda de um importante centro de produção industrial situado no território nacional.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Ao mesmo tempo, manifestamos profunda preocupação pelas consequências sociais e económicas que advêm do desemprego directo de cerca de 400 trabalhadores e do impacto resultante noutras empresas directa e indirectamente relacionadas com a Bombardier.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nesta conjuntura, o Grupo Parlamentar do PSD não pode deixar de apoiar, sem reservas, a linha de acção definida pelo Governo no sentido de prosseguir, pelos canais apropriados, a sensibilização do Grupo Bombardier Internacional para outras soluções que não, necessariamente, o encerramento definitivo desta importante unidade produtiva.
Igualmente registamos a intenção inequívoca, já manifestada pelo Sr. Primeiro-Ministro aqui mesmo, na Assembleia da República, de não ratificar qualquer alteração de instrumentos de ordenamento de território nos terrenos em que se encontra instalada a Bombardier que possa motivar a extinção desta unidade produtiva.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não menos importante, o Grupo Parlamentar do PSD manifesta total e incondicional solidariedade para com os trabalhadores, apelando a que as suas preocupações legítimas não redundem em qualquer forma de apropriação política.
Nesta matéria, como em tantas outras, apraz-nos registar a clareza da posição assumida pelo Sr. Primeiro-Ministro quanto a este assunto no sentido de providenciar todos os esforços e iniciativas possíveis para tentar obviar a qualquer reflexo negativo para os trabalhadores em questão e respectivas famílias.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Termino imediatamente, Sr. Presidente.

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Deste modo, não por qualquer motivação de índole político-partidária, longe disso, mas, antes, por motivos de ordem social, o Grupo Parlamentar do PSD associa o seu parecer favorável ao voto ora apresentado.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Sorefame, actualmente designada Bombardier, é uma das mais prestigiadas empresas portuguesas. Desde o início dos anos 50 que esta unidade industrial, situada no município da Amadora, constrói carruagens que levam o nome de Portugal, o nome da indústria portuguesa, aos Metros de Los Angeles, de Chicago, de Nantes, e equipam a quase totalidade das carruagens do Metropolitano de Lisboa, todas as carruagens do Metro do Porto, todas as carruagens da linha de Sintra, as carruagens que fazem o serviço Lisboa-Porto da CP, carruagens incluídas no programa CP 2000.
A Sorefame/Bombardier é uma empresa com um valor estratégico e insubstituível para a indústria nacional.
Hoje mesmo, os trabalhadores da Bombardier manifestaram-se na cidade de Lisboa e junto à residência oficial do Primeiro-Ministro em defesa dos postos de trabalho, ameaçados pela decisão tomada pela administração desta empresa de encerrar as suas instalações em Portugal, lançando no desemprego 400 trabalhadores directos e criando, obviamente, um impacto dramático nos cerca de 1000 trabalhadores indirectos da Bombardier.
O Grupo Parlamentar do PCP está inteiramente solidário com a luta destes trabalhadores - aliás, temos apresentado nesta Assembleia diversas iniciativas para que o Governo português assuma as responsabilidades que tem nesta matéria, designadamente através do exercício de direitos de opção que a empresa pública ferroviária, isto é, a CP, detém relativamente à construção de carruagens no âmbito do Programa CP 2000. Não se trata de alterar quaisquer regras de concursos públicos mas, isso sim, de exercer um direito de opção que já está previsto num concurso que foi ganho pela Bombardier e que depende apenas de uma decisão de exercer ou não esse direito de opção.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Entendemos que o Governo deveria, inequivocamente, dar uma garantia de que esse direito de opção seria exercido e com isso viabilizar a continuação da actividade produtiva naquela empresa. Nesse sentido, apresentámos um projecto de resolução e anunciámos já a realização de um debate de urgência sobre o encerramento de empresas em Portugal, em que o caso da Bombardier está, obviamente, presente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O encerramento da Bombardier terá consequências muito graves, obviamente, para os seus trabalhadores, para as suas famílias, para a freguesia e para o município onde se insere, mas é uma perda irreparável para a indústria nacional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro Carmona Rodrigues, quando há pouco tempo participou numa reunião de uma comissão desta Assembleia, traçou um futuro risonho, a médio prazo, para a construção de material circulante ferroviário em Portugal. Falou no futuro projecto da circular de Lisboa, nas necessidades de reequipamento da CP, do Metropolitano de Lisboa, do TGV, isto é, garantiu-nos que daqui a algum tempo a Bombardier teria, seguramente, muitas condições para funcionar.
Ora, a questão, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que, se a Bombardier encerrar agora, não será em Portugal que esse equipamento vai ser construído.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E aquilo que poderia ser importantíssimo para a indústria nacional e que teria um valor estratégico, se a Bombardier, a única empresa que em Portugal fabrica material circulante ferroviário, encerrar, será feito noutros países, porque a Bombardier já terá encerrado e, então, será tarde demais para a pôr a funcionar.
Portanto, continuamos a entender que está nas mãos do Governo tomar uma decisão política que permita que a Bombardier possa continuar a trabalhar para poder fabricar em Portugal as encomendas,

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que são inequivocamente necessárias para Portugal e para a nossa indústria.
Nesse sentido, vamos votar favoravelmente este voto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista, em 20 de Janeiro de 2004, requereu na Assembleia da República que o Sr. Ministro das Obras Públicas viesse à comissão analisar, em conjunto com os Deputados, a situação da Sorefame.
Só no dia 6 de Março de 2004, o Sr. Ministro Carmona Rodrigues veio à comissão, tendo aí declarado que acreditava que a Sorefame/Bombardier continuaria a desenvolver a sua actividade. Referiu mesmo que, entre carruagens e outro material circulante, o Plano de Investimento Ferroviário para 2004/2006 comportava a necessidade de quase 114 unidades, no valor de milhões de euros, sem falar nas necessidades futuras do TGV.
Por outro lado, a Assembleia Municipal da Amadora, por unanimidade de todos os partidos nela representados, aprovou, em Julho de 2003, uma moção na qual recomendava que a Câmara Municipal da Amadora não procedesse, quando da revisão do PDM da Amadora, a qualquer alteração do uso dos terrenos onde está implantada a Sorefame/Bombardier.

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - Em reunião pública de ontem, dia 31 de Março, tanto a Câmara Municipal como a Assembleia Municipal da Amadora, que ontem também reuniu, por unanimidade de todos os partidos, voltaram a reiterar as deliberações antecedentes. Aliás, os pontos deliberativos 1, 2 e 3 do voto de solidariedade agora apresentado são a reprodução quase na íntegra da deliberação da Assembleia Municipal da Amadora, tomada ontem, dia 31 de Março.
O PS tem, assim, a convicção de que o futuro da Sorefame/Bombardier e dos seus trabalhadores depende, única e exclusivamente, das decisões do poder político, do Governo.
É necessário salvaguardar os postos de trabalho de cerca de 400 trabalhadores e a existência de uma empresa, que tem mercado, que tem saber fazer acumulado, que tem capital humano altamente especializado e que é viável economicamente.
Naturalmente, votaremos a favor deste voto de solidariedade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do CDS vai votar favoravelmente o voto n.º 146/IX. Não deixa, contudo, de fazer duas observações: primeira, a claríssima importância do ponto 1 do voto, de manifestação de solidariedade; segunda, a clara redundância dos pontos 2 e 3, na medida em que as recomendações que são feitas ao Governo correspondem, desde logo, a compromissos já assumidos pelo Sr. Primeiro-Ministro,…

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Exactamente!

O Orador: - … indo o ponto 3 claramente no sentido daquilo que já neste momento estão a fazer quer o Sr. Ministro da Economia quer o Sr. Ministro das Obras Públicas.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Não poderíamos deixar passar esta ocasião sem marcar uma posição de solidariedade em relação a esta situação e, mais uma vez, um voto de confiança em relação ao que o Governo de Portugal está a fazer.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 146/IX - De solidariedade com os trabalhadores da Bombardier (BE).

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

A empresa canadiana Bombardier, a maior fabricante mundial de comboios, anunciou que vai despedir 6600 postos de trabalho das suas unidades de transportes e encerrar sete fábricas na Europa, entre as quais a fábrica da Amadora. Além da ex-Sorefame, também fecham as portas três fábricas no Reino Unido e outras três na Alemanha, Suíça e Suécia. No entanto, e proporcionalmente, a mais atingida é a Bombardier/Sorefame, com a eliminação de 400 postos de trabalho - 75% da sua actual força de trabalho.
A Bombardier, na sua comunicação 07/04, entregou a todos os seus funcionários as "Condições de Cessação de Contratos de Trabalho por Mútuo Acordo", colocando-os perante o ultimato: ou aceitam o despedimento por mútuo ou terão um despedimento colectivo. Trata-se de uma ameaça que constitui uma estratégia condenável de coacção pela Bombardier.
A antiga Sorefame, situada no concelho da Amadora, iniciou a sua actividade em 1943 e, ao longo de 60 anos de actividade ao serviço da indústria portuguesa, desenvolveu, projectou e forneceu equipamentos para aproveitamento hidro-eléctrico, hidro-agrícolas e equipamentos de material circulante ferroviário, destinado ao mercado de vários países, prestigiando o nosso país e contribuindo positivamente para a economia nacional.
Actualmente, a empresa emprega directamente cerca de 500 trabalhadores e, indirectamente, em regime de subcontratação, mais cerca de 1000 trabalhadores. Tem em curso a execução de dois projectos, Metro do Porto e CP/2000 comboios do Porto, cuja fabricação e montagem final termina em Abril de 2004.
A decisão da execução dos projectos em curso foi atrasada, designadamente os do Metro do Porto e de Lisboa (em expansão das suas frotas) e os das carruagens incluídas no programa CP 2000, que prevê, nomeadamente, a possibilidade de opção de aquisição de mais 10 carruagens sem a necessidade de novo concurso. A administração da Bombardier, neste contexto, tem sido criticada por não potencializar o capital humano e a empresa.
O futuro da Bombardier/Sorefame e dos seu trabalhadores dependia e depende das decisões do poder político. Segundo o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação, Carmona Rodrigues, o Governo tem um plano para que a Bombardier "passe ao lado da situação dramática de encerramento". O titular da pasta dos transportes afirmou que mandara "auscultar todas as empresas de transportes do Ministério sobre eventuais aberturas de concursos para material circulante nos próximos dois anos". A informação foi compilada para a administração da Bombardier actuar em conformidade, ou seja: participar nos concursos de material circulante, a fim de manter a empresa com uma carteira de encomendas que lhe garanta o futuro.
Trata-se de uma indústria única no sector ferroviário, uma empresa de ponta a nível mundial, com um know-how acumulado, um capital humano com formação e qualificação e plenas condições de viabilidade económica.
Não se pode, por isso, deixar de considerar escandaloso o anúncio do encerramento da Bombardier. No momento que o País atravessa e face à pesada incidência social, laboral e económica no concelho da Amadora, é fundamental preservar esta unidade produtiva.
A Assembleia da República, profundamente preocupada com o futuro da empresa Bombardier, decide:
1 - Manifestar a sua solidariedade com os trabalhadores e com todos os esforços para assegurar, de forma sustentada, a manutenção dos seus postos de trabalho;
2 - Instar o Governo, no seguimento de declarações do Primeiro-Ministro na Assembleia da República, a não aprovar ou ratificar qualquer instrumento de ordenamento do território que altere o uso dos terrenos onde está implantada esta unidade produtiva;
3 - Recomendar ao Governo que tome todas as medidas necessárias para preservar esta importante unidade produtiva, relevante para o sector ferroviário nacional.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do projecto de resolução n.º 239/IX - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 28/2004, de 4 de Fevereiro, que estabelece o novo regime jurídico de protecção social na eventualidade doença, no âmbito do subsistema previdencial de segurança social (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do

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PCP, do BE e de Os Verdes.

Segue-se a votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 387/IX - Altera o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis no caso dos prédios cuja propriedade esteja registada em regiões com regime fiscal claramente mais favorável (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos passar à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 116/IX - Aprova o regime jurídico aplicável à realização de ensaios clínicos com medicamentos de uso humano.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do BE.

Esta proposta de lei baixa à 8.ª Comissão para apreciação na especialidade.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação de um requerimento, apresentado pelo PCP, BE e Os Verdes, de baixa à Comissão de Educação, Ciência e Cultura, sem votação, pelo prazo de 90 dias, do projecto de lei n.º 415/IX - Altera o Decreto-Lei n.º 123/99, de 20 de Abril, que aprova o Estatuto do Bolseiro de Investigação (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Segue-se a votação de um requerimento, apresentado pelo PSD, de baixa à Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, sem votação, da proposta de resolução n.º 44/IX - Aprova, para ratificação, a Decisão do Conselho, reunido ao nível dos Chefes de Estado ou de Governo, de 21 de Março de 2003, relativa a uma alteração do n.º 2 do artigo 10.º dos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, na sequência deste requerimento do PSD, quero interpelar a Mesa sobre o mesmo, se me permitir.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não há discussão!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, quer algum esclarecimento? É que os requerimentos são votados sem discussão.

O Sr. Honório Novo (PCP): - É para fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, é que esse requerimento não tem fixação de prazo para a discussão na comissão.

O Sr. Presidente: - Não é obrigatório.

O Orador: - Eu sei, Sr. Presidente. Mas, dado que se trata de uma matéria que já foi amplamente discutida, para evitar que a votação final da proposta de resolução seja, eventualmente, feita depois das eleições europeias ou depois da aprovação do Tratado Constitucional,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isto é que é uma interpelação?!

O Orador: - … sugiro à Mesa, e a si, Sr. Presidente, em especial, que solicite aos autores desse requerimento a fixação de um prazo, muito curto, para que possamos votar a proposta do Governo.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, os requerimentos são votados conforme são apresentados, pelo que vou pôr à votação o requerimento subscrito por Deputados do PSD tal qual se encontra.
Srs. Deputados, vamos, então, proceder à votação do requerimento do PSD, de baixa à Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, sem votação, da proposta de resolução n.º 44/IX.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP e do BE e votos contra do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, vamos proceder à votação global da proposta de resolução n.º 57/IX - Aprova, para ratificação, o Acordo sobre a Participação da República Checa, da República da Estónia, da República do Chipre, da República da Letónia, da República da Lituânia, da República da Hungria, da República de Malta, da República da Polónia, da República da Eslovénia e da República Eslovaca no Espaço Económico Europeu, assinado no Luxemburgo, em 14 de Outubro de 2003.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos passar à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 366/IX - Revisão da lei-quadro que define o regime e forma de criação das polícias municipais (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos, agora, proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, relativo à proposta de lei n.º 114/IX - Cria as comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e abstenções do PS, do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, atendendo à urgência da publicação deste diploma, quero solicitar a dispensa de redacção final.

O Sr. Presidente: - Pergunto aos restantes grupos parlamentares se têm alguma coisa a opor.

Pausa.

Uma vez que ninguém se opõe, defiro o seu pedido, Sr. Deputado, e vamos tratar de enviar o diploma para promulgação o mais depressa possível.
Passamos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 117/IX - Aprova medidas preventivas e punitivas a adoptar em caso de manifestações de violência associadas ao desporto, e ao projecto de lei n.º 410/IX - Altera a Lei n.º 38/98, de 4 de Agosto, que estabelece medidas preventivas e punitivas a adoptar em caso de manifestações de violência associadas ao desporto (BE).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, permite-me, de novo, o uso da palavra?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, também relativamente a este diploma, como sucederá, aliás, quanto à proposta de lei n.º 118/IX, cuja votação iremos realizar a seguir, e caso venha a ser aprovada, quero solicitar a dispensa de redacção final, atendendo, igualmente, à manifesta urgência dos diplomas.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, parece-me que a urgência de publicação destes diplomas é óbvia e, portanto, se não houver objecção, o pedido é deferido.

Pausa.

