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Sábado, 17 de Fevereiro de 2007 I Série — Número 50

X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 16 DE FEVEREIRO DE 2007

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Fernando Santos Pereira

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.
Foi apreciado, na generalidade, o projecto de lei n.º 281/X — Preços máximos de venda ao público dos medicamentos não sujeitos a receita médica (BE), sobre o qual intervieram os Srs. Deputados João Semedo (BE), Vasco Franco e Joaquim Couto (PS), Carlos Andrade Miranda (PSD), Bernardino Soares (PCP) e Helder Amaral (CDS-PP).
A Câmara discutiu o projecto de resolução n.º 169/X — Recomenda a ratificação do Tratado da Antártida (Os Verdes), tendo-se pronunciado os Srs. Deputados Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Renato Leal (PS), Luís Carloto Marques (PSD), António Carlos Monteiro (CDS-PP), Miguel Tiago (PCP) e Alda Macedo (BE).
Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 113/X — Aprova o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, tendo usado da palavra, a diverso título, além dos Srs. Ministros do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (Francisco Nunes Correia) e dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva) e do Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades (João Ferrão), os Srs. Deputados José Eduardo Martins (PSD), António Carlos Monteiro (CDSPP), Luís Pita Ameixa (PS), José Soeiro (PCP), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Alda Macedo (BE) e Ramos Preto (PS).
Deu-se ainda conta da entrada na Mesa dos projectos de lei n.os 352 e 353/X.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 50 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS)

Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira

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Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José dos Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vitor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD)

Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques

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António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Domingos Duarte Lima
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Comunista Português (PCP)

Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado

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Bernardino José Torrão Soares
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Miguel Tiago Crispim Rosado

Partido Popular (CDS-PP)

Abel Lima Baptista
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Helder do Amaral
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães

Bloco de Esquerda (BE)

Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)

Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não havendo expediente, passamos, de imediato, ao primeiro ponto da ordem do dia de hoje, que consta da apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 281/X — Preços máximos de venda ao público dos medicamentos não sujeitos a receita médica (BE).
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na política do medicamento do actual Governo há um aspecto paradoxal para não dizer caricato: o que é bom está no Programa, mas não é aplicado; o que é mau não está no Programa, mas é o que é aplicado.
Em dois anos, esta política tem três grandes momentos, se quiserem, três grandes marcas.
A primeira, anunciada logo na tomada de posse do Primeiro-Ministro, permite a venda fora das farmácias dos medicamentos não sujeitos a receita médica.
A segunda, também anunciada pelo Primeiro-Ministro, estabeleceu o acordo entre o Governo e a Associação Nacional das Farmácias (ANF) e, entre outras medidas, liberaliza a propriedade das farmácias e promove a instalação de farmácias privadas nos hospitais públicos, naquilo que podemos considerar uma verdadeira OPA da holding de João Cordeiro sobre as farmácias do Serviço Nacional de Saúde, ainda por cima bastante barata.
A terceira, a única que não faz parte do «portfólio» com que o Primeiro-Ministro procura construir a sua imagem de super-homem contra os lobbies, implica uma mexida global nos preços de venda ao público, no valor das comparticipações e no número de medicamentos comparticipados.
Tudo combinado, o resultado salta à vista: o Estado gastou menos, os portugueses pagaram e pagam mais na farmácia, ao contrário do que insistentemente é afirmado pelo Governo.

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E não vale a pena perdermo-nos em grandes controvérsias sobre os números porque já todos percebemos a engenharia contabilística do Governo: nas contas do Governo, só entram os medicamentos comparticipados, onde, de facto, baixou a despesa pública e se verifica uma ligeira redução da despesa directamente suportada pelos portugueses.
Mas como, entretanto, centenas de medicamentos passaram a ser integralmente pagos pelos cidadãos e outros viram a sua comparticipação bastante reduzida, a verdade é que, hoje, os portugueses gastam mais em medicamentos do que gastavam, como, aliás, está bem evidente nos dados recentemente publicados pelo INE e noutros estudos entretanto divulgados.
O Bloco de Esquerda tem apresentado diversas iniciativas legislativas — e certamente outras se seguirão — com o objectivo conjugado de diminuir a despesa pública, mas também de baixar o custo para os cidadãos, melhorando o acesso ao medicamento e assegurando a sua qualidade. Do nosso ponto de vista, esta alternativa existe e é possível.
Hoje, apresentamos um projecto de lei que incide sobre uma parte do problema, mas que, a ser aprovado, poderia constituir também parte da solução.
Ao decidir autorizar a venda fora das farmácias dos medicamentos não sujeitos a receita médica, o Governo associou-lhes o regime de preço livre, procurando, por esta via, induzir a redução dos preços, através dos tradicionais mecanismos de mercado.
O regime de preço livre aplicado aos medicamentos contraria o que, até hoje, tem acontecido, em Portugal.
Entre nós, a regra tem sido, desde sempre, a do preço fixo, assumindo o Estado uma intervenção reguladora e moderadora, com o propósito de conter o aumento do preço de venda dos medicamentos, como, aliás, acontece na maior parte dos países da União Europeia.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente!

O Orador: — Não é, pois, de estranhar que esta opção pelo preço livre se tenha traduzido numa efectiva e continuada tendência de subida dos preços, quer nas farmácias quer nos postos de venda entretanto autorizados, com claro prejuízo para os doentes. Não havendo um preço máximo estabelecido, os preços inevitavelmente tendem a subir.
A introdução do regime de preços máximos nos medicamentos não sujeitos a prescrição médica permitiria contrariar esta espiral, controlar a subida dos preços e estimular a sua descida, sem prejuízo da concorrência entre os intervenientes neste mercado e com benefício para os cidadãos, que teriam acesso a medicamentos mais baratos.
Recordando, Sr.as e Srs. Deputados, a unanimidade alcançada neste Parlamento, há algumas semanas, em torno da resolução apresentada por Deputados do Partido Socialista, que, relembro, tinha como principais motivações, igualmente, a contenção da despesa do Estado e dos cidadãos com os medicamentos, a minha expectativa, a expectativa do Grupo Parlamentar do BE é, naturalmente, a de contar com o voto favorável de todas as Sr.as e Srs. Deputados.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Franco.

O Sr. Vasco Franco (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Semedo, o Decreto-Lei n.º 134/2005, de 16 de Agosto, entrou em vigor há pouco mais de um ano, sabendo o Sr. Deputado as dificuldades que houve que enfrentar para implementar esse novo regime, nomeadamente ao nível da distribuição, muito controlada pela Associação Nacional das Farmácias. Não lhe parece, portanto, que é prematuro estar a fazer uma avaliação tão negativa do novo regime? Por outro lado, Sr. Deputado, não reconhece que há uma diferença substancial entre os medicamentos sujeitos a receita médica e os medicamentos de venda livre, quanto à possibilidade de escolha do cidadão? Isto é, o facto de o cidadão não poder escolher livremente o medicamento sujeito a receita médica, mas já poder fazê-lo em relação ao medicamento não sujeito a receita médica, não o induz a reconhecer essa diferença e a dar algum tempo para podermos avaliar o sistema? São estas as perguntas que lhe faço, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Vasco Franco, o problema, do nosso ponto de vista, não se coloca em termos de saber se é cedo demais para tomar esta medida. Do nosso ponto de vista, o essencial é responder a um problema que, é visível, vai continuar como tendência e que é este: se não há preços máximos dos medicamentos, naturalmente o preço vai subir.
Aliás, nesta matéria da política do medicamento, já percebemos que o que interessa não é tanto saber quem é o «maquinista» e quem são os «passageiros» mas, sim, constatar que o maquinista vai num sentido e

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os passageiros noutro. E por que é que digo isto? Porque no acordo estabelecido pelo Governo com a Associação Nacional das Farmácias, está prevista (e, portanto, aprovada e passível de ser implementada) a introdução da política de descontos nos medicamentos. Ora, se se introduz a política de descontos, é evidente que os medicamentos vão ter todos — não só estes mas também os outros — um preço máximo. Assim sendo, só procuramos antecipar-nos a esse momento, porque consideramos que, apesar de, como o Sr. Deputado disse — e bem! —, o tempo de vigência do decreto-lei ser ainda reduzido, já é tempo suficiente para perceber que esta tendência é inevitável — o preço dos medicamentos não sujeitos a receita médica vai continuar a aumentar. Esta é a nossa convicção e, por isso, apresentámos este projecto de lei.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Couto.

O Sr. Joaquim Couto (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Programa do XVII Governo Constitucional inscreveu a venda dos medicamentos não sujeitos a receita médica como uma preocupação, prevendo a reanálise das regras de comercialização dos medicamentos, bem como a revisão do sistema de comparticipações por preços de referência.
Estas opções ficaram bem explicitadas no preâmbulo e no articulado do Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto, bem como no Decreto-Lei n.º 134/2005, de 16 de Agosto, estabelecendo-se neste último que os medicamentos não sujeitos a receita médica e não comparticipados passam a ter um regime de preços livre, salvaguardadas as regras de concorrência.
Aliás, a solução preconizada neste diploma foi subscrita pela Autoridade da Concorrência, que, em estudo recente do sector, recomendou a adopção de outras medidas liberalizadoras, tendo em vista a introdução de mecanismos de concorrência, designadamente através dos preços.
Neste diploma, estão vertidas algumas das razões fundamentais para esta opção, para além da necessária coerência de todo este processo relativo ao medicamento: alargamento dos postos de venda; maior acessibilidade dos utentes; maior concorrência efectiva entre os vários canais de distribuição e comercialização; e novas oportunidades de trabalho para jovens farmacêuticos e técnicos de farmácia.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!

O Orador: — As opções do Governo nesta matéria acompanham a tendência internacional de alargamento dos pontos de venda deste tipo de medicamentos, tendo já sido adoptada em cerca de 11 países europeus.
O artigo 103.º do Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto, preconiza que, através de decreto-lei, o Governo defina o regime de preços dos medicamentos sujeitos a receita médica e não sujeitos a receita médica, mas comparticipados e de venda exclusiva em farmácias.
Nesta fase de reforma da formação do mercado do medicamento, é indispensável que os medicamentos de venda obrigatória em farmácias tenham um tratamento distinto dos medicamentos passíveis de venda em locais diferentes daqueles.
Acresce que, em todo este processo de reforma, o Governo cumpre a Base XXI da Lei de Bases da Saúde, a saber: a defesa e a protecção da saúde, a satisfação das necessidades da população e a racionalização do consumo de medicamentos.
Bem sabemos que alguns advogam uma rigidez do Estado, interventivo e tentacular, que tolhe a iniciativa e promove a desigualdade. Pela nossa parte, defendemos, antes, um Estado que cumpre a Constituição, regulador e respeitador do mercado.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!

O Orador: — É por isso que esta opção reformista do Governo, designadamente o regime de preços livres para os medicamentos não sujeitos a receita médica e não comparticipados, protagonizada pela equipa do Ministério da Saúde, nos parece sensata e cumpridora dos objectivos gerais do Programa do Executivo.
Mas vejamos, em particular, o conteúdo e os pressupostos do projecto de lei n.º 281/X, do Bloco de Esquerda, que procura contrariar a orientação do Governo nesta matéria.
Em primeiro lugar, não é verdade que, desde Outubro de 2005, o preço médio dos medicamentos não sujeitos a receita médica e não comparticipados tenha subido, bem pelo contrário, desceu — e, se lhe acrescentarmos o valor da inflação para idêntico período, concluiremos que desceu significativamente, face à inovação que representa para o mercado a nova legislação.
Em segundo lugar, no período compreendido entre Outubro de 2005 e Dezembro de 2006, o valor global das vendas comunicadas foi de cerca de 3,7 milhões de euros. Decompondo estes 15 meses em dois períodos distintos, verificamos que, de Outubro de 2005 até Maio de 2006, o valor das vendas foi de cerca de 800 000 euros, mas no segundo período, de Junho de 2006 a Dezembro do mesmo ano, já foi de cerca de 3 milhões de euros, triplicou. Ou seja, o mercado está a funcionar, está a adaptar-se à nova realidade e,

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estamos certos, vai estabilizar a preços mais baixos para o consumidor, seguindo a tendência até agora verificada.
Entendemos, assim, que este projecto de lei é extemporâneo e não é rigoroso nos seus pressupostos. Por isso, não o apoiaremos. Tem de haver estabilidade no processo legislativo e, neste caso concreto, é necessário esperar o tempo certo para que os vários agentes em presença se adaptem à nova legislação que está suportada numa coerência global da nova política do medicamento.
Seria contraproducente e destabilizador do mercado que agora produzíssemos alterações à recente legislação, sem a consistência advinda de um período de aplicação dilatado e da sujeição ao escrutínio e estudos do mercado, bem como da fiscalização dos organismos competentes, nomeadamente o INFARMED, e da complementaridade de outras medidas de política do Governo, em fase de promulgação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Andrade Miranda.

O Sr. Carlos Andrade Miranda (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao contrário do que o Sr. Deputado Vasco Franco nos dizia há pouco, 17 meses é já tempo suficiente, e bastante, para se fazer algum balanço deste novo regime da venda de medicamentos fora das farmácias. E esse balanço não dá uma imagem muito positiva; pelo contrário, dá uma imagem bastante nebulosa da actuação do Governo nesta matéria. Os três objectivos fundamentais que o Governo se propunha com esta medida — a introdução da venda livre de medicamentos fora das farmácias, isto é, a acessibilidade, a diminuição de preços e a manutenção das questões de segurança — não foram alcançados.
Em matéria de acessibilidade, como, ainda há pouco, citando o mesmo estudo, o Sr. Deputado Joaquim Couto nos dizia, verifica-se que a venda destes medicamentos está concentrada nas grandes superfícies, nas grandes cadeias alimentares, nos centros urbanos e não no resto do País. As populações não estão, pois, mais próximas deste tipo de medicamentos.
Em matéria de preços, todos se recordam da polémica com o Sr. Ministro, na Primavera passada, em torno dos relatórios do Observatório Português dos Sistemas de Saúde e do INFARMED, em que ninguém sabia se os preços tinham subido ou descido. No Outono passado, passou-se o mesmo e, perante o estudo da DECO, o Governo não soube dizer se os preços subiram ou desceram. Hoje, 17 meses depois da entrada em vigor do referido decreto-lei, é já possível concluir que não ocorreu nem uma coisa nem outra.
Nas grandes superfícies, nas grandes cadeias alimentares, nos grandes centros urbanos, o preço diminuiu sensivelmente; já no resto das lojas de venda deste tipo de medicamentos, o preço subiu.
Em matéria de segurança, não há notificações de problemas, é certo!, mas o risco que o Sr. Ministro criou, atirando para fora das farmácias tudo quanto, indiscriminadamente, adopte a designação de OTC, de medicamentos não sujeitos a receita médica, mantém-se. A Comissão de Avaliação de Medicamentos mantém fortes reservas em relação a um alargamento desta lista de medicamentos. E o Sr. Ministro há meses que hesita em impor a sua vontade política num campo eminentemente técnico e à revelia dos pareceres cautelares que lhe foram presentes.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Este tipo de voluntarismo é perigoso. E não se percebe — e há mesmo quem legitimamente se interrogue — o porquê deste afã, desta força, desta pressão, de querer aumentar este ramo de negócio.
Sr. Deputado João Semedo, sobre o projecto de lei da sua bancada, gostaria de dizer-lhe que o mesmo foi, como concordará comigo, fruto de um impulso de Primavera. De facto, foi naquele momento do relatório do Observatório Português dos Sistemas de Saúde que o Bloco de Esquerda entendeu que deveria estancar aquilo que, na altura, parecia uma cavalgada do aumento dos preços, mas que não ocorreu. Sr. Deputado, o vosso projecto de lei é uma espécie de Portaria n.º 713/2000, agravada.
Divergimos dele por variadíssimas razões, desde logo, matriciais, civilizacionais. O projecto estatiza, onde se deve liberalizar, e nega o mercado, quando devia afirmá-lo.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Exactamente!

O Orador: — Recordo-vos a Recomendação VI do G10, no sentido da livre fixação do preço dos medicamentos, e a Recomendação n.º 1/2006, da Autoridade da Concorrência, exactamente sobre a concorrência no sector do medicamento. Não é verdade, Sr. Deputado João Semedo, que, em Portugal, tenha prevalecido a opção pelo preço fixo do medicamento de venda livre — exceptuando aquele período, entre 2000 e 2005, em que estivemos sob o regime da notificação, não havia efectivamente regulamentação deste tipo de preços.

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O projecto de lei não atenta na diferença entre o regime de preços máximos e o regime de preço fixo, não atenta que o regime de preços máximos implica variação de preço e é incompatível com a rotulagem, tal como é pretendido no vosso diploma. Ora, isto é absolutamente insustentável, Sr. Deputado.
Uma palavra final para referir o que pensa o PSD sobre este regime. O PSD, como já o disse várias vezes, nada tem a opor, desde que sejam tomadas as devidas cautelas. Mas a verdade é que o Sr. Ministro da Saúde e o Sr. Primeiro-Ministro ainda não tornaram claras as razões pelas quais o aumento da automedicação e do consumo de OTC constitui uma prioridade, na área da saúde, em Portugal, em 2005/2007. Isto ainda não foi explicado pelo Sr. Primeiro-Ministro! Por estas razões, a posição do PSD será naturalmente contra.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este projecto de lei incide sobre um aspecto que foi marcante na política do Governo — e assim foi tratado pela própria propaganda do Ministério da Saúde —: o de apresentar a liberalização da venda dos medicamentos não sujeitos a receita médica (vulgo, de venda livre) fora das farmácias, noutros espaços, como uma forma de embaratecer estes medicamentos e de torná-los mais acessíveis aos cidadãos.
Em primeiro lugar, não havia qualquer problema de acessibilidade a estes medicamentos como a realidade veio comprovar, não havia qualquer problema nessa matéria, aliás, porque os sítios onde provavelmente continua a haver problemas de acessibilidade aos medicamentos não têm estabelecimento de venda livre algum, porque não são comercialmente apetecíveis.
Em segundo lugar, a questão do preço. De facto, o PS teve nesta matéria várias fases. Numa primeira fase disse: «Os preços vão baixar! Os preços baixaram! Estão muito mais baratos!» Depois, começou a ver-se que, afinal, não era bem assim e ao fim de uns meses a ideia já era outra: «Não, está ela por ela; não aumentou, mas também não baixou!» e acabámos por constatar que, de facto, os preços aumentaram nos tais sítios de venda livre, nos sítios fora das farmácias, com a consequência de aumentarem também, obviamente, por interesse comercial, nas próprias farmácias que não ficaram com um preço mais baixo sabendo que fora do seu espaço havia preços superiores.
Portanto, esta medida não teve o efeito que se anunciava e teve, em muitos casos, o efeito contrário.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Vamos ver!

O Orador: — Veremos o que o futuro nos dirá! Mas há um problema mais fundo nesta questão que é o seguinte: o Ministério da Saúde e o Governo tratam os medicamentos de venda livre como se fossem uma mercadoria puramente comercial e não são! Quando o Ministro da Saúde vem assumir publicamente, e dando orientações para o INFARMED, que é preciso aumentar o número de medicamentos de venda livre, que é preciso retirar da obrigatoriedade de receita um número maior de medicamentos, isto é muito preocupante, porque os critérios que devem presidir à venda livre são critérios estritamente técnicos, de não perigosidade, de balanceamento entre a acessibilidade mais fácil e a não perigosidade do medicamento.

Protestos da Deputada do PS Maria Antónia Almeida Santos.

E, portanto, isso não se pode determinar de forma administrativa com base em critérios comerciais como o Ministro da Saúde fez.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Não estão em causa esses!

O Orador: — Claro que nós sabemos que isso é uma alínea do protocolo com a indústria farmacêutica onde o Ministério da Saúde, responsável pela saúde pública, se compromete — vejam bem! — a aumentar os medicamentos de venda livre, o que é uma coisa extraordinária para um Ministério da Saúde!... Mas está lá, no protocolo, e esta política é a concretização desse protocolo sem que haja aqui um benefício para a população.
Concordamos com a medida proposta de, pelo menos, introduzir um preço máximo que impossibilite exageros ainda maiores no preço destes medicamentos, embora não se espere que o Ministério da Saúde, mesmo que esta medida — aliás, já admitida pelo Ministro da Saúde em vários momentos, espero que o Partido Socialista se lembre disto — entre em vigor, seja especialmente rigoroso no estabelecimento do preço máximo. Mas é sem dúvida um benefício, uma benfeitoria que, porventura, poderá corrigir alguns limites.
Agora, o que continua por corrigir e essa será, sem dúvida, a questão fundamental na política do medicamento é o continuado aumento da factura dos medicamentos para os portugueses com a diminuição das comparticipações, com poupança para o Estado e para o Orçamento do Estado, certamente, mas uma

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poupança que é no fundamental feita à custa das populações, cada vez mais penalizadas com medicamentos mais caros, cada vez mais penalizadas com uma saúde mais cara e cada vez mais discriminadas em função das suas condições sociais e económicas para o acesso à saúde e para o acesso aos medicamentos.

Vozes do PCP e do BE: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Helder Amaral.

O Sr. Helder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: com a implementação deste regime legal, espera o Bloco de Esquerda proporcionar aos consumidores maior e mais fácil acessibilidade aos medicamentos, redução dos preços e alargamento do número de locais de venda.
O regime jurídico da comercialização dos medicamentos não sujeitos a receita médica consta do DecretoLei n.º 134/2005, de 16 de Agosto.
Este diploma estabelece a possibilidade de estes medicamentos poderem ser comercializados fora das farmácias, proporcionando benefícios aos consumidores, quer em termos de acessibilidade facultada pelo aumento do número de pontos de venda quer em termos de preço.
É um facto conhecido que os medicamentos vendidos em Portugal sempre ultrapassaram os preços definidos por lei, e, em 2004, esse incumprimento da lei deu origem a custos extras para os utentes de 28 milhões de euros e de 20 milhões de euros para o Estado.
Do ponto de vista do Estado, de resto, os tectos de crescimento da despesa global com a venda de medicamentos nas farmácias e nos hospitais dão fiel testemunho precisamente dessa realidade: crescimento de 4,3% no ambulatório e de 9% no sector hospitalar em 2005; crescimento de 10,8% no ambulatório e de 15% no sector hospitalar em 2004; e crescimento de 18% no hospitalar e de 3,5% no ambulatório, apenas, e só, porque foi o ano em que o governo PSD/CDS lançou os medicamentos genéricos.
Tais factos constam das conclusões de um estudo da Associação Nacional das Farmácias, de 2005, que comparou os preços, à saída da fábrica, dos 15 fármacos que mais despesas geram no Serviço Nacional de Saúde.
De acordo com a lei, quando um remédio é introduzido no mercado deve ter um custo abaixo do valor praticado em Espanha, França e Itália, que eram os 3 países de referência àquela data — actualmente, incluise também neste grupo a Grécia.
Alguns remédios há, contudo, que chegam a custar mais 60% do que naqueles países, facto que acaba por se reflectir também no preço dos genéricos, que, quando são aprovados, devem ser, pelo menos, 35% mais baratos do que os remédios de marca. Sendo estes mais caros em Portugal do que nos países de referência, chega-se ao paradoxo de os genéricos, em Portugal, terem um valor igual ao medicamento de marca nos países de referência.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS-PP compreende que o Governo, perante este estado de coisas, teve de fazer alguma coisa. Para além de um acordo de contenção de preços, celebrado com o sector da indústria, o Governo procurou introduzir a redução dos preços nestes medicamentos liberalizando a sua fixação e promovendo a concorrência entre os vários canais de distribuição e comercialização, bem como o alargamento do mercado de emprego para os jovens farmacêuticos, criando novas oportunidades de trabalho.
Para aquilo que aqui nos interessa, cumpre sobretudo referir que estes medicamentos passaram a ter um regime de preços livre, salvaguardadas as regras da concorrência, ou seja, promovendo uma concorrência efectiva entre os referidos canais de distribuição e comercialização.
Sucede que o regime de preços livres, ao contrário do que foi a intenção do legislador, não se traduziu na diminuição dos preços daqueles medicamentos, dado que, passados os primeiros meses em que vigorou, em que se registou efectivamente uma queda generalizada dos preços, seguiu-se a natural subida de preços que ocorre sempre num mercado que vem de ser liberalizado, total ou parcialmente.
É normal, é sabido, é da experiência comum que a liberalização de um mercado ou de um determinado sector é uma «roleta russa», com consequências perfeitamente imprevisíveis e é isso mesmo que se está a passar com o mercado dos medicamentos não sujeitos a receita médica, tanto mais quanto tivermos em conta que os medicamentos de venda livre são um mercado em crescimento: 12,5% em 2004, contra 8,4% dos medicamentos comercializáveis apenas com receita médica.
É certo que a esta «doença» poderemos continuar a aplicar a «receita», bem portuguesa, de estabelecer acordos entre o Estado e a indústria farmacêutica, que é obrigada a devolver dinheiro caso se ultrapasse o tecto máximo para crescimento do mercado.

Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares.

Mas a grande verdade é que são os doentes os eternos esquecidos, os eternos prejudicados, pois não têm qualquer retorno quando os medicamentos em ambulatório ultrapassam os tectos de crescimento fixados nesses acordos! Não têm retorno porque não têm poder, não são o Estado, não compram em quantidade, são,

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em resumo, o elo mais fraco desta cadeia que envolve a produção, a distribuição e a comercialização de medicamentos: compram ao preço que lhes querem vender! Mas o Estado, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não está na mesma posição de um particular, o Estado tem outros meios, o Estado pode ter outras políticas! O Estado, em vez destes protocolos, pode conformar os preços dos medicamentos, como fez através da medida que obrigou os laboratórios a descerem o preço dos medicamentos em 6% e que se conjuga com outra medida que entrou em vigor no dia 1 de Fevereiro passado, a da descida das comparticipações do Estado.
Mesmo assim, e dado o facto de ter sido concedida aos laboratórios a possibilidade de escoarem o remédios de preço antigo nos próximos dois meses, o Estado ainda terá de suportar um esforço de mais 5,1 milhões de euros nos próximos dois meses.
Mas porque não segue este Governo o exemplo do anterior governo, PSD/CDS-PP e aposta na prescrição obrigatória por denominação comum internacional? Porque não aposta na adopção dos preços de referência, que tão bons resultados têm produzido noutros países europeus?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Orador: — E na receita única, uniformizada e renovável, como forma de integração da equipa de profissionais e de liberdade do doente? E, principalmente, como consequência destas várias medidas, a aposta decisiva no crescimento do mercado dos genéricos, prioridade política de vários governos, mas que só com o governo PSD/CDS-PP viram as promessas transformadas em resultados?

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Quando falamos do mercado dos genéricos, de resto, é melhor deixarmos os números falarem por si: pela primeira vez desde 2000, o crescimento da factura com medicamentos foi reduzida em 50%; os medicamentos genéricos passaram de uma quota de mercado irrisória de 0,3%, em 2001, para uma quota de 9,7% em 2004, crescimento sem paralelo nos países da União Europeia.
Os genéricos, sempre o dissemos, geram uma maior acessibilidade aos medicamentos e racionalizam os gastos, com as devidas consequências em termos de saúde pública e de controlo do gasto de dinheiros públicos. São uma aposta decisiva! Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, o CDS-PP deu o seu acordo de princípio à liberalização do preço dos medicamentos sem receita médica, tendo-se abstido na votação da proposta de lei n.º 2/X, que viria a dar origem à Lei n.º 38/2005, de 21 de Junho, e esta, por sua vez, ao Decreto-Lei n.º 134/2005, de 16 de Agosto.
Também o CDS-PP admitiu, como efeito desta liberalização, o aumento a prazo do preço dos medicamentos sem receita médica, mas sempre com a esperança de que o Governo contrariasse tal tendência intervindo junto dos laboratórios, fazendo baixar, logo na origem, o preço dos medicamentos — o que não sucedeu.
Assim sendo, o problema existe e há que resolvê-lo, senão através de uma medida como a que vem proposta pelo Bloco de Esquerda ao menos com outra que produza o mesmo efeito.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma última intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, gostaria de deixar um breve comentário apenas para manifestar a minha perplexidade relativamente à posição do Partido Socialista. Perplexidade e incompreensão! Na realidade, a vossa posição traduz-se na total indiferença relativamente ao custo que hoje têm os medicamentos para o bolso dos portugueses. O que é que Governo tem feito? O Governo aumenta às carradas o número de medicamentos não comparticipados e depois diz que nada tem que ver com o preço. E os senhores estão a querer convencer-nos de que os medicamentos não comparticipados são todos mais ou menos uma espécie de rebuçados para a tosse, quando os senhores sabem que não são! É porque se fossem ainda seria de admitir que quem quisesse comesse rebuçados, mas não é disso que estamos a falar! Estamos a falar de centenas de medicamentos que têm utilização diária na prática clínica, que aliviam sintomas, não tratam doenças, como é óbvio, mas aliviam sintomas, repito, como o Sr. Dr. Joaquim Couto sabe! Portanto, os senhores têm uma posição de que «o mercado há-de funcionar, os portugueses vão pagando, o que interessa é que o Estado cada vez tenha menos responsabilidades sociais nesta matérias»...
Compreendo a posição do PSD, pois sempre foram os paladinos do mercado, não há qualquer problema, compreendemos essa posição, repito. Mas, ao contrário do que o Sr. Deputado Carlos Andrade Miranda disse,

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a tradição em Portugal é do preço fixo. Aliás, o que explica o facto de os preços terem disparado é a circunstância de a indústria se ter sentido liberta desse «colete de forças» do preço fixo!

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — E a concorrência? O mercado?

O Orador: — Não vemos outra forma de limitar e controlar esta situação — a bem dos doentes, a bem do equilíbrio social — que não seja a de definir um preço máximo. O Partido Socialista vai ter de explicar aqui aos restantes Deputados quando o Governo decretar o regime de descontos nos medicamentos por que é que vai manter a distinção entre medicamentos comparticipados e não comparticipados.
Isso é uma argumentação que não colhe na vossa política, sobretudo é muito contraditória com o vosso discurso tão social, de tanta preocupação com o que os portugueses gastam nos medicamentos.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — A despesa com os medicamentos baixou ou não?

O Orador: — Na realidade, no momento em que podiam tomar uma posição e uma medida decisiva para conter os preços dos medicamentos, os senhores mantém-se indiferentes e arranjam uma argumentação que, desculpem que vos diga, não tem qualquer sentido.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, terminado este primeiro ponto da nossa ordem do dia, passamos, agora, à discussão do projecto de resolução n.º 169/X — Recomenda a ratificação do Tratado da Antártida (Os Verdes).
Para apresentar o projecto, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Partido Ecologista Os Verdes propõe hoje ao Plenário da Assembleia da República que aprove um projecto de resolução recomendando ao Governo que assine o Tratado da Antártida.
Perguntarão alguns: mas que interesse pode ter para Portugal aderir a um tratado internacional que versa sobre uma massa continental extremamente fria, ventosa, inóspita, longínqua e estranha, a terra gelada dos pinguins? A verdade é que aquilo que se passa na Antártida e aquilo que o futuro reservar àquele canto do mundo, conhecido como a última fronteira terrestre do nosso planeta, não é indiferente ao resto da Humanidade.
Com efeito, a Antártida não é apenas um continente e um oceano, extremamente ricos em recursos naturais, recursos marinhos e recursos minerais, não é apenas a maior reserva, com cerca de 90% da água doce do planeta Terra, constituída pelo gelo polar, não é apenas lugar de suporte a um sensível, delicado e extremamente frágil ecossistema e de um inestimável património de biodiversidade mundial, como desempenha ainda um importantíssimo papel na regulação do clima do nosso planeta, servindo, em conjunto com o Pólo Norte e o Árctico, como sistema de refrigeração da Terra através das trocas de calor processadas ao nível dos oceanos e da atmosfera absolutamente determinante no equilíbrio climático de todas as zonas do globo e, portanto, dizendo respeito a todos nós.
Nestes tempos em que uma das maiores ameaças e preocupações da Humanidade são as alterações climáticas, o estudo e a preservação daquele que é o maior tubo de ensaio e, simultaneamente, o maior arquivo geológico da história do clima no nosso planeta, apresentam-se como absolutamente fundamentais.
A verdade é que as regiões dos pólos se têm revelado as que mais sofrem e onde mais clara e rapidamente se fazem sentir os efeitos das alterações climáticas e do aquecimento global, visível nos degelos das calotes polares em zonas como o Alasca, a Sibéria ou na própria Antártida, servindo assim, para além do mais, como barómetro e sinal de aviso em relação à mudança de atitudes e de rumo que é urgente realizar nas nossas opções de desenvolvimento e nas políticas que têm vindo a ser prosseguidas.
Prova mais do que evidente disso mesmo é o famoso caso do dito «buraco» na camada do ozono, visível precisamente na Antártida e que, graças à tomada de consciência, possível graças ao estudo científico e aos alertas lançados, e às consequentes alterações e mudanças feitas a nível político e das sociedades, foi possível agir no sentido de começar a inverter o fenómeno.
Contudo, o estudo e o conhecimento científicos progridem permanentemente, e apesar de a importância e o fundamental papel desempenhado pela Antártida na regulação do clima mundial já serem conhecidos, muito há ainda a descobrir, a perceber, e a aprender acerca daquele continente, como funciona e afecta a vida no grande ecossistema terrestre e, consequentemente, a todos nós. É a própria comunidade científica internacional que afirma que o conhecimento é ainda muito incompleto e necessita de ser aprofundado.
Reconhecendo isso mesmo, em 1961, nasceu o Tratado da Antártida, inicialmente subscrito por apenas 12 países, tendo hoje já 45 aderentes, 16 dos quais são nossos parceiros na União Europeia, sendo firmado sobre o reconhecimento da importância superior para toda a Humanidade em preservar a região a sul do paralelo 60, e salvaguardá-la quer de conflitos internacionais e da presença de armamento e actividades

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bélicas, da poluição e de actividades nucleares quer do saque e da sobreexploração dos seus recursos naturais que possam conduzir à sua destruição mas também da vontade de consagrar o continente Antárctico, ou a Antártida, exclusivamente a fins pacíficos, à investigação científica livre, à defesa do meio ambiente e da natureza e à promoção da cooperação internacional.
Assim, o texto do referido Tratado proibiu expressamente todas as actividades de natureza militar, bem como a realização de testes de armamento, explosões nucleares ou o depósito de resíduos radioactivos ou outros, existindo, aliás, programas de controlo dos impactos das actividades humanas naquela região, assumindo os seus signatários o desejo de travar igualmente a corrida à exploração de recursos de minérios, que conduziriam à destruição daquele ecossistema e da vida selvagem ali existente, estando neste momento assumida pelas partes signatárias, pelo menos, até meados deste século.
Neste sentido, a comunidade científica internacional, no que é acompanhada por muitos cientistas e investigadores nacionais, designadamente pelos pertencentes ao Comité organizador do Ano Polar Internacional em Portugal, tem-se empenhado para que a Antártida se mantenha de acordo com os princípios estabelecidos naquele Tratado, livre da actividade e pressão humana insustentável naquele território internacional.
No próximo mês iniciam-se as comemorações em Portugal, que se prolongarão por dois anos, do III Ano Polar Internacional (os dois primeiros foram, respectivamente, em 1882-1883 e em 1932-1933), momento naturalmente raro e significativo, ao qual o referido Comité já manifestou desejar e entender profundamente importante, para a continuidade de projectos de investigação científica nacionais, associar, depois da entrada de Portugal, em 17 de Julho de 2006, como membro associado, para o Comité Científico para a Investigação na Antártida (SCAR), comité interdisciplinar pertencente ao Conselho Internacional para a Ciência, a adesão formal do nosso país ao Tratado da Antártida.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Leal.

O Sr. Renato Leal (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Está em discussão o projecto de resolução n.º 169/X, de Os Verdes, que recomenda a Ratificação do Tratado da Antártida, que deu entrada na Assembleia da República a 15 de Dezembro último, tendo sido publicado no Diário a 22 do mesmo mês.
O Tratado da Antártida, em vigor desde 1961, definiu que esta região seria usada apenas para fins com liberdade de pesquisa científica e promoção da cooperação internacional no continente, ficando igualmente proibida qualquer actividade de natureza militar, explosões nucleares, deposição de resíduos radioactivos, havendo ainda a obrigação de preservação do ecossistema antárctico.
De entre os 12 países que inicialmente o subscreveram, 7 deles tinham territórios a sul dos 60 graus de latitude, que diziam ser seus ou ter direitos sobre eles.
No início da década de 90, o Tratado foi sujeito a um alargamento, tendo, então, sido assinado por um grupo de mais de 30 países. Os actuais 45 membros reúnem todos os anos num país diferente, onde aprovam recomendações, que posteriormente têm de ser integradas na ordem jurídica de cada país membro.
A Antártida desempenha um papel crucial no sistema climático da Terra, influenciando a circulação oceânica, as interligações climáticas e os níveis do mar.
O professor Chris Rapley, director do British Antarctic Survey, com sede em Cambridge, numa conferência realizada em Exeter nos primeiros dias de Fevereiro de 2005, declarou que a Antártida, no último relatório do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas das Nações Unidas (IPCC), era apresentada como «um gigante adormecido em termos de alterações climáticas, mas o gigante despertou».
Rapley acrescentou ainda não ser possível partilhar o optimismo de estudos anteriores, em que se afastava o perigo de a densa camada de gelo que cobre a parte ocidental da Antártida se desintegrar antes de 2100.
O eventual colapso desses gelos antárcticos constituiria um desastre de proporções gigantescas, já que enormes zonas costeiras submergiriam, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento.
Este cientista britânico lembrou ainda que, nos últimos 50 anos, a região tem sofrido um aumento médio da temperatura na ordem dos 2,5ºC e que, como consequência, dos cerca de 400 glaciares da Península da Antártida, 75% registaram diminuições de densidade, o que representa uma subida do nível médio dos oceanos de um quinto de milímetro por ano.
De Março de 2007 a 2009, decorre o IV Ano Polar Internacional, havendo no nosso país um comité nacional devidamente reconhecido pelo Governo e que se propõe desenvolver um trabalho altamente meritório, designadamente junto da população escolar, em que os alunos, por exemplo, podem questionar, via net, os investigadores portugueses que estão na Antártida e obter respostas quase em tempo real.
Mostrar o que se passa na Antártida ao nível das mudanças no clima, na criosfera, nos ecossistemas, nos hábitos de vida dos povos polares, bem como as consequências que estas regiões têm para o resto do planeta são alguns dos assuntos que os investigadores portugueses se propõem partilhar com os nossos alunos.
Aos níveis científico e educativo, como se vê, Portugal está dando significativos pequenos grandes passos.
Parece-nos, por isso, que importa também acompanhar esta dinâmica ao nível diplomático, razão pela qual dedicamos o maior interesse a este projecto de resolução.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Carloto Marques.

O Sr. Luís Carloto Marques (PSD): — Ex.
mo Sr. Presidente, Ex.
mos Sr.as e Srs. Deputados: Perto do «Mundo do Fim do Mundo» ergue-se uma enorme região do globo que, devido às suas características, o homem ainda não conseguiu habitar permanentemente, o que não quer dizer que diversos países não tivessem reivindicado para si o seu quinhão de território.
Os primeiros países subscritores que assinaram o Tratado da Antártida, onde estavam os sete que reivindicavam direitos sobre esta região, celebraram um acordo onde se comprometiam a utilizar a zona unicamente para fins pacíficos, nomeadamente para pesquisas científicas.
Ora, o Parlamento discute, hoje, um projecto de resolução no qual se recomenda ao Governo que Portugal ratifique este Tratado.
Portugal foi, na pessoa dos seus navegadores, uma Nação pioneira no planeta que «deu novos mundos ao mundo». Assim sendo, o conteúdo deste Tratado representa muito do nosso espírito como País. A sua subscrição é, pois, um desafio para todos nós, especialmente para a nossa comunidade científica.
A Antártida é uma região singular. Antes da deriva dos continentes estava unida à Índia, Austrália e América do Sul e possui quase 14 000 000 km
2
, área que, no seu Inverno rigoroso, pode atingir cerca de 30 000 000 km
2
. O seu diâmetro atinge cerca de 4500 km e contém cerca de 80% da água doce do planeta mas, ironicamente, é considerada a região mais seca do planeta, isto se exceptuarmos as zonas costeiras e insulares.
Trata-se, também, da região mais alta do globo, com uma altura média de 2000 m e é a mais ventosa, com rajadas que podem atingir os 327 km, a par de ser a mais fria do planeta.
São raros os animais que aqui habitam. Luc Jacquet imortalizou-os através da sétima arte, ao realizar um filme sobre a longa marcha dos pinguins imperadores.
A Antártida tem ainda outras particularidades. Ela conserva a memória dos portugueses, nomeadamente dos nossos investigadores que lá trabalharam em missões internacionais, mas também dos que reivindicaram para esta região um estatuto especial.
Cabe aqui referir o português Fernando Pereira, que faleceu, como todos sabemos, em 1985 na Nova Zelândia, vítima de um atentado bombista ao navio da Greenpeace.
A Antártida conserva a memória da Terra. Foi lá, no seu gelo profundo, que os cientistas descobriram qual era a nossa atmosfera há milhares de anos. Descobrimos aí que estamos a modificar a composição da nossa atmosfera e, consequentemente, a alterar o clima à face do globo.
A este propósito, convém recordar que faz hoje dois anos que um conjunto muito significativo de nações ratificou o Protocolo de Quioto.
O ex-vice-presidente americano Al Gore demonstrou, recentemente, no que é hoje «a nossa verdade inconveniente», que estamos perante um desafio sem precedentes para a humanidade. Foi particularmente relevante a sobreposição realizada de diversas fotografias, de épocas diferentes, da Antártida, revelando as mesmas que esta está a perder cerca de 152 km
3 de gelo por ano.
Em cerca de 50 anos a espessura do gelo diminuiu aproximadamente 40% e a área congelada é, agora, um terço da área total da região, ou seja de 5 300 000 km
2 num total de 14 000 000 km
2
.
Foi sobre esta imensa região que os satélites descobriram que a Terra estava a ficar sem a camada protectora de ozono, que nos protege da radiação ultravioleta. Os CFC que usamos no nosso quotidiano ou o brometo de metilo que usamos na agricultura chegaram ao «Mundo do Fim do Mundo».
Apesar da subscrição do Tratado de Montreal, no qual nos comprometemos a diminuir a utilização destas substâncias nocivas para o ozono, esta batalha ainda está longe de ser ganha. A Antártida recorda-nos isso todos os dias.
Apesar de nunca termos usado o dicloro difenil tricloroetano, vulgo DDT, na Antártida, os pinguins que ali residem tinham este poluente na sua gordura. A Antártida ensinou-nos que este insecticida migra na cadeia alimentar e pode chegar até aos animais que vivem nesta região longínqua.
A fragilidade e singularidade da Antártida dá-nos também uma lição de política. Quem pensava que as preocupações ecológicas eram uma moda passageira enganou-se profundamente. Quem ambicionou que, através da legítima preocupação dos cidadãos, perante o desgoverno ambiental do planeta, ganharia a visibilidade política necessária para ascender aos centros de decisão, para aí desconsiderar as mais fundadas preocupações sobre o tema, para esses a Antártida é uma lição de sabedoria.
O ambiente é uma política estrutural do século XXI. Não são os senhores da API, com a quase total subserviência do Ministro do Ambiente, que nos vêm ensinar hoje qual é o papel que as políticas ambientais têm neste século.
A Antártida está aí para os ensinar, caso não acreditem.

Aplausos do PSD.

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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Tratado da Antártida foi subscrito em Dezembro de 1959 por doze países — Reino Unido, África do Sul, Bélgica, Japão, Estados Unidos, Noruega, França, Nova Zelândia, Rússia, Argentina, Austrália e Chile — e entrou em vigor no dia 23 de Janeiro de 1961.
Neste momento, já são 45 os países que o subscrevem, 16 dos quais nossos parceiros na União Europeia.
Este Tratado nasceu da vontade de consagrar o continente antárctico exclusivamente a fins pacíficos, à investigação científica livre, à defesa do meio ambiente e da natureza e à promoção da cooperação internacional.
A Antártida é um continente extremamente rico em recursos naturais, designadamente marinhos, mas também minerais, servindo como sistema de refrigeração da Terra através das trocas de calor processadas ao nível dos oceanos e da atmosfera.
Neste mundo global em que vivemos, a Antártida é cada vez mais considerada fundamental para o equilíbrio do nosso ecossistema. A Antártida não é um mero cenário de filmes infantis que saem, em regra, pelo Natal, tais como Happy Feet, A Marcha dos Pinguins e outros. É, pois, fundamental, para todos nós — é o que sucede neste Tratado — que se reconheça o interesse de toda a humanidade em preservar a região a sul do paralelo 60.º.
Entendemos que é importante que não haja conflitos internacionais nem sobreexploração dos recursos da Antártida. Portugal não tem contribuído para isso.
Não temos interesse directo e próximo na Antártida, mas temos interesse, enquanto parte deste mundo global, em que a Antártida seja preservada.
O Tratado proíbe expressamente todas as actividades de natureza militar, mas também a corrida à exploração dos recursos minérios que levaria a uma sobreexploração e à contaminação do que é, ainda hoje, uma reserva fundamental de água doce do planeta, constituída pelo gelo polar.
Portugal é também, desde 17 de Julho de 2006, membro associado do Comité Científico para a Investigação na Antártida (SCAR), o que permite que Portugal contribua para a investigação naquela região.
Neste mundo global, é importante que todos nós demos o nosso contributo para que se preserve o que ainda hoje se mantém, de alguma forma, intocado.

Aplausos do CDS-PP:

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes» traz para a agenda parlamentar uma matéria da maior importância — a preservação da Antártida.
Num momento em que a protecção da natureza e a minimização do impacto da actividade antrópica se colocam como prioridades para a manutenção e progresso da qualidade de vida das populações, importa garantir a participação do Estado português em todas as verdadeiras plataformas que visem a efectiva preservação.
O Tratado da Antártida, iniciado em 1959 e em vigor desde 1961, consubstancia o desígnio plural e patrimonial desse continente. Este Tratado visa a protecção da Antártida mas também a sua elevação a instrumento ao serviço da humanidade, no estudo científico, na preservação de recursos geológicos e hídricos, na preservação da biodiversidade.
Salvaguardar o continente antárctico de um conjunto de agressões é um passo para a garantia da sua integridade enquanto património de todos, ao serviço do progresso mundial, ao serviço do conhecimento, alheio à exploração desenfreada e desregrada de recursos. Mas salvaguardar a Antártida é, também, salvaguardar o planeta, já que este continente, coberto de glaciares, é um ponto vital para o equilíbrio climatológico do planeta: é parte fundamental dos frágeis sistemas dinâmicos de toda a superfície terrestre.
Neste momento, a Antártida serve de base a estudos sobre o clima, sobre o funcionamento geológico do globo, sobre os fenómenos que condicionam a estabilidade das comunidades biológicas, com dados importantes, inclusivamente sobre as extinções em massa e variações climatológicas do passado.
Ratificar o Tratado da Antártida é aliar a voz de Portugal ao esforço internacional iniciado em 1959 pelos Estados que o subscreveram. Um esforço que visou a ruptura com a corrida pela posse territorial do continente e que veio estabelecer o rumo da sua protecção.
Reforçar, pela ratificação, este Tratado é reforçar os seus princípios e objectivos.
A ratificação pode ser um contributo para a intensificação do contributo de Portugal e do seu potencial científico no panorama internacional, na perspectiva da partilha do conhecimento e da cooperação.

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Neste sentido, acompanhamos e saudamos a proposta do partido Ecologista «Os Verdes», apelando a que a ratificação do Tratado comporte também medidas objectivas e concretas no plano do apoio à investigação e da preservação do meio ambiente, promovidas pelo próprio Governo em Portugal.
No espírito original do Tratado, os Estados comprometeram-se com a promoção da paz, da cooperação, com a não realização de actividades militares ou nucleares e com a proibição da exploração dos recursos naturais na região a sul do paralelo 60.º. Não há razões para que a sul do paralelo, ou a norte, Portugal não se associe a tão dignas intenções.

Vozes do PCP: — Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que comece por cumprimentar todas as bancadas parlamentares por esta expressão de grande consenso em torno deste projecto de resolução que o Partido Ecologista «Os Verdes» nos traz aqui hoje e que tem um significado, tal como foi salientado por todos nas intervenções que me antecederam, ao nível do progresso e da necessidade de um incentivo ao conhecimento do planeta, à preservação dos equilíbrios ecológicos, à nossa defesa enquanto parte deste grande ecossistema planetário.
Cumprimento também a iniciativa do Grupo Parlamentar de Os Verdes, que gera um consenso desta natureza e que vem, aliás, na sequência de uma recomendação do Comité Português para o Ano Polar Internacional.
Falta acrescentar apenas um aspecto, que se prende com a importância dos contributos das diversas bancadas e com a importância que constituiu a assinatura deste Tratado, na sua versão de 1961, altura em que foi assinado.
Este Tratado é «uma pedrada no charco» em relação à forma como a humanidade olha para os recursos naturais que são propriedade da humanidade e que, portanto, não devem ser alvo da cativação privada de um qualquer Estado.
Estes recursos naturais, como aqui foi salientado, são preciosos do ponto de vista da defesa, do conhecimento deste grande ecossistema global e, ao mesmo tempo, são um espaço para reflexão sobre outros recursos naturais que precisam de ter um estatuto que os defenda à escala do planeta, à escala global face às tentativas de exploração verdadeiramente suicida, do ponto de vista da nossa existência enquanto humanidade neste planeta que tem recursos finitos.
O Tratado da Antártida demonstrou e conseguiu consagrar, pela primeira vez, a ideia de que os recursos do planeta não são infindáveis. Pelo contrário, eles têm de ser defendidos, protegidos e acarinhados por serem, ainda, dos poucos que restam enquanto grandes espaços naturais —por exemplo correntes oceânicas e grandes manchas florestais em termos do que são as florestas tropicais.
Foi esta ideia, que foi inovadora nos anos 60, que permitiu ganhar uma nova consciência de pertença planetária que hoje acabamos por, comummente, reiterar como querendo fazer dela também nosso património político.
Por isso, o meus cumprimentos a esta Assembleia e ao partido que deu origem a este consenso.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate do projecto de resolução n.º 169/X (Os Verdes).
Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 113/X — Aprova o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território.
Para apresentar a proposta do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.

Pausa.

Srs. Deputados, como ainda não se encontra presente qualquer membro do Governo, nomeadamente o Sr.
Ministro do Ambiente, vamos interromper os nossos trabalhos por alguns momentos.
Está, pois, suspensa a sessão.

Eram 11 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

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Eram 11 horas e 11 minutos.

Srs. Deputados, na medida em que o Sr. Ministro do Ambiente já se encontra presente, penso que estamos em condições de iniciar a apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 113/X - Aprova o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território.
Para apresentar esta iniciativa, tem, pois, a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.

O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (Francisco Nunes Correia): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É de desenvolvimento, é de soberania, é de participação e de cidadania que vos venho hoje falar. Em rigor, venho falar-vos de ordenamento e gestão do território na sua expressão legislativa mais elevada, o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT).
Quero destacar o elevado significado político deste momento. De facto, o debate sobre o PNPOT, que hoje se inicia na Assembleia da República, deve representar um importante marco na afirmação de Portugal como país desenvolvido, senhor do seu destino em matéria de ordenamento do território, mas, ao mesmo tempo, bem integrado no contexto europeu e nos grandes desígnios de âmbito global.
O território é um recurso, um património, um quadro de vida, um elemento de racionalização e de integração de políticas públicas, mas também um campo de iniciativa e de acção decisivo para nos afirmarmos como colectividade política soberana, coesa e desenvolvida. É esse o estatuto que a nossa Constituição lhe atribui e que foi consagrado na Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e do Urbanismo, aprovada em 1998.
O correcto ordenamento do território é, assim, uma das tarefas e um dos deveres fundamentais do Estado, a promover e concretizar em articulação com as regiões autónomas e com as autarquias locais e contando com a participação dos cidadãos. A política de ordenamento do território e do urbanismo assenta num sistema de gestão territorial que se organiza através da interacção coordenada dos âmbitos nacional, regional e municipal. O PNPOT é o pilar mais importante de enquadramento e de orientação estratégica nacional desse sistema, constituindo o quadro de referência a considerar na elaboração dos demais instrumentos de gestão territorial e cumprindo-lhe estabelecer as grandes opções com relevância para o território nacional e as condições de cooperação com os demais Estados-membros para a organização do território da União Europeia.
Compreende-se, assim, que o Programa do XVII Governo Constitucional tenha definido como prioridade fundamental a conclusão, aprovação e aplicação do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, o qual, juntamente com a Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável, deve constituir o documento de referência para as diversas intervenções com impacte territorial, nomeadamente as que serão executadas no âmbito do QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional).
Com a apresentação da proposta de lei que aprova o PNPOT pretende-se, pois, dar um passo decisivo no sentido de completar o enquadramento não apenas dos instrumentos de gestão territorial de âmbito nacional, regional e municipal, mas também das diversas políticas sectoriais com incidência territorial.
O PNPOT organiza-se em dois documentos interligados: o Relatório e o Programa de Acção. Em conjunto, constituem um guia para caracterizar o território de Portugal, para projectar o seu futuro e para se agir de modo a que o País seja um espaço sustentável e bem ordenado, uma economia competitiva, integrada e aberta, um território equitativo no desenvolvimento e bem-estar e uma sociedade criativa e com sentido de cidadania.
O Relatório apresenta uma visão ampla e actualizada sobre Portugal, identifica o seu lugar e papel na Europa e no Mundo, caracteriza as grandes condicionantes, tendências, contrastes e problemas de desenvolvimento, e fundamenta as opções e as prioridades da intervenção para o ordenamento do território até ao final do primeiro quartel do século XXI. O Relatório procede também à definição de opções estratégicas para as várias regiões e estabelece um modelo de organização espacial e de desenvolvimento territorial do País para o horizonte de 2025, que se estrutura em três grandes pilares: a prevenção e gestão de riscos; a conservação e gestão sustentável dos recursos naturais e dos espaços agro-florestais e o sistema urbano e de acessibilidades.
O Programa de Acção concretiza a estratégia de ordenamento, desenvolvimento e coesão do País, integrando o programa das políticas com incidência territorial e estabelecendo as directrizes para os instrumentos de gestão territorial. O programa das políticas consiste no conjunto articulado de objectivos estratégicos, de objectivos específicos e de medidas que especificam, respectivamente, o rumo traçado para o território de Portugal no horizonte de 2025, as principais linhas de intervenção a desenvolver com essa finalidade e ainda as acções prioritárias que permitirão concretizá-las nos próximos anos, isto é, até 2013. As medidas que integram este programa constituem um conjunto vasto de compromissos que envolvem e vinculam as várias áreas governativas e que representam também um estímulo e um apelo à participação de toda a sociedade.
O PNPOT é um instrumento político que, depois de aprovado, vinculará todas as instituições públicas e, em especial, os dois órgãos de soberania que intervêm mais directamente na sua elaboração e na sua aprovação:

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o Governo e a Assembleia da República. Mas é também um documento tecnicamente fundamentado e bem ancorado num longo e alargado processo de participação cívica.
A sua elaboração foi desencadeada em 2002 pelo XIV Governo Constitucional, culminando, assim, os passos fundadores de ordenamento do território dados sob orientação dos governos do Partido Socialista.
Três anos depois, quando o nosso Governo tomou posse, o processo de elaboração do PNPOT, promovido pela DGOTDU (Direcção-Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano) com o apoio de um gabinete coordenado pelo Prof. Jorge Gaspar, tinha progredido no plano técnico, mas encontrava-se numa encruzilhada difícil, marcada por perturbações no relacionamento com a comissão consultiva, a quem cabia o acompanhamento do processo, e pela incapacidade de garantir uma participação continuada por parte das regiões autónomas. A pronta e decisiva acção deste Governo e a resposta construtiva das várias entidades envolvidas permitiu ultrapassar tais dificuldades.
Em Abril de 2005 concluiu-se a fase de elaboração e acompanhamento da proposta técnica do PNPOT.
Seguiu-se um longo e profícuo período de concertação com as entidades públicas e da sociedade civil.
O período de discussão pública da proposta de PNPOT aprovada para este efeito pelo Governo decorreu até 31 de Outubro de 2006, tendo havido uma forte participação da sociedade civil, o que muito contribuiu para o seu enriquecimento. Simultaneamente, e conforme requerido pela lei, foi promovida a consulta a seis instituições universitárias que emitiram os seus pareceres.
Finalmente, com base no Relatório de Apuramento e Ponderação dos Resultados da Discussão Pública, o Governo, com o envolvimento e a consulta dos órgãos próprios das regiões autónomas, aprovou, em 28 de Dezembro de 2006, a proposta de lei que aprova o PNPOT e cuja apreciação pela Assembleia da República agora se inicia.
Ao concluir esta intervenção, quero deixar aqui registadas duas palavras de compromisso. A primeira para manifestar a total disponibilidade de cooperação institucional do Governo com a Assembleia da República nesta fase decisiva de aprovação do PNPOT sob a forma de lei. A segunda para afirmar a determinação do Governo em assegurar a execução do PNPOT, concretizando o seu Programa de Acção em cooperação com as regiões autónomas e as autarquias locais e com o envolvimento activo e coordenado de toda a Administração. Determinação ainda em promover o acompanhamento e a avaliação da concretização do PNPOT, nomeadamente através do observatório do ordenamento do território e do urbanismo contemplado na nova lei orgânica da DGOTDU, e da apresentação a esta Assembleia da República de relatórios sobre o estado do ordenamento do território, de dois em dois anos, conforme o previsto na legislação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro do Ambiente seis Srs. Deputados.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente em exercício,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Presidente em exercício?! Sr. Presidente!

O Orador: — … começo este pedido de esclarecimento sem saber se, desta vez, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares também nos vai esclarecer que, no alto critério do Governo, há perguntas a que respondem e outras a que não respondem. Tenho a expectativa de que isto serve para alguma coisa, mas conto com os bons ofícios do Sr. Presidente para me ajudar no que for possível.
Em todo o caso, tinha a esperança de que o Sr. Ministro do Ambiente resistisse a esta tentação «politiqueira» de vir para aqui reclamar paternidades do que, pura e simplesmente, não fez. Já que não resistiu, vou recordar-lhe o percurso político do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território.
Foi deliberado fazer-se o PNPOT numa lei de bases de 1998, no tempo do governo do Eng.º Guterres e do ministro Sócrates, que, em 2002, depois de ter perdido as eleições, sobre este Programa não apresentou nada ao Conselho Nacional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CNADS), tendo-se limitado a apresentar uma resolução do Conselho de Ministros que determinava a sua elaboração. O empenho do governo socialista passou, portanto, por, em 1998, apresentar uma lei de bases e por, na semana anterior a arrumar os caixotes e ir-se embora, depois de ter perdido as eleições, ter ido ao CNADS entregar uma resolução do Conselho de Ministros. Como fez, de resto, com a Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável, em relação à qual disse: «Venha daí alguém que faça!» A verdade é que, de facto, «veio aí alguém que fez», porque, se não tivesse sido assim, não era possível que o Secretário de Estado que está sentado ao seu lado, Sr. Ministro, tivesse, 21 dias depois de ter tomado posse, entregue ao Conselho Nacional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – agora sim! – o trabalho acabado. Trabalho que o Sr. Ministro imagina que a DGOTDU fez sozinha, sem a orientação política dos governos que, apesar de terem tido tantos ministros, alguma coisa conseguiram fazer. Ora, estes governos conseguiram fazer o trabalho que o senhor, dois anos depois de estar pronto, traz à Assembleia da República.

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Como tal, a minha primeira pergunta é, pois, no sentido de saber o que é que o senhor fez para que um trabalho que encontrou pronto – e que o anterior governo socialista não quis fazer – tenha demorado dois anos a chegar à Assembleia da República. Enfim, é um bocadinho o registo do costume. O Sr. Ministro faz tudo muito devagarinho e só faz «papel». Convinha, no entanto, que começássemos a ver alguma coisa de diferente.
Para vermos algo de diferente, porém, é preciso perceber – e é esta a segunda pergunta – como é que se executam todas estas prioridades do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território.
Nomeadamente, é preciso perceber qual será o seu reflexo no próximo período de programação financeira comunitário. O Sr. Ministro, no QREN, repete 10 vezes o PNPOT, pelo que lhe peço que faça o favor de nos identificar as linhas de concretização do Programa Operacional Temático de Valorização do Território. É que não se vê uma! Se o senhor quiser fazer o favor de explicar, ficar-lhe-emos gratos.
A outra coisa que obviamente tem de explicar é como é que este PNPOT se coordena com a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza, com o Plano Sectorial Rede Natura 2000 ou com o Plano Estratégico Nacional de Desenvolvimento Rural 2007/2013. Parece que estamos, mais uma vez, a falar de documentos paralelos que falam da mesma coisa de forma diferente, mas onde, pura e simplesmente, não há coordenação, que devia ser o mote de todo este exercício.
Por último, o Sr. Ministro importa-se de nos dizer onde é que no PNPOT está, em termos de política de adaptação às alterações climáticas – convinha que Portugal começasse a ter uma! -, um «pingo» de relacionamento com o programa de alterações climáticas ou com qualquer desiderato de adaptação a esta matéria?! Para já, na expectativa de que hoje o Governo decida responder às perguntas do PSD, é tudo, Sr.
Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente em exercício, Sr. Ministro do Ambiente, confesso que a apresentação do PNPOT na Assembleia da República acaba por ser uma boa surpresa. Digoo porque contrasta com outros programas do Governo que foram ocultados à Assembleia e que o Sr. Ministro não se deu sequer ao trabalho de vir aqui apresentar ou sequer discutir.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Dê um exemplo!

O Orador: — Sr. Ministro, por que razão é que apresentou o PNPOT na Assembleia da República, mas resolveu não apresentar na mesma sede, por exemplo, o PERSU II (Plano Estratégico dos Resíduos Sólidos Urbanos), que consideramos fundamental, limitando-se a aprová-lo através de uma mera portaria? Por que razão é que o mesmo sucedeu com o PEAASAR (Plano Estratégico Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais), que é fundamental para as nossas águas?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Sr. Ministro, V. Ex.ª veio dizer que era fundamental que este Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território vinculasse estes dois órgãos de soberania, a Assembleia da República e o Governo, mas o que está verdadeiramente em causa é a falta de peso que o senhor tem no âmbito do Governo para conseguir impor as soluções ambientais necessárias, com vista ao bom ordenamento do território do País. O Sr. Ministro tem, portanto, a necessidade de vir pedir à Assembleia que aprove este Programa sob a forma de lei, pois, caso contrário, já sabemos o que, com este Governo, vai acontecer ao ordenamento do território. A não ser assim, vamos ter mais casos como os dos projectos das Herdades do Pinheirinho e da Costa Terra e outros que tais, porque o Sr. Ministro é incapaz de defender as opções correctas para o ordenamento do território e para o ambiente no seio do Governo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Todavia, consideramos que é importante aprovar o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, mais que não seja porque nos permitirá exercer uma vigilância ainda muito mais «apertada» sobre o desgoverno que tem sido a política de ordenamento do território.
Sr. Ministro, considero que seria fundamental clarificar o conteúdo normativo das opções que são tomadas por parte do Governo no âmbito do PNPOT. De facto, ele não pode ser apenas um diagnóstico em tom proclamatório do que são as opções do Governo nesta matéria. Era necessário muito mais, porque é a política de ordenamento do território que aqui está em causa.

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Por fim, lamento que este Programa apareça aqui dois anos depois de estar concluído. Em Abril de 2005 os trabalhos técnicos estavam concluídos e o atraso que este Programa denota acaba por contaminar todos os outros planos que V. Ex.ª até hoje não conseguiu apresentar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Pita Ameixa.

O Sr. Luís Pita Ameixa (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, quero, em meu nome pessoal e em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, colocar algumas questões a V. Ex.ª a respeito da sua intervenção e do PNPOT, mas não sem antes cumprir o que julgo ser o dever político do Parlamento, que é saudar o Governo por ter trazido aqui o PNPOT, porque é um facto inédito. Ainda que muitos anteriormente tenham «patinado» ou «surfado» em cima de vários papéis, há uma coisa que conta, que é a concretização.

Risos do CDS-PP.

E, pela primeira vez, na nossa história política, alguém ou algum governo submete ao Parlamento um Programa Nacional da Política do Ordenamento do Território, para que este o discuta, o aprove e o entregue ao País para ser aplicado.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): - Agora, convinha explicar aqueles que escondeu e não trouxe cá!

O Orador: - O primeiro ponto que quero colocar, Sr. Ministro, diz justamente respeito às relações que existem entre os órgãos do poder político para a gestão do PNPOT e de toda a política e instrumentos do ordenamento do território.
O poder central e a administração local, ambos, têm um papel a desempenhar nesta matéria, designadamente na sua gestão e na sua aplicação. A construção e a completude de todo o edifício do ordenamento do território dará, designadamente às autarquias locais, uma maior autonomia nas suas competências em matéria de poder local, libertando-as de diversas aprovações governamentais.
Portanto, a primeira questão que lhe coloco é sobre esta, como agora se diz, governança do ordenamento do território no que respeita aos vários níveis do poder político.
Em segundo lugar, é de notar também que o crescimento económico mundial e nacional é sobretudo um crescimento económico baseado no terciário. Ora, esta circunstância faz com que ele se torne um crescimento com uma incidência sobretudo urbana e, portanto, isto coloca-nos dificuldades e questões no que diz respeito ao equilíbrio territorial no plano social e no plano demográfico. Qual é o papel do Estado? Para o Governo e para o PNPOT, qual deve ser o papel do Estado para promover os equilíbrios da ocupação do nosso território?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): - Essa é uma pergunta difícil!

O Orador: - Finalmente, quero também sublinhar a ligação que há entre o PNPOT e o QREN. O PNPOT vigorará até 2025 mas tem medidas até 2013, que estão coadunadas com o período de vigência do QREN.
Temos um problema de coesão do território e um problema de competitividade e a questão que quero colocar ao Sr. Ministro, porque essa competitividade pode pôr problemas de concentracionismo que sejam deficientes para a ocupação do território, é quais são, na visão do Governo, as nossas linhas de promoção da competitividade regionalmente diferenciada para «casar» a política de ordenamento do território com a aplicação do QREN para o período até 2013.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.

O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: - Sr.
Presidente, Srs. Deputados, se me permitem, começarei por responder por ordem inversa dos pedidos de esclarecimento.

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O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): - É mais fácil!

O Orador: - Sr. Deputado Luís Pita Ameixa, concordo inteiramente com as considerações que fez. É mais fácil falar do que fazer, é mais fácil pôr recados nos jornais do que concretizar documentos com a envergadura que estes têm, e é por isso que algumas bancadas, numa interpretação que aos meus olhos me parece insólita do mandato que lhes foi dado, em vez de virem aqui fazer críticas profundas e construtivas, manifestando, naturalmente, as suas opções e os seus pontos de vista, perdem os seus minutos a dizer que disse, que criticou, que já fez e que já tinha feito. Alheemo-nos, pois, desse espírito, que não nos leva a coisa nenhuma, nem julgamos que seja isso o que o povo português espera de nós.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Muito bem!

O Orador: - As suas questões, Sr. Deputado, são de uma grande pertinência. As cidades, hoje, desempenham um papel absolutamente crucial como motores do desenvolvimento regional, elas são as verdadeiras âncoras do desenvolvimento regional. Aliás, na política de cidades que tem vindo a ser formulada, a relação entre a cidade e a sua região envolvente é uma das facetas que queremos sublinhar, que queremos potenciar e que, justamente, no quadro do QREN e precisamente no quadro do PNPOT, como não poderia deixar de ser, é bastante acentuada. Sabemos que existem regiões onde a desertificação humana e a rarefacção das actividades económicas criam desafios muito particulares ao nosso país.
Como sabem, as questões da competitividade podem ser vistas a várias escalas. Há uma escala nacional que, em primeiro lugar, nos tem de preocupar, porque ela se reflecte a todos os outros níveis, mas também há uma escala local de que não nos podemos dissociar. Por isso, o conceito de competitividade, enquanto estrangulamento para as políticas de coesão, enquanto estrangulamento para as políticas de desenvolvimento regional, é um conceito fundamental. Mas temos de olhar para a competitividade como algo de regionalmente diferenciado, como disse, e muito bem.
Qual o papel do Estado? A pergunta é muito pertinente e estas são as questões que julgo que vale a pena discutir numa Assembleia como esta. O Estado tem um papel essencial, desde logo naquilo a que se chama as falhas de mercado, criando um conjunto de incentivos e de estímulos que permitam, nas zonas que mais dificuldade têm em afirmar a sua especificidade e a sua capacidade competitiva, promovê-la.
Em primeiro lugar, no quadro do PNPOT, como no quadro do QREN, isso está bem saliente, desde logo na política de cidades, que mesmo agora referi, que é uma alavanca dos processos de desenvolvimento regional.
Em segundo lugar, uma boa parte do QREN é dedicada ao estímulo à economia, às empresas, mas há uma modelação regional desses incentivos, e isso é também um elemento de diferenciação que queremos reter.
Em terceiro lugar, através de um programa em que o nosso ministério tem posto grande empenho, que é o Programa de Valorização Económica de Recursos Endógenos, especialmente desenhado para regiões de baixa densidade e de baixa actividade económica.
Portanto, Sr. Deputado, no escasso tempo que temos, estas são as respostas que me parecem pertinentes.
Apesar de tudo, respondamos às outras questões que nos foram colocadas.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado António Carlos Monteiro, com todo o respeito, mas talvez por ser um recém-chegado a estes temas, a estas áreas, não conhece alguns aspectos do ordenamento jurídico que as regem.
O Sr. Deputado diz que aprovámos o PERSU por mera portaria.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): - Devia ter cá vindo discuti-lo! O Orador: - Pois, Sr. Deputado, a lei que diz que o PERSU é aprovado por portaria. Não há outra maneira de o aprovar!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): - O Sr. Ministro fugiu à Assembleia!

O Orador: - E essa lei é o regime geral dos resíduos, que é um decreto-lei enquadrador da questão dos resíduos, de importância fundamental, que nos coube a nós fazer.
O Sr. Deputado diz que o PEAASAR não foi trazido a esta Assembleia para discussão. A sua memória é fraca, Sr. Deputado, porque tenho a certeza de que participei num debate apenas dedicado ao PEAASAR nesta Assembleia da República.

Vozes do PS: - Faltou!

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O Orador: - Julgo até que o Sr. Deputado estava lá e até me lembro que trocámos algumas impressões, aí sim, muito interessantes sobre a relação entre públicos e privados. O Sr. Deputado estava lá! Se trocámos essas impressões foi porque houve um debate na Assembleia da República!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): - O documento final não veio cá!

O Orador: - Depois, e isto é de bradar aos céus, o Sr. Deputado diz que, por uma questão de peso político – desculpe mas essa questão de peso político está estafada –,…

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): - Não está estafada, não, é real!

O Orador: - … tem de vir à Assembleia, para ter a força de lei. Sr. Deputado, este programa vem a Assembleia porque, justamente, a Lei de Bases do Ordenamento do Território diz que o PNPOT, enquanto pedra de fecho do edifício dos instrumentos de gestão do território, é uma lei da Assembleia da República.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): - Senão seria também por portaria!

O Orador: - E aqui estamos nós a apresentá-la. Para nós, um ano e meio chegou, mas para os senhores três anos não chegaram! E isto leva-me rapidamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado José Eduardo Martins.
O Sr. Deputado tem razão. A resolução do Conselho de Ministros que dá início a este processo e que lhe define as traves-mestras foi aprovada antes mas acabou por ser publicada no Diário da República já em Abril de 2002. Mas essas linhas-mestras foram adoptadas pelos seus governos, sinal que as entenderam como boas. E devo dizer-lhe que fizeram uma coisa correcta, que foi designar o Professor Jorge Gaspar, pessoa extraordinariamente competente, para coordenar o grupo de trabalho.
Eu próprio disse que, em 2005, a parte técnica estava, nos seus aspectos essenciais, feita.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr. Ministro, peço-lhe que conclua.

O Orador: - Mas este documento não é técnico, é político, e aí o falhanço foi crasso. Se o grupo de trabalho do Professor Jorge Gaspar e a DGOTDU fizeram um bom trabalho, a condução política do processo foi desastrosa e nós fomos juntar as peças para dar o relevo político a um documento técnico que estava simplesmente malbaratado e em risco de se perder.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr. Ministro, concluiu o seu tempo, queira concluir.

O Orador: - Sr. Presidente, muito rapidamente, vou falar apenas das relações com o QREN.
Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que as opções estratégicas a nível regional do PNPOT são exactamente as que estão plasmadas nos programas operacionais regionais do QREN. O horizonte temporal de execução do PNPOT é 2007-2013, justamente para coincidir com o QREN, que, aliás, assimila o PNPOT e diz que ele é um documento enquadrador.
Finalmente, os indicadores que estão a ser preparados para os programas operacionais são os mesmos que estão presentes no PNPOT.

Aplausos do PS.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD):- Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Para que efeito, Sr. Deputado? Espero que não seja para uma réplica, que não está prevista no Regimento.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - É para uma brevíssima interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Sr. Presidente, é só para constatar que o Sr. Ministro, que decidiu teorizar sobre como é que essa maçada da oposição deve utilizar os seus minutos, não considerou importante responder a perguntas sobre a relação do PNPOT com o PNAC, com a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade, com a Estratégia do Desenvolvimento Rural ou, sequer, com o Programa Operacional da Valorização do Território, do seu ministério. É só isso que registo para que fique em Acta, Sr.
Presidente.

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O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): - Sr. Presidente, peço também a palavra.

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, presumo que pede a palavra para o mesmo efeito.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Exactamente, Sr. Presidente. O Sr. Presidente acertou em cheio!

O Sr. Presidente (António Filipe): - Era previsível, Sr. Ministro.

Risos.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Mas isso não quer dizer que o Sr. Presidente também não acerte em cheio mesmo quando as coisas são imprevisíveis.

Risos.

Sr. Presidente, pedi a palavra exactamente para o mesmo registo.
Todos nós que aqui estamos somos mulheres e homens livres e respondemos pelas afirmações que aqui fazemos. As Sr.as e os Srs. Deputados são inteiramente livres nas afirmações, nas perguntas e nas intervenções que fazem e no modo como as organizam, assim como os membros do Governo são inteiramente livres e responsáveis pelas suas afirmações e pela forma como organizam as respostas. Nem o Governo pode determinar o conteúdo das perguntas feitas pelos Srs. Deputados, nem os Srs. Deputados podem determinar o conteúdo das respostas dadas pelo Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente (António Filipe): - Sr. Deputado José Eduardo Martins, peço imensa desculpa mas não vamos eternizar este incidente. Há mais Deputados inscritos para pedir esclarecimentos e os direitos dos demais Deputados têm de ser respeitados. Portanto, Sr. Deputado, já lhe dei a palavra para uma interpelação à Mesa e não posso dar-lha segunda vez.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.

O Sr. José Soeiro (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, o Grupo Parlamentar do PCP congratula-se por ter, finalmente, um instrumento para apreciar e poder pronunciar-se sobre o mesmo. Aguardámo-lo no passado e aguardámo-lo com este Governo durante dois anos, na medida em que em 2005, como o Sr. Ministro deve estar recordado, numa Comissão de Economia, foi aberta esta perspectiva.
Já tínhamos tido conhecimento do núcleo duro do PNPOT através de uma sessão em que tivemos oportunidade de participar com o Sr. Professor Jorge Gaspar. Naturalmente, ao longo deste processo, fomos questionando o Sr. Ministro, e voltamos agora a fazê-lo, sobre três questões que consideramos da maior pertinência para qualquer política de ordenamento do território e que nos preocupam.
Primeira questão: desenvolvimento rural. Está em discussão e em fase de conclusão um PDR. As apreciações feitas pelas organizações de agricultores sobre este PDR são que ele vai no sentido de contribuir para agravar as difíceis condições em que já se encontra hoje o interior do País e o mundo rural. Daí que a pergunta, Sr. Ministro, seja a seguinte: como é que este PDR se compagina com aquilo que se diz ser a estratégia de coesão territorial da competitividade que se pretende atribuir aos diferentes territórios? E como é que se pretende que as pessoas possam subsistir no interior do País sem terem a mínima garantia das condições mínimas para lá continuarem?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — A segunda questão, Sr. Ministro, tem a ver com o turismo.
O Governo arvorou a bandeira do turismo como uma das grandes bandeiras do desenvolvimento. Nós temos a opinião de que, sem dúvida, o turismo em Portugal é uma aposta a fazer, mas o que perguntamos, Sr.
Ministro, é qual é a coerência entre a política que o Ministério da Economia tem vindo a anunciar sucessivamente, isto é, de forma casuística, com os chamados PIN? Se fizermos uma avaliação aos mesmos facilmente constatamos que, mais uma vez, se trata de exercer uma carga sobre o litoral, quer o litoral algarvio, quer o litoral alentejano, quer mesmo a norte do Tejo. Portanto, como é que se compagina a

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estratégia de dar coesão, dar equilíbrio ao território como um todo e, simultaneamente, afunilarmos, efectivamente, o investimento nesta direcção?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — A terceira questão, Sr. Ministro, prende-se com os transportes, na medida em que, sendo embora uma questão estratégica também para a estruturação do próprio território, o que vemos nesta matéria é o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações ir anunciando medidas atrás de medidas, pouco fundamentadas, pouco estudadas, mas, procurando apresentá-las como factos consumados, e não vemos, na estratégia até hoje apresentada, uma linha coerente com aquilo que também se diz no PNPOT, que é a necessidade de uma aposta maior nos transportes ferroviários, no seu alargamento a outros pontos do território. Na verdade, o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações do que é que fala? Do novo aeroporto da Ota/TGV, do TGV/novo aeroporto da Ota!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não sai dali!

O Orador: — Como é que isto se compagina com uma estratégia de investimento sério na linha convencional ferroviária, na sua modernização e no seu alargamento, para garantir o acesso a este meio de transporte por parte de toda a população?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, Os Verdes atribuem uma importância muito significativa ao Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território. É uma importância tal que, assim que tivemos acesso ao documento, tivemos oportunidade de o ler de uma forma muito cuidada e sentimos, até, uma particular necessidade de intervenção no próprio período de discussão pública - creio, até, que fomos o único partido político a ter um parecer escrito em sede de discussão pública - por aquilo que encontrámos naquela primeira versão do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território e que nos deixou profundamente preocupados: encontrámos uma evidente desarticulação com outros planos e outras estruturas já criadas, sendo que muitas delas não têm a dinâmica que na altura já deveriam ter, como, por exemplo, as autoridades metropolitanas de transportes ou a própria Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável.
Devemos referir que, da primeira versão para esta segunda, encontrámos algumas melhorias. Porém, os programas não valem por si só. É evidente que é importante o objectivo da elaboração do programa, mas é fundamental olhar ao seu conteúdo no sentido de percebermos a sua eficácia concreta.
Ora, apesar dessas pequenas melhorias, não estamos profundamente descansados relativamente aos objectivos traduzidos neste programa, desde logo porque o Sr. Ministro terminou a sua intervenção referindo que aquilo que o Governo podia garantir era a execução concreta deste Programa.
Na verdade, um dos requisitos que traduz o decreto-lei que determina a elaboração do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território é justamente a identificação dos meios de financiamento das acções propostas.
A minha primeira questão é esta: por que é que este programa nacional não traz associada a si a programação financeira para a sua execução? Esta é, de facto, uma questão crucial, pois sem financiamento não há execução, e, evidentemente, perguntamos: que financiamento? Qual a origem? É isto o que importa saber e que, justamente, a lei determinava que deveria vir associado a este programa de ordenamento do território.
Depois, há uma questão fundamental, de resto, já aqui abordada, que se prende com a questão do transporte ferroviário, a qual é uma questão crucial em termos da mobilidade a nível nacional, no combate ao despovoamento do interior do País e naquilo que diz respeito aos nossos objectivos também ao nível do combate às alterações climáticas.
É por isso que nos preocupa bastante que este programa reconheça que, nos últimos 10 anos, foram encerrados - reconhece e é com legitimidade, porque é a realidade - mais de 300 km de linha ferroviária convencional, mas não apresenta exactamente a perspectiva contrária para os próximos 20 anos. Ou seja, considera que o transporte ferroviário deve ter um papel dinâmico na mobilidade da população e no domínio do transporte de mercadorias, mas não apresenta, depois, uma linha concreta que nos leve a crer que vai haver uma inversão na aposta da linha convencional, que não tem havido até à data. Gostaria, por isso, de obter um esclarecimento relativamente a esta matéria.

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Por último, mesmo para terminar, há também uma questão crucial que não é sequer falada neste Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, que se prende com as medidas de adaptação às alterações climáticas.
Temos o Plano Nacional para as Alterações Climáticas, mas, actualmente, em todos os seminários, em todas as conferências, sempre que se fala sobre alterações climáticas, toda a gente realça a necessidade de uma plano nacional de adaptação às alterações climáticas. Como é que se faz um programa nacional de ordenamento do território sem prever o exercício desse plano nem essas medidas de adaptação?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, deixe-me retomar um pouco aquilo que foi a sua resposta ao Deputado Luís Pita Ameixa, quando referia aquilo que considera ser o papel do Estado como «preenchedor dos buracos» que o mercado vai deixando, e, portanto, sobre essa visão minimalista das funções e responsabilidades do Estado.
O Sr. Ministro sabe que não estamos de acordo com isso, que o Estado não é propriamente uma «massa de concertação de buracos», o Estado tem uma função muito mais importante, que, aliás, é a função que está naquilo que tem vindo a ser referido aqui, que é a Lei de Bases da Política do Ordenamento do Território, quando esta lei remete e acomete ao PNPOT justamente uma função essencial ao nível de «assegurar a igualdade de oportunidades dos cidadãos no acesso às infra-estruturas, equipamentos e funções humanas.» Sr. Ministro, isto está na lei de bases, que, aliás, o Programa do Governo, de alguma forma, retoma, porque o Programa do Governo – muito superficialmente, é verdade – retoma esta ideia de que uma das prioridades é contrariar a tendência à excessiva litoralização do País e de desertificação do interior.
Ora, isto traz-nos inevitavelmente àquilo que é, na opinião do BE, a grande fragilidade do PNPOT, quer ao nível do diagnóstico que faz do território, quer ao nível das medidas que propõe e que são, ou deviam ser, adequadas a um diagnóstico mais exaustivo.
E esta grande fragilidade, Sr. Ministro, tem a ver com a necessidade de perceber o fenómeno que o PNPOT identifica claramente, tem a ver com as transformações na distribuição territorial dos activos, que «parecem ter envolvido sobretudo os sectores de baixa produtividade, pelo que aquelas transformações não se repercutiram de modo proporcional no padrão espacial da produção de riqueza».
Portanto, nesta relação dinâmica entre o desenvolvimento, a produção de riqueza e a ocupação do território, o PNPOT identifica claramente o movimento, o qual tem sido no sentido da transformação e da concentração na faixa litoral dos sectores da massa crítica, dos sectores mais produtivos.
No entanto, aquilo a que assistimos é que, do ponto de vista da percepção do porquê - o que é que dá origem a estes processos -, a identificação e o diagnóstico do PNPOT ficam muito aquém das necessidades.
De facto, não é feita uma identificação, do ponto de vista dos indicadores de qualidade de vida das populações (e refiro-me a algumas coisas que são essenciais, como as taxas de mobilidade, por exemplo), em termos de mapeamento do território, das taxas de mobilidade e das desigualdades de mobilidade da população, assim como não existe, ao nível da identificação da qualidade de vida das populações, um factor e um indicador essencial, que é o da equidade de acesso aos serviços públicos (estamos a falar da educação, da saúde, da justiça), e também não é feita uma identificação, um mapeamento nacional, das condições de segurança dos cidadãos.
E refiro-o porque é do conjunto da oferta de emprego, da mobilidade, da qualidade e da equidade de acesso aos serviços que se consegue encontrar a justificação para estes processos de grande transformação territorial e, a partir daí, ter um programa de medidas que combata eficazmente este processo de desertificação.
O Bloco de Esquerda tem vindo a propor a inclusão de um mapa nacional de serviços públicos, Sr.
Ministro.
Gostaria que se pronunciasse sobre isto, porque aquilo a que assistimos nos pequenos lugares do nosso país - e os Srs. Deputados do Partido Socialista sabem isto muito bem – é que um dia a Ministra da Educação fecha a escola; outro dia o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações fecha o posto dos correios; outro dia fecha-se mais um segmento de linha de caminho-de-ferro e outro dia fecha-se mais um outro serviço público!

O Sr. Ramos Preto (PS): — Criam-se serviços integrados, não se fecham!

A Oradora: — Portanto, aos poucos e poucos os pequenos lugares estão a ser «encerrados», estão a desaparecer, estão nitidamente a perder um mínimo de vitalidade.
Contrariar este processo, Sr. Ministro, significa uma necessidade de coordenação conjugada entre ministérios. Não pode ser o Ministro da Saúde a dizer que tem critérios técnicos para a área da saúde para fechar urgências em determinado lugar, é preciso que o Ministro da Saúde se entenda…

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Pode concluir, Sr.ª Deputada.

A Oradora: — … com a Ministra da Educação, com o Ministro da Justiça e com o resto do Governo, no sentido de saber exactamente com que modalidades. Elas podem ser as mais diversificadas (Sr. Presidente, peço-lhe desculpa, estou quase a terminar), podem ser serviços móveis, podem ser aquilo que o Governo entender, mas o Governo tem é de garantir equidade de acesso para todos os cidadãos no território nacional, e esse é o compromisso que o PNPOT não contempla.

Vozes do BE: — Muito bem!

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Jaime Gama.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.

O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Sr.
Presidente, quero começar por agradecer aos Srs. Deputados José Soeiro, Heloísa Apolónia e Alda Macedo por terem feito perguntas de política, por terem lido o documento. Naturalmente, muitas coisas me afastam dos vossos pontos de vista, mas as questões são pertinentes. Muito obrigado por isso.
Tenho apenas pena que o tempo seja tão escasso que não permita uma discussão global. Mas como viremos, com certeza, à comissão especializada, teremos oportunidade de aprofundar estas questões.
Sr. Deputado José Soeiro, as relações entre o PDR e o QREN são muito relevantes e o PNPOT funciona precisamente, de alguma maneira, como uma envolvente estratégica de todos estes documentos. Pode estar descansado que há uma articulação entre essas vertentes, sendo que ambas contribuem para uma política de desenvolvimento regional e, por essa via, de desenvolvimento do País.
As fronteiras entre as duas linhas de financiamento estão discutidas. Entre nós e o Ministério da Agricultura há um consenso relativamente a uma ênfase, por parte do FEDER e do Fundo de Coesão, nas infraestruturas, digamos, de utilização comum (bens comuns), enquanto que o Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) e o Fundo Europeu para as Pescas estão primordialmente dirigidos ao agente económico.
Portanto, no que diz respeito ao mundo rural, o FEADER apoia, sobretudo, a iniciativa do agricultor, daquele que se quer dedicar ao turismo em espaço rural, daquele que se quer dedicar às pescas, enquanto que do lado dos fundos estruturais se apoia, sobretudo, a infra-estruturação geral do território comum a todos os cidadãos.
Em qualquer dos casos, Sr. Deputado, tanto quanto sei, dia 7 de Março vai haver uma interpelação ao Governo precisamente sobre esse tema e aí, com o Ministro da Agricultura, terá com certeza oportunidade de aprofundar essa questão.
Mas digo-lhe também que estamos a preparar com o Ministério da Agricultura aquilo que chamamos a estratégia nacional para os efluentes da agropecuária e da agro-indústria, onde justamente convergem fundos do FEADER e do QREN,…

O Sr. Luís Carloto Marques (PSD): — Era em Fevereiro!

O Orador: — … para resolver um dos problemas de poluição mais sérios do nosso país ligado às actividades rurais.
O Sr. Deputado faz críticas violentas aos PIN, referindo que são cargas excessivas sobre o litoral.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma desconformidade!

O Orador: — Não há desconformidade nenhuma, há uma total adequação.
Sr. Deputado, PIN significa potencial interesse nacional. Esse potencial interesse nacional resulta essencialmente do nível de investimento e dos postos de trabalho que o projecto cria, e tenho a certeza que a sua bancada não é insensível a essa dimensão.
Qual é papel do Ministério do Ambiente? É assegurar que esses projectos são feitos em plena conformidade com a legislação e trazer uma mais-valia ambiental a todo esse processo.

O Sr. Luís Carloto Marques (PSD): — Não diga isso! O senhor altera a lei!

O Orador: — O nosso Ministério tem sido soberano nas suas decisões relativamente a essa matéria.

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Ainda esta semana, há três ou quatro dias atrás, tive oportunidade de comunicar aos promotores de um projecto no Algarve – foi uma das regiões referidas pelo Sr. Deputado – a não aceitação de uma das suas propostas.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Extraordinário!

O Orador: — Perto de 20% dos projectos PIN foram rejeitados. Falei num caso recente de grande visibilidade pública.
Quanto ao sector ferroviário, Srs. Deputados, é uma prioridade deste Governo e foi devidamente anunciada pelo Sr. Ministro das Obras Públicas, Transporte e Comunicações.
Em primeiro lugar, fala-se sempre do TGV como sendo uma espécie de luxo, de coisa supérflua. Não é, Srs. Deputados. O TGV é algo de essencial para a coesão interna deste território…

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Lá vem a cassete!

O Orador: — … e para a sua coesão a nível europeu.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Todos os países europeus estão a ser dotados de TGV. Portugal não se pode deixar «periferizar» e este Governo não vai permitir que uma visão antiquada leve este País a deixar-se «periferizar».
Mas não é só TGV, são as linhas Sines/Badajoz, potenciando o pólo de Sines, que finalmente encontra a sua verdadeira vocação, são as redes suburbanas, e tantas outras iniciativas que foram anunciadas nessa linha.
A Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia refere, pede e insiste na pergunta: onde está a programação financeira? Enfim, centro-me nessa sua principal questão.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, pode concluir.

O Orador: - Sr.ª Deputada, este não é um programa de aplicação, pelo que não faz sentido, aqui, uma programação financeira.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Mas a lei é que determina que tem de haver!

O Orador: — Muitas destas medidas são de macropolítica, são legislativas, são institucionais.
Tem muita programação financeira no QREN, há aí muitas oportunidades para a sociedade prosseguir as linhas que aqui são definidas.
Sr.ª Deputada Alda Macedo, vou fazer três breves referências.

O Sr. Presidente: — Já esgotou o seu tempo, Sr. Ministro. Ou pede uma transferência de tempo ou terá de concluir.

O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
Em primeiro lugar, o PNPOT traduz-se em linhas-mestras que se desdobram em muitas outras iniciativas.
A Sr.ª Deputada diz que a questão do acesso não está contemplada. Sr.ª Deputada, a única explicação para isso é que, por lapso, falta uma página no seu documento. Imagine que há um objectivo estratégico todo ele dedicado a garantir a equidade, o acesso aos equipamentos e às infra-estruturas! Além do mais, o nosso Ministério, como sabe, dá muita importância a isso e tem em curso uma iniciativa relevante, que são os centros multiserviços.
Também o QREN dedica capítulos ao problema da inclusão, nomeadamente nas suas diversas várias vertentes, quer a inclusão territorial, quer a inclusão de sectores da população, desde logo das mulheres, que estão previstas também explicitamente. Portanto, estamos à-vontade nessa matéria.
Peço desculpa por ter excedido o tempo, Sr. Presidente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD saúda o impulso político serôdio assumido pelo Governo com a apresentação da presente proposta de lei, que pretende aprovar o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, por este Programa, na verdade,

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constituir uma peça fundamental de todo o edifício jurídico-institucional da política para o território e, também, uma base estrutural para a organização do País.
É isso mesmo que decorre da Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo, de 1998, que caracteriza o PNPOT como um «instrumento de desenvolvimento territorial (…) cujas directrizes e orientações fundamentais traduzem um modelo de organização espacial que terá em conta o sistema urbano, as redes, as infra-estruturas e os equipamentos de interesse nacional, bem como as áreas de interesse nacional em termos agrícolas, ambientais e patrimoniais».
Nesse enquadramento, o PNPOT veio reconhecer, e bem, alguns dos mais importantes problemas estruturais do nosso país, designadamente a má gestão dos recursos naturais, com ênfase para a água e floresta; a deficiente exploração das fontes renováveis de energia; a reduzida eficiência energética, tanto nas actividades económicas como nos modelos de mobilidade e consumo; a elevada dependência da energia primária importada; a expansão desordenada das áreas metropolitanas e a má qualidade de áreas residenciais; a deficiente intermobilidade, com destaque para a dependência dos veículos automóveis privados; o insuficiente desenvolvimento do transporte ferroviário, que não das linhas de alta velocidade como acabam de ser defendidas; a dificuldade no cumprimento de legislação existente.
O PNPOT deveria, assim, estar orientado para a mitigação e a resolução destas questões através da implementação de medidas eficazes e concretas.
Dois anos depois de a pesada herança que este Governo encontrou ter sido pura e simplesmente o trabalho feito, o resultado é que desta redacção ou não se percebe como irão ser implementadas determinadas medidas ou se definem novos e mais planos de implementação, o que irá, inevitavelmente, gerar uma rede de procedimentos burocráticos tão ao gosto do titular da pasta que hoje, aqui, está connosco.
Por outro lado, apesar da sua abrangência, não está definido qualquer órgão responsável pela implementação deste Programa, nem sequer o seu modelo de gestão.
Nada é referido a propósito da viabilização financeira da aplicação das medidas previstas no PNPOT.
Não há a mais pequena clarificação dos compromissos do Governo, ao nível de medidas legislativas e seus calendários, de investimentos públicos ou, sequer, de instrumentos de natureza fiscal para a concretização destas propostas.
É, pois, indispensável que o PNPOT defina estratégias concretas e objectivas e não aumente, apenas, a teia de regulamentos e de procedimentos burocráticos, para lá dos que já existem.
É por estas razões que aquilo que o Governo nos traz é um documento vago, extenso e de difícil implementação, mesmo a longo prazo.
Por outro lado, as prioridades do Programa não contemplam o problema da desertificação humana e física, que atinge quase dois terços do território nacional, sendo que este problema pode até vir a ser agravado pela multiplicação de planos sectoriais.
Não há — e o Ministro recusou-se a responder, porque bem sabe que não há — qualquer articulação com o Plano Estratégico Nacional para o Desenvolvimento Rural 2007-2013, no sentido de serem previstas medidas para a protecção dos solos de maior produtividade, sobretudo nas áreas metropolitanas,…

O Sr. Ramos Preto (PS): — Não é verdade!

O Orador: — … as quais deviam ser seguidas pelos planos regionais de ordenamento do território, que este Ministério se prepara para elaborar, em «caixinha fechada», dentro das CCDR.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Pois é!

O Orador: — É inegável que deveria ter sido dada mais importância, no PNPOT, à problemática dos riscos naturais na política de ordenamento do território e, em especial, aos impactes decorrentes das alterações climáticas para vários sectores económico-sociais e sistemas biofísicos, como os recursos hídricos, a agricultura, a floresta ou a orla costeira. Mais uma vez, o Sr. Ministro não respondeu, não porque, como diz o Ministro dos Assuntos Parlamentares, na sua liberdade, o Governo escolha aquilo a que deve ou não responder, mas porque, na sua falta de responsabilidade perante esta Assembleia, o Governo sabe muito bem aquilo a que não tem resposta para dar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Deveria existir, ao invés de simples medidas de prevenção e de mitigação, como mapas de riscos, uma óbvia articulação entre o PNPOT e o PNAC, sobretudo em matéria de adaptação, que, pura e simplesmente, não existe.
Cerca de um terço do território nacional é ocupado por espaços florestais com pouca valia económica directa. O PNPOT não analisa em profundidade nem apresenta uma única proposta séria sobre o que fazer com estas áreas.

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O sector imobiliário, axial na política de ordenamento do território, merece uma simples medida, integrada no Objectivo Específico 3.3, de promover mecanismos de combate à especulação fundiária, o que quer que isso, um dia, talvez, possa vir a ser.
Dito isto, cabe, contudo, analisar o Programa, tanto no seu percurso como nos aspectos mais relevantes da sua substância.
Como já se disse, a primeira vez que se falou do PNPOT foi em 1998. No entanto, quatro anos depois, mais precisamente, em Fevereiro de 2002, repito, em Fevereiro de 2002, é que o Eng.º José Sócrates, então Ministro do Ambiente e actual Primeiro-Ministro, acompanhado pelo Dr. Pedro Silva Pereira, hoje Ministro da Presidência, convoca uma reunião extraordinária do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS) para — pasme-se! —, como diz o Ministro, deixar, quatro anos depois — o Programa? Alguma coisa que pudesse ser analisado? Não! — uma resolução do Conselho de Ministros, como todas as que se fizeram a «martelo», quando o Governo já estava em gestão, para fazer crer que se deixaram feitas coisas para as quais, pura e simplesmente, não se olhou durante quatro anos. É caso para dizer, num marketing bastante actual, e citando o Primeiro-Ministro, «Ele há coisas fantásticas…!».
Após este desperdício de quatro anos, o Governo da coligação PSD/PP elaborou o PNPOT, nos pouco mais de dois anos que esteve em funções. Como o Sr. Ministro fez questão de sublinhar, escolheu os melhores, orientou-lhes o trabalho e produziu resultados.
Agora, que este Sr. Ministro venha à Assembleia dizer-nos que encontrou um processo político complicado, que ele fez avançar, depois de tudo o que é o balanço destes dois anos de política do ambiente, é matéria que já nem sequer um sorriso nos suscita.
Ao apresentar esta versão final, o Governo do Eng.º Sócrates persiste apenas no timbre que sempre foi seu apanágio, mesmo enquanto Ministro do Ambiente: empatar, empatar, empatar!…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Tal e qual!

O Orador: — Estes mais de dois anos perdidos pelo Governo, foram-no por que razão? Para poderem dizer que o Plano é vosso? Triste sina a dos políticos que passam tanto tempo a «arrombar a porta aberta»!… Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Uma das questões que muito pertinentemente atormenta os portugueses que se interessam por estas matérias do ordenamento do território e do desenvolvimento sustentável é, infelizmente, a veia marcadamente dilatória tanto do Primeiro-Ministro como do Ministro do Ambiente.
E, porque a verdade se constrói também com a memória, atentemos aos seguintes factos, relativos aos planos de ordenamento das áreas protegidas.
O Eng.º Sócrates, enquanto Ministro do Ambiente, encontrou já elaborado, do tempo dos governos do Professor Cavaco Silva, o Plano de Ordenamento do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, por publicar em 1995. E quedou-se por aí! Seria o Governo da coligação PSD/PP que, em menos de três anos, aprovaria e faria publicar os Planos de Ordenamento do Parque Natural de Sintra/Cascais, do Paul de Arzila, do Parque Natural do Vale do Guadiana, do Parque Natural das Dunas de São Jacinto e dos Parques Naturais de São Mamede e da Serra da Malcata.

O Sr. Ramos Preto (PS): — Veremos, na especialidade!

O Orador: — Esse Governo deixou concluído, quando cessou funções, em Março de 2005, o Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida, que o actual Executivo apenas veio alterar, por virtude de capricho político, para instalar a co-incineração de resíduos perigosos no Parque Natural da Arrábida.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Ramos Preto (PS): — Não é verdade!

O Orador: — O Governo PSD/PP deixou concluídos os Planos de Ordenamento do Paul do Boquilobo, das Serras de Aire e Candeeiros, da Serra da Estrela e do Douro Internacional.
Quando o actual Ministro do Ambiente, este senhor, que está hoje connosco, se deslocou, pela primeira vez, à Comissão Parlamentar de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território, para uma audição com os Deputados, no dia 24 de Maio de 2005, as suas palavras, relativamente aos planos de ordenamento das áreas protegidas, foram, textualmente, as seguintes: «Do que tenho a certeza…» — do que este Sr. Ministro tinha a certeza — «… é que, a curto prazo, vão ter uma surpresa, quando começarem a ver os planos de ordenamento (…)» — das áreas protegidas — «(…) a aparecer e a serem agendados». Famous last words, Sr. Ministro!… Para além da publicação do Douro Internacional, que mais tem V. Ex.ª para apresentar, um ano e meio depois? É que o Sr. Ministro do Ambiente vem somando desculpas, atrás de mais desculpas, nas suas tentativas para justificar persistentes atrasos, seja no que for, cabendo perguntar-lhe que mais desculpas terá, então, no

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fim de um mandato, que já está a meio, para justificar tudo o que estava no Programa do Governo e que, pura e simplesmente, não aconteceu?! Bom, mas é com esta mesma equipa governamental que se irá implementar o PNPOT, aqui apresentado.
E, por isso, cabe insistir, voltar a perguntar sobre tudo o que não foi dito.
Onde está a articulação do PNPOT com o QREN? Em tudo e em lado nenhum? Ou será sustentável um QREN que fala tanto do PNPOT, para que o programa essencial para a sua concretização, que é o da valorização do território, nada diga?! Onde está a articulação com a Estratégia Nacional para o Desenvolvimento Sustentável, com a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade, com o Plano Sectorial da Rede Natura 2000? Quais são as verdadeiras prioridades deste Programa e onde está o quadro de atribuições e competências para a sua concretização? Onde estão previstos os riscos naturais e a sua articulação com o PNAC? Vai ou não vai este Programa ser o «guião» das diversas políticas sectoriais? É que, por exemplo, que se veja, nem na decisão sobre o carácter ferroviário ou rodoviário da nova ponte Chelas/Barreiro ou nos critérios para os encerramentos das unidades e urgências hospitalares, um pouco por todo o País, se tem visto ponderação ou qualquer critério do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território. Ou será que o PNPOT que o Sr. Ministro nos traz aqui hoje visa apenas coordenar as decisões estratégicas que, entretanto, os seus colegas já tomaram, de há dois anos a esta parte?! Sr. Ministro, o nosso receio é o de que V. Ex.ª, afinal, acabe a concretizar estas medidas como o seu antecessor e actual Primeiro-Ministro concretizou os planos de ordenamento das áreas protegidas, numa frase, nada concretizando!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ramos Preto.

O Sr. Ramos Preto (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Com a apreciação e futura aprovação do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, pelo Parlamento, conclui-se o edifício normativo de enquadramento das diversas políticas sectoriais com incidência territorial e de todos os instrumentos de gestão territorial de âmbito nacional, regional e municipal.
Este é um momento relevante para a disciplina do ordenamento do território nacional, culminando num trabalho iniciado de forma sistemática com a Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2002 e dando corpo ao estabelecido na Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo.
Numa acepção mais ampla, o ordenamento do território é equivalente à política dirigida a garantir o equilíbrio das condições de vida em todas as partes do território nacional, ou seja, a acção pública destinada à prossecução de uma digna qualidade de vida.
Na Carta Europeia do Ordenamento do Território, aprovada pelo Conselho da Europa em 1983, o ordenamento do território foi definido precisamente como: «(…) uma disciplina científica, uma técnica administrativa e uma política, concebidas como uma abordagem interdisciplinar e global que visam desenvolver de modo equilibrado as regiões e organizar fisicamente o espaço, segundo uma concepção orientadora».
A proposta de lei em apreço, no seu artigo 5.º, define objectivos estratégicos para Portugal, que passam a constituir o quadro referencial de compromissos das políticas com incidência territorial.
Tais objectivos fundamentais consistem, essencialmente, na distribuição racional, em termos geográficos, das actividades económicas; no desenvolvimento socioeconómico e no restabelecimento de equilíbrios entre partes e regiões do País; na melhoria da qualidade de vida; na gestão responsável dos recursos naturais e na protecção do ambiente; na utilização racional do território, reforçando a qualidade e a eficácia da gestão territorial, promovendo a participação informada, activa e responsável dos cidadãos e das instituições.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PNPOT, que hoje aqui apreciamos, rejeita a ideia ou a visão do ordenamento do território como um problema político essencialmente voltado para a acção e a eficácia, não limitado por regras jurídicas, inteiramente dominado por objectivos quantificáveis e inspirado unicamente por elementos económicos, estatísticos, prospectivos e de programação.
Embora não se ponha em causa o princípio segundo o qual a realização dos objectivos do ordenamento do território tem uma componente política, o PNPOT procede à articulação e compatibilização do ordenamento do território com as políticas de desenvolvimento económico e social e as políticas sectoriais com incidência na organização do território, em resultado de uma adequada ponderação dos interesses públicos e privados envolvidos.
O que é verdade é que, ao estabelecer-se uma relação directa entre o PNPOT e os outros instrumentos de gestão territorial, determinando-se, no n.º 2 do artigo 4.º da proposta de lei, que o PNPOT prevalece sobre os demais instrumentos de gestão territorial em vigor, sublinhou-se que a ordem jurídica pode e deve enquadrar eficazmente as acções englobadas no ordenamento do território, organizando a sua coerência interna. Aliás, na linha do referido pelo Professor Alves Correia, na sua obra O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade,

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«(…) a atestar o lastro jurídico do ordenamento do território está o facto de o seu objectivo fundamental ser a obtenção de uma justiça distributiva, de uma espécie de paridade regional (…). O seu verdadeiro sentido é a criação de condições de vida equivalentes em todas as partes do território. O ordenamento do território visa, assim, garantir uma certa igualdade entre as pessoas, procurando pôr termo à situação chocante de um homem que vive numa região não dispor de condições de vida e de trabalho semelhantes e não ter as mesmas hipóteses de progredir que um homem que vive noutra região».
Sr. Presidente, hoje, também é um dia em que se dará mais um passo que gostaríamos que se transformasse numa caminhada célere no sentido de cumprir o disposto no artigo 66.º da Constituição da República, que institui, na alínea b) do seu n.º 2, que incumbe ao Estado: «Ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento socioeconómico e a valorização da paisagem».
Na verdade, o Partido Socialista já fora responsável pela apresentação da proposta de lei que esta Assembleia da República aprovou e que deu origem à Lei n.º 48/98, de 8 de Agosto, que definiu as bases da política de ordenamento do território e de urbanismo e que alterou o sistema de gestão territorial que até então vigorava. Essa Lei introduziu uma alteração na tipologia dos instrumentos de planeamento, criando novos tipos de planos e reformulando alguns dos planos já existentes. E entre os novos tipos de planos criados pela Lei de Bases centra-se, precisamente, o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território — plano de nível nacional com o qual terão de agir, de forma coordenada, os restantes planos de nível regional e de nível municipal.
Ficará Portugal, com a aprovação do PNPOT, a dispor de instrumentos, de âmbito nacional, onde se define o quadro estratégico para o ordenamento do espaço nacional, estabelecendo as directrizes a considerar no ordenamento regional e municipal e a compatibilização entre os diversos instrumentos de política sectorial com incidência territorial, instituindo, quando necessário, os instrumentos de natureza especial.
Da leitura da proposta de lei resulta a ideia de que mais importante do que a existência de uma hierarquia de planos, em que os planos inferiores devem obediência aos planos superiores, é a articulação entre eles e a coordenação das entidades responsáveis pelos diferentes instrumentos, por forma a que não estejam em vigor, sobre uma mesma área, planos com soluções de ordenamento do território opostas, suscitadoras de conflitos institucionais, mas, pelo contrário, soluções que são ponderadas e discutidas entre as várias entidades responsáveis na matéria. E assim deverá ser, na esteira do disposto na Lei de Bases, que introduziu uma nova forma de relacionamento entre as entidades com atribuições em matéria de planeamento, onde prevalece a ideia de coordenação, porquanto o ordenamento do território e o urbanismo são matérias que convocam, simultaneamente, interesses gerais e interesses locais, tornando-se, por isso, necessário e imprescindível que se proceda a uma correcta articulação de tarefas entre as várias entidades públicas.
Tal como é comummente reconhecido, as ideias de complementaridade, solidariedade, equilíbrio e harmonia devem inspirar as relações interorgânicas em matéria de ordenamento do território.
Daí que o princípio da coordenação, instituído na alínea c) do artigo 5.º da Lei de Bases, obrigue à articulação e compatibilização do ordenamento do território com as políticas de desenvolvimento económico e social, bem como com as políticas sectoriais com incidência na organização do território, no respeito por uma adequada ponderação dos interesses públicos e privados em jogo.
Com o PNPOT, é agora possível estabilizar, no quadro institucional português, uma política de ordenamento do território, que é apenas uma de entre outras políticas que se desenvolvem no território, mas uma política de carácter coordenador e integrador das restantes.
Sr. Presidente, a proposta de lei que o Governo submeteu hoje à apreciação da Assembleia é constituída por dois documentos: o Relatório e o Programa de Acção.
O Programa de Acção concretiza a estratégia de ordenamento, desenvolvimento e coesão territorial do País, em coerência com outros instrumentos estratégicos, através da definição de orientações gerais. Com a sua aprovação, o País passa a dispor daquele que será o guia orientador da gestão do território e da política de ordenamento do território, instrumento-chave que, como já aqui foi referido pelo Sr. Ministro, em articulação e em coerência com a Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável (ENDS) e com diversas intervenções com incidência territorial, designadamente as consideradas no QREN para o período de programação financeira comunitária, será um instrumento importantíssimo para o desenvolvimento do País.
Sabemos que as políticas de ordenamento e de desenvolvimento do território que o PNPOT espelha contribuirão de forma inovadora e duradoura para que Portugal seja um espaço ordenado e sustentável, equitativo em termos de desenvolvimento e de bem-estar, com uma economia competitiva e integrada, no qual vivifique uma sociedade criativa e com alto sentido de cidadania.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP regista como positiva a abertura do Governo para uma discussão na especialidade do PNPOT. Faremos, pela nossa parte, tudo o que estiver ao nosso alcance para que o País seja dotado de um

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instrumento estratégico com a importância que deve ter um Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território.
Naturalmente, o documento que nos foi agora entregue tem um conjunto de elementos importantes compilados e traduz um pouco a realidade nacional. Não é uma realidade nova, é uma realidade que podemos encontrar em muitos documentos anteriores. Podíamos mesmo ir buscar a resolução do Conselho de Ministros que decide pela elaboração do PNPOT para vermos que já aí eram apontadas muitas das questões que o relatório que acompanha esta proposta de lei materializa e consagra: desde as concentrações urbanas nas grandes metrópoles de Lisboa e do Porto à «litoralização» do País e à desertificação do interior, à falta de coesão social, que tem vindo a aprofundar-se, à falta de uma política estratégica que preserve não apenas os solos, como bem escasso e finito, como os recursos hídricos, as políticas das florestas e de urbanismo.
Portanto, podíamos falar de todas elas, mas estão vistas, toda a gente as conhece. Qualquer pessoa que tenha acompanhado as discussões que se tem feito no nosso país pode interrogar-se como é que isto acontece depois de tantos anos e de tanto investimento. Esgotámos três quadros comunitários de apoio em investimentos, sempre a declarar que iríamos contrariar estes objectivos, que iríamos garantir aos cidadãos portugueses melhor qualidade de vida, maior coesão social, maior coesão territorial, que iríamos fazer um País mais moderno, mais competitivo, que iríamos acompanhar os países mais evoluídos da Europa. Tudo isto podemos encontrar em discursos de sucessivos governos ao longo quase dos últimos 30 anos.
A verdade é que, feito este diagnóstico e assumido que temos tido um modelo de desenvolvimento errado, porque os resultados estão à vista, não se compreende que sejamos agora confrontados com um Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território que no seu objectivo mais longínquo dá-nos a «litoralização» ainda mais acentuada do País,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — … a concentração em quatro grandes áreas ou eixos metropolitanos: Lisboa, o Noroeste (para não se dizer Porto), o arco entre Coimbra, Aveiro e Leiria, a que, talvez por iniciativa do Sr. Deputado José Junqueiro, juntaram Viseu, e o Algarve. E o resto do País? O que é que se faz ao resto do País? É o deserto? É para a biodiversidade? Para os passarinhos? Para os cogumelos? Isto é que temos de perguntarnos, porque não basta colocar no papel que vamos ter coesão territorial, que vamos ter combate às assimetrias e que vamos conseguir esta gestão com equidade do todo nacional.
Este quadro que temos na mesa não garante isto, e é assumido. Aliás, não é por acaso que os mapas que mostravam que iríamos ter uma concentração demográfica no litoral, uma concentração de produção do produto interno bruto no litoral, não acompanham esta versão final. Mas são uma realidade! As perspectivas que se nos apontam vão no sentido de concentrarmos em Lisboa e no Porto 75% do produto interno bruto. Sr. Ministro, isto é uma barbaridade! Diga-me outro país da Europa, moderno, desenvolvido, que não aponte exactamente no sentido inverso, que não procure efectivamente a coesão territorial com medidas e incentivos concretos que não conseguimos encontrar nas políticas sectoriais e territoriais que estamos a discutir neste momento.
O que questionamos, Sr. Ministro, é qual a correspondência entre os programas sectoriais que se vão desenvolvendo no terreno, que vão definindo um determinado tipo de ordenamento do território, e, depois, as boas intenções, que podemos plasmar num bom documento. E até podemos dizer que pode ser um bom documento para o País, mas a realidade já está de tal forma «desconformada» com o mesmo que restar-nosá, então, retomar a revisão do PNPOT e fazer um outro PNPOT qualquer que corresponda à anarquia que tem sido imposta no nosso território, com projectos que podem dizer-se de interesse nacional mas, muitos deles, o que têm sido é chorudos negócios para alguns à custa da delapidação de recursos estratégicos para o País.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — E este é que é o problema que temos de acertar na discussão na especialidade e vermos até onde vai a bondade. Não basta o Sr. Ministro do Ambiente dizer-nos que tem intenções de fazer, é preciso que os Srs. Ministros da Economia e da Inovação, da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, nos planos sectoriais que estão a andar no terreno,…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, faça favor de concluir.

O Orador: — … efectivamente se conformem àquilo que vier a ser este projecto. E isto não vai acontecer com decisões precipitadas de construção de novos aeroportos. E não temos nada contra os TGV, temos, sim, contra a aplicação de todos os recursos em TGV,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

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O Orador: — … deixando para trás os recursos que são necessários para o resto do País. É disto que discordamos!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo trouxe hoje à Assembleia da República a proposta de lei n.º 113/X, que consagra o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, mais conhecido por PNPOT, o qual resulta essencialmente de um trabalho técnico desenvolvido ao longo dos últimos anos.
Sublinhamos, desde logo, o diagnóstico feito no seu relatório. Revela esse relatório que há um deficiente estado do ambiente e do ordenamento do território em Portugal, por isso consideramos que esse trabalho, do ponto de vista técnico, é positivo.
Tem também este Programa a vantagem de sintetizar as opções necessárias a uma boa gestão do território. Resta saber, no âmbito das acções concretas, qual será a actividade do Governo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): —Exactamente!

O Orador: — Na essência deste Programa está a clara necessidade de haver uma política nacional de gestão do território do nosso país, com o que concordamos. É necessário olhar para Portugal como um todo e não como uma manta de retalhos. No entanto, só agora o PNPOT chega à Assembleia da República para discussão.
Trata-se de um documento importante que o Governo nos apresenta como lei, sendo que convinha que fosse esclarecido qual vai ser, afinal, o conteúdo vinculativo para os vários membros do Governo. Aliás, importa sublinhar a diferença de procedimento, o contraste entre o método seguido em relação ao Plano Estratégico dos Resíduos Sólidos Urbanos (PERSU II) e ao Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais (PEAASAR II), que o Governo aprovou por portaria sem antes ter trazido ao escrutínio do Parlamento.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Uma trapalhada!

O Orador: — Agora, o PNPOT vem como proposta de lei ordinária e estamos aqui a discuti-lo.

O Sr. Ramos Preto (PS): — É obrigatório por lei!

O Orador: — Entendemos que é importante que isso tenha sido feito, mas não consideramos razoável que o PERSU II tenha sido aprovado sem ter vindo em primeiro lugar à Assembleia da República para ser discutido.
No fundo, a única conclusão que podemos retirar é a de que o Sr. Ministro do Ambiente tem necessidade de vincular o Governo a estas opções e que não tem peso político para ser ele a definir essas opções, porque são definidas por outros Ministérios.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — É verdade!

O Orador: — Ora, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o que estamos a fazer aqui, hoje, é a analisar a política de ordenamento do território até 2013. Em causa estão as directrizes e as orientações fundamentais de um modelo de organização espacial que terá em conta o sistema urbano, as redes de infra-estruturas e os equipamentos de interesse nacional, bem como as áreas de interesse nacional em termos agrícolas, ambientais e patrimoniais.
Logo à partida, perante a leitura dos 24 problemas para o ordenamento do território que são enunciados, percebemos que, de facto, na última década, não houve uma coerente política de ordenamento do território. É fácil perceber porquê. Realmente, o diagnóstico não é bom.
Nestes últimos 10 anos, as leis produzidas nesta área têm o cunho de sete anos de socialismo e seus governos.
Começamos, desde logo, pela Lei n.º 48/98, de 12 de Agosto, que define o PNPOT como um pilar para o desenvolvimento do território. O PS tem, assim, particulares responsabilidades no desordenamento do País.
Aliás, isto responde à sobranceria de quem aqui disse que os outros são recém-chegados a estes assuntos. É que, realmente, as responsabilidades são de quem cá está, há mais tempo, a intervir nesta matéria.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Orador: — Concluído que foi o trabalho do gabinete do PNPOT, em Abril de 2005, sublinho, o seu Programa de Acção foi aprovado apenas em Março de 2006.
O texto que hoje debatemos tem uma óbvia alteração, desde logo, relativamente aos prazos. Aí, Sr.
Ministro, quanto aos prazos, já percebemos que o ambiente tem os modelos «devagar», «devagarinho», «parado». Agora, já só faltava o modelo «andar para trás»…! Quanto às políticas, basta ler as orientações estratégicas do PNPOT, em cujo n.º 12 — e refere-se a uma área de directa responsabilidade do Sr. Ministro — se diz que há a necessidade de um espaço sustentável e bem ordenado, através da preservação da paisagem, em particular dos recursos hídricos, da zona costeira e da floresta. O que percebemos é que nada disto pode ser levado a sério com este Governo. Aliás, basta olhar para o desinvestimento que se verificou nestas áreas em sede do Orçamento do Estado para os dois últimos anos. Só no Orçamento para este ano, o Ministério do Ambiente tem menos 8,4% do que tinha no ano anterior e, já em 2006, tinha perdido 13,3% das verbas. O investimento caiu 26%.
Em termos práticos, no que se refere a verbas inscritas em PIDDAC, o ambiente e o ordenamento do território perderam mais de 21% de verbas no Orçamento para 2007. As áreas protegidas perderam, só num ano, 67,5% das verbas. Matérias como a gestão dos resíduos viram as respectivas verbas diminuir em 52%, enquanto na área de gestão e ordenamento de zonas e bacias costeiras a diminuição foi de 38,39% e, na área de construção e reabilitação de bacias hidráulicas, houve uma diminuição de 87,91% nas verbas. Estes são exemplos do que vemos vertido como opções estratégicas no PNPOT, mas os números dos últimos Orçamentos do Estado revelam-nos que a opção do Governo é exactamente a contrária.
Aliás, também o QREN não nos traz nada de tranquilizador porque o Sr. Ministro do Ambiente foi completamente subalternizado nesse domínio.
O que sabemos é que, em política de ordenamento do território, o PNPOT corre o risco de ser o telhado de uma casa que não tem paredes, não tem janelas, não tem portas, em resumo, não tem fundações. Penso que esse é o sinal do que é a política de ambiente deste Governo.
Temos um Ministro do Ambiente que aprova empreendimentos como o Costa Terra, o Pinheirinho, o Centro Logístico de Castanheira do Ribatejo, em zona REN, e, infelizmente, o que podemos dizer é que não é por passar a existir o Programa Nacional de Política de Ordenamento do Território que este Governo passou a ter uma estratégia e a capacidade política para a executar.
Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, de boas intenções está o Inferno cheio.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que seja breve.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente, serei brevíssimo.
É apenas para saber se a Mesa tem conhecimento de algum parecer do Conselho Económico e Social sobre o PNPOT, na medida em que, segundo informação que nos chegou, este documento só ontem aí terá dado entrada, o que nos parece inacreditável.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, acabado de chegar à Mesa, vou tentar averiguar e darlhe-ei uma informação.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Começo por me dirigir ao Sr. Ministro do Ambiente, que, enfim, considerou tratar-se de um aspecto menor a não inscrição da programação financeira no Programa Nacional de Política do Ordenamento do Território, para dizer que, como bem sabe, o Decreto-Lei n.º 380/99 estabelece que o Programa Nacional da Política do Ordenamento do Território é constituído pelo Relatório e pelo Programa de Acção e que este último deve estabelecer, justamente, a identificação dos meios de financiamento das acções propostas.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Oradora: — É essa carência que tem este PNPOT e que, evidentemente, deve ser colmatada, porque a questão do financiamento é determinante, até para se perceber as prioridades apontadas e, designadamente, a verdadeira execução da calendarização e da programação.

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Por outro lado, uma questão central. Da leitura deste Programa que nos é apresentado, não vislumbramos que, com o mesmo, seja invertido o problema estrutural da «litoralização» deste país. Ou seja, não há perspectiva de que o Governo não considere um facto transponível o actual modelo de ocupação e desenvolvimento do território.
Aliás, isso tem sido perfeitamente visível perante um conjunto de medidas que o Governo tem tomado, políticas que tem adoptado, desde o encerramento de serviços públicos até à própria óptica que foi apresentada em sede de Orçamento do Estado e que já tivemos oportunidade de discutir nesta Câmara.
Então, é preciso perguntar como é que um país, o nosso, pode dar-se ao luxo de desperdiçar dois terços, ou um terço que seja, do seu próprio território, desperdiçar as potencialidades que, no seu todo, o território pode ter em termos de competitividade, palavrão de que os senhores tanto gostam, e de desenvolvimento, expressão de que eu própria gosto mais. Essas potencialidades, o aproveitamento desses recursos endógenos é que acaba por ficar desperdiçado pela inactividade económica e produtiva a que o interior do País é remetido.
Aliás, basta dar uma olhada pelas medidas prioritárias apresentadas para cada região para perceber que este fenómeno da «litoralização» e do despovoamento e desertificação do interior do País acaba por ficar quase remetido a uma verdadeira continuidade de opção através deste PNPOT.
A terminar, Sr. Presidente, debruço-me sobre a questão do transporte ferroviário, porque consideramos ser matéria da maior importância e entendemos que, de facto, era importante haver, neste país, uma inversão da lógica da própria concepção de «mobilidade» e de «transporte». É que o Sr. Ministro diz que não está tudo virado para o TGV, mas está tudo virado para o TGV.
Digo-o porque, quando nos debruçamos sobre o Programa de Acção e atentamos no Objectivo Estratégico relativo à estruturação e desenvolvimento das redes e infra-estruturas de suporte à acessibilidade e à mobilidade, o que verificamos, no que se refere à rede ferroviária, é o que está escrito: «Assegurar no planeamento da Rede Ferroviária de Alta Velocidade no território continental, a articulação com as linhas e serviços do caminho de ferro convencional (…)».

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Oradora: — Ou seja, é tudo em torno do TGV.
A resposta que a rede ferroviária convencional pode dar à mobilidade interna de pessoas e mercadorias no País não está dada. Neste domínio, tudo está em torno do TGV.
Lamentamos que essa seja, de facto, a prioridade do Governo.

Vozes do PCP: — — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, Srs. Ministros e Sr. Secretário de Estado: No brevíssimo tempo que me resta, uma apreciação final que, forçosamente, é extremamente superficial.
Apenas quero dizer-vos que, da apreciação que o Bloco de Esquerda faz do PNPOT, gostaria de salientar um aspecto que tem a ver com a legitimidade e a fiabilidade dos instrumentos de ordenamento do território.
Para além da divergência que temos quanto à forma e à concepção de fundo contida no PNPOT em relação às prioridades estabelecidas e ao desenho territorial da distribuição do investimento para colmatar esses problemas centrais, existe o problema da fiabilidade e da legitimidade dos instrumentos de ordenamento. Esse problema decorre de dois aspectos no essencial, um dos quais é o de garantir a coordenação entre o PNPOT mais o que está decidido em termos do respectivo Programa de Acção e os programas sectoriais definidos para as diversas áreas de intervenção, o de haver ou não coordenação, convergência entre estes instrumentos.
Devo dizer que não tenho tempo para demonstrar que não há convergência nem coerência mas, efectivamente, assim é. Basta verificar o que é dito no PNPOT em relação a resíduos sólidos urbanos e o que está contemplado, em sede de PERSU, sobre a mesma matéria.
Portanto, esta incoerência retira ao PNPOT uma grande parte da sua fiabilidade.
O segundo aspecto tem a ver com o envelope financeiro que vem agregado às medidas propostas no PNPOT. Acerca deste envelope financeiro, deixe-me dizer-lhe que, se é verdade que o PNPOT prevê a conclusão de um plano ferroviário nacional que aqui tem vindo a ser amplamente falado, certo é que o QREN, ao nível do que são as prioridades do investimento, limita-as efectivamente à Rede de Alta Velocidade, à ligação Sines/Badajoz e a um pequeno troço em Guimarães, e não há mais nada em sede de QREN. Lamento muito, mas esta é que é a verdade! Portanto, os senhores vêm defender o PNPOT, avançando a ideia de que o documento contempla a conclusão dos trabalhos em relação ao plano ferroviário nacional mas, se este plano não tem um pacote financeiro, então, Sr. Ministro, é porque não é para levar a sério, é porque não é verdade e andamos aqui a brincar aos planos que, um dia, eventualmente, hão-de ser realizados.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Oradora: — Vou terminar. Sr. Presidente.
Finamente, o terceiro aspecto que confere fiabilidade aos instrumentos de ordenamento do território tem a ver com o facto de existirem ou não, na nossa ordem jurídica, short cuts para fugir aos planos de ordenamento. Isto é, há ou não meios e caminhos para, no que se refere ao que está decidido em sede de planeamento, conseguir encontrar percursos mais curtos, mais breves, que permitam fugir ao próprio ordenamento? Esse é que é o grande problema.
O grande problema reside, justamente, naquilo a que hoje assistimos. É que, apesar das declarações de boas intenções em relação à Rede Agrícola Nacional e à Rede Ecológica Nacional,…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, queira concluir, por favor.

A Oradora: — … a verdade é que o Governo fura sistematicamente esses instrumentos de ordenamento de cada vez que aprova a desanexação de mais uns tantos hectares para permitir que uma grande promotora imobiliária possa fazer um bom investimento e retirar mais-valias rapidamente, a curto prazo, apropriando-se de uma riqueza que é colectiva, de todos nós.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, respondendo à interpelação feita há pouco pelo Sr. Deputado José Soeiro, estou em condições de informar que o parecer a que o Sr. Deputado aludiu não está neste processo e, até agora, não deu entrada no Gabinete do Sr. Presidente da Assembleia da República.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades.

O Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades (João Ferrão): — Sr.
Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de sublinhar que o PNPOT, Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, ilustra de forma muito clara o que são os valores e os princípios que aplicamos em matéria de sistema de planeamento territorial.
Em primeiro lugar, participação. Gostaria de relembrar que o debate público deste documento prosseguiu entre 17 de Maio e 31 de Outubro,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas só ontem chegou!

O Orador: — … um debate que representa uma prorrogação do prazo inicialmente previsto.

Protestos do PCP.

Srs. Deputados, todos os documentos estão disponíveis no site da DGOT, inclusive este! Durante todo este processo tivemos uma participação muito significativa, do ponto de vista de debates presenciais, do ponto de vista de elaboração de fichas, e, portanto, aquilo que alguns consideram como «tempo perdido» não foi. Entre 17 de Maio e 31 de Outubro, podem ver-se os resultados da participação, se compararem a versão que hoje temos aqui em debate com a versão que foi aprovada em Conselho de Ministros para debate público.
Em segundo lugar, coordenação: não há planeamento sem coordenação e, por isso mesmo, houve uma concertação interministerial muito forte, durante o processo de elaboração desta versão. Este documento não é do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, é um documento do Governo! Por isso, o Primeiro-Ministro resolveu aprovar em Conselho de Ministros a própria versão que foi para debate público, para dar um sinal de que este documento é do Governo e não é um documento de um ministério!

O Sr. José Soeiro (PCP): — Mas parece!

O Orador: — Aliás, se tiverem curiosidade (e, com certeza, alguns Srs. Deputados já o fizeram), verão que, para todas as medidas, estão identificados os ministérios responsáveis.
No entanto, gostaria de dizer que fazemos a distinção: uma coisa é comprometer o Governo — e o Governo, obviamente, está comprometido com este programa —,…

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Está, sim, senhor!

O Orador: — … outra coisa é governamentalizar aquilo que deve ser o PNPOT. O Governo comprometese com aquilo que está a apresentar, mas não governamentaliza o PNPOT. Porquê? Porque o PNPOT, e assim deve ser, é um documento estratégico que vai para além de qualquer ciclo de governação, e, portanto,

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temos de garantir níveis de consenso e de estabilidade fundamentais. Temos uma visão estratégica e a visão estratégica significa definir prioridades, mas temos também sentido de Estado: o PNPOT é uma lei da Assembleia da República e, como tal, tem de responder a esse consenso e a essa estabilidade.
Terceiro valor: o valor da descentralização. Como bem sabem, e está consagrado há muito na legislação em vigor, com a aprovação do PNPOT e com a aprovação dos PROT, podemos finalmente falar, de forma séria e rigorosa, em descentralização no que diz respeito ao ordenamento do território.

Protestos do Deputado do PCP José Soeiro.

Podemos confiar e podemos responsabilizar as autarquias locais, porque, finalmente, o Estado fez aquilo que devia ter feito há muito tempo, que era produzir documentos estratégicos de referência, quer de nível nacional quer de nível regional. Esta é a obrigação do Estado, é isto que o Governo está a fazer e estas são as condições necessárias para, finalmente, podermos falar, de forma rigorosa, em verdadeira emancipação das autarquias locais em matéria de ordenamento do território, 25 anos depois do 25 de Abril!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Já lá vão 33 anos!…

O Orador: — Finalmente, quarto valor fundamental: prestação de contas. Não há planeamento, não há ordenamento do território sem prestação de contas.
Ontem, mesmo, aprovámos em Conselho de Ministros, as leis orgânicas do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional,…

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Já não era sem tempo!

O Orador: — … e a lei orgânica da DGOT inclui, como estava já prometido há muito, a criação do observatório do ordenamento do território e do urbanismo.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Passaram dois anos!

O Orador: — Este observatório é a entidade que tem a responsabilidade de desenvolver todos os procedimentos de acompanhamento e de avaliação do PNPOT. Terá um conselho de orientação aberto, representativo, quer da administração local quer de todos aqueles que devem ter um papel essencial no acompanhamento e na avaliação deste processo. E, como sabem também — aliás, está previsto na legislação em vigor —, o próprio observatório terá de publicar, de dois em dois anos, um relatório do estado do ordenamento do território que apresentará à Assembleia da República para debate.
Sr.as e Srs. Deputados, uma última palavra para dizer que a nossa posição é de rigor, é uma posição séria.
Nós não andámos «a perder tempo» durante dois anos; andámos a fazer aquilo que era necessário fazer: ouvir as pessoas;…

A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Os «Amorins», os «Espírito Santo»!…

O Orador: — … ouvir a sociedade civil; acreditar na participação; retirar os devidos resultados dessa participação; e — muito importante! — a concertar posições no contexto do Governo, justamente para que o Governo, no seu todo, se possa responsabilizar pelo documento que aqui chegou.
O PNPOT não é um plano, como sabem, e não é um documento meramente tecnocrático; é um documento de natureza política e, como referi há pouco, um documento que deve sobreviver para além dos ciclos de governação! É este o nosso desafio, foi este o nosso objectivo e penso que podemos dizer — com orgulho! — que, com base nestes princípios, o princípio da participação, o da coordenação, o da descentralização e o da prestação de contas, estamos a contribuir, não obviamente sozinhos, mas com a Assembleia da República, para que o ordenamento do território possa dar um salto qualitativo, que é aquele de que precisa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai conta do expediente.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 352/X — Altera o Código Penal (CDS-PP) e 353/X — Altera o Código Penal (BE); que baixam à 1.ª Comissão.
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realizar-se-á na próxima quarta-feira, dia 21, e terá período de antes da ordem do dia.

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Na ordem do dia, serão apreciadas várias iniciativas legislativas de alteração ao Código Penal, respectivamente a proposta de lei n.º 98/X e os projectos de lei n.os 211/X, do PS; 219/X, de Os Verdes; 236/X e 239/X, do PSD; 349/X, de Os Verdes; 352/X, do CDS-PP e 353/X, do BE.
Será ainda debatida a proposta de lei n.º 107/X — Cria um regime de mediação penal, em execução do artigo 10.º da Decisão-Quadro n.º 2001/220/JAI, do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal.
Está encerrada a sessão.

Eram 12 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS)

Fernando Manuel de Jesus
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Rita Susana da Silva Guimarães Neves

Partido Social Democrata (PSD)

Arménio dos Santos
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Luís Miguel Pereira de Almeida
Mário Henrique de Almeida Santos David
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Pedro Miguel de Santana Lopes
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Popular (CDS-PP)

José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
Paulo Sacadura Cabral Portas

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS)

António Ribeiro Gameiro
João Carlos Vieira Gaspar
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pereira Ribeiro
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes

Partido Social Democrata (PSD)

Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Fernando Mimoso Negrão
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Mário Patinha Antão

Partido Popular (CDS-PP)

Página 39

39 | I Série - Número: 050 | 17 de Fevereiro de 2007

João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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