O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

Quinta-feira, 15 de março de 2012 I Série — Número 84

XII LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2011-2012)

REUNIÃOPLENÁRIADE14DEMARÇODE 2012

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz Abel Lima Baptista

S U M Á R I O

A Sr.ª Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas

e 5 minutos. Deu-se conta da apresentação da interpelação n.º 3/XII

(1.ª), da proposta de lei n.º 48/XII (1.ª), dos projetos de resolução n.

os 252 a 256/XII (1.ª), do projeto de deliberação

n.º 6/XII (1.ª), dos projetos de lei n.os

196 a 199/XII (1.ª) e da apreciação parlamentar n.º 8/XII (1.ª).

Foi aprovado um parecer da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação autorizando um Deputado do PSD a depor, como testemunha, no âmbito de processo que corre em tribunal.

Em declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes), a propósito da passagem do primeiro aniversário do abalo sísmico ocorrido no Japão, que provocou um tsunami e o desastre nuclear em Fukushima, alertou para os perigos da produção daquele tipo de energia e defendeu a sua não importação por Portugal. No final,

respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Paulo Sá (PCP), Luís Fazenda (BE) e Pedro Delgado Alves (PS).

Em declaração política, o Sr. Deputado Nuno Reis (PSD) contestou declarações do líder do Partido Socialista, nomeadamente por ter associado um número anormal de mortes a razões de natureza social e económica. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados João Semedo (BE), Maria de Belém Roseira (PS), Paula Santos (PCP) e Teresa Caeiro (CDS-PP).

Em declaração política, o Sr. Deputado Rui Jorge Santos (PS) acusou o Governo e o Ministro da Educação e da Ciência de apresentarem valores errados relativamente à requalificação de escolas por parte da empresa Parque Escolar e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Emídio Guerreiro (PSD), Miguel Tiago (PCP), Michael Seufert (CDS-PP) e Ana Drago (BE).

Página 2

I SÉRIE — NÚMERO 84

2

Em declaração política, o Sr. Deputado Agostinho Lopes (PCP), a propósito da demissão do Secretário de Estado da Energia, Henrique Gomes, insurgiu-se contra as políticas energéticas seguidas pelos sucessivos governos, tendo depois respondido a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), Catarina Martins (BE), Hortense Martins (PS) e Nuno Filipe Matias (PSD).

Foi discutido, na generalidade, o projeto de lei n.º 181/XII (1.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro, reforçando o controlo e prevenção das incompatibilidades, impedimentos e conflitos de interesses dos agentes e dirigentes dos Serviços de Informação da República Portuguesa (PS). Usaram da palavra os Srs. Deputados Marcos Perestrello (PS), Teresa Leal Coelho (PSD), António Filipe (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Cecília Honório (BE) e José Luís Ferreira (Os Verdes).

Foi igualmente discutido, na generalidade, o projeto de lei n.º 124/XII (1.ª) — Altera o mecanismo de prova de condição de recursos, permitindo a atualização permanente

dos rendimentos do agregado familiar (PCP), sobre o qual se pronunciaram os Srs. Deputados Jorge Machado (PCP), Mário Ruivo (PS), Joana Barata Lopes (PSD), Mariana Aiveca (BE) e Artur Rêgo (CDS-PP).

A Câmara apreciou, ainda, a petição n.º 62/XII (1.ª) — Apresentada por Victor Alexandre Simão Pinto Ângelo e outros, solicitando que a Assembleia da República defenda a importância das artes e da cultura para além da crise, em conjunto com os projetos de resolução n.

os 220/XII (1.ª) —

Recomenda a adoção de medidas que permitam um efetivo aproveitamento dos fundos comunitários dedicados ao setor cultural (BE) e 253/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a adoção de medidas de combate aos efeitos da crise no setor cultural (PCP). Fizeram intervenções os Srs. Deputados Catarina Martins (BE), Miguel Tiago (PCP), Inês Teotónio Pereira (CDS-PP), Inês de Medeiros (PS) e Maria Conceição Pereira (PSD).

O Sr. Presidente (Guilherme Silva) encerrou a sessão eram 18 horas e 11 minutos.

Página 3

15 DE MARÇO DE 2012

3

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Antes de iniciarmos a ordem do dia, vou pedir ao Sr. Secretário para proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa e

foram admitidas as seguintes iniciativas legislativas: interpelação n.º 3/XII (1.ª) — Centrada nas consequências

do pacto de agressão na vida dos portugueses — a grave crise económica em que se traduz a aplicação do

Memorando de Entendimento (PCP); proposta de lei n.º 48/XII (1.ª) — Aprova as alterações ao Código do IVA,

ao Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo e ao Decreto-Lei n.º 347/85, de 23 de agosto, no âmbito

do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro da Região Autónoma da Madeira, que baixou à 5.ª

Comissão; projetos de resolução n.os

252/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a promoção de incentivos ao

empreendedorismo jovem (PSD), que baixou à 6.ª Comissão, 253/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a

adoção de medidas de combate aos efeitos da crise no setor cultural (PCP), que baixou à 8.ª Comissão,

254/XII (1.ª) — Por um envelhecimento ativo (PSD), que baixou à 10.ª Comissão, 255/XII (1.ª) — Recomenda

ao Governo que, tendo em atenção a extinção de feriados a que se vinculou no Compromisso para o

Crescimento, Competitividade e Emprego, promova o dia 1 de dezembro como um dia de efetiva celebração

de Portugal e da independência (CDS-PP), que baixou à 8.ª Comissão, e 256/XII (1.ª) — Recomenda ao

Governo que instale uma unidade de cuidados paliativos para crianças e adolescentes nas instalações do

Hospital Maria Pia, no Porto (BE), que baixou à 9.ª Comissão; projeto de deliberação n.º 6/XII (1.ª) — Delibera

que o dia 1 de dezembro, apesar de deixar de ser feriado, passe a ser oficialmente celebrado pela Assembleia

da República (CDS-PP), que baixou à 8.ª Comissão; projetos de lei n.os

196/XII (1.ª) — Estabelece a isenção

de pagamento de atestado multiuso de incapacidade emitido por junta médica para efeitos de obtenção de

isenção de pagamento de taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde (BE), que baixou à 9.ª Comissão,

197/XII (1.ª) — Consagra a cativação pública das mais-valias urbanísticas prevenindo a corrupção e o abuso

do poder (BE), que baixou à 11.ª Comissão, 198/XII (1.ª) — Cria um processo excecional de regularização de

dívidas às instituições de crédito no âmbito dos contratos de concessão de crédito à habitação própria e

permanente (BE), que baixou à 5.ª Comissão, e 199/XII (1.ª) — Procede à 2.ª alteração ao Decreto-Lei n.º

28/2005, de 10 de fevereiro, sobre o regime jurídico de acesso às pensões de invalidez e velhice dos

trabalhadores da Empresa Nacional de Urânio (ENU), SA, e estabelece o direito a indemnização em caso de

doença (Os Verdes), que baixou à 10.ª Comissão; e a apreciação parlamentar n.º 8/XII (1.ª) — Decreto-Lei n.º

30/2012, de 9 de fevereiro, que transpõe para a ordem jurídica interna as disposições da Diretiva

2009/71/EURATOM, do Conselho, de 25 de junho de 2009, que estabelece um quadro comunitário para a

segurança nuclear das instalações nucleares, e cria a respetiva autoridade reguladora competente,

estabelecendo o seu âmbito e atribuições (PCP).

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, há ainda um parecer da Comissão para a Ética, a Cidadania e a

Comunicação, autorizando o Sr. Deputado Luís Leite Ramos (PSD) a prestar depoimento, por escrito, como

testemunha, no âmbito do processo n.º 230/09.OBEPNF, a correr no Tribunal Administrativo e Fiscal de

Penafiel.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, o parecer está em votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Após esta votação, iniciamos a ordem do dia, cujo primeiro ponto consiste em declarações políticas,

encontrando-se já inscritos para o efeito os Srs. Deputados Heloísa Apolónia, Rui Santos e Agostinho Lopes.

Tem, pois, a palavra, para uma declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

. e Srs. Deputados: Passou um ano sobre o

fortíssimo abalo sísmico ocorrido no dia 11 de março no Japão, seguido de tsunami, que teve efeitos

Página 4

I SÉRIE — NÚMERO 84

4

devastadores, entre os quais a explosão, a 12 de março, de reatores da central nuclear de Fukushima,

decorrente de incapacidade de resistência do sistema da refrigeração.

Deste drama, relacionado diretamente com o acidente nuclear de Fukushima, resultaram 150 000 pessoas

refugiadas dentro do seu próprio país, para fugir ao perigo radioativo mortífero, e 28 milhões de metros

cúbicos de solo radioativo contaminado diretamente da central. É de 600 000 milhões de dólares o custo

estimado para assumir os efeitos mais diretos do custo total do desastre nuclear.

São dramas e perdas que não se circunscrevem a um momento determinado ou a um espaço confinado.

São dramas e perdas que se prolongam no tempo e no espaço.

Fukushima, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, demonstrou, de uma forma inabalável, que a produção

de energia nuclear não é segura! Aqueles que apregoam a alta segurança do nuclear nos dias que correm,

procuram minimizar o desastre de Fukushima de uma forma profundamente desumana e com uma

insensibilidade atroz. São os mesmos que nunca se referem aos custos exorbitantes de desmantelamento,

nem à produção elevada de CO2, decorrente desse desmantelamento de uma central nuclear. São os mesmos

que querem lançar um debate mas que nunca falam dos resíduos radioativos, que são indestrutíveis e

potenciais contaminadores, durante milhares e milhares de anos. São aqueles que sugerem enriquecer-se

com o negócio nuclear à custa da insegurança e do perigo generalizado de todos.

No mundo existem cerca de 440 reatores nucleares, cada um deles constituindo um perigo para uma

comunidade em concreto, para uma região concreta, para um Estado concreto, para um planeta concreto, que

é o único que temos para nos acolher. É este o mundo que se construiu, importando perceber que, ao nível

energético, se criou uma potencial bomba delapidadora do planeta, descentralizada por vários pontos do

globo, gerando um paradigma de insegurança, que importa que retroceda, a bem da humanidade e de todas

as formas de vida.

Sr.as

e Srs. Deputados, o nuclear não é uma fonte de energia limpa, produz resíduos radioativos altamente

perigosos; o nuclear não é uma indústria barata, se contabilizados todos os seus procedimentos, incluindo o

limite de vida de uma central nuclear e a sua necessidade de desmantelamento, bem como os financiamentos

públicos que influem na sua capacidade de competitividade; o nuclear não é uma fonte de energia renovável, é

dependente do urânio, que é esgotável.

Em Portugal, já se viu alegar algo tão disparatado quanto isto: coabitando nós com os riscos do nuclear

instalado na vizinha Espanha, é, então, pouco acrescentador de perigo a construção de uma central nuclear

por cá. Como se nos fizessem a todos de tolos e nos indicassem que termos um foco de perigo, ou dois, ou

três, ou quatro vem tudo a dar no mesmo. Não, dizem Os Verdes! Portugal, que optou, e muito bem, pelo «não

ao nuclear» nos anos 70, que rejeitou sujeitar-se a riscos tamanhos, deve mover-se pelo alargamento da

segurança e pela isenção de riscos que escolhemos não ter, impelindo igualmente outros a inverter o seu

caminho nuclearista.

É por isso também, Sr.as

e Srs. Deputados, que Os Verdes consideram que se torna absolutamente

relevante uma contestação à importação, por Portugal, de energia nuclear, advenha ela de Espanha, ou de

França, ou de outro lado qualquer.

Essa é uma responsabilidade também nossa e, porque assim é, o Partido Ecologista «Os Verdes» não

poderia deixar de relembrar o recente drama de Fukushima, que ainda hoje tem repercussões profundamente

dramáticas.

A Sr.ª Presidente: — Os Srs. Deputados Paulo Sá, Luís Fazenda e Pedro Delgado Alves inscreveram-se

para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, trouxe hoje

aqui um tema muito importante, o da energia nuclear.

Quero dizer-lhe que desde a primeira Conferência das Nações Unidas para a Aplicação Pacífica da Energia

Atómica, em 1955, a energia nuclear tem sido considerada, por diversos setores, como a energia do futuro.

Contudo, a expansão do uso da energia nuclear processou-se a um ritmo modesto e sempre envolto em

grande controvérsia. Para isso contribuíram vários fatores, entre os quais a segurança dos reatores, que a Sr.ª

Página 5

15 DE MARÇO DE 2012

5

Deputada referiu, a recuperação e reciclagem dos combustíveis irradiados nos reatores e, por fim, o problema

da deposição definitiva dos resíduos radioativos.

O aproveitamento da energia nuclear para fins pacíficos é uma questão muito complexa, que envolve

problemas de ordem técnica e científica e alimenta receios justificados relativamente aos impactos e riscos

ambientais, como o demonstram os acidentes que ocorreram e que a Sr.ª Deputada referiu, nomeadamente o

problema de Fukushima.

As necessidades energéticas da humanidade têm crescido de uma forma exponencial, contudo, a energia

nuclear contribui para o peso global nuns modestos 6,7%. Este número não pode crescer significativamente,

até porque as reservas de combustível nuclear são limitadas e esgotar-se-iam ao fim de umas dezenas de

anos.

Portanto, face ao conhecimento científico e técnico atual, entendemos que a energia nuclear não é, nem

pode ser, uma alternativa aos combustíveis fósseis e que a aposta, na nossa opinião, deve ser feita nas

energias renováveis.

Relativamente a Portugal, entendemos que, no atual quadro nacional, nada justifica que se avance pela via

nuclear, até porque no atual nível de desenvolvimento científico e tecnológico, os graves problemas relativos

ao funcionamento dos reatores e à deposição definitiva dos resíduos nucleares ainda não estão resolvidos.

Entendemos, pois, que no quadro atual não se deve avançar nesta via. No entanto, estamos abertos a

analisar, no futuro, face aos avanços da ciência e da tecnologia para resolver estes problemas referidos na

intervenção da Sr.ª Deputada, a analisar essa possibilidade.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Termino, Sr.ª Presidente, perguntando à Sr.ª Deputada se concorda com esta

perspetiva.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Heloísa Apolónia, trouxe hoje aqui um tema

absolutamente central na discussão política europeia, nos dias de hoje. Ainda ontem, na Alemanha, houve

manifestações de muitos milhares de cidadãos e cidadãs contra a energia nuclear.

A questão há muito que foi ultrapassada. E não interessa se é para fins pacíficos ou para fins militares; é

«não à energia nuclear!», é «nuclear? Não, obrigado!»

Felicito-a por essa intervenção, porque as nossas duas bancadas foram as únicas que, claramente, ao

longo dos últimos anos, aqui, nesta Assembleia, sempre disseram «nuclear? Nunca!».

E, neste momento, é preciso reverter, apesar de uma tragédia. Apesar de uma tragédia, que foi a tragédia

de Fukushima, que, dado o efeito europeu enorme que teve, levou a que, na Alemanha, todos aqueles que

queriam reativar a energia nuclear acabassem por «desarmar» esse programa e recuar totalmente nesses

objetivos. E bem assim, a pouco e pouco, vai-se fazendo um caminho na Europa — hoje em dia, a França, por

exemplo, está mais cercada em relação a essa política energética —, que é definitivamente no sentido de

passar um certificado de óbito àquilo que têm sido as motivações, os objetivos e os negócios da energia

nuclear.

É a racionalidade a vencer sobre o lucro, a racionalidade de quem sabe que não tem condições, sob um

princípio de precaução, para garantir que a energia nuclear não possa ter acidentes, desastres e, sobretudo,

não sabe como eliminar os resíduos radioativos que são depositados, em geral, nos oceanos, por muitas

décadas e décadas, séculos, milénios até, dependendo dos seus componentes.

Sr.ª Deputada, hoje, em Portugal, onde a opção nuclear tem sido rebatida — há partidos que a têm rebatido

do ponto de vista conjuntural, discutindo de legislatura em legislatura —, precisávamos de um pacto bem mais

alargado, um pacto que poderia dizer «em Portugal, nuclear nunca!».

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

Página 6

I SÉRIE — NÚMERO 84

6

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Mas, para isso, têm-nos faltado parceiros. Esperemos que apareçam, hoje,

neste debate.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, começo também por saudar a escolha do tema desta

declaração política. A temática não é central por, no ano passado, termos tido a infelicidade de nos

depararmos com um acidente nuclear, mas por ser mais um capítulo numa história que, infelizmente, não é

marcada pela devida atenção e pela devida consciencialização do problema.

Sr. Deputado Luís Fazenda, devo dizer-lhe que há alguma desatenção da sua parte quanto à recusa da

opção pelo nuclear, a nível desta Câmara, pois o Partido Socialista tem dito muito claramente, na definição de

uma política energética, que não pretende o caminho…

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Nesta Legislatura!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Não é só nesta Legislatura! Nesta e nas anteriores legislaturas, com

toda a clareza — e apesar de podermos não ter um entendimento unânime quanto ao caminho alternativo —,

recusámos a opção do nuclear. E recusámos a opção do nuclear precisamente porque, no contexto português,

ela não faz sentido. Isto, para além das razões que nos levam a recusar a energia nuclear: por força do risco a

que está associada e por força do problema de resíduos que coloca, demonstrando que não é uma energia

limpa. Ou seja, recusamos a energia nuclear, por razões intrínsecas à própria opção do nuclear, mas também

porque, no nosso contexto, essa opção seria errada.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Depende do programa eleitoral do PS!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Não é, ao contrário da mitificação que aparece, uma indústria «de

chave na mão» e uma opção «de chave na mão» — longe disso! Não temos, nem capacidade tecnológica,

nem vantagem em fazer essa opção.

Por isso, num contexto europeu em que a Alemanha, desde 1998, optou por desligar gradualmente as suas

centrais e tem feito um compasso de espera, também por muita pressão exercida por um partido nosso

parceiro na Internacional Socialista que se tem batido por esse desligar das centrais, o que devemos

sublinhar, neste momento, aproveitando este debate, é precisamente a aposta alternativa que temos de fazer.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Que falta de memória!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — E aí, sim, chegamos ao ponto que gostaríamos de sublinhar na

questão que colocamos, que diz respeito à valorização das energias renováveis.

De facto, nos últimos anos, penso que é inegável e indesmentível que o PS sempre valorizou as energias

renováveis. Podemos discordar quanto à execução — e, nesse aspeto, acho que discordaremos —, porque o

Partido Socialista, por exemplo, através do Plano Nacional de Barragens, através da articulação da oferta das

hídricas com as eólicas, tem procurado um caminho distinto. Mas esse caminho distinto assenta na lógica da

recusa da dependência dos combustíveis fósseis e também na construção de um mix energético equilibrado.

E, nesse mix, sempre recusou o nuclear e sempre valorizou as energias renováveis.

Esperamos poder continuar a contar com as bancadas que intervieram neste debate para essa aposta nas

energias renováveis.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

Página 7

15 DE MARÇO DE 2012

7

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sabemos que à nossa esquerda, provavelmente, não teremos essa

dificuldade. E esperamos que haja esse compromisso…

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Ah!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — E se o Sr. Deputado Luís Fazenda me impele, viro-me, sem

dificuldade, para a direita e questiono-me se, à nossa direita, há, ou não, o compromisso em manter essa

aposta clara, reconhecida e valorizada internacionalmente nas energias renováveis como uma aposta de

futuro para a nossa suficiência energética.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, quero agradecer aos Srs. Deputados do PCP, do

Bloco de Esquerda e do Partido Socialista que fizeram os seus comentários e colocaram as suas questões. E

gostava de realçar aqui uma questão: já repararam, Sr.as

e Srs. Deputados, que o PSD e o CDS nunca abrem

a boca nos debates que têm lugar sobre matérias ambientais?

Vozes do CDS-PP: — Oh!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É verdade! A não ser que sejam obrigados por via de uma grelha

imposta na agenda parlamentar. Assim, quando surgem os debates, designadamente ao nível das

declarações políticas, sobre matérias ambientais, o PSD e o CDS não abrem a boca. Ora, julgo que isto se

coaduna muito com a política ambiental que se tem desenvolvido, em Portugal, que é justamente nula —

nada, absolutamente nada!

O Ministério do Ambiente desapareceu do mapa, enrolado naquela amálgama de designações de

«Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território». Alguma coisa teria de cair…

E o Ambiente caiu — em queda profunda!

Relativamente à matéria do nuclear, em concreto, Sr.as

e Srs. Deputados, uma coisa é chegarmos aqui

convictos da nossa razão e dizermos que estamos a falar de uma indústria altamente perigosa, outra coisa, é

o mundo, infelizmente, assistir a esta razão por via de um desastre dramático como aquele que aconteceu em

Fukushima. E não é caso único, porque, se andarmos para trás várias décadas e recuarmos até aos anos 50,

aquilo de que nos apercebemos é que houve centenas de acidentes, uns com maior dimensão e maior

projeção e outros com menor dimensão e menor projeção, em reatores nucleares por todo o mundo. E isto

deve fazer-nos pensar.

É que àqueles que permanentemente alegam, sustentados em absolutamente nada, que o nuclear é

altamente seguro e, a cada ano e a cada década que passa, continuam a afirmar permanentemente a mesma

coisa, quando a realidade o desmente, dizemos que, a cada ano e a cada década que passa, se verifica que,

de facto, o nuclear não é uma indústria segura, é sim uma potencial bomba que se instala nas populações e

nos territórios e que, fruto de muitas questões e de muitos fatores, designadamente de ordem natural, como,

por exemplo, os fatores sísmicos, pode trazer, como Fukushima infelizmente demonstrou, problemas

dramáticos que se prolongam no tempo e no espaço e que percorrem a vida de muitas e muitas pessoas de

uma forma profundamente preocupante.

Relativamente à União Europeia, certo é que, depois de Fukushima, houve alguns países, como a

Alemanha, que procuraram publicamente recuar na sua intenção relativamente à construção de mais reatores

nucleares e que, fundamentalmente, afirmaram também sua a intenção de encerrar alguns reatores nucleares.

Também na Suíça essa intenção foi declarada para o ano de 2034. Na Itália, por exemplo, foi a população —

95%! — que se pronunciou em referendo e que disse claramente «não» à instalação de centrais nucleares

neste país — na Itália, parou o nuclear!

Certo é que, na União Europeia, existem cerca de 60 pedidos para instalação de reatores nucleares. E a

União Europeia, aqui, também deve ter uma palavra e uma coerência relativamente ao financiamento e à

Página 8

I SÉRIE — NÚMERO 84

8

conceção do seu mix energético. Em nossa opinião, a União Europeia tem tido pouca força e pouca

razoabilidade no caminho que deve ser prosseguido, com urgência, ao nível europeu, nesse mix energético e

no financiamento a energias renováveis.

Sr.as

e Srs. Deputados, termino, referindo o seguinte: é verdade, Sr. Deputado Luís Fazenda, o mar, um

dia, pode trazer-nos grandes novidades! É que, no fundo do mar, temos potenciais perigos decorrentes de

depósitos de resíduos radioativos. Julgo que a maior parte da humanidade nem imaginará o que por lá se

pode encontrar. Infelizmente, um dia, poderemos vir a saber. Espero bem que não, Sr.as

e Srs. Deputados!

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Quanto às energias renováveis, Srs. Deputados, essa matéria é

profundamente conhecida por parte de Os Verdes. Consideramos que a solução para Portugal passa

justamente pela poupança energética, pela eficiência energética e por formas de energias renováveis que

sejam, de facto, sustentáveis, coisa que, definitivamente, não acontece com o Plano Nacional de Barragens.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, prosseguimos no âmbito das declarações políticas. O PSD acabou

por se inscrever para intervir e não deferir para amanhã.

Sendo assim, tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Nuno Reis.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em política não pode ou, melhor, não

deve valer tudo.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Daqui a três semanas, assinala-se precisamente um ano do momento em que

o, à data, Ministro de Estado e das Finanças, Prof. Teixeira dos Santos, reconhecia publicamente que Portugal

já não tinha dinheiro para pagar os salários dos funcionários públicos e pensões a partir de Maio, bem como

para fazer face ao serviço da dívida, em Junho.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito mal!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Na sequência dessa tardia constatação, foi acionado um pedido de assistência

financeira internacional e negociado um acordo com o Banco Central Europeu, a Comissão Europeia e o

Fundo Monetário Internacional, com o objetivo de garantir o financiamento do Estado português até final de

2013.

Esse acordo, é sabido, obriga Portugal a implementar um conjunto de medidas, nas mais diversas áreas.

Não vá andar por aí alguém esquecido, citarei algumas do sector da saúde: reduzir o custo com transporte

de doentes em um terço; reduzir a despesa pública com medicamentos para 1,25% do PIB, até final de 2012,

e rever e aumentar as taxas moderadoras; reduzir em dois terços as deduções fiscais relativas a encargos

com a saúde; reduzir a despesa global do SNS com entidades privadas ao nível de meios complementares de

diagnóstico e terapêutica.

Esta semana, o líder do PS veio acusar o Governo de estar «a transferir custos elevadíssimos para as

pessoas e dificultar o seu acesso a cuidados essenciais» de saúde.

Esta política, diz ainda o líder do PS, «vem diminuir a qualidade da prestação do SNS e está a atirar

portugueses para fora dos cuidados de saúde que estão habituados a ter». Diz ainda esperar «que a tragédia

não aconteça».

Para começo de discussão, conviria dar ao líder do Partido Socialista um exemplar do Memorando que o

seu próprio partido negociou e assinou.

Aplausos do PSD.

Página 9

15 DE MARÇO DE 2012

9

Mas conviria também explicar-lhe, agora que está tão preocupado com o transporte de doentes, que as

regras aprovadas e aplicadas para o transporte de doentes datam precisamente do governo de José Sócrates.

Para nós, Grupo Parlamentar do PSD é, de facto, necessário rever este regime de forma mais justa e

equilibrada, por forma a acautelar aqueles que mais precisam.

Deverá perdurar a isenção por insuficiência económica, mas, em tempos de crise e de necessidade, é

preciso ir mais longe e, independentemente da insuficiência económica e de forma não cumulativa, ao

contrário do que acontece com o atual regime instituído pelo Partido Socialista, isentar aqueles que, por

razoes clínicas devidamente justificadas, recorrem a tratamentos continuados e que perduram, como, por

exemplo, os doentes oncológicos.

A coerência que aqui nos permite defender estas posições é a inversa da que falta ao líder do Partido

Socialista para dizer aquilo que disse [Imagem 1].

Aplausos do PSD.

Mais grave do que as anteriores afirmações do líder do Partido Socialista é, no entanto, esta. Diz o líder do

PS que «é preciso não ignorar os especialistas que já vieram dizer que o número anormal de mortes não se

deve apenas à questão dos vírus que são normais nesta altura do ano e que pode estar associado a outras

razões, designadamente de natureza social e económica».

Se esses especialistas, nos quais convenientemente se escuda para dizer algo com a gravidade do que

disse, se dessem ao cuidado de fazer o trabalho de casa saberiam que, nas últimas semanas, assim como em

Portugal, foi reportada mortalidade acima do normal em pessoas com mais de 65 anos, em países como a

Bélgica, Holanda, Suíça, França, Suécia e Finlândia.

Cito dados da insuspeita Euromomo, que conclui ainda que os excessos de mortalidade foram

coincidentes, em termos temporais, com uma vaga de frio e a ocorrência de uma epidemia de gripe.

Poderia ainda recorrer às também insuspeitas informações do Centro Europeu de Prevenção e Controlo de

Doenças, que refere igualmente Portugal, Bélgica, Holanda e Suíça como os países com aumento do número

de óbitos por todas as causas no grupo etário de mais de 65 anos.

Para aqueles que se entretêm a usar informação de forma parcial e conveniente aos interesses do

momento conviria perguntar se terão dito alguma coisa em dezembro de 2008 quando, em Portugal, ocorreu

um excesso de mortalidade no mesmo grupo etário e num período semelhante do ano.

Aplausos do PSD.

O traço comum de dezembro de 2008 e fevereiro de 2012 é o AH3, não a mesma estirpe, mas

precisamente a mesma família de vírus da gripe.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A quem tem responsabilidades políticas, no mínimo, pede-se que

não lance o alarme social com base em análises apressadas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — A necessidade de afirmação no partido não é desculpa para tudo.

Se determinadas atitudes não são de espantar em partidos radicais, é no mínimo surpreendente ver um

partido, cujo governo assinou o Memorando de Entendimento assim se obrigando a um conjunto de medidas

concretas e reformas estruturais, pela voz do seu próprio líder, a assobiar para o lado e a cavalgar a

demagogia mais barata.

Em política não pode ou, melhor, não deve valer tudo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Nuno Reis, os Srs.

Deputados João Semedo, Maria de Belém Roseira, Paula Santos e Teresa Caeiro.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.

Página 10

I SÉRIE — NÚMERO 84

10

O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Reis, parte da sua intervenção foi um

remake do que aqui discutimos na sexta-feira, mas foi muito ligeiro na apresentação dos elementos

estatísticos sobre o período da gripe mais recente e nos anos anteriores.

A questão de fundo é a seguinte: o Governo, durante seis semanas, esteve impávido e sereno, manteve-se

imperturbável, verificando que todas as semanas morriam mais portugueses do que no período homólogo, na

semana homóloga dos últimos 10 anos.

Picos de infeção pela gripe há todos os anos, Sr. Deputado. Não é essa a questão. A questão é a

correlação entre esse pico da epidemia de gripe e o número de mortes.

Sr. Deputado, não vale a pena querer atirar areia para os olhos, pois ninguém que seja sério, que tenha

alguma preparação e queira avaliar a realidade tal como ela se apresenta negará que o número de mortes que

extraordinariamente aconteceu neste período é a combinação do vírus da gripe com o vírus da austeridade,

como aqui referi na sexta-feira. Não tenha qualquer dúvida. Isto tem de se dizer, porque é preciso

responsabilizar o Governo por, durante seis semanas, não ter feito rigorosamente mais.

Para terminar, Sr. Deputado, vou colocar-lhe uma pergunta.

O Sr. Deputado sabe qual foi a evolução do número de portugueses que foram vacinados contra a gripe

este ano? Sabe? É que nem a isso o seu Governo sabe responder, o que demonstra total estado de

indiferença relativamente à evolução da epidemia de gripe este ano!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — O Sr. Deputado Nuno Reis informou a Mesa de que responde conjuntamente aos

vários pedidos de esclarecimento.

Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Reis, quero cumprimentá-lo

por trazer este assunto a discussão aqui, na Assembleia da República.

Como o Sr. Deputado sabe, houve abundantes notícias sobre esta factualidade de picos de mortalidade

muito elevados face a períodos homólogos do ano anterior…

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Dos últimos 10 anos!

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — … e, quando acontece uma situação destas, ela deve ser

analisada e aprofundada, uma vez que, como é evidente, causa preocupações. Sabemos que a saúde é algo

que diz muito a todos, é o nosso bem mais precioso, pelo que é muito importante que, no local nobre onde a

política se discute, estes fenómenos sejam avaliados e analisados.

O Sr. Deputado mostrou-nos uns gráficos que gostaria de ter recebido como informação do Governo,

porque, sendo um assunto muito importante, todos os partidos deveriam dispor dessa informação.

Sr. Deputado, o que nos pode preocupar, para além destas análises, que são temporais, limitadas, de

coincidência de ocorrência de um determinado fenómeno de morbilidade, é analisar mais globalmente, no

contexto de grande crise económica e social em que estamos hoje em dia integrados, o impacto dessa crise

económica e social na saúde. Essa é uma discussão mais vasta, é uma discussão política muito importante.

Como o Sr. Deputado sabe, porque já está identificado há muitos e muitos anos, o estado de saúde de uma

determinada população não depende apenas do funcionamento do sistema de saúde em si, mas de todo um

conjunto de condições económicas e sociais, que são as chamadas «determinantes da saúde». Isso hoje está

demonstrado. Para que se faça política adequadamente e para que se desenhe uma intervenção de política de

saúde é muito importante conhecer esse fenómeno e o seu impacto, o que só vai ser conseguido, no que se

refere ao período em presença, daqui a algum tempo.

Sr. Deputado, relativamente às visitas no contexto da «semana da saúde» que o Partido Socialista

entendeu desenvolver, eu própria tive oportunidade de estar ontem no Nordeste Transmontano e de reunir

quer com as pessoas quer com os profissionais de saúde.

Página 11

15 DE MARÇO DE 2012

11

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Como estava a dizer, considero absolutamente essencial este conhecimento de como os serviços

interpretam as regras que existem e as orientações que são dadas para que se descodifique tudo aquilo que,

na interpretação dessas regras, se reverte em prejuízo do acesso dos utentes.

Eu própria já tive ocasião de falar com o Sr. Ministro da Saúde, que está preocupado, como eu estou, com

que as regras de acesso aos transportes sirvam as necessidades dos doentes em função das suas situações

específicas e da morbilidade.

Tenho a certeza de que, neste trabalho sério de oposição e de articulação com quem tem de definir a

política e dar as instruções aos serviços, os portugueses sairão beneficiados.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Reis, terminou a sua intervenção

dizendo, salvo erro — poderão não ter sido exatamente estas as palavras usadas —, que na política não vale

tudo.

Pois é, Sr. Deputado, na política e na saúde não vale tudo, mas também não podem fingir que não há

problemas, não podem fingir que o acesso aos cuidados de saúde não está hoje cada vez mais dificultado e

têm de ser responsabilizados pelas consequências das políticas que estão a implementar no nosso País.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — O Sr. Deputado, na sua intervenção, referiu algumas. A palavra de ordem é

reduzir: reduz-se nos transportes de doentes, reduz-se nos medicamentos, reduz-se nas isenções fiscais. Há,

no entanto, um aumento: aumentam-se as taxas moderadoras.

O Sr. Deputado acha que estas medidas não vão ter implicações na saúde dos portugueses?! Considera

que restringir o acesso aos cuidados de saúde e encerrar serviços de saúde não tem consequências nos

cuidados de saúde das populações?!

Tem, Sr. Deputado, tem muitas consequências. Infelizmente, estamos já a ver algumas evidências dessas

mesmas consequências, pelas quais o seu Governo vai ser responsabilizado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Deputado, quero registar, com viva indignação, os problemas com a

assistência médica que rodearam a morte de uma senhora por acidente cardiovascular no Hospital de Chaves,

Centro Hospitalar de Trás-os-Montes, que se deveram — lá está! — à pressão da redução das despesas

neste hospital, à desativação dos serviços de cardiologia em dezembro sem que fossem tomadas as

necessárias medidas para garantir atempadamente o tratamento dos doentes e os cuidados de saúde em

situação de urgência.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Na verdade, importa aqui relembrar a aprovação, por unanimidade, na

Assembleia da República, de um projeto de resolução contra o desmantelamento do Hospital de Chaves e

pelo reforço dos seus serviços. Os próprios autarcas do PSD no concelho de Chaves vieram colocar em causa

esta mesma situação e querem que se apurem responsabilidades nesta matéria.

Sr. Deputado, reduzir despesas, concentrar e encerrar serviços, como está a ser feito e como hoje, na

Comissão de Saúde, foi mais uma vez evidenciado, ao dizer-se que isso vai ser implementado em todo o País,

Página 12

I SÉRIE — NÚMERO 84

12

o que foi assumido pelo PSD e pelo CDS, vai ter consequências na saúde das pessoas e, infelizmente,

também no tempo e na esperança média de vida da nossa população.

Assumam as vossas responsabilidades! PSD e CDS, de facto, não podem continuar a passar impunes e

têm de ser responsabilizados pelas políticas que estão a adotar em matéria de saúde, desprotegendo milhares

de cidadãos no nosso País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Para o PSD, quem não pode pagar morre!

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Reis, em nome do CDS, quero

agradecer-lhe vivamente ter trazido este tema para uma declaração política, porque, de facto, não vale tudo.

Ouvimos, recentemente, o Secretário-Geral do Partido Socialista, o maior partido da oposição, um partido

com especiais responsabilidades, dizer que a saúde não é uma brincadeira.

Ora, Sr. Deputado Nuno Reis, o que nos parece uma brincadeira de muito mau gosto é fazer política

partidária assente em falsidades e na deturpação de indicadores,…

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — … instigando o alarme social com o bem mais precioso do ser humano,

que é a sua vida e a sua saúde, e, sobretudo, fazendo insinuações tenebrosas — e esta crítica estende-se à

esquerda radical e à extrema-esquerda — de que há qualquer tipo de associação entre as políticas do

Governo e um acréscimo de mortes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Há, há!

Protestos do PCP e do BE.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Esse tipo de insinuações tenebrosas é inaceitável e têm de ser

denunciadas.

Vozes do CDS-PP e do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Deputado, no que se refere à gripe, já ficou aqui bem patente que o

aumento do número de óbitos não é uma realidade exclusiva em Portugal. É uma realidade que se prende

com a seca, com um clima específico, designadamente o frio nalgumas zonas da Europa, e esta evolução da

estirpe do vírus da gripe, o AH3, incide especialmente sobre pessoas idosas. No entanto, não é só sobre os

idosos portugueses. É também sobre os idosos suecos, sobre os idosos finlandeses, sobre os idosos

holandeses, sobre os idosos franceses,... Será que a política de saúde portuguesa também já atinge estes

países?!

Fazer este tipo de associações tenebrosas é de uma deslealdade e de uma falta de seriedade política que

não podemos tolerar!

De facto, verificou-se um pico, um aumento de óbitos, mas, se forem registar o acesso às consultas de

especialidade e sobretudo às urgências, ao contrário do que muitos insinuam, designadamente o Partido

Socialista que tem especiais responsabilidades, na altura em que foi necessário esse acesso, ele foi em grau

equivalente ao dos anos anteriores.

Há ainda outra questão que gostaria de referir e que também assenta em grandes falsidades. Não quero

nem consigo acreditar que estas críticas venham do Partido Socialista. Se não estou enganada, foi Óscar

Manuel de Oliveira Gaspar, secretário de Estado do governo socialista anterior, que assinou o Despacho n.º

19264/2010, estabelecendo o atual regime de transporte dos doentes não urgentes e, agora, indignados com

Página 13

15 DE MARÇO DE 2012

13

as iniquidades do regime em vigor, que foi aquele que deixaram, os senhores vêm oferecer-se para fazer uma

articulação com o Governo! Muito obrigada, mas já não é preciso, porque tem havido reuniões muito profícuas

entre o Ministério da Saúde e a Liga dos Bombeiros Portugueses exatamente no sentido de retirar a iniquidade

deste despacho, de adaptar a realidade do transporte dos doentes não urgentes à lei. Por exemplo, nem todos

os casos necessitam de um transporte em ambulância, nalguns basta o transporte em viaturas ligeiras, até

porque — e isto é muito importante — é preciso pagar as dívidas de 15 milhões de euros que os senhores

deixaram!

Aplausos do CDS-PP.

A S.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Reis.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Semedo, gostaria de começar por lhe dizer

que separo completamente aquilo que são posturas de natureza pública e de natureza político-partidária

daquilo que são opiniões e pensamentos próprios, sobretudo se forem expressos à porta fechada.

V. Ex.ª, com a experiência que tem enquanto administrador hospitalar e também enquanto médico, sabe

perfeitamente que não pode proferir as afirmações que proferiu e sabe perfeitamente que a sua intervenção foi

ligeira.

Aplausos do PSD.

Devo dizer-lhe também que, por muito que V. Ex.ª se tenha esforçado, quer no debate de sexta-feira, quer

no de hoje, não conseguiu estabelecer qualquer nexo de causalidade entre as medidas de austeridade,

nomeadamente entre o aumento das taxas moderadoras, como alguns tentaram fazer, e o aumento do

número de óbitos em pessoas com mais de 65 anos.

Fazer uma análise ao fim de 10 dias, como ouvi numa rádio, ou ao fim de 2 meses passados sobre a

instauração de taxas moderadoras, seria, quanto muito, uma análise parcial e, portanto, nenhum nexo de

causalidade poderia ter sido estabelecido.

Sr. ª Deputada Paula Santos, a quem aproveito, tal como ao Deputado João Semedo, para agradecer a

questão colocada, devo dizer que não fico surpreendido pelas posições expressas pelo Partido Comunista

Português nem dou a mesma relevância política às graves afirmações que o líder do seu partido proferiu no

passado domingo que dou às afirmações proferidas por responsáveis políticos do Partido Socialista enquanto

maior partido da oposição e partido que aspira a ser governo.

Independentemente de não lhes dar a mesma relevância política, faço uma pergunta retórica, que já foi

colocada na passada sexta-feira aquando do debate com o meu colega que interveio em nome do Grupo

Parlamentar do PSD: o que defende, afinal, o Partido Comunista Português para o Serviço Nacional de

Saúde? É que ficamos sem perceber o que defende.

Gostava, aliás, de lhe colocar outra questão: o PCP defende a liberdade de acesso? Defende que não deve

haver restrições no acesso com base no local de residência, ou, pelo contrário, que os cuidados de saúde

apenas podem ser prestados a quem reside de forma permanente no local onde funciona o serviço de saúde?

A questão que lhe coloco, naturalmente de forma retórica, tem a ver com algo chamado «propiska», o

chamado registo do local de residência, que era obrigatório na ex-União Soviética para as pessoas se

deslocarem pelo país e poderem ter acesso a vagas de emprego, para poderem casar-se e para receberem

atendimento médico. Só com base nessa propiska é que podiam ter atendimento médico, viajar no País e ter

acesso a uma unidade de saúde fora do local de residência.

Protestos do PCP.

Sr.ª Deputada, ficamos sem perceber se, hoje, o Partido Comunista Português continua a defender as

mesmas ideias que então foram instauradas por Estaline!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Página 14

I SÉRIE — NÚMERO 84

14

Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira, saúdo-a pela intervenção que fez, que foi ponderada, inteligente,

cuidada, como é de resto seu timbre, e confesso que, depois de ter feito as afirmações que fiz, e que reitero, a

propósito das declarações proferidas pelo líder do seu partido, não ficaria espantado se V. Ex.ª tivesse

atacado a forma como intervim aqui.

De qualquer das formas, V. Exª fez uma intervenção de fundo, explicativa, mas com uma pequena falha: a

pessoa a quem deveria ter dirigido essa intervenção não se encontra hoje aqui sentada porque está — com

toda a legitimidade! — a fazer o roteiro da saúde.

A explicação relativa às análises que são feitas deveria ter sido dada ao Sr. Deputado e Secretário-Geral

do Partido Socialista, António José Seguro.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Porém, separo completamente a parte do todo e registo que todas as

declarações da Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira neste roteiro para a saúde foram responsáveis, como,

repito, é seu timbre. Infelizmente, o líder do seu partido não o fez da mesma forma.

A Sr.ª Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado, pois já ultrapassou os 5 minutos de que dispunha.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Termino, perguntando à Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira se, ao

acompanhar este roteiro para a saúde, se revê nas declarações de um líder distrital do Partido Socialista que

ainda ontem dizia: «Parece que o Governo tem o objetivo oculto de provocar a morte de pessoas em idade

avançada para não pagar reformas».

Esta frase foi dita à beira do líder do seu partido e julgo que também à sua beira.

Espero que não se reveja na gravidade dessas afirmações.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Peço aos Srs. Deputados que observem melhor os tempos estipulados no Regimento

para as intervenções, porque a equidade obriga-me, depois, a um entorse completo em relação aos tempos

para debate, o que não é nada bom para a organização dos trabalhos.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Jorge Santos.

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Na passada semana, Nuno Crato

veio ao Parlamento semear, deliberadamente ou por inépcia, a confusão e a calúnia. Numa audição à

Comissão de Educação, o Ministro acusava a Parque Escolar de ter deixado o custo unitário das escolas

intervencionadas subir de 2 milhões de euros para 15 milhões.

Já sabíamos que a direita convivia mal com a requalificação da escola pública, com o facto de as escolas

secundárias requalificadas serem espaços de excelência, espaços reconhecidos por todos os que nela

ensinam e aprendem, e pela comunidade envolvente, e reconhecidos também por entidades internacionais

como a OCDE.

Aplausos do PS.

Deste desconforto da direita já sabíamos. O que não sabíamos é que o Governo era capaz de recorrer à

desonestidade política ao nível a que o ministro Nuno Crato chegou na semana passada,…

Aplausos do PS.

… e a partir do qual foi montada a campanha que resultou na demissão do Conselho de Administração da

Parque Escolar.

Página 15

15 DE MARÇO DE 2012

15

A questão essencial é que o Ministro da Educação comparou valores que não fazem nenhum sentido

serem comparados.

O orçamento inicial consistiu na previsão de um conjunto de pequenas reparações ou substituições de

materiais e equipamentos, obras executadas até aí pelas direções regionais de educação. Aquando do

lançamento deste programa, era essa a base de trabalho existente, que se sabia incompleta e provisória.

O valor de 2 milhões de euros por escola serviu para avaliar os valores subsequentes e para mostrar o

caminho percorrido pela Parque Escolar no real mapeamento do nível de degradação das escolas públicas

que a sua criação pretendia resolver.

Curiosamente, os valores citados pelo Ministro não estão no relatório da Inspeção-Geral de Finanças, que

Nuno Crato apenas disponibilizou na sexta-feira à tarde ao Parlamento, depois de sanear politicamente o

Conselho de Administração da Parque Escolar.

É, efetivamente, de saneamento politico que se trata, porque o relatório em caso algum justifica a decisão

de Nuno Crato. Na verdade, a insinuação que Nuno Crato fez sobre a gestão da Parque Escolar tem um

nome: calúnia politica.

Aplausos do PS.

Curiosamente, ao contrário do Ministro, a Inspeção-Geral fez uma avaliação justa das qualidades,

constrangimentos e problemas do programa e do trabalho do Conselho de Administração.

Ao contrário do Ministro, o relatório reconhece que «não foram identificadas ilegalidades na adjudicação

das empreitadas e na aquisição de bens e serviços abrangidos pela amostra selecionada».

Enquanto alguns vieram a público afirmar que isto era um caso de polícia, seguramente sem terem a mais

leve ideia do que vem escrito no relatório, o Ministro remeteu-se ao silêncio.

Ou seja, à calúnia somou o silêncio perante a calúnia dos outros. Isto não é um caso de polícia, é um caso

de política: a política, do «bate e foge».

Aplausos do PS.

O relatório contextualiza a evolução do programa de modernização das escolas. Assim, é verdade que o

investimento médio real por escola em 2011 era 66% superior ao investimento médio estimado para 2008.

Mas só a demagogia pode descontextualizar estes valores.

O que explica esta diferença? Diz-se no relatório, Sr.as

e Srs. Deputados, relatório que todos podem e

devem ler, que o aumento da área de construção por escola em 61% é em larga medida explicada pelo

aumento estimado de alunos em 52%.

E porque aumentou a área de construção e aumentaram os alunos? Pela concretização de medidas de

política educativa avançadas depois de apresentado o Plano de Negócios de 2008 da Parque Escolar e das

alterações significativas do quadro legal e regulamentar de várias atividades no âmbito ambiental, energético e

de segurança legisladas em 2006 e implementadas em 2007.

Na realidade, se contabilizarmos os alunos que estas escolas devem acolher, o investimento médio real por

aluno é apenas 9,4% superior ao investimento médio estimado em 2008.

O investimento médio real por metro quadrado de construção foi apenas 3,1% superior ao investimento

estimado em 2008. Se ajustarmos à inflação, que foi de 4,1% entre 2008 e 2011, verificamos que o metro

quadrado construído ficou mais barato em 2011 do que o previsto em 2008. Repito, Sr.as

e Srs. Deputados:

ficou mais barato.

Aliás, o relatório cita ainda um estudo internacional que, na análise de 12 países, demonstra que o custo de

construção por metro quadrado, em Portugal, é inferior ao do dos países europeus estudados, sendo que é

também o País onde a área disponível por aluno é a maior dos países da amostra. Por outras palavras, temos

escolas mais baratas e mais amplas.

Estamos, pois, perante um programa que, ao longo do tempo, se foi tornando mais ambicioso, exigente e

de difícil execução, e que, por isso, sofreu uma mudança qualitativa, seja para responder a medidas de política

educativa, seja para participar no combate à crise económica de 2009.

Página 16

I SÉRIE — NÚMERO 84

16

Aplausos do PS.

Entre os anos de 1990 e 2006, o Ministério da Educação dispôs de cerca de 2,3 milhões de euros, a preços

correntes, nos seus orçamentos, em sede de PIDDAC. Este valor foi, ao longo de mais de década e meia,

gasto na construção, na manutenção e conservação dos edifícios, na construção de bibliotecas e de pavilhões

desportivos. Independentemente do mérito destas ações, a verdade é que, em meados da década passada,

era generalizada a degradação de muitas escolas secundárias, e não havia nada que se assemelhasse a uma

escola requalificada. Se nada tivesse sido feito, estaríamos hoje na mesma: de pequena obra em pequena

obra, nenhuma escola secundária estaria modernizada.

Assim, este programa permitiu a realização de um investimento de dimensão semelhante, que resultou em

escolas modernas e funcionais, que são o orgulho para todos os que nelas ensinam e aprendem.

Aplausos do PS.

Mais de duas centenas de escolas recuperadas, com mais alunos e mais oferta formativa numa rede

escolar mais racional e eficiente para garantir a progressiva universalização da escolaridade obrigatória até

aos 18 anos.

Para o futuro, Sr.as

e Srs. Deputados, é isto que fica, por muito que incomode o PSD e o CDS, por muito

que incomode os matemáticos da pequena política.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Emídio Guerreiro, do

PSD, Miguel Tiago, do PCP, Michael Seufert, do CDS-PP, e Ana Drago, do BE.

Entretanto, o Sr. Deputado Rui Jorge Santos informou a Mesa que pretende responder individualmente

após cada pedido de esclarecimento.

Para pedir esclarecimentos, dou a palavra ao Sr. Deputado Emídio Guerreiro.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Deputado Rui Santos,

começo por lhe dizer o seguinte: temos muito orgulho no nosso passado no que diz respeito à construção de

escolas.

Quero recordar ao Sr. Deputado e à bancada do Partido Socialista que nós, entre 1985 e 1995,

construímos mais de 800 escolas e não precisámos de uma Parque Escolar nem precisámos de nos endividar.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Queria também dizer-lhe, Sr. Deputado, que desonestidade política foi aquilo que o senhor fez.

Vozes do PSD: — Exatamente!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — O Sr. Deputado veio aqui, num exercício demagógico, procurar

branquear o que está à vista de todos. E o que está à vista de todos é que houve um programa de

modernização das escolas que foi apresentado há muito poucos anos que nos dizia o seguinte: vamos alocar

2400 milhões de euros para recuperar 332 escolas. Ora, é isto que temos de avaliar, Sr. Deputado! E, no final

do processo, o que temos? Temos o seguinte: gastou-se muito mais dinheiro do que este e existem ainda 151

escolas onde não se mexeu uma palha, e infelizmente!

Protestos do Deputado do PS João Galamba.

É isto que está em cima da mesa e é isto que queremos questionar.

Página 17

15 DE MARÇO DE 2012

17

Sr. Deputado, se a Parque Escolar não cumpriu o seu trabalho foi por uma razão muito simples: porque o

Partido Socialista, que estava no poder, o que quis foi mostrar aquelas famosas tendas para dizer que estava

a fazer obra e a inaugurar!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Acho muito importante que a Parque Escolar venha prestar contas ao

Parlamento, porque a seguir vem o anterior Governo prestar contas a este Parlamento pelos 1000 milhões de

euros de dívida que existem e pela obra que devia ter sido feita e que não foi!

Gostaria que o Sr. Deputado me esclarecesse o porquê de a Parque Escolar não ter alertado a tutela para

o crescimento desmesurado dos orçamentos. Por que razão não houve um teto para a obra? Por que razão

não houve qualquer cuidado nos projetos?

Protestos do PS.

Talvez o Sr. Deputado saiba explicar à Câmara por que razão, por exemplo, numa escola a sala de

estudantes tenha como cobertura um tronco cónico excêntrico todo ele feito em vidro importado da Holanda!?

E isto numa escola que é localizada na Marinha Grande, na capital do vidro português!! E talvez saiba explicar

por que é que mais de metade das torneiras aplicadas foi importada!?

Protestos do PS.

É sobre estas matérias que é preciso responder!

Por que razão foram utilizados granitos róseos? Por que razão a política de manutenção não foi pensada?

Porque os senhores, com a ânsia, com a fome de quererem inaugurar, o que quiseram foi deixar encargos

brutais para o futuro que os nossos filhos e os nossos netos vão ter de pagar. Com uma nuance: aquele

dinheiro que devia servir para todas as escolas, não chegou a ser utilizado em 151 escolas e, neste momento

tão difícil para o País, vai ser muito complicado fazer o que os senhores deviam ter feito.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Por isso, Sr. Deputado, desonestidade intelectual foi a sua!

Lamento profundamente que o Partido Socialista não seja capaz de assumir as suas responsabilidades

nesta matéria e justificar este desmame de milhões e milhões de euros que é preciso pagar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Jorge Santos.

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, factos são factos! E

nenhuma alusão pode escamotear que o Sr. Ministro veio aqui mentir, pois aquilo que disse não se comprova

com os relatórios que nos mostrou.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que vão longe os tempos em que o PSD, pela voz da sua líder, Dr.ª

Manuela Ferreira Leite, mesmo em campanha eleitoral para as eleições legislativas de 2009, elogiava o

programa de modernização das escolas do ensino secundário como um exemplo de investimento inteligente

de requalificação nas infraestruturas locais. Ofereço-lhe a entrevista onde a Dr.ª Manuela Ferreira Leite diz

Página 18

I SÉRIE — NÚMERO 84

18

isto! Longe vão esses tempos!… Nós percebemos que, hoje, o PSD é muito mais à direita, é muito menos

social-democrata do que na altura!

Protestos do PSD.

Ofereço-lhe, pois, esta entrevista, pois pode ser que sirva para alguma coisa.

Mas vamos a factos.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Diga, então!

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Disse que havia abóbadas, e coisas do género… Posso ler-lhe o

relatório…

Vozes do PSD: — Leia, leia!

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — … que diz que o Conselho de Administração — e passo a citar algumas

passagens — adotou boas práticas de gestão, garantiu o controlo das derrapagens dentro dos limites legais

previstos no Código de Contratação Pública, fixou objetivos de controlo de custos das empreitadas mais

exigentes do que os previstos no Código de Contratação Pública…

Estes são factos! O resto são invenções!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Rui Santos, em primeiro lugar, o Grupo

Parlamentar do PCP gostava de lhe colocar a seguinte questão: por que é que chegámos à situação que

chegámos? Por que é que o parque escolar atingiu o grau de deterioração que atingiu? E têm ou não o PS, o

PSD e o CDS responsabilidades na incúria de terem mantido um sistema de subfinanciamento para a

modernização do parque escolar?

Em segundo lugar, Sr. Deputado, não deveria ter sido o Estado a assegurar a modernização do parque

escolar? É que se o Partido Socialista tivesse assumido como função do Estado e do Ministério da Educação

—como, aliás, a lei já permitia — esta tarefa de modernização das escolas, hoje não estaríamos a ter esta

discussão e não estaríamos sequer a ponderar os milhões que foram deitados à rua em obras, muitas vezes,

irrazoáveis.

A Sr.ª Gabriela Canavilhas (PS): — Deitados à rua?!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Deputado, deveria ou não o seu partido, quando teve essa possibilidade,

ter atribuído diretamente ao Governo e ao Ministério da Educação, como, aliás, propôs o PCP, esta tarefa?

Não. Entendeu empresarializá-la, dar um passinho para a privatização do parque escolar! E o resultado está à

vista!

E este Governo, do PSD e CDS, escolheu o pior dos caminhos: cancelar as obras, mas manter a empresa.

Veja-se bem: a empresa, que cometeu todos os graves atos que agora o PSD e o CDS indicam, mantem-se;

as obras, que é o que faz falta, são o que se cancela!!

As escolas continuarão a deteriorar-se, as escolas com obra a meio continuarão divididas entre barracões

e edifícios novos e edifícios antigos e as escolas já requalificadas, entretanto, continuam sem dinheiro para

fazer frente ao agravamento dos custos com a eletricidade, com a água e com a manutenção dos espaços que

estas obras vieram significar.

Página 19

15 DE MARÇO DE 2012

19

Portanto, Sr. Deputado do Partido Socialista, já entende o PS por que é que o PCP sempre propôs a

responsabilização direta do Governo pelo parque escolar, ao invés da sua empresarialização, ao invés da

criação de nichos de negócios, de atribuição duvidosa de projetos de arquitetura?! Já entende o PS por que é

que esta é uma tarefa do Estado e não uma tarefa de uma empresa nomeada e a ganhar ordenados

principescos?!

Sr. Deputado do Partido Socialista, uma última nota. Como sabe, há mais de dois anos, o PCP requereu

uma auditoria do Tribunal de Contas, que esperamos venha a clarificar todos os aspetos mais difusos sobre a

ação e intervenção da Parque Escolar, mas, curiosamente, Sr. Deputado, o relatório desta auditoria do

Tribunal de Contas, ainda hoje, dois anos volvidos sobre o requerimento apresentado pelo PCP, não é

conhecido.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Esperemos, então, que esse relatório da auditoria venha trazer à luz tudo o

que se passou na Parque Escolar e a lucidez necessária para que PS, PSD ou CDS reconheçam que quem

tem de fazer as obras é o Estado e não nenhuma empresa paga pelo dinheiro dos contribuintes.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Jorge Santos.

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, decididamente o PCP ainda

não percebeu qual é a diferença entre ter o PS no governo ou ter esta maioria de direita no governo.

Aplausos do PS.

O PCP, por obsessão, por obsessão compulsiva contra a ação do anterior governo, tem — vá-se lá saber

porquê!? — uma «pedra no sapato» contra a Parque Escolar. Será que esta sua má vontade tem a ver com o

facto de esta entidade ter permitido e agilizado a criação de milhares de postos de trabalho?

Protestos do Deputado do PCP Miguel Tiago.

Será que esta sua má vontade tem a ver com o facto de a Parque Escolar ter permitido que se fizessem

investimentos descentralizados e de proximidade, ajudando e criando obras e empregos nas médias e

pequenas empresas? Será que, agora que a escola pública foi requalificada como nunca antes se tinha visto,

o PCP, que sempre defendeu e sempre disse que defendeu a requalificação da escola pública, é contra? Será

por tudo isso?!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, a Parque Escolar, nomeadamente este programa, é financiada por verbas do QREN e do

BEI.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Então, gasta-se!

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — O Estado não tem empresas de construção civil. Então, o Estado tratou

de encontrar quem sabia de construção civil para que se pudessem fazer as obras e requalificar os espaços.

Você sabe disso! Você sabe disso!

O PCP continua a preferir a direita no governo do que o PS no governo.

Aplausos do PS.

Página 20

I SÉRIE — NÚMERO 84

20

Protestos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Rui Santos, vejo o Partido Socialista

muito emocionado e muito exaltado com esta matéria e temo bem que por isso não tenha tido tempo de ouvir

o que o Ministro da Educação disse na Comissão de Educação.

Fui consultar as gravações e verifiquei que aquilo que o Ministro da Educação disse foi, e cito: «É

extraordinariamente importante, porque se nós olharmos para a evolução do que se passou desde a

apresentação do programa, em 2007, em que o custo unitário das escolas, que eram 332, era de 2,82 milhões

de euros até atualmente, em que o custo unitário é de 15,45 milhões de euros, vemos que houve uma subida

de custos muito grande e que houve um grande endividamento da Parque Escolar» — isto foi aos 49 minutos

de audição.

Às 2 horas e 53 minutos, da tarde, V. Ex.ª, Sr. Deputado, disse: «Tanto quanto sabemos, quer pela

Inspeção-Geral das Finanças quer pelo Tribunal de Contas…», como se já soubéssemos alguma coisa —

mistério da fé, mas enfim… — «… é que teria derrapado entre 15 a 20%.»

Entre estas duas declarações, Sr.ª Presidente, apenas uma é verdadeira! Verdade é que, no Relatório de

Contas de 2007 da Parque Escolar, na página 10, em Estruturação da execução do programa, é a Parque

Escolar que refere um custo unitário de cerca de 3 milhões de euros por escola para a requalificação do

parque escolar num programa total de 166 escolas. Sr. Deputado, isto é insofismável!

O Sr. Deputado diz que, no relatório e nos planeamentos financeiros, nada disto aparece. É evidente. Não

aparece porque o modus operandi do governo do Partido Socialista era inventar números para apresentar ao

público — foi assim no TGV, no aeroporto de Beja… — e depois, quando as obras aparecem feitas, afinal, os

números não batem certo: há derrapagens, não há passageiros em Beja, não há nada que sustente o TGV…!

Os senhores fazem uma leitura do relatório ignorando o que nele se diz. O relatório refere, nomeadamente:

escolas desnecessariamente grandes, o que terá custos a longo prazo; espaços que podem ficar

desatualizados a médio e curto prazo; madeiras nobres; pedras naturais nobres; bibliotecas e salas

polivalentes com áreas excessivas; pavimentos exteriores em deck, etc.

Protestos do PS.

É o relatório que diz «etc.», não sou eu!

Continuando: deficiências construtivas; potências elétricas demasiado elevadas; iluminação decorativa em

excesso; gastos com pessoal na Parque Escolar que derraparam 96% em 2010; Direção de Comunicação e

Imagem — acrescento eu, propaganda, porque eram os senhores e os seus ministros que estavam a usufruir

disso! — de 60 000 €/ano; 719 000 € em advogados sem consulta de mercado.

E termina o sumário executivo de uma forma extraordinária, Sr. Deputado: as necessidades de

financiamento em 2011 e em 2012 estima-se serem essencialmente feitas com recurso ao endividamento

bancário. São 827 milhões de euros, Sr. Deputado, cuja fatura vai ser paga por nós e pelas gerações que aí

vêm!

A Sr.ª Presidente. — Queira terminar, Sr. Deputado!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Termino, Sr.ª Presidente.

Porém, nada disto configura, em princípio, um caso de polícia. Nós nunca dissemos que é um caso de

polícia, mas tem um nome: chama-se socialismo. Gastar mais do que aquilo que se deve e para além do que

existe foi o que os senhores fizeram ao País durante anos a mais, Sr. Deputado!!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr.ª Presidente, a pergunta que deixo ao Sr. Deputado Rui Jorge Santos é esta: devia ou não haver, como

refere o relatório, um teto máximo de custos e de gastos por projeto, a bem da situação do erário público? Diz

Página 21

15 DE MARÇO DE 2012

21

o Sr. Deputado — e termino mesmo, Sr.ª Presidente — que ficam muitas escolas para vermos. Pois ficam!

Mas também ficam muitas escolas por requalificar e fica muita dívida para pagar, e para isso estamos cá nós.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Jorge Santos.

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, o que o Sr. Ministro disse

não corresponde ao que está no relatório do Instituto de Gestão Financeira.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Portanto, não adianta auscultar a audição do Sr. Ministro, porque aquilo

que ele disse não se comprova com os fatos. E os fatos são os que estão no relatório da Inspeção-Geral de

Finanças.

Aplausos do PS.

Quero também dizer-lhe que aquilo que você diz, em regra, não corresponde à verdade. Ainda na passada

quinta-feira, o Sr. Deputado trouxe aqui um suposto comunicado da Parque Escolar, onde dizia que a Parque

Escolar admitia um desvio de 375%, e depois entreguei-lhe o comunicado da Parque Escolar e o que lá dizia

não era nada daquilo que você dizia.

A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Muito bem!

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Portanto, aquilo que você diz não se escreve, Sr. Deputado.

Aplausos do PS.

Depois, disse que as escolas tiveram recuperações faraónicas de luxo.

Risos do Deputado do CDS-PP Michael Seufert.

Mas o relatório não diz isso. Há pouco, citei o relatório e ele não diz isso. Diz que há um estudo comparado

de 12 países e que em Portugal, por m2, o custo é o mais barato e as escolas têm mais área.

Não sei por que é que se ri!?

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Porque isso é ridículo!

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Ri-se com a verdade, é? Tem dificuldade em afrontar a verdade?

Quero ainda dizer-lhe que o relatório refere que a derrapagem de custos não tinha sido por medidas de

contenção, além de um mínimo de 0,6% a 6,7% do valor contratual. É o que está no relatório. Portanto, eu

enganei-me. Eu disse: 10 a 15%, mas é menos, é 0,6% a 6,7%.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — O Sr. Deputado Rui Santos tem origem no norte e o «você», no norte, tem um

sentido respeitoso, eu sei, embora não seja o mais comum aqui, no Parlamento.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, o debate já vai longo e relativamente acalorado.

Página 22

I SÉRIE — NÚMERO 84

22

Sr. Deputado Rui Santo, creio que o Partido Socialista não pode cair no erro de transformar o debate sobre

o investimento e sobre a requalificação das escolas públicas numa defesa do que foi a sua governação à

altura em que tínhamos como Primeiro-Ministro o Eng.º Sócrates, porque esse é o debate errado. Neste

momento, a vontade do Governo da direita é pegar no historial da Parque Escolar ao longo dos últimos anos e

entreter a oposição, entreter o País, a fazer a análise dessa história para, pura e simplesmente, colocar um

ponto final em qualquer investimento, qualquer requalificação da escola pública. Eu creio que não podemos

cometer esse erro.

A Parque Escolar tem uma história atribulada. Hoje, quando vamos visitar escolas intervencionadas pela

Parque Escolar, vemos um investimento que era, obviamente, necessário. Esses edifícios têm problemas?

Com certeza que têm problemas. Têm as escolhas estruturais erradas? Sim. No que toca aos domínios da

utilização energética, é, hoje, um problema sério. O Partido Socialista fez a escolha certa em fazer um

investimento na requalificação do nosso edificado e das nossas escolas secundárias? Sim, com certeza! É

para isso que serve o dinheiro dos contribuintes portugueses. Aliás, para que serviria o dinheiro dos impostos

dos portugueses senão para requalificar serviços públicos como a escola? Não é, certamente, como acha o

Governo do PSD e do CDS para dar à Lusoponte, ou para meter no buraco do BPN, ou para continuar a

sustentar taxas de rentabilidade das PPP em que estes senhores não mexem! Fez o Partido Socialista um erro

enorme, enorme, na constituição da Parque Escolar? Fez, porque permitiu modelos de contratação errados.

Só em 2011 houve um único concurso para projetos de arquitetura; tudo o resto foi ajuste direto. Os lotes para

as empreitadas foram construídos de modo a que só grandes empresas puderam concorrer.

Houve em todo este processo muitíssimos erros e entendo que os devemos analisar. Devemos fazer o

apuramento dessa história, devemos fazer o apuramento das derrapagens da Parque Escolar. Não são os

447% referidos pelo Sr. Ministro, porque se baseia numa inserção errada daquilo que foi a evolução do plano

de negócios da Parque Escolar, mas os 70% são igualmente preocupantes. Devemos fazer toda essa história

com todo o cuidado e rigor, mas o debate central é saber se, à custa da desculpa da Parque Escolar, a direita,

pura e simplesmente, encerra qualquer investimento de requalificação no edificado do nosso sistema

educativo. Esse é que é o debate e é para esse debate que o Partido Socialista também é necessário.

Portanto, tem menos que andar à volta da sua história e tem mais que perguntar ao PSD e ao CDS o que

tencionam fazer para o futuro, porque ainda nada disseram.

Metem dinheiro na Lusoponte? Metem! Metem dinheiro nas parcerias público-privadas? Metem!

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Metem dinheiro no BPN — 700 milhões de euros? Metem! Mas no que toca à requalificação da escola

pública, neste momento, zero. Há escolas que são estaleiros, porque estes senhores entenderam que os

alunos e professores podem ser vítimas deste debate político.

Este é que é o debate central, Sr. Deputado Rui Jorge Santos, e é para isto que eu o queria chamar, a

saber, para o futuro.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Jorge Santos.

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, temos muito orgulho na obra

do anterior governo na área da educação e também na obra da Parque Escolar.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Deputada insinuou que houve ajustes diretos e que esses podiam ser menos corretos. Sr. Deputado,

no relatório, é dito que o ajuste direto foi o procedimento de contratação mais utilizado (62,6%) face ao número

total de procedimentos. No entanto, em termos de valor, apenas envolveu 7,2% do montante total das

adjudicações.

Página 23

15 DE MARÇO DE 2012

23

Portanto, estamos conversados quanto ao ajuste direto!

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Não, não estamos!

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — O ajuste direto foi um procedimento para agilizar as obras,…

A Sr.ª Ana Drago (BE): — Não, não foi!

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — … não teve nada de escuro ou de escondido — aliás, a auditoria assim o

comprova.

Ao terminar este debate, quero reafirmar aquilo que disse no início da minha intervenção: o Sr. Ministro

Nuno Crato enganou os portugueses,…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — … enganou os Deputados, porque não há nada no relatório da Inspeção-

Geral de Finanças que fale em derrapagens de 400%. Não há rigorosamente nada!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Com este relatório, as dúvidas ficam esclarecidas. Este Governo quer atacar a escola pública, este

Governo tem uma opção ideológica que passa por fragilizar a escola pública, este Governo quer procurar

desculpas para parar as obras da Parque Escolar.

O Sr. Ministro faltou à verdade. Está na hora de começar as obras!

Aplausos do PS.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr.ª Presidente, solicito à Mesa que mande distribuir, se possível, por

todos os Srs. Deputados cópia da ata da reunião da comissão onde o Sr. Ministro interveio sobre esta matéria.

O Sr. Rui Jorge Santos (PS): — Já temos!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Dessa forma, esclareceríamos a verdade e, com certeza, quem lê

percebe que aquilo que agora foi dito não é verdade.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado. Proceder-se-á em conformidade.

Vamos prosseguir com as declarações políticas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes, do PCP.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O Secretário de Estado da Energia foi

anteontem «atropelado mortalmente», como membro do Governo PSD/CDS-PP, pelos mais de 1000 milhões

de euros de lucros anuais que a EDP arrecada desde 2005. Parece que tinha descoberto que havia «rendas

excessivas», lucros excessivos na EDP e outras eletroprodutoras. Ouçam bem, Srs. Deputados do PSD, do

CDS-PP e do PS: «rendas excessivas»! O Sr. Secretário de Estado, suportado por estudo de empresas de

Página 24

I SÉRIE — NÚMERO 84

24

consulta económica, descobriu que há uma renda excessiva de 49 € em cada ano, paga por cada família

portuguesa ao sistema eletroprodutor! Só para a EDP, 27 €, por ano, por família! O Governo — permitam-me

este aviso — devia calcular os retroativos que foram cobrados indevidamente aos consumidores nas últimas

décadas!

Percebemos agora melhor por que razão a Autoridade da Concorrência e a Entidade Reguladora dos

Serviços Energéticos consideraram, quando questionadas pelo PCP, nos últimos anos, que não era sua

missão ou objeto analisar os lucros excessivos da EDP, da Galp e de outros monopólios, perante a

passividade dos Deputados do PSD, do CDS e do PS!

Percebemos agora melhor a «indisposição» de alguns comentadores — recordo um subdiretor de um

importante jornal diário — e a oposição destes partidos à chamada dos presidentes executivos dessas

empresas à Comissão de Economia para serem ouvidos sobre as razões e origens dos seus «lucros

excessivos»!

Mas não há novidade nenhuma na descoberta do Sr. Secretário de Estado, apenas a comprovação e

consolidação da denúncia que o PCP há muito vem fazendo sobre a inequívoca ligação entre essas «rendas

excessivas» e as tarifas excessivas da eletricidade, do gás natural e dos preços excessivos dos

combustíveis,…

Aplausos do PCP.

… para maior prejuízo do bolso das famílias portuguesas e da tão proclamada competitividade da

economia nacional, mas para maior glória dos acionistas privados, nacionais e estrangeiros, de um importante

conjunto de empresas estratégicas produtoras de bens e serviços essenciais.

Escrevemos, e afirmámos há um ano, precisamente a 17 de março, no projeto de resolução sobre energia

debatido na Assembleia da República: «Os fabulosos lucros apresentados ao longo dos últimos anos pelas

principais empresas mostram que há nos resultados obtidos uma desproporção evidente face aos valores

médios dos rendimentos do capital em Portugal.

Quer pela exploração das posições monopolistas/oligopolistas com que intervêm no mercado nacional,

quer no caso de preços regulados, pelos mecanismos de fixação dos preços e custos do uso das redes de

transporte pela entidade reguladora (ERSE), são-lhes proporcionados/garantidos preços que asseguram

elevados sobrelucros.»

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Ontem, nos postos de combustíveis de uma dada marca, o gasóleo subiu

2 cêntimos e a gasolina 3 cêntimos, atingindo novamente valores recorde neste início do ano!

Nos últimos 12 meses o litro do gasóleo subiu 5,2%, enquanto a gasolina 95 subiu 7%. Também aqui há

«rendas excessivas» resultantes da posição monopolista e colusão tácita de operadores. E também aqui toda

a verve inflamada, fortemente inflamada, dos Deputados do PSD e do CDS, na oposição, com declarações

políticas, projetos de resolução e chamadas dos ex-Ministros Manuel Pinho e Vieira da Silva à Comissão de

Economia, e justamente, «foi chão que deu uvas»! Nem pio! E, no entanto, estamos perante preços de

combustíveis a ultrapassar, de longe, os máximos de 2008!

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Srs. Deputados do PS, do PSD e do CDS, não era contra os lucros das

empresas portuguesas que o PCP se posicionava, era contra os seus «superlucros», como, então, se disse e

redisse, agora postos a nu — ironia do destino! — por um ex-Secretário de Estado do vosso Governo. Os

«superlucros», as tais rendas excessivas, que engordaram um valor equivalente a 15% do PIB (24 000

milhões de euros), transferidas, segundo Vítor Bento, em duas décadas, do setor de bens transacionáveis

para o setor de bens não transacionáveis.

O extraordinário é que um Governo tão rápido, tão urgente e emergente na tomada de medidas para subir

o IVA na eletricidade e no gás natural, tão pronto a sacar o subsídio de Natal e o subsídio de férias aos

portugueses, a subir as taxas moderadoras, não tenha, em sete meses de funções, conseguido eliminar uma

só dessas «rendas excessivas».

Página 25

15 DE MARÇO DE 2012

25

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Srs. Deputados, a demissão do Secretário de Estado da Energia é o

culminar da «impotência» de um Governo, capaz de massacrar, espremer os portugueses até ao último

cêntimo, mas incapaz de tirar um só cêntimo aos acionistas da EDP, Iberdrola, Endesa, REN, Galp, PT,

Jerónimo Martins, Sonae e setor financeiro.

Aplausos do PCP.

A demissão do Secretário de Estado deve ser esclarecida pelo Governo, mas mais importante no atual

quadro de profunda crise económica e social a que a política de direita levou o País e que o pacto de agressão

das troicas, nacional e estrangeira, agravaram e continuam a agravar brutalmente é que sejam assegurados

aos portugueses e à economia nacional, nomeadamente às micro, pequenas e médias empresas e aos

setores produtivos, preços de energia compatíveis com o seu poder de compra e a defesa da competitividade

da economia nacional. Isto só se consegue travando a desastrosa política energética em curso desde há 30

anos e avançando com medidas como as que o PCP apresentou nesta Assembleia, concretamente a fixação

dos preços máximos na eletricidade, gás natural e combustíveis, a diversificação do uso de matérias-primas

energéticas, nomeadamente a utilização do gás natural comprimido e do gás natural liquefeito, a concretização

de uma rede de low cost, a calendarização da eliminação dos custos de interesse económico geral (CIEG), as

taxas reduzidas de IVA, nomeadamente para o gás dos pobres — o gás propano e butano —, e a questão-

chave, que é a recuperação, pelo Estado, do comando estratégico das principais empresas de energia.

Aplausos do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Guilherme Silva.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, de facto, a

demissão do Secretário de Estado da Energia alegando questões pessoais e familiares, que são sempre

respeitáveis, do ponto de vista do Partido Ecologista «Os Verdes», não pode, contudo, deixar de nos fazer

notar a coincidência — e as coincidências existem! — de sair o membro do Governo que andava em conflito

com o setor que tutelava, designadamente por ter assumido aquilo que é mais do que evidente para todos os

portugueses, menos para o Governo, pelos vistos, que tem a ver com as elevadas rendas pagas ao setor

energético e o facto de este setor ser beneficiado de uma forma profundamente escandalosa. Se calhar, foi até

o único membro do Governo que, nesta matéria, mostrou alguma preocupação com o interesse público.

Mas há outra coincidência, esta, de natureza temporal. É que esta substituição do Secretário de Estado da

Energia acontece exatamente numa altura em que decorre a renegociação dos contratos com as empresas

fornecedoras de eletricidade. E bem se pode dizer que os motivos e razões são de ordem pessoal e familiar,

que são sempre respeitáveis, mas esta demissão, muito provavelmente, não se pode desligar de um conjunto

de nomeações, nomeadamente das nomeações feitas pela EDP, e, sobretudo, da estratégia do setor

eletroprodutor para ganhar ainda mais espaço estratégico no País, sem obstáculos de nenhuma natureza e

sem nada nem ninguém que lhes faça frente, bem pelo contrário.

Por isso, chegámos ao ponto a que chegámos. É que aquilo a que assistimos hoje é que as grandes

empresas do setor energético formam um verdadeiro «Estado» dentro do próprio Estado e esta questão deve

merecer a nossa preocupação, ainda por cima quando o Governo, através da privatização da EDP e de outras

empresas, se demite completamente do controlo desta área estratégica para o País.

O Sr. Deputado Agostinho Lopes afirmou, na tribuna, que o ex-Secretário de Estado da Energia tinha sido

«atropelado» e eu gostava de lhe perguntar se considera que a manutenção do ex-Secretário de Estado da

Energia no Governo poderia, de alguma forma, causar algum desconforto ao setor, nomeadamente, algum

desconforto à EDP. Gostava que o Sr. Deputado se pudesse pronunciar sobre isto.

Página 26

I SÉRIE — NÚMERO 84

26

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, julgo que é uma

evidência muito, muito clara que a demissão do Sr. Secretário de Estado tem a ver, inevitavelmente, com a

afronta aos interesses dos grandes operadores do setor da energia…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — … e, concretamente, dos sistemas eletroprodutores, por tudo aquilo que

é conhecido, por tudo aquilo que veio a público, por aquilo que o Governo não esclareceu. E era bom que o

Governo esclarecesse, de facto, as razões dessa demissão, porque, por exemplo, tivemos oportunidade de

ouvir ontem, durante a manhã, a voz avalizada e autorizada de Luís Filipe Menezes a dizer que foi por

fortíssimas divergências com o Governo em matéria de política de energia,…

Risos do CDS-PP.

… mas, depois, à tarde, o Sr. Ministro da Economia, tranquilamente, afirmou a continuidade da política

anterior. Isto é, de facto, absolutamente extraordinário!

Não há quaisquer dúvidas de que os grandes operadores, os monopólios do setor da energia — são

bastante conhecidos e não são apenas da eletricidade, mas também do gás natural e dos combustíveis —

tudo fizeram para que nenhuma das medidas que foram sendo indiciadas pudesse ir para a frente. Lembremo-

nos, por exemplo, da chamada «taxa sobre o sistema eletroprodutor», sobre as empresas eletroprodutoras,

que, anunciada em agosto, hibernou em pleno agosto e, ainda hoje, apesar do calor deste inverno quente, não

tornou a ressuscitar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina

Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, saúdo-o, e ao PCP, pelo

tema que aqui trouxe.

Começo por lhes falar da edição de hoje do Jornal de Negócios, em Mercados, que parece dizer tudo sobre

a demissão do Sr. Secretário de Estado da Energia. Num dia em que a Bolsa subiu, a Galp Energia foi a

cotada que mais contribuiu para a valorização do PSI 20 — num dia de subida de preços do petróleo — e,

depois, a EDP ganhou, a EDP Renováveis ganhou.

Portanto, o que se pode dizer sobre a demissão do Sr. Secretário de Estado da Energia é que os mercados

perceberam bem quem manda e quem é o Ministro da Economia. E quem manda é a EDP, quem manda é a

Galp, quem manda é quem vai comprar — ainda nem sequer comprou, mas já está a mandar — e já está a

dizer que não aceita deixar de ter as rendas excessivas pelos preços da eletricidade.

O que o Governo mostra é que cede em toda a linha aos interesses das grandes empresas produtoras de

energia, cede em toda a linha com todo o facilitismo, continuando a pagar as rendas excessivas.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Deputado Agostinho Lopes, quero colocar-lhe a seguinte questão:

como sabe, o Bloco de Esquerda pediu já a audição, em comissão, do Secretário de Estado da Energia que se

demitiu e do novo Secretário de Estado da Energia, para que possamos perceber, talvez, que renegociação é

esta que, a meio, vai abaixo e mostra quem manda. E a EDP mostra bem quem manda!

Página 27

15 DE MARÇO DE 2012

27

O que lhe pergunto, Sr. Deputado, é se não lhe parece estranho que os estudos que devem demonstrar o

pagamento excessivo de rendas não sejam conhecidos deste Parlamento e se não deveríamos saber

exatamente que estudos são esses, para sabermos o que está em causa nesta renegociação e se o Governo

está ou não empenhado em acabar com as rendas excessivas da EDP e das outras grandes empresas

produtoras de energia.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, antes de mais, agradeço

as questões que colocou.

Em primeiro lugar, é uma evidência que estes documentos deveriam ser conhecidos da Assembleia,

mesmo que não tragam muito de novo a muitos estudos, a muitos pronunciamentos de estudiosos dos

problemas da energia em Portugal, que há muito denunciam os lucros excessivos, ou até, diria, a muitas das

críticas que os Deputados do PSD e do CDS foram fazendo,…

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Já esqueceram!…

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — … ao longo de seis anos, nesta Assembleia da República.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Onde isso já vai!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Não estão, certamente, esquecidos dessas intervenções inflamadas,

insisto, contra os altos custos da energia, responsáveis por problemas na competitividade da nossa

economia?!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Isso, agora, já não interessa!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ainda hoje de manhã o fizemos!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Mas percebemos o silêncio do PSD e do CDS nesta matéria.

Primeiro, porque, em matéria de combustíveis, viriam aqui dizer-nos, certamente, aquilo que o Governo tem

dito em relação aos problemas que se colocam com os preços dos combustíveis: exatamente as mesmas

medidas que, durante anos, os governos do PS anunciaram, ou seja, tabuletas nas autoestradas, mais postos

na grande distribuição, etc., constatando até o facto de a subida dos preços da energia e dos combustíveis ser

brutal, desproporcionada, relativamente às alterações que os condicionam.

Mais: viriam também aqui repetir-nos, certamente, em relação ao setor elétrico, a extraordinária afirmação

de ontem do Secretário de Estado Carlos Moedas, que remeteu as medidas para negociações bilaterais com

os operadores, e não unilaterais, porque as unilaterais são as que tomam contra os trabalhadores

portugueses, contra os reformados portugueses, contra os utentes do Serviço Nacional de Saúde, pondo em

causa contratos há muito fixados pelo Estado português e pondo em causa esse contrato básico de qualquer

Estado de direito, que é a própria Constituição da República.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Hortense Martins.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Lopes, quero também

cumprimentá-lo por ter trazido este assunto a Plenário.

Página 28

I SÉRIE — NÚMERO 84

28

Na realidade, o Partido Socialista também viu com muita preocupação a demissão do Secretário de Estado

da Energia, que, pelo que nos pudemos aperceber nos debates que fomos aqui travando, parecia ser uma

pessoa séria e verdadeiramente interessada em cumprir o Memorando da troica, que também foi assinado

pelo PS, o qual prevê a revisão destes contratos. Aliás, como diz o próprio Memorando, devem ser tomadas

medidas para limitar os sobrecustos associados à produção de eletricidade em regime ordinário,

nomeadamente através da renegociação ou da revisão em baixa dos custos de manutenção de equilíbrio

contratual.

Sobre a política energética, o Partido Socialista tem o entendimento de que devemos diminuir a nossa

dependência energética, devemos pugnar por medidas que mantenham a sustentabilidade do sistema

nacional energético, temos de atender a um equilíbrio nesse mix energético, mas há questões que revelam

que certas forças têm mais poder do que o interesse nacional.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Mas isso não é de agora!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — O Partido Socialista, exatamente para assegurar a defesa do interesse

nacional, também solicitou os contratos e as adendas aos contratos, através de um requerimento que dirigiu

aos Ministérios das Finanças e da Economia, justamente para verificar de que forma é que o Governo diz ter

assegurado o interesse nacional.

Temos, necessariamente, de tomar medidas, de forma rápida, para diminuir a fatura energética dos

consumidores e das empresas, mas o Governo, que foi muito rápido a antecipar o aumento do IVA na

eletricidade e no gás, está a ser muito lento na tomada destas medidas, e pelos vistos ainda vai ser mais,

porque não podemos confiar totalmente na palavra do Sr. Ministro da Economia, que diz que tudo vai ficar na

mesma, quando, afinal, muda o Secretário de Estado que tinha o dossier e que nos parecia ser totalmente

competente para assegurar esta renegociação.

Portanto, Sr. Deputado Agostinho Lopes, também estamos muito preocupados com esta matéria e,

necessariamente, queremos ver medidas e que se cumpra o Memorando da troica, a bem dos consumidores,

das empresas e da competitividade portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Hortense Martins, julgo que a

preocupação com a demissão do Sr. Secretário de Estado da Energia deve ser, sobretudo, uma preocupação

com a política que foi sendo desenvolvida ao longo dos últimos anos em matéria de energia e com a política

que estaria em desenvolvimento, a qual não conhecemos, apesar de o Sr. Secretário de Estado ter sido

suficientemente questionado sobre ela numa audição aqui realizada em dezembro, aliás, por proposta do

PCP. Falou-nos que, mais tarde, nos informaria sobre um possível plano energético para o País, mas nada

disso veio a lume.

A Sr.ª Deputada lembrou, e muito bem, que o PS subscreveu o Memorando da troica e também as medidas

para a energia.

Sr.ª Deputada, a primeira questão que gostaria de referir diz respeito às vossas preocupações com as

privatizações da EDP, da REN e da Galp, que ainda acontecerão certamente. Gostaria de lembrar que o

grande problema dessas privatizações é precisamente a própria privatização e não tanto as medidas

cautelares relativamente à defesa dos interesses estratégicos do País,…

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Mas é preciso fazer alguma coisa, não é?!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — … embora esses interesses sejam defendidos não privatizando. E vocês

não só subscreveram um Memorando que prevê a privatização dessas empresas, como já tinham proposto

essas privatizações nos anteriores Programas de Estabilidade e Crescimento (PEC).

Página 29

15 DE MARÇO DE 2012

29

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Já esqueceram!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Em segundo lugar, Sr.ª Deputada, acho muito interessante que o PS

descubra agora que havia sobrecustos nos preços da energia, nas tarifas da energia.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Não descobrimos agora!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Descobriram, e até assinaram no Memorando da troica a confirmação

da sua existência.

Mas, Sr.ª Deputada, muitos desses sobrecustos foram invenção de alguns senhores que hoje se sentam na

sua bancada!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Não foram invenção, não! Têm muitos anos!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Por exemplo, a garantia de potência — uma invenção do ex-Secretário

de Estado Carlos Zorrinho —, que custa aos consumidores de energia elétrica entre 60 a 70 milhões de

euros/ano, foi uma invenção do governo do PS.

E há outras, nomeadamente, a forma como passou a ser feita a atualização dos terrenos das barragens e

os incentivos excessivos relativamente às renováveis…

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Diminuímos a dependência energética!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Portanto, é justo, é adequado, que os senhores agora «batam com a mão no peito» penalizando-se por

aquilo que vocês próprios fizeram enquanto estiveram no governo, pois são responsáveis, juntamente com o

PSD e o CDS, pelos preços excessivos. E, quando digo preços excessivos, não me refiro só aos que estamos

a pagar agora, mas os que pagamos há mais de 30 anos neste País pela energia elétrica e pelos

combustíveis.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Nuno

Filipe Matias.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Afinal, o Governo está aqui representado por alguém!

O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, infelizmente, numa altura de

emergência e em que se exigem medidas difíceis, enquanto o Governo está empenhado em governar, temos

a oposição a entreter-se em encontrar fogachos comunicacionais, em ver fantasmas onde não existem, em

escrever teorias de conspiração e em criar episódios que verdadeiramente não fazem sentido.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — A criar episódios? Então, o Secretário de Estado da Energia não se

demitiu?!

O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — Sr. Deputado, não sei se ouviu bem, mas, por ter havido uma

mudança pontual num membro do Governo, não significa que se tenha alterado a política energética deste

Governo.

Página 30

I SÉRIE — NÚMERO 84

30

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Esse é que é o problema!

O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — E ficou bem claro que os compromissos que o Governo da República

Portuguesa assumiu perante entidades externas que vieram em nosso auxílio, no âmbito do Memorando da

troica, serão para cumprir. Não se esqueça desse pormenor.

Não se esqueça também que o interesse nacional que o Governo já declarou, que é combater os claros

problemas da nossa deficiente balança energética, será para cumprir. Os problemas crónicos dos alisamentos

sucessivos que têm existido ao nível dos défices tarifários são para resolver.

Portanto, que não exista dúvidas sobre isso na mente de quem, infelizmente, procura correr atrás da

polémica sem perceber a envolvente do problema.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

O Governo mudou um dos seus protagonistas, mas não mudou as suas ideias, não mudou a sua estratégia

e não vai mudar as suas orientações e as suas decisões.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — É fundamental que isso fique claro. O PCP vê fantasmas, mas,

infelizmente para vós e felizmente para a sociedade e para a nossa civilização, a História tem comprovado e

penalizado essa vossa forma de fazer política e essa forma — infelizmente, má — de ouvir e de representar o

que, ao fim e ao cabo e em última instância, devia defender, que são os interesses nacionais e os interesses

de todos os nossos cidadãos.

Aplausos do PSD.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Filipe Matias, obrigado pelas suas

questões.

Poderia retorquir com uma pergunta: o Sr. Secretário de Estado da Energia não estava interessado em

governar? Todo o conjunto de medidas sobre as quais ele foi dando indícios não fazia parte de medidas do

Governo? É uma questão à qual era preciso que os senhores respondessem.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — De facto, precisam de nos esclarecer sobre o seguinte: se há uma

continuidade dessa política, por que razão é que uma voz — não é uma voz qualquer, como o senhor sabe,

quem o disse, repito, foi Luís Filipe Menezes — disse, ontem, que havia «divergências fortíssimas» entre o

Secretário de Estado e os membros do Governo responsáveis pela política de energia?

Sr. Deputado, os «fantasmas» do PCP, hoje, são fáceis de constatar. Hoje, é fácil demonstrar que, de

facto, não são «fantasmas», como não eram «fantasmas» as denúncias que fizemos ao longo de anos sobre

os lucros excessivos, os superlucros, os lucros do monopólio e oligopólio deste conjunto de operadores do

sector da energia!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Não é por acaso que é o Sr. Deputado a questionar-me, depois da

declaração política que fiz (penso que o Sr. Deputado não esteve neste Parlamento nas últimas legislaturas).

Podiam tê-lo feito os Deputados do PSD ou do CDS que tantas vezes nos acusaram de não querermos que

Página 31

15 DE MARÇO DE 2012

31

essas empresas tivessem lucros, de que o que gostaríamos era de ver a EDP e a Galp falidas. Esses é que

eram os «fantasmas» do PCP!

Hoje, comprova-se que ao longo de anos, particularmente depois dos processos de privatização e de

liberalização dos operadores do setor de energia, os portugueses, a economia portuguesa, os setores

produtivos e os setores exportadores pagaram tarifas de eletricidade, tarifas de gás natural e preços de

combustíveis completamente exagerados, brutais!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Por acaso, o Sr. Deputado sabe qual foi a evolução dos lucros líquidos

da Galp, depois de o governo do PSD/CDS, de Durão Barroso e Paulo Portas, ter liberalizado os preços dos

combustíveis, em 2004?! Sr. Deputado, desde essa data, os lucros da Galp mais do que quintuplicaram!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Uma vergonha!

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Estes é que são os «fantasmas» do PCP! Mas vocês é que deveriam

tomar as medidas para pôr fim a este escândalo que tão gravemente penaliza a economia nacional!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos dar início ao segundo ponto da nossa

ordem de trabalhos, que consiste na discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 181/XII (1.ª) — Procede

à primeira alteração à Lei n.º 9/2007, de 19 de fevereiro, reforçando o controlo e prevenção das

incompatibilidades, impedimentos e conflitos de interesses dos agentes e dirigentes dos Serviços de

Informação da República Portuguesa (PS).

Tem a palavra, para apresentar o projeto de lei, o Sr. Deputado Marcos Perestrello.

O Sr. Marcos Perestrello (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O projeto de lei que agora

apresento tem como objetivo aumentar a exigência no exercício das funções de dirigentes e funcionários do

Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), incluindo o Serviço de Informações Estratégicas de

Defesa (SIED) e o Serviço de Informações de Segurança (SIS), e ao mesmo tempo reforçar as garantias de

independência da ação destes serviços e criar mecanismos de reforço, controlo e prevenção das

incompatibilidades, dos impedimentos e conflitos de interesses dos seus funcionários e dirigentes.

A matéria respeitante ao Sistema de Informações da República Portuguesa não deve ser utilizada como

instrumento de combate político, mas tal não nos deve sugerir que não vejamos o óbvio. E o óbvio é que, nos

últimos meses, foram publicamente suscitadas dúvidas sustentadas quanto à garantia da imparcialidade e do

interesse público na prossecução da sua missão pelos serviços de informações.

Parte dessas dúvidas incidem sobre a adequação dos mecanismos de controlo da ocorrência de conflitos

de interesses entre os fins públicos confiados àqueles serviços e atividades de natureza privada, com os quais

os agentes e dirigentes dos mesmos se podem confrontar no exercício das suas funções ou após o seu

término.

Sublinhe-se que o próprio Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa

sugerira já, em 2010, a eventual utilidade de se vir a criar um impedimento legal temporário para dirigentes e

funcionários com especiais responsabilidades, como veículo para a prevenção de situações de conflitos de

interesses e de prejuízo à missão daqueles serviços.

Assim, com vista a acautelar as dificuldades decorrentes da transição de antigos agentes e dirigentes do

Sistema de Informações para o sector privado, introduz-se neste projeto de lei uma obrigação de permanência

no exercício de funções públicas, por um período de três anos, após a cessação das respetivas funções no

Sistema de Informações.

Admite-se, contudo, o regresso à atividade privada já exercida antes do início de funções no Sistema de

Informações, bem como a autorização do Secretário-Geral do SIRP para o exercício de funções privadas,

desde que demonstrada a ausência de quaisquer conflitos de interesses.

Página 32

I SÉRIE — NÚMERO 84

32

Paralelamente, e com vista a reforçar o controlo de conflitos de interesses e a prevenir a sua verificação, o

presente projeto de lei determina a obrigatoriedade de inscrição e atualização de um registo de interesses,

depositado junto de cada serviço e consultável pelo Secretário-Geral do SIRP, de todas as atividades

suscetíveis de gerar incompatibilidades, impedimentos ou conflitos de interesses.

Com vista a assegurar maior clareza na delimitação do âmbito de intervenção de cada um dos serviços de

informações e a sua permanente vinculação à prossecução do interesse público, a presente lei determina

ainda quais os canais através dos quais entidades privadas podem requerer acesso a informações,

impossibilitando a interação direta dos serviços operacionais com os requerentes.

Finalmente, é reforçado o escrutínio parlamentar da atividade dos serviços, passando a ser obrigatória a

audição parlamentar, prévia à sua nomeação, dos diretores do SIED e do SIS, à semelhança do que sucede já

com o Secretário-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa.

Sem prejuízo da nossa disponibilidade para um debate mais alargado e uma intervenção mais profunda na

organização do Sistema de Informações, designadamente na sua fiscalização, afigura-se desejável reforçar as

garantias de independência de funcionários e dirigentes do Sistema, acautelar a forma de cessação de

funções nos serviços e melhorar os mecanismos de escrutínio parlamentar.

O Partido Socialista entende que a confiança dos cidadãos nas instituições do Estado de direito, bem como

a garantia da eficiência e credibilidade dos serviços públicos essenciais representam valores fundamentais a

salvaguardar na edificação do normativo que lhes é aplicável, em especial quando estas preocupações se

entrecruzam com uma área de significativa sensibilidade para a segurança interna e externa da República,

como é o caso do sistema de informações.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Marcos Perestrello (PS): — Vou já concluir, Sr. Presidente.

Entendemos que, nesta matéria, como noutros campos da soberania, é útil encontrarmos consensos

políticos amplos, para além das maiorias circunstanciais deste Parlamento. Apresentamos, por isso, um

conjunto de propostas sensatas e razoáveis que constituem um corpo capaz de sustentar um reforço da

confiança no Sistema de Informações da República Portuguesa.

Muito obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.a Deputada Teresa Leal

Coelho.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: entendo que o meu Grupo

Parlamentar recebeu da parte do Sr. Deputado Marcos Perestrello um convite para um consenso no que diz

respeito às reformas que pretendemos introduzir nestas matérias. E a nossa resposta, embora não esteja

vestida de branco, é a seguinte: sim, Sr. Deputado! Garanto-lhe que estamos disponíveis para o consenso.

Garanto-lhe, por todos os Deputados desta bancada, que estamos disponíveis para trabalhar, não só com os

nossos aliados de coligação, como com os restantes partidos com assento parlamentar. E peço ao Sr.

Deputado que garanta que também os Deputados da sua bancada estão disponíveis para trabalhar nas

reformas que vamos brevemente, em parceria com o CDS-PP, apresentar neste Parlamento.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Temos praticamente prontos três projetos de lei que visam

precisamente estabelecer as reformas para que há muito vimos apelando neste Parlamento. Trata-se da

reforma relacionada com a Lei do Segredo de Estado, da reforma relativa ao sistema de fiscalização das

matérias classificadas e, ainda, da reforma atinente ao reforço do modelo de fiscalização dos serviços de

informações.

Página 33

15 DE MARÇO DE 2012

33

Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se o Grupo Parlamentar do PS está disponível para trabalhar connosco estes

três projetos de lei relativos a estas matérias de segredo de Estado, tão cruciais para a preservação do

interesse nacional.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Por outro lado, o PSD tem vindo a afirmar regularmente nesta

Câmara que repudia quaisquer reformas incidentais sobre estas matérias. E repudia-as em razão de essas

reformas poderem potenciar, afetar, a coerência legislativa. É precisamente essa coerência legislativa nestas

matérias que exige que as reformas sejam sistémicas, estruturadas e consensuais. Esperamos poder fazê-las

brevemente.

Como acabámos de estabelecer aqui um compromisso (pelo menos, da nossa parte estabelecemos o

compromisso com o PS, como esperamos estabelecer o compromisso com os restantes grupos

parlamentares), o compromisso de uma reforma estruturada, consensual, sistémica e responsável nestas

matérias, devo desde já estabelecer um conjunto de limites que reportam a questões com as quais não

concordamos e que estão aduzidas neste diploma. Desde logo, o nosso entendimento é o de que não

devemos preocupar-nos particularmente com a regulação das relações entre os serviços de informações e as

empresas privadas, porque o destinatário das informações não são as empresas privadas.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de concluir, Sr.a Deputada.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Devemos, sobretudo, salvaguardar que o segredo de Estado seja

blindado de tal forma que essa fuga de informação não ocorra na pendência da atividade ou posteriormente a

ela.

Por outro lado, como afirmámos diversas vezes em sede própria, é nosso entendimento que o controlo da

confiança funcional dos agentes e dos funcionários se deve fazer sobretudo a montante, no plano do

recrutamento, estabelecendo exigentes condições de recrutamento e também...

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de concluir, Sr.a Deputada.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Vou já concluir, Sr. Presidente.

Estamos, no entanto, disponíveis para aprofundar estas matérias e, como tal, iremos abster-nos na votação

deste diploma, precisamente para que, em sede de comissão, e juntamente com os projetos que vamos

apresentar, possamos estabelecer um amplo debate sobre as matérias.

Muito obrigada pela tolerância, Sr. Presidente.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero fazer algumas observações

relativamente a este projeto de lei do Partido Socialista, sendo a primeira para exprimir concordância

relativamente à proposta de que os indigitados para diretores do SIS e do SIED possam ser ouvidos em

audição parlamentar e não apenas o Secretário-Geral do SIRP.

Passo a enunciar três críticas a este projeto de lei, sendo a primeira relativa à possibilidade, que se admite,

de que entidades privadas possam solicitar informações aos serviços de informações — ao SIS e ao SIED —

através do membro do Governo respetivo.

Ora, não nos parece que os serviços de informações possam funcionar como agências, às quais entidades

privadas possam recorrer para obter informações, já que, para isso, há aí umas empresas de informações

comerciais. Os serviços de informações do Estado não servem para que as entidades privadas possam pedir

ao Estado informações sobre matérias, ainda por cima, em segredo de Estado, porque os privados não podem

ter acesso a isso e, portanto, vemos esta possibilidade como absolutamente absurda.

Página 34

I SÉRIE — NÚMERO 84

34

Não estamos a ver que a lei possa permitir que entidades privadas façam pedidos ao Governo, tais como:

«peçam aí umas informações ao SIED ou ao SIS, porque isto é útil para a nossa atividade». Isso é impossível,

Srs. Deputados, porque é contraditório com o estatuto constitucional e legal dos serviços de informações.

A segunda crítica prende-se com o registo de interesses. Ora, em princípio, o que é proposto não tem nada

a ver com o registo de interesses como ele é normalmente entendido, uma vez que o registo de interesses é

um instrumento destinado a garantir a transparência pública relativamente ao exercício de funções. Ora, não é

isso que se pretende — era o que faltava que, relativamente a agentes de serviços de informações, fizessem

um registo de interesses público, porque, a ser esse o caso, todos ficariam a saber quem eram os agentes dos

serviços de informações.

Mas o que também nos parece absurdo é o seguinte: trata-se de um registo de interesses que fica no

serviço. Mas, pergunto eu, quando alguém é recrutado para os serviços de informações, não se sabe nada

dessa pessoa? Ou seja, é depois de ter sido admitida que essa pessoa vai fazer um registo de interesses e,

que, depois, o Secretário-Geral vai dizer «ó diabo, não devíamos ter admitido este homem, porque ele tem

aqui umas atividades que são incompatíveis com o exercício destas funções». Vai dizer isso depois de essa

pessoa já lá estar a trabalhar?!

Risos de Deputados do PCP, do BE e do CDS-PP.

Obviamente que, a haver registos formais, no mínimo teriam de ser de candidatura. Mas depois de lá estar

é que nunca se iria fazer um registo de informações onde constasse que «afinal, havia aqui umas

incompatibilidades que não declarei antes de ser admitido, porque assim não me admitiam».

Não me parece, pois, manifestamente, que este registo de interesses faça sentido.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Tem toda a razão!

O Sr. António Filipe (PCP): — A minha terceira crítica — e, com isto, termino, Sr. Presidente — diz

respeito ao aspeto do período de nojo.

Vemos, com simpatia, que se encontre uma solução para isto, para que não haja promiscuidade entre o

exercício de funções, este tipo de informações e atividades privadas. Mas há reparos a fazer a este regime

que é aqui proposto.

Em primeiro lugar, não podem ser excluídas todas as funções privadas. Imaginemos uma pessoa que sai

do exercício de funções e vai dedicar-se à agricultura, porque tem umas hortas na sua terra. Creio que não faz

sentido algum que o Estado impeça o exercício de todas e quaisquer atividades privadas, ainda que elas não

tenham rigorosamente nada a ver com esse exercício de funções. Dir-me-ão: «há aqui uma possibilidade

excecional de autorização». Mas coloca-se aqui um outro problema, que é o seguinte: propõe-se, para quem

saia dos serviços, em qualquer circunstância, como não pode ir trabalhar para o setor privado, que o Estado

arranje uma bolsa de lugares públicos, onde essa pessoa permanecerá, durante três anos, enquanto não

puder ir trabalhar para o setor privado. E eu pergunto: e se essa pessoa tiver saído dos serviços por

incumprimento culposo dos seus deveres? Ou seja, se uma pessoa for despedida «por indecente e má figura»

— como se costuma dizer —, o Estado vai garantir-lhe o emprego na mesma categoria, durante três anos, em

quaisquer circunstâncias?! Do nosso ponto de vista, isto não faz sentido, ou seja, tem que se encontrar, neste

ponto, uma outra solução.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.

O Estado não pode premiar alguém que seja afastado do serviço por violação dos seus deveres e,

portanto, tem de se encontrar, neste ponto, outra solução para o período de nojo.

Vozes do PCP: — Muito bem!

Página 35

15 DE MARÇO DE 2012

35

O Sr. António Filipe (PCP): — Pode ser que, em sede de especialidade, se encontre uma outra solução.

Consideramos que a ideia deve ser desenvolvida, mas não nos parece que esta solução, como prevista, seja

muito curial.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: De facto, este projeto do Partido

Socialista contém um conjunto de boas intenções, que acompanhamos, logo à partida a ideia de clarificação

do regime, mas depois, quando se desce ao concreto, ele não está à altura das boas intenções que anuncia.

De resto, resolver este tipo de matérias com projetos de meia dúzia de artigos para tentar responder a três

ou quatro preocupações mediáticas, Sr. Deputado, normalmente não é bom caminho e pode resultar num

projeto do tipo deste que temos. Enfim, vem-me à cabeça aquela velha expressão sobre o Melhoral, que é

uma coisa que «não faz muito bem nem faz muito mal». Quer dizer, propõe algumas coisas que até nem são

más ideias, outras nem por isso, mas, de facto, responde pouco às preocupações fundamentais.

Ora, o que nos propõe este projeto e o que nos diz, caso a caso? O que diz respeito a informações de

empresas, setorialmente, ministro a ministro, para depois chegarem aos serviços de informações, não faz

sentido algum porque isso envolve o Governo, envolve os ministros naquilo em que não têm que estar

envolvidos. E por duas razões: em primeiro lugar, porque não tem de ser envolvimento deles; em segundo

lugar, porque os ministros têm mais que fazer do que andar a gerir informações privadas, que passam pelos

serviços secretos, etc.

E se o próprio diretor do SIRP já tem, neste momento, funções equiparadas a membro do Governo, esse

reconhecimento faz com que, precisamente, aquele envolvimento não seja necessário. E, a haver

envolvimento do Governo, devia ser com um ministério determinado que centralizasse, eventualmente com a

própria Presidência do Conselho de Ministros, que é quem tem a competência. Mas envolvimento gabinete a

gabinete, ministério a ministério, do nosso ponto de vista não faz sentido algum, como aqui já foi dito, e bem.

Em relação ao acompanhamento pela Assembleia da República, temos sido sempre favoráveis a um maior

acompanhamento e, portanto, estamos dispostos a considerar essa possibilidade de audição. Mas, audição

dos diretores? Enfim, não sei… Para parar onde? Nos agentes? De qualquer forma, essa pode até ser uma

boa ideia. Estamos dispostos a ponderá-la e a trabalhar sobre isso.

Há, depois, duas questões que são as questões essenciais deste projeto e as mudanças mais importantes.

Em relação a uma delas, o registo de interesses, diz o Sr. Deputado Marcos Perestrello que este projeto

vem responder a dúvidas levantadas na opinião pública e na comunicação social. O problema é que, como

aqui já foi dito, não resolve essas dúvidas, porque, com este projeto, elas mantêm-se.

Vozes do CDS-PP: — Claro!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Porque o registo de interesses, nuns casos, até me parece que pode

ser demais, mas para resolver as dúvidas é de menos. O que quero dizer com isto? É demais, porque temos

os agentes a contar a história toda do seu exercício cívico, presumo que desde os escoteiros, se tiverem sido

membros, e, no caso de haver alguma falha, a estarem sancionados por uma falha de que os próprios podem,

na altura, não se lembrar, sequer, o que pode não ter nenhum tipo de relevância. Portanto, nesse aspeto,

podemos ter invasão da privacidade.

Para efeitos de controlo, para efeitos de exigência, para efeitos de transparência, como aqui disse, e bem,

o Sr. Deputado António Filipe, é de menos, porque este registo não é público, é privado. Só o diretor é que tem

acesso e vai usá-lo para…

Risos do Deputado do PS Marcos Perestrello.

E, depois, o que consta do próprio registo, Sr. Deputado Marcos Perestrello? Sr. Deputado, isto não é

divertido, é muito sério.

Página 36

I SÉRIE — NÚMERO 84

36

O Sr. Marcos Perestrello (PS): — Sr. Deputado,…

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mas quer responder-me?

O Sr. Marcos Perestrello (PS): — Não tenho tempo!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço desculpa…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Queira concluir, Sr. Deputado. Já esgotou o seu tempo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo apenas o seguinte: Sr. Deputado

Marcos Perestrello não pode ter transparência, tem de ser secreto. Mas serve para quê? Qual é a utilidade? E

o que é que lá tem de estar? As filiações? Quais? As públicas? Os grupos de interesse também? Os grupos

de pressão também? Onde para e onde começa? É que, sem clarificar isso, não serve para absolutamente

nada. É para agradar à comunicação social.

A terminar, em relação às empresas privadas, Sr. Deputado, diga-me, como é que limita. Se for trabalhar

para o estrangeiro, pode ou não pode…? Se for exercer profissão liberal, pode ou não pode…? Como é que

os senhores resolvem esses problemas? O que é que os senhores fazem?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Os senhores põem as pessoas numa incubadora, de quarentena,

durante três anos, sem trabalhar, a serem pagas pelo Estado, para, a seguir, fazerem nem sei o quê. Isso não

resolve! A intenção até pode ser boa, de criar um mecanismo que até pode ser bom, mas com esta solução

não resolve.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mas vamos discutir isso, vamos ter as nossas próprias ideias e

propostas, como já aqui foi dito, vamos trabalhar e, depois, na especialidade, talvez se consiga qualquer coisa

de bom. Mas com este projeto de lei parece-me difícil!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília

Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Vou começar por referir

as nossas preocupações relativamente ao que o Sr. Deputado Marcos Perestrello aqui apresentou como um

conjunto de boas intenções.

Em primeiro lugar, já foi denunciado que, evidentemente, está fora de questão que o sector privado possa

fazer pedidos à la carte aos Serviços de Informação da República Portuguesa. E, sobre esta vertente, é

preciso dar nota de uma primeira questão óbvia: a tutela na arquitetura da lei compete ao Primeiro-Ministro,

que pode delegar no secretário-geral, por isso pergunto como se sentiria o atual Primeiro-Ministro se o Ministro

Álvaro Santos Pereira fosse requisitado, diariamente, com pedidos das empresas privadas aos quais teria de

dar satisfação. Esta é uma matéria que nos deixa preocupações quanto à natureza da vossa proposta, até

porque desvirtua a arquitetura e a relação hierárquica de competências.

A segunda questão tem a ver com a declaração de interesses. Ela é preocupante do ponto de vista da

obrigatoriedade consagrada, porque nos merece reflexão sobre os direitos fundamentais, mas até estaríamos

disponíveis a secundarizar os princípios em nome da eficácia. Porém, Sr. Deputado Marcos Perestrello, a

eficácia obriga-nos a considerar a realidade que hoje procuramos superar com estas iniciativas legislativas.

Página 37

15 DE MARÇO DE 2012

37

Ora, reconhecendo — como reconhecem — que o artigo 60.º da lei que os senhores se propõem alterar é

muito claro no que toca ao facto de os diretores dos diferentes serviços serem indigitados pelo Primeiro-

Ministro, tendo em conta um perfil rigoroso de competências, a idoneidade e a experiência profissional, queria

colocar-lhe a seguinte questão hipotética: se o Dr. Silva Carvalho tivesse preenchido um papel a dizer que era

membro da maçonaria, o anterior Primeiro-Ministro não teria indigitado este responsável pelos serviços de

informações?

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Uma pergunta óbvia!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Se este mesmo responsável tivesse preenchido esse dito papel,

declarando «eu pertenço a uma loja maçónica», isso teria evitado estes indicadores que vão surgindo à luz do

dia, de uma potencial associação criminosa entre uma loja maçónica, entre os serviços de informações e

interesses privados? Ou teria evitado, também, as informações que têm vindo à luz do dia, de que os próprios

serviços de informações externos foram utilizados para andar a «fichar» uns e outros? Tinha evitado estes

problemas?

A questão fundamental, como sabe, Sr. Deputado, não reside exatamente nesta questão. Ainda hoje

podemos ficar, no mínimo, algo surpreendidos e surpreendidas quando tudo se passou entre tantas

observações que poderiam ter sido feitas, entre tantos registos que tinham de ser considerados, entre tanta

gente que podia ter visto e que, afinal não viu!

Finalmente, quanto ao período de nojo, bem-vindos ao debate, valeu a pena! Afinal, com o tempo,

perderam a reserva que tinham no passado relativamente à aplicação desta medida a todos os agentes e

funcionários. Esta é uma questão que exigiria alguma precaução e, porventura, um debate mais alargado, que

poderemos fazer.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Queira fazer o favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Termino já, Sr. Presidente.

Por último, não há previsão de sanções e, do nosso ponto de vista, era evidente que essa matéria deveria

estar consagrada nesta vossa iniciativa.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís

Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Partido Socialista traz

hoje para discussão uma iniciativa legislativa no sentido de reforçar o controlo e a prevenção das

incompatibilidades, impedimentos e conflitos de interesses dos agentes e dirigentes dos nossos serviços de

informações.

Como primeira nota, gostaria de dizer que este projeto de lei vem, de certa forma, ao encontro da posição

assumida pelo Conselho de Fiscalização do Sistema de Informação da República Portuguesa, que, num

parecer de 2010, chama a atenção para a «eventual utilidade de se poder vir a criar um impedimento legal

temporário para dirigentes e funcionários com especiais responsabilidades».

Nesta perspetiva, Os Verdes também consideram que a confiança dos cidadãos nas nossas instituições,

mas também a necessidade de reforçar a sua eficiência e credibilidade, assumem uma natureza prioritária,

porquanto representam valores fundamentais que é necessário proteger, sobretudo ao nível da arquitetura

legislativa que lhe dá corpo.

Entendemos, assim, que é de toda a oportunidade proceder a uma clarificação do regime jurídico dos

serviços de informações, que passe, por um lado, por reforçar o controlo e a prevenção de incompatibilidades,

impedimentos e conflitos de interesses dos seus membros e, por outro lado, pelo reforço da intervenção

parlamentar.

Página 38

I SÉRIE — NÚMERO 84

38

Aliás, a propósito da intervenção parlamentar nos Serviços de Fiscalização, como já tivemos oportunidade

de referir, e sem pretender desvalorizar a iniciativa em discussão, Os Verdes consideram que a solução mais

adequada, a solução mais desejável e a mais democrática seria a de envolver a própria Assembleia da

República na fiscalização direta dos serviços de informações.

Para nós, é uma questão absolutamente essencial consagrar a efetiva e direta fiscalização dos serviços de

informações para o nível parlamentar.

Bem sabemos que não é essa a proposta do Partido Socialista, que, aliás, nesta matéria se limita a permitir

um escrutínio parlamentar mais reforçado no momento da designação dos membros dos serviços de

informações, o que representa, de qualquer forma, um avanço — ainda que tímido, diga-se — no escrutínio

parlamentar no que diz respeito à atividade dos serviços com a audição prévia e obrigatória dos futuros

diretores dos serviços de informações.

Todavia, isto não pode querer dizer que não se continuem a procurar formas de fiscalização democrática

do funcionamento dos Serviços de Informação da República Portuguesa, porque para Os Verdes esta

Assembleia não pode, nem deve, demitir-se do exercício dessa importante função para a democracia, que é a

sua fiscalização.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Muito bem!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não havendo mais intervenções, está concluída a

discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 181/XII (1.ª).

Vamos passar ao terceiro ponto da ordem de trabalhos, a discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º

124/XII (1.ª) — Altera o mecanismo de prova de condição de recursos, permitindo a atualização permanente

dos rendimentos do agregado familiar (PCP).

Para apresentar o projeto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde a primeira hora, o PCP alertou

para o problema que o Decreto-Lei n.º 70/2010 — a chamada «condição de recursos» — iria criar na

sociedade portuguesa. Votámos contra e, desde a primeira hora, denunciámos que este mecanismo legal

visava limitar o acesso a prestações sociais.

Hoje, há muitas pessoas que precisam de apoios sociais e não os recebem por culpa desta «condição de

recursos» criada pelo PS, com o agrado e o aplauso do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — O Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, desferindo um rude golpe às

mais fundamentais prestações sociais, como o abono de família, a bonificação por deficiência, o rendimento

social de inserção, o subsídio social de maternidade e paternidade, o subsídio social de desemprego, entre

tantos outros, foi um passo fundamental para a destruição dos direitos das pessoas.

A título exemplificativo, o abono de família, que abrangia 1,8 milhões de crianças e jovens em 2010, em

maio de 2011 passou a abranger 1,190 milhões de crianças e jovens. Isto é, 637 000 crianças e jovens ficaram

sem abono de família, além de milhares que viram a sua prestação social reduzida.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Uma vergonha!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Este diploma, ao alterar os requisitos para a verificação da condição de

recursos, incluindo rendimentos que anteriormente não eram contabilizados, veio vedar o acesso de milhares

de pessoas a um conjunto significativo de prestações sociais.

Sem deixar de afirmar a injustiça e a necessidade de revogar a condição de recursos — o Decreto-Lei n.º

70/2010 —, há uma realidade, um problema que urge atender. Hoje, fruto da crise económica e social, fruto de

opções políticas, fruto do pacto de agressão a que se assiste no nosso País, há cada vez mais famílias que

sofrem alterações significativas dos seus rendimentos: de um momento para o outro, há famílias da dita

«classe média» que passam para uma situação de pobreza.

Página 39

15 DE MARÇO DE 2012

39

Acontece que, segundo o Decreto-lei n.º 70/2010, para a atribuição de prestações sociais o que conta é a

declaração de IRS do ano passado. Só que, de um momento para o outro, tudo muda, graças ao desemprego

por exemplo, mas para o acesso às prestações sociais tudo fica na mesma! Impede-se, assim, o acesso a

prestações sociais com base em rendimentos que já não existem.

Esta injustiça foi denunciada, e muito bem, pela CGTP e pelo Sr. Provedor de Justiça. Aliás, importa aqui

citar o Sr. Provedor de Justiça, quando diz: «O critério geral estabelecido no diploma legal supramencionado

para o apuramento de rendimentos dos agregados familiares é gerador de manifesta iniquidade,

nomeadamente nas situações em que se verifique uma redução anómala dos rendimentos das famílias,

impondo-se…» — continua o Sr. Provedor — «… a adoção de um critério que atenda aos rendimentos

efetivamente auferidos pelo agregado familiar».

Nessa medida, o PCP entende que é urgente alterar a lei e permitir uma reavaliação das prestações, uma

atualização sempre que se verifiquem alterações significativas dos rendimentos dos agregados familiares.

O PCP apresenta um projeto de lei que responde a este problema e, independentemente das divergências

que temos em torno do Decreto-Lei n.º 70/2010 e as injustiças que tal Decreto-Lei comporta, importa corrigir

esta manifesta injustiça!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Ruivo.

O Sr. Mário Ruivo (PS): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Através do projeto de lei n.º 124/XII,

hoje em discussão, visam os Deputados do Partido Comunista permitir a atualização permanente dos

rendimentos do agregado familiar para efeitos da atribuição das prestações e apoios sociais previstos no

Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho.

Permitam-me, Sr.as

e Srs. Deputados, que relembre que o Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, veio

determinar a criação de um quadro harmonizado de acesso às prestações sociais não contributivas da

segurança social, conferindo maior coerência, rigor e eficiência na atribuição das mesmas.

Para o Partido Socialista, sempre o afirmámos, o acesso às prestações e aos apoios sociais do Estado tem

de pautar-se por princípios de rigor, de transparência, de justiça e de equidade.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Neste contexto, consideramos a iniciativa legislativa do PCP, que visa a atualização permanente dos

rendimentos do agregado familiar para efeitos de atribuição das prestações previstas no Decreto-Lei n.º

70/2012, de 16 de junho, globalmente positiva no plano dos princípios e dos objetivos que encerra.

Com efeito, a atualização permanente dos rendimentos do agregado familiar conduziria seguramente a

uma maior justiça e rigor na atribuição das prestações sociais não contributivas, quer seja em virtude de

quebra quer seja por via do aumento dos rendimentos do agregado familiar.

Contudo, temos algumas reservas quanto à exequibilidade da medida, já que a mesma pode conduzir, no

limite, a que todos os meses ocorram alterações ao nível das prestações e o que importa ponderar é se estão

os serviços da segurança social preparados para responder a estas situações de forma célere e eficaz.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O atual quadro de acesso às prestações sociais estabelecido no

Decreto-Lei n.º 70/2010 afigura-se, na nossa perspetiva, justo, adequado e equilibrado na medida em que

assenta na composição e nos rendimentos do agregado familiar e na estabilidade do montante das prestações

concedidas, sem prejuízo da sua revisão em momento próprio.

Naturalmente, estamos, como sempre estivemos, abertos a aperfeiçoamentos e benfeitorias que se

traduzam em maior rigor, transparência e justiça na atribuição das prestações sociais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Barata

Lopes.

Página 40

I SÉRIE — NÚMERO 84

40

A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O projeto de lei que o Partido

Comunista Português hoje traz a esta Assembleia pretende uma alteração imediata do Decreto-Lei n.º

70/2010, que estabelece as regras para verificar as condições de recursos no acesso a prestações sociais de

solidariedade.

Baseia-se o PCP no alerta do Sr. Provedor de Justiça para casos em que, na aplicação deste Decreto-Lei

aprovado pelo anterior governo socialista, se geram situações de injustiça relativa.

No momento inequívoco de delicadeza orçamental para as famílias, não restam dúvidas ao PSD de que

esta situação deve ser devidamente analisada.

Na voz do PCP, tudo é fácil!

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Utilizam a carta do Provedor de Justiça ao Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social

para justificar o levantamento da situação…

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

… mas, convenientemente, ignoram a parte em que, nesse mesmo documento, o próprio Provedor afirma

que a solução — aqui proposta pelo PCP — levanta questões procedimentais e operacionais graves que

poderão originar desigualdades de tratamento entre os portugueses.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Questões procedimentais e operacionais que dificultam a aplicação

desta solução por terem na base falta de rigor e instrumentos de fiscalização. E uma solução pouco rigorosa e

séria não serve os que dela necessitam.

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Não tem o PSD dúvidas de que é importante encontrar uma fórmula para que seja conjugável o princípio da

eficácia com o princípio da oportunidade, ou seja, encontrar um mecanismo que garanta que o sistema de

segurança social responde às necessidades dos portugueses no efetivo momento de carência.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — É para isso que trabalham o PSD e o Governo.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — PSD, zero!

A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Trabalho que vai, aliás, ao encontro de muitas das preocupações

formuladas pelo Sr. Provedor de Justiça para com as famílias e os jovens. É o caso das famílias

desempregadas com filhos a cargo, a quem este Governo majorou o subsídio de desemprego, por exemplo.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Uma vergonha!

A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Relembro também que o Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho, já

foi alvo de alteração, viabilizada pelo PSD, corrigindo uma situação de profunda injustiça no cálculo para

atribuição das bolsas de estudo e de formação.

Página 41

15 DE MARÇO DE 2012

41

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Com esta alteração, reforçaram-se os apoios aos jovens estudantes mais carenciados e aos agregados

familiares mais numerosos.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Primeiro corta, depois aumenta!

A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — É aqui, aliás, Sr.as

e Srs. Deputados, que nos diferenciamos: o PSD,

mesmo tendo de conjugar a responsabilidade da governação de um País com a marca inquestionável da

justiça e da sensibilidade e solidariedade sociais, identifica problemas e aplica soluções justas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — O Governo, tendo já identificado os problemas a que reporta o Sr.

Provedor de Justiça, acolhe deste as preocupações manifestadas e, não temos dúvidas, tudo fará para os

ultrapassar. Mas fá-lo-á sempre salvaguardando o rigor na atribuição de prestações sociais, porque o sistema

de segurança social não pode ser vulnerável, em qualquer momento, a situações menos claras.

Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: As soluções facilitistas não servem. Só uma segurança social séria

e justa poderá ser solidária e garantir o apoio àqueles que dela efetivamente necessitam.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Gostaria de começar esta

intervenção citando o então Deputado Pedro Mota Soares aquando da discussão que aqui se fez sobre o

Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho. Dizia o então Deputado, agora Ministro, o seguinte: «Este diploma

penaliza os pensionistas, penaliza os idosos mais doentes, penaliza as crianças, penaliza famílias

trabalhadoras, nomeadamente as que têm a cargo filhos a estudar (…)» Mais à frente, dizia o então Deputado

Pedro Mota Soares, agora Ministro, que «O Governo não percebe que um idoso pensionista tem de ser olhado

pelo Estado, pela sua condição etária, como alguém que é mais frágil, alguém que está mais dependente,

alguém que está mais sujeito ao abandono e que, na maior parte dos casos, tem consumos com a saúde

muito elevados e que, sistematicamente, tem sido penalizado por este Governo (…)». O governo era então do

Partido Socialista, que, de facto, produziu um decreto-lei que estigmatizou os mais pobres dos pobres, um

decreto-lei que os faz pagar uma crise que não é deles.

Não obstante termos defendido a revogação do Decreto-Lei n.º 70/2010, situação que continuamos a

defender, porque não é pela fiscalização apenas dos mais pobres que se faz justiça — e este decreto-lei

penaliza apenas os mais pobres —, entendemos que hoje é urgente fazer uma alteração, ainda que cirúrgica,

a este diploma, nomeadamente adequando-o àquilo que, de facto, as pessoas ganham.

Não venham os Srs. Deputados do PS, do PSD ou do CDS invocar que os serviços não têm condições

para aplicar tal alteração. Os serviços terão todas as condições, Sr.as

e Srs. Deputados, porque estamos

exatamente na era das novas tecnologias, onde um programa informático tem condições para resolver este

problema, aliás, como já é praticado na concessão de outros benefícios e de outros subsídios, como bem

sabem as Sr.as

e os Srs. Deputados.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exatamente!

Página 42

I SÉRIE — NÚMERO 84

42

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Naturalmente que a Sr.ª Presidente do Instituto da Solidariedade e

Segurança Social acolheria com muito bons olhos tal medida, até porque, creio, está, com certeza,

empenhada em prestar um bom serviço aos beneficiários mais estigmatizados.

Por isso mesmo, e seguindo a opinião do Sr. Provedor de Justiça, não podemos remeter para a atribuição

de um subsídio os rendimentos auferidos há mais de um ano — porque é disto que se trata —, com as

situações que hoje existem de desemprego acelerado, do custo de vida, que aumenta de uma forma

assustadora, e de muitas e muitas famílias estarem a entregar as suas casas.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Termino já, Sr. Presidente.

Infelizmente, não pode ser esta a base para a atribuição dos subsídios. Por isso mesmo, esta alteração é

uma urgência e é para ser feita imediatamente, Sr.as

e Srs. Deputados.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Não vamos escamotear a situação

que o PCP aqui traz a debate com o presente projeto de lei. Evidentemente, estamos conscientes de duas

situações: primeiro, da existência deste problema, que vem de trás, vem do Decreto-Lei n.º 176/2003, de 2 de

agosto, artigo 36.º, que diz que a condição de recursos é provada pela apresentação do IRS do ano

imediatamente anterior àquele em que se pede a prestação social — não vamos escamotear esta situação —,

e, segundo, não vamos escamotear também, a partir do momento em que a reconhecemos, que há

necessidade de resolver a situação em devido tempo, com bom senso, da melhor maneira e com o melhor

benefício para todas as pessoas.

Porém, a questão é esta: primeiro e com o devido respeito, ao contrário do que diz o PCP na parte inicial

do seu projeto de lei, a situação não afeta todas as prestações sociais, afeta só as prestações familiares. Não

afeta o RSI (rendimento social de inserção), nem outras prestações; só afeta as prestações familiares.

Vozes do PCP: — Só?!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Segundo, tomo a devida nota da fé que a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca

depositou no sistema informático dos serviços sociais,…

Protestos da Deputado do BE Mariana Aiveca.

… mas faço lembrar que, ainda há pouco tempo, foi debatida aqui, por iniciativa não sei se do Bloco de

Esquerda, se do Partido Comunista ou se de ambos, a questão dos erros, das cartas enviadas, das

reclamações, etc.,…

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exatamente! É um exemplo!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … erros que também são gerados pelo sistema informático.

Ora, a questão que se coloca é esta: vamos introduzir uma medida destas sem primeiro aferir junto do

sistema e dos serviços a sua capacidade de processar este volume de informação, e de a processar de forma

correta, sem criar um entupimento, sem criar problemas gravíssimos de atraso na entrega das prestações, de

pagamentos errados de prestações, com todas as reclamações e todos os inconvenientes que daí podem vir?

Esta é a primeira questão que se coloca.

Portanto, no nosso entender, primeiro, há que avaliar, há que estudar e ver a forma concreta de

implementar uma alteração destas.

Página 43

15 DE MARÇO DE 2012

43

A segunda questão que se coloca, já aqui levantada, e muito bem, pela Sr.ª Deputada do PSD que

interveio antes de mim, é a da verificação, da fiscalização, porque não podemos presumir que as variações no

rendimento são só para baixo, podem ser para cima. Como é que podemos controlar?

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Está tudo a ficar a rico!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sabemos, porque faz parte da natureza humana, e é justo, que quem tem

uma variação para menos vai imediatamente comunicá-la à segurança social, mas não temos a certeza de

que quem tem uma variação para mais vá voluntariamente comunicar à segurança social essa variação para

mais, querendo, portanto, passar a receber menos. Esta certeza não a temos, e não temos maneira de

controlar, a não ser a posteriori, no ano seguinte, com a entrega da declaração de IRS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

E, aí, lá teríamos as tais cartas a pedir a devolução do que receberam a mais e que, voluntariamente, não

foram declarar. É isto que queremos evitar.

Para terminar, Sr. Presidente, quero dizer que o CDS está sensibilizado para esta matéria, que o PSD está

sensibilizado para esta matéria, como aqui disse, e, acima de tudo, o Governo também está.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — E não fazem nada?!

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Neste momento, o Governo, o Sr. Ministro e a Sr.ª Presidente do Instituto

de Solidariedade e Segurança Social estão a trabalhar em conjunto com os serviços que fazem a gestão das

prestações sociais de forma a encontrarem um meio, uma maneira eficaz, correta e que funcione, que permita

resolver este problema, que, reconheço, existe e não é escamoteado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado para uma segunda

intervenção muito breve, dada a curteza do tempo de que dispõe.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A atribuição das prestações sociais

é, efetivamente, uma questão de rigor.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — É que, hoje, uma família em que, fruto do desemprego, um ou até os dois

membros do agregado familiar fiquem desempregados em fevereiro, no que diz respeito às prestações sociais,

só em janeiro de 2013 é que vai ter acesso a prestações sociais, porque só nessa altura é que são

considerados os verdadeiros rendimentos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pois é!…

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Trata-se aqui de ter em conta a situação real das famílias. Hoje, uma

família que passa para o desemprego não tem nenhum benefício, não pode concorrer ao abono de família,

não pode ter direito ao subsídio social de desemprego, porque o que conta são os rendimentos do ano

passado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

Página 44

I SÉRIE — NÚMERO 84

44

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Que lógica é que isto tem, Srs. Deputados? Absolutamente nenhuma!

Mas parece que a bancada do PSD não percebeu esta questão, que é tão simples,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — …e dá um tiro totalmente ao lado. Totalmente ao lado!… E isto é

verdadeiramente inaceitável, porque é de uma insensibilidade total. Do que se trata aqui é de ter em conta as

condições reais efetivas das famílias!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, peço-lhe que termine.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Termino, Sr. Presidente, contando com a mesma benevolência que deu

ao CDS-PP.

Dizem o PS e o PSD que a segurança social não tem condições para se adaptar, que isto iria criar

problemas, que seria difícil. Bem, a segurança social terá de adaptar-se. Hoje, há soluções informáticas.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, já igualou a tolerância dada ao CDS-PP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Por acaso ainda não!

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Por acaso, ainda não, Sr. Presidente, mas, seja como for, termino

perguntando se é ou não verdade que, quando foi para cortar nas prestações sociais e para cortar nas

pensões de reforma, os serviços da segurança social tiveram em conta os rendimentos reais. É ou não

verdade que para o rendimento social de inserção são tidos em conta os rendimentos reais, calculados e

verificados mensalmente? Então, por que é que para a atribuição de prestações sociais a quem fica no

desemprego não é tida em conta a situação real? É inaceitável!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos passar ao ponto 4, e último, da nossa

ordem de trabalhos, que consiste na apreciação da petição n.º 62/XII (1.ª) — Apresentada por Victor Alexandre

Simão Pinto Ângelo e outros, solicitando que a Assembleia da República defenda a importância das artes e da

cultura para além da crise, em conjunto com os projetos de resolução n.os

220/XII (1.ª) — Recomenda a

adoção de medidas que permitam um efetivo aproveitamento dos fundos comunitários dedicados ao setor

cultural (BE) e 253/XII (1.ª) — Recomenda ao Governo a adoção de medidas de combate aos efeitos da crise

no setor cultural (PCP).

Para apresentar o projeto de resolução do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina

Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Começo por saudar os

peticionários da petição sobre a importância das artes e da cultura para além da crise, alguns dos quais estão

hoje aqui, entre nós, e a quem agradeço a sua presença no Plenário da Assembleia da República.

Esta é uma petição que vem não só chamar a atenção para a importância das artes e da cultura no

desenvolvimento, na qualificação, na inclusão e na democracia portuguesa e também para aquilo que tem sido

as falhas nas políticas públicas para a cultura e no investimento, mas também exigir medidas e respostas

concretas.

Eu diria que, com este Governo, já não podemos sequer falar de desinvestimento na cultura, é mesmo um

completo desprezo. É de tal forma o desprezo que a cultura já nem sequer «flor na lapela» é; a cultura, pura e

simplesmente, desapareceu das políticas públicas deste Governo, e os sinais de desprezo são muitos, a

começar por um orçamento que desceu 75% em 10 anos.

Página 45

15 DE MARÇO DE 2012

45

Mas há mais: muito recentemente, tivemos palavras de circunstância, aquando da discussão do Orçamento

do Estado, onde nos disseram que a educação para a arte e para a cultura seria essencial, mas, logo a seguir,

faz-se uma revisão curricular, em que a arte ou a cultura não têm direito sequer a uma alínea; fala-se em

querer preservar o património da Humanidade, o Douro Vinhateiro, mas, logo a seguir, sabemos que os

pareceres negativos à construção da barragem, da parte da tutela do património, nem sequer são lidos, não

servem para nada, vão para o lixo; agora até sabemos que temos um miniconselho de ministros para decidir

as estratégias para a aplicação dos fundos comunitários através do QREN, em que a cultura nem sequer está

assente. Neste miniconselho de ministros, presidido pelo Ministro das Finanças, a cultura nem sequer tem voz,

direta ou indiretamente. Não está! Está fora! Nem sequer se lembraram! Sabiam lá que isso existia!… Não é,

Sr.as

e Srs. Deputados do PSD e do CDS?

Hoje, apresentamos aqui um projeto de resolução que vai ao encontro de um dos pontos da petição, e esta

petição fala-nos de várias áreas, às quais o Bloco de Esquerda tem apresentado propostas, em sede de

Orçamento, relativamente ao funcionamento dos contratos. Este Governo, que não pode rasgar contratos nem

com a Lusoponte, nem com a energia, nem com ninguém, na cultura rasga contratos uns após outros, sem

problema algum.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Mas o projeto que hoje apresentamos é para preparar a possibilidade de

utilizarmos dinheiro comunitário, porque o Governo diz-nos sempre que não há dinheiro. É mentira! A verdade

é que há, e parte desse dinheiro é comunitário. Todos os países da Europa estão a preparar-se para um novo

pacto, para um novo quadro comunitário, onde há mais dinheiro para a cultura, e Portugal nada faz. É contra

isto que estamos aqui hoje, e o nosso projeto de resolução é para prepararmos a nossa intervenção.

Lembro que só em Portugal é que um agente cultural vai a uma instituição internacional, a um encontro

internacional, e está sozinho. Um agente de qualquer outro país da Europa teria lá, com ele, uma televisão

pública ou a instituição pública da cultura. Com o de Portugal não está ninguém.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Só em Portugal é que as entidades responsáveis pelos fundos

comunitários da cultura nem sequer percebem que existe uma coisa chamada «bens imateriais», que é

cultura, e são capazes de levar à falência estruturas que foram financiadas, como acontece com o Artemrede.

E é para preparar a utilização dos fundos comunitários, para que não sejam destinadas a um exército de

intermediários mas, sim, ao setor nuclear da cultura, que apresentamos medidas concretas, porque não é

verdade que não haja dinheiro. A verdade é que os senhores não querem saber da cultura.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para apresentar o projeto de resolução n.º 253/XII (1.ª), do PCP,

tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, em nome do Grupo

Parlamentar do PCP, quero saudar os subscritores desta petição, os que se encontram presentes nas galerias

da Assembleia da República e todos aqueles que não puderam vir e que, certamente, acompanharão o debate

através de meios próprios. Quero também saudar todos aqueles que, não sendo subscritores da petição, se

reveem nas preocupações que ela manifesta, nomeadamente os que vivem das artes e da cultura, apesar de,

no momento em que vivemos, isto poder constituir um desafio à própria sobrevivência, e que persistem nesta

escolha, nesta sua opção de manifestar o seu sentimento através da arte e da cultura, enriquecendo, assim,

toda a nossa sociedade. Pena é que os nossos governos, os sucessivos governos, e, agora, ainda mais por

causa desta submissão aos comandos de uma troica estrangeira, teimem em não compreender o valor social

Página 46

I SÉRIE — NÚMERO 84

46

da arte e da cultura e insistam numa política de supressão, de censura financeira à produção artística e, por

esta via, também limitem a liberdade de criação e fruição culturais.

O PCP, porque se revê e porque partilha não só muitas das preocupações afirmadas nesta petição como

também algumas das exigências e reivindicações aqui colocadas, apresentou um projeto de resolução à

Assembleia da República que, não traduzindo todas as reivindicações colocadas na petição, nomeadamente a

elaboração de uma lei de bases da cultura e do financiamento da cultura por esta Assembleia, no essencial,

dá resposta a algumas das questões levantadas e estabelece sete medidas para que o Governo possa corrigir

um conjunto de políticas que têm vindo a ser levadas a cabo nos últimos anos e fazer com que, pelo menos no

setor da cultura, os trabalhadores da cultura, aqueles que vivem das artes e da cultura fiquem, de certa forma,

ressalvados pelo estado das pesadas influências da crise, que tem servido de pretexto para limitar a

intervenção do Estado em tudo.

Do ponto de vista do PCP, abandonar as artes e a cultura, abandonar o apoio às artes ou mesmo atrasar

os pagamentos, como se tem vindo a fazer — há pagamentos do apoio às artes que continuam por chegar às

estruturas de criação artística —, cancelar concursos, como, por exemplo, no apoio à produção

cinematográfica, para nós, esta questão do financiamento, do apoio do Estado às artes é determinante não

apenas para que as estruturas possam produzir mas porque determina a liberdade que os outros têm para fruir

de cultura, para fruir de bens e produtos artísticos e culturais que não sejam, única e exclusivamente,

determinados pelo mercado, pelo rolo compressor da monocultura capitalista que se impõe, que tritura tudo à

sua volta, que esmaga e seca toda a produção cultural livre e independente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — As sete propostas que o PCP aqui apresenta visam, no essencial, repor o

financiamento às estruturas de criação artística, criar condições para orçamentar mais para o próximo ano,

desbloquear fundos comunitários e garantir também a fiscalização das relações laborais nesta área, problema

tão conhecido desta Assembleia, entre outros, que hoje funcionam, objetivamente, como obstáculos ao

desenvolvimento de um serviço público de arte e cultura, ainda que também desenvolvido por estruturas

independentes e associativas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês Teotónio

Pereira.

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por cumprimentar os

peticionários aqui presentes, em nome do Grupo Parlamentar do CDS, e por agradecer terem trazido este

tema a Plenário, que veio despoletar a apresentação de dois projetos de resolução, um pelo PCP e outro pelo

Bloco de Esquerda, sobre os apoios financeiros e a atividade do Estado no setor cultural.

Começo pela petição, que considero bastante genérica, uma vez que se foca, principalmente, nas linhas

orientadoras de toda uma política governamental na área cultural.

Em nosso entender, parte desta petição já está desatualizada, porque a subida da taxa do IVA, no setor da

cultura, já aconteceu, tendo-se, no entanto, mantido a isenção em alguns serviços e bens culturais, como

esclareceu o Ministro das Finanças.

Quanto a determinar que a percentagem do orçamento para a cultura seja fixada em, pelo menos, 1% do

Orçamento do Estado, conforme sugere o texto da petição, consideramos que os orçamentos para as várias

áreas não se resolvem por fixação de percentagens mas, sim, tendo em conta as possibilidades práticas e as

necessidades, avaliando as prioridades de cada setor.

Ora, no contexto atual, existem necessidades urgentes, como todos sabemos, e condicionalismo rigorosos

que são aplicados a todos os setores, sem exceção, e a cultura não foi, nem será nunca, uma exceção.

Página 47

15 DE MARÇO DE 2012

47

O Sr. João Oliveira (PCP): — Para o CDS, os filmes portugueses não são cultura, os de Hollywood é que

são!

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — A petição e o projeto de resolução do PCP partem de um

pressuposto com o qual não concordamos: a cultura está apenas dependente do Estado. No nosso entender,

ao Estado compete ser facilitador da cultura e não o principal financiador, o que faria aumentar o seu potencial

determinismo sobre a atividade cultural.

Neste aspeto, concordamos, aliás, com o PCP, quando este diz que «O Estado não é programador cultural

(…) mas é o garante da liberdade de criação e, consequentemente, de programação».

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Consideramos que o importante é diversificar as fontes de

financiamento para o sector artístico, de modo a que este fique cada vez menos refém do apoio estatal.

Protestos do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Então, é o Governo que diz o que é arte e o que não é arte!

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Ora, esta petição e este projeto de resolução do PCP, apesar

de serem inquestionáveis, as suas boas intenções (parecem-me boas intenções) vão no sentido inverso,

alimentando essa dependência, razão pela qual não poderíamos subscrever nenhum dos documentos.

Um outro aspeto, que está esquecido na petição e em todos os projetos de resolução, é o público. Importa

salientar que a cultura tem um valor inestimável para a sociedade, mas apenas o tem se a sociedade usufruir

dela. Caso contrário, independentemente do seu valor artístico, não terá valor para a sociedade que com ela

não contacta. Isto parece-me óbvio! A distância entre a atividade cultural e o público é gritante e é um dos

obstáculos ao desenvolvimento do sector.

Note-se que não se trata de hierarquizar as obras culturais em função das audiências mas, sim, de insistir

no facto de que este ato tem de ser levado em conta quando o Estado define um critério para a atribuição de

financiamento.

Acreditamos que é neste sentido, tanto na autonomia do sector como na sua proximidade com o público,

que a Secretaria de Estado da Cultura tem de trabalhar.

Quanto ao projeto de resolução do Bloco de Esquerda, que pede maior ação por parte da Secretaria de

Estado, no sentido de garantir maior aproveitamento dos fundos comunitários, é de referir que o projeto de

resolução, embora também cheio de boas intenções, não traz nenhuma novidade, não propõe nada de

concreto que não seja já a parte integrante de qualquer ação governativa na área cultura.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

Protestos do PCP e do BE.

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Se calhar, o que fundamenta este projeto de resolução é o

facto de o Bloco de Esquerda, legitimamente, considerar que a Secretaria de Estado da Cultura não está a

fazer o seu trabalho e, por isso, achar necessário recomendar à Secretaria de Estado que faça um bom

trabalho. Achamos isto legítimo, no entanto, não concordamos e, como tal, também não podemos subscrever

este projeto de resolução.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de

Medeiros.

Página 48

I SÉRIE — NÚMERO 84

48

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também começo por saudar os 5000

peticionários que assinaram esta petição sobre a importância da arte e da cultura, sobretudo na pessoa dos

primeiros peticionários aqui presentes. Ainda bem que existem as petições, para conseguirmos falar de cultura

neste Plenário.

Nesta petição, os peticionários fazem sete propostas, entre as quais criar uma lei de bases para a cultura,

criar relações intergovernamentais entre educação e ciência, diversificar as fontes de financiamento e agilizar

os sistemas de apoio comunitário, para além, obviamente, das questões laborais dos trabalhadores do setor e

do orçamento para a cultura.

A Sr.ª Deputada do CDS acha estas propostas vagas. Eu acho que elas são muito, muito concretas. Aliás,

esta petição tem o mérito de abordar algumas das questões essenciais e mais urgentes no setor da cultura, e,

por isso, não posso deixar de estranhar a resposta que foi dada, aliás, assinada, pelo chefe de Gabinete do Sr.

Secretário de Estado da Cultura, que considera estas propostas bem-intencionadas, mas tão abrangentes que

mais parecem um programa eleitoral.

Pois é, Srs. Deputados, o que lamentamos é que o Programa do Governo não chegue, sequer, a abordar

estas matérias. É tão magrinho, tão magrinho, tão difuso, tão vago, tão vago, tão vago que nem sequer estas

matérias aborda. Esta é a primeira questão.

O problema é que, se o Programa do Governo é fraco, a atuação ainda é pior. E tenho de voltar à resposta

que foi dada pelo Sr. Secretário de Estado, que diz que todas as medidas — tirando a questão do orçamento e

do aumento do IVA, à exceção do IVA do livro, que passou de 6% para 13% — ou já estão em prática ou em

vias de implementação. Srs. Deputados, esta resposta foi dada em janeiro, estamos em março, e, portanto, é

legítimo perguntar: onde está a lei de bases da cultura pedida pelos peticionários? Onde está o registo

nacional dos profissionais do setor das atividades artísticas, que a Lei n.º 28/2011 previa para, justamente,

combater a precariedade dos trabalhadores do setor? O Governo tinha 60 dias para a implementar. Onde está

este registo? Já está implementado? Está em curso? Onde está a revisão da lei do mecenato? Dizem que já

está, mas aonde? Não sabemos!

Espero ter tempo para falar dos projetos de resolução, mas há a questão dos novos fundos da Europa e há

também a questão dos fundos regidos pelo QREN, obviamente.

Vamos, então, à questão do QREN. O que pudemos constatar é que o GPEARI (Gabinete de

Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais), que tinha como missão principal as relações

internacionais, agora já só tem uma missão pequenina, aliás, as relações internacionais já não estão previstas.

Mas, mais importante — e vou terminar, Sr. Presidente, antes que me diga qualquer coisa —,…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Ainda bem que a Sr.ª Deputada tem essa iniciativa.

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Termino já, Sr. Presidente. Só peço a mesma indulgência também.

Como eu estava a dizer, mais importante é saber onde estão as linhas estratégicas para os novos apoios

do QREN. O que fizeram em relação aos projetos que já estavam em curso pelo anterior Governo, aos

cineteatros e à rede de cinema digital? Onde é que isto está? Não há novidades!

Mais: o que aconteceu aos projetos que já estavam, de facto, em curso e para os quais Portugal só tinha

de contribuir com 15%, pois 85% eram fundos comunitários? Ao que parece, a Secretaria de Estado tem tão

pouco dinheiro que nem estes 15% consegue!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Por fim, as boas intenções são ótimas, mas, para já, o que está a

acontecer, na prática, é um corte de 100% no setor da cultura, porque todos os concursos de apoio à arte

estão parados, tanto na Direção-Geral das Artes como no ICA. É um caso inédito o corte de 100% num setor.

Aplausos do PS.

Página 49

15 DE MARÇO DE 2012

49

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria

Conceição Pereira.

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Cumprimento, também,

em primeiro lugar, os peticionários e, nomeadamente, os aqui presentes na pessoa do Sr. Vítor Ângelo, que

saúdo, de uma forma muito especial, pelo respeito que me merecem todos os profissionais das artes e da

cultura.

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

Eu não me assusto, Sr. Deputado. Pode ir dizendo os seus apartes, que não me assusto.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Já tenho alguns anos para não me assustar com apartes.

Dizia eu que esta petição tem, certamente, o seu mérito pelas finalidades que aqui apresenta, e referem os

peticionários que, de acordo com o artigo 78.º da Constituição, o Estado tem a responsabilidade de assegurar

o acesso de todos os cidadãos à cultura. Estamos totalmente de acordo. Mas também gostava de lembrar que

o artigo 42.º da Constituição refere, igualmente, a liberdade de criação cultural. O PSD acredita perfeitamente

que o Estado não tem de ser o principal investidor, nem o grande regulador, para não se tornar no grande

controlador da cultura. Acreditamos, sim, na criatividade e na liberdade dos protagonistas da cultura.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Todos sabemos que o País atravessa, neste momento, um

período difícil. E os Srs. Peticionários também o sabem, pelo que certamente também quererão dar a sua

participação para este desiderato de recuperação do País.

No PSD, não estamos de má consciência, Srs. Deputados. Se quiserem, podem verificar quais eram as

verbas existentes nos anteriores governos do PSD para a área da cultura.

O Sr. MiguelTiago (PCP): — Queremos saber é agora!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — O PSD é sério, o PSD assume todos os encargos,

nomeadamente aqueles que nos deixaram.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Temos de pagar 6 milhões de euros que não estavam

cabimentados, nem orçamentados.

Protestos do BE.

Essa é a realidade dos factos. E se esses 6 milhões de euros não tivessem ficado dentro da gaveta, se

calhar serviriam para outros fins para os profissionais das artes e da cultura.

Vozes do PSD: — Muito bem lembrado!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Nós não temos estado distraídos, Sr.ª Deputada Inês de

Medeiros.

Página 50

I SÉRIE — NÚMERO 84

50

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Ah, pois não!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Temos não só de pagar como também de resolver os

problemas que nos deixaram: no OPART, na Orquestra do Norte, na Tóbis. São inúmeros os problemas que

temos para resolver.

Nós não prometemos, como alguns responsáveis do governo anterior, que «choraram lágrimas de

crocodilo» e que disseram que iam dar 1% do Orçamento. Nós não gostamos de mentir às pessoas. Isso seria

falacioso.

Risos do Deputado do PCP Miguel Tiago.

Refiro ainda que, a nível da taxação, como já disse, e muito bem, na área do livro e na área dos ingressos,

baixámos o IVA.

Quero dizer ao Bloco de Esquerda que também saúdo a sua proposta de resolução, até pelo fim em vista.

A União Europeia apresentou este programa da Europa Criativa, embora o Bloco de Esquerda, no seu projeto

de resolução, prefira usar palavras inglesas, dizendo Creative Europe. Devo, contudo, dizer que, no próprio

QREN (e os fundos comunitários são exatamente a mesma coisa), já hoje os projetos na área da cultura

atingem 196 milhões de euros.

Quero também dizer ao Partido Comunista Português, que, como é natural, foi a reboque da petição, que,

neste momento, já está a ser feito (e até me admira que desconheça) um levantamento das necessidades e

que tanto o Sr. Diretor-Geral das Artes como todo o seu staff já estão no terreno para fazer esse levantamento.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Assim sendo, vem atrasado, Sr. Deputado!

O Sr. MiguelTiago (PCP): — A sua intervenção não me assusta, Sr.ª Deputada!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Acima de tudo, nós cumprimos o que prometemos. E pagamos

o que nos deixaram para pagar.

O Sr. MiguelTiago (PCP): — É mentira! Não pagam! Não estão a pagar!

A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Por isso, estamos aqui de cabeça erguida.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, chegámos ao fim da nossa ordem de trabalhos.

A próxima sessão plenária realiza-se amanhã, às 15 horas, com a seguinte ordem de trabalhos:

declarações políticas; debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PS, sobre a economia

portuguesa e a execução do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN); a apreciação da Conta

Geral do Estado de 2009; e a apreciação da petição n.º 70/XII (1.ª) — Apresentada por Sérgio Claudino e

outros, solicitando à Assembleia da República a adoção de medidas para uma formação inicial autónoma dos

professores de Geografia e História.

Srs. Deputados, vai ter lugar, no restaurante do Edifício Novo, uma degustação de pão de ló e vinho verde

do concelho de Felgueiras. Os Srs. Deputados que queiram passar por lá, façam favor.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 11 minutos.

Página 51

15 DE MARÇO DE 2012

51

Imagem projetada pelo Deputado do PSD Nuno Reis no decurso da declaração política que proferiu.

Imagem 1 — voltar

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária:

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×