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Sábado, 3 de Fevereiro de 2007 I Série — Número 45
X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 2 DE FEVEREIRO DE 2007
Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama
Secretários: Ex.mos Srs. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Fernando Santos Pereira
SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.
Foram aprovados três pareceres da Comissão de Ética, autorizando igual número de Deputados, do PSD, do PCP e do BE, a deporem por escrito em tribunal na qualidade de testemunhas.
Foi apreciado o Decreto-Lei n.º 216/2006, de 30 de Outubro — Oitava alteração ao Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 265/93, de 31 de Julho [apreciação parlamentar n.º 34/X (PSD)], tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva) e do Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna (José Magalhães), os Srs. Deputados Henrique Rocha de Freitas (PSD), João Rebelo (CDS-PP), João Serrano (PS) e António Filipe (PCP). No final, o Sr. Presidente anunciou a apresentação, pelo PSD, de um projecto de resolução a pedir a cessação de vigência daquele Decreto-Lei.
Foi igualmente apreciado o Decreto-Lei n.º 196/2006, de 10 de Outubro — Atribui ao Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior a competência para proceder à simplificação e integração num regime comum das regras a que está sujeito o reingresso, mudança de curso ou transferência para cursos de licenciatura e para ciclos de estudos integrados conducentes ao grau de mestre dos estudantes oriundos de estabelecimentos de ensino superior nacionais e estrangeiros [apreciação parlamentar n.º 35/X (PCP)].
Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, os Srs. Deputados João Oliveira (PCP), Abel Baptista (CDS-PP), Cecília Honório (BE), Manuel Mota (PS) e Emídio Guerreiro (PSD).
Por fim, foi apreciado o Decreto-Lei n.º 231/2006, de 24 de Novembro — Autoriza a APS — Administração do Porto
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I SÉRIE — NÚMERO 45 2 de Sines, S. A., — a concessionar, mediante concurso público, o serviço público de movimentação de cargas no terminal especializado de granéis líquidos do porto de Sines e de gestão integrada dos resíduos gerados na área de jurisdição do porto, e aprova as bases do contrato de concessão [apreciação parlamentar n.º 38/X (PCP)]. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, os Srs. Deputados José Soeiro (PCP), Helena Pinto (BE), Vasco Cunha (PSD), Alberto Antunes (PS), Hélder Amaral (CDS-PP) e Luís Rodrigues (PSD), tendo, no final, o Sr. Presidente anunciado a apresentação, pelo PCP, de um projecto de resolução a pedir a suspensão de vigência daquele Decreto-Lei.
A Mesa deu ainda conta da apresentação dos projectos de lei n.os 346 a 348/X e da proposta de lei n.º 114/X.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 10 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pereira Ribeiro
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
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Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José dos Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
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Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Domingos Duarte Lima
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Irene Martins Baptista Silva
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Vasco Manuel Henriques Cunha
Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Odete dos Santos
Miguel Tiago Crispim Rosado
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Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Hélder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura de três relatórios e pareceres da Comissão de Ética.
A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Ministério da Defesa Nacional — Marinha — Direcção de Tecnologias de Informação e Comunicação — Comissão Eventual, Processo Disciplinar, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação.
Pausa.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.
A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Ministério da Defesa Nacional — Marinha — Direcção de Tecnologias de Informação e Comunicação — Comissão Eventual, Processo Disciplinar, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado António Filipe (PCP) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação.
Pausa.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.
A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Ministério da Defesa Nacional — Marinha — Direcção de Tecnologias de Informação e Comunicação — Comissão Eventual, Processo Disciplinar, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fernando Rosas (BE) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação.
Pausa.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar o parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.
Srs. Deputados, vamos iniciar a apreciação do Decreto-Lei n.º 216/2006, de 30 de Outubro — Oitava alteração ao Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 265/93, de 31 de Julho [apreciação parlamentar n.º 34/X (PSD)].
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, o Governo socialista já nos habituou a algumas chinesices…, a última das quais made in China, mas a verdade é que o que está em debate nesta apreciação parlamentar é um tema central da Defesa Nacional, isto é, o modelo de profissionalização das Forças Armadas.
Vejo que o Governo está apenas representado na sua bancada pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e pelo Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna. Por isso, eu gostava de perguntar ao Sr. Presidente se tem notícia de que alguém do Ministério da Defesa Nacional se fará representar no debate desta apreciação parlamentar.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a composição do Governo na bancada é a presente, mas o Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares poderá esclarecê-lo.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Sr. Presidente, é apenas para esclarecer que o decreto-lei cuja apreciação é pedida é um decreto-lei da responsabilidade do Ministério da Administração Interna e, portanto, é este Ministério que está aqui representado.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Mas a responsabilidade é do Governo!
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, peço novamente a palavra para uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, em virtude de o Governo não se fazer representar por qualquer titular da pasta do Ministério da Defesa Nacional, tenho muito gosto em fazer chegar ao Governo, através de V. Ex.ª, uma cópia da Lei do Serviço Militar e do decreto-lei dos regulamentos e incentivos, para que ele possa acompanhar condignamente este debate parlamentar.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a Mesa fará distribuir esses documentos.
Agora, para fundamentar este pedido de apreciação parlamentar, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: «Não prestamos para nada se só formos bons para nós próprios», disse um dia Voltaire. E que diria Voltaire se, porventura, nem para nós próprios fôssemos bons?!
O Sr. António Filipe (PCP): — Que diria Voltaire se cá voltasse?!…
O Orador: — Certamente diria que, a sermos assim, também não prestávamos para nada. Ora, é justamente o caso desde decreto-lei em apreciação parlamentar.
Um decreto-lei que altera o Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana, retirando o princípio da exclusividade no acesso aos seus quadros de praças aos militares que tenham cumprido dois anos de serviço em regime de contrato, não é bom para a GNR nem é bom para as Forças Armadas.
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O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — E, sem forçarmos muito o raciocínio de Voltaire, podemos concluir, então, que este decreto-lei também não presta para nada e que, para além de não prestar para nada, Sr. Presidente e Srs. Deputados, também é um decreto-lei envergonhado, como irei demonstrar.
Trata-se de um decreto-lei aprovado no Verão, em pleno Agosto, em férias parlamentares, sem uma única voz a defendê-lo, apenas o registo cinzento de umas poucas linhas no comunicado oficial do Conselho de Ministros. Este não foi, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um decreto-lei com direito a PowerPoint. Não foi, nem podia ser!! Um decreto-lei que é um atentado ao processo de profissionalização das Forças Armadas portuguesas e aos seus incentivos só podia ser apresentado envergonhadamente, como, aliás, o foi.
Só um Governo sem coragem e com total desrespeito pela instituição militar pode, pela via da Administração Interna e das forças de segurança, aprovar medidas com impacto decisivo na área da Defesa Nacional e das Forças Armadas.
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Triste ministério este que nem a si próprio se sabe defender…
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que hoje verdadeiramente se discute neste Parlamento é uma relevante questão de Estado: o que hoje está em discussão é o modelo que o País quer para as suas Forças Armadas e para as suas forças de segurança. E temos de perder complexos relativamente às Forças Armadas: elas devem ser vistas como uma instituição que serve a Nação e um instrumento de defesa da Pátria!
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — E a verdade é que Portugal optou pelo caminho da profissionalização, assente num largo consenso nacional. E, posto o País perante este desafio, importa, como nesta Casa se disse em 1999, criar condições para que a prestação de serviço militar seja atractiva, humanizada e enriquecedora. Como então se disse, os jovens não irão «perder tempo» no serviço militar; irão, sim, cumprir uma nobre missão e valorizar-se para a vida, dando mais força ao conceito de igualdade de oportunidades. Profissionalizar as Forças Armadas é um passo que obriga a uma cuidada reflexão sobre a nova relação cidadão/Forças Armadas.
O paradigma, Sr. Presidente e Srs. Deputados, alterou-se substancialmente. A instituição militar não representa já uma obrigação para os jovens, ela pode ou não representar uma opção para a juventude portuguesa! Ao optar por Forças Armadas totalmente profissionalizadas, o sucesso do modelo depende da capacidade de motivação dos jovens para o voluntariado e esta motivação depende essencialmente dos incentivos que forem disponibilizados.
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — E porque este processo está em consolidação, importa ao Estado favorecê-lo e não dificultá-lo.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Os incentivos são, assim, decisivos para o sucesso desta reforma das Forças Armadas, razão pela qual, em 2004, no fim do processo de transição do serviço militar obrigatório (SMO) para a profissionalização, o governo de então entendeu conceder aos militares que tivessem prestado dois anos de serviço em regime de contrato o benefício da exclusividade na admissão aos concursos para ingresso nos quadros de praças da GNR.
E porquê só em 2004? Porque enquanto o serviço militar obrigatório foi constitucionalmente universal o seu cumprimento foi condição de admissão na GNR, só na fase final do período de transição, em que existiu um sistema misto de serviço militar obrigatório e de voluntariado, foi admitido que jovens na reserva de disponibilidade pudessem concorrer à GNR. Esta situação veio terminar em Novembro de 2004, pelo que o fim do SMO colocou novamente todos os cidadãos em igualdade de circunstâncias no tocante à prestação do serviço militar. Assim sendo, em coerência, o governo de então retomou o princípio da exclusividade na admissão aos concursos da GNR.
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Criou-se, assim, um sistema que promove a busca de sinergias e de cooperação no seio da Administração Pública. Aqui a utilização de recursos humanos deve ser cooperativa e não competitiva, tanto mais quanto se trata de entidades tão próximas e tão contíguas, como as Forças Armadas e a GNR, atenta a sua condição militar.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — E, se se continuar a pretender que a GNR mantenha a sua natureza militar, é útil reforçar a complementaridade com as Forças Armadas, nomeadamente no que diz respeito aos recursos humanos.
Seria incompreensível, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o Estado introduzisse a competição entre as Forças Armadas e a GNR. Ao ser uma força de natureza militar, com formação e disciplina militares, a alimentação da GNR por meios exclusivamente no seio da instituição militar só pode ser uma mais-valia. A questão da exclusividade tem de ser analisada, pois, em nome dos superiores interesses do Estado. É redutor e artificial considerá-la como uma questão das Forças Armadas, como uma questão da GNR ou como uma questão da GNR/Forças Armadas.
Refira-se também que o modelo da exclusividade nada tem de original, sendo adoptado em vários países europeus nosso aliados, como é o caso da Itália, onde a importante força dos Carabinieri é inteiramente alimentada a partir das forças armadas.
Acresce que a exclusividade no acesso à GNR é um dos mais relevantes incentivos para os candidatos militares, é um incentivo que não traz encargos — pelo contrário, é um incentivo que reduz a despesa pública, em virtude de tornar dispensável o pagamento dos subsídios de reintegração aos RD e RC que ingressem na GNR.
Mas há uma outra razão de fundo para sustentar a tese da exclusividade: é que os militares, ao ingressarem na GNR, são já portadores de um conjunto de valores, como a disciplina, a assiduidade, a vivência em grupo, a pontualidade, a lealdade e a camaradagem, que se acredita serem muito úteis à GNR.
O Sr. António Filipe (PCP): — Quer dizer que a GNR não tem nada disso?!
O Orador: — A possibilidade também de aqueles que permanecem, pelo menos, dois anos nas fileiras das Forças Armadas adquirirem experiência em operações de manutenção da paz e humanitárias, em que a instrução, a preparação e a execução exigem, em larga escala, o controlo da agressividade, autodomínio e poder de comunicação, são características fundamentais para qualquer agente de uma futura força de segurança.
Os militares adquirem, assim, nas fileiras maturidade, estabilidade emocional e motivação para a função, o que permitirá reduzir futuras inadaptações, inadequações e perdas, proporcionando à GNR maior rendimento e menor dispêndio em tempo e recursos.
Sendo esta uma questão de Estado, ó óbvio que temos de garantir que a regra da exclusividade proporciona à GNR um contingente com a qualidade requerida e um número de candidatos necessários. Foi isso que aconteceu também no primeiro concurso em 2005.
Mas alguém na GNR e alguém neste Governo, concretamente no Ministério da Administração Interna, não quis esperar, e a verdade é que, se tivessem esperado, volvido um ano, logo em 2006, as Forças Armadas podiam oferecer mais de 11 000 candidatos, o que garantiria uma potencialidade de 10 candidatos para uma vaga.
Como se vê, este modelo de exclusividade responde às necessidades quantitativas concursais da GNR, como responde às necessidades sentidas pela GNR no que diz respeito ao quantitativo do universo feminino e ainda à condição da idade de acesso, bem como às preocupações legítimas de um melhor nível de habilitações literárias no seu concurso.
Um retrocesso neste modelo de exclusividade, que envergonhadamente o Governo socialista aprovou, levará a uma concorrência desequilibrada decorrente do facto de as Forças Armadas só poderem oferecer uma ocupação temporária — no máximo seis anos —, enquanto a GNR oferece a possibilidade de uma carreira estável, segura e prolongada para a vida.
O abandono do critério da exclusividade coloca em risco a profissionalização das Forças Armadas, conduzindo, muito provavelmente, à necessidade de uma constituição de quadros permanentes das praças, com graves consequências na operacionalidade e muito significativo aumento nas despesas públicas, pelo que só se encontra justificação para rever a regra da exclusividade no ingresso na GNR se se quiser tornar aquela força de segurança numa força policial idêntica à PSP. Não contam com o PSD para tal desvirtuamento da natureza militar da GNR!! Volto, como no princípio, a Voltaire: que dizer de um Governo que põe em causa a natureza militar da GNR e ataca o processo de profissionalização das Forças Armadas? Se calhar, e «voltarianamente», dizer que é um Governo que não presta para nada. Mas não é de estranhar, porque, tal como os homens, os governos só depreciam aquilo que não podem entender, e este Governo deixou já sérios sinais de que não entende o significado e a importância da Defesa, da instituição militar, para a identidade nacional de um País como Portugal.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna (José Magalhães): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 216/2006, proposto pelo Ministério da Administração Interna, aprovado em 17 de Agosto, à luz do dia, promulgado pelo Sr. Presidente da República em 16 de Outubro e publicado em 30 de Outubro, que diz respeito ao Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana — isto é óbvio e, portanto, não invoquemos Voltaire, invoquemos talvez o Monsieur de la Palice —, alterou os procedimentos de admissão a concurso para ingresso na carreira de praças da GNR por boas e fundadas razões.
Ao requerer a apreciação parlamentar, o PSD disse o que aqui agora foi editado em temos mais desenvolvidos pelo Sr. Deputado Henrique de Freitas. Mas gostaria de vos afirmar, Sr.as e Srs. Deputados, que, ao invés, o risco que aqui foi alegado e descrito apocalipticamente simplesmente não existe e que, em vez de retrocesso, haverá um progresso assinalável, sem qualquer alteração da natureza militar da Guarda Nacional Republicana e sem ferir o regime aplicável à profissionalização militar.
Em primeiro lugar, as modificações — para quem ler — introduzidas no Decreto-Lei n.º 216/2006 não põem em causa nem colidem com o sistema vigente — VV. Ex.as
, Srs. Deputados do PSD, terão reparado que foi alterado e corrigido — de serviço militar nos regimes de contrato e de voluntariado, que se mantêm na sua concepção, nos seus objectivos e na sua matriz. Salvaguardaram-se até todos os direitos, como, aliás, é obrigatório, dos que optaram pela carreira militar e pretendem vir a ingressar na GNR, ficando, assim, plenamente asseguradas as expectativas criadas.
Em segundo lugar, as alterações introduzidas destinaram-se, e destinam-se, a dar resposta a uma situação insuportável, que debilitava a renovação das praças da GNR e que impedia esta força de responder com eficácia às missões de segurança que lhe estão confiadas.
Em terceiro lugar, com a correcção feita — e só com a correcção feita —, temos um sistema mais justo e transparente, que corresponde de forma mais adequada às necessidades da GNR, às expectativas dos que se candidatam e às necessidades do País, com salvaguarda plena do regime de voluntariado nas Forças Armadas.
Os números, Srs. Deputados, falam por si e são muito expressivos: em 2004 — Sr. Deputado Henrique Freitas, trouxe-nos as contas truncadas —,…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Está enganado, Sr. Secretário de Estado!
O Orador: — … candidataram-se a praças 16 190 (dos quais 15 939 às armas e 251 à carreira de músico, que, como sabem, também existe).
Protestos do Deputado do PSD Henrique Rocha de Freitas.
Nesse ano, o Decreto-Lei n.º 119/2004, de 21 de Maio, veio consagrar um regime de preferência, que V.
Ex.ª descreveu, aliás, incorrectamente. Nunca se tratou de uma preferência absoluta, e é inutilmente demagógico sustentá-lo! Sempre o regime disse que, a título excepcional e se necessário, era possível a abertura de um novo concurso, por despacho do Primeiro-Ministro e do Ministro da Administração Interna, caso as vagas não fossem preenchidas. E a esse concurso poderiam candidatar-se todos os cidadãos que preenchessem os requisitos gerais, sem a necessidade de prévia condição de regime de contrato com as Forças Armadas.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Eu explico-lhe! Faço-lhe o desenho!
O Orador: — Ora, em 2005, sendo aplicável já este regime para o concurso de praças 2005/2006, destinado a preencher 1075 vagas, as consequências foram estas — e chamo a atenção, Sr.as e Srs. Deputados, para este ponto —: apresentaram-se 2646 candidatos; foram admitidos 2462; 224 candidatos faltaram à prova cultural e ficaram de fora; restaram 2238 candidatos; destes últimos, 595 candidatos obtiveram classificação positiva e só 310 candidatos foram aprovados, a final. São números irrefutáveis, mas vejam, agora, a consequência.
Foi aberto novo concurso, novo procedimento, novas provas, com novos encargos para os concorrentes, para o Estado e para os contribuintes. Sr. Deputado Henrique Freitas, todas estas coisas são voláteis, a lex passa do Diário da República para a realidade, gratuitamente. Não há concursos grátis, Sr. Deputado!
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Já lhe dou a resposta!
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O Orador: — No segundo concurso, candidataram-se 17 332 cidadãos, iniciaram curso de formação 1002 e terminaram-no 941. E foi possível dar cumprimento à lei, a bem da GNR e da eficácia das forças de segurança.
Não vale, portanto, a pena, Srs. Deputados, fugir à realidade: os benefícios esperados do regime, que fizeram no ciclo político anterior, de incentivos militares não ocorreram; e dificultou-se muito — isso, sim, ocorreu — a renovação da GNR. Esta ficção custou caríssimo, não estava de acordo com a realidade, nem com a composição sociológica e de formação dos que se encontravam em regime de contrato, e que é preciso estudar. Toda a gente perdeu! Repito: toda a gente perdeu, incluindo os contribuintes, naturalmente, que pagaram caro a duplicação de procedimentos concursais.
E quanto à reforma que, agora, introduzimos? Quanto a esta, devo dizer que resulta da devida articulação entre ministérios e foi cuidadosamente preparada.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Total!
O Orador: — Em consonância com a alteração introduzida no Regulamento de Incentivos à Prestação de Serviço Militar nos Regimes de Contrato e Voluntariado, publicada no mesmo dia, prevê-se agora a precedência — note bem, Sr. Deputado Henrique Freitas: a precedência! — no acesso ao curso de formação de praças a quem tiver prestado, no mínimo, dois anos de serviço efectivo militar como voluntário e contratado nas Forças Armadas, nas categorias de praça ou sargento. Logo — julgo que isto é bastante óbvio —, a precedência é sempre dos que cumpriram serviço militar naquelas condições; e até se garantiu, por cautela institucional — aliás, completamente justa —, uma percentagem mínima, a fixar pelos Ministros da Administração Interna e da Defesa Nacional (aí, sim, obrigatoriamente conjuntamente), que nunca poderá ser inferior a 30%.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Limitámo-nos a corrigir a ilusória preferência, que, em caso de insuficientes candidatos aptos, obrigava a abrir as portas a outros interessados, gerando dois concursos, com toda a inerente carga processual, burocrática e financeira. Num só concurso, Simplex, de forma mais transparente, garante-se o justo acesso à GNR por quem cumpriu serviço militar.
E há ainda uma outra coisa, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: é que o universo de recrutamento entre candidatos com serviço militar é de cerca de 15 000 pessoas e, dessas, apenas 13% são do sexo feminino.
Se o universo de recrutamento abranger toda a população com condições de concorrer atinge cerca de 500 000 pessoas, das quais cerca de 53% são mulheres.
O número de mulheres nas Forças Armadas em regime de contrato é, como sabem, ainda diminuto. O anterior regime, enclausurado na sua forma, não permitia que mais mulheres acedessem à GNR, onde têm, aliás, vindo a desempenhar, as que lá estão, com muito êxito, importantes missões e actividades, designadamente no apoio às vítimas de crimes mas, não, apenas. O novo regime vem contribuir para que mais mulheres possam candidatar-se, enriquecendo a GNR.
A possibilidade de escolher os mais aptos, abrindo-lhes oportunidades de futuro, não é só uma maisvalia para o Ministério da Administração Interna e para a Guarda; é, Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma mais-valia para todo o País.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Há dois pedidos de esclarecimentos, sendo o primeiro o do Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas, a quem dou de imediato a palavra. Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, comecemos, então, pelo óbvio.
Sr. Secretário de Estado, Monsieur de La Palice, certamente, neste debate parlamentar, falaria do óbvio.
O óbvio é falar da defesa nacional e das Forças Armadas; e o Governo socialista, neste debate parlamentar, ao problema crucial das Forças Armadas portuguesas disse zero!! A questão não é a do estatuto da GNR; a questão é a dos incentivos à profissionalização e ao modelo que queremos para as Forças Armadas portuguesas. Porque, Sr. Secretário de Estado, não estou aqui a discutir a GNR; estou aqui a discutir o futuro das Forças Armadas portuguesas e, a isso, sublinho, o Sr.
Secretário de Estado disse zero!! Mas podemos, então, aumentar o número e, em vez de falarmos de zero, falemos de números do concurso de 2005, que o senhor os tornou falaciosos. Diga à Câmara qual o número de candidatos militares que concorreu à GNR, no segundo concurso de 2005! Eu digo-lhe: 7236. Sublinho: 7236, o que significa que, no seu ano, que considerou catastrófico, concorreram à GNR 9900 militares, com as qualidades que todos nós conhecemos.
Não pode comparar — e, aliás, os resultados do concurso demonstram-no — as habilitações psíquicas, físicas e, até, intelectuais daqueles que, durante dois anos, estiveram nas Forças Armadas e as daquele cidadão civil que presta, pela primeira vez, concurso nestas provas que, aqui, acabei de definir. Por isso, Sr.
Secretário de Estado, quando fala dessa cláusula, recordo que essa cláusula foi introduzida porque nós, no
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governo de então, sabíamos que os dois primeiros anos, 2005 e 2006, eram os piores anos.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna: — Obviamente!
O Orador: — Obviamente!! Monsieur de La Palice saberia isso, o governo socialista não sabe! Mas é pena, mas há tanta coisa que não sabe… Só sabe, nesta Sala, fazer citações fantásticas do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares…
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Um bocadinho mais elevadas que as de La Palice!
O Orador: — Portanto, digo-lhe, uma vez mais, Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: está provado que os militares são suficientes para alimentar o ingresso na GNR. Se o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna não tem consciência disso é porque quer alterar a natureza da GNR. Mas esse é um outro debate. O debate de hoje — e, daí, a pena que tenho de não estar aqui presente o Ministro da Defesa Nacional… E também tenho pena de que, nesta Assembleia, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista tenha uma intervenção não de um Deputado da Comissão de Defesa Nacional mas Deputados que são membros da 1.ª Comissão. Porque eu gostava de saber, se esta matéria fosse discutida na Comissão de Defesa Nacional, qual era a posição dos Deputados socialistas nesta matéria…! E também gostava de saber se o Governo, quando aprovou esta alteração ao Estatuto da GNR e a alteração ao estatuto dos incentivos, também ouviu as Forças Armadas e os seus chefes militares. Não ouviu, de certeza, porque o Governo é surdo à instituição militar!!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo, a quem dou muitos parabéns pelo seu aniversário!
Risos.
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Muito obrigado, Sr. Presidente. Já são 37 anos, infelizmente, já vem contabilizando…
Vozes do PSD: — Já não pode candidatar-se à GNR!
Risos.
O Orador: — Já não, acabou a minha situação de reservista das Forças Armadas, porque já passei os 35 anos.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna — a quem cumprimento —, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: A minha pergunta tem a ver, exactamente, com o que foi aqui realçado pelo Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas. Porque esta medida tem um impacto essencial — o Sr. Secretário de Estado vai concordar connosco — sobre o sucesso da profissionalização das Forças Armadas. Faz parte de um conjunto de incentivos (e, quando esta lei foi feita, toda a gente e os interessados na matéria manifestaram o seu apoio para que esta lei fosse feita desta maneira) e tem a ver com um aspecto que foi aqui realçado: nos contactos que a Comissão de Defesa Nacional teve sempre com as chefias militares, este elemento foi considerado essencial para o sucesso da profissionalização das Forças Armadas. Porque deve estar ligado! Porque nós, CDS-PP — e fiquei satisfeito quando o Sr. Secretário de Estado realçou isso —, consideramos essencial que a natureza militar da GNR se mantenha. Mas o Sr. Secretário de Estado sabe que existem pessoas que discordam: o PCP discorda disso, bem como outros partidos de esquerda; existem algumas tendências também no próprio Partido Socialista, que sempre defendeu que não devia haver essa natureza militar; e há mesmo sindicalistas (mas não vou pedir-lhe, obviamente, que responda pelos sindicalistas) que, ainda hoje, num artigo do Público vêm defender a fusão da PSP com a GNR, o que seria um total disparate. Portanto, fiquei satisfeito por ouvir o Sr. Secretário de Estado realçar que defende a manutenção da natureza militar da GNR.
Mas este elemento é essencial, Sr. Secretário de Estado: a reacção das chefias militares no que se refere a esta alteração do Governo foi muito negativa. E, como disse o Sr. Secretário de Estado, a possibilidade que a lei facultava de se fazer este concurso que o Governo fez era a título excepcional, fazendo-o, obviamente, na possibilidade de, nos primeiros anos, não correr muito bem. Mas, como digo, era excepcional.
Portanto, a lei estava bem feita: tinha uma orientação clara em relação à admissão na GNR, mas permitia umas excepções na eventualidade de, no início, correr mal, sobretudo, porque a profissionalização total só se iniciou em 2004 e, portanto, só nos próximos anos é que a disponibilidade de pessoas que prestaram o serviço militar durante seis anos, dentro de quatro, cinco, seis anos, vão estar, depois, com vontade da
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admissão à GNR.
Em suma, Sr. Secretário de Estado, a pergunta que lhe faço é no sentido de que o Sr. Secretário de Estado deixe claro que o Governo e o Partido Socialista querem manter a natureza militar da GNR e não querem fazer alteração em relação a isso, obviamente, com todas as implicações que isso tem.
Finalmente, quero que o Sr. Secretário de Estado me diga qual foi a reacção das chefias militares quando este assunto foi discutido com o Governo, porque as informações que temos — e são públicas, pois os chefes militares discutem esse aspecto com os Deputados da Comissão de Defesa Nacional — foram muito negativas em relação a esta alteração.
Por conseguinte, como é essencial que, nesta matéria, quer o Ministério da Administração Interna, obviamente, porque tutela a GNR, quer também o Ministério da Defesa Nacional tenham de falar em relação a isso, eu gostaria que o Sr. Secretário de Estado me informasse sobre qual a reacção por parte das chefias militares.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, julgo que, nesta matéria, não devemos cair no vício, que é terrível e desgosta tanto os cidadãos da política, que é o de inquinar debates, «misturando alhos com bugalhos», e, sobretudo «tirando dos armários fantasmas» que devem lá ficar fechados. Quanto ao «fantasma» da alteração da natureza jurídica da GNR: coloquem-no num cofre, fechem-no e atirem fora a chave neste ciclo político! Não vamos trazê-lo para o debate neste Plenário!! Portanto, o Sr. Deputado Henrique Freitas atira uma espécie de «arma de diversão», quando deveríamos estar a discutir um tema, que se trata da alteração do Estatuto da Guarda Nacional Republicana. Como eu disse, obviamente, e sem implicações que foram cuidadosamente ponderadas. E julgo que surdo — surdo, surdo — é quem, face à aplicação de um quadro legal que gera disfunções, não tira qualquer consequência, nem ouve o brado que as disfunções geram nos cidadãos. É porque, meus Senhores e minhas Senhoras, esta matéria tem implicações na vida concreta de pessoas!! Estamos a falar de pessoas que tenham cumprido serviço militar e feito contrato, ou não; de jovens que querem ou têm a ambição de, neste caso, fazerem parte de uma força de segurança, de cumprirem missões que são de importância essencial para a segurança interna, e que se apresentam a concurso. Devemos escolher quem? Eu diria os mais aptos.
E o resultado do concurso, a não ser que infamemos completamente aqueles que procederam à aplicação das regras concursais e digamos que eles fizeram uma espécie de razia dolosa, premeditada, ilegal nos candidatos —…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Tem dúvidas?
O Orador: — … e o PSD não o disse, a não ser agora sob a forma de aparte, portanto, é muito interessante que fique registado no Diário que o PSD considera que uma instituição como a GNR é capaz de organizar, fabricar, distorcer e viciar um concurso…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Só as suas palavras é que fazem fé!
O Orador: — O Governo não «mete as suas mãos» em tais calúnias e, pelo contrário, sustentamos e defendemos a honra, o brio e a legalidade da instituição.
A não ser que se vá pelo caminho que referi — e eu não vou, o Governo não vai! — os resultados são aqueles que vos expus: a partir de um determinado número de candidatos, o número de candidatos vindos das Forças Armadas não era bastante e foi necessário abrir um segundo procedimento «concursal».
Os Srs. Deputados acham que isso não é importante, que os concursos não custam nada, que é facílimo, que o Estado não tem de preocupar-se com essa matéria? Estão puramente enganados e julgo que a lição da história vos ensinará.
Represento aqui o Ministério da Administração Interna e gostaria de vos dizer que estudámos esta matéria, que avaliámos as suas implicações, que foi discutida em Conselho de Ministros, foi promulgada, está hoje em vigor e é nosso empenhamento que seja este regime bem aplicado.
Não nos envolveremos em querelas assentes numa visão especulativa, na visão mirífica de que apareceriam militares hipertreinados,…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — É claro que apareceram!
O Orador: — … capazes de entrarem até sem avaliação de aptidão. Essa ficção, essa quimera, infelizmente, Srs. Deputados, não acontece!! Se acontecesse seria óptimo, mas não acontece! Portanto, temos
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de ser realistas e não gerar querelas estultas e artificiais.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Está a matar as Forças Armadas!
O Orador: — Gostaria, evidentemente, de dar os parabéns ao Sr. Deputado João Rebelo não apenas pelo seu aniversário mas pela sua intervenção.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Serrano.
O Sr. João Serrano (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado adjunto e da administração interna, Sr.as e Srs. Deputados: Vem o PSD, através da presente apreciação parlamentar, questionar a bondade do Decreto-Lei n.º 216/2006 — Oitava alteração ao Estatuto dos Militares da GNR.
Considera o PSD que o Governo com este diploma «altera os procedimentos de admissão a concurso de ingresso na carreira de praças da GNR», tratando-se por isso de um «grave retrocesso nos incentivos legais de profissionalização das Forças Armadas, colocando em risco o processo de recrutamento militar».
Tal visão é, no mínimo, redutora. Senão vejamos.
Na sequência da lei de revisão constitucional ocorrida em Setembro de 1997 e da nova Lei do Serviço Militar, aprovada através da Lei n.º 174/99, estabeleceu-se uma inovação histórica no recrutamento dos efectivos, há muito reivindicada pelo Partido Socialista: o serviço militar passou a ser voluntário em vez de obrigatório, como até então.
Mas esta lei foi mais longe ao criar um sistema de incentivos para estimular o interesse dos jovens e das jovens na prestação do serviço militar nos regimes de voluntariado e de contrato. Daí que a Lei do Serviço Militar e o regulamento de incentivos, aprovado através do Decreto-Lei n.º 320-A/2000, com as alterações ocorridas em 2004, prevêem, entre outros incentivos, um sistema de remunerações adequadas; o direito à segurança social e à assistência médica e medicamentosa para os voluntários e seus familiares; apoios excepcionais ao emprego, dando incentivos à obtenção da habilitações académicas, à formação e certificação profissionais, bem como à inserção no mercado de trabalho; e atribui condições especiais de acesso ao crédito à habitação.
Neste diploma (repito: que se mantém em vigor), no que diz respeito à inserção do mercado de trabalho, prevê-se a atribuição de condições de ingresso prioritário na função pública e nos quadros permanentes das Forças Armadas e das forças de segurança.
Quanto à admissão aos quadros permanentes das forças de segurança, o regulamento de incentivos previa que os militares que tinham prestado serviço em regime de contrato pelo período de dois anos beneficiavam, nos seis anos subsequente à data de cessação do contrato, de um contingente de 30% do número total de vagas disponíveis nos concursos para ingresso nos quadros de praças e oficias da GNR, de 15% nos quadros das forças de segurança e de 30% no quadro permanente das Forças Armadas.
Posteriormente, em Maio de 2004, o anterior governo procedeu à alteração do regulamento de incentivos e à transposição imediata, aliás, no mesmo Diário da República, deste novo quadro legal para o Estatuto dos Militares da GNR.
Tratou-se de uma alteração que, no essencial, apenas incidiu sobre os concursos de ingresso na carreira de praças da GNR. Com este diploma, os militares passaram a beneficiar de exclusividade na admissão aos concursos para ingresso nos quadros de praças da GNR. Quanto aos concursos de oficiais da GNR, de quadros da PSP e mesmo do quadro permanente das Forças Armadas, nada se alterou, apenas no concurso de praças da GNR.
No entanto, e antevendo o que veio a acontecer, nesta alteração previu-se que, quando não fosse possível preencher as vagas postas a concurso, podia, a titulo excepcional, mediante despacho do PrimeiroMinistro e do Ministro da Administração Interna, ser realizado um novo concurso,…
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Excepcional!
O Orador: — … destinado às vagas que não fora possível preencher e a que concorriam os candidatos que não tivessem cumprido o serviço militar. Tratava-se, por isso, de uma exclusividade que, diria, mitigada.
O diploma que ora apreciamos mantém o princípio da precedência na admissão ao concurso de formação de praças, sobre os restantes candidatos, àqueles que prestem ou tenham prestado serviço militar em regime de contrato, até um limite que nunca pode ser inferior a 30% das vagas postas a concurso.
E, se é verdade que com o diploma que hoje apreciamos o Governo impõe que o cumprimento de serviço militar deixou de ser condição obrigatória e exclusiva apenas para o ingresso na categoria de praças da GNR, não é menos verdade que com esta alteração estamos a salvaguardar os superiores interesses das forças de segurança, em particular da GNR, sem atingir o recrutamento militar e, por extensão, o funcionamento do próprio sistema de prestação de serviço militar.
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Com este diploma o Governo vem corrigir, no fundo, algo que já em 2004 se previa: que o índice médio de escolaridade e de habilitações detidas pelo pessoal contratado das Forças Armadas não era conjugável com as necessidades e exigências pedidas para admissão à GNR e que os requisitos e exigências de selecção, nomeadamente o perfil psicofísico, entre os membros das Forças Armadas e de segurança não são comparáveis, pois visam aferir qualidades e comportamentos para perfis profissionais diferentes. E suspeitava-se que, a curto prazo, a oferta de vagas suplantasse a procura por inexistência de efectivos militares recrutáveis em número suficiente. E o anterior governo já o sabia, daí ter consagrado um sistema de exclusividade com reservas, ao prever a realização de um novo concurso.
Infelizmente, esta situação veio a acontecer logo no primeiro concurso, após a entrada em vigor deste novo regime, que se mostrou completamente inadequado, porquanto moroso, face às exigências e às necessidades de serviço da própria GNR.
Como é sabido, e disse o Sr. Secretário de Estado, a admissão aos quadros da guarda para o curso de formação 2005/2006 decorreu em dois momentos distintos, porque não foi possível, entre o universo dos candidatos oriundos das Forças Armadas, prover a totalidade das vagas colocadas a concurso.
Com o Decreto-Lei n.º 216/2006 foram revistos os contornos práticos e estatutários de consagração do princípio da exclusividade, que passou a ser desenvolvido de uma forma mais consentânea com as reais e efectivas necessidades da GNR, sem que com isso se tenha vindo a prejudicar as expectativas dos candidatos provenientes das Forças Armadas.
Continua a reconhecer-se um direito de precedência na admissão a concurso de formação de praças da guarda aos cidadãos que tenham prestado serviço militar, comparativamente com os que o não tenham feito, e nada impede, caso o número total de vagas postas a concurso o permita, que todos os militares, num determinado ano, possam candidatar-se aos concursos abertos e logrem ingressar nos cursos de formação, preferindo aos cidadãos que não tenham passado pelas fileiras militares.
Por tudo isto, é, no mínimo, demagógica a visão pela qual se defende que a alteração ao regime de acesso ao concurso de formação de praças da GNR constitui um atentado grave ao novo sistema de prestação de serviço militar, mormente em sede de recrutamento.
O regime de incentivos não se esgotava, nem se esgota, no benefício em causa de ingresso na GNR.
Não se deve imputar à GNR a responsabilidade de viabilizar ou de inviabilizar o novo sistema de prestação de serviço militar. Se o fizermos, estamos a ser, no mínimo, injustos, quando não temos o mesmo grau de exigência com as outras forças de segurança e mesmo com as Forças Armadas. Para estas, apenas se prevê a precedência dos candidatos oriundos do serviço militar até ao limite de 15% e 30% das vagas postas a concurso.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A solução ora apresentada para o ingresso na categoria de praças da GNR não compromete o regime de incentivos das Forças Armadas e responde às dificuldades então sentidas em sede de recrutamento.
O que está em causa é um justo equilíbrio entre o novo sistema de serviço militar, que nunca devemos pôr em causa, e a salvaguarda da operacionalidade da GNR como instrumento fundamental de um sistema de segurança interna, que todos preconizamos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Serrano, tenho duas pequenas questões para colocar-lhe, agradecendo, obviamente, a cedência do tempo.
O Sr. Deputado acha irrelevante que no primeiro ano em que foi aplicado o princípio da exclusividade tenham concorrido 9900 militares? Sublinho: 9900 militares?! O Sr. Deputado acha irrelevante que fosse expectável, para o ano 2006, um número de cerca de 16
Há estudos publicados em revistas de psicologia militar que definem um único critério para a desistência dos militares das fileiras das Forças Armadas. Esses estudos apontam para a dificuldade de carreira militar, isto é, a dificuldade de carreira militar leva a que as pessoas saiam do Exército, da Marinha e da Força Aérea.
Portanto, pergunto-lhe, se, em consciência, acha que um jovem com 18 anos, tendo, por um lado, as Forças Armadas (Marinha, Exército e Força Aérea), que lhe podem dar apenas um percurso profissional de seis anos, e, por outro lado, uma força se segurança, a GNR, que lhe pode dar uma carreira de 36 anos, opta pelas Forças Armadas ou pela GNR. É evidente que esse jovem tenderá a optar pela GNR, o que, obviamente, secará a «alimentação» das Forças Armadas.
Por isso, pergunto-lhe apenas isto: acha justa esta opção que o Governo tem como opção de Estado?
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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Serrano.
O Sr. João Serrano (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas, não confundamos as coisas. Aqui, não está em causa o regime de incentivos;…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Pois não! Está em causa o quê?
O Orador: — … não está em causa o regime de precedência, o que está em causa é que…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Não sabe o que está a dizer!
O Orador: — … houve um concurso ao qual concorreram mais de 2600 candidatos, sendo que, no final do mesmo, apenas 310 candidatos obtiveram aproveitamento.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Quantos concursos houve em 2005?
O Orador: — O que está em causa é que foi necessário abrir-se um novo concurso; o que está em causa é que houve custos deste novo concurso; o que está em causa é que para o número de vagas que existiam no ano passado, de 1200, apenas 310 candidatos foram aprovados.
Aqui, o que está em causa é uma correcção do sistema, ou seja, continuam a abrir-se todas as possibilidades de os candidatos provenientes das Forças Armadas se candidatarem. No entanto, há é um sistema muito mais flexível, que, obviamente, permitirá, acima de tudo, preencher as vagas e colmatar algo que para nós é muito caro, que é a possibilidade de termos incorporações totais e forças de segurança a servir a população.
Aplausos do PS.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Responda aos números! Não sabe responder, como é óbvio!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem palavra o Sr. Deputado João Rebelo.
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado adjunto e da administração interna, Sr.as e Srs. Deputados: Com a nova Lei do Serviço Militar, aprovada em 2000, e a nova política de recrutamento e sustentação de efectivos militares tornou-se essencial encontrar um mecanismo que auxiliasse na satisfação das necessidades de pessoal decorrente da profissionalização das Forças Armadas e do fim do serviço militar obrigatório.
Nesse sentido, foi aprovado o Decreto-Lei n.º 118/2004, de 21 de Maio, que estabeleceu um regime preferencial na admissão aos quadros permanentes das forças de segurança. Neste diploma, os militares que prestem ou tenham prestado serviço militar em regime de contrato, desde que tenham cumprido dois anos serviço nesse regime, beneficiam de exclusividade na admissão aos concursos para ingresso nos quadros de praças da GNR.
Havia aqui também uma forte motivação para os jovens abraçarem voluntariamente a carreira militar, pois sempre tinham garantida uma progressão profissional previsível e estável,…
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — … ajudando, assim, a dar um argumento importante e válido para a promoção do recrutamento voluntário nas Forças Armadas.
Neste debate ficou claro que, quando dizemos que esta alteração do Governo tem um impacto muito importante nas Forças Armadas, isso tem exactamente que ver com esta previsível e garantida progressão profissional para os profissionais das Forças Armadas, ajudando assim a dar mais um argumento a quem ingresse nas Forças Armadas.
No entanto, volvidos apenas dois anos, o Governo do PS muda as regras do jogo e decide abrir um concurso não apenas para militares mas também para qualquer jovem que se queira candidatar.
Comentando esta decisão do Governo em 2005, eu disse que o mesmo estava a actuar na legalidade, porque a lei previa a criação de um quadro excepcional para, no caso de o concurso não funcionar ou não ter as vagas suficientes, poder abrir novo concurso alterando as suas regras. Mas eu disse que era em termos excepcionais e nunca para passar a definitivo, porque era natural que nos primeiros anos da profissionalização das Forças Armadas a disponibilidade de antigos profissionais das Forças Armadas para ingressar na GNR fosse limitada e que a título excepcional podia aceitar-se isso.
No entanto, o Governo resolveu fazer uma mudança mais vasta. E julgo que também ninguém tem dúvi-
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das quanto às vantagens que a GNR tem em ter nas suas fileiras homens e mulheres que, para além das suas competências técnicas, têm já testado um conjunto de competências comportamentais de inquestionável valor para o futuro.
Um simples concurso, como o actual Governo defende, pode não permitir uma avaliação rigorosa dos homens que integrarão a GNR. Nem sempre é através de um concurso que sabe se o candidato tem um perfil adequado para se tornar agente de segurança.
O Governo, mais uma vez, nos dá um testemunho de acção voluntariosa e errática, trocando o certo pelo incerto:…
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — … troca a prática e a preparação intensa de dois anos nas Forças Armadas por voluntários que necessitam de formação intensa e dispendiosa.
Com esta medida o Governo consegue também aumentar indirectamente os custos de formação da GNR. Tenho a certeza, Sr. Secretário de Estado, que não nos vai querer convencer de que é a mesma coisa, de que são afectados os mesmos recursos financeiros para formar para agente de segurança um militar com dois anos de serviço ou um jovem sem experiência militar.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — É óbvio que a admissão de militares com experiência reduz futuros problemas de inadaptação e de quebras de pessoal e obtém melhores índices de rendibilidade, havendo automaticamente menor dispêndio de tempo e de recursos financeiros.
Paralelamente a estas questões, esta alteração legislativa vem indirectamente prejudicar a política de incentivos legais à profissionalização das Forças Armadas.
É verdade, Sr. Deputado João Serrano, que não é o único aspecto dos incentivos para a profissionalização, mas é um aspecto importante.
Aplausos do CDS-PP.
Um jovem que abraça a carreira militar, obviamente, pondera as diversas opções de futuro e, neste momento, tem menos uma opção.
Um outro aspecto que importa não esquecer prende-se com o facto de a alteração promovida pelo governo anterior ter sido feita a pensar no futuro das Forças Armadas e, como tal, teve o apoio de todas as chefias militares, todos os chefes militares estavam de acordo e entenderam que este seria um dos principais incentivos à profissionalização das Forças Armadas. E eles não mudaram de opinião em relação a isto! Em conclusão, esta medida só complica o que não estava complicado: vem dificultar e encarecer o recrutamento de homens para a GNR e vem minar os incentivos legais à profissionalização das Forças Armadas.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Vou dizer apenas algumas breves palavras sobre este processo de apreciação parlamentar, na medida em que não discordamos do Decreto-Lei que está em apreciação. Discordámos, isso sim, frontalmente, do diploma que este Decreto-Lei alterou, da responsabilidade do Governo anterior, e que obrigou a que qualquer candidato ao ingresso na GNR tivesse de ter cumprido serviço militar em regime de voluntariado ou contrato.
Na verdade, o que aconteceu foi que o Governo anterior, pela mão do Ministro da Defesa da altura, o Dr.
Paulo Portas, resolveu colmatar a falta de incentivos para o regime de voluntariado e contrato das Forças Armadas à custa da GNR, isto é, impondo à GNR o ónus de só admitir nos seus efectivos cidadãos que tivessem passado pelo serviço militar em regime de voluntariado ou contrato. Ora, isso não só não resolve o problema dos incentivos, como cria, de facto, um encargo pesadíssimo para a GNR.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Está enganado!
O Orador: — Discordamos, pois, dessa medida, quer por razões de princípio, quer também por razões conjunturais que se prendem com as necessidades da GNR.
Podíamos questionar por que razão é que o Governo, na altura, entendeu impor essa condição relativamente ao ingresso na GNR e não a impôs em relação ao ingresso em outros sectores da Administração Pública, quer noutras forças de segurança, como a PSP e a Polícia Judiciária, quer nos próprios serviços prisionais, quer ainda noutros sectores, como no acesso à docência, para dar aulas de Inglês, para ingres-
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sar nas Finanças. Isto é, por que é que o Governo o estabeleceu só em relação à GNR? Obviamente, isso tem um sentido: o Governo anterior pretendia acentuar uma ligação «umbilical» entre a GNR e as Forças Armadas. É uma questão de fundo, da qual discordamos, como é sabido, pois entendemos que uma força de segurança não deve ter natureza militar, com todo o respeito que temos pelas Forças Armadas. Nesta Assembleia, sou membro quer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, quer da Comissão de Defesa e, portanto, tenho oportunidade de manifestar o grande apreço que o Grupo Parlamentar do PCP nutre pelas Forças Armadas, mas entendemos que as funções das Forças Armadas e as das forças de segurança são funções de soberania distintas.
Obviamente, o Governo, na altura, como já referi, quis acentuar uma ligação «umbilical», mas o problema é que o fez prejudicando os interesses próprios da GNR. E isso parece inquestionável, porque não vemos qualquer razão para que um cidadão que reúna todas as condições para ingressar na GNR, que tenha o perfil adequado, que preste as provas necessárias, seja impedido de aceder à GNR porque não cumpriu o serviço militar em regime de voluntariado ou de contrato. Não vemos razão nenhuma para isso, porque ele pode cumprir todas as exigências culturais, de disciplina, pode ter o perfil adequado, pode passar em todas as provas. Ora, se o cidadão passa em todas as provas, se demonstrou que tem todas as condições para ser da GNR, por que razão é que lhe há-de ser vedado o acesso à GNR pelo facto de não ter cumprido o serviço militar em regime de voluntariado ou de contrato?! Não faz sentido absolutamente nenhum e prejudica a GNR.
Coloquemos o problema do lado da GNR.
A GNR precisa de jovens efectivos, tem um conjunto de pessoas que reúnem todas as condições para serem admitidas, passaram todas as exigências, mas falta uma: não cumpriram o serviço militar em regime de voluntariado ou de contrato. Pergunto: que sentido é que isto faz? Isto é, que sentido faz bloquear o acesso à GNR, com base numa razão desta natureza? Entendemos, portanto, que o «remendo» que este Governo fez a este regime é um «remendo» necessário. Enfim, admitimos que possa ser estabelecido como critério preferencial o facto de se ter cumprido o serviço militar — é de admitir —,…
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Mas a lei é essa!
O Orador: — … mas o que não faz sentido absolutamente nenhum é que isso seja condição sine qua non para se poder ter acesso a uma força de segurança como a GNR.
Os critérios de acesso à GNR devem ser pautados, exclusivamente, pelas exigências próprias dessa missão, pelo que deve ser a GNR a saber definir, concretamente, o que é que se exige para que alguém possa ingressar nas suas fileiras. E alguém que reúna essas condições, obviamente, deve poder ser admitido sem condições artificialmente criadas, como as que foram criadas, sublinho, para assegurar que os efectivos das Forças Armadas tivessem o número mínimo considerado necessário. Como o Governo, na altura, entendeu que os incentivos que estava a oferecer não eram suficientes, considerou necessário criar mecanismos, neste caso coactivos, adicionais, para que as pessoas se vissem como que compelidas a cumprir o serviço das Forças Armadas, em regime de voluntariado ou de contrato, a título de condição para poderem seguir, mais tarde, uma carreira na GNR. Isso, do nosso ponto de vista, não faz sentido e, portanto, não nos associamos aos fundamentos da apreciação parlamentar que foi suscitada.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, entretanto, deu entrada na Mesa um projecto de resolução, apresentado pelo PSD, a propor a cessação de vigência deste Decreto-Lei, o qual será votado, na próxima semana, no período regimental de votações.
Para uma intervenção, tem, ainda, a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de, brevemente, dizer que houve duas coisas que me impressionaram neste debate.
Em primeiro lugar, a absoluta indiferença em relação às consequências de soluções que não basta plasmar nas páginas do Diário da República e cuja aplicação prática se torna num inferno para os organizadores, num fardo para o Estado.
Portanto, dizer que a solução simplificada, agora adoptada, encarece revela que os Srs. Deputados — os que o disseram, naturalmente — ou não fizeram contas ou são totalmente insensíveis a este aspecto. É, aliás, essa a razão pela qual temos de fazer uma profunda reforma — que, aliás, será feita — que acabe com a atitude que leva a tomar medidas sem verificar o impacto dos custos e das suas consequências práticas.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — É o caso desta medida do Governo!
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O Orador: — Não! É o contrário, Sr. Deputado Henrique de Freitas. E a história o dirá, nem o discuto nesta sede.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Não o sabe discutir! Não tem argumento!
O Orador: — A segunda questão que me impressionou foi o carácter oco dos contra-argumentos, ou dos argumentos, ou dos pseudo-argumentos aqui invocados. E devo dizer que há um que me choca e do qual me dissocio totalmente: qualquer atitude tendente a colocar este debate em termos de uma guerra da GNR contra as Forças Armadas ou de uma guerra das Forças Armadas contra a GNR é completamente incorrecta e absolutamente irresponsável. Não vestimos aqui uma camisola contra, estamos em perfeita rota de articulação entre instituições. Portanto, essa atitude consiste em alimentar uma quezília, um equívoco. E, Sr. Deputado Henrique de Freitas, não conte connosco para essa guerra absolutamente inútil…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — O Governo é que começou a guerra! No nosso tempo não havia guerra!
O Orador: — … e, aliás, prejudicial em todos os sentidos.
Choca-me também que, em relação a dados objectivos, se façam operações de ilusionismo. Os números são estes, não são impugnáveis, só são impugnáveis se se entender — o Sr. Deputado Henrique de Freitas não teve a coragem de o dizer em Plenário, só o disse em aparte — que a instituição Guarda Nacional Republicana não cumpriu as regras que a lei impõe na aferição dos candidatos e que, deliberadamente, prejudicou candidatos, o que, como se sabe, é algo que viola ou violaria a lei. Isso não foi feito, Sr. Deputado Henrique de Freitas.
Em último lugar, Srs. Deputados, veremos o que resulta desta lei, mas digo-vos que uma coisa não resultará: a ficção, a hipocrisia de um concurso que, realmente, gere dois e a perda de tempo, Srs. Deputados, que é uma coisa muito importante quando estamos a pensar em instituições que precisam de operacionalidade e de recursos humanos.
Os recursos humanos saem todos os anos, às centenas, da GNR, como os Srs. Deputados sabem. É necessário renovar, e o Governo tem conseguido alocar os recursos necessários para essa renovação, tem conseguido levar a cabo o processo de formação e tem conseguido injectar no sistema sangue novo, homens e mulheres disponíveis para prestarem serviço na Guarda Nacional Republicana. E devo dizer que temos muito orgulho nesse esforço e em ter podido assistir ao acto de juramento em que se comprometeram a servir na Guarda Nacional Republicana.
Continuaremos esse esforço, não entraremos em nenhuma quezília secundária e menos ainda naquela que nos é proposta pelo PSD.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para exercer o direito regimental de defesa da sua honra pessoal, tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Rocha de Freitas.
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Sr. Presidente, julgo que esta é uma matéria de relevante sentido de Estado, não é uma matéria que leve a irrelevantes estados de alma.
Se o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna sentiu necessidade de intervir, nos poucos segundos de que dispunha, para dizer o que disse tal significa para o PSD que toda a nossa argumentação foi válida e que o Sr. Secretário de Estado apenas nos veio dar razão.
Agradeço-lhe, Sr. Secretário de Estado, que me tenha permitido esta intervenção, porque uma vez mais lhe digo que o PSD defende a instituição militar e a honra da Guarda Nacional Republicana.
Não lhe admito, Sr. Secretário de Estado, que insinue que o meu partido ou eu próprio, em alguma circunstância, mesmo em apartes, tenhamos posto em causa a honradez daqueles que comandam as instituições, quer seja a GNR, quer sejam as Forças Armadas.
O Sr. Ramos Preto (PS): — É a parábola moral!
O Orador: — Fica-lhe muito mal, mas mesmo muito mal, que, na última intervenção que proferiu neste debate, tenha ofendido, não a mim, mas aqueles que, em circunstância alguma, podemos acusar de ter corrompido a legalidade e os concursos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas eles não pediram a defesa da honra!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Onde é que está a defesa da honra?!
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O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna: — Sr. Presidente e Srs. Deputados, se bem me lembro, uma defesa da honra não é isto, porque, na verdade, não houve ofensa.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Muito bem!
O Orador: — Houve, no entanto, um problema. É que reparo que o Sr. Deputado Henrique de Freitas aproveitou a circunstância que lhe foi dada, o que, aliás, é positivo, para retirar a insinuação que tinha feito, o que também é positivo, de que tinha havido, por parte da Guarda, qualquer procedimento contrário à lei na aferição dos candidatos. E retirando V. Ex.ª esse aspecto, que era injurioso, insultuoso e inapropriado, chegámos ao ponto em que começámos, ou seja, o concurso foi o que foi, gerou um défice e penúria de elementos, V. Ex.ª confessou que tinha admitido, na sua prospecção e por estudo de impacto — que não conheço, mas que deve ter feito, pelo menos mentalmente —, que poderia haver essa penúria, que tinha admitido, a título excepcional, que a penúria fosse colmatada com um outro concurso, que V. Ex.ª é totalmente insensível aos custos — aliás, o resultado viu-se na governação em que esteve presente —, e que, portanto, estamos hoje a pagar as facturas dessa insensibilidade,…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — E daqui a uns anos pagaremos a sua factura, que será altíssima!
O Orador: — … dessa indiferença e da tentativa de, quando as coisas correm mal, mudar de conversa.
Mas, Sr. Deputado, não consegue! Não vai conseguir! Nem muda de conversa, nem discute aqui o que tem de discutir na Comissão de Defesa,…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Nem discuto questões de defesa com o Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna!
O Orador: — … nem resolve aqui os problemas que não resolveu no passado. Pelo contrário, estendemos-lhe a mão — note a diferença — para avaliar cuidadosamente o impacto, para pedir os números, para estudar os números, na comissão que V. Ex.ª integra ou noutra qualquer, para avaliar os números, para acompanhar o processo de recrutamento,…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — Se fosse a si não propunha isso! Olhe que sai-se muito mal!
O Orador: — … que é transparente e justo, e para, no fim, avaliar se esta solução é ou não melhor. Na nossa opinião, é claramente uma solução melhor,…
O Sr. Henrique Rocha de Freitas (PSD): — É pior!
O Orador: — … porque não estamos fixados no passado, não estamos cristalizados num dogma que conduziu a um resultado negativo, nem alimentamos guerras, guerrilhas, conflitos ou quezílias que em nada ajudam a reformar o nosso sistema, que tem de dar resposta a ameaças novas, de mãos dadas e com cooperação e conjugação de recursos.
Por isso, não somos contra a preferência, somos pela preferência, mas não mistificamos uma preferência relativa em preferência absoluta e não fechamos os olhos, os ouvidos e todas as fontes de conhecimento ao real, quando o real se espeta contra a nossa cara, revelando-nos a necessidade de tomar medidas. É esta a postura com que estamos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos à apreciação do Decreto-Lei n.º 196/2006, de 10 de Outubro — Atribui ao Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior a competência para proceder à simplificação e integração num regime comum das regras a que está sujeito o reingresso, mudança de curso ou transferência para cursos de licenciatura e para ciclos de estudos integrados conducentes ao grau de mestre dos estudantes oriundos de estabelecimentos de ensino superior nacionais e estrangeiros [apreciação parlamentar n.º 35/X (PCP)].
Para uma intervenção, fazendo a sua estreia parlamentar nesta Legislatura, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, é caso para dizer que é a primeira vez desde a última em que cá estive, como ainda ontem foi referido.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Parece o Manuel Pinho!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados:…
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Também vai dizer que os sindicatos são uma força de atraso?!
O Orador: — Não! Esteja descansado, Sr. Deputado! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 196/2006, de 10 de Outubro, que o PCP traz hoje à apreciação da Assembleia da República, tem por objecto a mobilidade dos estudantes entre os estabelecimentos de ensino superior nacionais, do mesmo ou de diferentes subsistemas, e entre estabelecimentos de ensino superior nacionais e estrangeiros, visando a aprovação de um regime comum. A necessidade de criação desse regime resulta do contexto de reorganização do ensino superior decorrente do Processo de Bolonha, que tem tido na mobilidade dos estudantes um dos argumentos chave da sua apresentação e defesa.
Estabeleceu-se naquele Decreto-Lei que o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior deveria aprovar, por portaria e no prazo de 30 dias, as regras a que está sujeita essa mobilidade. De acordo com o preâmbulo do referido Decreto-Lei, dar-se-ia, assim, concretização a duas normas do Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de Março, e cumprir-se-iam, simultaneamente, os desígnios de simplificação de procedimentos previstos no programa Simplex.
A verdade é que não houve nem simplificação nem respeito pela lei.
Por um lado, o prazo para publicação dessas novas regras foi ultrapassado sem que houvesse sequer indícios de concretização do novo regime. Simplificadamente, nada se fez.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Por outro lado, ao prever que o novo regime seja aprovado por portaria, o Governo não respeita a forma legal exigida pela lei para a concretização destas regras. De facto, a Lei de Bases do Sistema Educativo determina, na alínea f) do n.º 1 do artigo 62.° e no n.º 3 do artigo 66.°, que o Governo deve fazer publicar por decreto-lei a legislação complementar necessária para o desenvolvimento daquela Lei de Bases, nomeadamente o sistema de equivalência entre os estudos, graus e diplomas do sistema educativo português e os de outros países, agora integrado no regime de mobilidade.
E, se o atraso na publicação daquelas regras é preocupante, o desrespeito pela Lei de Bases não deixa de ser um sinal de maior preocupação.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — O facto de se diminuir a dignidade legal prevista pela Lei de Bases para um regime jurídico desta natureza tem um importante significado político não só no que deixa transparecer da forma como o Governo encara o cumprimento da Lei de Bases do Sistema Educativo mas, também, no que esta situação concreta representa de tentativa de fuga ao debate político e ao controlo da actividade governativa pela Assembleia da República.
O PCP entende, por isso, ser necessário salvaguardar o cumprimento da Lei de Bases do Sistema Educativo e o respeito pelo debate político e apresentará, assim, as adequadas propostas de alteração do Decreto-Lei n.º 196/2006, porque é importante alterar o diploma, mesmo sabendo que o que está em causa é apenas mais um reflexo ou sintoma de problemas mais fundos: o problema da errada orientação das políticas educativas levadas a cabo por sucessivos governos; o problema das desfiguração do sistema educativo português, agora a reboque dos ditames das potências europeias, vertidos num processo europeu que terá como consequências a elitização e a privatização do ensino; o problema de um sistema educativo orientado para a criação de um exército de mão-de-obra barata, capaz de sustentar o modelo económico baseado em baixos salários, que ainda recentemente o Ministro da Economia sustentou na China e o Grupo Parlamentar do PS defendeu na Assembleia da República.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vou dar as explicações do Governo, face a este pedido de apreciação, apresentado pelo Sr. Deputado do PCP, que também aproveito para saudar nesta sua primeira intervenção na Assembleia.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Não é a primeira!
O Orador: — Então, por esta nova sua intervenção na Assembleia.
Começo pelas duas questões colocadas pelo Sr. Deputado, na intervenção inicial.
Em primeiro lugar, a questão do prazo. De facto, o Decreto-Lei em apreciação estabelece o prazo de 30 dias para a aprovação e publicação da portaria de regulamentação. Esse prazo não foi cumprido, pela simples razão de que o processo de audição se revelou mais moroso. É preciso conduzir um processo de audição dos interessados, que inclui, necessariamente, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, a Associação Portuguesa do Ensino Superior Privado e as diversíssimas associações de estudantes. Esse processo de audição está em curso e, logo que esteja concluído, será publicada a portaria.
Em relação à invocação que fez da Lei de Bases do Sistema Educativo, salvo melhor opinião, julgo que se tratou de um lapso, visto que o artigo que citou é um artigo que vem da redacção original de 1986 dessa lei e as disposições relativas à legislação por decreto dos sistemas de equivalências entre cursos, diplomas e graus no nosso e entre o nosso e outros sistemas de ensino superior já foram regulamentadas através de um decreto sobre o regime geral de equivalências e, depois, em 1997, de outro decreto especificamente sobre o reconhecimento do grau de doutor.
As preocupações deste decreto são completamente diferentes e positivas. Este decreto inscreve-se na dinâmica gerada pelas alterações à Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovadas nesta Assembleia por amplíssima maioria em 2005, e destinam-se a materializar um dos objectivos fundamentais dessas alterações à lei no que diz respeito à regulação do ensino superior, que é fomentar a mobilidade, fomentar a participação de Portugal na construção do espaço comum europeu do ensino superior e derrubar as barreiras que ainda hoje existem à mobilidade dos estudantes, quer no interior do nosso sistema quer entre o nosso sistema e outros sistemas de ensino superior, designadamente na Europa.
O que acontecia era uma situação absurda, visto que o regime de reingresso, de mudança de curso e de transferência entre estabelecimentos de ensino superior portugueses estava (e ainda está hoje) regulado por portaria, ao passo que o regime de transferência entre um estabelecimento de ensino superior estrangeiro e um estabelecimento de ensino superior português estava regulado por decreto-lei — um regime que abrangia quer se tratasse de estudantes estrangeiros quer se tratasse de estudantes nacionais com frequência em estabelecimentos de ensino superior no estrangeiro.
É esta divergência, esta dissonância que não faz nenhum sentido. Designadamente no quadro do Processo de Bolonha, da construção do espaço comum europeu do ensino superior, que, por sua vez, é um dos pilares fundamentais do processo da construção europeia, não faz nenhum sentido que a lei portuguesa, face às mudanças de curso, às transferências e aos reingressos, operando no interior do sistema de ensino superior português, continue a discriminar negativamente aqueles portugueses ou estrangeiros que queiram fazer mudanças de cursos e transferências a partir de estabelecimentos de ensino superior estrangeiros.
É esta discriminação, esta dissonância que agora se corrige numa lógica de desburocratização, numa lógica de simplificação de procedimentos.
Portanto, o decreto limita-se a investir o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior da capacidade de definir por portaria os regimes, quer se trate do ensino superior português quer se trate das transferências e mudanças de curso que ocorrem entre o nosso sistema de ensino superior e sistemas de ensino superior estrangeiros.
Esta preocupação de simplificação, de derrube das barreiras administrativas à mobilidade é o objectivo político essencial deste Decreto-Lei, que, por sua vez, se inscreve naquele que é um dos objectivos fundamentais da revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo — que permitiu, finalmente, a dinamização, em Portugal, do Processo de Bolonha —, que é, justamente, haver mais estudantes a frequentar o nosso ensino superior, mais oportunidades para a frequência do nosso ensino superior, mais mobilidade interna e externa no nosso sistema de ensino superior, mais abertura do nosso sistema de ensino superior face ao mundo europeu e ao mundo contemporâneo, menos burocracia e mais responsabilidade das instituições de ensino superior.
É essa a linha de força quer da revisão da Lei de Bases quer dos diferentes decretos que a regulamentam e que, neste caso em concreto, se conjuga, e bem, virtuosamente, com a nossa outra preocupação essencial de desburocratizar, de simplificar procedimentos e, portanto, de não criar barreiras artificiais às livres escolhas dos estudantes e das suas famílias.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, três Srs. Deputados.
Tem, em primeiro lugar, a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, da nossa
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parte, temos imenso gosto em ouvi-lo todas as vezes, nomeadamente nas fábulas de La Fontaine em que V. Ex.ª é muito bom. No entanto, não deixo de lamentar que, numa apreciação parlamentar requerida por um partido político na Assembleia da República, o Governo não se faça representar pelo ministério competente sobre a matéria que está em causa. É, efectivamente, de lamentar que, da parte do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, não esteja cá ninguém, nem sequer o Sr. Secretário de Estado, mas apenas o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, que, como disse, temos sempre muito gosto em ouvir, mas, sobre esta matéria, gostávamos muito mais de ouvir o que tem para dizer o próprio Ministério.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Trata-se de questões muito importantes. Ainda ontem, aqui, se dizia que a educação, a tecnologia, o ensino superior era a grande matriz e a grande aposta do Governo. Tive oportunidade de referir, neste Plenário, que o verbo não condiz com o ser, o que, mais uma vez, está provado.
A Lei de Bases do Sistema Educativo é uma lei orgânica, sendo-lhe, por isso, atribuída uma dignidade diferente daquela que tem a generalidade das outras leis. A própria Lei de Bases prevê, no seu artigo 66.º, que a situação de equivalência de estudos deve ser feita por decreto-lei. É estranho que agora, a título de um processo de simplificação administrativa, do Simplex, se venha dizer que essa situação, em vez de ser feita por decreto-lei, possa ser feita por portaria. Obviamente que isso limita, aqui também, o controlo que deve ser feito por este Parlamento.
Portanto, Sr. Ministro, nesta matéria, gostava de lhe perguntar (tem de ser a V. Ex.ª e não ao Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior) por que é que terá de ser feito desta forma e não de outra, até porque, no próprio diploma aprovado em Conselho de Ministros e que estamos hoje aqui a apreciar, o DecretoLei n.º 196/2006, a assinatura do Sr. Ministro Ciência, Tecnologia e Ensino Superior não aparece — se calhar, não estava presente nesse Conselho de Ministros, o que também não deixa de ser muito curioso.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Não estava nesse Conselho de Ministros!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares também não estava lá!
O Orador: — Neste sentido, gostaria de saber, Sr. Ministro, por que é que é feita esta proposta e não se mantém aquilo que diz a própria Lei de Bases, quanto a ser estabelecido por decreto-lei.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, antes de mais, queria saudar o registo deste atraso, sobretudo tendo em conta que se deve a uma intenção de participação e de audição de diversas entidades, que consideramos ser necessário ouvir.
Adiantando alguma coisa quanto ao objecto central da nossa apreciação parlamentar, a razão por que a apresentamos é a de que não queremos que a Assembleia da República deixe de ter o espaço que consideramos adequado na participação da avaliação deste processo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Por outro lado, relativamente às questões que salientou, a regulamentação do artigo 66.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, em causa, não está completamente consumida com a publicação dos diplomas que referiu e exige regulamentação. Entendemos que a regulamentação que é necessário fazer dessa norma cabe, precisamente, no âmbito deste Decreto-Lei n.º 196/2006.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Tendo em conta que há aqui, de facto, uma alteração com a necessidade de reorganização do sistema em função do Processo de Bolonha, é necessário haver uma transposição daquilo que é a intenção desta norma, que corresponde à redacção originária de 1985, no que é hoje o quadro da mobilidade no âmbito do Processo de Bolonha. Entendemos que tanto assim é que, até em relação aos diplomas cuja revogação se prevê no Decreto-Lei n.º 196/2006, essa necessidade transparece.
Portanto, entendemos que, pela dignidade legal que deve ser atribuída a este regime jurídico, seria necessária esta alteração.
Vozes do PCP: — Muito bem!
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, convinha que esclarecesse de que quadro de mobilidade e de que regras comuns está, neste momento, a falar, evocando este princípio matricial no Processo de Bolonha, quando este quadro de referências e de regras não existe, como o senhor bem sabe. Estamos à espera de uma portaria que tem enredado numa burocracia extraordinariamente complexa a maior parte dos estudantes que deveriam ter acesso a princípios muito claros.
Por outro lado, também quero perguntar-lhe se, com a sua intervenção, o que se propõe fazer é dar por extintos os artigos 62.º e 66.º da Lei de Bases, esquecendo a clareza que lhes é intrínseca, esquecendo, efectivamente, que é por decreto-lei que deve ser efectuada toda a produção legislativa complementar.
Se o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior não entende que assim deva ser, o melhor, provavelmente, é pedir responsabilidades ao Partido Socialista que, nesta Lei de Bases do Sistema Educativo, consagrou a possibilidade de ser o Parlamento a acompanhar e a fiscalizar todo esse processo legislativo.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para responder, em conjunto, aos três pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, agradeço as questões colocadas e respondo com todo o gosto.
Primeiro ponto: ainda a questão dos prazos.
Verifico que o PCP acompanha o Governo nesta questão que é essencial. Mais vale demorar mais umas semanas…
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Uns meses!
O Orador: — … e ouvir todos os interessados do que fazer alguma coisa à pressa, diminuindo o tempo de audição dos interessados, até porque o efeito útil da portaria projectar-se-á sobre o ano lectivo 2007—
2008. Portanto, o que importa, de facto, é que a portaria esteja em vigor no início desse ano lectivo, e, naturalmente, estará em vigor muito mais cedo.
Mas há aqui uma confusão.
O que a Lei de Bases do Sistema Educativo diz, e bem — insisto: desde a sua redacção original, de 1986 —, é que o regime geral de equivalências é definido por decreto-lei, isto é, tem a dignidade de decreto-lei a definição de como se articulam e compaginam as diferentes formações que as pessoas vão adquirindo. Isso não está em causa, já foi regulamentado.
Ora, o Decreto-Lei n.º 74/2006, que, por sua vez, regulamenta as alterações introduzidas por esta Assembleia em 2005, que é o decreto-lei sobre a estrutura de graus e diplomas no ensino superior português, acrescenta mais um importante segmento a essa regulamentação: isso é feito por decreto-lei, sê-lo-á por decreto-lei, tem de ser por decreto-lei, à luz da lei.
Coisa completamente diversa, Srs. Deputados, é a regulamentação do regime de transferência entre cursos, de mudança de cursos, ou de reingresso nos cursos.
Estamos a falar das regras a que devem obedecer alunos que frequentaram um curso, abandonaram-no e querem reatá-lo — reingresso —, alunos que frequentavam um curso numa determinada área e querem frequentar outro, noutras áreas, sem ter de regressar necessariamente, ao ponto zero de um novo percurso — mudança de curso —, ou alunos que querem transferir-se entre escolas no mesmo curso — transferência. É deste regime que estamos a falar, Srs. Deputados, e isto não carece de decreto-lei. A prova de que não carece de decreto-lei é que, em termos de ensino superior português, sempre foi regulamentado por portaria, coisa que nenhum dos Srs. Deputados contestou, e muito bem.
O problema que havia neste domínio era o de uma discriminação, uma dissonância, um preconceito. O preconceito era este: se se tratasse de mobilidade entre o sistema de ensino superior português e sistemas de ensino superior estrangeiros, tinha de ser por decreto-lei, então, não bastava a regulamentação por portaria. Essa dissonância é que tem de ser ultrapassada.
Se os estudantes portugueses quisessem transferir-se entre a Universidade de Coimbra e a Universidade de Lisboa, submetiam-se a regras reguladas por portaria, mas se os mesmos estudantes portugueses quisessem transferir-se entre a Universidade de Oxford e a Universidade de Lisboa, teriam de submeter-se a regras definidas por decreto-lei. Isto faz sentido? Não! Isto fez sentido no passado, nos tempos anteriores ao Processo de Bolonha, anteriores à plena integração de Portugal no processo de construção europeia. Isto fez sentido nos tempos anteriores à definição, pela Europa, como sendo um dos pilares essenciais, a construção de um espaço comum de ensino superior e de ciência. Faz sentido hoje? Nenhum!
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É preciso uniformizar. É preciso terminar com esta dissonância, esta discriminação.
Como é que se procede? Há duas hipóteses.
Ou pega-se na portaria aplicável aos estudantes do ensino superior português e eleva-se à dignidade de decreto-lei ou pega-se no decreto-lei que estava em vigor, que era o instrumento normativo necessário no passado para regular a mobilidade entre o sistema de ensino português e sistemas de ensino estrangeiros, e reduz-se este à dignidade de portaria. É esta a nossa opção. Porquê? Porque queremos que não haja barreiras administrativas à mobilidade no nosso sistema de ensino superior.
É completamente espantoso que várias bancadas parlamentares queiram acompanhar o Partido Comunista Português no que me parece ser um evidente lapso.
Vejamos.
Somos ou não a favor do processo de integração de Portugal na União Europeia? Somos ou não a favor da valorização do espaço comum no ensino superior, na Europa? Somos ou não a favor da mobilidade no nosso ensino superior? Somos ou não a favor da simplificação de procedimentos? Que o PCP seja contra, já estamos habituados,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ainda bem que não falou no Processo de Bolonha…!
O Orador: — … mas que seja tão rapidamente acompanhado por mais duas bancadas, confesso o meu espanto! Última nota, sobre questões de assinaturas em Conselho de Ministros.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — E de presenças em Plenário, no Parlamento!
O Orador: — Informei previamente o grupo parlamentar que solicitou a apreciação deste Decreto-Lei que o membro do Governo que tem a competência nesta área não poderia estar aqui presente porque está ao serviço do País, na viagem do Sr. Primeiro-Ministro à China, situação que, aliás, também se verificará no próximo ponto da agenda de trabalhos de hoje.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Já não há ministros?
O Orador: — Quanto às questões que foram colocadas, deixe-me fazer uma nota em relação à assinatura do Secretário de Estado do Ensino Superior em sede do Conselho de Ministros. Isso demonstra que foi ele próprio que participou nesse Conselho de Ministros. O facto de não constar a minha assinatura não quer dizer que eu não tenha participado no Conselho de Ministros.
É que, como o Sr. Deputado Mota Soares sabe, e bem, as assinaturas são as dos ministros em razão da matéria e não uma espécie de «folha de presenças» no Conselho de Ministros.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Mas não está a do Secretário de Estado!
O Orador: — Está, está! Vá lá verificar!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.
O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Requereu o PCP a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 196/2006, de 10 de Outubro, que atribui ao Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior a competência para proceder à simplificação e integração num regime comum das regras a que está sujeito o reingresso, mudança de curso ou transferência para cursos de licenciatura e para ciclos de estudos integrados conducentes ao grau de mestre dos estudantes oriundos de estabelecimentos de ensino superior nacionais e estrangeiros.
O referido Decreto-Lei insere-se no contexto da mobilidade dos estudantes entre estabelecimentos de ensino superior nacionais e estrangeiros, decorrente da prioridade estratégica de cooperação europeia reforçada, em matéria de educação, promovendo, dessa forma, «transparência, comparabilidade, transferibilidade e reconhecimento das qualificações e/ou competências entre diversos países e a diferentes níveis.» Entendemos esta apreciação parlamentar, solicitada pelo PCP, como uma oportunidade de analisar o Processo de Bolonha nas vertentes das suas implicações ou da sua aplicação em Portugal. Constatamos, infelizmente, que se enredou apenas em equívocos legais e de prazos.
O Processo de Bolonha representa um desafio tão importante como os que estão definidos na Estratégia de Lisboa e que visam, para a Europa, os perfis próprios de um espaço económico mais dinâmico e competitivo, baseado no conhecimento e capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com
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mais e melhores empregos e com maior coesão social.
É o desafio das qualificações que Bolonha pretende vencer e, para isso, são necessárias mudanças profundas no nosso ensino superior, sendo que grande parte delas já está concretizada: consolidação do sistema europeu de transferência de créditos (ECTS); concretização do sistema de reconhecimento de graus académicos; nova estrutura de graus; adopção de medidas de promoção efectiva da dimensão europeia do ensino superior; implementação de um sistema nacional de avaliação e acreditação do ensino superior; reforma dos modelos de acesso ao ensino superior.
A alteração da Lei de Bases do Sistema Educativo, introduzida pela Lei n.º 49/2005, estabelece as principais linhas orientadoras e a regulamentação da mesma já está concretizada.
Respondo agora à parte central, suscitada pelo pedido de apreciação parlamentar do PCP, o acesso ao ensino superior, a organização da formação, diplomas conjuntos, reconhecimento, mobilidade e graus e diplomas, bem como a formação pós-secundária e sua creditação.
Em relação à questão do formalismo legal, isto é, de as alterações serem introduzidas por portaria ou por decreto-lei, o que estabelece inequivocamente o regime das equivalências e o reconhecimento das habilitações é o n.º 3 do artigo 55.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, cuja redacção inicial, inequívoca, constava já da Lei de Bases de 1986 e está regulado, nomeadamente, pelo Decreto-Lei n.º 283/83, de 21 de Junho, em relação ao regime geral de equivalências, e também pelo Decreto-Lei n.º 216/97, de 18 de Agosto, em relação ao regime de reconhecimento do grau de doutor.
Em relação às regras previstas nos novos n.os 4 e 5 do artigo 13.º da Lei de Bases, estabelece-se, no n.º 4, que «A mobilidade dos estudantes entre os estabelecimentos de ensino superior nacionais, do mesmo ou de diferentes subsistemas, bem como entre estabelecimentos de ensino superior estrangeiros e nacionais, é assegurada através do sistema de créditos, com base no princípio do reconhecimento mútuo do valor da formação e das competências adquiridas» e, no n.º 5, que «Os estabelecimentos de ensino superior reconhecem, através da atribuição de créditos, a experiência profissional e a formação pós-secundária dos que nele sejam admitidos através das modalidades especiais de acesso (…)».
Estas normas já foram regulamentadas por decreto-lei, nomeadamente, n.os 64/2006, de 21 de Março, 74/2006, de 24 de Março e 88/2006, de 23 de Maio.
A Lei de Bases estatui já, objectivamente, toda a regulamentação, e por decreto-lei. Sobra, pois, muito pouco ao PCP e sobrará muito menos após esta discussão.
Como vimos, a parte fundamental da Lei de Bases que já foi regulamentada já o foi com aplicabilidade, no essencial, para o ano lectivo 2006/2007.
A portaria, resultante do Decreto-Lei aqui em discussão, já ultrapassou, efectivamente o prazo previsto para a sua apresentação, mas o importante é que estivesse pronta para ter efeitos no ano lectivo 2007/2008 e, como disse o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, a audição já começou, estando, muito provavelmente, ainda este mês, em vigor. Mais que a tempo de ser aplicada no próximo ano lectivo e, acima de tudo, acabando com um conjunto de regras de mobilidade interna e externa absolutamente fora do contexto actual.
Na verdade, o PCP tem de reflectir um pouco sobre a sua posição em relação ao Processo de Bolonha.
Risos do Deputado do PCP Bernardino Soares.
Umas vezes, diz que este está a ser aplicado de forma demasiado célere, o que não permite a adaptação das universidades e dos politécnicos, outras, usa atrasos em prazos meramente instrumentais ou pormenores legais como pretexto para mais um «número» político.
A realidade demonstra que já temos resultados de algumas dessas medidas, como sejam o aumento de número de alunos no ensino superior, fruto do acesso de maiores de 23 anos; o sucesso que está a ser a implementação dos cursos de especialização tecnológica, principalmente nos institutos politécnicos; e o esforço das instituições de ensino superior que, tudo o indica, terão 90% dos seus cursos adaptados a Bolonha, já no próximo ano lectivo.
O Processo de Bolonha está a decorrer no ritmo certo, estando Portugal na linha da frente da sua implementação, sem avanços nem recuos mas com passos seguros que nos permitem dizer que, antes do ano lectivo 2009/2010, data da sua entrada em vigor no espaço europeu, estará todo concretizado, para bem de Portugal e dos portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, apreciamos o DecretoLei n.º 196/2002, de 10 de Outubro, que atribui ao Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior a competência para proceder à simplificação e integração no regime comum das regras a que está sujeito o reingresso, mudança de curso ou transferência para cursos de licenciatura e para ciclos de estudos integrados conducentes ao grau de mestre dos estudantes oriundos dos estabelecimentos de ensino superior nacio-
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nais e estrangeiros.
Este Decreto-Lei encontra-se inscrito no famoso Programa de Simplificação Administrativa — Simplex, e tem por objectivo alterar os procedimentos de transferência e mudança de curso, não só dos estudantes nacionais, como já foi referido, mas também dos estrangeiros, coisa que, até este momento, tem passado um pouco ao de leve por este debate, alargando, deste modo, os limites à admissão e simplificando os respectivos procedimentos.
Para tal, atribui ao Sr. Ministro da Ciência e do Ensino Superior competência para aprovar, através de portaria e no prazo de 30 dias, a nova regulamentação a que está sujeita a matrícula e/ou inscrição em cursos de licenciatura e em ciclos de estudos integrados conducentes ao grau de mestre, através dos regimes de reingresso, consoante se trate, como já se disse, de estudantes que já estiveram matriculados e inscritos em estabelecimento e curso de ensino superior português e de estudantes que já estiveram matriculados e inscritos em estabelecimento e curso de ensino superior estrangeiro.
Após a publicação da referida portaria, serão revogadas as normas legais aplicáveis aos estudantes oriundos de sistemas de ensino superior estrangeiro.
Ora, nós somos a favor da simplificação dos procedimentos e também da mobilidade e entendemos que deve ser rápida e eficaz. Contudo, não podemos passar por este debate sem referir um conjunto de aspectos que estão a montante do Decreto-Lei em apreciação.
Importa recordar que, decorrente da necessidade de concretização do novo modelo de organização do ensino superior consubstanciado no Processo de Bolonha, procedeu-se à alteração da Lei de Bases do Sistema Educativo, o que originou a aprovação de alguns diplomas, nomeadamente o referente aos graus e diplomas, o Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de Março.
Contudo, a regulamentação da Lei de Bases do Sistema Educativo não se esgota neste diploma referente aos graus e diplomas, ou no dos cursos de especialização tecnológica, ou, ainda, no decreto-lei que regula as condições especiais de acesso e ingresso no ensino superior.
De facto, a Lei n.º 49/2005, de 30 de Agosto, a segunda alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo, determina, no capítulo Disposições finais e transitórias, concretamente na alínea f) do n.º 1 do seu artigo 62.º, que o Governo, no prazo de um ano, fará publicar, mediante decreto-lei, a legislação complementar necessária ao desenvolvimento da lei, designadamente no domínio do ensino superior.
Mais: determina, no seu artigo 66.º, que o «Governo deve definir por decreto-lei o sistema de equivalência entre os estudos, graus e diplomas do sistema educativo português e os de outros países, bem como as condições em que os alunos do ensino superior podem frequentar em instituições congéneres estrangeiras parte dos seus cursos, assim como os critérios de determinação das unidades de crédito transferíveis».
Face ao exposto e ao que é passível de ser inferido do conteúdo da exposição da apreciação parlamentar em epígrafe, é nosso entendimento que está subjacente a este pedido de apreciação a ausência de regulamentação prévia, por parte do Governo, de matérias que se relacionam directamente com o DecretoLei n.º 196/2006, como seja a definição do sistema de equivalência entre estudos, graus e diplomas do nosso sistema educativo e o de outros países, bem como o estatuto do estudante internacional, tal como vem referido na Lei de Bases do Financiamento do Ensino Superior (Lei n.º 37/2003, de 22 de Agosto), no n.º 4 do artigo 16.º.
De facto, já decorreram mais seis meses para além do prazo fixado pela Lei de Bases do Sistema Educativo para a aprovação de legislação complementar no âmbito do ensino superior, pelo que somos de opinião que o Governo deveria ter regulamentado, em primeiro lugar, o sistema de equivalência entre os estudos, graus e diplomas do nosso sistema educativo e o de outros países e, posteriormente, definido o regime comum das regras a que está sujeito o reingresso, mudança de curso ou transferência para cursos de licenciatura e para ciclos de estudos integrados conducentes ao grau de mestre dos estudantes oriundos de estabelecimentos de ensino superior nacionais e estrangeiros.
Por outro lado, e decorrente também desta matéria, impõe-se, como foi já referido, que o Governo proceda, com a máxima brevidade, à publicação do diploma relativo ao estatuto do estudante internacional.
Com efeito, para que as universidades portuguesas possam captar estudantes não oriundos da União Europeia, é necessário que exista o respectivo enquadramento legal no nosso sistema jurídico.
Mais, o Conselho de Reitores apresentou, há mais de um ano, uma proposta de regulamento do conceito de estudante internacional, proposta esta entregue ao Sr. Ministro da Ciência e do Ensino Superior e sobre a qual, até hoje, não se conhece qualquer resposta.
Se a internacionalização do recrutamento do ensino superior português é prioritária ou interessante, então, é fundamental e urgente proceder a esta regulamentação.
Achamos que só depois de feitas todas estas regulamentações, que já deveriam tê-lo sido anteriormente, faria sentido aligeirar os procedimentos administrativos, como é o caso do diploma hoje em apreciação.
E esta questão do prazo, hoje aqui justificada pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, sendo interessante e tendo até subjacente alguma lógica, é incoerente, porque não foi este Parlamento que fixou o prazo de 30 dias. Quando se fixou o prazo, era por demais óbvio, até porque estava expresso no DecretoLei hoje em apreciação, que era necessário ouvir um conjunto de entidades. Ora, quando tivemos conhecimento do Decreto-Lei e vimos que havia esse prazo de 30 dias para simplificar tudo isto, estávamos convencidos de que o processo de auscultação das várias entidades também seria feito ao abrigo do Simplex e
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que seria simples e eficaz. Pelos vistos, não foi… Mas essa é uma matéria na qual o Parlamento não tem qualquer responsabilidade.
Por isso, terminando e respondendo directamente ao repto do Sr. Ministro, quero referir o seguinte: somos a favor da mobilidade e achamos que ela deve ser incrementada e somos a favor da simplificação, mas somos muito mais a favor de que elas se façam, ou seja, de que a mobilidade se concretize e de que a simplificação seja uma realidade.
Agora, já não conseguimos concordar com momentos e mais momentos de propaganda, onde se anuncia que se vai fazer, que se vai simplificar e que se vai dar mobilidade aos estudantes.
É que a verdade é só uma e é esta: ao incluirmos este Decreto-Lei no programa Simplex, a mais não assistimos do que a uma manifestação de propaganda por parte deste Governo. Todos ficámos convencidos — ou, melhor, o Governo procurou convencer-nos — de que, a partir da aprovação deste Decreto-Lei, através de um simples toque numa tecla, os processos de simplificação administrativa estavam conseguidos e a mobilidade era uma realidade.
A verdade é que não há, até hoje, um regulamento do estudante internacional, o processo não está simplificado e com uma nuance, que é esta: os parceiros, quando viram este Decreto-Lei ser aprovado e publicado, criaram expectativas legítimas e isto, por sua vez, criou um processo de paragem na análise dos processos de equivalência, porque, então, estavam à espera da simplificação que, supostamente, 30 dias depois, iria existir. Ora, os 30 dias já lá vão e não sabemos quantos mais 30 dias teremos de esperar para que a mobilidade e a simplificação dos processos sejam uma realidade e não um anúncio virtual.
É que a verdade é só uma: este Simplex, aplicado nesta matéria, tornou-se num «compliquex» e só criou «confusex» nas universidades e nas pessoas que têm de fazer a avaliação destes processos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.
O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, creio que devo felicitá-lo pela sua boa disposição, mas devo dizer-lhe que, no essencial, a sua intervenção não fez qualquer sentido.
A sua tentativa de, ao fazer a intervenção, jogar com as palavras e tornar-se «interessante» fê-lo perderse no conteúdo da mesma. Objectivamente, o que está em causa com a apresentação deste Decreto-Lei é o seu efeito nas instituições — aliás, toda a sua intervenção foi nesse sentido. E o efeito nas instituições só poderia ser efectivo no ano lectivo de 2007/2008. Ou seja, qualquer atraso de prazos — e, designadamente, o atraso de prazos que está aqui em causa e a sua relevância — não tem, efectivamente, qualquer efeito no interior das instituições, porque as questões específicas da mobilidade resultantes da portaria que será publicada só terão efeitos no ano lectivo de 2007/2008.
Depois, o Sr. Deputado disse que não se discutiu aqui a questão central dos requisitos estabelecidos actualmente pelo Decreto-Lei em relação à mobilidade de estrangeiros. Ora, isso é exactamente o que está em causa neste Decreto-Lei, é a alteração de requisitos, absolutamente fora do contexto, como já foi dito pelo Sr. Ministro e como referi na minha intervenção, e que não fazem, neste momento, qualquer sentido. A saber, o requisito de ter de frequentar, pelo menos, dois anos lectivos — e não só dois anos lectivos como, cumulativamente, dois níveis de aprendizagem — e de obter 50% de aprovação a todas as disciplinas desses dois anos. É essa a questão central.
Depois a questão que o Sr. Deputado tentou transformar na questão central da apreciação parlamentar do PCP, e que também eu achava que podia ser uma oportunidade de debate em relação ao Processo de Bolonha mas que não foi. Faz todo o sentido o PCP ter essa opção, mas o Sr. Deputado não pode é transformá-la naquilo que é a sua visão do Processo de Bolonha.
Disse-lhe com clareza que aquilo que é a regulamentação essencial recorrente da Lei de Bases do Sistema Educativo, em relação ao Processo de Bolonha, está concretizada.
O acesso ao ensino superior está concretizado, através das seguintes normas e diplomas: a alínea a) do n.º 5 do artigo 12.º da Lei de Bases do Sistema Educativo; o Decreto-Lei n.º 64/2006, de 21 de Março; a alínea b) n.º 5 do artigo 12.º da Lei de Bases do Sistema Educativo e o Decreto-Lei n.º 88/2006, de 23 de Maio.
A organização da formação, diplomas conjuntos, reconhecimento, mobilidade e graus e diplomas está estabelecida no Decreto-lei n.º 74/2006, de 24 de Março.
A formação pós-secundária e sua creditação está concretizada através do Decreto-Lei n.º 88/2006, de 23 de Maio.
A questão central da mobilidade, que é equivalências e reconhecimento de habilitações, está concretizada no Decreto-Lei n.º 283/83, de 21 de Junho, e pelo Decreto-Lei n.º 216/97, de 18 de Agosto.
A questão da mobilidade dos estudantes entre os estabelecimentos de ensino superior nacionais, do mesmo ou de diferentes subsistemas, está estabelecida nos n.os 4 e 5 do artigo 13.º da LBSE, normas estas já regulamentadas pelos Decretos-Lei n.os 64/2006, de 21 de Março, e 74/2006, de 24 de Março.
Portanto, no essencial, a regulamentação foi feita — e foi-o antes do prazo, estabelecido na Lei de Bases, que era de um ano —, faltando apenas as normas instrumentais, a estabelecer agora nesta portaria
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e que, no essencial, estarão concluídas no próximo ano lectivo.
Por isso, não percebi a sua questão e gostaria que, então, me esclarecesse sobre qual é a sua perspectiva em relação aos efeitos negativos que isto pode ter para as instituições, porque, de facto, só os poderia ter para ano lectivo de 2007/2008.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Mota, agradeço as suas questões e também o seu elogio à minha boa disposição, que, como pode ver, se mantém.
Sr. Deputado, o senhor pode estar aí 20 anos a louvar o que já está regulamentado, mas a verdade é que também há um conjunto de matérias que ainda não o estão.
O Sr. Deputado considera que o que está regulamentado são as questões essenciais, mas com certeza sabe que haverá um conjunto de artigos que ainda não o estão — e não vale a pena estar agora a citar artigo a artigo.
O Sr. Manuel Mota (PS): — Quais?!
O Orador: — Relativamente à matéria em causa, quero dizer-lhe o seguinte: o senhor diz que isto é para ter incidência no próximo ano lectivo — é certo. Mas o que o senhor não diz, porque não quer, é que os processos de certificação de equivalências estão a ser feitos ao longo deste ano lectivo. Então, digo-lhe eu que o efeito da legislação hoje aqui em apreciação nesses processos é nulo, é zero, porque não existe, não está regulamentado, porque não houve portaria nenhuma! E, no que diz respeito aos estudantes do estrangeiro, é pior que nula. E está toda a gente à espera, já há mais de um ano… Aliás, como tive oportunidade de dizer, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas apresentou uma proposta muito interessante, proposta essa, diga-se, feita a pedido do próprio Governo, sobre o regulamento do estatuto do estudante internacional, e não há qualquer resposta.
O que quis dizer-lhe é o que se passa na realidade, é o que está a passar-se nas várias faculdades que são confrontadas com processos destes, ou seja, de dar equivalência ou não, reconhecer ou não, permitir ou não que esses estudantes possam integrar, no próximo ano lectivo, os nossos cursos. E aí — e quem está a lidar com esses processos no dia-a-dia sabe-o — não há solução, porque os prazos foram completamente ultrapassados e o Governo não se definiu.
E volto a dizer o seguinte: não foi esta Câmara, não foi o Parlamento no seu todo que disse que, em
É que esta questão do prazo parece muito simpática e é muito fácil estarmos aqui a dizer que ainda temos de ouvir este ou aquele, mas a verdade é que já estava escrito na lei que era preciso ouvir esta gente toda.
Por isso, creio que já é tempo de os decisores políticos usarem a verdade e de, quando assumem determinados compromissos, serem capazes de os cumprir. Ou, então, assumimos todos aqui que, quando se diz que, no prazo de x, vamos regulamentar isto, ouvindo A, B, C e D, não estamos a falar verdade, estamos a mentir! Relativamente aos prazos, é isso que está aqui em causa e não se pode, meses e meses depois, vir aqui dizer «isto é muito complicado, há muita gente para ouvir e não conseguimos ouvi-los no prazo que definimos».
Então, pense-se antes de se decidir! É este o conselho que quero deixar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Ministro teve aqui a tentação de passar um atestado de menoridade às bancadas da oposição, supondo que elas são incapazes de reconhecer um processo Simplex e que simultaneamente não assumem a mobilidade como um processo matricial na modernização do sistema universitário português à escala europeia. Conseguiu inclusivamente trazer aqui à colação temas como a Europa, o anti-europeísmo e o pró-europeísmo, por conta desta sua necessidade de desvalorizar o essencial.
Ficámos sem saber qual é o estatuto que atribui aos artigos da Lei de Bases que foram aqui focados e que obrigam o ministério e o Governo a apresentar a produção legislativa complementar sob a forma de decreto-lei.
Nesse sentido, o Bloco de Esquerda quer sublinhar claramente os fundamentos da apreciação parlamentar que aqui fazemos.
De facto, não se sabe, Sr. Ministro, que destino deu a dois artigos da Lei de Bases, profundamente
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debatida nesta Casa. A este propósito, convido-o, mais uma vez, a pedir responsabilidades ao Partido Socialista, quando abriu, através deste diploma fundador, a possibilidade de o Parlamento acompanhar e fiscalizar toda esta matéria.
Estas são as questões que estamos aqui a discutir, e não outras, Sr. Ministro.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, já me pronunciei sobre os termos da apreciação parlamentar apresentada pelo Partido Comunista Português, mas não é isso que está agora em causa, o que está em causa é a tentativa de desviar o objecto da apreciação.
Não trato ninguém com menoridade. Não tenho essa autoridade nem tenho essa pretensão, procuro apenas é explicar as coisas e as coisas têm de ser explicadas quando são confundidas, deliberadamente ou não.
Os Srs. Deputados Emídio Guerreiro e Cecília Honório reduzem a sua intervenção ao artigo 66.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, sustentando que, como esse artigo diz que no prazo de um ano o Governo regula por decreto-lei o regime de equivalências e como esse artigo se mantém no texto da lei, essa regulamentação está por cumprir.
Ora, isso é um absurdo, Srs. Deputados! A Lei de Bases do Sistema Educativo é uma lei de 1986, que foi alterada duas vezes, em 1997 e em 2005. As alterações são alterações dos artigos 13.º, 14.º, se não me falha a memória, em 2005…
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sim!
O Orador: — … e, agora já não consigo dizer ao certo quais são os artigos, artigo 16.º, se não me falha a memória, em 1997.
O texto restante da lei mantém-se. Quando a Lei de Bases do Sistema Educativo diz, nas suas Disposições Finais,…
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Leia lá!
O Orador: — …que as disposições relativas à duração da escolaridade obrigatória aplicam-se aos alunos que se inscreverem no 1.º ano do ensino básico no ano lectivo de 1987-1988 e para os que o fizerem nos anos lectivos subsequentes, a Lei de Bases, que tem uma disposição de 1986, foi cumprida em 19871988. A partir de 1987-1988 a escolaridade obrigatória passou a ser de nove anos. As alterações subsequentes não foram alterar essa disposição, que tem um valor histórico.
A disposição relativa à regulamentação por decreto do regime de equivalências é uma disposição que consta da lei de 1986 e que foi regulamentada por duas vezes, com dois decretos-lei que o Sr. Deputado Manuel Mota já citou: um decreto-lei sobre o regime geral de equivalências e depois outro, particular, de 1997, sobre o reconhecimento do grau de doutor. Portanto, essas disposições estão regulamentadas, o facto de a lei continuar a ter o texto não quer dizer que elas não estejam regulamentadas, quer dizer apenas que esse é o texto original da lei que não foi alterado nas alterações de 1997 e 2005.
É só esta clareza que peço, porque senão é impossível discutir politicamente. E a questão política aqui, na qual creio que toda a Câmara acompanha o Governo, é a questão de saber se queremos mais mobilidade no nosso ensino superior ou não. Dizemos todos «sim», julgo eu. E queremos que essa mobilidade seja travada por barreiras administrativas ou não? Julgo que todos dizemos «não» e, portanto, julgo que estamos todos concordantes…
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — É preciso é fazer!
O Orador: — … com esta medida simples de colocar no mesmo nível regulamentar as regras não da equivalência mas, sim, da transferência, do reingresso e da mudança de cursos, sejam elas aplicáveis ao ensino superior português ou ao ensino superior de países estrangeiros.
Isso é essencial e tem que ver com o processo de construção europeia, evidentemente! Isto porque, a razão de ser da revisão de 2005 é o Processo de Bolonha…
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, queira concluir!
O Orador: — Concluo já, Sr. Presidente.
Como dizia, a razão de ser da revisão de 2005 é o Processo de Bolonha. Uns estiverem de acordo, outros não. Uma ampla maioria desta Assembleia manifestou-se de acordo e o cerne do Processo de Bolo-
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nha é mais mobilidade, não só interna de Portugal como interna ao espaço europeu, e é isto que este dispositivo, juntamente com outros, pretende concretizar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não há mais pedidos de intervenção sobre a apreciação parlamentar n.º 35/X. Deram entrada na Mesa duas propostas de alteração, apresentadas pelo PCP, que baixarão à 8.ª Comissão.
Passamos, agora, à apreciação do Decreto-Lei n.º 231/2006, de 24 de Novembro — Autoriza a APS — Administração do Porto de Sines, S. A., a concessionar, mediante concurso público, o serviço público de movimentação de cargas no terminal especializado de granéis líquidos do porto de Sines e de gestão integrada dos resíduos gerados na área de jurisdição do porto, e aprova as bases do contrato de concessão [apreciação parlamentar n.º 38/X (PCP)].
Para apresentar o pedido de apreciação parlamentar, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.
O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP decidiu apresentar esta apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 231/2006, de 24 de Novembro, que autoriza a Administração do Porto de Sines a concessionar o serviço público de movimentação de cargas no terminal especializado de granéis líquidos do porto de Sines e de gestão integrada dos resíduos gerados na área de jurisdição do porto, por considerar que o Decreto-Lei do Governo tem por objectivo entregar, pela forma de concessão, uma estrutura essencial para desenvolvimento de um sector estratégico, o sector portuário, e, neste caso, na vertente dos granéis líquidos, que é a principal actividade do porto de Sines.
Fá-lo precisamente no momento em que esta infra-estrutura de interesse nacional está em condições de assegurar, com uma boa gestão pública, o retorno dos investimentos que foram feitos ao longo do tempo neste terminal.
Basta ver os números para compreendermos que o terminal de granéis líquidos tem vindo a aumentar o seu peso na actividade portuária de Sines. De 56%, em 2002, subiu para 61%, em 2005. É uma actividade que representa 74% do movimento total do porto de Sines e naturalmente que os argumentos invocados pelo Governo para abrir portas a mais esta entrega ao capital privado deste sector serão o do investimento.
Lembramos que o Governo não investiu como devia, com dinheiros públicos, obrigando a APS a recorrer sistematicamente ao crédito e daí o endividamento existente.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Mas hoje, Sr.as e Srs. Deputados, no momento em que o terminal de granéis líquidos tem a perspectiva de aumentar a sua actividade, e todos sabemos que é isto que está no horizonte, no momento em que podemos assegurar o aumento dessa actividade — e lembro que o terminal de granéis líquidos do porto de Sines está aproveitado a menos de 60% da sua capacidade, logo, temos aqui um potencial enorme —, se tivermos presente a estratégia de utilizar mais o transporte marítimo como opção e se considerarmos a implementação e o reforço de actividades nesta área em Sines, como tem vindo a ser anunciado, não podemos aceitar que o terminal de granéis líquidos do porto de Sines seja transformado em mais uma das muitas negociatas que se fazem à custa do investimento público para depois assegurarmos a sua exploração lucrativa pelo sector privado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — E daí entendermos que este Decreto-Lei só pode ter um caminho, que é a cessação da sua vigência.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — É esta a proposta que o Grupo Parlamentar do PCP traz a esta Câmara e esperamos que as Sr.as e Srs. Deputados, reflectindo sobre esta realidade, nos acompanhem nesta nossa proposta.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria também de tentar esclarecer as dúvidas que o PCP exprime através deste pedido de apreciação parlamentar.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não há muitas dúvidas!
O Orador: — Comecemos por uma divergência política geral que não vale a pena esconder, que é uma divergência política geral sobre as nossas concepções acerca das funções do Estado na economia.
Tipicamente, para o PCP, o Estado deve ser o prestador directo e o único prestador directo, pelo menos nos sectores que o PCP costuma delimitar com uma linguagem que lhe é habitual. Para o Governo, as funções essenciais do Estado na economia são funções de regulação e, do ponto de vista dessa concepção, aquilo que ao PCP parece uma negociata – coisa, aliás, que o PCP nunca demonstra –, é, na óptica do Governo, a normal utilização de um instrumento administrativo claramente tipificado na lei, que é a concessão de serviço público, quando ela se justifica.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Se justifica para o interesse privado!
O Orador: — Portanto, há aqui uma divergência clara, uma divergência política, entre as concepções do Estado proprietário e Estado prestador directo, único prestador, típicas da ideologia do PCP, e as concepções das funções essenciais do Estado, da função reguladora do Estado na economia, típicas da ideologia do Partido Socialista.
Os senhores estavam à espera que eu fosse usar ideologia no sentido pejorativo mas, para mim, ideologia não tem sentido pejorativo.
Há diferenças ideológicas e políticas que são evidentes e que estão, aliás, na raiz deste pedido de apreciação parlamentar por parte do PCP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é verdade!
O Orador: — Segundo ponto essencial: esta decisão não é de natureza conjuntural,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ah pois não! Isso também é verdade!
O Orador: — … não é de natureza episódica, não tem qualquer razão circunstancial, é uma decisão que se inscreve no Programa deste Governo, aliás, na lógica de desenvolvimento da gestão marítima-portuária em Portugal.
É neste sentido que aponta a Resolução do Conselho de Ministros de 1998, que aprovou o Livro Branco da Política Marítima-Portuária. O Programa do Governo, na sua secção relativa aos portos, propõe como objectivo optimizar as infra-estruturas e promover a competitividade dos portos nacionais, regulando o sistema de concessões de instalações portuárias. E as orientações estratégicas para o sector marítimoportuário, que o Governo apresentou em Dezembro de 2006 e que estão em discussão pública, reforçam também estes dois pilares: a consolidação do modelo de gestão dito landlord port, portanto um modelo no qual a própria autoridade portuária mantém as funções de regulação e subcontrata funções de prestação directa de diferentes operadores, e o reforço da participação da iniciativa privada na gestão dos portos nacionais.
Portanto, segundo elemento que convém tornar claro: há aqui uma diferença política essencial entre o PCP e o PS – como se sabe, o eleitorado prefere, por larga maioria, a do PS – e, em segundo lugar, há aqui uma visão estratégica para os portos nacionais, na qual esta medida também se inscreve.
Não querendo demorar muito tempo, quero dizer-lhe ainda o seguinte em relação às duas ou três preocupações que o Partido Comunista Português exprime na sua apreciação parlamentar.
Quanto à primeira preocupação, o receio de que o Estado deixasse de ter o controlo da actividade portuária, especificamente da actividade do terminal, quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que não tem razão de ser.
Quer por via dos poderes de fiscalização e de regulação que a autoridade portuária manterá, quer através especificamente dos «remédios», como se diz na linguagem da Autoridade da Concorrência, isto é, das disposições contidas nas bases da concessão, o que é preciso garantir, do ponto de vista da plena utilização do serviço público essencial que é assegurado por aquele terminal, está garantido, seja do ponto de vista da segurança e ambiente, seja do ponto de vista do padrão de qualidade de serviço, seja do ponto de vista do que está previsto em casos de incumprimento grave por parte do concessionário, medidas que podem ir ao sequestro, ao resgate, ao fim da concessão.
Portanto, esta preocupação que o Partido Comunista Português exprime, no seu pedido de apreciação parlamentar, não tem razão de ser.
Uma segunda preocupação, a que, aliás, o Sr. Deputado José Soeiro não se referiu na sua intervenção inicial, diz respeito à situação e aos direitos dos trabalhadores, mas tudo isso está também plenamente garantido, quer os contratos, quer os direitos laborais, incluindo o direito decisivo à negociação colectiva.
Também a importância estratégica do terminal para o abastecimento do País em recursos essenciais para as populações e as indústrias está garantida pelos termos e pelas bases da concessão.
Portanto, resumindo e concluindo, descontada a nossa divergência ideológica de base, que não quero esconder, as preocupações que o PCP poderia ter em relação a este Decreto-Lei não têm razão de ser, do
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ponto de vista do Governo, justamente porque quer os termos do Decreto-Lei quer os termos das bases de concessão respondem plenamente ao que podia deduzir-se dessas preocupações.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados José Soeiro e Helena Pinto.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.
O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, naturalmente, há uma diferença de fundo efectiva entre a filosofia da política do Governo e a filosofia que o Grupo parlamentar do PCP acabou de expor na minha intervenção, porque entendemos que as alavancas estratégicas para o desenvolvimento do País devem estar ao serviço do País e não ao serviço de interesses privados.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Esta é uma questão central.
Na verdade, a preocupação que o Governo tem vindo a manifestar visa sobretudo criar condições para tornar apetecíveis os negócios para o sector privado. É o Estado que investe, são os dinheiros públicos que criam condições para criar as infra-estruturas mas, depois, na altura em que estão criadas as condições para o retorno ser assegurado, o Governo abre portas ao negócio!
O Sr. João Oliveira (PCP): — É uma vergonha!
O Orador: — E não é para perder! Basta ler os relatórios do Tribunal de Contas sobre muitas das concessões que têm sido feitas ao longo dos anos, neste país, para constatarmos os lucros exagerados que são assegurados em concessões leoninas para o sector privado. Esta é a realidade!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Portanto, ao contrário do que disse o Sr. Ministro, não se trata apenas de o Grupo Parlamentar do PCP vir para aqui falar, sem demonstrar aquilo que diz! Basta ver os lucros fabulosos que conseguem as concessionárias com as concessões que o Governo lhes vai dando.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — E isso é mau?!
O Orador: — É normal que se exijam sacrifícios aos trabalhadores, aos empresários, aos portugueses e que, depois, os resultados desse esforço, desse investimento vão parar directamente aos bolsos dos grandes grupos? Para o Sr. Ministro, é normal!
Vozes do PCP: — Uma vergonha!
O Orador: — Ficamos a saber que, efectivamente, esta é a filosofia do Governo e do Partido Socialista.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Não é, mas devia ser!
O Orador: — Nós não a acompanhamos.
Não pusemos em causa a entrada dos granéis líquidos energéticos no País, o que dissemos foi que, no momento em que se perspectiva potencializar aquela infra-estrutura feita com o dinheiro público, o Governo tem a preocupação de «abrir a porta já»! Até podia esperar, pelo menos, para tentar fazer um negócio melhor, mas no momento em que o porto está a aumentar a sua capacidade, no momento em que começa a apresentar lucros, fá-lo imediatamente, não vão os lucros aumentar demais e, então, a concessão ser demasiado escandalosa ou não ser tão lucrativa quanto o privado deseja.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Gostava que o Sr. Ministro me respondesse se há alguma lei que imponha a privatização deste sector e que lei é essa. Já agora, ficamos a saber! O Sr. Ministro diz-nos: «a lei permite». E quem fez a lei? Por que é que a fez? Não foi precisamente para abrir portas a estes negócios?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
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O Sr. Jorge Machado (PCP): — É uma vergonha!
O Orador: — Ela não caiu do céu! Há responsáveis e é essa responsabilidade que invocamos na nossa intervenção.
Quanto aos trabalhadores, já percebemos que querem acabar com a contratação colectiva, procurar desregulamentá-la e reduzir os direitos dos trabalhadores, direitos conquistados ao longo de gerações, para poderem oferecer, no exterior, as vantagens comparativas de terem aqui mão-de-obra barata.
Está tudo dito, Sr. Ministro! Nesta matéria, não vale a pena acrescentar mais nada.
O Sr. Ricardo Gonçalves (PS): — Quem manda na China é o partido comunista chinês!
O Orador: — Acho lamentável que os senhores invoquem uma coisa e, depois, façam pior! Até já oferecem a mão-de-obra dos portugueses, invocando precisamente a natureza barata que a mesma pode ter aqui, para o capital investir.
Aplausos do PCP:
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, ouvi as suas explicações em relação a este pedido de apreciação parlamentar do PCP mas penso que V. Ex.ª não respondeu à questão principal.
Assim, se me permite, voltaria a colocá-la para que o Sr. Ministro a aprofundasse um pouco mais.
A questão principal é esta, Sr. Ministro: por que é que o Governo optou pela concessão a privados de um serviço público precisamente no momento em que a capacidade do porto em causa e os movimentos no seu terminal estão a aumentar significativamente? Por que é que, no momento em que as coisas até estão a correr bem, o Governo opta por concessionar a privados um serviço que está nas mãos do Estado e que não está, de modo algum, a correr mal? Aliás, houve mesmo, tal como já aqui foi demonstrado por números, um grande investimento nesse serviço.
Posto isto, para além da divergência ideológica que nos separa, importa perceber como é que esta concessão se enquadra nas tais orientações estratégicas. Existe, de facto, um documento de orientações estratégicas para todos os sectores (que o Governo até diz que se interligam), por isso pergunto como se enquadra nas opções estratégicas do Governo para o sector portuário a concessão deste serviço público, que, como sabemos, tem vindo a aumentar e que poderia, como o Sr. Deputado José Soeiro disse, e muito bem, começar a garantir algum retorno ao Estado.
Por último, o problema dos direitos dos trabalhadores não ficou nada esclarecido.
Peço desculpa, mas a garantia aqui dada pelo Sr. Ministro de que os direitos dos trabalhadores estão assegurados não pode ser verdadeira, e não pode ser verdadeira porque a concessão tem uma base que refere, exactamente, a existência de contrato individual para os trabalhadores — é o que está lá escrito! Então, por que é que houve essa necessidade? Também em resultado das declarações proferidas na China, percebemos que o Governo quer alterar o modelo de regulação das relações laborais. Portanto, também aqui temos uma importante divergência ideológica.
Diga-me, Sr. Ministro, como é que desta forma se garante o direito dos trabalhadores daquele porto? Esta questão não está devidamente esclarecida.
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, agradeço as questões colocadas pelos Srs. Deputados José Soeiro e Helena Pinto e manter-me-ei na terminologia leninista da questão principal.
A questão principal que nos divide, que divide o Partido Socialista do Partido Comunista Português, não é que uns estejam a favor de quem está ao serviço do País e outros se queiram pôr ao serviço de interesses privados.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É, é!
O Orador: — Não, não! A questão é a seguinte: do ponto de vista do PCP, para estarem ao serviço do País, as instituições têm de ser inteiramente públicas e, dentro do público, inteiramente estatais. Por isso é que o PCP é estatista!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não exagere!
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O Orador: — Para o PCP, só se estiver nas mãos do Estado é que um serviço, uma instituição, uma actividade pode ser dita de interesse público. Esta não é a concepção do Partido Socialista,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — A do PS é neoliberal!
O Orador: — … nem é a concepção da esquerda democrática, moderna e europeia que queremos ser.
A questão também não se põe relativamente à natureza das parcerias público-privadas. O problema não é que o PCP veja negociatas onde elas existam; o problema é que, para o PCP, sempre que há uma parceria público-privada, por definição, há uma negociata.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Por acaso, a maior parte das vezes há!
O Orador: — É isto que nos distingue.
Há pouco, disse o Sr. Deputado Jorge Machado, em aparte, que é uma vergonha. Sr. Deputado, o que é uma vergonha é continuar a pensar assim no século XXI. Isso, sim, é que é uma vergonha!
Vozes do PCP: — Ah!
O Orador: — Quanto à questão colocada pelo Sr. Deputado José Soeiro, noto que o Sr. Deputado, quer na intervenção inicial quer no pedido de esclarecimentos, já teve o cuidado de se demarcar da expressão absurda que vem no pedido de apreciação. Refiro-me à equivalência sugerida entre a existência de contrato individual de trabalho e a inexistência de direito à negociação colectiva. Entretanto, o Sr. Deputado José Soeiro interveio e já clarificou essa matéria que estava nebulosa no texto do pedido de apreciação parlamentar do PCP.
Quanto à questão principal colocada pela Sr.ª Deputada Helena Pinto, que quer saber por que é que se concessiona, por que é se aposta nas concessões de serviço público, por que é se aposta nas parcerias público-privadas, devo dizer que o fazemos por três razões fundamentais, Sr.ª Deputada.
Primeira razão: porque clarifica muito melhor as funções de regulação e de fiscalização que o Estado, e só o Estado, pode garantir. E tem de ser o Estado a fazê-lo, porque não há mercado sem regulação. Portanto, quanto menos se confundirem os papéis de prestador e de regulador, mais independente, mais eficaz e mais colocada ao serviço do interesse geral é a regulação e a intervenção pública.
Segunda razão: porque faz todo o sentido trazer os nossos agentes económicos para os investimentos estruturantes nas infra-estruturas de que necessita a nossa economia. Portanto, faz todo o sentido trazer para a gestão dos nossos portos aqueles que os utilizam, faz todo o sentido trazer para a gestão das nossas infra-estruturas aqueles que as utilizam. Sabe porquê? Porque assim essas infra-estruturas são geridas mais num ambiente de mercado e para o serviço dos utilizadores e não por burocratas e num ambiente de burocracia.
Protestos do BE.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Só se forem os burocratas do PS!
O Orador: — Terceira razão fundamental: porque deste modo o Estado, as instituições públicas, a Administração Pública, garantem retorno, Sr.ª Deputada. A concessão significa um encaixe financeiro imediato com o concurso, implicando depois o pagamento anual de uma taxa de concessão. E assim se conseguem retornos, isto é, dinheiro para que o investimento público possa ser dirigido para onde ele é preciso e onde o mercado não consegue fazê-lo.
São três razões fundamentais que levam a que, para os socialistas, as parcerias público-privadas sejam úteis e a concessão de serviço público seja um instrumento adequado, com bases claras. Julgo que não é assim para o Bloco de Esquerda, porque o Bloco de Esquerda nega à partida, por preconceito ideológico (ou, se quiser, por axioma ideológico), a possibilidade de o Estado favorecer mais as suas funções de regulação do que as funções de prestação directa e, ainda, a possibilidade de o Estado se envolver em parcerias com os privados. Esta é a diferença essencial.
Mas há uma outra diferença a que a Sr.ª Deputada Helena Pinto se poderia ter referido, que tem a ver com o facto de este processo não se ter iniciado agora, de estar em curso desde 2002. Refiro-me à diferença introduzida pelo actual Governo, em função, aliás, de uma recomendação da Autoridade da Concorrência.
Com efeito, estava previsto que houvesse um ajuste directo e este Decreto-Lei veio obrigar à realização de um concurso público. Ou seja, mais transparência, mais independência e, também, melhor satisfação do interesse público.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Cunha.
O Sr. Vasco Cunha (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, e não vou poder cumprimentar a Sr.ª Secretária de Estado dos Transportes que, presumo, não estará na China…
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Está, está! Está em Macau, que é na China!
O Orador: — Então, não está presente ninguém da área… O Governo parou! Sr. Presidente, Sr
.as e Srs. Deputados: O presente debate é suscitado pelo Grupo Parlamentar do PCP, que requereu a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 231/2006, de 24 de Novembro, que autoriza a APS -Administração do Porto de Sines, S.A., a concessionar o serviço público de movimentação de cargas no terminal especializado de granéis líquidos do porto de Sines e de gestão integrada dos resíduos gerados na área de jurisdição do porto.
O Grupo Parlamentar do PCP considera que o diploma em apreço «representa mais um passo no sentido da alienação de alavancas estratégicas da economia nacional, designadamente no sector portuário».
Com efeito, o PCP afirma que «este caso reveste-se ainda de implicações particularmente críticas para o sector energético, tendo em conta que se trata da concessão a privados do principal porto de abastecimento energético do nosso país».
Sr.as e Srs. Deputados: Importa, por uma questão de rigor, fazer a história recente da concessão do terminal de granéis líquidos do porto de Sines.
O XIV Governo Constitucional definiu como vector estratégico para a política dos portos e para o interesse nacional a concessão directa da exploração do terminal de granéis líquidos do porto de Sines à Petrogal. Nesse tempo, a Petrogal era uma empresa de capitais públicos e o interesse estratégico da concessão era evidente e claro.
Com o XV Governo Constitucional desenvolveu-se esta ideia e deu-se o aval à concessão à Petrogal da exploração do terminal de granéis líquidos do porto de Sines.
Neste momento, em Fevereiro de 2007, a Galp está no domínio privado e não se poderia compreender que o interesse estratégico favorecesse uma empresa privada em detrimento de outras empresas.
Mas mais do que isto, nomeadamente quanto aos termos do contrato de concessão que vier a ser estabelecido com a empresa que ganhar o concurso público, importa analisar se o Governo tem uma estratégia para os portos e se as medidas essenciais para o desenvolvimento do porto de Sines prometidas pelo Partido Socialista estão a ser cumpridas.
Lembramos que, em relação ao porto de Sines e no âmbito da concessão do Terminal XXI à PSA – Port of Singapore Authority Corporation Limited, o actual Governo fez acompanhar o contrato de uma cartaconforto com promessas de intervenção nas áreas ferroviárias e rodoviárias que ainda não foram cumpridas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, a realidade é evidente, a propaganda é permanente e os anúncios recorrentes, mas a verdade é outra. Estamos cansados de promessas ao longo destes dois anos de mandato socialista. Daí que se justifiquem as nossas questões. Como está o IP 8, que assegura a ligação a A2 e a Espanha? Onde está o IC4, que constitui a necessária ligação ao Algarve? Como está a ligação ferroviária a Badajoz, essencial para o desenvolvimento estratégico e a internacionalização do porto de Sines? Estará o Governo em condições de dar cumprimento a uma política consequente para o sector ou vamos assistir à aplicação de medidas descontextualizadas, numa política de faz de conta, virtual, sem rumo e sem estratégia? Nesta linha, lembramos ainda que as auto-estradas marítimas são um dos pilares do desenvolvimento estratégico da Europa e de defesa do meio ambiente.
Sr. Presidente, sem uma política concreta, assente em modelos de desenvolvimento e de interoperabilidade ferroviária e rodoviária, não é possível definir uma política para os portos. O porto de Sines, como porto de águas profundas, é uma porta essencial nas operações transitárias e na entrada de mercadorias na Europa. O Governo, por falta de visão estratégica, está a passar ao lado de um dos vectores do nosso desenvolvimento, desperdiçando a nossa costa e os caminhos do mar.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Antunes.
O Sr. Alberto Antunes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: O Decreto-Lei n.º 231/2006, cuja apreciação parlamentar o PCP solicitou, autoriza, como aqui já foi referido, a Administração do Porto de Sines (APS) a concessionar o serviço público de movimentação de cargas no terminal de granéis líquidos do porto de Sines e da gestão integrada de resíduos, através de concurso público internacional, a pessoas singulares ou colectivas.
Esta decisão não resulta de qualquer lei, como o Sr. Deputado José Soeiro disse, mas, sim, de um programa que o Partido Socialista apresentou ao eleitorado, que foi por este sufragado e que está plasmado
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no Programa do Governo aprovado por esta Assembleia. A medida decorre, portanto, de um compromisso eleitoral, mas devo dizer que se insere numa visão estratégica para o sector marítimo-portuário que o Partido Socialista vem defendendo há muito tempo. Já em 1998, como o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares referiu, foi aprovado em Conselho de Ministros o livro branco do sector marítimo-portuário, do qual constavam, como pilares fundamentais para um modelo de gestão dos portos comerciais, o reforço na consolidação do modelo de landlord port e o reforço da participação da iniciativa privada.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Mas esta visão estratégica, como também foi explicado, decorre ainda de uma filosofia global que entende o papel do Estado essencialmente como regulador e não como prestador de serviços.
O PCP continua, na teoria, fiel ao princípio da prestação directa do serviço público através do Estado.
Mas também aqui em teoria, porque quando assumem responsabilidades executivas nem sempre são fiéis à teoria. Assim aconteceu, por exemplo, na câmara de Setúbal, cuja primeira medida, depois de o PCP ter reconquistado o executivo, foi a de concessionar a privados os serviços de limpeza do concelho através de concurso público.
Vozes do PS: — Ah!
O Orador: — Neste caso, até com a curiosidade de ter optado pela proposta mais cara, onerando, assim, os contribuintes. «Bem prega Frei Tomás»!…
O Sr. José Soeiro (PCP): — Já falamos!
O Orador: — O Grupo Parlamentar do Partido Socialista reconhece que esta concessão apresenta particular relevância e sensibilidade para a economia nacional. Mas ela será atribuída com base num concurso público internacional, o que resultará em maior transparência quanto ao método de escolha do futuro concessionário e prestador do serviço. Alem disso, será atribuída de acordo com o previsto nas bases gerais da concessão do terminal, que englobam áreas tão diversas como a publicidade relativa à exploração, a segurança e o ambiente (vertente decisiva desta atribuição e que nem sempre foi bem acautelada), as condições de rescisão e caducidade da concessão e o regulamento de tarifas.
O futuro concessionário está, assim, condicionado a orientações claras, previstas nas bases da concessão, que salvaguardam o interesse público.
A Sr.ª Isabel Jorge (PS): — É verdade!
O Orador: — À Administração do Porto de Sines impõe o Estado que regule e fiscalize com rigor a actividade do futuro concessionário.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista orgulha-se, através da actividade de fiscalização do anterior executivo, de ter impedido um ajuste directo, como forma de atribuição da concessão à Galp, que nos suscitou as maiores dúvidas. Não estavam, em nossa opinião, a ser garantidas condições de transparência, rigor e defesa do interesse público na atribuição dessa concessão. Por isso, apresentámos nesta Assembleia da República um requerimento, perguntando o que estava e como estava a ser feito. Eram, sobretudo, as condições de atribuição da concessão que podiam pôr em causa o futuro serviço público da operação.
Tal como nós, também a Autoridade da Concorrência teve a mesma interpretação, o que levou à inviabilização do ajuste directo. Na verdade, o mapa da área a concessionar impedia a possibilidade de terceiros poderem dispor de condições de tancagem, o que impedia as condições de livre concorrência.
Sr. Deputado Vasco Cunha, o Partido Socialista orgulha-se da gestão levada a cabo pelo seus governos e da estratégia imprimida ao desenvolvimento do porto de Sines. Já aqui recordei, em intervenção proferida no período de ordem do dia, as obras e respectivos protagonistas: o terminal de gás natural, o Terminal XXI de contentores, em associação com a PSA, que tanto foi criticado pelo PSD, as melhorias no porto piscatório e a remodelação e os investimentos no terminal que agora irá ser objecto de concurso.
Felizmente, os três anos de desvario de uma administração PSD-CDS não foram suficientes para destruir a obra lançada e impedir a concretização da estratégia de desenvolvimento deste porto. Recordo, aliás, que as obras da ferrovia e da rodovia podiam e deviam ter sido desenvolvidas pelos governos do PSD e do CDS, o que, infelizmente, não aconteceu. A obra do PSD no porto de Sines consistiu apenas em atrasar a entrada em funcionamento do terminal de gás natural e do terminal de contentores.
Nestes termos, não tememos, antes apoiamos, a concessão a privados dos serviços de carga e descarga dos granéis líquidos do sector energético, realizada nos termos e condições previstas no Decreto-Lei em apreciação e respectivas bases gerais. Confiamos no papel activo e interveniente da administração portuária, enquanto entidade reguladora e fiscalizadora. E nem sequer descortinamos o atentado aos direitos dos trabalhadores, porque o regime de contrato individual de trabalho é hoje um dos regimes praticados em todos os sectores de actividade, incluindo da Administração Pública.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — O que não quer dizer que seja bom!
O Orador: — Em segundo lugar, acreditamos nos trabalhadores portugueses, que cada vez mais desejam um posto de trabalho onde possam pôr ao serviço da comunidade a sua capacidade de trabalho. Isto é de tal forma evidente, natural e assimilado pelas organizações sindicais responsáveis, que o Sindicato dos Trabalhadores das Administrações e Juntas Portuárias negociou uma convenção colectiva onde estão presentes os critérios de mobilidade, flexibilidade e polivalência. E de tal forma assim é que, hoje, nesta área sensível e vital para a economia nacional existe uma organização de trabalho de tal forma eficiente que regista 0% de absentismo.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista dará, assim, assentimento ao presente Decreto-Lei e à consequente privatização deste sector estratégico, nos termos e condições incluídos nas bases do concurso.
Até porque ao Governo caberá sempre uma última e ponderada palavra na análise e escolha do futuro concessionário e na defesa do interesse nacional. Incluindo a possibilidade de não concretizar a adjudicação se considerar que este interesse pode estar em perigo.
A esta Assembleia caberá também a função de apreciar e fiscalizar os actos do Governo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje a apreciação parlamentar requerida pelo Partido Comunista Português sobre o Decreto-Lei n.º 231/2006, de 24 de Novembro.
A actividade portuária portuguesa é um importante elemento de competitividade e criação de riqueza do País. Com a zona económica exclusiva que o mar nos oferece, a nossa longa costa pode funcionar como porta de entrada na Península Ibérica bem como na Europa. A falta de uma política estratégica integrada na gestão marítimo-portuária fragiliza em muito a potencialidade deste segmento. É, pois, primordial que todo o sector marítimo e portuário nacional seja alvo de uma concertação estratégica, de modo a ser criada uma rede eficaz para o mercado nacional e internacional. É necessário e urgente apostar neste sector com políticas integradas dos vários portos nacionais, promovendo a competitividade dos mesmos e não tendo como objectivo a concorrência entre si, mas, sim, com outros portos europeus.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!
O Orador: — Muito do volume de transacções do porto de Algeciras, no sul de Espanha, que foi da ordem das 64 000 000 t em 2005, pode ser transaccionado nos portos nacionais.
O transporte marítimo é hoje, no mercado internacional, responsável pelo movimento de mais de 90% do total de mercadorias transaccionadas e Portugal está longe de contribuir para esta fasquia, muito devido à falta de estratégia política no sector. A preferência pelo transporte marítimo é também fortemente incentivada pela Comissão Europeia, em detrimento do transporte terrestre, possibilitando, assim, o descongestionamento dos grandes eixos rodoviários e ferroviários e retirando daí todas as mais-valias para a economia e o ambiente.
A actividade portuária nacional foi, em 2004, responsável pela transacção de 46 000 000 t de mercadorias, representando, assim, 61% do comércio externo.
O porto de Sines é considerado o principal porto português, com uma quota de 24% das transacções do comércio externo. Em 2005, movimentou 25 000 000 t de mercadorias e 9800 t de peixe, registando um volume de negócios de 30 000 000 €, o que representa um crescimento de 17% relativamente ao ano anterior. É de 63% a quota do comércio nacional de produtos petrolíferos que passaram pelo porto de Sines.
Fica demonstrado o potencial deste porto e por isso mesmo nos parece incompreensível que o mesmo não tenha ainda as condições mínimas de acesso terrestres e ferroviárias.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Ao contrário do que foi afirmado, não houve no passado qualquer desvario. O que há é uma evidente falta de visão estratégica deste Governo.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este Decreto-Lei vem colmatar graves lacunas e incongruências detectadas pelo Tribunal de Contas em auditoria realizada à Administração do Porto de Sines.
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Este pedido de apreciação parlamentar, requerido pelo Partido Comunista Português, tem como aspecto positivo o alertar para a necessidade de uma visão estratégica, integrada e articulada para todo o sector, mas erra no «remédio», porque, certamente, não estarão de acordo com a situação em que se encontra o porto de Sines.
A sua situação económica é frágil, sendo que em 2005 o endividamento da APS ascendia a 74 400 000 €. Nos últimos quatro anos os encargos financeiros ascenderam a cerca de 11 300 000 €, estando estimado que até à maturidade desses empréstimos ainda serão dispendidos mais 11 400 000 €.
Entre as irregularidades apontadas pelo Tribunal de Contas estão os contratos de concessão de serviço público celebrados com a Portsines, S.A., e com a Port of Singapore Authority, ambos precedidos de ajuste directo. A opção por este procedimento em detrimento do concurso público restringe a concorrência e não é a mais adequada ao acautelamento dos interesses financeiros do Estado, bem como à defesa do interesse público.
Por outro lado, a APS despendeu 21 000 000 € na construção de uma infra-estrutura que excedia o necessário face aos riscos comerciais envolvidos e cuja rentabilização não se encontra garantida.
A acumulação de funções de regulação na área sob sua jurisdição é incompatível com as actividades de gestão da actividade de serviço público que exerce no terminal portuário de granéis líquidos.
Com este Decreto-Lei é possível criar uma gestão eficiente deste segmento de negócio do porto de Sines, fazendo com que as regras do mercado funcionem livremente e com que este seja devidamente regulado. Ainda assim, é necessário ir mais longe na privatização dos portos, fazendo com que estes tenham equipas de gestão que busquem a rentabilidade dos equipamentos, com estratégias de marketing fortes, de modo a conseguir capitalizar para Portugal muitos dos navios que estão a recorrer a portos europeus.
É necessário um novo enquadramento do trabalho portuário. Para que exista eficiência e competitividade, as áreas de jurisdição dos portos afectas ao domínio público e privado, bem como as questões relacionadas com a aptidão profissional dos trabalhadores portuários e com o trabalho eventual, têm de ser revistas.
Mas o sector marítimo-portuário tem de ser sempre visto num plano interoperabilidade com outros sectores, de onde se destaca o logístico. Este é um elemento fundamental para a competitividade dos portos nacionais em relação aos estrangeiros. Temos de ter a capacidade de transportar as mercadorias que recebemos para os outros países europeus. Portugal pode ser um ponto de transacção ou transbordo de mercadorias de grandes navios que, depois, são transportadas para outros mais pequenos para os vários países europeus, segmento denominado por feeder.
A janela única aduaneira é fundamental para que haja uma simplificação de todo o processo entre os vários agentes de navegação e as autoridades marítimas. Esperamos que este novo modelo seja, o quanto antes, alargado à totalidade dos portos nacionais.
Não podemos de deixar de referir a importância das auto-estradas do mar, bem como o transporte marítimo de curta distância, definidos pela União Europeia como instrumentos fundamentais para aumentar a atractividade dos portos.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste domínio, tudo está ainda por fazer. Espero que o Governo o faça sem desvarios e com grande competência e rigor, porque isso, sim, protegerá este sector importante para a economia nacional.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Rodrigues.
O Sr. Luís Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apesar de esta matéria dizer respeito ao meu distrito, ao distrito pelo qual fui eleito, não tinha pensado intervir. No entanto, algumas intervenções não podem ficar sem resposta.
De facto, não estamos aqui para dirimir os nossos argumentos de «política caseira», mas, sim, para defender o que entendemos ser estratégico para a economia e para o desenvolvimento nacional. Todavia, o Partido Socialista entendeu trazer a esta discussão tricas e mexericos que, depois, não são consequentes.
Falta de transparência, como o próprio Tribunal de Contas confirmou, teve o governo do Partido Socialista que entregou o Terminal XXI à PSA sem concurso público. Como tal, Sr. Deputado Alberto Antunes, se há algum problema de má gestão ou de gestão danosa a este respeito, poderá ser, com certeza, atribuído ao Partido Socialista.
Mas se o Partido Socialista acompanha as palavras do Sr. Deputado Alberto Antunes quanto à anterior administração do porto de Sines, então tem de ser consequente e abrir inquéritos a essa administração. A verdade é que não podemos ficar apenas pelas palavras da tal baixa política. Não! Sejamos consequentes e atribuamos as responsabilidades, se, de facto, existirem, à má gestão e ao desvario de que aqui falaram.
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Desvario, contudo, é o défice que ainda hoje se paga no porto de Sines e que está relacionado com um contrato muito mal feito com a PSA. Esta é a principal razão das grandes dívidas do porto de Sines.
Queria ainda dizer que os governantes deste país têm de ser responsáveis e, para o caso de não estarem recordados, lembro-lhes que foi com o governo anterior, do PSD e do CDS-PP, que o Terminal XXI ficou a funcionar. Também não sei se o Sr. Deputado Alberto Antunes, que teve responsabilidades no Governo Civil do Distrito de Setúbal, está recordado do estado em que estava o IC33, a ligação entre a A2 e Sines, no seu tempo, no tempo do seu governo. Lembra-se? Muito dificilmente poderíamos evitar os buracos que aquela estrada tinha. Sabe quando foi adjudicada e feita a obra de reparação dessa estrada? Foi com os tais governos do dito «desvario». Foram os governos liderados pelo PSD que resolveram esse problema. Diga-nos, portanto, Sr. Deputado, onde é que estão os grandes problemas.
Não é disso, contudo, que os alentejanos estão à espera. O que esperam é o cumprimento das promessas reiteradamente feitas nesta Casa e fora dela. Não se esqueçam que estão há dois anos no Governo!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Orador: — Estão há dois anos no Governo e o IP8 é zero! O IC4, que liga Sines ao Algarve, é zero! E, de acordo com o que está escrito, nunca mais vai deixar de o ser! Finalmente, também considero importante a tal ligação ferroviária, mas a verdade é que, apesar de as promessas serem muitas, ao fim de dois anos temos, a este respeito, zero!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assunto Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Dirijo-me aos Srs. Deputados que se encontram à minha direita, que aproveitaram a apreciação parlamentar de um decretolei, cujo objecto é a abertura de um concurso público internacional para a concessão do terminal de granéis líquidos e da gestão de resíduos no porto de Sines, para colocar questões sobre a organização em geral desse porto, assim como sobre a estratégia marítimo-portuária do actual Governo. Esclarecerei essas questões com todo o gosto.
Começo pela questão da propaganda ou do fingimento. Em matéria de transportes, Sr. Deputado Vasco Cunha, deixe-me dizer-lhe que se há pessoas que não podem falar de mundo a fingir e de propaganda são, justamente, os Srs. Deputados do PSD. Todos nós ainda estamos lembrados da Cimeira Luso-Espanhola em que o então Primeiro-Ministro, do PSD, assinou um mapa de quatro linhas de TGV – Porto-Vigo, PortoLisboa, Lisboa-Faro, Lisboa-Madrid – mais Aveiro-Salamanca, tendo a primeira conclusão prevista para 2009.
Portanto, sobre propaganda e mundo a fingir, estamos conversados.
Sobre a realidade das coisas, sobre a necessidade de orientações estratégicas, estou totalmente de acordo com o Sr. Deputado Hélder Amaral que é preciso uma estratégia. Por isso mesmo é que, na sua anterior passagem pelo governo, em 1998, o Partido Socialista fez aprovar o livro branco sobre a gestão dos portos, estando agora em discussão pública as orientações estratégicas para o sector marítimoportuário, nas quais o porto de Sines constitui um pilar essencial, com tudo o que isso significa.
Um porto é apenas uma porta de entrada, que deve ser servida quer do ponto de vista de acessos, quer do ponto de vista de logística. É isso que se está a fazer em Sines. Está-se a construir em Sines uma rede de abastecimento e entrada de recursos ou de produtos no País, com a respectiva componente logística, que passa por aproveitar plenamente a plataforma logística de Elvas-Caia, a ligação ferroviária entre o porto de Sines e Elvas, e depois a Badajoz, e um verdadeiro hub portuário no porto. E isso é essencial.
Mas é essencial também por outra razão: é porque este Governo quer fazer, de novo, de Sines um centro industrial do País,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não se esqueça do que está a dizer!
O Orador: — … apostando, em particular, na indústria petroquímica. Estamos a trabalhar nisto há muito tempo. Não queremos, como bem disse já o Sr. Primeiro-Ministro, «gato por lebre». Portanto, nem todos os projectos lá cabem, cabem os projectos de qualidade, os projectos de reindustrialização do País, porque só assim é que conseguimos crescer economicamente aquilo que precisamos de crescer. E para isso é preciso que a economia, as infra-estruturas e os acessos estejam de braço dado.
Quanto à questão que coloca do ponto de vista da política nacional de gestão de portos, se deve ser concorrencial, se deve ser cooperativa, achamos que deve ser as duas coisas. Por isso, usamos o termo técnico habitual nestes domínios da coopetition — cooperação e competição ao mesmo tempo —, porque, evidentemente, todos eles servem uma estratégia nacional da política marítimo-portuária do País, mas nenhum deles pode, digamos assim, viver encostado ao outro. Cada um tem de mostrar o que vale, tem de ter a capacidade e também a possibilidade de utilizar plenamente todos os seus recursos e todas as suas possibilidades.
O Tribunal de Contas já verificou, para o ano passado, no conjunto das administrações portuárias portu-
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guesas, um resultado positivo de 13 milhões de euros. O Terminal XXI, o terminal que foi concessionado à PSA, atingiu o breack-even, atingiu as 100 000 unidades, o que quer dizer que já está hoje a garantir retorno.
O que é característico do investimento é que nós investimos num momento para ter resultados diferidos no futuro, por isso é que é preciso atrair investimento, para que esses resultados possam ser produzidos no futuro. Mas, para isso é preciso valorizar as infra-estruturas, valorizar as ligações rodoviárias e ferroviárias, como aqui se está aqui a fazer, de modo a permitir a Sines a utilização plena deste efeito de fachada, que é o efeito do País, que é a fachada da Europa para o Atlântico, e também a vocação industrial, comercial e histórica que Portugal tem do ponto de vista da sua relação com o mar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Antunes.
O Sr. Alberto Antunes (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria, muito rapidamente, dizer ao Sr. Deputado Luís Rodrigues que me recordo perfeitamente do IC33. E, a este respeito, quero dizer-lhe apenas o seguinte: para o IC33 foi feita uma adjudicação nos tempos do governo do Partido Socialista por 900
Portanto, o Governo do Partido Socialista tem a consciência tranquila nesta matéria e respondeu sempre às propostas e aos desafios de desenvolvimento daquela zona do País.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.
O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por dizer ao Sr. Deputado Alberto Antunes que reflicta sobre o que disse. Por duas razões simples: a primeira é que se o Sr. Deputado confunde transportes marítimos, estruturas marítimo-portuárias — ou aero-portuárias, porque também lá temos a ANA — com serviços de limpeza na câmara municipal, «vou ali e já volto».
Risos do PCP.
De facto, trata-se de uma visão estratégica para o País em relação à qual estamos conversados! Não há mais nada a dizer! Mas ainda lhe lembro uma coisa: uma vez que conhece tão bem Setúbal, talvez tenha conhecimento da dívida que os 16 anos de má gestão do Partido Socialista deixou na Câmara Municipal de Setúbal.
Vozes do PCP: — Exactamente!
Vozes do CDS-PP: — Ah!
O Orador: — Talvez isso sirva de alerta para esta maioria! É que não há maiorias eternas. Ganham-se e perdem-se.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente! Sobretudo quando fazem mau trabalho!
O Orador: — Portanto, fica o «aviso à navegação».
Mas o Sr. Ministro falou das parcerias público-privadas. Queria dizer que o que, na verdade, temos tido é públicas para o investimento — e já lá vão 80 milhões de euros em três anos — e privadas para os lucros!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — É que se se tratasse de parcerias público-privadas, no sentido de fazer convergir esforços com remunerações ajustadas, adequadas ao capital investido, poderíamos estar a discutir uma proposta que podia, eventualmente, ser uma solução. Mas o que temos constatado é que as parcerias públicoprivadas feitas são, na verdade, como há pouco referi, muito, mas muito, investimento público com todos, mas todos, os resultados para os privados.
Vozes do PCP: — Essa é que é a verdade!
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Protestos do Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Orador: — Isso é que nós condenamos, isso é que nós não aceitamos e isso é que está aqui em jogo. Daí o incómodo da bancada do Partido Socialista, e até do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, que é uma pessoa que, normalmente, tem um certo fair play, mas enervou-se e foi buscar uma questão… Já agora, Sr. Ministro, recomendava-lhe uma boa leitura: Portugal — Uma democracia avançada no limiar do século XXI, que é o Programa do PCP. Ao contrário daquilo que são os clichés que a bancada do Partido Socialista sistematicamente repete, através de uma cassete que está francamente ultrapassada — os portugueses e as portuguesas vão compreendendo como está ultrapassada esta cassete do anticomunismo —,…
Risos do PS.
… o Sr. Ministro compreenderá que, hoje, como ontem, o PCP tem um Programa que, efectivamente, defende alavancas essenciais na mão do Estado. Se elas estivessem na mão do Estado não tínhamos as desgraças que por aí vemos, nas «EDP», nas «Galp», nas «PT», etc.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!
O Orador: — Lembro os lucros que podiam estar a entrar nos cofres do Estado e a contribuir para menos impostos sobre os cidadãos e que, na verdade, estão a encher os bolsos dos especuladores bolsistas! É bom lembrar isto! De facto, temos diferenças de fundo. A nossa política é clara, é transparente, está consagrada num programa que não engana, ao contrário do que acontece com os programas do Partido Socialista, que são como aquelas propagandas da banca que dizem «tem ganhos, etc…», mas que depois, em letras muito pequeninas, dizem o resto, e o resto é o desastre para aqueles que caem na armadilha dos números grandes! Sabemos como essas técnicas se fazem. De facto, se fôssemos questionar os cidadãos sobre as propostas concretas que o Partido Socialista lançou durante a campanha eleitoral… A sua prática política, na verdade, tem muito pouco a ver com aquilo que foi o discurso, não o programa — sabemos como é que se tratam os programas eleitorais e o número de exemplares de programas eleitorais que cada partido faz e discute.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Portanto, também sobre isto estamos conversados!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Mas não posso deixar, Sr. Ministro, de referir o problema dos trabalhadores. Se olharmos com atenção para o que está na cláusula, vemos que é, efectivamente, uma imposição. Todos sabemos o que é um contrato individual de trabalho, todos sabemos que é um instrumento para levar os trabalhadores a abdicar de direitos.
Aliás, o Sr. Deputado Alberto Antunes até falou em «flexibilidade», em «mobilidade», em «polivalência», em «baixos salários»… Diga, Sr. Deputado, diga, porque é isso que o Sr. Ministro da Economia diz por todo o lado…!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Até na China!
O Orador: — Até na China usa isto como uma vantagem comparativa para virem investir em Portugal! Portanto, o Sr. Deputado Alberto Antunes e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares fariam bem em reler o Programa Eleitoral do PCP. Se é que alguma vez o leram!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O Sr. Ministro leu!
O Orador: — Possivelmente fazem os clichés a partir das notícias dos jornais… Não nos surpreendia muito!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O Sr. Ministro leu!
O Orador: — Mas o Sr. Ministro, como é uma pessoa que até evocou o marxismo-leninismo, leu com
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certeza. E, se leu, seguramente sabe que, a par do capital público e do sector público, nós defendemos o sector cooperativo e um sector privado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pois é!
O Orador: — E, talvez por isso, nós dizemos que, cada vez mais, empresários, agricultores, armadores olham para este partido como o partido que defende os seus interesses, tal como defende os interesses dos trabalhadores, que tem propostas e projectos para tirar Portugal da crise para que as políticas de sucessivos governos o têm atirado
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Meu Deus, meu Deus!
O Orador: — O Sr. Deputado Pedro Mota Soares está com as mãos na cabeça… Tome Aspirina!
Risos.
Nós compreendemos o seu desgosto! O fracasso da política da direita está à vista! É crise em cima de crise!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Temos confiança de que, um dia, o eleitorado, tal como em Setúbal viu na CDU a alternativa ao PS, também compreenderá que Portugal precisa de um governo connosco e não de um governo assente no anticomunismo!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um projecto de resolução, do PCP, a propor a cessação da vigência do Decreto-Lei agora apreciado, que será votado na próxima reunião plenária.
Pedia à Sr.ª Secretária o favor de proceder à leitura de expediente entretanto entrado na Mesa.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 346/X — Reconhece o direito ao subsídio de desemprego ao pessoal docente e investigador contratado por instituições de ensino superior e de investigação públicas e cria mecanismos para o acesso a esse direito (BE), que baixa à 11.ª Comissão, 347/X — Determina a realização de concurso para selecção e recrutamento de pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário para o ano lectivo de 2007/2008 (PCP) e 348/X — Atribui o direito a subsídio de desemprego ao pessoal docente e investigador contratado por instituições do ensino superior e de investigação públicas, em regime de exclusividade (CDS-PP); e a proposta de lei n.º 114/X — Autoriza o Governo a alterar o Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, que estabelece o regime jurídico do sector empresarial do Estado, que baixa à 5.ª Comissão.
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, estão concluídos os nossos trabalhos.
A próxima reunião plenária realizar-se-á na próxima quarta-feira, dia 7, que terá período de antes da ordem do dia, com declarações políticas, e no período da ordem do dia proceder-se-á, em primeiro lugar, à apreciação da proposta de lei n.º 110/X — Altera a Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas, no que respeita à composição, competências e funcionamento do Conselho Superior de Defesa Nacional, e, em segundo lugar, à apreciação conjunta do projecto de lei n.os 159/X — Atribui o direito a subsídio de desemprego ao pessoal docente e investigador contratado por instituições do ensino superior e de investigação públicas (PCP) e dos projectos de lei n.os 346/X e 348/X, que acabaram de ser referidos pela Sr.ª Secretária.
Está encerrada a sessão.
Eram 13 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
José Augusto Clemente de Carvalho
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José Eduardo Vera Cruz Jardim
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Teresa Maria Neto Venda
Partido Social Democrata (PSD):
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
José Manuel Pereira da Costa
Luís Miguel Pereira de Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Pedro Miguel de Santana Lopes
Zita Maria de Seabra Roseiro
Partido Comunista Português (PCP):
José Honório Faria Gonçalves Novo
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Partido Popular (CDS-PP):
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS):
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS):
António José Ceia da Silva
Glória Maria da Silva Araújo
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques
António Paulo Martins Pereira Coelho
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José de Almeida Cesário
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Sérgio André da Costa Vieira
Bloco de Esquerda (BE):
Fernando José Mendes Rosas
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL