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Quinta-feira, 24 de outubro de 2013 I Série — Número 13
XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)
REUNIÃOPLENÁRIADE23DEOUTUBRODE 2013
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Maria Paula da Graça Cardoso Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 4
minutos. Foram aprovados dois pareceres da Comissão para a
Ética, a Cidadania e a Comunicação, um, relativo às suspensões e respetivas assunções de mandato de Deputados do PSD, do PS e do CDS-PP, e, outro, relativo às renúncias e respetivas assunções de mandato de Deputados do PSD.
Deu-se conta da entrada na Mesa do projeto de resolução n.º 857/XII (3.ª).
Ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento, procedeu-se a um debate com o Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho), que respondeu às perguntas formuladas pelos Deputados João Semedo (BE), Luís Montenegro (PSD), António José Seguro (PS), Nuno Magalhães (CDS-PP), Jerónimo de Sousa (PCP) e Heloísa
Apolónia (Os Verdes), tendo ainda esta Deputada dado explicações ao Deputado Luís Montenegro, que usou da palavra em defesa da honra da bancada.
Seguiu-se um debate com o Primeiro-Ministro, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 21/2012, de 17 de maio (Altera a Lei n.º 43/2006, de 25 de agosto, relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da República, no âmbito do processo de construção da União Europeia), de preparação do próximo Conselho Europeu. Além do Primeiro-Ministro, pronunciaram-se os Deputados António José Seguro (PS), Jerónimo de Sousa (PCP), João Semedo (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Nuno Magalhães (CDS-PP) e António Rodrigues (PSD).
A Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 55 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, a quem a Mesa
cumprimenta, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 4 minutos.
Podem ser abertas as galerias.
A ordem do dia de hoje consiste no debate quinzenal com o Sr. Primeiro-Ministro, ao abrigo da alínea b) do
n.º 2 do artigo 224.º do Regimento.
Antes de entrarmos na ordem do dia, vou dar a palavra à Sr.ª Secretária, Deputada Maria Paula Cardoso,
para ler o expediente.
Faça favor.
A Sr.ª Secretária (Maria Paula Cardoso): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, deram entrada na
Mesa dois relatórios e pareceres da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação.
O primeiro é relativo ao pedido de suspensão de mandato, nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea g), do
Estatuto dos Deputados, do Sr. Deputado Luís Vales (PSD), círculo eleitoral do Porto, sendo substituído pelo
Sr. Deputado Nuno Filipe de Sá Costa, com efeitos a partir de 23 de outubro de 2013, inclusive; da Sr.ª
Deputada Ana Sofia Bettencourt (PSD), círculo eleitoral de Lisboa, sendo substituída pela Sr.ª Deputada
Hermínia Maria da Fonseca Bexiga Azenha, com efeitos a partir de 24 de outubro de 2013, inclusive; do Sr.
Deputado Basílio Horta (PS), círculo eleitoral de Leiria, sendo substituído pelo Sr. Deputado Jorge Manuel
Rosendo Gonçalves, com efeitos a partir de 23 de outubro de 2013, inclusive; do Sr. Deputado Rui Jorge
Santos (PS), círculo eleitoral de Vila Real, sendo substituído pela Sr.ª Deputada Paula Barros, com efeitos a
partir de 26 de outubro de 2013, inclusive, e do Sr. Deputado Altino Bessa (CDS-PP), círculo eleitoral de
Braga, pela Sr.ª Deputada Otília da Conceição Ferreira Gomes, com efeitos desde 21 de outubro de 2013,
inclusive.
O parecer é no sentido de as suspensões e as assunções de mandato serem de admitir, uma vez que se
encontram verificados os requisitos legais.
O segundo é relativo à renúncia ao mandato de Deputado, nos termos do artigo 7.º do Estatuto dos
Deputados, do Sr. Deputado Sérgio Humberto (PSD), círculo eleitoral do Porto, sendo substituído pela Sr.ª
Deputada Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca, com efeitos desde 21 de outubro de 2013, inclusive,
e do Sr. Deputado Almeida Henriques (PSD), círculo eleitoral de Viseu, sendo substituído pela Sr.ª Deputada
Maria Ester Vargas, com efeitos desde 22 de outubro de 2013, inclusive.
O parecer é no sentido de as renúncias e as assunções de mandato serem de admitir, uma vez que se
encontram verificados os requisitos legais.
Deu, ainda, entrada na Mesa o projeto de resolução n.º 857/XII (3.ª) — Propõe a realização de um
referendo sobre a possibilidade de coadoção pelo cônjuge ou unido de facto do mesmo sexo e sobre a
possibilidade de adoção por casais do mesmo sexo, casados ou unidos de facto (PSD).
É tudo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar os pareceres da Comissão para a Ética, a Cidadania e
a Comunicação que a Sr.ª Secretária acabou de ler.
Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.
Dou as boas-vindas aos Srs. Deputados que hoje tomam assento no Plenário.
Vamos passar à ordem do dia, que consiste no debate quinzenal com o Primeiro-Ministro.
Como já enunciei, o debate realiza-se nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento,
significando que se inicia logo com as perguntas, as quais têm a seguinte ordem: BE, PSD, PS, CDS-PP, PCP
e Os Verdes.
Peço aos Srs. Deputados o favor de tomarem o mais depressa possível os lugares para que o orador que
abre o debate possa ser devidamente escutado.
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Pausa.
Para fazer a primeira pergunta, tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, peço desculpa a todos pela minha rouquidão, mas julgo que
me ouvirão em condições.
Sr. Primeiro-Ministro, a sua política de austeridade tem trazido muitos sacrifícios a todos os portugueses. A
todos não é bem verdade, porque há um pequeno grupo de privilegiados que têm sido capazes de fugir a
esses sacrifícios e era desse pequeno grupo que lhe queria falar a propósito do novo Código do IRC.
O novo Código do IRC, caso seja aprovado e entre em vigor, inclui uma cláusula que protege da tributação
uma série de grandes empresas. Estou a referir-me à isenção definitiva sobre algumas empresas que
estiveram envolvidas em processos de fusão, de cisão, de compra ou de venda de partes sociais e que, se
reinvestissem esses ganhos, tinham um benefício fiscal de ver suspensa ou adiada a sua tributação até estar
concluído o processo de investimento. Entre essas empresas, encontram-se o BES, a Sonae, a SGC, a
Cofina, a Semapa, entre muitas outras. Falo de centenas de milhões de euros tributáveis.
Queria perguntar, Sr. Primeiro-Ministro, como é que o senhor pode autorizar uma isenção definitiva desta
matéria tributável no exato momento em que tantos cortes são feitos nos salários, nas pensões, nas pensões
de sobrevivência, nas reformas, nos serviços públicos. Como é possível que o mesmo Governo que impõe
tanta austeridade promova este perdão, este verdadeiro e fantástico prémio fiscal?
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Semedo, refere-se
a matérias que estão propostas no novo Código do IRC que o Governo enviou para o Parlamento. É uma
matéria importante, que estará em discussão no Parlamento e relativamente à qual quero aproveitar a
oportunidade para exprimir a convicção de que se trata de uma reforma fiscal, relativamente ao investimento e
às empresas, extremamente importante, para a qual deveríamos concitar não apenas o mais amplo debate
possível, mas também o consenso mais alargado possível.
A proposta tem um pressuposto, que é o de que nós não devemos criar, por razões de competitividade
fiscal, uma discriminação negativa demasiado acentuada com o que se passa na média dos países europeus,
e isso passa-se hoje em dia em Portugal, por razões conhecidas. Estamos, portanto, interessados em que, na
tributação sobre as empresas, que são geradoras de crescimento, de investimento e de emprego, possa haver
competitividade fiscal.
Estamos interessados também, além das questões relacionadas com a taxa propriamente dita, na
possibilidade de criar outros elementos duradouros que atraiam investimento, independentemente do retrato
que o Sr. Deputado quis fazer dos investimentos ou das empresas que já existem.
A proposta que o Governo enviou para o Parlamento não foi feita a pensar no conjunto das empresas que
hoje existem, nem nas fusões que já foram feitas, nem nos investimentos que já foram realizados, é, sim, a
pensar para futuro, para todas as empresas que existem e para aquelas que queremos que passem a existir,
para investimentos que queremos atrair no futuro e que são indispensáveis para uma estratégia de
crescimento em Portugal.
Dentro dessa estratégia que propomos ao Parlamento, estamos inteiramente abertos para discutir os
elementos dessa estratégia com os partidos com assento parlamentar, reputando de relevante o diálogo que
possa ser realizado aqui com o Partido Socialista também nesta matéria, em razão de estarmos a falar de uma
reforma que se pretende duradoura e, portanto, não é para os próximos dois anos mas para os próximos 10 ou
20 anos, e isso exige, entre os maiores partidos políticos com atuais ou futuras responsabilidades de Governo,
um entendimento o mais alargado possível. Mas, dentro dessa estratégia que propomos ao Parlamento, está a
possibilidade de se fazer uma discriminação positiva relativamente aos ganhos que são reinvestidos nas
empresas, mesmo aqueles que resultem de fusões entre empresas.
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Trata-se, portanto, de uma matéria que, em primeiro lugar, pretende premiar quem, em vez de distribuir os
dividendos, possa reinvestir os lucros dentro da própria empresa para crescimento da empresa, para
crescimento do seu produto e para crescimento do emprego e, além disso, uma discriminação que ajude a
certos processos de maior capacidade crítica no meio empresarial português, que é predominantemente
habitado por pequenas e médias empresas.
Portanto, pretende dar uma orientação no sentido de dizer que, se é verdade que as pequenas e médias
empresas são extremamente relevantes e extremamente flexíveis, quer para reter emprego, quer para
poderem responder a estímulos mais imediatos sobre a economia, no entanto, necessitamos também de
alguma capacidade crítica, de alguma dimensão crítica e devemos, nessa medida, criar um estímulo para que
haja maior dimensão empresarial, a pensar não só no mercado interno, mas também na exportação.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado João Semedo, ainda dispõe de tempo.
Faça favor.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não lhe falei de benefícios fiscais para
estimular o investimento, mas, sim, de um fantástico perdão fiscal, de um prémio fiscal que o seu Governo
aprovou e propôs à Assembleia.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exatamente! Responda a isso!
O Sr. João Semedo (BE): — Foi sobre isso que lhe falei, num momento em que o senhor e o seu Governo
veem à lupa todos os cortes que podem fazer a mais nos salários, nas reformas, nas pensões. E o senhor vem
aqui, com esse ar displicente, verdadeiramente de mãos largas para os grupos financeiros e económicos. Foi
sobre isso que lhe perguntei e não sobre os estímulos ao investimento.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, a austeridade tem tido consequências. A austeridade não tem escondido
apenas estes benefícios aos grupos económicos. A austeridade não resolveu nem um só problema, mas
agravou todos os problemas do País.
Nós fazemos contas: em três anos, as medidas de austeridade do Governo totalizaram 25 000 milhões de
euros e, no entanto, o défice baixou apenas, nesses três anos, 3000 milhões de euros. O défice e a
austeridade são como miragens no deserto: quanto mais nos aproximamos da miragem, mais ela se afasta de
nós. Com o défice e a austeridade, o que acontece é quanto mais a austeridade avança, mais o défice foge à
sua frente.
Portanto, é natural perceber, perante este descalabro, a desorientação do Governo. Há uma verdadeira
cacofonia do Governo sobre o futuro do plano de ajustamento e das relações com os credores. O Sr. Primeiro-
Ministro, tanto fala num segundo resgate como num plano cautelar. Há ministros que falam em caução, há
ministros que falam em seguros, há ministros que falam em apoios financeiros.
Ainda há poucos dias, o Sr. Ministro da Economia dizia: «Eu sou um soldado do Governo». Eu não sei se o
Governo é um exército, o que sei é que parece que este Governo está sem general!
Portanto, é este o momento de lhe colocar uma questão. Sr. Primeiro-Ministro, nós sabemos que, na sua
política, à austeridade segue-se mais austeridade — isso, para nós, está claro. Ainda hoje, ouvimos a Sr.ª
Ministra das Finanças dizer que 94% das medidas de austeridade vieram para ficar. Portanto, nós, sobre isso,
não temos qualquer dúvida.
Mas talvez seja necessário, finalmente, o Sr. Primeiro-Ministro esclarecer o Parlamento e o País sobre o
que é que anda a negociar em matéria de futuro com a Comissão Europeia, com o Banco Central Europeu e
com a troica.
É esse esclarecimento que lhe peço neste debate.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra.
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Semedo, sobre a matéria fiscal, quero
dizer-lhe que o Governo não propõe qualquer perdão fiscal em matéria de IRC.
O Sr. João Semedo (BE): — Que ideia!…
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas o Sr. Deputado terá ocasião de discutir essa matéria, porque o debate, na
generalidade, em sede de Comissão, vai ocorrer justamente amanhã no Parlamento e, durante todo o debate,
na especialidade, terá muitas oportunidades para discutir essa matéria.
Mas há uma coisa que quero dizer-lhe, Sr. Deputado. É que, do ponto de vista do Governo, o investimento
das empresas é crítico para a recuperação do País, em termos económicos, e também para a recuperação do
emprego. Portanto, o que tem de se fazer relativamente à matéria fiscal corporativa pode ser muito importante
para a nossa recuperação.
Diz também o Sr. Deputado que mais austeridade tem correspondido a maior défice. Não é verdade, Sr.
Deputado! O senhor é desmentido pelos factos.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Por si!
O Sr. Primeiro-Ministro: — A verdade é que temos vindo, ano após ano, a reduzir o défice do Estado. Ele
tem vindo a ser reduzido, quer para efeitos do Programa de Assistência Económica e Financeira, quer em
matéria estrutural, quer em matéria nominal. Portanto, Sr. Deputado, os factos desmentem aquilo que o senhor
pergunta.
Sabemos, evidentemente, que devemos pensar também na conclusão do nosso Programa de Assistência
e, portanto, devemos pensar no pós-troica. Já muitas pessoas se pronunciaram sobre esse cenário, e eu
também neste Parlamento. Nós queremos trabalhar para o pós-troica. A primeira pessoa que, em Portugal,
veio falar, a propósito desse pós-troica, num programa cautelar foi o Sr. Governador do Banco de Portugal, em
março deste ano. Depois disso, muita gente se tem pronunciado sobre essa matéria.
Sr. Deputado, o que quero dizer-lhe aqui sobre isso é muito simples: nós sabemos que ainda nenhum país
saiu do Programa, a Irlanda será o primeiro país a fazê-lo, e estaremos atentos para saber o que é do
interesse da Irlanda fazer nessa matéria. No dia em que estivermos em condições de poder estar a fechar o
nosso Programa, nessa altura, falaremos de detalhes para saber se é de um programa cautelar que
precisamos ou se é de outra coisa, na assistência que viermos a necessitar para termos pleno acesso a
mercado.
Mas, Sr. Deputado, até lá, vou estar muito comprometido, como tenho estado até hoje, na conclusão do
Programa de Assistência Económica e Financeira, porque é isso que os portugueses esperam deste Governo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado João Semedo, ainda tem tempo, mas muito pouco. O Sr. Primeiro-
Ministro é que já não dispõe de tempo para responder.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. João Semedo (BE): — Poderá responder sempre nos nas respostas seguintes, Sr.ª Presidente.
Sr. Primeiro-Ministro, vamos ver se nos entendemos. Quando olhamos para as contas públicas, o que
vemos é que o seu défice, sem receitas extraordinárias, estaria exatamente na mesma ao longo destes três
anos.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Não! É falso!
O Sr. João Semedo (BE): — E o que eu lhe disse foi que a austeridade não controla o défice, não controla
as contas públicas.
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Isto para não lhe falar na dívida. Mas, se quiser, falo-lhe na dívida. Em 2011, era de 108% do PIB, em
2012, era de 124% do PIB e, em 2013, é de 127% do PIB.
Deixe-me que lhe diga, Sr. Primeiro-Ministro: a austeridade tem sido vista pelos portugueses como um
filme de terror. E sabe, Sr. Primeiro-Ministro, o senhor deve ser o único português que acredita que os filmes
de terror têm um final feliz, um final cor-de-rosa. Mas não têm, porque à austeridade segue-se sempre mais
austeridade.
Deixe-me que lhe diga mais: não sei onde é que o senhor encontra legitimidade política, legitimidade
democrática para a um primeiro programa de resgate querer impor ao País um segundo programa de resgate,
chame-se ele como se chamar — seja programa cautelar, seja caução, seja seguro, seja apoio, chame-lhe o
que quiser.
O senhor não tem legitimidade política, nem legitimidade democrática, para impor um segundo programa
ao País. Garanto-lhe que o Bloco de Esquerda se baterá para que, pelo voto, os portugueses o impeçam de o
fazer.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Concluem-se aqui as perguntas do Bloco de Esquerda.
A próxima pergunta é do PSD.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na próxima semana, teremos
ocasião de fazer o debate, na generalidade, do Orçamento do Estado, que o Governo remeteu à Assembleia
da República.
Em todo o caso, há algumas considerações e algumas questões que se colocam, desde já, neste domínio
e que queria colocar a V. Ex.ª.
Sr. Primeiro-Ministro, nesta bancada, temos a noção de que o Orçamento do Estado para 2014 comporta
um exercício muito exigente, um exercício duro mesmo. Temos como principal objetivo concluir, no prazo
previsto, o nosso Programa de Assistência Económica e Financeira.
E, Sr. Primeiro-Ministro, essa é uma nota de esperança que devemos enfatizar nesta ocasião. De facto,
podemos estar na presença do último Orçamento do Estado do nosso Programa de Assistência Económica e
Financeira, que o mesmo é dizer o Orçamento do Estado da saída da troica, como sempre quisemos e como
sempre tivemos na nossa mira, no prazo previsto, em junho de 2014.
Mas não é só por isso que é um Orçamento de esperança, Sr. Primeiro-Ministro. É também um Orçamento
de esperança, porque, contrariamente a muito daquilo que se tem dito, não onera mais os contribuintes
relativamente ao esforço que tem sido pedido ao longo deste Programa. Não há nenhum aumento de
impostos, nomeadamente impostos relativos a rendimentos do trabalho.
E é também um Orçamento que coloca a grande fatia do esforço que é necessário fazer do lado da
despesa, do lado do Estado, e não do lado da receita.
Mas é também — e isso tem sido de alguma forma ocultado no debate público — um Orçamento que é
amigo do crescimento económico. É um Orçamento que tem medidas fiscais de incentivo ao investimento e é
um Orçamento que vem na sequência da evolução da trajetória económica do nosso País.
Sr. Primeiro-Ministro, tivemos um 2.º trimestre de 2013, em que registámos crescimento económico, e os
dados apontam para que, no 3.º trimestre, se possa repetir o crescimento económico. E isso tem um
significado, Sr. Primeiro-Ministro; que, do ponto de vista técnico, já não estaremos em recessão. Isso significa
também, Sr. Primeiro-Ministro, que muitos daqueles que disseram o contrário se enganaram nas previsões. Há
muitos agentes políticos, nomeadamente nesta Câmara, que acusam o Governo e esta maioria de falharem
sucessivas previsões. Mas eles fizeram uma previsão — e fizeram-no de uma forma solene, em várias
ocasiões, neste Plenário —, ao dizerem que Portugal estava a caminhar para uma espiral recessiva e ao
afirmarem que daí não iria sair. Pois, Sr. Primeiro-Ministro, parece que os dados não confirmam essa previsão
e parece que quem está a falhar a previsão principal relativamente ao crescimento económico não é esta
maioria, não é o Governo mas, sim, a oposição e, em especial, o principal partido da oposição.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Primeiro-Ministro, é verdade que este Orçamento pede mais esforço do lado do Estado e menos
esforço do lado da sociedade. Esse é também um critério, que não podemos deixar de considerar, de justiça e
de equidade, Sr. Primeiro-Ministro, a juntar a outros e a outras medidas que estão contidas nesta proposta de
Orçamento.
Apetece-me perguntar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro: é ou não verdade que as pensões mínimas, que foram
congeladas na vigência do Governo anterior,…
O Sr. Mota Andrade (PS): — Outra vez?!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … são, de novo, atualizadas, e ainda em montante superior à inflação,
Sr. Primeiro-Ministro?
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — É ou não verdade que, mesmo a contribuição extraordinária de
solidariedade, aplicada às pensões, não se aplica em duplicado àqueles casos em que as pessoas entram no
regime de convergência da Caixa Geral de Aposentações com a segurança social? E, a este propósito, Sr.
Primeiro-Ministro, também me parece que muitos daqueles que falam sobre esta medida se esquecem que
esta era uma daquelas medidas do famoso PEC 4 — já lá estava prevista, como também estava prevista no
Memorando de Entendimento. Não é, portanto, uma medida nova que este Governo veio implementar.
E é ou não verdade, Sr. Primeiro-Ministro, que setores historicamente protegidos são chamados a
contribuir mais neste exercício orçamental? Do lado da energia, do lado da banca, do lado das parcerias
público-privadas.
Protestos do BE.
Hoje, ainda não ouvimos, mas, se calhar, vamos ouvir neste debate, que há proteção daqueles que têm
maior capacidade. Não há, Sr. Primeiro-Ministro! Como não há, de resto, na aplicação de taxas adicionais aos
rendimentos singulares e coletivos mais elevados. E esta é também uma questão que não pode deixar de ser
referida.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, é verdade que o esforço que é pedido ao setor público, também com critérios
sociais e de progressividade, é um esforço maior do que aquele que é pedido ao setor privado. Isso tem a ver
com o facto de, até ao momento, o ajustamento ter sido mais suportado precisamente pelo setor privado do
que pelo setor público.
Quero aqui afirmar desta bancada, Sr. Primeiro-Ministro, que nós, no PSD, não temos nada contra os
funcionários públicos,…
O Sr. Mota Andrade (PS): — O que faria se tivesse!…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … nem temos nada contra aqueles que prestam serviço na
Administração. Bem pelo contrário, Sr. Primeiro-Ministro, temos bem a noção de que o Estado precisa da
capacidade dos seus funcionários.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Exatamente!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Mas, Sr. Primeiro-Ministro, nós não estamos só a falar de diminuir a
despesa pública, o que, por si só, já é relevante. Nós estamos a falar de situações de emprego que são
indiscutivelmente mais seguras do que aquelas que temos no setor privado. Estamos a falar de funcionários
que não têm os problemas que se colocam no setor privado, por exemplo, para o pagamento dos salários de
forma atempada. Estamos a falar de um regime laboral que ainda é mais favorável.
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Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Falso!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, quero dizer-lhe: de facto, não temos nada
contra os funcionários públicos…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Não?!…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … mas a verdade é que, ao longo dos últimos anos, em Portugal, mais
de 400 000 portugueses perderam o emprego.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — E quantos professores?!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — E a questão que se coloca deve ser direta: quantos, destes 400 000
portugueses, eram funcionários públicos, Sr. Primeiro-Ministro?
É preciso que, quando utilizamos e concretizamos os princípios de justiça e equidade social, não nos
esqueçamos daquela que é a realidade que temos pela frente e daqueles que são os objetivos que
pretendemos alcançar.
Mesmo do ponto de vista salarial, Sr. Primeiro-Ministro, também não nos podemos esquecer que, fruto das
circunstâncias e das vicissitudes da nossa situação económica, houve (e o Banco de Portugal ainda o disse há
relativamente pouco tempo) uma diminuição dos salários do setor privado, em média, superior a 10%.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É o desemprego!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, é importante que nenhum de nós esteja a
estigmatizar o setor público, mas todos nós tenhamos uma postura séria, olhando para o País que temos pela
frente e tentando encontrar uma forma de o construirmos com mais justiça e com mais equidade para o futuro.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, uma última questão relativamente a esta discussão
que se abriu e à muita confusão que é deliberadamente criada com um putativo programa cautelar,…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Então não é?!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … à confusão que muitos, de forma deliberada, repito, querem fazer
dessa eventualidade — o Sr. Primeiro-Ministro disse que é apenas uma eventualidade, uma das formas que
poderá ser adotada para termos um acompanhamento da nossa reentrada no mercado, que o mesmo é dizer
que finalizamos o nosso Programa e reentramos no mercado, essa é apenas uma das formas que será aferida
oportunamente.
Mas há muitos agentes políticos que se apressaram a tentar confundir isto, a assustar as pessoas,
querendo dizer que se tratava de um segundo resgate.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, devemos todos ser sérios nesta discussão. Está
em causa o nosso futuro e também a expectativa das nossas pessoas e das nossas empresas.
De facto, um programa cautelar é muito diferente de um segundo resgate.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É na cor do papel!
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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Desde logo, o programa cautelar, por inerência, só pode ser colocado
em cima da mesa das opções se o programa de resgate tiver terminado — esse é o pressuposto do programa
cautelar.
Ora, o segundo resgate é precisamente o contrário, é um novo programa de resgate, é aquele programa
em que Portugal seria forçado a entrar, caso, por exemplo, seguisse as propostas e as políticas do Partido
Socialista, Sr. Primeiro-Ministro.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — E é lamentável, do ponto de vista democrático, que seja o próprio
Partido Socialista, voluntária e deliberadamente, a assustar o País com esta insinuação de que uma coisa é
igual à outra, Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Podemos não estar de acordo quanto ao caminho seguido, podemos não estar de acordo quanto a
algumas das medidas que são adotadas, mas devemos fazer este debate de forma séria, transparente e a não
confundirmos os nossos concidadãos e a não afetarmos a imagem interna e externa do nosso País.
Para este combate precisamos de todos, mesmo daqueles que estão na oposição, Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, na sua introdução, relembrou
um conjunto de resultados que mostram que o caminho que temos vindo a trilhar tem sido um caminho de
cumprimento que, em simultâneo, assegura a realização de reformas estruturais importantes para futuro, mas,
ao mesmo tempo, mantém o equilíbrio no curto e no médio prazos, representado pela necessidade de
equilibrar as contas públicas e reduzir o nível que, por essa via, resultaria para o endividamento do Estado, em
simultâneo produzindo efeitos de crescimento sobre a economia. Esse é um dado extremamente relevante
porque, como o Sr. Deputado disse, e muito bem, havia quem prognosticasse que ficaríamos um bocadinho
armadilhados, presos a essa armadilha, que era a de não conseguir conciliar a necessidade de reduzir o
défice com a necessidade de ver a nossa economia crescer. Mas os dados factuais evidentes mostram, como
o Sr. Deputado disse, que conseguimos reduzir o nosso défice e, ao mesmo tempo, lançar as sementes de um
crescimento que queremos que seja sustentável. A economia cresceu, de facto, no 2.º trimestre deste ano,
tudo aponta para tenha crescido no 3.º trimestre — teremos, sobre isso, notícia oficial dentro de algum tempo
—, mas os indicadores avançados confirmam a tendência de crescimento e não há nenhuma razão, nesta
altura, que nos leve a pensar que o último trimestre será diferente.
Aproveito, por isso, para exemplificar bem como não corresponde à verdade a ideia de que nós
consolidámos as finanças públicas.
O Sr. Deputado João Semedo, há pouco, insistia numa falsidade factual. O nosso défice nominal recuou
ano após ano.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sabemos que, para efeitos do PAF (Programa de Assistência Financeira), nem
todas as variáveis são contabilizadas. Por exemplo, em 2013, temos cerca de 700 milhões de euros que foram
utilizados para capitalização do Banif e que representam uma despesa que não se repete em anos seguintes e
que, portanto, não afeta o défice estrutural — afeta o défice nominal, mas não afeta o défice estrutural.
Ainda assim, quando tomamos em linha de conta todas as medidas de caráter extraordinário, quer do lado
da despesa quer do lado da receita, a verdade é que o nosso défice implícito foi sempre menor.
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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É falso!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas há uma medida que é inequívoca quanto ao sentido desse défice, que é
medido pelo défice estrutural primário. Quer dizer, descontados os juros que pagamos da dívida pública, o que
é que aconteceu ao longo dos anos em relação à despesa estrutural do Estado que não está relacionada com
o ciclo económico?
Sr. Deputado, o saldo estrutural primário, que estava estimado em menos 5,9%, em 2010, foi de menos
2,5%, em 2011, teve um excedente em 2012 de 0,1% e estimamos que, no final deste ano, seja de 0,5%. O
que significa, portanto, que o défice estrutural primário recuou praticamente seis pontos percentuais do PIB.
Ora, é evidente que, quando a intenção é ignorar os factos porque eles não se encaixam na nossa teoria
política e na nossa posição política, é o vale tudo! Mas isso não é, Sr. Deputado João Semedo, uma forma
correta de fazer política com o povo português.
Se os dados desmentem a sua teoria e a sua posição política, o que precisa de ser revisto, Sr. Deputado, é
a sua posição política, não são os factos!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Deputado Luís Montenegro, realmente é muito importante que estes dados que vamos recolhendo e
que mostram que há um recuo do défice correspondem a uma posição duradouramente melhor para futuro. Há
um dado que retrata também isso muito fielmente, que tem que ver com a nossa posição líquida sobre o
exterior em matéria de balança de pagamentos.
Portugal, ciclicamente, anos após anos, décadas após décadas, endividou-se não apenas por razão do
défice público, mas também do défice privado, do endividamento privado. Quer dizer, o País, recorrendo ao
crédito externo, via sistema bancário ou outras soluções, foi criando uma dívida que está
desproporcionadamente elevada face à riqueza que produz.
Ora, nós conseguimos, nestes últimos dois anos — e quando digo «nós», estou a falar do País, porque não
é o Governo que intervém diretamente nesta matéria; o Governo é importante no sentido em que mantém a
determinação desta linha política que permite que estes resultados possam aparecer, mas o resultado é do
País! —, um equilíbrio externo que corresponderá, já este ano, a um excedente da balança corrente e de
capital e também a um excedente da balança corrente dentro de pouco tempo, no próximo ano, em particular.
Significa isto que interrompemos décadas de crescentes e contínuos processos de endividamento.
O País, em matéria externa, está a não necessitar de maior financiamento, o que significa, portanto, que
podemos crescer duradouramente em cima disto — evidentemente, se não recuarmos nas nossas políticas.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Há alguns debates anteriores falou-se no exemplo da Grécia e do equilíbrio
que também se está a atingir nesse país em razão da quebra da procura interna e, portanto, da quebra das
importações.
Ora, a Grécia, infelizmente, não atingiu ainda este equilíbrio externo, ainda tem défice da balança corrente
e de capital, da balança de pagamentos, mas, em particular, não conheceu, como nós, ganhos em matéria de
exportações em quotas de mercado.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Nós fizemos evoluir a nossa balança não apenas porque o País passou a
importar na medida das suas disponibilidades, mas também porque aumentou as suas exportações e as suas
quotas de mercado no exterior. O que significa que melhorámos, do ponto de vista estrutural, a nossa posição
para futuro.
Mas, Sr. Deputado Luís Montenegro, o nosso futuro depende, julgo, no essencial, de duas condições: a
primeira é a de mostrarmos absoluta determinação na prossecução desta linha de política. Quer dizer, se,
externamente, existir a perceção de que o País, porque está sob assistência e, portanto, sob monitorização
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direta da troica, vai cumprindo, mas, mal a troica saia, deixará de cumprir porque voltará aos procedimentos
antigos, continuará os seus défices excessivos, alijará as políticas de rendimentos e permitirão, portanto, um
novo endividamento do País, nesse dia a confiança esvai-se.
Se queremos manter-nos no euro, se queremos que as taxas das nossas obrigações do Tesouro a 10 anos
baixem para níveis compatíveis com um regresso pleno ao mercado, então, teremos de mostrar que não
estamos a cumprir apenas porque a troica está cá, mas porque isso é importante para nós, e continuaremos,
no futuro, essa linha de cumprimento.
A segunda condição é a de que saibamos pensar o pós-troica em condições realistas.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem! É verdade!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Ora, muitas vezes tem existido no debate público em Portugal essa falta de
realismo e confunde-se os efeitos da crise com as políticas que nos deverão retirar dessa crise.
Muitos dos efeitos negativos que estamos a sentir, nomeadamente no desemprego, não são o resultado
das políticas que atuam sobre as causas dos problemas, são o resultado dos problemas que acumulámos
nestes anos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Se não existir transparência e uma forma verdadeira de comunicar isto ao
País, quer dizer, se se alimentar, perante o País, a ilusão de que teremos, nos próximos anos, com este
Governo ou com qualquer outro, disponibilidade para fazer reverter estas políticas, então nem este Programa
conseguiremos concluir.
Estas duas condições são críticas e tenho-me batido muito para que ambas se possam verificar para que
possamos concluir com êxito este Programa de Ajustamento.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PS.
Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo,
Sr. Primeiro-Ministro, uma pergunta muito simples: o Primeiro-Ministro mantém o que afirmou há 19 dias nesta
mesma Câmara de que não será necessário um novo programa para Portugal?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, só para dizer que faço minhas as palavras do Sr. Deputado
Luís Montenegro.
A tentação do Partido Socialista e do seu líder em procurarem confundir os portugueses quanto à ideia que
poderá resultar da eventualidade, que nem sequer é certa, de que Portugal possa vir a necessitar de um
chamado «programa cautelar» é lamentável, Sr. Deputado!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
No dia em que o Sr. Deputado quiser, com transparência, sem demagogia nem populismo, discutir o fecho
do nosso Programa de Assistência, a criação de metas nominais para a despesa pública que garantam, no
médio prazo, que o défice vai mesmo baixar de acordo com os compromissos que o senhor também assumiu
no âmbito do Tratado Orçamental, no dia em que o Sr. Deputado quiser discutir essas matérias estou
disponível para fazer uma discussão séria. Para responder a clichés, não, Sr. Deputado!
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado António José Seguro, tem a palavra.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não era minha intenção irritá-lo.
Vozes do PSD: — Ah!
O Sr. António José Seguro (PS): — A minha intenção é muito simples: esclarecer esta Câmara e os
portugueses. E não há nenhum debate que não possa ser travado aqui.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — É aqui que o senhor tem de debater connosco, com o País, porque é
aqui que tem os representantes do País!
Aplausos do PS.
A pergunta que fiz não é demagógica, é uma pergunta que tem todo o sentido, porque dei como certa e
válida a resposta que o Primeiro-Ministro me deu no dia 4 de outubro. O Primeiro-Ministro disse, nesta
Câmara, que não era necessário um segundo programa para Portugal e eu disse: «Fica registado».
Esta semana, em Londres, um ministro do seu Governo, o Ministro, do CDS, Dr. Pires de Lima, disse que
estavam a preparar um segundo programa para Portugal.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
É com a maior justiça e o maior rigor que pergunto ao Primeiro-Ministro, com muita clareza, o seguinte: o
senhor mantém ou não aquilo que disse neste Parlamento no dia 4 de outubro? É simples. Não se refugie em
palavras. Diga: mantém ou não mantém?! Diga!
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro, para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, o Sr. Deputado não me
irrita nada!
Agora, gostaria que o País pudesse tirar todas as conclusões daquilo que diariamente anda a sugerir.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O Sr. Deputado quer estabelecer uma confusão no País.
O Sr. António José Seguro (PS): — Responda! Sim ou não?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, não insista nessa via. Não é nem uma forma transparente nem
é uma forma madura de responder aos portugueses.
Vozes do PS: — Responda!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O Sr. Deputado sabe, porque já me fez essa pergunta e eu já respondi, que
não considero que Portugal precise de um segundo resgate.
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O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Portugal não precisa de um segundo resgate, se cumprir as metas que estão
estabelecidas. E nós estamos a fazer tudo para que essas metas sejam cumpridas.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O Sr. Deputado insiste, depois, nas declarações do Sr. Ministro da Economia,
que é ministro do meu Governo. Não é ministro do CDS, é ministro do meu Governo!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Ministro Pires de Lima disse aquilo que eu já disse, disse aquilo que o Sr. Vice-Primeiro-Ministro já
disse, ou seja, disse que nós esperamos poder concluir com sucesso o nosso Programa de Assistência
Económica e Financeira sem requerer nenhum outro e que esperamos, se isso acontecer, poder vir a preparar
um programa cautelar, que foi, nos termos precisos, muito bem densificado e muito referenciado pelo Sr.
Governador do Banco de Portugal, em março deste ano. Foi exatamente nos mesmos termos.
O Sr. António José Seguro (PS): — Não se refugie aí!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, Sr. Deputado, deixe-me dizer-lhe que eu não sei se haverá essa
necessidade. Se houver essa necessidade e for preciso encontrar um mecanismo que nos permita regressar a
mercado de uma forma apoiada, nós não deixaremos de o fazer — para o País. Com certeza que sim! Mas,
Sr. Deputado, nesta altura, não só não há nenhuma negociação a decorrer, como não se está a preparar
nenhuma negociação sobre isso, e eu isso também já o referi.
Portanto, Sr. Deputado, querer fazer disto um caso, depois de todos os esclarecimentos serem prestados,
é vontade de não discutir o essencial e de querer ficar pelo acessório.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado António José Seguro, faça favor.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, este assunto é da maior
importância e o País não pode ter um Primeiro-Ministro a dizer uma coisa no Parlamento e ter um ministro do
seu Governo a dizer outra coisa fora do País.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — Não pode! Não deve! Em particular num assunto desta importância.
E entendamo-nos, Sr. Primeiro-Ministro: pare de jogar com as palavras! Entendamo-nos!
A questão é simples: só há quatro formas de regressar a mercado. Uma delas é uma forma independente.
Só uma delas dispensa programa, só uma delas dispensa condicionalidades,…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não faça demagogia!
O Sr. António José Seguro (PS): — … todas as outras, chame-lhe o Primeiro-Ministro o nome que quiser
— cautelar, segundo programa, o que entender —, exigem condicionalidades.
Ora, o que é que está aqui em causa?
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É o País!
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O Sr. António José Seguro (PS): — O que está aqui em causa é o seguinte: o senhor garantiu aos
portugueses, ao longo destes 28 meses em que governa o País, que o programa que estava a ser aplicado
teria êxito. Pois fica a saber que se o nosso País necessitar de um segundo programa é porque o seu
programa não teve êxito, e a responsabilidade é sua! Isto é muito claro!
Aplausos do PS.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Que vergonha!
O Sr. António José Seguro (PS): — Quero dizer-lhe isto com muita clareza!
E, devo dizer-lhe, não venha novamente alijar responsabilidades, porque ninguém lhe perdoará esse
falhanço. Não lhe perdoam os desempregados, quase 1 milhão,…
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Que vergonha!
O Sr. António José Seguro (PS): — … não lhe perdoam os funcionários públicos, não lhe perdoam as
famílias, que pagam elevados impostos, não lhe perdoam os portugueses que emigram, os jovens, a quem o
senhor corta esperança, a classe média, que o senhor está a destruir.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Que vergonha!
O Sr. António José Seguro (PS): — Se houver necessidade — e nós desejamos que não haja — de um
segundo programa no nosso País, a culpa é sua, do seu Governo, e o senhor tem de tirar todas as
consequências desse falhanço. Não terá perdão! Não terá perdão!
Aplausos do PS.
Mas há outra coisa que quero dizer ao Sr. Primeiro-Ministro, e vamos falar de contas públicas.
No dia em que o senhor apresentou o Orçamento do Estado para 2014, ficou conhecida uma nova previsão
para o défice orçamental para este ano. E essa nova previsão é precisamente igual àquele que era o défice
inicial neste ano. O que quer dizer que os sacrifícios que o senhor exigiu aos portugueses, quer nos cortes de
salários, quer nos cortes das pensões, quer no corte das reformas, quer no aumento brutal de impostos
serviam para zero! Serviram para nada!
Protestos do PSD.
O défice sem recurso a medidas extraordinárias é rigorosamente igual ao défice, no início de 2013.
O Sr. Mota Andrade (PS): — Bem lembrado!
O Sr. António José Seguro (PS): — A pergunta é muito simples: quais são as conclusões e as
consequências que o Primeiro-Ministro tira deste défice?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, fiquei a saber que há
quatro formas de regressar a mercado e que três têm condicionalidade. As que têm condicionalidade, mas que
permitem regresso a mercado, do seu ponto de vista, revelam que o Programa não teve êxito.
Portanto, deduzo que teve êxito a estratégia do Partido Socialista que nos conduziu ao Programa de
Assistência Económica e Financeira em 2011. Esse teve êxito!
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do Deputado do PS António José Seguro.
Essa foi uma estratégia bem-sucedida!
Agora, uma estratégia que nos conduza ao regresso a mercado, desde que tenha condicionalidade, mostra
que há insucesso.
Sr. Deputado, essa é uma forma muito especial de ver o problema. Percebo a vantagem que lhe dá, mas,
sinceramente, não subscrevo.
No entanto, quero atrever-me a sugerir que há uma razão para o Sr. Deputado estar a insistir nesta
matéria, que é esta: o Sr. Deputado até ao verão insistiu que queria eleições a todo o custo e de qualquer
maneira.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Depois, percebeu que era muito difícil andar mais dois anos a dizer que queria
eleições. Então, tem de encontrar um pretexto qualquer para poder dizer: «Tem de haver eleições!»
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Claro! Claro!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Tem de haver eleições, porquê?
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Tal qual!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Se o Programa de Assistência Económica e Financeira resultar, apesar de
necessitar de condicionalidade, o senhor não pode discutir essa condicionalidade, tem de fazer eleições!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E, portanto, o Sr. Deputado quer andar até às eleições europeias a pedir
eleições, sem as pedir!
Ó Sr. Deputado, é tão óbvio! Porque é que não o diz diretamente? Ficava-lhe melhor!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Diz também o Sr. Deputado que o défice para 2013 revela a inconsequência das medidas que adotámos.
Não é verdade! E não é verdade pela simples razão de que o défice será este ano, de acordo com as nossas
estimativas, 5,5%. Em termos do PAF, é isso que conta — aliás, será de 5,9%, atendendo à recapitalização do
Banif, que não ocorreu no passado nem vai voltar a ocorrer.
Portanto, trata-se de uma medida que não transporta nenhum peso específico para o ano seguinte. Logo,
devemos partir da base adequada.
Sr. Deputado, nós teremos conseguido no final deste ano, segundo as previsões da UTAO (Unidade
Técnica de Apoio Orçamental), que coincidiram com as do Governo, uma redução do défice estrutural próximo
de 0,5%, exatamente 0,4%. É nosso convencimento de que esse valor se aproxima de 0,5%, que é aquele que
nós devemos garantir para, no âmbito do procedimento por défices excessivos, ter progressão orçamental.
Mas vamos entender-nos no seguinte: o Sr. Deputado está sempre a insistir nesta questão do défice. O Sr.
Deputado diz: «As medidas deviam ter permitido uma redução maior do défice, mas, como não aconteceu, o
Governo está a falhar.»
O Sr. João Galamba (PS): — É zero! Zero!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, para o Governo acertar mais que medidas de corte de despesa
pública é que gostaria que o Governo tomasse? Diga lá, se fizer favor, para sabermos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado António José Seguro, tem a palavra.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, quero dizer ao Sr. Primeiro-Ministro que só o Sr.
Primeiro-Ministro é que encontra redução, ainda que seja pouquinha, no défice deste ano. Não houve redução!
E quando o Sr. Primeiro-Ministro vem dizer que o Banif é uma medida one-off, ou seja não passa para o
ano seguinte, tem razão, mas as receitas extraordinárias provenientes do perdão fiscal também não passam
para o ano seguinte, o que quer dizer que não houve nenhuma alteração.
Aplausos do PS.
O senhor já não engana mais ninguém! O senhor já não engana mais ninguém!
O senhor pode rir-se, mas os portugueses não se riem. Os portugueses que sofrem, que estão
desempregados e a quem o senhor corta nas pensões não se riem. Não se riem!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O défice, segundo as estimativas feitas pelo Governo em Outubro, chegará ao final deste ano precisamente
ao mesmo nível em que estava quando começámos, o que quer dizer que todas as suas medidas de
austeridade — e foram tantas e tão pesadas! — valeram zero. Valeram zero.
O Sr. João Galamba (PS): — Zero! Zero!
O Sr. António José Seguro (PS): — E essas medidas custaram imenso aos portugueses, mas devo dizer-
lhe que não resolveram nada!
O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Zero! Zero!
O Sr. António José Seguro (PS): — O senhor, perante isso, não tira conclusões? O senhor, perante isso,
não tira consequências? O Sr. Primeiro-Ministro é incapaz de responder. Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro nunca
responde a nada, porque não assume nenhuma responsabilidade perante o que está a fazer há 28 meses.
Aplausos do PS.
E, devo dizer-lhe, há 28 meses que o senhor governa este País. O senhor transformou um plano de
ajustamento num plano de empobrecimento. O País está hoje pior do que quando o senhor iniciou funções…
O Sr. João Galamba (PS): — Muito pior! Muito pior!
O Sr. António José Seguro (PS): — e a única coisa que o senhor tem para dizer é que, perante o seu
falhanço, vai insistir na mesma política.
A proposta de Orçamento que o senhor entregou não corresponde a nenhuma estratégia orçamental; é um
plano de pobreza. A via de empobrecimento que o senhor escolheu não só aprofunda a crise, como soma
mais crise àquela que já existia, e os problemas não param de crescer.
A dívida pública, ao longo destes meses, cresceu cerca de 30 000 milhões de euros — 30 000 milhões de
euros!
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Protestos do PSD.
A via do empobrecimento destruiu cerca de 400 000 postos de trabalho. Portugal, que tinha passado a ser
um País de imigração, passou a ser um País de emigração e uma componente forte desses portugueses que
emigram são jovens, jovens a quem o senhor cortou a esperança e uma parte dos portugueses que vivem com
receio, com insegurança, com incerteza, com medo do dia de amanhã são os reformados a quem o senhor
garantiu há dois anos que nunca, mas nunca, faria um corte retroativo nas pensões…
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Bem lembrado!
O Sr. António José Seguro (PS): — … e agora está a fazer esse corte retroativo nas pensões.
Aplausos do PS.
É deste País e é perante esta realidade que o senhor tem de assumir as suas responsabilidades.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, julgo que revela muito
pouca consideração quer pelos resultados, quer pelos sacrifícios que os portugueses fizeram vir dizer que as
medidas valeram zero. Não, Sr. Deputado! As medidas que foram executadas permitiram-nos atingir as metas
que estavam acordadas com a troica. Sr. Deputado, isso devia motivar da sua parte regozijo e satisfação. O
facto de Portugal estar a cumprir essas metas devia ser motivo de satisfação para o Sr. Deputado.
Aplausos do PSD.
Agora, não responderei mais nada até o Sr. Deputado se posicionar neste debate de acordo com a
exigência que coloca, que é dizer, se quer que o défice seja mais baixo, que medidas adotaria na redução da
despesa para garantir um défice mais baixo.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Claro!
O Sr. Primeiro-Ministro: — É a isto que o Sr. Deputado tem de responder. Não pode querer reclamar «sol
na eira e chuva no nabal»!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Não pode querer, ao mesmo tempo, criticar o Governo por não reduzir mais o défice e criticá-lo por adotar
as medidas que lhe permitem reduzir o défice.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Isso não é possível, Sr. Deputado! É uma demagogia absoluta!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS.
Por fim, disse o Sr. Deputado que este Orçamento do Estado é um plano de pobreza. Não é, Sr. Deputado!
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O Sr. João Galamba (PS): — É, é!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Este Orçamento do Estado apresenta-se aos portugueses para cumprir dois
objetivos: primeiro, o de levar mais longe o esforço que o Estado tem de fazer na sua despesa para reduzir o
défice público, e é isso que faz…
Protestos do Deputado do PS João Galamba.
Sr. Deputado, não se excite tanto! Não se excite tanto, Sr. Deputado! Tenha calma! Tenha calma!
Protestos do PS.
Agora, há uma segunda condição que é muito importante: poder dar à economia razões para que ela possa
respirar e crescer.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, há muito ruído de fundo na Sala.
Sr. Primeiro-Ministro, se me dá licença, direi o seguinte: o Parlamento é um espaço de combate, mas é
preciso ouvir os combatentes…
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
… e, Srs. Deputados, está difícil, às vezes, ouvir os oradores.
Pedia que os apartes, que são legítimos, pelo menos, não fossem permanentemente feitos em refrão, às
vezes em voz singular que se confunde com a do orador. Pedia, pois, este favor.
Faça favor de continuar, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Concluirei, Sr.ª Presidente, dizendo que este Orçamento tem uma estratégia,
que é a de fechar o nosso Programa de Ajustamento num clima de recuperação económica. É isso que está
previsto e é por isso que estamos a lutar.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quando foi apresentada a
proposta do Orçamento do Estado para este ano a meta contratada com a troica para o défice era de 4,5%. No
final, vai ficar, sem recurso a medidas extraordinárias, em 6,3%. Contra factos não há nenhum argumento.
O Sr. Primeiro-Ministro pergunta pelas medidas e pelas propostas do Partido Socialista, mas o senhor tem
conhecimento delas, pelos menos desde julho de uma forma sistemática.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas essas só aumentam a despesa!
O Sr. António José Seguro (PS): — Eu vou entregar-lhas novamente, Sr. Primeiro-Ministro. Tem à sua
disposição 19 páginas de propostas concretas para o equilíbrio das contas públicas, para a estabilização da
nossa economia, para ter uma política de rendimentos sustentável e para voltar a ter o crescimento económico
como prioridade.
Terei todo o gosto em voltar a reenviar-lhas, Sr. Primeiro-Ministro, embora tenha pouca esperança em que
consiga compreender o que ali está de interesse para o nosso País, isto é, em colocarmos Portugal numa via
de crescimento económico e de preservação de postos de trabalho.
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Mas há uma terceira nota que quero deixar. O Primeiro-Ministro veio aqui falar nas medidas que o Governo
está a adotar, mas o País não vê medidas, o País vê cortes; o País não vê nenhuma reforma. Aliás, onde é
que está a reforma do Estado que o senhor prometeu ao País?
Vozes do PS: — Bem lembrado!
O Sr. António José Seguro (PS): — Faz para a semana um ano que o senhor disse que o País teria de
fazer agora uma grande reforma do Estado. Convidou até o Partido Socialista, excluindo outras forças
políticas, a dar o seu contributo. E disse: «Temos de concluir esta reforma até fevereiro de 2013». Passou
fevereiro, e onde é que está essa reforma?
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. António José Seguro (PS): — O Sr. Primeiro-Ministro veio dizer que, até junho, o Governo
apresentaria um guião para essa reforma do Estado. Passou junho, e onde é que está o guião e a reforma?
Estamos no final de outubro e não há nenhuma reforma, nem há nenhum guião. Sabe porquê, Sr. Primeiro-
Ministro? Porque já não há Governo em Portugal.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, dispõe de muito pouco tempo para responder, mas tem a
palavra.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Eu serei breve, Sr.ª Presidente.
O Sr. Deputado António José Seguro pode remeter-me para as propostas do Partido Socialista, mas
nessas propostas só vejo aumento da despesa e, portanto, défice.
O Sr. António José Seguro (PS): — Não é verdade! Seja sério!
O Sr. Primeiro-Ministro: — No dia em que o Sr. Deputado apresentar medidas concretas que reduzam a
despesa ao nível que ela necessita de ser diminuída, nesse dia nós conversaremos, Sr. Deputado.
Mas o Partido Socialista não apresenta essas medidas. Seja como for, insisto, Sr. Deputado: o défice
estrutural primário teve a maior redução que se conheceu em toda a União Europeia.
O Sr. António José Seguro (PS): — Isso não é sustentável!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, se o senhor entende que a melhor forma de avaliar um país é
em função do retrato estrutural e a melhor forma de avaliar se o procedimento excessivo é cumprido ou não é
pelo recuo do défice estrutural, porque insiste o Sr. Deputado em ignorar o recuo imenso que nós
conseguimos fazer nestes dois anos em matéria de défice estrutural? É que isso é o mais importante para o
futuro.
O Sr. António José Seguro (PS): — Está enganado!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Quanto ao que disse sobre a reforma do Estado, quero dizer-lhe o seguinte:
Sr. Deputado, não confunda o guião da reforma do Estado com a reforma do Estado, porque essa iniciou-se
há dois anos e meio. É verdade, Sr. Deputado, há dois anos e meio que este Governo tem vindo a reformar o
Estado, e os exemplos são múltiplos.
Exemplificarei quando tiver tempo, mas remato dizendo-lhe o seguinte: o facto de termos tido a oitava e a
nona avaliações não nos permitiu considerar ainda a discussão sobre o guião da reforma do Estado, mas ele
está agendado para próxima reunião do Conselho de Ministros. Na próxima semana, o Sr. Deputado poderá
utilizar, na discussão sobre o Orçamento do Estado, o tema do guião da reforma do Estado.
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Poderá utilizá-lo abundantemente, mas quando o fizer não se esqueça que essa reforma já se iniciou há
dois anos e meio…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … e tem prosseguido intensamente, como se observa agora na área da
justiça,…
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — … que é uma área de soberania muito importante das políticas públicas e que
tem vindo a ser amplamente reformada.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra, pelo CDS-PP, o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ainda não foi hoje que
assistimos a um dia histórico nesta Casa. O Sr. Primeiro-Ministro bem tentou, mas ainda não foi desta que
conhecemos uma medida de redução da despesa proposta pelo maior partido da oposição.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ainda não foi desta que o Sr. Deputado António José Seguro
conseguiu apontar uma alternativa, uma medida de redução efetiva de despesa. Ainda não foi desta!
Mas há uma coisa em que o Sr. Deputado António José Seguro tem razão. Há uma questão que o Sr.
Deputado levantou que é da maior importância, porque tem a ver com a qualidade da democracia, que se
avalia também pela qualidade da alternativa. E a qualidade da alternativa está no maior partido da oposição.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Primeiro-Ministro, quem, liderando o maior partido da oposição,
deliberadamente confunde, pretendendo confundir, mantém a confusão entre aquilo que é um programa
cautelar e um segundo resgate, não está preparado para ser alternativa nem para ser candidato a Primeiro-
Ministro.
Aplausos do CDS-PP.
As pessoas percebem que um programa cautelar, que é o que irá acontecer à Irlanda, irá acontecer porque
aquele país cumpriu com as suas metas. Um segundo resgaste, Sr. Deputado, é aquilo que aconteceu com a
Grécia e é aquilo que aconteceria com Portugal se este Governo seguisse a estratégia que V. Ex.ª, Sr.
Deputado António José Seguro, tantas vezes aqui propôs.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — E os portugueses percebem isto. Não vale a pena confundir, não
vale a pena, por uma mera questão eleitoral ou de discurso político, estar a criar medo e receios nas pessoas
que não se justificam.
De resto, o que foi dito foi muito claro e já foi dito pelo Governador do Banco de Portugal, e até pelo Sr.
Presidente da República, quando convocou os vários partidos para um acordo para o pós-troica, que
necessitava de ser pensado e bem.
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Portanto, relativamente a essa matéria, creio que estamos esclarecidos quer quanto à diferença entre o
programa cautelar e o segundo resgaste, quer em relação àquilo que está por trás das reais intenções do
Partido Socialista, que não é ajudar a esclarecer as pessoas, é ajudar a confundir em troca não sei bem de
quê, nem para quê.
Sr. Primeiro-Ministro, depois de ter deixado esta nota, queria ainda dizer-lhe o seguinte: sendo esta a
primeira vez que aqui participa num debate após a apresentação do Orçamento do Estado, é nossa convicção
que este é o último Orçamento do Estado sob o Programa de Assistência Económica e Financeira a que
fomos sujeitos por força da governação anterior.
Cremos mesmo que será o último Orçamento do Estado que faremos sob condição da troica, o que não é o
mesmo que dizer que é o último Orçamento do Estado que faremos sem a necessidade de ter equilíbrio e
consolidação orçamental.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muitas vezes, aqui — ainda agora isso sucedeu mais uma vez —, se
lança a confusão, que pode dar resultados a curto prazo, mas que a médio e longo prazo irá reverter para
quem a lança, de que logo que consigamos libertar-nos da troica — como estamos convictos de que vamos
conseguir, cumprindo com aquilo que nos comprometemos, regressando aos mercados na data prevista, findo
o Programa de Assistência — tudo poderemos mudar, ou seja, que poderemos voltar ao investimento público,
à obra pública pela obra pública, ao investimento desbragado que nos trouxe a esta circunstância dificílima de
termos a nossa autonomia financeira limitada e, com isso, uma parcela importante da nossa soberania debaixo
de protetorado.
Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, chegados ao Orçamento, é altura de vermos as escolhas e as opções dos
diferentes partidos, dos diferentes grupos parlamentares.
Já percebemos que mais à esquerda mantém-se o não pagar, o não cumprir, o sair da zona euro, o sair da
União Europeia — imagine-se, Sr. Primeiro-Ministro, até da NATO! Sabemos o que aconteceria se este
Orçamento fosse nesse «canto de sereia» da esquerda mais à esquerda: desvalorização imediata e brutal da
nossa moeda, perda de poder de compra, inflação galopante, aumento inusitado dos bens que importamos,
crise do sistema bancário, depósitos congelados.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso parece uma situação próxima da que vivemos!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não é, certamente, esta a opção da maioria dos portugueses.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, poderíamos pensar numa segunda opção, aquela de que o maior partido da
oposição tantas vezes fala: reestruturar a dívida. Seria mais tempo, mais dinheiro, mais juros, mais défice,
mais austeridade durante mais tempo.
Sabemos que foi isso que a Grécia tentou, sabemos aquilo a que isso infelizmente, conduziu na Grécia: as
pensões e os salários do setor público caíram em média 25%, os impostos aumentaram mais de 20% para a
maioria do povo grego.
Quem defende esta circunstância e esta solução não pode ficar a meio caminho, tem de defender tudo e
tem de, sobretudo, elucidar os portugueses do risco que ela mesmo comporta.
Por isso, a terceira opção, aquela que este Orçamento segue, julgo ser a melhor. Trata-se, evidentemente,
de um Orçamento muito exigente, muito duro, com medidas difíceis, mas é um Orçamento que não desiste do
País depois de termos percorrido três quartos do caminho e de estarmos a oito meses do fim desse Programa.
É um Orçamento que implica medidas difíceis, muitas delas já acordadas no âmbito da sétima avaliação. E,
de caminho para as oitava e nona avaliações, o Partido Socialista, convidado pelo Governo para poder
negociar, para poder propor, entendeu que não seria necessário nem oportuno juntar-se ao Governo, porque
sabia muito bem que essas medidas também implicariam a redução de despesa, e para isso não está
disponível.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Bem lembrado!
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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Assim, não obstante a dificuldade deste Orçamento, registamos o
facto de a redução de despesa ser de 80% e de a redução da receita ser apenas de 20%.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Registamos o facto de não haver um aumento de impostos,
nomeadamente sobre o rendimento e sobre o trabalho dos cidadãos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Registamos que a banca vai pagar mais, a EDP vai pagar mais, a PT
vai pagar mais, certos fundos imobiliários beneficiarão menos.
Isso combate a ideia, mil vezes repetida, mas ainda assim falsa, de que este Orçamento não é equitativo
na redistribuição dos sacrifícios.
Sendo certo, como eu disse, Sr. Primeiro-Ministro, que é um Orçamento difícil, também é um Orçamento
que deve dar execução, dar robustez a alguns sinais que, por muito que a oposição se esforce por negar, não
deixam de ser factos.
Não deixa de ser um facto que as exportações portuguesas, segundo dados da União Europeia, não deste
Governo, nos primeiros oito meses deste ano cresceram mais de 10%, com mais quota de mercado, e que foi,
como há pouco disse, a maior subida registada na União Europeia.
Não deixa também de ser verdade que a produção industrial, segundo dados do Eurostat, em agosto
último, subiu 8,2%, a maior subida registada na União Europeia.
Não deixa de ser verdade que os indícios do 3.º trimestre são no sentido de manter uma tendência do 2.º
trimestre consecutivo de crescimento.
E recordo-me bem de uma afirmação do líder da oposição, que dizia aqui para o Sr. Primeiro-Ministro,
numa proclamação definitiva, como quase todas, que estávamos perante uma espiral recessiva imparável.
Onde é que está a espiral recessiva imparável, quando podemos ter dois trimestres consecutivos a crescer
economicamente?
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — E também importa responsabilizarmo-nos todos pelos sinais que
damos lá para fora, para os portugueses que estão a sofrer, para as empresas que estão a resistir a medidas
dificílimas, e não em lançar confusão.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
É nesse sentido que gostaria de dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que estamos disponíveis para uma reforma
que também consideramos essencial, que é a reforma do IRC. É evidente que não se trata de dar benefícios
fiscais a quem quer que seja,…
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Então é o quê?
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … trata-se, isso sim, de dar incentivos ao crescimento para que haja
investimento e para que esse investimento possa criar ou, pelo menos, segurar os postos de trabalho.
É em relação a essa matéria que lhe quero dizer que, pela parte do Grupo Parlamentar do CDS, terá, com
certeza, total disponibilidade do Governo para, em conjunto com o PSD, mas também com o Partido
Socialista, arranjar uma solução estável, uma reforma que perdure durante vários anos, porque é isso que as
empresas e aqueles que querem investir no nosso País esperam, ou seja, que haja previsibilidade no nosso
País. E foi isso que tantas vezes falhou.
É justamente sobre isso que gostaria de ouvir a opinião do Sr. Primeiro-Ministro, sobre o que deve ser um
sistema fiscal previsível, que capte investimento e para, de uma vez por todas, se terminar com mais uma
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mentira que, por mil vezes repetida, não se pode tornar verdade: não se trata de perdoar empresas, não se
trata de dar benefícios fiscais a empresas…
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … trata-se de harmonizar o sistema fiscal português com outros da
União Europeia e com isso tornar-se atrativo para o investimento estrangeiro, criando emprego e combatendo
o desemprego.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, este Orçamento do Estado
que o Governo propôs ao Parlamento, e que será discutido e avaliado, tem realmente o propósito, como o Sr.
Deputado disse e o Sr. Deputado Luís Montenegro também já tinha avançado, de permitir cumprir o Programa
de Assistência Económica e Financeira e de fechar este período de emergência económica e financeira em
que o País tem vivido.
O Orçamento tem metas extremamente exigentes e exigirá, do ponto de vista da execução, uma cautela e
uma concentração totais, para que as metas possam ser atingidas.
Digo, como já o disse noutras ocasiões, que este Orçamento tem vários riscos, não é um Orçamento fácil
de cumprir, mas é o Orçamento que precisamos de cumprir, para poder fechar este período da nossa história
política, económica e social e partir para outra, partir para uma situação diferente e, evidentemente, melhor.
Agora, quando olhamos para o futuro, para aquilo que já se designou o pós-troica, temos de jogar com dois
fatores de forma conjugada: um é o dos requisitos que estão na legislação europeia, na nossa lei europeia, e
outro, fora da lei europeia, é o do tratado orçamental que subscrevemos, em conjunto com outros países, em
particular com os países da zona euro. Isto é extremamente importante, porque, não tendo nós, e bem, uma
moeda própria, porque a adesão ao projeto da moeda única também foi politicamente relevante para Portugal,
não podemos pensar os próximos anos como pensámos o passado em Portugal.
No passado, sempre que houve crises mais agudas, desvalorizou-se a moeda e, com isso, até por efeito da
inflação, atacou-se o rendimento real das famílias e reduziu-se o valor da dívida, ou seja, teve de se fazer isso
de uma forma direta. Quando o Dr. Mário Soares e o Dr. Ernâni Lopes conduziram uma política de forte
austeridade no País, para satisfazer as condições do Fundo Monetário Internacional, o que permitiu que os
empréstimos em dólares chegassem ao País, no fundo o que fizeram foi retirar rendimento real às famílias,
apesar dos aumentos nominais dos salários.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E, nessa altura, os portugueses, em dois anos, ficaram quase sem 20% do seu
rendimento real.
Ora, hoje, não dispomos dessas políticas, temos de o fazer abertamente, não o podemos fazer com o véu
monetário e da inflação, fazemo-lo, portanto, dando a cara pelas políticas que têm de ser seguidas, que são
duras, que envolvem medidas duríssimas. Não há ninguém que possa ter satisfação com o desempenho
dessas políticas. Ninguém!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — É óbvio!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Elas seguem-se, porque temos absoluta necessidade de as adotar.
Mas, se não queremos fazer como no passado, que é, de cada vez que o problema vem à superfície,
desvalorizar a moeda e, com a inflação, pagar a dívida e reduzir o rendimento real das pessoas, se queremos,
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de facto, ganhar competitividade em permanência, então temos de atuar sobre a causa dos problemas, e foi
isso que estivemos a fazer, durante este período de três anos, em que estivemos protegidos dos mercados.
O nosso convencimento, até a avaliar pelos resultados da troica, é o de que essa reforma ampla tem vindo
a ser executada de modo a garantirmos, no futuro, uma recuperação duradoura. Mas há uma componente que
não tem a ver com essa reforma estrutural, que tem a ver com uma mudança de mentalidade, e que é muito
importante. É que o País, daqui para a frente, quer o privado, quer o público, não pode ter ganhos
significativos no rendimento, acima da produtividade, antes pelo contrário não pode, portanto, dispor da
política orçamental nem da política de rendimentos fora do quadro realista da riqueza que é criada. É assim! É
a realidade! Não é uma imposição ideológica! Quando não é assim, não há ideologia que valha, tem de se
estender a mão e pedir dinheiro!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Claro!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exato!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Isto não é uma questão ideológica, é uma questão prática!
Ora, é prático, então, que, nos próximos anos, defendamos políticas orçamentais que visem o contrário do
que se passou em quase toda a nossa história económica desde 1974 — com honrosas exceções, em matéria
de défice primário, estrutural, porque houve, de facto, excedentes primários em alturas muito pontuais —, em
que a regra foi, ano após ano, défice nominal, défice estrutural, défice primário, já que isto é a garantia de que
Portugal não tem espaço para ficar no euro, não tem espaço para fazer parte desta Europa e não tem espaço
para ser o País desenvolvido que tem o direito de ser.
Se queremos durabilidade para estas políticas, exige-se seriedade neste debate e que se diga, então,
como conseguimos manter o nível da despesa para futuro. E, como se costuma dizer, não se pode viver hoje
com aquilo que não se tem, contando com o que há de vir. O que há de vir resultará do nosso esforço.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Para quem aumenta a dívida, essa é uma posição interessante!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Por isso, Sr. Deputado Nuno Magalhães, quando o Sr. Deputado diz, e bem,
que este é o Orçamento que nos põe fora do domínio da troica, essa é uma parte importante da verdade, mas
só é uma verdade duradoura se não precisarmos de recorrer à troica para fazer aquilo que se impõe que
façamos, e isto exige muita responsabilidade, nomeadamente responsabilidade orçamental.
Este Orçamento do Estado traz medidas que se executarão em 2014, mas, como a Sr.ª Ministra das
Finanças já disse, e com muita coragem, algumas dessas políticas terão de ser realizadas em anos
subsequentes, enquanto não conseguirmos ajustar o ritmo de crescimento da nossa economia.
Quando um partido propõe que uma meta não seja cumprida, pensando que a Europa nos há de ajudar a
gastar mais, está a iludir o problema, está, ao mesmo tempo, a desqualificar o seu próprio programa, está a
dizer «o meu programa pode ser aplicado em condições que não dependem de mim».
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mais do que isso: é pouco provável que venha a depender da boa vontade dos
outros, porque muitos dos outros que hoje oferecem garantias para os empréstimos que são concedidos a
Portugal têm um PIB/per capita inferior ao de Portugal, têm níveis de proteção social inferiores aos de
Portugal.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Como é isso?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — É importante que exista esta contextualização dentro do nosso País, para que
percebamos com o que estamos a comparar.
Portanto, quando um partido aparece no debate público a dizer que isto só é sustentável se a Europa
decidir de outra maneira, diz, ao mesmo tempo, que não está em condições de poder governar Portugal com o
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seu programa, porque o desqualificou, ao fazê-lo depender de variáveis que não dependem nem da nossa
vontade, nem da vontade do próprio partido. Ora, é isto que precisamos de evitar, Sr. Deputado.
O que gostaria, portanto, era que o País, e não apenas o Governo, não apenas os portugueses que estão a
fazer sacrifícios para que esta etapa difícil se vença, mas o sistema político português, oferecesse,
externamente, como ofereceu a Irlanda, a possibilidade de um consenso de médio e longo prazo quanto
àquela que deve ser a nossa trajetória, porque, para o resto, Sr. Deputado, as diferenças entre os partidos são
muito bem-vindas e ainda muitíssimo mais bem-vinda é a alternância democrática que corresponda a
verdadeira alternância de políticas. É que, se o médio prazo estiver acordado nas suas linhas essenciais,
então o caminho livre da alternância será um caminho de responsabilidade e não um caminho de um novo
resgate.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para formular as suas perguntas, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de
Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que volte à questão
suscitada pelo anúncio do Sr. Ministro da Economia, de encetar a negociação de um novo programa que, do
nosso ponto de vista, de cautelar nada tem e que, a ser concretizado, será um programa da troica sob a batuta
de uma dupla: União Europeia e Banco Central Europeu. Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro aproximou-se um pouco
disso, nesta parte final da sua intervenção, quando relembrou o tratado orçamental,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — … a que junto a governação económica, a Estratégia 2020, ou seja, o
espartilho que se coloca a Portugal, em termos de plano, para o futuro próximo.
Mas, ainda assim, permita-me que registe as contradições existentes entre a afirmação do Sr. Ministro da
Economia, as suas declarações e as do Vice-Primeiro-Ministro.
Dizia o Sr. Primeiro-Ministro, recentemente, no Algarve, que, depois de junho de 2014, ainda vamos ter cá
a troica, que eles vão continuar a aterrar na Portela — creio que foi esta a sua expressão.
O Sr. Primeiro-Ministro disse isso, mas, simultaneamente, o Vice-Primeiro-Ministro, para justificar a carga
de sacrifícios que está hoje a atingir os portugueses, dizia que eram sacrifícios que valiam a pena, porque nos
iriam libertar, e libertar Portugal, da troica e dos senhores da troica. Estou a citar de memória, mas creio que
não estou a falhar muito.
Depois, veio o Ministro da Economia dizer que, enfim, é preciso encetar negociações sobre um programa
cautelar e, depois, seguro… — que raio de nome!…
Risos.
De qualquer forma, Sr. Primeiro-Ministro, quem é que está a enganar quem? É que esta é a questão que
se coloca. Pode dizer-se que há acerto total de posições, mas a verdade é que o discurso é diferente.
Do nosso ponto de vista, emende-se a mão, chamemos-lhe o nome que quisermos — «segundo resgate»,
«programa cautelar», «programa seguro» —, que, no fundo, do que se trata é do reconhecimento do fracasso,
da injustiça desta política que está a afundar o nosso País, de que o novo ciclo e a retoma anunciada pelo
Governo não passam de propaganda, de que o sofrimento e os sacrifícios que se abateram sobre os
portugueses serviram uns poucos, mas não resolveram nenhum dos grandes problemas do País.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Mais um sinal, citando o Sr. Deputado Nuno Magalhães: diz o
Eurostat que a dívida pública portuguesa, no 2.º semestre, sobe para 131% do PIB. As estatísticas valem o
que valem, mas o Sr. Primeiro-Ministro dirá alguma coisa sobre este sinal.
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Aquilo que é importante dizer é que, no fundo, todas estas manobras, estas contradições, estas posições
aparentemente antagónicas visam, no essencial, esconder aquilo que está em causa. Procurarão todas as
justificações para continuar este caminho para o desastre, de perpetuação da dependência. É isto mesmo que
está em causa, Sr. Primeiro-Ministro!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, quando o objetivo é
alcançar um esclarecimento, é evidente que a resposta interessa. Se não quisermos ser esclarecidos,
qualquer resposta serve, mas gostaria que a resposta que vou dar pudesse ser esclarecedora.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Também nós!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O País está a trabalhar arduamente para encerrar o Programa de Assistência
Económica e Financeira. Este Programa será encerrado de forma favorável, se cumprirmos as nossas metas e
não voltarmos a precisar de assistência oficial, ou seja, se, para pagar ou amortizar as obrigações do Tesouro
que se vão vencendo e as emissões de novas obrigações que resultem das necessidades orçamentais,
pudermos ir a mercado e obter taxas compatíveis com o financiamento do Estado. É por aqui que tem de se
medir o sucesso do Programa, é para isso que ele serve; ele serve para, durante o período em que estamos
assistidos, fazermos reformas importantes, de modo a podermos ganhar, depois, o acesso a mercado. E
podemos ou não precisar de mais alguma assistência ou apoio para regressar plenamente a mercado.
A Irlanda, por exemplo, está nesta altura a estudar se precisa ou não de mais apoio; não é claro que
precise e pode não precisar. Não vou, agora, debater aqui o caso da Irlanda — o Primeiro-Ministro irlandês
deverá estar ocupado com isso —, como é evidente só estou atento, porque, sendo a Irlanda o primeiro país a
sair do Programa, a forma como a Irlanda sair interessa-nos, podemos aprender com isso, pode ser-nos útil.
Em todo o caso, não dou por garantido que a Irlanda tenha interesse em ter, por exemplo, um programa
cautelar. Não o dou por garantido, pode não ter interesse, pode não precisar, não sei, tal como também não
sei o que se vai passar com Portugal a esse nível. Não posso excluir essa possibilidade, mas não posso dizer
que isso é certo. Pode ser que sim, pode ser que não…
O Sr. António José Seguro (PS): — Essa frase é muito elucidativa!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Desejaria que não precisássemos de coisa nenhuma, mas, se precisarmos de
alguma assistência ou de algum apoio no regresso a mercado, não vou deixar de recorrer a ele, pela simples
razão de entender que mais vale pedir um segundo resgate do que passar para mercado. Isso seria um
absurdo! Portanto, trabalharemos todos, na altura própria, para discutir esse assunto, quando ele se colocar!
Esse assunto não está, hoje, em cima da minha mesa de trabalho; não está em cima da mesa de trabalho
da Ministra de Estado e das Finanças; não está na nossa mesa de negociação com a troica.
Portanto, Sr. Deputado, espero que estes meus esclarecimentos sejam suficientes.
O Sr. Deputado colocou também uma questão sobre declarações que proferi no Algarve a propósito da
troica. Gostaria de dar esclarecimentos sobre isso, porque na altura pensei que a questão se esclarecia a si
própria, mas às vezes, enfim, a intermediação da mensagem nem sempre permite que as coisas sejam
transmitidas com a fidelidade necessária.
Eu disse que até cerca de dois terços de o pagamento da dívida estar feito os credores têm direito a querer
saber como é que vão as coisas e se vão receber ou não o seu dinheiro. Nesse sentido, é evidente que os
nossos credores nos visitarão de tempos a tempos: eles cá virão saber o que é que se passa com Portugal.
Isso parece-me evidente! Com Portugal, com a Irlanda, com muitos outros países, Sr. Deputado!
Não queira confundir isso, por favor, com o regime de assistência em que o País vive, que é de avaliação
trimestral, para saber se o programa está a ser executado nos termos combinados ou não. Sei que o Sr.
Deputado não confunde isso, nem quer que essa confusão resulte para o País.
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Portanto, é verdade que enquanto devermos dinheiro temos explicações a dar a quem nos emprestou o
dinheiro, mas é evidente que não estaremos limitados na nossa autonomia financeira como estamos enquanto
vivermos sob o efeito do Programa de Assistência Económica e Financeira.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Ministro, a explicação que deu foi brilhante: enfim, pode ser que
sim, pode ser que não, talvez…
Risos do PCP e do BE.
Portanto, ficamos com esta resposta precisa e concisa do Sr. Primeiro-Ministro, que replicou com uma tripla
às questões colocadas.
Sr. Primeiro-Ministro, a propósito do Banif, e porque o referiu, o senhor está em condições de garantir que
este caso não se irá transformar num novo BPN? Apesar das diferenças — quero aqui sublinhar que o Banif
não se trata de um caso com contornos de polícia —, o senhor está em condições de garantir que os
portugueses não vão ser chamados de novo a pagar um outro buraco num banco?
Dos 1100 milhões que recebeu do Estado, quanto é que o Banif já devolveu? E o que é que o Governo já
exigiu quanto à devolução desse dinheiro?
Sabe, Sr. Primeiro-Ministro, muitas vezes fazemos críticas duras, denunciamos a natureza da vossa
política… Um Governo que foi tão célere a cobrar aos desempregados…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — … e aos doentes os respetivos subsídios é o mesmo que tem mãos
largas, mãos rotas para os amigos. Isso tem um nome concreto: é uma política para servir os grandes, os
poderosos, atacando quem menos tem e menos pode!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É por isso mesmo que consideramos que o que este Governo está a
fazer é o Estado mínimo para quem trabalhou ou quem trabalha e o Estado máximo para os poderosos, para o
grande capital. Isso é que marca a natureza deste Governo.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, lamento discordar,
francamente, do tom que empregou quanto às questões da recapitalização bancária, dizendo que o Governo
tem mãos grandes para os amigos.
Ó Sr. Deputado, não tenho amigos…
Risos do PCP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não admira!
O Sr. Primeiro-Ministro: — …, não tenho amigos no Banif.
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E a recapitalização do Banif, tal como a recapitalização do BCP, do BPI e da Caixa Geral de Depósitos
decorreram num quadro de transparência, de escrutínio e de avaliação responsável, que foi partilhada não
apenas com o Banco de Portugal mas também com as instituições da troica.
Portanto, Sr. Deputado, a sugestão de que haja aqui uma espécie de favor ou de privilégio…
O Sr. João Oliveira (PCP): — O que é que o Banif já cumpriu?
O Sr. Primeiro-Ministro: — … não existe e repudio-a. Repudio essa visão! Isso não existe!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Quanto é que já foi devolvido?
O Sr. Primeiro-Ministro: — Pode o Sr. Deputado defender que o Estado não atue em matéria de sistema
financeiro; pode o Sr. Deputado entender que, se os bancos precisarem de ajuda e, porventura, o Estado tiver
a irresponsabilidade de voltar a cara, é preferível que eles possam fechar a porta pondo em causa os seus
depositantes e a estabilidade do sistema financeiro.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não é os depositantes, é a especulação!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Ó Sr. Deputado, essa não é a nossa posição.
Portanto, não é por acaso que no nosso Programa de Assistência está previsto um envelope financeiro
adequado para fazer face a necessidades de recapitalização do sistema financeiro. Essa recapitalização é
feita de forma bem escrutinada e transparente e tem custos que foram imputados ao sistema financeiro!
O sistema financeiro deve remunerar bem acima de condições de mercado o dinheiro público que lá se
disponibilizou; os gestores desses bancos ficaram com vencimentos limitados a metade daquilo que recebiam
e não superiores àqueles que se possam verificar no banco público; os bancos não podem distribuir resultados
nem prémios extraordinários! Portanto, a própria lei da recapitalização tornou muito transparente este
processo.
Sr. Deputado, não tenho uma bola de cristal e não posso garantir o que é que vai acontecer no futuro no
sistema financeiro, nem o Sr. Deputado, com honestidade, estaria à espera que eu lhe desse respostas
dessas.
Contudo, garanto-lhe que estamos a fazer tudo o que está ao nosso alcance para manter a estabilidade do
sistema financeiro, sem a qual não há economia.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Afinal, tem amigos!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas a confiança que tenho no desempenho que o sistema financeiro e os
nossos bancos têm vindo a evidenciar é inegável.
Portanto, todo o processo que estará a decorrer, ao qual, provavelmente, nos reportaremos daqui a pouco,
não tem, nesta altura, desconfiança por parte do Governo.
A Sr.ª Presidente: — Faça favor de concluir, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou concluir, Sr.ª Presidente. Peço apenas a sua indulgência para o seguinte:
vários Srs. Deputados suscitaram uma questão, à qual acabei por não responder, que tem que ver com o rácio
de dívida pública. A esse respeito, gostaria de dizer duas coisas telegraficamente.
A primeira é que a dívida pública líquida, nesta altura, é inferior a 120%. A Sr.ª Ministra de Estado e das
Finanças já o explicou e já o detalhou.
A segunda é que as variações que têm acontecido no rácio de dívida pública devem-se essencialmente aos
seguintes movimentos.
Em primeiro lugar, devem-se aos movimentos com impacto positivo que resultam da alienação de ativos
em resultado do processo de privatizações.
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Em segundo lugar, em sentido negativo, resultam de encaixes financeiros que o Estado tem vindo a
realizar com operações de médio e de longo prazo no financiamento da dívida pública, que estão em depósito
no Banco de Portugal ou no IGCP. Isto significa que são disponibilidades que nós lá temos e que não estamos
a usar por prudência, mas, no dia em que as usarmos para fecharmos posições e obrigações que se vencem,
elas abatem à dívida pública.
Em terceiro lugar, por efeito da redução do próprio Produto, que é o efeito contabilístico de denominador;
não significa que mais dívida tenha sido emitida.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é óbvio!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Em quarto e último lugar, pelo valor do défice público que é ocasionado em
cada ano. Aí, Sr. Deputado, o nosso objetivo é estancar esse processo, o que será validado quando
conseguirmos ter excedentes orçamentais.
Porém, para que isso aconteça, Sr. Deputado, ainda temos trabalho a fazer no que respeita à diminuição
da despesa. Mas concordará comigo quando digo que ela é necessária justamente para que o rácio da dívida
pública possa entrar numa fase descendente, como está previsto que aconteça a partir de 2014, e não
continuar a aumentar, como aconteceu até aqui!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, retiro a parte dos amigos, mas
não retiro a pergunta, porque não me respondeu quanto é que o Banif devolveu ao Estado em relação aos
compromissos que assumiu.
Mas gostaria de colocar-lhe uma última questão, mesmo sabendo que não tem tempo para me responder,
sobre o facto de termos assistido a manifestações de justa indignação das populações do interior do País, que
todos os dias veem desaparecer serviços públicos essenciais para o seu viver e importantes, também, para
garantir emprego nas suas terras. Depois de escolas, de centros de saúde, de tribunais, são as repartições de
finanças que o Governo pretende encerrar — mais de centena e meia.
Dou-lhe um exemplo, que é próximo da sua terra de origem: em Valpaços, com o encerramento de
repartição, as pessoas terão de ir a Vila Real. Sabe bem quanto é que isso custa.
Em Portalegre, das 14 repartições sobrarão 2; em Beja, das 14 repartições sobrarão 2; e temos também o
exemplo de Évora.
Poderíamos dar aqui vários exemplos que demonstram, afinal, que com este Governo já não se é só
penalizado por razões de origem social, mas também pelo sítio onde se nasceu.
Sr. Primeiro-Ministro, o que é que ganha o País com esta política de desertificação do interior? Porquê esta
cegueira que varre tudo e todos, independentemente das consequências? Que conceção tem o Sr. Primeiro-
Ministro da coesão social e territorial deste País?
Sr. Primeiro-Ministro, é por isso que nós dizemos tantas vezes que esta política tem de ser interrompida e
este Governo travado, senão dá cabo do resto.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Termina aqui a pergunta do PCP.
Tem agora a palavra, por Os Verdes, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, queria fazer aqui um ponto
prévio, porque ouvi neste debate, pela boca do Sr. Deputado Luís Montenegro, uma das coisas mais
inacreditáveis que tive a oportunidade de ouvir no decurso desta Legislatura.
A páginas tantas da sua intervenção, o Sr. Deputado Luís Montenegro disse que centenas de milhares de
pessoas caíram no desemprego e perguntou, em boa voz: «E quantos eram funcionários públicos?».
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Então, concluiu que para haver justiça e equidade, se no setor privado há desemprego, na função pública
os trabalhadores também têm que ir para o desemprego!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não, não!
Vozes do PSD: — Não disse isso!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Disse, Sr. Deputado!
Ora, Sr. Deputado e Sr. Primeiro-Ministro, neste caso, o que compreendi é que à desgraça acrescenta-se
desgraça! Ou seja, em vez de o Governo criar um programa para combater o desemprego no setor privado,
designadamente por via de medidas que alavanquem a economia, faz exatamente o contrário: a sua lógica de
equidade é pegar numa boa massa de funcionários públicos e lançá-los igualmente no desemprego!
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Isso é mentira!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ó Sr. Primeiro-Ministro, com este Governo, este País, de facto,
tornou-se uma fábrica de criação de desemprego, e isto é da pior injustiça possível.
Sr. Primeiro-Ministro, queria também dizer-lhe, com toda a frontalidade, que este Governo não tem
nenhuma lealdade. São inúmeros os exemplos que aqui poderíamos dar — e já os demos em sucessivos
debates —, mas não sei se o Sr. Primeiro-Ministro se lembra de dizer, há tempos, que determinadas medidas
transitórias eram para durar só até ao final do Programa de Assistência. De facto, aquilo que o Sr. Primeiro-
Ministro e este Governo fazem é assim!
Um desses exemplos é o dos cortes salariais de 2011, que ainda perduram. Então, o que é que o Governo
faz? Acaba com esses cortes salariais e substitui-os por outros ainda mais gravosos, os quais são aplicados a
rendimentos partir dos 600 €!
Ó Sr. Primeiro-Ministro, isto não é, de facto, uma absoluta falta de lealdade e de verdade para com o País?!
É que criam-se expetativas que depois se frustram completamente!
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, temos uma expetativa muito
forte a que queremos corresponder, que é a superação da emergência financeira e económica em que
vivemos. Ela tem um custo social muito elevado e essa é a razão pela qual estamos totalmente determinados
em vencê-la.
As medidas que têm vindo a ser executadas ao longo de dois anos e meio em matéria de despesa pública,
as quais, portanto, envolvem também os rendimentos de terceiros que trabalham para o Estado ou que são
pensionistas do Estado (é disto que estamos a falar), inserem-se nesse objetivo global, que é o de saber como
é que cada uma das áreas pode contribuir para a superação da emergência económica e financeira e para o
equilíbrio das contas públicas.
Sabemos que é um equilíbrio difícil de fazer, porque temos de conseguir, ao mesmo tempo, não esmagar a
economia com impostos, mas também pôr todos, toda a área privada, a dar um contributo para a recuperação
das nossas contas públicas. Mas também não podemos deixar a própria área pública de fora, e essa foi a
razão por que mantivemos uma medida que foi aprovada pelo Governo anterior para 2011, que foi a redução
salarial.
No novo quadro de emergência não havia condições para remover essa medida, razão por que a temos
mantido todos os anos, e este ano, para 2014, entendemos que era importante alargar a base dessa medida.
Protestos do PS.
Mas, repare bem a Sr.a Deputada que isso não acontece por acaso. Em 2012, suspendemos os 13.º e 14.º
meses. Uma vez que essa política não foi validada em termos constitucionais, tivemos de encontrar um
substituto para ela. E o substituto que encontrámos foi, numa parte, aumentar o IRS para toda a gente — e,
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portanto, pôr a área privada também a pagar uma parte do ajustamento público — e manter um subsídio
suspenso.
Uma vez que esta medida também não foi considerada compatível e dado que houve a sugestão de que
deveríamos encaminhar o tratamento da área pública para aquilo que se processa na área privada, criámos
um quadro que previa, na requalificação e na mobilidade, a possibilidade de rescisão do contrato de forma não
amigável, se quiser, isto é, no caso de não haver necessidade de manter aquele emprego público. Uma vez
que esta medida também não é possível, Sr.a Deputada, só resta alargar a base. Não há outra!
Protestos do PS.
Porque é que o Governo teve, desse ponto de vista, cuidado e sensibilidade? Porque o fez, justamente,
mantendo alguma progressividade, aumentando, até, esse leque de progressividade. Os subsídios estiveram
suspensos a partir de 600 € por mês; a bitola foi a mesma: 600 €, por mês. Mas 600 € por mês é um
rendimento muito baixo.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ah, pois é!…
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sabemos disso! E, por essa razão, Sr.a Deputada, baixámos a convergência,
desse ponto de vista, para 2,5% progressiva até aos 12%. Mas isso aconteceu, Sr.a Deputada, justamente
para proteger os salários mais baixos, como já o tínhamos feito na questão da suspensão dos subsídios. Não
pode ser de outra maneira.
Apesar de ser uma política no longo prazo, que levanta problemas muito difíceis do ponto de vista do leque
salarial da própria administração, e que levanta até problemas de equidade, porque, no fundo, estamos a
achatar muito o leque salarial, a verdade é que mantivemos essa progressividade por saber que estamos a
lidar com salários muito baixos, Sr.a Deputada. Essa foi a razão de ser da medida.
Agora, o que é que procuramos fazer? Ter a transparência de dizer que essas medidas serão medidas a
remir, na medida da recuperação da economia e do défice estrutural. É isso que estamos a dizer. Ela,
portanto, não tem um ponto âncora fixo, tem um ponto âncora variável, dependendo do nosso ritmo de
ajustamento orçamental. Mas eu creio que é isso que se espera, não é uma meta rígida para essa matéria, é
uma matéria que permite alguma flexibilidade dentro daquela que podemos evidenciar. E, desse ponto de
vista, Sr.a Deputada — concluo, Sr.ª Presidente —, é que posso dizer que este Orçamento, mesmo trazendo
notícia para a área pública, que é uma notícia que não é boa, porque contém medidas que são difíceis para a
área pública, elas foram temperadas com equidade e com preocupação de proteger os salários mais baixos,
que é aquilo que se espera de um Governo que tenha sensibilidade social, sobretudo num tempo de crise.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, passo a fazer alguns comentários à resposta
dada pelo Sr. Primeiro-Ministro.
Sabemos que um salário de 600 € é muito reduzido, Sr. Primeiro-Ministro, mas graças ao Governo esses
salários ficarão ainda mais reduzidos.
Sr. Primeiro-Ministro, não fale, por favor, de equidade!
O Sr. Primeiro-Ministro olha para o Orçamento do Estado que propõe para 2014 e vê que o sacrifício
pedido à banca, às energéticas, às petrolíferas não ultrapassa, no «bolo» global, os 5%! O resto recai sobre
funcionários públicos, famílias… Ó Sr. Primeiro-Ministro, vem falar de equidade?! Aos grandes o senhor não
pede!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Pede-se mais!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Àqueles que nadam em dinheiro o senhor não pede!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Pede-se mais!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vai aos salários de 600 €, Sr. Primeiro-Ministro?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Pede-se mais!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não, não pede! Em termos de proporção, não pede! Não venha
falar em proporcionalidade e em equidade. Sr. Primeiro-Ministro, aos «tubarões» não pede!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Não pede, não, Sr. Primeiro-Ministro!
E se o Sr. Primeiro-Ministro, porventura, não quisesse esmagar a economia, como tem feito até à data,
tinha dado um sinal neste Orçamento de Estado e tinha, por exemplo, reduzido o IVA da restauração que,
como o senhor sabe, é fundamental para redinamizar a economia!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não, Sr. Primeiro-Ministro, os senhores têm objetivos estruturais!
Os senhores, como já aqui foi dito, depois de meados do ano que vem, hão de inventar uma coisa com um
nome qualquer, seja «programa cautelar», seja «segundo programa», seja «seguro cautelar», seja aquilo que
for. Os senhores hão de inventar um novo programa para continuarem o empobrecimento do País!
Sr. Primeiro-Ministro, há de ser um programa de empobrecimento adicional. Os senhores agora dizem «nós
não queríamos, mas a troica obriga» e depois já não vão poder dizer o mesmo. Há de haver necessidade, por
parte do Governo, de se agarrar a outra estrutura qualquer e a outro programa qualquer para continuar a
«sacudir dos ombros» aquilo que os senhores querem, mas não querendo assumir a responsabilidade!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Olhe, Sr. Primeiro-Ministro, não há novo ciclo nenhum. Já reparou
nisso?! Isto é tudo matéria para continuidade.
Sabe quando é que se vai abrir, de facto, um novo ciclo, em Portugal? É quando este Governo for para a
rua.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
A Sr.ª Presidente: — O Sr. Deputado Luís Montenegro pediu a palavra para uma interpelação à Mesa.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, é uma interpelação à Mesa no sentido de solicitar que,
através de V. Ex.ª, fique clara uma questão que foi aqui completamente deturpada pela Sr.a Deputada Heloísa
Apolónia.
De facto, na minha intervenção, fiz alusão, a propósito da segurança no emprego, à diferença entre o setor
público…
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, com que fundamento é que faz a interpelação? Pergunto-lho só por
uma questão de cumprir o Regimento.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, queria evitar ter de pedir a defesa da honra da bancada,
mas se tiver de convolar o meu pedido a esse propósito, eu então peço a palavra para defesa da honra da
bancada.
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A Sr.ª Presidente: — Parece-me que sim, Sr. Deputado. Faça favor.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito obrigado, Sr.ª Presidente.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.a Deputada Heloísa Apolónia, de facto, a deturpação que fez não é
legítima do ponto de vista da lealdade do debate parlamentar.
Efetivamente, na minha intervenção, a propósito da segurança no emprego, fiz uma alusão à diferença
entre os regimes do setor público e os do setor privado, para anotar que uma das consequências que o
ajustamento económico e financeiro que se fez notar no setor privado foi precisamente a do aumento da taxa
de desemprego, que, nos últimos anos, «obrigou» 400 000 portugueses a sofrerem esse flagelo.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Mais!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Ora, da parte do Estado, a propósito das regras laborais vigentes no
setor público, nenhum ajustamento equivalente foi feito. Eu não defendi que devesse ser feito, anotei apenas
esta distinção para poder dizer-lhe, com toda a convicção, que quando tentamos repartir de forma equitativa e
justa o esforço dos nossos concidadãos não podemos deixar de atender à circunstância e à dificuldade que
está inerente ao exercício de funções, seja no setor público seja no setor privado.
Vozes do PSD: — Claro!
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Também são pessoas!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Foi isso que justificou, nos últimos Orçamentos de Estado, que
houvesse propostas orçamentais distintivas e foi isso que justificou também a apresentação de propostas
distintivas neste Orçamento do Estado. Deturpar o sentido com que proferi esta análise, Sr.a Deputada, não é
legítimo do ponto de vista da lealdade parlamentar.
É legítimo que a Sr.a Deputada discorde, que apresente ideias diferentes, mas não fale, porque em nenhum
momento eu o preconizei ou propugnei, em despedimentos no setor público para que o efeito seja equivalente
ao setor privado.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr.a Deputada Heloísa Apolónia, tem a palavra para dar explicações.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, quero só dizer
que registo o esclarecimento que fez, mas faço-lhe, então, um desafio na sequência daquilo que acabou de
dizer.
Se, porventura, a ideia que o Sr. Deputado agora procurou transmitir é a de que não defende
despedimentos na função pública, desafio o Sr. Deputado a ser um opositor seríssimo à política que o
Governo está, neste momento, a desenvolver de despedimento real na função pública. Designadamente, os
professores terão muito que pedir ao Sr. Deputado — que não defende o despedimento na função pública,
como aqui referiu — que faça diligências junto do Governo para que não continue esta ofensiva aos
funcionários públicos e este verdadeiro programa de despedimento de milhares e milhares de funcionários
públicos, engrossando, assim, a bolsa de desemprego no País. Ou seja, a desemprego acrescenta mais
desemprego!
Programas de combate ao desemprego nunca surgiram no decurso desta Legislatura!
A Sr.ª Presidente: — O Sr. Primeiro-Ministro acaba de pedir a palavra.
Faça favor, Sr. Primeiro-Ministro.
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, o meu pedido de palavra não tem a ver com esta questão.
Quero apenas, por intermédio da Sr.ª Presidente, dar uma resposta precisa à pergunta formulada pelo Sr.
Deputado Jerónimo de Sousa a propósito do Banif.
Recebi, entretanto a nota, que não tinha na altura, de que o Banif devolveu 150 milhões de euros com o
primeiro reforço de capital privado que foi realizado.
Muito obrigado pela tolerância, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, ficou dada a informação. Foi dada um pouco fora do modelo do
debate, mas ficou dada.
Passamos ao segundo ponto da ordem do dia, que, como sabem, consta do debate com o Primeiro-
Ministro, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 21/2012, de 17 de maio (Altera a Lei n.º
43/2006, de 25 de agosto, relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da
República, no âmbito do processo de construção da União Europeia), de preparação do próximo Conselho
Europeu.
Tal como definimos em Conferência de Líderes, a moldura deste debate é a seguinte: a intervenção de
abertura cabe ao Sr. Primeiro-Ministro, seguindo-se intervenções do PS, do PCP, do BE, de Os Verdes, do
CDS-PP e do PSD, sem réplica. No final, o Sr. Primeiro-Ministro encerrará o debate.
Tem a palavra, pois, a palavra, Sr. Primeiro-Ministro, para abrir o debate.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O Conselho Europeu que vai ter lugar
nos próximos dois dias tem uma inserção temática que é conhecida. O Presidente do Conselho Europeu
propôs que o conjunto das reuniões do Conselho pudesse ser aproveitado, até ao final da, digamos, sessão
legislativa europeia, no próximo ano, para debater um conjunto de matérias que são importantes do ponto de
vista de uma estratégia de crescimento e de emprego e de aumento da competitividade no espaço europeu. O
tema central deste Conselho Europeu tem a ver com o esforço que a União Europeia pode fazer para a
recuperação e o crescimento e o emprego a partir da aposta na agenda digital, portanto na economia digital,
na inovação e nos serviços.
Evidentemente que o Conselho Europeu irá debruçar-se também sobre matérias importantes que têm a ver
com os progressos que têm sido realizados no âmbito do aprofundamento da união económica e monetária e
também com o ponto de avaliação da situação económica e social que se vive no conjunto europeu.
Quero, de uma forma muito abreviada, dizer que, relativamente à primeira matéria, o Governo português se
tem colocado na posição de defender a importância desta agenda digital e de implementar, de executar o mais
rapidamente possível um aprofundamento do nosso mercado interno no que respeita às questões que
envolvem a economia digital, a inovação e os serviços.
Portugal fez um esforço particularmente relevante nestes dois anos na transposição da Diretiva dos
Serviços, quando, como Primeiro-Ministro, iniciei este processo, tínhamos praticamente o conjunto dos
diplomas que pressupõe a transposição das diretivas para fazer.
Nesta altura, sobra menos de meia dúzia de diplomas, em mais de 60 que precisavam de ter lugar,
justamente para que nos pudéssemos colocar a par de outras economias na Europa que quebram barreiras
internas e habilitam os cidadãos e as empresas na área dos serviços a competirem no espaço europeu de
uma forma mais aberta e, portanto, menos protegida.
É nossa opinião também, de acordo com o relatório apresentado pela Comissão Europeia, que da agenda
digital, com tudo o que envolve — seja ao nível da aplicação das tecnologias da informação e do
conhecimento na área educativa, seja ao nível da inovação e da investigação, seja ao nível do esforço grande
que é preciso fazer na remoção de barreiras, nomeadamente ao nível dos operadores privados que funcionam
no espaço europeu no mercado de comunicações e de telecomunicações —, pode resultar um contributo
extremamente significativo para a criação de emprego e para o crescimento e competitividade no espaço
europeu.
Nessa medida, temos feito algumas observações que, em qualquer caso, julgamos poderem ser úteis no
sentido de levar ainda mais longe o esforço que tem sido realizado e, ao mesmo tempo, compatibilizá-lo com a
realidade que vivemos em Portugal.
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Refiro-me, em particular, ao indicador de medição de inovação proposto pela Comissão Europeia, que nos
parece demasiado redutor na medida em que deixa de fora empresas que tenham menos de 10 trabalhadores.
Ora, no nosso caso em particular existe um universo extremamente rico de empresas justamente neste
segmento que são muito importantes e competitivas na área da inovação. Era muito importante que esse
indicador europeu pudesse também contemplar essa realidade, na medida em que é uma realidade importante
em Portugal e nos aproxima do esforço, do objetivo e das metas que estão colocadas em termos europeus, as
quais, de outra maneira, ficarão precludidas num indicador mais grosseiro, se assim lhe posso chamar, isto é,
de menor resolução.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, quero também dizer, de uma forma muito breve, relativamente aos
progressos no âmbito do aprofundamento da União Económica e Monetária, que seremos informados do
caminho que tem vindo a ser trilhado em matéria de criação do mecanismo único de supervisão, bem como do
mecanismo único de resolução.
O Governo continua convencido de que deveria, igualmente, ser criado um fundo único europeu para
garantia de depósitos, embora ainda não tenhamos logrado convencer a maioria dos nossos parceiros
europeus dessa necessidade. Julgamos que a união bancária não ficará completa enquanto não existir
também um mecanismo europeu de garantia de depósitos. Contudo, entendemos que os progressos que têm
sido feitos ao nível da supervisão são importantes e mostram que estamos dentro dos timings que tínhamos
acertado e que estamos a cumprir as metas a que nos tínhamos comprometido.
Vai iniciar-se o processo de avaliação de ativos nos bancos que vão passar para a supervisão direta do
Banco Central Europeu. Como eu disse aqui há pouco, nada tenho a temer em particular no sistema financeiro
português, e quero repeti-lo agora. Na sequência disso, estaremos em condições de fazer uma segunda vaga
de stress tests, conduzidos pela European Banking Authority (EBA), que são essenciais para voltar a dar
confiança ao sistema financeiro europeu de modo a combater a fragmentação financeira que ainda vivemos.
Por fim, temos noção de que ainda existe muito trabalho para fazer em matéria de mecanismo único de
resolução. Não há ainda nenhum atraso, o calendário tem vindo a ser cumprido de acordo com as orientações
traçadas, mas percebe-se, nas discussões que têm lugar, que, no final do período em que formos chamados a
tomar as decisões, depois de os relatórios terem sido elaborados, ainda não está estabelecido um consenso
quanto à forma como esse mecanismo deve funcionar.
Seja como for, temos mantido a posição de que é indispensável a indústria ser chamada diretamente a
constituir o fundo de longo prazo, que garanta a resolução dos bancos protegendo os depósitos,
evidentemente, e impedindo que tenha de existir intervenção pública de dinheiro dos contribuintes em
processos de resolução bancária. Mas parece evidente que, até esse fundo estar constituído, uma garantia,
um backstop adequado tem de ser encontrado, não apenas à escala nacional mas também à escala europeia.
É por isso que nos temos batido e é isso, evidentemente, que irei recordar no Conselho Europeu.
Para concluir, Sr.ª Presidente, quero dizer apenas que, na opinião do Governo, o período que temos vindo
a atravessar de forma desigual na Europa, e que é um período de grandes dificuldades, nesta altura apresenta
uma expetativa positiva de recuperação, que, mais uma vez, também não é uniforme entre todos os países
europeus, mas é de recuperação.
Há ainda sinais de alguma fragilidade e volatilidade na situação de alguns países da zona euro e existe
ainda alguma ameaça externa que pode perturbar o nosso processo de recuperação.
Porém, não há dúvida de que, olhando para os dados do Eurostat, verificamos que a recuperação
económica na União Europeia, e também na zona euro, está, de facto, a acontecer desde o 2.º trimestre deste
ano, e isso oferece, sobretudo quando olhamos para Espanha, uma expetativa mais positiva também para as
pretensões nacionais, o que não posso deixar aqui de sublinhar.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do PS.
Sr. Deputado António José Seguro, tem a palavra.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Realizamos mais um encontro entre
o Governo e o Parlamento e menos um debate sobre o próximo Conselho Europeu. Nesse sentido, a sessão,
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tal como está organizada, pressupõe um somatório de declarações de que o Governo tomará boa ou má nota
em função de as mesmas se encaixarem, ou não, na estratégia do Governo.
Assim sendo, gostaria de transmitir qual é a posição do Partido Socialista em relação ao momento que se
vive na Europa.
Quero dizer, em primeiro lugar, que a Europa, mais uma vez, tem uma agenda para o seu principal
Conselho completamente desligada da realidade por que passam os europeus. Isto é, não digo que algumas
das matérias não tenham implicação e consequência na vida dos cidadãos, o que digo, e repito, é que, hoje,
os cidadãos deviam olhar para a Europa e estar a assistir a uma discussão séria sobre quais os mecanismos,
as políticas e as decisões que a União Europeia deveria tomar para fazer a sua parte no combate à crise.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — O problema que existe de desemprego e de pobreza não é apenas
um problema dos Estados sob assistência financeira, é um problema da própria Europa. É um problema real
mas também um problema filosófico, naquilo que corresponde aos princípios matriciais desta mesma Europa,
ou seja, que a ação em conjunto é muito mais eficaz do que o somatório das partes.
Esta crise começou há cerca de cinco anos fora da Europa. Hoje, é não apenas uma crise instalada na
Europa como é também uma crise da própria Europa. Hoje, em vésperas de mais um Conselho Europeu,
deveríamos estar a olhar para uma agenda que respondesse a questões tão concretas como estas: como
relançar a economia na Europa? Como ajudar as empresas a investir? E como apoiar os Estados-membros
europeus que estão em dificuldades? Olhamos para a agenda, olhamos para a proposta de conclusões desse
Conselho e sobre isso não há rigorosamente nada!
O Partido Socialista tem uma visão distinta da do Governo, quer quanto ao aprofundamento político e
económico da União Europeia, quer no que diz respeito à necessidade que existe, do nosso ponto de vista, de
completar e equilibrar a União Económica e Monetária, quer quanto à necessidade de a União Europeia adotar
a sua quota-parte de responsabilidade no combate à crise e de assumir também as suas responsabilidades no
que diz respeito aos mecanismos que decretou e que seriam suficientes e eficazes para combater essa crise.
Não podemos ignorar que dois terços da composição da troica são europeus, provenientes do Banco
Central Europeu e da Comissão Europeia. Desse ponto de vista, é fundamental que a Europa decida coisas
tão simples como estas: quer a Europa continuar com o único banco central do mundo que está impedido de
emitir moeda? Quer a Europa combater esta crise sem ter, pelo menos, a possibilidade não de alterar os
tratados mas, sim, de atribuir uma licença bancária ao mecanismo europeu para poder ajudar, nem que seja
por um período curto, os Estados-membros em dificuldades?
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — Dou um exemplo: os bancos portugueses comerciais financiam-se no
Banco Central Europeu a taxas de juro de 1% e compram dívida pública portuguesa a taxas de juro de 3%,
4%, 5% e mais. O que se propõe, com a atribuição dessa licença bancária ao mecanismo europeu, é que esse
mecanismo se possa financiar no Banco Central Europeu, tal como se financiam os bancos comerciais, e,
dessa forma, que países como Portugal possam beneficiar de financiamento a juros mais baixos. Isto teria
várias vantagens, uma delas diminuir o nosso défice, porque o serviço da dívida, este ano, está em níveis
superiores a 7000 milhões de euros, e o mesmo vai ocorrer no mesmo ano. Se tivéssemos essa possibilidade,
haveria um efeito de corte no nosso défice superior a, pelo menos, dois pontos percentuais, o que faria com
que não fossem necessários tantos impostos sobre os portugueses e tantos cortes sobre as pensões.
Outra proposta concreta tem a ver com o perfil da nossa dívida. Sei que o Primeiro-Ministro não gosta de
ouvir isto e que, muitas vezes, confunde a discordância com a ausência de defesa dos interesses do País. Não
o acompanho também aí. Devemos afirmar as nossas discordâncias em público e com clareza para que os
portugueses possam fazer as suas opções.
Há muito tempo que o Partido Socialista defende a mutualização de uma parte das dívidas soberanas.
Fazemo-lo não para passar encargos para os europeus, nem para dizer aos europeus «paguem lá parte da
nossa dívida». Não, fazemo-lo porque numa Europa solidária, e como uma união económica e monetária deve
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funcionar, todos nos devíamos responsabilizar por uma parte dessa dívida. O ideal era que fossem os
primeiros 60% dessa dívida, mas sabemos que isso já não é possível e que, do ponto de vista pragmático, na
Alemanha é muito mais interessante fazê-lo através daquilo que designaram como fundo de redenção, que
permitisse precisamente mutualizar a dívida soberana de todos os Estados que estejam nessas condições,
acima dos 60%. Isso permitiria, através dessa mutualização, a redução dos nossos encargos com essa parte
da dívida, mas também podermos ir a mercados de forma independente, sem programas, sem
condicionalidades, para nos financiarmos em 60% da dívida soberana.
São propostas destas, sustentáveis, fundamentadas e estudadas que hoje a Europa deveria estar a
discutir.
É esta, e continua a ser esta, a posição do Partido Socialista.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do PCP.
Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, tem a palavra.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: A agenda do
Conselho Europeu insiste na mesma linha de sempre — ignorar a dura realidade de milhões de pessoas e dar
os passos necessários para continuar a encher os cofres ao grande capital e à grande finança. Não nos
surpreende.
Mais uma vez se avança no aprofundamento do mercado único, no caminho das privatizações dos serviços
públicos, seja nas medidas que garantem a estabilidade e o lucro do capital e a instabilidade e pobreza dos
trabalhadores, seja nas medidas, que mais uma vez se prosseguem em toda a linha, que visam esmagar
ainda mais a soberania dos Estados, continuar a sugar os seus recursos e transformá-los em colónias do
século XXI, comandados pelo grande capital e pelo diretório de potências.
Falando de ataques à soberania, queremos expressar-lhe o nosso profundo repúdio pelo conteúdo do
relatório interno da Comissão Europeia, que, na sequência de inaceitáveis afirmações de ingerência do
Presidente da Comissão Europeia, tem o seguinte título: Irá o Tribunal Constitucional pôr em risco a
implementação do Memorando de Entendimento? Veja-se onde chegámos! Isto é um verdadeiro insulto aos
portugueses, um espezinhar da nossa independência e soberania, uma pressão e um ataque direto a um
órgão de soberania. E que diz o Governo português? Nada, absolutamente nada!
Já agora, que falamos de silêncios, como devemos interpretar o silêncio do Governo português perante as
afirmações da Sr.ª Merkel, que vem agora propor uma revisão dos tratados no quadro da discussão do
chamado «reforço da UEM»? Quer isto dizer que está de acordo com a possibilidade de se avançar na via do
estabelecimento dos denominados «contratos para a competitividade e crescimento» que obrigam Portugal a
cumprir o que as troicas considerarem importante para o ajustamento estrutural e para a melhoria da
competitividade do País — encerramentos, privatizações de serviços públicos, cortes em salários e pensões?
É isso, Sr. Primeiro-Ministro? É esse o caminho que andam a engendrar para nos condenarem a uma
dependência perpétua de um novo contrato de submissão, chame-se lá como se vier a chamar tal
instrumento?
O Conselho Europeu repete a mesma ladainha do crescimento, da competitividade e do emprego e salpica
as suas conclusões com decisões essencialmente de propaganda, como é o caso do desemprego juvenil, que
é trazido para a proposta de conclusões com pompa e circunstância, depois de o Conselho ter aprovado
cortes do já de si magro Orçamento da União Europeia, nomeadamente em fundos de coesão que poderiam
servir para atenuar esse flagelo.
Mas, como nunca nos limitamos a denunciar o desemprego juvenil, defenda, Sr. Primeiro-Ministro, defenda
neste Conselho o aumento das verbas do programa para, pelo menos, 21 000 milhões ao longo do período
2014/2020. E veja lá que a proposta nem sequer é nossa, é da Organização Internacional do Trabalho, que
refere que só assim o programa teria algum impacto real na criação de empregos, com direitos e com salários
justos.
Sr. Primeiro-Ministro, deixo-lhe outra proposta: pronuncie-se contra, impeça a ideia de o programa financiar
estágios não remunerados, de fazer despedimentos com a substituição de trabalhadores com contratos
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permanentes por trabalhadores com contratos precários ou por estagiários, muitas vezes com salários abaixo
do salário mínimo nacional.
Aqui está, Sr. Primeiro-Ministro, a nossa visão deste Conselho. Leve estas propostas, que seria bom para
Portugal e para os portugueses.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Bloco de Esquerda.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Bem sei, Sr. Primeiro-Ministro, que os
debates quinzenais não têm segunda volta. De qualquer forma, permitia-me utilizar algum tempo deste debate
para voltar a uma questão anterior que se liga com o défice e com a dívida, aliás, matérias importantíssimas
na política europeia e, portanto, o meu abuso não é grande.
Queria apenas referir o seguinte: o Sr. Primeiro-Ministro sabe, com certeza, tão bem como qualquer
Deputado e qualquer Membro do Governo, que o défice contabiliza os juros e, portanto, não nos interessa
muito o argumento que o Sr. Primeiro-Ministro utiliza, que é: «se os juros isto, se os juros aquilo, se os juros
não contassem, se os juros não se contabilizassem, se não tivéssemos que pagar os juros…». Isso não
adianta muito e é isso que faz a diferença. A posição que o Governo tem em relação aos juros e à dívida é
diametralmente oposta daquela que defendemos e que tem muito a ver com a política europeia e com as
relações com os credores. É isso que nos distingue e é por isso que retomo este assunto.
Repare, Sr. Primeiro-Ministro, é o próprio relatório do Orçamento do Estado e não apenas o relatório da
UTAO que refere que o défice em 2012 e em 2013 tem exatamente o mesmo valor, se as receitas
extraordinárias não forem contabilizadas. É isto que interessa deixar claro. São exatamente iguais, se não se
contabilizassem as receitas extraordinárias. E o seu Governo é useiro e vezeiro em aproveitar das receitas
extraordinárias.
Sobre o debate que agora travamos, queria apenas dizer o seguinte: sucedem-se os conselhos europeus
e, à medida que se vão realizando, os portugueses olham para eles e lembram-se daquela conhecida frase
«muda o disco, mas a música é a mesma», «muda o disco e toca a mesma música»…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E toca o mesmo!
O Sr. João Semedo (BE): — «Toca o mesmo», exatamente! E, na realidade, é assim mesmo: «muda o
disco e toca o mesmo»!
Portanto, não estranho nem tenho a expectativa de que o Sr. Primeiro-Ministro amanhã, no Conselho
Europeu, levante a sua voz, reclamando uma política diferente da que tem sido prosseguida pela Comissão
Europeia.
Na realidade, a elite europeia tem sempre a mesma receita: castiguem-se aqueles que, supostamente,
vivem acima das suas possibilidades, salvem-se os bancos e protejam-se os credores. Em resumo, é isto e
pouco mais. Por isso, quer a Europa, quer os países que estão em maiores dificuldades, encontram-se
progressivamente em maiores dificuldades.
O Sr. Primeiro-Ministro tem uma visão diferente, bem sei, já a explicitou por diversas vezes, mas isso não
altera a realidade. É perante esta realidade e perante este tipo de relacionamento com a Comissão Europeia
que eu, não tendo qualquer expectativa de que o senhor altere esta política, não deixo de estranhar que o Sr.
Primeiro-Ministro tenha afirmado que considera irrepreensível a atitude da Comissão Europeia relativamente
ao Estado português quando comenta o relatório da representação da União Europeia em Portugal.
«Irrepreensível» foi a palavra que o Sr. Primeiro-Ministro utilizou. Pergunto-lhe: está a referir-se a quê? Acha
irrepreensível quando a representação da Comissão Europeia em Portugal questiona a independência política
do Tribunal Constitucional? Ou quando acusa o Tribunal Constitucional de ativismo político? Ou quando
questiona que o Tribunal Constitucional não respeita a soberania do pacto orçamental? Sr. Primeiro-Ministro,
era a isto que se referia quando considerou o comunicado irrepreensível?
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Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. João Semedo (BE): — Gostava que, na sua intervenção final, tivesse oportunidade de esclarecer.
Na realidade, já percebemos que o Governo e a Comissão Europeia desenvolvem uma campanha contra o
Tribunal Constitucional, iludindo os portugueses sobre a responsabilidade do fracasso desta política.
Mais, Sr. Primeiro-Ministro: é lamentável que a Comissão Europeia e o Governo queiram exigir que o
Tribunal Constitucional deixe de fazer aquilo para que ele existe: fazer cumprir, fazer respeitar a Constituição.
Hoje, os senhores pedem a cabeça do Tribunal Constitucional, amanhã pedem a da Constituição, mas
verdadeiramente o que os senhores querem é acabar com o regime democrático e constitucional, acabar com
a democracia social, limitar os direitos, virar o regime do País «de pernas para o ar». Nós não aceitaremos
isso.
Nós defendemos esta Constituição, porque ela representa a democracia pela qual nós nos batemos.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é de Os Verdes.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Sr. Primeiro-Ministro, se algum
representante ou alguma representação de alguma instituição europeia dissesse ou insinuasse algo parecido
com isto, que o Tribunal Constitucional de Portugal deve obediência à troica, eu gostava de saber se,
porventura, o Sr. Primeiro-Ministro aproveitaria o seu primeiro contacto com alguma instituição da União
Europeia para explicar exatamente a independência do Tribunal Constitucional português e que o Tribunal
Constitucional deve obediência à Constituição da República Portuguesa. Gostava de uma resposta concreta
sobre esta matéria.
Sobre a construção europeia, digamos assim, a posição de Os Verdes é conhecida, bem como o seu
distanciamento em relação à posição do Governo. Só há um fator para o qual gostaria de chamar hoje a
atenção e que, julgo, nós, em Portugal, estamos a senti-lo na pele, acho que isto hoje é muito percetível para
os portugueses: é que desviar, digamos assim, poderes para centros de decisão mais afastados como a União
Europeia, retirá-los no caso concreto, do Governo português e atribuí-los à União Europeia, significa deixar de
haver uma visão mais aproximada dos problemas concretos dos países. Ou seja, o afastamento dos centros
de decisão relativamente aos povos concretos é sempre o maior problema. Porque aqueles senhores que
fazem parte das instituições europeias não sentem o nosso desemprego como nós devemos sentir, não
sentem o nosso estrangulamento económico e o estrangulamento das famílias como nós devemos sentir.
Portanto, esse afastamento significa também uma maior dificuldade, por via do menor sentimento, de uma
resolução concreta dos problemas dos portugueses.
É por isso que também se explica que o programa da troica se tenha, pura e simplesmente, centrado em
números e não se tenha debruçado igualmente sobre as consequências diretas e famigeradas que esse
programa levaria à casa concreta, às famílias concretas, às pequenas e médias empresas concretas e,
portanto, àquilo que é fundamental no País.
O que Os Verdes pedem ao Primeiro-Ministro de Portugal é que, pura e simplesmente, seja porta-voz
destes problemas concretos do País no Conselho Europeu e que transmita, porque é sempre isso que
pedimos, esta realidade concreta do País para que as soluções se possam melhor adaptar à realidade, porque
elas andam tão desfasadas, tão distanciadas da nossa realidade!
A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do CDS-PP.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: O
Conselho Europeu de amanhã tem uma agenda da qual gostaríamos de destacar dois temas importantes —
por um lado, mais e melhor coordenação das denominadas «políticas comunitárias prioritárias» ao nível
económico, financeiro, de segurança e de justiça e, por outro lado, o debate sobre o reforço da importância
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das instituições europeias na gestão, nomeadamente da crise que todos nós um pouco por todo o lado na
União Europeia atravessamos.
Em relação ao primeiro ponto — mais e melhor coordenação das políticas comunitárias —, como já aqui foi
referido, discutir-se-á a iniciativa Emprego Jovem, que entrará em vigor em janeiro de 2014. Creio que se trata
de uma matéria importante e que, certamente, deverá ter desenvolvimentos neste mesmo Conselho.
Certamente, também será dada prioridade, nomeadamente, no âmbito da necessidade do crescimento
económico e na aposta da excelência tecnológica, competitividade industrial e inovação científica e da
necessidade de garantir esse mesmo financiamento à economia, ainda que, como o Sr. Primeiro-Ministro
disse e bem, seja através da consolidação de um mecanismo de supervisão único e de autoridade bancária.
Tomamos boa nota da defesa que o Governo português fará para que essa garantia possa vir, no futuro,
abranger também a garantia dos depósitos bancários.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muitas vezes há a noção de que temos uma União que se quer
política e também económica, mas depois, muitas vezes, do ponto de vista financeiro, tal não é subsequente.
Quanto ao segundo ponto, Sr. Primeiro-Ministro, muito brevemente, gostaria de, em nome do CDS,
assinalar o seguinte: a nosso ver, vemos em vários Estados-membros da União Europeia alguma tentação de
procurar — permita-me a expressão, com muitas aspas, obviamente — nacionalizar políticas que até aqui
foram sempre entendidas como sendo políticas europeias. Não nos parece que esse seja um caminho a seguir
do ponto de vista da União Europeia. Sei que não é esse o caminho que, obviamente, o Governo português
defende.
O Sr. Primeiro-Ministro saberá, certamente, que outros Estados-membro ou algumas tendências dentro dos
Estados-membros procuram essa nacionalização (com muitas aspas, repito), mas parece-nos que neste
momento, especialmente num momento de grandes dificuldades um pouco por toda a Europa, qualquer
tentativa de procurar reduzir o papel das instituições europeias, quer do Parlamento Europeu, quer da
Comissão Europeia, e que resulta de anos e anos de tratados e de negociações difíceis, não é, em si mesmo,
um contributo válido para o que deve ser uma construção europeia de uma Europa mais justa, mais solidária e
mais atenta a este tipo de problemas.
Neste segundo ponto, parece-nos, também — de resto, não teremos dúvidas sobre isso — que o Governo
português terá uma posição no sentido de reforçar esses mecanismos. Aliás, o Sr. Primeiro-Ministro, na sua
intervenção inicial, já o disse de uma forma clara; em todo o caso, gostaria de, em nome do CDS, reforçar esta
matéria.
Por fim, mas não menos importante, também não queria deixar passar uma nota sobre a inclusão nesta
agenda — pelo menos, a provisória, à qual tivemos acesso — de matérias relacionadas com a imigração.
Todos nós assistimos aos factos tristes, trágicos, que ocorreram. Parece-nos que, também aqui, é necessário
que haja uma política comum e de asilo concertada no âmbito da União Europeia, nomeadamente para evitar
alguns radicalismos que vemos a crescer na União Europeia. Só uma moderação coordenada, concertada e
ativa entre todos os Estados-membros poderá vencer esta batalha.
São estes os pontos desta agenda que gostaríamos de salientar, na convicção de que o Governo
português, como é hábito, irá defender intransigentemente os interesses de Portugal, mas também os
interesses da União Europeia, porque, ao defender os interesses da União Europeia, também estamos,
contrariamente ao que aqui foi dito em algumas intervenções, a defender os interesses do nosso País.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.
O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Sr. Primeiro-Ministro, começo por deixar duas notas prévias relativamente à reunião do
Conselho Europeu de amanhã e de depois de amanhã.
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A primeira nota é a de que, porventura pela primeira vez desde que o Sr. Primeiro-Ministro participa nas
reuniões do Conselho, Portugal tem indicadores positivos relativamente ao desenvolvimento da sua economia,
o que quer dizer que, porventura também pela primeira vez, Portugal começa a aparecer mais como parte da
solução europeia do que como parte do problema, como aconteceu em 2010, em 2011 e nos anos seguintes,
em que a Europa olhava com preocupação para Portugal.
Hoje, a Europa pode olhar para Portugal já com alguma distinção, já com algum orgulho e já com algum
princípio de recuperação, fruto da ação deste Governo, pelo que o Sr. Primeiro-Ministro pode reclamar esse
papel junto do Conselho Europeu.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Rodrigues (PSD): — A segunda nota que quero deixar, Sr. Primeiro-Ministro, é — julgo que
posso assim transmiti-lo — um recado deste Parlamento. Há pouco tempo, aprovámos aqui um projeto de
resolução — o CDS recordou-o aqui hoje — sobre imigração. Todos, em conjunto e de modo unânime, nos
manifestámos preocupados com isso. Curiosamente, a oposição, hoje mais preocupada em atacar o Governo
nacional do que em discutir políticas europeias, esqueceu-se desse assunto. Mas não queremos nem
podemos esquecer os milhares de pessoas que morrem nas águas do Mediterrâneo, os milhares de pessoas
que fogem dos seus destinos à procura de um destino melhor. Ora, para evitar esses dramas, a Europa e
Portugal não podem deixar de se associar a esse problema, não podem deixar de se preocupar com este
problema e têm, sim, de olhá-lo atentamente. Não basta atirar dinheiro para cima da mesa; é preciso uma
política de prevenção relativamente a estas matérias.
Essa questão faz parte da agenda do Conselho Europeu, que tem de tomar uma posição clara sobre ela.
Sr. Primeiro-Ministro, aqueles que não têm a preocupação da governação ou que não sabem governar
esquecem-se dos pontos importantes que constam da agenda do Conselho Europeu. O Sr. Primeiro-Ministro
referiu alguns, como o da união bancária e dos mecanismos de supervisão bancária, que são fundamentais
para concluirmos o edifício do euro, matéria tão preocupante e que conduziu a uma situação difícil em toda a
Europa e não apenas em Portugal. Por isso, realço as palavras aqui proferidas pelo Sr. Primeiro-Ministro
relativamente a esta matéria, como um dos pontos principais em que há que batalhar para concluir este
edifício, nesta ou porventura na próxima reunião, mas ainda em 2013, se tal for possível.
Registo também as preocupações do Governo em matéria de desemprego, nomeadamente de
desemprego jovem. Por isso, deixo-lhe esta pergunta: em matéria de desemprego jovem, qual é a iniciativa
que o Governo tem para assegurar que podemos contar com um combate decisivo a este flagelo, não só a
nível europeu mas também a nível nacional, de forma a conseguirmos diminuir o desemprego entre os jovens
portugueses?
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Rodrigues (PSD): — Acrescentaria mais uma questão que a oposição, em geral, esqueceu,
mas para a qual toda ela foi chamada a participar, e em que participou ao longo dos últimos meses, ainda com
o anterior Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, que várias vezes se dirigiu a este Parlamento sobre
esse assunto. Trata-se da matéria relativa ao desenho do quadro financeiro plurianual, sobre a qual o Governo
conseguiu uma solução consensual e que concluiu e apresentou em tempo, em conformidade com o Acordo
de Parceria, em Bruxelas.
Não é matéria do Conselho Europeu, mas da qual, seguramente, Portugal se pode orgulhar, porque foi
matéria com a qual os partidos que têm tido responsabilidades governativas se debateram para encontrar uma
solução conjunta, de modo a que se pudesse aplicar de forma adequada, pudesse ser aceite e entrar em vigor
a tempo. E o Governo merece uma saudação especial, porque soube, de uma forma consensual, produzir um
documento que foi oportunamente apresentado em Bruxelas, de modo a poder entrar em vigor a tempo.
Julgo que estas matérias são muito relevantes para a questão mais importante para a qual a Europa nos
transporta. Estamos a poucos meses das eleições europeias, a poucos meses de convocar os portugueses,
assim como todos os cidadãos europeus, para uma participação geral, para uma chamada de atenção para a
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valia do projeto europeu. Não pelo projeto filosófico ou romântico que tantos proclamam, mas por um projeto
real, concreto e decisivo para o nosso futuro.
Por isso, é importante que, ponto por ponto, tanto na economia digital, como aqui referiu, como na
inovação, no desenvolvimento económico, no crescimento económico, na união bancária, em suma em todas
as matérias que fazem parte da ordem de trabalhos do Conselho Europeu de amanhã, possamos encontrar
soluções concretas para mostrar aos europeus que vale a pena participar.
Essa será a carta de alforria da Europa relativamente às próximas eleições europeias, que é dizer aos
europeus que vale a pena participar, que vale a pena construir o projeto europeu. Não vale a pena clamar pelo
projeto europeu se todos nós não concorrermos para ele, se todos nós não ajudarmos a que ele seja um êxito,
para todos nós sentirmos que mais do que uma nação somos parte de um projeto conjunto, de um projeto
coletivo. E é para isso que nós trabalhamos também. Não é apenas para olhar para a política nacional, não é
só para olhar para os nossos interesses egoístas e mesquinhos, mas é para todos nós conseguirmos construir
um projeto coletivo, um projeto conjunto, que, afinal de contas, tem mais de 50 anos, mas também tem o
mesmo nome de sempre, que é o projeto europeu.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para encerrar o debate, como previsto, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: De facto, este é um modelo de debate
que, creio, o Parlamento poderia aperfeiçoar de forma a haver mais tempo de debate. Mas isso não resulta de
intervenção direta do Governo. Julgo que seria positivo que pudéssemos trocar impressões mais diretas sobre
esta matéria. A iniciativa é extremamente louvável e penso que bastante melhor do que o modelo que existia
antigamente, mas quando coincide com os debates quinzenais acaba por transformar-se num modelo mais
limitado para o confronto de ideias. Em qualquer caso, procurarei complementar algumas ideias que não tive
ocasião de expender na intervenção inicial e responder a alguns dos Srs. Deputados.
Em primeiro lugar, sobre as acusações que alguns Srs. Deputados dirigiram ao Conselho Europeu em
matéria de desfasamento de agenda entre os problemas da União e aqueles que constam da próxima reunião
destes dois dias, julgo que é importante ter presente que o Conselho Europeu, não sendo um governo
europeu, juntando os chefes de Estado e de Governo dos países da União Europeia, tem vindo, ao longo dos
últimos anos, a fazer um trabalho que considero meritório — e, evidentemente, não estou a referir-me apenas
ao período em que, como Primeiro-Ministro português, ali participei, estou a fazer uma observação de
perspetiva mais alongada. Julgo que o Conselho europeu tem, como dizia, desempenhado um papel
relevante, por um lado apontando, provavelmente além daquilo que são as suas competências em termos de
Tratado, para uma reforma institucional que tem vindo a ser prosseguida ao nível da zona euro, e, por outro
lado, embora à margem do Tratado, construindo soluções que o método comunitário deve absorver no futuro
tão rapidamente quanto possível, mas que foram alcançadas numa base multilateral entre os diversos
Estados.
Sejamos diretos: se esse papel não tivesse sido desempenhado pelo Conselho Europeu — e suportado,
umas vezes antes e outras vezes depois, pelo Conselho ECOFIN, bem como pelo Eurogrupo —, não teríamos
conseguido instituir fundos dedicados a apoiar os países em dificuldades, não teríamos conseguido criar um
mecanismo permanente de estabilidade financeira, não teríamos conseguido encontrar um mecanismo de
maior responsabilidade orçamental no seio da zona euro e no espaço europeu, não teríamos conseguido o
consenso alargado para um pacto orçamental em que, do ponto de vista do médio e do longo prazo, a
disciplina seja um compromisso renovado em permanência pelo conjunto dos Estados, e não teríamos
conseguido um acordo para que o chamado «pacto para o crescimento» pudesse utilizar os mecanismos de
que já dispomos, orientando-os mais para políticas de conjuntura, como é necessário.
Portanto, não partilho da visão negativista que, muitas vezes, é atribuída ao Conselho Europeu. Mas
evidentemente que, dada a posição portuguesa, sob maior pressão do que outras economias, a nossa
impaciência é por vezes maior do que a de outros Estados. Portanto, não se estranha que, por vezes, sejamos
mais ativos na busca de soluções que nos permitam, no médio e no longo prazo, inverter a atual situação.
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A agenda digital estará amanhã em discussão, a par do aprofundamento da união económica e monetária
e da avaliação das medidas de desempenho na área do combate ao desemprego jovem e na área do apoio às
pequenas e médias empresas, com recurso a fundos estruturais e a linhas dedicadas do Banco Europeu de
Investimentos — tudo isso vai ser avaliado e analisado neste Conselho Europeu —, e a verdade é que o
aprofundamento do mercado interno é essencial para a recuperação europeia. Não chega, mas é essencial.
Tenho dito várias vezes que a abertura ao exterior, através dos contratos de associação dos novos e mais
atualizados acordos comerciais que estão a ser preparados, quer com os Estados Unidos da América, quer
com o Mercosul, quer com a América Latina, quer com a China, são relevantíssimos para a recuperação da
economia europeia e para a competitividade europeia.
Mas quero, de forma muito dedicada, responder a algumas questões muito concretas que me colocaram.
Em primeiro lugar, sobre a Garantia Jovem, que tem na Iniciativa para o Emprego dos Jovens o meio
orçamental que suporta o desenvolvimento destas políticas no quadro financeiro plurianual que foi acordado.
Em Portugal, também estamos a fazer tudo para poder garantir a execução desta medida, que prevê que, num
prazo máximo de quatro meses, um jovem, até aos 25 anos de idade, que esteja desempregado, possa ou
obter uma oferta de emprego ou ter uma expectativa de vir a ter emprego mediante a realização de um estágio
profissional, ou ter a capacidade para ser acolhido no sistema formal de ensino (ensino básico e secundário ou
ensino superior) ou ser alvo de uma oferta formativa que o habilite a ingressar no mercado de trabalho.
O reforço para medidas desta natureza, em Portugal, é de cerca de 150 milhões de euros, o que significa
que teremos 300 milhões de euros para, no próximo quadro financeiro plurianual, responder a estas
necessidades.
A execução destas medidas tem vindo a ter uma evolução positiva, como, de resto, demonstram os dados
já aqui publicitados.
Um segundo aspeto é o seguinte: ao nível da reforma institucional, teremos de preparar para futuro
aprofundamentos ainda maiores da união política e da união económica e orçamental. Já tive ocasião de
discordar do Sr. Deputado António José Seguro quando defende a monetização dos défices. Não creio que
exista vantagem em que o Banco Central Europeu possa monetizar os défices. Isso está-lhe vedado pelo
Tratado e julgo que assim deve continuar.
Isso não tem impedido o Banco Central Europeu de atuar com mais ativismo, no sentido de garantir que as
suas políticas de acesso a liquidez para o sistema financeiro não sejam, no fundo, minadas pela fragmentação
dos mercados a que ainda se assiste na periferia. Mas isso depende de várias reformas importantes,
nomeadamente da construção da união bancária, que estamos a realizar.
Por fim, passo a referir-me a aspetos que foram referidos de forma muito pontual por alguns Srs.
Deputados.
Em primeiro lugar, refiro a questão da Comissão Europeia e do Tribunal Constitucional. A Comissão
Europeia dirá aquilo que deve dizer sobre essa matéria. Foi questionada sobre isso e respondeu. Não me
compete responder pela Comissão Europeia.
Mas quero dizer, como já disse — disse-o hoje na concertação social e já o disse quando estava no
México, antes de iniciar a visita, que o relacionamento que temos tido com a Comissão Europeia, seja em
termos bilaterais, seja em termos do comportamento no seio da troica, foi sempre uma relação respeitadora da
soberania portuguesa e dos órgãos constitucionais portugueses. Não devo, portanto, apontar à Comissão
Europeia intenções quanto a não respeitar a soberania portuguesa.
A Sr.ª Presidente: — Tem de terminar, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas quero também dizer aos Srs. Deputados, nomeadamente ao Sr.
Deputado João Semedo, que o debate interno em Portugal sobre esta matéria, que também foi reportado pela
representação permanente da Comissão Europeia, é um debate aberto que tem vindo a ter lugar. Da minha
parte, Sr. Deputado, aproveito apenas esta oportunidade para reafirmar a minha convicção de que o Tribunal
Constitucional não é sujeito a pressões influenciáveis. Portanto, acredito na independência do Tribunal
Constitucional. Da mesma maneira que já discordei de decisões do Tribunal Constitucional — e não há
ninguém que, evidentemente, esteja livre da crítica —, a verdade é que nunca pus em questão a sua
independência para decidir, como, de resto, o demonstrou o Presidente do Tribunal Constitucional.
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Mas, Sr. Deputado, dizer que aqueles que discordaram do Tribunal Constitucional no passado têm uma
posição suspeita de o pressionar é tão errado quanto assumir que aqueles que acham que o Tribunal
Constitucional devia invalidar esta medida ou outra estão a fazer pressões sobre o Tribunal Constitucional.
Evidentemente que as duas coisas seriam legítimas. Mas a verdade é que eu não penso assim.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Penso que, da mesma maneira que os Srs. Deputados devem livremente defender a perspetiva de
inconstitucionalidade de um conjunto de leis ou de normas, assim quem as elabora pode e deve perfeitamente
viver segundo a presunção de que, até prova em contrário, o Parlamento legisla conforme a Constituição.
Mas isso não é nenhuma pressão sobre o Tribunal Constitucional. Não é a posição daqueles que entendem
que as medidas foram elaboradas de acordo com o respeito pela Constituição como não é ilegítima a posição
dos partidos ou dos Srs. Deputados que entendem que essas normas poderão não ser constitucionais.
Nenhuma delas revela pressão sobre o Tribunal Constitucional, que não é influenciável nessa matéria.
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Concluo, Sr.ª Presidente.
Quando o Sr. Deputado João Semedo diz que, afinal, os juros contam e que, portanto, não interessa
apenas o saldo estrutural primário, gostaria de rematar dizendo: é justamente porque os juros contam e têm de
ser pagos que nós precisamos de ter excedentes orçamentais. Não chegam excedentes primários, é preciso
excedentes orçamentais.
Mas se o Sr. Deputado concorda que os juros contam e têm de ser pagos, então temos de levar a sério o
debate orçamental e não nos devemos refugiar apenas na demagogia ou no populismo, querendo confundir os
sintomas da crise com as decisões que somos chamados a tomar para a ultrapassar.
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — E, desse ponto de vista, o contributo que o Bloco de Esquerda tem dado até
esta data para esse debate não é um contributo construtivo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, convenhamos que se excedeu bastante em relação ao tempo
de que dispunha.
Vozes do PS: — Não!…
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, queria dizer que foi atendendo a que este debate, normalmente, tem
réplica que permiti que o Sr. Primeiro-Ministro fosse um pouco mais longe no tempo.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, é apenas para fazer uma correção em relação a um
lapso que há pouco cometi quando me referi ao encerramento das repartições de finanças: deveria ter referido
Vinhais, no concelho de Bragança, e não Valpaços, que fica no concelho de Vila Real.
A Sr.ª Presidente: — Está retificado.
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24 DE OUTUBRO DE 2013
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Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se amanhã, e terá a seguinte ordem do dia: em primeiro
lugar, realizar-se-á um debate, ao abrigo do artigo 225.º do Regimento, com o Sr. Ministro da Administração
Interna.
Segue-se a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 175/XII (3.ª) — Procede à reforma da
tributação das sociedades, alterando o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas,
aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro, e o Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de
setembro.
Será ainda apreciada, na generalidade, a proposta de lei n.º 179/XII (3.ª) — Procede à segunda alteração à
Lei n.º 17/2012, de 26 de abril, que estabelece o regime jurídico aplicável à prestação de serviços postais, em
plena concorrência, no território nacional, bem como de serviços internacionais com origem ou destino no
território nacional, conjuntamente com o projeto de resolução n.º 856/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo a
suspensão do processo de privatização dos CTT, a manutenção da empresa no Estado e o reforço das suas
competências (BE).
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 55 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.