Página 1
Quinta-feira, 4 de julho de 2013 I Série — Número 108
XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)
REUNIÃOPLENÁRIADE3DEJULHODE 2013
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 8
minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º
160/XII (2.ª) e dos projetos de resolução n.os
781 a 787/XII (2.ª).
Em declaração política, a Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes), face à crise política desencadeada pela demissão dos Ministros de Estado e das Finanças e de Estado e dos Negócios Estrangeiros, teceu críticas ao Primeiro-Ministro e à política prosseguida pelo Governo e defendeu a dissolução do Parlamento e a realização de eleições.
Em declaração política, o Deputado Couto dos Santos (PSD), manifestou preocupação pela crise política e apelou a que todos os partidos, em especial o maior partido da
oposição, não tomem posições que afetem a imagem do nosso País e a credibilidade dos nossos credores. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados José Junqueiro (PS), João Oliveira (PCP), Pedro Filipe Soares (BE) — que também deu explicações ao Deputado Abel Baptista (CDS-PP), que usou da palavra em defesa da honra da bancada — e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Em declaração política, o Deputado Carlos Zorrinho (PS), tendo em conta o momento de crise política, acusou o Governo de ser um fator de instabilidade, colocando em causa o esforço feito pelos portugueses, e defendeu a realização de eleições. Respondeu, depois, ao pedido de esclarecimento do Deputado Luís Montenegro (PSD).
Em declaração política, o Deputado Bernardino Soares (PCP) protestou contra o Governo português pela recusa de
Página 2
I SÉRIE — NÚMERO 108
2
autorização de aterragem do avião presidencial da República da Bolívia em território nacional, pediu a demissão do Governo, a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições.
Em declaração política, a Deputada Catarina Martins (BE) defendeu a realização de eleições, exigiu clareza por parte dos partidos políticos na rejeição da política de austeridade e propugnou pela renegociação da dívida.
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, o Deputado Rui Pedro Duarte (PS) alertou para os efeitos que o desinvestimento está a ter nas novas gerações, para a falta de capacidade do Governo para responder ao desemprego jovem e defendeu um novo governo capaz de garantir um contrato de confiança com as novas gerações de portugueses.
Ainda ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, a Deputada Isabel Alves Moreira (PS) insurgiu-se contra os acontecimentos dos últimos dias desencadeados pelo pedido de demissão do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Portas, e acusou o Primeiro-Ministro de estar a desmantelar o Estado social.
Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 159/XII (2.ª) — Autoriza o Governo a rever o regime sancionatório constante do Capítulo IV do Decreto-Lei n.º 133-A/97, de 30 de maio, aplicável no âmbito do regime jurídico de instalação, funcionamento e fiscalização dos estabelecimentos de apoio social geridos por entidades privadas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de
março. Intervieram, além do Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social (Marco António Costa), os Deputados Inês Teotónio Pereira (CDS-PP), Jorge Machado (PCP), Carlos Silva e Sousa (PSD) e Mário Ruivo (PS).
Foi também apreciada, na generalidade, a proposta de lei n.º 158/XII (2.ª) — Estabelece o regime aplicável aos grafitos, afixações, picotagem e outras formas de alteração, ainda que temporária, das caraterísticas originais de superfícies exteriores de edifícios, pavimentos, passeios, muros e outras infraestruturas, tendo-se pronunciado, a diverso título, além do Ministro da Administração Interna (Miguel Macedo), os Deputados João Oliveira (PCP), Pedro Delgado Alves (PS), Cecília Honório (BE), Carlos Peixoto (PSD) e Teresa Anjinho (CDS-PP).
Foram debatidos em conjunto os projetos de resolução n.
os 647/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo o estudo e a
tomada de medidas urgentes a fim de dar sustentabilidade ao setor automóvel em Portugal (PS), 781/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a análise e adoção de medidas de apoio ao sector automóvel nacional (PSD e CDS-PP) e 782/XII (2.ª) — Medidas urgentes para o sector automóvel (PCP). Fizeram intervenções os Deputados Fernando Serrasqueiro (PS), Paulo Simões Ribeiro (PSD), João Paulo Viegas (CDS-PP), Bruno Dias (PCP) e Ana Drago (BE).
O Sr. Presidente (Guilherme Silva) encerrou a sessão eram 18 horas e 5 minutos.
Página 3
4 DE JULHO DE 2013
3
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 8 minutos.
Os Srs. Agentes da autoridade podem abrir as galerias.
Antes de darmos início à ordem do dia, o Sr. Secretário, Deputado Duarte Pacheco, vai fazer o favor de ler
o expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 160/XII (2.ª) — Cria a Comissão para o
Acompanhamento dos Auxiliares da Justiça, que baixa à 1.ª Comissão; e projetos de resolução n.os
781/XII
(2.ª) — Recomenda ao Governo a análise e adoção de medidas de apoio ao setor automóvel nacional (PSD e
CDS-PP), que baixa à 6.ª Comissão, 782/XII (2.ª) — Medidas urgentes para o setor automóvel (PCP), que
baixa à 6.ª Comissão, 783/XII (2.ª) — Reorganização das áreas territoriais das forças de segurança no
concelho de Ourém por uma justa repartição de território entre a PSP e a GNR (PSD e CDS-PP), que baixa à
1.ª Comissão, 784/XII (2.ª) — Concessões ferroviárias (PSD), que baixa à 6.ª Comissão, 785/XII (2.ª) — Que
estude a possibilidade de desativar os três pórticos de cobrança de portagem localizados na malha urbana da
cidade da Maia, entre os quilómetros 4 e 8 da A41, defendendo os melhores interesses da Maia e de toda a
Região Metropolitana do Porto, reparando uma grave injustiça para com os maiatos face ao contexto nacional
(PSD), que baixa à 6.ª Comissão, 786/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a conclusão urgente das obras de
requalificação da Escola Secundária do Monte da Caparica, da Escola Secundária João de Barros, da Escola
Secundária Jorge Peixinho e da Escola Secundária do Pinhal Novo, na região de Setúbal (PCP), que baixa à
8.ª Comissão, e 787/XII (2.ª) — Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 68/2013, de 17 de maio, que procede
à transferência de competências do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, IP (INSA, IP), exercidas
pelo Centro de Genética Médica Doutor Jacinto Magalhães daquele Instituto, para o Centro Hospitalar do
Porto, EPE (PCP).
A Sr.ª Presidente: — Vamos, agora, entrar na ordem do dia, cujo primeiro ponto consiste em declarações
políticas.
Segue-se, no segundo ponto, o debate da proposta de lei n.º 159/XII (2.ª), sobre estabelecimentos de apoio
social geridos por entidades privadas. Teremos, depois, a discussão da proposta de lei n.º 158/XII (2.ª) sobre
grafitos. Por último, serão apreciados três projetos de resolução sobre o setor automóvel.
Sendo assim, vamos dar início às declarações políticas.
Em primeiro lugar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Das piores coisas que
podem acontecer a um País é ter um Primeiro-Ministro que perdeu a lucidez,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … quando não percebe o seu isolamento e que o seu tempo
como chefe do Executivo acabou!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Acabou mesmo!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — O Governo não tem, de há muito tempo, apoio social. Não é de
estranhar! O que assumiu na campanha eleitoral desvirtuou imediatamente a seguir à sua tomada de posse.
Fez tudo ao contrário do que tinha prometido, desde o aumento mais do que brutal de impostos ao confisco
dos salários, pensões e subsídios, ao galope numa austeridade de gravíssimos resultados para o País. Tudo
isto sob a promessa imediata de que os resultados se vislumbrariam a breve prazo. Em 2011, assegurava o
Primeiro-Ministro que o ano de 2012 era o ano de viragem — foi um ano ainda pior!; em 2012, que 2013 seria
o ano do crescimento. A estimativa é, porém, uma recessão, por enquanto de 2,3%. Em 2013, já se afirmava
Página 4
I SÉRIE — NÚMERO 108
4
que será em 2014! E, contudo, é sempre, sempre a afundar! Com famílias e empresas completamente
estranguladas, como era possível este Governo manter algum apoio da sua sociedade?
Tudo falhou: o País empobreceu, o desemprego galopou, a emigração forçada renasceu, a economia
definhou, o défice subiu, a dívida cresceu. Cada deslocação pública de um membro do Governo fomentava um
mar de vaias e de protestos populares. Foram greves e manifestações das maiores de que há memória. Era o
sentimento social mais evidente de que já não dava para aguentar mais este Governo.
Aqueles que acham que a luta não vale a pena têm hoje respostas claras. Unir vozes que evidenciem os
efeitos das políticas na vida concreta das pessoas, a reclamação de medidas justas e que levantem o País, a
união das populações, em suma, a luta, desgasta os protagonistas destas políticas degradantes.
Desgastado, Vítor Gaspar demitiu-se, esmagado pela evidência da incompetência das políticas
governamentais. No dia seguinte, uma hora antes da tomada de posse da nova Ministra das Finanças, já
previamente desgastada por toda a sua envolvência na polémica dos swap e, portanto, de negócios ruinosos
para o País, os portugueses conhecem a decisão irrevogável da demissão de Paulo Portas, Ministro de Estado
e dos Negócios Estrangeiros e presidente de um dos partidos da coligação governamental. Sai tarde, mas
valha-nos pelo menos o facto de ter saído antes de ter apresentado a proposta para a chamada «reforma do
Estado», que significaria o encerramento de inúmeros serviços públicos e o despedimento em massa de
milhares e milhares de funcionários públicos.
Definhado o País e desagregado o Governo, apresentou-se ontem, numa declaração aos portugueses, um
Primeiro-Ministro com uma total falta de lucidez! «Não me demito!» — foi a sua palavra de ordem. Mas o que é
preciso acontecer mais para que Pedro Passos Coelho perceba que o Governo acabou, que os Ministros
fogem a conta-gotas a cada dia que passa e que o seu isolamento é mais do que evidente? O que é preciso
mais para que o Primeiro-Ministro perceba que cada dia que passa, com este Governo em funções, é mais um
dia em que o País perde tempo, o tempo que precisa para recuperar dos erros cometidos? Os Verdes
disseram ontem, e reafirmam hoje, que o País não tem tempo para se pôr a assistir a jogatanas político-
partidárias entre o PSD e o CDS. O Governo acabou!
O Sr. MiguelTiago (PCP): — Acabou!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Este espetáculo deprimente precisa ter um fim!
É exatamente aqui que é chamada a Presidência da República. Um Presidente da República que se
assuma como garante do regular funcionamento das instituições democráticas, como a Constituição manda
que seja, só tem uma hipótese possível de atuação neste momento: dissolver a Assembleia da República! O
Governo e a maioria parlamentar não têm mais ponta de viabilidade, constituem a instabilidade política mais
evidente, são a irregularidade mais pura! A dissolução da Assembleia da República é o imperativo nacional!
Vozes do PCP: — Muito bem!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — O País, no estado em que está, não pode tolerar mais um
Presidente adormecido, a assumir o papel de «almofada» de um Governo e de uma maioria parlamentar
desagregados. O que nos faltava ainda era, chegados a este ponto, confirmarmos a total inutilidade de um
Presidente da República! O Sr. Presidente quer ouvir os partidos com representação parlamentar. Esperemos,
pois, que seja com um único objetivo possível: a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições
antecipadas!
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Pela parte de Os Verdes, só temos mais a acrescentar que não
abdicaremos de nenhum dos instrumentos que temos ao nosso alcance e ao nosso dispor para pôr fim a esta
crise que grassa pelo País, protagonizada por um PSD e por um CDS que «cavaram a sua própria sepultura».
Para que o País tenha oportunidade de viver em paz, é preciso que urgentemente se realizem novas eleições
legislativas.
É preciso, agora, uma resposta de quem a deve aos portugueses. Aguardaremos pela atitude do Sr.
Presidente da República. Pela parte do Partido Ecologista «Os Verdes», o que temos a dizer é que não
aceitamos outra solução que não passe pela dissolução do Parlamento. Para nós, outra qualquer decisão
Página 5
4 DE JULHO DE 2013
5
seria uma traição ao País, face à realidade, às necessidades e ao espetáculo absolutamente deprimente que
hoje está criado.
É triste dizê-lo, Sr.as
e Srs. Deputados, mas é justamente com a desagregação do Governo que renasce
nova esperança para o País! Há alternativas saudáveis a esta política medonha da direita, assim essa seja a
opção dos portugueses.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para proferir a próxima declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Couto dos
Santos.
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Estamos a viver uma séria
crise política que deve merecer de todos os partidos uma reflexão profunda e a serenidade necessária para
que as soluções que venham a encontrar-se deem confiança e não ponham em causa os interesses de
Portugal e dos portugueses.
Apelo a que as paixões políticas e as emoções do momento não contribuam para tomadas de posição que
afetem a imagem do nosso País e não afetem a credibilidade dos nossos credores.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — Se assim não for, serão sempre os portugueses e os mais
necessitados a ser atingidos nas suas condições de vida.
Mais do que nunca, exige-se dos políticos bom senso e inteligência…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Diga isso ao Primeiro-Ministro!
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — … para que os portugueses possam ficar descansados relativamente
ao seu futuro.
Ficamos preocupados com esta crise, mas o PSD tudo fez para a evitar e tudo fará para a resolver, a bem
do País e dos portugueses.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — Neste momento, os interesses partidários têm de ser sacrificados,
pondo Portugal e os portugueses na frente, face às preocupações que temos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O País vive, há dois anos, sob um programa de assistência financeira. E vale a pena recordar que esta
ajuda foi pedida quando já não havia dinheiro para pagar salários e pensões.
Protestos do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É mentira!
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — Esse programa impôs ao País medidas muito duras e exigentes que
teriam de ser cumpridas, para que os nossos financiadores continuassem a emprestar-nos dinheiro,
essencialmente para pagar aquilo a que chamamos o Estado social.
O Sr. MiguelTiago (PCP): — Falso!
Página 6
I SÉRIE — NÚMERO 108
6
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — E foi neste quadro que o atual Governo entrou em funções com uma
coligação que lhe permitia garantir a estabilidade governativa e com uma matriz de exigência que era do
conhecimento de todos os atores.
Curiosamente, o rigor das medidas inscritas no Programa de Assistência eram conhecidas em pormenor
por todos os partidos políticos com assento parlamentar e foram assinadas e subscritas por mais de 80% da
representação desta Câmara.
Aplausos do PSD.
Porém, à medida que iam sendo aplicadas, o Governo sentia que, na oposição, ia diminuindo a vontade ou
a identificação com os compromissos assumidos.
Às vezes, para um desconhecedor da realidade portuguesa até parecia que foi o PSD que assinou o
contrato de assistência financeira.
Protestos do PS.
E porquê? Porque queremos respeitar os compromissos do Estado português para garantir a credibilidade
e a sustentabilidade do País. Sem isso, as nossas empresas não conseguiriam financiar-se e exportar para os
mercados externos. Sem isso, não haveria investimento e criação de emprego. Sem isso, as taxas de juro no
mercado primário e secundário subiriam…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Estão sempre a subir!
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — … e ficaríamos bloqueados no acesso ao financiamento nos mercados
financeiros e não teríamos os meios necessários para manter o Estado social por que todos nesta Câmara
pugnamos.
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Qual Estado social?
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — Sem isso, a crise económica e financeira poderá ser muito séria,
podendo ser pior que um segundo resgate, e dessa forma perdendo a nossa soberania, arrastando os
portugueses para uma situação social insustentável.
Aplausos do PSD.
Por isso, não compreendo a política do Partido Socialista até hoje.
Risos do PS.
Propôs e aceitou as medidas do Memorando, assumindo-o em nome de Portugal. Mas, logo após as
eleições, passou a desenvolver todos os esforços de branqueamento político das suas responsabilidades. E
como a memória política é curta, até parece que o Governo, ao cumprir os acordos, é que é responsável pelas
medidas constantes do Memorando.
A política não pode viver de hipocrisias nem de populismos eleitorais.
O PS sabe que, de acordo com o que assinou, o caminho possível é o que o Governo tem seguido. O PS
sabe, porque assinou, que o Memorando impunha sacrifícios e austeridade. Dizem haver outro caminho, mas
ficam-se pelas generalidades. Nunca foram capazes de explicar que caminho seguiriam.
Protestos do PS.
Página 7
4 DE JULHO DE 2013
7
Gostávamos de ver uma atitude de inteligência e responsabilidade política por parte do Partido Socialista,
explicando o que faria diferente e como, mas de forma concreta e explícita, aliás indo além das medidas que
recentemente apresentou nesta Câmara e que o Partido Social Democrata e a maioria aprovaram.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Muito bem!
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, a realização agora de eleições iria pôr
em causa o enorme sacrifício que os portugueses já fizeram e fechar a janela de oportunidades que hoje se
abre para começarmos a crescer e a criar melhores condições de vida.
O défice estrutural diminuiu, o défice público está dentro dos parâmetros acordados com a troica, as taxas
de juro no mercado primário e secundário desceram, o País ganhou credibilidade externa.
Protestos do PS.
Uma crise política agora seria como estar-se a sair de um túnel e alguém provocar um desabamento nesse
momento.
Aplausos do PSD.
Depois da tecnocracia e do trabalho de se controlar as contas públicas e de se obter confiança dos
credores, é tempo de se passar à economia e à política. Por isso, deixo um apelo ao sentido de
responsabilidade histórica e política do Partido Socialista e ao bom senso e espírito democrático do seu
Secretário-Geral, António José Seguro, com as seguintes perguntas:
Estão conscientes de que a defesa dos interesses de Portugal e dos portugueses passa por eleições?
Acreditam e querem assumir a responsabilidade por contribuírem para fomentar a continuação da crise
política, ao ponto de se chegar a um processo eleitoral no momento em que se realiza a oitava avaliação do
Programa de Ajustamento e no momento em que as perspetivas de abertura da troica poderão gerar melhores
condições para a economia?
Acreditam e querem assumir a responsabilidade pelas consequências de termos um processo eleitoral
antecipado, quando estamos a nove meses de terminar o Programa de Ajustamento e de voltarmos a ser
autónomos e soberanos?
Os Srs. Deputados do Partido Socialista têm a certeza e a consciência, pelo menos política, de que os
mercados vão continuar a financiar Portugal nas mesmas condições se tivermos, neste momento, eleições
antecipadas?
Sr.as
e Srs. Deputados, temos a experiência, nesta Câmara, de que o Bloco de Esquerda e o Partido
Comunista, dois meses após qualquer ato eleitoral para as eleições legislativas, arrancam com a campanha de
pedir eleições antecipadas.
Vozes do PCP: — É falso!
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — Faz parte do seu código genético. Por isso é que, felizmente para o
País, não chegam a governar Portugal.
Mas da parte do Partido Socialista, partido de alternância, estamos habituados a ver sentido de Estado,
responsabilidade política e bom senso. Não quero acreditar — nem acredito — que o Partido Socialista pense
mais no partido do que no País, pelos princípios democráticos em que baseia a sua doutrina e a sua conduta e
pelas pessoas que o constituem.
Protestos do PS.
Acredito no sentido de responsabilidade coletiva dos políticos e dos partidos políticos para se encontrarem
caminhos de entendimento em políticas de longo prazo e que são fundamentais para os portugueses. São
políticas que não podem ser condicionadas pelos ciclos eleitorais.
Página 8
I SÉRIE — NÚMERO 108
8
Protestos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado!
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — Vou já terminar, Sr.ª Presidente.
Tal como na dor, é na crise que se reforça a solidariedade política e se gera um clima de confiança que
permita construir políticas duradouras que garantam aos portugueses melhores condições de vida.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Isso já era!
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — É isso que os portugueses esperam de nós. Será assim que
engrandeceremos a política e o Parlamento.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, antes de indicar os Deputados que se inscreveram para fazerem
pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Couto dos Santos, queria dar conta de que se encontra, na galeria
destinada ao corpo diplomático, um congressista do estado da Califórnia, de origem açoriana, o Sr.
Congressista David Nunes, que cumprimentamos.
Aplausos gerais, tendo o PSD, o PS e o CDS-PP aplaudido de pé.
Sr. Deputado Couto dos Santos, estão inscritos, para fazerem pedidos de esclarecimento, os Srs.
Deputados José Junqueiro, do PS, João Oliveira, do PCP, Pedro Filipe Soares, do BE e Heloísa Apolónia, de
Os Verdes.
Tenho indicação de que o Sr. Deputado Couto dos Santos responderá em conjunto.
Sr. Deputado José Junqueiro, tem a palavra.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Couto dos Santos, o seu discurso, que todos
ouvimos, trata-se de facto de um hino monumental à hipocrisia.
Gostava de lhe perguntar, Sr. Deputado, se o Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo
Portas, é membro do Partido Socialista ou é o segundo elemento da coligação governamental.
O senhor esteve aqui a dirigir-se ao Partido Socialista sem pinga de pudor, mas também, desculpe que lhe
diga, sem pinga de vergonha. Porque se existe, hoje em dia, no País, uma crise política profunda é porque o
PSD e o CDS se desentenderam e deram o triste espetáculo que deram ontem perante todo o País.
Aplausos do PS.
O Sr. Deputado fez um discurso a enviar recados para o CDS, mas o Sr. Deputado é um homem sem
coragem, porque foi incapaz de pronunciar o nome do CDS.
Hoje, na vida política, coragem precisa-se, e o Sr. Deputado não teve coragem, não conseguiu falar no
nome do CDS e virou-se para o Partido Socialista, sendo certo que todos sabemos, como toda a gente sabe,
que só esta maioria podia causar um problema à maioria: desagregar-se. E os senhores desagregaram-se
vergonhosamente!
Como é que o Sr. Deputado tem coragem de se dirigir ao Partido Socialista e ao seu Secretário-Geral nesta
matéria?
Aplausos do PS.
O Sr. Deputado e o PSD chegaram ao Governo com base na mentira e vão sair do Governo com base na
mentira!
Página 9
4 DE JULHO DE 2013
9
Aplausos do PS.
Aliás, a sua intervenção é tão patética que me atrevo a desconfiar que terá sido o Sr. Deputado a escrever
a intervenção de ontem do Sr. Primeiro-Ministro quando se dirigiu ao País.
Há limites. Em política não vale tudo.
Protestos do PSD.
Os senhores exigiram aos portugueses muitos sacrifícios, a maioria deles sacrifícios inúteis! Os
portugueses cumpriram e os senhores falharam!
Aplausos do PS.
É preciso lata para, com a degradação do funcionamento das instituições, o Sr. Deputado ter chegado aqui
e ter dito o que disse!
Termino, dizendo o seguinte: os senhores foram muito injustos durante estes últimos anos, e foram muito
injustos principalmente para uma pessoa do vosso partido: o Dr. Santana Lopes.
É altura de lhe pedirem desculpa, porque nunca o Dr. Santana Lopes, com todas as dificuldades que
conheceu, atrapalhou tanto e degradou tanto as instituições da República como os senhores fizeram agora!
Têm de lhe pedir uma desculpa, e é isso que devem fazer a seguir!
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — O próximo Sr. Deputado inscrito para pedir esclarecimentos é o Sr. Deputado João
Oliveira. Tem a palavra.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Couto dos Santos, nos quase 11 minutos que
durou a sua declaração política o Sr. Deputado fugiu, como o Diabo da cruz, de uma questão que,
necessariamente, tenho de lhe colocar.
O Sr. Deputado considera que estão reunidas condições para o regular funcionamento das instituições?
Aplausos do PCP.
O Sr. Deputado considera que hoje, com a situação política com que estamos confrontados, está
assegurado o regular funcionamento das instituições ou se, pelo contrário, se exige, como se prevê na
Constituição, que haja uma intervenção do Presidente da República, demitindo o Governo e convocando
novas eleições?
Nós temos esta questão bem clara, Sr. Deputado, e obviamente que a nossa resposta é a segunda.
Na sua declaração política, falou da preocupação com a imagem e a credibilidade do País. Nós
perguntamos, Sr. Deputado: um Primeiro-Ministro que vê esboroar-se a coligação que suporta o Governo e
que ainda assim persiste agarrado ao poder, custe o que custar, dá um contributo para a boa imagem e para a
credibilidade do País?
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Dá um contributo para a boa imagem e para a credibilidade do País um
Primeiro-Ministro que, perante toda esta situação, contra tudo e contra todos, inclusivamente contra o parceiro
da coligação — que, afinal de contas, era uma espécie de bicho que ia corroendo a coligação por dentro —, se
mantém agarrado ao poder?
Página 10
I SÉRIE — NÚMERO 108
10
Sr. Deputado Couto dos Santos, percebe-se bem que os senhores não querem largar o poder e se querem
manter agarrados ao poder, custe o que custar, até fazendo agora apelos ao Partido Socialista para que vos
lance uma boia de salvação.
Mas, Sr. Deputado Couto dos Santos, aquilo que os senhores têm parar de fazer é de enganar as pessoas
com um discurso de falsidades!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — O Sr. Deputado Couto dos Santos sabe que, descontados os 12 000
milhões de euros para a banca e descontados os montantes para os juros da especulação do próprio
empréstimo e da especulação anterior, deste empréstimo pouco mais sobra.
O Sr. Deputado sabe tão bem quanto nós que este empréstimo foi contraído para salvar a banca e o capital
financeiro, não foi contraído para pagar salários.
Aplausos do PCP.
O Sr. Deputado sabe bem que o discurso de que pode não haver dinheiro para pagar salários é a última
esperança que lhes resta para condicionarem os portugueses relativamente ao futuro e para garantirem
condições de se manterem ainda no poder. Mas os senhores vão ser desmascarados, têm de ser
desmascarados.
O Sr. Deputado diz que, perante esta situação, é preciso responsabilidade porque é agora que estamos
perto da bancarrota e do segundo resgate. Sr. Deputado, então com um desemprego de quase 20%, com uma
recessão de 3,3%, com um défice de 10,6%, com uma dívida pública que aumentou 25 000 milhões de euros
em dois anos, afastámo-nos da bancarrota, Sr. Deputado?! É que este é o resultado concreto das políticas que
os senhores fizeram, das políticas que promovem a bancarrota para chantagear os portugueses e para impor,
de novo, mais sacrifícios, mais ataques à democracia, mais degradação das condições de vida e de trabalho
em Portugal.
É esse o programa político que os senhores têm para cumprir em Portugal. Por isso, é que dizemos que a
demissão deste Governo não é uma desgraça para o País, é uma pequena «luz ao fundo do túnel», que tem
de ser acompanhada de novas eleições e de um outro governo, que esteja em condições de cumprir uma
outra política, patriótica e de esquerda.
Este Governo, de submissão, de entrega dos interesses nacionais ao capital financeiro e aos grandes
interesses económicos, já demonstrou que o único programa que tem para o País é um programa de
retrocesso e de bancarrota e, para isso, Sr. Deputado, não contam com o PCP!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Couto dos Santos, perante o que disse,
do alto da tribuna, de que devíamos, a todo o custo, evitar uma crise política, só lhe posso fazer uma pergunta:
onde esteve ontem, anteontem e hoje? Leu algum jornal? Viu televisão? O que é que andou a fazer?
Aplausos do BE.
Crise política é o que estamos viver! Crise política é o facto de o Governo que o Sr. Deputado apoia ter
perdido os seus números dois e três nos primeiros dias desta semana. Por isso, vir dizer-nos que a culpa de
haver uma crise política no País é da oposição, qualquer que ela seja, é tentar esconder o sol com a peneira.
Manter este caminho, manter a política de austeridade foi o que destruiu o Governo, que mergulhou Portugal
no pântano, na crise económica, na crise social e na crise política porque levou o PSD e o CDS a digladiarem-
se entre si.
Página 11
4 DE JULHO DE 2013
11
A pergunta que se colocava no início desta tarde era se da reunião magna do CDS poderia, de alguma
forma, surgir uma boia, que, atirada a Pedro Passos Coelho, pudesse dar algum espaço de vida a este
Governo. Ora, a intervenção do Sr. Deputado demonstrou — e só não vê quem não quer ver — que não há
qualquer salvação, que não há qualquer possibilidade de haver um acordo de incidência parlamentar. Esta é a
conclusão que se tira da sua intervenção.
O Sr. Deputado esteve 10 minutos a falar e não tocou uma única vez nem no nome de Paulo Portas nem
no nome do CDS. Percebemos: não há salvação para esta coligação. Esta coligação já morreu, está morta!
Aplausos do BE.
E só aqueles que estão agarrados ao poder para ficarem lá custe o que custar, só os que estão agarrados
aos seus interesses é que não querem largar aquela bolsa de ar para a nossa democracia, mas que também é
o espaço da solução para esta crise política.
Dizer que as eleições são mais um passo para esta crise política é tentar manter no poder o pântano que
está a destruir o País. Ora, as eleições são o garante da saída desta crise política e aqueles que estão contra
as eleições estão do lado dos que querem que a crise continue, estão do lado da luta do PSD contra o CDS e
da luta do CDS contra o PSD.
Registo o seguinte: o CDS não se inscreveu para fazer uma única pergunta e também não se inscreveu
para, esta tarde, fazer uma declaração política. Há um partido que recusa assumir as suas responsabilidades,
fechou-se em copas, fechou-se no seu castelo para discutir o que vem a seguir. Ora, um partido que se fecha
em copas neste momento do País é um partido que não assume as responsabilidades daquilo que andou a
fazer e que tem vergonha.
Mas um partido, como aquele que o Sr. Deputado representou nesta declaração política, que nos dizia que
tudo ia bem e que agora, sim, é que íamos chegar ao momento do investimento nem sequer chega aos
calcanhares de Vítor Gaspar, que, na sua carta, dizia que assumia as responsabilidades dos dois anos de
governação. Diz Vítor Gaspar: «Ninguém acredita em mim». Eu acrescento: ninguém acredita neste Governo.
Só este Governo é que se quer manter custe o que custar.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, não é propriamente para uma interpelação, é mais para
defesa da honra da bancada do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Deputado Pedro Filipe
Soares, não é seguramente o Bloco de Esquerda que decide da oportunidade ou não da intervenção do CDS
nesta Câmara. O CDS é um partido institucional, é um partido que respeita as intervenções dos outros e que
exige o mesmo respeito na liberdade de escolha das suas intervenções.
O CDS não está calado. A liderança do CDS, da qual também fazem parte os líderes desta bancada, está
neste momento reunida. Por isso mesmo, a liderança da bancada não está hoje presente, mas está
representada. Se o Bloco de Esquerda não entende que a democracia se faz com os partidos políticos e se
não entende que os partidos políticos têm momentos próprios de decisão e de reflexão sobre a sua vida
interna e sobre o exercício dos seus mandatos é porque não estará habituado a isso em democracia.
A perspetiva do CDS da vida democrática é a de que, estando a decorrer uma situação grave —
poderemos dizer que é grave — para o País e para a vida interna do nosso partido, o CDS deve estar a
habilitar-se, neste momento, para poder intervir e informar o País sobre o que entende quanto à atual situação
política.
É por isso que o CDS não faz hoje nenhuma declaração política.
No final do dia, será feita uma declaração pelo presidente do partido.
Página 12
I SÉRIE — NÚMERO 108
12
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares para dar explicações, querendo.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Abel Baptista, disse, em nome da
bancada, ter sido atingido na sua honra.
Nas explicações que deu não referiu quais as palavras que utilizei que feriram a honra do CDS. É certo que
o CDS tem o direito de reagir como quer ao debate parlamentar, mas não tem o direito de impor que essa
atuação impeça os outros partidos de terem uma opinião e de a interpretarem. Foi exatamente o que fiz.
Toda a escolha política tem uma interpretação política. E quando, na Assembleia da República, o órgão
máximo da democracia do País, temos um espaço de intervenções políticas, onde as diferentes bancadas
partidárias podem expressar a sua opinião, os seus valores, as suas ideias sobre aquilo que está a acontecer
no País, e quando temos, como disse, um momento tão grave no País, o Sr. Deputado não pode querer que
não interpretemos a ausência no debate do CDS e que o consideremos normal. Não, não consideramos
normal. Aliás, o CDS foi tão interventivo ao longo dos dois mandatos do anterior Governo quando estava na
oposição que seria normal dizer alguma coisa sobre o que está agora a acontecer no País.
Mais: quando o líder do CDS, o Ministro Paulo Portas, ou, melhor, o ex-Ministro Paulo Portas, largou ontem
a bomba sobre o País, colocando este Governo em causa, seria de esperar que o CDS tivesse a frontalidade
de aqui, na Casa da democracia, expor as suas opiniões. Não o fez. Tem todo o direito de não o fazer, e
respeitamo-lo. Porém, também temos todo o direito — fizemo-lo e continuaremos a fazê-lo— de o interpretar,
de o criticar, se assim o considerarmos, e de tirar ilações políticas.
O CDS fechou-se em copas porque sabe que essa defesa entre muros é a única salvação quer para o que
fez ontem quer para o que tem andado a fazer ao longo destes últimos dois anos.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Prosseguindo com os pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Couto dos Santos,
tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Couto dos Santos, ao ouvir a sua
declaração política em nome do PSD, questionei-me sobre se o Sr. Deputado tem absoluta consciência da
gravidade do que se está a passar no País. É que, às tantas, parecia que sim e, às tantas, parecia que não.
Sr. Deputado, já outros Deputados de outras bancadas lembraram — e é justo referi-lo — que o Sr.
Deputado não falou do CDS na sua intervenção, o que se torna uma coisa bastante esquisita face àquilo a que
as pessoas têm vindo a assistir. Então, sinto legitimidade para perguntar ao Sr. Deputado que leitura é que
podemos fazer desse silêncio do PSD relativamente ao CDS. Significará isso, Sr. Deputado, que o PSD
entendeu, de uma vez por todas, que a coligação, que esta maioria parlamentar acabou definitivamente? Será
que o Sr. Deputado quis dar a entender que o CDS é já, para o PSD, uma carta fora do baralho? Pareceu-me,
às tantas, que sim. É por isso que lhe faço a pergunta direta, que, julgo, importava esclarecer.
Às tantas, o Sr. Deputado virou-se para o Partido Socialista quase a dizer «ajudem-nos, ajudem-nos,
ajudem-nos», quase a bater às portas das capelinhas, mais ou menos como que a perguntar «quem é que
quer casar com a carochinha»? Acho que, neste momento, ninguém quer.
Para as bancadas da esquerda obviamente não se virou, porque já sabia qual era a resposta, não é
verdade? O Sr. Deputado, obviamente, só se virou para o arco da troica! E qual é a resposta de que está a
espera, Sr. Deputado?
O isolamento é uma coisa terrível, mas os senhores cavaram o vosso próprio isolamento através das
políticas absolutamente medonhas que prosseguiram com o CDS. Sr. Deputado, isto foi uma absoluta
desgraça!
Mas, Sr. Deputado, caia na real: o ex-Ministro das Finanças, Vítor Gaspar, demitiu-se reconhecendo o total
falhanço das políticas do Governo. O Sr. Deputado não ignora isso, pois não?
Página 13
4 DE JULHO DE 2013
13
Paulo Portas, Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, demitiu-se dizendo que essa decisão é
irrevogável. O Sr. Deputado sabe o que é que quer dizer «irrevogável»?! É que parece que o Sr. Primeiro-
Ministro não entendeu o significado da expressão!
Então, pergunto, Sr. Deputado: como é que o PSD resolve esta situação? Face à crise que está criada, aos
ministros que vão saindo todos os dias e à crise nítida que há entre o PSD e o CDS, como é que o Sr.
Deputado pretende resolver a situação? Sr. Deputado, para Os Verdes, não há outra alternativa se não a da
dissolução do Parlamento, que está nas mãos do Sr. Presidente da República, e a convocação de eleições
antecipadas.
A última pergunta que gostaria de fazer ao Sr. Deputado é a seguinte: qual é o medo que o PSD tem de dar
a palavra ao povo? Chegou o momento, Sr. Deputado! Não há volta a dar. Os portugueses têm de ter uma
palavra em toda esta situação. Os senhores não se podem agarrar ao poder com «unhas e dentes» e dizer,
como o Sr. Primeiro-Ministro disse ontem, «daqui não saímos e daqui ninguém nos tira». Não pode ser, Sr.
Deputado! Há que assumir responsabilidades, e a responsabilidade que o PSD tem neste momento é a de
acabar com toda esta história absolutamente deprimente e sair! É o povo, neste momento, que deve governar,
através da sua palavra, e dizer dos destinos que quer para o País.
Sr. Deputado, qualquer outra solução que não passe pela dissolução do Parlamento será uma mera
pseudossolução de maquilhagem de uma situação que está absolutamente degradada, e o País, na situação
económica e social em que está, não suporta soluções de maquilhagem.
Sejamos sérios, Srs. Deputados, e partamos para soluções credíveis para levantar definitivamente este
País, para dar lhe esperança e rigor de futuro. Para isso, Sr. Deputado, é preciso que os senhores assumam a
vossa responsabilidade e saiam definitivamente.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Couto dos Santos.
O Sr. Couto dos Santos (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, a primeira nota que quero deixar é a
seguinte: não me arrasa nem me deixa, de alguma forma, preocupado a questão da crispação política, porque
o que me preocupa — e foi nesse sentido que fiz a minha intervenção — são os problemas que os
portugueses atravessam, aquilo que estão a pensar de nós neste momento.
Aplausos do PSD.
Já passei, na política, por crises e por momentos muito bons, e é nesse sentido que aqui apelo a todos
que, com serenidade, com honestidade, com responsabilidade política, possamos encontrar soluções para a
crise, porque é isso que os portugueses esperam de nós.
Vozes do PS: — Já vem tarde!
O Sr. Couto dos Santos (PS): — A resolução dos problemas da crise não se resolve com pessoas;
resolve-se com partidos políticos, que representam os portugueses.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Estamos preocupados com a crise, e foi isso que eu transmiti.
A nossa responsabilidade, enquanto partido — como o PSD é — mais votado, é fazer esse apelo, é fazer
tudo o que estiver ao seu alcance para encontrar soluções de forma a que os portugueses não possam ter
mais preocupações para além das que já têm e possam encontrar nos políticos as respostas aos seus
problemas.
Aplausos do PSD e CDS-PP.
Página 14
I SÉRIE — NÚMERO 108
14
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, ainda não indiquei os restantes oradores que estão inscritos para
proferirem declarações políticas, mas vou fazê-lo agora.
Encontram-se, pois, inscritos para esse efeito os Srs. Deputados Carlos Zorrinho, do PS, Bernardino
Soares, do PCP, e Catarina Martins, do BE. Os Srs. Deputados Rui Pedro Duarte e Isabel Alves Moreira, do
PS, estão inscritos para fazerem intervenções ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento da Assembleia
da República, o que significa que usam da palavra por conta própria sem dedução do tempo disponível no
Grupo Parlamentar em que se inserem.
Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O Governo somou uma gravíssima
crise política à crise económica e social em que já vivíamos. Desde setembro que o Governo é um fator de
instabilidade política em Portugal.
Esta crise política atingiu um nível inimaginável. Dois ministros demitiram-se no espaço de 24 horas,
colocando em causa o esforço e os sacrifícios exigidos aos portugueses nos últimos dois anos.
Esta é uma crise política fruto da irresponsabilidade do Governo e que os acontecimentos dos últimos dois
dias tornaram absolutamente intolerável.
Falhou a política e falhou o Primeiro-Ministro!
Aplausos do PS.
O Partido Socialista tem denunciado este falhanço, mas não é apenas o PS que o denuncia; é todo o País
e mesmo personalidades que estiveram diretamente ligadas à execução das políticas que denunciam este
falhanço.
Falhou a política, como o reconheceu o ex-Ministro Vítor Gaspar na sua carta pública de demissão, que
passo a citar: «O nível de desemprego e de desemprego jovem são muito graves. Requerem uma resposta
efetiva e urgente a nível europeu e nacional. Pela nossa parte, exigem a rápida transição para uma nova fase
de ajustamento: a fase do investimento. Esta evolução exige credibilidade e confiança. (…) não estou em
condições de as assegurar» — citei Vítor Gaspar num reconhecimento lúcido, mas cruel, do falhanço absoluto
de uma política.
Mas o ex-Ministro das Finanças identificou também um outro problema: o problema da incapacidade de
liderança de Pedro Passos Coelho.
Assim, dirigindo-se a Passos Coelho, Vítor Gaspar diz: «Cabe-lhe o fardo da liderança (…) os riscos e
desafios dos próximos tempos são enormes (…) exigem a coesão do Governo».
Aqui está um ministro que sai e que reconhece que o Governo está fraturado!
Mas se não bastasse este reconhecimento do ex-Ministro de Estado e das Finanças sobre a debilidade
política e a fragilidade da liderança de Pedro Passos Coelho, também o Ministro de Estado dos Negócios
Estrangeiros Paulo Portas vem pôr em causa a política, dizendo: «O Primeiro-Ministro decidiu seguir o
caminho da mera continuidade no Ministério das Finanças. Respeito, mas discordo».
E Paulo Portas não põe só em causa a política, põe também a liderança. E volto a citar: «A forma como
reiteradamente as decisões são tomadas no Governo torna, efetivamente, dispensável o meu contributo».
Sr.as
e Srs. Deputados: Depois destas palavras, escritas por membros centrais, ministros de Estado deste
Governo, alguém tem dúvidas de que este Governo chegou ao fim? Nós temos ministros mas não temos
Governo! É, pois, confrangedora a falta de sentido de Estado da maioria e a atitude do Primeiro-Ministro.
Aplausos do PS.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Portugal vive um momento que exige de todos os agentes políticos
responsabilidade, serenidade, convicção e capacidade de colocar o interesse nacional acima dos interesses
partidários.
O Governo é, hoje, a fonte primária da instabilidade política e da instabilidade social. É evidente que o País
precisa de um novo Governo.
Página 15
4 DE JULHO DE 2013
15
Por isso, repito o que disse antes: a saúde democrática exige que a palavra seja devolvida aos
portugueses.
Para uma situação como esta existe uma única solução, e essa solução está consagrada na Constituição
da República Portuguesa. A Constituição não se engana. É necessário devolver a voz aos portugueses. São
necessárias eleições.
Aplausos do PS.
Face a um Governo e a uma maioria que se desmoronou, só a realização, quanto antes, de eleições pode
restaurar a confiança e a esperança: a confiança e a esperança para concretizar uma nova agenda, uma
agenda bem exemplificada.
Ainda no passado dia 27, o Partido Socialista apresentou medidas concretas, a maioria das quais aprovada
aqui nesta Câmara, medidas que demonstram que há outro caminho na conjugação entre a economia real, o
emprego e o rigor financeiro, tal como há outro caminho para o relacionamento de Portugal com o mundo e
com a União Europeia: um caminho de coesão e de capacidade competitiva; um caminho de ambição e de
afirmação de novas soluções e de novos instrumentos para salvaguardar o futuro de um projeto importante, de
um projeto que também é nosso, que é o projeto europeu.
Apresentámos, pois, soluções fortes e operacionais de que são exemplo o fundo de redenção, a
mutualização da dívida, as cooperações reforçadas para a competitividade ou, ainda, a cooperação solidária
para o emprego e o crescimento.
Como afirmou ontem o Dr. António José Seguro, este é o momento para confiar nos portugueses e na
democracia.
Confiar na democracia é também confiar na dimensão ética e na coragem dos que assumem
responsabilidades políticas.
Cada partido, cada parceiro, cada responsável institucional e cada instituição estão hoje, mais do que
nunca, obrigados a assumir as suas responsabilidades.
O Partido Socialista assumirá em plenitude as suas responsabilidades: assumimos a responsabilidade do
diálogo político; assumimos a responsabilidade do diálogo social; e assumimos a responsabilidade de
submeter aos portugueses uma alternativa sólida e de esperança.
Assumimos, pois, perante Portugal, a responsabilidade e o compromisso de propor e de concretizar um
novo rumo para o nosso País.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Deputado Carlos Zorrinho,
queria começar por lhe dizer que, na bancada do PSD, não ignoramos a gravidade da situação política que
Portugal vive no dia de hoje. Temos uma noção clara da preocupação que ela infere a toda a sociedade
portuguesa…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não parece!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … e das consequências que ela traz.
De resto, não é uma situação nova, Sr. Deputado Carlos Zorrinho. O Partido Socialista, ao longo destes
anos de democracia, tem também tido oportunidade de exercer funções governativas e, nessa condição, teve
também as suas dificuldades.
Devo recordar-lhe — creio que o Sr. Deputado até fazia parte desse Governo — que no primeiro Governo
do Eng.º Sócrates, até um ano depois de iniciar funções, saiu um Ministro das Finanças e saiu um Ministro dos
Negócios Estrangeiros.
Vozes do PSD: — É verdade!
Página 16
I SÉRIE — NÚMERO 108
16
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não é uma situação nova!
Vozes do PSD: — Esqueceram-se!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Embora na altura a situação não fosse tão dramática, porque Portugal
estava a crescer, não estava em recessão; a Europa estava a crescer, não estava a definhar do ponto de vista
económico e social; e, sobretudo, Portugal não estava sob assistência financeira.
O Sr. António Braga (PS): — E não era um governo de coligação!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Digo-lhe isto, não para escamotear a gravidade da situação, mas para
contribuir para poder desdramatizá-la.
O Sr. Deputado identificou aqui alguns dos problemas que hoje afetam a nossa sociedade. São problemas
nacionais a que, naturalmente, o Governo e a maioria têm a primeira responsabilidade de dar resposta, mas
que nos responsabilizam e nos convocam a todos, e também aos partidos da oposição, sobretudo ao principal
partido da oposição.
Por isso, quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que a postura política que o Partido Socialista vem afirmando há
vários meses, e que não está relacionada com a situação política atual de pedir eleições antecipadas, deve
também fazer refletir o Partido Socialista.
O que aconteceu ontem com este episódio de instabilidade criado nos mercados financeiros, nas bolsas,
deve fazer refletir o Partido Socialista para que possa aferir o que é que um processo de eleições antecipadas,
que não é aquele que estamos a viver, pode trazer como consequência à vida das pessoas e ao caminho de
recuperação do nosso País.
Aplausos do PSD.
Por isso, Sr. Deputado Carlos Zorrinho, este é o momento em que todos devemos ter sentido de
responsabilidade, sentido de Estado e serenidade para não desperdiçarmos o esforço, o sacrifício, o
sofrimento de tantos e tantos portugueses, de tantas e tantas famílias, de tantas e tantas empresas, que, face
à situação que se criou em Portugal em 2011, tiveram de ultrapassar grandes adversidades e grandes
dificuldades.
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Nós não podemos desmerecer e desrespeitar esse esforço. Todos nós!
Aqueles que hoje exercem a responsabilidade de suportar o Governo e aqueles que se querem constituir
como uma alternativa a esse Governo quando houver eleições.
Sr. Deputado Carlos Zorrinho, termino dizendo-lhe o seguinte: não escamoteamos a gravidade da situação.
Estamos empenhados nesta maioria, no PSD e, seguramente, também no CDS-PP em encontrar soluções
que possam garantir estabilidade governativa, que possam garantir a subsistência da coesão desta coligação
e que possam, sobretudo, assegurar que vamos ser capazes de cumprir o contrato que afirmámos com os
nossos parceiros internacionais e que vamos recuperar, no tempo que está determinado, que é em junho do
próximo ano, a nossa soberania plena para que sejam os portugueses a escolher o seu futuro, as suas
políticas, aquilo que querem que seja o Portugal sólido, com crescimento económico e com criação de
emprego.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Carlos Zorrinho, tem a palavra para responder.
Página 17
4 DE JULHO DE 2013
17
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, queria começar por saudar
a humildade com que, perante esta Câmara e perante os portugueses, reconheceu que, depois de tantos
malefícios e de tanta flagelação que esta maioria provocou aos portugueses, ainda a acumular a tudo isso, nas
últimas 24 horas, devido ao desmoronar da coligação, a bolsa portuguesa perdeu mais 6% e a nossa dívida
pública subiu mais 2%. De facto, é obra! E ter reconhecido isso é algo muito importante.
Protestos do PSD.
Mas concentremo-nos no essencial, Sr. Deputado.
É do Primeiro-Ministro e da maioria que o apoia a culpa da crise económica, a culpa da crise social e a
culpa da crise política.
O Sr. António Braga (PS): — Muito bem!
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Eu, da tribuna, dei a entender que considerava, e considero, que esta
governação não foi competente, dei a entender que considerava, e considero, que esta governação não foi
capaz, mas não disse, e não digo, que esta governação não tenha propósito. Ela tem propósito, um mau
propósito, e foi esse que atrapalhou agora o vosso caminho. Havia um propósito claro: não só o de cortar as
pensões aos funcionários públicos e aos reformados, o de cortar retroativamente, mas também o de despedir
os funcionários públicos sem qualquer critério.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD, batendo com as mãos nos tampos das bancadas.
Foi esse propósito que dividiu a maioria, porque enquanto parte da maioria disse: «Errámos, queremos
parar aqui o erro», a outra metade da maioria disse: «Errámos e queremos continuar o erro».
Pois fiquem a saber, Srs. Deputados, o seguinte: vocês estão divididos sobre esse propósito, mas os
portugueses não, os portugueses estão todos contra esse propósito.
Deixem que haja eleições e poderão verificar que é verdade que os portugueses estão todos do outro lado
da barricada e não apoiam o vosso Governo nem a vossa política.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — A próxima declaração política é do PCP.
Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Começo esta declaração política com
o mais vivo repúdio e protesto contra a atuação do Governo português no caso da recusa de autorização de
aterragem do avião presidencial da Bolívia. Trata-se de uma atitude que viola todas as regras do direito
internacional, de gestão do espaço aéreo e de relacionamento entre países soberanos e que têm relações
diplomáticas ativas. É uma atitude que deixa Portugal mal visto perante o mundo.
Vamos questionar o Governo para saber quem tomou esta decisão e porquê, que razões técnicas são
essas que justificaram esta inaceitável decisão.
Não sabemos ainda se foi Paulo Portas ou se já nem isso é preciso e é, de facto, a Administração dos
Estados Unidos da América que controla o nosso espaço aéreo e os nossos aeroportos!?
Diz-se que a recusa de Portugal se deveu ao rumor de que estaria a bordo Edward Snowden, o tal que
denunciou gravíssimos atos de espionagem dos serviços secretos norte-americanos sobre países da União
Europeia e sobre as comunicações privadas de milhões de cidadãos.
Afinal não vinha a bordo, mas perguntamos: e se viesse? Como é que se justifica que, perante a denúncia
de que os Estados Unidos espiam vários países da Europa e instituições da União Europeia, Portugal e outros
Página 18
I SÉRIE — NÚMERO 108
18
países europeus se dediquem a perseguir aquele que pôs a nu a violação das suas soberanias? Um
escândalo que justificaria um pedido de demissão, se ele não tivesse já ocorrido.
Aplausos do PCP.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Podem dar as voltas que quiserem, podem tentar esconder ou diminuir,
mas a verdade é que a derrota profunda deste Governo é o fruto da luta das populações e dos trabalhadores.
Foi ela que fragilizou politicamente este desgraçado Governo, que provou que já não tem há muito base social
de apoio e que levou à própria desagregação da coligação PSD/CDS.
E de uma coisa podem ter a certeza: se faz falta dar o último empurrão a um Primeiro-Ministro que não
quer largar o poder, ele há de ser dado hoje, no desfile que o PCP promove às 18 horas do Chiado para o
Rossio, e também no sábado, na manifestação já convocada pela CGTP para o próximo sábado, junto ao
Palácio de Belém.
Os últimos dias têm vindo a deixar claro que este Governo, que durante dois anos tem vindo a destruir o
nosso País, não tem sequer a dignidade, a começar pelo Primeiro-Ministro, para largar o poder que já não tem
quaisquer condições políticas de exercer e devolver ao povo o que é do povo: o direito a decidir em eleições o
seu futuro.
A patética novela que se desenrola desde o início da semana é indigna do nosso regime democrático e
demonstra bem que esta gente que nos desgoverna não tem, nem nunca teve, qualquer respeito pelo País e
pelos portugueses e passa ao lado de princípios fundamentais do nosso regime democrático.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E hoje, pelos vistos, o Sr. Primeiro-Ministro foi a correr buscar conforto
em Berlim e fazer o relatório ao Governo alemão, quiçá na expetativa de obter apoio para a sua continuação.
Um Primeiro-Ministro que pensa que, em vez de responder perante o povo português, pode responder
perante os seus mandantes do Governo alemão é um Primeiro-Ministro que não tem condições para continuar,
que não tem lugar neste regime democrático.
Aplausos do PCP.
É caso para perguntar, mais uma vez, ao Sr. Presidente da República, ele próprio envolvido nesta
sucessão absurda de acontecimentos, se ainda não é desta que considera estar em causa o regular
funcionamento das instituições.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Se o Presidente da República não tomar de imediato a única medida
aceitável — a demissão do Governo e a consequente dissolução da Assembleia da República e convocação
de eleições —, está ele próprio a pôr-se de forma inequívoca à margem desse regular funcionamento das
instituições.
Não há duas soluções possíveis para esta situação. Há uma única que é a demissão imediata e sem
qualquer hesitação do Governo.
E temos de dizer aos banqueiros, aos mercados, aos grupos económicos que querem fugir a todo o custo
de dar a palavra ao povo, bem como aos comentadores que, bem-mandados, já alinham por esse discurso,
que convocar eleições e devolver ao povo o poder que é dele não é um problema, é uma solução — a única
solução.
Escusam de vir falar da ameaça de um segundo resgate que todos andam há muito a preparar para
aplicarem nova dose de roubo dos direitos do povo e dos recursos do País, escusam de vir agora dizer que se
vão deitar fora os sacrifícios feitos até agora, como se a situação em que colocaram o País, os que assinaram
este pacto de agressão e o apoiam e os que, nestes dois anos, o aplicaram, não fosse um completo e absoluto
desastre económico e social.
Página 19
4 DE JULHO DE 2013
19
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É um desastre da responsabilidade do PSD e do CDS na sua
aplicação. O CDS pode estar calado a tarde toda, pode dar as piruetas que quiser, mas não se livra de ser tão
responsável como o PSD pela situação em que o País está colocado!
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
Como se o prosseguimento deste caminho do pacto da troica não significasse o afundamento, cada vez
maior, da vida das pessoas e do futuro nacional. Escusam de ameaçar com as gravosas consequências que
supostamente adviriam da demissão do Governo. Tudo o que aconteceu até agora e tudo o que acontecer
para diante é da responsabilidade dos que nos trouxeram até aqui, não será da responsabilidade da
convocação de eleições.
A situação em que o País se encontra não permite, sem dúvida, uma resolução rápida e mágica de todos
os seus problemas. Mas eles só se resolvem com a inversão do caminho seguido, com a rutura com a política
de direita e nunca com a sua continuação.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É por isso que dizemos que há de ser o povo a resolver esta situação.
O mesmo povo que levou à implosão do atual Governo e que há de conquistar uma nova política.
E é preciso dizer desde já que não serve ao País mudar de Governo e não mudar de política; não serve ao
País trocar um Governo e um Primeiro-Ministro desgastado por outro que ainda não esteja; não serve ao País
quem queira continuar pelo mesmo caminho, mesmo que com esta ou aquela alteração circunstancial.
Nos últimos 38 anos, foram alternando os Governos e piorando as políticas. Agora é tempo de exigir uma
verdadeira mudança. Uma política que rejeite o pacto de agressão — o Memorando da troica; uma política em
que seja o povo a mandar e seja o povo o destinatário das políticas e não, outra vez, os banqueiros, os
grandes grupos económicos e financeiros, a especulação e as grandes potências da União Europeia.
Desta vez, é preciso que as decisões do povo não lhe sejam roubadas a seguir. É preciso um Governo de
esquerda com uma política de esquerda, com uma política patriótica, com uma política de futuro. E vamos
conquistar essa política!
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
A Sr.ª Presidente: — A próxima declaração política é do Bloco de Esquerda.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: As últimas 48 horas são a
cronologia da ópera bufa em que se tornou a coligação de direita. Um Governo a decompor-se perante o olhar
de todos os cidadãos, um Primeiro-Ministro sem Governo e agarrado ao poder que nem uma lapa, um País
refém dos humores de um ministro de Estado com zero sentido de Estado.
Esta crise resume-se numa palavra: irresponsabilidade. Ou, se quiserem, em duas palavras:
irresponsabilidade máxima.
A direita não hesitou em tornar o País refém das suas birras e lutas internas. Se há pouco a dizer sobre o
degradante espetáculo oferecido por Pedro Passos Coelho e Paulo Portas, Cavaco Silva é outro nome que já
deu demasiadas provas de não estar à altura das suas responsabilidades.
Estas 48 horas de absoluto desprezo pelos cidadãos e pela consequência de tanta irresponsabilidade nas
suas vidas, não começaram ontem. Não. A crise que rebentou esta semana é o epílogo de uma crise há muito
anunciada: a do falhanço estrondoso da austeridade e da sua incapacidade para oferecer soluções e
esperança ao País.
Comecemos pelo princípio.
Página 20
I SÉRIE — NÚMERO 108
20
A carta de Vítor Gaspar é a carta de um homem derrotado, é a confissão de quem, ao fim de dois anos, se
confronta com o falhanço de tudo aquilo que foi defendendo. Mais do que um mar de desempregados e do
endividamento recorde, saber que a austeridade apenas oferece como saída mais austeridade, ainda mais
desempregados e mais dívida. Preso na sua própria ratoeira, Vítor Gaspar bateu com a porta.
A imagem da tomada de posse, ontem, é o momento simbólico da farsa em que a direita se tornou e para a
qual quer arrastar o País, se, entretanto, não for parada.
O proclamado institucionalista Cavaco Silva deu cobro a uma impostura, como há muito não se via na
política portuguesa. Uma ministra que sabia que não era ministra, de um Governo que sabe que já não é
Governo, foi empossada por um Presidente da República que 90 minutos antes ameaçava a oposição a
apresentar uma moção de censura a um Governo que já não era Governo.
A resposta da Comissão Europeia, em todo o caso, também merece umas palavras. Diz a Comissão que
foi surpreendida com a rapidez da deterioração da situação política em Portugal. É a derradeira prova de que
há sempre quem teime em nada aprender.
O que os eventos deste dia mostram, por muito que custe a Durão Barroso, ao BCE e ao FMI, é que a
violenta engenharia social a que deram o nome de austeridade — tentando comprimir, em dois ou três anos,
os direitos sociais, laborais e rendimentos conquistados em gerações — é incompatível com a democracia.
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — A chantagem contra a democracia e contra as eleições em Portugal, em
que agora embarcam, lembra perigosamente a chantagem feita contra a Grécia. É bom que arrepiem caminho!
Sim, há uma crise política em Portugal, e não começou esta semana! É a crise política gerada pelo
falhanço de todas as metas anunciadas pela austeridade.
Sim, o Governo ruiu, porque já não tinha base de apoio nem condições políticas para a continuação do seu
programa de reconfiguração da relação entre trabalho e capital.
Que no dia em que o Governo se esfrangalha, um dos seus secretários de Estado ache que tem condições
para alterar as regras laborais na função pública diz tudo sobre a obstinação da direita. E que, ontem, Paulo
Portas, demissionário, tenha recusado a aterragem do avião do Presidente da Bolívia, Evo Morales, diz tudo
sobre um Governo que envergonha o País, a mancha negra de quem não sabe o que é soberania e obedece,
cegamente, a qualquer instrução internacional.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.as
e Srs. Deputados: O estado de negação a que chegaram Pedro
Passos Coelho e Paulo Portas, na hora terminal do Governo, só tem paralelo na dimensão da destruição que
impuseram ao País.
Neste momento de pântano, é bom não esquecer o essencial: não foi por birras ou amuos que esta
coligação acabou. Se foi a política que ditou o fim do Governo, vamos, então, à política e à responsabilidade
pelo destino coletivo do País.
PSD e CDS levaram a dívida pública a novos máximos — o FMI prevê atingir os 140% do PIB —, ao
mesmo tempo que provocaram um empobrecimento sem paralelo à generalidade da população. O défice está
em 10,6% e o desemprego atinge mais de 1,5 milhões de pessoas. A cada execução orçamental o desvio é
maior. Falharam! Falhou a austeridade e, por isso, o Governo acabou!
O falhanço tem como consequência a falta de credibilidade, interna e externa. Já ninguém acredita em
nada do que o Governo diga, anuncie ou faça. Prometeram a recuperação e levaram à bancarrota. Uma
coligação incapaz de ter a confiança do País e dos partidos que a sustentam, incapaz mesmo de estabelecer
relações mínimas de confiança entre os seus ministros, é uma coligação morta.
Um Governo sem credibilidade, contestado pela população, que conseguiu uma unanimidade nunca antes
vista contra a sua política, que viu as maiores mobilizações populares do País desde o 25 de Abril, que foi
Página 21
4 DE JULHO DE 2013
21
derrotado na luta contra a TSU, na luta dos professores, que o Tribunal Constitucional condenou, é um
Governo que não pode governar. Não há Governo, porque não há maioria!
A austeridade falhou e o Governo empurra Portugal para um segundo resgate. E é neste momento que é
necessário tomar as decisões mais sensatas. A responsabilidade, hoje, exige duas decisões claras: ter ou não
eleições, aceitar ou não um segundo resgate.
Face à instabilidade, à profunda crise política em que PSD e CDS mergulharam o País, a única solução de
estabilidade e clarificação é ir a votos. Tudo o resto não será mais do que um jogo perigoso de taticismos
pessoais e partidários, que deixarão o País suspenso e determinarão um Governo de pântano, sem
estabilidade, sem programa, sem legitimidade.
Eleições são a resposta da clarificação, em vez do pântano, da sensatez, perante a irresponsabilidade
destes dias. Eleições são, pois, a única resposta que permite estabilidade e que confere legitimidade. Mais:
são a única resposta que resgata a própria democracia da crise de regime a que a irresponsabilidade conduziu
o País.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Quanto ao segundo resgate, que o Governo preparava já por causa da
dívida imensa que gerou e que PSD e CDS aceleram com o pântano agora criado, exige-se clareza de todos
os partidos. Não se pode ficar em cima do muro. Ou se aceita mais política de austeridade, mais
empobrecimento, mais perda de soberania, mais troica, ou se rejeita o caminho da bancarrota que tem vindo a
ser prosseguido e se tem a coragem de dizer não à troica e proteger o País.
Daqui a duas semanas, começa a oitava avaliação da troica e a clarificação é inevitável. Não foi apenas o
Governo que implodiu, a receita da troica falhou. A escolha é simples: ou lutamos por um Governo que rejeite
a troica e proteja o País, ou estaremos condenados a líderes políticos que, no dia em que o País se afunda,
entram no primeiro avião para Berlim.
A resposta do Bloco é a defesa do País e da democracia, da economia, das pessoas e do emprego. A
resposta do Bloco é a renegociação imediata da dívida e a rejeição da troica.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para proferir uma intervenção ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do
Regimento da Assembleia da República, o Sr. Deputado Rui Pedro Duarte.
O Sr. Rui Pedro Duarte (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Um dia depois da implosão da
coligação, um dia depois da explosão da crise anunciada e um dia depois de o País saber que o Primeiro-
Ministro não se assusta com as adversidades que os portugueses enfrentam, o Primeiro-Ministro segue para
Berlim, para, supostamente, tratar das adversidades com que os jovens portugueses se confrontam todos os
dias.
Instalou-se, em Portugal, por demérito da maioria, uma espécie de cisma juvenil que já arrastou mais de
42% dos jovens para o desemprego. O mesmo cisma juvenil já fez embarcar, só nos últimos dois anos, cerca
de 110 000 jovens para outros destinos, que não o nosso País, foram cerca de 110 000 jovens que decidiram
não desistir de si próprios.
Praticamente um em cada dois jovens portugueses está desempregado e aqueles que ainda trabalham, ou
aqueles que já trabalham, são, cada vez mais, os novos autómatos do seu dono, a funcionar barato.
Falamos, por isso, das gerações de que Portugal não pode, nunca, prescindir, não pode, nunca, abdicar, a
geração de portugueses de que o Governo não poderia, nunca, ter desistido.
Em Portugal, como na Europa, a condição social, económica e laboral dos jovens tem estado
constantemente na periferia das prioridades políticas e nos subúrbios das opções de investimento.
Portugal, pela mão da ainda maioria PSD/CDS, é uma boa metáfora deste desinvestimento nas novas
gerações, desta ausência de visão estratégica, deste desrespeito pelo presente e desta inquietante demissão
do Estado de uma política de emancipação jovem.
Página 22
I SÉRIE — NÚMERO 108
22
A título de exemplo, nos últimos anos, à falta de mais jovens qualificados, o Governo respondeu sempre
com um desinvestimento massivo na educação; ao esgotamento das famílias portuguesas, o Governo
respondeu sempre com menos ação social; à situação de alerta vermelho dos jovens portugueses, o Governo
respondeu com um simpático livro branco.
Está tudo ao contrário! O País perde força produtiva, os jovens portugueses, que deviam ser parte da
solução, são parte do problema, não têm oportunidades e o Primeiro-Ministro ainda entende que representa a
esperança neste País.
Aplausos do PS.
As Grandes Opções do Plano para 2013 na área da juventude, assim como o Programa do Governo nesta
área, são verdadeiros certificados de ilusões que não só não compreendem a insuficiência política do
Governo, como faltam à verdade em cada minuto da sua validade.
O País está, por isso, refém de um discurso falido e de uma prática falhada! Um discurso obsoleto que
torna absurdo dizer que o talento, a criatividade e a inteligência dos jovens portugueses são um capital de
esperança importante e, em simultânea contradição, faz deles e das suas competências-chave o alvo
preferencial das insustentáveis políticas de austeridade.
Não se combina talento, criatividade, visão e espírito de risco com salários indignos, precariedade imoral,
exploração ilegítima ou ausência de expectativas. Mas muito menos se combina um discurso de apelo à
emigração dos jovens com qualquer hipótese teórica de retoma económica, de crescimento e emprego ou de
um caminho de desenvolvimento sustentável.
É por isso escandalosa a inoperância do Governo e inaceitável a sua incapacidade para responder aos
fatais números do desemprego jovem.
Já ninguém acredita, o País já não quer crer na telenovela dos derivados do Impulso Jovem. Este
programa, que, na sua versão original, prometia visar 90 000 jovens, tem hoje integrados cerca de 10%.
Na segunda edição, com direito a embaixador, o Primeiro-Ministro, que diz ser o «baluarte da confiança»
neste País, queria 40 000 jovens abrangidos até ao Verão, mas o Verão já começou e continuam integrados
cerca de 10% da meta inicial. Mas, como o melhor, com este Governo, está sempre para vir, é a vez de Álvaro
refinar expectativas e apresentar o sucedâneo estratégico do Impulso Jovem, o qual, não se sabe quando nem
como, vai, afinal, integrar 120 000 jovens.
Verdadeiramente, Sr.as
e Srs. Deputados, o único impulso de que os jovens portugueses beneficiaram, nos
últimos dois anos, foi o impulso ao abandono escolar, por via dos cortes na ação social indireta; o impulso ao
abandono do ensino superior, por termos das propinas mais elevadas da Europa e das famílias com menos
rendimento disponível; o impulso à descrença no percurso educativo, que leva 43% dos jovens que este ano
realizaram exames nacionais a dizerem que não acreditam nas vantagens de frequentar o ensino superior em
Portugal; em síntese, o impulso ao empobrecimento intergeracional, que coloca em causa, todos os dias e a
toda a hora, o presente das futuras gerações e o futuro das presentes gerações.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O último Conselho Europeu decidiu dar razão, mais tarde do que o
previsto, à proposta da família socialista. Em consequência, e por obediência, o Governo português acata a
sugestão do PS para a implementação da Garantia para a Juventude, que a maioria decidiu chumbar, há 12
meses, neste Parlamento, mas que o Primeiro-Ministro hoje tenta defender em Berlim.
Foram precisos 12 meses e mais 22 000 jovens desempregados para que o Governo reconhecesse o
mérito e a razão do Partido Socialista nesta matéria; foram precisos 12 meses e mais 22 000 jovens
desempregados para que o Governo reconhecesse que havia outro caminho no combate ao desemprego
jovem.
A Garantia para a Juventude é, na prática, uma segunda oportunidade para Portugal desenvolver uma
política de rápida administração de antídoto no vicioso e desproporcionado ciclo de desemprego jovem.
Há, por isso, nesta matéria, uma urgência a tratar na quantidade e uma emergência a resolver na
qualidade. Não bastará disponibilizar mais recursos para uma política de estágios que perpetue e incentive o
trabalho low-cost, a partir do Estado.
É imperativo que a Garantia para a Juventude não seja mais uma oportunidade para o Estado consolidar a
sua reputação de bom promotor do trabalho precário.
Página 23
4 DE JULHO DE 2013
23
É urgente criar critérios de qualidade nos programas de apoio à contratação e de estágios profissionais, a
fim de termos ofertas de formação e emprego com condições salariais, de trabalho e segurança
absolutamente adequadas.
Todavia, e ainda que novos esforços sejam apresentados para combater o desemprego jovem no quadro
da União Europeia, os últimos dois anos demonstram-nos que, para Portugal, as oportunidades que, à partida,
parecem ganhas, estão, afinal, sempre perdidas, que os momentos de lucidez política da Europa não cabem
no plano político do Governo, de empobrecer Portugal.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Pedro Duarte (PS): — Assim se comprova que, de forma insensata, a iniciativa Oportunidades
para a Juventude foi desperdiçada com o frustrante Impulso Jovem.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Apesar de haver uma nova garantia europeia para os jovens, o
Governo, ou o que dele resta, já demonstrou que não está capaz de garantir nada a ninguém. Pelo contrário!
O País precisa de um novo Governo, capaz de garantir um novo contrato de confiança com as jovens
gerações de portugueses, que, ao contrário deste Governo, não veem no modelo do empobrecimento o futuro
do nosso País.
O País precisa de um novo Governo, que não perpetue os tempos de falsas ilusões entre as novas
gerações.
Não se pode esperar que haja um dia de amanhã, um dia de esperança para este País, sem que todos os
jovens beneficiem e lhes permitam ter melhores condições de vida, aspirar a uma vida melhor e à definição de
um plano de vida.
Em suma, os jovens portugueses têm hoje uma única certeza quanto ao seu futuro e uma única motivação,
porventura a única que sobrevive ao seu deserto de expectativas: basta de austeridade! Este Governo chegou
ao fim!
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe desculpa, porque houve um erro meu na leitura do tempo de
que dispunha. Espero não lhe ter amputado tempo de intervenção. É que, de facto, o Sr. Deputado tinha
direito a mais tempo do que o que eu cuidava que tinha, pois agora é que vi o artigo ao abrigo do qual fez a
intervenção. Pelos vistos, não houve problema, e ainda bem, Sr. Deputado.
Tem agora a palavra, para proferir uma intervenção ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento da
Assembleia da República, a Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Quando escrevi esta
declaração, ainda não tínhamos assistido a um espetáculo infantil que os portugueses não merecem.
A morte do Governo ocorrida ontem seguiu o processo implícito à declaração inicialmente pensada, isto é,
o do divórcio total entre a falsa dupla Passos/Portas e o País real que ouviu isto: Primeiro-Ministro recebeu o
pedido de demissão de manhã, não a comunicou ao Presidente da República, permitindo, por parte deste,
uma declaração impenetrável, tudo isto acompanhado da tomada de posse da secretária de Estado com nome
de ministra, acontecimento alegadamente causa irrevogável da demissão de Portas, e atempadamente
comunicada a Passos, o que, segundo Passos, não é verdade, apesar de querer tentar fazer as pazes com o
alegado mentiroso! Perceberam?! O País também não!
Pior perceberam que o Primeiro-Ministro viesse, vitimizando cada palavra, não aceitar, em tom patriótico, o
pedido de demissão de Portas, curioso episódio de mais um atropelamento da Constituição, pois só o
Presidente da República tem semelhante poder.
«Não abandono o País», disse o Primeiro-Ministro. Sr. Primeiro-Ministro, o País é que já o abandonou.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
Página 24
I SÉRIE — NÚMERO 108
24
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Nem o Sr. Primeiro-Ministro percebe, nem, até agora, um Presidente
da República, que durante dois anos perdeu todo o capital político que tinha acumulado ao longo dos últimos
oito anos em Belém! Sr. Presidente da República, descole-se do Governo e recupere o seu cargo!
Aplausos do PS.
O País não percebeu qual o limite do insulto que tem de suportar de quem chama missão a uma
obstinação usando os supostos sacrifícios dos portugueses, que terão, imagine-se, valido a pena. O
comunicado do Primeiro-Ministro foi tão divorciado do País que parecia um sacerdote a pregar em Marte, e os
portugueses aqui.
Este Governo valeu a pena, pois claro.
Recordemos: a direita, apenas por sede de poder, não achou grave a crise das dívidas soberanas. Havia
que assaltar o poder para desfazer o Estado social.
Vou exemplificar com a função pública, que é como quem diz com o Estado social.
Demorou a construir uma Administração Pública que existe para servir os cidadãos: apenas os funcionários
públicos estão vinculados a princípios dos quais se destaca o da prossecução do interesse público, porque
são os rostos das funções do Estado; nada há de político no exercício da função pública, o funcionário está
apenas ao serviço do interesse geral; funcionário público é um modo específico de exercer a profissão.
Ficou claro, ao fim de dois anos, que a austeridade expansionista, derrotada sucessivamente em todos os
objetivos, tinha inimigos a atacar: os funcionários públicos, o que é simultaneamente um ataque à
Administração Pública e ao Estado social.
O Memorando foi elevado a programa de Governo para sustentar um conceito experimentalista: o
liberalismo policial. Havia que romper a sociedade num discurso manipulador, o do alegado excesso do peso
do Estado e o das regalias extraordinárias dos diabólicos funcionários públicos.
O discurso governativo imoral tentou fraturar o País, na esperança que do resultado pretendido de
acusações mútuas, viesse a legitimidade para cumprir um programa ideológico que enterra a história da
social-democracia e a história da democracia-cristã.
Acontece que as pessoas sabem do discurso sem som escondido pelo discurso oficial, porque as pessoas
não sentem que há médicos a mais, não sentem que há professores a mais; antes, sentem que, na alegada
despesa do Estado, está a sua disponibilidade financeira, pensam na receita que significa nas suas vidas
haver quem traduza a sua segurança, a sua saúde pública, a sua velhice, a sua escola pública, o Estado
social.
As pessoas sabem que quem está a mais é o Governo, e ontem assistiram à sua queda em direto. À queda
de um Governo que chama reforma do Estado a um número que implode com o Estado social, com
consequências recessivas gravíssimas.
O Governo usurpa inconstitucionalmente retribuições aos funcionários públicos, mas insiste e faz das férias
dos mesmos, devidas em junho por lei, uma guerra vingativa das decisões do Tribunal Constitucional.
Pacificamente, anuncia, em junho, que não há junho e ignora a proposta do Secretário-Geral do Partido
Socialista.
Um Governo absolutamente ajurídico, que despreza princípios elementares, como o da tutela das
expetativas jurídicas.
O ataque à função pública, mascarado de eufemismos baratos, esquece que só uma Administração Pública
estável é compatível com o dever de adstrição total ao interesse público. Só entendendo isto é que se permite
libertar do aparelho governativo, por exemplo, consultores externos pagos a peso de ouro, precisamente sem
vinculação aos princípios que vinculam os funcionários públicos.
Portugal não tem excesso de funcionários públicos, como é sabido! Se tivesse, não teria a direita instalado
um sistema de escravatura punitiva dos beneficiários do rendimento social de inserção, confundindo prestação
social com retribuição.
Chega de engendrar uma espécie de despedimentos «à grega» que o Governo prepara antecipando o
inimigo — o Tribunal Constitucional.
Esta arrogância permanente tem efeitos em pessoas concretas, pessoas que têm as suas vidas como as
demais e que também contam para o desemprego e para capacidade de consumo interno, imagine-se…
Página 25
4 DE JULHO DE 2013
25
Incluindo tudo o que já foi exigido aos funcionários públicos, nomeadamente, para além do já referido, em
corte das horas extraordinárias ou na redução de ajudas de custo e de acumulação de funções e o aumento
da carga fiscal, para dar alguns exemplos, chegamos à conclusão de que esta gente já foi «depenada» em
valor impressionantemente superior ao alegado buraco provocado pelo Tribunal Constitucional. O verdadeiro
buraco sem saída é outro: o que a política governamental teima em cavar à sombra do seu maoismo moderno,
que vai em 18% de desemprego; em 127% de défice; e em mais de 10% de défice no 1.º trimestre deste ano.
Mas, na última greve geral, ouvimos isto do Governo: «Respeitamos quem fez greve, mas respeitamos
ainda mais quem trabalhou». Como é possível, Sr.as
e Srs. Deputados? Como é possível?!
Com um milhão de desempregados, o Primeiro-Ministro, em democracia, atreve-se a dizer a quem luta
precisamente por emprego com direitos que «é preciso fazer menos greves e trabalhar mais». Como é
possível, Sr.as
e Srs. Deputados? Como é possível?!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — A direita parlamentar aplaude entusiasmada um Primeiro-Ministro
derrotado juridicamente na greve dos professores mas pronto a legislar contra o poder judicial. Este oráculo
vem acompanhado de exigências persecutórias: há que saber quanto custam os sindicatos da educação. Esse
é o ponto. Governar tem sido ameaçar!
A velha propaganda «menos Estado, melhor Estado», frase que há mais de um século é usada por fações
ligadas ao grande capital, sempre foi proclamada, devidamente adornada de clichés, para agradar os fortes. É
hoje claro, para o país real, que dois anos de assalto ao poder para a implementação de um programa de
empobrecimento geral não valeram a pena. Que o diga cada Ministro que vai «saltando».
Basta ter memória coletiva para saber que, quando recomeça o discurso, que é uma arma, do «menos
Estado, melhor Estado», quem se apaga chama-se povo.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Sr.as
e Srs. Deputados, terminadas as declarações políticas, antes de iniciarmos o
debate da proposta de lei n.º 159/XII (2.ª), queria cumprimentar a Secretária de Estado dos Assuntos
Parlamentares e da Igualdade e o Sr. Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social.
Vamos, pois, dar início ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 159/XII (2.ª) — Autoriza o
Governo a rever o regime sancionatório constante do Capítulo IV do Decreto-Lei n.º 133-A/97, de 30 de maio,
aplicável no âmbito do regime jurídico de instalação, funcionamento e fiscalização dos estabelecimentos de
apoio social geridos por entidades privadas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de março.
O debate é aberto pelo Sr. Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social, dispondo o
Governo, por ser o autor da iniciativa, de mais 1 minuto.
Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social (Marco António Costa): — Sr.ª
Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Sr.as
Deputadas e Srs.
Deputados: A rede de apoio aos idosos tem vindo a ser melhorada em todas as suas respostas.
Desde logo, em parceria com o setor social, acordámos nos protocolos para os anos 2011 a 2014 a revisão
do serviço de apoio domiciliário.
Nesse sentido, flexibilizando e alargando o leque de serviços básicos, lançamos uma nova geração de
serviços de apoio domiciliário que garante a segurança, o combate ao isolamento, o acompanhamento e a
sinalização de idosos que queiram permanecer em suas casas e, por outro lado, estimulamos o uso das
tecnologias, nomeadamente da teleassistência, como um instrumento ao serviço desse apoio.
Mas também, na resposta de estruturas residenciais para idosos, introduzimos uma série de alterações que
conferem a proteção e o cuidado devidos, alterações, essas, que reforçam o conceito de rede e a relação de
cooperação entre autarquias, Estado central e sociedade civil, representada pelas instituições sociais, que
combate a quebra da rede de vizinhança e os eventuais efeitos de desestruturação familiar.
Página 26
I SÉRIE — NÚMERO 108
26
Importa que o Estado, sempre em parceria com as instituições sociais, saiba dar novas respostas a estes
novos casos. Nesse sentido, para a promoção desta parceria com as instituições sociais, aumentámos em
mais 30 milhões de euros as verbas em acordos de cooperação, num total de 1200 milhões de euros.
Foi também com as instituições sociais, que conhecem o terreno e as necessidades, que trabalhámos para
maximizar as capacidades instaladas dos lares de idosos, sem abdicar de padrões de qualidade e de
segurança a que nos habituámos, e, por sabermos dos tradicionais entraves burocráticos para o licenciamento
de equipamentos, simplificámos e agilizámos esses processos.
Com a simplificação, com o aumento da capacidade instalada e com a abertura de novos equipamentos, foi
possível aumentar a rede de lares e, concomitantemente, em mais 7000 vagas os lugares disponíveis para
acolher idosos — isto desde junho de 2011.
Se, por um lado, criámos condições para o licenciamento e para a legalização de equipamentos, por outro
lado, queremos ser mais exigentes contra a clandestinidade e a fuga à legalidade.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança Social: — Sr.as
Deputadas e Srs.
Deputados: Ao aumentarmos a oferta de vagas na rede legal, ao encontrarmos mais alternativas para apoiar
os idosos em suas casas, procurámos esvaziar a procura da rede clandestina, sem prejuízo de um combate
intransigente à mesma. Tem sido essa a nossa aposta e é por aí que continuaremos.
Mas chegados a esta fase e implementados os mecanismos de prevenção, importa combater firmemente
os prevaricadores e a clandestinidade.
Foi nesse sentido que, em 2012, reforçámos exponencialmente as ações de fiscalização. Desde 2009, a
média de fiscalizações anuais rondava as 720 ações um pouco por todo o País. Em 2012, o número de ações
de fiscalização passou as 2500, o que representa um aumento superior a 200%.
Mas faltava rever o regime sancionatório e, por isso, a nossa presença aqui, hoje.
É importante referir que só parte do atual regime sancionatório se encontra em vigor. Torna-se, pois,
imprescindível uniformizar e clarificar a atuação e a aplicação das contraordenações aos estabelecimentos
que não preencham os requisitos legais de licenciamento.
Desde 1997 que os valores aplicáveis às infrações não sofriam alteração, o que significa um
desajustamento de 16 anos face à realidade atual. Os montantes em vigor não dissuadiam as respetivas
infrações e chegavam a ser vantajosos sob o ponto de vista económico para aqueles que pretendiam arriscar
pela via da ilegalidade. Por falta de licenciamento, arriscavam apenas coimas de menos de 2500 € e, por
infração muito grave, coimas de apenas 1000 €.
Quem, hoje, abria um lar ilegal e era detetado e punido, poderia abrir novo lar ilegal alguns metros ao lado,
sem que a sua reincidência fosse alvo de qualquer agravamento, em termos de censura contraordenacional.
Assim, a construção da atual proposta mereceu uma reflexão e diferentes contributos na sua elaboração,
por forma a termos um enquadramento mais responsável e exigente.
Agora, quem não tenha licenciamento, poderá ser penalizado com uma coima de cerca de 20 000 €; quem
incorra numa infração muito grave, poderá ser punido com uma coima de cerca de 5000 €; e, em situação de
reincidência, a coima será elevada até um terço do seu valor.
Para que não seja mais vantajoso prevaricar, para que a rede ilegal seja combatida, apresentamos este
agravamento de coimas com a atual proposta em discussão.
Importa deixar o aviso bem claro que, a partir de agora, não será economicamente vantajoso apostar na
ilegalidade, nem na clandestinidade, nomeadamente como método reiterado de atuação.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Guilherme Silva.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês Teotónio Pereira.
Página 27
4 DE JULHO DE 2013
27
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Solidariedade e da
Segurança Social, Sr.as
e Srs. Deputados: A proposta que hoje discutimos visa obter autorização legislativa
para rever o regime contraordenacional aplicável no âmbito do regime jurídico de instalação, funcionamento e
fiscalização dos estabelecimentos de apoio social geridos por entidades privadas.
Esta é uma iniciativa que, acima de tudo, envolve uma carga significativa de direitos humanos e da
condição de vida dos cidadãos, nomeadamente de alguns grupos que estão mais expostos aos perigos e aos
riscos do quotidiano do dia a dia.
Esta proposta de lei pretende que o crime deixe de compensar e que os cidadãos, crianças, jovens e
idosos institucionalizados, possam ser protegidos e garantida a sua segurança e condições de vida digna.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — O regime sancionatório aplicável aos estabelecimentos de
apoio social atualmente em vigor decorre, como aqui foi dito pelo Sr. Secretário de Estado, de um decreto-lei
de 1997, que se manteve inalterado até aos dias de hoje, o que significa que já está ultrapassado, inadequado
e urge ser alterado.
Essa necessidade de atualização decorre não apenas do facto de esse diploma se manter inalterado há
mais de 16 anos mas também, e sobretudo, pela circunstância de se constatar que as coimas aplicadas não
são dissuasoras da prática de ilícitos, incluindo os ilícitos mais graves.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Para termos uma simples mas real noção dos processos que
ocorrem nos últimos anos, é bom dar uma nota do que se passa.
Em 2012, foram efetuadas 2608 ações de fiscalização e encerrados 83 equipamentos; em 2011,
realizaram-se 750 ações de fiscalização a lares de idosos e 109 resultaram em encerramentos; em 2010,
foram feitas 713 ações de fiscalização e 709 resultaram em encerramentos.
É preciso termos noção da realidade. E a realidade é que as coimas por falta de licenciamento destes
equipamentos são baixas. Ora, se cada utente em lar de idosos ilegal paga, em média, uma mensalidade de
800 € a 1000 €, sendo que muitos lares acolhem uma dezena de idosos e, em alguns casos, uma, duas ou
mais dúzias, facilmente se compreende que a ilegalidade é bastante compensadora, chegando a atingir
valores na ordem das dezenas de milhares de euros.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Pagar coimas compensa e não afeta o lucro.
No caso concreto, é consensual a necessidade da revisão dos valores previstos para infrações praticadas
quer pelo exercício da atividade sem licenciamento quer pela violação de normas respeitantes ao respetivo
funcionamento e instalação.
É, pois, neste sentido que o Governo quer agora alterar a legislação, contemplando: nos casos de
reincidência, os limites mínimos e máximos das coimas serem elevados a um terço do respetivo valor; a
tentativa, que passa a ser punida nos ilícitos de mera ordenação social muito graves e graves; a possibilidade
de adoção de sanções acessórias cumulativamente com as coimas; e, muito importante, procura ainda
funcionar como um claro elemento dissuasor da prática de ilícitos, em particular do exercício da atividade sem
licenciamento para as situações de negligência e maus tratos de idosos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Acima de tudo, e como já foi anteriormente referido, não
podemos, nem devemos esquecer o que aqui está em causa. E o que aqui está em causa são as condições
de vida e o respeito pela vida digna dos cidadãos que se encontram aos cuidados dessas instituições.
Página 28
I SÉRIE — NÚMERO 108
28
Por isso mesmo, não vemos como poderá deixar de ser aprovado unanimemente esta iniciativa neste
Parlamento, pois esta é uma questão apenas e só de direitos humanos.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge
Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaríamos de dizer,
Sr. Secretário de Estado, que lhe cabe a si este papel na defesa desta proposta de lei na ausência do Ministro
Mota Soares. Na verdade, não temos Ministro da Solidariedade e da Segurança Social, pois ele está
demissionário e, nessa medida, cabe-lhe a si este papel.
A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade (Teresa Morais): — Ninguém
disse que o Sr. Ministro vinha cá hoje!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Mas, desde já, lhe digo que o Sr. Ministro não faz falta absolutamente
nenhuma — aliás, é uma boa notícia para o País a demissão de mais dois Ministros do CDS. Só falta o resto
do Executivo fazer o mesmo para, de uma vez por todas, mudarmos de política e de opções.
Protestos do PSD.
O Sr. Secretário de Estado falou um pouco de tudo no que diz respeito à rede de apoio social, falou de um
conjunto de matérias, mas, na minha opinião, centrou-se pouco no regime sancionatório.
Depois, não falou do verdadeiro preconceito relativamente às IPSS que esta proposta deixa transparecer.
Ora, não esperava isto de um Governo PSD/CDS-PP.
É que este diploma e esta alteração ao regime sancionatório das entidades que prestam apoio social
aplica-se também às IPSS. O Sr. Secretário de Estado nada disse sobre esta matéria, mas a verdade é que o
diploma consagra essa mesma possibilidade.
Mais: é um regime sancionatório manifestamente exagerado no que diz respeito às IPSS, se entendermos
as IPSS como entidades sem fins lucrativos e tivermos em conta as dificuldades que elas hoje em dia
enfrentam.
Uma outra questão que não é aqui abordada é que toda a alteração ao regime sancionatório está centrada
não nas questões da qualidade e do licenciamento, apesar de essas questões estarem lá, mas, sim, nas
questões administrativas, que ganham claramente peso.
Efetivamente, o Governo propõe-se alterar o regime de contraordenação nas atividades sem licenciamento,
nas situações de negligência e maus tratos — muito bem! Nada contra que sejam punidas estas situações.
Mas acreditamos que, além de uma forte punição, não há milagres, tem de haver inspeção no terreno e
atividade inspetiva. Isso tem vindo a ser feito, mas tem de ser melhorado, têm de ser combatidas estas
situações, não há dúvida.
Agora, a verdade é que o diploma se centra muito em questões mais burocráticas, que têm a ver com o
funcionamento. Vou dar alguns exemplos: a inexistência de diretor técnico, mesmo numa IPSS que fique em
dificuldades e possa não ter condições para preencher este lugar, é considerada uma contraordenação
(infração) muito grave, punível com coima entre 5000 e 10 000 € (bem sei que nas IPSS a coima relativa à
contraordenação é reduzida a metade, mas de qualquer maneira têm essa coima); a falta de comunicação
prévia, aos serviços competentes da segurança social, das alterações do regulamento interno é punida com
uma coima de 2500 a 5000 €; a falta de remessa anual, aos serviços competentes da segurança social, dos
mapas estatísticos dos utentes e da relação do pessoal existente no estabelecimento, bem como do preçário é
considerada outra contraordenação muito grave, punida com coima de 2500 a 5000 €.
Este conjunto de matérias é manifestamente exagerado, porque entendemos que as questões da qualidade
e do licenciamento é que deveriam ser as questões centrais.
Página 29
4 DE JULHO DE 2013
29
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Mais: temos uma dúvida que importa apurar, que é estabelecer a tentativa
punida nos ilícitos de mera ordenação social graves e muito graves. Isto é, a tentativa é punível neste tipo de
contraordenações. E nós temos sérias dúvidas, do ponto de vista jurídico, se é possível e lícito que, por
exemplo, a tentativa da falta de comunicação prévia das alterações do regulamento interno seja punida.
Portanto, há aqui um conjunto de matérias que nos oferecem sérias dúvidas.
O que vale é que este Governo «tem os dias contados», pelo que, muito provavelmente, este diploma não
verá a luz do dia. Nessa medida, o problema está resolvido e esta alteração legislativa não irá avançar.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Silva e
Sousa.
O Sr. Carlos Silva e Sousa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados: Começaria por me referir ao que acabei de ouvir, surpreendentemente, da parte do Sr. Deputado
Jorge Machado. Pelos vistos, o PCP tem muitos tiques contra a igualdade. Quer o quê? Regimes
privilegiados? Ficam muito em dúvida os princípios apregoados pela esquerda. A lei não é para todos? As
IPSS têm sido objeto de cooperação e apoio do Governo, de forma absolutamente transparente e no sentido
de prosseguirem os mesmos objetivos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Silva e Sousa (PSD): — A proposta de lei n.º 159/XII (2.ª) é uma iniciativa legislativa
complementar de legislação anterior sobre os estabelecimentos de apoio social geridos por entidades
privadas, cujo regime jurídico de instalação, funcionamento e fiscalização se encontra atualmente definido no
Decreto-Lei n.º 99/2011, de 28 de setembro.
As respostas sociais dos nossos dias, tal como definido na lei, são, designadamente, de apoio a crianças e
jovens, a pessoas idosas, a pessoas com deficiência, a pessoas com doença do foro psiquiátrico ou a outros
grupos vulneráveis, e de apoio à família e à comunidade.
Se, por um lado, as necessidades exigem que o Estado simplifique e agilize as regras de instalação e
funcionamento, tendo em atenção a criação de um balcão único eletrónico dos serviços para tramitação
desmaterializada dos procedimentos, por outro lado, com as instituições fica uma maior responsabilidade de
atuação correta, em harmonia com o Estado, na prossecução do interesse público, nesta matéria, que exige
especial cuidado, como exigido pela comunidade, que se pretende avançada na salvaguarda dos direitos de
pessoas em situação de debilidade.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Silva e Sousa (PSD): — Um Estado moderno e democrático não se pode demitir das suas
responsabilidades, muito em especial com questões de justiça social, dirigida aos lados débeis da nossa
sociedade, cuja salvaguarda é garante da dignidade de uma comunidade que deve prosseguir sempre o valor
universal da justiça.
Cabe ao Estado essa salvaguarda, mas a verdade é que grande parte deste interesse público não é
prosseguido diretamente pelo Estado, sendo assegurado, em grande medida, por instituições particulares de
solidariedade social e também por particulares, pelo que, a par de uma cooperação forte entre os
intervenientes e com regras simples e claras, há também que reprimir aqueles que, à margem das regras, à
margem da salvaguarda dos direitos destas pessoas, têm por objetivo não a salvaguarda dos direitos
humanos, mas o lucro indevido e associado à evasão fiscal.
Vozes do PSD: — Muito bem!
Página 30
I SÉRIE — NÚMERO 108
30
O Sr. Carlos Silva e Sousa (PSD): — A própria Constituição da República Portuguesa, que muito enche a
boca, quando é conveniente, a certos grupos, consagra um capítulo sob a epígrafe «Direitos e deveres
sociais», nos artigos 63.º a 72.º.
Nesta sede, o Estado deve apoiar e fiscalizar a atividade e funcionamento das instituições particulares de
solidariedade social e de outras de reconhecido interesse público. Mas também sabemos que os
estabelecimentos de apoio social não se esgotam naquelas entidades, pois outras existem de carácter
privado. E, não obstante estas últimas terem carácter lucrativo, a lei deve impor a todos as regras de
prossecução do interesse público. Ora, para isso, há também que haver regras que se ajustem aos tempos
atuais e que sejam dissuasoras de práticas ilícitas, em proteção da dignidade e bem-estar das pessoas mais
frágeis da nossa comunidade.
Este é o objetivo nobre da presente proposta de lei.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Mário Ruivo.
O Sr. Mário Ruivo (PS): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Solidariedade e da Segurança
Social, Sr.as
e Srs. Deputados: Através da proposta de lei n.º 159/XII (2.ª), vem o Governo propor a revisão do
regime contraordenacional aplicável à instalação, funcionamento e fiscalização dos estabelecimentos de apoio
social geridos por entidades privadas, revendo, assim, o Capítulo IV do Decreto-Lei n.º 133-A/97, de 30 de
maio, por o considerar desajustado à realidade atual. Estou convencido de que é mesmo apenas para, como
dizia o preâmbulo do diploma anterior que foi alterado, «os estabelecimentos lucrativos de entidades
privadas».
A Exposição de motivos desta proposta de lei acompanha genericamente as preocupações do diploma
anterior, aprovado pelo Governo PS, que visava uma filosofia de maior rigor e penalização na violação das
normas de instalação e funcionamento dos estabelecimentos de apoio social lucrativos.
Consideramos importante a adoção de medidas legislativas dissuasoras da prática de ilícitos em
equipamentos de promoção de bem-estar das crianças e dos idosos, protegendo-os de situações que
coloquem em risco a sua fragilidade social, pelo que o agravamento do regime sancionatório para o exercício
ilegal desta atividade merece o nosso acolhimento.
Mas consideramos também importante que, paralelamente, se promovam, como no passado, políticas
ativas de qualificação dos equipamentos sociais na rede solidária, dotando-os dos meios necessários ao seu
funcionamento, através da celebração de acordos de cooperação essenciais ao recrutamento de meios
técnicos e humanos, quer nos casos em que tal ainda não ocorreu quer nos casos em que não se atingiu
ainda o limite da capacidade instalada nessas instituições.
Mas o reforço de medidas sancionatórias de práticas ilícitas tem de ser acompanhado de uma eficiente
resposta dos serviços da segurança social quer no licenciamento quer na sua ação fiscalizadora.
De pouco servirá o agravamento das sanções se, depois, não existir capacidade dos serviços por ausência
de meios técnicos e humanos.
Esperamos que este seja um sinal que o Governo dá com esta proposta e que com ela faça uma avaliação
da situação de carência de meios humanos e das condições de exercício de atividade em que se encontram
muitos dos serviços distritais da segurança social e de fiscalização.
Concluo, dizendo que só com uma qualificada rede de equipamentos sociais e de serviços públicos
adequados se pode evitar o recurso a atividades clandestinas.
Prevenir é muito mais importante do que reprimir, porque o que aqui está em causa é a segurança e o
bem-estar social dos cidadãos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições em relação a este
tema, vamos passar ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 158/XII (2.ª) — Estabelece o regime
Página 31
4 DE JULHO DE 2013
31
aplicável aos grafitos, afixações, picotagem e outras formas de alteração, ainda que temporária, das
caraterísticas originais de superfícies exteriores de edifícios, pavimentos, passeios, muros e outras
infraestruturas.
Srs. Deputados, enquanto aguardamos a chegada do Sr. Ministro da Administração Interna, aproveito para
solicitar aos grupos parlamentares que façam atempadamente as inscrições dos Srs. Deputados que irão
intervir em relação a esta proposta de lei porque, em relação a pontos anteriores da ordem do dia, a Mesa
tem-se por vezes deparado com a falta de inscrições e com a tentação de passar ao ponto seguinte.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna para fazer a sua intervenção de apresentação da
proposta de lei n.º 158/XII (2.ª).
O Sr. Ministro da Administração Interna (Miguel Macedo): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados:
Gostaria de começar por cumprimentá-los a todos e de ir direto ao tema, uma vez que não temos muito tempo
para a discussão desta matéria.
Sr.as
e Srs. Deputados, muitos perfilham da ideia de que o espaço público, sendo de todos, não é de
ninguém e que, não sendo de ninguém, permite a alguns apropriarem-se do espaço público. Ora, esse não é o
nosso entendimento sobre o tema que nos traz a esta Assembleia da República.
Com esta proposta de lei, entendemos que é preciso clarificar e tornar efetiva a possibilidade de reagir a
um conjunto de situações que degradam o ambiente urbano e que prejudicam entidades públicas e privadas,
sem que, na generalidade dos casos, nada aconteça.
Para ser inteiramente claro, queria chamar a atenção da Assembleia da República para dois aspetos que
me parecem importantes.
Primeiro: o que é que esta proposta de lei não faz? Por um lado, esta proposta de lei não altera o regime
penal relativo a esta matéria dos graffiti. Por outro lado, esta proposta de lei não mexe em nada no regime
especial, que está em diploma especial, que regula a propaganda política.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Era bom, era!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — São dois pontos em que esta proposta de lei não mexe em
absoluto, como é evidente.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Pena é que não dê instruções nesse sentido à PSP!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — O que é que esta proposta de lei faz? Há um espaço, que é
um espaço de ninguém, entre o que está no Código Penal como crime de dano e as possibilidades reais de
entidades públicas e privadas de reagirem contra a danificação do património.
Esta situação, Sr.as
e Srs. Deputados, custa milhões de euros ao País, nomeadamente a câmaras
municipais, a empresas públicas, a entidades privadas.
Ainda no final do ano anterior, um vereador da Câmara Municipal de Lisboa — estou à vontade para o
referir, porque nem sequer é do PSD — dizia que a Câmara de Lisboa, em média, gasta mais de 1 milhão de
euros para salvaguardar património e para repor a situação em património monumental, património construído,
equipamento social e outros equipamentos relevantes, como por exemplo mobiliário urbano. E este exemplo é
apenas um, porque ele repete-se, como os Srs. Deputados bem sabem. Há autarcas de todos os partidos, de
norte a sul do País, que se queixam da situação que se vive nesta matéria, não falando de empresas públicas
e de muitos particulares.
Srs. Deputados, há uma outra coisa que esta proposta de lei não faz, que é distinguir arte do que não é
arte.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Faz, faz!
Página 32
I SÉRIE — NÚMERO 108
32
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Não nos metemos nisso.
O que dizemos, Srs. Deputados, é que há uma fronteira que não pode ser ultrapassada. E essa fronteira
tem a ver com o facto de alguns julgarem que podem impor prejuízos ilegítimos a todos. É essa a fronteira que
não pode ser ultrapassada!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Muito bem!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para sermos
claros sobre esta matéria, gostaria de dizer o seguinte: temos um regime penal que a maior parte das vezes
não se tem aplicado. Isto porque sabemos o que é que os tribunais, em regra, têm exigido para a aplicação
desse regime penal: que a destruição, danificação ou desfiguração do bem tenha de atingir caraterísticas
funcionais da coisa que é danificada. Portanto, tem sido esta a jurisprudência muitas vezes subscrita pelos
tribunais.
Nós entendemos que, fora do regime penal — que é o que faz esta proposta de lei —, deve haver a
possibilidade de reação contraordenacional para que quem pratica atos destes, nos termos estritos da lei.
Quero ainda dizer, Srs. Deputados, que, sendo isto polémico — não desconheço que é —, não podemos
desistir de ter para todos um ambiente público que seja um ambiente respeitado por todos e ao serviço de
todos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Inscreveram-se dois Deputados para pedirem esclarecimentos. O
Sr. Ministro já não dispõe de tempo, mas a Mesa concede-lhe 1 minuto, ciente do seu poder de síntese.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, embora nada tenha
que ver com o Sr. Ministro, quero registar um protesto da falta de vontade da maioria para alargar o tempo
deste debate.
Sr. Ministro, quero colocar-lhe duas questões muito concretas sobre esta proposta de lei.
Em primeiro lugar, gostávamos de saber porque é que uma proposta supostamente sobre graffiti faz
também referência a autocolantes, placards, cartazes e posters?
Em segundo lugar, Sr. Ministro, gostava que nos dissesse, e que fundamentasse com o texto da proposta
de lei, se em alguma circunstância um movimento social, um movimento de utentes dos serviços públicos, um
sindicato ou uma juventude partidária afixarem cartazes, pintarem um mural ou fizerem um graffiti contestando
o Governo ou apelando à participação numa manifestação ou greve são ou não perseguidos e punidos por
esta lei e com que justificação.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Pedro Delgado Alves.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, é
absolutamente claro que o ponto fundamental, que é o de assegurar que o espaço público tem a capacidade
de se apresentar de forma satisfatória para a comunidade e que não é desfigurado, é algo que não é polémico
nesta Câmara.
O que se contesta, e em relação ao qual colocávamos algumas questões, tem a ver com a necessidade e
com a adequação da proposta que é apresentada.
De facto, como o Sr. Ministro disse, temos uma previsão penal para o crime de dano. E continuaremos a ter
essa previsão penal para o crime de dano, continuaremos a ter a mesma jurisprudência e, potencialmente,
continuaremos a ter os mesmos problemas de interpretação que a lei não resolve, uma vez que se decidiu por
não caminhar no sentido de alterar o regime penal.
Página 33
4 DE JULHO DE 2013
33
Podemos até ter um risco adicional, que é o de a lei que entraria em vigor ser percecionada como
descriminalizando a prática destes atos, transformando-os apenas em atos contraordenacionalmente puníveis.
Esta é uma dúvida que importará esclarecer em trabalho de especialidade, eventualmente, para que não se
introduzam elementos de ruído onde aparentemente já temos jurisprudência que resiste a resolver o problema
por essa via.
Para além disso, como já foi sublinhado, temos regras sobre a afixação de propaganda e materiais em
espaço público, seja de ordem política ou de outra natureza, e temos posturas municipais que se debruçam
sobre esta matéria.
Portanto, ao nível da necessidade desta intervenção legislativa — eventualmente salvaguardada a questão
do regime contraordenacional que, devidamente implementada, poderia fazer sentido, desde que nos termos
estritos daquilo que já é permitido e o que não é permitido —, não vemos, de facto, algumas das medidas
como sendo adequadas.
Faço esta referência, desde logo, porque, apesar de o Sr. Ministro ter dito que não se procura, com esta
iniciativa, definir o que é que é arte e o que é que não é, a verdade é que estamos a lidar com direitos
fundamentais, estamos a lidar com a liberdade de expressão, estamos a lidar parcialmente com a liberdade de
criação artística e, nalguns casos, especialmente em relação a um dos aspetos que está subjacente à
proposta, temos as maiores dúvidas quanto à licitude de se criar um regime de licenciamento para esta
atividade, quando, por exemplo, ela tem lugar num espaço privado e os proprietários desse espaço privado
não se opõem.
Que sentido faz, neste contexto, exigir a intervenção municipal, licenciando algo que é uma criação do
próprio e à qual o proprietário não se opõe, e estar a introduzir um elemento que pode ser burocratizante e que
até contraria a lógica de remoção de licenças e de autorizações ao exercício de direitos fundamentais? Isto
nesse aspeto, porque, quanto à propriedade pública, quanto a monumentos nacionais e quanto a
equipamentos de transporte público coletivo, não poderíamos estar mais de acordo.
De facto, há uma necessidade e há um custo para os municípios e obviamente que todas as pessoas que
têm trabalho autárquico reconhecem que este é um aspeto fundamental para assegurar que o espaço público
tem um determinado contexto em que ele é gerido por quem deve gerir o espaço público. Não é isso que
questionamos. O que questionamos é que, em relação a alguns aspetos, a lei vai manifestamente além do que
se propõe na exposição de motivos, pelo que é em relação a estes aspetos que entendemos que é adequado
haver alguma clarificação.
Entendemos que deve também haver lugar a clarificação em relação a outro aspeto, que está sublinhado
no parecer da Ordem dos Advogados (ou do Conselho Superior da Magistratura, não me quero equivocar),
onde se refere que, se se define a intervenção nestes espaços quando se classifica o tipo de atividades que
são potencialmente ilícitas e depois essas mesmas atividades definidas como potencialmente ilícitas podem
ser eventualmente objeto de licenciamento, então o texto legal apresentado pode ter alguma contradição na
definição do que é que está na esfera de ilicitude e o que é que não está. Portanto, pensamos que estes são
aspetos que podem ser melhorados em sede de especialidade.
De resto, acompanhamos a preocupação que o Sr. Deputado João Oliveira colocou, porque é um aspeto
muito sensível, uma vez que aí acrescentamos outros direitos fundamentais, nomeadamente os de
participação política.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que estamos disponíveis para
colaborar no sentido de ajudar a ter um instrumento adicional que não seja um obstáculo e que não introduza
ruído numa área em que, felizmente, as melhores estratégias são aquelas estratégias locais dos municípios e
das freguesias, que desenvolvem mecanismos de arranjar espaços para que esta atividade possa ter lugar de
modo a que se consiga compatibilizar a realidade das comunidades locais, nos casos em que efetivamente é
arte urbana, com a necessidade de também assegurar uma gestão do espaço público.
Aplausos do PS.
Página 34
I SÉRIE — NÚMERO 108
34
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração
Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente e Srs. Deputados, agradeço as questões que
colocaram.
Começo por responder ao Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, dizendo que registo, com agrado, a abertura
do Partido Socialista para estudarmos e aprofundarmos este diploma em sede de especialidade e por a
posição do Partido Socialista não ser uma posição de rejeição liminar da proposta que aqui trazemos.
Todos sabemos, de forma responsável, que este é um problema que tem suscitado por parte de outros
países europeus, mas não só europeus, reações legais, contraordenacionais e outras.
Não vale a pena ignorar o problema.
Esta questão significa milhões de euros para o erário público, no sentido das várias entidades que gerem o
espaço público em todo o País, milhões de euros esses que têm muito melhor utilização, convenhamos todos,
em outro tipo de atividades.
Mas é também, Sr. Deputado — queria sublinhar este ponto —, em muitos casos, um atentado ao direito
de privados em relação à sua própria propriedade. E esse direito não pode ser ignorado nem desvalorizado.
Sr. Deputado, sabe por exemplo quanto é que a CP gasta por ano na limpeza de comboios que são
vandalizados desta forma? Sabe quanto é que empresas de transporte rodoviário gastam por ano nisto? Sabe
quanto é que se gasta por ano nas câmaras municipais em múltiplos arranjos e reposição de situações fruto
desse tipo de prática? Sr. Deputado, gasta-se muito dinheiro, muitos milhões de euros, que todas essas
empresas, todas essas autarquias locais certamente dariam por mais bem empregues noutras atividades em
favor dos cidadãos.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Registo com agrado a posição do PS e quero dizer ao Sr.
Deputado que estamos inteiramente disponíveis para encontrar as melhores soluções neste domínio.
Sr. Deputado João Oliveira, para não haver nenhuma dúvida, a proposta de lei é muito clara: o artigo 1.º
excetua expressamente tudo o que está regulado em matéria de propaganda política. O n.º 2 do artigo 1.º da
proposta de lei não apresenta nenhuma dúvida em relação a essa matéria.
Sei que interessa, do ponto de vista político, fazer a confusão sobre regulação de uma matéria que a
esmagadora maioria das pessoas entende como necessário combater e a confusão entre opções de arte, nas
quais não me meto — é absolutamente legítimo que isso aconteça —, e vandalismo, que é aquilo que
acontece, infelizmente, em muitas situações que existem pelo País, de norte a sul.
Sr. Deputado, não me peça para eu estar de cordo com a sua posição sobre esta matéria. Uma coisa é
liberdade de expressão, liberdade política, propaganda política — não há nada neste diploma que afete essa
matéria. Outra coisa completamente diferente é, a coberto disso, permitir as situações com que, infelizmente,
milhões de portugueses são confrontados todos os dias, que danificam o espaço público, abusam do espaço
público e prejudicam o País.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Secretários de
Estado: Além de os cumprimentar, quero deixar algumas notas quer sobre a oportunidade desta iniciativa quer
sobre o seu conteúdo e valor.
Quero registar a pressa com que o Governo quer aprovar esta proposta de lei. Trata-se de um Governo
que se está a desfazer, de um País que está numa crise como aquela que observamos, mas pressa para os
graffiti já há muita.
Página 35
4 DE JULHO DE 2013
35
Mas, tirando este aspeto, gostava de recordar que o Sr. Ministro teve, no passado, muitas reservas sobre a
intervenção nesta matéria. Tinha muitas dúvidas, tinha mesmo muitas dúvidas. Agora, não sei se por
necessidade de segurar a coligação — numa hora é necessário, na outra já não é —, se é uma resposta ao
seu parceiro de coligação, se é uma resposta para animar a campanha eleitoral ou para animar até alguns
mais reconhecidos e afoitos combatentes dos graffiti (gostava de lembrar que o centro histórico do Porto é um
caso preocupante, não pelos graffiti, mas pelo abandono da intervenção pública e pela publicidade das
cervejeiras), o Sr. Ministro vem aqui com uma pressa extraordinária muito preocupado com os custos e com os
gastos que as autarquias têm.
É verdade, é um problema que as autarquias muitas vezes têm de enfrentar. Mas, então, pergunto-lhe:
porque é que não responde à Associação Nacional dos Municípios Portugueses, que, relativamente aos
processos de que faz instrução, exige e reivindica que o produto das coimas reverta para os municípios? Se
está tão preocupado com esta matéria porque é que não altera a proposta? Sr. Ministro, segundo a proposta,
60% é para o Estado, alterou 10%. Mas, se está preocupado com as autarquias, explique lá por que é que o
produto desta «caça» à coima não reverte para as autarquias.
Sr. Ministro, sobre o conteúdo e o valor desta iniciativa legislativa, é um facto que, ao associar graffiti a
outras formas de intervenção, o Governo considera que os graffiti não são manifestações culturais, não são
manifestações artísticas, associando-os a formas de vandalismo. Diz que a proposta de lei não se quer meter
nesta questão, mas não é verdade, Sr. Ministro, porque a proposta de lei faz um juízo de valor referindo que
os graffiti, entre outras formas de intervenção, são manifestações de vandalismo.
Aliás, esta proposta de lei está fundamentada por um conceito de higienismo urbano, um bocadinho à laia
de Orwell, com uma harmonia do ambiente urbano. Portanto, não nos venha dizer que não se mete, porque se
mete efetivamente, fazendo um juízo de valor sobre esta questão.
Relativamente à necessidade de intervenção no quadro legal, porque é que não há salvaguarda efetiva da
liberdade de expressão política?
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Está na Constituição!
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não nos venha dizer que a proposta de lei garante a liberdade de
expressão política por que não garante. Se bem que possa invocar a exposição de motivos, é certo que há
imensos artigos que, pelo facto de serem difusos e abertos, não garantem todas as formas de liberdade de
expressão, nomeadamente política, e não é verdade que tenha encontrado resposta para esta questão, que,
para nós, é muito preocupante.
Para além do que já está salvaguardado nos artigos 212.º e 213.º do Código Penal, não explica
exatamente porque é que o quadro legal em vigor sobre o crime de dano não satisfaz o Governo.
Finalmente, há que reconhecer que há intervenções em autarquias, como os regulamentos e os protocolos
que as autarquias estabelecem com várias organizações, que já preveem muitas outras possibilidades — é o
caso de Lisboa — ou, por exemplo, os concursos que são lançados, como em Almada ou em Setúbal. Há
muitas outras formas de intervenção e quero perguntar-lhe, Sr. Ministro, porque é que não deixa às autarquias
essa capacidade de intervenção, de regulação e tem necessidade de fazer uma uniformização que, de facto,
compromete direitos fundamentais, quer que no que se reporta à manifestação de formas de arte quer no que
se reporta à liberdade de expressão política de outros que não os partidos propriamente ditos.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, a
proposta de lei que agora discutimos não é uma proposta sobre graffiti, é uma proposta que, a coberto dos
graffiti,pretende introduzir agravadas limitações à liberdade de expressão e de propaganda, perseguindo
quem contesta o Governo e as suas políticas.
Esta proposta persegue os graffiti, mas visa sobretudo perseguir a contestação política e social que o
Governo vai enfrentando nas ruas.
Página 36
I SÉRIE — NÚMERO 108
36
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Ao misturar graffiti com autocolantes, placards, posters e cartazes, o que o
Governo pretende é criar um quadro de perseguição a todas as formas de exercício da liberdade de
propaganda. Não se atrevendo para já a criminalizar a contestação política, o Governo fica-se — e não é
pouco — pela perseguição policial e pela aplicação de coimas.
A proposta do Governo cria um quadro propositadamente incerto quanto ao seu âmbito de aplicação,
introduzindo até. Sr. Ministro. um conceito jurídico tão sólido e claro como é o da conspurcação, mas,
sobretudo, permitindo que aqueles presidentes de câmara que já hoje se comportam como autênticos
tiranetes, limitando e impedindo o exercício da liberdade de propaganda, reforcem o seu comportamento
antidemocrático, ainda por cima com o incentivo de ficarem com uma percentagem das coimas aplicadas.
Sr. Ministro, sabemos bem o que isso significa, porque ainda temos fresca na memória a imagem dos 11
jovens da JCP (Juventude Comunista Portuguesa), detidos na semana passada no Porto, como se de
criminosos se tratassem, quando pintavam um mural de contestação ao Governo e de apelo à greve geral.
Essa é a verdadeira intenção desta proposta, isto é, perseguir e punir quem contesta o Governo e as suas
políticas.
A exclusão do âmbito de aplicação da lei das situações cobertas pela lei relativa à publicidade e
propaganda é apenas «para inglês ver». Aliás, se o Sr. Ministro continuar a ler a proposta de lei depois da
alínea a) do n.º 2 do artigo 1.º vai perceber que assim é.
O que o Governo pretende com esta proposta é a possibilidade real de ter presidentes de câmara ou
dirigentes de empresas e serviços públicos a limitar direitos constitucionais que os portugueses conquistaram
com a liberdade em abril de 74. É esse património político que se impõe defender contra esta proposta do
Governo.
Mas esta proposta é também a única proposta possível de um Governo com conceções mesquinhas e
atrasadas relativamente à expressão livre da arte e da cultura, que apenas aceita e autoriza a arte e a cultura
que não contestem os seus propósitos políticos e ideológicos.
Trata-se de um Governo que, incapaz de compreender o verdadeiro grafitocomo forma de expressão
artística integrada num movimento cultural mais vasto e bem distinto de fenómenos de poluição visual, que
obviamente não merecem o nosso apoio, opta por perseguir e punir a expressão artística em vez de criar
condições para o seu livre exercício.
Incapaz de compreender e de conviver com expressões artísticas e culturais que não se enquadrem na sua
política de gosto ou assumam a crítica social como elemento matricial, o Governo considera vandalismo aquilo
que noutros países, como é o caso da Irlanda, Sr. Ministro, é objeto de valorização e classificação patrimonial.
Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, a única mensagem que o Governo transmite com esta
proposta é uma mensagem de intolerância, censura, autoritarismo e repressão.
É, afinal de contas, o único produto possível de um Governo de desastre nacional cujo programa político
para Portugal é de subversão da Constituição, de ataque à democracia, de retrocesso social e cultural para um
povo inteiro.
Por isso mesmo, o povo inteiro deve mobilizar-se para exigir novas eleições e construir uma política
patriótica e de esquerda com um governo à altura de a executar.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos
Peixoto.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: Percebe-se bem o
desconforto que esta proposta causa à esquerda portuguesa, que aproveita qualquer oportunidade para pedir
a «cabeça» do Governo. Até um simples grafito, um gatafunho apócrifo ou uma sujidade colocada numa
parede é suficiente para a esquerda pedir a «cabeça» do Governo e para pedir eleições. Não faz o menor
sentido!
Página 37
4 DE JULHO DE 2013
37
É verdade, Srs. Deputados, que esta proposta pode colidir com muitas das ações que se veem na margem
sul e noutros lados, onde há vários murais com o patrocínio de símbolos partidários. Mas esse problema não
se vai colocar, porque o que esses partidos antes faziam vão continuar a poder fazer, só com uma limitação:
primeiro, têm de pedir licenciamento prévio, primeiro têm de pedir uma autorização.
Protestos do PCP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Até o Ministro diz que não é preciso!
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, por favor deixem prosseguir o Sr. Deputado que
está no uso da palavra.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Srs. Deputados, a lei diz que é necessário licenciamento prévio e
autorização prévia naquelas ações e manifestações que conspurquem, que alterem, que desfigurem os
espaços públicos. É isso que a lei diz.
E, Srs. Deputados, não vale a pena confundir, fazer graffiti é, muitas vezes, uma forma de criar, de
representar, uma forma de fazer arte — ninguém questiona isso. Só que, como disse um dia um filósofo
alemão, a tarefa atual de fazer arte é introduzir o caos na ordem. Aquilo que quer o Governo é introduzir a
ordem no caos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Espero que o Sr. Ministro o ponha na ordem!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Alguém esta semana, num semanário, escrevia sobre o assunto dizendo
que se tratava de uma anarquia ou de uma pandemia dos graffiti — era assim que um escritor de um
semanário de referência dizia —, que nos conspurca todos os dias os olhos com arte que é mera gratuitidade
e que não tem a ver com nenhuma expressão artística.
Mas, mais importante do que isso, Sr. Ministro e Srs. Deputados, as manifestações de arte, estas
expressões livres vão continuar a ser feitas e aquilo que esta proposta potencia é que estas manifestações
sejam feitas em sítios apropriados.
O Sr. João Oliveira (PCP): —O que é que impede que isso aconteça já hoje?
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sabem quais são os exemplos? São os do Reino Unido, dos Estados
Unidos da América, da França… Há vários sítios em que isso é possível. E não é na casa dos Srs. Deputados,
nem na minha, nem em edifícios públicos, porque isso tem de ser censurado com contraordenações.
É isso que esta proposta de lei pretende, ou seja, autorregular os espaços públicos, criar ambientes sadios,
que não ofendam nem os olhos nem o ambiente. É isso que todos nós pretendemos, não é limitar o direito de
ninguém.
Portanto, Sr. Ministro, termino dizendo-lhe que esta proposta de lei é absolutamente necessária e
inovadora porque Portugal estava órfão de uma legislação que sancionasse contraordenacionalmente estas
atitudes e as ações invasivas do nosso património privado e coletivo. Portanto, fica aqui este marco histórico e
legislativo que é relevante e que merece ser devidamente valorizado.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr. ª Deputada Teresa
Anjinho.
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados: Com a proposta de lei ora em debate, propõe o Governo a aprovação do regime jurídico aplicável
aos graffiti, afixações, picotagem e outras formas de alteração, mesmo que temporária, das características
originais de edifícios, pavimentos, passeios, muros e outras infraestruturas.
Página 38
I SÉRIE — NÚMERO 108
38
A necessidade de estabelecimento deste novo regime jurídico esteia-se numa realidade preocupante que
todos com facilidade reconhecemos: o aumento da degradação dos monumentos, dos imóveis, do mobiliário
urbano, dos meios de transporte e outros, por recurso a formas de alteração que transformam, muitas vezes
irreversivelmente, a aparência original das superfícies em que são realizadas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso não tem nada a ver com grafitos!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Estas alterações relevantes, quando não consentidas e realizadas em
claro desrespeito pela natureza do património histórico-cultural de uma cidade, realce-se, ou com desprezo
pela importância dos seus equipamentos de uso público, ou pelos seus meios de transporte coletivo, são nada
mais nada menos do que vandalismo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Foi esse o termo usado na Exposição de motivos desta iniciativa e, a
nosso ver, muito propriamente.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Não os confundamos com outra coisa qualquer, Sr. Deputado João
Oliveira, designadamente com o exercício da liberdade de expressão ou de criação cultural, como acontece
em certos casos.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Uma coisa é a arte e a expressão da arte — regulamentada — e outra
é o vandalismo e a destruição de propriedade alheia.
Vozes do CDS-PP e do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Não somos contra a arte, nem contra a existência de espaços livres,
mas somos contra formas de expressão que ofendem a propriedade alheia e ofendem, inclusivamente, uma
conceção de ambiente.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Hoje em dia, não escapam a este tipo de vandalismo os prédios
urbanos, as cidades, os transportes públicos, entre outros.
Sr.as
e Srs. Deputados, estamos a falar de cidades históricas como Évora, Sr. Deputado João Oliveira,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente! Onde nunca houve problemas desses!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — … de monumentos como o Aqueduto das Águas Livres, de
autocarros, de comboios e respetivas paragens e estações (algumas acabadas de inaugurar); estamos a falar
de bancos de jardim, de quiosques, de sinais de trânsito e de muitos outros exemplos que aqui poderiam ser
dados.
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
Protestos do PCP.
Página 39
4 DE JULHO DE 2013
39
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Aliás, o CDS já teve oportunidade de apresentar uma iniciativa de
idêntica natureza, que foi discutida neste Plenário em fevereiro de 2001, e, nessa ocasião, o CDS mostrou os
cartazes com fotografias das pinturas que desfeiam as cidades, os monumentos, os prédios e os
equipamentos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — A título de memória, relembro que esta iniciativa acabou chumbada
com os votos contrários de toda a esquerda com fundamento na defesa — contra tudo e contra todos! — da
liberdade de criação cultural de quem quer que se encontre com uma lata de spray na mão e contra uma das
medidas que propúnhamos, a da proibição de venda de sprays a menores de 18 anos, que já existia em
países como a Alemanha e, ainda recentemente, foi adotada pelo Brasil.
A nossa perspetiva continua a ser a de proteger o património coletivo cultural de Portugal e valorizá-lo.
A nossa perspetiva continua a ser a de proteger os bens públicos, ou de utilização comum, contra todas as
formas de vandalismo e de deterioração voluntária, porquanto o mesmo, relembre-se, resulta de investimentos
com verbas públicas, portanto, financiado por todos nós e para satisfação de necessidades da comunidade.
A nossa perspetiva continua a ser a da proteção do ambiente e da arquitetura das nossas cidades.
A partir de agora, fazer um graffiti ou afixar um cartaz numa parede tem de passar, e bem, por um pedido
prévio de licença à câmara, com apresentação de um projeto do que pretende desenhar, bem como de uma
autorização, por escrito, do proprietário do edifício.
Naturalmente que se ressalva, e bem, como disse o Sr. Ministro, a aplicação de sanção mais grave por
força de outra disposição legal, designadamente quando estiver em causa crime de dano.
Em suma, não obstante considerarmos que esta é uma matéria que pode ainda ser sujeita a melhorias
neste diploma ou noutros campos, como os de natureza penal, e a uma discussão que esclareça eventuais
dúvidas, como as aqui apresentadas, refletindo, nomeadamente sobre o justo equilíbrio dos direitos
subjacentes ao diploma, como a liberdade de expressão e o direito de propriedade, relembro que nenhum
destes direitos são direitos absolutos.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
A nossa liberdade termina onde começa a liberdade dos outros, Sr. Deputado João Oliveira. É uma pena
que o Partido Comunista Português não saiba reconhecer isso…
O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Onze jovens detidos!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Em suma, onde o Partido Comunista Português vê autoritarismo, na
nossa parte vemos responsabilidade e pensamos que a solução encontrada pelo Governo é equilibrada, eficaz
e merece, naturalmente, o nosso voto favorável.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Protestos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, uma vez que não há mais inscrições para a
discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 158/XII (2.ª), vamos passar à discussão conjunta dos
projetos de resolução n.os
647/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo o estudo e a tomada de medidas urgentes a
fim de dar sustentabilidade ao setor automóvel em Portugal (PS), 781/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a
análise e adoção de medidas de apoio ao sector automóvel nacional (PSD e CDS-PP) e 782/XII (2.ª) —
Medidas urgentes para o sector automóvel (PCP).
Página 40
I SÉRIE — NÚMERO 108
40
Para apresentar o projeto de resolução do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.
O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A degradação da situação
económica no nosso País tem incidência em todas as áreas de atividade, mas há áreas onde essa
degradação é mais visível, onde as falências se sobrepõem e os despedimentos têm um impacto significativo.
O setor que estamos hoje a tratar, o do comércio e reparação automóvel, foi muito influenciado pela
retração da atividade económica com um número de falências muito significativo, com despedimentos e,
sobretudo, até para o próprio Estado, com uma diminuição significativa da cobrança de impostos.
Justifica-se, portanto, uma iniciativa do Partido Socialista, neste caso a apresentação de um projeto de
resolução, que deu entrada na Mesa há alguns meses, no sentido de estabelecer consenso para que medidas
de natureza urgente possam ser recomendadas ao Governo para minorar as influências negativas da situação
económica do nosso País. E fizemo-lo, desde logo, numa tentativa de não impactar, de não levar ao
Orçamento do Estado algo que pudesse não merecer consenso da parte da maioria para que este setor fosse
apoiado.
Assim, começamos por sugerir alterações no que se refere aos custos de contexto, quer a nível da
fiscalização da economia paralela, onde este setor tem, de facto, muitos concorrentes desleais, quer,
sobretudo, a nível dos impostos.
Relativamente ao imposto de circulação, sugerimos — e esta é uma reivindicação de todo o setor — a
suspensão deste imposto para os veículos que não circulam na via pública e que estão em fase de
comercialização. Entendemos que esta proposta, tendo em conta a redução das vendas, é muito importante.
Entendemos também muito importante que se alargue os processos relativos ao registo da propriedade
automóvel. Hoje em dia, o período de 180 dias para este tipo de produtos e serviços é um prazo curto para o
nível de stockagem que este comércio tem, pelo que sugerimos o alargamento da imposição do registo para
que este não tivesse de ser feito pelo comércio automóvel.
Apresentamos igualmente uma proposta no sentido de que se promova a adoção de boas práticas que
levem a que os consumidores possam ter mais confiança neste tipo de comercialização, a par de medidas de
natureza ambiental, quer no que respeita ao seu alargamento a outras unidades económicas, quer, sobretudo,
a outros setores.
A nível do financiamento, quer comunitário quer bancário (que se diz estar disponível, mas que, depois,
não chega) e, sobretudo (gostaria aqui de levantar esse tema) a nível do MODCOM, modernização do
comércio — não entendemos por que razão este programa, que, neste momento, tem verbas nacionais
disponíveis para se poder lançar mais uma fase e que é muito útil para o comércio automóvel, está suspenso
há mais de dois anos —, adianto que estamos disponíveis para consensualizar com todos os grupos
parlamentares (aliás, quero aqui saudar a maioria por também ter apresentado um projeto de resolução,
contrariando muito a tendência deste Governo em assentar só na consolidação orçamental, e vir ao nosso
«clube»), no sentido de dosear as medidas de iniciativa de consolidação orçamental, mas, sobretudo, também
de estímulo à atividade económica. Poderão contar connosco para consensualizar um conjunto de
recomendações, desde logo, ter um olhar bem diferente e, sobretudo, uma nova política, uma renovação
daquele que foi um programa que teve efeitos práticos na economia deste setor e que será um novo programa
de abate dos veículos com mais anos para estimular a atividade económica no sentido de renovar a frota,
modernizar e criar melhores condições de segurança para este setor.
Este é o nosso projeto e espero que daqui possamos dar mais um impulso para que esta atividade
económica possa vir a ter melhores dias nos próximos tempos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para apresentar o projeto de resolução do PSD e CDS-PP, tem a
palavra o Sr. Deputado Paulo Simões Ribeiro.
O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A produção e a venda de
automóveis registam uma queda continuada nos últimos anos, quer em Portugal quer no seio da União
Página 41
4 DE JULHO DE 2013
41
Europeia, sendo desejável, no nosso entendimento, a adoção de medidas que contribuam para a
sustentabilidade deste sector, sem que daí, mesmo assim, resultem globalmente encargos para o Estado.
A queda do mercado automóvel, a diminuição do volume de negócios no sector, o combate à economia
paralela, a necessidade de defender as empresas que atuam dentro do mercado e em verdadeira e sã
concorrência, são, entre outros, motivos mais do que suficientes para que o PSD e o CDS-PP apresentem
esta proposta de recomendação para análise e adoção de medidas de apoio ao sector automóvel nacional.
Não deixamos de registar que, embora ainda não tenham sido adotadas medidas de financiamento
específicas para o sector automóvel, o Governo já lançou algumas medidas que também procuram minimizar
os impactos associados às atuais dificuldades de acesso ao financiamento bancário também para este setor.
O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Muito bem!
O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): — Falo da Linha de Crédito PME Crescimento 2013, do alargamento
de prazo no âmbito das Linhas de Crédito PME Investe, dos fundos de capital para empresas com estratégias
de crescimento, da Linha Investe QREN e dos Fundos Revitalizar.
Conscientes de que a crescente integração da economia mundial exige que as empresas portuguesas
estejam aptas a responder aos permanentes desafios que lhes são colocados, entende este Grupo
Parlamentar que, para a sustentabilidade das unidades do sector automóvel, é crucial melhorar a
competitividade do produto e apostar na sua qualidade, bem como otimizar os custos de produção, da fatura
energética, da distribuição, ou reforçar o objetivo de redução da carga burocrática e fiscal associada à
atividade, antecipando também algumas das exigências decorrentes das normas europeias.
Por isso, neste projeto de resolução, recomendamos ao Governo a adoção de um conjunto de medidas:
que estude a criação de um programa de incentivos ao abate para carros em fim de vida; que pondere a
introdução de apoios financeiros e/ou fiscais à transformação de veículos para GPL, pela economia que isto
proporciona na fatura energética nacional; que implemente medidas de redução dos custos de contexto,
nomeadamente quanto ao registo legal de propriedade por parte dos comerciantes de automóveis, quer
alargando prazos quer permitindo que estes comerciantes possam, em caso em que eles não o façam, efetuar
o registo em nome do comprador; que simplifique e reduza em baixa os emolumentos associados à
transferência de propriedade; que suspenda o pagamento do imposto único de circulação durante o período de
revenda; que reformule os normativos ambientais e respetivas sanções; que fixe metas de recolha mínima
obrigatória de resíduos referentes a produtos com impactos ambientais negativos; que simplifique formulários
e sujeite as grandes superfícies comerciais às regras decorrentes da legislação ambiental em vigor, como seja
a comercialização de baterias e óleos para o sector automóvel; e, por fim, que reforce o combate à economia
paralela, evitando a concorrência desleal e a evasão fiscal.
O Sr. Paulo Batista Santos (PSD): — Muito bem!
O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): — Deve, ainda, ser promovida a implementação de um código de
conduta para divulgar as boas práticas e, por fim, reforçar, no quadro da iniciativa PME Líder, as medidas
transversais aplicáveis ao sector automóvel.
Estas são propostas pensadas e debatidas, que resultaram da auscultação de todos os intervenientes no
setor e que são a resposta global aos problemas globais deste setor e que promovem a sustentabilidade do
mesmo.
Verificamos que as medidas que aqui propomos merecem algum consenso, pelo que se viu, do Partido
Socialista e estamos em condições de dizer que as medidas que aqui trouxemos serão merecedoras de um
amplo debate e, estou certo também, de um amplo consenso nesta Câmara para, no fundo, ajudarmos um
setor tão importante para a economia nacional.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Ainda para apresentar o projeto de resolução do PSD e CDS-PP,
tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Viegas.
Página 42
I SÉRIE — NÚMERO 108
42
O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Tendo em consideração
que o setor automóvel tem um peso enorme na economia nacional; considerando ainda que há cerca de 33
000 empresas do setor que representam 2,7% do total do emprego em Portugal e um total de 138 000 postos
de trabalho diretos; não esquecendo que o volume de negócios atingidos por estas empresas é de perto de 24
000 milhões de euros (cerca de 15% do PIB); sabendo também nós que o nosso País tem um forte centro
exportador no que respeita ao setor automóvel e seus componentes; sendo as receitas fiscais geradas pela
venda e circulação automóvel em Portugal responsável por 6500 milhões de euros, ou seja, a cerca de 20%
do total das receitas fiscais, não podemos ficar indiferentes.
Para que se possa ter uma ideia, no início deste ano, o mercado de automóveis ligeiros caiu cerca de
1,2%, em comparação com o período homólogo, isto após ter passado um ano de 2012 absolutamente negro.
Assim e depois de muitas queixas que vinham a terreiro por parte das associações, que pretendiam ver
resolvidos problemas tais como a falta de concessão de crédito por parte de entidades bancárias; a falta de
incentivos ao abate que, na sua ótica, deram um forte contribuído para a salvaguarda do ambiente e para a
promoção da segurança rodoviária; a necessidade de o imposto único de circulação ter um regime adaptado
aos vendedores do setor; a necessidade de a transmissão da propriedade automóvel poder ser iniciada pelos
profissionais do setor; a exigência de, na venda de determinados produtos, passar a existir igualdade entre
eles e todos os estabelecimentos que comercializam os mesmos produtos quer para a manutenção quer para
a reparação; e a necessidade de revisão dos valores das coimas ambientais para as PME e microempresas, o
CDS, com o PSD, quiseram dar resposta a todas as preocupações que os empresários têm no exercício da
sua atividade.
Esperamos, com isto, conseguir encontrar uma matriz que permita o desvendar da rota de recuperação do
setor, desejando também nós, ao mesmo tempo, encontrar uma candeia para outros setores fragilizados da
economia nacional.
Atender às especificidades de cada atividade e conseguir compatibilizá-las com uma intervenção
estratégica, que não envolva muitos meios monetários, mas, acima de tudo, que envolva meios dinâmicos,
tem que ser o caminho.
A recomendação que hoje fazemos pretende levar o Governo a ponderar algumas medidas interessantes,
como sejam: a criação de um programa de incentivo para os veículos em fim de vida, que poderá gerar uma
receita fiscal adicional de 65 milhões de euros; a introdução de apoios financeiros ou fiscais à transformação
de veículos para GPL, pela economia proporcionada na fatura energética nacional e pelo respeito ambiental; a
desburocratização da transmissão de propriedade; e a possibilidade de rever alguns constrangimentos
associados ao imposto único de circulação.
Esperamos, assim, que o CDS e o PSD possam conduzir o setor automóvel nacional a bom porto…
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso é o que vamos ver!
O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — … ainda que os empresários tenham que enfrentar a crise
internacional, responsável por uma quebra de consumo do cidadão europeu, que prejudica a produção
nacional.
Temos consciência de que o projeto de resolução que hoje apresentamos não vai resolver todos os
problemas quer do comércio automóvel quer da reparação automóvel. Sabemos que a atual conjuntura em
que vivemos coloca a compra de um automóvel como uma não prioridade e a manutenção dos existentes são
adiadas ou não realizadas. Este é um sector que representa um número significativo de empregos e de
investimento.
Neste sentido, devemos criar as condições para que estas empresas possam ultrapassar este momento
particularmente difícil com o esforço que têm demonstrado e sem inviabilizar por completo a continuidade da
sua atividade.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Página 43
4 DE JULHO DE 2013
43
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para apresentar o projeto de resolução do PCP, tem a palavra o Sr.
Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por parte do PCP, gostaríamos de nos
congratular com este agendamento pela inegável e concreta importância que o setor automóvel assume para
a nossa economia e, precisamente por termos em conta essa importância do setor e a gravidade da sua
situação, queremos aqui apresentar as propostas concretas do Partido Comunista Português. Por isso, não
será ainda agora que faremos referência a motores gripados, direções desalinhadas, reboques partidos ou
copilotos em fuga.
Ora, o que propomos é que haja uma intervenção concreta com medidas urgentes para o setor, mas de
uma forma abrangente, desde o subsetor do comércio automóvel até ao da reparação, sem esquecer o da
desempanagem e reboque. Aliás, é preciso observar que as medidas propostas e a recomendar pela
Assembleia não podem passar ao lado de uma realidade concreta e incontornável do setor.
Nesse domínio, aí está o problema grave das práticas de abuso de posição dominante e de situações de
dependência económica, designadamente por parte de um conjunto cada vez mais poderoso de companhias
seguradoras, que impõem uma exploração brutal às micro, pequenas e médias empresas, quer nas oficinas,
quer nos reboques.
Esta realidade não é abordada em nenhum dos documentos que está a debate, à exceção do projeto do
PCP, e é importante que esta situação seja atendida e respondida pela Assembleia da República.
É preciso combater a concorrência desleal. Apresentamos propostas também no sentido da fiscalização e
da defesa da situação das empresas que estão colocadas à mercê dessa concorrência desleal.
É preciso uma política fiscal diferente, que acabe com esta asfixia não só no ISV (imposto sobre veículos),
que é, aliás, mais importante, diria eu, do que aquilo que se possa colocar em relação ao incentivo ao abate,
especialmente nos segmentos mais baixos em termos do mercado, mas também, desde logo, nas taxas e
emolumentos e no valor exorbitante que atingiram até agora, designadamente desde 2011. Aliás, é isto, em
larga medida, que influencia os problemas no registo automóvel, porque se os valores fossem mais baixos do
que aqueles que foram colocados por este Governo e pelo Governo anterior, salvo erro, com os PEC, a
situação seria significativamente diferente. Não é tanto a questão do atraso, mas mais o valor exorbitante das
taxas e emolumentos, uma questão concreta que é preciso atender e responder de forma efetiva, não com
uma pequena redução simbólica, mas com uma redução significativa. É aqui que queremos deixar…
Protestos do PSD.
Srs. Deputados do PSD, não se indignem. Nós queremos apenas deixar aqui a referência para que, no
futuro, não haja alguém a dizer que foi revisto em baixa o valor das taxas e emolumentos.
É preciso desenvolver uma política económica que promova o poder de compra das pessoas — esta é uma
questão central para o setor automóvel. Não vale a pena estarmos com paliativos enquanto as pessoas
continuarem com os carros a apodrecer à porta porque não têm dinheiro para a reparação ou enquanto uma
empresa não leva a viatura à inspeção, ficando esta parada, porque não há liquidez na empresa para resolver
o problema.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Esta situação de falta de poder de compra das pessoas, de falta de liquidez e
de capacidade de investimento das empresas é um caminho que não deve ser seguido. Pelo contrário, esta
questão da produção nacional como fator fundamental para a fileira automóvel em Portugal, sendo que a
produção nacional deve substituir as importações e não as importações por quebra na procura, que é o que
tem acontecido ao longo destes anos, é o caminho alternativo que tem de ser seguido no nosso País.
Devemos também ter em conta forçosamente a questão dos fundos comunitários.
Finalmente, mas não menos indispensável, é preciso ouvir o setor, dialogar com o setor. Alguns Srs.
Deputados já disseram que é essa a intenção e foi nesse espírito que apresentaram esta proposta. Do ponto
de vista do Governo, não é isso que tem acontecido ao longo destes anos.
Página 44
I SÉRIE — NÚMERO 108
44
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Termino dizendo que o PCP manifesta toda a abertura e empenho para um
trabalho de debate e de construção de um texto comum que responda de forma concreta e efetiva à realidade
gritante do setor. Mesmo que sejam outros governantes a aplicar estas medidas, o que é importante é que as
medidas sejam corretas e adequadas à situação que se coloca. Aliás, principalmente, se forem outros
governantes a seguirem outra política, teremos mais garantias de que este setor terá um futuro melhor.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Queria começar por saudar as diferentes
iniciativas que foram aqui apresentadas pelos grupos parlamentares no que toca a medidas de recuperação do
setor automóvel e das dificuldades económicas que tantas PME estão a atravessar.
Eu diria que o Bloco de Esquerda não apresenta aqui um projeto de resolução no sentido em que considera
que as diferentes propostas que são apresentadas nos diferentes projetos de resolução são soluções positivas
e interessantes. Creio, portanto, que a Assembleia pode, nesta matéria, fazer um bom trabalho, quer nos
apoios às PME, que são versados nos diferentes projetos, quer também no que toca a medidas fiscais e de
taxas que hoje são excessivamente pesadas sobre este setor e que, portanto, corre riscos no que toca ao
emprego e à atividade económica que desenvolve.
É certo que fazemos este debate sobre este conjunto de medidas, mas é também certo que a situação
económica que o País atravessa coloca dúvidas muito maiores a montante deste conjunto de iniciativas que
são aqui apresentadas.
Creio que é o debate político que vai percorrendo a crise política que vivemos por estes momentos e é bom
pensar que todas essas medidas como a do acesso a financiamento, a dos apoios às PME, a da redução de
impostos, a da redução de taxas, a da desburocratização são, certamente, importantes, mas, apesar de tudo,
o problema é mesmo a dificuldade da nossa economia, a espiral recessiva, a morte do emprego, a redução do
poder de compra das nossas famílias. Enquanto não encararmos de frente essa enorme dificuldade e todos os
erros que foram cometidos nos últimos dois anos, dificilmente vamos responder aos problemas do setor
automóvel.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, terminámos os nossos trabalhos.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, com início às 15 horas e a seguinte ordem do dia:
interpelação n.º 12/XII (2.ª) — Sobre a insustentabilidade da dívida pública e a política de austeridade,
apresentada pelo BE.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 5 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.