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Sábado, 24 de Fevereiro de 2007 I Série — Número 53
X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 23 DE FEVEREIRO DE 2007
Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama
Secretários: Ex.mos Srs. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Fernando Santos Pereira
SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.
Procedeu-se a um debate de âmbito sectorial com o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago), sobre as orientações do Governo para a reforma do sistema de ensino superior, no qual usaram da palavra, a diverso título, além daquele Sr. Ministro e do Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva), os Srs. Deputados Agostinho Branquinho (PSD), Bravo Nico (PS), João Oliveira (PCP), Abel Baptista (CDS-PP), Cecília Honório (BE), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Emídio Guerreiro (PSD), Manuel Mota (PS), Miguel Tiago (PCP), Pedro Duarte (PSD), Luiz Fagundes Duarte (PS) e Bernardino Soares (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 12 horas e 20 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 10 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
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Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José dos Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vitor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
Partido Social Democrata (PSD)
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
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Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Miguel Pais Antunes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Vasco Manuel Henriques Cunha
Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Odete dos Santos
Miguel Tiago Crispim Rosado
Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Helder do Amaral
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José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Bloco de Esquerda (BE)
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não havendo expediente para anunciar, passamos, de imediato, à ordem do dia de hoje, que consta de um debate de âmbito sectorial com o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, nos termos do artigo 240.º do Regimento da Assembleia da República, sobre as orientações do Governo para a reforma do sistema de ensino superior em Portugal.
Para dar início ao debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Mariano Gago): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Cabe-me, em primeiro lugar, agradecer a V. Ex.ª, Sr. Presidente da Assembleia da República, o honroso convite que me dirigiu para vir apresentar à Assembleia as orientações do Governo para a reforma do sistema do ensino superior em Portugal.
Esta intervenção vem na sequência do próprio Programa do Governo, das iniciativas legislativas e programáticas já tomadas e muito especialmente do discurso do Primeiro-Ministro no final do ano.
As regras obrigam, contudo, a que esta minha primeira intervenção seja curtíssima e, portanto, em matéria como esta, apenas indicativa. Não repetirei, assim, neste momento o que já foi anunciado e sujeito a discussão, e que, certamente, teremos ocasião de detalhar neste debate, e concentrar-me-ei agora em três pontos apenas: os objectivos da reforma, o seu espírito e o calendário legislativo proposto.
O principal objectivo da reforma é o de preparar um sistema de ensino superior capaz de qualificar melhor muitos mais jovens e muitíssimos mais adultos do que actualmente. Qualificar melhor por referência não só ao presente mas especialmente aos mais elevados níveis internacionais, cujo desafio passa a ser assumido como absolutamente vital para Portugal.
O reforço do topo do sistema, da qualidade da sua investigação e da formação pós-graduada, do nível da actividade cultural, científica, artística e técnica e da sua capacidade de cooperação internacional são a melhor garantia para o reforço da qualidade das instituições quando acompanhados por um claro mandato de abertura à sociedade e disposição a práticas independentes de avaliação. Mas também qualificar mais, muitos mais jovens e muitíssimos mais adultos, sabendo-se que o horizonte da formação necessária à viabilidade do País já não pode limitar-se à escolaridade obrigatória ou à conclusão do ensino secundário, pesem embora os seus baixos índices actuais que urge superar.
Esta é tarefa do ensino superior. Levar a generalidade dos jovens ao ensino superior organizado em formas diversificadas que incluam novas valências profissionais curtas, formações flexíveis e, em muitos casos, integradas com a vida profissional é hoje desafio central nas sociedades desenvolvidas. Trazer adultos ao ensino superior, a formações vocacionais, graduadas e pós-graduadas e abrir e adequar a este objectivo as instituições e as formações aí praticadas é outro dos desafios urgentes do País à luz não apenas das nossas carências actuais mas especialmente do nosso futuro colectivo na economia e na sociedade europeia e internacional.
Falo agora do espírito desta reforma do ensino superior, cujas principais orientações estão em debate.
Pretendemos uma reforma participada pelas instituições, naturalmente, mas também pelos seus actores mais dinâmicos (professores, investigadores, estudantes), participada também especialmente pela sociedade, pelas forças da cultura e da ciência e da economia e do trabalho, pelas forças políticas e, em especial, por esta Assembleia da República.
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O que verdadeiramente visamos não é um consenso qualquer, mas um enraizamento social da reforma tão amplo quanto possível e que garanta a sua sustentabilidade futura. Temos a consciência nítida de que a reforma de todo o sistema do ensino superior só pode ser uma acção partilhada e cujo sentido seja claro para a multiplicidade dos actores sociais que nele intervêm. Não se trata de uma qualquer operação burocrática, pois o sucesso da reforma apenas se medirá pela sua apropriação efectiva por quem dentro e fora das instituições do ensino superior, que queremos autónomas e responsáveis, lhes possa dar corpo e energia.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Por fim, refiro o calendário legislativo proposto sem me deter no que já concretizámos: reforma da lei de bases, Processo de Bolonha, abertura a adultos, cursos de especialização tecnológica, racionalização da oferta, exigência no acesso, etc.
Foi já aprovado, para consulta pública, o projecto de decreto-lei que cria a agência nacional de acreditação e avaliação do ensino superior. Dentro de semanas será remetida à Assembleia da República a proposta de nova lei de avaliação do ensino superior. Será apresentada à Assembleia, até Maio, a proposta de lei sobre a autonomia, gestão e regulação das instituições de ensino superior. Antes dessa data será ainda elaborada a proposta do novo estatuto do ensino superior particular e cooperativo.
A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Muito bem!
O Orador: — Até ao Verão aprovaremos, após negociação, as revisões dos estatutos da carreira docente universitária, da carreira docente politécnica e da carreira de investigação.
Por último, quero chamar ainda a vossa atenção para um outro elemento decisivo desta reforma: a garantia de mobilidade efectiva, desburocratizada, nacional e internacional, de estudantes e diplomados vocacionada para atrair e fixar em Portugal recursos humanos qualificados, portugueses ou estrangeiros.
Estará pronto nas próximas semanas o novo sistema de garantia de mobilidade, que integra, para além da portaria sobre reingresso, mudanças de curso e transferências — neste momento em consulta —, um decretolei que simplifica drasticamente o reconhecimento de diplomas estrangeiros e um decreto-lei que abre o ensino superior a frequência por unidades capitalizáveis, diplomas que serão igualmente objecto de consulta.
Este novo e moderno sistema de garantia de mobilidade é prioritário para o próprio desenvolvimento e consolidação da reforma do sistema do ensino superior. A mobilidade das pessoas e das ideias está na base das sociedades e das economias do conhecimento.
Superar atavismos corporativos e ilusões de auto-suficiência é, pois, exigência do País neste momento de desafios e de oportunidades.
Muito obrigado, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Dando início à primeira volta de perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, antes de mais duas notas prévias.
Temos a firme convicção e a expectativa de que V. Ex.ª, hoje, aqui, no Plenário, cumpra aquilo que é normal nestas matérias, ou seja, responder às questões que lhe vamos colocar e que não faça como habitualmente costuma fazer, que são aqueles «discursos redondos» cuja substância, no final, é zero, em que saímos daqui exactamente como entrámos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Olha quem fala!
O Orador: — Sr. Ministro, como segunda nota prévia, quero dizer-lhe que esta não é uma sessão para anúncios, não é uma sessão de propaganda nem de realidade virtual.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Esta sessão serve para fazermos o balanço dos dois anos da sua governação, Sr. Ministro.
Essa é a questão fundamental.
V. Ex.ª vem aqui dizer que vão fazer «isto» até ao Verão, que vão fazer «aquilo» até não sei quando… Sr.
Ministro, o que aqui estamos a fazer é o balanço daquilo que V. Ex.ª fez até agora, durante dois anos, enquanto Ministro do Ensino Superior.
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Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Foram dois anos, Sr. Ministro! E para facilitar a discussão, permita-me que, nesta primeira ronda de perguntas, só lhe coloque duas questões.
Sr. Ministro, são só duas questões, esperando que, desta vez, eu vá feliz com a resposta de V. Ex.ª.
A primeira questão tem a ver com um tema genérico que eu poderia qualificar de opacidade, de falta de transparência, de amiguismo. Digamos que esse é o highlight desta primeira questão que lhe queria colocar.
Sr. Ministro, o exemplo que lhe quero dar de opacidade, de falta de transparência, porventura de amiguismo, tem a ver com uma proposta de decreto-lei de que V. Ex.ª ainda há pouco falou: a proposta de criação da agência de avaliação e acreditação para a garantia da qualidade no ensino superior, que tenho comigo, e que V. Ex.ª pôs em discussão pública.
Sr. Ministro, por que razão V. Ex.ª escolheu a forma de decreto-lei para algo de tanta importância e relevância para o ensino superior em Portugal? Será que V. Ex.ª não escolheu a forma de decreto-lei exactamente para evitar que este Parlamento possa discutir essa matéria?
Vozes do PSD: — Exactamente!
O Orador: — Não será esse já um primeiro sinal de que V. Ex.ª não quer que o Parlamento discuta, de forma clara, participada e aberta, uma matéria tão relevante como a da agência de avaliação e acreditação? A segunda questão que lhe quero colocar, Sr. Ministro, tem a ver com a substância. Se dúvidas existissem sobre a ausência de transparência e sobre a governamentalização pura e dura, sem qualquer tipo de escrúpulos e sem pudor, que V. Ex.ª leva a cabo, elas teriam desaparecido com esta proposta de criação da agência de avaliação e acreditação. De facto, muito claramente, não há escrúpulos nem pudor de qualquer espécie em relação à tentativa de governamentalização desta futura agência.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Vou dizer-lhe porquê, Sr. Ministro — é tremendamente simples. A agência de avaliação e acreditação que V. Ex.ª quer criar é nomeada por um conselho geral. Esse conselho geral tem três elementos.
Paradoxalmente, ou talvez não, dois elementos são nomeados por V. Ex.ª e o terceiro elemento é nomeado pelo Sr. Ministro das Finanças. Ó Sr. Ministro, que transparência é esta?! Que independência é esta?! Então quem vai fiscalizar todo o sistema de ensino superior são pessoas nomeadas por si?! Ainda por cima, são estas pessoas que, depois, vão escolher o conselho de administração. Não me diga que estas três pessoas vão estar imbuídas de um espírito de independência e nomear um conselho de administração independente… V. Ex.ª escolheu, pois, o pior dos caminhos para a criação desta agência de acreditação! Permita-me que lhe faça uma sugestão, na senda, aliás, do que o Conselho Nacional de Educação já fez.
Não chame a este organismo agência de avaliação e acreditação, mas, sim, comité central de controlo do ensino superior a mando do Governo! Bem sei que é um bocado extenso, mas este é, na realidade, o nome que traduz a proposta de criação da agência de avaliação.
Deixo mais duas ou três notas sobre esta agência de avaliação que V. Ex.ª propõe, para dizer, em primeiro lugar, que ela não segue as boas práticas internacionais. Na verdade, o Sr. Ministro terá grande dificuldade em nos mostrar quais são as boas práticas internacionais que este modelo de agência segue.
Por outro lado, este modelo não segue as recomendações da ENQA — Rede Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior e não assegura a participação dos agentes e dos actores do ensino superior, nomeadamente das instituições de ensino superior e dos estudantes. Não nos venha, sequer, dizer que essa participação é assegurada por aquele Conselho Consultivo do Ensino Superior que V. Ex.ª criou, porque este não tem poder algum, a não ser o elenco dos trinta e tal tipos de participações que vai ter. Para mais, o modelo em causa não contribui para resolver os problemas do sistema de financiamento do ensino, antes os agrava, não tem o apoio do Conselho Nacional de Educação e não assegura a prestação de contas da agência, quer do ponto de vista democrático, perante o Parlamento, quer do ponto de visto administrativo, perante o Tribunal de Contas, porque a figura jurídica que o Sr. Ministro inventou pretende exactamente fugir ao controlo democrático e administrativo.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, permita-me apenas que deixe uma nota final sobre o Processo de Bolonha.
Sr. Ministro, o problema do Processo de Bolonha passa pelo seguinte: os números positivos que V. Ex.ª apresenta não dependem do trabalho do Ministério que o senhor dirige.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Exactamente!
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O Orador: — São números que têm a ver com a capacidade que os estabelecimentos de ensino superior tiveram para se adaptar ao Processo de Bolonha. De facto, se esses estabelecimentos seguissem os indícios e sinais que V. Ex.ª deu ao ensino superior, estaríamos hoje numa situação muito má, num caos, que foi o que o Sr. Ministro fez ao dar menos de uma semana para que se adaptassem os cursos a Bolonha e ao efectuar cortes cegos da ordem dos 16% no orçamento e no financiamento do ensino superior. E que dizer sobre a demissão, cuja história ainda não conhecemos, do «Sr. Bolonha», Pedro Lourtie, que foi secretário de estado do ensino superior, especialista nesta matéria? Será que ele foi penalizado porque, de forma sustentada, denunciou o caos que V. Ex.ª criou no ensino superior? É para estas questões muito simples que, espero, V. Ex.ª tenha hoje respostas concretas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, pretendo apenas salientar que, nestas sessões, a praxe é a de que o Governo responda a cada pergunta individualmente, pelo que, neste caso, o Sr.
Ministro da Ciência e do Ensino Superior deveria responder desde já à questão que lhe foi colocada.
O Sr. Presidente: — Muito bem.
Para responder, tem, então, a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Branquinho, gostava que nos entendêssemos nesta matéria.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Entendemos, desde que V. Ex.ª responda!
O Orador: — A verdade é que o Sr. Deputado, ao optar por essa via, começa muito mal. V. Ex.ª pensa que deveríamos fazer um balanço destes dois anos de governação — e fá-lo-emos quando o senhor quiser —,…
Vozes do PSD: — Hoje! Hoje!
O Orador: — … julgava, porém, que o Sr. Deputado estava sobretudo interessado em discutir as orientações para a reforma do ensino superior que vai acontecer nos próximos meses. Pensava, até, que o Sr. Deputado iria responder à questão fundamental que passa por saber qual a participação que a sua bancada quer ter nessa matéria.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Temos projectos!
O Orador: — Mas não foi nada disso que o Sr. Deputado aqui disse! O Sr. Deputado pediu duas coisas. Pediu que fizéssemos um balanço e pediu para eu o fazer feliz. Penso, contudo, que não tenho capacidade para tal, porque a sua felicidade é de outra medida.
Risos e aplausos do PS.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — E que tal responder às questões?!
O Orador: — Depois, o Sr. Deputado invocou dois conceitos da física — e esses conheço: falou dos conceitos de opacidade e de falta de transparência. Não sei se reparou, mas são exactamente o mesmo. Ou seja, não se trata de dois conceitos, mas, sim, de apenas um!
Risos do PS.
Falou ainda de qualquer coisa que, julgo, lhe trotava no espírito por outra razão qualquer: falou de «amiguismo»… Isso, tenho muita pena, mas não lho permito! Mas passemos à primeira questão que colocou, que diz respeito à avaliação.
O Sr. Deputado conhece sistemas de avaliação, sistemas de avaliação científica e de universidades…Voulhe contar como é que funciona o sistema de avaliação que está a funcionar há mais tempo…
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O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Não! Fale do seu sistema de avaliação!
O Orador: — Dê-me licença que termine! Vou, pois, contar-lhe como é que funciona o sistema de avaliação científica em vigor em Portugal há 10 anos. São o presidente e a direcção da Fundação para a Ciência e Tecnologia — que, a exemplo do que acontece com todas as agências do mesmo tipo na Europa, são nomeados pelo Governo — quem nomeia todos os avaliadores científicos em Portugal.
Quer o Sr. Deputado designar os avaliadores científicos da área da física, da química, da matemática, etc., para todos os projectos e instituições científicos em Portugal?! É a isso que chama de desgovernamentalização?! Julga, porventura, o Sr. Deputado — ou quer fazer crer ao povo — que alguma vez o Governo interfere em qualquer avaliação científica desta natureza em Portugal?!
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Não sou eu! É o Conselho Nacional de Educação!
O Orador: — Estamos agora a falar de avaliação das universidades e de acreditação de cursos e de um sistema em tudo idêntico ao da generalidade das agências de avaliação e acreditação de toda a Europa. Este projecto está em discussão pública, mas o próprio projecto corresponde exactamente ao modelo de três quartos das agências de avaliação e acreditação que existem em toda a Europa. Estas têm a mesma estrutura jurídica, a mesma estrutura legal e exactamente o mesmo tipo de responsabilidade. Nesses países também é o Governo o responsável pela existência destas agências e pela garantia de que os seus operadores são inamovíveis e independentes no exercício dos seus cargos.
Entende o Sr. Deputado que as garantias de independência da administração não são suficientes? Entende que o carácter de inamovibilidade e que o carácter de incompatibilidades, etc., não são suficientes? Proponha outros!
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Já propusemos!
O Orador: — O que não lhe admito é que classifique este modelo como sendo de «amiguismo»! Isso, desculpe, é inaceitável e indigno de si!
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Não sou quem o diz! É o Conselho Nacional de Educação!
O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — Ele só está zangado porque não foi convidado, Sr. Ministro!
O Orador: — Na verdade, não há governamentalização. Antes pelo contrário, há total independência.
O que é verdadeiramente estranho, Sr. Deputado, é que até hoje não havia avaliação independente e o senhor em nada protestou contra isso. Até hoje, a legislação aprovada por um governo da sua maioria permitia que fossem as próprias instituições de ensino superior a designar os seus próprios avaliadores e o Sr. Deputado pensava que era assim que se defendia o interesse público!
Aplausos do PS.
Srs. Deputados, passemos adiante sobre esta matéria. O Sr. Deputado Agostinho Branquinho desconhece quais são as práticas internacionais nesta matéria, apesar de as ter na boca. Desconhece qual é a estrutura e não leu o relatório da ENQA.
Aplausos do PS.
Sobre a matéria de Bolonha, o Sr. Deputado não fez qualquer pergunta. Lançou insinuações, mas não fez pergunta alguma. Afirmou simplesmente aquilo que sempre disse, ou seja, que aquilo que o legislador fez não interessa para nada, o que é pena, porque…
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Fomos nós!
O Orador: — Pois foram! O legislador permitiu que o Processo de Bolonha, finalmente, e depois de enorme atraso, se concretizasse! E as instituições de ensino superior responderam, e responderam bem.
E sabe que mais, Sr. Deputado? O acompanhamento do Processo de Bolonha…
Protestos do Deputado do PSD Agostinho Branquinho.
Sabe que não aumenta a razão se esbracejar, Sr. Deputado! Certamente que aumenta a capacidade respiratória, mas não aumenta a razão!
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Risos do PS.
Protestos do PSD.
No que diz respeito ao acompanhamento do Processo de Bolonha, quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que as informações que neste momento existem do primeiro relatório preliminar da Comissão para o Acompanhamento do Processo de Bolonha são extraordinariamente positivas. Mostram que, evidentemente, ainda existem carências, que existe muito trabalho a fazer, mas que o processo foi conduzido com muita eficiência.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bravo Nico.
O Sr. Bravo Nico (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Verifica-se hoje, em toda a Europa, uma profunda mudança dos sistemas científico e de formação superior.
O conhecimento é, na actualidade, um factor insubstituível para o processo de crescimento humano e social e assume-se como a matéria-prima essencial para a construção da principal infra-estrutura axiológica, humana e técnica que habilite os cidadãos europeus a encarar, com sucesso, os desafios da época em que vivemos.
Na realidade, nos tempos que correm, cada vez mais a qualidade de vida e os níveis social, económico e cultural da população europeia (e, consequentemente, da portuguesa) estarão dependentes de dois factores: em primeiro lugar, da qualidade e das consequências económica e social do conhecimento que é produzido pelos sistemas científicos; em segundo lugar, da qualidade axiológica, humana e técnica da qualificação que é disponibilizada pelos sistemas públicos de educação e formação.
A reforma dos sistemas científico e de ensino superior portugueses inscreve-se em todo este contexto europeu e é um dos centros de gravidade da dinâmica de modernização e desenvolvimento de Portugal.
Esta reforma, em Portugal, está a ser muito exigente. Exigente, porque mais rápida que a rapidez com que mudam as nossas mentalidades. Exigente, porque necessariamente mais profunda que o conforto que sempre resulta das reformas levemente epidérmicas, que nada mudam. Exigente, porque somos convidados a mudar com a bitola da reforma europeia, quando a nossa bitola de partida, sendo claramente heterogénea, implica uma menor capacidade de reacção rápida.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Exigente, porque esperámos demasiado tempo para iniciarmos a marcha reformista. Mas também é exigente porque é ambiciosa, de sentido positivo e absolutamente necessária para a construção de um novo modelo de desenvolvimento económico e social para Portugal.
Esta mudança é hoje encarada pelas instituições científicas e de formação superior como uma extraordinária oportunidade de modernização, e por isso mesmo é desejada. Quebra, dia após dia, as ancestrais inércias pessoais e institucionais. E mobiliza, cada vez mais, as comunidades científica e académica portuguesas.
Portugal, com o firme e esclarecido impulso reformista do actual governo socialista, acerta, finalmente, a bitola com a União Europeia em termos de ciência e de ensino superior.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Pertencer à rede europeia de investigação científica e de ensino superior é assumir, definitivamente, que as instituições portuguesas adoptam as mesmas regras de funcionamento, financiamento e avaliação das suas congéneres europeias e promovem, com a máxima liberdade e igualdade de oportunidades, a mobilidade de estudantes, professores, investigadores e técnicos, contribuindo, dessa forma, para a construção de um espaço europeu de ciência e de formação.
Nas últimas três décadas, este é o segundo grande desafio com que as instituições de investigação científica e de ensino superior, em Portugal, se confrontam.
O primeiro desafio, nas últimas três décadas do século passado, foi ganho. Foi o desafio da democratização, da abertura, da expansão, da cobertura territorial, do contributo, qualificado e qualificante, para o desenvolvimento das pessoas, dos territórios e do país.
Vozes do PS: — Muito bem!
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O Orador: — Foram estas algumas das dimensões do contributo que as universidades, os institutos politécnicos e as diferentes unidades de investigação científica deram, nos últimos 30 anos, a Portugal.
Como se encontraria Portugal, hoje, sem este contributo? Como se encontraria, hoje, o Alentejo, sem o contributo da Universidade de Évora e dos Institutos Politécnicos de Beja e de Portalegre? Como se encontraria, hoje, a Beira Interior, sem o contributo da Universidade da Beira Interior e do Instituto Politécnico de Castelo Branco? Como se encontraria, hoje, o Algarve, sem o contributo da Universidade do Algarve? Como teriam acedido à qualificação milhares de portugueses, impossibilitados de aprender presencialmente numa instituição, sem o contributo da Universidade Aberta? Portugal seria, certamente, um país menos desenvolvido e menos coeso, porque menos qualificado.
O contributo científico e formativo para o desenvolvimento do país e para a qualificação dos portugueses, no entanto, nunca foi, e não é, um exclusivo de algumas instituições. Foi um contributo de todas as instituições, cada uma com a sua história, a sua circunstância territorial e humana e a sua dinâmica própria.
Portugal necessita, hoje, mais do que nunca, da totalidade das suas instituições científicas e de ensino superior. Uma vez mais, as universidades, os institutos politécnicos e os centros de investigação científica portugueses estão perante um grande desafio e, uma vez mais, irão vencê-lo, com o seu contributo para a construção europeia, a modernização do país e a qualificação dos portugueses. É essa a sua missão, é essa a sua vontade e é isso que os portugueses esperam e exigem.
Foi este, Sr. Ministro, o rumo que o PS propôs aos portugueses, que estes legitimaram pelo voto. E é por isso mesmo esta a missão que o Governo do PS está a concretizar.
Permita-me, Sr. Ministro, que lhe coloque duas questões.
Primeira questão: neste momento de mudança e de ambição, na opinião de V. Ex.ª, que evidências nos mostram que as instituições científicas e de ensino superior portuguesas estão a caminhar na direcção correcta e a vencer o desafio da sua reforma e da sua internacionalização?
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Só evidências!
O Orador: — Segunda questão: qual o balanço que, neste momento, é possível fazer-se da implementação do Processo de Bolonha no sistema de ensino superior português? Quais, na opinião de V.
Ex.ª, os principais constrangimentos mas também quais as mais evidentes provas de potencialidades e de sucesso da transição que neste momento está em marcha?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bravo Nico, estou completamente de acordo com a sua afirmação sobre a importância das instituições de ensino superior no desenvolvimento regional. As instituições de ensino superior, em todo o mundo e, designadamente, em Portugal, passaram da função essencialmente de formação qualificada à escala nacional, que tinham quando não estavam distribuídas pelo território, para funções de muito maior enraizamento no território económico e social, designadamente das regiões. E esse processo, que é um processo universal, teve em Portugal, após o 25 de Abril, uma expressão particularmente forte, com o desenvolvimento dos institutos politécnicos e de muitas universidades nas regiões do país e nas regiões autónomas.
Gostaria de responder às questões que me colocou da seguinte forma: em primeiro lugar, não há instituições de ensino superior dispensáveis.
A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD). — Ai não?!…
O Orador: — Estamos completamente de acordo, nessa matéria, com a análise que, ao fim de um ano de estudo detalhado, é produzida no relatório da OCDE. A previsão das necessidades do país em matéria de qualificação de mais recursos humanos nas próximas décadas mostram que não temos recursos a mais (antes pelo contrário!) e que, portanto, o capital instalado, em matéria de instituições, deve ser reformado, sim, mas não pode de maneira alguma ser ignorado e muito menos eliminado. Haverá racionalização a fazer no interior dos institutos politécnicos, no interior de cada universidade, na articulação entre eles, com certeza!, mas isso não significa — que fique absolutamente claro! — que qualquer dessas instituições seja dispensável. Não é dispensável! Temos pela frente um desafio, pese embora o que muitos possam pensar pelo decréscimo do número de alunos de 17 e de 18 anos à entrada do ensino superior nos últimos anos, pois muitos pensavam que o ensino superior estava condenado a estagnar, a estabilizar ou a diminuir. Não é verdade! E não é verdade porque o ensino superior português não respondia nesse momento a uma das necessidades principais a que os ensinos superiores modernos têm de responder, que é a atracção para cursos diversificados e formações diversificadas de populações adultas, de populações que abandonaram o estudo precocemente e, no outro
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extremo, de populações com níveis de educação superior avançados, que regressam ao ensino superior, em formação pós-graduada ou para formações profissionais complementares.
Ora, esse movimento está em marcha, neste momento, nos dois extremos. No crescimento das pósgraduações e no crescimento da entrada de estudantes adultos no ensino superior, pela primeira vez em número significativo este ano. É um processo que está a iniciar-se, mas devo dizer que a resposta do ensino superior, finalmente, à abertura legislativa e à pressão social e política que sobre eles foi exercida, foi uma resposta extraordinariamente positiva, nesta primeira fase. Muito haverá a corrigir no futuro, mas foi de facto uma resposta extraordinariamente positiva, quer do sector público quer do sector privado, nas duas frentes: na frente da pós-graduação e na frente da entrada de adultos. E também na frente — que ainda estamos no princípio para avaliar e apreciar em detalhe — da generalização de cursos de especialização tecnológica, ou seja, de formações vocacionais curtas no ensino superior em larga escala, designadamente nos institutos politécnicos, que permitam a estudantes que nunca entrariam no ensino superior fazerem primeiro uma formação vocacional no ensino superior e creditar mais tarde essa formação, se o desejarem, para continuação de estudos no próprio ensino superior.
Tudo isto neste momento está em marcha e são elementos extraordinariamente positivos.
Muito haverá a corrigir,…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Ministro.
O Orador: — Termino já, Sr. Presidente, é só mais um instante, para terminar este raciocínio.
Como eu estava a dizer, muito haverá a corrigir, mas, para que isso seja possível — e sabemos as dificuldades que foram atravessadas em muitos países —, é preciso que os cursos se organizem em função dos horários de trabalho daqueles que os frequentam, que as metodologias de ensino para estas novas populações sejam largamente ultrapassadas e, por último, que o reconhecimento das competências profissionais e de vida destas novas gerações de estudantes seja feito sem sobranceria e que estas competências sejam incorporadas de uma forma nova no interior dos percursos académicos desses mesmos estudantes.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, quando, em 2004, afirmámos que a Declaração de Bolonha tinha como objectivos não declarados a elitização económica do ensino superior e a privatização progressiva do ensino superior público, acusaram-nos de sermos «velhos do Restelo», inimigos da modernidade e da mudança.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!
O Orador: — Hoje, a realidade do ensino superior português demonstra que a modernidade apregoada é, afinal, uma antiguidade recauchutada e que a mudança foi feita ao jeito dos interesses económicos de poucos e em prejuízo de muitos outros.
Vozes do PCP: — Exactamente!
O Orador: — A «modernidade» do modelo de ensino superior que resulta do Processo de Bolonha reserva para os mais remediados dos pobres os primeiros ciclos de formação, de natureza generalista ou de cariz profissionalizante, que os grandes interesses económicos definem como a formação adequada às exigências do mercado de trabalho.
O Sr. Manuel Tiago (PCP): — E mais nada!
O Orador: — O acesso à cultura, à ciência e à formação avançada dos 2.
os ciclos fica reservado para quem possa dispensar os mecanismos de acção social escolar, quase inexistentes, e pagar propinas que podem variar entre os 1500 e os 4000 euros.
Vozes do PCP: — Uma vergonha!
O Orador: — É esta a «modernidade» que Bolonha nos anuncia, como se a educação gratuita, de acesso universal e de qualidade, fosse coisa antiga, do tempo dos faraós!…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
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O Orador: — Quanto à mudança, o cenário não melhora, pelo contrário.
A realidade mostra que o sistema de ensino superior português muda com Bolonha porque deixa de ter a natureza de serviço público nacional para passar a ser um serviço comercial, sujeito às regras do mercado, como há muito exigiam os interesses económicos ansiosos por poderem desfrutar de mais esta choruda oportunidade de negócio.
Muda também porque esta lógica de negócio é um novo argumento para justificar as políticas de desresponsabilização de sucessivos governos em relação ao ensino superior,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora aí está!
O Orador: — … não só no que se refere ao financiamento das instituições mas, agora, também no que respeita às condições da sua autonomia.
O discurso de abertura das instituições à sociedade e à economia aí está, mais uma vez, para justificar o subfinanciamento e colocar as instituições de ensino superior dependentes das orientações dos interesses económicos, a troco da sua própria sobrevivência.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — O sistema de ensino superior português muda ainda porque se reduz significativamente a carga lectiva e muitas instituições não terão os 2.
os ciclos aprovados. Alguns milhares de docentes, trabalhadores dos mais qualificados, serão, assim, empurrados para o desemprego ou para funções que desaproveitam as suas qualificações.
A mudança traduz-se, afinal, na transformação da educação em negócio inacessível para largas camadas da população, mas lucrativo para quem o explora e injusto para quem é explorado.
É neste contexto que se pondera agora a necessidade de reorganização de todo o sistema de ensino superior, orientada para o agravamento da privatização do ensino superior público, que se esconde por detrás das propostas técnicas do relatório da ENQA.
É neste contexto que o mesmo Governo que determinou gravíssimos cortes orçamentais à generalidade das instituições de ensino superior vem agora afirmar que cabe a essas instituições a responsabilidade de corrigir as ineficiências do actual sistema de financiamento.
É o Governo responsável pela diminuição em 10% do emprego de trabalhadores qualificados, o mesmo Governo que parece nada querer fazer para evitar o despedimento de milhares de docentes do ensino superior ou para garantir a contratação de cerca de 3000 estagiários do Programa de Estágios Profissionais na Administração Pública, cujos contratos já começaram a chegar ao fim.
O Governo que afirma que serão revistos os Estatutos das Carreiras Docente e de Investigação, com vista a atrair para Portugal recursos humanos qualificados, é o mesmo que defende a precarização dos vínculos laborais dos docentes, pela introdução de contratos individuais de trabalho em situações onde deveria haver vínculo público.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Esta preocupante realidade com que estamos confrontados não é, no entanto, uma fatalidade incontornável: ela decorre de opções políticas e a sua correcção exige respostas e medidas políticas.
Esta realidade exige saber se o Governo está ou não disposto a definir um estatuto jurídico para as instituições de ensino superior que inverta a lógica da sua sujeição a interesses económicos e a recentre na prestação de um serviço público de interesse nacional, que garanta uma verdadeira autonomia baseada na gestão e na participação democráticas e corrija as políticas de subfinanciamento crónico.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A democracia é do passado!
O Orador: — Esta realidade exige também saber se o Governo está ou não disposto a assumir o direito à educação como um factor fundamental de concretização de uma democracia plena, nomeadamente pela definição de mecanismos que garantam o acesso à educação em condições de igualdade a todos os portugueses, sem discriminações de natureza económico-social, porque não são os empréstimos aos estudantes que garantem essas condições e muito menos o pagamento de propinas máximas pelos estudantes bolseiros.
Esta realidade exige, por fim, saber se o Governo está ou não disposto a tomar medidas para evitar que cerca de 2000 docentes do ensino superior sejam empurrados para o desemprego até ao final do presente ano lectivo, por falta de verbas das instituições onde desempenham funções.
Está ou não o Governo disposto a garantir as condições de estabilidade e dignidade para estes trabalhadores qualificados, de que o desenvolvimento do País tanto necessita?
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Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência e do Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência e do Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, V. Ex.ª parece viver numa neurose perigosa.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — O Sr. Ministro vai substituir o Ministro da Saúde!?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ficou nervoso!
O Orador: — Neurose porque vê uma ameaça onde há uma oportunidade; perigosa, porque nunca assisti, num debate sobre ensino superior, a um tal conservadorismo e vontade de que tudo fique exactamente na mesma.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É a cassete…!
O Orador: — Se ficar na mesma, Sr. Deputado, uma coisa lhe garanto, é que deixa de haver ensino superior em Portugal que alguém queira reconhecer.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é verdade!
O Orador: — Espero que, rapidamente, V. Ex.ª tenha a noção do que são as transformações do ensino superior no resto da Europa e daquilo que é exigido aos jovens portugueses no mercado de trabalho internacional e em Portugal para poderem garantir ao nosso país os níveis de bem-estar e de desenvolvimento a que todos aspiramos.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — É absolutamente inacreditável que a abertura do ensino superior a novos públicos, designadamente a abertura às classes sociais mais desfavorecidas, que está em curso neste momento, seja descrita como uma ameaça por V. Ex.ª
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vai ser!
O Orador: — É absolutamente extraordinário que V. Ex.ª, tendo na boca um discurso social, esteja, de facto, contra a abertura social do ensino superior àqueles que são mais pobres e àqueles que nunca nele entravam.
Aplausos do PS.
Pela primeira vez, como V. Ex.ª, certamente, distraidamente não reparou, e tal como tínhamos sempre prometido, o sistema de acção social foi estendido também ao 2.º ciclo de Bolonha. Foi estendido para todos os 2.
os ciclos, como sabe, ao contrário do que VV. Ex.as andaram a «vender» em todo o País e a dizer que era mentira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É exactamente ao contrário!
O Orador: — Eu gostava agora de ouvir uma retratação.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Uma retratação? Mas onde é que está o dinheiro para isso?
O Orador: — Mas não houve qualquer retratação.
O orçamento para a acção social também aumentou em 5% este ano.
Portanto, Sr. Deputado, sobre esta matéria, temos dito.
Não há nas suas afirmações qualquer verdade, mas apenas a expressão do conservadorismo, e também não existe qualquer pergunta a que eu, infelizmente, possa responder.
Aplausos do PS.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Nas suas é que não há verdade! Não quer é responder!
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O Sr. António Filipe (PCP): — Não há é perguntas a que saiba responder!
O Sr. Presidente: — Para formular a sua pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência e do Ensino Superior, há pouco V. Ex.ª dizia que lamentava, mas não estava aqui para «fazer a felicidade» do Deputado Agostinho Branquinho. Também não está cá para contribuir para a minha felicidade pessoal, mas compete ao Sr.
Ministro e ao Governo fazerem a felicidade do povo,…
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Dos professores, dos estudantes e das famílias!
O Orador: — … nomeadamente e no caso concreto, dos estudantes e dos professores do ensino superior, da investigação em Portugal e daquilo que as famílias esperam do Estado no que ao ensino superior diz respeito.
Relativamente a esta questão, o Sr. Ministro disse hoje, aqui, que não falaria daquilo que já tem dito, porque o que tem dito não tem dado bons resultados. E, apesar de o termos informado e de lhe termos feito ver que algumas situações não iriam dar bom resultado, o Sr. Ministro não nos quis ouvir. Lembro-lhe, por exemplo, no caso da discussão do Orçamento do Estado, em que dizíamos que o financiamento do Estado não era suficiente para garantir o pleno funcionamento das universidades, de V. Ex.ª ter dito que não era verdade e que iriam ter todo o dinheiro necessário para funcionarem.
Ora, hoje, verificamos que o Reitor da Universidade de Évora diz que, a partir de Setembro, não tem dinheiro para pagar salários; que o Reitor da Universidade do Algarve vai dispensar professores porque não tem dinheiro para lhes pagar; que a Reitora da Universidade de Aveiro está com graves dificuldades no pagamento de salários; que o Instituto Politécnico da Guarda já enviou uma carta a dizer que vai ter de dispensar docentes; que a Universidade do Minho está com sérios e graves problemas para poder continuar a pagar salários aos professores; que existe a previsão de que haja cerca de 2000 professores que vão ser dispensados no corrente ano lectivo, mas, apesar disso, a insensibilidade social do Partido Socialista é de tal ordem que não conseguiu apresentar um projecto de lei alternativo àqueles que foram aqui apresentados para o pagamento do subsídio de desemprego aos professores do ensino superior, porque foram apresentados vários projectos de lei, entre eles um do CDS-PP, mas o Partido Socialista disse que não os aprovava porque irá fazer uma reforma que irá abranger muitos, o que só irá acontecer lá mais para a frente.
Vozes do CDS-PP: — Uma vergonha!
O Sr. Digo Feio (CDS-PP): — Isso é no papel!
O Orador: — Vai ser quando aqueles que vão ficar desempregados já não possam lá chegar.
Mas, Sr. Ministro, vamos agora a algumas questões de que V. Ex.ª aqui não falou. V. Ex.ª não falou, por exemplo, sobre como é que vai ser feito o financiamento, se vai ser feito através de parcerias público/privadas, pela chamada sociedade civil, enfim… Concordamos um bocado com isso, o que lamentamos é que alguns dos sinais não vão nesse sentido.
Por exemplo, agora, no caso da Agência de Avaliação e Acreditação para a Garantia da Qualidade do Ensino Superior, o que verificamos é que a sociedade civil não é chamada para poder estar, aí também, na avaliação do ensino superior que vai produzir profissionais para a própria sociedade civil, para a sociedade e para a economia, para poderem aí trabalhar.
O Sr. Ministro não nos falou, nada!, sobre a questão de como é que vai ser esse financiamento, nem como é que vai resolver o hiato entre a situação actual e a próxima situação, já que, da forma como está a ser desenvolvido o ensino superior, vai haver aqui um problema de subfinanciamento.
Como sabe, Sr. Ministro, valorizamos, e muito, os exames nacionais e o acesso ao ensino superior através de exames, mas há uma coisa que também dizemos e temos vindo a dizer: é que deve haver diferenciação por cada estabelecimento de ensino na forma de acesso a esse ensino superior. Ora, o Sr. Ministro nada disse aqui, nada!, sobre isso.
Vai ou não haver a possibilidade de cada estabelecimento de ensino superior no âmbito da sua autonomia poder diferenciar e fazer formas diferenciadas de acesso dos alunos para aqueles que quer formar nas suas escolas?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Já agora, e a propósito disto, onde está a verdadeira competitividade, em igualdade de circunstâncias, entre o público e o privado quando, por exemplo, Sr. Ministro, fomos surpreendidos recentemente pelo facto de que o Estado, nos estágios profissionais na área da saúde dos alunos do ensino superior privado, vai exigir pagamento desse estágio?! Esses estágios têm de ser pagos aos hospitais públicos, ao contrário dos públicos que, muito bem, já estão dispensados, porque essa é uma dispensa que
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compete ao Estado dar aos seus estabelecimentos públicos. Mas não faz sentido que, em igualdade de circunstâncias, nos privados não exista exactamente a mesma situação. Não é justo, nem é, até, constitucional!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Ohhh!… Que injustiça…!
O Orador: — O que é que o Sr. Ministro tem a dizer-nos sobre esta matéria? Há aqui uma outra questão que o Sr. Ministro abordou, que é a do acesso ao ensino superior dos cidadãos com mais de 23 anos. Estamos de acordo, Sr. Ministro, mas penso que o enfoque não tem de ser dado nos cidadãos com mais de 23; os mais de 23 devem ser chamados ao ensino superior, deve ser-lhes dada mais uma oportunidade.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Claro!
O Orador: — No ano passado, Sr. Ministro, entraram no ensino superior público 34 931 alunos, num universo de jovens entre os 17 e os 19 anos, de 352 000 jovens. Ou seja, entraram no ensino superior pouco mais de 10% dos jovens em idade de poder lá chegar.
Ora, é aí que, creio, tem de ser feito o esforço, ou seja, é chamando os jovens a entrarem na universidade, a fazerem a sua formação no tempo e no momento certos; não é esperar para, depois, mais tarde, virmos chamar aqueles para quem já passou uma oportunidade de poderem lá estar. Devemos é concentrar o nosso esforço exactamente aí, na formação dos jovens, na qualificação dos jovens, na formação daqueles que ainda estão para entrar no mercado de trabalho.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Ministro, e sobre isto V. Ex.ª ainda nada disse, rigorosamente nada!!
O Sr. Manuel Mota (PS): — Disse, disse. Não ouviram, não estão atentos!
O Orador: — Numa segunda oportunidade, vamos questioná-lo sobre a questão da acção social escolar, que esta, efectivamente, também não foi matéria que V. Ex.ª tivesse abordado inicialmente.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, agradeço as suas perguntas e tentarei responder às várias questões no tempo disponível.
Quanto à primeira questão, Sr. Deputado, pelo menos, V. Ex.ª não me pede a felicidade…
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Para mim não, arranjo-a de forma diferente!
Risos.
O Orador: — Normalmente, também a entrego de forma diferente, sabe? Portanto, estamos bem! Sr. Deputado, quanto à primeira parte, gostaria de a dispensar. O Sr. Deputado, com certeza, não quer preferir o populismo de fazer de caixa de ressonância das queixas…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Querem ver que também são antidemocráticos?!…
O Orador: — … e muito menos quer estar do lado daqueles que entendem que não se devem combater as ineficiências das instituições. O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Mas oiço as pessoas!
O Orador: — Devo dizer-lhe que não esperava da sua parte que tomasse uma posição dessas.
É evidente que é preciso combater as ineficiências das instituições, as próprias instituições estão a combater essas ineficiências e tenho toda a confiança nas instituições do ensino superior para combaterem as ineficiências que sabem que têm nas suas instituições.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Eu também, Sr. Ministro!
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O Orador: — Portanto, o populismo de fazer de caixa de ressonância das queixas ou da comodidade não é, com certeza, para aqui chamado!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Não tenho é confiança no Governo!
O Orador: — Segunda questão, Sr. Deputado, é sobre a agência de avaliação e acreditação. Há duas questões que o Sr. Deputado levanta e eu gostava de deixar uma delas absolutamente clara.
Parece que ainda não foi bem entendido onde está a mudança. A mudança é esta: a avaliação passa a ser independente dos avaliados! Este é o ponto central: não são os alunos que se avaliam, são as instituições, e a avaliação passa a ser independente daqueles que são avaliados! E este é o princípio-base da avaliação.
Há uma segunda alteração fundamental: é que a acreditação dos cursos passa a ficar dependente da avaliação, e não independente da avaliação, como também acontecia até aqui. Até aqui, aconteciam duas coisas: a avaliação não era independente dos avaliados e a acreditação nada tinha a ver com a avaliação. São estas duas grandes mudanças com as quais espero que V. Ex.ª esteja de acordo.
Agora, aquilo que não entendi, e julgo que não entendeu, é a questão da participação da sociedade civil.
Fica absolutamente garantida a participação da sociedade civil, designadamente o novo regime da participação obrigatória das ordens e das associações profissionais em sede de acreditação. Não é em fim de linha, depois de o Estado ter acreditado, anos mais tarde, vir a ordem profissional dizer: «acredito neste curso» ou «não acredito neste curso»… Depois de os estudantes lá terem andado de boa fé? Não, Sr. Deputado!! Agora, passa a ser diferente: as associações profissionais, os empregadores, passam a fazer parte do processo de avaliação e de acreditação. Eles dão parecer obrigatoriamente sobre essa matéria, à cabeça, permitindo, portanto, defender os interesses das instituições e os dos jovens que nelas participem.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Há duas outras questões que o Sr. Deputado suscitou, uma das quais diz respeito ao acesso ao ensino superior e eu gostaria que esta questão fizesse parte do debate.
É uma questão muito difícil, a questão de se ultrapassar o quadro legal existente de um concurso nacional de acesso que garante equidade e substituí-lo por um regime inteiramente ligado a cada estabelecimento de ensino superior. E este assunto já foi muito estudado em Portugal. Não tenho aqui tempo para isso, mas poderemos, muito provavelmente em sede de comissão, detalhar este assunto e ver os prós e contras destas alterações que têm muitos problemas.
Primeiro problema: a diversidade de classificações dos estudantes, que apenas as provas nacionais permitem superar parcialmente.
Segundo problema: o facto de se tornar extraordinariamente difícil a muitos estudantes concorrem a vários estabelecimentos de ensino superior. Essa é a razão fundamental por que se tem mantido, apesar de em muitos estabelecimentos haver provas. Poder combinar-se? Com certeza, Sr. Deputado, estamos inteiramente abertos a esse debate. Não temos qualquer posição fechada sobre essa matéria.
Por último, Sr. Deputado, não me parece razoável vir opor o aumento necessário de jovens à entrada do ensino superior ao aumento, ainda mais necessário, de adultos no ensino superior.
A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Muito bem!
O Orador: — Por que é que digo ainda mais necessário? Porque não havia lá nenhuns, Sr. Deputado!!
A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Exactamente!
O Orador: — Porque a percentagem de adultos no ensino superior era, em Portugal, muitíssimo mais baixa do que em qualquer outro país. É este o ponto.
Em segundo lugar, claro que estamos de acordo de que é preciso aumentar o número de jovens à entrada do ensino superior. Mas como é que o devemos fazer? Dando uma mensagem de facilitismo aos jovens do ensino superior? Não. Aos jovens do ensino secundário? Não. Devemos fazê-lo dando uma mensagem clara de exigência à entrada. Ora, foi isso que fizemos, com a imposição da nota de 9,5 valores à entrada, nas provas específicas. E assim continuaremos a fazer, Sr. Deputado.
Aplausos do PS.
Protestos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para formular perguntas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, efectivamente, não tem nenhum compromisso com a felicidade dos Srs. Deputados.
A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Ainda bem!
A Oradora: — E ainda bem que não tem.
O Sr. António Filipe (PCP): — Estávamos desgraçados!
A Oradora: — Mas tem, efectivamente, um compromisso com os actores de que aqui falou, esse actores que quer ver participar e para os quais o senhor, em princípio, deveria estar a trabalhar. E é sobre o bem-estar e a auto-realização desses actores que vale a pena conversar, sobre o seu presente e sobre o seu futuro.
Começo pelos estudantes. Sr. Ministro, não trouxe aqui, hoje — que estranho! —, os empréstimos, a possibilidade de os estudantes se tornarem, a termo, estudantes clientes.
Não está a falar com toda a seriedade da questão de fundo deste processo. Está a oferecer-lhes uma formação altamente desqualificada no 1.º ciclo, está a empurrá-los para a fatalidade de um 2.º ciclo, que não é o espírito de Bolonha, e está a pensar que eles vão pagar essa mesma formação.
Estudantes, que se viram confrontados com uma quebra de expectativas e de direitos, que se inscreveram em cursos e que, ao abrigo de um processo de transição, estão a frequentar cursos que não foram aqueles que escolheram — bem-estar e felicidade dos estudantes.
Sr. Ministro, passo aos professores e ao desemprego.
Refiro os números do desemprego e um direito fundamental, Sr. Ministro, que a maioria aqui não deixou passar (provavelmente, é falso, pela sua cara), que é o direito ao subsídio de desemprego. Mas o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares prometeu que, a breve prazo, essa questão seria resolvida. Talvez o Sr. Ministro nos possa dizer quando, efectivamente.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — É um anúncio importante, hoje!
O Sr. João Oliveira (PCP): — São perguntas sem resposta!
A Oradora: — Sr. Ministro, ainda quanto aos actores e ao seu bem-estar, refiro os investigadores, os bolseiros e a mobilidade: as bolsas de mobilidade, que não foram pagas; os bolseiros, que não estão a receber; a Fundação para a Ciência e a Tecnologia, que está, como o senhor bem sabe, entregue, em boa parte, a bolseiros que assumem tarefas administrativas.
Que exemplo é este de investigação, de modernidade e de felicidade para os actores que quer ver participar nesta sua reforma?!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Isso é sadismo!
A Oradora: — Mas vamos, então, à sua reforma, Sr. Ministro.
No que respeita à Agência de Avaliação e Acreditação para a Garantia da Qualidade do Ensino Superior, o que está assumido — e é este o compromisso do Governo — é que ela será independente dos avaliados, do Estado e do Governo. Não é esse, efectivamente, o modelo que o senhor apresentou. Não há dúvida de que esta Agência assenta num modelo de governamentalização, Sr. Ministro.
Depois, o Conselho Estratégico para o Ensino Superior, com representação da comunidade, da cultura, da ciência, das empresas e com possibilidade de vincular as orientações para o ensino superior. O Sr. Ministro acha possível que os «comendadores Berardo» definam a política para o ensino superior, em Portugal?
O Sr. Manuel Mota (PS): — Quer a sociedade civil ou não?!
A Oradora: — Por que é que um órgão que não é eleito tem carácter vinculativo na política para o ensino superior?
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Evidentemente. Ninguém entende!
A Oradora: — Tenho perguntas sobre este futuro da reforma, de que o senhor, aqui, veio dar apenas o calendário.
Autonomia, gestão e regulação. Como é que entende esta possibilidade de ter as instituições fora da Administração Pública? Como é que perspectiva esta possibilidade aberta para as fundações, quando o senhor sabe que esta realidade, na Europa, tem muito pouca validade, dado o peso, nomeadamente em termos de dotação orçamental, necessário para a criação das fundações?
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Quanto aos contratos individuais de trabalho, o que é que vai acontecer com esta possibilidade, que o senhor vai encontrar, de estes corpos fora do Estado terem contratos individuais? Vamos ter, aliás, no ensino superior, uma carreira de professores de «casta», aqueles que estão no sistema, e outros professores cada vez mais precarizados,…
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Aí é que está!
A Oradora: — … para os quais nem sequer existe subsídio de desemprego?
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Bem visto!
A Oradora: — Passo a referir-me ao futuro do financiamento, Sr. Ministro.
Vamos ter um novo modelo de financiamento — aliás, a fórmula de financiamento foi largamente pervertida este ano, como bem sabe: os contratos, esta gestão de resultados, esta grande «fibra» do Partido Socialista da gestão dos resultados. Portanto, os senhores vão financiar em função do sucesso, que não se sabe muito bem o que é, mas que os senhores definiram, e da empregabilidade.
Uma pergunta, Sr. Ministro: está, ou não, em condições de assumir, pela primeira vez, que as faculdades ligadas às ciências humanas e às ciências socioeconómicas vão ser duramente penalizadas com o futuro modelo de financiamento e vão, potencialmente, ficar reféns do financiamento privado? Está, ou não, em condições de perspectivar e de assumir o futuro destas instituições?
Vozes do BE: — Muito bem!
A Oradora: — Espero, depois disto, Sr. Ministro, que não faça como é muito do seu agrado. Conto, finalmente, ouvi-lo. Sei que é desconfortável, porque o senhor sabe, e tem consciência, que está a desfigurar o ensino superior público. O senhor sabe disso.
Espero, no entanto, desta vez, ter o privilégio de ouvir respostas às perguntas que lhe coloquei e não ser alvo dessa retórica, também fácil, com que o senhor adjectiva os discursos da oposição que não lhe interessam.
Aplausos do BE.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma neurose contagiosa!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, interessam-me imenso os discursos. O seu discurso sobre empréstimos é de um tal reaccionarismo que me interessa extraordinariamente.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — É uma vergonha!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Está de cabeça perdida!
O Orador: — Interessa-me extraordinariamente pelo seguinte: sabe a Sr.ª Deputada o número de estudantes que hoje, para garantirem a sua independência, recorrem a empréstimos? Entende a Sr.ª Deputada que o Estado nada deve fazer para oferecer melhores garantias a esses empréstimos, para que os juros sejam muito mais baixos para todos os estudantes?
O Sr. Luís Fazenda (BE): — É uma vergonha!
O Orador: — Portanto, V. Ex.ª quer que os estudantes que agora recorrem à banca continuem a pagar os empréstimos aos juros actuais…
Protestos do BE e do PCP.
… e está contra que o Estado intervenha, como acontece em toda a Europa, repito, como acontece em toda a Europa, para que os juros baixem! É isto que deve ficar absolutamente claro a esses estudantes, Sr.ª Deputada!
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Aplausos do PS.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Isso é miserável, do ponto de vista intelectual!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Que vergonha!
O Orador: — Acho absolutamente extraordinário, também, que a Sr.ª Deputada diga que as formações de 1.º ciclo são altamente desqualificadas. Os portugueses, portanto, são altamente mais estúpidos, na opinião da Sr.ª Deputada,…
Protestos da Deputada do BE Alda Macedo.
… do que todos os outros europeus, na medida em que a formação que está generalizada em toda a Europa é precisamente a de 1.º ciclo…
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Isso não é verdade! É uma falsidade!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não foi isso que a Sr.ª Deputada disse!
O Orador: — … e não consta que ela esteja altamente desqualificada.
O Sr. Honório Novo (PCP): — É inaceitável! Um homem destes a dizer uma coisa destas!
O Orador: — Julgava que a Sr.ª Deputada estava do lado da modernidade e que defendia que as condições de formação, em Portugal, deveriam ser idênticas às dos países mais desenvolvidos da Europa.
Além disso, a Sr.ª Deputada pergunta-me se estou de acordo que deve haver conselhos do ensino superior não eleitos que definam orientações de carácter vinculativo. Não estou de acordo, Sr.ª Deputada! A Sr.ª Deputada pergunta, ainda, se entendo que as instituições públicas de ensino superior podem ter o estatuto de entidades não estatais, continuando a ser públicas. Sr.ª Deputada, isso é o que acontece, desde há muitos anos, em Inglaterra.
O Sr. António Filipe (PCP): — E eles estão satisfeitos?!
O Orador: — Em Inglaterra, as instituições de ensino superior públicas não são estatais, mas são públicas.
O Sr. António Filipe (PCP): — Quero lá saber da Inglaterra!
O Orador: — Quero lá saber de Inglaterra — foi o que disse o Sr. Deputado, não é verdade?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pois foi!
O Orador: — Claro! Acho que não devemos querer saber o que se passa no resto do mundo…!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O Sr. Ministro está desesperado!
O Orador: — Disse-me a Sr.ª Deputada que é absolutamente indispensável que em todos os modelos de ensino superior europeus os professores sejam funcionários públicos. Pois deixaram de o ser há mais de 20 anos, na Holanda. Podemos olhar para essa experiência e ver se isso «precarizou» o emprego ou se melhorou a universidade. É uma análise que está a ser feita. O debate de orientação durante os próximos dois meses é precisamente esse, Sr.ª Deputada. O que aqui defendo não é nenhum modelo fechado, o que entendo é que deve haver diversidade nesta matéria, em Portugal, e o nosso país deve abrir-se a essa diversidade. A Europa está toda a mudar neste domínio e alguns destes modelos não são novos, são antiquíssimos, e provaram a sua viabilidade. Quais são as vantagens e os inconvenientes é uma matéria que deve ser ponderada, sou o primeiro a dizer que deve ser ponderada, mas não devemos ficar fechados nos modelos antigos, cujos inconvenientes também conhecemos muitíssimo bem.
Por último, Sr.ª Deputada, quanto à sua afirmação, que espero que fosse também uma pergunta, sobre se as faculdades de ciências sociais e humanas vão sair perdedoras desta reforma, não vejo porquê, Sr.ª Deputada. As faculdades de ciências sociais e humanas, tal como quaisquer outras faculdades e formações, têm igual dignidade. Disse-o no meu discurso, falei sempre nas formações humanas, nas formações científicas, nas formações artísticas. Em nada o financiamento público ao ensino superior distingue negativamente estas áreas; antes, pelo contrário, Portugal é dos países da Europa em que a percentagem de financiamento para a ciência afecta às ciências sociais e humanas é mais consistente.
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Aplausos do PS.
Protestos da Deputada do BE Alda Macedo.
O Sr. Presidente: — Para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, dois meses depois de o Sr. Primeiro-Ministro ter vindo aqui falar, no debate mensal de Dezembro, sobre o rumo das políticas do ensino superior no nosso país, é com alegria que recebemos o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior para dar mais esclarecimentos e explicar aquilo que o Sr. PrimeiroMinistro não disse nem assumiu perante os portugueses. Gostaria de ver o Sr. Ministro assumi-lo hoje, aliás, acredito que, durante esse debate, o Sr. Ministro tenha tido, muitas vezes, vontade de intervir e acrescentar algumas explicações que o Sr. Primeiro-Ministro, então, não deu.
O Sr. Primeiro-Ministro não assumiu, nomeadamente, o rumo de privatização e desresponsabilização que o Governo está a promover face à educação, em geral, e ao ensino superior público, em particular, o qual é extremamente grave, violador do princípio constitucional e desmente, flagrantemente, o discurso oco do Governo, que diz apostar na qualificação dos portugueses e a todo o instante fala dessa qualificação e do aumento de formação de jovens e adultos.
O Sr. Primeiro-Ministro também não explicou por que é que, apesar do amém que disseram a muitas das recomendações do relatório da OCDE, atentando às suas críticas, fizeram, contudo, orelhas moucas quando esse relatório aconselhou e apontou como determinante o reforço do investimento, em geral, e muito concretamente do investimento público. Em relação a isto, os senhores não seguiram o conselho do relatório da OCDE, porque, de facto, não é a isso que estamos a assistir. No Orçamento do Estado para 2007, as universidades e politécnicos sofreram cortes substanciais nos seus orçamentos, cortes, esses, que os colocaram numa situação extremamente difícil. Pode, já agora, o Sr. Ministro explicar, porque o Sr. PrimeiroMinistro não o fez, como é que vão reforçar os politécnicos. É que a situação a que estamos a assistir, neste momento, é de uma grande dificuldade de funcionamento dos politécnicos. O Sr. Primeiro-Ministro anunciou que o ia fazer, mas não explicou como nem para quando, e o Sr. Ministro tem, agora, oportunidade de o explicar. Tudo o que sabemos, neste momento, é que as dificuldades financeiras e os estrangulamentos orçamentais a que este Governo, tal como os governos de direita, está a sujeitar as instituições de ensino superior já estão a produzir efeitos, designadamente o despedimento de docentes no ensino superior, às dezenas em 2006 — …
O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — Diga os números!
O Orador: — … não sabemos os números, ao certo, porque não somos nós que estamos no Governo, Sr. Deputado, mas, com certeza, o Sr. Ministro poderá dar essas informações — e, em 2007, já há quem aponte para a possibilidade de despedimento de quase 2000 docentes no ensino superior.
É também esse o efeito de Bolonha e das reformas que o Governo pretende fazer a seu reboque. É que, por detrás de Bolonha e dos bons objectivos de mobilidade, das boas intenções de empregabilidade, está uma péssima reforma: redução do tempo de ensino, redução das matérias abrangidas, manutenção dos custos para as famílias e diminuição do financiamento e da responsabilidade do Estado. Vai ser exigido mais aos professores e aos alunos, porque vai ser exigido aos professores que em menos tempo formem mais e melhor, acompanhado de um decréscimo de docentes, ao qual já estamos a assistir.
Talvez o Sr. Ministro entenda que estes não são os seus problemas, mas estes são, definitivamente, problemas existentes no ensino superior e aos quais é preciso dar respostas.
Ao problema do desemprego docente, o Governo e o Partido Socialista não respondem com o subsídio de desemprego, apesar de o terem prometido aos portugueses antes das eleições. Adiam para mais tarde, certamente para quando o universo a despedir for menor do que o número de despedimentos que, entretanto, vai acontecer. Aliás, é de notar que, durante o «chumbo», que o Partido Socialista promoveu, dos três projectos de lei que, aqui, no Parlamento, visavam garantir esse direito, nada foi dito, em concreto, sobre como o Governo vai resolver este problema. O Governo nega esse direito, à espera de reduzir o universo máximo e de criar outras medidas legislativas, sujeitando os futuros trabalhadores ao contrato individual de trabalho. Aos alunos, propõe os empréstimos, para agravar as actuais condições de endividamento das famílias, que já estão sobrecarregadíssimas. Será este o fim anunciado do apoio social.
Já agora, em relação aos alunos, Sr. Ministro, sabe V. Ex.ª, certamente, que há um conjunto de situações, designadamente, dos alunos que terminaram as suas licenciaturas mesmo à beira de entrar no Processo de Bolonha e que querem saber que oportunidades vão ter de recuperar, relativamente aos seus colegas que já entraram no processo de transição. Mas os problemas dos alunos do processo de transição também se colocam, designadamente daqueles alunos que estão a pagar propinas por inteiro e que, no entanto, não vão ter aulas durante o ano inteiro. Que resposta tem o Sr. Ministro para dar a esses alunos? Finalmente, Sr. Ministro, apenas uma ou duas questões quanto à autonomia.
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VV. Ex.as disseram — o Sr. Primeiro-Ministro disse-o e o Sr. Ministro também já o reafirmou — que entendem que o Estado intervém demasiado na gestão das instituições do ensino superior. E, por isso, a vossa solução é a maior autonomia financeira, ou seja, a desresponsabilização do Estado, e a menor autonomia científica. E como é que se concretiza esta menor autonomia científica?
O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — Com a introdução de empresas nos órgãos de gestão das universidades, com a criação de um conselho estratégico de ensino superior. É assim que os senhores entendem a autonomia! Finalmente, Sr. Presidente, só mais uma questão que tem a ver com o seguinte: foram denunciados pela ABIC (Associação dos Bolseiros de Investigação Científica), mais uma vez, novos atrasos no pagamento das bolsas da Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Foi referido, por esta Fundação, que esses atrasos são normais e, geralmente, correspondem a um ano.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — Mas, depois, numa resposta mais concreta, diz que foram pagas em 2006 bolsas referentes a 2003, o que revela um atraso muito mais grave. E é tanto mais grave quanto são, muitas vezes, os estudantes que têm de pagar as propinas logo no início do ano lectivo, sendo que a sua bolsa só vai ser dada muito tempo depois, prejudicando-os, naturalmente, e levando a que muitos desses investigadores e estudantes tenham, muitas vezes, de recorrer ao crédito para poder fazer face a despesas normais, correntes, como a renda, a água e a luz das suas casas, porque aquela bolsa é, na realidade, o seu vencimento mensal.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, em primeiro lugar, repito, pela enésima vez, que não há qualquer ideia, intenção, propósito ou prática de privatização dos estabelecimentos de ensino superior público em Portugal. Que fique absolutamente claro! Não há qualquer intenção, projecto, ideia ou prática de concretização de qualquer modelo de privatização do ensino superior público em Portugal; antes, pelo contrário, está em causa a defesa do ensino superior público ou, melhor, está em causa a defesa de todo o ensino superior e também do ensino superior público.
Segunda questão: Sr. Deputado, a recomendação da OCDE, em matéria de financiamento do ensino superior, é integralmente partilhada e assumida pelo Governo.
V. Ex.ª não leu essa recomendação, porque o que a OCDE recomenda é que, neste momento, se mantenha o nível de financiamento do ensino superior em Portugal, se obtenham os ganhos de eficiência necessários pela reorganização interna do sistema de ensino superior e que, ao aumento de alunos do ensino superior, após esta fase, corresponda um aumento de investimento. O Sr. Primeiro-Ministro, nesta mesma Casa, em Dezembro, afirmou claramente que de imediato seria garantido o mesmo financiamento público em percentagem do Produto para o ensino superior, que depois cresceria com o aumento dos estudantes, que esperamos que aconteça em todo o ensino superior.
Terceira questão: reforço dos institutos politécnicos. Duas respostas: primeira, em função do aumento de graduados que acontecerá no sistema do ensino superior politécnico, com o reforço excepcional para o financiamento dos cursos de especialização tecnológica nos institutos politécnicos já este ano e, nos anos subsequentes, em função do aumento do números de estudantes e de graduados; segunda, através do reforço da internacionalização dos institutos superiores politécnicos. Queremos que os institutos superiores politécnicos portugueses, tal como as universidades o fizeram já há vários anos, se internacionalizem, recrutem estudantes estrangeiros e tenham possibilidade de ver as suas licenciaturas reconhecidas no mercado de trabalho internacional através da criação de graus conjuntos com institutos politécnicos de referência de outros países.
Quarta questão: redução do tempo de ensino. Sr. Deputado, não sei do que está a falar. Se está a falar da redução do número de anos de licenciaturas, então, Sr. Deputado, dou-lhe a mesma resposta que já dei à Sr.ª Deputada do Bloco de Esquerda. Confesso que não consigo compreender como é que alguém, nesta Câmara, pode defender um sistema em que os estudantes portugueses eram sistematicamente preteridos em relação a todos os estudantes com as mesmas habilitações de toda a Europa para terem o mesmo grau. Como é que algum Deputado, que deve defender o interesse público, pode defender tal anomalia?! Se o Sr. Deputado, pelo contrário, está a referir-se ao tempo lectivo, à quantidade de tempo lectivo semanal de cada estudante, também gostava de lhe dizer que todas as avaliações internacionais mostram que
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essa é uma das questões básicas a corrigir em Portugal, que existe tempo lectivo a mais e tempo de trabalho a menos para os estudantes, na esmagadora maioria do ensino superior português,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Os estudantes portugueses aprendem de mais!
O Orador: — … quando comparado com o ensino superior de qualidade dos outros países.
Quanto ao apoio social,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É preciso ter descaramento!
O Orador: — Há palavras que acho absolutamente extraordinárias, Sr. Deputado, e que a decência me impede de repetir, porque as ouvi!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Então, tenha tento na língua!
O Orador: — Por último, Sr. Deputado, a questão da autonomia.
V. Ex.ª diz que pretendemos menor autonomia científica nos estabelecimentos de ensino superior. Não é verdade! Pretendemos idêntica autonomia científica; ela é total nos estabelecimentos de ensino superior hoje e pretendemos que continue a sê-lo.
A nossa política é no sentido de garantir a integridade científica das instituições. O facto de as instituições de ensino superior — elas próprias, não é ninguém por elas, não é o Governo, nem a Assembleia da República, nem as empresas — e os seus órgãos eleitos terem de cooptar pessoas com formação diferente daquelas que estão dentro das instituições de ensino superior é, com certeza, uma via de aumentar a sua autonomia e a sua capacidade de intervenção na sociedade, tal como acontece em todos os países desenvolvidos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos iniciar a segunda volta de perguntas, dispondo agora cada orador de 3 minutos.
Para formular a sua questão, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, gostaria de começar exactamente por lhe devolver um repto que lançou aqui ao Sr. Deputado Agostinho Branquinho. Quero dizer-lhe claramente que, em matérias de iniciativa, o seu repto é mal dirigido. O PSD, de há muitos meses a esta parte, apresentou, nesta Casa, a única iniciativa no que diz respeito ao ensino superior. Temos aguardado, ao longo de meses, de facto, por sinais seus, por iniciativas de outros grupos parlamentares, que até agora não surgiram.
O Sr. Ministro pediu também propostas. É muito simples, Sr. Ministro: transforme o seu anteprojecto da agência de acreditação em proposta de lei e com certeza que terá muitas propostas nesta Casa, não só deste grupo parlamentar mas, com certeza, também dos outros.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Mas isso ele não quer!
O Orador: — Mas, Sr. Ministro, hoje estamos aqui, sobretudo, para aferirmos o grau de concretização dos múltiplos anúncios que foram sendo feitos ao longo dos últimos dois anos. Penso que isso é que é, de facto, importante, pelo que eu gostaria de começar por aí.
Os 1000 doutorados que supostamente seriam contratados até ao final da Legislatura foram transformados em 500 e a serem contratados em 2007, com um calendário muito bem definido. Supostamente, em Novembro iniciava-se o processo e, supostamente também, este mês ainda já estariam os primeiros a ser contratados.
Sr. Ministro, faça-nos aqui, hoje, um ponto da situação, porque a informação recolhida na Fundação para a Ciência e Tecnologia diz que, desde Novembro, tudo isto está adiado sem qualquer outro prazo alternativo.
Uma outra questão, já referida aqui, tem que ver com os bolseiros.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Nem uma palavra hoje!
O Orador: — Recordo que passou já quase um ano sobre um debate mensal em que o Sr. PrimeiroMinistro anunciou o reforço de 60% do número das bolsas, que era já válido para o concurso que estava a decorrer no ano passado, e, mais, que estas bolsas, ao contrário do que era habitual, iriam ser pagas a partir de Outubro.
Estamos nos últimos dias de Fevereiro e nem metade do número de bolsas foram contratualizadas e muito menos estão a ser pagas.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!
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O Orador: — Há ainda uma outra questão em que gostaria que o Sr. Ministro fosse claro na resposta, que tem que ver também com os mais de 8000 bolseiros de investigação científica que têm, de facto, desempenhado funções muito específicas nas instituições. Qual é a resposta? A resposta não existe. A solução é mesmo irem para o desemprego, Sr. Ministro?
O Sr. Luís Fazenda (BE): — E sem subsídio!
O Orador: — Já agora, no que diz ainda respeito a bolsas, gostaria que me esclarecesse uma coisa. Há já mais de um ano que o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro Mariano Gago disseram que estavam a estudar a actualização do valor das bolsas. Gostaria hoje de saber se esse estudo já terminou ou se ainda estão a fazer «revisão da matéria dada». É que o tempo vai passando e as respostas não chegam.
Mas se a resposta é, de facto, o desemprego para todos esses bolseiros, Sr. Ministro — e percebo que até agora não tenha respondido a esta questão, embora ela já tenha sido levantada por duas vezes nesta Casa, mas é importante que à terceira a reposta saia —, qual é o seu compromisso, afinal? É que o senhor, em 2005, foi dizendo que a Assembleia da República iria resolver o problema do subsídio de desemprego para os investigadores e docentes;…
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Nem uma palavra!
O Orador: — … no dia 5 de Novembro de 2005, deixava satisfeitos os sindicatos; no dia 7 de Novembro, numa entrevista, dizia que a Assembleia estava a resolver a questão e que se esta não a resolvesse o Governo resolvê-la-ia; em Janeiro de 2006, vem dizer que já tem um pré-entendimento com o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social. Estamos em Fevereiro de 2007 e percebo agora por que o Sr. Ministro não veio ao debate que ocorreu aqui há poucos dias e em que o Governo esteve representado pelo Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares: porque é uma situação que o incomoda. É que foi o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior que assumiu estes compromissos públicos com as pessoas, ou seja, mais uma vez, anunciou e não cumpriu, e é disso que estamos hoje aqui a tratar.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — É o costume!
O Orador: — O Sr. Ministro — e termino com esta questão, Sr. Presidente — já por duas vezes hoje falou aqui da questão da acção social escolar e do aumento que estava previsto no Orçamento. Recordo ao Sr.
Ministro, e gostaria que me respondesse quanto a esta matéria, que no Orçamento estavam previstos, de facto, 45 milhões de euros para acção social escolar provenientes de fundos comunitários, que era o tal reforço, o tal aumento. Como estamos com o QREN na situação em que está, como sabemos, porque o Governo já o disse aqui, que para este ano não há QREN nenhum,…
Vozes do PSD: — Não há QREN nenhum!
O Orador: — … gostaria que o Sr. Ministro explicasse hoje nesta Câmara onde é que vai buscar esses 45 milhões de euros.
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — É um empréstimo!
O Orador: — Acho que é uma questão muito concreta e os milhares de estudantes do ensino superior mereciam claramente saber como é que vai fazer esse reforço.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Ministro, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, gostava, em primeiro lugar, de saudar a sua afirmação inicial de disponibilidade e de vontade de participação e colaboração no que diz respeito à reforma do sistema de ensino superior.
Essa é uma condição essencial para que possa haver uma reforma de ensino superior, para que essa reforma seja sustentável no tempo e para que ela tenha possibilidade de vir a responder às necessidades futuras, e não apenas presentes, do País. E gostava de insistir neste ponto.
Há duas questões que o Sr. Deputado me levanta e sobre as quais gostava de o esclarecer para não sobrarem quaisquer dúvidas, sendo que não dizem respeito a matéria de ensino superior mas, sim, de ciência.
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As informações de que disponho, e que tenho aqui à minha frente, sobre o concurso de 2006 de bolsas de estudo de doutoramento e pós-doutoramento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia mostram que foram aprovadas, nesse concurso, cerca de 2428 bolsas novas. Quando comparado com o concurso do ano anterior, de 2005, em que foram aprovadas 1593, mostra um acréscimo muitíssimo significativo. A primeira promessa está, pois, cumprida.
Risos da Deputada do BE Cecília Honório.
O Orador: — Devo, além disso, dizer à Sr.ª Deputada Cecília Honório que, destas 2428 bolsas, foram aprovadas 726 na área das ciências sociais, das quais 575 de doutoramento, 138 pós-doutoramento e 13 de mestrado. Dessas bolsas novas a conceder, e neste momento estão todas processadas, existem 582 cujos contratos não podem ser assinados, porque não foram completados pelos candidatos, havendo por isso dados que estão em falta, e neste momento, além destas bolsas, existem 400 recursos que serão analisados para a semana, ou seja, estes 400 recursos finais passam no painel de avaliação na próxima semana.
O Sr. Deputado colocou-me ainda uma outra questão relativamente a um processo de enorme importância, que diz respeito à contratação pelas instituições científicas, em regime de concurso internacional, de 1000 novos doutorados. Foram recebidas candidaturas de muitas instituições científicas nacionais, correspondentes a mais de um milhar de candidatos. Após um longíssimo processo de análise dessas candidaturas e de completar essas licenciaturas, foi decidido que o processo de avaliação desses contratos-programa não podia ser apenas administrativo e que era preciso nomear painéis internacionais para cada uma dessas áreas. A avaliação em todas as áreas desses contratos-programa estará pronta no dia 15 de Março.
Entende, com certeza, o Sr. Deputado que este processo, que é de enorme importância, devia ser feito com a maior das seriedades. O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Desde o início!
O Orador: — É isso que estamos a tentar fazer, face à dimensão daquilo que entendemos e ao impacto que esta medida vai ter em todo o sistema científico nacional. Não houve, portanto, qualquer redução da ambição, antes pelo contrário, o Governo considera a possibilidade, face ao segundo concurso (não só este, mas também o do próximo ano), de ampliar o número de 1000 contratos.
Aplausos do PS.
Vozes do PSD: — E o subsídio de desemprego?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Mota.
O Sr. Manuel Mota (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, em poucos segundos vou fazer uma nota prévia e centralizar o debate naquilo que é a questão fundamental, ou seja, no papel que esta reforma do ensino superior tem, em Portugal, na continuidade da reforma do próprio modelo económico, que emerge e que é fundamental em termos da globalização que se perspectiva.
A nota prévia vai para o PSD e para a espécie de chicana política que optou por fazer, criando a expectativa de que, neste debate, poderia fazer a análise e o balanço de dois anos de governação, perdendose depois na oportunidade, apenas criticando a perspectiva de avaliação do projecto que está em discussão em relação à Agência de Avaliação e Acreditação.
Protestos do PSD.
Tenham calma, Srs. Deputados! A verdade é que o parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) de que o Sr. Deputado Agostinho Branquinho referiu ainda não está concluído. E tanto não está concluído que até nem é público! Mas posso lerlhe um parecer que é público, de uma associação de estudantes, que é parte do sistema educativo, que diz, com clareza:…
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Posso ler o outro!
O Orador: — … «assumimos como fundamental a criação da Agência de Avaliação e Acreditação para a Garantia da Qualidade do Ensino Superior. Os seus princípios são importantes e fundamentais para a mudança do actual paradigma do ensino superior e a recuperação da credibilidade perdida pelo anterior sistema de avaliação.»
A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Muito bem!
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O Orador: — O parecer que acabei de ler é da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Defende a governamentalização da agência?
O Orador: — Centralizando novamente a discussão naquilo que é, já hoje, a perspectiva do ensino superior em Portugal, podemos voltar a falar da felicidade resultante já das medidas deste Governo. Podemos falar da felicidade daqueles que, na perspectiva da concretização da Lei de Bases do Sistema Educativo, tiveram a possibilidade de, no ano 2006-2007, ter os seus cursos adaptados a Bolonha — 50% dos cursos estavam adaptados a Bolonha e perspectiva-se que, no próximo ano lectivo, 90% estejam já disponíveis para estar adaptados a Bolonha.
E mais: a importante medida de alteração do modelo ad-hoc de acesso ao ensino superior para maiores de 23 anos foi uma lei apresentada pelo Ministro na Assembleia e perspectiva uma mudança fundamental naquilo que é a realidade do acesso ao nosso ensino superior.
Protestos do Deputado do PSD Agostinho Branquinho.
Sr. Deputado, ouça que isto é para si! Durante os vossos anos de governação, o acesso ao ensino superior para maiores de 25 anos era quase irrelevante — eram 900 candidatos que acediam ao ensino superior. Só no ano passado, acederam mais de 5000! É da felicidade desses alunos e dessas famílias que falo aqui, dos que tiveram já a oportunidade de estar no sistema de ensino superior.
E falo também da felicidade de todos aqueles alunos e famílias que têm a oportunidade, neste momento, de acederem aos cursos de especialização tecnológica. Já foram aprovados mais de 60 cursos de especialização tecnológica e esses alunos e essas famílias só têm a agradecer a este Ministro e a este Governo.
Não há dúvida que a vossa análise sobre o balanço dos dois anos de governação não foi feita. Sabe porquê? Porque também não têm nada para dizer em relação àquilo que foram os vossos anos de governação.
Protestos do PSD.
Não esquecemos aquilo que é o compromisso para a ciência e a vantagem desse compromisso. Não esquecemos o que VV. Ex.as fizeram à Agência Ciência Viva ou em relação à comparticipação do Estado nas instituições de investigação internacionais. Não nos esquecemos porque a realidade hoje é bem diferente.
Hoje, recupera-se o atraso científico nacional, e este é o centro do debate, esta é a realidade do País e é isto que muda no País.
Aproveito, agora, para colocar uma pergunta muito objectiva e relevante ao Sr. Ministro. O Deputado Bravo Nico colocou-lhe a questão central da internacionalização das nossas instituições do ensino superior. Assim, no ano em que o programa Erasmus faz 20 anos —…
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Também é vosso?
O Orador: — … que permitiu que mais de 1 milhão de estudantes tivessem oportunidade da mobilidade e também que mais de 21 000 professores, só este ano, tivessem mobilidade —…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente! E não foi preciso o Processo de Bolonha para haver mobilidade!
O Orador: — … peço que nos clarifique e perspective aquilo que são as novas regras da mobilidade de estudantes no ensino superior em Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Mota, é verdade que este ano se cumprem 20 anos do programa Erasmus, provavelmente um dos símbolos mais importantes da Europa, que será comemorado durante a presidência portuguesa em Lisboa e que será, certamente, a ocasião para repensarmos, à escala europeia, o seu relançamento e a sua abertura, designadamente a sua abertura social.
Gostaria de dizer ao Parlamento que a proposta que fiz à Comissão Europeia e que farei aos outros países membros da União Europeia, nesta matéria, é a de se tirarem consequências, obviamente positivas e de
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evolução na continuidade, relativamente ao programa Erasmus, mas também no sentido de se recomendar às políticas nacionais e à política comunitária um alargamento da base social dos estudantes Erasmus nos próximos 20 anos. Precisamente, o sucesso destes primeiros 20 anos aconselha e recomenda que esse passo significativo possa vir a ser dado.
Relativamente à mobilidade e ao sistema novo de garantia de mobilidade a que me referi na minha primeira intervenção, gostaria de insistir nalguns pontos.
O novo sistema vai permitir o seguinte: primeiro, o reingresso no mesmo curso, no caso de se ter frequentado o mesmo estabelecimento ou o mesmo curso, sem qualquer limitação quantitativa e com acreditação da totalidade da formação já adquirida.
Segundo: a mudança de curso, de um estabelecimento nacional ou estrangeiro, assegurando a conversão directa entre escalas de classificação de disciplinas realizadas no estrangeiro.
Terceiro: a transferência, com creditação da totalidade da formação obtida durante a anterior inscrição no mesmo curso ou no curso que o antecedeu, garantindo que o número de créditos a realizar para obtenção do grau não pode ser superior à diferença entre o número de créditos necessário para obtenção do grau e o valor creditado.
No que diz respeito ao reconhecimento dos graus académicos, terminaremos com o actual sistema obsoleto das equivalências, que já não vigora em matéria de doutoramentos, e estenderemos o actual sistema de reconhecimento de doutoramentos aos outros graus, à licenciatura e ao mestrado. Ou seja, o reconhecimento dos graus estrangeiros a todos os níveis passa a ser substituído por um procedimento de reconhecimento automático para todos os graus estrangeiros que tenham o mesmo nível e os memos objectivos que os correspondentes graus portugueses, como já acontece actualmente para os doutoramentos.
Além disso, é assegurada a conversão directa, para todos os efeitos legais, entre escalas das classificações finais dos graus estrangeiros.
Trata-se de uma revolução no sistema de mobilidade nacional e internacional de estudantes e de diplomados, cujo objectivo último é o reforço da capacidade de atracção para Portugal de portugueses ou estrangeiros com altas qualificações académicas e científicas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, antes de mais, gostava de dizer que registamos que, da parte do Sr. Ministro, não houve resposta a muitas perguntas e, especificamente, às que colocámos relativamente às questões dos 2000 docentes que, neste momento, estão em risco de ficar desempregados, já neste ano lectivo, dos bolseiros beneficiários da Acção Social Escolar que pagam as propinas máximas, dos estudantes que não podem pagar as propinas do 2.º ciclo, que, nalguns casos, já totalizam 3000 €, valor que o tão propagandeado aumento da Acção Social Escolar certamente não cobrirá, dos 3000 estagiários dos também «milagrosos» programas do Governo de inserção de estagiários na Administração Pública, sendo que nenhum deles ingressará nos quadros.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Zero!
O Orador: — Registamos também que o Sr. Ministro diz que está a debater a estratégia mas, ao mesmo tempo, anuncia-a, portanto está disposto a receber a bajulação mas a crítica, não. É um belo exemplo de debate!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Fica-lhe mal, como democrata!
O Orador: — «(…) Todos somos contra esta coisa absolutamente abominável. Está-se a contratar para as coisas mais inverosímeis do mundo, com base no estatuto do bolseiro, pessoas que deviam ser técnicos, funcionários e que estão a ser, pura e simplesmente, explorados como bolseiros. Parto do princípio que a política de impedir recrutar pessoas novas para os politécnicos e não alargar os quadros das universidades há-de acabar e que havemos de fazer tudo para acabar com ela. Não acho possível o País resistir durante muitos anos com o congelamento de quadros universitários e com o congelamento de quadros dos laboratórios do Estado. Isso, acho impossível (…)» Parece impossível, mas é verdade! Estas são palavras do actual Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Doutor Mariano Gago, em Maio de 2004.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não pode ser!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Lembra-se, Sr. Ministro?
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O Orador: — Como é que o Sr. Ministro faz corresponder as suas afirmações, até bastante efusivas — «abominável», «impossível» e por aí fora —, ao actual rumo que tem imprimido ao sistema tecnológico e científico nacional? Como é que há correspondência? Onde encaixam aqueles seus compromissos com a reforma dos laboratórios do Estado? Será que encaixam na diminuição de 30% na massa salarial que tem sido ordenada aos conselhos científicos e aos directores? Ou encaixarão na continuidade do congelamento das contratações e admissões, com a generalização continuada e a proliferação do recurso ao estatuto de bolseiro de investigação científica, os tais «explorados», segundo as palavras do Sr. Ministro? Como justifica o facto de estarem a chegar aos laboratórios do Estado propostas de futuros estatutos para os mesmos, muitas vezes com um prazo de dois ou três dias para a emissão de pareceres e propostas? O que leva o Sr. Ministro a insistir nesta estratégia de relação prepotente para com os conselhos científicos, não criando condições para um debate e para a participação dos que, no dia-a-dia, efectivamente se cruzam com os problemas? Como é possível que o Governo, incondicional fã do rigor e da disciplina, envie, por exemplo, para o Instituto de Tecnologia Nuclear (ITN) uma proposta de estatutos que, em vez de referir o ITN refere o Instituto de Investigação Científica Tropical e em que se revoga o decreto que cria o Centro Científico e Cultural de Macau?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Que grande rigor!
O Orador: — A este rigor e a esta disciplina chama-se outra coisa, Sr. Ministro: trapalhada! A esta a forma de tratar igualmente o que é diferente também se costuma chamar «chapa 5»! «Chapa 5» foi o que o Sr.
Ministro aplicou, ao ter feito copy, paste de estatutos para entidades que são diferentes.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Por último, o Sr. Ministro da Agricultura já disse, já desdisse, já anunciou, já corrigiu, já justificou o injustificável. Está tão consciente disso que afirma que, afinal, as instalações do Laboratório Nacional de Investigação Veterinária (LNIV), em Benfica, não só serão mantidas como serão beneficiadas.
O Sr. Presidente: — Pode concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — Vou concluir, Sr. Presidente.
Diz ainda o referido Ministro que o projecto de novas instalações em Oeiras, em que já foram investidos milhões de euros, prosseguirá finalmente.
Ora, o Sr. Ministro da Ciência e Tecnologia não tem qualquer posição sobre os destinos do LNIV. Mas mais importante é saber qual é a estratégia que pensa seguir para o LNIV, qual é a sua posição, num quadro em que o Ministro da Agricultura também anuncia que, apesar de tudo, novos recrutamentos, novos investimentos, novos reequipamentos serão reservados apenas às instalações do LNIV em Vairão.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, não creio que tenha havido qualquer pergunta que me tenha sido dirigida.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não houve?!
O Orador: — Nenhuma! Houve várias curiosas afirmações.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — É preciso ter «lata»!
O Orador: — Srs. Deputados, há algum nervosismo!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Indignação!
O Orador: — Contudo, gostaria de aproveitar os 3 minutos de que disponho para rebater essasa afirmações, que não são perguntas.
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Primeiro, não há 2000 docentes de ensino superior em risco de desemprego, há a tentativa dos Srs. Deputados de lançarem o pânico nos docentes do ensino superior.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Segundo, Sr. Deputado, este ano, existe crescimento, e ímpar, do orçamento para ciência e tecnologia, o que os Srs. Deputados bem gostariam de ver silenciado.
É a esse crescimento do orçamento para ciência e tecnologia que corresponde o aumento dos recursos humanos para ciência e tecnologia que, neste momento, está a verificar-se em Portugal, em todos os sectores, designadamente no sector público. É a isso que corresponde o aumento, neste domínio, de 1000 empregos para doutorados, em condições de competitividade internacional.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Então, por que é que mandam cortar os laboratórios?
O Orador: — É isto que está em causa, Srs. Deputados, e é isto que os senhores querem ignorar.
Aplausos do PS.
O Sr. Manuel Tiago (PCP): — Que descaramento!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É só isto?! Então, não respondeu a nada! Para que é que servem estes debates?! É só para nos ouvirmos uns aos outros?! O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, vou começar por uma questão que V. Ex.ª referiu há pouco.
Se o Sr. Ministro acha que é populismo os conselhos científicos das universidades e dos institutos politécnicos e os reitores das universidades informarem a sociedade que não têm dinheiro para pagar os salários até ao final do ano, se entende que isto é «caixa de ressonância» e populismo, então, estamos conversados sobre a matéria, Sr. Ministro.
Digo que estamos conversados sobre essa matéria se considera que as elites deste país estão a fazer populismo quando dão informações à sociedade. Digo-lhe, Sr. Ministro, que, sobre isso, estamos muito bem conversados! Estamos a chegar ao final deste debate pelo qual V. Ex.ª passou como «gato por brasas», muito levemente, sem nada querer dizer.
No que diz respeito à questão do desemprego e do subsídio de desemprego para os professores do ensino superior, V. Ex.ª conseguiu não responder a nenhuma das cinco ou seis perguntas que lhe foram colocadas.
No que se refere ao reforço de verbas para a Acção Social Escolar, o que está no Orçamento do Estado é um aumento de verbas comunitárias. O QREN não vai estar em vigor antes do final do ano lectivo em curso e muito dificilmente poderá ser aplicável no início do próximo ano lectivo.
Então, como vão ser pagas as verbas da Acção Social Escolar e qual vai ser o investimento em termos de residências universitárias e de melhoria das instalações dos serviços de refeições para os alunos das universidades e dos politécnicos? Como é que isso vai ser feito? A segunda questão, ainda relacionada com este tema, Sr. Ministro, é a seguinte: uma parte da verba da Acção Social Escolar vai ser gasta no apoio ao pagamento de juros aos empréstimos? A questão é muito simples: vão ser gastas verbas da Acção Social Escolar no apoio ao pagamento de juros aos empréstimos dos alunos do ensino superior? Espero a sua resposta, Sr. Ministro.
Uma outra questão que tem sido suscitada por algumas universidades — e espero que não me venha dizer que também é populista — é a dos contratos baseados no desempenho. As universidades e os politécnicos devem ser premiados pelo seu próprio mérito, por aquilo que vão fazendo de bem. Essa é, porém, uma questão ainda não referenciada nos novos projectos que V. Ex.ª tem para o financiamento do ensino superior.
Assim, pergunto: vai haver algum factor de correcção para aquelas universidades cujo desempenho fique acima da média, cujo desempenho seja excelente e justifique, por isso, que elas sejam compensadas através de financiamento extra? Finalmente, Sr. Ministro, diga-nos alguma coisa — deixo-lhe a pergunta para que nos diga o que achar mais conveniente — sobre a fusão entre universidades e politécnicos, sobre a alteração da rede do ensino superior público em Portugal.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — É que, sobre isso, também ainda nada disse. E se há reforma que faz sentido e sobre a qual é necessário sabermos algo em concreto é exactamente a da rede do ensino superior público.
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Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Abel Baptista, não tenha dúvida alguma de que a Acção Social Escolar será a que está orçamentada e a que for necessária será obviamente paga.
Não está previsto no orçamento deste ano — teria de ser no orçamento deste ano — qualquer pagamento de juros de empréstimos pela Acção Social Escolar. Nada disso foi previsto, nem está orçamentado. Se alguma vez esse assunto tiver de ser discutido, terá de ser previsto expressamente no Orçamento do Estado.
Entendemos, contudo, que a experiência de outros países mostra outra coisa: que é absolutamente essencial o reforço do sistema de fundo de garantia, que permita precisamente que os empréstimos possam fazer-se ao juro mais baixo possível. Esse é o ponto fundamental que em primeiro lugar temos de garantir, para que os estudantes não sejam obrigados a dar garantias reais para poderem ter acesso a empréstimos em excelentes condições.
O Sr. Deputado questionou-me sobre contratos de desempenho. Estamos de acordo — aliás, já o referi várias vezes. A passagem de um sistema de fórmula única de financiamento para, progressivamente, um sistema de contratos de desempenho com as instituições é a intenção do Governo em termos de financiamento das instituições públicas de ensino superior.
Sabemos, contudo, pela experiência de todos os outros países europeus, que esses contratos de desempenho têm partes comuns com o sistema tradicional de financiamento através de uma fórmula única, porque, senão, seriam contratos puramente arbitrários. Os parâmetros desses contratos de desempenho fazem as vezes de parâmetros de uma fórmula de financiamento. Já a actual fórmula de financiamento inclui parâmetros de desempenho, como seja, por exemplo, o sucesso escolar ou a qualificação do corpo docente.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Não é verdade!
O Orador: — Claro que é verdade, Sr. Deputado! E o reforço de mecanismos de contratos de desempenho, designadamente numa época de transformações e de reconversão das instituições de ensino superior é cada vez mais importante.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — E vai ser feito?
O Orador: — Vai ser feito! É essa a nossa proposta.
Hoje, o próprio sistema, que acrescenta à fórmula de financiamento uma fracção muito significativa de financiamento público, que são precisamente os contratos de investigação e desenvolvimento com as instituições, já é um mecanismo, numa área particular, a da investigação e desenvolvimento, de contrato de desempenho com as instituições.
Por último, Sr. Deputado, quanto à fusão entre as universidades e os politécnicos, gostava de deixar absolutamente claro o seguinte: defendemos o sistema binário, o reforço da qualificação dos institutos politécnicos, em Portugal, e o reforço da qualificação científica das universidades portuguesas. Não permitiremos, nem aceitaremos, a diluição do ensino politécnico em ensino universitário; não aceitaremos que instituições politécnicas deixem de sê-lo; não aceitaremos que se reduza a qualificação do ensino politécnico em Portugal; não aceitaremos que instituições do ensino politécnico entrem para as universidades para deixarem de ser instituições politécnicas.
Sabemos que existem, em Portugal, e bem, instituições universitárias que acolhem instituições politécnicas no seu seio, e outras instituições que têm escolas politécnicas dentro das universidades. Porém, nunca autorizaremos que essas escolas politécnicas deixem de ser escolas politécnicas. Que fique absolutamente claro este princípio! A colaboração entre universidades e politécnicos, a colaboração entre universidades entre si, a colaboração entre politécnicos entre si, a criação de graus conjuntos e a criação de programas de graduação conjuntos, com certeza! A diluição e a eliminação de escolas politécnicas através de processos corporativos de transformação de escolas politécnicas em faculdades e a passagem de professores do ensino politécnico a professores do ensino universitário, lamento muito mas seria um péssimo serviço prestado ao País.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à terceira, e última, volta de perguntas.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.
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O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, estamos na última volta deste debate, um debate que, ocorrendo num momento intermédio deste mandato, deveria servir para duas coisas: por um lado, para fazer uma retrospectiva de dois anos de mandato e, por outro, para eventualmente perspectivarmos o que aí vem nos restantes dois anos.
Quanto à primeira vertente, ao balanço dos dois anos de mandato, a conclusão do Partido Social Democrata já ficou aqui bem expressa: foram dois anos perdidos.
Protestos do PS.
Consideramos que, olhando para estes últimos dois anos, temos no ensino superior uma «mão cheia de nada». O balanço é extraordinariamente negativo e somos críticos daquilo que foi feito. V. Ex.ª, no Ministério do Ensino Superior, limitou-se a encomendar dois estudos internacionais e sentou-se à espera que os relatórios chegassem. Quanto ao resto, felizmente — e já aqui o dissemos —, as instituições desenrascaramse muito bem no desenvolvimento do Processo de Bolonha, apesar da omissão do Governo.
Quanto ao que aí vem, à perspectiva dos dois anos restantes, hoje, depois deste debate, temos infelizmente de concluir que continuamos como estávamos ontem. De facto, este debate nada trouxe de novo.
Foram repetidos alguns anúncios — uns constavam do Programa do Governo e, portanto, já têm dois anos e outros foram aqui feitos há alguns meses, num debate mensal com o Sr. Primeiro-Ministro — e continuamos, como antes, sem ter nada de concreto.
Por outro lado, o Sr. Ministro continua a não responder a muitas das questões que lhe são directamente colocadas, como já ficou aqui bem expresso em diversas intervenções.
Perante este enquadramento, vale a pena pensarmos como estamos hoje no ensino superior. E vale a pena dizer que o Governo está objectivamente envolvido num contexto extraordinariamente difícil para poder empreender uma verdadeira reforma no ensino superior. A verdade é que os diferentes agentes educativos, os diferentes agentes da sociedade civil que têm particular interesse nesta matéria estão, por um lado, a sentir-se ostracizados, por outro lado, a sentir-se hostilizados e, por outro ainda, desconfiados da acção do Ministério.
Ora, perante este contexto difícil, temos dúvidas de que o Sr. Ministro tenha não só coragem e determinação mas também discernimento suficiente para poder empreender a reforma de que o ensino superior carece.
Nesse sentido, o que quero dizer, em nome do Partido Social Democrata, no encerramento deste debate, é que, apesar de tudo, o nosso sentido de responsabilidade leva-nos a concluir que existe hoje uma oportunidade para fazermos uma grande reforma no ensino superior, projectando-o para aquilo que é a realidade do século XXI no nosso país.
O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — Mas é isso que está a ser feito!
O Orador: — Sr. Ministro, não é tanto uma pergunta que lhe deixo, mas, antes, um repto, um desafio: da parte do Partido Social Democrata, enquanto partido líder da oposição, existe a disponibilidade, digo até a vontade, para que se altere aquilo que tem vindo a ser o rumo do ensino superior no nosso país, nomeadamente perante a inacção destes últimos dois anos, para que possamos agora, de facto, dar o passo em frente.
O Sr. Luíz Fagundes Duarte (PS): — Em três anos vocês não o fizeram!
O Orador: — Poderá contar connosco, responsavelmente, para isso.
Devo dizer-lhe — tenho ouvido as suas intervenções com agrado — que V Ex.ª muitas vezes se refere a um consenso tão abrangente quanto possível. Evidentemente que não se trata de um consenso a todo o custo, mas tão abrangente quanto possível. Registamos isso! Mas, Sr. Ministro, muitas vezes, a retórica é uma coisa e a acção, infelizmente, é outra completamente distinta.
Julgo que a população portuguesa, o País, precisa de ter garantias de que V Ex.ª não vai assumir aquela postura, por vezes mais fácil, de querer o consenso, avançando com ideias e propostas que, na nossa óptica, em certas circunstâncias, ficarão muito aquém do desejável, e depois dizer que quem quiser que venha atrás.
Não pode ser assim, Sr. Ministro! Gostaríamos, pois, de saber se o Sr. Ministro está ou não disponível para, com a sociedade civil, com os partidos da oposição, nomeadamente com o Partido Social Democrata, empreender, de base, uma mudança de paradigma no nosso ensino superior.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Como sabe, o PSD apresentou, quase há um ano, propostas concretas aqui na Assembleia da República. Portanto, fizemos o nosso «trabalho de casa» já há muito tempo, aguardando aquela que é a postura do Governo, nomeadamente o surgimento de ideias mais concretas.
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Quando estiverem reunidas essas condições, pode contar com o sentido de responsabilidade do PSD para todos construirmos um melhor ensino superior, porque, sinceramente, penso que temos de recuperar dos dois anos perdidos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, se eu passar por cima dos «dois anos perdidos», também lhe posso responder que foram dois anos perdidos de oposição, e ficávamos iguais.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Essa, por acaso, é uma boa abordagem! São cada vez mais iguais!
O Orador: — Mas não gostaria de entrar nesse diálogo. Pretendo, sim, insistir no seguinte ponto: não é verdade, Sr. Deputado, que as orientações, obviamente não o articulado, não sejam conhecidas. São conhecidas! Eu próprio, muito recentemente, tive ocasião de expô-las, de publicá-las e de suscitar e solicitar o debate no Conselho Nacional de Educação sobre esta matéria.
E, em primeiro lugar, é preciso que fique absolutamente claro se estamos de acordo ou em desacordo relativamente a essas orientações. Isto, porque essas orientações são discutíveis e entendemos que podem ser discutidas. Ora, é, com certeza, muito mais fácil avançar com base nessas orientações do que em tecnicidades. Não se trata da tecnicidade de saber como é que, em detalhe, é constituído o órgão máximo desta ou daquela instituição, não se trata de saber se o regime é de opting in ou de opting out, mas sim de saber se estamos de acordo em que temos de avançar para um aumento drástico do número de diplomados, que esse aumento se vai acentuar essencialmente no sector do ensino politécnico, que reforçamos o sistema binário, que reforçamos as pós-graduações e internacionalização do sistema; que reforçamos a capacidade científica e técnica das instituições e a sua capacidade de gestão.
Tudo isto são alterações significativas ao modelo existente e são orientações que propomos. Propomos estas orientações, não as impomos, porque estamos convencidos delas, mas estamos dispostos a ouvir argumentos que as corrijam, que as melhorem, que as completem.
O detalhe destas orientações no ponto em que, precisamente, permite a abertura de todos, dos diferentes actores políticos e dos diferentes actores sociais, está feita e exposta..
Disse, há pouco, na minha intervenção inicial que não dispunha de tempo para expor em detalhe cada uma dessas orientações, que, insisto, o Ministério tornou públicas — solicitou a órgão próprio o debate nacional sobre esta matéria — e que estão à disposição da Câmara, mas quero, neste momento final do debate, salientar a sua intervenção, Sr. Deputado: sentir que existe uma responsabilidade — também a sinto —, que existe uma oportunidade e que essa oportunidade e responsabilidade podem ser cumpridas, e devem sê-lo da melhor maneira possível por todos nós.
Estou convencido de que não só é possível como é absolutamente imperativo que se faça, agora, uma reforma do ensino superior em Portugal. O tempo perdido relativamente ao resto da Europa não tem, neste momento, dimensão; o País desconhece a distância a que está de grande parte do sistema de ensino superior desenvolvido do resto da Europa.
Conhecem essa realidade os profissionais do sistema de ensino superior mais competentes e mais internacionalizados, mas parte do sistema de ensino superior desconhece-a, assim como a maior parte do País também a desconhece. É, por isso, indispensável que os actores políticos, em Portugal, tenham consciência de que está em jogo um elemento central para o futuro do País e que não há tempo a perder.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte.
O Sr. Luiz Fagundes Duarte (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, quando falamos em ciência e ensino superior em Portugal, pelo menos no plano dos princípios e das opções políticas, perpassa por esta Câmara um curioso espírito de consenso.
De repente, todos descobriram que estão diagnosticados todos os problemas do ensino superior e da investigação científica em Portugal, todos chegaram à conclusão que é necessário fazer muita coisa para promover o desenvolvimento da investigação científica, mas, curiosamente — e é bom referir isto aos partidos que se sentam à nossa direita —, é agora que estamos a encontrar alguns caminhos, algumas propostas concretas, e já no terreno, para a resolução desses problemas.
O PSD aparece aqui numa postura de «anjo da espada de fogo», que chega aqui de espada em riste e divide o mundo em «bons e maus»: os «bons» seriam o PSD e o CDS-PP, quando estiveram no governo,…
Vozes do CDS-PP: — Ora, bem lembrado!
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O Orador: — … que diagnosticaram os problemas — mas não conseguiram resolver um que fosse!; os «maus» seriam aqueles que, de facto, estão a trabalhar e a produzir um edifício legislativo que, pela primeira vez, em muitos anos, vai permitir que o ensino superior e a investigação científica, em Portugal, tenham aquele desenvolvimento que todos nós queremos.
Srs. Deputados do PSD e do CDS-PP, estamos aqui a falar de coisas sérias. É verdade que passaram dois anos desde que este Governo tomou posse, mas esses dois anos foram passados a analisar a situação que os senhores deixaram, a preparar legislação, a ler os relatórios técnicos que os senhores não leram, porque aqueles que foram feitos no vosso âmbito não chegaram a produzir qualquer resultado prático.
Na verdade, os resultados estão agora a aparecer, depois de ter sido aqui anunciado um pacote legislativo com datas. Sr. Ministro, estamos à espera que esses decretos-leis finalmente apareçam e estamos convencidos de que, até ao final desta sessão legislativa, o edifício legislativo necessário para o desenvolvimento do ensino superior e da investigação científica em Portugal estará pronto. Confiamos que assim será e, sobretudo, temos a certeza de que as universidades, os politécnicos e os investigadores vão saber aproveitar (e pôr no terreno) tudo o que está a ser consolidado no plano legislativo e no plano da governação neste momento.
Sr. Ministro, uma vez que há um certo «ruído» na Sala, gostaria que reforçasse um aspecto, já referido por V. Ex.ª e salientado por alguns partidos, e explicasse melhor quais são as grandes medidas que o seu Ministério vai tomar no imediato para definir e rentabilizar da melhor maneira o sistema binário universidade/politécnico e, sobretudo, quais são os benefícios que o sistema de ensino superior em Portugal vai receber dessa redefinição do sistema binário. Ao mesmo tempo, pergunto como é que ele se integra no processo de internacionalização do ensino superior e da investigação científica portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
O Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte, nestes dois anos, além de se proceder a todos os estudos que eram necessários para a tomada de decisão colectiva, foram feitas alterações extraordinariamente significativas que estão no terreno — Processo de Bolonha, Lei de Bases do Sistema Educativo, regime que simplifica e flexibiliza o acesso ao ensino superior a maiores de 23 anos, cursos de especialização tecnológica, racionalização da oferta de cursos superiores, exigência no acesso e, neste momento, mobilidade, avaliação e acreditação.
O Sr. Deputado pergunta-me como rentabilizar o sistema binário. Esta é uma questão central porque, durante anos, um grande número de institutos politécnicos viveram num contexto de indefinição da política de clarificação do que era o sistema binário.
O desenvolvimento de um politécnico é a sua conversão num excelente politécnico; o desenvolvimento de uma universidade é a sua conversão numa excelente universidade. O horizonte de um curso de natureza politécnica não é a sua conversão num curso de idêntica temática da universidade.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Isso é verdade!
O Orador: — E isso tem implicações.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Monsieur de La Palice não diria melhor!
O Orador: — O Monsieur de La Palice dizia outras coisas… Não sei se o leu!?
O Sr. Luís fazenda (BE): — É um autor reaccionário!
O Orador: — Do ponto de vista das universidades, esse problema foi resolvido através da sua internacionalização.
Foi o sistema de internacionalização das universidades portuguesas (contrário às velhas universidades em Portugal, isoladas) que permitiu que gerações sucessivas de docentes universitários tivessem a possibilidade de marcar um horizonte e de dizer: queremos que os nossos departamentos, os nossos cursos, os nossos centros de investigação sejam como os das melhores universidades do mundo nestas áreas.
Idêntico processo de internacionalização não esteve à disposição dos institutos politécnicos.
Os institutos politécnicos portugueses, salvo raríssimas excepções, não estão envolvidos em redes internacionais de institutos politécnicos das mesmas áreas, não conhecem a actividade politécnica dos países onde o sistema binário é essencial para o funcionamento da economia e da sociedade e desconhecem, portanto, qual o horizonte a que devem referir-se quando procuram caminhos de progresso para o seu instituto.
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É esse o mecanismo que o Governo vai pôr no terreno com esta afirmação do sistema binário, no que diz respeito aos politécnicos.
No que diz respeito às universidades, o reforço do topo das universidades, o reforço da sua qualificação científica e, muito em breve — já o anunciámos no nosso programa e está, neste momento, em curso de transformação no calendário que estava previsto, ou seja, este ano —, o reforço da reorganização do sistema de centros de investigação universitários em Portugal irá permitir a sua consolidação em massas críticas significativas.
É este o futuro de progresso que queremos, quer para o sistema universitário quer para o sistema politécnico, insistindo, naturalmente, para que haja colaboração entre ambos, actividade conjunta e actividades de investigação científica em que docentes dos institutos politécnicos e docentes das universidades não se dividam por múltiplas «capelinhas» mas participem das mesmas unidades de investigação ou de prestação de serviços.
Todavia, deve ficar absolutamente claro qual é a missão fundamental, separada dos institutos politécnicos e das universidades.
Cursos de especialização tecnológica nos institutos politécnicos, naturalmente, e nunca, em regra, nas universidades; pós-graduações nas universidades, mas também ao nível de mestrado profissional nos institutos politécnicos, isto sem confusão de princípios entre um e outro, como estabelece a lei.
Esta clarificação só pode ser benéfica para ambos os sectores e, portanto, para o País.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Bernardino Soares pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Para interpelar a Mesa sobre a condução dos trabalhos, Sr.
Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, apenas queria exprimir a ideia de que este debate, proposto pelo Sr. Presidente em Conferência de Líderes, se justificou plenamente, e só não se justificou mais porque, de facto, o Sr. Presidente não pode controlar a efectividade das respostas que o Governo tem de dar a esta Câmara.
O Governo não respondeu a inúmeras questões, e não se trata aqui de um problema de política errada que está a ser seguida neste sector mas, sim, de um desrespeito para com a Assembleia da República e os poderes dos Deputados.
Vozes do PCP: — Exactamente!
O Orador: — É evidente que quando a propaganda do Governo não resiste à realidade concreta, as dificuldades são muito grandes. E quando temos respostas feitas apenas de frases de conveniência, às vezes a roçar o insulto, estamos perante uma atitude de total desrespeito para com a Assembleia da República, o que não queríamos deixar de registar com o nosso protesto.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Igualmente para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, uso da palavra exactamente para o mesmo efeito, para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos.
Estou de acordo com a primeira afirmação do Sr. Deputado Bernardino Soares, a de que este debate foi muito útil. Mas não consigo resolver o problema do Sr. Deputado Bernardino Soares quando, manifestamente, no fim do debate, descobriu que tinha gerido mal as intervenções da sua bancada…
Risos do PS.
Protestos do PCP.
… e tentou fazer uma intervenção final para disfarçar esse fraquíssimo desempenho.
Vozes do PS: — Muito bem!
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O Orador: — Esse é um problema que não consigo resolver ao Sr. Deputado Bernardino Soares, pois é da responsabilidade da direcção da bancada do Partido Comunista Português escolher a forma como quer intervir no debate.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Essa agora! O Governo não respondeu a nada!
O Orador: — A substância do debate ficou claríssima: há um sistema de ensino superior português que está em movimento, e esse movimento tem uma orientação, que é a de acompanhar as melhores práticas internacionais no espaço europeu de ensino superior; e há uma posição conservadora, imobilista, representada aqui, melhor do que ninguém, pelo Partido Comunista Português.
Vozes do PCP: — Isso é falso!
O Orador: — Se outra utilidade o debate não tivesse tido, teria essa — que é a utilidade própria dos debates políticos —, a de clarificar, de confrontar as posições para que as pessoas que nos ouvem possam perceber quem está a favor e quem está contra o processo de mudança no ensino superior.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, estão concluídos os nossos trabalhos.
A próxima reunião plenária realizar-se-á quarta-feira, às 15 horas, tendo como ordem de trabalhos o debate mensal com o Primeiro-Ministro.
Sr.as e Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 12 horas e 20 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS)
Alberto Arons Braga de Carvalho
António Ribeiro Gameiro
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Paula Cristina Nobre de Deus
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Partido Social Democrata (PSD)
António Paulo Martins Pereira Coelho
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Miguel de Santana Lopes
Partido Comunista Português (PCP)
José Honório Faria Gonçalves Novo
Partido Popular (CDS-PP)
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS)
António Ramos Preto
João Barroso Soares
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
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Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Partido Social Democrata (PSD)
António Joaquim Almeida Henriques
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Partido Comunista Português (PCP)
José Batista Mestre Soeiro
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS)
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Partido Social Democrata (PSD)
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Domingos Duarte Lima
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
José de Almeida Cesário
José Manuel Pereira da Costa
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Sérgio André da Costa Vieira
Zita Maria de Seabra Roseiro
Partido Comunista Português (PCP)
Maria Luísa Raimundo Mesquita
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL