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Quinta-feira, 10 de Julho de 2008 I Série — Número 104
X LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2007-2008)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 9 DE JULHO DE 2008
Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama
Secretários: Ex.mos Srs. Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de resolução n.os 92 e 93/X, dos projectos de lei n.os 548 a 552/X, da apreciação parlamentar n.º 86/X e dos projectos de resolução n.os 357 a 360/X.
Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo CDS-PP, sobre política agrícola. Na fase de abertura, intervieram o Sr. Deputado Paulo Portas (CDS-PP) e o Sr.
Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Jaime Silva), tendo-se seguido no uso da palavra, além daqueles oradores, os Srs. Deputados Rui Vieira (PS), Ricardo Martins (PSD), Agostinho Lopes (PCP), Luís Fazenda (BE), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes), Miguel Ginestal (PS), Carlos Poço (PSD) e Abel Baptista (CDS-PP).
No encerramento do debate, intervieram o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e o Sr. Deputado Paulo Portas (CDS-PP).
Procedeu-se ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 198/X — Transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva 2006/23/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril de 2006, relativa à licença comunitária de controlador de tráfego aéreo. Intervieram, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações (Paulo Campos), os Srs. Deputados Helena Pinto (BE), Custódia Fernandes (PS), Vasco Cunha (PSD), Bruno Dias (PCP) e Abel Baptista (CDS-PP).
Foi apreciada a petição n.º 312/X (2.ª) — Apresentada por Mariana Alves da Rocha e outros, solicitando que a Assembleia da República legisle no sentido de garantir a acessibilidade electrónica a todos os cidadãos com necessidades especiais (pessoas com deficiência e idosos) e de impor verdadeiras obrigações e sanções para o seu incumprimento. Proferiram intervenções os Srs. Deputados Mariana Aiveca (BE), Luís Campos Ferreira (PSD), Paula Nobre de Deus (PS), Jorge Machado (PSD), Pedro Mota Soares (CDS-PP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes). Foi também apreciada a petição n.º 362/X (2.ª) — Apresentada pelos Profissionais do Espectáculo e do Audiovisual, solicitando à Assembleia da República a
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criação de um regime laboral e direitos sociais para o trabalho intermitente, tendo usado da palavra os Srs. Deputados Mariana Aiveca (BE), Fernando Antunes (PSD), Pedro Mota Soares (CDS-PP), João Oliveira (PCP), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes) e Miguel Laranjeiro (PS).
A Câmara apreciou ainda a petição n.º 435/X (3.ª) — Apresentada por Sandra Cristina Andrade Carvalho e outros, solicitando à Assembleia da República que desencadeie acções tendentes a acabar com os falsos recibos verdes na Administração Pública, tendo-se pronunciado os Srs. Deputados Mariana Aiveca (BE), Pedro Quartin Graça (PSD), Jorge Machado (PCP), Miguel Laranjeiro (PS), Pedro Mota Soares (CDS-PP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 35 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
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Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Eugénia Simões Santana Alho
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Marisa da Conceição Correia Macedo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira
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Partido Social Democrata (PSD):
Abílio André Brandão de Almeida Teixeira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel de Matos Correia
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Artur dos Santos Castro de Campos Rangel
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro
Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
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António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Helder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Deputado não inscrito em grupo parlamentar:
Maria Luísa Raimundo Mesquita
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai proceder à leitura do expediente.
A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: propostas de resolução n.os 92/X — Aprova o Tratado entre a República Portuguesa e a República Popular da China sobre Extradição, assinado em Pequim, em 31 de Janeiro de 2007, que baixou à 2.ª Comissão, e 93/X — Aprova o Tratado entre a República Portuguesa e a República Popular da China sobre a Transferência de Pessoas Condenadas, assinado em Pequim, em 31 de Janeiro de 2007, que baixou, igualmente, à 2.ª Comissão; projectos de lei n.os 548/X — Revoga o Decreto-Lei n.º 268/2003, de 28 de Outubro, consagrando um novo modelo de financiamento e funcionamento para as autoridades metropolitanas de transportes (BE), que baixou à 9.ª Comissão, 549/X — Regras relativas à transparência na publicidade e contratos de crédito (BE), que baixou à 6.ª Comissão, 550/X — Altera o Código do Trabalho e a respectiva regulamentação, repondo justiça social e laboral (BE), que baixou à 11.ª Comissão, 551/X — Regula o regime de avaliação dos programas educativos (CDS-PP), que baixou à 8.ª Comissão, e 552/X — Afirma os direitos dos ciclistas e peões no Código da Estrada (BE), que baixou à 9.ª Comissão; apreciação parlamentar n.º 86/X — Decreto-Lei n.º 105/2008, de 25 de Junho, que institui medidas sociais de reforço da protecção social na maternidade, paternidade e adopção integradas no âmbito do subsistema de
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solidariedade e altera o Decreto-Lei n.º 154/88, de 29 de Abril (CDS-PP); e projectos de resolução n.os 357/X — Recomenda ao Governo que elabore, a partir da Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidades e Saúde (CIF), uma Tabela de Incapacidades Decorrentes de Doenças Crónicas e uma Tabela de Funcionalidade (CDS-PP), 358/X — Recomenda ao Governo que reponha o conjunto de direitos outrora atribuídos aos deficientes das Forças Armadas (DFA) e implemente medidas que visem a plena reparação das consequências advindas da participação em cenários de guerra (BE), que baixou à 3.ª Comissão, 359/X — Recomenda ao Governo a adopção de um sistema plurianual de financiamento das instituições de ensino superior, tendo em vista assegurar a sua sustentabilidade e limitar o esforço financeiro de alunos e famílias (BE), que baixou à 8.ª Comissão, e 360/X — Visa permitir aos antigos combatentes, que, por situação de justo impedimento, entregaram os requerimentos fora de prazo, exercerem os seus direitos ao abrigo das Leis n.os 9/2002, de 11 de Fevereiro, e 21/2004, de 5 de Junho (CDS-PP), que baixou à 3.ª Comissão.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia consta de um debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre política agrícola.
Para a intervenção de abertura do debate, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Lembramo-nos todos, certamente, dos três d que eram atribuídos ao 25 de Abril: descolonizar, desenvolver, democratizar. É caso para dizer que a política deste Ministério da Agricultura ficará conhecida por muitos d, mas infelizmente são outros: o desprezo pelos agricultores; o desperdício dos fundos comunitários para a agricultura; a dilação das candidaturas dos agricultores até ao «dia de são nunca à tarde»; a destruição do investimento modernizador na agricultura;…
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … a desatenção às prioridades nacionais da agricultura; a desorganização do Ministério; e, irónica e surpreendentemente, até o diospiro, porque, se um agricultor quiser produzir cereais, leite ou carne — bens primários e essenciais — tem uma pontuação mínima, mas se quiser produzir (o que é respeitável) o diospiro ou a baga do sabugueiro tem uma pontuação máxima.
Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Isto diz tudo sobre a política agrícola do Sr. Ministro da Agricultura!
Aplausos do CDS-PP.
É certo ainda que o Ministério da Agricultura se caracterizou por semear a discórdia no sector e terminar com uma certa forma de desautorização — e estou a ser benigno na expressão que uso — relativamente à capacidade negocial com os produtores e agricultores.
Foram, em grande medida, Sr. Presidente, Srs. Ministros e Sr.as e Srs. Deputados, três anos perdidos.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Exactamente!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É mais fácil recordar os conflitos do Sr. Ministro da Agricultura do que as suas obras e é mais fácil recordar as suas derrapagens verbais, que, hoje em dia, já não se cingem ao CDS, do que as suas reformas estruturais.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É importante, por isso mesmo, fazer uma avaliação crítica destes anos e dizer-lhe, Sr. Ministro, com toda a frontalidade, que foi um erro desincentivar a cultura dos cereais, como hoje se vê, dado o grau de dependência do País em matéria de importações de bens essenciais,…
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O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … que foi um erro acabar com a electricidade verde, à conta de uma demagogia precária que nunca se viu confirmada nos factos, que foi um erro desvalorizar a electrificação nos projectos de investimento dos agricultores, que foi um erro reduzir ao mínimo as medidas agro-ambientais, que foi um erro reformar o antigo INGA e o antigo IFADAP sem cuidar da respectiva certificação,…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … porque isto contribuiu para os atrasos nos pagamentos,…
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … que foi um erro contrariar ou desincentivar a entrada de jovens agricultores e que foi um erro «multar» os agricultores portugueses, escolhendo a modelação voluntária.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Tudo isto, Sr. Ministro, são erros demais!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Mas façamos também a avaliação do presente, dos dias de hoje, onde, curiosamente, num sector em que é evidente a caracterização da economia de mercado, o Ministério acaba por falhar onde, numa economia de mercado, o Estado não pode falhar, ou seja, na fiscalização.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — O Sr. Ministro tem, hoje, milhares e milhares de agricultores à espera do regime de pagamento único de 2007, ou seja, do ano passado. Comprometeu-se, várias vezes, a fazer esse pagamento, a última das quais até ao último dia de Junho; porém, milhares de agricultores ainda não viram aquilo a que têm direito.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Qual é a razão? É que o Ministério não consegue fazer a fiscalização das ajudas. Tendo de fiscalizar até 5% das ajudas, nem isto consegue fazer para poder honrar o seu compromisso, que é o de pagar a tempo e horas.
Aplausos do CDS-PP.
Outro exemplo de que o Ministério falhou, exactamente na fiscalização, tem a ver com o nemátodo do pinheiro. O Governo tinha dois compromissos, em nome do Estado português: conter a doença, mas ela aumentou; erradicar a doença, mas ela alastrou. Agora, perante uma ameaça de embargo e perante a consideração de todo o território nacional como potencialmente afectado, é importante perguntar por que é que o Estado falhou. Falhou na fiscalização, esqueceu-se de fazer a prevenção e esqueceu-se de fiscalizar o transporte da madeira cortada.
Sr. Ministro, pode falhar em muitas coisas, mas, na fiscalização, o Estado, numa economia de mercado, não pode falhar!
Aplausos do CDS-PP.
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Finalmente, Sr. Presidente e Sr. Ministro, façamos ainda uma avaliação do futuro, para perceber se V. Ex.ª usa eficientemente os fundos comunitários, define correctamente as prioridades e põe em marcha os mecanismos de candidatura, tal como os agricultores merecem.
O que é que já sabemos? Que, no ano de 2005, de acordo com a regra «‘n+2’está fechado», 35 milhões de euros de fundos comunitários ficaram por usar e, em matéria de planos operacionais, cerca de 30 milhões de euros para a agricultura ficaram por usar. Não me parece que seja vocação de Portugal devolver a Bruxelas o dinheiro que, dificilmente, negociou para beneficiar a agricultura portuguesa.
Aplausos do CDS-PP.
Protestos do Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
Em segundo lugar, sabe-se que, desde 2005, não há investimento na modernização da agricultura. E sabese mais: que o PRODER (Programa de Desenvolvimento Regional) era para 2007-2013, que, em 2007, não houve candidaturas abertas nem pagamentos feitos e, em 2008, com requintes de malvadez que são típicos de uma burocracia fechada — e não o responsabilizo a si mas aos seus serviços —, as portarias e avisos foram publicados tão tarde que, se juntar os prazos para os agricultores se candidatarem, as candidaturas serem avaliadas, o gestor tomar a decisão e os contratos serem assinados, chegamos a 31 de Dezembro e não há, mais uma vez, mais um ano, 1 cêntimo para a modernização da agricultura em Portugal.
Aplausos do CDS-PP.
Para terminar, Sr. Presidente, como disse no início, não nos parece que as prioridades estejam correctamente definidas, pelo que consideramos inevitável a revisão e a reorientação do PRODER.
Por tudo isto, Sr. Presidente e Sr. Ministro, temos hoje menos agricultores, mas isso talvez fosse um traço do destino. O que não era um traço do destino era termos agricultores mais empobrecidos. Temos hoje menor produção de produtos essenciais do que devíamos e podíamos ter e maior dependência da importação.
Não tivemos um bom Ministro da Agricultura. Precisamos de uma política agrícola que atenda às prioridades nacionais.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Também para a intervenção de abertura do debate, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Jaime Silva): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: Quando, em 2005, o Governo iniciou funções, estávamos perante duas situações concretas e preocupantes no universo agrícola: tínhamos um Ministério inadequado às novas exigências do sector…
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — De Bruxelas!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — … e tínhamos a ausência de uma política agrícola nacional, no quadro da PAC, que desse futuro à agricultura portuguesa e ao mundo rural.
Isto, depois de termos investido, durante vários anos, qualquer coisa como 26 000 milhões de euros, sem que o nosso produto agrícola se tivesse alterado.
Foi com este panorama que nos deparámos, há três anos, e não perdemos tempo a agir:…
Vozes do PSD: — Isso é verdade!…
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O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — … fizemos um reforma profunda do Ministério da Agricultura, uma reforma que se impunha e que todos reconheciam como necessária mas que ninguém ousou levar por diante.
Aplausos do PS.
Assim, de cerca de 12 000 funcionários, o Ministério passou a contar com 7000 e reduzimos as chefias em 28%. Tratou-se de um processo difícil, penoso para todos, mas fizemo-lo no respeito dos direitos dos trabalhadores da função pública.
Hoje, podemos começar a dar nova esperança de carreira aos trabalhadores do Ministério e podemos apostar no rejuvenescimento de serviços.
Mas há mais: fizemos esta reforma baseada na regionalização e descentralização dos serviços. A médio prazo não haverá mais de 25% dos efectivos em Lisboa. Queremos um Ministério mais próximo das regiões e dos seus agricultores! Face aos estrangulamentos estruturais da nossa agricultura, reconhecidos por todos, inclusive pelo governo anterior e pela Comissão Europeia, havia que negociar e assegurar um pacote financeiro significativo de apoios para os ultrapassar. Por isso, apesar de a União Europeia ter passado a 27 Estados-membros, este Governo conseguiu assegurar um montante de 3,5 milhões de euros, que com o co-financiamento atinge 4,4 milhões de euros de despesa pública para apoiar a agricultura portuguesa. Foi este Governo, e não outro, a consegui-lo!
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Importa, pois, não cometer os mesmos erros do passado na sua aplicação. Não podemos chegar a 2015, olhar para a agricultura portuguesa e dizer que temos os mesmos problemas que os senhores aqui sentados à direita nos deixaram.
Por isso, era necessário mudar. Mudar é difícil, mas nós mudámos! E o PRODER é mudança, Srs. Deputados, em três eixos fundamentais.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Quando chegar!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Na competitividade, porque acreditamos nos nossos agricultores e empresários agrícolas, capazes de produzir mais e, sobretudo, melhor; capazes de produzir com valor acrescentando; capazes de comercializar e exportar, de concentrar a oferta e de ultrapassar os problemas graves da pequena agricultura.
Na sustentabilidade, pois teremos de produzir num quadro ambientalmente sustentado.
Na pequena agricultura: havendo necessidade de apoiar a sua diversificação em actividades que permitam complementar os rendimentos dos agricultores, a pequena agricultura tem verbas duplicadas, Srs. Deputados.
Face ao programa da direita, duplicámos os apoios à pequena agricultura.
Aplausos do PS.
Protestos do CDS-PP.
Isto tudo num quadro de coesão territorial. A regionalização das decisões assegurará, Srs. Deputados,…
O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — E os agricultores?
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — … que o PRODER é um programa para todos o País e, sobretudo, é um programa para todos os agricultores e não apenas para alguns.
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Fizemos reformas que doem, determinámos um caminho ambicioso, mas acreditamos na capacidade dos nossos agricultores.
Estivemos e estamos na linha da frente! E, Srs. Deputados, este Governo não se conforma com aquilo que foi negociado em 2003! Em 2003, congelámos os rendimentos históricos dos agricultores portugueses! Em 2003, os agricultores passaram a saber que os agricultores do Norte da Europa tinham duas ou três vezes mais apoios do que os agricultores portugueses e o governo de então, onde o CDS-PP tinha um importante papel, não faz nada, não se alarmou, não criticou e não disse aos agricultores portugueses o que tinha acabado de se consolidar com a reforma de 2003.
Aplausos do PS.
Entretanto, Srs. Deputados, não ficámos por aqui! Nem uma palavra foi dita sobre a reforma do vinho, que a Presidência portuguesa concretizou e que o mundo vitivinícola europeu, e sobretudo o nacional, aplaudiram.
Conseguimos uma reforma com 71 milhões de euros adicionais. Para fazer o quê? Uma politica nacional do vinho, independentemente das análises de Bruxelas!
Protestos do PSD.
Mas fizemos mais, Srs. Deputados! Não ouvi nenhum Sr. Deputado preocupar-se como o sector das pescas! Também nas pescas, apesar de sermos 27 Estados-membros, Portugal viu negociar um aumento de verbas de mais 3% para este quadro comunitário de apoio.
E não parámos, Srs. Deputados! Temos um programa e uma estratégia para a agricultura portuguesa.
Vozes do PSD: — Para acabar com ela!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — São diferentes dos da direita! Naturalmente, são diferentes! O imobilismo conduziu a agricultura àquilo que os agricultores sabem! E os problemas da agricultura não se resolvem vindo a esta Assembleia ou indo à televisão dizer «resolve-se com subsídios». Resolvem-se com um programa estrutural, resolvem-se com mudanças, Srs. Deputados! Aqueles que apostam no imobilismo olhem para o resultado das suas políticas: o produto agrícola não subiu;…
Protestos do PSD.
… o rendimento dos agricultores não aumentou; a competitividade da agricultura portuguesa não cresceu! É este o balanço das políticas da direita e, face a esse balaço, mudámos, Srs. Deputados!
Aplausos do PS.
Mudámos e vamos continuar a mudar! Há mais mudanças! Cumprimos o nosso programa no essencial, mas teremos mais reformas na próxima sessão legislativa! É isto que anunciarei nas conclusões do debate!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos iniciar a primeira ronda de pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Vieira.
O Sr. Rui Vieira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As verdadeiras razões das recentes catilinárias do Sr. Deputado Paulo Portas contra o Ministro das Agricultura do Desenvolvimento Rural e das Pescas,…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Catilinárias?!
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O Sr. Rui Vieira (PS): — … e que subjazem ao requerimento deste debate pelo CDS, têm mais que ver com as reformas em curso no Ministério e com as novas políticas para a agricultura do que com alguns incidentes recentes, aproveitados para disfarçar aquilo que verdadeiramente dói ao CDS.
Aquilo que verdadeiramente dói ao CDS é que o Ministro da Agricultura tenha arrancado e prosseguido com a reforma do Ministério, com vista a transformar uma estrutura pesada, ineficiente, em geral distante da agricultura e dos agricultores, concentrada em Lisboa e no meio urbano, numa estrutura orgânica mais leve, eficiente e amiga dos agricultores.
Aplausos do PS.
Esta reforma, como todas, mexeu com muitos hábitos, rotinas e interesses. Obviamente, o CDS não gostou.
O Sr. José Junqueiro (PS): — É verdade!
O Sr. Rui Vieira (PS): — Aquilo que verdadeiramente dói ao CDS é que as prioridades da política agrícola tenham sido redefinidas de acordo com as aptidões culturais mais adequadas aos nossos solo e clima, elegendo o vinho, o azeite, a hortofruticultura e a fileira florestal… O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — O mato!
O Sr. Rui Vieira (PS): — … como sectores estratégicos, porventura longe do conceito de lavoura nacional, tão do agrado do Deputado Paulo Portas,…
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Rui Vieira (PS): — … conceito cuja substância se forjou a partir da realidade concreta das grandes explorações do Alentejo e do Ribatejo, nos tempos do «saudoso» Dr. Oliveira Salazar, mas que não se adapta à moderna agricultura do século XXI.
Aplausos do PS.
O Dr. Paulo Portas, manifestamente, não apreciou a redefinição destas prioridades da política agrícola.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Agora, a culpa é do Dr. Salazar?!
O Sr. Rui Vieira (PS): — Aquilo que verdadeiramente dói ao CDS é que este Ministro fale claro, e, sobretudo, que aja em função do interesse geral, sem atender a direitos adquiridos que o País não pode nem deve sustentar.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Sr. Rui Vieira (PS): — Quando um pequeno número de grandes empresários agrícolas recebe a maior fatia das ajudas comunitárias, compreende-se que o Ministro da Agricultura procure uma redistribuição mais equilibrada, defendendo a modulação redistributiva, mais justa para a maioria dos agricultores.
Coerentemente, o CDS é contra: «foge da modulação como o diabo da cruz».
O Sr. José Junqueiro (PS): — Claro!
O Sr. Rui Vieira (PS): — O CDS não admite, o Dr. Paulo Portas não tolera, que se introduza mais equidade na distribuição das ajudas comunitárias.
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É pena que o CDS se ocupe de questões de lana-caprina em vez de tratar do que é realmente importante para os agricultores, para todos os agricultores.
Tomemos o exemplo do vinho e da vinha e da recente reforma da OCM (Organização Comum de Mercado).
A negociação conduzida pelo Sr. Ministro da Agricultura traduziu-se num êxito inequívoco que beneficia os vitivinicultores e vai ter um impacto positivo na economia portuguesa. Traduziu-se na manutenção dos apoios à renovação das vinhas e na concessão de ajudas à promoção do nosso vinho em países terceiros, bem como à destilação e à utilização de mostos concentrados. Tudo implica um investimento no sector de 416 milhões de euros, 75% dos quais são ajudas da União europeia.
Ora, aqui está um bom pretexto. Sr. Dr. Paulo Portas, para felicitar o Ministro.
Protestos do Deputado do CDS-PP Nuno Magalhães.
Mas isto não convém ao Sr. Deputado.
Uma negociação bem conduzida, que mereceu referências elogiosas dos vitivinicultores, que dotou o sector de meios que garantem a sua modernização e qualificação nos próximos anos, não comove o Sr. Dr.
Deputado Paulo Portas. É mais conforme à sua natureza cavalgar a onda do descontentamento, com a subida do preço dos combustíveis.
Perante a incessante escalada do preço do crude, o que propõe o líder do CDS? A inovadora ideia da baixa generalizada do ISP e, ainda mais, uma generosa bonificação do gasóleo verde para o agricultor, que já hoje paga menos 40 cêntimos do que o utilizador normal.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Subiu 42% relativamente ao ano passado!
O Sr. Rui Vieira (PS): — Não diz o Sr. Deputado onde vai buscar o dinheiro para compensar o rombo na receita fiscal. Nem é necessário: um partido que acaba de propor nas suas jornadas parlamentares, nos Açores, um plano fiscal, a cinco anos, de descida generalizada dos principais impostos (IRS, IRC, ISP e IVA), com o objectivo confesso de induzir coercivamente a redução de despesa pública, diz tudo sobre a credibilidade das suas propostas.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Não sabe o que diz! É ignorante!
O Sr. Rui Vieira (PS): — O CDS e o seu incontornável Presidente acusam o Governo de não ser amigo dos agricultores. Eles, sim, são os verdadeiros amigos dos agricultores portugueses!...
Diga-nos, Sr. Deputado Paulo Portas, dessa sua acrisolada devoção, acaso resultou, durante os 3 anos em que foi uma figura de proa do governo, alguma medida notável, uma marca,…
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Refira alguma!
O Sr. Rui Vieira (PS): — … um rasto, uma pegada que possa, hoje, exibir como inequívoca e autêntica prova de veracidade desse tão propalado apego à lavoura nacional? Em suma, ao CDS não importa a reforma do Ministério; ao CDS não interessam as politicas direccionadas para uma agricultura mais sustentável, menos subsídio-dependente, orientada para o mercado e para os consumidores; ao CDS não interessa que, até 2013, o investimento, através do PRODER, atinja a verba de 6424 milhões de euros.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Tem é que entrar em vigor!
O Sr. Rui Vieira (PS): — Nada disto importa ao CDS. O que realmente importa ao CDS é manter tudo como dantes.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Quanto é que já foi pago aos agricultores?
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O Sr. Rui Vieira (PS): — Desde a adesão à Comunidade Económica Europeia foram investidos na agricultura mais de 23 000 milhões de euros sem que o produto agrícola tivesse aumentado. Dos 602 milhões de euros de subsídios permanentes, por ano, 432 milhões não ajudam a produzir. Existirá alguém satisfeito com esta situação?
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Nem o CDS!
O Sr. Rui Vieira (PS): — É imperioso mudar. Em vez de subsidiar para não produzir, devemos canalizar as ajudas disponíveis para modernizar o sector e pô-lo a produzir para o mercado. Para isso é necessário reconfigurar a PAC (política agrícola comum) e adaptá-la às novas realidades do aumento dos preços dos alimentos, do auto-abastecimento e da criação de reservas estratégicas alimentares.
Prossiga, Sr. Ministro. Mais cedo ou mais tarde, até o CDS vai entender.
Aplausos do PS.
Risos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Martins.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Ministros e Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, este debate ocorre na véspera do debate sobre o estado da Nação, pelo que importa fazer um balanço do estado da agricultura portuguesa. E, Sr. Ministro da Agricultura, o resultado da avaliação que fizemos confirma aquilo que já todos suspeitávamos: o senhor é, indiscutivelmente, o elemento biótico mais nocivo da agricultura portuguesa.
Protestos do PS.
Lembro apenas alguns factos concretos para corroborar esta avaliação.
Começo pelo programa VITIS (regime de apoio à reconversão e reestruturação das vinhas) para lembrar que Portugal desperdiçou quase metade dos 35 milhões de euros disponíveis para 2007, graças aos atrasos na abertura das candidaturas e na celebração dos respectivos contratos.
O culpado tem um rosto: o seu, Sr. Ministro, que andou sempre a apregoar a sua aposta nesta fileira mas se esqueceu de fazer o trabalho de casa.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Acresce que, só em 2007, e pela aplicação da «regra da guilhotina», Portugal devolveu 73 milhões de euros de fundos comunitários.
O culpado também aqui tem um rosto: o seu, Sr. Ministro da Agricultura, que foi displicente na aplicação destes fundos. E quem ficou a perder, mais uma vez, foram os agricultores portugueses.
Por isso, pergunto-lhe: como pensa ressarcir os agricultores por esta lamentável e indesculpável perda de fundos comunitários?
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Recordo também que, há mais de dois anos e meio, que os nossos agricultores e agro-industriais não dispõem de novos instrumentos de apoio ao investimento e à modernização.
O culpado tem apenas um rosto: o seu, Sr. Ministro, que entregou tarde e mal o PRODER, em Bruxelas, e 18 meses depois da data em que deveria entrar em vigor apenas 6 das mais de 50 acções e medidas previstas abriram candidaturas. E os cerca de 750 milhões de euros que deviam estar, neste momento, a
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animar a agricultura portuguesa continuam guardados nos cofres de Bruxelas! Este é, porventura, o expoente máximo da sua falta de competência! Pergunto-lhe, pois, Sr. Ministro: para quando a regulamentação e a abertura das candidaturas a todas as medidas e acções do PRODER? E que dizer da falta de apoio ao sector florestal? O seu desleixo e a sua negligência contribuíram decisivamente para que a fileira do pinheiro bravo em Portugal, responsável por 680 milhões de euros na balança das exportações, esteja hoje à beira do colapso.
A par do nemátodo do pinheiro, o Sr. Ministro da Agricultura é o grande culpado por esta situação, já que somou à trapalhada que constituiu a intervenção na faixa de contenção um estrondoso falhanço no controlo à expansão do nemátodo e do seu vector. Como resultado directo da sua inaptidão, os movimentos de madeira a partir de Portugal para os outros países estão agora proibidos, a menos que o material seja submetido a um tratamento.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Sr. Ministro, tem ao menos uma ideia do sobrecusto que este tratamento representa para o sector? Não considera que o Estado deve, agora, ajudar a suportar estes custos? E o que pensa fazer para travar a desvalorização deste produto? Mas se uma certeza existe quanto ao estado da agricultura portuguesa é que ela perdeu competitividade nos últimos três anos e que essa perda se ficou a dever a dois factores essenciais: ao aumento exponencial dos custos de produção, mas, sobretudo, a más decisões governativas, de que são exemplo o cancelamento das medidas agro-ambientais e da electricidade verde! E também aqui o culpado tem apenas um rosto: o seu, Sr. Ministro, que desonrou os compromissos do Estado português, quando decidiu não pagar as agro-ambientais devidas a mais de 26 000 agricultores, por mera birra, e com isso prejudicou a agricultura em mais de 350 milhões de euros, e ainda quando actuou de forma injusta, imoral e mesmo difamatória, escudando-se num relatório da Inspecção-Geral da Agricultura e Pescas sobre a electricidade verde, que ninguém viu, para lançar a calúnia sobre todos os agricultores portugueses, insinuando que esta ajuda era tão mal aplicada que até servia para encher piscinas! Por tudo isto, e pelo muito que ficou por dizer dada a escassez de tempo, podemos resumir a sua actuação à frente dos destinos da agricultura portuguesa, recorrendo a um elemento estatístico absolutamente brutal e indesmentível: o rendimento da actividade agrícola nos últimos três anos diminuiu 16,6% face a 2004,…
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — … sendo que o VAB de 2007 é mesmo o mais baixo dos últimos sete anos.
Que belo troféu!… Esta é a verdade dos factos e este é, infelizmente para a agricultura portuguesa, o cunho da má governação socialista.
Mas, Sr. Ministro da Agricultura, se este é o resultado da sua gestão danosa à frente do Ministério, que dizer então do relacionamento que o Sr. Ministro da Agricultura manteve sempre com os agricultores e suas organizações.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Péssimo!
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — O senhor viveu este tempo todo de costas voltadas para os problemas do sector, em guerra com os agricultores e as suas organizações e foi sempre um Ministro que nunca soube ouvir e, pior, que nunca quis perceber as razões que assistiam aos agricultores.
Vozes do PSD: — Muito bem!
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O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Longe vão os tempos em que o Sr. Ministro, num debate nesta mesma Câmara, em Maio de 2005, logo no inicio do seu mandato, reconhecia e exaltava a dignidade e a responsabilidade das organizações e das confederações, bem como a responsabilidade que os agricultores tinham e que outros — leia-se os Deputados — não tinham.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Isso já era!
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Bastou vir a contestação e as primeiras críticas para logo se manifestar a sua intolerância democrática.
Mas o feitiço virou-se contra o feiticeiro. Tanto atacou as associações que estas ganharam um maior reconhecimento junto de todos os portugueses e mereceram, inclusive, um rasgado elogio público do Sr.
Primeiro-Ministro.
Quem verdadeiramente ficou mal nesta fotografia foi o Sr. Ministro, que é hoje, aos olhos dos portugueses, um ministro frágil e politicamente acabado.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Aos olhos do PSD!
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Sr. Ministro, a terminar, deixo-lhe um conselho: não se iluda. Apesar de o senhor se manter à frente do Ministério da Agricultura, na prática e de facto já todos os portugueses perceberam que o senhor já não tutela o sector, e não o tutela por um qualquer impedimento formal, mas porque já ninguém o ouve, ninguém fala consigo ou o respeita no mundo agrícola nacional.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Sr. Ministro, o senhor passou os últimos três anos a semear ventos, pelo que não se pode queixar de agora, politicamente, colher tempestades! Pena é que sejam os agricultores portugueses (e os portugueses em geral) a sofrer os efeitos dessas tempestades.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, certamente porque V. Ex.ª tem tido contactos intermitentes com o «novo Ministro da Agricultura», que é o Primeiro-Ministro,…
Vozes do CDS-PP: — Exactamente!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … não se actualizou quanto ao «chip» de ataque à oposição. É que, segundo o Sr. Ministro, a culpa já não é do passado, agora a culpa é do mundo!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Não está, pois, actualizado.
E o Sr. Deputado do Partido Socialista também não, embora tenha feito uma variante: para ele, agora a culpa é do Dr. Salazar! Então, a culpa do nemátodo também é do Sr. D. Dinis. Sabia? Isto de acordo com os socialistas.
Aplausos do CDS-PP.
Vamos ver o que sobra dos pinhais que o Sr. D. Dinis mandou plantar.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Gostava de salientar que cada vez que o Sr. Ministro da Agricultura ou algum membro do Governo referem os fundos comunitários esquecem-se de um facto que não tem explicação, e que é o seguinte: na Conta de 2005, que já está fechada, nós devolvemos a Bruxelas — nós, Estado português — dinheiro que devia ter sido utilizado.
Vozes do CDS-PP: — Exactamente!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E as verbas são significativas, de acordo com a própria Comissão Europeia: ascendem a centenas de milhões de euros! São dezenas de milhões de euros que não foram aplicados, região a região do País.
Como segundo ponto, Sr. Ministro, não posso deixar de dizer-lhe que quando fala no PRODER lembra-me aquele jogo interessante Onde está Wally? É difícil descobrir «Wally»!… Onde está o PRODER, Sr. Ministro? Era para ser em 2007 e não foi! Era para ser em 2008 e vai terminar 2008 sem um cêntimo pago ou investido!
Vozes do CDS-PP: — Zero!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E há cada vez menos PRODER! É como o Sr. Ministro da Agricultura: tem cada vez menos peso político. E o PRODER, Sr. Ministro, era o instrumento de modernização que os agricultores tinham à disposição.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Queria deixar-lhe cinco perguntas campestres, muito simples, Sr.
Ministro.
Primeira pergunta: por que é que um agricultor que tem um pivô de rega ou um motor de bombagem de água no meio da herdade — não é em sua casa, Sr. Ministro — e paga uma taxa audiovisual pelo motor ou pelo pivô da rega?
Vozes do CDS-PP: — Exactamente!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Não está lá nenhum plasma, nenhuma televisão, Sr. Ministro! Segunda pergunta: por que é que, em 2005, houve 25 800 candidatos às medidas agro-ambientais e foram aprovadas 55 candidaturas, Sr. Ministro? Terceira pergunta: quando vai ser feito o pagamento do regime de pagamento único relativo a 2007, já que os prazos estão ultrapassados? Quarta pergunta: diz o seu antigo Director-Geral dos Recursos Florestais, Castro Rego, que o cadastro florestal não está feito e diz o Sr. Ministro da Agricultura, em comissão parlamentar, que o cadastro florestal está feito.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Não disse isso!
Vozes do CDS-PP: — Disse, disse!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Não sendo uma questão indiferente, queria saber quem é que tem razão.
Aplausos do CDS-PP.
Por fim, Sr. Ministro — peço-lhe uma resposta concreta, porque esta matéria é relevante para todos os pagamentos — o IFAP, o organismo novo que nasce da fusão do IFADAP e do INGA, já está definitivamente certificado pela Comissão Europeia? Não estou a perguntar se está certificado pelo Ministério das Finanças mas, sim, pela Comissão Europeia. Sim ou não?
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Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, estamos a fazer um debate de urgência, requerido pelo CDS. Mais uma vez, a oposição tem destas coisas: descobre os problemas da agricultura portuguesa. A oposição é, de facto, muito importante para que as inteligências despertem.
Sr. Ministro, urgente, urgente era, de facto, uma mudança de política, uma mudança de fundo, séria e radical da política agrícola prosseguida nos últimos 30 anos. E não é isso que os senhores estão a fazer.
Os senhores não acertam uma! Não acertam, designadamente: no preço dos combustíveis, no problema da electricidade verde, no problema da água (diferentemente dos espanhóis), no problema dos outros factores de produção, no problema da segurança social, no problema do seguro agrícola, que foi uma promessa inicial do Sr. Ministro, no problema dos fundos comunitários, quer dos fundos de investimento, quer de ajudas ao rendimento. E o Sr. Ministro vem aqui, mais uma vez, com essa mentira de que aumentou as ajudas à pequena agricultura! Ora, o Sr. Ministro aumentou alguns agricultores em alguma coisa e tirou-lhes em triplo o que lhes deu singelo. Como o Sr. Ministro sabe, o que lhes deu nas indemnizações compensatórias tirou-lhes por via das medidas agro-ambientais.
Faça as contas, Sr. Ministro! De facto, os senhores não acertam uma! O Sr. Ministro fala numa reforma profunda e eu diria que é tão profunda, tão profunda que os senhores se preparam para enterrar, definitivamente, a agricultura portuguesa
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — E enterrar bem fundo!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Na reforma da PAC (em que ainda se está numa fase de proposta), os senhores nem sequer são capazes de avançar com orientações claras e importantes para a agricultura portuguesa. Aliás, seria bom que o PS, hoje, aqui, nos esclarecesse qual é a sua posição relativamente à reforma da PAC: se a do Deputado do Parlamento Europeu Capoulas Santos, se aquela que o Sr. Ministro da Agricultura anuncia.
Protestos do PS.
Sr. Ministro, gostaria de colocar-lhe ainda uma questão sobre a política das pescas. Anda por aí uma organização ambientalista a dizer que o grande problema das pescas portuguesas é que os portugueses comem peixe a mais. O Governo, o Sr. Ministro e respectiva equipa estão de acordo, uma vez que, face ao défice de 877 milhões de euros de produtos de pesca que o País todos os anos suporta, os senhores preparam-se para reduzir ainda mais a capacidade da frota de pesca portuguesa — aliás, contrariamente ao que o Sr. Ministro nos tinha dito durante o debate do Orçamento do Estado para 2008.
Não só vão abater como vão abater — nas palavras do Sr. Secretário de Estado — «a grande velocidade»: aquilo que era para fazer em seis anos vai ser feito em três anos! Já estão aí 8,2 milhões de euros, Srs. Deputados do PS, não para produzir mais mas, sim, para abater barcos e produzir menos! Não tenho qualquer problema em dizê-lo, com tudo o que isto significa para uma frota pesqueira já altamente debilitada, com um défice de produtos de pesca que é conhecido.
Isto é um crime contra o País e não apenas contra os pescadores e as pescas portuguesas.
Mas o Sr. Ministro não se contenta em liquidar a frota pesqueira; o Sr. Ministro (e o resto do Governo) acaba de mandar demolir a Escola de Pesca e da Marinha de Comércio para entregar o espaço à Fundação Champalimaud. E eu pergunto-lhe, Sr. Ministro, se não tinha outro lugar para onde mandar a Fundação Champalimaud e o seu projecto de investigação.
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Sr. Ministro, com estas duas medidas do Governo (abate de barcos e as medidas ao nível da formação) os senhores preparam-se para liquidar a formação profissional nas pescas e são bem sintoma de como encaram as pescas portuguesas.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura e Pescas, há uma coisa que não é verdadeiramente de entretenimento, porque acerca disso pode haver um comentário mais ou menos jocoso na comunicação social. A verdade é que, reiteradamente, o Sr. Ministro veio tendo um tom muito agressivo, a roçar o insultuoso, em relação aos interlocutores da sua área de tutela: segundo o Sr. Ministro, as organizações sociais padecem de todos os vícios políticos e o Sr. Ministro está no altar, está no Olimpo, no bom caminho. Pura e simplesmente, marginalizou todos os seus interlocutores.
Este é um dado político. E como estamos aqui num debate político, seria bom averiguar — já que o Sr.
Ministro nada nos disse — porque é que tem semeado a discórdia e a interrupção de diálogo com quaisquer organizações no seu sector. Vamos tomando conhecimento de que são umas atrás de outras…
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — É verdade!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Há uma lista interminável de organizações que consideram que não têm qualquer diálogo com o Ministro da tutela, que esse diálogo é improfícuo e que são maltratadas. Esta é uma responsabilidade política e creio que o Sr. Ministro hoje, neste debate, deveria dizer-nos algo sobre essa responsabilidade política. O que tem sobrado é arrogância e não qualquer sinal de entendimento, de concórdia ou de tentativa de convergência para a resolução de problemas prementes na área alimentar portuguesa.
Sr. Ministro, creio que não será hoje o dia em que faremos um grande balanço acerca das reformas que imprimiu na agricultura, matéria de grande divergência, mas devo adiantar que não se notam muitas diferenças em relação ao passado. Porventura, uns ou outros instrumentos serão diferentes, mas se atendermos aos grandes agregados do produto, da população activa, da diminuição de explorações agrícolas, da estrutura etária não há sinais de grande viragem no panorama da agricultura portuguesa.
Hoje, queria sobretudo questioná-lo sobre o seguinte: estamos no meio de uma crise alimentar mundial e, sobre isso, temos ouvido pouco o Ministro da Agricultura. Há poucos dias, foi conhecido um relatório, atribuído ao Banco Mundial, segundo o qual se julga que a adopção dos biocombustíveis seja responsável por 75% do aumento especulativo dos preços na cadeia alimentar. Ora, Portugal tem um programa nesse domínio, que não é da sua tutela mas, sim, do Ministério da Economia, mas a verdade é que hoje, na União Europeia, não se discute outra coisa! Mais: vários governos estão a rever as suas posições anteriores em relação aos biocombustíveis. E, pela componente importada, essa alta de preços, essa especulação dos preços tem um efeito diferido e pesado em Portugal.
Gostava de questionar o Ministro da Agricultura, que é o primeiro responsável na área alimentar e que, creio, não pode diferir essa responsabilidade para outros membros do Governo ou remetê-la para o Sr.
Primeiro-Ministro — e não me venha falar dos programas em Moçambique ou em Angola —, sobre o seguinte: porque é que Portugal não tem uma posição clara acerca disso, de restrição total dos agrocombustíveis!? Restringindo, inclusivamente, as oleaginosas com efeito combustível, porque, como é óbvio, as oleaginosas vêm retirar superfícies aráveis em largas áreas do globo. E porque é que Portugal não tem uma posição activa contra esse tipo de biocombustíveis, que não são regeneração de outro tipo de valorizações energéticas mas constituem, claramente, um atentado ao potencial agrícola do mundo, convergindo num objectivo, que é o da baixa dos preços dos produtos alimentares? Como primeiro responsável na área alimentar, qual é, Sr. Ministro da Agricultura, a sua posição no âmbito da União Europeia? É que esta discussão acerca da reforma da PAC, que se vai eternizando, é também um «biombo» para que o Governo português, como Estado-membro da União Europeia, não tenha uma posição clara acerca dos biocombustíveis. Gostaríamos, por isso, de ouvir uma palavra só do Ministro da Agricultura de Portugal, já que tem sido um ministro ausente nesta matéria.
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, permita-me que lhe diga que tem uma particularidade, que é vir sempre falar ao Parlamento como se o mandato estivesse agora a começar, como se ainda estivéssemos em 2005 e as coisas estivessem todas no início. Mas não é verdade, Sr. Ministro! Estamos em 2008 e já lá vão três anos do vosso Governo! Vem tudo isto a propósito porque o Sr. Ministro prepara-se para fazer manchetes com os anúncios que está a guardar para a intervenção de encerramento deste debate — como já o disse — de algumas medidas, supostamente novas, para resolver o problema da desertificação e do abandono das terras rurais.
Mas a verdade é que essas medidas, que o Sr. Ministro adiantou ao jornal Público, já foram todas anunciadas há cerca de um ano e meio aqui mesmo, no Parlamento, durante a interpelação que Os Verdes fizeram ao Ministério da Agricultura. Arrendamento rural, penalização dos proprietários, aproveitamento do regadio, bancos de terras para os jovens agricultores, tudo isto já tinha sido anunciado aqui há cerca de um ano e meio e, no entanto, nada foi feito, Sr. Ministro. Isto são promessas de um ministro! O Diário da Assembleia da República não me deixa mentir, tendo o Sr. Ministro referido, inclusivamente, um plano global de combate ao abandono da actividade dos solos agrícolas. Mas, Sr. Ministro, até hoje nada.
A única coisa que o Sr. Ministro tem feitio é cortar nos apoios, cortar nos investimentos, conflituar com os agricultores, desrespeitar as associações de agricultores e de produtores florestais e as suas confederações, desestabilizar o sector e ajudar a acabar com a agricultura. Veja-se o caso do pagamento das agro-ambientais ou da electricidade verde. Havia problemas e ilegalidades? É possível que sim. Mas, Sr. Ministro, quando há problemas, resolvem-se esses mesmos problemas e corrigem-se os instrumentos legais para os mesmos, o que não se espera é que, havendo aparentemente problemas porque os iates podem usar o gasóleo para as pescas, se corte o gasóleo para as pescas, em vez de se corrigir a regulamentação. Espero que o Governo não vá, mais uma vez, por esse caminho.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Muito bem!
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Mas, de facto, o problema da desertificação, do despovoamento e do abandono agrícola do interior do País é uma realidade que tem de ser resolvida e que importa combater. Aliás, dois estudos que recentemente foram conhecidos, um da WWF e do ISA, que alerta para essa situação e para a importância do montado de sobro, e outro da OCDE, sobre o desempenho ambiental da agricultura, que diagnostica os impactes da agricultura mais intensiva na erosão dos solos e na poluição das reservas de água, referindo ainda o desaparecimento de alguns sistemas agrícolas que beneficiam a biodiversidade, são extremamente preocupantes.
Os Verdes sabem que o Sr. Ministro, em comissão parlamentar, desvalorizou estes relatórios, dizendo que eram dados até 2004. Mas a verdade, Sr. Ministro, é que, com a sua política, estes dados só podem piorar. E só podem piorar, porque as poucas medidas que existiam para isso eram precisamente as agro-ambientais, que foram praticamente liquidadas pelo Sr. Ministro e pelas suas políticas dos últimos tempos.
Eliminaram 18 das 21 medidas, como, por exemplo, as relacionadas com os lameiros, os montados, o olival tradicional, a policultura; reduziram em mais de metade as verbas para estas ajudas; e deixaram de fora toda a agricultura convencional, ou seja, mais de 90% da agricultura portuguesa, acabando com os incentivos à adopção de práticas agrícolas ambientalmente mais sustentáveis.
O numero de beneficiários caiu em 85%, ou seja, de 78 000 do RURIS para 12 000 no PRODER.
Estivemos três anos sem candidaturas às agro-ambientais e às ajudas ao investimento. Foram três anos sem modernização na nossa agricultura.
O rendimento dos agricultores caiu 16% nesse período.
Até há pouco tempo, Sr. Ministro, havia muito poucas candidaturas ao PRODER apresentadas por agricultores. Aliás, é preciso dizer que, dentro do PRODER, ainda só abriram as candidaturas para as grandes produções, porque as candidaturas até 25 000 € estão ainda por abrir, tal como estão por abrir as
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candidaturas ao investimento, as candidaturas às zonas florestais e as candidaturas ao Programa LEADER, para as regiões desfavorecidas. Porquê, Sr. Ministro? Para quando esta abertura? É mais um anúncio que aqui nos traz?! É mais uma cartola que o Sr. Ministro vai trazer aqui à Assembleia?! Não acha que o atraso de três anos não é pouco, Sr. Ministro?!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Portas, recentemente V. Ex.ª deve ter ouvido a sua colega de governo, a Dr.ª Manuela Ferreira Leite, referir que não há dinheiro para nada. Gostaria de lembrar ao Sr. Deputado e ao Grupo Parlamentar do PSD que a Dr.ª Manuela Ferreira Leite se enganou no tempo do verbo, pois o que ela devia dizer era que não havia dinheiro para nada quando nós chegámos ao governo em 2005.
E vou lembrar factos, porque, para nós gastarmos o dinheiro de Bruxelas negociado na Agenda 2000 pelos socialistas, tínhamos de ter dinheiro quando chegámos ao Ministério da Agricultura: Primeiro facto, Sr. Deputado Paulo Portas: o IFADAP andou a cobrar uma taxa aos agricultores e, em 2004, a Comissão Europeia escreveu ao seu governo a dizer-lhe que essa taxa era ilegal e que, por isso, tinha de ser devolvida aos agricultores. O que é que fez o Governo em 2004, Sr. Deputado?
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Foi dissolvido!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Ignorou essa carta e deixou que a Comissão fosse para tribunal. E, agora, é este Governo que está a pagá-la aos agricultores. Sabe quanto é, Sr. Deputado? São 22 milhões de euros! Ora, com 22 milhões de euros eu trazia mais de 100 milhões de euros de Bruxelas.
O Sr. Deputado, vai-se dar conta, com o que vai ouvir a seguir, com aquelas notícias do Dr. Ribeiro e Castro — por quem eu tenho consideração…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Agora!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — … e não acredito que lhe tenha mandado uma «casca de banana» —, de que a responsabilidade é vossa.
Segunda notícia e novidade para o Sr. Deputado — devia sabê-la, mas, se calhar, esqueceu-se: o Ministério da Agricultura, em 2004, teve de transferir para o Ministério do Trabalho 180 milhões de euros.
Porquê? Porque, Sr. Deputado, cada vez que havia uma manifestação o seu governo dava um subsídio e cada vez que havia um problema dava isenção para a segurança social e o resultado foi, para não haver problemas com Bruxelas, retirar do Orçamento do Estado de 2004 — pergunte ao Dr. Bagão Félix, que ele vai dar-lhe as contas — 180 milhões de euros. Portanto, Sr. Deputado, o resultado é este: 170 milhões de euros de PIDDAC teriam sido suficientes para gastar as verbas que os socialistas — e este é o Governo do Partido Socialista — tinham negociado no ano 2000.
Portanto, Sr. Deputado, espero que não volte a falar de verbas de Bruxelas não utilizadas, porque a responsabilidade é do governo em que participou. E, na altura, o senhor nada disse. «Engoliu», andava em águas profundas!… Vejamos agora o problema do nemátodo do pinheiro. O Sr. Deputado compreenderá que o nemátodo do pinheiro e a sustentabilidade do pinhal português não me permite avançar com muita discussão, até porque não há certezas do ponto de vista científico. Mas dou-lhe um dado: o seu governo, em 2004, abateu 98 000 árvores e, no ano seguinte, tivemos de abater 238 000 árvores. Quem é que andou distraído?! Quantas análises fez o seu governo para detectar o nemátodo do pinheiro?! Fez um terço das que devia.
Protestos do CDS-PP.
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O Sr. Deputado, quando falar do nemátodo do pinheiro, tem de ter em atenção três coisas: em primeiro lugar, aprender que a sustentabilidade da floresta e do pinhal português não está em causa; em segundo lugar, aprender que o único instrumento que existe é a gestão activa da floresta; e, em terceiro lugar, fazer o balanço dos três anos, quando o nemátodo do pinheiro se expandiu neste País e os senhores se limitaram a procurá-lo na zona onde ele estava.
Portanto, Sr. Deputado, não entre em alarmes, diga aos agricultores portugueses, aos produtores florestais e à indústria que utiliza o pinheiro que não há problemas com a sustentabilidade do pinhal português. Não há! O nemátodo do pinheiro só representa entre 12% a 18% das árvores mortas.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — «Só»?! E os custos dos tratamentos?!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Nós temos um programa para o controlar, e vamos fazê-lo.
Relativamente às outras questões também levantadas pelo Sr. Deputado Paulo Portas, quero dizer-lhe que o Sr. Deputado é o campeão do «menos Estado e mais economia de mercado». O Ministério da Agricultura tem uma reforma profunda e o Sr. Deputado acha que está mal. O Ministério da Agricultura fez um trabalho que os senhores anunciaram em 2002… É que o INGA e o IFADAP está para ser fusionado há cinco anos, os senhores anunciaram a fusão, só que não tiveram coragem para a fazer. Porquê? Porque dói!
Protestos do CDS-PP.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Não dói! Falta é fazer a certificação!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — É que fusão é o mesmo que reestruturar, redimensionar, poupar dinheiro.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado Paulo Portas, é mais fácil sair do Governo e anunciar amizades à agricultura. Na prática, o senhor, concretamente, não deixou marcas.
O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — O que é que quer dizer com isso?!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Sr. Deputado Agostinho Lopes, quando anunciei a reforma dos seguros agrícolas, tive o cuidado de dizer a esta Assembleia que a preocupação do Governo português não era a de fazer a reforma dos seus seguros agrícolas e deixar que outros Estados-membros, sem défice, fizessem também as suas reformas, dando apoios mais importantes aos seus agricultores. E eu disse, na altura, Sr. Deputado — lembra-se? (eu fui muito transparente) —, que a minha primeira preocupação era a de cumprir a promessa eleitoral,…
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Não respeita os compromissos do Estado respeita quanto mais os compromissos eleitorais!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — … mas, primeiro, queria convencer Bruxelas a fazer uma medida horizontal para todos os Estados-membros.
O Sr. Deputado sabe…
O Sr. José Junqueiro (PS): — Sabe, mas já esqueceu!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — … que a Comissão propõe exactamente aquilo que Portugal defendeu: discussão de seguros agrícolas de todos os Estados-membros,
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regras para todos os Estados-membros e financiamento comunitário. Portanto, Sr. Deputado, vamos ter isso.
Não esteja preocupado.
Quanto às medidas agro-ambientais, pensei, Srs. Deputados, que depois de uma leitura atenta — e penso que o Sr. Deputado Paulo Portas é jurista… Se o Sr. Deputado Paulo Portas lesse o parecer do Sr. Provedor da Justiça sobre as agro-ambientais, nunca mais voltava a falar de agro-ambientais nesta Casa;…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Falarei as vezes que forem necessárias!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — … se o Sr. Deputado fosse ver os resultados das queixas em tribunal, nunca mais voltava a falar nesta Casa sobre agro-ambientais.
Protestos do Deputado do CDS-PP Paulo Portas.
O Sr. Deputado Paulo Portas precisa saber que há mais de 50 000 agricultores que hoje beneficiam de medidas agro-ambientais,…
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Não há 50 000 mas 8000 agricultores!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — … mas medidas que protegem o ambiente, Sr. Deputado, e não ajudas encapotadas ao rendimento.
Aplausos do PS.
O Sr. Deputado andou meses e meses a dizer que não pagávamos as ajudas e que estávamos atrasados.
Não se lembrou que, no tempo do seu governo, havia 12 meses de atraso.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — E as raças autóctones estão atrasadas quanto tempo?! Um ano!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Nós pagámos antes de 30 de Junho, pagámos em Março.
O Sr. Deputado não se deu ao trabalho de estudar os regulamentos — eu sei que dá muito trabalho, que é mais fácil correr para feiras! —…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Nós não fugimos das feiras, como V. Ex.ª!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — …, mas, se se desse a esse trabalho, sabia que há uma percentagem mínima de agricultores que está sob controlo e, à medida que o controlo é feito, nós pagamos as ajudas.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Foi o que fizemos, Sr. Deputado. Pagámos as ajudas. Imagina a quantos? A 96% dos agricultores portugueses. Na data limite? Quatro meses antes. O Sr. Deputado não gosta de ouvir, mas terá de ouvir.
Protestos do Deputado do CDS-PP Paulo Portas.
Por último, os biocombustíveis. O Bloco de Esquerda coloca a questão de saber qual é a política do Governo em termos de política energética. O Governo privilegia, como sabe, as barragens, as energias renováveis e só põe em última prioridade os biocombustíveis. E, se lesse atentamente aquilo que eu disse, saberia que o Governo privilegia os biocombustíveis de 2.ª geração, ou seja, a biomassa. O Governo sempre disse que não ia dar apoios para a utilização de matéria-prima nacional na produção de biocombustíveis.
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Sr. Deputado, eu também li esse relatório do Banco Mundial, e ele fala na especulação financeira, porque hoje o que se utiliza para a produção de biocombustíveis em termos de cereais é apenas — repare bem! — 1,4% de cereais e oleaginosas. Ou seja, não é por aí que há um problema de biocombustíveis, não é por aí que há um problema de preço de matérias-primas, é na especulação financeira de um programa anunciado para os próximos cinco anos de um certo país que se chama Estados Unidos da América.
Tenha alguma calma e verá que a política deste Governo não é desviar matéria-prima — cereais e oleaginosas — da produção nacional para a produção de bioetanol. Não é! Tanto mais que não financiamos nem apoiamos a construção de qualquer unidade de transformação em Portugal.
Sr. Deputado, esteja, pois, tranquilo, porque nós, quando participámos nas discussões da FAO, justamente sobre esta matéria, anunciámos que era preciso que todos os países do mundo desenvolvessem capacidades próprias produtivas e que a ajuda alimentar directa, mandar cereais, não resolvia o problema de fundo desses países. Todas as regiões do País e todos os países de África têm de ter capacidades produtivas próprias.
Aquilo que defendemos para nós, defendemos para os países africanos: transferência de conhecimentos, investimentos, transferência de tecnologia. É esta a política do Governo nos biocombustíveis.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos entrar na segunda ronda para pedidos adicionais de esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Ginestal.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A agricultura voltou a ter uma importância primordial na definição da agenda política.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Por más razões!
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — É certo que para isso em muito contribuiu a recente crise alimentar mundial.
Mas é nas crises que devemos encontrar as oportunidades.
Ainda ontem, o G8 debateu a «crise dos alimentos», que, em conjunto com a «crise climática» e a «crise dos combustíveis», são aspectos interligados que afectam o desenvolvimento e a economia global.
Portugal não é uma ilha. Estamos numa economia global, mas mesmo assim, o aumento dos preços dos alimentos em Portugal não teve a mesma expressão que em outros países da Europa, o que é um sinal da estabilidade da economia portuguesa.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — O Governo preparou, em boa hora, uma estratégia para o desenvolvimento rural do País que tem o foco na competitividade, o que obriga a agricultura portuguesa a uma mudança profunda. Hoje, a palavra de ordem é a produção de alimentos. Uma produção que se quer competitiva, baseada em fileiras devidamente estruturadas e organizadas, nas quais se exige uma gestão empresarial e eficiente dos recursos financeiros aplicados.
Fez bem o Governo, nem a oposição o questiona, ao eleger como fileiras prioritárias para o investimento as hortofrutícolas que, com o vinho, representam 42% da produção agrícola nacional, o azeite, que apenas há 3 anos assegurava a produção de 50% do consumo, a floresta, que já vale 14% do produto industrial português nas suas subfileiras da pasta do papel, madeira e cortiça, e os produtos tradicionais, essenciais ao combate à desertificação do mundo rural. E também não esqueceu, ao contrário do que diz o CDS-PP, sectores já hoje competitivos da nossa economia agrícola como a pecuária, o leite e os cereais.
É nesse prisma que o PRODER dispõe de 4400 milhões de euros de fundos públicos comunitários e nacionais para a modernização da nossa agricultura.
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Desde 1986, o País recebeu 26 000 milhões de euros, repito, 26 000 milhões de euros, sem que o produto agrícola nacional tivesse aumentado. É o resultado dessa reflexão que nos exige esta mudança.
Sr.as e Srs. Deputados, repito, Portugal não é uma ilha.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Mas tem ilhas!
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — A nossa política agrícola é extremamente condicionada pelas decisões impostas pela PAC. Uma PAC reformada em 2003, durante a vigência dos governos do PSD e do CDS e que permitiu o desligamento da produção. Ventos da liberalização que é tão propagada pela direita como a panaceia para todos os problemas da economia.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Ai sim? E o Capoulas Santos? Quem foi o primeiro a defender isso? Tenha vergonha!
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Uma PAC que se revelou incapaz de responder às crises, uma PAC que se revela insensível às questões sociais dos agricultores. Uma PAC que precisa de ser revista rapidamente.
Protestos do PSD.
Sobre o futuro da PAC, nem uma palavra se ouviu neste debate o que é revelador de que a oposição não tem uma ideia sobre o futuro da economia e da agricultura.
Protestos do PSD.
Sei que custa, mas vão ter que ouvir! Na verdade, se algo ficou claro neste debate é que o que verdadeiramente interessa ao CDS-PP, e ao Dr.
Paulo Portas, é fazer guerra ao Ministro para tentar manter as coisas como sempre estiveram…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Quem faz guerra ao Ministro é o Primeiro-Ministro!
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — … ou seja, continuar a distribuir 80% das ajudas por apenas 20% dos agricultores.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, queira concluir,…
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — … porque, senão, depois o Deputado José Junqueiro faz uma interpelação à Mesa sobre o excesso de uso de palavra de V Ex.ª.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
O que o Dr. Paulo Portas quer é continuar a dar 430 milhões de euros de subsídios para não se produzir em Portugal. É isto que vai mudar. Em vez de subsídios para não produzir, vamos ter ajudas ao investimento para termos mais alimentos, melhores preços ao consumidor e melhor remuneração ao produtor.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Poço.
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O Sr. Carlos Poço (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr.
Ministro bem se pode esforçar, mas este é um assunto muito complicado.
A política do Ministério da Agricultura teve um efeito central, que foi o de inviabilizar a actividade agrícola, prejudicando os agricultores nacionais face aos parceiros comunitários.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Foi a única coisa que fez!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Numa palavra: acabar com os agricultores portugueses.
Opções políticas erradas não adaptadas à realidade portuguesa, por desconhecimento ou por intenção, e quebra de compromissos assumidos são algumas das razões com que o Sr. Ministro vem comprometendo a competitividade agrícola em Portugal.
Vejamos alguns exemplos.
Conseguiu desmantelar as medidas agro-ambientais. Começou por suspendê-las com efeitos retroactivos; depois, a pretexto de reestruturá-las, reduziu-as a três. Reduziu de 800 000 beneficiários para cerca de 8000.
Perante esta redução de 72 000 agricultores, o que pergunto é se considera ter sido a opção correcta e se pensa ou não corrigi-la.
O Sr. Ministro afirma com frequência — e nós subscrevemos — que a agricultura portuguesa tem de ser mais competitiva e que tem de produzir para o mercado.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — Pena é que não tenha feito nada sobre isso!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Neste sentido, na elaboração do PRODER dirigiu para o eixo da competitividade 45% do total das verbas do programa comunitário. Na prática, dos actuais 317 000 agricultores portugueses, apenas 6% (ou seja, 18 000 agricultores) irão poder beneficiar deste apoio ao investimento.
Protestos do PS.
É só fazer as contas. Tendo em conta que 4000 são candidaturas de jovens agricultores, restam cerca de 14 000 dos actuais agricultores, o que significa que apenas 4% dos produtores nacionais terão acesso à medida «Modernização», deixando de fora 96% dos agricultores portugueses. Isto dos 45% do total do PRODER. É este o meio de induzir a competitividade à agricultura deixando a quase totalidade do tecido produtivo de fora? É esta a política do Governo? Por outro lado, como pode o Sr. Ministro falar de competitividade quando é o próprio Ministério a inviabilizar a produção agrícola? Temos um instrumento que devia já estar todo à disposição dos agricultores: o PRODER. Sr. Ministro, com vista à competitividade, quando estarão abertas todas — mas todas — as candidaturas ao PRODER? Quando? O Sr. Ministro, em Março de 2007, afirmou, nesta Assembleia o seguinte: «O ano de 2007 é para a agricultura portuguesa um ano crucial». Estamos em meados de 2008 e pergunto: o que foi crucial em 2007 para os agricultores portugueses? Só vejo o desânimo e o abandono.
O Sr. Ministro, em 2007, anunciou um «Plano global que combate o abandono da actividade nos solos agrícolas». O que foi feito neste sentido?
A Sr.ª Rosário Cardoso Águas (PSD): — Muito bem!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Onde está a fiscalidade positiva e negativa para criar esse mercado da terra prometida?
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Que o senhor anunciou! Prometeu!
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O Sr. Carlos Poço (PSD): — Anunciou, também, um plano de tratamento de efluentes provenientes da pecuária, com planos regionais. Onde está esse plano? O que foi feito?
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Zero!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Está farto de anunciar para breve o regulamento para o licenciamento das explorações pecuárias. Quando, Sr. Ministro? É esta a pergunta.
A revisão da Lei do Arrendamento Rural quando estará à disposição dos agricultores portugueses? Quando? O pagamento das raças autóctones está com um ano em atraso. Isto é pagamento a horas? É razoável para os agricultores?
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Não está em atraso!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Não está porque, se calhar, pagou hoje. Mas estava.
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Paga amanhã!
O Sr. Carlos Poço (PSD): — Sr. Ministro, estas falhas não são quebras de promessas eleitorais, repito, não são quebras de promessas eleitorais. São quebras de compromissos assumidos pelo Ministério e por este Ministro e muita falta de trabalho.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro, retomo algumas questões colocadas pelo Presidente do CDS, Dr. Paulo Portas, a que V. Ex.ª não respondeu.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — É o costume!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Quanto à taxa do audiovisual, o que tem o Ministério da Agricultura a dizer pelas baixadas exclusivamente para fins agrícolas e, até, para rega?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Ministro, das 25 000 candidaturas apresentadas, foram aprovadas 55. O que se passa relativamente às outras? Gostaria de saber o que tem a dizer-nos relativamente ao cadastro e à informação que o Sr. Prof.
Francisco Castro Rego deu num artigo de opinião e que, tanto quanto sabemos, não é propriamente uma pessoa que não estude os dossiers.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Perguntámos se o IFAP, em termos comunitários, está ou não certificado e o Sr. Ministro não respondeu. Diga-nos se está ou não certificado.
Quanto à questão das agro-ambientais e das indemnizações compensatórias, é verdade que o Sr. Ministro começou a pagar mas com um ano de atraso…
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Não há atraso nenhum!
