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Sexta-feira, 4 de Maio de 2007 I Série — Número 79

X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 3 DE MAIO DE 2007

Presidente: Ex.mo Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Antes da ordem do dia. — Deu-se conta da apresentação dos projectos de resolução n.os 203 a 207/X.
Em declaração política, o Sr. Deputado Miguel Macedo (PSD) criticou a postura dos partidos da esquerda parlamentar relativamente à situação política vivida na Câmara Municipal de Lisboa, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Filipe (PCP), António Carlos Monteiro (CDS-PP), Vitalino Canas (PS) e Luís Fazenda (BE).
Em declaração política, o Sr. Deputado Diogo Feio (CDS-PP) apelou ao Governo para exercer mais justiça na cobrança de impostos aos portugueses, dando depois resposta aos pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Victor Baptista (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Agostinho Lopes (PCP) verberou a política agrícola do Governo.
No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Jorge Almeida (PS) e Abel Baptista (CDS-PP).
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Fernando Rosas (BE) assinalou a passagem do Dia Internacional da Liberdade de Imprensa e manifestou-se contra a política que está a ser seguida pelo Governo no que respeita à liberdade de imprensa e de expressão.
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Vitalino Canas (PS) responsabilizou o PSD e o seu Presidente, Dr. Luís Marques Mendes, pelo fracasso do projecto para Lisboa e pela crise na Câmara Municipal de Lisboa. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Miguel Macedo (PSD) e António Filipe (PCP).
Ordem do dia. — Ao abrigo do n.º 4 do artigo 78.º do Regimento da Assembleia da República, procedeu-se ao debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar de «Os Verdes», sobre o Instituto da Conservação da Natureza, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr.

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Secretário de Estado do Ambiente (Humberto Rosa), os Srs. Deputados Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), José Eduardo Martins (PSD), Renato Sampaio (PS), Miguel Tiago (PCP), António Carlos Monteiro (CDS-PP), Alda Macedo (BE), Luís Vaz e Jovita Ladeira (PS), Ricardo Martins (PSD) e Álvaro Saraiva (Os Verdes).
No encerramento do debate, usaram da palavra o Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva) e o Sr. Deputado Álvaro Saraiva (Os Verdes). Foi aprovado o voto n.º 95/X — De pesar pelo falecimento de Boris Ieltsin (CDS-PP), tendo usado da palavra, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, os Srs. Deputados Hélder Amaral (CDS-PP), José de Matos Correia (PSD), Luís Fazenda (BE), Renato Leal (PS), Bernardino Soares (PCP) e Francisco Madeira Lopes (Os Verdes). O voto n.º 97/X — De pesar pelo falecimento do Dr.
António Rocha e Melo (PS) foi também aprovado, após o que a Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.
Depois de terem usado da palavra os Srs. Deputados Fernando Rosas (BE), Bruno Dias (PCP), Fernando Negrão (PSD), Hélder Amaral (CDS-PP), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes) e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, foi aprovado o voto n.º 96/X — De condenação pelo genocídio no Darfur (BE).
Mereceu igualmente aprovação o voto n.º 98 /X — De congratulação pela designação do Dr. Jorge Sampaio para Alto Representante das Nações Unidas para o Diálogo de Civilizações (PS), ao qual se associaram, em intervenções anteriores o Sr. Deputado Fernando Negrão (PSD) e o Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares.
Foi aprovada, na generalidade, a proposta de lei n.º 119/X — Aprova normas para a protecção dos cidadãos da exposição involuntária ao fumo do tabaco e medidas de redução da procura relacionadas com a dependência e a cessação do seu consumo.
Também na generalidade, foi aprovada a proposta de lei n.º 116/X — Aprova o regime jurídico que estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projectos, pela fiscalização de obra e pela direcção de obra, que não esteja sujeita a legislação especial, e os deveres que lhes são aplicáveis, e revoga o Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro.
A Câmara aprovou, ainda, três pareceres da Comissão de Ética autorizando uma Deputada do PSD e dois Deputados do PS a deporem no âmbito de processos que correm em tribunal.
Por fim, procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 121/X — Altera a Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, que altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais e dos projectos de lei n.os 286/X — Cria o Instituto de Assistência Jurídica para tornar efectivo o acesso à justiça e ao direito (BE), 287/X — Lei relativa ao acesso à justiça e ao direito (BE) e 377/X — Garante o Acesso ao Direito e aos Tribunais revogando o regime jurídico existente (PCP). Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Justiça (João Tiago Silveira), os Srs. Deputados João Oliveira (PCP), Helena Pinto (BE), Helena Terra (PS), António Montalvão Machado (PSD), Diogo Feio (CDS-PP) e Francisco Madeira Lopes (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 10 minutos.

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Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José dos Mártires Rodrigues

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Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosalina Maria Barbosa Martins
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Zita Barbas Marvão Alves Gomes
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte

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Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Miguel Tiago Crispim Rosado

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Hélder do Amaral

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José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Paulo Sacadura Cabral Portas

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «s Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Álvaro José de Oliveira Saraiva

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai dar conta do expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de resolução n.os 203/X — Alteração ao Regimento da Assembleia da República (CDS-PP), 204/X — Alterações ao Regimento da Assembleia da República (PS), 205/X — Altera o Regimento da Assembleia da República (PCP), 206/X — Alteração ao Regimento da Assembleia da República (Resolução n.º 4/93, com as alterações introduzidas pelas Resoluções n.os 15/96, 3/99, 75/99 e 2/03) (Os Verdes) e 207/X — Adopta medidas de eficiência energética e poupança de água (Os Verdes).

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, chamo a vossa atenção para que se encontra presente na tribuna oficial uma delegação da OCDE, organização de que Portugal é país fundador, presidida pelo seu Secretário-Geral, Sr. Angel Gurría, uma grande figura da vida política mexicana e internacional, que se encontra acompanhado pelo nosso Embaixador na OCDE e ex-Deputado desta Casa Ferro Rodrigues.
Peço uma saudação do Plenário para esta importante delegação.

Aplausos gerais, de pé.

Vamos, então, dar início ao período de antes da ordem do dia com uma primeira declaração política que vai ser proferida pelo Sr. Deputado Miguel Macedo.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Presidente do PSD expressou ontem, de forma clara, a posição que entendemos assumir para resolver a situação política que se vive na Câmara Municipal de Lisboa.
O que havia a dizer sobre esta matéria ficou dito. Com responsabilidade, com clareza e com coragem políticas, colocando o interesse dos cidadãos à frente de meros calculismos partidários,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — … o PSD reafirmou que percorre, inabalável, um caminho de coerência que faz da credibilidade da vida política um eixo fundamental da sua acção.

Vozes do PS: — Não se nota nada!

O Orador: — Clareza política e coragem política, justamente os atributos ausentes nos partidos da oposição na Câmara Municipal de Lisboa.

Risos do PS.

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O Sr. Mota Andrade (PS): — Essa é boa!

O Orador: — Uma oposição que privilegiou a gritaria ao debate sereno dos problemas que afectam os cidadãos, uma oposição que foi um deserto de ideias e de propostas e uma oposição que se barricou na obstrução política, indiferente aos problemas dos cidadãos.
Uma oposição que foi obstrução, pois não fez, nem deixou fazer. O que se passou com a obra do Túnel do Marquês é bom exemplo do que acabo de afirmar. A irresponsabilidade e a insensatez do vereador do Bloco de Esquerda fez com que a obra se arrastasse por mais um ano e custasse alguns milhões de euros a mais aos cidadãos de Lisboa.

Aplausos do PSD.

Vozes do BE: — É mentira!

O Orador: — Foi este o saldo da sua irresponsabilidade: milhões a mais numa obra parada e milhares de horas roubadas aos cidadãos que tiveram de esperar mais um ano até conclusão desta obra.
Uma oposição com um comportamento político hipócrita, pois afirmaram todos os dias a necessidade de eleições intercalares e tinham na Câmara a maioria necessária para provocar essas eleições, mas, pensando mais nos interesses partidários do que nos interesses dos cidadãos e actuando com desprezível calculismo, os partidos da oposição mostraram aos cidadãos que não merecem a confiança de quem quer soluções e dispensa complicações.

Protestos do PS, do PCP e do BE.

Uma oposição sem coragem, sem projecto e sem noção de serviço público, uma oposição que foi incapaz de pensar por um momento no interesse dos cidadãos de Lisboa.
Uma oposição que prega de forma farisaica a virtude política em Lisboa, mas que se dispensa de actuar em conformidade quando, e onde, podem ser afectados os seus interesses partidários.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Comecemos pelo Bloco de Esquerda. Rotineiramente implacável na acusação e ligeiro na condenação, o Bloco de Esquerda atropela argumentos para justificar a manutenção do seu apoio à Presidente da Câmara de Salvaterra de Magos, arguida num processo no exercício do seu mandato.

Vozes do PSD: — É verdade!

Vozes do BE: — É mentira!

O Orador: — O Bloco é um caso de dupla personalidade: aqui, em Lisboa, acusa e exige; lá, em Salvaterra de Magos, protege e silencia.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Vozes do BE: — É mentira!

O Orador: — Aqui, em Lisboa, proclamam as virtudes do que designam por ética republicana; lá, em Salvaterra de Magos, agarram-se ao poder e «mandam às malvas» a ética republicana.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — É mentira! Tenha vergonha!

O Orador: — É mesmo caso para citar o povo: «Bem prega Frei Tomás, olha para o que eu digo não faças o que eu faço!»

Aplausos do PSD.

Depois, temos o Partido Comunista Português, que, também neste caso, não resistiu a fazer como os demais: em permanentes divagações, reclamou a necessidade de eleições, mas esqueceu o que não há muito tempo ocorreu em Setúbal.
Recordemos os factos: em Setúbal, o PCP despediu o presidente eleito pelo voto dos eleitores e, em seu lugar, colocou quem mais se conformava com os ditames da ortodoxia partidária.

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Protestos do PCP.

Acontece que a actual presidente de câmara, cargo que exerce por vontade exclusiva do PCP, está também arguida num processo por matéria que tem a ver com o exercício das suas funções.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Tal como o seu colega de bancada Deputado Fernando Negrão!

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Eu não!!

O Orador: — Esta é matéria que inquiete o PCP? Não! Uma vez mais, o que é exigência em Lisboa é calado em Setúbal — são dois pesos e duas medidas!!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Finalmente, temos o Partido Socialista. Esta é mesmo, Sr.as e Srs. Deputados, a mais chocante das situações. Passa-se aqui ao lado, em Oeiras.
Todos se recordam do que aconteceu com o PS, em Oeiras. Aquando das eleições autárquicas, os seus dirigentes afirmaram repetidas vezes que a sua candidatura à Câmara Municipal de Oeiras seria liderada por uma destacada figura socialista. Quem foi essa destacada figura socialista? O obscuro presidente da estrutura local do PS.
Na altura, muitos não quiseram perceber o que se estava a passar naquele concelho e outros tantos quiseram acreditar que tudo aquilo era normal.
A aparência de confronto político foi encenada até ao fim — a candidatura socialista à Câmara Municipal de Oeiras não hesitou até em mandar distribuir, durante a campanha eleitoral, o que denominou por Livro Negro do Verbo Isaltinar, onde eram feitas graves acusações à conduta política do agora presidente da câmara.
Agora que o Presidente da Câmara de Oeiras não é apenas arguido, mas já é também acusado de vários crimes, e crimes graves!, resultantes do exercício das suas funções, o que faz o PS? A resposta está à vista de todos: faz uma aliança com o autarca de Oeiras, aliança que só é possível com o alto patrocínio do Primeiro-Ministro e Secretário-Geral do PS e de outras destacadas figuras socialistas.

Vozes do PSD: — É verdade!

Protestos do PS.

O Orador: — Para os socialistas de Oeiras, as acusações que impendem sobre o presidente do município são «uma questão da vida privada do autarca».
Por nós, ficamos esclarecidos, mas interrogamo-nos sobre que fortes razões, que delicados motivos, que interesses fundamentam esta aliança patrocinada pelo Primeiro-Ministro.
Os dirigentes nacionais do PS — a começar pelo seu Secretário-Geral — têm estado calados sobre esta situação.
Pois bem, desafio daqui o Secretário-Geral do PS a pronunciar-se sobre esta matéria, porque, neste caso, calar é pactuar, calar é sinónimo de cumplicidade política.
Desafio o Primeiro-Ministro a dizer publicamente se apoia a coligação, em Oeiras,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — … entre Isaltino Morais e o Partido Socialista.
Desafio o Primeiro-Ministro a quebrar o seu silêncio cúmplice sobre uma situação que afecta gravemente a credibilidade das instituições, da política e dos políticos.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: São estes comportamentos políticos que afastam os cidadãos da política! São estes comportamentos políticos que autorizam os cidadãos a pensar que tudo não passa de um mero jogo de interesses partidários! São estes comportamentos políticos que minam a credibilidade da política e dos políticos, sejam eles autarcas ou não! São estes comportamentos políticos que afectam a qualidade da nossa democracia! Por nós, percorremos caminhos diferentes, caminhos que prestigiam a política e os políticos.
E assim vamos continuar.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Filipe, António Carlos Monteiro, Vitalino Canas e Luís Fazenda.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, verifico que o Sr. Deputado pretendeu fazer hoje aqui uma espécie de «fuga para a frente» perante o reconhecimento que o PSD foi obrigado a fazer de que a actual situação a que chegou a Câmara Municipal de Lisboa não tinha outra solução que não fosse a da realização de eleições antecipadas.
Mas o que, na realidade, o Sr. Deputado veio aqui fazer foi procurar escamotear quem tem, de facto, a responsabilidade pela situação que se criou e procurar responsabilizar toda a gente menos o único e verdadeiro responsável que é o PSD.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Sr. Deputado, não vale a pena procurar vir aqui dar exemplos que são completamente inadequados. O Sr. Deputado veio aqui distribuir acusações pelos vários partidos, dizendo, por exemplo, que a Presidente da Câmara Municipal de Setúbal, do PCP, também é arguida num processo. Ó Sr. Deputado, ela é tão arguida como o Sr. Deputado Fernando Negrão, que está aí sentado ao seu lado e que, segundo a comunicação social, também é arguido,…

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Não sou!

O Orador: — … pela mesma razão que a actual Presidente da Câmara Municipal de Setúbal, porque eram vereadores e membros do executivo na altura em que, supostamente, foram cometidos factos que estão sob investigação! Portanto, Sr. Deputado, esse exemplo não colhe.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mau exemplo…!

O Orador: — Foi um mau exemplo, à falta de melhor, para procurar fugir à questão essencial.
Sr. Deputado Miguel Macedo, o que está em causa, na Câmara Municipal de Lisboa, é uma situação que representa o retumbante fracasso da gestão do PSD à frente da câmara, não apenas nos últimos dois anos, mas nos últimos seis anos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Efectivamente, a situação a que se chegou na Câmara Municipal de Lisboa é o resultado daquela que tem sido a gestão do PSD, quer no mandato anterior sob a presidência do Dr. Santana Lopes e do Eng.º Carmona Rodrigues, quer no mandato em curso e em vias de terminar da pior forma possível.
Sr. Deputado, a responsabilidade por isto… Olhe, da CDU é que não é! Aliás, o PCP foi a única força política que votou contra a permuta de terrenos com a Bragaparques, que é o que está na base dos processos em curso e que conduziram a esta situação.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Bem lembrado!

O Orador: — Portanto, da CDU é que a responsabilidade não é!!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Mas é uma evidência que a responsabilidade pela situação que se vive na Câmara Municipal de Lisboa é do PSD, que foi de tropeção em tropeção até chegar a uma situação de estatelamento final, que o PSD não pôde evitar e para a qual a única saída que encontrou foi a de admitir que era insustentável a situação que se estava a viver e que só com eleições intercalares ela poderia ser resolvida, isto é, devolvendo a palavra ao povo.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: — Vou concluir, Sr. Presidente, perguntando o seguinte: e a assembleia municipal, Sr. Deputado? O Sr. Deputado considera que é aceitável que, havendo eleições para a câmara municipal, a assembleia municipal não tome idêntica posição e queira manter uma situação de completa ilegitimidade, pretendendo exercer funções num mandato que já não é seu? É essa a questão que lhe coloco, Sr. Deputado.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, quero reafirmar o que disse da tribuna: o PSD, pela voz do seu presidente, disse o que tinha a dizer sobre a Câmara Municipal de Lisboa — assumiu as suas responsabilidades e fê-lo com inteira clareza!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — E para ficar claro tudo aquilo que queremos dizer em relação a esta matéria, não vou fugir à sua questão sobre a Assembleia Municipal de Lisboa.
Recordo ao Sr. Deputado António Filipe — que sabe isto tão bem como eu — que os cidadãos de Lisboa votaram para a câmara municipal e para a assembleia municipal, que na Assembleia Municipal de Lisboa não há qualquer problema e que é a lei que determina que eleições intercalares são eleições para o órgão a que dizem respeito.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Essa é a parte jurídica! E a parte política?

O Orador: — Portanto, não vale a pena os senhores insistirem nessa tecla. Nós assumimos, com a coragem que os senhores não tiveram na Câmara Municipal de Lisboa, a clareza política em relação a uma situação, pensando nos lisboetas e em Lisboa. Os senhores andaram, durante um ano e meio, a reclamar eleições — de resto, não olhando para os vossos próprios exemplos… Falei no caso da Câmara Municipal de Setúbal e esse caso está na cabeça de toda a gente. Os senhores substituíram um presidente de câmara, puseram, ao arrepio do voto que tiveram nas eleições, uma outra presidente de câmara no seu lugar e agora estão a tentar confundir essas situações.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O voto foi na lista!

O Orador: — Nós não vamos por aí! O nosso caminho, como referi, está traçado: é um caminho de clareza política, de credibilidade política e é esse caminho que vamos percorrer!!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, para o CDS, a questão da Câmara Municipal de Lisboa é política e sempre considerámos que não se devia confundir aquilo que é político com aquilo que é jurídico.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Ontem ouvimos o Presidente do PSD considerar esgotada a solução política de 2005 para a Câmara Municipal de Lisboa. Confesso que estranhamos que essa mesma conclusão não seja retirada em relação à Assembleia Municipal!…

Vozes do CDS-PP e do PS: — Muito bem!

O Orador: — O Dr. Marques Mendes escolheu, em 2005, o Prof. Carmona Rodrigues e a Dr.ª Paula Teixeira da Cruz para serem candidatos em Lisboa. Foram candidatos juntos, fizeram campanha juntos e foram a votos juntos. Dizer-se, como foi dito ontem, que a solução estava esgotada e não retirar essa mesma conclusão para a Assembleia Municipal é não perceber o que está em causa na política.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — O que está em causa é a sinceridade e a autenticidade da solução apontada ontem pelo Presidente do PSD.
Sr. Deputado Miguel Macedo, confesso que estranho ainda uma outra coisa: ontem, falou o Sr. Presidente do PSD, hoje falou o Sr. Secretário-Geral do PSD, mas ainda ninguém ouviu falar o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Prof. Carmona Rodrigues!… Sr. Deputado Miguel Macedo, considero isso estranho, pois era natural que ele já tivesse falado… Sr. Deputado, para sermos consequentes com aquela que foi a declaração de ontem do Presidente do

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PSD, a única solução que existe é haver também eleições para a Assembleia Municipal. É que só assim se refaz uma nova legitimidade em Lisboa.
Ora, mais tarde ou mais cedo, o que vai acontecer, se houver eleições para a Câmara Municipal e se não houver eleições para a Assembleia Municipal, é um conflito institucional e esse conflito institucional vai fazer com que seja impossível resolver os problemas dos lisboetas.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Tenho a noção de que está na mão do PSD resolver este problema em relação à Assembleia Municipal. Por isso, lanço esse apelo para que seja feita uma verdadeira clarificação. Ora, essa verdadeira clarificação significa que para os dois órgãos das autarquias é necessário que haja uma devolução do poder e da voz aos lisboetas.
Fazer como agora se está a tentar fazer, fingir que já nem se conhece o Prof. Carmona Rodrigues, é tentar esconder dos lisboetas uma situação absolutamente insustentável a que chegou a Câmara de Lisboa por responsabilidade única e exclusiva do PSD.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Carlos Monteiro, quero ser muito directo nesta matéria. Havia problemas na Câmara Municipal de Lisboa, problemas esses que tinham a ver com a capacidade política de fazer uma governação como a que os lisboetas exigem e a cidade reclama.
Nós assumimos com clareza as nossas posições em relação a essa matéria.
Sr. Deputado, pelo caminho da sua argumentação, daqui a pouco estaríamos a pedir eleições não só para a Assembleia Municipal como para todas as juntas de freguesia, porventura para a Assembleia da República…

Protestos do PS e do CDS-PP.

… e chegaríamos, talvez, ao Presidente da República! Sr. Deputado, aquilo que o espanta é uma realidade com que muitas autarquias de todo o País convivem todos os dias.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): —Exacto!

O Orador: — Ou seja, há uma maioria para a Câmara Municipal e há uma maioria diferente para a Assembleia Municipal.

Protestos do PS e do CDS-PP.

Os Srs. Deputados não se lembram, mas no último mandato havia uma maioria diferente na assembleia municipal daquela que existia na câmara municipal,…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): —Exacto!

O Orador: — … e nem por isso a câmara municipal deixou de funcionar e de trabalhar!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não é esse o problema!

O Orador: — O que aconteceu nesta Câmara Municipal foi uma obstrução permanente dos partidos da oposição que inviabilizaram a capacidade de fazer aquilo que era preciso fazer para Lisboa.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Responsabilidade do PSD!

O Orador: — Portanto, essa é uma falsa questão! Essa situação é uma situação que todos os dias ocorre em tantas e tantas autarquias deste País. É porque — e o Sr. Deputado bem sabe — a legitimidade que decorre do voto directo dos que estão na Câmara Municipal é uma legitimidade diferente daquela que decorre também do voto directo dos que estão na Assembleia Municipal. Confundir isto é apenas isso: confusão!

Aplausos do PSD.

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O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Quem considera esgotada essa solução é o Presidente do PSD!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado, V. Ex.ª começou por afirmar que o percurso do PSD tem sido, neste caso, inabalável. Quero começar por lhe dizer, Sr. Deputado, que o felicito por ter conseguido dizer isso sem se rir!

Risos do PS.

É porque penso que os cidadãos portugueses que estão lá fora a ouvir esse discurso ter-se-ão certamente rido…! Percurso inabalável, Sr. Deputado? O PSD assistiu à queda, um por um, dos seus principais vereadores. O PSD foi vendo a situação da Câmara Municipal de Lisboa a degradar-se…, a situação das finanças da Câmara Municipal de Lisboa a degradar-se… É esse o percurso inabalável que o Sr. Deputado encontra no PSD?!

Protestos do PSD.

Sr. Deputado, acha que é um sinal de coragem vir aqui, ao Parlamento, atirar a responsabilidade pela situação em que vive a Câmara Municipal de Lisboa aos partidos da oposição, quando todos sabemos, inclusive o líder do seu partido, que a responsabilidade pela situação catastrófica da Câmara Municipal de Lisboa é do PSD?!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — É mentira!

O Orador: — Considera que isso é um sinal de coragem, Sr. Deputado?! Não é um sinal de coragem!! O PSD deveria assumir todas as responsabilidades por aquilo que se passa na Câmara Municipal de Lisboa e não está a assumir essas responsabilidades. Mais, Sr. Deputado: deveria tê-lo feito mais cedo! Sr. Deputado por que razão o PSD demorou tanto tempo? Por que é que deixou que a situação se degradasse, mês após mês, sem tomar qualquer atitude como aquela que está a tomar agora?

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — E o que é que disse o cabeça de lista de Lisboa?!

O Orador: — O Sr. Deputado procurou aqui dizer-nos que a situação é exactamente igual quando os cidadãos que votam simultaneamente para uma assembleia municipal e para uma câmara municipal decidem que a assembleia municipal deve ter uma maioria diferente daquela que está na câmara municipal e que isso é igual a obrigar os cidadãos a escolher uma solução para a câmara municipal e ter de conviver com uma assembleia municipal que pode obstaculizar essa mesma solução política para a câmara municipal.
O Sr. Deputado considera que isso são coisas exactamente iguais?… O Sr. Deputado não considera que isso, sim, revela falta de coragem do PSD? Não considera que isso, sim, revela que o PSD está agarrado ao seu poder na Câmara Municipal de Lisboa e na Assembleia Municipal de Lisboa? O Sr. Deputado não considera que essa solução de eleições intercalares visa hipotecar, tutelar uma solução política, que o Sr. Deputado já reconheceu que vai ser com uma nova maioria na Câmara Municipal de Lisboa, através de uma Assembleia Municipal que foi eleita para outra maioria? Não considera que isso é antidemocrático, Sr. Deputado?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Vitalino Canas, quero fazer um primeiro registo: sobre Oeiras e a estranha cumplicidade do Partido Socialista, nem uma palavra!

Vozes do PSD: — Zero!

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O Orador: — Sobre Oeiras e os interesses delicados que juntam o Partido Socialista à maioria da Câmara Municipal, nem uma palavra! Registo isso.
Julgo que essa «finta» que tentou fazer a debater estas questões, que são questões importantes porque têm a ver com a credibilidade da democracia, da qualidade da nossa democracia, diz tudo da posição do Partido Socialista.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Muito bem!

O Orador: — E repetem, neste momento, aquilo que o Partido Socialista andou a fazer durante um ano e meio, ou seja, reclamando todos os dias eleições, mas todos os dias, sendo incapaz de dar o passo que a coragem política reclamava, que era assumir no local próprio, na Câmara Municipal, a responsabilidade decorrente daquilo que era aparentemente a sua posição política.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Portanto, Sr. Deputado, vai ouvir aqui outra vez: aquilo que os senhores estiveram a fazer neste mandato da Câmara Municipal de Lisboa, aquilo que o senhor aqui fez agora mesmo, foi pura hipocrisia política! Repito: pura hipocrisia política!!

Aplausos do PSD.

O que os senhores estiveram a fazer até hoje foi um mero jogo que se basta com os puros interesses partidários, mais nada do que isto. Os senhores não olharam um minuto para os lisboetas; os senhores não olharam um minuto para o interesse da cidade de Lisboa; os senhores estiveram numa atitude permanente de obstrução, de maledicência e de tentar enganar os cidadãos com manobras políticas que todos os dias mais não faziam do que impedir o trabalho de uma Câmara Municipal.
Sr. Deputado, termino como comecei: espero que até ao fim deste debate possamos ouvir de si ou de alguém dessa bancada algo sobre aquilo que se passa em Oeiras!

Vozes do PSD: — Exactamente!

O Orador: — É que as acusações ficaram ali feitas. E o silêncio comprometido que o senhor teve na sua intervenção basta-me para confirmar aquilo de que há muito suspeitava.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, a sua intervenção é uma intervenção de desespero depois do «naufrágio» em que o Partido Social-Democrata deixa a Câmara Municipal de Lisboa O Sr. Fernando Rosas (BE): — Muito bem!

O Orador: — Quase não merecia comentário, porque só poderia merecer da nossa parte comiseração, pois é essa a situação de caos. Até o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa perderam pelo caminho…!

Aplausos do BE.

Portanto, vêm aqui, a esta Câmara, quase num acto de contrição, responsabilizar, tentar enlamear todas as bancadas. Mas eu devo responder-lhe, porque acusou claramente o meu partido de um conjunto de falsidades.
Em primeiro lugar, o Vereador Sá Fernandes não embargou a obra do túnel do Marquês, esse «monumento do santanismo» ao regime. Foi o tribunal que embargou!!

Vozes do BE: — Exactamente!

O Orador: — E em boa hora o embargou por sete meses, num atraso de mais dois anos que ainda não terminou, porque a obra ainda não terminou, como se sabe!! Para quê? Para que houvesse um estudo de impacte ambiental e fossem introduzidas melhorias no túnel que muito valeram para a sua segurança!

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O Sr. Deputado Miguel Macedo é contra a segurança rodoviária para a segurança dos cidadãos e é a favor dos «pontos negros» da capital, nem que isso seja manobra de manipulação política da sua parte e do seu partido!

Vozes do BE: — Muito bem!

O Orador: — Outras falsidades, Sr. Deputado Miguel Macedo: o Bloco de Esquerda nunca pediu a suspensão de qualquer vereador por ser constituído arguido — nunca, jamais em tempo algum!! — e apenas o faz quando são acusados. Desafio-o a apresentar uma única prova acerca disso! Na Câmara Municipal de Lisboa não pedimos a suspensão de um único vereador, pedimos sempre eleições intercalares! Porquê? Porque quando se rompeu a coligação PSD/Partido Popular não havia mais condições de governabilidade na Câmara Municipal de Lisboa. A Câmara era um caos, tinha-se transformado num imenso «Parque Mayer», não tinha qualquer credibilidade. Queríamos eleições, não pedimos a suspensão de qualquer vereador! Não estamos a pedir a suspensão do mandato do Presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Rio, que está constituído arguido. Nós ouvimos bem ontem as palavras do presidente do seu partido, que disse que o Partido Social-Democrata não pede a suspensão de mandatos de presidentes de câmaras municipais por «casos menores», como é o caso do Dr. Rui Rio. Também é o caso da Presidente da Câmara Municipal de Salvaterra de Magos, que é acusada com base numa denúncia anónima, não está acusada e apenas corre uma investigação — aquilo de que é denunciada é absolutamente risível! Quer comparar o caso Bragaparques e todo o imbróglio da Câmara Municipal de Lisboa com a circunstância de o Dr. Rui Rio ter sido constituído arguido por não ter aceite um parecer do IPPAR ou de qualquer outro acto administrativo?!…Quer comparar?!… Não tem comparação possível!! Sr. Deputado Miguel Macedo, essa tentativa póstuma de o Partido Social-Democrata se transformar num «poço de virtudes» é verdadeiramente a anedota do ano!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, o senhor quis aqui reescrever a história do último ano e meio!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — O senhor é que mente!

O Orador: — O senhor quis aqui reescrever a história do último ano e meio porque, afinal, tudo aquilo que os lisboetas e os portugueses foram vendo em todos os telejornais não aconteceu! Tudo aquilo que ouvimos do vereador do Bloco de Esquerda na Câmara Municipal de Lisboa nunca aconteceu!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — É uma falsidade!

O Orador: — Ó Sr. Deputado Luís Fazenda,…

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Não minta!

O Orador: — Sr. Deputado Luís Fazenda, vai ouvir até ao fim, vai ouvir até ao fim!! O senhor quer reescrever a história daquilo que se passou num ano e meio na Câmara Municipal de Lisboa. Agora, os senhores nada têm a ver com a questão do túnel e a paragem das obras!

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Temos, mas pelos melhores motivos!

O Orador: — Não têm nada a ver… Portanto, somos nós que pairamos neste mundo e que de repente descobrimos uma coisa dessas.
Ó Sr. Deputado Luís Fazenda, eu percebo a sua indignação. O senhor está mesmo indignado, mas sabe porquê? Porque o senhor não respondeu em Salvaterra de Magos com os princípios que diz defender em todos os outros sítios. Essa é que é a grande questão, Sr. Deputado!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Isso é falso! É mentira!

O Orador: — E o senhor tem de ouvir isto. Pode doer, mas tem de ouvir isto!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Peça a suspensão do mandato do Dr. Rui Rio!

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O Orador: — Sr. Deputado, não confunda coisas!

Vozes do PS e do BE: — Ahhh…!

O Orador: — O Sr. Deputado acabou de dizer que ouviu ontem com atenção o presidente do meu partido.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Pantominices!

O Orador: — O que tínhamos a dizer sobre esta matéria repetimos ontem, nem sequer o dissemos pela primeira vez. Como tal, o Sr. Deputado, que sabe ouvir e ler, percebeu tudo o que ontem repetimos outra vez. Era isto que lhe queria dizer!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do CDS retoma hoje o debate sobre um dos temas que mais preocupa os portugueses, a fiscalidade.
Como primeiro princípio, afirmamos como claro que os impostos das pessoas singulares e empresas devem ser pagos pela totalidade ao Estado, mas também consideramos evidente que essa cobrança tem de ser feita de uma forma proporcional e adequada, respeitando direitos essenciais dos cidadãos e a saúde da nossa economia.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — O combate à fraude e à evasão fiscais é um objectivo nacional. Os resultados dos últimos cinco anos devem ser aplaudidos, mas hoje é altura de se questionar se os portugueses não estarão perante uma situação de saturação, devido ao aumento da carga fiscal a que se junta uma submissão a expedientes legais que criam uma situação próxima do servilismo perante o Estado para as empresas e os cidadãos.
É, então, essencial que sejam vistos alguns exemplos desta relação entre «David e Golias». O primeiro exemplo é o seguinte: com o Orçamento para 2007, o Governo propôs (e a maioria fielmente aprovou) o fim do regime de caducidade das garantias prestadas em caso de apresentação de reclamação ou impugnação judicial. Isto é, na era anterior ao Governo do PS as garantias que os cidadãos eram obrigados a prestar em caso de litígio tinham um limite temporal. Acabado o prazo, deixavam de se ser obrigatórias. Hoje não! As garantias e o pagamento de juros mantêm-se até que a questão seja resolvida; ou seja, demore 1, 10 ou 20 anos a ser resolvida a questão — muitas vezes a favor dos contribuintes —, a obrigação de garantia e os seus custos acompanham as empresas e cidadãos no seu calvário.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Para quem se diz defensor da competitividade, não está nada mal! É caso para dizer que o «olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço» se tornou bem actual e tem um moderno tom cor-de-rosa, que esconde o vermelho das medidas…

Aplausos e risos do CDS-PP.

Passo ao segundo exemplo, o das doações de valor inferior a 500 € e que sejam consideradas normais de acordo com os usos sociais. De acordo com a lei, essas doações são isentas de imposto, mas a mesma lei determina uma obrigação de comunicação que, a não ser cumprida, constitui um ilícito. Ora, pretende a Administração aplicar esta disposição que tem sido — e bem! — considerada letra morta. Está a abrir-se, com a conivência e o silêncio da bancada do Partido Socialista, todo o caminho para a «coscuvilhice» fiscal sobre as relações mais normais entre pessoas, muitas vezes da mesma família.
Por que razão não se termina com este abuso? Conseguirá qualquer máquina fiscal controlar todos os milhares de movimentos que todos os meses estão em causa? Parece evidente que não! Por isso mesmo, este absurdo tem de ser denunciado e alterado: deixemos que, com toda a tranquilidade, se continuem a pagar mesadas e estudos de familiares ou a fazer pequenos empréstimos entre amigos sem que o Estado tenha de se intrometer!! Aqui temos mais um exemplo com que toda a certeza concordam os Srs. Deputados do Partido Socialista, pelo menos os que têm bom senso.

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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — O terceiro exemplo é o da excessiva mobilidade das nossas leis, que de forma constante e infelizmente rotineira são alteradas. Todos os anos as formas de cálculo dos principais impostos são modificadas. Não existe qualquer estabilidade. Vivemos uma situação de constante devir fiscal. O abismo pela mudança é tal que temos conhecimento de queixas de contribuintes que diligentemente tentam calcular o seu imposto imobiliário e notam que a fórmula de cálculo presente na página de Internet das entidades oficiais não corresponde à fórmula legal entretanto alterada. É o chamado «cálculo histórico». E o que seria se não tivesse havido alteração? É caso para dizer que, em Portugal, os cidadãos têm de sofrer. É caso para dizer que o cálculo não é sobre o imposto a pagar mas, sim, sobre o imposto que se pagava.

Aplausos do CDS-PP.

O quarto e último exemplo, aparentemente, passou desapercebido, mas não deixa de ser bem demonstrativo da predação a que os cidadãos vão sendo sujeitos.
Foi assumido — e bem! — o objectivo de combate à fraude e à evasão fiscais no sector da construção civil, especialmente sentidas no caso do IVA. Por isso se entendeu que seria necessário mais controlo.
Assim, entendeu o legislador, e explicou depois a Administração, que a liquidação do IVA nos serviços de prestação de construção civil passava a ser responsabilidade do adquirente. Deste modo, quem contrata uma obra em casa, entrega parte do preço ao empreiteiro e a outra parte ao Estado. Passa a ter mais trabalho e hipótese de responsabilidade. Aqui temos uma situação em que um bom objectivo não é prosseguido de forma adequada.
Antes, o Estado controlava apenas as empresas de construção civil. Agora, passam a estar em causa o Zé, a Maria, o Luís, o Manuel…, a empresa de seguros, a empresa têxtil, a clínica, a sociedade de advogados… e, enfim, todos os sujeitos passivos de IVA que tenham direito a dedução! Assim será sempre que estejam em causa obras de remodelação, manutenção, conservação e demolição de bens imóveis em regime de empreitada. A lista de obras a que se aplica a regra de inversão inclui, entre outras: as pinturas, estuques e outros revestimentos; construção, reparação e pinturas de estradas ou caminhos; serviços de canalização e pichelaria; construção, montagem, e reparações de linhas eléctricas; drenagens ou construção de parques de estacionamento; e construção e reparação de linhas férreas. Como se pode ver, são todas obras muito parecidas…! Agora, sujeitos passivos de IVA, é simples: quando tiverem uma obra a fazer só têm de pagar ao empreiteiro, entregar o imposto ao Estado, receber a factura em que se diz «IVA devido ao adquirente» e rezar para que não haja nenhum problema pelo qual possam ser responsabilizados perante a Administração!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — O princípio da colaboração dos particulares com a Administração passa ser uma espécie de serviço gratuito a prestar. Temos agora o «serviço militar fiscal» em pleno séc. XXI!! Hoje, os portugueses têm taxas de imposto mais altas, mais desproporcionadas e, enfim, mais injustas.
O combate a esta situação será uma prioridade do CDS. Não terão, da nossa parte, tréguas. Queremos um verdadeiro Estado que faça uma boa cobrança dos seus impostos, mas que o faça com mais justiça e respeito pelos cidadãos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, a sua intervenção teve dois momentos diferentes: o primeiro, em que reconhece e aplaude o trabalho realizado pelo Governo no que respeita ao combate à fraude e à evasão fiscais, e o segundo, que nos deixa com muitas dúvidas. Digo-o porque, no final da sua intervenção, o Sr. Deputado parece não estar preocupado com o facto de o cidadão, em muitos casos, pagar os impostos sem que o Estado os receba.
O Sr. Deputado foca o problema do IVA especificamente no sector da construção civil, mas sabe tão bem quanto nós que há, nesta matéria, uma particularidade que distingue este sector de outros. O passo ainda não foi dado, mas parece-me óbvio que alguma coisa de diferente terá de fazer-se. O que me parece irrazoável e inaceitável é que um cidadão pague os seus impostos e, muitas vezes, o Estado não os receba. Ora, essa deveria ser a preocupação do Sr. Deputado.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

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O Orador: — Depois, V. Ex.ª fala ainda de «coscuvilhice» em matéria fiscal… Mas o Sr. Deputado não defende a transparência fiscal nestas matérias?! Há alguma razão para que o cidadão em geral não seja conhecedor de tudo o que se passa em termos fiscais? «Quem não deve, não teme!» Ora, quem não teme não tem receios! De todos os modos, já tinha sido óbvio, quando discutimos o sigilo bancário, que o CDS tinha muitas reservas nesta matéria. Enquanto maioria, entendemos que demos o passo certo, até porque a iniciativa que apresentámos foi, na Comissão de Orçamento e Finanças, aprovada com o apoio dos partidos da oposição. Curiosamente, o CDS agora, de forma indirecta, acaba por entender que há «coscuvilhice» quando a administração fiscal quer que haja transparência, justiça e equidade fiscal entre os cidadãos…! O Sr. Deputado, por fim, fez uma referência ligeira e indirecta à carga fiscal. É evidente, todos o reconhecemos, que há carga fiscal em Portugal, mas ela existe numa situação de dificuldade e pretende resolver os problemas graves do País. Como tal, no momento próprio, quando for adequado e o País o permitir, garantidamente essa carga fiscal será desagravada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Victor Baptista, entendamo-nos sobre um conjunto de matérias, a primeira das quais relativa à carga fiscal. V. Ex.ª deve aceitar que, se há bancada que tem falado desta matéria de forma séria, é a do CDS.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — O que não queremos, contudo, é que a gestão orçamental seja feita de modo a permitir a redução dos impostos em anos de eleições, porque os impostos não estão dependentes de actos eleitorais!!

Aplausos do CDS-PP.

Esta é a primeira matéria que queremos que fique muito clara, porque acima das eleições que o Partido Socialista quer ganhar está o País. Não haja sobre isto qualquer espécie de dúvida! Sobre as matérias de que falei mais desenvolvidamente nesta minha intervenção, queria analisar, em primeiro lugar, a questão do IVA. Neste aspecto, até lhe digo quais os sectores em que tem de existir uma intervenção especial no que toca ao combate à fraude e à evasão fiscais. Trata-se, de facto, da construção civil, das sucateiras e da restauração. Estas são as áreas em que existe, de acordo com os dados disponíveis, alguma fuga aos impostos.
Mas, se estamos a favor do combate a essa fuga, não aceitamos medidas que sejam desproporcionadas. Ora, o que se determina é que empresas e cidadãos que tenham trabalho independente façam retenção na fonte, entregando-a ao Estado. Sabe o que é que vai acontecer? É que se antes a Administração tinha controlo sobre umas centenas de empresas, controlo mais fácil de fazer, agora tem de controlar milhares de contribuintes que, ainda por cima, podem ser responsabilizados.
A questão é tão simples como este exemplo, Sr. Deputado: se V. Ex.ª tiver um problema na canalização de sua casa e for trabalhador independente tem de fazer retenção na fonte do imposto e de entregar essa quantia ao Estado. Pensa que isto é razoável? Pensa que seria razoável, para combater a fraude e a evasão fiscais em relação ao sector da restauração, dizer que sempre que um trabalhador independente se deslocasse a um estabelecimento daquele sector se passasse a fazer retenção na fonte sobre o seu almoço ou o seu jantar?! Isto é completamente absurdo, Sr. Deputado!! É precisamente por isto que esta medida é contrária aos seus objectivos, prejudicando, para mais, os cidadãos na sua vida! Isto é que nos preocupa! No que toca à «coscuvilhice», não confunda sigilo fiscal com sigilo bancário!! O Sr. Deputado sabe o que dissemos no debate de que falou e sabe o apoio que demos em relação a algumas matérias! Mas, para nós, se é muito importante o combate à fraude e à evasão fiscais, também é muito importante no Parlamento a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. É para isso que aqui estamos, Sr. Deputado!

Aplausos do CDS-PP.

E é para atingir a situação de equilíbrio em relação a essa matéria que queremos actuar.
Por outro lado, em relação a situações em que há isenções de imposto, não compreendemos por que é que existe a obrigação de comunicação sobre coisas tão simples como uma mesada ou uma pequena doação feita a um familiar.

Aplausos do CDS-PP.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não se pode dizer que o XVII Governo do PS desiste ou vai desistindo da agricultura, porque tudo indica estar objectivamente apostado na «liquidação» da agricultura portuguesa. É uma ofensiva poderosa e em todas as frentes. Se, como dizia Galbraith, não há país sem agricultura, Portugal está a caminho de se tornar um «não País»! Em primeiro lugar, uma ofensiva com toda a aparência de «batalha final» para a exterminação total da pequena agricultura, da agricultura familiar. Bastaria destacar a justificação que o Sr. Ministro da Agricultura deu em Março sobre a eliminação das indemnizações compensatórias para explorações com menos de 1 ha.
Repetindo fórmulas do passado, usando e manipulando tecnocraticamente os conceitos de competitividade e de qualidade, ocultando ou fazendo que não vê a complexidade do tecido socio-económico agrícola e rural, reduzindo todas as explorações agrícolas a um estatuto único de empresas produtoras de bens alimentares para o mercado, o Governo aposta numa deliberada política de liquidação da pequena agricultura.
Depois da «liquidação» estatística de há uns anos, aquela estratégia está presente em força no Plano de Desenvolvimento Rural: nos modelos das ajudas; na eliminação das medidas agro-ambientais policulturais e tradicionais e na redução substancial das ajudas a algumas raças autóctones.
Trata-se de medidas agro-ambientais, que, contrariamente ao que o Governo declarou em Março e Abril de 2006, não entrarão em vigor a 1 de Janeiro de 2007, o que significa três anos — 2005, 2006 e 2007 — sem essas ajudas.
Quando o Governo vem dizer que dará, ainda este ano, um adiantamento de 60% ou de 70% está já a falar relativamente a possíveis candidaturas para 2008! Aquelas opções estão presentes na sobranceria tecnocrática com que se responde ao problema da exclusão de mais de 30% dos produtores de azeite e azeitona dos pagamentos complementares de ajudas! Aquelas opções estão presentes na forma de abordagem do combate ao nemátodo do pinheiro, com uma intervenção burocrática e tecnocrática na concretização de uma faixa de contenção, com editais desadequados, atrasos e prazos inaceitáveis, informação insuficiente e onde pesará, inevitavelmente, a falta de recursos humanos da Direcção-Geral dos Recursos Florestais! Aquelas opções estão presentes na insensibilidade perante a sistemática «expulsão» de centenas de agricultores e agricultoras do sistema público da segurança social e na abordagem do cumprimento pelas pequenas e médias explorações e instalações pecuárias de exigências ambientais.
Mas a ofensiva não se dirige apenas à pequena exploração. Também as ditas viáveis, — pelo menos até agora — estão em risco, sendo cada vez menos viáveis. Basta ver o que sucede com as explorações leiteiras crescentemente entaladas entre os preços em baixa do leite e os preços em alta dos factores de produção.
Mas há, na presente situação da agricultura portuguesa, três questões que merecem destaque.
A «reestruturação» em curso do Ministério da Agricultura e o «despedimento» de 3 500 funcionários, novos e velhos, com qualificação e sem qualificação, escolhidos sem qualquer critério, lógica ou racionalidade, colocados no quadro da «mobilidade», porque tem que ser, assim o obriga o Pacto de Estabilidade e Crescimento e a vontade neoliberal do Governo de privatizar serviços públicos.
Atente-se no problema do IFADAP. Como é que se avança no desmantelamento de um organismo com o «normativo de decisão certificado» pela Comunidade de entidade pagadora sem se ter construído uma alternativa igualmente certificada? Qual é a situação no presente momento? Alguém do Governo saberá? O que acontecerá às centenas de processos de projectos em avaliação e decisão? Novos atrasos de meses e meses na aprovação e pagamento! Vai reduzir o pessoal do IFADAP?! Mas um relatório da Inspecção-Geral de Finanças dizia que o IFADAP tinha falta de pessoal! Será que vai acontecer aqui o que já aconteceu nos serviços do Ministério da Agricultura em Braga, em que quatro trabalhadores, depois de receberem de manhã a notificação da sua colocação na lista de mobilidade, à tarde e no dia seguinte já estavam a ser contratados por uma empresa alugadora de mão-de-obra para ficarem a trabalhar no mesmo local e a exercer as mesmas funções?! Atente-se no problema das coudelarias nacionais. A Coudelaria Nacional do Vale de Santarém, integrada na Estação Zootécnica Nacional, vai fechar em Julho e os seus serviços vão ser transferidos para Alter do Chão e esta já tinha sido «desclassificada administrativamente» e integrada organicamente na Companhia das Lezírias, em Santarém! Que sentido isto tem? A de Alter, afirmou por escrito e por boca o Sr.
Ministro, não sofreria com a mudança orgânica nenhuma alteração no seu estatuto público. Agora sabe-se, veio nos jornais sem desmentido, que a Companhia das Lezírias era apenas para assegurar «transitoriamente o desenvolvimento do processo» a caminho de parceiros privados (Banco Espírito Santo, Rui Nabeiro ou José Roquette) para concessão da gestão! Atente-se no problema dos laboratórios do Ministério da Agricultura. Afinal, tudo se resume à privatiza-

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ção dos serviços prestados à agricultura… Depois, hipocritamente, fala-se da concentração da atenção do Estado na «investigação fundamental». Um escândalo no escândalo do desemprego pelo Estado de técnicos qualificados e competentes, no escândalo da venda do valioso património imobiliário, e quantas vezes histórico, de edifícios públicos, para respeitar o Pacto de Estabilidade e Crescimento e o capital privado! A segunda questão, a dos processamentos do regime de pagamento único, é não só um bom exemplo das orientações políticas do Governo como do completo «autismo» do Ministro e do Ministério ou de como o Simplex é um objectivo «complex»! Depois do arranque simbólico e solene — com Ministro, televisão e tudo —, no dia 2 de Abril, do novo sistema informatizado — o IDigital, on line — para a recepção das candidaturas, e na ausência de um prévio ensaio a garantir o seu funcionamento, verifica-se que nada se encontra ainda operacional, em condições aceitáveis e em todo o País, para desespero das associações agrícolas e agricultores.
Estão em causa valores na ordem dos 600 milhões de euros de ajudas e quase 300 000 agricultores.
O que está a acontecer não resulta da falta de alertas atempadas de diversas organizações agrícolas ao Governo.
A terceira questão é a da nova Lei Orgânica do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto. À «boleia» do PRACE e da reestruturação do Ministério da Agricultura, o Governo resolveu «pôr a cereja em cima do bolo» em toda a Região Demarcada do Douro. Isto é, «liquidar» o interprofissionalismo, também à «boleia» do qual — recordemos — sucessivos governos retiraram atribuições e competências à Casa do Douro, atirando-a para o fosso financeiro em que ela hoje se encontra.
O Decreto-Lei n.º 47/2007 procede a uma verdadeira reconfiguração do IVDP, que esquece a sua história institucional recente, como resultado da incorporação da Comissão Interprofissional da Região Demarcada do Douro (CIRDD) com o Instituto do Vinho do Porto (IVP), passando a revestir a natureza de organização interprofissional.
Salientam-se como aspectos negativos da alteração a não audição das profissões, a sua transformação num órgão desconcentrado e governamentalizado do Governo, a perda de poderes do Conselho Interprofissional e o agravamento dos défices de democraticidade e representatividade dos 30 000 vitivinicultores da Região Demarcada do Douro.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora apenas tenham decorrido três anos, como vai longe — é a longa distância da oposição ao Governo — o debate, ocorrido a 21 de Janeiro de 2004, nesta Assembleia da República, relativo à apreciação do Decreto-Lei n.º 278/2003, que então aprovou a orgânica do IVDP [apreciação parlamentar n.º 62/IX].
Como foram rapidamente «varridas» — realço a pouca durabilidade da memória do Deputado da oposição quando feito Secretário de Estado — as sábias palavras do então Deputado Ascenso Simões sobre a tentativa do governo de então de «controlar a nova administração do IVDP», de limitar «a actuação das «profissões», sobre o escândalo de se acabar com o «equilíbrio institucional no Douro» (será que agora se recuperou?), ou ainda a situação «incrível» das «profissões», através do Conselho Interprofissional, não se tendo aprovado nem «o plano de actividades nem o orçamento» da instituição. E agora, aprovam, Sr.
Secretário de Estado e Srs. Deputados do Partido Socialista?!… Mais uma vez o PS diz uma coisa na oposição e faz outra no governo! Mas — sublinhe-se — vai mais longe do que tudo o que teriam sonhado os governantes de então! Esta política agrícola não serve! É uma praga, uma filoxera, um nemátodo, um escaravelho, a corroer o que ainda resta da agricultura e dos agricultores em Portugal! Logo, não serve nem interessa ao País que ainda é Portugal!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Jorge Almeida e Abel Baptista.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Almeida.

O Sr. Jorge Almeida (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, ao ouvir o seu discurso, se o avaliasse apenas pela forma, pela convicção das suas palavras, pela sua pretensa generosidade e não ligasse ao conteúdo, era levado a solidarizar-me com o mesmo. Mas, Sr. Deputado, o conteúdo é uma coisa, a forma é outra. É mentira e não vale a pena repetir permanentemente as mentiras.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O que é que é mentira?

O Orador: — É mentira que a Lei Orgânica do IVDP tenha «liquidado» o interprofissionalismo, Sr. Deputado! Apresente-me aqui uma única competência que tenha sido retirada do interprofissional na actual Lei Orgânica… Se o Sr. Deputado não concorda com um modelo que passou de uma direcção de três elementos para dois, pode invocar essa discordância, argumentá-la e é natural que o faça. O que não pode dizer, porque é mentira, é que o interprofissionalismo foi esvaziado e alterado no seu conteúdo. Nem uma alínea foi alterada e eu convoco o Sr. Deputado a dizer o contrário: qual a competência que o interprofissional perdeu na

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actual Lei Orgânica, Sr. Deputado? É mentira que o combate ao nemátodo do pinheiro se tenha transformado num combate estéril ou não profícuo, Sr. Deputado! Desde 2000/2001 que a situação estava identificada e qual foi o Governo que fez o diagnóstico, que preparou os instrumentos para resolver o problema do nemátodo, que criou a «zona tampão» e a faixa de contenção, Sr. Deputado?! O senhor pode dizer que os editais não foram bem colocados ou que a informação não chegou a todos os agricultores, mas está continuamente mal informado, pois o combate ao nemátodo do pinheiro é um êxito no nosso país, Sr. Deputado.

Risos e protestos de Deputados do PSD.

É mentira que as medidas agro-ambientais não venham a ter este ano cobertura e apoio financeiro, pois isso vai acontecer a partir de 1 de Janeiro, tal como o Sr. Ministro aqui o prometeu e tal como está a decorrer nas candidaturas.
Há algum atraso nas candidaturas? Há, sim, Sr. Deputado! Mas, se a via electrónica não está a funcionar bem há outras soluções, há outros procedimentos. As medidas agro-ambientais vão ser correspondidas correctamente no actual sistema, tal como aqui o garantiu o Sr. Ministro.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de terminar, senão ser-lhe-á desligado o microfone.

O Orador: — Sr. Presidente, vou já acabar dizendo ao Sr. Deputado que, quanto às indemnizações compensatórias abaixo de 1 ha, as candidaturas passarão a ser feitas em agrupamento, e as cooperativas vão fazê-lo…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Como já tinha alertado, o seu tempo terminou há muito, Sr. Deputado.

Aplausos do PS à intervenção do Deputado Jorge Almeida.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, ainda bem que trouxe a debate a questão da agricultura portuguesa.
V. Ex.ª referiu duas matérias extremamente importantes. Aliás, o Sr. Deputado do Partido Socialista acabou por questioná-lo e por contrariá-lo mas, lamentavelmente, não apresentou dados para o fundamentar e eu ficaria muito satisfeito se o Sr. Deputado fosse contrariado no diagnóstico que fez.
O Sr. Deputado falou nas candidaturas e algumas delas terminaram na passada segunda feira sem que muitos agricultores as pudessem efectuar. Já questionámos o Governo no sentido de saber como é que vai resolver esta questão porque o IDigital, um tão apoiado programa informático, iria permitir as candidaturas on line a partir da própria residência do agricultor e acaba por não ser possível fazê-lo nem da sua residência, nem da sua organização profissional nem da sua cooperativa nem de qualquer outro local.
Sr. Deputado, o que julga V. Ex.ª que irá o Governo fazer, uma vez que, sendo esta regra dos prazos comunitária, o Governo solicitou informalmente autorização para prorrogação do prazo e não a obteve? Entende que os agricultores devem ficar sem apoio ou devem o Governo e o Sr. Ministro da Agricultura ser responsabilizados pela falta de apoio que os agricultores, com certeza, irão ter? O Partido Comunista Português entende que a reestruturação do Ministério da Agricultura deve ser feita no sentido de retirar trabalhadores de locais próximos dos agricultores? Ou deveria ser exactamente o contrário, isto é, no sentido de os trabalhadores que estão nos serviços centrais do Ministério da Agricultura serem colocados próximos dos locais onde os agricultores precisam do seu apoio técnico, por exemplo, no processo de candidatura aos apoios comunitários? Qual é a proposta do Partido Comunista sobre esta matéria, uma vez que o Partido Socialista apenas fez uma defesa muito afincada do Governo, não tendo apresentado propostas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, julgo que o Deputado Jorge Almeida seria mais útil ao Douro, que diz querer defender, se fosse menos cego e menos veemente na defesa seguidista do que faz o Governo.

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Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — O Sr. Deputado, certamente, não leu, mas fazia bem em ler, o debate travado nesta Casa a 21 de Janeiro de 2004, relativo à apreciação parlamentar proposta pelo PS, concretamente as intervenções dos seus então colegas Deputados do Partido Socialista, alguns dos quais actuais membros do Governo.
De facto, a nova Lei Orgânica do IVDP não retira competências ao Instituto. E esse é que é o problema: anteriormente, quem comandava o órgão era o Conselho Interprofissional; com a alteração, passou a ser o Governo, através do Presidente e do Vice-Presidente, nomeados pelo Ministro. É esta alteração que o Sr. Deputado, pelos vistos, não percebe!…

Protestos do Deputado do PS Jorge Almeida.

O Sr. Deputado não percebe o que significou o Conselho Interprofissional passar a ser uma espécie de órgão consultivo do IVDP! O Sr. Deputado ouviu, tal como eu e outros Deputados da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, o que nos foi dito sobre a situação, na recente visita à Azambuja, às freguesias de Manique do Intendente e de Aveiras de Cima. Os que lá estiveram não podem ter quaisquer dúvidas sobre a veracidade do que afirmei.
Mas o Sr. Deputado poderia esclarecer-me acerca das razões porque não funciona, há dois anos, o grupo de acompanhamento do problema criado por lei e porque não há relatórios sobre a situação!

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Em relação às medidas agro-ambientais, sabemos que o Partido Socialista está muito interessado em combater os privilégios e, nesta matéria das agro-ambientais, está, certamente, a combater os «privilégios», por exemplo, daquele agricultor que, em pleno Barroso, tem três ou cinco vacas barrosãs, reduzindo-lhe substancialmente a ajuda e criando até uma diferenciação — não se percebe porquê!?… —, em nome do combate aos «privilégios», relativamente aos seus vizinhos de Montalegre.
Ora, é por este combate aos privilégios que os pequenos agricultores que fizerem investimentos abaixo de 25 000 € só têm direito a juros bonificados, aqueles que fizerem investimentos acima de 25 000 € têm ajudas a fundo perdido. E estes últimos com esta «pequena» diferença: aqueles que fizerem investimentos abaixo de 100 000 € têm 25% de ajudas a fundo perdido; os que fizerem investimentos acima de 100 000 € têm ajudas a fundo perdido de 30% e, ainda, juros bonificados de 30%. É, certamente, o combate aos «privilégios» dos pequenos agricultores portugueses…!!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora, aí está!

O Orador: — Ao Sr. Deputado Abel Baptista começo por agradecer a questão que colocou e dizer que não deve haver quaisquer dúvidas de que o Governo ainda não tornou absolutamente claro que não haverá agricultor português que seja penalizado por algo que é da exclusiva responsabilidade do Governo português. E tudo o que não seja conseguir um prazo de candidaturas até 31 de Julho vai, inevitavelmente, prejudicar a agricultura, os agricultores portugueses e, também, o Estado por responsabilidade única e exclusiva do Governo, que não quis ouvir nenhuma das confederações e associações agrícolas deste país.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Comemora-se hoje o Dia Internacional da Liberdade de Imprensa. Num cenário internacional em que centenas de jornalistas são perseguidos, raptados e assassinados todos os anos, comemorar talvez não seja a palavra mais adequada. Mais do que comemorar o dia de hoje é de alerta. Todos os estudos mais recentes a nível mundial coincidem num ponto: é cada vez maior o número de jornalistas assassinados no exercício da sua profissão.
Ainda ontem, o Secretário-Geral das Nações Unidas, num discurso onde chamou a atenção para os riscos que correm os jornalistas, considerou «alarmante» o exponencial aumento do número de raptos e assassinatos, realçando que isso já não acontece apenas em cenários de guerra, mas, de uma forma cada vez mais frequente, para silenciar notícias incómodas sobre corrupção, abuso de poder ou as degradantes condições laborais em algumas regiões do Globo.
O mensageiro tornou-se o alvo, mas não se tornou o alvo apenas de ditadores e assassinos. Em nome da eficácia no combate ao terrorismo, temos assistido, por parte de um securitarismo que se vem instalando, à lenta mas progressiva erosão das condições do exercício do jornalismo livre e das liberdades indivi-

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duais que pensávamos serem inatacáveis.
Não se julgue, porém, que estas ameaças acontecem apenas em países como a China ou a Rússia.
Nos últimos anos, à sombra desse mesmo securitarismo que se tenta instalar, houve jornalistas processados pela violação de segredos de Estado, ou acusações similares, em países como o Canadá, a Dinamarca, a Alemanha, a Holanda, os Estados Unidos da América, a Suíça ou o Reino Unido.
Também em Portugal existem sinais preocupantes, que se têm adensado a um ritmo cada vez maior nos últimos meses. Comecemos pela oportunidade perdida que foi a criação da «Entidade Reguladora da Comunicação Social». O que poderia ter sido uma instituição reguladora que merecesse a confiança dos profissionais do sector e da opinião pública está paulatinamente a transformar-se naquilo que o Bloco já tinha alertado quando votou contra a sua criação: um órgão de carácter politico — manchado pela nomeação partidária dos seus representantes pelo PSD e pelo PS —, mais interessado na definição de controlos editoriais e noticiosos do que na regulação de um sector fulcral para a democracia.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Orador: — A acção do Governo nesta área não se resume à criação de uma entidade reguladora cujo nome mais correcto deveria ser o de Entidade Controladora da Comunicação Social, fazendo inaceitáveis e inusitadas considerações sobre a linha actual de alguns órgãos de comunicação social que mais parecem ter sido escritos por um qualquer ministro da propaganda.
O Estatuto dos Jornalistas, apresentado pelo Governo e aprovado na generalidade — com o simpático apoio de um PSD que só parece preocupar-se com a liberdade de imprensa nos feriados da República!… —, é o instrumento que faltava para acabar de vez com a incomodidade para quem está no poder que é o jornalismo de investigação.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Votámos contra!

O Orador: — De facto, nunca em Portugal se avançou tão determinadamente na limitação do sigilo profissional e nas ameaças à protecção das fontes. Não é o jornalismo de «sarjeta» — para usar a expressão do Ministro Augusto Santos Silva — que preocupa o Governo, mas, sim, a ideia de que o jornalismo possa ter outra função que não seja a de apresentar as quatro conferências de imprensa, apresentações ou slideshows que o Governo promove por cada medida que toma.
É por isso que um Governo que se encontra tão interessado na limitação do sigilo profissional e da protecção das fontes, há mais de um ano que vai adiando a apresentação de um projecto para limitar a concentração da imprensa, ela sim um sinal preocupante da diminuição do pluralismo informativo e da liberdade dos jornalistas.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Orador: — Será por isso que o mesmo Estatuto pretende conferir poderes disciplinares à Comissão da Carteira Profissional de Jornalista, pondo não só jornalistas, mas os representantes dos patrões dos jornalistas, a aplicar multas pecuniárias aos colegas ou aos subordinados que resolvam condenar.
É aqui, na recusa de um Estatuto dos Jornalistas que menoriza os profissionais e limita as condições do seu exercício profissional, que se joga a defesa do pluralismo informativo e o combate às tentativas de governamentalização, aliás, bem presentes na nova lei da RTP, que retomou várias das disposições mais controversas e autoritárias do governo PSD/PP, nesta matéria.
Mas não é apenas do poder político que chegam as ameaças à liberdade de imprensa. Também do sistema judicial têm chegado sinais preocupantes do entendimento que alguns fazem da liberdade de imprensa e de expressão. Depois do arresto, sem precedentes, dos computadores da um jornal diário, do processo movido contra um jornalista que se recusou a denunciar as suas fontes, o recente acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, ao condenar o jornal Público a uma pesada multa sobre uma notícia (considerada correcta e verdadeira), é um perigoso convite à autocensura e uma forma insidiosa de ir instalando um clima de «respeitinho» e intimidação.
Quando se chega ao ponto em que um acórdão do mais alto tribunal do País considera que uma notícia ser verdadeira é algo de irrelevante e considera que é um dado acessório porque ofende a boa reputação de uma instituição em situação de incumprimento fiscal, pergunta-se qual é o próximo passo. Escondem-se as notícias, mesmo que sejam verdadeiras e de inatacável interesse público? Ou colocam-se advogados a chefiar as redacções? Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A liberdade de expressão e de imprensa, que hoje se assinala por todo o mundo, não é em lado nenhum do mundo um dado garantido, é uma luta diária da cidadania.
Uma luta de vigilância, de crítica, de participação.
No que nos toca, podem estar certos de que o Bloco de Esquerda se não demitirá desse dever.

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Câmara Municipal de Lisboa vive a sua mais grave crise política desde a criação do poder local democrático.
Essa crise tem um responsável e tem um rosto que sobressai sobre todos: o PSD e o seu líder, Dr. Marques Mendes.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!

O Orador: — Essa crise tem-se arrastado penosamente nos últimos meses. A intervenção que o líder do PSD fez ontem à hora dos telejornais foi, por conseguinte, tardia.
Mas, presumindo que o líder do PSD, ao falar antes do próprio Presidente da Câmara, não quis simplesmente actuar como seu porta-voz, a intervenção do Dr. Marques Mendes tem um mérito: reconhece que o seu projecto para Lisboa foi um fracasso e que está pessoalmente envolvido nesse fracasso. Com a sua intervenção, o Dr. Marques Mendes reconhece responsabilidade pela crise na Câmara Municipal de Lisboa.
As escolhas fundamentais que conduziram a esta crise política foram escolhas pessoais do líder do PSD.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!

O Orador: — Foi ele quem escolheu pessoalmente o candidato do PSD a Presidente da Câmara de Lisboa nas eleições autárquicas de Outubro de 2005. Foi ele que ratificou a equipa escolhida para a Câmara.
Foi ele que sancionou a estratégia política que conduziu à ingovernabilidade da Câmara.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Exactamente!

O Orador: — Foi ele que deu assentimento a uma coligação pós-eleitoral com o CDS-PP. Foi ele que provocou a quebra dessa coligação, com intervenção directa e comprovada em nomeações efectuadas pelo Presidente da Câmara de Lisboa. É ele, Marques Mendes, que aparece agora a anunciar eleições intercalares em Lisboa.

O Sr. José Junqueiro (PS): — E nunca foi candidato a nada!

O Orador: — Não sei se o Dr. Marques Mendes vai aceitar o repto que alguns já lhe lançam do interior do seu partido de assumir ele a candidatura à presidência da Câmara de Lisboa nas próximas eleições.
Mas sei uma coisa: mesmo sem ser presidente ou candidato à Câmara, o Dr. Marques Mendes já mostrou um enorme «apetite» para intervir directamente nos assuntos dessa mesma Câmara.

Aplausos do PS.

O Dr. Marques Mendes tem sido verdadeiramente o «Presidente sombra» da Câmara de Lisboa.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Acumulação!

O Orador: — Mas a intervenção do líder do PSD está ferida por um enorme vício político. Sabemos que ela não visa pôr cobro à crise política, à instabilidade, ao descalabro financeiro e à paralisação da Câmara Municipal. Ela visa, sim, pôr cobro ao embaraço do próprio PSD.
O PSD tem neste momento um Presidente de Câmara e um conjunto de vereadores do PSD que constituem um problema.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Exactamente!

O Orador: — O PSD quer simplesmente ver-se livre desse Presidente e desses vereadores. O PSD sente que a sua credibilidade será ainda mais afectada se esses responsáveis políticos permanecerem mais tempo nos respectivos cargos. O PSD quer que se realizem eleições para tirar esses e pôr outros.
Simplesmente isso! Mas o PSD quer a todo o custo conservar um poder efectivo na governação da Câmara, qualquer que venha a ser a vontade dos lisboetas.
O PSD quer que a maioria da Assembleia Municipal, eleita nas suas listas ao serviço de um programa,

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de uma estratégia e de uma equipa, que fracassaram, continue a tutelar qualquer solução e qualquer maioria política que os cidadãos de Lisboa escolherem democraticamente.
O PSD quer ter a certeza de que se os lisboetas escolherem uma nova maioria e um novo projecto para a cidade, esse programa e esse projecto fiquem reféns de uma maioria da Assembleia Municipal escolhida para suportar outro programa e outra maioria já derrotados.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Bem lembrado!

O Orador: — O PSD quer que se mantenha a instabilidade política na Câmara de Lisboa, com uma velha maioria da Assembleia Municipal a obstaculizar um novo governo da cidade.
Confirma-se, assim, o que já sabemos: o PSD é o partido da instabilidade política. O PSD foi o partido da instabilidade política no governo de Portugal, entre 2002 e 2005. O PSD é o partido da instabilidade política na Região Autónoma da Madeira. O PSD tem sido o partido da mais grave instabilidade política na Câmara de Lisboa desde a instauração da democracia. O PSD quer continuar a ser o partido da instabilidade política na Câmara de Lisboa.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Bem lembrado!

O Orador: — A solução que o Dr. Marques Mendes propõe é uma solução que não garante a estabilidade política em Lisboa. Essa solução é, além de mais, uma solução que mostra desconfiança e receio em relação ao veredicto dos cidadãos de Lisboa. É uma solução ética e democraticamente inaceitável. O PSD tem-se queixado do vírus de «claustrofobia democrática». Vemos agora que esse vírus se alojou verdadeiramente nas profundezas do PSD!… É por isso que dizemos: a declaração do líder do PSD revela falta de coerência e de coragem políticas para levar a clarificação até ao fim.
Não deve haver apenas eleições para a Câmara. Devem realizar-se também eleições para a Assembleia Municipal.
Não é altura para o PSD se agarrar aos lugares que detém na Assembleia Municipal de Lisboa. Só com eleições para a Câmara e para a Assembleia Municipal será possível obter um mandato claro e legitimado capaz de garantir uma solução estável em Lisboa.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!

O Orador: — Sr. Presidente, o PSD não esteve à altura da confiança que os lisboetas nele depositaram nas eleições municipais de Outubro de 2005.
Ao fim de um ano e meio, o PSD deixa a Câmara de Lisboa numa grave situação de crise política, de descrédito, degradação e ruptura financeira.
O Partido Socialista endereça, a partir daqui, uma mensagem aos lisboetas e aos portugueses em geral.
Estaremos em condições de construir uma solução política credível e capaz de resolver os problemas de Lisboa. A situação da Câmara Municipal de Lisboa não é uma fatalidade. Com dinamismo e um novo projecto, é possível devolver aos lisboetas e a Lisboa uma Câmara Municipal prestigiada, financeiramente saneada e líder na inovação e na modernidade.
O Partido Socialista cá estará para cumprir a sua obrigação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Miguel Macedo e António Filipe.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Vitalino Canas, o Sr. Deputado teve oportunidade de falar de Oeiras não só quando há pouco intervim da tribuna mas também agora quando interveio e desperdiçou as duas oportunidades. Vou dar-lhe uma terceira oportunidade de falar de Oeiras.
Gostava que o Sr. Deputado Vitalino Canas dissesse aqui, em nome do Partido Socialista, o que é que vos inibe de falar sobre a situação de Oeiras, o que é que vos inibe de falar sobre a aliança, a coligação, que existe entre o Partido Socialista e a maioria na Câmara de Oeiras, que interesses impedem o Deputado Vitalino Canas e os Deputados do Partido Socialista de falarem sobre Oeiras, o que é que o PrimeiroMinistro e Secretário-Geral do Partido Socialista tem a dizer sobre Oeiras.
Era esta terceira oportunidade que não queria deixar de lhe dar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

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O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, o Sr. Deputado, hoje, já teve, pelo menos, cinco oportunidades de responder a algumas das perguntas que os portugueses estão a fazer lá fora e ainda não respondeu!

Aplausos do PS.

Continua, inclusive, a não dizer porque é que o PSD se agarra ao poder na Assembleia Municipal de Lisboa.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Exactamente ao contrário!

O Orador: — O Sr. Deputado pretenderia, certamente, desviar as atenções para Oeiras. Ora, devo dizer que o PS não tem qualquer tipo de embaraço em Oeiras. Os senhores, sim, têm um embaraço em Oeiras, porque o Dr. Isaltino Morais foi militante do PSD, foi uma criação política do PSD, foi vosso autarca modelo, foi vosso ministro!….

Aplausos do PS.

Os factos de que ele está acusado foram praticados quando estava no governo do PSD e quando estava na Câmara, em nome do PSD. O Dr. Isaltino Morais e Oeiras são um embaraço vosso, não são um embaraço do Partido Socialista!

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Quem apoia a vereação em Oeiras?!

O Orador: — É uma coisa vossa, não é uma coisa do Partido Socialista!

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Então, porque é que o PS a apoia?!

O Orador: — Tal como é coisa vossa a situação catastrófica que vive a cidade de Lisboa e a Câmara Municipal de Lisboa. E é sobre isso que eu gostaria também de ouvir falar o Sr. Deputado. Já teve muitas oportunidades de explicar aqui porque é que, durante vários meses, o PSD foi assistindo, impávido e sereno — esperando, porventura, que a situação se resolvesse por si! —, à queda sucessiva dos seus vereadores e porque é que o PSD, agora, se agarra ao poder na Assembleia Municipal de Lisboa e vincula os cidadãos de Lisboa à actual maioria aí existente, quando eles vão escolher uma nova solução política para a cidade, hipotecando esta solução política, porque os senhores querem continuar com aqueles lugares que têm na Assembleia Municipal de Lisboa.
Era a isso que eu gostaria de ter ouvido o Sr. Deputado responder e não falar de outros assuntos que hoje não estão em causa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, antes de mais, quero corrigir algo que disse há pouco. Há pouco, procurando dar exemplos de vereadores do PSD da Câmara Municipal de Setúbal constituídos arguidos, usei o exemplo do Sr. Deputado Fernando Negrão, o que não é correcto. Há vereadores do PSD da Câmara Municipal de Setúbal já constituídos arguidos, mas não é o caso do Sr. Deputado Fernando Negrão. Por isso, quero deixar aqui esta correcção.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Foi precipitação!

O Orador: — Sr. Deputado Vitalino Canas, a pergunta que gostaria de lhe colocar — e já a coloquei, há pouco, ao Sr. Deputado Miguel Macedo, mas a sua resposta foi tudo menos convincente — tem a ver com a Assembleia Municipal de Lisboa. Nós sabemos que, por vontade dos eleitores, no mesmo mandato podem existir maiorias diferentes nas câmaras municipais e nas assembleias municipais, e isso aconteceu, inclusivamente, em mandatos anteriores no próprio município de Lisboa. Mas isso foi no mesmo mandato.

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O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — É a lei!

O Orador: — Agora, Sr. Deputado, havendo eleições intercalares para um dos órgão, concretamente para a Câmara Municipal, que é o que está em causa, e havendo uma nova maioria e uma nova legitimidade, como é que se compreende que essa nova legitimidade seja contrariada por um órgão que perdeu toda a legitimidade política pelo facto de ser de um mandato anterior e por a legitimidade que lhe foi conferida ter sido já ultrapassada por eleições subsequentes para um outro órgão do mesmo município?

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Aconteceu no mandato anterior! Quem era o Presidente da Assembleia Municipal?!

O Orador: — Nós sabemos que, na lei, não há nada que obrigue os membros da Assembleia Municipal de Lisboa a renunciarem aos seus cargos,…

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Porque o PS não quis!

O Orador: — … mas também não há para a Câmara Municipal.
Ora, o que acontece é que o PSD para a Câmara Municipal retirou consequências políticas óbvias, que tinha de retirar, mas recusa-se a retirá-las para a Assembleia Municipal.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Não há problemas na Assembleia Municipal!

O Orador: — Gostava de saber o que é que o Sr. Deputado pensa disto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, tenho muito gosto em responder-lhe de um modo que acho que é unânime nesta Casa, com excepção do PSD: todos nós já percebemos que esta solução que o PSD encontrou para tentar resolver o seu problema em relação a algumas pessoas que exercem o cargo de presidente de câmara e de vereador, dos quais se quer ver livre, fica muito curta,…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Não quiseram mudar a lei!

O Orador: — … porque é uma solução que visa preservar, contra a vontade dos cidadãos, que, certamente, irão dar uma nova maioria para governar a cidade de Lisboa, uma maioria antiga, que pode vir contrariar a vontade desses mesmos cidadãos. É isto que o PSD está a procurar fazer.
O Sr. Deputado Miguel Macedo — e o Sr. Deputado António Filipe fez bem referência a isso —, há pouco, procurou convencer-nos de algo que é absolutamente inacreditável: de que é exactamente a mesma coisa, quando os cidadãos numa mesma eleição escolhem maiorias diferentes, porque querem escolher essas maiorias diferentes,…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Exacto! E são para respeitar!

O Orador: — … porque lhes é dada a possibilidade dessa escolha, eventualmente para um melhor controlo da câmara municipal, e quando se impõe aos cidadãos uma velha maioria para controlar uma nova solução de governo.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Têm medo!

O Orador: — É algo completamente diferente do ponto de vista democrático. E a única justificação que os senhores têm é simples: agarrar o poder, procurar reduzir os danos que já estão a sentir e também criar instabilidade política no futuro. Creio que esta solução do PSD é uma solução para procurar criar instabilidade política no futuro e a impossibilidade de a Câmara Municipal de Lisboa ser bem governada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

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Eram 16 horas e 45 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos dar início à ordem do dia com o debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», sobre o Instituto da Conservação da Natureza, ao abrigo do n.º 4 do artigo 78.º do Regimento da Assembleia da República.
Srs. Deputados, como a agenda de hoje é extremamente longa, serei muito rigoroso na aplicação dos tempos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Portugal apresenta, felizmente, uma riqueza imensa em termos de património natural e de biodiversidade um pouco por todo o território nacional, em particular nos parques e reservas naturais e nas áreas de paisagem protegida, expoentes máximos desse bem público tão inestimável e insubstituível quanto sensível e delicado.
A importância das áreas protegidas e dos habitats presentes nos sítios de importância comunitária ou nas zonas de protecção especial, que integram a Rede Natura 2000 e que, em conjunto, representam 22% do total do nosso território, é indiscutível não só como repositórios de um património genético único mas também como factor de sustentabilidade e equilíbrio dos ecossistemas, dos quais depende a qualidade ambiental do ar, dos solos e dos nossos recursos hídricos, ou seja, da própria vida.
Infelizmente, a política da conservação da natureza em Portugal não tem conhecido muitos dias felizes.
À triste realidade dos fogos florestais, que, no ano passado, dizimaram 12 000 ha de área protegida em Portugal, às construções ilegais, depósitos de entulho e lixeiras, que grassam nalguns parques, face à incapacidade fiscalizadora, à lentidão e à falta de transparência dos processos, ou à ausência de planos de ordenamento em cerca de metade das áreas protegida, somam-se agora os ataques de alguns megaempreendimentos turísticos em Rede Natura, com a mais alta chancela pública, e um Plano de Desenvolvimento Rural, que deixa de fora a esmagadora maioria de áreas de Rede Natura que poderiam beneficiar de apoios para projectos agro-ambientais fundamentais para a fixação de populações nessas regiões.
A falta de técnicos e de funcionários especializados, designadamente dos que têm por missão vigiar e fiscalizar no terreno, contactando com as populações e exercendo um importantíssimo papel educativo e de esclarecimento, e a falta muito em concreto de vigilantes da natureza, com apenas cerca de 150 destes profissionais para todas as áreas protegidas, ou seja, para 700 000 ha, já não falando nos 2 milhões de hectares de Rede Natura, o que dá uma média de mais de 4600 ha por vigilante, não explicando tudo, dá, certamente, boas pistas para compreender a situação a que se chegou actualmente.
Uma situação em que o Instituto da Conservação da Natureza (ICN), criado em 1993, herdeiro do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagístico, datado de 1975, tem sido vítima de um crónico subinvestimento por parte dos sucessivos governos, designadamente nos últimos anos, votando-o a um verdadeiro estrangulamento financeiro, responsável por inúmeras dificuldades, que têm minado o dia-a-dia das direcções das áreas protegidas e dos seus funcionários, que procuram, com os poucos meios ao seu dispor, executar a difícil missão que têm a seu cargo.
Isto tem transformado o ICN em pouco mais do que uma máquina burocrática de aprovação ou chumbo de projectos, com os técnicos fechados em gabinetes e atulhados de processos, criando situações verdadeiramente caricatas, se não fossem vergonhosas, como a falta de meios financeiros, a comprometer, para além do pagamento atempado de salários, as próprias deslocações ao terreno, por falta de parque automóvel ou de combustível, ou a realização do mero expediente, como a simples impressão de documentos, fazer telefonemas ou enviar correio.
Neste cenário, é óbvio que algumas das tarefas mais importantes, como a gestão florestal, prevenção e combate a incêndios, controle de infestantes ou implementação de projectos de conservação da natureza, vão ficando, inevitavelmente, para trás e sendo, sucessivamente, adiadas.
Esta situação crítica e preocupante levou ao pedido por parte dos responsáveis do ICN, na busca de soluções, da realização de uma reestruturação deste instituto público, a qual foi anunciada por este Governo logo no início do mandato.
Contudo, apesar de já decorridos dois anos, durante os quais o Sr. Ministro do Ambiente foi confrontado na Assembleia da República por Os Verdes e por outros partidos da oposição, quer em sede de dois Orçamentos do Estado, quer, mais recentemente, em, pelo menos, duas reuniões de comissões, nas quais esteve agendado a discussão da reestruturação do ICN, sempre o Sr. Ministro se recusou não só a discutir a fundo esta questão mas até mesmo a disponibilizar um mínimo de informações acerca dos planos e das intenções do Governo e das linhas com que se coseria esta reforma.
Por isso mesmo, a bancada do Partido Ecologista «Os Verdes», entendendo ser de primordial importância para o desenvolvimento sustentável do País a adequada gestão das nossas áreas protegidas, a qual depende em concreto dos meios e da capacidade para responder às necessidades de salvaguardar o inte-

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resse público da conservação da natureza de que dispuser o ICN, decidiu usar o seu agendamento potestativo para provocar um debate de urgência e exigir, por fim, as explicações, o debate e o respeito devido a esta Câmara.
Infelizmente, ainda não é hoje que o Sr. Ministro vai responder. Lamentamos. Sem desrespeito pelo Sr.
Secretário de Estado, entendemos que a importância desta matéria merecia a presença do Sr. Ministro do Ambiente.
Com efeito, foi mais o que se foi sabendo pela própria comunicação social do que em informações prestadas directamente à Assembleia da República. E, se essas informações não auguravam nada de bom, a publicação, nos últimos dias, do Decreto-Lei n.º 136/2007 — Lei Orgânica do Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade, que já substituiu o anterior ICN, e da Portaria n.º 530/2007, que aprovou os respectivos estatutos, vêm confirmar o pior dos cenários: o cenário de desresponsabilização do Estado da tarefa fundamental de promover a conservação da natureza, transformando também esta área num negócio chorudo para privados.
Apesar de o Governo não avançar ainda para a empresarialização do ICN, é, teoricamente, só isso que fica a faltar fazer e que poderá ser feito por um próximo governo de direita como este.
Na prática, face às dificuldades existentes nas áreas protegidas, qual foi a opção deste Governo? Face à falta de meios humanos, em vez de reforçar os quadros com os técnicos e funcionários em falta, coloca os actuais funcionários entre a «espada e a parede», obrigando-os a aceitar o regime do contrato individual de trabalho, anulando a sua situação de emprego público, sob pena de serem empurrados para o quadro dos excedentários, num ataque à sua situação profissional, que em nada contribui para a estabilidade e segurança, essenciais à prestação de um bom serviço público, e parecendo confirmar os receios de futuros despedimentos e reduções de pessoal, que serão extremamente nocivas para o futuro dos parques.
Aliás, esta decisão aparece em contradição flagrante com o artigo 34.º-A da Lei n.º 3/2004, recentemente aditado por este mesmo Governo, que prevê que, em situações de alteração de regimes de pessoal dos institutos públicos, se mantenha o regime de emprego para os trabalhadores que se mantêm em funções, e junta-se, ainda, a um outro retrocesso, que é, contrariando o que este Governo fez em 2005, em que os directores das áreas protegidas passaram a ser escolhidos por concurso público, garantindo a equidade, a transparência e a escolha dos mais competentes, voltar-se ao antigamente, em que é o governo que nomeia quem entende da sua confiança.
Face à falta de meios financeiros do ICN, que, nas palavras do Sr. Ministro, tem estado, ao longo dos anos, sujeito a altos e baixos — faltando acrescentar que são mais os baixos do que os altos e que isto acontece por culpa exclusiva dos governos —, em vez de se decidir por dotar financeiramente e à altura da sua missão, competência e tarefas o ICN, opta-se por condená-lo a ter de produzir receitas próprias, com o objectivo de atingir os dois terços de auto-suficiência em 2009, cobrando taxas aos cidadãos que queiram usufruir daquilo que é património de todos e patrocinando uma preocupante promiscuidade com o sector privado, em parcerias público-privadas com empresas, como cimenteiras, indústria química ou de pasta de papel, substituindo o objectivo da salvaguarda do interesse público pelo objectivo da busca e maximização do lucro, convertendo o património natural de todos num negócio privado de alguns.
Mas vai-se mais longe: com a criação das cinco superáreas ou «Departamentos de Gestão de Áreas Classificadas», o Governo irá produzir uma preocupante centralização de competências, afastando o centro de decisão do terreno e das populações, deixando ali meros executores técnicos sem capacidade negocial, ao mesmo tempo que afasta definitivamente as autarquias dos órgãos colegiais, nos quais conheciam, discutiam, participavam e davam contributos para as decisões que afectam também os seus territórios e os seus munícipes, remetidas, agora, as câmaras e juntas de freguesia para os conselhos estratégicos de natureza meramente consultiva e não vinculativa.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Face a este cenário, podemos esperar o pior, isto é, uma política da conservação da natureza sujeita aos ditames do mercado, sujeita a uma lógica economicista, mascarada de modernidade sobre a anglofonia e o «economês» dos clusters e da Business & Biodiversity, como a grande aposta e uma das prioridades para a presidência portuguesa da União Europeia, que, na verdade, mais não escondem do que a pura desresponsabilização do Estado na protecção da natureza e o início da privatização das áreas protegidas, no total desrespeito pelo interesse público nacional.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Humberto Rosa): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Devo começar por dizer que o tema da conservação da natureza e da biodiversidade é muito digno para esta Câmara e gostaria de o trazer, primeiro, à sua imagem global. Como sabemos, é uma imagem de marca do planeta Terra, longamente acumulada ao longo de muitos milhões de anos de evolução. Sabemos também que, mais do que um apelo estético ou de valia intrínseca, é dela que dependemos para o nosso bem-estar, para os serviços que a natureza nos presta e para a própria manutenção da vida no planeta. Sabemos,

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igualmente, que está em declínio em todo o mundo, a uma taxa que se estima 100 000 vezes superior à taxa pré-humana.
Portanto, podemos dizer que a alteração global de géneses humana, a par com as alterações climáticas, mais marcante, mais perene, porventura mais duradoura, é o declínio da biodiversidade.
A estrutura de um serviço da administração central não se confunde com o tema da política da conservação da natureza e da biodiversidade mas é, seguramente, uma peça importante para o efeito, e é neste sentido que trago, com muita satisfação, os nossos esclarecimentos sobre um objectivo assumido desde a primeira hora, que está previsto no Programa de Governo, que foi devidamente enquadrado no PRACE, que foi concluído no timing devido e que é uma verdadeira reestruturação do Instituto da Conservação da Natureza.
Qual era o problema fulcral do Instituto da Conservação da Natureza? Desde logo, um acréscimo de competências, mormente por via da Rede Natura 2000, zonas de protecção especial, sítios de interesse comunitário e as muitas competências por via de convenções internacionais. Ao mesmo tempo, um decréscimo de técnicos, fruto de saída por faltas de progressão na carreira, de escassez orçamental, de falta de operacionalidade, sem suficiente planeamento de actividades ou de gestão de recursos humanos e, sobretudo, com uma estrutura organizacional atípica e disfuncional. No ICN, havia 28 direcções de serviços, correspondentes às áreas protegidas, na dependência funcional da presidência do ICN com competências próprias, não delegadas nem invocáveis, e tinha, ademais, serviços centrais parcialmente desadaptados das novas realidades e necessidades da política de conservação.
A reestruturação que fizemos visou dar resposta precisamente a estas matérias, no sentido de criarmos um verdadeiro instituto público. Assim: mantivemos a dimensão pública da conservação da natureza; não fizemos a alegada empresarialização da conservação da natureza que nos era imputada; reorientámos a política de conservação da natureza para fugir àquilo a que ela estava acantonada, ou seja, a, apenas, regulamentação, que é uma via conflituosa e menos eficaz, para uma lógica mais contratual de parcerias e de gestão activa, que é a que visamos; e fizemos uma reorientação, abandonando uma mera óptica de áreas protegidas como ilhas no território, para uma óptica de biodiversidade no seu contínuo, para além das áreas protegidas com os corredores ecológicos e distribuição de espécies e habitats.
Esta reestruturação visa tornar o ICN a autoridade nacional para a conservação da natureza e da biodiversidade e um parceiro pró-activo a nível local e central, com parcerias, sim, com múltiplos actores, aberto a parcerias público-públicas e público-privadas, sim, Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, a protocolos, concessões e contratos, porque a conservação da natureza não é tarefa de um único instituto, é de todos os sectores e de toda a sociedade, que promova a qualidade, a atractividade e visitação das áreas protegidas e que tenha uma nova forma de encarar a comunicação com o público, com a sociedade, trazendo ao mesmo tempo a racionalização de meios e de procedimentos e clarificação de responsabilidades e competências.
Em concreto, de 28 direcções de serviços e 9 divisões, todas «penduradas», digamos assim, no presidente do ICN, passámos para 8 departamentos com 10 unidades orgânicas. E começarei pelos serviços centrais, chamando a atenção para as novidades em relação ao que preexistia. Desde logo, o Departamento de Conservação e Gestão da Biodiversidade, para dar uma óptica de gestão activa, que inclui: uma unidade de ordenamento e impacte ambiental; uma unidade de espécies e habitats; uma unidade de convenções internacionais; obviamente, um departamento de finanças e gestão administrativa; um departamento — este, sim, inovador — de comunicação e gestão de operações, para que haja uma nova forma de comunicação com a sociedade e uma nova capacidade de gestão operacional e de parcerias; uma unidade de gestão de sistemas, que também é muito importante pela muita informação que o serviço tem e que carece de devida gestão; e uma unidade de planeamento estratégico e controlo de gestão, de que muito careceria para coordenar as suas actividades.
A nível das áreas protegidas, que é onde a óptica da nossa sociedade mais incide, foi criado o que sempre anunciámos, inclusive nesta Câmara, várias vezes, ou seja, que era nossa intenção criar um nível intermédio de gestão/organização das áreas protegidas. As 25 áreas protegidas de âmbito nacional estão agrupadas em cinco departamentos de áreas classificadas, o que constitui uma manifesta descentralização, porque o que acontecia é que cada área protegida dependia directamente do presidente do ICN e hoje em dia tem o equivalente a um subdirector-geral, responsável pela coordenação de um conjunto de áreas protegidas, que foi organizado por critérios geográfico-funcionais e, também, temáticos.
Esta reestruturação é um efectivo reforço das áreas protegidas ao dotá-las com uma direcção de nível de subdirector-geral, uma vez que potencia a partilha de recursos e valências técnicas para optimizar a gestão de recursos, evitando, assim, a necessidade de duplicação de recursos em cada área protegida, com dois a três directores adjuntos, nomeados por concurso, como é evidente e como hoje em dia se faz, por cada agrupamento de áreas protegidas, mantendo-se um responsável em cada área protegida ao nível adequado, que poderá ser desde subdirector-geral a técnico, conforme a circunstância.
Em termos de organização funcional, deixou de haver, porque este era o principal factor de disfuncionalidade do ICN, comissões directivas com competências próprias rompendo a normal hierarquia organizacional de uma entidade como o ICN. Ora, isto permite um objectivo essencial: nós queremos a gestão das áreas protegidas próximas do cidadão — esta é fundamental —, mas queremos que a sua orientação e a

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política que elas prosseguem tenha uma coordenação nacional, porque há valores em causa que não são de âmbito local nem regional, são de âmbito nacional ou, mesmo, comunitário.
Quanto a municípios, o Sr. Deputado fez-nos a acusação, previsível, de que nos teríamos movido pelo objectivo de arredar municípios. Quero ser muito claro numa coisa, Sr. Deputado: não embarcamos na crítica fácil aos municípios em matéria de conservação da natureza, que existe em parte da nossa sociedade.
Consideramos os municípios um parceiro absolutamente fundamental, credível e de grande valia para a conservação da natureza.
A realidade é que a forma de podermos colaborar com os municípios implica podermos ter, primeiro, a «casa» reestruturada e organizada e, depois, aí sim, por via das parcerias que queremos fazer com eles, um papel mais activo dos municípios na gestão de áreas protegidas também nacionais. Isto é inteiramente alcançável e está no nosso objectivo político, assumido através das parcerias.
Hoje, estamos num momento que não é o de 1993. Temos planos directores municipais mais compatibilizados com os planos especiais de ordenamento do território; temos planos de ordenamento das áreas protegidas em elaboração em todas as áreas protegidas; temos um plano sectorial de Rede Natura 2000, cuja discussão pública já passou e que também é orientador para esta interface; e podemos, através do nível certo, que é o nível de orientação estratégica em cada área protegida, ter os autarcas, através dos seus municípios, envolvidos, em vez de, como alguns se nos queixavam, estarem a emitir pareceres em horas sucessivas de reuniões de comissões directivas…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Queira concluir, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: — … sem que o fizessem nos seus próprios órgãos autárquicos.
Sr. Presidente, para não exceder o tempo, ficar-me-ei por aqui.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Já ultrapassou o tempo de que dispunha, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos dar início à primeira volta de pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, ao contrário do Partido Ecologista «Os Verdes», a primeira coisa que esta bancada gostava de lhe dizer é que, sem qualquer acrimónia ou ironia, temos uma expectativa muito mais elevada num debate travado com V. Ex.ª do que os outros que temos tido aqui sobre a mesma matéria com o Sr. Ministro.

Risos do PSD.

