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Quinta-feira, 3 de Maio de 2007 I Série — Número 78
X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 2 DE MAIO DE 2007
Presidente: Ex.mo Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte
Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Abel Lima Baptista
SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15 minutos.
Foram aprovados dois pareceres da Comissão de Ética relativos à renúncia ao mandato de um Deputado do CDSPP e de outro do PS.
Deu-se conta da apresentação dos projectos de lei n.os 377 e 378/X, do projecto de resolução n.º 202/X e da apreciação parlamentar n.º 43/X.
Procedeu-se à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 119/X — Aprova normas para a protecção dos cidadãos da exposição involuntária ao fumo do tabaco e medidas de redução da procura relacionadas com a dependência e a cessação do seu consumo, sobre a qual intervieram, além do Sr. Ministro da Saúde (Correia de Campos), os Srs. Deputados José Eduardo Martins (PSD), José Vera Jardim (PS), Bernardino Soares (PCP), João Semedo (BE), Hélder Amaral (CDS-PP), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Maria de Belém Roseira e Maria Antónia Almeida Santos (PS).
A proposta de lei n.º 116/X — Aprova o regime jurídico que estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projectos, pela fiscalização de obra e pela direcção de obra, que não esteja sujeita a legislação especial, e os deveres que lhes são aplicáveis, e revoga o Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro, foi igualmente apreciada, na generalidade, tendo proferido intervenções o Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações (Paulo Campos) e os Srs. Deputados Pedro Mota Soares (CDSPP), Carlos Poço (PSD), Jorge Machado (PCP), Mariana Aiveca (BE), Hélder Amaral (CDS-PP), Álvaro Saraiva (Os Verdes) e Hugo Nunes (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas.
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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a ses-
são.
Eram 15 horas e 15 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
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Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José dos Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato José Diniz Gonçalves
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosalina Maria Barbosa Martins
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Zita Barbas Marvão Alves Gomes
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
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Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Miguel Pais Antunes
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Miguel Tiago Crispim Rosado
Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Hélder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
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Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Álvaro José de Oliveira Saraiva
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, por consenso entre os grupos parlamentares, não haverá período de antes da ordem do dia.
A Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa dois relatórios e pareceres da Comissão de Ética, que devem ser apreciados e votados, relativos à renúncia ao mandato de dois Srs. Deputados.
O primeiro parecer refere-se à renúncia ao mandato, com efeitos a partir de 27 de Abril de 2007, do Deputado António Pires de Lima, do CDS-PP (Círculo Eleitoral do Porto), por José Paulo Carvalho, que já se encontra em exercício de funções.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que a renúncia ao mandato do Deputado em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.
Pausa.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o segundo parecer refere-se à renúncia ao mandato do Deputado Joaquim Pina Moura, do PS (Círculo Eleitoral da Guarda), por Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel, com efeitos desde 2 de Maio de 2007, inclusive.
O parecer da Comissão de Ética vai no sentido de que a renúncia ao mandato do Deputado em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.
Pausa.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram ainda entrada na Mesa as seguintes iniciativas legislativas: projectos de lei n.os 378/X — Altera a lei que regula e garante o exercício do direito de petição (BE) e 377/X — Garante o acesso ao direito e aos tribunais revogando o regime jurídico existente (PCP), que baixaram à 1.ª Comissão; projecto de resolução n.º 202/X — Alterações ao Regimento da Assembleia da República (BE); e apreciação parlamentar n.º 43/X (PCP) — Decreto-Lei n.º 98/2007, de 2 de Abril, que aprova o regime de incentivo à leitura de publicações periódicas.
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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos aguardar pela chegada do Governo, que contava com um prévio período de antes da ordem do dia, para iniciarmos o debate.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, por minha única responsabilidade, e visto que da agenda dos trabalhos de hoje constava um período de antes da ordem do dia, comuniquei ao Sr. Ministro da Saúde que ele só precisaria de estar no Plenário por volta das 15 horas e 30 minutos.
Assim sendo, solicito uma interrupção dos trabalhos até às 15 horas e 30 minutos, pois o Sr. Ministro está agora a sair do Ministério e pode haver alguns problemas de trânsito. Peço, pois, que os trabalhos sejam interrompidos por 10 ou 15 minutos.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Antes de interromper os trabalhos por 15 minutos — e temos de fazê-lo, pois não podemos iniciar o debate sem a presença do Sr. Ministro —, chamo a vossa atenção para que se encontra presente na tribuna oficial uma delegação da Comissão de Relações Exteriores, Cooperação Internacional e Comunidades Angolanas no Estrangeiro da Assembleia Nacional da República de Angola, para a qual peço uma saudação do Plenário.
Aplausos do PS, do PSD, do PCP e do CDS-PP, de pé.
Srs. Deputados, não me resta senão, ao abrigo das disposições regimentais, interromper os trabalhos.
Eram 15 horas e 20 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 50 minutos.
Srs. Deputados, lamento esta situação, mas ela também foi devida ao facto de, sem ninguém estar prevenido, não ter havido período de antes da ordem do dia.
Vamos, então, dar início ao período da ordem do dia, com a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 119/X — Aprova normas para a protecção dos cidadãos da exposição involuntária ao fumo do tabaco e medidas de redução da procura relacionadas com a dependência e a cessação do seu consumo.
Para iniciar o debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.
O Sr. Ministro da Saúde (Correia de Campos): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, começo por pedir-lhes desculpa pelo atraso imprevisto, que se deve também à imprevisibilidade dos vagares do trânsito lisboeta no seu eixo central, apesar do enorme sucesso mediático que parece ter sido a abertura do túnel do Marquês… Sr. Presidente, Srs. Deputados: A política de prevenção do tabagismo foi consagrada no ordenamento jurídico português pela Lei n.º 22/82, de 17 de Agosto, que foi regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 226/83, de 27 de Maio. Ao longo de mais de 20 anos de vigência, foram dezenas as alterações sofridas por estes diplomas, sem que tal permitisse, em muitos casos, a obtenção de um impacto positivo.
O consumo de tabaco é, hoje, a principal causa evitável de doença e de morte. O fumo do tabaco contém milhares de substâncias químicas, com efeitos tóxicos, mutagénicos e cancerígenos, que afectam não só os fumadores como também as pessoas expostas ao fumo do tabaco, que assim têm uma maior probabilidade de vir a contrair cancro do pulmão, doenças cardiovasculares e diversas patologias respiratórias de natureza aguda e crónica.
O Governo, ciente do movimento mundial em torno da protecção de todos aqueles que se encontram expostos ao fumo do tabaco, implementa, na presente proposta de lei, o disposto no Decreto n.º 25A/2005, de 8 de Novembro, que aprovou a Convenção-Quadro da Organização Mundial de Saúde para o Controlo do Tabaco.
Com a presente proposta de lei apresentada à Assembleia, visa-se proteger os cidadãos da exposição involuntária ao fumo do tabaco, quer nos locais de trabalho quer nos espaços de lazer. Foi também preocupação do Governo apresentar medidas de redução da procura relacionadas com a dependência e a cessação do consumo do tabaco, já que a nicotina, presente no tabaco, é uma substância com propriedades psicoactivas que gera dependência, pelo que é necessário prestar um maior apoio aos fumadores que pretendam abandonar este perigoso hábito.
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O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
O Orador: — Há ainda que não esquecer que muitas das normas constantes da proposta de lei são provenientes de directivas comunitárias, que têm de ser respeitadas pelo legislador nacional.
São, assim, pontos fundamentais, no diploma, a protecção dos não fumadores da exposição ao fumo passivo, a proibição da publicidade ao tabaco, a utilização de advertências de saúde nas embalagens, o apoio na cessação tabágica e a informação e educação para a saúde, em particular das crianças e dos jovens.
A coerência de conteúdos e de construção técnica da proposta de lei tem também de ser confrontada com a sua exequibilidade.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
O Orador: — Persistimos, durante longos 25 anos, com uma lei, socialmente avançada para a época, que ficou largamente por cumprir, tendo como excepções positivas, entre outras, a cessação do hábito de tabaco nas salas de aula e nos transportes públicos. Algo se conseguiu, mas muito abaixo do desejável.
A presente proposta revela, segundo vários estudos de opinião, um alto grau de adesão dos cidadãos à longa lista das suas medidas restritivas, com uma excepção: a da proibição total de fumar em cafés, restaurantes e bares com menos de 100 m
2 de área, onde a adesão é mais baixa, revelando-se, em contrapartida, elevada aceitação de um modelo opcional, por decisão do proprietário ou responsável pelo estabelecimento.
Os legisladores parlamentares têm agora diante de si uma ponderação de interesses entre uma medida sociologicamente exigente, coerente com o princípio de defesa da saúde dos trabalhadores contra o fumo passivo, mas potencialmente mais frágil em termos de cumprimento, ou a sua atenuação através da opção livre de não se fumar, tomada pelo proprietário ou responsável.
Dir-se-á que a atenuação respeita melhor as liberdades do comércio, obtendo também importante efeito dissuasor e, sobretudo, facultando aos não fumadores a fruição de um espaço livre de fumo por mútua opção, do agente económico e do cliente. Todavia, tem de contrapor-se a perda de coerência da ratio legis: construída para proteger fumadores passivos não voluntários, acaba por tolerar que os trabalhadores dos locais consentidos sejam expostos ao fumo do tabaco, mesmo não o querendo. E com um importante efeito adverso adicional: a concentração de fumadores em locais de fumo consentido torna estes locais de mais difícil convivialidade para quem, não sendo fumador, os frequenta involuntariamente.
Na procura de um equilíbrio entre o rigor na defesa da saúde dos trabalhadores e a capacidade de este dispositivo da lei ser ou não cumprido reside, porventura, o acúmen das dificuldades da presente peça legislativa.
Poderá, ainda, Sr.as e Srs. Deputados, o legislador encurtar significativamente a vacatio legis geral de um ano, tornando-a mais curta para todas as proibições onde a demora na execução da lei seja apenas justificada pela necessidade de adaptação física dos locais, com explícita exclusão de qualquer fundamentação de aculturamento à nova situação de restrição do fumo. Referimo-nos especialmente às proibições de fumar previstas em várias alíneas do artigo 4.° Aqui temos, Sr.as e Srs. Deputados, uma breve apresentação desta lei e do que sobre ela pode ser ainda feito durante o presente processo legiferante. Queremos todos uma lei exequível, mas também uma lei com rigor e sem perda da sua razão de ser, basicamente a da defesa dos cidadãos, em geral, e dos trabalhadores, em especial, contra o fumo passivo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados José Eduardo Martins e José Vera Jardim.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Saúde, o PSD saúda naturalmente esta iniciativa legislativa, oportuna, sobre o controlo dos efeitos nocivos do fumo e do tabaco em geral, mas gostaria de dizer — e o Sr. Ministro certamente não pensa que pedi a palavra para fazer perguntas apenas para lhe dizer com o que concordo — que, em alguns pontos de vista, esta proposta de lei fica muito aquém do desejável e, ao contrário do que o Sr. Ministro anunciou, não cumpre seguramente esses cinco objectivos que delimitou no seu discurso.
Estamos a reduzir a discussão deste tema à protecção dos não fumadores, mas entendamo-nos sobre este aspecto: o PSD sabe e reconhece que há um efeito muito nocivo sobre os não fumadores, mas também sabe que, em cada 10 pessoas que morrem por efeito do tabaco, na prática nove são
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fumadores e os fumadores não são criminosos que temos de opor aos não fumadores, como se ambos não tivessem direitos e, sendo os fumadores os mais afectados, não fossem também eles os primeiros com que temos de nos ocupar.
É por isso que, com esta iniciativa legislativa, louvável, estamos muito longe de atingir os objectivos preconizados pelo artigo 14.º da Convenção citada pelo Sr. Ministro.
Ora, era sobre essa matéria que gostaríamos de colocar algumas questões ao Sr. Ministro, até para decidir como vamos orientar o resto da nossa postura na discussão, na especialidade, que esperamos construtiva e consensual, como esta matéria tem sido até hoje.
Nomeadamente em relação a um tema inicial, à informação que é prestada aos consumidores de tabaco, espanta-nos, Sr. Ministro, que não tenha havido vontade de ir mais longe na obrigatoriedade de identificação de outros constituintes dos cigarros que não apenas os três referidos na lei.
Mas é, sobretudo, na redução do consumo, no apoio à desabituação do tabaco e na prevenção do consumo pelos menores que achamos que esta lei é, no mínimo, omissa. É omissa no que diz respeito à possibilidade de utilizar um conjunto de mecanismos, de que a própria Convenção fala, como o de ir actuando sobre o preço, mais do que pela via fiscal, também pela via do preço mínimo. E embora a lei fale em não permitir a venda a preços reduzidos, não concretizando o que é esse conceito indeterminado, é como se nada cá estivesse escrito.
Estamos, por outro lado, curiosos para saber que meios vai dispensar o Governo para as consultas de desabituação tabágica, aqui previstas de uma forma tão vaga que não sabemos o que são, nem quando vão começar.
Queremos saber se o Governo está disponível para alocar parte das receitas, quer as geradas por este diploma quer as geradas pela tributação do tabaco, para introduzir o princípio da comparticipação de medicamentos que manifestamente ajudem as pessoas a deixar de fumar.
Em relação à protecção dos jovens e à efectiva garantia de que menores de 18 anos não podem comprar tabaco, gostávamos de saber se o Governo está disponível para proceder ao licenciamento dos pontos de venda, ou como pretende tornar esta medida eficaz num país onde há tantos e tão indiscriminados pontos de venda e tão pouco controlo sobre eles.
É porque sem estas garantias, manifestamente, a única coisa de que estamos aqui a falar é da protecção aos não fumadores, matéria obviamente nobre, que deve ser tratada e na qual estamos de acordo com a generalidade das propostas apresentadas, mas que não esgota o tema.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — Para concluir, Sr. Presidente, quero só perguntar ao Sr. Ministro se ele se recorda do que aconteceu à legislação do tempo do Prof. Cavaco Silva, que previa que 1% das receitas do imposto sobre o tabaco fossem utilizadas na prevenção e no combate ao tabagismo, e se lhe parece coerente que, cobrando o Estado português 1500 milhões de euros de receitas do imposto sobre o tabaco, a Direcção-Geral de Saúde tenha, em 2006, gasto 124 000 euros com esta matéria. Pergunto-lhe, Sr.
Ministro, se é essa a medida do empenho do Governo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Respondendo o Sr. Ministro, em conjunto, aos dois oradores inscritos, tem agora a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.
O Sr. José Vera Jardim (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Saúde, saúdo a sua iniciativa, a iniciativa do Governo, e também a sua intervenção, sucinta, mas clara, sobre os objectivos da lei que aqui nos trouxe.
A pergunta que queria fazer-lhe é a seguinte: eu atribuo uma importância muito grande a todos os meios postos ao serviço daqueles que pretendem deixar o hábito nocivo de fumar, designadamente às chamadas consultas de cessação tabágica. Inclusivamente, sei do esforço que tem sido feito para manter as consultas deste tipo na generalidade dos centros de saúde e de muitos hospitais, e não só, ou seja, também do acompanhamento posterior.
Sr. Ministro, gostaria de saber se vê como possível, pelo menos dentro do prazo — se não antes — da entrada em vigor da lei que iremos discutir, aliás, segundo a sua sugestão na sua intervenção, que essas consultas venham a ser feitas em tempo razoável. Ou seja, a pessoa que pretende ajuda, apoio para deixar o hábito de fumar possa contar com tempo razoável na marcação da consulta e no início do tratamento e acompanhamento.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.
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O Sr. Ministro da Saúde: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito obrigado pelas vossa intervenções.
Registo o interesse do principal partido da oposição na possível aprovação consensual desta legislação. Registo também que entenderam que a lei ficou aquém das intenções ou daquilo que esperavam.
Em relação a esse aspecto, recomendava ao Sr. Deputado José Eduardo Martins que fizesse o cotejo desta legislação com aquela que foi deixada pelo governo que substituímos imediatamente. Provavelmente saberá que foi devolvida ao governo, à Presidência do Conselho de Ministros, legislação que estava preparada acerca dessa matéria e que era muitíssimo mais conservadora…
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Não é conservadora que se diz! Ser moderno não é fumar!
O Orador: — … e muito menos audaciosa ainda do que esta legislação. Por alguma razão o resultado eleitoral foi aquele que se verificou…
Protestos do PSD.
Em relação à desabituação do consumo por via fiscal, todos sabemos que a elasticidade da procura em relação ao preço é superior à unidade do tabaco. Portanto, aos aumentos do preço do tabaco correspondem reduções do consumo mais do que proporcionais.
Ora, como sei que o Sr. Deputado está atento aos mecanismos da nossa economia, V. Ex.ª deve ter acompanhado o PEC, o Programa de Estabilidade e Crescimento, e deve ter verificado que uma das «armas» do PEC foi justamente o aumento dos impostos sobre o tabaco, aumento esse que se consignava em cerca de 75% acumulados ao longo de quatro anos. Portanto, essa desabituação está a fazerse por outra via que não necessariamente a via do Ministério da Saúde.
Quanto às consultas médicas de desabituação tabágica — e dirijo-me também ao Sr. Deputado Vera Jardim —, neste momento as consultas de desabituação tabágica têm de existir em todos os centros de saúde. Actualmente, 60% dos centros de saúde da Administração Regional de Saúde do Norte já têm consulta de desabituação tabágica. As percentagens são menores nas outras ARS, mas, no fim do ano, a meta da ARS Norte corresponde a 100% de consultas de desabituação em cada um dos centros de saúde. Essa é a linha. V. Ex.ª tem toda a razão e, portanto, não há que hesitar.
Quanto às receitas do tabaco consignadas no valor de 1%, constantes da decisão do anterior governo para a luta contra o cancro, essa medida existia e cessou num dos governos em que participei, em Novembro de 2001, por razões bem conhecidas dos economistas.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Então e a consignação do IVA à segurança social, Sr. Ministro?!
O Orador: — Sr. Deputado, estou certo de que na sua bancada haverá alguém que terá todo o gosto em explicar-lhe que não há, nem deve haver, receitas consignadas. Esse é um dos princípios de gestão orçamental essencial e, portanto, no tabaco essas receitas consignadas cessaram em Novembro de 2001.
Finalmente, em relação ao co-pagamento de meios médicos, gostaria de chamar a atenção para vários estudos internacionais, que poderei facultar. Segundo esses estudos, quando aqueles que cessaram o hábito tabágico são interrogados sobre a importância relativa dos vários factores (capacidade própria, auto-educação, doença grave, etc.), 70% considera negligenciável o efeito do pedido de comparticipação da segurança social, como é o caso de Espanha.
Não direi que há uma evidência universal, mas há alguns elementos de informação segundo os quais essa desabituação feita por comparticipação medicamentosa não é verdadeiramente essencial para a desabituação — há outros factores.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Todos os especialistas são unânimes em considerar o tabagismo como a maior causa de morte evitável no mundo ocidental.
O consumo de tabaco atingiu hoje dimensões de verdadeira pandemia e, segundo a Organização Mundial de Saúde, mata anualmente 5 milhões de pessoas.
Sabemos, portanto, que em Portugal, independentemente das diferentes estimativas sobre o número real de fumadores, muitos morrerão de cancro pulmonar (e de outros tipos de cancro), de doenças car-
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diovasculares ou de doença pulmonar obstrutiva crónica.
Sabemos também que a exposição ao fumo ambiental aumenta a probabilidade de vir a contrair as referidas doenças.
Embora a aditividade e a nocividade associadas ao consumo de tabaco não fossem propriamente desconhecidas no passado, foram os avanços das ciências médicas em paralelo com a massificação do consumo no séc. XX que tornaram evidentes as dramáticas consequências deste hábito importado do Novo Mundo pelos portugueses.
Em face da esmagadora evidência científica, não há quem, com bom senso, questione a necessidade de controlar este fenómeno.
Nas sociedades ocidentais a tentativa de controlar este consumo será talvez tão antiga quanto o próprio tabaco.
Apesar dos fundamentalismos modernos, não queremos certamente chegar aos extremos da Rússia dos Czares, em que se mandava cortar a cabeça a quem incorria neste hábito. Mas, seguramente, «sem perder a cabeça»…, temos nesta matéria a obrigação de não baixar os braços!
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Conforme reconhece a Organização Mundial de Saúde, dentro de 30 anos o consumo de tabaco, mesmo implementando todas as medidas previstas na Convenção-Quadro para o Controlo do Tabaco, continuará a ser um hábito para mais de 1300 milhões de habitantes do planeta, mesmo, repito, na condição de sucesso das políticas antitabágicas.
Portugal não será excepção e, apesar dos sucessos obtidos em matéria da redução da prevalência, não será excessivo admitir que este é um hábito que permanecerá entre nós nos próximos anos.
Mas, sobretudo, cristalizando na lógica redutora do fumo em locais públicos, este Governo parece ter esquecido que o País procedeu à ratificação da Convenção-Quadro e não aproveitou a ocasião para legislar em áreas que são por aquela apontadas como determinantes para o sucesso das políticas públicas de prevenção do tabagismo.
Sem querer entrar excessivamente no detalhe de matéria que trataremos em sede de especialidade, não gostávamos de deixar de apontar dois ou três esquecimentos bem reveladores desta falta de ambição.
Não se entende que, ao contrário da importância crescente dada a este assunto e mesmo da necessidade de reforçar e acompanhar as medidas preconizadas, se venha propor afinal a extinção do Conselho de Prevenção do Tabagismo, que funciona na dependência directa do Ministro da Saúde, despromovendo o assunto a um grupo de aconselhamento do Sr. Director-Geral.
Na própria exposição de motivos do diploma dá-se relevância às propriedades aditivas do tabaco, constatando-se que o respectivo consumo regular é «difícil de abandonar sem apoio». Qual é a solução proposta pelo Governo? Uma promessa de alargamento das consultas existentes e a ausência de resposta sobre a coerência de arrecadar 1500 milhões de euros de receitas nesta matéria e investir pela Direcção-Geral de Saúde 124 000 euros.
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Mas o que propõe o Sr. Deputado?!
O Orador: — É pena que este Governo não se recorde da regra da consignação, quando consigna 1% do aumento do IVA à segurança social e que isto só valha para umas razões, mas não valha para outras…
Aplausos do PSD.
Porém, independentemente dessa incoerência do ponto de vista técnico-legislativo, na pureza dos princípios e das intenções, bastava ter querido gastar mais do que aquilo que se gastou no ano passado.
Aliás, o PSD propõe desde já que todas as receitas geradas pela aplicação deste diploma sejam directamente canalizadas para a prevenção e o controlo do tabagismo, nomeadamente para as consultas médicas de desabituação e para a comparticipação dos medicamentos para reduzir o vício.
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Quase 60% para o Estado!
O Orador: — A Sr.ª Deputada nunca ouviu falar em earmarking, mas é uma técnica legislativa que se pode usar.
Porém, a resposta do Sr. Ministro ignora o óbvio, pois são muitas vezes os mais desfavorecidos junto de quem o vício é mais difícil de combater e que mais ajuda mereciam para deixar de fumar.
Noutra vertente, constatamos a elevação para 18 anos da idade mínima para a compra de tabaco. É talvez aqui que o Sr. Ministro vê a evolução em relação ao diploma anterior que recebeu.
Olhando para a realidade nacional é, no entanto, difícil perceber como é que, dada a tremenda profu-
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são de pontos de venda existentes, se poderá fazer aplicar esta medida sem uma racionalização e um controlo mais efectivos do circuito de distribuição.
A Convenção-Quadro prevê ainda que as partes signatárias adoptem medidas para a redução do consumo que envolvam designadamente o preço dos produtos do tabaco e não necessariamente, apenas e só, a fiscalidade.
Olhando para a problemática do consumo de tabaco pelos mais jovens, que segundo o Banco Mundial são, de resto, a fatia da população mais sensível às variações do preço do tabaco, para além da acessibilidade geral dos fumadores ao produto, não se compreende que o Governo não tenha, à semelhança da prática recente noutros Estados-membros da UE, aberto a via para a fixação de preços mínimos de referência para o tabaco, impedindo que, face aos aumentos de fiscalidade, os produtores recorram a preços promocionais e a introduzir tabaco das marcas mais baratas e mais nocivas no mercado para habituar os jovens.
Seria também uma oportunidade para Portugal acompanhar as evoluções mais recentes e tomar a dianteira, como fez no passado, nas políticas públicas de prevenção do tabagismo.
Olhando para os Estados Unidos da América, terra de muito fundamentalismo, mas também de bastante progresso científico, vemos que se debate actualmente, por proposta conjunta do Senador Democrata Ted Kennedy e do Senador Republicano Cornyn, a atribuição à Food and Drug Administration de poderes para regular todos os aspectos relacionados com a produção e o consumo dos produtos de tabaco.
Isto é, enquanto nós extinguimos o Conselho para a Prevenção do Tabagismo e despromovemos o assunto para um grupo de trabalho, nos Estados Unidos da América promove-se o tema, propondo-se a atribuição de plenos poderes a uma das mais poderosas agências federais para exigir aos fabricantes de tabaco que diminuam os níveis dos constituintes nocivos do fumo ou que regulem o surgimento de novos produtos de tabaco que reclamem sempre um potencial de menor nocividade.
Aliás, aproveitando a notoriedade desta discussão, ainda recentemente surgiu em Portugal a notícia de produtos que alegam uma menor nocividade, mas que, seguramente, não passariam por qualquer crivo científico rigoroso que o justifique.
Como tudo na vida, nem sempre as políticas mais efectivas e consequentes coincidem com as mais radicais. Frequentemente, há ganhos que se conseguem, paulatina mas consistentemente, com uma abordagem sensível, abrangente e persistente e, sobretudo, passível de aplicação efectiva.
Acreditamos ser este o consenso existente nesta matéria, quer na sociedade portuguesa quer também nesta Câmara. Ora, foi esse consenso, aliás, que permitiu que Portugal, há já mais de duas décadas, se tornasse pioneiro no domínio destas políticas públicas.
Face a essa constatação, não podemos deixar de estranhar, além do tempo perdido durante estes dois anos, os avanços e recuos que marcaram todo este processo até à aprovação de uma proposta de lei que, afinal, na sua essência, estava pronta quando o Governo tomou posse.
A questão do consumo de tabaco em locais públicos é bem sintomática da inconsistência com que este assunto tem vindo a ser abordado. O anteprojecto de lei submetido à discussão pública era eivado do mais puro radicalismo; depois, assistimos a um ziguezague, para afinal ficarmos no ponto em que estávamos, fazendo «tábua rasa» do consenso a que a sociedade portuguesa nos fazia chegar.
Dito isto, acreditamos que, com a introdução de modificações em sede de especialidade orientadas construtivamente para alcançar um instrumento não só efectivo mas, sobretudo, aplicável de prevenção do tabagismo e da protecção da exposição ao fumo ambiental, nos encontramos perante uma proposta de lei que tem condições para vir, no futuro, a justificar uma aprovação consensual nesta Câmara.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Vera Jardim.
O Sr. José Vera Jardim (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Uma declaração prévia, não de interesses mas de hábitos, se impõe: sou fumador.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Sou fumador de há muitos anos, com várias tentativas, infelizmente goradas, para deixar o hábito do tabaco.
Tenho consciência de que ganharia qualidade de vida e seria, certamente, mais saudável. Penso que uma política de controlo do consumo por si só não resolve o problema dos fumadores, mas é importante como um primeiro passo e um sinal para a sua ajuda.
São razões de saúde pública, como já aqui foi abundantemente dito, que estão na base das medidas de controlo do uso do tabaco. Saúde dos fumadores mas também dos que, sem o serem, são expostos a ambiente de fumo nos lugares de utilização colectiva. Como também dos mais jovens, em relação aos
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quais as campanhas de prevenção, mas também a proibição de aquisição de produtos do tabaco, podem ajudar a não iniciar um caminho de que é, em muitos casos, difícil de sair.
Por essas razões, foi-se gerando nas nossas sociedades um movimento com amplo apoio para controlar e, em muitos casos, proibir fumar em espaços fechados de utilização colectiva.
A prevenção do tabagismo é, hoje, na generalidade dos países europeus uma prioridade das políticas de saúde pública.
São muitas as recomendações, os planos da União Europeia, por exemplo, as directivas internacionais relativas à comercialização e ao consumo de tabaco, aliás já em boa parte transpostas para a ordem jurídica portuguesa.
Também a OMS (Organização Mundial de Saúde), através do impulso à Convenção já aqui citada, veio tornar obrigatória para os Estados-membros a adopção de um conjunto de medidas de política antitabágica a que esta proposta de lei pretende — e bem! — dar cumprimento.
Alguns sectores da opinião pública criticam as políticas de controlo e de proibição por limitarem a liberdade de opção de cada um, mesmo tendo em conta os efeitos nocivos do consumo do tabaco; alguns mesmo recusam a legitimidade dos poderes públicos para limitar a liberdade individual, mesmo para restringir ou, em certos casos, proibir práticas que dados científicos geralmente aceites têm como altamente nocivas para a saúde.
Recuso movimentos que chegam a roçar a compulsão e a discriminação violenta sobre o fumador,…
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!
O Orador: — … mas sou de opinião, desde logo, pelo efeito nocivo que tem em terceiros, que se impõem, com inteira legitimidade, restrições ao acto de fumar em espaços fechados de acesso colectivo, como se impõe, a meu ver, igualmente, sabendo que não há nesta matéria consenso unânime, a proibição da venda de tabaco a menores de 18 anos, no desenvolvimento de uma política de saúde, com objectivos de evitar a entrada precoce no consumo e na criação de dependências.
São diversas as opções europeias nesta matéria, dentro de uma política geralmente aceite de controlo e de restrições ao consumo, desde as soluções da Irlanda ou da Escócia, de geral proibição sem excepções em todos os espaços públicos fechados, até às soluções mais flexíveis da Áustria, de França ou de Espanha.
Mas, na generalidade dos países europeus, existem já hoje, como todos sabemos, mais fortes restrições do que as que têm sido progressivamente adoptadas em Portugal desde o início da década de 80.
A proposta do Governo é uma abordagem global não apenas de controlo da procura mas incluindo medidas de prevenção da iniciação, de eliminação da exposição involuntária aos efeitos do fumo e de apoio e formação para programas de abandono.
Podem discutir-se a razoabilidade e a eficácia de algumas medidas, mas não se pode negar um esforço consequente para encontrar soluções equilibradas que afirmem, claramente, uma política séria de prevenção de um grave problema de saúde pública.
Penso que a excessiva permissibilidade tal como a possível ineficácia de proibicionismos totais são dois escolhos a evitar.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — A direcção da política está correcta: obter um forte controlo e contenção do tabagismo.
Mas, a nosso ver, existe espaço — aliás, também já anunciado na intervenção do Sr. Ministro da Saúde — para, no quadro de discussão na especialidade, encontrar soluções de aperfeiçoamento que, mantendo a correcta direcção da lei, possam concorrer para aquilo que é muito importante, isto é, para a sua generalizada aceitação e, portanto, para a sua eficácia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Queria, em primeiro lugar, dizer que esta lei tem objectivos e assenta em pressupostos e princípios muito positivos, que visam não só, como é evidente e como decorreu das palavras do Sr. Ministro, a protecção dos não fumadores em relação ao fumo em espaços de convivência comum mas, também, contribuir para que, dificultando o fumo, se incentive (penso que esta filosofia também estará presente na lei) o abandono do tabaco por parte dos fumadores. Ambos os objectivos são evidentemente estimáveis.
Importa, pois, apenas ver se aquilo que a lei nos propõe e os caminhos que nos indica são os mais adequados para os atingir.
É evidente — aliás, o próprio Sr. Ministro o disse — que uma lei antitabagismo tem de ser exequível,
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para não cair na armadilha de prever normas muito restritivas, muito rígidas de proibição do fumo no papel, no texto legal, no Diário da República, que, depois, pela sua dificuldade de execução, acabem por ser «letra morta», na prática. Penso que, se isso acontecer, não trará qualquer contributo para o combate ao tabagismo e para um melhor ambiente nos locais de convívio público.
Portanto, a exequibilidade tem de ter como um dos critérios a capacidade de aplicação das normas que estão na lei.
É preciso também ter em conta que não pode ser apenas uma exequibilidade da proibição. A proposta de lei aponta para a existência de consultas de apoio à cessação do fumo em todos os centros de saúde e hospitais para que todos os cidadãos possam a elas ter acesso. Ora, como estamos bastante longe desse objectivo, importa que essa norma programática não fique apenas por aí, enquanto a proibição entra em vigor no prazo estabelecido na proposta de lei.
A lei tem também de ser equilibrada e sem excessos desnecessários. Não podemos ter proibições que não tenham um muito claro efeito útil, uma muito clara justificação para a sua existência. Não se pode proibir por proibir! Tem de se proibir o fumo naquelas situações em que se verifique ser indispensável. É preciso, portanto, conciliar estes vários interesses na aplicação das normas que vierem a ser aprovadas.
Será muito importante, para a bancada do PCP, que, em sede de especialidade, o Governo nos traga alguma avaliação da aplicação de leis, com perspectivas diferentes — umas ainda mais restritivas, outras com maior capacidade de opção —, noutros países da União Europeia, para sabermos qual foi o efeito concreto nos hábitos tabágicos e se isso pode ser tido em conta naquilo que se prevê possa vir a ser o efeito da proposta de lei que estamos a discutir. Isto é muito importante para podermos avaliar da experiência de outros países sem que nos fixemos na necessidade de importarmos outras soluções e de termos as nossas, mas também para perceber quais foram a reacção e a adaptação das sociedades ao avanço de normas no sentido de uma maior restrição ao fumo.
Importa também, sem pôr a questão económica acima da questão de saúde pública, que é evidentemente mais importante, avaliar o efeito concreto de normas deste tipo, designadamente em pequenos estabelecimentos em que isso possa constituir uma dificuldade. Não significa isto que devamos abrir, com toda a latitude, a possibilidade do fumo nesses estabelecimentos, mas outros países adoptaram soluções de diverso tipo, também consentâneas com o avanço dos princípios do antitabagismo, sem com isso deixarem de ter em conta situações muito concretas de explorações económicas de muito pequena dimensão em que uma aplicação cega e taxativa de normas demasiado restritivas pode ter efeitos muito perniciosos que têm de ser equacionados ao discutirmos esta lei.
É preciso também avaliar o peso das coimas e das sanções que estão previstas na lei para ver se, do ponto de vista relativo, elas são adequadas ao que se pretende proibir, designadamente em comparação com outras matérias também alvo de coimas e de sanções semelhantes.
Dito tudo isto em relação a esta matéria, desejaríamos que esta lei fosse pacífica, porque a maior garantia da sua aplicação é a aceitação pacífica das suas normas, a qual depende do equilíbrio do que for finalmente aprovado e da conciliação dos diversos interesses, sem nunca perder de vista os objectivos fundamentais, que são os de prevenir e combater o tabagismo e motivar os que continuam a fumar para que, no maior número possível e com o melhor apoio possível da parte do Serviço Nacional de Saúde, o possam deixar de fazer assim que o conseguirem. Esses objectivos são estimáveis.
Pela nossa parte, não inviabilizaremos esta proposta de lei e, na sua discussão em sede de especialidade, contribuiremos para que o texto final seja exequível, equilibrado, continuando a prosseguir e aprofundando estes princípios do combate ao tabagismo e da preservação dos ambientes onde as pessoas convivem do fumo e dos seus malefícios.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei do Governo anuncia três grandes propósitos: proteger os não fumadores, desincentivar os novos fumadores e promover a desabituação dos que fumam.
Não se contestando os malefícios do tabaco — essa é uma certeza há muito adquirida e um ponto de partida fundamental para esta discussão —, todos e cada um daqueles propósitos recolhem uma generalizada aceitação.
O Bloco de Esquerda é claramente a favor de uma lei que proteja, efectivamente, os não fumadores.
Contudo, a proposta de lei apresentada pelo Governo é desequilibrada, privilegiando as medidas restritivas em detrimento de uma política pública de informação, de prevenção do consumo, de educação para a saúde, de promoção de hábitos e de criação de condições para a prática de uma vida saudável, matérias com as quais a lei nada ou pouco se compromete.
Desequilibrada, também e ainda, porque não assume um compromisso claro sobre a inalienável res-
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ponsabilidade do Estado na criação e no funcionamento eficiente e atempado dos serviços, das consultas e dos tratamentos para a desabituação tabágica, que, como sabemos, continuam a ser suportados pelo bolso de quem a eles recorre.
Não se compreende a extinção do Conselho Português para a Prevenção do Tabagismo, substituído por mais uma anónima e apagada comissão técnica, a funcionar junto da Direcção-Geral da Saúde.
A lei tem 30 artigos, dos quais apenas dois, repito, apenas dois, se ocupam da prevenção, educação e tratamento. Proibir, Sr.as e Srs. Deputados, é mais fácil e até mais barato do que prevenir, dissuadir ou tratar. Mais uma vez, o Governo escolheu a facilidade e a poupança! A proposta do Governo é, ainda, desequilibrada na regulação dos direitos dos fumadores e dos não fumadores, que, como todos sabemos e reconhecemos, é o ponto mais sensível e mais controverso da problemática que hoje discutimos e sobre o qual não deve haver qualquer equívoco ou desatenção.
Qualquer cidadão tem o direito de fumar, mas o facto de o fumar prejudicar a sua saúde não pode servir de pretexto nem de fundamento à limitação desse direito. Fumar não é crime, o fumador não pode nem deve ser considerado nem tratado como um maldito ou um «cidadão de segunda».
Todos os não fumadores têm o mesmíssimo direito de não ser incomodados ou prejudicados pelo fumo dos outros, sobretudo quando essa convivência não resulta de uma opção, de uma escolha feita por si, mas, bem ao contrário, lhe é imposta, mesmo que não a deseje, como acontece nos locais de trabalho ou nos locais de atendimento público, por exemplo.
São direitos iguais que a lei e o Estado devem respeitar e fazer respeitar sem estabelecer qualquer hierarquia entre eles nem qualquer discriminação a favor de uns ou de outros, sobretudo quando a convivência entre uns e outros decorre das próprias escolhas pessoais, como sucede nos recintos de diversão e convívio, muito diferentes, como sabemos, das condições existentes nos locais de frequência obrigatória.
O fumador fuma porque quer e é livre de frequentar ou não espaços onde não pode fumar. Igualmente, o não fumador não fuma porque não quer e é livre de frequentar ou não espaços onde se pode fumar.
O proibicionismo da proposta governamental é fundamentalista na exacta medida em que impõe a mesma regra, a mesma regulação de direitos entre fumadores e não fumadores, quer a convivência entre eles seja uma inevitabilidade ou decorra das suas livres escolhas.
O Bloco de Esquerda recusa esta discriminação, não aceitamos que a lei e muito menos o Estado escolha pelos cidadãos e entre os cidadãos, em função da sua conduta e dos modos de vida de cada um. Não queremos um Estado missionário, nem novas «cruzadas», santas ou laicas que sejam. Rejeitamos a imposição, por decreto, de um clima de apartheid entre fumadores e não fumadores.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Orador: — Não é certamente por acaso que o Estado que agora aponta e carrega sobre o fumador é o mesmo que se descarta da economia, minimiza as suas funções sociais e se deixa embalar pela melodia do laisser faire, laisser passer do mercado.
O mesmo Estado que procura descomprometer-se dos seus deveres, a partir de uma lógica muito simples: se o Estado tem deveres perante o cidadão, este também tem deveres perante o Estado. O Estado deve proteger o cidadão que saiba defender o seu direito de se proteger. O direito à saúde fica assim condicionado ao cumprimento desse dever.
A pretexto da falta de meios económicos para tratar todos, tratam-se apenas os que merecem, ou seja, os que se portam bem.
Este, Sr.as e Srs. Deputados, é o ponto de chegada de todos os proibicionismos, de todos os fundamentalismos.
Do fundamentalismo não devemos esperar mais do que respostas absurdas. É um absurdo proibir a venda de tabaco a menores de 18 anos quando aos 16 se tem livre acesso a qualquer bebida alcoólica, se paga impostos e se pode responder judicialmente.
É um absurdo, próximo da desumanidade, o regime previsto para as prisões e também para os lares de terceira idade.
É um absurdo, ainda, o valor das coimas previstas, tanto mais que o produto apurado nem sequer é destinado a financiar programas de combate ao tabagismo ou de desabituação tabágica.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
O Orador: — O Bloco de Esquerda não quer uma lei inconsequente que mude alguma coisa para que tudo fique na mesma. Queremos uma lei que produza mudanças efectivas e significativas no panorama carregado e denso do tabagismo no nosso país. Queremos que os não fumadores sejam protegidos.
Defendemos, sem qualquer hesitação, a restrição do tabaco nos locais de trabalho, nos serviços de atendimento ao público e na Administração Pública, desde que estejam asseguradas áreas destinadas aos fumadores nas pausas do trabalho.
Pela natureza e essência da actividade que realizam, consideramos que as escolas, as faculdades e
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as unidades de saúde devem ser espaços livres de tabaco, com as necessárias e mais que justificáveis excepções.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
Pretendemos regras diferenciadas para restaurantes, cafés, bares e discotecas e proporemos essas alterações na discussão na especialidade.
Reclamamos que a lei explicitamente proíba qualquer discriminação dos fumadores no domínio dos direitos laborais, nomeadamente que o fumar ou não fumar possa ser utilizado como critério de selecção, promoção ou despedimento.
Por último, Sr.as e Srs. Deputados, tal como está, o Bloco de Esquerda não votará favoravelmente esta proposta de lei. Dito de outra forma, para votarmos esta proposta de lei, ela tem de sofrer significativas mudanças, cujo sentido aqui afirmámos e que concretizaremos no debate na especialidade.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: «Deixar de fumar é a coisa mais fácil do mundo. Sei muito bem do que se trata, já o fiz cinquenta vezes». Esta é uma citação de Mark Twain, que ilustra de modo simples, mas de forma inequívoca, a dificuldade e os contrapontos da matéria que hoje é trazida a esta Câmara para discussão.
Com efeito, reúne-se hoje o Parlamento para, em Plenário, apreciar a proposta de lei do Governo que aprova normas para a protecção dos cidadãos da exposição involuntária ao fumo do tabaco e medidas de redução da procura relacionadas com a dependência e a cessação do seu consumo. Trata-se de um nobre motivo! Para além da doença e morte, cuja responsabilidade se atribui ao consumo do tabaco e cuja descrição exaustiva está na Exposição de motivos do diploma ora em discussão, poderíamos sempre acrescentar a estes os efeitos económicos, entre outros, os custos suportados pelo sistema nacional de saúde, os custos relacionados com o tratamento de doentes com patologias directamente relacionadas com o consumo do tabaco, com o acompanhamento de doentes terminais de cancro ou de outras doenças com a mesma origem ou, mesmo, os custos de produção relacionados com o absentismo laboral resultante de doença originada por hábitos tabágicos.
Também aqui, presumo, estamos todos de acordo! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É indiscutível a necessidade de limitar a permissão de fumar em locais de livre acesso ao público, por razões de saúde pública, conforme enunciado no preâmbulo da proposta de lei n.º 119/X, agora em discussão. O CDS-Partido Popular está de acordo com esta posição de princípio.
Mas, para além disso, não pode ignorar o direito que assiste a qualquer pessoa de optar por proteger ou prejudicar a sua saúde, tendo em conta, sobretudo, que a nicotina não é, ainda, uma substância proibida.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Nesse aspecto, a bancada do CDS-Partido Popular dará liberdade de voto. No entanto, espero que seja um voto maioritariamente favorável a esta proposta de lei, porque estamos genericamente de acordo com os princípios nela enunciados. O CDS-Partido Popular quer contribuir, de forma responsável e séria, para que a proposta de lei do Governo seja transformada numa lei em que o equilíbrio entre os direitos em colisão seja uma realidade.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — O tabagismo é, de facto, um problema de saúde pública, que deve ser atacado. Mas não podemos esquecer a realidade portuguesa e certo é que, se o problema existe, deve-se ao facto de, no nosso país, existir uma fatia importante da população que é fumadora. São os direitos destes, em confronto com os direitos dos não fumadores, que ao longo dos últimos anos têm sido palco de acesos debates e posições extremas, que, por via legal, terão de ser ultrapassadas.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Orador: — Passando ao texto da proposta de lei em discussão, uma dúvida sistémica é-nos, desde logo, colocada: na verdade, o artigo 3.º afirma que as proibições de fumar previstas no diploma se referem aos «recintos fechados destinados a utilização colectiva». Porém, ao longo do texto legal surgem várias referências a permissões de fumar em locais ao ar livre. É o caso, por exemplo, do n.º 3 do artigo 5.º, quando se prevê que se possa fumar nas universidades e institutos superiores ao ar livre, ou o inverso na alínea t) do artigo 4.º, quando se mencionam as estações ferroviárias, que neste país têm todas uma área ao ar livre.
Não se vislumbra, de facto, fundamento para a proibição de fumar ao ar livre, seja qual for o local.
Teremos de ter presente o escopo da presente lei, que, como se disse (e bem, em nosso entender), é a protecção da exposição involuntária ao fumo do tabaco. Este risco não existe ao ar livre, independentemente de se tratar da via pública, dos pátios das escolas ou das universidades.
Compreendo a intenção do legislador ao excepcionar os locais inseridos no sistema de ensino superior, e não as restantes escolas: entende que desta forma previne os mais novos de iniciarem o consumo de tabaco.
Quanto à proibição geral de fumar nos «locais onde estejam instalados órgãos de soberania, serviços e organismos da administração pública e pessoas colectivas públicas», não poderemos ter a pretensão de impor a todos os titulares de tais órgãos e trabalhadores desses locais que deixem de fumar como condição para exercerem a sua função ou para trabalharem.
Constituindo o propósito da proposta de lei a protecção da saúde de terceiros, designadamente dos não fumadores, não se vê obstáculo a que as pessoas fumem nos seus gabinetes privativos de trabalho, desde que aos mesmos não aceda o público ou outros trabalhadores.
Assim, nas situações referidas, restringiríamos a proibição aos locais de trabalho de duas ou mais pessoas e aos locais de acesso público.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Já no que se refere à excepção dada aos pacientes psiquiátricos, toxicodependentes, alcoólicos e presos, diríamos que é, no mínimo, caricata: nos serviços que lhes são destinados, poderão ser criadas zonas exclusivas de fumadores, mas o doente mental, toxicodependente, alcoólico ou preso que necessite de um internamento em virtude de uma apendicite aguda já não pode fumar… A proposta de tratamento excepcional para os indivíduos referidos justifica-se pela ansiedade e stress que a falta do tabaco lhes possa causar. Mas não entendemos por que razão apenas os doentes mentais, os toxicodependentes, os alcoólicos e os presos terão essa benesse: se fumar causa dependência física e psíquica, e a abstinência poderá ter como efeito o aumento da ansiedade e do stress, isso aplicase a todos os profissionais que não possam, de todo, fumar nos locais onde passam muitas vezes mais de 12 horas por dia. Pense-se, por exemplo, no caso dos médicos — classe profissional que, sabidamente, é uma grande consumidora de tabaco —, que são sujeitos a 8 ou 10 horas de serviço nas urgências. Correríamos o risco de ver, em determinados períodos, os serviços hospitalares sem médicos, por se encontrarem no exterior do edifício, a fumar e a combater a sua ansiedade e o seu stress… Tudo isto para concluir que entenderíamos melhor as restrições, se a excepção prevista nos dois primeiros números do artigo 5.º se aplicasse a outros serviços e edifícios públicos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Quanto aos estabelecimentos de restauração, de bebidas e de diversão, sabendo nós que o acto de fumar é, para além de mais, um hábito social, serão as ocasiões em público em que fumador maior necessidade sentirá de fumar, pela própria natureza dos serviços prestados por tais ramos de actividade, e teremos de ter sempre presente que fumar não é uma actividade proibida.
Pretendendo a presente proposta de lei proteger o direito à saúde dos denominados «fumadores passivos», não poderemos esquecer que os fumadores também têm direitos, para além do dever primordial de respeitar quem não fuma. Não se compreende que o proprietário de um pequeno restaurante não possa optar entre receber no seu estabelecimento clientes que fumam ou clientes que não fumam.
A proposta de lei deveria prever a possibilidade de um determinado estabelecimento ser para fumadores e para não fumadores. E, perante a opção entre ir jantar a um restaurante para fumadores ou a um restaurante para não fumadores, devidamente sinalizados, cada um seria livre de optar e autoresponsabilizar-se pela sua saúde.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Este foi o caminho por que optaram já outros países da União Europeia, como, por exemplo, a nossa vizinha Espanha, reduzindo significativamente o impacto negativo do novo regime legal, quer no turismo, quer na economia.
Finalmente, e neste particular, impõe-se que o prazo para a entrada em vigor da presente lei terá de
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ser mais longo do que o ano previsto, de forma a permitir aos empresários prepararem devidamente os seus estabelecimentos.
Por último, pune a lei como contra-ordenação o fumador que fume num dos locais proibidos pela lei.
Teremos de assentar num princípio: ou é proibido ou é permitido fumar. Não bastarão os procedimentos previstos no artigo 7.º? As entidades policiais têm competência para fazer cumprir a lei, impedindo os fumadores de fumarem naqueles locais, em última instância, obrigando-os a deixar os locais.
Mas não se pode aceitar que aos fumadores sejam impostas coimas mais elevadas do que aos consumidores de substâncias estupefacientes proibidas: enquanto o processo contra-ordenacional contra os toxicodependentes poderá ser suspenso para tratamento do agente e a coima aplicável se situa entre 25 € e os 403 €, para o fumador o processo nunca é suspenso, não está previsto o tratamento da sua dependência e a coima aplicável situa-se entre os 50 € e os 1000 €! Afinal, qual é a conduta mais grave? Se um indivíduo consumir heroína ou cocaína num bar, tem uma de duas alternativas: ou se trata, ou paga uma multa de 25 €. Mas se o mesmo indivíduo fumar um cigarro, a lei aplica-lhe uma coima, no mínima, do dobro do valor! Assim, há aqui como que a uma inversão dos valores comunitariamente aceites, pois todos sabemos que será mais grave consumir cocaína do que fumar um cigarro.
Aplausos do CDS-PP.
A legislação nacional deve funcionar como uma unidade. Assim, a prever-se uma qualquer medida punitiva, terá de ser adequada e proporcional à gravidade do acto concreto, comparativamente com outros já punidos por outra lei nacional.
Com a aprovação desta medida, nos termos em que está proposta, corremos o risco de incorrer naquele extremo que o legislador deve afastar, por desproporcional e desadequado.
Não constitui solução para o problema do tabagismo a sua mera repressão. A presente proposta de lei pouco ou nada nos refere sobre medidas de dissuasão do consumo do tabaco, e ninguém compreende que os fumadores não tenham acesso a consultas antitabágicas, a tratamento comparticipado pelo Estado, ou a consultas de desabituação do tabagismo.
Temos, ao longo da nossa História, exemplos de que um comportamento social não se afasta através da sua mera punição e repressão. Seria o mesmo que dizer que, para combater o problema da obesidade, se deveria proibir a venda a crianças de um gelado ou de todos aqueles produtos alimentares susceptíveis de a provocarem.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Entendo que a proposta de lei n.º 119/X constitui uma excelente base de trabalho com vista ao objectivo que é necessário prosseguir. No entanto, deve ser melhorada de forma séria, prevendo acima de tudo um período de transição mais adequado, e deve ser dotada dos equilíbrios de que ainda carece, conferindo-lhe, enfim, o necessário aperfeiçoamento para que quem não fuma, como eu, não tenha dos fumadores as reservas que a lei lhes pretende dar.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Estamos hoje a discutir a proposta de lei n.º 119/X, apresentada pelo Governo, que visa melhorar a actual legislação em relação ao consumo de tabaco e à dissuasão do consumo do mesmo.
O tabaco tem inúmeros malefícios. É uma das principais drogas legais do nosso país, em simultâneo com o álcool, que atinge cerca de 2 milhões de consumidores.
A verdade é que tem um impacto extremamente negativo: cerca de 12 000 mortes por ano, em Portugal, são relacionadas com o tabagismo — 30% dessas mortes por cancro, principalmente nos pulmões e vias respiratórias mas também na garganta, boca, estômago, fígado, pâncreas e rins, sendo que 85% dos casos de doença pulmonar obstrutiva crónica são também devidos ao tabaco e afectam cerca de 500 000 portugueses, concorrendo, aliás, de forma determinante para a mortalidade por causas cardiovasculares.
Além disso, a Organização Mundial de Saúde tem lembrado regularmente que o tabaco é a principal causa, evitável, de morte.
Mas, mesmo quando não causa a morte, o tabaco é sempre responsável pelo aparecimento ou agravamento de múltiplas doenças, como é o caso da asma, por uma considerável diminuição, em geral, das capacidades físicas e da resistência física, sendo também responsável pela degradação do ambiente e
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da qualidade de vida, não só para quem fuma mas também para quem convive ou frequenta os locais onde se fuma.
O tabaco é, além disso, uma droga que causa uma habituação particularmente forte, quer física quer psíquica, o que torna extremamente difícil a tarefa de abandono desse vício tão nefasto.
Os seus efeitos negativos e a elevada taxa de fumadores existente no nosso país faz deste problema, verdadeiramente, um grave problema de saúde pública, que necessita de um empenho crescente e muito superior ao que se tem realizado, principalmente para se procurar reduzir as taxas de incidência, sem descurar a necessidade de garantir no âmbito do SMS apoio a quem deseja deixar de fumar ao nível da prevenção, especialmente da prevenção precoce, junto dos grupos etários onde é mais corrente iniciarse o consumo do tabaco, inclusivamente antes dos 16 anos.
Mais do que através de campanhas, isso deve ser feito através de uma acção continuada, integrada e sustentada ao nível do conhecimento científico e técnico, com profissionais habilitados, e ao nível financeiro, com dotações próprias, através de acções de formação, de informação e educação, onde verdadeiramente podemos e devemos dar passos decisivos no combate ao tabagismo.
Não temos dúvidas de que a legislação actualmente em vigor pode e deve ser melhorada e reconhecemos que a proposta de lei n.º 119/X se encontra imbuída de um sentido de dever de responsabilidade de proteger o dito fumador passivo, ou seja, os cidadãos que, não fumando voluntariamente, se encontram expostos ao fumo do tabaco por frequentarem ou trabalharem em locais onde podem estar sujeitos ao fumo alheio, acabando por ser afectados no seu direito a viver livres de fumo por sua opção. Este direito, parte do direito fundamental ao ambiente sadio constitucionalmente garantido, deve ser protegido, e, nesse sentido, acompanhamos a intenção aqui presente.
Aliás, esse direito a um ambiente sadio, designadamente do ponto de vista da qualidade do ar que respiramos, não é, infelizmente, apenas afectado pelo acto de se fumar tabaco, pois conhecemos, a nível urbano e ar livre, verdadeiros atentados pelos índices de poluição, oriundos principalmente das emissões de gases dos transportes, que conheceram, na última década, uma verdadeira explosão de crescimento por falta de incentivo, promoção e investimento nos transportes colectivos, já sem falar nas actividades industriais e de produção de energia a partir de fontes fósseis ou na incineração de resíduos perigosos.
Reconhecendo a necessidade imperiosa de garantir os direitos aos não fumadores, incluindo os mais frágeis — crianças, jovens, idosos ou doentes —, entendemos que uma lei antitabágica que coloque no seu cerne apenas a proibição e a restrição de fumar é uma lei incompleta e insuficiente.
Não falamos apenas da necessidade de, em concreto e em sede de especialidade, se proceder a uma análise cuidada das medidas propostas e da sua entrada em vigor mas também em se encontrarem as melhores soluções, sem se cair em excessos, em cruzadas ou em diabolizações dos fumadores mas também sem se ceder ao que é essencial.
Contudo, infelizmente, a proibição por si só não resolverá o problema; se assim fosse, com a aprovação desta lei poderíamos ficar tranquilos porque ninguém começaria a fumar, pelo menos de forma regular, antes dos 18 anos, já que não poderia adquirir o tabaco. Infelizmente, o passo fundamental de combate ao tabagismo — a prevenção — é o parente pobre desta proposta de lei.
Tanto no que toca às consultas de cessação tabágica como no que toca à prevenção, esta proposta de lei é de tal modo vaga e imprecisa e de tal forma diluída das suas responsabilidades que bem podemos temer que os bonitos princípios nela presentes nunca venham a sair do papel.
Extingue-se o Conselho de Prevenção do Tabagismo sem que este tenha sido ouvido ou sem que se conheça a avaliação da sua actuação, e, em seu lugar, apenas se cria um grupo técnico consultivo, que prestará assessoria técnica e colaboração na definição e implementação de programas e de outras iniciativas no domínio da prevenção e controlo do tabagismo.
Agora, por quem e com que meios é que esses programas serão implementados, isso a proposta de lei não nos diz. Tal como não diz, em concreto, quem, e como, é que prestará a informação e a educação para a saúde. Diz-nos apenas que é o Estado, designadamente os sectores da saúde, da educação, da juventude, do desporto, da defesa do consumidor, do ambiente, do trabalho, da economia e da cultura, as regiões autónomas e as autarquias locais. São todos! Sem dúvida que esta luta é de todos, mas com esta proposta de lei o que se pode recear é que, no fim de contas e na prática, venha a ser de ninguém.
Infelizmente, a falta de financiamento para a prevenção tem marcado as políticas nesta área e essa falta, sim, é demonstrativa, para lá dos bonitos discursos, da falta de prioridade nesta matéria. E aqui, sim, é importante fazer uma mudança, que não é apenas legislativa mas, sim, de atitude do Governo e da Administração.
Os Verdes esperam que no próximo Orçamento do Estado haja uma consignação, seja a partir do imposto sobre o tabaco, seja através de inscrição da uma medida específica para a prevenção, adequada ao alcance e gravidade deste problema, dando-se, assim, de facto, um passo significativo para alterar a actual realidade.
Vozes do PCP: — Muito bem!
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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.
A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei hoje em análise é uma iniciativa bem-vinda.
Sabemos que, em termos de número de fumadores, os portugueses são dos povos que fumam em menor número, mas, quando fumam, fumam muito.
Calcula-se que o fumo que sai da ponta incandescente de um cigarro é 50 vezes mais tóxico do que o que passa pelo filtro e nunca é demais lembrar que o tabaco, durante o século XX, fez mais vítimas do que qualquer guerra — 100 milhões de pessoas — e mata cerca de 5 milhões de pessoas por ano em todo o mundo. Se nada se fizer contra o tabagismo, ele estará a provocar cerca de 10 milhões de mortes por volta de 2030.
Se a este facto acrescentarmos que cerca de metade destas mortes ocorreu entre os 35 e os 69 anos de idade, portanto abaixo, em muitos países do mundo mesmo muito abaixo, da esperança média de vida, com facilidade visualizaremos o número astronómico de anos de vida perdidos que o tabagismo provoca. E isto para já não falar do número de anos vividos com incapacidade, que são ainda mais expressivos do que os anteriores e geram enorme sofrimento também.
O tabaco, portanto, mata muito e mata ao retardador.
Sabemos hoje que o mercado do tabaco se expande mais nos países em desenvolvimento do que nos países desenvolvidos, até porque são sempre as pessoas dos estratos socioeconómicos mais elevados que, na sua origem, introduzem estes hábitos, mas são também estas as que, tendo maior capacidade para percepcionar os seus efeitos negativos e os seus riscos, mais depressa e com mais facilidade alteram o seu comportamento.
Mas mesmo nos países desenvolvidos há dois mercados potenciais a explorar – o dos jovens e o das mulheres – e as estratégias comerciais adaptam-se com toda a naturalidade a estas realidades. Razão pela qual também as estratégias de combate ao tabagismo têm de as conhecer para que possam ser definidas e concretizadas, tendo como o seu objectivo principal a eficácia.
Como já ouvimos hoje podem ter nuances várias as perspectivas dos diferentes grupos parlamentares, e é isso que faz a riqueza dos resultados do contraditório. Talvez por isso mesmo o Governo tenha optado por apresentar uma proposta de lei e não por legislar directamente. Mas, no essencial, pareceme estarmos todos unidos.
O debate na especialidade que, a partir de hoje, se iniciará no âmbito da Comissão de Saúde constituirá uma ocasião de ouro para difundir as mensagens essenciais e, a partir dessa difusão, contribuir também para a prevenção do tabagismo, encontrando as mais eficazes formas de proteger os fumadores passivos e ajudar os fumadores activos a formar a sua vontade no sentido de abandonarem o hábito e fazer respeitar os direitos daqueles que, tendo optado por continuar a fumar, não podem, para fazer valer as suas escolhas, pôr em causa as escolhas daqueles que optaram, pura e simplesmente, por viver a vida com outros gostos e, sobretudo, com outro cheiro e outro sabor.
Seguidamente construiremos, estou certa, uma lei equilibrada, justa, eficaz e com forte sustentação social, que o mesmo é dizer exequível.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida Santos, que dispõe, para o efeito, de 1 minuto e 36 segundos.
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Neste pouco mais de um minuto de que disponho, gostaria apenas de frisar que estamos na presença de uma proposta de lei cujo produto final vai, seguramente, ser saudado por uma larga maioria de portugueses, incluindo muitos que são fumadores, porque são hoje sobejamente conhecidos os malefícios do consumo do tabaco não só na saúde dos próprios fumadores mas também na das pessoas que se encontram expostas ao fumo do tabaco.
Neste contexto, gostaria de frisar uma vez mais e reiterar que o novo regime jurídico deverá integrar soluções justas e equilibradas, que permitam uma efectiva compatibilização entre o direito à saúde dos cidadãos não fumadores e o respeito pela liberdade individual dos cidadãos fumadores, cumprindo deste modo a matriz de um Estado democrático.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, no encerramento do debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Saúde.
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O Sr. Ministro da Saúde: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, antes de mais, saudar todas as bancadas e o quase consenso, incluindo a liberdade de voto do CDS-PP, que é um sinal, a meu ver, muito positivo de forte consensualidade.
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Muito bem!
O Orador: — Esse sinal, de resto, caracteriza-se também numericamente nos diferentes inquéritos de opinião. Há, sensivelmente, 70% de pessoas fumadoras em Portugal, com uma pequena variação de um ponto percentual entre homens e mulheres (29% e 30%), mas há 80% de pessoas apoiantes desta proposta de lei, apesar de as pessoas não a terem podido conhecer pormenorizadamente. Trata-se de um consenso muito forte, que se reflecte, naturalmente, nesta Câmara.
Gostava, agora, de deixar aqui duas ou três pequenas precisões.
Houve uma afirmação segundo a qual o anteprojecto inicial estaria eivado de radicalismo e que agora teríamos tido um comportamento diferente. Creio que há um desconhecimento factual, porque essas duas versões do anteprojecto, que foram publicadas no portal do Ministério da Saúde e, portanto, são acessíveis e conhecidas, pelo menos a segunda, era muito menos «radical», porque permitia um regime transitório de quatro anos para a entrada em vigor da proibição total nos pequenos estabelecimentos.
Portanto, não entendo essa crítica, suponho que ela está baseada em falta de conhecimento ou de leitura.
O Governo trouxe aqui uma proposta de lei quando podia não o ter feito, como foi salientado pela Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira. O Governo podia perfeitamente ter legislado por decreto-lei, no entanto, entendemos que este era um problema divisório na sociedade portuguesa, mas não tão divisório como, porventura, se pensava inicialmente. Quando se geram consensualidades, é positivo que elas sejam geradas e apareçam num ambiente de representação popular total, completo e autêntico. Portanto, ninguém nos pode acusar de não estarmos a usar todos os mecanismos da democracia para este efeito.
A minha estupefacção vai para o Bloco de Esquerda. Realmente, não entendo a posição do Bloco de Esquerda! Em primeiro lugar, o Bloco de Esquerda não deve ter lido a proposta de lei, porque vem dizer que proibimos nas prisões e nos lares. Enfim, deviam ter percebido, se lessem com cuidado, que estão excepcionados e até pode haver alas de fumadores nas prisões. Em segundo lugar, não entendo que o Bloco de Esquerda ache que devem ser privilegiados os frequentadores dos cafés e dos restaurantes e que não o devem ser os trabalhadores desses locais.
Aplausos do PS.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Isso é uma falsidade!
O Sr. João Semedo (BE): — Não ouviu o que dissemos!
O Orador: — Esta é a questão essencial: onde é que pára o espírito social do Bloco de Esquerda?! Logo a seguir ao 1.º de Maio, esta afirmação deixa-me completamente boquiaberto.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Falsidade absoluta!
O Orador: — O Sr. Deputado do Bloco de Esquerda embrulhou-se depois numa questão de direitos e deveres, admitindo que não estariam de acordo com que se tratem apenas os que se portam bem. Mas onde é que, neste diploma legal, está alguma selectividade em relação aos que se portam bem ou se portam mal e que o serviço de saúde trata apenas os que se portam bem?! Acho que estão a agitar fantasmas em relação a uma realidade inexistente.
O Sr. José Vera Jardim (PS): — Muito bem!
O Orador: — Srs. Deputados do Bloco de Esquerda, Sr. Deputado João Semedo, a política do «orgulhosamente sós» é uma política que já demonstrou não ter qualquer sucesso.
Aplausos do PS.
O Sr. João Semedo (BE): — Que o diga o Sr. Ministro!
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, terminámos a discussão da proposta de lei n.º 119/X.
Vamos, agora, iniciar o debate da proposta de lei n.º 116/X — Aprova o regime jurídico que estabele-
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ce a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projectos, pela fiscalização de obra e pela direcção de obra, que não esteja sujeita a legislação especial, e os deveres que lhes são aplicáveis, e revoga o Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro.
Para a apresentar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações (Paulo Campos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É verdade que, mais uma vez, o Governo apresenta-se neste Plenário para concretizar mais uma reforma.
Mais uma vez, o Governo apresenta-se no órgão máximo da democracia portuguesa para apresentar uma proposta de nova legislação com profundo teor reformista. É este o espírito central deste Governo.
Aquilo que nos é exigido pelos portugueses não é adiar, não é atrasar, não é fingir que mudamos e fica tudo na mesma; aquilo que nos é exigido é governar, é decidir, é concretizar o Programa de Governo, é agir.
E, neste caso, fazemo-lo com alguma felicidade. O Decreto n.º 73/73 é há muito discutido nesta Assembleia mas também na sociedade civil, entre os agentes política e tecnicamente envolvidos. Há muito tempo que se estabeleceu um amplo consenso em relação a esse decreto: não nos serve! Sr.as e Srs. Deputados, o Decreto n.º 73/73 está há tempo demais desactualizado. Há muito que estamos todos de acordo: é necessário alterá-lo. Mas também há muito que ninguém apresenta uma proposta global para o mudar. E é isso o que estamos, finalmente, a propor.
Hoje, como nunca, a importância do ordenamento, da sustentabilidade, da qualidade da construção e da alteração da paisagem estão na ordem do dia das exigências das pessoas, denotando que as actuais preocupações dos portugueses são um bom sinal. Ainda bem que os portugueses se preocupam cada vez mais com o ordenamento, com a sustentabilidade e com a alteração das nossas paisagens. A nós, em sede de Governo ou nesta Casa, compete-nos encontrar respostas a estes legítimos anseios.
Assim, surge a proposta de lei n.º 116/X, que tem estrategicamente três premissas essenciais: a vontade da sociedade, a colaboração de todos os directamente envolvidos — nomeadamente os arquitectos, os engenheiros, os engenheiros técnicos — e o sentido de uma maior exigência e responsabilização dos agentes.
Em primeiro lugar, é sabido que esta Assembleia aprovou o projecto de lei n.º 183/X, em Maio de 2006, que teve como base a primeira iniciativa legislativa da sociedade civil, assinada por 35 000 peticionários e que foi acolhida pelo voto unânime desta Câmara. A proposta de lei que hoje apresentamos acolhe as propostas desta iniciativa.
Em segundo lugar, para construir este diploma, o Governo ouviu e trabalhou com todas as partes directamente interessadas, nomeadamente a Ordem dos Arquitectos, a Ordem dos Engenheiros e as associações dos engenheiros técnicos.
Permitam-me uma nota terminológica: na construção política não há unanimidade, não há projectos unânimes; é impossível pensar em estabelecer um paradigma e julgar que todos vão concordar. Arquitectos, engenheiros e engenheiros técnicos, assim como o próprio Governo, que se rege por princípios de coesão e defesa intransigente dos cidadãos nos seus territórios, não podem aspirar a estar 100% de acordo. Essa utopia leva ao arrasto permanente e à inconsequência deste e doutros projectos.
O que atingimos foi uma proposta em que o diálogo e o consenso foram levados ao extremo possível.
Por isso, uma palavra de apreço a todos os que contribuíram para esta proposta de lei: aos arquitectos, que vêem reconhecido o princípio de a arquitectura ser desempenhada por arquitectos, mas também a todos os outros profissionais, nomeadamente aos engenheiros, que vêem clarificadas, simplificadas e qualificadas as suas funções.
Em terceiro lugar, o que esta proposta de lei propõe, a exemplo do que é praticado nos outros países europeus, é o espírito de equipa de projecto. A alma da proposta de lei n.º 116/X é a promoção da equipa de projecto.
Se olharmos para a realidade, para a actual organização da nossa sociedade, verificamos uma tendência multidisciplinar, com complementaridade de funções, partilha solidária de responsabilidades e, obviamente, a coordenação — um titular de responsabilidade e obrigações próprias.
Esta proposta de lei exige cabalmente a qualificação exemplar dos técnicos, afinal, ao abrigo de outras propostas legislativas do Governo, que se enquadram na ampla estratégia de ganhar, em qualidade, a batalha contra muitos projectos de autores não qualificados ou mesmo de assinaturas facilitadas e de donos de obra, aqui ou ali, sem preparação. Esta proposta de lei visa acrescer a responsabilidade dos arquitectos, dos engenheiros e dos restantes agentes em toda a cadeia de execução de um projecto, desde a sua ideia até à sua execução.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao apelarmos ao voto favorável à aprovação desta proposta de lei, estamos cientes de que o trabalho não acaba aqui; efectivamente, começa aqui. Na especialidade, os Srs. Deputados terão ainda a oportunidade de contribuir de forma qualificada para esta proposta de lei e para a ambição apresentada na semana passada pelo Governo, pela voz do Sr. PrimeiroMinistro, de simplificar e, ao mesmo tempo, clarificar o licenciamento e o planeamento territorial.
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O Sr. Hugo Nunes (PS): — Muito bem!
O Orador: — Finalmente e para terminar, uma palavra de ânimo para o sector da construção, tão importante para a nossa economia e para o nosso desenvolvimento sustentado. É bom que fique claro que o Governo não hesitará em garantir legislação e promoção para o bom funcionamento do sector.
Mas também é importante que os elementos deste sector saibam que os nossos objectivos para o sector são claros: qualidade, responsabilidade e exigência.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, inscreveu-se o Sr. Deputado Pedro Mota Soares, a quem dou a palavra.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, começo por agradecer-lhe, Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações, a sua exposição inicial e relembro aqui uma matéria que me parece muito importante: estamos a falar da revisão de um enquadramento legal – o famoso Decreto n.º 73/73 – que é um enquadramento legal pré-constitucional, prévio à entrada em vigor do novo quadro constitucional que temos desde 1976.
Como é óbvio, foi muitas vezes alterado, mas nunca foi alterado na sua integralidade.
E a verdade é que, durante muitos anos, nomeadamente a década em que a construção em Portugal assumiu a função de grande motor da economia, trabalhámos com um regime e um enquadramento legais que, visivelmente, não serviam os interesses da sociedade portuguesa no seu todo.
Obviamente, esta proposta de lei que o Governo hoje aqui traz é um diploma extenso, com matérias de um grau de complexidade e tecnicidade assinalável, e sobre essas matérias falará o meu colega Hélder Amaral. Mas há uma questão crucial sobre a qual queria saber já a sua opinião: a questão das qualificações profissionais que os vários agentes, os vários intervenientes, no processo de construção têm e que, a partir da aprovação deste diploma, terão obrigatoriamente de ter para exercerem a sua profissão, para poderem subscrever projectos.
Nesse sentido, como o Sr. Secretário de Estado dizia há pouco e com razão, deu entrada no Parlamento, subscrito por mais de 36 000 portugueses, um projecto de lei de iniciativa popular — aliás, o primeiro neste Parlamento —, visando consagrar o acto de arquitectura como um direito exclusivo dos arquitectos. Na altura, foi viabilizado por toda a Câmara, com um pedido também unânime de todos os partidos: o de que esse projecto fosse debatido num quadro de revisão geral do Decreto n.º 73/73, porque era a única forma possível de se enquadrar e de se conseguir garantir também um conjunto de direitos àqueles portuguesas e portugueses que, durante muitos anos, com qualificações que lhes foram dadas e reconhecidas pelo Estado, desempenharam funções nesta matéria, nomeadamente pessoas como os engenheiros técnicos ou mesmo os agentes técnicos de arquitectura.
Nesse sentido, parece-nos importante que se dê um passo – e entendemos que esta proposta de lei pode ser um primeiro passo –, mas com um conjunto de matérias que, na sua regulamentação e mesmo na definição em sede de especialidade destas matérias, têm de ser mais bem definidas. Mesmo assim, Sr. Secretário de Estado — e eu gostava de o ouvir especificamente sobre este ponto —, parece-nos que a garantia de um conjunto de portugueses, que são quase 5000, ao que nos dizem os números oficiais, que trabalham nestas áreas com qualificação que lhes foi dada pelo Estado, é de uma forma muito directa posta em causa.
Como é normal, esses profissionais estão extremamente preocupados com o seu futuro, o que é algo absolutamente normal. Percebemos que a ideia do Governo, com esta proposta de lei, não é a de retirar a essas pessoas o direito ao emprego, o direito ao trabalho, mas obviamente que esta matéria, em sede de especialidade, tem de ser melhor salvaguardada.
Ora, o que eu gostava de saber, da parte do Governo, é qual é a disponibilidade do Governo para os partidos da oposição, em sede de especialidade, reformularem esta matéria, nomeadamente quanto ao tempo de transição e, acima de tudo, também quanto à possibilidade do reconhecimento, primeiro, da formação que estas pessoas têm e, mais do que isso, de uma formação complementar que lhes possa atribuir um conjunto do direitos que, nomeadamente,…
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Orador: — … os arquitectos ou os arquitectos paisagistas já têm.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações: — Sr. Presidente,
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Sr. Deputado Pedro Mota Soares, os Srs. Deputados são soberanos nesta Casa e, portanto, nesse contexto, é óbvio que a margem de manobra será aquela que os Srs. Deputados entenderem na discussão que vão fazer e naquelas opções que decidirem tomar.
No entanto, obviamente, têm de ter em boa conta uma proposta que é feita pelo Governo. O Governo trabalhou nesta proposta de lei durante longo tempo e está, obviamente também, aberto a algumas contribuições, como há pouco referenciei. Portanto, eu diria que não há neste momento qualquer porta fechada para se conseguir aprofundar o trabalho que foi feito até este momento.
Devo dizer que algumas das preocupações que o Sr. Deputado colocou também estão já plasmadas, em nosso entender, na proposta de lei que hoje vos apresentamos, nomeadamente temos um período de transição suficientemente alargado, pensamos nós, em relação às questões que o Sr. Deputado enunciou. E também devo dizer-lhe que, dentro do espírito e objectivo desta nossa proposta de lei, entendemos que o conjunto das funções que hoje já são exercidas por um conjunto de profissionais vêem reforçadas as suas capacidades nesta proposta e, nomeadamente em muitas circunstâncias, vêem também qualificadas as suas funções. Nesse contexto, entendemos tratar-se de uma proposta que não pode obter o consenso mas que tem a base que consideramos adequada e suficiente para que esta reforma se possa concretizar.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Poço.
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A revogação do Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro, e a publicação de uma lei que dê resposta à actual realidade é desejada e, seguramente, aplaudida por todas as entidades e técnicos envolvidos.
Ao longo do tempo, tem havido iniciativas que visaram a alteração do Decreto n.º 73/73, e, neste sentido, relembro diversas petições, que passo a referir.
A petição n.º 22/IX (1.ª), na qual os cidadãos apelam à Assembleia da República para «(…) que tome as medidas legislativas que se impõem com vista à revogação do Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro, salvaguardando o princípio de que os actos próprios da profissão de arquitecto competem exclusivamente a arquitectos, solicitando ao Governo a definição, de modo compatível com a reserva da actividade de arquitecto aos arquitectos, do regime da qualificação profissional exigível aos restantes agentes no sector da construção, contribuindo-se desse modo para a regulação imprescindível de um sector de actividade de importância vital para o País», a qual foi aprovada por unanimidade; a petição n.º 78/IX (2.ª), que apresentou contributos para a revisão do Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro; a petição n.º 63/X (1.ª), que propôs a revogação do Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro; e ainda uma iniciativa de um conjunto de cidadãos, que, ao abrigo das disposições constitucionais, apresentou o projecto de lei n.º 183/X — Arquitectura: um direito dos cidadãos, um acto próprio dos arquitectos (revogação parcial do Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro, que foi aprovado, por unanimidade, e baixou à Comissão Permanente de Trabalho e Segurança Social.
Na sequência destas iniciativas, o Governo apresenta à Assembleia da República a proposta de lei n.º 116/X, com a qual pretende revogar o Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro, o qual veio dispor sobre a qualificação dos técnicos responsáveis pela elaboração de projectos de obras sujeitas a licenciamento municipal, prevendo que os mesmos, por regra, deveriam ser elaborados por um conjunto de técnicos, abrangendo arquitectos, engenheiros civis, agentes técnicos de engenharia civil e de minas, construtores civis diplomados e outros técnicos diplomados em engenharia ou arquitectura reconhecidos pelos respectivos organismos profissionais.
Sr.as e Srs. Deputados: O diploma a revogar, em vigor há 34 anos, o que representa uma estabilidade legislativa nada habitual no nosso sistema jurídico, tem vindo a ser aplicado aos sucessivos regimes de licenciamento de obra particular e de urbanização.
Como se plasma na exposição de motivos da proposta de lei, o diploma «(…) é aplicável ao Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 177/2001, de 4 de Junho, prevendo o n.º 4 do artigo 10.º do RJUE as qualificações adequadas à elaboração de projecto para efeito dos procedimentos nele regulados».
À data da sua aprovação, o Decreto n.º 73/73 foi essencial para colmatar a regulação de uma matéria desordenada e que necessitava de regulamentação especifica. Com a evolução do nosso país, com a oferta de técnicos em todas as especialidades, com as exigências de melhorar a qualidade de todas as intervenções nesta matéria e o surgimento de mecanismos que criaram condições para a melhoria da formação dos técnicos, o Decreto n.º 73/73 já não satisfaz, pelo que se impõe, consequentemente, a sua alteração.
No quadro de referências para a revogação desse diploma está o interesse público e a qualidade dos projectos. E sublinho: a qualidade dos projectos. É uma matéria que não deverá fazer parte das disputas político-partidárias e à volta da qual se deverá reunir um consenso alargado de modo a poder servir, com qualidade, o interesse publico.
É claro que esta nova realidade não pode pôr em causa todos os que, ao longo dos anos, contribuí-
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ram com esforço e dedicação para a mudança do território, eventualmente sem as melhores soluções, mas dando o seu melhor em defesa dos interesses das populações, exercendo a sua actividade num quadro legal existente.
Sr.as e Srs. Deputados: Sem que isto signifique seguir a justificação do Governo para a revogação do diploma, concorda-se, porém, que «(…) a progressiva inadequação das normas à realidade existente acabou por produzir lesões ao interesse público na qualidade, técnica e estética, segurança, durabilidade e funcionalidade das edificações.».
Entendemos que esta proposta de lei representa uma oportunidade para alterar uma legislação inadequada e ultrapassada, mas que, fundamentalmente, deve ser vista como uma base de trabalho que permita a existência de um regime jurídico coeso, racional, inteligente e estável numa matéria essencial para o ordenamento do País, para a segurança das pessoas e para qualidade de vida,…
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — … sem esquecer que, a par da vertente técnica, importa fazer uma avaliação do seu impacto social e profissional e saber quais as suas implicações para um elevado numero de profissionais que trabalham nesta área e que vivem do seu trabalho.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Da análise cuidada do diploma, a efectuar em sede de especialidade, e após a audição das entidades representativas das ordens profissionais, de entidades de ensino superior, das organizações económicas do sector, dos sindicatos e das associações sindicais, vai resultar, estamos em crer, um diploma que congregue todos aqueles que querem um Portugal moderno e com mais qualidade.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Em nossa opinião, esta proposta do Governo necessita de melhorias significativas, de aprofundar conceitos e de «consensualizar» propostas que se traduzam em contributos sérios e de grande valia técnica para o processo legislativo.
Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PSD vai votar favoravelmente, na generalidade, a proposta de lei, sem que tal signifique que concorda com a totalidade do texto apresentado,…
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — … mas na expectativa de que o Governo e o Partido Socialista, em sede de especialidade, terão a abertura e a capacidade para receber e introduzir na proposta de lei os contributos válidos que surjam na sua discussão e que possam transformá-la numa boa lei para Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 116/X, que hoje apreciamos, não pode ser discutida sem ter em conta o projecto de lei n.º 183/X, iniciativa legislativa de cidadãos, que versa sobre a questão de saber quem pode elaborar e subscrever projectos.
Aquando da discussão do projecto de lei n.º 183/X, dissemos que essa alteração ao Decreto n.º 73/73 era um esboço inicial do que deveria ser uma revisão integral do mesmo e que, em sede de discussão na especialidade, importava proceder a uma revisão mais global. Acontece que, face ao anúncio do Governo de que iria apresentar uma proposta de revisão global do Decreto, o processo legislativo ficou suspenso. Hoje, retomamos a discussão, para análise da presente proposta de lei.
Tal como afirmámos no passado, entendemos que chegou a hora de mudar o Decreto n.º 73/73, uma vez que impera a necessidade de adequar a legislação que rege estas matérias às necessidades e à realidade que este sector enfrenta.
Na verdade, a existência de critérios de exigência e de qualificação na gestão urbanística do nosso território é um desiderato que pode e deve ser exigido a todos os intervenientes do processo construtivo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Orador: — Quanto às soluções preconizadas pelo Governo, queremos salientar as seguintes: defi-
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ne-se quem são os profissionais que podem elaborar projectos, fazendo a distinção entre projectos de arquitectura, de estrutura e de espaço exterior, atribuindo, em regra, aos técnicos da respectiva área a responsabilidade para a elaboração dos mesmos; define-se de quem são e quais são os deveres dos diferentes intervenientes, entre outros o coordenador de projecto, o director de fiscalização de obra, o autor de projecto, o director de obra e o director de fiscalização de obra; estabelece-se ainda o regime relativo à responsabilidade civil dos diferentes técnicos, bem como a obrigatoriedade de celebrar um contrato de seguro de responsabilidade civil profissional.
Admitindo que existem ainda aspectos a corrigir, alguns deles já manifestados pelos diferentes intervenientes através dos respectivos pareceres, importa relegar para a discussão, na especialidade, essas matérias.
Quanto a um dos aspectos mais problemáticos deste diploma, e curiosamente esquecido na intervenção do Sr. Secretário de Estado, a questão dos agentes técnicos de arquitectura e de engenharia, importa lembrar que o Decreto n.º 73/73 definiu quem podia elaborar e subscrever projectos, bem como criou um regime transitório que ainda hoje se encontra em vigor.
Se é verdade que, hoje, não temos a carência de técnicos que na altura justificou este regime transitório, também é verdade que estes profissionais não são responsáveis por esta situação.
Reiterando o que afirmámos na discussão do projecto de lei n.º 183/X, dizemos que não podemos ignorar que existem, hoje, profissionais a quem foram criadas, pelo próprio Estado, legítimas expectativas de exercício de uma profissão, alguns deles exercendo a sua actividade há mais de 30 anos, pelo que importa encontrar soluções legislativas que tenham em conta este cenário.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
O Orador: — Mais afirmamos que sacrificar, por via legislativa, a vida profissional de um número significativo de pessoas não pode nem dever ser a solução. Ora, a solução encontrada pelo Governo, a criação de um período transitório de cinco anos, não é, na nossa opinião, satisfatória, pelo que importa, em sede de discussão na especialidade, encontrar as soluções adequadas para este problema.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Tendo em contas as especificidades desta matéria e a necessidade de corrigir alguns aspectos deste diploma, importa aprofundar o processo de auscultação dos diferentes intervenientes; importa que, em sede de discussão na especialidade, se oiçam todos os intervenientes, começando pela Ordem dos Arquitectos, a federação dos engenheiros, a Associação Nacional de Municípios Portugueses, a Associação Portuguesa do Arquitectos Paisagistas, passando pelo Sindicato dos Agentes Técnicos de Arquitectura e Engenharia, entre muitos outros.
Reconhecendo que o Governo fez um esforço para ouvir os diferentes intervenientes, a verdade é que a Associação dos Agentes Técnicos de Arquitectura e Engenharia apenas teve três dias úteis para proceder à analise e ao envio de um parecer sobre a presente proposta de lei e que somente foi recebido pelo Governo na véspera da aprovação de presente proposta em sede do Conselho de Ministros.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A actual proposta de lei intervém em duas grandes frentes. Se, por um lado, tem o objectivo de melhorar e actualizar o regime jurídico, por outro lado, interfere com expectativas legítimas, mas distintas, e às vezes contraditórias, de diferentes interesses profissionais, que têm necessariamente de ser conciliados atendendo às situações concretas e aos problemas sócio-laborais e profissionais que acarretam.
Da nossa parte, acreditamos que este diploma pode e dever ser melhorado, pelo que esperamos que a discussão, em sede de especialidade, contribua para esse objectivo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações, Sr.as e Srs. Deputados: Em 18 de Maio do ano passado, foi discutida, nesta Assembleia, o projecto de lei n.º 183/X, iniciativa legislativa de cidadãos, que acolheu um consenso generalizado, no sentido da alteração de um Decreto com 34 anos de existência — o Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro.
Esta matéria já mereceu, em anteriores momentos, discussão e até tomadas de decisão desta Câmara. E recordo que, na IX Legislatura, uma petição subscrita por 54 839 cidadãos deu origem a uma resolução (a n.º 52/2003), que, lamentavelmente, não teve as consequências que a mesma propunha.
Também agora, uma decisão que deveria ter ocorrido nos 90 dias imediatos à aprovação da iniciativa de cidadãos, aliás, prazo assumido pelo Governo em sede de Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, tardou em chegar.
Todos reconhecemos a necessidade da revisão do Decreto n.º 73/73, até porque o enquadramento social e histórico subjacente à sua aprovação se alterou: se nos anos 60 o património habitacional desti-
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nado aos cidadãos foi claramente negligenciado, em contraponto com as obras de regime, às quais foi dada toda a primazia, a partir dos anos 70, pressionado pelo rápido crescimento demográfico, especialmente nos centros urbanos, colocou-nos perante um enorme défice de profissionais de arquitectura, para responder a essas mesmas necessidades. Basta recordarmos o exíguo número de arquitectos inscritos no sindicato em 1969 (apenas 500).
Não deve, em nosso entender, esta discussão ser dissociada da qualidade do edificado e do ordenamento do território no nosso país, nem da qualidade de vida associada ao viver/habitar num território ressentido de direitos sociais, porque o que constatamos é que existem muitas fraquezas, muitas debilidades e muita mediocridade. São demasiadas agressões, a maior parte das vezes subjugadas ao lucro fácil, ao imediatismo e à cedência a interesses especulativos e perversos do uso do solo.
O milagre de transformar «cimento em ouro» é ao que temos assistido nos últimos tempos com esta perversão do uso do solo. São demasiadas agressões, quando se «despejam» comunidades inteiras sem adequadas respostas de mínimos de dignidade garantidos, aliás constitucionalmente consagrados.
Também não podemos, de forma simplista, assacar aos profissionais a quem o Decreto n.º 73/73 reconheceu competências para subscrever projectos de arquitectura — aos arquitectos, engenheiros civis, técnicos de engenharia e minas, construtores diplomados e outros técnicos diplomados em engenharia e arquitectura — as responsabilidades de tão escandalosa situação. A actividade da construção conta, hoje, com um conjunto de profissionais de variadas formações académicas a que urge dar um adequado enquadramento não só numa perspectiva de qualificação e de valorização mas também de responsabilização.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 116/X «(…) regime jurídico que estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projectos (…)», hoje em debate, abre o caminho a uma discussão que não é fácil face à realidade existente e às situações profissionais em presença.
Devemos, por isso, ter a capacidade de não ensombrar, nem provocar, uma situação de fragilidade, de incertezas e de desconfianças entre os profissionais que têm dado, ao longo das últimas décadas, o melhor do seu profissionalismo.
As respostas aos desafios da inovação e da qualidade da construção têm que ser vistas num contexto dinâmico e multidisciplinar, porque é nesse contexto que todos têm um papel a desempenhar.
Não defendemos visões corporativas, não estamos em altura de nos ficarmos pelo esgrimir de razões, cada uma mais válida do que a outra. Pelo contrário, entendemos que é possível criar um quadro normativo que responda eficazmente à realidade dos dias de hoje.
Todos estes profissionais são imprescindíveis, na multiplicidade dos seus saberes, para responder aos grandes desafios dos nossos dias: qualificar o espaço público; promover o ordenamento urbano como garantia de sustentabilidade e de qualidade de vida; e inovar a qualidade da edificação, incorporando as preocupações de eficiência dos edifícios urbanos.
É nesse sentido que entendemos que no processo de discussão na especialidade todos os intervenientes, e em pé de igualdade, devem ser ouvidos e responsabilizados pela sua intervenção.
Não é mais possível continuar com um regime que foi transitório durante 34 anos. O Bloco de Esquerda está, por isso, disponível para contribuir, com a responsabilidade que se exige, para que, em sede de especialidade, se tenham em conta as realidades, de forma a não criar roturas desnecessárias e a garantir o direito ao trabalho para todos.
Aplausos do BE.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Partindo do princípio de que a excelência cria excelência, a proposta de lei n.º 116/X vem no bom sentido, até porque, como já foi dito, o Decreto n.º 73/73, que esta proposta pretende revogar, há muito está ultrapassado, tendo estado na origem de vários atropelos a projectos, levando à perda de qualidade de alguns empreendimentos.
No entanto, esta proposta parece-nos demasiado restritiva. Há nesta proposta uma visão excessivamente rígida, preocupada mais com a salvaguarda dos conflitos de interesses entre os técnicos abrangidos, sejam eles arquitectos, engenheiros ou técnicos, do que com a salvaguarda do interesse geral, podendo perder-se, assim, uma oportunidade de uma verdadeira reformulação das regras na concepção de projectos urbanísticos.
Mas o mais preocupante neste diploma é a falta de interdisciplinaridade, exigível para o sucesso de qualquer projecto. É necessário definir as funções e competências de cada técnico, sejam eles arquitectos, engenheiros, técnicos de arquitectura, técnicos de engenharia, arquitectos de interiores, designers de ambientes, entre outros. Todos estes agentes têm uma carga de conhecimento que pode contribuir
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para o sucesso global do projecto, no entanto tem de ser reconhecida a sua qualificação.
Mais do que nunca, exige-se a colaboração das várias áreas do saber, de modo a que o resultado final seja o mais próximo do ideal.
Existe, neste contexto, o projecto de lei n.º 183/X, já aqui mencionado, apoiado por 36 783 cidadãos, que, ao abrigo do direito de iniciativa legislativa dos cidadãos, apresentaram à Assembleia da República um valioso contributo sobre o que é mais essencial na arquitectura e que poderia ser melhor aproveitado na concepção do diploma que hoje discutimos. Levanto, por isso, aqui algumas questões.
Os loteamentos e os espaços públicos não estão nitidamente inseridos neste diploma, pois surge como «projecto de outras obras públicas», sendo um pouco dúbia esta designação, pois o «espaço público» poderá ou não estar incorporado.
A limitação que este diploma produz para o desenvolvimento da actividade de um arquitecto é muito perigosa e prejudicial para o desenvolvimento do espaço público. Nesta proposta é limitado o trabalho do arquitecto a edifícios.
Sabemos que os projectos de loteamento têm sido uma das formas directas de produção de tecido edificado desqualificado. É incorporado o conceito de espaço exterior, mas este dirige-se ao espaço aberto não edificado ou já construído, estando, assim, de parte a maioria dos espaços públicos urbanos, como largos, praças, ruas, avenidas, frentes de mar, áreas de lazer e tudo o mais em que hoje consideramos ser necessário o trabalho de um arquitecto. Corremos o risco de não poder contar com novas obras de arrojada arquitectura em espaços públicos, de que são exemplo os Aliados, no Porto, de Souto Moura, ou a frente marítima de Matosinhos, de Siza Vieira.
É evidente a ausência de referência ao projecto de execução, sendo que sem esta exigência todo o processo de qualidade pode estar em causa, podendo, assim, aplicar-se a expressão de projecto a simples estudo prévio ou anteprojectos, que por si só não permitem garantir uma boa execução.
A inclusão do projecto de execução iria garantir a qualidade da maioria dos projectos, visto que só os técnicos qualificados teriam capacidade para desenvolver os projectos nesta fase, garantindo-se, assim, o interesse do consumidor.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Há uma ausência de definição dos direitos e deveres do dono da obra e do utilizador, fazendo crer que a simples presença de técnicos qualificados resolverá tudo o que haja para resolver. As responsabilidades estão definidas exclusivamente para projectistas e técnicos, não havendo referências ao dono da obra.
Neste capítulo, também é notório as poucas responsabilidades das empresas de construção. A inclusão apenas da designação de «empresa», em detrimento de «entidade», leva a que se exclua da actividade de projecto agentes públicos ou privados com estatuto não empresarial.
É necessário também medir a coerência deste diploma com o regime jurídico da urbanização e edificação, bem como o regime jurídico das empreitadas de obras públicas.
É de realçar também que existem muitos princípios já obsoletos que provêem do Decreto n.º 73/73, entrando assim o diploma em contradição com os regimes jurídicos atrás apresentados. Não se justifica e não é coerente fazer a divisão dos técnicos por tipos de obras: primeiro, os técnicos habilitados para projectos de edifícios e, em seguida, os técnicos habilitados para projectos de outras obras.
Apesar de tudo isto, Sr. Secretário de Estado, consideramos que este diploma, depois de trabalhado em sede de especialidade, poderá melhorar a situação actual e que todos poderemos contribuir para que todas estas dúvidas sejam esclarecidas.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Saraiva para uma intervenção.
O Sr. Álvaro Saraiva (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Passados 34 anos, discutimos hoje a tão ansiada revogação do Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro, há muito tempo obsoleto e em cuja revogação, há já vários anos, os sucessivos governos se vinham comprometendo.
Na verdade, o n.º 2 do artigo 1.º diz que os projectos deverão ser elaborados e subscritos por arquitectos, engenheiros civis, agentes técnicos de engenharia e de minas, construtores civis diplomados ou outros técnicos diplomados em engenharia ou arquitectura reconhecidos pelos respectivos organismos.
Passados 34 anos tais normas continuam a vigorar.
Embora a proposta de lei n.º 116/X seja muito mais aberta e abrangente, o que em nosso entender é um passo positivo, não podemos deixar de fazer um alerta. É que desde a discussão do projecto de lei n.º 183/X [Arquitectura: um direito dos cidadãos, um acto próprio dos arquitectos (revogação parcial do Decreto 73/73, de 28 de Fevereiro)], resultante da iniciativa legislativa de cidadãos, que mereceu o seu
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debate em Plenário em 19 de Maio de 2006, e que baixou à 11.ª Comissão, passaram 12 meses. Também o compromisso do Governo, que estabeleceu 90 dias para apresentar a sua iniciativa nesta Câmara, foi ultrapassado em muito. Em nosso entender, esta proposta de lei que agora discutimos já podia contemplar o texto resultante do trabalho da Comissão.
O Decreto n.º 73/73 há já muito tempo que estava em sentido oposto à Constituição e ao direito comunitário, assim como em contradição com vária legislação ordinária que foi saindo. Exemplo disso é o Decreto-Lei n.º 205/88, de 16 de Junho, que no seu preâmbulo admite a necessidade de o Decreto n.º 73/73 sofrer uma revisão profunda. O Decreto-Lei n.º 292/95, de 14 de Novembro, também revela no preâmbulo a preocupação em face da situação actual. O Decreto-Lei n.º 167/97, de 4 de Julho, vai no mesmo sentido.
Da análise do conjunto destes diplomas podemos dizer que o legislador tem plena consciência da necessidade social e económica da reforma do sistema, nomeadamente da alteração do regime instaurado pelo Decreto n.º 73/73.
O Grupo Parlamentar de «Os Verdes» entende que um urbanismo de qualidade só se faz com regras bem claras e específicas nas suas mais variadas vertentes; que quando falamos em ambiente — e, no texto constitucional, ao falarmos de ambiente sadio e ecologicamente equilibrado estamos a falar de modo inovador — estamos a falar da relação do espaço à nossa volta.
Só com regras bem definidas é que podemos ter qualidade no urbanismo e no espaço que o envolve, que é uma peça determinante na promoção da qualidade do ambiente urbano, tendo implicações directas na qualidade de vida das populações.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Muito bem!
O Orador: — Pode assim considerar-se que a proposta de lei n.º 116//X peca por tardia, por ter deixado arrastar o regime previsto no Decreto n.º 73/73. E a responsabilidade política de ter deixado arrastar esse regime deve ser assumida e traduzida na própria proposta. É por isso que, por exemplo, em relação ao regime de transição deve ter-se em conta que há agentes técnicos que fazem projectos dentro da legalidade há décadas, fruto justamente do sistema criado e prolongado pela vigência do Decreto n.º 73/73. É preciso, então, entender se o regime de transição proposto é o mais adequado ou se, pelo contrário, cria uma dificuldade de adaptação destes agentes a um regime que lhes retira competências.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Pensamos que em sede de especialidade tem de se trabalhar com grande sentido de responsabilidade, tendo em conta os projectos e propostas já discutidos nesta Câmara, e promovendo um conjunto de auscultações necessárias para melhor solucionarmos as dificuldades e encontrarmos um regime que melhor sirva uma matéria que — há que assumi-lo — se depara com interesses diferenciados.
O Grupo Parlamentar de «Os Verdes» viabilizará, na generalidade, esta proposta de lei e empenharse-á também, em sede de especialidade, em contribuir para o enriquecimento da mesma.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Muito bem!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Nunes.
O Sr. Hugo Nunes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República debate hoje uma proposta de lei do Governo que se propõe aprovar um novo regime jurídico que estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projectos, pela fiscalização e pela direcção de obra que não esteja sujeita a legislação especial e os deveres que lhe são aplicáveis, revogando assim o Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro.
Este Decreto assumiu um papel importantíssimo no sector da construção no nosso país. Reportandonos à data e, por conseguinte, ao contexto da época, facilmente percebemos que este Decreto foi a resposta a uma necessidade objectiva de regular a qualificação dos técnicos responsáveis pelos projectos de obras sujeitas a licenciamento municipal, o que não podemos deixar de reconhecer que veio a acontecer.
Em função das necessidades do País e da pressão resultante da procura de novas habitações, impunha-se a regulamentação da actividade, o que levou à definição de que os projectos de obras sujeitas a licenciamento municipal deveriam, por regra, ser elaborados por técnicos, «arquitectos, engenheiros civis, agentes técnicos de engenharia civil e de minas, construtores civis diplomados ou outros técnicos diplomados em engenharia ou arquitectura reconhecidos pelos respectivos organismos profissionais».
Previa, em simultâneo, o Decreto n.º 73/73 um regime transitório, que permitiu, até hoje, que outros técnicos com experiência comprovada pudessem fazê-lo, ordenando o sector e introduzindo mais rigor e credibilidade.
No entanto, esta definição serviu um propósito e uma época, respondendo a necessidades e dificul-
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dades efectivas do País e das populações. De facto, desde a data da sua publicação decorreram já 34 anos. A realidade mudou! O sector da construção passou por muitas transformações, acompanhando também alterações profundas na nossa sociedade. Não só por isso, mas também por isso, o Decreto n.º 73/73 está hoje desactualizado.
Efectivamente, do contexto que originou a sua criação mantêm-se pouco mais do que a importância do sector da construção e a necessidade de regular com rigor o exercício de actividades nesse sector.
Aliás, há um amplo acordo nesta desactualização e na justificação para alterar, rever e até revogar este Decreto.
A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!
O Orador: — E nisso, como todos reconhecemos, o debate não é novo. Não é novo no País nem é novo na Assembleia da República.
A título de exemplo, recorde-se a petição n.º 22/IX (1.ª), subscrita por 54 839 pessoas, e a resultante resolução da Assembleia da República n.º 52/2003 ou, ainda mais recentemente, o projecto de lei n.º 183/X, inédito e louvável na forma, resultando da iniciativa de 36 783 cidadãos, que propõe a revogação parcial do Decreto n.º 73/73.
Por outro lado, e embora fora do sistema legislativo, são públicas posições, anteriores e posteriores, de entidades representativas do sector que reconhecem a desadequação deste enquadramento legal e a necessidade da sua actualização e substituição.
A revogação ora proposta é, portanto, o corolário de um amplo reconhecimento, eventualmente da unanimidade, de que o Decreto n.º 73/73 hoje não serve nem os interesses do sector nem os interesses do País.
A Sr.ª Isabel Jorge (PS): — Muito bem!
O Orador: — A proposta de lei n.º 116/X, «coincidindo e dando resposta à iniciativa legislativa de cidadãos», como é reconhecido no seu preâmbulo, procede a uma revisão cabal e integrada do Decreto n.º 73/73, adequando o quadro legal à realidade dos nossos tempos.
Assim, esta proposta procura definir claramente áreas de competência, qualificações, deveres e responsabilidades, alargando a área de intervenção prevista na iniciativa de cidadãos a todo o processo, desde a fase de elaboração do projecto até à construção e fiscalização, abrangendo também a regulação da obra pública.
A definição precisa de funções como autor de projecto, coordenador de projecto, director de fiscalização, director de obra, identificando qualificações e regulando responsabilidades, é um sinal claro de exigência, de rigor, de procura do aumento das qualificações dos profissionais do sector mas também — e que não restem dúvidas — da sua responsabilização.
Por outro lado, a inclusão destas funções, associadas à fase de execução e fiscalização, é também um exemplo claro de que esta proposta de lei procura corresponder às expectativas de muitos, indo mais longe do que a fase de projecto.
A proposta de lei procura garantir um período de transição e de salvaguarda dos profissionais que já participam no sector, procurando criar condições para garantir a compatibilização do reforço da regulação com a possibilidade de adquirir novas qualificações e de certificar competências já adquiridas, procurando evitar rupturas e permitindo uma adaptação gradual às novas regras. Aliás, esta proposta está directamente relacionada com outros dos desafios com que nos deparamos nos nossos dias. Esta é outra dimensão que deve merecer toda a nossa atenção. Efectivamente, não só é necessário garantir a sua articulação com os novos caminhos e as novas respostas na formação, reconhecimento e certificação de competências, mas também com as mudanças ao nível do ensino superior decorrentes do Processo de Bolonha.
Por outro lado, e no âmbito da compatibilização com o normativo comunitário, tenhamos presente que não sendo aceitável que os portugueses tenham direitos acrescidos apenas pela sua nacionalidade é também expectável que não tenham menos.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Com esta proposta de lei, o Governo cumpre os objectivos a que se propôs. Salvaguardando os casos em que há a sujeição a legislação especial, apresentou à Assembleia da República uma proposta de revogação do Decreto n.º 73/73, substituindo de forma clara e abrangente a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projectos e também pela fiscalização e pela direcção de obra.
A Assembleia da República assume agora a responsabilidade de continuar e aprofundar esta discussão, não esquecendo que a discussão na especialidade da iniciativa de cidadãos, o projecto de lei n.º 183/X, foi suspensa, após a realização de um alargado leque de audições, exactamente para que os passos seguintes pudessem ser feitos em simultâneo com a discussão desta proposta do Governo em sede de especialidade.
É de realçar que as Comissões Parlamentares de Obras Públicas, Transportes e Comunicações e de
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Trabalho e Segurança Social decidiram já pela criação de um grupo de trabalho conjunto para proceder à realização de novas audições e à preparação do processo legislativo subsequente, o que nos parece constituir um exemplo claro da consciência da sua importância e abrangência.
O desafio não é fácil, como o demonstra o caminho já percorrido, mas com certeza que em conjunto o venceremos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de registar o acolhimento extremamente positivo que esta proposta de lei teve por parte de todas as bancadas. Portanto, nessa matéria sentimo-nos reconfortados pelas palavras que, na generalidade, os diferentes grupos parlamentares hoje transmitiram neste debate.
Em segundo lugar, quero dizer-vos também que esta nossa proposta de lei foi extremamente participada. Houve um período longo, na opinião de muitos dos Srs. Deputados, para audição, diálogo e para procura de consensos, mas também, como disse, os consensos, muitas vezes, não são possíveis. Neste caso concreto, levámos o diálogo ao extremo possível, ao limite. Recordo que, nesta matéria, ouvimos várias estruturas representativas dos profissionais abrangidos por esta proposta, nomeadamente as duas ordens profissionais, várias associações, cerca de seis, e um sindicato, envolvendo todos esses agentes na discussão e na preparação desta proposta.
Em terceiro lugar, gostaria também de dizer-vos que esta não é uma proposta isolada, enquadrandose num vasto conjunto de alterações legislativas em curso e que, em muitos casos, estão já bastante adiantadas ou em processo legislativo. Por exemplo, o código dos contratos públicos está em fase final de processo legislativo, mas também o regime geral das edificações urbanas, o regime jurídico da urbanização e edificação, apresentado pelo Sr. Primeiro-Ministro no último debate parlamentar, ou ainda as normas para execução de projectos, que estão também em fase muito avançada. Este é um pacote bastante largo, que, aliás, abrange algumas das propostas que os Srs. Deputados hoje também colocaram em cima da mesa e que são matérias que, no nosso entendimento, não devem versar na proposta de lei agora em discussão.
Em quarto lugar, quero dizer-vos que, nesta proposta, ficam reguladas as funções de elaboração de projectos, de fiscalização de obra e também de direcção de obra. É criada a figura da equipa de projecto, assegurando, pela primeira vez, a tal interdisciplinaridade, que o Sr. Deputado Hélder Amaral há pouco referiu que não via nesta proposta. Essa interdisciplinaridade é aqui levada ao extremo, nomeadamente através da criação da equipa de projecto, podendo os diferentes elementos que participam no trabalho eleger um coordenador para esse projecto.
Como há pouco referenciei, esta proposta atribui que, em regra, os projectos de arquitectura devem ser elaborados por arquitectos, os de engenharia por engenheiros e engenheiros técnicos e os de espaços exteriores por arquitectos paisagistas. Reconhece, também pela primeira vez, as empresas de projecto e de fiscalização enquanto realidade organizacional corrente.
Atribui ainda um conjunto de deveres próprios e específicos ao desempenho das diferentes tarefas evidenciadas no projecto.
Torna obrigatória a subscrição de um termo de responsabilidade pelo cumprimento dos deveres a que estão sujeitos os diferentes intervenientes regulados no diploma.
Consagra e disciplina o dever de assistência técnica, abrangendo os termos do seu funcionamento e a responsabilidade dos técnicos pelo seu incumprimento, a que ficam obrigados, nomeadamente, o coordenador de projecto e autores de projecto, quando necessário para assegurar a correcta execução do projecto elaborado ou quando solicitado pelos demais intervenientes na realização e fiscalização dos trabalhos de construção.
Prevê a responsabilidade civil profissional decorrente da violação de deveres contratuais e extracontratuais, de natureza individual, e institui a responsabilidade civil solidária entre técnicos intervenientes na elaboração do projecto e execução e fiscalização dos trabalhos de construção, salvaguardando-se, dessa forma, o direito simples de regresso a que haja, eventualmente, lugar.
Torna obrigatória a celebração de um contrato de seguro de responsabilidade civil para o desempenho de qualquer das funções reguladas neste diploma.
Trata-se, portanto, de uma proposta de lei suficientemente abrangente que toca nas matérias que consideramos fundamentais neste contexto, nomeadamente ao nível dos deveres, mas também dos direitos e das responsabilidades dos diferentes intervenientes na cadeia de valor que o diploma pretende regular.
Finalmente, esta proposta de lei define um regime transitório de cinco anos que permita não apenas a aquisição das habilitações necessárias para a realização das tarefas reguladas por estes novos preceitos, mas também a necessária reconversão, quando estamos a introduzir mais exigência, mais rigor e
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também maior responsabilização.
É esta a mensagem final que gostaria de deixar. Espero que o trabalho na especialidade, que certamente será útil, também emane dos mesmos princípios que estiveram presentes na elaboração deste diploma, ou seja, exigência e responsabilidade, sendo certo que, se lhe atribuirmos esses valores, teremos um bom diploma, que será aprovado por esta Câmara muito proximamente.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Como os Srs. Deputados terão reparado, o Sr. Secretário de Estado beneficiou de tempo cedido pelo PS.
Sr.as e Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.
A nossa próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 15 horas, e contará com um período de antes da ordem do dia, destinado a declarações políticas. No período da ordem do dia, a primeira parte será preenchida com um debate de urgência, requerido por Os Verdes, sobre o Instituto da Conservação da Natureza, sendo a segunda parte reservada à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 121/X — Altera a Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, que altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais, e dos projectos de lei n.os 286/X — Cria o Instituto de Assistência Jurídica para tornar efectivo o acesso à justiça e ao direito (BE), 287/X — Lei relativa ao acesso à justiça e ao direito (BE) e 377/X — Garante o acesso ao direito e aos tribunais, revogando o regime jurídico existente (PCP).
Às 18 horas, terá ainda lugar um período destinado às votações regimentais.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS):
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Paulo Martins Pereira Coelho
Carlos Jorge Martins Pereira
Domingos Duarte Lima
Emídio Guerreiro
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge José Varanda Pereira
José Manuel Pereira da Costa
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Mário Henrique de Almeida Santos David
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Paulo Miguel da Silva Santos
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro
Partido Comunista Português (PCP):
Francisco José de Almeida Lopes
Partido Popular (CDS-PP):
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS):
Jaime José Matos da Gama
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
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32 | I Série - Número: 078 | 3 de Maio de 2007
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Umberto Pereira Pacheco
Partido Social Democrata (PSD):
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Partido Comunista Português (PCP):
José Honório Faria Gonçalves Novo
Partido Popular (CDS-PP):
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS):
António Ramos Preto
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Luís Miguel Pereira de Almeida
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL