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Sexta-feira, 23 de Março de 2007 I Série — Número 63

X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE MARÇO DE 2007

Presidente: Ex.mo Sr. Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Antes da ordem do dia. — Em declaração política, o Sr. Deputado João Oliveira (PCP) criticou a política educativa do Governo e, depois, deu resposta aos pedidos de esclarecimento da Sr.ª Deputada Cecília Honório (BE).
Em declaração política, o Sr. Deputado Mendes Bota (PSD) insurgiu-se contra a escolha do nome «Allgarve» para a campanha promocional da região algarvia e, no fim, respondeu aos pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado David Martins (PS) e ao protesto do Sr. Deputado Renato Leal (PS).
Também em declaração política, a Sr.ª Deputada Cecília Honório (BE) chamou a atenção da Câmara para as dificuldades laborais por que passam os profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual, após o que respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados João Oliveira (PCP) e Teresa Caeiro (CDS-PP).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Marcos Sá (PS), a propósito da comemoração do Dia Mundial da Água, falou dos recursos hídricos e respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Eduardo Martins (PSD), Miguel Tiago (PCP) e Francisco Madeira Lopes (Os Verdes).
O Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), ainda em declaração política, e também a propósito da comemoração do Dia Mundial da Água, manifestou-se contra a política levada a cabo pelo Governo no que diz respeito aos recursos hídricos.
O Sr. Deputado Luís Montenegro (PSD) lembrou a situação em que se encontra a empresa Rohde, em Santa Maria da Feira, em que estão em risco postos de trabalho, e condenou a acção governativa em matéria de política económica. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Afonso Candal (PS) e Jorge Machado (PCP).
Ordem do dia. — Foi discutido o parecer, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, no sentido de indeferir o recurso, interposto pelo PSD, da admissão pela Mesa do projecto de

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I SÉRIE — NÚMERO 63 2 lei n.º 366/X — Determina a equiparação entre os Deputados à Assembleia da República e os Deputados às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas em matéria de incompatibilidades e impedimentos (PCP), que foi aprovado. Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Hugo Velosa (PSD), António Filipe (PCP), Ana Catarina Mendonça (PS), Pedro Mota Soares (CDS-PP), Luís Fazenda (BE) e Bernardino Soares (PCP).
Procedeu-se à discussão do projecto de resolução n.º 175/X — Recomenda ao Governo um programa de apoio às pequenas e médias empresas (PSD), tendo sido rejeitado.
Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Almeida Henriques (PSD), Hortense Martins (PS), Hugo Velosa (PSD), Diogo Feio (CDS-PP), Agostinho Lopes (PCP), Luís Fazenda (BE) e Ventura Leite (PS).
A Câmara aprovou o voto n.º 90/X — De congratulação pela atribuição do Prémio Camões ao escritor António Lobo Antunes (PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE e Os Verdes).
Em votação global, foram aprovadas as propostas de resolução n.os 43/X — Aprova as emendas ao Estatuto da Conferência da Haia de Direito Internacional Privado, adoptadas em Haia, a 30 de Junho de 2005, 44/X — Aprova, para ratificação, o Acordo de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal entre a República Portuguesa e a República Argentina, assinado em 7 de Abril de 2003, e 46/X — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e a Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China sobre os Privilégios Fiscais Aplicáveis às suas Delegações e Membros do seu Pessoal, assinado em Lisboa, em 23 de Junho de 2006.
Foram também aprovados diversos pareceres da Comissão de Ética autorizando Deputados do PS e do PSD a deporem no âmbito de processos que correm em tribunal.
Procedeu-se, ainda, à apreciação conjunta dos projectos de resolução n.os 184/X — Suspensão do processo de encerramento de serviços de urgência em hospitais e centros de saúde (PCP) e 185/X — Recomenda ao Governo uma orientação para o processo de implementação do plano de requalificação das urgências hospitalares (BE), sobre os quais se pronunciaram, a diverso título, os Srs. Deputados Bernardino Soares (PCP), Ricardo Gonçalves (PS), João Semedo (BE), Ana Manso (PSD), Teresa Caeiro (CDS-PP), Manuel Pizarro (PS) e Francisco Madeira Lopes (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a ses-
são.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Marques Antunes
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira

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Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José dos Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Victor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Alfredo Delgado da Silva Preto

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António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Jorge Martins Pereira
Domingos Duarte Lima
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Jerónimo Carvalho de Sousa

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José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Miguel Tiago Crispim Rosado

Partido Popular (CDS-PP):
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Hélder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A actuação do actual Governo do Partido Socialista em matéria educativa tem-se traduzido num fortíssimo ataque ao sistema educativo público, consubstanciado na degradação das suas condições de funcionamento e no ataque à função docente e aos professores.
O Governo do PS já percebeu que não há sistema educativo que resista à desmotivação dos seus profissionais e parece mesmo ter encontrado neste factor a alavanca com que pretende arrombar o edifício educativo público português.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Responsabilizando os professores pelos problemas das escolas, pretendendo transformálos em profissionais sem brio nem dignidade e atacando a sua condição e os direitos laborais, o Governo tenta destruir a motivação dos professores portugueses e as condições de exercício da docência, para assim justificar novas vagas da mesma ofensiva.
A revisão do Estatuto da Carreira Docente é o mais recente exemplo dessa táctica. O Governo impôs aos professores portugueses uma revisão feita contra os seus direitos, contra a dignidade da função docente e contra os interesses do sistema educativo e da escola pública. A união, pela primeira vez, de todas as estruturas sindicais de professores na rejeição das soluções impostas pelo Governo demonstra bem o carácter desta revisão e a postura autoritária e arrogante com que foi levada a cabo.
Mas o Partido Socialista não se ficou por aqui. Na passada terça-feira, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista votou contra todas as propostas apresentadas, aquando da apreciação parlamentar do DecretoLei n.º 15/2007, promovida pelo PCP. As cerca de 70 propostas de alteração àquele diploma que apresentámos foram todas recusadas pelos Deputados do PS, que, assim, subscrevem o entendimento e as solu-

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ções do Governo.
Afinal, as medidas de perseguição aos docentes e às suas organizações sindicais ou de degradação da condição profissional dos professores e educadores portugueses não agradam só ao Governo.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista subscreve a existência de uma prova que dificulta o acesso à profissão e a criação de categorias hierarquizadas numa carreira que era única; aceita que se estabeleçam constrangimentos administrativos de acesso ao topo da carreira para a esmagadora maioria dos docentes; aceita a existência de um sistema de avaliação dos docentes, baseado em critérios como as taxas de abandono escolar, os resultados académicos dos alunos ou a apreciação da actividade lectiva pelos encarregados de educação, que impõe a existência de quotas na atribuição das classificações mais elevadas do processo de avaliação, contrariando o discurso do mérito tantas vezes repetido: e aceita ainda o agravamento das condições de precariedade laboral a que estão sujeitos tantos milhares de docentes contratados e a introdução de factores de instabilidade, que se estendem aos docentes dos quadros, ameaçados com a mobilidade, e os quadros de supranumerários.
Esta postura revela a total insensibilidade do PS e do Governo para a discussão de alternativas às suas próprias soluções, deixando bem claro o cunho autoritário e prepotente da actual maioria absoluta.
Afinal, não é só o Ministério da Educação que entende não aceitar as críticas e as propostas apresentadas pelos sindicatos na discussão dos diplomas legislativos, também a maioria do PS na Assembleia da República se recusa a aceitar qualquer proposta da oposição.
É, aliás, elucidativo da obstinação do PS que ontem, a propósito do Dia Mundial da Poesia, a Sr.ª Ministra da Educação tenha citado uma frase do poeta Herberto Hélder quando ele diz que «A poesia é feita contra todos».
Ao contrário daqueles que entendem que esta obstinação se deve a alguma forma de autismo, o PCP encontra nesta postura e no conteúdo concreto das medidas em causa o sentido claro de opções políticas de que o PS não se quer desmarcar e que, pelo contrário, aprofunda e agrava. É o sentido de opções políticas que, ano após ano, governo após governo, promovem a degradação de serviços públicos e o seu encerramento, degradam as condições de funcionamento da Administração Pública e promovem a sua privatização. No fundo, é o sentido das políticas responsáveis pela profunda crise social que hoje o País atravessa e que uma política de esquerda impunha alterar.
Por serem estas as opções do Partido Socialista, teremos, em Portugal, uma docência desfigurada na sua condição, trabalhadores mutilados nos seus direitos laborais e humilhados na sua condição de educadores, funcionários públicos desmotivados e perseguidos no cumprimento da sua função. Teremos, enfim, uma escola pública mais pobre, com maiores dificuldades em cumprir o objectivo de elevar a formação de todos os portugueses e empurrada para lógicas de funcionamento incompatíveis com a qualidade de ensino.
Da parte do PCP não deixaremos de assumir a necessidade de combater estas orientações, na defesa dos interesses do povo e do desenvolvimento do País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, eu tinha pedido a palavra para pedir esclarecimentos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É o silêncio socialista!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — A Sr.ª Deputada tem de se inscrever mais cedo. Creio que neste momento já não é possível, a não ser que o Sr. Deputado Mendes Bota aguarde um bocadinho…

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, eu aguardo.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Então, embora ligeiramente atrasada, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório para pedir esclarecimentos.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, muito obrigada pela sua cortesia. Não estou, garantidamente, atrasada no tema que o Sr. Deputado João Oliveira aqui nos trouxe, que é, evidentemente, um tema da máxima prioridade e urgência para o País.
Sr. Deputado João Oliveira, este Governo humilhou os professores, culpabilizou-os por aquilo que entendeu durante os últimos anos e, como se não chegasse, impôs-lhes um estatuto que fractura a carreira em duas, estabelece condições limitativas de acesso ao topo da carreira e condiciona o futuro e a qualidade da escola pública em Portugal.
Quando se esperava motivação dos profissionais, quando se esperava qualidade nas nossa escolas, o ministério impõe um estatuto que é às avessas de tudo aquilo que as escolas, os alunos e os professores

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poderiam esperar.
E o que é que o Partido Socialista faz em relação a tudo isto, quando tinha a oportunidade de corrigir estas desigualdades? O Partido Socialista diz que está tudo bem, que é assim mesmo, que a Sr.ª Ministra tem razão e que está muito bem neste caminho que está a seguir de desfalque da escola pública e do papel dos professores.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Um vergonha!

A Oradora: — O Partido Socialista diz que sim, que a qualidade só se pode avaliar com quotas; o Partido Socialista diz que sim, que sete anos de apreciação curricular chegam e bastam para apreciar 20 e 30 anos de uma carreira. É a isto que o Partido Socialista diz que sim!! Sr. Deputado João Oliveira, quero perguntar-lhe — agradecendo e sublinhando a importância da sua intervenção — se considera que a Assembleia da República deve pactuar com a máxima ilegalidade de considerar para a avaliação dos professores as faltas dadas por motivos de doença, para assistência a menores ou por morte de familiares. Esta saga vai, garantidamente, continuar, por isso eu queria ouvir a sua opinião sobre esta matéria.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, começo por dizer-lhe que a sua pergunta é natural, o que não é natural é o silêncio do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — E este silêncio demonstra o comprometimento que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista não pode deixar de sentir ao subscrever medidas impostas pelo Governo ao arrepio da opinião e da sensibilidade daqueles que todos os dias constroem a escola pública portuguesa e daqueles que todos os dias têm de desempenhar a sua actividade em condições difíceis, impostas por erradas orientações políticas deste Governo e de governos anteriores.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Perante esta realidade, aquilo que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista entende é que deve subscrever estas opções políticas do Governo.
Ora, este contexto é agravado pela recusa das cerca de 100 propostas de alteração, 70 das quais apresentadas pelo Partido Comunista Português, que permitiriam, de facto, dar resposta a alguns dos mais graves problemas, de que é exemplo a questão que referiu e que eu também já tinha referido na minha intervenção de tentar fracturar numa carreira única, procurando virar professores contra professores e que se instale, de facto, um clima de inveja e de competição, que em nada favorece a melhoria do ensino e a qualidade do sistema educativo português.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Para terminar, Sr.ª Deputada, importa realçar uma nota, que também já tive oportunidade de referir na minha intervenção: é que, de facto, não se pode atribuir a esta postura do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e do Partido Socialista no seu todo, que apoia as orientações deste Governo, qualquer caracterização de autismo, porque, como já referi na minha intervenção, estas são opções que claramente marcam o rumo que o Partido Socialista entende que deve ter a escola pública, que é um rumo de degradação consciente das suas condições de funcionamento e de ataque deliberado aos direitos dos professores e à condição da docência em Portugal.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Agora, mesmo a sério, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota para uma declaração política.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No passado dia 16 de Março, em Lisboa, o Ministro da Economia fez a apresentação pública de uma campanha promocional anunciada como «Projecto de Valorização do Algarve 2007 e a sua marca».
De forma inesperada, o nome da região foi objecto de um trocadilho, adoptando um anglicismo desajus-

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tado, desnecessário e descaracterizador da sua identidade.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!

O Orador: — As reacções não deixam dúvidas sobre a rejeição que a ideia suscitou na sociedade algarvia, e não só, a qual tem manifestado um vivo repúdio por mais esta desconsideração do Governo para com a região, que, segundo a pomposa campanha apresentada pelo Ministro da Economia, deixará de ser conhecida internacionalmente por Algarve, para se passar a chamar «Allgarve».

O Sr. Horácio Antunes (PS): — Não é o Algarve, é a campanha!

O Orador: — Os argumentos em sua defesa são patéticos. Não necessitamos do abcesso inglês all para designar «todo o Algarve». Há muitas décadas que a marca Algarve está consolidada no mercado, e proceder a esta alteração só poderá servir para confundir um nome que, a par do Vinho do Porto, é dos poucos de que Portugal se pode orgulhar à escala mundial.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Ao que se sabe, o Governo colocou em «cima da mesa» três alternativas, qual delas a pior: «Algarvis», «Algarve Affair» e «Allgarve», o nome de todas as polémicas.
Não estão em causa os eventos previstos, nem as acções promocionais, nem os meios financeiros colocados, sem favor algum, ao serviço da promoção do Algarve; está em causa, tão somente, o nome «Allgarve». Trata-se de uma afronta ao bom e verdadeiro nome do Algarve, um golpe na coerência de uma marca consolidada internacionalmente há muitos anos, mais um estrangeirismo descaracterizador da nossa identidade cultural e uma demonstração de falta de bom gosto e de bom senso.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!

O Orador: — É verdade que o Ministro da Economia já tinha passado incólume em 2006, quando brincou com o nome de Portugal. Só que a campanha-relâmpago intitulada «Portugall Summer», anunciada no final de Julho para derreter 1,5 milhões de euros logo nas primeiras duas semanas de Agosto, esgotou-se em meia dúzia de eventos, cujo saldo variou entre o fiasco e uns quantos banquetes para auto-exibição de um vistoso naipe do chamado jet-set nacional.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Mas o Sr. Ministro da Economia não pensa, não tem tempo para pensar, desdobrado que anda a presidir a banquetes e a cortar fitas do PowerPoint.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Já não é mais possível calar o atropelo ao Algarve, região mártir da actuação deste Governo, verdadeiro celeiro fiscal do País, por via da sua indústria turística, que vê minguadas as contrapartidas de investimento público central, abaixo de um patamar onde o miserabilismo se transforma em desprezável gorjeta.
Já não é só o trágico desfiar de um conjunto de promessas eleitorais, até agora incumpridas na sua totalidade, pomposamente apresentadas aos eleitores algarvios, em Fevereiro de 2005, sob o título de «Uma Nova Agenda para o Algarve», hoje transformada numa verdadeira «Agenda Zero».
Desde logo, à cabeça, a regionalização, cuja rápida implementação foi despachada para as calendas incertas de 2012, num exemplo de rapidez à escala jurássica.
A construção do Hospital Central do Algarve era tão prioritária que até hoje não passou do papel da «comissão de sábios».

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — É verdade!

O Orador: — A criação de uma faculdade de Medicina foi rapidamente esquecida e até o curso de Medicina continua a aguardar a luz verde de um ministro cinzento, que tem repetido, à saciedade, que não quer mais faculdades de Medicina nem mais cursos de Medicina em Portugal.
Os pólos tecnológicos não passaram do papel; o Programa Polis não sofreu qualquer impulso novo; o avanço das soluções ferroviárias ligeiras de carácter suburbano e regional continua fora dos carris; a navegabilidade dos rios Guadiana e Arade atolou-se na lama; a garantia absoluta de não introduzir portagens na Via do Infante deixou de garantir o que quer que seja; e a construção da barragem de Odelouca, até agora,

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não arrancou…

O Sr. Afonso Candal (PS): — Vai arrancar!

O Orador: — … e será financiada por um empréstimo bancário, o que significa repercutir a dívida no preço da água. Ou seja: o dinheiro sai dos dois bolsos dos algarvios, do da direita para os impostos e do da esquerda para a factura da água.
O Algarve é a região mártir da Europa às mãos de um Governo insensível, arbitrário e autoritário.
Apanhada no golpe estatístico do alargamento da União Europeia, a região do Algarve é a única das 13 regiões europeias em situação de saída do Objectivo 1 que leva pancada às três tabelas.
De um dia para o outro, o Algarve vai perder, nos próximos sete anos, 55% dos fundos europeus, na comparação com o que recebeu nos últimos sete anos, ou seja, vai perder em cada dia, incluindo sábados, domingos e feriados, durante 2 555 dias, um investimento global de, pelo menos, cerca de 0,5 milhões de euros/dia.

Vozes do PSD: — Uma vergonha!

O Orador: — A nova Lei das Finanças Locais coloca as autarquias do Algarve na primeira linha dos principais perdedores e o PIDDAC para o corrente ano de 2007 representa apenas 31% do que foi há seis anos atrás.
Este é o Governo do fecha: o Governo já fechou ou prepara-se para fechar no Algarve serviços de saúde de urgência, extensões de saúde, postos da GNR, escolas primárias, delegações de apoio à pesca e à agricultura. Até o Consulado de Portugal em Sevilha este Governo queria encerrar. De facto, aqui, há que reconhecer, há obra. Há obra, mas apenas neste terreno.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Mas as malfeitorias deste Governo e deste Ministro da Economia não se ficaram por aqui.
À revelia de todos os responsáveis políticos e dos representantes das forças vivas do Algarve, no secretismo dos gabinetes, ignorando as denúncias e os protestos, o Governo entregou por 55 anos a pesquisa e a exploração de petróleo e gás natural frente à Costa Vicentina e prepara-se para fazer o mesmo relativamente à frente de mar da Ria Formosa, de Faro a Vila Real de Santo António, colocando, assim, toda a região do Algarve em risco de desastre ambiental, e sem qualquer benefício para os algarvios.
Estranha-se esta contradição de um Governo que tem alguma obra no avanço para as energias alternativas e renováveis, mas que, ao mesmo tempo, está a amarrar o País, por mais de meio século, a um ciclo do petróleo, de que os países mais desenvolvidos do planeta se querem libertar o mais rapidamente possível.
Porquê esta tentação serôdia de ingressar no clube dos países produtores de petróleo? Para quê aumentar exponencialmente o risco ambiental de todo o litoral da costa alentejana e algarvia, dos ecossistemas existentes e das praias, que são o principal activo da indústria turística actual e futura? Porque não se esclarece o povo português que, a haver petróleo, como tudo indica que haja, isso não significa nem gasóleo, nem gasolina mais barata, nem preços preferenciais, pois, por lei e por contrato, o petróleo pertence às empresas concessionárias, que o venderão a quem quiserem aos preços de mercado?

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Porque não houve, nem há, o cuidado de, pelo menos, introduzir nos contratos de concessão uma cláusula de flexibilidade ou de salvaguarda que permita ao Governo português, daqui a 5 ou 10 anos, qualquer que seja o governo, impedir a passagem da fase da prospecção para a fase da exploração se razões ambientais ou de política energética desaconselharem, na altura, a extracção do petróleo?

O Sr. Afonso Candal (PS): — Já vai na extracção!

O Orador: — É necessário dizer aos portugueses que as contrapartidas miseráveis a receber pela extracção de petróleo oscilam — vejam bem! — entre os 10 e os 25 cêntimos por barril para os Blocos 13 e 14 frente à Ria Formosa, sendo que cada barril contém 159 litros. Ou seja: o Estado português receberá a ridícula quantia de 0,6 cêntimos por cada litro de crude, por exemplo, no caso do Bloco 13.
É um grande, grande, grande, negócio…!! E está-se a ver quem é que esfrega as mãos de contente.
Refira-se ainda que o IRC aplicável, só o será se a sede do consórcio concessionário for localizada em Portugal.
O Estado receberá pela assinatura dos contratos dos Blocos 13 e 14 a modesta quantia de € 80 000,00

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e uma renda de superfície que ronda os € 95 000,00 por ano, ou seja, praticamente nada! Há que dizer que, no seu limite mais próximo da costa, existirá sempre a possibilidade de ver instaladas plataformas de exploração de petróleo a 8,5 Kms de Faro, por exemplo, o que as torna visíveis a partir da cidade e das praias, como é óbvio.
É espantoso que o Governo não tenha exigido a realização de estudos de impacte ambiental prévios.
Estas actividades são uma ameaça para o turismo, para a pesca e para o bem-estar das populações do Alentejo e do Algarve. Perante a demissão de responsabilidades de um Ministério, onde a palavra Ambiente é uma mera alcunha, o Governo ameaça não parar por aqui, proclama às sete partidas do mundo dos magnatas do petróleo que tem mais mar para alugar.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A actuação negativa do Ministro da Economia e o seu impacto não conhece limites nem fronteiras, revela-se na China como se revela em Fornos de Algodres de Cima, e coloca em causa a imagem e o bom nome de Portugal, como de uma qualquer sua região, como foi agora o caso do Algarve.
O rei Midas da mitologia grega ficou célebre por transformar em ouro tudo aquilo em que tocava; o Ministro da Economia é a incarnação do anti-Midas: transforma numa imensa trapalhada tudo aquilo em que toca.

Aplausos do PSD.

Os resultados da actuação do seu ministério apresentam um saldo desolador: a economia está estagnada, cada vez mais divergente com a Europa, o investimento desce e o desemprego galopa.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Os resultados do controlo do défice orçamental fizeram-se à custa de uma suspensão brutal das obras públicas, do aumento dos impostos, e de uma verdadeira ditadura fiscal sobre os contribuintes e as pequenas e médias empresas.
É verdade que as exportações subiram, mas as importações cresceram ainda mais, e o défice da balança comercial é um desastre. A manutenção deste ministro no passivo governamental é um verdadeiro mistério.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: — Ao mantê-lo em funções, o senhor Primeiro-Ministro presta um péssimo serviço ao País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado David Martins.

O Sr. David Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, antes de mais, quero pedir desculpa por não ter tido oportunidade de assistir a toda a intervenção, mas por aquilo que consegui registar, ao que nós assistimos foi efectivamente à continuidade da profecia da desgraça.
Permitam-me dizer isto porque, nos últimos tempos, temos reparado, no Algarve e aqui em Lisboa, na Assembleia da República, que é normal o Sr. Deputado Mendes Bota estar sempre a aludir a determinadas situações que ocorrem no Algarve como «absolutas desgraças», mas que nós, pelo contrário, interpretamos como grandes oportunidades.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Lá que o Algarve tem algumas desgraças, tem!…

O Orador: — Referir — e começo pela parte final — que a questão do petróleo no Algarve irá causar grandes impactos, uma grande nuvem negra na nossa região, que, efectivamente, é a maior região turística, não é falar com seriedade. E por que é que não é falar com seriedade? Porque os estudos de impacto ambiental, segundo a nossa lei, segundo a lei vigente, só têm de ser feitos após a prospecção e a indicação de que efectivamente existem os recursos.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Essa garantia o Governo já a deu: a de que todas as informações serão concedidas e de que todos os estudos serão feitos.
Quanto à responsabilidade política: será que qualquer político responsável, qualquer Deputado responsável diria que, tendo nós uma dependência de 86% dos recursos energéticos, nos poderíamos dar ao luxo

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de, tendo um recurso — que poderão ser hidrocarbonetos, que poderá ser petróleo, que poderá ser gás natural —, não o explorarmos?! Alguém responsável diria isto?

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Sobre a questão do «Allgarve» e do Algarve, em primeiro lugar, quero dizer que efectivamente este Governo, e ao contrário de outros governos anteriores, já manifestou que aposta fortemente no turismo e na região do Algarve. Deixem-me dizer que 6 milhões de euros foi o investimento feito para a promoção turística do Algarve. E o programa que referimos neste momento prende-se com um evento, com uma duração de três anos, que, efectivamente, pretende criar uma dinâmica na nossa região.
Assumir que todos os algarvios vão ser chamados, como se quer fazer passar a imagem, de «allgarvios», parece-me ser de muito mau gosto e sem legitimidade. A região do Algarve é uma marca muito bem definida, é o maior destino nacional e assim continuará! Aquilo que sucede é que foi a escolha de uma determinação de um brand name para um programa e esse é o programa que nos interessa e não vemos qualquer conotação… Deixem-me recordar, Sr.as e Srs. Deputados, aquilo que já aconteceu em Portugal: houve uma campanha que se chamava «Sportugal», uma campanha dinâmica de eventos desportivos, que ocorreu também em Portugal. Algum dos senhores, alguma vez, registou que o nosso país se alterou por termos um programa com este nome?

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Bom, era um programa que tinha que ver, exactamente, com nove nações…! Termino, de imediato, Sr. Presidente, dizendo o seguinte: de facto, não vemos que isto seja negativo; muito pelo contrário, vemos aqui uma grande oportunidade para o Algarve. Entendemos que tem de haver algum respeito pela decisão e pela opinião de cada um mas, acima de tudo, deve haver uma responsabilidade política regional, porque estas informações podem ser aproveitadas, essas sim, por comunicações externas e, aí, a nossa imagem ser posta em causa.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Não coloco questões, eram estas apreciações que queria fazer. Naturalmente, as questões ficam iludidas no âmbito da intervenção. Sr. Deputado Mendes Bota, pensa, ou não, que isto é um pouco exagerado e que os pressupostos são os de progredir?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, em primeiro lugar, gostaria de salientar que o Sr. Deputado David Martins teve uma atitude honesta quando «interviu»,…

Risos do PS.

… porque teve a honestidade de reconhecer que entrou tarde neste debate e que, portanto, não ouviu a essência da minha intervenção, nomeadamente não ouviu a primeira parte que tinha a ver com o «Allgarve» de que falou no final.
Mas eu registo: é preciso ter honestidade e tenho bastante respeito pelo Sr. Deputado, mas não diga que as minhas intervenções têm falta de seriedade.
Naquilo que diz respeito ao petróleo está tudo documentado nas respostas que o Governo deu ao meu requerimento, passado quase mais de um ano, depois das primeiras perguntas que fiz.
Não vale a pena! O Sr. Deputado está a cumprir a função que entende, que é a de defender a todo o transe o Governo. E para si não há alarme, não há problema algum: podem vender o petróleo «ao preço da chuva», que isso não tem interesse para o País, não tem interesse para o Algarve…! Podem dá-lo!!

O Sr. Afonso Candal (PS): — Mas qual petróleo?!