Não digo isto, de todo em todo, com o propósito de criar dissenso, em primeiro lugar, porque essa não é a minha vontade e, em segundo lugar, porque, conhecendo o seu carácter, também sei que não podia ser a minha pretensão.
Mas, Sr. Secretário de Estado, estamos a meio de um mandato deste Governo — já o passámos, aliás! — e, em breve, este Governo terá tanto tempo de funções como o anterior, que tão lestamente critica.
Portanto, não levará a mal que eu aproveite os meus 5 minutos para confrontar V. Ex.ª com uma espécie de mid term review do que é o vosso próprio Programa de Governo, que definiu a conservação da natureza como a primeira das prioridades das estratégias de gestão territorial e traçou, para a conservação da natureza, essencialmente, quatro objectivos: concretizar a Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável e da Biodiversidade; rever o regime jurídico da conservação da natureza e acabar os planos de ordenamento, ligando-os à nova política de desenvolvimento rural; dinamizar o Programa Nacional de Turismo de Natureza; e, por último — concordo consigo, não podemos reduzir os serviços de Estado à política de conservação da natureza —, promover a reformulação do Instituto da Conservação da Natureza.
Sobre concretizar a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade, estamos conversados. São os serviços do ICN, em discussões públicas dos planos de ordenamento que andam a ocorrer pelo País, que confessam que isto, pura e simplesmente, não aconteceu, e é o próprio presidente do ICN quem diz que espera pelos meios do QREN para que isto venha a acontecer. Como o QREN nunca mais se «desembrulha» e, convenientemente, ultimamente, nem temos ouvido falar dele, é de esperar que daí nada venha! Aliás, em matéria de política ambiental, basta ver , de ano para ano, o relatório do estado do ambiente para se constatar que, se há matéria em que Portugal não progride mesmo, é na conservação

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dos seus biótipos. E a isto não é estranha a política de conservação da natureza.
Os senhores disseram que iam rever o regime jurídico da conservação da natureza — nós não sabemos o que isso é e, até hoje, não aconteceu!… — e acabar os planos de ordenamento.
Está na altura da comparação, Sr. Secretário de Estado.
O governo de coligação, anterior, não só deixou prontos seis planos de ordenamento (o de SintraCascais, o de Paul de Arzila, o do Vale do Guadiana, o das Dunas de São Jacinto, o da Serra de São Mamede e o da Serra da Malcata) — planos, estes, aprovados nos três anos em que esse governo esteve em funções —, mas também deixou prontos o do Douro Internacional e o da Arrábida — que este Governo pôs em discussão pública um mês depois de ter entrado em funções e em relação aos quais só mudaram a possibilidade de fazer co-incineração —, bem como o de Paul de Boquilobo, o das Serras d'Aire e Candeeiros e o da Serra da Estrela. Os senhores, até hoje, aos costumes têm «zero» para apresentar! Zero planos de ordenamento concluídos, Sr. Secretário de Estado! É a comparação de dois anos e meio com três anos! Está aqui feita.
Depois, os senhores disseram que iam dinamizar o Programa Nacional de Turismo de Natureza e nós supomos que isto é só para facilitar um pouco a vida à Agência Portuguesa para o Investimento (API)! Mas, enfim, veremos qual é o resultado…! A verdade é que nomearam um grupo de trabalho interministerial, que prometeu resultados apresentados publicamente até ao dia 31 de Março de 2006. Pois estamos nos idos de Maio de 2007 e se o Sr.
Secretário de Estado nos quiser falar desses resultados, estamos, seguramente, muito curiosos!! Mas, sobre o Instituto da Conservação da Natureza, esta redução dos quadros dirigentes e esta desgraça que o Sr. Ministro tantas vezes cá vem anunciar esperou, contra a palavra do Ministro, que aqui o afirmou em Maio de 2005… E é bom que se diga, Sr. Secretário de Estado, que, depois da «entrada de leão» que o Sr. Ministro aqui teve em 2005, muitas destas medidas não perderam validade, mas perdeu-se o limite da credibilidade de quem as executa.
Os dirigentes de nomeação política no novo Instituto da Conservação da Natureza estão deslocalizados onde a gestão deveria ser técnica; acabam as comissões directivas, sem que a maior parte das áreas protegidas tenham a vigorar planos de ordenamento eficazes, ou seja, a gestão das áreas protegidas, agora agrupadas desta forma, não tem instrumentos de ordenamento que definam, com clareza e com transparência, as regras do jogo.
Não fosse V. Ex.ª o meu interlocutor, hoje, e eu diria que talvez isto seja apenas para facilitar certo tipo de intervenções, que sei que não têm espaço no seu coração, mas que, pelos vistos, assim ficam mais fáceis de concretizar! Além de que a maior parte das áreas protegidas são habitats e é imprescindível uma articulação com as comissões directivas nas autarquias onde estavam representadas.
O Sr. Secretário de Estado disse-nos, a terminar, que não alinhava pelo diapasão fácil de demonizar as autarquias. Mas o Sr. Ministro, que, presumo, não vai desdizer, declarou, em entrevista, que entendia que a nova escolha política, como sublinharam Os Verdes, dos directores das áreas protegidas «implica um bom relacionamento com as câmaras municipais, mas isto não significa a promiscuidade, com que temos de acabar.» Ora, «promiscuidade» é, no dicionário luso-brasileiro de língua portuguesa, o «estado de qualidade promíscuo; uma mistura confusa ou desordenada; a convivência com pessoas que, de alguma forma, vai contra os princípios do que se considera normal.» O Sr. Secretário de Estado, que tutela o Instituto da Conservação da Natureza, confirma o que diz o Sr.
Ministro?!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Terminou o seu tempo, Sr. Deputado. Queira concluir.

O Orador: — Encontrou «promiscuidade» entre os autarcas e a conservação da natureza?! Tem também — e vou terminar, Sr. Presidente — a visão de que a conservação da natureza só se fará contra as pessoas?! Eu não acredito que assim seja. Se assim fosse, iriam por mau caminho!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, não é possível fazer uma avaliação séria, rigorosa e correcta sobre o estado da conservação da natureza sem sabermos o ponto de partida. E qual foi a situação encontrada por este Governo no ICN? Descrédito da instituição, desmotivação dos funcionários, saída de quadros técnicos por falta de estímulo e sem perspectiva de progresso nas carreiras, rotura financeira do Instituto, com uma dívida acumulada elevadíssima, ausência de uma política coerente de planeamento, total impossibilidade de acção para cumprir a vocação que lhe estava determinada. Era este o estado caótico do ICN quando chegámos ao Governo.
Por isso, era indispensável inverter a situação e dotar o Instituto de meios eficazes e de uma estrutura com capacidade para cumprir a missão para que está vocacionado: a conservação da natureza e a defesa

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do nosso património natural.
Foi isto que o Governo fez ao reestruturar o ICN com vista a adequá-lo aos novos desafios que se adivinham, dotando-o de mais competência, nomeadamente na preservação da biodiversidade, passando, assim, a ser uma verdadeira autoridade nacional na conservação da natureza e da biodiversidade, e procurando ganhos de eficácia — uma inovadora capacidade para agir no território e uma simplificação nos procedimentos — aliados a uma racionalização de meios.
Tudo isto foi feito com base na lógica de uma Administração Pública mais eficaz e mais eficiente, compaginando a reestruturação do ICN com o PRACE e com a nova lei da mobilidade.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Ora, aí está!

O Orador: — É isto que o Governo está a fazer, a bem da conservação da natureza e do nosso património cultural.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Sr. Deputado, muito obrigado pela economia de tempo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, já foi dito, mas não será demais frisar, que esta não é a segunda nem a terceira vez que esta Assembleia, por via dos diversos grupos parlamentares aqui representados, tenta discutir o Instituto da Conservação da Natureza e a sua reestruturação, finalmente conhecida, com o Governo. Já houve chamadas do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional à Comissão; já houve a promessa de que este assunto viria ao Plenário, por parte do próprio Ministro; e tanta disponibilidade era a do Governo que foi preciso um agendamento potestativo de um grupo parlamentar e um debate de urgência para que um membro do Governo se dignasse discutir não com os jornais, como sucedeu num fim-de-semana com o anúncio desta reestruturação do ICN, furtando-se, assim, ao confronto democrático com os partidos políticos e com os grupos parlamentares, mas, finalmente, com a Assembleia da República.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Veremos o «sumo» das intervenções e das explicações e se, de facto, elas ultrapassarão este magnífico exercício de oratória vazia com que o Partido Socialista acabou de nos presentear, em que falou durante 5 minutos e nada disse!… Do que o Instituto da Conservação da Natureza precisa e que o Sr. Secretário de Estado bem diagnosticou da tribuna, é, essencialmente, de meios, de recursos humanos e de reforço nestas áreas.
Portanto, a visão e o modelo orgânicos serão sempre um instrumento, obviamente, mas não é aí que radicam os principais problemas do Instituto da Conservação da Natureza.
Um Instituto da Conservação da Natureza que se dá ao luxo de ter os seus técnicos «trancados», ao mesmo tempo que adjudica a empresas, por «externalização», serviços que podia fazer com os seus meios; um Instituto da Conservação da Natureza que não tem os meios para ir ao terreno; um Instituto da Conservação da Natureza que diz gerir a Rede Natura 2000, mas que não a conhece, porque o próprio diz que não tem meios para isso, e que fez um plano sectorial dessa Rede Natura 2000 manifestamente insuficiente para as necessidades — e isso é reconhecido no plano sectorial pelo próprio ICN —, é óbvio que do que precisa não é só de uma reestruturação orgânica. E esta reestruturação orgânica que o Governo anuncia faz parte do PRACE, não é uma reestruturação para fortalecer o ICN mas, sim, para cortar gastos e entregar a conservação da natureza, e agora também da biodiversidade, aos interesses do lucro, aos interesses do mercado, é fazer da conservação da natureza um mercado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Aproveito esta primeira ronda de pedidos de esclarecimento para colocar duas ou três questões ao Sr. Secretário de Estado do Ambiente.
O que vai significar esta reestruturação, concretamente no número de trabalhadores, sabendo agora que o regime é o do contrato individual de trabalho? E o que acontecerá àqueles que não aceitarem esta norma transitória para o contrato individual de trabalho, como está previsto na lei orgânica? O que serão estas parcerias público-privadas, tão faladas pelo próprio Secretário de Estado do Ambiente e pelo Ministério? Será que vamos estar no Parque Natural da Arrábida SECIL, ou na Reserva Natural do Estuário do Tejo Sonae, ou, quem sabe, no Parque Natural da Serra da Estrela Turistrela, e por aí fora?! São estas as parcerias público-privadas?!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Queira concluir, Sr. Deputado.

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O Orador: — É estabelecer parcerias, no que respeita à gestão, com aqueles que têm representado as maiores ofensivas à gestão do território?!

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, estamos aqui, hoje, num debate de urgência, que foi requerido pelo Partido Ecologista «Os Verdes», para falar sobre o ICN.
Em relação ao ICN, é importante dizer, desde logo, que o CDS não tem preconceitos quanto à sua reorganização, mas uma das funções desta Assembleia é fiscalizar a actuação do Governo e, desde o dia 24 de Maio de 2005, em que foi anunciada a reestruturação, não faltaram oportunidades ao Governo para explicar à Assembleia como é que pretendia fazer essa reestruturação e não explicou. Veio aqui hoje, pela primeira vez, falar efectivamente sobre o assunto.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — É verdade!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Teve que vir, porque foi obrigado!

O Orador: — O Sr. Secretário de Estado disse que era importante alterar a orgânica de forma a tornar o ICN mais eficiente, e nisso estamos de acordo.
Mas que estudos existem e que estudos pode o Sr. Secretário de Estado fornecer a esta Assembleia, como deveria ter feito nas múltiplas oportunidades que teve para o efeito, quanto a esta reestruturação? Quais são os funcionários necessários? Quais são as verbas precisas para o funcionamento efectivo do ICN? Quais são as competências que realmente devem estar no ICN? Será que não faz sentido a criação da agência para o litoral e essas competências deixarem de estar no âmbito do ICN? No fundo, onde estão os estudos que podem fundamentar a decisão que o Governo tomou em matéria de reestruturação deste Instituto? Por outro lado, qual é o modelo de gestão que esses estudos apontam em termos de ICN? Qual é a forma de financiamento? Quais são os recursos? Não temos nada contra a criação de parcerias públicopúblicas e público-privadas, e isto que fique claro.

O Sr. António Filipe (PCP): — As público-públicas ainda escapam!

O Orador: — Consideramos que a parceria público-privada não é necessariamente incompatível com a protecção do ambiente;…

O Sr. António Filipe (PCP): — Parcerias «privado-privadas» seriam melhores!

O Orador: — … pensamos que pode ser uma forma de financiar actividades fundamentais para o ambiente.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Mas, Sr. Secretário de Estado, não sabemos como é que isso vai funcionar, qual é o modelo de gestão que efectivamente vai ser posto em prática e como é que irá cumprir esse mesmo objectivo.
Mas, Sr. Secretário de Estado, há uma outra matéria que não bate certo com as preocupações com o ambiente. É que, ao mesmo tempo que se fala na reestruturação e na importância das áreas protegidas, no PIDDAC para 2007, em termos de verbas para investimento, o corte foi quase de 68%. E o Sr. Secretário de Estado sabe que isto significa cortar em matéria de investimentos nas áreas protegidas. Isto precisa de explicação, Sr. Secretário de Estado, porque, evidentemente, o investimento público não é substituído apenas pelo investimento privado, ainda mais quando não se explica como é que isso pode ser feito.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Portanto, Sr. Secretário de Estado, aguardo explicações sobre esta matéria.
Tenho mais perguntas fazer e, obviamente, na segunda ronda colocá-las-ei.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, gostaria de começar por valorizar a declaração de princípios que fez na sua introdução acerca da importância da preservação do ambiente no sentido do suporte à vida e de inflectir este percurso, que tem vindo a ser conhecido ao longo dos últimos anos, de declínio da biodiversidade no nosso País.
É uma declaração de princípios importante, tanto mais quanto o coloca a si, Sr. Secretário de Estado, numa posição absolutamente contraditória à orientação do Governo, que neste campo tem uma política liberalizante, como em todos os outros campos da nossa vida política nacional, que não é senão uma «maré negra» que invade o nosso ordenamento do território e acaba por constituir justamente um atentado àquilo que deveria ser a sua prioridade.
Em relação à reestruturação do ICN, há várias questões que o Governo precisa de esclarecer com a maior transparência, e, por isso, lhe peço que se concentre, para já, sobre duas delas, sendo que uma tem justamente que ver com o financiamento do ICN.
O Sr. Secretário de Estado referiu, há pouco, a necessidade de conseguir obter recursos para o ICN. É verdade, o ICN tem vindo a ser «emagrecido» e descapitalizado, e não apenas nos últimos dois anos: ao longo dos últimos cinco anos, tem havido cortes progressivos, sistemáticos nas dotações para o ICN, que hoje conta, no seu orçamento, com metade das verbas que tinha há cinco anos atrás. E daí as extraordinárias dificuldades com que os técnicos do ICN se defrontam para conseguirem cumprir com a sua missão, que não é propriamente fácil mas, sim, complexa e difícil.
O que o Governo traz aqui como a grande solução para este problema da necessidade de obter receitas para o ICN são as ditas parcerias público-privadas.
Portanto, gostaria que o Sr. Secretário de Estado esclarecesse, afinal de contas, aquilo que têm sido as declarações públicas do Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, que ainda recentemente disse que há perspectivas muito encorajadoras a este nível nas conversações com empresas que vão ajudar à conservação da natureza — são palavras do Ministro do Ambiente.
Gostaria que nos explicasse, Sr. Secretário de Estado, que empresas são estas que vão ajudar à conservação do ambiente, se está a falar da IKEA, se está a falar da Pelicano, se está a falar da Pescanova! São estas as empresas? Pergunto-lhe isto porque estas são as empresas que por todo o nosso país…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Oradora: — … (e vou terminar, Sr. Presidente) têm sido responsáveis por verdadeiros atentados contra a conservação do ambiente! Veja-se o caso da IKEA,…

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Muito obrigado, Sr.ª Deputada.

A Oradora: — Sr. Presidente, se me der licença, só pretendo terminar esta frase.
Veja-se o caso da IKEA, que destrói 300 ha de floresta num concelho que tem um parque industrial perfeitamente equipado para a instalação da sua unidade industrial. Isto não se compreende, não faz sentido e é uma contradição que o Sr. Secretário de Estado tem de explicar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, antes de mais gostaria de deixar uma nota muito breve relativamente à ausência do Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, dizendo que não vi, da parte do Sr.
Secretário de Estado, nenhuma justificação para essa ausência.

O Sr. Luís Carloto Marques (PSD): — Está escondido!

O Orador: — O que quer dizer que ficamos sem saber se o Sr. Ministro do Ambiente não está presente por impossibilidade de agenda, por algum motivo de força maior ou, simplesmente, se é uma opção política do Ministro não estar presente neste debate.
Entendemos a sua ausência não como uma falta de respeito para com Os Verdes, não é isso que nos preocupa, mas como um menor interesse da parte do Ministério do Ambiente, que não envia o seu mais

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alto representante e responsável a um debate sobre a conservação da natureza mas apenas, sem desmerecimento nenhum, o Sr. Secretário de Estado. Aliás, em nosso entender, deveriam estar os dois presentes, como já tem acontecido noutras circunstâncias e muito bem.
Portanto, não sendo esclarecida a sua ausência, fica, naturalmente, a interpretação de que o Sr. Ministro do Ambiente entende que esta questão não é primordial, o que lamentamos.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Quando for um governo de Os Verdes mandam Os Verdes!

O Orador: — Naturalmente! Sr. Secretário de Estado, na última vinda do Sr. Ministro à Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território para falar sobre os problemas do litoral e da costa constava também da agenda o debate sobre a situação do ICN e a sua reestruturação. Contudo, mais uma vez, o Sr. Ministro demonstrou pouca vontade para falar da reestruturação do ICN, para discutir o futuro deste instituto público com os partidos da oposição. O Sr. Ministro, aliás, depois de questionado por Os Verdes sobre qual seria o futuro do quadro de pessoal do ICNB, passados dois anos de ter anunciado a intenção de reestruturar o ICN, disse «ainda não chegámos lá».
Ora, perante uma das questões mais importantes para o bom funcionamento deste instituto público, para o bom funcionamento e salvaguarda da conservação da natureza, que é haver um quadro de pessoal adequado, ao fim de dois anos, o Sr. Ministro disse «ainda não chegámos lá»! Estará, porventura, à espera que o Ministério das Finanças e da Administração Pública lhe diga o que tem de fazer. Isto é profundamente preocupante e lamentável.
Mas com o Decreto-Lei n.º 136/2007, de 27 de Abril, e com a Portaria n.º 530/2007, de 30 de Abril, publicada na última segunda-feira, já ficámos com uma ideia do que o Governo pretende fazer: acabar com o vínculo à função pública; precarizar e fragilizar os trabalhadores do ICNB; passar a nomeação dos directores dos departamentos de gestão das áreas classificadas a ser feita por escolha e pela confiança política — e até, possivelmente, político-partidária —, o que constitui um manifesto retrocesso deste Governo, que em 2005 determinou que os directores das áreas protegidas fossem escolhidos por concurso público, abrindo assim a porta a uma dependência pouco saudável em termos de funcionamento da função pública.
Estas são questões importantes, mas em relação a isto, infelizmente, já não restam dúvidas. O que continuamos sem saber é se o Governo vai despedir ou dispensar trabalhadores e funcionários, se vai manter o actual quadro, manifestamente insuficiente, em nosso entender e no entender de muitos técnicos que se têm manifestado, ou se vai reforçar esse mesmo quadro, designadamente ao nível dos vigilantes da natureza, como até o Sr. Ministro chegou a prometer há pouco tempo, tendo dito, por exemplo, que o seu Ministério não tem excesso de funcionários.
A pergunta é muito clara, Sr. Secretário de Estado: o que é que vai acontecer em termos de quadro de pessoal? Vai diminuir? Vai manter-se? Vai aumentar?

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: — Uma última questão.
O Sr. Secretário de Estado, na questão do financiamento e das parcerias público-público e públicoprivadas, parece colocar as autarquias no mesmo pé das empresas privadas, de empresas como as cimenteiras, de pasta de papel ou de indústria química, que, como sabe, têm interesses muito preponderantes e, muitas vezes, incompatíveis com a defesa e protecção da natureza.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Como é que o Sr. Secretário de Estado concebe uma eficaz gestão da área protegida democraticamente partilhada com este tipo de promiscuidades?

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Vaz.

O Sr. Luís Vaz (PS): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, ao longo dos últimos anos era visível uma necessidade de intervenção no ICN. Por razões que já foram aqui aduzidas por V. Ex.ª e também pelos Srs. Deputados, vinha-se assistindo a uma inadequação do ICN às tarefas que tinha pela frente, nomeadamente àquelas, já referidas, que tinham que ver com directivas comunitárias, com acordos internacionais que Portugal assumiu e, sobretudo, com a vasta área da Rede Natura 2000.
Por outro lado, também estava associada à ineficácia do ICN a questão financeira. E é bom recordar que foi sobretudo nos anos de 2002, 2003 e 2004 que o ICN sofreu grandes cortes orçamentais, que, obviamente, seriam necessários, porque toda a gente reclama que é necessário emagrecer a despesa do Estado,…

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Protestos do PCP.

… à excepção, talvez, do PCP, que resolve o problema com a «rotativa» da fabricação de notas. O que é certo é que houve necessidade, bem ou mal, de reduzir a dotação financeira do ICN. Mas foi também o actual Governo que, em 2005, através do Orçamento rectificativo, conseguiu o financiamento necessário para pagar as dívidas acumuladas dos anos anteriores.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Estão a diminuir!…

O Orador: — Foi através do Orçamento do Estado para 2006 que se conseguiu algum equilíbrio para o bom funcionamento do ICN, tal como com o Orçamento do Estado para 2007, com um acréscimo de cerca de 7,8% para o investimento, numa altura em que há necessidade de contenção de despesas, como é visível para toda a gente, inclusivamente no próprio ICN.

Protestos do PSD.

Portanto, coloca-se aqui um problema de financiamento. E se tivermos em conta os números, a dotação total do ICN para 2007 é de 28,6 milhões de euros, sendo as receitas próprias apenas de 1,6 milhões de euros. É muito pouco. É necessário, obviamente, aumentar as receitas próprias. E se, de facto, a questão da conservação da natureza e da biodiversidade deve ser fundamentalmente uma tarefa pública, não é desprezível, antes pelo contrário é defensável, uma maior intervenção do sector privado na questão da rentabilização do sistema.
Por exemplo, tive oportunidade, na década de 90, de visitar a maioria dos parques nacionais em França e até os meus miúdos, que tinham, na altura, sete e oito anos, já sabiam que quando se ia visitar uma área específica do parque nacional os adultos pagavam 35 francos e as crianças 15 francos.

Protestos do Deputado de Os Verdes Francisco Madeira Lopes.

Também tive oportunidade, na Finlândia, ainda há bem pouco tempo, de visitar uma área específica de um parque nacional em que um casal de biólogos, com mais dois auxiliares, eram responsáveis, por concessão, pela gestão de uma vasta área, obviamente controlada pelo organismo nacional responsável, e conseguiam assim rentabilizar e ter receitas próprias necessárias à conservação da natureza.

O Sr. António Filipe (PCP): — Está mal!

O Orador: — Portanto, não é minimamente incompatível a coexistência do privado com o público. Há que rentabilizar, há que apostar também aqui na aliança entre a conservação da natureza e o turismo ecológico, há que tirar partido da riqueza e do potencial que temos no nosso país, sem qualquer preconceito entre o que é privado e o que é público, quando é possível coexistirem.

Protestos do BE.

Nesta óptica, pergunto ao Sr. Secretário de Estado o que é que concretamente o Ministério pretende ou defende no que diz respeito à concessão de áreas específicas dentro dos parques naturais. Por outro lado, temos algumas experiências, embora poucas, em termos de áreas protegidas de interesse local. Gostaria também de saber qual a política do Ministério para essas áreas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Eduardo Martins, começo por lhe responder que o que V. Ex.ª faz é tentar avaliar-nos, a meio do mandato, por todo o Programa do Governo. E tem razão: a revisão do regime jurídico da conservação da natureza não está ainda concluída, está em curso.
Devo dizer-lhe, sinteticamente, quanto ao QREN, que vai encontrar meios financeiros para a conservação da natureza, nomeadamente para a gestão de espécies e de habitats e para infra-estruturação da visitação.
Quanto a planos de ordenamento de áreas protegidas, concordo em que é bom compararmos. Comparemos exactamente. E, para sermos concretos, deixe-me referir o seguinte: até 2002, foram aprovados seis planos de ordenamento de áreas protegidas; entre 2002 e 2005, antes do XVII Governo, foram aprovados

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seis planos de ordenamento de áreas protegidas; em 2005, o XVII Governo aprovou dois dos planos que referiu (é verdade!); em 2006 tem três planos prontos a aprovar, neste momento, mas tem, em 2007, 12 planos lançados e mais quatro em revisão, todos em simultâneo, com todos os instrumentos (resolução do Conselho de Ministros, comissões mistas de coordenação constituídas e a reunir).
O Sr. Deputado, neste momento, pode perguntar-me quantos planos aprovámos depois desses dois que referiu. Ainda nenhum, Sr. Deputado, mas espere pelo fim deste ano e aí compararemos de uma forma, creio, mais eloquente.
Quanto a turismo da natureza, diz o Sr. Deputado, com razão, que criámos um grupo de trabalho. Os resultados? Primeiro, o resultado é o próprio Plano Estratégico Nacional do Turismo (PENT), onde encontrará, também fruto da obra desse grupo de trabalho, uma prioridade ao turismo de natureza. Também encontrará, quando for anunciado o programa de investimentos para o turismo, a dimensão própria do turismo na natureza como uma dimensão estratégica. E quero tornar claro, porque tem repercussões noutras respostas, que a visitação, as áreas protegidas como área de visita para o cidadão nacional e estrangeiro, é um vector estratégico que não é de modo nenhum alheio à acção deste grupo de trabalho.
Quanto a promiscuidade, subscrevo inteiramente o que disse o Sr. Ministro, porque foi num contexto muito próprio. Queremos um grande empenho na colaboração com os municípios, mais do que com qualquer outro actor. A promiscuidade encontrámo-la nós quando a nomeação de um director de área protegida podia ser vetada, ou não, pelos municípios envolvidos. Não concordamos com isso, porque é uma promiscuidade, não para não colaborar mas, sim, porque colaboramos melhor com a clarificação.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — E as declarações do Sr. Ministro e do Sr. Secretário de Estado à comunicação social?

O Orador: — Sr. Deputado Renato Sampaio, de alguma forma, V. Ex.ª aflorou o que encontrámos. Quero dizer-lhe que não se mete tudo na reestruturação, e passo a elencar algumas coisas que fizemos no sentido de cumprir o Programa do Governo no que se refere à dignificação do ICN. Nomeadamente, acabámos com o regime de nomeação dos dirigentes, passando a ser por concurso público; repusemos algo que faltava no ICN, competência sobre caça em áreas protegidas — pasme-se! —, a qual tinha sido retirada pelo governo anterior; criámos um grupo de coordenação dos vigilantes da natureza e dotámo-los de fardamento e de identificação, em falta há muitos anos. Como já foi referido pelo Sr. Deputado Luís Vaz, salvo erro, saldámos dívidas com o Orçamento rectificativo de 2005 e operacionalizámos as comissões directivas, onde faltava a designação dos vogais quer do ICN quer dos municípios.
Sr. Deputado Miguel Tiago, tenho a impressão — e isto também se aplica ao Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes — que VV. Ex.as têm um terror preexistente e, depois, lêem os documentos e encontram o que lá não está. Nomeadamente, sempre que viemos a esta Câmara — e foram várias vezes — e falámos de ICN, parece que o tema de entrega ao lucro, aos interesses dos privados, às empresas é algo que, pelos vistos, encontram na reestruturação do ICN. Confesso que não encontro isso, mas os Srs. Deputados dirão onde está.
Quero ir em concreto ao tema — respondendo também ao Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes— dos contratos individuais de trabalho/despedimentos. Também não está no diploma que os funcionários do ICN são obrigados a adoptar o contrato individual de trabalho. Isso não está lá!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Está lá a dizer que o regime é o contrato individual de trabalho!

O Orador: — Comparem o artigo 11.º com o artigo 17.º. No artigo 11.º aplica-se o contrato individual de trabalho e no artigo 17.º está escrito «podem adoptar». Quem não opta mantém-se como funcionário público, como é óbvio, Srs. Deputados, não há qualquer despedimento nesse sentido.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — A letra da lei não é assim tão óbvia!

O Orador: — Voltarei à questão das parcerias adiante.
Sr. Deputado António Carlos Monteiro, primeiro, quanto a estudos, devo dizer-lhe que este processo, integrado no PRACE, foi dos mais participados e produtivos de ideias de que tenho memória na minha fraca experiência. Desde logo, foram debatidas várias propostas internas do ICN. Mas não nos ficámos só com o trabalho «caseiro». Não concordo com o que diz o Sr. Deputado Miguel Tiago, que tudo se pode fazer só na «casa», porque há um problema: a «casa» tem excesso de competências, acrescidas ao longo de anos, e há matérias e competências que temos de ir buscar fora.
Foram consultores especializados em reforma da instituição pública que nos fizeram um trabalho, com diagnóstico de prioridades de prevenção, com uma comparação internacional de outros casos, com modelos organizacionais alternativos, com processos críticos para decisão superior e com processo de transição.
Esses estudos estão concluídos, Sr. Deputado, e terei muito gosto em lhos fazer chegar à primeira oportunidade.

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O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Estamos à espera desde 24 de Maio de 2005!

O Orador: — Quanto a financiamento, tema relevante, pois aparece na boca de vários dos Srs. Deputados, podemos dizer que durante muito tempo se tornou um fetiche da política de ambiente olhar para o Orçamento do Estado e ver se o ICN tem mais ou menos dotação do que no ano anterior: se tem mais, dizse que a política de conservação da natureza está melhor; se tem menos, diz-se que está pior. Não há dúvida de que o Orçamento é importante — longe de mim dizer o contrário —, mas também estava diagnosticado com clareza que, com o ICN como se encontrava, com um «cheque» muito maior, os problemas se mantinham.
A reestruturação é um passo prévio fundamental…

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — O que não quer dizer que qualquer reestruturação sirva!

O Orador: — … para reduzir gastos onde há que os reduzir e para dotar de eficácia o que dela carece.
Porém, temos muito claro que o ICN carece de recursos próprios, e tem de começar com aqueles que é possível gerar na própria área da conservação. E quais são esses? É muito simples: a aposta estratégica de primeiro passo é na visitação como geradora de recursos.
O Sr. Deputado Luís Vaz deu exemplos eloquentes no estrangeiro, que prezamos e que gostaríamos de ver replicados cá, em que para estacionar numa certa área, para visitar um certo percurso, para atravessar uma certa área em certos momentos, é pedido ao visitante um pequeno contributo, que ajuda a gerir a sua presença, que ajuda até a valorizar os serviços de conservação que vai obter e, inclusive, a tratar os resíduos e o pisoteio que gera.
Essa é uma peça fundamental que queremos lançar, que tem um primeiro exemplo na Mata de Albergaria, onde hoje há portagens em certos momentos, excepto para os habitantes locais, portanto, apenas para os visitantes. É uma pequenina portagem que ajuda a conter e a gerir a área protegida.
Sem prejuízo disso, quanto ao tema das parcerias, há um outro «papão» que os Srs. Deputados têm: o «papão» de que queremos entregar as áreas protegidas à empresa a, b ou c. Não queremos! Mas, Srs. Deputados, privados não são só as empresas. Pensando no exemplo referido pelo Sr. Deputado Luís Vaz,…

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — São os casais de biólogos!

O Orador: — … se houver população local querendo fazer o seu negócio, através da concessão de uma certa área protegida, do bar, da visitação, etc., achamos isso magnífico, Sr. Deputado. Portanto, aí podemos discordar inteiramente; achamos isso excelente, é um tipo de parceria que queremos. Porém, entre empresas e municípios, queremos primeiro os municípios. Esse é o nosso principal parceiro para parcerias.
Em segunda via já direi adiante algo mais sobre empresas.
Queria dizer algo sobre financiamento, que foi referido, salvo erro, pelo Sr. Deputado Luís Vaz. O orçamento do ICN aumentou muito nos anos 2000 e 2001; sofreu uma redução drástica nos anos 2002, 2003 e 2004; em 2005, através do Orçamento rectificativo, beneficiou de um reforço que permitiu saldar dívidas; em 2006, num cenário de retracção do orçamento geral do Ministério, subiu; e, em 2007, não sobe, de facto, pois temos no Ministério do Ambiente um PIDDAC mais curto, fruto também do facto de termos contribuído para o Plano de Estabilidade e Crescimento, que não é compaginável com aumentos do PIDDAC do ICN. Mas, pela primeira vez em muitos anos, o ICN tem um orçamento de funcionamento que permite cobrir as suas receitas próprias e permanentes, o que possibilita uma coisa muito simples: progressões na carreira, que durante décadas não foram possíveis e que estão agora a ser retomadas e em curso. Esta é a realidade sobre financiamento no ICN.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — E o quadro de pessoal vai aumentar?

O Orador: — Esse é outro dos «papões». Os Srs. Deputados bem sabem que esta reestruturação foi inserida no PRACE. O PRACE tem as suas etapas e uma etapa sequente à publicação das leis orgânicas e portarias é quadro de pessoal.
Há algo que temos muito claro: num serviço que é basicamente operacional, como o ICN, queremos um bom equilíbrio entre as funções ditas de suporte e as funções operacionais. Posso adiantar-lhe, Sr. Deputado Madeira Lopes, que ambicionamos aumentar as operacionais onde se incluem, por exemplo, os vigilantes da natureza — ambicionamos! — e que é natural que, se encontrarmos excesso em suporte, ambicionamos ter menos funções de suporte. No entanto, não está, com certeza, à espera que façamos uma reestruturação com a «máquina de fazer dinheiro» sem ouvir o Ministério das Finanças. Isto é, efectivamente, integrado no PRACE e estamos em plena fase de abertura desse processo.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Isto não é integrado no PRACE! Isto é PRACE!

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O Orador: — É PRACE, exactamente, Sr. Deputado. Diz bem! Esta reestruturação, felizmente, foi bem integrada no PRACE. Por isso, ela resultou melhor.
Queria ainda dar uma nota à Sr.ª Deputada Alda Macedo sobre financiamento ou, de outra maneira, sobre empresas, porque há a confusão das parcerias puxando para algumas empresas. Existe uma iniciativa, que muito prezamos, da Presidência da União Europeia, a que chamamos — e o Sr. Deputado Madeira Lopes referiu-se a ela de uma forma depreciativa — business and biodiversity (os negócios e a biodiversidade), que visa algo muito simples: trazer à biodiversidade o que ela precisa, que é o reconhecimento do valor económico que, de facto, tem. Defenderemos a biodiversidade mundial, quando for reconhecida.
Ora, as empresas quererem voluntariamente ter as suas próprias estratégias de compensação, de não redução da biodiversidade, etc. É uma mais-valia que perseguimos à escala europeia e também nacional, que é complementar com a nossa visão de conservação. É muito diferente de entregar a área protegida a ou b à empresa c ou d.
Peço desculpa pelas respostas que posso não ter dado.

Aplausos do PS.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: — Vamos passar, agora, aos pedidos de esclarecimento adicionais.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Jovita Ladeira.

A Sr.ª Jovita Ladeira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, Portugal tem um forte recurso potenciador de riqueza, que é a sua biodiversidade. Será que estamos conscientes deste aspecto? Penso que sim.
A singularidade das nossas paisagens, a variedade, a variabilidade e o estado de conservação dos habitats, aliado ao vasto repositório genético com particular interesse agro-silvo-pastoril, reveste-se de uma particular relevância no nosso património natural, que se traduz em responsabilidades acrescidas na conservação desses valores que são insubstituíveis.
O património natural, como o património histórico e cultural, que a ele se encontra ligado de forma indissociável, constituem valores que podem e devem ser relevantes factores de afirmação de uma identidade e competitividade própria do nosso país, quer no contexto europeu quer no contexto mundial.
Mas, sendo a biodiversidade uma riqueza, é uma riqueza que, naturalmente, se encontra ameaçada — o que, penso, é consensual.
Este é um fenómeno global que tem também expressão em Portugal, essencialmente resultante da acção do homem, que muitas vezes se mostra incapaz de promover uma utilização sustentável dos recursos biológicos. E esta é uma situação extremamente preocupante pelas profundas implicações não só de natureza ecológica mas também no plano do desenvolvimento económico e social, em relação ao valor que estes recursos representam para o nosso país em termos económicos, sociais, culturais e científicos.
E porque fazer política exige algum realismo e verdade, não podemos «tapar o sol com a peneira» e ignorar o clima de descrédito a que se chegou no ICN: a desmotivação dos funcionários, a saída acentuada dos quadros técnicos, a falta de estímulo e de reconhecimento do trabalho desenvolvido e também a conflitualidade e a «guerra surda» entre população local e ICN.
Em bom rigor, o retrato, que não é de hoje, é dramático. Assistiu-se a um ciclo de degradação e de desinvestimento na política de conservação da natureza e biodiversidade.
Muitos falam em reformas. Outros fazem-nas — como este Governo, este Ministério e o Secretário de Estado que está hoje, aqui, presente. E isso cria alguns engulhos nas consciências de muitos dos que estão hoje aqui sentados.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Está enganada!

A Oradora: — E porque uma reforma em que se definem opções claras, identificam prioridades e definem processos tem de ter sempre em conta uma situação, à partida, de diagnósticos rigorosos, afinal, Sr.
Secretário de Estado, o que encontrou V. Ex.ª, quando chegou ao Governo, na casa do ICN e o que fizeram durante estes dois anos?

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.

A Oradora: — Para terminar, a última questão tem a ver com os planos de ordenamento do território, que são cruciais para ordenar estes espaços. Gostaria de saber em que fase é que se encontram, como estão e quando estarão concluídos.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Martins.

O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, no Programa do Governo para a área do ambiente este Executivo propôs-se promover a reorganização do ICN, devolvendolhe a dignidade e superando progressivamente a situação de grave estrangulamento financeiro em que se encontrava.

O Sr. Renato Sampaio (PS): — É verdade!

O Orador: — Também nesta Assembleia, em sede de audição parlamentar na Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território, ocorrida no dia 24 de Maio de 2005, o Sr. Ministro do Ambiente retratava, da seguinte forma, o estado financeiro do ICN: «Deparou-se-nos um quadro que, não parece exagero dizer, precisa de ‘cuidados intensivos’. As agressões orçamentais foram enormes, qualquer coisa como 50% de cortes. O destrambelho era completo de um ponto de vista orçamental e financeiro.» Ou seja, o Sr. Ministro, quando chegou ao seu Ministério, afligiu-se, indignou-se e afirmou que, consigo à frente dos destinos do ambiente, «o ICN iria recuperar a sua dignidade e não mais iríamos assistir a situações de ruptura, como as registadas no passado, para vergonha do País». Estas foram palavras do Sr.
Ministro do Ambiente.

Vozes do PS: — E bem!

O Orador: — É necessário, no entanto, fazer a análise entre o que foi dito e o que foi feito.
Em dois anos de Governo socialista, o ICN passou de uma dotação de 40,1 milhões de euros, no último orçamento da responsabilidade de um governo de maioria PSD, para um orçamento proposto para 2007 de 28,5 milhões de euros! Um corte de 28%, Sr. Secretário de Estado! Menos 11,5 milhões de euros! Aliás, este orçamento agora proposto, e contrariamente ao que diz a bancada do Partido Socialista, é mesmo o mais baixo dos últimos 10 anos, pelo menos, com a agravante, Sr. Secretário de Estado, de não haver verba disponível para novas acções na área da conservação e valorização das espécies e habitats, aquela que é precisamente a trave mestra de actuação do ICN. É uma vergonha, é um escândalo e os resultados estão à vista de todos! Noticiava, o Diário de Notícias no dia 23 de Março: «Como o dinheiro é pouco, o ICN vê-se impedido de desempenhar as tarefas mais básicas: a gasolina acaba e os carros dos vigilantes ficam na garagem; se os carros avariam, ficam na oficina; se acaba a tinta das impressoras, deixam de imprimir». Por seu turno, o Público noticiava: «Deslocações suspensas no ICN por falta de dinheiro. Funcionários não podem sair para o campo ou participar em reuniões no estrangeiro».
Sr. Secretário de Estado, é este o caminho de dignificação do ICN que este Governo propõe? Estas situações de ruptura que se verificam agora já não configuram um escândalo? Já não o indignam? Esta equipa do ambiente, Sr. Secretário de Estado, não só não retirou o ICN da situação de «cuidados intensivos», onde dizem tê-lo encontrado, como ainda atirou a instituição para um estado de «coma profundo».
Pergunto-lhe: esta desorçamentação é para continuar? Até quando? O Sr. Secretário de Estado falou na falta de verbas de investimento e a verdade é que, nos últimos dois anos, assistimos ao cancelamento de projectos já aprovados e com financiamento comunitário por falta de componente nacional.
Gostaria de saber se este Governo está hoje, aqui, em condições de garantir que situações como estas nunca mais se vão repetir.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Orador: — Mesmo para terminar, Sr. Presidente, queria falar no lobo ibérico.
As indemnizações pelos prejuízos causados pelo lobo estão extremamente atrasadas, Sr. Secretário de Estado. Aliás, nunca estiveram tão atrasadas! Só se vai pagar, em 2007, metade do que era devido em 2006. Não considera que esta situação pode colocar em risco a protecção da própria espécie?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, ficou claro que esta reestruturação é PRACE. Portanto, não é conservação da natureza, mas PRACE. É uma reestruturação que visa minimizar gastos, custos e pessoal, não é conservação da natureza. Podem fazer as exposições

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de motivos que entenderem para este decretos-lei que isso não altera o seu conteúdo.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Srs. Deputados, é óbvio que está ameaçada a biodiversidade. É unânime todos reconhecermos que está ameaçada. Mas está ameaçada por quem? A natureza entrou, de repente, num processo autodestrutivo e, portanto, está a entrar em colapso? Não! Está ameaçada, por quem? Pelos interesses públicos ou pelos interesses privados? Quem é que o ICN tem de licenciar? Quem é que o ICN tem de fiscalizar? São as entidades privadas, que visam, obviamente, obter lucro através da construção, da exploração dos recursos naturais, que têm, obviamente, um impacto na biodiversidade. Ora, se vamos fazer as parcerias com aqueles que são os fiscalizados, estamos a «pôr a raposa na capoeira» e quem está a abrir a porta é o Governo do Partido Socialista.
Sobre o vínculo laboral, Sr. Secretário de Estado, fica claro, da leitura do decreto-lei, que o regime de trabalho do pessoal no ICNB é o do contrato individual de trabalho, dizendo, mais à frente, que os trabalhadores da Administração Pública podem aceitar voluntariamente a passagem do vínculo para o contrato individual de trabalho. E os que não aceitarem? Tendo em conta que o vínculo é o do contrato individual de trabalho, retira-se que não podem continuar no ICNB. Portanto, vão para os excedentários, certamente. Era bom que o Sr. Secretário de Estado dissesse alguma coisa sobre isso.
Gostaria também de saber como é que o Sr. Secretário de Estado nos pode garantir que os trabalhadores do ICNB com contrato individual de trabalho têm a mesma capacidade de independência para cumprir a legalidade que os trabalhadores com um vínculo à Administração Pública. Como é que um trabalhador com um vínculo precário pode contrariar a chefia, que lhe diz para licenciar uma determinada construção mesmo que ela vá contra na lei, contra o ordenamento do território que está estabelecido ou contra os valores que o ICN pretende defender? Como é que pode um trabalhador fazer face a estes interesses, tendo um vínculo precário? Obviamente que pode denunciar, mas temos todos de reconhecer que está numa situação bastante mais complicada.
Em terceiro lugar, Sr. Secretário de Estado, era bom que nos dissesse quantos estudos foram, de facto, analisados para escolher este e quais foram os critérios que levaram a esta escolha, porque já resultou claro que os critérios não são o da melhoria da política de conservação da natureza mas outros. Também importava saber por que é que o Estado não utilizou os seus meios próprios para fazer esses estudos.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Já terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: — Para terminar, queria só clarificar uma questão: obviamente que, quando o PCP se referiu aos estudos e aos trabalhos que o ICN poderia fazer com os seus próprios meios, estava a falar dos trabalhos da biodiversidade e da conservação da natureza e não sobre os da Administração Pública.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado do Ambiente, registei o seu silêncio quanto às explicações que poderia fornecer, neste Plenário, em relação ao conteúdo dos meus primeiros pedidos de esclarecimento. E, para além de não ter respondido às questões e elaborado minimamente sobre elas, admitiu, pela primeira vez, que tem estudos e que os mesmos não foram fornecidos à Assembleia.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A ninguém!

O Orador: — Sr. Secretário de Estado, este não é um assunto que vem aqui pela primeira vez! Este é um assunto que, desde o dia 24 de Maio de 2005, tem vindo a ser tratado em sede de comissão, em sede de Plenário, e sobre o qual todos os partidos têm feito perguntas insistentemente.
Sr. Secretário de Estado, neste caso, a pergunta é muito simples: por que é que escondeu os estudos? Por que é que esses estudos não estão a ser distribuídos hoje, agora? Sr. Secretário de Estado, dizer que tem um estudo e não o fornecer a quem está a fiscalizar a actuação do Governo é esconder «as cartas na manga».

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — É falta de respeito!

O Orador: — Sr. Secretário de Estado, desculpe que lhe diga, mas isso não é politicamente sério.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Exactamente!

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O Orador: — Portanto, o Sr. Secretário de Estado não responde às perguntas concretas que coloquei quanto ao modelo de organização, quanto ao número de funcionários que são necessários, quanto à estrutura orgânica, quanto ao que, em termos de financiamento, é a componente que deve ser pública e a que deve ser privada. Sabemos que houve um corte de 68% nas verbas em sede de PIDDAC. Como é que isso é compensado? Perguntei também se há estudos que fundamentam esta decisão. O Sr. Secretário de Estado admite que os mesmos existem mas ainda não os forneceu, apesar de, ao longo dos meses, constantemente, esta matéria ter vindo a ser tratada.
Se o Sr. Secretário de Estado não responde a nada disto, então, isso é esconder «cartas na manga», é não tratar a Assembleia com o respeito que lhe é devido por parte do Governo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Por outro lado, também é importante falar um pouco sobre os planos de ordenamento.
Sabemos que os planos de ordenamento deviam estar prontos há já muito tempo, até desde o tempo dos governos do próprio Partido Socialista.
Neste momento, faltam mais de metade dos planos de ordenamento, mas também já sabemos que não vão estar prontos dentro do prazo que o próprio Governo estabeleceu, já que era suposto estarem prontos até final de 2005 e o Governo adiou o prazo para final de 2007. Ora, Sr. Secretário de Estado, já sabemos que vamos ter de ter um novo decreto-lei a prolongar o prazo por mais dois anos.
Pergunto, então: se estão a decorrer 12 planos, será que, em 2009, vamos ter uma nova prorrogação para 2011? Mais uma vez, os planos não vão estar prontos a tempo? Esse é, pois, um ponto que gostaria que o Sr. Secretário de Estado explicasse, porque não adianta continuar a alimentar expectativas já que, com o Governo do Partido Socialista, os prazos, nomeadamente em matéria de ambiente, nunca são para cumprir.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Saraiva, para um pedido de esclarecimento adicional.

O Sr. Álvaro Saraiva (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O poder local democrático tem permitido a resolução de muitos problemas e é o que, com uma gestão de proximidade, melhor conhece o terreno e o seu ordenamento.
É do conhecimento geral que, neste momento, estão em curso negociações entre o Governo e a Associação Nacional dos Municípios Portugueses sobre o pacote de transferência de competências para as autarquias locais. Aliás, o Sr. Ministro António Costa, na sessão comemorativa do 30.º aniversário das primeiras eleições autárquicas, fez um desafio aos autarcas no sentido de haver uma discussão séria e participada e afirmou que contava com os valiosos contributos dos municípios sobre estas matérias.
Neste processo de transferência de competências da administração central para a administração local, estão o ambiente e o ordenamento do território como matérias essenciais das negociações.
Quando o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, documento da autoria do Ministério do Ambiente, aponta para a necessidade de metodologias assentes na proximidade aos beneficiários, quando é reconhecido o falhanço do modelo centralista para gerir as áreas protegidas, eis que se anuncia uma medida que vem reforçar esse mesmo modelo, afastando ainda mais os municípios da gestão de uma significativa parte do seu território.
Além do mais, trata-se de uma clara violação da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, no seu artigo 26.º, que determina ser da competência municipal participar na gestão das áreas protegidas de interesse regional e nacional.
Sr. Secretário de Estado, a pergunta que coloco é muito simples: o Ministério que V. Ex.ª integra ouviu os municípios, através da respectiva associação nacional, sobre esta matéria? Não acha que está a ir contra a filosofia apresentada pelo Sr. Primeiro-Ministro quando, no último debate mensal, anunciou que era intenção do Governo dar mais responsabilidades aos municípios na gestão do território?

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Manuel Alegre.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, houve aqui um pequeno lapso. A Mesa deu a palavra a Os Verdes antes de a ter dado ao BE, o que teria sido a ordem correcta de uso da palavra.
Assim, para um pedido de esclarecimento adicional, dou agora a palavra à Sr.ª Deputada Alda Macedo, que tem 3 minutos.
Faça favor.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, deixe-me dizer-lhe que a visão

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idílica que aqui nos trouxe do pequeno quiosque no meio do bosque ou da pequena portagem no caminho florestal é de uma ingenuidade que só pode ser ultrapassada pelos contos de fadas para embalar crianças.
Na verdade, quando os senhores falam em «parcerias com os privados», não estão a falar nem de pequenos quiosques nem de pequenas portagens. Do que os senhores estão a falar é de implicar as empresas que estão interessadas num espaço que é um grande território que tem um valor, o valor comercial da paisagem que as mesmas bem conhecem, e cuja exploração estão interessadas em fazer à custa da degradação do próprio espaço.
É que, na verdade, quando se fala na degradação e na perda de qualidade da biodiversidade, estas não surgem por acção do homem mas devido a um modelo de desenvolvimento que é iníquo porque subverte o que é a lógica das prioridades.
Sr. Secretário de Estado, não foi dada resposta para os problemas essenciais.
O Sr. Secretário de Estado não nos convence quanto à capacidade de encontrar o financiamento necessário para a reabilitação do ICN e para a sua capacidade de intervenção, como não nos convence no que diz respeito ao outro problema que tem a ver com os recursos humanos necessários para levar a cabo a missão, que é complexa, de mediação, de regulação e de negociação com os poderes locais, sobretudo quando, hoje, estamos perante um vazio — e esta é a última questão — naquilo que será o agrupamento das áreas protegidas em cinco grandes grupos. Na verdade, está a faltar-lhe aqui o interlocutor político que tem a ver com estes agrupamentos, que é o poder regional.
E à falta deste interlocutor político, o Governo limita-se a desvalorizar aquele que é o papel das autarquias locais, sem reconhecer que, na verdade, para levar esta reforma a cabo e para ela ter um mínimo de coerência naquilo que é a estrutura que lhe está subjacente, faltam-lhe duas coisas: ter um interlocutor político ao nível da região e quadros, meios técnicos e humanos capazes de executar a missão do ICN.
Em relação à resposta a este problema, o Sr. Secretário de Estado não pode remeter apenas para o Ministério das Finanças, tem de haver uma ideia de como é que, do ponto de vista do ICN, o mesmo vai ser resolvido.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos interromper o debate porque é chegada a hora regimental para votações.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.
Os Srs. Deputados que não puderem fazer uso do respectivo cartão electrónico já sabem que têm de se dirigir aos serviços para assinarem a folha de presenças.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 177 presenças, a que há que somar a de 10 Srs. Deputados que a assinalaram manualmente, totalizando 187 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Começamos pela apreciação do voto n.º 95/X — De pesar pela morte de Boris Ieltsin (CDS-PP). Cada grupo parlamentar dispõe de 2 minutos para usar da palavra.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este voto tem a ver com a personalidade de Boris Ieltsin, que foi uma figura relevante para o seu país, para a democracia.
Toda a comunidade internacional fez referência ao seu falecimento e parece-me que a Assembleia da República não poderia ficar de fora…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — … em relação a uma figura como Boris Ieltsin, que possibilitou que a União Soviética se tornasse num país mais democrático.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Boris Ieltsin foi o primeiro Presidente eleito e, de facto, foi referido por todos os países da Europa e por todas as pessoas de bom senso como tendo sido fundamental para que, hoje, haja mais liberdade, haja pluralidade na Rússia. Foi também quem criou as bases para uma recuperação económica da Rússia, que se deseja, e as bases para uma relação mais profícua e mais séria com os países da Europa.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Por esses motivos, entendemos que esta Assembleia, esquecendo o passado, se quise-

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rem, mas olhando para o futuro e para as marcas deixadas por Boris Ieltsin, deve votar favoravelmente este voto.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado José de Matos Correia.

O Sr. José de Matos Correia (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Boris Ieltsin foi seguramente uma das personalidades mais marcantes do final do século XX.
Se é verdade que foi Gorbatchev quem teve a coragem de acabar com o Estado totalitário que era a União Soviética, através das suas políticas de Perestroika e de Glasnost, foi Boris Ieltsin quem conduziu a Rússia para a comunidade dos países democráticos e foi Boris Ieltsin quem assumiu a tarefa, complexa e hercúlea, de fazer de um Estado daquela dimensão e com todos os seus problemas, um Estado que rejeitou o totalitarismo e que foi capaz de abraçar a democracia e de se transformar num Estado aberto, com uma economia livre e concorrencial.
Acresce que Ieltsin teve a coragem de, pela primeira vez na Rússia, não temer a opinião dos seus compatriotas. Foi o primeiro Presidente da Rússia eleito, foi coerente com tudo o que defendeu, foi um dos grandes defensores do fim da União Soviética e, nessa medida, é credor do respeito de toda a comunidade internacional.
O mundo é diferente, em larga medida, pela coragem que Boris Ieltsin teve. O mundo é hoje uma realidade em que a democracia impera em muitos mais países do que naquela época porque Ieltsin teve a coragem de, à cabeça de um país com grandes dificuldades, promover a mudança democrática.
Foi inteiramente merecida, por isso, a manifestação de pesar que a comunidade internacional soube dar no funeral de Boris Ieltsin, com a presença de representantes da grande maioria dos países do mundo.
É por isso também inteiramente merecida a homenagem que a Assembleia da República quer prestarlhe, votando este voto de pesar, manifestando assim a sua consternação pelo desaparecimento de um grande homem e de um grande defensor da democracia e da liberdade no final do século XX.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Nem a Federação da Rússia classificou Boris Ieltsin como um herói da liberdade da forma que o CDS aqui o faz.
Diga-se de passagem que, tirando o que é o ritual do regime, as homenagens foram bem discretas e claramente desqualificadas em comparação com as prestadas a outras personalidades da Federação da Rússia. E isso tem a sua razão de ser.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — É verdade que o Brezhnev teve uma manifestação muito superior!

O Orador: — É que dizer que Boris Ieltsin foi uma personalidade controversa é dizer muito pouco.
Pela nossa parte, não nos move qualquer saudade em relação à União Soviética…

Vozes do CDS-PP: — Mas parece!

O Orador: — … e, portanto, afastamo-nos bem disso.
No entanto, é bom que, atenta a responsabilidade política na cena internacional, se veja que Boris Ieltsin foi o artífice da chacina na Chechénia e que, como é reconhecido por todos os analistas, ocidentais e orientais, onde quer que se posicionem, foi ele quem abriu a «caixa de Pandora» da máfia russa, dos oligarcas, tudo isso que, hoje, é absolutamente condenado pela comunidade internacional. Não estou a referir-me a bizarrias de comportamento do, ao tempo, Presidente Boris Ieltsin, estou a referir-me a responsabilidades criminosas na cena política internacional.
Entendemos que, da parte do CDS, é estulto e ousadíssimo, é uma imprudência e uma irresponsabilidade política propor um voto do género deste.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado Renato Leal.

O Sr. Renato Leal (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ieltsin foi uma personalidade que marcou de forma muito significativa a última década do século passado, não só na Rússia como, e sobretudo, em toda

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a Europa de Leste. Muito amado por uns, profundamente odiado por outros, foi indiscutivelmente um dirigente polémico, não raro altamente polémico.
Para a História fica, sobretudo, o seu difícil, mas convicto, combate pela liberdade.
Nestas circunstâncias, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista irá votar favoravelmente este voto.

Aplausos do PS.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Mais uma vez, o CDS utiliza o voto de pesar não para manifestar pesar mas como arma de arremesso político para procurar fazer um debate sobre outro tema que não o pesar pela morte de alguém.

Protestos do CDS-PP.

Infelizmente, outros partidos, designadamente o Partido Socialista, têm colaborado nesta forma de actuação, que em nada prestigia os votos de pesar da Assembleia da República.
Boris Ieltsin foi, objectivamente, um firme aliado dos interesses do Ocidente e dos Estados Unidos da América na interferência na situação política interna da então União Soviética. Foi um instrumento muito útil, naquele período de fim da Guerra Fria e de transição para outro momento político na vida política mundial. Foi, para o seu país, aquele que desencadeou uma política de desastre económico e social que fez com que — vejam bem! — a esperança média de vida, na Rússia, tenha diminuído, por essa altura, 10 anos.

Protestos do CDS-PP.

Vozes do PCP: — Oiçam!

O Orador: — Foi aquele que desencadeou crises militares e conflitos regionais, que até hoje se arrastam e que tanto sofrimento têm trazido para o povo daquelas regiões.
Foi aquele que — vejam bem o seu carácter democrático! — mandou bombardear o Parlamento eleito, quando ele se opôs a algumas das suas decisões.

O Sr. António Filipe (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Aí está o exemplo de democracia que o CDS, o PSD e o PS querem hoje aqui valorizar! Foi aquele que transferiu o património público — o qual, bem ou mal, pertencia ao povo e ao Estado daquele país — para a mão de um grupo de oligarcas que circulavam à sua volta e que fizeram, de um dia para o outro, grandes fortunas, que ainda hoje se mantêm muitas vezes ligadas a actividades e organizações criminosas.
Por isso, não poderemos votar a favor deste voto de pesar.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Vou já terminar, Sr. Presidente.
Não votaremos a favor deste voto de pesar, não por falta de respeito pela morte de qualquer ser humano mas porque ele não é objectivamente um voto de pesar. É, sim, a tentativa de impor uma verdade que não é verdadeira e que, por isso, vai merecer o nosso voto contra.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Naturalmente, a morte de qualquer ser humano é sempre de lamentar e não causa a satisfação de ninguém.
Contudo, não podemos deixar de exprimir a nossa perplexidade não só pelos termos em que este voto é elaborado mas também pelo contexto em que ele se insere. De facto, não se percebe a intenção do Partido Popular ao propor um voto de pesar pela morte de um ex-estadista de um país estrangeiro que, no seu país e durante o período em que esteve no poder, deixou uma herança de extrema miséria para o seu povo, de instalação da corrupção ao mais alto nível e das máfias, e de propagação da pobreza pelo povo russo.

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Além disso, mantém-se vivo na nossa memória o ataque perpetrado por tanques ao Parlamento russo, legitimamente eleito.
Por isso, mais do que não apoiar o voto de pesar pela morte de uma pessoa, não apoiamos principalmente aquilo que representou o período em que esteve no poder nem aquilo que são as intenções não confessadas de quem apresenta este voto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Governo, quero também associar-me a este gesto da Assembleia da República.
Como as autoridades dos Estados democráticos, as autoridades do Estado português reagiram no próprio dia da morte do ex-Presidente da Federação Russa, Boris Ieltsin, lamentando-a — desde logo, pela declaração do Sr. Presidente da República, e, depois, em nome do Governo, pela declaração do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros — e valorizando, como a generalidade das autoridades dos Estados democráticos no mundo de hoje, o importante papel de Boris Ieltsin na continuação e no aprofundamento do processo de mudança política e social, iniciado na então União Soviética por Mikhail Gorbatchov.
Passados poucos dias da morte de Boris Ieltsin, não é altura para juízos históricos sobre a sua personalidade e a sua contribuição para o seu país e a humanidade — deixemos isso para os historiadores.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Mas é o que está a fazer!

O Orador: — Como a generalidade das instituições dos Estados democráticos, repito, julgo que, nesta hora, o que vale a pena salientar é esse seu gesto, em Agosto de 1991, absolutamente decisivo para a derrota do golpe que queria parar o processo de democratização e liberalização na então União Soviética.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Isso já não é história?!

O Orador: — Esse seu gesto basta para inscrevê-lo no lado daqueles que contribuíram para que a história do final do século XX fosse a história de uma nova vaga de revoluções democráticas na Europa e no mundo.

Aplausos do PS e de Deputados do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto que acabámos de apreciar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

É o seguinte:

Voto n.º 95/X De pesar pelo falecimento de Boris Ieltsin

Com 76 anos, morreu, em Moscovo, na passada segunda-feira, Boris leltsin.
Boris Ieltsin, que governou a Rússia entre 1991 e 1999, foi o primeiro Presidente eleito democraticamente do período pós-comunismo. A sua ascensão ao poder marcou o fim da antiga União Soviética (URSS).
Representou uma época no seu país, foi uma referência chave no pós-comunismo. Enquanto Presidente, enfrentou enormes desafios e mandatos difíceis, mas conseguiu aproximar o Leste e o Ocidente e ajudou a substituir o confronto pela cooperação.
Boris Ieltsin, apesar de polémico, foi uma grande personalidade da política russa e internacional, um corajoso defensor da liberdade, associado e recordado para sempre pela transição da Rússia de um regime opressor das liberdades para uma sociedade com maiores garantias de pluralidade.
Boris Ieltsin foi, sem dúvida, uma figura histórica numa época de grandes mudanças e desafios para a Rússia.
A Assembleia da República manifesta o seu pesar e consternação pela morte de Boris Ieltsin.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, passamos à apreciação do voto n.º 97/X — De pesar pelo falecimento do Dr. António Rocha e Melo (PS).
Tem a palavra o Sr. Secretário, para proceder à respectiva leitura.

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O Sr. Secretário (Fernando Santos Pereira): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é o seguinte:

António Rocha e Meio nasceu em Penafiel, em 1923, mas viveu desde muito jovem no Porto, onde se licenciou em Medicina.
Logo após a licenciatura, dedicou-se à neurocirurgia, de que foi um dos pioneiros no nosso país, tendo tido papel de destaque na formação de várias gerações de neurocirurgiões.
Entre 1955 e 1957, completou a formação neurocirúrgica em Edimburgo, obtendo o título de especialista no ano imediato. Em 1962, esteve de novo nesta cidade escocesa, efectuando um estágio de seis meses no Laboratório de Neurofisiologia.
Em 1972, foi nomeado chefe de serviço de neurocirurgia no Hospital Geral de Santo António, passando, em 1978, a ser o primeiro director desse serviço. A sua dedicação ao Hospital e aos doentes foi, durante décadas, inexcedível. Graças à sua iniciativa e visão, reuniu importantes apoios privados, que permitiram dotar o Hospital e o serviço da mais moderna tecnologia e de condições de conforto para os doentes.
Entre 1980 e 1993, foi regente da cadeira de neurocirurgia do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, que ajudou a fundar, em 1975.
Alcançou elevado prestígio profissional no nosso país e no estrangeiro, representando a neurocirurgia portuguesa na Sociedade Americana de Neurocirurgia, na European Association of Neurosurgical Societies e no Comité de Traumatologia da World Federation of Neurosurgical Societies. Foi presidente da Sociedade Luso-Espanhola de Neurocirurgia e da Sociedade Portuguesa de Neurologia e Psiquiatria.
Para além desta intensa actividade profissional, António Rocha e Meio foi sempre um cidadão empenhado na causa da liberdade, na participação cívica e na cultura. Contribuiu, em inúmeras ocasiões, para actividades da oposição democrática. Entre 1989 e 1991, foi administrador da Fundação de Serralves e vice-presidente desta instituição entre 1991 e 1997.
Em 2007, foi agraciado pela Câmara Municipal do Porto com a Medalha Municipal de Mérito — Grau Ouro.
Após algumas semanas de doença, que interromperam de modo abrupto uma vida rica de envolvimento cívico que constitui um exemplo de cidadania, a morte levou-o no passado 30 de Abril.
Nesta hora, a Assembleia da República curva-se perante a memória de António Rocha e Meio e envia as mais sentidas condolências à sua família e às instituições a que esteve ligado.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos votar o voto que acabou de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Peço aos serviços que façam chegar este voto à família.
Srs. Deputados, vamos, agora, apreciar o voto n.º 96/X — De condenação pelo genocídio no Darfur (BE).
Cada grupo parlamentar disporá de 2 minutos para intervir.
Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, pensa esta bancada que é altura de o nosso Parlamento tomar uma posição face ao genocídio no Darfur: 200 000 mortos, 2 milhões de pessoas brutalmente deslocadas das suas casas, 3,5 milhões de pessoas dependentes da ajuda internacional, generalização da violação e abuso sexual de mulheres e crianças, tudo tem sido utilizado como uma arma de guerra e de perseguição à população civil no Darfur.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se faz sentido falar de fascismo a propósito do fundamentalismo islâmico, este é um caso típico dessa situação.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Orador: — Um regime brutal, racista, violento, voltado para as piores execrações contra a população que se lhe opõe. É necessário, portanto, proceder, fazer diligências e pressões internacionais para a interposição de uma força de Capacetes Azuis que acabe com o genocídio e a matança no Darfur. Uma força genuinamente de paz e não de guerra.
Assim, a proposta do nosso voto é de condenação do genocídio e de apelo para que o Governo português se associe às pressões internacionais no sentido de realizar essa intermediação dos Capacetes Azuis no conflito do Darfur.

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pela parte do Grupo Parlamentar do PCP, votaremos a favor deste voto e associamo-nos ao alerta e às preocupações que permitam chamar a atenção e mobilizar esforços para o gravíssimo problema humanitário que continua a verificar-se na região do Darfur.
Com efeito, as vidas humanas sacrificadas, os deslocados, a fome que continua, cada vez mais, a assolar aquela região são problemas de extrema gravidade e complexidade que exigem o contributo construtivo de todos para a construção da paz, de uma paz justa e duradoura, para o urgente apoio humanitário às populações, para a viabilização de uma saída para a gritante situação que ali se verifica. De facto, há aqui um papel fundamental das Nações Unidas e, naturalmente, do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados.
Nesta matéria, entretanto, importa aqui sublinhar que, assim como em outros processos noutras partes do mundo, há também ainda muito caminho a percorrer no campo da diplomacia.
Queremos, assim, reiterar que, neste como noutros processos, é imperioso que o apoio humanitário, a solidariedade, a defesa da paz não permitam dar espaço a processos e a resultados que, em vez de serem soluções, sejam em si problemas graves de escaladas militaristas, de processos neocolonialista que a história e a vida já nos demonstraram no que poderão resultar.
Nesse sentido, associamo-nos à preocupação expressa por este voto e votaremos favoravelmente o que temos em apreciação.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão.

O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Mais de 200 000 mortos, mais de 2 milhões de refugiados. É esta a situação trágica humanitária que se vive na região do Darfur.
O Governo do Sudão tem usado aviões, que caracteriza mentirosamente como sendo das Nações Unidas, para bombardear aldeias na região do Darfur. É esta a tirania sanguinária que ali se vive.
Existe o incumprimento generalizado de todas as resoluções das Nações Unidas. É esta a manobra usada para permitir a continuação do genocídio.
Por isso, o PSD votará a favor deste voto de condenação porque está claramente ao lado da paz e do direito internacional.
Sr. Presidente, aproveito para fazer referência ao voto que o Partido Socialista apresenta relativo ao Dr.
Jorge Sampaio. São conhecidas as divergências políticas entre o Partido Social Democrata e o Dr. Jorge Sampaio, especialmente no que diz respeito à última parte do seu mandato. Contudo, o que aqui está em causa é a designação de alguém para um alto cargo de grande dignidade a nível internacional. O PSD nunca deixou de votar favoravelmente moções nesse sentido e assim continuará a fazê-lo. Por isso, votará favoravelmente aquele voto.

Aplausos do PSD.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Ao contrário do Partido Socialista, quando foi com o Dr. Durão Barroso!

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS-PP também se associa a este voto por considerar que estamos perante o maior e mais complexo problema humanitário.
Entendemos que, com este gesto, embora simbólico, fazemos aquilo que devemos, pois não podemos nem devemos calar uma situação destas, não podemos nem devemos deixar de a denunciar sempre e quando for possível. Pelo contrário, podemos e devemos pedir ao Estado português que, através de todas instâncias, utilize todos os meios ao seu alcance para que seja encontrada uma solução para esta miséria, para esta desgraça e para aquilo que é, na nossa opinião, a parte mais negra da natureza humana.
De facto, estamos perante uma catástrofe! Trata-se de um problema que muitas vezes subsiste e sobrevive com base na hipocrisia de muitos governos e de muitos cidadãos, que podem e devem tomar uma posição.
Este voto denuncia e alerta para essa situação, merecendo, por isso mesmo, o acordo e o apoio do CDS-PP.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado Renato Leal.

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O Sr. Renato Leal (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O voto de condenação, da autoria do Bloco de Esquerda, começa por referir 200 000 mortos, 2 milhões de pessoas brutalmente deslocadas das suas casas, 3,5 milhões de pessoas dependentes da ajuda internacional.
A vida ensina-nos que se estes números não são verdadeiros é porque, infelizmente, podem pecar dramaticamente por defeito. Nestas circunstâncias apetece-nos citar a canção «Vemos, ouvimos e lemos/Não podemos ignorar».
A situação referida no voto de condenação do Bloco de Esquerda merece, indiscutivelmente, o nosso apoio e, em consequência, a nossa permanente condenação de todas as atrocidades que são cometidas no Sudão.
Gostaria apenas de fazer uma pequena ressalva no primeiro parágrafo do preâmbulo do voto. Preferiríamos que, em vez de «passividade», aparecesse, eventualmente, «relativa passividade» ou «ineficácia» da comunidade internacional, porquanto estamos convictos de que, a determinados níveis da diplomacia internacional, designadamente da União Europeia, vários esforços foram efectuados no sentido de minimizar esta situação.
Por isso nos empenharemos, não só durante a Presidência portuguesa da União Europeia — infelizmente, este conflito não se sanará durante esse lapso de tempo — como porfiaremos para que esta situação seja ultrapassada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Ecologista «Os Verdes» associa-se a este voto de condenação pelos actos que têm vindo a decorrer no Darfur, no Sudão Ocidental.
As situações de guerra, de fome, de destruição de recursos naturais, de violação de direitos humanos, de genocídio, de limpeza étnica ali existentes são, de facto, aterradores e de uma brutalidade incrível e inadmissível. Infelizmente, não são caso único, nem sequer restrito a África. Também num passado longínquo e num passado mais recente tivemos, na Europa, situações deste género, que são lamentáveis. Mas recordamos, por exemplo, em África, a situação vivida no Ruanda.
Aquilo que gostaríamos de evidenciar, sem querer simplificar a questão, é que, muitas vezes, por trás desses conflitos existe uma situação que é já de si economicamente muito frágil, onde grassa a pobreza e a dificuldade de acesso a bens fundamentais.
Por isso, impõe-se, da parte da comunidade internacional, não apenas a intervenção em situações de crise dramáticas como estas, apesar de serem fundamentais, mas também um apoio ao desenvolvimento sustentável, ao combate à pobreza e também ao combate à hipocrisia de quem trafica armas e permite que estas situações de conflito assumam pressões gigantescas e extremamente vergonhosas para a humanidade.
Para finalizar, esperamos que este voto não seja apenas «um lavar de mãos». Hoje, a Assembleia da República «dá um passo» que é um gesto simbólico e significativo de condenação do genocídio, mas é ainda mais importante que se dêem passos concretos tendentes a acabar com a situação gravíssima que se vive naquela região.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apenas umas breves palavras para me associar a esta iniciativa e dizer que o Governo toma boa nota do sentimento de unanimidade que ela suscita na Assembleia, designadamente no que toca às recomendações que a proposta apresentada endereça ao Governo.
Portugal ocupará a presidência da União Europeia no segundo semestre e, como todos sabemos, a relação entre a Europa e a África e a defesa e o respeito pelos direitos humanos em qualquer parte do mundo são, naturalmente, linhas mestras da nossa política externa e serão também linhas mestras da nossa Presidência.
Aproveito para também me associar ao voto de saudação pela designação do Dr. Jorge Sampaio para Alto Representante das Nações Unidas para o Diálogo das Civilizações. De facto, a frequência com que personalidades que ocuparam importantíssimas funções na vida pública portuguesa são chamadas a ocupar, depois, importantíssimas funções nas mais variadas instâncias da ordem internacional deve enchernos a todos de orgulho e só demonstra a qualidade da nossa classe política.
Importa também realçar que uma das vozes mais importantes, mais empenhadas e mais autorizadas na denúncia do genocídio no Darfur é, justamente, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, António Guterres.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos proceder à votação do voto n.º 96/X — De condenação pelo genocídio no Darfur (BE).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

É o seguinte:

Voto n.º 96/X De condenação pelo genocídio no Darfur

200 000 mortos. 2 milhões de pessoas brutalmente deslocadas das suas casas. 3,5 milhões de pessoas dependentes da ajuda internacional para continuarem a subsistir. São estes os números do brutal genocídio que ocorre, desde 2003, no Darfur, no Sudão Ocidental, perante a passividade da comunidade internacional.
A generalização da violação e abuso sexual de mulheres e crianças tem sido utilizada como uma arma de guerra e de perseguição à população civil. O Governo do Sudão tem utilizado falsos aviões da ONU para bombardear aldeias na região do Darfur.
António Guterres, Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, afirmou recentemente que o que se está a passar no Sudão e no Chade é «o maior e o mais complexo problema humanitário no mundo.» Perante o incumprimento generalizado de todas as resoluções da ONU, a última ronda negocial com o Governo sudanês — que teve lugar na Etiópia, em Novembro de 2006 — não conseguiu forçar o presidente Bashir a aceitar a entrada de 10 000 tropas conjuntas da ONU e da União Africana, sem as quais é impossível parar a violência sectária que tem marcado esta região do globo nos últimos quatro anos.
Assim, nos termos regimentais em vigor, a Assembleia da República reunida em Plenário: Condena veementemente o genocídio e a limpeza étnica levado a cabo pelo Governo do Sudão, responsável pelo massacre de 200 000 pessoas e a deslocação forçada de mais de 2 milhões de pessoas das suas casas.
Recomenda que o Governo português defenda, em todas as instâncias internacionais em que estiver representado, nomeadamente na União Europeia, da qual Portugal assume a Presidência rotativa dentro de poucos meses, o reforço da pressão diplomática e económica ao regime sudanês, forçando-o a aceitar a presença de 10 000 efectivos internacionais para pôr fim à violência sectária que grassa na região.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos, agora, proceder à votação do voto n.º 98 /X — De congratulação pela designação do Dr. Jorge Sampaio para Alto Representante das Nações Unidas para o Diálogo de Civilizações (PS).
Tem a palavra a Sr.ª Secretária para proceder à respectiva leitura.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é o seguinte:

No dia 26 de Abril, o Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-Moon, anunciou a designação de Jorge Sampaio para o cargo de Alto Representante para o Diálogo de Civilizações.
A iniciativa internacional Diálogo de Civilizações pretende-se como uma opção institucional estratégica para dissipar tensões perigosas e aprofundar o relacionamento entre sociedades e povos, garantindo a estabilidade internacional e a paz.
As qualidades pessoais e políticas de Jorge Sampaio auguram-lhe um excelente desempenho na promoção das iniciativas que fomentem o diálogo e a compreensão entre os povos, o respeito pela diversidade das suas culturas, civilizações e religiões, bem como na contribuição para o reforço da vontade colectiva em abordar os problemas e os desequilíbrios mundiais de forma concertada.
A Assembleia da República não pode deixar de registar os termos muito honrosos da designação de Jorge Sampaio e de se associar ao juízo das Nações Unidas, segundo o qual Jorge Sampaio «teve uma carreira brilhante e traz um tesouro de experiência para o seu novo cargo.» A designação de Jorge Sampaio, ao mesmo tempo que o prestigia, configurando um reconhecimento internacional das suas qualidades pessoais e políticas, é também muito importante e honrosa para Portugal, por se enquadrar na nossa melhor tradição de ponte entre povos e culturas.
A Assembleia da República congratula-se e felicita Jorge Sampaio pela sua designação para Alto Representante das Nações Unidas para o Diálogo de Civilizações e augura-lhe um feliz desempenho para as funções para as quais acaba de ser designado.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos proceder à votação deste voto.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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Srs. Deputados, segue-se a votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 119/X — Aprova normas para a protecção dos cidadãos da exposição involuntária ao fumo do tabaco e medidas de redução da procura relacionadas com a dependência e a cessação do seu consumo.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP, do BE, de Os Verdes e do Deputado do CDS-PP António Carlos Monteiro.

A proposta de lei baixa à 10.ª Comissão.
Srs. Deputados, vamos, agora, proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 116/X — Aprova o regime jurídico que estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projectos, pela fiscalização de obra e pela direcção de obra, que não esteja sujeita a legislação especial, e os deveres que lhes são aplicáveis, e revoga o Decreto n.º 73/73, de 28 de Fevereiro.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do PCP.

Esta iniciativa baixa à 9.ª Comissão.
A Sr.ª Secretária vai dar conta de três relatórios e pareceres da Comissão de Ética.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 5.º Juízo Tribunal Instrução Criminal de Lisboa, Processo n.º 7002/06.1 — TDLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Helena Lopes da Costa (PSD) a prestar depoimento presencialmente, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Santo Tirso, Processo n.º 947/01.7 — TASTS, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Joaquim Couto (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Vila do Conde, Processo n.º 1059/06.2 — TBVCD, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Lúcio Ferreira (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Srs. Deputados, vamos retomar o debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar de «Os Verdes», sobre o Instituto da Conservação da Natureza.
Para responder aos pedidos de esclarecimentos que lhe foram colocados, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a Sr.ª Deputada Jovita Ladeira perguntou-me o que encontrámos e o que fizemos, o que me dá oportunidade de reafirmar o que fizemos quanto à dignificação do ICN, nomeando dirigentes de áreas de protegidas, repondo competências de caça, coordenando, identificando e dando fardas aos vigilantes, saldando dívidas e operacionalizando comissões directivas. Mas ainda posso falar da reclassificação que fizemos de uma área de paisagem protegida em parque natural, da alteração de limites de dois parques naturais, do desbloqueamento da classificação do Cabo Mondego como monumento natural, de protocolos com câmaras municipais para gestão de zonas húmidas, do programa sectorial agrícola do Mira, do facto de termos complementado o plano de ordenamento e compatibilizado a actividade agrícola com a conservação e a conclusão do plano sectorial da Rede Natura 2000.
Queria sobretudo salientar que Portugal tem uma dimensão estratégica potencial na biodiversidade. De facto, temos uma considerável biodiversidade no contexto europeu, mas temos, nos nossos parceiros estra-

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tégicos da CPLP, nomeadamente no Brasil e nos países africanos, parceiros de grande biodiversidade.
Estávamos, contudo, absolutamente descapitalizados em termos das nossas capacidades a nível internacional. A Comissão de Coordenação Interministerial para a Biodiversidade estava desaparecida, o comité nacional do programa da UNESCO Man and Biosphere inexistia, não existia comité para as zonas húmidas (Convenção de Ramsar), etc. Tudo isso existe hoje e, portanto, estamos bem para além da mera reestruturação do ICN.
O Sr. Deputado Ricardo Martins falou do financiamento. Não vou repetir os números que referi há pouco, relativos ao período de 2000 a 2007, mas, relacionado com o que disse a Sr.ª Deputada Jovita Ladeira, quero fazer um reconhecimento público do ICN e do trabalho que este Instituto faz. O lugar comum do «coma profundo», da «área protegida parada», do «entulho», da «área protegida destruída pelo fogo», etc., não só denota que não conhece as áreas protegidas no terreno como dá conta de algo que, do meu ponto de vista, é um pouco confrangedor. Refiro-me ao desrespeito por aqueles que, com falta de meios, é certo, muito fazem, durante muito tempo, para termos as áreas protegidas que temos.

O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Ninguém diz o contrário!

O Orador: — O exemplo que V. Ex.ª deu relativo ao lobo ibérico, parece-me, então, particularmente infeliz. É que durante muitos anos houve atrasos de 4, de 3 ou de 2 anos…

O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Nunca! No máximo, os atrasos foram de 1 ano!

O Orador: — … e nós vamos chegar ao fim de 2007 com 2006 pago, ou seja, vamos ficar apenas com 1 ano de atraso, o que não é o ideal, mas é melhor do que a situação verificada nos anos anteriores.
Vou, contudo, dar-lhe números que desmentem as ideias que transmitiu de ruptura e de coma! No Gerês, em 2006, tivemos 1150 autos de avaliação, 90% dos quais confirmados como ataques de lobo, envolvendo 520 pastores e um total de indemnizações de 255 000 €. Sr. Deputado, adivinhe com que meios é que foram feitos esses 1150 autos! Com que gasóleo e com que viaturas foram feitas as deslocações ao terreno! Com que operacionais! Com os do ICN, da área protegida…

O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Com os quatro vigilantes que existem para 70 000 ha!

O Orador: — Exactamente! Ora, hoje em dia, com o Departamento de Terras Classificadas, há uma melhor partilha entre as áreas que precisam desta operação.
Esta situação não é a ideal, por isso, em relação ao lobo, estamos a investir na prevenção. Mas reafirmo que se trata de um exemplo que me parece pouco adequado.
Sr. Deputado Miguel Tiago, do meu ponto de vista, há uma diabolização do sector privado no seu discurso. Todavia, o sector privado é também a Associação de Agricultores e a Associação de Produtores Florestais, que são privadas, e as ONG, que também o são. Com todos esses almejamos fazer parcerias, em particular com os municípios, que não são privados. Não fazemos, contudo, qualquer diabolização do sector privado nesta matéria.
Quanto à função pública, o contrato individual de trabalho passa a ser a norma. Quem não o queira adoptar e já esteja na casa mantém-se na função pública, como é óbvio. Mas qual despedimento?! A mobilidade do pessoal joga-se no contexto do PRACE, pelo que no ICN não há nada de especial quanto a despedimentos.
O Sr. Deputado disse que não falei de critérios. Referi-os no início e não vou repeti-los. Do meu ponto de vista, estão bem consubstanciados na reestruturação que fizemos.
Sr. Deputado António Carlos Monteiro, não me apetecia muito mergulhar numa figura de retórica que usou. O Sr. Deputado disse: «Já se falou aqui do ICN e os senhores só agora é que falam de estudos».
Mas o Sr. Deputado só perguntou agora pelos estudos, nunca o fez no passado!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Que ideia! Estamos fartos de perguntar!

O Orador: — Além do mais, quando aqui se falou da reestruturação do ICN os estudos ainda não estavam feitos.
Portanto, Sr. Deputado, falar de falta respeito pelo Parlamento, etc… Devo dizer que serão facultados todos os estudos, onde não encontrará a solução final, porque há uma dimensão política de que não prescindimos, mas verá como há uma grande orientação em relação ao que viermos a obter.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Não sabemos é qual é!

O Orador: — Quanto aos planos de ordenamento de áreas protegidas, matéria objecto de uma pergunta da Sr.ª Deputada Jovita Ladeira, devo dizer, para seremos claros, que faltam 12 planos de áreas protegi-

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das. Estão todos em elaboração, estando 3 prontos para entrar em processo legislativo, havendo ainda 4 revisões de planos de ordenamento a ser elaboradas. A nossa meta é a de termos todos aprovados até ao fim de 2007.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Não podem estar prontos, e o Sr. Secretário de Estado sabe disso!

O Orador: — Bem sabemos que há uma fragilidade numa meta destas, porque há certas dimensões que não dependem só de nós, dependem da comissão mista de coordenação, etc. Mas espero que no Verão todas as discussões públicas tenham sido feitas e que no fim do ano todas as aprovações estejam concluídas.
O Sr. Deputado Álvaro Saraiva falou do falhanço do centralismo. Mas há aqui algo que me parece contraditório. É que se, hoje em dia, o centralismo se medisse por ter as comissões directivas com um vogal das autarquias, então não tínhamos centralismo, mas, sim, um sistema não centralista que estaria a funcionar. Não há qualquer centralismo, Sr. Deputado. Aquilo que temos é, do nosso ponto de vista, inteiramente coerente com a transferência de poderes para os municípios. Em que medida? Os municípios podem e devem participar na gestão de áreas protegidas. Participam, nomeadamente, na elaboração dos planos de ordenamento, nas comissões mistas de coordenação, e integram os conselhos estratégicos que criámos para cada área protegida, que existiam teoricamente sem estarem constituídos e que vão existir efectivamente.
Essa é a orientação estratégica do que deve ser a condução de uma área protegida, que é a participação do município quando a área protegida é nacional.
Sr. Deputado, reafirmo que o nosso principal objectivo estratégico em parcerias é com os municípios.
Queremos mais gestão dos municípios nas áreas protegidas, não menos. Vamos atingi-lo da forma mais nobre e adequada, que é a da contratualização/protocolização, e não apenas através do participante minoritário que havia numa comissão directiva, desadaptada da realidade actual.
Sr.ª Deputada Alda Macedo, sei muito bem que há empresas… Não se trata do casal de biólogos de que falava o Deputado Luís Vaz, de forma eloquente, mas quando uma grande empresa tem uma actividade com impactos na conservação da natureza achamos muito bem que ela contribua financeiramente para os compensar. Portanto, nada temos contra esse objectivo, mas é completamente diferente de dizer «tome lá a área protegida para si», que é o que os senhores consideram estar na base da reestruturação e que não encontramos em lado algum.

A Sr.ª Alda Macedo (BE): — É o que está a acontecer!

O Orador: — Quanto ao financiamento, consideramos que a primeira etapa de maior financiamento deve vir da visitação, que deve gerar recursos. Também temos a noção de que não será suficiente, pelo que o Estado português deve pôr-se de acordo quanto a formas complementares de financiar a conservação. Ora, onerar os que têm impacto nela é uma via que não desdenhamos explorar.
Há ainda outro aspecto que me parece que a Sr.ª Deputada não entende. Referiu os cinco agrupamentos de áreas classificadas e que deixámos de ter interlocutor político. Sr.ª Deputada, se o interlocutor político era o Governo, ele está no mesmo sítio; se era o Presidente do ICN, está no mesmo sítio. Há é um interlocutor que não havia antes, com o estatuto de subdirector-geral, que pode, ao nível de cada agrupamento, ser um interlocutor político acima de directores de serviços, com mais capacidade de intervenção. Isto é, para nós, um reforço e não o contrário.
Quanto a quadros, creio que também já fui claro. Queremos mais quadros operacionais no ICN. Queremos um reacerto entre funções de suporte e operacionais, pelo que precisamos de mais operacionais. Este processo está em curso em termos de mobilidade. Não lhe posso dizer qual o resultado final pois este ainda não está definido, mas fica registado que desejamos ter uma melhor proporção entre funções de suporte e funções operacionais.
Para terminar, devo dizer aos Srs. Deputados, com muita honestidade, que das várias tarefas desempenhadas nestas funções, orgulho-me em particular desta reestruturação, porque é, porventura, uma das mais complexas do Ministério do Ambiente, que apareceu no contexto do PRACE. Não resolve tudo si, não resolve tudo de imediato, mas tenho a certeza de que é uma peça fundamental para podermos ter um figurino de conservação da natureza e de áreas protegidas diferente e para que nos orgulhemos delas como um verdadeiro cartaz de visita do País para todas as populações.
Haverá, com certeza, dificuldades. Era muito melhor termos mais meios, mas não os temos todos. Será, no entanto, uma peça fundamental no sentido de alcançarmos a dimensão estratégica que a biodiversidade deve ter para o País. Ela não é um prejuízo ou uma maçada, é uma oportunidade, e julgamos que estamos no caminho de o fazer reconhecer.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Vamos passar ao período de encerramento do debate.
Tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, cinco notas no encerramento deste debate.
A primeira nota é para a iniciativa do Partido Ecologista «Os Verdes», que gastou o seu agendamento potestativo para discutir o tema «Instituto da Conservação da Natureza». Repito: Instituto da Conservação da Natureza! Não a política do ambiente, não a política da defesa da biodiversidade, não a política da conservação da natureza. Não! O Instituto da Conservação da Natureza!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Acha que uma coisa não tem nada a ver com outra?!

O Orador: — O Partido Ecologista «Os Verdes» decidiu utilizar o seu agendamento potestativo para fazer um fingimento de apreciação parlamentar antecipada.
Foi aprovado e publicado, na passada sexta-feira, o decreto-lei que revê a lei orgânica e que cria o Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade e o Partido Ecologista «Os Verdes» não pôde esperar pelo pedido de apreciação parlamentar desse decreto e decidiu propor à Assembleia que discutisse não a política do ambiente, mas o Instituto da Conservação da Natureza!

Protestos de Os Verdes.

Isto diz tudo acerca de um particular entendimento do que é o interesse geral. Para Os Verdes e para os partidos que o acompanharam, o interesse geral é o interesse de um serviço público, não um interesse sobre as políticas públicas. Ora, Srs. Deputados, as políticas públicas não existem para servir os serviços públicos, estes é que existem para servir o interesse público, para servir os cidadãos e para realizar as políticas públicas.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — La Palice não diria melhor!

O Orador: — Segunda nota: o que é que uniu os grupos parlamentares da oposição ao longo deste debate? A reclamação de mais meios e de mais pessoas! Que o Instituto da Conservação da Natureza deveria gastar mais dinheiro e deveria ter mais pessoas! É muito interessante esta postura, porque é a atitude daqueles que se recusam a introduzir na organização e no funcionamento da Administração Pública critérios de avaliação de custo/benefício, de efectividade, de eficiência, de olhar para a Administração Pública a começar pela resposta à pergunta «que fins queremos atingir?» e, depois, verificar quais são os meios necessários para o fazer.
É o fantasma do medo da avaliação da eficiência e da efectividade da nossa Administração que perpassa como um traço unificador da posição dos diferentes grupos parlamentares da oposição.
Terceira nota e outro traço marcante: a ausência de discurso programático.
O Sr. Secretário de Estado do Ambiente, em nome do Governo, apresentou aqui, programaticamente, a política para a defesa da biodiversidade e para a conservação da natureza, com três eixos fundamentais. O primeiro é, justamente, a sua globalização, pensando em termos de promoção da biodiversidade e recusando-nos a encarar as áreas protegidas como se fossem uma espécie de ilhas isoladas do contínuo que é a biodiversidade portuguesa. O segundo eixo é a gestão activa e a organização coerente dos meios disponíveis para a realização dessa política de promoção da biodiversidade. O terceiro eixo é a abertura às parcerias, a abertura à economia, a abertura às pessoas que, do nosso ponto de vista, deve comandar a política de conservação da natureza e, portanto, em consequência, a organização e o funcionamento do Instituto da Conservação da Natureza.
Em relação a este discurso programático, qual é a resposta, qual é a reacção da oposição? É o conformismo, é a resignação, é achar que tudo estava bem — para quê mudar? Ora, com resignação e conformismo não mudamos o que é preciso mudar em Portugal.
A quarta nota é sobre a questão geral da reforma da Administração Pública. Porque, evidentemente, a reorganização do ICN e a criação do ICNB faz-se no contexto do PRACE, serve ao mesmo tempo a política do ambiente e serve ao mesmo tempo a política de organização e reestruturação da Administração Pública.
E aí a nota saliente, designadamente à direita, é a duplicidade do discurso: são a favor da redução da despesa pública, mas, concretamente, sempre que ela se faz, estão contra! São a favor da mudança do ponto de vista retórico, mas, concretamente, sempre que ela é proposta estão contra! São a favor, até, da racionalização dos recursos — até propunham que se despedissem funcionários públicos —, mas sempre que vêem qualquer racionalização de recursos humanos estão contra no particular! Em retórica, são a favor da clarificação de funções, mas sempre que a clarificação de funções se aplica na prática, designadamente na relação sadia e, por isso, de parceria positiva entre o ICNB e os municípios, também estão contra! No geral são a favor, mas em cada caso concreto estão sempre contra a mudança, estão sempre contra a reforma!

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Quinta nota, sobre a presença do Governo na Assembleia.
O Governo vem à Assembleia com todo o gosto, e se há coisa que o caracteriza, nos seus mais diversos níveis, é a importância que dá à política de ambiente.
Qual foi o tema do debate mensal com o Primeiro-Ministro em Janeiro? Foi o das alterações climáticas! Quantos debates mensais, durante o anterior Governo, tiveram como tema políticas de ambiente? Nenhum! Quantas vezes veio o Ministro do Ambiente defender as suas posições ao Plenário da Assembleia até agora? Onze! Quantas vezes o foi fazer em sede de comissões parlamentares? Dez! Quantos vezes Secretários de Estado vieram às Comissões parlamentares, sem ser a acompanhar o respectivo ministro? Cinco! Estamos sempre disponíveis, em qualquer área. Mas o que pedimos à oposição é que, em vez de querer discutir instituto a instituto ou serviço a serviço, queira discutir políticas; em vez de querer discutir interesses particulares, queira discutir o interesse público geral; em vez de querer defender, à outrance, o status quo aposte connosco no inconformismo e na mudança, porque é assim que se fazem as reformas de que o País precisa.

Aplausos do PS.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Saraiva.

O Sr. Álvaro Saraiva (Os Verdes): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, antes de iniciar a minha intervenção, gostaria de sublinhar que só pedimos o agendamento desta matéria porque, quando questionámos o Governo sobre a mesma, nenhuma resposta nos foi dada. Inclusive, o decreto-lei a que o Sr. Ministro se refere foi publicado no dia 27, portanto esta matéria não foi discutida com ninguém, tendo nós tido apenas conhecimento dela através da comunicação social.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Com a realização deste debate de urgência, agendado pelo Partido Ecologista «Os Verdes», a Assembleia da República teve hoje a oportunidade de discutir uma questão fundamental na área do ambiente, que tem a ver com a reestruturação do Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB). E temos de reafirmar que Os Verdes, por diversas vezes, tentaram obter informações por parte do Governo, o qual se procurou sempre esquivar a respostas.
Hoje, o Governo continuou a optar por respostas vagas, procurando fugir ao cabal esclarecimento que se impõe.
O que está em causa é que, com esta reestruturação, aquilo a que vamos assistir é a um maior estrangulamento do funcionamento do Instituto da Conservação da Natureza, quer a nível financeiro, quer a nível do quadro de pessoal.
Quanto ao financiamento, o que temos vindo a constatar é uma cada vez maior redução nas verbas a afectar: em 2007, esta entidade conta no seu orçamento com cerca de metade da verba prevista em 2002 e sofre um corte de 18,6% em relação a 2006. Com isto assistimos a casos caricatos, como o de deslocações suspensas por falta de verbas, como aconteceu no ano passado, ou, como aconteceu mais recentemente, com o corte de verbas aos centros de recuperação de animais selvagens.
Em 23 de Março, num jornal diário, o Sr. Ministro falava da necessidade de as áreas classificadas aumentarem as receitas próprias, salientando que, a breve prazo, haveria um conjunto de empresas disponíveis para trabalhar com o ICN. «Vamos cruzar negócios com a conservação da natureza», dizia o Sr.
Ministro. Que negócios serão esses? Que empresas serão essas? Quais as áreas de intervenção? Também ficámos preocupados com a criação de taxas para visitantes das áreas protegidas que, segundo notícias, terão de ser vistas caso a caso, dado a maioria dos terrenos serem privados, segundo alguns técnicos do ICN.
Quanto ao futuro dos funcionários do ICN, as perspectivas de reestruturação propostas poderão conduzir à progressiva paralisação dos serviços, o que pode disfarçar um possível pretexto para a sua privatização. Aliás, é sustentada a hipótese de abrir a lógica das parcerias público-privadas na gestão, o que pode claramente vir a converter objectivos de conservação da natureza e de preservação da biodiversidade em objectivos de obtenção de lucros a curto prazo.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Exactamente!

O Orador: — Com a publicação do Decreto-Lei n.º 136/2007, de 27 de Abril, constatamos que o Sr.
Ministro, na mesma linha do Governo, continua, na «penumbra», a perseguir os trabalhadores da função pública. O artigo 17.º define o regime transitório da função pública: no seu n.º 1 vem explícito que «os funcionários públicos do quadro de pessoal do Instituto da Conservação da Natureza podem optar pelo regime do contrato individual de trabalho no prazo de 90 dias a contar da data da notificação que lhe seja feita pelo serviço ou, quando não haja lugar à aplicação de métodos de selecção, da publicitação das listas e mapa a que se refere o n.º 3 do artigo 14.º», o que quer dizer são colocados na mobilidade.

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O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Exacto!

O Orador: — Mais, no mesmo artigo 17.º, n.º 3, é dito que a celebração do contrato individual de trabalho implica a exoneração do lugar de origem e a cessação do vínculo à função pública.
Com esta reestruturação assistimos a uma proposta de centralização da gestão das áreas protegidas em cinco super áreas. Com esta formulação corre-se o risco de vermos diminuída (ainda mais) a celeridade das decisões da Administração Pública e de se afastarem essas decisões da realidade concreta do território.
Para além disso, as experiências pontuais que já hoje existem de concentração de áreas classificadas (como, por exemplo, o Parque Natural da Arrábida e a Reserva Natural do Estuário do Sado, áreas protegidas com a mesma direcção) têm dado bem conta da forma como os meios se tornam ainda mais insuficientes e de como se fragiliza a gestão de algumas dessas áreas pela dispersão de problemas diferentes e pela incapacidade de acompanhar da mesma forma as prioridades que requerem resposta.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Bem lembrado!

O Orador: — Por isso, Os Verdes assumem uma forte discordância em relação à proposta do Governo de concentrar as áreas protegidas.
Outro ponto a salientar — que, em nosso entender, é um retrocesso significativo na transparência dos cargos dirigentes — é a nomeação dos directores. Até aqui estes cargos eram ocupados por concurso público, processo com o qual concordamos.
Ora, com esta reestruturação, os directores das áreas protegidas passam novamente a ser nomeados pelo Governo, por via do Ministério, para garantir que sejam de total confiança política do Governo, trocando-se a competência técnica pela confiança partidária, de modo a que não contestem a vergonhosa opção de desinvestimento real e significativo na conservação da natureza. O que o PS criticou no Governo PSD/PP está agora a adoptar enquanto Governo.
O que, na nossa perspectiva, é importante é manter a isenção dos directores das áreas protegidas, de modo a que a sua competência técnica e profissional esteja acima dos interesses e pressões de quem estão dependentes para ser nomeados.
Já tivemos exemplos disso com a tentativa de silenciar os directores das áreas protegidas, quando, em 2005, o director do Parque Natural da Serra da Estrela foi impedido de prestar declarações públicas sobre os incêndios e a fragilização dos meios de prevenção e combate aos mesmos.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, o tempo de que dispunha terminou. Tem de concluir.

O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
Ainda relativamente à participação dos municípios na gestão das áreas protegidas, voltamos a reafirmar que não concordamos com o facto de as autarquias locais, que estão mais próximas das populações, deixarem de ter um papel participativo nas mesmas, o que, como aliás já dissemos, viola a Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro.
Para finalizar, deixamos um sublinhado: o conjunto de questões que foram colocadas devem suscitar uma profunda reflexão por parte do Ministério.
É, pois, uma boa oportunidade para o Governo fazer o que, por regra, não é feito: ter uma política de ambiente verdadeiramente eficaz e activa, fazer com que o Instituto da Conservação da Natureza reforce o seu quadro de pessoal, nomeadamente na área dos vigilantes, e apostar num alargamento da educação ambiental.

Vozes de Os Verdes: — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, que consiste na discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 121/X — Altera a Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, que altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais e dos projectos de lei n.os 286/X — Cria o Instituto de Assistência Jurídica para tornar efectivo o acesso à justiça e ao direito (BE), 287/X — Lei relativa ao acesso à justiça e ao direito (BE) e 377/X — Garante o Acesso ao Direito e aos Tribunais revogando o regime jurídico existente (PCP).
Para apresentar a proposta de lei do Governo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça (João Tiago Silveira): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que hoje se discute nesta Câmara tem o objectivo claro de melhorar o acesso à justiça e aos meios de resolução de litígios, alargando o leque de beneficiários e o leque de benefícios das prestações sociais que garantem o acesso ao direito.
Com esta proposta de lei, cresce o universo dos beneficiários da protecção jurídica, ou seja, do apoio

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judiciário e da consulta jurídica. Com efeito, é revisto o critério de insuficiência económica para que se torne mais abrangente através de duas modificações de relevo: em primeiro lugar, através da elevação dos valores-referência do rendimento relevante para protecção jurídica; em segundo lugar, por via de uma contabilização mais justa do número efectivo de elementos do agregado familiar.
Mas a melhor forma de captar o alcance desta medida e desta proposta de lei é mesmo com exemplos.
Dou um primeiro exemplo: um agregado familiar de duas pessoas cujo rendimento líquido é de 9000 €/ano, o que corresponde a 375 € líquidos mensais por pessoa, actualmente não tem direito a consulta jurídica gratuita, só tem direito a pagamento faseado de taxa de justiça e demais encargos com o processo e ao pagamento faseado de honorários do patrono ou remuneração do solicitador de execução designado.
Para que esta família tenha direito a dispensa total de taxa de justiça e de pagamento de honorários, o rendimento anual do agregado familiar não pode ser superior a 6350 €. Hoje, no regime em vigor, só tem direito ao pagamento faseado.
Com a proposta de lei do Governo, esta família terá direito a: consulta jurídica gratuita, dispensa total do pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento de honorários do patrono e/ou atribuição de agente de execução.
Mas vamos a um segundo exemplo. Consideremos um agregado familiar constituído por três pessoas com um rendimento líquido de 11 500 €/ano.
Actualmente, esta família não tem direito a consulta jurídica gratuita. Para ter direito a consulta jurídica gratuita no actual regime é necessário ter um rendimento líquido anual igual ou inferior a 2900 €.
Com a proposta de lei do Governo, esta família passa a ter direito a consulta jurídica gratuita.
Em suma, cresce a protecção jurídica enquanto medida de protecção social para quem esteja numa situação de insuficiência económica, garantindo-se modalidades de apoio judiciário como a nomeação de patrono oficioso e a dispensa de pagamento de taxas de justiça a mais pessoas e a novas situações.
Mas não é só o leque de beneficiários que cresce com esta proposta de lei. Também cresce o leque de benefícios.
É conhecida a aposta do Governo nos meios de resolução alternativa de litígios. Julgados de paz, centros de arbitragem e novos sistemas de mediação cada vez mais estão e estarão presentes na vida das pessoas enquanto formas de composição de litígios.
Por essa razão, o sistema de protecção jurídica deve acompanhar este movimento de crescimento de novos métodos de resolução de conflitos e adaptar-se a novos mecanismos que possam, muitas vezes de forma mais adequada, solucionar litígios.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Por outras palavras, o alargamento da oferta de meios de resolução de conflitos também deve beneficiar quem careça de protecção jurídica. Assim, a proposta de lei que agora se apresenta passa a prever a concessão do benefício de apoio judiciário para a utilização de mecanismos de resolução alternativa de litígios. Ou seja, o patrocínio de advogado oficioso e as taxas devidas passam a poder ser suportadas pelo Estado também quando seja utilizado um sistema de mediação laboral, um sistema de mediação penal, uma mediação familiar ou um centro de arbitragem para resolver conflitos.
A lista de novos benefícios no sistema de protecção jurídica não se fica por aqui, Sr.as e Srs. Deputados.
Em matéria de consulta jurídica, também há novidades que contribuem para um acesso ao direito mais completo para quem precise de aconselhamento jurídico e não disponha de meios suficientes.
E isto por duas vias. Por um lado, é criada uma nova modalidade de consulta jurídica de taxa reduzida para aqueles que tenham direito a apoio judiciário, mas não a consulta jurídica gratuita. São situações de pessoas que, embora podendo pagar algo pela consulta jurídica, devem poder beneficiar de um aconselhamento jurídico a preços controlados, no âmbito do sistema de protecção jurídica. Alarga-se, assim, a consulta jurídica a um conjunto de pessoas que, de outra forma, não teriam qualquer protecção no sistema de acesso ao direito em matéria de aconselhamento jurídico.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Por outro lado, criam-se condições para que a consulta jurídica se expanda e se alargue de forma mais efectiva a todo o território nacional. Permite-se que este benefício possa ser prestado nos escritórios de advogados e não apenas em gabinetes de consulta jurídica.
Deixa, pois, de ser necessário garantir o funcionamento de um espaço físico com equipamentos e funcionários especificamente dedicados à prestação de serviços de consulta jurídica. A consulta jurídica multiplica-se por novos pontos no território nacional, passando a poder ser prestada com rentabilização de meios e equipamentos privados, quando o advogado que participe do sistema de acesso ao direito dê o seu acordo à prestação da consulta jurídica por esta via.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é uma proposta que honra o Governo e que pode ser melhorada com o contributo das várias bancadas.
É uma proposta que, na melhor tradição de um Governo com preocupações sociais na sua marca gené-

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tica, incrementa o nível de protecção social daqueles que necessitem de protecção jurídica em função dos seus rendimentos.
É uma proposta que garante mais apoio a quem mais precisa, mas é também uma proposta que garante esse apoio a mais pessoas.
E é uma proposta de progresso social, que alarga os benefícios e os beneficiários da protecção jurídica, não descurando o rigor, indispensável a quem se preocupe em proteger quem verdadeiramente precisa de protecção social: aqueles que se encontrem numa situação real de insuficiência económica.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Justiça, muito rapidamente, gostaria de colocar-lhe uma questão.
Para o PCP, o problema central que está hoje em discussão é o da concretização de um direito fundamental previsto na Constituição. A situação que abordamos hoje diz respeito à redução da concretização desse direito a um pequeno universo de portugueses — que são os mais pobres dos pobres —, excluindo uma larga franja de cidadãos com fracos recursos económicos do acesso ao direito e aos tribunais.
A verdade é que o Sr. Secretário de Estado, ainda agora, na sua intervenção, referiu um aumento que a proposta de lei prevê nos montantes a considerar para efeitos de concessão deste tipo de apoios, mas que, em nosso entender, poderão não resolver o problema de fundo. Porque o problema de fundo que se coloca aqui, Sr. Secretário de Estado, é o da transformação da realidade concreta de uma determinada situação e das dificuldades sentidas pelos portugueses em fazer face às despesas com um determinado processo e da aplicação de uma fórmula matemática que por 1 cêntimo pode excluir o requerente desse apoio ou pode remetê-lo para outro tipo de apoio, porque tem 1 cêntimo a mais do que as tabelas que estão aqui definidas.
Portanto, esta tentativa de matematização da análise de questões sociais e económicas poderá, no fim de contas, conduzir à não concretização de um direito fundamental dos cidadãos.
Por outro lado, gostaria de deixar alguns exemplos de problemas que, quanto a nós, constam da proposta de lei ora em debate.
Existem situações de vítimas de tráfego de seres humanos e de exploração para prostituição ou ainda vítimas de violência doméstica que podem não estar em condições de reunir a documentação que é necessária para obter o apoio judiciário. Assim, por uma questão formal e por uma questão de procedimento, estes cidadãos estarão excluídos do acesso à protecção jurídica. É o caso, por exemplo, de um desempregado, cuja situação, naquele momento concreto em que necessita de recorrer ao tribunal, não é compatível de ser apreciada para efeitos de apoio judiciário, porque, no fim de contas, durante o ano, teve outro tipo de rendimentos que o excluem do acesso ao apoio judiciário.
Gostaria, assim, Sr. Secretário de Estado, que pudesse dar uma resposta relativamente à abertura ou não do Governo para discutir estas matérias e para considerar outro tipo de regulamentação para o apoio judiciário e acesso ao direito e aos tribunais.

Vozes do PCP e de Os Verdes: — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, agradeço as perguntas que me colocou.
O Sr. Deputado colocou uma questão muito importante, a que diz respeito aos problemas concretos das pessoas. Vamos aos problemas concretos das pessoas e não vamos dizer generalidades. Aliás, tive essa preocupação na intervenção que fiz.
Sr. Deputado, volto a referir o seguinte: uma situação de duas pessoas com um rendimento familiar líquido completo de 9000 € por ano — que corresponde a 375 € líquidos mensais por pessoa — no regime actual não tem direito a consulta jurídica gratuita e só tem direito a apoio judiciário na modalidade de pagamento faseado.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Mas não é disso que se trata!

O Orador: — No novo regime, que apresentamos, com casos concretos, preocupando-nos directamente com as pessoas e com os seus problemas, passa a ter direito a consulta jurídica gratuita e a dispensa total do pagamento da taxa de justiça e dos encargos com os processos e com o advogado.
Sr. Deputado, nós até tivemos a preocupação de criar um sistema que faz sentido e que é direccionado

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para aqueles que têm mesmo problemas de insuficiência económica e para os problemas que foram assinalados e detectados. E eu recordo que o Grupo Parlamentar do PCP enumerou dois exemplos de situações da vida de duas pessoas que estavam excluídas do sistema de apoio judiciário com o regime que actualmente temos em vigor. Ora, com esta proposta de lei, passa a haver apoio judiciário para essas duas situações. Se calhar, o Sr. Deputado não se lembrou de ir ver isso, mas estes são os problemas e as situações concretas das pessoas que precisam de ser resolvidos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E o exemplo que lhe dei?!

O Orador: — Esta é uma proposta de progresso social, e nós vamos de encontro a esse progresso.
O Sr. Deputado João Oliveira coloca ainda uma outra questão, que tem muito a ver com a abordagem que o PCP faz e com a abordagem moderna que tem de se fazer destas questões. Tem a ver com a fórmula matemática que é utilizada para aferir se a pessoa está ou não em condições de beneficiar de apoio judiciário. Mas esquece-se de algo que está na proposta de lei, que é a possibilidade de, por decisão dos serviços de segurança social e do director dos serviços, o resultado da aplicação da forma poder ser desconsiderado se levar a uma situação de manifesta injustiça. Portanto, essa preocupação até está acolhida na nossa proposta de lei. Trata-se, pois, de uma preocupação que não tem de ter.
O vosso projecto de lei, esse sim, cria um problema evidente para as pessoas e para os seus direitos. É que, para terem direitos, as pessoas precisam de saber que direitos têm. E com o casuísmo que é próprio dos projectos e das propostas do PCP, que, aliás, voltariam a atribuir competência ao juiz para, casuisticamente, decidir se concedia ou não o apoio judiciário, as pessoas não sabiam se tinham ou não direito, porque isso dependia de uma apreciação casuística do juiz.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É o mesmo casuísmo que determina o valor de uma multa!

O Orador: — Ora, o que nós queremos é que as pessoas saibam aquilo a que têm direito. E sabem aquilo a que têm direito com uma fórmula que lhes permita saber isso, com a válvula de segurança que precisam de ter e que têm com este sistema.
Sr. Deputado, em relação ao problema concreto que coloca, de documentação e de apresentação de prova, quero sossegá-lo e dizer-lhe que, de qualquer forma, estamos sempre disponíveis, como referi, para debater soluções para problemas concretos que nos sejam apresentados.
Não quero terminar sem deixar lhe dizer muito claramente uma coisa em que este Governo tem muito orgulho, que é o progresso social e o alargamento…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Peço-lhe que conclua, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: —… das situações de protecção jurídica que resultam da proposta de lei que aqui hoje é discutida.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar os projectos de lei n.os 286/X — Cria o Instituto de Assistência Jurídica para tornar efectivo o acesso à justiça e ao direito (BE) e 287/X — Lei relativa ao acesso à justiça e ao direito (BE), tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo Sr.as e Srs. Deputados: O princípio da igualdade não será real se aqueles e aquelas que não podem pagar a justiça a ela não tiverem acesso.
A marca da desigualdade é real e bem compreensível quando olhamos para o acesso à justiça no nosso país. Existe um cunho económico na obtenção de justiça. Quem tem meios económicos tem acesso à justiça e quem não os tem fica de fora. É esta a percepção do geral dos cidadãos e cidadãs, e corresponde à verdade. E nem sequer pensar numa reparação dos direitos dos ofendidos.
Não vale a pena, sequer, falar da inqualificável lei do governo PSD/CDS-PP. A lei da direita estabelecia cidadãos e cidadãs de segunda; a lei do Partido Socialista mantém ainda um problema intrínseco de cidadania. Corrige alguns aspectos escandalosos da anterior lei, mas mantém o emaranhado das equações matemáticas, em detrimento dos critérios objectivos, para dar cumprimento efectivo ao desígnio constitucional de tornar igual no acesso à justiça quem é desigual na vida.
A explicação não pode estar na recusa financeira e na ortodoxia orçamental, a não ser que se queira conceber, de uma forma mais ou menos agravada, que o tribunal deve ver as suas acções como mercadoria. Para o Bloco de Esquerda assim não é. Por isso, neste debate desafiamos o Governo a que não se limite a remendos numa lei que já provou a sua ineficácia e a sua estrutural injustiça.
Propomos a criação de um instituto de assistência jurídica, estrutura pública que organiza os defensores ou patronos nomeados e, assim, contribuirá para que a qualidade dos serviços prestados seja superior,

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quer no que diz respeito à selecção dos profissionais, quer também no que diz respeito à concessão de apoio judiciário, que deve sair da tutela da segurança social e ser recolocado no sistema de justiça, de que é, de facto, parte integrante.
A concessão de apoio judiciário não é um acto de caridade, é um direito fundamental previsto pela Constituição, é o cumprimento de um dever do Estado social para a garantia do exercício dos direitos de todas e de todos.
A criação deste instituto, que consagra gabinetes especializados, será uma garantia de uma melhor organização dos serviços de justiça, pois está vocacionado, do princípio ao fim da linha, para o acesso ao direito.
Trata-se de um novo patamar, onde se incluem também os interesses públicos, colectivos e difusos.
Direitos estes cuja legitimidade da sua defesa é reconhecida, desde 1995, no Código de Processo Civil, como o Sr. Secretário de Estado bem sabe.
O Governo continua a remeter para uma lei própria. Será que temos de esperar mais dois anos, como tivemos de esperar pelas alterações agora propostas, que, mesmo assim, se mostram insuficientes? Os direitos ambientais, dos consumidores, do património, das minorias e os direitos humanos esperam e desesperam para que o sistema de justiça lhes dê a dignidade que merecem.
No projecto de lei relativo ao acesso à justiça e ao direito propomos a reintrodução das situações de presunção de insuficiência económica para trabalhadores em processo laboral, beneficiários de subsídio de desemprego, beneficiários do rendimento social de inserção, beneficiários do rendimento social de idosos, vítimas de violência doméstica, vítimas de crimes com base em discriminações étnicas e sexuais, para além dos menores e sinistrados em acidentes de viação.
O Governo deve explicar porque é que não propõe a reintrodução deste princípio. Que a direita o tenha retirado, percebe-se, porque se conhece a sua aversão ao Estado social, mas que o Governo, que se diz de esquerda moderna, capitule, isso carece de explicação. Assim como merece explicação o facto de apenas terem direito a apoio judiciário os cidadãos estrangeiros da União Europeia ou com título de residência num Estado da União Europeia. O que conta é o título de residência e não a protecção de quem viu os seus direitos violados?! É a proporcionalidade, neste caso, das opções, que fazem sempre pender um dos pratos da balança da justiça.
O Bloco de Esquerda considera este debate fundamental. É preciso uma política do princípio ao fim da linha para o acesso à justiça e ao direito, tendo em conta o défice que a sociedade portuguesa tem da percepção lata da justiça do princípio até ao fim.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Terra.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, não obstante o escasso tempo que lhe resta, penso que é o suficiente para que V. Ex.ª possa esclarecer algumas dúvidas que ficaram depois de uma leitura atenta dos dois projectos de lei que o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta.
Em primeiro lugar, compre-me registar que, provavelmente, sem que nos tivéssemos apercebido, terá sido celebrado um pacto de incidência político-parlamentar entre o Bloco de Esquerda e o PCP, pois constata-se que o Bloco de Esquerda veio apresentar agora uma versão recauchutada do projecto de lei n.º 188/X, do PCP, apresentado na anterior sessão legislativa, que previa a criação de um Instituto do Serviço Público de Acesso ao Direito, agora rebaptizado pelo Bloco de Esquerda de Instituto de Assistência Judiciária.

A Sr.ª Sónia Sanfona (PS): — Bem lembrado!

A Oradora: — Em segundo lugar, considerando que, nos termos do projecto de lei n.º 286/X, do Bloco de Esquerda, os serviços de assistência jurídica serão prestados por advogados ou solicitadores integrados no quadro do Instituto de Assistência Judiciária por contrato com duração de três anos, renovável por uma vez, escolhidos estes por concurso público, e sabendo nós que o BE propõe também que os cargos dos respectivos profissionais do foro sejam exercidos em exclusividade e a tempo inteiro, não percebemos como é que este regime se compatibiliza com o regime remuneratório por VV. Ex.as também proposto da avença mensal, sendo certo que nos resta ainda a dúvida de saber se, ao proporem um contrato de duração limitada a três anos, pretendem com isto incentivar o crescimento da precariedade no trabalho, que em outras circunstâncias utilizam como bandeira eleitoral de combate.
Em terceiro lugar, propondo o Bloco de Esquerda, como, aliás, o PCP também faz, que a prova da insuficiência económica seja feita por meio idóneo, mas não esclarecendo o que entende por tal, gostaríamos de aproveitar a oportunidade para solicitar ao Bloco de Esquerda que nos pudesse densificar este conceito, que, sendo tão indeterminado, pode dar lugar, na prática, a uma série de abusos, que a história recente nos

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faz adivinhar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Terra, obrigada pela questão que me colocou. Vai perdoar-me, mas tenho de lhe dizer que a sua pergunta foi um tanto ou quanto cínica.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Não foi, não!

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Foi, foi!

A Oradora: — Foi, foi! Foi bastante! Aliás, quando se refere à proposta do Bloco de Esquerda como versão recauchutada, vai perdoar-me também, mas eu nem sequer respondo, porque, como deve calcular, não há nada que impeça os grupos parlamentares aqui presentes de apresentarem as propostas que entendam como boas ideias. Pena tenho eu que o Partido Socialista não faça isso mais vezes. Pena tenho eu e as portuguesas e os portugueses.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Nós somos mais criativos!

A Oradora: — Portanto, a essa pergunta não respondo.
Agora, Sr.ª Deputada, com franqueza, se viéssemos aqui propor um regime de carreira, os senhores diriam que era um regime extremamente rígido e impossível de ser aplicado.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Afinal é um contrato de trabalho ou de prestação de serviços?!

A Oradora: — O Bloco de Esquerda traz aqui uma proposta transparente, com critérios de concurso público, no sentido de melhor organizar o sistema de defesa e de acesso à justiça, e os senhores acham que isto é uma coisa que brada aos céus. Lamento profundamente essa questão.
Parece-nos que a nossa proposta é perfeitamente exequível e poderá, com certeza, ser aplicada numa fase de transição para outros modelos mais avançados, que todos nós sabemos que existem no mundo.
Não foi isso que o Bloco de Esquerda aqui trouxe.
Lamento muito que a Sr.ª Deputada não tenha tido a preocupação de colocar, nomeadamente, questões em relação à presunção da insuficiência económica, porque é um facto que, ao longo destes anos… E tenho de sublinhar que o Partido Socialista levou dois anos — e foi questionado sobre esta matéria, nomeadamente pelo Bloco de Esquerda, desde a sua tomada de posse — para propor insuficientemente a justiça em relação a uma questão de que os cidadãos e as cidadãs se têm visto afastados.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projecto de lei n.º 377/X — Garante o acesso ao direito e aos tribunais, revogando o regime jurídico existente (PCP), tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O tema do acesso ao direito e aos tribunais foi já, por diversas vezes, trazido pelo PCP à discussão da Assembleia da República. A importância desta discussão está por demais identificada e encontra no nosso ordenamento jurídico o tratamento adequado, com dignidade constitucional, consagrado como direito fundamental no artigo 20.º da Constituição.
Ao prever que a ninguém possa ser denegada a justiça por insuficiência de meios económicos, a norma do n.º 1 do artigo 20.º da Constituição exige a necessária concretização legislativa. E esta deve ser a preocupação central da discussão que hoje aqui fazemos, com vista a garantir as condições para que a ninguém seja denegada a justiça por insuficiência de meios económicos. Todas as outras questões deverão estar subordinadas a esta preocupação fundamental.
E devemos recordar que foi precisamente a subversão destas prioridades que nos trouxe à situação que hoje vivemos. As alterações introduzidas pela Lei n.º 34/2004 e pela Portaria n.º 1085-A/2004, justificadas, então, com a necessidade de aumentar o rigor e tornar o regime de apoio judiciário mais criterioso, transformaram-se em factores de efectiva denegação da justiça para uma larga franja de cidadãos de fracos recursos económicos.
As dificuldades que os portugueses enfrentavam para suportar as despesas ou encargos com um processo judicial foram transformadas no singelo produto de uma operação aritmética elementar, em que as

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despesas com necessidades básicas passaram a ser a incógnita D, os encargos com a habitação a incógnita H e o rendimento do agregado familiar passou a ser considerado num sistema de escalões. Tudo isto se passou a conjugar matematicamente em fórmulas suficientemente compostas com chavetas e parêntesis rectos e curvos, utilizando todas as operações aritméticas. O apuramento da insuficiência económica dos portugueses passou a depender do preenchimento burocrático de um formulário, como se a realidade pudesse ser capturada por variáveis contidas entre chavetas.
Mas esta teimosa realidade não se quis adaptar ao apregoado rigor do novo regime legal. Demorou pouco até se perceber que, com esse regime, era a justiça que ia ficando entre parêntesis e o acesso ao direito e aos tribunais começava a tender para zero.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Obviamente só para aqueles cuja condição económica não cabia nas grelhas das tabelas do apoio judiciário.
Por isso, urgia mudar o sistema. Já nesta Legislatura, com esta maioria do Partido Socialista, o PCP trouxe de novo a discussão do acesso ao direito e aos tribunais à Assembleia da República, tendo apresentado os projectos de lei n.os 187/X e 188/X. Dessa discussão resultou clara a necessidade de rever o regime de acesso ao direito, sobretudo tendo em conta a importância que assume o recurso aos tribunais para o exercício de direitos numa conjuntura de agravamento das condições de vida e de trabalho para a generalidade dos trabalhadores portugueses.
O Partido Socialista, apesar de reconhecer a necessidade de rever o sistema, optou, então, por rejeitar as iniciativas do PCP. Na altura — em Maio de 2006 — o argumento de que o Governo tinha em preparação uma proposta de lei que previa um sistema «mais célere, mais racional e integrado» foi motivo bastante para o PS adiar a resolução de um problema que continuou a atingir milhares de portugueses.
Entretanto, a situação na justiça agravou-se com a continuação do processo de privatização do notariado, a celebração do pacto parlamentar para a justiça entre PS e PSD e as suas decorrências e com a apresentação pelo Governo de propostas de revisão do mapa judiciário, prevendo o encerramento de tribunais.
A revisão do regime de acesso ao direito e aos tribunais é que tardou, apesar das promessas que vinham sendo feitas desde o fim de 2005.
Confrontados que estamos, finalmente, com a proposta de lei do Governo, constatamos que, afinal, a «montanha pariu um rato». Talvez possamos vir a assistir a um alargamento do âmbito de concessão do apoio judiciário, mas não estamos, certamente, perante a resolução dos problemas de fundo que temos identificado até aqui. Continuaremos perdidos na racionalização matemática de questões sociais, em nome de um rigor que estabelece limites matemáticos aos direitos constitucionais.
A proposta de lei que hoje temos em discussão insiste, assim, na prioridade do acessório face ao que é essencial. Insiste numa solução burocrática que transforma decisores em autómatos e que deixa de fora dos tribunais aqueles que, não sendo os mais pobres dos pobres, não dispõem ainda assim dos meios económicos para fazer face às despesas com a justiça.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — E temos mais: os profissionais forenses que participem neste sistema de acesso ao Direito poderão ser nomeados para lotes de processos e escalas de prevenção, mas deixam de ter direito a uma remuneração para passarem a receber uma compensação pelo seu trabalho, sem direito a reembolso das despesas que eventualmente venham a suportar. Fica a dúvida: estamos perante meras alterações de natureza semântica e organizativa ou o futuro para estes profissionais será, mesmo, o de mais trabalho com menos retribuição? A tudo isto, o PCP propõe uma alternativa que não tem a presunção de aprisionar a realidade entre chavetas, mas que tem em conta as suas complexidade e dinâmica próprias.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Propomos a devolução ao juiz da competência para a decisão de concessão do apoio judiciário e a possibilidade de este ordenar todas as diligências que entenda necessárias e indispensáveis ao apuramento do rendimento. Propomos a consideração de situações de presunção de insuficiência económica, identificando, entre outras, as situações dos desempregados, das vítimas de tráfico de seres humanos, de exploração através da prostituição ou de violência doméstica. Propomos, igualmente, a isenção de custas em processos do foro laboral para todos os trabalhadores e, em algumas situações, para os funcionários e agentes da Administração Pública. Propomos, ainda, a fixação de um prazo objectivo para o pagamento de honorários aos profissionais envolvidos no sistema de acesso ao Direito.
Damos, ainda, cumprimento ao Acórdão n.º 654/2006 do Tribunal Constitucional, restringindo o conceito de agregado familiar para efeitos de consideração dos rendimentos a ponderar.
No PCP, continuamos a entender que uma correcta organização do sistema de acesso ao Direito impli-

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caria a criação de um instituto público dotado de meios técnicos e humanos adequados a essa missão.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: — Concluo já, Sr. Presidente.
Aliás, perante as conclusões constantes do Relatório n.º 50/2006 do Tribunal de Contas, relativo a um processo de auditoria aos sistemas de gestão e controlo do financiamento do acesso ao Direito e aos tribunais, temos agora razões para considerar que tal solução significaria mesmo uma melhoria na afectação dos recursos públicos e na eficiência do sistema.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Sem prejuízo de apresentação futura de uma iniciativa nesse sentido, concentramo-nos agora no que entendemos ser prioritário. E a prioridade que o PCP define com este projecto de lei é a de garantir um regime de acesso ao Direito e aos tribunais que dê verdadeira concretização ao artigo 20.º da Constituição e seja um factor de construção de uma democracia avançada no Portugal do séc. XXI.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nós temos hoje em discussão aqui, no Plenário, três propostas completamente distintas, a propósito do chamado apoio judiciário ou acesso à justiça e ao Direito.
Quanto à primeira proposta, que é a do Bloco de Esquerda, não me levem a mal que diga, desde já, que ela é péssima.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Bem lembrado!

O Orador: — E é péssima por várias razões que passo a citar. Quando eu estava a lê-la, pensei mesmo que ainda bem que não há, no processo legislativo, um despacho liminar, porque, se o houvesse, ele podia ser de indeferimento liminar,…

Risos de Deputados do PS.

… quando as propostas fossem infundadas, manifestamente inconclusivas, manifestamente inconcludentes. Porque se houvesse despacho liminar seria, de facto, de indeferimento liminar.

A Sr.ª Zita Seabra (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Mas ela é péssima pelo seguinte: não é só uma visão recauchutada de uma proposta do PCP.

Protestos do BE.

Não, não!! É pior ainda, é recauchutada para pior! E até fui aqui verificar… Repare-se, Sr. Presidente e Srs. Deputados, como é que ela é: propõe uma mega constelação de órgãos, uma «constelação» complexa e confusa, burocrática, mesmo, que envolve sete órgãos. Vejam bem, não podia ser menos! Tem sete órgãos: um presidente do IAJ, o tal instituto de assistência jurídica; um departamento de apoio judiciário; um departamento de defesa pública; um departamento de defesa de interesses públicos; uma divisão administrativa; uma divisão financeira; e, finalmente, uma comissão fiscalizadora.

Risos de Deputados do PS.

Não podia ser pior, não podia ser mais burocrático!! Mas isto ainda não é o pior do projecto: é que, depois, cada departamento destes como que se integra e subdivide em gabinetes centrais que, por sua vez, se subdividem em gabinetes regionais e, sei lá, em que gabinetes mais!…

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A Sr.ª Helena Terra (PS): — Essa é boa!

O Orador: — Ou seja, aquilo que eu queria perguntar era justamente o seguinte: alguém dessa bancada fez um estudo — mas um estudo sério —sobre o número de funcionários que seria preciso para esta «constelação»?!

A Sr.ª Helena Terra (PS): — E eu é que era cínica!…

O Orador: — Alguém dessa bancada fez um estudo — mas também um estudo sério — sobre os encargos financeiros que a contratação de todo esse pessoal implicava? Creio que não. É por isso que esse projecto de lei merece, de facto, a nossa reprovação.
Pior ainda: o projecto prevê, finalmente, aquilo a que não chama, mas é, verdadeiramente, o denominado «advogado público», porque prevê — não lhe chama, claramente, mas prevê.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Claro!

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Orador: — Tanto prevê que diz lá que os advogados vão ser contratados — note-se bem! — no regime de exclusividade e a tempo inteiro! Eu até talvez acrescentasse — porque não?… — com horário de trabalho, a entrar às 9 horas e sair às 17 horas, com livro de ponto, a pedir ao chefe para sair!… Sr.ª Deputada, permita-me que lhe diga o seguinte: eu, por acaso, felizmente e com muita honra o digo, sou advogado há mais de 30 anos. A advocacia é uma função nobre e independente, uma profissão feita de «nervo», de «cérebro», de «fibra», de tristezas e desilusões, mas é uma profissão autónoma e independente!!

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Orador: — E o advogado é um profissional liberal, não é um funcionário, conforme VV. Ex.as põem no vosso projecto de lei!!

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Orador: — VV. Ex.as transformam o advogado num funcionário! Um verdadeiro funcionário público, com uma avença mensal, a entrar à hora x e a sair à hora y.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Mas isso é contraditório com a exclusividade?

O Orador: — E, portanto, Sr. Presidente, quanto a este projecto de lei, temos dito!

O Sr. João Oliveira (PCP): — E o que é que são as sociedades de advogados?

O Orador: — Quanto ao projecto de lei do PCP, eu queria pedir licença para, antes de mais, cumprimentar o PCP. E cumprimentar porquê? Porque o PCP, durante anos, defendeu justamente um projecto igual ao que, agora, o Bloco de Esquerda apresenta. Correcto! E, agora, arrepiou caminho.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Continuamos a defender!

O Orador: — Não, não! O Sr. Deputado, então, não estudou. Mas eu vou já dizer-lhe: agora, arrepiou caminho, só que, em vez de progredir, regrediu.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma questão de calendário!

Risos do PCP e do BE.

O Orador: — Sim, regrediu!! Eu não vou criticar demasiadamente essa proposta, mas regrediu. Porquê? Porque disse assim: vamos fazer de conta que não se passaram estes anos, e vamos voltar atrás. Vamos voltar a atribuir ao juiz da causa a competência para conceder ou denegar o apoio judiciário, tudo…

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Nós sabemos — e o Partido Comunista Português também — que foi na decorrência de sucessivos e sucessivos apelos da magistratura portuguesa, que dizia que quando os juízes concediam ou denegavam o apoio judiciário, quando no fundo indagavam da situação de pobreza pessoal ou não das partes, não estavam a exercer solene e verdadeiramente a função jurisdicional.
Sei que o regime vingou e vigorou durante anos… e, enfim, até admito que seja melhor!

Vozes do PCP: — Melhor e com melhores resultados!

O Orador: — Eu disse-o aqui! Melhor do que muitos até já pensados e até já postos em prática. O que acontece é que, de facto, optou-se por este regime e optou-se com uma enorme maioria nesta Casa.
Optou-se quando? Justamente, Srs. Deputados, quando estava no poder um governo socialista. O Partido Social-Democrata apoiou esta iniciativa, mudando este regime e reconhecendo que a concessão do apoio judiciário, seja para isentar as partes de custas e encargos seja para nomear gratuitamente mandatários, é, de facto, um benefício social. E se é, de facto, um benefício social, então, investigar, autuar e conceder ou não, essa deve ser tarefa da segurança social…

Vozes do PSD e do PS: — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Faliu!…

Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares.

O Orador: — … e não do juiz da causa.
Todos nós sabemos, porque andamos nos tribunais há muitos anos, como é verdadeiramente nefasto para a celeridade das acções o incidente da instância, em que consistia o apoio judiciário, quando era indagado, instruído, decidido pelo juiz da causa! Era um incidente da instância que era péssimo, justamente, para a tramitação célere das acções.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — É verdade!

O Orador: — Por isso, é que eu digo que o Partido Comunista Português, hoje, não defende, nada — mas, bem, não está incorrecto! —, a solução que propugnava na anterior sessão legislativa, em que defendia uma posição igual à que, agora, advoga o Bloco de Esquerda. Hoje, defende outra, defende o retrocesso…

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

Mas é uma opção que respeito e que, já o disse aqui, é uma opção completamente diferente daquela que, nessa altura o governo socialista defendeu, que o PSD apoiou e o CDS também. Isto foi em 2000. E em 2004, no governo de maioria PSD/CDS, o Partido Socialista, melhorando — como estamos, hoje, a tentar começar a fazer, hoje, aqui — essa lei de 2000, também a votou a favor.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É uma declaração da factualidade da desgraça!

O Orador: — E, por isso, é que esta mudança tem de ser para melhor. E para ser melhor é preciso dar tempo, porque tratando-se de alterações importantes no funcionamento da justiça, como estas, só se dá conta delas, do seu verdadeiro acerto ou desacerto no terreno judiciário e anos depois de entrarem em vigor. Por isso é que temos de estar atentos e irmos melhorando.
Ouvi da boca do Sr. Secretário de Estado uma palavra que me agradou: é que o Governo e, portanto, o Partido Socialista também estão dispostos a aceitar contributos. Pois bem, o Partido Social-Democrata tem vários contributos que, parece-me, são importantes para, evidentemente, na especialidade, fazermos uma lei melhor, mas dentro deste paradigma que foi aqui defendido.
Por isso, Sr. Presidente, nós iremos votar, na generalidade, a favor da proposta de lei e — não me levem a mal! —…

Risos de Deputados do PS, do PCP e do BE.

… votamos contra, claro, o projecto de lei do Bloco de Esquerda. Quanto ao projecto de lei do PCP, porque é outro regime, também votaremos contra, mas por razões bem diferentes que respeitamos e que reconhecemos.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quando estamos a falar do direito de acesso dos cidadãos aos tribunais, estamos, evidentemente, a fazer uma referência, que também é constitucional, mas, fundamentalmente, que é da maior justiça nas sociedades modernas; estamos a falar daquele que é um dos pilares essenciais de qualquer Estado de direito. E é por isso mesmo que também é necessário recordar um bocadinho aquela que tem sido a história da discussão em relação a estas matérias, como ainda há pouco foi feito pelo Sr. Deputado António Montalvão Machado.
Quanto a esta matéria, temos, evidentemente, orgulho daquilo que tem sido o nosso posicionamento e a nossa posição activa. Recordamos que hoje estamos a tratar da possibilidade de alterar a Lei n.º 34/2004, que surgiu numa altura em que o CDS tinha especiais responsabilidades na área da justiça. Foi uma lei trabalhada em conjunto com várias bancadas, para além daquelas que compunham a maioria na altura, as do CDS e do PSD, com um contributo extraordinariamente positivo da bancada do Partido Socialista.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Orador: — Portanto, estamos com aquela que é a discussão quase do costume, independentemente de pequenas mudanças: há aquelas forças partidárias que, por natureza, estão contra, porque vivem, nestas matérias, noutro mundo; e há aquelas que têm uma preocupação de, pela positiva, poderem melhorar aquilo que é apresentado.
Começo pela proposta que o Governo aqui nos apresenta em que se clarifica o conceito de insuficiência económica; em que se faz uma revisão dos critérios de apreciação dessa mesma insuficiência económica; em que se faz uma definição até de um conjunto de regras mínimas em relação à prova da insuficiência económica, sendo que o essencial será determinado por portaria.
Mas, em relação a esta matéria, temos, evidentemente, também uma postura que é de natureza positiva e queremos, desde logo, que seja determinado, durante todo este debate, e também no debate na generalidade, o que se irá fazer em relação à matéria em que haja um requerimento relativo à situação de insuficiência económica em que se permite que o dirigente máximo do serviço de segurança social que aprecia o pedido solicite ao requerente que autorize, por escrito, acesso a informações e a documentos bancários.
Queremos saber, desde logo, quem garante o requerente em relação ao arbítrio que pode existir por parte do dirigente máximo do serviço. Em que circunstâncias é que se pode determinar a existência de dúvida? A autorização do particular é restrita às situações presentes ou pode, por exemplo, ter efeitos quanto à sua situação de natureza fiscal?

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Os dados podem, ou não, ser transmitidos? O que pretendemos saber, fundamentalmente, é se esta é uma medida que tem como objectivo incentivar a existência de apoio ou se será, pelo contrário, uma medida que acaba por dificultá-lo.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Depois, em relação à eliminação da concessão do apoio judiciário a pessoas colectivas com fins lucrativos, a dúvida que temos é a seguinte: mas então uma empresa insolvente deixa de poder litigar? Será que mesmo esses casos, que são reduzidos, fazem com que essa litigância não seja permitida? Queremos salientar, em relação a esta proposta de lei, a extensão do regime de apoio judiciário a estruturas de resolução alternativa de litígios. E fazemo-lo porque esta forma de resolução alternativa de litígios deve ser cada vez mais vista pelo Parlamento, e também pelos restantes órgãos de soberania, como uma forma essencial de, nos dias de hoje,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Muito bem!

O Orador: — … poder resolver litígios entre cidadãos.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Por isso mesmo, é indispensável que critérios como este que aqui estamos a discutir sejam também transmitidos para essa mesma resolução alternativa de litígios, porque será um passo para que ela possa ser cada vez mais generalizada e assim tenhamos aquilo que é essencial, que é uma justiça mais célere e que com certeza, sendo-o, também actuará.

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Passo a referir-me aos projectos de lei, que estão aqui em discussão, da iniciativa do PCP e do BE.
A iniciativa do PCP é, pode dizer-se, de natureza conservadora,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — É uma iniciativa progressista!

O Orador: — … de um regresso ao passado em que a decisão do apoio judiciário é «posta nas mãos» do juiz. Esse é um modelo que está ultrapassado, nós já estamos noutra fase e é preciso que se entenda isso.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Agora, estamos na fase do retrocesso!

O Orador: — Importante seria que houvesse, passada a fase da berraria, algumas propostas de natureza positiva, para podermos melhorar este regime.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não fazemos as nossas propostas de olhos fechados!

O Orador: — Isto é, não estamos perante um clube fechado… Com toda a certeza que o Partido Comunista Português, se conseguisse evoluir na sua posição, seria muito bem-vindo em relação a esta matéria.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Nós temos sempre uma esperança, se calhar quase de natureza cristã.

Risos do CDS-PP.

Quanto à iniciativa do Bloco de Esquerda, para além daquela que é a sua fase também ultrapassada e, diria, burocrática, porque é criada muita burocracia (seriam contratados mais funcionários, isto é, criar-se-ia um modelo de Estado mais pesado, como alguns partidos defendem), volta com a questão da presunção;…

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Ahhh!… O Orador: — … volta com um modelo que é, igualmente, já inadequado quanto às presunções de insuficiência económica.
Contudo, há um aspecto curioso no projecto do Bloco de Esquerda, que tem que ver com a questão do apoio judiciário incondicional, que é particularmente chocante nos casos de acção popular. Bem, se calhar não surpreende quando nos lembramos do Bloco de Esquerda e de alguns profissionais em acções deste género. Provavelmente, é devido a isto que aqui vem esta intervenção do Bloco de Esquerda, esquecendose, mais uma vez, que a acção popular não pode ser vista em relação a alguns casos concretos, tem de ser vista em termos genéricos e abarca enormes situações.
A postura do CDS, neste debate, vai ser pela positiva;…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — … será, com toda a certeza, de rejeição dos modelos ultrapassados, mas de propostas…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mais conservadoras!

O Orador: — … em relação àquilo que é essencial: um melhor acesso à justiça, em Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Terra.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Temos, hoje, em apreciação, nesta Câmara, para discussão na generalidade, uma proposta de lei do Governo e três projectos de lei do Bloco de Esquerda e do PCP, que visam alterar o sistema vigente de acesso ao Direito e aos tribunais e, em particular, o regime do apoio judiciário.
É um facto por todos reconhecido que o actual sistema de apoio judiciário constante da Lei n.º 34/2004 enferma de alguns bloqueios e que estão de há muito identificados: os critérios de insuficiência económica são demasiadamente restritivos, deixando de fora cidadãos que deveriam estar abrangidos pelo sistema de apoio judiciário; o sistema é demasiado oneroso, especialmente em face dos resultados obtidos, gerando

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custos excessivos e enormes desperdícios; o nível de qualidade técnica da defesa e do patrocínio oficiosos é por vezes insuficiente, sendo, por isso, necessário inverter esta situação, assegurando serviços de cada vez melhor qualidade, porque estão em causa direitos essenciais dos cidadãos; o sistema continua a carecer de regulamentação de alguns aspectos concretos.
Em suma, não obstante o caminho positivo trilhado nas últimas décadas e o esforço empreendido pelos diversos protagonistas do sistema, continuamos ainda longe da situação ideal que garanta a todos os cidadãos, e em particular aos mais carenciados, o adequado acesso ao Direito e a uma tutela jurisdicional efectiva.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Decorridos cerca de dois anos e meio desde a entrada em vigor da Lei n.º 34/2004, que alterou o regime de acesso ao Direito e aos tribunais com o objectivo essencial de tornar mais rigoroso o procedimento de concessão de protecção jurídica e de reforçar a componente da informação e da consulta jurídicas, o Governo considerou oportuno proceder à avaliação desse regime identificando e introduzindo os aspectos carecidos de aperfeiçoamento ou de alteração.
Feito o diagnóstico sintético dos principais «males» do sistema de apoio judiciário, é com satisfação que constatamos que a proposta de lei n.º 121/X veio ao encontro das grandes linhas de orientação a que uma reforma do actual sistema de apoio judiciário deverá estar sujeita.
Desde logo, o alargamento do acesso efectivo ao Direito e aos tribunais, uma vez que a experiência dos últimos anos nos permite concluir que algumas franjas de pessoas efectivamente carenciadas continuam a estar excluídas em resultado de uma aplicação estrita e cega de critérios demasiado restritivos suportados apenas em índices de ordem financeira.
A revisão dos critérios de apreciação da insuficiência económica de quem requer a protecção jurídica, através da elevação dos valores de referência do rendimento relevante para efeitos desse benefício, permite o alargamento do universo de beneficiários.
Na mesma linha, entendemos que se deverá proceder à clarificação do conceito de insuficiência económica, que deverá passar a conter uma referência expressa aos elementos objectivos relativos ao requerente e ao seu agregado familiar, que são hoje ponderados para o cálculo do rendimento relevante para efeitos de protecção jurídica,…

A Sr.ª Sónia Sanfona (PS): — Muito bem!

A Oradora: — … designadamente o rendimento, o património e a despesa permanente daqueles.
Finalmente, e porque a realidade dos factos e das pessoas é por vezes bem mais complexa do que a letra da lei, registamos como positiva a introdução pelo Governo de uma cláusula de salvaguarda que admite a possibilidade de dispensa das condições previstas na lei para a concessão de protecção jurídica se esta conduzir, no caso concreto, a uma manifesta negação do acesso ao Direito e aos tribunais; o novo mecanismo de apreciação dos pedidos de protecção jurídica, que permite ao dirigente máximo dos serviços de segurança social competente para a decisão sobre a concessão do benefício decidir, com fundamentação especial, de forma diversa da que resultaria da aplicação dos critérios previstos na lei.

A Sr.ª Sónia Sanfona (PS): — Muito bem!

A Oradora: — Por último, em matéria de apoio judiciário, sublinha-se a eliminação da possibilidade de concessão de apoio judiciário a pessoas colectivas com fins lucrativos e a estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada, numa lógica de moralização do actual sistema.
Nos termos da proposta de lei do Governo o aperfeiçoamento do sistema vigente deverá também passar pela criação de um regime mais claro de defesa e patrocínio oficiosos, assente, por exemplo, na possibilidade de nomeação para «lotes» de processos de geometria variável e com preços predeterminados, indutores de uma maior estabilidade e de uma melhor gestão por parte dos profissionais envolvidos. De igual modo, também a introdução de regras mais objectivas de compensação pelo serviço prestado permitirá corrigir os tradicionais atrasos e assegurar o pagamento atempado.

A Sr.ª Sónia Sanfona (PS): — Muito bem!

A Oradora: — O pagamento dos serviços prestados no âmbito do acesso ao Direito passam também a ter uma periodicidade definida, ou seja, até ao termo do mês seguinte àquele em que os serviços são prestados.
Em terceiro lugar, destacamos um duplo estímulo introduzido pela proposta de lei do Governo à resolução extrajudicial de litígios, quer por via da extensão do benefício de apoio judiciário a esta forma alternativa de composição de litígios quer por via do acréscimo do montante de compensação atribuído aos profissionais forenses que patrocinem tal forma de resolução.
Finalmente, em matéria de consulta jurídica, e sem prejuízo do regime de consulta jurídica gratuita já existente, apraz-nos registar um duplo avanço: por um lado, a criação de um novo regime de consulta jurídica sujeita ao pagamento prévio de uma taxa reduzida; por outro, a consagração de a dita consulta poder

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ser prestada quer em Gabinetes de Consulta Jurídica quer em escritórios de advogados que adiram ao sistema de acesso ao Direito. Por esta via obtêm-se manifestos ganhos em termos de possibilidade de escolha do patrocinado e, bem assim, em termos de cobertura geográfica, mormente em zonas de província até aqui excluídas por falta de Gabinetes de Consulta Jurídica.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Realizada a análise dos problemas e apresentadas as soluções mais relevantes, plasmadas na proposta de lei do Governo, resta-nos apreciar, ainda que sinteticamente, os projectos de lei que o Bloco de Esquerda e o PCP aqui nos trazem.
Quando a prioridade é contenção e racionalização de recursos, sem prejuízo do comando constitucional de que a todos os cidadãos é garantido o acesso ao Direito e aos tribunais, o BE, com o seu projecto de lei n.º 286/X, propõe-nos uma lógica despesista, de criação de novas estruturas, em que, paralelamente à actual «constelação» de entidades, surgiria um novo instituto de assistência judiciária, composto por sete órgãos: o presidente, o departamento do apoio judiciário, o departamento de defesa pública (subdividido ainda em gabinete central e gabinetes regionais), o departamento de defesa dos interesses públicos, a divisão administrativa, a divisão financeira e ainda — imagine-se!… — uma comissão fiscalizadora.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Não se pode fiscalizar!?

A Oradora: — Os serviços de assistência jurídica seriam, de acordo com o projecto do BE, prestados por advogados ou solicitadores integrados nos quadros do instituto de assistência judiciária por contrato com duração de três anos.
O proposto instituto de assistência judiciária, com a sua complexa estrutura,…

O Sr. Luís Fazenda (BE): — A segurança social não é nada complexa…!

A Oradora: — … a única coisa que traria de novo seria mais custos para o Estado e para os portugueses, uma maior carga burocrática para os cidadãos e nenhuns, mas mesmo nenhuns ganhos em termos de eficácia!!

A Sr.ª Sónia Sanfona (PS): — Bem lembrado!

A Oradora: — Só a ausência de responsabilidades governativas por parte do Bloco de Esquerda podem justificar a criação de novas entidades, que, em bom rigor, nada trazem de novo que não o engordar da pesada máquina do Estado, que o actual Governo se tem esforçado por emagrecer.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Nota-se!…

A Oradora: — No que respeita ao projecto de lei n.º 287/X, igualmente do BE, constata-se o enorme desconhecimento do proponente relativamente ao trabalho já desenvolvido por este Governo no que toca à disponibilização gratuita de informação jurídica, bem como de acesso a bases de dados de legislação e jurisprudência. Ao propor o acesso gratuito a bases de dados actualizadas de legislação e jurisprudência o Bloco de Esquerda esquece por completo que o Diário da República e a base de dados do Digesto já são, desde 15 de Setembro de 2006, de acesso universal e gratuito, estando também acessível a base de dados do Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça (ITIJ), que permite o acesso à jurisprudência portuguesa.
Pela sua especial relevância, destacamos a coincidência de opções por parte do BE e do PCP no regresso a um regime de presunção de insuficiência económica, susceptível de…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Resolver o problema!

A Oradora: — … gerar enormes distorções sociais e, por via disto, de subverter o valor social que visa preservar.
Em concreto, a proposta do PCP de isentar do pagamento de custas os trabalhadores em qualquer processo de natureza laboral, seja qual for a sua posição processual e, sobretudo, independentemente do seu rendimento, configura uma perspectiva enviesada do bem constitucional que visa salvaguardar,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — É como fazem os espanhóis!

A Oradora: — … podendo conduzir na prática a situações objectivas de verdadeira injustiça social, onerando, por esta via, os cofres do Estado com despesas de quem tem perfeita capacidade para as custear.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, tem de concluir.

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A Oradora: — Concluirei dentro de segundos, Sr. Presidente.
Por outro lado, a opção do PCP de devolver ao juiz da causa a competência para a decisão sobre a concessão do apoio judiciário, em incidente no respectivo processo, constitui uma involução judicial inadmissível.

A Sr.ª Sónia Sanfona (PS): — É verdade!

A Oradora: — Ao juiz cabe a nobre tarefa de julgar, motivo pelo qual devemos libertar os juízes de expedientes administrativos que apenas entorpeceriam a desejavelmente célere administração da justiça.
Face ao exposto, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista votará contra os projectos de lei do Bloco de Esquerda e do PCP, saudando os avanços materializados na proposta de lei do Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Muito rapidamente, Os Verdes gostariam de reconhecer, como já outras bancadas o fizeram, inclusivamente o Governo, que a actual lei e situação são profundamente negativas, iníquas e constituem uma barreira que impede, de facto, os portugueses de acederem em condições de equidade e de justiça ao Direito e aos tribunais para salvaguarda dos seus direitos.
E não é apenas o regime do acesso ao Direito que se encontra iníquo, mal elaborado, que não responde aos problemas dos portugueses. Os Verdes têm, em diversas ocasiões, aqui, na Assembleia da República, alertado para questões que consideravam prioritárias e que, infelizmente, só agora começam a ser tratadas.
Também a questão das custas judiciais conheceu um agravamento excessivo, do nosso ponto de vista, o que tem constituído um desincentivo a que as pessoas recorram aos tribunais para verem garantidos os seus direitos. Mas podemos ainda falar da acção executiva, Sr. Secretário de Estado, que nos actuais moldes também tem constituído um entrave para muitos cidadãos verem garantidos os seus créditos, porque, de facto, envolve custos exorbitantes, que serão comportáveis para dívidas de grande montante, para empresas com grandes posses de capital, com grandes posses financeiras, e para cidadãos com capacidade económica mas que para muitos portugueses é uma situação também de denegação de justiça. Por isso mesmo nos preocupou o PS decidir fazer um pacto de justiça com o PSD, que, em nosso entender, foi o principal responsável por estas três reformas que contribuíram tanto para afastar os cidadãos portugueses do acesso à justiça, ao Direito e aos tribunais.
O Sr. Secretário de Estado falou dos aspectos profundamente negativos da actual lei de 2004, que, de facto, a pretexto de introduzir rigor, objectividade e transparência, criou um sistema de verdadeira negação de justiça e, assim, de violação do imperativo constitucional, presente no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, de garantia do acesso ao Direito e aos tribunais, tornando o apoio judiciário, infelizmente, quase só para situação de indigentes.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Mas a grande discussão que hoje devemos fazer é a de como mudar a iniquidade actualmente existente, num momento em que as condições de vida de muitos portugueses se agravam, com o aumento do custo de vida e a diminuição dos salários reais, num momento em que as desigualdades também se aprofundam entre os mais ricos e os mais pobres no nosso país. Devemos, neste contexto, ser ainda mais exigentes no cumprimento e na garantia deste direito fundamental que é o acesso à justiça.
Nesse âmbito, devemos dizer que o Governo, depois de andar muito preocupado com outras questões, de chamar a atenção para o pseudo problema das férias judiciais, de andar preocupado em reorganizar o mapa judiciário, chegou finalmente às que, em nosso entender, são de facto as questões prioritárias, entre as quais a alteração da lei do acesso ao Direito e ao apoio judiciário. Chegou um pouco tarde mas chegou.
A direita, contudo, parece querer continuar na situação em que se está, não vê problema de maior, diz que podemos melhorar mas que a situação tal como está actualmente, entende a direita, está bem.

O Sr. João Oliveira (PCP): — São posições tácticas!

O Orador: — Devemos dizer que também da parte do Governo gostaríamos de ver uma maior ousadia.
Sr. Secretário de Estado, não basta alargar o apoio judiciário. É importante, e saudamos esse passo, mas não basta. É preciso consagrar o apoio judiciário em toda a medida daquilo que é justo e para que a ele possam aceder aqueles que realmente carecem na nossa sociedade. E, desse ponto de vista, parece-nos que a proposta de lei do Governo fica ainda aquém do que seria necessário.

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Contudo, aquilo que desejaríamos deixar como nota neste debate, para além de realçarmos que entendemos que este passo de alargamento do apoio judiciário é positivo, é que em sede de especialidade se possa, de facto, ir um pouco mais além e consagrar um regime justo e correcto, independentemente de o primeiro passo do Governo não ter ido nesse sentido.
Esperamos que em sede de especialidade haja abertura da parte do PS para chegarmos onde é preciso.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Justiça.

O Sr. Secretário de Estado da Justiça: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queria dizer, em primeiro lugar, que o Governo toma boa nota e está disponível, como está sempre e tem sido sempre dito, para acompanhar e analisar, na especialidade, as várias questões que foram colocadas e verificar como pode ser melhorada a proposta apresentada pelo Governo.
Porém, essencialmente, queria dizer o seguinte: fica claro, deste debate, que há duas visões diferentes sobre aquilo que é o apoio judiciário e o acesso ao direito.
Uma visão, a do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda, assenta não na consideração das pessoas e do acesso ao direito como uma protecção social mas como algo que é apenas motivo de palavras. Não ouvi uma única referência a um caso concreto, em que tenha sido elevado, em concreto, o problema concreto de uma pessoa que esteja em insuficiência económica.

Protestos do PCP e do BE.

Ouvi grandes proclamações e até ouvi coisas erradas, como a ideia de isentar todos os trabalhadores de custas, mesmo aqueles que ganhem muito dinheiro durante todos os meses do ano.

Protestos do PCP e do BE.

Lamento, mas essa não é a visão do Governo. A visão do Governo é a de que este é um mecanismo de protecção social para quem tem insuficiência económica.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — E essa é a grande diferença: o acesso ao direito é protecção social. Por isso, Srs. Deputados, é que deve estar na segurança social.

Protestos do PCP e do BE.

Custa a ouvir! Deve estar na segurança social.
Gostaria de terminar, indo directamente àquilo a que os Srs. Deputados não deram resposta: agregado familiar constituído por duas pessoas sem móveis nem imóveis, com um rendimento líquido completo de 23 050 € anuais, que corresponde a 960 € líquidos mensais por pessoa — muito próximo, aliás, do rendimento médio de um trabalhador por conta de outrem a tempo completo. Para este há também uma proposta do Governo de apoio judiciário, na modalidade de consulta jurídica sujeita ao pagamento de uma taxa e com pagamento faseado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Queríamos era que fossem mais do que dois!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: — Isto é que é progresso social e isto é que é encarar o acesso ao direito como uma prestação social.
Lamento que os Srs. Deputados não tenham dado essa resposta.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, concluída a discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 121/X e dos projectos de lei n.os 286 e 287/X, ambos do BE, e 377/X, do PCP, restame informar que a próxima reunião plenária se realiza amanhã, com início às 10 horas, e terá como ordem do dia um debate, ao abrigo do artigo 240.º do Regimento, um debate sobre política de juventude, desporto, igualdade de oportunidades, imigração e minorias étnicas, bem como a apreciação das petições n.os 157/X

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(2.ª) — Apresentada por Miguel Saturnino e outros (Associação de Sensibilização para os Direitos dos Animais), solicitando à Assembleia da República que adopte medidas que assegurem o tratamento condigno e o fim do extermínio dos animais em canis/gatis municipais, e 260/X (2.ª) — Apresentada pelo Instituto de Estudos Clássicos da Universidade de Coimbra e outros, solicitando que a Assembleia da República crie condições para o ensino das línguas e culturas clássicas em todos os níveis de ensino.
Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Carlos Bravo Nico
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Renato José Diniz Gonçalves
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos

Partido Social Democrata (PSD):
Arménio dos Santos
Domingos Duarte Lima
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Luís Miguel Pais Antunes
Mário Henrique de Almeida Santos David
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Santana Lopes
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Popular (CDS-PP):
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
Jaime José Matos da Gama
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Umberto Pereira Pacheco

Partido Social Democrata (PSD):
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Melchior Ribeiro Pereira Moreira

Partido Comunista Português (PCP):
José Honório Faria Gonçalves Novo

Partido Popular (CDS-PP):
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

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Partido Socialista (PS):
António Ramos Preto
Glória Maria da Silva Araújo
Joana Fernanda Ferreira Lima
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos António Páscoa Gonçalves
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José de Almeida Cesário

Partido Popular (CDS-PP):
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Srs. Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003, de
11 de Outubro):

Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares

Partido Comunista Português (PCP):
Jerónimo Carvalho de Sousa

Partido Popular (CDS-PP):
Paulo Sacadura Cabral Portas

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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