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O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — … e depois de ter um processo em tribunal movido pelo Presidente do CDS.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Esta é que é a verdade! Quanto ao regime de pagamento único, o Sr. Ministro disse que ia pagar adiantado e que em 30 de Junho todos teriam recebido. Sr. Ministro, não tem feito esse pagamento a todos os agricultores por falta de controlo.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Quanto a questões novas, o Governo tem anunciado como a grande medida social o apoio ao abono de família. Sr. Ministro, e o abono de família para os agricultores? É que os agricultores estão a ser penalizados ao ser-lhes cortado o abono de família porque, no seu rendimento total, sem qualquer exclusão em termos de despesa, entram os apoios para a modernização da agricultura e para a exploração e, por causa disso, não recebem abono de família.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Qual é a posição do Ministério da Agricultura relativamente a esta injustiça, ela própria apontada — já que falou há pouco no Provedor de Justiça — pela Provedoria de Justiça?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Ministro, V. Ex.ª, juntamente com o Governo, determinou — e fez bem! — três meses de isenção de pagamento para a segurança social para o sector das pescas. Sr. Ministro, porque é que não temos a mesma medida para o sector agrícola? Isto é, isenção, durante algum tempo, do pagamento para a segurança social com vista a apoiar a actividade agrícola?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — O que se passa sobre isto e qual é a política que o Sr. Ministro tem para actividade? Relativamente ao nemátodo do pinheiro, não é uma situação que estejamos a «cavalgar», mas é uma situação para a qual vimos alertando há mais de um ano. V. Ex.ª, Sr. Ministro, dizia, há dois meses, que não havia razão para alarme e que a situação estava sob controlo. Sr. Ministro, neste momento, temos um embargo da União Europeia à exportação da madeira de pinheiro portuguesa.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Não há embargo nenhum!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Não há embargo? Mas, Sr. Ministro, não pode ser exportada madeira portuguesa sem prévio tratamento.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Pode!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — É isto que a União Europeia diz.
Sr. Ministro, relativamente a esta matéria, que tipo de apoio vão os produtores receber para não terem uma quebra no seu rendimento, quebra essa devido à ineficácia e à total incapacidade do Governo em controlar a doença do pinheiro? O Sr. Ministro disse que tinham sido abatidas muitas árvores. Pois foi, mas o problema é que a fiscalização não foi feita.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — E no vosso tempo, houve?
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O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Ministro, só houve expansão da doença durante o ano de 2006.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, quero colocar-lhe um conjunto de perguntas concretas, para as quais pedia uma resposta concreta.
Quanto às raças autóctones, o Sr. Ministro vai reduzir, de facto, os apoios em 25% no PRODER? Vai sacrificar as raças autóctones às raças exóticas? No que se refere ao Centro Operativo e de Tecnologia de Regadio, o Sr. Ministro vai cumprir a promessa que fez de o financiar até fins de Junho ou vai acabar com ele, deixando-o morrer à míngua de financiamento? Relativamente ao nemátodo, o Sr. Ministro começa por subestimar, mais uma vez, a dimensão e o impacto deste problema. Gostaria de saber se, face à gravidade efectiva deste problema para a fileira florestal, para o pinhal português, para o País, o Governo vai ou não vai tomar medidas, como, por exemplo, criar uma equipa interdisciplinar que responda, de uma forma global e integral, a todo este problema.
As organizações de produtores pecuários (OPP) são outro desastre de dimensões nacionais, a que o Sr.
Ministro não está a responder. As OPP nem sequer têm dinheiro para comprar simples brincos de identificação dos animais. Sr. Ministro, gostaria de saber se o Estado vai assumir os seus compromissos para com estas organizações, se o Sr. Ministro vai ou não assinar os protocolos que já devia ter assinado para 2008. O que é que o Sr. Ministro vai fazer relativamente às OPP no nosso País? Quanto a atrasos de pagamentos e dívidas pagas muito para além do prazo, não vale a pena dizer nada, porque o Sr. Ministro nega permanentemente a realidade.
Sr. Ministro, gostaria de lhe fazer mais uma pergunta muito concreta: acha bem que um agricultor que apresentou um projecto Vitis em Junho de 2007, o tenha visto aprovado em Março de 2008 e depois lhe tenham exigido que o executasse até ao dia 30 de Maio? Sr. Ministro, quando é que vai alterar radicalmente o PRODER? No que se refere ao Douro, o Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto, IP (IVDP) e as casas exportadoras fizeram, recentemente, uma reunião e concluíram pela revisão do chamado «sistema do benefício» e simplificação da lei do terço. Revisão do chamado «sistema do benefício», porque consideram que é um subsídio que distorce o mercado. Descoberta «notável» do IVDP com as casas exportadoras!… Entretanto, o IVDP continua a roubar o cadastro — sei que o Sr. Ministro não gosta da palavra, mas a palavra é esta! —, através de um novo sistema informático na definição das parcelas das vinhas. O Sr.
Ministro está de acordo com este comportamento do IVDP? Se não está de acordo, que medidas vai tomar? Sr. Ministro, o Sr. Primeiro-Ministro já lhe fez chegar a carta da empresa Leitejo, produtoras de leite, do Ribatejo? Se não lhe fez chegar, posso dar-lhe um exemplar. No entanto, gostaria de saber, Sr. Ministro, que resposta é que dá ao agricultor socialista que é referido nesta carta, relativamente às intervenções que o Sr.
Ministro tem andado a fazer nessa matéria.
Finalmente, o Sr. Deputado Miguel Ginestal falou aqui, e muito bem, no desperdício de 26 000 milhões de euros por sucessivos governos do PS, do PSD e do CDS-PP, ao longo destes anos.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Eu não disse isso!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — O Sr. Deputado Miguel Ginestal esqueceu-se de referir que, pelo menos, 9,1 mil milhões de euros — mal gastos! — são da responsabilidade directa de governos do Partido Socialista. E esqueceu-se também, mais uma vez, de questionar quem é que apoiou as reformas da PAC de 1992, de 1999 e, inclusive, de 2003, com o desligamento das ajudas à produção.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Foram o PSD e o CDS que fizeram isso!
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O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — O Partido Socialista tem, nesta matéria, tantas ou mais responsabilidades que o PSD e o CDS-PP!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura e Pescas, registo que nada disse acerca do facto de ciclicamente aparecer em público com um tom acusatório em relação às organizações sociais do sector. Ou seja, quando vem aqui, à Casa da democracia, não tem nada a dizer acerca disso.
Registamos.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — O Sr. Deputado é que não tem nada a dizer sobre o tema!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Aliás, tem um estilo muito peculiar, que se nota: quando aqui chegou, fez a primeira intervenção e anunciou que na última nos iria trazer umas novidades. Entretanto, passámos todo o debate sem as conhecer.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — E não são novidades nenhumas!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — É um estilo muito peculiar. É uma «alergia» íntima à democracia, típica de uma certa mentalidade burocrática que o Sr. Ministro transporta consigo, indefectivelmente.
Protestos do PS.
Gostaria de sublinhar o seguinte: porventura, não teremos lido o mesmo relatório do Banco Mundial, mas naquele que eu li, atribui-se cerca de 75% dos custos especulativos na área alimentar à existência de biocombustíveis de origem agrícola.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Aqueles que vão existir no futuro!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente! É, portanto, um problema gravíssimo e todos aqueles que tentaram encontrar uma multiplicidade de causas e não atribuíram uma causa principal à crise alimentar e àquilo que detonou a especulação dos mercados, hoje em dia têm alguma dificuldade em lidar com isso. É claro que — e nisso estaremos absolutamente de acordo — os Estados Unidos da América são os principais acusados e visados nesse relatório e no factor facilitador dessa especulação a nível mundial. Mas vou deixar essa questão para trás, porque me parece ser até secundária.
Queria sublinhar, de uma forma muito vincada, as palavras do Sr. Ministro acerca dos biocombustíveis, porque ouvi nas suas palavras uma contradição total, repito, total, com aquilo que nos tem dito o Sr. PrimeiroMinistro e o Sr. Ministro da Economia. E, curiosamente, estou próximo de si! O que o Sr. Ministro da Economia nos tem dito é que não há problema — nós já sabíamos que não havia subsídios para a produção, em Portugal —, mas tem-nos adiantado esse projecto energético. No entanto, o Sr.
Primeiro-Ministro, aqui, em debate quinzenal, chamou a atenção para o facto de não se tratar de cereais mas de oleaginosas, que vêm de África, pelo que não são de cá.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Está escrito!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sublinho, com toda a ênfase, o facto de o Sr. Ministro da Agricultura nos dizer que, em Portugal, tem defendido a capacidade produtiva de África: cereais e oleaginosas.
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Muito bem, Sr. Ministro! Quem não está bem é o Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do BE.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — E sobre a agricultura?!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, o nemátodo da madeira do pinheiro é um problema antigo, vem desde 1999. Em 2000, 300 000 ha infectavam a zona de Setúbal; em 2007, o número ascendia a 1 milhão de hectares, desde a faixa de Vila Franca até Odemira; e, em 2008, está classificado todo o território nacional.
Este Governo teve uma condução, no mínimo, desastrosa, no que toca a este problema: sacrificou o Director-Geral dos Recursos Florestais como bode expiatório à má consciência do Sr. Ministro, que, desde Abril de 2007, estava a par da situação, como confirmou a Inspecção-Geral da Agricultura e Pescas, desmentindo o Sr. Ministro; houve uma tremenda derrapagem das contas para cerca do quádruplo relativamente ao que foi inicialmente previsto; houve uma deficiente fiscalização e controle do fluxo — aliás, as associações florestais são unânimes ao dizerem que basta olhar para a A1, pois, ao longo da A1, vemos, nas suas fronteiras, árvores infectadas, fruto da madeira que saiu da zona de contenção, que isso não foi controlado; foi criada uma Faixa de Contenção Fitossanitária que muitos dizem que foi inútil, pois não resolveu o problema, porque, como já lhe disse, ele seguiu ao longo da A1; gastaram-se milhões que, eventualmente, podiam ter sido gastos noutras medidas a resolver melhor este problema; a faixa foi mal delimitada, não aproveitando as barreiras e obstáculos naturais, poupando, assim, árvores.
O Sr. Ministro diz que não há muitas certezas científicas em relação a este problema, mas há, pelo menos, uma certeza política: este processo foi extremamente mal conduzido.
Restam duas perguntas.
O que vamos fazer às zonas desbastadas, designadamente à Faixa de Contenção? Que regras ou medidas vão ser tomadas para a sua reflorestação sustentável? Ou vamos deixá-la à regeneração natural ou à «eucaliptização»? Em segundo lugar, porque é que os proprietários ainda não foram compensados, como estava previsto, Sr.
Ministro? De que é que estão à espera? Para quando? Ou já não vão ser compensados, uma vez que o Sr.
Ministro entende que quem é responsável por debelar esta situação são os proprietários? Finalmente, Sr. Ministro, foi anunciada a construção de um estabelecimento prisional na freguesia das Fazendas de Almeirim, em 42 ha de montado de sobro, cortando 12 000 sobreiros, espécie protegida, de elevado valor ambiental, de combate à desertificação, que dá rendimento à freguesia e que foi alvo, inclusivamente, de um investimento financiado por dois programas comunitários — AGROS e AGRIS —, com o qual se plantaram mais árvores que nem vão chegar a adultas, se esta intenção for para a frente. Ainda por cima, existem alternativas de localização, Sr. Ministro! No momento em que se destaca o papel da floresta e do montado no combate às alterações climáticas como sumidor de CO
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, no combate à desertificação, este é um péssimo sinal que o Governo dará. Gostava de saber se o Sr. Ministro da Agricultura vai sancionar este abate de sobreiros.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, vou começar pela concertação social, respondendo à pergunta que há pouco o Bloco de Esquerda me colocou e eu não respondi.
O Governo assinou a concertação social e, se for ao site do Ministério da Agricultura, poderá ver que todas as semanas tenho reuniões com as associações e as confederações dos agricultores. E convém ver para lá daquilo que são divergências naturais, para lá daquilo que é a discussão democrática, para lá daquilo que é
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umas vezes estarmos de acordo e outras vezes não estarmos com as associações. Convém ver, para lá da politiquice, o trabalho que o Governo tem feito com as associações. E elas têm vindo todas a reuniões ao Ministério da Agricultura.
Portanto, para lembrar, iniciámos — e só posso agradecer a esta Assembleia, que teve a iniciativa da primeira reunião — um amplo debate sobre o futuro da agricultura europeia e da agricultura portuguesa. Nesse debate, nesta Assembleia, todas as associações estiveram presentes. Depois, todas as associações foram debater com o Ministério da Agricultura que, a seguir, descentralizou o debate em cada capital de distrito, em cada zona agrária. Por fim, o Ministro da Agricultura vai concluir esse debate, reunindo directamente, com cada confederação individualmente: na semana passada, foi com a Confederação Nacional das Cooperativas Agrícolas (CONFAGRI) e esta semana será com a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), com a Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP) e com a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP).
Portanto, poderá ver que o debate não tem faltado, há pontos em que há acordo e há pontos em que, naturalmente, há desacordo. Como sabem, o Governo faz política agrícola para todos os agricultores e não apenas para uns ou outros, consoante são representados pelas diferentes confederações.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — No que se refere ao abandono e ao exemplo que o Dr. Paulo Portas trouxe aqui dos dióspiros, não sei se viu a sua amiga Constança Cunha e Sá entrevistar-me, mas foi pena, porque, se assim fosse, já tinha a resposta, que é muito simples, Sr. Deputado. Não venha com caricatura.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Como é que sabe se é minha amiga ou não?!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Foram colegas no jornal.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — O senhor não está bom da cabeça!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Sabe que o dióspiro faz parte das hortofrutícolas. Sabe quanto é que representa a hortifruticultura no produto agrícola, Sr. Deputado?
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro «passa-se»!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Oiça com atenção! A hortifruticultura mais a vinha são mais de 50% do produto agrícola nacional.
Protestos do Deputado do CDS-PP Paulo Portas.
Vozes do PS: — Ouça!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — O senhor não acha importante apoiar mais de 50% do produto agrícola?
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Claro que não!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Claro que não acha, porque o senhor quer mostrar que não apoiamos a produção de cereais. Mas apoiamos! E, agora, oiça com atenção:…
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — O Sr. Ministro está «passado»!
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O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — A produção de cereais neste País rondava os 1,5 milhões de toneladas até 2004. O que é que aconteceu em 2005? Em 2005, houve a política do facilitismo e de iludir os agricultores, a célebre «reforma de 2003».
Protestos do PSD e do CDS-PP.
O governo em que o Sr. Deputado participou decidiu implementar a reforma de 2003 no dia 1 de Janeiro de 2005. Foi o «campeão» da reforma de 2003! Diz que votou contra, mas foi o primeiro a aplicá-la! E o resultado, qual foi? Os agricultores que iam semear trigo rijo em 2004 não o fizeram. A quebra de produção foi na ordem dos 99%. Aqui é que se vê quem é que apoia a produção de cereais.
Este Governo também reuniu, há 15 dias, com as duas grandes associações produtoras de cereais. O que é que o Governo lhes disse? Têm apoio ao investimento em regadio: se for colectivo, os apoios quase chegam aos dos investimentos públicos; se for individual, é o apoio do PRODER. E chamou a atenção dos produtores de cereais para o facto de, para terem bons preços no futuro, haver necessidade de terem capacidade de armazenagem. E é este Governo que vai resolver o problema da armazenagem, que os senhores não resolveram com os silos da Empresa para a Agroalimentação e Cereais, SA (EPAC).
Portanto, apoiamos os produtores de cereais. Quem criou a ilusão de que há um «saco azul» e acredita que há milagres que vêm de Bruxelas, afinal, é o governo da direita deste País. Esse governo acha que é muito fácil dizer aos agricultores portugueses: «Não se preocupem! Até há ajudas para não produzir!» Mas isso mudou, Sr. Deputado, e vai continuar a mudar, ainda que não goste. E vai continuar a mudar, porque pensamos na agricultura portuguesa no seu todo. Os cereais representam 3,5% da produção agrícola, mas são importantes.
O Sr. Ricardo Martins (PSD): — São ou não estratégicos?!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — São importantes e são o sector com mais apoios e mais ajudas directas deste País. São só 185 milhões de euros/ano e, apesar disso, têm apoios ao investimento, têm apoios ao regadio e vão ter a solução da armazenagem. Acham pouco, Srs. Deputados? Quando os senhores estiveram no governo não tomaram uma única medida.
Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, o nemátodo do pinheiro não existe desde 1999. O nemátodo do pinheiro existe no Canadá, nos Estados Unidos da América, no Japão, na Coreia do Norte, na China…
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — E existe no Governo do Ministro Jaime Silva!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Ouça com atenção! Esse problema existe, em vários países, há dezenas e dezenas de anos, os quais não têm resposta para o problema. Nós tivemos à má sorte de essa doença ser importada e cientificamente não há solução para o problema.
Protestos do PCP.
Mas, Sr. Deputado, vou dar-lhe uma informação: o nemátodo do pinheiro não se vê de uma viatura na A1.
Protestos do PCP.
O Sr. Deputado tem de saber que as análises indicam que em cada 100 árvores que morrem, apenas 12 a 18% poderá ser devido ao nemátodo do pinheiro. Não crie alarmes, Sr. Deputado.
Protestos do PCP.
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A sustentabilidade do pinhal não está em causa. E depois, Sr. Deputado, anda distraído. É que este Governo foi o primeiro, e único, que ordenou florestalmente todo o País. O senhor sabe que temos os planos regionais de ordenamento florestal aprovados. O senhor sabe que quem quiser plantar…
Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.
Oiça, Sr. Deputado! Eu sei que os senhores não leram os 21 programas aprovados, mas, ao menos, compreendam que o PRODER irá financiar apenas a floresta que se enquadre nos planos regionais de ordenamento florestal.
Apenas essa.
Vozes do PSD: — É uma vergonha!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Por isso, vamos ter ordenamento.
Sr. Deputado, o senhor vem-me com o caso do abate dos sobreiros. Eu estava à espera que fosse o Dr.
Paulo Portas a colocar essa questão.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Nós também!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Mas é o senhor que coloca a questão dos sobreiros e eu vou explicar a política do Governo em matéria de sobreiros.
Em primeiro lugar, como se sabe, existe a lei do montado. Ora, o Programa do Governo é claro. Não vamos deixar que se reduza a área do montado neste País. O Sr. Deputado sabe qual é o inventário florestal.
Até é bom para o Dr. Paulo Portas saber. Talvez o anime.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Oiça! Oiça!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — É que anda para aí muita gente com a ideia de que toda a floresta nacional está em perigo. Graças às políticas feitas neste País, particularmente a partir de 1995, o inventário florestal diz que a mancha do montado foi a única área que aumentou em Portugal, Sr. Deputado.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — O azinho desceu!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — E o pinho desceu por causa de quê? Dos incêndios florestais.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Eu falei em azinho!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Ah, o azinho! Está bem, Sr. Deputado. Para sua tranquilidade, direi que o azinho é uma espécie preferida no PRODER e tem apoios superiores. Não esteja preocupado com o azinho.
Protestos do Deputado de Os Verdes Francisco Madeira Lopes.
Mas, ainda sobre os sobreiros, Sr. Deputado, nós não somos dogmáticos. O Sr. Deputado precisa de conhecer a lei, porque não é o Ministro da Agricultura quem autoriza os abates ou cortes de sobreiros.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Em última instância, é!
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O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Não é! É a autoridade florestal e esta autoridade tem uma orientação política clara: qualquer abate tem de ter compensação.
Protestos do Deputado de Os Verdes Francisco Madeira Lopes.
Qualquer abate tem de ter compensação. Sr. Deputado, não seja dogmático! Abatermos 1000 sobreiros e termos como compensação a plantação de 2000, Sr. Deputado, é um balanço positivo.
Protestos do Deputado de Os Verdes Francisco Madeira Lopes.
E, Sr. Deputado, no fim da Legislatura, cá estaremos…
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — E os 12 000…
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Já vou aos 12 000.
Cá estaremos, no fim da Legislatura, para fazer o balanço das autorizações que foram dadas pela autoridade florestal e das compensações que tivemos. Vai ver que o saldo é largamente favorável ao montado.
A cadeia, Sr. Deputado, essa construção necessária que o Governo decidiu, vai implicar o abate de mais sobreiros, mas vai haver compensação. Estamos a escolher as áreas onde vamos ter compensação. Não seja dogmático, Sr. Deputado.
Protestos do Deputado de Os Verdes Francisco Madeira Lopes.
A área do sobreiro não vai baixar. Posso garantir-lhe isso, Sr. Deputado. É o compromisso do Governo aqui, nesta Assembleia.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Vamos entrar no período de encerramento do debate.
Para uma intervenção, em nome do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.
Pausa.
Efectivamente, compete ao Sr. Ministro da Agricultura usar da palavra. Esta é uma das incongruências das nossas ordens de trabalho, ou seja, depois deste período do Governo haver um encerramento em que o Governo também começa. Há uma continuidade regimentalmente correcta mas parlamentarmente duvidosa.
Tem, então, a palavra, em nome do Governo, o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: A Comissão Europeia acabou de apresentar uma proposta de balanço da «saúde» da política agrícola comum. A Comissão Europeia apresentou uma proposta a que o Governo português só tem uma resposta a dar: ela não responde aos problemas da agricultura portuguesa, não responde aos problemas da agricultura europeia actualmente, não responde aos desafios da globalização que se colocam hoje nos mercados das matérias-primas.
É uma proposta que, na lógica da Comissão, visa apenas remendar, afinar, a reforma de 2003. Ora, Srs. Deputados que não haja ambiguidades nesta Sala: a reforma de 2003 não teve, não terá, o apoio deste Governo. É uma reforma que consolidou as ajudas históricas, é uma reforma — e nós não nos conformamos com isso — que «congelou» as desigualdades de tratamento entre os agricultores portugueses e os do norte e do centro da Europa.
O Sr. Miguel Ginestal (PS): — Muito bem!
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O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Isto, Srs. Deputados, foi o que fez, ou deixou fazer, o governo da direita, em 2003.
Já dissemos à Comissão Europeia que ou introduz modificações de fundo que tenham em conta os problemas de cada Estado-membro, que tenham em conta os desafios para o futuro da política agrícola comum ou seremos obrigados a não aceitar esta reforma.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Nós iniciámos a discussão com quem devíamos iniciar em primeiro lugar, ou seja, as associações representativas dos agricultores, tivemos o privilégio — e agradecemos a esta Casa — de iniciar o debate aqui sobre essa reforma, mas essa reforma também não nos deve deixar de ver os problemas da agricultura portuguesa e para os quais há soluções, não precisamos que seja Bruxelas a indicá-las.
Temos problemas graves de abandono rural, temos problemas graves de desigualdade entre os agricultores, de desigualdade entre regiões e temos de encontrar respostas, pois elas não existem nos Quadros Comunitários anteriores.
O PRODER dá algumas respostas, favorece os pequenos agricultores, duplica as ajudas aos pequenos agricultores.
Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.
Posso garantir ao Sr. Deputado Agostinho Lopes que os pequenos agricultores viram o pacote financeiro crescer 18 milhões de euros. O líder e os grupos de acção local para encontrarem emprego, criarem microempresas, desenvolver aquilo de que hoje ninguém falou, ou seja, os produtos tradicionais, têm as verbas duplicadas, ou seja, 300 milhões de euros.
Essa é a resposta. Mas não chega. Temos um problema sério de abandono das terras, temos um problema sério do mercado da terra. Ora, o Governo já tem agendada, para decidir este mês, a lei do arrendamento rural e a lei sobre a reserva agrícola nacional. O Governo distribuirá a quem deve distribuir em primeiro lugar, a esta Assembleia e às associações de agricultores, um documento que contempla toda a revisão da legislação do desenvolvimento rural que tem a ver com a definição do uso dos solos.
Aplausos do PS.
Não estava no Programa do Governo, mas este Governo não abandona, contrariamente ao que alguns pensam, porque as reformas do Ministério da Agricultura não acabaram. Não podemos aceitar que a faixa etária da nossa agricultura seja, em média, superior a 55 anos. Temos de instalar jovens, mas para isso não bastam os apoios do PRODER. É preciso encontrar terra e para isso temos de agilizar o arrendamento e temos de levar os agricultores, os proprietários, a disponibilizarem a criação de banco de terras.
Vamos salvaguardar a propriedade privada seguramente, mas vamos agilizar e apoiar os jovens para encontrar no banco de terras a alternativa que hoje não existe. É isto, Srs. Deputados, que não estava no Programa do Governo, mas vão ser as reformas que iremos apresentar nesta Casa a partir do início da próxima sessão legislativa.
Aplausos do PS.
A concluir, Sr. Presidente e Srs. Deputados, direi o seguinte: mudar é difícil, mas, se não mudarmos, a agricultura portuguesa, seguramente em 2015, estará pior do que a herança que nos deixaram.
O imobilismo de que a direita desta Assembleia dá provas quando está no governo é real. Quando está na oposição, o facilitismo com que distribui subsídios é correspondente à irresponsabilidade que demonstraram quando estiveram no governo e pediram à Comissão Europeia para fazer um estudo. A Comissão fez esse estudo e disse que os problemas estruturais da agricultura se mantêm. O que fez o governo da direita deste
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País quando recebeu este relatório? Veio dizer aos portugueses que tinha feito uma grande negociação e que a reforma de 2003 iria resolver os problemas da agricultura portuguesa.
Concluo, pois, Sr. Presidente, dizendo que o Governo vai continuar com as suas reformas na agricultura, para bem de todos os agricultores e, sobretudo, da coesão territorial, porque os agricultores portugueses estão em todo o País e não apenas numa região.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Portas.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS fez muito bem em agendar este debate porque ele revela um Ministro da Agricultura com muito pouca obra para mostrar, que é um «passa-culpas» permanente,…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … que, se for preciso, inventa — há mesmo momentos hilariantes! —…
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Olha quem fala!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … que não responde a nada do que se lhe pergunta em concreto…
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — É verdade!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … e que, de quando em vez, como toda a gente já percebeu, «se passa».
Mas vou dizer-lhe uma coisa, Sr. Ministro: não vale a pena ir por aí. Sabe porquê? Porque vai acabar abandonado por todos, incluindo pelo Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do CDS-PP.
Sr. Ministro, queria dizer-lhe que agradeço imenso a importância que dá ao CDS, à direita e até a mim próprio. Ela é inversamente proporcional à consistência das respostas que o senhor dá a perguntas muito concretas!
Aplausos do CDS-PP.
Sr. Ministro, imagine que os agricultores estão a ouvi-lo — e alguns estarão, mas não por estarem a pagar taxa audiovisual nos pivôs de rega! Ficarão, certamente, impressionados porque o Sr. Ministro adopta uma atitude que tem muito pouco a ver com a consistência ou com a seriedade das explicações. É que o senhor, em vez de responder, inventa, o senhor, em vez de se responsabilizar, passa culpas, o senhor, em vez de explicar, insinua, o senhor, em vez de detalhar às vezes ofende e julga que vai a algum lado com este tipo de atitudes.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem! Há limites para tudo!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Não vai! Habitue-se ao contraditório. É um facto democrático, Sr.
Ministro.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
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O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Gostava também de lhe dizer o seguinte: este debate mostrou como o Sr. Ministro não tem respostas para dar às pessoas.
Primeira questão: há ou não desperdício dos fundos comunitários? Há uns meses, o Sr. Ministro dizia: «Não. Eu usei tudo. Até consegui mais e gastei mais!» O problema é que não é verdade. A conta de 2005 está fechada e foram desperdiçados fundos comunitários no valor de dezenas e dezenas de milhões de euros. A responsabilidade é sua? «Não, é de não sei quem do governo anterior» — é uma resposta absolutamente extraordinária porque o ano para execução dos fundos comunitários é da vossa governação.
Não venha com delírios nem com invenções, Sr. Ministro!
Aplausos do CDS-PP.
O senhor sabe por que razão não usa os fundos comunitários? Porque não quer pagar a comparticipação nacional — e esse é o segundo problema da gestão política do seu Ministério.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Pois! Os senhores conhecem bem essa prática!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — É que o Sr. Ministro da Agricultura, quando, em negociações que obviamente são difíceis, tem de escolher entre os interesses da agricultura e os do Ministério das Finanças, sempre põe em primeiro lugar os interesses do Ministério das Finanças e, em último lugar, os interesses dos agricultores.
Aplausos do CDS-PP.
Vozes do PS: — Demagogia!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Isso não sucede com mais nenhum governo da União Europeia.
Sr. Ministro da Agricultura, o que é extraordinário, quando fala do PRODER, é que faz de conta que este Programa já existe. Só que o senhor é o único português que acha que o PRODER já existe.
O PRODER, supostamente, era para vigorar no período 2007—2013. Ora, em 2007, não há um tostão que tenha sido pago ao abrigo do PRODER. Em 2008, os senhores atrasaram de tal maneira a abertura das candidaturas que não vão pagar até ao fim do ano. Portanto, não responda com ilusões.
O senhor não pode dizer «o PRODER vai ser salvífico» quando, cada ano que passa, o senhor, pura e simplesmente, mutila o PRODER, que é o que está a acontecer.
Em alternativa, há quem o acuse de estar a concentrar o uso de todos os fundos para 2009 que, por acaso, é o ano das eleições! Só que o senhor não percebe uma coisa: cada vez que o Estado português não paga aos agricultores, cada vez que atrasa as candidaturas, cada vez que protela o início dos planos de desenvolvimento, o senhor não está a contrariar a subsidiodependência, uma imagem dos agricultores que a esquerda gosta de fazer passar, está é a atacar a competitividade dos agricultores portugueses em relação aos espanhóis, aos italianos, aos franceses, porque os respectivos governos pagaram a tempo e horas, abriram as candidaturas a tempo e horas, já estão a desenvolver projectos, a tempo e horas.
O Sr. Rui Vieira (PS): — Isso não é verdade! Santa ignorância…!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — E os apoios comunitários são o que permite aos agricultores portugueses serem competitivos em relação aos dos outros países.
Portanto, arrede daí qualquer lógica populista que os senhores gostam de usar — «os pequenos e os grandes», a «agricultura do Alentejo e a agricultura do Norte». Aliás, gostava que os senhores me explicassem onde é que, no Alentejo, há agricultura de pequena dimensão que seja competitiva. Portanto, repito, tirem daí essa «poluição» intelectual que os senhores, às vezes e em desespero, gostam de usar para fugir às questões verdadeiras.
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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Os fundos comunitários foram desperdiçados. O PRODER já devia estar em vigor há um ano e meio e não está. A realidade é esta.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Finalmente, Sr. Ministro, não pense que o CDS vai desistir de fazer-lhe a pergunta.
É que o Sr. Ministro pagou as indemnizações compensatórias e as agro-ambientais porque foi preciso «bater o pé» muitas vezes para que se lembrasse dos avisos que tinha publicado que, depois, tinha alterado, que, depois, não tinha pago — e até discutiremos isso em tribunal. Mesmo que seja necessário ir a tribunal, tenho muito orgulho em ter contribuído para que o senhor tivesse começado a pagar.
Aplausos do CDS-PP.
Só que, agora, quanto às ajudas RPU (regime de pagamento único) para 2007, voltou a acontecer o mesmo, Sr. Ministro. Não estão pagas em grande medida, já passou o prazo!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, da Agricultura e das Pescas (Luís Vieira): — É mentira!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Fizemos-lhe a pergunta: quando é que vai pagar? O senhor não responde! Fiz-lhe outra pergunta que é muito importante para o futuro: Sr. Ministro, está certificado definitivamente, em Bruxelas, e sabe já — sim ou não? E o senhor foge da resposta! Percebo porque é que foge da resposta. É porque o senhor fez uma reestruturação sem pensar na certificação da entidade pagadora! O que é extraordinário é que o senhor tenha feito uma reestruturação do IFADAP e do INGA sem se lembrar desse pequeno detalhe — a entidade pagadora. Se esta não estiver certificada, não pode receber candidaturas nem pode pagar aos agricultores.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Já pagou!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Isto é que é inaceitável, Sr. Ministro!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Por fim, e termino, quanto à doença provocada pelo nemátodo, para além de, um dia destes, repito, o senhor estar a culpar o Senhor D. Diniz, as coisas são muito claras: os senhores alargaram a faixa, cortaram árvores sãs,…
Protestos do PS.
… não pagaram aos produtores que, até hoje, ainda não viram um cêntimo. Depois, não fiscalizaram o transporte. Tinham obrigação de ter contido a doença…
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — … e esta alastrou para o norte e para o centro do País.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: — Já lá estava!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Pois, com certeza que já lá estava…! Agora, inventa que já lá estava! O senhor delira, desculpe que lhe diga!
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Sr. Ministro, era da sua responsabilidade conter e erradicar a doença, mas a doença alastrou. Aconteceu, pois, exactamente o contrário! Estamos pior do que estávamos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Rui Vieira (PS): — Olhe para o que se passa no Canadá!
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Sr. Ministro, isto é a prova acabada da sua pouca competência.
Vou dizer-lhe mais: em matéria agrícola, poucos governos governaram tanto para as grandes companhias como o seu.
Prefiro olhar para o essencial da agricultura portuguesa que é a pequena agricultura de subsistência, que ainda existe e é muito grande, e a agricultura empresarial, que fará de nós um sector e um país competitivo nesta matéria. Para as empresas agrícolas de média dimensão, o senhor não olhou.
Entre as grandes companhias e as pequenas e médias empresas, também na agricultura, a vossa escolha foi a de olhar pelos grandes.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Está concluído este debate de urgência sobre agricultura.
Vamos passar ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 198/X — Transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva 2006/23/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril de 2006, relativa à licença comunitária de controlador de tráfego aéreo.
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações (Paulo Campos): — Sr.
Presidente, Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Encontro-me aqui, hoje, com a finalidade de apresentar a esta Assembleia a proposta de lei com a qual se visa transpor para a ordem jurídica interna a Directiva 2006/23/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Abril de 2006, relativa à licença de controlador de tráfego aéreo.
A decisão de legislar assentou quer no imperativo constitucional de proceder à referida transposição quer, ainda, no cumprimento das obrigações que impendem sobre o Estado Português, por imposição dos regulamentos comunitários que regulam a matéria do Céu Único Europeu.
A presente Directiva insere-se no âmbito do programa de harmonização do quadro regulamentar, a nível comunitário, para a criação do Céu Único Europeu, onde são impostas aos Estados-membros também obrigações em matéria de licenciamento dos controladores de tráfego aéreo, tendo em vista a harmonização das condições de garantia dos mais elevados níveis de responsabilidade e competência e, ainda, de promoção do reconhecimento mútuo das licenças.
Efectivamente, a prestação de serviços de controlo de tráfego aéreo exige pessoal com grau de qualificação elevado, cuja habilitação se encontra sustentada em padrões definidos para todo o espaço comunitário, constituindo a licença comunitária o título profissional de cada controlador de tráfego aéreo, cujo reconhecimento, além de potenciar a sua mobilidade dentro do espaço comunitário, constitui também garantia de competência.
Para além disso, o estabelecimento de normas harmonizadas entre todos os Estados-membros reduz a fragmentação neste domínio, tornando mais eficiente a organização do trabalho, no âmbito de uma colaboração regional crescente entre os prestadores de serviços de navegação aérea.
Assim, através da presente iniciativa legislativa, a ordem jurídica interna passa a contemplar uma licença comunitária de controlador de tráfego aéreo, o que constitui um meio de reconhecer o papel específico desempenhado por estes profissionais na segurança do controlo do tráfego aéreo no espaço comunitário, no qual se insere, naturalmente, o espaço português.
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Estabelece-se, ainda, o reconhecimento, em Portugal, das licenças, qualificações e averbamentos emitidos, quer nos países membros da União Europeia quer nos países membros do EUROCONTROL, com base no princípio da reciprocidade.
Neste sentido, estou convicto que a presente proposta merecerá, certamente, o acolhimento de VV. Ex.as
.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, tendo em consideração que a Directiva, cuja transposição para a nossa legislação é proposta hoje, aqui, visa melhorar e aumentar os meios de segurança do serviço do controlo do espaço aéreo, assim como a certificação dos controladores aéreos, gostava de colocar-lhe uma questão e de ter uma resposta.
Por que é que o Governo não optou por transpor o texto da Directiva, no seu artigo 1.º, que, do nosso ponto de vista, se afigura claro, e optou, sim, por introduzir a definição de a quem se aplica e a quem não se aplica esta Directiva — refiro-me ao n.º 3 do artigo 1.º da proposta de lei —, lançando uma confusão que nos parece desnecessária porque, inclusivamente, pode vir a excluir algumas pessoas, nomeadamente militares, que, ao abrigo de protocolos, exercem, em determinadas situações, o serviço de controlo do tráfego aéreo? Isto, Sr. Secretário de Estado, sobretudo quando é muito claro o quadro que estabelece as competências, quer da NAV–Navegação Aérea de Portugal, EPE, no sentido de ser a entidade prestadora de serviços de tráfego aéreo, quer o INAC (Instituto Nacional de Aviação Civil), enquanto Autoridade Supervisora Nacional.
Portanto, a questão é a de saber por que é que o Governo não optou pelo texto da Directiva mas, sim, por introduzir este n.º 3 do artigo 1.º que traz alguma confusão.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, a Directiva diz claramente que se aplica aos instrumentos de controlo de tráfego aéreo e aos controladores de tráfego aéreo que exerçam as suas funções sob a responsabilidade de prestadores de serviço de navegação aérea que prestam serviços principalmente destinados aos movimentos de aeronaves de tráfego aéreo geral. Ora, o que fazemos transpor, na proposta de lei que hoje submetemos à Assembleia da República, é, exactamente, a leitura deste princípio, que está vertido no n.º 2 do artigo 1.º da Directiva.
Aplausos do PS.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso é no n.º 1! E o n.º 3?
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Não percebeu a nossa pergunta!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Custódia Fernandes.
A Sr.ª Custódia Fernandes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas e Comunicações: Através da proposta de lei n.º 198/X, visa o Governo transpor para o ordenamento jurídico português a Directiva 2006/23/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril de 2006, relativa à licença comunitária de controlador de tráfego aéreo.
Trata-se de uma importante directiva comunitária que assenta em preocupações relacionadas com o aumento dos níveis de segurança e a melhoria do funcionamento do tráfego aéreo ao nível europeu, cuja transposição para as ordens jurídicas internas dos Estados-membros contribuirá para a harmonização do quadro regulamentar comunitário que estrutura o Céu Único Europeu.
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A harmonização, ao nível comunitário, das condições de acesso e de exercício da profissão de controlador de circulação aérea, bem como o reconhecimento mútuo de licenças, não só se afigura positiva, por permitir um nivelamento das exigências relativas ao exercício desta profissão, como também contribuirá para o aprofundamento do princípio da liberdade de circulação de trabalhadores, beneficiando as condições de mobilidade dos profissionais deste sector e a dinâmica do respectivo mercado de trabalho.
A referida proposta de lei é, no nosso entendimento, globalmente positiva, revelando-se fiel aos objectivos e ao âmbito da Directiva citada.
O âmbito de aplicação da Directiva 2006/23/CE encontra-se claramente definido no n.º 2 do artigo 1.º e aplica-se aos controladores de tráfego aéreo e aos instruendos de controlo de tráfego aéreo que exerçam as suas funções sob responsabilidade de prestadores de serviços, principalmente destinados aos movimentos de aeronaves de tráfego aéreo geral.
No entanto, como também existem outros prestadores de serviços de navegação aérea que, apesar de vocacionados essencialmente para prestar serviço a aeronaves diferentes do tráfego aéreo geral, também podem, de forma regular ou planeada, prestar serviço ao tráfego aéreo geral, o Parlamento Europeu e o Conselho, sem se imiscuírem nas exigências de formação e de qualificação destes prestadores de serviço, vêm alertar os Estados-membros que têm de assegurar que o nível de segurança e qualidade dos serviços prestados por estes são equivalentes aos dos outros.
Nesse sentido e embora se entenda que a intenção do Governo foi dar integral cumprimento ao disposto na Directiva, o Grupo Parlamentar do PS apresentará uma nova redacção para o artigo 1.º n.º 3, em sede de especialidade.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Custódia Fernandes (PS): — Iremos propor, ainda, uma nova redacção para o artigo 42.º, alargando o período mínimo para o registo de horas de trabalho efectivo nos sectores, permitindo, desta forma, uma fiscalização mais efectiva e de qualidade na segurança do trabalho desenvolvido.
Em suma, sem prejuízo de pequenas benfeitorias que apresentaremos em sede de especialidade, no sentido de melhorar o diploma a aprovar, consideramos que a proposta de lei em discussão se afigura muito positiva numa lógica de aumento dos níveis de segurança e da melhoria do funcionamento do tráfego aéreo ao nível europeu.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Cunha, para uma intervenção.
O Sr. Vasco Cunha (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, genericamente, há um entendimento favorável do PSD à proposta de lei n.º 198/X, que transpõe para o nosso ordenamento jurídico a Directiva n.º 2006/23/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril de 2006, respeitante à licença comunitária de controlador de tráfego aéreo.
Todavia, como já aqui foi referido, o n.º 3 do artigo 1.º da proposta de lei merece a nossa discordância, atendendo à sua redacção original. Aliás, no seguimento da intervenção da Sr.ª Deputada Custódia Rodrigues, e daquilo que ainda há pouco o Sr. Secretário de Estado nos dizia, acabei por não perceber qual das posições vai prevalecer, se aquela que o Sr. Secretário de Estado aqui deixou há minutos, se a que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista agora anunciou.
Em todo o caso, a nossa discordância é sobretudo em relação a este desconhecimento mútuo das licenças.
Foi, aliás, nesse sentido a intervenção do Deputado Nelson Baltazar, Relator na Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, quando, ainda esta manhã, no relatório apresentado à Comissão, e traduzido, depois, nas suas conclusões, colocava objecções a este n.º 3 do artigo 1.º da proposta de lei que o Governo nos apresenta.
De facto, não seria compreensível, por exemplo, como já aqui foi referido, que os controladores aéreos militares não fossem contemplados na transposição desta directiva. Creio que todos lhes reconhecemos
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competência técnica, currículos e exercício das funções, mesmo em bases aéreas militares onde há tráfego civil.
Por isso, Sr. Presidente, vamos aguardar pelo debate na especialidade para que estas posições do Grupo Parlamentar do Partido Socialista e do Governo possam ser conciliadas, sendo que, da nossa parte, há toda a disponibilidade para acolher um texto diferente do original que vá ao encontro das aspirações de algumas entidades que não estão totalmente cobertas pela transposição desta directiva.
Aplausos do PSD.
Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente António Filipe.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de mais, importa assinalar — ainda não foi dito — que esta directiva se integra directamente na estratégia do chamado Céu Único Europeu, tratando-se de uma orientação política da União Europeia para a integração do controlo do tráfego aéreo num nível comunitário, que merece a firme oposição do PCP, justamente porque está em causa a gestão do espaço aéreo do nosso país, componente inalienável da soberania nacional.
Sejamos claros: o que a Comissão Europeia pretende a todo o custo (e o que os governos apoiam fervorosamente) é a liberalização e a posterior privatização desta actividade.
Este instrumento da «licença comunitária de controlador de tráfego aéreo» não passa disso mesmo, isto é, de um instrumento, de uma peça integrante dessa estratégia iníqua e perigosa. A este propósito, é particularmente preocupante que o Governo mantenha o silêncio sobre a questão central do controlo de tráfego aéreo no novo aeroporto de Lisboa e a quem será atribuída essa actividade.
Em segundo lugar, coloca-se a questão do processo legislativo e da participação das entidades com intervenção nesta matéria. O Governo indica, no preâmbulo da proposta de lei, que foram ouvidas as associações sindicais e de operadores do sector e a Comissão Nacional de Protecção de Dados, mas não faz acompanhar a sua iniciativa de quaisquer estudos, documentos ou pareceres que a tenham fundamentado, não cumprindo assim o previsto no n.º 3 do artigo 124.º do Regimento da Assembleia da República.
Por outro lado, o próprio preâmbulo desta proposta refere um processo de discussão pública — e inclusive a publicação do diploma em separata do Diário da Assembleia da República — que, pura e simplesmente, nunca aconteceu! O PCP suscitou esta questão na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, a necessidade de ouvir estas organizações, e se até agora tal não aconteceu, então, pelo menos em sede de especialidade, isso terá de acontecer.
Em terceiro lugar, um aspecto preocupante, que, aliás, já hoje salta à vista no sector do transporte aéreo em Portugal, é o regime difuso e pouco claro (para não dizer pior) que hoje existe na regulação atribuída ao Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC) e nas competências delegadas, formal ou informalmente, a outras entidades ou empresas, como é o caso da Empresa Pública Navegação Aérea, NAV, EPE. Essa confusão entre regulador e regulado volta a acontecer com esta proposta do Governo.
Veja-se o artigo 23.º, que simplesmente estabelece que o sistema de avaliação de proficiência, necessário para a renovação da licença, é da responsabilidade do «prestador de serviços de navegação aérea», ou seja, neste caso, da NAV, EPE, o que significa que os controladores de tráfego aéreo são avaliados pela entidade patronal, avaliação essa que pode resultar na impossibilidade de o controlador exercer a sua profissão no espaço comunitário! Em terceiro lugar, há uma outra questão concreta que não podemos ignorar, que se prende com o âmbito de aplicação desta proposta de lei e que já foi alvo de intervenções neste debate. A este grupo parlamentar — e também a outros nesta Assembleia — chegou um testemunho de alerta e preocupação quanto à hipótese de, sendo excluídos deste sistema de certificação os controladores de tráfego aéreo portugueses militares, poder dar-se o caso de o Estado português ser obrigado a reconhecer profissionalmente os controladores militares de outros países onde essa exclusão não aconteça.
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Trata-se de matéria que merece reflexão, no seguimento, aliás, do parecer elaborado pelo Deputado Nelson Baltazar, do Grupo Parlamentar do PS. Apesar das evasivas do Sr. Secretário de Estado, o anúncio trazido pelo PS a este debate merece que acompanhemos com atenção e expectativa as propostas do Partido Socialista que estão na calha.
Finalmente, para terminar, Sr. Presidente, também merece reflexão e esclarecimento uma questão que o PCP suscitou, desde logo no Parlamento Europeu: a abertura da possibilidade de controladores «que exerçam a sua actividade sob a responsabilidade de prestadores de serviços de navegação aérea» não serem seus empregados. Terão um vínculo precário? Serão trabalhadores de uma empresa e trabalham noutra? Sob que condições? Pode um controlador trabalhar sem ser empregado do prestador do serviço de navegação aérea? Com que consequências? São aspectos que continuam por esclarecer e que suscitam as maiores preocupações do PCP, na forma, no conteúdo, e até no processo.
Estamos, pois, perante mais uma etapa de um processo particularmente gravoso para o interesse nacional e para a própria soberania.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Sem prejuízo de um debate mais aprofundado sobre a questão do Céu Único Europeu e de tudo o que ele significa no contexto das políticas europeias, sobre as quais temos, como é conhecido, muitas e profundas críticas, o debate sobre esta proposta de lei, infelizmente, não foi suficientemente aprofundado porque ficámos sem perceber, por um lado, qual é a posição do Governo, que é o autor desta lei, e, por outro, quais são as propostas de alteração da bancada do Partido Socialista. Parece-me que isto era importante para percebermos qual vai ser o resultado final desta proposta de lei.
Ficamos numa situação de «meias-tintas», onde tudo é possível e o seu contrário também. Sabemos que existe a opinião do Relator, Sr. Deputado Nelson Baltazar, a qual, como é óbvio, gostaria de sublinhar, mas não sabemos mais do que isso. Era muito importante que se fizesse uma clarificação, porque estamos a tratar da certificação, dos seus critérios, das entidades certificadoras, de um elenco muito vasto de questões que a própria directiva imana relativamente a uma profissão que, como todos e todas sabemos, exige altas qualificações e cujas pessoas que a exercem têm um desempenho fundamental para a segurança do nosso espaço aéreo. Portanto, parecia-me muito importante que o Governo tivesse uma postura de maior esclarecimento desta Assembleia para sabermos o que é que iremos, mais tarde, votar.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, agora, o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei n.º 198/X, que hoje apreciamos, visa transpor para a ordem jurídica interna a Directiva 2006/23/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, que cria a licença comunitária de controlador de tráfego aéreo.
Com efeito, a prestação de serviço de navegação aérea exige pessoal com grau de qualificação elevada, cuja competência possa ser demonstrada por vários meios. Assim, a licença comunitária constituí uma espécie de diploma de cada controlador de tráfego aéreo cujo reconhecimento em toda a União Europeia faz aumentar não só a liberdade de circulação mas também o número de controladores de tráfego aéreo. Pretende-se, deste modo, contribuir para o aumento dos níveis de segurança e para a melhoria de funcionamento do sistema comunitário de controlo de tráfego aéreo, bem como para o reconhecimento do papel específico desempenhado pelos profissionais do sector da segurança do controlo de tráfego aéreo.
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Pretende-se ainda reconhecer, com base no princípio da reciprocidade, as licenças, as qualificações e os averbamentos emitidos quer nos países da União Europeia quer nos países membros da Organização Europeia para a Segurança da Navegação Aérea.
Há uma questão que nos preocupa bastante, que foi colocada até pela Associação Nacional de Sargentos (ANS), presente nas galerias, a quem saudamos, que tem a ver com a exclusão de centenas de militares do direito da licença comunitária de controlo de tráfego aéreo. O Sr. Secretário de Estado não a esclareceu devidamente e o Partido Socialista diz que está disponível para, em sede de especialidade, introduzir alterações ao artigo 1.º da proposta de lei, onde esta questão se coloca.
Obviamente que, da nossa parte, essa é uma questão incompreensível, porque ela está salvaguardada na directiva mas na proposta de lei que a transpõe ela não ficava devidamente salvaguardada.
Como referimos, reconhecemos a necessidade da existência de elevadas qualificações para quem faz o controlo de tráfego aéreo e reconhecemos a estes profissionais estas qualificações. Aliás — e a própria Associação Nacional de Sargentos refere-o —, os controladores aéreos fazem controlo do tráfego aéreo civil, por exemplo, em missões de paz, sendo o que está a acontecer em Cabul, neste momento.
Portanto, não se trata de uma reivindicação mas de um alerta perfeitamente justo da própria Associação e, por isso, esperamos que o Partido Socialista e o Governo aceitem, em sede de especialidade, que esta medida seja devidamente regulamentada e fique expressa na transposição. Aliás, a transposição deve admitir e incentivar esta situação, o que de outra forma não poderia ser, sob pena de, por exemplo, em Lisboa, os aviões terem de fazer uma espécie de gincana para poderem aterrar porque haveria áreas restritas aos controladores de tráfego aéreo militar e outras restritas aos controladores de tráfego civil, o que obviamente permitiria uma confusão total, e seguramente não é isso que se pretende.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Inscreveu-se, para uma segunda intervenção, o Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de esclarecer que, como é óbvio, o Governo apresenta uma proposta a este Parlamento, e, como sempre, nesta e em todas as outras, as contribuições do Parlamento são sempre bem-vindas.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito obrigado!
O Sr. Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações: — Neste contexto, os grupos parlamentares poderão, como é óbvio, apresentar contributos para a melhoria da proposta de lei. É nesse âmbito que se espera que seja feito o trabalho do Parlamento, isto é, para melhorar as propostas que são apresentadas e, obviamente, é nesse contexto que esperamos que os trabalhos sejam delineados.
Gostaria de esclarecer os Srs. Deputados que a nossa intenção é a de transpor a directiva nos seus exactos termos e a interpretação que fazemos é a de que a transposição está feita nos seus exactos termos.
Mas estamos obviamente disponíveis para melhorias que possam esclarecer se esses exactos termos estão ou não bem transpostos. É neste contexto que aqui estamos.
O Sr. Deputado Bruno Dias referiu-se ao novo aeroporto e ao espaço aéreo, mas é a primeira vez que oiço tal questão. Não há qualquer dúvida: a gestão do espaço aéreo do novo aeroporto, como todo o espaço aéreo nacional, é da responsabilidade de uma empresa pública, a NAV, e continuará a ser.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Concluímos assim o debate relativo à proposta de lei n.º 198/X e vamos passar à apreciação de petições.
A primeira petição a ser apreciada é a petição n.º 312/X (2.ª) — Apresentada por Mariana Alves da Rocha e outros, solicitando que a Assembleia da República legisle no sentido de garantir a acessibilidade electrónica a
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todos os cidadãos com necessidades especiais (pessoas com deficiência e idosos) e de impor verdadeiras obrigações e sanções para o seu incumprimento, dispondo cada grupo parlamentar de 3 minutos.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta petição n.º 312/X (2.ª) é subscrita por 7431 cidadãs e cidadãos e tem toda a oportunidade, porque reclama medidas concretas que permitam e garantam acessibilidade electrónica a todas e todos os cidadãos com necessidades especiais.
Falamos de cidadãos e cidadãs portadores de deficiência, mas também de cidadãos e cidadãs idosos.
Passados oito anos sobre a primeira petição electrónica que deu origem a uma resolução do Conselho de Ministros que já estabelece regras relativas a acessibilidades aos conteúdos dos organismos públicos pelos cidadãos com necessidades especiais, é hora, Sr.as e Srs. Deputados, de se fazer muito mais e de não se ficar apenas por uma resolução do Conselho de Ministros, que, neste momento, para muitas entidades, não passa de recomendações.
Por essa razão, solicitam os peticionários que se vá bastante mais longe, que se legisle no sentido de o acesso a estes serviços ser efectivamente obrigatório e também que haja consequências quando não o seja.
É verdade que os censos que dão conta de quantos cidadãos e cidadãs existem são de 2001 — curiosamente censos contraditórios até com os de 1999. É inexplicável que, hoje, em 2008, não se tenha sequer actualizado os censos para sabermos quantas são exactamente as pessoas portadoras de deficiência.
Mas esta petição vai mais longe e extravasa este grupo, porque também aqui são englobadas outras pessoas como os idosos.
De qualquer forma, e tendo como base os censos de 2001, temos cerca de 2,5 milhões de pessoas nestas situações.
Quando, em sede de comissão, se discutiu esta petição, todos os grupos parlamentares consideraram que era muito importante a matéria que hoje aqui se traz. É hora, então, Sr.as e Srs. Deputados, de dar corpo às pretensões dos peticionários, de acesso a serviços tão importantes como são a Internet, os programas informáticos e a televisão — e, inclusivamente, acesso a uma coisa muito básica, as caixas multibanco, que, como sabemos, não têm qualquer tipo de adequação a estes cidadãos e cidadãs.
Por último, quero dizer que o Estado deveria ser o modelo, o exemplo. Mas a verdade é que, nesta como noutras áreas, o Estado fica sempre pelas intenções e não legisla de acordo com as necessidades, que são reais e objectivas, dos cidadãos e cidadãs.
Bem-haja aos peticionários! O Bloco de Esquerda considera que esta é uma matéria muito importante, da qual tem de resultar uma iniciativa legislativa do Governo.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Campos Ferreira.
O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a petição que hoje apreciamos solicita que a Assembleia da República legisle no sentido de garantir a acessibilidade electrónica a todos os cidadãos com necessidades especiais e de impor verdadeiras obrigações e sanções para o seu incumprimento.
Em primeiro lugar, cumprimento os peticionários, autores desta iniciativa, cujo objecto merece a maior atenção desta Câmara: a promoção da igualdade de oportunidades para todos.
As tecnologias da sociedade de informação representam, hoje, uma oportunidade para todos os cidadãos.
Mas, e conforme é referido na petição, para as pessoas com necessidades especiais este é um meio propiciador de inclusão e participação social por excelência. A acessibilidade electrónica proporciona a estes cidadãos uma maior autonomia e representa também uma possibilidade de evolução profissional em igualdade com os restantes profissionais.
Mas, infelizmente, nem todos têm acesso a esta oportunidade, porque a maior parte destes produtos e serviços são concebidos sem ter em conta o conceito de desenho universal — capazes de serem utilizados por todos —, impedindo as pessoas com deficiência e também os idosos de os usar.
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A infoexclusão é, nos dias de hoje, um factor de exclusão social.
Os peticionários solicitam, assim, à Assembleia da República: a publicação de um acto legislativo que incida nas áreas da Internet, dos programas informáticos, da televisão, comunicações electrónicas, multibanco e máquinas de venda automática de produtos e serviços; a imposição de obrigações e sanções em caso de incumprimento; a inclusão de disciplinas nos curricula dos cursos superiores com ligação a esta área que incidam sobre a adequação dos serviços e produtos aos cidadãos com necessidades especiais; e que o Estado dê o exemplo e passe a adquirir produtos e serviços acessíveis a todos.
Ao nível legislativo, refiro em particular, para além da Resolução do Conselho de Ministros n.º 97/99, a Lei n.º 38/2004, Lei de Bases do Regime Jurídico da Prevenção, Habilitação, Reabilitação e Participação da Pessoa com Deficiência, que previa, no seu artigo 44.º, a elaboração de um plano nacional de promoção da acessibilidade, de modo a adoptar medidas específicas que assegurassem o acesso da pessoa com deficiência à sociedade de informação.
Neste sentido, e posteriormente, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 9/2007 aprovou o Plano Nacional de Promoção da Acessibilidade, que sistematiza um conjunto de medidas nas mais diversas áreas, entre as quais o acesso à informação e aos serviços electrónicos.
Na verdade, não nos faltam os princípios orientadores, as recomendações. Todavia, nem sempre estas são cumpridas. É necessário, de facto, concretizar a promoção da igualdade de oportunidades, se queremos uma sociedade mais justa.
Permitam-me que refira ainda o projecto de lei n.º 428/X da autoria do PSD, que estabelece medidas de promoção da acessibilidade de pessoas com deficiência visual à informação sobre determinados bens de venda ao público, o qual, merecendo o contributo, em sede de especialidade, de todas as bancadas parlamentares, inclui também especificidades para o serviço de vendas on-line.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir.
O Sr. Luís Campos Ferreira (PSD): — Concluo já, Sr. Presidente.
Um dos maiores desafios que a sociedade actualmente enfrenta é a melhoria da qualidade de vida e a autonomia dos cidadãos com deficiência e dos idosos. A sociedade da informação tem uma missão muito relevante na prossecução deste objectivo.
Podem, pois, contar com o Partido Social Democrata nesta matéria.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Nobre de Deus.
A Sr.ª Paula Nobre de Deus (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição que está a ser debatida na Assembleia da República propõe que esta Assembleia legisle no sentido de garantir a acessibilidade electrónica a todos os cidadãos com necessidades especiais (pessoas com deficiência e idosos) e de impor obrigações e respectivas sanções em caso de incumprimento.
É importante que esta Câmara registe a dimensão ética de uma petição subscrita por um amplo conjunto de cidadãos atentos ao impacto das novas tecnologias de informação e comunicação, alguns dos quais com necessidades especiais, aqui presentes e que aproveito para saudar.
A Comissão Europeia, na sua proposta de «Agenda Social Renovada para a Europa em ordem ao BemEstar dos Cidadãos na Sociedade da Informação», publicada no passado dia 2 de Julho, vem chamar a atenção para a importância das tecnologias digitais na organização da sociedade e no actual quotidiano dos cidadãos, nomeadamente das pessoas com necessidades especiais.
Perante o reconhecimento do fraco compromisso dos governos nacionais na resolução dos problemas relativos à acessibilidade electrónica, a Comissão Europeia lançou uma consulta pública sobre novas medidas para tornar os sítios web acessíveis, a começar pelos das administrações públicas, e convida as partes interessadas a apresentarem os seus pontos de vista sobre essa e outras áreas de acessibilidade.
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No entanto, esta tendência foi contrariada por Portugal. Aliás, o nosso país, a par da Áustria, da França, da Itália e dos Países Baixos, foi um dos que tomou medidas para melhorar a situação, nomeadamente estabelecendo orientações e metas para os sítios web públicos.
Portugal ultrapassou a Europa e vai muito à frente em matéria de acessibilidade electrónica. O Partido Socialista acompanha as preocupações dos peticionários e o Governo do PS, oportunamente, desencadeou um processo coerente de intervenções em cascata, com resultados visíveis.
Actualmente, estão em conformidade com as regras de acessibilidade electrónica grande parte dos sítios da Internet, com carácter informativo, dos Ministérios. Os sítios que ainda não estão corrigidos irão sê-lo, durante o ano de 2008. Estes resultados superam totalmente os avanços conseguidos na maioria dos Estados-membros! Pela primeira vez, passou a estar legalmente consagrado o princípio do desenvolvimento gradual das obrigações dos operadores televisivos, no que respeita ao acompanhamento das emissões por pessoas com necessidades especiais, e o Grupo Parlamentar do Partido Socialista interpelou recentemente a Entidade Reguladora para a Comunicação Social, a quem cabe definir essas obrigações, no sentido de o fazer com a maior urgência possível.
Neste debate, o Partido Socialista considera que é da máxima justiça dar boa nota do esforço da própria Assembleia da República, no sentido de garantir um maior nível de acessibilidade ao seu site, que já cumpre muitas das normas internacionais de acesso a conteúdos web.
Entretanto, esta Assembleia aprovou recentemente uma lei que obriga os serviços de venda on-line a incluírem uma opção que garanta a acessibilidade das pessoas com deficiência e incapacidades visuais.
Os Estados-membros da União Europeia, em 2006, comprometeram-se a diminuir, até 2010, o fosso, em termos de utilização da Internet, que separa do resto da sociedade os grupos em risco de exclusão, nomeadamente idosos e pessoas com deficiência.
Tendo também em conta este compromisso europeu, a proposta dos peticionários deve merecer a nossa melhor atenção.
O Partido Socialista considera que tem a responsabilidade política de dar continuidade ao ciclo que esta petição desencadeou e cuja primeira fase termina com este debate.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista assume o compromisso de propor, no início da próxima sessão legislativa, em sede de 12.
a Comissão, a constituição de um grupo de trabalho destinado a produzir uma iniciativa legislativa que seja consentânea com as expectativas dos cidadãos peticionários.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero saudar os 7431 peticionários que nos apresentaram uma petição, que, importa salientar, tem uma complexidade e um grau muito concreto de elaboração e de propostas que não são habituais nas petições. Por isso, importa saudar até o cariz informativo e demonstrativo da tecnologia existente, no que diz respeito à acessibilidade das pessoas com deficiência.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Fica registada a saudação, em nome do Grupo Parlamentar do PCP.
Esta petição tem também aqui um aspecto importante. É que vem chamar a atenção deste Parlamento para o seguinte facto: a evolução tecnológica na Internet, na televisão e nos telemóveis foi de tal ordem que hoje nada justifica a exclusão dos meios informáticos e da tecnologia das pessoas com deficiência e dos idosos.
Portanto, hoje, a tecnologia abre um conjunto de portas para as pessoas com deficiência, seja no âmbito laboral, onde estes trabalhadores encontram ferramentas que lhes permitem estar a par de qualquer outro trabalhador e, assim, combater as suas limitações e serem tão produtivos como qualquer outro trabalhador,
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pelo que importa que essas tecnologias estejam efectivamente acessíveis às pessoas com deficiência, seja no plano cultural e no lazer, que não é de subestimar, antes pelo contrário, onde as pessoas com deficiência encontram, nomeadamente na Internet, uma fonte de acesso à informação muito significativa, que importa salientar e tornar acessível a estas pessoas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — A tecnologia abre, assim, um conjunto de portas que não podemos fechar.
Infelizmente, há um conjunto de mecanismos — e começo pelas páginas da Internet — que continuam inacessíveis às pessoas com deficiência, nomeadamente aos cegos e amblíopes, que, muitas vezes, não têm acesso a muitas páginas da Internet, a começar pelas páginas do próprio Governo, com informação relevante para as pessoas com deficiência.
A Sr.ª Paula Nobre de Deus (PS): — Oh, Sr. Deputado!...
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Reconhecendo que foi feito algum esforço relativamente a esta matéria, importa concluir esse esforço já feito e tornar todos os sítios do Governo e da responsabilidade do Governo, na Internet, acessíveis às pessoas com deficiência, para que tenham acesso a essa matéria.
Mas há um outro plano que importa salientar. É que o Governo tem de dar o exemplo, mas, do ponto de vista legislativo, também tem de o impor às restantes entidades privadas.
A Internet já foi aqui referida, mas há outros âmbitos em que o Governo tem de intervir. Assim, não tem qualquer cabimento que os programas informáticos hoje feitos não tenham acessibilidade às pessoas com deficiência. O Governo tem uma palavra a dizer.
No que diz respeito à televisão, importa referir que, na televisão digital, em que recentemente foram dados passos significativos, está criado um conjunto de condições tecnológicas para permitir, por exemplo, a legendagem automática, o alargamento da língua gestual, a audiodescrição e outras soluções tecnológicas que têm de ser implementadas.
Portanto, importa que o Governo dê o exemplo. A Assembleia da República, por iniciativa do PCP, tem, aquando da transmissão da nossa sessão plenária, intérpretes de língua gestual, tornando-a acessível às pessoas com deficiência. Importa alargar esta realidade a mais programas de televisão.
Depois, relativamente ao multibanco, também há muita matéria onde se pode avançar, no que diz respeito às acessibilidades.
Para concluir, no que diz respeito aos telemóveis, importa referir que as licenças de terceira geração dadas exigiam contrapartidas aos operadores que não foram controladas ou fiscalizadas. Vamos, por isso, apresentar um requerimento no sentido de controlar quais os projectos com que as operadoras se comprometeram que avançaram e qual o público-alvo que atingiam no que diz respeito à acessibilidade das pessoas com deficiência, porque, efectivamente, esta era uma das contrapartidas para a cedência das licenças de terceira geração, que nunca foi implementada.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me que comece por saudar os peticionários, primeiro, pela importância desta petição, segundo, porque também foi um conjunto de peticionários que, há alguns anos, em 1998, com uma petição semelhante, «forçou» o Governo a fazer a primeira resolução nesta matéria e, terceiro, porque penso que os peticionários conseguiram hoje um momento histórico no Plenário do nosso Parlamento: é a primeira vez que, nos termos da lei, e bem, se fazem acompanhar por cães-guia ao Plenário do Parlamento.
Estamos perante o cumprimento de disposições nacionais e comunitárias que julgo que o Plenário tem de saber registar, porque é um sinal da inclusão e do cumprimento das leis que o próprio Parlamento tem levado
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a cabo. Por conseguinte, gostaria de, em nome da bancada do CDS, mas também em meu nome pessoal, dirigir a estes peticionários uma saudação muito especial.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, se a igualdade enquanto valor absoluto é uma utopia, o combate às desigualdades não é uma utopia, é uma realidade e é uma possibilidade em que todos temos de nos empenhar permanentemente.
Estamos hoje, aqui, para saber se vários dos nossos concidadãos têm ou não o direito de participar plenamente na sociedade de hoje, que é uma sociedade de informação. Dizem-nos os dados dos últimos censos que cerca de 20% dos portugueses podem ter entraves seríssimos a participar na sociedade de hoje, do século XXI, que é uma sociedade, acima de tudo, assente no fenómeno da comunicação.
O que os peticionários nos pedem, o que exigem de nós, é que seja possível criar mecanismos que lhes permitam comunicar na Internet, na televisão, nas comunicações electrónicas, nos programas informáticos e até em matérias tão simples como o acesso a uma caixa de multibanco ou a uma máquina de venda automática.
Penso que, nos últimos tempos, o Parlamento tem estado na primeira linha do combate às desigualdades e na luta pela inclusão, sendo que há um conjunto de exemplos felizes que temos de saber registar, como o caso já aqui hoje falado sobre a rotulagem dos preços, uma questão que é muito importante, e a decisão inédita que a direcção do Canal Parlamento tomou de ter uma transmissão em directo com linguagem gestual, são sinais positivos desta inclusão.
Creio que temos de pôr a mão na consciência e reconhecer que muito há a fazer. Mas muitas vezes, o muito que há a fazer não passa só pela imposição de legislação. Relembro o caso, já hoje referido, da Lei da Televisão, que obriga todos os operadores televisivos a terem uma percentagem significativa das suas emissões com transmissão para pessoas com necessidades especiais mas, depois, não há cumprimento dessa lei, principalmente no canal público, como há pouco tempo vimos no relatório da Entidade Reguladora para a Comunicação Social.
Por isso mesmo, entendemos que o Parlamento tem de estar sempre atento à componente legislativa (que é uma das suas primeiras obrigações), mas também tem de estar muito atento à componente de fiscalização da legislação que vamos produzindo.
Por conseguinte, penso que é essencial reforçarmos, quer em sede de 12.ª Comissão, quer em sede de Plenário, o aspecto do cumprimento desta legislação que vamos produzindo e sobre a qual muitas vezes não temos o retorno.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em primeiro lugar gostaria de saudar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», os 7431 peticionários e também aqueles que entenderam assistir à sessão plenária onde esta petição está a ser discutida, com o objectivo, certamente, de ouvir o que os diferentes grupos parlamentares têm a dizer sobre esta matéria.
Resumidamente, esta petição exige que os cidadãos com necessidades especiais não sejam infoexcluídos.
Este é o grande objectivo desta petição. No fundo, pretende-se que lhes seja garantida a acessibilidade electrónica e que lhes seja facultada a utilização de todos os meios de modernização tecnológica possíveis.
Foi interessante assistir a este debate e à forma como todos os grupos parlamentares se associaram a estes objectivos, e aproveito para dizer que Os Verdes se associam também aos objectivos presentes nesta petição, a qual teve o grande mérito (ouvida a intervenção do Partido Socialista) de produzir um compromisso concreto por parte da maioria parlamentar no sentido de que, no início da próxima sessão legislativa, a Assembleia da República avançará com um processo legislativo relativamente ao conteúdo da petição em apreço.
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Isto é positivo. Associamo-nos, pois, claramente a este objectivo, mas não sem antes chamar a atenção para o facto de que muitas vezes legislar não é suficiente, embora seja preciso dar esse passo, certamente.
A este propósito, gostaria de relembrar alguns exemplos sobre os quais há legislação mas relativamente aos quais essa legislação não é cumprida, o que significa que, na prática, não são garantidos os direitos dessas pessoas com necessidades especiais.
Todos os Srs. Deputados se lembram de ter ouvido falar inúmeras vezes, neste Plenário, da questão da eliminação das barreiras arquitectónicas na Assembleia da República. Há legislação específica que obriga, designadamente as entidades públicas, à eliminação das barreiras arquitectónicas. Quantas existem ainda hoje, Srs. Deputados? O que é que se fez? «Deu-se a volta» à legislação. Mas assim é batota! Assim não vale!... Ou queremos garantir direitos ou, então, não vale a pena andarmos com pretensas legislações, que depois não são cumpridas.
Outro exemplo referido hoje nesta Câmara prende-se com a obrigatoriedade, a necessidade absoluta de o serviço público de televisão, não só mas fundamentalmente, garantir a existência de língua gestual, para que um conjunto de nossos concidadãos possa ter acesso a todo o tipo de programas.
Têm-se dado «passos de caracol» relativamente a esta matéria. Primeiro que esta matéria integrasse a legislação de uma forma mais clara, foi uma «dor de cabeça», aqui, na Assembleia da República!...
Há mais de 10 anos que Os Verdes falam sobre esta matéria, tendo apresentado inúmeras propostas concretas. Mas a questão é que, mesmo havendo legislação, ela depois não é cumprida na íntegra e esses concidadãos ficam afastados do direito objectivo à informação, ao entretenimento e a tudo o que as outras pessoas que não têm estas necessidades especiais podem ter acesso, designadamente através da televisão.
Para terminar, Sr. Presidente, este é o alerta que Os Verdes aqui querem deixar, sendo certo e seguro que participarão com grande sentido de responsabilidade no processo legislativo que a Assembleia da República venha a abrir relativamente ao conteúdo desta petição.
Vozes de Os Verdes: — Muito bem!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos passar, agora, à discussão da petição n.º 362/X (2.ª) — Apresentada pelos Profissionais do Espectáculo e do Audiovisual, solicitando à Assembleia da República a criação de um regime laboral e direitos sociais para o trabalho intermitente. Cada grupo parlamentar dispõe de 3 minutos para a apreciação da mesma.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, esta é uma petição com toda a actualidade. Pese embora se tenha legislado sobre a matéria do trabalho intermitente das artes e do espectáculo, a verdade é que ela matéria de perfeita actualidade, uma vez que o Governo do Partido Socialista fez passar, no ano passado, um diploma onde não resolveu quase nenhum dos problemas com que se confrontam estes profissionais.
Para além de ser subscrita por 4117 cidadãos e cidadãs, esta petição tem o mérito de juntar mais de 10 associações das artes e do espectáculo e dois sindicatos.
Foi criada esta Plataforma para o combate à resposta prometida pelo Partido Socialista nas relações de trabalho destes profissionais, que são relações de trabalho que têm carácter temporário, descontínuo e com projectos de duração limitada. Falamos de trabalhadores que são músicos, actores, profissionais de rádio, televisão, do circo e de todas as artes em Portugal.
Não é compreensível que estes trabalhadores, na sua maioria, trabalhem ainda hoje a recibo verde. Não é compreensível que, numa sociedade onde se deve acarinhar o que é muitas vezes o espelho dessa sociedade, os artistas, estes trabalhadores não tenham protecção no desemprego, não tenham direito a estar doentes, não tenham quaisquer condições de protecção social.
Isto sucede porque o Partido Socialista considerou que tinha de haver um regime específico de protecção social para estes trabalhadores. Dizia, na altura, o Sr. Deputado Jorge Strecht: «Haverá harmonicamente um regime de segurança social». Mas, Sr.as e Srs. Deputados, até hoje não há harmonia de espécie alguma. A
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situação continua exactamente igual: os profissionais das artes e do espectáculo em Portugal continuam a trabalhar a recibos verdes e continuam sem qualquer protecção ao nível dos direitos básicos.
A lei que saiu não tratou de problema nenhum. Em primeiro lugar, não englobou todos os profissionais e deixou de fora uma fatia importante de profissionais que laboram nesta área. Em segundo lugar, criou uma grande confusão em matéria de direitos de autor e direitos conexos ao pretender tratar, numa legislação laboral, um problema que não decorre desta legislação. Em terceiro lugar, não tratou do problema maior.
Gostaríamos de saudar os peticionários pela actualidade do objecto da petição e pela luta que têm vindo a desencadear, luta com a qual o Bloco de Esquerda está absolutamente de acordo com vista à protecção destes trabalhadores.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Antunes.
O Sr. Fernando Antunes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a petição que hoje apreciamos solicita à Assembleia da República a criação de um regime laboral adequado às especificidades do sector do cinema, do teatro, da música, da dança e de outras artes do espectáculo.
Esta petição deu entrada na Assembleia da República em 24 de Abril de 2007, cerca de dezassete dias antes da discussão, na generalidade, das iniciativas legislativas do PCP, do BE e do Governo cujo objecto era precisamente o regime dos contratos de trabalho dos profissionais deste sector.
Aproveito para salientar, neste momento, a colaboração empenhada destes peticionários no processo legislativo referido, representados pela Plataforma dos Intermitentes, constituída por um conjunto de organizações que participaram em audiências e forneceram documentos de trabalho que em muito aproximaram os grupos parlamentares às suas realidades laborais e às suas reivindicações.
A Plataforma realizou um trabalho exaustivo quer de caracterização da situação laboral do sector e suas especificidades quer de sugestão de enquadramentos legais e demais propostas.
Saúdo, pois, os peticionários, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, pela sua participação activa.
Do processo legislativo anteriormente referido resultou a Lei n.º 4/2008, que poderia ter respondido às solicitações dos peticionários. Infelizmente, tal não aconteceu. Deste modo, estes, na audição de 8 de Abril de 2008, confirmaram a actualidade da presente petição, por não se encontrarem resolvidos os problemas nela identificados.
A votação final global da proposta do Governo deixou expressa a falta de consenso social mínimo e as insuficiências do diploma: insuficiências no âmbito, falhas nos conceitos fundamentais e ausência de regime de protecção social.
Desde há vários anos que o sector das artes do espectáculo e do audiovisual reclama a criação de um estatuto profissional.
Desde há vários anos que o sector das artes do espectáculo e do audiovisual reclama a criação de um estatuto profissional. Infelizmente, a maioria socialista acompanhou o Governo numa atitude de indiferença pelo contexto social que envolve este sector.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Fernando Antunes (PSD): — Pesem, embora, as alterações introduzidas em sede de especialidade, a Lei n.º 4/2008 não apresenta qualquer solução para a intermitência da actividade dos trabalhadores e nada acrescenta em matéria de regime de segurança social.
O PSD considera também que o âmbito deste regime deveria ser mais abrangente, aplicando-se aos profissionais do sector das artes do espectáculo e do audiovisual — actividades artísticas e técnicas — e não apenas a algumas actividades artísticas.
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As inúmeras manifestações públicas de descontentamento, promovidas pela generalidade dos agentes artísticos e profissionais do sector, para quem esta lei se dirige, demonstram a ineficiência prática desta lei e a falha dos objectivos que presidiram a todo este processo.
Passados oito meses sobre a aprovação desta lei, o Governo continua a falhar com o compromisso de apresentar o regime de segurança social, previsto no artigo 21º. O PSD teve ocasião de questionar o Sr.
Ministro da Cultura sobre este facto e a resposta foi: «Não tenho ideia de que estejamos perto de encontrar uma solução, porque o objectivo do Governo tem sido o de eliminar excepções e fazer regimes uniformes».
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Fernando Antunes (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Passado mais de um ano da entrega desta petição e passado o processo legislativo acima descrito de forma sucinta, as pretensões dos peticionários continuam sem resposta.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me, antes de mais, cumprimentar os peticionários e saudar a importância e a actualidade desta mesma petição.
Gostava de começar por relembrar o projecto de resolução n.º 48/X, do CDS, que propunha a criação de um regime laboral, fiscal e de protecção social, específico dos trabalhadores das artes e espectáculos.
E porque é que nós propúnhamos isto em sede de projecto de resolução? Porque sempre advogámos que era urgente e necessária a reunião das três vontades dos ministérios directamente interessados e envolvidos — quer do Ministério da Cultura, quer o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, quer o Ministério das Finanças —, na resolução e tentativa de se encontrar uma solução comum para um conjunto de problemas, que são muito específicos, destes trabalhadores.
Já aqui foi relembrado o processo legislativo que levou à criação da Lei n.º 4/2008, de 7 de Fevereiro, e todos nós nos lembramos de que o próprio Partido Socialista, nesta Assembleia da República, teve os maiores conflitos internos.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Na Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, o Partido Socialista considerava necessário fazer a revisão global do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos; na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, o Partido Socialista considerava que tinha de se fazer uma solução parcial, encaixando na lei do regime profissional dos trabalhadores a revisão do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Portanto, daqui logo se percebe que a criação deste regime específico, no caso do direito de autor, foi a criação de um regime anacrónico e muito desajustado à realidade e à necessidade destes mesmos trabalhadores.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Pior: na altura, o Partido Socialista, quer em comissão parlamentar, quer pela voz do Governo, assumiu a promessa pública de rapidamente criar um regime específico de segurança social. E a verdade é que, até hoje, esse regime não apareceu.
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O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Se, porventura, estivéssemos a falar de um grupo profissional que pudesse cortar o País a meio ou bloqueá-lo, certamente que o Governo já tinha resolvido o problema; mas como, infelizmente, estamos a falar de um conjunto de profissionais que não têm, tantas vezes, essa força e esse poder negocial, o Governo mantém-se sempre na mesma, não dando soluções e, acima de tudo, não honrando sequer a sua palavra, perante o Plenário da Assembleia da República, perante os Deputados da maioria e perante os portugueses.
Por isso mesmo, para nós, a solução tem de ser, mais uma vez, uma solução específica para estes trabalhadores. É que estamos a falar de problemas que são, no caso do mundo de trabalho destes trabalhadores, muito específicos. Por exemplo, o problema da segurança social e dos tempos de desconto e dos tempos de trabalho que estes trabalhadores têm; como é que se pode fazer essa contabilização, quando, muitas vezes, estes trabalhadores trabalham durante um período do ano e, no restante período, não estão a trabalhar; também o problema dos tempos de trabalho e dos horários de trabalho; também o problema do seu regime específico laboral; mas também outros problemas para que o CDS, em devido tempo, alertou e apontou, como, por exemplo, o regime fiscal e, mais uma vez, a solução anacrónica do direito de autor e dos direitos conexos.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar por saudar os 4117 peticionários, subscritores desta petição, alguns dos quais se encontram presentes nas galerias a assistir a esta discussão.
Gostava de começar por referir, como, aliás, já aqui foi dito, que esta petição foi entregue no dia 24 de Abril de 2007 e, quase um ano depois, no dia 8 de Abril de 2008, os peticionários, quando foram ouvidos na Assembleia da República, confirmaram a sua actualidade. E confirmaram-na porque, apesar de ter decorrido, entretanto, um processo legislativo que conduziu à aprovação da Lei n.º 4/2008, os problemas que cá os trouxeram e que motivaram esta petição continuam hoje por resolver.
Trata-se, neste caso, de trabalhadores afectados por uma situação de grande instabilidade profissional e também por uma situação de desprotecção social. Trata-se de trabalhadores afectados pela instabilidade da sua actividade profissional, pela fragilidade que decorre do carácter temporário, descontínuo e intermitente da sua prestação de trabalho e também por horários desregulados. Trata-se de trabalhadores empurrados para a contratação ilegal através dos recibos verdes, como se fossem prestadores de serviços, quando, na realidade, são trabalhadores por conta de outrem e que, por isso, não têm acesso a prestações sociais indispensáveis, como a protecção no desemprego, na doença, na invalidez ou na maternidade.
A verdade é que, em 10 de Maio de 2007, esta Assembleia discutiu, por iniciativa do PCP, uma série de diplomas que pretendiam resolver este problema, entre os quais uma proposta de lei que acabou por ser aprovada pelo Partido Socialista e que não resolveu o problema.
No dia 10 de Maio de 2007, a então Ministra da Cultura, hoje Deputada do Partido Socialista, a Sr.ª Deputada Isabel Pires de Lima, dizia: «Este Governo prometeu, este Governo cumpre». E a verdade é que este Governo prometeu, mas não cumpriu.
O regime laboral que foi aprovado não resolveu os problemas destes trabalhadores, como, aliás, resulta bem da insistência dos peticionários para que a petição fosse discutida, porque, de facto, mantém toda a sua actualidade.
Vozes do PCP: — Exactamente!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Nesse debate do dia 10 de Maio, o Sr. Secretário de Estado da Cultura dizia que, primeiro, era preciso aprovar um regime laboral para que, depois, fosse aprovado um regime da segurança social, para que estes trabalhadores vissem o seu problema resolvido. E dizia esse Sr. Secretário
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de Estado: «Além disso, em sede de concertação social com os parceiros sociais, o Ministério do Trabalho comprometeu-se a entregar, até ao fim deste ano, o regime da regulamentação das profissões de desgaste rápido».
Neste caso, o Governo prometeu e também não cumpriu, porque, mais de um ano depois desta discussão, quase seis meses depois de a lei ter sido aprovada, continuamos sem ter regime de segurança social. Estes trabalhadores continuam desprotegidos, apesar de a sua situação profissional não ter sido alterada em rigorosamente nada, porque o regime laboral imposto pelo Partido Socialista nesta Assembleia da República não resolveu um único dos problemas que existiam e contribuiu, sim, para agravar alguns outros que existiam para aqueles trabalhadores que já tinham contratos estáveis.
Portanto, os problemas que motivaram os trabalhadores intermitentes a realizar e a subscrever esta petição e a trazê-la à Assembleia da República mantêm-se, hoje. Esses trabalhadores exigem uma resposta e é preciso que desta vez o Governo, que prometeu, cumpra.
O PCP cumprirá, certamente, e voltará a apresentar as soluções que são necessárias para resolver os problemas destes trabalhadores. Esperemos que o Partido Socialista esteja disponível para, de uma vez por todas, os resolver.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.
O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Ecologista «Os Verdes» gostaria também de saudar os peticionantes da petição n.º 362/X (2.ª), apresentada pela Plataforma dos Trabalhadores Intermitentes, que congrega 15 associações destes profissionais, trabalhadores dos espectáculos, e que foi apresentada em 24 de Abril de 2007. Por esse facto, essa petição poderia ter perdido algum sentido com o posterior processo legislativo, que teve lugar por iniciativa do PCP, contando com uma proposta de lei, um projecto de lei do Bloco de Esquerda e um projecto de resolução do CDS-PP, para além do projecto de lei do PCP, como é óbvio, que foram discutidos em conjunto e que deram origem à Lei n.º 4/2008.
Infelizmente, por exclusiva culpa do Governo e do Partido Socialista, esta petição mantém a sua razão de ser praticamente integral. Porquê? Porque o Partido Socialista, em sede de especialidade e de votação final global, fez aprovar sozinho uma lei que deita fora as propostas dos outros grupos parlamentares mas que, principalmente, não responde às necessidades destes trabalhadores das artes do espectáculo.
Como os próprios, em audição ocorrida em Abril último, referiram aqui, no Parlamento, o Partido Socialista sozinho fez aprovar um regime que exclui boa parte destes trabalhadores — os técnicos das artes performativas ao vivo ou em produção televisiva. Não se compreende, não se pode aceitar que cenógrafos, aderecistas, operadores de câmara, de som, de luz, directores de fotografia, carpinteiros de cena, etc., sem os quais os espectáculos simplesmente não existem, não acontecem, fiquem de fora do âmbito de uma lei deste género.
Trata-se de uma lei que falece em compreender cabalmente o conceito de intermitência em todas as suas dimensões.
Todos concordamos em que seria preciso um contrato de trabalho adaptado à realidade destes trabalhadores, que desse alternativa à solução — à má solução — dos recibos verdes, que continua em força neste sector, sonegando elementares direitos laborais e de protecção social. Mas o Governo ainda não compreendeu, por exemplo, a intermitência de quem labora, com frequência, com contratos por poucos meses, mudando permanentemente de projectos e de empregadores numa transumância natural para muitos artistas não residentes.
Mas, como é óbvio, a mais grave, a mais gritante, aquela que, pelo menos, era uma das principais, se não principal, reivindicação — o principal problema a resolver e o que perpetua o recurso a recibos verdes — é a ausência de protecção social, de um regime de segurança social adequado a estes trabalhadores, que lhes permita descontar apenas quando estão em trabalho efectivo, com regras específicas e próprias, para que estes trabalhadores tenham direito a protecção, em situação de desemprego, maternidade e doença. E, a isso,
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este projecto de lei não responde. A isso o Governo do Partido Socialista e a bancada parlamentar do Partido Socialista ainda não responderam e continuamos à espera que responda.
Por isso mesmo, mantém-se plenamente actual esta petição, mantêm-se plenamente actuais as propostas que o resto da oposição apresentou relativamente a esta matéria e que terão de, rapidamente, voltar a ser discutidas para alterar e corrigir este gravíssimo problema social.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos a petição n.º 362/X (2.ª), entregue pela Plataforma dos Trabalhadores Intermitentes e subscrita por mais de 4000 cidadãos, que, assim, têm o direito de ver a sua pretensão também discutida em Plenário.
O objecto da petição é a criação de um regime laboral e direitos sociais para o trabalho intermitente, através de um regime específico para os profissionais deste sector, preenchendo um vazio legal, na opinião dos subscritores.
Em relação ao regime laboral, foi no pressuposto desta mesma necessidade, isto é, da necessidade de um regime laboral específico para a actividade artística, que o Governo apresentou a esta Câmara a proposta de lei n.º 132/X. A referida proposta de lei visava o regime dos contratos de trabalho dos profissionais de espectáculos, organizar melhor a relação laboral destes profissionais, dando mais viabilidade aos contratos de trabalho dos artistas, com vista a que o contrato de trabalho se torne a regra da relação laboral e não a excepção.
Partindo da proposta inicial do Governo, esta Assembleia introduziu diversas modificações, aliás já aqui salientadas, as quais, creio, certamente melhoraram o texto final, aceitando diversos contributos das entidades ouvidas — nomeadamente a Plataforma dos Trabalhadores Intermitentes, entidade autora desta petição —, e desde logo o importante conceito da presunção da existência de contrato de trabalho, visando facilitar essa mesma presunção.
Do processo legislativo resultou a Lei n.º 4/2008, que permite que a actividade dos artistas passe a ser regulada por um contrato de trabalho especial. Adequou-se a actividade dos profissionais de espectáculos, em matéria laboral, a um regime mais adaptado ao seu estatuto, à crescente mobilidade nacional e internacional dos artistas, à diversidade das actuações e dos projectos, enfim, a uma dinâmica que existe no mundo do espectáculo, em diversos aspectos muito e muito diferente de outro tipo de actividade.
Uma intermitência que, como referem, e bem, na própria petição, é da própria natureza das suas profissões e onde os projectos são de duração limitada, efémera, que têm uma carga horária irregular e implicam a alternância de períodos de trabalho intenso com períodos de menor actividade.
Foi tendo em conta esta realidade, descrita pelos peticionários, que foi aprovada a Lei n.º 4/2008, regulando os regimes de contrato de trabalho dos profissionais de espectáculos, permitindo a celebração de contratos de trabalho a termo resolutivo, certo ou incerto, ou por tempo indeterminado. Neste último caso, as partes podem acordar na sua sujeição ao exercício intermitente dessa prestação de trabalho.
Do que se tratou foi de encontrar formas contratuais adaptáveis e aplicáveis à especificidade dos artistas.
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
Vejamos, agora, a questão da segurança social.
Foi sempre dito que para avançar com um novo regime de segurança social aplicável aos artistas era necessária a legislação que os enquadrasse em termos laborais. E esse primeiro passo está dado. O Governo comprometeu-se a aprovar, em diploma próprio, o regime de segurança social aplicável aos trabalhadores de espectáculos. E é isso o que vai fazer.
Devo recordar que a Assembleia da República discutiu, em Maio de 2007, um projecto de resolução que recomenda ao Governo que, até final da Legislatura, crie os regimes especiais necessários para promover o
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enquadramento laboral e de protecção social — repito: até ao final da Legislatura. É este o compromisso do Governo e é também este o nosso compromisso.
Sabemos que continuam a decorrer trabalhos para a elaboração da nova legislação, numa área em que devem ser acautelados, por um lado, os direitos dos artistas e, por outro, a necessária garantia de equidade a que todos devemos estar vinculados, mas queremos que o carácter de necessidade absoluta e de urgência da protecção social destes profissionais esteja permanentemente presente em todos os passos que se seguirão.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, concluímos o debate da petição n.º 362/X (2.ª), pelo que passamos à apreciação da petição n.º 435/X (3.ª) — Apresentada por Sandra Cristina Andrade Carvalho e outros, solicitando à Assembleia da República que desencadeie acções tendentes a acabar com os falsos recibos verdes na Administração Pública.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é mais uma petição que deixa transparecer o escândalo que é a precariedade em Portugal.
De facto, temos, hoje, um país com mais de 1,8 milhões de pessoas a trabalhar na mais vil das precariedades. E não é apenas a precariedade do trabalho, é a precariedade na vida, é a precariedade completa. São vidas adiadas, vidas sem nenhuma estabilidade.
Os movimentos que surgiram em torno da defesa do trabalho estável e contra os recibos verdes tiveram o mérito de trazer para o País, para a comunicação social, uma realidade muito escondida em Portugal. E, de facto, ganharam essa batalha. Hoje, todas as pessoas sabem o que significa um falso recibo verde. Um falso recibo verde é uma falsa vida a prazo, é uma falsa carreira, é uma carreira «verde», que não existe.
No Estado, há 117 000 precários. O Estado «põe a cabeça na areia» e diz que não se passa nada. O Sr.
Ministro das Finanças, hoje de manhã, dizia que, lá para o Orçamento de 2009, há-de fazer uma aferição, no sentido de saber quais são os trabalhadores e trabalhadoras que estão no Estado e configuram falsos recibos verdes. O Governo parece não querer reconhecer nem dar o exemplo na sua própria casa.
O Governo, ainda recentemente, rescindiu contratos com trabalhadores avençados, que trabalhavam há mais de três anos, por exemplo, no Instituto de Meteorologia; o Governo mantém trabalhadores a recibo verde nas actividades de enriquecimento curricular; o Governo mantém arquitectos a trabalhar de graça; o Governo mantém psicólogos nos hospitais a trabalhar de graça. O Estado deveria dar o exemplo! E já nem falo na iniciativa Novas Oportunidades e no escândalo que têm sido os centros Novas Oportunidades, com trabalhadores e trabalhadoras a recibos verdes.
Vozes do BE: — Exactamente!
O Sr. Luís Carloto Marques (PSD): — É verdade!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Essas é que são as novas oportunidades!…
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Esta petição tem toda a actualidade, este debate está longe de estar terminado.
Um país que não dignifica a juventude, a geração mais qualificada de sempre, é um país, também ele, adiado.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — O Governo do Partido Socialista tem essa obrigação.
Saúdam-se, pois, os peticionários e todos os movimentos e sindicatos que têm trazido para a ribalta o escândalo que são os falsos recibos verdes.
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Este Governo e este Partido Socialista têm a obrigação de dar, hoje, aqui, um sinal e de assumirem as suas responsabilidades no combate à precariedade.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para uma intervenção, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Pedro Quartin Graça.
O Sr. Pedro Quartin Graça (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os signatários da petição n.º 435/X trazem à Assembleia da República a temática dos falsos recibos verdes. Trata-se de um assunto da maior importância e que tem vindo a merecer o interesse e o pronunciamento por parte das diversas forças políticas, sendo que o Grupo Parlamentar do PSD não se furtou, desde o início, a esse debate, tendo-se, aliás, manifestado bem cedo quanto a esta matéria. Eu próprio, pelo menos em duas ocasiões, neste Plenário, abordei esta temática, quer em perguntas ao Sr. Ministro do Trabalho, quer no debate de urgência sobre matéria laboral, da iniciativa do PCP.
É verdade que os falsos recibos verdes têm vindo a minar as relações de trabalho existentes em vários sectores da sociedade portuguesa, designadamente na Administração Pública, pela situação de instabilidade e desigualdade que criam junto dos referidos trabalhadores.
É também verdade que, de forma a ir ao encontro dos milhares de pessoas que são contratadas para exercer funções em entidades no regime de falsos recibos verdes, importa ouvir, da parte do Governo, respostas concretas a questões como aquelas que foram colocadas pelos signatários da petição, ou seja, em primeiro lugar, se o Governo está disponível para regularizar todas as situações relativas aos trabalhadores que usam falsos recibos verdes, no âmbito da Administração Pública, convertendo estas situações em contratos de trabalho e, em segundo lugar, se o Governo pretende criar, como nós próprios já havíamos questionado, sem obter resposta é certo, um mecanismo expedito, no âmbito da administração fiscal, que permita que a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) passe a dispor de informação sobre as empresas que contratam serviços contra recibo verde de forma a permitir que a ACT possa incluir as referidas empresas nas acções de fiscalização previstas na sua planificação anual.
Mas também e, em terceiro lugar, a necessidade de serem criados mecanismos rápidos relativamente à possibilidade de denúncias, junto da ACT, de situações em que existem falsos recibos verdes, que é uma reivindicação que se nos afigura justa e relativamente à qual aguardamos que o Governo se pronuncie.
Tudo isto não pode, todavia, esquecer uma realidade: a de que os recibos verdes têm de continuar a existir, porquanto os mesmos são indispensáveis para titular um conjunto de actividades desenvolvidas por profissionais liberais.
Assim, será interessante saber a forma como o Governo irá proceder, do ponto de vista legal, para distinguir a contratação e a precariedade ilegais de formas legais e absolutamente necessárias de contratação, como aquelas que em vários cenários o mercado exige.
Em suma, o assunto que motivou a apresentação da presente petição tem total pertinência e merece ser discutido por esta Assembleia de forma a poderem ser aperfeiçoados os mecanismos legais, tendendo-se à fiscalização de uma realidade que persiste em criar situações de fragilidade nas relações laborais em Portugal.
Esperamos que o Código do Trabalho – tivemos informação que acabou de dar entrada nesta Assembleia – possa, de alguma forma, responder a estes anseios.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Depois de termos discutido a petição relativa aos trabalhadores intermitentes, que traz para a Assembleia da República um dos aspectos mais graves da precariedade existente em Portugal, esta petição alerta para os falsos recibos verdes, contextualizando na questão da precariedade que os ultrapassa claramente.
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Efectivamente, o trabalho precário é uma praga a nível nacional. Hoje, a vida de milhares e milhares de trabalhadores – a grande maioria deles jovens trabalhadores – é também precária devido ao trabalho precário.
São a estabilidade familiar, o futuro e as perspectivas de futuro que estão claramente comprometidas com a existência de vínculos precários que limitam a sua vida e as expectativas de criarem família, de comprarem uma casa, de terem uma vida com o mínimo de estabilidade e de dignidade que merecem.
Portanto, actualmente, o trabalho precário é uma praga que merece um combate eficaz por parte do Governo. Os recibos verdes são uma parte do problema.
Hoje, o trabalho precário passa pelo outsourcing cada vez mais utilizado, nomeadamente na Administração Pública; passa pelo trabalho temporário, que é presentemente um dos mecanismos mais importantes para admitir trabalhadores com cariz precário para prestarem serviços a outras empresas e, assim, perpetuar o seu trabalho precário; passa pelos falsos contratos a termo, que subsistem. É muito preocupante o cenário que existe quer no sector privado quer no sector público.
E, aqui, já foi feita uma referência ao Código do Trabalho. Ora, o Código do Trabalho não vem responder a esta preocupação central. Nem o Código do Trabalho nem a legislação laboral para a Administração Pública resolvem este problema.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Pelo contrário, o Código do Trabalho vem legalizar o falso recibo verde, instituindo uma taxa, um pagamento para a segurança social, criando a ideia, na prática, de que com o pagamento à segurança social aquele trabalho está legalizado e, por isso, é legítimo contratar a recibo verde.
Vozes do PCP: — Exactamente!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Portanto, vem perpetuar o trabalho precário.
Alertando para um problema extremamente preocupante, infelizmente os peticionários não encontraram, neste Governo do Partido Socialista, qualquer resposta para esta praga social que é o trabalho precário.
Efectivamente, já nesta sessão legislativa, o PCP apresentou um pacote de iniciativas relativamente ao combate ao trabalho precário, dentro e fora da Administração Pública, nos sectores privado e público, com o reforço dos meios da inspecção, com medidas legislativas que visavam combater o trabalho precário.
Infelizmente, todas estas medidas e propostas que o PCP apresentou foram chumbadas pela maioria do Partido Socialista.
Quanto ao sector Estado, importa também referir, uma vez que a petição centraliza as questões da precariedade na Administração Pública, que o Sr. Ministro comprometeu-se a rever, no Orçamento do Estado para 2009, as contratações a recibos verdes na Administração Pública. Mas, citando um exemplo que já aqui foi referido, pergunto: o que é que o Governo pretende fazer a estes recibos verdes? O mesmo que fez no Instituto Nacional de Meteorologia, onde 40 trabalhadores que trabalhavam neste Instituto há mais de três anos, em trabalho subordinado, foram dispensados porque estavam a recibos verdes? É este o fim que o Governo destina a estes milhares de trabalhadores a recibo verde,…
A Sr.ª Ana Drago (BE):— Exactamente!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — … em vez de passar pela sua legalização e regularização?
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.
Na Administração Pública existe uma outra praga, a do outsourcing e utilização de empresas de trabalho temporário dentro da Administração Pública, o que é bem revelador do trabalho que o PS está a fazer na desregulamentação das relações laborais e na imposição de trabalho precário também na Administração Pública.
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Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Miguel Laranjeiro.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje a petição n.º 435/X (3.ª), subscrita por mais de 5200 cidadãos, que pretendem que a Assembleia da República desencadeie acções tendentes a acabar com os falsos recibos verdes na Administração Pública.
Trata-se de uma petição que saudamos, bem como a todos os seus subscritores.
O combate à precariedade laboral constitui um dos aspectos centrais da acção política do Governo e do Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Recordo que a proposta de revisão da legislação laboral tem desde o início, na sua matriz, uma marca no combate à precariedade, em particular no combate aos falsos recibos verdes, que é uma das formas mais visíveis de precariedade no mercado laboral português.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Bem lembrado!
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — A diminuição do limite máximo da duração dos contratos a termo, a diferenciação da taxa social única ou a alteração significativa dos critérios da presunção da existência de uma relação laboral subordinada são disso exemplo.
Tratam-se, aliás, de exemplos das propostas que o Governo fez em sede de concertação social com vista à diminuição da precariedade laboral, assumindo o mais importante combate contra os falsos recibos verdes de que há memória.
A necessidade do reforço da capacidade de intervenção da Autoridade para as Condições do Trabalho, que é também objecto da petição que hoje discutimos, vai ao encontro dos objectivos do Governo que promoveu o maior concurso de há longos anos a esta parte para 100 novos inspectores de trabalho.
Lembro que na audição com os representantes dos peticionários foi referido como positivo o impulso político que o Governo está a dar em matéria de combate à precariedade laboral, concretamente no debate da proposta do Código do Trabalho.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista apoiará sempre todas as medidas tendentes a diminuir a precariedade laboral, nas empresas privadas e, por maioria de razão, na Administração Pública. O Estado deve ser o primeiro a dar o exemplo e, sejamos rigorosos, nem sempre o fez.
Aquilo que é uma verdadeira prestação de serviço, de tarefa ou avença, deve ser tratado como tal. Se os seus pressupostos não forem respeitados, deve haver então um contrato de trabalho, mediante a legislação em vigor, nomeadamente a Lei n.º 12/A de 2008, que estabelece o regime de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas. A lei determina claramente que, para a satisfação de necessidades permanentes dos serviços, deve proceder-se à constituição de relação jurídica de emprego por tempo indeterminado. Trata-se da mesma legislação que introduziu fortes restrições ao recurso aos contratos de prestação de serviços.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças já anunciou nesta Casa, hoje de manhã mesmo, que no próximo Orçamento do Estado existirão mecanismos para desenvolver auditorias em todos os serviços da Administração Pública de molde a detectar falsos recibos verdes e com penalizações para os responsáveis que convivam e promovam essa situação, podendo mesmo constituir causa de destituição.
Será introduzida uma norma que vai determinar a abertura de concursos para recrutamento de trabalhadores por tempo indeterminado ou a termo quando, das auditorias realizadas, se conclua da existência de prestação de serviços para prestação de trabalho subordinado.
Em síntese, as situações em que existir uma relação subordinada de trabalho têm de pressupor um contrato de trabalho e não um recibo verde. É assim que vai acontecer. Com clareza, igualdade, equidade, com justiça sobretudo para muitos trabalhadores que verão a sua situação clarificada.
A precariedade ou a ilegalidade laboral terão um forte combate por parte do Governo e do Partido Socialista.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
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O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — A terminar, Sr. Presidente, direi que a posição do Governo ficou clara através das intervenções dos responsáveis governamentais, dando orientações aos serviços que tutelam e responsabilizando os seus dirigentes. É clara a determinação do Governo nesse combate e a posição do Partido Socialista nesta matéria, que hoje aqui reiteramos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de mais, começo por cumprimentar os peticionários, que confrontam o Parlamento com um tema que já foi muitas vezes falado, mas que é, de facto, muito importante, que é o tema dos falsos recibos verdes na Administração Pública.
Este é um tema que nos permite ver, de forma muito directa, como o Partido Socialista se comporta erraticamente em política e a pouca coerência que tem entre os seus discursos na oposição e na maioria.
Quando o Partido Socialista era oposição, ouvimos muitas vezes críticas ferozes relativamente a situações que são sempre, a todos os títulos, condenáveis e lastimáveis; quando o Partido Socialista chega ao governo faz exactamente o contrário.
Atente-se no que hoje está em discussão no Parlamento, que é o regime de contrato de trabalho para funções públicas.
Debaixo de uma capa de uma suposta aproximação entre o regime laboral público e o regime laboral privado, o que o Governo hoje propõe é, tão-somente, esta situação: um trabalhador que, numa empresa privada, tenha um falso recibo verde pode ir a um tribunal, o tribunal dar-lhe-á razão e ele é integrado no quadro permanente dessa mesma empresa, enquanto que, hoje, com o regime que o Governo do Partido Socialista propõe para a função pública, um trabalhador da função pública que tenha um falso recibo verde, vai a um tribunal e é despedido, sem possibilidade de integrar o quadro de trabalho, é liminarmente despedido, sem possibilidade de reconversão do seu contrato de trabalho.
Curiosa ideia de aproximação e de similitude de regimes que o Partido Socialista tem: para os privados tudo, para o Estado nada! É, de facto, uma forma muito curiosa de abordar este problema e de ver quem é que faz e como é que se faz a protecção dos trabalhadores.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Por estes sinais, ficamos, de facto, muito preocupados com a forma como o Governo está a resolver ou a tentar resolver os casos pendentes de falsos recibos verdes na Administração Pública, tratando o que é igual de forma perfeitamente desigual, tratando pessoas com recibos verdes, que são não falsos mas, sim, verdadeiros recibos verdes, em situações em que é o próprio trabalhador que não quer trabalhar permanentemente, sem termo, na função pública, como alguém que é obrigado, porque não tem outra opção, a estar a trabalhar para o Estado só em regime de recibo verde.
Sr. Presidente, como espero que V. Ex.ª me dê os parabéns, tal como ao Sr. Deputado Pedro Quartin Graça, termino por aqui, deixando algum tempo.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Muito obrigado, Sr. Deputado, pela disciplina no uso do tempo.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, em nome do Grupo Parlamentar «Os Verdes», saudar os 5257 peticionários, que trazem à Assembleia da República, através desta petição, uma matéria de absoluta relevância.
De facto, como alguns Srs. Deputados já aqui hoje tiveram oportunidade de dizer, os falsos recibos verdes constituem um dos verdadeiros escândalos que hoje existe na Administração Pública, ainda por cima
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institucionalizado. É a precariedade institucionalizada. Toda a gente sabe que existem — e o Governo sabe-o bem! —, mas não se tomam acções tendentes a acabar com esta falsidade. E isto, na nossa perspectiva, constitui um verdadeiro escândalo.
Já aqui foram falados vários institutos, na dependência, evidentemente, do Governo, mas eu gostava de, mais uma vez, nesta Casa, porque já aqui foi falado por diversas vezes, realçar o escândalo dos centros Novas Oportunidades. Justamente um centro que visa valorizar pessoas para o mercado do trabalho tem nele trabalhadores a recibo verde. As pessoas que lá trabalham, que têm um trabalho continuado de formação, estão a recibo verde, como se lá estivessem por pouquíssimo tempo, numa prestação de serviços. A estas pessoas exige-se exclusividade, o que é um verdadeiro escândalo. E mais: há outros como o Centro de Formação Profissional de Sintra, da responsabilidade do IEFP, que tem atrasos absolutos de pagamento. O pagamento é feito de uma forma completamente irregular.
Ora, face a este quadro, como se consegue perceber que alguém que vive nestas circunstâncias tem alguma segurança na sua vida, pode perspectivar alguma coisa na sua vida? O Governo está sempre — perdoem-me a expressão — a «encher a boca» com o apoio à natalidade.
Como é que alguém consegue perspectivar uma vida familiar nestas condições? Não há possibilidade, Srs. Deputados, e ou encaramos esta situação de uma vez por todas ou, então, continuamos a desgraçar a vida de muitos jovens em Portugal.
Quero também referir que esta é uma matéria de tal modo urgente em termos de resolução que não se compadece com o ritmo que o Governo está agora a propor. «No Orçamento de Estado para 2009, vamos fazer uma auditorias entre os vários serviços, vamos aferir a situação e ver quantas pessoas estão com falsos recibos verdes.». Mas, em relação a isso, já toda a gente sabe. O Estado, num ápice, sabe aquilo que quer no Orçamento do Estado para 2009. E, então, isso é para quê? Para no Orçamento do Estado para 2009 dar uma luz para as eleições de 2009 de que talvez possa vir a resolver o problema?!… Basta de falsidades…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, por favor.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Basta de «encher os olhos» em inúmeras matérias para as eleições. Aquilo que exigimos é a resolução de um problema que toda a gente conhece e queremos saber por parte do Governo como vão resolvê-lo.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, resta-me informar que a sessão plenária de amanhã, com início às 15 horas, será inteiramente dedicada ao debate, anual, sobre o estado da Nação.
Está encerrada a sessão.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS):
Teresa Maria Neto Venda
Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Paulo Martins Pereira Coelho
Carlos Jorge Martins Pereira
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Miguel Pais Antunes
Pedro Augusto Cunha Pinto
Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
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Partido Comunista Português (PCP):
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
Bloco de Esquerda (BE):
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS):
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Partido Social Democrata (PSD):
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares
Umberto Pereira Pacheco
Partido Social Democrata (PSD):
Domingos Duarte Lima
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
João Bosco Soares Mota Amaral
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Pereira da Costa
José Mendes Bota
Luís Miguel Pereira de Almeida
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Miguel de Santana Lopes
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL