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Quinta-feira, 30 de Setembro de 2004 I Série - Número 7

IX LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2004-2005)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 29 DE SETEMBRO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Fernando Santos Pereira
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e de respostas a alguns outros, da proposta de lei n.º 140/IX e do projecto de lei n.º 493/XI.
Em declaração política, o Sr. Deputado António Filipe (PCP), a propósito de uma notícia sobre o sistema de quotas para a imigração, criticou a política do Governo para o sector e respondeu a pedidos de esclarecimento da Sr.ª Deputada Celeste Correia (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira (PS) falou sobre o estado das finanças públicas e as medidas levadas a cabo pelo actual Ministro das Finanças.
O Sr. Deputado Álvaro Viegas (PSD) fez um balanço da execução do Programa Operacional do Algarve (Proalgarve). No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado José Apolinário (PS).

Ordem do dia. - Procedeu-se ao debate dos Relatórios Anuais de Actividades do Provedor de Justiça - 2002 e 2003. Usaram da palavra os Srs. Deputados Francisco Louçã (BE), Isilda Pegado (PSD), Celeste Correia (PS), Miguel Paiva (CDS-PP), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e António Filipe (PCP).
Foi apreciado o relatório e conta de gerência da Assembleia da República relativo a 2002, tendo proferido intervenções os Srs. Deputados Fernando Serrasqueiro (PS), Rodeia Machado (PCP) e João Rebelo (CDS-PP), às quais se associou o Sr. Presidente, face à apreciação positiva que foi feita por aqueles oradores e pelo Tribunal de Contas à respectiva gestão administrativa e financeira.
A Assembleia apreciou também a petição n.º 2/VIII (1.ª) - Apresentada por Jaime Pinho e outros, manifestando total oposição aos projectos de privatização da ponta da Península de Tróia de novas construções na zona das dunas e à intenção de terminar com as carreiras regulares de barcos entre as duas margens do Sado, sobre a qual se pronunciaram os Srs. Deputados Alberto Antunes (PS), Luís Rodrigues (PSD), João Teixeira Lopes (BE), Herculano Gonçalves (CDS-PP), Odete Santos (PCP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Por último, a Câmara procedeu à apreciação da petição n.º 54/IX (2.ª) - Apresentada pela Associação dos Amigos do Mindelo para a Defesa do Ambiente, solicitando a recuperação e protecção urgente da Reserva Ornitológica do Mindelo, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Honório Novo (PCP), Renato Sampaio (PS), Diogo Luz (PSD), João Teixeira Lopes (BE), Álvaro Castello-Branco (CDS-PP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos de Sousa Pinto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Henriques de Pinho Cardão
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Delmar Ramiro Palas
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Eduardo Artur Neves Moreira
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Fernando António Esteves Charrua
Fernando José Pimenta Rodrigues
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José David Gomes Justino
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá

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João José Gago Horta
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim dos Santos Ferreira
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Manuel Cruz Roseta
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Susana Maria de Moura Alves da Silva Toscano
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Jorge Valdez Ferreira Matias
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis
Álvaro José Martins Viegas

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Jorge Gonçalves e Gama de Oliveira
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões

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Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Gustavo Emanuel Alves de Figueiredo Carranca
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos das Dores Zorrinho
José da Conceição Saraiva
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Carvalho Carito
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

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Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor José Cabrita Neto
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
António Herculano Gonçalves
José Marcelo Sanches Mendes Pinto
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Maria Celeste Ferreira Lopes Cardona
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Ângela Ricarda Carriço Sabino

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Fernando Santos Pereira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, no dia 21 e na reunião plenária de 22 de Setembro, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: aos Ministérios do Turismo e da Agricultura, Pescas e Florestas, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, formulados pelos Srs. Deputados Francisco Madeira Lopes, António Filipe e Honório Novo; ao Ministério da Cultura, formulado pela Sr.ª Deputada Ângela Sabino; ao Ministério das Actividades Económicas e do Trabalho, formulado pela Sr.ª Deputada Ana Drago.
Entretanto, no dia 22 de Setembro, o Governo respondeu a requerimentos apresentados pelos Srs. Deputados Álvaro Castello-Branco, José Apolinário e Isabel Castro.
Deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 140/IX - Autoriza o Governo a alterar o regime jurídico do arrendamento urbano, que baixou à 9.ª Comissão, e projecto de lei n.º 493/IX - Elevação da vila de Meda, no concelho de Meda, à categoria de cidade (CDS-PP), que baixou à 4.ª Comissão.
Em matéria de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao período destinado a declarações políticas.
Assim, para uma declaração política, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O jornal Público, na sua edição de ontem, publicou uma notícia aterradora: o sistema de quotas para a imigração, que constituiu a grande bandeira da política de imigração dos Governos do PSD e do CDS-PP, só legalizou três pessoas. Repito: três pessoas! Legalizou um cidadão brasileiro, trabalhador agrícola; um cidadão moldavo, escriturário; e um cidadão ucraniano, copeiro.
A esta tristeza se resume, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a tão generosa política de imigração destes Governos.
Em resposta às 8500 vagas para trabalhadores estrangeiros, proclamadas pelo Governo ao abrigo do tão rigoroso estudo sobre as necessidades de mão-de-obra, elaborado pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional, apareceram 60 candidatos e, destes, apenas três conseguiram obter o visto de trabalho.
Então, de duas uma: ou só entraram em Portugal três imigrantes ao longo de todo o ano de 2004 ou a política de quotas, tão propagandeada pelo Governo, teve exactamente o efeito que aqui dissemos que iria ter: fazer aumentar a imigração clandestina e condenar os trabalhadores estrangeiros à ilegalidade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Como bem lembra o artigo do Público, "a fixação de um limite máximo anual de entradas de cidadãos de Estados terceiros foi considerada pelo Governo como 'um instrumento decisivo para a regulação e estabilização das entradas em território nacional'. (…) Desta forma (…), evitar-se-ia que continuassem as correntes de imigração ilegal e que bolsas de desemprego contribuíssem para a marginalização das comunidades estrangeiras".
Dos diversos ministérios que lidam directamente com o processo - Negócios Estrangeiros, Administração Interna, Assuntos Económicos e Trabalho -, ninguém sabe explicar este fracasso. Do SEF, também ninguém faz qualquer comentário.
Mas, continua o artigo do Público, alguns responsáveis relacionados com o fenómeno da imigração admitem que o falhanço do processo revela que os empresários portugueses continuam a preferir recrutar ilegalmente imigrantes, em vez de enveredarem pelo processo oficial e legal. E o Presidente da CIP, embora afirme não saber muito bem o que aconteceu, dado continuar a haver uma grande falta de mão-de-obra pouco qualificada no País, aventou a possibilidade de muitas empresas em dificuldades terem preferido os imigrantes ilegais sem contrato, dado que os patrões em tempo de crise "ligam pouco às leis". O Presidente da CIP saberá do que fala…!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Uma vergonha!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se a política de imigração deste e do anterior Governo se pautasse pelo objectivo de promover a imigração legal, regulando-a devidamente, e pretendesse, de facto, viabilizar a integração social dos trabalhadores imigrantes e das suas famílias, estaríamos perante um monumental fracasso. Mas, como os objectivos destes Governos nunca foram esses, estamos perante uma monumental fraude política, social e económica. É que ainda não esquecemos o discurso contra os imigrantes que marcou, há um ano atrás, o discurso da rentrée política do Presidente do CDS-PP. Esse discurso xenófobo foi muito elucidativo e ajuda a perceber certas atitudes destes Governos, que sacrificam os direitos mais elementares dos cidadãos imigrantes ao serviço de um patronato sem escrúpulos, que beneficia de uma lei injusta e de uma actuação administrativa inadmissível, para explorar, de forma criminosa, em seu proveito, a ilegalidade a que os trabalhadores imigrantes são condenados.
O Governo não pode fingir-se surpreendido com a situação que criou. Pela nossa parte, não nos cansámos de alertar aqui mesmo, nesta tribuna, para as consequências negativas da sua política e da lei de estrangeiros que aqui fez aprovar.
Dissemos aqui, em Abril de 2003, que "A situação de imigração ilegal com que nos confrontamos não resulta de nenhuma política de portas escancaradas mas, sim, de uma política que dificulta a legalização de milhares de trabalhadores imigrantes. (…) Não é nenhum exercício de futurologia afirmar que, com esta lei, vai aumentar nos próximos anos o número de trabalhadores ilegais em Portugal, com todas as consequências humanas, sociais e económicas que isso vai implicar.".

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Como a realidade demonstra, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não se tratou de nenhum exercício de futurologia, nem de nenhuma previsão excessivamente pessimista. Tratou-se apenas de reflectir sobre os problemas da imigração com o sentido de responsabilidade que o Governo não tem.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ainda ontem foi divulgada uma investigação sobre a tendência para o envelhecimento e para a diminuição da população portuguesa, apresentada no âmbito do Congresso Português de Demografia, na qual se conclui que para que o índice de relação de dependência das pessoas idosas (número de pessoas em idade activa por pessoa idosa) se mantenha nos níveis actuais - de 4,1 - é preciso que entrem em Portugal, até 2021, 188 000 imigrantes por ano.
O Governo não quer saber destes problemas. O Governo só está preocupado em dificultar a vida aos trabalhadores imigrantes, impedindo a sua legalização, sabendo muito bem, ou não podendo deixar de saber, que, quanto mais difícil é a legalização dos imigrantes, mais fácil é a vida dos patrões que abusam dessa ilegalidade para os explorar, para os roubar nos salários, para os privar de direitos, para os despedir quando muito bem entendem, para fugir às suas obrigações para com o fisco e a segurança social.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - E como se não bastasse a total complacência para com os empregadores que não colaboram na legalização dos trabalhadores e que ameaçam de despedimento os que pretendam legalizar-se, o Governo, através do SEF, parece fazer tudo o que pode para dificultar ainda mais a legalização dos imigrantes.
Ainda há poucos dias, à porta do SEF, em Lisboa, tivemos oportunidade de testemunhar a fila de cidadãos estrangeiros que ali perdem dias de vida e de trabalho para tentar corresponder às exigências que são feitas para a sua legalização e que, em muitos casos, por mera e abusiva interpretação administrativa, transcendem em muito as próprias exigências legais.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Uma vergonha!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo deve uma explicação ao País e a esta Assembleia sobre as consequências do monumental fracasso da sua política de imigração. O Governo tem de explicar por que razão só três trabalhadores obtiveram visto de trabalho, ao abrigo da chamada "lei das quotas"; o Governo tem de explicar o que tenciona fazer, perante o aumento dramático da imigração ilegal; o Governo tem de explicar o que tenciona fazer, quando caducarem as dezenas de milhares de autorizações de permanência concedidas nos últimos anos a cidadãos sem autorização de residência; o Governo tem de explicar a sua complacência perante o patronato sem escrúpulos que beneficia da imigração ilegal; o Governo tem de explicar os absurdos critérios utilizados pelo SEF para dificultar a legalização dos imigrantes.
Por isso, o Grupo Parlamentar do PCP vai solicitar, hoje mesmo, que seja agendada a comparência, na 1.ª Comissão, do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Presidência, responsável pela política de imigração. Esperamos que o Governo não se furte a assumir as suas responsabilidades nesta matéria.

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Celeste Correia.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, foi também com algum espanto que, no artigo que referiu, vimos o Sr. Presidente da CIP dizer que este fracasso, que o Governo ainda não explicou, se devia ao facto de, e cito, ser "(…) possível que os imigrantes prefiram vir para cá clandestinamente.". Creio que qualquer Sr. Deputado concordará comigo se eu disser que os imigrantes não querem vir para cá clandestinamente, que os imigrantes não querem viver num ambiente de medo, que os imigrantes não querem o clima de violência que, por vezes, encontramos no mercado de trabalho.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Celeste Correia, permita-me uma interrupção.
Peço aos Srs. Deputados do PSD o favor de tomarem os seus lugares e criarem condições para que se ouça a oradora.
Queira prosseguir, Sr.ª Deputada.

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A Oradora: - Os imigrantes sabem que uma imigração legal, com direitos, é uma imigração com vantagens económicas e sociais.
Por outro lado, já concordo com o Sr. Presidente da CIP quando diz que muitas empresas em dificuldades preferem imigrantes ilegais, sem contratos, desprotegidos, a enfrentar a burocracia. Claro! É evidente! Essas empresas utilizam os ilegais que cá estão e, se for preciso, vão buscar mais imigrantes lá fora.
Já por si, é muito difícil um sistema de quotas. Quotas, como? Que capacidade para escolher quem? Fazer à moda dos Estados Unidos, com quotas x para o primeiro mundo, y para o segundo mundo, z para o terceiro mundo?! Quotas em função das necessidades do País? Muito bem! Só que, Srs. Deputados, não estamos numa economia planificada nem num país com fronteiras fechadas. Não é possível, pois, resolver a questão da imigração unicamente com o sistema de quotas, porque, se houver trabalho, as pessoas vêm para cá, se não houver trabalho, as pessoas vão à sua procura.
Este fracasso do Governo, Sr. Deputado António Filipe, não nos surpreende porque o Governo debilitou o sistema de controlo e de inspecção que o PS tinha reforçado. E o mercado tem de ser controlado! Não podemos deixar o mercado regular-se a si próprio. Um exemplo do que acabo de dizer é o Governo ter afastado a Inspecção-Geral do Trabalho do acesso à informação da segurança social e do sistema fiscal, dificultando o trabalho em rede que estava a ser feito e o cruzamento de sistemas de informação. Este Governo enfraqueceu a dimensão da transparência que o PS tinha introduzido e o sistema de regulação do Estado tem vindo a funcionar sem a transparência devida, o que se traduz numa grande preocupação.
Portanto, como disse - e bem! -, Sr. Deputado António Filipe, a Administração, o Governo tem de prestar contas ao País sobre este processo e o seu fracasso.
Estamos, neste momento, numa encruzilhada: ou continuamos a basear a competitividade da economia na mão-de-obra barata ou queremos que a imigração seja um contributo…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, esgotou-se o tempo de que dispunha.

A Oradora: - Já vou terminar, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, estamos numa encruzilhada: ou continuamos a basear a competitividade da economia na mão-de-obra barata ou queremos que a imigração seja um contributo para a transformação estrutural, com qualidade e inovação, de que a sociedade portuguesa precisa. Creio que o Governo escolheu um caminho que não é o nosso, e também não me parece que seja o seu, pelo que gostava de o ouvir sobre isto, Sr. Deputado António Filipe.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Celeste Correia, antes de mais, agradeço a sua pergunta.
Este fracasso da política das quotas também é bom para os senhores aprenderem, porque a primeira legislação sobre quotas ainda foi feita no tempo do governo do Partido Socialista,…

Risos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.

… aliás, na altura, com o acordo lamentável do CDS-PP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Bem lembrado!

O Orador: - Portanto, é bom que o CDS-PP não se comece a rir, porque é, desde início, parceiro nesta opção.
Mas a Sr.ª Deputada fez bem em referir um aspecto. Dizia o Sr. Presidente da CIP, naquele artigo do Público, que haverá imigrantes que preferem vir clandestinamente. Sr.ª Deputada, uma afirmação desta natureza não tem pés nem cabeça. É evidente que nenhum cidadão que queira ir trabalhar para outro país o fará clandestinamente se o puder fazer legalmente. A questão é a seguinte: o que é que faz com que, em Portugal, não sejam admitidos trabalhadores, legalmente, para exercerem a sua actividade profissional? E uma das razões está inventariada: há muitos patrões que preferem a mão-de-obra ilegal.

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Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Mais: há patrões que ameaçam com despedimento imediato os seus trabalhadores ilegais se eles pretenderem legalizar-se e não colaboram, tal como a lei exige, para que esses trabalhadores possam ficar em situação legal.
Há, em Portugal, um sector do patronato que não tem escrúpulos de espécie alguma e que quer beneficiar, e está a beneficiar, com a complacência do Governo, da manutenção dos trabalhadores em situação ilegal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Isso é uma desgraça para os trabalhadores envolvidos e é indigno para um Estado de direito democrático, para um país democrático.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, é preciso que a situação seja alterada e que, de facto, os patrões que querem beneficiar da imigração ilegal sejam duramente combatidos, porque isso é absolutamente inadmissível.
Depois, há um segundo aspecto, que é o abuso de exigências por parte do SEF. Um trabalhador estrangeiro que queira tratar quer da sua legalização, quer, muitas vezes, da renovação de autorizações de residência ou de vistos que já possua passa, como costuma dizer-se, as "passas do Algarve" à porta do SEF, perdendo ali dias de vida e de trabalho, e não consegue, em muitos casos, resolver situação alguma, porque o SEF ainda exige muito mais do que a própria lei. Há interpretações, por parte do SEF, num sentido restritivo e de aumento de exigências, que não têm a mínima base legal!!
Ainda há poucos dias recebemos aqui, em resultado de um requerimento que dirigimos ao Ministro da Administração Interna, uma resposta do SEF, defendendo que um cidadão que tenha uma autorização de residência e queira renovar o título - e não é a autorização é o título, como sucede com um cidadão nacional que queira renovar o bilhete de identidade -, tem de apresentar toda a documentação, como se não tivesse qualquer autorização. Seria a mesma coisa que exigir a apresentação de uma certidão de nascimento a um cidadão português, sempre que quisesse renovar o bilhete de identidade. Ora, o SEF defende esta interpretação, o que é inteiramente absurdo!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha. Tenha a bondade de concluir.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Este é apenas um exemplo de uma situação que urge alterar e, por isso, exigimos a presença aqui do Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Presidência, para nos dar esclarecimentos e explicações acerca desta matéria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Joel Hasse Ferreira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É certo que o Executivo Durão Barroso/Ferreira Leite criou uma situação quase insustentável nas finanças públicas, ao mesmo tempo que degradava, de forma tremenda, a situação económica e social portuguesa.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - A Dr.ª Manuela Ferreira Leite, quando ministra, não conseguiu conter as despesas públicas de forma adequada, nem sequer aplicar um programa de reestruturação da Administração Pública com alguma lógica. A, então, Ministra seguiu a política dos cortes cegos, das fusões disparatadas, tratando de forma idêntica o que era diferente e de forma desigual o que era similar.

Vozes do PS: - Muito bem!

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O Orador: - Mas, entretanto, Srs. Deputados, promoveu a venda mal preparada, mal fundamentada, de património do Estado e a titularização de créditos, através de uma operação que saiu bem cara ao Estado português.
Sr. Presidente, o actual Ministro das Finanças pretende continuar com a venda de património do Estado, com uma variante perigosa: a de, posteriormente, alugar instalações que, entretanto, tenha vendido.

O Sr. José Magalhães (PS): - Notável!…

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Ministro das Finanças já manifestou também a sua intenção de proceder à integração do Fundo de Pensões da Caixa Geral de Depósitos na Caixa Geral de Aposentações. Esta intenção corresponde à concretização de uma estratégia de cosmética orçamental, associada à assumpção de responsabilidades para o Estado não directamente traduzidas nos mapas orçamentais.

O Sr. Afonso Candal (PS): - É verdade!

O Sr. José Magalhães (PS): - Bem dito!

O Orador: - O Sr. Presidente da República já explanou a sua concepção sobre aspectos essenciais das finanças públicas e do enquadramento orçamental. Não sabemos se o Governo tomou boa nota das advertências do Dr. Jorge Sampaio, nomeadamente das publicadas, recentemente, no jornal Expresso…!
Sr. Presidente, esta estratégia de actuação vem no seguimento de outras operações desenvolvidas, por vezes de forma bastante inábil, pela ministra Manuela Ferreira Leite. Referimo-nos, nomeadamente, à operação de integração do Fundo de Pensões dos Correios na Caixa Geral de Aposentações. Por meio dessa operação, contabilizaram-se cerca de 930 milhões de euros como receita do Estado e pôs-se o Estado a assumir responsabilidades ao longo das próximas décadas, o que corresponde, Srs. Deputados, a contabilizar no presente e a hipotecar no futuro.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Ministro das Finanças manifestou-se, há bem pouco tempo, particularmente crítico da utilização, de forma sistemática, das receitas extraordinárias, mas vem insistir no pecado que criticou, de forma implícita mas clara, quando o mesmo pecado foi cometido pela Dr.ª Manuela Ferreira Leite.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sabe-se lá porquê!

O Orador: - O Sr. Ministro considera que o Fundo de Pensões da Caixa está mesmo ali, à "mão". O Sr. Ministro está todos os dias descobrindo novos Fundos. Ele quer dar não "novos mundos ao mundo", como dizia o poeta, mas novos Fundos para tapar o fundo do buraco em que os Executivos da coligação das direitas estão a colocar a situação financeira do País.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, há uma linha constante na política financeira do actual Executivo. Trata-se de uma evolução na continuidade: continua o Governo a não desenvolver um esforço estruturado no sentido do reequilíbrio das finanças públicas; prossegue o Governo na venda de património do Estado; procura o Governo evoluir na sofisticação dos métodos, agravando as responsabilidades do Estado português e hipotecando o futuro das portuguesas e dos portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, podemos resumir numa frase a actuação financeira do actual Executivo da coligação das direitas: estão a hipotecar o futuro.
Sr. Presidente, não há Fundo que escape à cobiça de actual Ministro das Finanças. Depois do Fundo de Pensões da Caixa, noticia hoje mesmo um importante quotidiano económico que um dos fundos de pensões da empresa Aeroportos de Portugal (ANA) estará também na linha de mira do actual Ministro.

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Seriam mais de 100 milhões, que os novos "Patinhas" das Finanças julgam poder precisar para tapar um "buraco" que se vai reabrindo noutros lados.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - Srs. Deputados, qual é o reverso da medalha? É que o Fundo em causa tem responsabilidades assumidas de cerca de 180 milhões de euros. Ou seja: a concretizar-se esta manobra, o Estado contabilizaria uma receita inferior a 110 milhões de euros e assumiria responsabilidades muito superiores.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Não é aceitável!

O Orador: - Contabilisticamente apareceria como positivo; as responsabilidades reais aumentariam.

Aplausos do PS.

Trata-se também de hipotecar o futuro!
Mas, Sr. Presidente, segundo os dados vindos a público, já que a maioria parlamentar tem impedido a ida do Sr. Ministro à Comissão Parlamentar de Economia e Finanças, com a cumplicidade do Dr. Miguel Frasquilho, o Fundo de Pensões da Caixa Geral de Depósitos disporá de 2,5 mil milhões de euros. A sua contabilização permitiria, de uma só parada, ou de uma só "jogada", reduzir formalmente o défice excessivo previsto para os consagrados - e em vias de serem ultrapassados - 3% do Produto Interno Bruto.
E o futuro? Quais são as responsabilidades do Fundo de Pensões da Caixa Geral de Depósitos? Onde registam este novo compromisso do Estado?
Em suma, aqui trata-se, mais uma vez, de hipotecar o futuro!

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Seja qual for o modelo que venha a ser adoptado para a nova fase de alienação do património imobiliário do Estado, há que verificar a contabilização de receitas efectivamente entradas e a assunção, pelo Estado, de compromissos a perder de vista na parte que for arrendada. Creio que um bom gestor faria exactamente isto.
De facto, este Governo ainda não percebeu que há mais mundo para além do défice, este Governo não entendeu ainda algumas coisas na área das finanças públicas: não compreendeu que o que interessa é alterar o equilíbrio, de forma estruturada, entre receitas e despesas; que na área das receitas é necessário, nomeadamente, intensificar, sofisticar e tornar mais eficaz o combate à fraude e à evasão fiscais; que - e isto é essencial - é preciso fazer crescer a economia de forma acelerada, apostando na qualificação das pessoas, na modernização tecnológica, no apoio à inovação, bem como no aperfeiçoamento de métodos e sistemas de gestão.
Sem esse claro entendimento, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a estratégia de "tapa buracos", a estratégia de "remendos" a que este Governo se tem dedicado, merece a nossa mais veemente crítica, a nossa maior apreensão, porque hipoteca o futuro das portuguesas e dos portugueses, de nós e dos nossos filhos, em nome de um sacrossanto défice formal, hoje posto em causa em toda a linha e em toda a parte.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que nos interessa é que se incremente um processo de eficaz e estruturada consolidação das finanças públicas, articulado com um crescimento económico acelerado, de forma a que se desenvolva economicamente Portugal e se possam aplicar políticas sociais justas que aumentem a coesão e a solidariedade entre as portuguesas e os portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção sobre assunto de política relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Viegas.

O Sr. Álvaro Viegas (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Passados que são quatro anos e meio de vigência do QCA III, importa fazer um primeiro balanço da execução do Programa Operacional do Algarve (Proalgarve), enaltecer as principais obras executadas e perspectivar o futuro.
O Proalgarve prevê um investimento total que ascenderá a 733 milhões de euros no período de 2000 a 2006.

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Os projectos, já aprovados e homologados à data de 31 de Agosto deste ano, totalizam cerca de 524 milhões de euros, assim repartidos: 163 milhões de euros no Eixo 1 (projectos de interesse municipal e intermunicipal), 14 milhões de euros no Eixo 2 (acções integradas de base territorial) e 347 milhões no Eixo 3 (intervenções sectoriais desconcentradas).
A execução dos projectos aprovados no programa atingiu, à data de 31 de Agosto, os 348 milhões de euros, assim distribuídos: 118 milhões de euros no Eixo 1; 8,8 milhões de euros no Eixo 2; 221 milhões de euros no Eixo 3.
O nível de realização financeira representa, assim, 66,4% das aprovações do programa e 47,5% do programado até 2006.
No quadro do Proalgarve, já foram aprovados 216 projectos do Eixo 1. Dos 163,3 milhões de euros do investimento elegível aprovado, as maiores parcelas abrangem os projectos relativos ao ambiente, às acessibilidades e à renovação urbana.
Igualmente importante é o investimento em projectos de equipamentos colectivos, que engloba a construção de bibliotecas e centros escolares, e a remodelação e ampliação de equipamentos colectivos já existentes.
Através destes números pode verificar-se uma preocupação crescente dos autarcas algarvios, sem excepção, em preservar o meio ambiente, em requalificar as suas cidades e em facilitar as vias de acesso.
O turismo algarvio, que se encontra hoje perante forte concorrência, deve apostar na diversidade da oferta. Os produtos "sol" e "mar" não chegam para atenuar os efeitos negativos da recessão económica dos países emissores nos últimos anos.
A aposta tem de passar pela qualidade e não pela quantidade e por uma oferta completa, onde, para além do "pacote" tradicional, caibam também o turismo da natureza, o turismo cultural, o turismo arquitectónico, o turismo desportivo e o golfe.
No Eixo 2 do Proalgarve apostou-se nas acções viradas para as áreas da baixa densidade e para a competitividade das cidades.
As acções mais relevantes situam-se a nível do Programa Prolocal, virado para o desenvolvimento e a diversificação económica do interior do Algarve, do Programa Prestígio, destinado a projectos estruturantes de valorização do interior do Algarve, e do Programa Sofia, que incide sobre projectos de redes de inovação e conhecimento.
Reconhecidamente, o Algarve não tem sabido aproveitar as potencialidades inseridas neste Eixo e por isso a sua taxa de execução é francamente reduzida, atendendo às necessidades do interior algarvio, ainda tão carenciado.
Espera-se, contudo, que no próximo QCA as autarquias locais e os restantes beneficiários aproveitam na sua plenitude as acções previstas para cerca de 2/3 do território algarvio.
O Programa Polis, por má programação do governo liderado pelo Partido Socialista, tem sofrido atrasos consideráveis, que todos queremos ultrapassar rapidamente.
O Algarve tem nas suas cidades de Silves e Albufeira dois projectos da mais elevada importância. Enquanto em Silves o Programa Polis tem cumprido, escrupulosamente, o calendário, o de Albufeira tem-se deparado com atrasos que urge recuperar, pois este projecto é estruturante tanto para esta cidade como para o turismo de qualidade de que o Algarve bem necessita.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É da mais elementar justiça enaltecer os dirigentes responsáveis pela gestão do Proalgarve, ou seja, os autarcas e as diversas entidades beneficiárias deste QCA, que, nos últimos anos, têm sabido gerir e potenciar os fundos comunitários colocados à sua disposição.
Só assim é possível o Algarve orgulhar-se de ter investido milhões de euros em estradas, em saneamento básico, no abastecimento de água, na construção de escolas, em parques empresariais, em bibliotecas e em renovação urbana.
Ficam aqui assinalados algumas obras emblemáticas que o Proalgarve apoiou: a circular de São Brás de Alportel; a construção da via V3 em Portimão; o saneamento básico das hortas em Vila Real de Santo António; as bibliotecas municipais de Loulé e de Faro; o pavilhão do Arade; a via dorsal de Armação de Pêra; o centro oceanográfico de Sagres; o ambulatório do Hospital Distrital de Faro; o estádio intermunicipal Faro/Loulé; o porto de abrigo de Albufeira; o mercado abastecedor de Faro; e o projecto Algarve Digital.
Até ao final de 2006, estão previstos apoios aos seguintes projectos: Polis de Albufeira e de Silves; concretização do plano escolar regional a todos os concelhos; intervenção em todas as aldeias do Algarve;…

O Sr. Afonso Candal (PS): - Todas?!…

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O Orador: - … museu do turismo em albufeira; pavilhão multiusos no parque das cidades; bioparque de Monchique; parque industrial de Tavira.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O futuro do Algarve passa pela definição de um plano estratégico regional, associado a um plano financeiro que, em articulação com o Protal, projecte a nossa região.
Para conseguir tal desiderato é necessário que as forças vivas da região se unam no que é essencial e joguem para trás das costas o que é acessório, não valorizando as guerras de "capelinha". A região do Algarve tem de ser pensada como um todo, não pode ser espartilhada. Não é mais possível pensar no seu território concelhio sem articulação com os demais.
O papel da Grande Área Metropolitana do Algarve, liderada por um grande autarca, é o de ser capaz de interpretar este sentimento e este grande objectivo, juntando os 16 concelhos naquilo que for estruturante para a nossa região.
O futuro QCA, com as condicionantes conhecidas pelo facto de o Algarve sair do Objectivo I, terá de ser mais ambicioso e de apostar, decisivamente, na qualificação das nossas cidades, nos recursos humanos e na diversificação da oferta turística.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Só?!…

O Orador: - Por isso, projectos como os pólos tecnológicos de Castro Marim, Faro e Tunes devem avançar, privilegiando as novas tecnologias não poluentes.
A navegabilidade dos rios Arade e Guadiana até Mértola é urgente para permitir uma aposta séria no turismo de cruzeiros. Lisboa é hoje o principal porto de entrada deste tipo de turistas com forte poder económico.
As obras de adaptação no porto de Portimão para atracagem de navios de grande porte e a navegabilidade dos rios Arade e Guadiana permitirão definir uma rota turística de Portimão a Silves e de Vila Real de Santo António até Mértola.
Outra obra essencial para o Algarve, que deverá constar no próximo QCA, é a reformulação do actual traçado da ferrovia. A actual via que atravessa o Algarve não serve os principais pólos urbanos, como Lagoa, Albufeira, Quarteira/Vilamoura, o aeroporto e a universidade.
A opção pela velocidade alta, em contraponto com o TGV, deverá ser assumida de uma vez por todas, por ser menos dispendiosa e mais fácil de executar.
Por último, em sede de revisão do Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (Protal) deve ser assegurado que a aposta no turismo de qualidade será a tónica de todo o processo. A primeira preocupação deve ser a requalificação, e não a autorização sem nexo, do número de camas, que só tem o efeito contrário ao pretendido pelos empresários do sector.
Saibamos nós, algarvios, independentemente da opção político-partidária que cada um tiver, aproveitar as sinergias para potenciar a nossa região.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao orador, tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Viegas: Um pedido de esclarecimento muito breve, porque, no essencial, a sua intervenção limitou-se a reescrever o plano de desenvolvimento traçado por este QCA negociado durante o governo do Partido Socialista. Referiu-se até ao Programa Polis, que, como sabe, esteve completamente paralisado nos últimos dois anos e meio.
Aliás, há outros projectos que estão paralisados, como, por exemplo, a obra do porto de cruzeiros de Portimão, que está por lançar há um ano… Podíamos citar uma infinidade de exemplos, mas, em minha opinião, não é isso o que aqui importa sublinhar a propósito da sua intervenção.
Todos nós, Deputados eleitos pelo círculo do Algarve, recebemos esta semana uma carta das associações empresariais do Algarve - da Associação do Comércio e Serviços da Região do Algarve (ACRAL) da -Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), da Associação dos Industriais Hoteleiros e Similares do Algarve (AHISA), da Confederação dos Empresários do Algarve (CEAL) da Associação Empresarial da Região do Algarve (NERA) - sobre a questão das portagens na Via do Infante, considerando que a eventual introdução de portagens implica em diminuição de produtividade e de competitividade, sendo uma penalização injusta para o Algarve.
Sr. Deputado, uma vez que, presumo, fez uma intervenção em nome dos Deputados do PSD eleitos pelo círculo do Algarve, quero saber qual é a posição dos Deputados do PSD sobre a anunciada intenção de fixação de portagens na Via do Infante.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Viegas.

O Sr. Álvaro Viegas (PSD): - Sr. Presidente e Sr. Deputado, e meu amigo, José Apolinário: em relação ao Programa Polis, obviamente que o senhor não avançou nessa temática porque sabe, tão bem como eu, em que situação este Governo encontrou a execução desse programa.
Na verdade, devido à má programação do Partido Socialista, os atrasos que nele se verificaram a nível nacional - em Albufeira o atraso é inferior a um ano - comprometeram a sua boa execução. Se os senhores tivesse feito bem o vosso "trabalho de casa", com certeza que o Programa Polis teria avançado e estaria a cumprir o cronograma e as suas datas.

O Sr. José Apolinário (PS): - E as portagens?

O Orador: - Já lá vou!
Em relação aos outros projectos de que falou, quero dizer-lhe que, quanto às questões para as quais se pretende um consenso regional com vista à sua inclusão no próximo QCA, não existiam - e eu sei-o, dadas as minhas funções na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento do Algarve (CCDR) - quaisquer projectos para aquilo a que o senhor chamou turismo de cruzeiro.

O Sr. José Apolinário (PS): - Isso não é verdade!

O Orador: - O que existe é uma intenção, que se pretende incluir no plano estratégico regional, que vai servir de base ao próximo QCA, em articulação com o Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (PROTAL).

O Sr. José Apolinário (PS): - Isso não é verdade! Mas, e as portagens?!…

O Orador: - Por último, em relação às portagens, o senhor mesmo disse que é uma anunciada intenção. Portanto, não devemos falar ainda de anunciadas intenções, porque também está anunciada a intenção de efectuar uma discriminação positiva para os residentes no Algarve em todas as áreas onde existem estas SCUT.
Sr. Deputado, não precipitemos o debate e não tenha dúvidas de que o PSD saberá, na devida altura, dar a resposta certa a essa temática.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 15 horas e 40 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia da sessão de hoje é a aprovação do relatório do Provedor de Justiça 2002/2003.
O relatório sobre esta matéria, preparado na 1.ª Comissão, é da autoria da Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, que não vejo presente na sala e a quem, portanto, não posso dar a palavra para fazer a sua apresentação.
O primeiro orador inscrito é o Sr. Deputado Francisco Louçã. Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, também eu lamento que o relatório da 1.ª Comissão não possa ser apresentado, por circunstâncias certamente justificáveis, até porque, tratando-se de uma matéria não polémica - é a apreciação de um relatório - merecia que fossem destacados preliminarmente os seus aspectos mais importantes.
Em qualquer caso, sublinho que este relatório representava, em alguma medida, o trabalho conclusivo do primeiro mandato do Provedor de Justiça e que o mesmo Provedor foi reeleito para o seu cargo por grande maioria desta Assembleia, o que certamente exprime apreço pelo trabalho a que se dedicou e que, em alguma medida, está bem representado por este relatório.

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O Provedor preocupou-se não só em fazer um levantamento de todo o seu trabalho como indicou algumas das suas prioridades: a visita aos 55 estabelecimentos prisionais do País e propostas para a revisão do sistema prisional; a sua preocupação com a acessibilidade dos deficientes aos edifícios públicos e ao edificado em geral; a sua crítica à morosidade administrativa; a sua preocupação com o fisco. Aliás, ainda há poucos dias veio a público invectivar o Governo e o Estado pela falta de publicação dos indicadores técnico-científicos, que são um dos instrumentos mais poderosos e uma das faltas mais graves na nossa capacidade de combater a fuga ao fisco.
O relatório, no entanto, trata de algumas outras matérias. Sublinha, por exemplo, que não há ainda uma conveniente cooperação de todas as instituições do Estado com o funcionamento da Provedoria, dando o exemplo de câmaras municipais, na Região Autónoma da Madeira (página 25 e 129), que não satisfazem as necessidades de informação da Provedoria da Justiça, mas, sobretudo, concentra-se em algumas injustiças importantes em Portugal. E é de uma delas - que, aliás, já foi tratada aqui, em declaração política que abriu esta sessão - que queria também voltar a tratar.
Ontem mesmo, o Provedor emitiu uma nota em que dava conta de que se tinha dirigido ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras para sublinhar que esse serviço tinha de passar a informar quem ocorresse ao seu serviço que se poderia acompanhar de advogado e que devia, aliás, ter prova escrita de que essa informação tinha sido dada, visto que, naturalmente, o Provedor registava demasiados abusos neste capítulo.
Sublinha também o relatório, no mesmo sentido, que a obtenção da nacionalidade é excessivamente morosa, passa por práticas ilegais e inaceitáveis e dá-nos um exemplo extraordinário na página 771. Diz o Provedor: "Lembro a demora de dois anos ocorrida numa simples emissão de segunda via do documento titulando a autorização de residência. Assim, uma eventual vantagem para a pessoa foi administrativamente transformada em penalização por largo período de tempo."
Este tipo de advertências, de intervenção, de avisos e de preocupação regista-se em todo este relatório e é talvez um dos valores mais importantes que ele tem para trazer à Assembleia da República: um debate sobre a política administrativa, sobre a transparência da acção pública, sobre a responsabilidade dos serviços públicos e sobre a correcção de injustiças fundamentais.
Por isso, saudamos o relatório e o trabalho do Provedor, registando que ele marca algumas das medidas mais importantes que a agenda da Assembleia da República deve vir a consagrar nos próximos meses.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Isilda Pegado.

A Sr.ª Isilda Pegado (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Foram presentes a esta Assembleia os relatórios de actividades do Provedor de Justiça referentes aos anos de 2002 e de 2003, cuja apreciação nos cabe hoje fazer.
Em sede de 1.ª Comissão, foi elaborado um relatório, cujo mérito há que realçar, louvar e nomear a sua relatora, Deputada Maria de Belém. A forma exaustiva como são tratados os dados nesta peça do processo parlamentar libertam-nos para outros considerandos.
Feita esta introdução, são quatro as reflexões que gostaríamos de deixar em face das actividades relatadas pelo Provedor de Justiça.
A primeira refere-se ao instituto do Provedor de Justiça, cuja génese, em Portugal, se reporta há menos de 30 anos e que, graças ao caminho trilhado por muitos dos que por ali passaram, isto é, trabalharam e trabalham, ganhou foros de legitimidade e eficácia que resultam, mais do que da letra da lei, do serviço de facto prestado à comunidade que serve.
Não sendo uma comparação, cabe aqui referir o "homem bom da terra" que brotava da realidade social e, por isso, tinha credibilidade e capacidade reguladora de conflitos sociais. Não é um saudosismo esta nossa referência mas, antes, a adequação à realidade, que importa afirmar. A razão é a mesma. Há uma legitimidade que não deriva do ser mas do agir e do fazer.
O Provedor de Justiça, fiei às linhas mestras da instituição - defesa dos direitos e da legalidade, agilidade, informalidade, resposta oportuna -, tem sido, ao longo destes anos, merecedor de créditos públicos por parte de quem o procura e, em grande medida, por parte de quem o ouve.
Os relatórios de 2002 e de 2003 são a prova cabal desta eficácia e desta resposta, que, embora numa estrutura em permanente mutação, é também ela própria desejosa de melhor servir.
Podemos mesmo dizer que, apesar de importado dos ordenamentos jurídicos do norte da Europa, o Provedor da Justiça, em Portugal, tem encontrado formas de se adaptar e adequar à realidade nacional em prol da justiça e do bem comum. Isto é, ganhou corpo e estatuto.

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A segunda reflexão prende-se com a actividade expressa nestes dois relatórios, que são, necessariamente, fruto do Provedor que esta Câmara elegeu e que, em vias de terminar mandato, dá a conhecer a atenção prestada ao cargo, a capacidade de inovar e a dinâmica introduzida numa equipa que dirige com graus de exigência científica muito elevados e, simultaneamente, com jovialidade e respeito pelos poderes instituídos no ordenamento jurídico português.
É talvez uma banalidade falar dos vícios que a burocracia da administração central e local criam e o entorpeço que geram na vida dos cidadãos, mas digo-o para confronto com o muito arrojo, a sageza e a eficácia que vemos plasmados nas recomendações e pareceres carreados para estes relatórios.
Não posso deixar de referir o deleite jurídico com que li muitos dos pareceres que informaram tomadas de posição do Provedor de Justiça junto da administração ou de institutos. É, de facto, um gosto. O trabalho sério, científico e fundamentado que ali encontro é, seguramente, o melhor passaporte para a eficácia de um órgão que não tem poder executivo mas vê executado muito daquilo que recomenda.
Num tempo em que o publicado ou publicitado parece marcar o ritmo de vida, encontrar quem, de uma forma discreta ou até silenciosa, contribui para a felicidade de injustiçados e para a reposição da legalidade é, de facto, uma lufada de ar fresco.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O terceiro apontamento prende-se com a estrutura humana e logística que nos é apresentada nestes relatórios.
A Provedoria tem um orçamento anual de apenas 4,5 milhões euros, destinado em larga medida ao custo de recursos humanos. Os cerca de 120 funcionários - em que mais de 60% têm grau académico correspondente a licenciatura e se situam na faixa etária dos 30 aos 40 anos - produzem um trabalho que está plasmado nos milhares de páginas destes dois relatórios e que me escuso de adjectivar.
De facto, ressalta uma eficácia e agilidade da própria estrutura interna da Provedoria que importa realçar numa época em que a reforma da Administração Pública e da sua máquina é um imperativo nacional. Há que olhar para os bons exemplos.
O quarto e último apontamento que tenho para fazer dirige-se à relação entre a sociedade e o Provedor de Justiça, que, de uma forma viva, transparece nas páginas dos relatórios já referidos e que ficou clara na audição, em sede de Comissão, do Sr. Provedor de Justiça, Dr. Nascimento Rodrigues.
Por um lado, ressalta que os conflitos e questões submetidos ao Provedor de Justiça são, em larga medida, emergentes de direitos individuais e, necessariamente, têm um tratamento na esfera desses mesmos direitos individuais e mediante factos concretos.
Este realismo de um "eu" ou de um "tu" de cada relatório, recomendação, censura, reparo ou sugestão contrasta com comportamentos eivados de abstracção e que dificilmente dão resposta ao homem.
Tenho para mim que, estruturalmente, o fenómeno humano é o fenómeno do "eu" e do "tu" e que, no entanto, é um fenómeno que pode ser de tal maneira forte que se torna polarizador do universo. Mas quando se sai desta dimensão para o homem concebido abstractamente, cai-se numa ilusão, porque é com nós mesmos e com as nossas exigências que é preciso viver. Esta é também uma mais-valia do Provedor de Justiça.
Daqui resulta com mais clareza as dificuldades tantas vezes sentidas pelo Provedor de Justiça quando o projecto de resolução, parecer ou recomendação que leva em mão encontra pela frente um ente abstracto que recusa uma resposta, escondendo-se numa estrutura ou até mesmo na natureza jurídica do Provedor da Justiça. De facto, traz-se à colação o estatuto do Provedor da Justiça emergente da lei que o cria e regula, isto é, claramente informal, com meios de acção que não usam o mandato injuntivo e que apenas aguarda a resposta fundamentada e no prazo legal daqueles a quem se dirige.
Será suficiente? Carece o Provedor de Justiça de mais instrumentos? Não quero dar respostas, mas apenas deixar as perguntas.
Como já referi, a actividade do Provedor de Justiça, que se salda como largamente positiva, atenta a matéria constante dos relatórios, cria por si só uma legitimidade que lhe advém da acção e que é corroborada pelo aumento do número de casos que lhe são presentes.
Essa legitimidade, plasmada na diminuição das pendências, na diminuição do prazo médio de instrução e na diminuição dos processos de longa duração, traz à mente uma conclusão que cabe ressaltar: os números escritos nos relatórios falam por si, sendo que são também estes os objectivos que o Sr. Provedor de Justiça se propôs levar a cabo no seu mandato.
Para terminar, quero dizer que foi minha intenção clara não analisar números que expressam oscilações em determinados sectores por, no nosso modesto entender, ser a variação anual insuficiente para

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mais apuradas conclusões, atentas as conjunturas que seguramente explicam muitas destas variantes. Esse é o trabalho sociológico e político que outros farão.
À política e, neste caso, à Assembleia da República, que o elegeu e tem o dever e o direito de apreciar o trabalho do seu eleito, cabe agora uma palavra de verificação de pressupostos, cumprimento de objectivos e adequação e - por que não? - de estímulo para um trabalho que é seguramente de uma instituição mas é também parte de um Estado capaz de servir a comunidade, as relações entre as pessoas e entre estas e o poder, enfim, um Estado que sirva o homem.
A subida a Plenário destes relatórios, mais do que o cumprimento de um formalismo, é a dignidade do Provedor de Justiça, instituição que queremos valorizar e reconhecer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Correia.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A figura do Provedor de Justiça ganhou, ao longo dos anos, cada vez mais consistência e dignidade e afirmou-se definitivamente na consciência colectiva dos cidadãos.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Estes, desde sempre ávidos de uma justiça célere e transparente, querem exercer o direito a serem ouvidos e a terem a sua voz - o "povo a falar em voz alta", que era como definia a Provedoria da Justiça um dos seus brilhantes representantes, o Dr. Mário Raposo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

A Oradora: - Não se limitando a ser uma "caixa de correio" das queixas dos cidadãos, a Provedoria tem-nas feito investigar, inquirir, apreciar, aconselhar, recomendar, isto é, a Provedoria tem exercido, dentro das suas atribuições e competências, a defesa dos direitos, liberdades, garantias e interesses legítimos dos cidadãos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A apresentação nesta Assembleia, para apreciação em Plenário, dos relatórios do Provedor de Justiça sobre a actividade deste órgão do Estado nos anos de 2002 e 2003 é um facto que nos merece uma viva saudação.
É que nunca é demais afirmar e mostrar que a inserção constitucional do Provedor de Justiça na parte geral dos direitos fundamentais mostra claramente que ele é, essencialmente, um órgão independente, garante daqueles direitos e um órgão de garantia da Constituição da República.
Com efeito, a Lei Fundamental consagra expressamente a figura do Provedor de Justiça como um órgão independente, cujo titular é designado pela Assembleia da República pelo tempo que a lei determinar, não podendo as suas funções cessar antes do termo desse período, salvo nos casos previstos na lei.
A actividade do Provedor pode ser desencadeada pelas queixas que os cidadãos lhe dirijam ou no exercício de um particular direito de petição. No entanto, nada impede, em termos constitucionais, que o Provedor de Justiça se ocupe de questões de que tenha conhecimento por outros meios que não sejam a queixa directa.
Para além da apreciação das queixas contra a actuação dos diversos poderes, por actos e omissões, ao Provedor compete ainda assinalar as deficiências de legislação, emitindo recomendações para a sua interpretação, alteração ou revogação, ou sugestões para a elaboração de nova legislação.
A apresentação e a apreciação destes dois relatórios do Provedor de Justiça conduz-nos a algumas constatações que são significativas e que aqui importa ressaltar.
Os relatórios descrevem, nos termos do Estatuto do Provedor de Justiça, as iniciativas tomadas, as queixas recebidas, as diligências efectuadas, os resultados obtidos, para além de um balanço final de mandato.
É constituído por uma introdução e quatro partes - actividade processual, outras actividades, gestão e atendimento (dados estatísticos) e índices das recomendações.
O Provedor faz o balanço das actividades desenvolvidas, dos objectivos traçados e assinala as alterações introduzidas no que respeita aos critérios de referência e de organização de processos.
Assim, é de assinalar, em termos gerais: a referência ao número exacto de reclamantes e não só a indicação do número de processos organizados, bem como os dados conexos e o fim da distinção entre processos principais e processos apensos que se verificava pelo menos desde 1992, o que evita

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empolamentos circunstanciais no volume anual de queixas recebidas. Isto significa que se for recebida queixa com o mesmo objecto de processo que esteja pendente não há lugar à abertura de novo processo, incorporando-se a queixa no mesmo, a exemplo do procedimento do Tribunal Constitucional.
As entradas de maior número de processos verificam-se nas áreas 2 (Assuntos financeiros e economia, direitos dos consumidores) e 5 (Assuntos judiciários, segurança interna e trânsito, registos e notariado).
Ao contrário do era tradicional, não tiveram o maior volume de queixas as áreas 3 (Assuntos sociais, segurança social, direito do trabalho, saúde, menores, idosos e deficientes) e 4 (Assuntos de organização administrativa e função pública).
Verificou-se, ainda, diminuição dos processos pendentes, o que possibilitou a actuação do Provedor de Justiça em iniciativas de interesse geral, como a inspecção feita a estabelecimentos prisionais, outra inspecção a todos os lares de idosos da Região Autónoma dos Açores e, ainda, a hospitais psiquiátricos, atendimento nos hospitais e ao cumprimento do Decreto-Lei n.º 123/97, de 22 de Maio, sobre acessibilidades arquitectónicas a deficientes.
Constata-se ainda nos relatórios que a esmagadora maioria dos reclamantes é constituída por pessoas singulares. Os reclamantes masculinos são em maior número relativamente aos femininos, facto curioso que talvez mereça um estudo aprofundado.
Os distritos com maior número de queixas são Lisboa, Porto e Setúbal, havendo um acréscimo de queixas apurado na Região Autónoma da Madeira e um decréscimo na Região Autónoma dos Açores.
Há um forte aumento de queixas referentes a processos de aquisição ou requisição de nacionalidade, processos extremamente morosos.
Os ministérios mais visados foram os das Finanças, da Justiça e da Administração Interna, em detrimento do da Educação, como era tradicional.
Os municípios mais visados foram os de Lisboa, Cascais, Porto e Almada.
Relativamente a outras actividades, os relatórios procedem à análise de diversos serviços, nomeadamente, "Linha Verde", "Recados da Criança" e linha "Cidadão Idoso". A primeira destina-se a acolher as queixas relativas a menores em situação de risco, transmitidas pelos próprios ou por adultos em seu nome.
Sr.as e Srs. Deputados, quando vemos casos horríveis e tenebrosos como o do possível assassinato, por familiares, da pequena Joana, de 8 anos, verificamos como por vezes as nossas crianças estão vergonhosamente desprotegidas e sujeitas à violência de energúmenos.
A linha "Cidadão Idoso" tem por objectivo divulgar junto das pessoas idosas informações sobre os seus direitos.
É, ainda, de aplaudir o esforço feito pelo Sr. Provedor no sentido de diminuir o número de processos pendentes, a duração da instrução e a conclusão dos processos de longa pendência.
Para terminar, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de dizer que, 30 anos depois da introdução da figura do Provedor de Justiça em Portugal, esta é hoje uma instituição consagrada na Constituição e consolidada na opinião pública. Os cidadãos esperam dele que continue a significar o exercício real e efectivo de uma instância de recurso institucional e que se imponha como instrumento de realização ética da democracia.
Há ainda um longo caminho a percorrer pela Provedoria, nomeadamente nas áreas da imigração, do ambiente e de uma certa pedagogia a que é preciso dar mais visibilidade. Enfim, ainda há caminhos que precisam de ser percorridos porque a democracia necessita sempre de ser aprofundada. As actividades vertidas nos relatórios em apreciação significam passos nesse sentido. Passos seguros e sérios e, portanto, credores da consideração positiva do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que saúda o Sr. Provedor pelo trabalho realizado e pela sua recente reeleição.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na esteira do relatório da 1.ª Comissão sobre esta matéria, subscrito, e bem, pela Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, referindo-se embora aos relatórios relativos aos anos 2002 e 2003, vamos ater-nos sobretudo a este último, sem prejuízo, naturalmente, da devida ligação, sempre que tal se afigure necessário.
A primeira constatação é a de que, em 2003, foram apresentadas 14 140 queixas, que deram origem a mais de 5000 processos, queixas essas relacionadas essencialmente com fiscalidade, concessão de nacionalidade, segurança social, função pública, urbanismo e ambiente.

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As entidades mais visadas foram, desde logo, a administração central, com 52% das queixas, e a administração local, com 16%, sendo certo que se verifica uma tendência, que se vem notando ao longo dos anos, de diminuição do número de queixas apresentadas contra a administração central, a par de um acréscimo das queixas apresentadas contra a administração local.
Em 2003, forma concluídos 5676 processos, dos quais 86% demoraram menos de um ano a ser analisados pela Provedoria- e estes prazos parecem-nos, de facto, importantes -, 72% menos de seis meses e 49% menos de 30 dias.
Registam-se algumas alterações interessantes, e que aqui já foram referidas, designadamente quanto à organização dos processos e também quanto à clareza da leitura dos elementos fornecidos no próprio relatório.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Assim, à Assembleia da República é agora dada informação quanto ao exacto número de pessoas e entidades que se dirigem à Provedoria e não só quanto ao número de processos. Casos há, como é bom de ver, em que um abaixo-assinado, subscrito, por exemplo, por 30, 50 ou 100 pessoas, dá origem a um processo. Portanto, convém que a leitura nos permita fazer essa diferenciação.
Houve mudanças no critério de organização dos processos: acabou-se com a distinção entre processos principais e apensos. Assim, uma queixa que seja apresentada com o mesmo conteúdo de uma anterior será incorporada no processo já existente, evitando-se, portanto, um empolamento artificial do número de processos.
A maioria dos processos de reclamação são relativos a matérias relacionadas com a administração fiscal, o que tem por motivo próximo a extinção do cargo de Defensor do Contribuinte, que, de resto, também é matéria bem esclarecida no relatório.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Outra grande fonte de queixa relaciona-se com atrasos na concessão de pedidos de nacionalidade portuguesa, sobretudo oriundos de cidadãos do ex-Estado português da Índia.
Cabe aqui uma referência e uma palavra de apreço, dirigida ao Sr. Provedor e aos respectivos serviços, pela diminuição do número de processos pendentes, o que, de resto, também já foi referido.
De facto, enquanto, em fins de 2002, eram mais de 7000 os processos pendentes, nos finais de 2003, esse número baixou para pouco mais de 3300, número este que baixa ainda mais, para 2500, se apenas tivermos em conta processos principais.
Estes resultados de uma actuação pronta e expedita são uma condição essencial de eficácia e de credibilidade e representam, afinal, um contributo importantíssimo para a resolução de problemas e para a regularização de situações.
Uma palavra de apreço, ainda, pela particular preocupação do Sr. Provedor com o bom funcionamento do nosso sistema prisional e que se traduz, além do mais, em inúmeras visitas aos estabelecimentos prisionais e inúmeros pareceres que foram elaborados sobre a matéria.
Não deixo de referir, pela sua importância, a estruturação, o aprofundamento, o desenvolvimento dos serviços da Provedoria mediante uma política de recursos humanos bem delineada e concretizada.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Um cumprimento final ao Sr. Provedor, que, com os relatórios ora em apreciação, cumpre não só um preceito legal mas também nos dá conta, de forma cabal e clara, de uma actividade intensa, necessária e altamente meritória, sem que daí se possam tirar outras ilações, ao contrário do que já se pretendeu fazer nesta Câmara, que são despropositadas e ilegítimas.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, para uma intervenção.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes consideram que estes relatórios do Sr. Provedor de Justiça, relativos aos anos de 2002 e 2003, que estamos a analisar, constituem uma peça preciosa para o conhecimento e a análise dos problemas concretos que afectam os cidadãos no seu dia-a-dia.

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Estes relatórios concentram a voz dos cidadãos contendo as inúmeras queixas e os inúmeros processos que chegam à Provedoria de Justiça, a qual, para além de dar-lhes seguimento, no desígnio de assegurar e garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, cria um instrumento importante, consubstanciado neste relatório, que concentra essas denúncias, essas preocupações e, também, um considerável conjunto de recomendações relativamente às mesmas.
Na perspectiva de Os Verdes, estes relatórios retratam bem deficiências legislativas, deficiências na aplicação da lei e, também, insuficiências de meios no que toca a serviços essenciais para garantir direitos fundamentais dos cidadãos.
A este propósito e a título de exemplo, entre tantos outros, indico a recomendação relativamente à alteração da legislação sobre avaliação de impacte ambiental no sentido de permitir a avaliação dos efeitos cumulativos dos projectos em análise; a dificuldade na aplicação da lei do ruído; as carências na fiscalização do domínio hídrico, muito insuficiente, revelando muito bem a importância da existência de um corpo de guarda-rios; a crónica falta de médicos nos centros de saúde e um número significativo de população sem médico de família, numa profunda desigualdade no acesso a cuidados médicos; as más condições, aqui retratadas, dos estabelecimentos públicos de saúde; a questão das taxas moderadoras, também aqui reveladas, da forma como são indicadas, como um obstáculo no acesso à saúde, quando nomeadamente é recomendado o alargamento da isenção das taxas moderadoras dos 12 anos para os 16 anos relativamente às nossas crianças; as carências na educação especial aos alunos com necessidades educativas especiais, que necessitam de apoio pedagógico, e, ainda na área da educação, a forma como foram beneficiadas escolas privadas, devido à prática conhecida da fraude no ensino recorrente; a prática de discriminação das mulheres no emprego, no que se refere à protecção da maternidade.
Foram estes alguns exemplos aqui bem retratados, entre, como referi, muitos outros que poderia ter aqui enunciado.
Gostava ainda de realçar uma preocupação expressa neste relatório, que se prende com uma relação pouco directa e pouco respeitadora da Administração em relação aos cidadãos. O Sr. Provedor de Justiça retrata bem este problema em muitos dos subcapítulos apresentados, quando fala na falta de respostas atempadas da Administração Pública a pedidos de informação dos cidadãos, quando fala mesmo da ausência de respostas a reclamações apresentadas pelos utentes nos estabelecimentos de saúde ou até quando fala nas demoras inaceitáveis na correcção de erros nos serviços em matéria de justiça tributária e na incapacidade de prestar, de forma atempada e correcta, informação aos contribuintes.
Para além disso, este relatório retrata uma realidade para a qual temos chamado a atenção por diversas vezes neste Plenário, que tem a ver com uma preocupação de carência de participação e de informação dos cidadãos em relação aos processos decisórios. Isso é aqui bem retratado relativamente à decisão e localização de grandes obras públicas, das quais, em termos concretos, também temos trazido aqui muitos exemplos.
Para terminar, refiro que muitas das questões sublinhadas neste relatório chegam com regularidade à Assembleia da República e são aqui denunciadas pelos grupos parlamentares mas, infelizmente, muito pouco atendidas em muitas das matérias que são também da responsabilidade directa do Governo.
A questão coloca-se quando, de relatório em relatório, os problemas se mantêm, e sem perspectivas de resolução, designadamente por falta de vontade política.
Dizia a Sr.ª Deputada do PSD que foram cumpridos os objectivos da Provedoria de Justiça em relação ao relatório aqui apresentado e que poderiam também, "por que não", constituir um estímulo relativamente à acção. Penso que o "por que não" deveria ser retirado e que o cumprimento desses objectivos deveria mesmo constituir um estímulo à acção.
Consideramos, portanto, que este relatório é um instrumento importante. E também deixamos aqui um recado: um governo que olhe primeiro para as pessoas, como todos os governos gostam de apregoar, tem de conseguir ultrapassar muitas destas deficiências, acaso fosse essa a vontade de um governo.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, a primeira palavra que quero deixar é de saudação e de felicitação ao actual titular do cargo de Provedor de Justiça, Dr. Henrique Nascimento Rodrigues, pela forma exemplar como tem exercido as funções de Provedor de Justiça e dignificado esse cargo. Esta saudação é extensiva aos provedores adjuntos e, em geral, aos assessores e demais colaboradores da Provedoria de Justiça.
Embora corresponda a um imperativo legal a apresentação por parte do Provedor de Justiça de um relatório anual à Assembleia da República, este relatório do Provedor de Justiça transcende muito o cumprimento desse imperativo legal, estando nós perante um relatório notável acerca da actividade da Provedoria

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de Justiça, que importa registar. De facto, importa registar o cuidado e a minúcia com que estes relatórios têm vindo a ser apresentados.
Trata-se, neste caso, de um relatório que reflecte, de forma pormenorizada, toda a actividade desenvolvida pela Provedoria de Justiça, mas, mais do que isso, os principais estrangulamentos da actividade administrativa e, fundamentalmente, as principais razões de queixa dos cidadãos relativamente à actuação da Administração Pública.
Daí ser um instrumento muito precioso de avaliação política do funcionamento e das disfunções da Administração.
É de salientar que estes relatórios têm vindo a ser aperfeiçoados ao longo dos anos, permitindo esse aperfeiçoamento uma visão mais rigorosa da realidade administrativa. Designadamente, o relatório relativo a 2003 permite, pela primeira vez, apurar o número de cidadãos que individualmente se queixaram à Provedoria de Justiça. Assim, já não estamos apenas perante dados relativos ao número de processos, mas é também possível saber, através da minúcia com que é elaborado este relatório, além de quantos processos deram entrada na Provedoria de Justiça, quantos cidadãos, sendo signatários das queixas apresentadas e dos processos abertos, se queixaram, o que nos dá o número impressivo de 14 140 reclamantes à Provedoria de Justiça, no ano de 2003.
É de salientar um dado importante que resulta deste relatório: a redução da pendência processual e a redução do tempo médio de duração dos processos na Provedoria de Justiça.
O Sr. Provedor de Justiça adoptou - e, a nosso ver, bem - a prioridade de instruir os processos relativos às queixas apresentadas pelos cidadãos em detrimento da acção por iniciativa própria do Provedor, o que não significa que essa acção não tenha sido desenvolvida.
É importante, do nosso ponto de vista, a prioridade dada aos cidadãos - o Provedor de Justiça existe precisamente para os cidadãos, para eles poderem reclamar, para eles poderem queixar-se, para obterem uma resposta em tempo útil às suas queixas -, sendo por isso meritória a prioridade dada à resolução desse tipo de processos.
No entanto, também não podemos deixar de salientar a iniciativa própria do Provedor de Justiça relativamente a alguns dossiers. E aqui é justo salientar o cuidado com que os últimos provedores de justiça têm tratado o problema do sistema prisional em Portugal. Foi uma prática iniciada pelo anterior Provedor, Dr. Meneres Pimentel, que fez o primeiro estudo pormenorizado sobre o sistema prisional português, trabalho esse exemplarmente prosseguido pelo Dr. Nascimento Rodrigues, através da publicação do segundo relatório sobre as prisões portuguesas. De facto, importa salientar esse levantamento exaustivo de todos os problemas existentes ao nível do sistema prisional.
Este relatório de 2003, tal como, aliás, aconteceu com os anteriores, não dá uma imagem lisonjeira da Administração Pública, embora também não dê uma imagem catastrófica e saliente - e bem - alguns aspectos que têm melhorado, designadamente ao nível do relacionamento com o Provedor e da resposta dada à actuação do Provedor de Justiça, isto é, da colaboração que a Administração Pública dispensa ao Provedor de Justiça.
É significativo o número de reclamantes - 14 000 reclamantes é um universo considerável -, o que quer dizer que ainda existem muitas razões de queixa. E, embora obviamente não signifique que todos os reclamantes têm razão, significa que existem razões de queixa em muitos sectores da Administração Pública que afectam muitos cidadãos, que há um reconhecimento maior por parte dos cidadãos da actividade do Provedor de Justiça e que a Provedoria é uma instância para a qual vale a pena recorrer quando um cidadão precisa de protecção perante uma determinada actuação da Administração Pública.
É também significativo que a esmagadora maioria destes 14 000 cidadãos sejam pessoas singulares e que, como refere o próprio relatório, os direitos individuais alegadamente infringidos pelos poderes públicos constituam o miolo do recurso ao Provedor de Justiça.
Efectivamente, é para isso que o Provedor existe. É importante que os cidadãos reclamem, é importante que o Provedor de Justiça possa responder em tempo útil a essa solicitações e é importante, depois, que a Administração Pública possa melhorar a sua actuação, por forma não apenas a corresponder, célere e satisfatoriamente, às recomendações feitas pelo Provedor, mas fundamentalmente a resolver os problemas concretos dos cidadãos que são objecto dessas queixas.
Ora, é importante registar as melhorias conseguidas, mas é também importante continuar a melhorar a capacidade de resposta da Administração Pública às recomendações do Provedor de Justiça, em relação ao que o relatório salienta haver ainda aspectos que importa melhorar.
Uma palavra final relativamente à Assembleia da República. Estamos, em Setembro de 2004, a apreciar o relatório do ano de 2003, o que não é intempestivo, dado que o relatório se refere ao ano transacto. Portanto, é importante que no ano seguinte, neste caso em 2004, estejamos a discutir o relatório de 2003, depois de a 1.ª Comissão ter podido analisar, de uma forma mais exaustiva do que aqui em Plenário, este

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relatório do Provedor, tendo sido elaborado um relatório pela Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira. Parece-nos, pois, que a Assembleia tratou o relatório de 2003 de uma forma adequada.
Pena é que estejamos também a discutir o relatório de 2002, o que significa que, no ano passado, houve uma omissão por parte da Assembleia da República que importaria não repetir em anos seguintes.
Seria ainda importante anotarmos que temos o dever de, no ano de 2005, nos pronunciarmos sobre o relatório que o Provedor de Justiça venha a apresentar relativamente ao ano de 2004. Fazendo nós votos para que a Administração Pública melhore a sua celeridade na resposta às recomendações do Provedor de Justiça, seria bom que a Assembleia da República usasse da celeridade necessária para apreciar no ano seguinte o relatório relativo ao ano transacto.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

O Orador: - Também nos parece que deveria ser dada uma atenção especial às recomendações que o Provedor de Justiça formula à Assembleia da República. É evidente que isso está dependente de uma iniciativa legislativa - qualquer grupo parlamentar pode e deve tomar a iniciativa legislativa naquilo que entender relativamente às recomendações do Provedor de Justiça -, mas talvez fosse bom que pudesse haver, por parte da Câmara no seu conjunto, uma atenção especialmente dirigida a cada recomendação que o Provedor apresenta a esta Assembleia.

Vozes do PCP e do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de passarmos ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, quero congratular-me com o debate que acabou de ter lugar.
É com muita satisfação que transmitirei ao Sr. Provedor de Justiça, de imediato, e sem prejuízo do conhecimento que ele terá do debate através da leitura do Diário da Assembleia da República, as referências favoráveis e até mesmo elogiosas que foram feitas por todas as bancadas à sua actuação.
O Sr. Provedor Nascimento Rodrigues mereceu bem a sua reeleição, por exercer com absoluta independência a sua alta magistratura.
Anoto também a referência feita pelo Sr. Deputado António Filipe ao agendamento da apreciação dos relatórios do Provedor de Justiça, tendo ainda o Sr. Deputado sublinhado que este ano estamos a pôr em dia o nosso trabalho. Espero que o mesmo aconteça no próximo ano, pois é um bom princípio que a Assembleia da República cumpra todas as suas obrigações em devido tempo.
Srs. Deputados, o ponto seguinte da ordem de trabalhos consta da apreciação do relatório e conta de gerência da Assembleia da República relativo a 2002.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.

O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, sobe hoje para apreciação em Plenário o relatório e conta de gerência da Assembleia da República no que respeita ao ano de 2002.
Em termos administrativos e financeiros, a Assembleia da República é um organismo autónomo, e decorrente disso mesmo tem uma conta que, por exigências normativas, sobe à Câmara após o respectivo visto do Tribunal de Contas.
Desde logo, importa dizer que a conta de 2002, decorrente do último acto eleitoral legislativo, tem duas gerências responsáveis: a gerência do anterior Conselho de Administração, durante o início do ano, e a gerência posterior a 10 de Abril, decorrente da eleição do novo Conselho.
Importa referir a apreciação que o Tribunal de Contas faz a essa conta de gerência.
A apreciação que faz, minuciosa nalguns aspectos, por amostra noutros, salienta uma avaliação global positiva, dando apenas conta de quatro pequenas deficiências, mas importa dizer - e isso o Tribunal de Contas também o faz - que estão totalmente reparadas, em resultado de uma decisão tomada em 2004 por esta Assembleia, pese embora ainda irem provocar impacto na conta de 2003.
Importa, pois, salientar que as únicas deficiências que o Tribunal de Contas aponta são pelo próprio Tribunal reconhecidas como tendo sido já ultrapassadas, referindo-se a matérias constantes da Resolução n.º 4/2004.
Em segundo lugar, refiro a adequação plena da conta ao orçamento apresentado. A execução orçamental adequou-se à proposta e posterior aprovação do orçamento da Assembleia da República. Importa até dizer que os acréscimos relativamente ao ano anterior foram bastante superiores em termos de receita do que em termos de despesa.
Deste rigor a Assembleia já teve conhecimento, mas, nesta altura, Sr. Presidente, importa referir e alertar o Plenário para as decisões que este toma, quer no respeitante à sua actuação enquanto Assembleia

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da República stricto sensu, quer quanto aos organismos autónomos que constam da conta da Assembleia mas que têm autonomia nas competências que a lei lhes fixou.
De facto, muitas vezes o Plenário talvez não dê a devida atenção aos impactos financeiros que qualquer decisão da Assembleia tem nela própria ou nos organismos autónomos que a Assembleia enquadra em termos financeiros. Por isso, muitas vezes o orçamento tem de conter algumas exigências que os organismos autónomos dizem que a lei os obriga a tomar.
Trata-se de uma matéria que justificaria uma reflexão mais profunda, dado que, neste momento, estão também para apreciação outras decisões do Plenário da Assembleia da República com forte impacto orçamental. Desta forma, importaria que, antes de serem tomadas, o Conselho de Administração desse alguma nota do seu impacto para que a Assembleia tivesse pleno conhecimento de que quando decide o faz em função não só da própria matéria normativa em si, mas também do seu impacto orçamental.
Em nome do meu grupo parlamentar, quero, pois, deixar expresso que iremos aprovar o relatório e conta de gerência da Assembleia da República relativo a 2002, referindo ainda que a gestão dos serviços tem sido rigorosa para com a execução orçamental que a Assembleia aprova.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, em nome do meu grupo parlamentar, direi que este relatório e conta de gerência da Assembleia da República relativo a 2002 tem dois momentos particulares, na justa medida em que tem dois subscritores, dois Conselhos de Administração diferentes: um até 5 de Abril de 2002, e outro, a posteriori, fruto das eleições legislativas de Março de 2002. Naturalmente, foi necessário fazer o exercício de se apresentar ao Tribunal de Contas duas contas de gerência totalmente diferenciadas, uma até essa data e outra, posterior, a partir da IX Legislatura da Assembleia da República. Foi, pois, necessário adaptar uma série de questões (que, para o futuro, já se tornaram num normativo) visto que havia um vazio em relação a essa matéria, na medida em que o Conselho de Administração anterior cessava funções no dia em que a nova Assembleia reunia pela primeira vez e que o novo só era eleito posteriormente. Através de um normativo, essa situação já foi, pois, sanada.
Apraz-me registar, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, que o Tribunal de Contas, com base na auditoria realizada, fez uma apreciação globalmente favorável à conta de gerência da Assembleia da República relativa a 2002. Tal significa, decerto, que foram tidos em linha de conta os pareceres anteriores do próprio Tribunal de Contas e que houve progressos em relação à evolução das contas da Assembleia da República, que foram sendo integradas e colmatadas ao longo do tempo.
Estamos a referir-nos ao orçamento de 2002, do qual constam despesas correntes no valor de 75 milhões de euros mais 4 milhões de euros de despesas de capital, o que perfaz um total de cerca de 79 milhões de euros.
Em cada ano é preciso discutir o orçamento, é preciso distribuir com consciência e capacidade de intervenção as verbas necessárias ao funcionamento da Assembleia da República e apraz-me registar que esta posição tem vindo a melhorar de ano para ano. Efectivamente, quer em relação ao financiamento tout-court da Assembleia, quer em relação à assessoria que é prestada aos Deputados, tem-se verificado uma melhoria de serviço, o que nos é muito grato aqui referir. Devo registar o esforço que tem sido feito pelos serviços da Assembleia da República, nomeadamente por quem tem a responsabilidade de gerir a Casa, a Sr.ª Secretária-Geral e respectivo gabinete, tendo, de uma forma genérica, melhorado substancialmente o funcionamento da AR.
Gostaria de referir que nesta conta de 2002 foi feito um esforço de incidência de investimento (que os Deputados, de uma forma geral, têm notado) na capacidade do sector informático da Assembleia da República, que melhorou consideravelmente, e na requalificação, em termos de património, do próprio edifício da Assembleia, cuja melhoria gradual se tem vindo a verificar de ano para ano.
Todo este investimento é extremamente importante, não sendo demais deixar nota que a Assembleia da República não tem PIDDAC e que é do seu orçamento que saem todas as verbas de requalificação do próprio edifício e de melhoria das condições de trabalho para o pessoal e para os Deputados.
Já aqui foi referido que há organismos e entidades que dependem da Assembleia e cujos orçamentos entroncam no orçamento da própria Assembleia da República. Refiro-me à Alta Autoridade para a Comunicação Social, à Comissão Nacional de Eleições, à Comissão Nacional de Protecção de Dados, à Provedoria de Justiça, à CADA e ao Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informação. Tal como o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro referiu, há que ter em linha de conta que quando essas entidades melhoram significativamente a sua capacidade isso espelha-se no orçamento da Assembleia da República.

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Uma última nota, Sr. Presidente, para dizer que o Grupo Parlamentar do PCP irá votar favoravelmente este relatório e conta de gerência da Assembleia da República relativo a 2002. Estamos a participar directamente nesta apreciação porque fazemos parte do Conselho de Administração e queremos também participar na melhoria e qualidade dos serviços da Assembleia da República, ao serviço dos cidadãos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou ser muito breve, uma vez que os Srs. Deputados Fernando Serrasqueiro e Rodeia Machado já falaram do que era importante em relação ao relatório e conta de gerência da Assembleia da República de 2002.
Também gostaria de justificar que o Sr. Deputado João Moura de Sá não se encontra presente por estar no exercício de outras actividades, o que o impede de aqui intervir na qualidade de Presidente do Conselho de Administração, cargo que desempenhou até há pouco tempo.
De facto, o relatório e conta de gerência de 2002 tiveram como responsáveis dois Conselhos de Administração, duas Secretárias-Gerais e dois Presidentes da Assembleia da República, mas todos seguiram exactamente as mesmas linhas orientadoras.
É pena que só estejam presentes três "resistentes" da comunicação social. Deviam estar mais jornalistas a assistir à discussão deste relatório, porque o Tribunal de Contas elogiou a forma como a Assembleia da República gasta o dinheiro dos contribuintes, elogiou a transparência e a qualidade desses mesmos gastos.
Ora, isto é de realçar, porque a Assembleia é alvo - o que é positivo - de um grande escrutínio por parte dos membros da comunicação social, que só enfatizam aqueles pormenores que, por vezes, são irrelevantes e não elogiam a forma como os gastos são feitos, o controlo que é exercido e a transparência de como tudo isso é feito e que mereceram do Tribunal de Contas rasgados elogios.
A apreciação que faz o Tribunal de Contas vai também ao encontro do que o Sr. Presidente e a Sr.ª Secretária-Geral, Dr.ª Isabel Côrte-Real, sempre têm defendido, vai ao encontro do que o ex-Presidente Almeida Santos e a anterior Secretária-Geral, a Sr.ª Juiza Conselheira Adelina Sá Carvalho, também defendiam, assim como todos os Deputados têm colaborado nesse sentido.
Gostaria ainda de destacar o excelente trabalho dos funcionários parlamentares que tratam destes assuntos e que têm prestado uma colaboração inexcedível.
Era positivo, de facto, que a comunicação social desse realce a estes aspectos, porque é a pura verdade, em vez de olhar apenas para situações que, muitas vezes, são acessórias e sem importância.
Portanto, o que o Tribunal de Contas refere é que a Assembleia da República utilizou de forma criteriosa e transparente o respectivo orçamento. Nunca é demais realçar a importância desta apreciação na discussão de hoje.
Também não queria deixar de sublinhar um aspecto já realçado pelo Sr. Deputado Rodeia Machado. É que, apesar do controlo que é feito e das restrições orçamentais que temos enfrentado nos últimos anos, o Parlamento distribuiu as verbas de forma a conseguir fazer recuperação e manutenção de património - sem PIDDAC, como foi dito pelo Sr. Deputado Rodeia Machado -, melhoria das condições de trabalho dos Deputados, que não são as ideais mas que vão sendo melhoradas substancialmente, todos os anos e paulatinamente, porque é necessário dar essas condições às Sr.as e aos Srs. Deputados.
Olhando para este relatório e conta de gerência de 2002 e para os dados de que dispomos em relação a 2003 e a 2004, a Assembleia da República, na pessoa do Sr. Presidente, das Sr.as e dos Srs. Deputados e dos funcionários parlamentares, está de parabéns.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos sobre este tema, quero congratular-me com as intervenções feitas e com o juízo positivo que delas decorre para a gestão da Assembleia da República, o que é muito responsabilizante para todos nós, já que a Assembleia da República tem plena autonomia financeira (e nem poderia ser de outro modo porque é um órgão de soberania) e até porque nós é que aprovamos o Orçamento do Estado, o Orçamento que o Governo executa.
A Assembleia da República exerce as suas prorrogativas com a maior responsabilidade e transparência, o que é reconhecido pelo órgão constitucionalmente competente para fazer essa verificação, o Tribunal de Contas. Os reparos feitos pelo Tribunal de Contas têm resposta, estão respondidos, e assim se tem

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feito de uma maneira sistemática - é essa a tradição da Casa e é assim que deve ser.
A Assembleia da República tem uma grande responsabilidade em dar o exemplo no que diz respeito à aplicação do dinheiro dos cidadãos, já que, como todos sabem, o Parlamento nasceu exactamente para defender os cidadãos no que toca à cobrança das receitas e à realização das despesas do Estado.
Congratulo-me também com os elogios feitos à Sr.ª Secretária-Geral, às pessoas que com ela directamente colaboram e, em geral, aos funcionários parlamentares. Associo-me a estas referências positivas e cumprimento-os a todos, assim como ao Conselho de Administração no seu conjunto, que também louvo pelo empenho que tem posto em fazer com que o Parlamento esteja na linha da frente de uma gestão financeira rigorosa, responsável, transparente, verdadeiramente democrática.
Srs. Deputados, encerrado este ponto da ordem do dia, vamos passar à apreciação da petição n.º 2/VIII (1.ª) - Apresentada por Jaime Pinho e outros, manifestando total oposição aos projectos de privatização da ponta da Península de Tróia de novas construções na zona das dunas e à intenção de terminar com as carreiras regulares de barcos entre as duas margens do Sado.
O primeiro orador inscrito é o Sr. Deputado Alberto Antunes, que dispõe de 3 minutos.
Tem a palavra.

O Sr. Alberto Antunes (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A península de Tróia, parte integrante do concelho de Grândola, situada entre o Oceano Atlântico e as reservas naturais do estuário do Sado e da Serra da Arrábida, face à sua magnifica localização e enormes potencialidades, cedo despertou a sua vocação de resort turístico de elevada qualidade e de enormes potencialidades e também os apetites dos investidores.
Foi nas décadas de 60 e 70 que se deu início a um processo de transformação de uso do solo. Estas transformações processaram-se, no entanto, sem um rumo definido e um plano de ordenamento que permitisse compatibilizar o aproveitamento das potencialidades naturais com a defesa dos ecossistemas existentes.
Nem tudo o que foi construído ao longo das últimas três décadas mereceu o consenso das pessoas e agentes no terreno.
Apesar disso, acreditamos que grande parte das suas riquezas e valores naturais devem ser postos à fruição da população e do desenvolvimento, sem que isso ponha em risco os valores ambientais e naturais em presença neste território.
Foi este o objectivo que presidiu à decisão do governo de António Guterres quando decidiu alienar, por concurso público, os créditos que o Estado detinha na empresa Torralta. E assim decidiu dar um novo impulso ao aproveitamento turístico da península de Tróia e impedir a degradação do património ali já construído.
Os adquirentes dos créditos do Estado assumiram, assim, contratualmente, a obrigação de dar este novo impulso ao desenvolvimento daquela privilegiada área. Mas vincularam-se igualmente às obrigações de apresentarem os planos e projectos necessários aos licenciamentos em causa, sujeitando-se não só à aprovação das entidades competentes como ainda ao respeito integral das normas e leis em vigor, designadamente os instrumentos de ordenamento aprovados ou a aprovar.
Com este processo, foi possível pôr termo a um ciclo de declínio económico e social de uma empresa-âncora da região e criar um novo impulso de desenvolvimento sustentável para uma das mais apetecíveis zonas do País.
De acordo com o acompanhamento que fizemos do processo e pelas informações prestadas pelas entidades envolvidas nos processos de informação e decisão, os projectos apresentados respeitarão escrupulosamente todas as normas em vigor, designadamente os índices e condições de construção definidas pelos instrumentos de ordenamento.
De resto, a aprovação dos projectos apresentados foi objecto de decisão por parte dos órgãos autárquicos, em Janeiro passado, numa reunião descentralizada que ocorreu na freguesia do Carvalhal, e de que a comunicação social deu nota, após o competente parecer favorável da comissão técnica de acompanhamento.
Como sublinha a informação que a Câmara Municipal de Grândola enviou a este Parlamento, não existe nenhum processo de privatização. Trata-se apenas de viabilizar e aprovar um projecto apresentado por entidade privada, proprietária dos terrenos. Também não é verdade que exista qualquer decisão relativamente à extinção do transporte entre as duas margens, de acordo com as informações prestadas quer pela Câmara Municipal de Grândola quer pelo Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente.

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Aguardamos, assim, que o Governo, após parecer da Direcção-Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano, ratifique os planos de pormenor e, deste modo, se inicie um novo ciclo de desenvolvimento sustentável para o concelho de Grândola e o distrito de Setúbal.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Rodrigues.

O Sr. Luís Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sobre o documento em apreciação, nem um filme de Hitchcock conseguiria semear tanto terror quanto esta petição. Catástrofe, alarmismo, suspeição e falsos moralismos são as armas de arremesso empregues por alguns políticos que, através da criação artificial de fantasmas, pretendem mostrar ser os únicos donos da verdade, os arautos da idoneidade, os únicos defensores dos pobres e oprimidos.
O encerramento das carreiras fluviais entre Setúbal e Tróia foi nesta petição um dos fantasmas levantados por estes peticionários, liderados pelo Bloco de Esquerda, em Setúbal, em plena campanha para as eleições legislativas de 1999.
Como é evidente, esta falsa questão nem merece resposta. Só mentes muito retorcidas e maquiavélicas poderiam colocar tal hipótese.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito mais importante para o distrito de Setúbal, para a sua capital e para o Litoral Alentejano é saber que modelo de desenvolvimento queremos, qual o caminho a seguir. Ora, de facto, é isso que estamos hoje aqui a discutir.
A visão retrógrada e conservadora é aquela que está representada nesta petição. O modelo preconizado na petição é sinónimo de um futuro pouco risonho para as gerações futuras. Os tempos da reforma agrária e das ocupações selvagens no Alentejo subjacentes a esta petição foram há muito afastados. O que interessa a algumas forças políticas é aumentar os níveis de pobreza da população, é manter as nuvens negras sobre o futuro dos mais novos porque só assim podem elas próprias sobreviver.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Os salários em atraso, a degradação do complexo turístico e a falta de confiança num futuro melhor para os trabalhadores, fazem parte - e bem - da história de Tróia.
O turismo e o lazer são prioridades do PSD na política de desenvolvimento do País. O Litoral Alentejano é uma das regiões do território continental com maiores recursos naturais para trilhar esse caminho.
De facto, população, autarquias, empresários e, principalmente, aqueles que querem ter um futuro mais promissor no Alentejo anseiam há muito pelos investimentos turísticos de elevada qualidade, sempre anunciados, mas nunca concretizados.
Tróia é apenas a extremidade de um vasto território que se estende para sul, que pode e deve ser um exemplo para Portugal do equilíbrio entre crescimento económico e ambiente.
Sr. Presidente, Sr. as e Srs. Deputados: A palavra que quero deixar aqui hoje a todos os responsáveis políticos e económicos, Governo, autarquias e investidores, é uma palavra de incentivo para se possam concretizar, quanto antes, os investimentos turísticos há muito anunciados, apostando ao mesmo tempo na sua integração exemplar no ambiente único deste imenso areal de Tróia até ao Algarve.
O PSD continua a apostar em Setúbal, no Alentejo e nos alentejanos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Teixeira Lopes

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A península de Tróia, com o seu ecossistema dunar, intimamente ligado à Reserva Natural do Estuário do Sado, é um valor de natureza extremamente frágil. Por isso, defendemos utilização humana leve, que passe, por exemplo, pelo ecoturismo de passagem e cultural, com instalações e equipamentos de apoio baseados em arquitectura de madeira e centros de informação ambiental e não, como se prevê, por um projecto megalómano de turismo de fixação e de exploração desenfreada, com mais do que a duplicação do número de camas, hotéis e aldeamentos baseados no betão, campos de golfe, casinos e tudo o que daí decorrerá.
Ao submeter a península de Tróia aos apetites devoradores, predadores dos promotores imobiliários e do lucro máximo, entra-se numa lógica incontrolável que, a médio e longo prazos, será desastrosa.

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A Sr.ª Ana Drago (BE): - Muito bem!

O Orador: - A construção da marina e do novo cais dos ferries será um golpe fatal para Tróia e para tudo o que ela representou ao longo de gerações.
Trata-se, na verdade, de dificultar o acesso a Tróia, às suas praias, às suas zonas de lazer, às pessoas de Setúbal, a jovens, a gentes ligadas à pesca, ao rio e ao mar, que sempre usufruíram deste espaço livremente e que agora terão dificuldades acrescidas para aí chegarem.
Ao deslocar o cais dos ferries para bem longe, o acesso público a partir de Setúbal torna-se inviável e os seus cidadãos passarão a ter custos exorbitantes quer nos novos preços da travessia, quadruplicando também a duração da viagem.
Para chegar à praia, que dista uns dois quilómetros e meio, passaria a ser necessário viajar ao largo, em direcção à Comporta, de barco, voltar por estrada para o extremo da península, regressar de novo, fazendo a estrada no sentido inverso, e de novo um trajecto de barco que duplica o actual, num total de 10 quilómetros.
No domínio económico, o estudo acena com os empregos directos e indirectos que serão criados. Mas aqui há que ter em conta que parte significativa dos projectos imobiliários em questão se destinam a venda e, por isso mesmo, serão para residências secundárias.
Além do mais, há um impacte tremendo sobre o ambiente. As escavações e drenagens para construção e posterior manutenção da marina e do novo cais vão agravar a erosão, vão agravar o já frágil cordão dunar.
As mexidas provocadas pelas duas instalações somam-se a outras que arrasaram vastas zonas do interior da península e as que se seguirão.
O equilíbrio de Tróia já está ferido. Pretende-se abrir caminho para mais um golpe profundo e extenso, num ecossistema nascido de um precário jogo de movimentos entre os ventos, as marés, o rio, o mar, as espécies vegetais e animais que fazem a riqueza de Tróia.
Além do mais, sabemos também que o próprio traçado da Reserva Natural do Estuário do Sado revela, claramente, segundas intenções, intenções essas que são as dos grupos económicos que pressionaram este traçado. Deixando de fora partes estratégicas da península, o traçado da reserva natural acaba por ser não um movimento de defesa deste ecossistema, mas, pelo contrário, um incentivo à sua deterioração.
Finalmente, temos ainda um ataque tremendo aos golfinhos sedentários que, sendo já uma espécie em extinção, com o novo cais dos ferries verão a sua sobrevivência ameaçada.
Por isso, temos aqui, sem dúvida, um exemplo de insensibilidade e de ganância dos promotores imobiliários.

A Sr.ª Ana Drago (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Gonçalves.

O Sr. Herculano Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Debatemos hoje uma petição subscrita por cerca de 9000 cidadãos, manifestando oposição aos projectos de privatização da ponta da península de Tróia, de novas construções na zona das dunas e à intenção de terminar com as carreiras regulares de barcos entre as duas margens do Sado.
Antes de mais, dirijo-me ao peticionários cumprimentando-os por não se demitirem dos seus direitos e deveres cívicos de participar na vida política activa.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É sempre de louvar que grupos de cidadãos se interessem pela coisa pública e pelos destinos do País. A petição n.º 2/VIII (1ª) é mais um exemplo da preocupação crescente dos cidadãos com o correcto e sustentável ordenamento do território.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como os peticionários já sabem, informados que foram pela 4.ª Comissão, a península de Setúbal encontra-se abrangida por quatro planos de ordenamento (o Plano de Ordenamento da Orla Costeira Sado, o Plano Regional de Ordenamento do Território do Litoral Alentejano, o Plano Director Municipal de Grândola e o Plano de Urbanização de Tróia). Estes planos determinam as zonas onde a construção será permitida. Essas zonas, segundo informação camarária, são todas de propriedade privada.

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Quanto aos transportes via ferry, também foram informados de que apenas está prevista a mudança de localização do cais de atracagem de veículos, nada mais que isso. As carreiras regulares de barcos entre as duas margens, certamente, nunca deixarão de se realizar
Para terminar, quero dizer que o CDS-PP se congratula por ter ajudado a esclarecer este grupo de cidadãos de Tróia sobre o futuro da sua região.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Efectivamente, muitos atropelos urbanísticos se verificaram em Tróia - são até bem visíveis -, atropelos esses que já vêm de há muito tempo, nomeadamente com a construção de um prédio de vários andares, que está parada há muitos anos, atropelos contra os quais a população de Setúbal já se chegou a manifestar, como foi o caso de dificultar o acesso à praia mediante a colocação de algumas correntes impedindo a passagem, havendo até atropelos cometidos legislativamente. Estou a recordar-me de algo que há muitos anos foi aqui discutido, ou seja, a criação de uma zona de jogo em Tróia, que penso ser o que não precisa a população daquela zona e do distrito de Setúbal.
Nesse sentido, é absolutamente natural e é de enaltecer que os cidadãos estejam atentos ao que se passa numa zona privilegiada do distrito de Setúbal e que serve para os lazeres dos setubalenses e de pessoas daquela área.
Com todo o respeito pelo trabalho feito pela comissão - que penso que foi muito -, suscitaram-se-me algumas questões que não quero deixar de colocar aqui. É que esta petição foi apresentada antes da consulta pública sobre os projectos daquela área. A situação não está esclarecida, pois a Câmara Municipal de Grândola, que tem jurisdição sobre aquela área, não a esclareceu. Disse apenas que as reclamações, durante a consulta pública, tinham sido devidamente ponderadas. Não sei se os peticionários, ou alguns deles, tiveram ocasião de colocar estas questões durante a consulta pública e se elas foram ponderadas.
O que nos foi transmitido pela autarquia de Grândola e o que disse a Câmara Municipal de Setúbal, que se opõe a qualquer dificuldade de acesso a Tróia pelo que isso representa para os setubalenses, não nos sossega completamente e é preciso estar atento ao que ali se passará.
Em relação ao acesso, devo dizer que me preocupa muito mais porque o acesso de pessoas é que tem de ser próximo da praia. A experiência daquela zona indica que os automóveis não se dirigem, na grande maioria, para Tróia, mas que serve, efectivamente, de local de passagem para outras zonas do País. Por isso, penso que talvez fosse melhor a deslocação.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando falamos de Tróia, falamos de uma zona muito privilegiada e de uma zona muito dada a determinados apetites e interesses que, de facto, são colocados relativamente ao projecto que conhecemos.
Gostaria de referir que quando tivemos conhecimento deste projecto, procedemos a um conjunto de contactos e tivemos oportunidade, também aqui, na Assembleia da República, de levantar a questão e de dirigir requerimentos ao Governo no sentido de obter alguns esclarecimentos mais pormenorizados sobre a matéria, porque a informação que nos chegava relativamente ao conhecimento do projecto deixava-nos muito preocupados quanto a questões de pressão urbanística, de um aumento muito significativo do número de camas naquela região, para além das prioridades dadas à questão do casino, da marina e do campo de golfe.
Pelo conhecimento que temos da afluência da população a Tróia, não só de população da região mas em grande parte da região, colocava-se também uma questão muito preocupante em relação à elitização do turismo naquela zona, sem esquecer as questões ambientais profundamente preocupantes que têm a ver com os efeitos da concretização daquele projecto no sistema dunar.
Neste caso não se pode falar de forma líquida da conformidade relativamente a um conjunto de planos, porque há planos que surgiram depois de se ter pensado e começado a concretizar este projecto, como o Plano de Ordenamento da Orla Costeira Sado/Sines ou o próprio Plano de Urbanização de Tróia, que já foram pensados tendo em conta este projecto. Mas sobre o Plano Regional de Ordenamento do Território da Litoral Alentejano, o PROTALI, é preciso referir que este projecto só é possível com a

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carga de pressão que tem porque foi invocado o regime de excepção, tendo em conta o interesse público. Devo confessar, mais uma vez - já o dissemos nesta Assembleia -, que temos grandes dúvidas relativamente à invocação do interesse público para a concretização de um projecto desta natureza.
Penso que este é um bom exemplo para nos fazer reflectir que projectos turísticos ou que tipo de turismo queremos e quem queremos servir: se queremos servir a população, de forma a poder gozar os seus momentos de lazer, os seus tempos livres e tudo o mais com esses projectos, ou se queremos servir outro tipo de interesses,…

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Muito bem!

A Oradora: - … nomeadamente alguns interesses imobiliários, que nos deixam muito preocupados. Infelizmente, em Portugal, os projectos turísticos têm servido mais esses interesses imobiliários do que a população.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, vamos passar agora ao debate da petição n.º 54/IX (2.ª) - Apresentada pela Associação dos Amigos do Mindelo para a Defesa do Ambiente, solicitando a recuperação e protecção urgente da Reserva Ornitológica do Mindelo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero saudar os autores/coordenadores desta petição, o Movimento PROMindelo e as organizações não governamentais do ambiente que o integram, a FAPAS, a Liga de Protecção da Natureza, a Quercus, e saudar também os mais de 7000 subscritores da petição. Saúdo os proponentes porque, através da apresentação de petição, é possível voltar a discutir, nesta Casa, a criação da ROM (Reserva Ornitológica do Mindelo), a necessidade de combater o prosseguimento da degradação e de defender a criação de um estatuto legal para aquela zona.
Em segundo lugar, gostaria de recordar que esta petição, subscrita por 7000 cidadãos, foi entregue na Assembleia da República no dia 23 de Outubro de 2003 - exactamente na véspera do dia em que foram debatidos, na generalidade, dois projectos de lei, cujo agendamento foi pedido e subscrito pelo PCP. Recordo também que, infelizmente, esses dois projectos foram rejeitados e , em sua substituição, foi aprovado um projecto de resolução que se limitava a recomendar determinados procedimentos, alguns absolutamente redundantes, sem impor datas, visando, portanto, no fundamental, não decidir, isto é, adiar.
Em terceiro lugar, recordo que, por via da petição e do relatório discutidos na Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente, foi possível clarificar algumas questões importantes, como, por exemplo: que as autarquias já se pronunciaram sobre o tema, que as organizações não governamentais também já o fizeram, que o próprio ICN também já o fez, que, finalmente, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte também acabou por dar um parecer favorável. Por outras palavras, os pareceres defendem todos, no fundamental, a criação de uma figura jurídica, isto é, a criação de uma área protegida para a ROM. Mas, apesar dos pareceres, todos eles existentes há quase seis meses, o facto é que nada avançou. Portanto, é neste contexto que nós, aqui, estamos responsabilizados para tomar a iniciativa. Por isso, o PCP, no início desta 3.ª Sessão Legislativa, já anunciara na cidade do Porto, há cerca de 10 dias, que iria reapresentar um novo projecto para a criação da área protegida na Reserva Ornitológica do Mindelo. Assim, o PCP aproveita o facto de estarmos aqui hoje a debater esta matéria para anunciar que já entregou, hoje mesmo, na Mesa da Assembleia da República, esse projecto.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

Orador: - Esta iniciativa do PCP dá corpo a uma opção própria, naturalmente, como não poderia deixar de ser, mas responde também àquilo que é o objectivo central de uma petição: dar seguimento legislativo à pretensão de que foi alvo, como, aliás, manda a lei das petições. Neste caso, e por último, feito este anúncio público que dá seguimento formal àquilo que é o alvo da petição, o PCP espera que estejam agora reunidas as condições políticas…

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Sr. Deputado, estão reunidas as condições para acabar a sua intervenção.

O Orador: - Vou acabar, Sr. Presidente.

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Como eu dizia, estão agora reunidas as condições políticas para este Plenário vir a aprovar finalmente aquela que é uma aspiração muito antiga, qual seja a criação da área de paisagem protegida na Reserva Ornitológica do Mindelo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Reserva Ornitológica do Mindelo é a mais antiga área classificada em Portugal; foi classificada em 1957. É, por outro lado, a mais importante reserva natural da Área Metropolitana do Porto; hoje, é mesmo a única.
A sua degradação avança a grande velocidade todos os dias. É, pois, urgente uma intervenção para conter esta degradação, a sua total destruição, para que não fique aos apetites dos interesses imobiliários.
Como aqui foi dito, esta Assembleia já rejeitou dois projectos, e a maioria, para aliviar a sua consciência, apresentou um projecto de resolução ao Governo, diploma este que o Governo não ouviu.

Vozes do CDS-PP: - Não é verdade!

O Orador: - Pelos vistos, o Governo não aceita as recomendações desta Assembleia, mesmo quando elas têm origem na maioria.

Vozes do CDS-PP: - Não é verdade!

O Orador: - Sabemos que, quer para o anterior governo quer para este, a área do ambiente não constitui uma prioridade política, mas não podemos deixar que o território seja degradado todos os dias.
Por isso, a maioria e o Governo devem, hoje, uma explicação a esta Assembleia, aos habitantes do Mindelo e aos habitantes Área Metropolitana do Porto. É o que esperamos aqui hoje, que esta maioria não limpe a sua consciência e que nos dê respostas claras sobre esta matéria.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Luz.

O Sr. Diogo Luz (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Através da petição n.º 54/IX (2.ª), a Associação dos Amigos do Mindelo para a Defesa do Ambiente solicita a recuperação e protecção urgente da Reserva Ornitológica do Mindelo e sugere que aquele local passe a ser considerado como uma área de paisagem protegida.
Situada no litoral da Área Metropolitana do Porto, no concelho de Vila do Conde, a sul da foz do rio Ave, é um espaço constituído por um conjunto valioso de praias, dunas, manchas florestais, zonas húmidas e campos agrícolas, onde coabita uma grande variedade de plantas e animais.
Constitui, sem dúvida, uma área com enormes potencialidades para actividades de lazer ao ar livre e para acções de educação e formação ambiental e a sua preservação é um passo importante na defesa do património cultural e histórico associado à paisagem dunar e florestal e à actividade científica ligada ao conhecimento das aves que buscam refúgio naquele espaço.
É, portanto, uma área que deve ser protegida.
Por esta razão, os partidos da maioria apresentaram a esta Assembleia um projecto de resolução, em que recomendavam ao Governo a criação da área de paisagem protegida da Reserva Ornitológica do Mindelo, depois de efectuados os estudos necessários e consultadas as entidades ligadas ao tema e à região.
Hoje, como então, não temos dúvidas sobre o grande interesse na protecção deste espaço, que é único em toda a Área Metropolitana do Porto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sabemos que o Governo, através do Instituto de Conservação da Natureza, tem estado a trabalhar, mas já não sabemos que iniciativa a Câmara Municipal de Vila do Conde tem tomado nesta matéria.
Ora, conforme o disposto nos artigos 26.º e 27.º do Decreto-Lei n.º 19/93, de 23 de Janeiro, são as autarquias locais que propõem ao Instituto de Conservação da Natureza a classificação das áreas de

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paisagem protegida. O Governo apenas intervém para decidir sobre a proposta de classificação apresentada pelo Instituto.
Sendo assim, é importante para um desenvolvimento mais dinâmico deste processo que a Câmara Municipal de Vila do Conde, reconhecendo a importância da preservação desta vasta área para a região, utilize todas as suas competências legais e assuma uma atitude menos passiva do que aquela que até agora tem tido.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não basta criticar, é preciso agir. Não chega mostrar interesse, é necessário actuar de acordo com o interesse manifestado.
É isto que se espera da Câmara Municipal de Vila do Conde, que assuma, em pleno, as suas responsabilidades. E, quando o decidir fazer e apresentar a sua proposta de criação da área de paisagem protegida do Mindelo, já o Instituto de Conservação da Natureza, pelo trabalho que tem desenvolvido, estará em condições de apreciar a proposta e de a enviar para decisão do Governo, que decidirá nos termos da lei, dando mais um passo no sentido do correcto ordenamento do território português, ou seja, da criação da área de paisagem protegida do Mindelo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes.

O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de lembrar que, de facto, a Reserva Ornitológica do Mindelo foi, como já aqui referido, a primeira área protegida a ser criada no País, mas foi também a primeira área a ser abandonada, o que a torna um triste símbolo do estado das políticas ambientais em Portugal.
Além do mais, através inclusivamente da Associação pró-Mindelo, aqui representada, tem sido feito um trabalho excepcional de envolvimento das populações.
A Junta de Freguesia de Mindelo desenvolve actualmente o programa da Agenda 21 e, neste âmbito, foi possível constatar que 80% da população do concelho de Vila do Conde está desejosa de criar esta reserva ornitológica como área protegida. Não é por acaso, aliás, que esta petição tem 7000 assinaturas.
Por isso mesmo, importa pôr cobro àquilo a que continua assistir-se: aos aterros em sítio ilegal; à construção desenfreada em sítio ilegal; à construção em cima da linha dunar, em situação, inclusivamente, de risco para a própria construção e obviamente contribuindo para a erosão dunar; àquilo que são, hoje em dia também, os usos do solo para fins florestais e para fins agrícolas devidos a uma certa pressão urbanística.
Impõe-se, neste caso, que a Assembleia da República seja capaz de honrar aquilo que aqui foi aprovado. É uma questão de credibilidade desta instituição. Se foi aqui aprovada uma proposta de resolução, que visava, no final, a criação da área de paisagem protegida da reserva ornitológica, não podemos agora entrar num pingue-pongue entre a Câmara Municipal de Vila do Conde e o Ministério do Ambiente. É necessário que ambas as instituições se envolvam.
Diz-me o Sr. Deputado que a Câmara pode tomar iniciativa. Pode, e deve! E o Ministério do Ambiente também pode e deve tomar iniciativas. É isto que se pretende. Não podemos continuar neste eterno adiar!
Inclusivamente, a Universidade do Porto fez estudos recentes que mostram não só a necessidade mas a viabilidade de protecção desta área, por isso, por que não avançar com um grupo de estudo que rapidamente conseguisse traçar o processo de classificação desta área e, finalmente, num prazo razoável, mas certamente curto, proceder à consagração desta área de paisagem protegida.
Quero dizer, além do mais, que, se esta Assembleia não der passos decididos em favor desta reserva ornitológica, estaremos a perder um valor único no litoral norte do País e estamos também, volto a repetir, a dar uma lição negativa aos nossos concidadãos de que há projectos de resolução que são aqui apresentados apenas para adiar problemas ou para piedosas intenções.
Mais do que nunca, é altura de passar à prática. Ministério do Ambiente, Câmara Municipal de Vila do Conde, é este o apelo que aqui queremos deixar!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco.

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O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar os subscritores da petição a favor da criação da Reserva Ornitológica do Mindelo que, usando os meios que o regime democrático permite, vêm a esta Câmara apresentar uma importante e não esquecida promessa eleitoral do CDS e do PSD.
A criação de uma área de paisagem protegida para a Reserva Ornitológica do Mindelo é uma ideia defendida há muitos anos pelo CDS e já foi alvo, como aqui foi referido, de uma iniciativa legislativa que apresentámos conjuntamente com o PSD. Esta iniciativa deu origem à Resolução da Assembleia da República n.º 80/2003, que recomenda precisamente ao Governo a criação desta área, bem como de mecanismos adequados à protecção da Reserva Ornitológica do Mindelo.
Debatemos, aqui, hoje, esta petição da Associação dos Amigos do Mindelo para a Defesa do Ambiente, que vem, uma vez mais, levantar esta questão.
Não posso deixar de salientar que se trata de uma petição, como também já foi referido, com mais de 7000 assinaturas, um número bastante superior ao dos habitantes do Mindelo, o que, portanto, é bem demonstrativo da vontade popular de criar esta área protegida.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O CDS-PP acompanha esta vontade, bem como a preocupação dos subscritores desta petição com a situação de degradação que se vem verificando naquela Reserva.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Acho bem!

O Orador: - No entanto, continuamos a entender que a criação de uma área protegida depende da realização prévia de vários estudos técnicos que permitam dizer com rigor…

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Já lá vou, Sr. Deputado.
Dizia eu que a criação de uma área protegida depende da realização de vários estudos técnicos prévios que permitam dizer com rigor de que áreas estamos a falar e quais são os instrumentos jurídicos mais adequados para a proteger. Haverá aqui que levar em conta também os interesses privados dos legítimos proprietários dos terrenos situados naquela zona.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente! Acho bem!

O Orador: - Por isso defendemos no passado, e continuaremos a defender, que o mais adequado será desencadear a aplicação do Decreto-Lei n.º 19/93, que estabelece, expressamente, que a classificação das áreas protegidas pode ser proposta por entidades públicas ou privadas e que compete ao Ministério do Ambiente, e só a este, a prática do acto de classificação, que terá de ser feita por decreto regulamentar.
O antigo Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, a propósito da petição, esclareceu já que a proposta de criação de uma área protegida está exclusivamente dependente de uma iniciativa do município de Vila do Conde, que, aliás, assegurará a sua posterior gestão. No entanto, ficou por esclarecer a posição da autarquia quanto a este aspecto.
Recebemos uma informação da Câmara Municipal de Vila do Conde esclarecendo que vê com bons olhos a concretização de uma figura jurídica que defenda toda a área da Reserva Ornitológica do Mindelo e que sejam criadas as condições administrativas e financeiras que permitam potenciá-la.
Portanto, parece que, com esta informação, estão reunidas todas as vontades necessárias para que esta área protegida se torne em realidade. Penso que apenas faltará que a Câmara Municipal de Vila do Conde esclareça, em definitivo, exactamente o que pretende para aquele espaço.

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Vocês é que o devem definir!

O Orador: - Por tudo isto, podemos concluir que as pretensões dos subscritores desta petição estão bem encaminhadas e tudo leva a crer que, em breve, a Reserva Ornitológica do Mindelo terá a protecção jurídica adequada à sua importância ambiental, científica e histórica.
Os Grupos Parlamentares do CDS-PP e do PSD deram já um contributo precioso para este objectivo ao fazerem aprovar nesta Câmara a Resolução da Assembleia da República n.º 80/2003.

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Só para terminar, e dirigindo-me aos Srs. Deputados Honório Novo e Renato Sampaio, quero dizer que, obviamente, um projecto de lei para a criação da área seria útil, só que não é competência da Assembleia da República a criação de áreas de paisagem protegida.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Está enganado!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Sr. Deputado, terminou o seu tempo. Queira concluir.

O Orador: - É uma competência que não é nossa, e, portanto, o projecto regulamentar é o meio adequado para esse fim, meio que nós, PSD e CDS-PP, usamos.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por referir que a questão da definição do estatuto de protecção da Reserva Ornitológica do Mindelo - como aqui já foi referido em diversas intervenções, a primeira área protegida criada em Portugal - já poderia estar resolvida, caso a maioria tivesse aprovado os projectos de lei que estiveram em discussão em Outubro de 2003, isto é, no ano passado.
Penso que esta petição, apresentada pela Associação dos Amigos do Mindelo e pelo Movimento PROMindelo, que entrou, justamente, na véspera da discussão desses projectos de lei, não foi apresentada ao acaso, pretendeu, com certeza, constituir também um mecanismo de pressão e de informação aos grupos parlamentares no sentido da importância da aprovação desses projectos de lei e da criação, de facto, de um estatuto de protecção de uma área protegida naquela zona do Mindelo. Mas a essa pressão e a essa informação não conseguiram responder nem o Grupo Parlamentar do PSD nem o Grupo Parlamentar do PP, e, pura e simplesmente, decidiram rejeitar os projectos de lei e, em alternativa, apresentaram um projecto de resolução que recomendava ao Governo a criação dessa área protegida.
É por isso que, de facto, é preciso desmascarar a intervenção destes grupos parlamentares da maioria, dizendo que aquilo que estão a fazer é adiar a criação desta área protegida e não a manifestar qualquer vontade política no sentido da criação desse estatuto de protecção. Se vêm com a conversa de que a competência é das autarquias,…

O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): - Não foi isso que dissemos! Falámos na iniciativa!

A Oradora: - … porque "carga de água", permitam-me a expressão, é que o vosso projecto de resolução, no sentido da criação desse estatuto de protecção, se dirigia ao Governo?!
A competência não é da Assembleia da República - dizem os senhores -, nós até discordamos disso! Então, a competência já pode ser do Governo. Mas, depois, o Governo não faz, porque os senhores, no vosso projecto de resolução, nem tão-pouco apresentavam metas e datas para a concretização daquilo que recomendavam.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Querem é pingue-pongue!

A Oradora: - Portanto, os senhores andam, de facto, como se dizia aqui há pouco em jeito de "boca", com um jogo de pingue-pongue que não se entende, nem se compreende, e com certeza que a população da região, nomeadamente estes peticionantes - Associação dos Amigos do Mindelo e o Movimento PROMindelo -, também não vão, de todo, compreender este jogo da maioria e este adiamento sistemático da criação daquilo que toda a gente na região considera fundamental, dadas as características naturais e o potencial de valorização daquela zona. De facto, ninguém consegue compreender esta vossa falta de vontade política, que é uma coisa que não consigo classificar de outra forma.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Teixeira Lopes, que dispõe de 55 segundos - 3 segundos do seu grupo parlamentar, 48 segundos cedidos pelo PS e 4 segundos concedidos pela Mesa.

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O Sr. João Teixeira Lopes (BE): - Sr. Presidente, não será necessário tanto.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Talvez se possa dar um avanço nesta questão se, em vez deste pingue-pongue que aqui está claramente implícito entre a Câmara Municipal de Vila do Conde e o Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território, tivermos da parte deste Ministério a garantia de que serão disponibilizados meios efectivos para a gestão da reserva. Neste caso a câmara municipal não terá qualquer álibi para não pedir a constituição e a consagração da reserva como área protegida.
Daríamos, certamente, um passo positivo se o Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território garantisse a todos - à câmara municipal e aos cidadãos do concelho - que fornece os meios necessários para a gestão da referida área.
Espero que o CDS-PP e o PSD sejam bons mediadores nesta matéria junto do Sr. Ministro.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos.
A próxima reunião plenária realizar-se-á amanhã, quinta-feira, dia 30, às 15 horas, tendo, como ordem de trabalho, um período de antes da ordem do dia, um período da ordem do dia, com a discussão da proposta de resolução n.º 73/IX, e um período regimental de votações.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva

Partido Socialista (PS):
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel de Medeiros Ferreira
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Maria Odete dos Santos

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
João Manuel Moura Rodrigues
Manuel Alves de Oliveira
Maria Eduarda de Almeida Azevedo

Partido Socialista (PS):
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

Partido Popular (CDS-PP):

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Henrique Jorge Campos Cunha
João Maria Abrunhosa Sousa

Partido Comunista Português (PCP):
Bruno Ramos Dias

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Francisco Miguel Baudoim Madeira Lopes

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
Manuel Joaquim Dias Loureiro

Partido Socialista (PS):
António Bento da Silva Galamba
Luísa Pinheiro Portugal
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Vítor Manuel Barreto Marinho da Cunha

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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