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Quinta-feira, 3 de Abril de 2008 I Série — Número 66

X LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2007-2008)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 2 DE ABRIL DE 2008

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de resolução n.os 72 a 75/X, do projecto de lei n.º 489/X, das apreciações parlamentares n.os 71 e 72/X e dos projectos de resolução n.os 299 a 301/X.
Em declaração política, o Sr. Deputado António Carlos Monteiro (CDS-PP) insurgiu-se contra a insistência do Governo pela proposta de nova travessia do Tejo Chelas/Barreiro e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Jorge Costa (PSD), Bruno Dias (PCP), Helena Pinto (BE) e Miguel Coelho (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Mendes Bota (PSD) denunciou falta de pluralismo político na informação da RTP, tendo respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Pedro Mota Soares (CDS-PP), Bruno Dias (PCP), Alberto Arons de Carvalho (PS) e Luís Fazenda (BE).
A Câmara debateu o Relatório sobre o Combate à Fraude e à Evasão Fiscais em Portugal, apresentado pelo Governo, nos termos do n.º 1 do artigo 95.º da Lei n.º 67-A, de 31 de Dezembro, tendo-se pronunciado, a diverso título, além do Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos), os Srs. Deputados Patinha Antão (PSD), Honório Novo (PCP), Francisco Louçã (BE), Hugo Nunes (PS), Diogo Feio (CDS-PP), Ofélia Moleiro e Duarte Pacheco (PSD) e Victor Baptista (PS).
Foi apreciada a petição n.º 360/X (2.ª) — Apresentada por Sónia Guadalupe dos Santos Ribeiro Neves de Abreu e outros, solicitando que o assunto objecto da petição seja apreciado na Assembleia da República, com vista à valorização da profissão, para que seja criada a Ordem dos Assistentes Sociais, tendo-se pronunciado os Srs. Deputados Isabel Santos (PS), Pedro Quartin Graça (PSD), Mariana Aiveca (BE), Luísa Mesquita (N insc.), Pedro Mota Soares (CDS-PP) e Jorge Machado (PCP).
Foi ainda apreciada a petição n.º 389/X (2.ª) — Apresentada pela Comissão de Trabalhadores da Companhia Nacional de Bailado, solicitando à Assembleia da República que seja reconhecida a especificidade da profissão de bailarino de dança clássica da Companhia Nacional de Bailado, a condição de desgaste rápido e o direito a aposentação no final das suas carreiras, assim como efectivas soluções de reconversão, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Ana Zita Gomes (PSD), Teresa Caeiro (CDS-PP), Mariana Aiveca (BE), Luísa Mesquita (N insc.), Miguel Laranjeiro (PS), João Oliveira (PCP) e José Miguel Gonçalves (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 45 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva

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Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Eugénia Simões Santana Alho
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Marta Sofia Caetano Lopes Rebelo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio André Brandão de Almeida Teixeira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Zita Barbas Marvão Alves Gomes
António Alfredo Delgado da Silva Preto

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António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Paulo Martins Pereira Coelho
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Mendes Bota
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Olímpia do Nascimento Castro Candeias
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio

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José Helder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Miguel Pacheco Gonçalves

Deputado não inscrito em grupo parlamentar:
Maria Luísa Raimundo Mesquita

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai anunciar o expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de resolução, n.os 72/X — Aprova o Acordo de Estabilidade e de Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados-membros, por um lado, e a República da Albânia, por outro, assinado no Luxemburgo, a 12 de Junho de 2006, 73/X — Aprova o Acordo de Estabilidade e de Associação entre as Comunidades Europeias e os seus Estados-membros, por um lado, e a República do Montenegro, por outro, assinado no Luxemburgo, a 15 de Outubro de 2007, e 74/X — Aprova as Emendas aos Estatutos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), resultantes da adopção da Resolução sobre o Estabelecimento da Assembleia Parlamentar da CPLP na XII Reunião Ordinária do Conselho de Ministros da CPLP, realizada em Lisboa, a 2 de Novembro de 2007, que baixaram à 2.ª Comissão, e 75/X — Aprova a Decisão do Conselho, de 7 de Junho de 2007, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias (Decisão 2007/436/CE, EURATOM), que baixou às 4.ª e 5.ª Comissões; projecto de lei n.º 489/X — Transfere para os municípios a definição dos horários de abertura dos estabelecimentos de venda ao público e de prestação de serviços (PSD), que baixou à 7.ª Comissão; apreciações parlamentares n.os 71/X (PSD) — Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de Março, que aprova o regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos e 72/X (CDS-PP) — Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, que, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º

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26/2007, de 23 de Julho, aprova o Regulamento das Custas Processuais, procedendo à revogação do Código das Custas Judiciais e a alterações ao Código de Processo Civil, ao Código de Processo Penal, ao Código de Procedimento e de Processo Tributário, ao Código do Registo Comercial, ao Código do Registo Civil, ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 28 de Agosto, à Lei n.º 115/99, de 3 de Agosto, e aos Decretos-Leis n.os 75/2000, de 9 de Maio, 35 781, de 5 de Agosto de 1946, e 108/2006, de 8 de Junho; projectos de resolução n.os 299/X — Sobre a instituição de um levantamento periódico dos índices de literacia dos alunos portugueses (CDSPP), 300/X — Recomenda ao Governo que proceda a um estudo com o objectivo de certificar a necessidade da criação da Ordem Profissional das Tecnologias da Saúde (CDS-PP) e 301/X — Recomenda ao Governo adoptar medidas que visem a dinamização económica e social na Região do Vale do Ave e Vale do Cávado (PSD).

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, a ordem de trabalhos da nossa reunião de hoje tem um período reservado a declarações políticas.
A primeira, do Grupo Parlamentar do CDS-PP, será proferida pelo Sr. Deputado António Carlos Monteiro.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste momento, encontram-se em estudo as diferentes alternativas para a escolha da nova travessia do Tejo e aproxima-se a altura em que o Governo irá tomar uma decisão — há quem diga que será muito brevemente, talvez até já amanhã. Entre essas hipóteses está a ligação Chelas-Barreiro.
Como é sabido, esta hipótese foi estudada quando o novo aeroporto estava previsto para a Ota e, apesar de, entretanto, a localização ter mudado para Alcochete, quer o Governo quer a RAVE continuam a tornar pública a sua preferência por esta opção e a insistir nela.
Inicialmente, esta ponte seria apenas uma ligação ferroviária. O Governo, posteriormente, optou por acrescentar uma componente rodoviária, o que, obviamente, terá forte repercussão no custo da obra e impacto no tráfego na cidade de Lisboa.
É também importante chamar a atenção para que, perante as notícias que têm sido publicadas, há custos financeiros que ainda não estão devidamente quantificados. Desde logo, os custos que têm a ver com a actividade do Porto de Lisboa.
O Porto de Lisboa é fundamental para a actividade económica da cidade, da região e do País, e esta ponte irá afectar canais de manobra e a navegação, o próprio terminal de cruzeiros, estimando-se que, pelo menos, estarão em causa cerca de 300 milhões de euros em obras, custos estes que não estarão quantificados.
Por outro lado, há materiais contaminados no leito do rio, o qual terá de ser objecto de dragagem para que sejam retirados, o que implica um custo que também não estará quantificado.
Por outro lado ainda, no passado sábado, tivemos a divulgação pública de projecções do que poderá vir a ser a nova ponte Chelas-Barreiro, o que veio introduzir um novo dado fortemente polémico e iniludível em termos da decisão final. Trata-se do impacto visual, paisagístico, ambiental em geral, que a referida ponte terá no horizonte de Lisboa, na relação da cidade com o Tejo e na violenta deformação da mesma.
Ouvimos dizer constantemente que é necessário devolver o rio à cidade. Ainda há pouco tempo, tivemos uma proposta do Governo para alterar a jurisdição nesta matéria, entregando-a à Câmara de Lisboa. Ora, facto é que esta ponte irá cortar a paisagem.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — No projecto que está em estudo no LNEC, o vão previsto é de 450 m. A verdade é que, para ser possível a navegação no rio, estima-se que esse vão terá de ser de 900 m.
Acresce que, se se confirmar o desenho, que foi publicado em órgãos da comunicação social no passado sábado, ou um desenho semelhante, então, a vista a partir quer do Castelo de S. Jorge, quer das Amoreiras, do Príncipe Real, do Cais do Sodré, do Parque Eduardo VII, do Terreiro do Paço, de S. Vicente de Fora ou de S.
ta Apolónia, ficará afectada devido a torres com mais de 200 m de altura. Estamos a falar da vista sobre

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monumentos e é incompreensível o silêncio das bancadas à esquerda quanto a este impacto visual na paisagem. Até agora, ninguém negou que o impacto seja o que descrevo.
O elevadíssimo impacto visual desta ponte que, de forma grave e irreversível, irá descaracterizar a cidade e esta região é menorizado e continuamos a estar perante uma obra do Governo que acaba por não ser discutida.
A este propósito, recordo que, no passado recente, tivemos aqui longos debates sobre o chamado «túnel do Marquês». O Partido Socialista e o Bloco de Esquerda fizeram uma guerra contra a construção do túnel, disseram que seria terrível o impacto do tráfego, que o ambiente seria prejudicado, que afectaria zonas húmidas, que o túnel seria uma catástrofe. Na verdade, aquele túnel tanto fazia sentido que funciona e está bem.

Aplausos do CDS-PP.

Agora, o que verificamos é o silêncio comprometido do Bloco de Esquerda, que vive em «união de facto» com o Partido Socialista na Câmara de Lisboa,…

Protestos do PS.

Risos do BE.

… tentando menorizar o que é um acto grave contra a paisagem. Agora, «o silêncio é de ouro». Afinal, os grandes defensores das causas públicas, do ambiente, dizem que o melhor é ter «calminha», que é preciso calma, que não nos enervemos.
A verdade é que, até agora, ninguém negou que a nova ponte venha a ter o impacto que foi denunciado na comunicação social.

Aplausos do CDS-PP.

Portanto, o que se vê é que a atracção pelo poder acaba por calar quem dantes não se calava e era a voz incómoda.
Por isso mesmo, perguntamos também ao Partido Socialista se, afinal, há obras que trazem trânsito radial para Lisboa e são boas e obras que são más — as obras do PS, afinal, são boas, as do PSD e do CDS, afinal, são más!

Aplausos do CDS-PP.

A verdade, Sr. Deputado Miguel Coelho, é que esta obra traz trânsito para a cidade, é uma obra com carácter radial, o que, evidentemente, é matéria que deve ser objecto de um debate sério e alargado. É que continuamos a ter um Governo que anuncia obras, quer fazer obras, mas, depois, verificamos que essas obras mais não são do que formas de provocar conflitos e de encontrar apoio com promessas demagógicas.
Temos de proteger a paisagem, um bem que pertence a todos. Mas verificamos que o Governo do República continua sem proceder à classificação de paisagens, apesar de, em 2005, na Convenção Europeia da Paisagem, ter assumido o compromisso de o fazer. Estranhamos que a paisagem de Lisboa não esteja classificada. Deveria ter-se avançado nesse sentido.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Pela nossa parte, temos pena é que haja um silêncio comprometido sobre esta matéria e que não se proceda a uma discussão séria sobre os impactos que esta obra irá ter.

Aplausos do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: — Esta declaração política suscitou quatro pedidos de esclarecimento, o primeiro dos quais do Sr. Deputado Jorge Costa.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Carlos Monteiro, a questão que traz aqui, hoje, é de facto importante e está na ordem do dia até porque aguarda-se para breve o relatório do LNEC sobre a terceira travessia do Tejo — e digo «para breve», uma vez que, como é sabido, já foi ultrapassado o prazo de 45 dias para entrega do relatório.
Relativamente a esta questão e logo que foi anunciada a pré-decisão de localização do novo aeroporto, o PSD fez dois desafios ao Governo: um, para que se fizesse um estudo comparado das soluções quanto à terceira travessia do Tejo, e outro, para que se fizesse um estudo sobre as soluções para o TGV.
O Governo «fez orelhas moucas» a uma parte desse nosso desafio mas, num daqueles seus ziguezagues muito conhecidos, veio dizer que, afinal, a ponte poderia já não ser Chelas-Barreiro mas, sim, Beato-Montijo ou outra localização que, entretanto, pudesse ser apresentada, e lá mandou o LNEC fazer um estudo.
Estamos para saber se o que o LNEC está a fazer é, de facto, um estudo sobre as soluções do ponto de vista comparado ou se é um estudo para confirmar uma decisão antecipada do Governo. Parece é que o Governo se esqueceu de incluir neste estudo a questão da entrada em Lisboa do TGV.
Assim, em nossa opinião, ao não considerar a questão da entrada em Lisboa do TGV, o Governo deixou de fora uma questão muito importante relativamente às acessibilidades, porque, em termos da localização da ponte, não é indiferente que o TGV chegue a Lisboa via margem direita ou a margem esquerda do rio Tejo.
Pensávamos que, com a questão da localização do aeroporto, o Governo tivesse aprendido a lição relativamente a factos consumados e a decisões que aparentemente são indestrutíveis, mas verificou-se que assim não foi, pelos vistos, não aprendeu.
Pior ainda, não conhecemos os critérios do LNEC — nem os ambientais, nem os de inserção das margens, nem os paisagísticos, nem os económicos — para o desenvolvimento deste estudo, ao contrário do que aconteceu com o aeroporto, em que o LNEC e o Governo vieram ao Parlamento dar a conhecer critérios e a identificação dos consultores.
Por isso, deixo-lhe as seguintes perguntas:…

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado. Já esgotou os 2 minutos de que dispunha.

O Sr. Jorge Costa (PSD): — … não considera que a questão da entrada do TGV também deveria ser considerada? Não considera que, a bem da transparência e do rigor, o País deveria conhecer os critérios de análise desta terceira travessia do rio Tejo?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Costa, concordo consigo em que é fundamental que este seja um processo transparente. A entrada do TGV em Lisboa é importante — é importante saber se a mesma vai fazer-se pela margem direita ou pela margem esquerda — e é fundamental fazer-se uma avaliação dos diferentes critérios que estão a ser utilizados pelo LNEC para comparar estas diferentes obras. E, quanto a este último aspecto, há um critério que, para nós, é fundamental, que é o critério ambiental, assim como é fundamental o impacto que esta obra vai ter na cidade de Lisboa, na sua qualidade de vida e naquilo que é o afluxo de tráfego que a proposta do corredor Chelas-Barreiro irá trazer ao centro da cidade.
A verdade é que estamos naquela fase do «bem prega Frei Tomás…». Ou seja, diz-se que o transporte colectivo é muito importante, ouvimos toda a esquerda neste Hemiciclo dizer que é fundamental reabilitar as infra-estruturas ferroviárias, que a ferrovia é fundamental, que todas estas questões são determinantes para a

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qualidade de vida e para o ambiente, mas, depois, faz-se uma ponte que já não é só ferroviária mas também rodoviária, trazendo automóveis para o centro da cidade de Lisboa.
Mais grave ainda é o que, até agora, estava oculto dos olhos de todos: o impacto que esta obra vai ter do ponto de vista visual e da paisagem.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Estamos a falar de uma obra que vai descaracterizar a cidade de Lisboa, a vista da cidade de Lisboa.
Portanto, para além de todas as questões que têm a ver com a gestão de tráfego, com os transportes colectivos, com o próprio TGV e com o ambiente em geral,…

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — … é necessário termos também aqui um debate sério sobre essa matéria, com critérios transparentes, que, até ao momento, não houve. Pelo contrário, assistimos, mais uma vez, à tentativa de impor uma solução de facto consumado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Carlos Monteiro, estamos, nesta matéria da terceira travessia do Tejo, perante um projecto de carácter estratégico, estruturante, quer para o País quer, sobretudo, para a Área Metropolitana de Lisboa. De facto, estamos perante questões determinantes não só ao nível das ligações internacionais ferroviárias de alta velocidade, segundo foi anunciado pelo Governo, mas também a nível metropolitano, da ferrovia convencional, na ligação ao sul do País, etc., e também na ligação rodoviária que é necessário reforçar e qualificar nesta área metropolitana, como a experiência demonstra.
E estamos perante uma infra-estrutura decisiva para o sistema de transportes, acessibilidades e mobilidade, que serve para as populações se deslocarem diariamente, e não apenas perante uma ponte que possa ser pensada como uma forma de chegar mais depressa ao aeroporto. Esta é uma questão relativamente à qual têm sido cometidos erros crassos de avaliação por parte de muitos intervenientes nestes debates.
Ora, com a intervenção proferida pelo Sr. Deputado, confirmámos que, na opinião do CDS, Portugal é Lisboa e o resto é paisagem e que a melhor ponte é a que não se vê de Lisboa. Aliás, uma paisagem na qual acaba por desaparecer misteriosamente a questão de fundo do carácter público que este projecto, esta infraestrutura tem de assumir, de forma inadiável e muito clara.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Temos um projecto em que, se olharmos para a experiência do que se passou com a travessia ferroviária da Ponte 25 de Abril, a própria CP foi impedida de concorrer. Temos um projecto em que, se olharmos para a travessia rodoviária da Ponte Vasco da Gama, o Estado já pagou várias vezes a quantia que seria necessária para construir aquela ponte. E estamos perante um projecto em que, pelos vistos, para o CDS, para a direita e para outros agentes do debate em Portugal, se pretende esconder da vista a Lusoponte.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas esta é uma questão de fundo — e com isto termino, Sr. Presidente —, porque o Estado português tem de recorrer a todos os instrumentos, jurídicos e negociais, que estiverem ao seu alcance para garantir, por um lado, o carácter público desta infra-estrutura e da sua construção e

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exploração e, por outro e acima de tudo, uma opção tecnicamente válida que sirva as populações, e essa não é no sentido daquilo que o Sr. Deputado aqui nos trouxe.
Portanto, estamos preocupados com as decisões que vão ser tomadas, principalmente ao nível da condução pública deste projecto, coisa que, pelos vistos, para o CDS, não é de todo um problema.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, realmente, para o PCP, só «sol na eira e chuva no nabal».

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Neste caso, é no sapal!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — É que, quando o PCP vem aqui, à Assembleia da República, defender os transportes colectivos, nomeadamente o transporte ferroviário, considerando-os fundamentais,…

Vozes do CDS-PP: — E bem!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — … só o faz para aquilo que interessa. Pois se, imediatamente a seguir, se quiser fazer um debate sério sobre essa mesma matéria (e nós apelamos a que se faça), o PCP, se isso mexer com as suas clientelas eleitorais, deixa de considerá-la uma matéria importante.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Tenha vergonha!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O problema é que o CDS, em Lisboa, tem pouca clientela eleitoral!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Portanto, a questão é esta: a obra da nova travessia do Tejo é fundamental para o País, para a Área Metropolitana de Lisboa e também para Lisboa.
E, como é evidente, para nós, um debate sério é um debate que não tem apenas em conta os interesses de algumas populações locais. A propósito, como o Sr. Deputado acha que, na minha opinião, Portugal é só Lisboa e o resto é paisagem (mas olhe que está enganado!),…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O senhor é que falou em paisagem!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — … digo-lhe que, se calhar, o senhor só pensa no «resto», provavelmente no outro tipo de clientela eleitoral que tem na outra margem, e por isso é que faz o discurso que faz.
Na verdade, esta obra, sendo uma obra nacional que implica vultuosos investimentos,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Que devem ser públicos!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — … deve ser pensada de forma a que estes impactos sejam minorados. E quando temos uma obra que afecta a própria natureza da navegabilidade do Tejo e que, por isso mesmo, terá de ficar a uma quota elevada com um vão enorme para poder haver manobras nos canais de navegação do Tejo, o Sr. Deputado não me diga que, não estando esta matéria a ser estudada no LNEC (o projecto que está no LNEC não é este, não prevê isto, porque não tem as alterações exigidas pela Administração do Porto de Lisboa), este processo está a correr bem.
Nós admitimos debater todas as soluções; queremos é debatê-las de forma transparente.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não se nota!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Ora, aquele impacto visual que veio publicado num jornal no passado fim-de-semana chocou-nos e, até hoje, aliás, não foi negado.
E se quer saber do que estamos a falar, posso mostrar-lhe: é disto!

Neste momento, o Sr. Deputado António Carlos Monteiro exibiu uma fotografia da nova travessia do Tejo.

Estamos a falar de 200 m de altura! E se estamos a falar disto, é importante que o debate seja sério e que todos participem nele.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Carlos Monteiro, o senhor trouxe hoje aqui, de facto, uma intervenção sobre uma das grandes obras públicas para os próximos anos.
Em primeiro lugar, gostaria de o descansar sobre a posição desta bancada — aliás, várias vezes referida na sua intervenção (até parecia que estava a dirigir-se exclusivamente ao Bloco de Esquerda) —, dizendo que ponderaremos todos os aspectos e todas as consequências ambientais e outras, relativamente às várias opções para a terceira travessia do Tejo. Certamente, aguardamos com expectativa o relatório do LNEC e iremos ponderar e ter em consideração todas as questões.
Mas, Sr. Deputado António Carlos Monteiro, devo dizer-lhe que o que esta bancada não fará, de modo algum, é «embarcar», à primeira, numa fotomontagem que é publicada num jornal — para isso, não conte connosco.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Depois, Sr. Deputado, gostaria de colocar-lhe uma questão que tem a ver com o seguinte: a polémica sobre a travessia Chelas-Barreiro, como o Sr. Deputado sabe, não surgiu agora, tem mais de uma década. E discutir as obras públicas parcialmente, só em relação a alguns dos seus impactos, também não nos parece o caminho correcto a seguir, quando se trata de investimentos tão avultados, com implicações mesmo para o Estado e para todos os contribuintes. Daí a questão bem concreta que quero colocar-lhe. O Sr. Deputado conhece, com certeza, a história da Lusoponte, pelo que sabe que a mesma recebeu, só em subsídios do Estado, 550 milhões de euros.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Coisa pouca!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sabe que o prazo de concessão da Lusoponte foi prolongado até ao ano de 2030.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Concluirei, Sr. Presidente.
Sabe ainda que a Lusoponte ficou com a exclusividade das travessias do Tejo a sul de Vila Franca de Xira.
Com certeza que tudo isso está na mente dos Deputados do CDS! Sabe também que nos recusamos a aceitar que o concessionário da obra seja obrigatoriamente o concessionário da concessão de exploração — e isso é, para nós, é uma questão de princípio.
Agora, Sr. Deputado, a questão que lhe deixo é muito concreta e é esta: o que é que o CDS defende relativamente à situação que temos com a Ponte Vasco da Gama e com a Lusoponte? Defende o resgate do contrato de concessão com a Lusoponte ou, simplesmente, uma negociação que continue a dar milhões de euros a um grupo privado, como aconteceu com o caso da «cereja em cima do bolo» (chamemos-lhe mesmo

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assim) da Ponte 25 de Abril, onde a Lusoponte não gasta um tostão — o Estado paga a manutenção —, mas fica com os lucros todos? O que é que o CDS defende, Sr. Deputado?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Pinto, a verdade é que a notícia e as fotografias, publicadas no passado fim-de-semana, até agora, não foram negadas.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Quem é que tirou essas fotografias?!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — E se não o foram é certamente porque este impacto vai ser violento.
Em relação à matéria dos impactos desta ponte, percebemos que só de vez em quando é que interessam, porque, quando chamamos a atenção para este problema, o que verificamos é o silêncio comprometido. E comprometido porque o tal «Zé que fazia falta», o tal «Zé da Al Jazeera que tanta falta fazia», afinal, desapareceu.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Isso é cassete! Anda à procura do Telmo?!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — E a única resposta que têm para esta questão, tendo responsabilidades directas nesta matéria, acaba por ser dizer que ficarão muito calmos à espera que o Governo do Partido Socialista imponha uma qualquer solução.
Sr.ª Deputada, é essa a resposta do Bloco de Esquerda e da bancada do Bloco de Esquerda? Que ficarão calmamente à espera da decisão do Partido Socialista e do Governo do Partido Socialista? É que calmo, calmo, tão calmo, Sr.ª Deputada, não nos lembramos de nada que seja assim tão parado e tão calmo!…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — «Quem os viu e quem os vê!…» — é o que apetece dizer acerca do Bloco de Esquerda. É que, quando as obras eram outras e quando se queria capitalizar esses mesmos votos, eram protestos aqui, na Assembleia, na rua, em todo o lado, e todos nós tivemos de pagar o custo que essa obra acabou por ter para o erário público, por ter sido atrasada pelo Bloco de Esquerda.
A verdade é que esta é também uma obra que irá trazer tráfego para o coração de Lisboa.
Sr.ª Deputada, o que vejo é um silêncio comprometido. Pois a verdade é esta: já percebemos que o Bloco de Esquerda, quando sente o «cheiro» do poder, não é diferente dos outros partidos, já percebemos!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E sobre a Lusoponte, nada?!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Esta união de facto que o Bloco de Esquerda tem com o Partido Socialista na Câmara Municipal de Lisboa…

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Até parece como no Casino!…

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — … compromete não apenas a Câmara mas também aqui o Bloco de Esquerda, em relação a esta matéria.
Lamentamos que assim seja, porque a única coisa que pedimos foi um debate sério sobre esta matéria, com dados claros. Constatamos, porém, que os senhores preferem continuar a viver na opacidade, à espera da decisão do Partido Socialista. Lamentamos que assim seja.

Aplausos do CDS-PP.

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A Sr.ª Helena Pinto (BE): — O silêncio é sobre a Lusoponte! É sobre isso que há silêncio!

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.

O Sr. Miguel Coelho (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Carlos Monteiro, foi divertido e, simultaneamente, até enternecedor verificar como o CDS-PP se ofereceu ao PSD para uma próxima coligação em Lisboa.

Protestos do CDS-PP.

VV. Ex.as já não têm a Dr.ª Nogueira Pinto para dar um número mínimo de votos,…

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Está baralhado!

O Sr. Miguel Coelho (PS): — … sabem desesperadamente que não podem concorrer sozinhos e por isso «V. Ex.ª passa e o Dr. Jorge Costa tenta rematar». Mas fê-lo mal, Sr. Deputado.
Em primeiro lugar, todos percebemos que a estratégia dos senhores é a de adiar e complicar tudo o que seja obras públicas. Obras públicas só para depois de 2009, agora não!

O Sr. Jorge Costa (PSD): — Jamais!

O Sr. Miguel Coelho (PS): — Complicar, complicar, complicar! Portanto, esta é a primeira lição que se tira da sua intervenção, porque os senhores pouco quiseram saber de Lisboa, pouca intervenção tiveram ao longo destes anos, mas agora estão extraordinariamente preocupados com situações que ainda não se colocam, nem se vão colocar, seguramente.
Há uma outra questão que também é essencial que esclareçamos desde já. Quando VV. Ex.as contestaram — e tinham todo o direito de o fazer — a opção tomada anteriormente pelo Governo em relação ao novo aeroporto de Lisboa, aceitaram como boa e louvaram, tal como eu, a competência técnica do LNEC para assim decidir,…

Vozes do PS: — Claro!

O Sr. Miguel Coelho (PS): — … mas agora — «cautela e caldos de galinha não fazem mal a ninguém…» — estão aqui a tentar pressionar e, desde já, a lançar um anátema sobre o LNEC para a eventualidade de a decisão não ser aquela que vos possa convir no momento eleitoral.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Coelho (PS): — Não sei qual vai ser a decisão do LNEC, mas de uma coisa tenho a certeza: o Partido Socialista e o Governo respeitá-la-ão,…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Miguel Coelho (PS): — … porque o LNEC é uma entidade que não deve ser posta em causa, é uma entidade pública de credibilidade internacional,…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Miguel Coelho (PS): — … que VV. Ex.as querem agora pôr em causa, despudoradamente! São vocês e a Lusoponte.
Para que fique registado, devemos tomar nota desta vossa posição.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Coelho, penso que está algo baralhado com as explicações: é que quem tem esse tipo de «casamento» é o Partido Socialista com o Bloco de Esquerda.

Vozes do PS: — Não tem, não!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — E, Sr. Deputado, não me venha dizer que está de acordo com a opacidade e a falta de transparência ou, até, com a lógica do facto consumado, porque, então, o Sr. Deputado está a negar tudo o que disse no passado em relação ao túnel do Marquês! Obras atrasadas, obras com prejuízos para o erário público foram aquelas que avançaram e que os senhores conseguiram travar, juntamente com o Bloco de Esquerda. Acabou por ser feito um esforço que dificultou, efectivamente, que se fizessem obras.
Sr. Deputado Miguel Coelho, o que queremos fazer é discutir uma obra antes de ela começar e não interromper a obra quando ela já começou. E queremos debatê-la e discuti-la de forma transparente.
Ora, a informação que temos (e esta notícia não foi negada) é a de que o projecto que está a ser avaliado no LNEC não tem um vão de 900 m, tal como o Porto de Lisboa pede para que os navios possam manobrar, mas de 450 m. E estamos a discutir, Sr. Deputado, que as obras no Porto de Lisboa vão custar 300 milhões de euros, pelo menos, aspecto que também não está contabilizado no projecto que está no LNEC.
Porque é que colocamos esta questão? Porque entendemos que é fundamental que se siga aqui um processo transparente e que exista um debate sério. Aliás, nós escrevemos uma carta ao Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, apelando para que seja feito um debate sério!

O Sr. Miguel Coelho (PS): — Agora já é tudo opaco! Só é transparente quando é a vosso favor!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Contudo, quando nos chegam informações de que não tivemos conhecimento e quando sabemos que o próprio LNEC não dispõe de informações que deveria conhecer para fazer essa avaliação,…

O Sr. Mota Andrade (PS): — Essa agora! Como é que sabe?!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — … é evidente que teremos de colocar estas perguntas. O que pretendemos, repito, é um debate sério sobre esta questão.
Gostamos de ver que, afinal, o Sr. Deputado tem vontade de fazer obras, porque dantes o senhor estava junto do grande bloqueador das obras! Agora, de repente, quer fazer obras, quer fazê-las a todo o custo e numa lógica de facto consumado.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E sobre a Lusoponte, nada!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Todos sabemos que a paisagem de Lisboa é fundamental para a actividade económica da cidade, porque faz parte do seu postal turístico, mas o Sr. Deputado não se lembra disso. E não se lembra porque o que quer fazer é lançar uma obra, a toda a pressa, para a apresentar como facto consumado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E sobre a Lusoponte, nada!

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O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: «Os princípios constitucionais de independência e pluralismo dos órgãos de comunicação social públicos proíbem que eles funcionem como serviço de publicidade oficial, como estrutura de public relations do Governo (ou de qualquer outra autoridade pública), não podendo eles pautar a sua orientação por um sentido de preferência para com a propaganda governamental». Assim escrevem os insuspeitos Gomes Canotilho e Vital Moreira — in Constituição da República Portuguesa Anotada, página 589.
Ao arrepio destes princípios, a RTP beneficia sistematicamente o Governo, em detrimento dos partidos da oposição, ignorando os princípios da isenção e do pluralismo político.
Existe uma sub-representação do Partido Social Democrata em todos os blocos informativos do operador público de televisão. Há muito tempo que o PSD vem denunciando esta situação inaceitável e discriminatória.
Só que, desta vez, foi a própria Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) que produziu esta grave afirmação, no relatório sobre o pluralismo político-partidário na RTP, entregue na Assembleia da República.
Tomando como base os valores de referência, correlacionados com a representatividade eleitoral de cada força partidária, o Governo e o PS conseguem mais de 56% do espaço informativo da televisão pública, contra menos de 18% dedicados ao PSD — é o triplo! A situação dispara para valores absolutamente escandalosos nas regiões autónomas, em termos de noticiário nacional. O Governo e o PS beneficiam de 77% na RTP-Madeira e de 60% na RTP-Açores.
Ao nível da informação regional, as situações seguem critérios diferentes. A RTP-Madeira concede ao Governo e ao PSD regionais, rigorosamente, o tempo de referência previsto, enquanto nos Açores, onde este ano se disputarão eleições regionais, o tempo concedido ao Governo e ao PS regionais é de 69%. Perante esta discrepância de tratamento, é legítimo perguntar se iremos estar perante um acto eleitoral disputado de forma justa.
A avaliação quantitativa do respeito pelo pluralismo político é obviamente insuficiente, nem pode ser medido em número de peças televisivas, e o relatório expressa essa mesma preocupação. E aqui a distorção e a desigualdade não é grande, é gigantesca! Só que esta avaliação qualitativa, à luz de outros parâmetros, como o formato e a audiência das emissões, não pode esquecer que nos programas de entretenimento e nos canais internacionais do serviço público a situação é ainda mais desequilibrada e estas realidades não foram escrutinadas pela ERC.
A verdade é que não existe sanção possível para a RTP. O contrato de concessão de serviço público de televisão está caduco. Por isso, no contexto da negociação de novo contrato em curso, devem ser introduzidos mecanismos sancionatórios para o incumprimento das obrigações contratuais de serviço público.
Numa atitude desculpabilizante, quase a título de compensação indevida, há quem tenha assinalado o quase total apagamento do Partido Socialista dos telejornais. Problema seu, que a nós não diz respeito. Seja o PS de socialista ou o PS de socrático, o tempo televisivo do Governo e da maioria governamental que o apoia não podem ser dissociados em matéria de contas do pluralismo político na televisão.
Outra justificação absurda é a que relaciona a presidência da União Europeia com este tratamento discriminatório. O próprio relatório da ERC elenca nove outros temas liderantes da agenda política e mediática no período em análise, incluindo umas disputadíssimas eleições internas no PSD e o congresso que se lhe seguiu.
O respeito pelo pluralismo e isenção na informação é um dever de todos os canais televisivos,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … mas o serviço público de televisão traz à RTP uma responsabilidade maior, e a sua administração terá que ser chamada a assumir as suas responsabilidades.
Aqui fica registado o nosso firme protesto nesta questão, sobre o qual apelaremos ao Provedor de Justiça e ao Presidente da República para exercerem o seu magistério e a quem enviaremos, também, o relatório da ERC que foi entregue na Assembleia da República.

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A televisão pública em Portugal constitui, hoje, parte importante do mecanismo da propaganda do Estado, colocado em marcha pelo actual Governo. É inconstitucional, é ilegal, é imoral! O abuso da propaganda tem sido um apanágio dos regimes autoritários. A palavra «propaganda», aqui utilizada com um sentido político pejorativo, deveria ser uma palavra tabu num contexto político pluralista.
Todavia, aquilo que hoje se passa no canal público de televisão, pago com o dinheiro dos contribuintes portugueses, é uma deriva perigosa do pluralismo político, que deveria ser a regra e o exemplo num regime democrático, como deveria ser o nosso na sua totalidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se três Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Mendes Bota, antes de mais, felicitoo por trazer ao Plenário da Assembleia da República, pela primeira vez — haverá outras! —, o tema, tão importante, da análise do relatório sobre o pluralismo político da RTP agora apresentado pela Entidade Reguladora da Comunicação Social.
Se alguém tinha dúvidas de que existe, de facto, uma campanha de propaganda feita pelo Partido Socialista nos meios de comunicação social, com um especial epicentro na RTP,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — … hoje, com este relatório, deixou de ter dúvidas.

Vozes do CDS e do Deputado do PSD Luís Montenegro: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Este relatório é a prova provada de que essa campanha existe e é esmagadora face a todos os outros partidos da oposição.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Por isso mesmo, o CDS apresentou um requerimento à Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, solicitando a vinda ao Parlamento dos directores de informação da RTP, mas também da RTP-Madeira e da RTP-Açores, porque o que está a passar-se nos canais regionais é tão grave…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — … ou mais grave do que o que se passa na RTP com sede em Lisboa.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Hoje mesmo, este requerimento foi apresentado e votado, tendo sido aceite por todos os partidos, unanimemente, a realização destas audições.
Contudo, não posso deixar de o questionar, Sr. Deputado, sobre dois aspectos que considero muito graves e que constam também deste relatório da ERC.
Em primeiro lugar, não lhe parece que, de facto, as obrigações constitucionais da RTP, enquanto detentora de um serviço público — obrigações de pluralismo, obrigações de liberdade de informação, obrigações de representação multipartidária —, ou seja, os valores essenciais num Estado de direito democrático, os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos na sua participação política estão a ser postos em causa?

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!

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O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Não me leve a mal, mas achei muito curioso que o Sr. Deputado também não tivesse falado de um aspecto que vem referido neste relatório e que é extremamente grave.
Refiro-me à ausência total nos espaços de comentário político de outras personalidades ligadas a partidos políticos que não o Partido Socialista ou o Partido Social Democrata.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Afonso Candal (PS): — O Dr. Paulo Portas também já esteve!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Não na RTP!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Refiro-me à RTP, Sr. Deputado Afonso Candal, um serviço público pago por todos os contribuintes portugueses: os contribuintes democratas-cristãos, os contribuintes comunistas, os contribuintes socialistas, os contribuintes sociais-democratas.

Protestos do PS.

É uma vergonha que só existam comentadores ligados aos dois maiores partidos!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Afonso Candal (PS): — E o Dr. Paulo Portas?!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Quem paga a RTP são todos os contribuintes, os de direita e os de esquerda!

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Não se percebe porque é a que a RTP, sistematicamente, elimina à direita do PSD e à esquerda do PS todos os partidos.
É uma vergonha democrática, que não lhe fica bem, Sr. Deputado Afonso Candal!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Não conhece a RTP, pois não? Não sabe o que é serviço público?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Mota Soares, penso que qualquer democrata, com uma formação de base e valendo-se de princípios de isenção, éticos e morais, deve concordar que uma democracia tem regras mínimas abaixo das quais não pode ir.
E é evidente que, embora faça parte do Partido Social Democrata, entendo que todos os partidos que têm uma relevância parlamentar devem ter oportunidade de ter pessoas ligadas ao espaço do comentário político.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Está a ver?!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Mas também é preciso fazer notar que não aceitamos que pessoas, embora fazendo parte do nosso espaço político, e que, claramente, por razões internas, têm uma atitude permanentemente contrária aos interesses defendidos de forma legítima pelo partido a que pertencem, sejam contabilizadas como um espaço a favor desse partido.

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O Sr. Afonso Candal (PS): — Essa agora!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Quero dizer-lhe, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, que as obrigações constitucionais existem e, portanto, há aqui uma inconstitucionalidade. E, neste momento, também há uma omissão de relação contratual, porque o contrato que obrigava a RTP caducou, não tem existência legal, por isso mesmo nem sequer há sanção. Mas é óbvio que a inconstitucionalidade deveria ser punida.
Esperemos que o contrato que, neste momento, está a ser negociado possa vir rapidamente a prever que a RTP não continue, impunemente, a gastar o dinheiro dos contribuintes e a não respeitar as regras da representatividade democrática, em que os contribuintes se revêem não só nesta Assembleia mas também no espaço público informativo da televisão.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Essa agora!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Quero, por último, dizer-lhe que partilhamos totalmente da vossa intenção — também já a tínhamos manifestado — no sentido de que os directores de informação nacional, mas também os directores de informação regional, sejam ouvidos neste Parlamento. Mas, acima deles, há alguém que tem uma responsabilidade maior,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … por isso entendemos que o Conselho de Administração da RTP também tem de vir prestar contas e assumir responsabilidades nesta Casa. É ele que tem o poder maior dentro da RTP, é ele que dá ordens e instruções ou, no mínimo, é ele que consente, por omissão, uma actuação contrária à isenção e ao pluralismo político.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Mendes Bota, a questão que abordou na sua intervenção — a diversidade e o pluralismo na comunicação social — é da maior importância e constitui, aliás, um dos problemas centrais para a qualidade da democracia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não podemos deixar de recordar que, ao longo dos anos, quando o PCP denunciava estas práticas de omissão e de silenciamento, falando sobre o que acontecia em relação à nossa própria presença na comunicação social dominante, inclusive em tempos de maioria e Governo do PSD,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … a resposta que invariavelmente ouvíamos era: «Lá vem o PCP com a conversa do costume!».
Portanto, a primeira questão que queremos sinalizar aqui é que, no nosso entender, este problema não é novo. Sr. Deputado Mendes Bota, novo é o relatório, o problema já existe há muitos anos,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … o que acontece é que vai sendo agora identificado de outra forma.
O PSD queixa-se de que não tem lugar no campo mediático, mas convenhamos que o PSD exige um lugar de 1.ª classe. Com o facto de outros poderem ir «de pé» ou «sentados no beiral» o PSD, pelos vistos, não se incomodará muito, porque, se há uma presença esmagadora do Governo e da maioria — é verdade que

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existe, e foi identificada quantitativamente —, não é menos verdade que é ainda mais esmagadora a representação de um autêntico bloco central de interesses, quer ao nível da informação diária e dos blocos noticiosos…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … quer, em particular, ao nível do comentário político,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … onde o bloco central marca presença todas as semanas na televisão.
Estamos a falar, seguramente, antes de mais, do serviço público de televisão, por que é à RTP que este relatório se refere, mas há uma questão central sobre a qual também lhe quero colocar a seguinte questão: o PSD considera que este é um problema específico do serviço público de televisão, tendo, aliás, em conta o relatório anterior da ERC sobre a regulação e sobre o panorama audiovisual dos vários canais, incluindo os canais privados?

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Não considera que há também um factor que influencia esta questão, que é o da concentração da comunicação social em grupos económicos ao nível deste sector? Considera, ao fim e ao cabo, que este é um problema novo? É que as respostas que têm de ser dadas, essas sim, são novas e há aqui um carácter de significado político e de consequências que é preciso retirar para a liberdade, para o pluralismo e para a diversidade da comunicação social a que a tendência das políticas actuais não tem vindo a dar sinais positivos, antes pelo contrário.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, V. Ex.ª fala-me de bloco central de interesses. Mas nós não temos quaisquer interesses no bloco central! Nem sequer há bloco central! Aliás, os nossos analistas são muito independentes,…

O Sr. Mota Andrade (PS): — Ex-presidentes do partido!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … não têm qualquer dependência ou acordo nem dentro nem fora do PSD.
Portanto, não vale a pena invocar essa história do bloco central de interesses, porque toda a gente já compreendeu que ele não existe, muito menos em matéria informativa.
Quero também dizer-lhe que o recurso ao passado pode ser legítimo. Todos os partidos, todas as bancadas, gostam sempre de olhar para o passado, dizendo «também já foi assim no tempo do seu governo».
Mas o senhor disse, e muito bem, que agora há um elemento novo, que é um elemento que deve ser valorizado. E oxalá o Presidente da ERC não seja penalizado por ter tido a hombridade, a coragem e a frontalidade de abordar esta matéria como abordou! Oxalá não assistamos a alguma manobra para tentar substituir quem está à frente da ERC, por ter tido a hombridade de vir demonstrar a realidade dos factos!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quem está à frente da ERC foi lá posto pelo bloco central!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Olhar para o passado não resolve a situação. Esta é uma situação do presente. O relatório incide sobre os quatro últimos meses de 2007, mas quero dizer-lhe que a situação só se tem agravado desde Dezembro de 2007.

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O PS queixa-se de uma situação de desequilíbrio entre o partido e o Governo, queixa-se que não tem muito espaço, que tem desaparecido. Mas é evidente que se trata de uma estratégia do Partido Socialista fazer desaparecer o seu próprio partido! Há, na bancada do Partido Socialista, muitos que se queixam de não terem visibilidade, que o partido desapareceu, que não tem notoriedade.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Na RTP é verdade!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Esse é um problema do Partido Socialista. O que conta é que, na contabilidade da isenção e do pluralismo político, o Partido Socialista e o Governo contam para o mesmo bloco,…

O Sr. Afonso Candal (PS): — Essa agora!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … e esse bloco está muito para além da representatividade política.
O Sr. Deputado diz que o PSD quer um lugar de 1.ª classe. Nós, na sociedade portuguesa, temos tido, em muitos anos, um lugar de 1.ª classe e, noutros, um lugar na classe imediatamente a seguir. Cada um tem aquilo que é a vontade do povo português e, obviamente, todos devem ter a representatividade de acordo com o voto e com o mandato que o povo português lhes dá. Não queira o Partido Comunista sentar-se na 1.ª classe e na primeira carruagem, em sentido quantitativo, quando tem tido um bilhete de 4.ª classe dado pelo povo português.
Mas acho estranho que o Partido Comunista não esteja preocupado…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … com a situação actual e esteja tão passivo em relação a esta situação, porque se ela hoje não é tão maligna em relação ao Partido Comunista como o é em relação ao Partido Social Democrata…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso diz o senhor!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … ninguém vos garante que, num futuro próximo, o Partido Comunista não esteja aqui a fazer exactamente o mesmo tipo de denúncia.
O que queremos é que a lei, a Constituição e os princípios sejam cumpridos não em benefício de quem quer que seja mas em benefício de todos, de acordo com o que cada um merece e justifica.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Arons de Carvalho.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Mendes Bota, não pretendo desvalorizar o relatório da Entidade Reguladora nem omitir as suas conclusões e muito menos ignorar os ensinamentos que ela nos oferece. No entanto, devo dizer que o relatório da Entidade Reguladora não pode ser utilizado, como tem sido, como forma de pressionar e de condicionar a RTP nem desonestamente deturpado, como tem sido.
Em nenhum passo do relatório se conclui haver quebra de independência ou de rigor informativo da RTP.
Pelo contrário, o Presidente da ERC sublinha que «a RTP equilibrou tendencialmente a presença do Governo e do PS, por um lado, e dos partidos da oposição, por outro.» O relatório da ERC não pode ser lido parcialmente. Porque se omite aqui que o relatório revela que as notícias sobre o PSD são as menos confrontadas com outras fontes? Porque se omite que a maioria das notícias sobre o Governo, pelo contrário, tem fontes múltiplas? Porque se omite que o próprio relatório explica o relativo predomínio de notícias sobre o Governo, atribuindo-o à Presidência da União Europeia? Porque se omite que o relatório conclui que a maioria das peças sobre o PSD têm uma tónica positiva, enquanto as

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peças sobre o PS têm uma tónica negativa? Porque se esconde que o relatório não contabiliza os tempos atribuídos às forças sociais? Sr. Deputado Mendes Bota, o relatório não pode servir como capa, como disfarce, para o gravíssimo défice de credibilidade do PSD; não pode servir para o PSD condicionar o trabalho jornalístico e limitar a sua autonomia editorial, transformando os telejornais numa sucessão de tempos de antena partidários; e não pode ser utilizado para pôr em causa o bom nome e a integridade dos profissionais da RTP — dos seus directores, dos seus editores, dos seus membros do Conselho de Redacção, dos seus jornalistas.
Sr. Deputado Mendes Bota, o serviço público de televisão é demasiado importante para ser utilizado como arma de arremesso político.
Sr. Deputado, na política não vale tudo.
Termino, fazendo-lhe duas perguntas que derivam da sua intervenção: Em primeiro lugar, fiquei com a noção de que o Sr. Deputado entende que o Conselho de Administração da RTP pode interferir na informação da empresa. Gostaria que me respondesse se entende que pode ou não.
Em segundo lugar, fiquei com a convicção de que o Sr. Deputado teme que o Governo demita o Presidente da Entidade Reguladora.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): — Gostaria de saber se pensa que é possível que o Presidente da ERC seja demitido pelo Governo, tendo em conta que ele foi eleito por esta Assembleia da República, por maioria qualificada de dois terços, para um mandato de cinco anos, não podendo ser demitido em circunstância alguma.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Ele não sabia!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Alberto Arons de Carvalho, não sei se o Partido Socialista andou a tirar um desses cursos rápidos, que agora também se tiram por aí e pelos quais os senhores tanto pugnam, sobre credibilidade. Mas não venha dar lições de credibilidade. O Partido Socialista não é juiz em causa própria em matéria de credibilidade dos outros. Não é juiz! Os senhores não têm nem mais nem menos credibilidade! Todos nós temos a nossa credibilidade, que é a credibilidade dada por aqueles que confiaram em nós. Portanto, não venha aqui atirar «bombas de carnaval» nem fazer uma «nuvem de fumo» com a questão da credibilidade para um assunto que é essencial.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): — Mas não manipulamos!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — E o que é que é essencial, Sr. Deputado Alberto Arons de Carvalho? É que este relatório é muito importante, porque é a primeira vez que tal acontece. Os senhores relativizam e procuram desvalorizar e subalternizar este relatório nas suas conclusões factuais, mas, se fosse ao contrário, Srs. Deputados, provavelmente «caía o Carmo e a Trindade». Mas como, neste caso, a vítima é o Partido Social Democrata, os senhores já acham que o relatório está a ser utilizado como arma de arremesso político.
As coisas são o que são, Sr. Deputado! Uma pedra é uma pedra e um minuto é um minuto. E os minutos que se gastam e que se consomem a favor de determinadas personalidades políticas na televisão pública paga por nós todos também são contabilizáveis.
Já agora vou dar-lhe conta de algo que não está no relatório. Nas duas últimas semanas, só no top ten das personalidades políticas portuguesas, que no conjunto das televisões — e se quiser dir-lhe-ei também só na RTP — mereceram destaque nos blocos noticiosos…

O Sr. Afonso Candal (PS): — Foi o Mendes Bota!

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O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Deputado, não brinque com coisas sérias, Sr. Deputado! Já é altura de levar isto a sério! Já tem idade para levar isto a sério.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Olhe, Sr. Deputado, sabe quando foi a primeira vez que eu me sentei aqui, nesta Câmara? Foi no dia 31 de Maio de 1983! O senhor, nessa altura, ainda andava muito longe! Sabe quem é que estava aí sentado? Era o seu pai. Há uma grande diferença. Portanto, tenha calma.
O Sr. Eng.º José Sócrates, na última semana do mês de Março, teve direito a 1 hora e 58 minutos nos telejornais e, na penúltima semana, teve direito a 1 hora e 17 minutos nos telejornais dos quatro canais generalistas. E sabe a quantos minutos é que teve direito o líder da PSD na penúltima semana? Nem figura na lista dos 10 mais!

O Sr. Mota Andrade (PS): — Responda às perguntas!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — E, na última semana de Março, teve 52 minutos.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado,

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Quero apenas dizer-lhe que é um mau argumento trazer aqui a questão de a Presidência portuguesa da União Europeia ter absorvido a atenção mediática, porque o próprio relatório diz — e o senhor não disse — que houve nove outros temas liderantes, como a abertura do ano escolar, o Orçamento do Estado, a greve geral, o pacto para a justiça, o Código de Processo Penal, o novo aeroporto de Lisboa, a Lei dos Partidos Políticos, e, mesmo que lhe custe admitir, as directas disputadíssimas do PSD e o congresso do PSD.
A verdade é que, apesar de tudo, isto foi o que foi, e os factos estão com toda a frontalidade expressos neste relatório, que os senhores agora querem desvalorizar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Alberto Arons de Carvalho (PS): — E as perguntas que eu fiz?

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Mendes Bota, o relatório que a ERC apresentou, relativo às actividades informativas e de comentário político da televisão pública entre Setembro e Dezembro de 2007, merece, na realidade, atenção, e V. Ex.ª trouxe, sobre isso, algumas reflexões ao Plenário.
Sr. Deputado Mendes Bota, vendo a matéria com a isenção possível nestas questões, esta bancada tem reservas em relação ao critério adoptado no relatório, e já o expressámos uma vez aqui.
Achamos que o noticiário político na televisão não é um tempo de antena automaticamente reservado, com quota fixa, aos partidos em proporção ao resultado eleitoral que têm e que o mesmo deve ser baseado na importância política da intervenção, mediada, portanto, por um critério jornalístico, sendo que nenhum partido tem, à partida, uma quota, um direito abstracto de presença nos noticiários.
Contudo, o Sr. Deputado tem razão numa coisa, e eu dou-lha. Vendo isto pelo critério bruto dos tempos em si próprios, ou mesmo pelos critérios mais sofisticados de considerar o que é, e o que não é, favorável, a conclusão é esmagadora: de facto, o predomínio do Governo e do PS em matéria de noticiário, seja por que porta se entrar, indicia um abuso em termos de equilíbrio informativo, no qual o Bloco de Esquerda é também prejudicado.

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A sua intervenção, Sr. Deputado, suscitou-me duas dúvidas. Primeira: o Sr. Deputado não se refere nem à SIC nem à TVI, e suspeito que nestes canais a situação deve ser ainda pior (o relatório da ERC, no fim deste mês, se não me engano, vai trazer qualquer coisa sobre os canais privados). Como não falou sobre isso, pergunto-lhe: não dá importância a isto no que toca aos canais privados? Não quer cá chamar também os directores de informação dos canais privados em função dos resultados que o relatório apresentar?

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Segunda questão: o Sr. Deputado não se pronunciou sobre o mais importante — o comentário.
O comentário não é só expressão política do rotativismo — não lhe chamarei bloco central mas, sim, rotativismo (ora um, ora outro): no comentário político ora está o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, ora está Pacheco Pereira… Aliás, António Vitorino (Pacheco Pereira é nas outras estações, porque também há rotativismo nas outras estações de televisão). E isto tem um problema grave, Sr. Deputado: é que não são só os outros partidos fora do rotativismo que estão excluídos, são escandalosamente excluídos os agentes da sociedade civil — os activistas sociais, os activistas sindicais, os pensadores independentes, os actores da sociedade civil, que não têm praticamente presença no comentário.

O Sr. Presidente: — Tem mesmo de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente.
E aí não se pode dizer que estamos a «forçar a nota», porque é a conclusão que a própria ERC também tira.
Gostava de saber se o Sr. Deputado dá mais importância ao noticiário do que ao comentário ou se não se referiu a este por achar que no comentário político as coisas estão bem, visto o seu partido, aí, não ser, de facto, prejudicado.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Rosas, em primeiro lugar, no comentário político, o PSD não se considera beneficiado em nada, apesar de, como já disse há pouco, haver alguns ditos militantes do PSD que fazem comentário político.

Vozes do BE: — «Ditos»?!…

O Sr. António Filipe (PCP): — E são «benditos» ou «malditos»?

O Sr. Mendes Bota (PSD): — São militantes, mas são uns militantes muito especiais! Em segundo lugar, quero dizer-lhe que referi no meu discurso que a situação é grave e má em todos os canais, porém o canal do serviço público de televisão tem uma responsabilidade muito maior.

O Sr. Pedro Santana Lopes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Esse canal é contratualizável! Esse canal recebe dinheiros públicos! Não podemos, obviamente, obrigar os canais privados a ter uma política que, eventualmente, fira as suas regras e os seus interesses comerciais,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Está enganado!

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O Sr. Mendes Bota (PSD): — … embora a nossa opinião é a de que, tendo licenças passadas pelo Estado, há obrigações de pluralismo que têm de ser respeitadas.

Vozes do BE: — Há!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Em relação às conclusões do relatório, elas são esmagadoras.
O senhor perguntou-me se eu não achava que a situação nas televisões privadas era ainda pior do que no canal público. Vou dar-lhe conta dos dados de que dispomos.
Quanto ao tempo informativo consagrado ao Primeiro-Ministro, este teve, na última semana de Março, na TVI, 37 minutos, na SIC, 30 minutos, na RTP1, 21 minutos, na RTP2, 17 minutos e, na SIC Notícias, 11 minutos. Ou seja, consegue ter mais tempo de informação nos canais privados do que na própria RTP. Porém, isto não invalida a outra questão: não há pluralismo político e não há respeito por todas as forças políticas da oposição.
Queixámo-nos porque nos dói, mas também assumimos as dores de o sistema democrático estar em causa…

O Sr. Pedro Santana Lopes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Mendes Bota (PSD): — … e de todos os partidos, mesmo os mais pequenos, terem de ser respeitados.
E vou até dizer-lhe mais, Sr. Deputado: até os partidos que não têm assento nesta Assembleia têm de ser respeitados, porque as minorias não são apenas étnicas, não são apenas sociais, não são apenas de nível salarial ou seja o que for, também há minorias ao nível de partidos que merecem ter direito a protagonismo e a verem divulgadas as suas actividades. E isso, infelizmente, nem no Açores, nem na Madeira, nem em Portugal continental se está a passar.
E aquele canal sobre o qual temos aqui uma tutela muito particular, porque para ele saem dinheiros do Orçamento do Estado, saem dinheiros públicos, tem de ser já «chamado à pedra». Mas sublinho também, desde já, que estamos totalmente de acordo em que os directores de informação dos outros canais venham ter uma conversa connosco para, num clima de diálogo, chegarmos a uma conclusão, que é esta: a situação actual não pode continuar.

Aplauso do PSD.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar ao ponto seguinte da nossa ordem do dia, o debate do Relatório sobre o Combate à Fraude e à Evasão Fiscais em Portugal, apresentado pelo Governo, nos termos do n.º 1 do artigo 95.º da Lei n.º 67-A, de 31 de Dezembro.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Teixeira dos Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O relatório sobre a evolução do combate à fraude e à evasão fiscais que hoje debatemos acolhe algumas das sugestões avançadas no ano passado por este Parlamento, dá conta das iniciativas, métodos e mecanismos antifraude utilizados pelos vários departamentos da administração tributária em 2007, bem como dos resultados alcançados.
Tal como ocorreu no ano passado, destaco a melhoria dos índices de cumprimento voluntário por parte dos contribuintes. Esta melhoria, ao permitir o alargamento sustentável da base tributável, justifica, em grande medida, o dinamismo apresentado pela receita fiscal em 2007.
Do conjunto das iniciativas prosseguidas no ano passado no domínio legislativo destaca-se a aprovação, pelo Governo, do projecto de decreto-lei que consagra, no ordenamento jurídico-fiscal português, medidas de carácter preventivo e de combate ao planeamento fiscal abusivo.
As regras aprovadas, que entrarão em vigor a 15 de Maio próximo, visam melhorar a transparência e a justiça do sistema fiscal, estipulando obrigações de comunicação, informação e esclarecimento às autoridades

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fiscais sobre esquemas ou actuações de planeamento fiscal agressivo, contribuindo para a prevenção de comportamentos abusivos.
Ao nível das medidas de natureza administrativa, salientam-se, pelo impacto na simplificação do relacionamento dos contribuintes com a administração tributária e na redução dos custos de contexto, o início do projecto do pré-preenchimento das declarações do Modelo 3 do IRS, abrangendo os rendimentos de trabalho dependente e pensões e as respectivas retenções na fonte. Em 2007, foram pré-preenchidas mais de 1,8 milhões de declarações, representando o número de contribuintes que efectuaram correcções aos valores pré-preenchidos menos de 10% do universo abrangido, comprovando a fiabilidade do sistema desenvolvido.
No âmbito do controlo da autoliquidação de IRC, e tendo em atenção a elevada representatividade que os prejuízos fiscais passíveis de serem reportados para os exercícios seguintes apresentam a nível declarativo, destaco a implementação de uma solução informática que procede à sua validação. Neste domínio, foram identificadas divergências em 2139 declarações do Modelo 22 de IRC, susceptíveis de conduzirem a correcções à matéria colectável correspondentes a 113 milhões de euros.
Também a verificação do cumprimento do pagamento especial por conta foi objecto de atenção especial, tendo sido desenvolvido um sistema de controlo automático, com a consequente instauração do respectivo processo contra-ordenacional em caso de incumprimento. Em 2007 foram, neste âmbito, levantados cerca de 108 500 autos de notícia.
Estes constituem apenas três exemplos do muito que, sob a orientação deste Governo, tem sido feito em prol da colocação dos sistemas informáticos ao serviço dos cidadãos, das empresas e da administração tributária, constituindo Portugal, hoje em dia, uma referência incontornável de boas práticas prosseguidas neste domínio.
Em 2007, foram ainda desenvolvidas acções visando identificar áreas e sectores de risco, que conduzirão à definição de estratégias inspectivas mais eficazes (por exemplo, a auditoria conduzida pela Inspecção-Geral de Finanças à transmissibilidade de prejuízos e planeamento fiscal agressivo dos grupos económicos e sociedades gestoras de participações sociais).
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os números deste relatório demonstram, sem margem para dúvidas, a sustentabilidade dos resultados alcançados no combate à fraude e à evasão fiscais.
Em 2007, as correcções realizadas à matéria colectável cresceram cerca de 56%, tendo atingido um valor de 4671 milhões de euros. Destaco o facto de cerca de 70% das mesmas respeitarem ao IRC, reflectindo uma orientação para o controlo dos contribuintes sujeitos a este imposto.
Relativamente aos impostos directamente em falta, o seu montante ascendeu a 975 milhões de euros, o que significa um crescimento de cerca de 16% face ao ano anterior.
Merece destaque que cerca de 1060 milhões de euros, no caso do controlo exercido sobre a matéria colectável, e de 271 milhões de euros, no caso dos impostos directamente encontrados em falta, foram objecto de regularização voluntária por parte dos contribuintes e sujeitos passivos faltosos.
Na área da justiça tributária, os elevados ganhos de produtividade resultantes da rápida adaptação dos recursos humanos à utilização das novas ferramentas informáticas contribuíram para que, uma vez mais, fosse superado o objectivo inicialmente previsto para o valor da cobrança coerciva, tendo esta atingido um valor histórico de 1633 milhões de euros.
Este resultado decorreu do crescimento do número de penhoras, em virtude da plena implementação do sistema informático de penhoras, as quais mais do que duplicaram face a 2007, e do aumento do número de vendas coercivas, em consequência da utilização crescente do Sistema Informático de Gestão de Vendas Coercivas.
No âmbito da publicitação de devedores, e na sequência de todo o procedimento anterior à sua concretização, designadamente a audição prévia dos contribuintes, foram regularizadas dívidas no montante de 242 milhões de euros.
Também ao nível da evolução da dívida instaurada os resultados obtidos são expressivos: entre 2005 e 2007, registou-se uma diminuição de 937 milhões de euros, reflectindo o aumento do cumprimento voluntário das obrigações fiscais. Este resultado contribuiu para a diminuição da dívida exequenda, a qual registou, entre 2006 e 2007, um decréscimo de 842 milhões de euros.
No plano dos direitos e garantias dos contribuintes, área fundamental para este Governo, assinalo a diminuição das reclamações graciosas pendentes de decisão, do tempo médio da sua análise e decisão, de 10

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meses em 2004 para 5,6 meses em 2007, cumprindo, assim, o estipulado na lei. Além disso, destaco a implementação do Sistema Informático de Gestão de Procedimentos de Revisão Administrativa, que veio permitir a entrega de petições de reclamação via Internet, aumentando o acesso dos cidadãos e agentes económicos à justiça tributária.
Já no domínio dos processos de crimes fiscais verificou-se um aumento de 18% do número de casos julgados face a 2006, assim como do número de arguidos condenados (de 15%) e de condenações (de, aproximadamente, 13%).
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No actual cenário económico internacional, marcado pela globalização, pela deslocalização dos operadores económicos, pela desmaterialização das operações e pela eliminação, no seio da União Europeia, dos controlos fronteiriços, a fraude fiscal transnacional aproveita-se das fragilidades dos sistemas fiscais, tornando-se cada vez mais complexa e com ligações comprovadas a outros tipos de criminalidade, como sejam o branqueamento de capitais e o terrorismo.
Além da perda de receitas, os fenómenos de fraude fiscal à escala internacional atentam contra a repartição da carga tributária e contra a eficiência dos sistemas fiscais e distorcem as condições de concorrência dos mercados, pondo em risco a sobrevivência dos operadores legítimos e a própria competitividade das economias.
Esta constitui uma área a que o Governo continua a prestar a maior atenção. Em 2007, deu-se continuidade a iniciativas que visam prevenir e reprimir a concretização deste tipo de esquemas, de carácter internacional ou internos, que, em virtude das organizações envolvidas ou pela força da respectiva complexidade técnica ou material, devem ser objecto de um acompanhamento especial. São disto exemplo a fraude intracomunitária ao IVA, a fraude no sector das sucatas, a emissão de facturas falsas, a viciação de programas informáticos de facturação, o combate à adulteração e introdução fraudulenta no consumo de bens sujeitos a impostos especiais sobre o consumo ou os crimes de fraude fiscal em investigação sob a designação de «operação furacão».
Neste domínio, e do ponto de vista da operacionalização dos trabalhos de investigação, tem-se vindo a revelar essencial a colaboração estreita entre os diversos órgãos de investigação nacionais (por exemplo, a administração tributária, o Ministério Público, a Polícia Judiciária, a Polícia de Segurança Pública, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, e a segurança social) e internacionais (com a troca de informação com as administrações fiscais de outros países). Esta colaboração, também na vertente da formação recíproca, deverá continuar a ser intensificada.
Em 2007, consolidou-se o funcionamento da investigação da fraude tributária sob a forma de 25 equipas mistas, compostas por elementos da Direcção-Geral dos Impostos e da Polícia Judiciária, as quais procederam, entre outras, a 449 vigilâncias, a 323 buscas, a 34 detenções e à constituição de 331 arguidos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito embora estes sejam números animadores, o Governo tem consciência de que há ainda um longo caminho a prosseguir no sentido de melhorar a luta contra formas de evasão e fraude fiscais cada vez mais sofisticadas, através do desenvolvimento de iniciativas e procedimentos que habilitem a administração tributária a enfrentar com sucesso as velhas e as novas formas de fraude e evasão.
Neste sentido, prosseguir-se-á este ano à implementação de novas iniciativas legislativas e operacionais, orientadas, nomeadamente, para o controlo de sujeitos passivos não declarantes com manifestações de actividade, utilizadores de facturas falsas, ou com divergências; sociedades com elevado endividamento perante os sócios; estratégias e sistemas de controlo das operações de planeamento fiscal abusivo; construção civil, obras públicas, subempreitadas e mediação imobiliária; actividades artísticas e de espectáculos; software de facturação e comércio electrónico; reforço da colaboração quer entre os corpos inspectivos tutelados pelo Ministério das Finanças quer destes com o sector da justiça.
Avançar-se-á, assim, com a disponibilização aos inspectores tributários, que em 2007 viram o seu número aumentado em 10%, da possibilidade de acesso à rede informática tributária e aduaneira, permitindo um acesso mais célere à informação disponível sobre os contribuintes.
Este ano, serão intensificadas as acções inspectivas com recurso a técnicas de auditoria assistida por computador, evoluindo-se para novas metodologias de auditoria, objectivando, desta forma, as decisões tomadas pela administração tributária em sede de procedimento inspectivo.

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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Reafirmo que a eficiência e a eficácia fiscais têm vindo a melhorar, contínua e significativamente, nos últimos anos. Esta melhoria resulta não só da actuação da administração tributária, mas também da crescente consciencialização dos contribuintes da ideia de que, se todos contribuírem com um pouco para as receitas do Estado, menor será o esforço que temos de exigir a cada um.
O Relatório sobre o Combate à Fraude e à Evasão Fiscais comprova que as opções que têm vindo a ser adoptadas pelo Governo têm surtido os resultados esperados, encontrando-se Portugal a trilhar o caminho no sentido de um sistema fiscal mais justo, mais equitativo e propiciador da actividade económica, capaz de contribuir para o crescimento e desenvolvimento do País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, vários Srs. Deputados.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, o debate sobre a evasão e a fraude fiscais é um debate sério e profundo, em que é importante que nos atenhamos à matéria objectiva.
Ninguém aqui, nesta Casa, pode reclamar mais do que outrem, um seu colega, o empenhamento neste combate. Não tem lugar nesta Casa da democracia quem não se queira empenhar neste combate sendo exigente ao máximo. Certamente que o Governo também está empenhado nesse combate com a mesma determinação.
O que estamos a discutir é a eficácia e o método, os resultados e a estratégia.
Sr. Ministro, queremos, desde já, colocar-lhe duas questões, relativamente aos offshore e à estratégia do combate à evasão e à fraude fiscais.
Números vindos a lume mostram que entidades não estatais terão investido nos offshore qualquer coisa como 23 000 milhões de euros, 15% do PIB. Esses mesmos números revelados pela imprensa dizem que o Estado, através de entidades estatais (não se sabe quais), terá investido, em 2006, cerca de 235 milhões de dólares.
Há 10 dias que o Sr. Ministro adia uma explicação cabal, transparente e rigorosa sobre esta presença do Estado nos offshore. O Sr. Secretário de Estado teve ocasião de dizer que o Sr. Ministro faria uma declaração específica sobre esta matéria. Como não a ouvimos na sua intervenção inicial, colocamos a questão com esta antecipação de propósitos.
Sr. Ministro, entendemos que o Estado deve ter uma posição clara: nenhuma entidade estatal deve utilizar praças offshore — por razões éticas, por razões de princípio, por razões de sinal! É certo quer utilizar praças offshore é legal, desde que não estejam na lista negra. Mas o Estado deve abster-se de o fazer. As praças offshore são utilizáveis, mesmo em termos legais, por operações fundamentalmente conduzidas com não residentes. Não nos parece que o Estado possa e deva fazê-lo.
Sr. Ministro, o Sr. Secretário de Estado teve ocasião de dizer, com toda a clareza (e é muito importante), que neste problema não está o Centro Internacional de Negócios da Madeira. Não é uma praça offshore, mas inshore. Está sujeita à fiscalização da administração fiscal, está sujeita à supervisão do Banco de Portugal e está sujeita à fiscalização da Direcção-Geral de Concorrência e Preços da União Europeia. E não tem nada a ver com esta matéria.
Sr. Ministro, os portugueses gostariam de saber como pretende, em primeiro lugar, responder à questão ética do papel do Estado e, em segundo lugar, que métodos e medidas vai utilizar para reduzir a situação constatada de que 15% do PIB português estará alegadamente investido em offshore. Queremos saber o que é que pensa da utilização de offshore da lista negra e que actividades e diligências está a empreender.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Guilherme Silva.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

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O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, nesta matéria, a diferença entre o PSD e o PCP é que o PSD não questiona os offshore e nós questionamos: eles questionam alguns dos que os usam e nós todos os que usam offshore.
Sr. Ministro, queria levantar-lhe duas questões.
A primeira tem a ver com segredo bancário. Em 2006, o Sr. Ministro veio a esta Casa anunciar que o Governo estava empenhado na eliminação do segredo bancário, que queria pôr Portugal na linha da frente dos países europeus. Estamos em 2008, passaram dois anos… O que se fez? Nada! Vai o Governo aceitar a versão do novo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de que a legislação actual, afinal, é adequada e suficiente, conforme referido em comissão parlamentar? Está o Governo satisfeito com o número de casos de levantamento do sigilo bancário ocorrido no ano de 2007? Vai o Governo manter Portugal na cauda da Europa ou vai tirar do congelador a iniciativa legislativa que a maioria socialista lá mantém há vários meses? A segunda questão tem a ver com a Associação Portuguesa de Bancos (APB) e os números que divulgou.
Segundo esta Associação, a taxa efectiva de IRC na banca nos últimos três anos foi de 11,6% em 2005, de 19% em 2006 e de 13,6% em 2007. Diz ainda que a banca teve, em 2007, mais 10% de lucros do que em 2006 e que a tributação final, em 2007, foi menos 29% do que em 2006.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Estes são os números oficiais da APB, alguns dos quais foram usados em debates orçamentais anteriores pelo próprio Ministro das Finanças aqui presente.

Vozes do PCP: — Uma vergonha!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Estes valores desmentem os números usados pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais na reunião da comissão parlamentar que teve lugar na semana passada — números mirabolantes! — e desmentem também os números dados pelo Sr. Primeiro-Ministro no último debate quinzenal com o Parlamento, na sexta-feira passada.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Estes números falam por si, Sr. Ministro! É possível falar em justiça fiscal, é possível falar de ética política, com este nível de tributação absolutamente imoral do sector mais lucrativo que temos em Portugal?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder , tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Patinha Antão, relativamente às praças offshore, não partilho da sua opinião. As praças offshore existem, são uma realidade ao nível dos mercados financeiros internacionais. Não se efectuam necessariamente em todas operações ilícitas ou ilegais e nem todas existem para encobrir operações mais obscuras. Aliás, o Sr. Deputado enunciou um exemplo: o offshore da Madeira.

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Não é um offshore, Sr. Ministro! É um inshore!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, para Portugal é um inshore, mas para outras economias é um offshore. Não tenhamos ilusões, não escamoteemos a questão e analisemo-la com objectividade e rigor.

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Quanto a esta matéria, Sr. Deputado, não sou arauto de princípios morais ou éticos. A lei e o enquadramento existem e a missão do Estado é assegurar que a lei é respeitada e que estes offshore são utilizados para fins lícitos e não para fins ilícitos e obscuros. É isso que compete ao Estado, é isso que o Estado tem de assegurar, é isso que procuramos assegurar. E não temos indicação alguma dos casos que refere, designadamente que entidades públicas tenham aplicações em offshore ou estejam, de facto, envolvidas em actividades de natureza obscura, ilícita ou ilegal.
Deixo os juízos de moral para quem quiser. Eu, como responsável do Estado, zelo pelo cumprimento rigoroso da lei, pela transparência e pelo cumprimento das obrigações fiscais, em particular.
Sr. Deputado Honório Novo, quanto ao sigilo bancário, gostaria de esclarecer V. Ex.ª de que nunca preconizei nesta Câmara a eliminação do sigilo bancário! O Sr. Deputado começou por me atribuir uma intenção que nunca tive nem nunca anunciei!!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Não disse isso!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Em segundo lugar, pergunta-me se estou satisfeito com os resultados e com o número de casos. Estou!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Ai está?!... Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Tivemos, de acordo com o relatório, cerca de 1067 procedimentos que resultaram em 37 decisões e…

Vozes do PCP: — 37?!...

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Houve decisões…

O Sr. Francisco Louçã (BE): — 37?!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, deixe-me acabar! Eu exijo que me deixe acabar. Eu ouvi tranquilamente V. Ex.ª Como eu dizia, resultaram 37 decisões de levantamento do sigilo e houve 978 processos em que houve autorização voluntária das pessoas para que isso fosse feito — reagiu cedo de mais...
Quanto ao enquadramento do sigilo bancário, devo esclarecê-lo, Sr. Deputado, de que estou satisfeito com o actual enquadramento, pois tem-nos permitido ter a eficácia necessária no combate à fraude e à evasão fiscais.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Mudam de opinião!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Quando considerar que o actual enquadramento é insuficiente, aí promoverei e proporei as medidas necessárias.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Portanto, mudam de opinião em dois anos!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — No entanto, até este momento os mecanismos de que a administração fiscal dispõe revelam-se suficientes, adequados e proporcionais àqueles que são os nossos objectivos.
Quanto à APB, gostaria de esclarecê-lo de que convém não misturarmos critérios e medidas diferentes. O IRC que se estima será pago relativamente ao exercício de 2007…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Termino já, Sr. Presidente.

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Como eu dizia, o IRC que se estima será pago relativamente ao exercício de 2007 com o lucro contabilístico. A metodologia usada pela administração tributária é a que confronta o IRC efectivamente pago, à luz até dos pagamentos especiais por conta efectuados pela banca, com o lucro colectável para efeitos fiscais. São medidas diferentes — daí a diferença dos resultados.
Se o Sr. Deputado usar o mesmo critério da APB constata que o valor que refere para 2007 representa um incremento substancial relativamente a anos anteriores pelo mesmo critério.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Ou seja, pelo critério da administração fiscal — e eu não tenho de usar o critério da APB…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Como é que conseguem manipular os números desta maneira?!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, eu não tenho de usar o critério da APB…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem de concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Eu utilizo um critério rigoroso da administração fiscal. A taxa efectiva de tributação da banca aumentou de 18 para 20%, em dois anos.

Risos do Deputado do PCP Honório Novo.

O exercício de 2004 teve uma taxa efectiva de 18%, os exercícios seguintes têm uma taxa de 20%. Esta é uma realidade indesmentível pelos dados da própria Direcção-Geral das Contribuições e Impostos. Eu acredito que o Sr. Deputado não goste. O Sr. Deputado não gosta da banca,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — O Sr. Ministro está a desmentir-se a si próprio!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado Honório Novo, peço-lhe que não interrompa o Sr.
Ministro porque já excedeu o tempo regimental.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Eu nada tenho contra a banca, que desempenha um papel fundamental na nossa economia e no nosso país; e acho bem que os bancos dêem lucros, porque, caso contrário, nenhum de nós confiava no nosso sistema financeiro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, V. Ex.ª está a irritar-se muito, mas só há vantagens que neste debate as informações sejam dadas com rigor. Portanto, vou pedir-lhe esse rigor sobre duas questões.
A primeira é a de que o Sr. Ministro prometeu uma comunicação ao País sobre a utilização pelo Estado, por si, de offshore. Até agora, nem uma palavra e não respondeu na sua resposta anterior.
Sr. Ministro, queria que desse a este Parlamento os seguintes dados concretos: quanto é que exactamente, em 2007, foi depositado pelo sector Estado em offshore e em quais offshore? É porque o Sr. Primeiro-Ministro disse aqui na última sexta-feira que não era a administração directa do Estado, mas reconheceu que é o sector público quem fez esses movimentos. Ora, quero saber, nomeadamente, se há um cêntimo de desconto para as pensões dos trabalhadores que esteja a ser depositado em offshore. Quero saber quanto, onde e por quem. Temos o direito de o saber!

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Sr. Ministro, a segunda questão tem a ver com os bancos. Sr. Ministro, entendamo-nos bem: o Sr. Ministro foi a um jornal no passado fim-de-semana dizer que aumentou o IRC, em grande parte por causa do IRC pago pelo sector financeiro.
Sr. Ministro, não discuta aqui critérios gerais! Dê-nos os números exactos. Não fale de 2004, 2005 e de 2006. Fale-nos das suas projecções para 2007, porque as da banca são estas: vangloria-se a Associação dos Banqueiros de que os lucros subiram 9% e os impostos descerão 29%. Mas, Sr. Ministro, um empréstimo médio na banca para habitação de 150 000 euros, por exemplo, vai pagar no ano de 2007 e no ano de 2008 mais 600 euros/ano. Portanto, a banca tem mais lucros porque cobra muito mais, mas vangloria-se de pagar menos 29% de impostos. E, Sr. Ministro, V. Ex.ª acredita que os banqueiros vão manifestar ao público a sua satisfação dizendo: «Pagamos menos impostos», e afinal estão a pagar mais? Por quem é que o senhor nos toma, Sr. Ministro?! Se nos quer trazer números rigorosos, venham eles, mas agora o que sabemos é que as contas dos patrões da banca, dos banqueiros, são estes: 9% de lucros a mais, 29% de impostos a menos!! Por isso, Sr. Ministro, o senhor enganou-se na sua declaração ao jornal ou deixou que os leitores fossem enganados.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Nunes.

O Sr. Hugo Nunes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, o senhor hoje veio aqui apresentar um relatório que o honra a si,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Uma equação numérica!

O Sr. Hugo Nunes (PS): — … que nos orgulha a nós e que, certamente, seria também razão de satisfação para qualquer um dos seus antecessores ter vindo a esta Casa apresentar um relatório com os números que o senhor nos veio apresentar.
Bom, que estas são boas notícias e que este relatório se refere a um bom desempenho não há dúvidas, até porque todos os partidos da oposição que intervieram até agora tentaram desviar a discussão do essencial.
Ora, o essencial é que este relatório nos apresenta bons resultados, que nos apresenta um aumento da eficiência dos instrumentos e dos recursos existentes, que nos apresenta a eficácia das novas medidas tomadas e que demonstra também o aprofundamento da articulação entre os vários serviços públicos no combate à fraude e à evasão fiscais. Essas são verdades que ninguém hoje aqui conseguirá questionar.
Sr. Ministro, o crescimento e a melhoria dos resultados no combate à fraude e à evasão fiscais, ao longo destes últimos anos, tem «aberto a porta» à discussão relativamente à capacidade de estabelecer objectivos mais ambiciosos e de os conseguir cumprir.
Deixo-lhe, por isso, a seguinte questão: relativamente a 2008 e ao futuro, qual é a margem de crescimento destes resultados com a qual podemos contar de uma forma rigorosa? Por outro lado, pedia-lhe também que nos esclarecesse e que aprofundasse que medidas e que resultados podemos esperar desde já para 2008.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, entre o orgulho do Partido Socialista sobre este relatório e as referências por parte de algumas bancadas em relação a quem paga impostos em Portugal, quero dizer que este relatório é apenas uma das «faces da moeda» da situação que existe em Portugal.

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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — O combate à fraude e à evasão fiscais é, certamente, importante, mas também era relevante saber como estamos a nível de abusos, por parte da administração, face aos contribuintes.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Os exemplos são vários: em primeiro lugar, penhoras ilegais; em segundo lugar, vendas judiciais para além dos limites; em terceiro lugar, compensações de impostos que não são feitas na altura devida; em quarto lugar, informações pedidas pelos contribuintes e que não são dadas pela administração — estamos a falar de informações vinculativas; em quinto lugar, coimas aplicadas e que depois têm de voltar para trás porque não foram devidamente aplicadas; em sexto lugar, informações pedidas a noivos em relação a despesas que, muitas vezes, não são eles próprios a fazer;…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — … em sétimo lugar, inspecções que estão a aplicar de forma retroactiva e interpretações a situações de contribuintes.
Sr. Ministro, aquilo que lhe quero perguntar é o seguinte: nós ouvimos, com algum estadão, que vinha aí agora o Governo amigo dos contribuintes, dos que pagam e que é necessário defender. Como considera que estamos em relação a esta matéria? Sr. Ministro, como considera que estamos em relação a esta matéria? Olhe, Sr. Ministro, já que quer números, neste momento estão a ser discutidas em tribunal acções cujo valor global ultrapassa os 14 000 milhões de euros, isto é, mais de 9% do PIB. Veja se sabe para onde vai o défice a partir do momento em que estas acções começarem a ser decididas, que é algo muito simples.
O abuso de uso é a devolução de amanhã.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Esse é um problema que está a ser criado relativamente aos governos futuros. Esse é um problema que tem de ser efectivamente resolvido.
Sr. Ministro, foi aqui tratada uma matéria importante e que tem a ver com a utilização de offshore. Neste momento, discute-se pela Europa fora a transparência de utilização de instrumentos como este. É sabido que da parte do Estado há utilização de offshore. Ora, aquilo que pretendemos saber, Sr. Ministro, é algo muito simples: entre os 235 milhões de euros que o Estado está a aplicar em offshore, há aplicações por parte daqueles que são sujeitos passivos de imposto? Há aplicações por parte de empresas públicas? Há aplicações por parte de entidades que devem pagar os seus impostos? É que aquilo que pretendemos: uma informação, mas uma informação transparente! É preciso relembrar que ainda há pouco tempo se fez um regime de regularização tributária para que cidadãos e empresas cessem o dinheiro que têm aplicado em offshore. Como o princípio tem de ser transparente e conhecido, será que essas empresas ou esses elementos do Estado utilizaram o regime dessa altura? Será que fizeram a aplicação já depois dessa regularização? Aquilo que se pretende fazer não é estar aqui a criticar os instrumentos que são utilizados genericamente. O que se pretende é uma informação o mais detalhada possível e mais clara e transparente.
É porque, Sr. Ministro, de acordo com as notícias que vêm a público, no caso do Liechtenstein há entidades de origem terrorista como a ETA que tinham aí a utilização dos seus dinheiros.
Portanto, é necessário saber quem, no Estado, aplicou, o que aplicou e em que altura o fez, a bem da transparência, que, por exemplo, é a preocupação de Governos como o alemão.

Aplausos do CDS-PP.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados Francisco Louça e Diogo Feio, no que se refere aos offshore, não tenho qualquer indício, pela informação que me foi possível obter até ao momento, de que haja irregularidades ou ilegalidades nas aplicações aqui referidas em offshore por parte de entidades do sector público administrativo. A informação que foi prestada e que veio a público é uma informação agregada, cuja fonte dessa informação não detém, de momento, a desagregação desse valor. Foi já solicitada uma informação desagregada e a curiosidade que V. Ex.ª manifestaram é a mesma curiosidade do Ministro das Finanças que, obviamente está interessado em completar a informação até agora obtida.

Risos do CDS-PP, do PCP e do BE.

No entanto, realço aquilo que há pouco referi, ou seja, que não temos necessariamente que «demonizar» aplicações mesmo de entidades do sector público administrativo em offshore porque isso não é necessariamente sinónimo de actos ilícitos ou obscuros.
Quanto à questão da tributação do sector bancário, gostaria que o Sr. Deputado Francisco Louçã estivesse um pouco mais atento àquilo que é a informação vinda a público e os esclarecimentos que são prestados!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — É a sua opinião.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, relativamente à receita de IRC cobrada em 2007, verifica-se um aumento muito significativo do IRC pago pelos bancos em comparação com o IRC pago em 2006. O IRC pago em 2006 diz respeito ao exercício de 2005. O IRC pago em 2007 diz respeito ao exercício de 2006.
Como disse, aquilo que o Sr. Deputado referiu são estimativas da APB na base de critérios de medição diferentes dos usados pela administração tributária relativamente ao exercício de 2007, isto é, do IRC que vai ser pago em 2008.
Mas, curiosamente, os bancos ainda não efectuaram sequer qualquer pagamento por conta do IRC em 2008. O que a APB tem é uma estimativa de IRC que será pago. Portanto, não estamos a confrontar nem a falar de IRC efectivamente pago mas, sim, de estimativas da APB (que não estou em condições de lhe dizer se são fidedignas ou não), usando métodos de mediação diferentes dos nossos.
Sr. Deputado, o IRC pago em 2007 aumentou relativamente a 2006; em 2008 ainda vai ser pago o IRC referente ao exercício de 2007 e as medidas adoptadas pela administração fiscal, quer no enquadramento legislativo quer no âmbito da inspecção e da fiscalização, permitem-me, de facto, esperar que a evolução registada nestes últimos anos quanto a uma maior participação da banca no esforço tributário continue a registar-se em 2008. Portanto, não estou a confrontar estimativas com factos ocorridos em 2007.
Se o Sr. Presidente me permite, gostaria de terminar de responder esclarecendo o Sr. Deputado Digo Feio…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — O Sr. Ministro já excedeu largamente os seus 3 minutos e, portanto, não tem tempo…

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Termino já, Sr. Presidente.
Se me permite, quanto aos erros, gostaria de referir ao Sr. Deputado que ocorrem erros da administração fiscal e que eles ocorreram no passado: «Finanças pedem 8 milhões a mulher 100 posses» — isto foi noticiado em Dezembro de 2003, Sr. Deputado! «Ilegalidade de cobrança de IMT mantém-se: fisco aplica penalizações sem base legal para o fazer» — esta é uma notícia de Fevereiro de 2004! Para além destas posso ainda citar: «Fisco retém reembolsos de milhares de contribuintes» e «Erros informáticos e desactualização das bases de dados registam dívidas que já foram pagas» — notícias publicadas em Novembro de 2004.

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Em Outubro de 2004, uma prestigiada consultora escrevia que «Em sede de garantias dos contribuintes e de competitividade do sistema fiscal, este Orçamento do Estado para 2005 representa provavelmente o maior retrocesso desde a reforma fiscal do início da última década do século passado»!...

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ofélia Moleiro.

A Sr.ª Ofélia Moleiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, quase no início do seu mandato, portanto, há praticamente três anos, o Sr. Ministro comprometeu-se perante a Assembleia da República e a Comissão de Orçamento e Finanças a implementar medidas de tributação indirecta dos serviços prestados em casamentos, em eventos, enfim, naquelas actividades económicas em que fosse mais difícil detectar por declaração os lucros para tributação. Acontece que, não fazendo este «trabalho de casa», que conta já com três anos, o Ministério escolheu a via mais fácil e pegou nos portugueses nubentes, nos noivos e, sem ser convidado, foi à festa de casamento…

Risos do PSD.

Ora, Sr. Ministro, sempre ouvi dizer e sempre me educaram dizendo que «a casamentos e a baptizados não se vai sem se ser convidado».
Mas o que mais impressiona é que os inquéritos que são lançados aos que não são contribuintes, mas apenas clientes, têm perguntas que são do foro privado das pessoas, tais como quem deu o vestido da noiva, quanto custou, quem deu presentes e quanto é que custaram… Ó Sr. Ministro, o nosso código de ética pessoal, o nosso código de boa educação em Portugal diz-nos que não devemos perguntar o preço das coisas que nos oferecem!… Portanto, tudo isto cria um clima muito desigual e muito desagradável.
Pergunto, Sr. Ministro: será legítimo, com esta «febre» de combate à evasão fiscal — que, devo dizer, é uma «febre» que o PSD também tem, também sofro dessa «febre» —, atropelar os direitos constitucionais dos contribuintes e continuar a fazer a «história» de cada casamento? É porque o que o Sr. Secretário nos disse foi que havia correcções, não nos disse que acabava com isso e, portanto, pergunto-me: será que vamos fazer dos 10 milhões de portugueses 10 milhões de trabalhadores ao serviço da administração fiscal?! Será que até as crianças vão ter de fazer o dossier das pastilhas elásticas que compram? Sim, porque crianças também são compradoras… No limite, podemos chegar a esta situação.
Até me interrogo mais: e se o Sr. Ministro ou o Sr. Secretário de Estado descobrirem que há um outro sector de actividade que eventualmente também foge à fiscalidade?! E se forem produtos íntimos, que perguntas nos vão fazer para as nossas casas?!

Risos.

Tenho medo por todos os portugueses. Temos de ter vida privada, Sr. Ministro… Pergunto: para quando as medidas indirectas para os contribuintes?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos novamente, porque não deve ter ficado devidamente esclarecido antes, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, de facto, não fiquei esclarecido em relação a questões que coloquei ao Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

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Em primeiro lugar, relativamente à matéria dos offshore, anotamos a sua resposta, Sr. Ministro.
Consideramos que esta é uma matéria que, com toda a sinceridade, ultrapassa a mera curiosidade, e que se trata de uma questão de transparência de funcionamento do mercado.
Pergunto ao Sr. Ministro se tem a possibilidade de assumir o compromisso de que, mal tenha essa informação, ela seja tornada pública para que se possa saber precisamente quem, quando e com que dividendos, porque isso é verdadeiramente essencial, uma vez que, como lhe disse, o Estado determinou — e bem! — um regime de regularização em relação a estas situações para que exista informação. Ninguém está aqui a tornar num demónio a existência de offshore, mas este é um movimento que existe pela Europa fora no sentido de uma maior transparência em relação à informação e, como deve compreender, Sr. Ministro, ela deve ser especialmente existente quando falamos de instituições que estão ligadas ao Estado. É natural que assim seja e, por isso mesmo, Sr. Ministro, peço-lhe que assuma esse compromisso.
Sr. Ministro, em segundo lugar, não podemos deixar de assinalar que, em relação a várias situações que lhe colocámos sobre abuso de posição por parte da administração, e que não são propriamente pequenas, não se trata de um erro. Uma coisa é um erro, outra coisa é um abuso. Aliás, Sr. Ministro, se perguntar a qualquer especialista que estude estas matérias se, neste momento, há uma situação de equilíbrio entre administração fiscal, por um lado, e contribuintes, por outro, dir-lhe-ão que não existe. E se o Sr. Ministro tem muitas dúvidas pode colocar essa questão ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que bem estuda esta matéria e que sabe a resposta que lhe dará em relação à mesma.
Sr. Ministro, faço-lhe também uma pergunta muito pela positiva. Estão, neste momento, a ser discutidos, na Comissão de Orçamento e Finanças, projectos do CDS-PP em relação à arbitragem fiscal e à caducidade das garantias. Apresentámos, também, no Plenário da Assembleia da República outros projectos que são claramente defensores da situação do contribuinte face aos abusos da administração fiscal, por exemplo, em relação à matéria da compensação no IVA e à possibilidade de comissões arbitrais a funcionarem nos tribunais para que as questões se resolvam mais depressa. Portanto, era essencial saber, Sr. Ministro, qual a opção que o Governo tem em relação a esta matéria. Continuamos à espera! Continuaremos a apresentar propostas alternativas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, desde que o Governo entrou em funções decretou o maior aumento de impostos de que há memória, em relação a nove impostos, e um deles foi o imposto sobre produtos petrolíferos (ISP). Decretou esse aumento logo em 2005, avisando os portugueses de que esse aumento iria perdurar pelo menos até 2009. Em consequência disso, as receitas provenientes deste aumento de impostos fazem até com que, hoje, se pague mais 20% de impostos sobre os produtos petrolíferos, sobre a gasolina, do que o que se pagava em 2005. Por decisão deste Governo, a cada litro de gasolina acrescem mais 12 cêntimos de impostos. Isto tudo para reforçar a receita fiscal, em relação à qual o Governo é sempre insaciável.
Perante isto, ficámos a saber, hoje, que só por este aumento de impostos, ficando o preço do petróleo, este ano, em média em cerca de 100 $ por barril, o Governo irá arrecadar uma receita suplementar de cerca 190 milhões de euros.
Todos sabemos — o Sr. Ministro sabe — que este agravamento do ISP tem consequências negativas para a economia portuguesa e tem consequências negativas para as empresas porque enfraquece a sua competitividade e tem consequências negativas para as famílias.
Mas, nos últimos dias, tivemos conhecimento de duas novidades, sendo que uma delas veio do próprio Governo. No relatório que o Sr. Ministro nos enviou, o Governo confessa que o acentuado desvio de comércio de Portugal para Espanha, em virtude dos significativos desníveis de preço dos combustíveis, em muito originados pela fiscalidade, correspondem a uma dificuldade da máquina fiscal. Ou seja, a máquina fiscal sente, hoje, dificuldades em cobrar tudo o que devia por responsabilidade do próprio Governo, dada a

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acentuada diferença de fiscalidade entre Portugal e Espanha. Não somos nós que o dizemos, foi o Governo que o disse.
A segunda novidade decorre da intervenção do seu antecessor, do ministro socialista do mesmo Governo de que o senhor faz parte, Dr. Campos e Cunha, que disse que, havendo necessidade de baixar impostos, dever-se-ia começar pela redução do ISP.
Perante este cenário, só tenho uma questão para lhe colocar: vai continuar a atirar milhões de euros dos portugueses para o «superavitário» orçamento de Espanha, ou vai seguir o conselho do seu antecessor, Campos e Cunha, e baixar o IRC para, assim, reforçar a competitividade da economia portuguesa?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Ministro, a sua resposta sobre os offshore é, no mínimo, surpreendente. Uma semana depois de prometer uma comunicação ao País, veio ao Parlamento e, instado, diz que não sabe. O Fundo Monetário Internacional identificou 235 milhões de dólares do Estado em alguns offshore, identificou mais sete offshore onde não se sabe quanto está. Perguntamos-lhe quanto está depositado nos offshore e se foram empresas do Estado ou se foi a segurança social.
O Sr. Ministro diz que não sabe, que vai perguntar ao Fundo Monetário Internacional, que vai pedir a desagregação. Mas, Sr. Ministro, não é em Washington que o senhor tem de obter a informação! É nas empresas públicas, é na gestão da segurança social, é no Estado, porque foi o Estado que fez este investimento.
Sr. Ministro, compreenda que seria com muito desgosto que o veríamos sair deste Parlamento sem nos deixar aqui o que tem de deixar, que é a lista das entidades públicas, o valor que elas depositaram e a razão pela qual fizeram esses depósitos em cada um dos offshore.
Sr. Ministro, o senhor deve a verdade ao País. E nós precisamos de saber em que é que o dinheiro público, que é de todos, está a ser aplicado. Vai apresentar-nos essa lista, Sr. Ministro?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, dispondo de 3 minutos, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, no que diz respeito à questão dos casamentos, que foi aqui suscitada, e de acordo com informação que tenho à minha frente, gostaria de recordar que deve utilizar-se a seguinte metodologia de actuação, tendo em vista a luta contra os fenómenos de evasão fiscal no sector da restauração: «contacto pessoal com os cônjuges no sentido de recolher informação com relevância fiscal sobre a existência de banquetes, ou seja, identificação do restaurante que o serviu e do proprietário das instalações, se estas foram alugadas expressamente para o efeito, do fotógrafo interveniente e de outros prestadores de serviços, e montante das despesas pagas aos diversos intervenientes, bem como identificação dos meios de pagamento utilizados».
Esta é uma informação que foi distribuída por uma Direcção Distrital de Finanças como a que deu origem às notícias recentes, e que está datada de 26 de Setembro de 2002.
Sr.ª Deputada Ofélia Moleiro, o combate à fraude e à evasão fiscais, como foi aqui dito e como começou por referir o Sr. Deputado Patinha Antão, não é apanágio deste Governo; é um desígnio de vários governos e é um trabalho que tem vindo a ser desenvolvido de há algum tempo a esta parte, neste domínio, identificando áreas de risco e adoptando as medidas necessárias.
Na verdade, este Governo intensificou esse combate, mas continuou a dar atenção aos sectores de risco previamente identificados pelos governos liderados pelo partido de V. Ex.ª. Portanto, isto não é novo, uma vez que se trata de uma prática que já dura há vários anos. Aliás, posso citar exemplos emanados de outras

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direcções distritais de finanças e que datam de períodos anteriores a 2005, altura em que este Governo começou a exercer funções.
Por conseguinte, se há por vezes excesso de zelo — como o Sr. Secretário de Estado aqui teve a hombridade de o reconhecer —, isso pode ser corrigido, mas não podemos baixar os braços e deixar de lutar contra a fraude e a evasão fiscais nos sectores de risco onde as mesmas são identificadas. Esta é uma luta que temos de continuar, e quem não está disposto a continuar esta luta — e sublinho as palavras do Deputado Patinha Antão — não é digno de estar nesta Sala!

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — No que se refere às questões suscitadas pelo Sr. Deputado Diogo Feio relativamente aos projectos do CDS, gostaria de dizer que não vou antecipar a discussão. Quando os projectos do CDS vierem a debate teremos oportunidade de os discutir e de expressar a nossa posição.
Quanto aos offshore, Srs. Deputados Diogo Feio e Francisco Louçã, a informação que veio a público invoca um relatório do FMI que tem como fonte dados compilados pelo Banco de Portugal.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — O tempo de que dispunha terminou, Sr. Ministro. Agradeço-lhe que conclua.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Vou concluir, Sr. Presidente.
A fonte a que me referi há pouco não era o FMI, mas os dados que vêm do próprio Banco de Portugal, instituição junto da qual irei obter informação mais detalhada.
Gostaria, no entanto, de alertar os Srs. Deputados para que tenham alguma prudência na suficiência e ênfase que põem nestas questões. Isto porque creio que todos temos aplicações das nossas poupanças no sistema financeiro,…

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Em offshore não sei! O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — … e aplicamos as nossas poupanças em fundos e em fundos de fundos. Ora não sei se todos os Srs. Deputados sabem exactamente onde é que esses fundos aplicam os dinheiros que nós lá colocamos. Porventura podem ter alguma aplicação em qualquer fundo de um banco com o qual tratam, que pode ter aplicações em offshore.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — E não temos o direito de saber?! Ora essa!…

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Portanto, sejamos cautelosos e prudentes nestas afirmações que por vezes estão cheias de deficiências.
Por isso, gostaria de ser muito claro em relação a esta matéria. O assunto terá com certeza de ser esclarecido, mas não quero nem me disponho a demonizar uma qualquer instituição por procurar gerir bem os dinheiros públicos, à luz da lei, não cometendo qualquer irregularidade ou ilegalidade.
No que diz respeito ao ISP, Sr. Deputado Duarte Pacheco, recordo que o ISP é normalmente actualizado de acordo com a taxa de inflação. Isto porque não é um imposto, é uma taxa específica. Portanto, houve, de facto, um aumento dessa taxa, aumento esse decidido em 2005.
É verdade que não aplicámos a actualização da inflação nos dois anos anteriores, isto é, em 2006 e em 2007, mas quero recordar ao Sr. Deputado que este ano nem actualizámos o imposto de acordo com a inflação nem aplicámos qualquer agravamento na taxa do ISP. Repito, o ISP não foi agravado em 2008, em comparação com 2007, portanto as reflexões que o Sr. Deputado fez no que se refere a 2008 não têm qualquer fundamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — O Sr. Deputado Honório Novo pediu a palavra para que efeito?

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O Sr. Honório Novo (PCP): — Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, face à controvérsia de alguns números aqui citados, creio que estou em condições de contribuir para um melhor esclarecimento relativamente a esta matéria. Por isso, peço que, através da Mesa, seja entregue ao Sr. Ministro um extracto de uma Acta de um debate levado a cabo quando da discussão do Orçamento do Estado para 2008 em que está transcrita uma afirmação do Sr.
Primeiro-Ministro que diz que «entre 2006 e 2007 a taxa efectiva da banca passou de 16% para 18%».
Tenho ainda cópia de outra Acta, de 30 de Novembro de 2006, que transcreve uma afirmação do Sr.
Ministro de Estado e das Finanças em que dizendo à TV que a taxa efectiva do imposto pago pelo sector bancário — taxa essa calculada sobre os resultados após posição de provisões — foi de 11,3%. Portanto, face aos números aqui avançados, creio que é importante que o Sr. Ministro possa levar estas duas Actas para casa, para nos dar alguma informação adicional em momento posterior.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faremos chegar ao Sr. Ministro de Estado e das Finanças a cópia das Actas referidas, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Patinha Antão.

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sr. Ministro de Estado e das Finanças, V. Ex.ª sublinhou que temos uma diferença de ponto de vista quanto à posição do Estado relativamente aos offshore. O Sr. Ministro entende que as entidades do Estado podem utilizar offshore no domínio da legalidade. Nós, Partido Social-Democrata, entendemos que não e explicámos porquê.
Vejamos os elementos concretos e objectivos. O Sr. Ministro diz que podem existir entidades do Estado que, através de fundos de fundos, podem ter aplicações em offshore. Ora, isso é verdade.
Sr. Ministro, qual é a razão dessa aplicação por parte de fundos do Estado? Gerir melhor a tesouraria? Não, Sr. Ministro! Essa tesouraria só pode ser melhor gerida utilizando praças de offshore se porventura houver elisão fiscal e incumprimento dos deveres fiscais para com o território fiscal residente, que é Portugal.
Por esta razão, Sr. Ministro, defendemos que qualquer eventual ganho que V. Ex.ª possa apor a essa definição deve ser eliminado por razões éticas — até pelo sinal que se deve dar.
V. Ex.ª avançou com uma iniciativa agressiva em matéria de planeamento fiscal: pretende que os sectores privados se abstenham deles em termos de actos objectivos. Pois bem, Sr. Ministro, a primeira coisa que deve fazer é evitar que o Estado esteja neste «nevoeiro» que faz com que possa legitimamente ser acusado de eventuais práticas desse tipo.
Depois, Sr. Ministro, é surpreendente (e perdoar-me-á a ironia) que V. Ex.ª não utilize a lógica da «empresa na hora» relativamente à obtenção de informação das entidades públicas que utilizam offshore.
Na verdade, o Sr. Ministro e o Conselho de Ministros podem, num ápice, resolver este seu problema de informação. Basta que o Sr. Ministro ou o Sr. Primeiro-Ministro estabeleçam que todos os directores-gerais e todos os presidentes das entidades públicas que porventura tenham essas operações declarem «na hora» essa informação. Parece-nos estranho que o Sr. Ministro precise de 12 dias (que já estão contados) para fazer esta pergunta ao Banco de Portugal, entidade que, como V. Ex.ª agora disse, é a fonte originária desta informação precisa. O Sr. Ministro precisa de 12 dias?!… Que eu saiba, a comunicação em termos electrónicos entre o Ministério das Finanças e o Banco de Portugal faz-se exactamente com a mesma velocidade com que se faz no resto do País…! Sobre a matéria mais profunda e mais séria do combate à evasão e à fraude fiscais relativamente a recursos tidos em offshore, gostaria que o Sr. Ministro nos dissesse — porque já fizemos essa pergunta e não obtivemos resposta —, em termos de compromisso estratégico, qual era o objectivo geral do Ministério das Finanças para reduzir os 22% do PIB, que alegadamente correspondem à fraude e à evasão fiscais com que iniciou o seu mandato. O Sr. Ministro espera chegar a 2009 com que ratio? Com 15%, que é um valor bastante

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razoável? Com 11%, que é o que corresponde à melhor prática europeia? Com 22%, que é nada fazer? Ou então eventualmente espera chegar aos 20%, que, como sublinhou, é o resultado da continuidade das medidas que vêm de trás e que têm de ver com a qualidade da máquina fiscal e com o empenhamento de todos na área fiscal com vista a conseguir melhores resultados. Sr. Ministro, diga-nos qual é o valor que pretende atingir neste mandato.
É porque este é um problema central, como V. Ex.ª sublinhou. É inaceitável que Portugal figure no topo do ranking europeu em matéria de evasão e fraude fiscais. Por isso pergunto: qual é o seu objectivo? Quais são as suas medidas estratégicas? Sr. Ministro, convocámo-lo para um debate no que diz respeito aos métodos indirectos. O Sr. Ministro teve ocasião de dizer que relativamente à aplicação destes métodos no governo anterior esse processo avançou também ao nível de procurar obter informação para que os mesmos pudessem ser aprimorados.
Além disso, num debate que aqui tivemos, o Sr. Secretário de Estado disse: «Estamos a pedir informações aos noivos para poder vir a definir os chamados indicadores técnico-científicos, que estarão prontos em 2009». Ó Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, com franqueza…! V. Ex.ª vai aplicar métodos indirectos quando estiver em pré-campanha eleitoral?!… Bom, cá estaremos para ver!… Mas há outras matérias sobre as quais gostaríamos de ouvir a sua opinião, Sr. Ministro.
Gostaríamos de saber se o Governo do Eng.º António Guterres andou «distraído» entre 1996 e 2001, porque, de acordo com a informação que nos foi dada, prescreveram dívidas fiscais na ordem dos 633 milhões de euros. Nos dados que VV. Ex.as nos deram a data refere-se ao período entre 1990 e 1995, por isso gostaríamos de perguntar quem é que andou «distraído» com as prescrições das dívidas. Além disso, Sr.
Ministro, gostaríamos de saber quais são os objectivos em matéria de garantia de que não haverá prescrições fiscais das dívidas cujos prazos estão neste momento a correr.
Sr. Ministro, não se surpreenda com o facto de que num debate desta natureza exista por parte das várias bancadas (que têm visões políticas plurais) atitudes de convergência, como a que observámos relativamente aos offshore e particularmente à posição do Governo no que diz respeito ao Estado. Devo dizer que não acompanhamos evidentemente o Sr. Deputado Honório Novo ou do Sr. Deputado Francisco Louçã relativamente à pertinácia com que entendem que a questão da evasão fiscal deve estar concentrada nos bancos. Não os acompanhamos nessa posição.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Isso é que era bom!

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Percebemos que a esquerda substituiu o fetiche da mercadoria pelo fetiche da banca.
Mas o Sr. Primeiro-Ministro, Eng.º José Sócrates, disse há um ano que iria perseguir a banca, portanto não se surpreendam que este discurso surja nesta altura.
Seja como for, do ponto de vista técnico, que é o que nos interessa agora, gostaríamos de perguntar-lhe o seguinte, Sr. Ministro: relativamente à tributação efectiva, o senhor vai melhorar e refinar a tributação de provisões, de complementos de reforma de activos que hoje estão abaixo da linha quer dos bancos quer de outras entidades, e que efectivamente neste momento não são tributados? Qual é o impacto desse tipo de medidas? Por último, Sr. Ministro, repito uma pergunta: o que é que o Sr. Ministro tem a dizer aos portugueses quando chegar a final do mandato? Vai dizer-lhes assim: «Comecei com 22% do PIB em evasão e fraude fiscais. Termino com que resultado? Que resultado consegui? Que poupanças consegui? Que recursos consegui para contrabalançar o excesso de carga fiscal?».
Este excesso de carga fiscal é, do nosso ponto de vista, completamente injusto, desnecessário e contraproducente. VV. Ex.as avançaram com esta carga fiscal através de uma estratégia de consolidação orçamental relativamente à qual temos discordâncias profundas.
O nosso caminho seria outro, mas convocamo-los para nos explicarem qual é efectivamente o resultado que conseguem no que é hoje o nosso magno debate, que é uma questão absolutamente vital para a qualidade do desempenho do seu Ministério.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Srs. Deputados: Estamos hoje a debater o Relatório sobre o combate à fraude fiscal, infelizmente e no essencial, uma cópia do que aqui ocorreu há um ano e uma repetição do debate de 2006.
Temos, é certo, um relatório cuja componente técnica e estatística mostra progressos na introdução de meios electrónicos na gestão e no controlo, revela progressos na cobrança coerciva e indicia alguma evolução no que respeita ao cumprimento de obrigações fiscais. Mas temos também um relatório que, à semelhança dos dois anteriores, passa completamente à margem das questões políticas que estão associadas ao combate à fraude e à evasão fiscais, passa ao lado das questões essenciais, sejam elas de natureza instrumental, sejam elas relativas à justiça e à equidade fiscal.
Não é possível nem aceitável que, ao fim de três anos, o Governo não mexa um dedo para quantificar os resultados do combate à evasão fiscal e os seus efeitos na economia paralela.
Sabemos que o Banco de Portugal estima em 21% do PIB a economia paralela no País. Ouvimos, há poucos meses, uma alta dirigente de um organismo internacional estimar acima de 20% do PIB o peso da economia informal. Ouvimos, há dois anos, o Ministro das Finanças admitir estes valores. Daí para cá nunca mais o Governo mostrou vontade política para avaliar a situação, para quantificar a sua evolução.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Houve ou não diminuição do peso da economia paralela em Portugal? Continua acima ou já está abaixo dos 20% do PIB? Por que não está o Governo interessado em saber? É que 20% do PIB são cerca de 34 000 milhões de euros que não pagam impostos. Se só metade, repito, metade deste valor pagasse imposto, o défice orçamental seria zero, os reformados teriam melhores pensões, o investimento em saúde e educação poderia ser maior, a carga fiscal sobre quem trabalha poderia, certamente, ser menor.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Não é possível insistir no combate à evasão e à fraude fiscais e deixar de lado — como volta a fazer o Governo e o Relatório — instrumentos essenciais para garantir a transparência e a equidade fiscais.
Em 2006, o Governo prometia avançar com medidas tendentes a eliminar o sigilo bancário.
Em 2006, o Governo anunciava estar disposto a colocar Portugal na rota da modernidade e a fazer alinhar o País pelas melhores práticas europeias.
O Relatório mostra os resultados, os maus resultados, diga-se! Pouco mais de 1000 processos de levantamento do sigilo, em 2007.
Mas o que mais pesa é o quebrar dos compromissos, é o deixar na gaveta, isto é, no caixote do lixo, a proposta minimalista e discriminatória que apresentaram e que, por isto mesmo, esbarrou em inconstitucionalidades.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Vêm, agora, o novo Secretário de Estado e, hoje, o próprio Ministro das Finanças dizer que a legislação actual, afinal, é adequada e não valerá a pena alterar o quadro actual. São estas afirmações verdadeiramente espantosas que responsabilizam o Governo e que sinalizam mais um compromisso público quebrado, ou em vias de ser assumidamente quebrado, por este Governo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

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O Sr. Honório Novo (PCP): — A recusa em utilizar informações bancárias como regra geral para eliminar dúvidas ou situações de evasão ou crime fiscal é o princípio de todas as injustiças e da mais completa iniquidade fiscal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — É assim que temos, por um lado, o levantamento do sigilo bancário para quem beneficia do complemento social para idosos ou do rendimento social de inserção…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — … mas mantemos, por outro lado, fechado a sete chaves, de uma forma absolutamente inaceitável e hipócrita, o acesso à informação bancária de quem tem manifestações exteriores de riqueza, de quem não declara o que está obrigado ou de quem — ainda pior! — comete fraude ou crime fiscal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Também no plano legislativo este Relatório e o Governo fogem às questões essenciais.
Não se trata apenas da tão prometida e sistematicamente adiada revisão e simplificação dos códigos ou do combate, tantas vezes prometido, aos benefícios e isenções fiscais, cuja proliferação e crescente injustiça não cessam de aumentar. Trata-se do repetido e insistente anúncio de legislação, cujos efeitos são, muitas vezes, mais do que duvidosos. É o caso mais conhecido da legislação sobre o planeamento fiscal abusivo.
Foi anunciada no debate orçamental de 2006. Foi, novamente, proclamada há um ano, no debate do Relatório sobre a evasão fiscal, tendo o Ministro das Finanças dito, na altura, que havia uma «preocupação em identificar e corrigir práticas abusivas de planeamento fiscal». Mas, afinal, a nova legislação só foi aprovada mesmo no final de Dezembro de 2007, não está ainda regulamentada e só irá entrar em vigor, talvez, em Maio de 2008.
Vinte meses para produzir uma legislação que, afinal, nem sequer vai limitar ou impedir algo de significativo e substancial;…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — … a única coisa que vai impor é que os «truques» sejam previamente comunicados à administração fiscal. Nenhuma vantagem fiscal «abusiva» será impedida nem limitada.
Em 2007, houve quase 1200 milhões de euros de vantagens fiscais com o planeamento fiscal; no essencial, tudo mas tudo vai ficar na mesma, porque tudo, mas tudo, continuará, na legislação, lícito e legal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Resultados para a receita fiscal? Zero! Resultados para a justiça fiscal? Nenhuns! Por tudo isto, não admira, Sr.as e Srs. Deputados, que a cobrança fiscal aos sectores bancários e financeiros tenha novamente caído. E nem importa invocar aqui os valores referidos pelo Sr. Secretário de Estado ou, hoje, pelo Sr. Ministro, que até contrariam declarações anteriores do próprio Ministro das Finanças e do Primeiro-Ministro, em debates prévios.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

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O Sr. Honório Novo (PCP): — Importa sublinhar os números conhecidos e que ninguém desmente, da própria banca. A banca continua a aumentar os seus lucros e prepara-se para pagar, relativamente ao ano de 2007, bem menos do que em 2006, voltando aos tempos das taxas efectivas de 13% a 14%.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Uma vergonha!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Este número, Sr. Ministro e Srs. Deputados, traduz bem o nível da injustiça fiscal em Portugal. Este número destrói pela base qualquer relatório governamental sobre o combate à evasão e à fraude fiscais, por mais completo e tecnicamente qualificado que se apresente. Este número, Srs.
Membros do Governo e Srs. Deputados, mostra bem quais são, afinal, para além da retórica e do discurso, os conceitos de equidade e de justiça fiscal deste Governo: pressão e carga fiscal sobre quem trabalha, privilégios, festins e ostentação para os ricos e poderosos!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Baptista.

O Sr. Victor Baptista (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado e das Finanças: Este é o melhor Relatório sobre a fraude e a evasão fiscais que foi feito nos últimos anos. Extenso, exaustivo, pormenorizado e que alerta para situações às quais é necessário dar resposta.
Nos últimos três anos, houve, em média, 125 890 inspecções, correcções às matérias colectáveis, pagamentos de impostos por iniciativa do próprio contribuinte. Isto demonstra, claramente, que o Governo não tem dado tréguas a este combate. E só poderá haver eficiência e justiça fiscais se, evidentemente, o Governo se disponibilizar, através dos meios de que dispõe — os serviços tributários e de fiscalização —, a recuperar os impostos que outros têm a obrigação de pagar e não cumprem. Só através do alargamento da base tributária será possível diminuir as taxas de imposto.
As intervenções que aqui foram produzidas pela oposição são intervenções normais…

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Vá lá!

O Sr. Victor Baptista (PS): — … de quem tudo diz, desde que seja no sentido do mal. Não houve uma única palavra de reconhecimento pelo trabalho que foi assumido por este Governo nesta matéria. Até o Sr. Deputado Francisco Louçã fez aqui um exercício de pura demagogia, ao dizer que, por um empréstimo para habitação de 150 000 € se iria pagar, por ano, mais cerca de 600 € de juros, de encargos,…

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Continhas bem feitas!

O Sr. Victor Baptista (PS): — … tendo subjacente que isto seria lucro para o próprio banco. Sr. Deputado, já conhecia a teoria do Sr. Deputado Honório Novo, em termos bancários, de estar sempre contra os bancos, agora o que desconhecia é que adiantava aqui um montante e não fazia a respectiva compensação. É que, como sabe, hoje, as entidades bancárias, para fazerem financiamento, têm de usar 8% de capitais próprios; depois dos 8%, para emprestar, ou depositam o dinheiro, e têm um custo do depósito, ou vão ao refinanciamento bancário.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Estou com tanta pena dos bancos!…

O Sr. Victor Baptista (PS): — Portanto, hoje, os juros pagos pelo contribuinte, ou pelo cidadão, também têm um custo, por parte do banco,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Quer 10 € para dar aos bancos?! Se quiser, ofereço-lhos!

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O Sr. Victor Baptista (PS): — … pelo que não correspondem a um lucro do próprio banco. É um exercício de pura demagogia apresentar o problema dessa forma!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Coitados dos bancos!…

O Sr. Victor Baptista (PS): — Mas este exemplo também serve, como é evidente, para o Sr. Deputado Honório Novo, concretamente para lhe dizer, de forma muito rápida, o seguinte: os bancos têm uma função na actividade económica, não são apenas entidades de depósitos e de empréstimos,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — É verdade!

O Sr. Victor Baptista (PS): — … têm a função de criar liquidez, de contribuir para a liquidez,…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Também é verdade!

O Sr. Victor Baptista (PS): — … para financiar o desenvolvimento do País.

O Sr. Honório Novo (PCP): — E têm de pagar impostos!

O Sr. Victor Baptista (PS): — Porque não me quero alongar mais sobre esta matéria, apenas duas referências, a primeira das quais sobre o stock da dívida.
O stock da dívida era, em 2001, de 2,9 milhões de euros; em 2003, Sr. Deputado Patinha Antão, era de 4,2 milhões de euros; em 2007, há uma inversão para 3,1 milhões, o que demonstra a eficiência fiscal.
Quanto às prescrições, foi aqui dito que, pelos vistos, o ano de 2007 seria deste Governo, mas não, Sr. Deputado, já que se trata de prescrições de processos até ao ano de 2004, de processos prescritos num sistema que inclui o ano de 2004 e não de 2007.
Por último, Sr. Ministro, uma questão fundamental. Temos, de facto, uma dívida exequenda de 14 000 milhões, isto é, de cerca de 9% do PIB. Por isso, é fundamental que o Governo tenha no horizonte que, para que haja equidade fiscal, é preciso alargar a base tributária, é preciso que todos contribuam, paguem e cumpram os seus compromissos fiscais perante o País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Sr.as e Srs. Deputados: Não sei se os estados de alma incluem a produção de tabus mas, se assim fosse, o dia de hoje seria um estado de alma muito elevado.
Surgiu um primeiro tabu: o Governo não mexe no segredo bancário, apesar de ter prometido, com solenidade, no Programa do Governo, alterá-lo, do ponto de vista das regras. Agora, já nada é preciso, nada vale a pena.
Mas há um segundo tabu, que é ainda mais importante: o dos offshore. Sr. Ministro das Finanças, tenho a certeza, sobre si, de que é um homem que se leva a sério. O senhor anunciou uma declaração ao País na quarta-feira passada; uma semana depois, não nos diz nada a não ser que a culpa é do Banco de Portugal, porque não lhe deu a informação. Não acredito nisto! Não acredito que, numa semana, o Banco de Portugal possa ter apresentado contas ao Fundo Monetário Internacional mas, perguntado pelo Governo de Portugal sobre as mesmas contas, nada lhe diga. Sr. Ministro, não acredito!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O problema é seu!

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O Sr. Francisco Louçã (BE): — Pois é! O problema é meu e dos portugueses, porque os portugueses dizem, ao caso, «Cuidado com o Governo! Cuidado com o Governo! Nós pagamos os impostos, como devemos, mas o Governo, a segurança social ou as empresas públicas aplicam o nosso dinheiro sabe-se lá onde e não o querem dizer».
Terceiro aspecto: os bancos.
Sr. Ministro, V. Ex.ª diz-nos o seguinte: «os bancos vão pagar mais». Os bancos, por sua vez, dizem: «Aleluia, vamos pagar menos!». Alguém há-de ter razão!...
Mas vamos ao fundo da questão: por que é que os bancos estão contentes e o Sr. Ministro também, pelas razões opostas? É que os bancos, usando a lei, a facilidade e o facilitismo da lei, vão depositar 1500 milhões de euros em provisões e com isso não vão pagar impostos devidos. Porquê? Porque os bancos vão protegerse contra dificuldades financeiras e nomeadamente, já agora, contra o facto de ter havido uma fraude no BCP que levou ao desaparecimento de algumas centenas de milhões de euros.
Portanto, peço-lhe o seguinte, Sr. Ministro: veja bem o significado das provisões! Quer dizer que os bancos podem pagar menos impostos recorrendo a um apoio fiscal que faz com que todos os contribuintes paguem uma parte da fraude que ocorreu no BCP e dos desmandos do Eng.º Jardim Gonçalves. Logo, perante esta contradição entre o optimismo do Governo e o optimismo dos bancos, já sabemos normalmente o resultado: ganha quem é mais forte.
Por isso é que os portugueses devem estar atentos. «Segurem as carteiras! Andam bancos à solta!» E estão a utilizar facilidades que lhes deram para provisões que legal mas ilegitimamente permitem a fuga aos impostos.
Se não fosse assim, Sr. Ministro, acha que a banca se atrevia a dizer-lhe que vai pagar muito menos impostos? Menos 6% de IRC do que no ano anterior! O anúncio está feito e ele é de uma gravidade imensa que não se resolve com a sua desculpa de que tudo chegará ao caminho certo. Não é assim.
Na verdade, Sr. Ministro, lamento muito que vá, hoje, sair do Plenário sem dizer ao País o que prometeu, que é a verdade sobre os offshore, e sem nos garantir que os impostos são pagos segundo a lei portuguesa, porque hoje já sabemos que há bancos à solta.

Aplausos do BE.

Neste momento, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Jaime Gama.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Vou referir as notas finais sobre este debate.
A primeira, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, é para que fique muito claro que, de acordo com a bancada do CDS, os abusos da administração fiscal não dependem da altura do calendário em que foram cometidos. São todos abusos, portanto todos devem ser criticados,…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Na altura não criticaram!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — … sejam de 2002, de 2003 ou de 2004. O problema é que eles têm aumentado nos últimos tempos, Sr. Ministro! A segunda nota é sobre os offshore.
Sr. Ministro, na conversa que aqui temos tido com V. Ex.ª não vimos com ideias pré-concebidas nem com a ideia de «demonização» dos offshore. Para nós, os offshore não são um demónio, portanto podemos ter os dois, aqui, uma conversa sem as questões…

O Sr. Honório Novo (PCP): — Vão ter uma conversinha? Podem tê-la aqui!

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O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — … e sem os preconceitos do Sr. Deputado Francisco Louçã, cujos pesadelos andam entre os offshore e os bancos, e até teria grande vontade de prender os bancos. É pena que não possa fazê-lo, Sr. Deputado.

Protestos do Deputado do BE Francisco Louçã.

Mas as ideias sobre esta matéria têm que ser muito claras, Sr. Ministro.
O que não é possível é que existam em Portugal dois pesos e duas medidas.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — O que não é possível é que se faça a comparação entre os investimentos de particulares, cujo dinheiro é seu, e os investimentos do Estado, cujo dinheiro é nosso.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Essa é uma enormíssima diferença, Sr. Ministro, e é precisamente por isso que pretendemos transparência.
E anotámos de uma forma positiva o que nos disse: pedimos uma informação detalhada e solicitou-a à instituição que lha pode dar, que não é evidentemente o Fundo Monetário Internacional (FMI), porque ainda não estamos propriamente numa escala planetária. Pediu-a a quem é devido.
Contudo, Sr. Ministro, o que queremos é que não exista um peso para os particulares e um peso para o Estado.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — O que não queremos é uma Operação Furacão para os particulares e uma «operação furaquinho» ou «ventinho» para o Estado.

Aplausos do CDS-PP.

O que pretendemos é que seja possível ter a informação e que ela seja tornada pública.
Por isso mesmo, Sr. Ministro, a nossa pergunta é muito simples: assume ou não o compromisso de, quando tiver essa informação, a tornar pública e transmitir ao Parlamento? Estamos a falar de dinheiro que é dos contribuintes. O que se pretende saber é muito simples: quem, em que quantidade e com que dividendos. Porque esta informação torna o mercado transparente… O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — … e acaba com aquele discurso de «prendam os bancos», «prendam os investidores».

O Sr. Presidente: — Tem que concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — É precisamente por isso, Sr. Ministro, que lhe pedimos, no tempo que tem disponível,…

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Cuidado com as carteiras!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — … que assuma perante a Câmara um compromisso muito simples: «mal tenha a informação, transmito-a ao Parlamento e torno-a pública».

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É isso que pretendemos porque – mais uma vez o digo –, nesta matéria, estamos a falar de dinheiro do Estado, de dinheiro dos contribuintes e, fundamentalmente, do funcionamento do mercado de um modo transparente, preocupação que existe noutros Estados da União Europeia e noutros governos, como, por exemplo, o governo alemão. Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de prestar alguns esclarecimentos adicionais e de retirar algumas conclusões sobre o debate que tivemos hoje.
Em primeiro lugar, pretendia responder a algumas observações feitas pelos vários partidos.
Reclama a bancada do PSD, pela voz do Sr. Deputado Patinha Antão, que não concorda e tem divergências profundas quanto à metodologia de consolidação orçamental prosseguida por este Governo.
Isso é óbvio, os factos denotam uma divergência profunda. Enquanto estiveram no governo reduziram o défice, em 3 anos, em 0,9 pontos percentuais do PIB e aumentaram o peso da despesa no PIB em dois pontos percentuais. Nós baixámos o défice em 3,5 pontos percentuais, reduzimos o peso da despesa no PIB em mais de 2 pontos percentuais e descemos o peso da dívida no PIB, coisa que não aconteceu durante a vossa governação.

O Sr. Patinha Antão (PSD): — No dia 9 de Abril temos esse debate!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Além do mais, nós tomamos as nossas decisões fiscais – e esta é uma grande diferença! –, não as alienamos ao governo de Espanha, fazendo depender a nossa fiscalidade das decisões do governo espanhol, como foi proposta recente do líder do seu partido.

O Sr. Patinha Antão (PSD): — No dia 9 de Abril cá estaremos!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Nós mantemos, preservamos e gostamos muito da soberania que temos nesse domínio.
Sr. Deputado, de facto, temos grandes divergências relativamente ao PSD nesta matéria, não só em questões de princípio mas também em matéria de facto.
Quanto às prescrições aqui referidas, esclareço que dos 764 milhões de euros de dívida prescrita que foram reportados nesse relatório, 634 milhões dizem respeito a dívidas fiscais referentes ao período de 1990 a 1995, que prescreveram até ao final de 2004. Ora, essas dívidas, bem como o grosso dessa prescrição, ocorreram também durante os governos do PSD e do CDS-PP.
Portanto, Sr. Deputado, não assaque a responsabilidade das prescrições de dívidas, conforme quis fazer na sua intervenção, a este Governo,…

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Não, ao governo do Eng.º António Guterres.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — … porque ela também é da vossa governação.
O Sr. Deputado referiu ainda que a economia informal é de 22%. Tem razão. Isso verificava-se em 2004, no tempo do governo do PSD e do CDS-PP, e não temos números mais recentes quanto a esta matéria, mas estou ciente de que os progressos feitos neste domínio reduziram o peso da economia informal.

Protestos do Deputado do PSD Patinha Antão.

Mas há uma grande falta de coerência, diria até alguma hipocrisia, nas posições defendidas pelo PSD nesta matéria.

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Como é que os senhores querem que se combata a economia informal e defendem, quanto à questão dos casamentos, que façamos vista grossa, que deixemos andar?! E quem diz este sector de actividade, diz outros, pois há muitos outros onde a economia informal reina e floresce.
Sr. Deputado, como é que querem combater a economia informal se fazem vista grossa e condenam as acções da administração fiscal nesta matéria?!

A Sr.ª Ofélia Moleiro (PSD): — Não é nada disso!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Grande incoerência da posição do PSD neste domínio!

Protestos do Deputado do PSD Patinha Antão.

E esta é, de facto, uma área importante, Sr. Deputado.
Detectámos, pelas acções efectuadas, 8 milhões de euros em matéria colectável e o imposto que obtivemos das correcções feitas foi de 1,6 milhões de euros. Obtivemos essa receita devido às nossas iniciativas. São acções que lutaram contra a economia informal e que renderam receitas para o Estado.
Sr. Deputado Diogo Feio, quanto aos offshore, estou inteiramente de acordo com a transparência. Contudo, também acho que não devo colocar no pelourinho da praça pública instituições que, porventura, fizeram operações de boa gestão,…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — … respeitaram a legalidade, não fizeram nada de ilícito nem de irregular!

O Sr. Presidente: — Tem que concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, é claro que a informação tem que ser obtida.
Não posso ignorar o interesse público que foi suscitado em torno desta questão.
A informação será obtida e, quanto a tiver, poderei informar esta Câmara se houve ou não irregularidades ou ilicitudes no comportamento das instituições envolvidas.
Quanto aos offshore, gostaria também de referir aqui uma grande hipocrisia da bancada do PSD. E tenho que dizê-lo com toda a sinceridade!

O Sr. Presidente: — Tem que concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Como é possível vir aqui reclamar ética quanto aos offshore e defender o offshore da Madeira?!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — A Madeira não é um offshore, é um «inshore»!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O Sr. Deputado, para ser coerente com o que disse quanto à falta de ética, deve apresentar um projecto de lei para acabar com o offshore da Madeira. Fico à espera dessa iniciativa do Sr. Deputado, para que seja coerente com aquilo que disse.

Aplausos do PS.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Esta bancada não lhe merece nenhuma resposta?!

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

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O Sr. Francisco Louçã (BE): — Se me permitir, para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, peço ao Governo, através da Mesa, uma precisão sobre o documento que nos vai enviar, porque foi pedida insistentemente ao Sr. Ministro a lista das aplicações de dinheiros públicos em offshore e o Sr. Ministro disse, agora, que certificaria se houve ou não irregularidades.
Queria só obter a certeza de que, em algum momento, o Governo nos dará a lista das aplicações e dos destinos dessas aplicações, na sua totalidade.

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Também para uma interpelação à Mesa, Sr. Deputado?

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Patinha Antão (PSD): — Sr. Presidente, gostaria que fosse informado o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, que teve aqui pelo menos um segundo momento de irritação e de algum desnorte, que não só o Sr.
Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais qualificou com rigor, na Comissão de Orçamento e Finanças, o Centro Internacional de Negócios da Madeira como uma praça «inshore»…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, qual é a interpelação?

O Sr. Patinha Antão (PSD): — … como também – e é este o sentido da novidade – o então Ministro das Finanças, hoje presidente do Tribunal de Contas, Dr. Guilherme d’Oliveira Martins, nesta mesma Câmara, teve exactamente a mesma expressão.
Se o Sr. Ministro porventura, neste momento, precisa de uma recordatória do que é uma praça «inshore», a bancada do PSD tem todo o gosto em fornecer-lha, particularmente a caracterização que foi feita pela União Europeia relativamente ao Centro Internacional de Negócios da Madeira.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado também vai fazer uma interpelação à Mesa?

O Sr. Honório Novo (PCP): — Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, gostaria de entender por que é o Sr. Ministro de Estado e das Finanças não tem…

O Sr. Presidente: — Então, é uma interpelação cognoscitiva.

Risos do Deputado do CDS-PP Paulo Portas.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Exactamente, Sr. Presidente.
Dizia eu que gostaria de entender por que é o Sr. Ministro de Estado e das Finanças não tem a delicadeza de se virar para as bancadas que estão à sua esquerda e pelo menos comentar, ou corrigir, as taxas efectivas do sector bancário que aqui foram largamente debatidas.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Ficámos com a sensação de que a nova legislação sobre o planeamento fiscal abusivo, afinal, não serve para nada, só serve para «inglês ver» e para manter as mesmas vantagens fiscais de outrora.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Diogo Feio, está contagiado pelo efeito interpelação?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não precisa! Já tem essa tendência!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, queria interpelá-lo no sentido que fique anotado que o CDS-PP não tem nenhuma interpelação a fazer.

Risos.

O Sr. Honório Novo (PCP): — Vai encontrar-se com o Sr. Ministro!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, peço a palavra, para os mesmos efeitos cognoscitivos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de informar, através de Mesa, o Sr. Deputado Patinha Antão que o Centro Internacional de Negócios da Madeira é uma praça «inshore» do ponto de vista do território nacional, visto que se situa dentro das nossas fronteiras, mas é uma praça offshore do ponto de vista dos outros Estados.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não senhor! Não sabe o que está a dizer!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — E o raciocínio simétrico aplica-se em relação aos offshore em cada um dos Estados.
Gostaria de dizer ao Sr. Deputado Honório Novo que o Sr. Ministro de Estado e das Finanças não lhe respondeu na última intervenção, primeiro, porque já tinha respondido a essas questões, que colocou em sede de pedido de esclarecimento e, segundo, porque a resposta já foi dada, isto é, a administração fiscal utiliza, naturalmente, os seus próprios critérios e, segundo estes, a taxa efectiva paga pela banca em sede de IRC passou de 18% para 20%.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Há-de explicar-me esses critérios!

Vozes do PCP: — É espantoso!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um milagre da matemática: a taxa aumenta mas pagam menos!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, concluído o debate do Relatório sobre o Combate à Fraude e à Evasão Fiscais em Portugal, apresentado pelo Governo, vamos passar à apreciação da petição n.º 360/X (2.ª) — Apresentada por Sónia Guadalupe dos Santos Ribeiro Neves de Abreu e outros, solicitando que o assunto

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objecto da petição seja apreciado na Assembleia da República, com vista à valorização da profissão, para que seja criada a Ordem dos Assistentes Sociais.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Santos.

A Sr.ª Isabel Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar por saudar os signatários da petição n.º 360/X (2.ª) aqui presentes e, através deles, os mais de 3700 cidadãos que a subscreveram, unidos pelo objectivo de trazer ao debate da Assembleia da República a persistência da pretensão anteriormente expressa de criação da Ordem dos Assistentes Sociais.
Os peticionantes fazem assentar a sua aspiração de criar uma associação profissional pública na pertinência do exercício do poder disciplinar e de controlo do desempenho funcional dos assistentes sociais, da compensação da vulnerabilidade dos profissionais perante as entidades de inserção do seu trabalho e da ambição de esta associação ser considerada como parceira reconhecida e qualificada dos órgãos de poder na tomada de decisão quanto às políticas sociais.
Trata-se de um objectivo amplamente debatido entre estes profissionais desde 1997 e que levou à elaboração do projecto de estatuto da Associação de Profissionais de Serviço Social, o qual acabaria por ser formalmente apresentado à Assembleia da República em 2003, depois do propósito de criação da ordem ter sido reiterado no primeiro Congresso de Serviço Social.
Desde 2003, a tomada de decisão sobre tal desiderato foi remetida para o contexto da criação de uma leiquadro das associações públicas profissionais, facto que se consumou recentemente com a aprovação e a entrada em vigor da Lei n.º 6/2008, a qual há muito era reclamada face à necessidade de estabelecer critérios claros e inequívocos capazes de gerar uma linha divisória entre as profissões a propósito das quais se justifica a criação de associações públicas profissionais e os casos em que isso não acontece, num contexto em que o surgimento de novas profissões, a autonomização e transformação de profissões antigas e a dinâmica social vivida tem vindo a gerar um número apreciável de movimentos que reivindicam a criação de novas associações deste tipo.
O Regime das Associações Públicas Profissionais, publicado a 18 de Fevereiro deste ano, no seu espírito e no conjunto do articulado que lhe dá corpo, contém as regras e os procedimentos através dos quais os profissionais poderão organizar-se em torno do objectivo de criação de associações públicas profissionais.
Assim, o referido projecto de estatuto da Ordem dos Assistentes Sociais terá de ser revisto de forma a acautelar a sua concordância com o estabelecido na lei-quadro em vigor, devendo ainda, de acordo com a mesma, ser elaborado um estudo por uma entidade independente e de reconhecido mérito sobre a sua necessidade em termos de realização do interesse público e o seu impacto sobre a regulação da profissão de assistente social.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista saúda a iniciativa dos peticionantes e manifesta a sua aturada atenção em matéria que diz respeito à valorização do exercício da profissão de assistente social. E, quanto à pretensão de criação de uma ordem profissional, manifestamos disponibilidade para a necessária análise e ponderação depois de o processo ser devidamente revisto e enformado dentro do espírito e da letra do Regime das Associações Públicas Profissionais em vigor.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Quartin Graça.

O Sr. Pedro Quartin Graça (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República recebeu, no âmbito do direito de petição, uma solicitação no sentido de ser apreciada, tendo em vista a valorização da profissão de assistente social, uma petição que solicita que seja criada a ordem dos assistentes sociais.
Como sabemos, esta mesma Assembleia aprovou recentemente o enquadramento jurídico a que devem sujeitar-se novas associações públicas profissionais, então consubstanciado no projecto de lei n.º 384/X e que hoje se traduz no diploma regulador da constituição e funcionamento deste tipo de entidades.

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O referido diploma veio, aliás, criar, do ponto de vista legal, o equilíbrio que faltava neste sector e que permite agora conciliar o interesse público com os direitos fundamentais de muitos cidadãos e o interesse colectivo das profissões em causa.
Como já havíamos enunciado aquando de uma anterior iniciativa similar, crê este grupo parlamentar que o actual espectro de ordens existentes em Portugal cobre já, de uma forma muito satisfatória, as variadas profissões que existem no nosso país, pelo que a criação de novas ordens deve ser encarada de uma forma muito séria e concretizar-se, apenas e tão-só, nos casos em que, manifestamente, os interessados cumpram de forma escrupulosa o novo enquadramento jurídico em vigor.
Diga-se contudo, e em abono da verdade, que a intenção de criação de uma ordem dos assistentes sociais por parte dos seus mentores não é um processo recente nem tão pouco desconhecido dos diferentes grupos parlamentares, já que, desde Outubro de 2003, a Associação dos Profissionais de Serviço Social tem vindo, junto da Assembleia da República, a sensibilizar os responsáveis políticos no sentido de ser criada uma ordem profissional que, no seu entender, permitirá melhor organizar a classe, dignificar o título profissional e melhorar a formação deste sector de actividade em Portugal.
Junto do relatório final da presente petição e como anexo ao mesmo, é possível, inclusive, encontrar um vasto conjunto de documentos comprovativos das várias iniciativas anteriormente desenvolvidas, o qual não deixará, seguramente, de ser levado em linha de conta pelo poder político.
Constituindo as associações públicas profissionais um modo de organização e de regulação de profissões caracterizadas por dois aspectos fundamentais, o da independência técnica de actuação e o da prossecução de certos interesses públicos, torna-se, assim, necessário assegurar que, através desta sua actuação, seja possível garantir quer os requisitos relativos à sua organização democrática interna, quer aqueles que dizem respeito ao correcto exercício da função de supervisão profissional, incluindo a função disciplinar por um órgão dotado de condições de verdadeira independência.
Aos mentores da petição que ora estamos a discutir lançamos, assim, o repto para que saibam concretizar a sua pretensão de acordo com os requisitos legalmente exigidos e que, dessa forma, consigam adequar o funcionamento da nova estrutura que pretendem ver criada com aquelas que são as naturais exigência decorrentes do interesse público, que importa, necessariamente, salvaguardar.

Aplausos do PSD e Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As assistentes sociais têm, na sociedade portuguesa, um importante papel. Desempenham a sua actividade na esfera do Estado mas também, muito mais recentemente, na esfera privada. Estas e estes profissionais estão na segurança social, nos infantários, nos equipamentos de juventude e nos equipamentos de idosos; na saúde, em hospitais, centros de saúde, centros profiláticos da droga e apoio a toxicodependentes; na justiça, nos estabelecimentos prisionais e nos serviços de reinserção social; na educação, desempenhando um importante papel junto das escolas; nas autarquias, nas câmaras municipais, nas juntas de freguesia, desempenhando também um importante papel de acção social e também em algumas acções relativamente à habitação. Estão por todo o lado na Administração Pública! Mas estão também num sítio muito complicado, estão junto das IPSS, sem qualquer tipo de formação e acompanhamento, onde a desregulamentação laboral é, efectivamente, um facto.
Estes profissionais merecem de todos nós muito carinho, toda a compreensão e também o empenhamento no desenvolvimento eficaz da sua profissão.
Existe, desde 1976, decorrente também da Revolução de Abril, a associação destes profissionais, que tem feito um importante percurso na defesa dos direitos e interesses da profissão e tem tido momentos altos.
Desde 1997 que se iniciou um debate no sentido de estes profissionais se organizarem no sentido da certificação da sua profissão.
Em Maio de 2002, todo este movimento teve um momento alto no I Congresso do Serviço Social, em Aveiro.

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Em Dezembro de 2003, esta associação propõe que se crie um mecanismo que certifique a sua profissão, no sentido de a desempenharem com melhor qualidade e de a virarem para aquilo que é a sua dimensão essencial, que é um melhor serviço para os utentes.
Nesta circunstância, acompanhamos com muito interesse as suas reivindicações, nomeadamente a criação de uma ordem profissional. Entendemos que, face ao actual quadro legislativo, têm todas as condições para se encaminharem neste sentido e da parte da bancada do Bloco de Esquerda há toda a disponibilidade para esta discussão, para termos um serviço social e uma profissão à altura da realidade deste país e as suas expectativas.

Aplausos do BE e do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, saudar todos os profissionais que aqui estão a assistir a este debate e dizer-lhes quão importante é, numa sociedade actual tão complexa como a nossa, o vosso trabalho nos mais diversos espaços da Administração Pública.
O teor desta petição – e de outras que, cumulativamente, tratam esta matéria –, a criação da ordem dos assistentes sociais, tem vindo a ser expressa por estes profissionais nesta Casa desde 2003, fundamentalmente através da Associação dos Profissionais do Serviço Social, não sendo, portanto, uma novidade.
As razões referidas enunciam a necessidade de regulação da profissão, com o objectivo de garantir a qualidade do desempenho funcional dos técnicos superiores do serviço social e, consequentemente, defender os interesses dos utentes dos serviços que estes profissionais integram. E tem sido exactamente esta a exigência que sempre têm feito.
Mas não é de somenos importância também que, num espaço europeu aberto e global, uma instituição desta natureza garanta, de igual modo, uma participação em pé de igualdade com as organizações similares quer de dentro quer de fora da Europa.
Naturalmente que organizações deste tipo devem pautar a sua intervenção sempre atentas a riscos de corporativismo e de fechamento profissional e assumir antes o protagonismo e a defesa daquilo que deverá ser uma resposta adequada e oportuna à sociedade de hoje.
A necessidade expressa por estes profissionais relativamente a uma auto-regulação ou a uma autoadministração está devidamente enquadrada no nosso ordenamento jurídico, sendo certo que, entre nós, durante muito tempo, só as profissões com carácter mais tradicional tiveram acesso à criação de ordens profissionais.
Entretanto, no passado recente, veio a aprovar esta Casa outras ordens fora deste espaço conceptual mais tradicional.
No entanto, e a propósito da ordem dos psicólogos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias chamou a atenção para a indispensabilidade de um quadro jurídico mais genérico que pudesse responder a esta mesma necessidade. Esse quadro está criado, a lei foi recentemente publicada e é dentro desse amplo espaço que está criado que os assistentes sociais, homens e mulheres — porque esta questão não é só no feminino, como parece que aqui já foi dito —, podem solicitar à Assembleia da República a continuidade do seu processo, que esta ponha em marcha a sua vontade e crie a ordem dos assistentes sociais.

Aplausos da Deputada do PS Paula Nobre de Deus.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Câmara reúne-se hoje para apreciar a petição n.º 360/X (2.ª), que solicita a criação da ordem dos assistentes sociais.

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Antes de mais, quero felicitar e cumprimentar os peticionantes, nomeadamente a Associação de Profissionais de Serviço Social, e, em nome do CDS, prestar a todos os assistentes sociais uma sentida homenagem.
Portugal é um país pequeno, com uma rica e grande História mas com muitos problemas sociais. Um problema prende-se com o desemprego neste momento registado, desemprego particularmente difícil nas mulheres, sobretudo nas mulheres já com alguma idade, que têm mais dificuldades em reentrar no mercado de trabalho; desemprego que atinge, neste momento, núcleos familiares inteiros, o que gera objectivamente um enorme problema social. Mas também com uma plêiade de outros problemas sociais.
Todos nós conhecemos os números do relatório sobre a pobreza — cerca de 2 milhões de portugueses vivem hoje abaixo do limiar da pobreza, portugueses que têm problemas de alcoolismo, de toxicodependência, de violência familiar, de exclusão, idosos que vivem problemas dramáticos de solidão.
Quem é, muitas vezes, o primeiro apoio, quem é, muitas vezes, o único apoio a estas pessoas são estes profissionais. Por isso mesmo, um partido como o CDS, que é um partido da democracia cristã, que é um partido que respeita e reconhece sempre esta dimensão dos que são excluídos e do apoio que eles têm de ter, obviamente, não pode deixar, aqui hoje, de fazer uma sincera e sentida homenagem a estes profissionais.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Somos confrontados, depois, com um segundo problema, que é o de perceber a importância vital que as ordens profissionais podem desempenhar num Estado de direito, nomeadamente o papel de auto-regulação e de hetero-regulação que têm de ter perante uma diferente ou específica profissão, sobretudo quando nessa área de actuação conflituam e, muitas vezes, existem realidades profissionais diferentes.
Todos nós conhecemos o papel dos técnicos sociais e dos mediadores sociais, mas reconhecemos também, e acima de tudo, o papel das assistentes e dos assistentes sociais. Por isso mesmo, é fundamental que haja uma clarificação de todos os seus papéis, que são complementares mas que não podem viver, muitas vezes, em choque e em entrechoque.
Desta forma, temos que saber se a resposta a estes problemas não será mais facilmente encontrada com uma auto-regulação desta classe profissional, assumindo também que, com a criação de uma ordem, se exige a estes profissionais uma responsabilidade acrescida. Sabemos a resposta a esta pergunta mas, infelizmente, neste momento, não pode ser a Assembleia a dá-la.
O PS quis, de uma forma relativamente à qual o CDS avisou muitas vezes, criar uma lei-quadro das ordens profissionais que implica, hoje, a existência de um estudo prévio, mas não definiu quem tem de o fazer e quem deve fazê-lo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Concluo já, Sr. Presidente.
É com muita pena que vemos a ausência do Governo neste debate, porque era muito importante sabermos se o Governo está ou não disponível para que exista um estudo prévio.
Somos a favor da criação e da existência desse estudo e que ele comece desde já, mas, hoje, infelizmente, nos termos da lei que o PS escolheu aprovar, só o Governo o pode fazer, sendo que a Câmara ficou «de mãos atadas» para a criação de novas ordens.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeira instância, quero saudar os peticionários, os 3725 cidadãos que subscreveram a petição.
Por parte do PCP, reconhecemos a importância dos assistentes sociais na sociedade. Vivemos numa sociedade cada vez mais injusta, onde o agravamento das desigualdades é gritante, onde os assistentes

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sociais desempenham um papel importante para mitigar as consequências destas políticas neoliberais e onde a injustiça, a pobreza, o desemprego e a miséria reinam. Os assistentes sociais vêm mitigar, ou tentar mitigar, essas situações.
O agravamento da exploração e da precariedade dos assistentes sociais é uma realidade, e bem o sabemos. Nas instituições particulares de solidariedade social (IPSS) e no próprio sector Estado multiplicamse fenómenos e situações de exploração dos trabalhadores, de exploração das condições de trabalho e de desemprego cada vez mais gravosas.
Quanto à petição e à solicitação para a criação de uma ordem profissional, importa referir que o enquadramento legal traz novos dados.
A lei-quadro das ordens profissionais — a Lei n.º 6/2008 — refere, expressamente, que as ordens devem, cumulativamente, «ser sujeitas ao controlo do respectivo acesso e exercício, à elaboração de normas técnicas e deontológicas específicas e a um regime disciplinar autónomo».
Diz o n.º 2 do artigo 2.º da mesma lei que «a constituição de associações públicas profissionais é excepcional e visa a satisfação de necessidades específicas, podendo apenas ter lugar nos casos previstos no número anterior, quando a regulação da profissão envolver um interesse público de especial relevo que o Estado não deva prosseguir por si próprio». E o n.º 3, já aqui citado, salienta o referido estudo sobre o impacto que a nova ordem vai ter sobre a regularização da profissão. Falta, portanto, este estudo para que o processo legislativo avance.
Queremos, no entanto, referir que as ordens profissionais não resolvem o problema laboral desta classe profissional. A situação laboral é grave, há claros motivos de contestação à situação em que vivem os assistentes sociais, mas estes problemas laborais não se resolvem por via de uma ordem profissional.
Resolvem-se, sim, no plano da luta de classes, no plano da luta dos trabalhadores, no plano sindical e da afirmação dos seus direitos nesta matéria. É aí que se resolvem os problemas laborais! Não desconhecemos nem ignoramos a existência de outros problemas que podem ser abordados, mas nesta fase, em que falta um conjunto de peças para que o processo legislativo avance, importa reunir esses dados, esse estudo que analise e defina em concreto o impacto que a ordem profissional vai ter sobre a profissão para tomarmos uma posição mais definitiva. Será nessa altura que iremos abordar e estudar mais aprofundadamente a necessidade da criação da ordem.
É esta a posição do Partido Comunista Português. Não quero, porém, terminar sem deixar uma saudação muito particular aos assistentes sociais e ao importantíssimo papel que eles desempenham na nossa sociedade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos para usarem da palavra sobre esta petição, passamos à apreciação da petição n.º 389/X (2.ª) — Apresentada pela Comissão de Trabalhadores da Companhia Nacional de Bailado, solicitando à Assembleia da República que seja reconhecida a especificidade da profissão de bailarino de dança clássica da Companhia Nacional de Bailado, a condição de desgaste rápido e o direito a aposentação no final das suas carreiras, assim como efectivas soluções de reconversão.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Zita Gomes.

A Sr.ª Ana Zita Gomes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos, hoje, uma petição que solicita o reconhecimento da especificidade da profissão de bailarino de dança clássica da Companhia Nacional de Bailado. Os bailarinos, autores desta iniciativa, que cumprimento, há vários anos que tentam, de uma forma tão determinada quanto paciente, sensibilizar os governos e a Assembleia da República para as suas preocupações. É inegável a importância da Companhia Nacional de Bailado no panorama cultural português e na representação da cultura portuguesa no mundo.
A dança clássica é uma arte muito exigente para quem a pratica. A dança clássica está classificada como a actividade física humana mais desgastante.
A carreira profissional de um bailarino é curta. É uma profissão, efectivamente, de desgaste rápido e altamente especializada, com poucas hipóteses de reinserção profissional. No final da carreira, a experiência

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artística acumulada — ao mais alto nível de rendimento — não é reconhecida. Está, portanto, o País a desperdiçar recursos humanos altamente especializados e com elevada experiência profissional.
Contrariamente à maioria das profissões, esta implica uma planificação precoce. Trata-se de um investimento de uma vida.
Considerando o elevado risco desta profissão, todo o investimento profissional pode, repentinamente, perder-se pela ocorrência de uma lesão — aliás, muito frequente a este nível. Sendo o corpo o seu instrumento de trabalho, os bailarinos deveriam ter, à semelhança dos desportistas, seguro de acidentes de trabalho adequado à sua actividade. Mas a diferença de tratamento entre desportistas e bailarinos não se fica por aqui. Aos desportistas, por exemplo, é reconhecido o estatuto de profissão de desgaste rápido, um regime fiscal e de segurança social mais favoráveis e um regime especial para o acesso ao ensino superior.
Segundo a comissão de trabalhadores, na Companhia Nacional de Bailado o número de bailarinos a atingir o tempo de trabalho de 25 anos — como é proposto pelos próprios — será, em média, inferior a um por ano.
Estes profissionais disponibilizam-se também a aumentar as suas contribuições para a segurança social para este fim.
São vários os países europeus onde, reconhecido o desgaste rápido, são atribuídas reformas antecipadas.
Em França, por exemplo, para além da reforma antecipada, é atribuído um diploma de professor para possibilitar ao bailarino o ensino da dança.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para o Grupo Parlamentar do PSD, as reivindicações destes profissionais são fundamentadas. A expectativa de uma solução era aguardada com o Estatuto do Profissional das Artes do Espectáculo. Este novo regime, alvo de críticas em todo o sector, também não contempla as pretensões dos bailarinos da Companhia Nacional de Bailado e as suas especificidades. Aliás, temem pela sua aplicação no que concerne, por exemplo, ao artigo 18.º, referente à reclassificação do trabalhador.
O Grupo Parlamentar do PSD reconhece que existe uma carência ao nível da protecção social destes trabalhadores. Reconhecer as suas pretensões não é uma consideração especial para com os bailarinos da Companhia Nacional de Bailado mas, sim, na nossa opinião, um dever do Estado para com a actividade artística e cultural portuguesa e para quem a exerce com excelência.
Em coerência com o afirmado, o PSD apresentará uma iniciativa legislativa que tentará responder a estas legítimas expectativas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aproveito também para saudar a comissão de trabalhadores da Companhia Nacional de Bailado, que se encontra, na galeria, a assistir a esta sessão e para dizer à Câmara que a carreira profissional de uma bailarina ou de um bailarino clássico começa muitas vezes, sobretudo no caso feminino, logo depois dos 16 anos. E a sua formação começou muito cedo, como aos 6 anos de idade. Ao longo da sua carreira, tudo é sacrificado em prol da sua actividade.
Um estudo da Universidade de Washington verificou que, num período de 8 meses, cerca de 61% dos bailarinos clássicos sofrem lesões. Este ratio de lesões foi, aliás, comparado, nesse mesmo estudo, com o ratio de lesões sofridas pelos desportistas de contacto, como, por exemplo, de futebol americano. Na incidência anual de lesões, a percentagem sobe para valores entre os 65% e os 95%.
Na Suécia foi realizado outro estudo, neste caso sobre a dor do sistema músculo-esquelético ao longo de seis anos. Este estudo revela que 90% dos bailarinos clássicos profissionais sofrem de dor recorrente. Citando o referido estudo, o bailado é «fisicamente muito exigente e desgastante e o facto de os bailarinos competirem entre si acrescenta ainda mais stress físico. Só assim se conseguem formar atletas com completa expressão artística. Só assim é possível apresentar as mais difíceis produções do repertório clássico, romântico e moderno. Só com profissionais assim preparados, treinados e motivados é possível manter viva a herança cultural do bailado e dar corpo à criatividade actual.
Dentro do universo da dança, o bailarino da dança clássica tem o treino mais especializado, a formação mais longa e a competição mais acesa. Mas tudo isto implica uma dedicação total em nome do bailado clássico. Tudo isto afecta mulheres e homens que, no fim da sua carreira artística, entregaram toda uma vida a

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uma forma de arte, com sofrimento, lesões e acidentes de trabalho. Tudo isto significa que é da maior importância e, seguindo o bom exemplo de outros países, como aqui já foi referido, reconhecer a enorme especificidade dos bailarinos da dança clássica, tal como pretendem os peticionários.
E reconhecer a importância da carreira pode-se, e deve-se, operar por duas vias. Por um lado, a reconversão das suas carreiras em oportunidades. Um País não pode dar-se ao luxo de perder todo o enorme conhecimento prático e artístico acumulado ao longo das carreiras profissionais destes bailarinos da Companhia Nacional de Bailado.
O OPART (Organismo de Produção Artística, EPE), em nosso entender, e já o criticámos abundantemente porque veio subalternizar o bailado em relação à ópera, deixou, em todo o caso, uma pequena «luz». Aliás, à semelhança do que já acontece com o estudo de ópera, que funciona dentro do Teatro Nacional de São Carlos, prevê-se nos Estatutos do OPART que seja criado um estúdio do bailado. Ora, este estúdio pretende ter como função proporcionar oportunidades de captação e formação de jovens artistas. Este estúdio-escola poderia ser uma interessante hipótese para os antigos bailarinos, conhecedores do repertório das produções da Companhia Nacional de Bailado, poderem captar, ensinar e preparar as novas gerações de bailarinos.
Por outro lado, é importante reconhecer o inegável desgaste rápido desta profissão e aceitar a alteração proposta pelos peticionários, aproveitando para relembrar esta Câmara que continuamos à espera das propostas do Governo em relação ao regime especial de segurança social e à aposentação dos artistas das artes e dos espectáculos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: São 5035 cidadãos que reconhecem que devemos proteger e dignificar os bailarinos de dança clássica em Portugal.
Esta é uma profissão de grande exigência física e mental, equiparável aos atletas de alta competição. Mas a verdade é que o tratamento que é dado a estes profissionais fica muito longe daquele que é dado aos atletas de alta competição em Portugal.
Não têm um regime fiscal como têm esses atletas; não têm nenhuns benefícios específicos; têm, até, uma reconversão profissional que, devido às últimas alterações na Companhia Nacional de Bailado, prevê tão-só que seja a própria Companhia a dizer onde é que os profissionais podem ser reconvertidos, sendo também passíveis de ver rescindidos os seus contratos caso não aceitem a reconversão.
Ora, um País que não acarinha o que de melhor tem, e a Companhia Nacional de Bailado é exactamente o que de melhor há nas artes e nos espectáculos, dá um sinal muito mau à sociedade.
O Governo do Partido Socialista, com a recente lei que aprovou e que não serve a ninguém, sendo ou não intermitente, das artes e espectáculos levou a que, em vez de resolver o problema dos intermitentes das artes e espectáculos, que são de facto intermitentes, trabalhadores profissionais tenham passado, em muitos casos, também a intermitentes. Este é um exemplo claro do que se está a passar.
Nesta matéria, o Bloco de Esquerda está perfeitamente à vontade porque muito no início desta Legislatura, em Abril de 2005, apresentou um projecto de lei que contemplava as principais reivindicações destes profissionais, nomeadamente as questões da segurança social devido à sua especificidade. Não é muito normal que haja profissionais num País que se predisponham a contribuir muito mais para a segurança social com vista a cobrir aquilo que pode ser uma situação muito exaltada pelo Partido Socialista, que é o défice da segurança social.
Era a isto que o projecto do Bloco de Esquerda respondia, dando também uma resposta clara e inequívoca à reconversão profissional.
Esse projecto nunca foi acolhido nesta Câmara. Queria, pois, dizer a todos, Sr.as e Srs. Deputados, e aos representantes da Comissão de Trabalhadores da Companhia Nacional de Bailado aqui presentes que nós não desistimos e vamos voltar a apresentar o projecto do Bloco de Esquerda que dá razão e cobertura à resolução desta situação da Companhia Nacional de Bailado.

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N insc.): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição que esta Assembleia hoje avalia teria sido desnecessária se o Governo do Partido Socialista tivesse cumprido, quer as promessas de outras legislaturas que ficaram pelo caminho, quer o que foi enunciado aquando da discussão de várias iniciativas relativas ao regime de contratos de trabalho dos profissionais do espectáculo.
Em Maio de 2007, o Governo afirmou, relativamente à não contemplação da segurança social na proposta de lei, que se tratava de uma matéria para tratar com rigor e que se deveria guardar para um segundo momento a regulamentação desta questão.
Dizia ainda o Governo que o Ministério do Trabalho se tinha comprometido, em sede de concertação social, a entregar, até ao fim de 2007, o regime de regulamentação das profissões de desgaste rápido, mas este documento autónomo sobre a segurança social ainda hoje não existe! A substância em causa não é tão inusitada que o Governo precise de tanto tempo para a resolver. Bastaria olhar para outros países europeus, que, tal como Portugal, têm uma estrutura similar à Companhia Nacional de Bailado, clássica e nacional, e encontraria respostas adequadas. Em França, como já foi dito, para além da prestação social, quando os bailarinos chegam ao fim da carreira é-lhes atribuído um diploma que lhes permite exercer a função docente.
Aqui não, é-lhes oferecida a rescisão do contrato quando não estão de acordo com a reconversão que lhes é sugerida pelo empregador.
Convém dizer que a própria UNESCO contraria a posição do Partido Socialista e de outros grupos parlamentares no sentido de considerar que o que interessa são os anos de carreira e não a idade, ao contrário do que tem sido defendido.
Ao contrário também do que tem sido dito, têm sido os bailarinos da Companhia Nacional de Bailado a sugerir as propostas necessárias e imprescindíveis à resolução desta prestação social, dizendo não só que estão disponíveis para acréscimos no valor das suas contribuições, mas também para discutir a reconversão da sua carreira.
No entanto, e apesar das propostas que têm sido feitas, nada aconteceu até hoje e o Partido Socialista e o Governo não apresentaram qualquer diploma autónomo sobre a matéria, podendo e devendo fazê-lo, rapidamente, mesmo fora do prazo.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.

O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos, hoje, a petição n.º 389/X, da iniciativa da comissão de trabalhadores da Companhia Nacional de Bailado, que aproveito para cumprimentar, subscrita por 5035 cidadãos, solicitando à Assembleia da República que seja reconhecida a especificidade da profissão de bailarino de dança clássica da Companhia Nacional de Bailado, a condição de desgaste rápido, o regime de aposentação no final das suas carreiras e as soluções quanto à sua requalificação profissional.
A Companhia Nacional de Bailado tem um histórico em defesa e promoção da cultura nacional que importa realçar. Um País europeu, moderno e culturalmente desenvolvido nunca poderá prescindir dos seus melhores profissionais nas diversas actividades, desde logo nas artes e, entre estas, na dança clássica.
Trata-se de uma actividade exigente, de grande dedicação, esforço e persistência. Sabemos que a profissão de bailarino é específica e deve ser vista como tal, tendo, no entanto, em conta a equidade com outras profissões. É neste equilíbrio, nem sempre fácil, que toda e qualquer medida deve ser desenvolvida.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde sempre que o Partido Socialista reconhece esta especificidade. Foi assim com a aprovação do Decreto-Lei n.º 482/99, que definiu o regime especial de acesso à pensão por velhice dos profissionais de bailado clássico ou contemporâneo beneficiários do regime geral da segurança social. Tratou-se, aliás, de uma medida efectiva no sentido de considerar a profissão de bailarino como especial, permitindo a antecipação da sua pensão de velhice. No referido Decreto-lei é lembrada «a exigência de determinadas aptidões físicas vulneráveis ao desgaste da idade, o treino físico exigente e permanente, as condições psicológicas que acompanham a prestação desta profissão».

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Foi também com a convicção da especificidade dos bailarinos que o Partido Socialista aprovou, recentemente, na Assembleia da República, a Lei n.º 4/2008, instituindo um novo regime de contratos de trabalho dos profissionais de espectáculos. Tratou-se de uma lei muito debatida em sede parlamentar, mas também na sociedade civil, com os mais directos interessados a fazer chegar contributos ao grupo de trabalho, muitos dos quais foram considerados no texto final.
Na legislação então aprovada, são também dadas garantias ao nível da reclassificação profissional, permitindo aos profissionais de espectáculos, bailarinos incluídos, a «definição de outras funções compatíveis com as suas qualificações», devendo ser assegurada formação profissional adequada, aumentando, assim, também, a responsabilidade das entidades empregadoras. Este foi um dos artigos que sofreu evoluções ao longo do debate no Parlamento, com a integração de propostas no sentido do que está inscrito nesta petição.
O artigo 21.º da Lei n.º 4/2008 refere-se ao regime da segurança social — um dos temas que levou à apresentação da petição que hoje discutimos —, como sendo objecto de diploma próprio. Quanto a este ponto, podemos referir que está a ser ultimada a regulamentação do regime de protecção social, dando origem a um sistema mais adaptável a todos os profissionais das artes e espectáculos.
Foi também com o Partido Socialista que, no âmbito do acordo de reforma da segurança social, aprovado em sede de concertação social, ficou expressa, num dos pontos que se refere às profissões de desgaste rápido, evidenciando a preocupação de todos, a necessidade de uma especial protecção a determinadas profissões, decorrendo daí a análise do regime de protecção social associado.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, para terminar, refiro que a situação dos artistas ao nível das relações laborais e da sua situação social é específica. Por isso, a existência de legislação própria. A posição dos bailarinos neste domínio é específica.
Nesta curta intervenção, creio que deixei várias referências sobre as posições do Partido Socialista, que demonstram uma atenção especial, uma posição política e uma acção neste domínio. O Grupo Parlamentar do Partido Socialista continuará empenhado em acompanhar com o maior cuidado todos os desenvolvimentos futuros que se farão nesta matéria.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, gostaria de começar esta minha intervenção com uma saudação, em nome do PCP, aos mais de 5000 peticionários que subscreveram a petição n.º 389/X, incluindo aqueles que hoje se encontram nas galerias a assistir a este debate.
Os problemas que esta petição traz à discussão na Assembleia da República não são novos e têm fundamentalmente que ver com dois aspectos: o primeiro diz respeito às condições de aposentação e acesso à reforma dos bailarinos e o segundo tem que ver com as possibilidades de reconversão profissional.
Estes problemas decorrem fundamentalmente de algumas características da profissão e da carreira de bailarino, que têm que ver não só com a extrema exigência do ponto de vista físico que esta actividade implica, mas também com o facto de se tratar de uma carreira que se inicia muito cedo e que acaba por ter uma duração curta, no que diz respeito à sua componente profissional.
Os problemas que esta carreira coloca não são novos nem únicos no nosso país. Verificam-se também noutros países da Europa e têm nesses mesmos países soluções que vão no sentido de garantir a consideração da duração da carreira e das condições em que essa carreira é concretizada pelos profissionais com vista ao acesso à aposentação e à reforma, variando de situação para situação, numa idade que vai dos 40 aos 45 anos.
A verdade é que em Portugal já temos um regime que diz respeito aos bailarinos e que contempla esta questão da aposentação, no entanto este regime não dá resposta a estes profissionais. Isto por duas razões fundamentais: por um lado, porque a aposentação aos 45 anos, nos termos previstos pelo Decreto-Lei n.º 482/99, é feita com reformas muito baixas. Refiro, aliás, a situação de uma bailarina que, aos 45 anos, se aposentou recebendo 288 €, o que é um claro exemplo de que o acesso à aposentação nesta idade apresenta limites. Por outro lado, a aposentação aos 55 anos é feita em condições completamente desfasadas daquilo que é a carreira e a profissão de bailarino.

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Além disso, este problema da aposentação relaciona-se também com a questão da reconversão profissional, uma vez que estas condições de aposentação não seriam tão gravosas se a reconversão profissional se pudesse fazer de outra maneira. No entanto, a reconversão profissional exige, por um lado, a existência de uma estrutura de formação no âmbito do bailado clássico, que não existe. Seria preciso, nomeadamente, haver uma escola de formação de bailado afecta à Companhia Nacional de Bailado.
Por outro lado, colocam-se hoje problemas à reconversão destes profissionais que resultam de uma lei que, segundo o Partido Socialista, é «bondosa» para estes profissionais. No entanto, o que esta norma prevê neste âmbito não é um mecanismo de reconversão profissional, mas antes um mecanismo que promove a caducidade dos contratos de trabalho, impondo aos trabalhadores perspectivas de reconversão profissional que não podem ser aceites como justas e sérias.
Portanto, a discussão que tem de ser feita terá de ser profunda, tendo em vista a revisão deste regime de aposentação dos bailarinos no sentido de considerar, por um lado, as propostas apresentadas pela comissão de trabalhadores no que diz respeito à contribuição acrescida para a segurança social e, por outro, a duração da carreira e não fundamentalmente de idade do bailarino.
Esta é uma realidade preocupante, sobretudo numa altura em que, pelos vistos, o Governo, já com três meses de atraso, se prepara para aprovar este regime de segurança social, não tendo em conta as especificidades de uma carreira que tem características próprias e que deve ser entendida nessa sua especificidade no sentido de garantir melhores condições não só de trabalho aos trabalhadores enquanto eles estão no activo, mas também de acesso a um regime de aposentação e de reforma que não os penalize por terem optado por uma carreira, que é de facto muito exigente do ponto de vista físico e que, por questões da sua própria natureza, se impõe que se inicie e termine muito cedo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Gonçalves.

O Sr. José Miguel Gonçalves (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apesar de todos os partidos políticos aqui representados valorizarem a existência, o percurso e o trabalho realizado pela Companhia Nacional de Bailado, enquanto um dos legítimos representantes da cultura nacional; apesar de todos reconhecerem que a profissão de bailarino de dança clássica tem especificidades únicas enquanto actividade profissional; apesar de estar demonstrado que a situação legal nos outros países confere maior protecção social a estes profissionais; e apesar de já terem sido aprovadas várias iniciativas parlamentares neste Plenário, entretanto caducadas, visando a resolução deste problema que é hoje aqui trazido por esta petição; o que é facto é que este problema continua a persistir nos mesmos termos em que foi levantado pelo Partido Socialista em 1994, aquando da apresentação de um projecto de lei da sua autoria, que visava, exactamente, criar condições especiais de reforma dos artistas de bailado.
Entretanto, a Lei n.º 4/2008, já aqui referida, aprovada em Fevereiro, na Assembleia da República, que regulamenta o regime dos contratos de trabalho dos profissionais de espectáculos, veio agravar ainda mais as perspectivas futuras destes profissionais, ao prever no seu artigo 19.º que se o trabalhador perder a sua aptidão para a realização da actividade artística e se este não aceitar outras funções compatíveis ou se estas não existirem na entidade empregadora, o contrato de trabalho caduca simplesmente, havendo direito a uma indemnização.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A profissão de bailarino de dança clássica é uma actividade que reconhecidamente exige exclusividade, que implica o seu início em idade muito jovem, com inevitáveis prejuízos para a normal progressão nos estudos e que, como todos percebem, termina mais cedo do que as outras profissões, numa fase em que actualmente se é novo para uma reforma, mas velho para encarar uma carreira numa outra área que implique retomar os estudos onde foram deixados e não valorize a experiência profissional adquirida.
Como tal, Os Verdes, assim como apoiaram anteriores iniciativas, estarão disponíveis para apoiar novas iniciativas parlamentares que permitam corrigir esta situação, reconhecendo a especificidade desta profissão como uma actividade de desgaste rápido, através de um regime especial de antecipação da reforma e de mecanismos de reinserção para actividades que valorizem a experiência adquirida por estes profissionais.

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Por último, Os Verdes gostariam de saudar os mais de 5000 peticionários e todos os trabalhadores da Companhia Nacional de Bailado.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Com esta intervenção, está concluída a apreciação da petição n.º 389/X (2.ª).
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, às 15 horas, dela constando um período de declarações políticas, bem como a apreciação da proposta de lei n.º 169/X — Aprovação da Terceira Revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (ALRAA), e dos projectos de resolução n.os 279/X — Riscos de inundações (PS), 296/X — Prevenção de riscos e medidas de intervenção em caso de inundações (PCP), 91/X — Recomenda ao Governo que tome medidas para a minimização de danos materiais e humanos consequentes de episódios sísmicos (PCP), 298/X — Recomenda ao Governo a criação do Fundo de Emergência Municipal (CDS-PP), 277/X — Recomenda ao Governo que, na sub-região do Vale do Ave e do Vale do Cávado, implemente um programa específico de combate ao desemprego, apoio aos desempregados, estímulo à produtividade e às empresas, bem como programas específicos de ocupação para desempregados de longa duração (CDS-PP), 294/X — Recomenda ao Governo a adopção de medidas tendentes a dinamizar o desenvolvimento e o crescimento económico e a promoção do emprego e formação profissional nas regiões do Vale do Ave e Vale do Cávado (PS), 297/X — O distrito de Braga reclama medidas urgentes: responder às causas, atalhar as consequências (PCP) e 301/X — Recomenda ao Governo adoptar medidas que visem a dinamização económica e social na Região do Vale do Ave e Vale do Cávado (PSD).
Haverá ainda lugar a votações, às 18 horas.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

Partido Social Democrata (PSD):
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
João Bosco Soares Mota Amaral
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel de Matos Correia
Luís Miguel Pereira de Almeida
Mário Henrique de Almeida Santos David
Melchior Ribeiro Pereira Moreira

Partido Comunista Português (PCP):
Francisco José de Almeida Lopes

Bloco de Esquerda (BE):
José Borges de Araújo de Moura Soeiro

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

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Partido Socialista (PS):
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida

Partido Social Democrata (PSD):
Henrique José Praia da Rocha de Freitas

Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Jacinto Serrão de Freitas
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Umberto Pereira Pacheco

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos António Páscoa Gonçalves
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Miguel Pais Antunes
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos

Partido Comunista Português (PCP):
Jerónimo Carvalho de Sousa

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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