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Sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014 I Série — Número 49

XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)

REUNIÃOPLENÁRIADE13DEFEVEREIRODE 2014

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Pedro Filipe dos Santos Alves Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 8

minutos. Em declaração política, o Deputado António Rodrigues

(PSD) chamou a atenção para a importância das eleições europeias que se avizinham na construção do projeto europeu. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados António Filipe (PCP), Carlos Zorrinho (PS), Pedro Filipe Soares (BE), Nuno Magalhães (CDS-PP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).

Em declaração política, o Deputado Eduardo Cabrita (PS) condenou o comportamento de membros do Governo relativamente aos resultados económicos em confronto com a situação real do País, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Cristóvão Crespo (PSD), Paulo Sá (PCP), Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP) e Pedro Filipe Soares (BE). No final, em interpelação à Mesa, os Deputados Cristóvão Crespo (PSD) e Eduardo Cabrita (PS) solicitaram a distribuição de documentos.

Em declaração política, o Deputado Hélder Amaral (CDS-PP) salientou os dados positivos decorrentes das

medidas tomadas pelo Governo para superar a situação económica e financeira, nomeadamente o aumento das exportações, tendo respondido, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Mariana Mortágua (BE), João Galamba (PS), Nuno Filipe Matias (PSD) e Bruno Dias (PCP).

Em declaração política, o Deputado António Filipe (PCP) acusou o Governo de ter em vista fins eleitoralistas ao propalar méritos das medidas de austeridade que tem vindo a impor ao País. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Mendes Bota (PSD), Pedro Nuno Santos (PS), José Luís Ferreira (Os Verdes) e Mariana Aiveca (BE).

Em declaração política, a Deputada Cecília Honório (BE) insurgiu-se contra o Governo pelas iniciativas que está a tomar em relação à RTP e à agência noticiosa Lusa, designadamente aquilo que considera ser o seu subfinanciamento e os planos de despedimento de trabalhadores em ambas as empresas. Deu, depois, resposta a pedidos de esclarecimento dos Deputados Raúl

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de Almeida (CDS-PP), Carla Cruz (PCP), Sérgio Azevedo (PSD) e Pedro Delgado Alves (PS).

Ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento, o Deputado Jorge Lacão (PS) propôs uma reforma no funcionamento das comissões de inquérito com vista à adoção de soluções que promovam a isenção dos relatórios e conclusões produzidos. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados António Filipe (PCP) e Pedro Filipe Soares (BE).

Foram debatidos, em conjunto e na generalidade, os projetos de lei n.

os 436/XII (2.ª) — Altera o regime jurídico da

progressão de carreira dos professores de técnicas especiais (BE) e 510/XII (3.ª) — Vinculação extraordinária dos docentes do Ensino Artístico das Artes Visuais e das Artes Audiovisuais, da Música e da Dança (PCP).

Intervieram os Deputados Catarina Martins (BE), Paula Baptista (PCP), Inês Teotónio Pereira (CDS-PP), Maria Ester Vargas (PSD) e Agostinho Santa (PS).

Foi ainda debatido, na generalidade, o projeto de lei n.º 493/XII (3.ª) — Integração da totalidade do lugar de Lagoa na União das Freguesias de Aboim, Felgueiras, Gontim e Pedraído (alteração aos limites da União das Freguesias de Aboim, Felgueiras, Gontim e Pedraído e da União das Freguesias de Moreira do Rei e Várzea Cova) (PS), tendo usado da palavra os Deputados Laurentino Dias (PS), Clara Marques Mendes (PSD), Otília Ferreira Gomes (CDS-PP), Carla Cruz (PCP) e Luís Fazenda (BE).

A Presidente (Teresa Caeiro) encerrou a sessão eram 18 horas e 55 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 8 minutos.

Os Srs. Agentes da autoridade podem abrir as galerias.

Antes de darmos início aos nossos trabalhos, peço aos Srs. Deputados o favor de ocuparem os seus

lugares, porque ainda há muito ruído na Sala e a primeira intervenção da tarde é sempre mais perturbada por

isso mesmo.

Pausa.

Como os Srs. Deputados sabem, a ordem do dia de hoje integra no seu primeiro ponto as declarações

políticas e também uma intervenção, ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do Regimento da Assembleia da

República, solicitada pelo Sr. Deputado Jorge Lacão.

A ordem das declarações políticas será a seguinte: primeiro, intervirá o PSD, depois, o PS, o CDS-PP, o

PCP e o Bloco de Esquerda, representados, respetivamente, pelos Srs. Deputados António Rodrigues,

Eduardo Cabrita, Hélder Amaral, António Filipe e Cecília Honório.

Assim, tem a palavra, para a primeira declaração política do dia, o Sr. Deputado António Rodrigues.

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Faltam 100 dias para as

eleições europeias, 100 dias para mobilizar os cidadãos europeus, e os portugueses em particular, para

participarem num projeto que une cidadãos de diferentes países à volta de um ideal, o qual está presente nos

mais pequenos atos do nosso dia-a-dia.

É por isso que, nestes 100 dias, importa explicar aos eleitores a relevância da sua participação nas

eleições europeias.

Em primeiro lugar, porque vamos eleger os nossos representantes no Parlamento Europeu. Deputados que

assumem como responsabilidade primeira não defender os interesses dos Estados mas encontrar as melhores

soluções para os cidadãos, soluções que lhes garantam mais direitos de participação, que lhes assegurem

proteção adequada e que lhes permitam ter voz na definição do seu futuro e do futuro dos seus.

As próximas eleições assumem uma relevância particular. Para além da escolha dos Deputados europeus,

teremos, pela primeira vez, perante nós, propostas de partidos políticos europeus assumidas pelos seus

protagonistas. A possibilidade de escolher o Presidente da Comissão Europeia de forma quase direta assume

principal relevo.

Mas, neste quadro, assume-se um cenário de consequências imprevisíveis no quadro da construção

europeia, nomeadamente a possibilidade de a abstenção em toda a Europa assumir valores record, próximos

da fasquia dos 50%, o que por si só pode tornar o projeto europeu mais difícil de evoluir ou determinar até que

regrida.

A abstenção anunciada pode refletir-se numa adulteração da composição do Parlamento Europeu, com

uma sobrerepresentação de eurocéticos ou de representantes antieuropeus.

Sejamos francos: a abstenção pode tornar-se o melhor aliado daqueles que lutam contra uma Europa

unida, em nome de agendas ideológicas próprias.

O que aconteceu com o referendo na Suíça deve ser um sinal de alerta. Um alerta para todos, os que

gostam e os que não gostam de uma União Europeia. Está em causa um dos princípios basilares da

construção europeia: a liberdade de circulação de pessoas.

Portugal envia e recebe milhares de emigrantes, nesta Europa em que nos inserimos, a qual tem de ter

capacidade de defender os seus direitos e deveres. Os povos de cada um dos países da União Europeia,

portugueses incluídos, não podem alhear-se de um futuro que passa inevitavelmente por uma união partilhada

de benefícios e obrigações.

Este alheamento anunciado, esta abstenção, significa que corremos o risco de que o projeto europeu seja

posto em causa e de que possa haver um retrocesso de cariz nacionalista ou antieuropeu, o qual pode atrasar

a sua evolução para os anos vindouros.

Falemos em concreto para aqueles que criticam a Europa.

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Recordemos os tempos em que era preciso passaporte para ir a Espanha, quando agora atravessamos um

continente.

Recordemos todos aqueles que buscam novas qualificações em programas como o Erasmus ou o

Leonardo, que dão nova dimensão, novos horizontes e novas aprendizagens, graças ao apoio europeu.

Recordemos a liberdade de circulação de pessoas, em particular de trabalhadores, para que nos

instalemos na maioria dos países europeus sem qualquer restrição.

Recordemos a facilidade de realização de transações comerciais, o que apenas apoia as nossas

exportações e, consequentemente, a nossa capacidade produtiva e a criação de novos empregos.

Recordemos o euro como um dos instrumentos que fomenta o nosso turismo e permite desenvolver este

setor da atividade económica.

Recordemos, ainda, a consolidação dos regimes democráticos na Europa nas últimas décadas. Nenhuma

ditadura surgiu, nenhuma democracia deixou de o ser e todos os conflitos são mediados e resolvidos em paz.

Ninguém tem dúvidas do contributo que o projeto europeu deu para a consolidação dos regimes políticos

democráticos, para o debate entre povos, para a consolidação da paz.

Este é o projeto europeu que defendemos. Por isso, faz sentido lutar pela Europa. Por isso, faz sentido

apelar à participação dos cidadãos, não como julgamento, mas como contributo na construção de um futuro

coletivo.

É por isso que aqueles que querem conjugar o resultado das eleições europeias com resultados nacionais

não só demonstram a sua fraqueza política como acreditam pouco na construção de uma Europa mais unida.

Aplausos do PSD.

Mais: acreditam pouco na capacidade dos portugueses para distinguir o que é importante em cada ato

eleitoral.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O princípio da participação democrática constitui um dos pilares da

evolução europeia, através de novos mecanismos acessíveis aos cidadãos.

O afastamento dos cidadãos do ideal europeu, sentido pela crise da zona euro, que contamina populações

de toda a União, constitui um perigo para o futuro do projeto que une povos e cria cidadania.

Sem tibiezas, reafirmamos aqui o nosso empenho e determinação no aprofundamento do projeto da União

Europeia.

Por mim, digo «sim» a todas as formas que impulsionam a participação dos cidadãos no domínio político,

principalmente no plano europeu.

As limitações que alguns pretendem impor a qualquer direito, incluindo a liberdade de circulação de

pessoas, abalando uma das maiores conquistas na Europa, deve merecer de todos uma resposta vigorosa.

Isto deve servir para marcar a diferença entre os que querem construir uma Europa para europeus e não

um mero conjunto de oportunidades egoísticas nacionais.

Aplausos do PSD.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Nestes 100 dias que faltam para as eleições europeias, importa

esclarecer, promover, responsabilizar e, acima de tudo, garantir a maior participação dos cidadãos em

Portugal e pela Europa fora.

Todos — mesmo todos — temos a responsabilidade de mobilizar os eleitores.

Todos — mesmo todos — temos o dever de esclarecimento.

Todos — mesmo todos — devemos assegurar que o projeto europeu cresça em estabilidade e assegure

futuro.

A Europa não são fundos nem dinheiro, são oportunidades!

A Europa não é uma ideia, é uma certeza!

A Europa não são 28 Estados, somos todos nós. Assim todos o queiram!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa regista a inscrição dos Srs. Deputados António Filipe, Carlos

Zorrinho, Pedro Filipe Soares, Nuno Magalhães e Heloísa Apolónia, para formularem pedidos de

esclarecimento ao Sr. Deputado António Rodrigues, e tem já a informação de que o Sr. Deputado responderá,

conjuntamente, a três e, depois, a dois pedidos de esclarecimento.

Assim sendo, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Rodrigues, houve um elemento

revelador na sua intervenção, quando…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Só um?!

O Sr. António Filipe (PCP): — Este é particularmente revelador, como verão!

Esse elemento revelador manifestou-se, quando o Sr. Deputado recusou a ideia de fazer qualquer leitura

nacional das eleições europeias. É muito revelador do que vos atormenta,…

Risos do PSD.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Nada nos atormenta! O tormento não está aqui!

O Sr. António Filipe (PCP): — … ou seja, os senhores têm o justo receio de que os portugueses utilizem

as eleições europeias, como é seu direito, para mostrar nas urnas aquilo que pensam da política do Governo

desta coligação PSD/CDS-PP, que, aliás, se apresenta como tal às eleições europeias.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

Portanto, nestas eleições europeias, o Governo vai ser julgado nas urnas pelos portugueses e os senhores

sabem que os portugueses sabem disso. Daí a sua insistência em não haver uma leitura nacional e em

apresentar aqui, na tribuna, uma preocupação com a abstenção e uma visão idílica da Europa e da União

Europeia. Esta sua visão faz lembrar, um pouco, uma visão efetivamente idílica da Europa que vem de

grandes pensadores, como Vítor Hugo, que acreditavam num continente europeu fraterno, em que os vários

países convivessem em cooperação, em paz.

Mas, Sr. Deputado, o Sr. Deputado acha que a União Europeia que temos hoje é isso? O Sr. Deputado não

acha que a tendência para a abstenção de muitos cidadãos — preocupação que, aliás, ali manifestou —, para

o crescimento de forças políticas xenófobas, racistas, de extrema-direita, na Europa, assenta, em grande

medida, no incumprimento de compromissos assumidos perante os eleitores por parte dos governos e dos

partidos dominantes nos países da União Europeia?!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. António Filipe (PCP): — O Sr. Deputado não acha que a situação de crise para que muitos países

europeus têm sido arrastados, incluindo o nosso, incluindo, de forma dramática, os países que estão sob

resgate ou intervenção externa, a mando da troica ou daquilo que lhe quiserem chamar,…

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Termino, de imediato, Sr.ª Presidente.

Como estava a dizer, o Sr. Deputado não considera que a forma como estes países têm sido arrastados

para a crise pelos governos que têm tido — e têm sido, todos eles, dominados pelos partidos dominantes na

União Europeia, ou seja, os partidos socialistas e sociais-democratas, os partidos que integram o Partido

Popular Europeu, onde o PSD e o CDS se integram — tem pesadíssimas responsabilidades no descrédito e

no descontentamento que grassa por essa Europa fora?

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Os Srs. Deputados acham que não é preciso mudar nada nesta Europa

para que os cidadãos se possam, de alguma forma, reconciliar com a atividade política e com qualquer projeto

de construção europeia, seja ele qual for?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Rodrigues, o Sr. Deputado pertence

a um partido cujo líder, e atual Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho, disse um dia «Que se lixem as

eleições!», mas, pelo contrário, todos os dias pratica o mais profundo eleitoralismo.

Aplausos do PS.

Mas também é esse eleitoralismo que faz com que muitos portugueses descreiam da democracia.

Em todo o caso, junto-me ao seu apelo, ao apelo a que todos os portugueses com capacidade eleitoral

possam exercer esse direito.

As eleições de 25 de maio são uma oportunidade para construirmos uma Europa diferente, uma Europa em

que não seja possível um governo governar como o seu Governo está a governar Portugal.

São a austeridade como mantra e o empobrecimento como grande fim e objetivo que conduzem ao

euroceticismo, que conduzem a que muitos cidadãos já não acreditem no projeto europeu. Mas o projeto

europeu não é aquele que o seu partido e a sua coligação estão a implementar em Portugal, o projeto europeu

está na mão dos cidadãos europeus e somos nós que o vamos definir nas eleições de 25 de maio.

Por outro lado, Sr. Deputado, também lhe quero dizer que um dos males mais profundos da nossa

democracia é a dicotomia entre aquilo que se promete e aquilo que se faz.

Por isso, em larga medida, algum desânimo que hoje ocorre no País tem que ver com a dicotomia entre

aquilo que os senhores prometeram antes de vencerem as eleições que vos conduziram ao Governo e aquilo

que efetivamente estão a fazer.

Logo, faço um apelo aos portugueses para que votem, mas também faço um apelo ao Sr. Deputado para

que, junto do seu partido e da sua coligação, seja possível que estas eleições tenham uma campanha digna,

uma campanha justa, uma campanha de verdade, que não volte a iludir os portugueses e a destruir aquilo que

tanto custou a construir, que é a nossa democracia e este importante projeto a nível geopolítico que é a União

Europeia.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Rodrigues, devo dizer-lhe que é

caricato, no mínimo, vir fazer a intervenção que fez. Então, não pertenceu o PSD aos governos e às maiorias

que sempre alhearam dos cidadãos qualquer decisão europeia?!

Então, por exemplo, não foi esta maioria, juntamente com o Partido Socialista, é verdade, que assinou um

Tratado Orçamental sem querer saber qual era a opinião dos cidadãos sobre a matéria?

Então, não pertenceu o PSD às vozes daqueles que, quando a sociedade pedia um referendo ao Tratado

de Lisboa, diziam «não, não queremos ouvir os cidadãos»! Pertenceu!

Ora, se o PSD esteve em todos estes maus momentos de falta de democracia na construção europeia,

como pode vir agora falar de alheamento, de preocupação com a abstenção?!

Afinal, leva à letra o ditado popular «só se lembra de Santa Bárbara quando troveja»! Só se lembra dos

eleitores quando há eleições, porque quando é importante ouvir as suas vozes sobre políticas que são

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definidoras, aí esquece-se, aí não quer saber, aí vira as costas às pessoas! E é isso que nós vamos julgar nas

próximas eleições europeias.

Quando perguntar às pessoas o que é que elas querem, qual é a Europa querem, elas já poderão escolher

sobre a Europa que têm. E a Europa que têm, ajudada a construir por este PSD, é a que virou às costas às

pessoas, aos cidadãos, às suas vozes e às suas necessidades!

O que tem Portugal a perguntar à União Europeia, à Comissão Europeia, ao Banco Central Europeu, sobre

o que aconteceu nos últimos dois anos? Afinal, quando o País mais precisava, quando mais necessitávamos

de solidariedade, o que é que eles nos enviaram?! «Deram-nos uma mãozinha»?! Não, «colocaram-nos o pé

em cima», trouxeram austeridade! E essas são as escolhas que vão a votação no próximo mês de maio.

Por isso, quando o Sr. Deputado diz «esperemos que as pessoas votem, esperemos que não estejam

alheadas e que a abstenção, afinal, não tenha o valor que se antevê que terá», lembre-se que esta maioria, o

PSD e o CDS e também o PS estão a colher exatamente aquilo que semearam, exatamente aquilo que esta

construção europeia semeou. Quiseram uma União Europeia contra as pessoas e, agora, são as pessoas que

se estão a levantar contra esta construção europeia.

A Sr.ª Presidente: — Agradeço que termine, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Termino, Sr.ª Presidente, dizendo que no mês de maio iremos avaliar,

sim, as políticas nacionais, porque o Tratado Orçamental e a austeridade permanente também vão a votos. E,

aí, já sabe que nós vamos apelar ao voto, mas ao voto contra esta Europa que oprime, por uma Europa dos

povos que possa ser de libertação.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado António Rodrigues, tem a palavra, para responder.

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Filipe, em primeiro lugar, quero

agradecer a pergunta que me fez e dizer que não a estranho, porque, pertencendo a um partido tão

antieuropeísta, é natural que não queira saber das eleições europeias e que tente transformá-las numa

sondagem,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — … mais do que na escolha do futuro dos portugueses e dos europeus.

Portanto, é natural que pense que as eleições europeias serão uma resposta nacional, quando elas não o são.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Ai são, são!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Se algo via estar em causa nessas eleições europeias é podermos

escolher um futuro comum a 500 milhões de pessoas e não aquilo a que os senhores as restringem.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Ao falarmos das eleições europeias, referimos uma matéria muito

importante, da qual o senhor não é capaz de falar, que é a preocupação com os emigrantes portugueses que

estão pela Europa fora, é a preocupação com aqueles que querem estudar pela Europa fora…

Vozes do PSD: — Muito bem!

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O Sr. António Rodrigues (PSD): — … e é a preocupação com aqueles que querem viajar pela Europa

fora!

Quanto a isso, o PCP não tem uma palavra, não tem uma iniciativa, não tem uma ideia, não tem sequer

alguma iniciativa que seja capaz de apelar ao tal ideal romântico de que falou, porque nem a esse ideal são

capazes de aderir,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — … tão circunscritos que estão às vossas próprias fronteiras.

Por isso, a nossa preocupação não é conjugar eleições nacionais com eleições europeias, é fazer com que

as pessoas, as tais pessoas que querem a Europa, possam dizer qual é o projeto que querem para a Europa e

não para Portugal, porque esse já têm.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr. Deputado Carlos Zorrinho, acho que no Partido Socialista algumas

pessoas continuam a confundir eleitoralismo com governar. Nós governamos, os senhores continuam a ser

eleitoralistas! Nós somos diferentes nesse aspeto,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — … porque temos um projeto europeu claro, temos uma afirmação

determinada relativamente à Europa. Porventura, neste Parlamento, nesta Legislatura, somos o partido que

mais propostas apresentou sobre a Europa, mais do que qualquer outro partido.

Por isso lhe digo que o que queremos é, de facto, continuar a discutir a Europa, com os senhores e com o

CDS, que tem sistematicamente estado do lado de quem quer construir futuro e não do lado daqueles que

sistematicamente viram as costas ao futuro, que se acantonam dentro das suas fronteiras e não querem fazer

outra coisa que não seja — e é isso que não queremos que sejam as eleições europeias — dizer não!

Queremos ser afirmativos, queremos ser positivos e queremos discutir convosco as nossas ideias, mas não

conseguimos discutir com aqueles que não têm nem querem ter ideias.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, devo dizer-lhe que participar é

democracia.

Protestos do Deputado do BE Pedro Filipe Soares.

E isso parece que falta, muitas vezes, a alguns cidadãos que andam por aí, àqueles que tentam fazer com

que não se participe nas eleições.

Participação é aquilo que nós queremos, queremos que os cidadãos participem,…

Protestos do Deputado do BE Pedro Filipe Soares.

… que os cidadãos digam qual é a Europa que querem ter e que não façam disso uma leitura enviesada

daquilo que está em causa.

Somos claros quanto àquilo que queremos fazer. Governámos, transformámos, fomos uma voz da Europa,

e a Europa, quando foi necessário — não nos últimos 2 anos mas nos últimos 30 anos, desde que estamos na

União Europeia —, apoiou-nos.

Contudo, não podemos ter uma visão materialista de Europa,…

Risos do Deputado do BE Pedro Filipe Soares.

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… pois a Europa não é apenas e só isso. Quando foi preciso também soubemos pedir dinheiro emprestado

à Europa, mas não queremos que a Europa seja apenas isso. Queremos que a Europa seja o tal mundo de

oportunidades que referi. E tem-no sido para jovens, para menos jovens, para gente que quer trabalhar, para

gente que quer aprender, tanto dos outros países para cá como de cá para os outros países.

É esse o nosso conceito da Europa, mas acima de tudo somos positivos e o que queremos é discutir coisas

positivas. Até hoje, que me recorde, as únicas propostas que o Bloco de Esquerda apresentou na Legislatura

relativamente à Europa foram sempre contra!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Um referendo ao Tratado Orçamental?! Um referendo para ouvir as

pessoas numa democracia?!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Contra o Tratado Orçamental, contra um referendo a favor do Tratado

Orçamental. Não foi capaz de ser positivo em relação a nada, porque não o é! O Bloco de Esquerda não sabe

ser positivo nem construtivo relativamente a nada. Nós somos, seremos e continuaremos a sê-lo, e ficamos à

espera que as vossas propostas, um dia, apareçam.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado António Rodrigues, terá ainda dois pedidos de esclarecimento, sendo o

primeiro do Sr. Deputado Nuno Magalhães, a quem dou a palavra.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Rodrigues, fez aqui uma

intervenção sobre a Europa, sobre a forma de construirmos e mantermos esse projeto comum que é a União

Europa, e, se possível, reforçá-lo.

Apesar de todas as dificuldades e de todas as crises, o projeto europeu é uma história de sucesso, pois foi

o que garantiu o maior período de paz e de prosperidade no continente europeu, outrora um continente

sempre em guerra, onde se registaram milhões de mortos. Portanto, nas dificuldades, na crise, que não

esquecemos, o projeto europeu é sem dúvida um projeto de sucesso.

O Sr. Deputado fez uma intervenção sobre um tema importante, isto é, sobre a Europa, sobre como

construir e reforçar a Europa, sobre como combater o afastamento dos cidadãos da União Europeia, sobre a

necessidade de a Europa refletir sobre si própria e sobre os seus mecanismos de decisão, para permitir essa

aproximação.

O Sr. Deputado sublinhou, e bem, que apesar de tudo é um passo o facto de haver uma eleição quase

direta do Presidente da Comissão Europeia e de se reforçar os órgãos.

O Sr. Deputado falou de temas importantes como o combate à abstenção e às derivas populistas de

extrema-direita ou de extrema-esquerda a que vamos assistindo na Europa e que podem pôr em causa

valores como a liberdade e a democracia, nomeadamente a liberdade de imprensa, valores que, estou em

crer, são comuns a toda esta Casa.

Sr. Deputado, depois de ter falado de tudo isto, sobre que assunto é que a oposição falou e lhe formulou

perguntas? Sobre as eleições! O Sr. Deputado não estranha que, relativamente a tudo o que acabei referir, a

oposição nada tenha a dizer em alternativa?!

Sr. Deputado, se calhar, atrevo-me a dar uma resposta: o problema é que a oposição, partindo da bancada

do Partido Socialista até à bancada Bloco de Esquerda, desde junho de 2011 só pensa em eleições, não

pensa em apresentar projetos alternativos quer para Portugal quer para a União Europeia. Portanto, fale-se do

que se falar, diga-se o que se disser, só referem eleições, eleições, eleições!

Sr. Deputado, devo dizer-lhe que nós, CDS, estamos, evidentemente, preocupados com esses populismos

de extrema-esquerda e de extrema-direita que se verificam na União. Importa combatê-los, não com mais

populismo mas com mais responsabilidade. Essa é uma matéria em que gostaria que pudéssemos ter, pelo

menos, a companhia do Partido Socialista, um partido do arco europeu, que sempre foi, honrando a sua

história, com essa mesma responsabilidade de combater populismos não com populismo mas, sim, com

responsabilidade.

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Na verdade, só temos uma aparência de alternativa ao projeto europeu, que é sairmos, alternativa que

ouvimos esta semana de alguns partidos mais à esquerda, aqui representados.

A Sr.ª Presidente: — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Estou a terminar, Sr.ª Presidente; vou justamente colocar a minha

pergunta.

Sr. Deputado, não acha que é muito pior a solução alternativa, que é sair da zona euro, sair do euro, ter

uma desvalorização imediata da nossa moeda, acabar com os depósitos bancários dos portugueses e das

respetivas famílias,…

Vozes do BE: — Eh!…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … numa situação parecida com a que se aconteceu na Argentina,

com o famoso corralito, em que de um dia para o outro as pessoas ficaram sem as poupanças de uma vida!?

O Sr. João Oliveira (PCP): — O vosso único argumento é esse!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Acha que isso é realmente uma alternativa?! É que é a alternativa do

PCP e do Bloco de Esquerda, uma alternativa de isolacionismo, uma alternativa que quer que saiamos da

União Europeia e que prefere o «orgulhosamente sós»!

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

É que a política do «orgulhosamente sós» não é a nossa! Sr. Deputado, gostaria de saber a sua opinião

sobre isso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Rodrigues, se me permitir,

vou juntar ao pedido de esclarecimento alguns comentários à intervenção que o Sr. Deputado Nuno

Magalhães fez.

A maioria do PSD e do CDS anda com um problema sério, porque não sabe ouvir; assim como não sabe

ouvir os portugueses, também não sabe ouvir aquilo que se passa no Parlamento.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Por isso, a maioria anda permanentemente a dizer que a

oposição não apresenta propostas.

Então, os senhores chegam sempre à conclusão de que só há duas hipóteses: ou somos totalmente

submissos à Europa, que é o que os senhores são, ou, então, saímos da Europa, e no meio não conseguem

encontrar mais alternativa nenhuma.

Lamento, Sr. Deputado, porque têm sido aqui apresentadas inúmeras alternativas e os senhores só sabem

fazer uma coisa, que é tapar os ouvidos.

Agora, vamos lá ser sérios, Sr. Deputado: o senhor aplicou hoje, aqui, um magnífico princípio da

prevenção.

De quê é que o PSD se lembrou para esta declaração política? Os senhores recordam-se ainda muito bem

da derrota política que sofreram nas autárquicas e sabem que isso foi um sério aviso ao Governo. Por isso, à

cautela, vêm agora, antes das eleições europeias, dizer o seguinte aos portugueses: «por favor, não façam a

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mesma leitura que fizeram das autárquicas e não penalizem o Governo, porque estas eleições não têm nada a

ver».

Mas, azar dos azares, Srs. Deputado, os portugueses sabem que tem a ver. Então, os portugueses não

sabem que estas eleições europeias são também uma oportunidade de ouro para penalizar as políticas

gravosas que o Governo tem implementado em Portugal?!

Agora, vamos ao passo seguinte: o Governo e a troica, Sr. Deputado! Importa que os portugueses não se

esqueçam que a União Europeia também faz parte da troica, também é responsável por tudo aquilo que

estamos a sofrer em Portugal. Não se desvinculam dessa responsabilidade!

E o Sr. Deputado acha que nas eleições europeias estas políticas não têm que ser penalizadas?! Sr.

Deputado, os portugueses não podem levar em conta o apelo que o Sr. Deputado aqui fez!

Parto do seguinte princípio: quando as pessoas têm intervenções escritas, cada palavra que dizem é

medida. E há uma frase na intervenção do Sr. Deputado, que apontei, em que faz um apelo ao voto dos

portugueses nas eleições europeias não como julgamento mas como participação.

Então, as pessoas quando votam não estão a julgar políticas, Sr. Deputado? O que é que o Sr. Deputado

está a pedir às pessoas?! Está a pedir-lhes que se desvinculem de tudo aquilo que tem que ver com a sua

vida concreta e que façam uma teoria na altura das eleições, através do seu voto, relativamente à União

Europeia?! Não pode ser, Sr. Deputado! As eleições são para julgar também políticas relativas à vida concreta

das pessoas.

Mas, depois, há outra coisa de que o Sr. Deputado não falou, que tem a ver também, obviamente, com

políticas concretas europeias. Não falou do que é que resultou dessas políticas, ao longo destes anos, por

exemplo, para a nossa dependência económica, da forma como a União Europeia «comeu» o nosso mercado

interno, como nos tornámos muito mais dependentes do exterior, designadamente a nível alimentar.

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.a Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Há coisas que o Sr. Deputado não contou. Não contou, porque não convém! Não é verdade, Sr. Deputado?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.

O Sr. António Rodrigues (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, concordo com as

questões que levantou, principalmente porque julgo que elas são pacíficas entre nós.

Risos do Deputado do PS Pedro Jesus Marques.

Isto é, a Europa é um espaço de paz nos últimos 60 anos muito por força de se terem constituído

instituições que juntam países, juntam Estados, juntam vontades, mais do que dividir.

Há 60 anos, andávamos todos ainda a tentar curar-nos das feridas das guerras; hoje, andamos todos a

discutir e a aprofundar democracia e isso é um dos principais ganhos que a União Europeia nos trouxe.

Em segundo lugar, concordo também consigo – e estou convicto, aliás – acerca da responsabilidade que o

Partido Socialista tem nesta matéria e que vai demonstrar nestas eleições europeias. Estou convicto de que

vai apresentar propostas, não necessariamente iguais às nossas, mas seguramente vai ser, como é, um

partido responsável e vai querer discutir connosco as verdadeiras questões europeias.

Vale a pena não deixar de referir também aqui, e concordando consigo, a alternativa zero que representa a

extrema-esquerda, aqueles que, pela Europa fora, aspiram a mais lugares precisamente pela falta de

participação dos outros. Portanto, eles querem que os outros não participem, eles querem que os cidadãos

fiquem em casa, eles gostavam, até, de poder concorrer sozinhos, mas nós não queremos deixar que isso

aconteça, não vamos deixar que isso aconteça, porque, de facto, queremos que as pessoas se pronunciem

sobre o projeto europeu, sobre o futuro da Europa, sobre aquilo que é um projeto comum, para nós e também

para eles, porque, mesmo que eles não queiram, queremos continuar sempre na Europa.

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Sr.a Deputada Heloísa Apolónia, muito obrigado pela sua pergunta. Devo dizer-lhe que estranho a sua

pergunta porque um partido como Os Verdes, que pretende trazer a bandeira do ambiente, devia associar-se,

em primeiro lugar, à Europa, porque é também da Europa que sopram os ventos da mudança nessa matéria,

ao longo dos últimos anos, que nos trouxeram grandes mudanças…

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Oh!…

O Sr. António Rodrigues (PSD): — … mudanças iguais àquelas tantas outras que tivemos e que tão

positivas foram que, às vezes, nem damos por elas. Foi pela positividade que tentei falar na minha

intervenção, por aquilo que não sentimos, pela facilidade que, hoje, é viajar, transacionar, crescer, melhorar, e

é isso que a Europa também significa. Não é a conjugação da negativa que apenas os senhores sabem fazer.

Por isso, continuamos apostados neste desenvolvimento, não olhamos para a Europa apenas como uma

coisa negativa. Não é uma coisa sempre boa, mas por isso também questionamos e apresentamos

alternativas, bem como propostas para a melhorar. Esperávamos que também os senhores nos pudessem

acompanhar nessa matéria mas, infelizmente, recusam sempre esta atitude porque, demasiados preocupados

com o vosso umbigo, estão muito preocupados com a questão nacional e não com a questão da solidariedade

para com todos os outros.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Rodrigues (PSD): — A solidariedade, para nós, tem dois sentidos: tem direitos e

obrigações, de nós para a Europa, mas também da Europa para connosco. Esperamos que os senhores

também venham connosco nesse desafio.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para proferir uma declaração política em nome do PS, tem a palavra o Sr. Deputado

Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O Sr. Primeiro-Ministro chegou ao

último debate quinzenal em tom de encenada festa e de pré-campanha eleitoral. A execução orçamental de

2013 era o pretexto para essa manhã de ilusões, adornada pela melopeia do consenso necessário com o PS,

por parte de um Governo que, ainda no Conselho de Ministros de hoje, voltou a provar que se carateriza por

uma relação de reincidente conflito com o Estado de direito e de generalizado desprezo pelas posições dos

parceiros sociais.

Aplausos do PS.

O semblante luminoso do Dr. Passos Coelho toldou-se, de imediato, quando o líder do Partido Socialista o

confrontou com a trágica dimensão dos sacrifícios para tão medíocres resultados e com a circunstância de o

milagre orçamental ter pés de barro, assentes largamente em receitas extraordinárias, sobretudo num perdão

fiscal que, segundo o FMI e a Comissão Europeia, incentiva o incumprimento e cujos custos, em receitas

perdidas, o Primeiro-Ministro não foi capaz de explicar.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Igualmente na audição dessa mesma tarde, 24 de janeiro, na Comissão

Parlamentar de Orçamento e Finanças, a Sr.ª Ministra apresentou-se exultante de autoestima com os

resultados orçamentais e a confiança dos mercados, mas, igualmente, surpreendentemente baqueou quando

confrontada com a dimensão dos sacrifícios exigidos aos portugueses para obter uma redução do défice, sem

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medidas extraordinárias, de umas parcas duas décimas de PIB, com a circunstância de a dívida pública ter

atingido quase 130% do PIB, mas, sobretudo, voltou a não ter resposta para dizer qual a despesa fiscal

resultante do regime extraordinário de regularização de dívidas fiscais e à segurança social que, in extremis,

permitiu maquilhar a medíocre execução orçamental de 2013.

Estranharam o tom de festa os contribuintes, as famílias e as empresas cumpridoras das suas obrigações

fiscais em tempos de crise.

Não houve perdão fiscal para os trabalhadores que, em 2013, pagaram mais de 35,5% de IRS, isto é, mais

3200 milhões de euros, na sua grande maioria pagos por retenção na fonte.

Não houve perdão fiscal para a restauração, que continuou a suportar um IVA mais elevado do que na

Grécia, na Irlanda, em Espanha ou na Itália.

Não houve perdão fiscal para os desempregados ou para os doentes, que passaram a pagar um imposto

especial de 5% ou 6% sobre os subsídios auferidos por circunstâncias que não escolheram viver.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Não houve perdão para os acamados ou fortemente incapacitados com

600 € de rendimento, que deixaram de receber o complemento para situações de dependência extrema.

O Sr. Alberto Martins (PS): — Muito bem!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Não houve perdão para os mais pobres e indefesos que foram vítimas, em

2013, da redução de cerca de 10% do complemento solidário para idosos, sem qualquer preocupação, neste

caso, do Ministro Mota Soares, com o consenso político ou social com o Partido Socialista, apesar de reduzir o

rendimento disponível dos titulares de pensões mínimas.

Estranharam a festa também os empresários das PME que continuaram a não aceder crédito em

condições competitivas, nem sequer por parte dos bancos que receberam um apoio de quase 6000 milhões de

euros por parte do Estado.

Estranharam sobretudo o tom festivo os quase 200 000 portugueses que emigraram no ano passado e

aqueles que deixaram de procurar emprego, contribuindo, assim, decisivamente, para o alívio estatístico da

tragédia social que é o desemprego.

O PS é o partido que tem estado sempre ao lado dos portugueses nos momentos difíceis: no PREC e no

pós-PREC, pela democracia, pela Europa solidária, nos anos 80, pela União Económica e Monetária, na

década de 90, pelo aprofundamento da integração económica e social, no debate da Constituição Europeia e

do Tratado de Lisboa.

A direita, europeisticamente titubeante, que chegou ao poder às cavalitas da troica, tem uma visão utilitária

do consenso.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O PS provou, recentemente, em matéria de IRC, que quando está em causa defender a economia, dar

esperança aos portugueses e criar mecanismos de confiança, tudo fazemos para obter consensos alargados e

de médio prazo. O perdão fiscal não é isso, é um expediente orçamental de vistas curtas que reforça o

sentimento de injustiça e retira credibilidade ao Governo para lançar propostas de futuro.

Vozes do PS: — Muito bem!

Protestos do PSD e do Deputado do CDS-PP Artur Rêgo.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Ontem, finalmente, o Ministério das Finanças respondeu ao Parlamento

sobre o pedido de perdão fiscal, confirmando uma receita extraordinária de 1277 milhões de euros, sem a qual

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o défice não só estaria muito acima do compromisso inicial de 4,5% do PIB mas mesmo claramente além do

objetivo definido, já em outubro, nas oitava e nona avaliações, de 5,5% do PIB.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Mas, sobretudo, veio confirmar as suspeitas do Partido Socialista sobre a dimensão elevada da perda de

receitas que envolveu este raide fiscal de curto prazo.

Segundo as contas do Governo, a que importará ainda acrescer os casos em litígio, este perdão custou

aos portugueses 494 milhões de euros — isto é, 38% da receita arrecadada — em juros de mora, juros

compensatórios ou coimas já liquidadas mas, agora, perdoadas.

Vozes do PS: — Bem lembrado!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Lembremos, Srs. Deputados, a dramatização e a chantagem feitas

recentemente pelo Governo em torno da aplicação retroativa de cortes nas pensões a aposentados ou viúvos,

com valor superior a 600 €.

O Sr. Pedro Jesus Marques (PS): — Muito bem lembrado!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Essa medida orçamental, que justificou considerações lamentáveis de

entidade externas sobre o Tribunal Constitucional, valia 388 milhões de euros e foi rapidamente substituída por

um agravamento de cortes para todas as pensões superiores a 1000 €.

A troica desejada por esta maioria não pode ser alibi para as escolhas que o Governo sucessivamente fez

por conta própria, aumentando a crise social, martirizando o mundo do trabalho, destruindo a esperança e

semeando a injustiça.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Esta opção de perdoar, para salvar mais um fracasso orçamental, quase 500 milhões de euros, ao mesmo

tempo que insiste em reduzir salários e cortar pensões, é a imagem da injustiça e da falta de credibilidade do

Governo. É o vosso caminho!

Contem com o PS para liderar consensos sociais e políticos alargados que garantam crescimento,

emprego, estabilidade económica e justiça social. É tempo de um novo rumo.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A Mesa regista quatro pedidos de esclarecimentos, a formular pelos Srs. Deputados

Cristóvão Crespo, do PSD, Paulo Sá, do PCP, Filipe Lobo d’Ávila, do CDS-PP, e Pedro Filipe Soares, do BE.

Pergunto ao Sr. Deputado Eduardo Cabrita como pretende responder.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr.ª Presidente, responderei em conjuntos de dois.

A Sr.ª Presidente: — Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Crespo.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, com a responsabilidade

que tem ao nível da Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, penso que devia ter sido

mais rigoroso na intervenção que fez na tribuna.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E mais rigoroso porque aquilo que permite esta regularização fiscal e à segurança social é defender

empresas e empregos. Portanto, sendo este o principal objetivo, penso que foi conseguido com esta medida

do Governo.

Esta medida veio, essencialmente, ajudar a economia e os senhores, nessa bancada, que tanto querem

ajudas à economia, não veem nesta medida o que ela tem de essencial.

De facto, não é uma medida que possa ser repetível no tempo, é uma medida extraordinária e rigorosa, em

primeiro lugar, porque vai permitir um encaixe de dívida que estava à beira da prescrição. Ora, se a dívida

estava em prescrição, ela não é de agora, a dívida estava em prescrição porque foi instaurada em 2007, em

2008, em 2009. Portanto, essa dívida estava à beira da prescrição e, possivelmente, dessa dívida o Estado e

os portugueses não arrecadariam nada. Dessa forma, não teríamos possibilidade de acorrer a todas aquelas

situações que o Sr. Deputado invocou da tribuna, de apoio aos mais frágeis e aos mais desprotegidos.

Portanto, esta é uma das falácias da sua intervenção, Sr. Deputado.

Por outro lado, esta medida permitiu evitar a insolvência de muitas empresas e não só, também de

profissionais livres, de trabalhadores que foram atingidos pela situação difícil que o País viveu, a qual não foi

fruto das políticas do atual Governo,…

O Sr. José Magalhães (PS): — Não!…

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — … mas, sim, das políticas do anterior Governo,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — … que levaram às restrições que o País passou a ter em termos de

Orçamento.

Mas há aqui uma outra situação: estando à beira do início de um novo quadro comunitário, também se

permite que a ele possam aceder muitas dessas empresas, que são viáveis, que têm condições para funcionar

e que, de outra forma, não poderiam aceder aos apoios dos fundos comunitários. E os senhores, que tanto

lutam pela defesa da economia, atacam esta medida!

A Sr.ª Presidente: — Faça o favor de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Já agora, para terminar, penso que o Sr. Deputado já tinha bastantes

responsabilidades políticas quando o Partido Socialista e o seu Governo aprovaram o «Plano Mateus», que,

por acaso, até correu bastante mal. Se nos lembrarmos de como foi o seu funcionamento, do descalabro e do

arrastar no tempo do «Plano Mateus», temos de concordar que, embora os senhores critiquem tanto esta

medida, apesar do impacto e dos resultados que ela alcançou, comparando-a com as medidas do Partido

Socialista, de facto, o PS acabou por encontrar uma medida pior, que funcionou pior e acabou por ser mais

injusta.

A Sr.ª Presidente: — Queria terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Portanto, Sr. Deputado, esta medida não custou nada aos portugueses, porque ninguém deixou de pagar

os impostos que eram devidos. Todas as entidades que deviam impostos pagaram o que era devido e mais

uma parte dos juros de mora.

O Sr. Pedro Jesus Marques (PS): — É apenas falso o que acaba de dizer!…

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Portanto, só não foram tratados os aspetos das custas e das coimas.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente. — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, começaria por fazer um primeiro

apontamento quanto à sua intervenção, dizendo que este perdão fiscal é uma medida extraordinária levada a

cabo pelo Governo com o objetivo de tentar mascarar o falhanço da sua política quanto àquele que era, ou

devia ser, um dos seus objetivos principais, a redução do défice.

Mas, sendo uma medida extraordinária, o perdão fiscal não é repetível nos próximos anos, não é repetível

nem em 2014 nem nos anos seguintes. Por isso, toda a encenação montada pelo Governo em torno do défice

visa apenas tentar fazer crer aos portugueses que os brutais sacrifícios que lhes foram impostos valeram a

pena, preparando, deste modo, caminho para aplicar mais brutais medidas de austeridade, que levarão ao

empobrecimento dos trabalhadores, dos reformados, dos pensionistas e das famílias, ao encerramento de

mais micro e pequenas empresas. Esta é uma situação que não podemos deixar de denunciar aqui.

Sr. Deputado Eduardo Cabrita, a questão do perdão fiscal é indissociável de uma outra questão, os

benefícios fiscais. Como o Sr. Deputado muito bem sabe, recentemente, o Tribunal de Contas denunciou o

facto de o Governo ter omitido, da Conta Geral do Estado para 2012, 1045 milhões de euros de benefícios

fiscais concedidos em sede de IRC a grandes empresas sociedades gestoras de participações sociais

(SGPS).

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Uma vergonha!

O Sr. Paulo Sá (PCP): — O Governo declarou na Conta Geral do Estado apenas 480 milhões de euros em

sede de IRC e escondeu mais do dobro, ou seja, 1045 milhões de euros.

Mas o Tribunal de Contas também denunciou outros factos. Por exemplo, denunciou o facto de o Governo,

no relatório do Orçamento do Estado para 2012, ter inflacionado arbitrariamente os benefícios fiscais em sede

de IRS, multiplicando o valor real dos benefícios fiscais em sede de IRS por 11 para tentar fazer crer aos

portugueses que os benefícios fiscais dos rendimentos dos trabalhadores eram superiores aos benefícios

fiscais dos lucros das empresas. A realidade não é assim, tendo ficado demonstrado numa audição do

Tribunal de Contas que o Governo manipulou descarada e despudoradamente os números para tentar induzir

os portugueses em erro.

Perante este facto, parece-nos indispensável, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, que o Tribunal de Contas

faça uma auditoria rigorosa aos benefícios fiscais. De resto, já apresentámos uma proposta na Comissão de

Orçamento, Finanças e Administração Pública exatamente no sentido de ser solicitada uma auditoria aos

benefícios fiscais aplicada a todos os impostos.

Gostaria de saber, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, se o PS acompanha o PCP nesta proposta no sentido de

solicitar ao Tribunal de Contas uma auditoria sobre os benefícios fiscais, de forma a apurarmos quanto milhões

ou milhares de milhões de euros são concedidos em benefícios fiscais.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr.ª Presidente, agradeço aos meus colegas da 5.ª Comissão, Cristóvão

Crespo e Paulo Sá, as questões que entenderam colocar, porque ajudam a centrar o tema da nossa

declaração política.

A nossa preocupação é esta: solidário com o esforço dos portugueses, com a desgraça em que vivem as

famílias, com a angústia em que vivem as empresas face a três anos de sacrifícios sem resultados, de

sacrifícios injustamente repartidos, de uma recessão sempre acima do previsto pelo entusiasmo, pela vocação

extremista de ir além da troica, o PS está aqui para, com rigor, trabalhar pelo futuro, trabalhar pela esperança

e pela criação de consensos que permitam aquilo que aconteceu, por exemplo, em matéria de IRC.

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Como sabe, a direita trouxe a debate uma proposta que beneficiava as grandes empresas e punha as

pequenas e médias empresas a pagarem mais 75% de impostos. Dessa vez, histórica e excecionalmente,

houve abertura para olharmos para o futuro, para garantirmos que as pequenas e médias empresas tenham

uma redução da taxa a pagar para 17% e que as grandes empresas continuem a pagar exatamente a taxa que

hoje pagam, sem qualquer redução, ao contrário do que, por vezes, o PCP vem dizendo.

Aplausos do PS.

Quando o Governo corta em 10% o complemento solidário para idosos, prejudicando os que recebem

pensões mínimas, quando o Governo corta salários a quem recebe 675 €, quando o Governo pretendia cortar

(e parece querer cortar) retroativamente pensões já constituídas, a nossa aposta é criar confiança, combater a

incerteza, olhar para o futuro com estabilidade nas políticas de rendimentos e preços, criando riqueza para a

repartir equitativamente, criando justiça para criar segurança, para dar esperança aos portugueses, para dar

esperança às empresas, que queremos que tenham sucesso para que os trabalhadores possam melhor

beneficiar desse sucesso.

O Sr. José Magalhães (PS): — Claro!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — E, por isso, só hoje, quando o Governo veio confessar o seu expediente de

última hora, exatamente pelas responsabilidades parlamentares que tenho, entendi usar da palavra sobre esta

matéria.

O Governo, que tirou aos trabalhadores 3200 milhões de euros de IRS, 35,5% de enorme aumento de

imposto sobre o trabalho, mesmo assim, pela sua política recessiva, estava à beira de mais um estrondoso

fracasso em outubro passado, no final das oitava e nona avaliações. Socorreu-se, então, de um recurso de

última hora, de um recurso irrepetível, que não tem nada de estrutural, beneficia o infrator, prejudica

competitivamente as empresas cumpridoras e, como confessou ontem a Ministra das Finanças, nos custa

quase 500 milhões de euros. É isso a vossa justiça social? Não é esse o nosso caminho. O nosso caminho é

um novo rumo de confiança, de crescimento e de emprego.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, tem ainda dois pedidos de esclarecimento.

Tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Lobo d'Ávila, do CDS-PP.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, fala-nos aqui da

troica desejada por esta maioria, fala-nos aqui de andarmos às cavalitas da troica. A verdade, Sr. Deputado, é

que se a troica entrou em Portugal foi pela mão do Partido Socialista!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Pedro Jesus Marques (PS): — Os senhores desejaram-na!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Os senhores é que chamaram a troica e, seguramente, será esta

maioria que conseguirá terminar o programa de assistência iniciado pelo Partido Socialista.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Esse novo rumo de que o Sr. Deputado fala só será possível

porque esta maioria vai conseguir terminar o programa de assistência.

Vozes do CDS-PP e do PSD: — Muito bem!

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O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — O Sr. Deputado Eduardo Cabrita fala-nos aqui, hoje, de

regularização de dívidas, de perdão fiscal.

Sr. Deputado, seguramente conhece o Decreto-Lei n.º 124/96, de 10 de agosto, seguramente conhece o

chamado «Plano Mateus», seguramente conhece um diploma assinado pelo ex-Primeiro-Ministro António

Guterres,…

O Sr. José Magalhães (PS): — E Alcácer Quibir?

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — … seguramente conhece também que desse Governo fazia parte

o líder do Partido Socialista. Não sei se nessa altura também haveria confissões a fazer, como aqui disse

hoje…

Em todo o caso, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, se o Partido Socialista tinha dúvidas sobre o perdão fiscal,

porque é que não pediu a apreciação parlamentar do decreto do Governo? É curioso, Sr. Deputado. Muito

curioso…

Como o Sr. Deputado sabe, e como já sucedeu com governos de centro-direita e também com governos de

esquerda, o Estado permitiu a regularização de dívidas por duas razões: para dar uma última oportunidade às

empresas de poderem regularizar a sua situação fiscal e contributiva para acederem a fundos comunitários

mas também para, no momento em que estamos em recuperação económica, viabilizar as empresas que são

viáveis.

Por isso, Sr. Deputado, é importante dizer que ninguém perdoou ao capital, atenuou-se os juros; e ao

arrecadar 1,2 mil milhões de euros estamos claramente a ter um sinal de que a economia quer crescer e

recuperar.

Mas, Sr. Deputado, falemos também de impostos, já que referiu aqui a matéria.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, queira terminar.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Os senhores não sabem que o PS assinou um Memorando de Entendimento que prevê que não pode

haver qualquer moderação fiscal sem autorização prévia da troica? O PS não sabe que 2015 será

precisamente o primeiro ano fora do Memorando? O PS não sabe que o Governo está disposto a trabalhar

tecnicamente para realizar uma reforma que permita uma moderação fiscal em 2015? Então, a resposta do PS

é colocar-se de fora de tudo isso?

Termino, Sr.ª Presidente, dizendo que «lata» é dizer-se que se quer consensos e «assobiar para o lado»,

«lata» é propor um tribunal rapidinho para os mais ricos e para os estrangeiros. Precisamos mais do que isso

do PS! O País exige mais do que isso do PS!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do

Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Eduardo Cabrita, devo dizer-lhe que não

foi sem algum espanto que, na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, na audição que

referiu, ouvi a resposta da Sr.ª Ministra das Finanças quando lhe foi perguntado aquilo que era óbvio, ou seja,

tendo ela feito grande alarido por ter recebido 1277 milhões de euros desta regularização de dívidas, qual

seria o custo, quanto deixávamos de receber em juros de mora e em juros compensatórios, portanto, quanto é

que perderíamos de facto.

A minha estranheza começou no imediato, porque, face a esta pergunta, a Sr.ª Ministra não teve qualquer

resposta, ainda ia estudar, ainda ia ver… Afinal, já tinha atirado os foguetes sem saber se havia motivos para

fazer a festa.

A resposta chegou hoje. Soubemos pela comunicação social, de manhã, e depois pelo e-mail da comissão

que, afinal, o Governo respondeu, dizendo que, por cada 2,5 € que foram regularizados, perdemos 1 €. E este

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é um sucesso, um milagre das escolhas do Governo?! É, afinal, mais um brinde para trazer na lapela?! Há,

assim, motivos para tanta alegria?! Como é possível?!

Se utilizarmos estes 494 milhões de euros, estamos por exemplo a falar — numa unidade métrica que é

conhecida do CDS — de um submarino que desapareceu das contas públicas. É esse o resultado deste

perdão fiscal!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Afinal, o perdão fiscal custou um submarino aos contribuintes! Esta é a

escolha clara e inequívoca.

Aplausos do BE.

Como é que isto é compreensível? Como é possível este perdão fiscal, que custou mais do que todo o

Orçamento retificativo, mais o valor do alargamento da contribuição extraordinária de solidariedade a quem

ganha pensões de 1000 € por mês, mais o aumento da contribuição para a ADSE (todos os trabalhadores e

pensionistas do Estado vão pagar mais 1% para a ADSE)? Mais do que tudo isso somado são 494 milhões de

euros! Sr. Deputado, não tenho palavras para descrever esta situação, a não ser dizer que, afinal, a maioria só

fica satisfeita quando perdoa a alguns e mais satisfeita ainda quando vai ao bolso de todos aqueles que

trabalham ou trabalharam.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados Pedro Filipe Soares e Filipe Lobo d’Ávila,

agradeço as vossas questões.

O Deputado Pedro Filipe Soares referiu, fundamentalmente, a experiência vivida pelos Deputados que

integram a Comissão de Orçamento e Finanças. Por isso, Sr. Deputado Filipe Lobo d’Ávila, com a

consideração e a amizade que tenho por si, permita-me que lhe lembre que privilegio o rigor, que privilegio a

busca de consensos e que privilegio a atenção ao futuro.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr. Deputado, eu sei que o CDS vive, às vezes, momentos difíceis, mas foi

o vosso parceiro de coligação que dizia, ainda em novembro de 2010, não que estava preparado para

governar com o CDS, mas que estava preparado para governar com o FMI! Esse era o parceiro de coligação

que Passos Coelho anunciou em novembro de 2010.

Aplausos do PS.

Em 2011, houve para Portugal uma circunstância muito especial, quando queríamos estabilidade social,

estabilidade política, consensos a médio e longo prazo. Ora bem, o que caracteriza a crise portuguesa é que a

Europa teve a Irlanda, em que a banca implodiu; teve a Grécia, com uma crise social profunda; e teve

Portugal, em que uma crise política deliberadamente aberta forçou Portugal a um resgate sem sentido…

Vozes do PSD: — Oh!…

Aplausos do PS.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — … e permitiu criar um Governo que, orgulhosamente, até a receita

estrondosamente falhar, sempre disse que ia além da troica.

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Quando a troica pedia 5000 milhões, o Governo oferecia 10 000 milhões.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Por isso, no ano passado, a aposta foi clara: 35,5% de aumento de IRS

face ao ano anterior — 3,2 mil milhões de euros!

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — É esse o legado histórico que o «partido dos contribuintes» também dá

para esta matéria!

Sr. Deputado, não vamos confundir acordos de pagamentos a médio e a longo prazo, que não têm

nenhuma dimensão eleitoral nem orçamental e que visam salvar empregos em empresas viáveis com aquilo

que o Governo decidiu à última hora, em outubro, negociando 5,5% de défice, porque tinha falhado o objetivo

inicial de 4,5%, e quando mesmo os 5,5% estavam claramente à beira do fracasso. Portanto, esta medida foi

um expediente de última hora, de outubro e novembro, que valeu 1200 milhões de benefício do infrator e que

nos custou a todos 500 milhões.

Aplausos do PS.

Basta ver que as escolhas eram múltiplas. Neste caso, o FMI e a Comissão Europeia foram muito claros ao

dizerem que esta medida incentivava o incumprimento, que preferiam que não tivesse sido adotada e que foi

da exclusiva responsabilidade do Governo português, que fez uma escolha: entre pedir mais 400 milhões aos

pensionistas ou às viúvas ou poupar 500 milhões em benefícios fiscais, resolveu optar por salvar o Orçamento,

fazer maquilhagem orçamental e dar 500 milhões a quem preferiu.

Aplausos do PS.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente: — Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Sr.ª Presidente, dá a sensação que o Sr. Presidente da Comissão de

Orçamento, Finanças e Administração Pública não leu a informação que o Governo lhe transmitiu.

Solicito, pois, que, através da Mesa, seja distribuída às bancadas essa informação.

O Sr. Deputado Eduardo Cabrita fala de empresas, mas o que verificamos é que, dos 300 000 contribuintes

com dívidas fiscais, 260 000 são contribuintes em nome individual…

A Sr.ª Presidente: — Vai ser distribuído o documento, Sr. Deputado.

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — … e à segurança social, dos 400 000 contribuintes, 120 000 são

pessoas em nome individual.

O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Afinal, não se trata de grandes empresas!

O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — Afinal, não são grandes empresas.

Aplausos do PSD.

Protestos da Deputada do PS Isabel Alves Moreira.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, o documento será distribuído.

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Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita, creio que também para interpelar a Mesa.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): — Sr.ª Presidente, de facto, já hoje mandei distribuir a todos os Deputados da

Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública a resposta que ontem o Governo prestou e na

qual caracteriza detalhadamente os 494 milhões de euros de perda de receita fiscal.

Peço à Sr.ª Presidente que a faça distribuir por todos os Srs. Deputados, dado que, manifestamente, não é

conhecida de todos e que demonstra como 38% da receita é perdida em despesa fiscal.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Vai ser distribuída, Sr. Deputado.

Passamos, agora, à declaração política do CDS-PP.

Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Numa declaração política

anterior, esbocei um enquadramento acerca do passado recente e da missão hercúlea que este Governo

herdou, mas nunca é demais relembrar.

Elevados défices, em torno dos 10%, como em 2009 e 2010, contribuíram para que a dívida pública

duplicasse, colocando o País em regime de protetorado, perdendo boa parte da autonomia financeira e

liberdade de decisão. Foi a falência, como é evidente, de um modelo de governação que não podemos nem

devemos repetir.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O Governo procurou, desde o primeiro momento, de forma realista,

minimizar os sacrifícios, suavizar e adaptar o Programa de Assistência à realidade económica e social de

Portugal, protegendo os mais vulneráveis e repartindo equitativamente os sacrifícios.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Haja descaramento!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Os portugueses têm sofrido os efeitos de uma rutura financeira a que

chegamos em 2011, têm respondido ao desafio com enorme coragem e com uma notável responsabilidade, a

mesma que, muitas vezes, devo dizê-lo, tem faltado a quem, de forma irresponsável e perigosa, colocou o

País à beira do precipício.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Que falta de vergonha!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É justo, por isso, prestar homenagem ao conjunto da sociedade

portuguesa. Existem hoje evidentes sinais de progresso ao nível das contas públicas portuguesas, ao mesmo

tempo que a economia começa finalmente a recuperar.

Há um País que todos os dias acorda com vontade de provar que é melhor, maior e mais forte do que as

dificuldades que enfrenta…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vocês é que não deixam!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … e há um outro que nega a realidade, optando por dizer que os dados

estatísticos oficiais, quer sejam nacionais ou internacionais, não correspondem à realidade. Esses

portugueses sentam-se à esquerda deste Hemiciclo e são os mesmos que davam credibilidade aos dados que

hoje negam. Ninguém se lembra de os ver questionar, há um ano atrás, a veracidade dos dados quando eles

eram negativos.

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A realidade é que hoje o País está melhor, hoje o País respira um clima de confiança, e existem dados que

podem comprovar exatamente isso.

A economia portuguesa cresceu nos segundo e terceiro trimestres de 2013. Enquanto o Partido Socialista

prefere falar numa espécie de «contentamento descontente», nós preferimos dizer que Portugal está

finalmente a crescer e que saiu da recessão técnica.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Em 2013, por cada empresa que fechou abriram mais duas, tendo

existido menos insolvências e uma quebra de 20% nos encerramentos. São dados do Instituto Nacional de

Estatística.

E o que diz a oposição sobre isso? Nada! Recordo, aliás, o que dizia, em palavras proferidas há um ano

atrás, o ex-Ministro da Economia, Manuel Pinho: que o «melhor indicador da mudança na economia eram as

falências e a criação de empresas». Ora, é exatamente esse indicador que nos dá o sinal que algo de positivo

está a acontecer na economia portuguesa.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Os indicadores de confiança dos consumidores e do clima económico

continuam a subir desde o início de 2013. Os consumidores e os empresários estão hoje mais confiantes no

seu País. Só a oposição é que continua a remar para o mesmo lado.

Poder-se-iam dar mais exemplos da recuperação económica e de outros dados, mas ficar-me-ei por este

último, dado o seu carácter fundamental: Srs. Deputados, as exportações portuguesas, em 2013, continuaram

a crescer, num contexto em que a Europa ainda atravessa enormes dificuldades.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Não desmentimos que o crescimento das exportações em 2013 foi

inferior ao crescimento verificado em 2012. Isto é também verdade.

Contudo, num contexto de austeridade na Europa, e quando se dizia que em 2012 Portugal já estava no

limite do seu potencial, no que respeita ao nível das exportações, a verdade é que o ano de 2013 representou

exportações de mais de 47 000 milhões de euros, quando em 2012 foram um pouco mais de 45 000 milhões.

Ou seja, existiu um crescimento superior a 4,5%.

Acresce ainda o facto de, apesar de as importações também terem crescido, Portugal ter conseguido

encerrar o ano com uma taxa de cobertura das suas exportações — prestem bem atenção, Srs. Deputados! —

de 83,6%, ou seja, o melhor registo desde 1977!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Para todos aqueles que teimam em desvalorizar os dados sobre as exportações, dizendo que só um ou

outro grupo de produtos é que foi responsável por esse crescimento, permitam-me avançar alguns exemplos

de crescimento de exportações em 2013 — os dados que vou citar são da AICEP (Agência para o

Investimento e Comércio Externo de Portugal): plásticos e borrachas, 5,6%; químicos, 6%; alimentares, 8%;

pastas celulósicas e papel, 4,7%; calçado, 7,8%; materiais têxteis, 5,5%; ótica e precisão, 22,1%; peles e

couros, 22,3%.

Uma outra conclusão interessante sobre a evolução das exportações portuguesas poderá ser comparada

em termos do ano de 2010 e o ano de 2013.

Concluímos, com essa comparação, que as exportações de bens para fora da União Europeia já são

superiores em 50% face a 2010, enquanto dentro da União Europeia são de 18%. Fica assim bem patente que

as exportações portuguesas conseguiram conquistar novos mercados, num contexto de dificuldades

europeias: mais produtos, mais países, mais mercados — isso é uma evidência.

Quatro exemplos de destinos dos nossos bens que foram para fora da Europa: em 2013, face a 2010, as

exportações aumentaram, Srs. Deputados, mais de 50% para os Estados Unidos, mais de 63% para Angola,

mais de 75% para o Brasil e mais de 180% para a China.

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Estes resultados, Sr.as

e Srs. Deputados, são mérito, sobretudo, dos portugueses (dos trabalhadores e dos

empresários) e também mérito deste Governo — e aqui uma palavra de especial agradecimento à ação do

AICEP — que, através de uma ambiciosa agenda de diplomacia económica, tem ajudado a promover as

empresas portuguesas nos mercados externos.

Importa deixar, no entanto, um alerta: estes sinais exigem proteção, realismo e humildade democrática.

Tudo o que se pode fazer para se criar um clima favorável e mais propício para que mais empresas exportem

e possam partilhar destes bons resultados deve ser acarinhado.

Foi assim que este Governo atuou, criando a linha PME Crescimento 2014, anunciada recentemente pelo

Ministério da Economia, que contempla 500 milhões de euros para dinamizar as exportações e a

disponibilidade de um novo quadro comunitário de apoio 2020, que tem, também ele, 6000 milhões de euros

destinados exclusivamente às PME (pequenas e médias empresas) portuguesas.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, a criação de consensos, a responsabilidade política, a tentativa de

acarinhar e proteger estes dados é uma responsabilidade de todos. Saibamos estar à altura dessa exigência e

desse compromisso.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Hélder Amaral, inscreveram-se quatro Deputados para pedidos de

esclarecimento, os Srs. Deputados Mariana Mortágua, do BE, João Galamba, do PS, Nuno Matias, do PSD e

Bruno Dias, do PCP.

Entretanto, o Sr. Deputado Hélder Amaral informou a Mesa que responderá a conjuntos de dois.

Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, tem a palavra.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, compreendo a difícil

posição em que se encontra a maioria: sabe que tem eleições à porta e precisa de inventar milagres.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Pensava que era o Bloco!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Precisa de inventar um milagre que desvie as atenções de factos reais:

o aumento exponencial da dívida pública, que está em 130% do PIB; falhanços orçamentais sucessivos —

falharam todas as metas orçamentais a que se propuseram; mas, sobretudo, é preciso desviar as atenções

das condições reais de vida dos portugueses — a pobreza, a precariedade, as desigualdades sociais, os

sucessivos favorecimentos à banca e aos grandes interesses económicos, quando comparados com as

descidas salariais e com o sofrimento daqueles que querem trabalhar neste País e não conseguem.

E o milagre que a maioria conseguiu inventar foi o das exportações e o do reequilíbrio da balança

comercial.

Lamento desiludir o Sr. Deputado na sua fé, mas vou fazê-lo, usando dados do último relatório estatístico

do INE (Instituto Nacional de Estatística), onde se diz que o crescimento das exportações em 2010 foi de

17.6%; em 2011, foi de 14.9%; em 2012, foi de 5.7%; e, em 2013, foi de 4.6%. O seu milagre é, pois, o

crescimento mais pequeno das exportações desde a crise económica.

E volto a referir dados do INE para avaliar a composição deste crescimento das exportações de que o Sr.

Deputado tanto se orgulha. Vamos ver, então, qual é a composição destas exportações: fornecimentos

industriais — aumento de 1.1%; combustíveis e lubrificantes — aumento de 44.8%; máquinas — aumento de

5.7%; material de transporte — redução de 1.2% (há um outlier aqui). Os combustíveis equivalem a 44.8% do

aumento das exportações, pelo que o seu milagre de reconversão da economia em Portugal tem um nome:

refinaria da Galp. É esse o seu milagre das exportações em Portugal.

Mas o Sr. Deputado sabe bem que o milagre do equilíbrio externo e da balança comercial não se deve a

um aumento das exportações, porque esse vinha a acontecer e, como já vimos, é menor este ano do que foi

anteriormente. O equilíbrio da balança comercial conseguiu-se devido a uma quebra brutal das importações; é

o empobrecimento que justifica o equilíbrio da balança comercial. Portanto, o vosso milagre não é mais do que

o ajustamento da economia portuguesa a um brutal processo de empobrecimento. É esse o seu milagre, Sr.

Deputado, o empobrecimento da população portuguesa.

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O desafio que lhe deixo é que pare de tentar inventar milagres, comece a olhar para a realidade e que, por

uma vez, compreenda que não há nenhuma economia saudável enquanto não houver salários dignos,

enquanto não houver criação de emprego, enquanto não houver recuperação, de facto, da produção industrial,

enquanto não houver financiamento decente às empresas, enquanto não houver condições de trabalho e o fim

da precariedade. É isso que irá definir o que é uma economia saudável ou o que não passa de um milagre

inventado para disfarçar o desastre de políticas económicas.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba, do PS.

O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, no seguimento da intervenção

da Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, penso que é claro perceber o que está por detrás do seu milagre.

Infelizmente, aos portugueses, depois da tragédia calha-lhes a farsa. Esse seu discurso, Sr. Deputado, é

uma farsa; aliás, o discurso da maioria é uma farsa. O Sr. Deputado, se for sério, …

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não é sério?! Deixar calotes e fugir para Paris é que não é sério!

O Sr. João Galamba (PS): — … há de reconhecer que o principal responsável pelo crescimento das

exportações em 2013 foi um investimento que vem de uma altura em que o seu partido dizia que não havia

investimento! A refinaria é da altura de um governo que o seu partido diz que deteriorou a capacidade

competitiva do País.

Protestos do CDS-PP.

Ora bem, o Sr. Deputado não pode vangloriar-se de um crescimento das exportações que é, em grande

parte, devido a uma medida de um governo que o senhor todos os dias diaboliza. Isso não é sério, Sr.

Deputado!

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. João Galamba (PS): — A refinaria de Sines é importante para esta análise. E como ela atingiu o seu

limite de capacidade, o crescimento deste ano não se poderá repetir para o ano que vem, a não ser que este

Governo crie uma nova refinaria em Sines, o que não consta que esteja nos planos de investimento da

maioria.

Portanto, Sr. Deputado, não só este é o crescimento das exportações mais baixo dos últimos tempos, como

referiu a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, como mais de metade desse crescimento das exportações deve-se

a um projeto que vem de um governo que o senhor diaboliza todos os dias.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Já disse isso duas vezes!

O Sr. João Galamba (PS): — Sem a refinaria de Sines, as exportações cresceriam apenas 2.2% — e

atente neste número, Sr. Deputado, já que pediu a atenção dos Deputados para outro aspeto que disse

anteriormente! Sem a refinaria de Sines, que vem de trás, o crescimento das exportações seria de 2.2% do

PIB.

Mas há um dado do Sr. Deputado ainda mais grave, que se prende com a alegada transformação estrutural

da economia portuguesa.

Como disse a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, e bem, e como o Partido Socialista tem repetido sempre

que fala do ajustamento da balança externa …

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — É a «bloquização» do PS! São o Syrisa!

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O Sr. João Galamba (PS): — Não tenho problema em concordar com os meus adversários políticos. Se

isso vos causa algum problema, não causa, certamente, ao Partido Socialista!

Portanto, Sr. Deputado, atente bem nisto: mesmo em recessão, se descontar os combustíveis, a nossa

balança externa deteriorou-se, porque sem a refinaria de Sines as exportações crescem apenas 2.3%, mas as

importações crescem 2.8%. Ou seja, sem a refinaria de Sines, a taxa de cobertura deteriora-se, a balança

deteriora-se — e ainda estamos em recessão. Se acabar a recessão e a economia entrar em estagnação ou

crescimento económico, aposto consigo, Sr. Deputado, que a balança de pagamentos vai deteriorar-se outra

vez, porque essa grande melhoria de que o senhor tanto se vangloria deve-se, apenas, a uma coisa: à

pobreza. E se ela é estrutural, se essa redução é estrutural, o Sr. Deputado tem de dizer aqui, nesta Câmara,

a todos os portugueses e a todos os Deputados, que, então, o desemprego, as falências e a emigração que a

tornaram possível também são estruturais, e isso tenho a certeza que o Sr. Deputado não tem coragem de

dizer.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Peço aos Srs. Deputados que se contenham no limite do tempo de que dispõem para

formularem perguntas.

O orador anterior também ultrapassou o seu tempo e, como a Mesa não prestou a atenção necessária, o

Sr. Deputado João Galamba teve direito a um pouco mais de tempo. Mas pedia aos próximos oradores o favor

de manterem o tempo regulamentar.

Sr. Deputado Hélder Amaral, tem a palavra para responder.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, começo por agradecer aos Srs. Deputados Mariana

Mortágua e João Galamba as perguntas que me colocaram.

Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, não deixa de ser curioso que tenha querido rebater aquilo que afirmei

dando dados ligeiramente diferentes, mas sempre dizendo «a crescer», «a crescer», «a crescer». Foi

exatamente o que eu disse!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE) — É o milagre!…

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Em resposta à seriedade que me é pedida no debate — e julgo que

sobre isso não terá dúvidas —, reconheci que estamos a crescer menos do que no ano anterior mas, ainda

assim, e nas contas agregadas que fiz, provei que estamos, de facto, com números avassaladores em relação

a 2010, que é exatamente o ano do tal governo que o Sr. Deputado João Galamba defende com tanta

coragem.

O Sr. João Galamba (PS): — Não é com coragem, é com orgulho!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O tal governo do Eng.º José Sócrates…

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Do PS!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O tal governo do PS e do Eng.º José Sócrates, que aumentou em

44.3% a dívida pública …

O Sr. João Galamba (PS): — Ah, já mudou de tema!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Não vou mudar de tema, não.

Esse governo deixou o País numa situação financeira tal que dificultou a vida às famílias, às empresas e,

obviamente, dificultou toda a ação deste Governo, trazendo a troica, que nos põe limites evidentes a uma

governação que devemos fazer e que queremos fazer.

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Portanto, o Sr. Deputado defenderá o que quiser, com a convicção que quiser, mas vou dar-lhe mais más

notícias para seu descontentamento, que é o contentamento dos portugueses. Por exemplo, segundo dados

de ontem, a produção industrial em Portugal foi a que mais cresceu em dezembro, e cresceu mais do que em

países como a Suécia, a Holanda e a Croácia.

Sabe o que significa isso, Sr. Deputado? Significa que o senhor não tem razão nenhuma. Gostava de ter

razão, a mesma razão quando essa bancada dizia que estávamos em espiral recessiva e que todos estes

dados não eram atingíveis — era o que o Sr. Deputado dizia —, mas a realidade e o esforço dos portugueses

estão a ultrapassá-lo, Sr. Deputado!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Obviamente que tal se deve à refinaria de Sines e ao aumento das importações, mas também lhe dei

dados relativos a outros produtos — já sabia que vinha com esses argumentos, por isso é que lhe dei dados

de outros produtos. Esconde que no setor do calçado a situação é boa? Esconde que no setor agroindustrial

os dados também são excelentes?

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE) — Não valem nada!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, vou também dar-lhe uma péssima

notícia para si, mas que é uma boa notícia para as empresas portuguesas e para os portugueses.

Sabe que o setor do turismo cresceu 5.9% em novembro de 2013? Sabe que o número de dormidas na

hotelaria aumentou 8%? Sabe disso? É mais uma boa notícia para as famílias, para as empresas e para os

portugueses e é uma péssima notícia para a oposição. Mas confesso que prefiro dar boas notícias aos

portugueses e péssimas notícias à oposição.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Segue-se no uso da palavra, também para pedidos de esclarecimento, o Sr.

Deputado Nuno Matias, do PSD.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Filipe Matias (PSD): — Sr.ª Presidente, dirijo um cumprimento especial ao Sr. Deputado

Hélder Amaral pela relevância do tema que nos trouxe, pelo facto de ter realçado resultados que são evidentes

e incontestáveis, mas também pela homenagem que fez ao esforço de Portugal e dos portugueses, que não

desistiram e resistiram no sentido de dar a volta a uma crise que não era da sua responsabilidade, estando em

boa parte o seu sacrifício, o seu esforço e a sua ambição a ser a solução para essa crise.

Gostaria de deixar isto bem claro e perguntar-lhe se não considera que a reação da oposição, o sentimento

de nervosismo, de incómodo e de repulsa em relação àquilo que são dados objetivos resulta numa falta de

respeito evidente em relação a cidadãos e empresas que, realmente, encontraram no modelo de negócio, de

criação de valor, de potenciar a criação de emprego, capacidade de dar a volta a uma situação que tinha sido

criada não só no último governo socialista, mas desde o final da década de 90, com um conjunto de causas, aí

sim estruturais, que induziram na economia portuguesa uma desalavancagem ao seu crescimento.

Falou-se aqui em milagre económico. Será que o aumento dos indicadores da produção industrial é ou não

é real? Quando se falou na baixa do crescimento e, sobretudo, na baixa evidente da taxa de desemprego, esta

é ou não real há onze meses consecutivos? Quando se falou na criação líquida de emprego, é ou não real?

Quando se falou no aumento das exportações, é ou não real?

Estamos a falar do quê? Estamos a falar de dados concretos ou da fantasia que a oposição opta por

encontrar, num discurso já gasto, como era o tal da espiral recessiva, que não se verificou porque houve um

governo que não desistiu? Houve um governo que não desistiu e, sobretudo, um conjunto de portugueses e

uma nação inteira que uniram esforços e lutaram para dar a volta à crise e para demonstrar que, com estes

dados, aquilo que estamos a construir é um paradigma de crescimento diferente mas, essencialmente, um

futuro mais estável e sustentável.

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Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Teresa Caeiro.

A Sr.ª Presidente: — Para mais um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, mais uma vez, assistimos aqui a

um número de, diria, estatística acrobática, com a maioria parlamentar a puxar pelos números, a torcê-los, a

manipulá-los, certamente com o objetivo de dar um aspeto de bonito efeito. Mas, lamento informá-lo de que o

que deu, afinal, foi um espetáculo lamentável.

É que, enquanto os senhores festejam a vossa estatística, a realidade concreta mostra um País que já está

a pagar caro as opções desastrosas deste Governo e da sua política de manipulação e de mistificação. O que

temos, na realidade concreta, na vida concreta dos trabalhadores e dos micro e pequenos empresários, é a

degradação económica e a fragilização dos setores produtivos, em resultado da evolução do investimento e do

impacto que terá o roubo nos salários, nas reformas e nas pensões, na evolução da economia portuguesa.

Não há golpe de ilusionismo estatístico que possa iludir as graves consequências para o País e para a

economia quando o investimento cai ao nível de 1988, Sr. Deputado! Não há golpe de ilusionismo estatístico

que possa camuflar uma dependência cada vez maior, com uma dívida que cresceu, no final de 2013, para

129,4% do PIB! Não há golpe de ilusionismo estatístico que possa esconder aquela que é a maior exportação

que os senhores vêm promovendo: a exportação do povo! Desde que os senhores tomaram posse, mais de

250 000 portugueses foram expulsos pela vossa política e emigraram. É a eles que o senhor dá os parabéns,

Sr. Deputado?!

Aplausos do PCP.

Esse «número» que o senhor aqui veio fazer não é novo, Sr. Deputado. Todo o santo dia, os senhores

aparecem a anunciar aumentos de produção e das exportações. Homenagens, parabéns e palmadas nas

costas, não faltam! Mas, depois, quando se trata de aumentar salários e distribuir essa riqueza e, assim,

promover até a criação de mais riqueza através da procura interna, quando chega a hora da verdade sobre a

tradução concreta desses resultados que os senhores anunciam, então, aí, vê-se que é só conversa, Sr.

Deputado — conversa de embalar, conversa de caça ao voto, enquanto prosseguem o saque e o agravam

cada vez mais. Dão os parabéns a um povo que condenam à miséria, à exploração e à emigração, e exibem,

com orgulho, aos olhos do mesmo povo, a riqueza que lhe vão espremendo para entregar aos senhores do

dinheiro.

Pode crer, Sr. Deputado, podem crer os Srs. Deputados e os Srs. Governantes da direita, que não há

encenações, nem propagandas, nem provocações a quem trabalha e luta pelos seus direitos que consigam

apagar ou perpetuar essa política de desastre, empobrecimento e exploração a que querem condenar o País e

o povo. É que a luta dos trabalhadores e do povo está aí todos os dias, nas empresas e locais de trabalho, a

construir a mudança em cada dia. É esse o maior fator de confiança no nosso futuro coletivo: a derrota deste

Governo e desta política e a mudança para uma política patriótica e de esquerda.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, quero agradecer aos Srs. Deputados Nuno Filipe

Matias e Bruno Dias as perguntas que me fizeram.

Começo por responder ao Sr. Deputado Bruno Dias, dizendo-lhe que, sobre manipulação de estatísticas,

de realidades e da História, não consigo competir com o Partido Comunista Português.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!

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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Portanto, sobre essa matéria, não posso dizer muito. Mas posso fazer-

lhe este desafio: uma vez que, no meu discurso, cito a fonte de todos os dados, posso dar-lhe uma cópia

desses dados e o Sr. Deputado, quando quiser, confronta-me e diz-me se algum dos dados que utilizei foi

inventado por mim ou se é do Eurostat, da OCDE ou do Instituto Nacional de Estatística.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Talvez os dados destas instituições, que, no passado, V. Ex.ª elogiava

quando eram negativos, agora o deixem triste e preocupado. Mas, olhe, quanto a isso, não posso fazer nada.

E não é uma questão de acreditar em milagres. Mas, sendo eu um homem de fé, quero dizer-lhe que tenho

muita fé nas empresas e nos trabalhadores, nos portugueses e na sua capacidade para ultrapassar essas

dificuldades.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mais vale falar da vida concreta das pessoas!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — No entanto, posso também dar-lhe uma má notícia para si: a OCDE,

sobre a taxa de desemprego atualizada em dezembro de 2013, diz que Portugal registou uma taxa de

desemprego de 15,4%, ou seja, menos 0,1%, relativamente ao mês anterior.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Por que é que será?!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Não é um dado meu, é mais um dado da OCDE.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não sabe porquê? Vá ao aeroporto da Portela!

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Srs. Deputados, terminei a minha declaração dizendo — acho que isso

é que é relevante — que nós não escondemos as dificuldades, não esquecemos o ponto de partida, não

esquecemos que ainda falta muito caminho para fazer. Mas ignorar a realidade e não querer ter uma palavra

de conforto para com os trabalhadores, que o Sr. Deputado tanto defende, e os portugueses em geral, parece-

me abusivo.

E sabe o que é que magoa mais? É saber que, por exemplo, o Comissário europeu elogiou os sacrifícios

feitos pelos portugueses, a OCDE está positivamente surpreendida com Portugal e admite uma saída limpa do

resgate, mas quando chegamos ao Hemiciclo, aos eleitos pelos portugueses, parece que uma parte deles está

descontente com estes resultados, parece que estão zangados, que estão tristes com isso.

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

Sr. Deputado, não consigo perceber, não consigo perceber!

O meu desafio é o de que possamos ultrapassar esse trauma e que possamos todos contribuir e trabalhar

para aproveitar todos esses dados, tenham eles a origem e as causas que tiverem. Temos de proteger esses

dados, temos de potenciá-los, porque é isso que vai fazer com que o emprego cresça, com que o investimento

estrangeiro cresça, com que as exportações cresçam, com que o mercado interno cresça.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E os salários?

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É nisso que estamos concentrados. VV. Ex.as

estão concentrados em

destruir, mas isso é uma proposta vossa. Os portugueses saberão avaliar e julgar em momento oportuno.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Pedro Nuno Santos (PS): — Exatamente! Agora disse tudo! Os portugueses irão avaliar!

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma declaração política, em nome do PCP, tem a palavra o Sr.

Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Enquanto a maioria dos portugueses

empobrece, o Governo decreta o fim da crise. A falta de vergonha de um Governo transformado em comissão

eleitoral da coligação PSD/CDS parece não ter limites.

Os membros do Governo responsável pelo maior aumento de impostos de que há memória prometem

baixar os impostos em 2015. Os membros do Governo que impôs aos trabalhadores cortes salariais infames e

inauditos vêm dizer que a economia portuguesa não pode desenvolver-se na base da mão-de-obra barata.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É verdade!

O Sr. António Filipe (PCP): — O Governo que fustiga e insulta os portugueses por alegadamente terem

vivido acima das suas possibilidades sorteia carros topo de gama, rebaixando as obrigações fiscais ao nível

das rifas.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — O Vice-Primeiro Ministro, que endividou o País para comprar submarinos,

afina o seu melhor espanhol para criticar quem governa com o dinheiro dos outros.

Na ânsia de minorar a derrota eleitoral que se avizinha para a coligação PSD/CDS, os membros do

Governo tentam desesperadamente conciliar o inconciliável: defender os méritos da austeridade que tem vindo

a arrasar a vida dos trabalhadores, dos reformados e das suas famílias e, ao mesmo tempo, prometer fazer

daqui para a frente exatamente o contrário do que têm feito até aqui.

E o País vai assistindo, atónito, a um discurso governamental sem sentido, obcecado com as eleições e

completamente alheio à realidade, no meio dos escombros de uma economia em ruínas, em que os jovens

não encontram outra solução que não seja emigrar, em que as pequenas e médias empresas, que não

beneficiam das benesses escandalosas atribuídas aos grandes grupos económicos, vão desaparecendo,

afogadas pela falta de poder de compra da grande maioria da população, em que as famílias desesperam por

falta de meios para fazer face às despesas necessárias para levar a vida com um mínimo de dignidade, em

que as pensões e reformas dos mais idosos, que servem cada vez mais de amparo dos mais novos, são

impiedosamente cortadas, em que as populações mais desfavorecidas veem negado o seu direito a serviços

públicos essenciais de proximidade, na saúde, na educação, na justiça e até nos correios, é no meio dos

escombros desta economia em ruínas e desta sociedade em desespero que os membros do Governo

percorrem o País em campanha eleitoral a reivindicar sucessos e a fazer promessas que já só enganam quem

se quiser deixar enganar.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. António Filipe (PCP): — No momento em que é desmantelada uma unidade industrial com a

importância dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, assistimos a discursos piedosos sobre a necessidade

de reindustrializar o País e sobre a importância do mar como grande desígnio nacional.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É verdade!

O Sr. António Filipe (PCP): — Entretanto, os pescadores, que há dois meses não podem sair para o mar

devido às condições adversas do tempo, não têm qualquer apoio para garantir a sua sobrevivência enquanto

persistir a adversidade.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

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O Sr. António Filipe (PCP): — Num momento em que as bolsas de investigação científica sofrem cortes

drásticos, assistimos a discursos piedosos sobre a indispensabilidade da inovação para ultrapassar a crise.

No momento que em vemos até um comissário europeu, ontem, em Lisboa, com toda a hipocrisia do

mundo, a zurzir na austeridade e nas suas consequências nefastas, temos o Primeiro-Ministro a dizer no

Tramagal que agora, sim, os portugueses estão a viver de acordo com as possibilidades, o FMI a dizer que é

preciso alterar ainda mais, para pior, a legislação laboral, e temos o Governo, hoje mesmo, a aprovar em

Conselho de Ministros novas regras para facilitar ainda mais os despedimentos.

No momento em que acaba de aprovar, no Orçamento retificativo, novos cortes nas reformas e nos

salários, o Governo pretende diferir os seus efeitos para depois das eleições europeias, para que os

portugueses afetados não «sintam na pele» os efeitos dessas medidas antes de ir a votos.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Entretanto, o Ministro Poiares Maduro vai percorrendo o País a anunciar os

milhares de milhões que hão de vir da União Europeia para nos garantir um futuro radioso.

É esta a realidade com que os portugueses se confrontam: um Governo a empobrecer o País e a criar

excêntricos todos os dias.

Aplausos do PCP.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A mais recente operação mistificatória do discurso propagandístico do

Governo chama-se, agora, «saída limpa». Quando se tratou de negar a inevitabilidade de um segundo

resgate, foi inventado o «programa cautelar». Quando se começou a perceber que o «programa cautelar» não

era mais nem menos do que a nova designação da troica, foi posta a circular a «saída limpa» e foi

encomendado o champanhe para a semana anterior às eleições europeias.

E como que para dar credibilidade a essa operação, foi anunciado mais um sucesso no regresso aos

mercados: o Governo conseguiu a enorme proeza de se endividar a uma taxa de juro proibitiva, superior a 5%,

para poder pagar os juros das dívidas anteriores.

Enquanto se mantiver este Governo e esta política, enquanto se mantiver a sujeição às imposições da

troica e do seu Memorando, enquanto se mantiver a obediência cega à ditadura dos mercados e dos

especuladores e enquanto se aceitar como inevitável que haja cada vez mais pobres para que os ricos sejam

cada vez mais ricos, não haverá saída limpa de espécie nenhuma. Quem lançou o País na lama não lhe pode

prometer uma «saída limpa».

Chamem-lhe «saída limpa», «programa cautelar», «ajustamento», chamem-lhe o que quiserem, o que

oferecem aos portugueses, à grande maioria, a quem trabalha ou trabalhou uma vida inteira, a quem estuda

ou quer estudar para ter uma vida digna é a condenação à pobreza, ao abandono ou à emigração.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Portugal está hoje muito pior do que estava antes do Memorando da troica.

O País tornou-se mais pobre, mais injusto e mais desigual.

A única saída limpa e digna para Portugal exige uma rutura clara com este Governo e com esta política.

Enquanto o País estiver amarrado à agiotagem e a ter de suportar os juros insuportáveis do endividamento a

que nos obrigaram para satisfazer a ganância dos especuladores, não haverá crescimento económico que nos

permita sair deste círculo vicioso.

A renegociação da dívida nos seus montantes, juros e prazos, e a adoção de políticas públicas capazes de

melhorar as condições de vida dos portugueses e promover o crescimento económico são condições

indispensáveis para, aí sim, uma saída limpa. Não a que o Governo promete, mas a que o País exige e está

ao alcance do povo português.

Aplausos do PCP.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado António Filipe, inscreveram-se quatro Srs. Deputados

para pedir esclarecimentos, a saber os Srs. Deputados Mendes Bota, do PSD, Pedro Nuno Santos, do PS,

José Luís Ferreira, de Os Verdes, e Mariana Aiveca, do BE.

O Sr. Deputado António Filipe informa a Mesa que responderá individualmente a cada Sr. Deputado.

Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Bota.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Filipe, habituei-me a vê-lo, em termos

políticos, como um Deputado com ideias substancialmente diferentes das minhas, mas também como um

homem que, muitas vezes, é um exemplo de seriedade.

Infelizmente, o seu discurso de hoje não foi um discurso sério. Foi um discurso que fugiu, ele sim, à

realidade que, neste momento, atravessa o País, foi um discurso autista.

Seria talvez exigir demais ao Sr. Deputado que tivesse ouvido há pouco o Sr. Deputado Hélder Amaral,

quando ele explicou muito bem aqueles que são, neste momento, sinais positivos da nossa economia. Ora, o

Sr. Deputado subiu à tribuna para dizer exatamente o contrário, como se aquelas instituições e aquelas

entidades que ainda não há muito tempo eram veneradas e respeitadas cada vez que davam notícias que na

altura eram más, com maus números, agora já nada significassem para si. De facto, agora, parece que o

Banco de Portugal já nada significa para si, parece que a OCDE já nada significa para si, parece que o

Eurostat já só publica estatísticas duvidosas, parece que todas as instituições internacionais que reconhecem

o esforço que Portugal fez e aquilo que é a recuperação económica neste momento já nada significam. E essa

recuperação económica já é iniludível, por muitos discursos que a oposição faça dizendo o contrário. Todos

nós sentimos, o povo português também sente, que estão aí sinais que já não são circunstanciais.

Sr. Deputado, não venha mais com a questão da troica, porque a troica não veio cá porque quis. A troica foi

chamada. E foi chamada porque não havia dinheiro nos cofres do Estado para pagar as reformas e para pagar

os salários da função pública.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

A troica veio cá e emprestou-nos dinheiro a um juro tão baixo que não há nenhuma outra entidade no

universo inteiro que nos empreste a juros tão baixos!

A troica, sobretudo, veio cá sugerir que fizéssemos as reformas de que andámos a falar uns com os outros

durante décadas sem nunca ter havido a coragem de as implementar. Essa é a verdade da troica! Os

senhores olham para a troica como um cliché. A troica está aqui porque nós a chamámos. Não se trata de

uma questão de soberania; a questão é a da falta de coragem que houve neste País, durante décadas, por

parte de muitos responsáveis, que não tomaram as medidas e não fizeram as reformas que se impunham.

O Sr. Deputado fala das empresas que fecham. Gostaria que falasse também das empresas que abrem e

do saldo fisiológico entre aquelas que abrem, que são muito mais do que aquelas que estão a fechar.

Protestos do PCP e de Os Verdes.

Gostaria que falasse, sinceramente, da poupança, da confiança dos portugueses, da confiança dos

consumidores, do saldo externo positivo, que é a primeira vez que se verifica em mais de duas décadas.

Protestos do PCP.

O Sr. Deputado falou em pagamento da dívida? Não. Falou em renegociação da dívida.

Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Agradeço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Mendes Bota (PSD): — Pois eu digo-lhe: um país que se quer honesto, como os cidadãos se

querem honestos, não foge a pagar os seus compromissos e não foge a resolver os seus compromissos!

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — E os salários e as pensões?

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O Sr. Mendes Bota (PSD): — Nós não queremos renegociar a dívida. Queremos, sim, pagar a dívida,

como é próprio das pessoas e dos Estados de bem!

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Que falta de decoro! Que vergonha!

Aplausos do PSD.

Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Mendes Bota, disse que estava habituado a

não sei quê da minha parte. Pelos vistos, estava mal habituado!

Quando ouvi esta sua intervenção, Sr. Deputado — como já aconteceu há pouco com a do Sr. Deputado

Hélder Amaral, mas a sua, agora, foi mais contundente —, pensei que o Sr. Deputado não deve sair à rua!

Aplausos do PCP.

