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Sábado, 7 de Junho de 2008 I Série — Número 93

X LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2007-2008)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 6 DE JUNHO DE 2008

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 10 minutos.
Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 197/X — Aprova o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, que foi aprovada, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (Gonçalo Castilho dos Santos), os Srs. Deputados Pedro Mota Soares (CDS-PP), Jorge Machado (PCP), Fernando Antunes (PSD), Mariana Aiveca (BE) e António Gameiro (PS).
Foi também discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 200/X — Estabelece o regime jurídico da qualidade e segurança relativa à dádiva, colheita, análise, processamento, preservação, armazenamento, distribuição e aplicação de tecidos e células de origem humana, transpondo para a ordem jurídica interna as Directivas 2004/23/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, 2006/17/CE, da Comissão, de 8 de Fevereiro, e 2006/86/CE, da Comissão, de 24 de Outubro. A requerimento do PSD e do CDS-PP, que foi aprovado, a referida proposta de lei baixou à Comissão de Saúde, por um prazo de 30 dias, para reapreciação. Intervieram no debate, a diverso título, além da Sr. Ministra da Saúde (Ana Jorge), os Srs. Deputados Carlos Andrade Miranda (PSD), João Semedo (BE), Joaquim Couto (PS), Bernardino Soares (PCP), Teresa Caeiro (CDS-PP) e Maria de Belém Roseira (PS).
Procedeu-se à apreciação do projecto de resolução n.º 330/X — Divulgação às futuras gerações dos combates pela liberdade na resistência à ditadura e pela democracia (PS, PSD, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes), que foi aprovado, tendo-se pronunciado, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva), os Srs. Deputados Marques Júnior (PS), Bernardino Soares (PCP), Guilherme Silva (PSD), Fernando Rosas (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e João Rebelo (CDS-PP).
Entretanto, foram aprovados o projecto de resolução n.º 333/X — Deslocação do Presidente da República a Saragoça (Presidente da AR), o projecto de deliberação n.º 14/X — Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República (Presidente da AR) e o projecto de resolução n.º 337/X — Prorrogação do prazo de vigência da Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas (Presidente da AR).

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Na generalidade, na especialidade e em votação final global, foi aprovado o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sobre o projecto de lei n.º 518/X — Alteração do regime remuneratório do Presidente da República (PS).
Em votação final global, foi ainda aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Defesa Nacional, relativo à proposta de lei n.º 186/X — Procede à sétima alteração ao Decreto-Lei n.º 236/99, de 29 de Junho, que aprova o Estatuto dos Militares das Forças Armadas Foi apreciada a petição n.º 399/X (3.ª) — Apresentada por Miguel Graça e outros, solicitando que a Assembleia da República tome medidas legislativas e políticas no sentido de garantir o direito à habitação. Intervieram os Srs. Deputados Ana Couto (PS), António Carlos Monteiro (CDSPP), Miguel Tiago (PCP), José Eduardo Martins (PSD), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Helena Pinto (BE).
A Câmara apreciou ainda, em conjunto e na generalidade, a petição n.º 438/X (3.ª) — Apresentada por Filipe Miguel da Cunha Oliveira Araújo e outros, solicitando que a Assembleia da República adopte medidas contra a prova de ingresso na carreira docente, nomeadamente a reformulação do artigo 20.º do Decreto Regulamentar n.º 3/2008, de 21 de Janeiro, com inclusão da prova nos próprios cursos via ensino como requisito de conclusão da licenciatura e a não aplicação da mesma a docentes já profissionalizados, e o projecto de lei n.º 484/X — Elimina a prova de avaliação de conhecimentos e competências do concurso para lugar do quadro de ingresso na carreira docente (oitava alteração ao Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário — aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139A/90, de 28 de Abril) (PCP). Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados João Oliveira (PCP), Abel Baptista (CDS-PP), Luísa Mesquita (N insc.), João Bernardo (PS), Bernardino Soares (PCP), Helena Terra (PS), Emídio Guerreiro (PSD) e Ana Drago (BE).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva

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Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Eugénia Simões Santana Alho
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís Pereira Leal
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Joaquim Almeida Henriques
António Ribeiro Cristóvão
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Emídio Guerreiro
Fernando Mimoso Negrão

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Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Olímpia do Nascimento Castro Candeias
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
José Helder do Amaral
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado

Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Fernando José Mendes Rosas
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

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Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Miguel Pacheco Gonçalves

Deputado não inscrito em grupo parlamentar:
Maria Luísa Raimundo Mesquita

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos começar os nossos trabalhos com a apreciação da proposta de lei n.º 197/X — Aprova o estatuto disciplinar dos trabalhadores que exercem funções públicas.
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, que faz a sua estreia parlamentar e a quem a Mesa cumprimenta.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública (Gonçalo Castilho dos Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é a primeira vez, como é sabido, que me dirijo a esta Câmara. É assim, para mim, precisamente uma honra que a minha primeira intervenção seja nesta Casa da democracia.
O estatuto disciplinar que hoje vos apresento decorre, desde logo, da necessidade elementar de dotar os trabalhadores que exercem funções públicas de um único estatuto disciplinar, acabando com a situação perturbadora e indesejável de no mesmo local de trabalho aplicar nesta matéria ora o regime disciplinar da função pública ora o do Código do Trabalho, conforme o vínculo do alegado infractor. O mesmo regime disciplinar para todos os trabalhadores da Administração Pública, parece, assim, ao Governo uma medida de elementar justiça.
A proposta de estatuto disciplinar que agora se apresenta assenta, assim, em quatro traves-mestras.
Em primeiro lugar, a adequação ao novo regime sobre vinculação, carreiras e remunerações.
Em segundo lugar, a aproximação ao regime laboral comum. Um tal objectivo deve traduzir-se numa aproximação às penas e respectiva medida, sem esquecer as especificidades do serviço público e, em particular, a prossecução do interesse público no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.
Em terceiro lugar, a projecção de uma visão da Administração Pública que valoriza o papel dos dirigentes no exercício das competências administrativas de gestão, em detrimento da tradicional propensão de atribuir aos membros do Governo uma elevada carga de competências neste domínio. Sem pôr em causa que o Governo é o órgão superior da Administração Pública, acentua-se que o Governo é o órgão de condução política e que se considera nuclear a responsabilização dos dirigentes na gestão corrente dos órgãos e dos serviços.
Finalmente, a actualização face ao movimento de modernização administrativa. De facto, o estatuto disciplinar sobrevive inalterado desde há 24 anos, tendo-se registado, entretanto, um esforço de simplificação e aceleração dos procedimentos administrativos. Daí que a presente proposta tenha confessada intenção pragmática de simplificação e de introdução de mecanismos que imponham celeridade na tramitação dos procedimentos disciplinares.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta que aqui discutimos comporta, assim, várias inovações e aperfeiçoamentos. Permitam-me destacar, de qualquer modo, algumas das mais significativas.
Estabelecimento inovador de um prazo máximo de 18 meses para a conclusão do procedimento disciplinar.
Definição de um procedimento especial — o processo de averiguações — exclusivamente destinado a apurar se duas avaliações do desempenho negativas consecutivas indiciam a existência de uma eventual infracção disciplinar.
Reforço da posição do advogado constituído no procedimento disciplinar, por exemplo, com a sua participação no interrogatório do arguido, o que até agora não acontecia.
Consagração do dever funcional de informar o cidadão, por oposição ao tradicional dever de sigilo.
Redução do prazo de prescrição do direito de instaurar procedimento disciplinar e da aplicação das penas propriamente ditas.

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Redução do número de penas disciplinares, tendo-se eliminado as penas de perda de dias de férias, de inactividade e de aposentação compulsiva.
E, ainda, admissibilidade, em caso de não oposição do arguido, de intervenção no procedimento disciplinar da comissão de trabalhadores ou da associação sindical a que aquele pertença.
Devo, a finalizar, alertar a Assembleia para o facto de que das três organizações sindicais com as quais o Governo negociou a presente proposta se tornou possível celebrar uma acta de concordância relativamente aos seus grandes princípios enformadores com duas dessas organizações.
Assim, estes dois acordos têm, para nós, particular relevância: são a prova de que em matéria tão sensível os trabalhadores da Administração Pública, através dos seus representantes, partilham com o Governo o entendimento de que este é o caminho certo a prosseguir.
Um caminho de reforma modernizadora.
Um caminho que aposta no mérito e na excelência, que visa garantir melhores condições para o exercício de funções públicas e que busca a constante prossecução de melhor prestação do serviço público aos cidadãos e às empresas.
É assim, neste contexto, que a Administração Pública ganhará, para o seu direito disciplinar, um instrumento moderno, rigoroso e de garantia para as partes envolvidas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Há dois Srs. Deputados inscritos para pedirem esclarecimentos.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, permita-me que comece, antes de mais, por felicitá-lo pela sua nomeação e, obviamente, em nome da boa praxe parlamentar e da educação que deve sempre permanecer, mesmo de um representante de um partido que não apoia o Governo, por desejar-lhe felicidades para o seu cargo.
Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, queria começar por colocar-lhe quatro questões muito focadas.
Primeira questão: o Governo assumiu — na página 40 do Programa do XVII Governo Constitucional — que a reforma da Administração Pública teria como consequência a redução «(…) em pelo menos (…)» — expressão do Programa do Governo — 75 000 efectivos. Gostava de perguntar-lhe, três anos passados e a um ano do fim da Legislatura, se o Governo mantém, ou não, este objectivo que estava previsto no Programa do Governo.
Segunda questão focada: no Ministério de que o Sr. Secretário de Estado faz parte — e que conhece bem, porque já está em funções, ainda que noutra área, neste Ministério — tem havido notícia de um conjunto de agentes do Estado que têm feito penhoras ilegais sobre privados, quer particulares quer empresas.
Quero perguntar-lhe, Sr. Secretário de Estado, se já houve algum processo disciplinar contra um qualquer funcionário que tenha indevida e ilegalmente penhorado a propriedade privada de um particular.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Terceira questão muito focada: gostava de perceber, Sr.
Secretário de Estado…

Neste momento, o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública troca impressões com o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Augusto Santos Silva.

Já entendi que o Sr. Secretário de Estado está a receber a «cartilha» do Sr. «sacristão» Ministro dos Assuntos Parlamentares…

Risos do CDS-PP.

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Protestos do PS.

Mas se o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares quiser falar também tem esse direito; está à vontade!...
Peço, aliás, Sr. Presidente, que inscreva, se assim desejar, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

Risos do CDS-PP.

Protestos do PS.

Sr. Presidente, já agora, pedia que inscrevesse igualmente algum Deputado do Partido Socialista para me fazer perguntas. Estou à vontade também! Não tenho qualquer problema em responder a perguntas do Partido Socialista, mas, já agora, façam-no no devido tempo, Sr. Presidente.
Continuando, uma das necessidades de fazer a reforma do estatuto disciplinar é a de adequar algumas novas regras da função pública. Gostava, por isso, de perguntar-lhe uma coisa muito específica.
Há, neste momento, um conjunto de funcionários que estão em novos regimes de mobilidade na função pública — os chamados supranumerários —, e esses funcionários não têm um vínculo, não têm uma fiscalização, não estão debaixo do poder de autoridade directa de um responsável do Estado. Pergunto-lhe se este estatuto disciplinar se aplica a esses trabalhadores supranumerários.
Passo à quarta e última questão.
Outra das necessidades que se encontra para criar um novo estatuto disciplinar é a de adequá-lo às regras do sector privado: haver uma similitude de regimes entre o que se passa no Código do Trabalho e o que se passa no estatuto disciplinar dos funcionários públicos.
Como todos sabemos, o Código do Trabalho, neste momento, está a mudar e uma das alterações mais substanciais que tem é exactamente à regra do procedimento disciplinar e, depois, à regra da impugnação desse procedimento disciplinar.
Ora, neste momento, o que o Governo está a fazer é a adaptar o regime dos funcionários públicos ao anterior regime do Código do Trabalho quando o Código do Trabalho vai mudar.
Coloco-lhe uma pergunta muito concreta: depois da alteração ao Código do Trabalho, vem o Governo a esta Câmara alterar de novo o regime disciplinar dos funcionários públicos, para, de facto, termos um regime semelhante ao do Código do Trabalho?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Administração Pública, este diploma que aprova o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas tem, necessariamente, que ser analisado juntamente com outros diplomas que o Governo aprovou e constitui mais uma peça do retrocesso que o Governo quer impor nas relações laborais da Administração Pública.
O Governo dividiu os trabalhadores: os com vínculo de nomeação, para um lado, e os com contrato de trabalho em funções públicas, para outro lado, promovendo a precariedade das relações laborais, atacando a estabilidade do emprego e os direitos conquistados.
Agora, o Governo decide atacar todos os trabalhadores recorrendo à figura da inaptidão como razão justificativa para despedir.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Não é verdade!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — O artigo 84.º, n.º 4, do diploma dos vínculos dizia que se mantinham as regras de cessação, mas a verdade é que o Governo quer introduzir no diploma que discutimos e no diploma do contrato de trabalho em funções públicas mais regras que visam facilitar os despedimentos.

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Assim, o Governo prevê, neste diploma, no seu artigo 18.º, no que respeita aos trabalhadores que têm vínculo de nomeação, a possibilidade de duas avaliações negativas levarem a um processo de averiguações do qual pode resultar o despedimento.
Para os restantes trabalhadores da Administração Pública, no diploma do contrato de trabalho em funções públicas, no artigo 406.º e seguintes, o Governo considera que o não cumprimento dos objectivos estabelecidos é suficiente para despedir.
Sr. Secretário de Estado, com estas regras fica à disposição do dirigente da Administração Pública o despedimento arbitrário. Ele decide quais são os objectivos, decide quem os executa e, depois, despede quem não cumprir os objectivos por ele mesmo fixados. É o despedimento por razões subjectivas e não baseado numa justa causa.
Já não lhe pergunto se considera justas estas regras; pergunto, sim, se acha, ou não, que estas regras violam a Constituição, que proíbe claramente o despedimento sem justa causa.

O Sr. António Filipe (PCP): — Exactamente!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, respondendo às perguntas relacionadas com este diploma, permita-me dizer-lhe, para as metas do Governo, que se mantém o compromisso de alcançá-las. Aliás, os resultados provam que em dois anos, dois anos e meio,…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Já lá vão três anos, Sr. Secretário de Estado! Não são dois anos!

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — … já 40 000 trabalhadores saíram da Administração Pública.
Portanto, o Governo mantém-se comprometido em prosseguir esse esforço e nada aponta no sentido de que o caminho que estamos a percorrer não é o correcto.
Quanto à questão que me colocou sobre penhoras ilegais, respondendo-a na perspectiva disciplinar, digolhe que, com certeza, sempre que há condutas ilegais (e estamos a falar, por exemplo, de um universo de quase 12 000 funcionários — não sei se algum já teve qualquer procedimento disciplinar), e comprovadamente ilegais, as sanções disciplinares a cargo dos senhores dirigentes existem para serem utilizadas.
Quanto à questão técnica que me colocou sobre os funcionários em mobilidade especial, sem dúvida que eles estão sujeitos à hierarquia e à orientação dos secretários-gerais. Portanto, a resposta é sim, eles estão sujeitos a este estatuto disciplinar no âmbito das secretarias-gerais.
Finalmente, a questão respeitante à relação existente entre o contrato de trabalho em funções públicas e a própria revisão geral do Código do Trabalho — depois, como será oportuno, nesta Câmara, haverá, nomeadamente, a apreciação do regime de contrato de trabalho em funções públicas e a eventual concatenação, ou confirmação da articulação, aí será feita.
Sr. Deputado Jorge Machado, permita-me que lhe diga que não há qualquer intuito de perseguição ou de arbitrariedade ou de subjectivismo na aplicação destas normas. Aliás, os dirigentes estão sujeitos ao princípio da legalidade.
Além do mais, toda a arquitectura pressupõe um regime e um sistema de recorribilidade: recurso para estruturas paritárias e recurso, por exemplo, em termos de garantia, para os chamados conselhos coordenadores da avaliação.
Por conseguinte, Sr. Deputado, não encontro aqui exemplos de que haja subjectivismo e muito menos inconstitucionalidade.
Quanto à questão que me colocou das duas avaliações negativas como quase um automatismo para despedimento, se o Sr. Deputado ler com mais atenção a proposta que temos perante nós verificará que estamos a falar de duas avaliações negativas consecutivas, intercaladas necessariamente pela formação adequada e desejável, e que indiciam que será necessário averiguar e, após essas averiguações, ponderar se vamos ter um procedimento disciplinar. Só depois é que se saberá se há lugar à sua aplicação.

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Portanto, diria que, em vez de um automatismo, temos um esquema equilibrado e garantístico, que procura dar aos dirigentes a capacidade de uma gestão correcta, premiando a competência e o mérito, em detrimento do acomodamento e do «deixa andar». Penso que este é um sistema equilibrado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Antunes.

O Sr. Fernando Antunes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.
Secretário de Estado da Administração Pública, a quem aproveito para desejar as melhores felicidades nas suas novas funções, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República discute hoje, na generalidade, a proposta de lei n.º 197/X, que aprova o estatuto disciplinar dos trabalhadores que exercem funções públicas.
É mais um diploma que vem completar o conjunto legislativo em que o Governo apostou só para, no entender do PSD, chamar a si louros de uma reforma que estava no terreno que era «urgente acelerar» e, porque não, possivelmente aqui e ali aperfeiçoar.

Protestos do PS.

O Governo socialista preferiu a sobranceria desta «luta de galos», à sombra de uma maioria arrogante e soberba, sem humildade para aproveitar uma reforma que já estava no terreno. O resultado é o de que, quando caminhamos para o fim da Legislatura, tarda a conclusão do processo legislativo e a sua implementação «vai no adro», ainda por cima quando as soluções são discutíveis, nomeadamente em relação a diplomas que põem em causa a dignificação dos recursos humanos que trabalham na Administração Pública portuguesa.
Esta reforma, que é estrutural, que não devia de modo algum admitir estratégias de conjuntura, muito menos estratégias político-partidárias, que devia ter uma base de apoio ampla e abrangente, foi mesquinhamente diminuída pelo PS, que não colaborou na reforma de 2004 e agora preferiu, de forma solitária e arrogante, aprovar sozinho na Assembleia praticamente todos os diplomas.

Protestos do PS.

A reforma em curso está longe de conseguir o seu desiderato fundamental: identificar desequilíbrios funcionais, motivar os profissionais da Administração Pública, qualificar e formar pessoas e serviços.
Em vez disso, o Governo fez aprovar — pela sua maioria submissa — legislação onde a motivação é substituída por um clima de medo e de «disciplina de silêncios», que se afasta da qualificação motivadora que devia envolver os recursos humanos da Administração Pública.
Veja-se o regime de avaliação que, além de ser uma teia burocratizante e complexa, induz mecanismos que podem levar à injustiça ou à partidarização de decisões de avaliação.
Recordemos, por exemplo, qual era a posição do PS em relação às quotas propostas na Lei n.º 10/2004, de 22 de Março, e o proliferar de quotas na legislação que fez aprovar no Sistema Integrado de Avaliação de Desempenho da Administração Pública, para não falarmos no Estatuto da Carreira Docente e na divisionista solução das quotas para o acesso à categoria de professor titular.
Muitas das soluções que o Governo nos tem apresentado tem implícita a subjectividade que, neste caso, pode ser um inimigo da justiça. A sua complexidade promove a falta de transparência e políticas discricionárias.
Isto acontece no diploma da avaliação, mas também no dos vínculos, carreiras e remunerações e, ainda, no contrato de trabalho em funções públicas, que em breve sobe a este Plenário e que, a nosso ver, vai conter mais um ataque àquilo em que o PS se vem tornando especialista nas reformas estruturais que agita como bandeiras desta Legislatura: o pôr em causa direitos adquiridos! É isso, claramente, que concluímos no regime de contrato de trabalho em função pública que aí vem e que, em vez de se aplicar a todos os que, a partir de agora, entram na Administração Pública, se vai aplicar retroactivamente a todos os funcionários da Administração Pública, milhares e milhares com vínculos de nomeação, desde que não pertençam àqueles

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serviços que exercem as chamadas funções nucleares, como são as de inspecção, diplomacia, informação e segurança.
Se acrescentarmos a tudo isto a incoerência do discurso socialista em relação ao PRACE e ao regime da mobilidade, onde se inclui a mobilidade especial que atingiu apenas 1750 funcionários, verificamos que ficam claramente longe dos objectivos e são incapazes de atingir as metas oportunamente previstas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD sempre se bateu por reformas promotoras do mérito, quer das pessoas quer dos serviços, que potenciassem a competência e um serviço público qualificado, resguardado de tentações e pressões dirigistas que, muito mais do que promover e agilizar a máquina da Administração, potenciam o aparecimento de medos e submissões inibidoras de uma cultura de valores.
Sinceramente, pensamos que o caminho escolhido pelo Governo para esta reforma tem para já um resultado: complicar em vez de simplificar. Na prática a gestão socialista defende que o Estado continue a fazer tudo, recusando-se a rever o seu papel e as suas funções.
O PSD entende apenas ser possível obter resultados se o Estado se libertar de funções acessórias, elegendo e investindo no exercício daquelas que são as suas funções essenciais, definidoras da defesa do interesse nacional e das funções sociais promotoras da defesa dos mais desprotegidos e dos principais direitos de cidadania.
Temos fundadas dúvidas sobre se o caminho escolhido pelo Governo alcançará os objectivos da reforma da Administração Pública,…

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Eu não acredito!

O Sr. Fernando Antunes (PSD): — … ou seja, a redução do peso do Estado na economia, a potenciação ao máximo do serviço público e a promoção dos princípios da economia, da eficiência e da eficácia.
Lamentamos o caminho solitário do PS em matérias que implicavam consensos a fazer no âmbito deste Parlamento e que o próprio interesse nacional implicava que sobrevivessem à natural e democrática alternância partidária na área governativa.
Temos hoje em discussão uma proposta de lei que, em termos substantivos, não é fomentadora de divergências. O que nos divide em relação a esta proposta de lei é a consequência da natural implicação que nela tem o cabaz legislativo já aprovado no âmbito global da Administração Pública.
Para atingir o seu desiderato, o Governo introduz profundas alterações à mens legis do Estatuto que agora se propõe revogar.
Desde logo, avulta a inversão da lógica do sigilo para a lógica da informação, sendo que o sigilo se permite residualmente. Mais se aposta na responsabilização dos dirigentes e serviços em prejuízo da intervenção da tutela — e pretende-se a celeridade processual.
Existem, obviamente, desideratos que qualquer grupo parlamentar, estou certo, subscreverá. É o caso da celeridade processual e a melhoria da defesa e garantias dos trabalhadores.
Divergências pontuais existem, nomeadamente em relação ao n.º 1 do artigo 70.º, onde se admite que seja averiguante um dirigente que já tenha exercido funções de avaliador do trabalhador em causa, em sede de processo disciplinar, passível de possibilitar a demissão ou a admissão de trabalhadores. Parece-nos haver aqui uma injustiça flagrante e uma violação clara do princípio da imparcialidade.
Efectivamente, o processo de averiguação suscita-nos as maiores dúvidas.
De facto, destinando-se este procedimento, com carácter de exclusividade, a apurar, em sede de procedimento disciplinar, se duas avaliações de desempenho negativas consecutivas indiciam uma infracção disciplinar, há aqui uma questão da maior sensibilidade e susceptibilidade.
Esperamos que a maioria, em sede de especialidade, permita a melhoria do diploma.
A votação do PSD desta proposta de lei, na generalidade, hoje, neste Plenário da Assembleia da República, não reflecte divergências de fundo quanto à sua especificidade. E só não votamos favoravelmente porque ela é consequente em relação à matéria referente à reforma da Administração Pública já aprovada pela maioria socialista — da qual, naturalmente, discordamos — e que reflecte uma postura de coerência em relação às nossas posições nesta matéria.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Os trabalhadores, conscientes de que a ofensiva é global, isto é, contra todos os trabalhadores, participaram ontem numa grandiosa manifestação promovida pela CGTP. Foram mais, muitas mais, de 200 000 as pessoas que protestaram contra a revisão, para pior, do Código do Trabalho e das leis laborais da Administração Pública.
Entre estes milhares de trabalhadores encontravam-se muitos trabalhadores da Administração Pública, conscientes de que a luta é o caminho para a derrota destas políticas de direita levadas a cabo, agora, pelo PS.
Depois do PRACE, depois dos supranumerários, depois do aumento da idade de reforma, depois do SIADAP e depois da lei dos vínculos, carreiras e remunerações, o Governo continua a ofensiva com a apresentação do Estatuto Disciplinar.
Após mais um simulacro de negociações, onde não mostrou qualquer vontade de negociar, o Governo apresenta à Assembleia da República o estatuto disciplinar dos trabalhadores que exercem funções públicas, que, não corrigindo qualquer das normas retrógradas do anterior Estatuto Disciplinar, vem agravá-lo! Este é um diploma que tem de ser analisado juntamente com os restantes diplomas, nomeadamente com o dos vínculos, que constitui, por si só, um gravoso retrocesso nas relações laborais de duvidosa constitucionalidade.
O Governo retira o vínculo de nomeação, a estabilidade no emprego a milhares de trabalhadores, para depois manter o grau de exigência e agravar as penalizações em sede de Estatuto Disciplinar.
Este Estatuto Disciplinar, que se aplica a todos os trabalhadores da Administração Pública, é um instrumento de pressão sobre os trabalhadores e não visa construir uma melhor Administração Pública.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Da análise do diploma resulta o claro objectivo de reforçar os poderes dos dirigentes para tentar intimidar os trabalhadores: é criado um conjunto de mecanismos como o processo de averiguações e a sindicância, que apenas servem para ameaçar e tentar intimidar os trabalhadores. Com este diploma é o dirigente que decide se se aplica ou não a pena de demissão quando, até aqui, tinha que ser um membro do Governo a fazê-lo.
O artigo 12.º é um disparate. Não obstante o recuo do Governo, mantém-se a possibilidade de aplicar a pena de multa e despedimento aos trabalhadores que cessaram a relação laboral com a Administração Pública se estes «constituírem nova relação jurídica de emprego público».
No anterior Estatuto Disciplinar a pena de multa exigia «negligência e má compreensão» das normas ou instruções. Agora exigem «negligência ou má compreensão», tornando mais fácil a aplicação de multas aos trabalhadores.
Mas é no âmbito da aplicação da pena de demissão que este diploma mais retrocessos impõe. O artigo 18.º prevê que a violação de procedimentos do SIADAP (do sistema de avaliação do desempenho) leva, primeiro, à suspensão do trabalhador e, ao segundo erro, ao despedimento deste mesmo trabalhador. Ser tivermos em conta a grande complexidade técnica e até jurídica do SIADAP, facilmente se percebe o risco que esta disposição acarreta.
Este mesmo artigo 18.º mantém a alínea c), permitindo o despedimento com base no seguinte fundamento: «Pratiquem actos manifestamente ofensivos das instituições e princípios consagrados na Constituição». Esta formulação demasiado vaga, que faz lembrar os tempos «da outra senhora», é demasiado subjectiva e pode abrir portas a abusos.
Por fim, o Governo dá um claro sinal ao patronato, numa altura em se discute o Código de Trabalho. Para a Administração Pública, para o patrão Estado, o não cumprimento de objectivos fixados pelo patrão é justa causa para despedir. Esta concepção retrógrada, inconstitucional e socialmente inaceitável não passará se os trabalhadores mantiverem acesa a luta e transformarem a grandiosa manifestação de ontem num processo

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crescente de contestação à política de direita deste Governo e de afirmação da necessidade de uma política diferente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quem ouvir os membros do Governo a apresentar propostas de lei relativamente à Administração Pública até parece que eles vêm sempre apresentar aqui coisas muito boas, que são sempre coisas boas que vêm do Governo e da bancada do Partido Socialista.
Mas a verdade é que esta é mais uma proposta de lei que não pode ser vista isoladamente — ela é uma peça do Código do Trabalho para a função pública, ou seja, do próximo «código Vieira da Silva», já antecipadamente aplicado à Administração Pública.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente!

A Sr. Mariana Aiveca (BE): — É, de facto, a peça que faltava para potenciar uma avaliação de desempenho, que — veja-se só!... — foi a própria Ministra da Educação que, em tempos, veio dizer que o SIADAP até era pior para a função pública do que a avaliação dos professores. Numa altura de grande conflitualidade, é um membro do próprio Governo que vem reconhecer exactamente que este é um processo de avaliação de desempenho perverso.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Bem lembrado!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — E, portanto, esta é a peça que vem dar sequência a esse mesmo processo.
Bem podem, então, «chover» os discursos de desadequação do actual Estatuto Disciplinar, que não conseguem justificar o que verdadeiramente já se sabe: são os despedimentos Simplex; são para todos, sem excepção; e vêm «embrulhados» na mesma conversa que, ainda recentemente, aqui ouvimos do Ministro do Trabalho e de alguns Deputados do Partido Socialista. É a confessada intenção pragmática de simplificação; é tudo muito simples — é assim na proposta de Código do Trabalho e é assim nesta proposta. Pragmática simplificação, Srs. Deputados!! Mas vejamos a proposta de lei no seu concreto. O Sr. Secretário de Estado apresentou os quatro propósitos fundamentais. Eu diria que são propósitos todos eles errados, que visam adequar este novo sistema ao regime de vínculos, carreiras e remunerações, quando este foi o primeiro «míssil» de ataque aos funcionários públicos que o Governo lançou ao considerar que os vínculos deixavam de ser públicos e que só esporadicamente havia vínculos públicos. O Governo desvincula a maioria dos funcionários públicos, fragilizando, assim, as relações laborais.
O segundo propósito, também errado — e o Sr. Secretário de Estado referiu-o —, é o de aproximar os regimes e torná-los num regime laboral comum. Ora, eu pergunto-lhe: mas qual regime? Querem-no aproximar ao «código Bagão Félix»? Mas as propostas que aqui vêm não são as do «código Bagão Félix»! As propostas que aqui estão são as que ainda estão em discussão na concertação social para o «código Vieira da Silva»! Ou seja: o Governo vem aqui assumir aquilo que tem andado a dizer que ainda não assumiu e, portanto, é bem pior do que Bagão Félix. Não há aqui qualquer propósito de tornar o regime comum.
Depois, a questão mais gravosa é dar ao chefe todo o poder. O chefe pode, simultaneamente, avaliar o trabalhador e, num processo que é uma novidade deste Estatuto, ser averiguador do não cumprimento dos objectivos. Portanto, quando resultarem avaliações negativas dadas por um chefe, esse mesmo chefe pode, num processo de averiguações, averiguar se o trabalhador tem ou não razão. Isto é uma situação que viola os princípios da justiça, da isenção e da imparcialidade. Como pode um trabalhador estar a pensar que está salvaguardado se vai ter um avaliador que pode ser juiz e, simultaneamente, carrasco?! Mas, Sr.as e Srs. Deputados, esta proposta de lei vai mais longe e ninguém escapa. As penas podem ser aplicadas até àqueles que já saíram. Outra coisa que não é aproximação comum ao actual Código do

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Trabalho. Não é! Os aposentados, por exemplo, podem, desde que constituam uma nova relação de emprego público, vir a sofrer a aplicação do despedimento, que está aqui previsto.
Portanto, parece-me que esta proposta de lei, ao invés de contribuir para a valorização dos funcionários públicos e do seu papel enquanto agentes de uma transformação que só o Estado pode garantir, subjuga os funcionários públicos. Este Estatuto não pode ser visto como Estatuto Disciplinar; é a indisciplina total das chefias e é a perversão completa do Estado na aplicação de penas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A primeira coisa que é importante dizer a propósito desta discussão é que ela se insere na reforma da Administração Pública que o Governo tentou fazer, mas que falhou.
E há números que evidenciam de forma clara esse falhanço. Neste momento, a meta do Governo era ter em mobilidade especial 2468 trabalhadores e tem 1750, mas se formos ver também ministério a ministério há números que são muito curiosos.
A meta do Sr. Ministro da Agricultura era ter 3500 funcionários em mobilidade especial. Quantos atingiu até hoje? 1350 funcionários.
Mas que dizer do Sr. Ministro da Justiça, que ontem se vangloriava de ter números positivos?! Prometia ter 327 funcionários em mobilidade especial, mas tem apenas 2 funcionários.
E, já agora, que dizer também do Sr. Ministro da Administração Interna, que gosta sempre de se vangloriar das reformas que supostamente faz?! Devia ter 142 trabalhadores em mobilidade especial. Quantos é que tem? Tem zero! Nem um para mostrar.
Por isso mesmo, é óbvio que esta reforma do Governo do Partido Socialista falhou. E é muito curioso que o Sr. Secretário de Estado hoje venha aqui, ao Parlamento, assumir e manter a promessa do Governo de redução de 75 000 funcionários públicos. Sabe, Sr. Secretário de Estado, já nem o Sr. Ministro assume essa reforma. No dia 29 de Maio, o Sr. Ministro assumia que seria muito difícil cumprir a meta de redução de 75 000 funcionários públicos. É muito curioso que o Governo venha agora dizer que já reduziu 40 000 funcionários, quando sabemos que essa redução…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — … de funcionários se prende, acima de tudo, com funcionários que estão a ir para serviços que saíram da tutela do Estado, como, por exemplo, as universidades que são fundações e a Estradas de Portugal.
Para terminar, Sr. Presidente, gostaria de colocar uma questão que é muito importante: neste momento, o Governo quer fazer algo que, no mínimo, nos parece abstruso, isto é, quer que funcionários que deixam de estar sujeitos à autoridade e direcção das chefias, porque estão em mobilidade especial, continuem sujeitos ao poder disciplinar das suas chefias. Não se percebe! Com a nova lei do divórcio que o Partido Socialista quer ter hoje, pelos vistos, é mais fácil a um trabalhador divorciar-se do seu cônjuge do que divorciar-se do Estado, porque deixa de estar submetido à autoridade e à direcção do Estado, mas, mesmo assim, continua sujeito à sua fiscalização. Isto é algo que não faz sentido.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Gameiro.

O Sr. António Gameiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Gostava, neste momento, de dar as boas vindas ao Sr. Secretário de Estado e desejar-lhe os maiores sucessos e felicidades em nome do Grupo Parlamentar do PS.
Esta iniciativa legislativa do Governo vem ao encontro e sublinha a coerência do processo de reforma da Administração Pública em curso, porque lhe completa o seu raio de acção.

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Esta proposta de lei vem, igualmente, no sentido de melhorar os níveis de transparência, celeridade e racionalidade da actividade de todos os trabalhadores pertencentes à Administração Pública.
Em primeiro lugar, porque faz a adequação ao novo regime sobre vinculação, carreiras e remunerações, texto que trouxe profundas modificações na situação actualmente em vigor.
Em segundo lugar, a aproximação ao regime laboral comum. Tal objectivo traduz-se, no que às questões disciplinares diz respeito, numa aproximação no que se refere às penas e respectiva medida, sem esquecer as especificidades do serviço público e, em particular, a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos. A acção dos funcionários deixa de estar sob o paradigma do sigilo, estritamente do sigilo, e passa ao conceito de uma Administração aberta e transparente.
Em terceiro lugar, a projecção de uma visão da Administração Pública que valoriza o papel dos dirigentes no exercício das competências administrativas de gestão, em detrimento da tradicional propensão de atribuir aos membros do governo uma elevada carga de competências neste domínio.
Finalmente, e ainda não sublinhada, a «actualização» face ao movimento de modernização administrativa.
De facto, nestes últimos 24 anos, várias alterações disciplinares foram introduzidas por legislação avulsa referente ao Código Penal, ao Código de Processo Penal, ao Código de Processo Civil, ao Código de Procedimento Administrativo, ao Código do Trabalho e ao Código de Processo dos Tribunais Administrativos exigiam uma adequação deste estatuto e agora, depois da lei das carreiras, vínculos e remunerações, exigiase que o Governo melhorasse a redacção, diminuísse o número de penas e desse celeridade aos procedimentos disciplinares.
Assim sendo, a presente proposta de lei põe um novo estatuto disciplinar em vigor, estatuto que, embora não sendo totalmente distinto do existente, acarreta algumas alterações relevantes. Por isso é que duas das três forças sindicais que têm assento nas mesas negociais com o Governo sublinharam, assinaram e deram o seu acordo a esta iniciativa legislativa, porque reconhecem que este é o propósito de uma Administração amiga do cidadão e responsabilizante da actividade administrativa dos funcionários.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Os funcionários são todos tontos! Só eles é que não vêem!

O Sr. António Gameiro (PS): — No âmbito dos deveres dos trabalhadores que exercem funções públicas releva a nova formulação do dever de prossecução do interesse público, o qual, continuando a ser definido pelos órgãos competentes, encontra-se agora devidamente balizado pela lei e pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.
A proposta de lei em apreço apresenta a atribuição, aos dirigentes máximos dos órgãos e serviços, a competência, com carácter indelegável, para aplicação de todas as penas disciplinares superiores, a repreensão escrita e ainda um procedimento especial tão criticado, o procedimento de averiguações. Trata-se de um procedimento exclusivamente destinado a apurar, em sede de procedimento disciplinar, se duas avaliações do desempenho negativas consecutivas indicam, ou não, a existência de uma infracção disciplinar, que, no limite, pode eventualmente vir a conduzir à demissão do trabalhador nomeado ou em comissão de serviço em cargo não dirigente. Mas, como já foi dito nesta Câmara, isso não é automático, há a ponderação, há a verificação, é um processo de averiguações e não a instauração directa do processo disciplinar.
Relativamente às penas disciplinares e aos seus efeitos, importa também sublinhar, porque muito importante, que, por um lado, existe a redução do número de penas disciplinares, tendo-se eliminado as penas de perda de dias de férias para o trabalhador, de inactividade e de aposentação compulsiva, e, por outro lado, existe a redução das molduras abstractas das penas de multa e de suspensão relativamente às vigentes no actual estatuto disciplinar.
Do mesmo modo, são reduzidos alguns dos efeitos das penas, nomeadamente, há a eliminação da perda do direito a férias, da impossibilidade de apresentação a concurso e da colocação em órgão ou serviço distinto, bem como a eliminação da perda do vencimento de exercício em caso de suspensão preventiva do arguido.
Em termos de tramitação dos procedimentos, e no que se refere a prazos, existem muitas e importantes melhorias. Assim, o prazo de prescrição do direito de instaurar procedimento disciplinar é reduzido para um

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ano a contar da data da infracção ou para 30 dias a contar do seu conhecimento pelo superior hierárquico.
Paralelamente, é estabelecido um prazo máximo de 18 meses para a conclusão do procedimento disciplinar, o que é uma inovação, pois no passado havia procedimentos disciplinares que se arrastavam anos sem que o trabalhador tivesse garantias de o ver concluído.
No que diz respeito à prescrição das penas disciplinares várias são também as alterações.
No que diz respeito ao procedimento, importa salientar a consagração da regra da apensação dos processos, medida de celeridade e transparência que é de sublinhar, porque, muitas vezes, havia vários processos a correr sob a dependência de vários funcionários e de vários instrutores sem que o trabalhador conseguisse garantir a unidade de processo e de tratamento.
Em conformidade com as alterações de um paradigma de uma Administração Pública que, nos últimos anos, vem reforçando os direitos dos trabalhadores que exercem funções públicas, é eliminado o dever de participação de infracção disciplinar por outro funcionário, medida que ainda vinha do estatuto disciplinar anterior ao 25 de Abril.
É reforçada a posição do advogado constituído no procedimento disciplinar, nomeadamente mediante a sua participação no interrogatório do arguido.
Passa a ser admissível, em caso de não oposição do arguido, a intervenção, no procedimento disciplinar, da comissão de trabalhadores ou da associação sindical, nos casos em que possa ser aplicada uma pena expulsiva.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do BE Mariana Aiveca.

E é aqui que se verifica bem que alguns intervenientes nesta Câmara não leram o diploma, porque há um reforço tendente ao processo de averiguações, com a intervenção da comissão de trabalhadores ou da associação sindical se houver um processo disciplinar posterior que venha indiciar a expulsão do trabalhador.
E, portanto, há um reforço das garantias do trabalhador nestas situações.
A reforma da Administração Pública é uma bandeira única, incomparável e simbólica da inegável coragem, força política e esforço reformista deste Governo. A nosso ver, todavia, é sempre uma reforma inacabada, apesar de o seu edifício jurídico estar praticamente concluído. Falta agora a mudança comportamental exigida nos diplomas ser posta em prática pelos seus dirigentes e trabalhadores.
Apesar de muitos a terem anunciado, foi este Governo que a concretizou. E é por este Governo a ter concretizado que vem trazer justiça à Administração Pública.
Então, não é da mais elementar justiça que um trabalhador que, dois dias antes de se aposentar de uma repartição de finanças, cometa um acto de burla ao Tesouro e ao erário público venha a ser, depois, objecto da correspondente sanção disciplinar?

O Sr. Jorge Strecht (PS): — É evidente!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Olha o que estão a pensar dos trabalhadores!

O Sr. António Gameiro (PS): — Então havia, digamos assim, uma cláusula de salvaguarda do crime aquando da aposentação do funcionário?! Ninguém perceberia isto em Portugal! Srs. Deputados do PSD, que esquizofrenia! Entendamo-nos! Percebi por que é que o Sr. Deputado Arménio Santos não estava presente. É porque, de facto, a intervenção do PSD nesta Câmara é ao arrepio de tudo o que tem lógica política, porque os dois diplomas que ataca, o das carreiras, vínculos e remunerações e este, foram objecto de acordo com os sindicatos da UGT e com o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado.
Por isso é que não se percebe qual a posição do PSD.

A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): — Qual PSD? Qual deles?

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O Sr. António Gameiro (PS): — Vem dizer que este Governo levou a cabo uma reforma que já estava no terreno mas, durante estes últimos três anos, não trouxe nenhum desses diplomas que tinha preparado para contrapor aos nossos. É porque da contraposição e da oposição democrática é que podia nascer luz para que a Administração Pública, hoje, pudesse ter outras medidas, e não só as do PS.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Gameiro (PS): — Mas quero dizer-vos também que não se percebe o discurso do PSD sobre a reforma da Administração Pública e sobre as funções do Estado.
Há que privatizar mais funções do Estado, delimitar e reduzir as funções do Estado. E qual é a primeira bandeira do principal partido da oposição? Reduzir as funções do Estado no serviço nacional de saúde. Pois aí está uma boa medida e uma boa iniciativa!… O que é que isso queria dizer? O PSD acusa o Governo de não proteger os mais desprotegidos, de não ter políticas sociais, mas o que o PSD vem dizer é: «Não, vamos privatizar a saúde porque, assim, aqueles que menos têm menos terão acesso à saúde». Boa medida da reforma da Administração Pública… Parabéns, PSD!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma última intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Pública.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: No final deste debate, permitam-me realçar alguns aspectos e tentar esclarecer mais alguns.
Não posso deixar de notar que da parte do PSD vem, talvez, um dos grandes elogios. É pena só que não seja suficiente para dar-me apoio. O Sr. Deputado do PSD dizia-nos que é um diploma consequente com a reforma em curso. Precisamente é o que queremos, que este diploma seja consequente com uma boa reforma, uma reforma importante para o País.
O Sr. Deputado, entretanto, salientou que lamenta que este Governo e o PS não aprofundem um maior aligeiramento da presença do Estado na Administração e no País, mas foi precisamente este Governo e este PS que encontraram, em 2005, 14,4% do PIB nas despesas com pessoal, sendo que, em 2007, estamos com 12,9%, ou seja, uma menor taxa e uma taxa mais convergente. Se isto não é aligeirar, não sobrecarregar a presença do Estado, e das despesas com pessoal em particular, no País, gostava, Sr. Deputado, que me dissesse o que é.
Depois, se esta é, de facto, uma iniciativa que coloca menos peso, mais celeridade, maior simplificação, maior desburocratização, diminuição de prazos de prescrição, etc., gostava que o Sr. Deputado e o PSD me explicassem como pode ser uma iniciativa acomodada e ultrapassada.
Olhando para as intervenções do PCP e do Bloco de Esquerda permitam-me que diga que o Governo tem dificuldade em perceber como é que esta iniciativa, que procura rever e acabar com um regime que já tinha 24 anos, que confere competências ao advogado do arguido, que não existia, que permite às comissões de trabalhadores proteger mais os trabalhadores,…

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Não há comissões de trabalhadores! Sabe que não há!

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — … que reduz os prazos de prescrição, de procedimentos e penas, o que não existia, sendo que — pasmemo-nos! — era possível decorrer um procedimento disciplinar durante dezenas de anos, estando o trabalhador sujeito a essa pressão, pelo que estatuímos agora um prazo máximo de 18 meses, é má para os trabalhadores, desprotege os trabalhadores.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Não compreendo!

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A mesma coisa relativamente ao poder absoluto para os dirigentes. Não se percebe porquê. Há recursos hierárquicos, há recursos para o membro do Governo,…

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — É tudo bom! Só os funcionários é que não vêem! São uns tontos!

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — … há recursos para os tribunais, há recursos para estruturas paritárias com os sindicatos. É tudo garantístico, no sentido em que se tem de confiar nos dirigentes mas não se lhes dá poder absoluto, dá-se formas de garantia nos termos da lei, nos termos da Constituição.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Finalmente, não é verdade que os aposentados ou os trabalhadores que cessam a relação jurídica fiquem com essa espada de Dâmocles sobre a sua cabeça para a eternidade. Não é verdade! Só se voltarem a estabelecer uma relação jurídica pública. Ou seja, se um trabalhador cometia uma falta grave, corria todo o procedimento disciplinar, aplicava-se uma sanção e, nesse dia, ele demitia-se, queria ir-se embora, e daí a três meses voltava a uma direcção-geral e tinha de estar imediatamente liberto. Não se pode pactuar com «chica-espertices» de fugir à lei, de fugir à competência e ao dever de zelo.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — Finalmente, queria só realçar que quando as metas são sustentadas em objectivos que estão a conseguir-se alcançar — e 40 000 funcionários libertos é um sinal inédito de que esta reforma está a produzir resultados — tal significa que o Governo não tem de estar, neste momento, com algum mal-estar de que não vai cumprir.
O que o Sr. Ministro de Estado e das Finanças terá dito é que o nosso objectivo com a reforma não é libertar,…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Corrija o Sr. Ministro das Finanças!

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — … não é despedir, não é afastar trabalhadores da função pública. Queremos uma reforma feita por trabalhadores da função pública, por trabalhadores em funções públicas, com eles, para eles e para o País.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Pois, eles é que ainda não perceberam…! São uns tontos!

O Sr. Secretário de Estado da Administração Pública: — O nosso objectivo não são grandes números, mas se lá chegarmos é um bom sinal.
Gostava só de dizer, para terminar, que este estatuto disciplinar é modernizador, vai em linha, evoluindo, com a jurisprudência e as soluções que tínhamos. É um bom estatuto disciplinar, que protege mais os trabalhadores, que responsabiliza os dirigentes e que é melhor para o País.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 200/X — Estabelece o regime jurídico da qualidade e segurança relativa à dádiva, colheita, análise, processamento, preservação, armazenamento, distribuição e aplicação de tecidos e células de origem humana, transpondo para a ordem jurídica interna as Directivas 2004/23/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, 2006/17/CE, da Comissão, de 8 de Fevereiro, e 2006/86/CE, da Comissão, de 24 de Outubro.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.

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A Sr.ª Ministra da Saúde (Ana Jorge): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que hoje aqui apresentamos diz respeito ao transplante de células e tecidos humanos.
O transplante de células e tecidos humanos é uma área da medicina que tem tido um enorme crescimento nos últimos anos e que proporciona grandes possibilidades terapêuticas a muitos doentes, como vem referido no preâmbulo.
Esta proposta de lei refere-se à utilização de tecidos e células de origem humana e não ao transplante de órgãos, que foi objecto de actualização legal concretizada nesta Assembleia em 2007.
No entanto, aproveito para assinalar os progressos alcançados no Serviço Nacional de Saúde no que se refere a transplantes de órgãos com uma subida global de 18% entre 2006 e 2007.
Esta lei tem como objectivo garantir a qualidade e a segurança relativa à dádiva, à colheita, à análise e ao processamento, preservação armazenamento, distribuição e aplicação de tecidos e células de origem humana.
Transpõe três directivas europeias: uma directiva de 2004, que estabelece normas de qualidade e segurança; outra, de 2006, que define os requisitos técnicos aplicáveis à dádiva, à colheita e à análise dos tecidos e células de origem humana; e a terceira, também de 2006, que se refere ao rastreio, à notificação de reacções e incidentes adversos graves e determinados requisitos técnicos para a codificação, processamento, preservação, armazenamento e distribuição de tecidos e células de origem humana.
Esta proposta de lei assegura o conjunto de procedimentos e de princípios que contempla os aspectos das três directivas.
Destaco, apenas, os princípios mais relevantes: em primeiro lugar, a necessidade de assegurar um ambiente jurídico de abertura à inovação, favorecendo a investigação e a transferência desses mesmos resultados em benefício dos doentes.
Um outro princípio está relacionado com os condicionalismos éticos que envolvem a dádiva de tecidos e células.
No ordenamento legal que propomos, esse processo terá de ser voluntário e altruísta, sendo vedado o pagamento em quaisquer circunstâncias da dádiva de células e tecidos humanos. Do mesmo modo, não poderá ser exigido aos receptores qualquer pagamento pelas células e tecidos.
Entendemos que esta é a solução jurídica que melhor defende os valores humanistas e que melhor se adequa aos princípios das convenções internacionais ratificadas pelo Estado português.
Dentro do mesmo espírito, impõe-se que a colheita de tecidos e células em dador cadáver seja feita com respeito pelo dador.
Naturalmente, os procedimentos relacionados com o consentimento devem respeitar as normas de boas práticas já instituídas na legislação nacional.
No que diz respeito à confidencialidade, adoptamos como princípio a protecção da confidencialidade do dador e do receptor, criando os mecanismos adequados e que se possa garantir a rastreabilidade das células e tecidos. Esse é um normativo que nos parece imperativo e garante da segurança dos procedimentos.
No que diz respeito aos procedimentos, reforça-se o papel da Autoridade para os Serviços de Sangue e Transplantação e do Conselho Nacional da Procriação Medicamente Assistida como autoridades competentes para a supervisão de todo o sistema.
Será desenvolvida uma rede nacional que integra unidades de colheita, bancos de tecidos e células e serviços responsáveis pela sua aplicação.
Ficam claros os requisitos técnicos a que deve obedecer cada componente da rede e o modo como se relacionam.
Numa área tão evoluída do ponto de vista tecnológico, pareceu-nos necessário e adequado regular estes procedimentos de modo a maximizar a qualidade e a segurança.
Por último, compatibilizámos a presente proposta de lei, com a Lei da Procriação Medicamente Assistida, aprovada no Parlamento em 2006. Esta Lei tem já normas sobre a colheita e utilização de células reprodutivas humanas, de células estaminais embrionárias e de outras células e tecidos colhidos no âmbito da aplicação daquelas técnicas. Evitam-se assim redundâncias ou, pior ainda, contradições que limitassem a sua efectiva aplicação.
Com a aprovação desta proposta de lei, Portugal aproxima-se dos países que praticam regras modernas e rigorosas em matéria de uso médico de células e tecidos de origem humana.

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Pretendemos, assim, garantir que os cidadãos portugueses continuarão, no Serviço Nacional de Saúde e nos outros componentes do sistema de saúde, a poder beneficiar das mais recentes descobertas da ciência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Miranda.

O Sr. Carlos Miranda (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, começo por lhe apresentar os meus respeitosos cumprimentos e dizer-lhe que V. Ex.ª, seguramente, está a par de algum ambiente menos positivo que rodeou o debate desta proposta de lei. Está, com certeza, a par de um certo constrangimento que os Deputados da Comissão de Saúde sofreram com este agendamento demasiado precoce.
V.ª Ex.ª tem, com certeza, ideia histórica do que é que o Governo andou a fazer. E é essa a primeira questão que lhe quero colocar: o que é que o Governo andou a fazer durante estes dois anos para deixar expirar todos os prazos de transposição destas directivas? Os prazos venceram em Setembro e Novembro de 2006 e só hoje podemos ver à luz do dia a transposição desta directiva tão indispensável.
Dá ideia que há um parti pris do Governo contra estas matérias e estes temas, parece que sucedeu com a transposição desta directiva exactamente a mesma coisa que sucedeu com a regulamentação da Lei da Procriação Medicamente Assistida (PMA): dois anos para transpor esta directiva, dois anos para regulamentar a PMA! Que dificuldades V. Ex.ª pensa que o Ministério sentiu para conseguir concretizar a transposição desta directiva? Era esta a questão fundamental que lhe queria colocar.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos à Sr. ª Ministra da Saúde, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, gostaria de lhe colocar três perguntas.
A primeira pergunta é sobre aquilo que me parece um pouco misterioso: a proposta de lei que a Sr.ª Ministra aqui apresentou atribui um elevado número de competências — e importantíssimas — à Autoridade para os Serviços de Sangue e da Transplantação.
Não consigo compreender como é que, sendo assim, o Governo não pediu um parecer à respectiva Autoridade sobre o conjunto da proposta de lei que aqui nos apresenta.
Tanto mais que, se estou bem lembrado, na última audição com o então titular da Autoridade para os Serviços de Sangue e da Transplantação, entretanto demitido, foi-nos dito por esse titular que estava exactamente a preparar um documento nesse sentido.
Portanto, parece-nos um pouco estranho que não haja qualquer referência a isto na proposta de lei.
A segunda pergunta que lhe quero dirigir é a seguinte: o Governo é ou não — ainda não compreendi — favorável à existência, à criação, de um banco de células, ou, se quiser, um banco de gâmetas? Pergunto-lhe isto, porque tenho ouvido opiniões diferentes de pessoas na área do Governo e gostava se saber, caso seja favorável, se defende a criação de um banco público ou se essa opinião favorável também é extensível à existência, no futuro, de bancos privados de células reprodutivas, de gâmetas.
Terceira e última pergunta: temos a Lei da Procriação Medicamente Assistida há dois anos, mas, tanto quanto eu sei, até hoje nenhum tratamento de infertilidade foi comparticipado pelo Estado — tanto quanto sei nem um foi.
Estando, também, de acordo com a metodologia que o Governo tem utilizado, nós só muito recentemente é que tivemos a regulamentação e outros aspectos técnicos da execução desta lei legislados.
A minha pergunta é a seguinte: quando é que o Governo prevê finalmente subsidiar, comparticipar, como está na lei e foi anunciado pelo ex-Ministro Correia de Campos, na altura da discussão do Orçamento do Estado, o primeiro tratamento de infertilidade em Portugal?

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É que têm passados anos, fala-se muito disto, o Governo anunciou várias vezes a mesma medida, mas até hoje não teve uma única concretização. Gostaria de saber, no âmbito desta discussão, para quando é que isso poderá vir a ser realidade no nosso país.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Couto.

O Sr. Joaquim Couto (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, começo por saudar o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e a Sr.ª Ministra da Saúde.
Gostaria de rapidamente questionar a Sr.ª Ministra sobre alguns aspectos da proposta apresentada e, antes de mais, felicitar o Governo por ter apresentado uma proposta de lei que uniformiza, transfere e cria alguma lógica que não existia em legislação anterior que tinha transposto parte das directivas comunitárias e aquilo que é a realidade concreta da evolução da medicina nos nosso dias e que, em muitos aspectos, ultrapassa o próprio processo legislativo.
A Sr.ª Ministra referiu aqui a necessidade de coordenar um conjunto de legislação já existente, de dar coerência a todo este sistema de colheitas, transplantes, segurança, armazenamento e utilização de tecidos humanos ou de células e ficou claro que todo este processo legislativo é de grande complexidade e obriga à audição de um conjunto vasto de entidades quer de natureza cívica e política, quer de natureza técnica e científica.
Nos outros países europeus, nomeadamente nos países da União Europeia, há mais ou menos avanços relativamente à transposição destas directivas comunitárias. Sr.ª Ministra, pergunto-lhe se o momento em que apresenta a actual proposta de lei tem algo que ver com a necessidade de audição de um conjunto de entidades, como acabei de referir, de natureza técnica, científica, política e cívica, ou se se deve a uma qualquer negligência por parte do Governo, não tendo aplicado mais cedo estas directivas comunitárias.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.

A Sr.ª Ministra da Saúde: — Sr. Presidente, em relação às questões que me foram colocadas pelos Srs. Deputados, gostaria de dizer o seguinte: esta é uma proposta de lei que entrou na Assembleia da República a 13 de Maio e que foi agendada, em Conferência de Líderes, a 21 de Maio. Trata-se agora de procedermos a uma primeira discussão, na generalidade, competindo depois a este Plenário todo o trabalho que entender necessário fazer.
Trata-se, no entanto, como calculam, de uma lei sobre uma matéria muito complexa e que pressupõe todos os cuidados na sua proposta de legislação. Foi tratada no âmbito dos serviços da Autoridade para os Serviços de Sangue e da Transplantação e daí não vir anexo um parecer desta própria Autoridade. No entanto, poderá ser pedido um parecer desta mesma Autoridade.
No que se refere à questão do banco público de gâmetas, está prevista a existência de um serviço público que possa contemplar e, se necessário, disponibilizar a toda a população esse mesmo banco. Já está em fase adiantada de execução, pelo que entrará em funcionamento ainda durante este ano.
Quanto aos tratamentos de infertilidade, já tive oportunidade de afirmar, noutro âmbito, que a legislação e tudo o que tem sido feito em relação à procriação medicamente assistida e à comparticipação desses mesmos tratamentos no sector privado vai no sentido de desenvolver toda uma actividade que permita garantir os serviços e que este financiamento e esta participação sejam bem regulados, o que pressupõe, primeiro, reforçar todo o sector público durante este ano e, em simultâneo, desenvolver (o que está a ser feito) um sistema informático que permita garantir a todos os casais candidatos o apoio de tratamentos medicamente assistidos ou, melhor, que permita garantir todo o tratamento da infertilidade de uma forma global e integrada, dado que, como sabe, esta é uma área que tem vários níveis de tratamento e não nos parece, do ponto de vista técnico, que se deva tratar exclusivamente os tratamentos da infertilidade mas, sim, garantir e contemplar todo o tratamento da infertilidade de uma forma global.

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Há, portanto, a necessidade de bem regular e estamos prontos para, ainda este ano, provavelmente durante o mês de Novembro, podermos ter já a primeira participação no sector privado. No entanto, foram dadas orientações no sentido de aumentar, de imediato, toda a capacidade de resposta no sector público, porque isso nos permite poder fazê-lo já.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Carlos Andrade Miranda.

O Sr. Carlos Andrade Miranda (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Hesitei entre se devia falar-vos hoje do suplício de Prometeu, na tragédia de Ésquilo, ou do Anfitrião, de Plauto. Acabei por decidir falar de ambos.
Como certamente se recordam, Zeus, pai dos deuses, muito zangado por Prometeu ter roubado o fogo divino, manda acorrentá-lo a um penedo no Monte Cáucaso, onde uma águia diariamente irá devorar-lhe o fígado. Mas o fígado de Prometeu regenera-se e Prometeu não morre, vivendo, assim, o seu suplício eternamente.
Hoje em dia, também as células do próprio paciente são retiradas por biópsia, multiplicadas in vitro, implantadas na zona doente, dando azo à regeneração do tecido. A medicina regenerativa alcança hoje bem mais longe que o mito grego.
Por sua vez, Plauto conta-nos que, enquanto Anfitrião e o seu escravo Sósia estavam longe, numa guerra, Júpiter, que se apaixonara pela linda Alcmena, mulher de Anfitrião, consegue enganá-la, transformando-se, ele próprio, em Anfitrião, enquanto Mercúrio tomou aspecto absolutamente idêntico a Sósia.
O encanto pelo sósia mantém-se ainda nas nossas culturas, como o anseio pela alteridade do eu, ou seja, a fuga à sua incapacidade, à sua insuficiência.
Ora, a clonagem possibilitaria precisamente esta alteridade do eu, permitiria amar-me no outro, melhor ainda do que Narciso perante a sua imagem reflectida nas águas.
O mito do homem repetível — qual Sósia… — permanece hoje muito vivo, ameaçando a sobrevivência da espécie, roubando-lhe a biodiversidade.
Não quero abusar da vossa paciência, mas não resisto em recordar-vos ainda o mito dos andróginos em O Banquete, de Platão, onde Aristófanes conta que os primeiros homens tinham, cada um, quatro braços, quatro pernas, duas caras e ambos os sexos, tendo, portanto, cada indivíduo auto-suficiência reprodutiva. Zeus decidiu enfraquecê-los, dividindo-os a meio. Perderam a autonomia reprodutiva. Para se reproduzirem passaram a ter de buscar a sua cara-metade.
Observa-se, hoje, uma certa saudade, um secreto anseio da mulher para reconquistar a autonomia reprodutiva dos andróginos de Platão.
A reprodução medicamente assistida permite à mulher procriar sem ter de se relacionar com um homem. E, se a clonagem fosse permitida, então a mulher nem sequer precisaria do espermatozóide de um banco de sémen. Teria reconquistado a plena autonomia reprodutiva.
Noutra ocasião, falar-vos-ei do mito do Centauro ou dos sucessos anunciados, dos perigosos sucessos anunciados da nova lei inglesa da embriologia e fertilização humana.
Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei do Governo convoca-nos para reflectir sobre todas estas questões que perseguem a nossa civilização há mais de 3000 anos, mas ao Parlamento, por todo e por junto, foram concedidos seis dias para preparar este debate, sem que o Governo tenha sequer facultado ao Parlamento o conjunto de pareceres emitidos por um conjunto de entidades a que alude na sua proposta.
É preciso que aqui se deixe registado para memória futura que a Assembleia da República não tem qualquer responsabilidade pelo facto de o Governo ter deixado ultrapassar todos os prazos legalmente estabelecidos para a transposição destas directivas.
No momento em que proliferam as redes nacionais e transnacionais de manipuladores de tecidos e células de origem humana, no momento em que o próprio Pentágono e o exército americano decidiram criar um instituto destinado a desenvolver métodos de regeneração da pele, dos músculos e dos membros de soldados feridos, no momento em que a engenharia tecidular avança em Portugal, o Governo não podia ter

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subestimado que era absolutamente imperioso transpor o conteúdo destas directivas, que visam, precisamente, harmonizar critérios de qualidade e segurança na manipulação das células e dos tecidos.
Uma primeira leitura, ainda muito superficial, da proposta permite-nos, no entanto, manifestar a nossa concordância quanto ao modo como se encontram aí plasmados os princípios da dádiva gratuita, do altruísmo, da solidariedade, da equidade, da transparência, da acessibilidade, da confidencialidade e da rastreabilidade.
A Assembleia da República deles tratará na especialidade, mas, atenção, o PSD não deixará de pautar a sua intervenção legislativa nesta matéria pelo princípio do primado do ser humano: «O interesse e o bem-estar do ser humano devem prevalecer sobre o interesse único da sociedade ou da ciência».

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, estou a ver que os deuses são mais férteis que os Srs. Deputados a estimular as intervenções dos Srs. Deputados da bancada do Partido Socialista. Temos, portanto, de agradecer ao Sr. Deputado Carlos Miranda ter-nos remetido para os percursos complexos dos mistérios do corpo e da alma, que tanto animam a bancada do Partido Socialista. Muito obrigado por isso.
Relativamente à proposta de lei, é evidente que se tem de dizer que o tempo de discussão foi demasiado curto e que seria uma manifestação bastante adequada ao reconhecimento do intervalo tão curto de tempo que tivemos que a bancada do Partido Socialista ou o próprio Governo propusessem que ela baixasse à comissão sem votação. Seria mais apropriado para que aquilo que aconteceu de facto não fosse interpretado de uma forma tão negativa, como já aqui foi referido.
Parece-me que a proposta de lei é devidamente equilibrada na salvaguarda e na garantia da qualidade e da segurança de processos altamente complexos e muito delicados. Também creio que a proposta respeita, no essencial, princípios fundamentais da ética e da bioética. É claro que há cuidado e respeito pelos direitos humanos e pela dignidade do ser humano e da pessoa humana. Creio que isso está devidamente acautelado na proposta.
Aquilo em que considero que a proposta é menos clara e menos bem conseguida diz respeito a um problema também complicado e que é, no fundo, hoje em dia, um risco grande destas problemáticas. De facto, a proposta parece-me pouco rigorosa no combate ao que podíamos chamar de «fraude científica associada a interesses comerciais». Ou seja, hoje em dia, vendem-se, no balcão de qualquer farmácia, sonhos e ilusões que não têm qualquer sustentação científica ou que, pelo menos, não têm ainda hoje qualquer sustentação científica.
Desse ponto de vista, procuraremos dar o nosso contributo no debate na especialidade, porque penso que a lei precisava de tornar mais claro o que significa proibir actividades de carácter lucrativo em qualquer uma das fases deste procedimento de transplante de células e tecidos. Acho que o princípio é correcto, mas sabemos, pela prática e pela realidade, quantas vezes este princípio é tão facilmente violado.
A outra questão que também merecerá um estudo mais atento e propostas da nossa parte diz respeito à possibilidade, que se compreende, de, em centros não autorizados, ser possível fazer a recolha de células, desde que seja feita por profissionais que trabalhem em centros autorizados. Ou seja, a lei propõe, de alguma forma, o princípio da sucursal para a recolha de células e tecidos.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Semedo (BE): — Estou quase a terminar, Sr. Presidente.
Compreendo as vantagens que isso tem em determinadas situações, mas também reconheço que é um perigo, porque, de certa forma, pode permitir o funcionamento em sistema de sucursal, ou seja, quem não está devidamente autorizado pode arranjar uma forma de utilizar e executar estas técnicas.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção. tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria dizer que não temos dificuldade em aceitar que esta proposta de lei tem, em geral, um conteúdo positivo e que vai ao encontro de necessidades, de características técnicas relativas a matérias muito importantes como a segurança e a qualidade em matéria de transplante de células e de tecidos humanos bem como da recolha das respectivas dádivas. É, pois, necessário que estas matérias sejam inscritas no nosso ordenamento jurídico na sequência, até, da legislação já aprovada pela Assembleia da República.
Evidentemente, todos sabemos que quanto mais se adensa a tecnicidade das matérias legislativas mais possibilidades há de haver uma divergência em relação a esta ou àquela solução técnica, mas penso que neste debate, na generalidade, nos devemos ater aos grandes princípios.
Ora, sobre esses penso haver um consenso para o qual contribuímos no sentido do que está contido na proposta de lei e que a Sr. Ministra aliás salientou, designadamente a questão do princípio do altruísmo e do não pagamento de qualquer destes actos e de eles não serem alvo de negócios. É importante que isso também fique assegurado e penso que é esse o espírito da legislação, mas talvez precise de uma maior clarificação. A previsão que se faz em relação à importação e à exportação não deve estar fora dessa obrigação de gratuitidade e de não pagamento.
Penso que o conjunto das funções que aqui são atribuídas nesta legislação à Autoridade para os Serviços de Sangue e da Transplantação e ao Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida coloca uma séria questão em relação aos meios dessas duas entidades, que até aqui tinham funções muito menos complexas e com muito menos vastidão do que aquelas que agora lhe são atribuídas nesta legislação e que, portanto, implicam um reforço de capacidade, certamente pessoal, para que possam desempenhar cabalmente as funções que nesta proposta de lei lhes são atribuídas.
É preciso dizer também que toda esta área de enorme inovação e avanço científico e tecnológico exige recursos, em geral no Serviço Nacional de Saúde, e é importante que eles existam. Ora, sabendo que o Serviço Nacional de Saúde continua a defrontar-se com sérias dificuldades a nível financeiro, a nível dos recursos humanos e a outra níveis, é muito importante que sejam tomadas as medidas para que também nas matérias de transplante de células e de tecidos humanos haja um acesso universal a este tipo de tratamentos, no qual o papel do Serviço Nacional de Saúde é fundamental.
Se não tivermos a capacidade para manter e para aumentar o número de profissionais muito qualificados no Serviço Nacional de Saúde nesta área vamos ter, certamente a prazo, algo que está a acontecer em muitas áreas, ou seja, uma exclusividade ou a propensão para uma exclusividade deste tipo de tratamentos no sector privado. Ora, penso que esse perigo deve ser evitado.
Para estar de acordo com esta proposta de lei não é preciso um grande desenvolvimento em matéria de mitologia, que aliás incorre num risco, ou seja, o de motivar mais uma intervenção do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, que normalmente intervém nestas matérias e que a intervenção do PSD pode provocar de modo a voltar a intervir depois das duas intervenções que fez ontem.
Termino dizendo que pensamos que o trabalho na especialidade terá toda a possibilidade de incorporar as reflexões, os pareceres, os contributos não só dos grupos parlamentares mas de muitos especialistas desta área, que a Comissão de Saúde deve ouvir.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta de lei que hoje discutimos com vista à transposição de várias directivas sobre normas de qualidade e segurança em relação à dádiva, colheita, análise, processamento, preservação, armazenamento e distribuição de tecidos e células de origem humana é tão importante quanto complexa quer do ponto de vista das questões bioéticas que levanta quer pela legislação que ainda está dependente desta regulamentação para a sua efectiva aplicação, como é o caso da legislação sobre procriação medicamente assistida (PMA).
Gostaria de aproveitar para referir aqui que têm sido vários os «estrangulamentos» à aplicação da lei da PMA — aliás, alguns já foram aqui citados — e ainda na semana passada tivemos oportunidade de ouvir o

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Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida que nos relatou o facto de, em alguns hospitais de algumas regiões, o acesso aos tratamentos contra a infertilidade ainda demorarem dois e três anos. Ora, isto é inadmissível! Também nos parece lamentável que a lei esteja dependente desta regulamentação que hoje está aqui a ser discutida, também ela com os contornos que conhecemos para efeitos da sua aplicação.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Mas a importância em regulamentar com seriedade e profundidade esta matéria é óbvia. Vivemos momentos de uma extraordinária evolução na medicina, a investigação e os resultados sucedem-se a uma cadência sem precedentes, a inovação dos meios de diagnóstico e terapêuticas é permanente e nunca na história houve tanta expectativa relativamente à cura nem se colocaram tantos dilemas como aqui foram reflectidos pelo Sr. Deputado Carlos Miranda.
Aliás, aproveito para lhe dizer, Sr. Deputado Carlos Miranda, que não é preciso ir tão longe como os andróginos de Platão. Sabe, Sr. Deputado, acontece que há uma corrente científica, nomeadamente no Reino Unido, que tem vindo a observar a degradação sucessiva do cromossoma y, prevendo que daqui a alguns anos, ou melhor, daqui a bastantes anos, possa deixar de existir o cromossoma y, deixando, por conseguinte, de existir homens.

Risos.

Portanto, essa é uma realidade que pode acontecer, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Já cá não devemos estar!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Estamos a assistir a uma degradação quantitativa e qualitativa do cromossoma y. Em todo o caso, felizmente, não estaremos cá para ver, pois imagina-se que isso só aconteça daqui a uns 10 000 anos. Portanto, os seus receios têm fundamento.
A evolução e o sucesso das terapêuticas dependem em grande medida da utilização de células e de tecidos humanos e, como tal, confluem para esta discussão os aspectos técnicos e éticos. Ora, se normalmente, em relação aos aspectos estritamente técnicos, se consegue um consenso genérico, o mesmo não acontece em relação a questões éticas que envolvem toda e qualquer prática da biologia. Assim, temos de ter a lucidez para perceber que a busca do equilíbrio é difícil e que é, certamente, o maior desafio da comunidade científica e do legislador. Temos de ter a lucidez de perceber que conciliar o respeito pela vida e pela dignidade da pessoa humana com a compreensível tentação da busca da cura a todo o custo é o nosso dever, mas também temos de ter a lucidez para perceber que raramente serão possíveis consensos éticos absolutos.
Todavia, tal evidência não nos deve impedir de procurar o máximo denominador comum e muito menos nos deve inibir de legislar. Ora, parece que o Governo, pelo menos nestes últimos dois anos, esteve inibido de apresentar esta proposta de lei no Parlamento.
Como aqui já foi dito, e conforme consta do relatório intercalar, faz-se referência na exposição de motivos da proposta de lei às várias consultas que foram efectuadas sem que, no entanto, se tenham anexado os resultados dessas consultas. Há que referir também que não foi ouvido nem solicitado o parecer à Autoridade para os Serviços de Sangue e da Transplantação. Ora, é impossível, num espaço de 15 dias, produzir um relatório ou fazer uma discussão tão aprofundada quanto seria necessário para efeitos de discussão, na generalidade, que, em todo o caso, merece alguma dignidade. Esperemos que isso venha a ser possível na discussão na especialidade.
Gostaria de dizer que concordamos genericamente com a proposta de lei. Consideramos que os princípios genéricos da gratuitidade, da voluntariedade, da solidariedade, da equidade, da transparência e da acessibilidade, bem como o princípio geral da não identificação do dador, são traves-mestras na orientação ética a seguir. Porém, temos reservas relativamente ao alcance e à medida que muitas das questões ainda se nos colocam.

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Penso que nunca será demais referir o desafio que será sempre colocado à comunidade científica e ao legislador: nunca desistir de procurar formas de investigação e de terapêutica cada vez menos invasivas da pessoa humana.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Penso que dificilmente encontraríamos um Plenário de sexta-feira de manhã tão interpelante como este, em que passamos da invocação da mitologia grega, o que é bom, o que é excelente, para a previsão de um futuro com o desaparecimento de um dos géneros humanos, o que, certamente, não terá grandes implicações na composição actual do nosso Parlamento.
De qualquer das maneiras, penso que a discussão e as intervenções a que hoje aqui assistimos nos estimulam para, em sede de especialidade, produzirmos um trabalho que, para além da reflexão que interpela aos nossos conhecimentos, também interpela ao nosso sentido de humanidade, que é aquele que deve presidir a todas as construções neste domínio.
Aproveito para recordar que não é só a mitologia grega que aqui nos serve de fundamento, mas também a filosofia, a evolução do conhecimento científico, as convicções religiosas. Portanto, esta é uma matéria feita de sucessivas construções, em que a ciência, o direito e a filosofia são essenciais para construir este conceito de bioética dos tempos modernos, que tem servido para sustentar toda uma dinâmica de preparação e de formulação de um conjunto de regras a nível internacional.
Realmente, estamos a construir leis universais neste domínio, através da UNESCO, do Conselho da Europa e, a nível nacional também, através do que temos conseguido em termos de máximo denominador comum, de todas as vezes que temos sido chamados a legislar sobre esta matéria ou em todos os domínios em que nós próprios temos tomado a iniciativa de legislar sobre a mesma.
O que penso que, hoje, é reconhecido por todos nós é que a ciência nunca isolará um valor ético no laboratório, porque os conceitos éticos foram desenvolvidos precisamente através de uma construção lenta, assente em tradições filosóficas, éticas, religiosas, jurídicas e, hoje em dia, muito ecológicas. A dimensão cósmica de todas estas intervenções é essencial na actualidade.
Mas toda esta nossa tradição simbólica não conflitua com a ciência, ambas se completam, encaixam-se uma na outra — e este é o trabalho que temos de fazer.
Os princípios definidos na proposta de lei que hoje estamos a discutir são aceites em geral por todas as bancadas, o que é bom. Aos princípios aqui definidos acrescentaria a importância da privacidade e da rastreabilidade e a questão da justiça.
É que, em algumas destas matérias, não temos capacidade para tratar todos e trataremos todos aqueles relativamente aos quais os princípios da necessidade, da justificação e do aconselhamento médico permitam não só fazer o que pretendemos alcançar, que é a responsabilidade do «bem» que obriga à preservação, mas é, sobretudo, a responsabilidade do «melhor» que determina que o progresso e o aperfeiçoamento da vida humana devem ser qualitativos.
É, portanto, neste conjunto de interacções e de relações, neste conjunto de respeito pelas diferenças e pelas divergências, que não significam nenhum processo de exclusão mas antes um processo de criação e de acréscimo, de acrescento, que nós, na Comissão de Saúde, com certeza trabalharemos proficuamente, delicadamente, com sensibilidade, com vontade de ouvir todas as entidades que possam ajudar-nos a melhorar o tecido legislativo que nos foi apresentado e proposto e com uma lógica de, também neste domínio, colocar Portugal para poder aproveitar da excelência e da exigência de qualidade que a sofisticação da intervenção nestes domínios permite, para que isto signifique o aperfeiçoamento progressivo do Serviço Nacional de Saúde em especial, do sistema de saúde no seu conjunto.
É que se, hoje, temos já uma conclusão muito clara relativamente a todos os avanços sobre estas matérias essa é a de que, pela especial exigência de qualidade e de segurança que garantam a eficácia, a defesa do «bem» e a promoção do «melhor», nós, através destas bolsas de intervenção, somos capazes de fazer uma

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«infecção» positiva, garantindo que tudo o que se passa à volta venha a melhorar através das exigências de excelência que são determinadas pelas práticas nestas áreas de intervenção.
Portanto, com todo o respeito pelas diferenças, com todo o respeito pelas opiniões diferentes, vamos construir uma lei que seja ainda melhor do que esta que agora nos é proposta e que salvaguarde e garanta a defesa e a promoção de todos os princípios que a todos nos unem, num consenso que, hoje, é cada vez mais universal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.

A Sr.ª Ministra da Saúde: — Sr. Presidente, para terminar, gostaria de congratular-me com o consenso manifestado pelas diferentes bancadas sobre esta matéria que, de facto, é muito importante para a saúde de todos. A aprovação deste diploma permitir-nos-á salvar muitas vidas.
É que, actualmente, com estes avanços da Medicina e com esta possibilidade, nós, em Portugal, conseguimos dar resposta a muitas necessidades e a muitos problemas de saúde, com ganhos significativos em saúde.
Obviamente, muito haverá ainda a aperfeiçoar, o que a Comissão vai fazer em pormenor. Por seu lado, o Ministério da Saúde estará completamente disponível, como é sua obrigação, para fornecer todas as informações e toda a documentação que for necessária, agradecendo a vossa colaboração para que, em Portugal, possamos desenvolver trabalho ao nível do que de melhor se faz na Europa e nos países desenvolvidos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, se não virem inconveniente, antes das votações regimentais, apreciaremos o projecto de resolução n.º 330/X — Divulgação às futuras gerações dos combates pela liberdade na resistência à ditadura e pela democracia (PS, PSD, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes). Cada grupo parlamentar dispõe de 2 minutos, tal como o Governo.
O primeiro orador inscrito é o Sr. Deputado Marques Júnior, a quem concedo a palavra.

O Sr. Marques Júnior (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de resolução que estamos a apreciar pretende divulgar às futuras gerações, através de um conjunto de propostas e de recomendações, o que foram os combates pela liberdade e pela democracia, valores que hoje são assumidos como referência da nossa vida quotidiana, como, aliás, a subscrição do diploma, por parte de todos os grupos parlamentares, atesta de forma inequívoca.
A este propósito, porque o projecto de resolução fala por si, gostaria de tecer duas considerações de ordem geral.
A primeira, para saudar todos os cidadãos do Movimento Cívico «Não apaguem a memória», que apresentaram a respectiva petição à Assembleia da República, e para sublinhar o facto de a mesma petição ter dado origem ao presente projecto de resolução, assim correspondendo ao apelo daqueles cidadãos.
A segunda, sendo eu próprio um dos Deputados que trabalhou este projecto de resolução, para agradecer a todos os Deputados desta Câmara, sem excepção, e, em particular, a todos os líderes dos vários grupos parlamentares, a sua disponibilidade, a sua boa vontade e o seu empenho que tornaram possível este projecto de resolução, demonstrando a todos os portugueses que, quando falamos da democracia e da liberdade, estamos todos unidos de facto, sem tabus, superando as nossas naturais divergências.
A respeito deste diálogo que tive oportunidade de estabelecer com todos os Srs. Deputados e, em particular, com os líderes parlamentares, devo dizer que, apesar de ter sido simples a elaboração deste projecto de resolução, representou, para mim, um dos momentos mais gratificantes que vivi ao longo destes anos na Assembleia da República.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. Marques Júnior (PS): — Diria que, neste caso concreto, e perante o teor desta resolução e a unanimidade de que é alvo, é como reviver por momentos os ideais mais puros e sublimes do 25 de Abril e o próprio dia 25 de Abril de 1974, que então uniu todos os portugueses e nos une aqui, agora, na defesa da liberdade e da democracia.
Para terminar, Sr. Presidente, se me é permitido, e se não considerarem abusivo da minha parte, gostaria de, em nome desses ideais, dizer a todos os Deputados: muito obrigado!

Aplausos do PS, com Deputados de pé, do PCP, do BE, de Os Verdes e da Deputada não inscrita Luísa Mesquita.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A aprovação, pela Assembleia da República, de uma resolução visando dar a conhecer e valorizar a luta anti-fascista no nosso país é um momento da maior relevância política, sobretudo em tempos em que o branqueamento do fascismo e a tentativa da sua reabilitação são uma preocupante realidade.
Saúdo, por isso, todos os que, na sua intervenção cívica, se empenham em vivificar a luta contra o fascismo e o colonialismo português, procurando preservar esse património de luta pela liberdade e a democracia, combater o apagamento de espaços com especial significado simbólico para a resistência antifascista ou fazer frente a novas tentativas de reabilitação da ditadura, como no caso do projecto do Museu Salazar.
Em Janeiro deste ano, o PCP apresentou um contributo no sentido de ser aprovada uma resolução e, entretanto, através de relatório sobre a petição n.º 151/X, anteriormente entrada, o Deputado Marques Júnior, que quero saudar pelo trabalho que desenvolveu. No relatório que elaborou, o Sr. Deputado Marques Júnior incluiu um conjunto de considerandos e de propostas, com vista à aprovação de uma resolução como a que hoje votaremos.
Perante o apelo dos peticionários para que se desenvolvesse este trabalho, nós próprios procurámos sintetizar os dois contributos, de forma a que o projecto pudesse ser concluído.
Foi possível, com base no texto e nas diligências do Deputado Marques Júnior, chegar a este texto comum que tem o acordo de todos. O texto que agora vamos aprovar não será, pois, pertença de nenhuma força política em particular mas património da Assembleia da República.
A aprovação desta resolução não é apenas um momento simbólico. A resolução tem um conteúdo concreto que deve ser cumprido.
Apoiar programas de musealização, designadamente em espaços historicamente ligados à luta antifascista; promover a investigação científica sobre este período; garantir que o período da ditadura fascista e o seu derrube, com a Revolução de Abril, são efectivamente parte dos currículos escolares leccionados; cooperar com os Estados soberanos surgidos das ex-colónias para a preservação do património de luta comum contra o fascismo e o colonialismo são alguns dos aspectos que, a partir da aprovação, hoje, desta resolução, passam a obrigar o actual e os próximos governos.
A partir daqui, teremos de zelar para que o que hoje se aprova amanhã se concretize, para que as novas gerações se formem nos valores da liberdade e da democracia e para que o fascismo nunca mais aconteça.

Aplausos do PCP, do BE, de Os Verdes e de alguns Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de mais, queria saudar o Deputado Marques Júnior pelo empenho que teve neste projecto de resolução, o que não nos admira pela circunstância de, talvez diante de todos nós, ser ele o que transporta a chama mais intensa do 25 Abril, como protagonista activo que foi desse movimento.

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Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Todos temos sentido, mais do que uma vez, que as novas gerações não estão motivadas para a coisa pública, que nem sempre fazem a avaliação do que foi a conquista da liberdade.
Mas nós, que pertencemos a uma geração que viveu sob o regime ditatorial, sabemos bem quantas vidas e quantos sacrifícios foram necessários para conquistarmos a democracia e a liberdade.
Porém, não devemos queixar-nos tanto pelo facto de essas gerações não terem essa avaliação porque, para elas, a liberdade e a democracia são um dado adquirido, dado adquirido que teve esse custo elevadíssimo. Compete-nos, sim, fazer pedagogia no sentido de essas gerações terem acesso a uma avaliação do que foi esse período negro da nossa história e do esforço colectivo para o ultrapassarmos, com o sucesso que o 25 de Abril nos proporcionou, acabando com o «orgulhosamente sós», acabando com o isolamento em que Portugal estava no mundo, acabando com uma guerra que não tinha fim e criando um País novo, que ainda não é aquele que todos desejamos, que também passa por dificuldades porque, em relação a algumas questões, também há o lado negativo.
Coloca-se uma restrição inultrapassável a esta resolução: ainda não temos o distanciamento histórico bastante para se fazer a história com a isenção que estes movimentos e estas situações exigem. Mas temos a obrigação de criar esses espaços, designadamente museológicos, para que a história fique ainda mais firme nos seus valores e nos seus princípios.
O que se pretende, através desta resolução, é estabelecer uma interacção das escolas e dos estabelecimentos de ensino de vários níveis com estes centros museológicos, onde também estão abrangidos, porque aí houve, infelizmente, focos de resistência, espaços onde a ditadura foi exercida de uma maneira mais forte, como o do Tarrafal, de má memória.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Quero ainda dizer que o 25 de Abril está muito presente nesta resolução, acima de tudo pelo consenso que obteve nesta Câmara, o que se pode constatar através das assinaturas que a resolução conseguiu.

O Sr. Pedro Santana Lopes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Não é preciso dizer mais nada, porque é isto que a Câmara sente.

Aplausos do PSD e de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta bancada regozija-se com a apresentação da resolução em debate, fruto, em boa parte, da acção persistente do Sr. Deputado Marques Júnior, que aproveito para saudar de forma muito especial, resolução, esta, que merece o apoio da bancada do Bloco de Esquerda.
A presente resolução significa que a República, sem prejuízo da sua essencial pluralidade de discurso sobre a memória, não é neutra em relação à própria memória genética da democracia; não é neutra no tocante à condenação da ditadura, do fascismo, da opressão e da guerra; não é neutra também no reconhecimento da dívida que tem para com os que resistiram, para com os que lutaram, sofreram e morreram em defesa da liberdade.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Fernando Rosas (BE): — É esse reconhecimento, esse ponto de partida, que nos permite dizer que a memória em democracia é, por natureza, um campo plural de debate, de disputa, disputa até entre

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contraditórias visões do mundo. Em democracia, não há nem donos, nem comissários, nem sacerdotes da memória ou da verdade histórica.
Porque partimos da condenação da ditadura e da defesa da democracia, a memória histórica é também ela terreno de opção de uma cidadania livre e informada, a possibilidade de cada um fazer suas as representações históricas que entende mais adequadas à sua maneira de viver o presente e de fazer o futuro.
Celebremos, pois, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a memória do longo combate pela democracia contra o fascismo. Celebremos o sacrifício e exemplo dos que o travaram.
Afinal, devemos-lhes quase tudo, até a possibilidade de, sem riscos, podermos divergir sobre tudo o mais.

Aplausos do BE, do PS, do PCP, de Os Verdes e de Deputados do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados: A primeira nota que gostaria de deixar é a de que foi com grande sentido de responsabilidade e também com grande orgulho que Os Verdes subscreveram o projecto de resolução que está em discussão.
A segunda nota, que não é de menor importância, é a de que este projecto de resolução foi subscrito por todas as bancadas. Penso que é importante realçar este pormenor, que não é tão pormenor quanto isso.
Em terceiro lugar, quero saudar a iniciativa e o empenho do Sr. Deputado Marques Júnior na elaboração e na conclusão deste projecto de resolução.
Em quarto lugar, refiro a importância do que está estabelecido neste projecto de resolução, que, ao ser concretizado, permite que se reconheça, se valorize e se preserve marcos importantes do 25 de Abril, possibilitando um maior conhecimento e divulgação.
Entendemos que não só mas também para as novas gerações é importante divulgar, é importante alastrar o gosto pela preservação do valor da liberdade e da democracia, facilitando o conhecimento dos factos, a sua investigação e permitindo o gosto por esse conhecimento, pela interiorização e também pelo desejo de participação, de partilha e de continuidade do que significou o 25 de Abril.
Srs. Deputados, isto torna-se tanto mais importante quanto, na verdade — não há que escamotear —, vivemos numa altura em que há um grande perigo relativamente ao branqueamento não só do que significou o período de ditadura longo e duro, medonho, mas também do fascismo que muitas das nossas gerações viveram.
É importante transmitir o horror que se viveu nessa altura para que o desejo de não regressar nem a uma ponta daquilo que se viveu e de nos agarramos «com unhas e dentes» aos valores da liberdade e democracia seja maior e sempre mais consistente.
Os Verdes saúdam, portanto, esta iniciativa de preservação, de divulgação do património de luta comum e da liberdade. Associamo-nos a ela, por isso a subscrevemos, e consideramos que a Assembleia da República deu este sinal precioso e que, daqui para a frente, terá a obrigação de ficar atenta à sua concretização.
É um dever de todos nós.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Rebelo.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: Gostaria de manifestar a nossa concordância com este projecto de resolução e saudar não só os autores da petição que trouxeram a Plenário esta discussão mas, particularmente, o Deputado Marques Júnior, que fez um excelente trabalho para que houvesse consenso nesta Casa.
É importante existir consenso nesta matéria porque os festejos da democracia e da liberdade não são de um único partido, seja ele qual for, mas, sim, de todos os partidos que acreditam na democracia e na liberdade. Isso é importante, e o Sr. Deputado alcançou esse objectivo, pelo que deve ser felicitado.
Saliento também que o CDS se associa a este projecto de resolução porque festeja a democracia e o combate que levou à sua instauração e que deve ser lembrado aos jovens.

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Também deve ser lembrado aos jovens que, no início, depois do 25 de Abril, algumas forças políticas tentaram que a democracia fosse derrubada e posta em causa por movimentos mais extremistas.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Deve estar a falar do Cónego Melo!

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Saliento que a democracia e a liberdade que veio depois do 25 de Abril também passaram dificuldades na sua instauração.
Votaremos a favor deste projecto de resolução e, mais uma vez, felicito o Sr. Deputado Marques Júnior pelo trabalho que fez.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, gostaria também de me associar, em nome do Governo, a este projecto de resolução e de saudar a iniciativa do conjunto de cidadãos que, através de uma petição dirigida à Assembleia da República, lhe pediram, e por seu intermédio, a todos os portugueses: «Não Apaguem a Memória».
Saúdo também o trabalho feito no âmbito da Assembleia da República na sequência da discussão dessa petição e, em particular, o papel do Sr. Deputado Marques Júnior na elaboração deste projecto de resolução e na obtenção da unanimidade que aqui se verifica.
Gostaria também de saudar, no conteúdo do projecto de resolução, o espectro largo que ele contém no que diz respeito às iniciativas que propõe para lembrar às gerações futuras e presentes o combate pela liberdade, o combate contra a ditadura, incluindo acções de natureza pedagógica, a proposta de um roteiro nacional de lugares que simbolizam esse combate, programas e iniciativas de musealização e de cooperação com os países que já foram colónias portuguesas, que se libertaram do colonialismo e que, hoje, são nossos parceiros na Comunidade de Países de Língua Portuguesa, incluindo manifestações quer da sociedade civil, quer das autarquias locais, quer das regiões autónomas, quer do Estado central.
É este espírito de largo espectro, quer das iniciativas, quer dos responsáveis, que gostaria de saudar, no conteúdo da resolução.
O seu significado político, para mim, é óbvio.
É, em primeiro lugar, uma homenagem que todos nós devemos aos que combateram pela liberdade, contra a ditadura, muitos dos quais estão, aliás, representados nesta Assembleia da República, todos os que combateram pela liberdade, contra a ditadura, obedecendo a credos diferentes, tendo sonhos e convicções políticas diferentes, mas todos eles unidos pelo mesmo amor à liberdade e pela mesma repulsa pela ditadura.
É, em segundo lugar, a consciência de que a democracia portuguesa tem uma história, na raiz da qual está o combate de todos aqueles que, lutando pela liberdade e contra a ditadura, fizeram com que fosse possível a democracia.
Hoje, as portuguesas e os portugueses e, em particular, as suas gerações jovens respiram a liberdade como o ar que respiram, é natural — a liberdade, a democracia não é questionada, hoje, em Portugal. Mas isso faz-se porque foi possível a transição democrática pacífica que houve em Portugal, a grande Revolução dos Cravos, pacífica, que houve em Portugal. E esta foi possível porque, antes dela, muitos combateram contra a ditadura e pela liberdade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos passar ao período regimental de votações. Recordo que, depois das votações, ainda há duas petições a debater, uma sobre o direito à habitação e outra sobre a prova de ingresso na carreira docente, assim como um projecto de lei que subiu em simultâneo com esta última.

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Vamos, então e antes de mais, proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

Recordo aos Srs. Deputados que não puderem utilizar os meios electrónicos que deverão assinalar à Mesa a respectiva presença e, depois, deverão assinar, junto dos serviços de apoio ao Plenário, para que seja registada a sua presença efectiva nas votações e na reunião plenária.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 195 presenças, às quais se somam 3 registadas pela Mesa, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Começamos por votar o projecto de resolução n.º 333/X — Deslocação do Presidente da República a Saragoça (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos à votação do projecto de deliberação n.º 14/X — Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Segue-se a votação do projecto de resolução n.º 330/X — Divulgação às futuras gerações dos combates pela liberdade na resistência à ditadura e pela democracia (PS, PSD, CDS-PP, PCP, BE e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Aplausos do PS, do PSD, do PCP, do BE e de Os Verdes, de pé, e do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos votar o projecto de resolução n.º 337/X — Prorrogação do prazo de vigência da Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 197/X — Aprova o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, votos contra do CDS-PP, do PCP, do BE, de Os Verdes e de 1 Deputada não inscrita e abstenções do PSD e de 2 Deputados do PS.

Este diploma baixa à 11.ª Comissão.

A Sr.ª Eugénia Santana Alho (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Eugénia Santana Alho (PS): — Sr. Presidente, para informar que apresentarei uma declaração de voto sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: — Assim ficará registado em Acta, Sr.ª Deputada.
Relativamente à proposta de lei n.º 200/X — Estabelece o regime jurídico da qualidade e segurança relativa à dádiva, colheita, análise, processamento, preservação, armazenamento, distribuição e aplicação de tecidos

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e células de origem humana, transpondo para a ordem jurídica interna as Directivas 2004/23/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, 2006/17/CE, da Comissão, de 8 de Fevereiro, e 2006/86/CE, da Comissão, de 24 de Outubro, deu entrada na Mesa um requerimento, subscrito pelo PSD e pelo CDS-PP, solicitando a sua baixa à Comissão, sem votação, por um período de 30 dias, para reapreciação na referida Comissão.
Srs. Deputados, vamos votar este requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Assim sendo, a proposta de lei n.º 200/X baixa, por 30 dias, à 10.ª Comissão, isto é, à Comissão de Saúde.
Vamos, agora, proceder à votação, na generalidade, na especialidade e final global, na medida em que a iniciativa originária foi retirada pelos respectivos autores, o texto de substituição, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo ao projecto de lei n.º 518/X — Alteração do regime remuneratório do Presidente da República (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Segue-se a votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Defesa Nacional, relativo à proposta de lei n.º 186/X — Procede à sétima alteração ao Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho, que aprova o Estatuto dos Militares das Forças Armadas.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, votos contra do PCP, do BE, de Os Verdes e de 1 Deputada não inscrita e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, vamos agora dar início à apreciação da petição n.º 399/X (3.ª) — Apresentada por Miguel Graça e outros, solicitando que a Assembleia da República tome medidas legislativas e políticas no sentido de garantir o direito à habitação.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Couto.

A Sr.ª Ana Couto (PS): — Sr. Presidente, Sr
.as e Srs. Deputados: Começo por saudar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, os peticionários presentes na galeria, neles saudando os mais de 4400 cidadãos e cidadãs que, através da Plataforma Artigo 65, dirigiram à Assembleia da República uma petição pelo direito à habitação.
Trata-se de um direito consagrado na Constituição da República Portuguesa. Mas é um facto — e não o negamos — que o nosso País tem, ainda, grandes carências ao nível habitacional. Carências, não tanto, em termos de quantidade mas em termos de qualidade (e também de preço), que afectam as condições de vida de um grande número de famílias.
Não é menos verdade, porém, que tem sido preocupação de todos os governos adoptar medidas que possam resolver essas carências que ainda atingem, na sua dignidade pessoal, muitos dos nossos concidadãos.
É isso que tem feito o Governo do Partido Socialista. Na linha de concretização do seu Programa, e das Grandes Opções do Plano, tem vindo a adoptar um conjunto de iniciativas, no âmbito das políticas de cidades e de habitação.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quais políticas?!

A Sr.ª Ana Couto (PS): — Recordemos, a propósito, alguns dos eixos de intervenção da política desenvolvida pelo Governo nessa área: o relançamento de programas de intervenção urbana, como é o caso do Programa Polis, uma criação de um outro governo do Partido Socialista e do então Ministro José Sócrates; o lançamento da iniciativa Bairros Críticos, com intervenções na Cova da Moura, no Vale da Amoreira e no Bairro do Lagarteira; a alteração do Programa Prohabita, um instrumento de financiamento da política social de habitação; e o lançamento da Iniciativa Porta 65, para promover o arrendamento habitacional com vocação

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social, que, para além do Programa Porta 65 Jovem, já em execução, vai contemplar ainda mais três instrumentos — os Programas Bolsa de Habitação, Gestão e Proximidade e Residência (Coabitação) apoiada.
No âmbito do PRACE, foi criado o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), organismo a quem está cometida a responsabilidade de assegurar a concretização da política definida pelo Governo para essas áreas, em articulação com a política de cidades e com outras políticas sociais.
Mas também o Plano Estratégico da Habitação (PEH), cuja versão inicial foi apresentada recentemente, representa uma profunda alteração nas políticas públicas do sector.
Partindo da análise regionalizada das necessidades de habitação, no contexto das dinâmicas do mercado de alojamento, o Plano assume que o Estado deve apostar na reabilitação do parque habitacional, nas parcerias público-privadas e na dinamização do mercado de arrendamento, conferindo um papel central às autarquias locais.
É um novo rumo, que representa um novo desafio para o Governo, mas também para os municípios.
O futuro das políticas do sector passa pelos programas locais de habitação, por uma nova responsabilidade das autarquias e pelo diálogo com novos parceiros e novos actores.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É minha convicção de que garantir a todos os cidadãos e a todas as cidadãs, a todas as famílias, o direito efectivo de acesso a uma habitação condigna é um combate que nos mobiliza a todos e a cada um.
Por uma sociedade mais justa e pela concretização dos direitos sociais e humanos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar os peticionários que se encontram nas galerias.
Desde logo, gostaria de dizer que a existência desta petição e deste Movimento é muito anterior àquilo que foi a forma oportunista como o Governo se apropriou do nome, chamando Porta 65 Jovem a mais um dos seus tremendos fiascos na área da habitação.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Os 26 000 jovens abrangidos pelo programa ficaram reduzidos a umas poucas centenas. É essa a política que o Governo tem seguido nesta matéria.
Numa altura em que as taxas de juro têm vindo a dificultar a aquisição de casa pelas famílias, as quais, no final do mês, têm enormes dificuldades em pagar a prestação das suas casas, e em que a classe média é sobrecarregada com o aumento dessas mesmas taxas de juro, o que verificamos é que não há solução alternativa no mercado de arrendamento.
É o próprio Governo a reconhecer, no seu Plano Estratégico da Habitação, que há 40 000 famílias a necessitar, com a máxima urgência, de casa, quer porque a sua está tremendamente degrada, quer porque não a têm de todo.
Ora, isto acontece quando temos milhares de fogos devolutos. Porquê? Porque não temos mercado de arrendamento, apesar daquela falhada reforma, daquele fiasco de reforma da Lei do Arrendamento Urbano feita pelo Governo PS.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Aliás, face ao trabalho executado, os prazos dessa reforma mostram que só daqui a 1450 anos é que conseguirão concluir aquilo que começaram no ano passado, porque as metas são impossíveis de atingir.
Vivemos, pois, nesta situação surreal em que só os muito ricos ou os muito pobres é que têm forma de alcançar esse desejo de todos nós, que é ter uma habitação condigna. Os muito pobres porque têm uma habitação social, que depois é negligenciada pelo Estado e pelas autarquias e que rapidamente se degrada;…

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Protestos do PCP e do BE.

… e os muito ricos porque não têm evidentemente este problema. Por conseguinte, sem mercado de arrendamento, não é possível haver qualquer solução.
Há também um outro aspecto relativamente ao qual o CDS é muito claro. No mercado da habitação, muitas vezes são as melhores intenções que têm os efeitos mais perversos. Na verdade, as intenções excelentes e os efeitos perversos das mesmas levaram a que se «matasse» o mercado de arrendamento e fizeram também com que neste momento não tenhamos a possibilidade de ter uma alternativa para tantas pessoas e tantos jovens que precisam de uma casa. Isto quando temos milhares de fogos fechados.
O que sabemos é que com o Partido Socialista continuaremos sem ter uma solução em termos de habitação, porque o Partido Socialista não tem realmente a menor noção do que fazer, além de que o que tem feito tem feito mal! Aliás, basta dizer que a intervenção nos bairros críticos até agora significou «zero». Sr.ª Deputada Ana Couto, vá ao terreno e veja! A Cova da Moura não mudou, Sr.ª Deputada. Está tudo na mesma! Vá ao Bairro 6 de Maio, vá às autarquias socialistas, que são as mais atrasadas em termos de PER (Plano Especial de Realojamento). Veja a situação da habitação nessas autarquias e diga-me qual é a solução que o Partido Socialista vai trazer para este problema.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A necessidade sentida de solicitar medidas para a garantia do direito à habitação, 34 anos após o 25 de Abril, demonstra bem o percurso seguido pelos sucessivos governos no que toca ao cumprimento e aplicação — ou, neste caso, ao não cumprimento e não aplicação — do Texto Constitucional de Abril.
O direito à habitação, consagrado no artigo 65.º da Constituição da República Portuguesa, contrasta frontalmente com as políticas prosseguidas e com a actual situação que se verifica no País: mais de 325 000 fogos em avançado estado de degradação; mais de 544 000 casas abandonadas; centenas de milhares de famílias submetidas a condições de habitabilidade degradadas, como revela o Censos 2001; mais de meio milhão de casas que não dispõem de condições básicas — canalização, electricidade, esgotos ou, sequer, instalações sanitárias.
A degradação da qualidade de vida dos portugueses, particularmente daqueles que, embora trabalhando, vão ainda assim empobrecendo, impede a compra de casa, mesmo com o recurso ao mercado selvagem do crédito à habitação. Com os baixos salários, o desemprego e a precariedade crescente para uma assinalável parte da população, é hoje impossível comprar casa, mesmo com o recurso a crédito, e mesmo o arrendamento, por tão caro, torna-se para muitos uma exigência extremamente difícil.
Ao contrário do que nos tentaram fazer crer, uma análise breve das políticas deste Governo revela uma ausência total de medidas estruturais e sistémicas na área da habitação, seja na garantia das condições de habitabilidade, seja no apoio e protecção da juventude, seja na garantia de alojamento para um conjunto de portugueses que continua a viver sem tecto ou em bairros ilegais.
A especulação imobiliária e a sobreposição total dos interesses privados aos interesses públicos têm conduzido o País a uma situação de pura irracionalidade, sacralizando o mercado e empurrando milhares e milhares de pessoas para as coroas periféricas das áreas urbanas, degradando a qualidade de vida e a qualidade ambiental, enquanto despovoa e desertifica os centros urbanos, colocando-os à mercê da especulação imobiliária.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Ao mesmo tempo, a política de construção a custos controlados de habitação social e o apoio à autoconstrução e ao arrendamento são elementos meramente residuais perante

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as necessidades. A política de reabilitação de centros urbanos conta apenas com alguns milhares de euros em PIDDAC para todas as regiões do País, se excluirmos o Programa Polis, que também não conta com muito mais.
É urgente uma política que promova a ocupação racional dos solos, que promova a ocupação dos centros urbanos, mas que ponha simultaneamente fim à litoralização do País e à macrocefalia urbana consequente.
A petição que discutimos hoje, e cujos subscritores aproveitamos para saudar, além do mérito que lhe é inerente, por constituir uma importante expressão de participação e democracia, traz-nos outros méritos: foca um problema central do Estado, aponta para a necessidade de rápida intervenção, mas não casuística, e mune esta Assembleia de uma síntese sobre as lacunas e necessidades legislativas no que toca ao normativo sobre habitação.
Ante estas duas qualidades desta petição, o Grupo Parlamentar do PCP afirma a sua solidariedade e o seu compromisso. Compromisso que já veio a provar nesta mesma Legislatura com: a apresentação de um projecto de lei que reforçava o extinto Incentivo ao Arrendamento por Jovens; a apreciação parlamentar do Decreto-Lei relativo ao Porta 65 Jovem; o projecto de resolução que propunha a sua cessação de vigência; o projecto de resolução que propunha a extinção da Fundação D. Pedro e a reversão para o Estado da propriedade dos Bairros dos Lóios e Amendoeiras; as críticas e propostas de alteração à nova Lei do Arrendamento Urbano; e, ainda, com o requerimento aprovado por unanimidade na Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território para a vinda do Sr. Presidente do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana para discutir a necessidade de aperfeiçoamento dos instrumentos do Estado e que, curiosamente, ainda não teve lugar.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O PCP afirma também o seu empenho perante as questões que esta petição nos traz e que conhecemos bem.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Assim, o PCP integrará, de futuro, como, aliás, tem feito ao longo do exercício do seu mandato político, estas preocupações na sua intervenção parlamentar. No entanto, não pode deixar de apelar a todos que continuem a luta pelo direito à habitação.
Perante a política de direita que o actual Governo, como os anteriores, vem promovendo,…

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Não é de direita!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … de submissão aos grandes interesses do capital e da banca, das entidades fornecedoras de crédito, da especulação imobiliária e da construção, nada senão a luta dos trabalhadores e todos os afectados por esta política pode obrigar a uma inversão de rumo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Peticionantes, permitam-me que cumprimente, na pessoa da Sr.ª Arquitecta Helena Roseta, todos os que apresentaram esta petição ao Parlamento. De facto, há um passado de intervenção cívica que assiste a alguns um particular direito a interpelar o Parlamento, em especial numa matéria tão séria. Mas confesso que estava aqui a ficar distraído a ouvir o Deputado Miguel Tiago e a pensar que, de facto, o exemplo da maioria das autarquias comunistas a sul do Tejo, no que diz respeito à gestão urbanística que fazem, tem tudo menos a ver com aquilo que ele acabou de nos dizer e que devia ser o exemplo de uma boa política da habitação!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Não diga disparates!

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O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Na verdade, Os Verdes — e aproveito para me penitenciar um pouco disso —, num tempo em que há tantas outras coisas para discutir, quiseram assinalar a semana do ambiente com um debate, que classifiquei de pouco oportuno, sobre a expansão do crescimento urbano nos planos directores municipais (PDM) em plena crise do mercado imobiliário. Mas não deixa de ser verdade que muitos dos PDM que permitiram a construção desenfreada foram os que estiveram na origem da pouca aposta que se fez na reabilitação urbana e na degradação do parque habitacional que hoje temos.
Faria melhor que, em vez de andarmos aqui a atirar farpas uns aos outros, nos concentrássemos no muito de importante que a petição tem para dizer e nos dispensássemos deste exercício de auto-elogio e de permanente crítica, porque, provavelmente, nenhum de nós estará isento de «telhados de vidro» nesta matéria! De facto, o Programa Polis — que hoje aqui foi citado e que muitas vezes nos tem parecido uma operação de verdadeira reabilitação urbana —, que deveria até servir de âncora a outras concretizações, precisa de uma avaliação muito séria para saber se valeu a pena gastar todos os recursos que tínhamos nos fundos estruturais neste programa e quase nada investir na reabilitação urbana, para que, afinal, na prática, tenhamos criado mais uns quantos espaços de construção, tenhamos alindado algumas cidades, mas perdido uma bela oportunidade de fazer requalificação urbana a sério! Esta petição identifica muitos problemas de que o País padece. Temos cerca de 1 milhão de fogos em Portugal sem condições básicas mínimas, em 2001 tínhamos 325 000 fogos muito degradados e a situação não tem estado a inverter-se particularmente. É por isso que esta petição faz hoje todo o sentido.
Sabemos, tal como o CDS citou, que o Porta 65 Jovem não substituiu, como deveria ter substituído, o Incentivo ao Arrendamento Jovem (IAJ) e temos a convicção de que a reforma que pretendemos fazer da Lei do Arrendamento e que foi pura e simplesmente enfiada na gaveta, ao contrário do Programa Polis, que talvez precise de mais alguns anos para ser avaliado, já pode ser hoje medida no seu insucesso.
O PSD está, portanto, preocupado com o mercado do arrendamento, pura e simplesmente parado e moribundo em Portugal.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sem fazer perder muito mais tempo à Câmara — e vou terminar, Sr. Presidente, não gastando os 5 minutos que o PCP gastou —, gostava apenas de dizer que o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata acompanha, infelizmente, o diagnóstico traçado pelos peticionantes e manifesta a sua disponibilidade política para acompanhar iniciativas políticas que permitam resolver este problema que, infelizmente, ainda é grave em Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os Verdes começam também por saudar os peticionantes e realçar o profundo valor que atribuímos à entrega desta petição na Assembleia da República e a tudo o que se desencadeou nesta Assembleia relativamente à matéria constante na petição.
Os peticionantes começam por lembrar aquilo que é óbvio: o direito constitucional consagrado no que diz respeito ao direito à habitação. Mas também relembram o modo como este preceito constitucional não está cumprido.
Na audição, obrigatória por via de número de assinaturas da respectiva petição, os peticionantes fizeram uma proposta concreta à Assembleia da República de elaboração de uma lei de bases da habitação, quase que uma estrutura intermédia entre o direito constitucional consagrado, relevantíssimo, e a legislação ordinária que se faz a partir daí, ou seja, um enquadramento, uma orientação para a política de habitação. Devo dizer que consideramos esta ideia muito interessante e parece-nos que a Assembleia da República deveria reflectir clara e objectivamente sobre ela.

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No que diz respeito à habitação, vivemos, de facto, num mercado selvagem. Digo «selvagem» porque é, mais ou menos, do tipo «salve-se quem puder».
Reportando-me à discussão que tivemos há dois dias, por iniciativa de Os Verdes, gostaria ainda de lembrar que temos muita construção, demasiada construção — mas nem por isso todos têm habitação e nem por isso as casas são mais baratas! —, muitos fogos vagos — nalguns concelhos, o número chega a atingir praticamente os 50% — e, também, muita degradação na habitação.
Portanto, este resultado tem de significar o falhanço de qualquer coisa ou a omissão de qualquer coisa.
Temos um conjunto de programas que não deram o resultado devido. Segundo o próprio diagnóstico do Plano Estratégico para as Políticas de Habitação, os apoios relativamente à habitação têm diminuído. O Porta 65 Jovem é bem um exemplo concreto desta questão.
Temos também, através deste diagnóstico, um levantamento das necessidades quantitativas e também qualitativas em termos de habitação. Isto é verdadeiramente assustador, isto tem de nos fazer reflectir e, mais do que reflectir, tem de nos fazer agir, porque, senão, não seremos responsáveis relativamente àquilo que conhecemos.
O que é que Os Verdes consideram que era importante concretizar já em termos de Assembleia da República — e quando digo «já» é mesmo a curto prazo? Temos tido várias iniciativas legislativas relativamente a esta matéria, provenientes de vários grupos parlamentares; temos ouvido, esporadicamente, uma ou outra associação, um ou outro responsável na matéria; temos uma petição concreta que deu um bom «pontapé de saída». Cabe-nos, agora, agir.
Considero extraordinariamente importante que a Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território fizesse uma audição parlamentar, com carácter de urgência — e vamos fazer uma proposta concreta em sede de comissão —, que reunisse técnicos, especialistas, associações que trabalham na matéria, conhecedores, todos os interessados, para que aquilo que temos andado a ouvir, pontual e separadamente, pudesse ser ouvido conjuntamente, num debate com todos os grupos parlamentares, para percebermos exactamente o sentimento generalizado e aquilo que podemos fazer imediatamente a seguir a essa audição.
Fica aqui a proposta, que concretizaremos, evidentemente, em sede de comissão parlamentar.

Aplausos do Deputado do PCP João Oliveira.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de, em primeiro lugar, saudar os peticionários e também a Plataforma Artigo 65.º, que esteve na origem desta petição, e dizer-vos que foi muito importante este processo e a entrada da petição na Assembleia da República. Isto porque a petição não só traz para a ordem do dia aquilo que todos sabemos que a Constituição já estabelece mas, sobretudo, empurra para a agenda política a questão da habitação em Portugal.
Por isso, temos de saudar a iniciativa cidadã que nos trouxe esta oportunidade.
Nós sabemos — e já aqui foi dito praticamente por todas as bancadas — que o direito à habitação está consignado na nossa Constituição. Bom, sabemos isso e é, de facto, muito importante. No entanto, ainda somos um País onde a habitação não é um direito pleno, e não o é para muita gente.
Apenas um pequeno parêntesis para dizer o seguinte: o Sr. Deputado António Carlos Monteiro acha que os pobres têm, todos, habitação.

O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Não foi isso que eu disse!

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Lamento que pense assim. Talvez o Sr. Deputado não conheça as barracas, não deve saber o que isso é! Talvez não conheça o que tem sido a demolição das barracas e como é ficarem famílias inteiras sem tecto!

Protestos do Deputado do CDS-PP António Carlos Monteiro.

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Mas temos que afirmar que nem todos os pobres, em Portugal, têm habitação e que esse deveria ser um desígnio de quem se diz democrata.
Srs. Deputados, temos também de dizer que nem todas as condições básicas das habitações estão garantidas e temos muitas famílias a viver em condições que não são adaptadas ao século XXI.
Por outro lado, temos tido políticas do Governo que não têm sido suficientemente corajosas — aliás, como toda a política social do Governo —, até têm sido falhadas, como é o caso do Porta 65, que não dá resposta ao arrendamento dos jovens. Inclusivamente, esta questão já foi também objecto de discussão nesta Assembleia.
Mas os peticionários entregaram à Assembleia da República uma petição com um objecto bem concreto, e é sobre ele que também temos de nos pronunciar e não fazer balanços das nossas actividades. E, como a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia disse, trazem também um conjunto de contributos para uma futura lei de bases da habitação. O desafio que colocam aos grupos parlamentares é no sentido de ver se vamos ou não trabalhar para que o nosso País fique dotado de uma lei de bases da habitação.
Da parte do Bloco de Esquerda existe disponibilidade para tratar esta matéria com a profundidade que ela exige e merece — com certeza, com audições parlamentares, com certeza, trabalhando com todos os técnicos, com as associações de moradores. Seria um passo significativo dotar Portugal de uma lei de bases da habitação, e é este o objecto da petição.
O Bloco de Esquerda, entre outras iniciativas, apresenta propostas concretas sobre os critérios para o arrendamento social, assim como em relação aos fogos devolutos. Teremos, por certo, oportunidade de discutir essa matéria.
Comprometemo-nos a manter esta importante questão na agenda política e termino, saudando, mais uma vez, a iniciativa que aqui hoje debatemos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, concluído o debate da petição n.º 399/X (3.ª), passamos à apreciação, conjunta e na generalidade, da petição n.º 438/X (3.ª) — Apresentada por Filipe Miguel da Cunha Oliveira Araújo e outros, solicitando que a Assembleia da República adopte medidas contra a prova de ingresso na carreira docente, nomeadamente a reformulação do artigo 20.º do Decreto Regulamentar n.º 3/2008, de 21 de Janeiro, com inclusão da prova nos próprios cursos via ensino, como requisito de conclusão da licenciatura e a não aplicação da mesma a docentes já profissionalizados, e do projecto de lei n.º 484/X — Elimina a prova de avaliação de conhecimentos e competências do concurso para lugar do quadro de ingresso na carreira docente (oitava alteração ao Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário — aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de Abril) (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostava de iniciar esta minha intervenção, registando o facto de ser a primeira vez que esta Assembleia da República discute simultaneamente uma petição e um projecto de lei. O PCP utilizou, hoje, esta figura regimental, porque entendemos que esta petição e a sua discussão não podem ficar-se pela afirmação de intenções e de solidariedade, sem que os peticionários possam ter alguma coisa mais que levar desta discussão que trouxeram à Assembleia da República.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Quero começar por saudar os 11 685 cidadãos que subscreveram esta petição, afirmando ao Governo que não vale tudo para atacar os professores e exigindo o fim de uma prova de acesso à carreira docente.

Protestos do PS.

Essa exigência é acompanhada pelo projecto de lei, cuja discussão o PCP, hoje, agendou.

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Em primeiro lugar, é uma prova injusta, porque apaga em uma hora e meia o percurso de formação de um docente; é uma prova que introduz um novo constrangimento no acesso à profissão de docente, com o objectivo de deturpar as estatísticas, que mostram as elevadíssimas taxas de desemprego dos docentes existentes no nosso País;…

O Sr. António Filipe (PCP): — Exactamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — … é uma prova que, por isso, viola a Lei de Bases do Sistema Educativo, sobretudo no artigo que identifica os requisitos de acesso à profissão de docente e que, agora, acrescenta esta prova de acesso à profissão de docente.
Esta prova é também uma peça daquele estatuto da carreira docente que o Ministério da Educação impôs aos professores portugueses, que ataca os seus direitos e que degrada a função de docente.

O Sr. António Filipe (PCP): — Exactamente!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Esta petição teve ainda o mérito de arrancar ao Ministério da Educação uma declaração de desconfiança relativamente à qualidade da formação de professores, ministrada pelas nossas instituições de ensino superior.
Temos, portanto, um Governo que, por um lado, desconfia da qualidade da formação dos professores feita pelas nossas instituições de ensino e que nada faz nesse plano, mas, por outro lado, já penaliza os professores, já penaliza os nossos licenciados, os nossos técnicos superiores, que saem com a formação superior das nossas instituições de ensino superior e que vêem obstaculizado o seu acesso à profissão de docente, com a necessidade de realização desta prova e que — veja-se o cúmulo! — têm de suportar do seu próprio bolso os custos para a realização desta prova.

O Sr. António Filipe (PCP): — É uma vergonha!

O Sr. João Oliveira (PCP): — A verdade, Sr.as e Srs. Deputados, é que este processo obstinado que este Governo do Partido Socialista tem levado a cabo contra os professores, contra a função docente, que degrada, na prática, não só o exercício da função docente mas, agora, também impede o acesso a esta profissão, é uma política que tem demonstrado que, para o Partido Socialista e para este Governo, vale tudo! Vamos ver se a bancada do Partido Socialista continua a entender que «vale tudo» para atacar os professores. É que, se assim não for, tem uma boa oportunidade: aprovem o projecto de lei do PCP, aprovem a eliminação desta prova de docente e, então, poderemos dar algum crédito àquelas afirmações de intenções, que, sucessivamente, têm feito, do vosso apreço pela função docente e pelos professores portugueses. Caso contrário, continua a senda de ataque e de degradação da função de docente que têm promovido.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Analisamos, hoje, a petição n.º 438/X (3.ª), subscrita por 11 685 peticionários, que, no essencial, pede a reformulação do artigo 20.º do Decreto Regulamentar n.º 3/2008.
Este artigo 20.º — que é, ao fim e ao cabo, uma norma transitória — destina-se a professores que, por um lado, sejam contratados com dois anos imediatamente anteriores ao ano 2007, para cujo contrato têm de ter, pelo menos, cinco anos de tempo de serviço completo e avaliação de desempenho superior a «Bom».
Portanto, são precisos quatro requisitos para que se aplique esta norma.
Esta norma não se aplica, pois, a todos os contratados, nem a todos os professores. Não se aplica, nomeadamente, àqueles que tenham dois anos, antes de 2007, que tenham serviço classificado de «Muito Bom» e que tenham, por exemplo, quatro anos. Nesta circunstância, estes professores não estão abrangidos por esta norma.

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A petição a solicitar a reformulação da norma tem como objectivo garantir uma regra fundamental do nosso sistema jurídico, que é o princípio da segurança jurídica e de que as leis, quanto a deveres, apenas dispõem para o futuro.
Todos os docentes contratados mas que não estão abrangidos por este Decreto-Lei, que fizeram a sua formação académica, técnica e pedagógica que lhes permitiu a qualificação para o exercício da função docente… Não é aceitável que, por exemplo, um professor com quatro anos de serviço, com formação académica de base de cinco anos, que trabalhou esse tempo de forma eficaz, com empenho e zelo, com grande competência científica e cumprindo todas as melhores práticas pedagógicas, seja, depois, sujeito à realização de uma prova para poder ingressar na carreira docente.
Por isso, o CDS também entende que esta norma deve ser reformulada e iremos apresentar um projecto de resolução no sentido de que o Governo altere este artigo, permitindo a todos os professores em regime de contrato e tenham obtido a classificação de, pelo menos, «Bom» a dispensa da realização desta prova.
Finalmente, o projecto de lei n.º 484/X, apresentado pelo Partido Comunista Português, não merece o nosso voto favorável nem a nossa concordância, porque o CDS entende que deve ser realizada uma prova por aqueles que, no futuro, pretendam ter acesso à carreira, a exemplo do que já acontece para acesso a outras carreiras de formação superior na função pública, noutro tipo de profissões.
Por isso, votaremos contra o projecto de lei apresentado pelo PCP.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (N Insc): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: Saúdo todos os peticionantes que se dirigiram a esta Casa no sentido de que seja discutida a prova de ingresso na carreira docente.
A quase totalidade das formações superiores em Portugal, ao dispor dos futuros professores, são direccionadas para o ensino. Significa que aqueles que optam por esta via só querem e só podem ser professores.
Os candidatos a docentes têm uma formação de quatro anos numa universidade e, se terminada com sucesso em todas as áreas, os licenciados têm, em seguida, mais dois anos de formação.
O primeiro ano será, sobretudo, teórico, científico e pedagógico e, naturalmente, sujeito a avaliação.
O segundo ano colocará o licenciado numa escola com todas as responsabilidades inerentes à profissão.
Esse trabalho é orientado e avaliado por dois ou quatro orientadores, divididos entre duas entidades — a escola e a universidade.
Terminado este ciclo, o licenciado tem agora uma formação especializada em pedagogia e didáctica, exclusivamente para a docência.
De acordo com o novo Estatuto, tudo se mantém. No entanto, a tentação para o supérfluo, para o balofo e para o excesso legislativo trouxeram o não necessário.
Agora, estes cidadãos qualificados irão ser sujeitos a duas ou três provas de avaliação de conhecimentos e competências. Destinam-se a avaliar o domínio da língua portuguesa, a capacidade de raciocínio, os conhecimentos de ordem científica e tecnológica, etc.
Se, em alguma das provas, o professor, porque já o é, tiver uma avaliação inferior a 14, por exemplo 13, mesmo que tenha 20+20 será eliminado.
Ultrapassada esta aberração, vem um período probatório de um ano, no mínimo, e se não tiver «Bom» não tem lugar no quadro, se o houver; se tiver «insuficiente» será exonerado e impedido de trabalhar na docência durante dois anos.
A tudo isto acresce ainda a avaliação contínua e de desempenho ao terminus da sua carreira.
Impõe-se perguntar qual a profissão que, em Portugal ou no mundo, é sujeita a tão inqualificável humilhação intelectual.
Não há, em Portugal, nem em nenhum outro país da Europa a 27, uma situação sequer similar! Permitir que esta excepção esteja legislada suscita, inclusivamente, dúvidas de constitucionalidade.

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Exigir que quadros qualificados científica e pedagogicamente sejam sujeitos a provas de controlo da sua capacidade escrita e de raciocínio evidencia ou incompetência ou a utilização de mecanismos com objectivos escusos.

O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Bernardo.

O Sr. João Bernardo (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os peticionantes têm dois objectivos complementares: por um lado, propõem que se tomem medidas para acabar com a prova de ingresso na carreira docente; por outro, que a referida prova seja incluída nos cursos via ensino, como requisito obrigatório de conclusão da licenciatura, e a não aplicação da mesma a docentes já profissionalizados.
Esta matéria está inserida na revisão do Estatuto da Carreira Docente (ECD), que pretendeu criar novas condições de exigência no acesso à carreira.
A prova de avaliação de conhecimentos e competências, prevista no ECD e no Decreto Regulamentar n.º 3/2008, de 21 de Janeiro, que ora se pretende eliminar, é uma peça essencial na concretização daquela orientação política.
Incidindo sobre as competências transversais às diferentes áreas e os conhecimentos de ordem científica e tecnológica próprios de cada domínio de habilitação, a prova de avaliação constitui-se como um importante instrumento que pretende assegurar, de modo equitativo, o exercício efectivo de docência apenas a quem garante o respeito por requisitos imprescindíveis de exigência e qualidade.
Por isso, num quadro de opções alternativas, pode admitir-se como discutível o método de concretização e aplicação da prova de avaliação adoptado mas considera-se gravemente prejudicial para a qualidade do sistema educativo o retrocesso que representaria a simples eliminação, ora proposta, da prova de avaliação de conhecimentos e competências como requisito de ingresso na carreira docente.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas eles não têm já essas competências?!

O Sr. João Bernardo (PS): — Por sua vez, o PCP pediu à última da hora…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — À última da hora?!

O Sr. João Bernardo (PS): — … o agendamento de um projecto de lei sobre a mesma matéria e em simultâneo com a petição. Má consciência, pois percebeu, pelo debate travado na comissão, que tinha um mau diploma…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Tenha vergonha!

O Sr. João Bernardo (PS): — … e, por via disso, fugiu de um debate alargado, a que tinha direito, em Plenário. Além disso, trata-se de uma falta de consideração e de desvalorização dos peticionários, que viram o seu tempo diminuído para o debate que mereciam e justificavam.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O quê?!...

O Sr. João Bernardo (PS): — Mas o projecto de lei corresponde a posições anteriormente assumidas pelo PCP — reconhecemo-lo.
Com efeito, apesar dos resultados globais insatisfatórios que a escola pública reiteradamente foi apresentando no passado, é uma evidência a posição dogmática e conservadora, em face de uma necessária agenda de mudança e reforma no sector da educação.
O PCP rejeitou as actividades de enriquecimento curricular, rejeitou a reorganização da rede escolar, rejeitou o regime de aulas de substituição, rejeitou o novo modelo de gestão escolar e, como não podia deixar de ser, rejeita, com o presente projecto de lei, o novo regime de ingresso na carreira docente.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Pois rejeita!

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O Sr. João Bernardo (PS): — Ora, perante os exigentes desafios da escola pública, as posições imobilistas não servem o necessário processo de modernização do País e de qualificação do sistema público de educação.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Trauliteiro!

O Sr. João Bernardo (PS): — Mas é diferente o segundo objectivo da petição, já que os peticionários propõem a reformulação do artigo 20.º do Decreto Regulamentar com a inclusão da prova nos próprios cursos via ensino como requisito de conclusão da licenciatura, e a não aplicação da mesma a docentes já profissionalizados.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista entende que esta é uma matéria que deve ser rapidamente reflectida e, eventualmente, enquadrada num processo de diálogo com o Ministério da Educação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, aquilo que pretendo é que a Mesa clarifique se é ou não verdade que este agendamento do projecto de lei do PCP foi feito em devido tempo, apresentado antes da última Conferência de Líderes,…

A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Claro!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — … decidido e aprovado pela própria Conferência de Líderes,…

A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Claro!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — … e corresponde a uma prerrogativa que a lei do exercício do direito de petição dá a todos os Deputados e grupos parlamentares, a qual foi introduzida na última alteração ou revisão do Regimento da Assembleia da República e de outras leis, como a lei do exercício do direito de petição, de que o PS tanto se orgulha e está sempre a invocar para puxar pelos seus galões democráticos.
Gostava de saber se é ou não verdade que todos os partidos poderiam ter utilizado este mecanismo e que se não o fizeram foi porque não tinham projecto, e o do PCP foi entregue em 19 de Março e não quando esta petição foi apresentada.
O que digo, Sr. Presidente, é que percebemos que o PS não queira utilizar este mecanismo,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Má consciência!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — … porque a maioria das petições que aqui vêm são para contestar a política do Governo e, portanto, o PS não tem projectos para dar satisfação a essas petições.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas o Sr. Deputado João Bernardo, que disse que o agendamento deste projecto era para retirar tempo ao debate da petição, engana-se, porque quem perdeu metade do tempo de que dispunha a falar do nosso projecto foi o Sr. Deputado, e fê-lo, porque sabe que o projecto incomoda.

Vozes do PCP: — Exactamente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Este projecto foi, pois, agendado de acordo com os direitos que temos, aliás, tal como todos os grupos parlamentares. O que o PS não queria era ser confrontado com uma

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iniciativa que vai ter de votar e que dá resposta a esta petição. Mas vai ter de votá-la, Sr. Deputado João Bernardo, porque esta prova de ingresso não é só rejeitada pelo PCP, é também rejeitada pelos professores, e é isto que custa ao Partido Socialista.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Também para interpelar a Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Terra.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Sr. Presidente, nos mesmíssimos termos do Sr. Deputado Bernardino Soares…

O Sr. Presidente: — Pode ser até em termos diferentes, Sr.ª Deputada.

Risos.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito obrigada, Sr. Presidente, mas quero apenas aproveitar para dizer ao Grupo Parlamentar do PCP que seria desnecessária esta interpelação, uma vez que, por parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ninguém referiu que não tivesse sido cumprido o Regimento da Assembleia da República.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas o Deputado João Bernardo disse «à última hora»!...

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Estamos certos de que a Mesa da Assembleia está sempre atenta e, como tal, se assim não tivesse sucedido, certamente, este agendamento teria sido recusado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Diga isso à sua bancada!

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Não obstante, Sr. Presidente, e daí ter referido que a minha interpelação era nos precisos termos da bancada do PCP, aproveito também esta oportunidade para dizer que o PCP poderia ter aproveitado este seu fervor de iniciativa e, em face da petição anteriormente apreciada, poderia também ter agendado uma iniciativa legislativa para resolver os problemas da habitação e, já agora, para contrariar o modelo de política que tem vindo a adoptar nas autarquias que são geridas pelo PCP.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, aproveito apenas para esclarecer que agendei este projecto de lei, ouvida a Conferência de Líderes, porque obedecia a todos os requisitos regimentais de apresentação e também àqueles que decorrem da lei das petições. E até é benéfico que os grupos parlamentares, a partir desta primeira iniciativa, possam usá-la de forma muito construtiva.

O Sr. João Oliveira (PCP): — A menos que tenham medo!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar os mais de 11 000 cidadãos que subscreveram esta petição e que, como já hoje foi aqui largamente discutido, pretendem a adopção de medidas contra a prova de ingresso na carreira docente, a qual resulta de um Estatuto da Carreira Docente que é, de facto, mau, porque divide a classe docente, porque não motiva os professores para os grandes desafios que cada um tem na sua escola, que são os desafios de educar e formar os nossos jovens.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Muito bem!

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O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — De entre as várias matérias que os peticionários suscitam, há uma em que me parece que têm toda a razão, que é, de facto, uma questão de justiça. Há, efectivamente, uma grande injustiça no que respeita aos professores contratados, profissionalizados, que, apesar de já terem sido contratados uma vez, apesar de já terem realizado a prova de ingresso uma vez, no ano seguinte, têm de fazer a mesma prova.

O Sr. Horácio Antunes (PS): — Está enganado!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Isto é qualquer coisa que não faz sentido e que, como constatámos em sede de comissão parlamentar, merece uma interrogação — e estou a ser simpático! — por parte de todos os grupos parlamentares.
De facto, é necessário regular esta matéria muito específica e, portanto, neste aspecto, em particular, concordamos com aquilo que os peticionários solicitam.
Já entendemos que não é com a proposta do Partido Comunista que isto se resolve, porque o PSD não é contra a prova de ingresso.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ah! Estão de acordo?!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — O PSD entende que a prova de ingresso é, realmente, mais um factor que nivela por cima a qualidade que pretendemos que os professores tenham, é um processo que ajuda a combater o facilitismo que impera nas nossas escolas…

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Facilitismo?!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — … e, como tal, entendemos que não é a solução fácil que o PCP apresenta — acabe-se com a prova de ingresso! — que vai dar resposta às necessidades do sistema de ensino.
Por isso, ontem mesmo, para dar resposta ao debate que existiu em sede de comissão parlamentar, o PSD apresentou um projecto de resolução em que recomenda ao Governo que actue nas matérias que foram consensuais, ou seja, damos uma oportunidade ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista para que junte as palavras aos actos e seja consequente com aquilo que afirmou na comissão.
Não é, claramente, com este projecto do PCP que o Partido Socialista pode ser consequente mas, sim, num momento posterior, quando aqui debatermos o nosso projecto de resolução. Aí é que vou gostar de ver se o Partido Socialista faz aquilo que diz ou se se fica pelas palavras.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutimos, então, uma petição, bem como um projecto de lei apresentado pelo Partido Comunista Português, que, creio, aponta mais um dos erros que foi criado pela revisão do estatuto da carreira docente.
Creio que a exigência desta prova de aptidão e de competências para acesso ao exercício de funções docentes torna toda a política do Governo no que toca à formação de professores relativamente esquizofrénica. Ou seja, não se compreende por que é que o Ministério da Educação quer submeter a uma prova de aptidão de competências, de capacidade para o exercício de funções docentes professores que já estão hoje no sistema educativo a dar aulas, que vão, aliás, ser avaliados pelo próprio sistema de avaliação de desempenho criado por este Governo em que podem ter «Bom», e mesmo assim têm que se submeter a uma nova prova.
Mas, acima de tudo, o Ministério da Educação assume que não confia na formação pedagógica e científica, nos estágios e na avaliação que é feita durante esse processo de formação dos professores, que é feita ao

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nível da formação superior e das instituições de ensino superior. E é por isso que esta imposição é absolutamente esquizofrénica.
E creio mesmo que esta é a forma ardilosa que o Ministério da Educação encontrou para fugir da questão central, que é a da qualidade da formação dos professores que entram no sistema educativo. Portanto, tenta criar aqui, assim, uma barreira, mas, na prática, não resolve um problema, que creio que é real.
Sabemos que ao longo dos anos 90, em particular, houve um aumento, diria quase abrupto, da oferta na formação superior para quem quer seguir a carreira docente no sistema educativo. Parte dessa oferta foi feita nas instituições privadas e há, hoje, a dúvida sobre a qualidade dessa mesma formação. Por isso mesmo, é necessário que o Governo, o Ministério do Ensino Superior, Ciência e Tecnologia e o Ministério da Educação assumam as suas responsabilidades. Esta é que não pode ser a forma de barrar o acesso dos professores, que fizeram estágio, que foram avaliados, que tiveram formação ao longo do seu percurso de formação superior, àquilo para o que é óbvio que têm habilitação docente.
Creio que é por isso que o Ministério da Educação deve eliminar esta prova e fazer o seu trabalho, que é apostar na formação e na qualidade da formação dos professores que contrata. Deve ser esse o seu desafio.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, concluímos a apreciação desta petição e com ela a nossa ordem do dia de hoje.
A próxima reunião plenária realiza-se na quarta-feira, dia 11, às 15 horas, com a seguinte ordem do dia: declarações políticas; um debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PCP, sobre financiamento do ensino superior; a apreciação do projecto de lei n.º 526/X — Estabelece a pensão de reforma por inteiro com 40 anos de descontos, sem penalização (BE); as apreciações parlamentares n.os 108/X (PSD), requerida ao Decreto-Lei n.º 58/2008, de 28 de Março de 2008, que estabelece o regime jurídico aplicável ao contrato de transporte ferroviário de passageiros e bagagens, volumes portáteis, animais de companhia, velocípedes e outros bens, 77/X (CDS-PP) e 81/X (PCP), ambas relativas ao Decreto-Lei n.º 66/2008, de 9 de Abril, que regula a atribuição de um subsídio social de mobilidade aos cidadãos residentes e estudantes, no âmbito dos serviços aéreos entre o continente e a Região Autónoma da Madeira; a apreciação da proposta de lei n.º 199/X — Autoriza o Governo a alterar o Estatuto da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 487/99, de 16 de Novembro, bem como a adaptar o regime geral das contra-ordenações tendo em vista a criação de um quadro sancionatório no âmbito do exercício de funções do Conselho Nacional de Supervisão da Auditoria; e haverá votações regimentais às 18 horas.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 5 minutos.

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas à
proposta de lei n.º 197/X

A Assembleia da República votou na generalidade, no dia 6 de Junho de 2008, a proposta de lei n.º 197/X,
que aprova o estatuto disciplinar dos trabalhadores que exercem funções públicas.
Considerando o artigo 17.º, relativo à suspensão aplicável aos trabalhadores, nomeadamente na sua alínea
j), «Agridam, injuriem ou desrespeitem gravemente superior hierárquico, colega, subordinado ou terceiro, fora
dos locais de serviço por motivos relacionados com o exercício das funções» e
Considerando que a sua aplicação em certas regiões do País, mais rurais, menos urbanas, menos
povoadas, onde todos os intervenientes se conhecem para além do serviço, onde existe entre as pessoas uma
maior proximidade que é quotidiana, que sabem onde se localizam as suas residências, que conhecem os
familiares e alguns amigos, pode em situações de quezílias pessoais, tornar-se com alguma facilidade numa
distorção do espírito inicial da lei, atingindo uma outra dimensão que poderá ser difícil ao trabalhador
desmontar e provar a sua verdadeira intenção de declaradamente ser tão só prejudicado na sua vida
profissional.

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Pelas inúmeras reservas e dúvidas que a respectiva aplicação me suscita, não pude deixar de me abster,
aguardando que até à votação na especialidade haja uma clarificação com vista à salvaguarda do trabalhador,
enquanto indivíduo, com vida própria, para além do exercício da sua actividade profissional, que deve
prosseguir sem receios de hostilidades ou tentativas de vinganças mesquinhas e alheias ao seu desempenho
enquanto trabalhador da função pública.
Muitos dos Srs. Deputados conhecerão situações reais, bem ilustrativas das circunstâncias que aqui refiro.
Por outro lado, mantenho também reservas relativamente ao artigo 18.º, relativo à demissão e
despedimento por facto imputável ao trabalhador, nomeadamente à alínea h), sobre trabalhadores que
cometam reiterada violação do dever de zelo, indiciada na obtenção de duas avaliações do desempenho
negativas consecutivas apesar da frequência de formação adequada aquando da primeira avaliação negativa.
Julgo absolutamente indispensável que, em sede de especialidade, haja uma maior clarificação desta
alínea h) do artigo 18.º, para que a sua aplicação não possa ser feita de uma forma discricionária e
discriminatória.
Pelas reservas e dúvidas relatadas, decidi na votação optar pela abstenção e simultaneamente apresentar
esta declaração de voto.

A Deputada do PS, Eugénia Santana Alho.

———

1 — A proposta de lei n.º 197/X é mais um diploma de um conjunto legislativo de uma reforma estrutural da
Administração Pública que urgia fazer para motivar os profissionais, evitar desequilíbrios funcionais, promover
a qualificação e formação de pessoal e serviços, com os princípios da economia.
Sendo de louvar os princípios e tendo, por disciplina partidária, votado a favor, não posso, em consciência,
deixar de expressar dúvidas e angústias em relação a alguns aspectos.
2 — Por outro lado, permita-se-me solicitar que sejam homenageados mais funcionários competentes que
se reformem, e não só, pois seria bom para a sua auto-estima e a do próprio País que a Administração Pública
se tornasse mais humanizada. Os louvores poderiam ser dados em cerimónias específicas ou, pelo menos,
através da publicação em Diário da República. De facto, há funcionários públicos muito bons cujo mérito não
tem sido, ao longo dos anos, devidamente reconhecido e que se têm reformado ultimamente, afirmando-se
publicamente desiludidos, frustrados e injustiçados. Os referidos louvores são um mínimo a quem tanto tem
dado a Portugal.
3 — Em relação concretamente a este diploma, é de louvar por exemplo a celeridade processual e a
melhoria da defesa dos trabalhadores, mas parecem-me perigosos certos poderes dados aos dirigentes,
permitindo-lhes perseguir subordinados sem motivos profissionais e objectivos (vide, por exemplo, os artigos
17.º e 70.º). Em certas regiões do País, em meios mais pequenos, perseguições destas podem ainda ser mais
gravosas.
Quanto ao artigo 18.º, sobre a demissão e despedimento por facto imputável ao trabalhador, a questão das
duas avaliações de desempenho negativas consecutivas, implica também problemas muito complexos, os
quais espero que, em sede de especialidade, sejam acautelados.

A Deputada do PS, Matilde Sousa Franco.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
António José Ceia da Silva
Fernando Manuel de Jesus
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Isabel da Silva Pires de Lima

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Marta Sofia Caetano Lopes Rebelo
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio André Brandão de Almeida Teixeira
António Paulo Martins Pereira Coelho
Arménio dos Santos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Feliciano José Barreiras Duarte
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel de Matos Correia
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Miguel de Santana Lopes
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Popular (CDS-PP):
Paulo Sacadura Cabral Portas
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
Bruno Ramos Dias
José Honório Faria Gonçalves Novo

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
João Bosco Soares Mota Amaral
José António Freire Antunes

Srs. Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003, de
11 de Outubro):

Partido Social Democrata (PSD):
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
Alberto Marques Antunes
José Carlos Bravo Nico
Luiz Manuel Fagundes Duarte

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Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio

Partido Social Democrata (PSD):
Agostinho Correia Branquinho
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge José Varanda Pereira
José de Almeida Cesário
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Miguel Pereira de Almeida
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Popular (CDS-PP):
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho

Partido Comunista Português (PCP):
Francisco José de Almeida Lopes

Bloco de Esquerda (BE):
José Borges de Araújo de Moura Soeiro

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