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Quinta-feira, 7 de Outubro de 2010 I Série — Número 10
XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 6 DE OUTUBRO DE 2010
Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama
Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Abel Lima Baptista
Pedro Filipe Gomes Soares
SUMÁRIO 1.ª Parte. — Às 15 horas, e dando início à Sessão Solene Comemorativa do Centenário da Implantação da República, entrou na Sala das Sessões o cortejo em que se integravam o Presidente da Assembleia da República, os Vice-Presidentes, os Secretários da Mesa, a SecretáriaGeral da Assembleia da República, o Director do Gabinete de Relações Internacionais e Protocolo e o Chefe de Gabinete do Presidente da Assembleia da República.
No Hemiciclo encontravam-se já os Deputados e Ministros.
Encontravam-se ainda presentes, nas tribunas e galerias, os Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal de Contas, o Presidente do maior partido da oposição, o Procurador-Geral da República, o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, o Provedor de Justiça, o Secretário Regional da Agricultura e Florestas dos Açores, os Chefes dos EstadosMaiores da Armada e do Exército e o Vice-Chefe de Estado da Força Aérea dois Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, os Vice-Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça, o Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana, o Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, o Secretário-Geral da Presidência da República, o Secretário-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros o Chefe do Protocolo do Estado, o Presidente da Câmara Municipal de Loures, a Presidente da Assembleia Municipal de Lisboa, em representação do Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, o Comandante Naval e o Comandante do Comando das Forças Terrestres, o anterior Presidente da República Mário Soares, os anteriores Presidentes da
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Assembleia da República Oliveira Dias e Almeida Santos, o anterior Primeiro-Ministro Pinto Balsemão, o Corpo Diplomático, o Director do Gabinete do Parlamento Europeu em Portugal, os Secretários de Estado, o representante do Presidente do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa, o Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados, o representante da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, o Presidente do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida, o Presidente da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, membros da Comissão da Liberdade Religiosa, a Direcção da Associação dos ex-Deputados da AR, os familiares de Anselmo Braamcamp Freire e outras individualidades convidadas, os representantes dos órgãos de comunicação social e o público.
Constituída a Mesa, a Banda da Guarda Nacional Republicana executou o hino nacional.
Seguiram-se os discursos dos Srs. Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), Francisco Lopes (PCP), Fernando Rosas (BE), Assunção Cristas (CDS-PP), Pacheco Pereira (PSD) e Maria de Belém Roseira (PS), do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Jorge Lacão) e do Sr. Presidente da Assembleia da República.
A sessão foi suspensa eram 16 horas e 6 minutos, tendo sido, de novo, executado o hino nacional pela Banda da Guarda Nacional Republicana.
2.ª Parte. — O Sr. Presidente declarou reaberta a sessão às 17 horas 4 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa das apreciações parlamentares n.os 63 a 65/XI (2.ª), dos projectos de resolução n.os 268 a 278/XI (2.ª) e dos projectos de lei n.os 428 e 429/XI (2.ª).
Foram apreciados os projectos de resolução n.os 158/XI (1.ª) — Recomenda ao Governo a criação de um portal Internet dedicado à exportação de produtos portugueses (PS) e 269/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a criação de uma central de vendas e promoção on-line de produtos portugueses (CDS-PP), sobre os quais se pronunciaram os Srs. Deputados Jorge Seguro Sanches (PS), Hélder Amaral (CDS-PP), Nuno Reis (PSD), Agostinho Lopes (PCP) e Pedro Filipe Soares (BE).
A Câmara apreciou também, em conjunto, os projectos de resolução n.os 261/XI (2.ª) — Recomenda medidas urgentes a adoptar pelo Governo em matéria de protecção e valorização da floresta (PSD), 267/XI (2.ª) — As áreas protegidas e os incêndios florestais de 2010 (PCP) e 273/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a adopção de medidas para prevenir os incêndios florestais (BE), tendo proferido intervenções os Srs. Deputados Paulo Batista Santos (PSD), Agostinho Lopes (PCP), Pedro Soares (BE), José Luís Ferreira (Os Verdes), Abel Baptista (CDS-PP) e Miguel Freitas (PS).
Foram discutidos, conjuntamente, o projecto de lei n.º 325/XI (1.ª) — Remoção de amianto em edifícios, instalações e equipamentos públicos (Os Verdes), na generalidade, e os projectos de resolução n.os 268/XI (2.ª) — Prioridade na execução das medidas associadas à exposição, utilização e remoção de amianto previstas na Estratégia Nacional para a Segurança e Saúde no Trabalho 2008 — 2012 (CDS-PP) e 271/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a adopção de medidas para prevenir e mitigar os riscos da exposição ao amianto nos edifícios públicos (BE), sobre os quais se pronunciaram os Srs. Deputados Heloísa Apolónia (Os Verdes), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Rita Calvário (BE), Acácio Pinto (PS), António Cabeleira (PSD) e Paula Santos (PCP).
Foram discutidos conjuntamente a petição n.º 64/XI (1.ª) — Apresentada por Luísa Jacinta Soares Dias Ferreira e outros, solicitando à Assembleia da República a preservação, restauro e manutenção do Complexo das Sete Fontes, bem como a proibição de construção nas suas imediações, e os projectos de resolução n.os 270/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a conclusão do processo de classificação do Complexo Monumental das Sete Fontes (CDS-PP) e 276/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a publicação do despacho de classificação do Complexo das Sete Fontes e a adopção de medidas para a sua protecção (BE). Intervieram os Srs. Deputados Maria Antonieta Dias (CDS-PP), Pedro Soares (BE), Miguel Macedo (PSD), Agostinho Lopes (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes) e Miguel Laranjeiro (PS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 51 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Distintos e Ilustres Convidados,
declaro aberta a Sessão Solene Comemorativa do I Centenário da República.
Eram 15 horas.
Neste momento, a Banda da Guarda Nacional Republicana, colocada junto aos Passos Perdidos, executou
o Hino Nacional.
Deputados presentes à sessão:
Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Ana Paula Mendes Vitorino
Anabela Gaspar de Freitas
António Alves Marques Júnior
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Aurélio Paulo da Costa Henriques Barradas
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Catarina Marcelino Rosa da Silva
Defensor Oliveira Moura
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Frederico de Oliveira Castro
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Rosendo Gonçalves
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pereira Ribeiro
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Rui Alves Duarte Cruz
João Barroso Soares
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Paulo Feteira Pedrosa
João Paulo Moreira Correia
João Pedro de Aleluia Gomes Sequeira
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Júlio Francisco Miranda Calha
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Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luís Miguel Soares de França
Luís Paulo Costa Maldonado Gonelha
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Marcos Sá Rodrigues
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Figueiredo de Sousa Rebelo
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Luísa de Jesus Silva Vilhena Roberto Santos
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto
Maria Odete da Conceição João
Maria da Conceição Guerreiro Casa Nova
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Miguel de Matos Castanheira do Vale de Almeida
Mário Joaquim da Silva Mourão
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Miguel da Costa Araújo
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rui José Prudêncio
Rui José da Costa Pereira
Sofia Isabel Diniz Pereira Conde Cabral
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Teresa do Rosário Carvalho de Almeida Damásio
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Brandão de Sousa Fontes
Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Adão José Fonseca Silva
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Agostinho Correia Branquinho
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Antonieta Paulino Felizardo Guerreiro
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Cândido Monteiro Cabeleira
António Fernando Couto dos Santos
Arménio dos Santos
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria Gomes Barros
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Celeste Maria Reis Gaspar dos Santos Amaro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isabel Maria Nogueira Sequeira
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Cláudio de Bacelar Gouveia
Jorge Fernando Magalhães da Costa
José Alberto Nunes Ferreira Gomes
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Matos Correia
José de Almeida Cesário
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
João Carlos Figueiredo Antunes
João José Pina Prata
Luís António Damásio Capoulas
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto
Maria Manuela Dias Ferreira Leite
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria Teresa Machado Fernandes
Maria Teresa da Silva Morais
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
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Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Raquel Maria Martins de Oliveira Gomes Coelho
Sérgio André da Costa Vieira
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vânia Andrea de Castro Jesus
Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Artur José Gomes Rêgo
Cecília Felgueiras de Meireles Graça
Filipe Tiago de Melo Sobral Lobo D' Ávila
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Rodrigo Pinho de Almeida
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Maria Antonieta Antunes Dias
Maria de Assunção Oliveira Cristas Machado da Graça
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Paulo Sacadura Cabral Portas
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Heitor Nuno Patrício de Sousa e Castro
Helena Maria Moura Pinto
José Borges de Araújo de Moura Soeiro
José Guilherme Figueiredo Nobre de Gusmão
José Manuel Marques da Silva Pureza
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
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Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira
Pedro Filipe Gomes Soares
Rita Maria Oliveira Calvário
Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Rita Rato Araújo Fonseca
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira
O Sr. Presidente: — Em representação do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Membros do Governo, Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Sr. Presidente do Tribunal Constitucional, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Convidados: Numa altura em que comemoramos o centenário da implantação da República, importa, antes de mais, realçar a importância que esse feito, essa vitória, representou para o nosso destino colectivo.
O 5 de Outubro de 1910, ou os Homens que fizeram desse dia um dia diferente, que rasgaram outros caminhos, para que diferentes fossem também os nossos dias, a partir daí, conseguiram pôr termo ao esgotado sistema político vigente, um regime monárquico, completamente fora de tempo e tão distante da quase totalidade dos portugueses e dos seus problemas.
A implantação da República é, sem dúvida, um marco muito importante da nossa História. Importante não só por ter posto fim à Monarquia mas também pelo que representou em termos de progresso, no plano dos direitos humanos, no plano social, na laicização do Estado e na liberdade religiosa, na consagração do serviço público.
E se é verdade que a República nos trouxe todo este valiosíssimo património, numa altura em que era visível a iniciativa popular, também é verdade que a mesma República conheceu governos, que, desprezando as promessas feitas, procederam a violentos ataques ao movimento sindical, quando os sindicatos protestavam ou pediam contas, face às promessas feitas. Estas ofensivas ao movimento sindical terão favorecido um certo enfraquecimento do apoio popular à República, que, certamente, em nada contribuiu para contrariar o Golpe Militar de 1926.
Um golpe militar que instituiu a ditadura fascista e que impôs profundos retrocessos, como o fim da liberdade de expressão e de imprensa, a promiscuidade entre o Estado e a Igreja, a proibição do livre associativismo e de criação de partidos políticos ou, ainda, o fim de eleições livres. Retrocessos que só foram
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ultrapassados com o 25 de Abril de 1974, que representou, de certo modo, a reimplantação da República e dos seus ideais.
Com a Revolução dos Cravos foram repostas as conquistas da República, que tinham sido eliminadas pelo Estado Novo, mas o 25 de Abril representa muito mais do que isso e foi, tal como o 5 de Outubro, à sua época, extremamente progressista e avançado, em termos de concepção de uma sociedade livre, aberta, moderna e enformada de preocupações de serviço público e de solidariedade social.
E se é verdade que, com Abril, reafirmámos a República e atingimos progressos notáveis, também é verdade que muito ficou por fazer — mais grave, quando constatamos que, nas últimas décadas, foram até dados passos atrás.
A reboque da União Europeia, da OMC e do FMI, os governos têm procedido à privatização e à liberalização da economia, ao esvaziamento do Estado, mas também ao ataque aos direitos de quem trabalha e dos mais desfavorecidos, deixando intactos os grandes poderes económicos.
É hoje fundamental defender o Estado social e vencer os desafios ambientais à escala global, o que só é possível garantindo os instrumentos que a República nos ofereceu, desde logo a liberdade.
Liberdade para recusar o actual modelo de pseudodesenvolvimento, insustentável do ponto de vista ambiental, que gera injustiças e perpetua desigualdades sociais.
100 anos é muito tempo. De facto, é muito tempo. Mas é o tempo de exigir responsabilidades a quem nos tem governado, cujas políticas conduziram à crise que vivemos.
É tempo de exigir uma cultura de responsabilidade aos governos que têm promovido uma injustíssima distribuição da riqueza e uma quase insultuosa repartição dos sacrifícios para responder à crise.
E o mais fácil não é o protesto e a reivindicação. Estas são faculdades que fazem parte do património da República e são o exercício de cidadania de quem não se conforma, de quem resiste.
O mais fácil é inaugurar 100 escolas, depois de encerrar 4000 escolas.
O mais fácil é proceder à inauguração de um hotel em Vidago sem passar pelas Pedras Salgadas e ouvir o que as populações têm a dizer sobre a requalificação do parque termal, que é da responsabilidade da mesma empresa e integrado no mesmo projecto de interesse nacional.
O mais fácil é recorrer aos falsos recibos verdes, para assegurar as comemorações do Centenário da República.
O mais fácil, mas muito pouco republicano, é culpar os mais desfavorecidos pelos erros das políticas praticadas. Isto, sim, é o mais fácil! 100 anos é muito tempo, mas é ainda tempo de exigir mais República e mais responsabilidade.
Viva a República! Viva o 25 de Abril!
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
Vozes do PCP: — Viva!
O Sr. Presidente: — Em representação do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Lopes.
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Srs.
Convidados: Assinalamos hoje um importante acontecimento da História de Portugal, o triunfo da Revolução Republicana de 1910, que pôs fim a um regime caduco e anquilosado. É indissociável de um forte sentimento de independência nacional e democracia e venceu com uma contribuição decisiva do movimento operário e popular. Promoveu significativas mudanças, no plano das liberdades e direitos fundamentais, da educação e da cultura, combateu a ignorância e o obscurantismo, implementou reformas positivas em relação à família e aos direitos das mulheres (não abrangendo, contudo, o direito de voto), concretizou a laicização do Estado e dotou o País de uma Constituição avançada para a época, a Constituição de 1911.
A implantação da República impulsionou importantes avanços, mas rapidamente o poder político se virou contra os trabalhadores e as suas organizações, defraudou expectativas populares, contrariou necessárias
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transformações, deixou praticamente intactas as estruturas económicas e sociais e prosseguiu uma política colonialista e de submissão, de que é exemplo a entrada de Portugal na I Guerra Mundial.
As concepções e apreciações laudatórias sobre a implantação da República não podem apagar as suas limitações, designadamente a violenta repressão sobre o movimento operário e sindical, que reduziu o apoio popular ao regime e a mobilização em sua defesa, tantas vezes decisiva, enfraquecendo a possibilidade de enfrentar com êxito a reacção monárquica e fascista.
Neste Centenário, impõe-se, contudo, valorizar o inegável conteúdo democrático e progressista do 5 de Outubro e combater as linhas de ataque à República, que visam justificar o Golpe Militar de 1926 e a instauração do fascismo, esconder o atraso e as injustiças a que este condenou o País e branquear os seus crimes. O fascismo não foi a correcção de erros ou insuficiências da República, mas, sim, a liquidação, por largas décadas, do que de mais positivo — em avanços e esperanças — esta representou.
Na nossa História, foi a Revolução de Abril que, pela sua densidade, profundidade e consequências, marcou a realidade nacional com notáveis avanços democráticos e progressistas. Iniciada com a acção dos militares e propulsionada pela participação decisiva dos trabalhadores e das massas populares, respondeu, em pouco tempo, com profundas transformações, às necessidades e aspirações dos trabalhadores, da juventude e do povo português, às exigências de liberdade, democracia, desenvolvimento, justiça social, paz e independência nacional, compromissos que inscreveu na Constituição da República Portuguesa de 1976.
Hoje, após mais de 30 anos de uma política contrária aos valores de Abril e à Constituição, subordinada às opções da integração europeia, que empurra o País para o declínio, as injustiças e desigualdades sociais, empobrecendo o regime democrático e amputando a soberania nacional, coloca-se a necessidade inadiável de promover a ruptura com o rumo que está a afundar o País e assegurar um caminho de desenvolvimento, democracia, justiça e progresso social.
República, povo, justiça social, democracia, soberania popular, independência nacional: aí estão fundamentos essenciais de Portugal, que a Constituição consagra e que devem ter tradução na vida. No entanto, em grande medida, eles foram substituídos por uma outra vinculação, a vinculação aos mercados financeiros e aos grupos económicos, sempre ao serviço dos seus interesses, da especulação, da dependência e contra os interesses nacionais e do povo português.
Quando ouvimos defender o brutal pacote de ataque aos trabalhadores, ao povo e ao País, que está em curso, e apelar à «união» e ao «compromisso», que mais não é do que uma união e um compromisso para prosseguir e acelerar o rumo de injustiças sociais e declínio nacional, afirmamos claramente que o caminho é outro.
O compromisso que se exige é o da responsabilidade da mudança. A ruptura e mudança para pôr Portugal a produzir, a criar emprego com direitos e a distribuir a riqueza com justiça. A mudança não com a subversão da Constituição, seja pela prática ou por projectos que a põem em causa mas, sim, com a sua efectiva concretização.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — A mudança para a concretização de um rumo patriótico e de esquerda, que cada vez mais se exige.
Quando ouvimos falar contra o exercício dos direitos constitucionalmente consagrados, afirmamos claramente que a mobilização e a luta dos trabalhadores, da juventude, do povo português, não é apenas um direito, é, acima de tudo, um dever. Um dever para com a sua própria vida, para impedir o desastre, para construir um futuro melhor.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — O 5 de Outubro e a Revolução de Abril de 1974 mostram que o povo português será o obreiro do seu futuro. Um futuro de soberania, justiça e progresso social, cuja concretização está e estará sempre nas suas mãos.
Viva a República! Viva Abril!
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Viva Portugal!
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
Vozes do PCP: — Viva!
O Sr. Presidente: — Em representação do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.
O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Cidadãs e Cidadãos: A República, implantada pela revolução popular de 5 de Outubro de 1910, cujo centenário ontem se assinalou, constituiu a primeira tentativa histórica de democratização e de modernização da sociedade portuguesa no século XX.
Sabemos hoje que, em aspectos essenciais, ela foi um projecto gorado e, depois, política e militarmente vencido pelo golpismo subversivo das direitas antiliberais e antidemocráticas emergentes, no primeiro quartel do século passado, por toda a Europa.
Mas nos propósitos matriciais da democracia moderna que enunciou, no que efectivamente realizou, no que tentou e não logrou realizar, isto é, mesmo na sua essencial incompletude, a I República é, sem dúvida, um património da luta emancipatória do povo e da esquerda portuguesa pela democracia, pelo progresso e pela justiça social.
A I República trouxe-nos, talvez, a mais importante reforma civilista das instituições do século XX: a separação do Estado e das igrejas, a laicidade do Estado e da escola pública, o casamento civil e o divórcio, o registo civil. Fundou, desde logo, para o ensino primário, o discurso moderno de defesa da escola pública (universal, obrigatória e gratuita). Criou as Universidades de Lisboa e do Porto e, com elas, o Instituto Superior Técnico, a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto e o Instituto Superior de Agronomia. Foi muito e foi pouco.
Efectivamente, essas reformas super-estruturais não se estenderam aos domínios vitais da democratização do Estado, da justiça social e do desenvolvimento económico.
A I República temeu democratizar o sufrágio e o funcionamento do sistema partidário, o que originou uma crise de legitimidade que está na origem da instabilidade que marcou a governação republicana.
A I República demonstrou, salvo raras e honrosas excepções, uma fundamental insensibilidade face à questão social, face à miséria da condição operária, largando em guerra contra as reivindicações sociais com uma dureza e um excesso que acabariam por alienar esse apoio vital em todos os momentos críticos da sua curta vida, que era o do operariado organizado.
A República, sem estabilidade para conduzir um processo de reformas económicas decisivas, acabou por transformar em desígnio nacional a participação suicidária do País na Grande Guerra. E, a bem dizer, não haveria de resistir à desastrosa tragédia humana, militar e financeira em que se saldaria o intervencionismo.
É bom lembrar, no entanto, que a República do pós-guerra viu nascer, pela primeira vez, ainda que de forma dispersa e difusa, uma esquerda republicana que pontualmente aliada ao movimento sindical irá formular, também pela primeira vez, um conjunto de reformas sociais e financeiras apontadas para uma reconfiguração regeneradora do ideal republicano. Mas era tarde: no confronto com as direitas golpistas e autoritárias, as esquerdas republicanas e operárias vão ser derrotadas em dois rounds.
O primeiro termina, incompleto, com o Golpe Militar de 28 de Maio de 1926, a que não conseguem opor-se.
O segundo começa onde o primeiro acaba: na decisão de resistir à Ditadura Militar de armas na mão.
A I República é também essa resistência civil e militar revolucionária, os combates derradeiros dessa guerra civil intermitente que oporá o «bloco do 5 de Outubro», tardiamente reconstituído, à ditadura e aos seus aliados.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Fernando Rosas (BE): — A República, devolvida à genuinidade progressista dos seus ideais, acabaria por cair nas barricadas do reviralhismo e da resistência operária e popular, cinco movimentos
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revolucionários e muitas conspirações depois e após uma tentativa de greve geral revolucionária e uma revolta dos marinheiros da Armada. Foi preciso, é bom recordá-lo, entre 1926 e 1939, um movimento repressivo sem precedentes no século XX para deportar, exilar, prender entre 15 a 20 000 pessoas com o fito de, sobre os escombros da I República, impor a Ditadura Militar e o Estado Novo.
Provavelmente, é essa República, retemperada e redescoberta com o sacrifício, até há poucos anos quase ignoto, de tanta gente; é essa República, que também ela inspirou a resistência à Ditadura Militar e ao Estado Novo; é essa República enquanto tentativa pioneira da democratização e da modernização social e política do País que faz sentido lembrar e assinalar nos seus 100 anos. Não para a comemorar ritualmente como ente «coisificado», jazente sem riscos de incómodo nas brumas do passado, mas para a celebrar, fazendo a República hoje, retomando o velho e sempre novo combate pela democracia política e social, pela justiça social, pelos direitos de quem trabalha, pela escola pública, pela saúde e pela segurança social para todos, pelos direitos das minorias, pela paz, por uma Europa democrática, cidadã e solidária. É essa a República da Rotunda, é essa a nossa República: sempre jovem, sempre combatente.
Viva o 5 de Outubro! Viva a República!
Aplausos do BE, de Deputados do PS e de Os Verdes.
Vozes do BE: — Viva!
O Sr. Presidente: — Em representação do Grupo Parlamentar do CDS-PP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Cristas.
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Ilustres Convidados: Hoje, no Portugal do século XXI, podemos falar em verdadeira liberdade quando cidadãos e empresas esperam anos por decisões judiciais ou quando os pais não têm possibilidades para terem os filhos que gostariam? Podemos falar em verdadeira igualdade quando o analfabetismo e a iliteracia ainda persistem ou quando sabemos que o nível de instrução dos pais é maioritariamente determinante do dos filhos? Podemos falar em verdadeira solidariedade quando a pobreza atinge praticamente dois milhões de portugueses, quando temos bolsas persistentes de exclusão, quando o fosso entre os mais ricos e os mais pobres se alarga, quando o contexto económico cria uma nova e antes improvável pobreza escondida na classe média portuguesa? A República é, em meu entender, a forma de governo mais democrática. Mas poderemos falar de verdadeira soberania popular quando nos sentimos amordaçados pelos credores internacionais? Quanta soberania, digo mesmo quanta liberdade dos portugueses que agora nascem fica hipotecada por um Estado que já vai a caminho de gastar mais em juros da dívida pública do que o que investe em toda a educação?
Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.
Ou ainda, noutro plano, que qualidade da democracia existe quando vemos o desinteresse das pessoas pelas eleições, a desconfiança em relação à palavra política e quando percebemos que quem escolhe os líderes políticos do País é um número cada vez mais reduzido de militantes partidários? Sr. Presidente, fazer justiça à República é também compreendermos o quão longe ainda estamos da plenitude dos seus princípios; é conseguirmos fazer a autocrítica de perceber que a I República em tantos casos se contradisse a si própria, com marcas de perseguições, de intolerâncias e com restrições de liberdades fundamentais. Confundir, ainda hoje, o princípio da igualdade republicana com a história concreta da I República pode satisfazer os critérios da correcção política mas não é um bom serviço prestado à verdade histórica.
Aplausos do CDS-PP.
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Senão, como explicar a emergência do Estado Novo, a sua longa duração e atraso, o seu carácter republicano e ao mesmo a negação dos princípios da liberdade e da igualdade? A III República, porventura a única verdadeira República democrática, só tem 36 anos, muitos deles agitados e traumáticos, e precisa de provar mais.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — De tudo o que da I República até hoje foi prometido, a educação é o que mais nos envergonha e torna o verso de Almada Negreiros «Sonhei com um país onde todos chegavam a Mestres» tão continuamente actual. Um verso que nos obriga a sonhar: a sonhar com um país onde a educação, desde a mais tenra idade, é universal, é rigorosa e é exigente, e por isso é um factor de realização pessoal, de mobilidade social e de desenvolvimento sustentado e produtivo de Portugal; a sonhar com um país onde todos podem chegar a todo o lado, onde o trabalho é valorizado e o mérito é premiado.
Aplausos do CDS-PP.
Sr.as e Srs. Deputados, o que o princípio republicano prometeu a todos os portugueses, sem excepção, foi a esperança de mais liberdade, de mais igualdade e de mais solidariedade. Estes princípios devem ser um mote suficientemente inspirador para nos despertar e desassossegar, para nos interpelar a fazer melhor, para termos a ousadia de querermos realizar agora um futuro mais luminoso. E esta interpelação dirige-se a todos os portugueses, porque, como dizia D. Manuel Clemente, «O melhor de Portugal pouco aparece e não abre geralmente os noticiários. Mas existe e é por ele mesmo continuamos nós a existir.».
E devemos começar por perguntar o que fazemos pela res publica e na res publica. Precisamos de nos sentir cidadãos, o que não passa só pelos partidos políticos mas passa também por eles. Quando cada jovem, ao preencher a sua primeira declaração de IRS, ganhar consciência fiscal, quando cada jovem, ao inscreverse num centro de emprego, ganhar preocupações sociais, então, terá um novo interesse em participar politicamente e, provavelmente, quererá influenciar a orientação dos partidos.
Precisamos de nos sentir cidadãos, com força e responsabilidade, para nos encontrarmos enquanto Nação que tantas vezes se superou e compreendermos que, em momentos particularmente difíceis como o actual, o que de bom alcançámos deve ser o alicerce para reinventar um percurso colectivo, com audácia, com imaginação e com tenacidade.
Aos inúmeros portugueses que hoje pensam «batemos no fundo» queremos dizer: é hora! É hora de mudar, de regenerar, de ter um novo projecto nacional.
Aplausos do CDS-PP.
Um projecto num mundo multicultural que Portugal ajudou a conhecer e por onde espalhou portugueses; num mundo que hoje também entra pelo nosso país e nos convida ao acolhimento com realismo e humanismo; num mundo que já não se joga entre poucas grandes potências mas em que, ironicamente, os fracos de ontem são hoje cortejados; num mundo com muitos centros, unidos pelo imenso mar que também fala português e que é, porventura, a nossa maior oportunidade; um mundo onde Portugal e os portugueses podem, com orgulho na sua História, assumir uma centralidade renovada e lançar as redes para novas colheitas.
Ainda caminhamos com dificuldade — a cada passo, até encontramos desilusão e carregamos fragilidades — , mas havemos de percorrer este caminho de liberdade, buscando mais igualdade de oportunidades e querendo uma sociedade com menos injustiça, com menos ostentação, com mais iniciativa e com mais humanidade.
Assumamos, de uma vez, a continuidade do nosso trajecto: são oito séculos e meio de História, os séculos da Monarquia e o século da República. Nenhuma nação com oito séculos e meio de História pode sequer hesitar quanto ao seu futuro.
Aplausos do CDS-PP.
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O nosso Estado de direito tem debilidades, mas a convicção do princípio republicano é a de poder dizer a qualquer menina ou a qualquer menino, em qualquer escola do nosso país, que um dia pode ser chefe de Estado, que um dia pode ser presidente de Portugal, que em Portugal todos podem ser tudo. Então, o que contará não será a nostalgia do que nos dividiu mas, sim, a acção que nos mobiliza.
Viva Portugal!
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Em representação do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Pacheco Pereira.
O Sr. Pacheco Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Srs. Convidados: Os 100 anos da instauração da República, que comemoramos hoje, realizam-se numa altura difícil para os portugueses, que não estão, aliás, muito voltados para comemorações, muito menos para aquelas que lhes podem parecer uma forma de legitimação de um estado de coisas em que os mais pobres estão a ficar mais pobres e a maioria dos portugueses vê roubada a sua esperança no futuro.
Por isso, as comemorações da República, temos de o reconhecer, não foram um momento de grande participação popular, sem que isso signifique que existe qualquer nostalgia pelo regime monárquico, cuja queda foi a principal consequência duradoura dos eventos de 5 de Outubro de 1910.
Desse ponto de vista, a revolução republicana deixou os portugueses na plenitude dos seus direitos de escolherem quem os governe, sem que, por razões de casta, família ou sangue, não pudessem escolher o primeiro magistrado da Nação. Os portugueses, hoje, podem eleger todos os responsáveis políticos. Isso foi conquistado há 100 anos e é um adquirido da nossa liberdade e democracia.
Tudo o resto dos tumultuosos 16 anos da I República é, como em todos os humanos regimes, matéria mais de repúdio do que de exemplo. Mas, se a mitificação da I República é um erro, seria um erro ainda maior usar a sua crítica para abrir caminho à legitimação da ditadura.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que é que podemos saber, hoje, com base nesses 16 anos, de 1910 a 1926? Primeiro, que os regimes acabam, que o que pensamos adquirido está bem longe de estar seguro. A liberdade política e uma débil democracia, construída em Portugal desde as lutas liberais, pôde acabar às mãos dos próprios demónios que soltou. Os republicanos, que eram positivistas, pensavam que o progresso era inelutável. Nós sabemos, depois das guerras do século XX e do Holocausto, que não é assim.
Segundo, que a democracia só subsiste se as instituições em que se baseia mantiverem um mínimo de legitimação popular. Nenhuma democracia sobrevive quando o povo a vê como um «sistema», uma rede estabelecida de interesses, assente numa oligarquia que deles beneficia. A democracia não é um facto natural mas uma escolha cultural e a sua legitimação vem da vontade popular. Sem essa vontade, tem os dias contados, seja para uma nova ditadura, seja para formas modernas de populismo demagógico, para que muito do mediatismo espectacular hoje nos empurra.
Aplausos do PSD.
Terceiro, das instituições políticas, cuja saúde é mais crucial em democracia, contam-se os partidos; é neles, na pluralidade política e ideológica, na diversidade dos interesses representados, que se materializa o tónus da vida pública e do debate cívico. Infelizmente, essa capacidade está hoje rapidamente a desaparecer, com uma degradação acentuada do papel dos partidos, em particular dos partidos do poder, de exercerem a sua função cívica de representação, dominados apenas por uma lógica de exercício desse mesmo poder.
Os partidos políticos republicanos tiveram muita responsabilidade na queda da I República. A III República, em que vivemos, degenera também pela partidocracia, quando os partidos, em vez de serem um elemento de representação dos cidadãos no poder, funcionam como uma barreira para a sua participação.
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Quarto, em período de crise económica e social, nada envenena mais a democracia do que a corrupção e, em particular, a corrupção na desigualdade. Isto é tão evidente que não vale a pena acrescentar mais nada. É, aliás, tão evidente como perigoso.
Quinto, a economia de mercado e as finanças públicas são a chave do crescimento e do desenvolvimento social, tão relevantes num País que continua na cauda da Europa em termos de pobreza e desigualdade e que conhece elevadas taxas de desemprego. A boa gestão da coisa pública, numa altura em que o Estado exige do cidadão muito do produto do seu trabalho, é outro elemento cuja deslegitimação destrói a solidez da nossa democracia. Lembremo-nos que Salazar chegou ao poder como «ditador das finanças».
Sexto e por último, se o Estado se envolve num conflito com os corpos da sociedade, associados à nossa identidade e soberania, acaba sempre por perder, com enormes custos para todos. A I República conduziu uma guerra contra a Igreja e perdeu-a. Convinha, perante uma Igreja hoje muito diferente e que também compreendeu a liberdade que lhe dá a separação do Estado, não querer laicizar uma sociedade à força de leis, sob pena de se violentar sentimentos que não são só dos crentes mas da sociedade em geral.
Aplausos do PSD e de Deputados do CDS-PP.
E, num País onde as Forças Armadas são um exemplo de civilismo, contrariamente ao que acontecia nos anos da República, não se afrontam as questões de Estado, como as do seu armamento e eficácia operacional, como se de anedotas jocosas se tratasse ou de meros pretextos de ocasião.
Aplausos do PSD e de Deputados do CDS-PP.
Em particular, quando há militares portugueses em situações de risco, em missões no estrangeiro.
Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: É verdade que houve, de 1910 a 1926, instabilidade, violência política, guerra civil, intolerância, repressão, manipulação eleitoral, actuação anti-operária e antisindical, censura, mas também é verdade que muitos republicanos, depois de afastados do poder, mostraram o melhor de si próprios.
Quando, depois de 1926, foram perseguidos, exilados, presos, impedidos de exercer a sua profissão, afastados das Forças Armadas, desempregados, insultados e agredidos, muitos republicanos, incluindo os chefes partidários, permaneceram fiéis a uma resistência tenaz, tanto mais valorosa quando durou quatro décadas, em que muitos podiam ter-se acomodado e desistido. Em muitas terras de Portugal, e não só nas cidades, eles fizeram sempre a melhor propaganda que há, a propaganda pelo exemplo.
Talvez por isso, mais do que a I República de 1910 a 1926, comemoramos hoje a sua imagem na resistência, nos anos do salazarismo e do marcelismo, quando se via, como eu vi, nas romagens aos túmulos das vítimas do 31 de Janeiro, no Porto, alguns velhos a chorarem quando gritavam, emocionados, «Viva a República». A revolução republicana já pouco dizia à minha geração, mas essa emoção dizia quase tudo.
Esse «Viva à República» era um puro acto de liberdade em tempos de servidão e esse grito de liberdade merece todas as comemorações.
Aplausos do PSD, de Deputados do PS e do BE.
O Sr. Presidente: — Em representação do Grupo Parlamentar do PS, usa da palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.
A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Sr. Presidente, Altas Autoridades do Estado, Ilustres Convidados, Sr.as e Srs. Deputados: Celebrar, hoje, os 100 anos da República, é verdadeiramente festejar. Festejar a vitória da verdadeira soberania do povo, povo não dependente e/ou condicionado pelo nascimento, festejar a vitória do conceito da igualdade de origem e de destino sobre o da pré-definição assente em privilégio.
É certo que Portugal vivia, desde 1820, os ventos democráticos que a Carta Constitucional lhe outorgara.
Mas é certo, também, que a astenia em que se deixou cair o regime monárquico, que tinha deixado subjugar os interesses do País aos da coroa britânica, que gastava mais do que o País lhe podia proporcionar, que se mostrava incapaz de responder à instabilidade política e social, de controlar a imoralidade na vida pública e
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que não distinguia entre o que pertencia a César e o que pertencia à Igreja, bem como o desfasamento entre a cultura dominante e os ventos da modernidade, faziam prenunciar o seu fim.
Este não chegou, como podia ter chegado, em 31 de Janeiro de 1891, no Porto. Mas chegou, quase duas décadas depois, num princípio de Outono, proclamada que foi no dia 5 de Outubro de 1910 e ontem magistralmente assinalada nas cerimónias que tiveram lugar no município de Lisboa.
Foi um momento alto e um momento fundador, porque assente em ideais e em valores: os ideais da igualdade, liberdade e fraternidade, provindos da Revolução Francesa, na sua expressão à época.
Eivados de elevado sentido patriótico e de sentimentos nacionalistas, os construtores da República lançaram mãos a uma tarefa ciclópica que apostava em vários eixos fundamentais, de que destaco: a alteração dos símbolos nacionais; a extinção dos títulos nobiliárquicos; o aprofundamento dos direitos civis e políticos; a laicidade do Estado; a reformulação do Direito da Família; a criação de uma nova unidade monetária, o escudo; o cumprimento dos compromissos internacionais assumidos pela Monarquia; o reconhecimento da instrução, nos seus diferentes níveis, como o vector essencial de libertação. Ao fim e ao cabo, aproximar o País da modernidade e dar ao povo a capacidade para exercer a cidadania.
Recorde-se que, à data, a taxa de analfabetismo da população portuguesa era de 75%, tendo como contraponto, por exemplo, a britânica que era de apenas1%.
Os proclamados valores republicanos da «virtude», entendida como prioridade do interesse comum sobre o interesse individual, de probidade, de elevado sentido do dever, de espírito de serviço dos detentores de poderes públicos, verdadeira devoção cívica e recuperação da harmonia assente na simplicidade, ficaram sujeitos à erosão da instabilidade política, do esforço de participação na I Guerra Mundial e no desequilíbrio das contas públicas que a própria instabilidade política não permitia resolver.
A ditadura de meio século que se seguiu à I República afrontou a nossa dignidade, afastou-nos do convívio internacional e do desenvolvimento, encerrou-nos no isolacionismo, no obscurantismo e na ruralidade.
Oprimiu-nos e reprimiu-nos com brutalidade. Negou-nos a liberdade principial e a afirmação da nossa identidade, enquanto seres autónomos e responsáveis porque livres.
O momento refundador de Abril devolveu-nos a esperança e a redefinição dos ideais e valores que devem sustentar as comunidades humanas: a universalidade dos direitos fundamentais, no seu conteúdo de identidade e alteridade como faces da mesma moeda; na reformulação da igualdade vista na sua plenitude, não só na sua dimensão de género mas também na importância de dar a vez, de abrir as portas a todas e a todos;»
Aplausos do PS.
» na importància da democracia participativa como forma de envolvimento dos cidadãos na decisão; na transparência e prestação de contas como requisitos da boa governação; na maior tolerância com as escolhas individuais; na menor tolerância com a violência das atitudes discriminatórias, das desigualdades e das exclusões.
Mas festejar um centenário também é questionar. Questionar o presente para preparar o futuro. E o presente é verdadeiramente perturbador.
As profundíssimas mudanças do ponto de vista geoestratégico e económico perturbam a ordem internacional até hoje conhecida. Pretendem impor outra cultura, outro entendimento para o papel da economia, contrário ao património ocidental dos direitos humanos de construção milenar.
O mercado especulativo não regulado ataca os Estados soberanos e fragiliza-os ao dificultar o seu financiamento externo e ao pretender impor outras regras de jogo em que a economia subjuga as pessoas em vez de as dignificar.
O impacto de todas estas transformações à escala nacional enfraquece a nossa imagem no panorama das nações.
Somos, pois, todos chamados, mais uma vez na nossa História, a um exercício de lucidez que reclama acções corajosas que passem pela preservação do essencial das nossas identidade e soberania, desistindo do acessório. Acções que sejam explícitas e claras, desenhadas com rigor e bom senso, com justiça social, com equidade, com coerência, e que se assumam como elemento estruturante na construção de um futuro melhor.
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É tempo, pois, para um novo sobressalto patriótico, para uma união convergente de esforços, para um reforço da nossa auto-estima e para uma «atitude de combate» que nos permita enfrentar e atravessar este mar alteroso em que navegamos, dobrando um novo cabo da Boa Esperança.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Oh, valha-nos Deus!»
A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Tudo isto sem abdicar do princípio de que a única política que promove o desenvolvimento é a que assenta no respeito pelos direitos humanos fundamentais que constituem o cimento agregador da coesão social na multiplicidade da sua expressão.
Um ideário político matricialmente enformado pelos direitos humanos, civis, políticos, económicos, culturais, sociais e ambientais, inter-relacionados e interdependentes obriga a uma agenda política que prossiga a criação de condições para o seu exercício.
É uma doutrina a assumir militantemente em termos nacionais e internacionais, porque é uma cultura e uma afirmação do ideal de justiça e de construção da paz. E, como diz Damásio, é através da cultura que nos envolve, dos valores que abraçamos que alcançamos a nossa transcendência, vista esta enquanto forma de superação da nossa pré-determinação genética.
Só assim crescemos como seres humanos, cientes dos nossos direitos e conscientes — a importância da consciência enquanto fenómeno cognitivo superador — dos nossos deveres, porque é no cumprimento dos deveres que se vivência a fraternidade.
E quanto a nós, mulheres e homens na política, responsáveis que também somos por lhe devolver a sua nobreza originária, entendamos a nossa função representativa não como um poder, mas um poder-dever, ou seja, aquele que é exercido pelo seu titular não «como queira», mas pelo modo exigido pela função do direito — o único entendimento que lhe confere legitimidade — , para mim, em termos pessoais e citando Eduardo Lourenço, o exercício de acção política «com sonho e vontade de solidariedade», que é bastante mais do que a simples força biológica de viver.
Viva a República, viva Portugal!
Aplausos do PS e de Deputados do BE.
Vozes do PS: — Viva!
O Sr. Presidente: — Para intervir em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Jorge Lacão): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Ilustres Convidados: É uma honra invocar a I República em sede parlamentar, nestas comemorações do Centenário, às quais o Governo, como é sabido, conferiu grande empenhamento, traduzido na criação de uma Comissão Nacional independente, responsável pela organização de um vasto programa de iniciativas.
Tal programa representa, em primeiro lugar, uma oportunidade para todos os portugueses se reencontrarem com uma parte da sua História, menos bem conhecida pelas gerações actuais, para todos se poderem confrontar com os grandes dilemas do início do século XX, um tempo em que se dizia já não haver lugar para um certo mundo velho e em que, para muitos, mal se podia compreender ainda em que alicerces se poderia edificar um mundo novo.
É, em segundo lugar, uma ocasião propícia à reflexão recorrente, mas sempre actual, em torno de saber até que ponto o conhecimento das dificuldades passadas e dos erros historicamente cometidos nos ajudam, no presente, a encarar com mais prudência e sabedoria os desafios que nós próprios temos pela frente.
Em ambas as perspectivas, neste Centenário da República, algo de muito valioso poderemos certamente identificar e celebrar: o património civilizacional que consiste em identificar nos valores comuns da liberdade, da igualdade e da fraternidade um ideário comum em que a acção política se pode afirmar e genuinamente redimir como uma causa digna de ser vivida e partilhada.
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É esse o elemento primordial que une as convicções dos republicanos de ontem e de hoje: a crença profunda de que nenhuma alternativa pode existir na vida dos povos fora do culto da dignidade humana e, por necessária razão, das instituições democráticas.
É a própria História do século XX português que nos demonstra que não há genuína alternativa regeneradora para as dificuldades do tempo que não passe pelo aprofundamento da democracia, e é em democracia que sempre se devem procurar as soluções — com os olhos postos em servi-la! Servir o País com espírito democrático implica persistir na busca de soluções para os desafios que atravessaram os últimos cem anos da vida nacional, a começar pelo reconhecimento do primado da educação como condição primordial de igualdade e progresso na sociedade,»
Aplausos do PS.
» a continuar no esforço do fomento (como lhe chamava Basílio Teles), a terminar na luta de todos os tempos em defesa da justiça e no combate aos privilégios.
Tais dimensões comuns no ideário republicano marcam um plano de identidade nas preocupações constantes da I República, tal como na República de Abril. Mas também são nítidos os contrastes do tempo — e, esses, felizmente, em favor da geração de que fazemos parte.
À cabeça de todas as diferenças, o bem inestimável da paz. Sabemos que a dilacerante participação de Portugal na I Guerra Mundial representou para os responsáveis da época um dilema considerado incontornável para garantir presença e relevância europeia ao nosso país. Bem mais afortunados somos nós — aqueles cujo desafio europeu, por mais dificuldades que nos levante, outras tantas oportunidades nos colocam enquanto cidadãos plenamente portugueses e de estatuto plenamente europeu.
Vencidos que foram os tempos da ditadura, além de uma vida nacional em clima de tranquilidade e de coesão, cem anos depois, a sociedade portuguesa é hoje uma sociedade profundamente diferente daquela dos alvores do século XX. E é-o, em grande medida, por efeito positivo das três décadas de democracia em estabilidade constitucional que são as nossas.
Em contraste com o passado de há um século, a sociedade mais urbana e cosmopolita em que vivemos está agora dotada de infra-estruturas básicas e de equipamentos fundamentais em todo o território, possui níveis de qualidade de vida sem paralelo. É uma sociedade estruturada na satisfação dos direitos sociais fundamentais, cujo paradigma está para além das notáveis caricaturas de Bordalo Pinheiro, mas é também uma sociedade que precisa da confiança e dos estímulos que lhe permitam enfrentar as dificuldades sem regredir.
É este o principal desafio dos tempos que correm, o desafio dos responsáveis políticos deste tempo, face ao qual faz todo o sentido atentar nas lições da História. Se alguma coisa comprometeu a longevidade da I República foi a crónica instabilidade política e a incapacidade do regime de então gerar soluções estáveis de governo.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Que vergonha!
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — O regime da I República viveu demasiado na urgência dos conflitos de curto prazo para ter tempo de estabilizar soluções duradouras de futuro. Esse fadário da I República tem estado sempre presente aos nossos olhos, ajudou a construir um sistema político-constitucional bem mais estabilizador e todos os dias convoca o sentido de responsabilidade das lideranças para que saibam assumir a pluralidade das suas diferenças e preparar o tempo das suas alternativas sem comprometer a estabilidade política e os interesses fundamentais do País.
Temos a nosso favor a possibilidade de reflectir sobre as dificuldades do passado e a faculdade de não repetir os mesmos erros. Temos a nosso favor a enorme vantagem de vivermos num tempo de tolerância e de gestão institucionalizada das diferenças. Saibamos, pois, aproveitá-la bem.
Srs. Deputados, celebremos, sem sofismas nem complexos, como ontem nos Paços do Concelho de Lisboa, o 5 de Outubro e o Centenário da I República. Celebremo-lo também aqui, na Assembleia da República, com a convicção de quem quer dignificar o ideário republicano e honrar a memória de quantos, ao longo da História, dedicaram a sua vida à extraordinária causa de conferir a Portugal uma soberania
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democrática e de fazer dos portugueses nunca mais súbditos mas membros de um povo orgulhoso de si, um povo de cidadãos!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e Representantes dos Tribunais Superiores, Antigos Presidente da República, Primeiro-Ministro, Presidentes da Assembleia da República e Deputados, Líder do Principal Partido da Oposição, Srs. Ministros, Altas Individualidades Políticas, Judiciais e Militares, Sr. Núncio Apostólico e Membros do Corpo Diplomático, Sr.as e Srs. Deputados, Ilustres Convidados: As palavras dos oradores precedentes e a presença de VV. Ex.as associam o Parlamento português de forma sóbria e solene, adequada ao momento em que vivemos, ao I Centenário da República, comemoração que assinalaremos, por igual, dentro de instantes, com o descerramento do busto de Anselmo Braamcamp Freire, primeiro e ilustre Presidente da Assembleia Nacional Constituinte, do Senado e do Congresso da República.
Volvidos cem anos sobre a instauração do regime republicano, vivemo-lo hoje em democracia plena, com liberdade civil, económica, política, cultural e religiosa. Podemos olhar para trás com a maturidade de pontos de vista diferenciados, mas com a evidência de constatações óbvias, que demonstram a responsabilidade conjunta por um aperfeiçoamento insofismável.
Temos democracia, porque, como recordava Antero de Quental, «quem diz democracia diz naturalmente República»; assentamos as instituições nas escolhas livres do povo e no mais amplo colégio eleitoral de sempre, sem exclusões de qualquer espécie; temos um Presidente da República eleito por sufrágio directo e universal, um Parlamento de uma só Câmara, perante o qual responde um Governo, de razoável duração, e um poder judicial independente; possuímos Forças Armadas e Forças de Segurança profissionais, tecnicamente capazes, realmente integradas no Estado democrático, e não toleramos a existência de grupos civis armados, pronunciamentos, ou ingerências ilegítimas na decisão política; alcançámos o equilíbrio em matéria de liberdade religiosa e não perseguimos, antes cooperamos com as confissões religiosas, tendo em conta a proporção do seu enraizamento na sociedade; garantimos, segundo os recursos disponíveis, um empenhamento constitucional nas tarefas sociais do Estado; não nos envolvemos em conflitos internacionais que impliquem a entrada do País em guerra, contribuímos, sim, para tarefas de paz legitimadas pela comunidade internacional, e estamos inseridos na construção europeia.
Como ninguém é dono da República também ela não é dona do País, e assim é que olhamos com o devido respeito para os momentos grandiosos da História-Pátria que a antecederam e em que a sua proclamação, a todos os títulos, igualmente se insere, afirmando de forma irreversível na vida nacional que a titularidade do poder político, em todos os níveis do Estado, exclusivamente, se obtém pelo voto, nunca pela condição do privilégio de nascimento, numa escolha em que os concorrentes são, à partida, todos iguais no que respeita aos direitos políticos. Na convicção visionária de Henriques Nogueira: «Quisera que num País como o nosso (») o governo do Estado fosse feito pelo povo para o povo, sob a forma nobre, filosófica e prestigiosa de República.» Herdeira do Vintismo, das lutas liberais, do radicalismo, da Patuleia, do Setembrismo, dos históricos, da dissidência progressista, dessa quase monarquia republicana que a precedeu, a República deve às ideias da época uma convicção optimista e quase científica sobre a natureza humana, a que se somou um forte patriotismo e um empenhamento decidido na instrução pública e na administração colonial. Se a fragilidade do sistema político não lhe permitiu levar mais longe muitas das suas aspirações, isso não invalida o propósito generoso de muitos dos seus protagonistas e o idealismo dos seus fundadores, quase sempre apostados na apologia de grandes ideais ao serviço da coisa pública, do bem comum e do interesse geral, em suma, da res publica.
Exemplo dessa nobreza republicana era já a proclamação de Machado Santos, na sua Ordem do dia n.º 1 do Quartel-General da Rotunda, no próprio dia 5 de Outubro de 1910: «A luta terminou! Já não há inimigos! Hoje todos os portugueses, trocando abraços fraternos, vão colaborar na obra da Regeneração da Pátria! Já não há inimigos! Há só irmãos!».
Sabemos que hoje, numa democracia moderna, não há lugar para qualquer tipo de historiografia oficial e, por isso, reconhecemos que o maior mérito do Centenário da República é, sobretudo, o de ter estimulado mais
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e melhor conhecimento sobre um período da História marcado, como todos, por êxitos e por fracassos, por grandezas e por misérias, por sonhos e por frustrações, por magnanimidade e por sectarismo. O vasto conjunto de obras publicadas e reeditadas, envolvendo historiadores das mais diversas orientações, é já um bom sinal de que nas nossas universidades e centros de investigação os departamentos de História Contemporânea continuam a realizar um trabalho de notável qualidade, com grande proveito para o público plural, que se enriquece com a sua leitura.
Sr.as e Srs. Deputados, como sempre, a leitura e a reflexão serenas são o caminho de cada um para se reencontrar com o passado e aceder a uma maturidade acrescida no conhecimento do nosso País. Nascidos em época de obnubilação sobre o movimento republicano e os alvores da República, o que não representou de descoberta fascinante para alguns de nós a leitura atenta de Um Escritor Confessa-se, de Aquilino Ribeiro, do Diário de um Monárquico, do Conde de Mafra, Thomaz de Mello Breyner, do Diário de João Chagas e das Memórias Políticas, de José Relvas? Ou o inebriamento absoluto com as insubstituíveis Memórias, de Raul Brandão, «a reclamar a hora tremenda do juízo final»? Para que em cada um de vós, Sr.as e Srs. Deputados, esta celebração propicie também uma meditação interior sempre renovada e exigente sobre os grandes encontros e desencontros com a História e com as ideias, convido-vos, após o Hino Nacional, a acompanhar-nos na inauguração da exposição Res Publica, Cidadania e Representação Política e também no descerramento do busto de Anselmo Braamcamp Freire, com que o Parlamento português se associa ao Centenário da República.
Está encerrada a sessão solene.
Aplausos gerais, tendo Deputados do PS aplaudido de pé.
Convido todos a ouvir, de pé, o Hino Nacional e declaro interrompidos os nossos trabalhos.
Neste momento, a Banda da Guarda Nacional Republicana, colocada junto aos Passos Perdidos, executou
de novo o Hino Nacional.
Aplausos gerais, de pé.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 17 horas e 4 minutos.
Sr.as e Srs. Deputados, peço à Sr.ª Secretária que proceda à leitura do expediente.
A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: apreciações parlamentares n.os 63/XI (2.ª) e 64/XI (2.ª) —
Relativas ao Decreto-Lei n.º 99/2010, de 2 de Setembro, que Altera o Regulamento Emolumentar dos Registos
e do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro, e legislação conexa em
matéria registral e emolumentar, apresentadas, respectivamente, pelo BE e pelo CDS-PP, e 65/XI (2.ª) —
Relativa ao Decreto-Lei n.º 105/2010, de 1 de Outubro, que aprova a 8.ª fase de reprivatização do capital
social da EDP — Energias de Portugal, SA (BE); projectos de resolução n.os 268/XI (2.ª) — Prioridade na
execução das medidas associadas à exposição, utilização e remoção de amianto previstas na Estratégia
Nacional para a Segurança e Saúde no Trabalho 2008/2012 (CDS-PP), que baixou à 12.ª Comissão, 269/XI
(2.ª) — Recomenda ao Governo a criação de uma central de vendas e promoção on-line de produtos
portugueses (CDS-PP), que baixou à 6.ª Comissão, 270/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a conclusão do
processo de classificação do Complexo Monumental das Sete Fontes (CDS-PP), que baixou à 13.ª Comissão,
271/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a adopção de medidas para prevenir e mitigar os riscos da exposição
ao amianto nos edifícios públicos (BE), que baixou à 12.ª Comissão, 272/XI (2.ª) — Aumento do salário
mínimo nacional (PCP), que baixou à 11.ª Comissão, 273/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a adopção de
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medidas para prevenir os incêndios florestais (BE), que baixou à 7.ª Comissão, 274/XI (2.ª) — Recomenda ao
Governo que tome a iniciativa de prever a construção de redes secundárias de abastecimento de água, com
aproveitamento das águas pluviais, em edifícios, instalações e equipamentos públicos de grande dimensão,
tendo em vista a sua utilização para usos e fins não potáveis, no sentido de se obterem ganhos ambientais
energéticos e económicos (PS), que baixou à 12.ª Comissão, 275/XI (2.ª) — Pagamento aos trabalhadores da
Base das Lajes do valor correspondente às perdas decorrentes do incumprimento do acordo laboral que
integra o Acordo de Cooperação e Defesa entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América e do
respectivo regulamento do trabalho (PSD), que baixou à 2.ª Comissão, 276/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo
a publicação do despacho de classificação do Complexo das Sete Fontes e a adopção de medidas para a sua
protecção (BE), que baixou à 13.ª Comissão, 277/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a construção do
matadouro público regional do Algarve (BE), que baixou à 7.ª Comissão, e 278/XI (2.ª) — Recomenda ao
Governo que corrija com urgência o tarifário das portagens na A21, auto-estrada Ericeira/Malveira/A8 (BE),
que baixou à 9.ª Comissão; e projectos de lei n.os 428/XI (2.ª) — Declarações antecipadas de vontade (PSD),
que baixou à 10.ª Comissão, e 429/XI (2.ª) — Regula as directivas antecipadas de vontade em matéria do
testamento vital e nomeação de procurador de cuidados de saúde e procede à criação do registo nacional do
testamento vital (CDS-PP), que baixou à 10.ª Comissão.
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos dar início ao primeiro ponto da nossa ordem do dia,
que consiste na apreciação dos projectos de resolução n.os 158/XI (1.ª) — Recomenda ao Governo a criação
de um portal Internet dedicado à exportação de produtos portugueses (PS) e 269/XI (2.ª) — Recomenda ao
Governo a criação de uma central de vendas e promoção on-line de produtos portugueses (CDS-PP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches.
O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Equilibrar a balança de
pagamentos é um desígnio que tem de estar na agenda portuguesa. Essencialmente para isso o PS aposta
em duas medidas políticas que consideramos da maior importância: a redução da dependência energética —
e aqui os últimos anos têm sido marcantes quanto à diversificação das fontes de energia utilizadas no nosso
País — e o aumento das exportações.
E se os números do aumento das exportações foram, até à crise económica internacional, muito positivos
— e agora estão novamente a ser retomados — , também aqui temos de apostar na diversificação. Houve uma
aposta clara na diversificação quando o Governo português apostou em novos mercados, nomeadamente em
mercados emergentes, como sejam o do Brasil e de outros países emergentes, mas entendemos que há
outras oportunidades que podemos utilizar também neste campo.
As novas tecnologias são claramente uma dessas áreas e, assim, o projecto de resolução que hoje
apontamos tem precisamente a ver com isso, ou seja, com a aposta nas novas tecnologias para podermos
divulgar melhor os produtos portugueses, não só no mercado português mas acima de tudo no mercado
externo.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal é reconhecidamente hoje o país-líder nos serviços públicos
on-line. Aquilo que o projecto de resolução do PS propõe é que aproveitemos essa excelente mensagem, essa
excelente campanha que o PS e o seu Governo souberam promover no sentido de os cidadãos portugueses
poderem aceder mais facilmente aos serviços públicos on-line, e a passemos para o serviço das micro,
pequenas e médias empresas. Entendemos, portanto, que deve existir um site promovido pelo Governo onde
seja possível aos produtores das micro, pequenas e médias empresas — que de outra forma não o
conseguiriam — divulgarem os seus produtos nos mercados externos.
Também propomos que o serviço público de televisão possa, nomeadamente, servir para divulgar este site
e dessa forma ajudarmos a economia nacional.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é, na génese, a proposta que o Partido Socialista hoje traz a
este debate.
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O CDS apresenta também um
projecto de resolução, pois queremos ser coerentes com aquilo que dissemos e para nós a defesa das
pequenas, micro e médias empresas passa muito por aproveitar esta nova janela de oportunidades que são as
novas tecnologias.
Hoje, o que acontece com este tipo de empresas é que elas sentem dificuldades naquilo que mais é
premente, que é a sua tesouraria, e isso, obviamente, fruto das dificuldades económicas e, porventura, da falta
de acerto das políticas do Governo.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Também o consumo e a perda do poder de compra afectam,
directamente, muitas micro, pequenas e médias empresas portuguesas. Portanto, estamos a falar apenas e só
daquilo que é a grande maioria do tecido empresarial português.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Aproveitar esta oportunidade é muito simples — a própria Agência para
a Sociedade do Conhecimento diz que Portugal está acima da média europeia. Não quero partir do princípio
de que há aqui muita propaganda do Governo», mas ç natural — há até um item em que parece que estamos
acima da média europeia, que é no da partilha de informação cliente/fornecedor, em termos da Internet. Pelo
menos, há aqui uma oportunidade que descobrimos e vimos que convém aproveitar.
Depois, há também, como devem calcular, a necessidade de ajudar aquelas empresas que estão mais
longe do mercado, que têm menos formação e menos informação e que, como tal, se sentem mais distantes
dos novos mercados emergentes.
No projecto de resolução do PS há, pelo menos, um dado que eu gostava de salientar — a feira virtual — ,
dando os parabéns ao Partido Socialista por isso e também por aproveitar a RTP internacional e a RDP; é
porque nós temos o potencial na nossa comunidade e nos luso-descendentes, muitos dos quais, hoje, têm
cargos importantes e até estão ligados ao tecido empresarial no estrangeiro, pelo que podem ser também aí
promotores e defensores dessa estratégia.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Portanto, hoje, temos produtos que são não só relevantes, em termos
internos, mas também um grande potencial de criação de marca. Portugal gasta muito na promoção externa,
mas quem nos visite e quem pergunte num site o que pode visitar é bom que saiba também o que pode
comprar, a que preço, e de que forma o pode fazer.
Aplausos do CDS-PP.
Isso é tanto mais relevante que, se olharmos para os mercados emergentes, que todos nós
consensualizamos quais são, verificamos que esses mesmos mercados são aqueles que utilizam a Internet,
de forma muito profícua. Estou a falar de países como a China, os Estados Unidos da América, o Japão, a
Índia, o Brasil, o Reino Unido e a Itália. São os países que, hoje, fazem mais uso da rede da Internet, e fazem
mais uso do que o do e-commerce. Em suma, estamos perante um potencial enorme.
De facto, com esta medida, podemos lançar as nossas exportações. E nós, no CDS, quisemos dizer muito
mais que o óbvio, pelo que propusemos não só um portal, onde a venda de produtos possa ser possível, como
também a ideia de lançar a possibilidade de haver um fundo, que possa ser ele próprio uma ajuda para as
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pequenas e médias empresas; ou seja, criar a possibilidade de as pequenas empresas que não têm know-
how, que não têm formação, terem esta porta de acesso, e a possibilidade de haver margens que possam ser
utilizadas, não só para financiar as próprias empresas, mas também para poupar aquilo que é uma boa
medida — poupar-lhes o armazenamento e a própria comercialização dos produtos.
Para terminar, quero dizer-vos que queremos aproveitar esta possibilidade que a Internet nos dá de
transformar o mundo, que é global, num mundo muito mais pequeno, muito mais acessível, de venda fácil e de
compra fácil.
Com isso, não só ajudamos os nossos produtos, mas criamos uma marca e conseguimos, novamente,
equilibrar a nossa balança comercial. São estas as nossas propostas, um pouco mais concretas do que as do
Partido Socialista, mas, ainda assim, não estão fechadas e merecem ser trabalhadas. Portanto, é esta a nossa
recomendação.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Reis.
O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em face das medidas brutais,
anunciadas pelo Governo na passada semana, dada a situação a que conduziu este País, apetece-nos
perguntar quanto a vida poderia ser diferente para famílias e empresas caso o Governo não tivesse «feito
ouvidos de mercador» ás denúncias do PSD»!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Nuno Reis (PSD): — Há, pelo menos, dois anos que o nosso partido vem alertando para a
insustentabilidade de um Estado que gasta muito mais do que aquilo que produz, de uma economia asfixiada
pelos impostos e pelo peso do próprio Estado.
Enquanto o «barco afunda», assistimos com expectativa crescente às iniciativas legislativas do grupo
parlamentar que suporta o Governo. Há cinco dias, foi aqui votado um projecto de resolução que mais não é
do que um acto de contrição relativamente à insuficiência — quase inexistência, diríamos até — de medidas
de promoção de eficiência energética, ao nível do Governo e Administração central. Esta semana, trazem-nos
um projecto de resolução que recomenda a criação de um portal Internet dedicado à exportação de produtos
portugueses.
Quero recordar que, desde 2005, Governo socialista tem traçado o objectivo de que as exportações
aumentem e alcancem os 40%, em proporção do PIB. Continuamos, teimosamente, na casa dos 30%!»
Quanto ao objectivo destes projectos, estamos todos de acordo. Mas será este portal a solução para
aumentar as exportações e atingir as metas desejadas? Temos algumas dúvidas.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Nuno Reis (PSD): — Por outro lado, parece algo contraditório que a Assembleia recomende ao
Governo a criação de um portal dedicado às exportações. Então, e o papel da AICEP (Agência para o
Investimento e Comércio Externo de Portugal)?
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Nuno Reis (PSD): — Tanto quanto sabemos, aliás, esta agência já edita uma publicação chamada
Portugal Global, em formato revista e on-line, a qual poderia disponibilizar espaço para que todas as empresas
pudessem publicitar os seus produtos.
Será que, em vez de o Governo criar um portal, o próprio portal da AICEP não poderia ter uma página com
todos os links das empresas? Não seria menos oneroso, mais simples e, até, em linha com a missão desta
Agência? Para quê, então, duplicar meios quando eles já existem e podem ser melhor aproveitados?
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Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Embora com algumas das reservas já abordadas, o projecto de
resolução do CDS parece-nos melhor fundamentado e concretizado.
No entanto, e porque ambos os projectos de resolução em discussão propõem a criação de uma central de
vendas on-line, não podemos deixar de denunciar, uma vez mais, que os pequenos empresários continuam a
ser prejudicados por uma Agência Nacional de Compras Públicas que tem estabelecido regras, altamente
discutíveis, no acesso a concursos de aprovisionamento, as quais dificultam, artificialmente, as candidaturas
das pequenas e médias empresas.
Antes de pensar numa nova central de vendas, desta feita, dedicada a exportações, não se esqueça o
Governo de corrigir o que está mal na central de compras actual e permita às pequenas e médias empresas
fornecerem à Administração Pública, em igualdade de circunstâncias com as grandes empresas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os projectos de resolução do PS e do
CDS-PP são certamente ideias interessantes e custarão pouco dinheiro ao Orçamento do Estado, mas são
também o resultado de uma tese consolidada no PS — Governo e Grupo Parlamentar — no sentido de que os
problemas do País se resolvem pela propaganda e com a propaganda.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Ora, o défice da balança comercial não se resolverá assim, mesmo que
o portal consiga que mais algumas mercadorias sejam exportadas; mais de 23 000 milhões de euros em 2008
não se resolvem, por melhor e mais eficiente que seja a propaganda.
O projecto de resolução do CDS vai pelo mesmo caminho.
Mas talvez aos exportadores portugueses agradassem mais outras medidas, medidas que lhes facilitassem
as exportações por as tornarem mais competitivas — e tal é possível sem reduzir salários, que é a única
solução que o PS, o PSD e o CDS e todos os neoliberais da nossa praça conhecem — , tal como, por exemplo,
reduzir o preço da energia, nas suas diferentes formas, claramente penalizadoras da nossa produção, no
confronto com os outros Estados-membros.
Ora, todos conhecemos a «ajuda» que o PS tem dado na electricidade, no gás natural, nos combustíveis —
ajudas, é claro, à EDP que, depois, permite aqueles «filmes» do António Mexia, em socorro dos refugiados, e
ao Manuel Pinho e ao Primeiro-Ministro, na sua missão de professor universitário, nos Estados Unidos da
Amçrica» Ajudas á Galp e a outras gasolineiras»
Por exemplo, os têxteis e a cerâmica e outros acabaram de ter uma «grande ajuda» no gás natural, com o
decreto-lei de Junho que liberaliza as tarifas e com as respectivas consequências de aumentos mínimos de
30% nas tarifas; e na electricidade, com outro decreto-lei, bem recente, de liberalização das tarifas para o
sector industrial que vai ter, certamente, os mesmos efeitos na tarifa.
Talvez os exportadores gostassem mais de outras políticas de crédito e de seguros e não vivessem o
sufoco dos spreads e das comissões bancárias impostos pela banca nacional!
Talvez os exportadores gostassem de outra política fiscal que protegesse a produção interna e dificultasse
a vida à produção externa!
Talvez os exportadores gostassem mais de uma resposta à situação de um euro super-valorizado, «à
medida» da Alemanha, mas sem nada a ver com a produtividade em geral da indústria nacional!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Talvez os exportadores gostassem mais de uma forte intervenção do
Estado português na política comercial na União Europeia para não acontecer, como aconteceu agora, com o
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enorme frete ao Paquistão, para maior prejuízo dos nossos têxteis, e justificada — calcule-se!» — com as
intenções humanitárias da União Europeia!»
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Mas o erro estratégico é fundamentalmente outro: durante 30 anos,
sucessivos governos do PS, PSD, CDS fizeram das exportações o centro nevrálgico da política industrial
portuguesa, desvalorizando, ignorando o mercado interno e a sua defesa; desvalorizando a produção interna
para esse mercado.
O resultado está à vista: só entre 1997 e 2008 (10 anos!), o défice da balança de mercadorias mais que
dobrou — défice externo, dívida externa, Portugal na mão dos grandes bancos europeus, alemães, franceses,
holandeses, etc., isto é, os chamados mercados financeiros que estão a saquear o País!!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: os projectos de resolução que
estão em discussão sobre a criação de um portal de vendas só resultam, só existem, só geram discussão
nesta Assembleia por apatia do Governo, porque se não fosse essa apatia toda esta temática teria já sido
levada a cabo por este que é o século da informação e da Internet, e que deveria ser o século onde nós
também aproveitaríamos todas as possibilidades que a Internet e as tecnologias da informação têm ao nosso
dispor para promovermos o nosso país e os nossos produtos.
Esperemos que não aconteça o que aconteceu já a dezenas de projectos de resolução que o Governo
recebeu mas, simplesmente, ignorou; por isso, virou as costas a esta Assembleia da República e àqueles que,
legitimamente eleitos pelo povo, quiseram também ter alguma opinião sobre a forma como o Governo agia no
nosso país.
Repito: esperemos, por isso, que não aconteça, exactamente, a mesma coisa a este projectos de
resolução.
Mas não esquecemos — e até parece a quem ouve a bancada do Partido Socialista falar sobre esta
matéria — os ataques que têm sido perpetrados pelo Governo ao potencial exportador do nosso país: em
primeiro lugar, pelos custos dos factores de produção.
Todos sabemos — já discutimos isso várias vezes, no entanto, o Governo nada faz para alterar esta
realidade»! — qual ç o custo da electricidade para as empresas, para as famílias,»
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — » e o que ç que isso representa na perda de competitividade de
Portugal, a nível da Europa, quando nós pagamos a electricidade mais cara da Europa.
O mesmo é passível de se dito ao nível dos combustíveis: onde está a voz do Partido Socialista, que nada
diz, está ausente no debate, quando Portugal paga, sem impostos, os segundos combustíveis mais caros da
Europa?
Ora, sobre isto, nada dizem, nada querem mexer!! Mas estes são factores essenciais que, qualquer
empresa, qualquer tentativa de exportação tem de contornar, porque, no mercado global, são factores que
fazem a diferença e que deixam par trás as exportações portuguesas.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mas vou referir um ponto que tem aparecido neste debate um pouco à
margem dos custos que traz para as exportações mas que resulta, no fundo, do pacto criado entre PS e PSD,
e que lesará também as empresas portuguesas: refiro-me às SCUT (auto-estradas sem custos para o
utilizador) e à introdução de portagens nas SCUT.
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O Grande Porto, o Norte de Portugal e o distrito de Aveiro vão ser extremamente lesados pela introdução
de portagens nas SCUT. E a minha pergunta é a seguinte: o que é que isto tem a ver com as exportações
portuguesas? Bem, nós exportámos para a Galiza mais do que actualmente exportamos para os Estados
Unidos da América; e isso significa que o Governo, por esta decisão administrativa, colocará ainda mais em
causa as exportações portuguesas e o nosso potencial exportador.
Por isso, concluindo, devo dizer que estamos ao lado destes projectos de resolução, mas, por parte do
Partido Socialista e um pouco do CDS, embora muito mais por parte do Partido Socialista, não vemos deles
mais do que uma tentativa de «lavagem da consciência» que estás pesada sobre esta matéria.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Não havendo mais oradores inscritos para intervir neste debate»
O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Seguro Sanches (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Agradeço as vossas
intervenções e queria registar duas ou três questões sobre aquilo que foi aqui referido.
Sr. Deputado Nuno Reis, quero dizer-lhe que é bom, na política, reconhecermos quando há medidas que
têm mérito.
Penso que toda a Câmara sabe, porque isso é reconhecido internacionalmente — e a República ensina-
nos que devemos ter essa agilidade na consciência — , que há duas áreas onde temos bons indicadores.
É verdade que estas medidas não são suficientes. Nem a proposta do CDS-PP nem a proposta do PS
constituem medidas suficientes, mas são medidas — o Sr. Deputado reconhecerá — que vão no sentido
positivo de ajudar as exportações, utilizando algo que é muito positivo em Portugal e que tem a ver,
precisamente, com a política do Governo electrónico.
Como referimos, temos muito bons indicadores na utilização dos serviços públicos on-line e podemos
utilizar esses bons indicadores para ajudarmos as nossas empresas e a nossa economia. Aliás, quero dizer-
lhe, Sr. Deputado Nuno Reis, que não compreendo a sua reacção à utilização dos sites, quando mesmo neste
momento o seu partido está a utilizar um site para tentar encontrar novas ideias para propor aos portugueses.
Nós já temos essas ideias, e estamos aqui a colocá-las para serem discutidas.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado Agostinho Lopes, reconhecerá que estas medidas vão no sentido positivo e dirá, com
certeza, que a sua intervenção, não trazendo nada de novo ao debate, foi muito mais propagandística do que
qualquer intervenção do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Protestos do Deputado do PCP Agostinho Lopes.
A terminar, Sr. Deputado Hélder Amaral, queria cumprimentar o CDS pela medida, colocando-lhe algumas
questões, que têm a ver com o seguinte: o Sr. Deputado, com o projecto que apresenta, traz encargos para os
produtores. É bom que se perceba essa questão.
Por outro lado, pergunto: quem assume o risco? Quem assume o risco do não pagamento? Como é que
isso vai funcionar?
Pergunto-lhe ainda: quem gere as devoluções? Quem gere as reclamações?
Penso que a proposta do PS é uma proposta muito mais simples e exequível, não dizendo o PS que «não»
à proposta do CDS, que vai no caminho certo, aproveitando, de facto, uma excelente oportunidade que existe
em Portugal para tentarmos ultrapassar uma grande dificuldade.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, quero, antes de mais, agradecer
as palavras simpáticas do Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches sobre a nossa proposta.
Para que não haja confusões, o CDS — o seu discurso é recorrente nesse sentido — tem dedicado grande
importância às pequenas e médias empresas. Não fazemos o mesmo caminho do Governo, queremos que o
problema da crise económica se resolva através da economia e da ajuda, do reforço e da capacidade das
pequenas e médias empresas em gerar emprego, riqueza e, por aí, aumentarmos as nossas exportações.
É óbvio que esta é uma oportunidade para o business to business ou para o business to consumer, ou seja,
relações de empresa a empresa e relações de empresa a consumidor. Isso é uma possibilidade: a Internet.
Os problemas que o Sr. Deputado do Partido Socialista me coloca são fáceis de resolver. Quando dizemos
que vamos criar um mecanismo que as próprias empresas que participam nesse portal possam elas próprias
gerir mais não é do que dar às empresas a capacidade de se auto-regularem e de auto-gerirem o seu produto.
O que nos preocupa — e até concordava com coisas que o Partido Comunista disse, tirando o «saque» e
outras expressões mais emotivas — é a capacidade de os produtos de excelência portugueses, muitos deles
com capacidades para competirem com o que há de melhor no mundo, poderem chegar lá fora e com isso
poderem aumentar a capacidade e a forma de financiamento das empresas portuguesas.
Não temos, pois, uma posição fechada sobre essa matéria. Entendemos que há, de facto, problemas
graves no que concerne à protecção das pequenas e médias empresas, nomeadamente na contratação dos
serviços do Estado, na criação de linhas e numa carga fiscal enorme, pesada, que, essa sim, é um saque às
pequenas e médias empresas, facto que não escondemos nem branqueamos.
O que entendemos é que esta nossa proposta é um contributo que, tal e qual como a do PS, tem aspectos
positivos. Cabe agora ao Governo passar da retórica e das palavras aos actos, respeitar os projectos de
resolução da Assembleia da República e, com isso, aproveitar esta janela de oportunidade. Nem precisa de
fazer o «mais», basta fazer o «menos», porque assim já ajuda, e muito, as pequenas e médias empresas e já
contribui, e muito, para que cada um de nós veja os próprios produtos cada vez mais a competirem e a
resistirem à abertura dos novos mercados e à maior agressividade de outros mercados.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, dispondo de uma transferência de tempo, tem a palavra o Sr.
Deputado Nuno Reis.
O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Independentemente de acharmos que o
projecto de resolução que o Partido Socialista aqui nos traz é uma mera aspirina para tratar um cancro muito
grande, que fique muito bem claro que não obstaculizaremos essa proposta, na esperança de que, ainda
marginalmente, as exportações consigam aumentar dessa forma.
Gostava de dizer ao Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches o seguinte: ao prepararmos este debate,
deparámo-nos com um projecto de resolução da anterior Legislatura que não resisto a trazer aqui à colação.
Esse projecto recomendava ao Governo a criação de um sistema de dinamização de parcerias e de apoio à
gestão das PME no âmbito do QREN, tinha por objectivo criar um interface interactivo, dinâmico, que não
fosse apenas um ponto de prestação de informação aos empresários, que assegurasse o serviço de
assistência técnica nas fases de pré e pós candidatura ao QREN e que fosse ao encontro do empresário
através de um plano de contacto executado preferencialmente por concelho.
Alguém nesta Câmara se recorda de algum resultado que adviesse desse projecto? Sr. Deputado, nós não
nos lembramos. Provavelmente, é o que irá novamente acontecer a este projecto. De qualquer forma, como
digo, a bem da Nação, votaremos favoravelmente.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, concluído este ponto da ordem do dia, passamos à apreciação
conjunta dos projectos de resolução n.os 261/XI (2.ª) — Recomenda medidas urgentes a adoptar pelo Governo
em matéria de protecção e valorização da floresta (PSD), 267/XI (2.ª) — As áreas protegidas e os incêndios
florestais de 2010 (PCP), e 273/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a adopção de medidas para prevenir os
incêndios florestais (BE).
Para apresentar o projecto de resolução n.º 261/XI (2.ª), tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Batista
Santos.
O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do
PSD entregou na Assembleia da República o projecto de resolução n.º 261/XI (2.ª), através do qual
recomenda medidas urgentes a adoptar pelo Governo em matéria de protecção e valorização da floresta.
Com a presente iniciativa, o PSD pretende, antes de mais, contribuir positivamente para a resolução de um
grave problema nacional — os incêndios florestais — , muitas vezes enunciado, mas que nem sempre conhece
acções estruturantes e medidas consequentes para a prática de uma gestão activa da floresta, para um
melhor e mais racional aproveitamento económico e, consequentemente, para um combate mais eficaz contra
o fogo.
Neste complexo edifício que é a gestão da floresta nacional, nos últimos anos a política florestal tem estado
mais orientada para o telhado da casa, quando deveria estar sobretudo concentrada nos alicerces ainda não
totalmente construídos. O telhado são os sucessivos planos e dispositivos de combate aos fogos florestais e
algumas penalizações fiscais entretanto aprovadas, mas que, no essencial, não respondem ou apenas
minimizam o problema.
Os alicerces, que estão a ser construídos, são as ZIF (Zonas de Intervenção Florestal), o ordenamento e a
gestão da floresta, a reestruturação profunda das medidas de apoio ao PRODER e ao Fundo Florestal
Permanente, a dinamização do programa de sapadores florestais, os planos de prevenção, as centrais
termoeléctricas de resíduos florestais e o cadastro de propriedade florestal.
Estes, Sr.as e Srs. Deputados, são os alicerces que ainda estão a ser construídos.
Também com a apresentação deste projecto de resolução para a floresta, o PSD pretende evidenciar a
importância da floresta para a economia do nosso País.
Recordo à Câmara que, segundo dados recentes, os espaços florestais ocupam dois terços do território do
nosso país. São 5,4 milhões de hectares, dos quais 3,4 milhões são arborizados.
Maioritariamente privada, a floresta portuguesa produz diversos produtos lenhosos que suportam fileiras
industriais relevantes.
A floresta em Portugal contribui para gerar cerca de 3,2% do PIB, mais de 150 000 postos de trabalho
directo e indirecto, 12% do PIB industrial e cerca de 10% das nossas exportações.
Nesta fase da vida do nosso país estes dados têm de ser tidos em conta.
Daqui facilmente se pode constatar a importância que a floresta constitui para a economia nacional.
Mais: a floresta, como todos sabemos, é uma peça-chave na conservação da natureza.
É uma fonte de importantes e abundantes matérias-primas renováveis e é um elemento decisivo na defesa
contra a erosão, bem como na regularização dos recursos hídricos.
É ainda o principal sumidouro de CO2 emitido pela utilização de combustíveis fósseis.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Perante estas evidências, não é exagero dizer que o sector florestal
constitui uma preciosa riqueza nacional, com enorme relevância em termos económicos, ambientais e também
sociais. Os dados ainda esta semana divulgados pela Autoridade Florestal Nacional (AFN), que registam,
entre Janeiro e 30 de Setembro deste ano, uma área ardida em Portugal que ascende a 126 000 hectares,
mais 58% do que no ano passado, devem, pois, suscitar a nossa maior apreensão.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Destes surpreendentes valores, os designados grandes incêndios
explicam 80% da área ardida, merecendo um registo de profundo lamento os graves incêndios ocorridos no
Parque Nacional da Peneda-Gêres e no Parque Natural da Serra da Estrela.
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Perante este cenário, Sr.as e Srs. Deputados, o PSD não se resigna e recusa olhar os incêndios florestais
como uma fatalidade.
Apresentamos um conjunto de medidas concretas e consequentes, reforçando verdadeiramente a floresta
como uma prioridade estratégica para o nosso País.
Termino, Sr. Presidente, com uma palavra de justa homenagem ao esforço extraordinário e, tantas vezes,
heróico dos bombeiros portugueses, das populações e dos agentes da Protecção Civil, que neste ano foram,
uma vez mais, o último recurso da defesa da floresta.
Sr.as e Srs. Deputados, o PSD convida hoje todas as bancadas a reflectirem sobre a protecção e a
valorização do importante e valioso património que é a floresta portuguesa.
Aplausos do PSD.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Luís Fazenda.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o projecto de resolução n.º 267/XI (2.ª), tem a palavra o Sr. Deputado
Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os 126 000 ha ardidos vieram
demonstrar que os problemas da floresta portuguesa continuam por resolver, como o PCP várias vezes
denunciou. Aliás, quando os principais responsáveis do Governo começaram, este ano, a invocar as
condições meteorológicas adversas e os incendiários, estávamos, mais uma vez, perante a fuga em assumir a
responsabilidade política pela causa essencial e central dos incêndios florestais: o estado da floresta, a que se
devem juntar algumas «poupanças» por conta do PEC, do défice orçamental, esquecendo-se os mesmos
governantes de que ainda «ontem» — em 2007 e 2008, anos de Verões chuvosos — atribuíam às medidas do
Governo a redução de incêndios e de área ardida.
Estas constatações não põem em causa as melhorias verificadas no dispositivo de combate. Bem pelo
contrário, elas demonstram que, depois de um longo período de incúria e de subestimação pela política de
direita de sucessivos governos — PS, PSD e CDS — , responsáveis por mais de 2,7 milhões de hectares de
floresta queimada nos últimos 25 anos, depois dos anos calamitosos de 2003 e 2005, foi possível, como o
PCP sempre afirmou e propôs, travar o flagelo.
Mas, nas questões estruturais da floresta, não se passou, em geral, do papel. Se dúvidas há sobre esta
afirmação, basta fazer o balanço do grau de concretização da «matriz de responsabilidades e indicadores da
Estratégia Nacional para as Florestas (ENF)».
O forte e cego condicionamento financeiro reduziu e estilhaçou os serviços do Estado para a floresta,
sendo responsável pela total ausência de investimentos PRODER na floresta, pelo desastre do Fundo
Florestal Permanente e pelo impasse com as ZIF.
Em matéria de cadastro florestal, estamos conversados: a Estratégia Nacional para as Florestas previa o
cadastro florestal concluído em 2013.
Como grave é a situação no mercado da madeira, com o preço da pasta de papel a subir e o preço do
eucalipto a descer.
Mesmo no quadro do dispositivo de prevenção e combate se notam as consequências dos PEC, como é o
caso dos GAUF (Grupo de Análise e Uso do Fogo), do equipamento dos bombeiros e das comunicações.
O PCP, no seu projecto de resolução, resolveu privilegiar os incêndios florestais nas áreas protegidas,
onde arderam mais de 15 000 ha. Foram fortemente atingidos a Peneda/Soajo/Gerês, a Serra da Estrela, o
Alvão, o Montesinho e o Douro Internacional. No Parque Nacional da Peneda-Gerês ardeu a mata do Cabril e
na Serra da Estrela foi atingida a reserva biogenética.
Compreendendo terras com diversa propriedade, as áreas protegidas estão sob tutela directa do Estado,
pelo que deveriam ser exemplares em matéria de prevenção, vigilância e combate aos incêndios. E não são!
Apesar das denúncias e alertas do PCP e de outros, os problemas agudizaram-se sob a pressão das
políticas orçamentais restritivas do PEC, em meios e recursos humanos.
Além de muitas outras situações, refira-se a história anedótica do tractor que, no Parque Nacional da
Peneda-Gerês, abria um caminho, que parou por falta de dinheiro para um filtro e que quando se arranjou
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dinheiro para o filtro parou por falta de dinheiro para o gasóleo! Ou refira-se a história do funcionário do
mesmo Parque que não se deslocou a um baldio a marcar madeira porque não tinha viatura disponível!
E como «casa roubada, trancas à porta», a Ministra do Ambiente e o Ministro da Administração Interna
anunciaram, em fins de Setembro, reforço de meios e compra de oito viaturas de combate para os parques. E
também os dois anunciaram, pela quinquagésima vez, o avanço do cadastro florestal, projecto experimental
para sete concelhos!
Mas a questão estruturalmente mais grave é o já referido confronto e hostilização das gentes que moram e
vivem nos parques, a imposição de taxas que nenhum residente pode aceitar — é o caso das revisões dos
planos de ordenamento, como o do Parque Nacional da Peneda Gerês, que não têm em conta as opiniões das
suas populações — , o que tem sido ignorado pelo Governo, com o argumento pífio de que tal acontece em
todo o mundo!
Assim, propomos no nosso projecto de resolução dois objectivos centrais e um conjunto integrado de
medidas. É também necessária uma política agroflorestal que combata a desertificação e reforce o apoio aos
agricultores e pastores, o que exige a mudança do PRODER e do Fundo Florestal Permanente,
nomeadamente das intervenções territoriais integradas (ITI), e a cobertura pelas medidas de emergência de
todas as áreas atingidas.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para apresentar o projecto de resolução n.º 273/XI (2.ª), tem a palavra
o Sr. Deputado Pedro Soares.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Agora, que entramos no Outono, é
bom que não nos esqueçamos dos meses dramáticos de Verão com os incêndios florestais. O ano de 2010 é
já um dos mais gravosos desta década em termos de fogos florestais. Não tenhamos dúvidas: a defesa contra
os fogos florestais joga-se, em primeiro plano, nas políticas públicas de prevenção e de vigilância da floresta,
na promoção da agricultura, no ordenamento da floresta e no combate ao abandono e à desertificação das
áreas rurais. É pela ausência de políticas públicas, e não só pela meteorologia, que já nos confrontamos,
neste momento, com 126 000 ha de área ardida no nosso País, a saber com 16 000 ha de áreas protegidas
afectadas pelos fogos florestais, como o Parque Nacional da Peneda Gerês, os Parques Naturais da Serra da
Estrela, do Alvão, de Montesinho e do Douro Internacional — um crime ambiental para a biodiversidade do
nosso território! — , com quase 400 000 ha contaminados pela praga do nemátodo do pinheiro, com a
necessidade de abate de 200 000 ha de pinhal e a perspectiva da perda de 10 000 postos de trabalho nesta
fileira.
Estamos — é preciso dizê-lo com toda a clareza — à beira da falência desta política governamental em
relação às florestas, uma política de abandono que levará a enormes prejuízos económicos, sociais e
ambientais para o nosso País e, em particular, para as populações do interior do nosso território.
É por isso que recomendamos ao Governo que arrepie caminho, que ultrapasse esta situação de impasse
das zonas de intervenção florestal (ZIF), que dê todo o apoio ao funcionamento das ZIF e amplie as suas
capacidades de intervenção na floresta.
Ora, é nesta matéria que se concentra o nosso projecto de resolução. E ainda bem que neste Parlamento
confluem três projectos de resolução: um, mais generalista, do PSD; outro, mais concentrado nas áreas
protegidas, do PCP; e ainda um outro, o nosso, do BE, concentrado sobre a necessidade premente de colocar
as ZIF a funcionar. De facto, este é um instrumento absolutamente necessário para compensar a pulverização
da propriedade florestal no nosso País e possibilitar o ordenamento e a gestão da floresta numa espécie de
condomínio, de forma associativa e integrada.
Só por incúria, incompetência ou mesmo desnorte político é que este Governo não supera os
constrangimentos que continua a impor às entidades gestoras das ZIF, a burocracia, as dificuldades nos
acessos a fundos comunitários, e a falta de envolvimento das ZIF na elaboração do cadastro rústico que
começou mas nunca mais acaba, que já foi atirado para as calendas mas é essencial, absolutamente
essencial para uma correcta política florestal e para o funcionamento das ZIF.
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Esta é a nossa urgente recomendação, esta é a nossa recomendação ao Sr. Ministro da Agricultura, que
não pode continuar a passar por este problema como «cão por vinha vindimada». É preciso que o Ministério
da Agricultura não continue, com a sua prática, a criar desmotivação e desmoralização nos pequenos
produtores florestais, que aderiram (com alguma dificuldade por vezes, mas que acabaram por aderir), na
expectativa de uma melhor gestão da sua propriedade, ao associativismo e às zonas de intervenção florestal.
Sr. Ministro da Agricultura, não mate as ZIF! Sr. Ministro da Agricultura, incentive-as, confira-lhes apoios
públicos, dê-lhes acesso ao PRODER, ao Fundo Florestal Permanente, crie equipas de sapadores florestais e
incentive-as, incremente o cadastro rural, e certamente que teremos não só menos fogos florestais no próximo
Verão como também um interior menos desertificado, mais coesão nacional e uma floresta a contribuir, de
forma importante, para a economia do nosso País e para a maior coesão territorial.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Pedro Soares (BE): — Responda a este aviso, Sr. Ministro da Agricultura, porque ele é
absolutamente premente.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís
Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Depois de cinco anos
mais calmos, com o Governo a afirmar que os incêndios de 2003 e 2005 eram coisa do passado, eis que um
Verão mais prolongado vem mostrar que, afinal, os problemas da nossa floresta continuam a reinar.
E se durante esse período ouvimos o Governo dizer que a diminuição da área ardida se ficou a dever às
medidas que o Governo tomou, ouvimos agora dizer que a responsabilidade pelo aumento da área ardida se
deve a tudo menos ao Governo.
Ou seja, quando as coisas correm bem, são as medidas do Governo, quando correm mal, são os outros. É
a isto que se chama conversa fiada, para não dizer conversa da treta.
É que, na verdade, não só os problemas estruturais da nossa floresta permanecem como a situação se
agravou nos últimos anos. E agravou-se ao ponto de as zonas de intervenção florestal passarem de um
sentimento de expectativa por parte dos produtores para um sentimento de desânimo absoluto.
Por sua vez, o cadastro florestal, instrumento fundamental de orientação e execução da política florestal,
continua sem sair da gaveta.
As ajudas comunitárias e as promessas de um investimento sem paralelo no sector acabaram por se
transformar no maior período de ausência de investimento público que o sector alguma vez conheceu.
A meio do período de duração do Quadro Comunitário, a execução financeira do PRODER é uma autêntica
desgraça. Senão vejamos: a modernização das empresas florestais tem 1% de execução; a minimização de
riscos tem 0% de execução; o ordenamento e reconversão dos espaços florestais tem 0% de execução.
Por outras palavras, o Governo não consegue colocar o PRODER ao serviço da floresta. Não consegue
transformar o PRODER num meio de combate aos incêndios florestais.
Não estranha, por isso, ouvir os produtores florestais dizer que o problema é «calor a mais e PRODER a
menos».
Depois temos o Fundo Florestal Permanente, que gera, anualmente, 30 milhões de euros e que deveria
ajudar a ultrapassar alguns destes constrangimentos e relançar o investimento no sector. Mas, não, esta verba
apenas tem sido aplicada no apoio ao planeamento de estruturas organizativas ligadas à produção e arranjo
de caminhos.
Por outro lado, o Estado, que deveria dar o exemplo no que diz respeito à prevenção e vigilância dos
incêndios florestais nas áreas onde tem particulares responsabilidades, como nas áreas protegidas, não dá
exemplo algum. O que aconteceu este Verão nas áreas protegidas deveria envergonhar os membros do
Governo com responsabilidades na matéria: mais de 15 000 ha de área ardida, apenas nas áreas protegidas,
o que representa um aumento de 60% relativamente à média anual dos últimos cinco anos.
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Os Verdes entendem que é necessário olhar para a nossa floresta como um recurso natural, dos poucos
que temos, que possui grande capacidade para produzir riqueza e emprego no País e que ocupa cerca de
40% do território nacional.
O Governo não pode ficar à espera de um Verão menos quente, é necessário investir na floresta, na sua
manutenção e preservação, é necessário, antes de mais, que o PRODER entre, de facto, em acção.
Assim sendo, Os Verdes vão votar a favor dos projectos que estamos a discutir, porque, na nossa
perspectiva, os mesmos podem representar contributos importantes para a manutenção e a preservação das
nossas áreas protegidas e da floresta em geral.
Vozes de Os Verdes: — Muito bem!
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Relativamente aos diferentes
projectos de resolução aqui apresentados, devo dizer que são, todos eles, bem-vindos — aliás, no seguimento
daquele que o CDS já apresentou, em primeiro lugar, e que será discutido na Comissão de Agricultura, o
projecto de resolução n.º 254/XI (1.ª), que recomenda ao Governo a implementação de medidas e eliminação
de constrangimentos relativamente ao PRODER no que à floresta diz respeito.
Ora, é exactamente devido à ausência de política que este Governo tem tido para a floresta que é
necessário não só recomendar ao Governo como tomar algumas medidas legislativas que são urgentes.
Há cerca de cinco anos que o Governo vem dizendo que falta cadastro para a floresta, tendo, há dias, o Sr.
Ministro da Agricultura anunciado que vai avançar com um projecto-piloto em nove concelhos, o que, ao ritmo
a que pretende fazê-lo, vai levar 30 meses para esses nove concelhos e 15 anos para o cadastro a nível
nacional.
Obviamente que a floresta, no estado em que se encontra, não aguenta, de forma alguma, esse tempo de
espera. Não aguenta esse tempo de espera na não implementação do PRODER no que à floresta diz respeito,
com taxas de execução muito próximo de 0% e, em alguns casos, mesmo a 0%. Não aguenta a falta de
política de prevenção no que diz respeito a algumas pragas e doenças da floresta,»
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — » sendo disso exemplo inacabado o que foi o nemátodo do pinheiro, o
que é o Programa PROLUNP, que deu o resultado que está a dar não só para a floresta como para a indústria
nacional, o stress do sobreiro, o cancro das resinosas, a altica do carvalho ou a tinta do castanheiro.
Estas são medidas que o Governo não toma, pois não tem política para a floresta.
E como se isto não fosse suficiente, verificámos este ano — um ano em que as condições climatéricas não
foram tão favoráveis à não existência de fogos florestais — que os fogos florestais grassaram de forma quase
incontrolável em praticamente todo o território nacional, atingindo já, neste momento, uma das mais extensas
áreas dos últimos 10 anos e, obviamente, muito acima daquilo que era a média dos últimos cinco anos.
Protestos do Deputado do PS Horácio Antunes.
No que diz respeito aos fogos florestais, seria bom saber qual é a monitorização que o Estado tem feito do
que são os planos municipais de defesa da floresta contra incêndios. A saber, o que se passa, relativamente a
esta matéria, na nomeação dos comandantes municipais de combate a fogos florestais.
O Sr. Horácio Antunes (PS): — As câmaras é que nomeiam!
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — O Governo, sobre esta matéria, nada nos diz — aliás, porque nada tem
para dizer.
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No que às ZIF diz respeito, que, provavelmente, são uma boa medida legislativa, mas que, na prática, têm
sido um desastre, verificamos que, neste momento, existem cerca de 16 000 proprietários organizados em
ZIF, presumindo-se, no entanto, que existam cerca de 400 000 proprietários organizados em ZIF.
Ora, a este ritmo, também não vamos lá, quando sabemos que 90% da floresta portuguesa pertence a
privados.
Quanto ao Código Florestal, feito há dois anos, que está, neste momento, suspenso e do qual o Governo
não sabe o que fazer, recomendamos ao Governo que o revogue e que faça efectivamente um código
florestal, porque o que existe não é um código mas um conjunto de medidas compiladas que, na prática, não
resolvem coisa alguma. Chamar código àquilo é muito pouco ou muito mau.
Assim sendo, da nossa parte, viabilizaremos estes projectos de resolução e esperamos que, se aprovados,
o Governo faça àquilo que normalmente não faz, ou seja, que cumpra aquilo que lhe é recomendado por esta
Casa, pois daqui saem, às vezes, algumas medidas que são boas e outras que, não sendo totalmente
eficazes, prevêem, pelo menos, situações que o Governo não tem tido o cuidado de prever, como as que
dizem respeito à floresta.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Freitas.
O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República decidiu,
através da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, avançar com um relatório sobre os
fogos florestais de 2010.
É, pois, no quadro desse relatório que está a ser produzido no âmbito da Comissão que, creio, esta
Câmara deverá fazer um conjunto de recomendações ao Governo.
É esse o tempo certo e é esse o local certo para o conjunto de recomendações que temos de fazer ao
Governo.
Compreendemos a necessidade que a oposição teve de se antecipar a essa discussão, mas, na verdade, é
aí que vamos fazer o verdadeiro debate sobre o ano de fogos florestais em Portugal.
Mas entendemos que os contributos dados, que são contributos importantes, podem ajudar a termos um
bom relatório de fogos florestais produzido por esta Casa.
O ano não foi bom, mas é preciso dizer que a estrutura operacional no terreno funcionou com competência,
com eficácia e com empenho. Creio que esta Câmara também reconhece isso.
Do nosso ponto de vista, agora é tempo de o Governo trabalhar, analisar a situação, estudar e fornecer à
Assembleia da República boa informação. Só com boa informação podemos ter um conjunto de
recomendações que apontem no sentido correcto do que é necessário para contribuir de forma a melhorar
esta questão dos fogos florestais. Portanto, neste momento, mais do que recomendações, temos um conjunto
de questões que gostávamos aqui, hoje, de deixar.
Em primeiro lugar, gostaríamos de saber exactamente qual é o ponto de situação dos Planos Municipais de
Defesa da Floresta Contra Incêndios e quais os mecanismos de coordenação que existem a nível regional e a
nível nacional. O Governo deve estudar e responder em concreto a esta questão.
Em segundo lugar, das mais de 21 000 ocorrências, em 24 fogos arderam mais de 1000 ha e temos de
saber porquê. Tem de ser feita uma análise e uma avaliação das razões que levaram a que em 24 fogos
ardessem mais de 1000 ha. Esta é outra resposta que o Governo tem de dar.
Em terceiro lugar, tivemos campanhas de sensibilização, mas na verdade parece que não resultaram, isto
é, o número de ocorrências continuou a ser muito elevado e cerca de 97% dessas ocorrências foram
provocadas por mão humana. Portanto, o Governo tem de nos dizer porque é que continua a haver um
elevado número de ocorrências em Portugal.
Finalmente, quero lembrar que este foi o ano em que houve mais detenções de pretensos incendiários.
Precisamos, pois, de ter informação relativa à investigação criminal e à evolução dos processos no âmbito da
justiça no quadro dos fogos florestais para que abandonemos a ideia da impunidade nesta matéria.
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Estas são as quatro questões a que esperamos que o Governo nos possa responder para que, no âmbito
do relatório dos fogos florestais, possamos fazer uma discussão séria e serena sobre esta matéria, que é, de
facto, importante para o País.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Sr.as e Srs. Deputados, passamos à discussão conjunta do projecto de
lei n.º 325/XI (1.ª) — Remoção de amianto em edifícios, instalações e equipamentos públicos (Os Verdes), na
generalidade, e dos projectos de resolução n.os 268/XI (2.ª) — Prioridade na execução das medidas
associadas à exposição, utilização e remoção de amianto previstas na Estratégia Nacional para a Segurança e
Saúde no Trabalho 2008 — 2012 (CDS-PP), e 271/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a adopção de medidas
para prevenir e mitigar os riscos da exposição ao amianto nos edifícios públicos (BE).
Para apresentar o projecto de lei de Os Verdes, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Julgo que será
reconhecido que Os Verdes não só têm trazido constantemente à Assembleia da República a preocupação a
propósito da questão dos edifícios que contêm amianto como têm procurado, permanentemente, soluções
concretas para esta problemática de saúde pública.
Já por diversas vezes, na Assembleia da República, em nome de Os Verdes, expliquei a grande
preocupação que decorre da presença de amianto em edifícios públicos, visto que há pessoas a frequentá-los
diariamente, muitas vezes durante anos a fio, designadamente nas comunidades escolares, e os perigos que
daí poderão decorrer para a saúde pública. Portanto, não vou fazer novamente uma intervenção desse
género. Vou apenas relembrar um processo altamente conturbado por uma única razão: a falta de vontade
política para resolver um problema de saúde pública.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Muito bem!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — A questão é a seguinte: em 2003, um projecto de resolução
aprovado por unanimidade na Assembleia da República determinava, tão simplesmente, que, no prazo de um
ano, deveria proceder-se a uma listagem dos edifícios públicos em Portugal que continham amianto e, por
outro lado, a uma avaliação do estado desses edifícios e a um plano de remoção do amianto onde houvesse
essa necessidade. Tão simples quanto isso. Mas estamos em 2010 e isso não está feito, o que é
absolutamente inacreditável perante um problema com esta dimensão.
Relembro que Os Verdes têm questionado permanentemente vários ministérios sobre esta matéria e o
Ministério da Educação, na Legislatura passada, deu-nos a informação preocupante de que 59% das escolas
avaliadas pelo Ministério da Educação continham amianto nas suas estruturas. Isto é preocupante e é mais do
que Os Verdes pensavam.
Consideramos, portanto, que é absolutamente fundamental intervir nesta matéria. Apresentámos uma
resolução, mas não deu resultado. Os sucessivos governos assobiaram para o lado. Nesse sentido,
entendemos que era fundamental transformar essa resolução num projecto de lei, numa lei obrigatória para
que o Governo tivesse de a cumprir. O processo legislativo foi iniciado na passada Legislatura com a
aprovação do projecto de lei na generalidade. No entanto, na especialidade, arrastou-se o processo, que
acabou por caducar com o final da Legislatura.
Foi, então, que Os Verdes entenderam, já no início desta Legislatura, que era tempo de apresentar este
projecto de lei e, assim, retomar este processo legislativo para que a Assembleia da República dê uma
resposta muito clara e legisle no sentido de criar a obrigatoriedade de fazer uma listagem dos edifícios
públicos que contêm amianto e, onde houver essa necessidade, criar um plano de remoção do amianto, em
benefício, naturalmente, da saúde pública.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Muito bem!
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O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para apresentar o projecto de resolução do CDS-PP, tem a palavra o
Sr. Deputado João Pinho de Almeida.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, o CDS-PP apresenta este projecto de
resolução sobre uma matéria que já foi muitas vezes discutida nesta Assembleia e que é, infelizmente, de
análise recorrente.
Como todos sabem, o amianto foi o material utilizado durante muito tempo por ter qualidades de
isolamento, de resistência e de incombustibilidade, ou seja, uma série de condições que, aliadas a um baixo
custo, faziam com que fosse muito utilizado em vários sectores, sendo um dos mais importantes o sector da
construção.
Acontece que, a partir dos anos 60, foram sendo divulgados estudos que relacionavam directamente a
exposição e o contacto com o amianto ao cancro do pulmão e obviamente que, à medida que esses estudos
foram sendo lançados, foram confirmando uma suspeita que existia, pelo que, desde essa altura, as
autoridades deveriam ter começado a preocupar-se não só com a utilização, como com a remoção do amianto
onde ele já existisse.
Em Portugal, legislou-se pela primeira vez sobre esta matéria em 1987, através de decreto-lei. A partir daí,
sucederam-se algumas iniciativas, sendo muito relevante o projecto de resolução que foi aprovado nesta Casa
em 2003 e que tinha como objectivo a remoção do amianto dos edifícios públicos e a proibição da sua
utilização futura. Acontece que, desde 2003, pouco foi feito de concreto que pudesse satisfazer os objectivos
deste projecto de resolução.
Em 2008, foi aprovada a Estratégia Nacional para a Segurança e Saúde no Trabalho (que é o ponto pelo
qual o projecto de resolução do CDS pega), na qual são incluídas várias medidas que têm a ver com a
exposição dos trabalhadores ao contacto com o amianto e com o impacto que isso tem na saúde dos mesmos.
O que nos parece fundamental neste momento é que, estando definida esta Estratégia, ela possa ser
concretizada na defesa da saúde dos trabalhadores no nosso país.
Vozes do CDS-PP: — Exactamente!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Portanto, em nome do princípio da precaução, que é um
princípio fundamental nesta matéria, entendemos que há dois objectivos essenciais, que são os que estão
contidos no nosso projecto de resolução: por um lado, concretizar o que já foi aprovado na Assembleia da
República em 2003, através da inventariação de todos os edifícios públicos que contêm amianto,
estabelecendo uma estratégia para a sua remoção e proibindo a sua utilização em construções futuras —
estes objectivos constam da Estratégia Nacional para a Segurança e Saúde no Trabalho; e, por outro lado,
para que tudo isto seja possível, é fundamental também regulamentar o processo de certificação das
empresas para a remoção do amianto.
Trata-se de medidas concretas que, pensamos, poderão ajudar a resolver um problema que há tantos anos
se arrasta. Como obviamente o que interessa é o objectivo final, entendemos que faz todo o sentido viabilizar
as iniciativas de Os Verdes e do Bloco de Esquerda, porque, apesar de apresentarem medidas diferentes, têm
também como objectivo, tão depressa quanto possível, conseguirmos resolver um problema que se arrasta há
tanto tempo.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para apresentar o projecto de resolução do Bloco de Esquerda, tem a
palavra a Sr.ª Deputada Rita Calvário.
A Sr.ª Rita Calvário (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Todos os projectos hoje, aqui, em
discussão têm em comum o mérito de trazer mais uma vez a preocupação com os riscos associados à
exposição ao amianto, que são muito graves para a saúde pública e que já foram identificados nas últimas
décadas.
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Esta é uma preocupação totalmente actual e pertinente, porque, ao longo dos últimos anos e dos
sucessivos governos, temos vindo a assistir à total inacção perante a legislação e as recomendações da
Assembleia da República.
Recordo, mais uma vez, a resolução tomada pela Assembleia da República em 2003, que dizia muito em
concreto que o Estado tem a obrigação de fazer a inventariação de todos os edifícios públicos contendo
amianto, identificar os casos de risco para a saúde pública e proceder, em tempo útil, à remoção desse
amianto, protegendo, assim, os trabalhadores, a população e os utentes desses edifícios.
Estamos a falar, muito em concreto, de escolas, de centros de saúde, de hospitais, de autarquias, de
repartições de finanças, etc. De facto, o universo dos edifícios públicos é bastante vasto e necessita de uma
intervenção urgente, mas, infelizmente, desde 2003, assiste-se à total inacção por parte dos sucessivos
governos.
Hoje em dia, não se conhece um inventário dos edifícios públicos contendo amianto, não se conhecem os
riscos relacionados com a presença desse amianto e não se avançou com as obras necessárias para conter
esses riscos e remover esse amianto quando assim é necessário.
Para o Bloco de Esquerda é preciso responder com urgência a esta situação e, mais do que novos planos,
do que novos prazos, do que dizer ao Governo que deve cumprir o que já está decidido, o Governo tem de
assumir um compromisso sério para a resolução do problema.
Por isso mesmo, propomos soluções muito concretas para agilizar estes processos.
Em primeiro lugar, propomos a criação de uma comissão especializada que se dedique inteiramente a
inventariar os edifícios públicos, a identificar os riscos para a saúde pública e a calendarizar um plano de
trabalho para intervir e efectuar obras nos edifícios onde são identificados os riscos e proceder-se, então, à
remoção do amianto sempre que assim seja necessário.
Propomos também que, após essa calendarização dos trabalhos, se proceda rapidamente às obras e que,
por isso mesmo, ultrapassando um conjunto de constrangimentos que hoje existem porque a adjudicação das
obras está afecta a cada um dos ministérios, sempre que possível, seja o próprio Estado a avançar com a
contratualização directa com as empresas de remoção do amianto.
Igualmente importante é prestar mais informação ao público e também formar os próprios gestores dos
edifícios públicos e dos seus trabalhadores para a adopção de normas de segurança que permitam proteger a
saúde pública.
Também é importante esta Assembleia da República e o público em geral terem acesso à informação
sobre o inventário dos edifícios públicos e aos trabalhos de remoção do amianto que, entretanto, se vão
realizando, e hoje em dia não existe qualquer informação pública disponível sobre esta matéria.
Para o Bloco de Esquerda são precisas soluções concretas para fazer cumprir uma resolução que já data
de 2003. Estamos perante riscos para a saúde pública e é preciso prevenir e mitigar estes riscos com soluções
concretas.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Acácio Pinto.
O Sr. Acácio Pinto (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista saúda o Partido
Ecologista «Os Verdes» por trazer este tema à discussão e por apresentar esta iniciativa legislativa, que tem o
mérito de trazer ao debate a perigosidade do amianto para o ambiente e para a saúde pública e, portanto,
merece a nossa melhor atenção.
Importa, porém, desde já dizer que não é verdade que os governos do PS nada tenham feito sobre esta
matéria.
Vamos aos factos.
No seguimento da Resolução de 2003, os diferentes ministérios têm procedido à avaliação dos edifícios da
sua tutela. Deixamos aqui os exemplos dos Ministérios da Educação e da Saúde.
O Ministério da Educação procedeu já à avaliação de todos os edifícios que contêm fibrocimento, amianto,
tendo esse levantamento sido efectuado por pessoal e firmas especializadas, após a devida autorização das
autoridades responsáveis e na ausência de alunos, de docentes e de outros funcionários.
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Podemos também recordar aqui que os programas nacionais para a requalificação e modernização das
redes escolares estão a contribuir, de forma decisiva, para a eliminação daquele material em edifícios e
equipamentos escolares.
Também o Ministério da Saúde está a fazer o seu percurso. Dada a pertinência da adopção de
procedimentos com vista à mitigação ou eliminação do risco da presença de materiais com amianto em
unidades de saúde, incluindo a descrição das acções a tomar e procedimentos normalizados, o Ministério da
Saúde está a elaborar o Guia de Procedimentos de Inventariação de Materiais com Amianto e Acções de
Controlo em Unidades de Saúde, onde se inclui o levantamento e a avaliação da problemática da presença de
materiais contendo amianto em edifícios e os seus efeitos na saúde pública e no ambiente.
Como podemos constatar, e nesta matéria, os governos do PS têm vindo a fazer o seu trabalho, não
havendo, pois, fundamento para as recomendações que aqui são apresentadas. O actual Governo está a
trabalhar empenhadamente nesta área, assim como o anterior governo já o fez.
Sobre o projecto de resolução do CDS, recordamos apenas que o mesmo é, na nossa leitura, redundante.
O LNEC tem o levantamento e inventariação de todos os edifícios públicos que contêm amianto na sua
construção e um plano de remoção desses materiais concluído desde 2009.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não é verdade!
O Sr. Acácio Pinto (PS): — Por último, e no que tange ao projecto de resolução do Bloco de Esquerda, o
objecto de trabalho da comissão especializada que se pretende criar estará, no final deste ano, no âmbito do
terminus do contrato de prestação de serviços celebrado entre a Direcção-Geral do Tesouro e Finanças e o
LNEC, concluído, e daí a redundância do projecto de resolução.
O Partido Socialista nada tem a obstar à adopção de medidas desde que razoáveis e sustentáveis, o que
não é o caso. Muitas das propostas e recomendações são, como já disse, redundantes com aquilo que está
em curso.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António
Cabeleira.
O Sr. António Cabeleira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As iniciativas em análise
incorporam o princípio da precaução e a promoção da saúde pública.
Sobre esta matéria, a Assembleia da República aprovou, por unanimidade, a Resolução n.º 24/2003, de 2
de Abril.
É do reconhecimento público que o amianto existente nas construções constitui um problema ambiental e
de saúde pública.
Lamenta-se, no entanto, que o projecto de lei do Partido Ecologista «Os Verdes», hoje em apreciação, seja
praticamente uma cópia do apresentado na legislatura anterior, não tendo os signatários tirado proveito da
discussão então havida.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Cabeleira (PSD): — Lamentavelmente, não pôde esta Assembleia e a população tirar
proveito do relatório prometido pela bancada do Partido Socialista.
É bom hoje recordar que a bancada do Partido Socialista tinha então prometido que o LNEC apresentaria
em Junho de 2009 um relatório com a listagem completa e com o calendário das intervenções. Disse a
bancada do Partido Socialista, e passo a citar «O Governo faz o seu trabalho e está sempre atento ao que se
decide nesta Assembleia» e «foram os Srs. Deputados surpreendidos pela eficácia do Governo». Maravilhosa
eficácia e extraordinária atenção! Aqui está um exemplo da governação socialista: ninguém conhece qualquer
relatório um ano após a data prometida e sete anos após a aprovação da Resolução.
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Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Cabeleira (PSD): — Colossal atenção dispensa o Governo ao que se decide na
Assembleia!
O actual Governo não age, nem coordena e o Ministério do Ambiente não tem vontade de actuar
transversalmente.
Sr.as e Srs. Deputados, estará o princípio da precaução e a defesa da saúde pública presente na constante
e persistente desqualificação e encerramento de serviços de saúde existentes no interior do País?
É inquestionável que a remoção do amianto deve constituir preocupação. Impõe-se, no entanto, hoje a
seguinte questão: a desestruturação do Serviço Nacional de Saúde no interior do País não deverá igualmente
preocupar-nos?
Muitos dos edifícios com materiais com amianto são património das autarquias. Houve necessidade e
urgência em construir equipamentos para democratizar o acesso a bens públicos.
Vivem-se momentos de crise e, quando há momentos de crise, as autarquias sofrem sempre
sistematicamente cortes drásticos. A calendarização das intervenções deverá ter em consideração os fortes
constrangimentos financeiros que as autarquias estão a viver por imposição do actual Governo, que impõe
cortes às autarquias, enquanto a despesa pública, sob sua responsabilidade, continua a aumentar.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O assunto que hoje discutimos na
Assembleia da República é, de facto, de uma grande importância para a saúde pública.
É do conhecimento de todos os malefícios que o amianto provoca na saúde das pessoas, como também
são conhecidos os perigos decorrentes da exposição humana ao amianto ou fibrocimento. Está comprovado
que estas partículas de amianto, quando inaladas ou, mesmo, em contacto com a pele, podem provocar várias
patologias.
Por isso, as iniciativas legislativas que hoje estão em debate e que propõem a remoção do amianto dos
edifícios, instalações e equipamentos públicos são de uma grande pertinência.
Vários estudos relacionam a exposição ao amianto com o surgimento de várias doenças, muitas delas
cancerígenas.
Em Portugal, desde 2005 que a legislação proíbe a utilização destes materiais na construção. No entanto,
muito embora o Partido Socialista afirme o grande empenhamento na resolução deste problema, a verdade é
que, na prática, não verificamos uma intervenção clara nesta matéria. Ou seja, continua a construir-se um
conjunto de edifícios e de equipamentos públicos com materiais que, na sua composição, contêm amianto. E
muitos exemplos poderiam ser dados, como, aliás, já o foram: escolas, hospitais, etc., edifícios frequentados
não só por um elevado número de trabalhadores mas também por muitos utentes. Esta é uma grande
preocupação, que continua por resolver.
Em 2003, a Assembleia da República aprovou uma resolução que recomendava que o Governo fizesse
uma listagem do conjunto de equipamentos e edifícios que fossem construídos com estes materiais que
contêm amianto com o objectivo de elaboração de um plano para a remoção desses mesmos materiais.
A verdade é que, passados sete anos — muito embora, mais uma vez, o Partido Socialista refira um
grande empenhamento e esforço por parte do Governo — , não se conhece essa listagem nem qualquer plano
de intervenção e os edifícios continuam a ter estes mesmos materiais que contêm amianto, permitindo a sua
utilização por um conjunto de pessoas e havendo uma desresponsabilização pelas consequências negativas
na saúde das pessoas.
Em relação às iniciativas hoje em debate, na nossa opinião, o projecto de lei proposto pelo Partido
Ecologista «Os Verdes» é o que permite a resolução do problema com a maior brevidade, pois prevê não só
diagnosticar a situação mas também criar um plano de calendarização para a remoção do amianto de um
modo faseado.
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Na nossa opinião, este plano deve não só estabelecer essas prioridades de intervenção, respeitando as
normas de segurança, saúde e higiene no trabalho, mas também dispor de um programa de apoio financeiro
para as várias entidades públicas procederem à remoção do amianto.
Não podemos continuar a adiar a solução para este problema.
A Assembleia da República tem legitimidade para decidir e legislar sobre esta matéria. É esta a questão
que está hoje em debate e cabe não só aos grupos parlamentares assumirem a sua responsabilidade e
decidirem em nome do bem-estar de toda a população mas também ao Governo procedendo à remoção do
amianto dos edifícios públicos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para uma segunda intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Já reparou, Sr. Deputado
Acácio Pinto, que a conversa do Partido Socialista ç a mesma em 2003, em 2007, em 2008, em 2010»! Não
pode ser! O LNEC está sempre a fazer, mas nunca mais acaba o que tem para fazer, não é verdade, Sr.
Deputado? Portanto, há que encarar a realidade.
Ora, aquilo que sabemos é que Programa de Gestão e Inventariação do Património Imobiliário Público, de
Fevereiro de 2010, refere que o LNEC fez um bocadinho do que era para fazer, mas o «bocadão» não está
feito. Porquê? Seguramente por questões de financiamento, de falta de vontade política, etc., como eu disse
no início da minha intervenção.
Mas o Sr. Deputado não pode estar sempre a dizer que o LNEC está a fazer ou que o LNEC já fez aquilo
que não está a fazer nem fez! Os senhores têm a mesma conversa há sete ou oito anos!
O Sr. Deputado falou dos exemplos na educação e na saúde.
Vou dar-lhe dois exemplos que gostaria que tivesse a curiosidade de conhecer pessoalmente: uma escola
em Monforte e o centro de saúde da Quinta do Conde. Sr. Deputado, estes dois estabelecimentos estão num
estado deplorável, têm amianto e as pessoas que os frequentam inalam diariamente partículas de amianto.
O Sr. Deputado tem alguma informação para nos dar sobre o novo centro de saúde da Quinta do Conde ou
sobre a remodelação da escola de Monforte? Não tem o Sr. Deputado, nem tem o Governo! Está a ver a
prioridade?!
Gostávamos que o amianto se tornasse um objectivo político em si para salvaguarda da saúde pública e
não viesse por arrasto de outras matérias.
Por último, Sr. Presidente, Os Verdes consideram que o melhor é criar obrigatoriedade relativamente a esta
matéria e daí a apresentação do projecto de lei.
Já existe um projecto de resolução de 2003. Será que os projectos de resolução do CDS ou do Bloco de
Esquerda vêm resolver a questão? Ora, se o Governo não cumpre o projecto de resolução de 2003, pergunta-
se: vai cumprir os de 2010?
Mesmo assim, julgo que o projecto de resolução do CDS vai num melhor sentido do que o do Bloco de
Esquerda, porque o diploma do Bloco de Esquerda acaba por retomar o processo do início, com outra
metodologia, e julgo que isso vai contribuir para atrasar a resolução deste problema.
Vamos pegar naquilo que já existe e lançar para a frente!
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino, Sr. Presidente, com a esperança de que o nosso
projecto de lei seja aprovado.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Srs. Deputados, passamos à apreciação conjunta da petição n.º 64/XI
(1.ª) — Apresentada por Luísa Jacinta Soares Dias Ferreira e outros, solicitando à Assembleia da República a
preservação, restauro e manutenção do Complexo das Sete Fontes, bem como a proibição de construção nas
suas imediações, e dos projectos de resolução n.os 270/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a conclusão do
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processo de classificação do Complexo Monumental das Sete Fontes (CDS-PP) e 276/XI (2.ª) — Recomenda
ao Governo a publicação do despacho de classificação do Complexo das Sete Fontes e a adopção de
medidas para a sua protecção (BE).
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Antonieta Dias.
A Sr.ª Maria Antonieta Dias (CDS-PP): — Ex.mo Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Esta é
a primeira vez que me dirijo ao Plenário e, por isso, quero cumprimentar, na pessoa do Sr. Presidente, todas
as Sr.as Deputadas e todos os Srs. Deputados.
Estamos hoje aqui a discutir uma petição que deu origem a dois projectos de resolução, um dos quais
apresentado pelo CDS, que visam a conclusão do processo de protecção, preservação e valorização do
Complexo Monumental das Sete Fontes, em Braga.
Como eleita pelo distrito de Braga, tenho por esta matéria um interesse natural. Este é, certamente, um dos
monumentos mais desconhecidos da população em geral, mas um dos mais interessantes do País no que se
refere à sua função.
As Sete Fontes devem o seu nome ao número de cúpulas exteriores que existiam aquando do seu
funcionamento pleno como complexo de abastecimento de água à cidade de Braga, complexo este que é uma
obra de engenharia hidráulica única em Portugal e no mundo, datada do século XVIII, que abasteceu a cidade
de Braga durante séculos.
Não é por acaso que 2010 foi consagrado, pela Organização das Nações Unidas, como o Ano da
Diversidade e ganhou dois dias no calendário: 22 de Março (Dia Mundial da Água) e 1 de Outubro (Dia
Internacional da Água).
Sentem-se hoje os efeitos da falta de medidas de protecção do monumento, com a colocação de aterros na
zona de minas oriundos do novo hospital de Braga. Não estamos contra as inovações e contra a construção
do hospital, estamos, sim, contra a perda de um espólio nacional e do património de Portugal.
Aplausos do CDS-PP.
Cremos que os acessos a este novo equipamento, agora projectados pela Estradas de Portugal, irão ter
efeitos menos negativos do que teriam aquando do projecto elaborado pela Câmara Municipal de Braga; no
entanto, outras infra-estruturas poderão inviabilizar a preservação deste monumento.
A forma pouco atenta como a Câmara de Braga lida com este monumento e com o seu espaço envolvente
tem sido facilitadora de um urbanismo descontrolado. Braga é uma cidade de monumentos históricos
«perdida» no meio do betão armado.
É difícil para os Srs. Deputados visualizar a monumentalidade deste conjunto. Por isso, atrevo-me aqui a
sugerir uma visita ao mesmo.
Aplausos do CDS-PP.
As sete bicas representam para Braga o ex libris, como o Aqueduto das Águas Livres representa para
Lisboa.
O projecto de resolução do CDS vem reforçar o pedido expresso na petição amplamente subscrita pelos
bracarenses.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Sr.ª Deputada, queira terminar, por favor.
A Sr.ª Maria Antonieta Dias (CDS-PP): — Estou a terminar, Sr. Presidente.
Este processo está, desde há muito tempo, no Ministério da Cultura à espera de resolução, sendo que já
passaram sete anos, desde 2003, para a publicação de classificação como Zona Especial de Protecção (ZEP).
Tem, hoje, esta Casa a oportunidade de apoiar a preservação do espaço, com a aprovação do projecto de
resolução do CDS-PP, que recomenda ao Governo a rápida publicação da Zona Especial de Protecção, com a
preservação e valorização do monumento e das suas fontes de abastecimento.
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Braga merece um parque da cidade, como todas as outras cidades do País. A beleza paisagística deste
sistema de captação e a junção de várias fontes num veio subterrâneo que produz um caudal que, à época,
servia uma grande cidade é, no nosso entender, o melhor local para a realização do parque da cidade de
Braga.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Luís Fazenda): — Para apresentar o projecto de resolução n.º 276/XI (2.ª), tem a palavra
o Sr. Deputado Pedro Soares.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Saudamos, em primeiro
lugar, em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, os peticionários e as peticionárias da petição n.º
64/XI (1.ª) em favor da preservação, restauro e manutenção do Complexo das Sete Fontes, obra de
engenharia hidráulica do século XVIII, do maior interesse patrimonial, histórico, cultural, arquitectónico da
época barroca, ambiental e económico.
Qualquer cidade europeia teria o maior orgulho numa estrutura com a importância única que o Complexo
das Sete Fontes tem em pleno centro da cidade de Braga. E é esta localização, é precisamente esta sua
localização, uma das suas grandes vantagens para a sua preservação e necessidade/possibilidade de
aproveitamento com um extraordinário — eventualmente, essa poderia ser a solução — parque temático
ligado à água.
Mas é também esta sua localização central em relação à cidade de Braga que poderá ser uma das suas
maiores desvantagens neste processo, porque se mantém sempre e sempre ameaçada pela política
mesquinha de quem tem governado aquela cidade ao longo de anos e que só tem na sua mente a economia
do betão e, assim, tem transformado aquela cidade.
Vozes do BE: — Muito bem!
Protestos do PS.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Só a economia do betão é que lhes interessa e por isso são incapazes de
perceber o valor único do Complexo das Sete Fontes.
Porém, é preciso dizer aqui, com muita sinceridade, que o Complexo das Sete Fontes não é apenas uma
questão da freguesia de São Victor, no centro da cidade de Braga, apesar do extremo empenho que o seu
Presidente tem dedicado à preservação e aproveitamento desta obra. Também não é apenas uma questão
que diga respeito exclusivamente ao município de Braga, cujo Presidente, por seu lado, pouco ou nada se tem
dedicado à preservação e aproveitamento das Sete Fontes. Este monumento tem relevância nacional.
De facto, em 2003, o Instituto Português do Património Arquitectónico propôs a classificação das Sete
Fontes como Monumento Nacional e o respectivo despacho de homologação foi exarado passado poucos
meses. No entanto, estamos em 2010, portanto passados sete anos, e o monumento das Sete Fontes
continua sem que tenha saído o despacho em Diário da República para a sua classificação como Monumento
Nacional.
É precisamente por isso que o Bloco de Esquerda apresenta o seu projecto de resolução, em que
recomenda ao Governo, como que exige ao Governo que, perante a amplitude desta obra de grande
importância arquitectónica e histórica, faça, por fim, com que seja publicado o despacho que, finalmente,
coloque as Sete Fontes na lista dos monumentos que são património nacional.
Esta seria uma medida absolutamente fundamental no sentido da preservação deste Complexo das Sete
Fontes e do seu aproveitamento lúdico, cultural e como parque temático com importância não só para a cidade
de Braga mas também para todo o País.
Aplausos do BE.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Jaime Gama.
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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.
O Sr. Miguel Macedo (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero, à cabeça desta minha intervenção,
dizer que o meu grupo parlamentar concorda inteiramente com os termos da petição que hoje apreciamos e
também com os dois projectos de resolução que aqui estão presentes.
Não vou perder muito tempo a enaltecer a importância deste Complexo das Sete Fontes — de resto, um
complexo que foi construído quase em simultâneo com o Aqueduto das Águas Livres — , que tem
características que são únicas no País e que, fruto do desleixo de muitos e da falta de cuidado de alguns, já foi
seriamente amputado. Uma das mães de água, que podemos ver hoje nesse Complexo, foi destruída para a
construção de alguns prédios, numa zona que há muito tempo devia ter sido interdita a qualquer uso que não
o aproveitamento das águas e zona lúdica e de lazer da cidade de Braga, uma zona de descompressão, para
ser usufruída e fruída pelos cidadãos de Braga.
Quero, no entanto, dizer, a este propósito, duas ou três coisas que me parecem essenciais.
Em primeiro lugar, lamentar que o despacho de 2003, que, de resto, dava seguimento a um parecer do
Conselho Consultivo do então IPPAR no sentido de a classificar como Monumento Nacional, não tivesse
chegado até ao fim do processo que permitisse, com a publicação em Diário da República, a consagração
como Monumento Nacional do Complexo das Sete Fontes.
Quero dizer que, voluntária ou involuntariamente, por via da edificação do novo hospital de Braga, as Sete
Fontes têm, hoje, uma nova ameaça.
Em relação a esta matéria, quero ser muito claro: acho que é muito importante viabilizar um acesso ao
novo hospital de Braga; no entanto, também acho que é perfeitamente possível compatibilizar a existência
deste Complexo das Sete Fontes com um acesso ao novo hospital de Braga. E não me venham dizer que isto
pode custar mais alguma coisa, porque o custo de perdermos sete fontes que têm um caudal importante de
água, que é boa, aquela edificação, que é única, e uma zona de descompressão de uma cidade que precisa,
como de pão para a boca, de zonas de descompressão urbanas são valores pequenos para o custo que a
mais tiver que ter este acesso ao novo hospital de Braga.
Há possibilidades de compatibilizar. Assim o queira a Estradas de Portugal, que tem hoje este processo em
mãos, mas queira, sobretudo, o Ministério da Cultura, através da Direcção Regional de Cultura — e com isto
termino — , fazer o trabalho que lhe compete para completar aquilo que, no fundo, vem proposto nos projectos
de resolução e é pedido pelos peticionários.
Este foi um movimento que, durante muitos anos, envolveu milhares de cidadãos em Braga. Esta petição é
assinada por milhares de cidadãos de Braga, que se interessam há muito tempo por esta matéria. Esta é
também uma luta cívica, a que nós aqui, na Assembleia da República, devemos dar acolhimento, fazendo as
recomendações que são devidas ao Governo neste sentido.
Portanto, que fique aqui claro que o meu grupo parlamentar acompanha os peticionários e os grupos
parlamentares que apresentaram os projectos de resolução, porque aquilo que é proposto é aquilo que é
devido para um monumento que já devia ser nacional em toda a sua plenitude.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.
O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Srs. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por saudar os peticionários
e sublinhar o excelente trabalho dos seus promotores na fundamentação e concretização desta petição.
Muito haveria a dizer, mas julgo que questão política central deste debate é uma interrogação. Por que
razão o problema burocrático-institucional da classificação do monumento e da definição da área de protecção
e defesa (ZEP) se arrasta há mais de uma década? Mistério! Mistério, sobretudo porque, havendo um enorme
e aparente consenso político-partidário e das próprias instituições sobre o assunto, vão passando os governos
e o problema continua por resolver!
No já longínquo ano de 1995, a ASPA requereu ao IPPAR, nos termos da lei do património cultural, a
classificação do «sistema de abastecimentos de água setecentista».
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Em Abril desse ano, 1995, o IPPAR abriu formalmente um processo de classificação e, em 10 de Abril de
2001, a mesma instituição pública definiu uma «área de delimitação cautelar».
Em 1 Junho desse ano de 2001, o PCP, após uma visita guiada que fez às Sete Fontes, questionou o
governo PS de então sobre o processo de classificação. A resposta foi zero.
Em 29 de Maio de 2003, como já aqui foi referido, é exarado o Despacho do Conselho Consultivo do
IPPAR, classificando as Sete Fontes como Monumento Nacional. Tudo resolvido? Não! O Despacho não é
homologado nem publicado em Diário da República. Porquê? Mistério!
Em 11 de Janeiro de 2006, o PCP volta a questionar o Governo a propósito da construção de uma área
comercial.
Em 18 de Abril de 2008, o PCP volta a questionar o Governo a propósito de um projecto escolar de grande
dimensão na proximidade do monumento.
Em 13 de Março de 2009, novamente questionámos o Governo a propósito da sua pressa eleitoral —
pressa que não teve durante dezenas de anos! — na construção do novo hospital.
As respostas da Sr.ª Ministra da Cultura foram sempre muito tranquilizadoras, mas, de facto, até hoje,
como todos sabemos, nem publicação, em Diário da República, da classificação de Monumento Nacional, nem
homologação final da ZEP, proposta concluída pelo IGESPAR, em 23 de Abril de 2010!
Enquanto as coisas estão em «vias de», a «aguardar apreciação», em «fase final de procedimento» em
sede do Ministério da Cultura e que também consta do «plano em desenvolvimento» na Câmara Municipal de
Braga — expressões das respostas que foram sendo dadas — , soubemos, por declarações públicas da
Direcção Regional de Cultura do Norte, de 22 de Abril, que há compromissos urbanísticos assumidos, que há
que ter em conta que há terrenos comprados, que têm direitos adquiridos de construção, que há o novo
hospital e que há a via de acesso.
Sabemos também que os estudos de impacto ambiental, previstos na DIA (Declaração de Impacte
Ambiental), a propósito da via alternativa à estrada nacional n.º 103, impostos pelo Ministério do Ambiente em
2003, não foram efectuados.
Sabemos, ainda, que as obras do hospital, e não só, continuam a impactar forte e feio na área do
monumento com escorrência de aluviões sobre a estrutura e parque hidrológico e arqueológico das Setes
Fontes para lá de um recente e surpreendente abate de árvores de grande porte.
Gostaria de, nesta oportunidade e para terminar, reafirmar o total acordo do Grupo Parlamentar do PCP
com os sete pontos constantes da petição e acrescentar a evidência que o recente temporal de chuvas em
Braga veio demonstrar: as Sete Fontes estão numa bacia de recepção e a sua manutenção, sem mais
cimento, é crucial para evitar também que chuvas fortes causem danos a jusante no interior da própria cidade
de Braga.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de mais e em nome
do Grupo Parlamentar de «Os Verdes», gostaria de saudar os peticionantes aqui presentes, as pessoas que
se envolveram mais na preparação desta petição e, de uma forma geral, saudar também os 6000 cidadãos
que subscreveram a presente petição e que, através dela, solicitam a preservação, restauro e manutenção do
Complexo das Sete Fontes, bem como a proibição de construção nas suas imediações.
O Complexo das Sete Fontes constitui, como já aqui foi dito, uma obra de engenharia única, datada do
século XVIII e classificada como Monumento Nacional em 2003, mas, apesar disso, apesar de terem passado
já sete anos sobre essa classificação, continua à espera não só que o Governo proceda à publicação do
respectivo despacho em Diário da República mas também da conclusão do seu processo de classificação
como Zona Especial de Protecção.
A manifesta indiferença por parte do Governo perante um património com esta importância tem facilitado as
agressões constantes à integridade do Complexo das Sete Fontes.
Situado numa zona sujeita a uma elevada pressão urbanística, o Complexo conhece agora uma nova
ameaça com a intenção de se construírem os viadutos de acesso ao novo hospital de Braga.
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Os Verdes, já há algum tempo, têm vindo a acompanhar este assunto importante, tendo, inclusivamente,
formulado ao Governo duas perguntas escritas, em Maio deste ano, e cujas respostas continuamos
pacientemente a aguardar, porque nem o Ministério da Cultura, nem o Ministério das Obras Públicas,
Transportes e Comunicações se dignaram, até hoje, responder.
Importa, pois, chamar a atenção do Governo para a necessidade de proceder, nomeadamente, à
publicação em Diário da República da classificação do Complexo das Sete Fontes como Monumento Nacional,
e à conclusão do processo de classificação do Complexo como Zona Especial de Protecção, com a inclusão
da zona edificante, de forma a impedir a construção nas suas imediações, desde logo, dos viadutos de acesso
ao novo hospital, procurando soluções alternativas.
Mas também se impõe que o Governo respeite e faça respeitar a Lei da Água, diligencie no sentido de se
proceder à elaboração e publicação dos estudos previstos na Declaração de Impacte Ambiental, que nunca
foram realizados, e, por fim, que devolva a sétima fonte, incluída no terreno do hospital, ao Complexo das Sete
Fontes e que dela faz parte.
Os Verdes acompanham, assim, na íntegra, as preocupações dos peticionantes e votarão a favor das
iniciativas que visem a preservação deste importante património, como é o caso dos projectos de resolução
que estão também em discussão.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.
O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos a debater a petição n.º
64/XI (1.ª), relativa à defesa do Complexo das Sete Fontes na cidade de Braga, e os 2 minutos atribuídos a
cada grupo parlamentar é pouco para abordar a importância das Sete Fontes nas suas várias vertentes.
Em primeiro lugar, quero cumprimentar os peticionários que tomaram a iniciativa e todos os que a
assinaram, pois trata-se também de um sinal claro de cidadania e de participação das populações que importa
realçar — aliás, creio que esta é também uma marca da própria República.
Nesta petição, que enquadra um número significativo de assinaturas, são notórias as preocupações
patrimoniais, ambientais, paisagísticas, defendendo os peticionários a preservação, o restauro e a manutenção
do monumento, o aumento da zona de protecção e do seu nível e, ainda, o reaproveitamento das águas
existentes.
Há, ainda, uma notória apreensão com o sistema de acesso ao novo hospital de Braga, como aqui já foi
referido, hospital que está em construção e que entrará em funcionamento no ano de 2011, uma obra, diga-se,
já agora, há décadas prometida e sempre adiada. Certamente que os Diários desta Assembleia registam
muitas intervenções de alguns dos Srs. Deputados que aqui anteriormente usaram da palavra no sentido da
defesa da construção do novo hospital de Braga!
Este sistema é considerado Monumento Nacional desde 2003, estando, de facto, hoje, em fase final de
classificação como Zona Especial de Protecção. Durante o processo de elaboração do relatório foram
solicitadas informações, esclarecimentos ao Ministério da Agricultura, ao Ministério do Ambiente e
Ordenamento do Território, bem como à própria Câmara Municipal de Braga, e, em resposta, a autarquia
bracarense — permitam-me dizê-lo — , legitimada pelo voto popular, afirma ter defendido a sua acção futura
em alguns pontos que, já agora, quero aqui realçar.
Assim, como que em resposta à Sr.ª Deputada do CDS-PP e com uma atenção particular relativamente a
este sistema, são de realçar os seguintes aspectos: preservação da totalidade do sistema; controlo
quantitativo e qualitativo da edificabilidade das imediações; e disponibilização de uma área territorial
significativa envolvendo esse sistema de abastecimento de água para integrar no domínio público, permitindo
assim a concretização futura do Parque das Sete Fontes, preocupação, aliás, que já foi aqui, de certa forma,
expressa pelo Sr. Deputado Miguel Macedo e com a qual concordamos.
Quanto ao processo de classificação e ao estabelecimento da respectiva Zona Especial de Protecção,
essencial para todo este processo, o Ministério da Cultura refere que se encontra, de facto, numa fase final de
procedimento. Há, ainda, audições prévias a fazer e reclamações a responder. Há também um Estado de
direito que é preciso cumprir e, cumprindo, também estamos a cumprir a República. Há procedimentos que
não podem ser ultrapassados, mas esses procedimentos não devem limitar o interesse na preservação das
Sete Fontes.
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Na nossa opinião, as entidades, directa ou indirectamente envolvidas, devem acompanhar e desenvolver, no âmbito das suas competências, as acções tendentes a defender, a promover e a desenvolver o sistema das Sete Fontes com vista à sua salvaguarda e fruição pela população.
Na verdade, desenvolver de forma integral no mundo moderno é conseguir novas oportunidades no território, é criar melhores equipamentos e infra-estruturas, conciliando, com respeito pelo património, a salvaguarda da memória colectiva.
Assim, conseguindo esta dupla dimensão, estamos, certamente, a construir um Portugal melhor.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, finda a discussão conjunta da petição n.º 64/XI (1.ª) e dos projectos de resolução n.os 270/XI (2.ª) e 276/XI (2.ª), está concluída a ordem do dia de hoje.
A próxima reunião realizar-se-á amanhã, às 15 horas, com a interpelação n.º 10/XI (2.ª), sobre educação, apresentada pelo CDS-PP.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 51 minutos.
Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS)
Alberto Bernardes Costa
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Partido Social Democrata (PSD)
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
João Bosco Soares Mota Amaral
José Mendes Bota
Maria Luísa Roseira da Nova Ferreira de Oliveira Gonçalves
Partido Popular (CDS-PP)
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Deputados que faltaram à sessão:
Partido Socialista (PS)
António Ribeiro Gameiro
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José João Pinhanços de Bianchi
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Partido Social Democrata (PSD)
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Egrejas Leitão Amaro
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António Joaquim Almeida Henriques
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Pedro Nuno Mazeda Pereira Neto Rodrigues
Partido Popular (CDS-PP)
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Bloco de Esquerda (BE)
Pedro Manuel Bastos Rodrigues Soares
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.