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Sexta-feira, 22 de Janeiro de 2010 I Série — Número 24

XI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2009-2010)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 21 DE JANEIRO DE 2010

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 14 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projectos de resolução n.os 57 e 58/XI (1.ª) e do inquérito parlamentar n.º 2/XI (1.ª).
Procedeu-se ao debate conjunto, na generalidade, dos projectos de lei n.os 8/XI (1.ª) — Elimina os mecanismos de aumento do horário de trabalho (PCP), que foi rejeitado, e 117/XI (1.ª) — Altera o Código do Trabalho, no sentido da humanização dos horários de trabalho (BE). Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Jorge Machado (PCP), Luís Fazenda (BE), Carla Barros (PSD), Mário Mourão e João Paulo Pedrosa (PS), Mariana Aiveca (BE), Anabela Freitas (PS), Rita Rato (PCP), Arménio Santos (PSD), Paula Santos (PCP), Maria José Gambôa (PS), Artur Rêgo (CDS-PP), Carla Rodrigues (PSD), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Pedro Mota Soares (CDSPP), Bernardino Soares (PCP) e Jorge Strecht (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 46 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 14 minutos.

Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Defensor Oliveira Moura
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Frederico de Oliveira Castro
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Albano Pereira Marques
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José João Pinhanços de Bianchi
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pereira Ribeiro
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rui Alves Duarte Cruz
João Barroso Soares
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal

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João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Miguel de Matos Castanheira do Vale de Almeida
Mário Joaquim da Silva Mourão
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Miguel da Costa Araújo
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui José Prudêncio
Rui José da Costa Pereira
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Bento Baptista
Victor Manuel Brandão de Sousa Fontes

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Partido Social Democrata (PSD):
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Cãndido Monteiro Cabeleira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Joaquim Almeida Henriques
Arménio dos Santos
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Pedro Correia de Aguiar Branco
José de Almeida Cesário
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
João José Pina Prata
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira

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Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto
Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria Teresa Machado Fernandes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
Altino Bernardo Lemos Bessa
Artur José Gomes Rêgo
Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Rodrigo Pinho de Almeida
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

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Bloco de Esquerda (BE):
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Pedro Filipe Gomes Soares
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
Rita Maria Oliveira Calvário

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Rita Rato Araújo Fonseca

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Sr. Secretária vai proceder à leitura do expediente.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projectos de resolução n.os 57/XI (1.ª) – Realização de auditoria sobre as interrupções no abastecimento de energia eléctrica decorrentes do temporal ocorrido na região Oeste no dia 23 de Dezembro de 2009, e ressarcimento dos prejuízos verificados (PCP), que baixou à 6.ª Comissão, e 58/XI (1.ª) – Consagra o Dia 31 de Janeiro como o Dia Nacional do Sargento (PCP), que baixou à 3.ª Comissão; e o inquérito parlamentar n.º 2/XI (1.ª) – Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar ao funcionamento da Comissão Permanente de Contrapartidas (BE).
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, hoje vamos proceder ao debate conjunto, na generalidade, dos projectos de lei n.os 8/XI (1.ª) — Elimina os mecanismos de aumento do horário de trabalho (PCP) e 117/XI (1.ª) — Altera o Código do Trabalho, no sentido da humanização dos horários de trabalho (BE).
Para apresentar a iniciativa do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: «Um dia de rebelião, não de descanso! Um dia não ordenado pelos indignos porta-vozes das instituições, que trazem os trabalhadores acorrentados! Um dia no qual o trabalhador faça as suas próprias leis e tenha o poder de as executar! Tudo sem o consentimento nem a aprovação dos que oprimem e governam. Um dia no qual, com tremenda força, o exército unido dos trabalhadores se mobilize contra os que hoje dominam o destino dos povos de todas as nações. Um dia de protesto contra a opressão e a tirania, contra a ignorância e as guerras de todo tipo. Um dia para começar a desfrutar de 8 horas de trabalho, 8 horas de descanso e 8 horas para o que nos apetecer.» Este era o conteúdo de um panfleto que circulava em Chicago, poucos meses antes do 1.º de Maio de 1886, que dava o mote para a tremenda luta que os trabalhadores desencadearam pela jornada de trabalho de 8 horas por dia.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Passados mais de 120 anos da consagração do 1.º de Maio como Dia Internacional do Trabalhador, numa justa homenagem aos trabalhadores que morreram e aos que foram presos e feridos nessa luta, o Governo do PS obriga os trabalhadores a voltarem a lutar pelo horário de trabalho de 8 horas por dia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de mais de 30 anos em que os partidos da política de direita, PS, PSD e CDS-PP, foram impondo retrocessos às gigantescas conquistas do 25 de Abril de 1974; depois de mais de 30 anos de políticas de ataque aos salários e direitos dos trabalhadores, com sucessivas alterações ao Código do Trabalho sempre para pior; depois da legalização da precariedade, com a admissão generalizada dos contratos a termo, com os recibos verdes, o trabalho temporário e, mais recentemente, o contrato de trabalho intermitente, sempre com o vergonhoso contributo do PS, os trabalhadores são hoje chamados, novamente, a resistir a uma nova e grave ofensiva.
O PS, ao alterar para pior o código de trabalho do PSD/CDS-PP, criou um conjunto de mecanismos legais que colocam nas mãos das entidades patronais a determinação e a organização dos tempos de trabalho. Com a adaptabilidade individual, a adaptabilidade grupal, o banco de horas e os horários concentrados, a entidade patronal pode alargar a jornada de trabalho diária até as 12 horas e a semanal até às 60 horas, sem o pagamento de um cêntimo que seja de trabalho extraordinário.
Para impor esta carga horária desumana sobre os trabalhadores, o PS deu vários caminhos ao patronato: deu o caminho da pressão individual sobre o trabalhador, da utilização de sindicatos minoritários coniventes com os patrões e, por fim, deu também aos patrões o poderoso instrumento da caducidade dos contratos colectivos de trabalho, que serve de pressão sobre os sindicatos para impor um retrocesso inaceitável.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A corajosa luta dos trabalhadores das grandes superfícies comerciais, dos CTT, entre outras, tornou claras as velhas e bafientas aspirações do patronato português. Seguindo as pegadas dadas por empresas do sector empresarial do Estado, vários sectores tentaram impor a desregulamentação do horário de trabalho, para assim aumentar a exploração dos trabalhadores.
Na luta dos trabalhadores das grandes superfícies comerciais ficou claro para a opinião pública que a intenção da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição era impor as 12 horas de trabalho por dia, 60 por semana.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Um escândalo!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Os trabalhadores responderam e convocaram uma greve para a véspera do dia de Natal e nem as ilegítimas e ilegais pressões, nem as palavras de Belmiro de Azevedo, que afirmava que se tratava de «um pequeno ataque de baixa qualidade», demoveram os trabalhadores. A determinação

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dos trabalhadores e do seu sindicato levou-os à vitória, e o gigante, a associação das empresas de distribuição, recuou, derrotado pela força que constitui a união dos trabalhadores.

Aplausos do PCP.

Mas, infelizmente, a desregulamentação dos horários de trabalho é já uma realidade em diversos sectores.
Hoje, há empresas dos sectores da indústria eléctrica, dos transportes de mercadorias e de passageiros, entre muitas outras, que praticam horários de trabalho que chegam às 12 horas por dia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As verdadeiras razões desta ofensiva não estão na competitividade. Vejase o caso exemplar da Qimonda em que aplicaram horários de trabalho de 12 horas por dia e o resultado foi a falência e o despedimento de centenas de trabalhadores.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — As razões que motivam os patrões e, consequentemente, o Governo PS são o aumento da exploração, a intenção de com menos trabalhadores produzirem mais. O objectivo é outro, como denuncia um membro da comissão de trabalhadores da CITROËN de Mangualde ao dizer «nesta empresa trabalha-se mais e ganha-se menos».
Com este mecanismos, o PS permite às entidades patronais reduzir os salários, uma vez que o não pagamento de trabalho extraordinário irá implicar, em alguns sectores, reduções dos salários entre os 25 e os 30%, contribuindo assim, de uma forma significativa, para o aumento da injustiça social.
Para além de aumentar a exploração, o aumento da jornada diária de trabalho para as 12 horas, bem como deixar a decisão da organização dos tempos de trabalho nas mãos dos patrões, traz consequências muito nefastas para a saúde dos trabalhadores. O aumento da jornada diária de trabalho, associado a ritmos de trabalho cada vez mais intensos, aumenta significativamente os riscos de doenças profissionais e de acidentes de trabalho.
Dados de estudos publicados por organismos do próprio Estado dão conta que «horários de trabalho superiores a 8 horas afectam negativamente a saúde e o bem-estar dos trabalhadores, sendo que os riscos a este nível aumentam em 61%».
Na realidade, os relatos que nos foram transmitidos pelo movimento sindical são assustadores.
Os trabalhadores com jornadas de trabalho diárias de 10/12 horas já estão a sofrer as consequências e, para além do aumento dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais – veja-se o caso gravíssimo das tendinites no sector das indústrias eléctricas –, aumentaram significativamente os casos de doenças do foro psicológico.
Assim, não é exagerado dizer que o aumento do horário de trabalho é uma séria ameaça à saúde dos trabalhadores, uma ameaça que é preciso eliminar.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Importa também referir que o aumento da jornada diária de trabalho torna impossível a conciliação entre a vida profissional e a vida pessoal e familiar do trabalhador.
O PS, que tantas vezes falou nesta mesma conciliação, não explica como é possível que uma família tenha tempo, ou sequer disposição, para a saudável convivência depois de 12 horas de trabalho.
O PS, que fala desta conciliação e da protecção da maternidade, não explica como é possível os pais encontrarem um espaço onde possam deixar o seu filho durante as 12 horas de trabalho ou aos fins-desemana e feriados, como impõem a generalidade dos bancos de horas já implementados, já para não falar dos impactos negativos para as crianças, uma vez que estão privadas do convívio com os seus pais.

Vozes do PCP: — Muito bem!

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Por mais que tente disfarçar e argumentar em sentido contrário, a manterem-se estes mecanismos perversos de desregulamentação do horário de trabalho, não há conciliação possível da vida pessoal e familiar com a vida profissional.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se tivermos em conta que, de acordo com o Banco de Portugal, a riqueza criada por um trabalhador aumentou, entre 1974 e 2004, 41 vezes e que o PIB, por empregado, subiu de 640 € para 26 300 €, facilmente concluímos que o que se exige não ç um aumento mas, sim, uma redução progressiva da jornada de trabalho diária.
Com os mecanismos de organização do tempo de trabalho previstos no Código de Trabalho do Partido Socialista, os horários são feitos apenas e só em função dos interesses das empresas e nunca em função das pessoas que lá trabalham.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — É regressar ao século XIX, onde os trabalhadores eram considerados como mais uma peça de uma engrenagem, como se fossem máquinas e não seres humanos.
Assim, o Partido Socialista, ao criar estes mecanismos, está a colocar-se ao lado dos patrões, está ajudar os patrões portugueses a aumentar a exploração, a aumentar os lucros, mesmo que seja à custa da saúde dos trabalhadores, e está a violar a Constituição, uma vez que compromete o direito «Ao repouso e aos lazeres (»)« previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 59.º.
O Código do Trabalho do PS, alterando para pior o já mau código do trabalho do PSD e do CDS, é um retrocesso histórico inaceitável que urge combater. E se dúvidas ainda existem, importa lembrar que em pleno século XIX, a Organização Internacional do Trabalho, na sua primeira reunião, determinou que 8 horas são para trabalhar, 8 horas são para descansar e 8 horas são para estar com a família ou para o lazer.
Importa lembrar, para que se perceba até onde o PS pode chegar, bem como a necessidade e a importância de alterar o Código do Trabalho, que em Maio de 1919 os trabalhadores da indústria e do comércio conquistaram as 8 horas e que foi em 1962, em plena ditadura fascista, que os trabalhadores agrícolas conquistaram, depois de uma violenta luta, a jornada de trabalho de 8 horas por dia.
Assim se percebe que o Código do Trabalho do PS não é um exemplo de modernidade, é antes um retrocesso histórico, é um frontal ataque a uma das principais conquistas dos trabalhadores portugueses.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agora, como no passado, o caminho é a luta. Só a luta organizada dos trabalhadores pode derrotar os partidos da política de direita e inverter o rumo, conquistar a mudança e construir um País mais justo. Só a organização e a união dos trabalhadores irá permitir que Portugal seja um país com mais justiça social e um país onde os interesses da maioria dos portugueses prevaleçam sobre os interesses de uma minoria que, à custa dos direitos, da saúde e da exploração de muitos, acumula ilegitimamente uma cada vez maior fatia da riqueza.
O PCP, dando voz a essa luta e consciente de que importa denunciar e combater o grave retrocesso que o Código do Trabalho representa, apresenta este projecto de lei que elimina os mecanismos de aumento do horário de trabalho, as adaptabilidades, o banco de horas e os horários concentrados, para assim retirar das mãos das entidades patronais a possibilidade de alargarem a jornada diária de trabalho até às 12 horas por dia.
Para o PCP, o caminho das relações laborais não pode ser um regresso ao passado. Para o PCP, o progresso tecnológico, o aumento da riqueza produzida tem que reverter para quem efectivamente cria riqueza, isto é, para os trabalhadores.
Depois deste debate, na votação deste projecto de lei do PCP, vamos poder constatar que coligações – estas sim verdadeiramente negativas – se formam para salvaguardar os interesses das entidades patronais em detrimento da larga maioria dos portugueses, que são trabalhadores.
Quanto ao PCP, agora, como no passado, o nosso compromisso é com os trabalhadores e iremos, mais cedo que tarde, com a luta dos trabalhadores, pôr termo a este caminho da exploração.
Hoje, como em 1886, é preciso acreditar e lutar para vencer e assim voltar a conquistar as 8 horas de trabalho por dia.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: — Inscreveram-se cinco Srs. Deputados, para pedirem esclarecimentos ao orador.
Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, o Bloco de Esquerda converge com o Partido Comunista Português na defesa dos direitos do trabalho e contra este aliado do incremento da exploração patronal que tem sido o Código do Trabalho, aliás, uma continuidade e um desenvolvimento negativo do Código do Trabalho anterior, aprovado pelos partidos da maioria de direita, PSD e CDS-PP. O Código de Bagão Félix teve, depois, aquele upgrade Vieira da Silva que o transformou ainda no maior inimigo dos direitos dos trabalhadores. Essa é a grande nódoa do Partido Socialista, que tem alguma dificuldade em limpar-se dela. Por isso, recorrentemente, estamos aqui a debater os direitos dos trabalhadores, e os direitos dos trabalhadores aos quais o Partido Socialista infligiu grande dano.
Acompanhamos o raciocínio que aqui foi apresentado pelo Sr. Deputado Jorge Machado, que consubstancia o projecto de lei que hoje se debate, propondo alterações ao Código do Trabalho. Ou seja, o alargamento do horário de trabalho, transformando o que era horas extraordinárias em horas a singelo, obviamente prejudica os trabalhadores, reduz os seus rendimentos, aumenta o lucro patronal, diminui aquilo que pode ser a balança do equilíbrio entre capital e trabalho.
Mas vamos muito mais longe do que isso, porque a concepção da hora extraordinária no direito do trabalho era a consagração do horário máximo de 8 horas, era um direito de civilização. Portanto, a banalização de horários de trabalho, mesmo que anualizados ou trimestralizados ou concertados em qualquer momento, significa, do ponto de vista do quotidiano, da vida dos portugueses e das portuguesas, banalizar completamente a jornada de trabalho.
A consideração sobre o limite máximo de uma jornada de trabalho não é algo ultrapassado. Muito pelo contrário, o objectivo social, o objectivo da humanidade, é exactamente encontrar a diminuição do tempo de trabalho, aumentar o tempo de lazer, encontrar as formas de fruição do trabalho, de tudo aquilo que possa ser a cultura dos novos meios de acesso às conquistas universais.
O que o Código do Trabalho do Partido Socialista veio fazer foi aumentar extraordinariamente as cargas de trabalho e desvalorizar a conquista das 8 horas de trabalho. E nesse sentido não foi apenas um ataque económico, foi também um ataque social e cultural aos direitos do trabalho.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Deputado Jorge Machado, acompanhamos o projecto de lei do PCP, mas era bom, neste momento, nesta sede, com um debate frontal, e sabendo até que o Partido Socialista não foi unânime aquando da votação deste Código do Trabalho, perguntar que posições tinha o Partido Socialista em relação aos horários de trabalho quando foi apresentado o Código de Bagão Fçlix pela direita »

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Oh! »

O Sr. Luís Fazenda (BE): — » e como é que acabou o Partido Socialista a votar este Código do Trabalho, sobre horários de trabalho, sobre desumanidade da vida laboral?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Barros.

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, já muito se tem falado nesta Câmara de tantas bandeiras eleitorais deste Partido Socialista que foram prometidas e não cumpridas, como é o caso do combate à precariedade laboral.
Srs. Deputados, nada a que os portugueses já não estejam habituados: habituados às constantes inversões de marcha do Partido Socialista; habituados a uma governação sem rumo à velocidade do TGV;

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habituados a verem as oportunidades transformadas em ameaças; habituados a um País onde os empresários têm falta de confiança nas políticas socialistas; habituados à ausência de protecção social dos trabalhadores! E assim, Srs. Deputados, num cenário como este de expectativas defraudadas, o que nos resta é termos uma oposição firme e segura, uma oposição que não apele ao sensacionalismo, uma oposição que deixe de lado a sua doutrina e saiba interpretar os problemas do País.

Aplausos do PSD.

E ç nesta linha de raciocínio que o PCP ainda não se soube posicionar,»

Protestos do PCP.

» e revelou, de certo modo, com esta proposta para os horários de trabalho, a ausência de vontade de ser um partido de governo, porque, numa altura de fragilidade social, é uma proposta que chamo de sensacionalista.

Vozes do PSD: — Exactamente!

Protestos do PCP.

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Srs. Deputados do PCP, o PSD também quer zelar pela qualidade de vida dos trabalhadores.

Protestos do PCP.

É verdade, Srs. Deputados! O PSD também quer zelar pela protecção social. Mas, Srs. Deputados do PCP, os portugueses e as portuguesas que nos estão a ouvir estarão certamente preocupados, porque quem iria pagar esta proposta do PCP eram os próprios trabalhadores.

Aplausos do PSD.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A senhora precisava de trabalhar 60 horas por semana atrás de um balcão ou numa fábrica!

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Não só o timing está incorrecto como abordar os horários de trabalho nesta visão tão redutora, sabendo VV. Ex.as que o Código de Trabalho é um instrumento tão complexo que não pode ser alvo destas alterações casuísticas,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Casuísticas?!

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — » terá impactos aos mais diversos níveis da relação laboral.

Protestos do PCP.

Srs. Deputados do PCP, a questão que dirijo a VV. Ex.as é a seguinte: que razões e em que teoria económica encontraram fundamento para tal medida nesta época de crise?

O Sr. Presidente: — Pode concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Termino, sim, Sr. Presidente.
Não será esta proposta feita à rebeldia daquilo que acontece na Europa? É que não conheço nenhum país que, estando numa luta pela sobrevivência das empresas, se proponha mexer agora na flexibilidade laboral que tanto custou a ter.

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Vozes do PSD: — Exactamente!

A Sr.ª Carla Barros (PSD): — Aqui fica um pedido aos Srs. Deputados do Partido Socialista: queremos mais e melhor trabalho, queremos competitividade das empresas. E faço aqui um apelo ao bom senso do Partido Socialista: se os senhores o quiserem com a mesma intensidade que eu e o Partido Social Democrata queremos, os portugueses ficarão bem melhor.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Mourão.

O Sr. Mário Mourão (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, brinda-nos hoje o PCP com uma proposta que, segundo VV. Ex.as, elimina o mecanismo do aumento do horário de trabalho.
Sr. Deputado Jorge Machado, como sabe, o actual Código de Trabalho nem sequer tem ainda um ano de vida.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Antes de nascer já o era!

O Sr. Mário Mourão (PS): — É nossa opinião que é prematuro pormos em causa estes mecanismos sem que haja tempo para uma avaliação séria do impacto destas medidas.
Sendo uma das componentes do actual Código de Trabalho a negociação colectiva e o diálogo e, consequentemente, a intervenção da estruturas dos trabalhadores (as comissões de trabalhadores, as comissões sindicais de empresa, os sindicatos, as estruturas de proximidade que representam estas estruturas), quer ainda o PCP passar um atestado de ineficácia à intervenção destas estruturas?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas quem faz a legislação?!

O Sr. Mário Mourão (PS): — Estarão VV. Ex.as a desvalorizar o papel fundamental destas estruturas?

Protestos do PCP.

Não me perturbam, Srs. Deputados! Relativamente ao banco de horas, à adaptabilidade individual, grupal e horários concentrados, será que o PCP sabe que existiram negociações, nomeadamente a nível das estruturas dos trabalhadores e empregadores, para estabelecerem regimes que decorriam ao livre arbítrio de qualquer regulamentação? Lembro, a propósito, o tão falado caso da Autoeuropa, cuja comissão de trabalhadores, e bem, maioritariamente constituída por membros do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda,»

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas o que é isto?!

O Sr. Mário Mourão (PS): — » teve de encontrar soluções de diálogo para defender os postos de trabalho e a viabilidade da empresa.

Aplausos do PS.

O PCP quer ignorar o capital do diálogo e a concertação estabelecida entre estas estruturas? Ainda neste domínio, o PCP roça toda a espécie de contradições. O vosso projecto de lei, por exemplo, diz que o banco de horas afecta a conciliação da vida profissional e familiar dos trabalhadores.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E é verdade!

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O Sr. Mário Mourão (PS): — Mas logo a seguir propõem que esse trabalho seja remunerado. Então em que ficamos, Srs. Deputados?

Protestos do PCP.

Esperem! Tenham calma, tenham calma! Se o trabalho for remunerado já não afecta a vida familiar e a conciliação com a vida profissional? Será que é o dinheiro que compra isso?

Protesto do PCP e do BE.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Ai este Partido Socialista!...

O Sr. Mário Mourão (PS): — Já agora, há mais uma contradição que não posso deixar passar em claro.
Como VV. Ex.as presumivelmente saberão, muitas empresas estão hoje, muito mais do que no passado, sujeitas a imprevisíveis picos de encomendas. Ora, isso é saudável quando esses picos assumem o sentido ascendente. Nessas circunstâncias, têm de dar resposta eficaz e célere aos clientes, sob pena de os perder para sempre.
Para tal, socorrem-se do regime da adaptabilidade, mediante negociações com a estrutura representativa dos trabalhadores e com os trabalhadores individualmente.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Têm é que pagar as horas!

O Sr. Mário Mourão (PS): — Porém, se seguíssemos o projecto do PCP, tal adaptabilidade só seria exequível pela via do despedimento, sem a correspondente manutenção dos postos de trabalho.
Então que lugar concede o PCP à negociação, valorizando as estruturas representativas dos trabalhadores? Pelos vistos, nenhum! O que francamente me preocupa, ainda mais, quando o PCP se coloca ao nível das práticas que prosseguiu após o 25 de Abril. Quanto pior melhor!

Protestos do PCP.

Hoje, Sr. Deputado, os tempos são outros! O que move a bancada do Partido Socialista são os superiores interesses dos trabalhadores e das empresas, através do caminho da negociação e do respeito pelo diálogo e pela negociação colectiva.

Aplausos do PS.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Ainda você não tinha nascido e já nós fazíamos isso!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputado Luís Fazenda, infelizmente, o PS está manchado pelos principais retrocessos no que diz respeito à legislação laboral.
Foi assim no contrato de trabalho a termo e foi-o agora, muito recentemente, com o Código de Trabalho e o contrato de trabalho intermitente.
Infelizmente, o Partido Socialista fica associado a estes retrocessos, que, em algumas situações, nem a direita parlamentar (o PSD e o CDS-PP) conseguiu impor, indo ainda mais longe que essa mesma direita, impondo, em nossa opinião, retrocessos históricos inaceitáveis.
Sr.ª Deputada Carla Barros, é fácil perceber — e os portugueses que nos ouvem já perceberam — que o PSD corre desesperadamente em defesa do Partido Socialista. É que aqui «pia fininho».
Estamos a discutir questões centrais da política dos direitos dos trabalhadores e aqui não há espaço para dúvidas: o PSD defende o PS «com unhas e dentes». Do que aqui se trata é de aumentar a exploração dos

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trabalhadores, é defender um Código de Trabalho injusto, socialmente inaceitável e que o PSD defende vergonhosamente! Mas mais vergonhoso ainda é o PS, que se vê socorrido pelo Partido Social Democrata e pelo CDS-PP na defesa deste Código de Trabalho! Portanto, Sr.ª Deputada, redutor é trabalhar 12 horas por dia. Se a Sr.ª Deputada trabalhasse 12 horas por dia numa fábrica, numa indústria eléctrica, sem receber mais um cêntimo que fosse pelo trabalho extraordinário, facilmente perceberia a injustiça que é este Código de Trabalho e a necessidade de o alterar.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — O Sr. Deputado do Partido Socialista refere que há falta de tempo. Não, Sr. Deputado. Os trabalhadores já sabem e já estão a sofrer as consequências do Código de Trabalho do Partido Socialista, que não paga mais um cêntimo de trabalho extraordinário.
Aliás, o Sr. Deputado deixou as coisas bastante claras, quase nem precisava de lhe responder. É que ficou claro na sua intervenção que o que é importante é o trabalho extraordinário ser pago. Ou seja, se não for pago está tudo bem, sendo pago já está tudo muito mal. Ora, Sr. Deputado, é precisamente isto que importa combater.
O Sr. Deputado fala da competitividade. Sr. Deputado, tenho aqui uma recomendação da OIT, aprovada em Washington, em 1919. Vem V. Ex.ª alegar competitividade com retrocessos históricos desta dimensão, Sr. Deputado? Como explica o caso da Quimonda, que aplicou as 12 horas de trabalho por dia? Não sabe qual foi o resultado?

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — O resultado foi o seguinte: falência da empresa e despedimentos, Sr. Deputado.
Se o Sr. Deputado fosse falar com os trabalhadores da Quimonda percebia que aumentaram, e muito, os acidentes de trabalho, as doenças profissionais e os problemas de foro psicológico.
Portanto, este é esse retrocesso que importa corrigir. O Partido Socialista fica manchado com esta «nódoa» desgraçada, de um retrocesso que nos faz lembrar o século XIX, ao invés de optar por uma legislação laboral moderna e socialmente mais justa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Pedrosa.

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, o regime de adaptabilidade da duração do tempo de trabalho consagrado no Código de Trabalho é um instrumento decisivo para a competitividade da economia portuguesa, sendo por isso do interesse de todas as partes, isto é, do interesse das empresas, dos trabalhadores e do País.
É do interesse das empresas porque lhes dá mais solidez, mais condições de competitividade e maior capacidade de criar riqueza, é do interesse dos trabalhadores porque lhes permite negociar, através de regulamentação colectiva, o seu regime de trabalho, e o PS acredita na regulamentação colectiva, pois só através da regulamentação colectiva as empresas podem progredir e fortalecer-se.
O PS acredita nos instrumentos de regulamentação colectiva, mas o PCP prefere o dogmatismo ideológico à livre negociação entre empregadores e empregados.
Por fim, o regime da adaptabilidade é bom para o País porque ele reforça as condições de inserção das nossas empresas e dos nossos produtos no mercado externo.
No momento em que toda a sociedade portuguesa fala da necessidade de aumentarmos os nossos factores de competitividade externa, de internacionalização das nossas empresas, de incremento dos nossos produtos lá fora para aumentar as exportações, vem o PCP pugnar por um modelo de competição e de competitividade económica que já não existe em nenhuma parte do mundo.

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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — A escravatura era mais produtiva!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Já agora só falta o trabalho infantil!

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Se não vejamos, Sr. Deputado Jorge Machado, e é essa a pergunta muito concreta que lhe quero fazer. Os mercados internacionais estão cada vez mais exigentes. Há, hoje, preços de produtos que vendemos ao estrangeiro 25% mais baratos do que há 10 anos atrás. No sector automóvel, as empresas portuguesas que lhes fornecem os componentes, como, por exemplo, no sector de moldes e plásticos, que exporta 100% da sua produção, vêem-se hoje confrontadas com mercados cada vez mais instáveis, e tanto podem receber encomendas de 500 automóveis num mês como de 100 no mês seguinte.

Vozes do PS: — Exactamente!

O Sr. João Paulo Pedrosa (PS): — Por isso, pergunto ao Sr. Deputado, e gostaria que me respondesse de forma muito clara e concreta: como devem proceder estas empresas? Devem satisfazer as encomendas do cliente, ajustando a sua capacidade produtiva à realidade do mercado, ou pura e simplesmente recusam as encomendas, caminhando para a falência e lançando mais trabalhadores no desemprego?

Aplausos do PS.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, vou só deixar que a bancada do Partido Comunista retome alguma serenidade para poder dirigir uma pergunta ao Sr. Deputado Jorge Machado.
Sr. Deputado, como sabe, nesta bancada entendemos que a matéria da adaptabilidade e da flexibilidade da legislação laboral é essencial para o desenvolvimento económico do País.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É lógico!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Ora, tenho a noção que há uma visão muito diferente do que é o mundo visto pelo CDS e visto pelo PCP. Temos a noção de que a rigidez do nosso mercado laboral, em conjunção com os atrasos sistemáticos do nosso sistema de justiça, são os factores mais prejudiciais para o investimento externo em Portugal e, até, para o desenvolvimento de um conjunto de investimentos internos.
Somos coerentes com estas posições e entendemos que é preciso garantir mais adaptabilidade, mais flexibilidade dentro do nosso mercado laboral, fazendo-o sempre através da negociação colectiva. Para nós, é fundamental revitalizar a negociação colectiva, a contratação colectiva e sabemos que é assim em todos os países da Europa desenvolvida.
Por isso, temos esta posição de coerência e foi em nome desta posição e deste princípio que promovemos o primeiro Código de Trabalho, em 2003.
Com esse Código de Trabalho e algumas alterações posteriores, nomeadamente a partir da sua regulamentação, foi possível começar a revitalizar a contratação colectiva, em Portugal, que, curiosamente, em 2009, com a aprovação de uma nova legislação laboral pelo Partido Socialista, acabou por cair.
Sr. Deputado, a pergunta que gostava de lhe fazer prende-se com o seguinte: nesta bancada, temos uma posição de integral coerência, somos fiéis a este nosso princípio e trabalhamos há muito tempo neste sentido.
Curiosamente, não deixo de reparar que, hoje, muitos daqueles que também já defendem a adaptabilidade dos horários de trabalho em negociação colectiva — a bancada do Partido Socialista — em 2003, estavam totalmente contra qualquer alteração.

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Lembro-me de intervenções, como a do Sr. Deputado Artur Penedos, em que este dizia que o Código do Trabalho era «uma bomba atómica, um míssil de grande potência que destruirá, certamente, muitas das expectativas dos mais desfavorecidos, daqueles que têm dificuldades em enfrentar a prepotência». E dizia, em aparte, um Deputado do Partido Socialista chamado José Sócrates: «Muito bem!».

Vozes do CDS-PP: — Está escrito!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Também a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, que ainda se senta na bancada do Partido Socialista, dizia: «Este Código do Trabalho ofende direitos sociais e económicos dos portugueses, despreza a dimensão integral dos seres humanos, prejudica gravemente as famílias». E dizia, em aparte, o mesmo Deputado José Sócrates: «Isso é que dói!».

Risos do CDS-PP.

Sr. Deputado Jorge Machado, não vou perguntar a V. Ex.ª se, a si, lhe dói, mas gostava de saber como comenta a coerência do Partido Socialista, que em 2003 era contra qualquer adaptabilidade e hoje vem defender – agora bem – a adaptabilidade que a nossa legislação laboral contém.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Há uma segunda questão, Sr. Deputado Jorge Machado, que também me parece importante e que é a seguinte: não posso deixar de registar que há uma significativa diferença entre os dois projectos de lei que estamos a discutir hoje, uma vez que o projecto do Bloco de Esquerda, também na matéria dos horários, propõe hoje a redução da semana de trabalho das 40 horas para as 35 horas, ainda que prevendo um período transitório. Ora, como sei que esta «bandeira» também é muito importante para o Partido Comunista, gostava de perguntar-lhe por que razão o PCP não avança com ela hoje.
Pela minha parte, quero dizer-lhe, com toda a frontalidade, que até considero irresponsável propor uma medida como esta numa altura em que o desemprego ultrapassa os 10%, numa altura em que a nossa economia atravessa uma enorme dificuldade e em que estamos perante enormes dificuldades sociais. Em todo o caso, não deixo de registar que o PCP (que, pelo que sei, ainda continua a defender esta questão, nomeadamente no seu programa), ao contrário do Bloco de Esquerda, não avança com esta medida.
Pergunto ao Sr. Deputado Jorge Machado se pode esclarecer a Câmara sobre o porquê desta posição.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, a questão das 35 horas semanais é muito fácil de explicar. Tal como referiu, ela consta do nosso programa e continua a ser a nossa proposta,»

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Eu li!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — » mas o que temos de resolver com urgência ç, precisamente, a desregulamentação dos horários de trabalho. Isso é o que, para nós, é necessário e urgente atacar no plano imediato.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Em todo o caso, não deixamos cair a proposta das 35 horas de trabalho semanais, que é de inteira justiça em função da riqueza que é produzida hoje e que deve reverter para os trabalhadores.

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Nesta questão, o Sr. Deputado argumentou também com a rigidez do nosso mercado de trabalho, o que não é verdadeiramente rigoroso. E, a este propósito, deixe-me dizer que o CDS é muito, muito mal agradecido ao Partido Socialista, porque o Partido Socialista fez um favor de classe ao introduzir uma profunda alteração ao Código do Trabalho que vai ao encontro dos interesses do CDS-PP. Mas o CDS-PP, infelizmente, ainda o atira à cara do Partido Socialista.
Portanto, o Partido Socialista deveria ter vergonha desses passos que deu – é verdade! –, mas o Sr. Deputado é mal agradecido ao tratar mal o Partido Socialista!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É verdade! Exactamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Curiosamente, o CDS utiliza a mesma argumentação do Partido Socialista (e com isto passo a responder ao Sr. Deputado do Partido Socialista), ou seja, refere a questão da competitividade.
É curioso que o PS não fale da Qimonda, uma vez que andaram anos a falar dela, designadamente o Sr.
Primeiro-Ministro, e agora a Qimonda caiu, desapareceu! E desapareceu porquê? Desapareceu, precisamente, porque aplicou as 12 horas de horas de trabalho e, mesmo assim, isso não tornou a empresa competitiva.
A competitividade não se conquista pela exploração de quem trabalha, não se conquista pela desregulamentação dos horários de trabalho.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — E, Sr. Deputado, não venha valorizar a contratação colectiva porque, no que diz respeito a esta matéria, a contratação colectiva tem de ser associada a uma outra questão, que é a de o Partido Socialista, ao mesmo tempo que desregulamenta os horários de trabalho, ter introduzido a caducidade dos contratos colectivos de trabalho. Portanto, os sindicatos vêem-se hoje numa situação em que estão a negociar contratos colectivos de trabalho com «a corda ao pescoço»: se não assinam o acordo, caduca a contratação colectiva e perdem um conjunto de direitos muito significativo.
O Partido Socialista colocou o movimento sindical nesta posição, para sua própria vergonha! O Partido Socialista não valoriza a contratação colectiva porque, se o fizesse, teria de determinar a não caducidade da contratação colectiva.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Mais: o Sr. Deputado esqueceu de referir que há adaptabilidade à desregulamentação do horário de trabalho que se consegue por acordo individual entre o patrão e o trabalhador – veja-se a adaptabilidade individual ou o horário concentrado.
Sr. Deputado, vá falar com os trabalhadores da Lisnave, que, mal assinam o contrato de trabalho, têm logo um crédito de 100 horas para dar, ao longo do ano, à entidade patronal: 100 horas que têm de trabalhar de graça!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isto ç que ç moderno!»

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Em sábados, feriados, fins-de-semana, seja de noite, seja de dia, os trabalhadores têm um crédito de 100 horas para pagar à entidade patronal! Sr. Deputado, não aceitamos a argumentação do modelo de desenvolvimento. O Partido Socialista diz que não tem cabimento e que há a questão da competitividade internacional, mas a competitividade internacional não se consegue por esta via. Não é este o caminho que pode mudar as relações laborais.
A competitividade é um falso argumento, e o Sr. Deputado sabe-o muito bem.
O caminho deve ser outro, deve ser o da valorização do trabalho, o de olhar para os direitos dos trabalhadores e para os elementos que são verdadeiramente determinantes na competitividade internacional

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do sistema económico, nomeadamente no que diz respeito à energia e à organização dos métodos de trabalho.
É um outro modelo de desenvolvimento, mas o Sr. Deputado não entende isso.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para fazer a apresentação do projecto de lei do Grupo Parlamentar do BE, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 1919 foi consagrado, pela primeira vez, o horário máximo de 48 horas semanais.
Passados 86 anos e depois de várias revoluções sociais e tecnológicas, os milhares e milhares de homens e mulheres que pagaram com sangue, suor e lágrimas esta tão importante conquista estavam certamente longe de imaginar que haveria de existir um Código do Trabalho que permitiria trabalhar 60 horas por semana.
Estavam também longe de imaginar que tal lei fosse aprovada por partidos que proclamam, do alto do seu pedestal, a compatibilização da vida pessoal, familiar e profissional, que apagaram da memória socialista a concepção do trabalhador como ser humano, com direito a vida pessoal e familiar, mas que o querem como máquina ao serviço do mercado, da exploração e do lucro.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Podemos certificar agora, sem qualquer espécie de dúvida, que eram hipócritas as declarações feitas em 2003, aquando da discussão do primeiro Código, uma vez que o segundo resultou exactamente igual ao primeiro em toda a sua extensão.
Este Código do PS é um veneno que contamina as vidas já difíceis e sofridas das pessoas que não têm salários dignos, tendo muitos deles de recorrer ao rendimento social de inserção porque são cada vez mais pobres mesmo trabalhando.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este Código do PS é um veneno que chantageia os trabalhadores e as trabalhadoras, confrontando-os com a circunstância de que «se tu não queres há mais quem aceite», porque o contingente de desempregados e precários aumenta a cada dia que passa.
É este Código do PS que, ao permitir que possam ser negociados individualmente ou em contratação colectiva direitos abaixo dos estabelecidos, dá todo o poder aos donos das empresas.
Ninguém em estado de necessidade está em condições de enfrentar o poder de quem detém o poder!

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — São bastos os exemplos de empresas que usam e abusam dessa chantagem.
Foi assim na Qimonda, onde, usando a falsa propaganda de que com maior adaptabilidade de manteriam os postos de trabalho, se impuseram horários diários de 12 horas consecutivas. Os postos de trabalho não foram garantidos e a empresa acabou por falir e encerrar.
É assim em muitas empresas de transportes ferroviários e rodoviários, é assim na Prossegur e na Essegur, onde se vive a mais extrema das chantagens, é assim em tantas e tantas empresas que tenho visitado e onde as histórias são sempre as mesmas, onde homens e mulheres, com horários que lhes são comunicados na véspera, desesperam com o facto de não saber como resolver o problema das suas crianças.
É assim que homens como Belmiro de Azevedo, que têm mandado neste país e detêm as maiores fortunas, se permitem a arrogância de querer impor a quem tem um contrato de trabalho a prazo a brutalidade de um horário de 60 horas por semana, sem pagamento de horas extraordinárias.

Vozes do BE: — É verdade!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — O PS, Sr.as e Srs. Deputados, é hoje o partido das 60 horas semanais.

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Temos hoje uma Ministra do Trabalho que, esquecendo tudo o que disse em Outubro de 2003, enquanto Vice-Secretária Geral da Confederação Europeia de Sindicatos, num seminário que ocorreu em Portugal, em que afirmou «estamos, de facto, em maus lençóis relativamente àquilo que poderiam ser as premissas de um relançamento económico. Portugal, nesse aspecto, está a ser extremamente fustigado. O nosso país destacase, por exemplo, pelo aumento fenomenal do desemprego, depois de anos de redução de desemprego, e pelo ataque perpetrado pelo Código do Trabalho», vem hoje dizer-nos, perante o braço de ferro entre as empresas de grande distribuição e os sindicatos sobre a alteração da carga horária para as 60 horas semanais, que «o Governo não interfere com as relações entre o patronato e os sindicatos. A responsabilidade do Governo é vigiar e responsabilizar o não cumprimento da lei. Nesta matéria não há qualquer violação à lei».
Para que conste e para memória futura, Sr.as e Srs. Deputados do Partido Socialista, este Código do PS desumaniza as relações laborais. Dissemo-lo deste o início e fizemos propostas para inverter a marcha do retrocesso. Não estivemos sozinhos! A oposição de Manuel Alegre e de mais alguns Deputados e Deputadas socialistas foram um exemplo que daqui saudamos.

Aplausos do BE.

Este Código é, portanto, antagónico com uma concepção de vida onde o trabalho é um factor de dignificação e de realização pessoal.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Será que, hoje, alguém do PS, do PSD ou do CDS-PP tem a ousadia de nos repetir que olhemos para esta vergonhosa situação com um olhar refrescado? O Bloco de Esquerda desafia-vos, Deputadas e Deputados do PS, Deputadas e Deputados do PSD, Deputadas e Deputados do CDS, a que ajam em conformidade com a vossa propaganda em tempo de eleições, em que a defesa da família e a defesa da consideração das crianças estão referidos por 36 vezes nalguns programas eleitorais, como é o caso do do Partido Socialista.

Aplausos do BE.

É por isso que vos desafiamos a votar favoravelmente o projecto de lei que hoje aqui apresentamos, um projecto de lei que vai exactamente no sentido da modernidade, com a redução do tempo de trabalho para as 7 horas por dia ou 35 horas por semana, não resultando daí qualquer diminuição da retribuição; que vai no sentido do respeito pela negociação colectiva nas empresas e sectores de actividade onde tenha sido estabelecido um calendário em que a redução do tempo de trabalho seja mais benéfica; que vai no sentido da garantia ao trabalhador de um período mínimo de descanso de 14 horas seguidas entre dois períodos de trabalho consecutivos (bem sabem, Sr.as e Srs. Deputados, que em muitas das nossas empresas estas 14 horas não existem!...); que vai no sentido da garantia de que os horários de trabalho não podem ser unilateralmente alterados, como propunha Belmiro de Azevedo.
Demonstrem, Sr.as e Srs. Deputados dos três partidos que hoje formam um «tripé» para a aprovação do Orçamento, que são verdadeiras as vossas intenções de humanizar os horários de trabalho. Esta é uma das principais condições da democracia. O sentido da modernidade só pode apontar para a redução e a humanização dos horários de trabalho. É isso que nos exige a presente geração, é essa a nossa obrigação.
Nós, no Bloco de Esquerda, assumimos essa responsabilidade!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se duas Sr.as Deputadas para pedir esclarecimentos à oradora.
Em primeiro lugar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Anabela Freitas.

A Sr.ª Anabela Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, temos estado hoje, aqui, a fazer uma espécie de viagem no tempo com alguns dos argumentos que estão a ser utilizados. Permitam-me, para não destoar, continuar nessa viagem no tempo e dizer que me orgulho de pertencer a um partido que, em 1996, aprovou a redução da jornada de trabalho.

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Este presente Código do Trabalho prevê uma gestão do tempo que permite a conciliação entre a vida pessoal, profissional e familiar do trabalhador, permitindo, a par disto e também no interesse do trabalhador, às empresas ser mais competitivas.
Sr.ª Deputada, quero colocar-lhe duas questões.
Primeira: como já hoje aqui foi falado, o Código do Trabalho está em vigor há menos de um ano, desde 17 de Fevereiro de 2009. Não acha que as empresas necessitam de estabilidade legislativa para poderem operar?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E os trabalhadores de estabilidade na vida!!...

A Sr.ª Anabela Freitas (PS): — Segunda questão: propondo-se a revogação da adaptabilidade individual e grupal, do período de referência, do banco de horas e do horário concentrado, marcas estas de modernidade legislativa, como é que articula estas propostas com a necessidade de tornar as nossas empresas mais competitivas e melhor preparadas para enfrentar os desafios do mercado?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, de facto, o assunto hoje aqui em discussão representa um civilizacional retrocesso e uma tentativa de limitar direitos fundamentais para a emancipação humana.
«Pela boca morre o peixe» e, na verdade, o Sr. Deputado do PS falou na possibilidade de trabalho não remunerado e disse que nem via mal nisso», porque o facto de os trabalhadores «trabalharem para aquecer« e sem verem o resultado concreto desse seu trabalho cabe nos parâmetros de modernidade deste PS»!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Mas não cabe certamente nas reivindicações dos trabalhadores e na degradação da sua qualidade de vida!! De facto, em 1866 — para o caso de os Srs. Deputados do PS, do PSD e do CDS não o terem presente —, no Congresso de Genebra, a I Internacional aprovou como resolução a jornada de trabalho de 8 horas e as medidas de protecção às mulheres trabalhadoras.
A Sr.ª Deputada Mariana Aiveca tocou num assunto muito importante, que é a questão da articulação entre a vida profissional e a vida pessoal e familiar das mulheres trabalhadoras.
Sr.ª Deputada, conhece os dados de 2008, que dizem que 38% das mulheres trabalham ao sábado, que 22% das mulheres trabalham ao domingo e que o trabalho nocturno aumentou, entre as mulheres, quase o dobro desde 1998? E como se esta situação não fosse por si só já grave, vem o Governo do PS aprovar o seu «código da exploração«. De facto, «moderno« ç continuar a senda da exploração dos trabalhadores»! A política de desregulamentação do horário de trabalho tem como grande objectivo — aliás, o Sr. Deputado do PS anunciou-o! — reduzir as remunerações dos trabalhadores com o não pagamento das horas extraordinárias e do trabalho suplementar.
O alargamento até às 12 horas de trabalho por dia e às 60 horas semanais destrói qualquer hipótese de compatibilização da vida pessoal e familiar com a vida profissional e torna também impossível a compatibilidade entre o trabalho e o direito das mulheres de participarem activamente no seu País na luta pelos seus direitos.
Em Outubro de 2007, uma empresa de prestação de serviços de alimentação num hospital público implantou as 12 horas de trabalho diário a oito trabalhadoras, violando a convenção colectiva de trabalho desse sector e as leis laborais. De um dia para o outro, saíam de casa de noite e regressavam a casa já de noite. Não entendo, por isso, onde está a preocupação da Sr.ª Deputada do PS que acabou de questioná-la quando diz que é perfeitamente possível conciliar a jornada de trabalho com a vida familiar»

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Com a aplicação do aumento do horário de trabalho, as trabalhadoras das cantinas, bares e refeitórios vêem o seu horário ultrapassar as 14 horas diárias, no comércio não é regulado o dia e o horário do turno, as operárias fabris não sabem quais os fins-de-semana em que vão compensar a empresa!...
Sr.ª Deputada, bem presenciei, na sua intervenção, que a questão da articulação entre a vida pessoal e a vida profissional é uma preocupação para o BE. Por isso, a pergunta que quero deixar-lhe é esta: entende que com a não votação favorável dos Deputados do PS destes dois projectos de lei está em causa, de alguma forma, o direito de uma mãe participar na vida do seu filho, de poder levá-lo à escola e de o ir buscar, de poder participar na sua educação?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, muito obrigada pelas questões colocadas.
Sr.ª Deputada Rita Rato, começando por responder-lhe, penso que tudo se antevê para que o tal «tripé» partidário que funcionará para aprovação do Orçamento do Estado irá funcionar aqui, hoje, para a rejeição dos projectos de lei em discussão.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É uma coligação negativa!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — É uma coligação, não sei se negativa se positiva, mas é do centro, é o «centrão» a funcionar, é, de facto, a direita a comandar!! Sr.ª Deputada Anabela Freitas, é preciso relembrar a História, sim, senhora, porque a História tem uma roda, que normalmente anda para a frente, não retrocede... Rejeitamos a marcha atrás da roda da História que os certificaram, porque este Código tem um ano, mas o veneno conceptual do Código não tem um ano, não senhor! É de 2003! E esse veneno conceptual foi muito rejeitado pela bancada do PS e, muito bem, pela actual Ministra do Trabalho, como também referi na minha intervenção.
Relembro, Sr.ª Deputada — é um dado também da História — que o programa do governo de um elemento do PS bem conhecido, o Eng.º António Guterres, propunha claramente a redução do horário de trabalho para as 37 horas semanais. De facto, essa é a roda da História no sentido da modernidade.
Relembro-lhe ainda, Sr.ª Deputada Anabela Freitas, também como elemento da História, que o actual Programa do PS refere 36 vezes a expressão «direitos da família», refere, na página 67, «o reforço dos dispositivos que garantam o direito da criança a crescer em família». Como é isto possível, Sr.ª Deputada, quando se impõe aos homens e às mulheres trabalhadoras horários de 12 horas no local de trabalho? E, como bem sabe, muito poucos são os trabalhadores que têm a fábrica ou a empresa ao lado da sua porta de casa, acrescendo a isto o transporte, portanto, não significa 12 horas mas muito mais! Que hipocrisia é esta, Sr.ª Deputada, quando um programa afirma que quer que se garanta o direito das crianças a crescerem em família e, depois, se ratifica este tipo de medidas? E vêm dizer-nos que estamos a fazer propaganda, que estamos a invocar demasiado a História, que a modernidade é continuar a aumentar a carga horária!?» Não, Sr.ª Deputada, a verdadeira modernidade é também redistribuir para aqueles que produzem riqueza os seus efeitos!! Depois de revoluções sociais e tecnológicas isto não se compreende» ou, antes, compreende-se muito bem, porque fica claro de que lado o PS está em não dar algum proveito aos trabalhadores, em não dar aos trabalhadores o proveito de trabalharem menos. É porque o que verdadeiramente aqui está em causa é um grande frete feito ao patronato para poupar dinheiro à custa das pessoas, para não pagar o trabalho extraordinário.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — É isto que está pressuposto! Os senhores podem chamar-lhe adaptabilidade grupal, individual ou lá o que quiserem, mas o que aqui aconteceu foi exactamente um frete a

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quem detém o poder, porque, de facto, os senhores estão com as dores daqueles que detêm o poder, ao lado da direita, e isso é verdadeiramente lamentável!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Arménio Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Código do Trabalho é apenas mais uma questão que demonstra como o PS, dito de esquerda, é um a fazer promessas e é outro, bem diferente, quando é chamado a cumpri-las.
O PS diabolizou o Código do Trabalho aprovado em 2004, até com um radicalismo superior ao do PCP e ao do BE, prometendo então alterá-lo em benefício do trabalhador. O PS prometeu isso na oposição mas, depois, com maioria absoluta, fez exactamente o contrário do prometido.
Agora — veja-se também aqui a roda da História — atç o PCP tem saudades do código de Bagão Fçlix»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Seja sério!

O Sr. Arménio Santos (PSD): — » e reconhece que o código de Vieira da Silva ç mais desequilibrado do que aquele que estava em vigor e que os socialistas alteraram.
Não está em causa a necessidade de dotar as relações laborais com os mecanismos e a flexibilidade que permitam a ambas as partes — empresas e trabalhadores — funcionarem de forma eficiente e equilibrada para alcançarem os objectivos a que se propõem.
As empresas têm de ter resultados, têm de ser competitivas, têm de gerar riqueza e têm de ter lucros para sobreviverem e criarem emprego,»

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas à custa de quê?

O Sr. Arménio Santos (PSD): — » enquanto os trabalhadores têm de cumprir as suas obrigações profissionais e têm de possuir condições de trabalho e remunerações dignas e justas, em ordem à sua realização pessoal, familiar, social e cultural.
Para o PSD isto são princípios básicos e que assumimos, aqui e sempre, com plena convicção.
O que está em causa, Srs. Deputados, não é, portanto, a necessidade de adaptar as leis laborais aos tempos de hoje! O que está em causa é a política de cata-vento praticada pelo PS; o que está em causa é a mistificação da política, ao prometer-se uma coisa aos cidadãos e, depois, fazer-se exactamente o contrário.
E quando se governa na base da mistificação, como é o caso do Partido Socialista, é difícil haver bons resultados e mobilizar as pessoas, particularmente no mundo do trabalho.
Neste domínio, o trabalho precário, em Portugal, hoje, com um Governo socialista, há quatro anos e meio, é dos mais elevados nos países da União Europeia.
O trabalho suplementar não remunerado ultrapassa os limites do admissível.
O recurso ao trabalho temporário absorve milhares de trabalhadores sem vínculo laboral.
Os «recibos verdes» ilegais são cada vez mais uma situação normal, perante os olhos do Governo socialista.
Os jovens à procura de emprego vêm o seu futuro adiado, porque sem uma oportunidade de emprego não podem construir a sua autonomia, organizar a sua família, programar o seu futuro.
O desemprego atinge, hoje, números cada vez mais impressionantes e que ultrapassam de longe as estatísticas oficiais.
Este é o resultado do Governo PS e, num quadro de emergência social, torna-se mais necessária a intervenção das autoridades competentes para assegurar a legalidade das relações laborais.
Quando grassa o flagelo do desemprego e se assiste diariamente ao encerramento de mais e mais empresas, como é o caso presente, a importância da Inspecção-Geral do Trabalho (IGT) é acrescida, uma vez que importa evitar abusos praticados por alguns, especialmente quando a relação sociolaboral está desequilibrada.

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O papel da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) é sancionatório, mas também tem de ser pedagógico, preventivo e dissuasor de más práticas e, por isso, os seus meios devem ser adequados às necessidades de uma época de crise social, como a que vivemos.
Sucede que, apesar das repetidas promessas do Governo socialista de reforçar os meios humanos daquela Autoridade, os dados que temos e os relatos que nos chegam são completamente inaceitáveis. De facto, os reforços humanos prometidos há vários anos, particularmente pelo anterior titular da pasta do Ministério do Trabalho, se tivessem sido cumpridos, totalizariam, hoje, largas centenas de inspectores na IGT.
Mas não existem e não existem, também aqui, porque as promessas não passaram disso mesmo.
Depois, a instituição que devia fiscalizar a utilização de falsos «recibos verdes» é a primeira a ter funcionários contratados com esses mesmos falsos «recibos verdes».
E, quando o mau exemplo vem de cima, quando é o Estado, por orientação do Governo socialista, a ter esta conduta, está tudo dito. Ora, o PSD discorda e condena, em absoluto, esta situação! Sr. Presidente, Srs. Deputados: Sendo verdade que as relações laborais são muito importantes — e respeitamos, de uma forma clara e inequívoca, as iniciativas legislativas aqui em debate —, consideramos que a questão central que hoje preocupa os portugueses e as famílias portuguesas são os dramas do desemprego, o desemprego que angustia centenas de milhares de famílias.
Muitos desempregados, cansados e desiludidos, já não acreditam nos serviços públicos de emprego e desistiram de se inscrever nos centros de emprego.
Milhares de pessoas trabalham meia dúzia de horas semanais e, só por esse facto, já não são consideradas para as estatísticas do desemprego.
Milhares de desempregados estão em acções de formação profissional ou de baixa médica e, por esse mesmo facto, também não contam para as estatísticas do desemprego.
Ou seja, Sr. Presidente e Srs. Deputados, os números reais do desemprego, em Portugal, são claramente superiores às estatísticas oficiais, já ultrapassam, de forma inequívoca, os 600 000 desempregados e, se nada for feito, o drama ainda será maior, no futuro.
Para o Governo, parece que apenas contam os desempregados das grandes empresas, que são objecto de notícia na comunicação social e adquirem visibilidade pública.
Mas o grande caudal de desempregados são os trabalhadores provenientes das micro e das pequenas empresas, que contribuem para o Orçamento do Estado e para a segurança social como as outras, mas foram sempre, e são hoje mais do que nunca, o parente pobre das políticas públicas.
Cabe ao Governo, todos o sabemos, a responsabilidade das políticas para ajudar as empresas e as famílias em situações difíceis, mas os resultados medíocres dessas políticas, até hoje implementadas pelo Governo, demonstram o seu falhanço e a necessidade de mudarmos de rumo.
Porém, em vez de agregar vontades e energias positivas, o Governo PS rejeita as propostas construtivas que o PSD tem apresentado.
E o mesmo fez, e faz, em relação aos parceiros sociais. É estranho, de resto, que, numa crise com a dimensão económica e social como esta, as opiniões dos representantes dos empresários e dos trabalhadores não sejam mobilizadas por quem tem essa obrigação política e devidamente valorizadas.
O governo anterior nunca foi capaz nem se preocupou em ouvir os parceiros sociais e agregar os seus contributos aos do Executivo, para juntos responderem aos problemas do País.
O actual Governo, talvez pela formação da Sr.ª Ministra do Trabalho, anunciou o seu empenho em negociar um pacto nacional para o emprego com os parceiros sociais.
Considerámos (nós, sociais-democratas) na altura, e consideramos hoje, que era um bom caminho. É nas situações difíceis, como a que atravessamos, que o diálogo social é mais importante e mesmo indispensável.
Defendemos, por isso, um pacto para o emprego assente numa estratégia positiva, que envolva o Governo e os parceiros sociais em torno de políticas que contribuam para o relançamento da economia nacional e que funcionem para os trabalhadores, para os empresários e para o País como um sinal de confiança.
Mas para nossa surpresa, ontem, no debate aqui travado sobre o desemprego, nem uma palavra do Governo sobre o anunciado pacto para o emprego... Silêncio que, só por si, diz tudo, Srs. Deputados: o Governo lançou essa ideia, mas não a trabalha, não a aprofunda, não acredita nela e não sabe o que fazer com ela.

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Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Arménio Santos (PSD): — Esperamos que a ideia desse pacto não se resuma à «espuma» de mais um anúncio, feito com o show off do costume e que caracteriza a generalidade das medidas do Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece claro que o Governo não está a fazer o que devia fazer para evitar aos portugueses sacrifícios maiores.
As exigências do momento não se compadecem com pequenas políticas e é fundamental que o discurso e a prática governativas sejam marcadas pelo realismo, pela coragem e por uma energia moralizadora, capaz de devolver a esperança e a confiança aos portugueses.
Nós, sociais-democratas, acreditamos nos trabalhadores e nos empresários portugueses e estamos convictos de que é essencialmente com eles que se podem ultrapassar as dificuldades do presente e erguer um futuro com mais emprego e mais justiça social.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se dois Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Arménio Santos: A saúde e a segurança dos trabalhadores constituem também um direito que os governos PS, PSD e CDS não salvaguardam.
O acréscimo do horário de trabalho, com jornadas superiores às 8 horas, coloca em causa a saúde e o bem-estar dos trabalhadores e aumenta os riscos de doenças e de acidentes de trabalho em 61%, porque avoluma os níveis de fadiga. Hipertensão, doenças cardiovasculares, stress e doenças crónicas são alguns exemplos das consequências na saúde dos trabalhadores, com incidência na sua vida familiar e pessoal.
O acréscimo da jornada de trabalho conduz a alterações no rendimento dos trabalhadores. Horários de trabalho reduzidos em 45 minutos resultam numa melhoria do rendimento de trabalho entre 3 a 10%.
O trabalho nocturno e o trabalho contínuo por turnos também apresentam efeitos nocivos na saúde e bemestar dos trabalhadores, alterando os ritmos normais do organismo, o que afecta principalmente o sono e os hábitos de alimentação. Verifica-se ainda que o trabalho nocturno implica um menor nível de rendimentos e uma maior frequência de acidentes de trabalho.
As trabalhadoras da Tyco, por exemplo, têm níveis de incidência de doenças profissionais, nomeadamente tendinites, próximos dos 100%. Para não falar do stress e dos problemas psiquiátricos que levam os trabalhadores e as suas famílias a recorrerem à ajuda médica.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Não são só o PCP, as organizações de trabalhadores e os próprios trabalhadores que denunciam os efeitos nefastos, provocados pelo aumento da jornada de trabalho, na saúde dos trabalhadores. Esta análise é realizada por vários estudos científicos divulgados pela segurança social, mas que, infelizmente, já não se encontram disponíveis on-line. Por que será? Talvez porque não corroborem as opções políticas deste e dos anteriores governos. E apesar destas evidências, a opção do PS, com a conivência da direita, é de conservadorismo, retrocesso e regresso às situações de trabalho do séc. XIX.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Deputado, a questão que lhe coloco é a de saber se considera, ou não, que se deve proteger a saúde dos trabalhadores e evitar a ocorrência de acidentes e de doenças profissionais, devido à desregulamentação dos horários de trabalho.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Mourão.

O Sr. Mário Mourão (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Arménio Santos, a sua intervenção suscitou-me uma dúvida. O actual Código do Trabalho foi amplamente discutido na concertação social, onde estão representadas as centrais sindicais, uma das quais é composta por trabalhadores sociais-democratas e parece-me que ainda presidida por V. Ex.ª» Por isso, fiquei perplexo e confuso com a sua intervenção inicial.
Mas, naturalmente, comungo de algumas preocupações aqui referidas pelo Sr. Deputado e pelos outros grupos parlamentares, designadamente sobre o problema das horas extraordinárias não remuneradas, que, de facto, é preciso combater, devendo todos nós fazer um esforço no sentido de eliminarmos essa chaga que ainda existe, nomeadamente em sectores fundamentais.
Ouvi muitas vezes fora desta Câmara, porque ainda não tinha aqui assento, e oiço agora aqui também, falar sistematicamente — e vou aproveitar para falar de um sector que nos é comum, que tanto eu como o Deputado Arménio Santos conhecemos, porque ambos pertencemos ao mesmo — dos lucros da banca, mas nunca ouvi aqui dizer, por exemplo, que uma parte significativa desses lucros se deve ao trabalho, à dedicação e ao empenho dos trabalhadores bancários.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Mário Mourão (PS): — Assim, noto uma grande preocupação e oiço muito falar sobre os resultados desse sector, mas nunca ouvi aqui enaltecer, nem valorizar, a contribuição dada pelos trabalhadores bancários para os lucros da banca.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Arménio Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Paula Santos, partilho, em absoluto, da necessidade de o contrato de trabalho e de toda a legislação laboral acautelar as condições ao nível da higiene, saúde e segurança no trabalho, em ordem a que os trabalhadores, sejam eles quais forem e exerçam eles a profissão que exercerem, acautelem a sua saúde.
Naturalmente, há forças políticas e sindicais que, por vezes, se consideram «proprietárias» de direitos dos trabalhadores, «donas» dos trabalhadores. Acho que essa é uma visão redutora da sociedade. Nem os senhores são donos dos direitos laborais nem donos dos trabalhadores, nem nós ou qualquer outra força política somos estranhos a esses mesmos trabalhadores ou a esses mesmos direitos sociais.
De resto, eu lembrava à Sr.ª Deputada Paula Santos que aquilo que está consagrado em lei, ao nível dos direitos sociais e laborais e ao da higiene, segurança e saúde no trabalho, tem uma matriz, Sr.ª Deputada: uma matriz social-democrata — tem uma matriz do Partido Social-Democrata e esse facto orgulha-nos muito! Por mais que o Partido Comunista Português se arvore em grande defensor de grandes causas sociais não retira ao PSD esse grande património de justiça social, de melhorar as condições de trabalho nos locais de trabalho!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Já vamos ver na votação!

O Sr. Arménio Santos (PSD): — É porque o Partido Comunista Português contesta, mas tem uma grande dificuldade em construir e o Partido Social-Democrata privilegia a construção à destruição!

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

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No que respeita às questões suscitadas pelo Sr. Deputado Mário Mourão: Sr. Deputado, o facto de os sociais-democratas estarem na UGT — e estão lá de corpo inteiro — e terem partilhado as soluções que foi possível construir em sede de concertação social, no que respeita ao Código do Trabalho, não significa que haja unanimidade plena. Nós sentimo-nos bem assim! Nós, social-democratas, sentimo-nos sempre muito bem com o pluralismo interno! Nunca recebemos quaisquer directrizes que nos imponham um sentido único e o pensamento único.
Por isso, partilhámos e participámos na construção da solução que era possível e que nos pareceu que era a mais adequada, a mais razoável. Porquê? Porque negociar e construir uma solução em sede de concertação social significa que deve haver abertura e flexibilidade de todos os intervenientes, em ordem a chegar-se a um compromisso.
Ora, um compromisso significa ceder, de todas as partes envolvidas e naturalmente que demos o nosso contributo positivo, construtivo e não nos arrependemos disso. Bem pelo contrário! Mas isso não nos retira a autonomia de expressar livremente a nossa opinião. E foi em homenagem a essa autonomia e à nossa independência de opinião que expressámos na altura também as nossas divergências pontuais, tal como o fizemos noutros locais e hoje aqui, em coerência, de resto, com o sentido de voto que expressámos na Comissão de Trabalho, Segurança Social e Administração Pública, em sede de especialidade, tal como o fizemos também na votação final global deste mesmo Código do Trabalho, aqui, no Plenário da Assembleia da República.
No que respeita à questão dos bancários: o Sr. Deputado Mário Mourão não é obrigado a ler tudo nem a ter conhecimento de tudo, mas eu recomendava-lhe que lesse as posições dos bancários sociais-democratas, onde eles se expressam; ao contrário de outros que defendem, por exemplo, que a banca não deve ter lucros, como se, de facto, a banca ou qualquer empresa privada fossem a «Santa Casa da Misericórdia«» Mas nós não defendemos isso, hoje; nós defendemos isso sempre, desde o 25 de Abril, e não é depois de 1978 ou de 1980; não, não, é desde o 25 de Abril de 1974!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Arménio Santos (PSD): — Somos consequentes, somos coerentes, sempre respeitámos a iniciativa privada e os objectivos das empresas!

Aplausos do PSD.

Nós dissemos isso e foi também em coerência com essa nossa postura que expressámos a nossa opinião sobre as injustiças que ocorrem ao nível do trabalho suplementar.
Entendemos que deve haver trabalho suplementar para resolver os problemas das empresas, sejam elas de que sectores forem, mas que os trabalhadores devem ser justamente remunerados. Tal como defendemos que os trabalhadores devem cumprir zelosamente as suas obrigações profissionais, também exigimos a contrapartida das entidades patronais, porque só assim é que há justiça, só assim é que há condições para que as duas partes funcionem e convirjam, de forma enérgica, para optimizar os resultados da entidade que os une, que é a empresa.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Arménio Santos (PSD): — A empresa tem de beneficiar do trabalho dos seus colaboradores e também tem de beneficiar do empreendedorismo dos titulares, dos empresários, dos administradores dessa empresa. E nós somos coerentes com aquilo que sempre defendemos quer na banca quer em qualquer outro sector de actividade.
Agradeço-lhe a tolerância, Sr. Presidente.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Gambôa.

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A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Comunista Português agendou, hoje, um debate centrado na sua iniciativa legislativa, o projecto de lei n.º 8/XI, sobre a eliminação dos mecanismos de aumento do horário de trabalho.
A este debate associou-se o Bloco de Esquerda com a iniciativa legislativa do seu projecto de lei n.º 117/XI, que visa a alteração ao Código do Trabalho no mesmo sentido, sob o pretexto da humanização dos horários de trabalho.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: O objectivo central destes projectos de lei consiste na eliminação dos mecanismos de adaptabilidade individual e grupal, do banco de horas e dos horários concentrados, previstos no Código do Trabalho. Este instrumento de gestão da organização do tempo de trabalho integra a reforma das relações laborais que o Partido Socialista propôs e que constitui, em nosso entender, um importante factor de facilitação da promoção da competitividade das empresas e do reforço dos níveis de empregabilidade dos nossos trabalhadores, a que acresce a emergência de um novo equilíbrio, por uma via negocial, entre a adaptabilidade e a segurança no emprego, entre as necessidades das empresas e a conciliação da vida profissional, familiar e pessoal, não alargando os limites da duração do tempo de trabalho, há muito vigentes no nosso país e alcançados, historicamente, pela mão do Partido Socialista, em 1996.
Analisando as iniciativas legislativas do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda naquilo que têm em comum, verificamos que pretendem, de uma assentada e «fazendo tábua rasa» da evolução das relações laborais em Portugal e dos acordos de concertação social, eliminar os mecanismos da adaptabilidade individual e grupal, o banco de horas e os horários concentrados.
Acresce que o Bloco de Esquerda vai mais longe: não só propõe a eliminação daqueles mecanismos de adaptabilidade, como propõe a redução diária e semanal do tempo de trabalho sem explicar o impacto dessa medida no plano da sustentação das pequenas e médias empresas, que tanto gostam de invocar, e a protecção dos níveis de empresa no nosso país.
Observando, então, cada um destes regimes de adaptabilidade consagrados no Código do Trabalho, sublinhamos a excepção do regime da adaptabilidade individual; em todos os restantes, verifica-se a intervenção do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho. Isto é, estes três regimes de adaptabilidade estão protegidos por uma arma poderosa e fundamental — instrumento que sindicatos já se habituaram a utilizar para, através dele, defenderem e protegerem direitos individuais e colectivos dos trabalhadores portugueses.
Mas, então, onde está o problema destes regimes, com estes horários de trabalho? Será que a negociação colectiva é um instrumento pouco credível, mal usado pelos sindicatos, ou mesmo usado pelos sindicatos contra os trabalhadores? Mas, então, em quem confiar, Sr.as e Srs. Deputados?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — No PS»!

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Não são as organizações dos trabalhadores, no formato do sindicato, o garante da sua representatividade e da sua capacitação negocial? Separam-nos visões ideológicas sobre estas matérias, mas tanto o Partido Comunista como o Bloco de Esquerda, estamos certos, acreditarão que os sindicatos são capazes de conduzir e de se responsabilizar pela defesa dos interesses dos trabalhadores, quando, por exemplo, em 2009, negociaram 361 instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, neles abrangendo 1 558 308 trabalhadores.
Este processo negocial, sabemo-lo todos, tem crescido todos os anos, desde 2005, após uma alteração cirúrgica feita ao Código do Trabalho de 2003, através da Lei n.º 9/2006, de 20 de Março, ultrapassando, então, em 2008, um valor histórico que permitiu que 1,8 milhões de trabalhadores fossem protegidos em sede de negociação colectiva.
A importância para os trabalhadores das vantagens do processo de negociação colectiva fica espelhada nestes números. Para nós, estes dados confirmam o lado forte do Código do Trabalho, que decorre das áreas negociadas entre parceiros.
Não parecem restar dúvidas quanto a esta constatação.

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Ao impor na lei laboral o processo de utilização do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, reforçou-se o lado mais frágil das relações de trabalho, as condições de trabalho e os direitos dos trabalhadores. Criaram-se, desta forma, mais regras e mais garantias para ambos os parceiros, porque sabemos bem que a organização do tempo de trabalho não é igual — não o pode ser — em todas as empresas e sectores, atendendo às suas especificidades.
Decorre, então, destas considerações que o importante é — será sempre — reforçar o papel da negociação colectiva, no enquadramento mais abrangente da concertação social.
Para o Partido Socialista, a negociação colectiva é determinante; o Partido Socialista acredita no diálogo social, enquanto instrumento colectivo da regulação das relações e interesses dos grupos sociais interdependentes, como é o caso dos trabalhadores e dos empregadores.
A construção de soluções que sirvam os interesses dos trabalhadores e que dignifiquem os empregadores na sua responsabilidade social, no respeito pelo custo do trabalho e pelo valor do trabalho digno são uma mais-valia deste diálogo social.
Acresce que a gestão dos recursos humanos, no sentido da obtenção de ganhos quer para o trabalhador quer para a empresa, é hoje uma questão central nos contextos das diferentes adaptabilidades no mundo do trabalho que apresentam, hoje, tão rápidas transformações.
Não são só os movimentos do capital internacional, que facilmente muda de mão; são também os processos produtivos, os mercados, o saber e as competências; é também a concorrência entre os povos, que hoje o mundo do trabalho confirma.
Apesar deste diagnóstico, sabemos que em Portugal é possível conciliar a indispensável modernização da nossa economia e das nossas empresas com a formação e valorização dos trabalhadores. As provas disto que acabo de referir estão aí e resultam do esforço negocial dos trabalhadores, dos empregadores e, em muitos casos, da intervenção do próprio Estado.
Modernizar o tecido empresarial e reforçar a formação, o saber, a valorização dos trabalhadores e das suas competências é uma escolha, é também uma decisão; é a nossa escolha, Srs. Deputados! Mas a realidade, Sr.as e Srs. Deputados, impõem-se-nos todos os dias e é também nesta matéria dos horários de trabalho que as empresas mais competitivas em Portugal aplicam já, já há bastante tempo, acordos com os trabalhadores, que possibilitam processos de gestão do tempo de trabalho, que se traduzem nos seus desempenhos e na sua capacidade de criar emprego — vários acordos em sectores tão importantes, já aqui, hoje, referidos, como o têxtil e o automóvel, em que a Autoeuropa continua a ser uma realidade de que todos, justamente, temos de nos orgulhar; e também agora, mais recentemente, a Administração Pública veio juntar-se a esta nova batalha pela representação dos interesses dos seus trabalhadores.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Aqueles que consideravam o Código do Trabalho como uma oportunidade perdida para a liberalização dos despedimentos e outros atropelos aos direitos dos trabalhadores têm nesta lei laboral a resposta impeditiva; mas, também aqueles que, agarrados a um passado que já passou, querem descredibilizar a negociação colectiva, o poder negocial dos representantes dos trabalhadores têm nesta lei laboral um impedimento de futuro. E o futuro, Sr.as e Srs. Deputados, estamos certos disto, vai transformar a negociação colectiva num instrumento de gestão das relações laborais, mas também num instrumento para o exercício da autonomia responsável dos empregadores, dos trabalhadores, nos actuais contextos laborais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Maria José Gambôa, vários Srs. Deputados.
Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Gambôa, a posição do CDS é cristalina, transparente e até estamos um pouco a latere desta discussão. O CDS sempre defendeu a

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flexibilidade e a mobilidade laborais. A adaptabilidade individual e grupal, o banco de horas, o horário concentrado sempre foram defesas nossas e já estavam presentes no nosso Código e na nossa proposta de 2003. Portanto, quanto a essa matéria, temos a consciência tranquila e, como disse, esta questão passa-nos um pouco ao lado.
Entendemos que as relações laborais devem ser livremente negociadas entre empregadores e trabalhadores, que é quem está mais directamente interessado em regular os seus interesses e em defendêlos. Portanto, somos contra demasiada rigidez, demasiada ortodoxia e concentração centralista nesse tipo de negociações.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Muito mal!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sabemos que há partidos que desde sempre defenderam esse centralismo e essa concentração, mas essa é uma posição histórica.
O que nos espanta, Sr.ª Deputada, tenho de dizê-lo, é a posição do Partido Socialista, porque em 2003, aquando da apresentação da proposta do Código do Trabalho por parte do CDS-PP, o PS opôs-se e votou contra, em especial em relação aos artigos 60.º e 64.º, que respeitavam precisamente à adaptabilidade individual e grupal, e disseram, como já aqui foi também referido, que seriam autênticas bombas e cataclismos no mundo laboral que iram cercear os direitos e as liberdades dos trabalhadores e, pura simplesmente, cair abruptamente sobre eles.
O PS, pelos vistos, mudou de opinião e, em 2009, aprovou precisamente essas normas no Código que actualmente está em vigor. Embora nos congratulemos com essa mudança de opinião do PS, que mostra que alguma luz se fez no espírito da bancada socialista, não poderemos deixar de perguntar o porquê dessa mudança.
Significa essa mudança que o PS reconhece que, em 2003, ao opor-se da maneira que se opôs a estas mesmas normas, usando os argumentos que invocou, estava a actuar como um partido da oposição que segue uma lógica de interesse meramente partidário, em detrimento e prejuízo dos interesses do País, e que em 2009, já no poder, vem reconhecer que efectivamente a posição correcta era a que o CDS propôs em 2003?

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Portanto, ao assim actuar, embora se registe positivamente essa mudança, não podemos deixar de lamentar que, durante seis anos, o PS condenou a área laboral a um atraso, a uma rigidez e a uma imobilidade que penalizou o País.
Esta é a primeira pergunta que lhe deixo.
Em segundo lugar, Sr.ª Deputada, também ligado com esta matéria, gostaria de lhe colocar outra pergunta.
Embora este Código adopte propostas que já eram do CDS desde 2003, não as adoptou na plenitude, tendolhes introduzido algumas mudanças. Como é que explica, pois, que com a entrada em vigor deste Código a contratação colectiva, que a Sr.ª Deputada referiu na sua intervenção como o ponto fundamental de toda a política laboral, tenha caído 18% e, neste momento, abranja menos 400 000 trabalhadores do que abrangia à data em que vigorou o Código proposto pelo CDS?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Rodrigues.

A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Gambôa, a Sr.ª Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social anunciou o programa Iniciativa Emprego 2010. E fê-lo sem o escrutínio dos resultados da iniciativa de 2009. Com efeito, tudo o que se sabe e está na página oficial do Governo são apenas alguns números e não uma avaliação rigorosa e completa.

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No entanto, o que importa é anunciar mais e mais medidas com grande operação mediática, mesmo que o resultado seja pouco ou nenhum na melhoria das condições de vida dos portugueses.
Anuncia-se pouco e, infelizmente, concretiza-se muito pouco.
Nesta lógica de anúncio, o Governo apresenta a nova iniciativa para 2010 antes de a levar à concertação social, como foi denunciado pelos parceiros sociais. Isto diz bem do desrespeito que este Governo tem pela concertação social, que, quando é feita, visa apenas cumprir calendário e não obter os contributos que potenciariam o sucesso da medida, porque a sobrevivência mediática do Governo a isso obriga. O que importa são os anúncios pomposos. Será que ninguém se importa com os resultados? Nós importamo-nos, Sr.ª Deputada.
Passemos, então, aos resultados.
A Sr.ª Ministra lá foi admitindo o baixo grau de execução da Iniciativa Emprego 2009. E o maior fracasso foi sem dúvida a medida da redução de três pontos percentuais das contribuições para a segurança social a cargo do empregador, em micro e pequenas empresas, para trabalhadores com mais de 45 anos. O anterior governo previu apoiar com esta medida 513 000 trabalhadores. Porém, só pouco mais de 194 000 foram apoiados.
E porquê este fracasso, Sr.ª Deputada? À Sr.ª Ministra não podemos assacar ainda responsabilidades, mas da Sr.ª Deputada e da sua bancada podemos e queremos uma explicação.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Não foi falta de divulgação da medida, como a Sr. Ministra justificou.
Acusar um governo socialista de incapacidade de divulgação seria quase um insulto.

Vozes do PSD: — Exactamente!

A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — A Sr.ª Deputada não ignorará que só as empresas com uma situação contributiva regularizada perante a segurança social poderiam ser abrangidas por esta medida. Ora, neste cenário de crise generalizada, são muito poucas as pequenas e médias empresas (PME) que têm a sua situação contributiva regularizada perante a segurança social.
O remédio deveria ser dado às empresas doentes, mas só as empresas sãs o puderam tomar. Porquê, Sr.ª Deputada? Fica, assim, bem claro que o desígnio do Governo não é o combate ao desemprego, como a Sr. Ministra ontem aqui profetizou.
Não sabemos ainda bem qual é o desígnio deste Governo mas, face à situação em que o País se encontra, sabemos que o seu objectivo é, claramente, a cobrança cega de impostos.
Esta é uma opção completamente errada.
O cerco que este Governo lançou às PME, onerando-as com uma pesada carga fiscal, impedindo-as de aceder aos poucos apoios que foram surgindo e ignorando os seus apelos para o pagamento faseado das dívidas, foi responsável pelo encerramento de inúmeras dessas empresas e pelo consequente agravamento do desemprego.
O combate ao desemprego e o equilíbrio das contas públicas tem de assentar na redução do peso da despesa pública no PIB e não no aumento de impostos.
Diga-nos, então, Sr.ª Deputada: além da sobrevivência mediática, qual é o desígnio deste Governo que VV.
Ex.as sustentam e apoiam?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Gambôa, começo por fazer um prévio esclarecimento.

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Falou aqui de um conjunto de acordos de empresas e de negociações sectoriais em que houve flexibilidade horária — algumas adaptabilidades negociadas, quantas vezes sob chantagem desses sectores e desses sindicatos —, mas em caso nenhum conseguiu aqui citar acordos desse género de borla, como está no Código do Trabalho. Não há casos ou circunstâncias em que não tenha havido contrapartidas do ponto de vista pecuniário e outras para os trabalhadores. Portanto, não vale a pena tentar misturar coisas que estão em categorias diferentes apenas para tentar impressionar o debate político. Não impressiona, porque não são factualmente rigorosos.
Numa coisa tem razão: há aqui posições ideológicas diferentes. Escuso-me de comentar qual é a posição ideológica do Partido Socialista, mas a posição do Bloco de Esquerda é fundada numa ideia humanista, de solidariedade, de valores socialistas. Aliás, também Manuel Alegre e outros Deputados socialistas tiveram uma posição ideológica ao votar contra este Código do Trabalho. Ou não terão tido uma posição ideológica?! Será que Manuel Alegre, ao votar contra este Código do Trabalho, não reivindicou uma posição ideológica?! Não considerou que o Código estava colado a uma filosofia neoliberal?! Não considerou que a forma como foi tratado o princípio do tratamento mais favorável aos trabalhadores era um golpe contra a Constituição da República?! Não foi isso que aconteceu? Ou já omitimos a história política?! A incomodidade do Partido Socialista é grande sobre esta matéria.
Portanto, quanto a este ponto, estamos de acordo: há aqui posições ideológicas diferentes.
No entanto, os Deputados da primeira fila da bancada do Partido Socialista só falaram de empresas. Não falaram dos direitos dos trabalhadores! Não falaram da conciliação. Falaram das empresas! E, aliás, falaram mal acerca da competitividade das empresas. Que competitividade do sector da distribuição é que se ganha com acordos deste género? Era bom fundamentar um pouco essa matéria.
Para permitir à Sr.ª Deputada respostas muito concretas, vou colocar-lhe duas perguntas.
Numa delas, concedo» O Partido Socialista considera que nós não fizemos um exame acerca das consequências económico-sociais da introdução das 35 horas semanais de trabalho — o que, aliás, tem muito a ver com a partilha do emprego no período em que se verifica a maior taxa de desemprego em Portugal.
Mas, então, eu retribuiria a pergunta à Sr.ª Deputada Maria José Gambôa. Há exactamente 11 anos, o Partido Socialista e António Guterres contemplaram no programa eleitoral e no Programa do Governo as 37 horas semanais de trabalho — nós, aqui, fazemos uma concessão e ficamos com as 37 horas»! Sr.ª Deputada, que avaliação faz da proposta das 37 horas, que o Partido Socialista abandonou? Está a dizer que, há 11 anos, quando propuseram as 37 horas, toda a sua bancada era inconsciente?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O Deputado Jorge Strecht já cá estava!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — O Deputado Jorge Strecht e todos os outros defenderam isso há 11 anos atrás! O que é que se passou 11 anos depois? O neoliberalismo cavalgou. Não se passou absolutamente mais nada.
Por outro lado, Sr.ª Deputada, esta engenharia sobre a adaptabilidade resulta unicamente no não pagamento de horas extraordinárias, ou seja, vai baixar os custos do trabalho à entidade patronal. Não resulta em absolutamente mais nada! Coloco-lhe uma pergunta muito concreta, Sr.ª Deputada Maria José Gambôa: para a competitividade, não é o modelo de baixos salários que o Partido Socialista defende? Estamos ou não perante o Partido Socialista no seu melhor? Os senhores disseram hoje aqui, neste debate, que para haver competitividade no mercado internacional temos de ter baixos salários. Foi o que o Partido Socialista hoje, aqui, defendeu. Deixo-lhe a pergunta muito concreta: é ou não é o modelo de baixos salários que está ínsito no Código do Trabalho e que foi hoje aqui defendido pela bancada do Partido Socialista? Ao tempo, o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista, Manuel Alegre e vários Deputados do Partido Socialista votaram contra — sim senhor! —, porque tinham posições ideológicas diferentes!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Gambôa.

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A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as questões que me colocaram e que, para cada grupo parlamentar, surgiram como as mais pertinentes.
Ao Sr. Deputado do CDS-PP diria o seguinte: o Partido Socialista não tem nenhum grau de incoerência quando, não aprovando o Código em 2003, vem, em 2009, recolocar um conjunto de questões face ao mundo laboral. O Partido Socialista não tem nenhuma dificuldade em assumir que lê os sinais do tempo, nomeadamente os sinais da economia, os sinais das relações laborais e os sinais das necessidades acrescidas a todo este contexto.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Só não lê os sinais da Constituição!

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Nessa medida, a proposta que o Partido Socialista apresentou em 2009, do ponto de vista da nossa profunda convicção, integra uma significativa regulamentação de uma alteração relativa a um espaço aberto que são os horários de trabalho. Estamos, assim, absolutamente convencidos de que a proposta que consagramos no Código do Trabalho tem todas as condições para ser respeitada no processo negocial. Digamos que a proposta do Partido Socialista para os diferentes horários de trabalho está armadilhada com um processo que ultrapassa o próprio Partido Socialista e que não lhe pertence, porque pertence aos trabalhadores, às suas organizações, porque tem sede de negociação colectiva, porque tem uma sede autónoma que não precisa dos Deputados nem dos partidos para poder realizar essas matérias.
Sr. Deputado, penso que respondi ao conjunto de questões que colocou.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Não respondeu à questão relativa à contratação colectiva!

A Sr.ª Maria José Gambôa: — Sr.ª Deputada Carla Rodrigues, quando vimos para um debate desta natureza, devemos respeitar o conteúdo desse debate. Mas percebo as tentações. Também sou mais velha que a Sr.ª Deputada, pelo que tenho obrigação de perceber o que é o debate parlamentar e as suas tentações.
Quero dizer-lhe apenas uma coisa muito simples: os desígnios do Partido Socialista são os desígnios de fortalecer a vida dos portugueses,»

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Vê-se!

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Se o Sr. Deputado me permitir, concluo.
Como eu dizia, os desígnios do Partido Socialista são os desígnios de fortalecer a vida dos portugueses — dos empregados, dos desempregados, dos homens e das mulheres.
São estes os desígnios que levam à aprovação de pacotes como aquele que foi aprovado, na semana passada em Conselho de Ministros, assim como de todos os outros que têm vindo a dirigir-se a uma população concreta de desempregados, de gente em sofrimento, de gente com imensas dificuldades em pensar que pode levantar a cabeça no futuro. É isto que preocupa o Partido Socialista e é para estes sectores que, hoje, especificamente, o Partido Socialista dirige medidas.
A Sr.ª Deputada repetiu algumas das preocupações que a Sr.ª Ministra aqui expressou, pelo que penso ter ficado informada em relação às preocupações que sustentam também o conjunto de desígnios da governação do Partido Socialista.
Gostaria de responder de uma forma muito séria ao Sr. Deputado Luís Fazenda, dizendo-lhe que não me preocupam as clivagens ideológicas comigo, consigo, com os meus camaradas do Partido Socialista. É isto também que constrói a nossa capacidade de pensar sobre as coisas. Sabemos que somos nós que fazemos a História, mas sabemos que também a História nos condiciona e nos influencia.
Portanto, é uma dinâmica muito dialéctica aquela que nos coloca, muitas vezes, em ângulos de reflexão.
Percebo bem as suas preocupações. Até lhe posso dizer que, provavelmente, não nos afastamos muito em termos do conjunto das preocupações que nos unem. Porém, compreendo também duas dimensões importantes.

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Hoje, o Partido Socialista está confrontado com um conjunto de realidades económicas que exigem determinados rigores. Não censuramos o projecto do Bloco de Esquerda, que vem a esta Câmara recolocar questões importantes do ponto de vista dos horários de trabalho, mesmo na sua perspectiva de redução.
Dissemos apenas que — e penso que concordará —, na devida proporção, um melhor debate fortaleceria a sustentabilidade da informação que ele contém e os objectivos a que ele se propõe e permitiria, inclusivamente, um melhor debate.
Mas, Sr. Deputado, não tenho qualquer dúvida de que estamos juntos nalgumas coisas muito importantes para os trabalhadores portugueses. Uma delas é a criação de instrumentos legais, e outros, que os protejam de um capital que, por vezes, salta de mão em mão mais tempo e mais rapidamente do que aquilo que nós desejamos e de uma sociedade que, às vezes, aos nossos olhos, se perde perante nós próprios, sem que a possamos controlar no tempo devido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Maria José Gambôa, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Gambôa, já aqui foi claramente explicado que a proposta de desregulamentação do horário de trabalho não diz respeito a uma questão de competitividade da nossa economia, mas, sim, de aumentar a exploração dos trabalhadores.
Deixo-lhe uma pergunta muito clara: como é que a Sr.ª Deputada e o seu grupo parlamentar convivem com o facto de esta medida que o Partido Socialista hoje defende, a desregulamentação dos horários de trabalho, implicar a redução dos salários dos trabalhadores em cerca de 25% a 30%, em sectores com baixos salários, que rondam os 500 € e os 600 €? Como ç que lida com isso, Sr.ª Deputada? Faço agora não uma pergunta, mas um agradecimento, pois a Sr.ª Deputada deixou um alerta.
Também os trabalhadores da Administração Pública têm razões para se preocuparem, porque o que está em cima da mesa é a desregulamentação dos horários de trabalho igualmente neste sector importantíssimo.
Quero, pois, deixar este alerta para dizer que consideramos inaceitável que se alargue a desregulamentação do horário de trabalho para os trabalhadores da Administração Pública.
Fica provado que o Partido Socialista opta por atacar um sector, para, depois, logo em seguida, atacar o outro e atacar, no fundo, todos os trabalhadores para, supostamente, nivelar.
O Partido Socialista, assim, não é responsável pelas conquistas históricas do horário de trabalho. É, sim, responsável pelos retrocessos que se impuseram ao longo da História no que diz respeito ao horário de trabalho.
Pergunto à Sr.ª Deputada como é que lida com o facto de uma Convenção da OIT ter estipulado, em 1919, oito horas para trabalhar e oito horas para descansar.
A Sr.ª Deputada elogia a negociação colectiva. É ou não verdade que existem formas de desregulamentar o horário de trabalho individualmente, juntamente com o trabalhador, imposto pelo patrão ao trabalhador? Existe ou não adaptabilidade individual? Existem ou não horários concentrados? Sr.ª Deputada, pensa mesmo que um trabalhador, quando assina um contrato de trabalho, e nele lhe é imposto automaticamente uma adaptabilidade individual, tem poder negocial? Considera isso, Sr. Deputada? Por fim, na negociação colectiva, como é que lida com o facto de o Partido Socialista ser o responsável pela caducidade dos contratos colectivos de trabalho, que não permite aos sindicatos negociar de igual para igual com o patronato e lutar contra estas medidas? Como é que explica esta medida e como é que se justifica a posição do Partido Socialista?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Gambôa.

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Sr. Presidente Sr. Deputado Jorge Machado, em nome do Partido Socialista, digo-lhe que não há desregulamentação dos horários de trabalho. Consulte o Código! O senhor é

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jurista, pelo que sabe ler melhor do que muitos dos Deputados presentes — tem formação para isso — os textos legais constantes do Código do Trabalho! Não há exploração, porque ela está absolutamente contornada pelos textos legais constantes do Código do Trabalho. Se os trabalhadores, hoje, ganham menos do que ganharam, Sr. Deputado, é porque sempre ganharam menos, é porque os salários dos trabalhadores foram sempre iludidos à custa dos seus suores de 20 horas de trabalho a mais por semana! E por mês! E por ano!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Não é verdade! Ganham 25% menos!

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Os salários dos trabalhadores foram sempre aldrabados em nome do trabalho extraordinário! Isso é algo que o Sr. Deputado não pode negar.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Está a fugir à questão!

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — É por isso que os trabalhadores, que ilusoriamente tinham a ideia de que tinham salários reais, confrontam-se hoje com a ausência dessa quantia de dinheiro que lhes vem da exploração. Esta é a realidade!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tenho ouvido com atenção o debate que tem sido feito em torno deste agendamento potestativo do PCP e penso que, por vezes, há alguns Deputados que, embora talvez não vivam desfasados da realidade, querem ocultar essa mesma realidade. Ninguém, face às circunstâncias evidentes, consegue viver desfasado dessa realidade! Neste País há inúmeros trabalhadores que são confrontados com chantagens reais por parte das entidades patronais: ou se sujeitam ao que a entidade patronal quer ou, em alternativa, a ameaça é a perda de emprego.
É a isto que o PS chama de negociação, como se estivéssemos entre duas partes iguais, como se a própria lei aprovada pelo Partido Socialista determinasse que estamos perante duas partes iguais. Mas não, porque, à partida, há uma delas que é mais forte, que é a entidade patronal. Mas, graças à lei aprovada pelo Partido Socialista, essa parte, a entidade patronal, ficou ainda mais forte no seu poder de negociação, leia-se concretamente «no seu poder de chantagem». É isto que deve ser verdadeiramente denunciado e que é inaceitável.
A Sr.ª Ministra do Trabalho, há pouco tempo, na Assembleia da República, veio manifestar a posição do Governo relativamente à imposição das 60 horas semanais de trabalho que a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição queria fazer aos seus trabalhadores. Esses trabalhadores fizeram a ameaça de greve que todos muito bem conhecemos, o que levou, depois, a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição a recuar.
Dizia a Sr.ª Ministra que o Governo nada tinha a ver com aquela imposição e que até não estava a violar a lei. Resta saber se alguém, no Partido Socialista e no Governo, conseguiu aperceber-se de algum problema naquela imposição que a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição queria fazer. Será que, para o PS, se tratava de um problema ou de uma coisa perfeitamente natural, até decorrente da lei? Era importante perceber isto. Para a Sr.ª Ministra, ao que parece, não havia qualquer problema, porque não estavam a violar a lei.
Ora, a questão é que o problema reside exactamente na lei aprovada pelo Partido Socialista.
Gostava de saber, pois ainda não o conseguimos perceber no decurso deste debate — se calhar, nem vamos perceber — se o trabalho sem direitos é um pressuposto da competitividade. Será que é assim? Será que algum Sr. Deputado entende e consegue fazer esta afirmação peremptória perante o que aprovam na Assembleia da República? O trabalho sem direitos é um pressuposto da competitividade? Quando foram aprovadas medidas relativamente ao aumento do IVA, afectou-se ou não a competitividade? O pagamento especial por conta afecta ou não a competitividade? As dívidas do Estado às empresas afectam

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ou não a competitividade? Relativamente a essas matérias, não ouvimos o Partido Socialista apregoar a tão abençoada competitividade, que, pelos vistos, só querem defender retirando direitos aos trabalhadores.
Será que os diversos estudos provenientes de várias estruturas, que revelam que um dos factores determinantes para a produtividade é a existência de um trabalhador motivado e empenhado e nunca um trabalhador desgastado, até ao nível psicológico — o que, sabemos, tantas vezes acontece no nosso país —, não motivam o Partido Socialista a pensar que, com a alteração ao Código do Trabalho, aquilo que está a fazer, em nome de uma competitividade, que não vai salvar absolutamente nada, é que os trabalhadores sejam sobrecarregados em vários aspectos, diminuindo, portanto, a produtividade? Isso não será relevante para o próprio Partido Socialista? A felicidade das pessoas que, tantas vezes, noutras discussões, apregoaram não será algo a que essas mesmas pessoas têm direito, por parte de um olhar sensível da Assembleia da República e do próprio Governo?

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Por que é que o Partido Socialista, em 2003, estava tão empenhado na defesa dos direitos dos trabalhadores, como demonstraram vários debates parlamentares, e depois, quando se viu com maioria absoluta, uma das primeiras e mais graves medidas que tomou foi justamente a alteração do Código do Trabalho, reforçando ainda mais a precariedade de direitos dos trabalhadores? É justificar aquilo que não é justificável.
A Sr.ª Deputada pode até dizer que, quando apresentaram a proposta de Código do Trabalho, já estavam na iminência de uma crise, aquela que, nessa mesma altura, recusavam, que diziam não existir. Então, já estavam a tomar medidas para uma crise quando diziam que ela ainda não existia?! Como se este Código do Trabalho viesse resolver algum problema económico e não viesse, na verdade, sobrecarregar os trabalhadores de problemas! Quando o Código do Trabalho foi discutido na Assembleia da República, o CDS — todos nos lembramos — elogiou enormemente a aproximação que o PS fez à sua lógica de trabalho. Acho que, nessa altura, tudo ficou respondido em relação à posição ideológica que o Partido Socialista tomou.
O Código do Trabalho está em vigor há cerca de um ano, mas quando as coisas se demonstram falidas há que alterá-las, vigorem elas ao tempo que vigorarem.
Vêm falar da compatibilização da vida pessoal»

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino, sim, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, vêm falar da compatibilização da vida pessoal com a vida profissional, mas aquilo que fazem com este Código do Trabalho, através da desregulamentação dos horários de trabalho e da precarização do trabalho, é, justamente, «dar uma machadada» nessa compatibilização.
O PS desvaloriza o factor trabalho, e todos os trabalhadores em Portugal devem ter isso em conta.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate convoca-nos a todos a pensar um pouco sobre o que, hoje, são regras essenciais do nosso Código Laboral, do nosso mundo do trabalho e sobre a necessidade que todos temos, enquanto sociedade, de, cada vez mais, conseguirmos introduzir regras de flexibilidade, de adaptabilidade no nosso mercado de trabalho, mas fazê-lo sempre com um princípio, que é o da paz social, o da negociação colectiva, o de acreditarmos que os trabalhadores e os empregadores podem, através de uma negociação séria, proteger e defender os seus interesses.
É assim que, em todas as sociedades desenvolvidas, e nos nossos parceiros europeus mais prósperos, se consegue encontrar um conjunto de regras que protegem os interesses de uns e os interesses de outros. E

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quando se protegem os interesses dos trabalhadores e, ao mesmo tempo, os interesses dos empregadores, o que estamos a fazer é a defender os interesses das empresas, que são a soma de todos estes interesses individuais.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Mas uns são mais individuais do que outros!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O CDS tem o orgulho de poder dizer que contribuiu para a entrada em vigor do primeiro Código do Trabalho, muito dinamizado pelo ministro António Bagão Félix, que foi responsável pelo grande incentivo da contratação colectiva que se verificou em Portugal a partir do ano de 2004,»

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — » ano em que foi regulamentado esse mesmo Código do Trabalho.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — A verdade é que, desde 2004 até 2008 — reconhecendo, embora, que foram introduzidas algumas alterações pontuais às regras da negociação colectiva —, foi possível termos todos os anos mais instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho a serem assinados e mais trabalhadores a ser abrangidos pela contratação colectiva. É assim que, num modelo económico civilizado, num modelo económico de desenvolvimento, as coisas devem ser feitas.
Temos muito orgulho de termos colaborado nessa alteração da legislação laboral em 2003 e até de termos viabilizado, mais tarde, outras alterações, que permitiram caminhar sempre num sentido, que é o de proteger cada vez mais os trabalhadores e os empregadores.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — O que é curioso é que outros, que, na altura, nomeadamente em 2003, acusavam o CDS de estar a flexibilizar e a liberalizar em demasia o mercado de trabalho, hoje defendam exactamente as matérias em relação às quais, em 2003, votaram contra.
Em 2003, o artigo 164.º do Código do Trabalho, que previa a adaptabilidade dos horários de trabalho, e os artigos 165.º e 166.º do mesmo diploma, relativos aos regimes gerais ou aos períodos de referência dos horários de trabalho, foram reprovados pela bancada do Partido Socialista.
Na altura, ouvimos declarações muito inflamadas de altos dirigentes do Partido Socialista, como, por exemplo, do Sr. Deputado Artur Penedos, que dizia que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista estaria sempre em oposição à possibilidade de os trabalhadores terem uma semana de trabalho de 60 horas, porque «é excessiva, extremamente violenta e em nada contribuirá para o aumento da produtividade, nem beneficiará as empresas ou os trabalhadores«,»

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — » mas, curiosamente, hoje, o Partido Socialista já aceita estas matérias.
Ora, isto só me faz pensar que a postura do Partido Socialista é a daquela conhecida actriz do teatro de revista que fazia a rábula da «Olívia patroa, Olívia empregada».

Risos.

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Quando se defendia o interesse dos trabalhadores, a «Olívia empregada» berrava contra a sua entidade patronal, mas, enquanto «Olívia patroa», dizia, muitas vezes, que era preciso comprimir os direitos dos trabalhadores.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — O CDS-PP é sempre a «Olívia patroa»!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Ora, o Partido Socialista tem exactamente essa postura. Quando está na oposição, parece muitas vezes a «Olívia empregada» e, quando está no poder, parece a «Olívia patroa». Infelizmente, este é o Partido Socialista que temos e, infelizmente, esta é a coerência da bancada da maioria que temos.
Pela nossa parte, sabemos que é preciso manter sempre uma linha essencial: defender, hoje, os interesses dos empregadores e os interesses dos trabalhadores é, acima de tudo, defender o interesse das empresas.
Se o Partido Socialista, hoje, diz que é preciso ler os sinais, para não dizer que muda de opinião, eu lançolhe um desafio: leiam os sinais, leiam os sinais da nossa economia, leiam os sinais do nosso desemprego, leiam os sinais das falências, leiam os sinais dos números da pobreza.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Leiam estes sinais e percebam que, tal como o CDS tinha razão em 2003, também hoje tem razão quando vos diz que, para combater o desemprego e para estimular a nossa economia, o que é preciso é ler os sinais, e ler os sinais é apostar verdadeiramente nas micro, pequenas e mçdias empresas; ler os sinais ç baixar significativamente o pagamento especial por conta;»

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — »; ler os sinais — para terminar, Sr. Presidente — é, de facto, pôr o Estado a pagar a tempo e horas às empresas; ler os sinais é o que conseguimos fazer ontem aqui no Parlamento, ou seja, reduzir o prazo de devolução do IVA de mais de 90 dias para 30 dias; ler os sinais é trabalhar por aqueles que exigem que nós aqui, no Parlamento, demos uma resposta definitiva à sociedade portuguesa.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No fundo, a questão que está presente neste debate é a de saber onde é que cada força política traça a linha de defesa dos direitos dos trabalhadores e como é que se posiciona perante a dicotomia entre o trabalho e o capital, entre o empregador e o empregado.
Perante esta contradição de interesses que se verifica, em que as partes, ao contrário do que muitos discursos aqui querem fazer crer, não têm as mesmas armas, não são iguais perante a realidade, a lei tem de proteger a parte que é mais fraca e não tratar as partes de forma equiparada. Foi isso que a Constituição de 1976 impôs à legislação do trabalho e é isso mesmo que está a ser violado nestas leis laborais, designadamente pelo Partido Socialista, que esteve do lado dos direitos dos trabalhadores na Constituição de 1976.
Aliás, quem ouvisse, sem olhar para as bancadas, os discursos que aqui foram feitos pelo PS, pelo PSD e pelo CDS, provavelmente, teria dificuldade em dizer qual dos Deputados era do PS, do PSD ou do CDS, tal foi a identificação dos discursos e o carácter retrógrado das afirmações.
Poderíamos falar aqui de muitos mais exemplos que têm chegado ao nosso conhecimento, como o da Citroën, em Mangualde, que aplicou um banco de horas antes mesmo de ele existir na lei e que obriga os trabalhadores que gozam licença de maternidade e de paternidade ou que pedem dispensa para assistência à

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família a compensar obrigatoriamente esses dias ao fim-de-semana, porque é esse o interesse da empresa. É esta a conciliação do Partido Socialista! É esta a conciliação dos partidos da direita! Falou-se aqui muito de competitividade, mas nós já sabemos o que é que isso quer dizer: é sempre a aumentar a exploração à custa de quem trabalha. Nunca é, por exemplo, a atacar os privilégios da EDP, para diminuir os custos de produção, é sempre a diminuir os direitos dos trabalhadores! Agora, já ouvimos o patronato, com a arma da caducidade das contratações colectivas que o PS lhe deu, a dizer, como dizia um dia destes o Vice-Presidente da Toyota, que a alternativa que é dada às empresas com este contrato colectivo é a de pagar o trabalho suplementar ao fim-de-semana ou perder uma encomenda por não a conseguirem fazer dentro do prazo.
Se há trabalho extraordinário, é preciso pagá-lo, e é preciso pagá-lo condignamente. Essa não é a alternativa que os patrões querem; o que eles querem é trabalho extraordinário com horários alargados, mas sem pagamento, de borla, à custa do esforço dos trabalhadores, não recompensado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exactamente!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E quem aqui tanto falou de competitividade sabe bem que o que está em causa é isto.
O Partido Socialista disse aqui, pela voz de um dos seus Deputados, que estava preocupado com as horas extraordinárias não pagas. Mas qual é a solução do PS para isto? É simples: elas deixam de ser extraordinárias, logo deixarão de ser pagas e já não há qualquer problema. Fica contente o patrão e fica prejudicado o trabalhador.
Há quem diga também que há uma contradição entre o combate ao desemprego e este projecto de lei que aqui apresentamos. Nada de mais falso! O que acontece é que muitos grupos económicos que utilizam estes mecanismos de flexibilidade do horário de trabalho estão, com isso, a evitar contratar mais pessoas para postos de trabalho que realmente existem, mas que eles não querem criar, porque, assim, lhes sai mais barato, explorando mais os trabalhadores.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vou já terminar, Sr. Presidente.
É isso que está em causa.
Não existe qualquer promoção da competitividade em permitir que os grupos da distribuição explorem mais os trabalhadores sem lhes pagarem condignamente. Isso não é a favor da competitividade, é contra a criação de emprego e é a favor do aumento do desemprego.
No fundo, a questão que hoje temos aqui é a de saber, nesta sociedade desenvolvida em que queremos viver, a quem é que deve aproveitar o progresso, se é possível aceitar que, quando o mundo, a tecnologia e a ciência progridem, aqueles que trabalham e criam a riqueza tenham de regredir nos seus direitos. Nós dizemos que não é possível aceitar isso e não aceitaremos que essa realidade se torne verdadeira.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaríamos de ter feito uma pergunta ao CDS-PP, mas não houve oportunidade para isso, devido à falta de tempo, mas a pergunta ainda é oportuna.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Pode ceder-nos tempo!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Bagão Félix, quando observou as primeiras provas do Código do Trabalho do Partido Socialista exclamou: «Este Código »« — o novo — «» está á direita do meu«. O que queríamos perguntar hoje ao CDS-PP era se corroborava essa afirmação e se assinava por baixo, porque, na verdade,

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nós, infelizmente — deve ser essa a leitura dos sinais dos tempos —, consideramos que este Código do Trabalho ficou à direita daquele que foi produzido pela direita. Veja-se bem onde as coisas chegaram! Esse tem sido o sentido da acusação muito concreta que os partidos da esquerda têm feito.
O que é verdadeiramente grave neste debate não é a rejeição dos projectos de lei mas, sim, o facto de, a uma só voz, o Partido Socialista recusar sequer a mínima abertura para debater matérias de trabalhos com os partidos à sua esquerda. Não tem, não quer ter e não vai ter! Encontrou uma aliança prática com os partidos da direita e, hoje, o Código do Trabalho é bíblia! Está escrito na pedra! Por isso, não vai ser discutido tão cedo.
O Partido Socialista não quer discutir os direitos do trabalho, não tem abertura a esse debate com os partidos à sua esquerda. E o dado conclusivo deste debate é a aliança prática com os partidos da direita e é um tabu na legislação do trabalho.
Não temos a possibilidade de ter esse debate político com o Partido Socialista, porque, de outro modo, o Partido Socialista teria chegado hoje aqui a este debate e dizia: «Não concordamos com estes projectos de lei dos partidos que se situam à nossa esquerda, mas estamos abertos a um debate, vamos debater algumas das matérias em concreto».
Ou será que não vem da realidade profunda, das contradições gritantes da nossa sociedade, o que está a acontecer com o agravamento da exploração do trabalho e com o aviltamento de todo um conjunto de circunstâncias como estas ligadas à penalização do horário de trabalho e das condições da prestação do trabalho?! Isso não está a acontecer?! O Partido Socialista não sabe que isso está a acontecer?! O Partido Socialista não teve qualquer palavra de atenção! Não chegou aqui com qualquer abertura! Não trouxe qualquer sinal de debate! O sinal dos tempos foi, simplesmente, estabilidade legislativa, competitividade e «não se mexe no Código do Trabalho». Portanto, é essa a conclusão deste debate.
Era bom que, em determinados momentos, quando vem falar da incapacidade de debate com os partidos à sua esquerda, o Partido Socialista arranjasse um espelho, porque isso se verifica em todas as grandes matérias sociais e políticas, como temos vindo a observar.
Portanto, o que hoje aqui temos, Sr. Presidente, é a repetição, na legislação de trabalho, das alianças que estão a ser feitas para o Orçamento do Estado, é o «tripé» governativo. Passem as encenações políticas, passem as várias considerações e desideratos de um ou de outro partido, mas a verdade é que o Partido Socialista e o Partido Popular ou o Partido Social Democrata entendem-se aqui nestas questões como se entendem na orientação política orçamental. Não admira que os partidos da direita se orientem assim — eles próprios hoje o disseram.
O Partido Popular desafiou várias vezes o Partido Socialista a admitir que eles foram a «candeia que foi à frente e que alumiou duas vezes», mas o Partido Socialista, acerca disso, hoje nada disse.
Na verdade, o Partido Socialista é um partido conservador, é um partido que se encostou aos valores liberais e à selvajaria de mercado, ao capitalismo selvagem.

Protestos do PS.

Quando o Partido Socialista aqui trouxe a questão ideológica, na confrontação das nossas propostas e das nossas ideias, fez bem, porque nós continuamos a defender valores socialistas, democráticos e modernos, enquanto a bancada do PS está rendida a um Código do Trabalho que é a bíblia do neoliberalismo.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Strecht.

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate que aqui travámos, no essencial, resume-se a uma enorme falácia dos partidos proponentes dos respectivos projectos de lei.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — O que é espantoso é que tenham a coragem de dizer uma coisa que sabem que é falsa: que houve alteração da carga horária. É falso!

Página 40

40 | I Série - Número: 024 | 22 de Janeiro de 2010

O regime do horário legal em vigor é de 40 horas, 8 horas diárias. E eles sabem muitíssimo bem que a hora extraordinária é aquela que é prestada depois das 40 horas. A adaptabilidade significa apenas e só que a média das 40 horas e das 8 horas diárias pode ser alterada por acordo.
Mas mais: eles sabem que o Código do Trabalho veio atempadamente, e bem, evitar uma efectiva desregulação na questão da adaptabilidade, porque há cláusulas contratuais, negociadas antes da entrada em vigor do Código, que são hoje nulas por força das baias que o Código introduziu na questão da adaptabilidade.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — É isso que os senhores sabem e deveriam aqui honestamente reconhecer.
Ora, os senhores sabem também que as horas extraordinárias, as reais horas extraordinárias, são pagas.
Mas sabem igualmente que não são pagas, infelizmente, em todos os sectores. Só naqueles que organizadamente as monopolizam, com isso proibindo o acesso ao mercado de trabalho dos trabalhadores que delas carecem e a elas não têm direito por estarem «prisioneiras» dessas mesmas organizações.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — E isso é contra o emprego! Isso é contra os trabalhadores! Isso não é uma atitude de esquerda!

Aplausos do PS.

Os senhores sabem e têm que reconhecer que a matriz do Partido Socialista se mantém constante e coerente»

Vozes do BE e do PCP: — Ahh!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — » e sabem que o vosso catastrofismo repousa numa concepção escatológica de sociedade, que o Partido Socialista recusou no passado, recusa no presente e sempre recusará no futuro.

Vozes do PS: — Muito bem!

Protestos do Deputado do BE Luís Fazenda.

O Sr. Jorge Strecht (PS): — É isso que os senhores têm escondido e não têm a coragem para o afirmar frontalmente.
Os senhores digam à Câmara: é o Estado o único empregador? Deve ser o Estado só e só o Estado o empregador? Reconhecem ou não que a empresa é muito mais do que capital/trabalho? É mais por uma razão singela: é que não há trabalho se não houver empresa, e os senhores têm de reconhecê-lo. Se não forem capazes de o reconhecer, têm que esconder a matriz ideológica. Talvez mais o Bloco do que o próprio Partido Comunista»!

Risos do PS.

O Partido Comunista, apesar de tudo, aguarda ainda os «amanhãs que cantam». É ainda uma tragédia para a humanidade a queda do Muro de Berlim» Mas o Bloco, nisto, é bem mais «malandro«, passe a expressão,»

Risos do PS.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — «Malandro»?!

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41 | I Série - Número: 024 | 22 de Janeiro de 2010

O Sr. Jorge Strecht (PS): — » porque esconde habilmente aquilo que não pode frontalmente dizer aos portugueses e vive de uma deriva populista que teve o seu tempo, mas, provavelmente, com o evoluir da história, será consumida»

A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): — Muito bem!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — » e, portanto, a prazo, veremos onde se reconduzem esses eleitores.
Por isso, digam a verdade. 40 horas, 8 horas diárias e a adaptabilidade tem vários travões: a convenção colectiva, mais de 60% da unidade respectiva que tem de aceitar, apesar de a convenção ter de prever, e, mais, trabalhadores que estejam abrangidos por convenções que não reconheçam, nem sequer se lhes pode aplicar.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Ó Srs. Deputados, os senhores falam de quê? Falam de que código? Os senhores não querem é reconhecer que o Código foi absolutamente indispensável para a defesa dos direitos dos trabalhadores.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Strecht, a «malandrice» do Bloco de Esquerda chama-se democracia e socialismo.

Aplausos do BE.

Risos do PS.

A «malandrice» do Bloco de Esquerda foi ter votado, por razões ideológicas, contra este Código do Trabalho, no qual foi muito bem acompanhado, como se deve recordar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Não há mais Srs. Deputados inscritos, pelo que damos por concluído o agendamento requerido pelo PCP para apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 8/XI (1.ª), tendo sido também apreciado o projecto de lei n.º 117/XI (1.ª), do BE.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.
Conforme os Srs. Deputados sabem, quem não puder sinalizar a presença por meio electrónico, deve comunicá-lo à Mesa e, depois, registar a sua presença junto dos serviços de apoio ao Plenário.

Pausa.

Em regra, o Deputado é aquele que se levanta e que fala. Neste caso, é aquele que se senta e regista.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 221 presenças (95 do PS, 75 do PSD, 20 do CDS-PP, 16 do BE, 13 do PCP e 2 de Os Verdes), havendo, por isso, quórum de deliberação.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 8/XI (1.ª) — Elimina os mecanismos de aumento do horário de trabalho (PCP).

Página 42

42 | I Série - Número: 024 | 22 de Janeiro de 2010

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do CDS-PP, votos a favor do BE, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PSD.

O projecto de lei n.º 117/XI (1.ª) — Altera o Código do Trabalho, no sentido da humanização dos horários de trabalho, apresentado pelo Bloco de Esquerda, que esteve hoje também em discussão, será votado oportunamente, depois de concluída a discussão pública.
Srs. Deputados, assim concluímos os trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, com início às 10 horas, tendo como ordem do dia a eleição de um Juiz para o Tribunal Constitucional e um agendamento do Bloco de Esquerda para apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 12/XI (1.ª) — Altera as regras da atribuição do subsídio de desemprego, introduzindo uma maior justiça social, sendo também apreciado, em consequência, os projectos de lei n.os 5/XI (1.ª) — Reforça a protecção social em situação de desemprego (PCP) e 133/XI (1.ª) — Alteração ao DecretoLei n.º 220/2006, de 3 de Novembro, que alarga o apoio aos beneficiários do subsídio de desemprego e estimula a contratação de desempregados (CDS-PP).
Haverá eventuais votações no final do debate e também votações regimentais.
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 46 minutos.

Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita

Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues

Partido Popular (CDS-PP):
Paulo Sacadura Cabral Portas

Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003, de 11 de
Outubro):

Partido Socialista (PS):
Glória Maria da Silva Araújo

Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques
José Eduardo Rego Mendes Martins

Partido Popular (CDS-PP):
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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