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Sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012 I Série — Número 76
XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)
REUNIÃOPLENÁRIADE23DEFEVEREIRODE 2012
Presidente: Ex.mo Sr. António Filipe Gaião Rodrigues
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz Abel Lima Baptista
S U M Á R I O
O Sr. Presidente (António Filipe) declarou aberta a
sessão às 15 horas e 5 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa do projeto de lei n.º
180/XII (1.ª). Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa
Apolónia (Os Verdes) insurgiu-se contra o incumprimento por parte do Governo da Lei n.º 2/2011, de 9 de fevereiro, relativa à remoção de amianto em edifícios, instalações e equipamentos públicos. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Rita Rato (PCP) e Ana Drago (BE).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues (PS) criticou a reorganização territorial do setor da justiça e a consequente extinção de tribunais, após o que deu resposta a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados João Oliveira (PCP), Cecília Honório (BE) e Teresa Leal Coelho (PSD).
Foram apreciadas as propostas de resolução n.os
14/XII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e os Emirados Árabes Unidos para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Abu Dhabi, a 17 de janeiro de 2011, 15/XII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e o Reino da Noruega para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Lisboa, a 10 de março de 2011, 16/XII (1.ª) — Aprova o Protocolo e o Protocolo Adicional, assinados em 7 de setembro de 2010, que alteram a Convenção entre a República Portuguesa e o Grão-Ducado do Luxemburgo para Evitar as Duplas Tributações e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre Rendimento e o Património e o respetivo Protocolo, assinados em Bruxelas, a 25 de maio de 1999, 17/XII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a República
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Portuguesa e a República do Panamá para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada na cidade do Panamá, a 27 de agosto de 2010, 18/XII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e a República da Colômbia para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Bogotá, em 30 de agosto de 2010, 19/XII (1.ª) — Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a Região Administrativa Especial de Hong Kong da República Popular da China para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinado em Hong Kong, em 22 de março de 2011, 20/XII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e o Japão para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Lisboa, em 19 de dezembro de 2011, e 22/XII (1.ª) — Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Estado do Qatar para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinado em Doha, em 12 de dezembro de 2011. Intervieram no debate, a diverso título, além do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas), os Srs. Deputados Pedro Filipe Soares (BE),
Honório Novo (PCP), Mónica Ferro (PSD), Basílio Horta (PS) e José Lino Ramos (CDS-PP).
A Câmara discutiu os projetos de resolução n.os
204/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a manutenção da autonomia de gestão dos portos comerciais nacionais (PS) e 227/XII (1.ª) — Exige a manutenção da gestão pública e autónoma dos portos portugueses (BE). Fizeram intervenções os Srs. Deputados Ana Paula Vitorino (PS), Catarina Martins (BE), Adriano Rafael Moreira (PSD), Bruno Dias (PCP) e Hélder Amaral (CDS-PP).
Foram apreciados o inquérito parlamentar n.º 1/XII (1.ª) — Comissão eventual de inquérito parlamentar à gestão do Banco Português de Negócios pela CGD e à sua venda ao BIC (BE) e o projeto de deliberação n.º 5/XII (1.ª) — Auditoria a realizar pelo Tribunal de Contas ao processo de nacionalização do BPN, Banco Português de Negócios, e ao processo que determinou a insolvência do BPP, Banco Privado Português, avaliando, nomeadamente, os custos já realizados e a realizar pelo Estado português (PCP). Usaram da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados João Semedo (BE), Hugo Velosa (PSD), Honório Novo (PCP), Pedro Nuno Santos (PS) e João Pinho de Almeida (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 55 minutos.
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Social Democrata (PSD)
Adriano Rafael de Sousa Moreira
Afonso Gonçalves da Silva Oliveira
Amadeu Albertino Marques Soares Albergaria
Ana Sofia Fernandes Bettencourt
Andreia Carina Machado da Silva Neto
António Carlos Sousa Gomes da Silva Peixoto
António Costa Rodrigues
António Egrejas Leitão Amaro
António Fernando Couto dos Santos
António Manuel Pimenta Prôa
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Bruno Manuel Pereira Coimbra
Carina João Reis Oliveira
Carla Maria de Pinho Rodrigues
Carlos Eduardo Almeida de Abreu Amorim
Carlos Henrique da Costa Neves
Carlos Manuel Faia São Martinho Gomes
Carlos Manuel dos Santos Batista da Silva
Cláudia Sofia Gomes Monteiro de Aguiar
Cristóvão Duarte Nunes Guerreiro Norte
Cristóvão Simão Oliveira de Ribeiro
Cristóvão da Conceição Ventura Crespo
Duarte Filipe Batista de Matos Marques
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Eduardo Alexandre Ribeiro Gonçalves Teixeira
Elsa Maria Simas Cordeiro
Emídio Guerreiro
Emília de Fátima Moreira dos Santos
Fernando Luís de Sousa Machado Soares Vales
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Nuno Fernandes Ribeiro dos Reis
Fernando Ribeiro Marques
Fernando Virgílio Cabral da Cruz Macedo
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Hélder António Guerra de Sousa Silva
Joana Catarina Barata Reis Lopes
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Jorge Paulo da Silva Oliveira
José Manuel Marques de Matos Rosa
José Manuel de Albuquerque Portocarrero Canavarro
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
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João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Figueiredo Antunes
João Manuel Lobo de Araújo
Laura Maria Santos de Sousa Esperança
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Valenzuela Tavares Menezes Lopes
Luís Manuel Morais Leite Ramos
Luís Pedro Machado Sampaio de Sousa Pimentel
Lídia Maria Bulcão Rosa da Silveira Dutra
Manuel Augusto Meirinho Martins
Manuel Filipe Correia de Jesus
Margarida Rosa Silva de Almeida
Maria Clara Gonçalves Marques Mendes
Maria Ester Vargas de Almeida e Silva
Maria Francisca Fernandes Almeida
Maria Isilda Videira Nogueira da Silva Aguincha
Maria José Quintela Ferreira Castelo Branco
Maria José Vieira Teodoro Moreno
Maria Manuela Pereira Tender
Maria Paula da Graça Cardoso
Maria da Conceição Alves dos Santos Bessa Ruão Pinto
Maria da Conceição Feliciano Antunes Bretts Jardim Pereira
Maria da Conceição Vaz Barroso Carloto Caldeira
Maria da Graça Gonçalves da Mota
Maria das Mercês Gomes Borges da Silva Soares
Maurício Teixeira Marques
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário José Magalhães Ferreira
Mário Nelson da Silva Vaz Simões
Mónica Sofia do Amaral Pinto Ferro
Nuno Filipe Miragaia Matias
Nuno Miguel Pestana Chaves e Castro da Encarnação
Nuno Rafael Marona de Carvalho Serra
Odete Maria Loureiro da Silva
Paulo Cardoso Correia da Mota Pinto
Paulo César Lima Cavaleiro
Paulo César Rios de Oliveira
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Paulo Jorge Simões Ribeiro
Pedro Alexandre Antunes Faustino Pimpão
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Augusto Lynce de Faria
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Manuel Tavares Lopes de Andrade Saraiva
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Ricardo Augustus Guerreiro Baptista Leite
Rosa Maria Pereira Araújo Arezes
Sérgio Sousa Lopes Freire de Azevedo
Teresa de Andrade Leal Coelho
Teresa de Jesus Costa Santos
Ulisses Manuel Brandão Pereira
Valter António Gaspar de Bernardino Ribeiro
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Vasco Manuel Henriques Cunha
Ângela Maria Pinheiro Branquinho Guerra
Partido Socialista (PS)
Acácio Santos da Fonseca Pinto
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Ana Paula Mendes Vitorino
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Manuel Soares Serrano
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
Carlos Filipe de Andrade Neto Brandão
Carlos Manuel Pimentel Enes
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elza Maria Henriques Deus Pais
Eurídice Maria de Sousa Pereira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando Pereira Serrasqueiro
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Glória Maria da Silva Araújo
Idália Maria Marques Salvador Serrão
Inês de Saint-Maurice de Esteves de Medeiros Vitorino de Almeida
Isabel de Lima Mayer Alves Moreira
Jacinto Serrão de Freitas
João Paulo Feteira Pedrosa
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
João Saldanha de Azevedo Galamba
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Carlos das Dores Zorrinho
José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Manuel José de Faria Seabra Monteiro
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria Gabriela da Silveira Ferreira Canavilhas
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Isabel Solnado Porto Oneto
Maria Odete da Conceição João
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Mário Manuel Teixeira Guedes Ruivo
Miguel João Pisoeiro de Freitas
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno André Neves Figueiredo
Paulo Alexandre de Carvalho Pisco
Paulo Jorge Oliveira de Ribeiro Campos
Pedro Filipe Mota Delgado Simões Alves
Pedro Manuel Dias de Jesus Marques
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rui Jorge Cordeiro Gonçalves dos Santos
Rui Paulo da Silva Soeiro Figueiredo
Rui Pedro Gonçalves Duarte
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Partido Popular (CDS-PP)
Abel Lima Baptista
Adolfo Miguel Baptista Mesquita Nunes
Altino Bernardo Lemos Bessa
Artur José Gomes Rêgo
Inês Dória Nóbrega Teotónio Pereira Bourbon Ribeiro
Isabel Maria Mousinho de Almeida Galriça Neto
José Duarte de Almeida Ribeiro e Castro
José Helder do Amaral
José Lino Fonseca Ramos
José Manuel de Sousa Rodrigues
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Manuel de Serpa Oliva
João Paulo Barros Viegas
João Pedro Guimarães Gonçalves Pereira
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel Fialho Isaac
Maria Margarida Avelar Santos Nunes Marques Neto
Michael Lothar Mendes Seufert
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Raúl Mário Carvalho Camelo de Almeida
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro
Teresa Maria de Moura Anjinho Tomás Ruivo
Vera Lúcia Alves Rodrigues
Partido Comunista Português (PCP)
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
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Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Augusto Espadeiro Ramos
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado
Paula Alexandra Sobral Guerreiro Santos Barbosa
Paulo Miguel de Barros Pacheco Seara de Sá
Rita Rato Araújo Fonseca
Bloco de Esquerda (BE)
Ana Isabel Drago Lobato
Catarina Soares Martins
Francisco Anacleto Louçã
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca
Pedro Filipe Gomes Soares
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV)
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
José Luís Teixeira Ferreira
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.as
e Srs. Deputados, antes de mais, peço ao Sr. Secretário que dê
conta do expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi
admitido, o projeto de lei n.º 180/XII (1.ª) — Estatuto do Pessoal de Investigação Científica em Formação
(PCP), que baixou às 8.ª e 10.ª Comissões, sendo esta última a comissão competente.
Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.as
e Srs. Deputados, vamos iniciar o período de declarações
políticas.
Em primeiro lugar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, se me permitirem, hoje
vou falar do meu lugar na bancada.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Gostaria de pedir que entendessem esta declaração política de Os
Verdes como um grito de alerta.
Para que o desconhecimento não sirva de pretexto à falta de intervenção por parte de ninguém, é
importante que todos tenhamos conhecimento de algumas matérias. E a matéria que Os Verdes hoje aqui
trazem ao Plenário por via desta declaração política diz respeito ao incumprimento por parte do Governo da
Lei n.º 2/2011, de 9 de fevereiro, relativa à remoção de amianto em edifícios, instalações e equipamentos
públicos.
Sr.as
e Srs. Deputados, a questão da remoção do amianto tem sido uma longa batalha de Os Verdes na
Assembleia da República. Por nossa iniciativa, à qual se juntaram, depois, outras iniciativas de outros grupos
parlamentares, foi aprovada na Assembleia da República, em 2003, uma resolução que solicitava ao governo
a realização de uma listagem de todas as edificações públicas que continham amianto na sua construção,
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para que, depois, se tratasse do processo de tratamento dessas questões, isto é, ou conservação ou remoção,
em função do estado dessas edificações. Esta resolução nunca foi cumprida. Por esse facto, Os Verdes
decidiram trabalhar, na Assembleia da República, uma lei com o texto da resolução, dando-lhe, portanto, um
carácter vinculativo, para que se formasse um diploma que o Governo obrigatoriamente tivesse de cumprir,
pois estamos aqui perante um sério risco de saúde pública, e é importante termos isto em conta, Sr.as
e Srs.
Deputados.
Trabalhámos esse projeto de lei no ano de 2010, processo que veio dar origem à Lei n.º 2/2011, de 9 de
fevereiro, que obriga o Governo a fazer uma listagem dos edifícios públicos que contêm amianto, a torná-la
pública e a prever, naturalmente, a sua forma de tratamento: ou conservação, ou remoção.
Quando estávamos a trabalhar esse projeto de lei, Sr.as
e Srs. Deputados, tomámos conhecimento de que
tinha sido adjudicado um estudo ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) para proceder a esse
levantamento. Soubemos informalmente, Sr.as
e Srs. Deputados — as informações informais valem o que
valem, e, como dá para perceber, muitas não valem absolutamente nada!… —, que este estudo ou
levantamento estaria a ser feito pelo LNEC com a colaboração do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo
Jorge (INSA).
Elaborada a Lei n.º 2/2011, Os Verdes aguardaram que o prazo fosse cumprido, ou seja, a partir do dia 14
de janeiro de 2011 até ao dia 14 de janeiro de 2012 essa listagem das edificações públicas contendo amianto
deveria estar concluída. Chegámos ao dia 14 de janeiro de 2012 e não há listagem para absolutamente
ninguém; ninguém a conhece! Mal!!…
A Lei não foi cumprida por parte do Governo, e os Deputados à Assembleia da República precisam de o
saber: nós fizemos uma lei que o Governo não cumpre!
Ora, Os Verdes deram os passos que se pressupunha serem dados na sequência deste incumprimento:
imediatamente reunimos com o Instituto Dr. Ricardo Jorge de modo a perceber em que estado estava a
elaboração desta listagem. Espanto dos espantos: recebemos a informação, por parte do Instituto, de que
nunca foram contactados para a elaboração de qualquer listagem desta natureza em Portugal!…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Uma vergonha!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não era esta a informação de que estávamos à espera, mas foi
esta a informação que obtivemos do Instituto que tem por competência analisar a exposição ao amianto em
determinados espaços, e que o faz com regularidade em Portugal a pedido de vários sectores e instituições.
O Partido Ecologista «Os Verdes» pede, entretanto, ao LNEC informação e uma reunião para obter
informação relativamente ao estado de realização do estudo que pensávamos que o mesmo estava a fazer. O
LNEC responde-nos o seguinte: «Vejam bem se ainda querem a reunião, porque nunca fomos contactados
por ninguém para o cumprimento da Lei n.º 2/2011. Não estamos, portanto, a fazer listagem absolutamente
nenhuma»!…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Uma vergonha!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Aquilo que o LNEC nos diz é isto: «Em 2010, realizámos dois
relatórios — um sobre o registo histórico da utilização de amianto na construção e outro sobre a identificação
de um conjunto, de uma parcela de edifícios públicos —, mas nenhum desses relatórios é público».
Sr.as
e Srs. Deputados, julgo que andamos «a brincar com o fogo» em Portugal, e a irresponsabilidade dos
sucessivos governos tem de ser chamada à colação. Lembram-se os Srs. Deputados de que, num debate
quinzenal, Os Verdes questionaram diretamente o Sr. Primeiro-Ministro sobre o incumprimento da lei do
amianto e que o Sr. Primeiro-Ministro disse zero, cerrou a boca e não disse absolutamente nada sobre a
matéria?!…
Há uma violação direta de uma lei aprovada pela Assembleia da República. O que é que nós, Deputados,
fazemos perante isto?
Sr.as
e Srs. Deputados, há uma situação de risco de saúde pública em Portugal. O amianto é altamente
cancerígeno! Não foi por acaso que foi proibido nas edificações nos anos 90 e em Portugal, em definitivo, em
2005.
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De acordo com o INSA, há 600 000 coberturas de amianto no País. Há a presença de amianto em placas
de fibrocimento, mas também há amianto flocado, usado para condutas, canalizações e ar condicionado. Há
inclusivamente pessoas que trabalham na construção civil, onde fazem reparação de edificações, mas que
nem sonham que estão a lidar com amianto, estando expostas a um grande perigo de saúde pública! É por
isso, Sr.as
e Srs. Deputados, que temos de fazer alguma coisa.
Os Verdes vão continuar a intervir sobre esta matéria.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Concluo já, Sr. Presidente.
Qual é o próximo passo? É chamar o Governo à Assembleia da República para prestar esclarecimentos
diretos sobre esta matéria. Por isso, Os Verdes vão propor um debate de urgência sobre a matéria.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à oradora, as Sr.as
Deputadas Rita Rato e Ana Drago.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, queria, desde já, saudá-la por
trazer este importante tema ao Plenário da Assembleia da República. Importa aqui dizer que este é um
assunto da maior gravidade e que põe em causa a saúde pública de todos aqueles que lidam e convivem
todos os dias com situações de proximidade com edifícios do tipo que referiu.
A Lei n.º 2/2011 estabelece os procedimentos e objetivos com vista à remoção de produtos que contenham
fibras de amianto na construção ou requalificação de edifícios, instalações e equipamentos públicos. Portanto,
cabe ao Governo efetuar o levantamento de edifícios e instalações no sentido de calendarizar a monitorização
das ações corretivas, as regras de segurança e a obrigatoriedade de informação aos utilizadores. Cabia ao
anterior governo, do PS, e cabe agora ao atual Governo, do PSD e do CDS, fazê-lo, mas, na prática, nem o
anterior nem o atual governos fizeram o seu trabalho. Tivessem o PS, o PSD e o CDS tanta pressa de cumprir
a lei da Assembleia da República como têm de obedecer às ordens da troica e a lei, hoje, estaria, de facto, a
ser cumprida!…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — O PCP teve também oportunidade, recentemente, de visitar a Escola Básica dos
2.º e 3.º Ciclos Avelar Brotero, em Odivelas, a escola básica dos 2.º e 3.º ciclos da Marinha Grande e o Jardim
de Infância Álvaro de Campos, em Odivelas, onde as coberturas dos edifícios são feitas de fibrocimento,
existindo, de facto, risco para a saúde pública, para a saúde daquelas crianças e de todos os que ali
trabalham.
A questão muito concreta que quero deixar-lhe, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, é esta: não entende que
do que se trata aqui é do cumprimento da lei e da maior gravidade que representa o seu incumprimento por
parte do anterior e do atual governos, que nada mais teriam de fazer do que rapidamente cumprir a lei, no
sentido de proteger a saúde pública?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, queria também saudá-la por
trazer um tema tão importante ao debate político desta tarde.
Creio que a negligência que sucessivos governos têm tido em relação à questão da existência de
fibrocimento nas coberturas de edifícios públicos e da persistência de amianto em tantos edifícios públicos
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demonstra uma total irresponsabilidade, que, creio, não pode persistir. Não podemos ter, em Portugal, este
tipo de processos políticos, em que surgem iniciativas aparentemente consensuais, lançadas até por grupos
políticos que não têm a maioria na Assembleia, em que há a possibilidade de criar nesta Assembleia um
consenso sobre um conjunto de medidas que é fundamental levar avante, em que temos a aprovação da lei,
mas em que no momento seguinte nada acontece.
Daquilo que estamos a falar, como Sr.ª Deputada aqui bem disse, é de saúde pública, e de saúde pública,
devo dizer-lhe por experiência pessoal, em edifícios que são utilizados, em muitos casos, por crianças e
jovens. Portanto, estamos a falar de processos de negligência, eu diria, quase criminosos em relação a essas
crianças.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Ainda na semana passada tive também oportunidade de visitar uma escola — lá
está, é uma escola construída em meados dos anos 80 — cuja cobertura tem amianto, sendo frequentada por
centenas de crianças todos os dias. Recordo-me também de sucessivos governos terem sido confrontados
com a manutenção destas coberturas de amianto nas escolas e de terem sempre dado respostas dizendo que
o problema estava solucionado. E não está, porque hoje, em 2012, vamos às escolas e as coberturas
mantêm-se!
Portanto, é preciso confrontar o Governo com esta situação. É insustentável manter este tipo de cobertura
em qualquer edifício público. Tenham muito cuidado com as consequências disto para a saúde dos utentes e
para aquilo em que estes governos vão ser responsabilizados!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Termino já, Sr. Presidente.
Acho que não é possível que esta Assembleia e que este Governo possam, mais uma vez, fechar os olhos
àquilo que é um problema gravíssimo de saúde pública, em particular nas nossas escolas.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra a
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, dispondo de 3 minutos.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas Rita Rato e Ana Drago, agradeço
as considerações e as questões que colocaram, bem como o facto de se associarem diretamente a esta
preocupação que Os Verdes trazem à Assembleia da República.
Infelizmente, Sr.as
Deputadas, há muitos anos que batalhamos relativamente a esta questão aqui, na
Assembleia da República. Digo «infelizmente» porque uma coisa é a Assembleia da República estar a
acompanhar o processo decorrente da aplicação da lei, outra coisa é a Assembleia da República, pensando
que o processo está a decorrer — porque nós, ingénuos, pensávamos que o processo estava a decorrer,
ainda que atrasado —, quando termina o prazo, deparar-se com o facto de nada, absolutamente nada, ter sido
feito!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ora, o mínimo que se pede neste caso é a identificação dos sítios
onde existe perigo. É o mínimo que se pede! Ou seja, que as pessoas saibam e consigam perceber onde é
que esse perigo está centrado e, claro, que depois se dê o tratamento à situação em função da própria
condição de perigosidade. De facto, como as Sr.as
Deputadas referiram — e muito bem! —, é
fundamentalmente nas edificações públicas, nas escolas e nas unidades de saúde, que este problema mais se
coloca e onde, curiosamente, se verifica a maior degradação destas placas e, portanto, onde a libertação das
partículas de amianto pode ser mais perigosa.
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Depois, há os outros casos que referi, daqueles trabalhadores, designadamente da construção civil, mas
também de outras áreas, que vão fazer reparações em edificações e que nem sonham que, quando estão a
tocar em canalizações ou em determinadas condutas, estão a tocar em amianto.
Portanto, isto é extraordinariamente perigoso, porque há aqui um problema de saúde pública e andamos
todos… Aliás, todos, não, porque alguns Deputados e alguns grupos parlamentares retiram-se desta
responsabilidade, pois não temos feito outra coisa a não ser pedir responsabilidades e ação ao Governo.
Outros, como o PSD e o CDS…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, peço desculpa por interrompê-la, mas está muito ruído
na Sala.
Srs. Deputados, faço um apelo para que haja menos ruído de modo a que a Sr.ª Deputada possa ser
ouvida em condições.
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, queira prosseguir.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, agradeço e, pegando justamente nessa questão
do ruído, o que eu mais desejava, neste momento, era que o PSD e o CDS fizessem tanto ruído relativamente
à exigência de cumprimento da Lei n.º 2/2011, que obriga o Governo a fazer esta listagem das edificações
com o ambiente, como fizeram quando o governo era do PS, relativamente à resolução de 2003. Mas agora
não! Agora não fazem esse ruído, fazem outro ruído, que era o que estavam a fazer agora, em que as
pessoas estão a falar sobre coisas importantes e viram-se para o lado a cochichar sobre outras matérias.
Infelizmente, esta Casa e estas maiorias funcionam assim, Sr. Presidente!…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo
Rodrigues.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: É hoje motivo de preocupação o
anunciado encerramento de 47 tribunais. Preocupação legítima para as populações das respetivas comarcas,
porque uma justiça longe dos cidadãos é menos eficaz e mais morosa.
A afirmação da soberania manifesta-se pela presença das instituições do Estado e os cidadãos interiorizam
essa presença como fator de coesão nacional e até de segurança. Extinguir tribunais é enfraquecer essa
afirmação da soberania e o direito de todos os cidadãos à justiça.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Tempos houve em que o PSD rompeu o Pacto para a Justiça por
apenas suspeitar que estavam em curso intenções de fechar tribunais. Hoje é o PSD que vai fechar os
tribunais sem que isto cause o menor incómodo aos seus decisores.
Aplausos do PS.
O PS continua a entender que não é necessário fechar tribunais e que a instalação de novas comarcas
permite uma melhor gestão dos recursos humanos afetos à justiça e uma necessária mobilidade de alguns dos
seus agentes.
Por outro lado, estava assente e sociologicamente estudado o abandono do velho conceito de distrito para
o novo conceito de divisão administrativa das NUTS (Nomenclaturas de Unidades Territoriais para Fins
Estatísticos).
A atual opção de organização territorial da justiça por distritos não deixa de causar uma certa estranheza
perante a posição que o atual Governo adotou em relação à importância dos distritos na vida política e na
organização territorial e administrativa portuguesa.
Aplausos do PS.
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Não nos podemos esquecer de que foi o atual Governo que assim decidiu por considerar que, segundo a
resolução do Conselho de Ministros sobre essa matéria (e passo a citar), «há anos que os governos civis
deixaram de ser estruturas com sentido, utilidade e razão de ser». Por isso, decidiu eliminar um dos símbolos
da divisão territorial por distritos: os governos civis.
O erro que este Governo vai cometer de encerrar tribunais e reinventar o conceito de distrito, em
detrimento da divisão em NUTS, que tem vindo a tornar-se na principal divisão territorial a ser utilizada para
definir as áreas de atuação da maioria dos serviços do Estado, contará com a oposição do Partido Socialista.
Aplausos do PS.
Fica, assim, claro que voltaremos a este tema, mais cedo ou mais tarde, em todo o caso, para o alterar em
conformidade com as atuais NUTS e os tribunais existentes.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — É por isso que não percebemos que, pelo menos em algumas áreas da
governação, este Governo não busque consensos.
A justiça é, na verdade, um sector que precisa de acordos e consensos. Contudo, aquilo a que temos vindo
a assistir é a uma revelação de poder absoluto que prejudica os portugueses e não traz nenhum ganho
económico relevante, na medida em que ninguém foi ouvido para as decisões apresentadas e não ficou
demonstrada a linha condutora de uma poupança efetiva.
Aplausos do PS.
O relatório apresentado pelo atual Governo evidencia, todavia, que em relação a este tema nem tudo nos
separa. Há pontos de convergência entre a proposta apresentada pelo atual Governo e a proposta da Reforma
do Mapa Judiciário apresentada pelo Partido Socialista.
A Reforma do Mapa Judiciário começou em 2008 e tinha uma matriz territorial em NUTS. Esta reforma
estava a ser aplicada faseadamente e resultava num fator comum a todos operadores da justiça: o
entendimento de que o novo modelo apresentado pelo Partido Socialista tinha, no global, produzido resultados
positivos para a administração da justiça, imprimindo uma nova cultura de gestão humana, material,
processual e financeira.
A confirmação de que a nova conceção de comarca e o novo modelo de gestão dos tribunais foi uma boa
solução encontrada pelo governo do PS é o facto de o atual Governo manter o modelo de gestão aprovado
pelo Partido Socialista, bem como continuar a defender o maior grau de especialização dos tribunais.
O Sr. Jorge Fão (PS): — Muito bem!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — O Governo, ao manter essas opções, tinha bons argumentos para
encontrar consensos em relação às soluções que nos dividem e que não garantem uma melhor justiça. Aliás,
foi assim que o PS atuou, mesmo quando tinha maioria absoluta, procurando encontrar soluções de consenso,
cedendo mesmo em algumas matérias, tendo sempre em vista que, com esses consensos os portugueses
sairiam a ganhar.
O Sr. Jorge Fão (PS): — Muito bem!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr.as
e Srs. Deputados: Analisando a proposta que foi assumida pelo
Governo, com grande afirmação de autoridade por parte da Sr.ª Ministra — como se viu ainda recentemente à
saída de uma reunião partidária —, a aplicação de critérios de ponderação para o encerramento dos tribunais,
para além de uma insensibilidade social a que este Governo já nos habituou, não traz nenhum outro ganho.
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Ao encerrar um tribunal, o Governo não está apenas a negar o acesso real e efetivo à justiça dos
portugueses, está também a promover o empobrecimento, as assimetrias sociais e a desertificação dessas
regiões.
Os tribunais, além da função de soberania e casa da justiça, são polos vitais para a economia e o
desenvolvimento das populações onde se encontram instaladas as comarcas. O próprio relatório apresentado
pelo atual Governo admite que é expetável um aumento da pressão sobre os serviços do litoral, uma vez que,
segundo o Censos 2011, a maior parte dos municípios do interior perdeu população e acentuou o padrão da
litoralização. Competiria ao Estado combater essa desertificação do interior, e não acentuá-la.
Os erros relativos às soluções de mobilidade ainda são muito mais óbvios do que, à partida, pareciam.
Em concreto, o Governo não verificou que redes de transporte existem, nem a frequência de transportes
entre as comarcas a extinguir e as que ficam territorialmente competentes. Há casos como o do Nordeste,…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Vou já concluir, Sr. Presidente.
Há muitos casos que o confirmam.
O Sr. José Junqueiro (PS): — É verdade!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — E esta discordância é alargada a alguns Srs. Deputados da maioria do
PSD e do CDS — uns de viva voz, outros através da comunicação social, já manifestaram as suas
divergências relativamente à aplicação concreta desta proposta.
Vimos hoje apelar à maioria para que tenha bom senso. A autoridade não é inimiga do bom senso, mas
aquela, sem este, é despotismo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues tem três pedidos de
esclarecimento, a saber, do Sr. Deputado João Oliveira e das Sr.as
Deputadas Cecília Honório e Teresa Leal
Coelho.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, com esta declaração
política o Sr. Deputado procurou fazer um exercício de demarcação do Partido Socialista em relação ao
Governo e à maioria do PSD e do CDS.
Compreende-se que façam esse esforço: têm acompanhado o PSD e o CDS em tanta coisa, nesta
Legislatura, que faz…
Protestos do PS.
Repito: compreende-se que o Partido Socialista se deve demarcar. Mas é preciso relembrar que não é só
agora que têm andado de braço dado com a direita, também o fizeram na anterior legislatura e,
inclusivamente, há duas legislaturas atrás, quando tinham maioria absoluta nesta Assembleia da República,
procuraram, com a direita, um entendimento em relação à justiça. E, se tivéssemos de encontrar um
denominador comum de todas as reformas que têm contribuído para a degradação do sistema de justiça,
encontrávamos sempre acordos, pelo menos entre o PS e o PSD. Talvez isso nos devesse obrigar a pensar
sobre os consensos que o Partido Socialista encontra com a direita e o resultado dessas reformas que
normalmente faz.
Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, queria colocar-lhe duas ou três questões muito concretas.
O Sr. Deputado reclama, da parte da maioria, uma atitude que contribua para maiores consensos em
relação a estas matérias, e afirma uma divergência em relação à direita que não conseguimos compreender,
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porque, no essencial, a proposta do Governo em discussão mantém as alterações introduzidas pelos senhores
em 2008.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Já se esqueceram!
O Sr. João Oliveira (PCP): — O Sr. Deputado não pode vir hoje criticar à direita a intenção de encerrar
tribunais, quando os senhores a previram em 2008, na alteração que fizeram.
O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues não pode vir hoje criticar à direita as soluções em relação à gestão dos
tribunais, que criam lógicas de gestão como se os tribunais fossem empresas, porque os senhores as
aprovaram em 2008.
O PS não pode hoje criticar à direita a orientação da gestão dos tribunais em função dos resultados, porque
os senhores a impuseram na reforma que aprovaram em 2008.
A questão, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, fundamentalmente é esta: como é que os Srs. Deputados do
Partido Socialista entendem ser possível fazer reformas, sem avaliar devidamente o que falhou no modelo
anterior?
Por que razão, em 2009, fizeram a reforma sem avaliarem o que tinha falhado, sem aproveitarem as
potencialidades, com a mesma opção de fundo, que é a de gastar menos com a justiça, e gastando menos
com a justiça, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, não há modelo de organização dos tribunais que funcione,
porque, se a opção for sempre gastar cada vez menos, não há modelos de organização que possam ser bem
sucedidos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, muito obrigado pela sua
questão.
Quanto à primeira parte da sua intervenção, permita-me recordar quem foi que se aliou à direita para
derrubar o governo do PS.
Aplausos do PS.
Permita-me recordar isso para que fique claro.
Depois, gostaríamos, então de analisar…
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Deu à sola! Fugiu!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Eu acho é que VV. Ex.as
têm sempre essa tentação de atacar o PS!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Caiu de podre!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — O PS já não está no governo. Escusam de atacar mais o PS.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Nós não gostamos de hipocrisia!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Já sabemos que VV. Ex.as
têm esse preconceito relativamente ao PS,
que não sei de onde vem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Não é só para o PS!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Mas nessa matéria gostava de perguntar, Sr. Deputado João Oliveira,
qual foi o tribunal que encerrou quando o PS foi governo?
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não tiveram tempo!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Nenhum, nenhum! Nem consta de nenhuma decisão política, nem de
nenhum Ministro da Justiça do PS o encerramento de tribunais.
Aplausos do PS.
Portanto, Sr. Deputado João Oliveira, é falsa a sua invocação de que o PS também queria encerrar
tribunais.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Não queria?! Essa é boa!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Não queria, nem quer! Aliás, podíamos, mas não temos tempo, para
explicar quais as intenções do PS sobre essa matéria.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Que descaramento!
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Deputado, eu disse da tribuna que considerava que a mobilidade de
alguns agentes da justiça pode facilitar a continuação da abertura de todos os tribunais atualmente existentes.
O que entendemos é que é possível fazer uma melhor gestão dos recursos humanos e que os tribunais
devem continuar a ter os julgamentos na sua própria casa e os senhores magistrados, eventualmente, terão
de circular à volta dos tribunais.
Esse é o nosso entendimento sobre a matéria.
Sr. Deputado, na verdade, o que acho é que o PS é, de facto, um partido responsável e não enjeita as suas
responsabilidades numa matéria importante como a justiça.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Vou já concluir, Sr. Presidente.
Temos áreas de comum acordo com o Mapa Judiciário apresentado por este Governo. E achamos que
este Governo está a tomar um mau caminho ao encerrar tribunais, porque é um caminho que vai contra as
populações e contra o interior.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas, Srs. Deputados, Sr. Deputado Ricardo
Rodrigues, quero cumprimentá-lo pela importância do tema que aqui nos trouxe hoje e perguntar-lhe se nos
acompanha nestas preocupações de fundo.
Para o Bloco de Esquerda não há qualquer revisão possível do Mapa Judiciário sem a verdadeira equação
que falta fazer, que é a do mapa dos serviços públicos. E com certeza o Sr. Deputado corroborará esta
posição de que há inúmeros tribunais que correm o risco de encerramento no interior do País e, se esta
política de liquidação de equipamentos e serviços públicos continuar, a verdade é que se corre o risco de
«encerrar» o interior do País. Portanto, a questão é de uma enorme gravidade.
Para além disso, o Sr. Deputado reconhecerá que estes critérios são muitíssimos questionáveis. Esta lista
extensíssima de tribunais tem situações que são verdadeiramente incompreensíveis, que vou exemplificar —
sem deixar outras situações realmente identificáveis de lado —, como é o caso do encerramento do Tribunal
de Nelas, que não tem a ver com nenhum dos critérios estipulados, não só pela abundância de pendências,
quanto pelos critérios que justificam a inexistência de transporte público. Esta é uma situação, entre muitas
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outras, que poderíamos aqui apontar e, nesse sentido é, efetivamente, desprezar o interior, desprezar as
populações, com critérios que nem sequer são verdadeiramente compreensíveis.
A segunda questão, Sr. Deputado, diz respeito a questões relacionadas com os profissionais da justiça. É
certo que a Sr.ª Ministra parece ter querido tranquilizar estes profissionais, mas quero perguntar-lhe se me
acompanha nesta questão do «é melhor ver claramente visto», porque, com o encerramento de tantos
tribunais, a verdade é que, a prazo, pode estar no horizonte uma perspetiva de despedimento. É que o quadro
de mobilidade forçada a que este Governo quer obrigar os prestadores de serviços públicos impõe que, a
prazo, façamos também esta equação do despedimento ao nível dos profissionais da justiça.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, queira concluir.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Por outro lado, apesar de a sua intervenção ter sido de uma enorme pertinência, não foi totalmente
compreensível se, no atual contexto, aquilo que é mais pesado para o Partido Socialista é a falta de critério, a
arbitrariedade das soluções apontadas para o mapa judiciário, ou esta espécie de amuo pelo facto de o
Partido Socialista não ter sido convidado para este consenso que tanto desejou, como transpareceu da sua
declaração.
O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Deputado Ricardo Rodrigues responderá conjuntamente aos
dois pedidos de esclarecimento finais.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Ricardo Rodrigues, pergunto-lhe onde é
que o Sr. Deputado e os Deputados dessa bancada estavam no dia 17 de maio de 2011, quando se assinou o
Memorando com a troica.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — O que pergunto a essa bancada é se estão dispostos a assumir o
compromisso que firmaram, em maio de 2011, se estão dispostos a aproximar-se das populações, a resolver
os problemas dos portugueses, no quadro que criaram, na sequência de seis anos de governação e da
adoção de um Memorando que impõe reformas e, necessariamente, nesta matéria, uma reforma com o
objetivo de proceder a um mapa judiciário que seja mais próximo dos cidadãos e mais adequado àquilo que é
a realidade de Portugal nos tempos que correm.
Penso que é ténue a fronteira entre o oportunismo político e a oportunidade política.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Esta intervenção será muito útil se os senhores quiserem dialogar
com o PSD, o CDS-PP e os restantes partidos com assento neste Parlamento para podermos cumprir aquilo
que os senhores impuseram a Portugal.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Foram os senhores que impuseram a Portugal a necessidade de
cumprir o Memorando da troica. Foram os senhores que impuseram a Portugal a necessidade de recorrer a
financiamento externo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Foram os senhores que afastaram os governos em que participaram das populações que temos de servir.
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O Sr. Deputado diz na sua intervenção que a justiça se afirma pela proximidade dos tribunais aos cidadãos.
Pois nós dizemos que a justiça se afirma pela afirmação de uma justiça material e não de uma justiça formal.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, queira concluir.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Ninguém quer fechar tribunais. Mas temos de fechar tribunais.
Nesta reforma, como na reforma autárquica, é caso para dizer que o PS criou as condições para termos de
tomar medidas duras. Mas também é caso para dizer que, quando a luta aquece, o PS desaparece das suas
responsabilidades.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do Deputado do PS João Galamba.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra, por 3 minutos, o Sr. Deputado Ricardo
Rodrigues.
O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas Cecília Honório e Teresa Leal Coelho,
muito obrigado pelas vossas perguntas.
Sr.ª Deputada Cecília Honório, concordo em grande parte com a sua intervenção, na medida em que
estamos contra, definitivamente contra, o encerramento de tribunais. Temos algum receio de que esse número
de encerramentos possa significar algum despedimento de alguns funcionários, pelo que temos um receio
legítimo de que esta não é uma boa ação deste Governo.
Portanto, pode contar com essa decisão, que é verdadeira, do PS, no sentido de nesse combate não
darmos tréguas ao encerramento dos tribunais. Por isso, nesse aspeto, estamos de acordo. É porque os
critérios não valem. A Sr.ª Deputada citou o caso de Nelas, mas também poderíamos referir vários casos no
nordeste dos Açores, onde não há transportes, nem os números coincidem com a verdade. Apetecia-me citar
o Sr. Deputado Hélder Amaral (aliás, o Sr. Deputado acabou de entrar na Sala) que disse, quanto ao mapa
judiciário, que «coisas decididas num gabinete e ‘por Guia Michelin’nunca dão bom resultado». Esta foi uma
boa observação do Sr. Deputado Hélder Amaral…!
Aplausos do PS.
Quanto ao referido pela Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, quero dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que não
convém enganarmo-nos uns aos outros… A Sr.ª Deputada não era membro deste Parlamento quando
rejeitaram o PEC 4, em 23 de março, mas a Sr.ª Deputada conhece naturalmente o acordo assinado. Ora,
quem está a desrespeitar esse acordo é o PSD e o CDS-PP, designadamente na área da justiça. A Sr.ª
Deputada sabe tão bem quanto eu que o que estava firmado no acordo que assinámos era a implementação
do mapa judiciário decidido pelo PS, não era o encerramento de tribunais — repito, não era o encerramento de
tribunais, Sr.ª Deputada!
Aplausos do PS.
A Sr.ª Ministra disse — e bem! — que também ia para além do acordo com a troica. Vai a justiça, vão as
Finanças, todos os ministérios vão para além do acordo com a troica! E esse acordo já não é, como referiu o
nosso Secretário-Geral, aquele que assinámos.
Por isso, a Sr.ª Deputada não está a dizer toda a verdade, pois o acordo da troica não obrigava ao
encerramento de qualquer tribunal — que isto fique claro!
Aplausos do PS.
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O que não ficou claro foi se a Sr.ª Deputada concorda ou não com o encerramento dos tribunais e se os
seus colegas Deputados eleitos pelos círculos de Viana do Castelo, de Viseu ou dos Açores, estão ou não de
acordo com a decisão da Sr.ª Ministra…! Espero que não estejam de acordo e que nós possamos encontrar
uma melhor solução para a justiça portuguesa, mais eficaz e que contribua para uma melhor justiça para os
portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Terminadas as declarações políticas, vamos passar ao segundo ponto
da nossa ordem de trabalhos, que consta da apreciação conjunta das propostas de resolução n.os
14/XII (1.ª)
— Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e os Emirados Árabes Unidos para Evitar a Dupla
Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada em Abu Dhabi,
a 17 de janeiro de 2011, 15/XII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e o Reino da
Noruega para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o
Rendimento, assinada em Lisboa, a 10 de março de 2011, 16/XII (1.ª) — Aprova o Protocolo e o Protocolo
Adicional, assinados em 7 de setembro de 2010, que alteram a Convenção entre a República Portuguesa e o
Grão-Ducado do Luxemburgo para Evitar as Duplas Tributações e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de
Impostos sobre Rendimento e o Património e o Respetivo Protocolo, assinados em Bruxelas, a 25 de maio de
1999, 17/XII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e a República do Panamá para Evitar
a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinada na
cidade do Panamá, a 27 de agosto de 2010, 18/XII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa
e a República da Colômbia para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos
sobre o Rendimento, assinada em Bogotá, em 30 de agosto de 2010, 19/XII (1.ª) — Aprova o Acordo entre a
República Portuguesa e a Região Administrativa Especial de Hong Kong da República Popular da China para
Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinado
em Hong Kong, em 22 de março de 2011, 20/XII (1.ª) — Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e
o Japão para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o
Rendimento, assinada em Lisboa, em 19 de dezembro de 2011, e 22/XII (1.ª) — Aprova o Acordo entre a
República Portuguesa e o Estado do Qatar para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em
Matéria de Impostos sobre o Rendimento, assinado em Doha, em 12 de dezembro de 2011.
Para proceder à apresentação das oito propostas de resolução, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e
dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas): — Sr. Presidente, a quem
aproveito para cumprimentar, Sr.as
e Srs. Deputados: Um dos instrumentos essenciais para ganhar
competitividade económica é a celebração de convenções para evitar a dupla tributação entre Portugal e
outros países.
Estas convenções contribuem para a internacionalização das empresas, para a atração de investimento
estrangeiro ao nosso País e para o combate à evasão e à fraude fiscais.
Pagar por um investimento o imposto que é devido por lei é uma obrigação cívica, em relação à qual o
Governo não é condescendente. Pagar duas vezes imposto pelo mesmo investimento é não só imoral como
injusto, e é por isso que se celebram convenções para evitar a dupla tributação.
É evidente que dificilmente uma empresa investirá no nosso País se tiver de pagar duas vezes imposto por
causa desse mesmo único investimento.
Do ponto de vista das obrigações da diplomacia económica, foi definida, num espírito de colaboração, que
quero sublinhar, entre o Ministério das Finanças e o Ministério dos Negócios Estrangeiros, uma decisão
relativamente às convenções para evitar a dupla tributação: a decisão de acelerar a sua negociação, acelerar
a sua aprovação e acelerar a sua ratificação, a bem da economia e das empresas portuguesas.
É possível verificar uma relação muito estreita entre os países que são economicamente mais avançados e
que têm mais convenções para evitar a dupla tributação e, por outro lado, países que têm uma rede mais
pequena e que têm pouco crescimento económico ou ainda um nível de atraso substancial.
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Dou-vos alguns números: o Reino Unido tem 119 convenções, a França tem 117, a Alemanha tem 99, a
Bélgica tem 90, a Holanda tem 86, a Áustria tem 80, a República Checa tem 78, a Dinamarca tem 71, a
Finlândia tem 70 e a Eslováquia tem 62. Portugal, neste momento, tem apenas 52 convenções. Se o
Parlamento aprovar aquelas que vêm hoje aqui a juízo e a voto, passaremos a ter uma rede de 60 convenções
para evitar a dupla tributação. É o fruto da primeira decisão de acelerar, mas é apenas o primeiro fruto, porque
continuaremos este esforço ainda nesta sessão legislativa.
Estão, neste momento, em negociação dezenas de convenções para evitar a dupla tributação, de modo a
facilitar a internacionalização das empresas portuguesas para esses países e o investimento estrangeiro
desses países em Portugal, gerador de riqueza e de emprego.
Quero ainda sublinhar que estas convenções contribuem, de acordo com as regras da OCDE, para um
reforço significativo dos mecanismos de combate à fraude e à evasão fiscais, porque estas convenções
contêm uma cláusula de troca de informações que implica o acesso aos documentos bancários dos
contribuintes nos dois países, o que permite, através dessa troca de informações, instrumentos muito mais
rápidos e eficazes no combate à fraude e à evasão fiscais. Acrescem ainda a este título os mecanismos de
assistência na cobrança de impostos.
Finalmente, quero sublinhar perante a Câmara que estamos a negociar um conjunto de convenções para
evitar a dupla tributação, que correspondem a mercados-alvo, nomeadamente para a internacionalização das
empresas portuguesas. Demos prioridade, não apenas naquelas que hoje são trazidas ao Plenário mas
também naquelas que estamos a negociar através das equipas do Ministério das Finanças, à América Latina,
aos países da CPLP, aos países asiáticos e aos países do Golfo, porque são manifestamente algumas das
regiões que, do ponto de vista do destino económico dos nossos produtos, das nossas empresas e das
possibilidades de atração de investimento, são prioritárias para Portugal.
Devo ainda sublinhar a questão da abrangência destas convenções. Embora elas se destinem, no
essencial, a facilitar a internacionalização das nossas empresas e o investimento estrangeiro em Portugal e a
combater a fraude e a evasão fiscais, elas não abrangem apenas empresas mas também estudantes,
pensionistas, artistas, desportistas ou outras profissões que têm regimes com especial mobilidade.
Finalmente, gostaria de transmitir à Câmara uma preocupação do Governo que, creio, é uma preocupação
de todos: a preocupação com a eficácia. Estas convenções demoram tempo a negociar, implicam negociações
técnicas, assinaturas técnicas, subida a Conselho de Ministros, vinda ao Plenário do Parlamento, promulgação
e publicação — e isto tem de acontecer num país e no outro.
É evidente que excesso de rapidez prejudica a consistência dos processos, mas excesso de demora
prejudica a economia. E, a nosso ver, não faz sentido que convenções que já foram tecnicamente subscritas
em 2010 só em 2012 possam ser trazidas ao Plenário da Assembleia da República, porque se perdem muitos
dias, muitos meses e, em economia, «tempo é dinheiro».
Estas convenções facilitam a vidas das empresas que querem internacionalizar-se e das empresas que
querem investir em Portugal, e precisamos disso em termos de crescimento económico e de criação de
emprego.
Por isso mesmo, o Governo entrega hoje, no Parlamento, em termos de apreciação formal, oito
convenções para evitar a dupla tributação, que são mais do que as que foram aprovadas em todo o tempo da
anterior Legislatura.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, os Srs.
Deputados Pedro Filipe Soares e Honório Novo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Paulo Portas, ouvimos a sua introdução
sobre esta temática e entendemos que este é um debate importantíssimo para o País. Em primeiro lugar,
porque o tema da dupla tributação e as formas de a evitar foi trazido à berlinda pelo caso recente da Jerónimo
Martins e da fuga, afinal, de todo o Grupo Pingo Doce para a Holanda, naquele que ficou conhecido como um
exemplo do que o problema da dupla tributação ou da falta dela poderia trazer a debate.
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Devo dizer que não temos quaisquer tabus nesta matéria. Por isso, percebemos que os acordos que
evitam a dupla tributação, sempre que têm o relevo de facilitar a troca de informação entre os dois países,
podem, e muito, favorecer o combate à fuga e à evasão fiscais. Quanto a isso, estamos absolutamente de
acordo com o que foi a sua exposição.
Parece-nos, no entanto, desfasado da realidade vir dizer-nos que estes acordos que evitam a dupla
tributação promovem a internacionalização da economia portuguesa, ao mesmo tempo que se esquece de
falar da equidade fiscal e da necessidade de estes acordos trazerem consigo o mecanismo que salvaguarde a
equidade fiscal no nosso País.
Porque, senão, vejamos o que acontece, por exemplo, na Holanda. A Jerónimo Martins foi para a Holanda,
onde pagará 15% de IRC. Se estivesse em Portugal, pagaria 25%. Há, por isso, 10% de diferença no que são
os dividendos distribuídos na Holanda ou os dividendos distribuídos em Portugal.
Pergunto-lhe se é devido ao acordo de dupla tributação que Portugal tem com a Holanda que não se pede
mais nada à Jerónimo Martins e que ficamos satisfeitos com os 15% que paga ou se, em nome da defesa dos
contribuintes, em nome da defesa das pequenas e médias empresas e em nome da defesa da tal propalada
equidade fiscal, não se deveriam exigir os 10% que faltam. Porque uma empresa que tenha exatamente a
mesma atividade e distribua os mesmos dividendos, em Portugal paga 25%, se conseguir pagar, mas se, em
nome da engenharia financeira, fizer essa operação na Holanda paga apenas 15%.
Por isso, pergunto-lhe, Sr. Ministro: está o Governo a pensar criar algum mecanismo de salvaguarda da
equidade fiscal ou, afinal, a defesa dos contribuintes e das PME fica apenas no discurso de campanha
eleitoral?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Ministro informou a Mesa de que responde conjuntamente aos
dois pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, está enganado. Se
forem aprovados os oito documentos do Governo, as convenções de Portugal não passarão de 52 para 60,
mas de 52 para 58. E vou explicar-lhe porquê. Uma das convenções em discussão é uma mudança de artigo e
outra é a mudança de uma convenção por outra e, portanto, não é nova.
Assim, vamos começar por ter rigor nesta afirmação: as convenções passam de 52 para 58 e não para 60.
O Sr. João Oliveira (PCP): — A matemática não é o forte do Sr. Ministro!
O Sr. Honório Novo (PCP): — O segundo comentário que gostava de fazer, Sr. Ministro, é o seguinte: diz
que esta é uma das formas de promover a competitividade fiscal. Pode ser, Sr. Ministro, mas bem mais
depressa pode ser uma maneira de promover a evasão fiscal.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Pelos vistos, Sr. Ministro, não o preocupa promover a evasão fiscal e a
iniquidade fiscal perante os portugueses, que, neste caso, continuam a pagar impostos com língua de palmo.
Como o Sr. Ministro não se fez acompanhar pelo seu colega da Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais,
vai apanhar com as perguntas — e são muitas — que tenho para lhe colocar sobre os acordos em concreto.
Começando pelos pareceres da Comissão Nacional de Proteção de Dados, há pareceres que dizem, de
uma forma expressa, que «os países em questão não asseguram um nível adequado de proteção de dados
para além daquilo que é a utilização para as finalidades fiscais previstas no acordo». É o caso de Hong Kong,
do Panamá, dos Emiratos Árabes Unidos, do Japão e do Qatar — aliás, estes dois últimos são da total
responsabilidade do Sr. Ministro e deste Governo.
Portanto, a pergunta é óbvia: porque é que não deu seguimento às observações da Comissão Nacional de
Proteção de Dados e como é que vai garantir que, no futuro, os dados fora da área fiscal vão ser protegidos?
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A segunda questão diz respeito ao acordo de dupla tributação com a Noruega. Trata-se de uma alteração
da Convenção.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira concluir.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Vou terminar, colocando a questão sobre a Noruega, Sr. Presidente.
Sr. Ministro, o Centro de Estudos Fiscais diz que se reduziram as taxas de tributação na fonte
relativamente à convenção anterior em 5% na maioria dos casos. Pergunto: porquê? Será, Sr. Ministro, para
proteger a participação do Norisbank na EDP e fazer com que os dividendos deste banco se reduzam ao
pagamento de 5%?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro de Estado e dos
Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, relativamente às duas
questões colocadas, há um ponto em comum que suscita, no mínimo, perplexidade, porque ou o Partido
Comunista e o Bloco de Esquerda pretendem ser coerentes com o discurso do combate à evasão fiscal e isso
significa que nos acordos entre Portugal e outros países têm de existir cláusulas de troca de informações
sobre os contribuintes num país e no outro…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sobre isso não nos ouviu falar!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … e isso, sim, permite o combate à evasão
fiscal ou, então, o vosso discurso sobre o combate à evasão fiscal é meramente retórico e não acreditam em
nenhum progresso jurídico, normativo e efetivo que permita a Portugal combater a evasão fiscal que é
praticada noutros países relativamente a cidadãos nacionais.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
É que uma de duas: ou se tem uma atitude coerente, se segue o modelo da OCDE que é feito em função,
também e significativamente, dos avanços do ponto de vista do combate à fraude e à evasão nos regimes
fiscais, ou não. E o que é que esse modelo da OCDE nos diz? Diz-nos que é preciso que os países se
disponibilizem para a troca de informações, que essa troca de informações deve acontecer com regularidade e
com efetividade e que, nesse sentido, isso tem de constar de documentos jurídicos assinados entre os dois
Estados. É isso que estamos a fazer.
Portanto, não me parece coerente dizer, no Parlamento português, que é preciso combater a evasão fiscal
e depois negar o direito de o Estado português verificar a legalidade fiscal de certos procedimentos que
acontecem com outros países ou noutras paragens.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Relativamente ao que foi salientado pelo
Deputado Honório Novo, que aproveito para cumprimentar, queria apenas assinalar que há um progresso.
Mesmo na sua versão de 52 para 58 sempre é um progresso. São mais convenções do que todas as que
foram aprovadas na última Legislatura.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Mas não são 60!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — No entanto, não desvalorize — é um
conselho que lhe dou — a alteração relativa à Convenção do Luxemburgo,…
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O Sr. Honório Novo (PCP): — Não, não! É a única positiva! Não falei dessa!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … porque é uma alteração muito significativa
do ponto de vista da transparência fiscal.
Quanto ao mais, Sr. Deputado, relativamente à Noruega, chamo apenas a sua atenção de que o mundo,
como creio que sabe, se calhar até melhor do que eu, mudou muito de 1970 para 2012 e a Convenção já
datava de 1970. Passaram 42 anos, a economia avançou muito, a política mudou muito e não podemos ficar
parados. Temos de nos adaptar, obviamente, àquilo que é uma economia aberta no espaço europeu no século
XXI.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — O senhor é que mudou o discurso nos últimos meses!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, Sr.ª Secretária
de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: Sr. Ministro Paulo Portas, é sempre um prazer tê-lo na Assembleia, mas
devo dizer-lhe que se perdeu alguma da qualidade interventiva que tinha quando estava sentado na bancada
do CDS. Agora, que está no Governo, traz um discurso escrito e, independentemente das perguntas que lhe
são colocadas, cinge-se apenas a ele quase como se não tivesse havido debate nesta Assembleia.
Sr. Ministro, voltámos a ter a possibilidade de debater e até de afastar alguns fantasmas que o Sr. Ministro,
muito cordialmente, gostava de criar para ajudar a sua retórica parlamentar, mas que, na prática, não existem.
Em primeiro lugar, vou repetir o que disse no meu pedido de esclarecimento para ter a certeza de que o Sr.
Ministro agora ouve e não se esquece.
Consideramos que nos acordos que servem para evitar a dupla tributação e combater a evasão fiscal há
uma parte importante de combate à evasão fiscal que passa pela troca de informação entre os Estados.
No entanto, quando se fala de evitar a dupla tributação, há todo um caminho aberto para o dumping fiscal,
para as empresas não pagarem impostos, cujo exemplo é a Jerónimo Martins, que o Sr. Ministro foi incapaz
de referir. E sabemos que outros, até do seu partido, defenderam, de forma algo velada, que fossem os
próprios consumidores a não comprarem no Pingo Doce. Contudo, não ouvi uma palavra do Sr. Ministro sobre
esta matéria, que é importantíssima para o debate.
A Jerónimo Martins sai de Portugal para a Holanda, porque na Holanda, devido ao acordo de dupla
tributação que tem com Portugal, paga menos impostos do que cá. Sobre os mesmos negócios, lá paga 15% e
cá pagaria 25%. Esta é a realidade.
Como pode o Sr. Ministro vir promover estes acordos de dupla tributação que permitem a alguns pagar
menos impostos, quando sabemos que os que apostam em Portugal e na economia portuguesa são obrigados
a suportar os tais 25% ao contrário de outros que querem fugir e que o Sr. Ministro permite que fujam? Onde
está a justiça? Onde está a equidade fiscal?
Em nome da justiça, juntamente com estes acordos para evitar a dupla tributação, teria de vir da parte do
Governo a criação de um mecanismo de salvaguarda da equidade fiscal.
Nesse sentido, vou repetir e insistir na pergunta que lhe coloquei, porque ela é essencial: onde está a
salvaguarda da equidade fiscal?
Sr. Ministro, desta forma está a promover os paraísos fiscais, o não pagamento de impostos e autoestradas
para a exportação de capital, mas não a criação de riqueza e de postos de trabalho.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Mónica Ferro.
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A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Ministro dos Negócios
Estrangeiros, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares: Deixem-me começar por assinalar esta
boa prática de relacionamento com o Parlamento e destacar o facto de o Sr. Ministro ter vindo à Assembleia
da República debater connosco este rol de convenções que Portugal assinou e que têm como fim evitar a
dupla tributação e prevenir a evasão fiscal.
Os tratados internacionais são normalmente votados por nós sem a reflexão e a discussão política, o que
não contribui para que os mesmos tenham reconhecida a sua relevância inquestionável nem para que esta
Assembleia e quem nos mandatou para cá estarmos em sua representação fiquem melhor informados.
Com esta série de convenções, o Governo dá corpo a mais uma das prioridades que elencou em sede de
política de negócios estrangeiros, mostrando à saciedade que, desta vez, diplomacia económica e
internacionalização da economia portuguesa serão mais do que rótulos para políticas avulsas.
Aumentar a rede portuguesa de convenções para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal é um
passo fundamental para que Portugal seja um polo de atração dos investimentos estrangeiros e para que as
nossas empresas queiram e não temam internacionalizar-se.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Não é uma varinha de condão, mas resolve, prevenindo, muitos problemas
de tributação e evasão que prejudicam o fluir da economia mundial e os operadores económicos.
São oito as novas convenções — Emirados Árabes Unidos, Noruega, Luxemburgo, Panamá, Colômbia,
Hong Kong, Japão e Qatar —, que se juntam à rede das cerca de 50 já em vigor e das cerca de 60 em
negociação, segundo dados recentes do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e que vêm consolidar uma
posição de partida: a recuperação da economia portuguesa faz-se no espaço intracomunitário, mas faz-se
também olhando para além do espaço europeu. Disso são prova as convenções aqui assinadas, a aposta na
CPLP, no espaço ibero-americano, na Ásia e no Médio Oriente, denotando que há mercados-alvo mapeados
pela nossa política externa.
Quando falamos destas convenções, falamos, sobretudo, de uma alteração substancial do volume e da
qualidade dos fluxos da economia internacional. Se até há alguns anos eram pouco relevantes ou até
negligenciáveis no domínio da fiscalidade os resultados da expansão económica, a velocidade e a
complexidade decorrentes da crescente interdependência mundial e, concomitantemente, a sua economia, o
aumento da mobilidade do capital financeiro e das oportunidades de investimento, a livre circulação e a
mobilidade da mão-de-obra e dos serviços suscitaram questões conexas com elevadíssimo número de
obrigações fiscais envolvidas — os requisitos e formalidades, o valor dos impostos bem como aquele que nos
traz hoje e que é corolários deste outros: a duplicação da tributação.
Estas situações de fortíssima mobilidade dão por vezes origem a mais do que uma obrigação tributária.
Para salvaguarda deste tipo de situação e para criar alguma segurança entre os operadores económicos que
querem investir em mercados internacionais, os Estados começaram a celebrar entre si acordos, convenções,
para evitar a dupla tributação internacional que nos traz aqui hoje.
Reconhecemos que há um certo planeamento fiscal com o objetivo de tirar partido das disparidades das
cargas fiscais existentes entre os Estados e os benefícios fiscais previstos pelas diferentes legislações.
Cabe, então, aos Estados tomar as medidas adequadas nas respetivas legislações nacionais para evitar a
utilização abusiva desses mecanismos.
A assinatura destas convenções é um passo fundamental para a redução dessa evasão fiscal.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Mónica Ferro (PSD): — Sr. Presidente. Sr. Ministro, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: Os alicerces
para uma próspera economia global são regras internacionais transparentes, regimes internacionais, mas
sempre dando origem a um sistema económico e financeiro mundial previsível.
O alargamento da rede de convenções para evitar a dupla tributação e a evasão fiscal tem como objetivo
fulcral a criação de um quadro de referência favorável à captação de investimento estrangeiro de
internacionalização das empresas portuguesas.
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Esta, a jusante, aportará uma maior diversificação dos mercados de exportação com a promoção de
mercados extracomunitários, como tem sido anunciado, mas também a captação de investimento externo para
Portugal.
Estas convenções contribuem para que este desígnio nacional seja feito de uma forma mais transparente e
mais previsível.
O volume das relações económicas com cada um dos países em causa, dos Emirados Árabes Unidos ao
Japão, passando pela Noruega, Luxemburgo, velhos parceiros, até à Colômbia, Panamá, Hong Kong e Qatar,
faz com que algumas convenções pareçam mais relevantes ou mais urgentes do que outras.
Não se deixem iludir, Srs. Deputados e Sr.as
Deputadas, pois este volume é, em muitos casos,
inversamente proporcional às dificuldades de investimento e aos obstáculos vários com que os operadores
económicos desses países se confrontam quando querem investir em Portugal.
A grande preocupação em clarificar, uniformizar e assegurar a situação fiscal dos sujeitos passivos de cada
país-membro, subjacente à convenção modelo da OCDE, que enformou a convenção celebrada pelo Panamá,
é fundamental para promover um bom ambiente de investimento internacional e para evitar a evasão fiscal que
nos preocupa a todos.
É imperioso para a recuperação nacional que consigamos projetar a imagem de um País onde as regras
são claras, onde a dupla tributação é evitada e a evasão fiscal combatida.
São princípios de uma encomia sã. É para aí que o nosso país caminha. Hoje, damos mais um passo no
sentido de uma maior internacionalização das nossas empresas e da captação de investimento estrangeiro.
Nada diz com mais impacto do relevo político destas matérias do que estarmos hoje, aqui, a discuti-las.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro: Que saudades eu tenho do Dr. Paulo Portas
quando, da bancada do CDS-PP, se dizia defensor dos contribuintes portugueses!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Agora, da bancada do Governo, o Dr. Paulo Portas defende os interesses
dos contribuintes, é verdade, mas dos contribuintes que são, simultaneamente, os grandes interesses
financeiros nacionais fora do País ou os estrangeiros que estão no nosso país.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. Honório Novo (PCP): — É essa a defesa que o Dr. Paulo Portas faz hoje!
Mas passo a colocar outras questões.
Em primeiro lugar, porque é que, no acordo celebrado com os Emirados Árabes Unidos há uma norma
única e especial que diz que os contratos especiais de tributação entre um Estado e um residente noutro
Estado não são abrangidos pelo acordo? Em que é que o Governo está a pensar com esta exceção? Qual é o
grupo ou o interesse árabe em Portugal ou o grupo ou interesse português nos Emirados Árabes Unidos que o
Governo quer proteger com uma taxa ainda inferior a 5%?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Outra questão, Sr. Ministro: o acordo celebrado com o Japão, negociado
por V. Ex.ª, é claramente o mais permissivo de todos os acordos. Porquê? Porque, segundo o parecer do
Centro dos Estudos Fiscais, enquanto os outros usam o método da imputação de crédito do imposto, o senhor,
neste, inclui outro método, o da isenção na tributação dos dividendos. Porque é que há esta exceção só para
este acordo?
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Bela defesa do contribuinte!
O Sr. Honório Novo (PCP): — E mais: porque é que, também neste acordo, se aplica a taxa mais baixa de
todas aos juros quando os juros são obtidos por bancos? Será que os bancos não residentes devem pagar
ainda menos do que os grupos económicos de uma forma geral? Porquê esta exceção, Sr. Ministro?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isto é para quem? Deve ser para alguém!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Ministro, o acordo com o Qatar, também negociado por V. Ex.ª, bate
meças ao pódio da permissividade. Qual é a permissividade excecional criada neste acordo? É a tributação
sobre as mais-valias imobiliárias — veja-se lá! —, que podem ser tributadas apenas com 5%. Diga-nos, Sr.
Ministro dos Negócios Estrangeiros, porquê esta exceção. Qual é o interesse imobiliário árabe do Qatar em
Portugal que o senhor que proteger?
Sexta e última questão: com a exceção do acordo com o Japão, as taxas sobre juros são idênticas nos
restantes acordos: 10%. Porque é que não se uniformiza o valor desta taxa?
Quanto à tributação dos dividendos, a discrepância — eu diria a injustiça… — é ainda mais flagrante. As
taxas vão dos 5% aos 10% e até aos 15% em alguns países, como no Panamá e na Colômbia.
Porque é que o Ministério dos Negócios Estrangeiros não adota a regra de impor taxas de tributação de
dividendos mesmo que menores aos que são praticados em Portugal para todos os acordos e faz esta
discriminação e discrepância tão evidentes?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Sr.ª
Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares, Srs. Deputados: Antes de mais, quero cumprimentar o Sr.
Ministro pela sua presença na Assembleia, que eleva o debate que estamos a travar nesta Câmara, uma vez
que o Sr. Ministro vem defender convenções assinadas pelo governo anterior. Obviamente que ao vir aqui
fazer a sua defesa eleva o debate que travamos nesta Câmara.
Os argumentos que o Sr. Ministro utilizou para defender estas convenções são os argumentos tradicionais
que já ouvimos várias vezes na OCDE, fundamentalmente no debate interessante que há na OCDE entre os
países do norte da Europa e a Suíça, às vezes com a observação próxima dos Estados Unidos.
Gostaria de acrescentar ao argumentário do Sr. Ministro um outro argumento simples, que é o da defesa
dos interesses específicos do Estado português, ou melhor, a defesa dos interesses específicos dos Estados
signatários e a defesa dos interesses específicos dos cidadãos desses Estados.
É verdade que estes acordos têm as desvantagens que referiu em termos de atração de investimento
estrangeiro e de regulação do relacionamento económico. Porém, Sr. Ministro, pressupõe que haja um
equilíbrio entre os investimentos de um País e os do outro e um equilíbrio entre os respetivos regimes fiscais.
Se esse equilíbrio não se verificar, temos de ter algum cuidado para o futuro. Porquê? É que, por exemplo, é
natural que haja mais investimento por parte dos Emirados em Portugal do que o contrário. Portanto, é normal
que queira fazer um acordo destes com a condição de taxar os investimentos dos Emirados de acordo com a
lei portuguesa. Mas, por exemplo, o Sr. Ministro vai ver que não vai ter grande investimento colombiano em
Portugal. O que vai ter é a Jerónimo Martins ou a Mota-Engil na Colômbia, que vão ser taxadas não pela
legislação portuguesa mas pela colombiana, que é bastante mais favorável. Este é um argumento.
Depois, há um outro argumento, que tem a ver a com a disparidade dos regimes fiscais — chamo a sua
atenção para esta matéria pois sei que sabe o que estou a dizer.
Por exemplo, em relação à Holanda, em que há dupla tributação, não sei se o Sr. Ministro sabe que, no
final do ano passado, havia 8 mil milhões de euros de dinheiro português na Holanda, um valor astronómico —
subiu 300% ou 400%!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Subiu 900%!
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O Sr. Basílio Horta (PS): — Sim, 900%.
Sr. Ministro, se abrimos a porta à exportação de capitais desta forma… E não se trata de evasão fiscal,
trata-se da opção por um regime fiscal mais favorável, que é o mais legítimo possível. Mas isso leva a que o
dinheiro que faz falta às nossas empresas (o Sr. Ministro sabe o que estou a dizer e sei que partilha desta
opinião) saia lá para fora!
Pela primeira vez, no ano passado, tivemos um investimento líquido português no estrangeiro quatro vezes
maior do que o investimento estrangeiro em Portugal, o que é algo que tem de nos preocupar a todos.
Sr. Ministro, francamente não entendi, seguramente por deficiência minha, o acordo com Hong Kong.
Temos algum acordo com a China? É que, se temos um acordo com a China — duvido que tenhamos, e já
explico porquê —, o acordo com Hong Kong parece-me um pouco despiciendo. Aliás, até pensava que Hong
Kong não tinha capacidade internacional para assinar acordos, mas vejo que tem. Mas se não temos um
acordo com a China, porque é que fazemos um acordo com Hong Kong e não com a China? Esta é a pergunta
que tem de ser feita.
Os grandes interesses de investimento em Portugal não são de Hong Kong — Hong Kong é uma praça
financeira, é a praça da especulação financeira pura e dura —, são chineses, e queremos que haja mais
ainda!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Há 10 anos disse o contrário!
O Sr. Basílio Horta (PS): — Admito que os chineses, exatamente porque têm aqui grandes interesses, não
queiram a dupla tributação, preferem tributá-los lá… Não sei se é assim, mas o Sr. Ministro, melhor do que
ninguém, poderá dizê-lo.
Creio que devíamos fazer esta reflexão por forma a que os acordos que assinemos tenham só as
vantagens que resultem desses acordos e não escondam eventuais desvantagens que nos tornam menos
competitivos.
Penso que o acordo com a Noruega é uma revisão do acordo de 1970 e que a ratificação do acordo com
os Emirados, com o Qatar e com o Japão não oferece dúvidas. Quanto ao Panamá e à Colômbia já se
colocam algumas dúvidas no sentido de se saber qual é o interesse desta dupla tributação, uma vez que se
preveem mais investimentos portugueses nesses países do que investimentos panamianos e colombianos em
Portugal.
O acordo com Hong Kong é bastante duvidoso, pelo que estamos à espera de uma boa explicação para tal.
Hong Kong não é um paraíso fiscal, tal como a OCDE o define, mas sabemos que não é uma praça livre de
impostos dos investimentos que lá fazem. Portanto, se há este acordo de dupla tributação, como é que
podemos dizer ao capital português que queira ir para a Ásia que não seja exportado para lá?
Depois há o caso especial do Luxemburgo. O Sr. Ministro referiu que todos os países têm a
obrigatoriedade de dar informações. E o Luxemburgo é o único que não tem. Compreendo que não tenha,
porque o Luxemburgo não «brinca em serviço» nestas matérias, nem nos acordos bilaterais isso acontece.
O Luxemburgo é um caso totalmente especial: 18% da população do Luxemburgo é portuguesa e, porque
estão em causa compatriotas, não nos atrevemos a mexer nessa matéria. Neste caso também é especial
porque não tem de cumprir a obrigação de dar informações.
Sr. Ministro, saudando-o mais uma vez por ter vindo defender convenções, se me permite deixo-lhe uma
sugestão para futuro: ponderação dos interesses portugueses em função do equilíbrio nos investimentos e nos
regimes fiscais.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José
Lino Ramos.
O Sr. José Lino Ramos (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.ª Secretária de Estado, Srs.
Deputados: O Governo traz hoje a esta Câmara oito propostas de resolução com vista à ratificação de
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convenções bilaterais para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre
rendimento e património.
Trata-se de oito acordos celebrados por Portugal e oito territórios soberanos entre Agosto de 2010 e
Dezembro de 2011. São oportunidades que se abrem num potencial de dinamização das relações económicas
tão vasto como dinâmico e que reflete ainda o indispensável alargamento geográfico dos nossos interesses
políticos, diplomáticos e económicos.
Destes oito acordos, seis foram assinados pelo anterior governo, que, no entanto, se mostrou incapaz de
acelerar a sua ratificação parlamentar e de os implementar na prática.
Protestos do PS.
Pode dizer-se que, nos últimos seis meses, este Governo fez mais para evitar a dupla tributação do que
todos os governos liderados pelo anterior primeiro-ministro. E teve que ser este Governo a trazer, finalmente, a
esta Câmara, estes acordos, acabando com um impasse injustificável, e sobretudo lesivo dos interesses
económicos portugueses, tanto na nossa capacidade de atrair investimento estrangeiro, como na dinamização
das nossas exportações.
Vozes do CDS-PP e do PSD: — Muito bem!
Protestos do PS.
O Sr. José Lino Ramos (CDS-PP): — O CDS saúda, por isso, o Governo e a dinâmica dos Srs. Ministros
dos Negócios Estrangeiros e das Finanças.
A verdade é que estas convenções, hoje em discussão, representam um contributo extremamente
importante para a criação de um enquadramento fiscal estável e sobretudo favorável ao desenvolvimento das
trocas comerciais e dos fluxos de investimento entre os Estados signatários, eliminando entraves fiscais
desnecessários à circulação de capitais e de investimentos.
Para além disso, constituem um instrumento da maior importância para a cooperação bilateral em matéria
fiscal, nomeadamente através da troca de informações, tendo em vista a prevenção da evasão fiscal, que a
todos preocupa. Ou seja, constituem mecanismos indispensáveis às boas práticas financeiras e comerciais,
mas também são instrumentos cruciais para a melhoria do desempenho económico.
Bloqueá-los, Sr. Ministro e Srs. Deputados, paralisá-los ou esquecê-los é não só moralmente inaceitável
como é contra os interesses de Portugal e dos portugueses.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. José Lino Ramos (CDS-PP): — Só uma economia mais aberta é capaz de vingar na competitiva
globalização económica. Só um país mais preparado é capaz de criar as oportunidades para inverter a difícil
situação económica em que se encontra.
É por isso essencial que Portugal, se quer atrair investimento estrangeiro e promover a internacionalização
das empresas portuguesas, melhorar muito significativamente esta rede de convenções que evitam a dupla
tributação entre Portugal e outros Estados e que constituem um entrave fiscal ao investimento.
Os portugueses sabem que este Governo tem uma preocupação permanente no desbloqueio de entraves
ao crescimento económico e à abertura das empresas portuguesas a novos e atrativos mercados
internacionais. Por isso, é de saudar a intenção do Governo aqui demonstrada em duplicar o número de
acordos com outros Estados para que empresas e investidores deixem de pagar os mesmos impostos em
duplicado, o que resultará numa maior atratividade de Portugal ao investimento estrangeiro.
É importante que se perceba esta ideia: duplicar o número de convenções para evitar a dupla tributação
significa que vamos duplicar as oportunidades: as oportunidades para quem queira investir em Portugal e as
oportunidades das empresas portuguesas que querem investir no exterior e reduzir assim os seus custos de
contexto.
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No contexto da globalização e da internacionalização das economias, as convenções para evitar a dupla
tributação e a evasão fiscal são um fator crucial no desenvolvimento dos fluxos económicos internacionais.
Em boa hora, o Governo trouxe estes acordos à Assembleia da República, mostrando quem está
verdadeiramente a trabalhar na recuperação económica, quem está ao lado das empresas e quem está ao
lado das empresas que criam de emprego.
Só com esta atitude Portugal pode dar a volta às dificuldades.
É esta atitude que, uma vez mais, o Governo prova hoje ter, a bem da economia e das empresas
portuguesas.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, em tempo cedido pelas bancadas do PSD e do
CDS-PP, num total de 5 minutos, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Quem
mais pede ao Governo português, seja ele qual for, para celebrar convenções para evitar a dupla tributação
com países para onde podemos exportar são as empresas portuguesas e eu, apesar de todas as divergências
ideológicas, olhando para o momento que Portugal está a atravessar, não recomendaria uma exagerada
diferença de pensamento entre o que é útil e importante para as empresas portuguesas que arriscam e vão
exportar, protegendo assim postos de trabalho e criação de riqueza, e aquilo que o Parlamento, às vezes por
dogmatismo ideológico, pode pensar.
De facto, quem mais pede ao Estado português a celebração de convenções para evitar a dupla tributação
são os que querem investir em Portugal, são os que querem apostar em Portugal e que se não tiverem essas
convenções são, obviamente, dissuadidos de criar riqueza ou postos de trabalho no nosso País.
Portanto, estas convenções favorecem as exportações portuguesas para outros mercados que nos querem
comprar produtos e favorecem o investimento de países estrangeiros que querem apostar em Portugal.
Esta é uma política que, aliás, tem continuidade, como aqui foi salientado. Não são todas as convenções
assinadas no tempo do anterior governo, mas as que foram assinadas nessa altura foram bem assinadas e a
única coisa que lamento é que tenha decorrido tanto tempo entre o momento da assinatura técnica e o
momento da ratificação política. Que isto seja uma lição para todos passarmos a ser mais ágeis nessa
matéria.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Devo também sublinhar, a propósito da
questão do combate à fraude e à evasão fiscais, que estas convenções, em que, aparentemente, os partidos
mais à esquerda votarão contra,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quem disse isso?
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — … são as únicas que permitem a seguinte
situação: no caso de a autoridade tributária nacional ter forte suspeita de que há evasão fiscal de um
contribuinte para um país terceiro, com a convenção pode-se pedir informação relativa a esse contribuinte —
IRC ou IRS — aos bancos desses países, mas sem a convenção não se pode pedir. Ou seja, com a vossa
posição, não dispomos de meios para combater a evasão fiscal, mas com a convenção celebrada pelo
Governo, trazida aqui e, espero eu, aprovada pelo Parlamento, podemos pedir informação fiscal e garantir
assim maior equidade fiscal.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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Queria ainda sublinhar que, quando se fala em equidade fiscal, estando nós a discutir convenções que são
celebradas entre países que são diferentes, soberanias que são diferentes e regimes fiscais que também são
diferentes, trata-se de uma negociação internacional onde é preciso, evidentemente, chegar a compromissos.
Aquilo que considero mais grave, do ponto de vista da equidade, é o seguinte: que uma empresa
portuguesa deixe de exportar para um país porque Portugal não tem uma convenção com esse país ou que
um investimento em Portugal se perca por Portugal não ter uma convenção com o país de origem desse
investidor.
E a razão é muito simples: é que as convenções servem para evitar a dupla tributação, ou seja, as
convenções não só garantem, através da troca de informações, que é feito um combate aos que fogem ao
pagamento de impostos como também garantem uma coisa que é justa, embora eu compreenda que na
extrema-esquerda esse não seja um valor relevante, e que é a seguinte: pagar uma vez imposto por um
investimento é justo, é legal e é necessário, mas pagar duas vezes impostos pelo mesmo investimento
significa perder esse investimento.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E é isso que, do ponto de vista prático da criação de riqueza, da atração de investimento estrangeiro e da
criação de emprego, é importante para Portugal, levando em conta matérias que aqui foram salientadas,
procurando diminuir ou reduzir certo tipo de disparidades, mas sabendo que se não houver negociação nem
compromisso nenhum Estado é obrigado a celebrar com Portugal uma convenção para evitar a dupla
tributação e ou nós queremos investimentos desses Estados e temos de chegar a um compromisso com os
seus negociadores — e são negociações de natureza técnica —, ou não queremos chegar a um compromisso
com esses Estados e assumimos as consequências, que é não termos um regime fiscal competitivo do ponto
de vista do investimento.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queria concluir, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Concluirei, dizendo, Sr. Presidente, que este
é um bom caminho que será prosseguido. O nosso compromisso é o do serviço à economia portuguesa, ao
investimento em Portugal, à criação de riqueza, à proteção dos postos de trabalho e no sentido de que as
empresas não sejam impedidas de se internacionalizar e que os investimentos não sejam impedidos de
chegar a Portugal por não haver convenções para evitar a dupla tributação.
Basta olhar — e com isto termino — para a lista dos países que têm mais crescimento, mais emprego e
mais desenvolvimento para ver que são também aqueles que têm mais convenções para evitar a dupla
tributação. É esse o caminho, e é esse o caminho que percorreremos!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basílio Horta (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo: Sr. Ministro, permita-me que lhe
diga que nós já entendemos que o Sr. Ministro tem uma parte política muito importante na economia. E ainda
bem que tem, mas deixe-me dizer-lhe que está nessas funções há pouco tempo, ainda não sabe tudo e é
necessário ouvir com alguma atenção.
Não se pode dizer que o Partido Socialista não apresentou acordos de dupla tributação. Apresentou 28! É
muito! Não sei se o Sr. Ministro os ponderou a todos da maneira como eu disse, não sei…
O Sr. Ministro fala do problema da exportação. O que é que a exportação tem a ver com isto? Nada!
Absolutamente nada! A não ser que se exporte e a empresa exportadora queria fazer uma sociedade lá e
passar a pagar impostos lá! Isso eu não sei! Mas se não é isso, então o que é, com toda a franqueza?
Coisa diferente é o investimento. Aí sim, se o Sr. Ministro me disser que Portugal pode fazer um grande
investimento na Colômbia e que é necessária uma legislação específica para que a Jerónimo Martins faça
esse grande investimento na Colômbia, que é útil à economia portuguesa e que temos de ajudar a empresa,
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com certeza, sim senhor! Mas não é em abstrato! E nem sei se o investimento que a Jerónimo Martins vai
fazer na Colômbia, que devem ser supermercados, é muito útil à economia portuguesa! Mas isso também não
está aqui em cima da mesa.
Mas que a Mota-Engil queira lá fazer obras e queira a dupla tributação para pagar na Colômbia 10% sobre
o IRC e não os trinta e tal que paga cá, com certeza! É bom para a Colômbia, é bom para a Mota-Engil e é
bom para Portugal, Sr. Ministro? — ponho um ponto de interrogação. Mas se o Sr. Ministro disser que é bom
para Portugal, então ainda bem que o fez!
O Sr. Ministro tem um acordo bilateral de dupla tributação com a Holanda e eu pergunto: quantos
investimentos holandeses vieram para Portugal? Zero! E posso referir-lhe números relativamente a outros
países.
O Sr. Ministro sabe que não há dicotomia entre quem defende e quem não defende as empresas. Penso
que não é possível dizer-se isso, porque nós sempre defendemos as empresas, mas defendemos primeiro o
País, defendemos primeiro Portugal, defendemos primeiro os interesses portugueses, fundamentalmente
quando estamos numa crise como aquela em que estamos, quando a Comissão Europeia já diz que 2013
afinal não será o oásis, será a estagnação, será a continuação do deserto… Enfim, quando estamos a ver a
China a dizer ao Governo português «continue a proteger as eólicas»… Já vamos nisto!
Aquilo que eu digo ao Sr. Ministro — e com isto termino — não é contra estas convenções, é para que o Sr.
Ministro tenha o sentido de Estado e patriótico, que sei que tem, de olhar para as convenções, pondo-se no
lugar do português contribuinte, pondo-se no lugar do Ministro das Finanças.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Em tempo cedido pelo PSD, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e
dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidente, quero apenas confirmar — foi
isso que afirmei — que, no primeiro ano desta Legislatura, o Parlamento aprovará mais convenções para
evitar a dupla tributação do que aprovou em toda a vigência da anterior Legislatura, que não terminou do ponto
de vista da normalidade do seu mandato, e chamar a atenção do Sr. Deputado Basílio Horta, a quem, como
toda a gente sabe, me une uma admiração frequente, que as convenções que foram negociadas, do ponto de
vista técnico, na vigência do anterior governo, nomeadamente a que refere, da Colômbia, não eram boas
naquela altura e passaram agora a ser más. São instrumentos jurídicos e económicos para, obviamente,
facilitar a internacionalização das empresas portuguesas e o investimento em Portugal.
Isto apenas para colocar as coisas no seu devido contexto, mas não deixaremos de ter em conta matérias
que foram aqui referidas, do ponto de vista conceptual, para enquadramento destas Convenções.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, terminámos o primeiro ponto da nossa ordem de
trabalhos. As propostas de resolução que acabámos de apreciar serão votadas amanhã no período regimental
de votações, que ocorrerá pelas 12 horas.
Passamos à discussão conjunta dos projetos de resolução n.os
204/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a
manutenção da autonomia de gestão dos portos comerciais nacionais (PS) e 227/XII (1.ª) — Exige a
manutenção da gestão pública e autónoma dos portos portugueses (BE).
Para apresentar o projeto de resolução n.º 204/XII (1.ª), tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino.
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Os portos nacionais têm
apresentado excelentes indicadores operacionais e financeiros, assegurando significativas distribuições de
dividendos, que os colocam em posição cimeira de competitividade a nível europeu e mundial e no quadro
nacional como um dos poucos setores que, mesmo em período de crise, regista níveis de crescimento acima
da média europeia.
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O setor privado assegura a atividade portuária, garantindo, por um lado, a sustentabilidade financeira e, por
outro, a realização de avultados investimentos quer em infraestruturas quer em equipamentos.
A defesa do interesse público, a integração com planos de desenvolvimento, a liderança da marca, a
gestão das concessões e a ligação às administrações central e local estão concentradas nas administrações
portuárias, que são empresas públicas.
Num setor tão relevante para as exportações nacionais, das quais depende em boa medida a evolução da
economia, é necessário garantir, por um lado, que viabilize uma estratégia nacional relacionada com a nossa
política externa, nomeadamente em termos de internacionalização, e, por outro lado, que potencie e seja
potenciado pelo tecido empresarial, nomeadamente o produtivo.
O melhor sistema para garantir esta dupla otimização não é conseguido através de uma holding para a
gestão dos portos, mas, sim, da implementação de um modelo de concorrência colaborativa, implementado
com inegável sucesso em Portugal desde 2007.
O Sr. Basílio Horta (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Este modelo tem assegurado o sucesso financeiro e logístico, com
resultados bem visíveis quer nos resultados financeiros lucrativos de todos eles, quer ainda na concretização
de projetos comuns, como é o caso do Janela Única Portuária ou da ligação às Autoestradas do Mar.
A excelente performance de todos os portos — Leixões e Viana do Castelo, Aveiro e Figueira da Foz,
Lisboa, Setúbal e Sines —, evidente em todas as estatísticas, tem como base fundamental a sua ligação à
comunidade respetiva, bem como ao tecido empresarial e social do seu hinterland, e tem permitido que cada
um deles se tenha vindo a constituir como a infraestrutura de referência e o hub logístico da região em que se
insere.
Dando como exemplo o porto de Leixões e a sua comunidade portuária, mas poderia ser qualquer um dos
outros, têm sido exemplares enquanto relação de proximidade e de sucesso. A forte interação com os
municípios adjacentes, particularmente o de Matosinhos, com o tecido empresarial da região Norte e a
crescente implantação junto das empresas da Galiza, têm conduzido a que o porto de Leixões se tenha
transformado no elemento-âncora das cadeias logísticas do noroeste peninsular e ex-libris da economia da
região Norte.
O Sr. Basílio Horta (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Não se está a ver, por exemplo, que os galegos fizessem acordos,
como os que fazem com Leixões, com uma empresa «Portos de Portugal», o que, naturalmente, contrariaria a
política espanhola.
O triângulo de proximidade estratégica e de decisão entre administração portuária, região e tecido
empresarial tem sido a chave do sucesso e fator incontornável de competitividade.
A notável evolução dos portos é, aliás, constatada no Plano Estratégico dos Transportes (PET),
apresentado pelo Governo em Outubro de 2011, que reconhece a adequação da organização e da estratégia
seguida, tendo em conta os resultados apresentados pelos vários portos nacionais.
Os portos atingiram plenamente, e ultrapassaram até, os objetivos de redução de custos para 2011
(Leixões, por exemplo, atingiu 17%). Num ano marcado pela maior crise financeira internacional de sempre, os
portos aumentaram o movimento de carga e os resultados líquidos e contribuíram decisivamente para a
evolução muito positiva das exportações.
É por isso espantoso que, numa manifestação de revanchismo político, ignorância sobre a realidade do
setor e obsessão centralista, seja este caso de sucesso da economia portuguesa colocado sob a ameaça de
centralização da gestão de todos os portos nacionais.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Quando, para reforçar a competitividade do País, seria mais necessário
do que nunca incentivar e apoiar o atual modelo de gestão portuária, o Governo tornou-se um fator de
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instabilidade que está a afetar gravemente as comunidades portuárias, gerando incerteza sobre o
desenvolvimento de novos projetos.
É por isso que o PS considera fundamental o agendamento deste debate e queremos que seja reconhecido
o papel dos portos na promoção da competitividade da economia nacional, e das várias regiões, e no
incremento das exportações; que seja mantida a autonomia de gestão dos portos,…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, queremos que seja mantida a autonomia de gestão dos portos, rejeitando-se visões
redutoras, como a da criação de uma holding centralizada, e queremos que sejam dadas condições aos portos
nacionais para reforçar o seu papel na economia portuguesa, designadamente concluindo-se os projetos em
curso de melhoria das ligações ferroviárias e rodoviárias aos mercados europeus e às plataformas logísticas
nacionais.
Temos a certeza de que contaremos com a solidariedade dos Deputados da maioria eleitos por Viana do
Castelo, Porto, Aveiro, Coimbra, Lisboa e Setúbal, que conhecem bem a importância dos portos para a
economia nacional e saberão fazer valer a força da razão sobre qualquer experimentalismo canadiano,
desconhecedor da realidade portuguesa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de resolução n.º 227/XII (1.ª), tem a palavra
a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: Estamos hoje, aqui, a
debater a gestão dos portos comerciais e o que estamos a apurar é se a Assembleia da República vai ou não
ter uma palavra a dizer na defesa de um setor estratégico da economia e, mais do que isso, impedir o Governo
de criar problemas onde eles não existem. É porque, se os problemas estão a ser criados onde não existem,
querendo centralizar a gestão dos portos, que, autonomamente, têm funcionado bem, há, com certeza, um
outro projeto do Governo, sob esta ideia de acabar com a autonomia de gestão.
Por isso, o Bloco de Esquerda apresenta este projeto de resolução, não só pela necessidade de manter a
gestão autónoma dos portos comerciais, como é prática em todo o mundo, mas, mais do que isso, para que
esta Assembleia da República também diga hoje, claramente, que os portos comerciais devem manter-se
públicos.
Estamos a falar de um setor estratégico da nossa economia que não vai movimentar massas populares em
sua defesa, porque as pessoas não o sentem, não têm relação quotidiana com os portos. Mas é um setor
onde o Governo poderá estar a tentar, na sombra, uma privatização, que, na prática, vai transformar, e muito,
a vida de toda a população, vai prejudicar as empresas portuguesas, vai prejudicar as exportações e
importações, vai criar problemas até ao nível dos combustíveis, porque para tudo isso precisamos dos nossos
portos a funcionar, e a funcionar numa lógica de portos públicos.
A ideia do Governo, meia-dita no Plano Estratégico dos Transportes, avançada numa entrevista pelo Sr.
Secretário de Estado das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, de que será necessária uma holding
para os portos comerciais, é uma ideia absurda, quando pensamos em portos públicos. É que, se os portos
comerciais são públicos, não é preciso nenhuma holding, ela já existe, é o Estado! É o Estado que tutela os
portos, não precisa de nenhuma holding! É o interesse público que coordena a nossa política portuária, não é
preciso nenhuma holding! Quando o Governo fala de uma holding, está não só a falar da centralização dos
portos — um absurdo, do ponto de vista internacional e europeu, de que não há exemplo em sítio algum —,
mas também, isso, sim, da possibilidade de privatizar os portos comerciais. E esta é uma experiência que já
aconteceu no mundo, e aconteceu com exemplos que este Governo gosta de seguir, mas que são
desastrosos. Aconteceu no Reino Unido, com Margaret Thatcher, e o que sucedeu foi que o Estado perdeu
dinheiro, constituíram-se monopólios nas áreas dos portos e toda a economia perdeu.
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Portanto, hoje, o que dizemos é que a Assembleia da República deve ter uma palavra a dizer, garantindo a
autonomia dos portos comerciais e garantindo que os mesmos se mantenham públicos.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Adriano Rafael
Moreira.
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O setor marítimo-portuário é da
máxima importância para o País e para este Governo, e disto faz memória e justiça o Plano Estratégico dos
Transportes ao reservar 2500 milhões de investimentos nesta área. Este é o reconhecimento de que, sobre a
importância do setor, existe um consenso no País.
Dizer que as iniciativas hoje em debate apenas estão preocupadas com a redução de 15 para 5
administradores, anunciada por alguma imprensa, seria uma visão redutora.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Seria, efetivamente, uma visão redutora, porque as referidas
iniciativas vão mais longe.
O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Muito mais longe!
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Haja seriedade!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — O Partido Socialista começa logo por pedir que se proponha ao
Governo que continue com os projetos ferroviários. Ora, quanto a isto, estamos esclarecidos: o PET já
consagra que o projeto de alta velocidade foi abandonado.
Mas o Partido Socialista solicita, ainda, à Assembleia que recomende ao Governo a continuação dos
projetos rodoviários.
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Onde?!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Também quanto a isto, estamos esclarecidos: as parcerias
público-privadas têm de ser reanalisadas; a dívida, ainda não determinada, tem de ser analisada; e as obras
serão reduzidas em mais de 1000 milhões de euros.
Tudo isto consta, desde Setembro, no Plano Estratégico dos Transportes.
Mas o Partido Socialista também procura o reconhecimento para o Portugal logístico, porque uma mentira
muitas vezes repetida é entendida por alguns como verdade.
O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Pois é!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Estamos a falar de algo que não existe,…
O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Nada!
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Estamos a falar de sustentabilidade!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — … de uma mão-cheia de nada, que muito foi apregoada,…
O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Promessas!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — … mas que, no terreno, não corresponde a qualquer realidade.
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O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — É verdade!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Mas, procurando fugir a essa visão redutora e falando de portos,
porque esta temática é abordada, algures, no projeto do Partido Socialista, quero dizer que a atitude que aqui
nos aparece é a mesma que surgiu relativamente aos grupos de trabalho para analisar os transportes urbanos.
Conhecido, através da imprensa, que o Governo estava a estudar os portos, de imediato, as oposições
uniram-se para que nada se estudasse, para que nada fosse feito, para que tudo continue na mesma. É a
mesma atitude: «fusões de empresas e redução de administradores, nunca!» — diz a oposição. Mas, depois,
entram em contradição, porque é a mesma oposição que, relativamente ao aeroporto do Porto e ao aeroporto
de Lisboa, diz que só devem ter um conselho de administração — com sede em Lisboa, claro! — e que,
relativamente à CP Porto e à CP Lisboa, que nada têm em comum, também só devem ter um conselho de
administração — e é estratégico que fique no Rossio.
Protestos do PS.
Argumentam, para esse efeito, com vários estudos e, nesses estudos, omitem o essencial. Falam em
Espanha, mas saltam à frente do que de relevante existe: em Espanha, existem 29 portos, mais de 400
milhões de toneladas movimentadas por ano, e uma gestão central.
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Não é verdade!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Em Portugal, existem 7 portos, 600 milhões de toneladas — só
Algeciras movimenta mais do que todos os portos portugueses —,…
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — E então?!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — … mas o fundamentalismo de evitar a redução de
administradores leva a que se salte esta informação.
A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Pedro Saraiva (PSD): — Pois é!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — Portanto, Sr. Presidente, seria muito redutor dizer que o que
pretendem é evitar a redução de 15 para 5 administradores e, como tal, vamos convir que, possivelmente, o
que os move é o interesse nacional do desenvolvimento do setor,…
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Diminuam os administradores e deixem tudo como está!
O Sr. Adriano Rafael Moreira (PSD): — … porque nisto estamos unidos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Há pouco menos de três anos, quando
o então governo PS trouxe ao Plenário da Assembleia da República as suas — felizmente! — defuntas
propostas para as leis dos portos e da navegação comercial marítima, o PCP denunciou, a esse propósito, que
era com um verdadeiro fervor fundamentalista que o PS (e, agora, acrescento o PSD e o CDS-PP) defendia o
modelo neoliberal do famoso «landlord port». O que a vida já confirmou é que esse modelo não permite —
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muito menos num país como o nosso — a estratégia integrada de desenvolvimento do setor e da economia
nacional de que o País precisa.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — O que é urgente e indispensável é a definição e a aplicação de um modelo
coerente de serviço público para o setor portuário. É esta a questão central, Srs. Deputados!
Enquanto alguns procuram erguer a vozearia, atiçando regiões contra regiões, os interesses privados dos
gigantes económicos transnacionais do setor vão tomando conta do sistema portuário nacional, peça a peça,
serviço a serviço. Desde a pilotagem até ao abastecimento de água, passando pelo reboque e a amarração,
como dissemos em 2009, nada escapava.
Esse modelo landlord port, de gestão concorrencial, coloca à evidência, de uma forma mais clara e mais
direta, que a estratégia dos sucessivos governos serve e segue o objetivo da entrega deste sector a esses
interesses. E esse objetivo, tal como foi seguido durante anos com os negócios a serem conduzidos pelas
administrações portuárias, com a Liscont, empresa do Grupo Mota-Engil, entre outros, poderá ser seguido
agora com o desmantelamento e a privatização a serem conduzidos numa espécie de comissão liquidatária
centralizada.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — São etapas diferentes de um mesmo processo, e é esse processo que é
urgente travar e inverter.
Há quem procure aparecer verbalizando uma suposta defesa das regiões, mas, como o PCP já sublinhou,
a análise de uma questão tão importante como esta não é compatível com a repetição exaltada da suposta
defesa regional, que, na verdade, apenas serve para disfarçar interesses privados na gestão de equipamentos
públicos rentáveis.
Na defesa do interesse nacional e do desenvolvimento regional, o PCP considera que o sistema portuário
nacional deve ser gerido de forma pública e integrada tendo em conta especificidades e potencialidades de
cada região; assegurando a complementaridade e cooperação entre portos e nos investimentos, ao invés da
competição e da concorrência; promovendo planos de investimentos integrados de material flutuante, como
dragas, reboques, lanchas, salvádegos, obedecendo a uma política nacional de aquisições e considerando a
mobilidade entre portos para atividades sazonais; harmonizando direitos e condições de trabalho dos seus
trabalhadores e dos trabalhadores das empresas fornecedoras de trabalho portuário; assegurando ganhos de
eficiência com estruturas transversais, aproveitando o exemplo positivo da gestão integrada pública e nacional
do sistema portuário.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Não podemos concordar com uma gestão centralista distanciada da
realidade local e nacional, contrária ao desenvolvimento integrado e da coesão territorial. Não podemos aceitar
uma lógica incoerente, desarticulada, fratricida, de uns portos contra os outros, todos olhando para as
realidades social, económica e ambiental que os rodeiam como se de obstáculos se tratassem. Não podemos
aceitar que cada porto seja visto como uma espécie de cidade-Estado.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
A defesa das várias regiões e do seu desenvolvimento económico e social não se faz com discursos
pseudorregionalistas, mas com políticas concretas de investimento público.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Hélder Amaral.
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Começaria por dizer que o
projeto de resolução que o Partido Socialista nos apresenta hoje é extemporâneo. Aliás, decorre de uma
notícia da imprensa sobre a possível criação de uma holding para a gestão dos portos.
Gostaria de perceber, para que o debate seja sério e profícuo, o que queria o PS quando assinou o
Memorando da troica e, conforme consta do ponto 5.25, aceitou criar um novo modelo de gestão para os
portos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — O que querem é a privatização! É sempre a mesma coisa!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sabemos pelo projeto de resolução o que o PS não quer, mas gostaria
de saber o que pretendia quando concordou com um novo modelo de gestão para os portos para podermos,
então, ter aqui uma discussão séria e minimamente coerente sobre o que deve ser a gestão dos portos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Queria ainda dizer que, de facto, os resultados são positivos — esse é
um dado positivo. E os resultados dos portos são positivos não só porque tiveram administrações diligentes, e
tiveram da parte das empresas e das autarquias essa mesma comparticipação, mas também porque usaram,
e bem, a Janela Única Portuária, que mais não é do que a centralização de um conjunto de procedimentos de
gestão dos portos.
Protestos da Deputada do PS Ana Paula Vitorino.
Aliás, o resultado seria ainda melhor se a Sr.ª Deputada Ana Paula Vitorino, à data governante, tivesse
concretizado o Portugal Logístico.
Protestos da Deputada do PS Ana Paula Vitorino.
Como reconheceu hoje mesmo o Administrador do Porto de Leixões, o que está a faltar é a área logística.
Ora, se o anterior governo tivesse cumprido aquilo a que se propunha, teríamos resultados fantásticos na
gestão dos portos portugueses!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
Protestos da Deputada do PS Ana Paulo Vitorino.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Deputada, há, de facto, problemas nos nossos portos. Eles têm
uma fraca quota de mercado — continuam a não ganhar quotas de mercado, apesar de terem resultados
positivos; há uma falta de conjugação sistémica da intermodalidade — ainda gerimos mal o mar, a ferrovia e a
logística,…
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Isto não é turismo!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … e o Plano Estratégico de Transportes tenta colmatar isso e integrar
todas essas matérias; e, inclusive, não há incentivos às exportações.
Como sabe, tirando o porto de Leixões, que faz uma gestão eficaz, as taxas são bastante elevadas, os
custos são bastante elevados, e não há uma separação entre a importação e a exportação.
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Não diga disparates!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Perguntar-me-á: devemos deixar tudo como está? Não! O Plano
Estratégico diz que não, o Memorando diz que não.
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Portanto, Sr.ª Deputada, é possível ganhar dimensão, é possível perder menos tempo, porque tempo é um
fator de alta competitividade nos portos, e é possível ter mais dimensão de carga, e falou-se aqui de Espanha.
O porto de Leixões, sendo bom, é menos de metade do porto de Algeciras, aliás, é menos movimentado que
os granitos transitados no porto de Vigo.
Protestos da Deputada do PS Ana Paula Vitorino.
Depois, temos de especializar os portos. Há os que podem fazer roll-on/roll-off; os que podem ser
especialistas em short sea; os que podem ser especialistas em graneis líquidos; os que podem ser
especialistas em terminais de cruzeiros.
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Não conhecem a realidade! Informem-se! Estudem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Portanto, a especialização pode ser uma forma competitiva de gerir os
nossos portos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Temos que encontrar uma
solução. Não estou seguro de que esta fórmula de holding possa ser a solução milagrosa. Não me parece,
mas é uma questão que teremos que ver.
Contudo, gostaria de encontrar uma fórmula que permitisse a todos os portos ganharem dimensão,
ganharem escala e potenciarem a quota de mercado, com especialização, e, ainda assim, terem a sua
existência regional, fazendo a sua ligação às empresas e às autarquias, terem essa autonomia.
A Sr.ª Ana Paula Vitorino (PS): — Aprovem os planos! Têm a consulta pública feita!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sendo certo — e vou terminar, Sr. Presidente — que não podemos ter,
outra vez, portos tão pequenos, tão pouco significativos, geridos de per si, temos que encontrar um modelo
inteligente e que precisa de consenso.
Espero que o Partido Socialista nos diga o que queria quando pôs esta matéria no Memorando da troica e
que participe numa discussão séria e serena, que não foi o que sucedeu agora. Embora reconheça que a Sr.ª
Deputada Ana Paula Vitorino percebe da matéria, julgo que convinha que, às vezes, ouvisse um pouco mais
os outros.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Catarina
Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente: O Bloco de Esquerda, hoje, trouxe aqui um projeto de
resolução que tem com única recomendação que, e vou ler, «A gestão dos portos comerciais portugueses se
mantenha autónoma e pública».
Não falamos neste projeto de resolução do número de pessoas nos conselhos de administração, nem de
temas que são importantes para nós, e que continuam a sê-lo, como o ambiente, o desenvolvimento regional,
a precariedade laboral ou o facto de até os guindastes estarem sujeitos, hoje em dia, a concessões privadas
nos nossos portos. São problemas que nos preocupam, e vamos continuar a lutar no que respeita a estas
matérias.
Mas o que hoje trazemos aqui é simples: que «A gestão dos portos comerciais portugueses se mantenha
autónoma e pública». E ou a maioria aprova este projeto de resolução ou o que está a dizer é que tem o
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projeto, não dito, não escrito, na «sombra», de privatizar os portos comerciais portugueses, e isso seria uma
experiência completamente leviana!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, está concluída a discussão dos projetos de resolução
n.os
204 e 227/XII (1.ª), que serão votados amanhã.
Vamos passar ao ponto seguinte da ordem do dia, que inclui a apreciação conjunta do inquérito
parlamentar n.º 1/XII (1.ª) — Comissão eventual de inquérito parlamentar à gestão do Banco Português de
Negócios pela CGD e à sua venda ao BIC (BE), e do projeto de deliberação n.º 5/XII (1.ª) — Auditoria a
realizar pelo Tribunal de Contas ao processo de nacionalização do BPN, Banco Português de Negócios, e ao
processo que determinou a insolvência do BPP, Banco Privado Português, avaliando, nomeadamente, os
custos já realizados e a realizar pelo Estado português (PCP).
Para apresentar a proposta de inquérito parlamentar n.º 1/XII (1.ª), tem a palavra o Sr. Deputado João
Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O BPN foi nacionalizado em novembro
de 2008, há pouco mais de três anos.
Desde essa data, o Estado deslocou para o BPN, seja diretamente, seja através da Caixa Geral de
Depósitos, os seguintes recursos públicos: 4500 milhões de euros em dívida garantida pelo Estado ao BPN e
às empresas participadas pelo BPN, até ao dia 1 de julho de 2011; 146,6 milhões de euros em garantias de
empréstimos obrigacionistas; e, se venda ao BIC se concretizar, o Estado pagará ainda 600 milhões de euros
(recapitalização acordada com o comprador), mais 167 milhões de euros para crédito malparado (condições
do contrato de compra e venda assinado com o BIC) e, ainda — há que acrescentar —, para eventualmente
indemnizar 830 trabalhadores, 25 milhões de euros.
Tudo isso, Sr.as
e Srs. Deputados, soma 5443 milhões de euros. Sr.as
e Srs. Deputados, 5443 milhões de
euros é um valor superior à consolidação orçamental efetuada em 2011 e em nome da qual, como devem
estar lembrados, os portugueses ficaram sem metade do subsídio de Natal, viram os seus impostos aumentar
e os funcionários públicos tiveram os seus salários congelados.
Mas, para sermos mais rigorosos, devemos falar em 5403 milhões de euros, porque é necessário
descontar os 40 milhões que o BIC paga ao Estado pela compra do BPN. São 40 milhões de uma «gorjeta»
que o BIC dá ao Estado, enfim, para recompensar o trabalho que o Estado realizou para entregar ao BIC um
BPN «limpinho» e «lavadinho», pronto a faturar.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!
O Sr. João Semedo (BE): — São 5443 milhões de euros. Bem longe do que previa e anunciava o então
ministro Teixeira dos Santos, quando em 5 de novembro de 2008, ano da nacionalização, pretendia sossegar
o País afirmando, e passo a citar, «não é de esperar que haja impactos significativos», referindo-se o então
ministro das Finanças ao impacto da operação BPN na consolidação orçamental.
Sr.as
e Srs. Deputados, antes da venda, o processo de reestruturação do BPN consumiu ao Estado 4611
milhões. Como foi gasto este dinheiro? Em que operações financeiras foi aplicado este dinheiro? Que
compromissos foram pagos com este dinheiro? Que irregularidades antigas, que ilegalidades antigas foram
limpas com este dinheiro? O Estado gastou o mínimo indispensável na reestruturação do BPN ou, ao
contrário, gastou mais do que era necessário, como quer saber a própria Comissão Europeia?
Não sabemos responder a nenhuma destas perguntas. Nem este Governo, nem o anterior, alguma vez
sobre isto deram qualquer informação, explicação ou esclarecimento.
Foi este muro de silêncio que levou o Bloco de Esquerda a propor que o Parlamento aprovasse, em janeiro
do ano passado (portanto, há um ano), a recomendação ao governo para que pedisse ao Tribunal de Contas a
realização de uma auditoria ao BPN. Nem o anterior governo, nem o atual Governo, deram um passo que
fosse neste sentido.
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Mas, Sr.as
e Srs. Deputados, se propusemos esta auditoria há um ano, se ela era necessária há um ano,
um ano depois, e por maioria de razão, ela continua a ser necessária.
Por isso, o Bloco de Esquerda, coerentemente e com toda a convicção, votará favoravelmente o projeto de
deliberação do PCP para que o Tribunal de Contas faça uma auditoria ao BPN e também ao BPP.
Sr.as
e Srs. Deputados, o final deste processo de reestruturação, anunciado e desejado pelo Governo, é a
venda por 40 milhões do BPN ao BIC — um banco, como sabemos, de capitais luso-angolanos. Uma decisão
que o Governo nem sequer levou à comissão de privatizações, como era, aliás, obrigado a fazer.
O BIC recebe um banco acabado de refinanciar com 600 milhões de euros e mais um financiamento de
167 milhões para crédito malparado. Para sermos completamente claros, o Governo entrega 767 milhões ao
BIC, para o BIC comprar o BPN por 40 milhões de euros.
Sr.as
e Srs. Deputados, não há muitos negócios como este. Só mesmo o Governo e os partidos da direita
que o apoiam não se incomodam nem se interrogam sobre as condições deste negócio, que pode ser uma
verdadeira venda de favor. Até a própria Comissão Europeia abriu um inquérito que, entre outras coisas,
pretende averiguar do favorecimento do Governo ao banco comprador.
As dúvidas em torno do BPN não se situam apenas no processo de reestruturação do Banco, na gestão
realizada pela Caixa Geral de Depósitos, nem tão-pouco nas indefinições relativamente ao custo final de toda
esta operação. Elas prolongam-se e incluem também a decisão de vender o BPN e a decisão sobre as
condições em que esta venda vai ocorrer e que o Governo aceitou.
Sr.as
e Srs. Deputados, é exatamente por assim ser que o PSD e o CDS fogem como «diabo da cruz» da
comissão de inquérito proposta pelo Bloco de Esquerda.
A direita não quer que o Parlamento e o País conheçam os meandros da venda do BPN ao BIC. O PSD e o
CDS querem impedir o Parlamento de avaliar politicamente as opções do Governo, razão de ser da comissão
de inquérito por nós proposta.
Aplausos do BE.
A comissão de inquérito é o instrumento de que o Parlamento dispõe para fazer com rigor e eficácia, em
tempo útil e de forma transparente, à vista de todos os portugueses, o juízo político sobre as opções do
Governo. Só assim se percebe e explica que PSD e CDS recusem o inquérito parlamentar. Ao recusar o
inquérito parlamentar PSD e CDS acabam por confessar que, neste negócio BPN/BIC, há alguma coisa que a
direita não quer que os portugueses conheçam. O voto do PSD e do CDS confirma, por isso mesmo, a
utilidade que teria esta comissão de inquérito.
E o CDS? Ao recusar o inquérito parlamentar, o CDS comporta-se como a nobreza falida, que vive das
glórias passadas. O CDS, agora no Governo, prefere dar uma «cambalhota» relativamente ao que sempre
disse sobre o BPN a dar uma «alfinetada» no parceiro da coligação.
Sr.as
e Srs. Deputados, a história do BPN é longa e acidentada, mas resume-se em poucas palavras: uns
andaram a roubar; outros deixaram roubar; e outros, ainda, vão ficar a ganhar, no final de tudo isto.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!
O Sr. João Semedo (BE): — E a direita? O Governo (o PSD e o CDS) quer o povo a pagar o prejuízo e o
Parlamento a «assobiar para o lado». Não contem com o Bloco de Esquerda.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo
Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Semedo, ainda bem que dispõe de algum
tempo para me responder.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — A eternidade!
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O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Tenho muito gosto em colocar-lhe três ou quatro questões.
O Sr. Deputado João Semedo acabou por demonstrar claramente, na sua intervenção, qual o objetivo
deste pedido de comissão de inquérito: chicana política pura.
Protestos do BE.
É óbvio o objetivo de chicana política pura.
Protestos do Deputado do PS Pedro Nuno Santos.
Agradecia que os Srs. Deputados do Partido Socialista não falassem muito, porque, na intervenção que
vou fazer, vou lembrar aquilo que, durante três anos, o governo socialista fez para que o BPN chegasse ao
estado a que chegou!
Protestos do PS.
Por conseguinte, seria melhor que houvesse algum cuidado com esses apartes, porque o Partido Socialista
foi quem fez o BPN chegar onde chegou e, algum dia, vão ter de responder por aquilo que fizeram em relação
ao BPN!
Protestos do PS.
Mas, Sr. Deputado João Semedo, acha mesmo que se quisesse uma comissão de inquérito, estava
requerê-la agora e não quando se concluísse todo o processo de venda do BPN? O Sr. Deputado João
Semedo conhece algum caso, no Parlamento, em que se tenha feito uma comissão parlamentar de inquérito
antes de se concluírem os factos? E depois, sim, baseado em factos fazer-se a comissão de inquérito. O Sr.
Deputado João Semedo quer antecipar porquê, quando, nos termos do Memorando da troica, o Governo se
comprometeu a vender o BPN, sendo que quem assinou esse Memorando foi o Partido Socialista? E se VV.
Ex.as
não estão de acordo em que seja vendido ao BCI ou se não estão de acordo em que o seja nestas
condições, não o vão evitar agora, através de uma comissão de inquérito. Há mecanismos parlamentares, de
discussão parlamentar, para o conseguirem.
Protestos do PCP e do BE.
Já agora, gostava de dizer o seguinte: o Sr. Deputado disse que ia votar favoravelmente aquilo que o
Partido Comunista pede. Acho bem que o faça. Mas talvez devesse fazer mais uma coisa: além de votar
favoravelmente, não requerer agora a comissão de inquérito e só requerer, com responsabilidade, como fez o
Partido Comunista, que a auditoria do Tribunal de Contas apure factos que demonstrem que o Parlamento
deve constituir uma comissão de inquérito.
Não temos medo de comissões parlamentares de inquérito, mas entendemos que elas só devem funcionar
no momento em que o Parlamento deve efetivamente pronunciar-se politicamente sobre os factos.
Aplausos do PSD.
Protestos do Deputado do BE Luís Fazenda.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hugo Velosa, de um lado, 767 milhões de
euros, que é quanto o seu Governo entrega ao BIC, e, do outro lado, 40 milhões de euros. Entre uma coisa e a
outra — parafraseando, novamente, o seu Ministro Vítor Gaspar —, o senhor só acha que há chicana?!
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O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Para que serve a auditoria?!
O Sr. João Semedo (BE): — Pois nós achamos que, entre um valor e o outro há muita interrogação, muita
questão, muita dúvida que é necessário esclarecer.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. João Semedo (BE): — Em segundo lugar, Sr. Deputado, sabe que esta questão do tempo de
decisão, do tempo de discussão, dá para tudo, é como a pastilha elástica. Estou farto de ouvir o PSD recusar
uma série de propostas dos mais variados partidos, porque já está decidido e não vale a pena.
O que lhe digo é que, em todo este processo, o que podemos aprender, entre outras coisas, é que se
tivéssemos discutido antes a nacionalização do BPN, talvez o BPN não tivesse chegado à situação a que
chegou hoje e aos prejuízos que trouxe para os portugueses, para as contas públicas.
Sr. Deputado, uma coisa lhe digo: não tenha qualquer dúvida de que não vai ser esse argumento da
decisão que vai fazer escapar o PSD de discutir, no País e no Parlamento, a operação de venda do BPN.
Aplausos do BE.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Nem nós fugimos!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Então, e a «nobreza falida», nem uma perguntinha?!
O Sr. João Semedo (BE): — Falida e envergonhada!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de deliberação n.º 5/XII (1.ª), do PCP, tem a
palavra o Sr. Deputado Honório Novo.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não é a primeira vez que o Parlamento
português pretende conhecer com rigor os recursos públicos, diretos e indiretos, que o Estado disponibilizou e
continua, infelizmente, a disponibilizar ao BPN.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Isso é verdade!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Outro tanto se pode dizer exatamente do processo que levou à falência do
Banco Privado Português, o BPP.
Ninguém sabe dizer, hoje, exatamente, quais os recursos públicos que ainda podem vir a estar implicados
neste processo, designadamente através das responsabilidades financeiras que o Estado assumiu e que pode
ter que encarar no futuro próximo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — As informações oficiais governativas sobre estes dois processos são
esparsas, incompletas, contraditórias (eu diria, deliberadamente incompletas, deliberadamente contraditórias),
sem qualquer margem de erro.
Há pouco mais de um ano, este Parlamento, com a oposição expressa do Partido Socialista, recomendou
ao governo de José Sócrates que promovesse, junto do Tribunal de Contas, a realização de uma auditoria às
contas do BPN. Escusado será dizer que o governo de Sócrates fez ouvidos de mercador e deitou mais esta
recomendação do Parlamento para o caixote do lixo. Isto mesmo confirmou o Presidente do Tribunal de
Contas quando, em resposta ao PCP, disse há dias, na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração
Pública, que ao Tribunal de Contas ninguém solicitara qualquer auditoria nem sobre o BPN nem tão-pouco
sobre o processo do BPP.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já ninguém confia, fundadamente, nas informações pontuais que os
governos vão dando, quando e como lhes interessa, sobre os buracos passados e futuros do BPN e do BPP.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — É mais que tempo de o País conhecer, exatamente, quanto gastou e quanto
vai gastar mais com as operações da falsa nacionalização do BPN e da falência do BPP e que destino
sofreram, de facto, os 421,6 milhões de euros que o Banco de Portugal e a Caixa Geral dos Depósitos
emprestaram ao BPN, dias antes da chamada nacionalização.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É verdade!
O Sr. Honório Novo (PCP): — As imparidades, já reconhecidas, são de 1850 milhões de euros, como dizia
Teixeira dos Santos, ou são já de 2350 milhões de euros, como, em agosto passado, admitia a atual
Secretária de Estado do Tesouro?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Boa pergunta!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Que garantias tem o Estado no BPN? São 3100 milhões de euros ou são
4100 milhões de euros, só para os veículos, e são só mais 400 milhões de euros para o próprio BPN?
Onde entram mais os 600 milhões de euros de recapitalização de um banco que está a ser vendido por 40
milhões de euros? E onde entram os cerca de 150 milhões de euros de garantias executadas de um banco
que está a ser vendido por 40 milhões de euros?
E que outros encargos vai ter o Estado, no contexto desta privatização? Por exemplo, quanto vai o Estado
pagar, e continuar a pagar, de salários dos trabalhadores do BPN, e até quando? E quanto vai o Estado pagar
pelos despedimentos dos trabalhadores que o BIC não vai querer no futuro banco privatizado?
Qual é o valor exato que o Estado já pagou pela falência do BPP? E quanto pode vir a pagar mais? Que
responsabilidades financeiras continuam hoje em vigor e durante quanto mais tempo?
E como se explica, hoje, Srs. Deputados, que as contrapartidas, ou melhor, as contragarantias, dadas ao
Estado pelo BPP tenham sido avaliadas então pelo Banco de Portugal em 600 ou 700 milhões de euros e,
hoje, pelos vistos, nada valham?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Importa, é evidente, seja no caso do BPN seja no caso do BPP, apurar
responsabilidades. Estamos prontos para o fazer, como o fizemos sempre no passado, mesmo que, quanto a
nós, as alternativas em presença não se coloquem apenas entre os custos da privatização e os custos da
liquidação.
Quanto a nós, insistimos, o futuro lógico do BPN deveria estar na esfera pública,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — … com marca própria, mercado específico, na área das exportações ou na
do apoio às pequenas e médias empresas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Honório Novo (PCP): — É pena, Srs. Deputados e Sr.as
Deputadas, que também não se fale disso,
hoje.
Certamente, importa — dizia, e repito — apurar responsabilidades. Mas importa, ao mesmo tempo, que os
portugueses conheçam de uma vez por todas, conheçam ao milímetro, conheçam cêntimo a cêntimo, o que
estão a pagar pelos atos criminosos de alguns e pelas ineficácias e omissões governativas de outros tantos.
Por isso, entendemos que deve ser o Tribunal de Contas a apurar, imediatamente, tudo o que houver a
apurar sobre estes dois buracos.
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Srs. Deputados, não há tempo a perder! É tempo de que o País conheça integralmente quanto se está a
pagar pelo BPN e pelo BPP!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra Sr. Deputado Pedro Nuno
Santos.
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como em 2008, sob a égide de uma
proposta do CDS-PP para a criação de uma comissão de inquérito ao processo de nacionalização do BPN,
hoje o Partido Socialista responde da mesma maneira, votando a favor da proposta do BE de criação de uma
comissão de inquérito à gestão do BPN pela CGD e à sua venda ao BIC.
Aplausos do PS.
O Partido Socialista não defende a transparência na oposição e, depois, o seu contrário quando está no
poder,…
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Muito bem!
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — … que é o que o CDS e, também, o PSD fazem. Em 2008,
defenderam, exigiram, bateram-se pela criação de uma comissão de inquérito ao processo de nacionalização
do BPN, mas hoje recusam-se a aceitar uma comissão de inquérito à privatização do BPN. É óbvio que
ninguém compreende!
Bem sei que o PSD se prepara para atacar o PS, mas a verdade é que nós, desde o início, quisemos
clarificar, com toda a transparência, o processo de nacionalização: as irregularidades subjacentes à gestão do
BPN que conduziram à sua nacionalização, bem como as potenciais falhas de supervisão. Na altura, era
importante fazer essa inquirição, e esse trabalho foi feito de forma aberta e transparente na sociedade
portuguesa.
O PS podia ter bloqueado a criação dessa comissão de inquérito — como sabem, o Partido Socialista tinha
maioria absoluta —, mas não o fez, porque é dever de quem está no poder, mesmo tendo maioria absoluta,
proporcionar todas as formas para averiguar e garantir a total transparência destes negócios.
Aplausos do PS.
O Sr. António Braga (PS): — Isso é que é democracia!
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Hoje, passados estes anos, o montante de verba envolvido e as
dúvidas que o País tem sobre o negócio justificam que, neste momento, voltemos a criar uma comissão de
inquérito para avaliar esse negócio e o processo de privatização.
O BIC pagará 40 milhões de euros por um banco com depósitos de 1800 milhões de euros, créditos de
2200 milhões de euros e que acabou de ser refinanciado pelo Estado em 600 milhões de euros, além de 167
milhões de euros de provisões disponíveis para crédito mal parado.
É justo, é obrigatório que todos tenhamos a certeza de que a transparência do processo seja acessível a
todos os portugueses, porque é da nossa responsabilidade. É, pois, grave que quem tem o poder de decidir
bloqueie a procura da transparência e o esclarecimento sobre este processo!
Aplausos do PS.
Portanto, queria deixar um repto ao CDS-PP, que teve a iniciativa em 2008, bem como ao grande partido
que hoje governa o nosso País na companhia do CDS-PP: não bloqueiem a procura da verdade, não
bloqueiem o esclarecimento deste negócio que a todos os portugueses preocupa — a nós e, com certeza,
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também a todos os Deputados do PSD. Participem no processo de clarificação, de transparência e de
esclarecimento deste negócio!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Queria dizer, com toda a simpatia,
que penso que o Partido Socialista deveria corar de vergonha pelo que fez ao longo deste processo. E vou
dizer porquê.
Aplausos do PSD.
Não sei se o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos estava cá quando ocorreram estes factos… Não sei!
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Estava, estava!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Se já estava, devia estar distraído!
Quando o Sr. Deputado diz «tínhamos maioria absoluta mas aceitámos uma comissão de inquérito», é
verdade…
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Ah!… Afinal, não estava enganado!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sim, é verdade! Aceitaram a comissão de inquérito, mas com esta nuance
fundamental (com certeza, não ouviu o que eu disse há pouco, quando formulei uma pergunta ao Sr.
Deputado João Semedo): é que, na altura, a nacionalização já tinha ocorrido e, agora, o Parlamento iria
pronunciar-se sobre um processo que está em curso e em vias de ser concretizado.
Mas há mais: o Partido Socialista impôs a sua maioria absoluta, e fê-lo de uma maneira vergonhosa. A
história do Parlamento, o Deputado João Semedo e os demais Deputados que estiveram naquela comissão de
inquérito sabem bem o que passou. Sabe como é que impôs, Sr. Deputado? Com a sua maioria absoluta,
votou favoravelmente, sozinho, um relatório que defendia que a nacionalização era a única solução para o
BPN, porque nenhum dos outros grupos parlamentares concordou com isso. Todos os grupos parlamentares
demonstraram que não era a única solução!
Esse é o ato que leva a que estejamos aqui, hoje, a ter esta discussão e que este Governo tenha de
resolver um problema que lhe foi «posto nos braços», de uma forma monstruosa, por um governo que nunca
prestou esclarecimentos sobre esta matéria ao longo dos anos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Se o Sr. Deputado quiser saber tudo o que se passou neste Parlamento,
basta ler as atas! O PSD e os outros grupos parlamentares, várias vezes, quiseram saber o que se estava a
passar e o ex-Ministro de Estado e das Finanças fica na história deste Parlamento por ter escondido, ao longo
dos anos, o que se passava com o BPN.
Portanto, na nossa opinião, o Partido Socialista devia corar de vergonha e não devia vir dizer que o PSD é
que quer evitar seja o for!
Ao Sr. Deputado Pedro Nuno Santos queria dizer mais: não temos problema algum e fica dito, desde já,
que aceitaremos uma comissão de inquérito, uma vez concluído este processo, com a qual colaboraremos se
necessário for.
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Muito bem!
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O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Vamos aprovar, hoje, que o Tribunal de Contas faça a análise de todo o
processo e se, nessa análise, o Tribunal de Contas entender que, efetivamente, há alguma coisa por apurar
nesta matéria, mesmo que tenha a ver com este Governo ou com o PSD, nós aprovaremos aqui a criação de
uma comissão de inquérito.
No que diz respeito ao BPN, mesmo em relação à sua fase inicial, quem esteve na comissão de inquérito
sabe que o PSD sempre prestou toda a colaboração para que se descobrisse a verdade, nunca escondeu
absolutamente nada, apesar de saber, é preciso dizê-lo aqui — e foi acusado disso várias vezes —, que
muitos dos seus militantes tinham a ver com o que se passava no BPN.
Essa é que é a grande diferença em relação ao que o Partido Socialista agora propõe.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, queira fazer o favor de concluir.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, estou a fazer uma intervenção e penso que ainda disponho
de tempo para continuar no uso da palavra.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem razão, Sr. Deputado, foi um lapso da minha parte. Peço-lhe que
prossiga.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Gostaria de dizer uma segunda coisa sobre a maioria absoluta do Partido
Socialista, que foi, também, uma das maiores vergonhas deste Parlamento: o Partido Socialista impôs e veio
dizer que não houve falhas de supervisão em relação ao BPN. É preciso não esquecer isso!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Todos os grupos parlamentares sabem que foi por haver falha de supervisão
que chegámos onde chegámos hoje, e não vou lembrar quem era o Governador do Banco de Portugal na
altura porque VV. Ex.as
sabem bem quem era!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Esse também «deu à sola»!
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — O Banco de Portugal é que é responsável?!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Portanto, o Partido Socialista não pode dar lições ao PSD nesta matéria, de
maneira nenhuma! E o Sr. Deputado só por ignorância do que se passou é que pode vir dizer o que aqui nos
disse.
Em suma, gostaria de dizer que o PSD, partido maioritário deste Governo e desta Assembleia, não tem
qualquer problema com a criação de uma comissão de inquérito sobre todo o processo do BPN. Nenhum
problema!
Também queria felicitar o Partido Comunista pela forma como apresenta o seu projeto de deliberação — às
vezes, os Deputados não leem os projetos de deliberação —, porque é de uma enorme responsabilidade no
modo como põe o problema.
Portanto, aguardamos serenamente que o Tribunal de Contas faça a sua análise ao que se passou em
todo o processo BPN. Aguardamos serenamente e, se for necessário uma comissão de inquérito, não temos
qualquer problema em sermos nós a propor a sua criação. Aliás, há pouco tempo, fomos nós que propusemos
a vinda da Sr.ª Secretária de Estado ao Parlamento, para vir falar sobre o processo de venda.
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — O processo de venda resulta do Memorando assinado com a troica. O que é
que o Governo poderia fazer?
Portanto, Sr.as
e Srs. Deputados, não temos qualquer problema de consciência nesta matéria. Este
Governo procurou fazer o melhor que pôde para resolver um problema que o Partido Socialista nos deixou.
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Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Deputado Hugo Velosa tem um tom muito interpelativo que me
confundiu… Estava a intervir e não a fazer um pedido de esclarecimento.
Para pedir esclarecimentos, agora sim, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos.
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hugo Velosa, ainda que tenha havido
falhas de supervisão do Banco de Portugal, não foi o Banco de Portugal, nem o seu Governador, o
responsável pela gestão danosa do BPN,…
O Sr. António Braga (PS): — Exatamente!
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — … que obrigou o País a nacionalizar o Banco.
Aplausos do PS.
É bom que o Sr. Deputado não se esqueça por que é que tivemos de nacionalizar o BPN: não foi por causa
do Banco de Portugal, foi por causa da gestão danosa do BPN que fomos obrigados a nacionalizá-lo!
Protestos do PSD.
Mesmo que as conclusões de uma comissão de inquérito, aprovadas pela maioria que estava representada
nessa comissão, não tenham sido do agrado do Sr. Deputado Hugo Velosa, e podendo as da comissão de
inquérito que agora se pretende criar não ir ao encontro da nossa ideia sobre este negócio em concreto, não
estamos contra a criação da comissão de inquérito e, por isso, votaremos favoravelmente a proposta do BE, e
fazemo-lo mesmo que as conclusões não sejam do nosso agrado.
Em 2008, o Sr. Deputado, o PSD e o CDS tiveram opinião diferente daquela que têm agora. Naquela
altura, para evitar o contágio ao sistema financeiro português, foi importante proceder àquele negócio, por isso
a nacionalização obrigou e exigiu uma urgência, situação que hoje é diferente.
O Sr. Deputado Hugo Velosa abriu a possibilidade e o compromisso de o PSD aprovar a criação de uma
comissão de inquérito e, por isso, queria deixar o desafio para que seja o próprio PSD, uma vez que agora vai
chumbar a comissão de inquérito proposta pelo Bloco de Esquerda, no momento em que o negócio for
concluído, a propor ao Parlamento a criação de uma comissão de inquérito.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, penso que fui claro no que
disse quanto à posição do PSD sobre a comissão de inquérito. Fui claro!
Se houver razões que justifiquem essa comissão de inquérito, até nem temos problemas em sermos nós a
propor a sua criação. Se houver razões para tal, obviamente, dado que vai haver uma auditoria do Tribunal de
Contas. A não ser que V. Ex.ª não confie no Tribunal de Contas, a não ser que não confie numa instituição
deste País que tem uma função fundamental!
O Sr. António Braga (PS): — Não é isso!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Portanto, a posição do PSD ficou perfeitamente clara.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado veio tentar dar uma explicação, dizendo que não foi por causa do Banco
de Portugal, foi por causa de umas pessoas que lá estavam e que fizeram… Tudo isso está hoje apurado,
menos a parte criminal, que corre nos tribunais, e não vou pronunciar-me sobre ela, nem nenhum de nós se
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deve pronunciar devido à separação de poderes. Ou seja, foi a gestão do BPN que o provocou, isso é óbvio, e
nós até aceitámos essa constatação nas conclusões da comissão de inquérito. Qual é o problema?!
Mas, atenção: a falha grave de supervisão foi fundamental, porque essas situações só aconteceram porque
houve falha de supervisão. Isto é perfeitamente óbvio, para mim! Já o foi na comissão de inquérito, em que só
para o Partido Socialista é que não foi, e nós não entendemos porquê!
VV. Ex.as
deviam recordar o seguinte: ao longo deste processo, durante quase três anos, o governo
socialista escondeu a realidade, o governo socialista tentou duas reprivatizações do BPN e falhou as duas! O
governo socialista deveria, sinceramente, corar de vergonha pelo que fez ao BPN e pelo que fez, no fundo, ao
País e a todos os contribuintes.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de
Almeida.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Atendendo ao tom do
debate sobre esta matéria do BPN, parece necessário esclarecer — e o CDS fá-lo desde já — dois aspetos,
um de que o CDS não abdica e outro em que nunca entrará.
Nunca entraremos numa chicana política à volta de um tema tão sério,…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — … nunca o fizemos no passado. É verdade, já aqui foi dito,
que, se este Parlamento teve uma comissão de inquérito sobre o BPN, foi porque o Grupo Parlamentar do
CDS propôs que fosse criada essa comissão de inquérito.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Srs. Deputados, isto é património, não é cadastro.
Aplausos do CDS-PP.
Portanto, honramo-nos do papel que tivemos, que foi importante para o esclarecimento destas questões
ligadas ao BPN. Na altura, assumimos claramente o nosso papel nessa comissão, sem nunca ter problema
algum em reconhecer que, além do Deputado que representou o CDS, o Deputado Nuno Teixeira de Melo,
outros Deputados e outros grupos parlamentares, todos juntos, em nome do Parlamento, prestaram um
excelente serviço ao País para esclarecer aquilo de que nunca abdicaremos, que é, num processo tão
vergonhoso e tão grave, saber, até ao fim, quanto gastou o Estado com o processo BPN. E, sabendo quanto
gastou o Estado com o processo BPN, sabermos que esforço foi pedido aos contribuintes para uma situação
que também tem de ter responsáveis.
É disto que não abdicamos: saber quanto custou, quanto pagaram os contribuintes e quem foi responsável
por este esforço dos contribuintes.
Não vale a pena andarmos a atirar pedras de um lado para o outro, porque é evidente, neste momento, que
há responsabilidades muito alargadas naquilo que se passou no BPN, em cada uma das suas fases.
Sabemos que o problema começou com a notícia pública de uma gestão com indícios de práticas que
contrariam a lei e que estão indiciadas como podendo ser criminosas. Se estão indiciadas como podendo ser
criminosas e se estão neste momento no âmbito dos tribunais, pois é no âmbito dos tribunais que devem ser
dirimidas.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — O que deve dizer qualquer responsável político é solicitar
aquilo que se pede à justiça, ou seja, que seja célere e que, com a maior celeridade possível, produza a
acostumada e necessária justiça.
É isso que, dentro do princípio da separação de poderes, qualquer responsável político pode pedir, sem ter
qualquer outro tipo de interferência, sem se pronunciar sobre os termos concretos dos processos que estão
em tribunal, mas não ignorando, porque nunca podemos ignorar, que estas notícias públicas e estes factos
que estão a ser julgados são suficientemente graves para merecerem a nossa atenção e, até final, seguirmos
os processos e o apuramento das responsabilidades.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sabemos também que isto não aconteceu sem a
complacência do Estado português, e a complacência do Estado português tem responsáveis. Tem, desde
logo, um responsável, o à época governador do Banco de Portugal.
Já aqui foi dito, e é verdade, que se este Parlamento não pôde concluir que houve irresponsabilidade do
Banco de Portugal na supervisão relativamente ao BPN e que o seu à época governador, o Dr. Vítor
Constâncio, não exerceu, como deveria ter exercido,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — … os poderes que tinha e os meios que poderia ter
aproveitado, foi porque uma maioria absoluta do Partido Socialista diz que esteve disponível… Esteve! De
facto, os Srs. Deputados estiveram sentados na comissão durante todo o tempo de duração da mesma, mas
levantaram-se no final para impedir a aprovação desta conclusão, que não foi uma conclusão do Parlamento,
porque os senhores não deixaram, mas foi uma conclusão de todo o País, que pôde assistir àquele debate,…
Aplausos do CDS-PP.
… que pôde assistir àquelas reuniões e percebeu claramente que o Parlamento não concluía por um «rolo
compressor» do Partido Socialista. Mas o País já estava esclarecido sobre a responsabilidade do Dr. Vítor
Constâncio e do Banco de Portugal naquela situação!
Sabemos também que a nacionalização do banco foi feita sob argumento ad terrorem, curiosamente
também da parte do Banco de Portugal, porque foi o Banco de Portugal que disse aos responsáveis políticos
que se não fosse nacionalizado aquele banco, naquele momento, havia um risco sistémico. Quem, sendo
supervisor, usa um argumento destes, usa-o sabendo que este argumento é sempre de prova impossível,
porque, tendo-se nacionalizado, nunca o Banco de Portugal vai conseguir provar que, de facto, havia o risco
sistémico. E, sejamos justos, quem defenda que não se devia ter nacionalizado também não pode provar que,
se não se tivesse nacionalizado, se tinha evitado esse risco sistémico.
Mas, mais uma vez, a responsabilidade tem um nome, Dr. Vítor Constâncio, que disse que havia este risco.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Depois, durante o período que se seguiu, a Caixa Geral de
Depósitos, na altura do governo do Partido Socialista, geriu o BPN, e foi uma gestão — há que dizê-lo —
totalmente inconsequente, a qual foi julgada também neste Parlamento sem necessidade de uma comissão de
inquérito.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Na legislatura anterior, este Parlamento promoveu as
audições necessárias ao apuramento de responsabilidades durante esse período de gestão sem necessitar de
uma comissão de inquérito, mas concluiu facilmente que a gestão era inconsequente, por duas razões: não
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conseguiu reprivatizar o banco rapidamente e não conseguiu sequer, em duas tentativas que fez, ter qualquer
concorrente para essa privatização. Ou seja, o mesmo Partido Socialista, que diz agora que a possível venda
ao BIC é por um valor baixo, enquanto estava no governo não conseguiu um interessado sequer, a custo zero!
Não conseguiu sequer um interessado no banco e agora diz que o preço é baixo!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Srs. Deputados, não conseguiu reprivatizar, mas também não conseguiu reabilitar o banco, e o banco foi-
se degradando, os seus ativos foram-se degradando e isso foi agravando o esforço que os portugueses
tiveram de fazer.
Na legislatura passada, promovemos aqui todas as audições. Neste momento, estamos num processo
determinado por um Memorando de Entendimento, que diz que até àquele prazo teria de ser encontrada uma
solução. Memorando este assinado por quem? Pelo Partido Socialista, que assumiu esse compromisso em
nome do Estado português!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Esqueceram-se!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — A Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro e das Finanças já
aqui esteve para dar o enquadramento do negócio, e podem ter os Srs. Deputados a certeza de que estará
aqui para responder por tudo aquilo que tem a ver com esta operação, porque, se houve todo o escrutínio até
agora, terá de haver todo o escrutínio daqui para a frente.
É por tudo isto que a posição do CDS sobre esta matéria é uma posição muito equilibrada. É fundamental,
de uma vez por todas, acabar com o pesadelo do BPN, e a forma de acabar com o pesadelo do BPN é
executar aquilo com que os senhores se comprometeram em nome do Estado português, ou seja, concretizar
o processo de venda.
Toda a gente compreende que a prioridade seja concretizar esse processo de venda. Concluído esse
processo de venda, todos — mas todos mesmo — os expedientes parlamentares, todos os meios de
escrutínio parlamentar, todas as diligências possíveis, incluindo a que é proposta na iniciativa do PCP, que é
muito positiva, no sentido da realização de uma auditoria, meio que nunca foi usado e que poderá permitir
novas conclusões, merecerão o voto do CDS para que se possa apurar a verdade. E isto por uma razão
simples, porque esta intervenção termina como começou: o nosso compromisso é saber quanto gastou o
Estado português, saber quanto custou aos contribuintes e saber quem foram responsáveis por esta vergonha.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Vamos lá!…
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Deputado João Pinho de Almeida:
Gostava de começar por dizer-lhe que quem governa já não é o Partido Socialista,…
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Estamos em 2012!
O Sr. João Semedo (BE): — … é o PSD e o seu partido, o CDS, e que a sua intervenção mostra muitas
falhas de memória.
O Sr. Deputado vem falar em chicana?! Quer que lhe lembre a chicana política que o CDS se fartou de
fazer sobre o processo do BPN?! Li hoje dezenas de declarações do Dr. Paulo Portas, suas e de vários
Deputados do seu grupo parlamentar! Vem falar em chicana política?! Acha que é chicana política,
concordando com o Deputado Hugo Velosa, os portugueses quererem saber porque é que se paga 767
milhões de euros para se vender um banco pelo qual se vai receber 40 milhões de euros?! O seu problema é
acabar com o pesadelo?!
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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não, não! É sabermos quanto custou!
O Sr. João Semedo (BE): — Ó Sr. Deputado, está muito enganado!… O pesadelo está a começar agora, e
vai continuar por muitos anos!… E vão ser os portugueses, com os seus impostos, a pagar esse tremendo
pesadelo!
Tenho aqui uma declaração do à altura Deputado Paulo Portas que acusava o governo de não estar a
defender o interesse nacional mas, sim, um camarada de partido. Pois, olhe, Sr. Deputado, o CDS, hoje, está
a fazer o mesmo, está a defender o partido da coligação, está a defender a coligação, está a defender o
Governo, mas não está a defender nem o interesse nacional nem o interesse dos portugueses.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não é verdade!
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Deputado Hugo Velosa, há aqui uma situação engraçada. É que eu quase
diria tudo o que o Sr. Deputado disse, mas, veja lá, tiro as conclusões contrárias! Então, o Sr. Deputado não
cora de vergonha quando o seu Governo decide dar 767 milhões de euros a um banco para outro o comprar
por 40 milhões de euros? O Sr. Deputado não cora de vergonha?!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. João Semedo (BE): — Concluo já, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado vem aqui criticar o governo anterior, e bem, porque a comissão de inquérito apareceu
depois da nacionalização. Porque é que não faz agora o mesmo raciocínio?! Porque é que o Sr. Deputado,
agora, quer que só haja comissão de inquérito depois do negócio fechado? Ora, Sr. Deputado, depois do
negócio fechado já não vai em tempo útil!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não vejo qual é a incoerência!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. João Semedo (BE): — Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, não ficamos nada descansados com os compromissos do PSD, porque o que o Sr.
Deputado aqui disse foi que, se a auditoria revelasse aspetos novos, então, talvez o PSD estivesse de acordo
com uma comissão de inquérito. Esse não é o compromisso que o PSD devia aqui fazer.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, para uma
intervenção.
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O PSD e do CDS estiveram
aqui a fazer um exercício de justificação de um sentido de voto recuando a 2008, como se estivéssemos a
discutir 2008, como se, em 2008, não tivesse sido aprovada uma comissão de inquérito, como se, mesmo
após 2008, não tivessem sido aprovadas várias audições com a administração do BPN e com o ministro das
finanças do Partido Socialista na Assembleia da República, já depois da comissão de inquérito.
O PSD tenta justificar-se com supostos fracassos do Partido Socialista para hoje chumbar a constituição da
comissão de inquérito. Não se consegue compreender isto, muito menos quando o CDS é tão preocupado
com o destino que se dá aos dinheiros públicos. Como é que o CDS, o PSD e o Governo conseguem explicar
a qualquer português, como é que conseguem explicar ao País, que este banco, com depósitos de 1800
milhões de euros e com créditos de 2200 milhões de euros, um banco que este Governo já refinanciou com
600 milhões de euros e mais 167 milhões de euros de provisões, depois de o BPN ter sido expurgado de
ativos tóxicos, é vendido por 40 milhões de euros?
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Como nós temos estas dúvidas, como os portugueses têm estas dúvidas, como qualquer pessoa de bom
senso tem estas dúvidas, justifica-se hoje aprovar a constituição de uma comissão de inquérito, tal como foi
aprovada em 2008. O CDS fazia aqui o gáudio de ter proposto a constituição da comissão de inquérito. Propôs
a comissão de inquérito e ela foi viabilizada pelo Partido Socialista. É só isso que voltamos a pedir ao CDS. Há
uma proposta do Bloco de Esquerda e pedimos a quem tem a maioria para viabilizar esta comissão de
inquérito, para que seja esclarecido cabalmente este negócio, que temos dúvidas que não seja ruinoso para o
Estado. Mais do que isso, é quase certo que será.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo para uma intervenção.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Uma primeira nota para registar e
sublinhar a mudança de posição do Partido Socialista relativamente à questão da auditoria às contas do BPN.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Não se trata de uma mudança de opinião relativamente a 2008, trata-se,
sim, de uma mudança de opinião relativamente à posição manifestada há nove meses, em 2011, quando
tinham uma recomendação de realização de uma auditoria ao Tribunal de Contas sobre as contas do BPN e
não a fizeram.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Estão esquecidos! Não se lembram de nada!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Portanto, registamos essa mudança de opinião, favorável à aprovação do
projeto de deliberação proposto pelo PCP, que, aliás, parece recolher a unanimidade desta Casa, e ainda bem
que assim é.
Também no que respeita à comissão de inquérito proposta pelo BE, que, naturalmente, vamos apoiar,
importava também que o PS clarificasse se está ou não de acordo que, dentro das responsabilidades e dos
custos comparativos a apurar, se coloque, de um lado, a alternativa da privatização, do outro lado, a
alternativa da liquidação …
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — É a direita quem governa!
O Sr. Honório Novo (PCP): — … e ainda a alternativa daquilo que representam os custos de uma opção
tomada pelo PS de rejeição de manter o BPN na esfera pública, servindo os interesses das pequenas
empresas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Uma outra nota que eu gostaria de exprimir tem a ver com a posição do
PSD, aqui expressa pelo Sr. Deputado Hugo Velosa.
Sr. Deputado, vamos ser claros: uma coisa é uma auditoria a custos passados e futuros, onde estão
também os custos do seu Governo, seja de 600 milhões de euros de capitalização,…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Já estava decidido antes!
O Sr. Honório Novo (PCP): — … seja de 160 ou 170 milhões de euros de execução de garantias, seja
também do acionamento de uma nova garantia de 1000 milhões de euros prestada aos veículos ainda durante
o ano de 2011. Portanto, uma coisa é uma auditoria, uma coisa completamente diferente, Sr. Deputado Hugo
Velosa, é uma comissão de inquérito.
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A realização de uma comissão de inquérito não tem de estar dependente dos resultados finais de nenhuma
auditoria do Tribunal de Contas.
Sr. Deputado Hugo Velosa, deixe-me lembrar-lhe uma coisa: quando aqui, hoje, o senhor lembrou a
comissão de inquérito de 2008 e de 2009, da qual o senhor e eu, entre outros, fizemos parte ativa, o senhor
sabe muito bem que não houve que esperar por nenhum resultado de qualquer auditoria de qualquer Tribunal
de Contas…
Vozes do PCP: — É verdade! Muito bem!
O Sr. Honório Novo (PCP): — … para que essa comissão, em 2008 e 2009, passasse, avançasse e
fizesse o seu trabalho, na situação concreta.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Termino, Sr. Deputado Hugo Velosa, lançando-lhe a si e ao PSD um desfio: não condicionem qualquer
comissão de inquérito ao resultado de nenhuma auditoria e, logo que termine — se é esse o vosso
entendimento, deplorável na nossa visão — o processo de privatização, o senhor e o CDS devem
comprometer-se aqui em avançar imediatamente com o processo de uma comissão de inquérito, seja qual for
o resultado da auditoria do Tribunal de Contas. Lanço-lhe esse desafio e gostaria de ter uma resposta.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, não vai ter a resposta hoje porque os tempos estão
esgotados. Quer o inquérito parlamentar, quer o projeto de deliberação n.º 5/XII (1.ª) serão votados amanhã,
sexta-feira, às 12 horas.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Tem 1 segundo! É «sim» ou «não»!
O Sr. Presidente (António Filipe): — A sessão de amanhã iniciar-se-á às 10 horas e terá a seguinte ordem
do dia: do ponto 1 consta a discussão conjunta, na generalidade, dos projetos de lei n.os
126/XII (1.ª) —
Eliminação da impossibilidade legal de adoção por casais do mesmo sexo (Primeira alteração à Lei n.º 9/2010,
de 31 de maio, segunda alteração à Lei n.º 7/2001, de 11 de maio, e primeira alteração ao Decreto-Lei n.º
121/2010, de 27 de outubro) (BE), 127/XII (1.ª) — Altera o Código do Registo Civil, tendo em conta a
procriação medicamente assistida, a adoção e o apadrinhamento civil por casais do mesmo sexo (BE) e
178/XII (1.ª) — Alarga as famílias com capacidade de adoção, alterando a Lei n.º 9/2010, de 31 de maio, e a
Lei n.º 7/2001, de 11 de maio (Os Verdes); do ponto 2 consta a apreciação conjunta, na generalidade, dos
projetos de lei n.os
96/XII (1.ª) — Altera o complemento solidário para idosos, tornando mais justa a sua
atribuição (PCP) e 176/XII (1.ª) — Altera o complemento solidário para idosos a fim de garantir que é justo e
acessível aos que necessitam de apoio (BE); do ponto 3 consta a discussão conjunta do projeto de resolução
n.º 65/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo que adote mecanismos internos que façam depender a concessão
de apoios públicos às pessoas coletivas e singulares que promovam atividades no sector das artes do
espetáculo e do audiovisual do recurso a uma percentagem mínima de contratos de trabalho (PS) e do projeto
de lei n.º 78/XII (1.ª) — Condiciona a atribuição de subsídios e apoios públicos nas artes do espetáculo e do
audiovisual ao cumprimento das leis laborais, combatendo a precariedade (BE); do ponto 4 consta a
apreciação da petição n.º 55/XII (1.ª) — Apresentada por Francisco José dos Santos Braz e outros, solicitando
à Assembleia da República a não redução de autarquias e de trabalhadores; do ponto 5 consta a apreciação
conjunta das petições n.os
64/XII (1.ª) — Apresentada por Álvaro Manuel da Silva Nobre e outros, solicitando à
Assembleia da República a tomada de medidas necessárias e legais para que não se extingam freguesias, e
69/XII (1.ª) — Apresentada por Pedro Manuel Valente de Sousa, Presidente da Junta de Freguesia de Leça da
Palmeira, e outros, manifestando-se contra os critérios do Eixo 2 do Documento Verde da Reforma da
Administração Local, que prevê a extinção da freguesia de Leça da Palmeira; do ponto 6 consta a discussão
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da proposta de resolução n.º 11/XII (1.ª) — Aprova, para adesão, uma Emenda ao Acordo relativo ao Fundo
Monetário Internacional respeitante à Reforma do Diretório Executivo, adotada em conformidade com a
Resolução n.º 66-2, de 15 de dezembro de 2010, da Assembleia de Governadores do Fundo Monetário
Internacional.
Srs. Deputados, não sei se teremos tempo, amanhã, de apreciar todas estas matérias até às 12 horas,
mas, se não tivermos, continuaremos após o período de votações.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 55 minutos.
Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:
Partido Social Democrata (PSD)
Adão José Fonseca Silva
Hugo Alexandre Lopes Soares
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Nilza Marília Mouzinho de Sena
Paulo Miguel da Silva Santos
Partido Socialista (PS)
João Barroso Soares
Maria Isabel Coelho Santos
Deputados que faltaram à sessão:
Partido Social Democrata (PSD)
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Maria da Assunção Andrade Esteves
Maria João Machado de Ávila
Partido Socialista (PS)
Fernando Medina Maciel Almeida Correia
José Carlos Correia Mota de Andrade
Luísa Maria Neves Salgueiro
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Maria Helena dos Santos André
Partido Popular (CDS-PP)
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.