O Orador: — O Sr. Deputado está ainda na ilusão de que o petróleo, a existir, nos pertence. Não pertence nada! Como demonstrei na tribuna — e tenho aqui a resposta do Governo —, vamos receber 0,6 cêntimos, repare, por litro de crude que for encontrado! E, portanto, o interesse nacional é colocado em risco!! O Sr. Deputado agarra-se a uma legislação que diz que só é obrigatório o estudo de impacto ambiental depois da fase da prospecção, e eu lamento que não tenha preocupações. E faço votos — faço-os, sinceramente! —, com seriedade, de que o Sr. Deputado não venha, um dia, a ter de lamentar as palavras des-

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preocupantes, despreocupadas e levianas que teve sobre esta matéria, aqui, hoje, e que ficam registadas, no Diário!

Aplausos do PSD.

Para o Sr. Deputado e, provavelmente, para outros Colegas nossos também do Algarve, não há problema algum.
Vou dizer-lhe uma coisa também com toda a seriedade: eu não estive na apresentação da campanha do Sr. Ministro da Economia, eu não sabia o que lá se tinha passado e quem me informou foram os jornalistas.
Não fui eu que lancei alarme algum; o alarme estava lançado! A mim, limitaram-se a perguntar qual era a minha reacção perante tudo aquilo.
E a reacção, Sr. Deputado — o Sr. Deputado está a contra-vapor ou vive noutra região, ou vive noutro país? —, a primeira consequência é a de que o Algarve foi ridicularizado, o Algarve tem sido «gozado», basta ver todos os Colegas aqui à volta… E ao senhor o bom nome do Algarve não o preocupa? É um problema seu, Sr. Deputado!! Cada um cumpre a sua missão. Eu cumpro a minha e defendo a minha região, esteja o meu partido no poder ou na oposição — e tenho provas dadas nesse sentido!!

Aplausos do PSD.

O Sr. Renato Leal (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Renato Leal (PS): — Para um protesto, Sr. Presidente, em defesa da Língua Portuguesa.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Não há essa figura!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, creio que essa é uma prerrogativa que cabe à Direcção da sua bancada, mas dou-lhe a palavra. Faça favor.

O Sr. Renato Leal (PS): — Muito obrigado, Sr. Presidente, por toda a atenção! Vou ser muito breve.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, no início da sua intervenção que, agora, terminou, o Sr. Deputado Mendes Bota referiu-se ao meu camarada David Martins dizendo: «o Sr. Deputado ‘interviu’».
O verbo intervir tem, no pretérito perfeito simples, a forma diferente: «interveio».
Para quem veio defender, tão veementemente, um anglicismo, que é, na opinião do Sr. Deputado o «Allgarve», eu, como filólogo, como falante da língua de Camões, de Antero e de Vitorino, gostaria de exarar aqui o meu mais profundo protesto, nesta tarde de quinta-feira!

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Defender a Língua Portuguesa é defender o Algarve, não é o «Allgarve»!!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, quero, apenas, fazer duas coisas: a primeira é lamentar que o Sr. Deputado confunda este Hemiciclo com uma sala de aulas; e a segunda é dizer que não respondo a quem tem «entradas de leão e saídas de sendeiro».

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, quero chamar a atenção da Câmara para que, no início do período da ordem do dia, terá lugar a discussão do relatório da 1.ª Comissão sobre um recurso relativo ao projecto de lei n.º 337/X e que, além desta discussão, haverá, de imediato, a votação.
Sei que está uma outra comissão em funcionamento, a do «Envelope 9», e pedi ao seu presidente que procurasse coordenar os trabalhos dessa comissão com os do Plenário e, eventualmente, se necessário, suspendendo por algum tempo os trabalhos da comissão, para que se faça este debate no início do período da ordem do dia.
Vamos, agora, prosseguir os nossos trabalhos no período antes da ordem do dia.
Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando, em cada dia, se aplaude o resultado do trabalho dos profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual, no palco ou no ecrã, pouco se sabe da insegurança e da precariedade a que estes trabalhadores estão condenados.
A insegurança entre a possibilidade de um emprego a termo certo e a incerteza de voltar a conseguir um trabalho marcam a vida da maioria dos profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual, quer se trate de actores, bailarinos, músicos ou de pessoal técnico e do sector audiovisual. Para estes trabalhadores, a estabilidade é a verdadeira excepção: um pequeno contrato pode ser um grande privilégio; os pagamentos a horas também; as férias, privilégio; segurança social, também; períodos de descanso, uma incógnita; subsídio de desemprego nem vê-lo…! A regra que impera é a de trabalhadores reféns dos recibos verdes e da desresponsabilização dos empregadores: por detrás de um espectáculo que deleita os olhos está a clandestinidade de profissionais sem direitos; por detrás do evento que faz esquecer as agruras dos dias está a angústia de quem não tem limite num dia de trabalho, de quem não sabe quando pode descansar, de quem não tem direito a subsídio de desemprego, de quem é refém dos recibos verdes.
O que impera é a desregulação dos vínculos laborais, são as pessoas usadas à tarefa e sem quaisquer regras. E qual é a resposta do Governo socialista a esta vergonha? Qual é o compromisso dessa maioria? Promessas numa mão e uma outra «cheia de coisa nenhuma».
Era para Dezembro a apresentação do estatuto destes profissionais… E nada! Estava pronto há um mês… E nada! E tudo parecia, afinal, tão simples: é, tão simplesmente, reconhecer que estes trabalhadores são trabalhadores por conta de outrem; que têm contrato de trabalho; que o mesmo deve ser reduzido a escrito; que dele decorrem direitos sociais e laborais, mormente o subsídio de desemprego. É reconhecer que o seu estatuto laboral tem requisitos de qualificação, mormente, o da realização de estágio e a certificação profissional.
Mas o Governo do Partido Socialista não responde, aposta na propaganda. E a resposta urge: estatuto profissional; contratos de trabalho; certificação profissional e protecção social são os mínimos de dignidade social e laboral a que este Governo e, em particular, a Ministra da Cultura têm de dar resposta, já! É porque a situação actual é verdadeiramente insustentável! Ao contrário desta e de outras maiorias, o Bloco de Esquerda nunca se conformou com a precariedade destes profissionais, nem com a invisibilidade das suas condições de vida. Mas este Governo prefere ocultar a precariedade a dar visibilidade a direitos fundamentais. Ao contrário da Europa, aliás, de onde vêm os exemplos das melhores práticas; ao contrário de França, de Espanha, do Reino Unido, de onde vêem exemplos das melhores práticas. Mas bem podemos evocar o exemplo europeu: por cá, só o anúncio de intenções.
A Ministra da Cultura dizia que era para Dezembro a apresentação do estatuto destes profissionais e, afinal, enganou-se. Há um mês, a Sr.ª Ministra repetiu aqui, em Plenário, que o estatuto, afinal, já estava pronto, que estava mesmo pronto. Afinal, não estava! Todos os dias, aliás, a Plataforma de Trabalhadores do Espectáculo e do Audiovisual expressa a sua total disponibilidade para o diálogo e o seu anseio pelas propostas do Governo, que, afinal, não existem. É porque este Ministério tem preferido encher as páginas dos jornais com demissões e nomeações de critérios duvidosos a encarar de frente a cultura e os seus profissionais!! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aqui fica o desafio ao Partido Socialista, ao seu Governo, à Ministra da Cultura, para que assuma imediatamente as suas responsabilidades face aos direitos sociais e laborais a que aspiram estes profissionais. Direitos, tais como: um regime laboral e social, definindo regras de contratação, qualificação profissional, regime de segurança social e protecção no desemprego; um contrato de trabalho, fundamental, independentemente da duração do trabalho, de tarefa ou da sua realização; o estabelecimento da presunção da existência de um contrato de trabalho, sempre que o trabalhador esteja inserido na estrutura organizativa e se encontre em situação de dependência económica, face à entidade promotora do espectáculo ou evento; o regime de segurança social dos trabalhadores aplicado aos trabalhadores por conta de outrem, independentemente do seu vínculo laboral.
Estes são os desafios a que o Partido Socialista e a Ministra da Cultura têm de responder, em nome da dignificação social e laboral destes profissionais!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — A Mesa regista dois pedidos de esclarecimentos. Pergunto, pois, à Sr.ª Deputada como pretende responder-lhes.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Conjuntamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Muito bem, Sr.ª Deputada. Dou, então, a palavra, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado João Oliveira.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, de facto, a realidade que nos trouxe, nesta sua intervenção, é uma realidade preocupante, que se confirma todos os dias, com as condições a que estão sujeitos estes trabalhadores do sector das artes do espectáculo.
Esta realidade é preocupante, sobretudo, por duas ordens de razões: a primeira é o facto de esta realidade não fugir ao cenário global de precariedade das relações laborais do nosso país — é uma realidade marcada pela utilização abusiva e ilegal do regime de recibos verdes; é marcada por horários de trabalho que, de facto, violam todas as regras e contribuem para uma sobreexploração destes trabalhadores; e é marcada também por contratos de trabalho, quando os há, de muita curta duração e que, de facto, não garantem nem os direitos que deveriam garantir a esses trabalhadores no plano da sua organização do trabalho e de outros direitos relativos à prestação do trabalho nem a protecção nas situações de desemprego, que, tantas vezes, se verifica com um carácter de intermitência.
A segunda ordem de razões que justifica esta preocupação que o PCP tem com a realidade a que estão sujeitos estes trabalhadores das artes do espectáculo tem que ver com aquilo que parece ser uma tentativa de justificação das condições de trabalho a que estão sujeitos estes trabalhadores com aquilo que seriam as especificidades do sector.
Ora, na nossa opinião, as condições a que estão sujeitos estes trabalhadores das artes do espectáculo têm, de facto, alguma parcela de especificidade que deve ser tratada com uma diferenciação face àquilo que é o quadro geral da legislação laboral.
No entanto, a preocupação fundamental deve ser a da garantia a estes trabalhadores dos direitos que estão legalmente consagrados para a generalidade dos trabalhadores e, portanto, a garantia de questões tão fundamentais como o acesso às prestações de desemprego, o acesso a condições de prestação de trabalho com horários que não sobrecarreguem estes trabalhadores e o acesso à protecção de uma série de outras situações, como, por exemplo, a protecção na maternidade que decorre, obviamente, da figura contratual em que estejam abrangidos.
Como é, certamente, do conhecimento da Sr.ª Deputada, o Partido Comunista Português teve já oportunidade de apresentar um projecto de lei que visa dar resposta a todas as questões que aqui foram colocadas e a um compromisso que assumimos na última campanha eleitoral.
Assim, pergunto-lhe se o Bloco de Esquerda está ou não disponível para, em conjunto com o PCP, promover o necessário desenvolvimento processual destas iniciativas na Assembleia da República para que estes trabalhadores possam ver a sua situação resolvida, na perspectiva de serem garantidos os seus direitos.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, estou certa de que em cada PAOD, aqui, no Parlamento, poderíamos, semana após semana, encontrar um assunto para debater a política deste Governo relacionada com a cultura, começando pela falta de rumo, passando pela asfixia financeira, as perseguições, as «purgas», a promoção da mediocridade,…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

A Oradora: — … a expulsão das pessoas e dos programas com qualidade, enfim, penso que teríamos a agenda cheia até ao fim do ano.
É verdade que, desde que tomou posse, este Governo, através da Ministra da Cultura, assumiu o compromisso de apresentar o estatuto do artista, num curto espaço de tempo, que foi sendo adiado, a belprazer da Ministra da Cultura. Isto porque, como sabemos, tem uma componente laboral, uma componente da segurança social e da protecção social, no seu sentido lato e uma componente fiscal.
Até agora, essa proposta de lei não apareceu — e duvido muito, Sr.ª Deputada, que venha a aparecer! Estou à vontade para o dizer porque, tendo consciência da complexidade desta matéria, aquando da cessão de funções no governo de coligação ao qual pertenci, deixei um trabalho muito aprofundado, feito por personalidades de reconhecido mérito na área do trabalho, mas também ligadas à cultura, sobre a primeira destas vertentes; ou seja, deixei um trabalho sobre os aspectos da caracterização do perfil do artista e sobre outros aspectos diversos a que deveriam obedecer os contratos de trabalho dos profissionais das artes do espectáculo.
É evidente que esse trabalho não obteve qualquer desenvolvimento, como vimos até agora, e precisa urgentemente de ser concluído.
Temos centenas de profissionais das artes do espectáculo, que vão da música ao teatro, quer pessoas que estão no palco quer aqueles que se encontram nos bastidores, os do audiovisual, os bailarinos, todos eles com características muito especificas e todos eles que trabalham em condições de enorme precariedade e de enorme vulnerabilidade.
Só que, Sr.ª Deputada, devo dizer-lhe, tomara que o mundo fosse tão simples como o Bloco de Esquerda o vê, mas não é!…

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O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

A Oradora: — Os senhores dizem: «resolva-se isto para todos ao mesmo tempo», mas os senhores não dizem coisas fundamentais, como, por exemplo: o que é ser artista para os senhores? O marceneiro que trabalha no palco, que faz os cenários, é artista ou não é? Deve, ou não, ser abrangido por um contrato específico? Ao fim de quantos anos terá ele direito a uma reforma? E em função de que período de trabalho, tendo em conta a sazonalidade destes contratos de trabalho? Visto pelos «olhos» do Bloco de Esquerda, o mundo é muito fácil, é muito linear, não tem qualquer complexidade. Ora, a vida real tem aspectos complexos. E nós ficaremos a aguardar, assim como aguardamos não pacientemente, mas com muita impaciência, que o Governo cumpra aquilo…

O Sr. João Oliveira (PCP): — O nosso projecto de lei já lhe dá as respostas!

A Oradora: — Sr. Deputado, fica-lhe muito bem fazer a defesa do Bloco de Esquerda, mas o mundo, aos «olhos» do PCP…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não, não confunda!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, já não tem tempo para concluir, muito menos para advertir um seu Colega! Faça favor de concluir.

A Oradora: — Concluo, Sr. Presidente, dizendo apenas que, infelizmente, a realidade não é assim tão fácil. Mas aguardaremos, impacientemente, repito, que o Governo cumpra com os seus compromissos e que os senhores também o façam.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados João Oliveira e Teresa Caeiro, começo por agradecer as questões que me colocaram.
Sr. Deputada Teresa Caeiro, acompanho algumas das suas preocupações, nomeadamente quanto à «falta de bússola» para a política cultural deste País, mas, com todo o respeito, convido-a a ler o projecto de lei do Bloco de Esquerda, pois penso que poderá esclarecer alguns dos equívocos, das confusões que aqui trouxe e acrescentar algo a algumas das dúvidas que são só suas. Em todo o caso, agradeço-lhe, como já lhe disse, as questões que levantou.
Sr. Deputado João Oliveira, tem toda a razão quando inscreve o problemas dos trabalhadores das artes do espectáculo e do audiovisual num quadro que é muito mais amplo do que o da especificidade destes trabalhadores: é o quadro da precariedade, da instabilidade, da sobreexploração, da falta de garantias, da ausência de direitos; é o quadro da política do Partido Socialista e do seu Governo.
Mas convirá em que esta realidade é ainda, de alguma forma, mais dramática se tivermos em linha de conta que a beleza da produção e do espectáculo permite e serve para ocultar a precariedade destas situações. Concordará que a sociedade tem muito pouca noção de qual é, efectivamente, a realidade destes profissionais.
Quero dizer-lhe, claramente, que o Bloco de Esquerda está disponível para todas as iniciativas que vierem a este Parlamento; está claramente aberto, nomeadamente em relação às propostas que a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro queira apresentar. Com certeza! Estamos o mais abertos possível a todas as propostas que garantam dignidade a estes profissionais, que reconheçam o seu trabalho, que reconheçam os seus direitos.
O que não entendemos é o silêncio da bancada do Partido Socialista, que não tem dúvidas, não tem perguntas; parece que está satisfeito com a mera propaganda da Ministra da Cultura…!! Pelos vistos, o silêncio da Ministra da Cultura, nomeadamente com estes profissionais, é um silêncio que, mais uma vez, vos agrada!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Marcos Sá.

O Sr. Marcos Sá (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há 15 anos, foi declarado através de uma resolução das Nações Unidas o Dia Mundial da Água.

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Desde 1993 que este dia é assinalado, com diversas iniciativas de âmbito nacional e internacional, com o objectivo de sensibilizar o público para a necessidade de conservar os recursos hídricos e de chamar a atenção para questões relevantes, relacionadas com a água.
Este ano, o tema escolhido foi o da escassez de água. Importa, por isso, referir que, no âmbito da presidência portuguesa da União Europeia, este será um dos temas centrais, uma vez que esta problemática terá cada vez mais impacto ao nível europeu, especialmente, num contexto de alterações climáticas, em que os fenómenos extremos são cada vez mais frequentes e devastadores.
Importa referir que Portugal está fortemente empenhado em conceder a esta questão uma dimensão europeia, uma vez que não existe uma estratégia comum que analise esta problemática específica e que promova a troca de experiências e uma abordagem inovadora.
Desta forma, está prevista a apresentação de uma comunicação na Comissão Europeia sobre esta temática, em Julho de 2007, tendo em vista a seguinte abordagem: a componente da escassez da água e a seca; a gestão da procura de água; o aumento da eficiência no uso de água em todos os sectores; e as políticas de tarifários da água.
Srs. Deputados, a aprovação nesta Legislatura da Lei da Água foi um passo fundamental para estabelecer as bases para uma gestão sustentável das águas e enquadrar o respectivo sector.
Tendo presente a importância e a urgência do assunto, foi apresentada e aprovada em Conselho de Ministros, no dia 5 de Junho de 2005, a proposta de lei que aprovou a Lei-Quadro da Água. Com esta proposta de lei, procedeu-se à transposição da Directiva-Quadro da Água, pondo fim a uma situação de incumprimento que se arrastava desde Dezembro de 2003.
Complementarmente à Lei da Água, tornou-se necessário proceder a uma sistematização e unificação das normas relativas à titularidade dos recursos hídricos, dispersas por diplomas diversos; estavam em causa as águas públicas, qualquer que seja a sua natureza, e os respectivos leitos, margens e terrenos confinantes. Tratou-se, essencialmente, de um exercício de harmonização legislativa, não se introduzindo modificações profundas no regime em vigor.
Assim, foi aprovada uma proposta de lei sobre a titularidade dos recursos hídricos, a qual, pela sua natureza, foi também remetida à Assembleia da República, que a aprovou também por extensa maioria.
Recentemente, esta Câmara aprovou uma autorização legislativa que permitirá ao Governo regular os termos de emissão, revisão, cessação, transmissão e transacção das concessões, licenças e autorizações que titulam a utilização dos recursos hídricos.
Foi também aprovada pelo Governo a estratégia de Portugal para o sector do abastecimento de água e saneamento de águas residuais para o período do novo ciclo de fundos comunitários. Refiro-me, concretamente, ao PEAASAR 2007-2013 (Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais).
Este plano indica níveis de atendimento compatíveis com os objectivos de progresso e propõe medidas de optimização dos sistemas estabelecendo modelos de gestão adequados para, em colaboração com as autarquias, proporcionar um impulso decisivo no desenvolvimento dos sistemas «em baixa»; estabelece, ainda, modelos de financiamento viáveis, assentes em previsões de custos de investimento, traçando as linhas de orientação da política tarifária e definindo a reformulação do enquadramento legal e do modelo regulatório necessário. Constitui, assim, um documento de referência para todos os protagonistas do sector, como orientador dos objectivos, políticas e acções, no domínio do abastecimento de água e saneamento de águas residuais.
Srs. Deputados, visto que o tema central do Dia Mundial da Água é a sua escassez, importa ainda realçar a importância que terá para Portugal o Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água.
Como é do conhecimento público, foi aprovada, em 2005, uma resolução do Conselho de Ministros em que foram aprovadas as linhas programáticas com o objectivo de promover o uso eficiente deste recurso escasso nos sectores urbano, agrícola e industrial.
Permitam-me, no entanto, destacar uma medida que é necessário reforçar de forma insistente, ao nível dos sistemas públicos de abastecimento, e a que todos deveremos dar especial ênfase: é fundamental todos os sistemas terem como principal preocupação o objectivo de reduzir as perdas de água, pois verificam-se perdas de água muito significativas no consumo total, em muitos sistemas de abastecimento do País.
Esta medida consiste na implementação pelas entidades gestoras de programas de detecção, localização e eliminação de perdas resultantes de fugas, roturas e extravasamentos do sistema, nomeadamente a nível das tubagens e das respectivas juntas, que constituem a rede pública de distribuição, e deverá ser uma das principais bandeiras de qualquer sistema de abastecimento de água, «amigo» do ambiente.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Para além das responsabilidades públicas, cada cidadão tem o direito de usufruir da água, mas também o dever de preservá-la, utilizando-a de maneira consciente, sem desperdícios, dando-lhe assim o devido valor!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José

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Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Marcos Sá, antes de mais, cumpre-me agradecer-lhe o facto de ter o Grupo Parlamentar do Partido Socialista decidido assinalar esta efeméride. Em boa hora o fez, porque temos muito que falar sobre a política de água, e é mesmo sobre este tema que eu gostava de fazer-lhe, rapidamente, duas ou três perguntas.
O Sr. Deputado recordou — e bem! — que, no dia 5 de Junho de 2005, foi aprovada a Lei da Água que transpõe a Directiva-Quadro da Água, mas estamos à espera de que essa lei seja concretizada. E boa parte dos problemas que referiu em relação à escassez de água não são seguramente apenas e só de Portugal, pois, como sabe, até são os relatórios das Nações Unidas que nos classificam como um dos países mais bem colocados no mundo, em matéria de conseguir enfrentar os dilemas do futuro da escassez da água. Mas estamos, há dois anos, à espera de que essa lei, que o Governo encontrou pronta…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — … e que, à semelhança de outras, quis publicar, como sua, no dia 5 de Junho de 2005, para assinalar a efeméride do Dia Mundial do Ambiente.
Portanto, Sr. Deputado Marcos Sá, sei que não pode falar pelo Governo, mas gostaria que me dissesse se tem alguma expectativa de que os conselhos de bacia sejam instalados, de que as administrações de região hidrográfica comecem a funcionar…

Vozes do PSD: — Não sabe!…

O Orador: — Será que vamos ter tudo aquilo que se disse querer fazer no dia 5 de Junho de 2005 no dia 5 de Junho de 2007, dois anos depois? Será que vamos, pelo menos, ter a instalação dos conselhos de bacia? Será que vamos, pelo menos, ter as administrações de região hidrográfica a funcionar? Será que vamos, pelo menos, ter aquilo que consta da Lei da Água a ser executado? É porque, até hoje, ainda não percebemos onde é que está a execução integrada que permite resolver boa parte desses problemas…! O Sr. Deputado referiu-se também, com uma extraordinária dose de optimismo, ao Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais sobre o qual o Partido Socialista dizia, na oposição, ter ideias claras, e que arrastou dois anos numa discussão pública, para concluir que o drive da execução, que o «motor» da execução é o sistema empresarial público e a Águas de Portugal! O Sr. Deputado pode dar-nos algum horizonte temporal de como e quando vai começar a ser executado esse PEAASAR? Ou vamos ter de esperar por mais um atraso do Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional na entrega dos programas operacionais a Bruxelas e que o Governo desembrulhe esta «bota» em que se meteu de não entregar a tempo e horas o Quadro de Referência Estratégico Nacional e de estarmos a assistir ao primeiro hiato da história da nossa integração europeia na aplicação dos fundos estruturais para o sector da água?

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Se o Sr. Deputado souber dizer-nos quando é que vai começar a ser executado o PEAASAR, perceberemos que o Partido Socialista tem mais do que palavras para apresentar nesta matéria.
Para descermos aos exemplos concretos, Sr. Deputado, boa parte dos problemas da escassez de água tem que ver com a poluição, e, esses, sim, são problemas graves das nossas bacias hidrográficas.
Estive há dois dias em Pernes, onde me explicavam que o Conselho de Bacia do Alviela há muito tempo não reúne mas, sobretudo, que este Governo não encontra disponibilidade, ao fim de dois anos, para, estudado o problema, tomar definitivamente uma decisão sobre a bacia do Alviela, como não toma uma decisão sobre a bacia do Lis ou sobre a bacia do Ave. E pura e simplesmente, como se dizia em Pernes, e não eram partidários do meu partido, acontece pela primeira vez agora uma coisa que nunca aconteceu em matéria de política de água.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, peço-lhe que termine.

O Orador: — Termino já, Sr. Presidente.
É que, pelo menos, antes havia interlocutor, desta vez, a junta, a assembleia de freguesia e a câmara municipal dirigem-se ao Governo e nem interlocutor têm.
Portanto, a pergunta final que lhe coloco, Sr. Deputado, é, no fundo, no sentido de saber se não acha que o verdadeiro problema de escassez em Portugal relativamente à política de água não é um problema de escassez de água mas, sim, de escassez de política.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Marcos Sá, já conhecemos bem a preocupação do Partido Socialista com a água e a solução mágica que apresenta: empresarializar, mercantilizar, transformar a água num mercado, e, portanto, a gestão passa automaticamente a ser a mais ajustada às necessidades.
Esta é a concepção do PS. E a sua preocupação central é a de fazer com que a água, enquanto bem público, passe de bem público a bem privado e a ser gerida por empresas para daí extraírem lucro. A lei da água vai exactamente nesse sentido, aliás, a pergunta colocada pelo Sr. Deputado José Eduardo Martins ajuda perfeitamente a compreender que a visão do PS e do PSD nesta matéria é paralela. Portanto, a lei já estava praticamente feita e o PS veio recauchutar, com alguns ajustes, a mesma visão mercantilista da água e da sua privatização.
O PEAASAR manifesta novamente esta preocupação, ou seja, a água enquanto bem escasso, enquanto bem que urge proteger, sendo a melhor forma de o proteger generalizar o aumento dos preços por todo o País, que é a lição central do PEAASAR II — Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Portanto, é esta a lição central desse plano.
O regime de utilização dos recursos hídricos por via da autorização legislativa de que falou também augura bons dias, Sr. Deputado Marcos Sá. É basicamente dizer-nos que todos os recursos hídricos deste país poderão estar sujeitos a concessões de 75 anos, em que as empresas concessionárias detêm todos os direitos exclusivos sobre a água, da qual compraram os títulos de utilização. Falta conhecermos o regime económico-financeiro e o que isso vai significar para os utilizadores!… É pena que as preocupações do PS em torno da gestão da água não sejam as de garantir a água a todos os cidadãos, em todo o território, em qualidade e a preços acessíveis.
A pergunta que lhe faço é simples: em que é que o PS sustenta esta grande doutrina, que tem vindo a aplicar, de que a gestão privada da água, a sua mercantilização e a concessão da sua gestão aos privados beneficia directamente, e faz ficar ausente de problemas, a gestão de um recurso que o Sr. Deputado descreve e caracteriza como escasso e necessário? Porque é que a gestão privada, a concentração do lucro em torno da água, vai resolver os problemas da gestão? É que, se eu tiver uma empresa e vender água, o que quero é vender mais água, Sr. Deputado!

Vozes do PCP e de Os Verdes: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Marcos Sá, antes de mais, uma palavra de apreço pelo tema que aqui trouxe hoje, que é certamente muito importante para a qualidade de vida dos portugueses, para a sustentação dos ecossistemas no nosso país e para o desenvolvimento de toda a nossa economia, inclusivamente. E hoje é uma data importante porque são muitos os problemas em torno da água, das massas de água e dos recursos hídricos no nosso país. Esses problemas prendem-se — aliás, a sua intervenção apontou nesse sentido, claramente — com os problemas de escassez que enfrentamos relativamente à água. Essa é, certamente, uma questão importante.
Ligada a essa questão de escassez está também a da falta de tratamento das águas residuais, problema que arrastamos ao longo dos anos e para o qual não há resposta à vista. Aliás, ainda hoje soubemos que Bruxelas vai levar, mais uma vez, Portugal ao banco dos réus do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias por aplicação inadequada de uma directiva comunitária relativamente ao tratamento das águas residuais urbanas por medidas que deviam ter sido tomadas até ao fim de 2000.
Em causa estão 29 zonas urbanas abrangidas pela directiva em que ainda não estão operacionais os sistemas colectores ou de tratamento necessários, como acontece, por exemplo, nos casos das ETAR de Alcântara, Matosinhos, costa de Aveiro, Póvoa de Varzim e Vila do Conde. Isto demonstra, de facto, os maus números que Portugal ainda apresenta nesta matéria e que levam, naturalmente, a que 44% dos nossos recursos hídricos de superfície estejam em má ou em muito má qualidade.
Perante esta situação de escassez, de mau tratamento dos nossos recursos hídricos, o que é que tem feito o Governo? Acredito que haja sensibilidade e disponibilidade da parte de alguns Srs. Deputados do PS para atender a determinadas questões muito concretas, como, por exemplo, a do rio Alviela, debatida, há

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pouco tempo, na Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território a propósito de uma petição e que o PS se mostrou muito preocupado e determinado, tal como todos os outros grupos parlamentares, em resolver, reconhecendo que é um problema actual que urge uma resposta que passa também pelo empenhamento do Governo. O problema é que não vemos essa mesma atitude da parte do Governo.
O que quero saber, Sr. Deputado, é se a sua bancada parlamentar está disponível para convencer o Sr.
Ministro do Ambiente de que o problema do rio Alviela não é do passado, é um problema do presente que requer uma resposta no presente, já com este Governo, e que há muitos anos espera por ela, porque a ETAR de Alcanena não dá resposta integral ao problema dos efluentes, designadamente das indústrias de curtumes.
Mas a realidade é que a prioridade do Governo relativamente às águas vai não para a resolução destas questões mas, sim, para a privatização da gestão da água, dos recursos hídricos e das margens, a toda força.
Por isso mesmo, gostaria de perceber, Sr. Deputado, dentro desta lógica do Governo de dar prioridade à transposição de uma directiva da lei da água e à elaboração de um PEAASAR II, sendo que todos estes instrumentos apontam no sentido da entrega a privados, através de concessões, da água e dos recursos hídricos, onde é que fica, nessa prioridade, o plano estratégico do uso eficiente da água.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Orador: — Termino já, Sr. Presidente.
Esse plano, em meados de 2005, foi alvo de um diploma do Governo que aprovou as bases e as linhas orientadoras do programa nacional; esteve à espera mais de seis meses que fosse assinado o despacho que determinasse a constituição do grupo de trabalho; e depois esteve à espera mais quatro meses que esse despacho fosse publicado. Neste momento, não sabemos em que pé está o funcionamento desse grupo de trabalho, mas sabemos que, pelo menos, até ao final de Agosto deste ano não teremos notícias relativamente a esse plano.
Gostava de perceber, ao fim de dois anos, qual a situação deste plano, de que maneira ele faz parte dos esquemas do Governo para atender aos problemas da água no nosso país.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Marcos Sá.

O Sr. Marcos Sá (PS): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, se me permitem, começaria por fazer uma referência que acho fundamental. Ficamos hoje com a ideia de que o Partido Comunista Português e o Partido Social Democrata consideram que a questão da escassez da água não é um problema, que não há problema absolutamente nenhum quanto a esta matéria.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso não é verdade!

O Orador: — É verdade! É exactamente o que disseram!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Eu não disse isso!

O Orador: — Ó Sr. Deputado, é verdade! O Sr. Deputado falou do preço da água. Se o preço da água baixar… O preço é um elemento regulador do consumo.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Para quem?

O Orador: — Para todos!

Protestos do PCP e de Os Verdes.

Sr. Deputado, quanto à questão das concessões é preciso esclarecer que são concessões em baixa, não é a privatização das águas.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Na prática, é a mesma coisa!

O Orador: — Os sistemas multimunicipais ficam totalmente sob a tutela do sector público, e o Sr. Deputado sabe isto muito bem. E veremos o que vai acontecer no Alentejo relativamente ao sistema multimunicipal.

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Protestos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, V. Ex.ª está a falar para a Câmara e não para um Deputado em particular! Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: — Ao Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes quero dizer-lhe duas ou três coisas relativamente ao rio Alviela.
Se bem se recorda, todo o investimento feito no rio Alviela aconteceu exactamente durante o governo do Eng.º António Guterres.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Que disparate! Acabou em 1995!

O Orador: — É uma verdade!

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Peço aos Srs. Deputados que façam silêncio para podermos ouvir o orador!

O Orador: — Trata-se de uma empresa com capitais municipais, como sabe.
Sr. Deputado, verifico que o problema aqui não foi o de discutir a escassez da água, e isso preocupa-me como metodologia.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Escassez de políticas!

O Orador: — Porque as políticas são muito claras relativamente a esta matéria e o PEAASAR II irá, com certeza, resolver muitos problemas e beneficiar muitas populações. Este é o vosso problema relativamente a esta matéria.
Sr. Deputado José Eduardo Martins, gostaria de dar-lhe um conselho. O Sr. Deputado devia falar sobre estes temas na medida daquilo que fez e não na medida daquilo que pensou fazer quando esteve governo.
É este o recado que lhe deixo,…

Aplausos do PS.

… porque se a lei-quadro da água estava pronta desde 2003, então, não sei porque é que em 2005 o Sr. Deputado não aplicou a transição.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Agora é que vamos ouvir falar correctamente da água!

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: No dia de hoje, Dia Mundial da Água, os números e as estatísticas vêm lembrar-nos a todos dos problemas e dificuldades que boa parte da humanidade já sofre pela escassez do precioso líquido.
A ONU lembra, nos seus documentos oficiais, que existe uma relação necessária entre a escassez de água e o subdesenvolvimento, a pobreza, a fome e a doença, que afectam boa parte da humanidade e podem vir a afectar cada vez mais pessoas num futuro não muito longínquo, não só em virtude das alterações climáticas e dos impactos que estas representam no regime hídrico a nível mundial mas por causas que se prendem, desde logo, com os próprios modelos de desenvolvimento assumidos pelos países e seus governos.
Um terço da humanidade encontra já hoje problemas, no seu quotidiano, de abastecimento de água e um quinto enfrenta mesmo uma luta permanente pela sua própria vida e do seu agregado familiar que o leva, nalguns casos, a deslocações diárias de várias dezenas de quilómetros até ao poço mais próximo, às vezes para descobrir, só quando lá chega, que aquele secou e que vai ter de dirigir-se ao seguinte, mais uns quilómetros adiante, só para obter a quantidade que permitir-lhe-á sobreviver mais um dia, alguns litros de água, às vezes a mesma quantidade que qualquer um de nós, num país dito desenvolvido, despeja de uma só vez numa descarga de autoclismo.

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Estes problemas, este quotidiano de alguns milhões de seres humanos, de cidadãos deste planeta, está muito longe do nosso olhar, do nosso conhecimento e, felizmente, longe da nossa experiência, o que não quer dizer que no nosso país não enfrentemos igualmente, à nossa escala, problemas graves no acesso a um dos mais importantes e fundamentais bens para humanidade: a água, sem a qual a vida não seria possível.
Em Portugal, cerca de 600 000 pessoas ainda não têm garantia de acesso a água com qualidade; 44% dos nossos recursos hídricos de superfície, de acordo com dados do Instituto da Água (INAG) referentes a 2005, estão em má ou muito má qualidade, com perda de vida selvagem e de biodiversidade, negando qualidade de vida e o direito ao desenvolvimento às populações ribeirinhas, apresentando, ainda por cima, uma tendência para piorar, situação a que não é certamente alheia a insuficiente cobertura ou respostas específicas de tratamento de águas residuais e efluentes industriais e domésticos, com ETAR a laborar sem licenças de descarga, muitas delas em mau estado de conservação, ou realizando apenas tratamento primário.
Alguns dos nomes mais vezes ouvidos, eternas vítimas da inconsciência e da falta de actuação das autoridades, entre os rios mais massacrados pela poluição, alguns há várias décadas, encontram-se o Tâmega, o Odre, o Ferreira, o Inha, o Zêzere, o Tinto, o Vouzela, o Mondego, o Ave, o Tinhela, o Leça, o Ceira, o Grande da Pipa, o Trancão, o Maior, o Lis e a Ribeira dos Milagres, o Alviela, entre tantos outros.
São a imagem da vergonha que persiste em perseguir um País em que continua a tomar-se decisões erradas de construção, «betonização» e impermeabilização de solos que constituem importantes zonas húmidas de regularização do regime hídrico e de recargas de aquíferos; em que continua a existir uma deficiente monitorização da água para consumo humano; em que as perdas de água entre a captação e a utilização e o consumo atinge a média nacional estimada de 35%; um País que não trata de forma adequada mais de 50% das suas águas residuais e que é, por esse facto, continuamente «chamado à pedra» pelas instâncias europeias pelo não cumprimento da legislação comunitária, como soubemos já hoje. Portugal vai sentar-se no banco dos réus do Tribunal de Justiça das Comunidades por subsistirem 29 zonas urbanas onde ainda não estão operacionais os sistemas de colectores ou de tratamento necessários, como são os casos das ETAR de Alcântara, Matosinhos, Aveiro, Póvoa do Varzim e Vila do Conde.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A água, nunca é demais lembrar, constitui um bem precioso e fundamental à vida. O «ouro azul», causa de discórdias e de possíveis conflitos armados futuros à escala regional, é um bem escasso. Renovável, mas escasso. Apesar do «planeta azul» se encontrar coberto, na sua maior parte por água, a verdade é que, de todo esse universo hídrico, principalmente constituído pelas grandes massas de água salgada dos mares e oceanos, não chega a 1% a que está ao alcance do homem em condições viáveis para satisfazer as nossas necessidades de consumo e dos outros seres vivos e ecossistemas dos quais todos dependemos. E é dessa fatia infinitamente ínfima e preciosa que todos dependemos não só para beber como para produzir alimentos, através da agricultura e da pecuária, para a indústria, comércio, turismo, etc. Não há grão de actividade humana que não dependa da água.
Daí a profunda necessidade de o homem salvaguardar a água, reconhecendo nela um bem insubstituível e, simultaneamente, um direito fundamental, inalienável da humanidade, um direito acessório e inextrincavelmente indissociável do próprio direito à vida e à dignidade da pessoa humana, valores supremos do nosso ordenamento jurídico.
A situação de seca extrema que Portugal atravessou em 2005, e que as previsões apontam para a probabilidade de se tornar uma situação recorrente e cada vez mais frequente, veio igualmente lembrar que gerir a água de forma ambientalmente sustentável, acautelando o futuro, garantindo o seu uso eficiente e racionalizado mas, igualmente, sustentável do ponto de vista social, assegurando a sua repartição de forma justa e equilibrada, é, porventura, um dos maiores desafios que se coloca à humanidade, como temos dito, e uma das mais indeclináveis tarefas do poder político, nos seus mais diferentes níveis.
É que a água e os recursos hídricos, pela sua escassez e pela sua preciosidade, são bens extremamente apetecíveis para os «grandes senhores do dinheiro», que em tudo põem um preço, de tudo querem fazer um negócio e uma oportunidade de lucro, não conhecendo limites o seu apetite voraz e sem escrúpulos, e só compreendem a lógica de chegar primeiro que a concorrência, vender ao mais alto preço e com o mais baixo custo, para obter o máximo rendimento.
Face a esta situação de escassez mundial e nacionalmente reconhecida como uma ameaça e uma grande preocupação, seria fundamental que se agisse, por um lado, no sentido de melhorar os actuais sistemas de abastecimento e de tratamento de águas residuais e os serviços prestados às populações, combatendo as fugas e os desperdícios, salvaguardando a qualidade dos recursos de superfície e os lençóis subterrâneos, e, por outro lado, no sentido de tomar medidas que respondessem à necessidade de tornar os consumos e as utilizações mais eficientes e racionais e, simultaneamente, acessíveis a preços justos e socialmente adequados.
Contudo, a verdade é que a prioridade deste Governo não foi, infelizmente, virada para a implementação, por exemplo, do Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água, instrumento fundamental, com medidas muito importantes, que, desde 2001, continua na gaveta, à espera de melhores dias. O Governo dele não se lembrou na elaboração do Programa do Governo, dele não se lembrou, igualmente, na elaboração do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, e votou-o ao esquecimento.

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Não! A prioridade do Governo foi para a transposição de uma directiva e para a elaboração de um conjunto de diplomas, como a Lei da Água, a Lei da Titularidade dos Recursos Hídricos e suas taxas, ou da utilização dos mesmos e de um PEAASAR II, onde a intenção é só uma: entregar a água a privados. Não! Não é privatizar, Srs. Deputados, pois não irão vender. Irão apenas entregar a gestão da água e dos recursos hídricos, mediante concessão, em negócios chorudos, satisfazendo, assim, os apetites dos privados que querem uma fatia deste «bolo monopolista».
Na verdade, eufemismos à parte, a intenção do Governo tem sido e continua a ser a de colocar todas as massas de água, todos os recursos hídricos, todos os serviços relacionados com a gestão deste bem, à venda num brutal negócio de milhões para alguns, com concessões ou licenciamentos de sistemas de abastecimento em alta e em baixa, do domínio público hídrico em regime de exclusividade a privados, que se vão fiscalizar a si próprios, exercendo competências próprias da Administração Pública, licenciando usos a terceiros e fiscalizando-os, num processo de «engorda», em que se alienam responsabilidades do Estado, que até assume compromissos de indemnizar os privados para que estes não corram qualquer risco.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Uma vergonha!

O Orador: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Verdes continuarão a denunciar esta situação e a lutar por uma efectiva gestão pública da água, a única capaz de garantir o acesso equitativo e racional desta, condição de desenvolvimento e de vida.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há dois anos, o Partido Socialista e o Primeiro-Ministro prometeram aos portugueses que o nosso crescimento económico seria superior a 3%.
Dois anos volvidos, esse crescimento foi de metade da média europeia e um terço do alcançado pela nossa vizinha Espanha. É o pior desempenho de toda a União Europeia.
Em matéria de investimento, são sete trimestres consecutivos a baixar. Vinte e um meses seguidos a decrescer.
Isto, apesar do anúncio pomposo de 27 000 milhões de euros em relevantes investimentos, dos quais só cerca de 4,5 mil milhões foram contratualizados e aguardam concretização. Ou seja, cerca de 86% do que foi anunciado «voou» ou desapareceu, entretanto.
No que concerne ao poder de compra dos portugueses, é mais um indicador a descer: menos 4,7% em dois anos, face aos nossos parceiros europeus.
Mas nem tudo desce! O défice externo, esse, cresceu 3 pontos em percentagem do PIB nos últimos dois anos. E o desemprego, esse, também cresceu, e muito, atingindo uma taxa só registada no longínquo ano de 1986.
Há dois anos, Srs. Deputados, o País acreditou que se criariam 150 000 novos postos de trabalho. Foi uma bandeira tantas vezes erguida, um sound bite tantas vezes pronunciado que se transformou em mais um caso de uma mentira tantas vezes dita e repetida até parecer verdade, mesmo sendo apenas uma promessa, sem qualquer concretização! Quem os ouvia até ficava com a sensação de que esses empregos já existiam! Porém, nada de mais falso e ilusório! A verdade é que, em dois anos, a taxa de desemprego subiu de 7,2% para 8,2%.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Bem lembrado!

O Orador: — Em média, foram mais 73 desempregados por dia, em dois anos. Mas pior: mais recentemente, só no último trimestre de 2006, foram mais 453 portugueses que, por dia, ficaram sem emprego.
Em 2005, o País viu e ouviu o então candidato a Primeiro-Ministro, José Sócrates, afirmar que a taxa de desemprego de 7,1% era um falhanço.
Em 2007, o País vê e ouve o Primeiro-Ministro, o mesmo José Sócrates, contente e satisfeito por apresentar uma taxa de desemprego de 8,2%.
É o cúmulo da insensibilidade social!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Exactamente!

O Orador: — E, face a esta discrepância entre a realidade virtual e propagandística do Governo e do Partido Socialista, por um lado, e o dia-a-dia real dos portugueses, cada vez mais se percebe que os sacrifícios a que estão sujeitos os portugueses, nomeadamente de aumento dos impostos, não têm qualquer

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compensação.
O que os portugueses queriam e mereciam era um Governo cujas políticas e intervenções pudessem contribuir para mais criação de riqueza, mais poder de compra e mais emprego.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — O que o Governo lhes oferece é, precisamente, o contrário! Para o PSD, cada desempregado, cada família cruzada ou apanhada com o sofrimento da perda ou de risco da perda de um emprego, constitui um problema. Um problema que cabe ao Governo debelar.
Mas, Srs. Deputados, se todos e cada um dos nossos concidadãos desempregados ou em risco de o serem nos merecem especial respeito e diligencia, a Assembleia da República não pode passar indiferente à ameaça que paira sobre casos especiais, como aquele que se verifica na empresa Rohde, em Santa Maria da Feira. São 1300 postos de trabalho que estão em risco, criando em outras tantas famílias situações de subsistência muito delicadas e preocupantes.
Conhecemos os contornos da situação. Falámos com trabalhadores e empregadores. Ouvimos os autarcas. Sabemos que se aguardam decisões para as próximas horas. Mas não podemos aceitar que o Governo, quase obrigado e por favor, se limite a acompanhar.
Ao Governo exige-se mais.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Exige-se intervenção. Exige-se que coloque a diplomacia económica ao serviço desta questão. Exige-se que envolva a Agência Portuguesa para o Investimento, o Instituto do Emprego e Formação Profissional, quer na luta pela manutenção dos postos de trabalho quer nas alternativas que possam minorar os efeitos de uma decisão menos favorável no decurso do processo de insolvência que corre na Alemanha. Exige-se que apoie jurídica e socialmente os trabalhadores que não só vêem perigar os seus empregos como têm já salários em atraso.
Ao Governo exige-se que olhe para o processo que, por exemplo, foi encetado aquando do encerramento da fábrica Clark, em Castelo de Paiva.
Sr. Ministro da Economia, é tempo de fazer menos festas, menos anúncios tão pomposos quanto inconsequentes. É tempo de fazer mais, muito mais, pelos reais problemas que afectam milhares de trabalhadores e milhares de empresas!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, começando pelo fim, em relação à empresa Rohde, de Santa Maria da Feira, devo dizer que V. Ex.ª, até por formação, tem obrigação de saber distinguir aquilo que é um processo de falência daquilo que é um processo de insolvência. Por isso, uma vez que não disse aquilo que sabe, não disse a verdade nesta Câmara.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — O que contam são os desempregados!

O Orador: — O que está em causa não é um processo de falência da empresa-mãe alemã, é, sim, um processo de insolvência,…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Não é um problema jurídico! É um problema social!

O Orador: — … tendo já sido nomeado um administrador judicial, que está em contacto permanente com o Sr. Secretário de Estado Castro Guerra, que teve, ainda ontem, uma reunião com os representantes dos trabalhadores, da administração da empresa em Portugal e da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira…

Neste momento, regista-se burburinho na Sala.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Peço aos Srs. Deputados para fazerem silêncio, porque estamos com dificuldades em ouvir a intervenção interessante do Sr. Deputado Afonso Candal.

O Orador: — Assim espero, Sr. Presidente. Assim espero…

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Risos.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: — Portanto, V. Ex.ª pode dizer tudo, mas não pode, no entanto, exigir coisa nenhuma, primeiro, porque não tem autoridade para o facto e, segundo, porque tudo aquilo que está ao alcance do Governo português está, uma vez mais, a ser feito — conforme já foi feito, aliás, noutras situações passadas, como é o caso, tal como ontem fiz referência, da Autoeuropa ou da General Motors — e está em curso em relação a esta importante empresa de Santa Maria da Feira, no distrito de Aveiro.
Relativamente à questão do desemprego, aquilo que V. Ex.ª aqui nos trouxe é, de facto, um exercício de retórica que, manifestamente, pretende dar uma imagem que não corresponde à realidade.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — São os números do INE!

O Orador: — V. Ex.ª diz que o crescimento do produto interno bruto português está abaixo da média europeia, acrescentando que o Governo actual se propôs crescer a 3%. Bem, propôs crescer a 3% como objectivo no final da Legislatura. A verdade é que foi o governo anterior, liderado pelo Dr. Durão Barroso, que assumiu o compromisso de, desde o início da Legislatura passada, crescer 2% acima da média da União Europeia. Qual foi o resultado? Não cresceu 2% acima da média da União Europeia, não cresceu de acordo com a média da União Europeia, não cresceu 2%, mas mingou, diminuiu. Portugal terminou o «consulado Durão Barroso» com resultados negativos em termos do crescimento, coisa que hoje não acontece, uma vez que nos últimos trimestres houve, em termos de crescimento, uma correspondência com a média europeia.
Mas vamos falar do desemprego. V. Ex.ª diz que o desemprego tem aumentado. É verdade! O desemprego tem aumentado, mas tem aumentado cada vez menos…

Protestos do PSD.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Tem aumentado no seu distrito!

O Orador: — Posso mostrar um gráfico referente à variação homóloga do desemprego…

Neste momento, regista-se burburinho na Sala.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, peço que tomem assento nos respectivos lugares e façam silêncio para podermos ouvir o Sr. Deputado Afonso Candal.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: — Os grandes crescimentos da taxa de desemprego registaram-se em meados do ano 2003.
Neste momento, continua a haver crescimento do desemprego mas a ritmo mais baixo e, em alguns meses, decréscimo, apesar de eu poder considerar que o que V. Ex.ª disse é correcto, ou seja, o desemprego, infelizmente, continua a subir, ainda que cada vez mais…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Sr. Presidente, peço que me desconte as interrupções. Estou certo de que o fará.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Eu bem ajudei, Sr. Deputado.

O Orador: — Como eu estava dizer, o desemprego continua a crescer a ritmo cada vez mais baixo, havendo meses em que há decréscimo.
Mas o problema não está aí. O problema, Sr. Deputado, é que, desde o início da presente Legislatura até agora, a população activa cresceu,…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — São fantasias!

O Orador: — … isto é, há mais 94 000 pessoas à procura de emprego em Portugal, das quais 46 foram para o desemprego, mas 48 400 encontraram postos de trabalho, mais do que aqueles que desapareceram. Ou seja, nos últimos dois anos, houve, em Portugal, um aumento líquido de emprego de 48 400. É certo que não chega para acomodar todo o crescimento da população activa.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, mesmo com as interrupções e os descontos res-

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pectivos, já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Orador: — Termino já, Sr. Presidente.
No entanto, aquilo que aconteceu no governo anterior, em três anos, foi que a população activa cresceu 136 000 e a população desempregada 177 000. Porquê? Porque a população empregada diminuiu e, portanto, tanto o aumento da população activa como a diminuição do emprego carrearam gente para o desemprego.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Isso, agora, não acontece, e esta é uma diferença substancial, porque a verdade é que há hoje mais 48 400 portugueses com emprego do que no início da Legislatura.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, queria valorizar a sua intervenção e dar, aqui, nota do papel e da intervenção do PCP junto dos trabalhadores da Rohde, nomeadamente da nossa deslocação nas alturas mais difíceis, bem como dos requerimentos que já apresentámos, quer na Assembleia da República, questionando o Governo, quer no Parlamento Europeu.
Gostava, no entanto, de lhe dar nota de dois factos que mereceram a nossa atenção na intervenção do Sr. Deputado Afonso Candal.
Efectivamente, o Sr. Deputado Afonso Candal pode dar as voltas que quiser às estatísticas do desemprego, mas pergunto-lhe: onde é que os 1300 trabalhadores da Rohde vão encontrar emprego naquele distrito, que, por acaso, é o seu distrito?!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — O Sr. Deputado sabe muito bem que estes trabalhadores não vão encontrar emprego tão facilmente.

Protestos do Deputado do PS Afonso Candal.

Por outro lado, o Sr. Deputado Afonso Candal fala nas questões do passado e valoriza a intervenção do Governo. Importa, porém, lembrar — e queria um comentário da sua parte, Sr. Deputado Luís Montenegro — toda a questão à volta dos trabalhadores da ECCO. Qual foi a intervenção do Governo? A empresa fechou. Qual foi a intervenção da câmara municipal? Oferta de formação profissional e de emprego próprio, ou seja, formação de empresas por conta própria. Qual é a situação real, hoje em dia? Aqueles trabalhadores estão todos no desemprego, com uma situação social muito difícil.
A nossa preocupação e solidariedade para com aqueles trabalhadores vai no sentido de exigir uma intervenção urgente do Governo que mude o modelo de desenvolvimento económico. Era isso que era importante que o Governo, de uma vez por todas, fizesse.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados Afonso Candal e Jorge Machado, agradeço as vossas questões e vou responder a ambos em conjunto, visto que o Sr. Deputado Jorge Machado secundou muitas das posições que assumi na minha intervenção.
Sr. Deputado Afonso Candal, relativamente à qualificação jurídica do processo que envolve a empresa Rohde, V. Ex.ª disse, e bem, que a minha área de formação devia (e deve, efectivamente) conduzir-me a um entendimento perfeito da situação. Sr. Deputado, como referi da tribuna, e repito, também conheço os contornos jurídicos da situação. Essa não é, porém, a questão relevante e não quero discutir juridicamente consigo esta matéria, até porque V. Ex.ª ficaria numa situação de inferioridade,…

O Sr. Afonso Candal (PS): — Não tema por mim!

O Orador: — … visto que não tem exactamente essa formação.
O que quero discutir consigo é a questão social e a questão económica.

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Relativamente à questão económica, a situação é a seguinte: V. Ex.ª diz que o objectivo do Governo é um objectivo de Legislatura, mas não explica porque é que o crescimento, em Portugal, é o pior da União Europeia — isso é que V. Ex.ª não consegue explicar.
Relativamente ao desemprego, Sr. Deputado Afonso Candal, fico preocupado — e, sendo seu amigo, preocupado até consigo —, porque V. Ex.ª mostra-nos alguns gráficos, que, aliás, tem preparado para as suas últimas intervenções sobre esta matéria, e acredita mesmo naquilo que esses gráficos lhe dizem. Só que esses gráficos nada têm a ver com a realidade, Sr. Deputado. A realidade é que, hoje, há mais desempregados do que havia quando VV. Ex.as iniciaram funções. De facto, hoje, há mais gente votada à precariedade no seu trabalho e a taxa de desemprego subiu de 7,2% para 8,2%, sendo que o número de desempregados, no final do ano de 2004, era de 389 000 e, no final de 2006, já era de 458 000. Esta é que é a realidade, estes é que são os números!

O Sr. Afonso Candal (PS): — E 600! 458 600!

O Orador: — E não são gráficos que fiz para acreditar neles e para poder ter uma nesga de argumentação no debate sobre a política de emprego. Estes são os dados do INE, são os dados que contam e são os dados que afectam a vida das pessoas.
E o que é preocupante — e mesmo assustador — é que V. Ex.ª percorra com o Governo um caminho que é insustentável, de despreocupação e de insensibilidade social, não percebendo o que se passa, no dia-a-dia, na vida dos nossos concidadãos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 40 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, o primeiro ponto do período da ordem do dia é preenchido com a discussão e votação do parecer, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sobre o recurso, interposto pelo PSD, da admissão do projecto de lei n.º 366/X — Determina a equiparação entre os Deputados à Assembleia da República e os Deputados às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas em matéria de incompatibilidades e impedimentos (PCP).
Cada grupo parlamentar disporá de 3 minutos para intervir.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Do nosso ponto de vista, esta iniciativa do Partido Comunista Português viola grosseiramente a Constituição da República Portuguesa, nomeadamente o seu artigo 231.º, n.º 7, que diz expressamente que «O estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas é definido nos respectivos estatutos político-administrativos.» Sr.as e Srs. Deputados, nomeadamente do Partido Socialista, isto está escrito em Português, pelo que qualquer Deputado entende este preceito constitucional pela sua mera leitura, não sendo necessário ser jurista ou constitucionalista. Repito, basta ler e ter uma capacidade normal de entendimento para perceber o que esta norma quer dizer literalmente.
Trata-se, portanto, de matéria de reserva dos estatutos político-administrativos das regiões autónomas.
Por isso, não cabe na competência legislativa reservada à Assembleia da República.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Aliás, segundo vocês, não é da competência de ninguém!

O Orador: — Mais: a reserva de iniciativa não compete à Assembleia da República — e o Sr. Deputado Bernardino Soares, que gosta tanto da Constituição, deve lê-la e saber que ela não pode ser alterada agora.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Felizmente!

O Orador: — Efectivamente, os artigos 226.º, n.º 1, e 227.º, n.º 1, da Constituição dizem claramente que a iniciativa pertence às assembleias legislativas regionais.
Muitas vezes, há dúvidas sobre a constitucionalidade de diplomas apresentados nesta Assembleia e, para esclarecê-las, existe o Tribunal Constitucional. Mas, no caso desta iniciativa, trata-se de uma inconstitucionalidade grosseira e expressa. Repito, trata-se de uma inconstitucionalidade expressa, que resulta da

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mera leitura de uma norma da Constituição.
Isto mesmo entendeu, e bem, o Governo Regional dos Açores, que, no seu parecer, diz a mesma coisa.
E era bom que os Deputados do Partido Socialista eleitos pelo Círculo Eleitoral dos Açores dissessem porque é que o Governo Regional dos Açores tem uma opinião e o Partido Socialista, aqui, tem outra.
Ainda ontem, um Vice-Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, do Partido Socialista, disse exactamente a mesma coisa.
Portanto, o Partido Socialista, aqui, em relação a este parecer, tem esta posição por mera chicana política, por mero oportunismo político,…

Vozes do PSD: — Exactamente!

O Orador: — … porque entende que é altura de alterar o estatuto e as incompatibilidades dos Deputados às assembleias legislativas regionais.
Aliás, até podemos fazê-lo, mas pelos meios constitucionalmente previstos. Ficaria muito mal a esta Assembleia votar favoravelmente este parecer.
O Partido Socialista ainda está a tempo de evitar que esta Assembleia vote favoravelmente um parecer que não é nada bom para ela, para as suas competências e para o prestígio que deve ter. É que isto é um ataque directo às autonomias regionais, como o Governo Regional dos Açores o admitiu claramente no seu parecer.
O Partido Socialista ainda está a tempo de ponderar o seu voto. É que o seu voto na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias foi um voto por mero oportunismo político, porque há eleições na Região Autónoma da Madeira.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
Quero dizer aos Srs. Deputados que os portugueses da Madeira sabem o que se está a passar, sabem que tanto esta iniciativa como este parecer são mais um ataque às autonomias. Esses madeirenses, esses portugueses, sabem que o Partido Socialista está a ter aqui uma posição que vai contra os seus interesses e direitos, consagrados na Constituição.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP vai votar favoravelmente o parecer aprovado na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, que é o que está aqui em discussão e vai ser votado.
Consideramos, em primeiro lugar, que há um problema político que não deve ser omitido, que é a recusa peremptória do PSD/Madeira em aceitar que haja uma equiparação de regimes, em matéria de incompatibilidades e impedimentos, entre os Deputados da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira e todos os demais. Os Deputados da Assembleia da República e os Deputados da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores têm regimes equiparados e, na Madeira, o PSD recusa essa equiparação…

O Sr. Jorge Strecht (PS): — É uma vergonha!

O Orador: — … e quer manter uma espécie de offshore na Madeira, em matéria de incompatibilidades e impedimentos, o que é absolutamente inaceitável.
Os Srs. Deputados do PSD dizem que o projecto de lei do PCP viola a reserva de iniciativa. Não, Srs. Deputados, não viola o direito de iniciativa. O projecto de lei do PCP não propõe qualquer alteração ao estatuto político-administrativo da região;…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Orador: — … o que propõe é que a Assembleia da República aprove uma lei, determinando que haja um regime equiparado de incompatibilidades e impedimentos entre os Deputados da Assembleia da República e os Deputados das Assembleia Legislativa de ambas as Regiões Autónomas,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

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O Orador: — … o que é muito diferente.
A questão que pode colocar-se, do ponto de vista constitucional, é a de saber se é constitucional que o estatuto político-administrativo de uma das regiões autónomas estabeleça um regime diferenciado, em matéria de incompatibilidades e impedimentos, relativamente aos que vigoram para os demais.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Mas votaram favoravelmente em 1999!

O Orador: — O Sr. Deputado Hugo Velosa diz que votámos a favor do estatuto, mas omite que, neste ponto, votámos contra.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Orador: — E não só votámos contra como, na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, o PCP apresentou uma proposta de sentido diverso daquele que foi aprovado, uma proposta exactamente no sentido daquele que agora aqui propomos e que o PSD, lá, impediu.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!

O Orador: — Aliás, já em tempos idos, o PSD, na Madeira, chegou a dizer, perante uma proposta do PCP visando consagrar esta matéria na Assembleia Legislativa da Região Autónoma, que isso não era um problema para a região autónoma mas, sim, para a Assembleia da República. Agora, nesta Legislatura, a posição já não é essa.
Em todo o caso, isso não está aqui em discussão. Aqui a questão é esta: consideramos que, não obstante a questão da constitucionalidade não ser em última instância dirimida na Assembleia da República, a Assembleia da República discute a questão politicamente como ela deve ser discutida. Do nosso ponto de vista, deve adoptar a solução justa, mas obviamente que não receamos essa discussão. O que questionamos é a constitucionalidade de um estatuto que quer impor um regime diferenciado para uma região autónoma relativamente ao regime de incompatibilidades e impedimentos. Essa é que é a questão que vale a pena ser aqui dirimida e não receamos qualquer discussão a qualquer nível sobre a constitucionalidade da nossa proposta nesta matéria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça.

A Sr. Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Haja decoro nesta discussão!

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — A discussão é muito simples e tem a ver com o seguinte: a iniciativa legislativa que o PCP apresenta a esta Câmara volta a colocar o PSD numa situação incómoda e, em particular, o PSD/Madeira numa situação tão incómoda quanto a de subsistir, num Estado de direito unitário, um regime de privilégio descarado na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, sendo que os Srs. Deputados aqui, no Continente, insistem nas inconstitucionalidades para não admitir qualquer proposta ou qualquer discussão sobre esta matéria.

Protestos do Deputado do PSD Hugo Velosa.

Mas, mais grave do que isto, numa forma totalmente antidemocrática, na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, rejeitam liminarmente qualquer iniciativa da oposição para alterar, em sede própria, o regime estipulado para os Deputados da Assembleia Legislativa regional.

O Sr. Mota Andrade (PS): — É uma vergonha!

A Oradora: — Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando se fala aqui em decoro e em seriedade política, nós podemos chamar a isso chicana política ou oportunismo político. Porque oportunismo político e chicana política é os Srs. Deputados do PSD, no Continente e na Madeira, insistirem em invocar o parecer do Governo Regional dos Açores e da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, que falam com a legitimidade própria de quem tem um regime equiparado ao regime existente na Assembleia da República.

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Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Portanto, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, quem está, mais uma vez, enganado neste debate, e visivelmente incomodado, é o PSD.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que, quando falamos em inconstitucionalidade, em última instância, quem poderá dirimir essa inconstitucionalidade é o Tribunal Constitucional. É ao Tribunal Constitucional que compete dizer, mais tarde, se esta iniciativa, apresentada pelo PCP, é ou não inconstitucional. O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Então, aprovem!

A Oradora: — Nos termos do artigo 133.º do Regimento da Assembleia da República, os limites à apresentação de qualquer iniciativa legislativa prendem-se com a existência de uma inconstitucionalidade grosseira. Ora, não é líquido, Srs. Deputados, que a matéria aqui discutida seja inconstitucional; o que é líquido, neste momento, é que a questão é política, é necessário o debate sobre esta matéria na Assembleia da república e é necessário que os portugueses, seja do Continente seja das Regiões Autónomas, percebam a discrepância e o despotismo a que o Dr. Alberto João Jardim já nos vai habituando e que os Deputados da Assembleia da República eleitos pelo Círculo Eleitoral da Madeira não querem perceber.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Termino, Sr. Presidente, dizendo que eu, como relatora, e o Partido Socialista votaremos favoravelmente este parecer, por entendermos que, num Estado de direito democrático, se devem aceitar todas as propostas e todas as discussões, desde que não violem grosseiramente a nossa Constituição. Cá estará o Tribunal Constitucional para decidir, quando, a seu tempo, a iniciativa for discutida e aprovada, se a mesma é ou não constitucional.
Mas esta é uma questão política!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Oradora: — Termino, Sr. Presidente, colocando o «dedo na ferida» e pedindo coragem aos Deputados eleitos pela Madeira para alterarem um regime de excepção, que não faz sentido num Estado de direito democrático como o nosso.

Aplausos do PS.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, peço desculpa, permite-me uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, invoquei, na minha intervenção, que os grupos parlamentares tinham votado, por unanimidade, o regime de incompatibilidades aprovado, em 1999, no Estatuto Político-Administrativo da Madeira, nesta Casa. Isto foi aqui posto em causa. E, nessa altura, já vigorava o actual regime de incompatibilidades para os Deputados que estão nesta Casa.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Qual é o sentido da interpelação, Sr. Deputado?

O Orador: — Sr. Presidente, a minha interpelação…

Protestos do PS.

… vai no sentido de solicitar à Mesa que distribua aos grupos parlamentares a Acta das votações referentes ao Estatuto Político-Administrativo, de modo a que fique claramente demonstrado que, nomeadamente, o Partido Socialista votou favoravelmente um regime de incompatibilidades diferente daquele que, nessa altura, aqui vigorava.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Os Srs. Deputados, com certeza, conhecem isso, mas a Mesa pode providenciar por localizar essa Acta e proceder à sua distribuição.
Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça.

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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, nos mesmos termos do Sr. Deputado Hugo Velosa, quero fazer uma interpelação à Mesa no sentido de pedir que sejam distribuídas as actas, quer do Diário da Assembleia da República, quer da 1.ª Comissão, relativas ao projecto de revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, apresentado pelos Srs. Deputados do PSD, que, inexplicavelmente, foi retirado nesta Legislatura.
Creio que vale a pena ficar registado que os Srs. Deputados do PSD insistem em recusar-se a discutir uma alteração necessária ao Estatuto Político-Administrativo e, por isso, peço que sejam distribuídas essas actas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, procederemos à distribuição de todas as actas que forem necessárias para o esclarecimento da Câmara.
Para uma intervenção, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Comecemos pelo início! O CDS é favorável à instituição de um novo regime de incompatibilidades e impedimentos relativamente à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira. E, se falamos aqui da Madeira, temos de ser honestos: este projecto de lei n.º 366/X, apresentado pelo PCP, tem um fim muito determinado. Este projecto de lei visa, única e exclusivamente, alterar a situação dos eleitos na Região Autónoma da Madeira,…

O Sr. António Filipe (PCP): — Exactamente!

O Orador: — … uma vez que, nos Açores, já há um regime que aponta, por semelhança, para o regime do Continente.

O Sr. António Filipe (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Nós, sendo favoráveis à mudança, propusemos a alteração no sítio próprio, que é o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, e lamentámos muito que não tivesse sido possível proceder a essa alteração no sítio constitucionalmente próprio. Mas sabemos quem foram os responsáveis! Os responsáveis foram aqueles Deputados que, na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, recusaram esta alteração. Os responsáveis foram a maioria dos Deputados do Partido Social Democrata que, na Madeira, recusaram esta alteração.
A verdade é que o CDS, consequente e fiel aos princípios, o propôs e, por isso mesmo, aproveito para cumprimentar o meu companheiro de partido José Manuel Rodrigues, Deputado à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira,…

Aplausos do CDS-PP.

… que, na sede própria, propôs esta alteração.
Agora, como é óbvio, Sr. Presidente, para nós, num Estado de direito, há regras e princípios que têm de ser respeitados, à cabeça dos quais se encontra a Constituição da República Portuguesa, que tem de ser respeitada.
Assim, diz o n.º 7 do artigo 231.º da Constituição: «O estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas…» — e aqui, como é óbvio, incluem-se os Deputados regionais — «… é definido nos respectivos estatutos político-administrativos». A Constituição, neste sentido, é clara.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — E grosseira!

O Orador: — E, claramente, em 1995, quando foi discutido o Estatuto dos Deputados e a sua revisão, excluíram-se, especificamente, os Deputados regionais, porque, na altura, toda a Câmara entendeu que não podia fazer aqui uma alteração ao estatuto político-administrativo das regiões autónomas. Tal como, já nesta Legislatura, quando foi aqui discutido o estatuto remuneratório dos Deputados à Assembleia da República, foram excluídos os Deputados às assembleias legislativas regionais, porque a Câmara entendeu, e bem, que, constitucionalmente, não o podia fazer.
Portanto, nós não mudamos a nossa opinião. Há quem mude, Sr. Presidente,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Orador: — … e, por isso, já agora, que estamos neste debate, é importante registar que o próprio Partido Socialista, que defendeu uma posição relativamente ao projecto do Bloco de Esquerda, que foi dis-

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cutido nesta Legislatura,…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Orador: — … agora, pelos vistos, está, em parte, a alterar a sua posição.
Considerei muito curioso, Sr. Presidente, ver que o Partido Socialista, no ponto 20 deste seu parecer, já admite que há uma eventual, uma possível inconstitucionalidade neste projecto de lei do Partido Comunista Português.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Não é isso que lá está! Não leu bem!

O Orador: — Registamos esta alteração no pensamento do Partido Socialista, e até com algum agrado, Sr. Presidente, porque nos parece que vai no sentido correcto, que é o de fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A admissão desta iniciativa, do projecto de lei do Partido Comunista, que procura equiparar o regime de incompatibilidades e impedimentos das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores àquele que é o regime dos restantes titulares de cargos políticos, designadamente dos Deputados à Assembleia da República, mereceu este recurso por parte do Partido Social Democrata, a exemplo do que já havia acontecido com idêntica iniciativa do Bloco de Esquerda.
Em primeiro lugar, creio que devemos apreciar o critério político desta iniciativa do Partido Social Democrata. E devo dizer que entendo que este recurso é um recurso de vergonha, é um recurso absolutamente desonroso para a política, para aqueles que são os direitos de cidadania.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Está escrito na Constituição!

O Orador: — O que o Partido Social Democrata aqui está a fazer é a tentar proteger uma situação de promiscuidade entre a política e os negócios,…

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Exactamente!

Protestos do PSD.

O Orador: — … uma situação em que a esmagadora maioria dos Deputados do Partido Social Democrata na Assembleia Legislativa da Madeira tem negócios directos com o Governo Regional. É isto e não é mais nada!

Aplausos do BE.

Curiosamente, os Srs. Deputados do PSD — e alguns já o escreveram e deram-no à estampa, em várias publicações — até entendem, numa homenagem do vício à virtude, que esse modelo da Madeira, um dia, há-de ser seguido por todo o Portugal. Mas não! Aí, os Srs. Deputados do PSD vão enfrentar todos aqueles que entendem que o Estado de direito tem regras…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Pois tem! E a primeira regra é a Constituição!

O Orador: — … e que a defesa do interesse público e dos interesses particulares tem regras necessárias, a defender. O Estado não pode ser apropriado por interesses privados, e é disso que aqui se trata, de nada mais! Quanto à questão suscitada, é um mero truque, uma tentativa de maquilhagem de uma interpretação constitucional,…

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não é interpretação!

O Orador: — … é levar uma situação ao absurdo, porque se, por um lado, a Constituição diz — e bem! — que o estatuto dos titulares de cargos políticos nas regiões autónomas será fixado no seu estatuto políti-

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co-administrativo, di-lo em relação a um elenco, a um conjunto de condições para onde se transportam directrizes constitucionais, leis da República e outros detalhes do funcionamento próprio desses cargos.
Da mesma forma, a Constituição prevê que é competência da Assembleia o regime geral de incompatibilidades e de impedimentos para titulares de cargos políticos, o qual deverá ser vertido para o Estatuto Político-Administrativo da Madeira.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Essa é boa!…

O Orador: — Por analogia e por absurdo, não me digam os Srs. Deputados do PSD que, por exemplo, leis como a dos crimes de responsabilidade política também deveriam estar contidas no Estatuto PolíticoAdministrativo da Madeira?! Ou outras, por absurdo?! Portanto, os Srs. Deputados do PSD tentam fazer aqui uma oposição, que não existe, entre o comando constitucional de fixar no estatuto político-administrativo o estatuto dos titulares de cargos políticos e outros comandos legislativos que devem ser transportados para os estatutos das regiões autónomas. É disso que se trata e nada mais! É que a Constituição é clara para todos os órgãos constitucionais e aqueles que resultem do sufrágio popular!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: — Portanto, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, votaremos favoravelmente o parecer da 1.ª Comissão e o PSD, queira ou não, vai ter de enfrentar este grupo parlamentar, ou outros, na correcção desse gravíssimo vício, dessa promiscuidade, dessa protecção ao negócio particular que existe na Madeira…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Orador: — … e que é uma nódoa e uma vergonha para a democracia.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos proceder à votação do parecer, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, no sentido de indeferir o recurso, interposto pelo PSD, da admissão pela Mesa do projecto de lei n.º 366/X — Determina a equiparação entre os Deputados à Assembleia da República e os Deputados às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas em matéria de incompatibilidades e impedimentos (PCP).

Pausa.

Srs. Deputados, o parecer foi aprovado, com votos favoráveis…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, permite-me uma interpelação à Mesa?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, a minha intervenção é verdadeiramente uma interpelação à Mesa, pois penso que, antes de se proceder à votação, deveria ter sido feita a verificação de quórum.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, a Mesa ponderou a necessidade ou não da verificação de quórum e pareceu-lhe manifesto que havia, efectivamente, quórum bastante para se proceder à votação e, por isso, passámos à votação, já a consumámos e …

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas tem mesmo de ser verificado o quórum por meio electrónico, não basta olhar e dizer que a Sala está «composta». Temos de saber quantos Deputados estão, neste momento, na Sala e quantos votaram.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, tenham paciência mas já consumámos a votação e VV. Ex.as deveriam ter suscitado o problema antes.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, dá-me licença…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, peço desculpa mas estávamos todos expectantes em relação à verificação do quórum, que é o procedimento habitual. Naturalmente, o Sr. Presidente, a Mesa, procede assim em todas as votações e não fomos informados de que se iria proceder de outra forma. Portanto, não havia nenhum modo de interpelar a Mesa para que se fizesse uma coisa que sempre se faz, porque não sabíamos que a Mesa não a ia fazer.
Por conseguinte, Sr. Presidente, penso que, tal como em todas as outras ocasiões de votação, em que também se verifica visualmente que existe quórum na Sala, devemos proceder à verificação do quórum por meio electrónico.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, uma vez que se suscita a questão da necessidade de verificação electrónica do quórum de deliberação e dado que não chegámos a anunciar o resultado da votação, vamos proceder a essa verificação e, posteriormente, efectuar, de novo, a votação do parecer.
Entretanto, conforme já sabem, os Srs. Deputados que, por qualquer razão, não puderem utilizar o cartão electrónico terão de o assinalar à Mesa e, depois, assinar a folha de presenças que se encontra nos serviços de apoio ao Plenário.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 196 presenças, às quais se somam 4 registadas pela Mesa, pelo que temos quórum para proceder à votação.
Vamos, então, proceder à votação do parecer, elaborado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sobre o recurso, interposto pelo PSD, de admissão do projecto de lei n.º 366/X — Determina a equiparação entre os Deputados à Assembleia da República e os Deputados às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas em matéria de incompatibilidades e impedimentos (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Terminada a discussão e votação deste parecer, cuja aprovação implica a rejeição do recurso, vamos dar início à apreciação do projecto de resolução n.º 175/X — Recomenda ao Governo um programa de apoio às pequenas e médias empresas (PSD).
Para fazer a intervenção de apresentação do projecto de resolução, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Henriques.

O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: São micro, pequenas e médias empresas mas têm uma grande importância para o País. As PME são 99,6% das empresas portuguesas, representam 3/4 dos postos de trabalho e 57,9% do volume de negócios. São elas que animam a microeconomia das regiões, combatem a desertificação de territórios, constituem o miolo do País real.
Que atenção mereceram nestes dois anos de Governo? Nenhuma! Há uma total insensibilidade para aquele segmento, que é «a menina dos olhos» da União Europeia, e a ausência da aplicação dos princípios que estão contidos na Carta Europeia das PME.
Numa atitude de deslumbramento, mas também de impreparação e desconhecimento, o Ministro da Economia comporta-se como se fosse o chairman da Agência Portuguesa para o Investimento (API), não percebendo que sem tecido intermédio não tem economia real. E quando o PSD denuncia a falta de políticas do Governo para as PME, apressa-se a desmentir, montando mais uma sessão de superpropaganda, tal como sucedeu, no Porto, no passado dia 6.
Até aqui, Sr.as e Srs. Deputados, quando os empresários se candidatavam a incentivos do PRIME, recebiam uma notificação pelo correio a informar da aprovação da candidatura e, dias depois, o contrato para assinarem.
Agora, são notificados para uma sessão pública de assinatura dos contratos, ainda para mais de um «rapar» dos últimos fundos do PRIME deste Quadro Comunitário de Apoio, uma atitude inqualificável, uma tentativa de instrumentalização dos empresários para esconder a inércia do Governo, inércia que está a produzir resultados que poderão ser dramáticos para o nosso futuro colectivo.
Darei só três exemplos face à exiguidade de tempo de que disponho.
À cabeça, convido os Srs. Deputados a irem às cidades e vilas transfronteiriças.
A política fiscal do Governo, o aumento do IVA para 21%, os sucessivos aumentos do preço da gasolina resultam em disparidades fiscais de tal ordem que levaram ao encerramento das bombas de gasolina do

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lado português. É desolador passar por estas cidades e vilas e verificar que as empresas vão fechando, que os cartazes de promoção de produtos foram substituídos por outros que dizem «encerrado» ou «trespassa-se».
O que é que o Governo faz para obviar a esta situação? Nada! O Governo ultrapassa a fronteira da indiferença e da insensibilidade face a esta questão. Impávido e sereno, vê a economia espanhola a ser ajudada pela débil economia portuguesa.
Mas, Srs. Deputados, igualmente triste é a situação dos nossos pólos urbanos.
Com populações de residentes cada vez mais envelhecidas, com a concorrência dos grandes centros comerciais e hipermercados que nascem como cogumelos, vão definhando.
Comerciantes mantêm as lojas abertas, muitas vezes por vergonha, consumindo as poucas poupanças acumuladas ao longo de anos; outros não aguentam e fecham; ainda outros colocam placas de «trespassase» à espera que apareça alguém interessado nas suas lojas.
O que faz o Governo? Lança o programa MODCOM para modernização das lojas. Seria melhor que lhe colocassem o nome MORRECOM, pois é um programa que, efectivamente, só ajuda as empresas a morrerem mais depressa.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — É verdade!

O Orador: — Será que os membros do Governo não percebem que se o empresário se candidatar para modernizar a sua loja vai ter de investir ainda mais e vai continuar sem clientes a entrarem na sua loja, isto é, fecha mais depressa? Na nossa opinião, seria mais adequado criar uma task force entre autarquias, associações comerciais e comerciantes, um plano de emergência que criasse dinâmicas capazes de fazer concorrência aos centros comerciais existentes, salvando o comércio de proximidade.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Mas não ficamos por aqui, Srs. Deputados.
Outro exemplo é o do combate à fraude e evasão fiscais. Estamos de acordo que deve ser cada vez mais firme, somos favoráveis a esta atitude de firmeza, mas talvez a atitude pedagógica pudesse surtir melhores efeitos.
Não podem existir dois pesos e duas medidas. O Governo não pode só exigir e não cumprir, o Governo não pode asfixiar ainda mais as micro e pequenas empresas, não lhes pagando a tempo e horas e exigindo o pagamento do IVA que não ainda pagou a essas mesmas empresas.
O Governo dá um mau exemplo. Diria mesmo que será a única situação em que se aplica o ditado «olha para o que eu digo, não para o que eu faço»! Sobre esta matéria, apresentamos três propostas concretas. Em primeiro lugar, escalonar no tempo o pagamento das dívidas em atraso às micro e PME, aliás, cumprindo uma directiva comunitária que está em vigor desde 2003.
Em segundo lugar, aceitar a compensação fiscal quando não cumpra o prazo a que se comprometeu e transformar automaticamente as dívidas do Estado às empresas em títulos que possam ser negociados com terceiros, antecipando assim o seu recebimento.
Em terceiro lugar, que o pagamento do IVA resultante de fornecimentos ao Estado só seja exigível após boa cobrança, como já funciona em relação ao sector da construção civil. Para além de moralizador, introduzia liquidez no depauperado tecido das PME e, do ponto de vista fiscal, seria uma medida neutra, pois não acreditamos que o problema do Governo seja de liquidez.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Também no âmbito da reestruturação do Ministério da Economia, um processo já com «barbas» e que tarda a ser colocado em vigor, o aspecto central deveria ter sido a criação do balcão único, do gestor do cliente que se assumisse como um facilitador junto dos inúmeros serviços da Administração Pública, mas tal não foi feito. É essa uma das medidas que propomos.
Também no domínio das compras do Estado, elas são ineficientes, caras e constituem um processo há muito ressequido, apesar de o anterior governo ter deixado todos os estudos e documentos que permitiriam uma profunda modernização nesta matéria.

A Sr.ª Zita Seabra (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Dois anos passaram, as novas empresas que vão surgindo não conseguem aceder à central de compras do Estado, os produtos que constam desta são mais caros do que no mercado, o Estado faz maus negócios! Também neste domínio entendemos que é preciso mudar.
No capítulo da inovação, o Sr. Ministro da Economia e da Inovação já só é, efectivamente, Ministro da Economia, pois perdeu o «I», o «I» de Inovação! O seu colega da Ciência foi-se encarregando de o esvaziar. Na Agência de Inovação, no processo de extinção do INETI, cada vez menos a inovação está centrada na produção de riqueza. Um desastre com-

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pleto! Por isso apresentamos também propostas neste domínio.
E o que dizer do QREN? Por imposição europeia da Estratégia de Lisboa, o QREN deveria ter (e tem) como vector principal a competitividade. Mas, por incrível que pareça, na troika que vai mandar neste importante instrumento de 21,5 mil milhões de euros, dos quais 3000 milhões são para a competitividade, não encontramos o Ministro da Economia — mas aparecem o das Obras Públicas, o do Emprego e o Ministro de Estado e da Administração Interna.
De facto, é caso para dizer que só encontramos o Ministro da Economia em actividades de propaganda ou em afirmações infelizes em relação à evolução do País. Se este Ministro não tem capacidade e se o Sr.
Primeiro-Ministro o quer manter, então, coloque-o definitivamente como chairman da API e chame a si a condução dos dossiers das PME. Aliás, tem sido essa a prática constante: quando o Governo tem dificuldades, o Primeiro-Ministro chama a si a condução desses mesmos dossiers! E, já agora, que aproveite e faça o mesmo em relação ao QREN — efectivamente, o QREN foi entregue em Bruxelas, mas é um facto que ainda não tem aprovado o seu modelo de governância.
Para terminar, Srs. Deputados, diria que esta matéria das PME é central. Aquilo que do tecido empresarial das PME hoje se destruir com esta atitude do Governo dificilmente será reconstruído no futuro. Ou o Governo acciona um plano de emergência para actuar neste domínio ou corre o risco de já ser tarde.
Uma palavra final, olhando para a bancada do Governo: mais uma vez, o Ministro da Economia prima pela ausência num debate desta importância.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Todo o Governo!

O Orador: — E prima pela ausência porque tem medo do contraditório, tem medo de ser confrontado com a sua incompetência e com a sua falta de saber nesta matéria.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Viro-me agora para a bancada do partido Socialista e lanço um desafio: sei que no Grupo Parlamentar do PS há pessoas com sensibilidade para esta matéria; por isso, não «metam a cabeça na areia», discutam de uma forma séria esta questão e aceitem algumas das soluções que apresentamos neste projecto de resolução, porque será uma maneira de conseguirmos obviar a que se destrua o tecido das micros e PME em Portugal.
Diria que já não se trata apenas de colocar as PME na agenda política, é imperioso que se faça algo, é imperioso que se actue, efectivamente! Se para o Governo o tema é pequeno, para nós é muito grande e fundamental para o País.
Espero esse bom senso da parte do Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de resolução hoje aqui apresentado pelo Grupo Parlamentar do PSD trata efectivamente de uma das áreas mais significativas da nossa economia. De facto, as micro, as pequenas e as médias empresas são um dos motores da economia portuguesa e grandes responsáveis pela criação de emprego.
Ainda recentemente, um estudo do IAPMEI referiu que, de 2000 a 2004, as PME criaram oito vezes mais empregos do que as grandes empresas e identificou que no norte e na zona centro as pequenas e médias empresas são as principais empregadoras.
Um outro indicador relevante é que o volume de negócios realizado pelas PME é sete vezes superior ao gerado pelas grandes empresas. Relevante é ainda o seu peso nas exportações e no volume de negócios nacional.
No entanto, consideramos que, no essencial, o PSD se limitou a reeditar, em pior, as anunciadas 15 medidas de apoio às pequenas e médias empresas que já tinham sido apresentadas em 2006, sem grande apoio, agora acrescida de uma que diz respeito à parte fiscal, mas que também não é nova, nem boa! No essencial, podemos dizer que muitas das questões abordadas no preâmbulo deste projecto de resolução reflectem também as nossas preocupações, que o Governo também comunga e que estão presentes na Carta Europeia das PME.
No entanto, tal referência, deve ser actualizada, porque existe já uma comunicação da Comissão ao Conselho, Parlamento e Comité das Regiões sobre «modernizar a política de PME na União Europeia para cumprir a Agenda de Lisboa», e que a substitui. E também convém não esquecer o plano de acção do empreendedorismo, de Novembro de 2005.
Mas, o que importa reter que o que interessa, Sr.as e Srs. Deputados, é olhar à acção. São necessárias algumas políticas que estes documentos referem, e isso é o que na opinião do Grupo Parlamentar do PS

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tem sido feito. Ou seja, o que é bom não é novo e o que é novo não é bom!

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Na nossa visão, apoiar as PME é compatível com o agir noutros campos, ao contrário do que diz o PSD, nomeadamente através da dinamização do investimento.
O PSD parece querer aqui, através de uma incompreensível amnésia, descurar o efeito de arrastamento para o investimento e para a fixação de PME em determinadas regiões e em determinados sectores, denominando-os de mega-investimentos. Não podemos de todo concordar com esta visão redutora porque também sabemos que aqueles podem ser uma oportunidade de negócio para as PME, quer como fornecedores quer como clientes.
É verdade que a dinâmica das PME é efectivamente muito relevante e esta situação muito se relaciona com a importância do empreendedorismo e da sua promoção, que reputamos de fundamental e que nos últimos tempos tem sido defendido e realizado.
Quando se compara as políticas dirigidas às PME em Portugal e na Europa, só por esquecimento se admite que nada seja dito no que respeita ao último relatório sobre a matéria da Comissão Europeia, em que o sistema de garantia mútua aparece como um caso de referência.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Muito bem!

A Oradora: — E temos ainda os casos da criação da Empresa na Hora e da Marca na Hora, que estão ao nível das melhores práticas — ainda recentemente, o projecto Empresa na Hora foi galardoado com o primeiro lugar no Prémio Europeu de Iniciativa Empresarial.
Desde o início do projecto, já foram constituídas 22 000 Empresas na Hora. Portugal subiu no ranking geral ao nível da facilidade em fazer negócios.
Os centros de formalidades empresariais, assim como as medidas no sentido da desburocratização e da desmaterialização dos procedimentos administrativos, são vistos como muito úteis à vidas das empresas. E estas reconhecem-no! Não é possível continuar a querer, insistentemente, ignorar tudo o que está a ser feito e dizer-se que o Governo só tem uma política dirigida aos grandes. Isto só pode ser designado por má fé e pelo crescente afastamento entre o PSD e a realidade do País.

Aplausos do PS.

Já somos reconhecidos internacionalmente pela adopção de algumas das melhores práticas. Com certeza, há ainda muito a fazer, mas finalmente Portugal está a dar passos rápidos e seguros para colmatar o imobilismo de anos nestas matérias.

Protestos do Deputado do PSD Miguel Frasquilho.

Houve imobilismo, sim, Sr. Deputado Frasquilho! Na impossibilidade de me referir com profundidade a todas as 16 medidas constantes do projecto de resolução hoje em análise, vou abordar apenas algumas que considero mais relevantes para a economia e para as PME.
Quanto à questão da carga fiscal excessiva das PME, em comparação com a média europeia, principalmente com os novos Estados-membros, temos de ser sérios e dizer que estão em causa realidades incomparáveis. Este argumento desconsidera, por exemplo, que a taxa portuguesa de 25% de IRC deve ser conjugada com um determinado número de incentivos ao investimento empresarial, havendo mesmo críticas da esquerda dita radical no sentido contrário — posso indicar, como exemplo, o regime contratual de benefícios ao investimento ou o regime de redução de taxa aplicável às regiões do interior.
Refira-se ainda que a taxa de IRC até tem sofrido fortes reduções nos últimos anos.
Portanto, a primeira medida, que propõe a constituição de um regime dual de taxas de IRC, criando uma taxa reduzida de 15% para os primeiros 100 000 € de matéria colectável, é um ziguezague constante, porque foi o mesmo PSD que, no governo, quis pôr fim às taxas diferenciadas para o interior.
A descida de impostos proposta pelo Dr. Marques Mendes gerou fortes reacções, desde logo por parte de prestigiados economistas, tendo sido classificada como irresponsável, dada a situação económicofinanceira que o País ainda hoje atravessa, no que diz respeito à consolidação das finanças públicas.
Em nossa opinião, tratou-se de uma certa precipitação do PSD, que, na continua busca do populismo, apresenta esta proposta numa altura em que tal representaria um retrocesso no processo de consolidação iniciado pelo Governo do Partido Socialista e, mesmo, o deitar por terra de todos os sacrifícios que os portugueses têm feito para que Portugal ponha em ordem as suas finanças e incremente o seu crescimento, de forma mais acelerada mas sempre mais consolidada.
Repare-se que nem os próprios empresários a apoiam.

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Esta semana, as confederações patronais já se tinham pronunciado quanto a esta medida e mostraram as suas dúvidas quanto à descida do IRC e do IVA, parecendo haver consenso quanto ao facto de ser um assunto a estudar, mas afastando a hipótese de ser para já.
Apoio às PME, sim! Populismo fácil e irresponsável, não!

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: — Isso é o que o PS está a fazer!

A Oradora: — No que respeita à medida que pretende facilitar o acesso ao crédito para investimento, tornando efectivo o acesso das PME a fundos de garantia mútuos com financiamentos públicos através do IAPMEI, consideramos que a medida é parcelar.
Em primeiro lugar, não se pode ignorar que o Sistema Português de Garantia Mútua está em fase de forte dinamização, especialmente direccionado para as PME. A Norgarante, a Lisgarante e a Garval, são os três operadores no domínio da garantia mútua e estão neste momento a aprofundar a recente iniciativa de abertura de antenas fora dos grandes centros urbanos, por forma a apostar ainda mais na proximidade ao tecido empresarial, exclusivamente de PME, o que consideramos de extrema importância.
As garantias totais emitidas pelo sistema tiveram uma evolução muito significativa. Assim, passaram de cerca de 250 milhões de euros no final de 2004 para cerca de 650 milhões de euros em meados de 2006.
No mesmo período, o número de operações passou de aproximadamente 2000 para 5500 garantias emitidas em favor de PME e microempresas.
Consideramos ainda muito importante os incentivos à contratação de licenciados pelas PME, uma vez que como sabemos o capital humano é hoje entendido como um factor critico fundamental.
Esta medida, a sétima do vosso projecto de resolução, na realidade corresponde integralmente à Medida 3 do INOVJOVEM. Globalmente, o INOVJOVEM tinha como objectivo inicial a inserção de 1000 jovens licenciados em PME. Curiosamente, este valor foi objecto de tantas críticas e declarações de cepticismo, mas, pelos vistos, os senhores pensaram melhor e consideram agora que a medida que já existe há quase dois anos é essencial. Mais vale tarde que nunca!

O Sr. Afonso Candal (PS): — Bem lembrado!

A Oradora: — Uma vez que reconhecem a importância desta medida concreta, aproveito para fazer um balanço da mesma. Das 1800 candidaturas, foram aprovadas mais de 1000, abrangendo mais de 4400 jovens. Estamos a falar aqui de volumes de incentivo concedido na ordem dos 74 milhões de euros. O número de jovens efectivamente integrados nas empresas já ultrapassa os 3500.
Os apoios a projectos inovadores no âmbito dos últimos concursos do Novo PRIME implicaram a criação de 11 000 novos postos de trabalho.
Também no que diz respeito a conceder um novo impulso ao ensino profissionalizante, estamos convictos que já terão notado que a aposta do Governo é clara. No âmbito do QREN, o Programa Operacional Potencial Humano é o que mais recursos financeiros terá para o apoio à qualificação dos portugueses.
Paralelamente, será mantido o apoio à formação profissional nas empresas, na sequência do que foi a aposta deste Governo no Novo PRIME.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, faça favor de concluir.

A Oradora: — Para terminar, porque não vou ter tempo de me referir a todas as medidas, gostaria de dizer que, em suma, elas são um rol de medidas que já estão a ser implementadas pelo Governo.
Em conclusão, podemos dizer que se tratam de medidas que aparecem de forma desgarrada e esquecem as suas vertentes de interdependência.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, faça favor de concluir.

A Oradora: — Termino já, Sr. Presidente.
Como disse, estas recomendações estão no terreno e estranhamos, aquando da apresentação das nossas propostas, não termos registado o consequente apoio da parte da bancada do PSD. Ficamos satisfeitos por agora o fazerem de forma mitigada. Mais vale tarde do que nunca! Fica o registo da aprovação – implícita, é certo – do PSD à política económica de apoio às PME seguida por este Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

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O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, comecemos pelo fim. Não sei onde se baseou para dizer que apoiávamos a política do Governo em relação às PME.

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Exactamente! Até porque ela não existe!

O Orador: — Desde a primeira hora que o PSD, responsavelmente, apresentou e sugeriu medidas concretas para apoio às PME e uma política verdadeira. E está à vista por que o fez, Sr.ª Deputada.
Em primeiro lugar, da sua intervenção verificámos que não conhece o País real. Diz que nós não o conhecemos, mas a Sr.ª Deputada é que não o conhece.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — O Sr. Deputado só conhece a Madeira!

O Orador: — Em segundo lugar, a Sr.ª Deputada defende um Ministro que anuncia 200 investimentos, o que antigamente era feito por carta, não sendo preciso «pompa e circunstância», e não anuncia uma única medida real que seja boa para as empresas. E sabe qual é o resultado? O resultado é claro: a economia não cresce e aqueles que estão nas PME não estão satisfeitos com a política do Governo. Isso é evidente!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — A Sr.ª Deputada falou nas medidas que são propostas, pronunciou-se sobre elas, mas leuas mal! É que todas elas são válidas e há um desafio, ou seja, o tempo demonstrará que o são.
Quando o Sr. Ministro Manuel Pinho, recentemente, disse que só nos próximos sete anos as PME serão uma prioridade, isso demonstra que nos primeiros dois anos não foram.

O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Claro!

O Orador: — Mas o Ministro Manuel Pinho ainda estará no Governo daqui a sete anos?!

Vozes do PSD: — Não!

O Orador: — Valha-nos Deus! Os Deputados do Partido Socialista já viram a desgraça que seria para este País e para as empresas?! Esse é o problema ao qual a Sr.ª Deputada tem de responder. Obviamente, este Governo não tem uma política concreta para as PME. Assim, desafio a Sr.ª Deputada a dizer, uma a uma, quais as que não são correctas.
Por exemplo, propomos duas medidas em relação ao IVA que são boas para o País, são aceites por todas as empresas e é o que há de mais correcto em legitimidade nas relações entre o Estado e as empresas, ou seja, a questão do pagamento do IVA. O Estado atrasa-se nos pagamentos. Há que fazer um plano de pagamentos para as empresas não serem prejudicadas. O Estado tem de pagar o IVA à cabeça em situações em que é o próprio Estado que fica a dever às empresas. Estas são medidas concretas.
A Sr.ª Deputada veio falar de uma menor burocracia para criar empresas. Bom, isso é positivo, mas o que é fundamental para que as empresas funcionem, para além da sua criação, é que depois existam medidas concretas para que a economia cresça e as empresas tenham condições para melhor viverem em Portugal.
Mas, Sr.ª Deputada, há uma questão que gostaria de lhe colocar. Fiquei muito admirado pelo facto de a Sr.ª Deputada, eleita pelo círculo eleitoral de Castelo Branco, que sabe o que se está a passar com o problema da carga fiscal, com a taxa do IVA e da diferença desta em relação a Espanha — uma Deputada do interior do País, que sente mais esta situação —, não ter ido ali, à tribuna, dizer: «Nós não concordamos com esta política do Governo, que está a asfixia» as empresas e que faz com que a economia não cresça».
É esse o problema! Ora, o desafio que se deixa aqui ao Partido Socialista é que, não por táctica política, porque considera que as medidas são desgarradas, venha aqui e aprove algumas medidas — mesmo que não as aprove todas —, dando um sinal de que a sua preocupação é que as empresas em Portugal produzam riqueza e a economia cresça efectivamente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Hortense Martins, há pouco, do alto daquela tribuna, V. Ex.ª fez uma intervenção sobre pequenas e médias empresas, segundo pressuponho. É

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esse o tema do nosso debate. Para além de uma interessantíssima referência a documentos do Conselho e da Comissão e da importante Carta Europeia das Pequenas Empresas, referiu-se a empreendedorismo, inovação, melhores práticas que são sentidas em Portugal e até teve tempo para acusar um partido da oposição de crescente afastamento da realidade. Ouvi-a com atenção.
A primeira pergunta que lhe quero colocar é a seguinte: por onde tem andado nos últimos tempos? Tem passado por Castelo Branco? Tem estado cá, em Portugal? É que, ouvindo-a, a primeira impressão que nos deixa é que não tem passado por cá. Deve ter andado por outras paragens!

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — A Óbidos é que não foi!

O Orador: — Deve ter andado por outras paragens… Sr.ª Deputada, V. Ex.ª está muito satisfeita com o facto de a economia portuguesa, em altura de ciclo económico positivo, crescer apenas 1,3%, quando a média comunitária é apenas mais do dobro e, em termos de economia mundial, subiu 5%?! Certamente, deve estar satisfeita com esta situação. Já agora, gostaria de dizer que, na sua resposta, não pode comparar realidades que são incomparáveis, ou seja, não compare um ciclo que é recessivo com um ciclo que é de crescimento, como estava a comparar o seu colega Deputado do lado.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Ah! É de crescimento!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Ainda bem que o diz!

O Orador: — Já agora, em relação ao papel que o Estado pode ter quanto a esta matéria, ele é, fundamentalmente, um papel de natureza fiscal, sendo muito importante aquilo que o Estado determina quanto à sua política de impostos.
Relembro uma proposta que o CDS fez aqui, no último Orçamento do Estado, e que tinha a ver precisamente com o regime fiscal especial para as zonas de fronteira delimitadas. Agora temos um problema: é que cada vez mais as nossas zonas de fronteira, tendo em atenção a diferença que temos com o IVA para Espanha, se vão alargando. O que vale é que temos o mar que as acaba por limitar e, por isso, os limites geográficos vão ajudar… Mas, Sr.ª Deputada, não considera necessário um regime especial para as zonas de fronteira, para além do que já existe para as zonas do interior?

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Essa questão não a preocupa? Será que não sente que empresas e empresas vão fechando nessas zonas, dia após dia, devido às enormíssimas dificuldades com que têm em competir na zona raiana, com um IVA que é completamente distinto do lado espanhol?

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Exactamente!

O Orador: — Já agora, o que pensa de uma proposta de que o Governo chegou a falar sobre a existência de uma bolsa específica para as pequenas e médias empresas? Trata-se de uma bolsa de valores para as pequenas e médias empresas e com incentivos de natureza fiscal. Apoia ou não? Considera que é importante ou não? Considera importante, como acontece pela Europa fora e cada vez mais se vai falando disso, respeitando aquelas que são as determinações europeias, que exista um regime especial para as pequenas e médias empresas no plano fiscal? É que é isto que se discute pela Europa fora. Ora, como V. Ex.ª não tem andado por Portugal, certamente tem andado por outras paragens e, certamente, lembra-se dessas discussões…!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Anda distraído!

O Orador: — Portanto, para nós, é essencial perceber qual a opção que o Governo tem em relação a essa matéria.
Havia outra questão que gostaria de perceber. Falou do QREN. Por onde anda o QREN? Já que estamos a questionar por onde andam, numa discussão como esta, sabe onde anda o Sr. Ministro da Economia?

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sei!

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O Orador: — Sabe onde anda o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social? Sabe onde anda a Sr. Ministro da Educação em relação às questões de formação?

O Sr. Afonso Candal (PS): — Para este debate?! Tinham mais que fazer!

O Orador: — É que essas questões são verdadeiramente essenciais e é pena que tenhamos um debate em que falta mais política social.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, faça favor de concluir.

O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
De facto, é pena que tenhamos este debate quando falta um dos elementos essenciais para discutir esta matéria, ou seja, o Governo. Ou será que temos um Governo que não se preocupa com esta matéria?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada Hortense Martins, o Partido Ecologista «Os Verdes» cedeu-lhe tempo para poder responder. Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Ai não foi do Governo?!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, antes de mais queria agradecer o tempo que me foi concedida.
Vou mesmo começar pela última questão do Sr. Deputado Diogo Feio, que me perguntou por onde anda o Ministro da Economia, relacionando com a pergunta sobre se eu tenho cá estado ou não.
Sr. Deputado, eu tenho cá estado, provavelmente o Sr. Deputado é que tem andado distraído, porque o Ministro da Economia, neste momento, está em Castelo Branco e esteve em Castelo Branco.

Vozes do PSD: — Grande Ministro!

A Oradora: — Ele anda no chamado País real, no interior, a lançar um importante investimento na área das centrais de biomassa. Se isso nada representa para o Sr. Deputado, está tudo dito!

O Sr. Afonso Candal (PS): — Escusava de ter ouvido esta!

A Oradora: — Também agradeço a pergunta colocada pelo Sr. Deputado Hugo Velosa que se relaciona com as SCUT e que também diz respeito às bancadas da direita. Se as SCUT também nada representam para o apoio ao investimento na óptica dos partidos da direita… Conheço muito bem os empresários daquela região e sei qual foi a importância deste investimento estrutural para o seu desenvolvimento, mas isso foi completamente menosprezado pelos senhores!

O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Não conhece o estado de espírito!

A Oradora: — Além disso, relativamente à burocracia, consideramos que não está apenas em causa a questão da burocracia na criação de empresas mas também nos chamados custos de contexto. Esse problema já existe há muito tempo e está a ser atacado seriamente pelo Governo.
Portanto, agradeço os vossos comentários e, como o Sr. Deputado Diogo Feio disse, estamos na óptica e num ciclo de crescimento. Assim continuemos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não nos cansaremos de sublinhar que a oposição faz milagres, como demonstra o novo afã e amor do PSD pelas pequenas e médias empresas, reproduzindo, aliás, um também conhecido «filme» do PS.
Corria o último ano do século XX quando, em debate nesta Assembleia da República sobre o Estado da Nação, no dia 24 de Junho de 1999, o Deputado Durão Barroso, então presidente do PSD na oposição, afirmou: «o apoio às pequenas e médias empresas será uma prioridade política. Farei aprovar, nos primeiros 100 dias de governo, um programa específico de apoio às pequenas e médias empresas. E, entre

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outras medidas, este programa vai consagrar uma redução do IRC das pequenas e médias empresas de 34% para 20% e uma redução para 15% do IRC das pequenas empresas sediadas fora das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto». Bem esperaram as PME até 20 de Fevereiro de 2005 pelo programa específico!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não tiveram tempo para o fazer!

O Orador: — Mas, como mais vale tarde que nunca, oito anos depois, com o PSD novamente na oposição e Durão Barroso lá longe em Bruxelas, cá estamos na mesma a debater um projecto de resolução contendo um programa específico de apoio às PME! Poderemos também sublinhar a redescoberta da Carta Europeia das Pequenas Empresas, para a qual, num acto de profunda autocrítica, se reconhece agora que «tardam respostas concretas e claras através de uma política coerente e competente». É uma verdade tão verdadeira que a Direcção-Geral das Empresas do Ministério das Actividades Económicas e do Trabalho do Governo PSD/CDS-PP, de Santana Lopes e Paulo Portas, no Relatório de Implementação de 2004 da referida Carta, reconhecia com uma objectividade digna de nota: «Em termos de conclusões, poderemos dizer que as medidas de política, ou mais propriamente a sua ausência,» — sublinho este excerto em que se diz «ou mais propriamente a sua ausência» — «de que iremos dar nota neste relatório, espelha o muito que ainda haverá que trabalhar para uma melhor implementação das preocupações manifestadas na Carta».
Posso ainda recordar (apesar de serem todas más recordações para as micro e pequenas empresas) a crítica radical e justa ao pagamento especial por conta feita pelo PSD. Quem não se lembra de um discurso violento do Deputado Rui Rio ou dos outdoors que diziam «Pena máxima para a Colecta Mínima»? Tudo isto foi, depois, transformado pela Ministra das Finanças Manuela Ferreira Leite, no supra sumo dos instrumentos de combate à fuga fiscal de pequenas empresas relapsas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

O Orador: — Valerá ainda a pena acrescentar três notas sobre algumas das medidas agora enunciadas.
A primeira para salientar a descoberta pelo PSD das virtualidades do «sistema bancário público» para apoiar o investimento e crescimento das pequenas e médias empresas.
A segunda para destacar a criação, no âmbito do IAPMEI, da figura do «Gestor de Cliente para as pequenas e médias empresas», interlocutor único para o tratamento dos assuntos das PME com o Estado.
O contrário, portanto, do que o PSD fez durante os governos de Cavaco Silva, ao alargar o objecto do IAPMEI às grandes empresas.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Isso já lá vai!

O Orador: — A terceira nota destina-se a felicitar o PSD por finalmente acolher como medida a necessidade de «discriminação positiva» das PME no acesso aos fundos comunitários, ao QREN, o que nunca fez enquanto foi governo! Feita esta breve resenha histórica, gostaria de afirmar que o Grupo Parlamentar do PCP considera globalmente positivo o projecto de resolução do PSD que recomenda ao Governo um programa de apoio às pequenas e médias empresas. Mas tenho de completar esta avaliação com a consideração de que o conjunto de medidas propostas é parcial e claramente insuficiente.
É parcial porque PS e PSD, quando falam de pequenas empresas, reduzem, em geral, os problemas e as respostas desse universo aos do conjunto constituído por algumas pequenas empresas, pela generalidade das médias empresas e, particularmente, pela porção desse conjunto que é exportadora. Isto quando não integram nesse universo as pequenas e médias unidades de um grande grupo económico. Lembremonos do que aconteceu com o RETEX e com os 50 projectos de empresas do Grupo Amorim! Ora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as micro e pequenas empresas são absolutamente dominantes (mais de 90%) e milhares e milhares dessas pequenas empresas produzem para o mercado interno. Quando as políticas económicas orçamentais restritivas penalizam o poder de compra dos portugueses e estrangulam financeiramente as autarquias locais, a sobrevivência destas unidades económicas torna-se um calvário. O projecto em apreciação nada diz sobre esta questão! Milhares e milhares dessas empresas estão ligadas ao comércio tradicional – 99,7% das empresas desse sector são PME. Ora, as políticas de expansão explosiva e desordenada das unidades e formatos dos grupos da grande distribuição – políticas que foram de total liberalização até ao governo PSD/CDS-PP e de total permissividade desde então, sem que o Governo PS as tenha ainda revogado – vêm liquidando irreversivelmente o pequeno comércio tradicional. O projecto de resolução nada diz sobre o assunto! Milhares e milhares de pequenas empresas de serviços e sectores tão diversos como as oficinas de automóveis, as empresas de desempanagem, proprietários florestais, pequenos retalhistas de combustíveis, pequeno comércio e pequenas unidades dos sectores produtivos, são vítimas da voracidade dos

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grandes grupos económicos da banca, dos seguros, da grande distribuição, das petrolíferas e das celuloses, que violam as regras de uma concorrência leal, abusam de posições dominantes e impõem preços monopolistas sem que o Governo intervenha a tempo e horas e em devida forma. O projecto de resolução nada diz sobre o tema! Milhares e milhares de pequenas empresas, em particular dos sectores produtivos, suportam elevados custos de factores de produção essenciais, como os da energia e telecomunicações, afectando a sua competitividade interna e externa, porque superiores aos dos seus concorrentes estrangeiros. O projecto de resolução faz silêncio sobre este problema! Mas não só o projecto de resolução do PSD nada diz sobre estes pontos como o Governo do PS e do Eng.º Sócrates prossegue a generalidade destas políticas para as pequenas e médias empresas com algumas agravantes.
De facto, com a nova lei do arrendamento penalizam-se os direitos e a estabilidade dos pequenos estabelecimentos e liquida-se o valor do trespasse. Com um QREN que transfere os apoios às micro e pequenas empresas para os programas operacionais regionais sem o estabelecimento de plafonds com esse objectivo, agravam-se ainda mais as dificuldades do acesso das PME às ajudas comunitárias. Com os atrasos de meses e meses nos pagamentos das dívidas do Estado às pequenas empresas, em particular respeitantes a projectos apoiados por fundos comunitários, agrava-se ainda mais esta situação.
Por outro lado, a manutenção de uma política fiscal com significativos diferenciais do IVA relativamente a Espanha causa a dizimação de centenas de pequenas e médias unidades de retalho nas zonas fronteiriças.
São necessárias outras políticas para as pequenas e médias empresas portuguesas. Não basta tecerlhes louvores no discurso político. São necessárias e possíveis políticas que atendam à sua especificidade, natureza e implantação no tecido económico português.
Gostaria de recordar, para terminar e para os mais esquecidos destas matérias, que a Constituição da República não é neutra face à dimensão das empresas. Diz, no seu artigo 86.º, que «O Estado incentiva a actividade empresarial, em particular das pequenas e médias empresas».

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, há pouco, ainda neste debate, tive oportunidade de fazer um conjunto de perguntas à Sr.ª Deputada Hortense Martins, que aqui veio apresentar a posição do Partido Socialista em relação a esta matéria. A primeira dessas perguntas procurava saber onde estava o Sr. Ministro da Economia, ao que me foi respondido que está em Castelo Branco.
Algumas conclusões se podem retirar deste facto. Em primeiro lugar, quem ainda não tinha percebido fica a saber que o Sr. Ministro da Economia está! Para além de estar, está em Castelo Branco, o que nos leva a excluir que esteja no Algarve. Não está no Algarve! Está em Castelo Branco! Para além do mais, está a apresentar, a lançar ou numa «festança» de lançamento de um projecto.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Numa «festança»?!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Do que ele gosta é de «festanças»!

O Orador: — Ora, quando é uma Deputada a dizê-lo, fica bem demonstrado o respeito que tem o Sr.
Ministro pela matéria em causa e o respeito que a Sr.ª Deputada tem pela participação do Governo nos debates do Parlamento, algo que também registámos.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Está a confundir as coisas!

O Orador: — Tanto quanto julgo saber, porém, no Ministério da Economia também há Secretários de Estado, ou não?! Suponho que sim e que podem participar nestes debates.
Mas esta matéria das PME está bem para além destas questões, visto que tem a maior importância no plano social e no plano económico. Esta é daquelas matérias estritamente necessárias para o nosso desenvolvimento, razão pela qual deve ser salientado que o papel central, neste domínio, é precisamente o das empresas e não o do Estado. O Estado é aqui um elemento acessório, se bem que com alguma relevância, desde logo devido à política fiscal e ao plano creditício.
É muito interessante pensar no que neste momento acontece com um Estado que é, e bem, exigente quanto ao cumprimento atempado das obrigações fiscais dos cidadãos e das empresas, mas que já não é tão diligente quando se passa para o plano de ser ele a pagar aos seus credores. Ora, este é um elemento que, muitas vezes, ajuda a asfixiar muitas e muitas empresas.
É essencial, em relação às pequenas e médias empresas, que se caminhe para um mercado financeiro próprio de natureza bolsista. É essencial, para as pequenas e médias empresas, que se caminhe cada vez mais para um regime simplificado quanto à sua contabilidade.

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O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Hoje em dia, as obrigações contabilísticas das pequenas e médias empresas são muito pesadas. Por isso mesmo, estas empresas devem ser cada vez mais aliviadas destas obrigações. Isto é, um regime simplificado de contabilidade para empresas de pequeno e médio porte é essencial. É também essencial que se crie um regime especial para as pequenas e médias empresas que estão em zonas de fronteira e que hoje passam enormíssimas dificuldades. É ainda essencial que estas empresas possam estar bem informadas sobre as suas possibilidades quanto ao QREN.
Aliás, não obtive resposta da bancada do Partido Socialista à pergunta que procurava saber qual o conhecimento que as pequenas e médias empresas podem ter do QREN. Não nos esqueçamos que estamos a debater este tema em 2007 e não em 2006 ou em 2005. Estamos precisamente em 2007 e ainda continuamos com uma total indefinição quanto ao que, no concreto, vai ser o QREN.
Como tal, diria que temos o maior respeito pelos empresários que, no dia a dia, lutam com enormíssimas dificuldades em Portugal.

O Sr. Ventura Leite (PS): — Não parece!

O Orador: — São eles que fazem a exportação que, depois, é aproveitada por outros no plano político como um grande elemento de natureza económica. Merecem, pois, apoio e palavras de estímulo e que, cada vez mais, o Estado deixe que as empresas actuem. Por isso mesmo, penso que devemos deixar de vez a ideia preconcebida segundo a qual o Estado vai resolver os problemas da economia. O Estado, quando muito, auxilia na sua resolução.
Temos, como tal, uma opção de natureza positiva quanto a este projecto de resolução, salientando cada vez mais que é essencial confiar nas empresas e nos nossos empresários.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sobre que matéria, Sr. Deputado?

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sobre a presença ou ausência do Governo nos nossos trabalhos, Sr.
Presidente.
De facto, não vou discutir matéria de substância, mas apenas fazer referência ao facto de estarmos a discutir um projecto de resolução do PSD que faz recomendações ao Governo. É suposto essas recomendações serem aprovadas ou reprovadas por esta Assembleia e, sendo aprovadas, dirigidas ao Governo.
Enfim, o Partido Socialista não tem qualquer pretensão…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, à Mesa já custa conduzir os trabalhos da Assembleia. Não nos peça agora para conduzirmos também os do Governo!

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, V. Ex.ª tem, de alguma forma, a obrigação de esclarecer quem nos está a ver em casa sobre os trabalhos desta Assembleia. Ora, a verdade é que o Governo não tem a obrigação de estar presente nesta discussão.

Vozes do PSD: — Tem, tem!

O Sr. Afonso Candal (PS): — O Governo tem, sim, a possibilidade de estar presente, como acontece na maioria dos debates que aqui ocorrem.
Acontece que nem sequer estamos a discutir um projecto de lei, mas, tão-só, um projecto de resolução com recomendações ao Governo. E essas recomendações nem sequer seriam úteis porque o essencial das que são boas já foi posto em prática.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, na verdade, regimentalmente, o Governo não tem obrigação de estar presente. Mas serão VV. Ex.as que avaliarão politicamente esse facto.
Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, a minha interpelação é muito simples e tem, de facto, a ver com a condução dos trabalhos em geral.

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Ouvi com atenção a intervenção que, sob a forma de interpelação, fez o Sr. Deputado Afonso Candal,…

O Sr. Afonso Candal (PS): — Desculpe, mas fiz uma interpelação!

O Orador: — … mas fiquei sem saber por que é que nos painéis electrónicos que indicam o tempo de que cada grupo parlamentar dispõe está registado que o Governo dispõe de 12 minutos.
Depois de ouvir o Sr. Deputado Afonso Candal, não percebo a razão de ser desta atribuição de tempo.

O Sr. Afonso Candal (PS): — V. Ex.ª cada vez percebe menos de mais coisas!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, a Assembleia, naturalmente, conta sempre com a presença do Governo, pelo que lhe atribui tempo para intervir nos debates.
De todo o modo, volto a afirmar que o Governo não tem, de acordo com o Regimento, obrigação de estar presente neste debate. É uma questão que os Srs. Deputados avaliarão politicamente.
Ainda para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Henriques.

O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Sr. Presidente, de facto, o Governo pode ou não estar presente nestes debates, se bem que, politicamente, entendamos que devia estar.
O Sr. Ministro da Economia, noutras sessões desta Assembleia, chegou a fazer comentários a este projecto de resolução, pelo que lhe dissemos que seria este o momento para, em respeito pelo princípio do contraditório, trocarmos impressões e vermos quem teria razão em relação às matérias tratadas nesta iniciativa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — O Ministro furta-se ao debate!

O Sr. Almeida Henriques (PSD): — Era bom, portanto, que o Sr. Ministro não optasse pela cobardia de não estar hoje aqui presente, para podermos discutir objectivamente as coisas!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Numa brevíssima intervenção, pretendo dizer que, em geral, acompanhamos um conjunto de boas intenções aqui propostas com vista a apoiar as pequenas e médias empresas.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas tinha pedido a palavra!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, já dei a palavra a todos os grupos parlamentares que quiseram intervir sobre a presença ou a ausência do Governo neste debate.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Mas a questão já não é essa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Não vou permitir que se prolongue este incidente, até porque temos de proceder às votações regimentais dentro de momentos.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Mas agora a questão é diferente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Qual é, então, a questão, Sr. Deputado?

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, num grande esforço de contenção para não repetir o que vou criticar, chamo a sua atenção para o facto de o Sr. Deputado do PSD ter dito que a ausência do Sr.
Ministro da Economia é uma questão de cobardia.

Vozes do PSD: — E é!

O Sr. Afonso Candal (PS): — Não vou classificar este tipo de ataques na ausência dos visados para não estar a replicar no mesmo teor.
Já foi dito que o Governo não tem de estar presente, visto que estamos a apreciar apenas um projecto

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de resolução que pretende recomendar algo ao Governo. Parece-me, contudo, de muito mau gosto da parte do PSD – e demonstra bem a força das ideias que tem – ter de trilhar o caminho do insulto fácil perante pessoas ausentes. Assim só demonstram a vossa fraqueza e desorientação.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Mas não estamos a referir-nos a pessoas ausentes. Estamos a referir-nos a um Ministro concreto, chamado Manuel Pinho!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem, então, a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, esperando não ser outra vez «arrasado» no uso da palavra, reitero o que disse há pouco.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — V. Ex.ª pode ser «arrasado» pelos aplausos que receberá, mas, se calhar, não é nisso que está a pensar.

O Orador: — Agradeço essa menção, Sr. Presidente.
Direi que, em geral, as medidas aqui propostas, designadamente a que prevê o cruzamento de dados relativos às dívidas a fornecedores e aos pagamentos fiscais, são favoráveis às pequenas e médias empresas. É também o caso de todas as medidas relacionadas com a inovação de produtos e serviços ou com a ajuda à internacionalização de transacções dos produtos, que são medidas positivas e que concorrem para a saúde financeira das pequenas e médias empresas. Acompanhamo-las genericamente e creio mesmo que elas fazem parte das cartas de intenções que todos os partidos promovem e das quais fazem bandeira política.
Contudo, creio que ficou algo por explicar ou trabalhar, quer pelo CDS, quer pelo Partido Social Democrata.
Exactamente ao invés do que disse o Sr. Deputado Diogo Feio,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Ainda bem!

O Orador: — … pensamos que uma maior presença do Estado na economia ajudaria as pequenas e médias empresas. De facto, se há coisa absolutamente notória é o facto de o Partido Social Democrata, o CDS-PP, o Governo ou a bancada que o apoia não se terem referido a reclamações que os pequenos e médios empresários fazem imediatamente quando com eles falamos, queixando-se do excessivo preço da energia e das comunicações. A verdade, porém, é que estando isto relacionado com os excessivos lucros dos accionistas destas empresas, é aqui que o Estado tem diminuído o seu papel, não regulando esses preços, por forma a que as pequenas e médias empresas possam ser mais competitivas e gerar mais emprego.
A ideia de que é preciso fazer pedidos ao Estado, por um lado, deixando no limbo da inexistência a situação relacionada com o preço do fornecimento de serviços essenciais às pequenas e médias empresas é, apesar de tudo, uma hipocrisia sobre a situação real destas empresas.
Já aqui se falou das dificuldades do crédito, mas creio que devemos sublinhar muito fortemente as dificuldades que têm a ver com os preços não competitivos que as pequenas e médias empresas pagam em Portugal pela energia e pelas comunicações. Sobre isto precisaríamos de todo um outro debate, até porque pensamos que, fundamentalmente, é aqui que o Governo do Partido Socialista tem falhado às pequenas e médias empresas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ventura Leite, que dispõe de 1 minuto e 45 segundos.

O Sr. Ventura Leite (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No tempo que me resta, desejo retirar algumas conclusões simples.
A verdade é que um assunto da maior importância trazido à Assembleia pelos Srs. Deputados do PSD redundou num completo fracasso, por três ordens de razões.
Em primeiro lugar, pelo interesse que suscitou entre nós e também nas galerias. Imagino o entusiasmo que as PME portuguesas sentirão depois de debatida esta iniciativa do PSD!… Em segundo lugar, pergunto como é possível uma iniciativa ser credível quando ignora por completo a realidade das medidas em curso. Como é que se pode pretender apresentar medidas para mudar a realidade se se ignora a própria realidade?

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A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Muito bem!

O Orador: — Srs. Deputados, a terceira ordem de razões está relacionada com um «pecado original» desta iniciativa. Na realidade, há, na Assembleia da República, grupos de trabalho que funcionam junto da 6.ª Comissão, debruçando-se sobre as áreas do têxtil, das contrapartidas e da cortiça, entre outras. É também verdade que nenhum grupo parlamentar tem apresentado qualquer iniciativa nestas matérias sem que os grupos de trabalho concluam as suas tarefas. Ora, havendo um grupo de trabalho relativo às pequenas e médias empresas, é inadmissível que o Grupo Parlamentar do PSD traga a Plenário uma iniciativa sobre este tema sem que esse mesmo grupo de trabalho, dirigido, aliás, por VV. Ex.as
, tenha concluído as suas tarefas.
Srs. Deputados, estamos disponíveis para participar activamente numa avaliação das políticas públicas para as PME, mas não para participar neste exercício, que é um completo fracasso.
Finalmente, Srs. Deputados, direi que esta é uma realidade complexa e que se fosse fácil tratar estes problemas, até os senhores os tinham resolvido durante os três anos em que estiveram no governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, porque vamos entrar em período de votações, temos agora, por exigência regimental, de proceder à verificação do quórum. Peço, portanto, aos Srs. Deputados que preparem os respectivos cartões.
Vamos, então, proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 187 presenças, às quais se somam 15 registadas pela Mesa, pelo que temos quórum para proceder às votações.

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Sr. Presidente, não houve ligação do sistema electrónico nalgumas bancadas.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, o que fiz foi pedir aos serviços para confirmarem o número de Deputados que puderam accionar o mecanismo electrónico. Aos que não o conseguissem fazer pedi que assinalassem à Mesa a sua presença, assinando junto dos serviços de apoio ao Plenário, tendo sido esse o registo que anunciei.
Vamos, pois, passar às votações.
Em primeiro lugar, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do voto n.º 90/X — De congratulação pela atribuição do Prémio Camões ao escritor António Lobo Antunes (PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE e Os Verdes).

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o teor do voto é o seguinte: O Prémio Camões, instituído em 1988 pelo protocolo adicional ao Acordo Cultural celebrado entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Federativa do Brasil, é o maior e mais prestigiado galardão dedicado à literatura em língua portuguesa e tem por objectivo «consagrar anualmente um autor de língua portuguesa que, pelo valor intrínseco da sua obra, tenha contribuído para o enriquecimento do património literário e cultural da língua comum». Na sua edição de 2007, foi atribuído a António Lobo Antunes, um dos escritores portugueses contemporâneos mais reconhecidos em Portugal e traduzidos e editados em outras línguas e países.
Nascido em Lisboa (1942), António Lobo Antunes é médico psiquiatra, mas desde há alguns anos dedica-se à escrita a tempo inteiro. Autor de vinte e seis livros, quase todos de ficção, publicados em vinte e sete anos (o primeiro, Memória de Elefante, é de 1979, e o mais recente, Ontem não te vi em Babilónia, de 2006), Lobo Antunes é também um dos mais conceituados cronistas da imprensa portuguesa actual. Pelos temas que trata nos seus livros de ficção, pela originalidade da sua técnica e da sua arte narrativas, pela lúcida interpretação que faz do nosso país e da nossa população nas suas crónicas, e sobretudo pela mestria com que utiliza, renovando-a e enriquecendo-a, a língua portuguesa, António Lobo Antunes ficará a marcar a literatura portuguesa do nosso tempo.
A sua vasta obra já lhe valeu diversos prémios e distinções, portugueses e estrangeiros, designadamente o Prémio Franco-Português, o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores, o Prémio de Melhor Livro Estrangeiro publicado em França, o Prémio de Tradução Portugal/Frankfurt, o Prémio France-Culture, o Prémio de Literatura Europeia do Estado Austríaco, o Prémio União Latina, o Prémio Ovídio da União dos Escritores Romenos, o Prémio Fernando Namora, o Prémio Jerusalém, e agora o Prémio Camões.
Esta decisão do júri — que é constituído por escritores e professores universitários portugueses, brasileiros e africanos de reconhecido mérito — dignifica, em simultâneo, o prémio e o premiado: António Lobo Antunes vem juntar-se, por mérito próprio, a um grupo de grandes personalidades das literaturas de língua

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portuguesa, como: Miguel Torga, João Cabral de Melo Neto, José Craveirinha, Vergílio Ferreira, Rachel Queiroz, Jorge Amado, José Saramago, Eduardo Lourenço, Pepetela, António Cândido, Sophia de Mello Breyner Andresen, Autran Dourado, Eugénio de Andrade, Maria Velho da Costa, Ruben Fonseca, Agustina Bessa Luís, Lygia Fagundes Telles e José Luandino Vieira — contribuindo assim para manter, ao mais alto nível, o elevado prestígio do Prémio Camões.
A Assembleia da República, interpretando o entendimento do povo português, congratula-se com mais esta distinção atribuída à personalidade e à obra literária de António Lobo Antunes e deseja-lhe uma duradoura carreira de escritor que continuará a prestigiar a literatura portuguesa e as literaturas de língua portuguesa.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, agradecia que apressassem a diligência de confirmação da vossa presença junto dos serviços para procedermos ao início das votações.

Pausa.

Srs. Deputados, temos de alterar este nosso procedimento. Os Srs. Deputados, que, por qualquer razão, não conseguirem utilizar o respectivo cartão electrónico ou se atrasarem, terão de passar a comprovar a sua presença no final das votações.
Vamos, então, proceder à votação do voto n.º 90/X — De congratulação pela atribuição do Prémio Camões ao escritor António Lobo Antunes (PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos agora votar o projecto de resolução n.º 175/X — Recomenda ao Governo um programa de apoio às pequenas e médias empresas (PSD).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e votos a favor do PSD, do PCP, do CDSPP, do BE e de Os Verdes.

Vamos votar, em votação global, a proposta de resolução n.º 43/X — Aprova as emendas ao Estatuto da Conferência da Haia de Direito Internacional Privado, adoptadas em Haia, a 30 de Junho de 2005.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PCP.

Segue-se a votação global da proposta de resolução n.º 44/X — Aprova, para ratificação, o Acordo de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal entre a República Portuguesa e a República Argentina, assinado em 7 de Abril de 2003.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos votar a proposta de resolução n.º 46/X — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e a Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China sobre os Privilégios Fiscais Aplicáveis às suas Delegações e Membros do seu Pessoal, assinado em Lisboa, em 23 de Junho de 2006.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai dar conta de vários pareceres da Comissão de Ética, que também serão submetidos a votação.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelas 3.ª e 4.ª Varas Criminais de Lisboa — 4.ª Vara — 2.ª Secção, Processo n.º 4674/02.0-TDLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Joaquim Pina Moura (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva):— Srs. Deputados, vamos votar este parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Ministério Público — Distrito Judicial de Lisboa — DIAP — 6.ª Secção, NUIPC: 525/06.4 — PELSB — 0604, a Comissão de Ética, decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Nuno Sá (PS) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, Processo n.º 47/07-6 — BEFUN, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelos serviços do Ministério Público do Tribunal de Instrução Criminal e DIAP de Lisboa — 9.ª secção, NUIPC: 1517/05.6 — JFLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Pedro Santana Lopes (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelos serviços do Ministério Público do Tribunal de Instrução Criminal e DIAP de Lisboa — 9.ª secção, NUIPC: 1517/05.6 — JFLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Vasco Franco (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelos serviços do Ministério Público do Tribunal de Instrução Criminal e DIAP de Lisboa — 9.ª secção, NUIPC: 1517/05.6 — JFLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Helena Lopes da Costa a prestar depoimento presencialmente, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, terminadas as votações, passamos à apreciação conjunta dos projectos de resolução n.os 184/X — Suspensão do processo de encerramento de serviços de urgência em hospitais e centros de saúde (PCP) e 185/X — Recomenda ao Governo uma orientação para o processo de implementação do plano de requalificação das urgências hospitalares (BE).
Para apresentar o projecto de resolução do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos os dias se confirma a oportunidade e a importância deste agendamento que o PCP, em boa hora, propôs na Conferência de Líderes.
Repetem-se não só os protestos da população por todo o País, mas também as decisões e os episódios que comprovam a gravidade das orientações economicistas em curso. Mais uma criança a nascer em ambulância a caminho de Coimbra, mais uma falha no atendimento de emergência no Alentejo, são apenas a face visível da dramática situação para que as populações estão a ser lançadas em todo o País.
E hoje mesmo é noticiado o encerramento de oito serviços de atendimento permanente durante a noite em oito concelhos do distrito de Bragança, que, com cinismo e requintes de malvadez, o Governo aprazou para o dia 25 de Abril, tal como, aliás, se prepara para fazer noutras regiões. O Governo quer encerrar a eito SAP e urgências no dia em que se comemora o aniversário da Revolução, que abriu caminho à instituição do Serviço Nacional de Saúde.
Quando o Governo iniciou o processo de encerramento de urgências em hospitais, centros de saúde e

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outros serviços, dissemos que se tratava de uma política orientada pela lógica da diminuição da despesa e da concentração de serviços, com elevados prejuízos para as populações, que os argumentos técnicos apresentados não chegariam para esconder as evidentes determinações políticas que conduzem o processo desde a primeira hora e que ao encerramento dos serviços públicos se seguiria o aparecimento de serviços privados prontos a ocupar o seu lugar.
Não somos contra a ponderação da rede de serviços, designadamente de urgências, nem avessos à sua reestruturação. Mas uma reestruturação dos serviços de saúde deve assentar no objectivo de encontrar as melhores soluções de organização para o acesso à saúde das populações e não, como acontece com a reestruturação do Governo, no objectivo da máxima poupança e da garantia de mercado para os privados.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — O projecto de resolução que hoje apresentamos visa precisamente garantir as condições mínimas para o debate e para a aplicação de uma verdadeira reestruturação das urgências e de outros serviços que não seja apenas um encerramento em larga escala. Não propomos soluções definitivas, mas desafiamos o Governo a apresentar à Assembleia da República uma proposta de lei que defina os critérios de distribuição pelo território dos vários serviços, permitindo uma ampla discussão sobre a matéria e o apuramento das linhas de orientação que deverão, depois, conduzir, então sim, a uma redefinição da rede de urgências coerente e ao serviço das populações.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Muito bem!

O Orador: — É, por isso, um projecto de resolução diferente do que é apresentado pelo Bloco de Esquerda. Parece-nos que a proposta do Bloco de Esquerda é, apesar de tudo, tímida na qualificação do processo que está em curso, que não peca apenas por não coordenar as alterações nos centros de saúde com as dos hospitais. Reconhecemos as cautelas postas nas propostas de forma a aligeirar os efeitos negativos da reforma em curso, mas, na nossa opinião, é preciso ir mais além, é preciso suspender e reavaliar em termos sérios este processo. É que, se ele se concretizar, mesmo com as cautelas que o Bloco de Esquerda propõe, o resultado final será indubitavelmente negativo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo tem procurado defender a sua política recorrendo aos mais diversos instrumentos. Desde logo, a nomeação de uma comissão técnica para elaborar uma proposta de rede de urgências hospitalares. É um truque conhecido.

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — É inacreditável!

O Orador: — O Governo já decidiu há muito qual é a orientação fundamental da política para os serviços de saúde: encerrar o mais possível.
Esse foi, portanto, o enquadramento do trabalho da comissão. Não um enquadramento que apontasse para a elaboração de uma proposta de proximidade com as populações, com mais investimentos em recursos humanos e equipamentos, mas, sim, um enquadramento condicionado por pressupostos de redução dos pontos de urgência, com uma visão da urgência reduzida aos casos de emergência ou de potencial emergência.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — A vida tem demonstrado que nem a maior competência técnica — que não se nega aos membros da referida comissão — pode emendar uma má orientação política.
De resto, ficou claro do debate da proposta da comissão técnica que ela ignorou o que se está a passar por todo o País em matéria de encerramento de SAP. Como se pode organizar as urgências hospitalares sem ter em conta a razia que o Governo está a fazer em matéria de atendimento nos centros de saúde? É que, mesmo aceitando que nem todos os que hoje recorrem a um SAP, entretanto encerrado, vão dirigir-se a um hospital, em geral muito mais distante, o que, em alguns casos pode até ter sérias consequências para a sua saúde, muitos irão, certamente, congestionar ainda mais as urgências hospitalares, com aumento dos tempos de espera e maiores dificuldades no atendimento. Uma coisa não pode andar desligada da outra.
A comissão técnica assenta, para além do mais, a sua proposta em pressupostos de investimento nos serviços de urgência básica a criar e nas redes de emergência pré-hospitalar. A comissão e todos os portugueses já perceberam que o Governo se prepara para aplicar como solução para a emergência préhospitalar as viaturas chamadas de suporte integrado de vida, menos diferenciadas e qualificadas.
De facto, as sucessivas promessas de investimentos por parte do Governo, para tentar esconder a gravidade das consequências dos encerramentos, não têm qualquer concretização em planos de investimento com datas e compromissos concretos.

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A política do governo é a de encerrar já e prometer remédios insuficientes, que não se sabe se e quando se concretizarão.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Governo vai usando os mais incríveis e falsos argumentos. O Governo e a comissão técnica falam de uma maior proximidade das urgências hospitalares na proposta apresentada. É uma visão deturpada da realidade. Primeiro, porque é visível que as contas feitas não têm em conta a demora que os meios de emergência levam a chegar ao local onde são necessários, a que acresce o tempo de deslocação até à urgência entretanto destinada, o único que é, em geral, considerado no estudo.
Depois, porque se trata de uma falsa maior proximidade de urgências. É que, entretanto, pelo caminho, encerraram muitas dezenas de serviços de atendimento que, até aí, estavam acessíveis às populações e que podiam dar resposta a muitas das situações em causa. Passamos de cerca de 180 pontos de urgência para pouco mais de 80.
É, aliás, curioso o discurso de desvalorização dos SAP que o Governo tem utilizado. Quem ouça o Governo fica a pensar que os SAP não servem para nada. Mas, na verdade, dados de 2005 demonstram que foram feitas nos SAP quase 5,7 milhões de consultas, sendo as das urgências hospitalares quase milhões. Quer isto dizer que aquilo que o Governo desvaloriza corresponde a quase metade dos atendimentos e consultas em urgência, atendimentos esses que, na esmagadora maioria dos casos, resolvem o problema sem necessidade de recurso a outra unidade. Ninguém acredita que seja possível absorver estes mais de 5 milhões de consultas nas urgências hospitalares e no funcionamento corrente dos centros de saúde.
O Governo esconde que muitos centros de saúde dispõem até nos atendimentos urgentes de condições semelhantes às que o Governo prevê agora para os serviços de urgência básica, que, mesmo assim, são fechados. A outros faltam equipamentos, é certo, mas esse problema tem de se resolver com mais investimento e não com mais encerramentos.
O Governo já foi obrigado a alguns retrocessos tácticos, meramente conjunturais e procurando garantir o essencial. Até já fala, no quadro dos protocolos assinados com algumas autarquias, em consultas abertas em algumas urgências a encerrar. Admite aquilo que tem andado a negar e consagra agora aquilo a que podemos chamar verdadeiros SAP hospitalares, quando anda a negar a existência dos SAP nos centros de saúde.
O que o Governo já não consegue esconder é que a sua política serve na perfeição a estratégia em desenvolvimento do sector privado. É o está a acontecer em Mirandela, com a maternidade, na Mealhada, em Espinho, em Guimarães ou em Torres Vedras e que acontecerá em todo o lado em que o negócio compense, face ao abandono das populações pelos serviços públicos. O Governo e o Ministério da Saúde comportam-se, assim, como verdadeiros angariadores de clientes para o negócio privado da saúde.
Se a maioria parlamentar não aceitar esta proposta de resolução, teremos de perguntar de que tem medo o Governo: de discutir critérios racionais de organização das redes de urgência e emergência? Ou terá medo de ter de justificar as suas decisões, pondo a nu a sua fragilidade e os seus verdadeiros propósitos, que é destruir o Serviço Nacional de Saúde e abrir caminho aos negócios privados? Não propomos soluções fechadas nem negamos a necessidade de discutir uma adequação das redes de urgência à realidade do País, propomos que, por uma vez, o Governo aceite parar para pensar e que não se comporte como os pistoleiros dos westerns, que disparam primeiro e perguntam depois, encerrando já e explicando depois.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Gonçalves.

O Sr. Ricardo Gonçalves (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bernardino Soares, o Partido Comunista encontrou neste processo das urgências um bom motivo para a sua forma de actuar, que é participar sempre nas manifestações, ajudar a mobilizar as pessoas, etc., etc. É, efectivamente, uma coisa extraordinária! O Sr. Deputado Bernardino Soares sabe perfeitamente que há muito tempo que não havia um debate tão grande sobre este tema. Aliás, o Sr. Ministro colocou o documento em debate público de uma forma muito transparente. Sabe perfeitamente que houve dúvidas dentro do próprio Partido Socialista sobre ele — eu fui um dos que tive essas dúvidas —, mas admiro a coragem do Sr. Ministro de pôr o documento na rua, onde toda a gente o discute, incluindo o Partido Comunista, que tem participado nessa discussão, tendo a comissão técnica já vindo duas vezes à comissão.
Como também sabe, toda a gente tem dado razão à comissão técnica, porque o número de urgências vai aumentar e as suas condições vão melhorar. Os senhores implicam exclusivamente com os SAP, mas o Sr. Deputado sabe perfeitamente que um SAP não é uma urgência. A comissão técnica também sabe isso e, por isso, hoje já se defende que o serviço deve passar a ser uma consulta aberta e não um SAP, porque é isso que sempre foi. Sabe ou não o que é uma consulta aberta?

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Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — E esses 5 milhões de consultas vão ser dadas na mesma nas consultas abertas. Os centros de saúde vão continuar a dar consultas às pessoas que não tenham consultas programadas. Foi o se fez sempre!

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Muito bem!

O Orador: — É uma questão de terminologia! Em relação aos casos mais graves, o Sr. Deputado sabe perfeitamente que hoje já não vão para os SAP, vão directamente para as urgências, que vão ficar mais perto do que estão actualmente, porque a nova rede de urgências vai, efectivamente, aproximar as verdadeiras urgências das pessoas,…

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Muito bem!

O Orador: — … que é isso que nos interessa, e não as falsas urgências, que são os SAP, que os senhores estão a defender hoje.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — O que acontece é que os SAP são transformados em consulta aberta e, quando muito, podem encerrar entre as 24 horas e as 8 horas, quando têm uma ou duas pessoas no máximo.
Mas isso vai ser substituído por viaturas melhor equipadas, que é muito mais importante.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Onde é que isso está escrito?!

O Orador: — O Sr. Deputado sabe que os protocolos que o Sr. Ministro assinou implicam tudo isso, tal como tudo o que está a ser feito nas ARS.
Sr. Deputado, uma coisa é partir-se deste estudo, que é um estudo reconhecido por toda a gente, e outra é aquilo que se vai resolvendo caso a caso.

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Muito bem! É isso mesmo!

O Orador: — Aliás, os senhores estiveram de acordo com os protocolos, que são para resolver os problemas caso a caso, articulando as redes de emergência, viaturas, apoios e urgências de referência, porque, obviamente, é preciso encontrar referências para tudo aquilo que vai sendo, efectivamente, transformado.
Obviamente que é muito fácil para o Partido Comunista dizer que estão a surgir privados, etc. É uma coisa extraordinária! O Sr. Deputado sabe quem assegura, à noite, as urgências no distrito de Braga? São cinco misericórdias, que têm protocolos com o Estado. E, se se justificar fazer protocolos com os privados, o Governo também os faz.

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Muito bem!

O Orador: — Nós não temos esses problemas ideológicos que os senhores têm!

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Desde que se justifique, fazem-se protocolos…

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Os utentes pagam mais!

O Orador: — Não, senhor! Hoje, nas urgências de Braga, os utentes não pagam mais!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Orador: — Portanto, o vosso problema é que colocam sempre a questão em volta de duas coisas: primeiro, jogar com a agitação e, segundo, trazer os preconceitos ideológicos quanto aos privados, e é na base disto que tomam as vossas posições.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Ricardo Gonçalves diz que o Governo lançou um debate. Pois, lançou um debate do qual já tinha tirado a conclusão.

O Sr. Ricardo Gonçalves (PS): — Não, não!

O Orador: — Ora, isto não é um debate, um debate é o que nós propomos: propomos suspender a conclusão para que o debate se faça sem que a conclusão já esteja tirada. É só isso que estamos aqui a discutir!

Protestos do Deputado do PS Ricardo Gonçalves.

E o que os senhores têm de fazer é optar entre estas duas hipóteses: ou admitir um debate que começou com a conclusão já tirada (e acertos pontuais não podem esconder que a conclusão de fundo já estava tirada) ou decidir se querem um debate em que se discutam as orientações e a filosofia para a rede de urgências e, depois, se tirem as conclusões.

Protestos do Deputado do PS Ricardo Gonçalves.

Toda a gente está de acordo com a comissão técnica, diz o Sr. Deputado. Não sei em que país é que o senhor anda. Eu vejo é muita gente em desacordo com a comissão técnica, e justamente.

O Sr. Ricardo Gonçalves (PS): — Quem? Diga quem!

O Orador: — Depois, diz também que os SAP não são urgências. O Sr. Deputado deve querer dizer que os SAP não servem para resolver muitas das situações de emergência, mas até há alguns SAP que servem para resolver situações de emergência.

Vozes do PS: — Mas servem mal!

O Orador: — E até esses o Governo encerra, obrigando as pessoas a irem para mais longe!

Protestos do PS.

No fundo, a filosofia do Sr. Deputado e a do Governo é esta: entre ter um SAP a 5 km e um hospital a 100 km e ter só um hospital a 100 km e nenhum SAP perto, o preferível é ter o hospital distante e não ter o apoio mais próximo. Certamente, muitas questões só se podem resolver nas urgências hospitalares, mas muitas, como aqui demonstrei, mais de 5 milhões, eram até resolvidas pelos SAP e agora vão deixar de ser.

Vozes do PS: — Não vão!

O Orador: — Portanto, os acessos às urgências estão mais longe do que estavam antes.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Não se trata apenas da rede hospitalar. Abaixo dela está uma rede de urgências dos centros de saúde, que os senhores querem ignorar neste debate, mas que altera completamente os dados desta questão.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, falemos claro: o Ministro Correia de Campos transformou-se numa ameaça para a tranquilidade dos portugueses. Existe hoje o risco real de uma redução drástica no acesso aos serviços de saúde, sobretudo quando eles são mais necessários: na

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doença aguda, no parto, nas situações de urgência, nos casos de emergência.
Correia de Campos promete melhores serviços de obstetrícia para iludir o fecho de maternidades e blocos de partos. Correia de Campos promete uma reforma dos cuidados primários de saúde para iludir o encerramento dos Serviços de Atendimento Permanente. Correia de Campos promete uma nova rede de urgências para iludir o encerramento de 15 urgências hospitalares e a desqualificação de outras 15. Correia de Campos promete o reforço do sistema de socorro e emergência pré-hospitalar para iludir a redução dos serviços de urgência. Correia de Campos promete mais rapidez, mais qualidade, mais segurança para iludir a sua compulsão pelos cortes cegos, pela poupança forçada a qualquer preço, com prejuízo indisfarçável para o funcionamento do Serviço Nacional de Saúde e para a saúde dos portugueses.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Orador: — Finalmente, Correia de Campos promete-nos a modernidade: nascer numa ambulância, esperar horas numa urgência, morrer à espera de que chegue o INEM.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Orador: — Correia de Campos promete, promete e promete, mas não se compromete. Não se compromete com prazos, nem com verbas, nem com mais profissionais para cumprir tanta promessa.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Orador: — A instalação das Unidades de Saúde Familiar anda «a passo de caracol»; a implementação da rede de urgências não está, sequer, calendarizada; do INEM nada se ouve, nada se sabe; a mobilidade médica não passa de um desejo.
O orçamento não permite nem garante o investimento necessário ao reforço dos meios de emergência, nem à construção da nova rede de urgências. Não se sabe, o ministro não diz, como vai financiar a instalação de 42 urgências básicas e a requalificação das 14 urgências polivalentes.
O ritmo da reforma dos cuidados primários de saúde desaconselha e não permite, ao contrário do que o Sr. Ministro diz, a dispensa e o encerramento dos SAP. Estão instaladas apenas 52 Unidades de Saúde Familiar em todo o País. Eram 100 as previstas para 2006 e são necessárias cerca de 400 para cobrir todo o País! É certo que, hoje, há mais 65 000 portugueses (nas contas do Governo) com médico de família, mas ainda é mais certo que, hoje, são ainda mais de meio milhão os portugueses sem médico de família. A esta velocidade como pode o Ministro insistir no encerramento dos SAP? Como pode o Sr. Ministro insistir em concretizar o fecho de todos aqueles Serviços de Atendimento Permanente que constam das folhas retiradas do relatório oficial e que aqui, ontem, mostrámos às Sr.as e aos Srs. Deputados? Não se invoque a insuficiência dos serviços prestados por estes SAP. Os SAP não são, efectivamente, um serviço de urgência, não é para isso que eles existem. Mas são, para muitos milhões de portugueses, o último dos últimos recursos.
Todos sabemos que os SAP foram criados precisamente para ultrapassar as dificuldades de acesso aos centros de saúde por parte dos utentes que não têm médico de família, quando adoecem, evitando, assim, sobrecarregar as urgências hospitalares. Mas estes dois condicionalismos ainda se mantêm, vivamente, no Serviço Nacional de Saúde.
Os SAP representam mais de cinco milhões de consultas por ano, como já aqui foi dito. Para onde irão, Sr.as e Srs. Deputados, estes doentes, quando todos os SAP estiverem encerrados? Não lhes resta qualquer outra alternativa que não seja a urgência de um hospital. O encerramento dos SAP, associado ao fecho das urgências hospitalares, sem que qualquer outra alternativa seja oferecida aos cidadãos, tornará insustentável as condições de assistência nas urgências dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde, onde já hoje, e com muita frequência, se espera durante 3, 4, 5 , 6 ou mais horas para se ser atendido.
Reconhecemos a necessidade de mudanças significativas, tanto nos cuidados primários de saúde, como nas urgências. Reconhecemos, até, que quer uma quer outra destas reformas que estão aqui em discussão apresentam algumas potencialidades. Sabemos também que nada se muda de um dia para o outro. Mas fazer tudo precipitadamente e ao mesmo tempo, não resistindo à solução mais fácil, e certamente mais barata, como é do gosto do Sr. Ministro Correia de Campos, de começar por fechar serviço atrás de serviço — ontem as maternidades, hoje os SAP e amanhã as urgências — não é, certamente, o caminho.
Isto, Sr.as e Srs. Deputados, não é acerto, é desacerto; não é tino, é desatino; não é governar, é desgovernar.
Ao contrário do que ontem aqui disse o Sr. Primeiro-Ministro, a desordem não está nas ruas, nem está no protesto popular; a desordem instalou-se na João Crisóstomo e tem um nome: chama-se Correia de Campos.
Não fosse o protesto popular e Correia de Campos não andaria agora, numa roda viva, a assinar protocolos por esse país fora, prometendo ambulâncias, camas para cuidados continuados, blocos para cirurgia

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de ambulatório, mais consultas de especialidade e, pasme-se!, até novos hospitais — nada que, efectivamente, possa mudar o que está em causa nesta discussão. Com Correia de Campos a política tornou-se numa agitada distribuição de «brindes de Páscoa» para silenciar autarcas e adormecer populações.
O Bloco de Esquerda não quer bloquear mudanças nem reformas. Move-nos a defesa do Serviço Nacional de Saúde e a sua modernização. Mas o projecto de resolução que hoje apresentamos procura, isso sim, garantir que as reformas anunciadas alarguem e não estrangulem o acesso aos serviços de saúde, melhorem e não prejudiquem a qualidade da assistência. O nosso projecto, Sr.as e Srs. Deputados, pretende pôr um travão no desnorte que tomou conta do Ministério da Saúde.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje dois projectos de resolução sobre o processo de requalificação da rede de urgências. Nas suas grandes linhas, um preconiza a suspensão do processo de encerramento de urgências e o outro pretende que a requalificação dessas urgências seja precedida do indispensável reforço prévio de meios.
Todos sabemos que estes dois projectos de resolução estão, à partida, condenados.
De facto, da mesma forma que o Ministro da Saúde não seguiu os critérios da comissão técnica do encerramento das Maternidades e, agora, deixou de seguir as conclusões do relatório da comissão do encerramento das urgências, é evidente que também não vai acolher as recomendações preconizadas nos dois projectos de resolução hoje em discussão.
O Governo imporá ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista o voto contra e o PS chumbará, ordeira e disciplinadamente, as duas iniciativas. Não surpreende que assim seja.
O que é verdadeiramente grave é que o Ministro da Saúde faltou à verdade quando referiu publicamente que o encerramento dos SAP fazia parte da proposta de reestruturação da rede de urgências, sendo certo que alguém deu indicações para serem retiradas as páginas 22 e 23 da mesma proposta de reestruturação, que dizem exactamente o contrário.
Ora, isso foi formal e categoricamente desmentido pelo Presidente da comissão técnica, quando este afirmou que o encerramento dos SAP nunca fez parte das recomendações do referido estudo.
Esta questão é da maior gravidade e exige, quanto a nós, a presença e o esclarecimento imediatos do Ministro da Saúde neste Parlamento. Aliás, o Ministro da Saúde já deveria, ele próprio, ter tomado a iniciativa de prestar os esclarecimentos que se impõem.
Não o tendo feito, o Grupo Parlamentar do PSD apresentará, hoje mesmo, um requerimento a exigir a sua presença na Comissão de Saúde, bem como uma nova audição do presidente da comissão técnica.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Se essa clarificação não for adequadamente feita, desde já que fique claro que avançaremos, se necessário, para a realização de um inquérito parlamentar que tudo esclareça.
Não aceitamos que ministros possam faltar à verdade em matérias destas e, muito menos, que se trate de modo menos sério a saúde dos portugueses. Levaremos este esclarecimento até às últimas consequências.
A verdade, Sr.as e Srs. Deputados, é que o Governo não ouve, finge que pratica o diálogo quando a isso é obrigado e a imagem que quer dar esconde, na prática, a atitude que verdadeiramente apresenta: arrogância e prepotência, quando não a mentira.
Isso os portugueses já vão percebendo! É evidente que o Ministro da Saúde, obrigado pelos receios e pelos custos políticos que as manifestações populares de Norte a Sul do País poderiam provocar, foi obrigado a recuar, celebrando protocolos com algumas das autarquias locais afectadas pelo encerramento de serviços. E não se diga que assim não é! Com efeito, o Ministro da Saúde, em Setembro de 2006, escreveu que as primeiras requalificações dos serviços de urgência seriam executadas no início de 2007, ou seja, já deveriam ter sido executadas.
De resto, o sentido geral da acção política do Governo no sector da saúde é claro: fechar serviços, encerrar maternidades, reduzir horários de funcionamento e tornar mais caro e mais difícil o acesso dos doentes aos cuidados de saúde.
Aliás, a própria Ordem dos Médicos reconheceu recentemente, na Assembleia da República, o seguinte: «Já todos nos apercebemos que o Ministério da Saúde é bem mais rápido a fechar do que a abrir ou a cumprir as suas promessas.» Por isso, os portugueses já sabem que este Governo tem uma não política de saúde ou, melhor, tem uma falsa política de saúde.
Como disse um dirigente socialista do interior, «O Ministro tem uma política de saúde inimiga das pes-

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soas».
Na verdade, por um lado, temos um Ministro que apregoa o seu preconceito contra os SAP, afirmando com gáudio que nunca vai, nem irá, a um SAP e, por isso, quer fechá-los!… Por outro, o mesmo Ministro resolve o problema retirando esses serviços às populações, sem lhes dar alternativas e tentando fazer-lhes crer que a retirada de serviços médicos melhora o seu acesso aos cuidados de saúde…! No entanto, o INEM confirma que envia doentes urgentes para os SAP. Como pode, então, o Ministro afirmar que não são unidades de urgência? Quanto à criação de novos serviços, a verdade é que o processo de criação das unidades de saúde familiar está muito atrasado e dele tem resultado a desnatação de inúmeros centros de saúde, principalmente nas zonas mais desfavorecidas do Interior do País.
Outro exemplo é o das novas ambulâncias, agora denominadas de «suporte intermédio de vida»…! Trata-se de um conceito novo, de que nenhum especialista ouviu falar, em que a grande inovação parece ser a de atribuir a outros funções que, até agora, são estritamente desempenhadas por médicos.
Para além da contundente crítica da Ordem dos Médicos, também a Comissão Técnica de Reestruturação das Urgências — Comissão que foi criada pelo próprio Ministro da Saúde… — discorda da criação destas ambulâncias híbridas.

A Sr.ª Regina Bastos (PSD): — Muito bem! Bem lembrado!

A Oradora: — E não surpreende que assim seja. Na verdade, essas ambulâncias, dando aos doentes uma falsa sensação de segurança, não terão o pessoal especializado que lhes assegurem um transporte seguro e qualificado. A isto chama-se, Sr.as e Srs. Deputados, «vender gato por lebre» — é caso para dizer que a reforma vai passar pelo interior, mas o interior não vai passar pela reforma!!

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Oradora: — Isto porque a actual política de saúde é socialmente injusta, tecnicamente insensata, moralmente absurda e geograficamente desequilibrada.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, falemos claro: em primeiro lugar, a reestruturação dos serviços de urgência só deveria avançar no terreno depois de ter sido previamente reforçada a Rede de Emergência Hospitalar.
Em segundo lugar, a reestruturação dos serviços de urgência só deveria avançar no terreno depois de estar bem implantada a reforma dos cuidados de saúde primários.
Em terceiro lugar, a reestruturação dos serviços de urgência só deveria avançar no terreno depois da reorganização do sistema de transporte de doentes, através da dotação e distribuição equitativa de meios, da clarificação e simplificação de competências e da definição da coordenação e controlo.
Em quarto lugar, a reestruturação dos serviços de urgência só deveria avançar no terreno depois de estar a funcionar o Call Center da saúde, sistema de atendimento que já devia estar operacional há mais de um ano.
Trata-se de uma reforma que deve ser executada em simultâneo. É por tudo isto que o Ministro da Saúde não pode fechar dezenas de SAP por todo o País, principalmente nas zonas mais desfavorecidas do interior, sem criar previamente alternativas aos utentes.

Risos do PS.

O Ministro não pode fechar 11 dos 14 serviços de atendimento existentes no distrito da Guarda sem que os utentes tenham alternativas.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — É uma insensatez!

A Oradora: — O Ministro não pode fechar 9 dos 14 serviços de atendimento existentes no distrito de Beja sem que os utentes tenham alternativas, assim como o Ministro não pode fechar 8 dos 12 serviços de atendimento existentes no distrito de Bragança sem que os utentes tenham alternativas. E, também, não pode fechar 5 das 9 urgências hospitalares existentes no distrito de Aveiro, sem que os utentes tenham alternativas. O mesmo se pode dizer em relação aos distritos de Leiria, Braga e a tantos outros.

Risos do PS.

Finalmente, Srs. Deputados, o Ministro não pode reduzir as cerca de 400 portas de entrada no SNS para

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portas de acesso ao Serviço Nacional de Saúde e, ainda por cima, fazê-lo a coberto de um pretenso parecer técnico que os próprios técnicos negam existir!!

Risos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, em especial do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que estão muito nervosos e incomodados com o que estou a referir, não julguem que é apenas o PSD que o diz, são os doentes que o sofrem, são os portugueses que o sentem!!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito bem!

A Oradora: — Não acreditem nas visões de que apenas VV. Ex.as querem o bem comum e que as críticas são as de uma Oposição que critica por criticar. Essa é uma visão maniqueísta e muito pouco democrática, mas é, sobretudo, Srs. Deputados, uma visão autista e falsa da realidade! De facto, ainda no passado dia 14, a Ordem dos Médicos disse, na Comissão Parlamentar de Saúde, que «As urgências estão a ficar saturadas e algumas a entrar mesmo em ruptura».
E a mesma Ordem também advertiu que «sem uma verdadeira reforma dos cuidados de saúde primários, não há qualquer possibilidade de resolver os actuais problemas e rupturas das urgências hospitalares.» Sr.as e Srs. Deputados, o Governo deveria fazer reformas para melhorar a saúde dos doentes e não fazer reformas contra os doentes; o Governo deveria fazer reformas orientadas para retirar doentes às urgências, encaminhando-os para a rede de cuidados primários.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — E é isso que está a fazer!

A Oradora. — Porém, o que o Governo faz é tirar as urgências aos doentes, fechando-lhes a porta de entrada no sistema de saúde.
Os resultados financeiros poderão ser os melhores, mas esse «grande desígnio» do Governo, dito socialista, será conseguido à custa do afastamento dos doentes dos serviços de saúde. E, pior de tudo, será conseguido à custa do sofrimento dos doentes!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — É verdade!

A Oradora: — O PSD entende que, a ir para a frente a teimosia deste Governo, largas dezenas de milhares de cidadãos ficarão a uma distância desmedida dos cuidados de saúde, particularmente em situações urgentes e de emergência.
A situação criada, Sr.as e Srs. Deputados, é inaceitável e é muito grave: partilho da preocupação manifestada pela Ordem dos Médicos quando disse o seguinte: «Desafortunadamente, os portugueses têm razões de sobra para estar verdadeiramente preocupados com uma política de saúde que desagrega o Serviço Nacional de Saúde, privilegia os encerramentos, favorece a substituição de recursos públicos por recursos privados e incrementa a transferência de custos para a população!» E, acreditem, Srs. Deputados, que o faço com a maior tristeza: assim o Partido Socialista o fizesse pela saúde dos doentes e pelo bem-estar e qualidade de vida de todos os portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — A Sr.ª Deputada Teresa Caeiro inscreveu-se para pedir esclarecimentos, mas a Sr.ª Deputada Ana Manso já não dispõe de tempo para lhe responder. A não ser que a Mesa lhe conceda 1 minuto, o que fará.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Manso, serei breve, até porque dispõe apenas de 1 minuto para me responder.
De facto, este plano de requalificação arrisca-se a tornar-se mais uma acção de propaganda deste Governo, mas desta vez uma propaganda francamente falhada — é caso para dizer que «saiu o tiro pela culatra» ao Ministro da Saúde… Sabemos que apesar de uma clara melhoria nos últimos anos nos serviços e no sistema de emergência e urgência médicas, ainda temos uma enorme desigualdade de região para região, com um claríssimo prejuízo para o interior do nosso país, onde encontramos não só menos serviços dos médicos mas também muito menos equipamentos, nomeadamente viaturas, basta ver o caso do distrito de Beja que tinha uma viatura médica e que agora passou a ter mais duas, como resultado do incidente lamentável que ocorreu há

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um mês atrás.

Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!

A Oradora: — Portanto, o que lhe quero perguntar é o seguinte: quando já temos um sistema de emergência médica tão iníquo, como é que o Ministério apresenta um plano de reestruturação que vem aprofundar, ainda mais, esta iniquidade e esta injustiça para com as populações do interior? Pergunto isto porque nove distritos, todos eles do interior, vão ficar sem serviço de urgências polivalentes, com escassíssimos serviços médico-cirúrgicos e muito poucos serviços de urgência básica.
É esta a questão que lhe deixo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Manso, dispondo para o efeito de 1 minuto, que a Mesa, com a tolerância que tem tido para com as outras bancadas, lhe concede.

A Sr.ª Ana Manso (PSD): — Agradeço a condescendência, Sr. Presidente! Começo por agradecer a questão levantada pela Sr.ª Deputada Teresa Caeiro e quero dizer-lhe que, de facto, parece que este Governo governa para metade dos portugueses e esquece a outra metade de Portugal, caracterizando-se, sistematicamente, pelo abandono do interior.
De facto, há nove distritos no Interior que ficam com nenhuma urgência polivalente. Pior do que isso é que em simultâneo fecham serviços de atendimento permanente que constituem verdadeiros serviços de urgência e portas de acesso aos cuidados de saúde primários e aos sistema de saúde e, em simultâneo, nada fazem, nada!, para alterar os serviços de urgência hospitalares!!

Vozes do PSD: — É verdade!

