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Sexta-feira, 12 de Outubro de 2007 I Série — Número 9
X LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2007-2008)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 11 DE OUTUBRO DE 2007
Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama
Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Abel Lima Baptista
SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 410/X e das apreciações parlamentares n.os 53 a 55/X.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Ana Drago (BE) considerou inaceitável num Estado democrático a visita de forças de segurança à sede do Sindicato dos Professores da Região Centro, na Covilhã, em véspera de uma manifestação de protesto, tendo acusado o Governo de tentar silenciar a crítica política e o protesto social.
Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Ricardo Rodrigues (PS), António Filipe (PCP) e Manuel Alegre (PS).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Bruno Dias (PCP) deu conta das recentes jornadas parlamentares levadas a cabo pelo seu partido, centradas no tema da educação, tendo também referido que foi abordado e condenado o processo de privatização da rede viária nacional que está a ser prosseguido pelo Governo.
Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Luís Fazenda (BE) e José Junqueiro (PS).
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura relativo à retoma de mandato de uma Deputada do PS.
Ainda em declaração política, o Sr. Deputado Paulo Rangel (PSD) manifestou preocupação pelos acontecimentos ocorridos na Covilhã, a propósito da visita de agentes ligados à investigação criminal a um sindicato para obtenção de informações sobre uma manifestação, tendo considerado importante uma tomada de posição sobre o assunto por parte do Primeiro-Ministro, do Governo e do Partido Socialista. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António Filipe (PCP), Diogo Feio (CDS-PP), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Ricardo Rodrigues (PS) — que deu também explicações ao Sr. Deputado Paulo Portas (CDSPP), que exerceu o direito de defesa da honra da sua bancada — e Ana Drago (BE), tendo ainda dado explicações ao Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, que exerceu também o direito de defesa da honra da bancada.
Também em declaração política, o Sr. Deputado Pedro Mota Soares (CDS-PP) criticou o Governo pelas políticas de emprego, que levam a um aumento da taxa de desemprego, de segurança interna, que têm conduzido a
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um aumento da insegurança, e de educação, pela aplicação dos quadros de supranumerários aos professores considerados incapazes de exercerem a função docente. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Pedro Duarte (PSD) e José Junqueiro (PS).
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) teceu críticas ao Programa Nacional de Barragens anunciado pelo Governo por o considerar desadequado às necessidades do País e causador de problemas ecológicos, como erosão costeira e degradação da qualidade das águas. Depois, deu resposta aos pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Renato Sampaio (PS).
Ainda em declaração política e a propósito da celebração do Dia Europeu Contra a Pena de Morte ontem ocorrida, a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça (PS) teceu considerações sobre o tema, após o que respondeu aos pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP).
A Câmara procedeu à reapreciação do Decreto da Assembleia da República n.º 150/X — Aprova o regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, tendo, no final, sido aprovado um requerimento subscrito pelo PS e pelo PSD no sentido de adiar a votação das propostas de alteração apresentadas.
Usaram da palavra, além do Sr. Ministro da Justiça (Alberto Costa), os Srs. Deputados Ricardo Rodrigues (PS), António Filipe (PCP), Paulo Portas (CDS-PP), António Montalvão Machado (PSD), Ana Drago (BE), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes) e Diogo Feio (CDSPP).
Foi apreciado, na generalidade, o projecto de lei n.º 402/X — Adita ao Código de Procedimento e de Processo Tributário um novo título sobre arbitragem (CDS-PP), o qual baixou à Comissão de Orçamento e Finanças sem votação, por um período de 90 dias, a requerimento do CDS-PP. Intervieram no debate, a diverso título, os Srs. Deputados Diogo Feio (CDS-PP), Hugo Velosa (PSD), Honório Novo (PCP), António Gameiro (PS) e Francisco Louçã (BE).
Foi aprovado o voto n.º 114/X — De pesar pelo falecimento de Fausto Correia (PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE e Os Verdes), após o que a Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio, tendo em seguida aplaudido de pé.
A proposta de lei n.º 150/X — Aprova a lei relativa à implementação da Convenção sobre a Proibição do Desenvolvimento, Produção, Armazenagem e Utilização de Armas Químicas e sobre a sua Destruição foi aprovada em votação final global.
Foram ainda aprovados dois pareceres da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, um autorizando uma Deputada do PS a depor como testemunha, por escrito, em tribunal e outro relativo à substituição de um Deputado do PCP.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 20 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
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Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vitor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Partido Social Democrata (PSD):
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
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Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando dos Santos Antunes
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Mendes Bota
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Miguel Tiago Crispim Rosado
Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
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Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Hélder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Ana Isabel Drago Lobato
António Augusto Jordão Chora
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projecto de lei n.º 410/X — Garante o princípio da precaução face às radiações provenientes de campos electromagnéticos produzidos pelas linhas e instalações de alta tensão (BE), que baixou à 7.ª Comissão; apreciações parlamentares n.os 53/X (PCP) — Decreto-Lei n.º 285/2007, de 17 de Agosto, que estabelece o regime jurídico dos projectos de potencial interesse nacional classificados como PIN +, 54/X (PCP) — Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, que no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 20/2007, de 12 de Junho, estabelece o regime jurídico das farmácias de oficina, e 55/X (PCP) — Decreto-Lei n.º 322/2007, de 27 de Setembro, que fixa o limite máximo de idade para o exercício das funções de piloto comandante e de co-piloto de aeronaves operadas em serviços de transporte comercial de passageiros, cargas ou correio.
Em termos de expediente é tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos entrar no primeiro ponto da nossa ordem de trabalhos de hoje, que consiste em declarações políticas.
Para o efeito, em primeiro lugar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma manifestação de protesto convocada, uma sede sindical, dois polícias. Na Covilhã, em véspera de um protesto convocado para contestar as políticas seguidas pelo poder socialista, dois polícias visitam a sede do sindicato dos professores e, tudo indica, aconselham «moderação na linguagem».
O País descobre, com estupefacção e indignação, uma nova medida de segurança: «visitas policiais preventivas» às iniciativas de protesto social; os portugueses medem agora o espaço e a natureza das liberdades de que dispõem para viver, de facto, como uma democracia pluralista.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Não há — não pode haver numa sociedade democrática — uma única razão para que as forças de segurança façam uma visita, dita informal, à sede de um sindicato em vésperas de uma manifestação. É uma forma de pressão inaceitável e é, principalmente, um — mais um — sinal de alarme do clima de sufoco democrático que vamos sentindo na sociedade portuguesa.
Sobre o caso da Covilhã repete-se a encenação. O Primeiro-Ministro vem dizer que não sabe se as coisas se passaram como de facto se passaram. Do Partido Socialista erguem-se vozes dizendo que não se passa nada, que está tudo bem, que foi apenas «excesso de zelo» da polícia.
Srs. Deputados, o problema não é o excesso, é o próprio zelo.
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O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Até porque esta história está mal contada: a manifestação de protesto na Covilhã foi convocada e comunicada ao Governo Civil pela União dos Sindicatos de Castelo Branco. Por que foi, então, a polícia «visitar» a sede do Sindicato dos Professores da Região Centro? Será porque os professores têm sido uma das principais vozes de protesto contra as políticas deste Governo? Pior: a Governadora Civil — nomeada e representante oficial do Governo no distrito de Castelo Branco — informou o País que estas visitas preventivas, que este comportamento é «habitual e rotineiro».
Não o sabíamos. Não o aceitamos. E desengane-se quem pensa que, com tempo e persistência, os cidadãos portugueses se vão habituar.
O Ministério da Administração Interna ordenou agora um inquérito célere. É bom que seja de facto célere, e é bom que este inquérito não se revele mais um instrumento para abafar e deixar cair no esquecimento o que se passou.
Os portugueses começam a ficar fartos de abusos que passam em claro; começam a ficar fartos de um Governo que lhes diz que, certamente, podem contestar as políticas do PS, mas que o façam baixinho, discretamente, de preferência no recato dos seus lares.
O episódio da Covilhã é grave e inaceitável num Estado democrático.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Como é grave e inaceitável a trajectória do poder do Governo do Partido Socialista na forma como lida, como pressiona e como tenta silenciar a crítica política e o protesto social.
A lista, Srs. Deputados, começa a ser demasiado longa, preocupantemente longa: a directora do Centro de Saúde de Vieira do Minho, exonerada porque se recusou a retirar um cartaz sobre declarações do Sr. Ministro da Saúde; os grevistas da função pública, a quem foi pedida identificação pelas chefias depois da jornada de 12 de Julho; manifestantes, aqui mesmo, frente ao Parlamento, em vigília legal, que foram identificados pela PSP e a quem tentaram retirar a instalação sonora; os manifestantes que em Guimarães protestavam contra as políticas do Governo, faz agora um ano, são agora alvo de um processo-crime que os coloca sob a ameaça de pena de multa ou mesmo de dois anos de prisão; o funcionário da DREN que comentou a figura do Sr.
Primeiro-Ministro e que, por isso, perdeu a posição de requisição nas estruturas do Ministério da Educação; os militares que participaram na passeata de protesto são agora alvo de processo disciplinar, com base nas fotografias encomendadas pelo Ministério da Defesa Nacional.
Certamente que os Srs. Deputados que apoiam o Governo repetirão também aqui, esta tarde, «nada menos nada mais do que excesso de zelo». Mas a verdade, e o que preocupa e tem de ser discutido, é que foi o Sr. Primeiro-Ministro que deu, e tem dado, o mote, quando classifica a luta política e o protesto social como insultos, quando usa um tom depreciativo — bafiento, que faz lembrar outros tempos — para aludir às críticas e às manifestações organizadas pelos sindicatos.
Aplausos do BE.
É bom que o Sr. Primeiro-Ministro, que o poder socialista e o Partido Socialista se habituem. Com um desemprego de 8,3%, com cortes massivos nos direitos sociais e com o desmontar da rede de serviços públicos, é bom que se habituem ao protesto, porque ele está condenado a aumentar.
Para os dirigentes do PS, que tanto repetem que não aceitam e que não recebem lições de democracia de ninguém, este é o momento de provar ao que estão, antes que, como sonha a Governadora Civil de Castelo Branco, a intimidação do protesto político se torne «habitual e rotineira».
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se vários Srs. Deputados para pedir esclarecimentos à oradora.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, gostaria de, a propósito da matéria que o Bloco de Esquerda hoje aqui nos traz, fazer algumas declarações.
O PS foi, é e será um partido da liberdade. É um partido que defende o Estado de direito, o Estado de direito democrático.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Belas palavras!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Palavras e actos, Srs. Deputados! Convém que recordem um pouco da nossa História recente e que percebam do que é que falamos.
Acabámos de aprovar, na 1.ª Comissão, a vinda do Sr. Ministro da Administração Interna ao Parlamento, onde estará à disposição de todos os Srs. Deputados para dar as explicações que forem necessárias.
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Para nós, aquilo que garante a liberdade é a lei. Somos acérrimos defensores da lei, porque esta é que distingue o que é bem e o que é mal, não são as opiniões avulsas, não é o cavalgar de versões que nos podem conduzir a um beco sem saída.
Aguardamos com tranquilidade e serenidade as averiguações que o Sr. Ministro da Administração Interna pediu e que estão a ser feitas pela Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI). Vamos ter, naturalmente, um resultado e, seja qual for, o PS agirá em conformidade com as decisões.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Não perseguimos ninguém, não queremos perseguir ninguém! Temos a certeza de que o Estado de direito tem uns mecanismos próprios para resolver as situações que são colocadas.
Não vamos fazer disso um caso excepcional, vamos, sim, tratá-lo como ele deve ser tratado: averiguar e, depois, tirar as consequências que são necessárias ao caso.
A liberdade sindical é, para o PS, um bem essencial da democracia; o direito de manifestação é outro bem essencial da democracia. E, em Portugal, nem os sindicatos nem a liberdade de manifestação serão ameaçados: continuarão a ter o seu rumo, continuará a ser possível, como sempre foi em Portugal desde o 25 de Abril, falar livremente.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, compreendo a sua dificuldade neste debate, refugiando-se naquilo em que se refugia sempre: «Bem prega Frei Tomás, olha para o que ele diz e não para o que ele faz».
A verdade, Sr. Deputado, é que há um problema político que o País sente e tem sentido. Por muito que os dirigente do PS aqui venham dizer que são os primeiros na defesa da democracia e das liberdades de protesto, a verdade é que todos os portugueses perceberam a mensagem que o Sr. Primeiro-Ministro tem transmitido ao País nos últimos dias: não gosta e não quer manifestações de protesto;…
Risos do PS.
… não gosta e não quer manifestações, em particular, Sr. Deputado, dessas «forças subversivas do antigamente» chamadas sindicatos. Mas é bom que os dirigentes do PS se habituem, porque os protestos vão continuar.
Quanto ao inquérito agora ordenado pelo Ministério da Administração Interna, aquilo que eu disse, Sr. Deputado, e repito, é que seria bom que o mesmo fosse célere, que, ao contrário do que estamos habituados em Portugal, não se mantivesse durante muito tempo e que, acima de tudo, não ficasse tudo em «águas de bacalhau», que é o que costuma acontecer.
Porque as indicações e as aprovações da bancada do Partido Socialista vão no sentido de «abrir buracos» nos direitos fundamentais. Aquilo que os senhores propõem e vão apoiar aqui quanto à Lei de Segurança Interna irá permitir fazer buscas sob um pretexto que só as forças de segurança é que sabem, com uma validação do juiz a posteriori, ou seja, sem qualquer tipo de penalização quando os direitos fundamentais dos cidadãos vierem a ser violados.
Sr. Deputado, é bom que as preocupações que aqui hoje nos deixou sejam transmitidas directamente aos responsáveis governamentais. É bom que o Primeiro-Ministro tenha finalmente uma lição de democracia para perceber que as liberdades conquistadas em Portugal não vão esvair-se sem uma grande luta.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, quero, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, saudar a sua intervenção e a pertinência do tema que aqui traz, que, aliás, acabámos de discutir agora mesmo, na 1.ª Comissão, a propósito de vários requerimentos, um dos quais, anunciado nas jornadas parlamentares do PCP, no sentido de o Sr. Ministro da Administração Interna vir rapidamente a esta Assembleia prestar esclarecimentos cabais acerca das responsabilidades que vão ser apuradas pelo que aconteceu no passado dia 8 na delegação da Covilhã do Sindicato dos Professores da Região Centro.
Creio que a Sr.ª Deputada também fez bem em lembrar o conjunto de situações que se têm vindo a verificar nos últimos tempos e que são extraordinariamente preocupantes do ponto de vista da defesa do Estado de direito e da defesa de direitos fundamentais dos cidadãos.
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A Sr.ª Deputada deu alguns exemplos, mas poderia ter dado outros, como o caso de a GNR se ter dirigido à Câmara Municipal de Avis, há uns tempos atrás, na véspera de uma manifestação da função pública, para perguntar quantos trabalhadores da Câmara é que iriam participar nessa manifestação.
O Sr. Francisco Teixeira Lopes (Os Verdes): — É verdade!
O Sr. António Filipe (PCP): — E o Governo, até agora, apesar de termos apresentado um requerimento sobre esse assunto, ainda não nos deu uma explicação cabal sobre quem é que deu ordens à GNR para ir à Câmara de Avis perguntar quem é que participava na manifestação.
A Sr.ª Deputada referiu-se, ainda, às punições que estão a ser desencadeadas contra dirigentes associativos militares, aliás com base em fotografias tiradas por alguém quando esses cidadãos militares se manifestavam numa iniciativa realizada na baixa lisboeta. Não sei se os Srs. Deputados têm consciência de que já foram aplicados 103 dias de prisão disciplinar, medidas aplicadas administrativamente e de forma selectiva a militares, por terem participado em acções de protesto, ou por terem prestado declarações, ou, por vezes, até, com base em notícias vindas nos jornais de que esses militares teriam dito algo que eles não confirmam e que em alguns casos até desmentem.
Ou seja, o que está a acontecer é a prepotência à solta, ainda por cima com punições que implicam a privação da liberdade desses cidadãos. Portanto, Sr.ª Deputada, também nos parece que estamos a viver dias muito complicados em matéria de defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, pelo que todos, nesta Assembleia, temos todas as razões para que esta questão seja aqui colocada e para que se proceda aqui a um debate muito sério sobre esses problemas.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, agradeço as questões que me colocou, agradeço as informações que trouxe a esta Assembleia, concordando consigo de que este é um debate urgente e inadiável que a Assembleia tem de fazer. A soma e a multiplicação de casos de intimidação sobre pessoas e funcionários que exercem aqueles que são os seus direitos e as suas liberdades é inaceitável.
Creio que todos compreendemos qual é a mensagem política que o Governo do Partido Socialista quer dar ao País: «Cuidado com aquilo que dizem, cuidado com o espaço em que o fazem».
Todo o tipo de medidas intimidatórias, como a identificação de manifestantes, a identificação de grevistas, tirar fotografias a militares que fazem uma passeata de protesto, vão no sentido de marcar claramente o terreno em que o protesto político ou a pluralidade política pode acontecer, que é dentro da casa de cada um.
Jamais pense alguma força social, alguma força política ou algum sindicato vir para a praça pública contestar aquilo que são políticas «tão boas» do Partido Socialista mas que teimosamente os resultados tendem a desmentir.
Sr. Deputado, acompanhamos a preocupação do PCP e pensamos que esta Câmara deve pronunciar-se, mas acima de tudo somos de opinião que também o Primeiro-Ministro, dadas as declarações que tem proferido nos últimos dias, deve agora uma explicação clara e cabal ao País.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.
O Sr. Manuel Alegre (PS): — Sr. Presidente, participei com V.ª Ex.ª, Mário Soares, Salgado Zenha, Edmundo Pedro e outros, alguns dos quais ainda aqui estão, no combate pela liberdade sindical quando se quis impor ao País a lei da unicidade sindical. Foi um momento essencial, direi mesmo um dos momentos fundadores da democracia portuguesa, tal como ela hoje está inscrita na Constituição.
O PS liderou, então, esse combate, que faz parte do seu património histórico. Gostaria, portanto, que neste caso, o da visita da polícia a um sindicato de professores, não houvesse sombras, nem equívocos, nem confusões.
O Governo ordenou um inquérito, mas antes mesmo desse inquérito e dos seus resultados, há uma pedagogia política e democrática que é necessário fazer: a liberdade sindical é inseparável da liberdade política. E não há liberdade sem liberdades, sem todas as liberdades.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Manuel Alegre (PS): — Espero, pois, que sejam apuradas responsabilidades, que este caso fique completamente esclarecido e, sobretudo, que não volte a repetir-se, para bem da transparência democrática, porque assim o exigem os princípios do Estado de direito que o Partido Socialista ajudou a fundar, de maneira
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decisiva, na sociedade portuguesa e porque assim o exige a própria história e identidade do Partido Socialista.
Aplausos do PS, do PSD e do BE.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel Alegre, deixe-me dizer-lhe que é com satisfação que vejo surgir uma lufada de ar fresco na bancada do Partido Socialista, que não ficamos pelas meias palavras, pelo «vamos averiguar», pelo «tenhamos calma», pelo «nada aconteceu», pelo «foi apenas um excesso de zelo».
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Quem é que disse isso?
A Sr.ª Ana Drago (BE): — O Sr. Deputado colocou a questão nos exactos termos em que deve ser colocada.
De facto, trata-se, neste caso, da liberdade de manifestação, e sabemos hoje que na sociedade portuguesa ela é fundamental para que possamos «respirar» em Portugal.
Creio que o Sr. Deputado também me acompanha quando peço que o Primeiro-Ministro esclareça este caso em todos os seus contornos e que nos acompanha, a todos aqueles que se batem pela liberdade, na defesa intransigente do direito de manifestação dos dirigentes sindicais.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Realizaram-se nos últimos dois dias as jornadas parlamentares do PCP, centradas no tema da educação, cujas conclusões foram publicamente divulgadas. Uma dessas conclusões versava sobre a necessidade de discussão e votação imediata do chamado «pacote da corrupção», há longos meses parado na 1.ª Comissão.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso é verdade!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Verificámos, aliás, que esta nossa proposta foi prontamente acolhida por outras bancadas, que propuseram o mesmo, incluindo a da maioria, que anunciou ontem a reactivação do grupo de trabalho que desde há muito se mantinha inactivo. Ainda bem que tomámos esta iniciativa!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — As jornadas parlamentares do PCP abordaram ainda um processo que, a concretizar-se, representará um capítulo negro da linha privatizadora seguida por sucessivos governos do PS e do PSD, com ou sem o CDS-PP. Falamos do processo conducente à privatização da rede viária nacional.
Nesta matéria, importa sublinhar que a Constituição da República determina, no seu artigo 84.º, que as estradas pertencem ao domínio público. Tal como as linhas férreas nacionais, os cursos de água navegáveis, as águas territoriais com os seus leitos e fundos marinhos, também a rede viária é componente fundamental, não apenas do património do Estado Português e do seu quadro de responsabilidades e deveres ao nível da gestão e defesa deste bem público.
Mais ainda do que isso, e também por essa razão, a rede viária constitui um factor absolutamente vital da soberania de um país e do funcionamento da sua economia. Por estas razões, esta norma constitucional tem que ser entendida pelos princípios que consagra e pelos objectivos que prossegue — não pode ser encarada como uma barreira que se contorna para seguir um caminho de entrega do País aos grupos económicos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É esse o caminho que este Governo está a tentar prosseguir a todo o custo, com vista à privatização das estradas nacionais. Um caminho que se iniciou com a «flor na lapela» da regulação estatal, que sempre acompanha as políticas de liberalização e privatização. Assim nasceu, em Abril, o Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias, com a respectiva lei orgânica e estatutos.
O caminho prosseguiu com a publicação, em 11 de Julho, da resolução do Conselho de Ministros que determinou o «modelo de gestão e financiamento do sector das infra-estruturas rodoviárias», abrangendo a totalidade da rede viária nacional. Aí se estabelecia o peregrino conceito da «solidariedade intergeracional», uma insólita solidariedade que não se dá mas que se exige às actuais e futuras gerações, deixando-lhes a factura deste escandaloso negócio.
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É assim que a maioria PS, nesta Assembleia da República, impôs a aprovação de uma lei de financiamento da rede rodoviária (publicada a 31 de Agosto), determinando que este seja assegurado pelos respectivos utilizadores. Como? Com a aplicação da tal «contribuição de serviço rodoviário» que, ainda por cima, não é contrapartida nenhuma ao uso das estradas nacionais, porque é paga em função do combustível gasto.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente! O Sr. Bruno Dias (PCP): — Trata-se de uma clamorosa manipulação das contas do Orçamento do Estado, com a transferência — ou, melhor dizendo, com a consignação — de receitas do ISP para a Estradas de Portugal, determinada pela obsessão do défice relativamente ao qual se pretende uma desorçamentação de cerca de 0,3%.
Mas o Governo e a maioria PS vão mais longe e determinam que «a exigência da contribuição de serviço rodoviário não prejudica a eventual aplicação de portagens em vias específicas ou o recurso pela Estradas de Portugal a outras formas de financiamento».
Entretanto, o Governo anuncia a aprovação, em Conselho de Ministros, de dois novos diplomas, respectivamente em 16 de Agosto e 27 de Setembro.
Com o primeiro decreto-lei, o Governo transforma a Estradas de Portugal em sociedade anónima, anunciando promover «maior aproximação ao mercado». Com o segundo decreto-lei, o Governo atribui a essa «nova» sociedade anónima a concessão do financiamento, concepção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede rodoviária nacional.
O eufemismo da figura de «concessão» não esconde a efectiva privatização das estradas do País, patente no prazo da concessão até 2099 — os Srs. Deputados ouviram bem, até 2099! — e na entrada do capital privado, para já em 50%, no capital social da nova empresa.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Um escândalo!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Com esta política e estas decisões, o Governo põe em causa a concretização do Plano Rodoviário Nacional, já considerado pelo Governo como «excessivamente ambicioso» e entrega aos grupos económicos que já hoje controlam a rede de auto-estradas o resto da rede viária. Mas entrega também, indirectamente, às grandes empresas de construção civil a monopolização do mercado das obras das grandes infra-estruturas públicas.
A filosofia neoliberal que justifica tal decisão vê a rede viária nacional como uma estrutura que apenas interessa aos que nela circulam, subvertendo a sua importância estratégica e nacional. É mais uma vez o interesse nacional que é posto em causa, é mais uma vez o nosso futuro colectivo que é penhorado ao sabor dos grandes interesses da alta finança.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É uma nova e gravosa peça na privatização de um conjunto de empresas públicas de serviços essenciais e redes de infra-estruturas únicas que correspondem a monopólios naturais, como a REN, a rede de cobre da PT, a ANA, os silos e infra-estruturas portuárias, a rede de auto-estradas e importantes pontes, preparando-se a já anunciada privatização da DOCAPESCA. Sobra — até ver! — a rede de caminhos-de-ferro da REFER e os CTT, ambos em acelerado processo de liberalização.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 1481, ano da morte do rei D. Afonso V, havia nobres que possuíam mais terras do que a própria Coroa. E as benesses dadas à nobreza ascendiam a tal monta que o seu sucessor, D. João II, proferiu um desabafo que ficou para a História: «Meu pai deixou-me rei das estradas de Portugal».
Com a política deste Governo, o povo português arrisca-se a dizer, um dia, que nem as estradas escaparam. Mas este submisso afã de entrega do património público — que é de todos! — às novas aristocracias do capital financeiro terá, seguramente, a resposta e a condenação dos trabalhadores e das populações. E a firme oposição do Partido Comunista Português.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, acompanhamos a preocupação do Partido Comunista Português em relação ao modelo que institui a Estradas de Portugal: privatização. Trata-se de uma privatização muito especial, por ser encapotada e com uma espécie de imposto consignado à cabeça, o que faz do povo português um contribuinte directo para um monopólio privado. Ainda por cima, trata-se de uma engenharia privatística interessante, porque sabe-se que a Brisa tomará a parte do leão, mas já se vê que a cria é o Grupo Mello (que está por trás).
Portanto, há aqui um «parto sem dor» numa privatização, toda ela «acolchoada» neste contributo do povo
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português.
A tanto chegou a falta de pudor do Partido Socialista e do seu Governo. Tal medida não constava do Programa do Governo, nem sequer do seu programa de privatizações inicial. Mas assim foi, assim ditaram aqueles entusiasmos na diminuição do défice orçamental, em relação aos quais até tivemos hoje uma nota patente por parte do Primeiro-Ministro, não se sabendo quantos sacrifícios a mais tiveram de fazer os trabalhadores portugueses para ele poder ufanar-se tanto por chegar mais cedo à meta imposta pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento e por Bruxelas.
Esta medida de privatização, absolutamente anómala e original, merece a nossa contestação. Na semana passada, fizemos igualmente essa denúncia e a resposta do gabinete do Ministro das Obras Públicas, dos Transportes e Comunicações foi a de que isso era um puro disparate. Creio que isto também vem no tom das respostas que o Governo hoje vem dando, com arrogância, às varias oposições.
Partilhamos essa análise, mas não cremos que ela seja um disparate. Disparatada é a política do Governo, disparatada é a forma como se constitui esta privatização, disparatada é a forma como o povo português é alienado de direitos essenciais, como seja, desde já, o direito ao controlo não apenas funcional, mas do património, das vias básicas de comunicação, das suas estradas.
Há poucos anos atrás, pareceria absolutamente inusitado que se procurasse privatizar a Estradas de Portugal. Vimos a saber que nada escapa à sanha privatizadora, porque o modelo privatizador é absoluto e total. Mas isso pouco tem a ver com uma democracia participada, a que todos ambicionamos, menos o Partido Socialista, que se vem excluindo desse projecto.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Fazenda, estamos, efectivamente, perante uma privatização encapotada, que vai «tirando o capote» à medida que o tempo passa.
Verificámos, inclusivamente, com a lei que foi aprovada por esta maioria PS, que foi inventado um novo imposto (embora não com esse nome), que corresponde, ao fim e ao cabo, a garantir receitas próprias com transferências orçamentais, porquanto verificamos que o imposto sobre os combustíveis é reduzido na exacta medida da nova contribuição de serviço rodoviário, ou seja, há uma transferência de verbas do Orçamento do Estado para a Estradas de Portugal, procurando que essa medida seja disfarçada, para Bruxelas, a Comissão Europeia e o Eurostat poderem considerar que o défice não é aquele que é na verdade.
Portanto, estamos perante uma medida de manipulação orçamental e, mais do que isso, mais do que esses truques de ilusionismo do ponto de vista da desorçamentação, estamos perante uma medida profundamente grave e comprometedora do futuro deste país.
Como temos dito, o ensino e a saúde não interessam apenas a quem deles precisa, não interessam apenas ao estudante universitário, não é apenas para ele que é necessário ter mais educação, ensino gratuito, público e de qualidade. O que é importante é que o País tem muito a ganhar e depende estrategicamente desse investimento e dessa garantia.
Aquilo que verificamos também com as estradas, que são um bem público nos termos da Constituição, é que a transformação da responsabilidade e do dever do Estado em defender este património estratégico para o nosso futuro está a ser transformado, por este Governo, ao fim e ao cabo, num clamoroso negócio, muitíssimo interessante para os grandes grupos económicos, para aqueles que já hoje têm uma fatia substancial do investimento e das receitas do sector rodoviário — veja-se as auto-estradas neste país.
A falta de responsabilidade e de vergonha destas políticas e decisões, desrespeitando compromissos para com o povo português, está a ser levada à prática, mas tem de contar com a oposição de todos nós e com a firme luta e resposta do povo português.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, reconheço que há uma enorme incomodidade do Partido Comunista quando olha para a realidade portuguesa e para o sistema rodoviário nacional e verifica que o País se desenvolve mais, que são criadas mais oportunidades às pessoas,…
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Às pessoas, não! Ao Grupo Mello!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … que há um incremento económico superior que dá às pessoas em geral uma nova visão e uma nova imagem daquilo que podemos e devemos fazer.
Como é óbvio, o Partido Comunista vem dizer que tudo o que os privados fazem é mau, só aquilo que o Estado faz é que é bom. Temos, aqui, uma diferença fundamental: nós reconhecemos que, em Portugal, tanto
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o Estado como os agentes económicos privados têm um papel fundamental para desenvolver. A verdade é que é essa concepção ideológica perfeitamente ultrapassada que faz mover o PCP, agitando o espantalho, o medo, o papão da privatização ou da intervenção dos agentes económicos na economia portuguesa.
Pergunto: será só isto? Não, não é! O desenvolvimento do sistema rodoviário nacional faz de Portugal um país mais igual, mais coeso, com mais oportunidades para todos. A verdade é que antecipamos o futuro…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Antecipam as receitas!
O Sr. José Junqueiro (PS): — … e damos novas oportunidades às gerações que agora se desenvolvem.
É evidente que o Sr. Deputado não falou nos resultados do estudo, hoje noticiados na televisão, segundo os quais Portugal deixa de ser o quarto país com maior sinistralidade para passar a ser o décimo quarto.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E é a privatização que vai resolver isso?!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Quer dizer que as estradas e os investimentos feitos nesta área contribuíram, de uma forma decisiva, para combater a sinistralidade.
Em suma, aquilo que o Partido Comunista quer é o inêxito do Governo. Mas o Governo tem tido êxito e tem servido os interesses das populações, que, reconheço, são muito diferentes dos interesses do Partido Comunista.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, começou o seu pedido de esclarecimento, que agradeço, referindo-se a uma incomodidade do PCP, mas verifico, depois de o ouvir, que a incomodidade está do lado do Partido Socialista.
Vozes do PCP: — Exactamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Porque sobre o assunto que eu aqui trouxe, que é o caminho de privatização da rede viária, o Sr. Deputado nada disse!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Disse tudo!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Aliás, seria interessante que o Sr. Deputado José Junqueiro dissesse alguma coisa relativamente ao comunicado do Conselho de Ministros que diz que o decreto-lei que referimos atribui à Estradas de Portugal a concessão de toda a rede rodoviária nacional até 31 de Dezembro de 2099.
Até 31 de Dezembro de 2099 estará nas mãos do grupo económico que detiver a Estradas de Portugal o futuro, o investimento, a gestão, a conservação, o negócio, as portagens que possam vir a ser aplicadas sobre a rede rodoviária nacional.
Isto é um escândalo, Sr. Deputado José Junqueiro! Quanto à antecipação de soluções para o futuro, aquilo que o Sr. Deputado menciona é antecipar o que as próximas gerações terão de pagar relativamente a receitas e negócios que já hoje interessam aos grupos económicos. Quando fala em solidariedade inter-geracional está a ocultar que, para as próximas gerações, se colocará a factura e o ferrete do pagamento da utilização da rede rodoviária. E é, efectivamente, um dever do Estado garantir e defender este bem público.
Por falar em bem público, seria interessante que o Sr. Deputado, que foi eleito pelo círculo eleitoral de Viseu, tivesse dito alguma coisa sobre aquilo de que tomámos conhecimento recentemente: da prática da empresa Estradas de Portugal, EPE, de remoção de propaganda em estradas nacionais do distrito de Viseu, sem qualquer autorização, inclusive de propaganda do PCP, na onda de retirar tudo o que é publicidade nas zonas periféricas das estradas nacionais. E aquilo que se verifica é a tentativa de impor às populações o pagamento de uma taxa, recebendo receitas a que não tem direito. Esta é uma matéria que tem a ver com o seu distrito, que tem de ser esclarecida, mas em relação à qual o Sr. Deputado nada refere.
Neste sentido, estamos perante a criação e a abertura da porta a um fabuloso negócio, que é um escândalo nacional. Esta maioria e este Governo têm de assumir a responsabilidade por uma decisão gravosa para o futuro do País e para o desenvolvimento estratégico que Portugal precisa e que, já há muitos anos, tem vindo a ser adiado por este Governo.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — A Sr.ª Secretária da Mesa vai dar conta de um parecer da Comissão de Ética.
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A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o parecer da Comissão de Ética é no sentido de autorizar a retoma de mandato, com efeitos a partir de 11 de Outubro de 2007, inclusive, da Sr.ª Deputada Isabel Coutinho (PS), círculo eleitoral de Braga, cessando o Sr. Deputado Victor Hugo Machado da Costa Salgado de Abreu.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, está em apreciação este parecer.
Pausa.
Não havendo inscrições, vamos votá-lo.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rangel.
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: Depois do que, nesta semana, vimos, ouvimos — e até daquilo que, infelizmente, não ouvimos —, o tempo que vivemos é de perplexidade e de apreensão.
Quando a polícia, através de agentes ligados à investigação criminal e, significativamente, despojados da farda, «visita» um sindicato para obter informações sobre uma manifestação, já regularmente notificada ao governo civil, e mais e pior, não se coíbe de recolher elementos probatórios, algo está «podre» na República Portuguesa.
Aplausos do PSD.
Nos seus contornos mais simples, o caso é grave, mais grave do que aparenta.
Basta lembrar que os agentes destacados estavam habitualmente ligados à investigação criminal da PSP, o que indicia, não uma perspectiva de ordenamento ou de ordem pública, mas de perigo ou risco de crime. Ou, então, que a polícia trajava à civil, dando a impressão de que ou actuava «informalmente e fora de serviço» ou conduzia uma verdadeira investigação.
Mas tudo se complica e se torna mais grave ainda quando se passa do escalão dos agentes para o domínio do Governo.
Confrontado com os factos, o Primeiro-Ministro recusou fazer uma denúncia, ainda que em tese ou em abstracto, daquela tipologia de prática policial ou parapolicial.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — E recorreu, uma vez mais, ao artifício da remissão para «as calendas gregas», instaurando um processo de averiguação — burocrático, moroso, sigiloso —, talhado para fazer esquecer a situação, diluir os seus efeitos perniciosos e deixar instalar um nebuloso clima de medo e de receio.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Sr.as e Srs. Deputados: Sem que, aparentemente, nada o exija ou reclame, sem que se perceba porquê ou com que fim, o Primeiro-Ministro e o Governo do PS subiram mais um degrau — um perigoso degrau — no clima de condicionamento, de cerceamento, de atrofia da liberdade cívica.
Aplausos do PSD.
A longa série de casos até agora conhecida situava-se no plano da reacção, da simples e estrita reacção.
Perante uma divergência ou crítica, o autor era delatado e logo alguém — ministro ou seu subordinado, na Educação, na Saúde ou na Cultura —, com inusitado zelo, tratava de instaurar um processo disciplinar, de castigar e de substituir o suposto infractor.
Estávamos no plano puramente reactivo, típico de uma censura a posteriori, que, quando muito, tinha um efeito intimidatório difuso.
Mas, desta feita, neste caso, deu-se um passo de gigante que altera a própria natureza do ataque e da hostilidade ao normal exercício das liberdades públicas.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Transitou-se da lógica da reacção para a lógica da prevenção.
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Ora, a prevenção de comportamentos indesejados é já da ordem da censura a priori e reveste uma natureza eminentemente policial.
O Governo passou, pois, do plano retributivo ou «disciplinar-sancionatório» para o plano preventivo, que o mesmo é dizer, para o plano policial. Onde dantes figurava o castigo ou retaliação, doravante figura já a «medida cautelar ou preventiva».
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Sr. Presidente da Assembleia, Sr.as e Srs. Deputados: Há momentos na vida — na vida das pessoas e na vida das instituições, na vida dos responsáveis políticos e na vida dos governos — em que é necessário fazer escolhas.
Há momentos em que não pode haver águas turvas, em que ninguém se pode esconder no arrastamento conivente e conveniente de processos burocráticos, em que não se pode diluir os valores fundamentais no labirinto kafkiano de delatores e passa-culpas.
Aplausos do PSD.
