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Sábado, 2 de Julho de 2005 I Série - Número 37

X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 1 DE JULHO DE 2005

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex. mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.
Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os 22/X - Aprova a Lei-Quadro da Água, transpondo para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2000, e estabelecendo as bases e o quadro institucional para a gestão sustentável das águas, e 19/X - Estabelece a titularidade dos recursos hídricos, e dos projectos de lei n.os 51/X - Aprova a Lei-Quadro da Água (PSD), 104/X - Lei-Quadro da Água (CDS-PP) e 119/X - Aprova a Lei de Bases da Água (PCP). Intervieram no debate, a diverso título, além do Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (Francisco Nunes Correia), os Srs. Deputados Adão Silva (PSD), Marcos Sá (PS), Alda Macedo (BE), Pedro Mota Soares (CDS-PP), António Filipe (PCP), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Jorge Moreira da Silva (PSD), Luís Vaz (PS), Miguel Tiago (PCP), Renato Sampaio (PS), José Raúl dos Santos (PSD), Abel Baptista (CDS-PP) e Mendes Bota (PSD).
Deu-se, ainda, conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º 25/X.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Martins Seguro
António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Carlos Cardoso Lage
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elísio da Costa Amorim
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Guilherme Valdemar Pereira de Oliveira Martins
Horácio André Antunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
João Cândido da Rocha Bernardo
João Cardona Gomes Cravinho
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos das Dores Zorrinho
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Luís Pereira Carneiro
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Lúcio Maia Ferreira
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro

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Luísa Maria Neves Salgueiro
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Luís Gomes Vaz
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Renato Luís Pereira Leal
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Ribeiro Cristóvão
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Domingos Duarte Lima
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando dos Santos Antunes

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Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Gonçalo Nuno Mendonça Perestrelo dos Santos
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Jaime Carlos Marta Soares
João Bosco Soares Mota Amaral
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Lopes Moreira da Silva
José António Freire Antunes
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Amaral Lopes
José Manuel de Matos Correia
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel Pereira da Costa
José Mendes Bota
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Comunista Português (PCP):
Abílio Miguel Joaquim Dias Fernandes
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Miguel Tiago Crispim Rosado

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

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Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Ana Isabel Drago Lobato
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, na primeira parte da nossa ordem do dia, vamos proceder à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 22/X - Aprova a Lei-Quadro da Água, transpondo para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2000, e estabelecendo as bases e o quadro institucional para a gestão sustentável das águas e dos projectos de lei n.os 51/X - Aprova a Lei-Quadro da Água (PSD), 104/X - Lei-Quadro da Água (CDS-PP) e 119/X - Aprova a Lei de Bases da Água (PCP).
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.

O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (Francisco Nunes Correia): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É costume dizer-se que o grau de civilização de um povo também se pode ver pela forma como trata dos seus rios.
Aquilo que hoje submetemos à vossa apreciação é, afinal, um pequeno contributo para tornar este País mais civilizado.
Como todos sabemos, há problema sérios, graves, de gestão de recursos hídricos em Portugal. Há uma degradação severa dos meios hídricos e dos ecossistemas relacionados. Esta situação, além de ter consequências ambientais gravíssimas, cria disfunções em vários aspectos da vida do País.
Como todos sabem, a água é um recurso extraordinariamente importante, não apenas por ser um componente essencial de todos os ecossistemas, razão pela qual tudo aquilo que acontece com os meios hídricos tem impactos em praticamente todas as esferas da gestão ambiental e, particularmente, dos ecossistemas, mas porque é uma necessidade básica das sociedades humanas. A água é fundamental praticamente para todas as actividades e é também, em si mesma, hoje em dia, um sector de actividade económica, uma área importantíssima de prestação de serviços.
Uma lei da água faz falta, e faria sempre falta. Recordo que a Lei da Água que temos em Portugal, formalmente em vigor, data de 1919 e a esta Lei da Água foram-se justapondo sucessivas camadas, sucessivas gerações de legislação, muitas vezes desconexa.
A partir da adesão à União Europeia, Portugal passou a receber o impacto do normativo comunitário e nem sempre esse normativo se cruzou bem com aquela que era a tradição jurídica portuguesa, criando situações de grande complexidade, muitas vezes, difíceis de dirimir, mesmo do ponto de vista conceptual, mas com consequências muito negativas na administração da coisa pública, uma vez que gerou vazios e ambiguidades, muitos deles resolvidos em tribunal e, por vezes, de formas contraditórias, dado que o sistema jurídico não é completamente claro.
Por isso, o Programa do XVII Governo Constitucional, que, como sabem, formalmente, está em plenas funções há 101 dias, uma vez que ontem se assinalaram 100 dias,…

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Não, não! Há mais! Essas contas estão mal feitas!

O Orador: - … desde que recebeu o mandato da Assembleia da República,…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): - A 12 de Março!

O Orador: - … e 108 dias desde que tomou posse.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - O vosso problema é mesmo em fazer contas! Nem nos 100 dias acertam!

O Orador: - O Governo, como eu dizia, inscreveu no seu Programa a firme intenção de pôr fim a esta

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situação, através da promoção da aprovação de uma nova lei da água. E cabe também dizer, embora todos o saibam e não precisasse de o recordar, que a Directiva-Quadro n.º 2000/60/CE, que, aliás, muito beneficiou da condução que Portugal deu ao processo - recordo que esta Directiva, depois de um processo muito complexo e longo, acabou por ser aprovada em Conselho, em Junho de 2000, precisamente na última reunião da Presidência Portuguesa, o que é um mérito de que todos nos devemos orgulhar, porque, na Europa, todos sabem disso e é bom que, em Portugal, também se saiba -, tinha um prazo para ser transposta, que era o de Dezembro de 2003. Pois bem! Passou o Dezembro de 2003, passou o Dezembro de 2004 e, infelizmente, só agora, em 2005, é possível satisfazer esse compromisso. Portanto, conseguir aprovar a lei da água é uma prioridade máxima.
A aprovação da proposta de lei da água, em termos de generalidade, como sabem, teve lugar num Conselho de Ministros dedicado ao tema do ambiente, em 5 de Junho, e acabou por ser aprovada, na especialidade, no Conselho de Ministros de 23 de Junho. Trata-se de uma proposta de lei que incorpora conteúdos de anteriores anteprojectos, em rigor, desde 2002, redireccionando-os em conformidade com as opções políticas do actual Governo e valorizando-os, do ponto de vista jurídico, de forma a melhorar a sua coerência global.
Esta proposta de lei reúne, de forma sistematizada, um conjunto de normativos sobre gestão de águas que ultrapassa os limites estritos da Directiva-Quadro, consolidando e clarificando todo o acervo legislativo relativo à protecção e gestão sustentada dos recursos hídricos.
O Governo, como adiante será explicado com maior pormenor, em vez de apresentar um documento único, entendeu apresentar duas leis, uma centrada na temática do normativo das instituições, das regras para a gestão sustentável da água, e outra, actualizando, clarificando, consolidando tudo o que tem a ver com a titularidade do domínio público hídrico.
Passarei a fazer uma apresentação sucinta de cada um desses diplomas, mas, antes, devo ainda referir que, para a transposição completa da Directiva-Quadro, é relevante um conjunto de anexos técnicos que se entendeu ser pouco apropriado constarem de uma lei que emana da Assembleia da República e, por isso, preferiu-se aprontar um decreto-lei que será discutido e aprovado, na especialidade, logo após a aprovação desta lei na Assembleia da República.
Assim, começarei por falar na lei da água e, depois, brevemente, na lei da titularidade dos recursos hídricos.
A lei da água, proposta pelo Governo, tem 103 artigos, distribuídos por 10 capítulos. Vou destacar um ou outro aspecto que me parece mais importante em cada um desses capítulos.
O Capítulo I, relativo a Disposições Gerais, estabelece objectivos, âmbito, princípios e definições em matéria de gestão sustentável das águas. Permito-me destacar, entre os vários princípios, o da dimensão ambiental da água, o do valor social da água e o do valor económico da água. Entendemos que estes valores não são contraditórios, antes, são complementares e, de alguma forma, toda a lei visa, afinal, assegurar essa compatibilidade entre valores económicos, sociais e ambientais.
Quanto ao Capítulo II, do Enquadramento institucional, de acordo com as exigências da Directiva, definem-se oito regiões hidrográficas no continente e duas nas regiões autónomas, constituídas por conjuntos contíguos de bacias hidrográficas. Estabelecem-se, depois, os principais órgãos da Administração com responsabilidades na gestão da água. É criada a figura da "Autoridade Nacional da Água", sendo as suas funções desempenhadas pelo INAG. Esta instituição assume funções reguladoras e coordenadoras, garantindo, externamente, o cumprimento das múltiplas obrigações impostas pela Directiva.
Optou-se por uma gestão especializada dos recursos hídricos, tendo por base as regiões hidrográficas, mas, naturalmente, sem descurar a integração da gestão da água na temática transversal da gestão ambiental.
Assim, são criadas, no continente, cinco administrações de regiões hidrográficas (ARH), dotadas de autonomia administrativa e financeira e património próprio. As ARH passam a ser competentes em matéria de licenciamento e de fiscalização dos recursos hídricos, assumindo também funções de planeamento. As ARH têm competência para elaborar os planos de ordenamento de albufeiras, os planos de ordenamento da orla costeira e os planos de ordenamento de estuários.
É reforçada a ideia da cooperação e da contratualização entre o Estado e os utilizadores, nomeadamente os privados, que são encorajados a associarem-se para desempenharem algumas funções tradicionalmente cometidas ao Estado.
É assegurada a necessária unidade na gestão das águas, sem prejuízo da delegação total ou parcial dos poderes das ARH em outras entidades.
A gestão dos recursos hídricos, actualmente sob a jurisdição das administrações portuárias, é submetida à orientação e à coordenação das ARH respectivas e ao recurso à técnica da delegação de poderes para atingir esse objectivo. Prevê-se que o título de utilização será a portaria governamental que concretizar os termos da delegação das ARH nas administrações portuárias.
Definem-se, também, a natureza e as atribuições das comissões de coordenação e desenvolvimento regional e dos Conselhos Nacional da Água (CNA) e de Região Hidrográfica (CRH). Estes últimos conselhos, entre outras atribuições, são chamados a dar parecer sobre o plano de investimentos públicos a realizar na respectiva região hidrográfica. Entendemos que isto é muito importante porque parte destes planos

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de investimentos passa a ser financiada pelas taxas de recursos hídricos cobradas na própria bacia hidrográfica. Portanto, os conselhos de região hidrográfica têm uma palavra decisiva a dizer sobre a forma como os recursos financeiros, arrecadados nas respectivas bacias hidrográficas, vão ser gastos ao serviço da melhoria das condições dessas próprias bacias hidrográficas.
No que diz respeito ao ordenamento e ao planeamento dos recursos hídricos, a proposta de lei identifica três tipos de instrumentos de intervenção: os planos especiais de ordenamento do território, os planos de recursos hídricos e outras medidas de protecção e valorização dos recursos hídricos.
Quanto aos planos especiais de ordenamento do território, no respeito pelo disposto na Lei de Bases de Ordenamento do Território, consideram-se os planos de ordenamento de albufeiras de águas públicas e os planos de ordenamento da orla costeira. Entretanto, a experiência mostrou ser útil criar um novo instrumento de ordenamento, o plano de ordenamento de estuários, que é, afinal, uma extensão dos POOC (Planos de Ordenamento da Orla Costeira) para a região das águas de transição, para a região dos estuários.
No que se refere aos planos de recursos hídricos, a proposta de lei concretiza os seguintes instrumentos: o plano nacional da água, os planos de gestão de bacia hidrográfica, que, aliás, emergem da própria Directiva-Quadro, e os planos específicos de gestão de águas. A figura dos planos específicos permite contemplar, de uma forma simples e flexível, uma grande diversidade de situações em que é necessário fazer um planeamento mais pormenorizado a nível de sub-bacia, de sector, de problema ou de tipo de água.
Os objectivos ambientais e monitorização das águas (Capítulo IV) resultam muito da Directiva-Quadro, na qual são estabelecidos objectivos ambientais para as águas superficiais, subterrâneas e para as zonas protegidas. Haverá, portanto, pouco a dizer sobre isso em termos de opções políticas, tão fortemente essas matérias estão enquadradas pela Directiva-Quadro da Água.
O Capítulo V refere-se à utilização dos recursos hídricos. A proposta de lei apresentada pelo Governo assenta no princípio da necessidade do título de utilização sempre que do desenvolvimento de uma actividade possam resultar danos para o estado das águas. Contudo, os recursos hídricos do domínio público são de uso e fruição comuns nas suas funções de recreio, estadia e abeberamento, desde que essas actividades sejam feitas de acordo com as condicionantes aplicáveis e não produzam alterações significativas.
Os títulos de utilização podem ter a natureza de autorização, licença ou concessão, com grau crescente de exigência e complexidade. Dez anos é o prazo máximo de duração das licenças e 75 anos o prazo máximo das concessões.
Há dois destaques que julgo interessantes: em primeiro lugar, a possibilidade de criar um mercado de transacção de títulos de utilização por meio de decreto-lei a emitir Governo. A experiência de outros países mostra que, desde que devidamente regulado, o mercado de títulos de utilização pode ajudar a superar situações de escassez de uma forma muito satisfatória para todas as partes envolvidas. Em segundo lugar, o destacado papel que pode ser atribuído às associações de utilizadores, que podem gerir em comum as licenças ou concessões de uma ou mais utilizações afins do domínio hídrico.
As ARH podem contratualizar com estas associações de utilizadores a realização de actividades que sejam de interesse comum, podendo utilizar parte da receita das taxas para fazer contratos-programa com as associações de utilizadores.
A questão das infra-estruturas hidráulicas é também tratada, podendo estas ser públicas ou privadas. Define-se um regime para empreendimentos de fins múltiplos.
No Capítulo VII trata-se do regime económico e financeiro. O regime económico e financeiro proposto obedece ao princípio da promoção da utilização sustentável dos recursos hídricos nos termos estritos da Directiva-Quadro da Água. A proposta prevê o pagamento de uma taxa de recursos hídricos para todos os utilizadores do domínio hídrico que beneficiem de prestações públicas que lhes proporcionem vantagens ou que envolvam a realização de despesas públicas.
A proposta governamental consagra - e isto é importante - o princípio da aplicação progressiva da taxa e reconhece a necessidade de isentar as utilizações pouco significativas dos recursos. Um pequeno agricultor com uma bomba de extracção de 3 ou 4 cv não vai ter de pagar pela utilização da água, apenas os grandes sistemas.
Um outro aspecto muito importante refere-se ao facto de as taxas se destinarem ao financiamento de actividades e acções que tenham por objectivo melhorar a eficiência do uso da água e a qualidade dos recursos hídricos e dos ecossistemas, bem como à amortização dos investimentos necessários para o melhor uso de água e à cobertura dos serviços de administração e gestão dos recursos hídricos.
As tarifas de todos os prestadores de serviços de água passam a estar sujeitas ao cumprimento de um conjunto de critérios que asseguram a sustentabilidade financeira desses serviços.
O Capítulo VIII é relativo à informação e participação do público. Segue-se de perto a Convenção de Aarhus, Convenção sobre Acesso à Informação, Participação Pública na Tomada de Decisões Ambientais e Acesso à Justiça em Questões Ambientais, e, naturalmente, em termos procedimentais, o Código do Procedimento Administrativo.
Quanto a fiscalização e sanções, é estabelecido, naturalmente, um regime para as contra-ordenações.
Finalmente, temos as disposições finais e transitórias. A proposta de lei-quadro da água estabelece uma calendarização de várias obrigações emergentes da transposição do articulado da Directiva n.º 2000/60/CE. Como sabem, esta Directiva-Quadro tem um calendário de implementação que se prolonga por vários

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anos. Os calendários da lei-quadro são estabelecidos em consonância com os da directiva.
Assinale-se um mecanismo de transição criado para a constituição e progressiva operacionalização das ARH e a transferência prevista de meios humanos e materiais dos organismos existentes para as correspondentes ARH.
A proposta governamental regula ainda a revogação da legislação anterior de uma forma prudente, na medida em que essa revogação fica condicionada à publicação de novos decretos-leis, evitando assim vazios legais.
De uma forma mais sintética, gostaria de fazer algumas referência ao diploma que estabelece a titularidade dos recursos hídricos.
A definição da titularidade dos recursos hídricos é uma questão prévia da maior importância para a boa aplicação de qualquer regime de gestão das águas.
No Direito português esta matéria está regulada em diplomas diversos e dispersos, alguns deles datados de 1919. As soluções nem sempre convergem, determinando a existência de frequentes conflitos de normas e de lacunas, resolvidas através de uma jurisprudência nem sempre uniforme, com as inevitáveis consequências negativas para a confiança jurídica.
Assim, quem trabalhou nestas matérias logo em 2000/2001 apercebeu-se de que não faria sentido definir um novo quadro institucional fortemente enquadrado pela Directiva-Quadro sem previamente assentar em base mais sólida a definição do regime jurídico da titularidade dos recursos hídricos.
Aqui não se regista o propósito de inovar, pelo menos de forma substancial, mas antes de consolidar e clarificar o acervo legislativo, procurando superar as referidas contradições no ordenamento jurídico e na jurisprudência dos tribunais e originando soluções consentâneas com o princípio da gestão unitária das águas.
Não se pretende, com a presente proposta de lei, como eu já disse, introduzir modificações profundas no regime actual, que na linha dos sistemas de base romanística continua a caracterizar-se por atribuir ao domínio público do Estado as águas do mar e as restantes águas, desde que navegáveis e flutuáveis.
Assim, no que diz respeito ao domínio hídrico, consideram-se três grandes segmentos: o domínio público marítimo; o domínio público lacustre e fluvial, e o domínio público das restantes águas.
Em função da titularidade, os recursos hídricos dividem-se em dominiais (pertencentes ao domínio público) e patrimoniais (pertencentes a entidades públicas ou particulares).
À excepção do domínio público marítimo, que pertence exclusivamente ao Estado, os restantes recursos hídricos públicos podem pertencer ao Estado, às regiões autónomas, aos concelhos e às freguesias.
No que concerne ao reconhecimento de propriedade privada sobre parcelas de leitos e margens públicas, considerou-se que a protecção dos direitos privados não devia ir tão longe que pudesse gerar instabilidade permanente na base dominial, continuando a permitir-se indefinidamente a invocação de direitos privados anteriores a 1864 ou 1867, como acontece com a legislação actual. Assim, estabeleceu-se um limite temporal razoável - 2014 - para a reivindicação de tais direitos privados, não parecendo justificar-se prazo mais longo.
A delimitação dos leitos e margens dominiais confinantes com terrenos de outra natureza compete ao Estado, cabendo ao INAG manter o registo dessa titularidade pública.
Manteve-se o regime das zonas adjacentes, que tem que ver com a protecção de zonas ameaçadas pelo mar ou pelas cheias, e é mantido também o conjunto de restrições de utilidade pública que já constava em diplomas anteriores.
Revogou-se expressamente a legislação de 1919 e 1971…