Dado que não há objecções, o pedido é, pois, deferido.
Vamos, agora, proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 81/IX - Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva 2000/43/CE, do Conselho, de 29 de Junho de 2000, que aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica, tendo por objectivo estabelecer um quadro jurídico para o combate à discriminação baseada em motivos de origem racial ou étnica.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, antes de passarmos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 118/IX - Estabelece o regime temporário da organização da ordem pública e da justiça ao contexto extraordinária da fase final do Campeonato Europeu de Futebol - EURO 2004, importa votar, na especialidade, o seu artigo 34.º, porque se refere a competências do Tribunal Constitucional e, de alguma forma, altera a respectiva orgânica, razão pela qual exige até uma votação por maioria qualificada e, consequentemente, por sistema electrónico.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se me permite, a Constituição exige a aprovação por maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções na votação final global e, portanto, presumo que só na referida votação é que teremos de utilizar o sistema electrónico.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado. Assim faremos, com o consenso geral dos ilustríssimos constitucionalistas e especialistas nestas matérias.
Vamos, então, votar, na especialidade, o artigo 34.º da proposta de lei n.º 118/IX, conforme consta do texto final já referido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, antes de passarmos à votação final global do texto, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 118/IX, comunico à Câmara que a 1.ª Comissão enviou uma alteração de última hora relativa à alínea c) do artigo 31.º deste texto final, que é a seguinte:
"Artigo 31.º
Revistas de prevenção e segurança

As forças e serviços de segurança, sempre que tal se mostre necessário, podem efectuar revistas de prevenção e segurança:

a) ……………………………………………………………………………………………………
b) …………………………………………………………………………………………………....
c) Quando, por efeito de identificação insuficiente de suspeito ou nos casos em que acção de prevenção policial tenha lugar, for necessário conduzir qualquer pessoa a posto policial."
Esta alteração foi acertada na comissão competente; portanto, é esta a redacção que vamos votar e que consideramos incluída no texto final.
Srs. Deputados, vamos, então, proceder à votação final global do texto, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 118/IX, com as

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alterações entretanto aprovadas, para cuja aprovação é necessária uma maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções.

Submetido à votação, foi aprovado, com 162 votos a favor (80 do PSD, 70 do PS e12 do CDS-PP) e10 abstenções (6 do PCP, 3 do BE e 1 de Os Verdes).

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Para uma declaração de voto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de fazer uma breve declaração de voto em relação à proposta de lei n.º 118/IX, cujo texto final acabou de ser aprovado.
Esta excelente iniciativa do Governo destinada a melhorar as condições de segurança durante o EURO 2004 foi claramente enriquecida nos trabalhos da 1.ª Comissão, nos poucos dias que tivemos para tratar desta matéria. Gostaria, portanto, de dizer que o Grupo Parlamentar do PSD se congratula com o facto de, na 1.ª Comissão, se ter prestigiado o trabalho do Parlamento na melhoria de um diploma que pode ser fundamental no sucesso do EURO 2004. Porque estamos a falar de medidas de segurança e dos aspectos que lhes estão associados, como a violência no desporto, este diploma é fundamental para o sucesso do evento.
Assim, por um lado, é de notar a celeridade com que se fez este trabalho, pois este diploma é efectivamente urgente, tem de entrar em vigor no dia 1 de Junho, uma semana antes do início do EURO 2004, e, por outro - e este é o aspecto essencial da minha declaração de voto -, é bom que se diga (e devemos dizê-lo muitas vezes no Parlamento) que, depois de tantas divergências existentes entre os grupos parlamentares, foram por todos dados contributos em áreas fundamentais deste diploma. E estas melhorias ocorreram na área dos meios de vigilância electrónica, na adaptação do texto ao parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados, em matéria de revistas de prevenção e segurança e também nos esquemas sancionatórios.
Termino, dizendo que nos congratulamos com a aprovação deste diploma mas, sobretudo, com o excelente papel que tiveram a 1.ª Comissão e os grupos parlamentares na melhoria deste texto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, estaremos todos de acordo em que liberdade e segurança são duas faces da mesma moeda. E estaremos igualmente de acordo, por certo, em que os problemas de ordem pública e de justiça devem ser encarados com especial cuidado e atenção num contexto tão especial e tão extraordinário como, obviamente, será a fase final do Campeonato Europeu de Futebol em Portugal.
Queremos que tudo possa correr modelarmente do ponto de vista estritamente desportivo, mas queremos e desejamos igualmente que tudo possa correr da melhor maneira pela forma como as instituições do Estado português possam garantir justamente as condições de liberdade e de segurança nesse momento tão significativo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, apesar de o Governo ter revelado o relativo atraso que nos preocupou, quanto às iniciativas legislativas estabilizadoras do especial regime e às aplicações do domínio da justiça e da ordem pública, nem por isso, da nossa parte, deixámos de contribuir diligentemente para encontrar as melhores soluções. E, particularmente, o fizemos indo ao encontro de preocupações construtivas e muito fundamentadas que as autoridades de segurança, em particular da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana, em devido tempo, tinham expresso e relativamente às quais o Governo tinha manifestado uma surpreendente desatenção.
Foi possível, com o nosso concurso activo, superar essa desatenção e encontrar soluções que, não só

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pela sua moderação e equilíbrio mas também pela procura de eficiência, por certo irão contribuir para a realização desse objectivo ideal da concordância entre liberdade, segurança, ordem e tranquilidade públicas.
Estes resultados não teriam sido possíveis sem a contribuição activa do Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Isto é apenas mais uma demonstração de que, com espírito de entendimento e diálogo, assumimos plenamente as responsabilidades e que aqui estamos até para superar as insuficiências do Governo quando elas se revelam, como se revelaram nesta matéria, mas que, em tempo útil, apesar de tudo, e por iniciativa nossa, puderam ser supridas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai ler alguns pareceres da Comissão de Ética.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o parecer refere-se à substituição, nos termos do artigo 7.º do Estatuto dos Deputados, da Sr.ª Deputada Maria Eulália Teixeira, do PSD (Círculo Eleitoral de Viseu), mediante renúncia de mandato, por Elvira Figueiredo, a qual já se encontra no exercício das funções.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que a substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o parecer está em discussão.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP, do BE e de Os Verdes e votos contra do PS.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, o parecer refere-se à substituição, nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 5.º e do n.º 2 do artigo 4.º do Estatuto dos Deputados, da Sr.ª Deputada Paula Carloto, do PSD (Círculo Eleitoral de Santarém), por Pedro Manuel Dias Figueiredo Marques, com início em 2 de Abril, inclusive.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que a substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, dá-me licença que interpele a Mesa?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, há aqui uma manifesta dificuldade de audição da comunicação que a Mesa nos está a fazer, e eu, particularmente, ressinto-me disso.
Assim, peço ao Sr. Presidente, para nos ajudar a compreender, que nos diga se a votação do parecer sobre uma suspensão temporária de mandato já teve lugar ou se é esta, a que agora foi anunciada.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o que aprovámos, com votos contra do Partido Socialista, foi a substituição da Sr.ª Deputada Maria Eulália Teixeira, por renúncia de mandato, por Elvira Figueiredo.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Foi essa que teve lugar há pouco, com o resultado anunciado?

O Sr. Presidente: - Exactamente.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o parecer da Comissão de Ética relativo à substituição da Sr.ª Deputada Paula Carloto, do PSD, por Pedro Manuel Dias Figueiredo Marques.

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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, continua a haver uma dúvida, porque parecer relativo à matéria de substituição temporária, neste momento, só há um para votar, creio eu.

O Sr. Presidente: - Exactamente, é este último, que se refere ao pedido de suspensão do exercício de mandato da Sr.ª Deputada Paula Carloto, ao abrigo das disposições da alínea d) do n.º 2 do artigo 5.º e do n.º 2 do artigo 4.º do Estatuto dos Deputados.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, é precisamente sobre este, que o Sr. Presidente agora referiu, que não há convergência de voto.

O Sr. Presidente: - Portanto, quanto ao parecer relativo à substituição da Sr.ª Deputada Maria Eulália Teixeira, do PSD, do Círculo Eleitoral de Viseu, não havia qualquer objecção.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, alteramos a votação…

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - … e consideramos que o parecer relativo à substituição, por renúncia ao mandato, da Sr.ª Deputada Maria Eulália Teixeira, do PSD, por Elvira Figueiredo foi aprovado por unanimidade.
Passamos agora à votação do parecer da Comissão de Ética relativo à substituição, por suspensão do mandato, da Sr.ª Deputada Paula Carloto, do PSD (Círculo Eleitoral de Santarém), por Pedro Manuel Dias Figueiredo Marques, com início em 2 de Abril, inclusive.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP, do BE e de Os Verdes e votos contra do PS.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Comarca de Santarém - Processo n.º 257/02.0TASTR -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado José Manuel Cordeiro (PSD) a prestar depoimento, por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Gabinete de Apoio Técnico Entre Douro e Vouga - processo de inquérito aberto com vista a apurar o rigor do acompanhamento e fiscalização das empreitadas de obras públicas designadas por "Jardim Público da Ponte", em que é dono da obra o município de São João da Madeira -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Manuel Cambra (CDS-PP) a prestar depoimento, por escrito, na qualidade de testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos.
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, dia 2, pelas 10 horas, constando da ordem de trabalhos

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a apreciação do relatório da Comissão Eventual para os Incêndios Florestais e a discussão, conjunta, das petições n.os 30/VIII (1.ª), 36/VIII (2.ª), 44/VIII (2.ª) e 51/VIII (2.ª).
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 35 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, referentes à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, relativo à proposta de lei n.º 114/IX

O Partido Socialista votou favoravelmente, na generalidade, a proposta vertente na convicção de que este projecto de diploma viria a incluir em sede de discussão na especialidade no âmbito da 4.ª Comissão, um conjunto de alterações, apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PS, que na nossa perspectiva contribuiriam para a melhoria técnica do mesmo e que potenciariam a sua execução e aplicação prática.
Considerando que:
a) Não foi aceite a proposta de incluir os presidentes de junta na composição das comissões municipais, sendo que só um representante é minimalista, porquanto esse elemento não tem conhecimento da situação e especificidades territoriais das demais;
b) Não foi aceite a representação dos estabelecimentos de ensino e agrupamentos de escolas, omissão essa que se revela preocupante, dado que é vital promover uma educação ambiental para a floresta e essa interligação com a escola seria um veículo de formação para a cidadania neste domínio;
c) Não foi aceite uma norma de previsão financeira que permitisse dotar as novas competências constantes no diploma, do necessário envelope financeiro (à semelhança, aliás, do solicitado pela ANMP no seu parecer a esta iniciativa), o que condiciona desde já a eficácia e a operacionalidade deste órgão, bem como, maiores dificuldades para os municípios no cumprimento da sua missão.
Neste contexto, a bancada do Partido Socialista absteve-se na votação final global do iniciativa em preço, uma vez que não se revê no modelo fixado, que, sem as alterações propostas pelo PS, sai "trilhado" e desconforme aos interesses que visa tutelar.
Com efeito, a eficácia da estratégia da defesa da floresta contra incêndios depende do saber dos diferentes actores envolvidos e da capacidade de coordenar a acção dos agentes que, em cada momento, desenvolvem actividades no domínio da prevenção, da detecção e do combate aos fogos florestais, condições essas que não estão asseguradas no diploma vertente.

Os Deputados do PS, José Miguel Medeiros - Pedro Silva Pereira - Jorge Coelho - Luís Miranda - Alberto Antunes.

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Com a criação da Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, proposta pelo Grupo Parlamentar do PCP, aprovada por unanimidade na Assembleia da República, abriu-se a oportunidade para uma análise detalhada sobre as causas e consequências dos incêndios florestais do ano de 2003.
Algumas das questões que foram ali analisadas eram já do conhecimento público e parlamentar, nomeadamente aquelas que dizem respeito à falta de ordenamento florestal da responsabilidade de vários governos, ao longo dos anos.
Mas igualmente a falta de apoio estatal ao associativismo dos produtores florestais condicionou fortemente as explorações quanto ao seu dimensionamento e à sua sustentabilidade, a par da necessidade de uma reestruturação fundiária neste sector, bem como o incumprimento da lei por parte da Direcção-Geral das Florestas no apoio às áreas florestadas e submetidas ao regime jurídico dos baldios, foram factores potenciadores para o desordenamento florestal.
O abandono da floresta, em parte propiciado pelas políticas agrícolas que têm sido seguidas, é outro factor que não pode nem deve ser escamoteado.
Acresce que a falta de guardas florestais e de vigias florestais no que à prevenção reporta, bem como a insuficiência manifesta de equipas de sapadores florestais para limpeza de matas e outros materiais combustíveis, bem como no combate ao fogo nascente, foram igualmente outros factores que aumentaram o risco de incêndio.
Sobre esta matéria o grupo de relatores composto por representantes do PSD, PS, PP e PCP elaborou uma proposta inicial, mas o relatório que foi presente a debate e votação na Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, nomeadamente quanto às conclusões, não foi um relatório de consenso mas, antes, um relatório tendencial da maioria parlamentar PSD/CDS-PP, que procurou branquear a responsabilidade

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do Governo, quanto à fusão do Serviço Nacional de Bombeiros e do Serviço Nacional de Protecção Civil num único organismo, o Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil, que foi feita de forma inoportuna e precipitada, no tempo e no modo.
Tal fusão, feita em cima de maior incidência de risco nos incêndios florestais, não criou as condições para uma operacionalidade da estrutura, o que veio a manifestar-se em todas as estruturas operacionais, quer a nível nacional, quer a nível distrital e local.
Criou-se um vazio no plano de coordenação das estruturas que operavam no terreno. Acresce que a forma tardia como o Governo interveio nestas matérias condicionou fortemente as acções de combate aos fogos florestais.
Estas questões, que pesaram na dimensão da tragédia dos incêndios, foram transmitidas à Comissão Eventual por entidades e individualidades ali ouvidas, que esperavam que o relatório a elaborar fosse efectivamente um retrato fiel do que no terreno se passou.
Com efeito, as conclusões extraídas neste relatório não correspondem, em nosso entender, às expectativas que foram criadas com a formação desta Comissão, e por isso apresentámos propostas que, pese embora algumas tenham sido aceites pela maioria do PSD e CDS-PP, foram no entanto insuficientes e por isso votámos contra este relatório.
As propostas que submetemos à apreciação da Comissão visavam um conjunto de matérias que, no entender do Grupo Parlamentar do PCP, para além de melhorar o texto, se traduziam no que efectivamente foi afirmado em sede de audição por várias entidade e individualidades.
Assim, queremos deixar aqui reproduzidas essas mesmas propostas:
1.1 - A questão florestal
Em primeiro lugar, situa-se de forma inquestionável a situação da floresta e do ordenamento florestal, a par com as mudanças culturais verificadas no País em resultado do processo de desertificação, em parte propiciado pelas políticas agrícolas que têm sido seguidas.
Estas situações propiciaram o aparecimento de uma floresta desordenada, não tendo sido criadas condições para a reestruturação fundiária e das explorações, para a sua diversificação e compartimentação, para a sua conservação e limpeza. Assim, ano após ano, foi crescendo uma floresta abandonada, sem limpeza e onde os resíduos lenhosos e de matos se acumulam de forma exponencial após os Invernos mais chuvosos.
A par destas mudanças, a florestação ocorreu, em grande parte, com base em espécies de crescimento mais rápido, prolongando a monocultura florestal em prejuízo de outras espécies mais resistentes ao avanço do fogo.
Acresce a ausência de uma política de diminuição do material combustível na floresta, designadamente através da criação de centros de biomassa que possam absorver os matos ou subprodutos dos cortes ou promover o seu enterramento, bem como de uma política activa de promoção do associativismo florestal com o envolvimento e participação dos respectivos produtores, de forma a garantir o apoio que promova o processo de compartimentação e diversificação da floresta através de meios a disponibilizar pelo Fundo Florestal aos produtores que os compensem da perda de rendimento em resultado da substituição das espécies nas zonas de risco, bem como em resultado da abertura de caminhos e aceiros.
A experiência no ano de 2003, quanto à criação dos Parques de Recepção de Material Lenhoso Ardido, deve levar a que, no futuro, eles sejam dotados de meios de corte e transporte e pagamentos adequados e em tempo que apoiem os produtores florestais afectados pelos incêndios que percorram a sua exploração.
1.3 - A questão institucional
Nesta matéria ressaltam as consequências do modo e do tempo em que foi realizada a fusão do Serviço Nacional de Bombeiros e o Serviço Nacional de Protecção Civil, dando lugar ao Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil.
O momento tardio da fusão (o diploma respectivo, Decreto-lei n.º 49/2003, só foi publicado a 25 de Março), quando as estruturas operacionais já deveriam estar no terreno a preparar a nova época, a extinção da CNEFF por aquele mesmo diploma, sem ter havido o cuidado necessário para que fossem criadas as necessárias estruturas alternativas - o núcleo de protecção florestal, a constituir dentro de um novo Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil, não chegou a ser operacionalizado -, tudo isto criou um vazio operacional, em que muitas das CEFF municipais, por arrastamento, acabaram por ficar desactivadas, tendo conduzido à criação de desarticulação em termos operacionais entre as várias estruturas que funcionavam no terreno pela falta efectiva de uma coordenação.
No teatro das operações continuaram a verificar-se várias deficiências já verificadas em anos anteriores:
a) Reacção tardia quanto às primeiras intervenções, pela ausência de brigadas de 1.ª intervenção

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descentralizadas pelos pontos de risco e dotadas de meios.
b) Ausência de logística adequada para orientar os corpos de bombeiros nas zonas de incêndio, para prestar apoio designadamente em matéria de alimentação e substituição de equipas.
c) Sérias deficiências em matéria de comunicações, pela não complementaridade entre si das bandas de frequência, designadamente.
d) Dificuldade de coordenação de meios aéreos e, em muitos casos, desadequação de tipos de veículos para as condições de terreno.
1.4 - A questão do incendiarismo
No entanto, o Director da Polícia Judiciária afirmou na Comissão que "Portugal não é um País de incendiários" e fundamenta a sua afirmação no facto do incêndio doloso, ou provocado por acção determinante do homem com intenção de lançar fogo, não abranger sequer os 30% das ocorrências, persistindo no entanto uma enorme mancha de negligência.
1.5 - A questão legislativa
Não obstante a legislação nacional se configurar como bastante abrangente e completa, em grande parte não é cumprida ou está por concretizar.
De facto, desde as questões relativas à limpeza das áreas florestais que são pura e simplesmente ignoradas, grande parte das vezes pela situação de abandono, motivada pela falta de apoio estatal pela estrutura fundiária e da pequena dimensão das explorações florestais.
Encontrando-se uma parcela significativa da floresta portuguesa submetida ao regime jurídico dos baldios, a gestão destas áreas nem sempre tem sido articulada e apoiada pela Direcção-Geral das Florestas, como determina a lei, pelo que importa que essa alteração seja efectuada no sentido da defesa deste importante bem comunitário.
2 - Sobre os apoios às vítimas
Quanto aos apoios aos produtores florestais e em especial os apoios ao restabelecimento do potencial produtivo, tal decorreu de modo diferente. Por um lado, os parques de madeira permitiram dar escoamento à madeira de pinho, embora o mercado tenha absorvido a maior parte desta matéria-prima. Por outro lado, quanto ao eucalipto e ao sobreiro, é de referir que foi determinado o protelamento da atribuição dos apoios, dada a necessidade de aguardar pela verificação da regeneração destas espécies.
3.1 - Organização institucional
O Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil deverá aprofundar a sua organização, funcionamento e modelo de gestão, tendo em conta o seu papel fundamental como serviço de protecção e socorro de pessoas e bens, devendo reforçar-se a valência de protecção civil, até hoje secundarizada.
Reorganização do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil, dotando-o de capacidade de intervenção e coordenação, de meios humanos e equipamentos para fazer face ao combate aos fogos florestais.
Nesse sentido, deve ser revista a lei de organização e funcionamento do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil para que tenha em conta as seguintes questões:
Articulação operacional entre os vários sistemas que integram o sistema de protecção e socorro em Portugal: sistema de socorro e luta contra incêndios; sistema integrado de emergência médica; sistema de autoridade marítima; sistema de busca e salvamento aéreo; sistema de busca e salvamento marítimo.
Articulação dos meios de coordenação, entre os vários níveis de intervenção, nomeadamente entre o Centro Nacional de Operações de Socorro, Centros Distritais de Operações de Socorro e os Serviços Municipais de Protecção Civil.
Maior celeridade entre os meios de alerta e a resposta no terreno.
Garantia de apoio logístico e substituição atempada do pessoal no teatro de operações de combate aos incêndios.
Definir, através de normativo legal, quais as competências dos Comandantes de Sector Operacional Distrital e Zona Operacional.
Aquisição de meios de comunicações para todas as estruturas de bombeiros, incluindo a coordenação, tendo em atenção a uniformização dos aspectos técnicos e da banda de frequência para todo o território nacional.
Aquisição de meios aéreos próprios de combate a fogos florestais.
Na área da formação de pessoal:
Definir através de diploma legal, qual o perfil funcional e conteúdo das carreiras e categorias dos quadros de pessoal, incluindo o quadro de comando, nos corpos de bombeiros.
Adequar a formação e conteúdo funcional das carreiras e categorias do pessoal dos quadros de bombeiros e quadros do comando, nos corpos de bombeiros.
Adequar a formação a experiências práticas e técnicas de combate a fogos florestais, nomeadamente no aperfeiçoamento das técnicas do contrafogo.

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Dotar todas as câmaras municipais de Cartas de Risco, para elaboração ou revisão dos Planos Municipais de Intervenção Florestal, articulando estes com os Planos Regionais de Ordenamento Florestal, previstos na Lei de Bases da Política Florestal.
Revisão do Estatuto Social do Bombeiro, no sentido de o dotar de capacidade atractiva para o voluntariado.
Revisão global do Regulamento Geral dos Corpos de Bombeiros, criado pelo Decreto-Lei n.º 295/2000, de 17 de Novembro, visando a estabilidade dos quadros de comando.
Revisão global da Lei de Tipificação dos Corpos de Bombeiros, definindo concretamente qual a dotação dos meios humanos e técnicos necessários ao seu funcionamento e equipamentos que devem possuir, bem como o seu financiamento, tendo em conta o seu reequipamento.
Criação de grupos de intervenção permanente nos corpos de bombeiros, localizados de forma descentralizada nos pontos de maior risco, dotados dos necessários meios operacionais para o ataque ao fogo nascente.
Criação de brigadas helitransportadas, dotadas de meios e equipamentos necessário à prontidão de resposta rápida.
Elaboração de normativo legal no que ao financiamento dos corpos de bombeiros respeita.
Proceder à revisão da Lei de Bases de Protecção Civil (Lei n.º 113/91, de 29 de Agosto), onde sejam consagrados os princípios de um sistema integrado de resposta a situações de socorro e emergência com os seguintes objectivos:
- Garantir a unidade de direcção, comando e controlo;
- Garantir a gestão e difusão da informação;
- Garantir a capacidade de antecipação;
- Garantir a articulação operacional entre os níveis nacional, regional, distrital e municipal.
Em articulação com as estruturas nacionais, as câmaras municipais devem ter um papel importante no trabalho de prevenção dos incêndios florestais, fazendo com que esta matéria também seja parte do processo de descentralização. Deverá incentivar-se a organização, estruturação e coordenação dos meios disponíveis a nível concelhio e a sua articulação com as estruturas distritais do SNBPC. Os municípios que têm apresentado maiores dificuldades nesta matéria deverão dar mais atenção ao desenvolvimento e desempenho dos respectivos Serviços Municipais de Protecção Civil. Igualmente, as comissões municipais de defesa da floresta contra incêndios, agora em criação, deverão constituir mais um elemento de reforço nesta organização.
3.2 - Reforma florestal
A implementação do Fundo Florestal Permanente deverá representar a disponibilização de meios financeiros, há tantos anos reclamados, para realizar as várias operações de ordenamento, gestão florestal e reflorestação, apoio à floresta de conservação, bem como à reestruturação fundiária.
Sublinha-se a necessidade do Fundo de Fomento Florestal, dar particular atenção aos produtores florestais, com vista a viabilizar os processos de reorganização da sua estrutura florestal, nomeadamente para as explorações com áreas de risco onde se torna necessário abrir caminhos e substituir espécies florestais por outras mais resistente ao avanço dos fogos mas menos rentáveis, bem como os apoios necessários às limpezas dos matos e restos de cortes.
3.6 - Reflorestação das áreas ardidas
Dada a dimensão da área ardida nos incêndios do Verão passado, deve constituir uma prioridade a realização da reflorestação destas áreas, aproveitando esta oportunidade para introduzir critérios de ordenamento, diversificação e compartimentação florestal e de organização da gestão das propriedades florestais.
Considera-se fundamental, em especial nas áreas protegidas e da Rede Natura 2000, avaliar a capacidade de regeneração natural dos locais atingidos, seguindo-se, em complemento, e sempre que entendida necessária, a reposição das espécies autóctones e o controlo das exóticas consideradas invasoras.
A criação da Comissão Nacional de Reflorestação (CNR) e das quatro Comissões Regionais de Reflorestação (CRR) - Algarve, Alto Alentejo, Ribatejo e Pinhal Interior - é uma iniciativa que, a ser bem concretizada, poderá permitir a reflorestação durante os próximos dois anos.
A Comissão expressa a sua preocupação quanto ao facto das medidas anunciadas pelo Governo, ou outras que se revelem necessárias na prevenção e combate aos incêndios florestais, poderem não estar em condições operacionais para o Verão de 2004, designadamente em matéria da criação efectiva das comissões municipais da defesa da floresta, de constituição das brigadas de primeira intervenção e da sua instalação descentralizada, em zonas de risco e da dotação dos corpos de bombeiros de meios adequados ao combate aos fogos florestais, bem como do reforço dos guardas florestais e vigias com vista à necessidade do reforço dos meios de vigilância e combate ao fogo nascente.

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Por tudo o que atrás ficou dito, o Grupo Parlamentar do PCP votou contra, em votação final global, o relatório.

O Deputado do PCP, Rodeia Machado.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
Arménio dos Santos
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Fernando Jorge Pinto Lopes
Henrique José Monteiro Chaves
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Pedro Filipe dos Santos Alves
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Socialista (PS):
José Augusto Clemente de Carvalho
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
Pedro Miguel de Azeredo Duarte

Partido Socialista (PS):
Maria Celeste Lopes da Silva Correia

Partido Popular (CDS-PP):
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo

Partido Comunista Português (PCP):
Maria Odete dos Santos

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Carlos de Sousa Pinto
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
José Manuel Carvalho Cordeiro
Mário Patinha Antão

Partido Socialista (PS):
Francisco José Pereira de Assis Miranda

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João Cardona Gomes Cravinho
José da Conceição Saraiva
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Isabel da Silva Pires de Lima

Partido Comunista Português (PCP):
Bruno Ramos Dias

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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