O Chefe do Governo, o Governo e o Partido Socialista estão, nos inícios de Outubro de 2007, num desses momentos, no momento de fazerem escolhas, de fazerem a escolha: quando são Governo e dispõem de maioria absoluta, de que lado estão? É que, em democracia, não é difícil ser amigo da liberdade e das liberdades quando se é oposição, nem quando se governa em coligação ou com simples maioria relativa.
O teste, o teste decisivo, é este: saber respeitar a liberdade quando se é poder e quando se é poder com maioria absoluta.
Aplausos do PSD.
Eis o que o Chefe do Executivo, o Governo, o PS e, em particular — hoje, aqui, agora —, os seus Deputados têm, de uma vez por todas, de decidir: estão do lado da liberdade crítica, da liberdade, das liberdades, do Estado de direito, ou estão do lado do condicionamento, do temor e da coacção, da reverência para com o poder e os poderes.
Srs. Deputados do Partido Socialista, aguardamos com expectativa, para lá da voz ímpar e singular do Vice-Presidente Manuel Alegre, a vossa tomada de posição.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Há quatro inscrições para pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Rangel, também o saudamos por ter trazido este tema ao debate do Plenário da Assembleia da República, dada a sua pertinência e, infelizmente, dada a sua actualidade, já que fomos confrontados com este facto recente ocorrido na Covilhã, o qual tem de ser averiguado.
Pergunto-lhe, então, Sr. Deputado, se entende que é preciso uma grande averiguação. Quer-nos parecer que não.
Os factos são conhecidos, foram relatados, não foram desmentidos. O que nos interessa saber é quem ordenou e quem vai ser responsabilizado por essa ordem. Não creio que seja necessário efectuar perícias laboratoriais muito demoradas,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — … sobretudo tendo em conta o que já foi dito pela Sr.ª Governadora Civil de Castelo Branco, para quem, pelos vistos, isto é uma prática rotineira. Não me parece que seja muito complexo ou demorado o procedimento para apurar exactamente como se passaram os factos. O que importa, agora, é apurar responsabilidades concretas para que situações destas não se repitam.
No entanto, infelizmente, estamos a ser confrontados com uma prática reiterada de identificação de manifestantes, selectivamente, como aconteceu numa manifestação, em Guimarães, em resultado do que, aliás, vários dirigentes sindicais enfrentam processos-crime dada a identificação que, naquela ocasião, foi feita pelas forças policiais.
Neste domínio, assistimos a coisas tão insólitas como, por exemplo, a de as forças de segurança dispersarem um plenário de trabalhadores dos CTT, em Braga — absolutamente insólito, inadmissível! Ora, de facto, tudo isto exige o apuramento de responsabilidades.
A questão que lhe coloco tem que ver com a recente «teoria do insulto».
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É que, agora, pelos vistos, o Sr. Primeiro-Ministro considera que todas as críticas à sua acção governativa constituem insultos pessoais ao Primeiro-Ministro e, portanto, passíveis de investigação criminal. Ora, Sr. Deputado, confundir a crítica a uma política governativa com um insulto pessoal ao Primeiro-Ministro é um pouco uma concepção à Luís XIV, para quem o Estado era ele próprio.
Gostaria, pois, que o Sr. Deputado pudesse dar-nos o seu comentário sobre esta nova «teoria do insulto», na qual o Sr. Primeiro-Ministro tem vindo a especializar-se nos últimos tempos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rangel.
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, agradeço imenso o seu pedido de esclarecimento.
Devo dizer-lhe que, realmente, estranho que um Governo que, todos os dias, nos brinda com o Programa Simplex, seja incapaz, num caso destes, de fazer uma averiguação em menos de 24 horas.
Realmente, é extraordinário ver como é que uma coisa tão simples, que é interrogar duas pessoas para saber quem lhes ordenou uma visita àquele sindicato — não é mais do que isso! —, pode demorar 24 horas, 48 horas, 72 horas… Já agora, também devo dizer-lhe que, pese embora a gravidade das afirmações da Governadora Civil, têm, pelo menos, um efeito benéfico que é o de as coisas terem sido ditas tal qual são. Nessa medida, julgo que é de saudar tais declarações.
Finalmente, quanto à «teoria do insulto», parece-me que todos já sabíamos, já sabemos, que o PrimeiroMinistro não gosta de ser criticado — porventura, ninguém gosta de ser criticado! —, reage mal às críticas.
Neste caso, o que considero particularmente grave, e que a sua pergunta sobre o insulto me fez lembrar, é que foi o próprio Primeiro-Ministro, que estava totalmente consciente de que iria à Covilhã, quem, embora com ironia e uma certa soberba, convidou aqueles cidadãos a manifestarem-se na Covilhã. Fez esse convite frente às câmaras da televisão, tendo dito que «bem, já ficam a saber que amanhã, às 15 horas e 30 minutos, estarei na escola, na Covilhã!» A verdade é que, antes disso, houve uma busca, houve uma diligência, houve uma visita ao sindicato.
Ora, esta relação entre o momento em que o Primeiro-Ministro se refere aos insultos, diz que tem perfeito conhecimento dos mesmos e até convida as pessoas a estarem presentes naquela escola às 15 horas e 30 minutos e, depois, haver uma diligência do género desta julgo que é uma coincidência que, essa, sim, precisava de uma averiguação que talvez seja mais demorada.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Rangel, a sua intervenção começou por me fazer lembrar que talvez fosse necessário algumas forças da autoridade e alguns políticos lerem o que está determinado na nossa Constituição e em todas as constituições do mundo civilizado quanto àquilo que é o direito de reunião e de associação.
Mas também quero fazer-lhe uma pergunta muito clara que tem a ver com um inquérito que foi rapidamente anunciado pelo Sr. Ministro da Administração Interna em relação a esta situação. O Sr. Deputado não é da opinião de que deveríamos ter precisamente a mesma rapidez na assumpção dos seus resultados?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Será que é assim tão complicado descobrir aquilo que todo o País já percebeu que aconteceu?! Já agora, Sr. Deputado, tem conhecimento de um outro inquérito àquilo que aconteceu na Herdade da Lameira, em Silves, ou seja, a uma ocupação de uma propriedade privada? É que, nesse caso, também rapidamente, surgiu logo a necessidade de fazer um inquérito. Já há algum resultado desse inquérito? Ou será que temos agora uma nova fase de inquéritos a «caírem em saco roto»?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Somos muito claros em relação àquilo que deve ser o papel das autoridades quando há uma manifestação. Uma coisa é a preparação prévia dessa manifestação: é necessário ver qual é o caminho que vai percorrer, possivelmente será até necessário cortar o trânsito nalgumas vias, e tem de se tratar da comunicação a fazer ao governo civil. Outra coisa, completamente diferente, é controlar as manifestações.
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Aplausos do CDS-PP.
Devo dizer-lhe que, perante tudo isto, estamos verdadeiramente perplexos e gostaríamos de saber qual é a posição do PSD a este respeito.
Numa altura em que o País vive uma onda de assaltos — assaltos às caixas Multibanco, em que é levada a própria máquina, assaltos a comboios, assaltos nas grandes cidades e nas aldeias — e os portugueses vivem com grande insegurança, a grande preocupação das forças policiais é saber como vai decorrer uma manifestação contra o Governo! Será que isto é aceitável?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Para nós, a resposta é muito clara: não, não é aceitável!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rangel.
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, agradeço o seu pedido de esclarecimento e devo dizer-lhe que, realmente, tocou num ponto importante ao falar na duração dos inquéritos — desse, da Herdade da Lameira, mas também de muitos outros. O caso da DREN é exemplar pelo tempo que se arrastou, sendo que já lá estava recurso hierárquico há muito — muito embora a Ministra dissesse sempre que não, já havia recurso hierárquico. E arrastou-se para chegarmos ao ponto a que chegámos: a Sr.ª Directora Regional ficou e o funcionário da DREN, Fernando Charrua, acabou por ser irradiado da DREN, tendo-lhe, no fundo, sido aplicada uma sanção acessória.
Quero chamar a atenção para o seguinte: esta é a táctica do Governo neste tipo de questões. Quando esperávamos que o Primeiro-Ministro dissesse «não, eu recuso liminarmente este tipo de comportamentos, se for isso que está em causa, recuso liminarmente», o que ele disse foi «vamos fazer um processo de averiguações». O Primeiro-Ministro cria cumplicidade e dá cobertura, o que cria um clima de intimidação, um clima de «nebulosa», para que todos aqueles que têm de lidar com o poder tenham medo.
Por isso, chamo a atenção para este aspecto, que considero fundamental: temos de denunciar aqui a táctica dos processos de averiguações, pois são eles que têm contribuído para, de uma forma clara, disseminar, prolongar a até reforçar o clima de intimidação que se quis criar com esse tipo de actuações. Os processos são apenas um reforço desse clima.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Rangel, antes de mais, Os Verdes gostariam de saudar o tema que o Sr. Deputado e a Sr.ª Deputada Ana Drago decidiram trazer aqui hoje, em declaração política, porque consideramos tratar-se de um tema de sobeja importância para a democracia portuguesa. Poderia não passar de um fait divers, se fosse um caso isolado, o que, ainda assim, exigiria a tomada de medidas concretas e uma análise ponderada do mesmo. Mas, infelizmente, este caso da Covilhã, aquele que imediatamente o antecedeu, ou seja, o caso de Montemor-o-Velho, e outros tantos que têm vindo a avolumar-se durante esta Legislatura, durante o Governo desta maioria absoluta, são de molde a suscitar as mais vivas preocupações pela saúde da democracia, pela saúde do nosso Estado de direito democrático.
Por isso, não é possível deixar passar em claro este tipo de actuações, este tipo de situações. Tem de se exigir a todo o custo que elas sejam esclarecidas e que venha à tona o que está a acontecer.
É que este caso vem somar-se a outros tantos em que têm vindo a ocorrer situações menos claras, sem se compreender ao abrigo de que normas legais têm lugar certas actuações das forças policiais, tentando controlar manifestações legítimas, feitas, aliás, no exercício de um dos mais fundamentais direitos que o 25 de Abril nos trouxe, o direito de expressão, de manifestação pública e de contestação política relativamente ao Governo. Este é um direito fundamental e, como tal, não pode ser restringido à toa.
Ora, as condutas a que temos vindo a assistir são extremamente preocupantes e não podem manter-se.
De facto, o que tem vindo a acontecer é tudo menos natural, é tudo menos habitual e não pode passar a ser rotina, pois isso seria extremamente grave.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Vou concluir, Sr. Presidente.
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Não podemos ficar calados, mas também não bastam as palavras. Não basta o Partido Socialista vir aqui continuamente afirmar que, historicamente, é um partido defensor da liberdade, é preciso que os actos desta maioria absoluta — aliás, isto já vai sendo um tique de qualquer maioria absoluta — demonstrem que a democracia não pode nunca ser posta em causa, nem as manifestações legítimas dos cidadãos.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rangel.
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, perante esta escalada, acho que é preciso pôr bem a nu que se deu aqui um passo diferente daquele que se tinha dado nas anteriores actuações, diria, censórias, por um lado, e persecutórias, por outro.
De facto, até agora, o que acontecia é que o Governo reagia à crítica — e reagia, perseguindo, punindo, suspendendo, abrindo processos, criando esse clima de intimidação. Até agora, todos os problemas eram problemas de reacção, de retaliação, de represália, de retribuição contra aqueles que divergiam da voz oficial.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Mas agora, neste incidente — e por isso é que ele reveste esta gravidade particular —, o que o Governo faz já não é sancionar quem diverge mas tentar impedir que se divirja.
Agora, o Governo vem com a precaução, com a prevenção, o que significa passar-se de um comportamento reactivo e retributivo para um comportamento claramente preventivo e policial.
Devo dizer que já tínhamos tido aqui um sinal disso, mas valeu-nos o Tribunal Constitucional. É que naquele caso, no caso das reclamações e dos recursos em matéria fiscal, já o Governo tinha previsto, como esquema intimidatório preventivo, que levantaria o sigilo bancário a quem reclamasse só por reclamar.
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Este esquema já estava montado, já estava lá na origem! Ora, o Governo, como não conseguiu fazer passar isso através de leis, quer agora fazer passar isso através de práticas. É este novo «código de boas práticas» que hoje tem de ser aqui denunciado.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Rangel, sobre o Estado de direito e sobre as liberdades, penso que não vale a pena o Partido Socialista voltar a repetir aquilo que já disse.
Vozes do PSD: — Vale, vale!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Não vale a pena! Todos sabem!
Vozes do PSD: — Vale, vale!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — A serenidade é importante nessas matérias.
Portanto, sobre liberdades…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Foi um director-geral!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Deputado Paulo Portas, V. Ex.ª a falar de liberdades?!… Ao que chegámos nesta Casa!…
Aplausos do PS.
Protestos do CDS-PP.
Sr. Deputado Paulo Rangel, o que retiro da sua exposição, com a serenidade que esses casos exigem, é que V. Ex.ª acaba de passar um período conturbado no seu partido.
Protestos do PSD.
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O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Grande argumento!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — A claustrofobia do condicionamento político, do condicionamento eleitoral, do condicionamento e da intimidação — com alguns dos vossos colegas a chamarem-se uns aos outros «o gang do Multibanco» ou qualquer coisa do género —, tudo isso são problemas que existem no seio do PSD, não no País.
Aplausos do PS.
A pergunta concreta que lhe faço, Sr. Deputado, a si, um homem do direito, é a seguinte: num Estado de direito, que o Sr. Deputado tanto defende, devemos fazer um julgamento popular ou devemos, antes, averiguar e decidir em consequência?
Aplausos do PS.
V. Ex.ª vem aqui propugnar um julgamento popular: imediatamente, decida-se, puna-se, sem se ouvir ninguém, sem se saber o que se passa! Meu caro Sr. Deputado, isso não é próprio de um Estado de direito e nós não vamos por aí! Mas essa averiguação também não vai levar semanas ou meses. A 1.ª Comissão já decidiu que o Sr.
Ministro da Administração Interna virá cá, na próxima terça-feira, para explicar o que ocorreu, altura em que terão oportunidade de ouvi-lo.
Agora, a minha questão, Sr. Deputado, é esta: o senhor é pelos julgamentos populares ou está do lado do Estado de direito?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rangel.
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, mal vai o PS e mal vai o Sr. Deputado quando, perante um facto destes, em vez de o denunciarem aqui,…
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Quais são os factos?
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — … em vez de fazerem, como fez o Vice-Presidente Manuel Alegre, a defesa da liberdade sindical, querem desviar as atenções e falar da vida interna dos outros partidos.!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — A sua declaração, devo dizer-lho, é hesitante, é tíbia e é pífia, quando estão em causa direitos, liberdades e garantias.
Aplausos do PSD.
E digo-lhe outra coisa: o PS não pode invocar o seu passado, porque esse nós respeitamos. Respeitamos o passado do PS antes do 25 de Abril e o de muitos que, na altura, ainda não eram militantes — porque ele só foi criado em 1973 — mas que já lutavam contra o regime salazarista.
Respeitamos o papel do PS em 1974/1976. Respeitamos o papel do PS ao longo destes anos, mas, desde 2005, desde que fez o «restyling José Sócrates», o PS não pode dar cartas em matéria de liberdade.
Aplausos do PSD.
Vozes do PS: — Oh!
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Vou dizer mais: se há muita gente que julga que o PS rejuvenesceu com José Sócrates, em matéria de liberdades envelheceu e reformou-se definitivamente!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Outra coisa que me preocupa muito, e que fica aqui para a posteridade, é a lei da segurança interna, é a concentração das funções de inteligência, de segurança e de investigação criminal, que, estando prevista neste momento com determinados contornos, a partir da altura em que detectamos que o Governo tem este tipo de comportamentos nos traz muito mais receios do que aqueles que tínhamos.
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Por isso, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, da sua declaração fica que, em nome do PS, não foi capaz de denunciar um ataque à liberdade sindical, da sua declaração fica um maior receio e um maior perigo para as liberdades a partir do «pacote» da segurança interna.
Aplausos do PSD.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Para defesa da honra da bancada, visto que o Sr. Deputado do Partido Socialista se referiu, sobre um aspecto que considero grave, a defesa que cada um de nós faz ou não das liberdades, a qualquer coisa que ele saberá a meu propósito nessa matéria e que gostaria que esclarecesse, porque, quando não, não lhe posso autorizar o estilo nem o tom que usou.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, é certo que faz parte das praxes não escritas que se possa comentar— porventura audivelmente demais — as intervenções que cada um de nós vai fazendo nesta Câmara. E se o meu comentário foi excessivamente audível, terá notado que era irónico, mas a sua intervenção não teve nada de irónico.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Ai não teve?!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — O Sr. Deputado disse: «O Sr. Deputado Paulo Portas a falar de liberdades?!». Sr. Deputado, nasci em democracia, cresci em democracia,…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … decidi fazer política em democracia…
Protestos do PS.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Mas não contribuiu nada para ela!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Pelos vistos, o PS está muito incomodado com esta matéria da liberdade, toca-lhes fundo!
O Sr. Presidente: — Peço que façam silêncio, Srs. Deputados.
Tem a palavra, Sr. Deputado Paulo Portas.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Fui eleito para esta Câmara com o sufrágio dos que entenderam escolher o partido por que me candidatava. Quando fui ministro, tive muitas manifestações à porta do Ministério da Defesa e nunca intimidei manifestantes, nunca mandei fotografar manifestantes, nunca mandei indagar os nomes dos manifestantes.
Aplausos do CDS-PP.
Sr. Deputado, se tem alguma coisa a dizer sobre o meu comportamento do ponto de vista da defesa das liberdades pessoais e individuais, diga-o, porque o seu comentário é, no mínimo, deselegante.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Deputado Paulo Portas, naturalmente, o meu comentário insere-se na sequência do seu e, portanto, não fique ofendido com um mero comentário.
De resto, não vou aqui elencar os seus actos políticos enquanto político de Portugal dos últimos anos. Não vale a pena, pois todos nós os conhecemos. Portanto, não vale a pena recordá-lo como Director do Independente, não vale a pena recordar-lhe episódios de barcos ao largo da nossa costa, mas fique ciente, Sr. Deputado, que jamais me passou pela cabeça fazer-lhe alguma ofensa pessoal. Todo o meu comentário se insere no âmbito político e na liberdade que temos de, politicamente, nos referirmos uns aos outros. Não se trata, pois, de nenhum insulto pessoal. Não foi nem é minha intenção atingi-lo pessoalmente mas, sim, fazer uma crítica política, que todos reconhecerão como tal.
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Paulo Rangel, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Rangel, quero começar por felicitá-lo por trazer também estes acontecimentos na Covilhã ao debate nesta Assembleia e dizer que acompanhamos as suas preocupações no que toca a um episódio absolutamente inaceitável num Estado democrático, que não pode voltar a repetir-se.
O Sr. Deputado tem razão, pois há uma alteração da lógica de actuação do Governo nesta matéria: já não é a de castigar o protesto social, é modelá-lo.
O Sr. Deputado também tem razão quando diz que estes são os momentos em que se prova de que lado é que estão os democratas.
Deixe-me aproveitar para dizer que, pela segunda vez, a bancada do Partido Socialista falou pela voz do Deputado Ricardo Rodrigues e continuamos perante as mesmas palavras fracas, frouxas e titubeantes.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — É bom que o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues tenha a percepção exacta do que está aqui em causa. Não está apenas em causa o apuramento dos factos mas, sim, a leitura política de acontecimentos inaceitáveis num Estado democrático. O Sr. Deputado disse: «Vamos ver, vamos apurar, logo vemos o que é que vai acontecer». Ninguém quer fazer aqui um julgamento popular. Queremos saber os factos, mas queremos que o Partido Socialista seja muito claro sobre isto e faça aquilo que tem de ser feito nestes momentos, que é dizer aqui, com toda a frontalidade, que isto não é aceitável e que não voltará a repetir-se na sociedade portuguesa, porque isso é que conta.
Os senhores mostram pelas vossas palavras fracas e por este tipo de procedimentos— e acima de tudo pelas declarações do Sr. Primeiro-Ministro — que querem uma democracia de um tipo muito especial, uma democracia domesticada, conformada, em que o protesto seja feito mas baixinho, com moderação na linguagem. Não foi esta a pedagogia que os agentes da polícia seguiram no sindicato dos professores?! Sr. Deputado Manuel Alegre, lamento, mas, infelizmente, o apelo que fez à pedagogia da liberdade parece que não chegou à primeira fila da bancada do Partido Socialista!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para responder tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rangel.
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, agradeço o seu pedido de esclarecimentos e aproveito para a cumprimentar pela intervenção que fez, que julgo ter trazido também um grande contributo nesta matéria essencial.
Devo dizer — e quero sublinhá-lo — que estamos num momento crucial, em que os Deputados do PS têm de tomar a palavra e dizer de que lado estão. Não podem ser cúmplices! Não há ao menos um Deputado, para além do Vice-Presidente Manuel Alegre, que diga que a liberdade sindical é um bem?! Já nem se pede mais!
Protestos do Deputado do PS Ricardo Rodrigues.
Não há um Deputado do Partido Socialista que critique este tipo de actuação?! Não há um Deputado do Partido Socialista que se sinta incomodado com este tipo de procedimento?! Onde está a liberdade dos Deputados do Partido Socialista? Esta é também uma pergunta que se tem de fazer.
Aplausos do PSD.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Para defesa da honra da bancada, na sequência da intervenção do Sr. Deputado Paulo Rangel.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Rangel, confesso-lhe que não sei o que é que se passou. Não sei se o Sr. Deputado estava fora, não sei se não ouviu, mas, na sequência da
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intervenção da Sr.ª Deputada Ana Drago, tivemos a possibilidade de dizer que jamais pode estar em causa a liberdade sindical.
Aplausos do PS.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista revê-se não só na minha intervenção inicial mas também na do Sr. Deputado Manuel Alegre. Espero que isto fique claro, pois não temos nem nunca tivemos dúvidas sobre esta matéria.
Ora, na sequência da sua intervenção não falei em liberdade sindical porque considerei desnecessário, pois já o tínhamos referido a propósito da intervenção da Sr.ª Deputada Ana Drago. Que os senhores não acreditem, é um critério vosso, mas a posição do Partido Socialista é aquela que foi a transmitida por mim, e consta da Acta, e a que foi transmitida pelo Sr. Deputado Manuel Alegre. Que não haja dúvidas quanto a isto.
Tudo o mais é um insulto desnecessário que não fica bem ao Sr. Deputado.
Não concordamos com a sua versão e, portanto, não queira denegrir a imagem do Grupo Parlamentar do Partido Socialista com questões essenciais e do âmago daquilo em que acreditamos, sendo a liberdade sindical uma delas, Sr. Deputado!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para dar explicações, se o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rangel.
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, verifico que, devagarinho e «a ferros», sempre acabou por ser mais claro e mais firme na defesa da liberdade sindical, porque uma coisa é certa: pode ter dito alguma coisa sobre isso mas, depois, gastou tanto tempo a falar nas averiguações, na necessidade de um inquérito, nos procedimentos, nas burocracias, que a liberdade se perde pelo meio, em inquéritos, em procedimentos e em burocracias.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Paulo Rangel (PSD): — Digo-lhe mais: a pergunta que fiz não é de retórica, é mesmo uma pergunta e, por isso, não posso aceitar que a rotule de insulto, a não ser que o conceito de insulto do Deputado Ricardo Rodrigues seja igual ao do Sr. Primeiro-Ministro e, então, nesse caso, estamos conversados!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para fazer uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP) — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há uma semana, um alto responsável político caracterizava o actual estado da governação do País como «um subsistema de directores-gerais» e de «ministros sem peso político».
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Quem fez estas afirmações não foi um comentador político, não foi um Deputado da oposição, não foi um dos milhões de portugueses que todos os dias criticam a acção política do Governo. Não, estas afirmações foram proferidas pelo Presidente do Governo Regional dos Açores e membro do Secretariado Nacional do Partido Socialista, Carlos César.
Porventura, estas afirmações foram feitas na expectativa de quem quer um «aconchego» especial no orçamento, de quem quer algum «carinho e atenção» orçamental, mas lá que são um bom retrato do actual Governo socialista, lá isso são
Aplausos do CDS-PP.
Senão, vamos a factos.
Segundo dados do Eurostat, o desemprego atingiu, em Portugal, em Agosto de 2007, o seu valor mais elevado dos últimos 23 anos, 8,3%. Este valor é atingido em contraciclo com a média europeia e, mais grave, ultrapassando a taxa de desemprego da nossa vizinha Espanha pela primeira vez nos últimos 30 anos.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O Primeiro-Ministro tem uma resposta para isto? O mesmo José Sócrates, que quando era líder da oposição era sempre o primeiro a comentar os dados mais recentes nesta
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matéria, tem agora alguma resposta para estes valores?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Quando um jornalista tem a «veleidade» de lhe perguntar sobre a mais alta taxa de desemprego desde que Portugal aderiu à União Europeia, o Primeiro-Ministro fica muito incomodado e remete todas as respostas para o Ministro do Trabalho.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Só que este Ministro deve ser daqueles que Carlos César considera «sem peso político», deve ser um daqueles que engloba o sistema dos «directores-gerais».
Senão, vejamos. Perante uma taxa que aumentou quase um ponto percentual no período homólogo e que subiu 0,1% num só mês (um mês particularmente grave, se considerarmos que estamos a falar do mês de Agosto, em que há um fenómeno de sazonalidade) qual é a resposta do Ministro? O Ministro está muito contente, porque o que está a acontecer é uma «estabilização».
Este tipo de resposta pode ser aceitável para quem acha, por exemplo, que «o poder de compra não tem a ver com a economia», como o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares,…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — … ou mesmo para quem acha que Portugal «está no caminho da retoma económica», como o «Sr. Director-Geral da Economia», perdão, Ministro da Economia, mas certamente que não é uma resposta aceitável para os portugueses que todos os dias vêem o seu poder de compra a diminuir, os seus impostos a aumentar, as dificuldades a acumularem-se e os empregos a desaparecer.
Aplausos do CDS-PP.
Segundo capítulo desta novela surrealista.
Na passada segunda-feira, o Ministro da Administração Interna verberava na televisão que o crime em Portugal estava a descer e que estava muito contente com os dados e com os números do último semestre, em matéria de criminalidade.
Enquanto o Ministro nos dava o retrato do «oásis», em dois pontos distintos do País, duas caixas de multibanco eram assaltadas à mesma hora, sendo que, num caso, todo o País pôde ver na televisão a facilidade com que estes crimes são praticados e a forma como uma caixa de multibanco foi ela própria arrastada e levada.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — A verdade é que todos temos sido confrontados com crimes que não estávamos habituados a ver: assaltos sistemáticos a bancos, arrastões em comboios, carjacking, lutas de gangs por territórios na cidade do Porto, crimes, todos eles, que têm um enorme alarme social.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — E o que é que o Governo faz perante isto? O Ministro, no meio dos seus auto-elogios, nem sequer consegue reconhecer o que é para todos uma evidência: que há uma escassez de recursos humanos nas nossas forças de segurança, acima de tudo há escassez de oficiais, para fazerem o patrulhamento das ruas e uma polícia de proximidade.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O maior paradoxo de tudo isto é que, neste mesmo momento, quando estamos à espera de ver mais efectivos, mais polícias nas ruas do País, onde é que eles aparecem? Na sede de um sindicato, a pedir informações sobre uma manifestação que esse sindicato queria fazer, perante a presença do Sr. Primeiro-Ministro.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sabemos que está a correr um inquérito sobre esta actuação, inquérito esse, aliás, que num país civilizado já teria dado conclusões, com a assunção de responsabilidades.
Mas há uma conclusão que desde já podemos retirar: para este Governo, o que é verdadeiramente um crime é
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que alguém se intrometa na descarada propaganda que o Governo todos os dias faz. Para este Governo, o que verdadeiramente é um crime é que alguém dê a conhecer um País que sofre, quando o Governo só quer mostrar a sua publicidade. Para este Governo, o que verdadeiramente é um crime é alguém manifestar-se e estragar os minutos de festa que o Governo prepara para a abertura do telejornal da noite.
Aplausos do CDS-PP.
Terceiro capítulo do «manifesto do surrealismo», de acordo com o Partido Socialista.
A Sr.ª Ministra da Educação, aqui, nesta Câmara, perante os Deputados do País, garantiu que não tencionava «colocar um único docente no quadro dos supranumerários».
Ontem, fomos confrontados com o anúncio de que, afinal, vão existir 2500 professores na lista dos supranumerários, curiosamente os professores mais fragilizados e que forem declarados incapazes para a função lectiva mas que podiam desempenhar outras funções no quadro do Ministério da Educação.
Para nós, o que verdadeiramente é grave é que estamos perante uma Ministra para quem algumas palavras parecem não ter significado. As palavras que erradamente foram inscritas nos enunciados dos exames e que levaram a lapsos notórios não têm importância;…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — … as palavras dos tribunais, que condenam o Ministério da Educação no caso da repetição dos exames, não têm importância; mais grave, a palavra da própria Ministra, dita perante o Parlamento, parece que não tem importância. Para nós tem!
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Pode concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Só há uma forma de descrever o actual estado de governação do Partido Socialista. Sabemos que, pelos vistos, o Sr. Primeiro-Ministro está mais enamorado do mundo do que preocupado com o que se passa em Portugal. Mas, como diz o povo, Srs. Deputados do Partido Socialista, «isto assim não vai lá!».
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Duarte.
O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, cumprimento-o pela intervenção que aqui nos trouxe hoje e gostaria de me associar às suas palavras no que diz respeito à preocupação com que estamos a viver hoje em Portugal.
Temos um país que está cada vez mais pobre, quando nos comparamos com a nossa realidade envolvente, nomeadamente com a União Europeia, e temos simultaneamente um Governo que, perante este estado do país, tem como único objectivo e como única atitude uma permanente vontade de iludir os portugueses com um país que, de facto, não é o real.
Se olharmos para factos muito concretos e reais, como o nosso crescimento económico, percebemos que somos o pior país da União Europeia, dado que crescemos metade da média europeia, um terço de Espanha, por exemplo.
Se olharmos para o desemprego, percebemos que, pela primeira vez desde 1978, temos uma taxa de desemprego que ultrapassou a espanhola e que está numa trajectória absolutamente em contraciclo com o que se passa em toda a Europa, onde o desemprego está a ser efectivamente combatido, ao contrário do que se passa em Portugal com este Governo socialista.
Se olharmos, por exemplo, para os indicadores educativos que o Sr. Deputado aqui referiu, somos o pior país europeu também ao nível do abandono escolar e vemos uma Ministra que acumula erros e disparates sem encontrar um rumo para o ensino no nosso país.
Se olharmos para a saúde, percebemos que ela está cada vez mais cara e cada vez mais longe de cada um dos portugueses, nomeadamente com o encerramento de uma série de serviços.
Portanto, a minha pergunta é muito clara, Sr. Deputado Pedro Mota Soares: como é que podemos interpretar esta atitude governamental de enorme dificuldade por parte do Governo e da maioria socialista em assumirem as suas responsabilidades políticas? O único objectivo parece ser o de iludir permanentemente os portugueses. O caso que o Sr. Deputado aqui trouxe da Sr.ª Ministra da Educação, infelizmente, é só mais um, num conjunto de situações a que temos vindo a assistir.
Tudo vale, em nome da propaganda governamental: seja a utilização de jovens figurantes a simularem o
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facto de serem alunos numa hipotética escola; seja através de processos disciplinares de punição de funcionários públicos, nomeadamente através do recurso a delações e a outro tipo de procedimentos que imaginávamos já não existirem num país democrático como o nosso; seja através de intervenções policiais de carácter muito duvidoso do ponto de vista das liberdades, de que já hoje aqui falámos recorrentemente; seja através do anúncio de números que depois as estatísticas oficiais vêm demonstrar que são o contrário (na educação isso tem acontecido também com regularidade); seja através de palavras que são proferidas, como aquelas que a Sr.ª Ministra de Educação proferiu perante os Deputados e que depois veio a verificar-se que afinal não são verdade.
Por tudo isto, aquilo que vale a pena dizer, em conclusão, é que o Governo, decorridos dois anos e meio, já esgotou aquilo que é o seu «arsenal» de propaganda.
Felizmente, os portugueses, hoje, já não se deixam iludir e enganar por auto-elogios, encenações bem montadas e actos de propaganda que nada mais visam do que dissimular e camuflar uma realidade que, infelizmente, é muito preocupante para todos os portugueses.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Duarte, muito obrigado pela sua questão.
O Sr. Deputado referiu um ponto que me parece muito importante. Dizia o Sr. Deputado que parece que para este Governo tudo vale. De facto, concordo consigo. Mas não pode ser assim! Em política e no exercício de funções políticas, tem de existir uma ética. Não pode valer tudo! Não pode valer que uma Ministra venha ao Plenário da Assembleia da República, perante os Deputados, dizer uma coisa e que, passado algum tempo, a sua palavra deixe de ter qualquer validade e o que disse passe a ser uma inverdade.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Em política não pode valer tudo e, acima de tudo, temos de saber questionar e criticar este tipo de comportamentos.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Exactamente!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — A Sr.ª Ministra foi absolutamente clara quando disse que não haveria um único professor na lista de supranumerários. Ficou registado nas Actas desta Câmara.
A verdade é que ontem soubemos que não há um nem dois, são cerca de 2500 professores que podem ser deslocados para a lista de supranumerários.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — É verdade!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Não é possível que tenhamos à frente do Ministério da Educação uma pessoa que sistematicamente rompe a sua palavra perante aqueles que acima de tudo deveria defender, os professores.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Não é possível que comportamentos «éticos» como estes continuem, porque, obviamente, há uma fragilização de toda a política, mas acima de tudo há, e é notória, uma fragilização extrema desta Ministra e desta equipa do Ministério da Educação que todos os dias é criticada por todos os professores.
Aplausos do CDS-PP.
Sr. Deputado, há muito tempo que não me lembrava de ver todas as forças vivas da educação convergirem num ponto, que é a crítica a esta Ministra e a esta tutela.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, estive hesitante sobre se deveria ou não colocar-lhe uma pergunta e decidi que sim. Sabe porquê? Porque estou de acordo consigo
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numa coisa que disse: é que, em política, não vale tudo, mas para o Sr. Deputado vale tudo.
Vale, por exemplo, na questão do défice. Na questão do défice, «as boas contas fazem os bons amigos».
O Governo conseguiu uma redução para 3%, o Governo tem ambição de para o ano ter o défice em 2,4%, o Governo tem a ambição de ter boas contas e de fazer a consolidação orçamental, mas V. Ex.ª ignora esse facto, desvaloriza o papel do Governo, passa ao lado e prefere não comentar um resultado positivo incontornável da política desenvolvida pelo Governo.
Mais: queria lembrar-lhe, Sr. Deputado (se me quiser ouvir), que, de facto, em política não vale tudo. O Sr. Deputado veio aqui com a história das caixas multibanco. Pergunto-lhe: o Sr. Deputado sabe quantas caixas de multibanco há no País? Sabe?! O Sr. Deputado não sabe, mas eu digo-lhe: há 12 000. Sabe, contudo, que foram cometidos crimes em seis destas caixas multibanco e, por outro lado, ouviu, como eu, estes números referidos na televisão por quem assume esta responsabilidade e diz que este comportamento, que deve ser combatido, como é óbvio, é marginal.
Mas o que faz o Deputado do CDS em matéria de segurança? Tenta «vender» na opinião pública que Portugal é um país inseguro, quando toda a União Europeia reconhece que Portugal é um país seguro, onde vale a pena investir e onde vale a pena apostar.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. José Junqueiro (PS): — V. Ex.ª presta, como tal, um mau serviço ao país por causa da sua agenda mediática. Não parece, aliás, um Deputado do CDS, mas alguém que se alimenta do argumento da caixa multibanco. Parece mesmo o «Deputado multibanco»! Por último, quanto à educação e à questão dos supranumerários, V. Ex.ª tentou transmitir uma ideia errada, com a concordância, aliás, de outros partidos. Mas, ao contrário do que o Sr. Deputado disse, os professores, nomeadamente os que estão doentes, aqueles a que V. Ex.ª se quis referir, não estão para ser lançados em algum quadro de supranumerários.
O que o senhor quer esconder é que o início do ano escolar está a correr bem, que há melhores condições para os professores, que há melhores escolas, que há colocação generalizada dos professores, que há mais acesso das pessoas e dos alunos às escolas e que a política de educação é um êxito. Ora, porque para si vale tudo em política, V. Ex.ª vem aqui tentar enfatizar algo que não existe num domínio que o Governo trata com particular atenção.
De resto, o que se passa é que os professores, aqueles que exercem esta profissão, como eu, e estão doentes, têm neste momento uma oportunidade de reconversão, de apoio e de orientação nas suas carreiras.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Junqueiro, se V. Ex.ª teve dúvidas sobre se havia, ou não, de me pedir esclarecimentos, só posso agradecer-lhe o facto de os ter pedido.
Assim, dá-me oportunidade de referir três pontos muito importantes.
Vou começar pela segurança.
O Sr. Deputado disse uma coisa extraordinária ao pedir-nos para dividirmos o número de assaltos pelo número de caixas multibanco, como se não compreendesse que este conjunto de crimes, pela sua gravidade e pelo alarme social que suscitam, têm uma gravidade absoluta. Sou eleito pelo círculo de Lisboa e convido-o a ir comigo visitar a linha de Sintra, onde ainda há dias houve um «arrastão» de mais de 30 bandidos dentro de um comboio!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Mais de 30 bandidos?! Isso parece o Gato Fedorento!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Ou será que V. Ex.ª quer dividir o número de bandidos pelo número de comboios?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Se calhar, devia fazer um exercício mais curioso e dividir o número de polícias que estão adstritos para a cobertura desta linha pelo número de turnos. Sabe qual seria o resultado, Sr. Deputado? Seis polícias por turno! Pensa que é um número suficiente? Pensa que isto garante paz social e segurança a quem todos os dias tem de circular nessa linha?