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, deixe-me só assinalar que terminou o tempo de que dispunha para este primeiro debate, embora a gestão da totalidade dos tempos previstos para os dois debates de hoje caiba a cada interveniente.
Portanto, o Sr. Ministro dispõe ainda do tempo previsto para a discussão da proposta de lei n.º 19/X, da qual já está a falar, mas convém não esquecer que vai haver muitos pedidos de esclarecimento. Peço-lhe, por isso, que tenha em consideração esse facto.
Faça favor de continuar, Sr. Ministro.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
De forma muito breve, quero dizer que se revogou explicitamente a lei das águas, de 1919, bem como o diploma de 1971, que continham importantes disposições sobre esta matéria.
Finalmente, remeteu-se a entrada em vigor do diploma para a data da entrada em vigor da lei-quadro da água, já que toda a matéria de utilização do domínio hídrico era regulada pelo Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, agora revogado, não devendo, portanto, essa revogação produzir efeitos antes de haver legislação que a substitua.
Em suma, e para terminar, gostava de dizer que hoje me parece ser um dia histórico, pois estamos a revogar legislação quase centenária. Estamos a modernizar, a clarificar e a consolidar o trabalho de sucessivas gerações, com especial incidência nos anos 60, 70 e 90, que foram construindo o nosso Direito da água de uma forma sempre interessante e lúcida e sempre muito ciente do interesse público, mas que,

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apesar de tudo, estas sucessivas gerações revelam ter alguma desarticulação conceptual.
Deu-se noção a esse edifício e trouxe-se o impacto novo de uma lei de água virada para a gestão sustentável dos recursos hídricos.
Recordo - se me permitem que deixe uma nota pessoal - que quando me licenciei e comecei a trabalhar nestes assuntos estava a ser criada a Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos (estou a falar da década de 70). Qual era o tema que na altura se propunha como grande tarefa? Uma nova lei de água! Pois bem, qualquer coisa como 30 anos depois foi com muito gosto que nos coube vir propor à Assembleia da República essa lei da água.
É por isso que é minha convicção que, independentemente da legítima opinião e do legítimo sentido de voto de cada um, devemos sentir satisfação e - permitam-me que o diga - até algum orgulho por ter cabido à nossa geração, e ter cabido a nós, propor, apreciar e votar a nova lei-quadro da água de Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Adão Silva.

O Sr. Adão Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, cumprimento-o pelo discurso de fortíssima densidade técnica, dificilmente apreensível pelos cidadãos deste país.

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Isso é mau!

O Orador: - Mas, Sr. Ministro, vamos falar de coisas concretas.
No momento em que se discute no Parlamento a proposta de lei-quadro da água, que aborda questões como a utilização sustentável da água ou a mitigação dos efeitos das inundações e das secas, não posso deixar de questionar o Sr. Ministro sobre as suas declarações recentes quanto à construção da barragem do Baixo Sabor.
Como é sabido, trata-se de um investimento da maior importância para Portugal, para a Região Norte e também para o distrito de Bragança. Apresentada no decurso da segunda metade dos anos 90 como alternativa ideal à barragem do Côa, viria a ter o seu projecto de construção sujeito a discussão pública durante o ano 2000.
Sendo ao tempo Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território o actual Primeiro-Ministro, José Sócrates, foi determinado que deveriam ser feitos novos estudos.
O processo caiu então num impasse e nada mais aconteceu. Só em Junho de 2004 o então Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, Arlindo Cunha, viria a emitir a declaração de impacte ambiental, criando, assim, condições para que a construção da barragem pudesse avançar.
No dia 6 de Junho de 2005, V. Ex.ª, Sr. Ministro, foi a Barca d'Alva e surpreendeu-nos com declarações que cito: "o actual projecto tem de ser reanalisado", "o projecto tem um problema inultrapassável: Bruxelas questiona o seu financiamento" e "tem de se reponderar um investimento daquela natureza, naquelas condições e naquele local".

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Mais um grupo de trabalho!

O Orador: - Numa palavra, V. Ex.ª veio dizer-nos que a barragem do Sabor não será construída apesar dos estudos e dos projectos já existentes e que as instâncias comunitárias se mostraram desfavoráveis ao co-financiamento do projecto.
Trata-se, de facto, de afirmações decepcionantes para as populações do distrito de Bragança.
Com efeito, é oportuno recordar, especialmente num ano de seca extrema como aquele que atravessamos, que a construção da barragem do Sabor constituiria uma terceira albufeira da maior importância, implantada no curso superior do rio Douro e capaz de mitigar uma escassez de água que já se constata, neste momento, a nível desse rio.
Por outro lado, sabe-se que a produção de energia eléctrica directamente na barragem do Sabor e na cascata das quatro barragens do rio Douro, a jusante da foz do rio Sabor, seria muito significativa, aumentando a autonomia energética do País à custa de energias renováveis. Devem ainda lembrar-se os efeitos do contributo da barragem para a redução das emissões de gases com efeitos de estufa e também a capacidade que ela teria para a redução dos efeitos destrutivos das cheias que, ciclicamente, fustigam o rio Douro, entre outras razões que não vou agora abordar para não me alongar.
Por isso tenho de colocar-lhe algumas questões, Sr. Ministro: qual foi a instância da União Europeia que se manifestou contrária à construção da barragem do Sabor? Qual é o documento comunitário que se refere a essa questão (e permito-me dele solicitar-lhe, desde já, uma cópia)? Qual foi o financiamento comunitário solicitado, em que montantes, com que propósito e com que justificação, no âmbito do projecto? Aventando-se a hipótese de a barragem ser construída noutro local, qual é essa alternativa? Finalmente, Sr. Ministro - e vejo que o Sr. Secretário de Estado do Ambiente está a ajudá-lo na resposta… -, quando é que V. Ex.ª se disponibiliza para receber os quatro presidentes de câmara do distrito de Bragança -…

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O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Não tem tempo!

O Orador: - … Alfândega, Macedo de Cavaleiros, Mogadouro e Torre de Moncorvo -, que já lhe pediram uma entrevista e precisam de dar respostas às populações locais, que V. Ex.ª disse que não recebia, pedindo ao Sr. Secretário de Estado que assumisse esta responsabilidade?

Aplausos do PSD.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): - E sobre a lei da água não diz nada?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Ministro vai responder a grupos de três pedidos de esclarecimento.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Marcos Sá.

O Sr. Marcos Sá (PS): - Ex.mo Sr. Presidente, Ex.mo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Ex.mo Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, Ex.mo Sr. Secretário de Estado do Ambiente, Srs. Deputados: É para mim uma honra assinalar a minha primeira intervenção neste Plenário com a discussão da lei-quadro da água, instrumento legislativo fundamental na procura de soluções para os problemas relacionados com a preservação dos recursos para as próximas gerações.
Como é do conhecimento desta Câmara, o Governo do Partido Socialista aprovou em Conselho de Ministros, no passado dia 5 de Junho, Dia Mundial do Ambiente, uma proposta de lei-quadro da água e uma proposta de lei sobre a titularidade dos recursos hídricos.
Esta iniciativa do Governo, nos primeiros 100 dias, demonstra a prioridade dada ao Ambiente, pois permite assegurar a transposição da Directiva 2000/60 do Parlamento Europeu e do Conselho.
Importa, por este motivo temporal, recordar que, não tendo o Governo PSD/PP realizado a transposição da Directiva-Quadro da Água no prazo estipulado, ou seja, Dezembro de 2003, os grupos parlamentares que o apoiaram apresentaram na presente Legislatura dois projectos de lei sobre este tema, como se não tivessem tido responsabilidades governativas no passado recente!!…

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Muito bem! Bem lembrado!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A presente proposta de lei da água assegura a transposição da Directiva e estabelece as bases para a gestão sustentável dos recursos hídricos, definindo um novo quadro institucional para o sector.
O novo enquadramento institucional é harmonizado com o princípio da região hidrográfica como unidade principal de planeamento e gestão, tal como imposto pela Directiva.
São, assim, criadas cinco administrações de região hidrográfica (ARH), cujas sedes coincidem com as das actuais Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR).
As administrações de região hidrográfica recebem as actuais competências das CCDR em matéria de licenciamento e fiscalização de recursos hídricos, bem como os meios materiais e humanos afectos a tais tarefas e assumem também as funções de planeamento que estão hoje concentradas no Instituto da Água. Por seu turno, o Instituto da Água passa a desempenhar funções reguladoras e coordenadoras, enquanto autoridade nacional da água.
A lei da água põe fim à actual divisão entre o regime aplicável à gestão das águas marítimas e o regime aplicável à gestão das restantes águas.
É criado ainda um sistema único para a gestão sustentável das águas, qualquer que seja a sua natureza e a dos respectivos terrenos confinantes. Esta unificação obrigou a uma reformulação completa do regime de utilização de tais recursos, que passa a estar sob a égide de uma única autoridade nacional.
A Directiva impõe também a reforma integral do regime económico-financeiro aplicável à utilização das águas.
A lei da água vem definir as bases desse novo regime, prevendo-se a sua aplicação progressiva de modo a assegurar as necessidades de financiamento da gestão das águas, sem, todavia, perder de vista as suas respectivas consequências. económicas, sociais e ambientais.
Compete a todos nós assegurar que esta lei seja implementada com eficácia, para que as gerações futuras disponham de água suficiente e que esta satisfaça normas de elevada qualidade.
Sr. Ministro, para finalizar gostaria de deixar-lhe uma questão concreta:…

Vozes do PCP e do BE: - Ahhh!…

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Estava a ver que não fazia perguntas!…

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O Orador: - … conhecendo V. Ex.ª os projectos de lei do PSD e do CDS-PP,…

O Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr. Deputado

O Orador: - Vou já concluir, Sr. Presidente.
Como dizia, conhecendo V. Ex.ª os projectos de lei do PSD e do CDS-PP, gostaria que realçasse, por comparação, as principais diferenças e vantagens das propostas apresentadas pelo actual Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, V. Ex.ª pronunciou-se sobre os dois diplomas que o Governo aqui traz à discussão e as minhas questões versam, justamente, sobre estes dois diplomas.
Em primeiro lugar, gostaria de chamar-lhe a atenção para o facto de ter começado a sua intervenção de apresentação da proposta de lei-quadro da água com a declaração - que não deixa de ser interessante - de que "o grau de civilização se vê pela forma como os povos tratam os seus rios"… Faço-lhe a justiça, Sr. Ministro, de reconhecer que quando falou em rios estava a tentar usar uma linguagem algo literária e que a sua visão é bem mais lata do que esta redução do meio hídrico exclusivamente aos rios.
No entanto, a lei da titularidade não deixa de cair neste "pecado" da restrição da visão que estabelece em relação ao meio hídrico, que passa a pertencer ao domínio público, isto é, os sistemas aquíferos constituem, no nosso país, uma reserva de água estratégica absolutamente fundamental (veja-se a sua importância e a sua relevância neste período de seca prolongada); no entanto, o diploma do Governo retira os sistemas aquíferos da titularidade pública das águas, deixando a definição de "outras águas" exclusivamente para águas subterrâneas, num conceito muito mais estreito do que este.
Devo dizer-lhe que esta é uma matéria que deve ser clarificada. Em nosso entender, este é um ponto central nesta proposta do Governo sobre titularidade e não vemos qualquer razão plausível para uma exclusão desta natureza.
Sobre a lei-quadro, ao longo da sua intervenção o Sr. Ministro, apelou regularmente para os normativos comunitários e para o facto de esta lei-quadro se submeter a esses normativos comunitários. Deixe-me dizer-lhe que, em termos da lei-quadro e de normativos comunitários, nada há que obrigue o Governo português a uma opção no sentido de uma escolha de política liberal em relação à água, porque é isto que, de facto, a lei-quadro é.
Recordo-lhe, Sr. Ministro, que mesmo a Directiva europeia, que se encontra em discussão, sobre o mercado interno de serviços e que tem sido, muito justamente, considerada uma proposta de directiva avassaladora, destruidora dos serviços públicos no espaço europeu (mesmo essa), não obriga os Estados-membros e admite que são objecto de derrogações ao princípio do país de origem, como é o caso dos serviços postais e dos serviços de distribuição de água.
Temos, portanto, Sr. Ministro, que a orientação de fundo, política, central, a marca mais importante da lei-quadro que hoje traz, aqui, à discussão é a abertura ao mercado privado dos sistemas de distribuição da água - sistemas de distribuição em alta e em baixa; é o que dá a marca liberal a esta proposta de lei-quadro e que, em nosso entender, não é a resposta a nada do que seja vinculativo em termos das orientações da União Europeia.
Sr. Ministro, conviria que admitisse que essa é uma escolha do Governo, é a sua escolha, é a escolha que propõe à Assembleia da República!!

Vozes do BE: - Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Telmo Correia.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.

O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: - Sr. Presidente, quero começar por agradecer a todos os Srs. Deputados que intervieram, colocando as suas questões. Vou, naturalmente, responder com muito gosto.
Uma vez que o tema desta sessão é a lei da água, vou dar prioridade àqueles que a ele se referem e tratarei, depois - e, se me permitem, mais brevemente, pois teremos oportunidade, com certeza, para falar sobre outros assuntos -, da questão colocada, que é sem dúvida pertinente, sobre o Sabor.
Vou começar do fim para o princípio, do último para o primeiro, ou seja, vou começar por responder à Sr.ª Deputada Alda Macedo.
Em primeiro lugar, Sr.ª Deputada, há uma questão que me parece importante assumir: não sou daqueles que se desculpam com Bruxelas para tudo e mais alguma coisa. As opções que constam desta lei são

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opções nossas, deste Governo, nomeadamente nos aspectos que referiu. De facto, Bruxelas estabelece um conjunto de princípios orientadores, um conjunto de regras que devem presidir à gestão - nesse sentido, em alguns aspectos, delineia as próprias estruturas institucionais -, mas de forma nenhuma os determina de forma imperativa.
Portanto, tudo o que está neste diploma é da nossa responsabilidade, é da responsabilidade do Governo.
Não obstante, penso que encontrou coisas neste diploma que não estão lá - talvez, se me permite, por fazer uma leitura preconceituosa, num sentido neutral, com um certo parti pris.
Encontra um forte liberalismo. Não me revejo nessa afirmação. Há, efectivamente, não uma alteração, mas um reconhecimento do status quo face à existência na legislação portuguesa, desde sempre, de águas públicas e de águas privadas. Sabemos que 99% das águas superficiais em Portugal são públicas, mas apesar de tudo esses regimes jurídicos existem.
Dito isso, o que esta lei de águas vem dizer - e isto contraria a deriva liberal que afirmou - é que, mesmo as águas privadas, estão sujeitas a uma disciplina pública. É isso que esta lei traz. Não é criar águas privadas.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Estamos a falar de concessionários por 75 anos, Sr. Ministro!

O Orador: - Não há uma gota de água que passe a ser privada por via desta lei.

Risos do Deputado do PCP Bernardino Soares.

O que há é o reconhecimento de que, mesmo as águas privadas, estão sujeitas a uma disciplina de interesse público. E, portanto, se me permite, esta lei vai num sentido algo contrário àquele que afirmou.
Depois, trouxe também para esta discussão uma questão que sei que gosta, que lhe interessa e julga pertinente discutir, que é a das empresas multimunicipais, dos sistemas em alta, em baixa, o problema dos privados. É, seguramente, uma das questões mais importantes, mais pertinentes que temos em agenda. No entanto, se me permite, passa um pouco ao lado desta lei. Esta lei não trata das empresas multimunicipais.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Trata de concessões!

O Orador: - Esta lei não trata da delimitação dos sectores. Se quer saber, isso foi feito, exactamente, em 1993, com a alteração da delimitação dos sectores, com a criação da figura das empresas multimunicipais, que podem ser privadas até 49%. É o que diz a legislação, que, entretanto, sucessivos governos mantiveram - e bem! - em vigor.
Mas não é esta lei que faz isso. Esta lei, evidentemente, vem dar uma espécie de enquadramento jurídico, de "chapéu" ou de cobertura jurídica, dizendo que há vários títulos de utilização da água, como a autorização, a licença e a concessão.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Até 75 anos!

O Orador: - A concessão é o que se aplica a esses grandes sistemas em alta e em baixa e ao acesso aos privados. Mas, Sr.ª Deputada, hoje já existem concessões! As empresas multimunicipais operam com termos de concessão.
Sr.ª Deputada, por favor, perceba que uma lei deste tipo não vem só trazer coisas novas; muitas vezes, vem consolidar e arrumar coisas que existem no direito, como é próprio de uma lei de bases, como é próprio de uma lei-quadro. É isso que esta lei faz, explicando bem o que é uma concessão e os termos de uma concessão. No entanto, hoje já existem concessões, pelo que não estamos a inventar. Portanto, a Sr.ª Deputada está a criticar a legislação de 1993, sucessivamente repetida e acolhida por todos os governos seguintes.
Como não me posso alongar muito, vou passar às observações, que naturalmente me pareceram pertinentes, do Sr. Deputado Marcos Sá.
Sr. Deputado, antes de responder concretamente à sua pergunta, queria realçar uma observação que me parece importante. Falou nas próximas gerações. De facto, não estamos a fazer uma lei para durar 5 ou 10 anos. A minha convicção - e, naturalmente, é um julgamento subjectivo - é que estamos a discutir e iremos aprovar uma lei para décadas. Portanto, é realmente uma lei para as próximas gerações, o que lhe dá um sentido histórico, seja qual for a opinião que tenhamos sobre ela.
Pergunta-me sobre as principais diferenças…

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, esgotou o seu tempo.

O Sr. Adão Silva (PSD): - E a minha resposta?

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O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Como tem ainda outra ronda de perguntas, poderá aproveitá-la para concluir as respostas.

O Orador: - Muito bem, Sr. Presidente. Vou juntar essa resposta à próxima volta e gerir melhor o tempo.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território, nesta matéria, conte, por parte do CDS-PP, com uma oposição responsável, com uma oposição que tem sempre em vista o interesse nacional. Por isso mesmo, queria, antes de mais, felicitá-lo por trazer esta matéria à Câmara.
É uma questão estruturante para o futuro do País, essencial para o futuro das próximas gerações e, acima de tudo, importante, porque estamos a debatê-la quando o País atravessa um dos piores períodos de seca das últimas décadas.
O Sr. Ministro é, reconhecidamente, um especialista nestas matérias e queria agradecer a sua honestidade intelectual em reconhecer que este diploma já estava preparado pelo XVI Governo Constitucional (estava em fase de consulta pública), sendo o responsável por esta área o Dr. Luís Nobre Guedes…

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Dos sobreiros!

O Orador: - …e tendo a colaboração do ex-secretário de Estado e hoje Deputado do PSD, o Eng.º Jorge Moreira da Silva.
Por isso mesmo, Sr. Ministro, há uma primeira crítica muito contundente que temos de fazer à apresentação destes projectos por parte do Governo. É que, de facto, não faz sentido nenhum separar a lei da água da lei da titularidade dos recursos hídricos. Penso, muito sinceramente, que o próprio Governo o reconhece.
Reconhece-o, logo à cabeça, nos projectos que apresenta, porque faz um conjunto de remissões, relativamente quer à data da entrada em vigor quer ao regime sancionatório, da lei da titularidade dos recursos hídricos para a lei da água.
Reconhece-o, aliás, o Sr. Ministro quando hoje aqui, no Parlamento, fez a apresentação conjunta dos dois projectos como se fossem um só. Espero, muito sinceramente, que o Governo não esteja só a separar estes dois projectos para dizer que está a fazer diferente, que tem alguma coisa de novo relativamente ao projecto do XVI Governo Constitucional. Pode ser que, no debate em sede de especialidade, o Governo repense esta matéria, porque, como o Sr. Ministro dizia, e com razão, se estamos a falar de uma lei para gerações, é preferível que consigamos consolidar tudo numa única lei-quadro, numa única lei de bases, que até possa evoluir (esse era o nosso desejo) para um "código da água".
Porém, Sr. Ministro, queria colocar-lhe duas questões muito concretas e que me parecem fundamentais para este debate.
O Governo aprovou, no passado dia 5 de Junho, na generalidade, dois decretos-leis que são fundamentais para fazer o debate sobre esta matéria (aliás, penso que é muito difícil fazer este debate não os conhecendo), que estabelecem o regime económico e financeiro dos recursos hídricos e o quadro de acção comunitária no domínio da política da água. Considero, além do mais, que demonstra alguma arrogância - que o Partido Socialista, como maioria, vai começando a ter, passados pouco mais de 100 dias da sua tomada de posse enquanto Governo - o facto de aprovar decretos-lei sobre matérias em relação às quais este Parlamento nem sequer se pronunciou.
Acima de tudo, há uma questão que é fundamental para este debate, e passo imediatamente às questões que quero colocar-lhe.
Está o Sr. Ministro disponível para dar a conhecer esses diplomas a este Parlamento?
Em segundo lugar, está ou não disponível para mudar esses diplomas se o Parlamento, ao aprovar esta proposta de lei-quadro da água, mudar também um conjunto de disposições fundamentais?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, igualmente para pedir esclarecimentos.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, na sua intervenção, V. Ex.ª disse que o que o Governo aqui apresenta hoje é um trabalho de gerações, tendo dito que já há 30 anos se aspirava à aprovação de uma lei da água. Ora, essa era uma razão mais do que suficiente para o Governo ter tratado este debate com outra dignidade.

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É que não faz qualquer sentido que, sendo um trabalho de gerações e correspondendo a uma aspiração de há já 30 anos, o Governo apresente uma proposta de lei numa semana para ser discutida na que se lhe segue e, ainda por cima, nem permitiu que a comissão competente pudesse fazer um relatório circunstanciado e pormenorizado sobre a matéria.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Não é verdade!

O Orador: - Fomos, pois, confrontados com o que a comissão pôde fazer - um relatório com três páginas -, o que não é responsabilidade sua mas é devido à forma como o Governo tratou este debate.
Esta proposta de lei merecia mais, merecia que, antes deste debate na generalidade, a Assembleia tivesse procedido a um amplo debate público, com audições. Aliás, dessa forma, teríamos ficado a conhecer melhor a posição da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, que, pelos vistos, é profundamente negativa relativamente às propostas do Governo. Não houve tempo para tal, o que se lamenta.
Em todo o caso, esperemos que, daqui até à aprovação final global dos diplomas em discussão, haja possibilidade de quebrar este manto de silêncio que se formou em torno de uma legislação tão importante quanto esta que regula a matéria da água e que hoje está em discussão.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O Governo traz-nos um diploma que afirma ser a transposição de uma directiva comunitária relativamente à água. Importa, pois, que confrontemos as opções do Governo com as constantes dessa Directiva n.º 2000/60/CE.
Chamo a atenção, designadamente, para um princípio que, nos termos da directiva, assume grande importância, o princípio da participação, que consta do 46.º considerando da mesma, onde se refere que "Para garantir a participação do público em geral, inclusivamente dos utilizadores das águas, na elaboração e actualização dos planos de gestão de bacias hidrográficas, é necessário fornecer informações adequadas acerca das medidas previstas e do progresso alcançado na sua execução, por forma a permitir a participação do público em geral antes da adopção das decisões finais relativas às medidas necessárias".
Pela leitura que acabo de fazer, vemos bem a importância atribuída ao princípio da participação, mas também vemos a pouca importância que lhe é dada na proposta de lei.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Os mecanismos de participação que estão previstos são meramente simbólicos e incipientes, quando seria possível e desejável - e nós propomo-lo - que houvesse maiores consequências deste princípio da participação, promovendo mais o direito de participação dos interessados em matérias relacionadas com a água.
Há um outro aspecto com o qual gostaria de confrontar o Governo.
A directiva diz, logo no início, que a água não é um produto comercial como outro qualquer mas um património que deve ser protegido, defendido e tratado como tal.
Ora, verificamos que, mais do que uma lei-quadro da água, o que o Governo nos propõe é uma lei sobre o mercado da água. Sr. Ministro, esta é, para nós, uma questão fundamental.
De facto, o que o Governo se propõe regular é a forma como os concessionários vão ter acesso à água e como é que os utilizadores vão ter de pagar a utilização da água.
Vemos o princípio do poluidor-pagador, mas não vemos o princípio do utilizador-pagador. Portanto, o Governo não transpõe o que devia e, a pretexto da directiva, pretende legislar por forma a considerar a água como um produto mercantilizável, o que é uma opção que consideramos profundamente negativa para o presente e para o futuro dos portugueses.

Aplausos do PCP:

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, também para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, o assunto que nos traz aqui, hoje, é da maior importância. O Sr. Ministro disse que temos o privilégio de legislar sobre a água, mas considero que, mais do que um privilégio, é uma grande responsabilidade.
De facto, a água é um bem fundamental à vida; sem água não há vida. Penso que isto tem de estar na base da discussão de qualquer lei sobre a água.
O Sr. Ministro traz-nos uma proposta de lei-quadro sobre a água para a qual, supostamente, transpõe a directiva comunitária sobre a matéria. No entanto, devemos dizer que esta proposta de lei-quadro, enquanto

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tal, mostra-se muito pobre, porque uma lei-quadro deve instituir grandes princípios fundamentais, designadamente o acesso à água como um direito, por se tratar de um bem insubstituível, essencial à vida. Esta proposta de lei não apresenta a água desta forma, antes como um produto mercantilizável. Aliás, a própria directiva, infelizmente, já abre essa porta, ao dizer que a água não é um produto mercantil como outro qualquer. Não será "como outro qualquer" mas, afinal, parece que é um produto mercantil e, do nosso ponto de vista, não pode sê-lo. Entendemos que a água tem de ser vista como um bem que tem de estar acessível às populações em condições de igualdade, equidade e justiça.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, infelizmente, devo dizer-lhe que, em nosso entender, as suas propostas têm um pendor mercantilista e liberalista.
Apesar de a proposta de lei, se comparada com a apresentada pelo anterior governo PSD-CDS, ser um pouco mais soft em termos de linguagem, receio até que tal seja para encobrir as verdadeiras intenções que estão por trás do texto que nos é apresentado. Na verdade, não se vê uma grande preocupação, por exemplo, com a utilização racional da água.
É que, Sr. Ministro, não é consagrando o princípio do utilizador-pagador e o princípio do poluidor-pagador que resolvemos os problemas da escassez da água. Ora, aí está um outro princípio que a proposta de lei não apresenta de uma forma clara: a água como um bem escasso, cuja qualidade é preciso proteger a todo o custo.
Em termos da qualidade, aí, sim, a directiva põe uma clara tónica, tónica essa que esta proposta de lei de alguma forma atira para uma área marginal. De resto, nem sequer se revogam os diplomas respeitantes à qualidade da água e que estão em vigor neste momento.
Portanto, a única coisa que os senhores fazem é avançar com uma taxa e com a possibilidade de entrada dos privados na gestão da água. Trata-se, pois, de toda uma visão mercantilista com a qual não podemos concordar.
Digo que não podemos concordar com esta visão porque, quando se trata de privados a gerir bens, naturalmente, o que pretendem é vender e quanto mais venderem, melhor. Para os privados, os melhores clientes são os que gastam mais e até, se esbanjarem mais, tanto melhor, porque vão pagar mais. Por isso, entendemos que a gestão correcta do bem "água" apenas pode ser feita por entidades públicas que prestem um serviço público e coloquem a salvaguarda desse bem fundamental acima de qualquer outro interesse.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, finalmente, tenho de dizer-lhe que, na altura em que era governo,…

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Sr. Deputado, esgotou o tempo de que dispunha. Por favor conclua.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Como dizia, o PSD cometeu um erro que foi o de querer que esta legislação passasse por uma proposta de lei de autorização legislativa. Felizmente, depois, recuou. Ainda assim, o governo de então colocou na Internet os projectos de lei para discussão pública, apesar de não ter avisado ninguém que lá estavam disponíveis. Portanto, só quem o adivinhasse ou deparasse com eles ao "navegar" na Internet é que poderia participar na discussão pública, ainda por cima na altura do Natal e do Ano Novo. Mas, enfim, "águas passadas não movem moinhos".
Agora, os senhores nem sequer procederam da mesma forma e, com um prazo de apenas uma semana para discussão na especialidade, apresentam à Assembleia uma proposta de lei extremamente técnica, extremamente hermética, de difícil compreensão por parte de leigos…

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: - Concluo já, Sr. Presidente.
Portanto, espero que a Assembleia, ao ter evitado um mal maior por ter decidido que todas as iniciativas legislativas sobre esta matéria baixarão à comissão sem votação, possa permitir ainda uma profunda e ampla consulta a todos os sectores técnicos da sociedade portuguesa, consulta essa que é fundamental, uma vez que se trata de mexer em todo o antiquíssimo regime da água que temos em Portugal.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para responder a este conjunto de pedidos de esclarecimento, tem

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a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.

O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: - Sr. Presidente, vou tentar responder de forma breve.
O Sr. Deputado Mota Soares coloca questões que acabam por ajudar-me a responder à pergunta que tinha sido feita anteriormente pelo Deputado Marcos Sá.
O Sr. Deputado pede-me que, em nome da honestidade intelectual, reconheça que o trabalho estava praticamente feito.
Bom, em nome da honestidade intelectual, devo dizer-lhe que é obrigação de cada governo, quando entra em funções, ver o que está feito, aproveitar, potenciar, reorientar e levar por diante. Foi o que fizemos. Assumimo-lo completamente.
Aliás, foi o mesmo que os senhores fizeram quando, em 2002, assumiram o poder, como consta de despachos em que está dito que "recebemos uma lei praticamente pronta: Vamos introduzir algumas alterações e andar com ela para a frente". Foi isso que foi feito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Se me permite, num tom um pouco áspero, dir-lhe-ei que é mais razoável um governo utilizar o que tem em cima da mesa e que merece ser levado por diante, introduzindo-lhe as alterações que entender, do que, depois de três anos sem pôr cá fora a lei, sair com os papéis debaixo do braço e apresentá-la na Assembleia da República, sob a forma de projecto de lei.

Aplausos do PS.

Vejamos agora as principais diferenças acerca de que fui questionado.
- Separação em dois documentos (depois, explicarei porquê).
- Reforço da natureza das ARH que, aqui, são organismos com personalidade jurídica, com autonomia administrativa e financeira, com uma muito maior capacidade de interlocução a nível regional e, por via disso, reforço da gestão por bacias hidrográficas.
- Inclusão das competências nas zonas costeiras, nomeadamente, elaboração dos POOC (planos de ordenamento da orla costeira) e jurisdição sobre os estuários. Isto prende-se com uma outra questão que é a da política para o litoral que, com certeza, teremos muitas oportunidades de discutir no futuro. Ora, nesta proposta de lei, sente-se já uma primeira inflexão na política para o litoral. As ARH vão ocupar-se do litoral e das zonas costeiras.
- Unificação da gestão do domínio hídrico, com uma competência unificada no INAG e nas ARH, considerando-se os outros exercícios, nomeadamente do ICN e das administrações portuárias, como administrações delegadas.
- Reforço dessa capacidade de delegação e de contratualização, nomeadamente com entidades públicas e privadas.
- Introdução da figura de "planos de ordenamento de estuários".
- Diminuição e simplificação dos planos de recursos hídricos (na versão que recebemos, havia, salvo erro, 11 tipos de planos diferentes e limitámo-nos a três, que são o nacional, o de bacia hidrográfica e os planos específicos).
- Os privados podem gerir concessões para aproveitamentos de fins múltiplos e, em geral, há um maior apelo (e aqui, para desagrado de algumas intervenções feitas por outros Srs. Deputados) aos privados e à sociedade civil.
- Normas para o estabelecimento de tarifas a observar por todos os serviços de água, criando balizas e procurando dar os primeiros passos para uma área muito sensível, que é fazer convergir as tarifas de todos os serviços de água em Portugal para valores sustentáveis.
- Melhor explicitação da transição das instituições actuais para as futuras ARH.
- Gradualismo das taxas e isenção dos pequenos utilizadores (nada disto constava da lei anterior).
- Eficácia revogatória, um sistema mais sofisticado para revogação.
Estas são apenas algumas diferenças. Uma comparação cerrada e mais detalhada dos textos permitirá encontrar outras diferenças.
Porquê duas leis? O Sr. Deputado também colocou esta questão, que, aliás, já vinha de trás. Estas leis têm objectivos complementares, mas muito distintos. A lei da água procura definir o enquadramento institucional e os instrumentos e normas para uma gestão sustentada. A titularidade actualiza, clarifica e consolida a titularidade pública das águas, consagrando princípios constitucionais, normas e fundamentos do sistema jurídico e práticas tradicionais neste domínio.
A lei da água aplica-se a todas as águas, públicas e privadas. A titularidade tem a ver com as águas públicas.
As questões das águas privadas estão no Código Civil, pelo que, por analogia, os senhores deviam ter transposto do Código Civil para a lei das águas. Ora, nós não sentimos essa necessidade e, portanto, preferimos

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fazer dois documentos separados: um, que revê o problema da titularidade das águas públicas, porque, esse sim, precisava de ser clarificado, mas separado da lei das águas, que trata de águas públicas e privadas. É uma questão de lógica.
Quanto ao código da água, um dia, discutiremos esta matéria. Aliás, o Sr. Deputado fez-me um elogio, dizendo que eu era um especialista. Não sei se o serei, mas não sei o que é um código da água. Essa é uma longa conversa, que, um dia, noutra oportunidade, teremos.
Outras questões são de índole mais polémica…

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Sr. Ministro, o seu tempo está esgotado. Peço-lhe que seja breve.

O Orador: - Quero apenas dizer aos Srs. Deputados António Filipe e Francisco Madeira Lopes que, embora compreendendo, no sentido em que acho coerentes, as vossas interpelações, a lei da água não é um manifesto, não é um elencar de princípios e de objectivos grandiloquentes. A lei da água, mesmo a lei de bases, é um conjunto de procedimentos operacionais inspirado em princípios.

Protestos do Deputado de Os Verdes Francisco Madeira Lopes.

E se for ler com atenção os princípios que constam desta lei da água, verificará que está lá o valor social da água, está lá o direito, até está lá dito que, embora a água seja um bem económico, isso não pode sobrepor-se ao direito ao acesso à água e não pode servir propósitos de discriminação social. Na lei, está lá dito isso.
Portanto, mesmo esses princípios, estão lá consagrados. Mas naturalmente ela não se limita ao elencar desses princípios.
Para já, é tudo o que tinha a dizer.

Aplausos do PS.

O Sr. Adão Silva (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Adão Silva (PSD): - Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Que seja, Sr. Deputado.

O Sr. Adão Silva (PSD): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa tem a ver com o seguinte: a lei-quadro da água, hoje aqui em discussão, trata da gestão das águas, nomeadamente das superficiais. Mas não há gestão se não houver água.
Ora, fiz um conjunto de perguntas muito concretas ao Sr. Ministro, sobre a questão da construção da barragem do Sabor, a propósito de um conjunto de declarações que o Sr. Ministro fez, que foram polémicas, incompreensíveis e deixaram toda a gente de boca aberta, nomeadamente no distrito de Bragança, e o Sr. Ministro não respondeu, como, aliás, aconteceu em sede de comissão.
Aliás, sobre esta matéria, o Sr. Ministro também não quer responder aos autarcas, presidentes de câmara do distrito de Bragança, os quais lhe solicitaram uma reunião no dia 9 de Junho e aos quais o Sr. Ministro disse que a mesma seria marcada oportunamente.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua a sua interpelação, que, de resto, está longe de o ser.

O Orador: - Portanto, tenho de pedir-lhe, Sr. Presidente, que tome medidas no sentido de que o Sr. Ministro responda a estas questões, porque, se assim não for, o Grupo Parlamentar do PSD vai solicitar a presença do Sr. Ministro na respectiva comissão parlamentar, para tratar exclusivamente da matéria relativa à barragem do Sabor.
Desculpe, Sr. Ministro, esta minha assertividade, mas tinha de fazê-lo desta maneira.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Sr. Deputado Adão Silva, os tempos para o debate estão distribuídos e a Mesa da Assembleia não toma medidas, conduz os trabalhos. Nesse sentido, digo-lhe, Sr. Deputado, que o Sr. Ministro usou do tempo de que dispunha para responder como entendeu.
Uma vez que existe uma interpelação e o Governo tem o seu tempo completamente esgotado neste debate, a não ser que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista ceda tempo ao Governo, o Sr. Ministro

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não poderá voltar a intervir.
A Mesa foi, no entanto, informada, neste momento, que o Partido Socialista cede tempo ao Governo, pelo que o Sr. Ministro terá oportunidade de voltar a intervir.
Independentemente disso, perante esta interpelação e para o mesmo efeito, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares pediu para usar da palavra.
Tem a palavra, Sr. Ministro. Peço-lhe que seja breve,

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): - Sr. Presidente, no mesmo sentido, quero, muito brevemente, dizer duas coisas.
Primeiro que o Sr. Ministro responderá à pergunta, visto que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista faz o favor de ceder o tempo necessário para o efeito.
Em segundo lugar, há disponibilidade total de qualquer membro do Governo para comparecer em qualquer comissão, desde que essa comissão o solicite.

Aplausos de Deputados do PS.

Aliás, o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional já teve oportunidade de discutir esta matéria em sede de comissão, para além de que a figura regimental das perguntas de âmbito geral ao Governo pode muito bem ser utilizada pelo Sr. Deputado Adão Silva para colocar todas as questões.

Protestos do PSD.

Agora, na medida em que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista cede tempo ao Governo, se o Sr. Presidente autorizar, o Sr. Ministro completará as respostas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Ah, isso é que é bom!

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para apresentar o projecto de lei n.º 51/X, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva.

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Dificilmente encontraremos, nesta Legislatura, um momento tão relevante da política ambiental.
Deixemos a "partidarite" à porta e tratemos da solidariedade intergeracional, porque é isso que está em causa neste debate.
A água, sendo dos mais abundantes e dos mais relevantes recursos planetários, é também aquele cujo estado mais reflecte a pobreza dos povos.
Aqueles 2000 milhões de cidadãos sem acesso a água potável pertencem precisamente à mesma região onde mais de 1000 milhões vivem em situação de pobreza extrema e 3000 milhões morrem anualmente devido a doenças transmitidas pela água.
Portugal, ao contrário dessas regiões, padece mais de uma crise na gestão da água do que de uma crise de falta de água, que, quando ocorre, como sucede neste momento, sendo grave, é, ainda assim, cíclica e temporária.
Neste quadro, o esbanjamento, o desperdício e a poluição da água representam um prejuízo ambiental e económico para o País, mas configuram também, se visto à escala global, uma imoralidade.
Este é, pois, o debate da solidariedade entre gerações, da coesão nacional e da regulação da globalização.
É, por isso, essencial aprovar e aplicar regras que, estabelecendo direitos mas também deveres, permitam: proteger e melhorar o estado dos ecossistemas aquáticos; impulsionar o uso sustentável de água, baseado numa gestão de longo prazo; mitigar os efeitos das inundações e das secas; assegurar o fornecimento em quantidade suficiente de água de boa qualidade; e promover o ordenamento do domínio hídrico.
Protecção, sustentabilidade, qualidade, ordenamento e prevenção dos riscos são precisamente os objectivos que presidiram à apresentação deste projecto de lei-quadro da água por parte do PSD, a 4 de Maio deste ano, lei esta que é exactamente igual àquela que, tendo sido elaborada pelo anterior governo, foi remetida para discussão pública a 9 de Dezembro de 2004.
E permitam-me agora fazer uma referência àquilo que o Sr. Ministro disse sobre trazer "papéis debaixo do braço" e apresentá-los neste Parlamento. Esperámos, de 12 de Março a 4 de Maio, que o Governo desse sequência à discussão pública por nós promovida relativamente à lei remetida a 9 de Dezembro sobre o quadro legal da água.
Ouvimos neste Parlamento o Sr. Primeiro-Ministro fazer críticas sucessivas à ausência completa de um quadro legal, na área da água, e dizer que todo o trabalho teria de ser feito de raiz. Foi, por isso, imprescindível reapresentar aqui o trabalho realizado e constatar que, afinal, o trabalho estava feito.
Este projecto, ao contrário da proposta do Governo, pode designar-se por lei-quadro:

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Enquanto que o diploma do PSD transpõe a directiva comunitária e institui um quadro consolidado relativo à protecção dos recursos hídricos, à sua titularidade e às especificações técnicas com recurso a um único instrumento legislativo, o mesmo não sucede com as propostas do Governo.
O Governo - provavelmente na busca de uma estéril inovação face ao diploma concluído pelo anterior governo e remetido para discussão pública - optou pela fragmentação da lei-quadro, originando três diplomas, dos quais apenas dois são conhecidos, sendo que aquele ao qual atribui a designação de lei-quadro não é mais do que uma lei de protecção dos recursos hídricos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A opção pela consolidação legislativa num domínio como este não é irrelevante. Só a consolidação garante o indispensável grau de comunicabilidade desta legislação tão fundamental junto dos cidadãos e dos agentes económicos e, por outro lado, a robustez das normas ao longo do tempo.
Defendemos mesmo, como afirmámos no passado, que, na sequência da aprovação da lei-quadro da água e dos respectivos decretos regulamentares, se deveria proceder à integração dessa legislação num código da água.
Esta lei-quadro baseia o cumprimento dos objectivos atrás definidos num conjunto de princípios orientadores: o princípio da dimensão ambiental da água; o princípio da gestão integrada dos recursos hídricos e dos ecossistemas; o valor da sustentabilidade e da solidariedade intergeracionais; o princípio da equidade na justa repartição de encargos e de benefícios; o princípio da responsabilidade e, por último, o princípio da participação cívica dos cidadãos.
Estamos, por isso, perante um quadro legislativo de grande fôlego, acarretando alterações significativas face às normas vigentes. Permitam-me que, de entre todas, destaque sete normas fundamentais.
Em primeiro lugar, esta lei opera uma reforma do modelo institucional da gestão e administração dos recursos hídricos, atribuindo ao INAG as funções de planeamento nacional, coordenação e regulação de todas as águas e às administrações de recursos hídricos (ARH) as funções, hoje dispersas entre o INAG e as CCDR, de planeamento, licenciamento, fiscalização e gestão.
Concretiza-se, assim, plenamente, o princípio da região hidrográfica como unidade principal de planeamento e de gestão, tal como definido na directiva comunitária.
Em segundo lugar, o diploma estabelece regras de titularidade, utilização, desafectação e classificação, relativas à totalidade dos recursos hídricos, actualizando legislação originária de 1919.
Pela primeira vez, registe-se, é estabelecido um regime comum para o domínio público hídrico, deixando de abordar, separadamente, as águas marítimas e as outras.
Por outro lado, com vista à estabilidade da base dominial, é definido um prazo máximo para o reconhecimento da propriedade privada anterior a 1864.
Em terceiro lugar, este diploma institui um novo sistema de protecção, planeamento e ordenamento dos recursos hídricos, compatibilizando, de forma judiciosa, a utilização económica da água e a sua protecção.
Em quarto lugar (e este ponto tem uma infeliz actualidade), é intensificada a protecção das águas subterrâneas, cuja degradação se tem acentuado pela abertura indiscriminada e cada vez mais profunda de captações privadas, com riscos para a saúde pública e para o ambiente.
Assim, são reforçados a fiscalização e os requisitos ambientais da qualidade das águas subterrâneas e é conferida às autoridades competentes a possibilidade de imporem no licenciamento condicionantes de ordem ambiental mais rigorosas à captação de águas subterrâneas em áreas consideradas críticas.
Permitam-me que, em quinto lugar, destaque o facto de esta lei-quadro da água consagrar plenamente a capacidade de monitorização do estado das águas. Serão definidas redes de recolha de dados em todas as regiões hidrográficas e será criado um programa nacional de monitorização do estado dos recursos hídricos.
Em sexto lugar, esta lei-quadro da água internaliza os custos ambientais no preço da água, através de um regime económico-financeiro alicerçado numa taxa de recursos hídricos. Desta forma, reconhece-se simultaneamente a escassez destes recursos e a necessidade de garantir a sua utilização economicamente eficiente, tendo por base os princípios do utilizador-pagador e do poluidor-pagador.
Defendemos a sua aplicação progressiva, no quadro da regulamentação prevista, começando pelos grandes consumidores e utilizadores. Por outro lado, esta taxa deve penalizar, essencialmente, o desperdício e não tanto a utilização eficiente - essa, sim, um direito de todos. O resultado das taxas deve ser orientado para a melhoria da qualidade do serviço prestado.
Em sétimo lugar, restringe-se - e esta é uma diferença em relação à proposta do Governo - a actividade de extracção de inertes de águas públicas aos casos em que tal extracção se afigura necessária à gestão das águas, ao abrigo de um plano específico de gestão das mesmas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este é um daqueles temas onde se justifica a densificação do debate e a busca do consenso mais amplo possível. Porque só assim se dá segurança aos cidadãos, porque só assim se garante, por muitos anos, a estabilidade da legislação aprovada e porque só assim se reforça a posição nacional nas discussões com Espanha.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O PSD tem dado provas de empenhamento nesse debate e nessa convergência de posições.
Com efeito, podendo ter procedido a um agendamento potestativo logo no início de Maio, quando apresentámos o nosso diploma, optámos por aguardar pelas propostas do Governo e dos outros grupos parlamentares. Mas a verdade é que, até ao momento (e este debate pode conduzir a uma inversão desta sensação), o Governo não tem enviado idênticos sinais. De outra forma, como explicar que os diplomas aprovados - e pomposamente anunciados - a 5 de Junho apenas tenham sido remetidos ao Parlamento há uma semana?

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Como explicar que, tendo aprovado, também a 5 de Junho, um decreto-lei que consagra a taxa dos recursos hídricos - matéria que esta lei regulamenta -, se não tenha tornado público o seu conteúdo?

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Pois é!

O Orador: - E como explicar que seja ainda desconhecido o decreto-lei que completa a transposição da directiva, também aprovado a 5 de Junho?

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Por que será?

O Orador: - Tendo começado mal, ainda vai o Governo a tempo de arrepiar caminho e demonstrar, neste debate, empenho em ouvir o maior número de entidades representativas e os argumentos da oposição.

Aplausos do PSD e do Deputado do CDS-PP Pedro Mota Soares.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Vaz.

O Sr. Luís Vaz (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva, permita-me que comece por fazer uma referência à intervenção há pouco proferida pelo Sr. Deputado Adão Silva,…

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Para dar resposta!

O Orador: - Não para dar resposta, Sr. Deputado, porque isso caberá ao Sr. Ministro do Ambiente, aqui presente, mas para dizer que a interpreto como uma intervenção, de certo modo, oportunista, porque não se insere no espírito da discussão da lei-quadro da água.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do PSD: - Não se insere?!

O Orador: - No entanto, devo dizer-lhe que, no seu conteúdo, estou plenamente de acordo com ela,…

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - … porque, como V. Ex.ª sabe, todas as forças políticas representantes do distrito de Bragança são favoráveis à construção da barragem do Baixo Sabor, que é também uma reivindicação muito arraigada nas populações daquela região.
Srs. Deputados do PSD, irei agora debruçar-me sobre o projecto de lei apresentado.
VV. Ex.as não estarão muito à-vontade para falar nesta Câmara e neste momento sobre questões do ambiente, na medida em que, durante três anos, fizeram circular uma série de ministros pelas instalações da Rua do Século - mais precisamente, foram quatro, entre os do PSD e os do CDS -, urdindo uma série de teias de interesses que, efectivamente, não permitiram que as legislações importantes que estavam em cima da mesa, parte delas herdadas do governo anterior, fossem concretizadas.
Refiro-me, desde logo, aos planos de ordenamento da orla litoral, aos planos de ordenamento de vários parques naturais do País e à própria lei-quadro da água, cujos projectos não foram concretizados ao fim de

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três anos. Ou seja, fez mais, em três meses, um só ministro do que, em três anos, quatro ministros apoiados pelas vossas bancadas!

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Neste contexto, Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva, a lei-quadro apresentada pelo Governo cinge-se exclusivamente à gestão da água e à transposição da Directiva comunitária, pondo de parte a matéria da titularidade da água, porque se entende que a titularidade da água tem questões específicas próprias e que esta lei-quadro deve ser a base em que assentará a restante legislação.
Por outro lado - e bem-, os anexos técnicos deixam de fazer parte da lei-quadro da água e passam a constar de decreto-lei, para permitir que, no futuro, qualquer alteração às questões técnicas evite que a lei-quadro retorne a esta Assembleia.
Nesta medida, pergunto ao Sr. Deputado qual é a abertura que existe por parte do Grupo Parlamentar do PSD em relação à separação destes dois projectos legislativos ou, em caso contrário, quais os argumentos fortes que sustentam a manutenção da titularidade da água no seio da própria lei-quadro da água.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva para responder, comunico que, entretanto, a Mesa foi informada por alguns grupos parlamentares que os tempos das duas grelhas da ordem do dia de hoje, a gerir em conjunto, não estavam ainda cumulados. Nesse sentido, peço aos serviços que, no painel dos tempos, sejam cumulados os tempos das duas grelhas para que os grupos parlamentares possam conhecer o tempo global de que dispõem e utilizá-lo neste debate.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva.

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Vaz, registo uma divergência entre o Grupo Parlamentar do PS e o Governo relativamente à barragem do Sabor, mas essa é uma matéria que, com certeza, depois resolverão.
De facto, até ao momento, não foi possível responder às questões do Sr. Deputado Adão Silva, tal como não foi possível responder às que coloquei em sede de comissão parlamentar, na presença do Sr. Ministro do Ambiente.
Em relação à questão dos três anos e dos seis anos de governação, diria que o Sr. Deputado Luís Vaz escolheu os temas errados. Então, critica o PSD e o CDS por, no último governo, nada terem feito ao nível dos planos de ordenamento quando foi, precisamente, um governo do Partido Socialista, de que fez parte o Ministro José Sócrates, durante os seis anos que antecederam a anterior governação do PSD e do CDS, que não elaborou um único plano de ordenamento das 29 áreas protegidas?!

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Zero!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Bem lembrado!

O Orador: - Nos últimos três anos foram elaborados e aprovados seis planos de ordenamento de áreas protegidas, quatro deles nos últimos oito meses.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - O resultado é 6-0!

O Sr. Hermínio Loureiro (PSD): - Uma "goleada"!

O Orador: - Também na área das alterações climáticas, herdámos uma derrapagem brutal em matéria de emissões de gases com efeito de estufa, e não só iniciámos a inversão dessa derrapagem - como a Agência Europeia do Ambiente acaba de demonstrar - como aprovámos um conjunto de legislação que garante que todas as emissões de gases com efeito de estufa estão ao abrigo de normas vinculativas de redução custo/eficiência dessas emissões.
Portanto, não queira comparar, Sr. Deputado. Se quiser, um dia podemos fazê-lo, mas, cuidado, deve consultar melhor a "herança" de 1995 a 2002 e compará-la com o que foi realizado nos últimos três anos.
Quanto à lei-quadro da água, há vantagens óbvias - e o PSD não está a inventar nada - com a consolidação do quadro legal relativo à água. A própria Directiva comunitária é um acto de consolidação das normas comunitárias relativas à água.
O que pretendemos é que, assim como a Directiva comunitária consolida legislação dispersa comunitária

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relativa à água, também em Portugal possamos aproveitar este debate e esta lei para consolidar num único instrumento todas as normas, porque tal permite que a água, um tema essencial, possa ser mais facilmente escrutinado por parte dos cidadãos e dos agentes económicos.
Por outro lado, esta lei dá maior estabilidade ao quadro legal. O que o Sr. Deputado Luís Vaz encara como uma desvantagem, eu encaro como uma vantagem, porque o que se pretende, precisamente, é que o quadro legal relativo à água não esteja a mudar todos os anos e que seja criada uma lei que tenha estabilidade, evitando uma diluição da protecção da água ao arbítrio dos ciclos eleitorais.
Portanto, não encontro qualquer vantagem na fragmentação face à consolidação. Assim, espero que neste debate os Srs. Deputados do Partido Socialista e o Governo nos possam apresentar mais claramente a vantagem da fragmentação face à interpretação clara de uma única lei.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para apresentar o projecto de lei n.º 104/X, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente e Ordenamento do Território, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O tema que a Câmara hoje, aqui, debate é da maior importância para o País, é verdadeiramente um tema estruturante.
O CDS, quer quando desempenhou funções governativas quer na oposição, teve sempre a mesma postura. É um partido responsável, que tem em conta o interesse nacional, o futuro do País e a solidariedade entre gerações.
A utilização, gestão, protecção, titularidade e salvaguarda da nossa água, no quadro das nossas obrigações para com o País, para com as gerações futuras e no quadro das nossas obrigações internacionais, principalmente da União Europeia, é um tema de importância capital.
Estamos conscientes, ainda por cima, que Portugal atravessa, neste momento, um dos piores períodos de seca das últimas décadas, com os recursos e reservas hídricas seriamente afectados, uma vez que a ausência de chuva não permite a necessária reposição dos níveis freáticos.
Estas situações de seca, bem como eventuais situações de cheias, serão, no futuro, cada vez mais frequentes, sendo por isso fundamental garantir a qualidade dos recursos hídricos e o seu uso eficaz.
A aprovação de um quadro legal por este Parlamento será, pois, um passo essencial nesse sentido.
Consciente destas responsabilidades, o CDS-PP apresenta aqui, hoje, o seu projecto de lei que cria a lei-quadro da água.
Fazemo-lo assumindo o património do XVI Governo Constitucional e do então Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, Dr. Luís Nobre Guedes, que, conjuntamente com o seu Secretário de Estado Adjunto, tomaram as medidas que hoje estão na base deste nosso projecto e, queremos crer, também na base da proposta legislativa do actual Governo.
A verdade é que essa iniciativa estava ultimada e aguardava somente a conclusão do processo de consulta aos organismos da área e, não fora a dissolução do Parlamento, estaria já hoje aprovada e Portugal teria já hoje uma lei-quadro da água.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, podia ler-se no despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Ambiente, hoje do Deputado do PSD, Eng.º Moreira da Silva, datado de 22 de Dezembro de 2002, que, ao deixar-se este processo concluído com os pareceres obrigatórios e necessários do Conselho Nacional da Água e do Instituto Nacional da Água, "a tutela do ambiente do XVII Governo Constitucional ir beneficiar da circunstância de já dispor de uma versão final da lei-quadro da água e dos contributos relevantes da respectiva discussão pública".
Estamos crentes que o XVII Governo Constitucional e o Sr. Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território em particular aproveitaram todo este trabalho que já estava preparado. É normal que em democracia assim seja. Por isso, Sr. Ministro, permita-me que lhe diga que foi um pouco deselegante aquela admoestação áspera que há pouco fazia à minha bancada, porque desde o primeiro momento que assumimos claramente este património.

Aplausos do CDS-PP.

Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Apresentamos hoje, aqui, o projecto de lei n.º 104/X, que aprova a lei-quadro da água, com um objectivo expresso: contribuir para a definição do enquadramento institucional e dos instrumentos e princípios que nos permitam alcançar uma gestão sustentável, num quadro de solidariedade intergeracional dos nossos recursos hídricos, criando-se para tal, nos termos da Directiva 2000/60/CE, a região hidrográfica como unidade de planeamento e gestão destes recursos.

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Estando no âmbito de uma lei-quadro, que estabelece as bases gerais do regime de gestão e protecção da água, entendemos que esta lei deveria contemplar uma matéria conexa, da maior importância para este debate, que é a matéria da titularidade dos recursos hídricos.
Reunir num só diploma a definição da política de gestão e protecção da água, com a titularidade deste recurso, a nosso ver só traz vantagens.
Cria, em primeiro lugar, um regime mais fácil, mais acessível, mais compreensível e transparente e, acima de tudo, um regime mais estável e menos propenso a que o legislador o esteja sempre a querer modificar.
Em segundo lugar, reúne num só diploma matérias muito dispersas, que vão, hoje, desde legislação da I República até à transposição de obrigações estabelecidas no quadro da União Europeia.
Em terceiro lugar, reunir todos os aspectos relativos à água num só diploma permite-nos caminhar no sentido de uma velha pretensão do CDS, que é a criação de um código da água, com óbvios benefícios para a protecção deste recurso.
Sendo isto para nós tão óbvio, não percebemos por que razão o Governo, separando o que deve estar junto, decidiu rasgar em dois este projecto, propondo dois diplomas ao invés de um só.
Esperamos sinceramente que não seja só para dizer que está a fazer diferente por fazer, porque num tema desta relevância esse capricho e essa petulância seriam totalmente inadmissíveis.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Ao apresentarmos este diploma estamos a assumir a transposição da Directiva 2000/60/CE, conjunta do Parlamento Europeu e do Conselho, que estabelece as bases e o quadro institucional para a gestão sustentável das águas.
Fazemo-lo orientados por um conjunto essencial de princípios e valores, e fazemo-lo visando fins muito determinados.
Fazemo-lo orientados pelo princípio da sustentabilidade e solidariedade intergeracional, assegurando a transmissão às gerações futuras do acesso à água com qualidade e em quantidade.
Fazemo-lo com recurso ao principio da utilização económica da água, por força do qual se consagra o reconhecimento da escassez deste recurso e a necessidade de garantir a sua utilização economicamente eficiente, com a recuperação dos custos dos serviços de águas, mesmo em termos ambientais e de recursos, tendo por base os princípios do poluidor-pagador e do utilizador-pagador.
Fazemo-lo com recurso ao principio da equidade e da subsidiariedade, assegurando uma justa repartição dos encargos e benefícios associados à gestão dos recursos hídricos.
Fazemo-lo tendo por base um princípio da responsabilidade, da precaução e prevenção, responsabilizando quem deteriorar ou colocar em risco este recurso, mas também adoptando medidas preventivas que minimizem os potenciais riscos que podem ser criados.
E fazemo-lo ainda - e muito importante - recorrendo ao principio de participação e segurança jurídica, interpelando cada português, cada um de nós, à dimensão cívica que a gestão da água sempre acarreta.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao apresentar este projecto de lei fazemo-lo também visando fins e objectivos muito determinados: primeiro, o de promover uma utilização sustentável da água; segundo, o de proteger e melhorar o estado dos ecossistemas aquáticos e terrestres; terceiro, o de assegurar a redução gradual e significativa da poluição das águas; quarto, o de obter uma protecção reforçada e um melhoramento do ambiente aquático; quinto, o de mitigar os efeitos das inundações e das secas; sexto, o de assegurar o fornecimento de água em qualidade e quantidade às populações; sétimo, o de proteger as águas marinhas, incluindo as territoriais; oitavo, o de assegurar o cumprimento dos objectivos dos acordos internacionais pertinentes, incluindo os que se destinam à prevenção e à eliminação da poluição no ambiente marinho; nono, o de promover o ordenamento do domínio hídrico; décimo, e por último, o de assegurar a salubridade e a limpeza das águas para consumo humano, de modo a proteger a saúde.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Se conseguirmos ser fiéis a estes princípios, se conseguirmos atingir estes objectivos, então estaremos todos aqui a fazer uma verdadeira reforma estrutural.
Para a concretização destes princípios propomos a criação de um novo quadro institucional, criando, nos termos da Directiva, as regiões hidrográficas e as administrações de região hidrográfica, com competências em matéria de planeamento e fiscalização dos recursos hídricos na respectiva área territorial.
Propomos a criação de quatro, e só de quatro, administrações de região hidrográfica (ARH), por nos parecer ser, face às circunstâncias e recursos do País, o que é necessário e adequado. Estas quatro administrações correspondem às quatro grandes bacias fluviais que Portugal tem.
Esta deve ser, a nosso ver, a divisão administrativa, contrariamente às cinco que são propostas pelo Governo, que copia divisões administrativas do País que nada têm a ver com a gestão dos recursos hídricos.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Há mais dois aspectos que nos parecem importantes referir. O primeiro é o regime de informação e o segundo é o regime sancionatório. Numa matéria desta importância tem de estar consagrado - e bem - um acesso privilegiado, porque estamos a falar de interesses muito especiais

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e muito susceptíveis dos cidadãos à informação sobre a água. Obviamente, temos de o fazer recorrendo também ao Código de Procedimento Administrativo. Mas queremos ir mais longe e criar um regime específico e especial do acesso à informação.
Por último, o regime sancionatório, que é também muito importante, é uma matéria que poderá ser analisada de uma forma mais directa no debate da especialidade.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, termino como comecei: nesta matéria, fundamental para o futuro do País e para as novas gerações, em que o princípio da solidariedade intergeracional é essencial, o CDS está onde esteve sempre, ou seja, será responsável e terá sempre em conta o interesse nacional.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para apresentar o projecto de lei n.º 119/X, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A água é essencial e insubstituível à vida. A vida humana, a produção de alimentos, a grande maioria dos sectores produtivos estão inevitavelmente dependentes da existência e disponibilidade desse líquido que parece ser tão abundante.
Mas a água doce em estado líquido é finita e vulnerável, a sua ocorrência varia no tempo e de forma irregular pelas várias regiões. No nosso clima mediterrânico, as variações sazonais são acentuadas. Há, periodicamente, cheias e secas.
Dependendo das substâncias dissolvidas e dos processos químicos e biológicos que nela se desenvolvem, a água pode ser fonte de vida e riqueza ou veículo de doenças, insanidade ou catástrofe.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Apenas 0,009% (menos de uma parte em dez mil) correm nos rios e lagos, 0,001% na atmosfera e cerca de uma parte num milhão está presente na biosfera. No entanto, a maior parte da água utilizável oculta-se onde antes o homem não tinha capacidade de chegar: no subsolo. As águas subterrâneas constituem 1,05% de todos os recursos hídricos do planeta e são hoje uma reserva inestimável, mas também ameaçada.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O desenvolvimento das técnicas de prospecção e captação de águas subterrâneas tem vindo a permitir a exploração das águas que se encontram centenas de metros abaixo do nível do solo. A capacidade de extracção avançou muito mais rapidamente que as práticas de protecção. Vários sistemas aquíferos portugueses estão, por isso, sob ameaça de sobrexploração ou de inquinamento.
É, portanto, urgente proteger as águas subterrâneas como recursos hídricos essenciais e estratégicos do País.
Ora, no actual quadro, de forte exploração desenfreada dos recursos naturais e de agravada e crescente poluição sob todas as suas formas, torna-se radicalmente necessária uma visão estratégica sobre a água.
Proteger a qualidade das águas para consumo humano, mas também em todas as suas funções sociais e ecológicas é central, imperioso e vital. E é tão importante, neste esforço de protecção, que sejam tidas em conta as águas subterrâneas como as águas superficiais e marinhas.
A poluição das águas, sejam elas superficiais ou subterrâneas, não constitui situação cujas consequências possam ser circunscritas a um rio, lago ou albufeira, nem mesmo a uma bacia hidrográfica. A água é um fluxo contínuo, não é estática nem compartimentada. Também em fluxo é utilizada a água. E é menos importante quanta é usada que as condições em que é devolvida e que efeitos essa devolução vai provocar.
A captação não pode ser, portanto, a única fase que merece atenção. A rejeição das águas é tão importante quanto a sua captação. É, no entanto, muito mais difícil de controlar, porque se uma única variável facilmente mensurável, o caudal, pode caracterizar a captação, a qualidade física, química e microbiológica da rejeição é muito mais complexa de controlar.
Mas importa proteger a qualidade das águas exactamente porque elas são essenciais à vida, à qualidade de vida e a um vasto conjunto de processos produtivos, dos quais também depende o bem-estar das populações, assim como a todos os seres vivos que nos rodeiam, incluindo aqueles de que nos alimentamos.
É essa a principal razão que deve servir de chamada de atenção para guiar as opções estratégicas em torno da gestão dos recursos hídricos nacionais: a necessidade incontornável da disponibilidade de água própria para consumo humano.
O Estado tem de reconhecer a importância essencial da água, da sua gestão e distribuição e tem, como tal, de garantir o cumprimento deste carácter público. Um recurso tão vital como é a água - o mais vital -

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não pode sair da esfera da gestão pública nem estar sujeito a outros mecanismos ou lógicas que não sejam os do interesse público, os do direito à vida.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A água é uma necessidade e um direito, e é dever fundamental do Estado protegê-la e garantir as suas funções essenciais.
A sujeição da gestão e distribuição dos recursos hídricos a lógicas mercantis subverte por completo o seu carácter de "condomínio" dos portugueses, da habitação e produção em todo o território português. O interesse do lucro conduz à sobreexploração e degradação de curto prazo e à exclusão, ameaça as condições de vida, as condições sanitárias e o sistema produtivo, hipotecando o futuro.
O Estado deve ser a peça fundamental no garante do acesso à água, sem excepções, para todos os cidadãos. Esta é a questão central que se coloca ao discutir o futuro deste recurso tão escasso. A gestão pública e o controlo público, popular e institucional, são a garantia de que a água é utilizada no próprio interesse colectivo, ao invés de ser transformada em mais uma mercadoria sujeita às regras do mercado e do lucro.
Srs. Deputados, a questão que se nos coloca hoje não pode, pois, ser analisada à luz de uma qualquer opção meramente partidária e deve, antes, ser profundamente ponderada face à responsabilidade da decisão e à importância da estratégia que será adoptada.
Para o Partido Comunista Português é tão importante garantir o carácter público do recurso propriamente dito como o da sua gestão e distribuição, pois de pouco importa que seja público um aquífero que se encontra a 400 m de profundidade se for privada a estrutura que procede à sua exploração, distribuição e gestão. O simples facto de existir aqui um intermediário privado na gestão do recurso significa a extracção de lucro na distribuição e gestão da água.
Assim, o Partido Comunista Português apresenta um projecto de lei da água que julga ir ao encontro das reais necessidades do bem a que nos referimos. Não é um corpo estático ou estanque nem compartimentado. A lei deve estar o mais possível adaptada a estas características, tendo em conta a ligação entre os aquíferos subterrâneos, rios, mares, lagos, albufeiras e águas atmosféricas.
O PCP apresenta um projecto de lei que garante o carácter público e a integridade do domínio público hídrico, bem como da sua gestão e distribuição.
O PCP apresenta um projecto de lei que vai ao encontro das verdadeiras características físicas do recurso em causa e que as concilia com soluções legislativas para o cumprimento da Directiva-Quadro da Água da União Europeia, mas essencialmente concilia também essas propriedades com a importância ambiental, sanitária, económica e política da água.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - O projecto de lei do PCP é o único hoje presente para discussão que integra o sistema de licenciamento num só processo, garantido a responsabilização do utilizador para com o percurso que dará à água por si captada e tendo em conta o princípio do poluidor-pagador. Garante-se, assim, o controlo público e democrático de todas as utilizações deste recurso, do princípio ao fim da sua utilização. As licenças são atribuídas para captação e rejeição em licença única, numa fórmula inovadora que responsabiliza o utilizador e introduz mecanismos de controlo não só da poluição pontual como da difusa.
O projecto que hoje apresenta o PCP é também o único que garante o controlo democrático da gestão e administração da água enquanto recurso comum de importância estratégica. É o único projecto que garante a soberania do interesse público, protegendo os direitos de cada cidadão e respeitando o interesse privado. É o único que impede a privatização da água, da sua administração, gestão e distribuição.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É, por outro lado, o único que garante também o carácter público das infra-estruturas hídricas, impedindo a sua privatização ou concessão a privados que podem colocar em causa a sua utilização para o bem do interesse público. É, finalmente, o único que responsabiliza, de facto, o Estado pela protecção da água, limitando-lhe, em simultâneo, a arbitrariedade e responsabilizando ainda os utilizadores.
Além do já referido, não podemos deixar de registar que o projecto de lei do PCP é também aquele que melhor transpõe os princípios da informação e participação dos cidadãos na delineação da política de gestão da água, nomeadamente através da criação de uma estrutura independente com forte pendor representativo - a Alta Autoridade para a Água -, onde terão lugar representantes do poder local autárquico e dos governos regionais, entre outros.
Ora, dizer que o projecto de lei do PCP é o único que contempla este conjunto de aspectos é o mesmo que afirmar que, em rigor, os outros documentos que discutimos são essencialmente contrários à protecção das funções essenciais da água. São regras comerciais destinadas à privatização da água em todo o seu percurso.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Resta saber por que existe tanta pressa e pressão para que esta lei, tão importante, seja rapidamente implementada. Será para bem dos utilizadores da água, ou seja, das populações? Ou será para possibilitar rapidamente a corrida ao lucro e a venda do interesse de todos? Quem ficará a ganhar?
Os partidos de direita e o Governo apresentam - e, no caso do Governo, pela calada - projectos que mais não fazem senão estabelecer as normas para a alienação da gestão do domínio púbico hídrico. Perde o povo português!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Propõem-nos que a concessão das explorações e distribuição da água possa ser adjudicada por despacho ministerial. A água que circula em Portugal passa a ser apenas mais uma mercadoria. Está à venda, para quem a quiser comprar e tiver dinheiro para tal!
Poderão os proponentes dos documentos louvar a sua dimensão técnica. O que não podem fazer é utilizá-la como pretexto para privatizar os recursos hídricos, a sua exploração, gestão e distribuição. Não podem dizer que transpor a Directiva é impor o princípio do utilizador-pagador (que não é, sequer, mencionado nesse diploma). Poderão hoje tentar esgrimir argumentos, utilizando as pequenas diferenças de pormenor que existem entre os projectos de lei do PSD e do CDS e a proposta de lei do Governo. Mas não poderão contrariar as orientações políticas de cada documento, pois são exactamente iguais.
Assim se comprova, até nesta matéria, a típica consonância entre o PS, o Governo e o PSD, que tanto tem vindo a contribuir para a alternância inconsequente do poder e para a recorrente desilusão da população. Nem mesmo na matéria da água, em que o PS teria uma excelente oportunidade para mostrar que, afinal, ainda lhe resta um pouco de consciência de esquerda, este partido opta por se colocar do lado dos portugueses. Opta, ao invés, por se colocar do lado da dinâmica do mercado, seja ela ou não positiva para a população portuguesa.
O Partido Comunista Português apresenta um projecto de lei inovador e adequado à resolução dos problemas actuais. Mas não o considera um projecto acabado ou um projecto fechado. Esta matéria tem implicações demasiado profundas e importantes para se limitar a uma sala, mesmo que esta albergue o Plenário da Assembleia da República.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Este não é um assunto que possa ser tratado com leviandade e à parte dos cidadãos e instituições. É necessária a maior e mais ampla discussão e preparação, envolvendo as instituições, as autarquias e os mais diversos agentes da sociedade portuguesa, desde os bombeiros às associações de utentes, passando pelos especialistas científicos em matéria de água, os agricultores, as associações de defesa do ambiente, os criadores de gado, os sindicatos e os diversos ramos da indústria utilizadora da água.
O Governo não teve, infelizmente, este entendimento e apresenta-nos uma proposta que mal tivemos oportunidade de debater como consideramos necessário.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Esta não é uma matéria que possa ser discutida, votada e aprovada num espaço de uma ou duas semanas. O Governo deveria ter toda a noção disso. E o PCP continuará a lutar por um processo aberto e participado que produza uma lei da água que sirva os portugueses e garanta o futuro.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A União Europeia aprovou em 2000, durante a presidência portuguesa, a Directiva-Quadro da Água, fortemente impulsionada pelo governo português, o que constituiu um contributo decisivo e fundamental para o estabelecimento de um novo quadro institucional da política da água. E aqui, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me que refira o papel determinante do actual Primeiro-Ministro, o Eng.º José Sócrates, nessa deliberação da União Europeia, porquanto era na altura Ministro do Ambiente e conduziu todo o processo negocial.
Passados cinco anos, pasme-se, esta Directiva, em que o governo português teve um papel fundamental,

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ainda não foi transposta para o Direito interno, colocando Portugal em incumprimento desde 22 de Dezembro de 2003. Mais: esta situação traduz um tal atraso que remete o nosso país para o lugar de penúltimo Estado-membro da União Europeia a concluir este processo. Isto em nada prestigia Portugal.
Assim, urge aprovar rapidamente as iniciativas do Governo - a proposta de lei-quadro da água e a da titularidade dos recursos hídricos - e acelerar os prazos impostos na Directiva, de forma a que em 2006 fiquem operacionais os programas de monitorização para a gestão da água, que em fins de 2008 fiquem concluídos todos os planos de gestão das bacias hidrográficas, devendo verificar-se a sua publicação em 2009, e, finalmente, que em 2015 esteja garantida a qualidade de todas as nossas águas, especialmente as de consumo. É este o sentido das propostas de lei do Governo, ou seja, o de garantir parâmetros de excelência da água para consumo humano, uma vez que foi esta uma das prioridades da própria União Europeia ao aprovar a Directiva-Quadro da Água.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta matéria está a ser amplamente discutida em vários fóruns há muitos anos. Contudo, só agora, com a apresentação e aprovação das propostas do Governo, estamos em condições de garantir e afirmar com segurança que passamos da teorização à decisão. Sobre esta matéria, praticamente tudo foi já dito e escrito e tudo foi já pensado e estudado. Falta o passo determinante - agir. Tal foi, portanto, o que este Governo fez: agiu. E, ao fim de apenas 100 dias, apresenta a este Parlamento duas propostas de lei fundamentais para a gestão e sustentabilidade deste importante recurso natural essencial à vida humana, a proposta de lei-quadro da água e a proposta da titularidade dos recursos hídricos. Finalmente, vamos ter uma lei-quadro da água.
Hoje, não criticamos aqueles que, por incapacidades várias ou por negligência persistente, foram incompetentes para actuar neste domínio. Mas não venham agora reivindicar direitos que não possuem, visto que prescreveram nos últimos três anos. Agora, o que se exige a todos é que, com todo o sentido de responsabilidade, sejam capazes de colaborar e aprovar os diplomas apresentados pelo Governo. O Grupo Parlamentar do PS está disposto a contribuir para encontrar um amplo consenso no domínio da política da água, mas não está disponível para adiar por muito mais tempo a aprovação dos instrumentos estruturantes para a qualidade e sustentabilidade dos nossos recursos hídricos.
Esta matéria tem gerado, ao longo dos tempos, e em várias instâncias, amplos consensos, e foi mesmo a água, na Cimeira do Desenvolvimento Sustentável de Joanesburgo, o único tema consensual, em relação ao qual foi possível avançar com as metas propostas pela União Europeia que Portugal está obrigado a cumprir.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, o Governo, para estruturar um novo modelo de gestão e sustentabilidade da água, optou, e bem, por autonomizar em dois diplomas a sua proposta, em vez de condensar num único diploma a definição de um novo quadro institucional. Estas são matérias qualitativamente diversas. A proposta de lei que estabelece a titularidade dos recursos hídricos tem como objectivo central clarificar e sistematizar as normas jurídicas que hoje regulam a titularidade pública dos recursos hídricos, hoje dispersas por diplomas diversos, unificando-as num diploma coerente, mantendo, contudo, o Código Civil as disposições relativas ao direito privado sobre as águas.
A proposta de lei-quadro da água tem como objectivo principal a definição do enquadramento institucional dos instrumentos e normas que permitem alcançar a gestão sustentável das águas, transpondo, no essencial, a Directiva-Quadro da Água.
Nesta, é estabelecido o princípio fundamental da região hidrográfica como unidade principal de planeamento e gestão e são, assim, criadas cinco administrações de região hidrográfica (ARH), coincidindo com as actuais comissões de coordenação e desenvolvimento regional (CCDR). As administrações de região hidrográfica passam, para além das funções de planeamento dos recursos hídricos, a ser competentes em matéria de licenciamento e de fiscalização. O Instituto da Água assume a denominação de Autoridade Nacional da Água e passa a desempenhar funções reguladoras e coordenadoras, garantindo externamente o cumprimento das múltiplas obrigações impostas pela Directiva. É definida a utilização dos recursos hídricos assente no princípio da necessidade do título de utilização, distinguindo-se bem o público e o privado e condicionando-se a extracção de inertes.
Também no cumprimento da Directiva-Quadro da Água, a proposta de lei regula o regime de taxas e tarifas, bem como as sanções a aplicar com as coimas. Finalmente, com a aprovação desta proposta de lei e subsequentes diplomas a aprovar pelo Governo, fica concluída a transposição da Directiva n.º 2000/60/CE, de 23 de Outubro, criando-se, assim, um novo ordenamento jurídico da política da água.
Temos consciência das nossas responsabilidades e, como tal, consideramos que à volta desta temática se deve criar um amplo consenso, com a participação de todos sem excepção. Com a disponibilidade que sempre manifestamos para, em sede de especialidade e sem adulterações, melhorar e aperfeiçoar as propostas do Governo, com o sentido da responsabilidade que nos caracteriza e nos deve orientar a todos, aguardamos o sentido de responsabilidade desta Câmara para garantir a preservação e conservação do ambiente e, sobretudo, do nosso recurso natural - a água.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado

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Renato Sampaio os Srs. Deputados José Raúl dos Santos e Abel Baptista.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Raúl dos Santos.

O Sr. José Raúl dos Santos (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados, na situação actual e no contexto de seca extrema que tivemos oportunidade de constatar aquando da deslocação da Subcomissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas ao Alentejo e Algarve, é quase certo que os problemas associados ao abastecimento de água para consumo humano e agrícola poderão agravar-se ainda mais no futuro, sobretudo na região alentejana. No primeiro caso, ou seja, no que respeita água para consumo humano, se a reserva de água que nos é proporcionada pela barragem do Alqueva poderá a vir a assegurar, no futuro, a médio e a longo prazos, o abastecimento das populações em boa parte dos concelhos do distrito de Beja, continua por garantir a qualidade dos caudais com origem na bacia hidrográfica do Guadiana. De facto, o elevado grau poluente que aflui à albufeira do Alqueva tem origem nas águas residuais produzidas em Portugal, que continuam sem receber qualquer tratamento, e na actividade agrícola e industrial que se localiza, sobretudo, no outro lado da fronteira. Como tal, a pergunta que se impõe, dirigida tanto ao Sr. Ministro como aos Srs. Deputados, é a que procura saber que programa está delineado pelo Governo para garantir o tratamento eficaz da água que é armazenada na albufeira do Alqueva.
Por outro lado, relativamente ao plano de regadio que o Alqueva veio colocar na ordem do dia, o mais relevante é, sem dúvida, conhecer os preços da água que vão ser praticados. De posições anteriormente assumidas por dirigentes socialistas, resulta claro que o preço da água fornecida por Alqueva é forçosamente político. Pergunto, portanto, se mantêm o princípio segundo o qual serão cobrar 16 escudos por m3 de água. Quanto a este ponto em particular, importa ainda saber que critérios pretende o actual Governo seguir na aplicação das tarifas a pagar pela água consumida na actividade agrícola e se estes preços diferem, e em que escala, da água destinada para o consumo humano.
Outra questão é a de saber se já existe um programa de monitorização sobre os impactos que vão ser provocados nos solos agrícolas pela salinização que está associada ao regadio. Como vai o Governo assegurar o abastecimento de água às populações dos concelhos de Serpa e Mértola até que esteja concluído o projecto que leva a água de Alqueva para a barragem do Enxoé? Segundo as afirmações que o Sr. Ministro já produziu publicamente, este projecto só estará concluído em 2008. Até lá, o que se irá fazer, sobretudo se tivermos um próximo ano de fraca pluviosidade?
Finalmente, o Sr. Ministro anunciou o envio para Bruxelas do projecto de abastecimento em alta aos 23 municípios alentejanos. Pode adiantar-nos mais alguma informação sobre esta matéria?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Renato Sampaio, as questões que quero colocar ao Partido Socialista prendem-se com o seguinte: o projecto de lei do CDS inclui, num mesmo diploma, a gestão dos recursos hídricos, o regime da titularidade dos recursos hídricos e a transposição do articulado da Directiva n.º 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro.
Por outro lado, o Governo apresentou duas propostas de lei em separado, que não transpõem, na totalidade, o articulado da referida Directiva.
Aquilo que ouvimos agora por parte do Partido Socialista foi a afirmação de uma atitude de abertura, que saudamos, quanto à possibilidade de, em sede de discussão na especialidade, podermos vir a dar contributos no sentido de melhorar os diplomas. É assim que deve funcionar e é assim que funcionam seguramente as comissões.
Em face disto, gostaria de saber se o Partido Socialista encara a possibilidade de fundir, num mesmo diploma, as duas propostas de lei apresentadas com os n.os 19/X e 22/X, respectivamente, com vista a criar um único diploma que trate desta matéria.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A segunda questão tem a ver com as áreas de recursos hídricos, matéria em relação à qual o Governo apresenta cinco áreas enquanto que a nossa proposta de lei sugere quatro.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Parece-nos que, em relação a esta matéria, a quinta área apresentada pelo Governo e que, ao fim e ao cabo, se resume à área de recursos hídricos do Algarve se limita a fazer a gestão das ribeiras do Algarve.
Ora, pensamos que é extremamente redutor uma área de gestão ter como única função a gestão das ribeiras do Algarve, não contemplando sequer o Guadiana. Pergunto, pois, ao Partido Socialista se considera a possibilidade de incluir esta quinta área na área de recursos hídricos do sul, tal como é proposto no

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projecto de lei apresentado pelo CDS-PP.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para responder, dispondo de 5 minutos, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, penso que o Sr. Deputado Raúl dos Santos deve ter chegado atrasado ao debate, porque as questões que me colocou deveriam ter sido dirigidas, a primeira, ao Governo e, a segunda, ao anterior governo.
Digo que a primeira pergunta deveria ter sido dirigida ao Governo, porque foi ao Governo que o Sr. Deputado se dirigiu claramente a colocar todas estas questões.
Quanto à segunda questão, ela deveria ter sido dirigida ao governo anterior pelo seguinte: como sabe, quando o Partido Socialista esteve no governo elaborou um programa chamado o Plano Estratégico de Abastecimento de Água e de Saneamento de Águas Residuais (PEAASAR), que garantia a qualidade das águas e que tinha por objectivo estar em vigor 2006. Ora, durante os três anos dos governos do PSD/CDS-PP, o PEAASAR foi "metido na gaveta", o que significa que, do ponto de vista do abastecimento de água e das redes de drenagem e tratamentos dos esgotos, nada foi feito. E, se nada foi feito, acabam por ir parar à albufeira do Alqueva alguns resíduos e alguns esgotos.
Por isso, como referi, a questão que colocou tinha duas dimensões: primeiro, era dirigida ao Governo, mas o Sr. Deputado chegou atrasado ou o seu partido não o inscreveu a tempo de poder colocar a pergunta ao Governo; e segundo, o seu governo não teve a capacidade de lhe responder.
Ao Sr. Deputado Abel Baptista direi que é evidente que a questão que colocou da existência das cinco regiões é uma questão de organização do Estado. Por isso, não podemos estar a menorizar os recursos hídricos, apesar de serem escassos como é o caso dos do Algarve. O que acontece, como referi na intervenção, é que estas cinco administrações correspondem às cinco CCDR que existem.
Quanto a condensarmos num único os dois diplomas que apresentamos, há pouco eu disse que estamos disponíveis para criar um grande consenso, mas não estamos disponíveis para atrasar este processo.
Aliás, se o Sr. Deputado tivesse estado atento (mas, provavelmente, já trazia a pergunta feita de casa), teria verificado que apresentei as razões por que foram apresentados dois diplomas. Pelos vistos, o Partido Socialista e o Governo entenderam que é melhor apresentar esta matéria em dois diplomas, como, de resto, justifiquei na minha intervenção.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Não seja agressivo!

O Orador: - Obviamente que, em sede de especialidade, estamos em condições de acolher todas as propostas e de criar um grande consenso. Não estamos é disponíveis para adulterar este processo, conforme referi na intervenção que fiz.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Este não é um debate sobre uma lei de pormenores exclusivamente técnicos, nem é um debate sobre um diploma legal meramente conjuntural. Este é um debate sobre uma lei que virá a enquadrar o modelo de gestão e o regime de utilização da água e, ainda, a titularidade do domínio hídrico.
Deve, portanto, centrar-se numa escolha estratégica política fundamental. Falo de uma escolha que é determinante para todo o sistema legislativo que daqui resultar. Esta escolha resume-se em saber se concebemos a água como um recurso natural de valor essencial à vida humana e à sustentabilidade dos ecossistemas ou se, por outro lado, concebemos a água como um bem económico, sujeito ao valor do mercado.
Tanto os projectos de lei apresentados pela direita como a proposta de lei do Governo são cristalinamente claros quanto à escolha que fazem. Nos projectos de lei do PSD e do PP, ela é enunciada logo à partida: definem o princípio do valor da economia como o princípio balizador prioritário na determinação das suas propostas.
A proposta de lei do Governo começa por enunciar o valor social da água, a par do valor económico e da dimensão ambiental, para logo a seguir construir um quadro legislativo profundamente liberalizador. Desta forma, atrofia aquela dimensão social em favor da dimensão económica e escancara a porta de oportunidade de negócio aos privados que queiram investir nos sistemas de captação e distribuição da água e avançar para a integração de todos os sistemas intermunicipais.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!

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A Oradora: - O regime de concessões proposto pelo Governo coloca a gestão da água sob a mesma lógica de qualquer outro produto mercantil.
O que os senhores pretendem fazer com esta proposta de lei é entregar um bem, que unanimemente se reconhece (como já foi dito hoje ao longo do debate) como uma fonte de vida essencial, nas mãos de empresas que se regem por uma lógica financeira.
Este é um erro político essencial, por duas razões: em primeiro lugar, porque o objectivo de uma política sustentada da água é incompatível com a mercantilização dos recursos hídricos; em segundo lugar, porque, numa altura em que a escassez dos recursos se torna uma realidade cada mais evidente, importa garantir o direito social ao acesso a estes recursos.
Sr.as e Srs. Deputados: A situação de escassez que o nosso país tem vindo a atravessar é certamente uma situação conjuntural, mas ao mesmo tempo não pode deixar de obrigar-nos a equacionar a urgência de políticas integradas e globais.
No cerne desta problemática, tem forçosamente que ser colocada a necessidade de promover não só a eficiência da gestão dos recursos mas, sobretudo, uma perspectiva de conservação.
A água potável globalmente disponível, à superfície ou subterrânea, não é um bem infindável. Pelo contrário, tem limites estreitos, se tomarmos em consideração todos os usos que lhe são dados - para o consumo humano, para fins agro-pecuários, para fins industriais, para o lazer, como meio de comunicação e de abastecimento.
Uma política sustentada tem necessariamente que ter como perspectiva o desenvolvimento equilibrado das actividades humanas e da conservação do produto e dos ecossistemas.
Não há forma, não há "ginástica" possível que compatibilize uma orientação desta natureza com uma lógica de gestão da água que a trata como um produto de negócio. A finalidade empresarial é uma finalidade de crescimento do negócio, logo, de promover mais e mais consumos e não de os diminuir.
Não se trata, Sr.as e Srs. Deputados, de acusar os investidores privados de qualquer espécie de malvadez. Trata-se, simplesmente, de reconhecer que a natureza do modo empresarial não deixa qualquer espaço para aquilo que deve ser a grande prioridade: conservar, racionalizar consumos, conter os desperdícios.
Vale a pena aprender com os erros que outros cometeram, como vale a pena aprender com as boas práticas de outros parceiros do espaço europeu.
Há, na Europa, casos suficientes de países que estiveram na vanguarda da concessão dos sistemas de distribuição de água a privados e que hoje sabem que esta orientação foi um erro de consequências por vezes dramáticas, e que se viram obrigados a arrepiar caminho.
A França e a Inglaterra foram os primeiros a entrar neste processo. Tanto num caso como no outro, foram os cidadãos que em última instância pagaram o preço desse caminho - tarifas cada vez mais elevadas, serviços mais ineficientes, falta de cumprimento por parte das empresas relativamente aos compromissos de investimento que tinham assumido contratualmente e consequente agravamento das taxas de perdas e desperdícios.
Certamente que empresas como a Suez, a Vivendi, a Thames Water, a United Utilities são multinacionais poderosíssimas, altamente cotadas no mercado de valores. Mas a sua vocação não é nem preservar os recursos naturais, nem prestar serviços públicos. Como também não o é para a Generale des Eaux nem a AGS.
Há, por outro lado, no espaço europeu boas práticas às quais nos podemos referenciar.
Em 7 de Setembro de 2004 o Parlamento holandês aprovou, por ampla maioria, uma lei que delimita ao sector público o abastecimento de água e saneamento.
Em Abril de 2005, o Governo belga aprovou uma resolução sobre a água, em que reconhece o acesso à água potável como um direito humano constitucionalmente reconhecido, aprovando medidas de gestão integrada de recursos, a exclusividade ao sector público na recolha e distribuição da água e, finalmente, mas não menos importante, o conceito de tarifas progressivas que garantam o direito à água para os mais pobres.
Estes são, na opinião do Bloco de Esquerda, dois bons exemplos que merecem ser tidos em consideração e que nos levam ao elenco de princípios que estão claramente ausentes tanto na proposta de lei como dos projectos de lei da direita e que são, em boa medida, contemplados no projecto de lei do PCP.
Primeiro: assegurar a sustentabilidade da gestão dos recursos, reservando os sistemas de recolha, distribuição e tratamento das águas residuais exclusivamente para o campo da esfera pública. Só desta forma se pode assegurar uma gestão adequada às necessidades reais das populações e um sistema eficiente que garanta a racionalização dos consumos e uma prevenção eficaz das contaminações.
Segundo: garantir a extensão da titularidade pública dos recursos a todas a reservas de água, sejam elas de superfície ou subterrâneas, em sistemas de bacias ou em sistemas de aquíferos. Só desta forma se pode assegurar a consagração da água enquanto bem universal, pelo qual todos somos colectivamente responsáveis. Responsáveis ao nível da conservação, da qualidade, do planeamento e das tipologias dos usos.
Terceiro: consagrar o direito à água como um direito social fundamental. Só desta forma se pode garantir que ninguém seja privado do acesso a um consumo mínimo garantido, como condição de sobrevivência

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elementar. Só desta forma se pode garantir uma política de tarifas que não exclua os mais pobres.
Quarto: consagrar o princípio da gestão democrática e participativa.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Esgotou o seu tempo, Sr.ª Deputada.

A Oradora: - Estou a terminar, Sr. Presidente.
Só desta forma se pode exigir das instituições da administração das regiões hidrográficas e das empresas executoras a transparência necessária para abrir o acesso à informação sobre volumes e qualidade das águas, para permitir a consagração da participação das associações de utilizadores, para promover uma cidadania exigente.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Termino, dizendo que a água tem uma característica que faz dela um bem único e exclusivo e, portanto, não há possibilidade de a conter. É um produto que não pode estar sujeito às lógicas estreitas do comércio, tem de ser usado de forma equilibrada, inteligente e solidária, consciente da fragilidade do mesmo, e tem de ser democraticamente partilhado. Esta é uma nova cultura da água que faz falta.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Falar da água é falar da própria vida no nosso planeta, que na água, precisamente, teve o seu início e deu os primeiros passos. Todos os seres vivos, entre os quais se inclui o homem, precisam de água para viver, pois 70% do nosso corpo é feito de água. A água está presente ao longo de toda a nossa vida, desde que nascemos, logo depois de se romperem as águas do ventre da nossa mãe, até ao dia em que morremos.
Por isso, dizer que a água é um bem fundamental à vida, e, naturalmente, à vida humana, não é de forma alguma um lugar comum ou uma frase feita. Ela é um bem indispensável e incontornável à sobrevivência do homem, mas também condição do seu desenvolvimento, na busca da satisfação das suas necessidades. Mas só será condição de verdadeiro desenvolvimento se for sustentável, isto é, se esse bem-estar não se fizer à custa do bem-estar e legítimas aspirações das gerações vindouras.
E a verdade é que, no nosso planeta, chamado "planeta azul" pelas grandes massas de água oceânicas que ocupam grande parte da superfície terrestre, apenas 0,01% dos recursos hídricos totais existentes é que constituem a água doce disponível para o consumo humano e para os ecossistemas.
A seca, que presentemente assola o nosso país de norte a sul, com causas que não se podem também elas dissociar dos impactos da acção do homem sobre o meio ambiente com efeitos nas alterações climáticas e no aquecimento global, veio lembrar e tornar claro que a água, apesar de ser um bem renovável, é um bem finito e tremendamente escasso.
Por tudo isto, Os Verdes têm procurado ser desde sempre, neste Parlamento, como noutras sedes, uma voz incansável no alerta e na defesa do bem água, cuja gestão entendemos, pela dimensão tão esmagadora que tem em todos os campos da actividade humana, desde a indústria, à agricultura e florestas, passando pelas pescas, transportes e lazer, dever estar, necessariamente, nas mãos de entes públicos, que, com responsabilidade e sujeitos a fiscalização democrática, coloquem a satisfação do interesse público acima de quaisquer outros interesses.
Igualmente temo-nos manifestado contra as múltiplas tentativas de mercantilização e privatização da água, que, sob diversas formas e com diferentes rostos, um pouco por todo o mundo e também aqui, em Portugal, têm avançado paulatinamente e com "pezinhos de lã" na corrida ao ouro azul, que é hoje uma preocupante e gravíssima realidade indesmentível.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: No momento em que realizamos o debate acerca do regime jurídico de base deste bem tão precioso, analisando as iniciativas legislativas que se propõem a introduzir, de uma forma tão profunda, alterações tão complexas no nosso actual ordenamento jurídico, importa, desde já, recordar alguns factos da história recente da lei da água no nosso país, designadamente neste órgão legislativo.
Importa recordar como foi intenção de um anterior governo do PSD de arredar este Parlamento do processo legislativo da lei da água, quando assumiu de início a intenção de apresentar um pedido de autorização legislativa, à qual não se podia furtar por constituir matéria de competência de reserva relativa da Assembleia da República.
Importa também lembrar como o mesmo governo de direita colocou o seu projecto na Internet em discussão pública em vésperas do Natal de 2003, disponibilizando-se para aceitar contributos até 10 de Janeiro seguinte, sem o fazer acompanhar de qualquer aviso ou publicação.
Na verdade, só graças à denúncia feita pela Associação Água de Portugal e ao empenho, neste Parlamento, de Os Verdes foi possível inverter o curso desta situação.

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Infelizmente, o Governo PS não aprendeu com os erros dos seus antecessores; antes pelo contrário. Se desta vez o PS nos apresentou uma proposta de lei da água, submetendo-se ao processo legislativo da Assembleia da República, como deve ser feito, não podemos deixar de notar um aspecto extremamente negativo: é que agora nem mesmo pela Internet, ainda que escondida numa qualquer página de um qualquer site, se abriu o processo de consulta e discussão pública da proposta de lei. Isto parece-nos extremamente grave.
É que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, estamos a falar de uma reforma de fundo do direito da água português, com raízes culturais profundas que vão beber ao Direito Romano, com um impacto muito grande no nosso país e para o qual se impunha contar com uma ampla participação da sociedade civil aos mais diversos níveis, desde agricultores, ecologistas, técnicos, associações de defesa de consumidores, autarquias e suas estruturas representativas, etc.
A agravar ainda mais esta situação, o Governo só nos disponibiliza as suas propostas com menos de uma semana de antecedência em relação à sua discussão em Plenário, em nada contribuindo para a riqueza e profundidade do debate. É caso para dizer que o Governo não começou nada bem, mas ainda vai a tempo de corrigir esta situação.
Relativamente às quatro iniciativas legislativas que temos perante nós, temos de dizer que uma se distingue claramente das restantes, pela positiva, consideramos nós, e essa iniciativa é a do PCP. O projecto de lei do PCP apresenta uma concepção da água como direito fundamental, que nós, Os Verdes, sempre afirmámos. Mas mais do que isso: o projecto de lei do PCP propõe uma nova cultura da água, a água como suporte de vida, como veículo do desenvolvimento da humanidade na sua plenitude, compreendendo e respeitando a água na sua dimensão ecológica e no seu ciclo natural.
Com efeito, as restantes iniciativas, para além de se apresentarem muito próximas e comungando de uma mesma visão e filosofia, não assumem um carácter de verdadeira lei de bases ou de lei-quadro. Na verdade, falta-lhes a dimensão de um verdadeiro diploma de base, estruturante, que lance os alicerces seguros, claros, justos e adequados de um regime jurídico da água.
Desde logo, deveriam estabelecer algo tão básico como o princípio da importância fundamental do bem água e do bem domínio público hídrico e a sua característica de escassez e fragilidade, face aos impactos que sofre com as actividades humanas. Mas estas iniciativas não o fazem.
Na verdade, mais parecem um super-regulamento que apenas pretende substituir um conjunto de diplomas actualmente em vigor e que, a pretexto de transpor a Directiva n.º 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, aproveita para criar todo um conjunto de fragilidades e abrir toda uma panóplia de brechas, no sentido de instituir a mercantilização da água e dos restantes bens do domínio hídrico, como os leitos, as margens, as zonas adjacentes, etc.
A intenção de dissimular entre artigos, cuja redacção de pendor fortemente técnico se mostram por vezes herméticos e quase blindados à compreensão por leigos, não é inocente e o pendor de gestão economicista e mercantilista, no intuito de desresponsabilizar o poder público pela concessão a privados, naquele que já foi chamado o negócio do século, por ser a água considerada pelos grandes consórcios privados e transnacionais capitalistas do seu ponto de vista exclusivamente com mira no lucro certo de um bem sem elasticidade na procura, pois esta nunca baixa muito, mesmo que aumentem os preços, porque simplesmente não é um bem que se possa dispensar, está bem presente nas iniciativas do PS e da direita.
Só a título de exemplo, veja-se o que prevê o artigo 72.º, n.º 3, alínea b), da proposta de lei-quadro do Governo, que permite que seja o privado concessionário de uma grande infra-estrutura hidráulica, como, por exemplo, a Albufeira de Castelo do Bode, a licenciar actividades e a fiscalizar o domínio público hídrico em relação a terceiros. Isto é, muito concretamente e sem qualquer sombra de dúvida, a privatização da água, das margens, ou seja, dos bens do domínio público hídrico.
É significativo que a Directiva-Quadro, que, teoricamente, pretendem transpor, coloque, ao longo de todo o texto, a tónica na qualidade e protecção da água, objectivo que na proposta de lei é absolutamente posto à margem, não se revogando, inclusivamente, a legislação nacional actualmente vigente sobre essa matéria.
O Governo só soube aproveitar da Directiva o que lhe interessava ou lhe pareceu inócuo, no sentido de abrir as portas à alienação da água aos privados, faceta que a própria Directiva, e por isso também a criticamos, infelizmente, já contém.
Depois, apesar de a proposta de super-regulamento do Governo tomar opções erradas, nalgumas das quais os técnicos são praticamente unânimes, como quando desvirtuam o princípio da gestão por bacia hidrográfica, espartilhando o domínio hídrico nacional em cinco administrações de região hidrográficas, chegando, inclusivamente, a juntar numa delas duas bacias internacionais com quatro nacionais, ao arrepio da opinião de especialistas e do próprio Conselho Nacional da Água.
Por outro lado, criam situações de bondade extremamente duvidosa, deixando demasiado para posterior regulamentação, recorrendo com frequência a conceitos indeterminados e legando margens de discricionariedade perigosas e injustificáveis.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há toda uma filosofia que perpassa as iniciativas do PS, do PSD e do CDS, que não acautela devidamente a qualidade da água, que não tem em conta a sua escassez ou o seu acesso justo e equitativo, sendo documentos cuja nota fundamental vai para uma gestão pejada de

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prioridades economicistas. Isso é óbvio quando, na senda dos princípios do poluidor-pagador e do utilizador-pagador, que acham que tudo resolve, consagram o próprio direito a poluir, fazendo depender a capacidade de exercer esse direito apenas ao pagamento da respectiva taxa.
Poucas vezes teremos nas nossas mãos o poder e a tremenda responsabilidade de tomar decisões sobre um regime jurídico que, de modo tão profundo e duradoiro, afecta toda a nossa vida enquanto indivíduos e membros da comunidade.
Por isso, é importante que não nos precipitemos, porque o que está em causa hoje é, efectivamente, a concepção da água como um direito ou como uma mercadoria, um bem venal, ainda que, como diz a Directiva-Quadro da União Europeia, não seja uma mercadoria como outra qualquer. É isto precisamente que está aqui em causa: decidir considerando a água como um direito fundamental ou como uma mercadoria.
Em nosso entender, só pode ser vista como um direito, como um direito natural,…

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Sr. Deputado esgotou o seu tempo.

O Orador: - Estou a terminar, Sr. Presidente.
Em nosso entender, só pode ser vista como um direito, como um direito natural, como complemento fundamental do próprio direito à vida, pois, sem água, a vida não é possível, e à dignidade da pessoa humana, valores jurídicos supremos no nosso ordenamento jurídico.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Num debate como este, tão importante é falar da lei-quadro da água como da falta de água, que, neste momento, atinge dramaticamente mais de 80% do território nacional, com muita acuidade no Alentejo e no Algarve, conforme esta semana ainda a Subcomissão Parlamentar de Agricultura teve ocasião de testemunhar no terreno.
Importa, pois, aproveitar o momentum para reflectir sobre a situação actual, mas também para uma visão prospectiva do que se poderá fazer no futuro para assegurar a todos os portugueses e a todos os sectores de actividade económica o abastecimento da água necessária à sua vivência.
Há novas pistas que importa desbravar, estudar, aprofundar. Falemos, pois, de algumas delas.
Não é por acaso que o Reino Unido se prepara para construir um equipamento de dessalinização de grandes dimensões em Londres, que fornecerá água para o consumo de mais de 900 000 pessoas, a partir das águas poluídas, castanhas, salgadas e viscosas de um curso como o rio Tamisa. E dispõem-se a investir qualquer coisa como 300 milhões de euros nesse equipamento.
A água dos oceanos significa 95% da água existente no mundo e mais de metade da população mundial vive num raio de 100 km das linhas de costa. Em Portugal, como se sabe, este ratio atinge mais de 80% da população a viver numa faixa litoral de 40 km.
Como de costume, chegamos sempre atrasados. A visão que existe em Portugal do processo de dessalinização retém na memória os velhos equipamentos, com as velhas técnicas pesadas de destilação de água, deixando atrás uma salmoura residual, com graves inconvenientes ambientais, e exigindo níveis de energia calórica que tornavam o método economicamente desaconselhável, à excepção - claro! - de países ricos do Médio Oriente, sem problemas de liquidez ou em situações de total ausência de alternativas na busca desse recurso precioso chamado água.
Acontece que se desenvolveram novas tecnologias no campo da dessalinização, o método a que os americanos chamam de reverse osmosis, através da passagem da água salgada por filtros que fazem a separação, e produzem água com qualidade para qualquer tipo de consumo, a custos operacionais altamente competitivos e impensáveis até há pouco tempo atrás.
Um país como Israel desenvolveu um programa a cinco anos, que o habilitará a uma auto-suficiência total em termos de água. Só a fábrica de Ashkelon, prestes a inaugurar, proverá um sétimo da água consumida pelo país.
Dos Estados Unidos ao Reino Unido, passando por Singapura, uma longa lista de países de vanguarda estão a optar por este método, porque a inovação tecnológica não pára e porque começaram também a fazer contas. A Espanha, aqui ao lado, também começou a fazer contas.
E nós, que temos um recurso inesgotável, como a água do mar, encostada à porta em mais de metade dos nossos limites territoriais, estamos à espera que chova para encher as barragens? Teremos necessidade de racionar o fornecimento de água a zonas litorais e turísticas, como pode acontecer, se não este ano talvez no próximo ano que aí vem, que nada augura que seja bom, porque o ciclo da seca nunca vem num ano só?
Mais uma vez, é a iniciativa privada que dá também bons exemplos. Há dois dias atrás, foi dada luz verde a um conhecido grupo hoteleiro nacional, com grande expansão no Algarve, para pôr a funcionar um equipamento de dessalinização que, para 1 milhão de euros de investimento, irá produzir anualmente cerca

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de 360 000 m3 de água, para fins múltiplos, que vão das lavagens às limpezas, das casas de banho à rega de jardins e de golfes, a um custo de exploração inferior a 50 cêntimos por m3.
Se pensarmos que o consumo anual do Algarve, só a título de exemplo, absorve 15 milhões de m3 de água na rega dos golfes e 72 milhões de m3 no consumo urbano, teremos uma noção da enorme potencialidade que o mar, como recurso praticamente inesgotável, neste momento nos oferece.
De resto, o tratar de um recurso tão precioso como a água, em tempo de seca e de alterações climáticas à escala global, que a loucura dos homens levará não se sabe até onde, não se esgota na construção de barragens. Sim, Odelouca é prioritária, e já deveria estar concluída há muito tempo! Sim, um sistema de pequenas e médias barragens deve avançar, porque a agricultura que nos resta ainda é o principal consumidor de água.
Mas do que Portugal precisa, paralelamente a uma nova lei-quadro da água para titular e gerir o recurso, é de uma verdadeira revolução de mentalidades, orientadas no sentido da poupança e de um consumo racional da água.
Faz algum sentido, nos tempos que correm, regar jardins e campos de golfe e despejar autoclismos com água tratada própria para consumo humano, que chega ao consumidor final a um preço elevadíssimo?
Por outro lado, e a propósito da taxa de recursos hídricos prevista para a nova lei da água, há perguntas que ficam no ar: já alguém fez um estudo da flexibilidade preço/consumidor para saber até onde pode ir o custo da água, mais do que um simples adicionar das parcelas de utilização, de regularização ou ambiental?
E, já que falamos em gestão, aqui ficam duas questões para uma mesma pergunta: sempre o Partido Socialista se manifestou contra a privatização do sector empresarial das águas. Todavia, no anúncio governamental do programa de investimentos para os próximos quatro anos, lá figura o sector da água e do saneamento. Por outro lado, o Ministro das Finanças, não se descoseu quanto à origem dos 400 milhões de euros, como receita das privatizações.
Será que o Governo se prepara para privatizar a Águas de Portugal SA, em pleno período estival, com a Assembleia da República de portas fechadas?
Há toda uma reforma a fazer nos métodos de construção do futuro e no planeamento urbanístico. O abastecimento de água deverá comportar um sistema integrado de duas redes: uma, com água de qualidade para consumo humano, e outra, de menor qualidade, para fins múltiplos. Os edifícios deverão prever este sistema de canalizações paralelas, autoclismos com descargas reguladas, torneiras com temporizadores e sensores automáticos. Os campos de golfe ou os jardins públicos deverão, obrigatoriamente, utilizar modernas técnicas de irrigação. É um desperdício inaceitável que se perca nas condutas 40% ou 45% da água em circulação, por deficiência da infra-estrutura.
Uma verdadeira estratégia para a gestão da água passa por cinco etapas inultrapassáveis: aumento das disponibilidades do recurso; aumento da capacidade de armazenamento; redução dos consumos; redução dos desperdícios; e aumento da eficiência na exploração das redes.
A aprovação da lei-quadro da água, a reboque da imperatividade de transposição de directiva comunitária, é apenas o início de um tempo novo que exige alteração de processos, diversificação de meios e reforma de mentalidades. É por aí que queremos ir!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Vaz.

O Sr. Luís Vaz (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Como vimos ao longo do presente debate, enquanto os projectos de lei do PSD e do PP integram no seu seio as matérias relativas à titularidade da água e, no caso do PSD, os próprios anexos técnicos da Directiva comunitária, a proposta de lei remete - e bem! - os anexos para um posterior decreto-lei, evitando assim que qualquer alteração aos mesmo implique o regresso da lei-quadro à apreciação desta Assembleia.
O regime jurídico da titularidade da água mereceu por parte do Governo um tratamento específico, em diploma próprio, fora da lei-quadro, clarificando e estabilizando o regime actual, disperso por legislação diversa, geradora de conflitos e de interpretações, nem sempre coincidentes, e temporalmente avulsa em diplomas de 1919, 1971 e 1994.
Tratando-se de matéria. com raízes históricas profundas e muito arreigadas na tradição popular, com esta opção, o Governo agiu também com a necessária clarividência, propondo a construção em bases sólidas do regime jurídico da titularidade dos recursos hídricos, que nada tem a ver com a transposição da Directiva comunitária, em simultâneo, o Governo propõe um novo quadro institucional da gestão da água, a lei-quadro da água, onde é transposta a referida norma comunitária.
Com o surgimento desta Directiva comunitária, também fruto da Presidência Portuguesa da União Europeia, surgiram correntes de opinião diversas: uma, a daqueles que entendiam dever apenas proceder-se à transposição da Directiva; e, outra, a dos que sempre disseram "não" a esta postura, defendendo ser necessário aproveitar a oportunidade da transposição para reorganizar o quadro jurídico da titularidade e elaborar uma verdadeira lei-quadro da água. Felizmente, foi esta a corrente que obteve êxito e é nela que

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se revêem os responsáveis políticos do PS e do Governo.
Considerando que grande parte do conteúdo dos diplomas em apreço são transposição da Directiva comunitária; considerando que há cerca de duas décadas que os meios profissionais e científicos dos recursos hídricos, em Portugal, discutem estas matérias, gerando, inevitavelmente, amplos consensos, tendo participado de forma cruzada na discussão, e até elaboração de documentos em governos de matiz partidária diversa, gente ligada a diversas áreas político-partidárias, verificamos ser diminuta ou praticamente inexistente a base de divergência técnica ou cientifica; por isso, a respectiva discussão centra-se em torno de questões de pormenor, de estrutura, de ordem política ou, até, de paternidade das iniciativas legislativas.
Nesta matéria, Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, também o debate tem sido esclarecedor.
Por isso, não é demais recordar, sobretudo às bancadas do PSD e do PP, que receberam uma lei quase pronta do anterior governo do PS, do então Ministro José Sócrates, e que, mesmo assim, deixaram expirar o prazo da transposição da Directiva comunitária, gerando um contencioso com Bruxelas.
Não será demais recordar que passaram três anos enleados em "teias de interesses", no rodopio de ministros que fizeram passear pelo nosso ambiente.
Súbita, apressada e separadamente, em menos de três meses apresentam os projectos de diploma que não apresentaram enquanto Governo. Será que só depois de alijados das tarefas do poder VV. Ex.as sentiram forças para o trabalho, recuperando o que tinha ficado perdido na Rua do Século?

Protestos do CDS-PP.

Sabem os portugueses, e por isso também VV. Ex.as, que o Governo do PS não recusa tudo o que vem do passado. Desde que bafejados de alguma bondade os projectos são recuperados, melhorados e desenvolvidos. E foi o que aconteceu com os estudos que foram sendo elaborados por técnicos competentes das mais diversas áreas políticas, desde há muitos anos.
O presente processo legislativo da lei-quadro da água foi iniciado por um governante socialista, agora Primeiro-Ministro; foi, inicialmente, rejeitado pelo governo da direita; foi, posteriormente, recuperado pela vontade técnica que se foi sobrepondo à vontade política; mas o trabalho, lentamente e ao sabor da referida "teia de interesses" que enredou os sucessivos governantes que foram passando pelo Ministério, não permitiu que avançasse.
Na fase final do famoso "governo das trapalhadas" - expressão tão querida de alguns membros das vossas bancadas -, o processo foi marcado por um episódio, de certa forma cómico, certamente fruto do ambiente governativo de então. Refiro-me ao célebre Despacho n.º 26 472/2004, de 22 de Dezembro, do, então, Secretário de Estado Adjunto do Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, que remeteu a proposta de lei-quadro da água do Governo PSD/PP ao Instituto da Água (INAG) e ao Conselho Nacional da Água (CNA), determinando a organização de um processo de discussão pública.

Vozes do CDS-PP: - E muito bem!

O Orador: - Tudo pareceria normal, não fosse o Despacho dado à revelia do próprio Ministro, que, por inerência, era também o Presidente do Conselho Nacional da Água…
Como o projecto de lei do PCP, de que, apenas ontem, tive conhecimento,…

O Sr. António Filipe (PCP): - Foi entregue antes da proposta de lei do Governo!

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado, mas eu tive ontem conhecimento do vosso projecto de lei e, com ele, são quatro os diplomas que baixarão à 7.ª Comissão.
Por isso, não será por falta de matéria-prima de qualidade que o País deixará de ficar dotado dos instrumentos fundamentais, que definirão, para o futuro, as questões da titularidade e da boa gestão e qualidade do património hídrico nacional.
Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, V. Ex.ª e o Governo que integra, num curto espaço de três meses de governação, já deram sobejas provas de determinação e de vontade de recolocar Portugal na grelha que o conduzirá ao progresso e a melhores dias de vida para os portugueses.
O Ministério que V. Ex.ª tutela demonstrou no passado dia 5 de Junho, que um só Ministro, em três meses, teve maior capacidade executiva e maior eficácia, que quatro em três anos.
Estou certo de que, da mesma forma que o investimento público pode induzir o investimento privado, também a intenção anunciada da apresentação destes diplomas inerentes aos recursos hídricos, induziu o PSD, o PP e o PCP a "mostrarem serviço".
Pelo exposto, temos a certeza de que as propostas do Governo são o melhor contributo e a base fundamental da legislação que esta Assembleia da República irá aprovar sobre a matéria em apreço, sem menosprezo do desejável contributo das propostas das restantes bancadas parlamentares, em sede de

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Comissão especializada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - O Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva pediu a palavra à Mesa. Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, só para informar a Câmara de que aquilo que foi dito pelo Sr. Deputado Luís Vaz não corresponde à verdade, mas eu poderei esclarecer a Câmara.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Qual é a figura, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, será uma intervenção para a qual, aliás, já estou inscrito, fazendo uso de tempo cedido pela bancada do PCP.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva, ainda não tenho o registo do seu tempo disponível; no entanto, se informa que tem essa possibilidade de uso de tempo, de cuja transferência o PCP já informou a Mesa, dar-lhe-ei a palavra.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Moreira da Silva (PSD): - Sr. Presidente, começo por agradecer ao PCP a cedência de tempo.
O meu pedido de palavra destina-se apenas a rectificar uma informação inexacta, que foi dada pelo Sr. Deputado Luís Vaz. Não é uma questão muito grave mas, em todo o caso, não faz sentido que algo fique por clarificar.
Era o que mais faltava vir aqui afirmar que eu, enquanto secretário de Estado, tomei uma iniciativa à revelia do, então, Ministro do Ambiente, Dr. Luís Nobre Guedes. Basta consultar o despacho de delegação de competências e as sucessivas informações que foram dadas para saber que me foi confiada a matéria da elaboração da lei-quadro da água, tendo sido nesta qualidade, sob acordo - natural e óbvio - do Ministro do Ambiente, que remeti a respectiva proposta para discussão pública.
O que eu esperava era que o Sr. Deputado Luís Vaz tivesse vindo aqui explicar-nos por que é que um processo de discussão pública, que foi iniciado por despacho, de 9 de Dezembro, foi "metido na gaveta" e os seus contributos também foram "metidos na gaveta". Não o tendo feito, é notável que venha aqui invocar um despacho que remete para discussão pública - o que é normal e recomendável - e não venha aqui prestar contas quanto ao resultado dessa discussão pública, esclarecendo em que é que nós todos beneficiámos dessa discussão pública. Portanto, o Sr. Deputado demonstra é que, neste momento, o Partido Socialista não tem qualquer tipo de interesse em ouvir a opinião das entidades representativas…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - … nem a da sociedade civil em geral.

Aplausos do PSD.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Vaz.

O Sr. Luís Vaz (PS): - Exactamente, Sr. Presidente. Muito obrigado.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, quero apenas responder ao Sr. Deputado Jorge Moreira da Silva, relativamente à questão do despacho, dizendo-lhe que a questão que se coloca aqui é a seguinte: o, então, Sr. Ministro do Ambiente era, por inerência, o presidente do Conselho Nacional da Água; e V. Ex.ª, Sr. Deputado, enquanto secretário de Estado proferiu um despacho - tenho-o aqui - a ordenar "ao Conselho Nacional da Água que abra um inquérito". Portanto, é só esta questão que não é muito curial também.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.

O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: - Sr.

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Presidente e Srs. Deputados, quero apenas retomar a questão do Sabor,…

Vozes do PSD: - Ahhh!…

O Orador: - … começando, enfim, por lamentar ao Sr. Deputado Adão Silva não o ter feito na altura.
Confesso que, com a pressão do tempo e por se tratar de um tema fora da ordem do dia, acabou por me passar de ideia, mas não foi voluntariamente e, por isso, é com muito gosto que respondo agora ou em qualquer altura, sobre esta ou sobre qualquer outra questão.
Tenho perfeita consciência de que a matéria do Sabor é, neste momento, muito sensível para todas as populações da região e para todos nós.
Quanto às declarações que proferi em Barca de Alva, não posso senão mantê-las, embora admita que, como frequentemente acontece, a comunicação social nem sempre reflecte, de forma absolutamente rigorosa, aquelas que são as nossas preocupações e os nossos ênfases. Por isso mesmo, agradeço a oportunidade de poder fazê-lo aqui.

O Sr. Adão Silva (PSD): - Nós também!

O Orador: - Começo por dizer, e parece-me importante sublinhá-lo, que sou absolutamente sensível à importância do aumento da capacidade de armazenamento naquela região e, em geral, no Douro.

O Sr. Adão Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Todos sabemos que o Douro tem uma sequência de aproveitamentos eminentemente hidroeléctricos que funcionam a fio de água e, por isso, o aumento da capacidade de armazenamento tem um valor estratégico importante, ao qual sou perfeitamente sensível.
Além disso, as populações associam a construção das barragens, por vezes com excesso de optimismo mas a verdade é que o fazem, a processos de desenvolvimento regional que umas vezes ocorrem e outras não.
Seja como for, é uma expectativa das populações e há mérito energético e estratégico indiscutível no aumento da capacidade de armazenamento no Alto Douro, o que deve ser sublinhado.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Porém…

O Orador: - Dito isto, é também público, e terei, com certeza, gosto em facultar documentação relativa a essa matéria, que existe uma situação de pré-contencioso com Bruxelas.
Foi-nos remetida, e à nossa delegação - a Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia (REPER) -, uma comunicação da Direcção-Geral do Ambiente da Comissão Europeia, onde se questiona severamente, em nome da Directiva Habitats, a viabilidade do empreendimento.
A informação dada por Bruxelas e a experiência que temos de outros casos, um deles referido já hoje, salvo erro pelo Sr. Deputado Mendes Bota, que é o caso de Odelouca, diz-nos que basta essa situação para tornar absolutamente inviável a obtenção de financiamento comunitário por Bruxelas. Portanto, estamos perante uma situação complexa.
Qual é o papel do Governo nessa situação? É o de esclarecer o problema, tentar perceber a solidez dos argumentos em presença e, se for caso disso, tentar encontrar soluções alternativas para resolver o problema. Isso tem complexidade e, portanto, Sr. Deputado Adão Silva, não lhe posso dar uma resposta imediata.
Há pouco, quando falei em reanálise, era exactamente isso que queria dizer, ou seja, não é uma decisão final, impõe-se, simplesmente, fazer uma reanálise. Dentro de algum tempo, teremos uma posição mais aprofundada sobre qual a estratégia a seguir relativamente a essa matéria.
Sobre esta questão é tudo e agradeço a generosidade do tempo que me foi cedido para este efeito.
Relativamente a outros temas do debate, não vou alongar-me, porque ele já vai longo e quase tudo foi dito, mas quero deixar prevalecer ou relevar aqui duas coisas.
Em primeiro lugar, aliás, como disse, independentemente das opiniões legítimas e do sentido de voto legítimo de cada um, é um momento histórico, ao fim de cerca de 90 anos, podermos discutir e - espero! - aprovar uma lei da água. Isto deve dar-nos satisfação a todos.
Em segundo lugar, é perfeitamente assumido que esta lei foi trabalhada por muitas pessoas, pelo menos desde o ano de 2000. Eu próprio integrei o grupo de trabalho que esteve na génese desta lei, ainda a Directiva-Quadro não estava aprovada. Muita gente lhe acrescentou valor, muitos técnicos de áreas políticas diversas e, sobretudo, independentemente das suas áreas políticas foram chamados a dar contributos para essa lei. O País ganhou muito com esse processo, apesar de ele se ter prolongado por muito mais tempo do que teria sido possível se houvesse uma liderança política eficaz, algo que não houve - há que reconhecê-lo - desde 2002. Houve um grande esforço na recta da meta, nos últimos meses, mas não foi suficiente.

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1592 | I Série - Número 037 | 02 de Julho de 2005

 

Portanto, estamos perante um trabalho que integra valor acrescentado por muitas pessoas e que julgo muito meritório.
Nestes últimos três meses, o Governo não se limitou a reimprimir, a fotocopiar, o que recebeu de trás. Leu com muita atenção tudo o que vinha de trás, eu próprio passei fins-de-semana a fazer uma confrontação cerrada e detalhada das várias versões que a lei tinha tido, para fazer aquilo que, infelizmente, faltou durante alguns anos - direcção política. O que é que, a nível político, queremos disto? Quais os ênfases políticos que queremos dar?
Ora, foi possível isso ser feito. Conseguimos aprovar o diploma a 5 de Junho e hoje aqui está ele a ser debatido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por terminado o debate.
Antes de encerrarmos os nossos trabalhos, a Sr.ª Secretária tem ainda expediente para anunciar.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi admitida, a proposta de lei n.º 25/X - Determina a não contagem do tempo de serviço para efeitos de progressão nas carreiras e o congelamento do montante de todos os suplementos remuneratórios de todos os funcionários, agentes e demais servidores do Estado até 31 de Dezembro de 2006, que baixou à 1.ª Comissão.
Em termos de expediente é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Telmo Correia): - Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á quarta-feira, dia 6, durante todo o dia, com início às 10 horas, e terá como ordem do dia a discussão e votação da proposta de lei n.º 24/X, o chamado Orçamento rectificativo.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 55 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Luís Manuel de Carvalho Carito
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Nelson Madeira Baltazar
Susana de Fátima Carvalho Amador
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Arménio dos Santos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Miguel Pais Antunes
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos

Partido Comunista Português (PCP):
Francisco José de Almeida Lopes
Maria Odete dos Santos

Partido Popular (CDS-PP):
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

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Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares
Luís Garcia Braga da Cruz
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro

Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado

Partido Comunista Português (PCP):
José Batista Mestre Soeiro

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
António José Ceia da Silva
Jacinto Serrão de Freitas
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes

Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho
Carlos Jorge Martins Pereira
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Comunista Português (PCP):
Artur Jorge da Silva Machado
Jerónimo Carvalho de Sousa

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António de Magalhães Pires de Lima
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo

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