Sr. Deputado, vá à rua e encontre um trabalhador que viu no seu recibo de vencimento a diferença entre o

que recebeu no início deste ano e no ano passado e pergunte-lhe o que é que ele acha e se considera que o

País está melhor. Fale com os reformados, que viram as suas reformas cortadas, tendo muitos deles de apoiar

filhos desempregados com a sua reforma e netos, levando-os à escola. Pergunte-lhes o que acham e se estão

muito contentes com os sucessos deste Governo, desta política e com o Memorando da troica. Pergunte aos

portugueses!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Os senhores vêm dizer que nós não nos preocupamos não sei com quê,…

com a OCDE, com uma série de instituições, com uma série de relatórios, relatórios esses que saem ao ritmo

de vários por dia a contradizerem-se uns aos outros. Os senhores não se preocupam é com os portugueses, e

é com esses que nós nos preocupamos, porque esses é que são verdadeiramente afetados pela política deste

Governo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Deputado insiste numa das maiores mentiras deste Governo e desta maioria, que é dizer que se não

fosse o Memorando da troica não havia dinheiro para pagar salários.

Vozes do PCP: — Exatamente!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E é verdade!

O Sr. António Filipe (PCP): — A troica não veio para cá para que o País tivesse dinheiro para pagar

salários. Veio para cá para que, à custa de um empréstimo a juros injustos e exorbitantes, houvesse dinheiro

para cobrir o buraco do BPN e outros buracos provocados nas contas públicas nacionais.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

Aplausos do PCP.

O Sr. António Filipe (PCP): — Não foi para pagar salários que a troica veio! Havia dinheiro para pagar

salários, não havia era dinheiro para pagar o buraco do BPN!

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O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Para isso é que não havia dinheiro! Porque transformaram dívida privada, à

custa dos desvarios da banca, em dívida pública e puseram os portugueses com os seus salários e com as

suas reformas a pagar os desvarios dos banqueiros. Para isso é que não havia dinheiro!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Questiona o Sr. Deputado se encontramos em algum lado taxas de juro

melhores do que aquelas que a troica nos ofereceu, segundo o Sr. Deputado, benevolamente. Olhe, Sr.

Deputado, juros incomparavelmente mais baixos são aqueles que os bancos pagam pelos empréstimos que

contraem junto do Banco Central Europeu.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

Aplausos do PCP.

Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Agradeço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

É que são esses bancos, Sr. Deputado, que contraem empréstimos junto do Banco Central Europeu a juros

inferiores a 0,5% que depois compram a nossa dívida soberana a 5,1%.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): — Uma vergonha!

O Sr. António Filipe (PCP): — É por isso que estamos na situação em que estamos, Sr. Deputado!

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro

Nuno Santos.

O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Filipe, o Governo e a maioria, tal

como agora se viu no pedido de esclarecimento feito pelo PSD, estão em campanha permanente e julgam que

um mero enunciado de estatísticas serve para esconder que, de facto, o País está hoje pior do que estava em

2011. Há mais desemprego hoje do que havia em 2011! Há mais pobreza hoje do que havia em 2011! As

desigualdades sociais são mais altas do que eram em 2011!

Mesmo em matéria de criação de emprego, o Governo e a maioria festejam a criação de emprego líquido.

Entre o terceiro e o quarto trimestres de 2013, fala-se em criação líquida de emprego de 7,9 mil empregos. O

emprego líquido criado na Administração Pública, defesa e segurança social é de 9000. O emprego líquido

criado entre o quarto trimestre de 2012 e o quarto trimestre de 2013 é 29,8 mil. O emprego líquido criado na

Administração Pública, defesa e segurança social, no mesmo período, é 24,7 mil empregos.

Não é verdade que haja uma mudança estrutural na nossa economia. Não é verdade que as empresas

estejam a criar emprego. O emprego líquido criado em Portugal foi à custa do Estado: à custa de contratos de

emprego/inserção, à custa de ações de formação, à custa dos desempregados que, recebendo subsídio de

desemprego, são obrigados a trabalhar. São estes os números que levam a que hoje possamos dizer que haja

emprego líquido criado em Portugal.

Quanto às exportações, não há qualquer mudança estrutural na nossa economia. Na verdade, mais de

41% das nossas exportações consistiam em média e alta tecnologia. Hoje essa percentagem é de 37%. Há

uma degradação do perfil de exportações da economia portuguesa. Não só estamos pior hoje como estamos

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menos preparados para enfrentar os desafios do futuro. Perdemos 200 000 portugueses com a emigração e

300 000 portugueses em idade ativa desistiram de trabalhar, ou seja, 2/3 dos desempregados são

desempregados de longa duração, que acabarão por fazer o caminho dos já 300 000 desencorajados.

Este País não só perdeu capital humano como perdeu também capital físico. O investimento caiu 30% nos

últimos três anos. Este é um País que vê o seu capital humano degradar-se, que vê o seu capital físico

degradar-se e é não só um País que está pior do que há três anos como é um País menos preparado para

enfrentar os desafios do futuro.

Não há milagre algum! O País está mal, o País está pior e o PSD e o CDS são os responsáveis.

Sr. Deputado, é ou não verdade que nós só não estamos pior, como estamos pior preparados para

enfrentar os desafios do futuro?

Aplausos do PS.

Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Faço um apelo, em nome da Mesa, para que sejam respeitados os

tempos regimentais.

Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, respeitarei seguramente o apelo que a Mesa faz.

Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, agradeço a pergunta que coloca e que me permite fazer duas breves

considerações.

A primeira é para dizer o seguinte: o Sr. Deputado reparará que no início do seu mandato uma das frases

mais recorrentes do Primeiro-Ministro era a da política de verdade. No entanto, já há longos meses se

esqueceu disso. Com o desvario eleitoralista com que os Ministros andam por aí a anunciar todos os dias, o

Primeiro-Ministro já não conseguiria, sem corar, fazer alusão a essa tal política de verdade. E, provavelmente,

como não consegue dizer sem corar, não o diz. Pura e simplesmente esqueceu-se disso.

Mas há uma questão que o Sr. Deputado coloca que creio ser da maior relevância. Referiu-se à

mistificação que tem sido feita em torno da questão das exportações. Obviamente, todos nos congratulamos

se houver um aumento das exportações portuguesas. Isso é evidente. Infelizmente, o maior aumento de

exportações que temos tido tem sido a exportação forçada de jovens quadros qualificados, que são obrigados

a encontrar emprego no estrangeiro.

É preciso dizer também que a economia portuguesa nunca conseguirá recuperar só na base das

exportações. Não é possível haver uma recuperação económica sustentada do nosso País sem se aumentar o

poder de compra dos portugueses. Milhares de restaurantes estão a fechar fechar porque os portugueses não

têm dinheiro para ir comer fora. Se não houver uma melhoria das condições de vida das populações, se não

houver um aumento do poder de compra da população — porque só será possível o crescimento económico

com o crescimento da procura interna —, não haverá obviamente um crescimento sustentado da nossa

economia e nunca será possível pagar os encargos da dívida que têm vindo a asfixiar de forma dramática a

economia portuguesa.

Portanto, e para terminar, Sr.ª Presidente, dizia há pouco o Sr. Deputado Hélder Amaral que a oposição

fica muito incomodada ou irritada com os sucessos do Governo. Sr. Deputado, o que irrita não apenas a

oposição mas todos os portugueses com bom senso é que esses sucessos sejam mentira e sejam

incessantemente repetidos! Isso é que irrita, Sr. Deputado!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís

Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, antes de mais, gostaria de saudar o Sr.

Deputado António Filipe pela oportunidade do assunto que nos trouxe para discussão, porque de facto há uma

enorme discrepância entre o discurso do Governo e o que está a passar-se no País.

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O que o Governo diz não cola com a realidade. E a distância entre a realidade e o que o Governo diz é de

tal ordem que só é comparável com as previsões do ex-Ministro das Finanças Vítor Gaspar.

De facto, cheira a campanha eleitoral. Só falta agora o vice-Primeiro-Ministro Paulo Portas ir para as feiras

com o chapeuzinho na cabeça e o atual Primeiro-Ministro fazer as promessas que fez antes das eleições de

que não aumentava impostos, de que não haveria cortes nas reformas e de que os subsídios eram intocáveis.

De resto, já está tudo preparado para o avanço da campanha eleitoral.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — A verdade é esta: os portugueses estão mais pobres e o

Governo continua a falar de sinais positivos. A nossa economia continua de rastos e o Governo continua a

falar de sinais positivos. O desemprego atinge números nunca vistos e o Governo fala em sinais positivos.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — O défice aumenta e o Governo fala de sinais positivos. A dívida

pública não para de crescer e o Governo fala de sinais positivos.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Mais de 440 000 desempregados não receberam prestações de

desemprego em dezembro de 2013 e o Governo fala de sinais positivos. Só no mês de dezembro de 2013,

perto de 1170 beneficiários perderam o direito ao abono de família. Ou seja, só no mês de dezembro de 2013,

1168 crianças e jovens perderam o direito ao abono de família relativamente ao mês de novembro e o

Governo fala de sinais positivos.

Aliás, os sinais positivos são de tal ordem que o Governo até pretende agora, pelos vistos, transformar

aquilo que era provisório em definitivo. O Governo até pretende transformar aquilo que era extraordinário e

portanto limitado no tempo em cortes definitivos. A ser assim, temos de dizer que o Governo faltou à verdade.

O Governo andou a enganar-nos este tempo todo. Andou a enganar os portugueses quando disse que estes

cortes eram provisórios.

Quanto a isto, Sr. Deputado Mendes Bota, lembrou-se muito bem dos compromissos que o Estado tem e

que assume. É que o Estado também assumiu compromissos com as pessoas que descontaram uma vida.

Mas quanto a isso o PSD e o CDS nunca falam dos compromissos do Estado! Por que é que será?! Por acaso

isto merecia uma reflexão!… É que quando falamos da troica e dos compromissos da troica falamos do Estado

de direito e da necessidade do Estado cumprir com os seus contratos e com a sua palavra. Quando falamos

de reformas e de cortes nas reformas, não dizem nada.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — O Sr. Deputado António Filipe ainda se referiu à necessidade de

combater o desemprego. Ora nós tomámos conhecimento de que o Governo aprovou hoje mesmo uma

alteração ao Código do Trabalho — aliás, sem o acordo dos parceiros sociais, como é a bandeira deste

Governo —, alteração essa que diz respeito à cessação do contrato por extinção do posto de trabalho ou por

inadaptação. A nosso ver, esta alteração é mais uma medida do Governo para fomentar o desemprego,

porque vem facilitar o despedimento tal como outras o fizeram no passado, como foi o caso das medidas

relativas à redução das indemnizações em caso de despedimento.

Gostaria de saber, Sr. Deputado, se partilha da leitura que fazemos no sentido de que esta medida que o

Governo tomou hoje ao nível do Código do Trabalho se insere na estratégia do Governo de combater o

desemprego, despedindo!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

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O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, efetivamente, para este

Governo há contratos e contratos, há «dois pesos e duas medidas».

Quando se trata de contratos feitos com os grandes grupos económicos — e nalguns casos são contratos

leoninos, contratos altamente lesivos para o interesse público, para o Estado e para os contribuintes, como as

parcerias público-privadas ou como as swaps —, aquilo que é dito é que esses contratos estão feitos, o

Estado não os pode renegar. Quando se trata de contratos com os trabalhadores da Administração Pública e

com os reformados, neste caso, o Estado já pode rasgar os contratos à vontade, esses contratos já não são

para respeitar. Ou seja, os contratos com os fracos são para rasgar, os contratos com os fortes são para

respeitar. É esta a política deste Governo. É esta a opção deste Governo.

O mesmo se passa no que se refere ao problema da dívida. Quando se fala na necessidade — quanto a

nós, inquestionável — para a economia portuguesa de aliviar o garrote da dívida externa, que nos asfixia, e de

exigir uma renegociação séria das condições de pagamento da nossa dívida, que implica renegociá-la nos

seus montantes, nos seus juros, nos seus prazos, o Governo diz logo: «Não, não pode ser. Não podemos

dizer que não queremos pagar». Ou seja, o Governo e a maioria, pura e simplesmente, fogem a essa

discussão com a acusação, completamente infundada, de que quem defende uma renegociação da dívida

quer dizer que não quer pagar, quando é exatamente o contrário. Aqueles que defendem a necessidade de

uma renegociação da dívida fazem-no precisamente porque querem honrar os seus compromissos e porque

têm a consciência plena de que, com estas condições, a dívida externa é impagável e a economia portuguesa

não terá condições para recuperar da situação dramática para que a maioria e o Governo a empurraram.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Agradeço ao Sr. Deputado, sobretudo, pelo escrupuloso

cumprimento dos tempos.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca para pedir esclarecimentos.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Filipe, o que ouvimos nos últimos

dias foi a grande propaganda da «saída limpa», «regresso direto aos mercados», «retoma da economia»,

«criação de postos de trabalho», «criação de emprego». Isto foi o que ouvimos.

Não obstante, o que constatamos é que não há qualquer mudança de política, mesmo com a saída da

troica, e que a austeridade é para continuar, está para ficar. O Ministro Mota Soares, que disse, ontem, que o

FMI não tem qualquer razão porque não se vai mexer na legislação de trabalho, surpreende-nos hoje com o

contrário do que disse ontem. Hoje, veio dizer que o primeiro critério para despedir passa a ser o da avaliação

de desempenho, quando sabemos que a maioria das empresas não tem qualquer tipo de avaliação e, ainda

que tivesse, é uma medida absolutamente discricionária; o segundo critério é o das menores habilitações

literárias; veja-se bem, o terceiro critério é o da onerosidade da manutenção do vínculo (isto quer dizer que

carreiras profissionais e promoções deixam, pura e simplesmente, de existir); o outro critério é o da menor

experiência profissional; e o último critério é o da menor antiguidade, ou seja, os jovens serão sempre os alvos

preferenciais do despedimento.

Portanto, o Ministro Pedro Mota Soares vem dizer-nos que contornou as decisões do Tribunal

Constitucional e aqui tem os despedimentos à la carte, porque, não podendo ocorrer o primeiro critério, passa-

se para o segundo, e assim sucessivamente. É a simplificação total, são despedimentos «simplex».

Assim, este Governo vai continuar na senda do agravamento cada vez maior da vida das pessoas e de que

a austeridade vai ser para ficar. O combate ao desemprego não tem qualquer sentido, nas suas palavras, e os

despedimentos, hoje anunciados, são, de facto, uma vergonha, são despedimentos «simplex».

O Governo coabita mal com as decisões do Tribunal Constitucional e quer sempre e sempre ir no caminho

errado, prejudicando os mesmos do costume.

Aplausos do BE.

A S.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

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O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, uma das imagens de marca

deste Governo é o confronto com a Constituição da República. Aliás, isso está mais do que demonstrado pelo

número de diplomas com normas já declaradas inconstitucionais, de que este Governo é recordista desde que

a Constituição entrou em vigor

Um outro aspeto é o propósito do Governo que, perante qualquer declaração de inconstitucionalidade,

procura não respeitar a decisão do Tribunal Constitucional e a Constituição, mas encontrar um qualquer

estratagema para conseguir obter o mesmo objetivo, ou seja, o que não conseguiu fazer «entrar pela porta»

vai fazer toda a ginástica possível para que consiga «entrar pela janela». Tem sido esse permanente esforço

de contrariar a Constituição e as decisões do Tribunal Constitucional que o Governo, mais uma vez, hoje nos

demonstrou com o que aprovou relativamente aos critérios para despedimento por extinção do posto de

trabalho.

Saliento, ainda, outro aspeto relativo a esta maioria e a este Governo, que é o de levar por diante uma

política assente em dogmas que não se discutem, ou seja, a dívida não se discute, as condições em que

Portugal contraiu esta dívida e os juros que são impostos pela troica não se discutem, as opções tomadas no

âmbito da União Europeia não se discutem. Se alguém questiona alguma coisa, se alguém considera que algo

deve ser discutido, se alguém considera que, por exemplo, as consequências da entrada de Portugal no euro

devem ser discutidas, qual é a resposta da maioria? A resposta é: «Os senhores querem é sair da União

Europeia!». É muito fácil discutir assim. Quem não tem argumentos usa o único que lhe resta, que é o medo! É

o medo!

Aplausos do PCP.

Não quiseram perguntar aos portugueses se queriam aderir à moeda única e não aceitam que os

portugueses discutam seriamente as consequências da moeda única. Se alguém questiona, se alguém

interroga, o que dizem é: «Bem, o que os senhores querem já não é sair do euro ou da União Europeia mas

separar o País do resto da Europa».

Protestos do PSD.

Os senhores com isto revelam que não têm argumentos e não sustentam uma discussão séria, à custa das

opções que unilateralmente querem impor ao País!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Fica concluído o período de pedidos de esclarecimento e respetivas

respostas quanto à declaração política do Sr. Deputado António Filipe.

Vamos prosseguir com a declaração política do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas, Srs. Deputados: A caminho dos três anos

deste Governo, e 2 ministros depois, os compromissos do Estado com a comunicação social, eixo da

democracia, continuam no limbo. Não é desnorte, é opção ideológica de uma visão minimalista de Estado.

Mas há uma orientação que se mantém: a asfixia financeira e a ameaça sobre os profissionais. É assim com a

RTP, é assim com a Lusa, onde o Estado é acionista maioritário.

Não estamos a falar de nada mais nem nada menos do que do direito de cada cidadão, que paga os seus

impostos, a ter um serviço de rádio e televisão qualificados e uma agência noticiosa capaz de responder aos

seus compromissos, também no plano internacional. A Constituição protege estas garantias, o Governo

resolve desvalorizá-las.

Foi assim, neste contexto, que nos últimos dias assistimos ao empurra com a barriga entre a tutela e o

Presidente do Conselho de Administração da RTP. À falta de projetos credíveis, importa-se o modelo de

governo BBC, ignorando-se os riscos de governamentalização que o mesmo tenta esconder sob o argumento

da transparência. Mas logo o Sr. Presidente do Conselho de Administração vem denunciar que o risco é o de

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ser controlado pelo CGI, é o de este órgão controlar a RTP e de ser representado por interesses no seu

interior e, mais ainda, deixou-nos o aviso para o risco dos «pavões» (e nem sequer estava a fazer uma

autocrítica).

Ao subfinanciamento crónico da RTP, o Governo respondeu com o fim da indemnização compensatória e o

aumento da CAV: por os contribuintes a pagar duas vezes é considerado pela tutela reforço da transparência

do financiamento. Vejam só!… Mas nem sobre isto Alberto da Ponte e Poiares Maduro se entendem: o

Ministro diz que o valor da CAV, fixado em 2,65 €, foi o sugerido pelo Conselho de Administração para a

consecução do Plano de Desenvolvimento e Reestruturação da empresa; o Presidente do Conselho de

Administração diz o contrário — a tutela definiu o valor, à revelia das suas recomendações e da carta da União

Europeia sobre radiodifusão.

Enquanto a Administração pode gastar mais de 1 milhão de euros em estudos sobre a privatização da

RTP, entre consultorias e assessorias — 64 000 €, pelo menos, para assessoria de imprensa (e para quê,

afinal?) —, os trabalhadores das RTP estão entre a espada e a parede: ou externalização dos serviços, ou

despedimento coletivo, ou «saídas amigáveis, tão «amigáveis» que para os mais velhos é pior do que serem

despedidos.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Soubemos, recentemente, que o plano das ditas «saídas voluntárias» —

estes eufemismos que esta maioria encontra! — faz o milagre de reduzir o tempo de serviço dos profissionais

da RTP: quem trabalhou 40 anos contabiliza 14 anos na folha de Excel, razão para dizer que até nos

despedimentos são caloteiros.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Enquanto os profissionais da RTP vivem a ameaça diária de não ter

trabalho no dia seguinte, o Presidente do Conselho de Administração da RTP pode falar sem pejo e sem

vergonha dos, e cito, «trabalhadores que não fazem puto» e anunciar escolher, e cito, «o que o cidadão quer

da RTP». É, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados, o serviço público à la carte, sem rumo nem estratégia. Refém

de uma lógica comercial, que cada vez menos se distingue das outras televisões generalistas, fica por saber o

que vai pagar cada contribuinte pelo exclusivo do Mundial de Futebol.

Onde a fatura poderia ser partilhada pelos três canais, com o mesmo resultado para os espectadores, mas

com menores custo para a RTP, como é evidente, o Governo vê uma forma de esconder o vazio da sua ideia

de serviço público. E se para o Mundial há dinheiro, já não há dinheiro para a ficção nacional ou para

promover documentários e há zero, zero encomendas a produtores independentes de temas que têm

interesse para o nosso País e que não têm lugar em mais nenhum canal. É o grau zero da ideia de televisão, é

o vazio como serviço público, é a nulidade como alternativa de programação.

O mesmo Ministro que se comprometeu a resolver a dívida do fator de correção com a Lusa, de quase 1

milhão de euros, é o mesmo que empurra para o Tesouro, que diz que não paga, não paga esta dívida. A Lusa

tem a sua rede de correspondentes ameaçada e extremamente precarizada e está hoje em risco de cortar

salários a, pelo menos, 22 profissionais. Como se não chegasse, fica a suspeita da potencial fusão com a RTP

ou, pior ainda (imaginemos este cenário plausível), de vir a ter, no futuro — e cumprindo a tradição por via do

privado mais poderoso, a Controlinveste —, o Sr. Mosquito à frente do Conselho de Administração da Lusa.

Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Não é desnorte nem falta de dinheiro — o dinheiro aparece para o

exclusivo mais caro de que há memória ou para os estudos sobre a privatização da RTP —, é querer deixar a

RTP no osso, é desvalorizar os direitos constitucionalmente protegidos do serviço público de rádio e televisão

e é desconsiderar completamente os profissionais que fizeram a RTP.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr.ª Deputada Cecília Honório, inscreveram-se quatro Srs.

Deputados, do CDS-PP, do PCP, do PSD e do PS, para pedidos de esclarecimento.

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Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida.

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, muito francamente,

cruzamo-nos na respetiva comissão onde são debatidas e discutidas estas matérias, sou testemunha de que a

Sr.ª Deputada lá está, pelo menos, sentada; contudo, pela sua intervenção, pareceu-me que a Sr.ª Deputada

parou algures no tempo em que o Bloco de Esquerda ainda tinha apoio popular, votos, e ficou presa à

privatização da RTP, que já não existe, não está em cima da mesa e de que ninguém fala.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não me ouviu dizer nada disso!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — A Sr.ª Deputada ouviu, como eu ouvi, como todos os Deputados que

tiveram na Comissão ouviram e quem quis ver no Canal Parlamento viu, que a produção nacional e o

documentário estão em alta. A RTP está a contratar cada vez mais, em percentagens que vão superando e

que estão permanentemente nos dois dígitos em termos de crescimento de contratação externa, e a Sr.ª

Deputada diz «zero»?!

A Sr.ª Deputada falou sobre o Mundial de Futebol. Ontem, precisamente, o Sr. Presidente do Conselho de

Administração explicou que era uma opção que liga a RTP aos portugueses e que foi feito um estudo em que

se apurou que a esmagadora maioria dos portugueses queria ver o Mundial de Futebol na RTP. Não vou

recordar aqui, por uma questão de cortesia, qual foi a resposta que a Sr.ª Deputada deu na altura e o que

entendi como sendo a sua interpretação de democracia.

Mas, Sr.ª Deputada, temos de falar sobre a RTP e a Lusa, dois ativos nacionais. Ou falamos com

seriedade, ou falamos com crédito para o futuro, ou falamos de uma Lusa e de uma RTP que os portugueses

possam sustentar com os seus impostos e com a sua contribuição, ou, então, condenamos… — não ouvi da

sua parte, por uma vez, uma ideia nem sobre a RTP nem sobre a Lusa. Só ouvi críticas, críticas, críticas e

falar de dinheiro, mais dinheiro, mais dinheiro!

Seria interessante até que se contratasse alguém — seria um escrutínio interessante de se fazer — para

analisar as propostas permanentemente despesistas que são feitas por determinadas bancadas e que, ao fim

de um ano, se fizesse um apanhado do custo dessas propostas. Gastaríamos num ano, seguramente, mais do

que aquilo que Portugal poderá gastar em 20, 30, 40 ou 50 anos. É porque se atira sempre dinheiro para cima

dos problemas e a RTP e a Lusa não são problemas, pois têm profissionais qualificados e uma imagem que

vale muito. O que nos interessa é que se revitalizem e recuperem junto do seu público e que os portugueses

as sintam como sua.

Sr.ª Deputada, sobre a RTP Internacional e o ativo estratégico que constitui para o País como forma de

promoção de Portugal no exterior, no mundo, junto da diáspora, junto de toda a comunidade mundial, nem

uma palavra!

Finalmente, Sr.ª Deputada, digo-lhe o seguinte: a RTP tem um rumo, a Lusa tem um rumo, embora com

dificuldades mas com uma gestão competente, para além de ter profissionais de primeiríssima água a

comporem os seus quadros. É verdade que atravessam dificuldades, como atravessam todos os portugueses

neste momento de crise nacional. No entanto, há um rumo, não há a privatização de que a Sr.ª Deputada

insiste em falar de um tempo que já passou. Não há a negação de tudo o que existe, existe mesmo.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, concluo e agradeço, desde já, a benevolência.

Ou há o compromisso de todos para que, juntos com o povo português, a RTP e a Lusa, identificadas com

esse povo e com os sacrifícios que fazem, sejam sustentáveis, perdurarem no futuro e prestigiarem-se ou

continuamos nesta discussão destrutiva que a nada nos levará.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa faz, mais uma vez, apelo para que sejam respeitados os

tempos regimentais.

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Como a Sr.ª Deputada Cecília Honório optou por responder individualmente, tem a palavra.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Raúl de Almeida, não tenho culpa se não

ouviu a minha intervenção. Não falei sequer do cenário de privatização da RTP.

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Falou três vezes!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Deputado, temos sempre a sensação de que esta maioria parece

comer novos paradigmas ao pequeno-almoço. Uma das questões que levantei, na intervenção, tem a ver

exatamente com isto: como é possível o Sr. Deputado justificar que saídas voluntárias ou amigáveis possam

ter, para os profissionais mais experientes da RTP, mais prejuízo do que se fossem despedidos? Era sobre

isso que gostava de o ouvir! Era sobre isso que teria gostado muito de o ouvir!

É facto e objetivo que há zero encomendas à produção independente sobre questões determinantes para o

nosso País; é facto objetivo que está expresso na cláusula do contrato de concessão da nova proposta, que

leio com muita atenção, que há uma desvalorização objetiva da ficção e do documentário, no futuro, da

produção interna da RTP; como é claro e objetivo que a ameaça de externalização dos serviços da RTP é

aquilo que está na ordem do dia.

Sr. Deputado, já agora, sabe o que é que eu também teria gostado muito de ter ouvido? O CDS é

conhecido por deitar, pelo menos, uma lágrima pelo canto do olho no que à Lusa diz respeito. A situação da

Lusa é dramática, como o Sr. Deputado bem sabe, o buraco financeiro é imenso, como o Sr. Deputado bem

sabe. Há o risco de, pelo menos, se perderem 22 profissionais da Lusa e não ouvi da sua parte nem uma

palavra, além do deficiente entendimento da minha declaração política. Subfinanciamento, Sr. Deputado!

Subfinanciamento! Não há independência! Não há independência com subfinanciamento!

O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Só os oiço falar de dinheiro, mais dinheiro, mais dinheiro!

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Não há um projeto político credível! Não há um projeto credível para o

futuro nem da RTP nem da Lusa, o senhor bem sabe. Mas essa lágrima pela Lusa, pelo menos, teria gostado

de ouvir.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla

Cruz.

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, de facto, as audições que

ocorreram esta semana em sede da 12.ª Comissão confirmam o rumo que tanto o Sr. Deputado do CDS

falava. O rumo para o serviço público de rádio e televisão e para a agência noticiosa Lusa é o

despedimento,…

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — … o rumo é o desmantelamento de um serviço público de rádio e televisão e

de uma agência noticiosa fundamentais, pilares da democracia e que este Governo, desde o início, tentou

desmantelar e está a conseguir concretizar.

Primeiro, foi a privatização. Não foi conseguida, mas agora engendrou um conjunto de medidas e um

pacote legislativo que visa, no essencial, o desmantelamento. A pretexto da suposta transparência do

pluralismo, o que o Governo e o Conselho de Administração da RTP têm feito é um ataque vil aos

trabalhadores.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!

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A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Nem o PSD, nem o CDS-PP, nem mesmo o Ministro Miguel Poiares Maduro

reprimiram e condenaram as afirmações agressivas e atentatórias que fez o Presidente do Conselho de

Administração da RTP relativamente aos trabalhadores e o PCP gostaria de os ter ouvido fazer a defesa dos

trabalhadores, porque é assim que se defende o serviço público de rádio e televisão.

Mas vamos à questão que, efetivamente, importa: o subfinanciamento da RTP está a liquidar o serviço

público de rádio e televisão. É importante clarificar que só há um verdadeiro serviço público com financiamento

público, pois é este que permite a independência.

Sr.ª Deputada Cecília Honório, pergunto-lhe se acompanha a avaliação que o PCP faz de que este novo

modelo, estes novos estatutos da RTP não permitem esta independência e que, bem pelo contrário, tornam a

RTP refém dos interesses económicos dos grandes grupos económicos.

Também pergunto à Sr.ª Deputada se acompanha o PCP na avaliação que faz de que o novo serviço, o

novo contrato de concessão de serviço público constitui um pacote de serviços mínimos das obrigações a que

o Estado tem o dever de responder. Os portugueses têm direito a uma informação de qualidade e em

extensão e acreditamos que este contrato impede a assunção desse direito.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Carla Cruz, acompanho-a, certamente, nas

preocupações que aqui trouxe e que são as preocupações de fundo sobre o futuro do serviço público de rádio

e televisão.

Mais: reforço essas preocupações com a vergonhosa proposta das saídas voluntárias para os

trabalhadores da RTP, em que encontraram uma fórmula de cálculo para as indemnizações que, repare, tem

dois problemas.

O primeiro é que o valor é o do salário com os cortes. É este o valor que é aplicado, tornando definitivo,

afinal, aquilo que era temporário.

O segundo é que, quando se contabiliza o número de anos do profissional, esse número de anos não pode

ser superior a 14 anos — é o número máximo! Portanto, trabalhe-se 30, trabalha-se 40 anos, só podem ser

contabilizados 14 anos de serviço. Isto é uma vergonha para os profissionais da RTP! É uma lata imensa

como proposta e, na verdade, desvaloriza os trabalhadores, que são obrigados, voluntariamente, ao

despedimento. É uma vergonha esta proposta! É um desprezo total pelos profissionais mais qualificados da

empresa e é isto a que esta gente chama «saídas voluntárias». É um plano barato para descartar

trabalhadores da RTP.

A questão é esta, Sr.ª Deputada: «não há dinheiro», dizem eles, mas depois vamos encontrá-lo. Não há

problema nenhum em gastar mais de 1 milhão de euros em consultoria e em assessoria para estudar a

privatização da RTP. Não houve problemas para isso! Nem houve problemas para gastar milhares de euros

para a assessoria de imprensa! Não há problema nenhum nestes gastos! Nem nos gastos astronómicos do

campeonato mundial de futebol. Para isso não há problema e há dinheiro! Não há dinheiro é para um projeto

decente, um projeto que dignifique o serviço público de rádio e televisão.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio

Azevedo.

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, com o devido respeito,

permita-me que lhe diga o seguinte: a sua intervenção faz-me lembrar, e uma vez que falou de futebol,

aquelas equipas de futebol que tentam ganhar na secretaria aquilo que perderam no campo.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

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O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — E é isto que acontece com a sua intervenção.

Desde sexta-feira passada que tivemos oportunidade de discutir com o Ministro, com o Presidente da RTP

e, agora, com a Sr.ª Deputada quatro vezes estas matérias, estas questões da RTP.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Perderam no debate!

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Perderam no debate em Plenário, na sexta-feira; perderam no debate na

Comissão;…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — E agora querem a desforra!

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — … perderam no debate com a RTP, na Comissão; e hoje vêm fazer um

«número» para a comunicação social de modo a tentar ganhar na secretaria!

Aplausos do PSD.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Perderam também no prolongamento!

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Mas, Sr.ª Deputada, uma vez que fez afirmações que não são totalmente

verdadeiras, deixe-me dizer-lhe o seguinte: não são os trabalhadores da RTP que estão entre «a espada e a

parede»; quem está entre «a espada e a parede» é o Bloco de Esquerda, que ontem, na comissão

parlamentar, disse ao Presidente da RTP que concorda com o princípio da criação de um conselho geral

independente e, hoje, vem ao Plenário dizer que a Administração da RTP se prepara para fazer uma afronta

aos trabalhadores, prejudicando-os.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — O que é que uma coisa tem a ver com a outra?!

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Quem está entre «a espada e a parede» são os senhores!

Sr.ª Deputada, deixe-me perguntar-lhe o seguinte: disse que a maioria não queria saber nem queria ouvir

falar sobre a questão dos despedimentos e sobre a questão que atormenta os trabalhadores. Mas quem é que

chamou o Sr. Ministro à Comissão para ser ouvido? Foi o Bloco de Esquerda? Não, fomos nós! Quem é que

chamou à Comissão o Presidente da RTP para ser ouvido sobre estas matérias? Foi o Bloco de Esquerda?

Não, fomos nós! Quem é que apresentou o requerimento ao Presidente da RTP sobre a negociação que fez

com Nuno Santos? Foi o Bloco de Esquerda? Não, fomos nós!

Esta é que é a diferença, Sr.ª Deputada: nós não utilizamos o palanque para tentar conseguir linhas em

páginas de jornais; nós fazemos! E sobre esta matéria estamos a fazer, porque não se trata de uma estratégia

à la carte, como a Sr.ª Deputada disse, mas, sim, de uma estratégia que vai tornar a RTP mais forte, mais

independente, mais eficiente e em maior correspondência com o que à sociedade cumpre.

É uma estratégia que aceitamos e respeitamos que o Bloco de Esquerda não partilhe, mas, Sr.ª Deputada,

deixemo-nos de retóricas, peça ao Bloco de Esquerda para parar com a retórica e diga, afinal, qual é a vossa

estratégia para a RTP.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Sérgio Azevedo, agradeço as questões que

colocou e peço-lhe imensa desculpa, mas eu não quero «jogar à bola» consigo…!

O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Vai perder!

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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Mais: no que à RTP diz respeito quem está «fora de jogo» é V. Ex.ª!

Vamos convir que quem está «fora de jogo» é V. Ex.ª! E explico-lhe porquê.

O Sr. Deputado veio aqui misturar matérias que não faz sentido serem misturadas. Podemos analisar o

modelo de governo e é facto, é verdade que dissemos na Comissão que não nos opomos a um conselho

independente, se ele for objetivamente independente. Mas o Sr. Deputado, se for sério neste debate, sabe

bem as críticas e as dúvidas que colocámos relativamente aos riscos de governamentalização do conselho

geral independente tal como ele está na proposta de lei, pelo que estamos disponíveis para apresentar

propostas no sentido de garantir a independência desta entidade.

Agora, explique-me V. Ex.ª como é que confunde o conselho geral independente com os trabalhadores e

com aquilo que está sobre a mesa, que é ou a externalização dos serviços, ou o despedimento coletivo, ou

esta hipocrisia de «saídas voluntárias» em que os profissionais com mais experiência ganham mais em ser

despedidos do que em sair voluntariamente!… Explique-me V. Ex.ª e diga-me se não está mesmo «fora de

jogo» no que à RTP diz respeito!… Como está, aliás, o Sr. Ministro.

O Sr. Deputado sabe que quer o Sr. Ministro quer o Sr. Presidente do Conselho de Administração

assumiram que a RTP tem trabalhadores a mais — certo? — e que é preciso reduzir drasticamente os custos

com recursos humanos. Isto é verdade! Esta empresa que perdeu mais de 1200 profissionais nos últimos

anos.

Mais: o Sr. Deputado tem um ministro que vem aqui comparar o que não pode ser comparado, ou seja, que

vem aqui dizer que a RTP tem trabalhadores a mais, porque não tem os mesmos das televisões privadas. Isto

é uma vergonha! Isto nem devia ser aceitável! Sabe porquê? Porque não se pode comparar realidades que

não são comparáveis, quer pelas obrigações a que a RTP está sujeita, como bem sabemos, quer pelos dois

serviços que cumpre, de televisão e de rádio.

Portanto, «fora de jogo» está o PSD, com a sua licença!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro

Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, saúdo-a pela

intervenção que fez porque, de facto, coloca em cima da mesa a questão com a abordagem que ela deve ter.

Sem prejuízo de o Sr. Deputado Sérgio Azevedo ter tentado ser um Gabriel Alves do debate parlamentar,

não como jogador, mas como comentador de fora, mas sem o estilo e a qualidade a que nos habituou Gabriel

Alves, francamente, não conseguiu rematar à questão principal, aquela que nos mobiliza para este debate.

Qual é o problema principal da RTP? É um problema de recursos, é um problema de financiamento. Não é um

problema de governamentalização.

A questão que nos é trazida pelo PSD e pelo CDS, através da proposta de lei, é um bocadinho

reminiscente da ideia de uma pessoa viciada no jogo que pede: «Por favor, não me deixem entrar no Casino»,

quando, na realidade, a única coisa que o Governo tem de fazer para não assegurar a governamentalização é

não governamentalizar, é não procurar influenciar as decisões do Conselho de Administração.

Portanto, está inteiramente nas mãos do Governo, com o quadro legislativo atual, não o fazer, porque,

recordo, o quadro legislativo atual, que o Governo herdou do Partido Socialista, foi construído no momento em

que, pela primeira vez na história da RTP, o ministro não alterou o conselho de administração, o ministro

manteve o saneamento financeiro que tinha herdado do governo anterior, do Governo do PSD, o ministro

aumentou os poderes do regulador e aumentou os mecanismos de controlo do serviço público e introduziu os

Provedores do Telespectador e do Ouvinte, mais uma vez, reforçando as garantias de independência do

serviço público.

Protestos do PSD.

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O que tivemos agora e ao que assistimos, desde a desorientação inicial do Ministro Miguel Relvas, foi

precisamente ao inverso, ou seja, foi ao deitar fora o que estava bem feito e procurar criar um problema onde

ele não existia.

Por isso, concentremo-nos no que é fundamental e é sobre o fundamental que eu queria colocar uma

questão à Sr.ª Deputada.

Fundamentalmente, o problema da RTP é de financiamento. Pedia-lhe que comentasse também se —

dados que se tornaram públicos, no quadro destas audições — a opção do Governo em, por um lado, acabar

com a indemnização compensatória e, por outro, em substituí-la por um aumento da CAV, que é insuficiente,

não vai, claramente, cavar ainda mais o fosso em que a RTP se encontra.

Mas há um aspeto que é importante sublinhar novamente: numa conferência realizada em Lisboa, a

Presidente da União Europeia da Radiodifusão veio dizer, muito claramente, que o cálculo estava mal feito e

que era necessário, pelo menos, um valor de 3 € para que se pudesse fazer um financiamento adequado do

serviço público de rádio e televisão — e, note-se, «adequado» para substituir o que desaparece com o fim da

indemnização compensatória, já nem sequer estamos a falar no ideal para assegurar a qualidade da RTP.

Esta é a questão de fundo que nos deve mobilizar. A RTP, o serviço público de rádio e televisão de

qualidade é a seiva da democracia, porque é o garante do pluralismo, é o garante da informação isenta, é o

garante de todas as regiões terem uma voz e uma capacidade de projetar aquilo que sucede nos seus

territórios e é aquilo que, infelizmente, com as medidas que estão em cima da mesa propostas pelo atual

Governo, está em risco de desaparecer.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, muito obrigada pela

sua questão.

Sr. Deputado, foi mesmo esse o desafio que aceitámos ao fazer a declaração política, em jeito de balanço

das audições que tivemos com a tutela e com o Presidente do Conselho de Administração, sendo que

identificamos que o essencial é o reconhecimento do subfinanciamento, que, do nosso ponto de vista, é um

subfinanciamento crónico da RTP.

Como sabe, condenamos a extinção da indemnização compensatória, fizemos, aliás, propostas em sede

de Orçamento do Estado no sentido da sua reposição, e entendemos que é uma vergonha que o Estado se

tenha, desta forma, descomprometido face a preceitos constitucionais, porque a verdade é que o Estado tem a

obrigação de garantir o financiamento do serviço público de televisão e de rádio.

Mas mais sinistra, convirá, e, porventura, o Sr. Deputado acompanhar-me-á neste raciocínio, é a ideia

criada pelo Governo de que pôr os contribuintes a pagar duas vezes é a forma de garantir transparência no

modelo de financiamento da RTP. Ou seja, os contribuintes pagam os impostos, aumenta-se-lhes a CAV e isto

é igual a mais transparência. Ora, este argumento não cabe na cabeça de ninguém, exceto na do Sr. Ministro

responsável pela área.

Um outro argumento ainda mais sinistro é o de entender que continuar a preservar este subfinanciamento é

uma forma de reforçar a independência da RTP, o que é absolutamente incompreensível, é exatamente o

oposto, uma vez que é o estrangulamento financeiro que reforça os mecanismos de dependência — aliás, a

independência só se assegura com garantias de saúde financeira para esta empresa e para o serviço público.

Depois, temos estas maroscas, que nem sequer são justificáveis do ponto de vista político: como é possível

que o Ministro diga uma coisa e o Presidente do Conselho de Administração diga exatamente o oposto no que

à CAV diz respeito? É que a contribuição do audiovisual deveria, segundo recomendação da própria União

Europeia, ser aumentada para 3 €, mas a opção foi a dos 2,65 €. O Ministro diz que foi o Conselho de

Administração que decidiu assim e o Conselho de Administração diz que foi o Ministro que decidiu assim…!

Ora, esta instabilidade, com a ameaça de despedimento permanente que os trabalhadores da RTP vivem,

é absolutamente inaceitável, do nosso ponto de vista. Todavia, entendemos que a resistência de todas as

forças políticas e dos profissionais, sobretudo da RTP e da Lusa, encontrará um futuro para as suas

responsabilidades e para o seu papel determinante na qualificação da nossa democracia.

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Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, concluídas as declarações políticas, informo que

está ainda inscrito o Sr. Deputado Jorge Lacão para fazer uma intervenção, ao abrigo do n.º 2 do artigo 76.º do

Regimento da Assembleia da República, norma que estabelece que «cada Deputado tem direito a produzir

uma intervenção por cada sessão legislativa, pelo período máximo de 10 minutos, não contabilizável nos

tempos do seu grupo parlamentar».

Ora, o Regimento da Assembleia da República é omisso relativamente à possibilidade de serem feitos

pedidos de esclarecimento aos Deputados que façam intervenções ao abrigo desta norma, cabendo à Mesa

decidir sobre essa possibilidade. A Mesa decidiu, em articulação com a Sr.ª Presidente e no seguimento de

alguma doutrina que se tem vindo a instalar, que deveria haver essa possibilidade para esta intervenção.

Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão, a quem poderão ser feitos pedidos de esclarecimento.

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Na semana passada, apresentei a este

Plenário, na condição de presidente cessante da comissão de inquérito aos derivados financeiros, o balanço

breve dos seus trabalhos.

Cumpridos com isenção os deveres da função, entendo ser o momento de apresentar à Câmara algumas

ilações sobre o funcionamento das comissões de inquérito e um alerta decorrente desses últimos trabalhos.

Faço-o, ao abrigo da faculdade regimental de uma declaração política pessoal, que só a mim me compromete,

com o desejo de que esta reflexão sirva para algo mais do que para prolongar controvérsias.

Mas é refletindo sobre o significado das recentes divergências em relação ao relatório e suas conclusões

que desejo começar. Como diz Tony Judt, esse grande historiador do século XX, quando se quer resolver um

problema é preciso ser capaz de nomeá-lo.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. Jorge Lacão (PS): — E o problema, aqui — face aos resultados das comissões de inquérito, desta

como doutras, ao sabor da conflitualidade política conjuntural —, é que a verdade, com fotografia objetiva da

realidade, resulta frequentemente comprometida à mercê da ideia que cada um quer formar acerca dela.

Quando, à partida, se percebe, e no fim se confirma, que há resultados conclusivos com «cartas

marcadas» desde o início, é preciso que ponhamos a mão na consciência para nos perguntarmos se é pelo

caminho do descrédito das comissões de inquérito que queremos continuar, ou se vale a pena que nos

concentremos em avaliar se o valor fundamental de uma investigação com poderes judiciais — o apuramento

objetivo da factualidade histórica — está a ser cumprido com idoneidade suficiente e, se não estiver, visando

restaurar o princípio da confiança, o que poderemos fazer para gerar condições institucionais de genuína

isenção.

Poderia ser tentado ao apelo da virtude da razoabilidade, para que todos nos esforçássemos a deixar de

lado os interesses políticos mais imediatos em benefício do apuramento imparcial dos factos.

Muitos, certamente, haveriam de sorrir por saberem que, na ação política, o critério da legitimidade,

infelizmente, nem sempre acompanha o critério da verdade. No dizer assertivo de um antigo moralista, La

Rochefoucauld, as virtudes perdem-se no interesse como os rios se perdem no mar.

Quero sugerir outro caminho: o da reforma institucional no funcionamento das comissões de inquérito,

precisamente quanto à responsabilidade de elaboração e apresentação do seu relatório e conclusões.

Garantir que tal relatório e tais conclusões sejam produzidos em condições, por todos reconhecidas, de

isenção na apreciação dos factos investigados, creio que é tema que pode merecer o nosso empenhamento e

é esse o apelo que vos faço.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Jorge Lacão (PS): — À primeira vista poderá parecer insuperável a influência da maioria conjuntural,

dada a constituição de qualquer comissão ter sempre de obedecer à proporcionalidade existente no

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Parlamento, mas a Constituição não impede — e, para o caso, é a Constituição que conta — que o Regime

Jurídico dos Inquéritos Parlamentares adote soluções que promovam a desejável isenção.

Procedendo assim, na busca de um salutar consenso para o problema, ganharíamos muito. O Parlamento

porque, na sua diversidade, sempre poderá assumir as ilações políticas que livremente entenda. Os cidadãos,

por ficarem cientes de que as conclusões de qualquer comissão de inquérito, pela sua idoneidade, merecem o

respeito de todos.

Se a preocupação que aqui vos deixo vier a merecer acolhimento na iniciativa parlamentar, manifesto-me,

como me compete, inteiramente disponível para aprofundar uma solução, que considero estar ao nosso

alcance.

Aplausos do PS.

Sr.as

e Srs. Deputados, no rescaldo dos trabalhos da Comissão de Inquérito, considero indispensável

chamar a atenção para a situação já identificada no relatório das insuficiências do sistema de supervisão

financeira e cuja reavaliação reputo da maior importância para a salvaguarda dos interesses nacionais.

As instituições financeiras estrangeiras, de entre as quais as que celebraram contratos de crédito ou de

derivados financeiros com as empresas públicas, tendo sucursal ou escritório de representação no nosso País,

todavia e não obstante as mesmas exercerem atividade em Portugal, não se encontram sujeitas à supervisão

prudencial do Banco de Portugal, uma vez que se encontram sujeitas à supervisão prudencial das autoridades

dos Estados-membros de origem.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem lembrado!

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Portanto, os bancos internacionais operam no mercado português, podendo

celebrar abundantes relações contratuais, sem que a regulação portuguesa possua a mesma capacidade de

intervenção prudencial que tem, ou deve ter, em relação aos bancos nacionais.

Nem mesmo a mais recente alteração legal, de fevereiro de 2012, em transposição de diretivas

comunitárias, ao Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, prevendo um regime de

cooperação para troca de informações qualificadas entre autoridades de supervisão, no quadro do sistema

europeu de supervisores, parece ser suficiente para assegurar uma disciplina de intervenção mais eficaz em

relação às sucursais e aos escritórios de representação dos bancos internacionais.

Esta situação deve ser objeto de cuidada análise para que se possam avaliar as razões pelas quais, e

apesar dos aperfeiçoamentos da lei, continua a não ser admissível ao Banco de Portugal sujeitar aos ditames

da sua direta supervisão as sucursais e os escritórios das instituições financeiras internacionais com atividade

no nosso País.

Se há um interesse nacional a defender, ele apresenta-se bem à frente dos nossos olhos.

Mas há ainda uma outra dimensão do problema: nas atuais práticas de regulação financeira, o regulador —

e, neste caso, ao Banco de Portugal acrescento, designadamente, a CMVM — tem competência para aplicar

sanções por irregularidades às entidades financeiras sob sua alçada.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem lembrado!

O Sr. Jorge Lacão (PS): — No entanto, para além de uma função mediadora, quando existe, não aplica

injunções comportamentais que permitam aos consumidores lesados, por produtos ou serviços financeiros, ver

restaurados os direitos ou interesses legítimos afetados por esses comportamentos irregulares.

O Sr. José Magalhães (PS): — Claro!

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Como na Comissão de Inquérito reconheceu o Presidente do Conselho

Nacional de Supervisores Financeiros, em Portugal a competência dos supervisores é limitada e as suas

decisões não se aplicam às partes lesadas, ao contrário, por exemplo, do que se passa em Inglaterra. E esta,

se bem avalio, é mais uma razão para agir em nome da importância de uma justiça restaurativa.

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Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Onde a aplicação dos bons princípios da governança possam

mostrar-se diminuídos ou insuficientes, é nosso dever fortalecê-los para que, em democracia, não seja o poder

dos interesses, quaisquer que eles sejam, a governar sobre a autoridade dos princípios.

É isso, seguramente, o que os cidadãos nos exigem e é isso, seguramente, o que os cidadãos nos

merecem.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, tendo sido entendimento da Mesa que podem ser

feitos pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Jorge Lacão no âmbito da sua intervenção, aplica-se,

obviamente, por analogia, os mesmos termos e os mesmos tempos dos pedidos de esclarecimento em relação

às declarações políticas, ou seja, 2 minutos para a pergunta e 2 minutos para a resposta, no caso de ser

individual como o Sr. Deputado Jorge Lacão bem sabe.

Sr. Deputado, estão inscritos, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados António Filipe, do PCP, e

Pedro Filipe Soares, do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, parece que a questão que

colocou só interessa à parte esquerda do Hemiciclo!…

Sr. Deputado, quanto ao tema que suscitou sobre as comissões parlamentares de inquérito, não

percebemos exatamente aquilo que propôs. Presumimos que propôs que haja uma discussão sobre o

problema das comissões parlamentares de inquérito. Ela é bem-vinda e dessas discussões tem resultado ao

longo dos anos alguns melhoramentos do regime das comissões de inquérito que importa salientar.

Normalmente, esse melhoramento acontece é quando não há maiorias absolutas e, portanto, este poderá não

ser o melhor momento. Em todo o caso, a questão é pertinente.

Sr. Deputado, a questão que colocou é a de que, em regra, as maiorias — e isso tem acontecido ao longo

dos anos — subvertem as conclusões da comissão de inquérito, manipulam as conclusões. Há matéria que é

apurada ao longo da comissão de inquérito e, depois, a maioria aprova um relatório que pouco tem a ver com

aquilo que foi, de facto, a matéria apurada e tem a preocupação central de branquear as responsabilidades do

Governo que apoia. A experiência tem-nos revelado isso.

Ora, nós podemos daí tirar as ilações políticas que quisermos, e tiramos, mas não podemos é julgar a

consciência de cada um, isto é, dizer que há Deputados que estão na comissão de inquérito e que por

disciplina, interesses partidários ou grupos de interesses, votam contra a sua consciência. É um processo de

intenções que não nos sentimos autorizados a fazer em relação a ninguém. Podemos é tirar ilações políticas

e, isso sim, tiramos.

Gostaria também de dizer que a questão que se coloca é a de saber se, apesar de sabermos que isso

pode acontecer e que uma qualquer maioria pode subverter as conclusões de uma comissão de inquérito,

ainda assim, vale a pena ou não constituir comissões parlamentares de inquérito. A nossa resposta é a de que

sim, vale a pena. Porquê? Porque as comissões parlamentares de inquérito são públicas.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É verdade!

O Sr. António Filipe (PCP): — E, quando há uma maioria que impõe um relatório que contraria o que

todos viram, quem fica mal é essa maioria.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não é o caso!

O Sr. António Filipe (PCP): — Isto porque, com a publicidade das comissões de inquérito — e essa foi

uma grande aquisição de uma reflexão que se fez há uns anos —, verdadeiramente quem julga não é a

maioria, quem julga são os cidadãos, que podem acompanhar os trabalhos.

Daí que a reflexão que o Sr. Deputado aqui trouxe é bem-vinda, mas mesmo com o regime atual, que,

obviamente, tem virtudes e defeitos, nós pensamos que as comissões parlamentares de inquérito são um

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valioso instrumento de fiscalização parlamentar dos Executivos e que continua a valer a pena constituir

comissões de inquérito quando se entende que há matéria que deve ser averiguada por essa via.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Filipe, começo por agradecer a questão

que colocou e que certamente contribuirá para irmos aprofundando o tema.

Em primeiro lugar, o Sr. Deputado referiu — e estou satisfeito por isso — que a questão que coloquei é

pertinente. Como se deduz das minhas palavras, é exatamente por estar convencido da importância do papel

das comissões de inquérito na vida parlamentar que entendo que deveremos promover as condições

institucionais desejáveis para que, do resultado dos trabalhos de qualquer comissão de inquérito, se possa

garantir a elaboração em condições de isenção do respetivo relatório e das respetivas conclusões.

O Sr. Deputado também disse, e reconheço, que não avancei qualquer resposta em concreto para

encontrar essa possível solução institucional. Mas, Sr. Deputado, estou convencido, e a sua própria

intervenção me ajuda a ficar mais ciente disso, de que o tema que trouxe interessará à Câmara. Portanto,

deverá ser num clima de aprofundamento de uma solução consensual que todos, sem exceção, deveremos

trabalhar.

Manifestei empenhamento em dar o meu concurso, porque tenho opiniões que gostarei de colocar em sede

própria. O Sr. Deputado António Filipe também já o fez e, por isso, esperarei que outros se juntem a esta

disponibilidade para que possamos, mais uma vez, revisitar o regime das comissões de inquérito e com isso

garantir que elas passem a ser totalmente respeitadas no final dos seus trabalhos, através dos seus relatórios

e das suas conclusões, para que a relação de confiança entre este Parlamento e os eleitores se aprofunde e

não seja posta em causa.

Sr. Deputado António Filipe, termino a minha resposta apenas com um reparo: o Sr. Deputado começou

por dizer que aparentemente esta matéria só interessava à parte esquerda do Hemiciclo. Julguei que também

se iria referir à questão da supervisão financeira em relação ao sistema financeiro. Tenho pena que não tenha

abordado essa matéria, porque igualmente me parece de grande relevância e interesse nacional.

Aplausos de Deputados do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro

Filipe Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Lacão, gostaria de lhe dizer que é

sempre difícil comparar 2 minutos de um pedido de esclarecimento aos 10 de uma intervenção, onde é

possível abordar com profundidade dois temas diferentes. No entanto, tentarei referir-me aos dois, porque

creio que ambos são importantes, mas permita-me que o faça de uma forma tão direta que poderá até parecer

que há uma ausência de espaço para diálogo, o que não é manifestamente o caso.

Sobre a independência dos Deputados na comissão de inquérito, devo dizer que abordar o tema apenas e

só pela relação das maiorias com as minorias no Parlamento é manifestamente insuficiente. Creio que a forma

certa de abordar este problema é a da subserviência dos Deputados aos Governos dos seus partidos. Isso é

que verdadeiramente foi demonstrado pela comissão de inquérito dos, vulgo, swap. Vimos, de facto, uma

maioria PSD e CDS a tentar branquear a ação deste Governo, mas também não deixa de ser verdade que

assistimos a parte da oposição, a do Partido Socialista, a tentar branquear a posição do Governo anterior.

Por isso, se é de independência que devemos falar é da independência de todos os Deputados. Esse é que

é o principal motivo de preocupação.

Como é que podemos responder a isso de uma forma muito clara? Em primeiro, não descredibilizando as

comissões de inquérito. Para nós, elas têm dois papéis fundamentais: um primeiro de informação. Há muitos

dados e muita informação que não vêm a público e, por isso, para informação dos cidadãos é importante que

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as comissões de inquérito existam porque elas dão poderes reforçados ao Parlamento para ter acesso a uma

relação mais transparente com qualquer acontecimento que muitas vezes o Governo quer tornar opaco.

No que toca à ação da comissão de inquérito, essa, sim, está dependente da ligação a um ou a outro

Deputado, ao seu Governo, ao seu grupo parlamentar e sobre essa matéria há, evidentemente, espaços de

melhoria. Por exemplo, um deles é o de que a aceitação do texto final do relatório não esteja apenas

dependente da maioria e, assim, tal como existe noutros documentos, por que é que não se coloca a opinião

de cada um dos Deputados, dizendo que cada emenda, cada alteração, tinha determinada aceitação no

conjunto de Deputados? Era mais transparente, era mais claro. É uma sugestão.

Portanto, há todo um espaço de debate e de aprofundamento que é possível fazer.

Se a Sr.ª Presidente me permitir mais 1 minuto, abordarei a matéria financeira para, com alguma

estupefação, perguntar ao Sr. Deputado Jorge Lacão o que se passou, porque as preocupações que traz não

são consonantes com as ações dos Governos do Partido Socialista.

Dizer-nos que o Banco de Portugal tem pouca ação de fiscalização, de supervisão, não é compaginável

com a votação, cujo último episódio é aquele que decorre apenas e só da união bancária, que torna o Banco

Central Europeu como o todo-poderoso da supervisão. De facto, há uma perda de soberania, digamos assim,

quanto à capacidade de supervisão.

São várias as matérias, desde licenciamento a seguros, a fiscalização, cuja competência já não é nacional,

mas de um outro Estado de origem dessa entidade do sistema financeiro, ou de outros setores, ou de uma

entidade central a nível europeu, que, neste caso, é o Banco Central Europeu. E, nesta matéria, o Partido

Socialista foi um dos partidos que apoiou o Tratado de Lisboa, que tem apoiado o tratado orçamental, que tem

dado os «nós» a toda esta legislação que tem atado, de facto, a ação de supervisão nacional.

Termino, então, Sr.ª Presidente, perguntando ao Sr. Deputado Jorge Lacão o que é que mudou ou se, ao

falar em nome individual, não está, de facto, a falar pela voz do Partido Socialista, porque essa é a novidade

deste discurso.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, antes de mais, agradeço a

sua pergunta.

Em relação ao regime das comissões de inquérito, quero também congratular-me pela disponibilidade que

manifestou no sentido de que se reflita e, para além de se refletir, se possa agir para aperfeiçoar o modelo de

funcionamento das comissões, em particular para a garantia da autenticidade do relatório e das conclusões

finais de qualquer comissão de inquérito.

As comissões de inquérito, como sabemos, conferem aos Deputados que delas fazem parte poderes

judiciais de investigação, o que é algo de muito importante para nos podermos conformar com a ideia de que

uma comissão de inquérito possa ficar por uma simples função tribunícia, ou seja, por tornar mais públicos

certos problemas, mas, depois, ficar aquém, em termos de, sobre eles, a comissão ser inteiramente assertiva

e, face às conclusões apuradas, haver uma confiança na sua idoneidade.

Estou, portanto, capacitado, Sr. Deputado, de que encontrámos uma área em que existe possibilidade de

aprofundar as nossas preocupações.

Quanto ao tema da supervisão financeira, creio que o Sr. Deputado confundiu dois planos. Um plano é o da

construção europeia, da realização da união bancária, o plano, portanto, do reforço das capacidades de

supervisão a nível europeu. Aliás, como tive ocasião de sublinhar na minha intervenção, o regime geral das

instituições de crédito e sociedades financeiras, recentemente alterado — em 2012 —, reflete as modalidades

de cooperação possível entre as instituições de supervisão nacional e as instituições de supervisão europeias.

Mas a questão fundamental, neste aspeto, é outra, a questão fundamental é a de nos perguntarmos se o

regime jurídico internamente aplicado às instituições financeiras portuguesas não deve poder ser igualmente

garantido, com a mesma eficácia do supervisor, em relação às instituições financeiras estrangeiras que atuem

em Portugal. Ora, é este o ponto exato que coloquei e, neste exato ponto que coloquei, não vejo qualquer

divergência em relação à orientação política do Partido Socialista.

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Portanto, embora tenha falado a título individual, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, permita-me que lhe

diga estar inteiramente convicto de que, se há alguém que tenha ouvido com atenção as palavras que produzi

sobre esta matéria, foram, certamente, todos os Srs. Deputados, mas terão sido, igualmente, os Deputados da

minha própria bancada.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, fica, assim, concluído o primeiro ponto da nossa

ordem do dia de hoje.

Passamos ao segundo ponto, que é relativo à apreciação conjunta, na generalidade, dos projetos de lei n.os

436/XII (2.ª) — Altera o regime jurídico da progressão de carreira dos professores de técnicas especiais (BE) e

510/XII (3.ª) — Vinculação extraordinária dos docentes do Ensino Artístico das Artes Visuais e das Artes

Audiovisuais, da Música e da Dança (PCP).

Para apresentar o projeto de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O ensino artístico, em Portugal,

sofre problemas que já vêm de há muitos anos. Tem existido uma desvalorização tanto do ensino artístico

como do ensino das artes na escola, desvalorização esta que tem múltiplos sintomas e se tem vindo a agravar

com o desinvestimento. E bem sabemos como precisamos do ensino das artes na escola e do ensino artístico

para termos um País mais qualificado.

Mas o projeto que o Bloco de Esquerda hoje aqui traz não é um projeto sobre todo o ensino artístico nem

sobre todos os graves problemas que hoje vive o ensino artístico, é um projeto de lei que é, de facto, a

resposta a uma exigência da Provedoria de Justiça sobre a situação de desigualdade de um grupo de

professores de técnicas especiais das Escolas Artísticas de Soares dos Reis e de António Arroio.

Como sabem, o Bloco de Esquerda tem acompanhado essas escolas desde há muito e na Assembleia da

República foi possível aprovar, há uns anos, uma recomendação para que houvesse uma vinculação de

professores de técnicas especiais. Essa vinculação aconteceu, mas a verdade é que, como nunca houve, de

facto, um pensamento estruturado sobre o ensino artístico e como a legislação foi sempre avulsa, criaram-se

fendas na lei que provocaram situações de injustiça grave que afetam, hoje, docentes que dedicaram toda a

sua vida ao ensino artístico e a quem o Estado não reconhece que são professores, embora os tenha

vinculado como professores. É uma situação verdadeiramente absurda e que urge corrigir.

A Provedoria de Justiça, em 16 de janeiro de 2013, considerou o seguinte, e cito: «Considerando que

estamos perante docentes em condições similares em matéria de habilitações, tendo, em regra, os docentes

abrangidos pelo Decreto-Lei n.º 338/2007 tempo de serviço inferior aos integrados na carreira em momento

anterior, a diferença de tratamento em matéria de progressão não parece estribar-se em fundamento bastante,

justificando, deste modo, a adequada reparação da situação por via legislativa». É tão simples como isto: o

decreto foi mal feito! Houve professores que ficaram numa fenda da lei e que não são respeitados enquanto

docentes que são.

O que o Bloco de Esquerda pretende com este projeto de lei é tão-só transformar em lei aquela que é a

recomendação da Provedoria de Justiça. Não quer isto dizer que o Bloco de Esquerda não entenda que há

muito mais a fazer pelo ensino artístico, pelo ensino das artes e pelos professores, pelos docentes do ensino

artístico e do ensino das artes na escola, mas este é um problema muito concreto que já podia ter sido

corrigido há muito tempo e que, de facto, não tem qualquer impacto orçamental, pelo que não me parece que

haja alguma razão para que hoje aqui, na Assembleia da República, não respeitemos o conselho que a

Provedoria de Justiça nos dá e não reparemos já esta situação.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Paula Baptista.

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A Sr.ª Paula Baptista (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O ensino artístico especializado e a

cultura em Portugal encontram-se profundamente desvalorizados, quer pelo desinvestimento público a que

têm sido votados por sucessivos Governos PS, PSD e CDS, quer pela manutenção da precariedade laboral

dos docentes.

O ensino artístico especializado das artes visuais, audiovisuais, música e dança, pelas suas características,

exige a existência de meios humanos com formação em distintas tecnologias de formação artística: cerâmica,

ourivesaria, têxteis, realização plástica do espetáculo, produção artística, madeiras, metais, representação

bidimensional e tridimensional, design de produto, serigrafia, fotografia, meios digitais, multimédia, design de

comunicação, audiovisual, dança e música.

Falar da situação profissional dos docentes do ensino artístico especializado até ao momento, em Portugal,

é sinónimo de instabilidade, de desvalorização profissional, de pagamento de salário pelo índice remuneratório

mais baixo da tabela salarial, de não pagamento de subsídio de férias, de não pagamento da compensação

por caducidade dos contratos de trabalho, situação mantida por sucessivos Governos.

Isto, Srs. Deputados, não são sinais positivos nem para a cultura nem para o ensino artístico em Portugal.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Paula Baptista (PCP): — Dos 400 postos de trabalho considerados indispensáveis pelo Governo

para assegurar o bom funcionamento das sete escolas da rede pública do ensino artístico e especializado,

este fixou apenas 38 vagas e extinguiu 32 postos de trabalho.

É essencial que as escolas do ensino artístico especializado das artes visuais e audiovisuais, da música e

da dança tenham condições de funcionamento para assegurar a qualidade do ensino. Para alcançar este

objetivo, a estabilidade e o cumprimento dos direitos dos docentes é determinante.

Por isso, o PCP apresenta uma proposta de vinculação extraordinária dos docentes do ensino artístico, das

artes visuais e audiovisuais, da música e da dança, integrando-os numa carreira, garantindo a sua progressão,

pondo fim à precariedade que impera nas escolas do ensino artístico especializado e assegurando a

estabilidade do corpo docente nestas escolas.

Tivemos conhecimento de que o Governo anunciou a criação de um grupo de trabalho para analisar

medidas legislativas que conduzam à vinculação dos professores contratados no ensino artístico especializado

das artes visuais e audiovisuais, esquecendo-se dos docentes de dança e de música, que se encontram em

situações similares em escolas artísticas especializadas da rede pública. Registamos este anúncio mas não

nos contentamos com intenções. Se o Governo quisesse resolver o problema, não criava grupos de trabalho,

propunha medidas concretas, porque o problema persiste há muitos anos, Srs. Deputados.

No entanto, se há uma verdadeira vontade de vincular extraordinariamente estes professores — e,

repetimos, estes professores têm de ter oportunidade de uma carreira, têm direito à sua dignidade laboral —,

então, aprovem aqui a proposta do PCP.

Vozes do PCP: — Muito bem!

A Sr.ª Paula Baptista (PCP): — A garantia da vinculação extraordinária dos docentes do ensino artístico

especializado das artes visuais e audiovisuais, da música e da dança e a sua progressão na carreira docente,

para o PCP, é uma questão de justiça.

O desprendimento com que o Governo vem desinvestindo na cultura e na educação é uma clara e evidente

opção ideológica. É a opção por atacar o caráter emancipador que a cultura e a educação podem

desempenhar enquanto elementos de transformação social e desenvolvimento nacional.

O desrespeito de sucessivos Governos, do PS e do PSD e do CDS, pelos docentes do ensino

especializado artístico, para lá de refletir o ataque mais geral contra os direitos dos trabalhadores, na sua

dignidade e condições de vida, constitui, ainda, um elemento de fragilização da escola pública e de ataque à

sua natureza democrática.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

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A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês

Teotónio Pereira.

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O tema que aqui temos

hoje, com estes projetos, infelizmente, é recorrente. É por essa razão que muitos consideram que a questão

da vinculação aos quadros dos professores de técnicas especiais, em particular dos professores do ensino

artístico especializado, tem vindo a ser propositadamente adiada pelo Governo e pela maioria, mas isto,

obviamente, não é verdade.

Toda a comunidade educativa sabe que a vinculação ao Estado impõe uma análise das necessidades

efetivas das escolas, não só no presente, mas também no futuro, a médio prazo. Isto porque, na perspetiva do

sistema educativo, não faz qualquer sentido proceder à vinculação de professores que num curto espaço de

tempo possam ficar numa situação de horário zero.

Ora, como se sabe, as necessidades permanentes não se podem esgotar no presente e, por isso, a

vinculação de professores aos quadros do Estado impõe uma ponderação a curto, médio e longo prazo.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Não sabe o que está a dizer!

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Nesse sentido, importa recordar que o País lidou nos últimos

anos com uma importante reorganização da sua rede escolar, nomeadamente por via do processo de

agregações, já concluído, e do alargamento dos limites geográficos dos quadros de zona pedagógica. Sem a

conclusão destes processos de reorganização da rede, o Estado estava impedido de fazer a avaliação das

necessidades permanentes, se quisesse ter em conta o médio e o longo prazos. Hoje, concluídos esses

processos, essa avaliação já é possível e, por isso, o Governo já anunciou que procederá à vinculação de

2000 professores este ano,…

Protestos do PCP.

… depois de já a ter realizado, como todos recordam, no ano passado, em relação a 600 professores.

No caso particular dos professores do ensino artístico, o Governo anunciou ainda o lançamento de um

concurso próprio, que ocorrerá em simultâneo com a vinculação extraordinária. Este concurso terá como

objetivo vincular professores do ensino artístico da Escola António Arroio, em Lisboa, e da Escola Soares dos

Reis, no Porto.

Do que é público e do que fomos informados, o número de vagas para o anunciado concurso de vinculação

não está ainda fechado e irá ser acordado com as escolas em causa, para se apurarem quais são, de facto, as

necessidades permanentes, em consonância com os seus projetos educativos.

De qualquer modo, todos sabemos que, para os partidos da oposição, esse número de vinculações nunca

será suficiente, porque o seu objetivo é, obviamente, desvalorizar tudo o que este Governo fizer nesse sentido.

Tal como desvalorizam a vinculação extraordinária que ocorreu no ano passado, também o farão com a

vinculação extraordinária deste ano.

Do lado do CDS, o que podemos desde já afirmar é que esta vinculação extraordinária para os professores

do ensino artístico é necessária, é justa e é uma medida significativa do reconhecimento da importância destas

escolas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Por isso, esperamos que este processo seja executado de

forma célere e justa tanto na determinação das vagas, tendo em conta as necessidades permanentes do

sistema a médio prazo, como nos critérios para a sua vinculação.

De resto, também é essa a posição dos professores dessas escolas, as quais, é bom dizer, desempenham

um papel fundamental e único no quadro a oferta educativa pública, acrescentando qualidade e diversidade ao

sistema,…

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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — … sendo por isso escolas que ocupam um espaço que importa

preservar e que, acreditamos, será preservado com a vinculação já anunciada pelo Governo.

Dito isto, não nos revemos nos projetos de lei do PCP e do Bloco de Esquerda. É que, apesar de todos

concordamos com as necessidades de vinculação destes professores, não consideramos que as opções

apresentadas pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP sejam as mais adequadas no sentido de garantir a justiça

que deve nortear todo este processo.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Ester

Vargas.

A Sr.ª Maria Ester Vargas (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Discutimos, hoje, dois

projetos de lei, apresentados pelos Srs. Deputados do Bloco de Esquerda e do partido Comunista Português,

relativos à situação dos professores de técnicas especiais.

É entendimento do PSD que a abordagem deste tipo de questões não pode ser pautada pela demagogia,

pelo contrário, a mesma deve ser caracterizada pelo realismo e pela responsabilidade, permitindo assim que a

defesa da escola pública seja uma realidade efetiva e não um mero chavão discursivo.

Sabemos todos que o Governo tem estado a levar a cabo uma gestão muito rigorosa no ajustamento do

número de professores às reais necessidades das escolas, otimizando e racionalizando os recursos,

recusando-se a enveredar por soluções que, podendo ser eventualmente mais agradáveis à opinião pública,

não contribuem para uma melhoria concreta do sistema educativo.

Protestos da Deputada do PCP Paula Baptista.

Em 2013, houve, como é do conhecimento geral, um concurso extraordinário de vinculação de

professores…

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

… e, recentemente, foi já anunciado um outro, que permitirá a vinculação de cerca de 2000 professores

contratados, de acordo com as necessidades do sistema. E é precisamente neste ponto que temos de nos

concentrar, pois se não atendermos às necessidades reais (e, sublinho, reais) das escolas, não estaremos a

valorizar a escola pública e estaremos a dar um péssimo contributo ao País.

Este grupo parlamentar, tal como o Governo, está atento à situação dos professores de técnicas especiais,

estando a tutela da educação a trabalhar com as diversas entidades com maior responsabilidade e interesse

nesta matéria, para que, de forma sustentada e sempre visando as necessidades do sistema, se possa

considerar a abertura de um procedimento concursal extraordinário, indo ao encontro da expetativas destes

docentes.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Não é concurso, é integração!

A Sr.ª Maria Ester Vargas (PSD): — Estes dois aspetos, a sustentabilidade e as necessidades reais,

levam a que, naturalmente, não se possa levar a cabo uma vinculação imediata e universal destes docentes.

Parece óbvio, mas pelos vistos não é, pois há ainda quem insista em medidas utópicas que em nada

contribuem para a melhoria do sistema.

Protestos da Deputada do PCP Paula Baptista.

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Temos que ter os pés bem assentes na terra e não podemos enveredar por situações que contribuam para

o colapso do sistema e não para a sua sustentabilidade.

Protestos da Deputada do PCP Paula Baptista.

Assim, acompanhamos o Governo no trabalho que está a levar a cabo para que o sistema educativo possa

corresponder de forma cabal às necessidades de formação dos nossos jovens, que são sempre o nosso

objetivo ao discutirmos estas matérias, independentemente de considerarmos o papel insubstituível dos

professores na construção de um futuro capaz de corresponder aos desafios do século XXI.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Não estamos a falar do mesmo!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Agostinho Santa.

O Sr. Agostinho Santa (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Embora dirigidos ao mesmo

universo de profissionais, os dois projetos de lei em discussão não se confundem, nem sequer nos seus

efeitos e na sua oportunidade. Motivarão, por isso, posicionamentos diferentes quanto à bondade das

soluções normativas propostas e ao sentido da sua aceitação.

O projeto de lei do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda ilustra uma situação que também nos parece

conter suficiente perversidade para demandar alteração urgente.

Pode, com segurança, afirmar-se que a existência de vários impulsos de vinculação excecional de

professores das ditas técnicas especiais, ligadas ao ensino artístico, profissional e tecnológico, tiveram como

resultado prático e indesejado a criação de uma situação de desigualdade de tratamento, em que alguns

profissionais, nas mesmas condições de habilitação para a lecionação de disciplinas técnicas e com superior

tempo de serviço em relações a outros, se veem confrontados com regras mais penalizadoras de progressão

na carreira e de estatuto remuneratório.

Neste sentido, o que este projeto de lei pretende — equiparação dos regimes de progressão na carreira de

todos os professores vinculados de técnicas especiais nas mesmas condições — assume foros de reposição

de níveis imprescindíveis de justiça.

Por sua vez, o projeto de lei do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tem como lastro

motivante a situação de uma elevada percentagem de docentes…

Protestos da Deputada do PCP Rita Rato.

… de disciplinas do ensino artístico das artes visuais e audiovisuais, da música e da dança que, suprindo

embora necessidades permanentes das escolas, são contratados a termo todos os anos, nunca tendo acedido

à vinculação, pretendendo-se que essa vinculação seja imediata e extraordinária para docentes contratados

com pelo menos três anos de serviço.

O Partido Socialista tem defendido, a propósito de iniciativas sobre o problema da precariedade nas

condições de exercício das funções educativas, que se impõe que a situação dos docentes contratados que

vêm preenchendo necessidades permanentes da escolas seja tratada com equidade, evoluindo para a

estabilidade através do acesso à carreira docente e respetivos quadros.

Mantemos esse entendimento na certeza reforçada de que a União Europeia impõe a tomada de medidas

em cumprimento da diretiva comunitária de combate à precariedade do regime de trabalho de profissionais,

entre os quais se encontram os docentes contratados, cumprimento esse a que o Governo português está

imperativamente vinculado.

Neste pressuposto, tem o Sr. Ministro da Educação entre mãos um problema que tem que resolver, nos

tempos mais próximos e de acordo com o direito comunitário e nacional. Este é, portanto, o tempo de o

Governo aparecer com a solução legalmente conformada; este não é o tempo de criar regimes excecionais de

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vinculação imediata para resolver o problema de específicos grupos de entre docentes contratados, desviados

de um enquadramento global e dos termos equitativos em que a solução deve assentar.

Entendemos, assim, que, nas atuais circunstâncias, a vinculação dos professores de disciplinas do ensino

artístico, respeitando o quadro legal de base específico,…

Protestos de Deputada do PCP Rita Rato.

… deverá ser equacionada sob critérios e regras aplicáveis, tendo em vista a vinculação aos quadros dos

restantes docentes sucessivamente mantidos em regime de contratação, em violação das normas laborais

aplicáveis. É isso, e não menos que isso, que se exige com a máxima urgência.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para intervir, a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Há dois problemas diferentes em

debate.

Por um lado, há um projeto de lei do PCP, que veio por arrastamento do projeto de lei do Bloco de

Esquerda, e que o Bloco de Esquerda apoia inteiramente. É preciso fazer a vinculação, a vinculação não é só

aquela de que fala o Governo, é uma vinculação feita noutros moldes e nós acompanhamos completamente a

necessidade de vinculação.

Por outro lado, há o projeto de lei que o Bloco de Esquerda apresenta aqui, hoje, ao qual nenhum Sr.

Deputado se referiu.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Ninguém o leu!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — O projeto que o Bloco de Esquerda aqui traz é sobre professores que já

estão vinculados. Eles são funcionários públicos, eles estão vinculados e os senhores não vão poder despedi-

los. Eles são funcionários públicos!

O que acontece é que, em 2007, foi feito um decreto-lei — um dos múltiplos, dos 500 que já se fizeram

sobre o ensino artístico e que foram «feitos com os pés», não há outra palavra para descrever a maneira como

o ensino artístico tem sido tratado em Portugal — que criou uma situação de desigualdade face a professores

com as mesmas habilitações, com o mesmo vínculo à função pública. Há uns que são docentes e há outros,

poucos, com anos de experiência, que construíram com o seu trabalho o que são as escolas artísticas, que

estiveram presentes em todo esse percurso, que é um percurso que orgulha pelo trabalho que foi feito por

estes docentes, que forma excluídos de serem considerados docentes, são «Anexo II», não existem!

Para o Estado português, professores que deram a sua vida ao ensino artístico, que estão vinculados à

função pública, não têm sequer o direito a serem considerados docentes, são «Anexo II» por causa do erro de

um decreto-lei!

É por isso que o Provedor de Justiça fez uma recomendação clara, dizendo que há uma situação de

injustiça que tem de ser corrigida por via legislativa. Cá estamos, por via legislativa, a corrigir uma situação de

injustiça, absurda, que pode ser corrigida tão facilmente, basta os Srs. Deputados e as Sr.as

Deputadas

quererem tratar com dignidade quem toda a vida tratou dignamente o ensino artístico.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — A Mesa não regista mais inscrições, pelo que fica assim concluído o

segundo ponto da nossa ordem do dia.

Vamos prosseguir com o terceiro e último ponto da nossa ordem do de trabalhos, que consiste na

discussão, na generalidade, do projeto de lei n.º 493/XII (3.ª) — Integração da totalidade do lugar de Lagoa na

União das Freguesias de Aboim, Felgueiras, Gontim e Pedraído (alteração aos limites da União das

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Freguesias de Aboim, Felgueiras, Gontim e Pedraído e da União das Freguesias de Moreira do Rei e Várzea

Cova) (PS).

Tem a palavra, para apresentar o projeto de lei, o Sr. Deputado Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Permitam-me que à qualidade de

primeiro subscrito deste projeto de lei acrescente o facto de ser Presidente da Assembleia Municipal de Fafe.

O projeto que apresentamos no Parlamento é relativo ao lugar de Lagoa, que é um bonito lugar entre Fafe,

concelho, e a serra do Gerês, conhecido no mundo pelas imagens do Rali de Portugal, que há muitos anos

está exatamente partido a meio, com metade das casas pertencendo a uma freguesia e outra metade das

casas pertencendo a outra, o que significa que metade dos eleitores são de uma freguesia e outra metade são

de outra, situação que é negativa para quem lá vive e que ficou muito pior com a agregação que a assembleia

municipal e o Parlamento entenderam fazer, porque com a agregação de freguesias mais distante ficou, quer

para uns quer para outros, o centro da freguesia a que ainda pertencem.

Daí que o sentido deste projeto seja proceder à regularização histórica do lugar de Lagoa. Pretende-se, se

vier a ser essa a vontade do Parlamento, que este lugar seja unificado numa só união das freguesias, que vem

citada no projeto, que junta Aboim, Felgueiras, Gontim e Pedraído. Espero que isso venha a acontecer. É isso

que penso que as populações deste lugar e desta freguesia desejam.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Clara

Marques Mendes.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Discute-se aqui, hoje, tal

como acabou de ser apresentado, um projeto de lei do Partido Socialista que visa a integração da totalidade

do lugar de Lagoa na União de Freguesias de Aboim, Felgueiras, Gontim e Pedraído, do concelho de Fafe, ao

qual pertenço e sobre o qual muito me orgulha, neste momento, estar aqui a falar,

De facto, relativamente a este projeto de lei, é importante que se deixem aqui duas notas.

Em primeiro lugar, devo dizer que algumas reservas nos deixa o instrumento utilizado pelo Partido

Socialista para o efeito, desde logo porque houve oportunidade de resolver essa situação do lugar de Lagoa

aquando da reconfiguração das freguesias e isso não foi feito. E não foi feito porque não houve vontade

política, por parte do Partido Socialista, para resolver esta questão.

De facto, o projeto aqui apresentado parece-nos um mea culpa por parte do Partido Socialista. Além disso,

é um mea culpa que nos deixa algumas dúvidas, e vou dizer porquê. É que este é um assunto muito

importante e muito sério, por isso merece ser tratado com essa seriedade e com essa importância. E porque é

que isso não acontece?

Porquê esta pressa em agendar este tema quando ainda faltam elementos fundamentais para que esta

discussão ocorra?

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — O Partido Socialista requereu o agendamento desta iniciativa e

trouxe aqui hoje a discussão uma matéria em relação à qual, de facto, aguardamos pareceres de seis órgãos

locais. Como esses pareceres foram solicitados no passado dia 31 de janeiro, nem sequer passou um tempo

mínimo para lhes dar resposta.

Entendemos que, neste momento, o Partido Socialista fala das populações, mas não está minimamente

preocupado em que as populações tenham o tempo necessário para fazerem ouvir a sua voz. Por isso, não

deveríamos estar hoje a discutir esta matéria, porque para uma discussão consciente e séria é necessário

aguardarmos a chegada dos pareceres. Mas o Partido Socialista requereu o agendamento de um debate que

ainda não está instruído nem completo.

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Depois disto, resta dizer que a atitude do Partido Socialista, neste momento, deve ser a de requerer que

este projeto de lei baixe à comissão competente, sem votação, para que aguardemos os pareceres e

conheçamos a vontade da população e, assim, possamos discutir de forma séria e consciente esta questão.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Otília Ferreira Gomes para

uma intervenção.

A Sr.ª Otília Ferreira Gomes (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A reorganização

administrativa territorial autárquica obedeceu a princípios muito claros e definidos. Destacamos a preservação

da identidade histórica, cultural e social das comunidades locais, a participação das autarquias locais na

concretização da reorganização administrativa dos respetivos territórios e a flexibilidade no desenho de

soluções concretas para essa mesma reorganização.

Neste contexto, todos os órgãos municipais foram convocados para se pronunciarem sobre a

reorganização do seu território, para que as opções concretas de cada um fossem as mais adequadas à

realidade local.

A unidade técnica criada para auxiliar essa tarefa legislativa deu sempre primazia às pronúncias das

assembleias municipais, favorecendo, assim, a vontade dos órgãos locais na reestruturação do seu território.

Foi o caso da Assembleia Municipal de Fafe, que se pronunciou e cuja solução foi adotada naquele município.

As assembleias municipais, na sua pronúncia, e ao contrário daquilo que a exposição de motivos do projeto

de lei do Partido Socialista aqui em discussão afirma, não tinham que atender apenas a critérios numéricos,

mas a todos os outros vertidos na lei, nomeadamente a continuidade territorial.

Assim, os órgãos locais tiveram oportunidade de ter uma participação ativa no desenho da reorganização

territorial e na solução concreta que melhor servisse aquela e a sua população.

Na pronúncia que a Assembleia Municipal de Fafe fez sobre esta matéria, não faz qualquer referência ao

lugar de Lagoa, nem à necessidade de este lugar integrar, na sua totalidade, qualquer união de freguesias

nem, mesmo, à vontade daquela população nesse sentido.

O facto de existir um critério numérico na lei não afasta que, dentro desse critério, fossem sinalizadas

situações concretas que necessitavam de uma outra configuração, cumprindo, assim, os princípios que

orientaram esta reforma.

O CDS sempre defendeu que, dentro do quadro normativo existente, se tentasse encontrar soluções

concretas que promovessem a coesão e a continuidade territorial, por um lado, e a vontade e o ganho das

populações, por outro.

Caso a vontade da população do lugar de Lagoa e dos órgãos locais, que ainda não se pronunciaram

sobre tal matéria — conforme já foi aqui referido pela Sr.a Deputada Clara Marques Mendes —,

nomeadamente a Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Aboim, Felgueiras, Gontim e

Pedraído e a Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Moreira do Rei e Várzea Cova, seja

aquela que está vertida neste projeto e nesta iniciativa legislativa, e essa seja a solução que melhor

salvaguarde os interesses daquela população, o CDS não vê qualquer razão para que não possa vir a ser

aprovada.

Mas o que não compreendemos, Sr. Deputado Laurentino Dias, é a razão da urgência deste agendamento

e desta discussão. Podíamos, e devíamos, ter esperado pelos pareceres dos órgãos locais, que se encontram

pendentes, conforme tem acontecido, aliás, com outras iniciativas sobre estas matérias.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, apoiaremos sempre soluções de reorganização, quer para a população de

Lagoa quer para outras populações, que salvaguardem o interesse público local e a vontade concreta das

populações, mas não concordamos que isso aconteça sem se conhecer, em concreto, qual é essa vontade e

sem que os órgãos locais sejam previamente consultados.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz.

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A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Discutimos hoje o projeto de lei apresentado

pelo Partido Socialista que visa integrar o lugar de Lagoa na União das Freguesias de Aboim, Felgueiras,

Gontim e Pedraído, do concelho de Fafe.

A população que reside no lugar de Lagoa há muito que reclama uma definição clara e inequívoca sobre a

sua situação.

Convém aqui relembrar que o lugar de Lagoa há muito está dividido entre as freguesias de Aboim e de

Várzea Cova, tendo-se a população mobilizado e realizado uma manifestação, que ocorreu em novembro de

2012, clamando pelo fim desta divisão administrativa.

Não nos opomos à resolução desta questão, isto é, à integração do lugar de Lagoa numa freguesia há

muito reivindicada pela população, problema que é anterior ao processo de extinção de freguesias.

Para o PCP, a resolução deste problema não está desligada da necessidade de reverter a extinção de

freguesias, processo levado a cabo pelo Governo PSD/CDS-PP, mas que foi iniciado — convém aqui lembrá-

lo — com a assinatura do pacto de agressão assinado por PS, PSD e CDS-PP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — O poder local democrático, ao longo dos últimos 36 anos, foi, inegavelmente,

responsável por profundas transformações sociais e pela melhoria das condições de vida das populações,

contribuindo, decisivamente, para o desenvolvimento local, regional e nacional e para a superação das

enormes carências existentes em Portugal.

A lei da extinção de freguesias, a par de outras iniciativas legislativas levadas a cabo pelo Executivo, revela

bem o ódio que este Governo e a maioria parlamentar que o suporta têm ao poder local democrático nascido

do 25 de Abril.

A política do Governo, no que às autarquias locais diz respeito, visa transformar as autarquias locais em

meras dependências do poder central, limitar brutalmente a sua autonomia, reduzir significativamente o

número de eleitos, atacando, por este meio, o caráter participativo e democrático do poder local.

A extinção de freguesias que, no caso do município de Fafe, levou à redução de 11 freguesias, passando

de 36 para 25, e, no caso hoje em apreço, à eliminação de 4, dando origem a duas novas freguesias, retira

expressão e força à representação dos interesses locais, e reduz a proximidade entre os eleitos e os eleitores.

A política de destruição do poder local democrático teve, tem e terá, forte oposição do PCP.

O PCP só aceita o aprofundamento dos princípios constitucionais do poder local democrático que permita e

incentive um maior envolvimento e participação das populações, que aprofunde a sua autonomia, que reforce

os seus meios, de molde a que sejam solucionados os problemas das populações e que contribua para a

melhoria da sua qualidade de vida.

Relativamente ao assunto que hoje discutimos, o PCP reitera que a sua plena resolução está intimamente

relacionada com o processo de reversão da extinção de freguesias.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: O que aqui hoje o Partido Socialista

nos propõe é que se resolva o problema de uma divisão de uma comunidade que está em duas freguesias

diferentes, que está em duas unidades administrativas contíguas. Ora, isso não faz sentido. Devem estar

numa situação de unidade, de unificação, pelo que essa pretensão deve ser apoiada.

Temos inúmeros problemas destes no nosso mapa administrativo, que causam variadíssimos incómodos e

bastantes preocupações a muitos dos nossos concidadãos.

Creio que, ao longo do processo legislativo, teremos oportunidade de conhecer todos os pareceres e

posições que nos serão remetidos por parte das entidades que foram consultadas.

Espero que o mapa que acompanha tenha o rigor devido. A Assembleia da República não tem sido muito

feliz nessa matéria nos últimos tempos e, portanto, impõe-se uma acrescida vigilância à elaboração dessa

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circunstância, situação que teremos de tratar para futuro e que outros Srs. Deputados já têm levantado em

sede de comissão. Não fica mal fazer aqui esse alerta.

Queria ainda dizer que o que importa é a resolução deste problema, não propriamente o problema mais

genérico da extinção das freguesias ou do eufemismo da agregação de freguesias, a não ser nesta

circunstância, muito peculiar, de que é difícil a alguém saber de que terra é quando parte da sua comunidade

está na União das Freguesias de Aboim, Felgueiras, Gontim e Pedraído e a outra parte está na União das

Freguesias de Moreira do Rei e Várzea Cova. É caso para dizer que é difícil saber de que terra se é.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma nova intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado

Laurentino Dias.

O Sr. Laurentino Dias (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Apenas duas notas para dizer que não há

pressa nenhuma, por parte do Partido Socialista, para ver este assunto resolvido O problema tem tantos anos

que aquelas populações esperarão que o Parlamento decida em mais 15 dias, um mês ou dois meses.

Também achamos bem que o Parlamento possa tomar uma decisão depois de ouvidas a câmara

municipal, a assembleia municipal e as assembleias de freguesia das duas freguesias em causa. Ouvimos,

aliás, com o devido cuidado, intervenções, como por exemplo a do CDS/PP, dizendo que, desde que as

populações o digam de forma expressa, o Parlamento fará bem em aprovar aquela que for a vontade das

populações.

Nessa medida, e para atuar com todas as cautelas, com certeza que estamos de acordo em que este

diploma possa baixar à comissão para receber todos os pareceres, sem votação, para que depois o

Parlamento possa, atendendo à vontade que vier a ser expressa por parte das populações, tomar essa

decisão, se possível por unanimidade.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Ainda para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Clara

Marques Mendes.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Queríamos saudar a posição do

Sr. Deputado Laurentino Dias de fazer baixar à comissão, sem votação, este projeto de lei, porque, de facto, é

muito importante ouvir a população e porque é determinante a vontade da população numa matéria tão

importante como esta.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições, pelo que fica

assim concluído o debate deste último ponto da nossa ordem do dia de hoje.

A próxima sessão plenária terá lugar amanhã, pelas 10 horas, e a respetiva ordem de trabalhos terá dois

pontos.

Do primeiro ponto consta o debate quinzenal com o Primeiro-Ministro, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do

artigo 224.º do Regimento.

O segundo ponto tem a ver com votações regimentais, no final do debate, estando agendados, sem

discussão, só para votação, os diplomas seguintes: projeto de lei n.º 505/XII (3.ª) — Primeira alteração à Lei

n.º 58/2012, de 9 de novembro, que cria um regime extraordinário de proteção de devedores de crédito à

habitação em situação económica muito difícil (PS) e projetos de resolução n.os

939/XII (3.ª) — Recomenda ao

Governo a criação de um Fundo de Garantia ao Crédito à Habitação (PS) e 940/XII (3.ª) — Recomenda ao

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Governo a suspensão dos procedimentos de venda executiva de imóveis penhorados por dívidas fiscais em

casos de agravamento da situação financeira dos agregados familiares (PS).

Por hoje, estão concluídos os nossos trabalhos.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 55 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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