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Em segundo lugar, passando à questão da educação, o Sr.
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Deputado pode considerar normal que uma Ministra venha ao Parlamento dizer que não há um único professor na lista de supranumerários…
O Sr. José Junqueiro (PS): — Não distorça o que a Ministra disse!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — … e que, passados uns meses, o seu Sr. Secretário de Estado venha dizer que há cerca de 2500 professores que podem ir para essa lista. V. Ex.ª pensa que isto é normal, mas a verdade é que ainda noutro dia o vi aplaudir quem dizia que o poder de compra não tinha qualquer relação com a economia. O senhor considera que isto é normal, mas eu não considero e não tenho a menor dúvida de que quem está lá fora também não considera! Por fim, o Sr. Deputado lançou uma questão muito interessante sobre o défice e sobre as boas contas que fazem os bons amigos. O Sr. Deputado, que, pelo visto, «está numa» de perguntas e de querer saber números concretos, sabe quanto é que subiu a receita fiscal este ano em Portugal?
O Sr. José Junqueiro (PS): — E sabe quanto diminuiu a despesa pública?
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Subiu 8,4%! Sabe quanto subiu a despesa corrente da Administração em Portugal? 4%! E sabe onde é que o Governo quer gastar o que os portugueses amealharam e conseguiram produzir? No investimento público! Pensa que este é o caminho certo para a nossa economia?! É extraordinário! Isto é de quem, de facto, «desligou», tem a cabeça em Bruxelas mas não sabe verdadeiramente o que se passa em Portugal!
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Mas a verdade é que, se não houver investimento público, não há mais políticas!
O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está em discussão pública o Programa Nacional de Barragens. Depois de se ler o Programa e o seu relatório ambiental, acaba até por ser confrangedor ouvir declarações do Sr. Ministro do Ambiente a alegar que as razões ambientais estiveram na base da selecção da localização destes empreendimentos. O membro do Governo que deveria ser o guardião do património ambiental e da sua valorização é quem anui em projectos que destroem o potencial que este país tem em termos ecológicos.
O primeiro grande erro crasso deste Programa é o de constatar que os consumos de electricidade têm crescido constantemente, aceitar piamente que essa realidade é para continuar e que, assim, há que encontrar mecanismos que sirvam esse aumento do consumo de electricidade. Portanto, todo o discurso sobre o aumento de eficiência energética e sobre a imperativa alteração do paradigma de consumos com vista à poupança energética, está visto, é mesmo só discurso e não constitui qualquer objectivo do Governo.
Por outro lado, o Programa aposta nas grandes barragens, em detrimento da produção mais localizada, sabendo-se, como hoje se sabe, que a perda no transporte de energia ronda os 60%, o que dá bem conta do desperdício energético que existe neste país. A aposta na produção localizada e sustentada, com grande peso para a micro-geração, deveria ser o caminho a prosseguir, em detrimento de mega-projectos que delapidam o nosso património natural e que inviabilizam potencialidades de desenvolvimento agregadas a esse património.
Uma das grandes lacunas do estudo ambiental sumário do Programa de Barragens é a avaliação dos impactos desta barragem no litoral. Andamos sempre a falar da fragilidade do nosso litoral, das agressões que sobre ele se cometem, da erosão da nossa zona costeira e, sabendo do grande impacto que as barragens têm sobre o entrave ao transporte de sedimentos, decide-se, ainda assim, construir 10 grandes barragens sem aferir pormenorizadamente do impacto que vão ter sobre o litoral. Isto é, no mínimo, irresponsável.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Muito bem!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Dir-se-á que isso será porventura avaliado no estudo de impacte ambiental que posteriormente será feito sobre cada uma das 10 barragens. Será? Mas esse, Srs. Deputados, é outro dos grandes logros deste Programa. Esta lógica demonstra bem para que servem os estudos de impacte ambiental em Portugal. Primeiro, decide-se o que se vai construir e onde e depois faz-se um estudo de impacte ambiental, que já não terá qualquer peso sobre a decisão de construção dos projectos e da sua localização.
Mas este Programa também revela bem para que serviu verdadeiramente a nova Lei da Água. O Programa de Barragens revela que vai provocar a degradação da qualidade das águas e piorar o estado dos ecossistemas aquáticos e as zonas húmidas dependentes. Uma lei tão apregoada para garantir a boa qualidade das águas num país saturado pela intensificação da poluição dos seus recursos hídricos, tinha,
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afinal (como Os Verdes denunciaram na altura), por verdadeiro objectivo a fixação dos direitos daqueles a quem é atribuída a gestão do recurso água, com poderes de licenciamento e de uso durante décadas e décadas, numa lógica de privatização real de patrimónios colectivos.
Este Programa de Barragens despreza os valores patrimoniais e ambientais, que, se valorizados, são inegavelmente factores de desenvolvimento e de melhoria das condições de vida das populações e das regiões.
A título de exemplo, direi que a barragem que é proposta para a foz do Tua é bem demonstrativa disso mesmo. O relatório ambiental, quando procede à avaliação sumária deste empreendimento, omite inexplicavelmente um conjunto de parâmetros que fazem parte da realidade regional. Ora, só se pode entender que nunca sejam referenciados por constituírem uma incalculável perda que, ao ser tida em conta, muito pesaria para não se optar pela construção dessa barragem.
Como é possível que o impacto paisagístico numa das mais belas zonas do Tua seja omitido no estudo? Como é possível omitir a classificação de património da humanidade dada pela UNESCO a zonas como Carrazeda de Ansiães e Alijó, que serão afectadas? Como é possível omitir completamente a linha ferroviária do Tua, considerada a terceira mais bela via estreita do mundo, nos parâmetros de avaliação dos efeitos de uma barragem que se propõe submergir, como refere o estudo, 35 km dessa linha? Depois do desastre ecológico irreparável que vai constituir a barragem do Sabor, a riqueza patrimonial de Trás-os-Montes tem de continuar a ser sacrificada com a construção de mais barragens? Esta é justamente uma das barragens que, de acordo com o estudo, não vai reflectir uma melhoria do rendimento nem num maior bem-estar das populações da região. Pelo contrário, vai eliminar elementos que podem contribuir para o seu rendimento, como o solo e uma linha ferroviária que, potencialmente, se poderia articular com a Linha do Douro e com a ligação a Espanha.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Os sucessivos governos têm insistido em deixar uma marca de poder associada a grandes obras, a grandes empreendimentos. Foi assim com as auto-estradas, com pontes e edificações e, para esse efeito, estas barragens servirão na perfeição. Mas o que Os Verdes querem deixar hoje expresso é que, para as necessidades do País, este programa de barragens é notoriamente desadequado e muito pouco sustentado na sua avaliação ambiental.
Aplausos de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.
O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, é constante que, quando o Governo apresenta uma política correcta, nomeadamente nas áreas do ambiente, Os Verdes estão contra. É sistemático e é recorrente nesta Câmara.
O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Muito bem!
O Sr. Renato Sampaio (PS): — A Sr.ª Deputada sabe que, finalmente, Portugal tem uma política energética correcta, que vai no sentido de aumentar o nosso potencial de energias limpas e de energias renováveis.
A Sr.ª Deputada também sabe que foi este Governo o único que se preocupou com a eficiência energética, ao publicar legislação sobre esta matéria.
A Sr.ª Deputada sabe que, quanto à política energética, este Governo apostou em todas as políticas limpas, nomeadamente na microgeração, na eólica, na biomasssa e na hídrica.
A Sr.ª Deputada sabe, igualmente, quanto é importante potenciarmos a nossa capacidade hídrica em Portugal — hoje, só utilizamos menos de 50% do nosso potencial hídrico.
O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Muito bem!
O Sr. Renato Sampaio (PS): — E é importante potenciarmos esta nossa capacidade porque é importante para a economia e para o País — é importante para a economia porque deixa o País menos dependente do exterior —…
O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Claro!
O Sr. Renato Sampaio (PS): — … e é importante para o ambiente porque conduz ao nosso cumprimento dos compromissos internacionais.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
O Sr. Renato Sampaio (PS): — A Sr.ª Deputada sabe, tão bem como eu, quanto são correctas as políticas
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ambiental e energética deste Governo.
A Sr.ª Deputada sabe também que não era possível fazer estudos de impacte ambiental se não houvesse primeiro a localização destas barragens.
O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Exactamente!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
Protestos de Os Verdes.
O Sr. Renato Sampaio (PS): — E foram feitos estudos de avaliação estratégica ambiental para as podermos localizar e só depois é que é possível fazermos estudos de impacto ambiental.
Mas, Sr.ª Deputada, percebo que há neste ponto uma grande divergência com o seu parceiro de coligação.
Ainda no último debate sobre energia, nesta Câmara, o Partido Comunista Português — o seu parceiro de coligação — defendeu mais barragens e melhor aproveitamento hídrico de Portugal. Os Verdes estão exactamente contra.
Risos de Os Verdes.
Pergunto à Sr.ª Deputada se, ao estar contra o aproveitamento hídrico em Portugal, a Sr.ª Deputada está aqui a abrir a discussão…
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Renato Sampaio (PS): — … e as portas à energia nuclear. Era esta a questão que eu gostaria de colocar-lhe.
Protestos de Os Verdes.
É porque, ao estar contra a política energética deste Governo, só há uma alternativa: a energia nuclear.
Risos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Isso é o que o Sr. Deputado está a dizer, mas não é verdade!
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Renato Sampaio (PS): — Estão sistematicamente contra esta política do Governo.
Vozes do PS: — É verdade!
Protestos de Os Verdes.
O Sr. Renato Sampaio (PS): — Portanto, eu quero saber se está a abrir as portas à energia nuclear em Portugal!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Renato Sampaio, muito obrigada pela sua questão, ainda que, evidentemente, discorde de praticamente tudo aquilo que referiu. Desde logo, a questão da «política correcta»: «correcta», na perspectiva do Sr. Deputado, que nada argumentou, absolutamente nada! — apenas lhe atribuiu o rótulo.
Sabe, Sr. Deputado, nós aqui, nesta Câmara, nós particularmente, no Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», já estamos a começar a ficar um bocado fartos desta questão dos rótulos… Sabe que esta questão dos rótulos de se ser «socialista» ou «de esquerda» não chegam para se ser efectivamente de esquerda;…
Protestos do Deputado do PS Mota Andrade.
… e os rótulos de «bom ambiente» também não chegam para, de facto, se prosseguirem bons objectivos
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ao nível ambiental, designadamente ao nível do desenvolvimento sustentável, que, como o Sr. Deputado sabe, deve integrar três componentes essenciais: a económica, a ambiental e a social.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Muito bem!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ora bem, o Sr. Deputado não se referiu, absolutamente em nada, ao Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico, mas eu gostava de tê-lo ouvido sobre essa matéria, porque aquilo que o Sr. Deputado diz não é verdade. «Deve haver a localização determinada dos projectos e, depois, faz-se o estudo do impacte ambiental» — isso foi aquilo que o Governo lhe «vendeu», é aquilo que o Governo quer vender a toda a gente. Mas nós não «compramos» essa teoria, Sr. Deputado!! O Sr. Deputado sabe que não é isso que deve acontecer, porque os estudos de impacte ambiental não devem ser um mero pró-forma e não devem ter como objectivo, exclusivamente, minimizar os efeitos daquilo que já está definido.
Protestos do Deputado do PS Renato Sampaio.
O que deve acontecer é existirem várias alternativas de localização, as mais possíveis, no sentido de, depois, se fazer um estudo de impacte ambiental individual, em relação a cada uma delas e cumulativo entre todas, para se aferir se, de facto, «sim» ou «não» ao projecto e se «sim» ou «não» àquela localização. Não é isso que vai acontecer! O Governo, agora, diz assim: «Estão aqui 10 barragens para pôr aqui! Agora, estudem lá aquilo que entenderem». Não é esta a nossa lógica, Sr. Deputado!! E, por favor, não nos venha dizer que a alternativa à contestação a este Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico é a energia nuclear, porque isso, então, é de facto, não ter mais qualquer argumento!
Protestos do Deputado do PS Renato Sampaio.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado nunca ouviu Os Verdes dizerem que não deve haver barragem alguma em Portugal.
Protestos do PS.
Não vale a pena dizer isso, porque nunca nos ouviu dizer isso!
Protestos do PS.
Ouviu-nos, de facto, contestar — e continuaremos a contestar! — a energia nuclear. E continuaremos a entender que as energias alternativas devem ser diversificadas…
Protestos do PS.
Não, a solar não é! Vocês não estão a apostar minimamente na solar nem na microgeração…
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem mesmo de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … e é uma vergonha que Portugal continue com valores extremamente baixos, designadamente em relação à Grécia,…
O Sr. Presidente: — Já terminou o seu tempo, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … naquilo que respeita à componente solar.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Um décimo!
O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, pelo Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça.
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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há 100 países no mundo que ainda têm nas suas leis fundamentais a pena de morte. Há 100 países no mundo que ainda executam seres humanos, que condenam à pena de morte.
Cerca de 1591 pessoas foram executadas em 25 países, no ano de 2006; 3861 pessoas foram condenadas à morte em 55 países; de acordo com os dados disponíveis pela Amnistia Internacional, estimase que entre 19 000 a 25 000 pessoas tenham sido condenadas à pena de morte e esperem a sua execução em todo o mundo.
91% das execuções ocorridas em 2006 foram levadas a cabo por seis países: 1010 pessoas (mas estimadas entre 7500 e 8000 pessoas) na China; 177 pessoas no Irão; 82 pessoas no Paquistão; 65 pessoas no Sudão; 177 pessoas no Iraque; e 53 execuções em 12 Estados dos Estados Unidos da América.
Por iniciativa do Conselho da Europa, celebrou-se ontem, 10 de Outubro, o Dia Europeu contra Pena de Morte.
Como Parlamentar portuguesa e membro do Conselho da Europa, Casa dos Direitos Humanos, regozijome com esta iniciativa, que deve merecer o aplauso de todos os Parlamentares portugueses. Esta iniciativa representa um sinal claro do reforço do compromisso do Conselho da Europa com um dos mais essenciais princípios da mais antiga organização supra-estadual da Europa — o reconhecimento da dignidade humana — e sublinha também os valores que partilhamos, enquanto europeus, e que devem constituir a base da nossa solidariedade com os que, por todo o mundo, lutam contra uma pena absurda e atentatória da dignidade humana.
A pena de morte é a punição mais cruel, mais desumana e mais degradante. Falamos de seres humanos, não de uma realidade virtual. A pena de morte é a negação do direito à vida, é a negação do direito à dignidade humana, é a negação do direito a ser tratado sem crueldade ou tortura. Ela pune irremediável e cruelmente, em vez de procurar a reinserção e a reabilitação do condenado.
Havendo pena de morte, haverá sempre a possibilidade do erro e risco de execução de inocentes. E quantos erros judiciais já se cometeram! Quantos foram já executados, Sr. Presidente e Srs. Deputados! Mas, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a campanha contra a pena de morte foi desencadeada em Portugal, no século XIX, por dois artigos de Alexandre Herculano e pela luta de um grande vulto parlamentar, António Aires Gouveia. Em 1852, é abolida a pena de morte para os crimes políticos; poucos anos depois, em 1867, para a generalidade dos crimes; e, finalmente, em 1976, há a abolição total, incluindo em teatro de guerra.
Há, pois, fundamento histórico e credibilidade que assistem à diplomacia portuguesa quando ela se empenha em iniciativas tendentes ao fim das execuções e à eliminação da pena de morte. Não se trata de supor ou reivindicar uma superioridade portuguesa; trata-se, sim, no quadro que se reveste de maior significado da presidência portuguesa da União Europeia, de sublinhar aqui o papel da União Europeia na organização da Conferência que decorreu, no dia 9, no Centro Cultural de Belém, A Europa contra pena de morte.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, num momento em que democracias que já aboliram a pena de morte, há muito, reclamam, agora, a sua reintrodução, são cada vez mais prementes a luta e o empenho dos Parlamentos europeus na luta contra a pena de morte.
A Europa deve manter-se firme na defesa de um lugar e de uma conquista que nos enobrecem e devem constituir exemplo e suporte fundamental para uma moratória universal a que estamos todos obrigados, pelo que estamos todos obrigados a lutar.
Foi também consciente da importância do papel da União Europeia na abolição da pena de morte que, em Abril, o Parlamento Europeu reforçou o apelo a uma moratória universal à pena de morte, com a aprovação da resolução que exorta todas as instituições da União Europeia, conjuntamente com o Conselho da Europa, a apoiar o Dia Mundial e o Dia Europeu contra a Pena de Morte.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apesar de tudo, desde 1 de Janeiro de 2007, 128 países aboliram já, na lei e na prática, a pena de morte. O Ruanda aboliu a pena de morte! Um país como o Ruanda, com a terrível violência que conheceu num passado recente, ter optado pela abolição da pena de morte vem dar um vigoroso exemplo a outros países de todo o mundo!...
Enquanto parlamentares, devemos continuar a exercer pressão em prol dessa abolição. A abolição da pena de morte contribuirá para a promoção da dignidade humana e para o desenvolvimento progressivo dos direitos humanos.
Termino, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, sublinhando que todos os gestos no sentido de abolir a pena de morte são poucos, enquanto houver um condenado e um executado, mas todos eles são necessários e todos nos devemos empenhar no fim deste horror.
Os esforços do Conselho da Europa e da União Europeia são uma evidência no sentido de uma esperança dos países que ainda vivem esta realidade. Condenar à morte não é fazer justiça mas, sim, exercer a mais fria e implacável das violências: a vingança. A pena de morte é um intolerável atentado contra o Homem.
O repúdio da pena de morte é uma opção humana e moral; representa a adesão a uma escala de valores que coloca a vida em primeiro lugar; é o reconhecimento de que a vida em comunidade tem sentido e que esse sentido é a promoção da vida livre e digna!
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A verdade é que, em cada país que acaba com a pena de morte, se reforçam os valores que foram nossos e que são, hoje, universais, em grande parte por obra nossa, dos parlamentares portugueses, como dizia aqui o Deputado Pedro Roseta, mas se reforça também a humanidade de toda a Humanidade.
A forma como a sociedade trata o crime é um dos testes à sua civilização. Por isso, que no segundo Dia Europeu contra a Pena de Morte possamos celebrar a tão necessária e esperada moratória universal.
Aplausos gerais.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça, uma questão, de forma muito breve, e até um apelo à reflexão da Sr.ª Deputada sobre um tema que, segundo suponho, une toda a Câmara.
A Sr.ª Deputada estará recordada, certamente, de que fiz aqui uma intervenção, em 9 de Fevereiro deste ano — talvez não estivesse cá —, onde apelava, exactamente, a que Portugal, enquanto na presidência da União Europeia, aproveitasse este momento para salientar um percurso que é de civilização e que, uma vez que Portugal, neste domínio, foi um país que deu passos em primeiro lugar, antes de todos os outros, também agora, fosse capaz de marcar essa diferença naquilo que é fundamental, que é a defesa dos direitos, liberdades e garantias de todos os cidadãos.
Mas isto faz-me reflectir também sobre a coerência com que estas questões devem ser tratadas, designadamente no plano internacional. E ocorreu-me como, há pouco tempo, numa decisão que, devo dizer, me chocou, o Eng.º José Sócrates, enquanto Primeiro-Ministro de Portugal, recusou receber S. S. o Dalai Lama, exactamente um representante espiritual mas, mais do que isso, o representante de um povo que viu o seu país ser ocupado, as suas gentes massacradas, todos os dias violados os mais básicos e elementares direitos humanos e em relação a quem, um alto representante desse país — que o é! —, faria sentido, no mínimo, que fosse feita uma recepção também por um dos mais altos representantes do Estado português. E é difícil compatibilizar o facto de S. S. o Dalai Lama não ter sido recebido pelo Primeiro-Ministro José Sócrates com o esforço, este, já de louvar, do mesmo Primeiro-Ministro, mas, já agora, enquanto Presidente em exercício da Conselho da União Europeia, a propósito do que se passa na Birmânia, onde o apelo é feito exactamente à China, país com influência particular na região, para que, no caso presente de violação dos direitos humanos, a interferência aconteça, o problema seja resolvido e aquilo que todos os dias nos choca e nos entra pela casa dentro, através das televisões, tenha um fim.
O Sr. Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Termino já, Sr. Presidente.
Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, se lhe parece que, em matéria de direitos humanos, nestas, em concreto, que são tão sensíveis, faz sentido não receber S. S. o Dalai Lama, ao passo que, numa situação equivalente, exactamente a mesma pessoa, ainda que no domínio de cargos diferentes, reage e apela à China, da forma como o faz.
O mesmo se diga a propósito do Zimbabué. A Sr.ª Deputada entende que faz sentido que, perante um país onde os mesmos direitos humanos são violados, onde um líder, por essa circunstância, está impedido de entrar na União Europeia, apesar da ressalva quanto às convenções internacionais, se prescinda da presença inglesa em favor da presença, neste caso, do Sr. Robert Mugabe.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª deputada Ana Catarina Mendonça.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, vou tentar esforçar a minha voz para lhe conseguir responder, uma vez que estou com problemas de garganta.
Darei apenas três notas, Sr. Deputado, a primeira das quais sobre S. S. o Dalai Lama.
Na outra visita de S. S. o Dalai Lama a Portugal, a esmagadora maioria dos Deputados da Assembleia da República recusou-se ao convite endereçado, à época, por dois parlamentares, para receber S. S. o Dalai Lama num hotel, em Lisboa.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Eu estive lá!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — O Sr. Deputado lembra-se de que, na altura, também me ouviu, a mim, apelar à defesa dos direitos humanos. E o que é verdade, Sr. Deputado, é que a coerência manda que nos empenhemos sempre na defesa dos direitos humanos e não apenas quando isso dá notícia.
Sr. Deputado, não peça já a palavra para defesa da honra,…
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O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Não vou defender a honra!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — … porque, se bem se lembra, esteve nessa reunião a título individual, uma vez que os grupos parlamentares entenderam que não o deviam fazer. E, na época, não ouvi o Sr. Deputado levantar a voz sobre isto! Mas vamos àquilo que nos interessa.
Só trouxe aqui a celebração do Dia Europeu contra a Pena de Morte porque me parece de extrema importância. Em face do apelo que o Sr. Deputado fez, no dia 9 de Fevereiro, na tribuna, era de elementar justiça que, hoje, dissesse que se congratulava com a iniciativa da presidência portuguesa…
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Comecei por aí!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — … e com o Sr. Ministro da Justiça, por ter organizado uma conferência europeia para sensibilização e para uma jornada de celebração do dia 10 de Outubro como o Dia Europeu contra a Pena de Morte. Sobre isto o Sr. Deputado nada quis dizer!
Aplausos de Deputados do PS.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Comecei por aí!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Em segundo lugar, Sr. Deputado, sobre a cimeira União EuropeiaÁfrica, não me parece que tenha sido objecto da minha declaração política… A única coisa que lhe posso dizer é a seguinte: preferia que não existisse tão importante evento, com a necessidade de estreitar relações entre a Europa e África, Sr. Deputado! Mas deixo-lhe, sobretudo, uma palavra — e com ela termino, até porque já ultrapassei o tempo de que dispunha —, Sr. Deputado: quanto à violação dos direitos humanos, o Partido Socialista estará sempre no seu combate, em nome daquelas que foram as lutas pioneiras por que Portugal se bateu, designadamente na abolição da pena de morte. O percurso é de civilização e há mais de um século que Portugal deu esse passo, esperando, agora, que a moratória universal possa ser celebrada em breve por todos os Estados.
Aplausos do PS.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, permite-me uma breve interpelação à Mesa?
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero apenas, através de V. Ex.ª, recordar à Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça como, aquando dessa primeira visita de S. S. o Dalai Lama a Portugal, não só os Deputados, vários, do CDS estiveram presentes como requereram…
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Não é verdade!
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Ó Sr.ª Deputada, pode dizer 20 vezes que não é verdade, porque é verdade!!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Mostre-me a lista!
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Estiveram presentes Deputados do CDS, um dos quais eu próprio, para além de terem requerido ao Sr. Presidente da Assembleia da República, à data, que o Dalai Lama fosse aqui recebido, em sessão solene.
Lembro também à Sr.ª Deputada que, nisso, a nossa coerência é completa, tanto à data como agora, ao contrário da do Partido Socialista, para quem, ao que parece, o que se passa no Tibete não tem qualquer importância comparativamente com o que se passa na Birmânia, apesar de toda a similitude nas circunstâncias e na violação dos direitos humanos.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, com a reapreciação do Decreto da Assembleia da República n.º 150/X — Aprova o regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.
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O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Deputados: Aprovámos, por unanimidade, nesta Casa, a proposta de lei relativa à responsabilidade civil extracontratual do Estado e estou convencido de que o fizemos por todos estarmos conscientes da necessidade da existência, em Portugal, de um diploma que previsse as indemnizações para o caso de violação de deveres públicos, por parte da Administração, para com os cidadãos. O Estado de direito português estava mais pobre sem um diploma com essas características.
Mas, se aprovámos esse diploma por unanimidade, o que é facto é que o Sr. Presidente da República entendeu por bem vetá-lo e fazer alguns comentários, exercendo, naturalmente, um direito constitucional que lhe assiste.
Porém, o Partido Socialista, nesta matéria, sempre disse que, se o diploma viesse a ter algumas alterações, deveriam ser pequenas alterações, porque se tratava de um diploma necessário e era urgente pôlo em vigor, já que vivemos num Estado de direito e os cidadãos, quando prejudicados pela Administração, seja ela quem for, devem ser devidamente protegidos. Foi neste sentido que o Partido Socialista apresentou, na Mesa, uma pequena alteração ao diploma, que, de resto, também surge na sequência de uma chamada de atenção do Sr. Presidente da República, no que diz respeito às normas de Direito Internacional. Ou seja, deixámos cair o último inciso do n.º 3 do artigo 15.º, retirando, agora, a possibilidade de conformidade de normas nacionais com normas de Direito Internacional, não porque tenhamos mudado de opinião sobre essa matéria mas porque entendemos que, no actual quadro constitucional e no actual quadro de competências do Tribunal Constitucional, era melhor retirar aquele inciso.
Há pouco tempo, o PSD apresentou-nos algumas alterações e, da leitura rápida que fiz, não me pareceram alterações de fundo mas, sim, de pormenor. De qualquer forma, como só as iremos votar daqui a oito dias, conforme requerimento apresentado na Mesa, nessa altura teremos oportunidade de, através do voto, nos pronunciarmos em concreto sobre essas alterações.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, faço-lhe a seguinte observação: o requerimento visa adiar a votação mas não a discussão.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Exactamente!...
O Sr. Presidente: — A discussão é feita hoje e não haverá, na próxima semana, mais discussão sobre este tema.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Muito obrigado, Sr. Presidente. Foi esse o meu entendimento, por isso a nossa opinião será expressa no voto.
Ou seja, ao votarmos, diremos se estamos contra ou a favor das alterações propostas pelo PSD, sendo certo que, repito, não estão em causa alterações substanciais ao diploma — pelo menos, foi o que retirei da leitura rápida que fiz. De qualquer modo, teremos essa opção na votação que se realizará na próxima semana.
Em suma, o Partido Socialista entende que não havia razões para alterar os fundamentos e o entendimento — unânime — do diploma. Apenas introduzimos uma pequena alteração por a considerarmos consentânea com a Constituição e com o Estado de direito democrático.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria dizer que já nos pronunciámos sobre este veto presidencial na primeira sessão plenária realizada após ele ter ocorrido e reafirmámos a nossa posição de princípio, que é favorável, relativamente ao Decreto aqui aprovado. Consideramos muito importante que o País seja dotado de uma lei sobre a responsabilidade civil extracontratual do Estado e reiteramos, hoje, essa nossa posição.
Também não nos opomos à proposta que foi apresentada pelo Partido Socialista já há algum tempo, pois ela parece fazer algum sentido. Portanto, não seremos nós a quebrar a unanimidade.
Acontece que, hoje mesmo, somos confrontados com propostas apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PSD em número significativo. Consideramos que tem inteira justificação que haja um adiamento da votação dessas propostas e consideramos mais: consideramos que não temos quaisquer condições para poder fazer uma discussão de improviso sobre propostas acabadas de entrar na Mesa e que, obviamente, incidem sobre um diploma que tem uma considerável complexidade técnica.
O que vamos fazer é analisar essas propostas com todo o cuidado, com toda a atenção e, obviamente, reservaremos a nossa posição para o momento em que elas forem votadas.
Aplausos do PCP.
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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS sabe exactamente o que fez quando, no dia 5 de Julho de 2007, votou — com orgulho — a favor de uma proposta de lei de responsabilidade civil extracontratual do Estado.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — As razões são simples e directas: nós acreditamos numa sociedade responsável e isso não se consegue sem um Estado responsabilizável;….
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … nós acreditamos na reforma do Estado e não vemos como é possível reformar o Estado sem o obrigar a uma lei de responsabilidade civil extracontratual;…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … nós temos uma tradição na matéria e ajudámos a fazer outra proposta de lei neste mesmo sentido, que considerávamos até tecnicamente melhor mas que, no essencial, visava obrigar o Estado a compreender que vivemos no século XXI e que as falhas, do ponto de vista do serviço público, têm de ter uma responsabilidade.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E esta visão do Estado não é compatível com uma Administração que exige tudo ao cidadão mas iliba ou exime o Estado de qualquer responsabilidade quando prejudica o cidadão.
Aplausos do CDS-PP.
Depois de tantos anos a discutir esta matéria (pelo menos, três propostas de lei são já conhecidas), depois de tanta discussão na doutrina e até na jurisprudência, achamos uma extravagância que o País continue a ter uma lei feita no quadro do Estado Novo — e, nesse quadro, até moderna — face a dúvidas que agora se colocam sobre esta lei que nos fazem retroceder do ponto de vista do que deve ser um Estado civilizado, que, obviamente, responde pelos seus erros.
Aplausos do CDS-PP.
Portanto, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o CDS sabe muito bem o voto que deu no dia 5 de Julho de 2007.
Não nos arrependemos, não mudamos uma vírgula, não mudamos um artigo, nada temos a rectificar.
Queremos um Estado que é responsável e responsabilizável quando erra e prejudica o cidadão.
Não votaremos nada de diferente do que já votámos, porque sabíamos o que estávamos a fazer quando votámos a proposta de lei de responsabilidade civil extracontratual do Estado.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta reapreciação há duas questões a equacionar.
A primeira delas é uma questão política. Temos um diploma da Assembleia da República que foi, de facto, aprovado por unanimidade — e todos os partidos o votaram em consciência, não foi só o CDS, obviamente —, mas que o Sr. Presidente da República vetou.
É, pois, preciso analisarmos a natureza desse veto.
Não é um veto contra os princípios ínsitos no diploma, nem contra os objectivos, nem contra a filosofia do mesmo. Todos estamos de acordo nesta Câmara — e o Sr. Presidente da República também está de acordo — que é necessário rectificar, actualizar uma legislação que tem, praticamente, 40 anos a propósito da responsabilidade civil do Estado para defesa dos cidadãos portugueses.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — O veto é no sentido de que se reflicta sobre o impacto,
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sobre os reflexos desse mesmo diploma.
O PSD desde logo manifestou a sua disponibilidade para reflectir, para reanalisar, para ponderar, tal como vários outros grupos parlamentares. E o PSD não o fez hipocritamente: fê-lo com o intuito de, justamente, reflectir, reequacionar o pensamento e, porventura, se fosse o caso, redigir um novo texto, ou parte de novo texto.
Portanto, ao apelo do Sr. Presidente da República, a resposta do PSD foi «sim». Pode haver pontos que merecem maior precisão, pode haver pontos que justifiquem mesmo uma reformulação do texto. Foi o que o PSD fez, sem hipocrisias, desde o primeiro momento,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — … ao contrário de outros grupos parlamentares que se mostraram disponíveis para fazer o mesmo, mas que «numa mão trazem nada e na outra coisa nenhuma»!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Há dois exemplos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que justificam as alterações propostas pelo PSD.
O primeiro deles diz respeito à responsabilidade no exercício da função legislativa. Em vez de se dirigir a actos que sejam desconformes com o Direito Comunitário e o Direito Internacional e a actos legislativos de valor reforçado, o PSD propõe, justamente, que «o Estado e as regiões autónomas sejam civilmente responsáveis pelos danos anormais causados aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos». Parece-nos uma proposta mais correcta, que impede a insegurança e a incerteza jurídicas do relacionamento jurídico entre os cidadãos e o Estado que a versão original do diploma implicava.
O segundo exemplo, Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça e Srs. Deputados, prende-se com o que propomos a propósito da abolição da obrigatoriedade do exercício do direito de regresso quanto aos funcionários ou agentes que tenham cometido as infracções com negligência.
Devem vigorar, isso sim, os princípios da adequação e da proporcionalidade. Reconhecer o direito de regresso — sem dúvida! — é absolutamente indispensável, mas obrigar sempre ao seu exercício é algo de insensato, algo de perigoso e algo de prejudicial que muito vai inviabilizar a boa actuação dos dirigentes públicos e, mesmo, dos nossos governantes.
A nossa proposta, portanto, Sr. Presidente, é seguramente a melhor.
O que está em causa nesta lei é, de facto, o reforço dos poderes dos cidadãos perante os erros do Estado e não a forma como, depois, o Estado, internamente, organiza o exercício do direito de regresso.
Devo saudar, como última palavra, Sr. Presidente, o Partido Socialista pela abertura que manifestou, desde já, em relação às propostas do PSD, o que mostra, também, neste ponto, sentido de responsabilidade face à envergadura e à dimensão deste diploma.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República aprovou, por unanimidade, uma proposta de lei que há muito se arrastava nesta Câmara. De legislatura para legislatura, a questão da responsabilidade civil extracontratual do Estado ia passando e ninguém a apadrinhava, até que, de uma vez por todas, esta Assembleia assumiu as suas responsabilidades e a lei foi aprovada.
Creio que ela qualifica a democracia no sentido em que permite aos cidadãos que venham a responsabilizar o Estado pelas suas acções danosas e pelas suas omissões.
As razões do veto apresentadas pelo Sr. Presidente da República são, a nosso ver — e dissemo-lo na altura —, absolutamente infundadas.
Veja-se, por exemplo, a responsabilidade relativa ao exercício da função político-legislativa, que o Sr.
Presidente dizia poder conduzir a custos orçamentais incomportáveis para o Estado. Mas esta responsabilidade existe apenas na possibilidade de haver danos anormais, extraordinários para os cidadãos e ainda, no caso de os lesados destes danos serem em número demasiado elevado, a indemnização a que teriam direito seria nivelada por baixo.
Portanto, poderíamos dizer ao Sr. Presidente da República, ao «fantasma de ministro das finanças» que habita a sua personalidade pessoal, que suspire de alívio, porque o perigo de bancarrota está necessariamente afastado.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues também não explicou os efeitos precisos da
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proposta de alteração que o Partido Socialista apresentou.
Quando propõe exonerar o Estado das responsabilidades relativas ao Direito Internacional, ao Direito Comunitário e a normas de valor reforçado, o Partido Socialista exclui desta responsabilidade as leis de bases.
Ontem tive o cuidado de, pessoalmente, telefonar para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, perguntando se havia um lapso, e a Sr.ª Deputada Sónia Sanfona, que, infelizmente, não está presente na sala, disse-me que não, que as normas de valor reforçado e tudo o que estava riscado na proposta de alteração era para se manter e, portanto, tudo o que são leis de bases da saúde e da educação deixará de estar ao abrigo desta responsabilidade civil extracontratual do Estado.
Sr. Deputado, no que toca ao Direito Internacional e ao Direito Comunitário, dou-lhe um exemplo desta situação: Portugal tem, como sabe, em Sacavém, um reactor nuclear ao abrigo de um programa de investigação organizado a nível europeu, mas, no que toca ao sector nuclear, a legislação nacional tem um enquadramento legal que é muito menos protector para o cidadão do que as normas comunitárias. Ora, uma vez que o Estado português não transpôs para o Direito nacional a legislação comunitária que protege mais o cidadão no que toca aos padrões de segurança, pergunto-lhe: no caso de haver danos anormais para os cidadãos portugueses, a quem é que eles vão pedir responsabilidades?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça, Srs. Deputados: A Assembleia da República aprovou um diploma sobre responsabilidade civil extracontratual do Estado e fê-lo por unanimidade. Fê-lo fundamentalmente por duas razões.
Em primeiro lugar, porque era urgente e premente alterar um regime que já tinha 40 anos, que já vinha do Estado Novo — e, em boa verdade, já nessa altura havia vários juristas que o criticavam e que entendiam que o seu regime era manifestamente insuficiente —, tendo-se tornado ainda mais inadequado depois do 25 de Abril e da nossa Constituição de 1976, cujos princípios fundamentais, muito concretamente o seu artigo 22.º, exigem um regime claro, transparente e, acima de tudo, justo, que garanta o direito essencial dos cidadãos a serem ressarcidos pelos actos e omissões do Estado, lato sensu, que violem ilegitimamente os seus direitos.
Este é um imperativo constitucional e ético que nenhum argumento financeiro pode disfarçar ou mitigar.
Em segundo lugar, porque o regime em concreto encontrado é francamente melhor do que a lei que é revogada por este diploma. É mais claro, mais abrangente e mais justo. E, se existisse há mais tempo, certamente que muitas das injustiças que, ao longo dos anos, ficaram por ressarcir nos nossos tribunais teriam visto outra solução.
Dado este passo fundamental, o Partido Ecologista «Os Verdes» entende que o diploma deve ser reconfirmado pela Assembleia da República. Não nos opomos a que, pontualmente, se proceda a correcções e melhoramentos técnicos cirúrgicos que não alterem no fundamental aquilo que esta lei vem consagrar. Mas, de facto, o debate de hoje fica, de alguma forma, amputado e prejudicado pelo conjunto de alterações que foram apresentadas, que ainda não tivemos tempo de analisar cuidadamente, mas, certamente, teremos ocasião de o fazer antes da votação. Contudo, não é possível aprofundar mais o debate, que fica prejudicado por esta questão.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Ministro da Justiça (Alberto Costa): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O novo regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado que hoje cumpre a esta Assembleia reapreciar assenta em dois alicerces, equilibrados após anos de debate. É um regime que melhora a qualidade do Estado de direito e que, simultaneamente, cria um quadro de maior exigência e rigor entre os cidadãos, as empresas, os serviços públicos e os servidores.
Não é o momento de renovar as discussões havidas em sucessivas legislaturas, quero apenas referir exemplos de inovações que não teremos, se esta nova lei da responsabilidade do Estado não entrar em vigor.
Em primeiro lugar, o Estado não ficará obrigado a exercer o direito de regresso sobre os funcionários que tenham agido de forma altamente censurável.
Hoje o Estado, quando é obrigado a indemnizar devido à conduta de um funcionário que tenha provocado um dano com dolo ou negligência grave, não está obrigado a responsabilizar esse funcionário, mas, com o novo regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado, estará. Passa a exigir-se mais rigor ao Estado que, de outra forma, não será introduzido.
Em segundo lugar, esta lei elimina obstáculos formais de peso à concessão de indemnizações.
Hoje, para haver indemnização, é preciso demonstrar que foi praticado um acto ilícito e que o funcionário que provocou o dano agiu com culpa. E todos sabemos como é difícil e, muitas vezes, até impossível demonstrar essa culpa e como, frequentemente, fica prejudicada a justiça por circunstâncias formais relacionadas com dificuldades de prova. Com o novo regime, passa a ser o Estado a demonstrar que não houve culpa. Ou seja: seguindo o actual padrão europeu, deixa de ser o lesado que sofreu o prejuízo a ter de
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prová-lo.
Em terceiro lugar, o regime que temos em vigor, que provém ainda do governo de Salazar, encontra-se muito distante não só das exigências da nossa Constituição como do Direito Comunitário, a que estamos, obviamente, vinculados, com grande impacto na área dos mercados públicos.
É tempo de reconhecer o trabalho da Assembleia da República nesta matéria. O novo regime da responsabilidade civil extracontratual foi aprovado várias vezes, em várias legislaturas, e em todas houve consenso. É por isso justo reconhecer que este processo sempre demonstrou da parte das forças políticas um empenho coerente e responsável. Esta circunstância reforça a credibilidade das soluções que hoje reapreciamos.
Este é o momento de não desistir de aperfeiçoar o Estado de direito em Portugal e de não fazermos desta Legislatura mais uma legislatura de discussão sem legislação.
Devemos focar-nos no essencial: aprovar um novo regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado que melhore a qualidade da protecção de direitos dos cidadãos e das empresas, mesmo que aspectos pontuais possam ser aperfeiçoados.
A história deste novo regime é uma história de consensos e de aperfeiçoamentos. Continuemos nesse padrão. Façamos o que tivermos de fazer, mas aprovemos um novo regime da responsabilidade civil extracontratual, que contribua para que o princípio da responsabilidade se aplique não só às pessoas e às empresas mas também ao Estado e às entidades públicas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Conhecemos bem os mecanismos parlamentares e a necessidade de se adiarem decisões para melhor podermos estudar as soluções alternativas, mas também conhecemos bem os resultados que teve o primeiro pacto de justiça, lamentáveis no plano da legislação penal.
Esperamos bem que um diploma que foi aprovado no Parlamento por unanimidade não se transforme num segundo pacto de justiça do «bloco central», que venha a trucidar o actual decreto,…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — … porque isso seria muito mau para o País e para a responsabilidade do Estado.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o requerimento, apresentado pelo PS e pelo PSD, de adiamento, para a próxima semana, da votação das alterações ao Decreto n.º 150/X — Aprova o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do PCP, do BE e de Os Verdes e votos contra do CDS-PP.
Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos, que é a discussão do projecto de lei n.º 402/X — Adita ao Código de Procedimento e de Processo Tributário um novo título sobre arbitragem (CDS-PP).
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS assumiu-se, nesta sessão legislativa e desde a primeira hora, como oposição reformista, focada e concreta.
Hoje os contribuintes, sejam eles empresas sejam eles cidadãos individuais, não perdem horas ou dias nos tribunais fiscais, perdem anos.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Apesar de não haver estatísticas oficiais recentes, apesar de os números serem muito difíceis de encontrar, é hoje mais do que evidente que uma qualquer impugnação fiscal demora, no mínimo, na ordem dos cinco anos a ser resolvida. Isto é uma limitação enorme a quem quer investir no nosso país; isto é uma limitação enorme para os cidadãos que querem defender os seus direitos.
Aplausos do CDS-PP.
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Por isso mesmo e porque estamos atentos àquilo que se passa no País fazemos uma proposta. É, aliás, a primeira vez que há um projecto de lei autónomo que propõe a existência de arbitragem em questões de natureza fiscal. Ela já existe noutras campos, existe no campo do consumo e, por exemplo, no campo do Direito Administrativo.
O conceito de direito indisponível não é visto hoje da mesma forma que era visto há uns anos atrás. De todo o modo, o CDS quis ser cuidadoso na apresentação deste projecto de lei e, por isso mesmo, cingiu-o à matéria dos contratos fiscais, contratos em que há um princípio de liberdade das partes, contratos em que pode aplicar-se, sem qualquer dúvida de legalidade, o princípio da arbitragem.
Mas queremos, desde já, assumir que, se houver vontade por parte de uma maioria nesta Câmara, estamos totalmente disponíveis para abrir o conceito de arbitragem a outras matérias, como, por exemplo, à avaliação indirecta dos rendimentos dos contribuintes ou a todas as matérias que têm que ver com benefícios fiscais e até com a Zona Franca da Madeira.
E, portanto, apresentámos um projecto de lei que tem como origem aquilo que se passa actualmente no Direito Administrativo, fizemos uma adaptação daquilo que se passa no Direito Administrativo às áreas do Direito Fiscal. Quisemos ter cuidados, mas são cuidados para que se possa caminhar, para que em definitivo se respeitem os direitos mais elementares dos contribuintes. E um deles é o de ver os seus litígios perante a Administração resolvidos a tempo e horas.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — O facto de se demorar na resolução é mau para os contribuintes, é mau para o Estado, que depois tem de pagar mais juros, e é mau, fundamentalmente, para a nossa economia.
Fizemos e apresentámos um projecto de lei na linha daquilo que, neste momento, é discutido na doutrina da matéria fiscal, quer na Europa quer nos Estados Unidos. Já vários Estados começam a querer aplicar a situação da arbitragem aos conflitos de natureza fiscal. Por isso mesmo, esta é uma matéria extraordinariamente importante e que exige reflexão por parte do Parlamento.
Quero aqui assumir que o Grupo Parlamentar do CDS-PP vai apresentar um requerimento à Mesa para que este projecto de lei baixe à Comissão de Orçamento e Finanças sem votação, na generalidade. Não queremos que exista sobre o mesmo qualquer espécie de decisão precipitada; queremos manter a vontade de reformar a nossa legislação fiscal,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — … de apresentar soluções que são boas para os contribuintes. Os contribuintes não podem ser vistos, em Portugal, apenas como aqueles que têm de sustentar o défice, apenas como aqueles que sofrem aumentos de impostos. Os direitos dos contribuintes têm de ser cada vez mais respeitados.
A nossa justiça — e pena é que o Sr. Ministro da Justiça não esteja aqui para ouvir isto — tem de se tornar mais moderna e, fundamentalmente, mais célere.
Com esta posição de deixarmos baixar o diploma à Comissão sem votação, na generalidade, evidenciamos que estaremos abertos a propostas que apareçam, em relação a qualquer melhoria do nosso projecto de lei.
De todo o modo, não podemos deixar de salientar que o CDS foi o primeiro partido a apresentar um projecto de lei autónomo de aparecimento de arbitragem fiscal em Portugal. O CDS sabe bem como devem passar-se as relações entre o Estado e os particulares e sabe fundamentalmente como se há-de modernizar a relação entre o contribuinte e a Administração.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se dois Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, deixe-me que lhe diga que, da parte do Grupo Parlamentar do PSD, vemos com enorme simpatia esta iniciativa, sobretudo porque tem o mérito de querer inovar numa área que parece vir a ser, no futuro, fundamental na solução dos litígios fiscais.
Portanto, estamos de acordo com o princípio, estamos de acordo com a ideia e aceitamos muito bem que o CDS-PP tenha apresentado ao Parlamento esta matéria. Porém, há duas questões que eu gostaria de deixar.
Naturalmente, vamos ter tempo para discutir em sede de especialidade essas matérias, mas há duas questões que quero deixar. A primeira delas tem que ver com o facto de o CDS ter restringido este projecto de lei somente à matéria dos contratos. Não vamos pedir que houvesse mais rasgo, até porque tive o cuidado de dizer que aceitávamos com simpatia que tivessem tido esta iniciativa, mas não há dúvida de que parece que poderíamos e deveríamos ir mais longe, inclusivamente pelo facto de não sabermos — embora o CDS o diga na exposição de motivos — qual o impacto que isto tem na efectiva diminuição dos casos de litigância fiscal
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nos tribunais fiscais, que todos sabemos estarem atafulhados com processos.
Parece-nos que levar esta questão só a este aspecto será insuficiente do ponto de vista concreto, do efeito que isso terá nas litigâncias. Esta é a primeira questão que deixo.
A segunda questão é de fundo. Nos exemplos de Direito Comparado que tive ocasião de verificar há, em todos os casos, uma mera arbitragem voluntária, ou seja, o Estado tem o direito de aceitar ou não o compromisso arbitral. Ora, isso parece-nos muito curto. E da leitura deste projecto de lei parece-nos que, neste caso, não há efectivamente uma arbitragem necessária obrigatória, o Estado não fica vinculado obrigatoriamente a este compromisso arbitral. Esta é a dúvida que temos, e penso que em especialidade poderemos tratar dela.
O que seria inovar efectivamente era obrigar o Estado ao compromisso arbitral, e não só neste caso, para que os direitos dos contribuinte sejam salvaguardados e para que diminuam as pendências nos tribunais fiscais.
Estas são as questões que deixo ao Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Diogo Feio, os mecanismos de arbitragem e de mediação de conflitos têm tido uma evolução recente muito positiva. Estou a referir-me — e isso está implícito na proposta do CDS — à questão da introdução dos julgados de paz, aliás resultantes, como sabe, de uma iniciativa desta bancada.
Vamos ver o que se passa nos julgados de paz. Os julgados de paz dirimem conflitos de natureza cível ou administrativa de pequena monta entre particulares, e o árbitro é o Estado, que assume o papel de neutralidade, de imparcialidade e medeia conflitos entre particulares.
O que é que temos na proposta do CDS? Temos, para já, apenas um certo tipo de matérias. Será por acaso que o CDS selecciona os contratos de investimento com benefícios fiscais, que normalmente colocam em litígio interesses entre o Estado e particulares de elevada quantia? O CDS, na sua proposta, não apresenta nenhuma indiciação quanto ao árbitro a nomear. Quem será o árbitro neutro, imparcial e independente que vai mediar interesses e litígios entre o Estado — não é entre particulares — e um particular? Isto causa-nos uma discordância de fundo. O interesse público que está em litígio com o interesse particular em matéria universal, em matéria de tributação, vai poder ser arbitrado por quem? Em quem é que o CDS estará a pensar? Não sei se estará em pensar em gabinetes de advogados altamente especializados para assumirem esta mediação independente. Não sei, mas era importante que isto ficasse clarificado no debate de hoje.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hugo Velosa, começo por agradecer a simpatia manifestada por V. Ex.ª na questão que colocou. De facto, esta é uma solução verdadeiramente inovadora face ao que actualmente temos na resolução de litígios fiscais.
Aproveito para responder já a uma pergunta que é comum também ao Sr. Deputado Honório Novo, apesar de a forma ser distinta. Porque é que este projecto de lei apenas se aplica aos contratos relativos a benefícios fiscais? Por uma questão simples: porque se quis, em relação a esta discussão, correr «risco zero», portanto, porque se quis não correr qualquer risco de hoje estarmos aqui a ter um debate em que se dizia que o CDS está a fazer uma proposta ilegal. Esta, manifestamente, não tem qualquer risco de ilegalidade porque estamos a falar de contratos, de actos onde a vontade é preponderante.
Ao mesmo tempo, na minha intervenção inicial, dei total abertura para que fosse possível «estender» a arbitragem a outras situações, aliás de acordo com o que acontece noutras administrações em que existe uma maior liberdade, como por exemplo no caso da Bélgica, em que existe uma maior liberdade para o contribuinte contactar com a Administração e encontrar, muitas vezes, soluções consensualizadas.
Ora, não é isso que se está aqui a propor, mas é preciso ter em atenção que pela Europa fora isto é possível.
Portanto, não se vive numa situação em que a Administração fiscal está numa espécie de torre de Babel e em que os contribuintes vivem no mundo dos infernos. Não é nada disso que acontece nas administrações europeias.
Quanto à questão específica colocada pelo Sr. Deputado Honório Novo sobre quem vão ser os árbitros, é evidente que há árbitros indicados pelas partes e há árbitros que têm de constar de uma lista — que terá de ser feita ou junto de um centro de arbitragem ou junto até do Ministério da Justiça —, de árbitros que sejam independentes, que sejam o terceiro árbitro, que vai ter aqui um papel essencial e que deve ser composta por técnicos desta área de enormíssima especialidade.
É precisamente isso que se pretende, porque aquilo que se quer é, de facto, encontrar soluções para que a resolução de litígios entre os contribuintes e a Administração seja mais célere e mais eficaz.
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Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, sabemos que falar de arbitragem em matéria fiscal se calhar é menos interessante do que falar de arbitragem noutras áreas de que as pessoas, normalmente, gostam mais, e também os Deputados certamente.
No entanto, volto a repetir o que já referi nas questões que coloquei ao Sr. Deputado Diogo Feio. Trata-se, efectivamente, de um primeiro passo importante, mas não entendi muito bem quando a questão é colocada no sentido de dizer «bom, se é objecto de um contrato, depois pode haver um compromisso arbitral». Ora, naturalmente que a ligação entre contrato, vontade das partes e compromisso arbitral nunca porá nenhum problema de ilegalidade, mas fica, desde já, o desafio à Assembleia da República para que, na especialidade, possa avançar um pouco mais.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Claro!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Porque a hipótese de haver compromisso arbitral obrigatório em matérias que envolvem o Estado, não enquanto o Estado está munido de jus imperii, portanto não um Estado munido de poderes públicos… Parece, pois, que podemos avançar nessa matéria. Assim, ainda bem que o diploma irá baixar à comissão para podermos trabalhar estes assuntos.
Estamos de acordo com os objectivos deste projecto de lei. Recordo que ele já foi aqui discutido, de forma muito rápida, aquando da discussão do Orçamento do Estado de 2007 e lembro-me — isto também é um desafio ao Partido Socialista — de o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, a certa altura, talvez um pouco contrafeito, ter dito que, se calhar, no futuro, a arbitragem seria uma solução para «desatafulhar» os tribunais fiscais dos processos e das pendências durante um tempo excessivo nos tribunais fiscais.
Portanto, aqui fica também esse desafio. Obviamente, não sabemos o que é que o Partido Socialista pensa desta matéria, nem o que pensa o Governo, mas a verdade é que várias vezes foi prometido que os tribunais fiscais iam ser mais céleres, que iam ser tomadas medidas para resolver o problema da falta de celeridade nos tribunais fiscais e que isso ainda não aconteceu.
Os tribunais, o Governo, conseguem uma enorme receita através dos mecanismos próprios, de um melhor funcionamento da Administração fiscal, mas não consegue resolver o problema das pendências nos tribunais fiscais onde, obviamente, há uma enorme receita que o Estado não pode arrecadar porque os processos nunca mais terminam.
Estamos também de acordo com o objectivo deste projecto — segundo aquilo que diz na sua exposição de motivos — relativamente à necessidade de «libertar o direito fiscal dos poderes do Estado».
Concordamos com isso, até porque ultimamente muitas vezes os contribuintes não vêem os seus direitos sempre salvaguardados nas medidas que a maioria tem tomado em relação à fiscalidade.
Portanto, se isso contribuir para uma melhor protecção dos direitos daqueles que pagam os seus impostos é, efectivamente, muito bem-vindo.
Para terminar, quero lembrar que existe um problema para o qual já há pouco chamei a atenção e que tem que ver com o direito comparado. No direito comparado, nos casos de compromissos arbitrais no âmbito da fiscalidade estamos perante os compromissos arbitrais voluntários, isto é, dos acordos que são feitos entre os contribuintes e o Estado, muitas vezes antes ou depois de haver o processo.
É por isso que eu digo que é fundamental que se dê o passo seguinte e que passemos para o compromisso arbitral de natureza obrigatória e de natureza necessária para que, efectivamente, isto deixe de ser uma boa vontade que, no fundo, não atinge os seus objectivos.
Portanto, terminando tal como comecei, ou seja, quando pus as questões ao Deputado Digo Feio, queria dizer que temos aqui uma boa base de trabalho para conseguir um diploma que atinja objectivos com os quais todos nós concordamos, que são os de retirar ao Estado a possibilidade de manter processos anos e anos pendentes sem que se resolvam e de dar aos contribuintes a possibilidade de, através de compromissos arbitrais — é uma maneira moderna —, através dos tribunais arbitrais resolver os seus conflitos fiscais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Gameiro.
O Sr. António Gameiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Digo Feio, cumpre-me, em primeiro lugar, enaltecer a iniciativa do Grupo Parlamentar do CDS-PP, que traz uma matéria ex novo a esta Câmara, uma matéria que no tratamento do direito comparado tem algumas similitudes noutros ordenamentos jurídicos, nomeadamente de natureza fiscal, mas gostaria de dizer-lhe também que essa matéria é bem-vinda e que, com certeza, em sede de especialidade, poderemos analisá-la e trabalhar de forma afincada no sentido de, eventualmente, vir a ser plasmada no nosso regime. É essa a nossa intenção e a nossa abertura para que
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possamos trabalhar.
De qualquer maneira, o Governo tinha dito, aquando da discussão do Orçamento para 2007, que eventualmente apresentaria e esta Câmara uma iniciativa legislativa nesta matéria, nomeadamente na revisão do Código de Procedimento e de Processo Tributário, algo que também, acontecerá.
Portanto, aceitando o princípio desta arbitragem fiscal, não abriremos, contudo, mão de três princípios. O primeiro tem que ver com a possibilidade de esvaziarmos a capacidade de decisão fiscal de natureza impositiva pela Administração. Quem determina a matéria colectável, a colecta e a aquilo que os contribuintes têm de liquidar continua a ser o Estado e não abriremos mão disso, nem por qualquer preço. Porém, abriremos a possibilidade de criar mecanismos que potenciem tratamento igual, mas nunca deixando na mão da Administração a possibilidade de qualquer tratamento desigual entre contribuintes, sobretudo numa matéria que tem aqui um enfoque muito especial, porque VV. Ex.as apresentam um projecto que só trata das empresas, só trata dos contratos de investimento.
O terceiro ponto de que não abriremos mão é a existência de regras muito transparentes sobre esta matéria, nomeadamente sobre a origem, a natureza e a qualidade dos árbitros e, por outro lado, em que condições e com que requisitos é que essa arbitragem será possível.
Sr. Deputado Diogo Feio, todos sabemos que enquanto que no direito privado, no direito contratual, a autonomia da vontade das partes determina o conteúdo do contrato, o direito fiscal de natureza juspublicista está sob orientação de outras regras, que são as do direito público, e no direito público só se pode fazer o que a lei permitir. Portanto, o princípio da legalidade estará sempre, enquanto trave-mestra, presente em qualquer possibilidade de existência de arbitragem.
Nesse sentido, devem estar muito bem clarificados os requisitos e previamente estabelecidas as condições quanto ao acesso a essa arbitragem, às respectivas condições e à qualidade dos árbitros.
Queria dizer ainda que concordamos com três pressupostos desta vossa iniciativa. No que se refere à celeridade na justiça, este Governo soube tratá-la de outra maneira, porque, já neste ano de 2007, tivemos pagamentos voluntários em sede de IRS e de IRC que ultrapassam largas centenas de milhões de euros. Isto, sim, é tratar das finanças públicas com rigor, exigir a todos os contribuintes tratamento igual. E tivemos hoje o anúncio do Sr. Primeiro-Ministro de que cumpriremos este ano, a 31 de Dezembro, não o défice de 3,3%, mas o de 3%. Isto é de enaltecer e sublinhar, porque é trabalho deste Governo.
Gostava de dizer que também queremos a redução dos conflitos e do tempo de tratamento desses conflitos. Por isso mesmo, teremos a possibilidade de invocar inúmeras iniciativas do Governo que têm potenciado uma menor duração do tempo de tratamento dos conflitos, nomeadamente o investimento nas tecnologias de informação na Direcção-Geral dos Impostos (DGCI) e o cruzamento das bases de dados do registo predial e da segurança social com o sistema de informação fiscal.
Por fim, esta iniciativa vem a talho de foice num dia em que foram apresentados, pelo Sr. Primeiro-Ministro, resultados concretos que levam esta matéria ao mais alto sublinhado nesta Câmara e que têm a ver com o facto de estarmos a trabalhar com um ímpeto reformista alargado e não focalizado, como o CDS-PP, mas é bem-vinda a iniciativa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A experiência que o País tem sobre a resolução de conflitos reside, no fundamental, no que resulta dos julgados de paz.
Aqui, medeiam-se conflitos de natureza administrativa e cível, no essencial existentes entre particulares.
Aqui, o Estado constitui-se um elemento neutro, evidentemente imparcial, que, aos olhos de todos e sobretudos dos litigantes, assume o papel de árbitro capaz de dirimir conflitos e encontrar soluções.
Aqui, o Estado desempenha também, sem qualquer demissão ou omissão, o papel que lhe compete na administração da justiça, função do Estado absolutamente inalienável.
O que pretende o projecto do CDS-PP é criar mecanismos de arbitragem a utilizar em certas questões de natureza fiscal e tributária, isto é, em conflitos em que uma das partes é o Estado e a outra parte uma entidade qualquer.
Percebe-se que o objectivo do CDS-PP é, antes de mais, o de circunscrever os conflitos objecto deste tipo de arbitragem a questões «respeitantes a benefícios fiscais ao investimento de natureza contratual», questões às quais o CDS-PP implicitamente reconhece constituírem a maior parte dos processos tributários de valor superior a um milhar de euros.
Mas o CDS-PP só agora clarificou, quanto a nós insuficientemente, aquilo que no seu entender deve ser o árbitro ou a pessoa imparcial a julgar esta mediação. No entender do PCP, e não obstante as regras que o PS afirmou desejar colocar em sede de especialidade, será muito difícil de demonstrar e de clarificar a neutralidade destes árbitros.
Duas outras questões, Sr. Presidente e Srs. Deputados, se levantam ainda, face a este projecto do CDSPP.
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Uma delas tem a ver com a natureza em si mesma do tipo de conflitos que pretende arbitrar.
Em nosso entender, as questões tributárias — mesmo aquelas que decorrem de contratos com o Estado — são regidas por legislação tributária de carácter universal que, no geral, tem (ou deve ter) por base a transparência e a equidade de todos os contribuintes perante a lei.
Não se entende, assim, muito bem como é que matérias desta natureza muito especial poderão ser dirimidas à peça, num sentido ou exactamente no sentido contrário, mesmo que para situações tributárias absolutamente idênticas.
Uma outra questão tem a ver com o desenrolar futuro deste tipo de arbitragem.
Percebe-se a aparente bondade do projecto que afirma pretender aliviar a pressão sobre os tribunais administrativos e fiscais — mesmo que, em nosso entender, o que deveria estar fundamentalmente em causa, nesta matéria, deveria ser a dotação da administração da justiça, dos recursos humanos e dos equipamentos e materiais capazes de lhes permitir dar uma resposta adequada e eficaz. Só que, quanto a nós, este tipo de arbitragem, em que se pretende mediar conflitos com o Estado, isto é, com o interesse público de um lado, pode ter — e terá, certamente — no horizonte a privatização a prazo dos mecanismos de mediação desta litigância. E, quanto a esta matéria, Srs. Deputados do CDS-PP, o PCP considera tratar-se de uma perspectiva e de um caminho pelo qual não queremos ir, um risco que não queremos que o País venha a correr no futuro.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, o CDS-PP apresenta-nos um projecto de lei que pretende introduzir um novo capítulo no Código de Procedimento e de Processo Tributário, para incluir, nesse contexto, o princípio da arbitragem.
O princípio da arbitragem tem sido um grande sucesso no direito português, tem sido desenvolvido através de uma instituição nova, aplicada em Portugal — os julgados de paz —, e tem sido estendido a muitos princípios de intermediação em conflitos entre interesses privados.
A legislação portuguesa, no entanto, como bem sublinhou o Deputado Diogo Feio, tem tido o cuidado extremo de excluir do princípio da arbitragem ou da intermediação tudo o que sejam direitos indisponíveis, ou seja, aqueles que têm que ver com a soberania do Estado.
É certamente discutível se, no caso em que o CDS-PP nos faz esta proposta, se trata de direitos indisponíveis ou não. Admito a relevância do argumento aqui apresentado — trata-se de um contrato —, mas é certo, também, que tudo o que são benefícios fiscais é indisponível, no sentido em que é determinado em geral e não particularizável em relação a um determinado contribuinte.
Dito isto, o aspecto talvez mais importante da envolvente argumentativa do CDS é uma alusão ideológica que, curiosamente, foi recuperada e recapitulada pelo PSD.
Um texto do Sr. Deputado Diogo Feio, que justifica abundantemente este caminho, cita uma das autoridades do Direito Fiscal, em Portugal, o Professor Diogo Leite de Campos, em que este último nos convoca para «libertar o Direito Fiscal do poder do Estado».
O Deputado Hugo Velosa utilizou exactamente a mesma expressão: é preciso agora, num novo movimento de libertação, «libertar o Direito Fiscal do poder do Estado».
É claro que nem a mais extrema das imaginações pode explicar-nos o que seria o Direito Fiscal «libertado do poder do Estado». Sem Estado, o que seria o poder fiscal? Ora, é exactamente essa questão ideológica que estamos a debater aqui: saber se há uma tutela pública do Direito Fiscal; saber se há uma soberania da decisão do Estado, contestável, nos termos legais, por parte dos contribuintes. É isso que aqui é posto em causa.
Na verdade, se virmos bem a fundamentação do que se propõe no projecto de lei do CDS, verifica-se que, exactamente onde o princípio de arbitragem é mais útil — celeridade, redução da litigância —, nenhum desses objectivos é alcançado pelo que é proposto.
«Redução da litigância»?! Na verdade — e é-nos dito no próprio projecto de lei do CDS, e correctamente —
, os tribunais fiscais não têm muitos processos. 60% dos processos, diz-nos o projecto de lei, são de valor superior a 1 milhão de euros. Ou seja, quase todos, aproximadamente dois terços, são de valores elevadíssimos.
Por que é assim? Porque a litigância do pequeno contribuinte não chega aos tribunais.
Aí, sim, compreender-se-ia que teria sentido e importância fazer aceder a uma nova capacidade, a um novo poder, dando ao contribuinte, que não tem força nem recursos para chegar a um tribunal, a capacidade de utilizar, então, este tipo de intermediação. Mas não é disso que se trata. Trata-se de benefícios fiscais, ou investimento, que são contratualizados.
Se o CDS nos fizesse aqui o exercício de dar um único exemplo em que o seu projecto de lei fosse aplicável ou, digamos (para ser ainda mais benévolo), nos apontasse uma categoria de litigância em que o seu projecto de lei fosse aplicável, então, perceberíamos que se trata, talvez, de uma meia dúzia de empresas, uma meia dúzia de casos, uma meia dúzia de contratos, com uma expressão tão reduzida que até podemos perguntar-nos: que sentido tem fazer um projecto de lei que é tão particularista, para responder a interesses
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tão particulares, em vez de, pelo contrário, criar uma nova forma de intermediação de resolução de conflitos e, portanto, de celeridade no processo decisional? Ora, aí, é que importava uma alteração, na dificuldade do acesso aos tribunais, na dificuldade de contestação de decisões arbitrárias. Mas — entendamo-nos bem! — não é isso que o CDS quer.
Afinal de contas, o CDS, fiel à sua palavra, junto com o PSD, só quer — nada mais, nada menos! — «libertar» o Direito Fiscal da existência do Estado.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, só há mais um orador inscrito, que é do partido autor do projecto de lei e que, aliás, dispõe de apenas 1,5 minutos.
Assim, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate foi, de facto, muito interessante.
Foi muito interessante ouvir as bancadas do Partido Comunista Português e, fundamentalmente, do Bloco de Esquerda com uma grande preocupação, a de defender uma determinada ideia de Estado.
Pois que fique muito claro: os senhores defendem o Estado, nós defendemos os contribuintes, a economia e as empresas — é a opção de cada um.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Defendem alguns contribuintes! Só alguns!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Cada um tem a sua opção.
Já agora, enquanto, com os dedos, fazem o sinal de dinheiro, uma pequena informação: em Portugal, já existe e está estabelecida arbitragem no Direito Administrativo. Querem ver maior poder do Estado do que o que tem no domínio do Direito Administrativo? E já tem arbitragem fiscal!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Vejam lá como foi possível terem deixado passar isto?! Com certeza estavam desatentos! Há mais.
O Sr. Deputado Francisco Louçã referiu que 60% dos processos nos tribunais fiscais dizem respeito a questões cujo valor é superior a 1 milhão de euros. Pois devo dizer-lhe que 100% das questões que estão em tribunal demoram mais de cinco anos a ser resolvidas. O que queremos criar é um meio que possa resolver de facto essas questões.
Por isso mesmo, queremos alargar o conceito inicial que aqui apresentámos. Dissemo-lo logo na nossa primeira intervenção e os senhores não quiseram ouvir. É uma opção vossa.
Temos uma ideia muitíssimo clara: hoje, a relação entre a Administração e os contribuintes está muitíssimo desequilibrada. Isso é mau para a nossa economia, é mau para aqueles contratos que são feitos por empresas que empregam centenas e milhares de trabalhadores — também é preciso não esquecer isso. Por isso mesmo, não nos ficamos por aqui.
Ainda hoje vamos apresentar na Mesa da Assembleia três projectos de lei para defender os contribuintes, voltando a fixar prazos de validade para as garantias que são apresentadas pelos contribuintes que não querem pagar porque estão a discutir em tribunal, fixando prazos para que as informações vinculativas sejam dadas pela Administração e mudando um paradigma que é muitíssimo importante.
É que, hoje em dia, quem reclama, vê indeferida a sua reclamação passados seis meses, isto é, a decisão é contra o contribuinte. Nós queremos dar maior prazo à Administração mas, findo esse prazo, a decisão passa a ser a favor do contribuinte.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Conclua, por favor.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP:— Vou terminar, Sr. Presidente.
Sabemos bem aquilo que queremos: queremos um Portugal mais moderno, queremos um Estado que está no seu lugar, queremos contribuintes defendidos e queremos, evidentemente, uma economia a crescer.
Aplausos do CDS-PP.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar ao período regimental de votações.
Antes de mais, vamos proceder à votação do quórum, utilizando o cartão electrónico.
Pausa.
Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 195 presenças, às quais acrescem 6 registadas pela Mesa, o que perfaz um total de 201 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Vamos apreciar o voto de pesar n.º 114/X — De pesar pelo falecimento de Fausto Correia (PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE e Os Verdes).
Tem a palavra a Sr.ª Secretária para proceder à respectiva leitura.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto é o seguinte: Foi com grande consternação e pesar que todos tomámos conhecimento do falecimento de Fausto Correia, no passado dia 9 de Outubro.
Homem de qualidades ímpares, desde muito cedo se destacou pela afirmação dos seus ideais e valores centrados na generosidade humana, na solidariedade e na entrega sem limites à causa pública.
Natural de Coimbra, licenciado em Direito, Fausto Correia foi presidente da Associação Académica de Coimbra — Organismo Autónomo de Futebol, ocupou vários cargos públicos, foi Secretário de Estado da Administração Pública, dos Assuntos Parlamentares, Adjunto de Estado e Adjunto do Sr. Primeiro-Ministro, Deputado à Assembleia da República, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Coimbra, Presidente da Assembleia Municipal de Miranda do Corvo. Tendo sido também Administrador da RDP e da Agência Lusa.
Neste momento, devido ao estado emocionado da Sr.ª Secretária, o voto passou a ser lido pelo Sr.
Secretário Abel Baptista.
O Sr. Secretário (Abel Baptista): — Actualmente, desempenhava os cargos de Deputado ao Parlamento Europeu e Deputado à Assembleia Municipal de Miranda do Corvo.
O rigor que sempre o caracterizou, o forte sentido de justiça social que imprimiu à sua actuação e a proximidade que teve com todos os que com ele conviveram fazem dele uma referência e um exemplo a seguir.
Era reconhecidamente um homem bom.
Também ao serviço da causa pública, quer enquanto governante, quer enquanto titular de cargos públicos electivos, soube a cada momento desempenhar a sua missão com elevado sentido de responsabilidade, qualidade e enorme mérito, granjeando o respeito, a consideração e o reconhecimento de todos os quadrantes políticos e dos cidadãos em geral.
Enquanto cidadão e político, nunca voltou as costas aos desafios e aos sacrifícios que lhe foram pedidos.
Aliando a competência técnica a um invulgar espírito de participação cívica, abraçava as causas que defendia com entusiasmo, empenho e dedicação.
A sua morte constitui uma perda irreparável para a democracia portuguesa.
Fausto Correia era um homem de generosidade ímpar, com um coração generoso e bondoso que lhe permitiu deixar amigos e admiradores por todos os locais por onde passou.
Era um amigo certo, dedicado e grato.
O seu nome e a sua marca política ficam associados a muitos projectos de Coimbra e do País. O lançamento das Lojas do Cidadão foi essencialmente obra da sua perspicácia, da sua determinação e, mais uma vez, da lógica da sua vida — trabalhar para os cidadãos.
Fausto Correia encarnava na perfeição o serviço público, falando com quem quer que o procurasse, no sonho que tinha que era o de ser sempre útil à sua terra: Coimbra e Portugal.
A Assembleia da República presta homenagem à sua memória e apresenta um voto de pesar pelo falecimento de Fausto Correia, endereçando, em nome de todos os grupos parlamentares, os mais sentidos votos de condolência à sua esposa, filhos, família e amigos.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.
Aplausos gerais, de pé.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, em relação ao projecto de lei n.º 402/X, do CDS-PP, que acabámos de discutir, o Grupo Parlamentar do CDS-PP requereu a sua baixa, sem votação, à Comissão de Orçamento e Finanças, por um período de 90 dias.
Não havendo objecções, assim acontecerá.
Vamos agora proceder à votação final global da proposta de lei n.º 150/X — Aprova a lei relativa à
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implementação da Convenção sobre a Proibição do Desenvolvimento, Produção, Armazenagem e Utilização de Armas Químicas e sobre a sua Destruição.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.
Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai dar conta de dois pareceres da Comissão de Ética, que serão votados após a respectiva leitura.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 4.º Juízo Criminal das Varas de Competência Mista e Juízos Criminais de Coimbra, Processo n.º 13/05.6TACBR, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Teresa Portugal (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o segundo parecer é no sentido de autorizar a suspensão temporária requerida pelo Sr. Deputado Francisco Lopes (PCP), ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 5.º do Estatuto dos Deputados, por um período não inferior a 50 dias nem superior a 254 dias, sendo substituído pelo Deputado Eugénio Rosa, a partir de 12 de Outubro, inclusive.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Srs. Deputados, a próxima sessão plenária terá lugar na quarta-feira, dia 17, pelas 15 horas, dela constando: a aprovação dos n.os 101 a 109 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 4 a 20 de Julho passado; um período para declarações políticas; a apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 157/X — Institui o sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na Administração Pública; a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 233/X — Altera o Decreto-Lei n.º 243/2001, de 5 de Setembro (Aprova normas relativas à qualidade da água destinada ao consumo humano), por forma a reforçar a informação sobre a qualidade da água ao público (Os Verdes); e o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 404/X — Suspensão de vigência da Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto (15.ª alteração ao Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de Fevereiro) (PCP).
No final dos nossos trabalhos, aproveito para endereçar, em nome da Mesa, as maiores felicidades aos Srs. Deputados do Grupo Parlamentar do PSD para a realização, no próximo fim-de-semana, do seu Congresso, que naturalmente todos seguiremos pelos meios de comunicação social.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 20 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS):
Alberto Marques Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
António Joaquim Almeida Henriques
Domingos Duarte Lima
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
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José Manuel de Matos Correia
Mário Henrique de Almeida Santos David
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Pedro Augusto Cunha Pinto
Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS):
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Partido Social Democrata (PSD):
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missão parlamentar:
Partido Socialista (PS):
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Partido Social Democrata (PSD):
Fernando Santos Pereira
Srs. Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003, de
11 de Outubro):
Partido Social Democrata (PSD):
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Vasco Manuel Henriques Cunha
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS):
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
Partido Social Democrata (PSD):
José António Freire Antunes
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Miguel Pais Antunes
Zita Maria de Seabra Roseiro
Partido Comunista Português (PCP):
Artur Jorge da Silva Machado
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DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL