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Sexta-feira, 5 de Janeiro de 2007 I Série — Número 32
X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 4 DE JANEIRO DE 2007
Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama
Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira
SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Antes da ordem do dia. — Deu-se conta da apresentação do projecto de resolução n.º 170/X.
Procedeu-se ao debate sobre os 250 anos da Região Demarcada do Douro, tendo sido apreciados os projectos de resolução n.os 139/X — Assinala os 250 anos da Região Demarcada do Douro, e recomenda ao Governo medidas dirigidas ao desenvolvimento económico e social daquela região (PS), que mereceu aprovação da Câmara, com a alteração entretanto aprovada, e 170/X — Desenvolver o Douro, proteger a Região Demarcada (PCP), que foi rejeitado. Usaram da palavra, além do Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades (João Ferrão), os Srs. Deputados Jorge Almeida (PS), Agostinho Lopes (PCP), Alda Macedo (BE), Ricardo Martins (PSD), Hélder Amaral (CDS-PP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Em declaração política e a propósito do naufrágio do barco de pesca Luz do Sameiro, ocorrido no passado dia 29, o Sr. Deputado António Filipe (PCP) falou sobre os meios de busca e salvamento na costa portuguesa, após o que deu resposta aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Fazenda (BE), Marques Júnior (PS), Agostinho Branquinho (PSD) e João Rebelo (CDS-PP).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes (PSD), fazendo um balanço da governação socialista, criticou a política que tem vindo a ser seguida pelo Governo nas diversas áreas.
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado João Semedo (BE) insurgiu-se contra a execução de Saddam Hussein e responsabilizou o Presidente norte-americano e as forças ocupantes do Iraque pela violência que marca o dia-adia neste país, tendo sido, depois, secundado pelos Srs.
Deputados José Vera Jardim (PS) e Bernardino Soares (PCP).
O Sr. Deputado Alberto Martins (PS), em declaração política, perspectivou a política do Governo para o ano de 2007 e
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respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Diogo Feio (CDS-PP), António Montalvão Machado (PSD), Bernardino Soares (PCP) e Luís Fazenda (BE).
Ordem do dia. — Procedeu-se à discussão do projecto de resolução n.º 161/X — Divulgação obrigatória dos cursos, e respectivos estabelecimentos de ensino, dos licenciados no desemprego (PSD). Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Pedro Duarte (PSD), Cecília Honório (BE), Abel Baptista (CDS-PP), Manuel Mota (PS), Miguel Tiago (PCP) e Francisco Madeira Mendes (Os Verdes).
Foi aprovado, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 106/X — Aprova a lei que procede à reestruturação da concessionária do serviço público de rádio e televisão.
A Câmara aprovou ainda dois pareceres da Comissão de Ética autorizando um Deputado do PS e outro do PSD a deporem, respectivamente, como testemunha e como arguido, em tribunal.
Por fim, foi apreciado, na generalidade, o projecto de lei n.º 201/X — Introduz o ensino multilingue nos estabelecimentos públicos de educação e de ensino (BE), tendo-se pronunciado os Srs. Deputados Cecília Honório (BE), Miguel Tiago (PCP), Emídio Guerreiro (PSD), Abel Baptista (CDS-PP), Paula Barros (PS), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Francisco Louçã (BE) e Ana Catarina Mendonça (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 15 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pereira Ribeiro
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
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Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Lurdes Ruivo
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
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Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Irene Martins Baptista Silva
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Sérgio André da Costa Vieira
Zita Maria de Seabra Roseiro
Partido Comunista Português (PCP):
Abílio Miguel Joaquim Dias Fernandes
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
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Miguel Tiago Crispim Rosado
Partido Popular (CDS-PP):
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Hélder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
ANTES DA ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa e foi admitido o projecto de resolução n.º 170/X — Desenvolver o Douro, Proteger a Região Demarcada (PCP).
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início ao período de antes da ordem do dia, que tem uma primeira parte relativa à comemoração dos 250 anos da Região Demarcada do Douro, aniversário que todos devemos saudar.
Estão em apreciação conjunta os projectos de resolução n.os 139/X — Assinala os 250 anos da Região Demarcada do Douro e recomenda ao Governo medidas dirigidas ao desenvolvimento económico e social daquela região (PS) e 170/X — Desenvolver o Douro, proteger a Região Demarcada (PCP), sendo que cada grupo parlamentar, bem como o Governo dispõem de 5 minutos para usar da palavra.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Almeida.
O Sr. Jorge Almeida (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Terminado o programa oficial das Comemorações dos 250 anos da Região Demarcada do Douro, conhecidos diversos estudos sócio-económicos sobre a região, produzidos por eminentes economistas e sociólogos, elaborado e aprovado que foi o Relatório Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, faz todo o sentido promover em Plenário uma reflexão sobre a Região do Douro, os seus activos e potencial endógeno, bem como sobre os seus constrangimentos, bloqueios e fragilidades, que nos permita concluir pela aprovação de recomendações ao Governo que possam contribuir para operacionalizar soluções bem ajustadas ao presente e bem projectadas para o futuro.
Os durienses detêm, em média, 55% do poder de compra do todo nacional.
É que, por um lado, o Douro convive desde há muito com um tremendo paradoxo: o seu enorme potencial endógeno e criação de valor e, por outro, os indicadores sociais, demográficos e económicos.
Por um lado, os seus vinhos, em particular o Porto e o Douro, a produção hidroeléctrica, materializada em grandes centrais como as da Régua, Valeira e Pocinho, o turismo, um rio navegável que vai de Barca d’Alva até à Foz, dois patrimónios da humanidade classificados pela UNESCO, Alto Douro Vinhateiro e
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Parque Arqueológico do Vale do Côa.
Por outro lado, a pobreza, o esvaziamento social e demográfico.
A perda populacional, ininterrupta desde há 40 anos, é de 9% por década. Tudo isto sem qualquer alteração ou inversão nos últimos 20 anos, durante os quais diversos planos operacionais e fundos estruturais foram canalizados para a região, o que não deixa de constituir também um outro terrível paradoxo.
A região necessita, por isso, não só de melhores apoios e acções conjunturais mas, fundamentalmente, da tomada de medidas políticas estruturantes, dirigidas à raiz dos problemas.
De entre estas, consideramos estruturante e decisiva para o futuro do Douro a operacionalização de um mecanismo de coordenação, intervenção e acompanhamento dos diversos actores e agentes públicos e privados, capaz de promover convergências, sinergias e optimização dos recursos, e de concretizar, finalmente, o Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro.
O Douro tem uma identidade sociológica muito complexa, assente no primado do individual, a que não são alheias a morfologia acidentada do território e a grande dificuldade histórica de uma ocupação sustentada do seu espaço físico.
Esta marca genética moldou um homem inquebrantável diante das vicissitudes da Natureza, capaz de uma autêntica epopeia ao construir um anfiteatro de xisto e capaz de produzir um néctar inigualável, conhecido como Vinho do Porto, mas que tem alguma dificuldade em integrar e fazer afirmar projectos colectivos e associativos.
A NUT III, do Douro, repartida por quatro distritos, integrando o forte espírito municipalista dos seus concelhos, tendo no seu seio inúmeras instituições, tantas vezes de «costas voltadas» e em caminhos de divergência, necessita de uma forte coordenação de vontades e energias que a Unidade de Missão do Douro, entretanto aprovada pelo Conselho de Ministros, pode realizar.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Mas não pode uma região como esta deixar de ter, em sede do QREN, do Plano Tecnológico, do Prime e dos Orçamentos do Estado, os apoios necessários para a mobilização das iniciativas empresariais, públicas e privadas, e para as parcerias com os centros de investigação científica e os pólos do ensino superior, capazes de fazer direccionar a investigação para a melhoria qualitativa dos produtos da região de marca Douro, uma investigação que apure e desenvolva o património genético agrícola da região, que enriqueça pela diversidade, alta qualidade e excelência o produto final de uma agro-indústria a desenvolver e a consolidar.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: De todo o estudo que fizemos e do conhecimento que detemos desde há muito da Região Demarcada do Douro, destacamos também como decisiva e estruturante a alteração do processo do ciclo do Vinho do Porto, a concretizar com o aumento da capacidade instalada das empresas no Douro, de forma a que, no espaço temporal de uma década, o principal da «stockagem», «lotagem», envelhecimento, engarrafamento, expedição e comercialização passem a ser feitos na e a partir da região.
O Douro, que produz anualmente entre 400 a 500 milhões de euros de valor em vinhos, dos quais apenas um terço fica na região, não terá nunca hipótese, à custa desta fileira, de ver invertida a tendência actual de empobrecimento e esvaziamento demográfico se não puder contar com a massa crítica do comércio exportador e com o emprego técnico qualificado, que neste momento estão maioritariamente sedeados e instalados noutras paragens.
A região muito em breve terá auto-estradas de enlace europeu que a colocarão, por terra, ainda mais perto das capitais europeias do que do próprio litoral, bem como trânsito comercial fluvial-marítimo directamente dos seus cais para qualquer cidade portuária estrangeira.
A logística que durante centenas de anos presidiu ao ciclo da DOC Porto, com o transporte a granel do Douro para Gaia, começada com o rabelo, continuada com o comboio e depois com o auto-tanque, pode deixar de fazer sentido.
As novas acessibilidades, uma visão de fileira do sector vinícola instalado na Região Demarcada do Douro e o reconhecimento da racionalidade de um modelo que aproveite ao máximo o potencial do sector para a região são os ingredientes principais para uma correcta perspectiva estratégica.
O desafio é grande, mas muito maior são a vontade e a força inquebrantável dos durienses em construir um futuro melhor.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Os problemas do Douro são conhecidos, as soluções também. O PS e o PSD conhecem-nas… na oposição, não as praticam no Governo!
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — O projecto de resolução do PCP centra-se em meia dúzia de evidências.
A evidência de que a marca distintiva da região é a sua diferença face a outras regiões vitivinícolas, diferença essa que constituiu e constitui a sua principal mais-valia.
A evidência de que sucessivos governos do PS e PSD (com ou sem CDS-PP) procuram há 20 anos apagar essa diferença. Com falsos argumentos, retiraram atribuições e competências e degradaram a situação económica e financeira da Casa do Douro e da região. Em vez de utilizarem a «diferença» para defender o Douro, copiaram, subservientes, regras estranhas para decepar as suas «vantagens», servindo os interesses nunca saciados das casas exportadoras de Gaia. Alguém será capaz de me dizer que altos «critérios vitivinícolas» podem explicar a manutenção, até hoje, da «chaptalização» na França vinhateira?! A evidência de que ainda não conseguiram destruir o trabalho da Natureza e do homem do Douro.
Mas está em risco o seu galardão «Património da Humanidade»! A evidência do mau caminho do actual Governo PS de Sócrates, que, em vez de retomar como prática governativa o que durante os três anos de governação PSD/CDS-PP foi o discurso do PS, através de Deputados que hoje são ministros, Secretários de Estado ou outra vez Deputados, repete a mesma política para o Douro. Depois de dois anos de confrangedora inactividade, avançou, em Setembro, com uma Resolução do Conselho de Ministros que cria a Estrutura de Missão para a Região Demarcada do Douro.
Para lá do nome pomposo, a resolução esvai-se num projecto centralista e fortemente governamentalizado, um projecto com objectivos vagos e insuficientes e sem uma clara definição do suporte financeiro.
A evidência de que o Douro só precisa que cumpram com os prometidos investimentos públicos. Uma visão de desenvolvimento integrado, centrado na sua principal riqueza — a magnificência dos seus vinhos —, sem alienar outras reais ou potenciais valias, o que significa uma Casa Douro com competências e atribuições recuperadas, eleita directamente pelos viticultores, saneada económica e financeiramente.
Precisa que lhe entreguem a iniciativa e os meios, que não lhe vendam a especificidade no «altar» da globalização, que haja vontade política e clareza estratégica.
É esta a resposta do projecto de resolução que o PCP hoje apresenta.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de resolução com que o PS pretende celebrar os 250 anos da Região Demarcada do Douro é um mau plágio e uma fraude política.
Vejamos: nas recomendações copia, deturpando, o texto do Relatório Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional (CAEIDR) sobre a audição e visita à Região de Trás-osMontes e Alto Douro efectuada há um ano.
De facto, o Relatório da CAEIDR propõe como recomendação (que os Deputados do PS aprovaram) um mecanismo de acompanhamento a todos os níveis na Região de Trás-os-Montes e Alto Douro. Mas o projecto de resolução do PS fala agora de «um mecanismo (…), a todos os níveis, na NUT III Douro».
Afinal, Srs. Deputados do PS, é uma estrutura para Trás-os-Montes e Alto Douro ou é uma estrutura para o Douro? É possível votar as duas ou optaram agora pelo Douro face à Resolução do Conselho de Ministros? Depois, o projecto de resolução é uma fraude política. Fala em acelerar a construção do IC26 e a «requalificação da Linha do Douro», mas os senhores acabaram de votar um Orçamento do Estado que esqueceu o IC26 e a Linha do Douro. Pior: votaram contra as propostas do Grupo Parlamentar do PCP para que essas obras fossem consideradas!! Consideram também que a recomendação do vosso projecto de resolução, a propósito da reorganização dos serviços públicos, é compatível com a desactivação dos Serviços de Urgência no Hospital da Régua?! Depois (coisa notável!), temos um projecto de resolução sobre os 250 anos da Região Demarcada do Douro que, nas recomendações, não fala da Casa do Douro, não fala da difícil situação que atravessam os seus 40 000 viticultores!!… Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Um ex-Secretário de Estado do governo do PSD, responsável por muitos dos problemas que a região atravessa, diz que há «falta de massa crítica», falta de «líderes» no Douro! Outro ex-Secretário de Estado do governo do PS diz que o Douro «precisa de importar cérebros».
O Sr. Ministro da Presidência, Pedro da Silva Pereira, questionado durante o debate do Orçamento do Estado sobre a contradição do que dizia sobre a Casa do Douro como Deputado do PS na oposição e do que fazia como governante, falou do «contexto» do seu discurso oposicionista.
Tudo isto é triste e, infelizmente, é fado das gentes do Douro!
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Mas não deve haver dúvidas de quem são as responsabilidades e de quais são as soluções e os caminhos para o Douro! Leia-se o manifesto «Douro, o futuro não pode esperar mais», assinado por dezenas e dezenas de personalidades durienses, fundamentalmente da área do PS e do PSD! Leia-se o manifesto «Perplexidades e Preocupações», de 12 párocos da região duriense! Leia-se o que escreveu António Barreto, a 5 de Novembro, no jornal Público! Dele temos (e terão outros) as maiores discordâncias políticas e ideológicas, mas há um inevitável e universal reconhecimento: António Barreto é um profundo conhecedor do Douro. Atente-se no seu alerta: «Com a destruição do edifício institucional, os durienses ficaram sem quem os defenda ou quem os represente»! E diz mais: «A resistência às mitologias da globalização e da desregulamentação. A falência da demarcação e da disciplina seria um crime sem perdão». Terminamos como começámos: os problemas são conhecidos, as soluções também. Assim as políticas servissem outros interesses que não os do grande capital nacional e estrangeiro, neste caso sediado em Vila Nova de Gaia!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Há sempre duas formas de dar início ao debate sobre a Região Demarcada do Douro. Uns começam pela história de 250 anos, desde a iniciativa pombalina; outros pela beleza da paisagem feita dos contrastes entre o espelhado do rio e os seus reflexos na monumentalidade da paisagem, dos contrastes das fragas e dos socalcos.
A riqueza de uma história e a monumentalidade de uma paisagem, que deviam ser bênção desta região, arriscam-se a camuflar aquilo que hoje a caracteriza dominantemente e a transformar história e paisagem não em bênção mas em maldição.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
A Oradora: — Quebrar este feitiço passa por olhar de frente para os problemas que afligem a Região Demarcada do Douro, equacionar que processos têm conduzido a esta situação e projectar o que precisa de ser mudado.
Pobreza, iliteracia e abandono são os problemas maiores. De entre, eles, a região defronta-se desde logo com o declínio demográfico, uma vez que perdeu cerca de 40% da sua população ao longo dos últimos anos. Isto é o resultado do abandono das gerações mais jovens, que seriam capazes de acrescentar massa crítica ao seu desenvolvimento. Eles não encontram, contudo, os atractivos necessários à sua fixação, e a verdade é que nenhuma paisagem natural serve de sustento, mas também nenhuma paisagem natural sobrevive se for um deserto de pessoas.
Por isso, o programa de investimento público tem de ser dirigido a cumprir com um mapa de serviços públicos que responda às necessidades das populações, no plano das infra-estruturas mas também no plano da educação e qualificação, do desenvolvimento cultural e da saúde pública.
Outro problema maior é o do empobrecimento da população.
Importa olhar para o território na complexidade das suas valências, uma região que é única, vive no essencial de um produto que é único — o vinho que produz. Contudo, sendo uma das regiões exportadoras de vinho com maior peso nas exportações vinícolas nacionais, é também, na região norte do país, aquela que conta com menor rendimento per capita.
No ano passado, de entre os 100 vinhos escolhidos internacionalmente como os melhores do ano, houve apenas quatro marcas portuguesas. Todas elas são do Douro. No entanto, da riqueza produzida na região, apenas um terço fica na própria região. Não há uma distribuição equitativa dessa riqueza; logo, ela não se traduz nem em desenvolvimento nem em qualidade de vida para as populações.
O processo a que temos vindo a assistir, mais acentuado desde 2003 — altura em que o «governo das direitas» esvaziou ainda mais profundamente a função da Casa do Douro —, é o da concentração crescente da comercialização dos vinhos do Douro e Porto em grandes grupos empresariais, que controlam, a partir de Vila Nova de Gaia, os preços aos produtores.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente!
A Oradora: — São mais de 40 000 pequenos produtores, sem capacidade negocial, sem capacidade de investimento e sem uma cultura cooperativa que lhes permita organizarem-se e terem uma relação de força diferenciada face ao mercado e face à própria Casa do Douro.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
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A Oradora: — O sector da produção de vinhos pode ser um sector de forte aposta no crescimento económico, mas para isso é essencial apoiar a reabilitação da Casa do Douro no sentido de dotá-la de capacidade coordenadora entre as diversas cooperativas de produtores, devolver-lhe a função reguladora em defesa dos pequenos produtores, conferindo-lhe um papel de reposição do equilíbrio de forças, que tem estado completamente ausente, optimizando a sua estrutura institucional numa orientação de representação verdadeiramente democrática.
Anos de investimentos comunitários na Região do Douro não têm sido capazes de inverter o caminho de reprodução de pobreza e de falta de qualificação. Os investimentos têm de servir para produzir desenvolvimento, e não é isso que tem acontecido! Chegamos, portanto, ao terceiro dos problemas maiores da Região do Douro: a dicotomização do poder local.
A incapacidade de os municípios da Região do Douro se articularem de uma forma solidária e de gerarem entendimentos entre si é a causa principal da ameaça, que paira sobre a região, de desclassificação como Património Mundial.
Inverter esta cultura política passa por uma estratégia integrada de desenvolvimento e ordenamento do território, que articule desenvolvimento com ambiente, com cultura e economia.
Os projectos estão elaborados, os programas de conjugação de actividades estão no papel, os meios de apoio à qualificação e ao aumento do nível de formação académica estão feitos. O que tem faltado é o investimento público necessário à sua concretização.
Eis-nos, pois, chegados ao que é o centro dos projectos de resolução que votaremos mais tarde: eles são, no essencial, um apelo ao Governo para que faça o que se tem comprometido a fazer.
Não basta um enunciado de intenções bondosas, nem basta uma estrutura de missão como a que foi criada; é preciso que o Governo se comprometa com a vontade política de realizar e, sobretudo, é preciso que o Governo compreenda que o investimento público é imprescindível para dar o impulso transformador capaz de quebrar com o ciclo de pobreza e começar a gerar progresso e desenvolvimento.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Martins.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, quero aproveitar para desejar a V. Ex.ª, a todos os Sr.as e Srs. Deputados e aos Srs. Membros do Governo um bom ano de 2007.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Há 250 anos atrás, assinava el-rei D. José o alvará régio que instituía a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro.
Nascia, assim, aquela que é a primeira região demarcada do mundo a cumprir os pressupostos e conceitos que hodiernamente se exigem para tal classificação.
O modelo de regulação da produção e comercialização do Vinho do Porto, de «carregação» ou «embarque» como era designado na época, para além da delimitação territorial, inovava, ao incluir mecanismos de controlo e certificação que, 250 anos volvidos, ainda perduram na sua essência.
São disto exemplo o cadastro, mandado elaborar na época, a tentativa de controlar os quantitativos da produção ou a fixação dos preços, em função da qualidade do vinho produzido «de feitoria» ou de «de ramo».
Nas palavras de António Pires Cabral, «Este Alvará nasceu com boa estrela. (…) Houve dias de prosperidade no Alto Douro, ainda que seguramente mal distribuída.» Com efeito, este momento marcará para sempre o futuro desta região, seja no plano económico, já que a vitivinicultura constitui a sua principal actividade, seja no plano cultural e social.
Um quarto de milénio depois, apesar de o Vinho do Porto constituir um produto de excelência, responsável por cerca de 60% das exportações vínicas nacionais, apesar de a estonteante paisagem do Alto Douro ter merecido a classificação como Património da Humanidade, a verdade é que o Douro é uma das regiões mais envelhecidas e desertificadas de Portugal, com indicadores socio-económicos abaixo da média nacional e que tarda em conseguir converter as suas potencialidades em ganhos de qualidade de vida para as suas populações.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O projecto de resolução que brotou do trabalho da comissão tem de ser lido à luz do que têm sido as tomadas de posição e as decisões adoptadas pelo Partido Socialista e pelo Governo que sustenta, no tocante à Região do Douro.
É importante lembrar que o partido que apresenta o projecto de resolução n.º 139/X é o mesmo que elaborou o relatório final sobre a audição e visita parlamentar à região de Trás-os-Montes e Alto Douro, por parte da 6.ª Comissão, que contemplava já um conjunto de propostas ao Governo que tivemos ocasião de classificar, nesta Câmara, como tímidas, fracas e pouco incisivas, como se exigia.
Ora, o que o Partido Socialista nos traz hoje é «mais do mesmo»!! Como não teve qualquer rasgo ou preocupação em alterar ou melhorar o texto inicial, transformou este projecto de resolução em algo absolutamente redundante, uma vez que recomenda ao Governo a mesmíssima coisa que o relatório da 6.ª Comissão já havia recomendado.
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O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem! O Orador: — É o mesmo Partido Socialista que há pouco mais de seis meses chumbou um projecto de resolução, apresentado pelo Partido Social-Democrata, e que visava conceder um apoio extraordinário aos agricultores que foram severamente afectados pela intempérie de granizo que afectou uma área superior a 5000 ha e atingiu mais de 3500 viticultores. Uma rejeição assente, única e exclusivamente, numa lógica de ciúme partidário, o que nem é de estranhar num partido que apoia um Governo que é «padrasto» da região.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Lembro apenas dois ou três exemplos, começando pelo anúncio feito pelo Sr. PrimeiroMinistro, com toda a pompa e circunstância, no Salão Nobre da Casa do Douro, a 31 de Agosto último, da determinação deste Governo em prosseguir uma estratégia integrada de desenvolvimento para a região, cuja concretização ficaria a cargo de uma Unidade de Missão, aprovada nesse mesmo dia em Conselho de Ministros.
Ora, volvidos que estão quatro meses, essa Unidade de Missão ainda não saiu do papel, porque — pasme-se! — o Governo ainda não teve tempo para nomear o seu chefe de projecto.
O mesmo Governo que ainda não teve tempo, em quase dois anos de governação, de tirar o Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro da gaveta onde o arrumou, no exacto momento em que tomou posse.
Um Governo que teima em não cumprir os protocolos celebrados entre o Estado português e a Casa do Douro, sendo, por isso, também responsável pelos salários em atraso dos funcionários do quadro privativo daquela importante instituição duriense.
O Sr. Arménio Santos (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Um Governo que pretende encerrar um conjunto significativo de serviços públicos, na região, na área da saúde, passando pela da segurança social e terminando na da justiça.
Estes são apenas alguns exemplos da actuação deste Governo, mas que são bem elucidativos da sua dita «determinação» em promover o desenvolvimento da região duriense.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Pois é!
O Orador: — Sobre tudo isto, o que diz o projecto de resolução do Partido Socialista? Nada ou praticamente nada! Este é um projecto de resolução que tenta expiar os pecados do Partido Socialista e do seu Governo para com a região, e que são muitos, pelo que este documento mais parece um projecto de redenção do que um projecto de resolução.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O que verdadeiramente nos distingue e separa são duas questões essenciais.
Enquanto que para o Partido Socialista o Douro é apenas mais um problema que este Governo tem de resolver, para o PSD, o Douro é uma oportunidade, é um desafio que urge agarrar, acarinhar e desenvolver. E, ao contrário do Partido Socialista, para quem tudo o que é apresentado pelo PSD não serve, só porque vem da oposição, o PSD não faz oposição aos portugueses nem aos durienses. Para o PSD, os portugueses estão primeiro e só depois vem o partido, pelo que, apesar de considerarmos este projecto de resolução redundante, tímido e mal elaborado, ele é um sinal de descontentamento para obrigar o Governo a fazer algo mais pela região duriense.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Sempre é melhor do que o vosso, que não existe!
O Orador: — É assim que o interpretamos e vamos votar!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O ano de 2006, que agora terminou, foi marcado por várias comemorações integradas na celebração dos 250 anos da constituição da Região Demarcada do Douro, a que se associou também a Assembleia da República. Ali, apostou-se na preservação da autenticidade, integridade e excelência da região e dos
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seus vinhos, bem como na valorização da actividade económica em que se sustentam as populações durienses.
Através do Alvará Régio de 10 de Novembro de 1756, que instituiu a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, estava criado um sistema de regulação da produção e comércio dos vinhos da primeira região demarcada do mundo.
Pese embora as várias interpretações históricas acerca do significado político, económico ou social da legislação produzida pelo Marquês de Pombal, esta assumiu, com assinalável pioneirismo, a nível mundial, o conceito e os princípios de regulação e defesa de uma denominação de origem controlada, definindo não só os limites geográficos de uma região vitivinícola mas também um cadastro e a classificação de parcelas dos respectivos vinhos.
Em boa verdade, apesar das várias alterações geográficas, institucionais e administrativas ocorridas ao longo do tempo, a Região Demarcada do Douro constituiu, enquanto região produtora de vinhos de qualidade, uma continuidade histórica, sendo a sua «paisagem cultural, evolutiva e viva» reconhecida pela UNESCO, desde 2001, como Património da Humanidade.
Tinha razão Miguel Torga ao dizer: «(…) E é no mapa da pequenez que nos coube a única evidência incomensurável com que podemos assombrar o mundo».
Só por si, estes factos de incontestável significado nacional e internacional justificam um especial destaque da Região Demarcada do Douro, secularmente associada à produção e à comercialização dos seus vinhos, já que o Vinho do Porto assumiu, ao longo dos últimos três séculos, um papel de primordial importância na economia portuguesa, como primeiro produto de exportação, contribuindo, simultaneamente, para a projecção internacional de uma imagem de qualidade e prestígio de Portugal.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Mas todos reconhecemos, internamente, que o Douro é mais do que vinho: são também as suas serras, que se prolongam em quase todo o seu percurso — Montemuro, Leomil, Meadas e Lapa.
Nas serras de Leomil e da Lapa crescem soutos e castanheiros, produzindo a famosa «castanha dos soutos da Lapa», com denominação de origem protegida.
Os pomares de Lamego, Sernancelhe, Penedono, Tarouca, Armamar e Resende produzem maçã, cereja e amêndoa, cuja qualidade é reconhecida.
O Douro é, assim, mais do que vinho.
No entanto, e apesar de todo este reconhecimento, tudo chega muito lentamente à região.
Foi assim com o moroso processo de criação da Fundação do Museu do Douro, cujo projecto, potencialmente o mais emblemático equipamento cultural da região, envolveu, para além do Ministério da Cultura, 17 autarquias e 23 entidades privadas.
São os núcleos do Imaginário do Douro e do Museu do Pão e do Moscatel, a instalar em Tabuaço e Favaios, respectivamente, sem que ainda exista uma definição concreta e definitiva relativamente à sua instalação.
É o Museu do Côa, que padece do mesmo protelamento, apesar das diversas iniciativas privadas que surgiram na área do turismo.
Foi a extinção do Gabinete Técnico Intermunicipal do Alto Douro Vinhateiro (GTI-ADV), importante instrumento de regulação de todas as intervenções na área classificada pela UNESCO como Património Mundial, demonstrando o desprezo pela região, que ficou abandonada à sua sorte, colocando em sério risco o título atribuído pela UNESCO, em 2001.
Mas aquilo que poderia ser a mola propulsora do desenvolvimento da região ainda se encontra adiado para as calendas — o Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro (PDTVD), determinado pelas Resoluções do Conselho de Ministros n.os 139/2003 e 5/2004, onde referem «a eleição do Vale do Douro como zona de excepcional aptidão e vocação turística.» A iniciativa para a elaboração do Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro decorreu do reconhecimento da «riqueza do património natural, paisagístico, histórico e cultural do Vale do Douro, associada a produtos de eleição, como os vinhos do Porto e Douro, dotando a região de condições ímpares para se poder constituir um destino turístico de excepção. Assim seja possível uma articulação entre a riqueza da paisagem, os produtos endógenos e a riqueza histórico-cultural, oferecendo um vastíssimo leque de opções turísticas que vai desde o enoturismo ou turismo em espaço rural entre outras.»
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — No entanto, numa região onde os que lá vivem e trabalham já não acreditam em miragens, reside ainda alguma esperança. Uma esperança depositada no trabalho que possa vir a ser desenvolvido pela recentemente criada Unidade de Missão do Douro (UMD), que preencherá o vazio deixado pela extinção do Gabinete Técnico Intermunicipal do Alto Douro Vinhateiro, sedeado em Lamego.
Caberá à Unidade de Missão do Douro verificar o actual estado de condições que garantiram o esta-
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tuto de Património da Humanidade e zelar para que haja uma cada vez maior valorização do Alto Douro vinhateiro. O primeiro passo será fazer um diagnóstico da situação para, depois, se poder agir em articulação com os municípios.
Deverá a Unidade de Missão criar todas as condições que potenciem os recursos naturais, humanos e financeiros disponíveis que garantam a sustentabilidade de toda uma região, conhecida pela região demarcada mais antiga do mundo.
A situação actual e as exigências do futuro implicam uma nova abordagem, que assegure a eficiência do esforço público e a mobilização da iniciativa privada, da aceleração e respeito pelos instrumentos de planeamento. Assim nos deve obrigar o respeito pelas suas gentes, que esperam o fim de notícias que muito recentemente foram primeiras páginas de jornais e de que gostava de deixar aqui alguns exemplos.
Primeiro: cinco anos após a classificação do Douro como Património da Humanidade, continuam por erradicar dezenas de lixeiras espalhadas pelas bermas das estradas.
Segundo: uma penhora ameaça sede da rota do Vinho do Porto.
Terceiro: o Estado não cumpre com regras do Plano Intermunicipal de Organização do Território do Alto Douro Vinhateiro, que — pasme-se! — sustentou a candidatura a Património da Humanidade, usando betão em vez de xisto, como sugere o Plano.
A confirmar-se o estudo do Instituto Nacional de Estatística, terá, esta região, em 2050, menos de metade da população que tinha nos anos 60.
Srs. Deputados: O vinho e a paisagem são a sua maior riqueza mas parecem não ser suficientes para vencer a pobreza das gentes do Douro.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Fazemos votos de que hoje, comemorados os seus 250 anos, seja possível cumprir os desígnios daqueles que lançaram a primeira Região Demarcada do Douro e fazemos votos de que o projecto de resolução do Partido Socialista, mais do que um cardápio de boas intenções, seja uma intenção válida de resolver os problemas das gentes do Douro.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Assinalamos hoje, no Parlamento, os 250 anos da Região Demarcada do Douro, aos quais podemos também associar os cinco anos da classificação pela UNESCO do Douro vinhateiro como património mundial, que se comemoraram no final do ano que agora terminou. Falamos, nada mais, nada menos, da mais antiga região demarcada do mundo.
Podemos aqui falar da riqueza paisagística e da capacidade produtiva que, com o saber acumulado de gerações de viticultores, conseguem produzir produtos de alta qualidade. Mas importa salientar, também, como esse património natural e cultural está ameaçado de gradual extinção, caso não sejam, atempadamente, tendo em conta o tempo que se tem vindo a perder, tomadas medidas que garantam a sua viabilidade.
O mesmo é dizer que estas terras vivem na contradição entre o potencial de desenvolvimento que as pode abrir e os problemas estruturais que as encerram entre as mais pobres do País.
Os seus cerca de 40 000 viticultores vivem em situação muito difícil, ameaçados pelas determinações da União Europeia, por via da Política Agrícola Comum, e pelas determinações da Organização Mundial do Comércio, e não tiveram, dos governos portugueses, a justeza de exigir uma visão da especificidade da Região Demarcada do Douro. Estes viticultores confrontam-se, ainda, com a institucionalização de uma lógica organizativa que lhes retirou poderes e que tem deixado a Casa do Douro no âmago do estrangulamento financeiro.
Mas se há matéria indesculpável e que tem acentuado os problemas estruturais desta região é, justamente, o problema do despovoamento e das assimetrias regionais, fomentado pelas políticas dos sucessivos governos, que alternam entre PS e PSD. Não têm sido parcos em resoluções de Conselho de Ministros, e outros documentos, que apontam as dificuldades com que se confronta a região e que até apontam medidas para procurar inverter a tendência do seu abandono. O que têm negado, depois, em múltiplos aspectos, é a sua concretização e o investimento público necessário à orientação da região para um desenvolvimento integrado e dirigido para diversas vertentes, que dê azo ao potencial de recursos naturais, paisagísticos e produtivos que aí estão encerrados.
Por exemplo, o Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro, constante dessa colecção de resoluções de Conselhos de Ministros, aponta como orientação estratégica a recuperação da linha ferroviária do Douro e a reabilitação das linhas do Tua e do Corgo. O que sabemos hoje é que a CP propõe o seu encerramento, por razões meramente economicistas, e que o Governo, que tinha como obrigação
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olhar as diversas componentes de desenvolvimento da região, fica agradado com semelhantes propostas e remete a prioridade ao respeito pelas opções da CP, quando o próprio Governo sabe que aquelas linhas ferroviárias estão subexploradas e constituem, inequivocamente, uma valorização turística para o Alto Douro vinhateiro e para o nordeste transmontano.
No âmbito desta necessidade de investimento público, para preservar património, para fixar populações e até para atrair outros investimentos privados, já entrados no primeiro ano de vigência do QREN, estamos ainda para perceber as orientações específicas que o Governo vai canalizar desse apoio comunitário para a Região Demarcada do Douro e o seu impacto na conclusão de um conjunto de projectos reclamados para a estratégia de desenvolvimento sustentável da região.
Mas, quando falamos de desenvolvimento integrado e da importância da riqueza paisagística, que prova a perfeição da Natureza e, simultaneamente, consegue provar a forma como o homem consegue esculpir a sua actividade de forma harmoniosa nessa paisagem, designadamente pela sua acção produtiva, devemos também invocar a forma como ela tem sido agredida, com negligência dos poderes públicos, que permitem a proliferação de lixeiras e vazadouros clandestinos nas bermas das vias rodoviárias, naquele património mundial, ou com ameaças de troços como, por exemplo, o do IP2, sacrificando centenas de hectares de vinhas de boa qualidade, ou mesmo da degradação provocada por projectos de barragens na região.
O subdesenvolvimento e a pobreza a que os sucessivos governos têm votado esta região não se compaginam com a sua riqueza patrimonial natural e com o seu potencial de desenvolvimento.
É preciso acreditar que esta riqueza e este potencial valem muito mais e exigir vontade, verdade e orientação política para inverter a realidade desta Região Demarcada do Douro. Foi esse também o contributo do manifesto, entregue no Parlamento em 2005, Douro: o futuro não pode esperar mais, subscrito por um conjunto de agentes activos e personalidades da região do Douro, e cabe-nos mantê-lo presente e activo, exigindo do Governo acções consequentes.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para terminar, relativamente aos projectos de resolução que foram apresentados e que estão em discussão, quanto a nós, Os Verdes, entendemos que o do PS é totalmente inútil, limitando-se apenas a copiar o relatório da Comissão. Quanto ao projecto do PCP, é útil, faz um conjunto de recomendações relevantes e consequentes e, por isso, merecerá, evidentemente, o nosso acordo.
Aplausos de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades.
O Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades (João Ferrão): — Sr.
Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, saudar as gentes do Douro, recordando aquilo que é justo e básico: afinal, foram eles os obreiros, quantas vezes em condições infra-humanas, daquilo que estamos hoje, justamente, a comemorar.
Quero ainda reconhecer e sublinhar a importância que o Governo atribui ao Douro vinhateiro. E, por isso mesmo, aprovou, em tempo útil, a resolução do Conselho de Ministros que definiu o apoio institucional e financeiro a dar às comemorações dos 250 anos da Região Demarcada do Douro.
Finalmente, quero felicitar o sucesso do programa das comemorações, que é, afinal, o reflexo do dinamismo das iniciativas locais.
O Governo, e é preciso dizê-lo claramente, considera o Douro como uma causa nacional e, por isso, cuida do seu presente e prepara o seu futuro.
Do ponto de vista das políticas públicas, foram anunciados pelo Sr. Primeiro-Ministro, na Régua, quatro grandes sectores prioritários: o sector do vinho, a cultura, o turismo e a paisagem. Em relação a estes quatro sectores os diagnósticos estão feitos, a realidade é conhecida e, por isso, é necessário passar à acção. Foi isso que o Governo fez já em 2006.
Em relação ao sector do vinho, foi concretizado o plano zonal do Douro, onde se investiram 4 milhões de euros — o dobro daquilo que tinha sido investido em 2005 —, apoiando 11 000 agricultores.
No que se refere à cultura, e no que toca ao Museu do Douro, foi criada a respectiva Fundação, criando-se condições para o seu funcionamento.
Protestos do Deputado do PSD José Manuel Ribeiro.
No que diz respeito ao Museu do Côa, foram adjudicadas as obras, que decorrerão durante o ano de 2007, podendo o Museu abrir as suas portas em 2008.
Na área do turismo, e como sabem, o Douro foi definido como um dos destinos prioritários, no âmbito do Plano Estratégico Nacional do Turismo e, em consequência, irá proceder-se à revisão do Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro, actualizando e revendo o programa de acção.
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Protestos do Deputado do PSD Ricardo Martins.
Ainda no âmbito do turismo, gostaria de lembrar que, neste momento, se encontram em curso as obras nos molhos da foz do Douro, tendo como objectivo regularizar os caudais e garantir a melhor navegabilidade do Douro, aspecto essencial para o turismo fluvial.
Finalmente, na área da paisagem, gostaria de recordar que já demos início ao projecto de recuperação de «Aldeias Vinhateiras», actuando em cinco aldeias, e que já foi adjudicado o plano de erradicação de lixeiras [Plano Estratégico dos Resíduos Sólidos Urbanos (PERSU) II] no valor total de 1,6 milhões de euros.
Mas cuidar do futuro implica mais do que estas iniciativas, que estamos já a desenvolver e da preparação desse futuro há várias acções que vale a pena salientar, a primeira das quais é a criação da Estrutura de Missão para a Região Demarcada do Douro.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — Se há um défice, que todos reconhecemos, que tem caracterizado o passado recente desta área é a fragmentação institucional; é a fraqueza, a debilidade da intervenção pública; é a descoordenação das políticas públicas nesta área. E, por isso, precisamos de um centro racionalizador da acção pública. É isso que a Estrutura de Missão para a Região Demarcada do Douro pretende e visa: garantir uma coordenação interinstitucional que permita uma intervenção mais inteligente do ponto de vista da acção pública.
Esta Estrutura de Missão irá iniciar a sua actividade no primeiro trimestre de 2007; ela terá a sede na Região, o chefe de projecto desta estrutura será o Eng.º Ricardo Magalhães,…
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — … que vai abandonar a sua actual posição na CCDR-Norte para se dedicar exclusivamente a esta área.
Gostaria ainda de lembrar que está prevista, e assim acontecerá, a existência de um grupo coordenador que acompanha de perto o papel e a acção da Estrutura de Missão, que é constituída por representantes de gabinetes de sete ministérios e também de seis representantes dos municípios. A presença de representantes de gabinetes dos setes ministérios é a melhor prova da vontade política de, pela primeira vez, se actuar de forma concertada nesta região.
Quero também lembrar que está previsto, e será constituído em breve, um conselho consultivo, aberto à sociedade civil e às organizações representativas da região, e presidido por uma individualidade de reconhecido mérito que, entre outros objectivos, garantirá a independência que este conselho deverá necessariamente ter em relação à iniciativa de natureza governamental.
Ouvimos com cuidado os comentários e lemos também os projectos que estão aqui hoje em debate e em votação, e creio que a Estrutura de Missão, tal como foi concebida e tal como será concretizada, responde por inteiro e de forma adequada àquilo que são défices há muito identificados, por todos reconhecidos, mas em relação aos quais, até ao momento, na verdade, não houve soluções no terreno que permitissem ultrapassar, superar de forma definitiva aquilo que é uma limitação fortíssima à evolução da região.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Bem lembrado!
O Orador: — Uma região forte exige instituições fortes; uma região forte pressupõe uma intervenção pública inteligente e coordenada, e é isso que a Estrutura de Missão irá fazer e garantir.
Quero igualmente dizer, dentro da perspectiva de preparação de um futuro para a Região do Douro, que tanto o QREN como o Plano de Desenvolvimento Rural, como o Plano Regional de Ordenamento do Território da Região Norte — em preparação, em laboração, em aprofundamento —, estes instrumentos, embora de natureza diferente mas complementares entre si, levarão a sério a especificidade e as necessidades, mas também as potencialidades da Região do Douro.
Finalmente, quero dizer que o melhor tributo que podemos prestar à Região do Douro e às suas gentes é criar condições para o seu desenvolvimento sustentável. É isso que os durienses exigem, é isso que o País espera, é isso que o Governo fará.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, quero apenas comunicar que o projecto de resolução do PCP, que foi distribuído, tem erradamente um conjunto de documentos anexos.
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Como anexos do projecto de resolução, apenas constam dois documentos: o manifesto «Douro: o futuro não pode esperar mais» e a «Carta dos 12 párocos da Região Demarcada do Douro — perplexidades e preocupações».
Era esta, Sr. Presidente, a informação que eu queria dar.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, está feito o esclarecimento.
Srs. Deputados, vamos passar ao segundo ponto do período de antes da ordem do dia que consta de declarações políticas, e o primeiro orador inscrito é o Sr. Deputado António Filipe, a quem concedo a palavra.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste final de ano 2006, o País foi confrontado com uma tragédia, na qual seis pescadores perderam a vida, a cerca de escassos 50 metros da nossa costa, perto da Nazaré.
As nossas primeiras palavras são, naturalmente, de pesar e de solidariedade para com os familiares das vítimas e também de solidariedade e de compreensão para com os pescadores que, na sequência desta tragédia, têm vindo a exigir melhores condições de segurança e melhores condições de busca e salvamento nas costas portuguesas.
Queremos deixar muito claro que não queremos de forma alguma arremessar esta tragédia contra ninguém; não queremos retirar qualquer espécie de dividendo político daquilo que aconteceu; também não queremos lançar culpas contra ninguém, antes de haver um apuramento rigoroso e exaustivo de todas as circunstâncias e responsabilidades que possam ter ocorrido.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Mas há uma ideia, muito clara, que queremos aqui deixar: é a de que seis pescadores perderam a vida, a 50 metros da praia, depois de terem permanecido mais de três horas sem terem obtido o auxílio que era necessário. E, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, isto não pode acontecer, de maneira nenhuma!! Não há qualquer justificação que possa ser apontada para que algo como isto tenha acontecido! Não é aceitável que aconteça, e não é aceitável que possa vir a acontecer! Podemos não ter a certeza de mais nada acerca deste trágico acontecimento, mas há uma coisa de que todos temos de ter a certeza: é a de que alguma coisa falhou, seguramente; alguma coisa está mal, para que isto possa ter acontecido, como aconteceu!
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — E, perante este acontecimento, não podemos cruzar os braços, nem esperar que, para a próxima vez, as condições climatéricas sejam menos adversas, ou que as coisas possam correr melhor do que correram. O que importa, neste momento, é averiguar, em pormenor, tudo o que ocorreu — todas as circunstâncias, o comportamento de todos os responsáveis envolvidos —, para se perceber o que é que falhou para que esta tragédia tenha acontecido.
É preciso apurar se falhou a prestação de auxílio que deveria e poderia ter sido prestado, e, neste caso, alguém terá de ser responsabilizado por isso; é preciso verificar se todas as entidades com responsabilidades cumpriram os seus deveres, se a falha não está nas responsabilidades individuais de alguém, mas está no sistema e na forma como ele está montado, e, então, é esse próprio sistema que tem de ser urgentemente reequacionado e alterado.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Importa, a esse respeito, apurar tudo aquilo que tiver de ser apurado: se a embarcação dispunha de condições para assegurar a segurança dos seus tripulantes; apurar se foram respeitadas regras de segurança da navegação; apurar se as entidades responsáveis pelo cumprimento dessas regras actuaram ou não e, se não actuaram, por que é que não actuaram; verificar se os sistemas de alerta e de pedido de socorro funcionaram ou não, e porquê; apurar como é que é possível que os pescadores tenham esperado mais de três horas até que o auxílio tenha chegado. É manifestamente tempo demasiado, e é preciso averiguar como é que isto se altera, para que tal não aconteça e para que o auxílio possa chegar atempadamente; é preciso verificar, portanto, se os sistemas de pedido de auxílio são ou não eficazes para acorrer a situações de emergência, como aquela que, infelizmente, ocorreu; e é preciso verificar se os meios de busca e de salvamento são os necessários, se são suficientes e adequados para as funções que têm de desempenhar. E importa apurar tudo isto, com o máximo rigor, não apenas para evitar que «a culpa morra solteira», se culpa houve neste caso; mas, já que não há remédio para o que aconteceu de mal, que possam ser evitados males futuros e que isto não volte a acontecer.
Temos, por isso, uma proposta muito concreta a fazer, Sr. Presidente e Srs. Deputados. A proposta é relativamente à Comissão de Defesa Nacional, que tem a tutela sobre os meios de busca e salvamento
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— mas, obviamente, a quem se podem associar outras comissões parlamentares que o entendam, designadamente a subcomissão responsável pela questão das pescas tem aqui obviamente uma palavra a dizer nesta matéria —, a de que seja dado um mandato a esta comissão parlamentar para proceder a uma audição parlamentar que apure, de forma exaustiva, o que é que falhou para que tenha sido omitido o dever de auxílio, em tempo útil, aos tripulantes da embarcação Luz do Sameiro; e, para além deste caso concreto e das circunstâncias e responsabilidades no caso concerto, para apurar com rigor das condições em que funciona e das condições de operacionalidade do Sistema Nacional de Busca e Salvamento Marítimo, quer em termos da quantidade e da adequação dos meios e dos equipamentos disponíveis — estamos a falar em equipamentos e também, obviamente, nos meios humanos que estão afectos a esta actividade — quer em termos da sua coordenação e da capacidade das entidades envolvidas.
Entendemos que devem ser ouvidos os responsáveis pelo sistema de autoridade marítima, representantes dos pescadores e representantes de todas as entidades que tenham algo a ver com o sistema de busca e salvamento nas costas portuguesas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Mais propomos: que essa audição parlamentar possa dar lugar a um relatório, que seja aprovado em comissão e que possa ser apresentado em sessão plenária desta Assembleia, no qual sejam equacionadas as medidas a tomar pelo Governo ou, eventualmente, pela Assembleia da República, para evitar que tragédias como esta se repitam, perante os nossos olhos, como se nada houvesse a fazer para as prevenir.
Não queremos aceitar a inevitabilidade de situações como esta! Entendemos que devem ser feitas todas as mudanças que sejam necessárias, e urgentemente, para que haja mais segurança para as pescas, para a navegação em geral nas costas portuguesas, e para que tragédias como esta não possam voltar a repetir-se!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Há dois pedidos de esclarecimentos, sendo o primeiro do Sr. Deputado Luís Fazenda, a quem dou a palavra.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado António Filipe, em nome do Bloco de Esquerda, gostava de secundar a expressão de pesar pelo falecimento dos nossos concidadãos pescadores, de Caxinas, ao largo da Nazaré, à vista da praia, com toda a tragédia, não só da morte desses nossos concidadãos mas também de todos nós, que morremos um pouco nessa expectativa dramática nesse naufrágio. Foi um naufrágio de condições de vida e é um naufrágio do sistema público! Como muito bem disse o Sr. Deputado, aquilo que morreu ali, um pouco, foi a protecção do Estado; o que aconteceu viola o fundamento de um contrato de confiança na nossa sociedade; aquilo a que ali se assistiu foi à mesma expressão de dor da ausência e de vazio que têm tantos dos nossos concidadãos quando sabem que o Estado não tem protecção adequada na altura dos incêndios florestais,…
Vozes do BE: — Muito bem!
O Orador: — … ou que o Estado não tem, ainda, a protecção adequada para tutelar menores em risco, ou quando não tem um sistema eficaz para salvar pescadores à vista da praia de uma morte que foi uma morte lenta e uma tortura para os vivos.
Hoje, todos soubemos que uma comissão de mestres da pesca das embarcações, de Vila de Conde, se dirigiu a Lisboa para falar pessoalmente com o Presidente da República e com o Primeiro-Ministro.
Com essa iniciativa, eles não visam, de algum modo, circular pelas instituições; visam fazer esse manifesto, que é um manifesto que vem da raiz da nossa sociedade, dizendo que é preciso outra coisa para o Estado, que o Estado não pode ser esvaziado daquilo que é o fundamento mínimo da protecção do socorro.
Nós também não queremos antecipar resultados de inquéritos, nem o apuramento do que possa ter corrido mal entre a Capitania, a Marinha, a Força Aérea, seja o que for.
Não queremos antecipar quaisquer resultados, mas a verdade é que teremos de olhar — as instituições, este Parlamento, o Governo da República — para um sistema que seja eficaz, um sistema com barcos salva-vidas, com outros meios mecânicos, com meios aerotransportados que possam ser adequados e eficazes para missões de salvamento em circunstâncias tão dramáticas como esta.
Já sabemos da dificuldade que existe, por exemplo, no mar territorial dos Açores, mas começamos a ver que até numa faixa litoral bem mais reduzida pode acontecer uma tragédia como a que tivemos.
Por isso, Sr. Deputado António Filipe, creio que devemos dar-lhe ouvidos, secundar a proposta que
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aqui fez acerca da assunção de responsabilidades deste Parlamento e, claramente, confrontar o Governo com uma matéria que vai muito para além de uma reivindicação pontual ou de um pesar, por muito profundo e grave que seja, mas que é momentâneo, que são os fundamentos da protecção do Estado de um contrato de confiança. O que lesa a democracia política e a confiança nas instituições é haver quem esteja em desgraça neste país e não ter ninguém que lhe estenda uma mão em socorro.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PS): — Sr. Presidente, gostaria, em primeiro lugar, de, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, expressar as nossas mais profundas condolências às famílias enlutadas pela morte de seis dos nossos compatriotas, de seis pescadores portugueses.
Aproveito esta oportunidade para dizer, relativamente à intervenção do Sr. Deputado António Filipe, que estamos, no essencial, muito de acordo com aquilo que disse. Uma situação destas não deveria, nem pode, acontecer. É evidente que ou alguma coisa falhou ou alguma coisa, de raiz, está mal.
Como o Sr. Deputado António Filipe sugere — e parece-me muito bem —, creio que as averiguações devem ser feitas para se saber, efectivamente, o que é que correu mal quer ao nível da utilização dos meios de socorro quer ao nível da embarcação relativamente aos seus próprios meios de solicitação de socorro.
A verdade é que, independentemente disto, o que todos reconhecemos é que aconteceu uma tragédia, que não pode repetir-se.
O Governo já assumiu o compromisso de fazer uma averiguação profunda relativamente às causas que estiveram na origem do que parece ter sido um deficiente socorro, uma vez que não se verificou em tempo útil, conforme seria desejado e esperado por todos nós, neste momento, face aos meios que actualmente já estão disponibilizados, pelo menos teoricamente. Não compreendemos, pois, que as coisas não tenham acontecido como deveriam. Mas o Governo já fez declarações públicas em que assumiu o compromisso — e nós, enquanto Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, queremos solidarizar-nos com esse compromisso — de que as averiguações serão feitas com toda a profundidade, de modo a verificar o que se passou e a corrigir aquilo que, eventualmente, possa ser corrigido, para que uma tragédia como a que ocorreu não possa voltar a verificar-se. Nada justifica que os portugueses possam ter assistido à tragédia que se verificou na nossa costa.
Por conseguinte, Sr. Deputado António Filipe, tem não só a solidariedade do Partido Socialista como também o nosso empenhamento e o do Governo na averiguação das circunstâncias em que esta tragédia se verificou e na tomada de medidas para proceder a correcções para que uma tragédia como esta não volte a repetir-se.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado António Filipe, há mais dois pedidos de esclarecimento, aos quais suponho que responderá no fim.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, o PSD quer, de forma muito clara, dizer que não pretende fazer política, como também V. Ex.ª disse no discurso, com o drama das pessoas. O nosso partido está é chocado com o que aconteceu. Foi, de facto, um grande drama.
Hoje, não queremos acusar ninguém, mas sentimos que é muito difícil perceber como é que seis pessoas morreram a poucos metros da praia e assistimos, ao mesmo tempo, à impotência total dos meios de salvamento.
Por isso, Sr. Deputado, no nosso entender, o que é importante é que o País reflicta sobre por que razão não tem meios para salvar os seus concidadãos e para evitar tragédias deste tipo. Aliás, hoje, talvez venha a propósito, tendo em consideração esta situação dramática, relembrar aquilo que se passou há uns anos em Castelo de Paiva.
Para nós, Sr. Deputado, reflectir significa agir, significa tomar medidas para que estas situações não se voltem a repetir.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — O que gostaríamos de dizer hoje é que, no mínimo, o que temos de fazer nesta Câmara
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é expressar as mais sinceras condolências e solidariedade às famílias dos pescadores que desapareceram na nossa costa.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, gostaria também de me associar aos oradores que me antecederam sobre o pesar que esta tragédia causou a todos nós, portugueses.
Queria, ainda, manifestar, da parte do nosso grupo parlamentar, o apoio à sugestão feita pelo Sr. Deputado António Filipe e pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português de que a Comissão de Defesa Nacional, que tutela também os Assuntos do Mar, comece a desenvolver um processo de audições com as várias entidades envolvidas para perceber o que correu mal.
E entendo que o Sr. Deputado António Filipe fez bem em, no discurso, não apontar já responsabilidades, aguardar a averiguação que está a ser feita pela Marinha e pelo Ministério da Defesa Nacional para, com todos os elementos, os Deputados poderem pronunciar-se.
Porém, há uma demonstração clara ou, pelo menos, uma consequência que é evidente para todos: algo correu muito mal. Isso pode ter várias origens, tais como a ausência, ou não, dos meios disponíveis para ajudar as pessoas, a responsabilidade, ou não — não sabemos! —, dos próprios pescadores na forma como se lançaram ao mar, a ausência, ou não, de coordenação entre os vários meios — a Autoridade Marítima Nacional, a Polícia Marítima, a Marinha, o Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil. Há que saber como tudo funcionou, ou seja, como correu a coordenação e por que razão esta tragédia acorreu.
De facto, a atitude da Assembleia de República deve ser a que foi salientada por todos os partidos, isto é, primeiro, não fazer aproveitamento político desta tragédia, o que seria lamentável e, aliás, vergonhoso, segundo, não apontar culpas antes de saber o que realmente se passou, terceiro, a Assembleia da República, como órgão de soberania e, também, de fiscalização da actuação do Governo e de todas as entidades que dependem do Estado, deverá averiguar e no fim, com as conclusões desse trabalho, apontar caminhos para, eventualmente, solucionar essas mesmas questões.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Deixo, obviamente, uma palavra às famílias das pessoas que faleceram.
Mas quero deixar, igualmente, uma palavra, que gostaria de realçar, à Marinha Portuguesa, à Força Aérea, à Polícia Marítima e ao Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil, que em outras ocasiões já foram muito úteis para salvar vidas. Convém também realçá-lo, porque às vezes não se fala do bem que eles têm feito na busca e no salvamento de vidas.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Termino, Sr. Presidente, saudando o Sr. Deputado António Filipe pela intervenção que fez, que foi muito positiva pelas recomendações e ideias que sugeriu.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado António Filipe, tem a palavra para responder a todas as perguntas que lhe foram lançadas.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, agradeço as palavras dos Srs. Deputados Luís Fazenda, Marques Júnior, Agostinho Branquinho e João Rebelo. No fundo, estamos todos de acordo, compartilhamos a perplexidade relativamente ao que ocorreu.
Todos sabemos a distância da costa a que esta tragédia ocorreu e estamos todos perplexos como é que não se conseguiu resgatar com vida aquelas pessoas, depois de terem permanecido o tempo que conhecemos à espera de socorro. É esta perplexidade que faz com que, em nosso entender e que, segundo verificámos, é compartilhado por Deputados de todos os grupos parlamentares, a Assembleia da República não possa ficar indiferente e tenha de ver o que é que, no âmbito das suas competências, é possível fazer para que seja alterado aquilo que está mal, para que circunstâncias destas não ocorram.
Ninguém regateia aquilo que é necessário para melhorar os meios de busca e salvamento. O País investiu, está a investir, em sede de programação militar, na aquisição de helicópteros EH-101, que são muito dispendiosos, mas que se consideram muito importantes para termos um eficaz sistema de busca e salvamento. Mas, depois, verificamos que de pouco nos valerá ter esses meios se não houver a coordenação necessária para que possam actuar com a prontidão que é precisa. Verificou-se, neste caso,
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que essa prontidão não foi suficiente.
Portanto, há que apurar por que é que não foi e há que agilizar os procedimentos para que estes meios possam acorrer com mais rapidez, de modo a que não aconteça aquilo que sucedeu.
Temos também de ver se os meios da Polícia Marítima são adequados, se há articulação entre as várias entidades, designadamente, a Marinha, a Polícia Marítima e o Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil, se estes se articulam adequadamente para acorrerem o mais depressa possível a estas situações. É possível verificar se temos os heliportos necessários e distribuídos pelo território nacional.
Nós próprios, em sede discussão de Orçamentos do Estado, temos colocado a questão da criação de mais um heliporto na região Norte.
Portanto, há muita coisa que temos de aprofundar e de discutir. É essa, fundamentalmente, a nossa proposta e congratulamo-nos que haja concordância relativamente a ela.
Podemos fazer um importante e frutuoso trabalho, mas, obviamente, neste momento, a hora é, sobretudo, de pesar, de solidariedade e de conforto para com as familiares das vítimas.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 2007, vamos entrar no terceiro ano da governação socialista. Acabou o tempo das desculpas e dos adiamentos. O País já não se satisfaz com anúncios e com promessas vãs. Os portugueses querem resultados positivos e concretos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Durante os últimos dois anos, à generalidade dos cidadãos foi imposto um violento apertar de cinto, foram exigidos sacrifícios e retirados direitos e expectativas. Apesar disso, a situação do País, das famílias e das empresas não melhorou. Pelo contrário, piorou.
Propaganda à parte, a verdade é que, pela primeira vez na nossa história recente, vive-se um período de retoma e de crescimento económico na Europa que Portugal não consegue acompanhar.
Pior: em 2006, o nosso crescimento económico foi o mais baixo de toda a União Europeia. Em termos de crescimento da produtividade, o nosso país situa-se nos três últimos lugares da Europa a 25, muito atrás do que se passa aqui ao lado, na nossa vizinha Espanha, muito atrás daquela que é a média europeia.
O Primeiro-Ministro diz que passo a passo Portugal está a recuperar. A verdade, porém, é que passo a passo Portugal vai ficando mais longe da Europa. Já fomos o 14.º país no ranking europeu, em termos de desenvolvimento e de riqueza, hoje baixámos para o 18.º lugar e em 2008, de acordo com as previsões oficiais, vamos baixar para um vergonhoso 20.º lugar.
Estes são os resultados de dois anos de mandato de governação socialista. Resultados que têm responsáveis, responsáveis que são conhecidos: o Governo do Partido Socialista e as políticas de asfixia da nossa economia seguidas pelo Eng.º José Sócrates.
Aplausos do PSD.
A política deste Governo é marcada por dois pilares: propaganda e arrogância.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Semana após semana, os portugueses são bombardeados com doses maciças de promessas, programas fantásticos de modernização, megaprojectos de fazer inveja aos nossos parceiros mais desenvolvidos, anúncios de uma coragem e determinação férreas de um Primeiro-Ministro que só falta dizer-nos que Portugal não o merece.
A Sr.ª Zita Seabra (PSD): — Muito bem!
O Orador: — E, no entanto, o poder de compra dos portugueses não aumenta, o que aumenta são os impostos sobre as pessoas e sobre as empresas.
Veio, hoje, o Ministro da Presidência dizer que há muitos investimentos em carteira, mas o que o Ministro e o Governo deveriam explicar é por que razão o investimento cai há sete trimestres consecutivos, algo nunca visto entre nós.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Isso é que é verdade!
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O Orador: — O que cresce, sim, é a prosápia e a desfaçatez de um Governo e de um Ministro da Eco
nomia, que não existe.
Aplausos do PSD.
As despesas do Estado engordam, o que emagrece é o poder de iniciativa das pessoas e o poder de intervenção da sociedade.
O emprego não aumenta, o que aumenta todos os dias é o número de jovens licenciados que vão parar ao desemprego.
A saúde não melhora, o que melhora é o grau de arrogância e de disparate do Ministro da Saúde.
Temos hoje uma saúde mais cara, mais difícil e mais longe das pessoas. O Ministro da Saúde chega ao desplante de achar normal o caos nas urgências do Hospital de Santa Maria, no primeiro dia deste ano.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — A educação afunda-se, o que sobe é a crispação nas escolas e o ataque despudorado aos professores, como se fosse possível melhorar o ensino desautorizando e desprestigiando sistematicamente os professores e minando a sua autoridade e a sua motivação.
Aplausos do PSD.
Em matéria de resultados, a verdade é esta: os portugueses empobrecem, os orçamentos das famílias emagrecem, as empresas estão cada vez mais asfixiadas e Portugal está cada vez mais distanciado da Europa que cresce ao nosso lado.
O Estado, esse sim, é que não pára de engordar. Agora, chega-se mesmo ao ponto de, em vez de fechar serviços inúteis, criar novas empresas públicas para reduzir o Estado. São mais três empresas públicas, mais lugares de administradores, mais directores, mais assessores, mais vencimentos chorudos e mais boys sentados à mesa do Orçamento.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Tal e qual!
O Orador: — A este respeito, quero aqui deixar claro o seguinte: se essas empresas forem mesmo criadas, o PSD irá exigir a apreciação parlamentar e a revogação dos diplomas, confrontando o Governo com a iniquidade das suas políticas e esta maioria com o disparate das suas opções.
Aplausos do PSD.
Mas a arrogância deste Governo não se fica por aqui. O que se passa com os fundos comunitários é verdadeiramente inqualificável. O novo quadro comunitário de apoio há meses — repito, há meses — que já devia estar aprovado e em Bruxelas, para que 2007 fosse, como devia ser, o primeiro ano de aplicação desses fundos. Foi, de resto, o que o Governo se comprometeu: ter tudo pronto em Julho do ano passado.
Somos dos países que mais precisa destes fundos — pelo menos, nós assim o achamos —, mas, afinal, somos dos poucos países que ainda nem sequer apresentou em Bruxelas o seu programa. Com isto, perde Portugal, porque perde o ano de 2007. Só lá para 2008, na melhor das hipóteses, vamos ter os fundos da União Europeia a serem realmente aplicados entre nós.
O Ministro, esse, diz que não há atrasos. Nós dizemos que há um Ministro que mente e um Governo que foi lesto a negociar os fundos, mas é lento, desleixado e incompetente a colocá-los à disposição do País.
Aplausos do PSD.
A incompetência é, de resto, outro traço dominante deste Governo. Veja-se o que se passa com as SCUT.
O Sr. Jorge Costa (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Primeiro, prometeram nas eleições que não havia portagens nas SCUT; depois, a seguir às eleições, violaram essa promessa e introduziram portagens em três SCUT; e, hoje mesmo, vem a público a notícia de que, afinal, portagens só lá para o final do ano. Não admira, pois, o que está a suceder: Portugal marca passo, enquanto os outros países avançam.
É esta a marca do Governo: preocupa-se em controlar o poder, em acumular mais poder, em usar e abusar do poder que tem, mas não apresenta resultados, ou, então, os resultados que tem não são, sequer, apresentáveis.
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O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O ano de 2007 é crucial.
Em 2007, Portugal tem de criar riqueza, tem de caminhar decididamente para a convergência. Sobretudo, num tempo em que a Europa já saiu da crise, já está a crescer, Portugal tem de começar a acompanhar o ritmo europeu. Só desta forma nos tornaremos um País competitivo, aumentando o poder de compra dos salários e das pensões e combatendo o flagelo do desemprego.
Em 2007, tem de haver, sem complexos, uma redefinição das funções do Estado. Temos de ter menos Estado para termos melhor economia e maior riqueza nacional.
Em 2007, devem ser postos de lado os projectos megalómanos que sugam os recursos escassos do nosso país.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Precisamos de investimento, mas de investimento sustentado e que acrescente competitividade ao País.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Em 2007, temos de ter uma política de apoio às pequenas e médias empresas. Elas são o motor da economia, pois são elas que criam riqueza, são elas que geram a esmagadora maioria dos postos de trabalho entre nós.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Em 2007, tem de se inverter o acentuado declínio da educação em Portugal, alterando-se estruturalmente o funcionamento das nossas escolas e das nossas universidades, em vez de se persistir no casuísmo e na política de permanente crispação e hostilidade para com os agentes educativos, em que este Governo se tem entretido.
Em 2007, é preciso cumprir e pôr em prática o vasto conjunto de reformas que se acordaram para a credibilização e a reforma da justiça.
Em 2007, é imperativo apresentar resultados no sector da saúde, arrancando com a construção dos novos hospitais, que há dois anos está parada, e avançando com coragem para a gestão dos centros de saúde por sociedades maioritariamente detidas por médicos ou pelo sector social.
Em 2007, em suma, o País precisa de mais e merece melhor. Precisa de outras políticas e merece outras prioridades. Sobretudo, os portugueses precisam de ver resultados e merecem ter esperança.
Em 2007, todos temos de exigir muito mais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O vídeo do enforcamento de Saddam Hussein, gravado por um telemóvel e distribuído massivamente a partir da Internet, não captou apenas as humilhantes condições em que o ex-ditador foi executado, mostrou também para todos quantos ainda tinham dúvidas a natureza da «democracia» que George Bush prometeu implementar no Iraque.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Orador: — Trata-se de uma execução ao pior estilo colonial, de um linchamento vingativo, depois de um processo que foi uma farsa lamentável, criticada por todas as organizações internacionais dos direitos humanos e da justiça, bem como pela União Europeia e pelos responsáveis de direitos humanos nas Nações Unidas.
A execução de Saddam Hussein constitui um crime jurídico e político. Jurídico, porque a pena de morte não é uma forma civilizada de punir qualquer crime e, ainda, porque o processo foi irregular, sem respeitar os direitos da defesa e sem a mais leve semelhança com um processo em que o direito predomine sobre a vingança política. A pena de morte é sempre o testemunho da barbárie.
Ainda por cima, tudo estava decidido à partida. Um dos juízes, acusado de ser demasiado brando para com Saddam, foi substituído por ordens superiores; alguns advogados de defesa foram assassinados; a execução processou-se num prazo recorde; e, para insultar a maioria da população, o enforcamento teve lugar num importante feriado religioso muçulmano em que são, como sabemos, ritualmente sacrificados
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animais.
Este julgamento não seria aceite em nenhum país que respeite os princípios do direito e é uma vergonha para os aliados de George Bush.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
O Orador: — Mas é também um crime político, porque acentua a guerra civil no Iraque. As suas consequências vão marcar profundamente o futuro do Iraque, agudizando o já problemático relacionamento entre as suas comunidades e a violência sectária que marca o dia-a-dia deste país.
Como bem destaca o editorial do Financial Times de há dois dias, a execução de Saddam representa o abandono pelo Governo de maioria chiita das pretensões a governar para todos os iraquianos e foi um acto de vingança deliberado para celebrar a nova hegemonia.
É certo, Sr.as e Srs. Deputados, que Saddam foi uma das personagens mais repugnantes da história mundial das últimas décadas, mas é igualmente certo que isso não serve nem pode justificar tudo.
Saddam foi condenado por crime cometido em 1982, altura em que era um dos principais aliados dos Estados Unidos da América. Até 1991 —até à invasão do Kuweit —, diversos governos apoiaram a sua acção e forneceram-lhe armas de destruição massiva e/ou munições, como, aliás, foi o caso do governo dos Estados Unidos da América, mas também do governo português, então dirigido por Cavaco Silva, que tinha como ministro dos Negócios Estrangeiros o actual Presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — É verdade!
O Orador: — Mesmo o principal massacre contra a população curda, em 1988, ocorreu três anos antes do embargo internacional ao regime iraquiano, muito antes de Portugal parar de fazer negócio com o torcionário que agora foi executado, o que só aconteceu em 1991, data até à qual o governo português vendia armas e munições a este regime, que, aliás, era um dos seus bons clientes.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — É verdade!
O Orador: — Foi com a aprovação de Washington e com o gás venenoso fornecido pela Alemanha Ocidental que Saddam arrasou Halabja com armas químicas em plena guerra entre o Irão e o Iraque, como, aliás, o próprio Saddam Hussein admitiu no seu julgamento.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Bem lembrado!
O Orador: — Os padrões dúplices usados pela Casa Branca não deixam nunca de nos espantar. Suharto, Pinochet, Videla, Strossner, Somoza e tantos outros protegidos por Washington, esses sim, são os ditadores de confiança, os bons clientes da Administração norte-americana.
Mas o que é certo é que nenhuma justiça baterá à porta dos que criaram o desastre no Iraque de hoje.
Bush e Blair nunca serão julgados nem nunca responderão pelos milhares de crimes e de mortos que provocaram com a invasão e ocupação do Iraque.
Sr.as e Srs. Deputados: Só mesmo George Bush é que poderia saudar esta execução. O Presidente norte-americano e as forças ocupantes do Iraque são directamente responsáveis por este crime. Aliás, a declaração de Bush sobre esta decisão — considerando-a um «marco para a democracia iraquiana» — ilustra perfeitamente o seu apoio e compromisso com a aplicação da pena de morte.
Compreende-se a vontade e a pressa de George Bush em liquidar e apagar Saddam. Como se já não bastasse a crescente oposição à guerra na sociedade americana, é a própria Casa Branca que se confronta, cada vez mais, com um número crescente da altas patentes militares que defendem a retirada das tropas norte-americanas de uma guerra entretanto já perdida.
A democracia prometida por Bush e seus companheiros nesta louca aventura de guerra tornou-se neste cenário: a substituição da ditadura liderada pela minoria sunita pelo totalitarismo da opressão da maioria xiita sobre as outras comunidades. Pelo meio morrem milhares e milhares de iraquianos e 3000 soldados americanos. O Iraque vive, há três anos, uma guerra civil, que tem destruído o país e minado todo o Médio Oriente.
A pronta condenação pela União Europeia da execução merece, naturalmente, ser sublinhada, mas convém não esquecer, no entanto, que alguns dos seus membros apoiaram ou participaram na invasão do Iraque — foi o caso do governo de Inglaterra, sob Tony Blair, ou do governo de Portugal, sob Durão Barroso —, e participaram na criação deste mesmo regime fantoche que conduziu à execução de Saddam.
Não nos esquecemos que foi na Cimeira das Lajes, em território português, com o aval do então governo PSD/PP, que foi dada a ordem de partida para a invasão do Iraque, iniciando uma guerra à revelia do direito internacional e suportada pela mentira grosseira das armas de destruição massiva.
Vozes do BE: — Muito bem!
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O Orador: — E registamos o embaraço e vergonha dos políticos de direita que apoiaram a ditadura de Saddam desde sempre para, depois, mais tarde, decidirem a ocupação do mesmo Iraque na base de uma mentira pela qual, aliás, nunca pediram desculpa.
Dizia Durão Barroso, neste Parlamento, que havia provas da existência de armas químicas, biológicas e mesmo nucleares no Iraque, para justificar o seu apoio à invasão. Os Deputados do PSD e do PP, que apoiaram o eixo da mentira, que apoiaram esta mentira, têm agora a oportunidade, Sr.as e Srs. Deputados, e até o dever de corrigirem a sua posição, de rejeitarem a pena de morte e de recusarem a estratégia de George Bush. Mas é mais do que certo que não o farão e que continuarão a apoiar o colonialismo no Iraque, porque, Sr.as e Srs. Deputados, afinal, o que esta execução demonstra é que o colonialismo não desistiu.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.
O Sr. José Vera Jardim (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Semedo, acompanhamos as suas considerações sobre o lastimável espectáculo a que assistimos nos últimos dias nas televisões, desde logo porque a pena de morte é sempre deplorável.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Nós temos, em Portugal, um sentimento de algum orgulho por termos sido dos primeiros países a abolir semelhante acto de retaliação, que é sempre de lamentar.
Mas são ainda mais de lamentar as circunstâncias em que se passou este deplorável acontecimento, com um conjunto de confusões, de notícias contraditórias e, ainda, a forma como ele foi — pelo que sabemos — executado e, sobretudo, a notícia foi transmitida. E, diga-se de passagem, também as televisões portuguesas não fugiram à tentação de nos dar um espectáculo, em que repetiram quatro, cinco e seis vezes esse acto preliminar da pena de morte. É, portanto, extremamente lamentável. Não começámos bem o ano. Bem pelo contrário, começámos mal.
E também no Iraque, onde só faltava este deplorável acontecimento para piorar ainda mais a situação que foi criada por essa guerra que — também o dizemos — foi uma guerra ilegítima, foi uma guerra baseada num conjunto de mentiras. Aliás, há muito tempo que estão à vista as mentiras e aquela que é a sua consequência: uma situação de pântano, de lodo, de onde ninguém sabe como sair, mas uma certeza temos — a de que se sai mal, necessariamente, porque sempre se sai mal de uma guerra que não teve a legitimidade do direito internacional e da comunidade internacional e que, sobretudo, foi baseada num conjunto de mentiras.
Aplausos do PS e do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Semedo, quero saudar também a sua declaração política, dizendo que, provavelmente, a última coisa que faltava ver ainda, na desgraça e no atoleiro em que se transformou o Iraque com esta guerra ilegal e de ocupação que tanto sofrimento e destruição tem causado àquele povo e àquele país e que foi assente numa mentira amplamente desmentida em pouco tempo, era a Administração norte-americana e o seu Presidente dizerem, como disseram, em relação a este hediondo acontecimento, ainda por cima difundido da forma como o foi, que se tratava de um marco importante.
Provavelmente, um marco importante para quem entende que tudo é possível e tudo é legítimo para fazer aplicar a sua lei e proteger os seus interesses, mesmo que isso signifique incendiar toda uma região, mesmo que isso signifique recorrer às formas bárbaras que estão a ser utilizadas, como a aplicação da pena de morte no Iraque, em prejuízo daquela população e daquele povo! Condenamos, pois, mais este acontecimento, condenando a pena de morte e, condenando, mais uma vez, se preciso for, esta ocupação e esta guerra, que só pode acabar o mais rapidamente possível com a retirada dos ocupantes daquele país, que deve ser soberano.
Aplausos do PCP.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não há mais pedidos de esclarecimentos?!
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, gostaria de começar por agradecer e por manifestar satisfação e concordância com as palavras dos Srs. Deputados Vera Jardim e Bernardino Soares. Não estranhamos, naturalmente, o conteúdo das intervenções dos Srs. Deputados, estranhamos, sim, de facto, o silêncio de outras bancadas.
A este propósito, também será necessário dizer que uma mão não lava a outra. A condenação do espectáculo, do circo mediático, montado pelos governos norte-americano e iraquiano a propósito do linchamento, do enforcamento, do ditador Saddam Hussein não isenta de responsabilidades todos aqueles que activamente ou pelo seu silêncio foram apoiantes ou cúmplices da invasão do Iraque.
Gostaria também de aproveitar a oportunidade para dizer que esta operação de linchamento, o enforcamento de Saddam Hussein, pode estar agora a servir à Administração norte-americana para criar um ambiente favorável ao reforço da presença e da participação do contingente militar dos norte-americanos estacionados no Iraque.
Desde já, alertamos para isso e reclamamos que todos aqueles que se associam à condenação da aventura belicista do imperialismo norte-americano no Iraque, todos aqueles que se associam à condenação dos recentes acontecimentos que culminaram no enforcamento de Saddam Hussein, possam também juntar-se ao Bloco de Esquerda, a outros partidos e a outras forças e organizações de esquerda e defensoras dos direitos humanos, defensoras da paz no mundo, para condenar, de hoje em diante, a ocupação militar no Iraque, para que, de uma vez por todas, se acabe com esta aventura militar,…
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Muito bem!
O Orador: — … que não cumpriu nenhum dos objectivos que estavam falsamente anunciados. A paz no Médio Oriente não é uma realidade, bem pelo contrário; a segurança à escala mundial não aumentou; a paz e a democracia no Iraque não existem. E esses são, de facto, os objectivos pelos quais o Bloco de Esquerda se bate e para os quais pede que todos aqueles que amam a paz e a democracia se nos associem.
Aplausos do BE.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Programa do Governo com que o Partido Socialista se apresentou às eleições legislativas de 2005 exprimia, e exprime, três propósitos essenciais: superar a crise orçamental e consolidar as contas públicas; mobilizar o País para uma estratégia de desenvolvimento assente na inovação tecnológica, na educação e qualificação dos portugueses; concretizar uma nova geração de políticas sociais, reformando, e por isso defendendo, o nosso modelo social, promovendo a equidade e a eficácia dos serviços públicos dirigidos ao bem-estar e dando combate à pobreza e à exclusão.
O governo de direita que substituímos deixou a economia com trimestres consecutivos de crescimento negativo, à beira da recessão.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Convém lembrar!
O Orador: — Hoje, podemos dizer que com o actual Governo, do PS, Portugal e os portugueses beneficiam já de maior crescimento, agora a ritmo moderado, de menos desemprego, da criação líquida de empregos pela economia, de mais exportações,…
O Sr. Agostinho Branquinho (PS): — Isso é ficção!
O Orador: — … com menor défice e menor peso da despesa pública no PIB. A confiança dos consumidores e das empresas é agora visível e sustentada.
Aplausos do PS.
O Partido Socialista, no Governo como no Parlamento, está motivado e unido, neste início de 2007, para as batalhas que temos pela frente. Sentimo-nos honrados pelos expressivos resultados já alcançados, mas estamos longe de qualquer situação de autocontentamento, pois ela colocar-nos-ia aquém dos objectivos do mandato que nos foi conferido.
As reformas da segurança social, das finanças locais e das finanças regionais, iniciadas e alcançadas,
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pela sua importância, rasgo e carácter estruturante, justificam, no que já foi feito, um destaque particular.
Na segurança social, desde logo, a convergência entre o regime de aposentação da função pública e o regime geral da segurança social; a revisão das regras de atribuição do subsídio de desemprego; a eliminação dos múltiplos subsistemas de protecção social e de saúde que há muito haviam perdido lógica e fundamentação.
Depois, as linhas estratégicas que foram objecto de acordo tripartido em sede de concertação social e de discussão e aprovação na Assembleia da República, como sejam a introdução do factor de sustentabilidade, a aceleração da transição, a revisão da fórmula de cálculo para o aumento das pensões e, recentemente, foi fixado, por unanimidade entre todos os parceiros sociais, um ambicioso e progressivo aumento do salário mínimo: em 2007, o valor fixado é de 403 euros.
Aplausos do PS.
No âmbito das finanças locais, o desenvolvimento regional e local, bem como a coesão do território, são uma preocupação constante do Governo. Veja-se o arranque do processo de reestruturação da administração desconcentrada do Estado segundo critérios referidos às chamadas «regiões plano» do Continente; a revisão das taxas dos municípios, do sector empresarial local e das finanças locais, que prevê novas responsabilidades na saúde, na educação e na acção social, maior competitividade fiscal e menor dependência face à gestão urbanística; a discriminação positiva em favor das regiões do interior, cujo rendimento médio é ainda inferior ao valor nacional, com objectivos de equidade territorial.
No caso da lei das finanças regionais, as relações entre o Governo da República e os governos das duas regiões autónomas pautam-se pela normalidade e solidariedade institucional. Porém, tais relações não devem ignorar que tratar de forma financeiramente idêntica realidades geográfica e economicamente distintas, como o são as Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, constituiria uma profunda injustiça.
Foi nesse espírito de equidade e de solidariedade com o esforço nacional de contenção orçamental que foi elaborada e aprovada a nova Lei de Finanças das Regiões Autónomas.
Aplausos do PS.
Mas falemos no ano de 2007.
Na presidência portuguesa da União Europeia, trabalharemos com abertura para superar o impasse político e institucional criado com o bloqueio do processo relativo ao Tratado Constitucional, sem prescindir da legitimação democrática de um texto constitucional que traduza um aprofundamento significativo da integração política na União Europeia.
Lutaremos por uma Europa mais forte. Este mundo globalizado precisa de uma Europa que tenha voz e que possa dar um contributo efectivo para a construção da paz, do diálogo entre civilizações e do desenvolvimento.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — O aprofundamento do projecto europeu não é importante apenas para Portugal. É importante para os europeus, para a economia europeia, para os valores europeus e é também importante para um mundo mais estável, mais equilibrado, mais seguro, um mundo em paz.
Aplausos do PS.
Lutaremos por uma Europa mais activa na cooperação com África e com os países da bacia do Mediterrâneo. O diálogo político aprofundado com África corresponde ao interesse mútuo de europeus e de africanos. A verdade é que a Europa não pode esquecer a sua responsabilidade moral com o combate à pobreza e ao subdesenvolvimento em África, nem pode esquecer o drama dos milhares de refugiados que as guerras, os desastres naturais, a miséria e a fome provocam naquele continente. África tem de ser, e é para nós, uma prioridade para a Europa.
Aplausos do PS.
A resposta aos desafios colocados pela globalização deverá, porém, procurar uma solução virtuosa do triângulo formado pelas preocupações com o emprego, com o crescimento económico e com a justiça social. Deste ponto de vista, trata-se de aprofundar e de levar a bom termo a Agenda de Lisboa.
A Europa que nós ambicionamos precisa de melhores, e não de menos, políticas sociais; de iguais direitos e deveres para todos; de igualdade de oportunidades e de acesso; de pleno emprego; de investimento na formação e qualificação das pessoas; da luta por sociedades mais inclusivas; da universalidade dos cuidados infantis; de igualdade de direitos para homens e mulheres; da aposta na concertação e diálogo sociais, fazendo da diversidade e da integração a nossa força; de lidar com a mudança climática para
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garantir que vivemos em sociedades sustentáveis, no contexto de uma Europa activa para as pessoas, mais competitiva, mais solidária e mais coesa.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Neste ano de 2007, serão particularmente sensíveis as questões da justiça, da educação e da reforma do sistema político.
No campo da justiça, o acordo parlamentar já alcançado assume especial relevância política e institucional por resultar de um consenso alargado numa matéria estruturante para o Estado de direito democrático.
No campo da educação, o desenvolvimento do País confronta-nos com uma opção clara e inadiável: a aposta na qualificação da população portuguesa. O atraso que nos separa dos países mais desenvolvidos radica, em grande medida, no insuficiente nível de qualificação dos portugueses. Essa é a questão central que temos de enfrentar, é aqui que temos de vencer.
O impulso da reforma no campo da modernização do sistema político não ficará pelo muito que já foi feito. Com efeito, avançaremos, a seu tempo, com a apresentação de projectos legislativos ou impulsionaremos a discussão de projectos já apresentados, e fá-lo-emos no respeito por um conjunto claro de ideias.
Uma democracia de qualidade exige um espaço público de qualidade, requer a modernização dos sistemas eleitorais, impõe a reforma e modernização do Parlamento, o alargamento dos mecanismos de participação dos cidadãos e um transparente sistema de controlos recíprocos e de separação de poderes entre as autoridades públicas. Exige, enfim, a generalização do reconhecimento do princípio da paridade e a intransigência perante corporativismos profissionais e económicos.
Finalmente, não queremos deixar de nos referir a um debate cívico próximo, muito importante: o referendo sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, em relação ao qual seremos proximamente chamados a pronunciar-nos. Ora, trata-se de um problema fundamental de política criminal do Estado democrático. Não se trata, pois, de qualquer discussão complexa sobre o sentido da vida, sobre o início da vida humana, sobre a natureza da vida intra-uterina, sobre a existência ou inexistência, a propósito, de pretensos ou reais conflitos entre direitos humanos ou direitos fundamentais. O que está em causa é nuclearmente uma alteração do Código Penal.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Orador: — Até porque não cabe ao Estado democrático aderir, professar ou defender, a propósito, uma singular ou particular concepção moral, filosófica ou religiosa. Nem, consequentemente, cabe ao Estado democrático inquirir os cidadãos sobre as concepções que cada um sustenta neste domínio.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
O Orador: — Portanto, e em definitivo, por mais que alguns pretendam continuar a confundir, manipular e distorcer, o que está em causa neste referendo é uma alteração do Código Penal.
Aplausos do PS.
Mas há alguém que no século XXI e na Europa dos nossos dias possa conscientemente pretender que, numa sociedade com os nossos valores e a nossa cultura, com os nossos princípios e as nossas práticas sociais, uma mulher que interrompa a gravidez em circunstâncias tão precisas e delimitadas nas primeiras 10 semanas de gravidez é, por esse facto, uma criminosa e que o Estado deve persegui-la penalmente, julgá-la, condená-la e, eventualmente, enviá-la para a prisão? As actuais normas penais carecem, por isso, de alteração. Primeiro, para terminar com a ameaça de prisão das mulheres e a sua sujeição ao calvário de um processo judicial, o qual não pode ser a resposta justa para o drama vivido por muitas mulheres portuguesas. Segundo, contra o aborto clandestino, pela viabilização de uma alternativa legal com garantia de condições de saúde e dignidade para as mulheres, designadamente as mais frágeis, nos planos cultural, económico e social. Por último, porque ao legalizar a interrupção voluntária da gravidez sob determinadas condições não se está, como é evidente, a liberalizar o aborto ou a incitar a sua prática. Está a alargar-se, apenas, de forma razoável e equilibrada, o elenco das excepções já hoje admitidas na lei à regra geral de criminalização, que permanece em vigor.
Ao alterar esta lei — e fazemo-lo por razões ponderosas —, estamos a agir em nome de valores superiores de uma sociedade democrática.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — A Mesa regista várias inscrições para pedir esclarecimentos. O Sr. Deputado Alberto Martins responderá a grupos de dois pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
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O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, V. Ex.ª fez há pouco, perante a Câmara, um exercício em relação a muito do que pode ser o ano de 2007.
Falou de economia, e em relação à economia não me parece que os primeiros dados sejam muito brilhantes. O que é que V. Ex.ª tem a dizer em relação ao poder de compra dos portugueses, no momento em que aumenta o preço dos bens essenciais, no momento em que aumenta o preço do pão de que os portugueses necessitam de comer? O que me dirá V. Ex.ª em relação à vida das empresas, quando o investimento tem constantemente quebrado em Portugal, quando, pelos vistos, os grandes projectos de investimento só conseguem ser vistos por uns óculos um pouco «à socialista»? Será, Sr. Deputado Alberto Martins, que durante o ano de 2007 vamos ter novidades em relação ao Ministro da Economia, que consegue andar ainda mais à deriva do que a própria economia?!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Vai aparecer?!
O Orador: — Curiosamente, continuamos a afastar-nos dos nossos parceiros europeus. Devo dizer, Sr. Deputado Alberto Martins, que sempre que há um alargamento da União Europeia fico preocupado com o lugar que Portugal, dentro de algum tempo, vai ocupar no ranking do desenvolvimento económico. É que, por muito que estejamos em clima de crescimento, aquilo que acontece é algo muito simples: continuamos a divergir, e divergimos cada vez mais, dos nossos parceiros da União Europeia.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Em relação a essa matéria, o Sr. Deputado Alberto Martins nada, rigorosamente nada nos disse.
Tal como poderia ter dito em relação a um QREN, que, previsivelmente, já deveria estar pronto e que não está e pelo qual vamos ter de esperar, pelos vistos, até ao mês de Março, sem sabermos rigorosamente nada quanto aos investimentos essenciais da nossa produtividade, da nossa economia e dos nossos sectores estratégicos essenciais.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — A matéria da competitividade fiscal foi também esquecida. Quando se fala de impostos, VV. Ex.as têm sempre uma tendência: só falam para depois das próximas eleições, independentemente de quem esteja a ocupar, nessa altura, o lugar no governo.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — É curioso também que não tenha falado na questão das pensões mínimas, porque aumentar o salário mínimo nacional toca, aproximadamente, 200 000 portugueses, mas aumentar as pensões mínimas toca 500 000 portugueses. Por alturas do anterior governo — ou, como V. Ex.ª refere algumas vezes, do «governo da direita» —, essas pensões mínimas aumentaram na ordem dos 15%; com o seu Governo, temos um aumento de 1% acima da inflação prevista no Orçamento do Estado. Isto não o preocupa? Isto não preocupa aquela que deveria ser a sua consciência de natureza social?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — No que se refere a reformas, estão VV. Ex.as disponíveis para fazer aquelas que são as verdadeiras reformas em áreas como a educação e a saúde, com verdadeira liberdade de escolha na área da educação, com mais parcerias público-privadas na área da saúde? Não considera também que, na área da justiça, é muito curto um acordo que tenha por base matérias de natureza penal? E a vida das empresas nos tribunais, aquilo que sofrem nos tribunais fiscais, o tempo e o dinheiro que perdem com a nossa justiça? Isso não deveria ser uma preocupação? E também não deveria ser uma preocupação aquilo que se gasta, a nível do Orçamento do Estado, todos os anos, em relação a esta matéria da justiça?
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — No entanto, V. Ex.ª não resistiu a tratar da matéria do referendo do aborto. E, sobre isso, o CDS está à vontade, porque tem uma posição oficial — é, aliás, o único partido nesta Câmara que claramente a assume.
Protestos do PS, do PCP e do BE.
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O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Também votam «não»?! O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Orador: — Vou concluir, Sr. Presidente.
Quando falo de partidos, costumo lembrar-me daqueles que pertencem ao arco da governabilidade, mas VV. Ex.as
, pelos vistos, têm outras tendências e outras lembranças!…
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Deputado Alberto Martins referiu esta matéria como uma mera questão de revisão do Código Penal. Nesta matéria, até podiam seguir a tendência de outras forças políticas, que é a de mudar a lei.
O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — Vou concluir, Sr. Presidente.
O Orador: — Não se trata, no entanto, de uma questão de revisão do Código Penal. Está bastante para além disso. É uma questão de natureza social: a de se saber qual o respeito que se tem, ou não, perante a vida intra-uterina.
Protestos do PS.
Essa é que é a grande questão!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Esse é que é o grande problema que está e vai estar em cima da mesa, a propósito do referendo do próximo mês de Fevereiro.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — A terminar, Sr. Deputado Alberto Martins, devo dizer-lhe que, na sua intervenção, ao falar do ano de 2007, referiu muito o ano de 2006. Foi mais uma intervenção de propaganda com diferente estilo.
Porém, Sr. Deputado, em relação a isso, cada vez mais os portugueses estão cheios!
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, tinha tanta esperança nesta sua intervenção… Todos estávamos esperançados… Mas, afinal, não! Sr. Deputado, é tempo de sermos sinceros e francos um com o outro. É tempo de as bancadas do PSD e do PS serem também sinceras.
O tempo de passar a culpa a terceiros acabou! O tempo de evocação da pesada herança socialdemocrata tem de acabar! Os senhores estão a caminho de meio da Legislatura e continuam a dizer, como V Ex.ª referiu da tribuna, que a pesada herança do governo anterior é culpada por tudo e mais alguma coisa.
Os portugueses não querem isto! Qualquer dia, Srs. Deputados, estamos a chegar ao fim da Legislatura e VV. Ex.as ainda dizem «Faltam uns dias, mas quem tem a culpa é o anterior governo PSD/CDS-PP».
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Os portugueses estão cheios disto! Os portugueses querem resultados palpáveis, resultados concretos, resultados efectivos!
O Sr. Mota Andrade (PS): — E estão a ter!
O Orador: — O Sr. Deputado veio dizer que, em 2007, vai fazer isto, aquilo e aqueloutro… E os dois anos que passaram não contam? E os impostos que aumentaram e que continuam a aumentar todos os dias não contam?
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O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Bem lembrado!
O Orador: — E o poder de compra dos portugueses, que diminui de dia para dia, não conta? E o desenvolvimento económico, que nunca mais arranca, também não conta? E o desemprego, que aumenta dia-adia, não conta? E os jovens licenciados, que não têm emprego, não contam? Tinha tanta esperança, Sr. Deputado Alberto Martins, mas V. Ex.ª vem com esse rosário, com esse missal de promessas para 2007, esquecendo estes dois anos.
A Sr.ª Helena Terra (PS): — Missal?!
O Orador: — V. Ex.ª pode esquecer, mas os portugueses não esquecem e sabem que, durante estes últimos dois anos, o Governo socialista não fez rigorosamente nada!
Vozes do PSD: — Muito bem!
Protestos do PS.
O Orador: — O Primeiro-Ministro diz que Portugal está a recuperar passo a passo, mas Portugal está, isso sim, passo a passo, a marcar passo! E diz o Ministro da Economia que não há atrasos, designadamente na aplicação dos fundos. Creio mesmo que o problema é ele. Ele é que é um atraso, um atraso de vida para a recuperação e para o desenvolvimento de Portugal e dos portugueses!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Por isso, Sr. Deputado Alberto Martins, aproveitando para lhe desejar um bom ano,…
Risos do PS.
… gostaria de lhe fazer algumas perguntas.
Sr. Deputado, foi das rabanadas e do bolo rei ou passou-lhe uma «branca» e V. Ex.ª esqueceu tudo o que o Governo deveria ter feito e não fez em dois anos?
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Foi das rabanadas e do bolo rei ou V. Ex.ª pensa que os portugueses fazem de conta que estes dois anos não existiram? Aguardo, serenamente, uma resposta sólida e consistente, como é timbre de V. Ex.ª.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder a este primeiro grupo de pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados Diogo Feio e António Montalvão Machado, agradeço os cumprimentos e a gentileza dos desejos de um bom ano.
Estou convicto que 2007 vai ser um bom ano para os portugueses, um melhor ano que 2006, seguramente melhor do que 2005 e os anos anteriores.
Aplausos do PS.
Protestos do CDS-PP.
Não me esqueço, Srs. Deputados, que os senhores, há 20 meses, estavam no governo e, há 20 meses, Portugal e os portugueses estavam numa situação económica de recessão, de grande depreciação e que, ao fim deste tempo, temos uma diminuição do número de desempregados; temos, finalmente, a economia a crescer, ainda que de forma lenta mas sustentável; temos as exportações a crescer a níveis imprevisíveis e é indiscutível que a confiança das empresas e dos empresários está em crescimento.
O País está a sair da situação que os senhores deixaram. De facto, a herança é negativa, mas temos de lembrar a incompetência para que os portugueses percebam o que se está a passar.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
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O Orador: — Por isso, dizemos que as reformas que estamos a desencadear são reformas estruturais.
Ao nível da Administração Pública, ao nível da segurança social, ao nível da saúde, ao nível da educação, são reformas que vão alterar o nosso modelo de Estado social, sem pôr em causa valores essenciais do nosso modelo.
Há aqui uma ideia que é preciso ter presente: estamos longe de defender o fatalismo do mercado, mas estamos também longe de defender o totalitarismo do Estado.
Aplausos do PS.
Para nós, nem Estado máximo nem mercado máximo, nem Estado mínimo nem mercado mínimo. Queremos o Estado necessário e estamos numa sociedade em que as regras do mercado são respeitadas mas em que o Estado intervém para garantir valores societários fundamentais ao nível da educação, da saúde e da protecção social.
Assim, deixando essa lembrança e indo directamente à questão da interrupção voluntária da gravidez, que é essencial, a posição pública do Partido Socialista e do Governo, que está no Programa do Governo sufragado pelos portugueses, é no sentido da despenalização da interrupção voluntária da gravidez feita por intermédio de referendo. Está no nosso Programa do Governo, batemo-nos por ela, apresentámos essa carta de compromisso público e vamos honrá-la.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Alberto Martins, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, saudando a sua intervenção, queria começar por me referir à questão do referendo que vamos ter sobre a questão da despenalização da interrupção voluntária da gravidez.
Concordo consigo, pois, de facto, o que vamos decidir neste referendo é se, no nosso país, continuaremos a ter uma lei de encarceramento das mulheres que têm de recorrer ao aborto ou se podemos ter uma lei que permita que cada pessoa possa agir e conduzir a sua vida segundo as suas próprias convicções sem que daí resulte uma tutela penal que penaliza determinada forma de agir.
É evidente que o Sr. Deputado tem razão quando diz que o debate está a ser adulterado, deturpado, porque os que não querem abolir a possibilidade de as mulheres serem presas quando, infelizmente, têm de recorrer ao aborto clandestino querem transformar este debate numa coisa que ele não é. Isso tem de ser contestado, mas implica um empenhamento muito forte das forças que estão pela despenalização da interrupção voluntária da gravidez, dos movimentos de cidadãos, das forças sociais e dos partidos políticos.
O Sr. Deputado sabe que temos a opinião de que o Partido Socialista tem, neste aspecto, uma grande responsabilidade, tendo em conta aquilo que se passou no último referendo e que não gostaríamos de ver repetido, nem em termos do pouco empenhamento do Partido Socialista nem, evidentemente, em termos do resultado final, para o qual, porventura, esse pouco empenhamento contribuiu.
No entanto, o restante discurso do Sr. Deputado parecia um discurso de Reis do Grupo Parlamentar do PS, retomando a mensagem de Natal do Primeiro-Ministro: a crise está ultrapassada; a partir de agora, vem aí a resolução de todos os problemas; não vale a pena preocuparmo-nos mais com os vários problemas que temos no nosso país.
Se a crise está superada, Sr. Deputado, por que é que o Governo não propõe aumentos salariais reais para os trabalhadores portugueses, para os da Administração Pública e para os do sector privado? Por que é que o Governo continua a restringir os direitos sociais para diminuir a despesa, com a transferência dos custos para os utentes na área da saúde ou a diminuição dos direitos no subsídio de desemprego e nas outras prestações sociais? Por que é que o desemprego continua ao mesmo nível dos últimos anos, e vai continuar a um nível semelhante?
O Sr. Mota Andrade (PS): — Não é verdade!
O Orador: — Por que é que continuamos a ter uma divergência de crescimento em relação à União Europeia, isto é, por que é que acentuamos o nosso atraso em relação à média dos outros países da União Europeia? Por que é que continuamos a ter o investimento a níveis preocupantemente baixos (o que é apontado, aliás, por muitos economistas como sendo uma preocupação), com um contributo negativo muito importante do Orçamento do Estado e do desinvestimento público, o que contribui para dificultar o relançamento da nossa economia? O Sr. Deputado disse também que querem o Estado necessário, nem o mercado máximo nem o Estado máximo. Pergunto-lhe, então, se não é necessário o Estado exercer a tutela e ter capacidade de intervenção na PT, na TAP, na REN, na ANA, na EDP, se isso serão alavancas desnecessárias na nossa econo-
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mia, se os serviços de saúde que o Governo se prepara para privatizar são desnecessários, se a parte da educação que o Governo se prepara para privatizar é desnecessária, se tudo isso que está na calha para deixar de ser assegurado pelo Estado são matérias desnecessárias.
O Sr. Deputado disse, e tem razão, que o seu partido e o seu Governo substituíram o governo de direita.
Só foi pena não terem substituído a política de direita que esse governo praticava.
Aplausos do PCP.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Isso não é verdade, Sr. Deputado!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Martins, creio que não será surpresa para si o facto de não acompanhamos as suas considerações, tecidas embora na sua filigrana parlamentar.
O seu era um discurso previsível, devido à época, um discurso de início do ano, e o que me faz usar da palavra é o imprevisto desse discurso. Não foi tanto a litania em torno da política económica errada do Governo, com a leitura mais ortodoxa que pode haver sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento, nem em torno da nossa divergência da União Europeia em termos de ritmo de crescimento, mas o Sr. Deputado Alberto Martins até chamou a si um único facto, a diminuição do desemprego. Imagine-se: seria como dizer a alguém que teve 40º de febre e tem 39,9º que está óptimo! É pouco mais ou menos isso! Mas o que foi imprevisto no seu discurso, e é sobre isso que o interpelo, de uma forma muito frontal, foi o convite, velado e aberto, dirigido ao Partido Social Democrata — deve fazer parte das reinterpretações da cooperação estratégica: abertamente, no caso da justiça, como é conhecido (já se conhece a via, ainda não se sabe é em que «estações» será a «paragem»), veladamente, na área da educação e, assim-assim, no que se refere à reforma do sistema político.
Ora, é exactamente sobre a reforma do sistema político, a propósito deste discurso de início do ano aqui proferido pelo Sr. Deputado Alberto Martins, com toda a solenidade, que gostava de lhe perguntar se, nesse «encontro dos bons espíritos» com o Partido Social Democrata, primeiro, arranjam o sistema eleitoral e, depois, apresentam-no, como fizeram com o pacto para a justiça, ou se será que, antes, o Partido Socialista apresenta o seu próprio projecto de lei e sujeita-se ao normal processo legislativo e democrático.
Com que contaremos, Sr. Deputado Alberto Martins? Com a cooperação estratégica secreta com o Partido Social Democrata…
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Não, não!
O Orador: — … ou com o respeito por este Parlamento e pelo debate democrático com todos os outros partidos da oposição? Era esta a pergunta que queria deixar-lhe, em vésperas do Dia de Reis, com quem tão bem sintonizou o seu discurso.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para responder, em conjunto, a estes pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, começo pela «evocação régia» do Sr. Deputado Luís Fazenda e, depois, passarei às questões colocadas pelo Sr. Deputado Bernardino Soares.
Quanto às questões que colocou relativamente à reforma do sistema político e à crise económica — e aqui respondo também, um pouco, ao Sr. Deputado Bernardino Soares —, devo dizer que, no meu discurso, não fiz nenhuma declaração de que a crise estava superada.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
O Orador: — A crise não está superada. Há três anos de recessão e de grandes dificuldades económicas que herdámos e é uma herança real, não é fictícia.
O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Já cá faltava essa!
O Orador: — Ora, em economia, não há varinhas mágicas, nem nós temos soluções que não correspondam aos nossos modelos organizativos. Não defendemos uma economia planificada, não vamos dar ao Estado o papel que teve noutros horizontes. Nunca acreditámos, e o Sr. Deputado Bernardino Soares sabeo, nos «pais dos pobres» nem nos «sóis das pátrias», não acreditamos em economias colectivizadas.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas quem é que propõe isso?! O Orador: — Por isso, a solução que defendemos é a de uma combinação entre o Estado e o mercado, e não temos uma varinha mágica para resolver os problemas da economia. Temos, isso sim, responsabilidades — e estamos a assumi-las — no sentido de diminuir o desemprego.
Em Março de 2005, os desempregados eram 484 500, ou seja, mais 26 000 do que em Novembro deste ano. Significa isto que o desemprego está a diminuir, que, pela primeira vez, parou de crescer e iniciou a descida, pois, como sabe, hoje, está em 7,4%.
Desde que o actual Governo iniciou funções — e, evidentemente, há os que saem e os que entram no mercado de trabalho e, daí, o número de apenas 26 700 —, a economia criou 92 900 postos de trabalho.
Estes números resultam dos dados conjugados provenientes do Instituto do Emprego e Formação Profissional. Tenho-os comigo e posso fornecê-los ao Sr. Deputado, se pretender criticá-los de forma mais rigorosa.
O governo de direita deixou este período recessivo da economia e o que constatamos hoje é que, ao fim de 20 meses, a economia cresce agora, em termos homólogos, 1,5% mais do que a generalidade das previsões. E já nem falo do crescimento exponencial das exportações, que é conhecido.
Significa isto que, sem varinhas mágicas, de forma consolidada, lenta, mas segura e sustentada, a economia está a melhorar, o desemprego está a diminuir, há uma luz ao fundo do túnel.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Esse túnel é muito comprido!
O Orador: — No que diz respeito à questão colocada acerca dos acordos parlamentares quanto ao sistema político, devo dizer que assumiremos todos os acordos com total transparência.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
O Orador: — Os nossos objectivos políticos estão no Programa do Governo, tal como a questão dos sistemas eleitorais. Tudo faremos para procurar obter a unanimidade em todas as soluções — isso é seguro e, para nós, é um valor. Se esta última não for possível, assumiremos, naturalmente, as nossas responsabilidades democráticas e, onde for possível, assumiremos a maioria absoluta com que o povo nos sufragou.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Relativamente à interrupção voluntária da gravidez, questão a que regresso e que foi colocada pelo Sr. Deputado Bernardino Soares, o que posso dizer-lhe é que o Partido Socialista está, e estará, empenhado, com os movimentos sociais, com os outros partidos políticos, com a consciência cívica, com os cidadãos individualmente considerados, em defender a despenalização da interrupção voluntária da gravidez.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem essa opção, o Governo tem essa opção, o SecretárioGeral do Partido Socialista tem essa opção. Vamos bater-nos por essa que é uma grande vitória em termos dos valores civilizacionais e culturais da sociedade portuguesa e vamos tentar alcançá-la.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia e recordo que, às 18 horas, terá lugar o período regimental para votações.
Eram 17 horas e 25 minutos.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: — Vamos dar início ao primeiro ponto da ordem do dia de hoje, a apreciação do projecto de resolução n.º 161/X — Divulgação obrigatória dos cursos, e respectivos estabelecimentos de ensino, dos licenciados no desemprego (PSD).
Para apresentar o projecto de resolução, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD traz hoje a esta Câmara
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uma proposta simples e cristalina mas de uma enorme relevância para a vida dos portugueses.
A proposta é clara: que esta Assembleia da República recomende ao Governo que estabeleça a divulgação obrigatória dos cursos, das universidades, dos institutos politécnicos onde se formaram as dezenas de milhar de jovens e não jovens que estão actualmente no desemprego e que detêm o título e o grau de licenciatura.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!
O Orador: — O objectivo da proposta é igualmente claro: permitir que a sociedade portuguesa, os candidatos ou potenciais candidatos ao ensino superior, nomeadamente, possam conhecer a realidade e, assim, tomar decisões, de forma mais esclarecida, sobre as opções e as escolhas para a sua vida.
O princípio em que se fundamenta esta proposta é, também ele, muito claro. É o princípio da transparência, é o dever de informação que o Estado tem perante os cidadãos.
Não defendemos que o Estado esconda, omita, camufle o que é a realidade e os dados que tem ao seu dispor. Pelo contrário, defendemos uma sociedade aberta, em que os cidadãos têm acesso à informação para assim poderem tomar as melhores opções em termos da sua vida pessoal.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A situação do desemprego no nosso país é verdadeiramente dramática, e em particular a situação dos desempregados que são licenciados é redobradamente difícil. Conhecemos os números que nos dizem que são mais de 50 000 os desempregados no nosso país que são licenciados e que o seu número tem vindo a aumentar paulatinamente.
Há, com certeza, muitas causas para explicar esses números. Contudo, há uma que é incontornável.
Refiro-me concretamente ao que é a discrepância, a dissonância entre a formação de muitos cursos superiores e a realidade do mercado de trabalho no nosso país.
Todos reconhecemos que o País tem este problema de há alguns anos a esta parte. É por isso que, hoje, o PSD apresenta uma proposta concreta que visa, de facto, começar a alterar esta mesma circunstância.
O projecto de resolução que hoje apresentamos, repito, é uma recomendação no sentido de que, rapidamente, o Governo tome medidas, criando a obrigatoriedade de divulgação pública dos cursos, das universidades e dos institutos politécnicos onde se formaram os licenciados que se encontram desempregados. Esta é uma ideia anunciada pelo líder do partido, Dr. Marques Mendes, já em Setembro do ano passado, por alturas do encerramento da Universidade de Verão, do PSD, e foi recebida com muitas reservas e até com discordâncias por parte do Partido Socialista e do Governo.
Felizmente, ontem, fomos agradavelmente surpreendidos por uma entrevista, certamente por coincidência, do Sr. Ministro da Ciência e do Ensino Superior, em que veio manifestar a sua concordância e a do Governo em relação a esta proposta apresentada pelo PSD. Mais do que isso, até vimos o Sr. Ministro assumir o projecto como sendo uma ideia sua, o que não deixa de ser absolutamente notável. Em circunstâncias normais, poderíamos mesmo acusá-lo de plágio. É que o Sr. Ministro, com certeza, poderia ter reconhecido que a autoria desta ideia é do Dr. Marques Mendes. Não o fez.
Vozes do PSD: — É verdade!
O Orador: — Contudo, é bom que se diga que, para nós, isso não é o mais relevante.
O relevante, para nós, para os portugueses, é que esta medida possa ser aprovada e concretizada. O importante, aparentemente e pelo que ontem ouvimos ao Sr. Ministro, é que o Governo socialista «emendou a mão» e, ao contrário do que disse no passado, hoje já concorda com esta ideia do Partido Social Democrata.
Esperamos, pois, que a maioria parlamentar socialista seja agora coerente com aquelas palavras do Sr.
Ministro da Ciência e do Ensino Superior e que, até em nome da boa fé parlamentar, aprove esta medida que o PSD aqui apresenta hoje, não se limitando a copiá-la e a apresentá-la posteriormente como se de sua própria autoria.
Repito que esta é uma proposta muito clara que visa concretizar melhorias significativas em termos do que são as potencialidades de melhoria de vida dos portugueses, nomadamente dos que pretendem candidatar-se ao ensino superior. Estes poderão ficar a conhecer melhor as potencialidades dos diferentes cursos, a realidade das saídas profissionais dos mesmos e, sendo este, entre muitos outros, um dos indicadores, poderão tomar as melhores opções para a sua vida.
O PSD, com esta proposta, como tem acontecido em muitas outras circunstâncias, apresenta-se com um sentido construtivo, com um contributo muito concreto para melhorar a vida dos portugueses.
Não encaramos a oposição como um mero confronto e discordância em relação a medidas, muitas das quais consideramos nefastas, que têm vindo a ser tomadas pelo Governo socialista. Nós próprios tomamos a iniciativa, e, hoje, estamos a fazê-lo. Esperemos que a maioria socialista tenha a grandeza de perceber que tem aqui uma oportunidade de dar um sinal claro de que coloca os interesses dos portugueses acima dos interesses meramente partidários.
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Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Há duas inscrições para pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Pedro Duarte, a primeira das quais é da Sr.ª Deputada Cecília Honório. Tem, pois, a palavra para o efeito, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, é reconhecível a pertinência do vosso projecto de resolução.
Os senhores falaram em transparência, no dever do próprio do Estado, no direito dos jovens fazerem as respectivas escolhas com mais informação, no direito das famílias saberem que escolha estão a fazer e, inclusive, num importante mecanismo auto-regulador das instituições de ensino superior. É, naturalmente, uma preocupação pertinente.
Os senhores também trouxeram aqui dados muito preocupantes relativamente ao desemprego dos licenciados: mais de 40 000 no segundo semestre de 2006, 14 000 no último mês. Os números são assustadores.
Esses números correspondem a pessoas, a milhares de pessoas, com qualificação, às quais este país não tem oferecido resposta. É por isso que nem sequer se compreende a mensagem de Ano Novo do Partido Socialista, quando a realidade destas pessoas é esta.
No entanto, gostava de colocar-lhe algumas questões.
Fiquei com a sensação — e o Sr. Deputado esclarecer-me-á — que os senhores entendem o mercado de trabalho como um mecanismo regulador por excelência desta realidade, que apostam, com uma fé absoluta, no mercado de trabalho como forma de resolução desta realidade. Pergunto, então, se não estão preocupados com as políticas de emprego, se esta não é a grande preocupação à qual esta informação pode dar resposta.
Pergunto-lhes também se não estão preocupados com os critérios de reestruturação da rede do ensino superior, se não acham absolutamente prioritário que esses critérios sejam divulgados, ou se estão tão preocupados com essa realidade porque, enfim, alguns cursos serão encerrados e muitos deles foram, inclusivamente, criados por vós, ao sabor de apetites e de favores políticos que era necessário satisfazer.
Quais são, então, as vossas preocupações relativamente à reestruturação da rede e com que critérios é que acham que ela poderia e deveria ser feita? Quais são, então, as políticas de emprego que devem ser a resposta natural à divulgação destes dados? Mais uma questão: quanto ao 1% do PIB para o ensino superior o próprio Ministro Mariano Gago diz que não chega mas que não há mais até ao final da Legislatura (não há mais!), e que se este país fizesse — o Sr. Ministro tem o «sonho americano»! — os esforços necessários e se o investimento privado entrasse nas universidades e nas instituições de ensino superior talvez pudéssemos chegar aos 2% da experiência dos Estados Unidos da América. Quero saber se esta é também a vossa preocupação. Quero saber se, sobre esta matéria, os senhores estão com o Governo e com o Partido Socialista na abertura das portas ao investimento privado e com que critérios é que vão garantir essa abertura nas instituições de ensino superior, que tão maltratadas foram, como os senhores bem sabem, por este Orçamento.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, em primeiro lugar, permita-me que felicite o Partido Social Democrata por ter apresentado este projecto de resolução, que nos parece oportuno e necessário. Aliás, sobre essa matéria, gostaria de colocar-lhe duas questões, que vêm no seguimento das medidas propostas pelo CDS no seu programa eleitoral, nas eleições legislativas de 2005, relativamente a esta matéria.
Em primeiro lugar, gostaria que nos explicasse por que razão este diploma se aplica só a licenciados e não igualmente a bacharéis. O ensino superior é bietápico, podendo atribuir o grau de licenciado ou bacharel, para além obviamente dos mestrados e dos doutoramentos. Então, porquê, nesta matéria, falar-se só dos licenciados? A segunda questão, mais abrangente, tem a ver com o seguinte: é verdade que deve ser divulgado quais são os licenciados que as famílias financiaram e que não encontraram emprego, mas também importa dar a conhecer ao País quais são (e são muitos mais) aqueles que, tendo concluído os seus estudos superiores, conseguiram emprego, onde o conseguiram, quais foram as escolas que os formaram e que tipo de trabalho estão a fazer. Acho que isto também deveria ser publicado. Assim sendo, está o Partido Social Democrata aberto a que possa vir a ser incluída uma recomendação ao Governo no sentido de, em termos de empregabilidade, ser dado a conhecer não só aqueles que ficaram de fora mas também aqueles que efectivamente conseguiram o seu objectivo, que foi o de contribuir para a competitividade e para o progresso do País, para a melhoria da qualidade de trabalho e para a melhoria da qualidade da economia nacional, através da sua formação e daquilo que puderam dar ao mercado de trabalho depois da sua formação?
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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório e Sr. Deputado Abel Baptista, agradeço as vossas palavras, até porque, julgo, o tom com que foram proferidas é, se me permitem o atrevimento, um pouco sintomático da realidade nacional.
Temos notado um consenso generalizado quanto a este projecto de resolução, apresentado pelo PSD.
Hoje, vimos que, por parte de diferentes quadrantes políticos, como o BE ou o CDS-PP, há uma concordância com a pertinência desta iniciativa; ontem, ouvimos o Presidente do Conselho de Reitores e o Presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Politécnicos manifestarem também a sua concordância com esta iniciativa e ouvimos até — veja-se lá! — o próprio Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior concordar com esta ideia, inclusivamente, como referi há pouco, assumindo-a como sua. Posto isto, esperamos que a maioria parlamentar tenha hoje, aqui, a grandeza suficiente para perceber que só pode ter um caminho a seguir, o de não inviabilizar uma medida como esta, até porque, sabemo-lo, mais cedo ou mais tarde vai querer assumi-la como sua.
E não estamos aqui propriamente numa competição para ver quem é o autor de uma iniciativa, o que nos interessa é que esta medida seja concretizada. Agora, julgo que a melhor garantia de que esta medida vai ser, de facto, concretizada é esta Assembleia não fugir à sua responsabilidade, aprovando aqui esta recomendação ao Governo. É só isso que nos move — que fique claro! Não vamos acusar o Sr. Ministro de plágio, nem nos importamos sequer que ele faça propaganda, assumindo como sua uma medida que, de facto, não o é, mas, sim, do líder do PSD, Dr. Marques Mendes. Isso não nos perturba. O que pode vir a perturbar-nos é a Assembleia da República, eventualmente, fugir à sua responsabilidade de recomendar ao Governo uma medida que consensualmente é assumida como positiva para o País.
Vou agora responder, mais concretamente, às questões que me foram colocadas.
Sr.ª Deputada Cecília Honório, é evidente que esta é uma medida entre muitas outras. Bem entendido, não estamos aqui a apresentar uma medida que vai resolver o problema do desemprego dos licenciados e, muito menos, do desemprego em geral. Este é apenas um pequeno passo, que, como é evidente, tem de ser integrado num conjunto muito mais significativo de medidas. Desde logo, naquilo que são as políticas de emprego, mas também naquilo que é a própria estrutura do ensino superior. A esse respeito, o Partido Social Democrata também tem apresentado propostas concretas e dado contributos muito claros.
Por exemplo, no mês de Dezembro, realizou-se aqui um debate mensal sobre este tema, em que o líder do PSD, Dr. Marques Mendes, apresentou propostas concretas. Mas, sobre esta matéria, também são da nossa autoria vários projectos de lei e, nesta área, também tomámos iniciativas próprias.
Agora, o que hoje aqui apresentamos é uma medida muito concreta, uma medida simples mas que pode ser de uma enorme relevância para a vida de muitos portugueses.
Por isso, digo-lhe que, evidentemente, estou muito preocupado com aquela que é a realidade do ensino superior no nosso país, com aquela que é a realidade das políticas de emprego no nosso país e com aquilo que são os cortes «cegos», nunca antes vistos no nosso país, no ensino superior, por exemplo, no Orçamento para 2007. Agora, julgo que, com este pequeno passo, poderemos dar um contributo para tentar atenuar as dificuldades actualmente sentidas pelos nossos concidadãos que estudam no ensino superior ou pretendem candidatar-se ao mesmo.
Sr. Deputado Abel Baptista, é evidente que acolhemos a ideia de os bacharéis estarem também incluídos neste âmbito — aliás, agradeço-lhe essa sua chamada de atenção. Não o fizemos no projecto de resolução uma vez que, tendo ele em vista o futuro, sabemos que esse é um grau que, por força do Processo de Bolonha, já não existe no nosso país, o que não significa, porém, que não existam bacharéis no «mercado do desemprego», digamos. Portanto, acho que faz todo o sentido que o Governo, quando implementar esta medida, possa alargá-la ao bacharelato.
No que diz respeito a outras propostas, nomeadamente à de abranger o percurso profissional daqueles que não estão no desemprego, é uma medida que faz sentido mas que, na nossa óptica, cumpre também um pouco a cada uma das instituições, e sabemos que há instituições, no nosso país, que já estão a fazêlo. A situação mais preocupante, neste momento, são os desempregados, pessoas que investiram muito do seu esforço, muito do seu tempo, muito do seu dinheiro para, no ensino superior, obterem um grau de licenciatura ou de bacharelato, ou até de mestrado e de doutoramento, e que, hoje em dia, estão no desemprego. Esta é a nossa primeira preocupação. Ora, penso que, através dos centros de emprego, o Estado pode facilmente tornar pública e transparente esta mesma realidade.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.
O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD apresentou, em Outubro de 2006, o
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projecto de resolução que hoje se discute, visando a divulgação obrigatória dos cursos, e respectivos estabelecimentos de ensino, dos licenciados no desemprego.
Do mérito do conteúdo em causa, nada a obstar. Já a forma como foi apresentada só pode servir para comprovar o total alheamento do PSD em relação ao que se vai fazendo em Portugal, nomeadamente em matéria de ensino superior.
O PSD anda distraído, sem ideias e, à falta de melhor, repete projectos do Governo. Não estranhamos porque, nesta matéria, o PSD tem demonstrado um desnorte demasiado preocupante. Isto é grave pois, para além de estarmos perante o maior partido da oposição, as reformas no ensino superior assumem um papel decisivo para o nosso futuro colectivo.
O PSD tem tentado fazer passar a ideia de imobilismo deste Governo em matéria de ensino superior, mas a realidade desmente-o.
Foi assim com a implementação do Processo de Bolonha, com a alteração do regime de acesso a maiores de 23 anos, com os cursos de especialização tecnológica, com as parcerias internacionais entre instituições de ensino superior, com a instalação do instituto ibérico de nanotecnologia, em Braga, com a apresentação do relatório da ENQA e consequente criação, este ano, da Agência Nacional de Avaliação e Acreditação dos cursos do ensino superior, e com as alterações, apresentadas no último debate mensal com o Sr.
Primeiro-Ministro, relativas à lei do financiamento, da autonomia e do Estatuto da Carreira Docente.
É verdade! No ensino superior, nada ficará como antes.
O PSD, provavelmente aturdido com tantas mudanças ou constrangido pelo rotundo fracasso das suas políticas para este sector, consubstanciadas pelos últimos governos, decidiu apresentar propostas requentadas.
O PSD sabe (ou está distraído) que, antes de apresentar este projecto de resolução, solicitou uma sessão de perguntas ao Governo de âmbito sectorial sobre política de ensino superior.
O PSD sabe (ou está distraído) que o Governo anunciou nesse mesmo debate, em 17 de Junho de 2006,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — É mentira!
O Orador: — … através do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, que iria actuar no sentido de passarem a ser do conhecimento público, de uma forma sistemática, as informações respeitantes aos níveis de desemprego da população que detém um grau de ensino superior.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Não tem nada a ver!
O Orador: — Estas informações, além de incluírem indicadores de carácter mais global, deverão incluir indicadores específicos, que permitam, nomeadamente, conhecer as áreas formativas e os cursos/diplomas de ensino superior onde o desemprego mais se faz sentir, bem como os respectivos estabelecimentos de ensino superior.
Estas informações irão contribuir, em primeiro lugar, para informar os candidatos ao ensino superior sobre as actuais saídas profissionais dos cursos de ensino superior disponíveis, permitindo mais adequadamente interpretar e concluir sobre a adequação da oferta de cursos do ensino superior ao mercado de trabalho.
Segundo informações que conseguimos obter junto do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social (já que esta medida, apesar de ser iniciativa do primeiro ministério, se concretiza no segundo), a situação actual e acções programadas são as seguintes: o Sistema de Informação e Gestão da Área do Emprego (SIGAE), utilizado pelos centros de emprego para registo dos dados dos desempregados que se inscrevem nos Centros de Emprego, está a ser alvo das alterações necessárias à sua adequação aos objectivos traçados pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, nomeadamente a obrigatoriedade do preenchimento de determinados campos que, até aqui, não o eram.
Estas alterações ao SIGAE serão efectuadas até Março de 2007, pelo que, a partir desta data, passarão a ser recolhidos, nos centros de emprego, todos os dados necessários para a disponibilização da informação sobre os desempregados com grau de ensino superior, nos termos referidos.
A primeira divulgação pública com os primeiros dados sobre os desempregados com grau de ensino superior ocorrerá, em Junho de 2007, permitindo aos candidatos ao ensino superior, no próximo ano lectivo, usufruir desta informação.
A divulgação pública dos desempregados com grau de ensino superior passará, assim, a ser parte integrante, de uma forma sistemática, das informações periódicas sobre desemprego, a partir de Junho de 2007.
Adicionalmente, os dados serão periodicamente disponibilizados à estrutura de observação do ensino superior, que realizará a sua análise, estruturação mais pormenorizada e divulgação para o domínio público, no âmbito das estatísticas do ensino superior.
Tendo em vista a adequação ao período de candidatura ao ensino superior, a divulgação desta informa-
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ção passará a ocorrer, no mínimo, no final do primeiro trimestre de cada ano.
O Governo tem, pois, calendarizados os passos para a implementação desta medida, não fazendo este projecto de resolução do PSD qualquer sentido.
Aplausos do PS.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Que vergonha! É a «voz do dono» a falar!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS, no seu programa eleitoral para as eleições legislativas de 2005, apresentava como meta, na área da educação, a avaliação exaustiva e transparente de todas as escolas públicas e privadas, com divulgação do respectivo desempenho, e a definição dos indicadores, a publicar todos os anos, correspondendo a diferentes ópticas e critérios, nomeadamente o da empregabilidade dos alunos.
Com o projecto de resolução n.º 161/X, apresentado pelo PSD, recomenda-se ao Governo que sejam divulgados, através de listagem, a relação de desempregados licenciados e o respectivo estabelecimento onde foram formados.
Este projecto de resolução, sendo positivo e oportuno, deveria ir mais longe e apresentar também a listagem dos empregos ocupados por licenciados, suas áreas de formação e respectivos estabelecimentos de ensino que os licenciaram.
A população portuguesa deve ter a noção exacta de quantos cidadãos frequentaram o ensino superior, quais os cursos em que se licenciaram e, dos que se licenciaram, quais os que tiveram sucesso em termos de emprego e não só daqueles que, apesar do esforço das famílias e do Estado, obtiveram uma formação que não foi uma mais-valia em termos do emprego.
É também importante que se interiorize que Portugal tem ainda défice de licenciados, assim como tem défice nas formações técnico-profissionais. Por isso, entendemos que também é necessário mostrar ao País que tirar um curso superior não é ficar licenciado para o desemprego, tem de ser sempre sinónimo de mais-valia pessoal e colectiva, tem de ser sinónimo de melhoria da competitividade e de empregabilidade de licenciados e de bacharéis.
Verificamos que o Sr. Ministro do Ensino Superior, numa entrevista que deu ontem a um jornal diário, assumiu que a divulgação dos dados do emprego dos licenciados vai ser publicada pelo Ministério do Trabalho. Saudamos a iniciativa do PSD e a adesão do Governo a uma ideia que o CDS apresentou no seu Programa do Governo, nas últimas eleições legislativas.
Assim sendo, existe, nesta matéria, um amplo consenso sobre a divulgação dos dados de empregabilidade dos licenciados.
No entanto, as famílias portuguesas devem, no momento em que financiam os estudos superiores dos seus filhos, ter presentes vários elementos para ponderarem e escolherem convenientemente os cursos que os jovens devem frequentar. Obviamente, devem ter presente qual a vocação do jovem, qual o estabelecimento de ensino que garante melhor empregabilidade, quais os cursos onde existe maior procura por parte do mercado de trabalho, onde e como são distribuídos os empregos por cada curso, e só o Estado lhes pode proporcionar esta informação! Portugal e os portugueses, não sendo, infelizmente, ricos, devem, por isso, maximizar todos os seus recursos financeiros, sejam eles das famílias, sejam do Estado. Todos os recursos devem ser rentabilizados, pelo que não nos podemos dar ao luxo de estar a formar jovens para, depois, não terem possibilidade de aplicar os seus conhecimentos numa vida profissional útil e que crie valor acrescentado para si e para o País.
Assim, apesar de o projecto de resolução ficar aquém do que são as ideias do CDS-PP no que diz respeito à informação sobre a empregabilidade de licenciados e bacharéis, merecerá, pela nossa parte, um voto favorável.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Estado divulga mensalmente os dados do mercado de emprego apurados pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional, e bem. O Instituto Nacional de Estatística projecta, trimestralmente, as informações referentes ao desemprego registado em Portugal, e bem.
É uma evidência que o desemprego entre licenciados, particularmente entre os jovens recémlicenciados, atinge proporções graves que colocam em situação precária milhares de jovens que, vendo as suas justas perspectivas defraudadas, engrossam hoje as fileiras do desemprego. O número de desempregados com habilitação superior ascende acima dos 40 000, número que tem apresentado um crescimento
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significativo.
O Partido Social Democrata traz hoje à discussão um projecto de resolução na tentativa de atribuir as culpas da escassez de emprego qualificado exclusivamente ao actual Governo quando, na verdade, o actual mais não faz senão intensificar as políticas do anterior, agravando também as suas consequências. O Governo anunciou, pela voz do Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, nesta Assembleia e, ontem mesmo, na comunicação social, a intenção de proceder exactamente da mesma forma: divulgar os cursos superiores e as instituições de onde provenham actuais diplomados no desemprego, como forma de informar e melhor conduzir os jovens para uma formação superior que promova a empregabilidade.
Mas o PSD quis «apertar» com o Governo e, na sua marcha vanguardista, como quem quer mostrar trabalho feito, avançou. Infelizmente, avançados ou recuados no tempo perante o Governo, o PSD opta por fazer suas as piores políticas do PS e vice-versa.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Claro que tanto o PS como PSD conhecem bem as causas do desemprego, estão envolvidos na sua origem e sabem tão bem um quanto o outro que os desequilíbrios hoje verificados na formação de quadros superiores no País se deve, essencialmente, ao acumular de anos de más políticas de ingresso no ensino superior, de proliferação de currículos de formação desajustados da realidade e da limitação da entrada em determinados cursos, sobrelotando outros, porventura menos necessários para a saúde do nosso tecido empresarial e produtivo.
Este é um desequilíbrio provocado pelos responsáveis do ensino superior, pelos governos, que optaram por uma política de numerus clausus e de desinvestimento no ensino superior, provocando limitações ao acesso e à frequência em muitos cursos, empurrando os estudantes para outros, e pelas decisões pouco ponderadas de abertura de novos cursos sem olhar às necessidades do País, empurrando agora essa responsabilidade para as instituições de ensino superior; um desequilíbrio provocado pela falta de formação de profissionais e de quadros superiores em diversas áreas, pelo desmantelamento do aparelho produtivo, da investigação e de outros vectores essenciais para o desenvolvimento e para o emprego.
E como querem agora, PS e PSD, corrigir o desequilíbrio? O PS continua a anterior política de desinvestimento no ensino superior e aposta na destruição do sector produtivo, permitindo a diminuição acentuada de postos de trabalho. O PSD apresenta esta iniciativa, medida que vai ao encontro daquilo que tanto tem defendido mas que é uma espécie de ranking do avesso.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Ao invés de indicar as formas de adaptar os estabelecimentos de ensino às reais necessidades do País e de cuidar o tecido empresarial e produtivo português, o PSD propõe exactamente o contrário. O que o PSD propõe não é o aproveitamento e maximização do capital humano do País mas, sim, o seu total ajustamento às regras do mercado de trabalho. Ou seja, para o PSD, deve ser o mercado de trabalho a condicionar e a ditar o rumo do País em matéria de formação de quadros superiores.
É uma visão de soberania nacional radicalmente diferente da do PCP! O PSD entende que cabe aos estudantes inscreverem-se nos cursos de maior empregabilidade, bastando-lhes saberem quais as instituições que garantem futuro emprego, como quem se coloca sobre um tapete de uma linha de montagem. É deixar o mercado funcionar e esperar que uma mão invisível venha intervir nas injustiças.
O que o PSD defende com este projecto de resolução é que exista um outro ranking das instituições de ensino superior, não com base na sua qualidade, não com base na sua capacidade científica, mas tendo como base a absorção que o mercado de trabalho faz, ou não, dos licenciados provenientes dessas instituições. Trata-se de divulgar a lista das mortes anunciadas das instituições como se a elas coubesse a responsabilidade de dar resposta especialmente dedicada aos caprichos do mercado de trabalho.
O PCP considera que esta medida pode apenas acentuar a degradação do ensino superior, intensificar as assimetrias que já hoje se verificam entre instituições, sejam públicas ou privadas. Consideramos que o ensino superior não é um mero estágio para o trabalho e que a escolha de acesso e frequência a um curso não deve ser simplesmente condicionada pelo acolhimento que essa formação tem no mercado de trabalho e que a vocação, o gosto e a opção também devem ser factores importantes no acesso ao ensino superior.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Mas, mais que isso, entendemos que não cabe exclusivamente ao estudante a procura de um curso para garantir emprego, cabe também ao Estado intervir na regulação do mercado de trabalho e na criação de alternativas para o emprego.
O recém-licenciado não é responsável pelo desemprego por ter escolhido o curso errado! A instituição de ensino não é responsável pelo desemprego por leccionar cursos que o mercado de trabalho não acolhe!
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Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Para o PSD, e para o Governo, pelos vistos, o ensino superior deve andar ao sabor das vontades do mercado. Hoje, vai tudo para hotelaria e turismo, amanhã se verá… Para o PSD, e para o Governo, o País precisa exactamente dos mesmos quadros superiores que o mercado de trabalho. O mercado de trabalho não acolhe filósofos, historiadores, geólogos, físicos, químicos, pintores, escultores e professores e, no entanto, ninguém pode dizer que o País não necessita deles quando o nosso défice cultural é acentuado,…
O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!
O Orador: — … os nossos recursos naturais estão subaproveitados, a nossa indústria está aquém dos avanços tecnológicos dos outros países e o insucesso escolar entre os jovens é flagrante e o maior da União Europeia.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Afinal, esses quadros superiores são tão necessários para o desenvolvimento do País quanto quaisquer outros. Não são, no entanto, necessários para um mercado de trabalho exclusivamente dedicado à obtenção de lucro e a quem o desenvolvimento do País é totalmente alheio.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Negamos a ideia de que devem ser os estudantes ou as instituições de ensino os responsáveis pela empregabilidade. Negamos a ideia de que o mercado de trabalho deve condicionar o sistema de ensino superior e que o Estado, os estudantes e os jovens não exerçam qualquer poder sobre esse mercado.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, analisamos hoje o projecto de resolução n.º 61/X, do Partido Social Democrata, que visa recomendar ao Governo que determine a obrigatoriedade de divulgação pública do desemprego entre pessoas habilitadas profissionalmente com uma licenciatura, com a indicação expressa dos cursos e das instituições de ensino que frequentaram.
De acordo com os proponentes, o País sofre de uma realidade preocupante, que é o crescimento do desemprego entre portugueses com habilitações superiores – o que é verdade e também me preocupa –, e propõem-se resolver esse grave problema através de divulgação pública da lista dos cursos que são um passaporte para o desemprego, nas palavras do Sr. Deputado Luís Marques Mendes, uma vez que essa lista reflectirá, sem sombra de dúvida, uma indicação clara dos cursos que «estão a dar» e dos cursos que «não estão a dar», no nosso País.
Isto para que os estudantes, ultrapassando o 12.º ano, façam a sua escolha não de acordo com as suas aptidões pessoais, não de acordo com as suas vocações, não de acordo com opções ou estratégias políticas na área da educação e do ensino superior, mas apenas com base numa indicação do mercado de trabalho ou, melhor, uma pseudoperspectiva futura do mercado de trabalho ou do que será o mercado de trabalho dali a 3, 5, 8 anos, quando terminarem a sua formação inicial, dando sinais que podem nem sequer corresponder à realidade ou às reais necessidades do País.
Esta proposta, que o Governo já assumiu partilhar – aliás, curiosamente, hoje assistimos, neste Plenário, a uma pequena guerrilha entre o CDS, o PSD e o PS sobre a paternidade da proposta ou da ideia, esta ideia, que, pelo menos, na sua essência, é inteiramente perfilhada pelo Governo –, é uma proposta que, por detrás das boas intenções de prestar mais informação e garantir um direito à informação por parte dos estudantes e até das instituições, esconde dois problemas fundamentais, sendo o primeiro a confiança cega na entrega das escolhas e da estratégia nacional, em termos daquele que deve ser o rumo e as opções de formação no ensino superior, ao mercado de trabalho e à sua lógica.
No entender do Partido Social Democrata, do Partido Socialista e também do CDS, as escolhas do curso, da universidade ou do politécnico a frequentar devem estar dependentes de uma lista de pseudoempregabilidade de cursos incapaz de reflectir, por exemplo, as próprias necessidades futuras do mercado de trabalho em natural e necessária renovação ou devido aos profissionais que, entretanto, se forem aposentando.
Essa lista nunca estará em condições de reflectir a realidade e as reais necessidades do País e pode,
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de facto, induzir em erro nessas mesmas escolhas. Esta ideia revela a vontade de recusar a responsabilidade de optar por uma estratégia nacional, que deve estar ao serviço das necessidades do País e do Estado.
Em segundo lugar, os verdadeiros resultados e as verdadeiras consequências e intenções são de criar um ranking. É extraordinário que o Partido Socialista, agora no Governo, adopte esta postura com tanta clareza e, depois, assistamos a Deputados da bancada do Partido Socialista acusarem o PSD de a única coisa que querem fazer é um ranking, quando o Partido Socialista vai fazer exactamente a mesma coisa, ou seja, um ranking das universidades e dos politécnicos, o qual, lançando a confusão entre alunos e famílias na escolha, na lógica do mercado e da competição, tem como única preocupação criar técnicos e tecnocratas executivos, mão-de-obra acrítica e não cidadãos completos ao serviço de uma sociedade plural e democrática.
Vozes de Os Verdes e do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos entrar no período regimental de votações.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.
Pausa.
Os Srs. Deputados que não tiverem cartão electrónico ou não conseguiram registar a presença devem assinalá-lo à Mesa e, depois, proceder à respectiva assinatura junto dos serviços.
Estão presentes 210 Srs. Deputados, pelo temos quórum para proceder às votações.
Srs. Deputados, a primeira votação é acerca do projecto de resolução n.º 139/X — Assinala os 250 anos da Região Demarcada do Douro e recomenda ao Governo medidas dirigidas ao desenvolvimento económico e social da região (PS).
Como o Grupo Parlamentar do PS apresenta uma proposta de alteração à alínea e) do seu projecto de resolução, votaremos primeiro essa proposta de alteração e depois as restantes alíneas.
Sendo assim, vamos proceder à votação da proposta de alteração da alínea e) do projecto de resolução n.º 139/X.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.
É a seguinte:
Estude a possibilidade de criação de incentivos às empresas de forma a aumentar a capacidade instalada da fileira do vinho do Porto, na região do Douro.
O Sr. Presidente: — Vamos passar, agora, à votação das alíneas a), b), c) e d) do projecto de resolução n.º 139/X, tendo em conta a emenda aprovada anteriormente.
Submetidas à votação, foram aprovadas, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, é para comunicar que apresentaremos uma declaração de voto.
O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado, fica registado.
Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 170/X — Desenvolver o Douro, proteger a Região Demarcada (PCP).
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes.
Passamos à votação do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 106/X — Aprova a lei que procede à reestruturação da concessionária do serviço público de rádio e televisão.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e votos contra do PSD, do PCP, do CDS-
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PP, do BE e de Os Verdes.
Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura de dois pareceres da Comissão de Ética.
Faça favor, Sr.ª Secretária.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Judicial da Covilhã, 1.º Juízo, Processo n.º 517/05.0 — TACVL, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Vítor Pereira (PS) a prestar depoimento presencialmente, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o parecer está em apreciação.
Pausa.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
A Sr.ª Secretária: — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal de Família e Menores da Comarca de Cascais, 4.º Juízo, Processo n.º 689/06.7 — PBCSC, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Pedro Pinto (PSD) a prestar declarações, por escrito, na qualidade de arguido, no âmbito dos autos em referência.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação.
Pausa.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, vamos prosseguir a discussão do projecto de resolução n.º 161/X.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, retomando a discussão do projecto de resolução n.º 161/X, dirijo-me directamente à bancada do Partido Socialista para dizer que a posição hoje aqui assumida só pode ter um de dois fundamentos: ou ignorância ou má fé. Quero acreditar que se deve a ignorância, pelo que vou recordar o que se passou.
No passado mês de Junho, por iniciativa do PSD, discutimos esta matéria no Parlamento e o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior comprometeu-se a que, no prazo de seis meses — e já lá vão muitos mais, como reconhecerá! —, «As universidades vão ter de revelar saídas dos cursos». Ora, não é isto que o PSD propõe, mas sim que os centros de emprego revelem os dados que têm ou podem ter ao seu dispor.
A prova desta realidade é que o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, ontem mesmo, numa entrevista que concedeu, reconheceu que o caminho que estava a seguir não era o correcto, tal como alertámos em Junho. E, referindo-se a esta mesma medida — de as universidades revelarem as saídas dos cursos —, disse: «Mas isso não chega, é preciso fazê-lo de forma mais organizada e com mais transparência», reconhecendo que não conseguiu levar a cabo aquela que era a sua ideia há seis, sete ou oito meses atrás. Foi por essa razão que inverteu a sua posição, emendou a mão.
Portanto, Srs. Deputados do Partido Socialista, perdoem que vos diga, se não aprovarem esta iniciativa, temos de concluir que o que vos move é, única e simplesmente, uma «partidarite crónica». A prova disso é que os senhores conseguiram, de ontem para hoje, evoluir na vossa posição: VV. Ex.as receberam ordens e instruções para votar contra esta iniciativa só porque ela é oriunda de um partido da oposição e, portanto, andaram à procura de um argumento.
Ontem, um Deputado do Partido Socialista prestou declarações à comunicação social, utilizou um argumento conceptual mas respeitável — concorde-se ou não — e, juntando a sua voz à do PCP, disse que, por razões conceptuais, os senhores eram contra a filosofia deste projecto, uma vez que ele levaria a rankings e a listas.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Uma vergonha!
O Orador: — Ora, de ontem para hoje, certamente receberam outro telefonema e mudaram de posição: são contra, mas o argumento é outro! Hoje, o argumento já não é o mesmo de ontem: afinal, estão de acordo com a filosofia do projecto, mas são contra porque ele não é necessário, uma vez que até já está a ser preparado um nos gabinetes ministeriais — talvez se tenham apercebido disso em resultado de um outro qualquer telefonema durante a noite.
Contudo, a fragilidade deste argumento é imensa, Srs. Deputados. Se assim é, se, de facto, concordam
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com a ideia e, eventualmente (segundo vos disseram pelo telefone), até já está a ser preparado um diploma nos gabinetes ministeriais, associem-se à ideia, aprovem este projecto de resolução! O que é que o País perderá com esta aprovação? Eu sei, e talvez possa responder: são as vossas convicções que se perdem, porque o que vos move, infelizmente, é a falta de sentido de Estado e a pequenez política com que abusam da vossa maioria absoluta.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, inscreveu-se o Sr. Deputado Manuel Mota, só que o Sr. Deputado Pedro Duarte já não dispõe de tempo para responder, a menos que a generosidade do perguntante lhe ceda algum.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, o PS cede 3 minutos ao PSD.
O Sr. Manuel Mota (PS): — 2 minutos!
O Sr. Presidente: — 3 minutos! A Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça foi muito mais generosa do que o Sr. Deputado.
Risos.
O Sr. Manuel Mota (PS): — A minha perspectiva era a de que iria utilizar um pouco mais de tempo na formulação do pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.
O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Pedro Duarte com certeza não esquece o que foi dito no debate do dia 17 de Junho, até porque estava presente — o Diário da Assembleia da República confirma-o, ao registar os seus aplausos à intervenção do Sr. Deputado Emídio Guerreiro.
Para que não fiquem quaisquer dúvidas, não sobre a «paternidade» da matéria, porque o que está aqui em causa é apenas uma medida entre outras que consideramos fundamentais para a reorganização e a formação do ensino superior, mas sobre a perspectiva da apresentação da medida, que foi a primeira a ser apresentada na discussão de âmbito sectorial sobre ensino superior no dia 17 de Junho de 2006, passo a ler o que foi dito pelo Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: «Primeira medida: será tornada obrigatória a recolha e divulgação de informação sobre o emprego dos diplomados de cada instituição do ensino superior nos últimos anos. Competirá ao Estado garantir a disponibilidade pública, assim como a qualidade e comparabilidade desta informação essencial para todos os candidatos do ensino superior».
Para nós, isto é objectivo.
O que está aqui em causa não é votar contra por votar contra. O que está em causa é que não faz sentido, do ponto de vista político, aprovar este projecto depois de esta medida estar a ser posta em prática e ter já a sua calendarização. Como sabe, apesar de a medida ser lançada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (a ideia é deste Ministério), a sua concretização é feita no seio do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social. Ou seja, este não é, propriamente, um processo simples de se concretizar. No entanto, o elemento fundamental e essencial, que é a relevância destes dados para os candidatos do ensino superior, está concretizado ou salvaguardado pela calendarização que lhe apresentei.
Os primeiros dados serão apresentados em Março de 2007 e em Junho de 2007 será feita a divulgação de todos os dados dos desempregados licenciados. Está, portanto, salvaguardada a importância da avaliação, por parte dos candidatos ao ensino superior, deste elemento importante. Tal como é importante para a esquerda, em termos de reorganização e de evolução do ensino superior, a concretização, em 2007, da agência de avaliação e acreditação dos cursos, porque vai trazer qualidade.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — É verdade que, durante algum tempo, passámos por um processo de democratização no ensino superior e é verdade que nesse período, considerando essa prioridade, foram cometidos alguns erros — hoje reconhecemo-los como erros —, mas é fácil avaliar, passados cinco ou dez anos, medidas que, na altura, eram compreendidas como prioritárias e essenciais para a democratização do ensino superior em Portugal.
Portanto, Sr. Deputado Pedro Duarte, objectivamente, o que lhe peço é que confirme, ou não, o que consta do Diário da Assembleia da República.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, queria, em primeira instância, agradecer ao Partido Socialista, em particular à Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, a generosidade com que me permite responder a esta questão.
Sr. Deputado Manuel Mota, ainda sobre a paternidade da iniciativa, e não sendo esta, tal como disse desde o início, a questão mais relevante deste debate, V. Ex.ª leu um excerto de um imenso debate que aqui travámos em Junho passado, mas vou ler-lhe também títulos de notícias de jornais do dia seguinte, todas elas publicadas a 17 de Junho (o debate teve lugar no dia 16): «Universidades vão ter de revelar saídas dos cursos», «Superior revela emprego», «Faculdades têm de revelar emprego a licenciados durante cinco anos», «Universidades divulgam onde trabalham ex-alunos».
Isto não é o que estamos a propor nem é o que o Governo defendia. Desde ontem, o Governo inverteu a sua posição, emendou a mão! É bom que fique claro.
Como referi, esta não é a questão mais importante, mas diz muito sobre a forma de estar, a transparência com que estamos na vida política. É por isso, Sr. Deputado, que o seu argumento é extraordinariamente frágil! Ou seja, se concorda com esta medida, se aqui nos vem dizer que até já está a ser preparada, algures, nos gabinetes ministeriais, pergunto-lhe: então, por que razão é que não a aprovam? Por que razão não dão mais força a esta medida?
O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — E por que razão é que a apresentam?
O Orador: — Sr. Deputado, V. Ex.ª pode ter contactos privilegiados no Governo e pode, com certeza, receber palavras de incentivo, em que lhe é explicado que o assunto já está a ser tratado entre determinados ministérios, com uma calendarização (que mais nenhum dos Srs. Deputados aqui presentes conhecerá) das metas e das medidas que vão ser tomadas no curto prazo. Mas, Sr. Deputado, o nosso papel não é sermos aqui vozes do Governo; o nosso papel, enquanto Deputados, é outro, o de assumirmos as nossas responsabilidades e as nossas convicções!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Portanto, se VV. Ex.as estão de acordo com este projecto de resolução, então vamos dar força a esta ideia! Se todos, conjuntamente, aqui o aprovarmos, aí sim, vamos ter a garantia, a salvaguarda de que esta medida vai ser implementada a bem dos portugueses.
Decididamente, é isso que nos move e espero, com sinceridade, que também seja o que move a bancada do PS.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Manuel Mota pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Manuel Mota (PS): — Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, considerando a relevância desta temática e compreendendo que a questão da paternidade desta medida tem apenas um elemento de relevância na questão do debate, a de perceber se os partidos estão atentos ao que se discute na Assembleia da República, considerando nós que esta Assembleia é mais importante do que qualquer jornal do ponto de vista factual do debate político, solicitava ao Sr. Presidente, se possível, que fizesse distribuir pelas bancadas, principalmente à bancada do PSD, o Diário da Assembleia da República do dia 17 de Junho de 2006, na sua página 6210, para que confirme, efectivamente, o que aqui foi discutido, nesta Assembleia, e não o que depois saiu nos jornais, no dia seguinte.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, fica registada a referência.
Srs. Deputados, concluída a discussão do projecto de resolução n.º 161/X, vamos dar início ao debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 201/X — Introduz o ensino multilingue nos estabelecimentos públicos de educação e de ensino (BE).
Para apresentar o projecto de lei, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal é cada vez mais um
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país multilingue. Um em cada dez alunos não tem como língua materna o português.
Em 2004, um estudo do Ministério da Educação registou 58 línguas diferentes nas 410 escolas inquiridas. Dessas línguas, o crioulo de Cabo-Verde, o guzerate, o mandarim e o ucraniano correspondem a 50% do conjunto das crianças e jovens que não têm o português como língua materna, sobretudo na zona da Grande Lisboa.
A modernização do ensino para garantir a sua qualidade exige, portanto, uma resposta ao problema do multilinguismo nas escolas. E é nas escolas que essa resposta deve ser dada.
O projecto de lei que o Bloco de Esquerda hoje submete a esta Assembleia representa uma estratégia para a integração de todos os estudantes na escola portuguesa, em coerência, aliás, com o que foi recomendado pelo Parlamento Europeu.
Essa estratégia tem como primeiro pilar a aprendizagem da língua portuguesa, que é e deve ser a língua de trabalho predominante e fundamental.
Todos os estudantes nas escolas portuguesas devem conhecer correctamente o português, e o Bloco de Esquerda só lamenta o facilitismo, a incompetência, a invenção de padrões desajustados e a desorientação que, muitas vezes, tem percorrido as orientações para o ensino do português, mudando programas ao sabor dos governos e diminuindo a exigência.
Vozes do BE: — Muito bem!
A Oradora: — A proficiência na língua portuguesa é determinante para o sucesso de todos e, por maioria de razão, para os que chegam. Ainda este ano foi publicado um despacho normativo que determina um esforço significativo na assunção do português como língua segunda. O Bloco de Esquerda só pode saudar este esforço assumido pelas escolas.
Ao mesmo tempo, nas escolas está a desenvolver-se o inglês, que é a língua de comunicação mais universal, e esse esforço, sempre que for competente, só pode merecer o aplauso de todos.
É necessário, então, acrescentar novas formas de aprendizagem que utilizem igualmente a língua materna dos estudantes, quando se trate de comunidades em grande número? A recomendação do Parlamento Europeu é a de que sim, sendo essa também a nossa resposta.
É necessário e é urgente porque é a forma de promover a qualificação dos estudantes e de dar-lhes a oportunidade e a responsabilidade de aprenderem; é necessário porque a língua materna é uma forma essencial de construção da pessoa e da sua comunicação quotidiana: em casa e no bairro, é na língua materna que as crianças e os jovens filhos de imigrantes comunicam e é com ela que também se fazem pessoas.
A escola não pode ser um lugar estranho nem, muito menos, hostil, porque assim dificultaria o sucesso escolar e aumentaria o abandono. Pelo contrário, é necessária a comunhão estreita entre as línguas maternas das crianças e dos jovens e a língua do país de acolhimento, o português, como língua de escolarização.
Esta é uma questão central para a próxima geração na sociedade portuguesa. E, simplesmente, é tempo de criar as condições para este desafio — desafio que começa nas escolas.
As experiências de ensino bilingue nos Estados Unidos, na Alemanha, no Canadá ou na França, onde a aprendizagem da língua materna é um direito reconhecido aos filhos de imigrantes no 1.° ciclo, são bons exemplos, exemplos que não podemos recusar.
Vejam, Sr.as e Srs. Deputados, o que se passa em França, onde nas escolas com, pelo menos, 25% de alunos portugueses ou filhos de portugueses algumas aulas são leccionadas em português; ou em Hamburgo, na Alemanha, onde um professor de português e outro de alemão estão presentes na sala de aula das crianças do 1.º ciclo.
Aplaudimos essa iniciativa em nome dos portugueses que vivem no estrangeiro e pedimos o mesmo para os estrangeiros que vivem entre nós — o que é bom para uns é bom para outros, e o que faz falta é a mesma política. Recusar aos imigrantes em Portugal o que queremos para os portugueses que emigram seria prova, Sr.as e Srs. Deputados, de racismo, o que é absolutamente inaceitável! Aliás, há boas razões, baseadas no sucesso da experiência, para promover o ensino apoiado do português e da língua materna de comunidades mais numerosas. É o que se está a fazer em Portugal em alguns jardins de infância, com experiências extraordinariamente positivas.
Em particular nos primeiros anos de escolarização, as crianças que não compreendem o português, ou o fazem com muitas dificuldades, devem ser apoiadas por um professor da sua língua materna e por um professor de português.
Propomos que se vá mais longe do que nestes primeiros anos de escolaridade, isto é, que, em contextos que o justifiquem, ou seja naqueles onde uma determinada comunidade imigrante tiver forte expressão, as turmas bilingues possam ser criadas noutros níveis de ensino para além do 1.º ciclo, tornando possível que se possa leccionar também uma ou mais disciplinas em língua parceira, ou que esta seja opção de segunda ou terceira língua, ou mesmo opção não curricular.
Vozes do BE: — Muito bem!
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A Oradora: — Estas são as escolhas abertas pelo projecto de lei do Bloco de Esquerda, que assume, claramente, a multi e interculturalidade no desenvolvimento das crianças, dos jovens e da sociedade em geral, a valorização da cultura das crianças e jovens filhos de imigrantes, os direitos de língua como direitos linguísticos destas crianças; que reconhece a escola pública como o espaço por excelência onde estes direitos devem ser consagrados; que assinala o ensino pré-escolar como o nível onde o ensino multilingue deve ser largamente apoiado e que o estende a outros níveis de ensino; que não esquece os adultos imigrantes, prevendo que as escolas assegurem o ensino do português aos imigrantes adultos em horário póslaboral ou fins-de-semana; que valoriza a aprendizagem do português como ferramenta essencial para o sucesso escolar dos alunos; e que defende a autonomia e responsabilidade das escolas pela educação multicultural, através do projecto educativo e de outras portas que são abertas, como o tratamento das questões multiculturais nas áreas curriculares não disciplinares e o investimento nas tutorias.
Este projecto de lei não obriga nenhuma escola a nada. Dá-lhes, sim, a possibilidade de escolher, de fazer as escolhas. Cabe ao Ministério da Educação a aferição da razoabilidade destas escolhas e à União Europeia o desafio de articular uma rede de escolas multilingues, tal como foi consagrado na resolução que o Parlamento Europeu aprovou em Outubro de 2005.
Sr.as e Srs. Deputados: A questão essencial que aqui trazemos é esta — o bilinguismo é uma necessidade no contexto multilingue, em particular para as crianças com maior dificuldade com o português e com a adaptação ao meio escolar, ou para aquelas que têm mais factores de risco para o abandono escolar. Os estudos sobre indivíduos bilingues demonstram que, ao contrário do que se pensou durante muito tempo, o bilinguismo é um apoio importante ao desenvolvimento intelectual e psicológico do indivíduo.
Como defende Isabel Aires de Matos, o ensino bilingue faz falta às crianças, «de maneira a serem acompanhadas durante os primeiros anos de escolaridade, deixando, assim, de estar abandonadas, para que anos mais tarde a sociedade não venha a ser vítima do gueto para onde a escola as atirou».
O estudo Diversidade Linguística na Escola Portuguesa afirma que «Quando se verifica a existência de um contexto multilingue em situação formal de ensino, devem criar-se condições para que os falantes comuniquem entre si sem perderem a sua identidade linguística e cultural».
Rui Marques, Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas, no prefácio da obra de Dulce Pereira, Crescer Bilingue, escreve que «Num contexto de construção de uma sociedade intercultural, a defesa do bilinguismo tem todo o sentido e representa uma expressão concreta de respeito pela diversidade. Proporciona a cada uma destas crianças, descendente de imigrantes, a possibilidade de, simultaneamente, se sentir com um lugar pleno na sociedade de acolhimento e de manter o vínculo às origens.» Pretende-se, assim, sublinhar a igualdade dos direitos educativos e o reconhecimento dos direitos de língua que assistem a todas crianças e jovens, criando melhores condições para o sucesso escolar e favorecendo a integração das segundas e terceiras gerações de imigrantes.
O ensino multilingue é parte das escolhas da democracia e da modernidade, porque, voltando a Dulce Pereira e à experiência de ensino bilingue nos jardins-de-infância do bairro 6 de Maio e Marvila 3 e às razões com que justifica o registo desta experiência na obra Crescer Bilingue: «a realidade deste projecto foi boa. Enleou-nos de prazeres inesperados, vislumbres de compreensão, certezas de mudança, sensações de bem-estar em crianças e adultos… Deixemos, pois, dela memórias, percursos e ideias (…) transportes para outros voos e golpes de asa, para um pouco mais de azul.» Com «um pouco mais de azul» podemos melhorar o nosso sistema educativo e responder a alguns dos seus problemas. Sabemos que esses problemas estão a crescer e vão crescer no futuro imediato — é preciso que as soluções cresçam também. Este é o desafio que aqui trazemos.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A fixação em Portugal de diversas comunidades imigrantes constitui, sem sombra de dúvida, uma importante mais-valia económica e cultural para o País. O acolhimento destas comunidades e a garantia dos seus direitos deve ser constante preocupação do Estado.
Da convivência multicultural e multiétnica, as populações criam novos ambientes culturais e sociais, ambientes mais ricos e capazes de garantir a permeabilidade entre as diferentes comunidades e etnias. Por isso mesmo, o Estado deve também contribuir para a preservação das culturas, num regime de troca e permuta e no sentido do seu mútuo enriquecimento. O Estado deve, sem dúvida, criar os mecanismos de apoio e de estímulo que propiciem este ambiente.
O projecto de lei que o Bloco de Esquerda hoje apresenta traz-nos a identificação de um problema e de uma insuficiência reais. A dissolução da variedade cultural e a constante tentativa da sua absorção e formatação nos padrões da cultura portuguesa, onde tem tido papel importante o sistema de ensino, deve ser combatida. De facto, suprimir as línguas estrangeiras nas escolas portuguesas não contribui para uma verdadeira integração, mas para uma gradual diluição que, como sabemos, dará origem a graves problemas
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sociais, entre os quais o insucesso e o abandono escolares e, em última análise, a segregação social.
No entanto, a forma como o projecto de lei sugere agir sobre o problema correctamente identificado parece ainda pouco fundamentada em experiência factual. Ministrar aulas em línguas distintas, de forma simultânea, apresentando a virtude de proporcionar a todos o contacto com uma língua que não a sua, não nos parece, no entanto, a ideia mais ajustada à realidade das escolas e do universo estudantil que se pretende atingir.
O essencial do projecto de lei, contudo, constitui uma abordagem positiva e sugere passos para a melhoria de uma situação que carece de acção política. O apoio efectivo a acções escolares que visem a integração e a promoção da tolerância e da convivência multicultural; o apoio ao ensino da língua portuguesa a imigrantes e a estudantes que não a tenham como língua materna; a possibilidade de aprender línguas maternas que não o português como segunda língua estrangeira e a formação de docentes no sentido do enriquecimento das suas capacidades para ensinar num ambiente multicultural são passos importantes que merecem o apoio do PCP.
No entanto, experiências mais avançadas, como as aulas bilingues e a forma como estas são ou devem vir a ser feitas, parecem carecer de maior experiência e capacidade de avaliação objectivas. São significativas as dúvidas que surgem em torno dessa medida concreta e da forma como seria levada a cabo. Contudo, embora a solução possa não receber o nosso aplauso, convergimos no sentido de adoptar criativamente formas de integração real e de valorização das línguas como expressões culturais de inestimável valor cuja preservação é fundamental. A integração dos imigrantes ou dos seus descendentes deve ser uma prioridade do sistema educativo e as próprias orientações do projecto de lei podem servir de base para esse trabalho, nomeadamente no que toca à criação de medidas de apoio a iniciativas escolares de valorização de culturas estrangeiras. É um caminho seguro e capaz de fornecer a experiência pedagógica num registo mais gradual e capaz de ser avaliado.
Apoiamos a criação de um programa de estímulo à iniciativa escolar no sentido da promoção da tolerância e multiculturalidade e, embora não consideremos criadas as condições para uma aplicação plena deste projecto de lei em toda a sua amplitude, daremos o nosso contributo para a sua discussão na especialidade em sede de comissão.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nos últimos anos, Portugal transformou-se também num país de imigração. Com a chegada de muitas dezenas de milhares de cidadãos estrangeiros a Portugal, o nosso país passou a conhecer o outro lado do fenómeno das migrações.
De país com quase 5 000 000 de emigrantes espalhados por 121 países de todo o mundo, passou igualmente a país com cerca de 500 000 imigrantes legais, que actualmente representam já quase 10% da nossa população activa e 5% da nossa população residente, oriundos de mais de 150 países de todo o mundo.
Os desafios para a integração destes cidadãos estrangeiros são incomensuráveis. Nos últimos anos, sobretudo por acção dos XV e XVI Governos Constitucionais, pôs-se em prática uma verdadeira política de imigração com vectores-chave de actuação muito claros. Entre outras medidas, foram criados o Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas, o Observatório da Imigração, dois Centros Nacionais de Apoio ao Imigrante, 50 Centros Locais de Apoio ao Imigrante, a Linha SOS Imigrante, o programa «Escolhas 2.ª Geração» e um Gabinete de Apoio ao Reconhecimento de Habilitações e Competências, além de muitos outros instrumentos de concertação de uma política de imigração assente não só no pilar da segurança interna mas também no pilar do acolhimento e integração. Recordo que, ainda recentemente, no debate na nova lei da imigração, os Ministros António Costa e Silva Pereira reconheceram a importância destes instrumentos.
O PSD, em matérias de integração, tem um trajecto com provas dadas e está permanentemente disponível para, de forma clara e segura, dar mais e mais passos que, efectiva e objectivamente, promovam a integração dos imigrantes no seio da nossa sociedade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estudos recentes atestam que, até ao ensino secundário, temos uma população estudantil que fala cerca de 230 línguas maternas diferenciadas. Assim, as necessidades de concretização de políticas na área da educação e formação direccionadas para esta população devem ser bem ponderadas e devem efectivamente promover a integração.
O projecto de lei que debatemos, partindo de matérias importantes que merecem uma reflexão positiva por todos nós, é, contudo, redutor e suscita a nossa rejeição nalgumas soluções. É verdade que invoca o «relatório Portas», mas este tinha uma amplitude e uma abrangência completamente diferentes das que agora nos são apresentadas. Tendo por base um relatório que visa aplicar-se a uma realidade de populações imigrantes extra-União Europeia, o BE exemplifica com o case study de uma experiência realizada em Hamburgo com cidadãos da União Europeia, no caso crianças portuguesas.
O relatório aponta diversos caminhos, referindo-se ao apoio por parte da União aos projectos educativos que, «para lá das suas obrigações curriculares, ensinem a língua e a cultura do país de acolhimento aos
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imigrantes que não estejam em idade escolar», bem como aos que construam pontes de diálogo entre a cultura e a história da região em que se inserem e a cultura e a história das comunidades de imigração.
Frisa ainda o mesmo relatório que devem ser tidos em conta, nomeadamente, os projectos que associam as pessoas a quem cabe o exercício do poder paternal, em especial as mães.
O relatório, ao qual este projecto de lei foi beber apenas uma das suas exortações, incentiva o patrocínio da União Europeia à constituição de uma rede europeia de escolas que espontaneamente desejem concretizar projectos educativos e comunitários que respondam às necessidades de aprendizagem, socialização e cultura referidas, sem esquecer o princípio da subsidiariedade.
O relatório afirma ainda que «a integração dos imigrantes na escola não se deve processar em detrimento do desenvolvimento da língua veicular do sistema educativo, especialmente se esta língua se encontra em situação minoritária», o que contrasta claramente com as turmas multilingues com dois professores e «um terço» de alunos de língua materna portuguesa, que o Bloco de Esquerda propõe no seu projecto!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD rejeita o caminho que o Bloco de Esquerda hoje nos propõe. Mais importante e decisivo do que este projecto de lei teria sido o voto favorável do Bloco de Esquerda, em Março de 2006, ao projecto de resolução que então apresentámos, que propunha a criação de um programa denominado “+ Inclusão”. As medidas que então apresentámos visavam o reforço da integração dos imigrantes, com a criação, em cada escola ou agrupamento de escolas, de equipas multidisciplinares de apoio especializado, compostas por professores, assistentes sociais, sociólogos e psicólogos, que interviriam em articulação com todos os parceiros institucionais e também com as comunidades imigrantes. Foi este tipo de intervenção global, mobilizadora e potenciadora de uma verdadeira integração que o Bloco de Esquerda então rejeitou.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — É verdade!
O Orador: — Não é com a criação de quotas de portugueses nas salas de aulas que se promoverá a integração. Esta nunca se fará por decreto ou por lei.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Não sabe do que fala!
O Orador: — É pelo reforço da autonomia das escolas que estas poderão, se assim o desejarem, reforçar os projectos multiculturais que já existem. É com mais autonomia e com o envolvimento das comunidades na definição dos diferentes projectos educativos que as escolas promoverão a integração dos jovens imigrantes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Para isso é necessário que este Governo, e também o Bloco de Esquerda, abandonem o modelo centralista de gestão das escolas e dos seus recursos. É preciso dotar as escolas de competências e meios, reduzindo os espartilhos de organização e gestão, para que casa e escola possam livremente definir o modelo que melhor se adapte ao reforço da integração das comunidades imigrantes.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Vai ser uma integração fantástica!
O Orador: — E aqui não temos dúvidas em afirmar que, antes de chegarmos ao ensino multilingue, temos de aumentar a integração pelo reforço do ensino da nossa língua nos jovens e também no restante agregado familiar e pelo reforço da interculturalidade entre as diferentes comunidades.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Este é o caminho que defendemos e em que acreditamos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda, ao lançar este debate, partiu de um bom princípio para um mau projecto. Partiu de uma boa ideia para uma má concretização da mesma e, deste modo, o PSD votará contra este projecto de lei.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda vem
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apresentar o projecto de lei n.º 201/X, que pretende introduzir o ensino multilingue nos estabelecimentos públicos de educação e ensino. Este projecto de lei é mais um dos exercícios demagógicos do Bloco de Esquerda.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — É sabido que, só nas escolas de Lisboa, convivem alunos que falam 17 línguas diferentes, havendo turmas onde existem alunos de mais de 10 nacionalidades e línguas diversas. Perante isto, o Bloco de Esquerda propõe que, na mesma aula e em simultâneo, se falem todas estas línguas e dialectos?! Dirão que todos não, mas apenas as línguas e dialectos daqueles que são a maioria. Mas, então, «atirase pela janela» aquilo que este diploma queria proteger: as minorias e o multiculturalismo.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — O respeito e a consideração que nos merecem todos os imigrantes e, muito em particular, todos aqueles que querem voluntariamente estar no nosso país, aceitando todas as condições que temos para oferecer, em igualdade de circunstâncias com os nossos nacionais, impõem que tenhamos para com eles especial atenção. Entre outras coisas, devemos ser capazes de lhes permitir a aquisição de aprendizagem e de formação para o país em que querem estar inseridos, aceitando que a inserção não é um processo de corte com a sua cultura, com a sua língua, com a sua religião ou com o seu passado.
Para nós, o mais importante é que os imigrantes e seus filhos possam falar português e ter acesso ao mesmo currículo de formação dos seus colegas portugueses, em igualdade de oportunidades proporcionadas aos nacionais.
No relatório do Parlamento Europeu afirma-se o seguinte: «Os filhos de imigrantes em idade escolar têm direito ao ensino público. (…) Esse direito inclui a aprendizagem da língua do país de acolhimento, sem prejuízo do direito destas crianças à aprendizagem da sua língua materna.» Quem o afirma é o Eurodeputado Miguel Portas, o relator deste documento. Este, sim, é um verdadeiro e primeiro direito com vista à integração dos imigrantes e dos seus filhos.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Leu, mas não percebeu!
O Orador: — Portugal foi e ainda é um país de emigrantes, mas tornou-se mais recentemente num país de imigrantes, que deve saber acolher. Mas é ou não verdade que todos os cidadãos residentes em Portugal devem saber falar e escrever bem português? A língua estrangeira ensinada no 1.º ciclo já pode hoje ser a língua materna do aluno. Por outro lado, já existe actualmente a possibilidade de se escolher a língua materna como segunda ou terceira língua, no caso dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e secundário. Veja-se, por exemplo, o que dispõe o Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro, e o que refere o currículo nacional do ensino básico, a partir da pág. 39 e seguintes. Este projecto de lei está, portanto, e nestes casos, atrasado em já vários anos.
As inovações que contém são, contudo, impraticáveis. Se não, vejamos: como se pode ter, na mesma aula e em simultâneo, um professor que fala português, outro que fala crioulo, ou ucraniano, ou mandarim, ou inglês, ou francês, ou árabe?! Para mais, dirigindo-se a alunos que falam crioulo, ucraniano, mandarim, inglês, francês ou árabe, para além de português! Somos, como sempre temos demonstrado, defensores da liberdade de escolha, defenderemos sempre e contra quem quer que seja o direito de todas as minorias, mas não entendemos como se podem obrigar a alunos cuja língua materna é o português a frequentar turmas de ensino bilingue. Ora, de acordo com o artigo 4.°, n.º 3, do projecto de lei, 30% das turmas bilingues devem ser constituídas por alunos de língua materna portuguesa. Será que, havendo alunos interessados em frequentar aulas na sua língua materna, serão impedidos de o fazer por não haver alunos portugueses interessados? Deve, como já hoje é possível através da lei em vigor, o Estado possibilitar a todos os cidadãos, sejam eles nacionais ou filhos de imigrantes, o direito de escolha da língua estrangeira que querem aprender. O combate de atitudes racistas, xenófobas ou étnicas faz-se pela integração de todos, no respeito pela sua diferença e na criação de regras que possibilitem às minorias a manutenção da sua cultura, onde se inclui, obviamente, a língua.
Porque o projecto de lei apresentado pelo Bloco de Esquerda em nada contribui para a melhoria da qualidade de ensino em Portugal, porque não apresenta nenhuma novidade que possa melhorar a integração dos imigrantes e porque não passa de um projecto de mera demagogia política, o CDS votará contra.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Barros.
A Sr.ª Paula Barros (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os fenómenos migratórios são qua-
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se tão antigos quanto a existência de vida. A luta pela sobrevivência determinou-os. A espécie humana não fugiu a esta regra e, portanto, desde os primórdios da história da humanidade que nos é permitido estudar fenómenos de nomadismo presididos pela necessidade de procura de melhores condições para a garantia de satisfação das necessidades mais básicas, como a da própria alimentação.
Na actualidade, vivemos fenómenos de crescentes movimentos migratórios não só na busca de melhores condições de vida como também, e felizmente, como processo de opção e expressão de vontade.
Em consequência, Portugal, um país com elevada percentagem de emigrantes, passou também a país de acolhimento de muitos movimentos de imigração. Por este motivo, penso não exagerar se disser que é não só responsabilidade mas também vontade e dever de todos colaborar, potenciando a criação de melhores condições de acolhimento e, acima de tudo, de inclusão dos nossos imigrantes.
É com base neste pressuposto que analisamos atentamente o projecto de lei n.º 201/X, hoje apresentado pelo Bloco de Esquerda, que aponta para a introdução do ensino multilingue nos estabelecimentos públicos de educação e de ensino.
Se, por um lado, encontramos neste projecto uma preocupação legítima e louvável com a inclusão da população imigrante, não podemos deixar, por outro lado, de fazer um reparo à sombra de um dedo apontado, acusador das comunidades imigrantes como responsáveis pelos fenómenos de violência e marginalidade.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Que disparate!
A Oradora: — Não consideramos que estes fenómenos devam ser associados às minorias migrantes.
Essa é uma verdadeira forma de discriminação.
Entendemos que a inclusão deve ser olhada de acordo com diversas vertentes e que maiorias e minorias devem aprender a conviver saudavelmente, sem que reciprocamente se absorvam ou prejudiquem, antes se constituindo esta convivência como um processo construtivo, potenciador de oportunidades. A multiculturalidade resultante deste processo de convivência já é olhada com relativa naturalidade e respeitada. Aliás, ao nível das comunidades educativas temos, felizmente, exemplos de muito boas práticas de educação intercultural.
Mas, acima de tudo, gostávamos de deixar bem expresso que entendemos que a preocupação com a inclusão dos imigrantes passa pela capacidade de lhes propiciar igualdade de oportunidades para a participação crítica e activa na nossa sociedade, que para eles funciona como de acolhimento. E não tenhamos ilusões: o domínio da língua portuguesa é de primordial importância para que o processo de inclusão se efective. É por isso que vemos com bons olhos todos os esforços que têm sido desenvolvidos no que respeita ao apoio aos alunos imigrantes na aprendizagem da língua portuguesa.
Naturalmente, defendemos e apoiamos todos os projectos que versem também a aprendizagem das suas línguas maternas. A este nível, as comunidades educativas estão dotadas de autonomia para os idealizar e desenvolver no âmbito dos seus projectos educativos. E quem melhor que as próprias comunidades educativas para o fazer conscientemente e com a capacidade de resposta máxima para as situações que vivenciam em concreto? É que, a este nível, o Bloco de Esquerda faz jus à sua genética centralista e mais uma vez nos confronta com uma posição de afastamento das realidades concretas, como se existisse, unicamente, um cérebro central com capacidade para avaliar e decidir sobre as situações.
Acreditamos, pois, nas boas práticas das escolas e comunidades educativas no que concerne ao respeito pela multiculturalidade e à promoção de uma educação intercultural. Revemo-nos em políticas inclusivas que visem a igualdade de oportunidades na aprendizagem da língua inglesa, como meio de comunicação fundamental para capacitar os indivíduos para um verdadeiro exercício de cidadania numa sociedade globalizada. Revemo-nos ainda em políticas que tenham por objectivo o reforço da aprendizagem da língua portuguesa por todos os que, tendo-a por língua materna, manifestam dificuldades na sua prática e por todos os demais em relação aos quais o Estado tem o dever de promover o seu domínio como verdadeiro motor de inclusão numa sociedade em que escolheram viver.
Assim, o projecto de lei aqui apresentado pelo Bloco de Esquerda, para além de ser tecnicamente frágil, na medida em que não parte de um diagnóstico consistente da realidade escolar portuguesa nem aponta reais mecanismos de operacionalização das suas propostas, ainda não compactua com o nosso entendimento de inclusão como a capacidade de facilitar e de incentivar a participação de todos, em real igualdade de oportunidades, na sociedade onde se encontram inseridos.
Não podem, contudo, acusar o Partido Socialista de estar isolado. Não temos de ir mais longe do que ao dia de ontem, no qual, numa visita a uma escola que se constitui como um verdadeiro exemplo de boas práticas de educação intercultural, o Sr. Deputado Francisco Louçã foi confrontado com a posição discordante do respectivo presidente do conselho executivo face ao conteúdo do projecto de lei aqui em análise.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Ouviu mal!
A Oradora: — Sabemos que não podemos estar desatentos nesta matéria, mas tal passa por saber corresponder às necessidades reais que outros, em convívio directo com as situações, estão, neste momento,
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mais habilitados do que nós para diagnosticar, propondo soluções. Acreditemos neles e saibamos apoiálos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Partido Ecologista «Os Verdes» acompanha, em geral, as preocupações expressas na exposição de motivos do projecto de lei n.º 201/X, do Bloco de Esquerda.
Hoje, a escola portuguesa, como a nossa sociedade, é cada vez mais plural, diversificada, cosmopolita e composta por pessoas das mais diferentes proveniências, trazendo consigo a sua história, cultura e, em muitos casos, a sua língua. Esta realidade, criada também pelos muitos imigrantes que trabalham no nosso país, contribuindo para o seu crescimento, desenvolvimento e riqueza, veio tornar ainda mais clara uma realidade de sempre – cada aluno é uma pessoa individual, com características individuais, à qual a escola pública (que se quer cada vez mais inclusiva, democrática e igualitária) tem o dever e a responsabilidade de procurar dar resposta, indo ao seu encontro, estabelecendo a comunicação, o contacto e a efectiva transmissão de conteúdos e da vontade de aprender.
No caso dos alunos portadores de outra língua materna, esta necessidade é ainda mais premente, o que resultou claro da exposição de motivos do projecto de lei do Bloco de Esquerda. Por outro lado, a necessidade de dar resposta aos filhos de imigrantes, quer estejam em situação de legalidade ou não, é fundamental, pelo que gostaríamos de realçar essa preocupação no projecto de lei do Bloco de Esquerda.
Em nosso entender, este projecto de lei encerra questões profundamente positivas, que merecem, por isso, a nossa aprovação. Refiro-me, por exemplo, à necessidade de reforçar os meios na escola pública para dar resposta a estas populações portadoras de uma língua materna diferenciada. Há questões profundamente positivas, que merecem por isso a nossa aprovação, designadamente pela necessidade de reforçar os meios na escola pública para dar resposta as estas populações portadoras de uma língua materna diferenciada.
Contudo, há questões de pormenor e de aplicação prática que nos parece ser fundamental analisar em sede de especialidade, que são as questões que se prendem com aspectos pedagógicos e de aplicação prática à realidade das escolas portuguesas, das quais dependerá a sua efectivação e a obtenção de resultados positivos. É fundamental estudar tudo isto na especialidade e para isso estamos disponíveis.
O Sr. Presidente: — Para uma nova intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, Sr. Deputado Miguel Tiago, quero agradecer-vos o reconhecimento que fizeram de que a proposta que hoje aqui apresentamos merece reflexão e aprofundamento, merece um debate sério, muito mais sério do que foi aqui assumido nesta Assembleia.
Nem o PSD nem o CDS-PP leram o «relatório Portas», o que é extraordinário. Ou se leram, não perceberam.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — É o mais provável!
A Oradora: — E, para além de não terem lido o «relatório Portas», não leram o projecto de lei do Bloco de Esquerda. Não leram!
Protestos do Deputado do CDS-PP Abel Baptista.
Não leu, Sr. Deputado. Não percebeu. Ou não pode sequer perceber, e essa é a questão fundamental.
É que a questão fundamental é que aquilo que serve para os filhos dos emigrantes portugueses não serve, pelos vistos, para os outros! Esta é que é a questão, para a qual os senhores não têm resposta!
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Chama-se racismo!
A Oradora: — Para os senhores, imigrantes, pelos vistos — e foi o que depreendi da intervenção do Sr. Deputado Emídio Guerreiro —, são os europeus, os europeus brancos, Sr. Deputado.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Exactamente!
A Oradora: — Portanto, foi essa a leitura, enviesada, que o senhor fez do «relatório Portas», sendo
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essa a questão determinante na vossa leitura.
Depois, há erros de interpretação que são de um primarismo gritante.
A proposta apresentada pelo Bloco de Esquerda abre várias portas, e os senhores sabem-no. A língua parceira pode ser língua segunda, língua terceira, pode ser uma opção extracurricular, e as turmas bilingues adaptam-se a contextos onde uma comunidade imigrante tem uma expressão significativa ou maioritária.
Este é o contexto da adopção desta estratégia, que é uma opção das escolas, que respeita a autonomia das escolas e que envolve os pais no processo. Mas os senhores «estão-se completamente nas tintas» para isso! Não vos interessa fazer a discussão de fundo.
Além disso, Sr.ª Deputada Paula Barros, tenho a dizer-lhe que o presidente do agrupamento que ontem visitámos — que, não sei se sabe, tem 85% de imigrantes, 75% dos quais são crianças e jovens oriundos dos PALOP — manifestou-se favorável à introdução de turmas bilingues no 1.º ciclo. É, pois, preciso gerir toda a informação para conseguirmos falar com alguma seriedade destas matérias. Efectivamente, os Srs. Deputados e as Sr.as Deputadas perderam uma oportunidade de discutir uma questão fundamental para o futuro.
Este é o desafio que falta fazer! Trata-se do futuro das segundas e terceiras gerações de imigrantes.
Repito, é um desafio fundamental e é um desafio da modernidade, a que os senhores se recusaram.
Os Srs. Deputados invocaram o português. É evidente que o português é a língua da escolarização.
Mas com o nosso projecto de lei esse aspecto não está minimamente comprometido! Nem um pouco! O que está comprometido é um passado que, por exemplo, no programa de língua portuguesa para o ensino secundário fez «esfumar» Gil Vicente. Isto é que é não saber o que se quer com a língua portuguesa! Não está em discussão a língua segunda e o esforço que foi feito do português como língua segunda. Se querem discutir com alguma seriedade, pensem efectivamente no que fizeram com os programas do ensino secundário e por que é que fizeram «esfumar» Gil Vicente ou Fernão Lopes! A Sr.ª Deputada Paula Barros há pouco falou de um «dedo acusatório», mas «dedo acusatório» é aquilo que o Partido Socialista aqui nos está a deixar perante uma discussão que deveria ser profunda e séria. O dedo acusatório que é feito é um dedo acusatório para o futuro, que aponta para estas crianças e estes jovens a quem estão a recusar os direitos de língua como direitos fundamentais e a quem estão a recusar que a escola pública tenha uma palavra essencial no reconhecimento e valorização das línguas de origem como línguas de construção das pessoas. As Sr.as e os Srs. Deputados sabem disto perfeitamente. São línguas do quotidiano. E o que os senhores dizem a estas crianças e a estes jovens é que eles não têm direito.
Protestos do PS, do PSD e do CDS-PP.
Eles não têm direito! Foi o que os senhores disseram dessas bancadas! Não têm direito! Isso não lhes interessa! E as segundas e terceiras gerações de imigrantes, o futuro deste País não vos interessa, porque a vossa leitura é que imigrantes, pelos vistos, são só alguns. E aquilo que querem para os filhos dos portugueses para os outros não serve,
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito rapidamente, gostaria de dar conta do seguinte: de facto, não sei o que as outras pessoas lêem ou deixam de ler, mas sei o que leio e sei aquilo que estudo. Além disso, muito sinceramente, não me incomoda muito que, em sede de debate parlamentar, se façam determinadas acusações. A última coisa que estava à espera hoje era de ser acusado de racista. Mas, sinceramente, passa-me ao lado, porque não é isso que está em causa, não é isso que eu sou, por isso passa-me ao lado.
Mas, nesta matéria, em que estamos a falar de inclusão e de integração das comunidades imigrantes, não posso deixar de fazer novamente referência àquilo que já disse há pouco, ou seja, para que esta matéria seja uma coisa séria e profunda, penso que é importante relembrar que foi criado o Alto Comissariado para a Integração das Minorias Étnicas, o Observatório da Imigração, Centros de Apoio ao Imigrante, a nível nacional e a nível local, uma linha SOS, o programa Escolhas 2.ª geração, dirigido especificamente para as comunidades imigrantes, um gabinete de apoio para o reconhecimento das habilitações literárias dos imigrantes, ou seja, um conjunto de medidas que os governos que antecederam este levaram a cabo, que promovem, de forma efectiva, a integração das comunidades imigrantes.
Também não posso deixar de referir que, quando discutimos aqui, em Março do ano passado, portanto há poucos meses, um projecto da autoria do PSD, não ouvi o Bloco de Esquerda manifestar-se a favor da criação das equipas multidisciplinares que, então, nós preconizávamos nas escolas e nos agrupamentos de escolas, com psicólogos, sociólogos, assistentes sociais, professores e com o envolvimento das comunidades imigrantes…
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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Votou contra! O Orador: — …e dos representantes das famílias, enfim, não só dos alunos mas também das famílias. O Bloco de Esquerda votou contra.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Afinal, amuou!
O Orador: — Ou seja, para o Bloco de Esquerda a inclusão e a integração faz-se por isto, faz-se pelo projecto que agora aqui trouxe. É uma coisa fantástica! Mas não posso deixar de recordar à Câmara que, numa peça televisiva, ontem à noite, ouvi o Sr. Presidente do agrupamento a falar, mas também ouvi um conjunto de alunos, um conjunto de jovens imigrantes que disseram ser muito interessante mas que, sobretudo, era preciso reforçar o português, porque para poderem ter sucesso neste País precisavam, cada vez mais, de saber português. É que, como dizia esse conjunto de jovens nessa mesma peça, nas suas casas já falam a língua materna dos seus pais e, por isso, gostariam era que a escola reforçasse o português. Foi nesse sentido que, de facto, apresentámos, anteriormente, um projecto e é esse o caminho que o PSD defende: uma inclusão e uma integração que não seja pontual e, sobretudo, que não seja residual. Aliás, é este também o sentido do «relatório Portas», contrariamente ao que acontece com o projecto que estamos hoje aqui a discutir. O que estamos hoje aqui a discutir é uma coisa muito mais pequenina e muito mais isolada.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas deixar três registos simples sobre o debate que aqui tivemos.
A divergência entre o Bloco de Esquerda e, em particular, as bancadas da direita, e presumo que também a bancada do Partido Socialista, incide em três questões.
Em primeiro lugar, na avaliação das experiências concretas com emigrantes portugueses em França e na Alemanha. A utilização do argumento que aqui é apresentado pela direita e pelo Partido Socialista exclui por completo o sucesso extraordinário com as crianças portuguesas em França, onde aprendem em francês, como têm de aprender, e também português, o que é útil para a sua aprendizagem escolar.
Na Alemanha acontece o mesmo.
Mas o que é bom para os portugueses em França é péssimo e impossível para os angolanos ou para os cabo-verdianos em Portugal… Nem pensar…! Abrenúncio Satanás…! Nunca tal pode acontecer…!
Protestos do Deputado do PSD Emídio Guerreiro.
Em segundo lugar, temos a experiência concreta. Diz o Deputado do PSD: «Fizemos muito!», «Alto Comissariado!». É verdade! Devia ouvir o que diz o Alto Comissário, Rui Marques, sobre esta matéria, porque ele defende exactamente este projecto,…
Protestos do Deputado do PSD Emídio Guerreiro.
… a partir da experiência de ensino bilingue que já há no ensino pré-primário e até no 1.º ciclo em Portugal.
Além disso, é extraordinário, porque estamos a introduzir uma segunda língua no ensino em Portugal, que é o inglês. Há aulas na universidade que já só são dadas em inglês e é natural que, nos outros níveis de ensino, se ensine cada vez mais o inglês. Só aplaudimos isso! Mas já não podemos aceitar que, para outras crianças, em particular de comunidades que têm maiores dificuldades de escolarização, não haja a possibilidade de maximizar a sua introdução no sistema escolar, como se faz noutros países.
Inclusive com as crianças portuguesas, já não é possível.
Mas, em último lugar, dizem os Srs. Deputados que é preciso reforçar o português. Pois claro que é! O português é a língua veicular, é a língua de base do sistema. Todos os estudantes têm de saber muitíssimo bem o português, porque é em português que vão fazer os testes e que vão ser avaliados. O que nós queremos é criar um sistema que ajude a percepção do português e de todas as matérias.
Mas temos de lembrar ao Governo do Partido Socialista que ninguém fez pior ao ensino do português do que os Governos dos últimos anos. Quem é que inventou a terminologia de aplicação no ensino secundário, senão o CDS e o PSD?! Quem é que inventou a terminologia para o ensino secundário, com o substantivo canino com quatro patas e outros?!… Quem é que o fez, senão o CDS e o PSD quando estiveram no Governo?! Lembram-se de alguma coisa pior que tenha sido feita à competência do ensino do português do que a vossa passagem pela educação?! Lembram-se?! Tirar o Gil Vicente, como foi
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lembrado, ou impedir que Luís de Camões seja aprendido pela grande maioria dos estudantes no ensino secundário?! Querem falar-nos do reforço do português, depois de um currículo e de uma habilitação lamentáveis dos Governos de direita em relação ao português?! O português tem é de se defender dos Governos de direita e, por isso mesmo, promover a capacitação das escolas, que é o objectivo deste projecto, respondendo à diversidade que hoje têm os grupos destas escolas, exige olhar para a experiência. E talvez fosse bom pensar nas recomendações do Alto Comissário e segui-las. Se assim fosse, este projecto seria aprovado por unanimidade.
Vozes do BE: — Exactamente!
O Sr. Presidente: — Para uma segunda intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Paula Barros.
A Sr.ª Ana Paula Barros (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta minha inscrição para uma segunda intervenção não deixa de, de alguma forma, ser inspirada numa certa insistência, da parte da Sr.ª Deputada Cecília Honório, no que respeita à falta de seriedade. É que, nesse aspecto, devo dizer-lhe que revela uma certa arrogância intelectual…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Certa, não! Muita!
A Oradora: — … que não pactua com os princípios da tolerância que constantemente aqui invocam, em todos os projectos que, sucessivamente, vão apresentando.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — É típico daquela bancada!
A Oradora: — Mas gostava também de saber de que forma é que consideram sério invocar exemplos de outros países onde não existe a prática daquilo que aqui propõem. Em França, não há prática de ensino de turmas bilingues! Para além do mais, consideram sério deturpar aquilo que é dito pelos outros Deputados, quando aquilo que propõem é exactamente o reforço da língua portuguesa?! Sim! Consideramos que isso é fundamental para o processo de inclusão. A inclusão só se efectiva com o reforço da língua portuguesa. Mas isto não obsta a que as comunidades educativas optem também por incluir, nas actividades de enriquecimento, as línguas maternas dos alunos de comunidades imigrantes que estejam presentes nessas comunidades educativas.
Lembro mais uma questão: com certeza, também não consideram séria a aprovação que foi feita, por esta Assembleia, da Lei da Nacionalidade, que marcou, definitivamente, uma conquista de direitos por parte dos nossos imigrantes.
Vozes do PS: — É verdade!
A Oradora: — Isto é sério, isto é trabalhar em prol da inclusão dos nossos imigrantes!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito rapidamente, no final deste debate, gostaria de salientar aqui três pontos que me parecem essenciais.
O primeiro ponto é o de que estamos a falar de imigração e de comunidades migrantes em Portugal e creio que não é sério, nem para este Parlamento, nem para o exterior, nem para as comunidades migrantes, que se trate o ensino bilingue como se fosse uma «grande conquista», ainda por cima — e digo isto com todo o respeito pelos Srs. Deputados subscritores — nos termos em que o projecto de lei aqui apresenta.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Ah! Não é sério?!…
A Oradora: — Aos olhos da bancada do PS, o projecto que o Bloco de Esquerda aqui apresenta não parece que sirva a necessidade de falar de um conceito mais lato e mais importante, e que não pode ser confundido com multiculturalismo, que é o conceito de integração dos próprios migrantes em Portugal.
Neste debate, e é esta a segunda nota que quero deixar, confundiram-se muito os conceitos, e também não é sério «falar, porque fica bonito», falar de inclusão, de integração e de multiculturalismo,…
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O Sr. Francisco Louçã (BE): — O que é isso do «não é sério»?! A Oradora: — … que são três questões diferentes, são três questões que exigem uma conceptualização como deve ser. E mais, Sr. Deputado Francisco Louçã: tenho muito respeito por si, mas o Sr. Deputado e a Sr.ª Deputada Cecília Honório quiseram aqui insultar todos os Deputados.
Protestos do BE.
E, portanto, não termino este debate sem dizer também ao Sr. Deputado que para nós, Partido Socialista, e depois das várias…
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Isto não é a Madeira!
Vozes do CDS-PP: — Também não é a Albânia!
A Oradora: — Ó Sr. Deputado Francisco Louçã, como me conhece, sabe perfeitamente que se há princípio por que zelo, aqui, é o da tolerância, o do respeito e o da democracia e, sobretudo, da tolerância entre todos nós e pela opinião de todos nós!
O Sr. Francisco Louçã (BE): — É o que está a dizer!
A Oradora: — Mas os senhores não podem arrogar-se o direito de dizer que todos nós faltámos com seriedade política a este debate…
Vozes do PS: — Muito bem!
A Oradora: — … e que os senhores são os únicos que chegam aqui com a seriedade total!
Protestos do BE.
Portanto, o que quero dizer-lhe, Sr. Deputado, é que quando estamos a falar da integração e da verdadeira inclusão das comunidades migrantes em Portugal, estamos a falar do reforço necessário da língua portuguesa…
Vozes do PS: — Exactamente!
A Oradora: — … e do seu ensino a estas comunidades.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Tiraram o Luís de Camões e o Gil Vicente!
A Oradora: — Por isso mesmo, Sr. Deputado Francisco Louçã e Sr.ª Deputada Cecília Honório, é preciso dizer que as experiências que existem de ensino bilingue, quer na Alemanha quer em França, são experiências extracurriculares; o ensino bilingue não é obrigatório, não está no currículo, são experiências para ajudar de uma outra forma à integração.
Aquilo que nós aqui defendemos, e temos defendido ao longo dos tempos, é que a língua portuguesa deva ser o factor mobilizador de inclusão destas comunidades migrantes em Portugal. Não estamos apenas a falar dos filhos dos migrantes; estamos a falar das comunidades migrantes no seu todo e, por isso mesmo, Sr. Deputado Francisco Louçã, «estamos a introduzir o inglês»!! Não percebo o seu argumento, porque quanto ao ensino do inglês nós também já o introduzimos!
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Com certeza!
A Oradora: — Portanto, não percebo qual é o seu argumento na questão da integração, mas quero dizer-lhe, sobretudo, Sr. Deputado Francisco Louçã, que esta sua intervenção revela, isso, sim, que com este projecto de lei o BE está a fazer demagogia política, e não é assim que se trata a inclusão dos migrantes em Portugal!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, com a conclusão do debate do projecto de lei n.º 201/X, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.
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I SÉRIE — NÚMERO 32
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A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, sexta-feira, pelas 10 horas, e constará da apreciação de um conjunto de petições que serão regimentalmente apreciadas em Plenário.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 15 minutos.
Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação do projecto de resolução n.º 139/X
O Grupo Parlamentar do PCP votou contra o projecto de resolução n.º 139/X, apresentado pelo PS, por-
que é uma cópia deturpada das conclusões do Relatório da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação
e Desenvolvimento Regional (CAEIDR) realizada a 4, 5 e 6 de Dezembro de 2005, que tinha sido aprovada
(em sede de Comissão) pelos votos do PS, PSD e PCP e a abstenção do CDS-PP (registando-se a ausên-
cia do BE e de Os Verdes).
Em particular:
a) A CAEIDR aprovou uma recomendação ao Governo para a criação de «um movimento de coordena-
ção, intervenção e acompanhamento» da «Região de Trás-os-Montes e Alto Douro». O projecto de resolu-
ção do PS propõe um movimento de coordenação, intervenção e acompanhamento da «NUT III Douro».
b) A CAEIDR aprovou uma recomendação ao Governo para a criação de uma entidade única virada
para a promoção turística no conjunto da Região do Douro. O projecto de resolução do PS deixou cair essa
proposta de «uma entidade única».
Se era contestável a «aprovação» por um Grupo Parlamentar das Conclusões de uma Comissão Parla-
mentar sem a articulação com os outros Grupos Parlamentares, inaceitável se torna a cópia com subversão
de conteúdos centrais.
Naturalmente que o voto contra do Grupo Parlamentar do PCP não significou estar contra o conteúdo
das recomendações b), c) e d) do projecto de resolução n.º 139/X, que tiveram, em sede da CAEIDR, a sua
ponderação (algumas resultaram mesmo de propostas do Grupo Parlamentar do PCP) e que até constituí-
ram de propostas de alteração apresentadas pelo PCP no debate do Orçamento de Estado para 2007.
Finalmente, o Grupo Parlamentar do PCP votou contra a proposta de alteração da alínea e) — onde
estava «incentivos para um movimento de deslocalização empresarial para a Região, no sector do vinho»
ficou «incentivos às empresas de forma a aumentar a capacidade instalada da fileira do Vinho do Porto, na
Região do Douro» — não pelo seu conteúdo concreto mas por representar um «arrependimento» de última
hora do Grupo Parlamentar do PS, receoso de afrontar os interesses poderosos das empresas de Vinho do
Porto sediadas em Vila Nova de Gaia.
Os Deputados do PCP: Agostinho Lopes — José Soeiro.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS):
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Paulo Martins Pereira Coelho
Domingos Duarte Lima
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
José de Almeida Cesário
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Miguel de Santana Lopes
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
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5 DE JANEIRO DE 2007
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Vasco Manuel Henriques Cunha
Partido Comunista Português (PCP):
Francisco José de Almeida Lopes
Maria Odete dos Santos
Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS):
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Nelson Madeira Baltazar
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Rosalina Maria Barbosa Martins
Partido Social Democrata (PSD):
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Luís Miguel Pereira de Almeida
Partido Popular (CDS-PP):
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Srs. Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003,
de 11 de Outubro):
Partido Social Democrata (PSD):
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL