14 | I Série - Número: 019 | 30 de Outubro de 2010
Sabemos que é uma metodologia que tem cerca de 40 anos de vida mas ninguém mais, ao que sabemos, a implementou nos seus orçamentos. Por exemplo, na Europa, não há qualquer caso de adaptação integral desta metodologia, mas há casos de provada eficiência, de provada avaliação de recursos e até de eficiência reconhecida, que permite aproveitar, com melhor rentabilidade, meios do Estado para o plano social e para o plano económico do que os citados exemplos dos Estados Unidos — julgo que estará de acordo com isso.
A questão é esta: não temos a certeza — e gostaríamos de saber a sua opinião sobre isso — de que o orçamento de base zero, porque é um instrumento, possa impedir por si só o descalabro das contas públicas a que assistimos neste momento em Portugal, ou possa impedir a opacidade total e a manipulação total da execução orçamental a que assistimos. Não é seguramente através deste sistema, mas gostava de ouvir a sua opinião sobre isto.
Neste contexto e por causa destes condicionalismos, quero colocar-lhe uma outra questão relacionada com estas.
Considera o Bloco de Esquerda exequível propor que o Orçamento do Estado para 2012 já possa ser elaborado a partir de uma base zero? Considera isto exequível, credível, no nosso País, em 2010 e 2011? É esta a questão que lhe coloco.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Honório Novo, considero esta proposta exequível se o trabalho for feito para introduzir o que falta na prática orçamental, que é o rigor nas contas e a prestação da informação.
A sua primeira questão, que separarei da outra, reforça uma que já foi apresentada e creio que é bem satisfeita pela leitura do texto.
O texto diz, no artigo 2.º, que o artigo 15.º da Lei de Enquadramento Orçamental será aplicado com a justificação detalhada de todas as dotações de despesa. Diz no artigo 4.º que o artigo 37.º da Lei de Enquadramento Orçamental será concretizado com a informação de todas as dotações já previstas na lei e diz, no artigo 9.º, que o artigo 19.º da Lei do Enquadramento Orçamental tem de incluir o plano da despesa plurianual em saúde, educação, segurança social, justiça e segurança pública. São estas as três concretizações — mais nenhuma! — que são aplicadas à Lei do Enquadramento Orçamental.
Não há, portanto, qualquer contradição. É o reforço dos objectivos da política orçamental, tal como é definido na lei geral e definido numa lei concreta, porque estas disposições aplicam-se neste ano, não se aplicam em todos os anos, dado que não é possível ter esta prática em todos os anos, como muito bem sublinhou.
A sua questão de fundo, e creio ter razão, é acerca do instrumento. É um instrumento, com certeza, e é um instrumento numa disputa dificílima. O orçamento tem sido utilizado para destruir o Estado social, e preservar o Estado social depende do rigor das contas, depende da força social, da democracia e da capacidade de tornar o serviço de saúde, a educação ou a segurança social pilares constitucionais da nossa vida pública.
Mas essa é mais uma razão para haver rigor nas contas públicas.
Dou-lhe um exemplo das contas deste ano, que o Sr. Deputado conhece muito bem.
Nas contas deste ano, há duas rubricas, entre outras (pois há muitas assim) que destaco: «outros trabalhos especializados» e «outros serviços». Quanto é que vamos pagar em «outros trabalhos especializados»? 617 milhões de euros. Quais? E em «outros serviços» estão 302 milhões de euros. Quais? Não podemos saber.
Em duas rubricas de «outros» — que não sei se são justificáveis ou não, uma parte será, outra não sei — , estão o equivalente a dois submarinos, está uma verba de um Ministério, e 1000 milhões de euros que não fazemos a mínima ideia do que são. São «outros serviços«, «outras compras«» Um orçamento que exige a justificação de cada serviço perante a opinião pública, perante o Parlamento, perante a Comissão, perante a verificação dos cidadãos, obriga a que despesas deste montante sejam ventiladas, verificadas e controladas. Esse é um benefício.
O que se gasta em «outros serviços», que não sabemos o que é, é o dobro do que se está a tirar ao Serviço Nacional de Saúde, é o mesmo que se está a tirar aos salários da função pública.