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Sexta-feira, 7 de março de 2014 I Série — Número 57
XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)
REUNIÃOPLENÁRIADE6DEMARÇODE 2014
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 14
minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º
210/XII (3.ª), das interpelações n.os
14 e 15/XII (3.ª) e do projeto de resolução n.º 976/XII (3.ª).
Em declaração política, a Deputada Rita Rato (PCP), aludindo ao Dia Nacional da Igualdade Salarial, acusou o Governo de praticar políticas que acentuam as desigualdades que atingem as mulheres, os jovens e os deficientes, tendo ainda assinalado os 93 anos do seu partido. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Elza Pais (PS), Cecília Honório (BE), Artur Rêgo (CDS-PP) e Joana Barata Lopes (PSD).
Em declaração política, a Deputada Cecília Honório (BE) condenou as declarações do Primeiro-Ministro relativas à não reposição dos níveis salariais e dos níveis remuneratórios das pensões de 2011, que considerou violarem os acórdãos do Tribunal Constitucional, e também assinalou a passagem do Dia Nacional da Igualdade Salarial. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento do Deputado Miguel Tiago (PCP).
Em declaração política, a Deputada Conceição Bessa Ruão (PSD), além de felicitar o Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto pelo seu
25.º aniversário de atividade, regozijou-se pela conclusão dos trabalhos de especialidade relativos à lei da investigação clínica, chamando a atenção para a sua importância. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento das Deputadas Teresa Caeiro (CDS-PP), Paula Santos (PCP) e Maria Antónia Almeida Santos (PS).
Em declaração política, o Deputado Carlos Zorrinho (PS) acusou o Governo pelos cortes que está a fazer na educação, relegando o conhecimento e a cultura para um plano secundário, tendo, depois, respondido a pedidos de esclarecimento dos Deputados Michael Seufert (CDS-PP), Amadeu Soares Albergaria (PSD) e Rita Rato (PCP).
Em declaração política, o Deputado Hélder Amaral (CDS-PP) considerou que o Governo tem atuado de forma eficaz na resolução dos problemas do País e realçou os valores positivos alcançados no setor do turismo. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Mariana Mortágua (BE), Acácio Pinto (PS), Nuno Encarnação (PSD) e João Ramos (PCP).
Foi debatida, na generalidade, a proposta de lei n.º 208/XII (3.ª) — Transpõe parcialmente a Diretiva 2013/25/UE, do Conselho, de 13 de maio de 2013, que adapta determinadas diretivas no domínio do direito de estabelecimento e da livre prestação de serviços, em virtude
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da adesão da República da Croácia, e procede à segunda alteração à Lei n.º 9/2009, de 4 de março. Intervieram, além do Secretário de Estado do Emprego (Octávio de Oliveira), os Deputados António Cardoso (PS), Joana Barata Lopes (PSD), David Costa (PCP), Otília Ferreira Gomes (CDS-PP) e Mariana Aiveca (BE).
A Câmara procedeu à apreciação da petição n.º 292/XII (3.ª) — Apresentada por José Carlos de Oliveira e outros, solicitando à Assembleia da República que promova o
debate urgente visando as iniciativas legislativas e políticas necessárias para garantir o funcionamento e evitar o encerramento da Cinemateca Portuguesa — Museu do Cinema. Usaram da palavra os Deputados Miguel Tiago (PCP), Inês Teotónio Pereira (CDS-PP), Cecília Honório (BE), Maria Conceição Pereira (PSD), e Inês de Medeiros (PS).
O Sr. Presidente (Guilherme Silva) encerrou a sessão eram 18 horas e 6 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 14 minutos.
Podem ser abertas as galerias.
Peço desculpa pelo meu atraso, mas estive à porta do Hemiciclo cerca de um quarto de hora, a falar com
Deputados, e acabei por me atrasar.
Antes de darmos início à ordem do dia, vou pedir ao Sr. Secretário Duarte Pacheco o favor de ler o
expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: a proposta de lei n.º 210/XII (3.ª) — Estabelece o regime
fiscal das entidades organizadoras das finais das competições UEFA Champions League e UEFA Women’s
Champions League da época 2013/2014, bem como dos clubes desportivos, respetivos jogadores e equipas
técnicas, em virtude da organização e participação naquelas partidas, que baixa à 5.ª Comissão; as
interpelações n.os
14/XII (3.ª) — Sobre a grave situação económica e social do País e a política alternativa
necessária para a solução dos problemas nacionais e 15/XII (3.ª) — Sobre o balanço do Programa de
Assistência Económica e Financeira, a avaliação da ação da troica em Portugal e a transição para o pós-troica
(BE); e o projeto de resolução n.º 976/XII (3.ª) — Recomenda a revogação das reduções remuneratórias dos
bolseiros de investigação aplicadas pelo Governo no Orçamento do Estado para 2014 já declaradas
inconstitucionais no Orçamento do Estado para 2013 (BE), que baixa à 8.ª Comissão.
É tudo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Como sabem, o primeiro ponto da ordem do dia consiste em declarações políticas,
cuja ordem de intervenção, por parte dos grupos parlamentares, será a seguinte: PCP, BE, Os Verdes, PSD,
PS e CDS-PP.
Para uma declaração política, pelo PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: No Dia Nacional da Igualdade Salarial,
registamos que a política de direita que tem destruído o País e a vida dos portugueses é a política do
agravamento das desigualdades que atingem os trabalhadores, as mulheres, os jovens, as pessoas com
deficiência.
A luta das mulheres trabalhadoras pela igualdade salarial e pela valorização do trabalho é travada há mais
de 103 anos.
Na raiz da comemoração do Dia Internacional da Mulher estão, exatamente, as reivindicações de salário
igual para trabalho igual, as 8 horas de trabalho diário.
Que jamais se esqueça que, em Portugal, só em 1976, resultado da luta geral dos trabalhadores e das
mulheres em particular, foi consagrado na Constituição o direito a salário igual para trabalho igual.
Passados 40 anos do 25 de Abril, os números da discriminação salarial mostram que o princípio do salário
igual para trabalho de igual valor está longe de ser cumprido.
Persistem e agravam-se as discriminações salariais diretas e indiretas, aprofunda-se a desigualdade
salarial entre homens e mulheres — a desigualdade salarial entre mulheres e homens é de 18%, e o valor da
remuneração base por hora de trabalho corresponde a um diferencial de 17,4%.
A desvalorização do trabalho qualificado das mulheres é, por isso, diretamente proporcional ao aumento de
lucros do patronato.
Há um ano atrás, denunciámos aqui a acelerada marcha em curso de sedimentação dos velhos itinerários
de desigualdade e discriminação das mulheres, por razões de classe e de sexo, no trabalho, na família, na
vida social e política, e o retrocesso social que significava.
Há um ano atrás, foram aqui aprovados, por unanimidade, três projetos do PCP: um plano nacional de
combate às discriminações salariais diretas e indiretas, com prioridade na ação inspetiva e punitiva; um
relatório de avaliação do impacto das medidas decorrentes do Orçamento do Estado no agravamento da
pobreza e da exclusão social e a criação de um plano nacional de combate à exploração na prostituição; um
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relatório sobre a situação socio-laboral das mulheres. Foram aprovados por unanimidade, mas até hoje estão
por cumprir.
Hoje, voltamos a afirmar com profunda convicção que a luta das mulheres pela igualdade é parte integrante
da luta pela valorização do trabalho, por uma sociedade mais justa, por um País de progresso e de justiça
social.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Em Portugal, o dia-a-dia de milhões de cidadãos é marcado pela negação
de direitos fundamentais e pelo agravamento da segregação e da discriminação.
Passados seis meses desde o início do ano letivo, existem ainda alunos com necessidades especiais sem
apoios, alunos surdos que estão nas aulas sem intérpretes de língua gestual portuguesa, centenas de crianças
que aguardam, desde outubro, a atribuição do subsídio de educação especial para pagar terapias
indispensáveis e 105 crianças que já perderam este apoio.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Uma vergonha!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Em janeiro deste ano, mais de 50 000 crianças perderam o abono de família e
cerca de 7000 perderam a bonificação por deficiência.
Na semana em que ficámos a saber como aumentaram as maiores fortunas do País, na semana em que
ouvimos um grande empresário da distribuição dizer que não paga ao Estado o que a lei obriga, ficámos
também a saber que o Governo se prepara para atacar novamente os direitos de quem trabalha.
O caminho imposto por sucessivos governos, e de forma particularmente grave pelo atual Governo
PSD/CDS, radicou sempre, mas sempre, na desvalorização do trabalho, no agravamento da exploração, na
agudização das desigualdades sociais e na concentração da riqueza.
O Governo prepara-se novamente, através das novas alterações ao Código do Trabalho, para premiar
quem viola os direitos dos trabalhadores. Pretende reduzir as indemnizações aos trabalhadores despedidos
ilegalmente, facilitando e convidando ao despedimento sem regras, tentando acabar, na prática, com a
proibição de despedimento sem justa causa.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Para este Governo PSD/CDS, o desemprego nunca é demais e o agravamento
brutal das condições de vida é sempre uma via certa para reforçar o exército de mão-de-obra disponível para
trabalhar a qualquer preço, nem que seja por um prato de comida.
Não há margem para dúvidas, Srs. Deputados: este Governo tem um projeto político de empobrecimento
em massa e concentração da riqueza, de substituição de trabalhadores com direitos por trabalhadores sem
direitos, de configuração do Estado à medida das necessidades do capital, mas a luta corajosa e determinada
que os trabalhadores e o povo português têm construído não permitirá a destruição das conquistas e dos
valores de Abril.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: No dia em que comemoramos os 93 anos do Partido Comunista
Português, reafirmamos aqui que a força da razão nos vem da profunda convicção de que é justa, empolgante
e invencível a causa por que lutamos.
Da parte do PCP, cá estaremos, a resistir e a lutar por uma política patriótica e de esquerda, pelo
cumprimento da Constituição e dos valores de Abril no futuro de Portugal, porque a luta, Srs. Deputados, foi e
continuará a ser o único caminho de construção do progresso e da felicidade.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente. — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Rita Rato, os Srs.
Deputados Elza Pais, do PS, Cecília Honório, do BE, Artur Rêgo, do CDS-PP, e Joana Barata Lopes, do PSD.
Entretanto, a Sr.ª Deputada informou a Mesa que pretende responder individualmente a cada um dos Srs.
Deputados.
Para pedir esclarecimentos, tem, pois, a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais.
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A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, começo por felicitá-la pela sua
declaração política sobre um tema tão importante para a vida do nosso País e para a vida dos homens e das
mulheres, porque é de homens e de mulheres que se trata quando falamos do País.
Esta diferença salarial de que a Sr.ª Deputada fala, e que se tem vindo a agravar no nosso País, traduz, de
facto, uma grave discriminação contra as mulheres. Deste modo, Sr.ª Presidente, não se está a cumprir o
princípio constitucional da igualdade, ao qual todos os Governos têm de estar vinculados, independentemente
da cor política de um ou de outro.
Enquanto na União Europeia esta diferença salarial está a diminuir, em Portugal está a aumentar: de 2011
para 2012, aumentou de 12.5% para 15.7% — mais de três pontos percentuais. É uma brutalidade! Não é
assim que construímos uma sociedade mais justa, onde todas as pessoas tenham iguais oportunidades,
porque as oportunidades estão a ser retiradas às mulheres todos os dias, assim como também aos homens, é
óbvio — dificulta a conciliação entre a vida pessoal, profissional e familiar —, quando retiramos tempo às
mulheres e aos homens para promover esta conciliação, que é o que acontece com o aumento do horário de
trabalho dos funcionários públicos para 40 horas.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, as mulheres trabalham, em média, mais 16 horas do que os homens. É
um trabalho não pago, o que nos preocupa muito, porque esta situação vai fazer com que as carreiras das
mulheres sejam mais dificultadas todos os dias. Depois, temos uma situação que já todos constatámos, mas
que ninguém consegue combater: nos postos de hierarquia mais elevada, obviamente que só podem estar os
homens, porque as mulheres veem as suas carreiras dificultadas por todas estas situações.
Também não podemos esquecer que a natalidade está a diminuir significativamente. Somos o país, não da
Europa, mas do mundo com a taxa mais baixa de natalidade. Sabemos que não é um fenómeno recente, mas
também sabemos que a crise está a agravar este fenómeno — em 2013, nasceram só 83 000 crianças.
Sr.ª Presidente, isto é muito difícil de combater, porque estão a ser retiradas férias às famílias.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Elza Pais (PS): — Estou a terminar, Sr.ª Presidente.
Também os salários estão a ficar cada vez mais baixos. E o que faz o Governo relativamente a esta
matéria? Aumenta o tempo parcial para as mulheres, criando e aumentando o fosso e diminuindo a igualdade
de oportunidades para mulheres e para homens. Esta não é uma boa medida para promover a igualdade, mas
seria se este tempo parcial também fosse dedicado aos homens.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Elza Pais, agradeço as questões que traz à
discussão.
De facto, o princípio de salário igual para trabalho igual foi uma conquista da Revolução de Abril, que foi
consagrada em 1976, na Constituição da República Portuguesa, Constituição essa que tem sido tão
maltratada por este Governo.
Importa dizer que, pese embora seja um princípio fundamental consagrado na Constituição, esse princípio
não está a ser cumprido, porque os salários e as discriminações salariais no nosso País, as desigualdades e
as diferenciações salariais beneficiam sempre, mas sempre, os lucros do patronato.
Recebemos aqui, na Subcomissão de Igualdade — recordo-me perfeitamente, assim como a Sr.ª Deputada
se recordará —, a CIP (Confederação da Indústria Portuguesa), que veio reiterar a sua total indisponibilidade
para resolver o problema da discriminação salarial, porque significaria sempre custos para as empresas. Isto
demonstra bem a indisponibilidade do patronato para resolver um problema inaceitável de violação da
Constituição da República Portuguesa.
Da parte do PCP, sempre dissemos e estivemos disponíveis para encontrar propostas para fiscalizar,
designadamente com ação punitiva e sancionatória, este tipo de violações. Mas também fomos sempre muito
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claros quando dissemos que isto não ia lá com sensibilizações. Trata-se de cumprimento da lei e não de
sensibilização.
O que seria fundamental acontecer era, da parte do Governo, um sinal claro de que o patronato tem de
cumprir aquilo que é um princípio constitucional. Da parte do PCP, continuaremos sempre a exigir isso, porque
é fundamental. E é inaceitável que a CIP tenha afirmado aqui, nesta Casa, que está indisponível para resolver
o problema das discriminações desde que represente um custo para as empresas.
Importa também dizer, Sr.ª Deputada Elza Pais, que é verdade que o pacto da troica trouxe desgraça e
destruição na dignidade da vida de milhões de portugueses. É verdade que as alterações ao Código do
Trabalho atingiram de forma particularmente grave os trabalhadores e as mulheres trabalhadoras; é também
verdade que o Decreto-Lei n.º 70/2010, que cortou nas prestações sociais, foi aplicado pelo anterior Governo,
do Partido Socialista, quando o PCP alertava para o que isso significaria de cortes nos abonos de família e
num conjunto de outras prestações sociais; e também é verdade que, na altura, quer PS, quer PSD, quer CDS
votaram a favor desse Decreto-Lei, aquando da respetiva apreciação parlamentar pedida pelo PCP.
Na hora da verdade, quando se trata de assumir uma posição de classe relativamente aos problemas da
sociedade, o que temos tido sempre da parte do PS, do PSD e do CDS é uma posição de compromisso com
um pacto de agressão aos trabalhadores e ao País, e é por isso que seria determinante que o PS, de uma vez
por todas, assumisse que ou quer estar com o pacto ou quer estar com a Constituição da República
Portuguesa.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para formular uma pergunta, pelo Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, queria saudá-la pela importância
da declaração política que aqui fez hoje e pela invocação da longa luta em nome do princípio constitucional da
igualdade entre homens e mulheres e de quão longe ela está.
Dados recentes apontam para o escavar da desigualdade salarial entre homens e mulheres, que hoje está
perto dos 18%, desigualdade que se aprofundou muito nos últimos cinco anos.
Pergunto-lhe se nos acompanha na perspetiva de que o argumento da crise é um instrumento para o
escavar das formas de dominação e de desigualdade ainda existentes entre homens e mulheres.
Pergunto-lhe também se considera que a perspetiva desta direita de fomentar a natalidade — esta direita
tem destruído os direitos das famílias, as oportunidades das crianças e vem agora com a ideia de que as
mulheres «bom, enfim, a tempo parcial isto resolve-se, porque elas vão para casa, têm mais tempo e, assim,
têm mais filhos» — faz algum sentido à luz do princípio constitucional que aqui recordou, e bem.
Na verdade, as políticas desta direita têm alvos, que a Sr.ª Deputada apontou, e bem. Os alvos são as
crianças — as crianças perdem o direito ao abono de família e as que têm necessidades educativas profundas
perdem o direito aos apoios que tinham —, as mulheres e as famílias. São estes os alvos das políticas desta
direita, quando sabemos também, como aqui recordou, que há portugueses que conseguiram subir na lista
dos multimilionários.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, agradeço as questões que
colocou.
De facto, a luta das mulheres trabalhadoras pela igualdade salarial e pelas 8 horas de trabalho é uma luta
que leva já mais de 100 anos, é uma luta em nome do progresso e da justiça social, pela qual a classe
operária, os trabalhadores e as mulheres trabalhadoras, na linha da frente, sempre, mas sempre, lutaram.
É fundamental recordar que muitas das conquistas da Revolução de Abril foram determinantes e são
complemento determinante do progresso que o País viveu. Aliás, a primeira vez que muitas mulheres tiveram
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direito de voto foi depois do 25 de Abril, a primeira vez que muitas mulheres tiveram direito de participação
política e social foi depois do 25 de Abril. É por isso que essa luta foi tão importante e que é também tão
importante nos dias de hoje, quando os princípios e os valores de Abril estão a ser espezinhados, de uma
forma inaceitável, por este Governo.
Em relação à questão que a Sr. Deputada coloca, o PCP entende, de facto, que a crise tem sido um
instrumento para o agravamento das desigualdades e da exploração. Quanto a isso não há dúvida. A crise tem
sido algo de profundamente negativo para a vida das mulheres e das famílias. Mas tem existido uma mão-
cheia de pessoas que tem beneficiado com a crise: aquelas que se dão ao luxo de poder vir dizer «não
pagamos!», que não pagam aquilo a que a lei obriga, a que as empresas de grande distribuição estão
obrigadas.
Os Srs. Deputados, certamente, ouviram todos ontem, como eu ouvi, um grande empresário da distribuição
— que obriga as suas trabalhadoras e os seus trabalhadores a trabalharem ao sábado, ao domingo e aos
feriados, impedindo a articulação da vida familiar com a vida profissional — dizer «não pagamos!».
O PS, o PSD e o CDS, que não querem fazer uma discussão séria sobre a renegociação da dívida e que
dizem que aquilo que o PCP diz é «não pagamos!», têm agora aqui um exemplo de quem é que não quer
pagar, para quem é que os senhores governam e quem é que os senhores privilegiam.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo, do CDS-PP, para formular uma pergunta.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, não posso deixar de lhe
agradecer, em meu nome e em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP, por ter trazido este tema ao Plenário
e por ter feito dele objeto das declarações políticas do Partido Comunista.
É evidente que a questão da desigualdade de género, no enfoque que a Sr.ª Deputada lhe deu na sua
intervenção — neste caso, desigualdade quanto à remuneração para trabalho idêntico, tendo em atenção o
género —, é um fator extremamente relevante que nos preocupa. Evidentemente que, nessa perspetiva, não
podemos deixar de concordar com a intervenção da Sr.ª Deputada, na parte em que foca a existência dessa
desigualdade e na parte em que elege essa desigualdade como tema relevante e que urge tratar aqui, na
Assembleia da República.
Sr.ª Deputada, ao longo dos 40 anos que levamos desde o 25 de Abril de 1974 e dos 38 anos que levamos
desde a Constituição da República de 1976, não só este Governo mas todos os governos da República têm
sucessivamente legislado sobre esta matéria laboral. E coloco-lhe uma primeira questão: tem memória de
algum governo que tenha criado legislação que, em si, ab initio, de raiz, seja discriminatória do género? Não.
Quando se criou o ordenado mínimo, este foi criado para o trabalho, não foi criado um ordenado mínimo de
género, um para os homens e outro para as mulheres!
Portanto, a ideia que me fica é a de que, em termos legislativos, em termos daquilo que queremos e que os
sucessivos governos, ao longo destes anos, têm querido é criar condições para essa igualdade.
Evidentemente que nesta área, como noutras — não é só na área laboral, é também na área económica, na
área de produção —, a grande falha que temos em Portugal é a falta de fiscalização das leis no terreno,
obrigando as pessoas a cumpri-las.
E colocava-lhe outra questão: isso acontece só em Portugal, Sr.ª Deputada? A desigualdade salarial existe
só em Portugal? Não existe também um pouco por todo o lado, nos restantes países da Europa? Esta é outra
questão que lhe levanto para que vejamos que não é só um problema de Portugal.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Concluo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Deputada tocou também noutro assunto, que gostaria de deixar bem claro: as notícias que saíram
hoje sobre a redução das indemnizações por despedimento sem justa causa.
Sr.ª Deputada, em primeiro lugar, devo dizer-lhe que já a legislação em vigor…
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A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Irei concluir, Sr.ª Presidente.
Já a legislação em vigor prevê indemnizações a começarem no meio mês, portanto abaixo do mês que
havia.
Em segundo lugar, isto já vinha — é bom que fique bem claro — no Memorando de Entendimento anterior.
Não é matéria em que o Governo esteja a inovar, a criar de novo; vinha já no Memorando de Entendimento
anterior, desde o início.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada Rita Rato, tem a palavra para responder.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Artur Rêgo, a desigualdade salarial, que é coisa
diferente de discriminação salarial, não é um problema só do nosso País. Infelizmente, não é. Mas também é
verdade que o nosso País tem, sobre esta realidade, números que são escandalosos e que não podem
continuar a fazer parte da realidade da vida dos trabalhadores.
No nosso País, quando as questões da igualdade não são cumpridas não é porque não haja lei que
obrigue a tal, mas sim porque a prática concreta e diária nos locais de trabalho e de alguns governos é
exatamente de incumprimento da lei. O que acontece muitas vezes é que da lei à vida existe todo um mundo
que separa uma coisa que está consagrada na letra da lei mas que não é o dia a dia de milhares e milhares de
trabalhadores.
Importa aqui dizer que a fiscalização da lei — e o PCP sempre a defendeu — é obrigação do Governo.
Aliás, a Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), por proposta do PCP, tem um conjunto
de matérias em cima da mesa que só não foram concretizadas porque o Governo, designadamente o
Ministério da Solidariedade e do Emprego, o ministério do CDS, não deu orientações para que se cumprisse.
O Sr. Deputado há de estar recordado que, há um ano, aprovou aqui uma proposta do PCP para a realização
de um plano nacional de combate às discriminações salariais diretas e indiretas, com a intervenção da CITE e
da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT). E pergunto-lhe, Sr. Deputado: por que é que não falou
deste plano? Por que é que não apresentou, objetivamente, os resultados deste plano nacional de combate às
discriminações salariais diretas e indiretas? Não falou nele porque sabe que não existe, porque o
compromisso deste Governo não é o combate às discriminações; o compromisso deste Governo é com o
patronato, é com a fragilização das relações laborais, é com o agravamento da exploração, é com a liquidação
de direitos que foram conquistados com Abril, é com a troica, é com o capital financeiro. O que este Governo
quer fazer é um ajuste de contas com Abril.
Relativamente às propostas que este Governo pretende para alteração do Código do Trabalho, diga-nos
aqui se confirma que um governo vai atribuir um prémio ao empregador que não cumprir a lei e que assim
pode mais facilmente despedir o seu trabalhador. Efetivamente é disso que se trata. Se for um despedimento
ilícito, o trabalhador tem de ser reintegrado. O trabalhador não tem de ser despedido com meia dúzia de
trocos; quando se trata de um despedimento ilícito, a reintegração no local de trabalho é um direito do
trabalhador — não estão a oferecer nada a ninguém.
Por isso, o que nós salientamos nesta matéria, como noutras, é a necessidade objetiva de cumprimento da
Constituição, daquilo que são os seus princípios fundamentais e, desde logo, de um princípio fundamental,
que é a não subordinação do poder político ao poder económico, que é exatamente o contrário daquilo que o
Governo PSD/CDS está a fazer, ou seja, a beneficiar e a governar para o poder económico e financeiro do
País.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Ainda para uma pergunta, pelo PSD, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Barata
Lopes.
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A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, em nome do Grupo
Parlamentar do PSD, queria felicitá-la por ter escolhido este tema das desigualdades salariais, nomeadamente
no que diz respeito à questão do género. Este é um assunto que temos tentado debater da forma mais séria
possível e que tem relevância pela importância das mulheres no mercado de trabalho e sempre que alguém
seja prejudicado por outra razão e ponha em causa a igualdade de oportunidades e de reconhecimento que
nós, enquanto PSD, defendemos.
Também disse aqui, e bem, que este é um problema europeu. De facto, os números do Eurostat dizem-nos
que este é um problema europeu, não é sequer um problema novo, tem vindo a crescer de forma clara desde
2007 em Portugal — também não é um problema deste Governo. Não nos contentamos com o facto de
estarmos abaixo da média europeia, porque nunca devemos contentar-nos enquanto houver alguém que seja
prejudicado na sua igualdade de oportunidades, mas, ainda assim, verificar que Portugal está abaixo da média
europeia será sempre positivo.
O que nos deve também pôr a refletir é que, de acordo com os dados do Eurostat, os países mais
desenvolvidos e aqueles que, segundo os dados do próprio Eurostat, mais investem nas medidas de
natalidade e de promoção da igualdade não têm conseguido combater esta disparidade na desigualdade
salarial, o que prova que é preciso prestar aqui alguma atenção, eventualmente sob outras perspetivas, e que
passará, naturalmente, pela vontade política de o tratar. Sendo certo, Sr.ª Deputada — devo dizer-lhe —, que
eventualmente não ajudará a que se consiga resolver este aspeto o facto de a Sr.ª Deputada ter trazido este
tema a debate mas não ter resistido a, no meio do tema, ter mascarado novamente a questão com aquilo que
escolhe sempre, que é o «quanto pior, melhor».
Poderia falar, por exemplo, do crescimento da economia, mas não o faz; fala sempre pelo lado negativo.
Quando fala de flexibilização, poderia falar no aumento dos postos de trabalho, que é particularmente
relevante também para a minha geração. A Sr.ª Deputada não o faz porque prefere sempre tratar este assunto
na rua, ao invés, eventualmente, da contestação social, que é uma nota que nós deveríamos ter em conta.
Ainda assim, e porque, do ponto de vista do Grupo Parlamentar do PSD, nos parece que só conseguimos
resolver de forma séria os problemas se seriamente nos dedicarmos a eles, ao invés de tentarmos emaranhá-
los noutras questões, o que gostaria de perguntar à Sr.ª Deputada é se, por exemplo, enquanto Deputada da
Assembleia da República Portuguesa, não fica satisfeita quando a Comissão Europeia destaca as resoluções,
nomeadamente a resolução que Portugal aprovou, em 8 de março de 2013, que incluía medidas destinadas a
garantir e a promover a igualdade de oportunidades.
Isso foi destacado pela Comissão Europeia, que faz, naturalmente, a comparação com outros países.
Pergunto ainda se a Sr.ª Deputada não fica satisfeita — e esta é uma das últimas perguntas que lhe deixo
— por, ontem, em Conselho de Ministros, novamente, e na senda do que tem sido feito por este Governo, ter
sido garantido que, em sede de concertação social, vai ser suscitado o debate para analisar o relatório pedido
por este Governo justamente sobre as desigualdades salariais. Aliás, não só foi garantido que esse debate irá
ser suscitado como foi exigido pelo Governo que isso seja feito em sede de concertação social, que é a forma
de tratar seriamente estas questões.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Finalmente, Sr.ª Deputada, uma vez que tanto falou em pormos isto em prática de forma efetiva, pergunto-
lhe se não fica satisfeita por o Governo ter chamado a atenção para a possibilidade de, relativamente aos
fundos comunitários, serem penalizadas as empresas que não tiverem em consideração a igualdade salarial.
Em suma, pergunto-lhe, Sr.ª Deputada se é simplesmente o «quanto pior, melhor» ou se se esqueceu de
referir algumas boas práticas que são bastante significativas.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Peço aos Srs. Deputados para também se autorregularem em matéria de tempo. É
que nem sempre temos, na Mesa, a possibilidade de manter uma atenção permanente.
Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Joana Barata Lopes, as questões que aqui
coloca sobre a concertação social obrigam-me a trazer à discussão a iniciativa da Sr.ª Secretária de Estado da
Igualdade, de levar a uma reunião da concertação social a matéria das discriminações salariais — e a Sr.ª
Deputada conhece certamente a ata dessa reunião, porque ela é pública e foi distribuída a todos os
Deputados da Subcomissão. Acontece que, designadamente, a CIP, em sede de concertação social, como
depois aqui fez na Assembleia da República, mostrou-se completamente indisponível para resolver os
problemas das discriminações salariais.
Por isso, Sr.ª Deputada, quanto à concertação social e à vontade dos patrões para resolverem o problema
das discriminações, estamos faladas.
Importa também dizer que o problema das discriminações salariais, o problema do agravamento da
exploração dos trabalhadores não é um problema novo, como bem aqui disse, é um problema que tem
séculos. Por isso, o PCP entende que é inaceitável que o seu Governo PSD/CDS queira impor aos
trabalhadores do século XXI os direitos do século XIX. Isso é um retrocesso civilizacional, para o qual não
pode contar com o PCP.
A Sr.ª Deputada fala aqui em flexissegurança. Mas isso, trocado por miúdos, é o quê? Isso, trocado por
miúdos, é banco de horas? Isso, trocado por miúdos, é trabalho aos sábados, domingos e feriados, sem se
receber mais por isso? É trabalhar para lá de 8 horas diárias, sem se receber o pagamento do trabalho
extraordinário? É que essas são sempre palavras muito bonitas para invocar em discursos de ocasião, mas
que, na realidade concreta da vida das pessoas, valem zero. É que a vida das pessoas é uma vida difícil, e é
cada vez mais difícil desde que os senhores chegaram ao Governo e começaram a aplicar as medidas do
pacto de troica, subscrito pelo PS, pelo PSD e pelo CDS.
É verdade, há sinais positivos. Quer que eu lhe dê aqui um exemplo de um sinal positivo? Para alguns foi o
aumento das grandes fortunas do País!
O Sr. João Oliveira (PCP): — É verdade!
Vozes do PSD: — Oh!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Mas esse não é um sinal positivo para a esmagadora maioria dos portugueses.
Esse é um sinal de concentração da riqueza e de agravamento das desigualdades sociais.
Para terminar, Sr.ª Presidente, porque o tempo a isso obriga, gostaria apenas de dizer que, da parte do
PCP, continuaremos sempre, mas sempre, a exigir que o princípio de salário igual para trabalho igual seja
cumprido. É que a defesa dos direitos das mulheres não é uma luta das mulheres trabalhadoras contra os
homens trabalhadores; é uma luta das mulheres pela dignidade nas suas vidas, por um País de progresso e
de justiça social.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — De seguida, para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: «Não podemos regressar ao nível
salarial de 2011, não podemos regressar ao nível remuneratório das pensões de 2011» — estas declarações,
ontem proferidas pelo Primeiro-Ministro, não podiam ser mais claras. Estas declarações contradizem, direta e
frontalmente, tudo o que o Governo foi dizendo sobre a natureza «transitória» e temporária dos cortes salariais
e violam descaradamente todos os sucessivos acórdãos do Tribunal Constitucional.
Aqui mesmo, na apresentação do Orçamento do Estado para 2014, a Ministra das Finanças garantiu que
os «cortes salariais na função pública são transitórios». «Transitoriedade não significa anualidade» mas, sim,
«excecionalidade», continuou Maria Luísa Albuquerque, que até assegurou que os salários iriam aumentar mal
«tenhamos novamente as condições para aumentar os funcionários públicos».
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Não há aqui nenhuma contradição com o Primeiro-Ministro, há todo um novo discurso. Mais: se o «milagre
económico» profetizado por Pires de Lima e vislumbrado por meio Governo está aí, como se explica que os
cortes temporários e transitórios tenham passado a permanentes, tenham passado a definitivos?
Mas não foi apenas um descuido da ministra das Finanças, não. No parecer enviado pelo Governo ao
Tribunal Constitucional, e que ainda hoje é possível encontrar no Portal do Governo português na Internet,
reafirma-se, por mais de uma vez, «o carácter transitório e o peso do interesse público imperioso em que se
fundamenta» o corte nos salários e nas pensões.
Sabendo que os cortes anteriores só tinham sido aceites com a condição de serem transitórios, foi esta a
justificação que o Governo deu para os mesmos — uma argumentação cheia de má fé.
E atente-se: a 11.ª avaliação da troica veio expor as contradições do discurso do vosso «milagre
económico». Com ou sem troica, ficámos a saber, pela voz da Ministra das Finanças, que o Orçamento do
Estado para 2015 está refém da decisão de uma troica que já poderá não estar no País, mas continuará a
mandar nas contas públicas. As notícias sobre a libertação da troica — o vosso sonho, o vosso discurso tão
eufórico, sobre a libertação da troica! —, parafraseando um conhecido escritor, são manifestamente
exageradas.
Entretanto, o Primeiro-Ministro diz — e sem se rir — que mais sucesso no ajustamento é difícil, enquanto
prepara o corte definitivo dos salários e pensões, o embaratecimento dos despedimentos, mesmo quando são
ilegais, e novos cortes nas prestações sociais.
Para quem ainda tinha dúvidas, o processo de ajustamento não é nenhuma resposta à crise, mas um
verdadeiro programa de empobrecimento do País e dos seus cidadãos, desvalorizando salários, desregulando
o mercado de trabalho e desqualificando o País — ideologia, pura ideologia.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — O argumento da crise é um instrumento de reforço da dominação e da
exploração — disso já não restam quaisquer dúvidas. Vejamos a desigualdade no mercado de trabalho, hoje
que assinalamos o Dia Nacional da Igualdade Salarial e quando sabemos que as mulheres portuguesas
continuam, em média, a ganhar menos 18% do que os homens. A média é da Comissão para a Igualdade no
Trabalho e no Emprego (CITE), que nos diz que, se na União Europeia as mulheres trabalham
«gratuitamente» perto de 59 dias, essa média, em Portugal, sobe para 65 dias.
Um homem que tenha estado de férias entre 1 de janeiro até hoje, 6 de março, com as mesmas funções,
acabaria o ano a ganhar exatamente o mesmo que uma mulher que tivesse trabalhado desde o dia 1 de
Janeiro.
Ainda segundo a CITE, a diferença salarial entre mulheres e homens é diretamente proporcional aos níveis
de qualificação, ou seja, quanto mais elevado é o nível de qualificação, maior é a disparidade. É a crise, a
crise é a responsável pelo agravamento destas desigualdades.
Em Portugal, a disparidade salarial entre homens e mulheres aumentou quase 70% nos últimos 5 anos, ao
invés, aliás, da tendência europeia, que regista uma reconhecida diminuição.
Que a crise é um instrumento de dominação, não restam dúvidas, Sr.as
e Srs. Deputados. E é porque este
é um argumento do agravamento da exploração e do agravamento das desigualdades que, além destas
disparidades salariais entre homens e mulheres, o País continua a ser esmagado com a realidade dos outros,
dos protegidos pela política deste Governo e a quem, de facto, se destina o «milagre económico». Para eles,
para os protegidos do Governo, para os privilegiados, para os multimilionários, o milagre, e, para Vítor Gaspar,
a absolvição, com a subida aos céus da política da austeridade, promovido como foi ao lugar tão honroso no
FMI.
Cabe-nos perguntar: que cadeira, neste céu da austeridade, terá, no final, Maria Luís Albuquerque?
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — A Mesa regista a inscrição do Sr. Deputado Miguel Tiago para pedir esclarecimentos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
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O Sr. MiguelTiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, quero, em primeiro lugar, em
nome do Grupo Parlamentar do PCP, saudar a sua intervenção, nomeadamente os temas que aborda.
Sobre as últimas questões que aqui colocou, relativamente à igualdade entre homens e mulheres, tendo
também em conta o dia que hoje se assinala, já a minha camarada Rita Rato deixou aqui algumas notas, pelo
que apenas diria, no contexto da sua intervenção, que se, por um lado, é real o aprofundamento das
desigualdades, esse aprofundamento deve-se também ao atual contexto que atravessamos e às políticas que
estão a ser levadas a cabo. Ou seja, a desigualdade entre homens e mulheres tenderá a agravar-se na
medida em que a riqueza tenda a ser concentrada.
Daqui partimos também para os restantes assuntos que a sua declaração política nos trouxe,
nomeadamente sobre as medidas chamadas «de austeridade», o pretexto da crise, o pacto de agressão,
assinado pelo PS, pelo PSD e pelo CDS com as instituições estrangeiras, e as medidas aí contidas.
Sr.ª Deputada, sobre esses assuntos da sua intervenção, quero deixar-lhe duas questões. Por um lado,
pergunto-lhe se não considera que o simples facto de agora se transformarem em permanentes medidas que
foram anunciadas como transitórias para resolver um problema é, em si mesmo, a comprovação de que o
pacto falhou nos objetivos anunciados, cumprindo outros objetivos, talvez mais obscuros, mas que, na
verdade, estão a fazer o seu caminho, nomeadamente o da concentração da riqueza, como, aliás, também já
foi referido no debate de hoje.
Por outro lado, pergunto-lhe se não confirma também aquilo que o PCP vinha dizendo desde o início, ou
seja, que este é um pacto de reconfiguração do Estado, um pacto que visa recolocar o Estado ao serviço dos
grandes grupos económicos, dos interesses dos monopólios, do aumento da exploração — e não de forma
transitória, não para um ajustamento para um posterior crescimento e para uma redistribuição justa da riqueza,
mas precisamente para garantir aos grandes grupos económicos que, após este pacto, tudo para eles será
melhor, maior será a exploração, aumentando a capacidade de exploração sobre os trabalhadores
portugueses e diminuindo os direitos dos trabalhadores. A não ser, claro, que seja derrotado este Governo,
que seja derrotado este rumo político da direita que nos trouxe até aqui, pelas mãos do PS, do PSD e do CDS,
e que seja construída uma alternativa política patriótica e de esquerda.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Tiago, agradeço-lhe as suas
questões.
Não se trata de um programa de ajustamento, trata-se — e hoje temos de falar claro, com os resultados
que temos — de um programa de empobrecimento da maior parte da população do País.
E não podemos pactuar com a continuidade da hipocrisia de quem diz: «Isto está tudo a funcionar tão bem,
até vem aí um milagre económico!». Não podemos, não temos condições, com 300 000 emigrantes depois de
este Governo ter tomado posse, com 10 anos de atraso económico decorrentes de três anos das políticas
deste Governo, com uma quebra brutal nas prestações sociais e com quase 3 milhões de pessoas em risco de
pobreza. Não podemos continuar com a hipocrisia! Este é um programa de empobrecimento da maior parte da
população do País e de transferência da riqueza.
Sobre isto, exige-se clareza. Não podemos pactuar com estas conversas cínicas de quem nos diz «isto é
tudo temporário, é passageiro, é enquanto se ajusta, é só um bocadinho, é mais um bocadinho» para, afinal,
constatarmos, como aconteceu ontem mesmo, pelas palavras do Sr. Primeiro-Ministro, que aquilo que era
temporário se tornará efetivamente permanente.
Esta é a realidade, Sr. Deputado. É que estes senhores se preparam para tornar permanente e definitivo o
que têm dito ser apenas temporário. Vão fazê-lo com os salários, vão fazê-lo com as pensões, vão continuar a
embaratecer os despedimentos e vão continuar a cortar nas prestações sociais. É este o programa de
empobrecimento que este Governo está a seguir, sem dó nem piedade.
E, repare, para Vítor Gaspar estava tudo a correr tão mal, mas, afinal, a vida acabou por lhe correr bem.
Aplausos do BE.
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A Sr.ª Presidente: — Passamos à declaração política do PSD, que será proferida pela Sr.ª Deputada
Conceição Bessa Ruão.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: No primeiro momento
desta intervenção, em nome dos Srs. Deputados do PSD e, de um modo especial, dos Deputados eleitos pelo
distrito do Porto, quero felicitar o IPATIMUP (Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do
Porto) pelo seu aniversário de 25 anos de atividade.
Quero igualmente prestar o meu reconhecimento a todos os investigadores dos centros de investigação e
universidades, públicos e privados, pelos contributos dados à Ciência.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, terminámos os trabalhos, em sede de especialidade, sobre a lei de
investigação clínica e, dentro em breve, procederemos à sua votação final.
Esta lei constitui o reconhecimento, por parte do Governo, da sua importância para o desenvolvimento do
conhecimento e inovação em saúde, para a melhoria da saúde das populações e qualidade dos serviços
prestados e, não menos relevante, para o seu potencial económico.
Ela abrange o regime da realização de ensaios clínicos com medicamentos para uso humano, o regime de
investigação clínica de dispositivos médicos, de produtos cosméticos e de higiene corporal.
Esta lei, à semelhança da que agora será revogada, continua a consagrar, em termos de princípios, a
prevalência dos direitos dos participantes sobre os interesses da ciência e da sociedade, o princípio da
dignidade da pessoa humana, o respeito pela privacidade do indivíduo e a minimização de eventuais danos
nos seus direitos de personalidade, integridade física e mental.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Na proteção dos participantes no âmbito dos ensaios e estudos
clínicos, mereceram especial atenção os menores em geral, os maiores incapazes de prestar consentimento
informado, bem como os menores sujeitos a medidas de acolhimento ou a medida institucional, sendo que,
sem os excluir dos ensaios, apenas neles participarão nas situações em que da sua não realização resulte
para os mesmos um prejuízo ou desvantagem potencial.
Sobre os diferentes intervenientes no processo de pronúncia e autorização, espera-se das comissões de
ética competentes que consigam reunir os mais aptos do ponto de vista científico e profissional para
realizarem em pleno as suas competências, que se dotem de mecanismos ágeis de apreciação de processos,
mas, sobretudo, que sejam capazes de assegurar a dimensão ética da investigação na salvaguarda da pessoa
humana, sem que com isso se acabe com a investigação clínica em Portugal.
Ao Infarmed exige-se que seja capaz de responder aos pedidos de autorização apresentados em 30 dias,
mas, mais do que isso, até 30 dias, pois a rapidez das decisões terá um papel decisivo na competitividade da
investigação em Portugal.
Mas a si está também cometida a enorme responsabilidade de, face aos conhecimentos atuais e estado da
arte, garantir a proibição de quaisquer ensaios que envolvam terapia génica que possa dar origem a
modificação na identidade genética germinal do participante.
Da Comissão de Ética para a Investigação Clínica (CEIC), sob a tutela do membro do Governo da área da
saúde, exige-se que seja uma entidade facilitadora e ágil, através da criação dos instrumentos reguladores e
orientadores em favor da eficácia, da eficiência e da competitividade para a investigação clínica.
Quanto aos instrumentos associados à investigação clínica, especificamente a responsabilidade civil por
danos causados aos participantes no âmbito dos ensaios clínicos, era e continuará a ser uma
responsabilidade pelo risco, presunção estabelecida em favor dos mesmos, devendo a Comissão de Ética
competente pronunciar-se, também nesta matéria, sobre o prazo e as condições de acompanhamento clínico
dos participantes após conclusão do estudo, bem sobre a necessidade de manutenção da mesma presunção
para além dos doze meses.
Em 1 de janeiro de 2014, entrou em vigor um regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho sobre
ensaios clínicos de medicamentos para uso humano.
Da análise do mesmo resulta a liberdade dada a cada Estado-membro de definir o organismo ou
organismos que hão de aprovar o ensaio clínico dentro dos prazos fixados por lei. Exige-se uma avaliação
independente e de elevada qualidade de pessoas que disponham coletivamente das qualificações e
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experiência necessárias em todos os domínios relevantes e que representem igualmente o ponto de vista dos
leigos.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Este Governo e a Assembleia da República cumpriram as suas
funções em termos legislativos. Porém, o Ministro da Saúde foi mais longe no reconhecimento da importância
da investigação clínica quando afetou, no Orçamento do Estado para 2014, na área da saúde, para esta
mesma matéria (investigação clínica), o valor de 42,2 milhões de euros, com um retorno financeiro estimado
previsível na ordem dos 143 milhões de euros, a que acrescerá todo um conjunto de fundos no âmbito do
programa Horizonte 2020 em termos das convocatórias já abertas. Aumentou igualmente a majoração da
atividade científica em termos de valorização curricular dos clínicos envolvidos no acesso à carreira de
consultor.
Porém, são vários os desafios que se colocam à investigação clínica em Portugal e ao Governo no futuro,
no sentido de favorecer a evolução para outros níveis de investigação clínica, que não só os ensaios, que,
sendo uma dimensão importante, não deve condicionar-nos a ser meros utilizadores de investigação e
inovação alheias, pois temos massa crítica para que tal possa acontecer.
Há também o desafio de conseguir que não se desmotivem os promotores, designadamente a indústria
farmacêutica, apesar da pressão que tem sido colocada sobre a redução do preço dos medicamentos, sendo
certo que ninguém ignora que, face a alguns constrangimentos financeiros, os promotores se tornam mais
seletivos nas suas opções e partam para parcerias.
Refiro ainda o desafio de evoluir para estruturas verdadeiramente profissionalizadas que, nos centros de
investigação clínica, sejam capazes de responder a todas as exigências relativas a pedidos de autorização,
decisivos em termos de competitividade nacional e internacional para que aí possamos marcar presença.
Por fim, respondendo ao desafio, repete-se que todas as entidades envolvidas nos processos de pronúncia
e autorização sejam capazes de o fazer não em 30 dias, mas até 30 dias, pois, a nível internacional, essa
capacidade fará a diferença em termos de participação.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Conceição Bessa Ruão,
as Sr.as
Deputadas Teresa Caeiro, do CDS-PP, Paula Santos, do PCP, e Maria Antónia Almeida Santos.
Entretanto, a Mesa foi informada que a Sr.ª Deputada Conceição Bessa Ruão responderá às perguntas
uma a uma.
Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, tem a palavra.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Conceição Bessa Ruão, em primeiro
lugar, gostaria de a saudar muito vivamente por ter trazido esta matéria a Plenário sob a forma de uma
declaração política.
Em segundo lugar, gostaria de saudar o papel fundamental da Sr.ª Deputada no grupo de trabalho,
empenhando-se para que esta proposta de lei se tornasse num decreto aprovado pela esmagadora maioria
destas bancadas.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Irei colocar-lhe quatro questões muito concretas.
Sr.ª Presidente, penso que esta não é uma questão ideológica, mas uma questão essencialmente técnica e
que se prende com os interesses do nosso sistema de saúde e com a nossa competitividade em termos
internacionais. Por isso, vou ser telegráfica nas minhas questões, Sr.ª Deputada.
O programa Horizonte 2020, para a investigação e a inovação, está em vigor desde o dia 1 de janeiro de
2014. O que lhe pergunto, Sr.ª Deputada, é se podemos ou não admitir que haja uma mudança de estratégia
ou, mesmo, um novo paradigma de investigação para a União Europeia e se, nesse âmbito, poderá ser
suscetível de ser exigido um alinhamento de gestão para os diferentes Estados-membros, designadamente
para Portugal, através da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT).
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Segunda questão: tem sido muito discutida a questão das bolsas para a área da ciência. A minha pergunta
é no sentido de saber se há alguma possibilidade real de apoio à investigação nestas áreas, mais uma vez
através do programa Horizonte 2020.
Terceira questão: face às necessidades reais de se encontrarem melhores medicamentos para os doentes,
face ao potencial económico desta área da investigação clínica, face mesmo aos montantes envolvidos por
parte da União Europeia para o programa Horizonte 2020, no valor de 78 000 milhões de euros — uma
coincidência numérica relativamente ao nosso Programa de resgate —, pergunto, Sr.ª Deputada, se não serão
de esperar, eventualmente, inúmeros pedidos de autorização, que podem criar dificuldades, e uma pressão
acrescida para com as comissões de ética competentes para efeitos de investigação clínica, atendendo à sua
natureza muitas vezes voluntarista.
Por último, pergunto se não poderão ser os mesmos — quando estamos a falar em sede de especialidade
e tentamos dedicar aos menores, aos maiores incapazes de prestar o seu consentimento e aos menores
institucionalizados ou em regime de acolhimento —, face aos limites impostos por esta lei, a pensar que estão
duplamente excluídos da sociedade.
Mais uma vez, Sr.ª Deputada, muito obrigada por ter trazido esta questão a debate.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Conceição Bessa Ruão.
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, muito obrigada
pelas suas palavras muito bondosas e prestimosas.
Gostaria de agradecer as questões colocadas e de, ao mesmo tempo, dar conta do seguinte: a verdade é
que o programa Horizonte 2020 será um grande motor da investigação clínica para a Europa, mas também
para Portugal.
Há uma mudança de paradigma, que implica para Portugal uma série de ajustamentos, designadamente na
gestão. A investigação passará a ter de assentar em modelos transdisciplinares, multidisciplinares e
interdisciplinares. Será uma investigação voltada para projetos orientados para a exploração e cobertura de
todo o ciclo de inovação, passando pela investigação fundamental, investigação aplicada, desenvolvimento
tecnológico, passando este pela prototipagem e demonstração.
Também os programas de investigação, ciências e humanidades serão um elemento essencial e um
desafio para a sociedade e para a liderança e inovação industrial.
Sem querer alongar-me muito, diria que são três os pilares: excelência científica; focalizado em decisões
do topo para a base; e liderança e inovação industrial.
Portanto, esta mudança de paradigma vai exigir, por certo, adaptações quer em termos de gestão, quer em
termos de atribuição, quer em termos de formação para as equipas em investigação.
Relativamente à questão colocada sobre as bolsas e a recusa de atribuição de bolsas, queria trazer alguns
dados importantes.
Todos temos conhecimento de que foram atribuídas este ano pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia
menos 1344 bolsas, nas seguintes áreas: sociologia, antropologia, geociências e história.
Porém, o programa Horizonte 2020 tem para Portugal, e com interesse nestas áreas — o que obriga a
considerações de gestão muito fortes —, programas específicos nas áreas de ciências sociais e humanidades,
mar, água, ambiente e bioquímica, florestas e herança cultural. O Programa cobre em absoluto as áreas que
ficaram descobertas pela não atribuição de bolsas e está aberto, sobretudo, a candidaturas individuais, mas
também às de grupo, podendo por isso responder às questões agora em aberto e aos bolseiros que deixaram
de ver contempladas as suas bolsas.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr.ª Presidente, na resposta ao pedido de esclarecimento
seguinte, concluirei a resposta à Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, se ela me permitir.
Muito obrigada, Sr.ª Presidente.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — A Mesa também agradece, Sr.ª Deputada.
Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Paula Santos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, cumprimento a Sr.ª Deputada Conceição Bessa Ruão pela
sua declaração política e pelo tema que traz.
Gostaríamos de fazer algumas considerações iniciais.
Primeira, quando falamos de investigação clínica, as pessoas são a questão central que deve prevalecer
em todo o processo, as pessoas que participam na investigação clínica e nos ensaios clínicos. Por isso, em
todo o processo a dignidade e os direitos das pessoas têm de ser salvaguardados.
Segunda, na nossa opinião, só se justifica a realização de investigação clínica, designadamente ensaios
clínicos, quando daí puder advir mais conhecimento. Caso contrário, não há qualquer justificação para a sua
realização.
Terceira, a investigação clínica deve ter uma estratégia que vá ao encontro das necessidades do Serviço
Nacional de Saúde, ou seja, todos os ensaios e toda a investigação que se realizarem no nosso País devem
corresponder a um plano de prioridades e de estratégia definidos pelo Ministério da Saúde, porque
entendemos que há determinados ensaios ou investigações que não interessam ao Serviço Nacional de
Saúde, pelas mais variadas razões.
Passando concretamente à lei que foi discutida nesta Assembleia, devo dizer que há um conjunto de
aspetos que nos preocupam e que motivou a discordância do PCP.
Em primeiro lugar, é uma lei que se centra, única e exclusivamente, nos ensaios clínicos e que foi feita para
dar resposta ao interesse comercial da indústria farmacêutica — é isto que está em cima da mesa —,
interesse que pode ser legítimo, mas que não deixa de ser um interesse pelo negócio e pelo lucro. A lei só vai
dar resposta a essa dimensão da investigação clínica, esquecendo a investigação por iniciativa do investigador
— não desenvolve essa vertente — e a investigação que pode ser realizada pelos próprios hospitais ou
estabelecimentos de saúde e pela Academia.
Mais: na nossa perspetiva, coloca os participantes numa situação de maior fragilização — aliás, a Sr.ª
Deputada sabe que esta foi uma matéria muito discutida. Muitas pessoas apresentaram preocupações em
relação à dispensa de determinados requisitos, como o consentimento informado ou o seguro, que a lei que foi
aprovada prevê, mesmo com a fundamentação da Comissão de Ética. A verdade é que fragiliza os
participantes.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente, dizendo o seguinte: na nossa perspetiva, esta
lei não responde às necessidades do País, não responde às necessidades do Serviço Nacional de Saúde.
Pergunto se não entende que esta lei cria esta fragilização e se não há necessidade de uma monitorização,
de um acompanhamento e de uma maior ponderação das normas desta lei, que pode não proteger os
elementos centrais da investigação, que são as pessoas.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Conceição Bessa Ruão.
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Paula Santos, aproveito este
momento não só para agradecer as suas questões, mas também os bons contributos dados por todos os
grupos parlamentares quando do debate na especialidade desta lei, contributos que tentámos acolher na
medida do possível.
Sr.ª Deputada, começando por responder à última questão, gostaria de dizer que sou adepta de que cada
lei que é posta no ordenamento jurídico deve ser suscetível de avaliação e de monitorização, sobretudo esta
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com a dimensão humana que tem em termos dos participantes que nela tomam parte. Portanto, quanto a isso,
nada tenho a objetar. Aliás, estou convencida de que o Ministério da Saúde, no âmbito do acompanhamento
das medidas que vai implementando, vai tendo capacidade de as monitorizar.
Quanto aos ensaios clínicos, a lei não só dá uma resposta à indústria farmacêutica como contém capítulos
específicos para os investigadores que nela estão também considerados.
Mais: há uma dimensão, também importante, da investigação em saúde, designadamente a que é levada a
cabo noutras áreas e que não tem de estar forçosamente na parte dos ensaios clínicos. Os ensaios clínicos
são ainda uma dimensão da saúde, da investigação e do conhecimento. Se eu tiver medicamentos por testar e
não os puder aplicar às pessoas que deles necessitam em cada momento, não tenho um contributo sério dado
pela investigação a favor da sociedade, a favor das pessoas.
Quanto à desproteção, designadamente a eliminação do seguro e do consentimento informado, estamos a
falar apenas daqueles atos de investigação que não têm qualquer intervenção. Aprovar uma cama ortopédica
não precisa do consentimento de ninguém;…
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — … aprovar uma cadeira para banho não precisa do
consentimento de ninguém. Portanto, vamos dar às coisas a dimensão que elas têm.
Aplausos do PSD.
Sr.ª Presidente, se me permitir, relativamente à proteção dos menores, e respondendo à Sr.ª Deputada
Teresa Caeiro, queria dizer que as pessoas são a nossa grande preocupação, aliás, transversal a todos os
partidos. Por regra, os participantes maiores incapazes de prestarem o consentimento e os menores em
situação de acolhimento não participarão em ensaios clínicos. Só participarão quando da não participação
resultar para eles um prejuízo maior; de outro modo, estariam a ser duplamente excluídos pela sociedade.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Maria Antónia Almeida
Santos.
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Conceição Bessa Ruão,
queria começar por saudá-la pela sua coragem em trazer este tema a esta Câmara, numa altura em que
assistimos a cortes nunca antes vistos na área da investigação científica e na área da qualificação científica no
que diz respeito a centros de investigação, a bolsas…
Aplausos do PS.
Sinceramente, Sr.ª Deputada, fiquei um pouco perplexa porque, se a acompanho na parte da sua
intervenção que diz respeito à lei da investigação clínica e se posso considerar que a lei é um bom instrumento
legislativo para começarmos a trabalhar — como a Sr.ª Deputada disse, e bem, teremos, depois, de avaliá-la
—, não consigo compreender que sentido teve a sua intervenção numa altura em que a área científica, do
conhecimento e da investigação em Portugal está a sofrer um dos maiores retrocessos a nível de qualificação
e de futuro.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Exatamente!
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Não só sou eu que o digo. É uma evidência.
A Sr.ª Deputada saudou, e bem, o IPATIMUP pelo trabalho e pelo mérito reconhecidos mundialmente. Ora,
o Professor Sobrinho Simões, que é um cientista reputado e dos mais conhecidos no mundo, numa entrevista
deu, fez uma afirmação que, no mínimo, nos coloca numa situação muito preocupante. Sei que a Sr.ª
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Deputada é séria e também está preocupada com certeza e, por isso, gostaria de perceber qual a sua opinião
sobre os cortes que esta área tem sofrido. Mas dizia o Professor Sobrinho Simões o seguinte: «Este Governo
fez uma espécie de destruição criativa: rebentou com tudo». Qual a sua opinião sobre esta afirmação que,
infelizmente, traduz o estado da investigação científica em Portugal e que tem tido tantas consequências
nefastas para a qualificação dos portugueses, que tanto trabalho e tanto tempo dedicaram a esta área?
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — Vou já terminar, Sr.ª Presidente.
Sabemos que a maior parte dos investigadores vão ter de procurar trabalho fora de Portugal.
Portanto, Sr.ª Deputada, gostava de saber qual é a sua opinião, sabendo que este foi um bom instrumento,
embora um bom instrumento legislativo não valha por si só, tem de ser complementado com meios financeiros
para que não se perca a capacidade criativa que tem existido ao longo de muitos anos em Portugal.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr. ª Deputada Conceição Bessa Ruão.
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr.ª Presidente, começo por cumprimentar a Sr.ª Deputada Maria
Antónia Almeida Santos, também Presidente da Comissão de Saúde, e agradecer as questões que colocou.
Sr.ª Deputada, devo dizer que o Sr. Prof. Sobrinho Simões, que é Presidente do IPATIMUP, disse, entre
outras coisas, o seguinte «porque a investigação que decorre das universidades e das instituições de
investigação não poderá absorver todos os doutorados que se formam.»
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Ora bem!
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — «Por outro lado, eles fazem falta nas empresas e serão o motor
fundamental da inovação. Por isso, a realidade portuguesa é ainda frágil.»
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — É o que é!
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — É o que é, de facto.
Acontece que o Sr. Prof. Sobrinho Simões disse também duas coisas muito importantes, designadamente
que estes cortes o iam afetar — e estava a referir-se ao IPATIMUP, em concreto — no que diz respeito às
infraestruturas de investigação.
Srs. Deputados, sobre infraestruturas de investigação, o programa Horizonte 2020 tem 2480 milhões de
euros para as seguintes infraestruturas absolutamente confinadas à investigação: câmaras esterilizadas,
metodologia avançada, supercomputadores, instalações analíticas, centros de ciências…
Meus Senhores, os recursos estão na Europa, nós estamos na Europa — fazemos parte deles — e, dos 78
000 milhões, temos a possibilidade de em cada ano poder ter cerca de 200 milhões para financiar a nossa
investigação.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — O Sr. Prof. Sobrinho Simões disse também o seguinte: «Até
agora, éramos nós que fazíamos perguntas, agora temos que dar respostas. A nossa investigação está mais
voltada para a prática e mais voltada para o mercado.»
Srs. Deputados, quando um dia formos um País rico, podemos satisfazer-nos a fazer investigação por
investigação, mas não é este o momento. Este é o momento de fazermos investigação a favor da inovação.
Na hora em que todos tanto precisamos de inovação, não faz sentido que toda a investigação e todo o
conhecimento não se convertam em inovação.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Conclui-se aqui a declaração política do PSD.
Srs. Deputados, durante a tarde tem-se registado algum ruído na Sala. No entanto, para não interromper os
oradores, a Mesa não tem dito nada. Peço, pois, que tentem fazer menos ruído.
A próxima declaração política é do PS.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Portugal precisa de alternativa e
não de alternância. Por isso, o Partido Socialista tem vindo a preparar um contrato de confiança com os
portugueses, no quadro do movimento Novo Rumo para Portugal. É um movimento que cresce todos os dias e
que envolve cada vez mais personalidades e instituições da sociedade civil.
Desde o seu arranque, há cerca de dois meses, que o movimento Novo Rumo para Portugal já realizou
sete conferências nacionais e 19 conferências distritais. A oitava conferência decorre no próximo sábado, num
local simbólico, na Escola Padre António Vieira em Lisboa, e versa um tema chave, a educação.
Nas últimas décadas, os portugueses adquiriram uma nova consciência sobre a importância da escola.
Finalmente, deixámos de estar na cauda da Europa nas áreas da educação e da ciência. A escola, e em
particular a escola pública, é um dos sucessos maiores do Portugal democrático, pois em poucas décadas
conseguimos superar um atraso de séculos. Universalizou-se a educação básica, reduziu-se o analfabetismo e
expandiu-se a ciência e o ensino superior. Os níveis de aprendizagem situam-se, atualmente, na média dos
países da OCDE. São progressos muito significativos e que nos devem orgulhar, mas são progressos ainda
insuficientes.
As desigualdades sociais continuam a marcar os percursos escolares dos alunos e a população adulta
possui ainda níveis muito baixos de educação e de qualificação. Basta citar dois compromissos da Estratégia
Europa 2020 para logo compreendermos a dificuldade do caminho que nos falta percorrer. A taxa de
abandono escolar precoce continua, em Portugal, acima de 20% e temos até 2020 de a reduzir para metade.
Para além disso, cerca de 20% dos jovens, na faixa etária entre os 30 e os 34 anos, têm um diploma do ensino
superior e, como sabemos, a média europeia e a meta com que nos comprometemos para 2020 é de
precisamente o dobro.
Por isso, Srs. Deputados, quando se aproxima o 40.º aniversário da Revolução de Abril, a educação deve
ser salientada como uma das suas conquistas mais relevantes, mas, ao mesmo tempo, também é uma
conquista ameaçada. A evolução do sistema educativo está, agora, a ser posto em causa pelo mau governo.
Vivemos um grave retrocesso que destruirá em pouco tempo, se não for travado, o que levou décadas a
construir. Segundo os dados preliminares da Pordata, as despesas do Estado em educação foram reduzidas
para 4% do PIB, um dos valores mais baixos da OCDE e um dos valores do PIB que mais decresceu na
OCDE, nos últimos anos.
O que está a acontecer com a educação em Portugal não é uma fatalidade, é uma escolha política. Mesmo
em situação de crise, a política inteligente é manter os níveis de investimento em educação e ciência. Essa é,
aliás, a única saída de futuro ou, se quiserem usar uma linguagem do momento, a única saída limpa. Mas o
Governo não pensa assim. Ao contrário do que recomendaria a inteligência e a evidência, em Portugal os
cortes mais violentos são justamente no sector da educação. Trata-se — é preciso dizê-lo — de uma opção
ideológica que relega o conhecimento e a cultura para um plano secundário.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Bem lembrado!
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Srs. Deputados, a pobreza, o desemprego e a emigração são os dramas
do presente, mas o drama maior para o futuro do nosso País é o desinvestimento na educação e na ciência.
Aplausos do PS.
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Por isso, é tão importante lutar contra o retrocesso a que estamos a assistir, construindo um novo rumo
para a educação em Portugal. É esse o compromisso que o Partido Socialista aqui assume: construir um novo
rumo para a educação em Portugal. Neste sentido, queria partilhar sete linhas fortes desse novo rumo.
Em primeiro lugar, uma sólida formação de base, cultural e científica é fundamental para a democratização
e para a participação de cada um nas sociedades do século XXI. Precisamos de elevar o nível educacional
dos portugueses, concretizando a escolaridade obrigatória até aos 18 anos — é um compromisso que
assumimos.
As escolas acolhem, hoje, alunos muito diferentes e estão localizadas em regiões com características muito
diferentes. No entanto, há uma excessiva uniformidade do ponto de vista organizativo e pedagógico, fruto, em
grande medida, de um controlo burocrático, centralista e regimental. Assumimos, pois, que garantiremos a
liberdade e a autonomia, permitindo a construção de escolas diferentes, fortemente baseadas em práticas de
colaboração e de cooperação entre os professores e com uma forte ligação em rede à sociedade.
Temos também um problema de coordenação entre as diversas entidades responsáveis pelas ofertas
formativas. Nós assumimos que faremos uma forte coordenação em rede e, sobretudo, promoveremos uma
cooperação local entre as diversas entidades, públicas e privadas.
Sabemos que a educação permanente é um direito de todos os cidadãos, consagrado na Constituição, e
que é uma necessidade vital das sociedades e das economias contemporâneas — asseguraremos esse
direito.
A valorização dos professores é fundamental, mas não é possível defender o prestígio ou a autoridade dos
professores e, simultaneamente, generalizar na praça pública acusações de mediocridade e de
irresponsabilidade.
Os problemas não se resolvem através de imposições administrativas ou burocráticas, mas, sim, como nas
outras profissões, ou seja, num quadro de partilha, de responsabilidade interpares e de colegialidade — é isso
que faremos.
Também o ensino superior fez progressos notáveis nas últimas décadas, mas há duas prioridades que
assumimos: a prioridade de reorganizar a rede do ensino superior, através de uma reflexão das próprias
instituições, conduzindo as propostas de agregação com distintas vocações e modalidades de organização; e
o compromisso de que iremos concretizar uma verdadeira autonomia das instituições, no que diz respeito à
carreira docente, à colaboração com empresas e com entidades diversas e à importante renovação geracional
do corpo docente.
Aplausos do PS.
Nas últimas décadas, Portugal construiu um sistema científico moderno e inovador. É inaceitável que os
investimentos feitos sejam desperdiçados por políticas medíocres que, sob a roupagem da excelência, estão a
destruir o trabalho realizado.
A liberdade científica está a ser posta em causa pela governamentalização da ciência e por uma infindável
burocracia. Se continuarmos a funcionar assim, corremos o risco de contribuir mais para o orçamento europeu
da ciência do que aquilo que dela receberemos e, assim, agravaremos o fosso que nos separa dos países
mais desenvolvidos.
Finalmente, refiro o seguinte: a descentralização do ensino é uma necessidade inadiável, em ligação com
as regiões e com as autarquias locais. É fundamental aproximar as escolas dos territórios em que estão
inseridas — comprometemo-nos a fazê-lo.
Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, pedindo desculpa por me ter alongado um pouco mais, termino como
comecei: as opções que aqui delineei são fruto de muito trabalho e de muitos contributos. Não são propostas
fechadas. Continuaremos a debater e a aprofundar estas e outras ideias. Nós representamos outra forma de
fazer política. Fazemos política com as pessoas. Portugal vai sair da crise, porque os portugueses não se
deixarão tolher pelo mau governo.
Um Novo Rumo para Portugal é um desafio para todos nós. Um desafio que, estou certo, vamos vencer.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Zorrinho, os Srs.
Deputados Michael Seufert, do CDS-PP, Amadeu Soares Albergaria, do PSD, e Rita Rato, do PCP.
Como o Sr. Deputado pretende responder individualmente, em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado
Michael Seufert.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Carlos Zorrinho, começo por
cumprimentá-lo pela sua intervenção e pela resenha que nos fez relativamente às propostas que vem
colecionando no âmbito do vosso programa Novo Rumo para Portugal.
Estava a ouvir as suas propostas e a pensar se, permita-me a brincadeira, em vez de Novo Rumo para
Portugal seria Novo Rumo para o Partido Socialista.
Ainda na semana passada, na Assembleia da República, tivemos oportunidade, justamente por mão da
bancada do CDS, de falar das questões da autonomia e de algumas questões que V. Ex.ª apontou, e muito
bem. No entanto, o PS não me pareceu muito entusiasmado com a ideia. Mas ainda bem que está
entusiasmado e bem-vindo ao debate que temos vindo a fazer. Aliás, ainda esta semana, com a presença do
Sr. Ministro da Educação e da Ciência, pudemos fazer este debate na Comissão de Educação.
Sr. Deputado, chamo a sua atenção para o facto de, em relação à autonomia e à descentralização,
estarmos ainda com muito para fazer. Por exemplo, entre 2007 e 2011, altura do Governo do Partido
Socialista, a OCDE disse-nos que a autonomia e a descentralização sofreram muito, nomeadamente a
autonomia que caiu acentuadamente, tendo em conta a forma como a OCDE mede este indicador. Por isso, já
houve algumas políticas que este Governo fez e que gostaria de recordar.
Em primeiro lugar, recordo a assinatura de centenas de programas e de contratos de autonomia.
Passámos de pouco mais de 20 para mais de 200 contratos de autonomia assinados pelo Governo, o que,
penso, é importante. Não serve, naturalmente, todas as escolas e todos os projetos educativos, mas é
importante e nós apoiamos. Por isso, gostava de saber se o Partido Socialista também apoia.
Também recordo outra política que tem a ver com a passagem direta, imediata e permanente de
competências da Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares para as escolas, tendo o Governo já pedido
aos diretores e ao Conselho das Escolas que se pronunciassem e que dessem um parecer, para que os
diretores das escolas identificassem quais são as áreas em que existe competências da Direcção-Geral — no
caso de Lisboa, competências centralizadas — e quais são as escolas que gostariam de receber mais
autonomia. Pergunto, também, se o Partido Socialista está disposto a fazer esse debate.
Por fim, recordo a existência de um grau de autonomia que se aplique ao ensino particular e cooperativo,
mas também às escolas com contrato de autonomia, quando quiserem redefinir de uma forma, mais direta e
local, algumas disciplinas e orientações curriculares, dentro das metas do currículo nacional, para que possa
haver comparabilidade entre todos os percursos escolares individuais.
Faz ou não sentido — e acho que o Sr. Deputado tocou bem nessa questão, a da integração com a
comunidade escolar, com as famílias e com os professores — haver uma definição local, por vezes, num
percurso escolar próprio, sempre que a escola, que junta essa comunidade, identifique a vontade e a
necessidade dos agentes para essa mesma autonomia?
Nesse sentido, Sr. Deputado, agradecemos a sua intervenção e sugestões e aguardamos que, quando
estas medidas do Governo forem concretizadas, o PS possa contribuir positivamente com o debate que vai
fazendo.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Estou mesmo a terminar, Sr.ª Presidente.
Achamos que é tempo de concretizar e de recuperar o atraso que Portugal vive relativamente à
descentralização e à autonomia das escolas e de poder, por isso, construir uma escola que responda à maior
diversidade, que hoje, felizmente, temos no nosso sistema de ensino.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.
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O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, bem-vindo. Finalmente, um
Deputado da maioria percebeu o que é discutir as reformas.
Discutir as reformas não é cortar para 4% o PIB da educação. Discutir as reformas é discutir a maneira
como os sistemas devem funcionar para, num quadro de consolidação das contas públicas, termos uma boa
prestação de serviço público às populações. Bem-vindo, portanto, a este debate.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Ainda na semana passada, falei nesse assunto!
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Queria dizer-lhe que temos uma profunda convicção de que os valores em
que acreditamos são bons para o País e são bons para os portugueses.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Nós também!
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Nós não fazemos a dicotomia entre partidos e interesses das pessoas nem
dizemos, como, por exemplo, o PSD, que há medidas que são boas para o País, mas que são más para os
portugueses. Nós não fazemos essas distinções e temos a profunda convicção de que estamos a procurar
boas soluções para o nosso País.
Noto que tem havido uma tensão muito forte dentro da coligação, uma tensão muito forte entre um PSD
mais especializado em «malhar» no serviço público e em apanhar os despojos e um CDS que faz um discurso
mais ligado à competitividade.
Por isso, Sr. Deputado, queria partilhar consigo e com toda a Câmara uma grande preocupação.
Ontem, foi publicado o European Innovation Scoreboard 2014, que, como sabe, é um indicador europeu
que tem 34 subindicadores. Nós, em 2006, herdámos o País em 23.º lugar, fizemos um esforço enorme e, em
2011, estávamos em 15.º lugar — estávamos abaixo da média em termos quantitativos, porque são 28, mas
estávamos acima da média em termos qualitativos, ou seja, o indicador agregado era acima da média.
Ora, passaram três anos e estamos agora em 18.º lugar, ou seja, passámos para uma posição, de novo,
abaixo de todas as médias — aliás, até Espanha, que está em crise como nós e é governada por um Governo
de direita como o vosso, nos ultrapassou. Isto não é sinal de boa política!
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PSD.
Tem a palavra o Sr. Deputado Amadeu Soares Albergaria.
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Carlos Zorrinho, quero
cumprimentá-lo pelo tema da sua declaração política.
Na realidade, esta semana, tivemos oportunidade de ouvir em audição o Sr. Ministro da Educação e
Ciência e, nessa sede, debatemos um conjunto de problemas muito relevantes para o sistema educativo
português. Mas tivemos também oportunidade de confrontar o Partido Socialista com a ausência de propostas
alternativas credíveis para a área da educação.
O Sr. Deputado Carlos Zorrinho apresentou aqui, hoje, um conjunto de intenções, importantes naturalmente
para um debate, mas pedíamos-lhe que concretizasse um pouco mais cada uma dessas intenções.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Em 6 minutos, não há tempo!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Na realidade, ao contrário do que pareceu aqui defender na
sua declaração política, a aposta na educação não tem de implicar gastar sempre mais.
Ainda não há muitos meses uma publicação da OCDE que se debruçou sobre esta problemática chegou à
conclusão de que o sucesso do sistema educativo de um País depende mais de como os recursos são
utilizados do que do volume de investimento. Assim, o que mais importa é como são gastos os recursos, ao
invés de quanto é gasto.
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Sr. Deputado, este Governo tem procurado centrar a sua atenção na melhoria do ensino e tem colocado
sempre acima de tudo os interesses dos alunos.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Muito bem!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Têm sido anos de intensa defesa da escola pública
portuguesa e o Governo tem feito um percurso para aumentar a autonomia das escolas.
O Governo do Partido Socialista tinha 23 escolas com contrato de autonomia e hoje temos 212 escolas…
A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Recentemente, o Governo anunciou novas medidas que
permitem avançar mais na autonomia das escolas.
O Sr. Deputado e o seu Grupo Parlamentar são favoráveis a esta maior autonomia das escolas, ou não? E
como é que se concretiza essa autonomia? Respondendo à questão que aqui foi levantada pelo Sr. Deputado
Michael Seufert, o Partido Socialista concorda com a possibilidade de competências que estão hoje sob a
alçada da direção dos estabelecimentos escolares poderem vir a ser transferidas para as escolas?
Gostava também de ouvir a sua opinião sobre o segundo concurso de vinculação extraordinária de
professores ao quadro, um problema de décadas, que se está a resolver num enquadramento financeiro muito
exigente, mas que é possível ser resolvido neste momento, porque se trabalhou nesse sentido desde o início
da Legislatura.
Gostava ainda de saber a sua opinião e a do Partido Socialista sobre o programa Mais Superior, que tem
por objetivo promover, junto dos candidatos e das famílias, a oferta educativa das regiões com menor pressão
demográfica, contribuindo para a coesão territorial pela fixação de jovens qualificados.
Gostava também de saber a sua opinião sobre o programa Retomar, que se destina a prevenir o abandono
escolar e a recuperar alunos que, comprovadamente, tenham abandonado o ensino superior por razões
económicas.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.
Sr. Deputado Carlos Zorrinho, é positivo que o PS não se demita de apresentar alternativas, pois só assim
se podem alcançar consensos — e estamos disponíveis para isso —, mas esperamos, com sinceridade, que
esse autodesignado Novo Rumo, do Partido Socialista, para a educação não signifique um regresso à «festa»
da Parque Escolar.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Amadeu Albergaria, citou um estudo da
OCDE onde se diz o óbvio, ou seja, que não basta atirar dinheiro para cima dos problemas; é preciso atirar
dinheiro e também usá-lo para reformar.
Ora, por alguma razão, na OCDE, Portugal é dos países que tem um menor investimento, uma menor
percentagem do seu produto interno bruto — 4% —, sendo que, ao mesmo tempo, somos também dos países
da OCDE que temos menos produto interno bruto per capita, portanto somos dos países que menos investe
em educação.
Por isso, Sr. Deputado não vale a pena tentarmos disfarçar. É o nível de investimento na qualificação de
um povo que mostra a ambição que o Governo tem em relação a esse povo.
Com este nível de cortes na educação, a vossa ambição não é o desenvolvimento; a vossa ambição é o
empobrecimento! E o que é terrível é que estão a conseguir! O que é terrível é que estão a conseguir!
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Sabe, Sr. Deputado, os números não enganam. Eu tenho comigo um gráfico do PISA onde se pode
verificar que os indicadores vinham alegremente crescendo, os nossos estudantes cada vez tinham melhores
resultados… Bom, depois, foi aplicada a vossa política e os dados ou estabilizaram ou desceram e, portanto,
começámos a regredir.
Não temos modelos perfeitos, não temos certezas absolutas, queremos ouvir-vos também, queremos
debater com toda a sociedade portuguesa, mas o risco que identifico — até ouvindo aquele seu soundbyte
tantas vezes repetido da Parque Escolar e de outras coisas mais… — e o medo que tenho é que os senhores
já não estejam em condições de ouvir ou de ver o que está a acontecer, ou seja, que os senhores já estejam
surdos perante a sociedade e cegos perante os factos.
Aplausos do P S.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Zorrinho, congratulo-o pela declaração
política que trouxe a Plenário sobre a aposta na educação e a importância da educação numa sociedade.
Todavia, acontece que na sua intervenção, e ao ouvi-lo com atenção, não podemos deixar de registar que
houve uma espécie de esquecimento seletivo relativamente a algum património do Partido Socialista em
matéria de escola pública e que, entendemo-lo, pelos impactos negativos que essas medidas tiveram, a nossa
responsabilidade obriga-nos a trazê-las aqui.
São elas: a criação dos mega-agrupamentos; o recurso ilegal à precariedade na contratação de milhares
de funcionários, professores, de psicólogos; o fim do par pedagógico EVT; os ataques e desvalorização ao
estatuto da carreia docente feitos pela então ministra Maria de Lurdes Rodrigues e depois pela ministra Isabel
Alçada; o Decreto-Lei n.º 70/2010 e o impacto gravíssimo que teve na atribuição das bolsas de ação social
escolar no ensino superior; o Decreto-Lei n.º 3/2008 e aquela decisão profundamente injusta de que os apoios
sejam apenas para os alunos que não têm necessidades transitórias, mas apenas para os que têm
necessidades permanentes; o fim da gestão democrática das escolas.
Em suma, um conjunto de medidas que, pela gravidade que representaram, deixaram sequelas e deixaram
uma porta aberta para que este Governo PSD/CDS pudesse entrar dentro da escola pública e agudizasse
muitos dos seus problemas estruturais.
O Sr. David Costa (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Não temos dúvida nenhuma de que a escola pública — e não é uma escola
qualquer, é a escola pública — é um pilar do regime democrático.
A escola pública é um instrumento de emancipação individual e coletivo, é um espaço de formação da
cultura integral do indivíduo e sobre isso, assim, em teoria, estamos de acordo. Aliás, com o discurso do PS
sobre a escola e a educação quando o PS está na oposição nós até estamos quase sempre, no essencial, de
acordo; o problema é que quando o PS chega ao Governo executa, na prática, uma política de destruição da
escola pública e do seu papel numa sociedade democrática.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Não é verdade!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Assim, a questão que gostaríamos de lhe colocar é no sentido de perceber onde
é que os desígnios que aqui apontou relativamente ao papel da escola pública se compatibilizam com o pacto
da troica.
Protestos do PS.
Srs. Deputados, a realidade incomoda o Partido Socialista, mas a realidade é esta: foi o Partido Socialista
que, na prática, abriu caminho ao PSD e ao CDS. Era importante que não tivesse sido, mas, na prática, foi
isso que aconteceu!
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Protestos do PS.
Quando o pacto da troica determina cortas inaceitáveis nas condições materiais e humanas da escola
pública e quando o tratado orçamental, que o Partido Socialista aqui assinou com o PSD e o CDS, prevê a
limitação do investimento público nas funções sociais e estratégicas do Estado, pergunto: que novo rumo é
que o Partido Socialista quer?
É que ao ouvi-lo na sua primeira intervenção parecia que existia uma vontade de alternativa, mas, Sr.
Deputado, nas respostas que deu ao PSD e ao CDS, de facto, o que aqui está não é um novo rumo de
alternativa; é um rumo de alternância. A escola pública não é qualquer coisa,…
O Sr. David Costa (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — … a escola pública é um pilar do regime democrático. A escola pública para o
cumprimento do seu papel exige investimento público, e isso não é despesa, mas investimento público!
Por isso, era importante que o Partido Socialista, de uma vez por todas, nos esclarecesse relativamente ao
pacto da troica, às suas implicações, designadamente no tratado orçamental, e aos impactos que isso vai ter
nos sistemas científico e técnico, na escola pública e no sistema educativo.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Zorrinho.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Rita Rato, deixe-me começar por dizer que
a realidade é o que é e não o que o PCP diz que é.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — É muito importante ter isso presente.
Por isso, na resposta que lhe vou dar, mais do que contrariar o seu discurso tantas vezes ouvido, vou falar
de método.
Assim, agradeço que me tenha dado oportunidade para dizer que o que enumerei da tribuna foi a síntese
de um trabalho realizado num laboratório de ideias, que tem mais de 500 pessoas que nele participam
ativamente, sendo que também temos um movimento Novo Rumo, que tem 3500 subscritores, de entre os
quais mais de 20% são agentes do setor educativo.
Nós não temos a ideia de que temos sempre razão, mas temos muito orgulho no que fizemos, por exemplo,
na criação da escola pública, que é, claramente, algo que faz parte do nosso património político.
De facto, temos muito orgulho nisso, mas sabemos que os tempos mudam e sabemos que mudando temos
de nos adaptar permanentemente. Nós não temos uma cartilha, não temos uma espécie de catecismo
intocável, como os senhores têm e que repetem sempre, seja qual for o Governo, seja qual for a circunstância.
Não! Nós pensamos em cada momento e tomamos decisões em cada momento.
Nós queremos propor ao País uma nova forma de fazer política. Queremos reconciliar as pessoas com a
grande política e a grande política é a que resolve o problema das pessoas, não é aquela que decide se
ganhámos o debate, se perdemos o debate, se falamos mais alto, se falamos mais baixo… A grande política é
aquela que resolve os problemas concretos das pessoas!
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — E é para isso que eu estou aqui, em nome do movimento Novo Rumo, a
convidar todas as portuguesas, todos os portugueses e todos os Deputados desta Câmara.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Presidente: — Conclui-se aqui a declaração política do PS.
A próxima declaração política é do CDS-PP.
Tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O esforço que os portugueses
têm feito para superar as enormes dificuldades que enfrentamos tem sido alvo de vários reconhecimentos e
até de elogios por parte de países, entidades e personalidades. É o caso dos Estados Unidos, da OCDE, da
Comissão Europeia, da Moody’s, do Financial Times, do banco alemão Commerzbank, do Banco Europeu
para a Reconstrução e o Desenvolvimento e do Presidente do Eurogrupo.
Mas quem elogia o esforço dos portugueses não está errado, quem está errado é precisamente quem, por
razões políticas, não o quer reconhecer.
Para esta recuperação gradual, que é cada vez mais uma certeza, tem contribuído, com especial vigor, um
setor, e quero falar-vos desse setor, que é o do turismo.
Em 2013, o turismo conseguiu ser o maior setor exportador português e tem sido aquele que mais
contribuiu para o saldo positivo da balança comercial.
O turismo representa hoje qualquer coisa como 10% do total da riqueza produzida em Portugal, 8% do total
do emprego na economia e 14% das exportações totais de bens.
Entre março e dezembro, foram criados, em Portugal, 128 000 postos de trabalho em termos líquidos e,
desses 128 000, mais de 25 000 respeitam a postos de trabalho criados por este setor. Ou seja, cerca de 20%
do emprego líquido criado ao longo dos últimos nove meses foram criados no turismo.
Recorrendo a dados do Instituto Nacional de Estatística e do Turismo de Portugal, é possível concluir que,
em 2013, o saldo da balança turística conseguiu crescer 8,3%, tendo existido um aumento tanto das receitas
quanto das despesas do turismo.
Uma análise mais detalhada permite concluir que os proveitos globais da hotelaria cresceram 5,4% (101,1
milhões de euros de proveitos adicionais). Para além disso, o total das dormidas cresceu 5,2% (2,1 milhões de
dormidas adicionais), tendo existido um aumento de 8% nas dormidas de estrangeiros.
Em termos de número de hóspedes, é de registar que existiu um aumento de 4,2% face ao ano anterior,
tendo crescido 8,3% o número de hóspedes residentes no estrangeiro. A propósito do número de hóspedes
residentes no estrangeiro no ano de 2013, gostava de salientar os seguintes números: Reino Unido, 7,4%;
Alemanha, 12%; Espanha, 3,6%; França, 12,4%; Holanda, 6,8%; Brasil, 7%; Irlanda, 10%; e Estados Unidos,
11%.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: No mesmo ano, atingimos um recorde no número de hóspedes, de
dormidas, de receitas da conta satélite do turismo, de saldo positivo da balança e dos proveitos globais do
alojamento. O ano de 2013 foi, por isso, de recordes! Dado o momento difícil que vivemos, estes resultados
são, em tudo, históricos e são um sinal de esperança para todos os portugueses.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Não negamos que a chamada «Primavera Árabe» teve, seguramente, impacto positivo no turismo de
Portugal. No entanto, é também de salientar que o nosso turismo se encontra em concorrência direta com
outros destinos que também beneficiaram com a «Primavera Árabe».
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Por isso, a «Primavera Árabe» não explica a razão de estarmos a
crescer mais do que a Espanha e acima da Europa Mediterrânica.
Não nos podemos esquecer que o nosso País tem clima, tem luz, tem história, tem tradição, tem cultura,
tem mar, tem hospitalidade, tem gastronomia. É único e diferente dos demais! Diria mesmo que, a par do
nosso país irmão, é «abençoado por Deus e bonito por natureza».
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Não podemos esquecer que, para estes bons resultados, contribuíram
também as empresas e os agentes turísticos, que são mais competentes do que os seus concorrentes, quer
sejam italianos, gregos ou franceses, porque os dados disso dão nota.
Mas a este crescimento não deverá ser alheia a promoção turística que hoje é feita. Ao contrário do
passado, a promoção turística, hoje, é mais direcionada para produtos e para mercados. Hoje, promove-se a
marca e o destino «Portugal». E isto reflete-se no novo PENT (Plano Estratégico Nacional do Turismo), no
qual se encontram inscritas metas mais positivas e, ao mesmo tempo, mais realistas.
Para o período 2013-2015, os objetivos contemplam mais dormidas na hotelaria, que deverão crescer a
uma taxa média anual de 3,1%, e mais receitas turísticas, que deverão crescer 6,3%. Isto significa que o
turismo, em Portugal, poderá atingir os 30 milhões de dormidas internacionais e crescer 2,2 mil milhões de
receitas, ultrapassando a fasquia de 10 000 milhões de euros.
O Governo tem assumido um papel decisivo, ao facilitar a vida às empresas. Como exemplos, temos a
simplificação do regime jurídico dos empreendimentos turísticos, do regime jurídico das empresas de
animação turística e do regime jurídico das agências de viagens. Deste modo, cerca de um ano e meio após a
entrada em vigor do novo regime jurídico das agências de viagens, registaram-se mais 400 novas agências de
viagens.
Também em menos de um ano após a entrada em vigor do novo diploma das empresas de animação
turística, foram criadas 246 novas empresas de animação turística.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O papel do Governo não se tem ficado por aqui, dado que também tem
colocado à disposição das empresas do setor um conjunto de mecanismos de apoio que respondem às suas
necessidades, nomeadamente, financeiras.
Como exemplos, temos a recente criada Linha de Apoio à Consolidação Financeira, que visa o
alargamento dos prazos de reembolsos de serviços de dívida anteriormente contraídos, a parceria estratégica
com a Federação Nacional das Associações de Business Angels, direcionada ao empreendedorismo, a Linha
de Qualificação da Oferta Turística ou, mesmo, a Linha de Apoio à Tesouraria.
Para além de tudo isto, uma outra medida importante colocada no terreno pelo atual Governo é o chamado
«Golden Visa», cujo processo envolve o início de uma atividade de investimento e não simplesmente a
aquisição de residência, o que contribui para a criação de riqueza e de postos de trabalho no nosso País. Esta
medida, pelo menos até ao final de fevereiro, tinha 679 vistos concedidos, num total acumulado de 414
milhões de euros de investimento.
Em suma, os dados do turismo em Portugal são hoje extremamente positivos, prevendo-se que o setor
venha a crescer ainda mais. Para isso têm contribuído o Governo e as empresas portuguesas. Os agentes
turísticos estão, por isso, de parabéns.
É isso que deveremos assinalar e foi disso que quis dar nota positiva.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Guilherme Silva.
O Sr. Presidente: — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Termino, Sr. Presidente.
Este Parlamento, todos nós, devemos acarinhar e proteger um setor que representa muito, mas muito, para
a economia portuguesa.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, a Mesa regista a inscrição de quatro Srs. Deputados
para formularem pedidos de esclarecimento, pelo que informará se responde individualmente ou em conjunto.
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Responderei a conjuntos de dois pedidos de esclarecimento, Sr.
Presidente.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Fica registado, Sr. Deputado.
Assim sendo, tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, veio aqui apresentar os
bons resultados do setor do turismo em Portugal, apesar, diria eu, das várias medidas deste Governo contra
as empresas do turismo, contra a economia e contra os trabalhadores em geral.
Saiba o Sr. Deputado que não negamos os dados do turismo. Sabemos, como aqui foi, aliás, admitido, que
parte deles provêm de circunstâncias alheias ao Governo, nomeadamente a «Primavera Árabe», mas é um
setor em expansão e não há como negá-lo.
Há, no entanto, várias questões que nos preocupam neste setor, nomeadamente o seu papel na economia,
pois é conhecido que nenhuma economia grande, importante, da Europa depende do turismo. As economias
mais importantes da Europa dependem muito pouco do turismo e mais da produção industrial, que gera mais
emprego e tem mais valor acrescentado. Preocupa-nos, sim, uma economia muito dependente do turismo,
porque é uma economia mais frágil, que produz menos e que fica mais dependente de circunstâncias que lhe
são alheias.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O Sr. Deputado veio aqui trazer a questão dos vistos dourados como um
motivo para atração de investimento, de criação de emprego. Sabemos, porque são estes os dados
divulgados, que 90% dos vistos Golden atribuídos em Portugal, os vistos que vendem autorizações de
residência a quem tiver dinheiro para as comprar — enquanto milhares de imigrantes morrem nos mares, a
tentar chegar à Europa, em Portugal podem vender-se vistos de residência, a quem tiver dinheiro para os
comprar —, não são para investimento produtivo, são para especulação imobiliária. E, portanto, não deixo de
ver aqui uma contradição entre um modelo que quer produzir mais e fomentar a economia produtiva, mas,
depois, quer atrair investimento que só visa a especulação imobiliária, sem a criação de um posto de trabalho
ou de um objeto que seja para exportação. Isto é investir no modelo que nos trouxe à crise, com a
especulação imobiliária.
Mas também há uma outra questão que diz respeito ao turismo, que, como aqui referiu, é um setor muito
importante para a criação de emprego em Portugal, que pode servir para tirar muitas empresas da crise, que é
a do IVA da restauração. Os restaurantes são uma parte importante do setor do turismo e o IVA da
restauração é uma medida reclamada por este setor como uma medida capaz de ajudar a combater a crise.
Não deixo de transmitir aqui a própria indignação que ouvimos deste setor, da restauração e do turismo,
perante um Governo que está sempre disponível para descer os impostos às grandes empresas, está sempre
disponível para facilitar…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Termino, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, este Governo está sempre disponível para descer os impostos às grandes empresas,
está sempre disponível para facilitar que as empresas, como, por exemplo, a Jerónimo Martins, transfiram
lucros para o exterior sem pagar impostos, mas não está disponível, pelo contrário, para baixar o IVA da
restauração, que tanto poderia ajudar as empresas do setor do turismo em Portugal.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado
Acácio Pinto.
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O Sr. Acácio Pinto (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, quero começar por saudá-lo pelo
facto de nos ter trazido uma declaração política sobre o setor do turismo. É um importante setor da nossa
economia e um importante setor exportador.
Saúdo também o seu esforço para nos falar num milagre económico no nosso País que, verdadeiramente,
só o Sr. Deputado e a maioria é que conseguem ver. O paraíso que aqui nos tentou mostrar não existe, Sr.
Deputado, e quero até dizer-lhe que Portugal não está melhor, porque os portugueses também não estão
melhores. A este propósito, qual é a sua opinião sobre uma declaração no sentido de que Portugal está
melhor, apesar de os portugueses estarem piores? Gostaria de ouvir a sua opinião sobre isto.
Mas, já agora, deixe-me fazer-lhe outra pergunta para nos entendermos sobre esta matéria. Não quero
estar aqui a falar-lhe da estatística que nos trouxe, das circunstâncias internacionais que também abordou, do
esmagamento dos preços, mas quero dizer-lhe que tudo o que se passou depende, em muito, do esforço, do
grande esforço que foi feito pelos nossos agentes e pelos inúmeros agentes do setor do turismo. Aquilo de que
o Sr. Deputado aqui nos devia ter falado era de qual foi o esforço do Governo para que a coesão territorial
também tivesse acontecido na área do turismo, mas nada nos disse sobre esta matéria.
Gostaria ainda que nos dissesse o que entende sobre o aumento das taxas aeroportuárias, pois isso
também está a pôr em causa a chegada de turistas nos próximos tempos.
Diga-nos, também, concretamente, qual foi o resultado fiscal que adveio do aumento de 77% que se
verificou, há dois anos, sobre o IVA da restauração. Qual foi o resultado que não tenha sido o encerramento
de empresas e o desemprego no setor?!
Já agora, quais são as respostas que o Sr. Deputado tem para combater a sazonalidade no setor do
turismo?
Deixe-me terminar, perguntando-lhe, ainda, qual a opinião do CDS e a sua opinião sobre a Agência
Nacional de Promoção Turística, um filho cuja paternidade, afinal, pelos vistos, ninguém quer assumir.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Acácio Pinto (PS): — Termino mesmo, Sr. Presidente, pedindo ao Sr. Deputado Hélder Amaral que
nos fale dessa realidade e, já agora, se quiser falar-nos de estatística, que fale da estatística do turismo
interno.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, queria agradecer as perguntas da Sr.ª Deputada
Mariana Mortágua e do Sr. Deputado Acácio Pinto e, se me permitem, começo por responder ao Sr. Deputado
Acácio Pinto.
Estava a ver se o PS resistia a fazer esse exercício de militância daqueles que são partidários do não
crescimento económico, que fazem parte desse grande partido que nega qualquer evidência de melhoria na
economia portuguesa, mas o Sr. Deputado não resistiu e fez aqui mais um desses exercícios.
É evidente que o Sr. Deputado pode seguir esse caminho, como fez no passado. Pode duvidar da lei das
agências de viagens, mas a verdade é que surgiram mais agências de viagens e a lei é pacífica no setor; pode
duvidar da tal coesão territorial e da nova lei das entidades regionais de turismo, mas a verdade é que ela é
pacífica e consensual e está no terreno; pode duvidar do efeito das portagens, como se esqueceu de dizer, ou
da «Primavera Árabe», mas a verdade é que o setor melhora e reage de forma muito positiva.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — E os salários?!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sabe, Sr. Deputado: os proveitos globais subiram 1,5%, os proveitos de
alojamento por hóspede subiram 2,1% e, quanto aos proveitos de alojamento em geral, tivemos um ano
recorde, com 1,37 mil milhões de euros, ou seja, mais 6,4%.
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Poderia dizer-lhe também que as receitas cresceram 7,5%, portanto, aqui, não houve «esmagamento» de
preços, e temos um saldo da balança de 8,3%.
Portanto, Sr. Deputado, poderia dizer que o IVA aplicado na restauração é de facto um constrangimento,
mas a verdade é que o setor reagiu de forma positiva, ao contrário do sentimento e, porventura, da vontade do
Partido Socialista. Transformaram as dificuldades em forças, e não é que o setor tem criado mais empresas?!
Já agora, deixe-me perguntar-lhe se ouviu bem os dados que referi, isto é, que o turismo representa 10%
do PIB e 8% do emprego. Desconhece que este crescimento tem um efeito multiplicador? Sabe porque é que
o setor automóvel reagiu? Porque as empresas de rent-a-car alugaram mais carros. Sabe que o acréscimo do
número de turistas aumenta a utilização de restaurantes, aumenta a venda de produtos endógenos?! Portanto,
este crescimento do turismo tem um efeito multiplicador na economia.
Pensava que o Partido Socialista, sendo responsável, viesse aqui dizer que é preciso olhar para isto e
apoiar tudo e mais alguma coisa que se faça no turismo. Por isso, lamento que venha pôr em causa dados
estatísticos, que são evidentes.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Só sabem é construir hotéis para ficarem vazios! É essa a vossa
política de turismo!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, sou levado a concordar consigo
quando diz que o País não é só turismo, mas permita-me que lhe diga que temos condições únicas para
considerar o turismo um setor fundamental para a economia portuguesa.
Ainda não estamos ao nível de alguns países que só têm duas estações, a do caminho-de-ferro e a do
verão; nós temos mais algumas. Temos várias condições, nomeadamente o sol e o mar, a gastronomia, o
golfe. Se reparar, recebemos cinco prémios internacionais, nove europeus, que são atribuídos exatamente a
destinos de sol e mar e a destinos de golfe, e até temos cidades, com o Porto e Lisboa, que ganham prémios
atrás de prémios.
Portanto, temos condições únicas e seria um erro estratégico não as aproveitar, nomeadamente não
aproveitar essas condições para dar visas gold — diria que até gostava que fossem vistos de platina —, para
possibilitar que os europeus possam gozar as suas reformas em Portugal, para utilizar a capacidade instalada
e a oferta existentes em termos de imobiliário, para promover o turismo de saúde e o turismo cultural.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Seria um erro se não olhássemos para um setor que é efetivamente
importante na criação de riqueza e de emprego. E, obviamente, em vez de discutirmos as nossas diferenças,
temos de ser muito sensíveis à imagem que criamos lá fora, pois ela é importante para atingirmos novos
mercados.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado
Nuno Encarnação.
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, cumprimento-o e felicito-o
pelo tema da declaração politica que trouxe a esta Casa, mas também não posso deixar de referir os dois
pedidos de esclarecimento que me antecederam.
Como é que o Partido Socialista, quando estava no Governo e tinha resultados menos positivos do que
este no setor do turismo, fazia «grandes festas»…
Protestos do PS.
… e, agora, consegue ler estes resultados altamente positivos de forma contraditória?! Acho isso
extraordinário, Sr. Deputado.
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Penso que não ficava mal ao Partido Socialista admitir que, neste setor, importante para a economia
nacional, os números do ano 2013 que foram referidos são bons.
O Sr. Acácio Pinto (PS): — É estatística! A economia é mais do que a estatística!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr. Deputado, não diga isso, que até lhe fica mal. Não duvide dos
números, porque o procedimento para aferir estes números é o mesmo que era utilizado na altura dos
Governos do Eng.º José Sócrates.
Por isso, considero que fica mal ao Partido Socialista fazer este «flic-flac», que costuma fazer com
frequência, neste setor que, é inegável, tem crescido e tem tido melhores resultados.
Sr. Deputado Hélder Amaral, estranho também o Bloco de Esquerda achar que investidores, tenham ou
não com vistos gold, são especuladores. Não percebo esta tese do Bloco de Esquerda. Quer dizer que não
querem investidores estrangeiros em Portugal?!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Ó Sr. Deputado, é especulativo! Por isso é que querem controlar os
vistos!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Agora, alegam que os vistos gold são para os especuladores e não
para os investidores?!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — 20% acima do preço!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr.ª Deputada, também acho essa tese do Bloco de Esquerda
extraordinária. Quer dizer, nada está bem! A Sr.ª Deputada até foi a primeira a admitir que os números são
mais positivos em 2013, ao contrário do que o Partido Socialista acabou de fazer, mas pôr em causa o intuito
dos vistos gold é um bocadinho grave.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Querem mudar as regras!
O Sr. Nuno Encarnação (PSD): — Sr. Deputado Hélder Amaral, gostaria que realçasse à Câmara, uma
vez que o Partido Socialista duvida destes números, se 2013 é ou não o ano de todos os recordes, se estamos
ou não a conquistar novos mercados, se achamos ou não que é importante reclassificar o turismo em Portugal
e crescer novamente em 2014.
Pretendia saber também se o Governo, e não só as empresas e os empresários, que têm um grande
sentido de antever o futuro, tem ajudado ou não na evolução deste setor, se tem implementado medidas e
reformas, se é ou não justo dizer que o Governo está de parabéns por tudo aquilo que tem feito em prol deste
setor.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado João
Ramos.
O Sr. João Ramos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Hélder Amaral, sabe que o PCP entende que é
necessário aprofundar a avaliação e a análise destas matérias por áreas, porque reconhecemos que há
diferenças entre as diversas áreas. Aliás, na passada sexta-feira, solicitámos ao Sr. Secretário de Estado que
o fizesse, sendo que o Sr. Secretário de Estado «levantou o véu» e admitiu um conjunto de problemas no
setor. Agora, o Sr. Deputado fugiu a essa análise e focou-se noutra perspetiva.
Um dos exemplos que damos — é conhecido, eu ouvi esse exemplo e o Sr. Deputado também — é o do
setor das agências de viagens, em que o volume de negócios se reduziu 40% desde o início da crise, e isto é
significativo.
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Na área do transporte aéreo, que também foi abordada na última audição, o Governo diz que se abstém
nestas matérias.
As companhias low cost têm contratos pouco transparentes ou pouco conhecidos. É reconhecido por todos
os intervenientes no setor que a TAP é fundamental para a angariação de clientes e para a promoção do
destino, contudo ela está para ser privatizada e o Governo diz que se abstém nestas matérias.
Outro setor onde há problemas, e já foi aqui referido, é o da restauração, que representa mais de 50% do
setor do turismo e onde Governo teima em manter a taxa de IVA mais elevada da Europa. Mas, para além do
problema do IVA, esse setor tem outros: o da lei das rendas, que está a «expulsar muitos restaurantes»; o dos
custos de contexto — a energia e os direitos de autor. Tudo isto são problemas que preocupam o setor e para
os quais não tem havido soluções.
Percebemos que o CDS tem muitas dificuldades em gerir a matéria do IVA, mas tem responsabilidades
políticas e tem de resolver o problema. É que o grupo interministerial que foi criado para se debruçar sobre o
problema do IVA apontava quatro cenários, e o Governo optou precisamente por um cenário de não fazer
nada.
O Sr. David Costa (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Ramos (PCP): — Ainda relativamente à esta matéria, precisávamos de saber melhor quais são
as receitas do IVA. O PCP apresentou um requerimento para esse efeito há dois meses e estamos à espera
de resposta. É que este Governo não nos dá as receitas do IVA de 2011 e de 2012 — foi essa a informação
que pedimos — para percebermos quais são os valores declarados e os valores efetivamente cobrados.
Sabemos que, no ano 2010, foram cobrados menos 600 000 € do que o valor que foi declarado. O Governo
diz que cumpriu os objetivos, porque as receitas do IVA estão a aumentar, mas desde 2010 que não sabemos
quais são os valores.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Ramos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado Hélder Amaral fala nos sucessos, mas a esses sucessos estão sempre associados os
trabalhadores e não há dúvida que os trabalhadores são fundamentais para o setor do turismo. Há mais
precariedade, os salários são menores, há salários em atraso e há despedimentos. Enquanto os proveitos das
empresas aumentaram 10%, os salários dos trabalhadores reduziram pelo menos 6%.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. João Ramos (PCP): — Como é que se fala em sucesso e, depois, esse sucesso não beneficia todos
os que estão envolvidos no setor? Por que é que os trabalhadores têm sempre que pagar uma parte do
sucesso das empresas? Por que é que associado ao sucesso que o senhor refere está sempre um processo
de concentração da riqueza?
Será caso para dizer, Sr. Deputado, parafraseando os vossos colegas de coligação, que o setor do turismo
está muito melhor mas os trabalhadores do turismo, esses, estão muito pior.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, começo por agradecer a forma coerente e simpática
com que o Srs. Deputados João Ramos e Nuno Encarnação me colocaram as suas perguntas.
Gostava ainda de referir mais alguns dados, para que não fique a ideia de que este crescimento do turismo
é feito com base no «esmagamento» de preços ou na pouca qualidade.
Vozes do PCP: — E os salários do trabalhadores!
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A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Os salários dos trabalhadores estão em atraso!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — As receitas dos hotéis de 5 estrelas aumentaram 17,4%. E sabe qual
foi o aumento das receitas dos hotéis de 4 estrelas? Foi de apenas 4,4%. E das receitas dos hotéis de 3
estrelas? O aumento foi de 3,1%.
Vozes do PCP: — E os salários?!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sabe que, ao mesmo tempo que no turismo se tem assistido a este
crescimento, a oferta aumentou? Quartos de hotéis, mais 27%; estabelecimentos, mais 52,9%; camas, mais
26,9%. Ainda assim, o Rev PAR (rendimento médio por quarto) teve um aumento de 5,6%.
Esses dados deixam os trabalhadores satisfeitos porque, com este crescimento, seguramente vai haver
mais emprego. Esses dados originam criação líquida de emprego no setor e a melhor notícia que podemos dar
a um desempregado é que vai ter emprego, não é dar-lhe um subsídio mas, sim, um emprego! Essa é a
melhor notícia que lhe podemos dar!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Não escondo que temos um problema de mercado interno. Não tenho por hábito vir aqui fazer demagogia
esquecendo-me de onde partimos. É evidente que o mercado interno cresceu, mas cresceu muito menos do
que o nosso mercado externo. Isso é um facto e é por isso as agências de viagens que registaram melhores
resultados são as que trabalham com o incoming, não as agências que trabalham com o mercado interno. Mas
esse é passo que daremos a seguir se o setor continuar a reagir.
Se a Organização Mundial do Turismo diz que até 2020 teremos um crescimento de mais 3,3% ao ano,
porventura, teremos aqui uma janela de oportunidades. Temos é que acarinhar estes resultados.
Considero que as companhias low-cost tiveram um efeito enorme no aumento do turismo de cidade, nos
city breaks, nomeadamente no Porto e em Lisboa, o que contraria até a «tese de Primavera Árabe», porque,
se formos ver, os números do turismo são os seguintes: Norte, mais de 15,2%; Lisboa, mais 9%; Madeira,—
mais 8,5%; Açores, mais 24,6%. Nos Açores, os efeitos das companhias low-cost não se verificam tanto, mas
no que respeita às cidades verificam-se.
Queremos que a TAP seja, de facto, a linha de excelência de transporte, de captação de tráfego e de
turismo internacional e, por isso, a seu tempo o Governo fará a privatização. Não podem é acusar o Governo
de ter parado o processo quando houve dúvidas sobre a qualidade da privatização.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Essa parece-me ter sido uma ação avisada, de bom senso e de defesa
dos trabalhadores e da empresa e, portanto, não me parece que tenha razão nessa matéria.
Também não quero esconder, e para terminar, que tenho o maior respeito pelos trabalhadores do setor do
turismo. Na audição que o Deputado João Ramo referiu eu até disse uma coisa importante: podemos ter os
melhores hotéis de 5 estrelas do mundo, os melhores produtos do mundo, mas, se não tivermos capital
humano com qualidade e em quantidade suficiente, isso de nada nos servirá.
Vozes do PCP: — E os salários?!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Portanto, a formação e a existência de um salário justo para o trabalho
realizado são fundamentais nesse setor.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Salário mínimo!
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Mas nós sabemos que o emprego e o ajustamento salarial é aquilo que
chega mais tarde e o que é mais difícil. Se não houver empresas, seguramente não haverá trabalho;…
O Sr. João Ramos (PCP): — Se não houver trabalhadores, também não há!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … se as empresas não tiverem receitas, seguramente não haverá
aumentos salariais.
Portanto, confio nos trabalhadores e nos empresários do setor. E os dados que tenho, não aqueles que o
Sr. Deputado aqui referiu e que não consigo encontrar em lado nenhum, indicam que estamos hoje muito
melhor — trabalhadores, empresários e o País.
Sr. Deputado João Ramos, termino colocando-lhe uma pergunta. Sabe que fizemos tudo isso gastando, em
termos de orçamento, menos 31%? Para aqueles que acham que para resolver todos os problemas é preciso
aumentar o orçamento, ora aqui têm um setor em que reduzimos o orçamento 31% e tivemos o melhor ano de
sempre! Com pouco fizemos muito mais.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, findam aqui as declarações políticas.
Passamos ao segundo ponto da nossa rodem de trabalhos, que consiste no debate, na generalidade, da
proposta de lei n.º 208/XII (3.ª) — Transpõe parcialmente a Diretiva 2013/25/UE, do Conselho, de 13 de maio
de 2013, que adapta determinadas diretivas no domínio do direito de estabelecimento e da livre prestação de
serviços, em virtude da adesão da República da Croácia, e procede à segunda alteração à Lei n.º 9/2009, de 4
de março.
Tem a palavra, para apresentar a proposta de lei, o Sr. Secretário de Estado do Emprego.
O Sr. Secretário de Estado do Emprego (Octávio de Oliveira): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A
liberdade de circulação das pessoas é um direito fundamental dos cidadãos da União Europeia. É, aliás, um
dos quatros pilares deste projeto que, em comum, as nações vieram erguer nas últimas décadas. Estas
liberdades fundamentais permitem ao empresário decidir livremente o local das suas atividades, ao
trabalhador escolher o seu local de trabalho e ao consumidor ter à sua disposição uma diversidade enorme de
produtos.
O conceito de livre circulação de pessoas surgiu com o Acordo de Schengen, em 1985, e, posteriormente,
foi consolidado com a Convenção de Schengen de 1990. Um projeto com enorme potencial de
desenvolvimento, um projeto que se quer atento às raízes das nações, às suas identidades, mas de
construção de um espaço comum. Só assim faz sentido termos um projeto europeu, um projeto que fique
assente numa solidariedade recíproca, criadora de oportunidades para os cidadãos e inclusiva nos seus
objetivos.
Todo este processo tem sido dinâmico e evolutivo. Ainda que com momentos mais expressivos e com outro
menos desenvolvidos, a verdade é que hoje todos aqueles que integraram o projeto europeu estão melhor,
mais prósperos, mais competitivos, mais inclusivos e coesos e mais tolerantes do que há 20 anos. São
conquistas civilizacionais, bases para outros desafios.
A relação com o indivíduo extracomunitário e a integração do recém-chegado é aquilo de que hoje estamos
aqui tratar. Portanto, Sr.as
e Srs. Deputados, com a integração da Croácia e funcionando como um mercado
único com 28 países, a União Europeia é uma importante potência comercial a nível mundial. A sua economia
é, atualmente, superior à dos Estados Unidos, o PIB da União Europeia, em 2012, foi perto de 13 biliões de
euros.
Embora a União Europeia represente apenas 7% da população mundial, o volume das suas trocas
comerciais com o resto do mundo corresponde a cerca de 20% do volume mundial das exportações e das
importações. Gerir esta dinâmica, com enorme potencial, responsabiliza cada país, cada nação, a adotar e a
sintonizar medidas globais.
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A proposta de lei n.º 208/XII efetua a transposição parcial para a ordem jurídica interna da Diretiva
2013/25/UE, do Conselho, que adota determinadas diretivas no domínio do direito do estabelecimento e da
livre prestação de serviços em virtude da adesão da República da Croácia.
As alterações propostas incidem sobre o reconhecimento mútuo das qualificações profissionais,
procedendo à segunda alteração à Lei n.º 9/2009, de 4 de março, que transpôs para a ordem jurídica interna
as disposições relativas ao reconhecimento das qualificações profissionais e determinadas diretivas no
domínio da livre circulação de pessoas em virtude da adesão, na altura, da Bulgária e da Roménia.
As alterações constantes da proposta de lei têm o seguinte objeto: alteração do artigo 46.º, referente aos
direitos adquiridos dos arquitetos, com inclusão da Croácia, que estabelece a data a partir da qual as
entidades competentes reconhecem, para efeitos de acesso e exercício das atividades profissionais de
arquiteto, os certificados emitidos pelos Estados-membros; a inclusão da Croácia nos anexos II e III, referentes
a um conjunto de títulos de formação e denominação de funções médicas especializadas e também referente
aos direitos adquiridos aplicáveis às profissões objeto de reconhecimento, com base na coordenação das
condições mínimas de formação.
Muito obrigado pela vossa atenção.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António
Cardoso.
O Sr. António Cardoso (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: A
proposta de lei n.º 208/XII transpõe parcialmente a Diretiva 2013/25/UE, do Conselho, de 13 de maio de 2013,
que adapta determinadas diretivas no domínio do direito de estabelecimento e da livre prestação de serviços,
em virtude da adesão da República da Croácia, e procede à segunda alteração à Lei n.º 9/2009, de 4 de
março. Basicamente, em termos reais, apenas define expressões usadas na Croácia para títulos, cursos e
organismos de formação credenciados, para permitir a leitura automática dos certificados de formação, e
outros.
Politicamente, o importante é referir que a comunidade europeia continua a ser um espaço de
oportunidades e que os países europeus ainda não membros continuam a desejar o acesso a essas
oportunidades económicas e laborais. Contudo, a livre circulação de pessoas e a livre prestação de serviços
deve ser uma oportunidade, uma opção tomada de livre vontade pelos europeus.
A crise na Europa e as escolhas do Governo português colocaram muitos portugueses, principalmente os
jovens, «entre a espada e a parede», entre o desemprego e a emigração, tornando esta oportunidade de livre
circulação uma pena pesada para Portugal e para os portugueses.
Sem pôr em causa a bondade e a generosidade da presente proposta de lei, existem realidades inevitáveis
que o Governo de VV. Ex.as
não pode esconder: para mais de 120 000 portugueses, a livre circulação no
espaço europeu foi um mal menor e não uma escolha livre e ponderada; foram, e continuam a ser, escolhas
forçadas, rodeadas de muitas situações dramáticas, cujas imagens diariamente entram pelas nossas casas
dentro.
A procura de emprego recorrendo à emigração é a única saída às políticas destruidoras de emprego e da
economia portuguesa protagonizadas pelo Governo PSD/CDS.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Barata
Lopes.
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: O
Governo traz hoje a esta Assembleia a proposta de lei n.º 208/XII (3.ª), que procede à segunda alteração à Lei
n.º 9/2009, de 4 de março, efetuando a transposição parcial para a ordem jurídica interna da Diretiva
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2013/25/UE, do Conselho, que adapta determinadas diretivas no domínio do direito de estabelecimento e da
livre prestação de serviços.
Como o Sr. Secretário de Estado bem explicou, esta transposição incide especificamente sobre o
reconhecimento mútuo das qualificações profissionais, procedendo, então, à segunda alteração ao diploma
referido.
Convém perceber que, como disseram o Sr. Secretário de Estado e também o Sr. Deputado do Partido
Socialista, esta é uma alteração que decorre da imposição europeia para incluir nos anexos à Lei n.º 9/2009 a
República da Croácia, que aderiu à União Europeia em julho do ano passado.
Convém deixar duas notas sobre este assunto, Sr. Secretário de Estado. Em primeiro lugar e na
decorrência até daquilo que foi referido pelo Sr. Deputado do Partido Socialista, não pode deixar de ser
realçado que se prefere, mais uma vez, chamar a atenção para o que está mal. Portanto, primeiro diz-se «sim,
senhor, ainda bem que estamos aqui, isto é um mercado de oportunidades a alargar», como muito bem referiu
o Sr. Secretário de Estado, mas, depois, diz-se que isto é uma coisa má.
Sr. Secretário de Estado, deixe-me esclarecer um aspeto que eu gostava muito que tivesse em
consideração. Eu, enquanto portuguesa, e os jovens da minha geração ficaremos satisfeitos quanto mais o
mercado se alargar, porque, na realidade, estamos cientes do mérito que temos, do que precisamos é das
oportunidades para o garantir.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Acreditamos no nosso mérito, precisamos apenas das
oportunidades.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, quero dar-lhe aqui nota, até porque sabemos como o reconhecimento
das qualificações é importante para si e tem sido importante para este Governo, de que, naturalmente, sim,
ficamos satisfeitos quando é alargado este mercado de oportunidades.
Não podemos também deixar de fazer aqui uma segunda nota: sendo esta alteração feita justamente pela
adesão à União Europeia um novo Estado-membro, numa altura em que tanto se questiona e se fala da
própria União Europeia, convém relembrar que este é um diploma de extrema importância no que diz respeito
à vida dos trabalhadores, mas, mais do que isso, mostra que a República da Croácia escolheu, como bem
referiu — como outros Estados continuam a escolher —, fazer parte deste mercado em que acreditamos.
Acreditamos nós, no PSD, e acreditamos nós, enquanto portugueses.
A prova disso é que, numa altura em que voltamos a pôr em causa valores específicos da União Europeia,
a Croácia, que ainda há 20 anos estava em guerra pela sua independência, tudo fez para garantir a sua
adesão à União Europeia.
O certo é que isso também serve para garantir valores como a paz, para além do reconhecimento das
oportunidades que a adesão à União Europeia traz. Não deixará de ser interessante referir este aspeto,
considerando que tantos tentam agora pôr em causa se esses valores continuam ou não garantidos. A prova
disso é que a República da Croácia aderiu à União Europeia em julho do ano passado, o que, quer para este
país que agora incluímos na Lei n.º 9/2009 como para todos aqueles que têm a sorte e o mérito de poder estar
neste mercado de igualdades, não pode deixar de ser uma boa notícia.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra o Sr. Deputado David Costa, para uma intervenção.
O Sr. David Costa (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: A proposta
de lei apresentada pelo Governo transpõe a Diretiva 2013/25/EU, do Conselho, de 13 de maio de 2013, para o
ordenamento jurídico nacional.
Tendo como objeto a abordagem da livre circulação de pessoas e o reconhecimento das qualificações
profissionais no seguimento da adesão da Croácia, vem a proposta de lei n.º 208/XII efetuar a segunda
alteração à Lei n.º 9/2009, de 4 março.
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Mantemos hoje todas as objeções que anteriormente afirmámos quanto à forma como, por via da
discussão sobre o livre estabelecimento e prestação de serviços, se agrava, no plano europeu, a exploração
de quem trabalha.
Como referimos na devida altura, o PCP vê com muita apreensão que o direito de estabelecimento e de
livre prestação de serviços não determine objetivamente uma obrigação de inscrição no regime de segurança
social no país onde é prestado o serviço ou evidente prova de contribuição no país de origem.
Mantém-se ainda um conjunto de mecanismos que resultam da primeira alteração, produzida através da
Lei n.º 41/2012, de 28 de agosto, como o deferimento tácito após 30 dias do pedido de habilitação profissional,
bastando o comprovativo do referido pedido para exercer uma qualquer atividade profissional. Constitui-se,
assim, uma simplificação perigosa do controlo das condições para o exercício profissional no nosso País.
Acresce que todo este processo legislativo nunca garantiu, desde a sua génese, em 2009, uma igualdade
de tratamento com os portugueses, a quem são exigidas, no espaço europeu, comprovadas condições de
aptidão profissional que em Portugal são ignoradas por via tácita, comprometendo, assim, o princípio da
reciprocidade.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. David Costa (PCP): — Mas se, por um lado, a União Europeia mostra toda a diligência para regular
o reconhecimento das qualificações profissionais, por outro, assistimos a uma diretiva europeia que não
incorpora nenhum tipo de correlação salarial com essas mesmas qualificações, criando concorrência entre
trabalhadores com o claro objetivo de diminuir direitos e agravar a exploração dos trabalhadores no seio da
União Europeia.
Sr.as
e Srs. Deputados, o Partido Comunista Português reitera a sua posição declarada em 2006, aquando
da discussão da «diretiva Bolkestein», afirmando que a aplicação da Estratégia de Lisboa seria catastrófica
para o País, não iria transformar a União Europeia num espaço de pleno emprego, com a economia mais
competitiva e dinâmica do mundo, como foi prometido, mas, sim, num espaço de grande exploração dos
trabalhadores, com desregulamentação laboral e com uma crescente liberalização e privatização dos setores
básicos e de serviços públicos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Otília Ferreira Gomes.
A Sr.ª Otília Ferreira Gomes (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados: Conforme já aqui foi referido, a proposta de lei n.º 208/XII transpõe parcialmente a Diretiva
2013/25/UE, do Conselho, de 13 de maio de 2013, que adapta determinadas diretivas no domínio do direito de
estabelecimento e da livre prestação de serviços, em virtude da adesão da República da Croácia, e procede à
segunda alteração à Lei n.º 9/2009, de 4 de março.
Esta lei transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva 2005/36/CE, do Parlamento e do Conselho, de 7
de setembro, relativa ao reconhecimento das qualificações profissionais, que concretiza e promove valores
fundamentais da União Europeia como a livre circulação de pessoas, de prestação de serviços e de
estabelecimento.
Em suma, o que a proposta de lei em discussão vem trazer de novo é a inclusão da Croácia numa lista de
países que beneficiam de legislação própria em termos de direito de estabelecimento e de livre prestação de
serviços por fazerem parte da União Europeia e não qualquer outra alteração à referida Lei n.º 9/2009, como já
ouvi aqui dizer.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Otília Ferreira Gomes (CDS-PP): — Ao fim e ao cabo, mais não é do que, nesta matéria, tornar a
Croácia país igual entre iguais.
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Estamos, pois, a discutir uma alteração que vai fomentar uma melhor livre circulação dentro do espaço
europeu. Não podemos, neste sentido, esquecer que a livre circulação é uma das quatro liberdades
fundamentais, como já aqui foi referido pelo Sr. Secretário de Estado, e um elemento essencial de cidadania
da União Europeia.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Otília Ferreira Gomes (CDS-PP): — Isso significa uma liberdade e não uma obrigação, bem como
uma porta de oportunidades para todos os trabalhadores da União Europeia.
Importa referir de igual forma, especificamente no que se refere ao Tratado sobre o Funcionamento da
União Europeia, que está estabelecido no n.º 2 do artigo 26.º que «O mercado interno compreende um espaço
sem fronteiras internas no qual a livre circulação das mercadorias, das pessoas, dos serviços e dos capitais é
assegurada de acordo com as disposições dos Tratados». É consagrado também o direito de estabelecimento
e à livre prestação de serviços.
É com base nestes avanços da cidadania europeia para todos os Estados-membros que se consegue
tornar o projeto europeu uma realidade cada vez mais consistente e cada vez mais um pilar sólido que
concretiza, na prática, as intenções que muitas vezes apenas ficam nos relatórios e nos documentos de
análises e de boas intenções.
Aliás, o compromisso de melhorar o regime de reconhecimento das qualificações profissionais e a revisão
das profissões regulamentadas no sentido de eliminar obstáculos de acesso ao mercado de trabalho por
qualquer profissional de qualquer Estado-membro foi assumido no Memorando de Entendimento sobre as
Condicionalidades de Política Económica, assinado em 2011 pelo Governo português com o Fundo Monetário
Internacional, a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu, e nas redações que lhe foram dadas pelas
terceira, quarta e quinta atualizações.
Neste sentido, esperamos que esta proposta de lei seja aprovada por todos os partidos, uma vez que, para
além do mais, vai ao encontro de compromissos assumidos pelo Estado português.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana
Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Esta proposta de lei transpõe de
uma forma parcial a chamada Diretiva «Serviços», a famosa «Diretiva Bolkestein», que em devido tempo tanto
criticámos e sobre a qual continuamos a ter a mesma opinião.
De facto, esta chamada Diretiva «Serviços» não trouxe um mercado de igualdades, nem tão-pouco, ao
contrário do que disse o PSD, o mercado em que acreditamos. Por isso mesmo e porque se trata de uma
transposição parcial, a proposta de lei, na nossa perspetiva, valerá pouco e achamos também que é
praticamente inócua.
O que criticamos é efetivamente o que lhe dá origem, ou seja, a Diretiva que lhe dá origem, que, no nosso
entender, veio fragilizar em toda a Europa a legislação do trabalho e o mercado de trabalho. Tem sido a cobro
desta Diretiva que os países têm feito alterações para pior às diversas legislações de trabalho.
Foi também a cobro desta Diretiva que se precarizou o mercado de trabalho na Europa e não há novas
oportunidades, particularmente para os jovens.
Sr. Secretário de Estado, ainda hoje soubemos da intenção do Governo em matéria de despedimentos
ilegais. Estamos perante o retorno à selvajaria no mercado de trabalho e esta selvajaria que aqui existe, em
Portugal, também trespassa, infelizmente, toda a Europa.
Não é esta a Europa em que acreditamos, acreditamos, sim, numa Europa dos povos, numa Europa de
verdadeira igualdade, numa Europa com um mercado de trabalho digno e dignificado.
Aplausos do BE.
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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma sintética intervenção, tem ainda a palavra o Sr. Deputado
António Cardoso.
O Sr. António Cardoso (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: É unicamente para desejar à Sr.ª
Deputada do PSD que não tenha necessidade de emigrar. Ainda hoje assistimos na televisão a imagens de
pessoas, enfermeiros e enfermeiras, que partiam para outros locais para encontrar trabalho e foi uma cena
muito comovente.
Queria também dizer à Sr.ª Deputada que era preferível ver um Portugal com imigração do que com
emigração e ainda que sei os custos da emigração, porque sou filho de um emigrante na Venezuela e sei
quanto sofri com isso.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não há mais inscrições para este ponto, pelo que
vamos passar ao ponto seguinte da ordem de trabalhos, que consiste na apreciação da petição n.º 292/XII
(3.ª) — Apresentada por José Carlos de Oliveira e outros, solicitando à Assembleia da República que promova
o debate urgente visando as iniciativas legislativas e políticas necessárias para garantir o funcionamento e
evitar o encerramento da Cinemateca Portuguesa — Museu do Cinema.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do Partido
Comunista Português, em primeiro lugar, cabe-nos saudar os subscritores desta petição que é hoje debatida e
que é motivada precisamente pela situação com que se confronta a Cinemateca Portuguesa e o Arquivo
Nacional da Imagem em Movimento (ANIM), que dela faz parte.
Quanto à cultura, a política do Governo é conhecida de todos pela forma como relega para segundo plano,
do ponto de vista financeiro, o serviço público de arte e cultura, o que se traduz, depois, na prática, nas
instituições que devem cumprir esse serviço. Ora, a Cinemateca, sendo uma delas, não é exceção. Aliás, é
talvez um exemplo claro de quais são os efeitos desta política, quer na limitação da programação, que, apesar
dos esforços, se sente, quer na limitação até do cumprimento da missão pública que está atribuída
particularmente ao ANIM, o que faz com que Portugal, apesar de ter, de acordo com a legislação, de cumprir
um conjunto de objetivos na preservação e salvaguarda do património fílmico, não esteja a conseguir
salvaguardar o património em película, estando com sérias dificuldades até em conhecer qual o património
novo que está a ser construído, a pouco e pouco, no âmbito do digital, por falta de meios, por falta de
recursos.
Ao mesmo tempo, como todos sabemos, a Cinemateca e os Amigos da Cinemateca dinamizaram um vasto
conjunto de iniciativas para alertar o Governo para os custos que esta política está a ter, para a limitação que
esta política implica no cumprimento do serviço público de arte e cultura, nomeadamente no serviço público
prestado pela Cinemateca à cidade de Lisboa e ao País, e não só na preservação e salvaguarda e como
museu mas também na programação própria e como instrumento de investigação fundamental para os que
estudam cinema.
Sobre esta petição, Sr. Presidente e Srs. Deputados, da parte do PCP resta-nos dizer o seguinte: ainda
antes das mobilizações, o PCP chamou a atenção do Governo para a situação com que estava a ser
confrontada a Cinemateca e o ANIM, inclusivamente dirigiu perguntas ao Governo e apresentou à Assembleia
da República um projeto de lei. Esse projeto de lei, que foi rejeitado pelo PSD e CDS, visava redistribuir os
recursos angariados através da Lei do Cinema, por forma a salvaguardar o financiamento da Cinemateca.
Esses contributos do PCP foram rejeitados.
Já nesta sessão legislativa, o PCP voltou a apresentar propostas para afetar uma parte do financiamento
angariado através da Lei do Cinema à Cinemateca, inclusivamente alargando a base de angariação de fundos,
iniciativas que também foram rejeitadas pelo PSD e pelo CDS.
Ainda há pouco tempo, o PCP apresentou, para a acompanhar uma proposta de lei do Governo, um projeto
de lei que ia no mesmo sentido e que foi rejeitado pelo PSD e pelo CDS. No entanto, a proposta de lei do
Governo não traz uma linha sobre a Cinemateca. Resta-nos, Srs. Deputados do PSD e do CDS, no debate
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desta petição, apelar para que estejam disponíveis para aceitar a proposta do PCP na especialidade, a qual
mantemos e não retiraremos, para que a lei que venha a sair deste trabalho na especialidade contenha a
salvaguarda da Cinemateca-Museu do Cinema,…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … para o seu financiamento por via da Lei do Cinema.
O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É uma Lei com a qual o PCP não concorda integralmente, como é sabido,
mas é uma Lei que tem, necessariamente, de salvaguardar esta dimensão da atividade do Estado na
preservação e salvaguarda do património cultural, sendo este tão importante quanto é o património
cinematográfico.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês Teotónio
Pereira.
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Queria começar por
saudar os peticionários por esta iniciativa, sobre a qual quero sublinhar, antes de mais, três pontos.
O primeiro, ao contrário do que se refere na petição, a Cinemateca nunca esteve em risco de
encerramento. Não está em risco de encerramento e não estará em risco de encerramento.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Esse é que é o critério?! O de não encerrar?! Que tristeza!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — Em 2013 a Cinemateca não esteve em risco de encerrar. É a
isso que se refere a petição e é sobre isso que estamos aqui a discutir.
Protestos do PS e do PCP.
O que está, de facto, em causa e o que aconteceu em 2013 é simples de explicar: a quebra de receitas da
taxa de publicidade e a obrigação de cumprimento da Lei dos Compromissos levaram a que a Cinemateca
solicitasse, junto da tutela, uma dotação excecional, para com ela garantir o seu funcionamento até ao final do
ano.
Essa solicitação foi acompanhada de declarações públicas, e políticas, nos meios de comunicação que
criaram uma onda de alarmismo infundada perante um problema que estava a ser resolvido e que foi
resolvido.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Claro!
A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — De facto, importa sublinhar que esta petição se assume como
uma compreensível resposta a notícias surgidas na comunicação social sobre a eventualidade do
encerramento da Cinemateca, algo que nunca foi equacionado.
Em tempo útil, o Governo garantiu à Cinemateca uma dotação excecional de mais de um milhão de euros,
que permitiu o seu normal funcionamento até ao final de 2013.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Muito bem!
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A Sr.ª Inês Teotónio Pereira (CDS-PP): — A Cinemateca não está, neste ano, em risco de encerramento.
O Orçamento do Estado de 2014 garantiu cerca de três milhões e meio de euros para a Cinemateca
Portuguesa.
Isto significa, portanto, que há um compromisso do Governo e dos Deputados da maioria no financiamento
da Cinemateca via Orçamento do Estado. Mais ainda: significa que, ao contrário do que afirmam muitos
alarmistas, este Governo estima a cultura e estima a Cinemateca Portuguesa, e está disposto a todos os
esforços para as salvaguardar, como já foi demonstrado.
A Cinemateca não estará, no futuro, em risco de encerramento. O compromisso do Governo é claro e esta
bancada parlamentar subscreve-o. A Cinemateca é uma instituição cultural das mais importantes do País e o
seu funcionamento estará sempre garantido, seja pela via do Orçamento do Estado ou seja por via de outro
meio que se considere adequado.
De facto, o modelo de financiamento da Cinemateca é um assunto que, mais tarde ou mais cedo, terá de
ser discutido com profundidade e, posteriormente, alvo de ação política. Aliás, refira-se que o desafio que aqui
está em causa não é apenas português. Por toda a Europa, a redução da publicidade comercial levou a uma
quebra das receitas para estas instituições culturais. No caso português, entre 2008 e 2013, a quebra de
receitas ascendeu aos 50%.
As opções são muitas e, como se sabe, sendo uma das mais referidas a de garantir o financiamento da
Cinemateca através da Lei do Cinema, mas essa hipótese, neste momento, não se coloca. Porém, isso não
significa que outras questões não devam ser discutidas e que não deva existir, de facto, um amplo debate
sobre este assunto.
Assim, e para concluir, quero que fique absolutamente clara a posição do Grupo Parlamentar do CDS. O
debate sobre o modelo de financiamento da Cinemateca é importante e de certo modo urgente, mas, decida-
se o que se decidir, o financiamento ficará sempre, de um modo ou de outro, assegurado. É esse o nosso
compromisso e sabemos que é igualmente o compromisso do Governo.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, queremos saudar os peticionários e
peticionárias, os objetivos e a pretensão desta petição, começando pela questão mais evidente: é
incompreensível que possa aqui ser afirmado que o problema está resolvido quando, neste momento, não há
sequer dinheiro para legendas. Portanto, não sabemos como é que um partido que apoia o Governo pode vir a
esta Casa dizer que o problema está resolvido.
Na verdade, o problema da Cinemateca é um problema adiado; todos os anos se repete exatamente a
mesma história, mantendo-se a Cinemateca «na corda bamba» e não se encontrando uma solução digna, à
altura das funções que são as suas.
Aliás, é preciso recordar a quem tem um discurso tão otimista que neste ano, objetivamente, o risco é o da
paralisação. Ora, nesta «corda bamba», em que todos os anos é a mesma história, todos os anos é o mesmo
problema de falta de orçamento ajustado às funções da Cinemateca, a pergunta que se impõe é se há mais
uma esmola, se o Sr. Secretário de Estado tem mais uma esmola para dar à Cinemateca, que em nada
dignifica as suas funções, que são de preservação, de arquivo e de acesso público ao património
cinematográfico, o que exige um orçamento ajustado e digno para o cumprimento destas funções.
Neste sentido, é bom recordar também que a própria Lei do Cinema colocou a Cinemateca no pior possível
dos dois mundos, porque, na verdade, nem há transferências por parte do Orçamento do Estado, nem é
beneficiária das novas receitas devidas à taxa das operadoras de TV por cabo e outras.
Por isso, depois de tantas propostas que temos apresentado ao longo destes anos, propostas ajustadas às
necessidades e à missão da Cinemateca, ainda temos algumas expectativas e alguma esperança de que o
debate, na especialidade, da Lei do Cinema integre as propostas que apresentámos, no sentido de resolver o
erro grosseiro que a própria Lei do Cinema veio criar.
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria
Conceição Pereira.
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Cumprimento também
os peticionários aqui presentes.
É com muito gosto que estamos hoje de novo a falar, neste Plenário, da Cinemateca Portuguesa, na
sequência de uma petição em defesa desta mesma instituição, petição que recolheu mais de 7000
assinaturas, o que significa a importância e a relevância que a Cinemateca Portuguesa tem no panorama
cultural português, como todos sabemos, com mais de 500 km de película.
A Cinemateca, que em si contém também o Arquivo Nacional das Imagens em Movimento, o chamado
ANIM, é efetivamente um organismo que tem a responsabilidade de colecionar, preservar, restaurar e
catalogar obras cinematográficas e quaisquer outras imagens em movimento de produção portuguesa ou
equiparada, bem como promover a sua exibição regular, o que devia juntar-nos a todos, e não dividir-nos.
Aqui também é bom dizer que à frente desta casa têm estado sempre pessoas de referência, desde o seu
fundador, Manuel Félix Ribeiro, passando por João Bénard da Costa, por Maria João Seixas e, atualmente, por
José Manuel Costa, um homem da casa, que, como todos sabem, foi o grande responsável pelo projeto do
ANIM.
Todos temos consciência de que estamos a falar de um património único, todos estamos aqui não com um
discurso otimista mas com um discurso realista — é bom que isto se diga — e todos sabemos que as receitas
consignadas para a Cinemateca são insuficientes, devido à descida que houve de cerca de 50% que houve
nas taxas de publicidade, tal como também já aqui a Sr.ª Deputada do CDS referiu. Mas também todos
sabemos que o Governo tem dado provas de que está atento a esta situação e, em 2013, reforçou o
orçamento da Cinemateca em mais de 1 milhão de euros, em cerca de 1,1 milhão de euros, e para o corrente
ano temos 3,2 milhões de euros.
Claro que também sabemos, como disse o Sr. Deputado Miguel Tiago, da necessidade de aquisição de
equipamentos que possam dar resposta às necessidades nomeadamente no ANIM. Por isso, recomendamos
ao Governo, e confiamos, que, no âmbito do novo quadro comunitário, não deixe de considerar tal
necessidade.
Em outubro passado, neste Plenário — e o Sr. Deputado Miguel Tiago referiu os projetos de lei e o projeto
de resolução que estiveram em discussão —, afirmei claramente que o Grupo Parlamentar do PSD estava de
confiante de que a Cinemateca Portuguesa não iria fechar. E não fechou! Espero que acreditem na minha
palavra. E que, em 2014, também não iria fechar.
Quero felicitar muito claramente os mais de 7000 peticionários que se movimentaram em defesa da
Cinemateca Portuguesa e dizer-lhes que o Grupo Parlamentar do PSD está totalmente ao lado deles em
defesa da Cinemateca Portuguesa e nunca permitirá os seu encerramento.
Também concordamos com a solicitação apresentada, em audição, pelo primeiro subscritor, Dr. José
Carlos de Oliveira, de se encontrar um acordo interpartidário para se financiar a Cinemateca. O PSD está,
como sempre esteve, disponível para encontrar consensos e soluções, mas soluções reais e possíveis, para
responder às necessidades orçamentais dos diferentes organismos e, claro, para defender a Cinemateca
Portuguesa-Museu do Cinema e o Arquivo Nacional das Imagens em Movimento.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de
Medeiros.
A Sr.ª Inês de Medeiros (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Também começo por saudar o
representante dos 7389 peticionários, aqui presente.
Devo dizer que tinha preparado uma intervenção mas, depois de ter ouvido as intervenções, sobretudo das
bancadas do CDS e do PSD, tenho de alterar um pouco o sentido da minha intervenção inicial.
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7 DE MARÇO DE 2014
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Vou começar por responder à Sr.ª Deputada Maria Conceição Pereira e também à Sr.ª Inês Teotónio
Pereira.
Sr.as
Deputadas, pobre País, quando o critério para avaliação das suas instituições culturais é o de se está
ou não fechado. Se os senhores acham que já podemos estar descansados porque não fechou… eis o projeto
futuro da atual maioria! Srs. Deputados, um pouco de decoro, pelo menos para com as pessoas que lá
trabalham e que delas dependem! É inaceitável que tragam como argumento: «estejam descansados, a
instituição não fechou». É inaceitável e quero que isto fique muito claro.
Aplausos do PS.
Por outro lado, é com gosto que ouço que toda a gente tem a consciência da falta de financiamento da
Cinemateca.
A Sr.ª Deputada do Bloco de Esquerda dizia que a solução do problema da Cinemateca está sempre a ser
adiada, mas é bom relembrar que o problema do financiamento da Cinemateca foi criado por este Governo ao
excluí-la da nova taxa, como, aliás, o refere a resposta do próprio Secretário de Estado da Cultura em relação
a esta petição. O Governo reconhece que exclui a Cinemateca da nova taxa e que isso vai criar uma quebra
absolutamente inaceitável do seu financiamento mas não propõe nenhuma solução.
Srs. Deputados, fico muito feliz por saber que estão todos de acordo com os peticionários e, aqui, com a
oposição para arranjarmos uma solução. Mas quando? Quando?! Quando é que vão querer fazer esse
verdadeiro debate, esse debate sério? Essas palavras soam tão bem mas soam também tão vazias, porque
não há maneira de os senhores decidirem abrir esse debate.
Mas, já agora, temos uma ocasião para o fazer. Vamos rever a Lei do Cinema, onde os senhores excluíram
a Cinemateca da nova taxa, e vamos revê-la por absoluta cedência da parte do Governo e subserviência para
com os operadores de televisão por subscrição — é bom não esquecer! Curiosamente, aí não há uma
proposta para resolver o problema da Cinemateca. O PS fez uma proposta de alteração para voltarmos a
incluir a Cinemateca, e a minha pergunta é simples: vão aceitar essa alteração? Sim ou não? Ou ainda vão
adiar o debate sério? Ou ainda vão querer pensar nos termos exatos em que se vai debater? O problema da
Cinemateca é hoje, é agora, senão, para o ano, a Sr.ª Deputada Conceição Pereira estará feliz de voltar a
debater este assunto. Eu não estou nada feliz, estou infelicíssima, porque isso significaria que, de ano para
ano, voltamos a discutir os mesmos problemas.
Portanto, ou criamos agora, e temos ocasião para o fazer, uma solução que perdure ou, então, para o ano,
voltaremos a estar a ver qual é o dinheiro disponível, a esmola disponível que o Sr. Secretário de Estado
queira dar à Cinemateca.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não há mais inscrições e terminámos a nossa
ordem de trabalhos.
A próxima reunião terá lugar amanhã, sexta-feira, dia 7 de março, pelas 10 horas, com a seguinte ordem de
trabalhos: ponto 1 — Apreciação parlamentar n.º 75/XII (3.ª) — Decreto-Lei n.º 167-E/2013, de 31 de
dezembro, que altera o regime jurídico de proteção social nas eventualidades de invalidez e velhice do regime
geral de segurança social (PCP); ponto 2 — Projetos de resolução n.os
957/XII (3.ª) — Aprova as linhas
fundamentais para a elaboração e execução do programa nacional de simplificação administrativa e
desburocratização SIMPLEX II (PS) e 974/XII (3.ª) — Recomenda ao Governo que apresente e proceda à
implementação de um programa global e integrado de modernização e simplificação administrativas —
Programa SIMPLIFICAR (PSD e CDS-PP); ponto 3 — Projeto de lei n.º 522/XII (3.ª) — Altera a previsão legal
dos crimes de violação e coação sexual no Código Penal(BE);ponto 4 — Projeto de resolução n.º 946/XII (3.ª)
— Sobre a intervenção na via navegável do Douro (Os Verdes); ponto 5 — Petição n.º 239/XII (2.ª) —
Apresentada por Rodrigo Guedes Simas Faria de Castro e outros, solicitando que a Assembleia da República
tome medidas no sentido de impedir que a interrupção voluntária da gravidez seja comparticipada pelo Estado
português.
Pelas 12 horas teremos votações regimentais.
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I SÉRIE — NÚMERO 57
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Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 6 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.