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Quinta-feira, 5 de dezembro de 2013 I Série — Número 23

XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)

REUNIÃOPLENÁRIADE4DEDEZEMBRODE 2013

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Maria Paula da Graça Cardoso Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.

os

472 a 474/XII (3.ª) e dos projetos de resolução n.os

863 a 868/XII (3.ª).

Ao abrigo do artigo 72.º do Regimento, procedeu-se a um debate de atualidade, requerido pelo PCP, sobre os objetivos e as opções por detrás das operações de gestão da dívida e de apuramento das responsabilidades do Governo por comprometer o futuro das novas gerações com tal atuação. Proferiram intervenções, além dos Secretários de Estado do Tesouro (Isabel Castelo Branco) e Adjunto do Primeiro-Ministro (Carlos Moedas), os Deputados Paulo Sá (PCP), Nuno Reis (PSD), José Luís Ferreira (Os Verdes), João Galamba (PS), Mariana Mortágua (BE), João Pinho de Almeida (CDS-PP), Miguel Tiago (PCP) e Afonso Oliveira (PSD).

Em declaração política, a Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) deu conta à Câmara dos resultados da XIX

Conferência das partes da Convenção das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, que teve lugar em Varsóvia, e criticou o processo de subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo levado a cabo pelo Governo. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Helena Pinto (BE), Pedro Farmhouse (PS), Margarida Neto (CDS-PP) e Carla Cruz (PCP).

Em declaração política, o Deputado Hugo Lopes Soares (PSD) recordou o 33.º aniversário da morte do Primeiro-Ministro Francisco Sá Carneiro e, a seis meses de terminar o programa de assistência ao nosso País, apelou ao Partido Socialista no sentido de ajudar a construir um Portugal melhor. Deu, depois, resposta ao pedido de esclarecimento do Deputado Hélder Amaral (CDS-PP).

Em declaração política, o Deputado Jorge Fão (PS) acusou o Governo de ter abandonado o caminho de viabilização e de modernização dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo e de optar pelo despedimento de trabalhadores, tendo, depois, respondido a pedidos de

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esclarecimento dos Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), Carlos Abreu Amorim (PSD), Mariana Aiveca (BE), Carla Cruz (PCP) e Abel Baptista (CDS-PP).

Em declaração política, o Deputado Michael Seufert (CDS-PP) congratulou-se com o acordo alcançado entre o Ministério da Educação e Ciência e os sindicatos de professores afetos à UGT no sentido de professores sem vínculo à função pública com cinco ou mais anos de serviço serem dispensados da prova de avaliação de conhecimentos e capacidades. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados António Cardoso (PS), Cecília Honório (BE), Rita Rato (PCP) e Amadeu Soares Albergaria (PSD). No final, a Deputada Rita Rato (PCP) interpelou a Mesa no sentido de pedir a distribuição do texto do acordo, o que suscitou também uma interpelação à Mesa do Deputado Nuno Magalhães (CDS-PP).

Em declaração política, o Deputado Bruno Dias (PCP) insurgiu-se contra o processo que está a ser levado a cabo pelo Governo de privatização dos CTT e do serviço público postal e respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), Mariana Mortágua (BE), Rui Paulo Figueiredo (PS) e Luís Menezes (PSD), tendo o Deputado Rui Paulo Figueiredo (PS), em interpelação à Mesa, solicitado a distribuição de documentos, o que originou, ao abrigo da mesma figura regimental, uma resposta por parte do Deputado Luís Menezes (PSD).

Em declaração política, a Deputada Cecília Honório (BE) referiu-se aos últimos resultados do Relatório PISA 2012 e acusou o Ministro da Educação e Ciência, Nuno Crato, de falta de visão da realidade e de insistir na realização da prova de avaliação de conhecimentos e capacidades a ser feita por professores contratados. Depois, respondeu a

pedidos de esclarecimento dos Deputados Rita Rato (PCP), Maria José Castelo Branco (PSD) e Agostinho Santa (PS).

A Câmara discutiu, na generalidade, a proposta de lei n.º 172/XII (3.ª) — Estabelece os princípios e as regras do intercâmbio transfronteiriço de informações relacionadas com a prática de infrações rodoviárias praticadas com utilização de veículo matriculado num Estado-membro distinto daquele onde a infração foi cometida e transpõe a Diretiva 2011/82/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2011, que visa facilitar o intercâmbio transfronteiriço de informações sobre infrações às regras de trânsito relacionadas com a segurança rodoviária. Usaram da palavra, além do Secretário de Estado da Administração Interna (Filipe Lobo d’Ávila), os Deputados António Filipe (PCP), António Gameiro (PS), João Paulo Viegas (CDS-PP), Pedro Filipe Soares (BE) e Paulo Simões Ribeiro (PSD).

Foi ainda apreciada, na generalidade, a proposta de lei n.º 185/XII (3.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 36/2003, de 23 de agosto, em cumprimento da Decisão n.º 2009/426/JAI do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa ao reforço da Eurojust e que altera a Decisão n.º 2002/187/JAI relativa à criação da Eurojust a fim de reforçar a luta contra as formas graves de criminalidade. Pronunciaram-se a Ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz) e os Deputados Cecília Honório (BE), João Oliveira (PCP), Ana Catarina Mendonça (PS), João Lobo (PSD) e Telmo Correia (CDS-PP).

Foi aprovado um parecer da Comissão para a Ética, a Cidadania e a Comunicação autorizando um Deputado do PS a intervir num processo que corre em tribunal.

Deu-se ainda conta da entrada na Mesa do projeto de deliberação n.º 18/XII (3.ª).

A Presidente (Teresa Caeiro) encerrou a sessão eram 20 horas e 8 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Antes de darmos início aos nossos trabalhos, vou dar a palavra à Sr.ª Secretária da Mesa Maria Paula

Cardoso para ler o expediente.

A Sr.ª Secretária (Maria Paula Cardoso): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na

Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projetos de lei n.os

472/XII (3.ª) — Limites

territoriais entre os concelhos de Sesimbra e do Seixal, no distrito de Setúbal (PCP), que baixa à 11.ª

Comissão, 473/XII (3.ª) — Pela salvaguarda da autonomia e independência das associações de estudantes e

respeito pelo seu papel (PCP) e 474/XII (3.ª) — Aprova o regime sancionatório aplicável aos maus tratos

contra animais e alarga os direitos das associações zoófilas, procedendo à segunda alteração à Lei n.º 92/95,

de 12 de setembro (PS).

Foram também apresentados os projetos de resolução n.os

863/XII (3.ª) — Abolição da cobrança de

portagens na Via do Infante (PCP), 864/XII (3.ª) — Determina a realização de concursos extraordinários de

apoio às artes (PCP), 865/XII (3.ª) — Reforço da ação social escolar no ensino superior (PCP), 866/XII (3.ª) —

Estabelece a progressiva gratuitidade do ensino superior público (Os Verdes), 867/XII (3.ª) — A revitalização

do montado e a importância de uma dinâmica concertada, por parte da sociedade civil, criada pelo Livro Verde

para os Montados (PS), que baixa à 7.ª Comissão, e 868/XII (3.ª) — Pela manutenção do serviço de finanças

de Castelo de Paiva (BE).

A Sr.ª Presidente: — Vamos, então, entrar na ordem do dia.

Hoje vamos iniciar os nossos trabalhos com um debate de atualidade, de marcação do PCP, realizado ao

abrigo do artigo 72.º do Regimento, sobre os objetivos e as opções por detrás das operações de gestão da

dívida e de apuramento das responsabilidades do Governo por comprometer o futuro das novas gerações com

tal atuação.

Como sabem, este debate tem caráter potestativo e tem lugar imediatamente a seguir à leitura do

expediente.

Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Realizou-se, ontem,

uma operação de troca de dívida pública, apresentada pelo Governo como um grande sucesso. Um sucesso,

sim, mas apenas para os credores, que veem aumentar a rendibilidade dos títulos por si detidos, ao mesmo

tempo que se agrava o fardo para o Estado, com o crescimento da taxa de juro implícita na dívida pública

portuguesa. Na prática, assistimos a uma operação que transferiu milhões de euros do erário público para os

chamados investidores institucionais, no fundamental a banca e os fundos de investimento. Com esta

operação, o Governo hipoteca o futuro, deixando para quem vier a seguir o pagamento do custo acrescido das

suas erradas opções.

Toda a encenação montada pelo Governo em torno desta operação de troca de dívida pública e de uma

operação idêntica realizada em outubro do ano passado tem apenas um objetivo: esconder dos portugueses

que a dívida pública é insustentável e que não poderá ser paga com as políticas atuais. O Governo, ao não

reconhecer a insustentabilidade da dívida pública, o que pretende é adiar indefinidamente a sua justa

renegociação, garantindo àqueles que especularam com a dívida pública portuguesa o recebimento, até ao

último cêntimo, do produto da sua agiotagem.

De acordo com os cálculos da UTAO, apresentados aquando da discussão do Orçamento do Estado para

2014, a redução da dívida pública para valores próximos de 60% do PIB só ocorreria se se verificassem,

simultaneamente, ao longo dos próximos 20 anos, duas condições: crescimento económico significativo, da

ordem dos 4% do PIB nominal, e ainda um saldo primário positivo, da ordem dos 3,5%. A política levada a

cabo pelo Governo nos últimos dois anos e meio, no âmbito do Memorando da troica, não assegurou qualquer

destas duas condições. Em vez de crescimento económico, o País mergulhou numa profunda recessão e,

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apesar das brutais medidas de austeridade, de cerca de 20 000 milhões de euros, impostas aos trabalhadores

e ao povo, o saldo primário manteve-se negativo. Em consequência, a dívida pública, em vez de diminuir,

aumentou, atingindo quase os 130% do PIB.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — No próximo ano, mesmo que se viessem a atingir as metas estabelecidas pelo

Governo no Orçamento do Estado — as quais, como sabemos, são extremamente otimistas, mesmo irrealistas

—, um crescimento económico de 0,8% e um saldo primário de 0,3% ficariam muito aquém do necessário para

assegurar a sustentabilidade da dívida pública. Mesmo no cenário cor-de-rosa traçado pelo Governo para o

próximo ano, a dívida pública continuará a subir em termos nominais. Perante isto, apenas se pode extrair

uma conclusão: a dívida pública portuguesa não é sustentável. É, hoje, claro para a maioria dos portugueses

que o programa de falência económica e social, assente no pacto de agressão assinado pelo PS, PSD e CDS

com a troica estrangeira, não só é contrário aos interesses de desenvolvimento e progresso do País, como

nem sequer garante a concretização dos objetivos que servem de pretexto para quem o aplica e defende: o

equilíbrio das contas públicas, a redução do défice e da dívida pública.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Em abril de 2011, o PCP foi pioneiro na apresentação da proposta de

renegociação urgente da dívida pública, nos juros, prazos e montantes. Na altura, fomos acusados por muitos

de defender propostas irrealistas, de defender soluções que atirariam o País para o abismo. Passados mais de

dois anos, amplos setores da sociedade portuguesa, mesmo aqueles insuspeitos de qualquer simpatia pelo

PCP, reconhecem a justeza da nossa proposta e defendem uma renegociação da dívida que alivie o País do

fardo insuportável dos juros que, em 2014, atingirão mais de 7300 milhões de euros.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Recentemente, durante a discussão do Orçamento do Estado, propusemos um

regime de renegociação da dívida pública que, assumindo o pagamento da dívida legítima e considerando a

necessidade de alargamento dos prazos de pagamento, estabelecesse como limite para o pagamento de

juros, em 2014, um montante máximo correspondente a 2,5% do valor das exportações de bens e serviços, ao

mesmo tempo que se garantia a plena salvaguarda da parte da dívida correspondente aos pequenos

aforradores e daquela que está na posse do setor público administrativo e empresarial do Estado. Esta

proposta foi recusada pelos partidos do Governo, mas também pelo PS, pois uns e outros não têm a coragem

de enfrentar e de afrontar os interesses dos banqueiros, especuladores e agiotas,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — … que vêm na apropriação da riqueza nacional, por via do pagamento dos juros

da dívida pública, uma fonte inesgotável de rendimento.

O Sr. António Filipe (PCP): — Essa é que é essa!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Tal como o PCP sempre afirmou, a consolidação das contas públicas e a

redução da dívida pública não passam por uma política assente na transferência dos recursos nacionais para

a especulação e para o sistema financeiro, na concentração da riqueza à custa do roubo dos salários, pensões

e reformas, na eliminação de direitos laborais e sociais, na manutenção de um elevado nível de desemprego

com o objetivo de facilitar e agravar a exploração dos trabalhadores, na destruição dos serviços públicos e no

empobrecimento generalizado do povo português.

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A resolução dos problemas nacionais passa pela rejeição do pacto de agressão da troica e pela adoção de

uma política alternativa que assuma como prioridade a criação de condições para o crescimento da economia,

a defesa e reforço da capacidade produtiva nacional e a valorização do trabalho e dos trabalhadores.

Sabemos que o Governo não quer ouvir falar na renegociação da dívida, nos moldes propostos pelo PCP.

Sabemos que o Governo não se atreve a beliscar os grandes interesses económicos e financeiros. Sabemos

que o Governo pretende continuar a usar a consolidação das contas públicas e a dívida como pretexto para

aplicar o seu programa ideológico de reconfiguração do Estado e de agravamento da exploração de quem vive

do seu trabalho.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Conhecemos bem as opções do Governo e dos partidos que o suportam, mas o

PCP continuará a exigir a renegociação da dívida, em defesa dos interesses de Portugal e dos portugueses.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Para proferir a próxima intervenção, do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno

Reis.

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares, Srs.

Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: A postura política do PCP nesta questão da dívida pública

suscita-nos várias interrogações.

Desde logo, é ou não verdade que se esta operação de compra de dívida pelo Estado de parte das

obrigações que se venciam em 2014 e 2015 e da emissão de novas obrigações com diferentes prazos de

maturidade tivesse corrido mal, Portugal estaria perante a quase inevitabilidade de um segundo resgate e,

como tal, a permanência da troica, em Portugal, estaria assegurada para além de junho do próximo ano? Isto

é ou não verdade, Srs. Deputados do PCP?

Se VV. Ex.as

estão contra uma simples operação de troca de dívida, que não significa o regresso normal do

País aos mercados, mas é um passo nesse sentido, pergunto ao Sr. Deputado Paulo Sá se não há aqui uma

espécie de desejo inconfessado do PCP em ver a troica permanecer em Portugal ad aeternum.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso é a vossa vontade!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — É sabido que, nas recentes eleições autárquicas, as primeiras desde que se

iniciou o programa, o PCP foi o único partido que cresceu em número de votos — aliás, já lhe demos os

parabéns.

Há dias, ficámos a saber que uma grande autarquia, agora liderada por um conhecido dirigente do PCP,

terá dívidas de mais de 20 milhões de euros.

Se a autarquia em causa, Sr. Deputado Paulo Sá, unilateralmente, decidir não pagar aos fornecedores,

sejam eles PME ou entidades bancárias, pergunto-lhe se isso é bom e, se sim, quais as consequências que

pode ter para a própria autarquia e para as entidades envolvidas.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É o que fazem no Seixal!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Já agora, se for possível a autarquia de Loures, no caso, diminuir a pressão

sobre o pagamento dessa dívida, designadamente estabelecendo um plano de pagamentos com algum

fornecedor, como aconteceu recentemente, isso é bom ou isso é mau, Sr. Deputado?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas isso é negociar, não é o que estão a fazer!

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O Sr. Nuno Reis (PSD): — Faz ou não parte da gestão corrente de uma PME, de uma autarquia, de uma

tesouraria familiar, de uma entidade, seja ela qual for, organizar o seu plano de pagamentos de acordo com as

necessidades de financiamento que pensa vir a ter no futuro?

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Sobre a questão da sustentabilidade da dívida pública, ainda há menos de 15 dias tivemos dois debates.

Pergunto ao Sr. Deputado se já conseguiu, ou não, confirmar que, pela primeira vez desde Dezembro de

2011, a dívida pública, em percentagem do PIB, desceu do segundo para o terceiro trimestre.

Pergunto-lhe igualmente se já confirmou, ou não, que a dinâmica da dívida pública nacional não é tão má

quanto era a da Grécia, quando esta, em meados de 2012, foi obrigada a fazer uma reestruturação,

envolvendo credores privados.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas a comparação não era com a Irlanda?!

O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs.

Deputados, Sr. Deputado Paulo Sá, à partida, para esta operação de troca de dívida, a generalidade dos

analistas considerava que se Portugal reduzisse as necessidades de financiamento para 2014 e 2015 em

2000 milhões de euros tal já seria um sucesso.

Ora, Portugal reduziu essas necessidades de financiamento em mais do triplo desse valor.

Como bem reconheceram a nível internacional insuspeitos analistas e órgãos de referência, a operação de

troca de dívida abre caminho, em breve, a emissões de dívida em prazos mais longos e, sobretudo, ajuda

Portugal a sair do programa da troica.

Que o PCP não esteja satisfeito com isto, chega até a ser surpreendente. Ou talvez não.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os

Verdes.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs.

Deputados: Começo por saudar o Partido Comunista Português pelo agendamento deste debate e registar a

oportunidade e a importância que a matéria reveste para o futuro do País e para o futuro dos portugueses.

De facto, à medida que o tempo vai passando, mais evidente se vai tornando para todos o que Os Verdes

já há muito defendem: a única forma de pagar a dívida é proceder à sua renegociação, porque à medida que o

tempo vai passando mais clara e mais acentuada se torna a natureza insustentável da dívida pública.

Ao contrário do que dizem o Governo e os partidos da maioria, renegociar a dívida não é fugir ao seu

pagamento. Renegociar a dívida pública é o único caminho para se proceder ao seu pagamento. Renegociar

não significa não cumprir, significa exatamente o inverso.

A renegociação das condições atuais da dívida pública é o único expediente objetivo para criar as

condições de tornar a dívida pagável. É a única forma de tornar possível o pleno cumprimento dos

compromissos que o País assumiu.

Mesmo assim, e apesar das consequências, o Governo e os partidos da maioria continuam a recusar

proceder à renegociação dos prazos, dos montantes e dos juros da dívida pública.

O resultado desta teimosia está bem à vista de todos. O universo pesadíssimo de sacrifícios que o Governo

continua a impor aos portugueses está a ser absolutamente desnecessário e irrelevante para os objetivos que

justificaram esses sacrifícios.

Aquilo que mais custa aos portugueses é começar a perceber que os sacrifícios que o Governo lhes está a

impor não resolvem os nossos problemas. Os sacrifícios estão a ser completamente desnecessários e a prova

é que atrás de sacrifícios vêm novos sacrifícios.

E o pior é que a dívida aumenta à medida que aumentam os sacrifícios. Isto é, quanto mais aumentam os

sacrifícios, mais aumenta a dívida. É exatamente isto que mais dói aos portugueses. É que estão a fazer

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sacrifícios atrás de sacrifícios e não conseguem ver resultados, não conseguem ver os tais sinais positivos,

não conseguem ver a tal luz ao fundo do túnel que só o Governo diz estar a ver.

Sucede que, apesar dos ditos sinais positivos, as coisas estão cada vez piores. Os portugueses continuam

a empobrecer e a dívida continua a aumentar, tornando-se cada vez mais insustentável.

Aliás, a operação de gestão da dívida pública que o Governo acaba de fazer, remetendo para 2017 e 2018

a amortização que deveria fazer em 2014 e 2015 de títulos de dívida pública de 26 000 milhões de euros, é

não só a prova cabal da insustentabilidade da dívida como ainda mostra os propósitos do Governo de

acentuar a insustentabilidade da dívida, uma vez que o valor das taxas de juro a pagar pelo nosso País fica,

com esta operação, ainda mais agravado.

O Governo quer tapar um buraco que ajudou a abrir. Mas para o fazer acaba por abrir um buraco ainda

maior para os que vierem a seguir tratarem. É, portanto, pior a emenda que o soneto. E assim, claro, não

vamos a lado nenhum!

Diga o Governo o que disser, a verdade é que não há nenhum povo que consiga pagar a sua dívida se não

produzir. Porque um povo que não produz, não cria riqueza. E um povo que não cria riqueza não consegue

pagar dívidas. Não há volta a dar!

Ora, nós não estamos a produzir. O Governo não consegue perceber que se não produzirmos não temos

condições de pagar a dívida.

Além disso, o Governo também não percebe que, para colocar o País a produzir, não basta fazer grandes

discursos, não basta fazer grandes apelos e grande apostas, como foi a aposta do mar.

Diz o Governo que mar é um recurso que tem de ser potenciado, que temos de potenciar o mar e a nossa

indústria naval, mas depois faz o que fez com os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, o que vai remeter

mais 609 trabalhadores para o desemprego e deixar cair um potencial de desenvolvimento.

O Governo não percebe que é necessário investimento público de qualidade para pôr a economia a mexer.

Diz o Governo que não há dinheiro para o investimento. E agora perguntamos nós: mas não há dinheiro

porquê? Porque o que há é para pagar juros. Então, renegoceie-se a dívida, para termos alguma folga, para

podermos respirar e colocar a economia a mexer, para pôr o País a produzir e dessa forma criar riqueza e

criar as condições para pagar a dívida.

Isso, sim, seria pensar nos portugueses. Isso, sim, seria pensar no País.

Mas o Governo pretende continuar o seu caminho, hipotecando cada vez mais o nosso destino coletivo,

como fez agora com esta operação de gestão da dívida pública, vinculando o Estado a mais compromissos

desastrosos que apenas dão resposta à gula dos especuladores do costume, os mesmos que continuam a

engordar à custa dos sacrifícios impostos aos portugueses.

Este não é certamente o caminho para o País. Este também não é certamente o Governo que os

portugueses merecem.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Galamba.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Sr. Deputado Paulo Sá, queria

começar corrigindo uma coisa que disse na sua intervenção. Não foi o PCP o primeiro a falar de restruturação

da dívida em 2011; foi o Sr. Secretário de Estado Carlos Moedas que, em maio de 2010, disse que era

necessário ir junto dos credores dizer que Portugal não estava em condições de devolver mais do que 60 ou

70 dos 100 que devia.

Portanto, honra seja devida ao Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro por, em maio de

2010, se ter antecipado ao PCP na defesa da necessidade de restruturar a dívida, porque se tal não

acontecesse era — cito-o — «a morte do País».

Aparentemente, depois de se ter tornado Secretário de Estado, o Eng.º Carlos Moedas já não pensa assim.

Mas caberá a ele explicar a esta Câmara o que mudou no seu pensamento.

O Governo tem festejado esta operação de troca de dívida por razões que são difíceis de entender.

Vejamos: o Governo reduziu a dívida? Não! Limitou-se a trocar, mantendo exatamente o mesmo montante. O

Governo reduziu juros? Não! Os juros estão em linha com o que se paga para emissões a cinco anos no

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mercado secundário. No entanto, curiosamente, trata-se de juros muito superiores àqueles que, neste

momento, constam do Programa de financiamento da troica e — pasme-se — muito superiores ao juro médio

do nosso stock da dívida.

Se olharmos para o juro desta troca de dívida feita pelo Governo, podemos concluir rapidamente duas

coisas e, logo de seguida, uma terceira: primeiro, estamos a financiar-nos mais caro do que nos financiamos

hoje; segundo, temos uma taxa de juro mais elevada do que todo o stock de dívida que já temos; portanto, se

temos um problema de sustentabilidade da dívida pública, torna-se um pouco difícil perceber como é que esta

troca melhora o que quer que seja, uma vez que piora em todas as dimensões.

Mas o Governo lá saberá explicar o que é que há de tão fantástico para festejar nesta operação.

O Partido Socialista tem defendido que a dívida, bem como as condições do nosso ajustamento, deve ser

parte de um pacote único de renegociação do nosso ajustamento e de renegociação das nossas condições de

pagamento da dívida.

Esse é, de facto, o programa de que Portugal necessita. Portugal necessita de renegociar em conjunto com

os seus parceiros. Não unilateralmente, porque unilateralmente significaria uma rutura com os nossos

parceiros e, desde logo, uma rutura com a zona euro e com a União Europeia. Portanto, defendemos uma

solução necessariamente negociada, mas que seja abrangente.

Há muitas modalidades de redução dos encargos com a dívida, o que será, obviamente, objeto de um

debate aquando da renegociação. Mas ela deve sempre ser avaliada em conjunto com o próprio Programa de

Ajustamento.

Os nossos credores são, simultaneamente, nossos parceiros e membros de uma zona monetária, em que

os problemas que muitas vezes nos são atribuídos exclusivamente e nós, nomeadamente por este Governo…

E lembro as extraordinárias declarações de Bruno Maçães, esse grande Secretário de Estado dos Assuntos

Europeus, que representa condignamente e com grande fervor os interesses nacionais no estrangeiro,

recusando mesmo toda e qualquer aliança com qualquer país, seja ele qual for…

Os nossos interesses estão, pois, pura e simplesmente alinhados com os dos nossos credores, o que é

uma situação um pouco insólita, mas, numa negociação a sério, que não seja conduzida por este Governo, a

dívida e as condições de pagamento da dívida são obviamente parte desse pacote.

Portanto, o que dizemos ao PCP é que não acompanhamos a vossa proposta isolada, porquanto

entendemos que deve ser parte de um projeto mais vasto de renegociação.

O que pedimos ao Governo é que explique, rapidamente: primeiro, porque é que Carlos Moedas defendeu

uma coisa e deixou de o fazer; segundo, como é que algo que paga juros mais altos do que aqueles que

pagamos hoje e mais altos do que todo o stock da dívida constitui um benefício para o País e um passo no

caminho para a sustentabilidade; e, já agora, em último lugar, como é que o Governo explica — isto consta do

próprio relatório do Orçamento do Estado para 2014 — que a principal razão que neste momento agrava a

dinâmica da dívida não é o défice, é a recessão, é a diferença entre a taxa de crescimento nominal e a taxa de

juro. O Governo ignora isto e centra tudo no debate do défice. É, pois, a isto que o Governo tem de responder,

e é bom que o faça rapidamente.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Há

uma confusão que tem sido apresentada pelo PSD e que, já antes, foi apresentada pelo Governo na imprensa.

Esta operação não representa, de forma nenhuma, um regresso aos mercados. Ela é, aliás, exatamente o

contrário do regresso aos mercados. O que esta operação representa é um Governo que sabe que tem de

refinanciar 28 000 milhões da sua dívida nos próximos dois anos e que não o consegue. E como sabe que não

consegue, é inevitável que faça aquilo que sabe, que é restruturar a dívida pública.

A diferença é que, em vez de fazer uma restruturação em favor do País, que reduza os encargos com juros

e os encargos com a dívida, uma restruturação a favor das pessoas, faz o contrário; faz uma restruturação em

favor dos bancos, uma restruturação que paga mais, durante mais tempo, à banca. É, aliás, uma solução à

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qual já nos habituámos! A única forma que este Governo conhece para resolver problemas é pagando mais à

banca. É assim nas PPP, foi assim nos swaps. Esta é a forma de este Governo resolver problemas.

Mas foi um mau negócio, Srs. Deputados. O Governo comprou dívida aos bancos acima do valor de

mercado, acima do que ela valia em mercado, e depois vendeu dívida nova, do mesmo valor, abaixo do valor

de mercado. E os bancos lucram!

E fez pior: a nova dívida emitida, que foi vendida abaixo do valor de mercado com desconto, paga mais

juros, durante mais tempo! Só em 2014 e 2015 falamos de mais 300 milhões de juros!

Portanto, não resolveram problema nenhum! Esta restruturação não resolve problema nenhum!

E não podem dizer que reduz as necessidades de financiamento, porque a única coisa que faz é empurrar

as necessidades de financiamento de 2014 para 2018. E neste tempo até 2018 garante que se paga muito

mais à banca em juros. Portanto, é um ótimo negócio para a banca, um péssimo negócio para o Estado!

A única coisa que esta operação mostra, Sr.as

e Srs. Deputados, é o fracasso da política de austeridade.

Mostra o fracasso de um Governo que não consegue pagar a sua dívida nos termos em que disse que ia

pagar e, portanto, tem de reestruturar a favor da banca. Mas mostra também outra coisa: mostra a falta de

coragem de quem nunca enfrenta a banca e aceita pagar mais e sempre contra os interesses do seu País, dos

seus trabalhadores e da economia.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Pelo CDS-PP, inscreveu-se, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Pinho de

Almeida.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: É, de facto, recorrente o debate, neste Parlamento, do tema da sustentabilidade da dívida

pública. É normal que um País que tem a nossa situação debata essa sustentabilidade.

O que acontece é que o grupo parlamentar que mais vezes traz esse debate a este Parlamento tem

sempre uma posição muito especial. Já vamos analisar qual é a posição que tem do ponto de vista teórico e

qual é, depois, a execução prática que dá a essa mesma posição.

Poderíamos considerar que há duas formas de encarar essa sustentabilidade: a dos partidos que

entendem que a sustentabilidade da dívida passa por conseguir, por um lado, ir pagando a dívida que se

vence e, por outro, gerir o pagamento de obrigações futuras em diálogo com os nossos credores e há quem

entenda que se deve fazer de forma unilateral e com um rompimento com os nossos credores.

São duas posições igualmente legítimas; num caso e noutro tem de discutir-se quais são as consequências

de uma ou de outra posição.

O Partido Comunista faz sempre uma coisa muito simples: faz o diagnóstico, a seguir diz qual é a solução,

mas abstém-se completamente de discutir quais são as consequências dessa discussão. Portanto, como o

Partido Comunista ainda dispõe de tempo neste debate, era bom que nos dissesse qual seria a consequência

da posição unilateral que sustenta. Quanto é que o PCP pensa que a desvalorização cambial seria, do ponto

de vista de uma renegociação unilateral que trouxesse Portugal a uma situação limite em que pudesse sair do

euro? É que não podemos entrar numa posição unilateral, ignorando as consequências possíveis dessa

posição. Está o PCP disponível para discutir a desvalorização cambial resultante de uma estratégia dessas

lado a lado com aquilo que é normalmente imputado pelo PCP, ao chamado empobrecimento, que atribui ao

Plano de Assistência Económica e Financeira?

Então, pesemos os dois. O PCP fala aqui abundantemente dos problemas de financiamento das PME.

Então, que diga o PCP como é que as PME se iriam financiar depois de uma posição unilateral como essa do

Estado português que levasse a uma situação extrema de conflito com as instituições de crédito e com as

instituições europeias e internacionais, com quem o Estado português iria romper!

As PME, de quem o PCP fala — e bem! —, iam financiar-se como?

Do ponto de vista das instituições bancárias, os Srs. Deputados criticam a recapitalização. Ora, o que é que

acontecia aos bancos numa situação destas? Como é que os bancos, que também têm dívida pública

portuguesa, iriam sobreviver a uma situação dessas? Recapitalizavam-se outra vez com dinheiros públicos ou

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eram nacionalizados? E essa recapitalização ou nacionalização era paga como? Como é que as poupanças

dos portugueses eram salvaguardadas?

Srs. Deputados do PCP, as discussões são totalmente legítimas desde que não escondamos atrás da porta

a consequência da proposta que apresentamos. Se os senhores querem discutir com seriedade, então sejam

capazes de dizer quais são as consequências da posição que defendem e de pesá-las em comparação com a

situação atual.

Mas já temos a resposta para isso. Sabemos que se o PCP for chamado a decidir não faz aquilo que aqui

defende, faz exatamente o contrário.

Daria o exemplo da Câmara Municipal do Seixal, governada com maioria absoluta do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Está enganado! Não sabe do que está a falar! Está a comparar câmaras

com o Estado!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Foi publicada uma notícia, com declarações do Vice-

Presidente da Câmara do Seixal, que diz o seguinte: «A Câmara do Seixal financiou-se junto da banca em 40

milhões de euros para saldar 38 milhões de euros de dívidas a fornecedores». Ou seja, para pagar a

fornecedores com quem a Câmara se comprometeu — recebeu os serviços, recebeu os bens e não pagou —,

o que é que a Câmara do Seixal, do PCP, fez? Financiou-se na banca, ou seja, pagou juros e dar lucros à

banca em relação às obrigações que não foi capaz de cumprir!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Porque o seu Governo cortou o financiamento às autarquias!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ou seja, o chamado privilégio, que supostamente outros

governos atribuem à banca, não é maior nem menor do que o privilégio que a Câmara Municipal do Seixal,

governada pelo PCP, atribui à banca.

Mas vamos mais longe, vamos à questão dos mercados. Cito declarações de Joaquim Santos, Vice-

Presidente da Câmara do Seixal: «Ao passo que muitos outros municípios aderem a programas, a Câmara do

Seixal enveredou por um caminho próprio que denota a confiança e a credibilidade que esta tem nos

mercados». Vejam lá que um Vice-Presidente de uma Câmara comunista não pagou a fornecedores, foi à

banca buscar dinheiro para pagar com o dinheiro que não tem, hipotecando as novas gerações de seixalenses

que vão ter de pagar a dívida que a sua Câmara constituiu, pagando lucros altamente especulativos e

totalmente imerecidos!… Foi esta a estratégia que o PCP adotou para proteger, como dizem tantas vezes, os

cidadãos e os trabalhadores? Não, Srs. Deputados! Para pagar o que não conseguiam pagar o que não

conseguiam pagar de outra maneira e — pasme-se! — para terem a credibilidade e a confiança dos mercados.

Também neste caso, o PCP não só não fala das consequências da posição que defende como defende

algo que não é o que pratica quando é chamado a assumir responsabilidades.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Secretária do Estado do Tesouro.

A Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro (Isabel Castelo Branco): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados: Portugal efetuou ontem uma operação de troca de dívida pública em mercado. Através dessa

operação, o IGCP recomprou cerca 6,6 mil milhões de euros de obrigações do tesouro de médio e longo prazo

e emitiu um montante idêntico de dívida com maturidades, em 2017 e em 2018.

Ao contrário do que tem sido referido, a operação de troca de dívida pública que ontem teve lugar não

configura uma reestruturação dos pagamentos devidos pelo Estado português. A operação de troca de ontem

foi uma operação sujeita às regras da oferta e da procura de mercado. Um conjunto de investidores, que

representaram 26% das emissões em causa, escolheu aceitar a proposta que o IGCP fez para comprar as

suas obrigações do tesouro com vencimento em 2014 e 2015 e emitir, em troca, obrigações do tesouro com

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vencimento em 2017 e 2018. As obrigações recompradas foram efetivamente pagas e houve lugar à emissão

de nova dívida.

As recompras efetuadas configuram uma antecipação parcial dos vencimentos que ocorreriam, de qualquer

forma, em 2014 e 2015. Anteontem, as amortizações de obrigações do tesouro previstas para estes dois anos

eram de mais de 26 000 milhões de euros. Neste momento, são cerca de 20 000 milhões de euros.

Em paralelo, foram antecipadas novas emissões, que teriam também lugar, de qualquer forma, em 2014 e

2015. Ou seja, foram emitidos 6,6 mil milhões de euros de nova dívida.

Desta forma, a operação permitiu reduzir em cerca de 2500 milhões de euros as necessidades de

financiamento de 2014 e em cerca de 4100 milhões de euros as necessidades de financiamento de 2015.

A taxa de mercado das emissões recompradas ontem oscilou entre 2,12% e 3,33%. Estes níveis de taxas

traduzem o facto de os vencimentos desta dívida terem lugar num curto espaço de tempo: as mais curtas

venceriam em apenas seis meses e as de 2015 teriam cerca de um ano e nove meses de vida. Não nos

sobraria muito tempo para utilizar os fundos em questão. Em contrapartida, as novas emissões foram

efetuadas a taxas de 4,68% e 4,96%, respetivamente para os vencimentos em outubro de 2017 e junho de

2018.

As taxas das novas emissões não são diretamente comparáveis com as taxas da dívida recomprada.

Refletem a possibilidade de podermos utilizar esses fundos durante mais tempo. A título de comparação,

também os bancos pagam aos seus clientes taxas mais elevadas por depósitos mais longos: é porque podem

utilizar os fundos por mais tempo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ouviu, Sr. Deputado João Almeida?!

A Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro: — Recordo que, na primeira metade de 2013, Portugal efetuou

duas emissões de dívida de grande sucesso, uma a 5 anos, em janeiro, e uma outra a 10 anos, em maio.

Nestas duas operações, foram emitidos, no total, cerca de 5,5 mil milhões de euros em dívida de médio e

longo prazo.

Depois de quase dois anos de ausência dos mercados de dívida de longo prazo, estas emissões marcaram

um novo posicionamento de Portugal no mercado de capitais

Ao longo de 2013, os investidores têm vindo a inteirar-se com mais profundidade da situação económica e

financeira portuguesa e têm reconhecido o esforço de ajustamento efetuado, tanto do lado orçamental como

do lado das contas externas. Pese embora o ajustamento orçamental não estar completo, os investidores

reconhecem e valorizam o caminho percorrido.

Portugal estará no mercado a partir de 2014 com emissões regulares de dívida de médio e longo prazo. A

operação de ontem tratou-se de um marco importante e revelou o interesse que existe, tanto da parte de

investidores portugueses como da parte de investidores internacionais. Leva-nos, por isso, a encarar com

otimismo a possibilidade de voltar ao mercado. Nos próximos tempos iremos estar a trabalhar ativamente para

esse acontecimento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em primeiro

lugar, deixo uma breve nota sobre as comparações absurdas que surgiram neste debate entre a gestão da

dívida pública e o pagamento das autarquias a fornecedores. Fazer essa comparação, por todos os motivos —

técnicos, políticos e mais alguns — ou é desconversar ou é não saber do que se está a falar!

Protestos do CDS-PP.

Aplausos do PCP.

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Aproveito para dizer ao Sr. Deputado João Almeida que, infelizmente, não são apenas as autarquias de

gestão CDU que são forçadas, em virtude das imposições e das limitações impostas por este Governo ao

financiamento das autarquias, a recorrer à banca porque a própria banca tem melhores condições do que

aquelas que o Governo dá às autarquias. Isso é que é lamentável!

Aplausos do PCP.

Srs. Deputados, o rumo que está a ser seguido é, como se comprova, o rumo do desastre. Mas é um rumo

do desastre que beneficia alguém, que não beneficia os portugueses, em que alguém lucra com a desgraça

que é imposta aos portugueses. E nesta operação, que foi mostrada pelo Governo como uma grande vitória da

sua política, há efetivamente dois vencedores: aqueles que especulam com a dívida pública e que conseguem

aumentar em quase 100% as taxas de rendibilidade associadas aos juros e, portanto, há um aumento de

100% do custo que o Estado português vai pagar através desta dívida e do adiamento do seu pagamento, e o

próprio Governo, que remete para quem vier a seguir (para depois das eleições, curiosamente!) o pagamento

destes valores que deveriam vencer agora.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — O que vale é que acredita sem ver!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Ora, não deixa de ser curioso que o mesmo Governo que diz sempre que

não é preciso haver preocupação, porque a dívida é sustentável e que é possível pagá-la nos prazos

definidos, venha agora vangloriar-se por ter conseguido, por mais dinheiro, por mais juros, protelá-la porque

afinal não era benéfico para o País pagá-la nesta altura. É uma contradição que também merece algum

destaque.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Este é o rumo do «quanto mais se paga, mais se deve». É um rumo para

fingir que a dívida pública é sustentável porque o Governo recusa-se a reconhecer que não é sustentável

nestes termos, recusa-se a renegociá-la para salvaguardar os interesses dos portugueses, mas, rápida e

prontamente, faz alterações para satisfazer os interesses dos grandes grupos económicos e daqueles que

especulam com a nossa dívida e, neste caso, os fundos de investimento e a banca, pelo que com a colocação

de dívida que agora acabámos de testemunhar já não levanta qualquer tipo de problema. Portanto, o Governo

sacrifica o interesse público ao interesse destes credores.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O que está em causa não é renegociar a dívida ou não renegociar a dívida,

porque, mais cedo ou mais tarde, quando o País estiver prostrado por força das vossas políticas, quando

estiver ainda mais empobrecido, mais dependente, sem nada para saquear e entregar aos grupos económicos

que vêm servir, então será necessário que quem quer que seja que venha renegoceie a dívida. A questão é

que quanto mais cedo se renegociar a dívida mais condições há para salvaguardar o interesse nacional do

País. Este Governo está interessado em protelar isso para «quanto mais tarde melhor». E isso é

compreensível, Srs. Deputados, porque a cada dia que passa este Governo assegura que fogem do nosso

País 20 milhões de euros produzidos pelo trabalho dos portugueses para pagar os juros da dívida que, durante

anos e anos, nos convenceram que era representativa do caminho do desenvolvimento.

Aproveito para responder ao Sr. Deputado João Almeida sobre a chantagem, essa chantagem ou

terrorismo verbal que comummente os Srs. Deputados da maioria vêm fazer para assustar os portugueses.

Aliás, vindo de que quem nos «prometeu o céu» com estas políticas, com o euro, com a União Europeia, com

a submissão ao Banco Central Europeu, denunciarem que vem um inferno se não seguirmos a sua política,

está tudo dito.

Aplausos do PCP.

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A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostava de

perguntar à Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro se considera que uma operação de troca de dívida em que o

juro contratado é superior à taxa de juro implícita de toda a dívida que já temos e superior ao juro a que nos

financiamos hoje aumenta ou piora a sustentabilidade da dívida.

Já agora, o juro é também superior à «taxa Machete» — os tais 4,5% —, é superior à taxa da troica, é

superior ao stock de dívida pública que temos hoje e, portanto, perante estes números, é difícil não concluir

que isto agrava e não melhora a sustentabilidade da dívida pública.

Peço, pois, à Sr.ª Secretária de Estado, que ainda dispõe de algum tempo, que faça um comentário sobre

esta matéria.

Em segundo lugar — o Partido Socialista já perguntou isto várias vezes ao Governo, mas aproveitamos

para fazê-lo novamente —, de acordo com dados do próprio Governo, a principal variável que determina, hoje,

a dinâmica da dívida pública não é o défice orçamental mas, sim, a recessão e a diferença entre juros

nominais e taxa de crescimento nominal do PIB.

Pergunto: qual é a política do Governo que responde a este problema? O Partido Socialista entende que

não é nenhuma, mas gostávamos de ouvir a opinião do Governo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.ª

Secretária de Estado: Há aqui uma certeza, independentemente do que podemos dizer, que é a de que vamos

pagar mais e durante mais anos pela mesma dívida pública.

Obviamente que a sustentabilidade da dívida pública, que já não era assegurada antes, está em causa e

fica ainda mais agravada. Aliás, é o facto de o Governo saber que não consegue financiar nos mercados o

montante de que necessita no próximo ano que o leva a fazer esta operação e a tomar esta decisão de pagar

mais.

Gostaria de propor aos Srs. Deputados das bancadas do CDS e do PSD e também à Sr.ª Secretária de

Estado que imaginassem a seguinte situação: uma família que tem problema económicos e que, por ter

problemas económicos, está com dificuldades em pagar a próxima prestação do seu empréstimo à habitação.

Como está com dificuldades e não a pode pagar vai ao banco. E o banco diz: «Tudo bem, adiamos o próximo

pagamento, mas só e apenas se vocês pagarem mais, durante mais tempo e se, em vez de pagarem 3%,

pagarem 5%.» A família aceita.

O que eu gostava de lhe perguntar, Sr.ª Secretária de Estado, é se isto é um gesto de confiança e uma

história de sucesso ou se, pelo contrário, é uma história de submissão e de desespero.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-

Ministro.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro (Carlos Moedas): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e

Srs. Deputados: Estamos aqui hoje para debater a sustentabilidade da dívida, mas dado que fui citado pelo Sr.

Deputado João Galamba sem contexto,…

O Sr. João Galamba (PS): — Bem citado!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: — … abro um parêntesis para explicar o texto

a que ele se referia.

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O Sr. João Galamba (PS): — Tenho-o aqui!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, escrevi esse texto em 2010

— lembram-se? —, mais ou menos na altura do PEC 1 e não tenho qualquer dúvida, Sr. Deputado João

Galamba, de que se Portugal continuasse com o modelo económico baseado nas grandes obras, na ideia de

que gastar traz crescimento, Portugal teria chegado a um momento de insustentabilidade.

Protestos do Deputado do PS João Galamba.

Sr. Deputado João Galamba, a prova de que aquilo que afirmei era verdade é que um ano depois de eu ter

escrito esse texto estávamos a pedir aos nossos parceiros um programa de ajustamento.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado João Galamba afirmou aqui hoje que a operação de ontem foi realizada a uma taxa muito

elevada, que tal não contribui para um custo médio sustentável da nossa dívida, bem como disse ontem o Sr.

Deputado Pedro Jesus Marques.

Ora, Sr. Deputado João Galamba, em fevereiro de 2011, o Governo de então, do Partido Socialista, fazia

uma emissão de dívida pública a cinco anos de 3,5 mil milhões de euros a pagar a uma taxa de juro — sabem

de quanto Srs. Deputados? — de 6,4%!

Vozes do PSD: — Ah!…

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: — Na altura, o Partido Socialista não achou

que isso fosse insustentável.

O Sr. João Galamba (PS): — Mas eu digo que era!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: — O Sr. Deputado João Galamba e o Sr.

Deputado Pedro Jesus Marques, nessa altura, nunca se referiram a essa taxa,…

Protestos do Deputado do PS João Galamba.

… mas hoje estão a dizer que a taxa que se pagou até 2018, também a cinco anos, na casa dos 4%, mais

precisamente 4,9%, é excessiva. Mas, na altura, 6,4% não era excessiva!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A questão que estamos aqui hoje a discutir, Srs. Deputados, é a da sustentabilidade da dívida. E para

falarmos de sustentabilidade da dívida temos de falar em duas dívidas: na dívida externa e na dívida pública.

Portugal fez um ajustamento da balança corrente em três anos de 10 pontos percentuais,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — À custa da miséria!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: — … algo que nenhum país na União

Europeia conseguiu fazer. Aliás, a Irlanda demorou cinco anos para conseguir ajustar a sua balança da conta

corrente

Em 2013, a nossa balança da conta corrente e de capital será positiva, de 2,3% — fui olhar para os dados

e desde 1986 que não consigo encontrar um dado positivo na balança corrente e de capital —, e isso graças à

evolução das nossas exportações, que são a prova de que estamos a conseguir dar a volta.

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As nossas exportações, nos últimos anos, cresceram mais do que em países como a Irlanda, a Espanha, a

Itália, a França e até como a Alemanha. De facto, as nossas exportações cresceram quase 25% em três anos!

Srs. Deputados, se olharmos para a redução da despesa e do défice público, que é o segundo ponto para

conseguir que esta dívida seja sustentável, veremos que, em 2012, conseguimos, pela primeira vez em muitos

anos, atingir um saldo primário estrutural equilibrado.

O Sr. João Galamba (PS): — À custa dos trabalhadores!

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: — Em 2014, conseguiremos tanto um saldo

primário estrutural como um saldo primário positivo, ou seja, Sr.as

e Srs. Deputados, antes de pagamento de

juros, com ou sem efeitos de ciclo, as nossas contas estarão equilibradas. E tal não acontece desde 1997, Srs.

Deputados!

A nossa despesa primária, entre 2010 e 2013 — sabem? —, reduziu-se de 6,4 mil milhões de euros e, até

final de 2014, terá uma redução total de 10 mil milhões de euros.

Mas dizia o Sr. Deputado João Galamba, e com razão, que é preciso criar as condições para o

crescimento. Essas condições para o crescimento, Sr. Deputado, são criadas através das chamadas reformas

estruturais.

Risos dos Deputados do PS João Galamba e Pedro Jesus Marques.

E, Srs. Deputados João Galamba e Pedro de Jesus Marques, sabem que, entre janeiro e setembro de

2013, para cada empresa que fechou abriram duas? Os Srs. Deputados estão conscientes dessa capacidade

que tem havido por parte das empresas portuguesas? Os Srs. Deputados têm consciência das reformas

estruturais que fizemos e dos seus resultados?

Quando olhamos para o sistema judicial, quando olhamos para as ações executivas, verificamos que no

segundo trimestre de 2013 por cada ação executiva cível que entrou no sistema resolvemos duas, enquanto

que há três anos não resolvíamos nenhuma.

São estas as reformas que a OCDE já reconheceu como um potencial para aumentar o nosso Produto

Interno Bruto em 3,5% até 2020.

O Sr. João Galamba (PS): — Onde? Como?!…

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: — Esta é a prova de que estamos a conseguir

dar a volta para o crescimento.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É, é!…

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro: — O sucesso da operação de ontem

demonstra o contrário do que foi aqui dito, ou seja, demonstra que estamos no caminho certo e que vamos

conseguir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma nova intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: O

Sr. Secretário de Estado, em 2011, era muito poupadinho e dizia, quando tínhamos uma dívida pública de

93%, «o que temos de dizer aos nossos credores é que dos 100 que nos emprestaram só podem receber 70

ou 80 desse montante». De tão poupadinho que era em 2011, passou hoje a esbanjador e a dizer aos

mesmos credores «pelos 100 que nos emprestaram vão receber 105 ou 110.»

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Portanto, a nossa pergunta, Sr. Secretário de Estado, é esta: onde é que estão hoje as suas preocupações

de poupança que estavam tão presentes em 2011, quando a dívida pública era bastante mais baixa do que é

hoje?

Lembro ao Sr. Secretário de Estado um texto que escreveu cujo título era: «Será que é a dívida que nos vai

matar ou somos nós que vamos matar a dívida?» Por este caminho, claramente, Sr. Secretário de Estado, é a

dívida que nos está e vai matar!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Sr.

Secretário de Estado, se em 2010 era urgente a renegociação da dívida, hoje, que há mais dívida e menos

economia, o senhor, curiosamente, até acha que o País já se pode dar ao luxo de negociar, de empurrar a

dívida para mais tarde com custos maiores!

Portanto, para si, se na altura era preciso renegociar, hoje, em piores condições, o País até já se pode dar

ao luxo de «fazer uns fretes» aos credores!

Com isso, Sr. Secretário de Estado, hipoteca o futuro das atuais e das futuras gerações de trabalhadores

no nosso País.

Nesta intervenção, que certamente será a última por parte do PCP, gostaria ainda de dizer que o que nós

propomos não é uma renegociação unilateral dos termos, montantes, juros e prazos da dívida, é, sim, aplicar o

que já resultou de outras negociações no passado, noutros casos, que é impor ao Governo que não possa

negociar além do interesse nacional, que não possa sacrificar o interesse nacional ao interesse de outros. É

impor ao Governo que, antes das dívidas e dos juros negociados para beneficiar os credores, sejam

assegurados os pagamentos dos salários, das pensões, das funções sociais do Estado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Trata-se de hierarquizar e de priorizar as principais tarefas do Estado e

permitir que o Governo negoceie, nesses termos, a dívida pública.

Sr.ª Secretária de Estado do Tesouro, Srs. Deputados, toda a argumentação do Governo sobre o sucesso

desta operação e sobre o sucesso das suas políticas assentou, única e exclusivamente, em dois pilares: a

normalidade da operação e a defesa do interesse nacional.

Sobre a defesa do interesse nacional, Sr.ª Secretaria de Estado, há que perguntar: de quem? Trata-se de

defender o interesse nacional dos banqueiros, dos especuladores? Ou o interesse dos trabalhadores e dos

portugueses? É que não são interesses iguais: quando uns pagam os outros recebem, e esse é um interesse

suficientemente antagónico para não podermos pôr tudo no mesmo saco.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Quanto à normalidade, está explicado como é que o País chegou até aqui,

porque há governos que acham que é normal contrair dívida, fazê-la rolar para depois, pagando mais juros,

fazendo fretes aos grupos económicos e aos banqueiros.

E é precisamente por força de nos virem aqui dizer que é normal que mais urge acabar com essa

normalidade. É urgente acabar com essas políticas que já vão considerando normal a ofensa direta ao

interesse nacional, e isso será garantido pela rejeição do pacto de agressão e, quanto antes, pela demissão

deste Governo.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Oliveira.

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O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados: Esta

discussão é recorrente e é importante, sem sombra de dúvida.

O PCP vem aqui, hoje, defender que a dívida pública portuguesa é insustentável, o PCP defende a política

do «não pagamos» ou do «pagamos assim-assim»,…

Protestos do PCP.

… mas o PCP não diz aos portugueses quais são as consequências do «não pagamos» e como é que

Portugal financiaria as suas necessidades.

O PCP, sistematicamente, em todas as discussões, vem defender o aumento de despesa pública. Não

apoia a redução de despesa pública, mas, depois, não afirma como é que financia a despesa.

Nesta matéria, o Governo fez a sua obrigação, tendo atuado sobre o stock de dívida, sobre a dívida pública

e sobre liquidações que Portugal tinha de efetuar em 2014 e em 2015. Ficou claro, ao longo deste debate, que

foi isto que o Governo fez, e fez bem!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Esta operação surpreendeu pela positiva e superou as espectativas que

existiam sobre a capacidade de Portugal efetuar uma operação com estas características. Aliás, quem lê os

jornais e os artigos dos analistas percebe que isto é verdade.

A verdade é que as emissões de dívida ao longo de 2013 têm provocado o maior interesse dos investidores

estrangeiros, o que representa um indicador muito claro sobre o entendimento relativamente à política de

consolidação das finanças públicas que Portugal tem vindo a prosseguir.

A verdade, também, é que foi este Governo, como já aqui foi dito hoje, que controlou o crescimento

exponencial de dívida pública a que tínhamos assistido durante a vida do anterior Governo.

É preciso dizer-se, em nome da verdade, para que não haja mais dúvidas, nem demagogia, nem

afirmações falaciosas como hoje aqui se ouviram, que a gestão do stock de dívida, a gestão das datas de

liquidação desses empréstimos, a gestão das necessidades de Portugal financiar em cada momento ocorrerá

sempre, sempre, independentemente do prazo de vigência do Programa de Ajustamento.

Portugal terá sempre de fazer a gestão de stock de dívida, não tem que ver com o Programa de

Ajustamento: fez no passado, fará hoje, fará daqui a um ano, daqui a dois anos, daqui a 10 anos. Esta

consciência tem de existir, não pode haver qualquer dúvida; qualquer entidade, uma empresa, um particular,

um país, uma câmara têm de a ter.

Por exemplo, há dias, ouvimos o Presidente da Câmara Municipal de Loures dizer «estamos a arrumar a

casa». Ora o «estamos a arrumar a casa» aplica-se completamente ao Governo português.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

Protestos do PCP.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, alguns

partidos da oposição apenas têm uma visão noturna da realidade. Essa visão noturna da realidade não é o

que nós precisamos; precisamos de uma nova visão para Portugal, uma visão que venha da esquerda, que

venha do Partido Socialista, que venha do PCP. Em nome da verdade, também é preciso dizer-se que, hoje, o

PS teve alguma moderação. Aliás, o Sr. Deputado do Partido Socialista que usou da palavra não transmitiu —

é a minha perceção, mas posso estar errado — a sua opinião sobre esta matéria; foi um bocado mais leve,

mas ainda bem que assim é.

Esperamos vir a ter, no futuro, uma oposição mais assertiva e com pensamento estratégico — é isso que

se pretende. A visão noturna que a oposição tem hoje sobre a realidade não é o que o País pretende.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, concluído este debate de atualidade, passamos ao ponto seguinte

da ordem do dia, que consta de declarações políticas, estando já inscritos para o efeito os Srs. Deputados

Heloísa Apolónia, por Os Verdes, Hugo Soares, pelo PSD, Jorge Fão, pelo PS, Michael Seufert, pelo CDS-PP,

Bruno Dias, pelo PCP, e Cecília Honório, pelo BE.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A XIX conferência das

partes da Convenção das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas decorreu em Varsóvia, com

representantes de cerca de 190 países, tendo finalizado os seus trabalhos no passado dia 23 de Novembro.

Tendo este Parlamento estado exclusivamente envolvido na discussão do terrível Orçamento do Estado

para 2014 enquanto decorria a Conferência Mundial sobre o Clima, não houve possibilidade de fazer um

acompanhamento em Plenário dos seus trabalhos, mas o Partido Ecologista «Os Verdes» considera que os

resultados desta cimeira não podem passar à margem da abordagem parlamentar e, por isso, importa fazer a

declaração que se impõe.

A primeira questão a assinalar é que, mais uma vez, da conferência do clima não resultaram compromissos

para uma ação pós Quioto com vista à redução das emissões de gases com efeito de estufa para minimizar o

fenómeno, já tão evidenciado, dos problemas e tragédias decorrentes das alterações climáticas. O que se fez

foi determinar que, para o ano, no Perú, se trabalhará uma versão preliminar de um novo acordo global, que

deverá ser apresentado e aprovado na conferência de 2015, em Paris, com o objetivo de entrar em vigor em

2020.

Em 2020, já se avançou quase um quarto do século, em que a comunidade científica, designadamente por

via do novo relatório do IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change), prevê que se possa assistir a

uma escalada da temperatura média planetária em cerca de 5 graus e que a subida dos níveis dos mares

avançará mais do que se previa em 2007, confirmando simultaneamente que se a mudança climática tem uma

influência de fatores puramente naturais a sua aceleração deve-se, numa enormíssima percentagem,

fundamentalmente à sobreprodução de gases com efeito de estufa (em especial dióxido de carbono) à escala

global, o que leva à ocorrência de mais fenómenos climáticos extremos.

Parece quase propositado por parte de uma natureza que não perdoa ataques constantes que cada

conferência anual das partes tenha sido precedida de um drama climático devastador. Desta vez, foi o

megatufão nas Filipinas, que matou mais de 10 000 pessoas e deixou sem nada centenas de milhares. Mas,

mesmo assim, os entraves políticos e económicos dos líderes de vários países têm-se sobreposto a uma ação

eficaz de mitigação e adaptação mundial às alterações climáticas.

Os Estados Unidos da América continuam a procurar diluir a sua responsabilidade, exigindo agora que um

futuro acordo se aplique da mesma forma a todos os países, pobres ou ricos, muito emissores de gases com

efeito de estufa ou pouco. Enfraqueceram-se objetivos de países como a Austrália, o Canadá ou o Japão. A

China não pode, obviamente, ficar de fora, mas tudo continua em aberto, e se houve coisa que a conferência

de Varsóvia demonstrou é que ainda não há compromissos, quanto mais ações.

Foi esta falta de ambição, de preservar este planeta, que levou as principais organizações ambientais

internacionais a abandonar a conferência antes de esta concluir os seus trabalhos.

Mas, nos dias que correm, há mais uma coisa que se impõe dizer. Há substancialmente duas formas de

concorrer para a redução de gases com efeito de estufa: através de investimento em modos de produção e de

vida sustentáveis ou através do aproveitamento dos efeitos da crise e dos brutais problemas económicos e

sociais daí resultantes. A primeira via é a desejável, a segunda é batota e é insustentável.

Um exemplo: se em Portugal as pessoas reduzirem o uso do automóvel porque estão desempregadas e já

não se deslocam para o emprego, ou porque emigraram, ou porque lhes cortaram os salários, esta não é a

forma de dar resposta à diminuição do uso do transporte individual. A forma sustentável é uma boa rede de

transportes públicos, com preços acessíveis e com qualidade de oferta adaptada às necessidades das

populações. Outro exemplo clarificador de erros que se podem cometer é o programa nacional de barragens

que concorre diretamente para a degradação do litoral, afetado pela subida do nível dos mares, e depois lá

vão pedir milhões e milhões de euros aos contribuintes para reparar os erros no litoral, depois de a EDP ter

lucrado milhões e milhões com as barragens.

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Sr.as

e Srs. Deputados, por falar em mar e em milhões, Os Verdes querem hoje deixar também aqui uma

nota sobre os Estaleiros Navais de Viana do Castelo.

Em primeiro lugar, um país que se quer virado para o mar, quando acaba com a potencialidade que tem de

reparação e construção de navios, portanto da indústria naval, comete um enormíssimo erro estratégico.

Em segundo lugar, o Governo justifica a subconcessão dos estaleiros com base na afirmação de que, se

não se desfizesse dos estaleiros, teria que devolver à União Europeia 180 milhões de euros, o que é uma

rotunda falsidade, para além de parecer que está a pedir à União Europeia que os peça de volta. Ora, quando

o pressuposto é falso, é preciso desconfiar que há uma má-fé que julgamos que o Governo teve em todo este

processo.

Em terceiro lugar, no passado mês de Setembro o Partido Ecologista Os Verdes questionou diretamente o

Ministro da Defesa, neste Plenário, sobre a acusação que este fazia de que o anterior Governo queria

despedir 420 trabalhadores dos estaleiros de Viana. Impunha-se, então, perguntar: se o Governo anterior

queria despedir 420, quantos trabalhadores iria despedir este Governo? O Ministro recusou-se a responder,

mas hoje o País já sabe: quer despedir todos os cerca de 620 trabalhadores, causando mais um drama social

e económico na região! E o certo é que o Governo não quis ter dinheiro para investir nos Estaleiros, mas agora

já arranja 30 milhões para pagar despedimentos!

Em quarto e último lugar, a estratégia do Governo foi a de fragilizar a carteira de encomendas, que tinha

um enorme potencial, de modo a afirmar posteriormente que os Estaleiros eram inviáveis, para os entregar

aos privados! É o Governo a desempenhar a sua estratégia neoliberal, a destruir um País que se encontra em

muito más mãos e que só encontrará rumo quando este Governo cair!

Aplausos de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, inscreveram-se os Srs. Deputados Helena Pinto, do

BE, Pedro Farmhouse, do PS, Margarida Neto, do CDS-PP e Carla Cruz, do PCP, para lhe pedirem

esclarecimentos.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, o tema que trouxe a debate,

através da sua declaração política, é muito importante para o nosso País, mas é um tema muito importante

para todo o mundo.

A Conferência sobre as Alterações Climáticas que teve recentemente lugar em Varsóvia é um assunto que

não deve passar ao lado deste Parlamento. De facto, é verdade, Sr.ª Deputada, que, como referiu na sua

intervenção, enquanto decorria a Conferência teve lugar um fenómeno climático extremo, o tufão que arrasou

o arquipélago das Filipinas. Parece, de algum modo, uma ironia do destino ou — porque não? — um alerta

para quem se reunia na Conferência.

Mas nem mais esta catástrofe diminuiu a influência dos lobbies nesta Conferência, com particular destaque

para o lobby do carvão. E este é um dos aspetos que eu gostaria que a Sr.ª Deputada abordasse de seguida.

Já sabemos que não se chegou a nenhum acordo vinculativo. Aliás a deceção, e mesmo o repúdio em

relação ao fracasso desta Conferência penso que ficou bem patente no abandono da Conferência por cerca de

800 delegados de organizações não-governamentais.

A conclusão parece-nos óbvia: a Conferência de Varsóvia significou um retrocesso para o ambiente, um

retrocesso para a estratégia mundial sobre as alterações climáticas. É, no fundo, um retrocesso para a

humanidade. Nesta fase, exigia-se mais, muito mais, mas não há compromisso algum, não há medidas

algumas, não há ação concreta.

Sr.ª Deputada, pelo que ouvi da sua intervenção, sei que partilha desta conclusão, mas parece-me ser

importante tirar outra conclusão extremamente preocupante desta Conferência: prende-se com o papel dos

lobbies da indústria poluidora. Isto porque, para além de esta Conferência ter significado um fracasso em

termos das políticas mundiais, ela significou também um caminho aberto aos lobbies das indústrias poluidoras.

E era sobre este aspeto que gostava de ouvir a opinião da Sr.ª Deputada.

Aplausos do BE.

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A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Farmhouse.

O Sr. Pedro Farmhouse (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, agradeço-lhe ter trazido

o tema da XIX Conferência das partes da Convenção das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas.

Gostaria de afirmar aqui, mais uma vez, que o Partido Socialista, tal como no passado, defende todas as

medidas de mitigação e adaptação às alterações climáticas que foram sendo desenvolvidas, tal como uma

economia de baixo carbono e a promoção de uma economia verde.

Mas gostaria de ouvir a opinião da Sr.ª Deputada sobre alguns aspetos desta Conferência, que tão poucos

resultados teve, além de acordarem no sentido de tentar estabelecer um acordo, em 2015, em Paris.

A primeira pergunta que gostaria de colocar à Sr.ª Deputada é a de saber se apenas teremos assistido a

objetivos frustrados e a algumas desilusões, mas os resultados das negociações em Varsóvia permitirão que

se alcance um acordo histórico, em Paris, em 2015, conforme se propõe para esta conferência de novembro.

A segunda questão, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, é a de saber se partilha da opinião da Sr.ª Comissária

Europeia, Connie Hedegaard, de que Varsóvia nos mostrou que seremos capazes de alcançar um resultado

ambicioso em 2015, ou seja, se o percurso acordado nesta Conferência de Varsóvia permitirá chegar a 2015

com um acordo para que a limitação das emissões entre em vigor em 2020. Será um bom caminho que os

diferentes Estados deixem de assumir compromissos — e esta é uma questão fundamental sobre aquilo que

se passou em Varsóvia — e passem apenas a dar contributos para as metas globais da redução de

emissões? Esta é também uma questão pertinente, no âmbito do que se passou em Varsóvia, quanto àquilo

que deviam ser compromissos e, por força dos países mais poluidores, passaram a ser apenas contributos.

Isto não poderá ser um entrave a que se chegue, em Paris, em 2015, ao tal compromisso que todos

desejamos que aconteça, a bem do planeta terra?!

Gostava também de saber se vê com bons olhos a partilha de responsabilidades por todas as nações, por

todos os países do mesmo modo ou qual é o contributo que entende que cada um tem de dar nesta matéria e,

em particular, neste caso, de Portugal, um dos países mais suscetíveis ao fenómeno da imprevisibilidade

climática no espaço europeu, além, obviamente, de o aumento da temperatura criar condições para

fenómenos meteorológicos extremos, de secas, de inundações, de tempestades bastante complicadas para a

sobrevivência do planeta.

Por último, gostaria também de saber a opinião da Sr.ª Deputada sobre o papel das organizações não-

governamentais neste processo de chegarmos a um compromisso para lutar pelos fenómenos de alterações

climáticas e o abandono da Conferência, que produziu um efeito tão frágil e tão mínimo em relação àquilo que

se esperava que fosse possível alcançar em Varsóvia.

Mas, acima de tudo, e na perspetiva de França 2015, gostava de saber qual é a expectativa da Sr.ª

Deputada sobre o papel que pode ser desempenhado, neste aspeto, por Portugal e pela União Europeia.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do CDS-PP.

Sr.ª Deputada Margarida Neto, faça favor.

A Sr.ª Margarida Neto (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Heloísa

Apolónia, começo por cumprimentá-la por ter trazido aqui matérias tão importantes como a das alterações

climáticas e da COP19 (19.ª Conferência das Partes).

Todas as Conferências das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas

são, por tradição, encontros suscetíveis de gerar grandes expectativas, acompanhadas intensamente por

todos e em particular pelas centenas de organizações mundiais que aí se deslocam, para fazer valer a sua

posição e as suas motivações históricas e atuais, bem como salvaguardar os seus interesses particulares na

gestão deste grave problema, que é o ambiental global.

Assim, a nossa missão em Varsóvia passava por aprovar, sem hesitações nem retrocessos, um plano de

atividades para 2014 e 2015 que identificasse o trabalho de casa e o respetivo calendário a cumprir por parte

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de todos os países, tendo em vista a obtenção, em 2015, de um acordo climático pós-2020, ambicioso, justo,

custo-eficiente e abrangente.

A delegação portuguesa participou nestas negociações, em conjunto com a delegação europeia, de uma

forma muito ativa e conseguimos atingir os nossos principais objetivos.

O resultado desta Cimeira não foi tão ambicioso como gostaríamos, mas, ainda assim, fornece os

elementos necessários para a conclusão do acordo pós-2020, na Cimeira de Paris, de que destaco alguns.

Em primeiro lugar, ficou acordado que todos os países — industrializados e em vias de desenvolvimento —

têm de apresentar até março de 2015, isto é, nove meses antes da Cimeira de Paris, as respetivas

contribuições nacionais de redução das emissões para o período pós-2020.

Em segundo lugar, os países industrializados reafirmaram o seu compromisso de mobilizar, através de

financiamento público e privado, e recorrendo a várias fontes, montantes crescentes de financiamento, até

atingir 100 000 milhões de euros, por ano, em 2020, para a mitigação e adaptação às alterações climáticas

nos países em vias de desenvolvimento.

Foi também estabelecido o mecanismo de Varsóvia sobre perdas e danos, um dos temas prioritários, em

particular dos pequenos Estados-ilha, e uma reivindicação de longa data por parte destes países e de outros

países em desenvolvimento, particularmente vulneráveis às alterações climáticas, entre os quais se encontram

alguns países da CPLP.

Neste contexto, estamos confiantes no caminho que está a ser traçado pelo Governo em matéria de

alterações climáticas. Não por termos sido novamente distinguidos, no âmbito da COP19, por uma reputada

ONG, como o terceiro país melhor colocado, o terceiro entre 58 países, no índice de desempenho climático,

mas pelas políticas que estão a ser desenvolvidas e pelo facto de o Governo português se ter comprometido,

nesta Conferência, com o desígnio de «sermos os campeões também na eficiência energética nos edifícios,

nos transportes e na indústria, reduzindo a nossa dependência energética do exterior». Estas foram as

palavras do Sr. Ministro do Ambiente e o CDS não tem dúvida de que é um dos vetores principais para

prosseguir na luta contra as alterações climáticas.

Neste contexto, Sr.ª Deputada, gostaria de questionar Os Verdes sobre se concordam ou não com esta

visão de responsabilidade política, cívica e empresarial em matéria de clima e de energia.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PCP.

Sr.ª Deputada Carla Cruz, faça favor.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, começo por

saudá-la pela declaração que aqui nos trouxe e vou centrar o meu pedido de esclarecimento num ponto da

sua declaração política, mais concretamente na questão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.

De facto, desde a semana passada, com o anúncio do encerramento dos Estaleiros Navais de Viana do

Castelo e o despedimento de 600 trabalhadores, temos vindo a assistir a um crime, a um crime social e

económico, que este Governo está a cometer.

Trata-se de um crime económico para o País e para aquela região, mas esta decisão do Governo não é,

efetivamente, uma decisão nova, ela traduz a matriz ideológica deste Governo, que é a de não zelar pelos

interesses públicos, não zelar pela economia nacional, mas, sim, governar em favor dos grandes grupos

económicos, do capital.

Só se compreende essa decisão tomando em conta a matriz que, efetivamente, tem governado o País. É

esta a razão e a orientação que o PSD e o CDS-PP têm seguido.

Mas gostaria também de dizer aqui que esta decisão decorre da orientação que foi seguida logo, à partida,

quando este Governo tomou posse, em 2011, que foi a de privatizar os Estaleiros Navais de Viana do Castelo,

desmantelar, destruir e despedir os trabalhadores.

Assim, Sr.ª Deputada, mais uma vez, saúdo a sua declaração política e coloco-lhe uma questão muito

clara: está o Partido Ecologista «Os Verdes» disponível para encetar medidas concretas e ativas para travar o

despedimento e para não encerrar os Estaleiros Navais de Viana do Castelo? É que, efetivamente, é isto que

está hoje em causa. Temos de preservar uma empresa pública importantíssima e estratégica para a região e

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para o País e temos de preservar todos os postos de trabalho, porque o modelo que o Governo adotou, a

subconcessão, é um crime social e económico para aquela região, para a economia nacional e para todos

aqueles trabalhadores.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, antes de mais, agradeço ao Sr. Deputado e às

Sr.as

Deputadas que colocaram questões.

Começo, talvez, pela última, da Sr.ª Deputada Carla Cruz, referente aos Estaleiros Navais de Viana do

Castelo, para dizer à Sr.ª Deputada que estou inteiramente de acordo, como, de resto, ficou expresso na

nossa intervenção de hoje e noutras que temos trazido à Assembleia da República, a propósito da matéria dos

Estaleiros Navais de Viana e também faço eco daquelas que são as exigências dos trabalhadores na

manutenção dos postos de trabalho, percebendo todas as consequências terríveis, ao nível económico e

social, que este despedimento e esta falência dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo poderão trazer para a

região.

Mas, Sr.ª Deputada, quero dizer-lhe que temos um dever, que é o de exigir responsabilidade e explicações

por parte do Governo. Mas temos mais do que esse dever: temos o dever de procurar explicações e

responsabilidade para além do Governo, porque, Sr.ª Deputada, desconfio que há coisas que não vamos

saber através do Governo. É por isso que também aproveito para saudar a iniciativa que o Grupo Parlamentar

do PCP tomou, no sentido de solicitar a constituição de uma comissão de inquérito relativamente a esta

matéria.

Quanto à questão colocada pela Sr.ª Deputada Helena Pinto, sobre as alterações climáticas, estou

plenamente convicta de que a Conferência de Varsóvia vem, mais uma vez, demonstrar que não há uma

vontade política ao nível global de resolver, de agir em setores e matérias que diretamente concorrem para o

agravamento do fenómeno das alterações climáticas. E, na verdade, como a Sr.ª Deputada também referiu, de

facto, o grande poder económico vale mais para determinadas classes políticas do que o bem-estar e a

qualidade de vida de milhões e milhões de seres humanos neste mundo. E, Sr.ª Deputada, porque as

questões ideológicas se colocam a tão diferentes níveis, isto tem de fazer este mundo pensar, porque este

mundo, por esta via, não terá pernas para andar, a par de uma determinada ideologia.

Sr. Deputado Pedro Farmhouse, quero dizer-lhe o seguinte: as expectativas — veja bem ao ponto a que já

chegámos —, da Conferência de Varsóvia para Paris, não são grandes, ou seja, as dúvidas, a desconfiança e

mesmo uma desilusão em relação àquilo que se pode vir a encontrar daqui a dois anos é grande. E, portanto,

isto gera o quê? Gera desmotivação e gera, de facto, uma perfeita convicção de que os responsáveis políticos

não estão a dar a resposta convicta que, obviamente, deveria ser dada. Portanto, esta dúvida que salta de

Varsóvia para o Peru e do Peru para Paris, de facto, deve fazer-nos pensar, porque as pessoas querem

compromissos, o mundo precisa de compromissos e de passar dos compromissos às ações. Ora, quando nem

aos compromissos conseguimos chegar, fica muito complicado traduzi-lo em ações.

Sr.ª Deputada Margarida Neto, em relação à questão que colocou, aproveito para dizer o seguinte: tenho

muita pena que, a partir de uma determinada altura e de uma determinada Conferência das Partes, o

Parlamento português tenha deixado de estar representado no acompanhamento desses trabalhos, ao

contrário de outros Parlamentos nacionais. Portanto, devia ficar também aqui uma reflexão, relativamente a

estas participações, para o Governo português.

Quanto a algumas das medidas concretas que focou, centro-me na eficiência dos transportes. Gostava,

talvez, de um dia ter oportunidade de debater com a Sr.ª Deputada, em sede de comissão ou noutra sede

qualquer — e, se calhar, teremos essa oportunidade —, se, por exemplo, tendo em atenção o que a Sr.ª

Deputada diz, ao nível energético, e relacionando-o com os transportes, entende que a política de transportes

que está a ser seguida é eficiente do ponto de vista do objetivo do combate às alterações climáticas. A Sr.ª

Deputada, porventura, por aquilo que ouvi, dirá, eventualmente, que sim, mas digo-lhe, convictamente, que

não e que a Sr.ª Deputada pode correr o risco de se centrar nos efeitos de uma crise — efeitos negativos, do

ponto de vista económico e social — para pensar que se estão a encontrar soluções sustentáveis para

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matérias ambientais, quando não é isso que está a acontecer. Mas, depois, daqui a uns anos, a resposta cair-

lhe-á em cima de uma forma, obviamente, negativa.

O mesmo poderei dizer relativamente à vossa insistência na manutenção de um programa nacional de

barragens que, veja bem, Sr.ª Deputada, nem os efeitos sobre o litoral estudou.

Portanto, quando falamos de poder económico, isso pesa tanto, não é Sr.ª Deputada?! Pesa muito mais a

EDP do que a qualidade de vida dos portugueses, do que o bem-estar dos portugueses e, já agora, Sr.ª

Deputada, também do que a nossa sustentabilidade ambiental.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Teresa Caeiro.

A Sr.ª Presidente: — Não havendo mais pedidos de palavra, vamos prosseguir os trabalhos com a

declaração política do Sr. Deputado Hugo Soares.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Evoca-se hoje o falecimento

de um dos maiores estadistas que o País conheceu; faz hoje 33 anos que Francisco Sá Carneiro

desapareceu. Como legado deixou a luta pela liberdade, pela democracia e por um Estado de direito que há

40 anos se libertou do jugo da ditadura.

Nasci e cresci na liberdade, sou da geração de liberdade; não sei o que é ter medo da palavra, ter receio

da autoridade, querer dizer e escrever e não poder. Sou de uma geração que aprendeu os valores do respeito,

da urbanidade, da justiça intergeracional, da solidariedade, tudo por adesão à virtude e nunca por qualquer

temor reverencial. Sou de uma geração habituada a viver numa sociedade com regras, somos um Estado de

direito democrático.

Não tenho, por isso, qualquer memória do que é viver num regime autoritário e também não vivi os tempos

agitados do pós-25 de Abril: o caos na rua e nas empresas, a desordem instalada, o desrespeito institucional e

a vontade férrea de instalar em Portugal um regime que renegava Abril e que empurrava Portugal para Leste.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Mas, Sr.as

e Srs. Deputados, não é por não ter vivido nenhum dos

tempos de que falei que me falta a legitimidade para afirmar, com convicção, que não quero nenhum regresso

ao passado, nem ao tempo da ditadura, nem ao tempo do PREC (Processo Revolucionário Em curso) —

renego os dois por igual.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Em democracia, é o povo, é sempre o povo que escolhe, não é uma qualquer minoria que se diz

esclarecida, vanguardista e tantas vezes egoísta.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Nos últimos tempos, temos

assistido a comportamentos e a declarações públicas que nada abonam a favor daquilo que todos devemos

defender.

Falemos claro. Quando se ouve um antigo Presidente da República dizer de um Governo legítimo que

«estes senhores têm de ser julgados», quando pactuou num silêncio cúmplice com um Governo que levou o

País à bancarrota, onde está a ética republicana?

Aplausos do PSD.

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Quando se ouve um capitão de Abril dizer que «O Governo se arrisca a sair à paulada», onde está o

respeito pela democracia que Abril instalou?

Ou quando vemos um ex-Primeiro Ministro dirigir-se, numa entrevista pública, ao Ministro das Finanças

alemão com o epíteto de «estupor», onde estão a distinção e a urbanidade que devem caracterizar os agentes

políticos?

Quando vemos alguns sindicalistas, alguns em particular, queimar o Orçamento do Estado e dizer «só é

pena não estar cá quem o aprovou», onde está o respeito institucional?

Não, não é esse o Portugal que vimos a construir!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quando vemos tudo isto e ouvimos os incitamentos que parecem ser à insubordinação por parte das

mesmas personagens que alinham numa esquerda reacionária renascida, devemos todos, nesta Casa, com

igual firmeza e com determinação repudiar este tipo de afirmações e de comportamentos.

É em defesa do Estado de direito democrático que todos — todos, sem exceção — estamos convocados e

deste consenso ninguém, mas ninguém, se deve eximir.

Mas será que tudo isto é por acaso? Será que é isto que desejam os milhões de portugueses que, com o

seu esfoço e sacrifício (repito: com o seu esforço e sacrifício) colocaram Portugal a crescer nos últimos dois

trimestres?

Risos do Deputado do PS António Gameiro.

Será que é isto que desejam os mais de 100 000 portugueses que encontraram trabalho nos últimos dois

trimestres?

Ou, ainda, será que é isto que desejam os empresários portugueses que criam emprego e exportam e que

com isso alavancam a nossa economia?

Sr.as

e Srs. Deputados, há portugueses a passar dificuldades? Há. Há portugueses a fazer sacrifícios? Há.

Mas não se politize nem instrumentalize aqueles para quem a nossa atenção deve ser prioritária!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso queriam os senhores! Que os portugueses comessem e calassem!

Desenganem-se!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Esses, os que precisam de nós, não são certamente os que

defendem as violações contantes, que alguns querem fazer e incitar, do Estado de direito democrático.

Os que defendem esses caminhos fazem-no por duas razões diferentes: uns, por afirmação ideológica — é

o Portugal advindo da anarquia que quiseram sempre construir; outros, porque nunca aceitam a ideia de que

foi um partido de esquerda que levou o País às portas da bancarrota e que pediu ajuda externa e que é este

Governo que vai libertar o País da dependência externa e que está a empreender as mudanças estruturais

que há muito se reclamavam.

Mas, Sr.as

e Srs. Deputados, não confundamos. Não estamos aqui a falar dos pensionistas que, no

exercício de um direito pleno, se manifestam; também não estamos a falar dos professores que fazem greve

legitimamente, nem dos sindicalistas ou de outros parceiros sociais que puxam por Portugal, estamos a falar

dos de sempre: dos que às sextas violam a lei nas galerias da Assembleia da República e que nos restantes

dias da semana se dizem representantes sindicais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Estamos a falar dos mesmos que vão para as portas dos ministérios como se se tratassem de cidadãos

anónimos e que depois, nos congressos partidários, de punho no ar, gritam pela revolução.

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O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não, Sr.ª Presidente, não é este Portugal que vimos a construir e não

é este Portugal que queremos construir.

Queremos todos um País mais justo, mais igual e mais solidário; não queremos um País em que a

democracia só existe quando faz a vontade à minoria, não queremos um País feito à medida de alguns. Os

portugueses não querem um País sem ordem; querem um País na ordem.

Sr.as

e Srs. Deputados, estamos a seis meses de terminar o nosso programa de assistência, tendo

ultrapassado já com sucesso nove avaliações da troica. Saímos da recessão técnica com dois trimestres de

crescimento consecutivos; o desemprego tem vindo a descer em cadeia e em termos homólogos e há criação

de emprego — mais de 100 000 portugueses encontraram trabalho nos últimos dois trimestres; as exportações

continuam a ser determinantes; a execução orçamental indicia o controlo das finanças públicas e o

cumprimento das metas do défice; e, ainda ontem, Portugal viu as taxas de juro da dívida pública descerem,

depois de uma operação de mercado classificada por todos, cá e lá fora, como um sucesso.

Por isso, Sr.as

e Srs. Deputados, não sejam aqueles que toda a vida viveram na sombra do privilégio ou na

esfera de influência a deitar tudo por terra.

Faço aqui um apelo, um apelo consciente aos partidos moderados da construção de Portugal e da Europa

para que todos juntos, em defesa do Estado direito democrático, ajudemos a construir um Portugal melhor. É

este o consenso que Portugal clama, é para este consenso que estamos todos convocados! De que estamos à

espera?!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa regista um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Hélder

Amaral, do CDS-PP, a quem dou, desde já, a palavra.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Deputado Hugo Soares,

queria dar-lhe os parabéns pela intervenção que acabou de fazer, porque é exatamente nestes momentos —

não exatamente no momento que se seguirá — …

O Sr. João Oliveira (PCP): — É uma pequena cimeira de articulação entre os partidos e o Governo!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … em que há alguns aspetos positivos, alguns sinais ainda ténues mas

positivos da economia portuguesa que é curioso ver que toda a oposição procura fazer com que passem

despercebidos.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Pesa-lhes na consciência!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É evidente que se há momentos em que a responsabilidade, o sentido

patriótico e o sentido de Estado se exigem àqueles que têm mais responsabilidades, este é exatamente um

desses momentos. É nos momentos de dificuldade que se sabe quem é que tem ou não estaleca para

governar.

O Sr. António Filipe (PCP): — Estaleca?!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Além disso, é curioso que o partido que foi responsável pela situação

em que o País se encontra seja aquele que se demite das suas responsabilidades, que se demite até da

responsabilidade de ser oposição. É a falta desse partido e dessa oposição que permite alguns exageros,

porventura alguns excessos de linguagem, que não quero valorizar porque acho que não é isso que é

relevante, que não é isso que nos deve preocupar.

Porém, devemos registar, especialmente no que respeita àqueles que têm e tiveram responsabilidades,

não só as coisas boas que fizeram mas também os erros que cometeram e que agora se demitem de assumir.

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O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Bem como devemos registar o comportamento daqueles políticos que,

estando ainda no ativo, confundem normalmente o plano e o cenário onde devem estar. Como o Sr. Deputado

disse, e bem, umas vezes atuam como manifestantes radicais, outras vezes como democratas moderados.

Portanto, essa capa tem que cair de uma vez por todas…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Essa é a sua veia de estivador inflamado!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … e temos que saber com quem podemos ou não contar, porque o

momento que atravessamos tem custos, tem sacrifícios.

Às vezes, na prática, esquecem-se, como ainda há pouco assistimos aqui no que toca à Câmara Municipal

do Seixal. Seria bom saber se o IMI e a derrama no Seixal baixaram ou aumentaram para sabermos quem

paga e como essas coisas têm custos!… Ou seja, há alguns partidos que procuram esconder o óbvio e alterar

a perceção da realidade.

Sr. Deputado Hugo Soares, quando verificamos que o clima de confiança melhora; que a produção

industrial melhora; que as exportações melhoram; que o desemprego, finalmente, com alguma consistência

vem baixando, ainda que de forma ténue; que a nossa economia começa a dar sinais positivos; que estamos

pertíssimo de acabar o Memorando de Entendimento para voltarmos a ter na nossa mão o nosso destino…

O Sr. António Filipe (PCP): — Quero ver como é que se responde a este pedido de esclarecimento!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … e aí, sim, termos a capacidade de ponto a ponto, de setor a setor,

fazer aquilo que queremos fazer, quer o Partido Socialista, quer o bloco de partidos mais à esquerda — e é

confrangedor assistir a isso — limitam-se a dar voz aos radicais, a dar voz àqueles que procuram parar o País,

a dar voz àqueles que procuram puxar para baixo os sinais positivos.

O Sr. António Filipe (PCP): — Não tem nada para dizer?! Diga qualquer coisa!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Não tenho tanta esperança como aquela que o Sr. Deputado aqui

transmitiu quando disse que este é o momento do consenso. Acho que o consenso é importante, que é

importante saber se o PS quer ou não «vir a jogo» e o silêncio que o PS hoje, aqui, mostra é o sinal evidente

de que este PS, como eu dizia há dias, «não é mata de onde saia lobo».

O Sr. Marcos Perestrello (PS): — Eu só conheço um PS!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Já não se espera nada desse Partido Socialista, nem mesmo uma

oposição ainda que irrazoável!

Protestos do Deputado do PS Marcos Perestrello.

Ter o Partido Socialista acantonado num piquete de greve ou numa aula magna qualquer é, de facto, o pior

a que podíamos assistir no que respeita à oposição que o País espera.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Deve precisar de mais 10 minutos para ver se diz qualquer coisa!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se tem alguma esperança de que, da

bancada do Partido Socialista, ainda haja algum consenso, mesmo que tenhamos alguma abertura, para fazer

reformas importantes como a do IRC e a da execução do Orçamento. Não tenho essa esperança, mas

gostava que me dissesse se conta com isso.

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Da nossa parte, cá estaremos para fazer aquilo que nos compete: o Partido Socialista estraga, nós temos

que compor; o Partido Socialista cria dívidas, nós temos que pagar; o Partido Socialista passa para o lado do

irrazoável, nós estamos do lado do razoável e do bom senso. No fundo, é isso que é importante saber.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Soares.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, deixe-me começar por

dizer que, no dia em que se evoca a memória de Sá Carneiro, respondendo a um Deputado do CDS, não

podia deixar de evocar também a memória de Adelino Amaro da Costa.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Deputado Hélder Amaral, concordo com aquilo que aqui nos

trouxe.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Pudera!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — De facto, o radicalismo nas posições, uma esquerda que se torna a

maior parte das vezes radical e que se acantona à esquerda mais radical nada traz de bom ao debate político,

mas pior do que nada trazer de bom ao debate político é nada trazer de bom ao País. E quando assistimos a

este silêncio do Partido Socialista, após a declaração que proferi da tribuna, devemos procurar extrapolar se é

um silêncio cúmplice com alguma das informações que citei ou se, como todos nós esperamos, é um silêncio

de concordância com as afirmações que produzi e se é também um silêncio de concordância com o consenso

que todos procuramos.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Numa altura em que o Governo, ainda esta semana, mais uma vez

demonstrou estar aberto a fazer acordos com os parceiros sociais e com os sindicatos, como no caso da

educação, numa altura em que os nossos parceiros sociais reclamam, cada vez mais, concertação social e os

nossos credores oficiais pedem sempre ao País que articule políticas e posições com os parceiros sociais e

com os partidos do arco da governação, quero dizer-lhe, Sr. Deputado Hélder Amaral, que só podemos olhar

para o silêncio do Partido Socialista neste debate, para esta ausência, este desaparecimento em combate

político aqui, hoje, como uma anuência ao consenso.

Ficamos no silêncio das palavras, espero que não seja na falta de ideias. Contamos muito com o Partido

Socialista para ajudar a construir o Portugal que queremos e para nos libertarmos da troica, que chamaram,

nos próximos seis meses.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge

Fão, do Partido Socialista.

O Sr. Jorge Fão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O mar é um espaço de afirmação secular

de Portugal no mundo e a mola impulsionadora da economia nacional.

Temos, hoje, cerca de 1600 km de costa e mais de 1700 km2 de zona económica exclusiva. Por isso,

Portugal continua a ter no mar o seu principal recurso natural, sendo cada vez mais forte a nossa consciência

e sólida a nossa convicção do incalculável potencial de desenvolvimento e geração de riqueza que o mar

constitui.

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A par do transporte de pessoas e mercadorias, da logística, do turismo, da pesca e aquicultura, da energia,

da defesa, da segurança e dos desportos náuticos, a construção e reparação naval pode, deve e tem que ser

considerada uma das principais componentes do cluster do mar e uma área estratégica de aposta da

denominada «economia azul».

Investigar novas soluções para navegar, conceber, projetar, construir, reparar, reconverter e até

desmantelar barcos são áreas de negócio com grande futuro nas próximas décadas.

Ora, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, que este ano comemoram 69 anos de existência e de cujas

docas saíram já mais de 230 novos navios para os mais exigentes armadores dos quatro cantos do mundo,

são o único estaleiro naval existente em Portugal com conhecimento, experiência e capacidade técnica

instalada para construir navios de grande porte de transporte, de vigilância, de defesa, de salvamento, de

lazer, de investigação, de prospeção, etc.

Tal como em outros países da Europa, também em Portugal a indústria naval tem enfrentado dificuldades

de competitividade e sustentabilidade financeira, fruto de uma conjuntura económica internacional

desfavorável e de uma forte concorrência dos estaleiros asiáticos.

Os Estaleiros Navais de Viana do Castelo não são exceção e, por isso, têm também sido fortemente

afetados por estes problemas.

A evidência dessa crise e a necessidade da urgente modernização da estrutura organizacional e dos

métodos de funcionamento dos Estaleiros foram as razões que levaram à realização, em 2010, de estudo e

apresentação de propostas para o futuro daquela empresa.

Encerramento, refundação e recuperação dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo — foram estes os três

cenários apresentados. O anterior Governo, da responsabilidade do Partido Socialista, rejeitou os dois

primeiros (repito, rejeitou os dois primeiros) e optou pelo cenário da recuperação, mandando elaborar um

plano de recuperação e viabilização.

Depois de tomar posse, em junho de 2011, o atual Governo do PSD e do CDS-PP, através do Ministro da

Defesa Aguiar Branco, decidiu abandonar o caminho da viabilização e da modernização daquele Estaleiro e

apostou em não recuperar a empresa, optando por se desfazer daquela unidade industrial.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Estamos em dezembro de 2013, passaram dois anos e meio sobre

esta incompetente e desastrosa decisão deste Governo. Foram meses e meses de indefinições, trapalhadas,

erros, ziguezagues e falhanços.

Este Governo parou a atividade produtiva da empresa, desmantelou o seu funcionamento, afundou a sua

imagem e credibilidade.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Mentira!

O Sr. Jorge Fão (PS): — Foram dois anos e meio de gestão incompetente e negros para a história dos

Estaleiros Navais de Viana do Castelo: não iniciou a construção dos navios asfalteiros para a Venezuela; não

firmou nenhuma encomenda para construção de novos navios; não foi dado nenhum passo no sentido de

reestruturar e modernizar a empresa; denunciou unilateralmente o contrato de construção de navios para a

Marinha Portuguesa; não encontrou nenhuma solução para o problema do ferry Atlântida; por fim, não lutou

até ao limite, como era sua competência e obrigação, junto da Comissão Europeia para encontrar solução

para o problema das ajudas de Estado consideradas irregulares.

Em consequência do rotundo falhanço desta estratégia, em abril deste ano, com uma lamentável resolução

do Conselho de Ministros, foi abandonado e encerrado, de forma atabalhoada, o processo de reprivatização

que, entretanto, tinha sido iniciado.

Insistindo em ver-se livre, a qualquer preço, dos únicos estaleiros de construção naval portugueses,

desprezando mais de 600 trabalhadores, o seu conhecimento e experiência, sem qualquer garantia de

continuidade da construção e reparação naval, este Governo fez uma nova investida contra esta empresa

pública e escolheu subconcessionar, sem ónus nem encargos, terrenos, instalações e equipamentos, a troco

de míseros 40 000 €, repito, a troco de míseros 40 000 € de renda por mês, ao único concorrente que se

interessou por este negócio.

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Há poucos dias, o Governo, pela voz do Ministro Aguiar Branco, com total insensibilidade, decidiu que

serão extintos os Estaleiros Navais de Viana do Castelo e, esbanjando 30 milhões de euros, despedidos, de

forma imediata e injusta, a totalidade dos seus 600 trabalhadores.

Resultado catastrófico, incompetente e prejudicial para a opção estratégica de fazer do mar um lugar de

futuro para Portugal.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A extinção, decidida por este Governo, dos Estaleiros Navais de

Viana do Castelo constitui uma afronta à história, à cultura e à identidade do País e, em particular, da região

do Alto Minho.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Tenha vergonha! Se tivesse vergonha, não falava disso!

O Sr. Jorge Fão (PS): — Constitui um rude golpe na Estratégia Nacional para o Mar e no futuro da

denomina «economia azul». Constitui, Sr.as

e Srs. Deputados, um revés na justificação para o alargamento da

nossa plataforma continental.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Ainda estamos a tempo de corrigir este erro. O PS considera que é

necessário evitar esta grave decisão de empobrecimento e atentado contra o interesse nacional e contra a

estratégia de afirmação de Portugal no mar.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa regista cinco inscrições para pedidos de esclarecimento ao

Sr. Deputado Jorge Fão, a saber, de Os Verdes, do PSD, do Bloco de Esquerda, do PCP e do CDS-PP.

Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Fão, queria começar por

saudá-lo por trazer este assunto à discussão, porque, de facto, a gestão do processo dos Estaleiros Navais de

Viana do Castelo é o exemplo claro da forma como este Governo encara o interesse público — o interesse

público esteve completamente ausente neste processo.

Mas o caso dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo também nos mostra o empenho deste Governo em

promover a nossa economia e em combater o desemprego: são mais de 600 trabalhadores que o Governo vai

enviar diretamente para o desemprego. É uma prenda de Natal que o Governo quer dar às 600 famílias

envolvidas e também à região de Viana do Castelo… É que, sejamos claros, não há qualquer compromisso

por parte da empresa que ficou com a subconcessão quanto a uma eventual reintegração dos trabalhadores

dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo que o Governo quer despedir.

Mas há ainda neste processo um elemento que ganha contornos, no mínimo, duvidosos e

incompreensíveis: o Governo diz que não tem dinheiro para que os Estaleiros possam comprar a matéria-

prima, nomeadamente o aço, para dar resposta às encomendas feitas, sobretudo à encomenda dos dois

navios asfalteiros feita pela Venezuela, mas para despedir 600 trabalhadores o Governo já tem dinheiro!

Quer dizer, para produzir não há dinheiro, mas para despedir o dinheiro aparece sempre!… E despedir os

trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo não custa apenas 30 milhões de euros, é preciso

contabilizar também os custos com o pagamento do subsídio de desemprego a 620 pessoas. Portanto, feitas

as contas, é preciso somar a esses 30 milhões de euros mais 8,5 milhões de euros referentes aos subsídios

de desemprego. Mas é preciso também ter em conta que esses trabalhadores deixam de contribuir para a

segurança social e ter presente que o Estado ainda perde terrenos, equipamentos, infraestruturas e até fundos

comunitários para os privados. São só bons negócios para o Estado!?…

Sr. Deputado, o Governo diz que se trata de uma imposição da Comissão Europeia, mas parece que não é

bem assim, parece que a Comissão Europeia não decidiu nada sobre esta matéria.

Gostaria de saber se o Sr. Deputado tem algum conhecimento formal de alguma decisão da Comissão

Europeia que obrigue ao despedimento dos mais de 600 trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do

Castelo.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Muito obrigada, Sr. Deputado, por ter respeitado o tempo.

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Srs. Deputados, a Mesa faz um apelo para que, tendo em conta o adiantado da hora, sejam respeitados os

tempos.

Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim para formular o seu pedido de esclarecimento.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Fão, hoje de manhã, na

Comissão de Defesa Nacional, o Sr. Ministro da Defesa Nacional fez um apelo para que neste debate existisse

algum pudor. Pelos vistos, a falta de memória ou, melhor dizendo, a memória seletiva que V. Ex.ª manifestou

na sua intervenção acabou por tornar inútil, pelo menos para já, este apelo do Sr. Ministro da Defesa.

Deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que há algo que me espanta, não apenas nesta sua intervenção mas em

muitas outras que, infelizmente, temos ouvido nestes últimos tempos.

A responsabilidade sobre a situação dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo tem de ser partilhada por

todos, nomeadamente por aqueles que tiveram responsabilidades governativas nos últimos anos e por

aqueles que nomearam administrações, muitas das quais tomaram decisões absolutamente ruinosas, que não

tiveram em conta os destinos daquela unidade empresarial e muito menos o destino dos trabalhadores que lá

estão.

Ora, aquilo que é curioso, e me causa uma enorme perplexidade, é não ouvirmos, nem da parte do Sr.

Deputado nem da parte do partido que representa, a mínima assunção de responsabilidades, de culpas,

quando sabemos que a responsabilidade, a quota-parte de responsabilidade, do Partido Socialista e das

administrações por ele nomeadas é enorme, é fundamental.

Nós, no PSD, estamos dispostos a esclarecer tudo aquilo que tenha de ser esclarecido, seja na Comissão

de Defesa Nacional ou em qualquer outro lugar, neste Parlamento. Estamos dispostos a esclarecer e estamos

dispostos a assumir as nossas responsabilidades. Seria bom que o Partido Socialista, e o Sr. Deputado em

particular, também o fizesse uma vez que fosse, ainda que essa manifestação fosse também peregrina.

Falou o Sr. Deputado num plano de reestruturação. Desculpe lá, não conheço!… Aquilo que vi quando

cheguei aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo foi uma empresa moribunda, uma empresa governada por

um conselho de administração com vontade de «morrer», que dizia, a quem queria ouvir, que aquela empresa

já devia ter fechado há muito tempo, que denegria os trabalhadores que lá estavam. A comissão de

trabalhadores da altura sabe bem que isto é verdade!…

Aquilo que sabemos é que se trata de uma empresa que dava prejuízo constante. As encomendas feitas

aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo foram de empresas financeiramente ruinosas. Neste momento, os

Estaleiros Navais de Viana do Castelo custam ao erário público, custam ao contribuinte, 110 000 € por dia.

Este Governo, desde que tomou posse, depois de acabar com essa farsa que foi o plano de reestruturação,

que era o plano de afundamento final dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, tentou todas as soluções

para que a atividade de construção naval permanecesse em Viana do Castelo e para que os direitos dos seus

trabalhadores fossem assegurados.

Vozes do PCP: — Nota-se!…

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — E isso, Sr. Deputado, posso garantir-lhe que está assegurado e

que vamos conseguir.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — O que conseguiram foi destruir!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado, peço-lhe que termine.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Termino, Sr.ª Presidente, apelando ao Partido Socialista para que

se responsabilize pelo desastre do navio Atlântida, da responsabilidade do Governo nacional de então, do

Governo dos Açores do Partido Socialista.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, queira concluir.

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O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Que assuma, valha-me Deus, alguma responsabilidade, da muita

que os senhores têm nesta matéria. Seria bom para todos nós, seria bom para o País, seria bom para a

política nacional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Fão.

O Sr. Jorge Fão (PS): — Sr.ª Presidente, agradeço aos dois Srs. Deputados que intervieram.

Começaria por responder e tecer algumas considerações em relação à intervenção do Deputado Carlos

Abreu Amorim. O Sr. Deputado, como toda a sua bancada, de uma forma geral, e, de alguma maneira, o Sr.

Ministro continuam a insistir em inverdades, diria mesmo, de uma forma clara, em mentiras.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Tenha vergonha!

O Sr. Jorge Fão (PS): — O senhor sabe perfeitamente que, quando este Governo, em 2011, chegou ao

exercício das funções e à responsabilidade da gestão deste dossier, havia para os Estaleiros Navais de Viana

do Castelo um plano de recuperação e revitalização apresentado, plano esse que, ainda hoje, de manhã,

criticaram de uma forma mordaz…

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Todos os trabalhadores iam para a rua! Diga isso!

O Sr. Jorge Fão (PS): — … por ter sido apresentado, inclusive, já depois do início da atividade deste

Governo.

Em relação aos Estaleiros Navais, a diferença que marca a atitude do PS da atitude do PSD esta: enquanto

o PS, perante as dificuldades que eram e são conhecidas e assumidas da construção naval nacional e

internacional e dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, enquanto foi Governo, o que fez foi tentar arranjar

encomendas, mandar elaborar um plano de recuperação que, como há pouco disse na tribuna, não decidindo

pelo encerramento da empresa, nem pela refundação, mas tentando manter em atividade aquela organização,

os senhores, quando chegaram ao Governo, disseram: «Aquilo não serve, nós temos muito boa solução para

os Estaleiros Navais de Viana do Castelo».

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Aquilo era um atentado aos trabalhadores!

O Sr. Jorge Fão (PS): — Sr. Deputado Luís Menezes, que sempre fala muito alto quando esta matéria é

discutida,…

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Pois falo!

O Sr. Jorge Fão (PS): — … mas que nunca vem a jogo neste debate, quero dizer-lhe o seguinte: dois anos

e meio depois, os senhores o que apresentaram (e aqui está a diferença) para os Estaleiros Navais de Viana

do Castelo foi o encerramento desta empresa e o despedimento de 600 trabalhadores.

Esta é que é a verdade dos factos e aquilo que nos diferencia nesta matéria.

Aplausos do PS.

O Sr. José Junqueiro (PS): — E com um custo!

O Sr. Jorge Fão (PS): — E, como o senhor sabe e bem, com um custo, como aqui me recomendam,

apontado, no imediato, de 30 milhões de euros para despedir trabalhadores, para criar desemprego. E o

resto? Mais de 150, 200 milhões de euros para acabarem, porventura, o procedimento de encerramento

daquela organização.

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Portanto, vejam, isto é delapidar o erário público e é, naturalmente, combater o interesse da economia

nacional com esta decisão.

A segunda situação de perfeita mentira é a razão de ser do processo de privatização, ou seja, do suporte

para a decisão obsessiva deste Governo relativamente a esta solução: desfazer-se da organização. Esta

questão é importante que se esclareça.

O Sr. Ministro, durante muito tempo (estamos a falar de dois anos e meio de gestão do Governo), disse que

tinha de privatizar, porque era a única forma de resolver o problema por causa da devolução dos 180 milhões

de euros. Disse isto durante uma quantidade de tempo a fio.

O Sr. Deputado recorda-se, hoje, do que o Sr. Ministro disse sobre essa matéria? Só depois de apresentar,

em Bruxelas, o processo de privatização é que percebeu que Bruxelas exigia a devolução dos 180 milhões de

euros. Aqui está o contrassenso completo, a contradição total do que aconteceu.

Os senhores têm, de uma vez por todas, de ser francos e sinceros. Assumir um erro, assumir um falhanço

é uma virtude, e os senhores assumam que, efetivamente, têm conduzido este processo de uma péssima

maneira e que aquilo que têm dito não corresponde à verdade.

O procedimento contra Portugal não está encerrado, tal como não está o procedimento da União Europeia

contra Espanha, nem contra França, nem contra os estaleiros holandeses, nem contra os estaleiros polacos.

Portanto, mais uma vez, afirmamos aqui claramente: se fosse esse o objetivo do Governo do PSD e do

CDS-PP, o de salvar aquela organização, garantir a quantidade da construção naval em Portugal, defender

efetivamente uma aposta estratégica no interesse do mar e da construção naval, os senhores tinham

procurado — e ainda hoje perguntei ao Sr. Ministro e ele não respondeu — se alguma vez, no exercício do

vosso mandato, equacionaram, sequer, uma vez a hipótese de estudar a recuperação e a viabilização daquela

empresa. Não estudaram, decidiram privatizá-la, decidiram desfazer-se dela. Como não conseguiram, porque

dizem que foi por causa da União Europeia… Já agora, deixe-me dizer que, pelo menos que eu tenha

conhecimento, cerca de 300 000 € — repito, cerca de 300 000 € — foram gastos em assessorias financeiras

para preparar o processo de privatização, com gabinetes de consultadoria externa…

Sr. Deputado, diga-me uma coisa, o senhor, que até é advogado, não lhe passaria pela cabeça…

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Não sou, não!

O Sr. Jorge Fão (PS): — Se não é, dá-lhe um jeito de vez em quando!…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Se não é, devia ser!

O Sr. Jorge Fão (PS): — Sr. Deputado, será que não passou pela cabeça dos juristas do gabinete de

consultadoria contratados para preparar o processo de privatização consultar previamente a Comissão

Europeia, a Direção-Geral da Concorrência para saber se, iniciando este processo, iriam ou não levantar

problemas a posteriori?! Isto era o básico, o mínimo. Eu, que não sou jurista, começaria por aí.

Os senhores falharam rotundamente. Assumam este erro. O que têm em cima da mesa para apresentar é

catastrófico para o País!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Fão, trouxe-nos uma temática

importante — aliás, o tema do dia.

Sr. Deputado, se me permite, queria tecer um comentário: sempre que falamos em Estaleiros Navais de

Viana do Castelo, assistimos a um espetáculo lamentável entre o passado e o presente, entre passa culpas de

quem foi pior para os Estaleiros.

Sr. Deputado, quero dizer-lhe que não há um bom passado pela parte do Partido Socialista, sabe isso

perfeitamente. Mas é reconhecido que o que se prevê para o futuro, por parte do PSD, ainda é pior. Ou seja,

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entre a situação de estaleiros moribundos, que a direita acusa, e a morte declarada creio que ninguém escapa

à política deste Governo.

Mas, Sr. Deputado, julgo que teremos, com certeza, oportunidade de aferir todas as responsabilidades

neste processo, todas as responsabilidades das várias gestões, absolutamente danosas, neste processo.

Aqui chegados, vem o Governo dizer que tem todas as condições para liquidar aquela empresa — é isso

que o Ministro Aguiar Branco anuncia, mesmo antes da decisão de Bruxelas. No ano passado, logo no início

do seu mandato, em outubro de 2011, o Sr. Ministro da Defesa já dizia que os Estaleiros tinham de ser

reprivatizados, tinham de ser liquidados. É este o termo que sempre utiliza: liquidar a empresa.

Nós não podemos estar de acordo com esta situação e entendemos que salvar uma empresa tão

importante para a economia nacional e para a região, uma empresa reconhecida internacionalmente, só pode

ter um plano, que não é o plano a, do Partido Socialista, nem o plano b, do PSD e do CDS. É o plano de

manter aquela empresa na esfera do Estado, porque só assim é possível torná-la competitiva. O Estado tem

de ter a capacidade de gerir aquela empresa com uma gestão claríssima e não pode vir hoje o Governo

anunciar o maior despedimento coletivo (que já fez) de uma empresa em que todo o capital social é do Estado.

Vamos assistir a um despedimento coletivo, vamos assistir a uma falência de contornos fraudulentos. O

Estado está a comportar-se como o pior dos patrões que encerram empresas para, no seu lugar, abrirem

outras, mudando apenas o nome, com outros trabalhadores, por sinal contratados a preço mais barato. É este

o plano claríssimo do Governo!

Por isso mesmo é que nós afirmamos que esta é uma falência fraudulenta, com bastantes encargos para o

País, com imensos encargos para o País.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Vá fazer queixa ao Ministério Público!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — E não são apenas os 618 trabalhadores que são despedidos, é a

delapidação dos recursos nacionais, do erário público; é a delapidação dos recursos da segurança social.

Numa altura em que se quer aumentar a idade de reforma, numa altura em que se cortam subsídios de

desemprego, vão direitinhos para o desemprego 618 trabalhadores para, depois, entrarem numa situação de

pré-reforma.

Mais: o Estado, como o pior dos patrões, até lá coloca dentro,…

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — 618 trabalhadores!

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — … funcionando como fator de pressão, pessoas do Instituto do Emprego e

da Segurança Social. Isto é que é lamentável, isto é que é vergonhoso!

O Estado, enquanto pessoa de bem, devia defender os seus recursos, a sua região e o seu País.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla

Cruz.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Presidente, queria começar por felicitar o Deputado Jorge Fão por ter

trazido este tema, efetivamente, de maior interesse para Portugal e para a região do Minho.

Na intervenção, o Sr. Deputado revela bem o conhecimento do encerramento dos Estaleiros Navais de

Viana do Castelo, bem como o despedimento de todos os trabalhadores, e desmente categoricamente — é

isto que vai acontecer — o que o Governo e o Ministro da Defesa Nacional sempre disseram, ou seja, que

tudo iam fazer para preservar os Estaleiros Navais de Viana do Castelo.

Ora aí está! A preservação do património dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo é o seu encerramento,

é o despedimento de todos os trabalhadores. É isto que este Governo tem para apresentar.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Que vergonha!

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A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Este exemplo dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo é um exemplo claro,

concreto, de facto, do que tem sido a política deste Governo: uma política que abdica dos interesses

nacionais, uma política que não está a favor do País, do povo e dos trabalhadores, mas uma política que está

a favor dos grandes grupos económicos, do grande capital. É um escândalo o que se está a passar em Viana

do Castelo e no País.

Sr. Deputado Jorge Fão, gostaria ainda de dizer que o Partido Socialista não está isento de

responsabilidades.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Ah!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Tanto o atual como os anteriores governos, tanto as atuais como as anteriores

administrações têm responsabilidades no que está a acontecer nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.

Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, referiu que os Estaleiros estavam moribundos, mas esqueceu-se de

dizer as causas, esqueceu-se de dizer por que é que eles estavam moribundos e por que é que, ao longo dos

últimos dois anos, ficaram moribundos. Ficaram moribundos pelas opções políticas deste Governo,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — … pelas opções, claras, de paralisação do trabalho dos Estaleiros Navais de

Viana do Castelo,…

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — … porque os trabalhadores estiveram lá a reclamar o trabalho e a defender a

empresa. O que fez o Governo? Nada! Deu orientações para nada se fazer. Repare, Sr. Deputado, que,

relativamente ao contrato dos asfalteiros, nada se fez, foi isto que aconteceu. Havia um contrato para se fazer,

mas está parado, pois os navios não foram construídos e, portanto, é importante que aqui fique claro que, se

estavam moribundos, a razão foram as opções políticas.

Gostaria de colocar ao Deputado Jorge Fão a seguinte questão: está o Partido Socialista, hoje, em

condições de dizer que está e vai continuar a estar empenhado em desenvolver e apoiar medidas concretas

que evitem o despedimento de todos os trabalhadores e o encerramento dos Estaleiros Navais de Viana do

Castelo?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Abel

Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Deputado Jorge Fão, traz

aqui uma questão muito pertinente, mas não contou toda a narrativa que já houve. Começava, exatamente,

por lhe fazer uma pergunta inicial e depois tecerei algumas considerações.

Primeira questão: o Sr. Deputado concorda com a privatização dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo

ou não?

Segunda questão: concorda ou não que seja o modelo das OGMA?

Depois, Sr. Deputado, como terceira questão quero perguntar-lhe se se lembra, de 2008 a 2011, qual era o

Governo que estava em funções…

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Já esqueceu!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — … e qual foi o Governo que, nessa altura, conseguiu passar um volume

de negócios de 129 milhões de euros, em 2008, para 55 milhões de euros, em 2009, para 20 milhões de

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euros, em 2010, e para 15 milhões de euros, em 2011. Ou seja, de ano para ano, reduzia em mais de 50% o

volume de negócios daquela empresa.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É preciso talento

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Quem é que estava no Governo, Sr. Deputado? Lembra-se?

Sr. Deputado Jorge Fão, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, empresa pública, são uma empresa

que tem, no total, entre empresa privada e empresa nacionalizada, cerca de 70 anos, ou muito próximo disso.

Desde, pelo menos, 2000 (e não vou referir dados anteriores), esta empresa acumula prejuízos, que atingiram,

no ano em que menos prejuízos deu, os 2 milhões de euros e, no ano em que mais prejuízos deu, em 2010,

os 41 milhões de euros.

Em 2000, o Governo de centro-direita (coligação PSD/CDS) procurou soluções para aquela empresa. E

esta foi a solução agora encontrada para a construção naval se manter em Viana do Castelo.

Por outro lado, quero corrigir uma afirmação do Sr. Deputado. É que sempre foi dito por parte do Governo

— incluindo o Sr. Ministro da tutela — que tudo faria para manter a construção naval em Viana do Castelo, que

é aquilo que está a ser feito, neste momento.

E, já agora, Sr. Deputado, agradecia que o senhor dissesse pelo menos uma palavra sobre qual é a

posição do Partido Socialista para a empresa que ganhou a subconcessão. É que se, ao contrário do apelo

que o senhor fez agora, de parar o processo de subconcessão, ele não for parado, qual é a palavra que o

senhor tem para uma empresa que vai iniciar atividade, contratar trabalhadores, procurar encomendas e

manter a construção naval em Viana do Castelo, distrito pelo qual tanto o Sr. Deputado como eu fomos

eleitos? Qual é a palavra que o senhor tem para a empresa que está a preparar todo este processo? É que, ao

contrário do que se anda a dizer, o anúncio da contratação de 400 trabalhadores para aquela empresa não foi

feito num discurso ao acaso ou numa entrevista inflamada, foi uma comunicação feita pela própria empresa

para a CMVM, onde a empresa está cotada, onde a empresa está internacionalizada e onde a empresa tem

experiência. E esta questão de as empresas privadas não serem capazes de gerir bem, ou de não serem

capazes de ter bom emprego, é uma questão que me deixa muitas dúvidas, porque há muitas empresas que,

depois de terem sido privatizadas,…

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — … passaram a ter bom trabalho, bons salários,…

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — … boa proteção para os seus trabalhadores e com uma condição que,

neste momento, não acontece nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, que é dar lucro. E, dando lucro,

pagando impostos ao Estado, em vez de absorver verbas do Estado, porque só entre 2006 e 2011 — e vou

terminar, Sr.ª Presidente —, o Estado teve de gastar, em média, mais de 35 milhões de euros por ano para

manter a empresa em funcionamento.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Fão.

O Sr. Jorge Fão (PS): — Sr.ª Presidente, agradeço as perguntas e as considerações dos Srs. Deputados

Mariana Aiveca, Carla Cruz e Abel Baptista. Mas permitam-me, antes de responder às questões e comentar

algumas das considerações que teceram, referir-me à questão colocada pelo Sr. Deputado José Luís Ferreira

— a quem peço desculpa por não o ter feito há pouco — sobre as ajudas, consideradas ilegais pela Comissão

Europeia, aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.

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Referi a matéria e disse claramente que não tínhamos conhecimento de que efetivamente houvesse

procedimento encerrado e decisão definitiva da Comissão Europeia no sentido de obrigar Portugal, como

qualquer outro país onde há procedimento encerrado, a devolver seja que dinheiro for.

Mas, por outro lado, permita-me, a propósito da sua questão, recordar um aspeto e clarificar uma situação

que tem vindo recorrentemente a ser afirmada, mais uma vez, com falsidade.

Neste processo, o Sr. Ministro começou por dizer que o problema se referia às ajudas ilegais de Estado

atribuídas aos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, entre 2006 e 2011. Recordam-se, Srs. Deputados do

PSD? Esta foi a primeira narrativa: ajudas ilegais de Estado atribuídas aos Estaleiros Navais de Viana do

Castelo, entre 2006 e 2011.

Insistimos que assim não era e combatemos essa afirmação, dizendo que o horizonte era mais alargado.

Ora, quando, em abril de 2013, foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia o procedimento aberto a

Portugal exatamente sobre esta matéria — o texto descritivo e justificativo desse procedimento e os quadros

que sustentavam estas questões —, pasme-se o que sobre ajudas de Estado consideradas irregulares aí

consta, no Quadro I, de que já hoje falámos! O que se diz, no Quadro I, Srs. Deputados Carlos Abreu Amorim

e José Luís Ferreira, é que, desses 180 milhões de euros, 101 milhões de euros dizem respeito ao período

correspondente ao ano de 2012 e foram atribuídos à Empordef, tendo sido ainda hoje confirmado pelo Sr.

Ministro de que se trata de necessidades de conversão e de aval de empréstimos e de manutenção da

atividade dos Estaleiros Navais. Esta é que é a realidade.

Mas não criticamos isto. Se o Governo teve capacidade para financiar, durante o ano de 2012, os

Estaleiros Navais de Viana do Castelo, ainda bem que o fez. Pena é ter desistido desse percurso e de

recuperar esta empresa.

Que fique, então, claro, de uma vez por todas, esta questão, de como é que foram distribuídos, ao longo

dos anos, estes 181 milhões de euros!

Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, registo e agradeço a sua intervenção, mas não posso estar minimamente

de acordo com a sua afirmação, aliás, recorrente, de que isto é um passa culpas do PS para o PSD, de que as

culpas são do PSD e do PS.

Afirmei várias vezes, em vários fóruns e em vários momentos, que o Partido Socialista assume as suas

responsabilidades, de menos sucesso e de alguns falhanços, na gestão daqueles Estaleiros, no período em

que foi Governo, entre 2005 e 2011 — naturalmente, assumimo-las.

Mas, há pouco, também referi — e a senhora sabe — que o contexto da conjuntura económica

internacional, o problema da própria crise da construção naval, a competitividade e a ferocidade da

concorrência dos estaleiros asiáticos, para além de alguns problemas de gestão e de outros problemas que há

que aduzir a esta questão, é que constituíram, esses sim, os principais fatores que levaram às dificuldades

sentidas e a alguns erros cometidos.

Agora, o que o PS fez, nestas circunstâncias — e a senhora faça justiça em relação a esta matéria —, foi

procurar encomendas, foi tentar manter os Estaleiros em atividade, foi procurar reformá-los e revitalizá-los.

Esta foi a postura que tivemos, durante o período de 2005 a 2011. Mas essa não foi a postura do PSD. E,

assim como nós assumimos as nossas responsabilidades, é importante que o Partido Social Democrata e o

CDS-PP assumam o desastre da sua decisão. É que isto, sim, é um verdadeiro desastre: encerrar a empresa,

despedir a totalidade dos trabalhadores e concessioná-la a uma organização, da qual não conhece o plano de

negócios, da qual não conhece a verdadeira situação financeira, da qual não conhece as verdadeiras

intenções sobre a contratação de pessoal. É que a contratação de pessoal por parte da nova empresa, esta

dizia, ontem, que iria contratar 400 trabalhadores em três anos, hoje de manhã, seriam 400 trabalhadores

imediatamente e, logo (já foi dito ontem, mas logo confirmar-se-á), serão provavelmente 1000 trabalhadores a

muito curto prazo.

Portanto, isto é uma situação muito baralhada. Mas, Sr.ª Deputada, faça-nos justiça, assumindo nós

responsabilidades naquilo que não correu bem, mas também a determinação e a vontade de lutarmos por

manter aquela empresa em atividade.

Sr.ª Deputada Carla Cruz, concordo plenamente consigo — aliás, as suas intervenções de hoje, de uma

forma geral, não me deixaram qualquer tipo de discordância. Efetivamente, aquilo que frisa, e muito bem, e

critica, de forma insistente, é esta decisão, este final, este resultado perfeitamente inaceitável e incompetente

deste Governo, de encerrar aquela empresa e não fazer esforço rigorosamente nenhum para tentar viabilizá-

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la, refugiando-se, escondendo-se na dita história dos 180 milhões de euros e da Comissão Europeia. Isto é

uma atitude de manifesta subserviência em relação à Comissão Europeia. Mas é também uma atitude de

desinteresse e de falta de empenhamento e de investimento político. É que, ainda hoje de manhã,

confirmámos (e a senhora ouviu) que o Sr. Ministro da Defesa, titular desta pasta, responsável por este

processo e pela decisão de encerrar os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, fala sistematicamente no

Comissário europeu Joaquín Almunia, fala sistematicamente nos 180 milhões de euros e na Comissão

Europeia, mas hoje confirmou que nunca tomou, ele próprio, a iniciativa política de solicitar uma reunião, um

contacto, uma discussão com o Comissário responsável por esta decisão. Isto também demonstra a forma

como, politicamente, este Governo tem lidado com este processo.

Sr. Deputado Abel Baptista — Deputado do CDS-PP, eleito pelo círculo eleitoral de Viana do Castelo —,

sobre esta matéria dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, os seus ziguezagues, as suas piruetas, as suas

entradas e saídas de cena são constantes. O senhor tanto aparece ao ataque como desaparece, tanto

defende os trabalhadores e a continuidade da empresa como já é apologista da privatização e da

subconcessão de terrenos e instalações. Convinha que o senhor se definisse, de uma vez por todas, sobre

esta matéria e dissesse de que lado está. Eu vou dizer-lhe de que lado estou relativamente a esta questão —

aliás, se tem acompanhado o meu percurso no debate desta matéria, percebe de que lado estou.

Agora, até hoje, sinceramente ainda não percebi muito bem qual é a sua opção. O senhor defende ou não

a continuidade daqueles Estaleiros Navais no nosso distrito, com uma matriz de empresa pública,

eventualmente participada, mas em funcionamento e garantindo a atividade da construção naval? Penso que

não.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Fão (PS): — Concluo já, Sr.ª Presidente.

Portanto, da nossa parte, respondo-lhe claramente: eu não tenho de dirigir qualquer palavra à empresa que

supostamente vai fazer o contrato de subconcessão. E não por hostilidade mas porque com quem me

compete falar é com o Ministro, com a administração e com os trabalhadores. E a minha opção não é

privatizar a empresa. A minha e a nossa primeira opção é manter a empresa em funcionamento,

eventualmente com abertura a capital privado, desde que haja parceiros para o efeito. Mas se não houver

parceiros credíveis para este processo e se não derem garantia da continuidade desta atividade,…

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Jorge Fão (PS): — … o que lhe digo claramente é que é obrigação do Governo, é obrigação do

Estado, é sua obrigação, enquanto Deputado eleito pelo círculo eleitoral de Viana do Castelo, estar ao lado da

manutenção da atividade desta empresa no nosso distrito.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma declaração política, em nome do CDS-PP, tem a palavra o

Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O entendimento alcançado

anteontem entre os sindicatos da UGT e o Governo sobre a prova de avaliação de conhecimentos e

capacidades é um entendimento que saudamos e acompanhamos.

A matéria em causa, a existência de uma prova deste tipo, não é novidade noutros países, quer à saída do

ensino superior quer no momento de candidatura para ingresso numa colocação pública.

Aliás, cá também existe, noutros moldes e noutras profissões, como, por exemplo, em Arquitetura e em

Medicina, onde formados em cursos de banda bem mais estreita também têm de prestar provas para exercer

a sua profissão.

No caso português, está prevista no Estatuto da Carreira Docente, desde 2008, e no Programa deste

Governo, desde o seu início, integrada com outras medidas aplicadas no sistema de formação inicial de

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professores, como, por exemplo, a exigência de exame nacional a Português e a Matemática para aceder a

estes cursos.

É uma medida que, julgamos, contribuirá para atuar na qualidade de formação dos nossos professores,

uma área fundamental para o sucesso dos alunos, como ainda ontem a OCDE reiterou e onde reformas do

passado já deram resultados concretos.

Mas tão importante como o objetivo específico desta prova e desta política, queremos salientar ter-se

conseguido um entendimento, mais um, com a UGT, permitindo que o Governo e estes sindicatos

aproximassem as suas posições, dirimissem as suas divergências e chegassem a um ponto mínimo de

consenso. E é nisso que hoje queremos focar-nos.

E não podemos deixar de o dizer: quer na educação quer na área laboral, quer um pouco por todas as

áreas da governação, é bom para o País que tenha sido possível, por vezes, encontrar entendimentos —

neste caso, com a UGT, mas não só, é justo dizê-lo —, o que demonstra uma capacidade, quer desses

sindicatos quer do Governo, em partir para os vários dossiers com espírito de abertura. E consideramos que

esse espírito de abertura é salutar e mesmo vital para obter este tipo de acordos.

Este espírito de abertura, aliás, contrasta quer com a postura de outros governos no passado quer com a

postura de outros sindicatos no presente, que mantêm uma absoluta intransigência no diálogo.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Só convidaram uns!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — É evidente que não ajuda a que possa constituir-se um clima de

concertação que muitas vezes se meçam ao milímetro supostos avanços e recuos nestas negociações. Aliás,

o resultado final de uma negociação não deve e não pode ser entendido como um triunfo de um dos lados

sobre o outro. Por definição, um acordo tem de satisfazer as duas partes, ainda que ambas possam, depois,

no fim, considerar que outra solução teria sido melhor.

Mas também é verdade que quem parte para uma negociação com uma posição irredutível não está a

negociar coisa nenhuma, não ajuda à concertação, não promove o diálogo e o consenso e, em última

instância, não produz resultados.

Por isso, não podemos apoiar essa postura. O que apoiamos, sim — e apoiámos e incentivámos junto do

Governo, nesta e noutras matérias —, é que exista capacidade para consensos, sempre que esses não

ponham em causa a essência das reformas que o Governo precisa de fazer, nesta altura de dificuldade.

Dificuldade, aliás, que dá até mais relevo à existência de acordos, sempre que seja possível.

Sabemos também que nem sempre é possível encontrar um acordo, que, por vezes quem representa os

trabalhadores tem justamente, tendo em conta aqueles que representa, de defender determinadas posições

até ao fim — compreendemos isso. Como também compreendemos que o Governo não possa acompanhar

essas posições quando entende que estão em causa matérias estruturais, algumas delas, aliás, decorrentes

de compromissos internacionais. Mas, repetimos, isso não quer dizer que, à partida, o espírito de abertura não

seja essencial para encontrar um acordo.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Na verdade, o que sucessivos acordos, nesta e noutras áreas, entre o

Governo e alguns sindicatos demonstram e comprovam é que a abertura leva à mudança e à obtenção de

avanços, enquanto a intransigência promove ruturas e não obtém qualquer resultado.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Se o Governo procura a paz social, melhorando as suas propostas

onde é possível, os sindicatos que vão ao diálogo obtêm também melhorias para aqueles que representam. E

o que se verificou esta semana é que foi possível, mais uma vez, com a UGT — neste caso, até a pedido

específico desta —, encontrar um entendimento entre o Governo e uma grande central sindical.

Acreditamos que essa abertura honra ambos os lados e contrasta com a intransigência a que por vezes

assistimos. O que este processo mostra, sobretudo, é que Governo e sindicatos podem bem entender-se,

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mesmo quando parecem partir de posições tão distantes, sempre que o interesse em encontrar uma solução

se sobrepuser à vontade de apenas retirar ganhos políticos dentro de uma negociação.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.as

e Srs. Deputados, a Mesa regista a inscrição de Deputados do

PS do BE, do PSD e do PCP para pedidos de esclarecimento.

Em primeiro lugar, para o efeito, pelo Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado António Cardoso.

O Sr. António Cardoso (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, o acordo anunciado é um

recuo tático do Ministro Nuno Crato perante tanta irresponsabilidade no modelo de recrutamento de docentes

que pretende seguir.

O PS vê neste recuo uma fraqueza confrangedora das políticas educativas deste Governo.

Protestos do Deputado do PSD Pedro Lynce.

Para o PS, tudo o que se faça para melhorar o sistema educativo é bem-vindo, é positivo, especialmente

quando os consensos encontrados tragam paz à escola e tranquilidade aos professores no seu desempenho.

Protestos do Deputado do PSD Pedro Lynce.

O PS quer, naturalmente, questionar esta famigerada prova de admissão à carreira docente.

Vozes do PS: — Muito bem!

Protestos do Deputado do PSD Pedro Lynce.

O Sr. António Cardoso (PS): — Definir cinco ou mais anos de serviço docente como condição de

dispensa da realização do exame de admissão à carreira docente é uma decisão irracional, retrógrada e, como

tal, inaceitável.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António Cardoso (PS): — O PS é a favor de uma rigorosa avaliação do desempenho docente, mas

não pode aceitar que candidatos à profissão docente, possuidores de formação superior adequada, tendo

exercido dois, três, quatro anos de profissão e avaliados sucessivamente com a classificação de «bom»,

sejam postos à prova, através de um exame questionável, onde em duas horas da sua vida é definido, de

forma arrepiante, o futuro a que terão de se sujeitar.

Finalizo, dizendo que o Partido Socialista entende que o modelo de admissão de candidatos à carreira

docente, este tipo de modelo de recrutamento de professores que VV. Ex.as

pretendem para educar os

professores, é uma aberração educacional.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Te agora a palavra, também para pedir esclarecimentos, a Sr.ª

Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, cumprimento-o pela sua

intervenção, se bem que tenha de lhe dizer que tive ainda a expectativa de que nos viesse falar dos resultados

do PISA, recentemente divulgados, ou que nos viesse falar das recomendações que são feitas no relatório

relativamente ao programa de Matemática que este Ministro deitou no lixo, ou que nos viesse falar do fracasso

do cheque-ensino na experiência da Suécia. Mas o Sr. Deputado veio falar-nos desta caricatura de prova para

os professores contratados, que visa, objetivamente, humilhá-los e desvalorizar toda a sua formação

profissional.

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Nesse sentido, o CDS vem dizer «ainda bem que a prova acabou». Mas eu gostaria de perguntar o

seguinte. Afinal, a posição do CDS é a de que a prova é má. Mas, se for só para alguns, já é boa? Já presta?

O Sr. Deputado falou em negociação. Não sei de que negociação exatamente é que está a falar, porque a

verdade é que houve um recuo «assim-assim» do Sr. Ministro da Educação, recuo esse que se deve à luta

dos professores e professoras e à trapalhada que foi surgindo em todo o lado com a implementação da dita

prova, com gente que nem sequer podia ter acesso à mesma, ou que tinha de pagar viagens de avião para

poder realizar a prova, ou que tinha de pagar os ditos 20 €. Ou seja, o Ministério está com falta de dinheiro e

punha esta gente a pagar rapidamente com algum dinheiro.

Portanto, explique-nos o seguinte, Sr. Deputado: para o CDS a prova não presta, mas se for para quem

tem menos de cinco anos de experiência, já presta? Esta posição da parte do CDS é que não faz qualquer

espécie de sentido.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Michael Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Cardoso e Sr.ª Deputada

Cecília Honório, agradeço os vossos comentários e considerações.

Devo dizer-lhes, no entanto, Srs. Deputados, que é circunstancial estar a falar hoje sobre a valorização que

o CDS faz dos entendimentos que se alcançam — neste caso, com a UGT — por ter havido esse sobre a

prova de acesso. De facto, poderia falar-se sobre os que já houve em relação a muitas outras matérias.

A questão que queremos frisar e que acreditamos ser positiva para o País e, nesse sentido também, para o

sistema educativo, como o Sr. Deputado António Cardoso referiu, é a possibilidade de haver sindicatos e

governos que se sentam à volta de uma mesa para dirimir um desentendimento. Neste caso concreto até era

um desentendimento profundo, porque havia posições muito vincadas e já tinha havido a tentativa, não levada

a termo, de conseguir um entendimento de que alguns sindicatos e o Governo podem sentar-se a uma mesa,

dirimir os seus desentendimentos e chegar a uma conclusão, de onde todos saem satisfeitos, porque, caso

contrário, não classificariam essa mesma solução de entendimento.

Portanto, julgamos que é isso que nos deve convocar para perceber se este tipo de diálogo, este tipo de

abertura, é ou não muito mais propício para a qualidade do sistema — neste caso, o educativo, mas podíamos

dizer para as leis laborais e para outras áreas da governação — ou se é o puro e duro choque, em que cada

lado está fechado na sua posição, fechado em copas, não se deixando movimentar, não se obtendo com isso

grandes resultados. Seja o Governo, porque mantém uma agitação que não é promotora da estabilidade,

neste caso da qualidade dentro das salas de aula, mas poderíamos dizer também dentro das repartições

públicas ou até dentro das empresas privadas; seja, por outro lado, os sindicatos, que justamente defendem a

sua posição mas que, se não conseguirem o acordo, também não a levam a lado nenhum.

É verdade que ouvimos muitas vezes algumas forças parlamentares — até desprezando o Parlamento,

francamente! — dizer que é na luta e na rua que se resolvem os problemas. Ora, aqui vemos que não. Vemos

que é exatamente sentando as pessoas com uma atitude de sensatez e bom senso de volta de um problema

que o mesmo é resolvido.

Os senhores podem dizer que é um recuo, que é marcha atrás. Mas podem chamar-lhe outra coisa, dizer

que é um avanço, porque o que aconteceu no final foi que houve duas partes que disseram «sim, senhor, nós

concordamos com estas condições mínimas».

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Houve um acordo!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Isso é que é importante.

Foi, pois, isso que quisemos frisar, até porque amanhã a questão concreta da prova estará em debate.

A Sr.ª Deputada Cecília Honório referiu também a questão do PISA, que tenho a certeza que teremos

oportunidade de debater.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É já a seguir!

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O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Chamo a atenção para o que a própria OCDE diz relativamente à

importância de haver qualidade na formação dos professores, que é, como toda a gente que discute isto sabe,

uma das áreas fundamentais para o sucesso dos alunos, como são as formações que já existem nas famílias,

nomeadamente com os pais, que têm muita influência na qualidade do sucesso escolar dos filhos.

Falou ainda na questão do insucesso do cheque-ensino na Suécia.

Sr.ª Deputada, as freeschools na Suécia, infelizmente, representam um número muito pouco significativo

no sistema. Por isso, ao estar a atribuir a esse sistema um decréscimo muito acentuado poderíamos contrapor

os casos do Chile e da Holanda, onde, com sistemas muito mais liberalizados da educação, estão a subir há

anos. Portanto, Sr.ª Deputada, julgo que isolar um fator da política educativa é um mau sinal. Mas, claro,

teremos oportunidade para discutir estas questões nas próximas ocasiões.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita

Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, «não é aceitável, por exemplo,

que um professor com quatro anos de serviço, com formação académica de base de cinco anos, que trabalhou

esse tempo de forma eficaz, com empenho e zelo, com grande competência científica e cumprindo as

melhores práticas pedagógicas, seja depois sujeito à realização de uma prova para poder ingressar na carreira

docente».

Sr. Deputado Michael Seufert, não é o PCP que diz isto, foi o Sr. Deputado Abel Baptista, do CDS, quando

o Partido Socialista estava no Governo.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É verdade que a expressão «quem os viu e quem os vê» e «quem os ouviu e

quem os ouve» aplica-se ao CDS e também ao Partido Socialista.

Nós sabemos que a «mãe» da prova é a Prof.ª Maria de Lurdes Rodrigues, o que não sabíamos era que o

«pai» era o Ministro Nuno Crato. Portanto, está feita a apresentação, porque sabemos que, quer da parte do

anterior Governo do Partido Socialista quer da parte deste Governo do PSD/CDS, o que está em cima da

mesa é uma prova de humilhação e de desvalorização da carreira docente e da escola pública de qualidade

para todos.

O Sr. António Filipe (PCP): — Claro!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — O acordo palaciano que o Governo quis assinar com o seu sindicato amigo,…

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Ah, não é amigo do PCP!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Se o Governo estivesse realmente interessado em assinar um acordo teria

aceitado a proposta de negociação suplementar que todos os sindicatos de professores propuseram em

agosto. Ora, em agosto não quis, mas em novembro, com a força da luta dos professores, chamou o seu

sindicato amigo — que vai sendo o mesmo desde há um tempo para cá — e propôs um acordo que é mau

para alguns.

Portanto, o que entendemos é que este acordo não serve os professores nem serve a escola pública,

porque esta prova é iníqua e é injusta.

O verdadeiro objetivo desta prova é dificultar o ingresso na carreira docente, é a generalização da

precariedade e é a redução dos custos de trabalho com os professores. Com esta prova pretende-se avaliar

professores que já tiveram avaliação académica e profissional, pretende-se avaliar professores que já

passaram por um período probatório nas escolas e pretende-se avaliar professores que são sujeitos

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anualmente a avaliação, dentro do sistema educativo. Portanto, esta prova é uma aberração e um embuste! É

um pretexto para que este Governo continue a despedir professores e a degradar a escola pública de

qualidade.

É por isso que o PCP, amanhã, como o fez em 2007, quando estava no Governo o Partido Socialista e

aplicou esta prova, proporá a sua abolição, porque a mesma é inaceitável, é uma humilhação e mais um

motivo para a derrota deste Ministro e deste Governo.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Amadeu Soares Albergaria.

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, começo por

cumprimentá-lo pela sua declaração política.

Gostaria de dizer-lhe que acredito — tenho-o dito em vários fóruns — que se os decisores políticos forem

capazes de chamar ao processo de decisão as pessoas, as opções que tomam tendem a ser mais acertadas,

tendem a gerar mais consensos, consensos que evitam conflitos, conflitos que desmotivam as pessoas e

criam instabilidade.

No contacto permanente que fazemos com os portugueses, nomeadamente no contacto que nós, os que

acompanhamos mais de perto os assuntos da educação, fazemos com a comunidade educativa, é-nos muitas

vezes perguntado por que não se colocam os políticos e os partidos mais vezes de acordo sobre determinadas

matérias.

Tenho para mim — mas peço-lhe a sua opinião — que, mais do que uma pergunta, isso é um apelo desses

portugueses para que mais vezes se consigam alcançar compromissos sobre determinadas matérias.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — A este propósito, porque também falou desse acordo na sua

declaração política, o Grupo Parlamentar do PSD não pode deixar de sublinhar e enaltecer o entendimento

entre o Ministério da Educação e Ciência e os sindicatos da UGT sobre a prova de avaliação de

conhecimentos e capacidades.

A UGT referiu, junto do Ministério, um conjunto de preocupações sobre a prova.

Foram consultadas, por parte do Sr. Ministro da Educação e Ciência, diversas entidades, como o Conselho

das Escolas e o Conselho Nacional de Educação, e o Ministério levou em linha de conta as preocupações

nomeadamente do Sr. Provedor de Justiça.

Penso que o compromisso alcançado enobrece a ação governativa. Como já tivemos oportunidade de

afirmar, foi feito um caminho construtivo, sério e responsável, um entendimento que só foi possível devido a

uma grande abertura de ambas as partes.

Pergunto também ao Sr. Deputado se este caminho não deveria ser mais vezes percorrido na política

portuguesa e pelo Partido Socialista, que é um partido que tem enorme tradição e responsabilidade,

nomeadamente no sistema educativo português.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem mais uma vez a palavra o Sr. Deputado Michael

Seufert.

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP). — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Amadeu Albergaria, gostaria de

agradecer as suas palavras e de dizer que, de facto, mais do que a questão concreta, neste ou noutros casos

em que se obtém acordo, aquilo que às vezes nos esquecemos de valorizar é a própria existência de um

acordo, de um entendimento. É o próprio processo que leva a que, havendo possibilidade de alterar, avaliar,

temperar uma proposta concreta, ela possa ser resolvida em conjunto com os interessados e com isso haver

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ganhos para todos, por um lado para aqueles que «defendem a sua dama», os seus representados, os seus

associados e, por outro lado, para o Governo, que, com um espírito mais aberto, consegue também fazer com

que os resultados das políticas tenham mais sucesso.

Porém, Sr. Deputado, nem todas as pessoas estão interessadas em que haja acordos — é verdade. A este

propósito, ouvimos bem a intervenção da Sr.ª Deputada Rita Rato, que começou por dizer que não era

aceitável aquilo que aconteceu, mas devolvo-lhe isso, Sr.ª Deputada. O que para o Partido Comunista é muito

difícil de aceitar é que haja sindicatos amigos do Governo e sindicatos amigos do Partido Comunista. É a única

maneira com que o PCP consegue dividir o mundo sindical.

Aliás, nós conhecemos muito bem o problema histórico do PCP com a liberdade sindical e com a

democracia sindical.

Protestos do PCP.

Aplausos do CDS-PP.

Quer em Portugal, nos anos do estabelecimento da terceira República, em que os senhores sempre foram

contra a democracia sindical, quer nos outros países que o PCP sempre viu como o seu grande farol na

política internacional sabemos bem como era tratados os sindicatos que não fossem da linha do governo e do

partido comunista do respetivo país!

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sindicato, sim, desde que seja fantoche!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP). — Sr.ª Deputada, digo-lhe desta bancada, que não acredita nos

coletivismos: a Sr.ª Deputada não está a dizer mal dos sindicatos, está a dizer mal das dezenas de milhares

de professores que estão inscritos nesses sindicatos e que dão tudo para chegar a acordos com o Governo

mesmo nos momentos mais difíceis.

Vozes do CDS-PP: — Ora bem! É isso mesmo!

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP). — Também não é difícil perceber que quando há entendimento isso lhe

faça confusão, porque a bancada do Partido Comunista é a bancada que neste Parlamento apela sempre à

rua à procura de uma força que os votos nunca lhes deram. E, por isso, Sr.ª Deputada, não estamos à espera

que o PCP fique contente com a existência de um entendimento, nesta como noutras matérias. O PCP está

sempre a dizer que tem é de se resolver as coisas com a luta, na rua, enfim, não sei muito bem…

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

Mas a verdade, Sr.ª Deputada, é que, em Portugal, quem decide as políticas são as instituições

democráticas e, sempre que isso aconteça, nos respetivos fóruns ou fora dos fóruns próprios, fora dos

mecanismos mais formais, sempre que se registar entendimento, cá estaremos quer para o felicitar quer para

apelar ao Governo que possa entender-se quando tal, à partida, parece não ser possível.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Rita Rato (PCP). — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caieiro): — Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caieiro): — Tem a palavra, Sr. ª Deputada.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, trata-se de uma interpelação à Mesa sobre a condução dos

trabalhos no sentido de solicitar à Mesa que peça ao CDS o texto do acordo que foi assinado mas que ainda

não é público.

Ainda não foi possível conhecer o texto do acordo, mas, uma vez que foi aqui tantas vezes invocado, peço

que o mesmo seja distribuído a todas as bancadas.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada Rita Rato, julgo que só os interpelados é que saberão

se dispõem desse documento.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, peço a palavra no mesmo sentido, para informar que

nós lemos jornais — são vários, não é só um, e de várias cores, de resto — e o Sr. Deputado Michael Seufert

falou exatamente do que está nos jornais, e que é público, que é a existência de um entendimento. Ora, um

entendimento é isso mesmo: um entendimento entre duas partes que querem conversar. Percebemos, ou

melhor, não percebemos, mas compreendemos o incómodo de certas forças políticas que não gostam de

entendimentos, nem de diálogos, nem de consensos. Mas essa é outra conversa!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, penso que fica assim ultrapassada esta questão.

Tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Muitas vezes, o PCP tem denunciado

a política de sucessivos governos, que têm promovido a reconstituição dos grupos económicos monopolistas,

entregando novamente setores estratégicos às oligarquias do antigamente.

Mas é preciso dizer com todas as letras que, no que concretamente diz respeito aos CTT e ao serviço

público postal, este Governo atreve-se a ir mais longe do que foi a própria ditadura fascista: pela primeira vez,

em cinco séculos de história, os Correios são entregues aos interesses privados dos grupos económicos.

Com foguetório e trombetas, foi anunciada para esta semana a estreia bolsista dos CTT, ponto alto da

privatização, um obsceno espetáculo de enriquecimento de alguns à custa do empobrecimento de quase

todos.

A suprema honra da entrada no PSI 20 promete-se para março. A venda da totalidade da empresa brilha

no horizonte. Os investidores internacionais posicionam-se como grandes acionistas, ou seja, passam os

Correios para as mãos de grupos estrangeiros.

A propaganda deste processo foi nada menos que uma provocação e um insulto. Os Correios, que são do

Estado porque o seu dono é o povo, são desta forma roubados aos portugueses e os portugueses são

convidados a comprar ações na bolsa da empresa que lhes é roubada.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Estaremos perante uma política de verdadeira traição do interesse nacional e

de ataque às condições de vida dos trabalhadores e populações.

No plano das contas públicas, o Estado perde as receitas dos dividendos que deixa de receber e perde

ainda receitas fiscais, agravando o défice orçamental. Mas, mais que isso, perde o comando do controlo

estratégico de um serviço público que é um fator fundamental de desenvolvimento e qualidade de vida, de

coesão territorial na ligação às regiões, tantas vezes o último serviço que restava nas povoações e o único

contacto regular que tinham populações isoladas e abandonadas por sucessivos governos.

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Ao vender os CTT na bolsa de valores, o Governo pretende transformar um serviço público num negócio

privado, num processo verdadeiramente escandaloso, de submissão total do interesse público, em que tudo

vale para favorecer este vergonhoso negócio.

São as centenas de estações de correios encerradas, as centenas de marcos do correio arrancados, é a

degradação do serviço postal, deixando ao abandono as populações.

É o ataque ao emprego com direitos e os milhares de postos de trabalho destruídos ao longo dos últimos

anos. É o anúncio e depois o jogo de palavras e ziguezagues, quanto à retirada do sistema de saúde a obras

sociais dos CTT, prejudicando a vida de dezenas de milhares de trabalhadores e aposentados dos CTT e suas

famílias.

É o tal protocolo desconhecido entre o Governo e os CTT, que levanta as maiores suspeitas e

preocupações, para a criação dos ditos espaços Loja do Cidadão em estações dos Correios, em

circunstâncias que ninguém conhece, mobilizando fundos públicos e comunitários, colocando funções do

Estado e da Administração Pública nas mãos de interesses privados.

É a abertura de par em par do caminho para a criação de um banco postal, alteração profunda do

panorama do setor financeiro nacional, que durante décadas foi falada, equacionada, analisada, mas sempre

travada quando era o interesse público que estava em jogo. Agora aí está a «luz verde» para avançar, mas

apenas e só se for essa a vontade dos senhores acionistas, porque o respeitinho é muito bonito.

É a alteração dos contratos de concessão do serviço postal, com o encerramento mais fácil de estações de

correios; aumentos de preços e discriminações tarifárias facilitadas; a eliminação do próprio conceito de rede

pública postal e do seu desenvolvimento.

E depois ainda nos vêm dizer que a qualidade e a regularidade do serviço postal continuarão sempre

garantidas depois da privatização. E depois ainda nos vêm falar em regulação e reguladores e do papel da

ANACOM. Essa conversa não pega, Srs. Deputados. O que os senhores prometem para o futuro é

desmentido já hoje pelos resultados concretos da vossa política.

O PCP irá requerer, na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, que seja chamado à

Assembleia da República o Governador do Banco de Portugal para uma audição sobre esta matéria do banco

postal, e irá promover a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 160/2013, que altera as bases da

concessão do serviço postal universal. E voltaremos a todas estas matérias também na interpelação ao

Governo que o PCP promove no próximo dia 19, em defesa dos serviços públicos e das funções sociais do

Estado.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, o comando político e democrático do processo de

desenvolvimento, organização e funcionamento da economia e da vida social exige, para ser cumprido, a

defesa e o reforço do setor empresarial do Estado. O que este Governo está a fazer é vender a retalho a

soberania nacional e a democracia económica.

O Governo e a maioria — e principalmente o poder económico que neles manda — andam por estes dias

em ambiente de euforia com o «banquete» que se anuncia com a privatização dos CTT. Fazem a festa com o

que está a ser roubado ao País e ao povo. Mas o povo e os trabalhadores, mais cedo que tarde, hão de

estragar-vos a festa. Porque a luta aí está e vai continuar, fator decisivo para a derrota desta política e para a

construção da mudança.

O que este processo vem demonstrar e confirmar é a incontornável necessidade e urgência em que estes

governantes sejam derrotados, que se vão embora de uma vez por todas e que levem esta política com eles,

para que não seja retomada e prosseguida por outros!

O País não tem de estar condenado a estas políticas e a estas supostas inevitabilidades. E essa mudança

de rumo será construção e conquista de quem não desiste de lutar por um futuro melhor.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Sr.as

e Srs. Deputados, inscreveram-se quatro Deputados para pedirem

esclarecimentos ao Sr. Deputado Bruno Dias.

Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

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O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, começo por saudar o Sr. Deputado Bruno Dias

por ter trazido este importante assunto para discussão numa altura em que o Governo se prepara para vender

uma boa parcela da sua soberania e para largar mão de um serviço que é das pessoas e que delas devia

continuar a ser.

Os Correios de Portugal constituem, de facto, um exemplo de prestação de bons serviços aos cidadãos,

com uma qualidade que é reconhecida, tanto a nível nacional como a nível internacional e, apesar da má

administração do serviço público dos Correios, que tem de certa forma vindo a fragilizar a qualidade do serviço

prestado aos portugueses, mas cuja responsabilidade é dos últimos conselhos de administração, e, sobretudo,

de quem os nomeou, o serviço público postal prestado pelos CTT, pelo Estado, continua a ser o garante do

acesso por parte de todos os cidadãos em igualdade e a preços acessíveis a este importante serviço público.

Apesar desta gestão, esta empresa pública continua a ser um contribuinte líquido em termos de receita

para o Estado. Portanto, perante este factos, bem podemos questionar os motivos que levam o Governo a

pretender privatizar uma empresa que, para além de garantir um serviço público de forma exemplar aos

cidadãos, ainda representa uma fonte de receitas para o Estado. Não se compreende!

O Governo diz que o serviço público será assegurado, mas nós sabemos quais são as prioridades dos

privados e também sabemos que, nesses cálculos, o serviço público acaba por ser reduzido a um meio para

potenciar o lucro dos acionistas. Aliás, basta olhar para ver o que se passou na Holanda, onde, após a

privatização do serviço postal, o serviço público ficou num estado lamentável, ao ponto de o próprio Governo

holandês ter necessidade de ir pedir contas aos privados e de, depois, ter sido confrontado com a resposta

«se querem um serviço público melhor têm de pagá-lo». Naturalmente que corremos o mesmo risco.

Sr. Deputado Bruno Dias, o Governo, nomeadamente o Sr. Secretário de Estado Sérgio Monteiro, diz que

os portugueses vão continuar com a mesma qualidade de serviço público e que os carteiros vão continuar a

bater à porta dos portugueses. Vai ser uma maravilha, na perspetiva do Governo, mas nós achamos que não

vai ser nada assim. Os carteiros até podem bater à porta dos portugueses, mas vão fazê-lo, certamente, uma

vez por semana e, noutros casos até, com menos frequência.

Portanto, a nosso ver, há fortes motivos para estarmos preocupados com a qualidade do serviço prestado

aos portugueses após a privatização dos CTT, pelo que eu queria saber se o Sr. Deputado Bruno Dias

também partilha desta minha leitura.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, que optou por responder

individualmente a cada um dos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, agradeço as questões que

me colocou e as palavras que dirigiu ao Plenário.

É uma evidência absolutamente indesmentível a importância que o serviço público postal tem para os

cidadãos, para a vida concreta de milhões de pessoas e aquilo a que temos vindo a assistir, ou seja, à

degradação da qualidade do serviço postal neste País, ao longo destes anos, tem sido, exatamente, o preço a

pagar pela preparação para esta privatização que está anunciada para esta semana.

Portanto, apesar do esforço enorme dos trabalhadores dos Correios, da sua qualidade, da sua tentativa de

garantir, da melhor forma possível, um serviço público postal de qualidade, aquilo a que temos vindo a assistir

é às perdas que já se têm vindo a verificar, não nas estatísticas, porque essas facilmente podem ser

corrigidas, mas na vida concreta das pessoas.

O Sr. Deputado citou o caso da Holanda, onde já estão a ser sentidas as consequências e as implicações

da liberalização do serviço postal e da privatização e eu acrescentaria ainda mais outros dois exemplos,

nomeadamente o mais recente, o caso da privatização dos Royal Mail, na Grã-Bretanha, serviço que veio a

ser privatizado numa operação muito semelhante a esta, num processo que passou pelo encerramento de

serviços e pelo abandono de populações por parte daquele serviço público postal, que era um dos mais

conceituados do mundo, e — pasme-se! — a avaliação da empresa, meses depois da privatização, era muito

acima do preço de venda!

Mas posso recordar também o recente caso da Argentina, país que, depois da privatização dos Correios,

está agora a tentar reconstituir um serviço público postal que foi destruído ao longo dos anos.

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A experiência destes países tem de constituir lição e ensinamento para Portugal e não podemos aceitar

que estas decisões desastrosas sejam aplicadas num verdadeiro roubo, num escândalo nacional, que está a

ser levado a cabo por este Governo!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, antes de mais, quero cumprimentar o Sr. Deputado

Bruno Dias por trazer aqui o tema da privatização dos CTT, assunto que, por mais que se discuta — e já

muitas vezes foi discutido nesta Casa —, não ganha sentido. Continuamos a não perceber o sentido de vender

uma empresa que é viável, continuamos a não perceber o sentido de vender uma empresa que, numa dezena

de anos, dará lucros que mais do que compensam o seu valor de venda hoje! Portanto, esta é uma operação

«curtoprazista» que só tem em conta os milhões, os trocos que vamos receber hoje…

Vozes do PSD: — Trocos?!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … e que põe em causa a sustentabilidade das finanças públicas no

longo prazo e a sustentabilidade de um serviço que é universal e que deve ser, também ele, público.

Continuamos sem perceber o sentido de vender uma instituição que presta um serviço público, um serviço

que é essencial ao País, uma instituição que tem cinco centenas de anos e que, em muitos locais deste País,

é o único contacto das populações com o Estado central e isto, Srs. Deputados, não tem preço, nem mais alto

nem mais baixo. Não se pode pôr um preço num serviço público.

Continuamos sem perceber o sentido de entregar o capital desta empresa, com esta importância que tem

para o País, aos mercados financeiros. Continuamos sem perceber o sentido de entregar o capital desta

empresa à especulação em bolsa, aos grandes investidores que não têm rosto, que não têm morada e que

não têm qualquer responsabilidade perante o País nem perante os seus habitantes.

Tal como aconteceu no caso da EDP Renováveis e de outras empresas cotadas no PSI 20, o que se pode

esperar é que, depois de uma euforia inicial, o preço venha a cair no futuro e, portanto, os pequenos

investidores vão perder as suas poupanças nesta ilusão de uma privatização — na realidade, só estão a

comprar aquilo que já era deles, porque era público — e o capital vai concentrar-se nos grandes investidores

institucionais. E tudo isto, Srs. Deputados, sem nenhuma garantia de manutenção de qualidade ou de

universalidade de serviço público postal.

Portanto, o que eu gostava de perguntar ao Sr. Deputado Bruno Dias é se acha que, como o Governo diz

— e o Sr. Secretário de Estado já aqui veio afirmá-lo várias vezes —, temos garantias de que a qualidade se

mantém no futuro, se temos garantias de que mais trabalhadores não serão despedidos, se temos garantias

de que os postos e o serviço se mantêm, ou se, pelo contrário, vamos assistir a uma situação semelhante,

como já aqui foi referida, à da Holanda, em que os Correios foram privatizados, a empresa que ficou com o

serviço deixou de prestar o serviço postal e agora diz ao Governo «se querem um serviço postal, paguem por

ele».

Portanto, a minha pergunta é sobre se temos garantias de que isto não venha a acontecer, se não vamos

no futuro ter de pagar por um serviço que agora privatizamos.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, agradeço as questões que

me colocou.

Ultimamente, tem vindo a surgir a pergunta e a discussão sobre se estaremos ou não perante um bom

negócio com esta privatização e o que se torna evidente é que, para os grandes grupos económicos e para os

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interesses privados, que estão interessados em apoderar-se dos Correios, esta é uma oportunidade que

aparece uma vez na vida.

Este é um negócio absolutamente irrecusável e é um excelente e atrativo negócio para os interesses

financeiros especulativos, para os grupos económicos, mas para o País e para o povo é um negócio ruinoso. E

até para os pequenos investidores, que poderão ter ficado entusiasmados com aquela publicidade lamentável

que surgiu nestas últimas semanas a apelar a que todos nós emitíssemos a nossa ordem de compra ao banco

para investir na compra de ações desta empresa, que nos está ser roubada a todos, aqueles que se

entusiasmaram com essa publicidade, dizia eu, possivelmente poderão estar a colocar-se numa situação

semelhante às que se verificaram no passado com outras privatizações, em que o engodo do capitalismo

popular serviu para que 99% do capital das empresas ficasse nas mãos dos grandes acionistas, que é o que

acontece no nosso País.

Portanto, o que temos é uma operação em que, eventualmente, o pequeno investidor e o capitalismo

popular servem de alibi para entregar uma fatia fundamental da nossa economia, da coesão territorial e até da

soberania do nosso País a interesses privados que têm a agenda do máximo lucro e a ele poderão submeter

matérias fundamentais para a vida das pessoas, nomeadamente funções do Estado e da Administração

Pública. Disso são exemplos a caixa postal, via CTT, que nos termos da lei é obrigatória para todos; a emissão

de dívida pública pelos certificados de aforro; o pagamento de impostos por parte dos contribuintes; o

levantamento de pensões de reforma… Estas são funções que a administração do Estado entrega aos

Correios e que vão ficar nas mãos dos grandes investidores estrangeiros que hão de comprar os Correios.

Isto é um escândalo nacional, Srs. Deputados, e nunca poderá deixar de merecer a mais veemente

oposição e luta de quem defende o interesse do País!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Paulo

Figueiredo.

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, em primeiro lugar, quero

saudá-lo, não só pelo tema que aqui trouxe, mas, acima de tudo, pelas iniciativas que anunciou e que o

Partido Socialista terá todo o gosto em apoiar e participar.

Como já vem sendo dito neste debate e em vários outros debates, os CTT são uma empresa reconhecida,

uma empresa que dá lucro, que nunca esteve previsto privatizar a 100%.

Mas nós podemos ver aqui um padrão nas privatizações e concessões em geral e nos CTT também; é o

padrão de um Governo que tem estado «fora de lei» em termos de privatizações e de concessões. É que, há

26 meses, aprovámos aqui uma lei-quadro das privatizações que dizia que o Governo tinha um prazo curto

para legislar sobre a salvaguarda dos interesses estratégicos nacionais e passaram-se 26 meses e o Governo

incumpriu. Até que pareceu na semana passada um comunicado do Conselho de Ministros a dizer que ia

legislar para salvaguardar os interesses estratégicos nacionais. E em que áreas? Na área da energia, foi o que

se viu na privatização; na área das comunicações, estamos a ver o que está a acontecer com os CTT; na área

dos transportes, são as privatizações e as concessões anunciadas… É uma fúria de privatizações, é uma fúria

de concessões, são as novas PPP deste Governo — devem ser as boas PPP —, e, muitas vezes, na

esmagadora maioria das vezes, por negociações particulares e ajustes diretos.

Nesta matéria dos CTT há vários temas que nos preocupam, sobre os quais gostávamos de saber a

opinião do Sr. Deputado Bruno Dias. Desde logo, sobre o que pensa que o Governo vai fazer com os 30%

remanescentes. Nós achamos que não deviam ser alienados, mas o Governo já anunciou essa alienação na

discussão na especialidade do Orçamento do Estado para 2014, mas esperamos que não seja, mais uma vez,

um negócio particular, um ajuste direto para alguém controlar a empresa.

Que negócio é este das Lojas do Cidadão, onde temos uma descoordenação total entre o que fazem o

Ministério da Economia e o Ministério das Finanças e aquilo que o Ministro Poiares Maduro anuncia? Será que

o Estado ainda vão pagar aos acionistas privados por algo que não salvaguardou neste processo?

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O que vai acontecer aos 200 milhões de euros que estão nas contas dos CTT? Vão para o Estado ou vão

para os privados? Nós temos mais de 600 milhões de euros nas contas, sendo 400 milhões da atividade

corrente dos CTT e 200 milhões têm a ver com lucros acumulados.

O que pensa que irá acontecer também ao nível da salvaguarda da qualidade do serviço, da universalidade

desse serviço, dos direitos dos trabalhadores e dos serviços sociais?

O Governo tem-nos dito — ainda hoje o disse —, que está tudo salvaguardado e que, se não estiver, o

Governo poderá intervir, mas nós recordamo-nos de, há alguns meses, o Governo ter dito o mesmo sobre, por

exemplo, o dossier da ANA. E o que é que temos? Temos um duplo aumento das taxas aeroportuárias em

Lisboa, prejudicando o País, prejudicando a economia e prejudicando toda a região.

Portanto, palavras do Governo, leva-as o vento.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo, agradecendo a questão

que me colocou, quero dizer-lhe que, por respeito à verdade e por dever de rigor na discussão, há uma

referência que não podemos deixar de fazer, e que é a seguinte: quando tantas vezes fomos confrontados

com as razões que levaram o PCP a rejeitar o PEC 4 do Governo PS/Sócrates, uma das razões — e não era

pequena — era a de que estava lá a privatização dos Correios, por proposta desse Governo.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Portanto, da mesma forma como nós, então, criticámos essa opção criticamos

agora esta concretização. Aliás, naquela altura, quando o PSD e o CDS votaram contra o PEC 4, na verdade

estavam de acordo com as medidas que lá estavam.

Nós, coerentemente, votámos contra, porque estávamos, nesse momento, tal como estamos hoje, contra a

privatização dos Correios.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Portanto, quando nós sabemos — e o Sr. Deputado referiu — que a empresa

CTT dá lucro, nós registamos e sublinhamos que os lucros e dividendos do setor empresarial do Estado fazem

falta ao Estado, fazem falta ao País, fazem falta às contas públicas. E quando estamos a alienar património

fundamental do setor empresarial do nosso País estamos a abdicar de lucros e de dividendos que poderiam

continuar a entrar nos cofres do Estado, mas que vão passar direitinhos — e, se calhar, aumentados e

puxados ao máximo — para os cofres das empresas e dos interesses privados que vão tomar conta desses

serviços.

Ora, quando sabemos que os Correios têm trazido lucros para o Estado — e que vão deixar de trazer, se

avançar esta operação —, nós acrescentamos que nem lucro tinham de dar; tinha de ser uma empresa

equilibrada, económica e financeiramente, mas tinha de garantir o serviço público às populações, e aquilo que

o Governo está a fazer é a negar o serviço público às populações, a degradá-lo e destruí-lo e a retirar deste

património os dividendos e os lucros que poderiam vir para o Estado.

O Sr. Deputado alerta, e bem, no fundo, para o problema dos 30% que restam do capital da empresa e nós

estamos a alertar, agora, para os 70% que aí estão e para que aquela operação que está a ser levada a cabo,

neste momento, já hoje, tem de merecer oposição não por estar a ser mal feita, mas por estar a ser feita.

Portanto, como dizíamos aqui há uns dias, no Plenário, não se trata do problema de fazermos uma

privatização mais jeitozinha. Queremos é que seja salvaguardado o interesse nacional e que sejam

canceladas estas operações. Por isso, é que a luta tem de continuar com a oposição a estes negócios

desastrosos para o País!

Aplausos do PCP.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís

Menezes.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Bruno Dias, saúdo-o por nos trazer um tema

que é relevante, que está na ordem do dia e ao qual não devemos fugir.

Quero também saudá-lo pela coerência com que o PCP sempre abordou esta questão, coerência que

comparo com a incoerência e mesmo — uso uma expressão um pouco mais forte — com a falta de vergonha

do Partido Socialista, porque, sucessivamente, em todos os PEC (até ao PEC III, que foi aprovado, e ao PEC

IV, que foi rejeitado), estava lá preto no branco a privatização dos CTT e agora diz: «Meu Deus que nós não

queremos a privatização dos CTT». Ou seja, esta incoerência mostra bem um Partido Socialista não só sem

memória, mas também sem saber exatamente aquilo que é e aquilo que quer para o País. É um Partido

Socialista perdido no tempo, perdido no espaço, sem liderança, apenas a olhar para o curto prazo, e ninguém

ganha com isso.

Relativamente à questão dos CTT, não vou sequer entrar no debate que, muito seriamente, nos pode

dividir, que é o de os senhores serem contra a privatização e de nós acreditarmos na privatização de um setor

em elevada transformação, como é o setor dos correios, e para uma empresa que, neste momento, fruto de

outras privatizações na Europa, pode interessar a muitos investidores. Soubemos, hoje, que 98% dos

investidores são portugueses.

Assim, aquilo que lhe quero mostrar, porque é factual, sendo embora um ponto de vista totalmente

diferente do seu — eu respeito o seu e peço-lhe que respeite também o meu —, são contas simples de se

fazer: amanhã, os CTT vão ser vendidos em bolsa com uma valorização de 100% do seu capital, de quase

900 milhões de euros, quase o dobro daquilo que alguns investidores diziam que dariam por essa empresa em

negociação privada. O Estado optou, e ainda bem, por uma operação pública de venda — neste caso,

mostrámos que estivemos bem.

O Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo falou das nebulosas das vendas diretas. Dou-lhe o exemplo da ANA

em que a Comissão Europeia conclui que o processo de negociação foi aberto e transparente e não que

houve discriminações relativamente às condições de elegibilidade.

Sr. Deputado Bruno Dias, indo ao assunto dos CTT, com números e factos — há um mar ideológico que

nos divide, mas eu respeito a sua coerência e peço-lhe que respeite a minha —, porque números são

números, devo dizer o seguinte: o Estado recebe, em média, dos CTT, por ano, cerca de 48 milhões de euros

de dividendos. Pela venda dos 70% que vai ser feita, o Estado vai receber quase aquilo que receberia por 12

anos de dividendos futuros da empresa, repito, 12 anos de dividendos futuros da empresa, e ainda fica com

30% do capital, por isso ainda vai receber, por ano, cerca de 12 milhões de euros de dividendos.

Para além disso, aquilo que é importante relembrar é que este dinheiro vai ser também abatido à dívida

pública e os juros da dívida pública que vamos deixar de pagar a uma taxa média de cerca de 4%, podemos

estimar, rondaria cerca de 20 milhões de euros de poupança.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente, agradecendo-lhe, desde já, a tolerância que

teve não só para comigo mas também para com os restantes oradores.

Acrescentaria apenas o seguinte: o PCP mantém a coerência de querer defender aquilo que acha que

politicamente deve ser defendido, aquilo em que acredita, que é a manutenção pública do que devem ser

alguns serviços universais mas também de alguns interesses sindicais que tem nessa empresa, tal como tem

noutras empresas. Isso é justo e é perfeitamente aceitável, mas uma coisa é certa: amanhã, os CTT vão ser

privatizados, 98% das ofertas são de investidores portugueses, vai ser vendido por um preço recorde em toda

a Europa — há mais nove países europeus onde isto já aconteceu e não é nenhuma tragédia —, o correio vai

continuar a ser entregue e, se houver algum problema, temos um regulador.

Relativamente à confidencialidade, e com isto termino, Sr.ª Presidente,…

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem mesmo de terminar, Sr. Deputado!

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O Sr. Luís Menezes (PSD): — … porque nunca vi os Deputados do PCP porem em causa o trabalho e a

seriedade da Comissão Nacional de Proteção de Dados, tenho a certeza de que não é agora que os senhores

vão dizer que a Comissão não vai continuar a manter a confidencialidade no serviço postal.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso não resolve tudo!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Luís Menezes, o senhor fala de

coerência na discussão política, mas, pelo sim pelo não, vem dizer que não quer entrar no conteúdo da

discussão…

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Eu não disse isso!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … e avança com alguns elementos para o debate.

Queria começar por dizer que o Sr. Deputado não precisa, ou talvez não deva, falar em mares ideológicos

porque corre o risco de ir nadar para fora de pé, porque o oceano Atlântico, que está à nossa frente, tem do

lado de lá um país com que V. Ex.ª certamente se identifica, os Estados Unidos da América, onde os correios

nem sequer são uma empresa pública, são um departamento do Estado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — São uma espécie de direção-geral dos correios, nem sequer empresas

chegam a ser. Portanto, na pátria do capitalismo, fazem aquilo que o Sr. Deputado condena, que é manter os

correios no controlo do Estado. Em matéria de mares ideológicos, diria que estamos conversados!

O Sr. Deputado refere que esta — aparente, digo eu — grande vitória de encaixe de 578 milhões de euros

com a venda deste capital equivale a 12 anos dos dividendos que têm sido entregues ao Estado. Ora, isto

significa que, se fosse ao contrário, se fosse o Estado a comprar os correios por este dinheiro, ao fim de 12

anos estava pago. Quer isto dizer que aquilo que colocámos no início está correto, ou seja, que para os

interesses privados dos grupos económicos esta é uma oportunidade que aparece uma vez na vida, é um

excelente negócio para os grupos económicos e é um péssimo negócio para o País.

Aliás, resta saber se o lucro dos correios não vai ser puxado ao máximo, muito mais do que aquilo que

temos vindo a assistir com negócios como o banco postal, como essa nebulosa das lojas do cidadão nos CTT,

como essas anunciadas medidas de retirada das obras sociais aos trabalhadores e aposentados, para além

da questão de sabermos quanto desse encaixe é que vai para a JP Morgan, para o Grupo Espírito Santo, para

o CaixaBI e para todos os assessores que assessoraram a operação, porque isto não é dinheiro em caixa em

relação às contas públicas, fica algum pelo caminho, como saberá V. Ex.ª!…

E, Sr. Deputado, o senhor que foi eleito pelo círculo do Porto, há uma pergunta que ninguém lhe poderá

fazer, que é a de saber qual é o valor adequado para justificar a venda do distrito do Porto a um país qualquer

— aos alemães, aos suecos, aos canadianos… É porque vendermos soberania nacional e fatores críticos e

estratégicos para o desenvolvimento e para a vida do País não tem resposta nem com 500 nem com 5000

milhões de euros, Sr. Deputado. O que estamos a criticar é uma opção de fundo do ponto de vista do

funcionamento do País que vem colocar ameaças profundas e preocupações muito sérias em matéria de

coesão territorial e até de soberania e isso, Srs. Deputados da maioria, não se responde, nem nunca poderá

ser respondido, com contas de 500, de 5000 ou de 500 000 milhões de euros, porque a soberania nacional

está em causa com esta operação, e os senhores deveriam reconhecer isso.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa sobre

a condução dos trabalhos. Serei muito breve

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Paulo Figueiredo (PS): — Sr.ª Presidente, solicitava, por seu intermédio, que os serviços da

Assembleia distribuíssem ao Sr. Deputado Luís Menezes todos os documentos que citou no pedido de

esclarecimento que fez, porque, pelos vistos, não tem os referidos documentos. É que em nenhum desses

documentos consta a privatização dos CTT a 100%.

Uma segunda nota tem que ver com o documento que o Sr. Deputado Luís Menezes também citou da

Comissão Europeia. Não faltaria que fosse essa a avaliação da Comissão Europeia, Sr. Deputado. Basta ver

quem foi a assessoria que tratou da privatização da ANA em Portugal…!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Luís Menezes, tem a palavra para responder,

querendo.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Para responder em nome da Mesa?

O Sr. Luís Menezes (PSD): — Sr.ª Presidente, gosto de ser muito factual.

Relativamente à segunda questão, sobre a Comissão Europeia, foi demonstrado pelo comunicado oficial da

mesma. Não o tenho aqui, mas citarei o trecho que de lá retirei: «A Comissão conclui que o processo de

negociação (…) foi aberto e transparente e que não foram discriminatórias as condições de elegibilidade (…).

Nenhuma das condições estabelecidas para a venda (…) reduziu significativamente o preço de venda (…)» e

que o preço excedeu claramente a avaliação dos ativos efetuada por avaliadores independentes antes da

privatização.

Quanto à primeira questão, infelizmente nem percebi o que o Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo quis dizer.

Em todo o caso, relativamente à segunda questão, entregarei ao Plenário, em momento oportuno, o

comunicado oficial da Comissão Europeia, que citei.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Rui Paulo Figueiredo, a Mesa não dispõe dos documentos a que se

referiu. Não sei se o Sr. Deputado Luís Menezes poderá disponibilizá-los através da Mesa…

Para fazer a última declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório, em nome do Bloco

de Esquerda.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: O Ministro Nuno Crato

vende, há anos, a imagem de uma escola pública facilitista. Os últimos resultados do estudo PISA

(Programme for International Student Assessment), recentemente reconhecidos, e a inutilidade ridícula da

prova para professores contratados provam, hoje, que o problema não está no facilitismo da escola pública,

está na incapacidade de o Ministro da Educação viver com a realidade.

Com efeito, os resultados do estudo PISA revelam uma melhoria sustentada em todos os indicadores nos

últimos seis anos, e cito: «Os resultados de Matemática, em 2012, são 21 pontos acima dos resultados de

2003 e 2006; os resultados de leitura foram 15 pontos acima dos registados em 2000 e 2006; os resultados

em Ciência foram 15 pontos acima dos registados em 2006. A percentagem de estudantes abaixo do nível 2

em Matemática diminuiu em 5 pontos percentuais e, simultaneamente, o número de estudantes com bons

resultados aumentou igualmente em 5 pontos percentuais». E nada disto foi obra do Ministro!

E, se dúvidas houvesse, a OCDE elogia o programa de Matemática? Não, Sr.as

Deputadas e Srs.

Deputados, não é o programa atual, é o programa que o Ministro deitou no lixo. Mais um exemplo deste

aventureirismo pedagógico tão regressivo!

E se dúvidas houvesse, a OCDE mostra que o modelo sueco do cheque-ensino — esta inspiração da

maioria de direita! — levou o País aos piores resultados de sempre. A ideia da concorrência escolar não

corresponde a qualquer espécie de melhoria na performance escolar, contribuindo, apenas, para o aumento

das desigualdades.

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Afinal, a escola pública de Portugal conseguiu que um País que chegou ao 25 de Abril com 30% da

população analfabeta tenha, hoje, melhorias notáveis na área da qualificação da sua população, ultrapassando

um país como a Suécia que, no virar do século XIX, registava já 100% de escolarização da sua população.

Vejam bem onde leva esta obsessão do cheque-ensino e o exemplo que é a própria OCDE a registar.

Do nosso ponto de vista, este Governo está assim perante um enorme problema: nenhum dos argumentos

com que construiu a subida ao poder dos ideólogos da direita bafienta da educação encontra sustento nas

análises internacionais ao sistema. Os dados do estudo PISA têm essa particularidade: desmentir o

argumentário de Nuno Crato sobre a falta de qualidade da escola pública.

Recorde-se que Crato e companhia disseram — e escreveram livros, que, aliás, que venderam bastante! —

que o «eduquês» iria criar uma geração de alunos sem capacidade para entender os textos mais básicos,

mas, afinal, as competências de leitura subiram; disseram, ainda, que o facilitismo iria fazer com que os

melhores alunos descessem os seus resultados e fossem seriamente prejudicados, mas os melhores e os

piores alunos melhoraram, afinal, o seu desempenho. O Ministro enganou-se? O Ministro desconhece a

realidade? Não! Na verdade, o Ministro quis enganar, porque é neste engano que radica a força do seu

argumentário na defesa de uma escola elitista e no favorecimento do ensino privado.

Eis que o facilitismo revogador de Nuno Crato fica exposto pelos seus maiores inimigos: a realidade e o

ridículo. Veja-se o que vale hoje, então, a bandeira da prova para os professores e professoras contratados.

Este Governo cortou 600 milhões no ensino básico e secundário, só a estes níveis — vamos ter menos de

metade da média europeia de investimento em educação —, mas, entretanto, ia arranjar uma forma expedita

de encontrar umas receitas muito rápidas, pondo professores e professoras a pagar 20 € pela prova, mais 15 €

por cada prova extra. Qual era a intenção? A intenção era humilhá-los, não era outra, senão esta: humilhar

professores contratados, desautorizando a sua formação profissional, ignorando que estes profissionais

fizeram parte do processo de melhoria dos resultados da escola pública.

Hoje — dizem-nos —, o Ministro recuou um bocadinho. Falam-nos de um acordo que, afinal, ninguém

conhece, pretendendo agora, pelos vistos, dividir para reinar: afinal, esta prova é só para aqueles que têm

menos de cinco anos de serviço docente. Qual será a intenção? É a mesma, ou seja, é castigar professores e

professoras com menos de cinco anos de serviço, como se tantos destes profissionais não tivessem até mais

qualificações do que muitos e muitas colegas com mais experiência de ensino.

Seria uma decisão ridícula, se não tivesse uma forte dose de perversão por detrás. Os professores e as

professoras, Srs. Deputados e Sr.as

Deputadas, bem como a escola pública, já deram provas de que

dispensam o aventureirismo e o radicalismo ideológico das políticas para a educação desta direita.

Desmentido pelos dados do PISA, na sua campanha contra a falta de qualidade da escola pública,

contraditado pela luta de professores e professoras, nesta caricatura de prova que tentou impor sem sucesso,

a porta de Nuno Crato só pode, afinal, ser uma: a da saída.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada Cecília Honório, inscreveram-se três Srs. Deputados

para pedir esclarecimentos.

Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Rita Rato.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, é bem importante o tema que

aqui traz hoje, em declaração política: a defesa da escola pública de qualidade para todos. É que, nos dados,

pese embora os avanços que revela, persistem sinais, ainda assim, graves e significativos da taxa de

abandono e insucesso escolar, sobre cujo impacto importa refletir. E importa refletir, porque, se é verdade que

este Governo faz orelhas moucas ao apelo das associações de professores de Matemática, também é

verdade que aquilo que conhece são programas curriculares do antigamente, do tempo em que se desligava a

realidade concreta do pensamento crítico,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — … do tempo em que a escola pública não tinha um papel de emancipação

individual e coletiva.

A escola pública de qualidade para todos e o alargamento da escolaridade obrigatória exigem exatamente

o contrário de tudo aquilo que este Governo faz à escola pública, que é o seu desmantelamento. Exigem mais

meios materiais e humanos, desde logo, mais professores e turmas mais reduzidas; exigem mais psicólogos

para combater aquilo que são hoje fenómenos importantes, a que a escola, todos os dias, tem de responder;

exigem mais funcionários que um ensino individualizado, conforme está consagrado na Lei de Bases, mas que

os sucessivos governos não têm vindo a concretizar.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Esta estratégia política de desmantelamento da escola pública para

favorecimento da escola privada é uma opção ideológica de fundo deste Governo, bandeira do cheque-ensino,

que era do CDS e foi agora adotado pelo PSD, com a mesma vontade, mas que, na prática, significa fazer

corresponder às elites económicas as elites intelectuais, dizer que quem não tem dinheiro não tem direito a

estudar no ensino superior, quem não tem dinheiro não tem condições para ter explicações, quem não tem

dinheiro não tem direito a manuais escolares, e há hoje, ainda, na escolaridade obrigatória, alunos sem

manuais escolares.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Este caminho de destruição da escola pública tem de ser travado e é um

caminho que, agora, com este novo sinal da prova de ingresso, é mais uma vez uma humilhação daqueles

que, ao longo dos anos, têm dado o melhor de si, daqueles que não têm vontade de enriquecer, mas têm

vontade de ensinar e de fazer aquilo que mais gostam, daqueles que têm andado com a casa às costas para

fazer aquilo que verdadeiramente gostam e os motiva, que é ensinar e ensinar na escola pública de qualidade.

É por isso que esta prova, que é uma prova profundamente injusta, iníqua, um embuste, uma prova de ódio

deste Governo em relação aos professores da escola pública, tem de ser abolida.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, agradeço as suas questões e

subscrevo as preocupações que aqui traz, nomeadamente quando conseguimos encontrar sinais positivos,

nos últimos resultados do PISA, em matérias importantes, como, por exemplo, em Matemática — e não

podemos esquecer que o programa e as medidas que permitiram estes resultados foram deitados no lixo por

este Ministro da Educação —, mas também há muitas matérias que continuam a preocupar-nos. E o

referencial PISA tem o seu valor, ou seja, é evidente que temos de o olhar com atenção, mas é um dos

quadros de referência internacionais, entre outros que poderíamos escolher.

Tem toda a razão quando diz que está muita coisa por fazer e o que nos preocupa mesmo é a consciência

de que, se este Governo continua mais tempo, muito, muito mais haverá por fazer em nome e em defesa das

crianças, dos jovens e da preservação da escola pública, porque, de facto, é a escola pública que está em

risco.

Se há necessidade de defender a democracia, se há necessidade de um compromisso da sociedade e da

democracia, é exatamente pela dignidade e pela preservação da escola pública, e ela está em risco.

Sabemos que muitas crianças, muitos jovens, muitos estudantes do ensino superior não têm as mínimas

condições de acesso, sabemos que o Governo liquidou alguns dos recursos de apoio até à qualidade e ao

reforço das aprendizagens, sabemos que esta escola e estas políticas têm aumentado as desigualdades

sociais, porque este Governo tem um forte desprezo por um grande conceito, por um grande princípio da

democracia, que é o princípio da igualdade de oportunidades para todos e para todas. E, por isso, a escolha

que faz parte do seguinte: vale a pena aprofundar a escola inclusiva, que é o desafio que hoje se coloca? Vale

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a pena fazer um esforço maior? Vale a pena melhorar e investir, em nome de uma escola para todos e para

todas? A resposta que dão, a resposta que esta direita e estes ideólogos radicais da direita nos dão é a de que

não vale a pena. A escola elitista é a sua escolha e, neste elitismo, é evidente que, como também bem

destacou, a humilhação dos professores e das professoras contratados faz parte do horizonte de destruição da

escola pública e dos valores democráticos que a guiam.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria

José Castelo Branco.

A Sr.ª Maria José Castelo Branco (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, antes de

mais, queria chamar a atenção que, em todo e qualquer projeto, é essencial o processo de avaliação para se

poder avaliar, tal como o nome indica, ponderar os modelos que foram adotados e, eventualmente,

reorganizar, reponderar e até introduzir alterações conducentes a que sejam obtidos melhores resultados, o

mais próximos possível daqueles que foram estabelecidos como objetivos.

A situação do PISA é a de um instrumento de avaliação, aliás, como a Sr.ª Deputada frisou, e bem, pelo

que temos de ter em linha de conta que é um instrumento que serve para avaliar, para ponderar e,

eventualmente, reconfigurar aquilo que está em curso em cada sistema educativo dos países que aderiram a

esta mesma avaliação.

Convém lembrar que este projeto, o PISA, está em implementação desde 2000. Portugal aderiu, desde o

início, a este projeto e, logicamente, não podemos deixar de avaliar e ter em linha de conta aquilo que é

considerado e está patente no Relatório, nomeadamente tudo o que foi conseguido, em termos, por exemplo,

da Matemática — conhecimentos de per si e também a aplicação desses mesmos conhecimentos à realidade

—, em Ciência, nas várias áreas do conhecimento.

Também não podemos esquecer que este mesmo projeto PISA está a alargar, cada vez mais, o número de

parâmetros que tem em linha de conta, tornando mais fiáveis os valores que são obtidos.

Não posso deixar de focar, por exemplo, o aspeto de que tem sido aumentado o número de amostras, o

número de parâmetros, de que têm sido alargados os aspetos a avaliar, ou seja, não são só os

conhecimentos, mas a sua aplicação prática, a perspetiva instrumental desses mesmos conhecimentos, que

cada vez mais se torna pertinente na sociedade atual. E não podemos esquecer que os relatórios são,

efetivamente, instrumentos de trabalho e servem para os decisores políticos dos países envolvidos insistirem

nas mudanças conducentes a melhorar cada vez mais as performances e os conhecimentos dos alunos e dos

jovens envolvidos. Tal como também não podemos esquecer que, aqui, o que está a ser avaliado são os

alunos com 15 anos, os conhecimentos evidenciados por esses mesmos alunos.

Assim, o Relatório PISA 2012 revela todas essas melhorias e debruça-se sobre o período entre 2003 e

2012. Portanto, nestes conhecimentos, temos de o ter em linha de conta, principalmente no que diz respeito à

aplicação prática desses conhecimentos em contexto real.

Muito há a fazer, logicamente, e é sempre possível fazer melhor no que toca à educação. Destaca-se, por

exemplo, um aspeto que também aparece e é avaliado neste Relatório, que é o da importância que pode ter a

diversificação de modelos de ensino e os objetivos conseguidos pelos países que adotaram essa mesma

diversificação de modelos de ensino.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria José Castelo Branco (PSD): — Os resultados são favoráveis e, portanto, tudo aponta que

isso é importante. A Sr.ª Deputada questiona se vale a pena e, logicamente, vale a pena…

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria José Castelo Branco (PSD): — … e vai ser tida em linha de conta a melhoria e diversificação

dos modelos para ir ao encontro das diferenças, já que todos somos diferentes.

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Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, agradeço as questões que colocou.

Certamente que reconhecemos a importância da avaliação na qualificação do sistema, aliás, o Bloco de

Esquerda há muito que apresentou iniciativas legislativas nesse sentido, quer para a avaliação do sistema,

quer para a avaliação dos professores. Portanto, não temos qualquer espécie de receio sobre esta matéria e

enfrentámo-la com propostas alternativas.

Vamos falar um pouco mais seriamente sobre a importância deste referencial internacional. É facto que é

um referencial, é um termo de comparação, mas é um dos mais prestigiados, e a Sr.ª Deputada há de

reconhecê-lo. É facto, também, que as melhorias sensíveis apontadas se reportam ao período de 2003/2009,

pelo que tem esta evidência como garantida.

Mas quero perguntar-lhe se, face às considerações que foi fazendo, não a perturba esta obsessão do Sr.

Ministro da Educação com os exames e se não a perturba termos um Ministro da Educação que está

orgulhosamente só no quadro das políticas europeias mais avançadas. E dou-lhe um ou dois exemplos.

Portugal, no quadro europeu, é o único País onde, nos primeiros nove anos de escolaridade, as crianças e

os jovens são obrigados à realização de exames em três momentos, exames cujos resultados e desastre bem

sabemos quais são e que, aliás, não têm correspondência, afinal, naquilo que o PISA nos vem dizer sobre o

desempenho destes jovens.

Outro exemplo: temos um Ministro da Educação que destrói um programa de Matemática que estava a dar

bons resultados e medidas de apoio à Matemática, nomeadamente o Plano de Ação para a Matemática,

quando a avaliação é tendencialmente positiva.

A pergunta que lhe deixo é esta: diversificação dos sistemas?! Gostaria de a ouvir falar sobre o desastre da

Suécia, com a implementação do cheque-ensino!… É porque o debate que hoje fazemos é mesmo este:

devemos aprofundar, melhorar, qualificar a escola pública e encontrá-la como um espaço constitucionalmente

defendido de igualdade de oportunidades para as nossas crianças e para os nossos jovens ou reforçar a oferta

privada, o ensino privado e apostar num modelo profundamente elitista e desigualitário?! Esta é a pergunta

que se faz ao PSD! Já engoliram o cheque-ensino, que, de facto, foi, durante muito tempo, a oferta número um

do CDS, mas os senhores integraram-no, e este é o debate que tem de ser feito em torno do futuro do nosso

País, porque é das nossas crianças e dos nossos jovens que estamos a falar.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Agostinho Santa, a quem saúdo, nesta primeira intervenção do seu mandato.

O Sr. Agostinho Santa (PS): — Muito obrigada, Sr.ª Presidente.

Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Cecília Honório, cumprimento-a por ter trazido a debate o assunto

que trouxe, principalmente no que tem a ver com os resultados do PISA.

O Relatório PISA vai muito para além do ensino, das implicações que tem com o ensino. Seria um erro

confiná-lo a esse nível, seria, quanto a mim, minimizá-lo nos seus sentidos e nos seus alcances múltiplos. O

projeto PISA não se confunde com uma mera classificação de testes escolares, tenta perceber, de uma forma

dinâmica, o nível de preparação dos jovens para enfrentarem a vida concreta.

Nesse sentido, permite uma análise a um nível mais global e fundo. Permite perceber o sucesso ou o

insucesso das políticas para o desenvolvimento na área da juventude, bem como valorar os instrumentos

usados ou não para o exercício pleno da liberdade, da cidadania, de uma vida de relação profícua com os

outros. Esses instrumentos apontam ao conhecimento, à educação, à formação, à ciência, à cultura, à

tecnologia e é por isso, é por terem esse alcance e esse efeito reforçados que os indicadores agora

publicitados trazem preocupações, e preocupações sérias.

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Em primeiro lugar, são sinais de interrupção de um ciclo de desenvolvimento que culminou com os

resultados obtidos e publicitados pelo Relatório PISA 2009 e que deveriam ter tido continuidade.

Em segundo lugar, trazem preocupações quanto à descontinuidade em relação a apostas essenciais dos

últimos governos liderados pelo Partido Socialista e que redundaram em tais resultados de sucesso.

É evidente que, não se confinando à escola, a escola pública de qualidade está presente, com certeza,

nestes resultados. E estão presentes também todos os professores, todos os educadores,…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Agostinho Santa (PS): — … mesmo aqueles a quem querem pedir agora uma prova de capacidade

e de conhecimentos. Mesmo esses contribuíram para estes resultados de sucesso.

É preciso não ignorar, é preciso perceber a tendência para podermos emendar a mão e corrigir erros.

A estagnação, o risco de inversão de um ciclo deve-se — é preciso dizê-lo — ao desinvestimento no que é

essencial para os jovens, naquilo que se lhes proporciona como projeto não apenas escolar, mas também

escolar, mas também integrado, sustentado e continuado de acesso a níveis qualitativamente superiores de

vida ativa e interventiva em sociedade, em liberdade e em arrojo.

Pergunto: o caminho não será o de repensar as soluções e as ausências que entretanto deram os

resultados agora explicitados? Não valerá a pena repor o caminho do investimento na formação de jovens que

conduza ao crescimento estruturado e permanentemente procurado?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Muito obrigada, Sr. Deputado, e considere este tempo de tolerância

como uma oferta da Mesa relativamente à sua primeira intervenção.

Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Agostinho Santa, queria também

cumprimentá-lo pelo conteúdo da sua intervenção e pelas preocupações que aqui nos trouxe e subscrever a

sua preocupação com o retrocesso nas políticas de educação que estamos a identificar.

Perguntou-me sobre as soluções. Respondo-lhe que as soluções têm tudo a ver com a urgência de parar

com este ataque à escola pública, que tem uma fortíssima componente ideológica de um radicalismo muitas

vezes inesperado, mas existente, que visa a sua desconfiguração.

Se me diz: «Bom, 'no tempo da outra senhora', no tempo dos Governos do PS é que era bom», eu digo-lhe:

«Não vamos por aí. Há trabalho feito, há alguns sinais positivos que somos capazes de identificar, mas, como

sabe, também há muita obra de má memória.»

Sobre a obra de memória assinalável, é evidente que há sinais objetivos de melhoria de desempenho dos

nossos jovens em áreas tão sensíveis como a Matemática, as competências da língua e o domínio das

ciências. Estes aspetos são positivos, são para sublinhar e, mais uma vez, servem para destacar o

contrassenso, a política de atraso de um Governo que, face a aspetos que são positivos, o que faz é deitar no

lixo aquilo que estava a correr bem. Isto é ameaçador! É mesmo profundamente preocupante aquilo que está

na cabeça deste Ministério da Educação, particularmente deste Ministro.

Queria deixar-lhe a seguinte nota: se os Governos do PS foram historicamente reconhecidos como sendo

capazes de fazer uma espécie de gastão controlada das desigualdades na escola pública, com mais ou menos

empenho dependendo dos ministros e das ministras, na verdade, o que este Governo tem é uma política de

engenharia social, através da escola pública, de elitismo, de seleção e de destruição do princípio fundamental

da igualdade de oportunidades. E é a destruição deste princípio que está na origem de todas estas políticas de

seleção, de reforço do ensino privado e da vertente profissionalizante, a qual sucede tão cedo na vida das

crianças que elas ainda nem sequer tiveram tempo para pensar bem e muito menos para definir um destino

profissional.

É tudo isto que está sobre a mesa e é por ser tão ameaçador e tão preocupante para o futuro da

democracia que deixo um apelo: é mesmo preciso mobilizar toda a gente em defesa da escola pública e da

sua qualificação.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — E é preciso concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, estou a colher do bónus que dá à última declaração

política.

Muito obrigada.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Agora, sim, fica concluído este ponto da nossa ordem do dia.

Vamos prosseguir com a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 172/XII (3.ª) — Estabelece os

princípios e as regras do intercâmbio transfronteiriço de informações relacionadas com a prática de infrações

rodoviárias praticadas com utilização de veículo matriculado num Estado-membro distinto daquele onde a

infração foi cometida e transpõe a Diretiva 2011/82/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de

outubro de 2011, que visa facilitar o intercâmbio transfronteiriço de informações sobre infrações às regras de

trânsito relacionadas com a segurança rodoviária.

Já temos entre nós o Secretário de Estado da Administração Interna e a Sr.ª Secretária de Estado dos

Assuntos Parlamentares e da Igualdade.

Para iniciar o debate, tem, desde já, a palavra o Secretário de Estado da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Filipe Lobo d’Ávila): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs.

Deputados: A presente proposta de lei transpõe para o ordenamento jurídico nacional a Diretiva 2011/82/UE,

do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2011, que visa facilitar o intercâmbio

transfronteiriço de informações sobre infrações às regras de trânsito relacionadas com a segurança rodoviária.

Conhecemos bem as dificuldades que hoje existem na aplicação de contraordenações rodoviárias a

condutores de veículos com matrícula estrangeira. Estou certo de que todos concordaremos que tal dificuldade

gera um sentimento de impunidade e de desigualdade face à aplicação da lei, que importa combater.

A presente proposta de lei permitirá, assim, a partilha da informação necessária entre os diversos Estados-

membros para que seja possível notificar o proprietário do veículo de matrícula estrangeira, partilha de

informação que se deverá realizar sempre com integral cumprimento das normas de proteção de dados

pessoais.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Que fique bem claro que o que se pretende é igualdade de

tratamento de todos os condutores, sejam nacionais ou estrangeiros.

A presente proposta de lei permitirá, assim, mais e melhor fiscalização rodoviária, contribuindo para o

aumento da segurança rodoviária. O combate à sinistralidade rodoviária é um dos pilares fundamentais do

Programa do Governo.

Quero aproveitar para, estando nós perto do final do ano, avançar já alguns números da segurança

rodoviária em Portugal que me parecem expressivos do trabalho que tem sido realizado na última década,

com particular enfâse nos últimos anos.

Até 1 de dezembro do presente ano, registámos em Portugal 464 vítimas mortais, o que compara com 528

vítimas mortais em igual período do ano passado — significa uma descida de quase 13%. Até 1 de dezembro,

registámos 1776 feridos graves, o que compara com 1893 feridos graves, em igual período do ano passado —

representa uma descida de quase 7%.

São números ainda provisórios, revelam, é certo, que há um longo caminho pela frente no que respeita ao

combate à sinistralidade rodoviária, mas revelam também, Sr.as

e Srs. Deputados, que estamos no bom

caminho, que Portugal está no bom caminho.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe,

do PCP.

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O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Li a proposta

de lei e, Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, não sei o que tem ela que ver com a sua

intervenção e com o bom caminho.

Trata-se de uma proposta de lei de transposição de uma diretiva que é razoável, que visa permitir que haja

fornecimento de informação necessária entre os vários Estados da União Europeia relativamente aos veículos

com os quais sejam cometidas infrações rodoviárias. Não tem nada de mais. Simplesmente, haverá alguns

aspetos que constam dos pareceres que, aliás, foram fornecidos ao Governo por várias entidades que foram

consultadas. Tivemos oportunidade de verificar que algumas das objeções suscitadas foram, entretanto,

acolhidas no anteprojeto de proposta de lei que aqui nos foi apresentada; no entanto, há algumas objeções e

sugestões concretas que foram feitas que, parece-nos, podem perfeitamente ser consideradas no debate de

especialidade.

Refiro-me, por exemplo, e sem querer ser completamente exaustivo, à sugestão do Conselho Superior da

Magistratura no sentido de haver uma maior precisão da alínea que se refere à condução sob o efeito de

substâncias psicotrópicas, havendo toda a vantagem em conciliar essa formulação com a que consta do

Código Penal relativamente a esta matéria, isto é, em prever substâncias psicotrópicas ou produtos com

efeitos análogos perturbadores da aptidão física, mental ou psicológica. É um reparo que, do nosso ponto de

vista, faz todo o sentido.

Assim como também faz todo o sentido a sugestão feita pela Ordem dos Advogados de que a Diretiva seja

transposta com maior precisão, designadamente no que se refere à obrigatoriedade da comunicação aos

supostos infratores dos dados relativos ao dispositivo que é utilizado para detetar a infração. É algo que consta

da Diretiva, mas que não consta da proposta de lei que aqui é apresentada.

Portanto, quer parecer-nos que há margem para que, na especialidade, possa haver algum

aperfeiçoamento desta proposta que o Governo aqui apresenta, mas, obviamente, parece-nos que a

transposição desta Diretiva tem razoabilidade e não é por nós que haverá qualquer inviabilização a que isso se

faça rapidamente.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António

Gameiro, do Partido Socialista.

O Sr. António Gameiro (PS): — Ex.ma

Sr.ª Presidente, Ex.ma

Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos

Parlamentares e Ex.mo

Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, Ex.mas

Sr.as

Deputadas e Ex.mos

Srs.

Deputados: A presente proposta de lei visa combater o sentimento de impunidade e de desigualdade que

existe em matéria de infrações rodoviárias que são cometidas com um veículo matriculado num Estado-

membro da União Europeia diverso daquele onde a infração foi cometida. Ou seja, vem permitir a penalização

de um vasto conjunto de infrações rodoviárias praticadas com veículos estrageiros em Portugal e, ao mesmo

tempo, a penalização efetiva de infrações praticadas com veículos matriculados em Portugal nas estradas dos

restantes Estados-membros da União Europeia.

Esta iniciativa vem no bom sentido e é bem acolhida por nós. Tudo o que promova a segurança rodoviária,

o que potencie a redução do número de mortos, de feridos e de danos materiais, o que aumente a

sensibilização dos cidadãos para as consequências jurídicas do incumprimento das regras de trânsito e o que

combata a sensação de impunidade existente na Europa será sempre defendido e sublinhado por nós.

A transposição desta Diretiva vem consolidar, de forma definitiva, uma matéria muito cara ao PS e aos

seus Governos. Foi com os Governos do PS e a sua aposta clara no combate à sinistralidade que, felizmente,

muitos dos rácios de mortalidade nas estradas portuguesas começaram a diminuir.

Foi com o anterior Governo do PS, e na Presidência portuguesa da União Europeia de 2007, que se

aprofundaram as negociações tendentes às Decisões de Prüm de 2008, relativas ao aprofundamento da

cooperação transfronteiras entre Estados nesta matéria, nomeadamente quanto ao direito de acesso aos

dados relativos aos registos de veículos, com vista a aperfeiçoar o intercâmbio de informações e à criação do

Sistema Europeu de Informação sobre Veículos e Cartas de Condução.

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Deixamos para a discussão em especialidade algumas pequenas reservas de redação a esta iniciativa,

mas sublinhamos que, num tempo de fortes restrições orçamentais para as forças de segurança, este diploma

pode vir a importar um forte aumento da despesa, com a tradução das notificações e o seu envio postal para o

restante espaço europeu, o que ainda poderá acarretar mais dificuldades, nomeadamente à GNR e à PSP,

não augurando nada de bom. De acordo com esta proposta de lei, estas notificações devem ser efetuadas na

língua do documento de registo do veículo ou numa das línguas oficias do Estado-membro do registo, quando

a Diretiva possibilita o uso de uma das línguas oficiais da União Europeia. Este é, portanto, um aspeto a

melhorar, em nosso entender, a bem de uma não maior e mais desgraçada deterioração orçamental das

forças de segurança.

Alertamos ainda para a não transposição de diversos conceitos previstos no artigo 3.º da Diretiva,

nomeadamente os conceitos de «consulta automatizada» e de «detentor do veículo», uma vez que estas

expressões poderiam ajudar a melhor densificar juridicamente o uso e manuseamento de dados pessoais para

este efeito e a distinguir a situação administrativa ou penal do detentor de veículo no momento da infração

detetada da situação do seu proprietário. É um aspeto que a lei não consagra por esta via e que deve ter, a

nosso ver, um tratamento diferenciado, sob pena de se potenciar exponencialmente a frustração dos principais

objetivos desta lei.

Contudo, num tempo em que tantos falam da falta de consenso, sublinho o meridiano e importante grau de

entendimento genérico que tem existido na sociedade portuguesa e nesta Casa sobre questões de segurança

interna e, sobretudo, de segurança rodoviária.

A bem de uma melhor segurança rodoviária, declaramos apoio à presente iniciativa legislativa do Governo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Viegas, do CDS-PP,

para uma intervenção.

O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs.

Deputados: A segurança rodoviária tem sido uma preocupação constante no nosso País, no sentido de

alcançar números melhores no que respeita à sinistralidade rodoviária.

O investimento feito nos cinco pilares da segurança rodoviária é, assim, um investimento que tem sortido

efeito. Mais gestão rodoviária, mais socorro às vítimas, mais e melhor comportamento humano, mais controlo

dos veículos e melhor manutenção das infraestruturas são responsáveis por melhores resultados.

O caminho que tem sido feito, lado a lado com as instituições europeias, tem, assim, de continuar. É desta

forma que olhamos para o que nos é apresentado hoje. Há uma cooperação institucional que tem de se

manter e, para o podermos fazer, temos agora de transpor a Diretiva n.º 2011/82/UE.

A medida, tal como nos é apresentada, visa reforçar o combate à sinistralidade rodoviária, havendo aqui

um empenhamento de todos os países da União Europeia no combate conjunto a algumas matérias, sendo de

destacar a condução sob o efeito do álcool e sob o efeito de substâncias psicotrópicas.

É sabido que há matérias legais de foro rodoviário que têm diferentes aplicações a cidadãos com veículos

registados em país diferente do da prática da infração. Significa que há muitos cidadãos com veículos

estrangeiros que, por dificuldades processuais, acabam por ficar impunes perante uma qualquer sanção. Há,

assim, necessidade de se colmatar esse problema.

A transposição em causa pretende alcançar um mais eficiente intercâmbio transfronteiriço de dados, no

que respeita ao registo dos veículos, que facilite a identificação das pessoas suspeitas de terem praticado uma

infração rodoviária, aumentando-se, desta forma, o efeito dissuasor e obrigando os condutores a um

comportamento de maior prudência.

Tendo o CDS consciência de que estamos a ir no caminho certo, não devemos esquecer alguns

pormenores que devem, desde já, começar a ser ponderados. Com a concretização desta transposição vão

ser encontradas outras dificuldades, com as quais nos devemos preocupar.

Não podemos esquecer-nos de que havendo regras diferentes, ou limites diferentes, pode ser alegado

desconhecimento por parte dos infratores. O caminho que aqui se procura só será verdadeiramente alcançado

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quando pudermos afirmar que as regras têm igual concretização nos países da União. Hoje há aqui referência

a oito temas comuns, mas no futuro terá, certamente, que existir uma grande área de regras comuns.

Outra dificuldade que prevemos, e que deve, desde já, iniciar um percurso de maturação, tem a ver com a

forma de notificação. Com o surgimento desta área comum e com a mais que certa densificação da mesma,

vão surgir dificuldades linguísticas. Pese embora o artigo 6.º, no seu n.º 3, refira que «A notificação ao arguido

deve ser efetuada na língua do documento de registo do veículo (…)», diz também que a mesma pode ser

feita numa das línguas oficiais dos Estados-membros. Assim, tem necessariamente de ser encontrado um

modelo único europeu de notificação para este efeito. Se assim não for, prevemos que venha a existir uma

enorme dificuldade em conseguir uma eficaz concretização desta medida.

Contudo, e tendo em consideração que temos de ir fazendo uma transposição das diretivas que respeite as

prioridades da própria União Europeia, temos também nós de nos adaptar a estes pormenores de extrema

importância e que põem em causa as concretizações prioritárias da própria União Europeia. Importa, ainda

assim, ir dando passos no sentido da concretização de um espaço europeu de segurança rodoviária.

Manifestamos, por isso, o nosso apreço pela proposta de lei que agora nos é apresentada e que segue as

prioridades do espaço europeu.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares para uma

intervenção.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.ª Secretária de Estado,

Sr.as

e Srs. Deputados: Este é um tema que, como se constata pelo debate, não cria grandes divergências

entre as bancadas. De facto, corresponde a uma transposição de diretiva mas também à vivência que se

percebe da passagem de carros de outros países em Portugal ou de carros com matrícula portuguesa noutros

países e à necessidade de fazer respeitar as regras a que também se obrigam os naturais de cada um dos

países.

Creio que um ponto levantado ainda agora, pela intervenção anterior, é relevante na aplicação desta lei.

Esta proposta de lei pode ser melhorada na especialidade, nos contributos já reconhecidos, mas há, de facto,

necessidade de responder à integração europeia nesta matéria. Por exemplo, os portugueses têm de

conhecer as regras espanholas de tráfego e dos tempos de resposta, como os cidadãos de outros países têm

de conhecer as regras e a lei de Portugal. Ora, este desconhecimento pode, realmente, ser alegado para um

atraso na resposta, até para a ausência de resposta, por si só impossibilitando a aplicação da lei e, por isso,

de se levar à responsabilidade pelas infrações que tenham sido cometidas.

Creio que a resposta ao problema que acabei de apontar não se colocará na presente proposta de lei em

concreto, mas é um desafio que se coloca aos diversos governos europeus para levar, de facto, à aplicação da

lei que agora estamos a discutir e que se prevê que seja aprovada. De outra forma, será mais uma das leis

que no papel até granjeiam a unanimidade dos grupos parlamentares mas que, na prática, não têm

consequência, não se chegando aos objetivos a que se tinha proposto.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Simões

Ribeiro, do PSD.

O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª e Sr. Secretário de Estado, Sr.as

e Srs.

Deputados: Tem sido reconhecido por esta Câmara que o combate à sinistralidade rodoviária deve continuar a

ser uma prioridade para Portugal.

Este Governo, desde o início das suas funções, ancorou o combate à sinistralidade rodoviária em ações de

prevenção e fiscalização, mas fundamentalmente numa maior e melhor fiscalização dos comportamentos de

maior risco. Aliás, os resultados que o Sr. Secretário de Estado aqui nos apresentou são já o fruto, também,

dessa estratégia.

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Em nossa opinião, o fenómeno da segurança rodoviária deve merecer uma abordagem sistémica,

conjugando conhecimentos relacionados com a caracterização do sistema rodoviário e do conflito rodoviário,

métodos científicos de estudo aplicáveis e medidas operacionais inovadoras de controlo da sinistralidade.

Deve promover-se um modelo holístico de segurança rodoviária, que consiste numa abordagem integrada

de boas práticas antigas associadas a novos projetos, às atividades prioritárias de fiscalização em

desenvolvimento e aos novos objetivos da União Europeia para o período de 2010 a 2020.

É neste pressuposto que o Governo tomou a iniciativa de apresentar a presente proposta de lei, que

transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2011/82/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de

25 de outubro de 2011, que visa facilitar o intercâmbio transfronteiriço de informações sobre infrações às

regras de trânsito relacionadas com a segurança rodoviária.

Esta iniciativa legislativa propõe-se pôr fim à impunidade, combater o sentimento de desigualdade e

uniformizar os procedimentos nas situações das infrações rodoviárias que são cometidas com um veículo

matriculado num Estado-membro da União Europeia diverso daquele onde a infração foi cometida.

O que hoje nos é proposto é um mais eficiente intercâmbio transfronteiriço de dados no que respeita ao

registo de veículos que facilite a identificação de pessoas suspeitas de terem praticado uma infração

rodoviária, amplificando o efeito dissuasor e levando a um comportamento mais cauteloso, nomeadamente

dos condutores dos veículos matriculados num Estado-membro quando em circulação noutro Estado-membro,

concorrendo, assim, para a redução do número de vítimas de acidentes rodoviários.

Estando em causa a partilha de dados, não deixamos de registar que as soluções contidas nesta proposta

de lei respeitam os princípios gerais de proteção de dados pessoais, designadamente no que toca à

identificação dos responsáveis pelo tratamento, à especificação de finalidades e à limitação dos dados

tratados, como, aliás, bem reconheceu a Comissão Nacional de Proteção de Dados.

Apesar dos bons resultados já obtidos no combate à sinistralidade rodoviária, não podemos aliviar a luta

contra este flagelo, pelo que esta proposta de lei, que merece o nosso apoio, é mais uma peça no reforço da

aplicação da legislação rodoviária.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna

para uma intervenção.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Agradecendo

todas as intervenções, queria apenas registar e sublinhar o apoio do Sr. Deputado do Partido Socialista

António Gameiro à presente iniciativa.

Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, acompanho, na generalidade, a intervenção que aqui fez e, sobretudo,

as preocupações que manifestou. Também estou absolutamente ciente dessas preocupações que aqui quis

partilhar.

Gostaria ainda de dizer, Sr.as

e Srs. Deputados, que, como é evidente, temos total disponibilidade para

introduzir as melhorias que se afigurem necessárias em sede de especialidade, desde que sejam, de facto, as

tais melhorias de forma, de que falava o Sr. Deputado António Gameiro, mas também melhorias substanciais

que vão ao encontro daquilo que está estipulado na própria Diretiva, atendendo, evidentemente, ao prazo de

transposição, que temos de cumprir o mais rapidamente possível.

Sr. Deputado António Filipe, aquilo que eu aqui quis dizer, basicamente, foi que esta iniciativa legislativa

tem que ver com o cumprimento de regras; e o cumprimento de regras nas estradas tem que ver,

evidentemente, com a segurança rodoviária. Como é óbvio, os índices e indicadores que aqui procurei dar são

provisórios, são indicadores que revelam, de forma evidente para todos nós, que Portugal está no bom

caminho.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa não regista mais inscrições, pelo que podemos dar por

concluído o debate da proposta de lei n.º 172/XII (3.ª) e passarmos ao quarto e último ponto da nossa ordem

de trabalhos.

Despedimo-nos, assim, do Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, Filipe Lobo d’Ávila, e

saudamos a Sr.ª Ministra da Justiça, que acabou de entrar na Sala.

Vamos, então, iniciar o último ponto da nossa ordem de trabalhos, que consiste na discussão, na

generalidade, da proposta de lei n.º 185/XII (3.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 36/2003, de 23 de

agosto, em cumprimento da Decisão 2009/426/JAI do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa ao

reforço da Eurojust e que altera a Decisão 2002/187/JAI relativa à criação da Eurojust a fim de reforçar a luta

contra as formas graves de criminalidade.

Para iniciar o debate, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça, que a Mesa saúda mais uma vez.

A Sr.ª Ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Com a

aprovação, por este Parlamento, da proposta de lei consubstanciada na primeira alteração à Lei n.º 36/2003,

de 23 de agosto, relativa à criação da Eurojust, dá-se um importante passo no reforço da cooperação judiciária

entre os Estados-membros da União Europeia e na luta contra as formas graves de criminalidade.

São reforçados os poderes da Eurojust, através do alargamento das competências deste órgão da União

Europeia, quer quando aja em nome próprio, quer através dos seus membros.

Por outro lado, foram criados mecanismos visando uma maior operacionalidade e eficácia, incluindo o

alargamento das competências judiciárias do membro nacional Eurojust em território nacional.

As características judiciárias do membro nacional Eurojust e as competências que detém ao nível da

investigação criminal determinam que, no exercício dessas funções, atue na direta e exclusiva dependência da

Procuradora-Geral da República, regendo-se exclusivamente por critérios de legalidade e de objetividade e

observando as normas legais, como estabelecido nos n.os

1 e 2 do artigo 4.º, o mesmo se aplicando aos

adjuntos e assistentes.

São clarificadas as regras para a nomeação do membro nacional da Eurojust, de acordo com as

competências constitucionais e estatutárias de cada um dos órgãos que integram a Procuradoria-Geral da

República (PGR).

Conforme o estabelecido no n.º 1 do artigo 3.º, é da exclusiva competência do Procurador-Geral da

República a escolha de quem propõe ao Governo para membro nacional da Eurojust, reforçando-se a sua

intervenção nesta matéria.

No n.º 4 do mesmo artigo 3.º reformam-se as competências do Conselho Superior do Ministério Público

enquanto órgão que exerce a ação disciplinária de gestão dos quadros desta instituição, clarificando-se a sua

intervenção enquanto garante da legalidade da nomeação, em conformidade com os critérios de objetividade e

de legalidade que já hoje regem a sua atuação.

Anteriormente, o Conselho Superior do Ministério Público, como todos sabíamos, era apenas ouvido,

enquanto agora passa a ter a competência para fiscalizar a nomeação que o Governo se propõe fazer,

podendo, inclusive, recusá-la.

Aclaram-se as competências próprias de cada um dos órgãos da Procuradoria-Geral, de um lado, as do

Procurador-Geral, e, do outro lado, as do Conselho Superior do Ministério Público.

A conformidade constitucional desta proposta é absoluta, em particular no respeito pela autonomia do

Ministério Público e no respeito pelas competências constitucionais da Procuradoria-Geral da República, em

particular dos dois órgãos que a compõem. Aliás, em nenhum dos pareceres recebidos ou de que tenhamos

conhecimento, essa questão foi, sequer, suscitada, o que bem se compreende: reforça-se a competência do

Procurador-Geral da República, reforça-se a competência do Conselho Superior do Ministério Público, reforça-

se a competência dos magistrados na Eurojust, passando a prever que apenas estes, e só estes, podem ser

designados adjuntos e assistentes do membro nacional.

Acresce ainda, Sr.as

e Srs. Deputados, que o funcionamento do sistema é, conforme estabelecido nos

artigos 12.º e 12.º-A, da responsabilidade do correspondente nacional, cargo exercido por um magistrado do

Ministério Público.

A adequação da lei interna às normas europeias é uma necessidade imposta — é imperioso reforçar os

instrumentos de cooperação judiciária.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Inscreveram-se dois Srs. Deputados para pedirem esclarecimentos à

Sr.ª Ministra.

Como a Sr.ª Ministra já não dispõe de tempo, a bancada do PSD cede 1 minuto do seu tempo disponível

para que possa responder.

Tem, pois, a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.ª Ministra, quero

cumprimentá-la por estar entre nós e deixar-lhe a seguinte questão: recentemente, em sede de debate do

Orçamento, disse-nos aqui, de forma calorosa, que a autonomia das magistraturas e a autonomia do Ministério

Público são, para si, princípios sacrossantos. Quero perguntar-lhe como sustenta esta defesa calorosa à luz

da arquitetura que é redesenhada por esta proposta de lei, que, objetivamente, retira autonomia ao Ministério

Público, que reduz o Conselho Superior do Ministério Público a um recorte decorativo, que com este rebuçado

— se me permite a expressão — de reforço de competências do Procurador-Geral da República no fundo

remete o fundamento da decisão para o Governo e, objetivamente, o membro nacional da Eurojust é uma

decisão do Governo.

Como articula esta proposta de lei, feita por medida, à luz dos dados que hoje conhecemos? Soubemos,

em audição, que o elemento nacional da Eurojust deixou funções porque o Governo assim o entendeu e que a

proposta apresentada pela Procuradoria-Geral da República para a renovação da comissão de serviço foi

recusada.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

João Oliveira, do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Justiça, tenho

comigo a Decisão que fundamenta esta proposta de lei do Governo e a primeira pergunta que quero deixar à

Sr.ª Ministra é a seguinte: onde é que, nesta Decisão, está prevista a obrigação de o Estado português alterar

as regras de nomeação de um membro nacional para a Eurojust?

Queria, em particular, que a Sr.ª Ministra pudesse dar a resposta, confrontando-a com aquilo que é

proposto no n.º 1 do artigo 2.º desta Decisão, que altera a Decisão anterior, quando se diz que a Eurojust é

composta por um membro nacional destacado por cada Estado-membro, segundo o seu sistema jurídico, que

deve ser procurador, juiz ou oficial de polícia com prerrogativas equivalentes.

Sr.ª Ministra, queria perceber porque é que esta Decisão implicava uma alteração às regras de nomeação

do membro nacional.

Em segundo lugar, Sr.ª Ministra, queria perguntar-lhe o seguinte: é ou não verdade que foi proposta a

renovação da comissão de serviço do atual membro nacional da Eurojust?

É ou não verdade que a Sr.ª Ministra recusou dar seguimento a essa renovação da comissão de serviço e,

Sr.ª Ministra, gostava de perceber como é que, neste quadro, apresenta a esta Assembleia da República uma

proposta de lei que reduz a capacidade de intervenção do Conselho Superior do Ministério Público?

Como é que a Sr.ª Ministra apresenta a esta Assembleia da República uma proposta de lei que deixa nas

mãos do Governo a possibilidade de influenciar substantivamente a escolha do membro nacional proposto

pelo Ministério Público?

E como pode esperar desta Assembleia da República que entendamos que isto nada tem a ver com essa

circunstância da proposta de renovação da comissão de serviço que lhe foi apresentada e à qual a Sr.ª

Ministra não deu seguimento?

Sr.ª Ministra — na intervenção que farei a seguir terei, não muito, mas algum tempo para explicar melhor a

conceção do PCP sobre esta matéria —, estamos perante a circunstância de discutirmos um regime que é

necessário salvaguardar no plano interno, sobretudo na decorrência das normas constitucionais previstas

sobre esta matéria, a autonomia externa do Ministério Público. E é fundamental que para a indicação de um

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membro de uma autoridade judiciária possa ser o Ministério Público a influenciar substantivamente essa

decisão.

Esta proposta de lei, Sr.ª Ministra, não é compatível com a autonomia externa do Ministério Público, nem

com os limites, as barreiras constitucionais que sobre esta matéria estão previstos.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.as

e Srs. Deputados, estamos perante uma situação que penso

que terá de ter não só a aceitação da Sr.ª Ministra da Justiça, mas também das bancadas parlamentares: a

Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça inscreveu-se agora para também colocar uma questão à Sr.ª Ministra

da Justiça, o que está fora do Regimento…

Pausa.

Como não registo qualquer oposição, tem a palavra, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Muito obrigada, Sr.ª Presidente.

A minha inscrição não está fora do Regimento, está é fora de tempo, mas agradeço à Câmara ter aceite

que eu use da palavra.

Sr.ª Ministra, muito brevemente, foi-nos revelado esta manhã, pela Sr.ª Procuradora-Geral, que em janeiro

terá proposto um nome para continuação do atual membro nacional da Eurojust e que não terá sido

renomeado por V. Ex.ª. Acontece, porém, que a razão de ser desta proposta de lei parece-nos a nós que tem

também subjacente um eventual conflito ou um eventual desentendimento entre os poderes do Ministério da

Justiça e a própria Procuradoria-Geral da República.

Por isso mesmo, Sr.ª Ministra, não decorre da Decisão a necessidade imperiosa de alterar os critérios de

nomeação do nosso membro nacional. Quero, pois, perguntar-lhe se houve algum desentendimento, se há

algum conflito e qual o fundamento para haver uma alteração desta natureza.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.

A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr.ª Presidente, as respostas são muito simples. Os Srs. Deputados sabem

perfeitamente que esta matéria já devia estar transposta. Nos termos da Decisão-quadro citada, como os

senhores sabem, podia até ser um polícia designado como membro nacional da Eurojust. Como sabem,

designadamente na Áustria e na França, a designação é direta, por parte do Ministro da Justiça. Portanto,

quanto à Decisão-quadro estamos falados.

Relativamente à questão constitucional, há o reforço dos poderes da Procuradoria-Geral da República,

porque o Governo não pode nomear sem ser de entre os três indicados pela Procuradoria-Geral.

Quanto à questão da pretensa intriga que alguns Srs. Deputados aqui vieram introduzir, quero deixar muito

claro o seguinte: quando estava em elaboração o projeto de proposta de lei, o membro nacional em causa

tinha cessado funções. Ora, fazia algum sentido, enquanto não se revisse a Decisão-quadro, estar a nomear

alguém? Na minha perspetiva, não fazia.

Portanto, o que transmiti à Sr.ª Procuradora-Geral foi que trabalharíamos todos na proposta de lei que aqui

estamos a discutir, e que, em sequência, seria a altura de o Ministério Público, a Sr.ª Procuradora-Geral,

indicar os três membros do Ministério Público para a escolha de membro nacional da Eurojust. É tão simples

quanto isto, Srs. Deputados, não há recusa nenhuma.

Além disso, sou, por natureza, contra o perpetuar das pessoas no exercício de funções. Entendo que as

funções devem ser rotativas e, portanto, é nessa lógica… Pior é o sistema atual vigente, em que o Governo

pode, simplesmente, não nomear. Com a atual proposta de lei há três nomes e o Governo tem de nomear.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Lobo, do

PSD.

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O Sr. João Lobo (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.ª Secretária de Estado dos

Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Srs. Deputados, muito brevemente, direi o seguinte: A proposta de lei

que hoje sobe a esta Câmara e que procede à alteração da Lei n.º 36/2008, em cumprimento da Decisão

2009/426/JAI, é uma situação que reclama urgência, porque deveria ter sido inscrita no ordenamento jurídico

nacional pelo menos até 4 de junho de 2011, o que significa que desde essa data o Estado português incorre

em incumprimento na sua inscrição — não propriamente transposição — no ordenamento jurídico nacional.

Daí que, conforme a situação se revela, exista a necessidade desta inscrição.

Depois, convém referir que a Eurojust, através desta Decisão, procura uma nova ampliação a dois níveis

que se inscrevem na sua própria natureza, na coordenação e na cooperação, e não mais do que isso, porque

é necessário adaptar o ordenamento jurídico português às exigências que decorrem da execução da Decisão,

designadamente no quadro do sistema nacional de coordenação da Eurojust e, ao mesmo tempo, definir e

atribuir as funções do correspondente nacional.

É conveniente, ainda, fazer referência ao seguinte: a Decisão aqui invocada refere que as competências da

Eurojust se reportam a investigações e a procedimentos penais que impliquem dois ou mais Estados-

membros, portanto, a questões transfronteiriças.

O exercício de funções jurisdicionais é prevalentemente, senão exclusivamente, quando há instauração de

um processo num país onde haja conexão dos elementos que integram o crime.

Mas refere o artigo 3.º da Decisão que os objetivos são o incentivo à melhoria da coordenação, à melhoria

da cooperação e outras formas de apoio às autoridades competentes.

E, usando agora, uma comunicação recebida por esta Casa, no dia 2 de dezembro corrente, relativamente,

então sim, a uma comunicação dirigida à Comissão, ao Parlamento e aos parlamentos nacionais, em relação

ao «cartão amarelo», e a propósito do procurador europeu, refere-se que (e, como não há versão em

Português, vou traduzir o que está em Inglês) são inerentes limitações ao papel desempenhado pela Eurojust

e que em relação a esta possibilidade de instaurar processos-crime e de produzir investigações nesse quadro,

não tem poderes para os iniciar, tem poderes, sim, para sugerir aos respetivos ordenamentos jurídicos

nacionais a instauração de processos, o prosseguimento da ação crime, mas circunscreve-se a esse plano.

E isto remete-nos para a natureza jurídica da Eurojust. E esta questão é fundamental porque se reporta a

questões da natureza judiciária deste órgão. E reporta-nos fundamentalmente para a questão do artigo 8.º e

para os eventuais problemas de inconstitucionalidade.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Mas o Sr. Deputado terá de concluir, pois já ultrapassou largamente

o seu tempo.

O Sr. João Lobo (PSD): — Concluo, Sr.ª Presidente, fazendo uso da tolerância que tem vindo a ser usada,

se me permite.

Direi apenas o seguinte: a questão da autonomia do Ministério Público encontra-se perfeitamente

salvaguardada. Recordo que o artigo 219.º da Constituição da República Portuguesa refere que a autonomia

não é tipificada nem densificada na Constituição, mas é remetida para a lei ordinária. E o artigo 2.º do Estatuto

do Ministério Público diz que a autonomia se traduz na vinculação a critérios de objetividade e de legalidade.

Portanto, são aspetos onde a conformação constitucional nos parece evidente.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, vai ter de concluir. Já ultrapassou em 2 minutos e 30

segundos o tempo de que dispunha.

O Sr. João Lobo (PSD): — Concluo, Sr.ª Presidente.

A bancada a que me encontro vinculado votará favoravelmente este diploma e encontrar-se-á aberta à

compreensão dos argumentos que aqui foram expendidos, se essa convergência for necessária.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília

Honório, do Bloco de Esquerda.

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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, esta sua argumentação é um pouco

inusitada. Não estamos habituados nem habituadas a esta variação de defesa de princípios da sua parte. Mas,

enfim, não vou tecer considerações sobre esta matéria. No entanto, quero deixar claro que não se trata de

fomentar qualquer espécie de intriga; trata-se de fazer o confronto entre a informação que tivemos na audição,

em que ouvimos a Sr.ª Procuradora-Geral da República e demais membros do Conselho Superior do

Ministério Público, e aquilo que a Sr.ª Ministra nos veio aqui dizer. E o que podemos confirmar é que há

objetivamente um conflito, confrontando aquilo que a Sr.ª Ministra da Justiça nos disse com as observações da

Sr.ª Procuradora-Geral, esta manhã.

Gostaria de deixar algumas notas sobre esta matéria. Não tenho tempo para me ater a uma perceção

política mais de fundo sobre a Eurojust, nesta falta de destino das políticas europeias e na necessidade de

uma reflexão bem mais profunda sobre a reforma em curso e a eventual colisão com competências nacionais

— a seu tempo o faremos. Mas é claro que as competências dos membros nacionais são competências de

natureza judiciária, o que lhes confere autonomia. E essa autonomia tem de ser conferida ao abrigo dos

preceitos constitucionais dos Estados nacionais.

Ora, neste contexto, o papel do Conselho Superior do Ministério Público não pode ser reduzido a uma

espécie de trabalho de secretaria. E não se percebe — nem a Sr.ª Ministra justificou até agora — o porquê da

necessidade de alteração do quadro legal em vigor nas propostas que contém.

O Conselho Superior do Ministério Público é, no quadro constitucional, um órgão independente de qualquer

tutela do poder executivo ou judicial. Não se percebe por que é que o membro nacional deixa de prestar

contas perante este Conselho.

Nós tivemos advertências sérias sobre os perigos de inconstitucionalidade, nomeadamente, da formulação

do n.º 4 do artigo 3.º — e vale a pena ponderá-los com razoabilidade.

O facto, Sr.ª Ministra, é que são três elementos e que o Governo escolhe. A questão fundamental é esta:

parece-nos que há uma intrusão clara do Governo numa matéria tão sensível e que o membro nacional é

escolha do Governo.

Com este artifício, é facto que há uma redefinição da arquitetura e um reforço das competências do

Procurador-Geral da República e uma dependência direta, portanto, um mandato que é aqui validado desta

forma. Há, efetivamente, uma subordinação hierárquica.

O que não se entende — e a Sr.ª Ministra ainda não justificou — é este atentado enviesado à autonomia do

Ministério Público pela desconsideração e pelo esvaziamento de competências do Conselho Superior do

Ministério Público.

E se isto tem alguma relação com estas tentações obsessivas da revisão constitucional, esta matéria ainda

nos deixa mais preocupados e preocupadas, Sr.ª Ministra.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira,

do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Em Portugal, a Sr.ª Ministra sabe

bem que não podia ser um polícia a ser designado membro nacional da Eurojust. A Sr.ª Ministra sabe que

essa é uma possibilidade que a Decisão-Quadro abre no quadro das possibilidades que cada sistema nacional

permite. Em Portugal, não podia ser um polícia o membro nacional na Eurojust.

Sr.ª Ministra, o PCP entende que o combate à criminalidade transnacional e a cooperação judiciária

internacional não implicam a transferência de competências, de responsabilidades e de esferas de soberania

do Ministério Público para autoridades supranacionais.

Portanto, temos uma discordância de fundo com esta arquitetura europeia que é construída para o combate

à criminalidade transnacional. É que ela não tinha de implicar que os Estados abdicassem de competências

nacionais e de soberania nacional; a cooperação judiciária internacional fazia-se já muito antes da União

Europeia e poder-se-ia continuar a fazer, sem que isso implicasse a alienação de soberania.

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E, Sr.ª Ministra, esta proposta de lei e a intervenção da Sr.ª Ministra não seria estranha em França, mas,

em Portugal, não é aceitável. E não seria estranha em França, porque, em França, o Ministério Público é

dependente do poder executivo, mas, em Portugal, não. Em Portugal, há uma obrigação constitucional de

respeito pela autonomia externa do Ministério Público. E, Sr.ª Ministra, esta proposta de lei não respeita essa

liberdade e essa autonomia externa do Ministério Público.

A Sr.ª Ministra sabe que a autonomia do Ministério Público é uma imposição constitucional e uma garantia

dos cidadãos, e é um reflexo do princípio da separação com interdependência de poderes.

A Sr.ª Ministra sabe que do que estamos a tratar hoje é da indicação de um membro nacional para uma

autoridade judiciária internacional. E, respeitando a autonomia do Ministério Público, o Governo deve ter um

papel meramente formal naquilo que é a indicação de um membro nacional para a Eurojust.

A Sr.ª Ministra da Justiça: — E tem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Ministra, a intervenção do Governo neste processo, como é proposto na

proposta de lei, não é uma intervenção, é uma interferência. O afastamento do Conselho Superior do

Ministério Público e o reforço dos poderes da Procuradoria-Geral da República é uma má opção, que não tem

a ver com quem exerce as funções mas, sim, com o modelo e a arquitetura orgânica do Ministério Público.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Esta proposta de lei, naquilo que prevê de definição dos correspondentes nacionais na Eurojust é uma

intromissão na autonomia do Ministério Público e é um condicionamento da liberdade de organização interna.

E, Sr.ª Ministra, esta proposta de lei, tal qual está, não tem rigorosamente nada a ver com as obrigações de

cumprimento da Decisão-Quadro. Ela é o aproveitamento da Decisão-Quadro para ir a matérias que não

tinham a ver com a Decisão e matérias que dificilmente conseguem ser explicadas sem atender àquela que é

uma questão de fundo (e não é um mexerico ou uma questão lateral): a decisão do Governo de não dar

seguimento a uma proposta do Conselho Superior do Ministério Público para renovar uma comissão de

serviço do membro nacional da Eurojust é um problema, Sr.ª Ministra, que traduz tudo aquilo que entendemos

negativo, que é a interferência do Governo naquilo que deveria ser uma responsabilidade exclusiva do

Ministério Público.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.ª Secretária de Estado dos

Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Sr.as

e Srs. Deputados: Neste ponto do debate, quero deixar duas ou

três notas sobre a posição do CDS nesta matéria.

Em primeiro lugar, para sublinhar aquilo que, de facto, me parece o mais importante, independentemente

de todos os incidentes laterais de que aqui temos estado a falar, que é o facto de estarmos perante uma

Decisão do Conselho da União Europeia — a Decisão 2009/426/JAI, de 16 de dezembro de 2008 — que

carecia obviamente de iniciativa legislativa para Portugal poder acompanhar essa mesma Decisão relativa à

Eurojust.

Em segundo lugar, para referir aqui, e para que se perceba, tanto a importância da Eurojust como a

urgência desta proposta de lei.

A importância da Eurojust deve-se ao facto de, como já aqui foi explicado, e bem, se tratar de um

organismo fundamental em matéria de cooperação judiciária — e isto é o mais relevante de tudo — e de um

organismo decisivo para, como aqui foi explicado pelo Sr. Deputado João Lobo, atuar na criminalidade

transnacional, designadamente em crimes como o terrorismo, a corrupção, enfim, crimes da maior

importância, cujo combate é absolutamente necessário e indispensável.

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Depois, esta proposta de lei é urgente por uma razão simples: Portugal está nesta matéria com

necessidade de cumprir esta atualização desde junho de 2011. Portanto, é absolutamente necessário que

Portugal o faça, que Portugal tome esta decisão e não fique parado em relação a ela.

Por outro lado, gostaria de dizer que, apesar da discussão que ouvimos aqui, dos temas seguramente

muito relevantes que os partidos da oposição trouxeram a esta mesma discussão, as duas questões mais

importantes da proposta são, não a designação do membro nacional mas, sim, em primeiro lugar, a criação da

coordenação permanente — uma coordenação permanente, no âmbito da Eurojust, que assegurará, 24 horas

por dia e sete dias por semana, capacidade de atuação à Eurojust — e, em segundo lugar, a existência de um

sistema nacional de coordenação, no âmbito da Eurojust, que permitirá obviamente a atuação dos

responsáveis das questões do terrorismo, da rede judiciária e das equipas de investigação nas áreas da

corrupção e de recuperação de bens. Estas duas são as grandes mudanças desta proposta e são as

mudanças que justificam, em si mesmo, o nosso apoio a esta proposta.

É suscitada aqui uma questão em relação à designação do membro nacional e às alterações feitas à

designação do membro nacional. É evidente que todas as questões podem ser discutidas, mas vejamos o que

é alterado. É alterado o facto de agora serem apresentados três nomes pela Procuradoria-Geral da República

e de se alargar o âmbito de escolha desses nomes a uma generalidade de procuradores e não só a

procuradores-adjuntos, como, inclusivamente, era feito anteriormente (propõem até algumas das instituições

ouvidas que pudesse haver uma espécie de candidatura, o que, enfim, é um detalhe, mas há um alargamento

indiscutível, desse ponto de vista), e é clarificada a competência do Conselho Superior do Ministério Público.

O que diria sobre esta matéria é que não acompanho as críticas aqui feitas, de se tratar de uma questão de

constitucionalidade. E nos tempos que correm, nos dias que vivemos, a questão da constitucionalidade é

suscitada em relação a todas as matérias. Até já tenho o cuidado de usar a pequena edição de bolso da

Constituição da República Portuguesa, que, em boa hora, a Assembleia da República editou,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Então, veja lá o artigo 219.º, n.º 2!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … para, a qualquer momento, poder confrontar, constatar, ler e saber.

Diz-nos a Constituição da República Portuguesa, a propósito desta matéria, que «O Ministério Público goza de

estatuto próprio e de autonomia, nos termos da lei». É isto que diz a Constituição. Ou seja, a questão, quanto

muito, seria uma questão no âmbito da lei e não uma questão constitucional em si mesma, uma vez que as

competências do procurador continuam a ser as de fazer a indicação do nome e são, como aqui explicou a

Sr.ª Ministra, em alguma medida, inclusivamente reforçadas.

Portanto, não me parece que se possa extrair daqui que haja qualquer tipo de questão constitucional, até

porque, quanto muito, o que podemos dizer (e o CDS tem-no dito muitas vezes) é que este artigo,

relativamente à função e ao estatuto, diz-nos que a Procuradoria-Geral da República tem Procurador e tem

Conselho Superior, não tipificando exatamente a função de cada um. Mas diz-nos também a Constituição que

a Procuradoria é uma estrutura hierarquizada, em cujo topo está, obviamente, o Procurador-Geral da

República, que, no presente caso, é a Sr.ª Procuradora-Geral da República.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

Protestos do PCP.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Portanto, em minha opinião, se os Srs. Deputados me permitirem que a

tenha, não creio que se possa extrair daqui qualquer dúvida de constitucionalidade.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado, também não há dúvida de que o seu tempo já

terminou.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Sr.ª Presidente, agradecendo, desde já, a sua tolerância, termino dizendo que, obviamente, a forma de

designação é uma matéria suscetível de discussão. O Governo faz esta proposta, seguramente discutimo-la,

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seguramente poderemos discuti-la, mas não creio que seja um problema de constitucionalidade, como penso

que aqui ficou demonstrado.

Diria só, para terminar — e do nosso ponto de vista é o mais importante —, que este processo é

importante, é relevante e é, como o próprio Governo aqui o propõe, urgente para Portugal. É fundamental,

para que Portugal, nesta nova realidade da Eurojust, com novas exigências, não fique de fora e, mais uma vez

afirmo, é fundamental e importante para o País…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Olhe que os alemães e os franceses vão ficar fora do processo!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … e, portanto, o CDS, obviamente, acompanhará esta mesma

proposta, e lá estaremos, Sr. Deputado João Oliveira,…

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … para em detalhe, e na Comissão, discutir todos os pormenores que o

Sr. Deputado quiser ou que outros Srs. Deputados possam querer.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina

Mendonça.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: É evidente, Sr. Deputado Telmo Correia, e o Partido Socialista não nega, e o

meu parecer, em sede de 1.ª Comissão, releva isso, que esta é uma matéria absolutamente fundamental para

os Estados-membros da União Europeia e, evidentemente, para Portugal, na medida em que ela reforça o

combate e a prevenção à criminalidade grave e, também, na medida em que aumenta as competências dos

vários membros da Eurojust. E aí nós estamos todos de acordo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Todos, não!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — O que não podemos deixar de sublinhar neste debate, Srs.

Deputados, é que, se, por um lado, este reforço é de saudar e é importante que se faça, porque é mais um

passo naquilo que é o reforço da perceção das competências judiciárias em sede de União Europeia, por outro

lado, nós não somos insensíveis àquilo que está vertido na lei, àquilo que está vertido nesta Decisão e àquilo

que são os pareceres que chegaram ao Ministério da Justiça, mas que chegaram, também, à Comissão de

Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

E eu não vou muito mais longe. Posso ficar apenas e só com aquilo que foi a audição hoje da Sr.ª

Procuradora-Geral da República e aquilo que é o parecer do Conselho Superior do Ministério Público.

Mais: era a Procuradoria-Geral da República que selecionava e escolhia o magistrado que entendia ser

mais capaz e mais habilitado.

A Sr.ª Ministra da Justiça: — E continua a ser!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — O que se pretende com esta alteração, Sr.ª Ministra — e não são

palavras minhas — é retirar ao Ministério Público, designadamente ao seu Conselho Superior, a possibilidade

de fazer essa seleção e escolha, impondo a indicação de um leque mais alargado.

A Sr.ª Ministra da Justiça: — Não há consenso!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — Não são palavras minhas, Sr.ª Ministra.

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Dir-lhe-ei mais: as reservas que o Partido Socialista apresentou em sede de Comissão, e que volta a

apresentar, significam apenas e só o seguinte: a Decisão de 2009, cuja urgência não negamos, mas essa

mesma urgência não é compatível com, ao longo do último ano, não ter sido renomeado o Procurador-Geral…

A S.ª Ministra da Justiça: — O Procurador-Geral?!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — … e ela era tão urgente que, se calhar, já podia ter sido feito, mas

diz-se, nesta Decisão, que a presente Decisão não afeta a forma como os Estados-membros organizam o seu

sistema judiciário.

E, Sr.ª Ministra, o que não fica explicado neste debate, nem com a resposta que deu às perguntas que lhe

foram colocadas, é por que razão, com que fundamento se alterou a forma de nomeação do nosso

representante na Eurojust, numa altura em que é tão importante esta nomeação e esta designação.

Não sou eu que coloco em causa apenas o princípio da autonomia e o possível ferimento constitucional do

princípio da autonomia do Ministério Público.

E há uma coisa que a Sr.ª Ministra, com a sua experiência profissional, sabe: é que a autonomia do

Ministério Público existe para impedir que o Ministério Público se torne um instrumento político.

A Sr.ª Ministra da Justiça: — Isso é o que os senhores faziam!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça (PS): — É por isso que digo, Sr.ª Ministra, que se esvaziarmos as

competências do Ministério Público nesta matéria, estamos a dar um poder ao Governo que não é, talvez,

legítimo e é objeto de discussão em sede de especialidade.

E é por ser em sede de especialidade que eu espero que possamos ouvir a Sr.ª Ministra com mais tempo

— não numa grelha destas de Plenário —, e, por isso mesmo, solicitava às bancadas da maioria e também ao

Governo que esta proposta de lei, na próxima sexta-feira, baixasse à Comissão sem votação, para que melhor

se analisem as questões que suscitam reserva, não apenas a esta bancada, mas à Ordem dos Advogados, à

Procuradoria-Geral da República e também ao Sindicato do Ministério Público.

Aplausos do PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — O PS dá-lhe a mão. Aproveite, Sr.ª Ministra!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Não havendo mais inscrições, fica assim concluído o último ponto da

nossa ordem de trabalhos de hoje, não sem antes nos despedirmos da Sr.ª Ministra da Justiça e da Sr.ª

Secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade.

Antes de a Mesa fazer o anúncio, tão breve quanto possível, da ordem do dia de amanhã, vou passar a

palavra à Sr.ª Secretária, Deputada Paula Cardoso, para dar conta de um parecer da Comissão para a Ética, a

Cidadania e a Comunicação, que teremos de votar, e anunciar um projeto de deliberação que deu entrada na

Mesa.

Sr.ª Secretária, tem a palavra.

A Sr.ª Secretária (Maria Paula Cardoso): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal

Judicial de Montemor-o-Velho, Processo n.º 294/XII.9TAMMV, a Comissão para a Ética, a Cidadania e a

Comunicação decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Laurentino Dias (PS) a intervir no

processo no âmbito dos referidos autos.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.as

e Srs. Deputados, vamos proceder à votação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos prosseguir com o anúncio da iniciativa que deu entrada na Mesa, Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Maria Paula Cardoso): — Sr.ª Presidente, deu entrada na Mesa o projeto de deliberação

n.º 18/XII (3.ª) — Procede à quinta alteração à Deliberação n.º 1-PL/2012, aprovada em 20 de janeiro de 2012

(fixa a composição, distribuição e elenco dos grupos parlamentares de amizade na XII Legislatura) (PCP, PSD,

PS, CDS-PP; BE e Os Verdes).

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Vou tentar ser tão sintética quanto possível no anúncio da ordem do

dia de amanhã, tendo em conta o adiantado da hora.

Começamos com a discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 459/XII (3.ª) — Altera o Código Penal,

qualificando os crimes de homicídio e de ofensas à integridade física cometidos contra solicitadores, agentes

de execução e administradores judiciais (PSD e CDS-PP), a que se seguirá a discussão conjunta do projeto de

resolução n.º 587/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a adoção de um plano integrado de revitalização das

associações de estudantes do ensino básico e secundário como vetor de promoção de uma cidadania juvenil

mais ativa (PSD e CDS-PP) e, na generalidade, do projeto de lei n.º 473/XII (3.ª) — Pela salvaguarda da

autonomia e independência das associações de estudantes e respeito pelo seu papel (PCP).

Seguir-se-á a apreciação do Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, que aprova o Estatuto do Ensino

Particular e Cooperativo de nível não superior [apreciações parlamentares n.os

68/XII (3.ª) (PS) e 69/XII (3.ª)

(PCP)]; e a apreciação do Decreto-Lei n.º 146/2013, de 22 de outubro, que procede à décima segunda

alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e

Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, e à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º

132/2012, de 27 de junho [apreciação parlamentar n.º 67/XII (3.ª) (PCP)] conjuntamente com as petições n.os

290/XII (3.ª) — Da iniciativa de Marco Gabriel Lopes Teixeira e outros, solicitando que não seja implementada

a Prova de Avaliação de Conhecimentos e Competências para Ingresso na Carreira Docente, e 298/XII (3.ª) —

Da iniciativa da FENPROF — Federação Nacional dos Professores, solicitando a revogação da prova de

acesso ao exercício da profissão docente.

Prosseguiremos com a discussão conjunta do projeto de resolução n.º 859/XII (3.ª) — Recomenda ao

Governo a suspensão do pagamento de propinas por parte dos estudantes no ensino superior até à receção

das bolsas de ação social escolar (BE), na generalidade, dos projetos de lei n.os

467/XII (3.ª) — Estabelece a

amnistia pelo incumprimento de pagamento de propinas universitárias por comprovada carência económica

para estudantes que regressem ao ensino superior (BE) e 468/XII (3.ª) — Eliminação de critérios abusivos

para acesso a bolsas de ação social escolar no ensino superior (BE) e dos projetos de resolução n.os

865/XII

(3.ª) — Reforço da ação social escolar no ensino superior (PCP) e 866/XII (3.ª) — Estabelece a progressiva

gratuitidade do ensino superior público (Os Verdes); e, por último, com a discussão conjunta dos projeto de

resolução n.os

810/XII (2.ª) — Pela continuação do Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica —

FITEI (Os Verdes), 861/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo concurso extraordinário de apoio às artes para

colmatar deficiências graves de oferta cultural, como as evidenciadas pelo perigo de extinção do FITEI —

Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica (BE) e 864/XII (3.ª) — Determina a realização de

concursos extraordinários de apoio às artes (PCP).

Informo que a sessão plenária de amanhã terá início às 15 horas.

Fica, assim, concluído o nosso dia de trabalhos de hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 8 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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