A Oradora: — Limitam-se a encerrar! Este Governo só sabe conjugar o verbo encerrar: «encerro hoje», «encerro amanhã», «encerro depois». Abrir? Nem um único!! No meu distrito, no distrito da Guarda, sistematicamente têm como «bode expiatório» os serviços de atendimento permanente dos 11 concelhos e vêm dizer-me que um doente que está em Pinhel, que tem o Serviço de Atendimento Permanente a funcionar 24 horas, se vai deslocar, passando pelos concelhos de Almeida, Figueira de Castelo Rodrigo, para ir à urgência base que é em Vila Nova de Foz Côa, quando tem o Hospital da Guarda logo ali, ao lado, bem perto, com uma urgência médico-cirúrgica…! Não conseguimos entender onde é que está a política de saúde deste Governo… Porque é que este Governo aposta em destruir o modelo do Serviço Nacional de Saúde? Porque é que este Governo aposta em fazer uma política de saúde contra os doentes, contra as pessoas, em vez de reestruturar o Serviço Nacional de Saúde e reestruturar os meios e as urgências hospitalares e os serviços de atendimento permanente?!…

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sequência das intervenções feitas fica mais uma vez claro que há algo que o Governo socialista não compreende. É porque quando estamos a falar de saúde estamos a falar do bem mais precioso para uma população, e quando estamos a falar de emergência médica estamos a falar de situações em que está colocado em risco esse bem mais precioso.
Sr.as e Srs. Deputados do PS, o CDS-PP fala com particular à vontade nesta matéria porque, na generalidade, concordámos com os critérios que estiveram na base do encerramento das maternidades, uma vez que estavam em causa critérios clínicos atendíveis.
Concordamos com a necessidade imperiosa de reestruturar o Serviço Nacional de Saúde no seu todo, nomeadamente a rede de urgências. No entanto, uma breve análise da gestão médica e política que este Governo tem feito no que se refere à requalificação das urgências mostra bem o desrespeito total que tem dedicado às populações.
Vou fazer apenas uma brevíssima cronologia da gestão política, isto porque as questões médicas já foram aqui largamente abordadas: dia 8 de Junho de 2006, anúncio de que a reforma irá ser feita até ao fim desse ano; depois, é nomeada a comissão técnica; em meados de Setembro, é anunciado o encerramento de várias urgências, que iriam ocorrer até Março de 2007; a 4 de Outubro é apresentado com pompa e circunstância um novo mapa das urgências em Portugal, sem qualquer estudo sobre a referenciação, ou

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seja, decreta-se o encerramento de urgências sem que se saiba como vai ocorrer a transferência dos doentes de um lado para o outro; a contestação dos autarcas começa; no mesmo mês, o Ministro diz que o mapa das urgências vai ser alterado.
A 14 de Outubro, temos notícia de que é o próprio PS que está agitado na sequência do anúncio deste novo mapa das urgências. Chegamos a Dezembro e verifica-se que as distâncias apresentadas no relatório da comissão técnica foram mal calculadas e que, por conseguinte, foram mal calculados os tempos de acesso. Afirma-se então que a nova rede ficará conhecida apenas em Janeiro, ou seja, depois da altura em que deveria ter-se começado a implementar a reestruturação das urgências.
Encerramos para Natal. Logo em 26 de Janeiro de 2007 é apresentado o novo mapa final — este aqui é que é «final»… — mas, nessa mesma noite, o Ministro da Saúde vai às televisões dizer que, afinal, não o é, que o «final, final, final, o mesmo final» só em Junho de 2007.
Continuamos, e prossegue a contestação, nomeadamente por parte de membros do PS. Já em Fevereiro verificamos que o processo de requalificação das urgências não tem sequer verbas orçamentadas ou cabimentadas para a sua execução. Intensifica-se então a contestação, e, como prova da convicção técnica e política do Ministro Correia de Campos, este decide, no próprio dia, formular e celebrar uma série de protocolos com, suponho, os autarcas mais barulhentos… Em suma, o que é que descobrimos? Descobrimos um mapa de urgências feito a «régua e esquadro»; depois, descobrimos que ele consiste, no seu essencial, nalguns encerramentos aqui e nalguns acordos acolá e verificamos que quem grita mais alto tem uma grande probabilidade de fazer valer a sua razão; em terceiro lugar, verificamos que não há dinheiro nem previsão do dinheiro necessário para fazer face às despesas com esta requalificação, no que se refere não só à reabilitação e requalificação de algumas urgências mas também à criação de urgências maiores, como é o caso das polivalentes.
Mas o pior, Srs. Deputados, e como já disse há pouco, é que este caso se arrisca a tornar um mero de fogo de vista. Mas é um fogo de vista muito injusto e com grande penalização…

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Muito bem!

A Oradora: — … sobretudo daquelas pessoas que acreditam, como nós acreditamos, que é necessário mexer na saúde em Portugal. Mas não nos basta um mapa feito a «régua e esquadro», não basta não haver verbas orçamentadas nem cabimentadas, que este estudo técnico está completamente desenquadrado e é absolutamente limitador, porque a urgência médica, como os Srs. Deputados saberão e compreenderão, é uma parte integrante de um mosaico complexo que tem de funcionar, de interagir de uma maneira articulada, entre os cuidados de saúde primários e a emergência pré-hospitalar. É preciso transportes de socorro adequados, em número suficiente, com tripulantes também em número suficientes e devidamente qualificados, são necessárias viaturas adequadas a todo o tipo de emergências e urgências, é preciso um sistema de referenciação capaz de dar respostas, é preciso um mecanismo de serviços que funcionem de forma continuada junto das populações… Fazendo aqui um parêntesis, é certo que os SAP não cumprem, no sentido técnico, as funções de uma urgência.

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Não cumprem!! Mas é que não cumprem mesmo!!

A Oradora: — Não cumprem as funções de uma urgência de emergências graves, mas cumprem o papel muito importante de proximidade com as populações, com os doentes, e um papel que os senhores não querem reconhecer mas que é evidente, que é o de fazer uma «pré-triagem».

Risos do PS.

Os senhores encerram os SAP, encerram urgências e estão à espera, ainda por cima sem estudos credíveis de referenciação, que não haja uma saturação ainda maior das urgências já existentes. Mais: também não encontramos uma solução que já devia ter sido encontrada e que evitaria uma grande parte do acesso às urgências: uma rede de cuidados de saúde primários adequada.
Relembro aos Srs. Deputados do PS o compromisso do Ministro Correia de Campos em como teríamos 100 unidades de saúde familiares,…

O Sr. Ricardo Gonçalves (PS): — Está a ser feito!

A Oradora: — … como alternativa ou reforço dos centros de saúde, a funcionar até finais de 2007. Neste momento temos 50, e já estamos quase a meio do ano! Portanto, a nossa grande preocupação é a de que não haja nem uma calendarização… E a calendarização não é política, não é para podermos contar os dias, nem tão-pouco nos dá um prazer especial «atirar à cara» dos senhores que não cumprem qualquer dos compromissos que assumem… E por que é que é necessário um calendário? Porque um calendário articulado é que permitiria fazer uma gestão articulada de

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todo este processo de reforma. Não é encerrar, encerrar, encerrar e, depois, esperar que os cuidados de saúde primários surjam;…

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Esperar, esperar!

A Oradora: — … acreditar, utilizando as palavras do presidente da comissão técnica, que este mapa, esta semi-reforma, irá pressionar outras reformas.
Não é assim, Sr. Deputado!

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Ai não?!

A Oradora: — Então, não se chama uma reforma, é um mapa!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.

A Oradora: — Termino já, Sr. Presidente.
É pegar em números e distribui-los por pessoas… É um PowerPoint, como os senhores sabem fazer!

Vozes do PS: — Ahhh!…

A Oradora: — Não é confiar que vão surgir mais transportes nem acreditar que as consultas abertas irão surgir, como disse o Sr. Deputado Ricardo Gonçalves, «caso a caso»… Mas o que é isto, Sr. Deputado?! Isto não é uma reforma!!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, tem mesmo de concluir!

A Oradora: — Concluirei de imediato, Sr. Presidente.
Os senhores dizem que isto é uma reforma, mas é, sim, um acto falhado de propaganda!!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Pizarro.

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os projectos de resolução hoje em debate estão eivados de erros técnicos e são inaceitáveis do ponto de vista político. Vamos primeiro às questões de natureza técnica.
O projecto de resolução do PCP é, sob este ponto de vista, o que mais equívocos acumula: assume como um mal a concentração de serviços ignorando toda a evidência, vertida em números de documentos de reputadas instituições internacionais, de que é precisamente através dessa concentração que os cidadãos poderão retirar todo o partido da Medicina moderna. Se o que queremos são cuidados médicos de alta tecnologia, que exigem equipamento evoluído e profissionais altamente preparados, resulta óbvio que a concentração é indispensável. Afirmar o contrário é pura demagogia!

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!

O Orador: — Alimentar o discurso de que esse tipo de cuidados médicos pode estar disponível ao pé da porta de cada um é alimentar um erro que conduz a um lamentável desperdício de recursos e, mais grave ainda, à existência de um sistema onde os doentes são tratados com qualidade diferente conforme a zona onde vivem.
O PS, umbilicalmente ligado à génese do Serviço Nacional de Saúde e comprometido com os seus objectivos solidários, não pode aceitar essa situação de desigualdade! O segundo erro técnico em que incorre o projecto de resolução do PCP é o de confundir os SAP com serviços de urgência. Esta é uma confusão deliberada, reiterada e repetida de modo insistente, na tentativa de conseguir a adequada dramatização. Mas, Sr.as e Srs. Deputados, este é mais um daqueles casos em que a falsidade, ainda que repetida muitas vezes, não se transformará em verdade.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!

O Orador: — Os cuidados primários de saúde devem caracterizar-se pela sua proximidade e pela interacção entre os cidadãos e o seu médico de família, mas esse é o objectivo da criação das unidades de saúde familiares, a que me referirei com maior detalhe mais adiante. Não podemos confundir esse nível de

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cuidados com a parafrenália tecnológica que deve estar associada a um serviço de urgência moderno.
Também no projecto de resolução do Bloco de Esquerda se encontram variadas incoerências técnicas.
Desde logo, a consideração ao mesmo nível dos diferentes serviços de urgência polivalente a desenvolver.
Parece óbvio que a situação não será igual em Vila Nova de Gaia, onde se exige uma perspectiva metropolitana coordenada com os Hospitais de São João e de Santo António, ou em Évora, que é único serviço de urgência polivalente previsto para o Alentejo.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!

O Orador: — Mas o Bloco de Esquerda a tudo aplica uma solução uniforme.
Num outro plano, o Bloco propõe serviços de urgência hospitalar a funcionar até às 22 horas ou até às 24 horas. Mas esta proposta é feita ao arrepio do imperativo das boas práticas neste domínio. Um serviço de urgência, se é verdadeiramente necessário, não pode deixar de funcionar de modo ininterrupto, não pode deixar de ser necessário durante a noite ou a uma certa hora. Cá temos o Bloco a contribuir para a confusão entre consulta sem marcação e urgência…!

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!

O Orador: — É fácil de compreender que um cidadão, confrontado com uma situação de doença de início agudo, queira procurar ajuda médica em busca de alívio dos seus sintomas ou de esclarecimento sobre a real gravidade dessa doença, mas, felizmente, a esmagadora maioria das condições de doença aguda não são condições de urgência e poderão ser adequadamente acompanhadas de uma consulta, que se deseja tão aberta e tão próxima quanto possível dos cidadãos. Mas isso não é um serviço de urgência! No plano político, os projectos de resolução que aqui, hoje, estamos a debater traduzem, na sua essência, uma mesma opção: propõem ao Governo que prescinda de governar, que nada decida, que deixe ficar tudo na mesma. Mas vamos ver a que nos conduziria isso.
A Comissão Técnica de Apoio do Processo de Requalificação das Urgências, composta por vários dos mais destacados especialistas nacionais em urgência médica, identificou, na actual situação da rede de urgências — a situação que temos hoje com 73 urgências —, 450 000 portugueses a mais de uma hora do serviço de urgência mais próximo e propôs uma nova rede, onde esse número é reduzido para menos de 60 000.
Claro que a implementação da nova rede não se faz de um dia para outro e não está isenta de dificuldades. Os recursos são, todos o sabem, embora alguns finjam ignorá-lo, finitos e sua realocação tem de ser pacientemente explicada e cuidadosamente posta em marcha. Mas isso é razão para nada se fazer? Onde está a preocupação das oposições com esse quase meio milhão de portugueses que está, neste momento, a mais de uma hora da urgência mais próxima? Como médico e como Deputado do PS, entendo que o Governo deve olhar de modo prioritário para esses portugueses e, no mesmo plano, assegurar a necessária requalificação de toda a rede de urgências.
O problema dos serviços de atendimento permanente (SAP) deve ser encarado com abertura e com realismo. A reforma em curso nos cuidados de saúde primários está a dar frutos,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — São é podres!

O Orador: — … por mais que os profetas da desgraça repitam o contrário. Estão em funcionamento unidades de saúde familiar (USF) e mais 23 têm candidatura aprovada. No seu conjunto, permitem que mais 92 000 doentes tenham médico de família. As novas USF estão abertas até às 20 horas ou 22 horas e, em alguns casos, também aos sábados e aos domingos. Cumpre-se, assim, o desidrato de diminuir o número de cidadãos sem médico de família e de facilitar que o atendimento de cada utente seja realizado pelo seu próprio médico.
Mais ainda: o número de médicos que se estão a especializar em medicina geral e familiar aumentou de 350, em 2004, para 558, neste momento.

A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Essa é que é essa!!

O Orador: — Este é o caminho que permitirá assegurar um médico de família a cada português.
Nos cuidados primários, que algumas oposições dizem que estamos a destruir, realizaram-se, em 2006, mais de 22,2 milhões de consultas programadas — um aumento de 2,3% em relação a 2004. Ao mesmo tempo, nos SAP realizaram-se 5,3 milhões de consultas, com um decréscimo de 7% em relação ao ano anterior.
Estes são dados positivos, que vão na direcção certa.
No que diz respeito à requalificação dos serviços de urgência, não podemos deixar de enaltecer o caminho que o Governo tem seguido, com a realização de um amplo debate e de um frutuoso diálogo.

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A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!

O Orador: — Foram já concertados protocolos com 10 municípios, resultando evidente o envolvimento do poder local no encontrar de soluções inovadoras.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Os tais «malandros» que estavam à frente das manifestações!

O Orador: — Revelaram os autarcas envolvidos capacidade para colocar os interesses das populações acima de estéreis disputas partidárias, muito ao contrário do que, vezes demais, temos observado no comportamento das oposições parlamentares.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Também no que diz respeito aos SAP, se salienta a disponibilidade para o diálogo, demonstrada pelo Ministro da Saúde, materializada nos contactos formalmente estabelecidos quer com a Associação Nacional de Municípios Portugueses quer, directamente, com muitos municípios.
Não se compreende, por isso, qual o real alcance dos projectos de resolução em causa. Eles são incongruentes, do ponto de vista técnico, e conservadores, do ponto de vista político.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — O caminho que o Governo tem vindo a percorrer — decidir com fundamentação técnica, rigorosa e intensamente debatida, após o envolvimento do poder local democrático — é o caminho certo.
Interrompê-lo seria condenar quase meio milhão de portugueses a permanecer excessivamente longe de um verdadeiro serviço de urgência.
A nossa aposta é no desenvolvimento dos cuidados primários de proximidade, em que cada português tenha o seu médico de família. A nossa aposta é na requalificação da rede de urgências que a todos garanta segurança e modernidade tecnológica. É assim que honramos o Serviço Nacional de Saúde!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Pizarro, em boa hora, estamos outra vez a discutir a questão das urgências e do encerramento de serviços de saúde no nosso País.
O encerramento de serviços tem sido, provavelmente, um dos traços mais marcantes deste Governo não só na área da saúde como noutras áreas, e tem ocorrido, designadamente, no interior do nosso país, trazendo tantas dificuldades e agravando o despovoamento e o ordenamento do território.
Isto é devido, temo-lo dito recorrentemente, a uma lógica economicista de desmantelamento da função pública nos seus objectivos mais nobres, como é o caso da saúde, em que o objectivo é, unicamente, poupar no orçamento, poupar a caminho do encerramento do Serviço Nacional de Saúde.
Encomendam-se estudos, partindo dos pressupostos da necessária poupança e concentração de serviços, para chegar à conclusão que já se pretendia antes de encomendar esses estudos.
O argumento para encerrar os serviços — de falta de condições e de pessoal — é por demais maquiavélico: no reconhecimento de que não estamos a prestar um serviço correcto às populações, partimos para acabar com esse serviço de vez, prestando ainda menos do que prestávamos antes.
A alternativa nunca é providenciar mais meios, nunca é corrigir ou suprir as insuficiências, nunca é cumprir o desígnio constitucional de dotar o nosso país de uma rede de serviços de saúde que sirva todos de uma forma equitativa e justa.
Os Verdes têm desafiado o Governo a suspender estes processos. Fizemo-lo no caso do processo de encerramento das escolas do 1.º ciclo. Porquê? Porque as escolas de acolhimento não estavam, em muitos casos, preparadas para receber o acréscimo de alunos a que se viram obrigadas.
Na saúde passa-se, precisamente, o mesmo. Estamos a dar primeiro os passos para encerrar, para cortar nos serviços, sem antes precaver as necessidades dos serviços que vão ficar no terreno para responder ao acréscimo de utentes que a eles vão ocorrer.
Por isso, seria fundamental assumir aqui, na Assembleia da República, a obrigação de suspender este processo. O Partido Socialista, já que está tão confiante na bondade e nas soluções que vão ser encontradas, não deveria ter receio de suspender este processo, de discutir com as populações, as autarquias e os restante partidos, e, seguindo a sugestão do Partido Comunista Português, através de uma proposta de lei, definir os princípios-base que vão presidir ao encerramento ou à reestruturação dos serviços de urgência.

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Entendemos que isso é fundamental, porque as pessoas têm dúvidas causadas, por exemplo, pelos falecimentos ocorridos, no espaço de duas semanas, no SAP de Odemira, ou pelos nascimentos que ocorreram em ambulâncias no caminho entre a Figueira da Foz e Coimbra, ou pelo parto ocorrido a caminho do Hospital Materno-Infantil de Badajoz vindo de Elvas.

Protestos do PS.

Estas dúvidas surgem também porquê? Porque no primeiro relatório da comissão técnica aparecia justificadamente a opção de um serviço de urgência em Vendas Novas e agora surge em Montemor-o-Novo sem que esteja justificada esta opção. Naturalmente, as pessoas têm dúvidas. Porquê não parar para pensar? Ou, por exemplo, o caso do encerramento da urgência no Centro de Saúde de Vila Pouca de Aguiar, em relação ao qual o Sr. Ministro garantiu, em Vila Real, que seria o último a fechar e, no entanto, está previsto o seu encerramento. Porquê?

Vozes do PS: — Não vai fechar!

O Orador: — Vai a caminho…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
Quanto ao Hospital de Santa Maria da Feira, estão a prever o encerramento de urgências e a canalização de utentes para este hospital, que já está sobrecarregado, sem que estejam, por exemplo, assegurados os transportes de Ovar.
É ou não verdade, Sr. Deputado, que privados e Misericórdias estão a ocupar os lugares deixados vagos pelo Serviço Nacional de Saúde? Se isto está a acontecer é porque há ali mercado, visto que as pessoas têm necessidade de serviços de saúde que o Governo lhes está a negar. É só por isto que os privados e as Misericórdias ali estão a intervir.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Pizarro.

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Madeira Lopes, agradeço-lhe as questões colocadas. Em resposta, abordarei apenas duas questões.
A primeira diz respeito ao problema da concentração. Não há qualquer dúvida de que um serviço de urgência que, em 24 horas, opera um ou dois doentes não tem condições técnicas, do ponto de vista de treino da sua equipa de urgência, para responder às verdadeiras urgências. É um erro do ponto de vista técnico, Sr. Deputado!! Quanto ao mercado, imagino que mercado haverá… É que, nos SAP que estão abertos durante toda a noite, da meia-noite às 8 horas da manhã, a média de atendimentos, no distrito de Bragança, é de 1,2 utentes; no distrito de Vila Real, é de 2,3 utentes; no distrito de Castelo Branco é de 2,2 utentes; e, no distrito da Guarda, é de 1,5 utentes. Portanto, esse parece-me um mercado extraordinário para que os privados montem clínicas em todo o lado… Talvez até venhamos a ter — imagino!… — secções da Clínica Mayo a substituir os SAP encerrados da meia-noite às 8 horas da manhã.

Aplausos e risos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares, em tempo cedido por Os Verdes.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, quero fazer dois ou três comentários, no final deste debate.
Diz o Sr. Deputado Manuel Pizarro que, ao contrário das normas técnicas internacionais, somos contra a concentração. Só que essas normas dizem respeito — e bem! — aos meios mais diferenciados tecnologicamente e, com isso, estamos de acordo; já não dizem respeito à proximidade das portas de acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) em relação às populações. Portanto, não responda com «bugalhos» quando estamos a falar de «alhos». Ninguém quer todos os equipamentos das urgências polivalentes em todos os sítios do País; o que queremos é que, a par de serviços concentrados mais diferenciados, haja serviços a que se possa aceder, mais próximos de onde as pessoas estão e mais disseminados no território, e isso é que está a ser posto em causa por esta reforma.
Diz o Sr. Deputado que queremos confundir as pessoas, ao dizer que os serviços de atendimento são urgências. Não, Sr. Deputado!! O Sr. Deputado e o PS é que querem fazer crer aos portugueses que a

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urgência se reduz às situações tecnicamente qualificadas como de emergência. Só que nós entendemos que a urgência é mais do que isso: é também aquele caso agudo de doença em que a pessoa não corre risco de vida, mas precisa de ter um atendimento. E precisa de ter um atendimento próximo e acessível, e não no dia seguinte ou a 100 km de distância!! Diz o Sr. Deputado, e o Partido Socialista, que os portugueses não precisam dos SAP para nada, pois os SAP para nada servem. Mas, depois, propõem, em alternativa, as consultas abertas, que é o SAP do hospital. Só que a diferença é a de que, enquanto o SAP do centro de saúde está na sede de concelho, está próximo alguns quilómetros ou algumas dezenas de quilómetros, os SAP que os senhores, agora, querem abrir nos hospitais estão, em muitos casos, a centenas de quilómetros, pelo que são de muito mais difícil acesso para a maioria das populações. Esta é que é a diferença: é entre a proximidade e a acessibilidade para todos e a distância e a insegurança da distância que os senhores querem impor à generalidade do território!

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — E se não fossem necessários os serviços públicos, por que raio de «masoquismo» é que os serviços privados estariam a abrir unidades por todo o País onde o serviço público falha por responsabilidade da política do Partido Socialista? Deve ser algum «masoquismo económico», alguma falta de visão, que está a levar os investimentos privados para os sítios onde o Governo mandou encerrar as unidades públicas… «Angariador de negócios privados» é o papel que esta política está a fazer no nosso país.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, procurarei ser muito rápido…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — É realmente exigível o máximo de poder de síntese possível.

O Orador: — Quero somente sublinhar uma contradição na posição do Partido Socialista.

Vozes do PSD: — Só uma?…

O Orador: — Os senhores vêem o que vos interessa e aquilo que interessa ao povo não vêem! Os senhores vêem, no País, 14 urgências polivalentes, mas elas não existem! Há seguramente três ou quatro — no Hospital Central de Braga, no Hospital de São João, nos Hospitais da Universidade de Coimbra e no Hospital de Santa Maria, em Lisboa —, mas vão demorar anos até todas as outras poderem ser consideradas urgências polivalentes.
Ao mesmo tempo, os senhores não vêem 5 milhões de consultas! É como se, de um dia para o outro, os portugueses tivessem que deixar de adoecer.

Protestos do Deputado do PS Manuel Pizarro.

Os portugueses podem ser atropelados, pode cair em cima deles uma varanda, podem cair de um 12.º andar, mas não podem adoecer, porque não podem ir aos SAP pois os senhores vão fechá-los! Essa é que é a vossa contradição: vêem o que vos interessa, mas não vêem o que interessa ao povo português!!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Pizarro, a quem peço o mesmo esforço de síntese que o tempo exige.

O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Terei isso em conta, Sr. Presidente.
Sr. Deputado Bernardino Soares, a definição de urgência não é política, nem carece de deliberação da Assembleia da República; é uma definição de ordem técnica. Em termos de ordem técnica, há situações de doença aguda, que podem justificar — e muito bem, do ponto de vista das pessoas — o recurso ao médico; e há situações de urgência em relação às quais o Estado tem a obrigação de assegurar uma resposta tecnicamente qualificada.
Inadmissível é que se enganem as populações com pretensos serviços de urgência que não têm condições para funcionar como tal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Portanto, fecham-se!

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O Orador: — A segunda questão tem a ver com o seguinte: naturalmente que os 5 milhões de consultas que se realizam nos SAP são, na sua maioria, úteis, mas algumas até nem o são. É que, como o Sr. Deputado João Semedo sabe bem, há aqui alguma perversidade, pois há consultas remetidas para os SAP que podiam e deviam ser feitas no funcionamento regular da relação médico de família/utente, no seu centro de saúde — e temos de realizar esse esforço. Ora, esse esforço não se realiza, privilegiando uma realidade que distorce o mecanismo de funcionamento do trabalho do médico e da sua relação com o utente.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A culpa é do sistema, não é dos doentes!

O Orador: — Mas também não vejo aqui qualquer situação de alarme. E o Governo, ao negociar casuisticamente — e bem, no entender do PS — os mecanismos de protecção local, de forma a que, em cada concelho, os utentes fiquem melhor do que estavam antes, está a precisamente a acautelar que não aconteçam os dramas com que o Sr. Deputado João Semedo aqui nos quis assustar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, está concluída a apreciação conjunta dos projectos de resolução n.os 184/X — Suspensão do processo de encerramento de serviços de urgência em hospitais e centros de saúde (PCP) e 185/X — Recomenda ao Governo uma orientação para o processo de implementação do plano de requalificação das urgências hospitalares (BE).
A próxima sessão plenária terá lugar amanhã, às 10 horas, tendo como ordem do dia a discussão da proposta de lei n.º 115/X — Estabelece as bases do ordenamento e da gestão sustentável dos recursos aquícolas das águas interiores e define os princípios reguladores das actividades da pesca e da aquicultura nessas águas, e dos projectos de lei n.os 255/X — Estabelece medidas de protecção aos carvalhos e outras espécies autóctones da flora portuguesa (Os Verdes) e 303/X — Altera a Lei Tutelar Educativa, aprovada pela Lei n.º 166/99, de 14 de Setembro, concatenando-a com o princípio do direito penal do facto (BE).
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
José Carlos Correia Mota de Andrade
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Partido Social Democrata (PSD):
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Pedro Augusto Cunha Pinto
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
Jaime José Matos da Gama
Vitalino José Ferreira Prova Canas

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

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Partido Socialista (PS):
Alberto de Sousa Martins
João Carlos Vieira Gaspar
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Manuel Alegre de Melo Duarte

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
José de Almeida Cesário
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Miguel Pais Antunes
Mário Henrique de Almeida Santos David
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Ricardo Jorge Olímpio Martins

Partido Comunista Português (PCP):
Francisco José de Almeida Lopes

Srs. Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003,
de 11 de Outubro):

Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas

Partido Social Democrata (PSD):
Domingos Duarte Lima
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Pedro Miguel de Santana Lopes

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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